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CRIMES IMPORTANTES

EM RAZÃO DOS IMPACTOS DA COVID-19


PERSPECTIVA DEFENSORIAL
SUMÁRIO
DIREITO PENAL .................................................................................................................................................... 3
PROMOÇÃO DE MIGRAÇÃO ILEGAL................................................................................................................ 3
ABANDONO MATERIAL ................................................................................................................................... 6
ABANDONO INTELECTUAL .............................................................................................................................. 8
ABANDONO MORAL ...................................................................................................................................... 10
CRIME DE EPIDEMIA ..................................................................................................................................... 12
INFRAÇÃO DE MEDIDA SANITÁRIA PREVENTIVA .......................................................................................... 15
OMISSÃO DE NOTIFICAÇÃO DE DOENÇA ..................................................................................................... 17
PERIGO DE CONTÁGIO DE MOLÉSTIA GRAVE............................................................................................... 17

2
DIREITO PENAL

Crimes apostas para as próximas provas: a) promoção de migração ilegal; b) abandono material; c)
abandono intelectual; d) abandono moral; e) crime de epidemia e impactos da COVID-19; f) crime
de infração de medida sanitária e impactos da COVID-19; g) Omissão de notificação de doença e
impactos da COVID-19 e h) perigo de contágio de moléstia grave e impactos da COVID-19.

Olá, pessoal. Tudo bem com vocês? Esse material não estava previsto para o nosso curso.
No entanto, o mundo está um pouco diferente devido à pandemia causada pelo Novo Coronavírus,
e por isso precisamos acrescentar diversos tipos penais, com o objetivo de te orientar sobre alguns
detalhes importantes para nossas próximas provas.

Então, mãos à obra.

PROMOÇÃO DE MIGRAÇÃO ILEGAL

PROMOÇÃO DE MIGRAÇÃO ILEGAL

Art. 232-A. Promover, por qualquer meio, com o fim de obter vantagem
econômica, a entrada ilegal de estrangeiro em território nacional ou de brasileiro
em país estrangeiro: Incluído pela Lei nº 13.445, de 2017 Vigência

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. Incluído pela Lei nº 13.445,
de 2017 Vigência

§ 1º Na mesma pena incorre quem promover, por qualquer meio, com o fim de
obter vantagem econômica, a saída de estrangeiro do território nacional para
ingressar ilegalmente em país estrangeiro. Incluído pela Lei nº 13.445, de 2017
Vigência

§ 2º A pena é aumentada de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço) se: Incluído pela Lei
nº 13.445, de 2017 Vigência

3
I - o crime é cometido com violência; ou Incluído pela Lei nº 13.445, de 2017
Vigência

II - a vítima é submetida a condição desumana ou degradante. Incluído pela Lei nº


13.445, de 2017 Vigência

§ 3º A pena prevista para o crime será aplicada sem prejuízo das correspondentes
às infrações conexas. Incluído pela Lei nº 13.445, de 2017 Vigência

Esse crime, apesar de não ter ligação nenhuma com a pandemia, com certeza estará
presente nas próximas provas de Defensoria Pública, sobretudo na DPU. Por essa razão,
entendemos por bem trazer suas nances e detalhes para vocês.

NOVO CRIME: Trata-se de novo crime, inserido em Código Penal pela Lei 13.445/2017 – Lei de
Migração, responsável pela revogação da Lei 6.815/1980 – Estatuto do Estrangeiro. Um detalhe
curioso é que o legislador inseriu a promoção de migração ilegal no Título VI da Parte Especial do
Código Penal (“Dos crimes contra a dignidade sexual”), mais especificamente em seu Capítulo V
(“Do lenocínio e do tráfico de pessoa para fim de prostituição ou outra forma de exploração
sexual”). Contudo, essa escolha não foi a mais acertada, como bem esclarece Cleber Masson (2018,
p. 200), pelos seguintes motivos:

“(...) A promoção de migração ilegal pode ser praticada para fim de


prostituição ou outra forma de exploração sexual, mas não se restringe a
esta finalidade. Como se sabe, nada impede a realização da conduta com
finalidade diversa, a exemplo da redução do estrangeiro a condição análoga
à de escravo em solo brasileiro, ou mesmo quando o sujeito cobra
determinado valor para promover a entrada ilegal e voluntária de brasileiro
em país estrangeiro, para lá trabalhar, firmar residência e quiçá constituir
família. Destarte, teria sido mais apropriada a inserção da promoção de
migração ilegal entre os crimes contra a Administração Pública, uma vez que

4
a descrição típica deixa evidente a ofensa a interesse da União,
notadamente na entrada ilegal da estrangeiro no Brasil.”1

Objeto material: É o estrangeiro que entrou ilegalmente no Brasil, ou então o brasileiro que entrou
ilegalmente em outro país.

Mas quem seria “o estrangeiro”? Isto é, quais são as definições para a referida expressão?
Na verdade, o estrangeiro, conforme o art. 1.º, § 1.º, da Lei de Migração, divide-se em:

Pessoa nacional de outro país ou apátrida que trabalha ou


IMIGRANTE reside e se estabelece temporária ou definitivamente no
Brasil (inc. II);
Pessoa nacional de país limítrofe ou apátrida que conserva a
RESIDENTE
sua residência habitual em município fronteiriço de país
FRONTEIRIÇO
vizinho (inc. IV);
Pessoa nacional de outro país ou apátrida que vem ao Brasil
para estadas de curta duração, sem pretensão de se
VISITANTE
estabelecer temporária ou definitivamente no território
nacional (inc. V);
Pessoa que não seja considerada como nacional por nenhum
Estado, segundo a sua legislação, nos termos da Convenção
APÁTRIDA sobre o Estatuto dos Apátridas, de 1954, promulgada pelo
Decreto 4.246, de 22 de maio de 2002, ou assim reconhecida
pelo Estado brasileiro (inc. VI).

Sujeito ativo: Cuida-se de crime comum ou geral. Pode ser cometido por qualquer pessoa.

Sujeito passivo: É o Estado e a pessoa eventualmente prejudicada.

1
Masson, Cleber. Direito penal: parte especial arts. 213 a 359-h/Cleber Masson. - 8. ed. - São Paulo: Forense, 2018.

5
Elemento subjetivo: É o dolo, somado ao especial fim de agir (elemento subjetivo específico), tendo
em vista a expressão “com o fim de obter vantagem econômica”.

ATENÇÃO: O art. 38 da Lei 13.445/2017 – Lei de Migração atribui à PF as funções de polícia


marítima, aeroportuária e de fronteira, nos pontos de entrada e de saída do território nacional.

ABANDONO MATERIAL

ABANDONO MATERIAL

Art. 244. Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho
menor de 18 (dezoito) anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido
ou maior de 60 (sessenta) anos, não lhes proporcionando os recursos necessários
ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada
ou majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente,
gravemente enfermo: (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)

Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa, de uma a dez vezes o maior
salário mínimo vigente no País. (Redação dada pela Lei nº 5.478, de 1968)

Parágrafo único - Nas mesmas penas incide quem, sendo solvente, frustra ou ilide,
de qualquer modo, inclusive por abandono injustificado de emprego ou função, o
pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada.
(Incluído pela Lei nº 5.478, de 1968)

Objetividade jurídica: Segundo Cleber Masson (2018, p. 265), o bem jurídico penalmente tutelado
é a assistência familiar, relativamente ao direito à vida e à dignidade no âmbito da família,
especialmente na esfera da estrita necessidade material reciprocamente devida entre seus
membros (alimentos, habitação, vestuários, remédios, etc.).2

2
Masson, Cleber. Direito penal: parte especial arts. 213 a 359-h/Cleber Masson. - 8. ed. - São Paulo: Forense, 2018.

6
CUIDADO: esse abandono do art. 244 é o abandono material. O abandono intelectual está previsto
no art. 246 do Código Penal (veremos mais abaixo).

Objeto material: renda, pensão ou outro auxílio.

O art. 244, caput, do Código Penal contempla três condutas criminosas distintas. Vejamos
cada uma delas.

1) Deixar, sem justa causa, de prover os recursos necessários à subsistência


do cônjuge, do filho menor de 18 anos ou inapto para o trabalho, ou do
ascendente inválido ou maior de 60 anos;

2) Faltar ao pagamento da pensão alimentícia fixada judicialmente;

3) Deixar de socorrer, sem justa causa, ascendente ou descendente


gravemente enfermo.

Elemento normativo do tipo: Segundo a doutrina e a jurisprudência, a descrição típica do art. 244,
caput, do Código Penal contém um elemento normativo, representado pela expressão “sem justa
causa”, que funciona como elemento negativo do tipo.

Sujeito ativo: trata-se de crime próprio, pois somente por ser cometido por:

• Cônjuges
• Pais
• Ascendentes, desde que não sejam os pais:
• Descendentes

Sujeito passivo: O sujeito passivo direto é o Estado. No entanto, o sujeito de forma mediata são: o
cônjuge, o filho menor de 18 anos ou inapto para o trabalho, o ascendente inválido ou maior de 60

7
anos, o ascendente ou descendente gravemente enfermo e também o credor de pensão alimentícia
acordada, fixada ou majorada judicialmente.

ABANDONO INTELECTUAL

ABANDONO INTELECTUAL

Art. 246 - Deixar, sem justa causa, de prover à instrução primária de filho em idade
escolar:

Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.

Sujeito ativo: os pais.

Sujeito passivo: o filho em idade escolar.

Bem jurídico tutelado: a assistência familiar (direito de acesso ao ensino obrigatório do filho em
idade escolar.

Núcleo do tipo: Masson (2018, p. 277) entende que o núcleo do tipo é “deixar de prover”, ou seja,
omitir-se, não efetuar a matrícula do filho em idade escolar no estabelecimento de ensino de
instrução primária, ou então impedir que este frequente o estabelecimento de ensino fundamental.
Trata-se, portanto, de crime omissivo próprio ou puro, pois o tipo penal descreve uma conduta
omissiva.3

Elemento normativo do tipo: O art. 246 do Código Penal também contém um elemento normativo,
representado pela expressão “sem justa causa”. Por exemplo, em meio a pandemia causada pelo
Novo Coronavírus (COVID-19), as escolas pararam de funcionar presencialmente em razão do
contágio rápido causado pelo vírus. Alguns pais, sobretudo em escolas particulares, optaram por
cancelar a matrícula dos filhos em razão de vários motivos, sobretudo financeiros. Neste caso,

3
Masson, Cleber. Direito penal: parte especial arts. 213 a 359-h/Cleber Masson. - 8. ed. - São Paulo: Forense, 2018.

8
considerando a situação provocada pela Pandemia, não há se falar na existência do crime de
abandono intelectual enquanto perdurassem as medidas de isolamento e quarentena, haja vista o
tipo do art. 246 exigir que o fato seja “sem justa causa”.4

Homeschooling: caso os pais, seja por questões de segurança ou pela baixa qualidade da educação
ofertada pelo Estado, decidam oferecer o chamado “ensino domiciliar” aos seus filhos menores de
idade, prática conhecida como homeschooling na Europa e nos Estados Unidos, responderão pelo
delito de abandono intelectual? Para o saudoso professor Damásio E. de Jesus, citado por Cleber
Masson,5 “o fato seria atípico, uma vez que haveria a educação domiciliar da criança ou do
adolescente e restaria ausente a lesividade da conduta”. Além disso, está caracterizada a “justa
causa” a face à existência da pandemia da COVID-19, que já matou mais de 50 mil brasileiros.
Lembrando que o STF decidiu, em repercussão geral, que “Não é possível, atualmente, o ensino
domiciliar (homeschooling) como meio lícito de cumprimento, pela família, do dever de prover
educação. Não há, na CF/88, uma vedação absoluta ao ensino domiciliar. A CF/88, apesar de não o
prever expressamente, não proíbe o ensino domiciliar. No entanto, o ensino domiciliar não pode
ser atualmente exercido porque não há legislação que regulamente os preceitos e as regras
aplicáveis a essa modalidade de ensino. Assim, o ensino domiciliar somente pode ser implementado
no Brasil após uma regulamentação por meio de lei na qual sejam previstos mecanismos de
avaliação e fiscalização, devendo essa lei respeitar os mandamentos constitucionais que tratam
sobre educação”. STF. Plenário. RE 888815/RS, rel. orig. Min. Roberto Barroso, red. p/ o acórdão
Min. Alexandre de Moraes, julgado em 12/9/2018 (repercussão geral) (Info 915).”6

4
Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/educacao/noticia/2020-05/pais-cancelam-matriculas-de-criancas-
em-creches-particulares. Acesso em 24 de Junho de 2020.
5
Masson, Cleber. Direito penal: parte especial arts. 213 a 359-h/Cleber Masson. - 8. ed. - São Paulo: Forense, 2018.
6
CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Não é possível, atualmente, o homeschooling no Brasil. Buscador Dizer o Direito,
Manaus. Disponível em:
<https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/cca289d2a4acd14c1cd9a84ffb41dd29>. Acesso
em: 24/06/2020.

9
ABANDONO MORAL

ABANDONO MORAL

Art. 247 - Permitir alguém que menor de dezoito anos, sujeito a seu poder ou
confiado à sua guarda ou vigilância:

I - frequente casa de jogo ou mal-afamada, ou conviva com pessoa viciosa ou de


má vida;

II - frequente espetáculo capaz de pervertê-lo ou de ofender-lhe o pudor, ou


participe de representação de igual natureza;

III - resida ou trabalhe em casa de prostituição;

IV - mendigue ou sirva a mendigo para excitar a comiseração pública7:

Pena - detenção, de um a três meses, ou multa.

Esse crime não está previsto com a nomenclatura “abandono moral” no Código Penal.
Portanto, se você abriu o seu vade-mecum, com certeza não encontrou a expressão. Na verdade,
está dentro da rubrica prevista para o abandono intelectual. Nesse sentido Cleber Masson (2018,
p. 281/182):

“(...) O legislador não conferiu rubrica marginal ao crime tipificado no art.


247 do Código Penal. Em que pese essa omissão, a doutrina é unânime ao
atribuir a esse delito a denominação “abandono moral”, porque todas as
condutas legalmente descritas são contrárias à formação moral do menor
de 18 anos de idade, revelando o descaso daqueles que deveriam zelar pela
sua educação e pela sua integridade. Com efeito, o bem jurídico

7
Lembre-se que o art. 60 do Decreto-lei 3.688/1941, que tipificava a contravenção penal de mendicância, foi revogado
pela Lei 11.983/2009.

10
penalmente tutelado é a assistência familiar, relativamente à educação e à
formação moral da criança e do adolescente.”8 (GRIFOS NOSSOS).

Sujeito ativo: O pai, a mãe ou qualquer outra pessoa que tenha poder sobre o menor, como o tutor
ou o guardião.

Sujeito passivo: O menor de 18 anos.

Objeto jurídico: A educação moral.

Classificação: Próprio; formal; de forma livre; comissivo; instantâneo; unissubjetivo; unissubsistente


ou plurissubsistente, conforme o caso.

Olhar crítico: o art. 247 traz alguns conceitos jurídicos indeterminados, que dependem
exclusivamente da interpretação do magistrado. Por exemplo, o que é uma casa “mal-afamada?”
Quem são as “pessoas de má vida”? Quais são os “espetáculos capazes de perverter o menos de 18
anos?” Essas expressões devem ser vistas sob um olhar crítico, porque o direito penal não pode
deixar esse tipo de margem para a interpretação do aplicador do direito.

Elemento subjetivo: é o dolo.

Detalhe importante: considerando que a pena máxima do abandono moral é de três meses,
tratando-se, portanto, de infração penal de menor potencial ofensivo, é cabível a transação penal
e o rito sumaríssimo, nos termos da Lei 9.099/1995.

8
Masson, Cleber. Direito penal: parte especial arts. 213 a 359-h/Cleber Masson. - 8. ed. - São Paulo: Forense, 2018.

11
CRIME DE EPIDEMIA

EPIDEMIA

Art. 267 - Causar epidemia, mediante a propagação de germes patogênicos:


Pena - reclusão, de dez a quinze anos. (Redação dada pela Lei nº 8.072, de
25.7.1990)

§ 1º - Se do fato resulta morte, a pena é aplicada em dobro.

§ 2º - No caso de culpa, a pena é de detenção, de um a dois anos, ou, se resulta


morte, de dois a quatro anos.

Fique ligado: esse crime, até pouco tempo atrás, sequer era trabalhado em nosso material. Isso
porque sua incidência era quase zero em nossas provas. No entanto, com os impactos trazidos pelo
Novo Coronavírus (COVID-19), não há dúvidas de que o tema agora passa a ter uma enorme
importância.

Objeto material: Segundo Masson (2018, p. 370), é o germe patogênico, compreendido como o
micro-organismo capaz de produzir moléstia infectocontagiosa, nociva à saúde humana. Exemplos:
bactérias, bacilos, vírus, protozoários, fungos, etc.

Primeiro, é preciso fazer algumas distinções entre os conceitos de surto, epidemia e


pandemia, segundo Guilherme de Souza Nucci.9

A mais leve lesão à saúde pública é o surto (aumento repentino e


SURTO inesperado de determinada doença abrangendo um local determinado,
como, por exemplo, um bairro ou região de certa cidade.

9
Disponível em: <https://guilhermedesouzanucci.jusbrasil.com.br/artigos/823696891/a-pandemia-do-coronavirus-e-
a-aplicacao-da-lei-penal>. Acesso em 24 de junho de 2020.

12
Segue-se para a epidemia (contaminação de várias pessoas, em curto
EPIDEMIA espaço de tempo e em vários lugares, muito acima da expectativa, como,
por exemplo, envolvendo toda uma cidade, um estado ou um país);
Após, atinge-se a pandemia (contágio e infecção de várias pessoas por uma
doença, acima do esperado, abrangendo inúmeros locais e extrapolando
PANDEMIA as fronteiras de vários países; enfim, uma epidemia de caráter global, nos
termos hoje usados pela Organização Mundial da Saúde). É que se observa,
hoje, na COVID-19.

Elemento subjetivo: dolo, havendo também a forma culposa, cuja pena é de detenção, de 1 a 2
anos; neste caso, havendo morte, a pena passa a ser detenção, de 2 a 4 anos.

Transmitir coronavírus (Sars-Cov-2), no Brasil, para outras pessoas, pode ser tipificado no delito do
art. 267? Para o Professor Nucci, depende. Isso porque, “para que alguém cometa o crime de
epidemia, seria preciso que, estando infectado, adentrasse região livre de contaminação, onde
disseminaria o vírus de modo doloso (direto ou eventual) ou culposo (negligência, imprudência
ou imperícia). Por óbvio, não se pode causar epidemia, onde ela já está presente, por se tratar de
crime impossível”. Imagine, no entanto, que na Ilha de Fernando de Noronha não há nenhum
caso, e alguém contaminado consegue entrar ilegalmente na ilha, e dolosamente propaga a
doença entre seus moradores. Neste caso, considerando que no local não havia ainda a epidemia,
o agente poderá responder pelo crime do art. 267 do Código Penal.

Assim, segundo o Professor Nucci, em locais em que a epidemia ainda não existe, teríamos
as seguintes situações:

SITUAÇÃO CAPITULAÇÃO JURÍDICA


Se o local onde esta enfermidade se O agente responderá por epidemia culposa
espalhar for considerado livre da doença. (art. 267, §2º, CP).
Conhecendo a sintomatologia do novo vírus Responde como incurso no art. 267, caput, do
e possuindo os sintomas (tosse seca, febre Código Penal

13
elevada, dificuldade de respirar), assume o
risco de transmiti-la a terceiros, em lugar
onde o coronavírus não chegou, causando a
epidemia por dolo eventual.
Se tiver feito o teste laboratorial e,
comprovada a contaminação pelo Atua com dolo direto e pode responder,
coronavírus, o agente se dirigir a local onde igualmente, como incurso no art. 267, caput, do
inexiste a epidemia, provocando-a, de Código Penal.
propósito,

Classificação do crime: Segundo Cleber Masson (2018, p. 372), “a epidemia é crime comum (pode
ser cometido por qualquer pessoa); material ou causal (consuma-se com a produção do resultado
naturalístico, ou seja, com a provocação da epidemia); de perigo comum e concreto (depende da
comprovação da situação de perigo a pessoas indeterminadas); de forma livre (admite qualquer
meio de execução); vago (tem como sujeito passivo um ente destituído de personalidade jurídica,
qual seja, a coletividade); instantâneo (consuma-se em um momento determinado, sem
continuidade no tempo); em regra comissivo; unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual
(pode ser praticado por uma só pessoa, mas admite o concurso); e normalmente plurissubsistente
(a conduta criminosa pode ser fracionada em diversos atos).”10

Qualificadora do resultado morte é hedionda: O art. 267, § 1º do CP traz a qualificadora de epidemia


com resultado morte. Neste caso, trata-se de crime hediondo, nos termos do art. 1º, VII da Lei de
Crimes Hediondos (Lei 8.072/90).

CAIU NA DPE-MS-VUNESP-2008: É crime hediondo nos termos do art. 1.º, da Lei n.º 8.072/90: 11
A) tráfico ilícito de entorpecentes.
B) epidemia com resultado morte.
C) terrorismo.
D) tortura.

10
Masson, Cleber. Direito penal: parte especial arts. 213 a 359-h/Cleber Masson. - 8. ed. - São Paulo: Forense, 2018.
11
GAB: B.

14
INFRAÇÃO DE MEDIDA SANITÁRIA PREVENTIVA

INFRAÇÃO DE MEDIDA SANITÁRIA PREVENTIVA

Art. 268 - Infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução


ou propagação de doença contagiosa:

Pena - detenção, de um mês a um ano, e multa.

Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se o agente é funcionário da


saúde pública ou exerce a profissão de médico, farmacêutico, dentista ou
enfermeiro.

Ex: município determina a proibição de eventos por Decreto e mesmo assim os organizadores
realizam. Há, assim, a incidência do art. 268 do CP.

Classificação: Comum; formal; de forma livre; comissivo; instantâneo; de perigo comum abstrato;
unissubjetivo; plurissubsistente.

Sujeito ativo: o crime é comum ou geral, podendo ser cometido por qualquer pessoa.

Sujeito passivo: tratando-se de crime vago, a coletividade é o sujeito passivo.

Elemento subjetivo: dolo. Não se admite a forma culposa.

Sobre tratar-se de norma penal em branco, estabelece Cleber Masson (2018, p. 374) que:

“O “poder público” que baixa a determinação pode ser qualquer autoridade


(federal, estadual, distrital ou municipal) competente para o ato, a qual
deve constar do rol de suas atribuições legais. Cuida-se, portanto, de lei
penal em branco, pois o preceito primário da lei penal depende de

15
complementação, a qual pode ser veiculada por outra lei (lei penal em
branco homogênea ou lato sensu) ou por algum ato administrativo (lei penal
em branco heterogênea ou stricto sensu).12

Implicações referentes à COVID-19: O professor Guilherme de Souza Nucci também reforça que
“este crime, diversamente da epidemia (vista acima), é norma penal em branco e depende de
complemento, vale dizer, do conhecimento de determinação do poder público exigindo
isolamento (separação de doentes ou contaminados pelo coronavírus), nos termos do art. 2º, I,
da Lei 13.979/2020, quarentena (restrição de atividades ou separação de pessoas suspeitas de
estarem contaminadas, mas não enfermas), conforme art. 2º, II, da referida Lei 13.979/2020 ou
outra medida, como a realização compulsória de exames médicos, testes laboratoriais, coleta de
amostras clínicas, vacinação, entre outras.”

Ultratividade da nova lei: importante lembrar que o complemento deste tipo incriminador é
ultrativo, nos termos do art. 3º do Código Penal. Isso porque, superada a crise e afastada a medida
restritiva imposta pelo poder público, quem a tiver infringido, quando a determinação estava em
vigor, continuará a responder criminalmente pelo que fez. Afinal, gerou perigo à saúde pública,
lesionando o bem jurídico tutelado. (NUCCI, 2020)13

Detalhe: competência do Juizado Especial por tratar-se de crime de menor potencial ofensivo. O
legislador brasileiro não imaginava que um fato tão grave como este chegasse ao Brasil com a
força que chegou.

Lesão corporal: Segundo o professor Nucci (2020), o delito de lesão corporal poderá ser aplicado
quando a transmissão do vírus se der, de forma dolosa, em ambiente restrito, onde há apenas
duas pessoas. Ex.: uma delas, contaminada, espirra no rosto da outra, visando à transmissão do
vírus. Caso resulte em infecção, haverá lesão corporal.14

12
Masson, Cleber. Direito penal: parte especial arts. 213 a 359-h/Cleber Masson. - 8. ed. - São Paulo: Forense, 2018.
13
Disponível em: <https://guilhermedesouzanucci.jusbrasil.com.br/artigos/823696891/a-pandemia-do-coronavirus-e-
a-aplicacao-da-lei-penal>. Acesso em 24 de junho de 2020.
14
Esse é o posicionamento do professor Guilherme de Souza Nucci. Cleber Masson sustentou, em uma aula disponível
em suas redes sociais, que no caso de uma pessoa contaminado pela COVID-19 cuspir ou espirrar perto de outra pessoa
(não contaminada) com o objetivo de transmitir a doença, mesmo que não haja a contaminação das vítimas, aquele

16
Omissão de notificação de doença

OMISSÃO DE NOTIFICAÇÃO DE DOENÇA

Art. 269 - Deixar o médico de denunciar à autoridade pública15 doença cuja


notificação é compulsória:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

Juizado Especial: estamos diante de crime de menor potencial ofensivo. Portanto, cabível a
transação penal e outros institutos da Lei 9.099/95.

Classificação: omisso próprio (descreve uma conduta negativa, um não fazer), unissubsistente (não
admite tentativa). Ex: médico requereu o exame ao paciente, constatou que testou positivo para a
COVID-19 e não fez a comunicação (por qualquer motivo) à autoridade pública competente. O crime
está consumado.

Sujeito ativo: próprio (especial). Só o médico pode praticar. É cabível concurso de pessoas (ex:
médico e enfermeira).

Sujeito passivo: a coletividade (crime vago).

PERIGO DE CONTÁGIO DE MOLÉSTIA GRAVE

PERIGO DE CONTÁGIO DE MOLÉSTIA GRAVE

Art. 131 - Praticar, com o fim de transmitir a outrem moléstia grave


de que está contaminado, ato capaz de produzir o contágio:

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

Se liga: esse crime admite a suspensão condicional do processo, se presentes os demais requisitos.16

responderá pelo crime do art. 131 do Código Penal (Perigo de contágio de moléstia grave). No entanto, como veremos,
caso haja a efetiva infecção, o crime será de lesão corporal ou até de tentativa de homicídio.
15
Segundo a doutrina, “A expressão “autoridade pública” relaciona-se com as autoridades sanitárias, a exemplo do
Ministério da Saúde, no âmbito da União, e da Vigilância Sanitária, no campo dos municípios.”.
16
Juizados Especiais – Lei 9.099/95: Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano,
abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo,
por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro
crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal).

17
Classificação: Para Cleber Masson (2018, p. 161), “cuida-se de crime formal (prescinde da
ocorrência do resultado naturalístico); de forma livre (admite qualquer meio de execução); próprio
(o sujeito ativo deve estar contaminado pela moléstia grave); comissivo, e, excepcionalmente,
omissivo impróprio ou comissivo por omissão (quando presente o dever de agir); unissubjetivo,
unilateral ou de concurso eventual (praticado por uma única pessoa, mas admite o concurso);
instantâneo (consuma-se em um momento determinado, sem continuidade no tempo);
unissubsistente ou plurissubsistente (se praticado mediante um único ou por vários atos); e de dano
(nada obstante a consumação ocorra com a simples exposição a perigo).”

Importante: O professor Cleber Masson (2018, p. 160)17 esclarece que neste crime o sujeito quer
produzir lesões corporais na vítima. No entanto, trata-se de delito de perigo porque para sua
consumação basta a exposição da saúde da vítima à probabilidade de dano. Por outro lado, se de
fato OCORRER A EFETIVA A TRANSMISSÃO DO CORONAVÍRUS, quatro situações podem ocorrer:

1. Se resultar lesão corporal leve (CP, art. 129, caput), esse crime será
absorvido pelo crime de perigo de contágio de moléstia grave, por se tratar
de mero exaurimento, e, além disso, trata-se de crime de dano com pena
inferior à do crime de perigo;

2. Se resultar lesão corporal grave ou gravíssima, o agente responde somente


por esse crime (CP, 129, § 1.º ou § 2.º); crime de dano mais grave do que o
crime de perigo;

3. Se resultar culposamente a morte da vítima, estará configurado o crime de


lesão corporal seguida de morte (CP, art. 129, § 3.º); e

4. Se resultar dolosamente a morte da vítima, em decorrência da gravidade da


moléstia pela qual foi contaminada, ao agente deve ser imputado o crime
de homicídio doloso. Nessa hipótese, será possível a tentativa, pois o agente
quis ou assumiu o risco de matar o ofendido. É o caso, por exemplo, de
alguém que esteja muito debilitado (doença em estado terminal), e o
agente delituoso, já contaminado, tosse no rosto da vítima, que vem a
contaminar-se. Neste caso, se o agente não quis a morte da vítima (dolo
direto), pelo menos assumiu o risco (dolo eventual).

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Direito penal: parte especial: arts. 121 a 212 / Cleber Masson. – 11. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense,
São Paulo: MÉTODO, 2018, p. 160.

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