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1
Humberto de Campos Ribeiro Júnior
2
Mirian de Waele Souchois
3
Vera Campos
4
Hilton Souchois de Albuquerque Mello
O presente trabalho apresenta o relato do caso clínico de uma paciente de quatro anos de idade com
mordida cruzada posterior unilateral na dentição decídua, tratada apenas com desgaste seletivo, com
base na revisão da literatura sobre o assunto. Com o objetivo de se validar a opção pelo tratamento
precoce, realizado ainda na dentição decídua, através do desgaste seletivo dos elementos dentários
causadores de interferências oclusais, o correto diagnóstico e o mais indicado tipo de tratamento são
destacados. O desgaste seletivo é um tratamento indicado em casos de mordida cruzada funcional. Ao
final deste relato de caso clínico, a mordida cruzada posterior unilateral foi corrigida e a paciente e seus
responsáveis foram instruídos a voltarem à clinica odontológica regularmente para a manutenção e
controle do caso.
Palavras-chave: mordida cruzada, dentição primária, má oclusão, ortodontia.
INTRODUÇÃO
A mordida cruzada posterior é a má oclusão mais prevalente na dentição
decídua 1, 2, 3, 4. Exatamente por esse motivo, grande importância deve ser dada ao
seu correto diagnóstico e tratamento mais adequado.
Foi-se o tempo em que, na odontologia, acreditava-se que as más oclusões
eram raras na dentição decídua. Atualmente, sabe-se que as más oclusões têm
seu início na dentição decídua. Através da intervenção precoce da mordida
cruzada posterior na dentição decídua (e também em outros tipos de más oclusões)
estas alterações poderiam ser tratadas antes de se tornarem casos complexos,
quando o tratamento é postergado para a dentição permanente.
Este trabalho tem como objetivo realizar uma revisão da literatura sobre a
mordida cruzada posterior na dentição decídua e apresentar um caso clínico de
uma paciente de quatro anos de idade, evidenciando o diagnóstico da mordida
cruzada posterior e seu tratamento precoce por intermédio de desgaste seletivo.
1
Especialista em Odontopediatria pelo IOPUC-RJ.
2
Professora assistente da Disciplina de Odontopediatria da FO-UERJ.
3
Professora assistente da Disciplina de Odontopediatria da FO-UERJ.
4
Coordenador do curso de Especialização em Odontopediatria do IOPUC-RJ.
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estão em oclusão; b) Muscular ou Funcional: manifestam
adaptações funcionais às interferências dentárias. A
análise funcional da oclusão deter mina tanto um
diagnóstico diferencial quanto a identificação dos dentes
com interferência oclusal; c) Esquelética: causadas por
aberrações no crescimento ósseo e/ou na morfologia dos
mesmos, promovendo crescimento assimétrico da maxila
ou mandíbula ou ainda acarretando em uma deficiência
na harmonia das larguras básicas da mandíbula e maxila.
Vadiakas & Roberts 4 também classificam a mordida
cruzada posterior em dentoalveolar, funcional e
esquelética, sugerem que, para um correto diagnóstico,
o paciente deve ser posicionado em relação cêntrica para
observação da presença ou não de um desvio oclusal.
De acordo com esses autores, a verdadeira mordida
cruzada unilateral é muito rara. Entretanto, um diagnóstico
diferencial entre constrição bilateral maxilar e mordida
cruzada unilateral verdadeira deve ser feita. O exame inclui
posicionamento da mandíbula em relação cêntrica e
observação do padrão de fechamento até a máxima
intercuspidação. Discrepância de linha média não
necessariamente significa presença de desvio. Já uma
discrepância na posição em relação cêntrica, sim. A
presença de simetria no arco maxilar é, geralmente,
diagnóstico de contrição bilateral da mandíbula. As
radiografias cefalométricas e a análise de modelos de
gesso também são importantes para um correto
diagnóstico 6.
Higley 8, descreve de forma mais detalhada seu
procedimento de diagnóstico. Para o autor, quando uma
deflexão mandibular for detectada enquanto a boca
estiver totalmente fechada, pede-se para o paciente abri-
la lentamente. Caso a mandíbula se desloque lateralmente
e continue sua abertura na linha média, pode trata-se de
uma inter ferência dentária, uma desordem
temporomandibular, artrite ou mesmo da presença de um
objeto estranho na cavidade glenóide. Porém, caso a
mandíbula continue se deslocando lateralmente, cada vez
mais distante da linha média, enquanto a boca se abre, a
causa seria a anquilose da ATM. Neste último caso, a
mandíbula sempre se desloca na direção do lado com a
anquilose. Em seguida pede-se ao paciente para fechar
a boca lentamente, até que haja um contato inicial entre
a mandíbula e a maxila. Quando a interferência dentária
for a causa da mordida cruzada, é possível constatar qual
dente está causando a interferência.
A opinião de que a mordida cruzada deve ser
tratada precocemente, assim que o problema é
diagnosticado, é defendida por vários autores 7, 6, 9, 11, 12, 14.
RELATO DE CASO
A paciente N. A. S., com quatro anos de idade,
compareceu à clínica de Especialização em
Odontopediatria da Pontifícia Universidade Católica (PUC)
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do Rio de Janeiro para tratamento odontológico. A queixa
principal da responsável era a presença de cáries na
criança.
O exame clínico da paciente comprovou a
existência de lesões de cárie em alguns elementos
dentários. Os procedimentos utilizados para obtenção do
diagnóstico e plano de tratamento consistiram de exame
físico, radiografias e modelos de gesso. Constatou-se
também a presença de uma mordida cruzada posterior
esquerda.
A paciente apresentava um comportamento tenso-
cooperador. As restaurações de amálgama, compósito e
ionômero foram realizadas, assim como a remineralização
de lesões ativas de mancha branca de cárie, através de
aplicações tópicas de verniz fluoretado.
Em seguida, foi iniciado o tratamento ortodôntico
da paciente, já que o exame de sua oclusão havia
revelado desvio da linha média inferior de três milímetros
para a esquerda, em posição de fechamento (Fig. 1).
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Ao todo, foram necessárias quatro consultas para
que uma oclusão adequada fosse atingida. Na consulta
posterior à última sessão de desgaste, pediu-se a paciente
que fechasse a boca até atingir os primeiros contatos
oclusais. Este contato estava igualmente distribuído em
ambos os lados (esquerdo e direito) e a linha média das
duas arcadas estava coincidindo (Fig. 3).
Figura 3 - Oclusão da
paciente ao final da quarta
sessão de desgaste.
Figura 4 - Entrega do
mantenedor de espaço
móvel, depois de terminadas
as sessões de desgaste.
DISCUSSÃO
De acordo com Riolo & Moyers 14 a mordida cruzada
posterior do tipo funcional se manifesta por intermédio de
adaptações funcionais às interferências dentárias. Sendo
assim é importante fazer uma análise funcional da oclusão
através da manipulação da mandíbula do paciente pelo
dentista até que seja identificado o dente que se
apresenta em interferência oclusal. A mordida cruzada
funcional poderá envolver um ou mais dentes do mesmo
arco dentário.
Pôde-se observar no caso clínico apresentado que,
de acordo com a sugestão de Vadiakas & Roberts 4, o
desvio de linha média não foi suficiente para que o
diagnóstico da mordida cruzada fosse feito. A
manipulação da mandíbula da paciente com movimentos
lentos de abertura e fechamento de boca, até posição
de relação cêntrica, foi realizada segundo proposto pela
literatura 4, 8. Apesar de Salzmann 6 considerar radiografias
cefalométricas e modelos de gesso indispensáveis para o
diagnóstico, os autores utilizaram apenas os modelos de
gesso. De posse de todos estes dados foi possível constatar
que se tratava de uma mordida cruzada posterior
funcional, causada por interferências dos elementos 63,
73, 62 e 72.
A decisão pelo tratamento precoce (ainda na
dentição decídua) foi embasada na literatura consultada
7, 11, 6, 9, 12, 14
e, de acordo com as conclusões dos trabalhos
publicados por Heikinheimo & Salmi 2; Salzmann 6; Fields Jr.
7
e Riolo & Moyers 14 e, optou-se pelo desgaste seletivo
como primeira forma de tratamento. Tal escolha foi feita,
mesmo sem a medição das distâncias intercanino e
intermolar, porque quando a mandíbula da paciente foi
manipulada para a posição de relação cêntrica, a
ausência de discrepância das larguras dos arcos maxilar
e mandibular tornava-se clara.
CONCLUSÕES
§ Com base na revisão da literatura foi possível
verificar que o tratamento da mordida cruzada posterior,
realizado da forma mais precoce possível, é de suma
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importância, tanto no que se refere à complexidade da
má oclusão quanto ao tratamento da mesma.
§ O dentista deve estar devidamente preparado
para que possam não só identificar a mordida
cruzada posterior funcional de uma mordida
cruzada posterior esquelética, mas também
para chegar a um diagnóstico preciso e correto.
E apenas dessa forma, não só a melhor forma
de tratamento, mas a saúde e bem estar do
paciente serão alcançados.
AGRADECIMENTOS
Apoio: CAPES
SUMMARY
This study reports a case of a 4-year-old female patient, with unilateral
primary posterior cross bite, treated with selective grinding based on the
literature review. To evaluate the results of early interceptive grinding in the
deciduous dentition, the correct diagnosis and most indicated treatment
were highlighted. Grinding guarantied good results in cases of posterior
functional cross bites. In the end of this case report, unilateral posterior cross
bite was corrected and the child and her parents were instructed to recall
visits to the dental clinic.
Key-words: malocclusion, orthodontics, primary dentition.
REFERÊNCIAS
1 Cavalcanti AL, Rodrigues CMD, Fazzi R. Mordida cruzada posterior
funcional: relato de caso. Rev Paul Odontol. 1996; 18(6):11-14.
2 Heikinheimo K, Salmi K. Need for orthodontic intervention in five-year-old
Finnish children. Proc Finn Dent Soc. 1987; 83:165-169.
3 Kurol J, Berglund L. Longitudinal study and cost-benefit analysis of early
treatment of posterior cross-bites in the primary dentition. Eur J Orthod.
1992; 14(3):173-179.
4 Vadiakas GP, Roberts MW. Primary posterior crossbite: Diagnosis and
treatment. J Clin Pediatr Dent. 1991; 16(1):1-4.
5 Moyers RE. Classificação e terminologia da má oclusão. In: ____________.
Ortodontia. 4. ed. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 1991. 483p. p.161.
6 Salzmann JA. Diagnosis and treatment in the deciduous dentition. In:
_______ Orthodontics in Daily Practice. Philadelphia: J. B. Lippincott, 1974.
658p. p316-318.
7 Fields Jr. HW. O tratamento ortodôntico de problemas não esqueléticos
em pré-adolescentes. In: Profit WR, Fields Jr. HW. Ortodontia
Contemporânea. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 1995. 596p.
p.374-378.
8 Higley LB. Crossbite: madibular malposition. J Dent Child. 1968; 35:221-223.
9 Weber FN. Interceptivepreventive orthodontics In: Salzmann JA.
Orthodontics in daily practice. Philadelphia: J. B. Lippincott, 1974. 658p.
p215220.
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