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Tecendo os parágrafos

Neste capítulo, vamos continuar com a tessitura do texto


como uma unidade linguística concreta que busca uma interação
comunicativa entre leitor e escritor, ouvinte e falante.
Trataremos de dois conceitos fundamentais para a cons-
trução da unidade e do sentido do texto: a coerência e a coesão.
Estes dois aspectos caminham juntos como dois fatores interde-
pendentes, pois, para haver coerência, é necessária a coesão que,
por seu lado, promove a coerência.
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No entanto, no ato da escrita ou fala pode acontecer de se produzir um


texto com todos os recursos de coesão e, ainda assim, ele não ser coerente, ou
produzir um texto coerente mesmo sem a coesão.
Vamos ao estudo de cada um desses conceitos, com suas particularida-
des, para adentrar no mundo do bom texto.

4.1 Coerência textual


É importante pensar, antes de discutir coerência textual, sobre o signifi-
cado que esta palavra transmite. Segundo o dicionário on-line Caldas Aulete,
coerência é:
1. Relação lógica e harmônica entre ideias, atos, situações;
lógica, nexo. Ex. A coerência do depoimento com os fatos
reais. A coerência entre o discurso e a prática.
2. Qualidade, condição, estado do que tem coerência.
Conhecendo suas ideias, é notória a coerência de seus atos.
3. Lógica interna entre os elementos de um sistema, como
entre argumentos, ideias, ações etc., ausência de contradi-
ções ou paradoxos entre eles: Seus textos são todos de uma
grande coerência.
4. Prevalência de uma uniforme maneira de alguém pensar,
proceder, julgar, etc. (AULETE, 2012, s. p., grifos nossos).

Logo, a coerência enquanto qualidade está presente no imaginário cole-


tivo como algo que se deve ter para ser levado a sério pelos outros, uma vez
que, sem ela, fica-se confuso, alienado, não se é entendido. Por este motivo,
é comum ouvirmos alguns comentários, como “Nossa, como você é incoe-
rente” ou “O que você está dizendo não tem sentido”, entre outros.
Assim, coerência textual é o atributo responsável pelo estabelecimento
do sentido produzido pelos leitores no ato da leitura. Deve encontrar-se tanto
em quem escreve quanto em quem lê, em outras palavras, ela desenvolve-se
no entrelugar autor-texto-leitor durante o ato de leitura. Ou seja, tem-se a
coerência interna – projetada no processo de produção do texto, na codifica-
ção – e a coerência externa, que ocorre no encontro do leitor com o texto no
processo de decodificação e interpretação.

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Tecendo os parágrafos

A coerência interna é centrada no escritor e na compatibilidade entre o


texto como um todo e as partes que o compõem, e concretiza-se na interação
que se estabelece durante o ato de leitura, logo ela existe antes da leitura,
como potencial do texto, sendo concretizada durante e após este ato. A inco-
erência ocorre motivada por vários fatores, como problemas de acentuação,
ortografia, junção das frases e parágrafos, uso inadequado de vocabulário,
aspectos relacionados à coesão textual e que comprometem a lógica na expo-
sição das ideias.

João Carlos vivia em uma pequena casa construída no alto de


uma colina árida, cuja frente dava para o leste. Desde o pé da colina se
espalhava em todas as direções, até o horizonte, uma planície coberta
de areia. Na noite em que completava 30 anos, João, sentado nos
degraus da escada colocada à frente de sua casa, olhava o sol poente e
observava como a sua sombra ia diminuindo no caminho coberto de
grama. De repente, viu um cavalo que descia para sua casa. As árvo-
res e as folhagens não lhe permitiam ver distintamente; entretanto,
observou que o cavalo era manco. Ao olhar de mais perto, verificou
que o visitante era seu filho Guilherme, que há 20 anos tinha partido
para alistar-se no Exército; e, em todo esse tempo, não havia dado
sinal de vida. Guilherme, ao ver o pai, desmontou imediatamente,
correu até ele, lançando-se nos seus braços e começando a chorar
(KOCK; TRAVAGLIA, 1990, p. 32).

O que torna incoerente, sem sentido, o texto destacado anteriormente,


não é apenas a extensão que ele possui, mas sua inaceitabilidade. Ele contém
profundas contradições, entre elas: João tem trinta anos e seu filho tinha
partido há vinte, com 18 anos; a planície era coberta de areia e depois coberta
de grama; ele morava no alto da colina e o cavalo descia para chegar, etc. No
entanto, apesar de todas estas contradições, o texto poderia, numa leitura
desatenta, passar por um texto coerente.
Portanto, ao se escrever um anúncio, um cartaz, um recado, a leitura
atenta deve ser redobrada – para evitar erros e não provocar confusão na
lógica do texto – e efetivada pelo leitor.

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HAAP Media Ltd/Michal Zacharzewski

HAAP Media Ltd/Ilker


Restaurante
beira mar
Aberto todos os dias!
Descanso semanal: segunda-feira

No primeiro anúncio, pode-se entender também que domingo não é


dia e, no segundo, que um dia você trabalha descansando.
A coerência externa está centrada no leitor. Ele, porém, pode não enten-
der o que o texto quer dizer e não conseguir compreender a lógica do autor,
por mais que a coerência interna tenha sido bem arquitetada. Desta forma, o
leitor considerará o texto incoerente.
Conforme vimos nos exemplos dados, muitas vezes textos mal elabora-
dos acabam afirmando algo diferente da real intenção do autor. Outra possi-
bilidade é de que o leitor não domine a linguagem utilizada pelo autor ou não
conheça o contexto no qual e para o qual o texto foi produzido. Para Koch e
Travaglia (1990, p. 61), “o conhecimento de mundo é visto como uma espécie
de dicionário enciclopédico do mundo e da cultura arquivado na memória”.
A coerência, portanto, longe de constituir “mera qualidade ou pro-
priedade do texto, é resultado de uma construção feita pelos interlocutores,
numa situação de interação dada, pela atuação conjunta de uma série de fato-
res de ordem cognitiva, situacional, sociocultural e interacional” (KOCH;
­TRAVAGLIA apud KOCH, 2005, p. 52).
Cada tipo de texto tem sua estrutura própria, por isso, os mecanismos
de coerência e de coesão (esta sendo uma costura entre as partes do texto
que se faz com uso de elementos conectores, os quais englobam numerais,
artigos, conjunções, pronomes entre outras classes gramaticais) também vão
se manifestar de forma diferente, conforme se trate de um texto narrativo,
descritivo ou dissertativo-argumentativo.

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Tecendo os parágrafos

No texto narrativo, a coerência está relacionada com a ordem tempo-


ral, cronológica, adotada para apresentar os fatos.

[...] as vidas não começam quando as pessoas nascem, se assim


fosse, cada dia era um dia ganho, as vidas principiam mais tarde,
quantas vezes tarde demais, para não falar naquelas que, mal tendo
começado já se acabaram. [...] Ah, quem escreverá a história do que
poderia ter sido? (SARAMAGO, 1988, p. 16).

Neste fragmento, Saramago afirma que “as vidas não começam”, na


sequência diz “as vidas principiam mais tarde”, depois “tarde demais” e “mal
tendo começado já se acabaram”. Isso nos dá uma noção evidente de sequen-
cialidade dos fatos.
No texto descritivo, a coerência está relacionada em função de uma
ordem espacial das características daquilo que se descreve, seja uma pessoa,
um cenário, um objeto. A coerência se dá quando o leitor consegue visuali-
zar, com a forte adjetivação das cores, volume, odor, textura, dimensões, o
todo a partir dessas características.

[…] algumas características […] sinais importantes […] vamos


descrever. Observem os olhos, que têm a prega nos cantos, e a pálpebra
oblíqua […] o dedo mindinho das mãos, arqueado para dentro […]
achatamento da parte posterior do crânio […] a hipotonia muscular
[…] a baixa implantação da orelha e […] (TEZZA, 2008, p. 45).

Cristóvão Tezza, nesta descrição, nos faz uma apresentação biológica


fotográfica do personagem (seu filho), uma criança com Síndrome de Down.
No texto dissertativo-argumentativo, é muito importante para a coe-
rência a ordem lógica das ideias. Na dissertação, são apresentados argumen-
tos, dados, opiniões, a fim de defender uma ideia ou questionar um assunto.
Para tal, é necessário usar adequadamente conectivos específicos para expres-
sar a causa, finalidade, conclusão, condição, etc. É importante, também, que
a argumentação esteja de acordo com a tese levantada e a conclusão deve ser
a decorrência lógica dessa argumentação.

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A contemporaneidade se caracteriza pelo tempo abreviado.


Falta de tempo. Falta de tempo de ler e de escrever. Falta de contato
com textos e contextos que incentivem a leitura como experiência.
Nela vivemos o paradoxo: muito se fala sobre leitura, muito se pro-
põe, mas os livros mais vendidos continuam sendo os didáticos. No
Brasil, em mais de 90% dos municípios não há livrarias, além de serem
muito precárias ou quase inexistirem as bibliotecas.
Quando não é assim, a quantidade de textos e de estímulos
acentua a leitura interrompida. Aos poucos e cada vez mais, além da
incompletude que marca o ato de ler, faz-se uma leitura fragmentada.
E aqui é preciso diferenciar a escrita em fragmentos (onde cada parte,
como uma ruína no sentido benjaminiano, contém as leis do todo) da
fragmentação a que assistimos, que nos afeta e que praticamos. Frag-
mentação também da leitura. Leem-se pedaços de textos cada vez mais
curtos, mensagens, trechos, resumos, informações. De que maneira as
crianças e os jovens respondem a todas essas transformações?
Em geral, a leitura impressiona de modo diferente aquele que lê se
é feita na juventude ou na maturidade, ainda que as ideias, ações, valo-
res e sentimentos possam ir se plantando mesmo se o leitor disso não se
dá conta. Mas na vida contemporânea há tempo e espaço para leituras
que sejam feitas como experiência? Há livros disponíveis e políticas cul-
turais que favoreçam tais práticas? (KRAMER, 2000, p. 20).

Essa é uma reflexão pertinente para todos os usuários da língua uma vez
que, se não houver tempo e espaço para a leitura em nosso cotidiano, haverá
um apagão da leitura. Para que isso não ocorra, é importante a presença de
políticas públicas de incentivo à leitura, o que responde a pergunta feita por
Sonia Kramer.
Seis são os tipos de coerência, segundo Koch e Elias (2006, p. 23): sintá-
tica, semântica, temática, pragmática, estilística e genérica.
1. Coerência sintática: depende do conhecimento linguístico dos
usuários da língua. Exige o domínio do léxico, do uso dos conecti-
vos, o respeito à ordem dos elementos da frase.

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Tecendo os parágrafos

2. Coerência semântica: evidencia-se pelo uso adequado das pala-


vras ou expressões e suas relações de sentidos produzidos no
texto.
3. Coerência temática: ocorre quando os enunciados presentes no
texto são importantes para o tema que se está discutindo.
4. Coerência pragmática: precisa que em uma sequência de atos de
fala eles estejam relacionados adequadamente, não podendo em
um mesmo ato realizarem-se diferentes ações, como perguntar e
dar ordem, ou dar ordem e cantar.
5. Coerência estilística: depende das situações interativas em que
o usuário da língua irá se encontrar. Para cada uma há um estilo
apropriado que deve ser respeitado.
6. Coerência genérica: recai sobre as características do gênero tex-
tual, como finalidade, conteúdo, estilo e forma em conformidade
com a prática social a ser realizada.
Portanto, o que se busca com a coerência é a unidade do texto. Inde-
pendentemente da forma que o autor dá a ele, se houver unidade de sentido,
haverá coerência. Veja, a seguir, um exemplo de texto que tem um conjunto
aleatório de referências e, mesmo assim, consegue deixar evidente o sentido.

— Que pão!
Doce? de mel? de açúcar? de ló? de mico? de trigo? de mistura?
de rapa? de saruga? de soborralho? do céu? dos anjos? brasileiro? fran-
cês? italiano? alemão? do Chile? de forma? de bugio? de porco? de gali-
nha? de pássaros? de minuto? ázimo? bento? branco? dormindo? duro?
sabido? saloio? seco? segundo? nosso de cada dia? ganho com o suor do
rosto? que o diabo amassou?

ANDRADE, C. D. A eterna imprecisão da linguagem.


In: SILVEIRA, M. H. A. Comunicação, expressão e
cultura brasileira. Petrópolis: Vozes, 1971. n. 3.

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Neste texto, a coerência foi possível a partir do título proposto por


Drummond ao leitor e comprovada com a enumeração de várias palavras e
expressões que se aproximam e se afastam no sentido.

4.2 Coesão textual


Para que um texto não seja um amontoado de frases e parágrafos, há
necessidade de se realizar a costura destas partes que o formam. A costura
é feita com elos que promovem a transição de uma frase para outra, de um
parágrafo para outro, de uma ideia para outra. Algumas vezes, o elo retoma o
que já foi dito e, outras vezes, sugere o acrescentar de novas ideias. Ou seja, é
um processo de olhar para trás e para adiante. A coesão ocorre, então, dentro
da frase e entre as frases e parágrafos.
Koch e Travaglia (1990, p. 13) conceituam a coesão como “o fenômeno
que diz respeito ao modo como os elementos linguísticos presentes na super-
fície textual se encontram interligados, por meio de recursos também lin-
guísticos, formando sequências veiculadoras de sentido”. Para Platão e Fiorin
(1996, p. 35), a coesão textual “é a ligação, a relação, a conexão entre as pala-
vras, expressões ou frases do texto.”
Para se produzir a coesão, é necessário utilizar os recursos do sistema
léxico-gramatical da língua. Ora serão utilizados recursos da gramática, ora
do léxico. Os autores Halliday e Hasan elencam várias possibilidades de se
fazer a coesão como por meio de referência, substituição, elipse, conjunção
e, ainda, lexicalmente entre um elemento do texto e algum outro elemento
importante para a sua interpretação (KOCH, 1990, p. 18).
A seguir, apresentaremos os elementos mais importantes a serem
empregados para assegurar a coesão.

4.2.1 Coesão referencial


A referência é feita por pronomes pessoais, possessivos, demonstrativos
ou advérbios e expressões adverbiais que indicam localização. Observe os
exemplos a seguir.

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2 O estádio é um dos melhores da cidade. Seus dirigentes se preo-


cupam muito com a limpeza e segurança. Ele recebeu o prêmio
destaque esportivo 2011.
2 Há uma grande diferença entre João e José. Este guarda rancor de
todos, enquanto aquele tende a perdoar.
2 Não podíamos deixar de ir ao Louvre. Lá está a obra-prima de
Leonardo da Vinci, a Mona Lisa.
2 Vamos fazer um exercício que é igual ao de ontem.

4.2.2 Coesão por substituição


A substituição é usada quando a referência não é idêntica e um item pode
ser colocado em lugar de outro, ou de uma frase inteira. Observe os exemplos.
2 Margarete comprou uma camisa cor-de-rosa, mas Cristina prefe-
riu uma vermelha.
2 O padre ajoelhou-se. Todos fizeram o mesmo.
2 Mate um frango ativo e roliço. Prepare-o e corte-o. Asse-o
durante uma hora.

4.2.3 Coesão lexical


A coesão lexical depende da utilização de palavras já ditas, com o uso
de sinônimos, hiperônimos, nomes genéricos ou palavras do mesmo campo
semântico (ou seja, são palavras diferentes, mas que se aproximam pelo sen-
tido, como no caso aluno/estudante; quadrados/retângulos, losangos/qua-
driláteros). Podemos afirmar que se designa como semântica a ciência que se
preocupa com o significado das manifestações linguísticas que é construído
pelas informações culturais. Observe os exemplos:
2 repetição – O diretor entrou na sala. O diretor estava atrasado.
2 sinônimo – A secretária entrou na sala. A secretária estava
atrasada.

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2 hiperônimo – Pedro desenhou quadrados, retângulos e losangos.


Os quadriláteros estavam corretos.
2 nome genérico – Pedro desenhou quadrados, retângulos e losan-
gos. As figuras geométricas estavam corretas.
2 palavras do mesmo campo – A empresa estava aberta. Dezenas de
diretores e funcionários circulavam nos corredores.

4.2.4 Coesão por elipse


Os pronomes, os verbos, os nomes e sentenças, em muitas frases, podem
estar implícitos e não precisam ser repetidos. Observe os exemplos.
2 Eles acordaram e [...] viajaram. (pronome – eles)
2 O ministro foi o primeiro a chegar. [...] Abriu a sessão às oito em
ponto e [...] fez então seu discurso emocionado. (nome – ministro)
2 Eu comprei camisas, minha irmã, [...] saias. (verbo – comprou)
2 Você já leu todo o livro? – Li. (frase – já li todo o livro)

4.2.5 Coesão por conjunção


As conjunções estabelecem relações significativas específicas entre
os elementos do texto. São conectores responsáveis pelo encadeamento
entre orações ou partes do texto, estabelecendo relações de sentido.
Observe os exemplos.
2 Fomos ao Rio de Janeiro. Depois, jantamos em Petrópolis.
2 Não adianta tomar atitudes radicais nem fazer de conta que o pro-
blema não existe.
2 Você devia estar preocupado com seu futuro, isto é, com a sua
sobrevivência.
2 Não estou descontente com seu desempenho, mas com sua
arrogância.

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4.2.6 Sentidos estabelecidos pelos conectivos


4.2.6.1 Conectivos coordenativos
São realizados pelas conjunções coordenadas elencadas a seguir.
2 Adição: e, nem, também, não só... mas também.
Exemplo: Ela faz esportes e trabalha.
2 Alternância: ou... ou, quer... quer, seja... seja.
Exemplo: Ou ela viaja ou trabalha.
2 Oposição, contraste: mas, porém, todavia, contudo, entretanto,
senão, que. Também as locuções: no entanto, não obstante, ainda
assim, apesar disso.
Exemplo: Ela trabalha, no entanto não estuda.
2 Conclusão (em relação à oração anterior): logo, portanto, pois
(posposto ao verbo). Também as locuções: por isso, por conse-
guinte, pelo que…
Exemplo: Ela trabalhou com dedicação, logo o projeto deverá
ser aprovado.
2 Explicação (justificam a proposição da oração anterior): que,
porque, porquanto…
Exemplo: Vamos preparar as pautas que as reuniões começam amanhã.

4.2.6.2 Conectivos subordinativos


São aqueles que unem duas orações que dependem sintaticamente uma
da outra, ou seja, não fazem sentido se ficarem sozinhas.
2 Causa: expressam a causa do efeito ou da consequência apresenta-
dos na oração principal: que, como, pois, porque, porquanto. Tam-
bém as locuções: por isso que, pois que, já que, visto que.
Exemplo: Ela deverá ser aceita, pois seu currículo é muito bom.

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2 Comparação: estabelecem uma comparação com a oração princi-


pal: menos…do que, assim como, bem como, que nem…
Exemplo: Ela é mais dedicada do que a maioria dos seus colegas.
2 Concessão: apresentam um fato que contraria a oração principal,
mas permite que ele aconteça: que, embora, conquanto. Também
as locuções: ainda que, mesmo que, bem que, se bem que, nem que,
apesar de que, por mais que, por menos que…
Exemplo: Ela não foi aprovada para o cargo, apesar de que sua
entrevista foi muito convincente.
2 Condição: como a própria palavra diz, expressam a condição para
que o fato mencionado na oração principal se realize: se, caso.
Também as locuções: contanto que, desde que, dado que, a menos
que, a não ser que, exceto se.
Exemplo: Ela poderá ser aprovada, se apresentar um ótimo desem-
penho em língua estrangeira.
2 Finalidade: Esclarecem o objetivo do fato apresentado na oração
principal. Vejamos as locuções para que, a fim de que, por que.
Exemplo: É necessário preparar-se com dedicação, para que se
obtenha boa classificação nos testes admissionais.
2 Tempo: expressam uma circunstância de tempo em relação ao
fato mencionado na oração principal: quando, apenas, enquanto.
Também as locuções: antes que, depois que, logo que, assim que,
desde que, sempre que.
Exemplo: Ela deixou de estudar com dedicação, quando foi aprovada.
2 Consequência: demonstram o efeito a respeito de um fato men-
cionado na oração principal: que (precedido de tão, tanto, tal) e

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também as locuções: de modo que, de forma que, de sorte que, de


maneira que.
Exemplo: Ela trabalhava tanto, que pouco tempo tinha para dedi-
car-se à família.
Não esqueça que, com estas palavras, mantemos o sentido, que é
construído com a coerência e a coesão, que faz a costura entre as partes
de um texto.

Dica de leitura
Para recordar o que é artigo, numeral, pronome, advér-
bio, conjunção consulte as relações completas dessas
classes gramaticais em gramáticas da língua portuguesa,
como:
BECHARA, E. Moderna gramática portuguesa. São
Paulo: Lucerna, 2009.
CEGALLA, D. P. Novíssima gramática da língua por-
tuguesa. 48. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacio-
nal, 2008.
LINDLEY, C.; CUNHA, C. Nova gramática do por-
tuguês contemporâneo. São Paulo: Lexikon, 2009.

Leia o texto de Rubem Alves, destacado a seguir, e perceba a presença


dos elementos de coesão na frase, entre as frases, entre os parágrafos e os senti-
dos que eles revelam. Somente alguns elementos foram destacados, deixando-
-se sem destaque todas as elipses nominais e verbais, bem como as referências
por meio de pronomes pessoais, possessivos, que são evidentes ao leitor.

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Os urubus e sabiás
Tudo aconteceu numa terra distante, no tempo em que os bichos
falavam... Os urubus, aves por natureza becadas, mas sem grandes dotes
para o canto, decidiram que, mesmo contra a natureza eles haveriam
de se tornar grandes cantores. E para isto fundaram escolas e impor-
taram professores, gargarejaram dó-ré-mi-fá, mandaram imprimir
diplomas, e fizeram competições entre si, para ver quais deles seriam
os mais importantes e teriam a permissão para mandar nos outros.
Foi assim que eles organizaram concursos e se deram nomes
pomposos, e o sonho de cada urubuzinho, instrutor em início de car-
reira, era se tornar um respeitável urubu titular, a quem todos cha-
mam de Vossa Excelência.
Tudo ia muito bem até que a doce tranquilidade da hierarquia
dos urubus foi estremecida. A floresta foi invadida por bandos de pin-
tassilgos tagarelas, que brincavam com os canários e faziam serenatas
para os sabiás...
Os velhos urubus entortaram o bico, o rancor encrespou a testa,
e eles convocaram pintassilgos, sabiás e canários para um inquérito.
— Onde estão os documentos dos seus concursos?
E as pobres aves se olharam perplexas, porque nunca haviam
imaginado que tais coisas houvesse. Não haviam passado por esco-
las de canto, porque o canto nascera com elas. E nunca apresen-
taram um diploma para provar que sabiam cantar, mas cantavam
simplesmente...
— Não, assim não pode ser. Cantar sem a titulação devida é um
desrespeito à ordem. E os urubus, em uníssono, expulsaram da flo-
resta os passarinhos que cantavam sem alvarás.
Moral: em terra de urubus diplomados não se houve canto de
sabiá (ALVES, 1995, p. 81, grifos nossos).

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Da teoria para a prática


Em todas as profissões, no dia a dia, existe a necessidade do uso coe-
rente da linguagem. Uma pesquisa recente mostrou que saber escrever
bem é o principal requisito para chegar aos cargos mais altos em uma
empresa. Na pesquisa, foram analisadas redações de 580 pessoas empre-
gadas em empresas de diferentes ramos. O resultado mostrou que aquelas
com cargos de chefia (e salários maiores) obtiveram uma nota média 43%
maior em seus textos.
É por isso que testes de redação estão presentes nos processos seletivos
de muitas empresas. Em outras tantas, a fluência da comunicação tem um
significativo peso na carreira profissional. “É uma competência bastante con-
siderada quando se pensa em promover alguém”, confirma Vera ­Vasconcellos,
consultora da Career Center, em matéria recentemente publicada no caderno
de empregos do jornal O Estado de S.Paulo.
Thiene Marcondes (2012), em reportagem recente, reforça esta ques-
tão quando afirma:
que expectativa o diretor de uma empresa criaria sobre o tra-
balho de alguém que lhe manda um e-mail assim:
Presado sr. silva
p/ meio desta gostaria de estar encaminhando anexo prop de trab
da equipe que sou cordenador , projetos integrados apresentando
soluçoes que nossa empresa precisa devido os prob logísticos ante-
riormente apresentados.
A sua disposiçao. abs... (MARCONDES, 2012, s. p.).

Cita ainda que Laila Vanetti, diretora e fundadora da Scritta, empresa


que oferece cursos e consultoria em linguagem escrita, faz um alerta: “falar
e escrever bem é uma condição de empregabilidade” (VANETTI apud
­MARCONDES, 2012, s. p.). Segundo Laila, as empresas procuram profis-
sionais que saibam organizar ideias, que tenham argumentos lógicos e que
sejam bem articulados. Sabe-se, portanto, que no mundo corporativo a alma
do negócio anda de mãos dadas com a comunicação. Telefonando, conver-
sando, enviando cartas e, na atualidade, com o uso contínuo de e-mail. Todos

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Leitura e Escrita na Era Digital

estes meios de comunicação exigem bom conhecimento da língua para que a


mensagem seja entendida. 
No âmbito educacional a linguagem sempre foi o instrumento essencial
e, atualmente, com o advento do ensino a distância, o domínio desta ferra-
menta tornou-se mais fundamental ainda, pois o professor precisa dominar
um conhecimento, apropriar-se dele e transmiti-lo não só oralmente, mas,
também, por escrito.

Síntese
Como foi possível perceber, coerência é o resultado da articulação das
ideias de um texto; é a estrutura lógico-semântica que faz com que, numa
situação discursiva, palavras e frases componham um todo significativo para
os interlocutores.
Algumas vezes, a incoerência resulta do uso inadequado dos elementos
de coesão na construção dos períodos e de parágrafos. Pode ser, ainda, provo-
cada pelo erro no emprego dos mecanismos gramaticais e lexicais. Quando
todos estes aspectos forem respeitados, o texto terá a unidade formal e o sen-
tido preservados.
A coesão é responsável pela ligação, relação, nexo entre os elementos
que realizam a tessitura do texto. As várias palavras que são usadas como
conectivos, tais como as preposições, as conjunções, os pronomes, os advér-
bios vão conferir a unidade ao texto e contribuir para a clareza das ideias
transmitidas. Já o uso inadequado causa problemas de compreensão do que
se está querendo dizer.

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