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MONTEIRO, Leonan B. Universidade pública no Brasil: desafios e responsabilidade.

CHAUI, Marilena. A universidade pública sob nova perspectiva. Minas Gerais: Revista
Brasileira de Educação, 2003.
“A universidade pública sob nova perspectiva”, de Marilena Chaui
A universidade enquanto instituição social expõe sistematicamente o funcionamento
da sociedade. De maneira semelhante, podem-se ser vistas ideias, atitudes, opiniões
divergentes da sociedade dentro das universidades. Isto é tão verdade que desde o seu
surgimento, ela sempre fora uma instituição social fundada no reconhecimento público de sua
legitimidade. A conquista da autonomia em relação ao Estado e a igreja lhe possibilitou isso,
ou seja, a universidade é guiada por um conhecimento que segue sua própria lógica.
Após as revoluções sociais do século XX a educação e a cultura passaram a ser
consideradas constitutivas da cidadania e como tal, direitos dos cidadãos. Além de vocação
republicana, a universidade se concretizou como instituição social inseparável da ideia de
democracia e democratização do saber; assim sendo, a relação entre Estado e universidade
não pode ser tomada numa relação de exterioridade, visto que o caráter republicano da
universidade depende da existência ou não dos ideais democráticos na sociedade.
Para Marilena Chaui, a universidade por ser uma instituição social diferenciada e
regida por autonomia própria, pode relacionar-se com o todo da sociedade e do Estado de
modo conflituoso. Pode dividir-se internamente entre os favoráveis à divisão social e os que
são contrários a maneira como o Estado afirma a exclusão social; para ela, isso apenas reforça
o impedimento de concretização republicana da instituição universitária e suas possibilidades
democráticas. A veracidade dessas observações pode ajudar-nos a ver com mais clareza a
mudança sofrida pela universidade depois da reforma do Estado.
Após a reforma, educação, saúde e cultura foram postas no setor de serviços não
exclusivos do Estado. Isso significa que a educação deixou de ser um serviço público para ser
um serviço que pode ser privado ou privatizado. Em outras palavras, o Estado passou a ver a
universidade como uma organização e não como uma instituição.
Encontramos o motor dessa mudança na forma do capitalismo atual onde se
caracteriza a fragmentação das esferas de vida social, assim como da fragmentação do sistema
de produção e a dispersão espacial e temporal do trabalho. Qual problema que isso acarreta?
Passa-se a ver sociedade e natureza como algo abstrato denominado “meio ambiente”, ou seja,
um lugar permeado por um espaço e tempo virtuais que nos afastam de qualquer densidade
material; nesse “meio ambiente” deve-se haver um planejamento de gestão controlado por
intervenção tecnológica e jogos de poder. Diante disso as organizações para continuar
dependem muito da capacidade de adaptarem-se às rápidas mudanças que ocorre no “meio
ambiente”, por isso sempre a crescente questão da flexibilidade das coisas.
A nova perspectiva de universidade que Marilena Chaui propõe é: o Estado não deve
tomar a educação unicamente pelo quesito gasto público, mas sim como investimento social e
político, coisa que só é possível se a educação for considerada um direito. Mede-se a relação
democrática entre Estado e universidade quando observada a distribuição da riqueza pública.
Se essa riqueza é usada para a concretude dos direitos sociais, então é correto; caso seja usada
para acumulação e reprodução do capital, então é errado.
Diante disso, Chaui considera importante pontuar algumas questões que levam a
mudança da universidade pela perspectiva da formação. Primeiro, colocar-se contra a
exclusão social, a educação superior é um direito do cidadão e como tal é universal. Segundo,
a própria universidade enquanto instituição autônoma deve definir suas normas de formação,
docência e pesquisa. Terceiro, a democratização do ensino superior não deve ser vista como
massificação; para isso, é necessária uma articulação entre os ensinos fundamental, médio e
superior. Revalorizar a docência que foi desprestigiada com a chamada “avaliação de
produtividade”, quantitativa. Revalorizar a pesquisa, estabelecendo não só as condições de
sua autonomia e as condições materiais de sua realização, mas também recusando a
diminuição do tempo para realização dos mestrados e doutorados. Tudo isso exige políticas
públicas de financiamento dos fundos públicos destinados a esse fim; as agências nacionais de
incentivo a pesquisa precisam seguir duas orientações: priorização dos projetos propostos
pelas próprias universidades, e dos projetos de setores do Estado que fizeram levantamentos
locais e regionais apontando necessidade de pesquisas.
Concordo plenamente com a valorização da educação no sentido geral do termo. Lutar
para que as políticas sociais no país sejam feitas respeitando os direitos dos cidadãos, deve ser
atividade constante dos que trabalham com educação e principalmente de quem a pensa. Sem
dúvidas que é uma batalha para toda a vida, então é preciso que os educadores sejam
educadores não apenas por desejo ou vontade, mas permita-me usar um termo mais
apropriado para a religião – vocação! Os educadores devem ser educadores por vocação. Se
não for desse modo, a educação continuará sendo o que ela é atualmente, um serviço
negligenciado em estado de deterioração. Além de o Estado neoliberal ser seu inimigo, a
educação também encontra obstáculos internos, professores descomprometidos com a
realidade e as demandas sociais. Então, é preciso um logo processo de lutas e reformas para a
concretude dos direitos humanos nesse país que ainda caminha em direção à democracia.

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