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SEXUALIDADE E GÊNERO

INTRODUÇÃO
O presente trabalho visa apresentar, discutir e refletir sobre a temática sexualidade e gênero na
contemporaneidade. Por conseguinte, se fez necessário exemplificar aspectos sociais e
culturais ligados a esta, bem como apontar seus possíveis desdobramentos na vida desses
sujeitos de maneira geral, para além é pertinente, discutir também as questões referentes à
violência de gênero.
De acordo com Santos (2013), a palavra gênero remete a uma construção que é
atravessada pelos sujeitos desde seu nascimento, esses, ao longo de sua vida, internalizam e
naturalizam regras e normas sobre os papéis de homem e mulher, ou seja, o que é ser homem
e mulher na sociedade. É através dessa construção que desde cedo incentiva-se que meninas
devem brincar de boneca e ser delicadas e meninos devem jogar bola e não chorar ou mostrar
sentimentos, por exemplo.
A definição do substantivo “gênero” é fortemente ligado a funções da sociedade onde
“feminino tradicionalmente é referida à esfera familiar e à maternidade, a referência
fundamental da construção social do gênero masculino sua atividade na esfera pública,
concentrador dos valores materiais, o que faz dele o provedor e protetor da família” (Giffin,
1994, p.146).
As práticas sociais do cotidiano expressadas em nome da Psicologia, como quando ao
aplicar testes de inteligência também endossam características do que é masculino e feminino,
apontando o domínio da voz masculina no mundo e nas mais diversas culturas. Nesse sentido
coloca-se a mulher em uma posição desprivilegiada e subalternizada em comparação aos
homens que, normalmente tem mais privilégios e oportunidades, tendo maiores salários,
sendo maioria em cargos de chefia e mesmo quando resolvem trabalhar em áreas ditas como
“femininas” encontram maior ascensão que as mulheres, pois tornam-se chefes de cozinha,
chefes de costura, etc. (SANTOS, 2013).
Dentre os privilégios que os homens têm, pode-se citar também a liberdade sexual,
onde são considerados “garanhões”, diferentes das mulheres que optam por exercer sua
sexualidade de forma livre e são chamadas de “galinhas”, “mulheres fáceis”, etc. Aos homens
é concedido o direito de trair suas companheiras, tendo sua atitude justificada apenas por
serem homens, já as mulheres, na maioria das vezes quando traem seus companheiros são
espancadas e assassinadas (SANTOS, 2013).
O termo gênero através do tempo e de estudos deixa de ser uma palavra para designar
o oposto dos sexos, e a partir dos anos 80 passa a envolver duas dimensões: gênero como um
atributo social institucionalizado e a noção de que o poder estaria distribuído de modo
desigual entre os sexos. Santos (2013) expõe que para a autora Joan Scott o gênero é um
elemento que se baseia nas diferenças percebidas entre os sexos e uma forma de perpetuar
relações de poder. Dentre várias autoras feministas que irão debruçar-se sobre o tema, pode-se
dizer que, em consenso, falar de gênero é falar de opressão do patriarcado, pois são discursos
que se pautam em construções hierárquicas que associam o masculino a uma posição superior.
O objetivo frente a execução desta pesquisa é apresentar de maneira sucinta e reflexiva
questões pertinentes acerca da sexualidade e de gênero, bem como discorrer sobre a
diversidade sexual existente na atualidade, apontando estigmas, preconceitos e a violência que
a comunidade LGBTQI+ enfrenta diariamente. A pesquisa está organizada em formato de
texto expositivo, demonstrando através do recorte de alguns autores, as nuances da
problemática. A metodologia utilizada foi pesquisa bibliográfica e discussão em grupo acerca
da temática.

DESENVOLVIMENTO
As articulações entre gênero e direitos humanos na Psicologia se fazem necessárias no
contexto contemporâneo, Almeida, et al (2010) ponderam que é necessário perceber que os
documentos que asseguram os direitos de todos estabeleceram-se em contextos de sofrimento,
onde milhares de pessoas foram discriminadas, como por exemplo as grandes guerras e o
holocausto. Porém mesmo com a declaração universal dos direitos humanos, a violência
persiste sobre aqueles considerados minorias: mulheres, negras (os), homossexuais,
deficientes físicas (os) etc.
Dentre os variados movimentos sociais que surgiram e expandiram-se durante a
metade do séc XX, pode-se citar o movimento das mulheres e o movimento feminista que
com o apoio de outros movimentos reivindicaram uma série de direitos para garantir a
liberdade e igualdade, independente do sexo, orientação sexual, cor da pele, classe social etc.
(ALMEIDA, ET AL 2010).
Almeida et al (2010), apud Antonio Flávio Pierucci (1999) reiteram que é possível
definir o movimento feminista numa sequência de três debates: 1) igualdade de direitos, onde
se priorizou a conquista de direitos para as mulheres exercerem sua cidadania (movimento
sufragista), 2) diferença de identidades entre as mulheres, teve foco na diferença entre homens
e mulheres, onde levantou-se a impossibilidade de falar de mulher como sujeito universal e 3)
diferenças entre as diversas categorias identitárias, buscou reconhecer as diferencias
identitárias de gênero, classe social, etnia, idade etc. dentro das categorias homem e mulher,
refletindo sobre a diversidade de identidades e sexualidades.
Nos dias de hoje existem discursos que afirmam não haver mais necessidade do
Feminismo, uma vez que as mulheres conquistaram alguns de seus direitos e podem exercer
sua cidadania, porém é necessário reiterar que o sexismo persiste e é expresso através de
violência (simbólica, sexual, física e psicológica) impedindo que o exercício da cidadania seja
pleno e ferindo os direitos humanos. Portanto o feminismo existirá até que a liberdade, a
igualdade e a fraternidade sejam efetivamente alcançadas (ALMEIDA, ET AL 2010).
Como exemplo dos direitos conquistados através desses movimentos, pode-se citar o
direito ao voto conquistado pelo movimento sufragista em 1934, quanto todas as mulheres,
solteiras ou casadas, com renda própria ou não puderam votar, porém não eram obrigadas,
fato que só se concretizou em 1946. Com o passar do tempo, além de votar, as mulheres
conquistaram o direito a se candidatarem a cargos políticos, sendo no ano de 1995 que a lei
determinou que 20% das vagas de cada partido deveriam ser destinadas às mulheres.
Entretanto mesmo com essas conquistas percebe-se até os dias atuais que o número de
mulheres na política é bem inferior ao de homens, reflexo de uma construção de gênero que
afasta as mulheres dos espaços sociais (ALMEIDA, ET AL 2010).
Em 1962 houve a extinção da afirmação do código civil onde apontava que o marido
tinha a função de chefe no casamento, nesses parâmetros era do marido o direito de autorizar
a profissão da mulher, por exemplo. Por fim, pode-se citar alguns direitos conquistados a
respeito da violência contra a mulher, em 1994 o estupro passou a ser tipificado como crime
hediondo e inafiançável; em 2002 houveram mudanças a respeito do pátrio poder, esse passou
a ser compartilhado entre a mulher e o homem: poder familiar; de 2003 pra cá houveram
grandes movimentos envolvidos na luta de direitos das mulheres e no combate da violência,
como é o exemplo da lei maria da penha de 2006 (ALMEIDA, ET AL 2010).
Apesar de muitas conquistas obtidas ao longo dos anos (não sem muita luta), não se
pode esquecer que a violência contra as mulheres continua aumentando e é, na maioria das
vezes, cometida pelos atuais ou ex-companheiros. Reitera-se que a luta está apenas
começando e que como cidadãs, as mulheres sempre estiveram abaixo dos homens, não
ingenuamente o latim e nossa língua optam por fazer o plural de todas as palavras no
masculino, por exemplo (ALMEIDA, ET AL 2010).
A respeito do papel da Psicologia na promoção e defesa de direitos, Almeida (2010)
aponta que no mesmo ano do artigo em questão a campanha do Congresso de Psicologia teve
o seguinte tema: “Psicologia: uma profissão com compromisso pela luta e promoção dos
Direitos”, nesse sentido a Psicologia enquanto profissão tem reescrito sua história pautada no
compromisso de que as e os psicólogas (os) exerçam seu trabalho com qualidade, ética e
dignidade.
A psicologia ocupa os mais diversos espaços de atuação, como por exemplo, está
envolvida na luta pelos direitos à assistência social, pois atua-se no Sistema Único da
Assistência Social (SUAS), no CRAS, no CREAS, em abrigos, em instituições de longa
permanência para as(os) idosas(os), etc. Luta-se pelo direito à saúde, pois atua-se no Sistema
Único de Saúde (SUS), em hospitais, CAPS, UBS’s, NASF, etc. Está também envolvida na
luta pelos direitos à educação, por uma educação inclusiva, pela Psicologia nas escolas
públicas e pela inclusão da temática de Direitos Humanos na grade curricular etc. Ainda se
envolve na conquista de direitos à Mobilidade, discutindo, para além do trânsito, a vida
humana em movimento e o meio ambiente. Sempre pautando-se no direito à não violência,
com as Varas e Delegacias para Mulheres, os Centros de Referência na atenção às mulheres
que sofreram violência e os serviços de acompanhamento às crianças e adolescentes que
tiveram seus direitos violados, direito à dignidade humana, com o sistema prisional, com a
luta antimanicomial e segurando a bandeira por uma sociedade sem instituições totais. Direito
à diversidade, direito à comunicação, à segurança pessoal e à liberdade. Ter direito à vida no
seu sentido mais coerente, pois em nome da vida, muitas vezes, também são cometidas
atrocidades. (ALMEIDA, ET AL 2010).
A autora relembra que as (os) psicólogas(os), juntamente com outros profissionais, em
tempos de ditadura colaboraram com a tortura e o terrorismo do Estado, os impulsionando a
funcionar de forma produtiva. Fato que fica no passado, pois atualmente ocupa-se cada vez
mais espaços públicos com consciência crítica, criando uma psicologia brasileira latino-
americana e cada vez mais envolvida com a política de dentro para fora (ALMEIDA, ET AL
2010).
Por esse fato, a Psicologia deve ocupar um lugar central na lembrança e na construção
dessa história, apontando e resistindo a tais práticas que afrontam os direitos conquistados, no
sentido de reinvenção, podendo afirmar que nos dias atuais a Psicologia é uma profissão de
direitos humanos. Sendo esse campo predominantemente feminino (em 2012, 89% dos (as)
psicólogos (as) brasileiros (as) eram mulheres), sempre necessário refletir mais e mais sobre o
lugar que as mulheres ocupam não só nessa profissão, mas nos diversos espaços públicos nos
dias atuais. Convocando todas a não desistirem das “coisas públicas” (ALMEIDA, ET AL
2010).
Apesar das inúmeras conquistas, vive-se ainda em uma sociedade que é atravessada
pela desigualdade, onde grupos sociais são estigmatizados por serem pobres, negras(os),
homossexuais, mulheres etc. Limitando as desigualdades voltadas ao gênero, a autora convida
a refletir quem eram os sujeitos de direitos quando se começou a falar em direitos humanos;
apontando um falso universalismo, uma vez que esses eram homens, brancos, financeiramente
mais abastados, isto é, por muitos anos mulheres foram (e ainda são) invisibilizadas em
relação aos direitos humanos. (ALMEIDA, ET AL 2010).
Sendo assim, é fato que a mulher não possui os mesmos direitos que um homem na
sociedade patriarcal. E isso pode ser identificado na esfera pública, no domínio da rua, no
espaço público e político que é predominantemente exercido pelos homens, e na esfera
privada, nos lares, que é onde se restringe o poder das mulheres. Essas não dominam nem
mesmo seu próprio corpo, estando sempre sob a vigilância do homem, ora através daqueles
que detêm o controle dos meios de comunicação e que as super-erotizam, super-expõem e
super-objetificam, ora por meio de representantes dos Poderes Legislativo e Judiciário ou da
igreja, que contesta a interrupção voluntária da gravidez ou retarda a sua realização mesmo
em situações já asseguradas por Lei – como em casos de estupro (ALMEIDA, ET AL 2010).
A respeito da violência contra as mulheres, essa é reflexo de uma sociedade machista
que ainda nos dias de hoje pratica o velho ditado “em briga de marido e mulher ninguém mete
a colher”, é importante questionarmos o posicionamento da psicologia no enfrentamento à
violência de gênero. E é nesse contexto que localiza-se a importância de agregar os homens a
essas reflexões e discussões, pois em se tratando de relações de gênero, se faz importante
discutir masculinidades e feminilidades como construções históricas e sociais que precisam
ser bem compreendidas dentro da Psicologia (ALMEIDA, ET AL 2010).
A autora traz à baila reflexões referentes a diferenciação no campo macro entre
homens e mulheres, para tal é necessário olhar para especificidades de raça, classe social e
sexualidade, desse modo maiores reflexões podem ser feitas. Almeida (2010) utiliza-se do
conceito de interseccionalidade para tratar da combinação dessas especificidades nas diversas
formas de discriminação e violação de direitos. Expomos que
“Para ela, a interseccionalidade é: [...] uma conceituação do problema que busca
capturar as consequências estruturais e dinâmicas da interação entre dois ou mais
eixos da subordinação. Ela trata especificamente da forma pela qual o racismo, o
patriarcalismo, a opressão de classe e outros sistemas discriminatórios criam
desigualdades básicas que estruturam as posições relativas de mulheres, raças,
etnias, classes e outras. Além disso, a interseccionalidade trata da forma como ações
e políticas específicas geram opressões que fluem ao longo de tais eixos,
constituindo aspectos dinâmicos ou ativos do desempoderamento (CRENSHAW,
2002, p. 177).
Nesse contexto percebe-se que mulheres negras ocupam posições ainda mais
desfavoráveis nas escalas de assalariamento, se comparadas aos homens brancos e negros ou
mesmo quando comparadas às mulheres brancas, por exemplo. Mulheres brancas têm um
acesso mais privilegiados que mulheres negras, esses aspectos interferem também na
categoria social (ALMEIDA, 2010).
A visibilidade de novas expressões de identidades, sexuais e de gênero, que destoam-
se dos padrões binários, padronizados pela atual sociedade tradicional, tem provocado
polêmicas. Movimentos e organizações sociais apresentam-se neste contexto como defensora
dos direitos sexuais e humanos, elaborando siglas que identificam essa variedade de
expressões, e estas tem ganhado cada vez mais letras, com o passar dos tempos (PERES E
TOLEDO, 2013). Por conseguinte iremos neste trabalho, atentar-se as letras “T” presente na
sigla LGBTQIA+, que abarcam as expressões sexuais, existenciais e de gênero do publico
travesti, transexuais e transgêneros .
“A repressão que a comunidade sofre, adotada pelo nome de homofobia, é vista de
forma semelhante ao machismo ou misoginia, quando tratamos do movimento feminista, ou
racismo, quando do movimento negro.”(BORTOLETTO, 2019, P.8).
Contrariamente ao que os movimentos propiciam através de siglas, os adjetivos
preconceituosos e pejorativos apresentam-se como uma maneira de intolerância, conforme
apresenta Barbosa (2013), “A categoria ‘viado’ é historicamente relacionada no Brasil a
convenções que associam homossexualidade a performances de gênero femininas em corpos
masculinos, sendo utilizada para práticas de ofensa, preconceito e violência”;
A homofobia tem consequências sociais, psicológicas e físicas que acrescentam na
construção da identidade pessoal de cada indivíduo que a comete e de quem é vítima
dela. É como forma de se tornar uma base para os indivíduos [...]que a comunidade
LGBTQIA+ nasceu, construindo dessa forma uma identidade que ao mesmo tempo
em que busca incluir todos sob sua bandeira, também o faz individualmente, através
das representações específicas que cada uma das siglas traz consigo
(BORTOLETTO, 2019, p.6).

Sobre as definições entendidas pelas letras “TTT”, Peres e Toledo (2013), apresentam
os travestis como “sendo pessoas que se identificam com imagens e estilos de gêneros [...]
contrários ao seu biológico[...] que desejam e se apropriam de adereços e indumentárias e
adereços destas estéticas” (p.79), já os transexuais são as pessoas que não se sentem
pertencentes ao seu sexo biológico, e muita das vezes recorrem a processos de ressignificação
sexual, mas salientam este processo não sendo uma regra, já os transgêneros são pessoas que
“temporariamente se caracterizam com o sexo oposto, na maioria das vezes com finalidade
artísticas” (p.79).
Apesar das diferenças identificatórias, o preconceito e a estigmatização são aspectos
que se fazem comum à vida destas pessoas, processos que dificultam a expressão de suas
singularidades, tendo reflexo na vivência de sua cidadania (PERES E TOLEDO, 2013). O
Brasil tem sido destaque mundial no que se refere as paradas LGBTQIA+, segundo Bortoletto
(2019), apesar disto o autor pontua que “o Brasil [...] também lidera o ranking de país que
mais mata transexuais e travestis” (P.7).
Sobre o entendimento do início do processo de estigmatização , é importante salientar a
conjuntura familiar “a desigualdade - está presente em todas as etapas da vida das travestis e
transexuais e pode ser cartografadas logo nas primeiras experiências vividas de discriminação,
estigmatização, violência e exclusão, que ocorrem no espaço familiar” (Peres E Toledo, 2013,
P.810),
Seria precipitado concluir que a identidade da comunidade LGTBQIA+ gira em
torno unicamente do seu compartilhamento de experiências onde o indivíduo sofreu
da homofobia alheia, mas também é ingenuidade acreditar que essa vivência de
violência não cria, nos indivíduos membros desta, um padrão em comum de
identidade ( BORTOLETTO, 2019, P.8).

As primeiras percepção de preconceito vivenciado pelas travestis e transexuais,


enfraquece o sistema psíquico e dificulta sentimentos de valoração e reconhecimento, às
expondo muita das vezes em confusão e desorientação, este fato faz com que muitos(as)
procurem grupos em que se identificam e se fortaleçam ” (Peres e Toledo, 2013, p.810).
Sobre o papel ocupado por pessoas que não seguem um padrão binário, podemos apontar
que “homofobia passa a ser não só um vilão sutil que deve ser vencido diariamente pelas
pessoas LGBTQIA+, mas também se transforma no principal pilar sob o qual a identidade da
comunidade se constrói.” (bortoletto, 2019, p.8), “a expõe a situações de vulnerabilidade
diversas somadas as estigmatizações especificas de sexo, classe social e racial/etnia” (PERES
E TOLEDO, 2013, P.84). Os autores ainda apontam que as condições de vida precárias fazem
com uma rede de apoio fragilizada diminua o acesso ao autocuidado e do cuidado do outro.
É atroz a existência de indivíduos que necessitam diariamente lutar para se manterem
vivos enquanto a sua condição cidadã não é reconhecida, vidas marcadas por inúmeras
violências e abandonos, em vista disso é necessário discutir e visibilizar os temas referentes à
sexualidade e ao gênero para que se distancie de um tabu, “ se pensarmos a travestilidade
com um ‘modo de existência’, podemos entendê-la não como prioridade de alguns, mas como
possibilidade de todos, pois todos, de alguma forma e/ou em alguns (ou muitos) momentos,
fogem às normas de gênero (PERES E TOLEDO, 2013, P.8).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Através dos dados e reflexões acima expostos pode-se concluir, portanto, que a violência é
“um fenômeno extremamente complexo, com raízes profundas nas relações de poder baseadas
no gênero, na sexualidade, na autoidentidade e nas instituições sociais” e que “em muitas
sociedades, o direito (masculino) a dominar a mulher é considerado a essência da
masculinidade” (HEISE, 1994: 47-48).
Vive-se ainda em uma sociedade com atributos e funcionamento patriarcal, como
assevera Caulfield (1985) “a ideologia dominante enfatiza que a dominação, o controle e, até
mesmo, a violência masculina na sexualidade são ‘naturais’” (p.360). Neste esquema cultural,
o resultado da identidade masculina se expressa através uma forma de “automutilação”, onde
os homens héteros também sofrem da alienação de reprimir as partes de sua própria
personalidade consideradas femininas (LISAK, 1991: 246).
Como aponta Griffin (1987) “a imagem objetificada da mulher na pornografia
representa aquela parte da masculinidade que abrange sentimentos de necessidades,
emocionalidade e dependência que os homens devem esmagar em si em troca do prestígio, do
poder e do status que acompanham os que alcançam uma identidade masculina” (p 92). Nesse
contexto a violência se expõe como fruto de uma repressão sexual onde o controle e a
dominação são a expressão de “um empobrecimento afetivo da relação sexual. Para que a
relação sexual seja um gesto de pouca emoção” (CHAUÍ ET AL., 1981 p.105).
Segal (1989) aponta que reflexões e (des)construções em prol de uma visão mais
integral do ser poderiam beneficiar tanto homens e mulheres quanto às demais formas de
expressão de gênero, pois os tornaria mais articulados emocionalmente. Visão que vai de
encontra a de Rubin (1975) que analisa o fato apontando que “longe de expressar diferenças
naturais, a identidade de gênero representa a supressão de semelhanças naturais” (p.180).
Com o questionamento desta dualidade arcaica, assim como a separação mente/corpo,
vários autores atualizam a definição de sexualidade como uma “dimensão simbólica que
articula nosso corpo e nossa psique” (CHAUÍ, 1991, P.30), e também como uma densa zona
de interação com outras pessoas (BLEIER, 1984).
É importante apontarmos também, que ao refletir sobre o fenômeno sexualidade e
gênero é igualmente necessário que se faça uma reflexão abrangente sobre cidadania, direitos
sexuais, bem como políticas voltadas ao tema, concluindo que a sexualidade, ainda nos dias
atuais, encontra-se instaurada em um padrão normativo binário, dificultando o acesso ao
mercado de trabalho, presença de processos de estigmatização e conseguintemente a exclusão,
dos que encontram-se diferentes desta.
O presente trabalho não esgotou os conhecimentos a respeito do tema, e reforça a
existência de necessidade em discutir questões diretamente ligadas a problemática e outros
que se encontram inseridos e permeados pela mesma, por todas as esferas da sociedade.

REFERÊNCIAS
DOS SANTOS, Helena Miranda. A importância de discutir gênero na psicologia. In:
ANDRADE, Darlane Silva Vieira; SANTOS, Helena Miranda (orgs.). Gênero na
psicologia: articulações e discussões. Salvador: CRP-03, 2013. p. 19-33.
ALMEIDA, Alessandra; ANDRADE, Darlane Silva Vieira; SANTOS, Helena Miranda.
Gênero e Direitos Humanos: por uma Psicologia para todos e todas. In: ANDRADE,
Darlane Silva Vieira; SANTOS, Helena Miranda (orgs.). Gênero na psicologia:
articulações e discussões. Salvador: CRP-03, 2013. p. 35-57.
PERES, S. TOLEDO, L. G. Travestis, transexuais e transgêneros: novas imagens e expressões
da subjetividade. 11 ed. São Paulo: Cadernos Temáticos CRP, 2013. 92 p.
GIFFIN K & Costa S 1999 (orgs.). Questões da saúde reprodutiva. Fiocruz, Rio de Janeiro.
Disponível em: https://www.scielosp.org/article/csp/1994.v10suppl1/S146-S155/es/ Acesso
em 22 de outubro 2020.
BORTOLETTO GE. LGBTQIA+: identidade e alteridade na comunidade. São Paulo,
2019 disponível em:
https://paineira.usp.br/celacc/sites/default/files/media/tcc/guilherme_engelman_bortoletto.pdf
Acesso em 22 de outubro de 2020.
BARBOSA, Bruno Cesar. "Doidas e putas”: usos das categorias travesti e transexual.
Sex., Salud Soc. (Rio J.), Rio de Janeiro , n. 14, p. 352-379, Aug. 2013 . disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1984-
64872013000200016&lng=en&nrm=iso> Acesso em 23 outubro de 2020.

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