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Universidade Federal Fluminense


Instituto de Ciências Humanas e Filosofia
Curso de Graduação em Ciências Sociais

RAYNA PEGADO

A COR DA VAGA: ENSAIOS SOBRE O RACISMO ESTRUTURAL NO


ENSINO SUPERIOR PÚBLICO

Niterói
2017
2

Universidade Federal Fluminense


Instituto de Ciências Humanas e Filosofia
Curso de Graduação em Ciências Sociais

RAYNA PEGADO

A COR DA VAGA: ENSAIOS SOBRE O RACISMO ESTRUTURAL NO


ENSINO SUPERIOR PÚBLICO

Artigo Monográfico apresentado ao Curso de Graduação em


Ciências Sociais da Universidade Federal Fluminense, como
requisito parcial para a obtenção do título de Licenciada em
Ciências Sociais.

Orientador: Profª. Drª. Ana Claudia Cruz da Silva

Niterói
2017
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Universidade Federal Fluminense


Instituto de Ciências Humanas e Filosofia
Curso de Graduação em Ciências Sociais

RAYNA PEGADO

A COR DA VAGA: ENSAIOS SOBRE O RACISMO ESTRUTURAL NO


ENSINO SUPERIOR PÚBLICO

BANCA EXAMINADORA

............................................................
Prof.ª Dr.ª Ana Claudia Cruz da Silva
Universidade Federal Fluminense

............................................................
Prof.ª Dr.ª Alessandra Siqueira Barreto
Universidade Federal Fluminense

............................................................
Prof.ª Dr.ª Flávia Rios
Universidade Federal Fluminense

Niterói
2017
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1 - A PROBLEMÁTICA DO ACESSO

Entrei em 2011.2, quando metade das vagas eram destinadas ao Sisu e a


outra metade ao antigo vestibular, meio pelo qual acessei a Universidade Federal
Fluminense. Naquela época eu não possuía tantas informações nem havia tantos
debates sobre as cotas e as possibilidades de acesso para os concorrentes à
universidade, assim preferi disputar a vaga via ampla concorrência do antigo
vestibular. A pouca informação se transmutou em medo de algum entrave
burocrático durante o processo de inscrição e matrícula, algo que me impedisse de
efetivar minha vaga, como a apresentação de documentos que eu não possuísse ou
comprovação de renda que eu não me encaixasse. Minha perspectiva hoje me faz
perceber essa questão de forma mais pragmática: a cota racial é para negros,
pardos e indígenas, diferente da cota sócio-econômica. Propostas distintas para a
minimização da desigualdade de grupos sociais distintos.

A burocracia por sua vez também atinge outros indivíduos que poderiam
acessar a universidade, operando de modo eficaz no afunilamento dos processos
institucionais. Afunilar no sentido de dificultar e até inviabilizar o processo de
pessoas desprovidas de recursos necessários, como ter as informações necessárias
para o recolhimento dos documentos requeridos, ter contato com pessoas que
possam auxiliar no levantamento dos mesmos, tempo para recolher todos os
documentos, dinheiro para tirar xerox, carimbos, autenticações, etc. Onde, como
conseguir? O que é necessário? São demandas que parecem obvias e acessíveis
partindo da perspectiva de uma parte da população que já tem alguma noção sobre
esses procedimentos burocráticos.

Tomando como exemplo apenas um dos documentos requeridos, a carteira


de trabalho assinada como comprovação do trabalho formal, é um privilégio, levando
em consideração as relações de trabalho historicamente até os dias de hoje no
Brasil.
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Código Penal de 1940 - Lei das Contravenções Penais.

Vadiagem

Art. 59 - Entregar-se alguém habitualmente à ociosidade, sendo válido para o


trabalho, sem ter renda que lhe assegure meios bastantes de subsistência, ou prover
a própria subsistência mediante ocupação ilícita:

Pena - prisão simples, de 15 (quinze) dias a 3 (três) meses.

Parágrafo único - A aquisição superveniente de renda, que assegure ao condenado


meios bastantes de subsistência, extingue a pena.

A lei da vadiagem, assim como outras leis, tem um alvo direcionado, mesmo
que para muitos de forma sutil (MOREIRA et al, 2006). Se concebermos o processo
de pós-abolição, desde a lei Áurea à importação de mão de obra camponesa
europeia e asiática, podemos observar como os negros “libertos” continuaram à
mercê da estrutura capitalista a se formar na época em questão: antes na condição
de mercadoria-escravizado, posteriormente como massa a ser
descartada/embranquecida. Espacialmente, a cidade do Rio de Janeiro também
reproduz a lógica de descarte e remoção dos grupos indesejados – sempre
com recorte racial específico –: o surgimento das “favelas” remonta a uma
demanda por moradia popular dos indivíduos expulsos dos cortiços demolidos, os
morros ocupados pelos negros sem habitação nos grandes centros da cidade.
(CHALHOUB, 1996)

A República brasileira por sua vez, nada fez para incluir os negros nessa
nação, a não ser as políticas de branqueamento (SILVA, 2017) que contavam com a
miscigenação (em sua maioria forçadamente) a fim de diluir a negritude da
população brasileira. . Assim se qualifica o negro na marginalidade, negando a
oportunidade de se incluir socio-economicamente, esse corpo será voltado aos
trabalhos menos reconhecidos, menos valorizados se mantendo assim na margem
não só racial mas econômica.
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As disparidades permanecem até hoje. Abaixo, dados do Censo do IBGE


compilados pelo jornal O Dia (O DIA, 2015) apontam a diminuição do abismo
econômico entre negros e brancos no Brasil nas duas primeiras décadas do século
XXI. Apesar do aumento real do salário mínimo ter elevado as condições de vida da
população pobre brasileira (em sua maioria negra), ainda percebe-se no gráfico uma
aguda desigualdade (a diferença entre os salários médios ultrapassa 1000 reais no
ano em que a desigualdade foi menor):

Eu, estudante negra, vinda de um colégio federal como o Pedro II, que
disponibiliza acesso e educação diferenciada da maioria das escolas públicas, não
tive a "clareza" dos procedimentos do acesso, acreditando que usar a cota racial
seria um caso de necessidade, quase num sentido capacitista. Me inscrever como
cotista seria como assinar um atestado de insuficiência pessoal, ignorando todo o
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peso social que influencia e constrói a conjuntura de oportunidades do indivíduo (no


caso, negro) de acordo com o lugar que este ocupa na sociedade. No caso, existir
como cotista seria “burlar” o ingresso na universidade, ou até mesmo “passar para
trás” os concorrentes à vaga ampla. E, particulamente para mim, era “passar para
trás” os próprios cotistas negros, que eu achava que precisavam mais do que eu por
serem de outras escolas públicas ou terem piores condições socioeconômicas.
Minha leitura de então, pleitear a vaga pela cota faria com que eles não só fossem
mais condizentes ao público destinado a vaga da cota, como mais negros do que eu,
num sentido de afastamento da referência de pessoa negra que carece dessa vaga
específica da minha identificação enquanto pessoa negra.

Esta violência subjetiva se dá a partir do momento em que se reconhece e se


identifica com algo que é socialmente lido como pejorativo, ou seja, que dentro do
meio social onde o indivíduo está inserido sua existência está ligada a algo negativo.
Assim, esse indivíduo tende a fazer um movimento de negação dessa identidade
numa tentativa de afastamento da referência simbolicamente negativa. Suas ações
vão no sentido de eleger outras características para compensar e desfocar esse
déficit social, para que a referência negativa seja invisibilizada, despercebida e por
sua vez não conote negativamente o indivíduo.

Há no imaginário da população uma ideia de que a cota seria algo negativo,


como uma forma de furar fila, ou pegar um atalho na entrada de processos seletivos.
Pois bem, se concebermos a funcionalidade dos processos seletivos, podemos
conceber que a seleção se dá de forma criteriosa a atender a necessidade do
demandante (as instituições de ensino superior), que geralmente é macro sendo
assim estrutural, por tanto hegemônico. Uma vez que essas seleções são feitas a
fim de promover ocupantes de cargos reconhecidos e legitimados pela sociedade,
existe uma grande procura - senão não seriam a partir de processos seletivos - e o
mecanismo utilizado para selecionar os “melhores” candidatos são critérios voltados
ao público seleto que a hegemonia espera que ocupem tais cargos disponíveis, esse
publico reflete os anseios e as possibilidades de acesso da elite. Quem tem acesso
a informação da existência de cota para negros em concursos públicos? Na pós
graduação em uma universidade?
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O critério meritocrático exaltado nesses processos seletivos ofusca a


coerência ao julgar especificamente os cotistas. Uma vez que os concorrentes,
todos, saem de diferentes lugares nessa corrida: uns largam mais a frente, outros
muito atrás, pra mesma linha de chegada. Dessa forma, a cota não poderia ser um
atalho, e sim existe como uma compensação a essa disparidade estrutural que faz o
negro largar sempre atrás do branco e ter de chegar na frente. O deslocamento além
de ser maior, carece de mais potência a fim de satisfazer a velocidade necessária
para percorrer maior distância em menos tempo. Segundo Elias (2000), o
distanciamento do referencial pejorativo possui:

“poder de ferir dependendo da consciência que tenham o usuário e o


destinatário de que a humilhação almejada por seu emprego tem o aval de
um poderoso grupo estabelecido, em relação ao qual o do destinatário é um
grupo outsider, com menores fontes de poder. Todos esses termos
simbolizam o fato de que é possível envergonhar o membro de um grupo
outsider, por ele não ficar à altura das normas do grupo superior, por ser
anômico em termos dessas normas” (ELIAS, 2000, p. 27)

Um exemplo do esteriótipo do cotista, o que Hall (2016) considera como


“conjunto bruto de representações mentais onde as representações bipolares iniciais
são legíveis” é a UERJ, primeira universidade do estado do Rio de Janeiro a adotar
cotas raciais, ser conhecida entre os estudantes das universidades públicas
brasileiras como o “Congo” (KACHANI, 2012).

“Afixar o rótulo de “valor humano inferior” a outro grupo é uma das armas
usadas pelos grupos “superiores” nas disputas de poder, como meio de
manter sua superioridade social. Nessa situação, o estigma social imposto
pelo grupo mais poderoso ao menos poderoso costuma penetrar na auto-
imagem deste último e, com isso, enfraquecê-lo e desarmá-lo.” (BARBOSA,
2014).

Além do distanciamento pejorativo, eu acreditava, na época, que a política de


cotas possuía uma perspectiva meritocrática também porque tangenciava (ou até
ignorava) questões estruturais, geralmente secundarizadas e eclipsando a raiz do
problema em questão: racial. Quando se fala de margem estrutural como o racismo,
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é recorrente colocá-lo enquanto um “apêndice”, uma ramificação de um problema


supostamente maior: a exploração de classes.

Negar o racismo enquanto espinha dorsal de um processo de exploração, é


reproduzido na crença em que pessoas negras sofrem preconceito pelo fato
de parecerem pobres, associando a negritude a uma desvantagem econômica, e
portanto social. Assim, é como se a "taxa do negro" na nossa sociedade fosse
abonada de alguma forma diante da aquisição do capital. Como se o negro rico,
deixasse de sofre racismo por ser negro.

“(...) o negro vive uma ambigüidade extraordinariamente neurótica. Com vinte


anos, isto é, no momento em que o inconsciente coletivo é mais ou menos
perdido, ou pelo menos difícil de ser mantido no nível consciente, o antilhano
percebe que vive no erro. Por quê? Apenas porque, e isso é muito importante,
o antilhano se reconheceu como preto, mas, por uma derrapagem ética,
percebeu (inconsciente coletivo) que era preto apenas na medida em que era
ruim, indolente, malvado, instintivo. Tudo o que se opunha a esse modo de
ser preto, era branco. Deve-se ver nisso a origem da negrofobia do antilhano.
No inconsciente coletivo, negro = feio, pecado, trevas, imoral. Dito de outra
maneira: preto é aquele que é imoral. Se, na minha vida, me comporto como
um homem moral, não sou preto. Daí se origina o hábito de se dizer na
Martinica, do branco que não presta, que ele tem uma alma de preto. A cor
não é nada, nem mesmo a vejo, só reconheço uma coisa, a pureza da minha
consciência e a brancura da minha alma.” (FANON, 2008:162)

2 - A ASCENSÃO SOCIAL

Para discorrer sobre a estrutura social brasileira, suas disparidades e


processos de mobilidade, é preciso conceber a construção da sociedade, que
remonta à sua colonização diaspórica: o deslocamento forçado de diversos povos
africanos durante a invasão colonial portuguesa no Brasil (e europeia em todo
continente americano, de modo geral). O sequestro e transporte dos povos africanos
para servirem de força de trabalho escravizada no estado moderno-colonial
(QUIJANO, 2000) é simbolicamente possível a partir do esvaziamento da
humanidade desses indivíduos, que uma vez racializados como “negros” passavam
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a ter todas as suas diferenças étnicas homogeneizadas sob a égide da mercadoria-


viva.

Para Quijano (2000) a colonialidade é um dos elementos constitutivos e


específicos do padrão mundial de poder capitalista, produziu um sistema de
classificação racial e étnica da população mundial para legitimar a escolha de
determinados grupos a serem explorados. Ela opera na dimensão material(1) e
subjetiva(2) da sociedade: porque estabelece um padrão de diferenciação na
sociedade que seleciona os grupos que possuirão acesso aos recursos da
mesma(1), e porque esse padrão possui uma existência social cotidiana que se
estende por todas as sociedades onde o capitalismo foi implementado(2).

Na metade do século XIX ao início do XX foi construída uma teoria de verniz


científico para legitimar a exploração étnico-racial do capitalismo e o projeto de
invasão e domínio do neo-colonialismo. O racismo científico, ou Eugenia, foi
pensado a partir de uma lógica evolucionista baseada no Darwinismo social.

“A classificação da humanidade em raças hierarquizadas desembocou numa


teoria pseudo-científica, a raciologia, que ganhou muito espaço no início do
século XX. Na realidade, apesar da máscara científica, a raciologia tinha um
conteúdo mais doutrinário do que científico, pois seu discurso serviu mais
para justificar e legitimar os sistemas de dominação racial do que como
explicação da variabilidade humana. Gradativamente, os conteúdos dessa
doutrina chamada ciência, começaram a sair dos círculos intelectuais e
acadêmicos para se difundir no tecido social das populações ocidentais
dominantes. Depois foram recuperados pelos nacionalismos nascentes como
o nazismo para legitimar as exterminações que causaram à humanidade
durante a Segunda guerra mundial.” (MUNANGA, 2004:24)

Esta “ciência” abordava campos da medicina, biologia, psicologia, etc.,


associando características fenotípicas – como tamanho de crânio, análise de arcada
dentária, quantitativo melanínico – a características morais e psicológicas – como
predisposição ao trabalho, voluptuosidade, inteligência e honestidade –, a fim
comprovar uma polaridade evolutiva da espécie humana, a qual o referencial
primitivo seria o tipo africano e o ápice da evolução humana seria o tipo europeu.
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Sendo assim, quanto mais próximo das características negróides, mais tendências
criminais, insuficiência intelectual e pré-disposição a trabalhos físicos. Da mesma
forma que quanto mais próximo da branquitude europeia, mas sofisticação social,
intelectual e comunicativa se teria. Continua o prof. Munanga:

“Carl Von Linné, o Lineu, (...) oferece (...) o melhor exemplo da classificação
racial humana acompanhada de uma escala de valores que sugere a
hierarquização. Com efeito, na sua classificação da diversidade humana,
Lineu divide o Homo Sapiens em quatro raças [americano, asiático, africano e
europeu]. (...)Como Lineu conseguiu relacionar a cor da pele com a
inteligência, a cultura e as características psicológicas num esquema sem
dúvida hierarquizante, construindo uma escala de valores nitidamente
tendenciosa? O pior é que os elementos dessa hierarquização sobreviveram
ao tempo a aos progressos da ciência e se mantêm ainda intactos
no imaginário coletivo das novas gerações. No entanto, não foi, até o ponto
atual dos conhecimentos, cientificamente comprovada a relação entre uma
variável biológica e um caractere psicológico, entre raça e aptidões
intelectuais, entre raça e cultura.”(Item: 25-26)

A eugenia foi uma corrente teórica de grande influência na sociedade


brasileira. Em 1929 a cidade de São Paulo sediou o I Congresso Brasileiro de
Eugenia (SOUZA, 2013), fruto de um conjunto de ideias que fermentaram o projeto
de branqueamento do país desde a segunda metade do século XIX:

“Para que esta evolução pudesse assim ocorrer, era preciso intervir na
história... ou na natureza — noções muito próximas neste quadro de
pensamento — e injetar mais brancos no espaço até então ocupado
predominantemente por negros e índios. Era por isso precisamente que se
fazia presente a necessidade da imigração europeia, com todo o seu poder
de purificação étnica.” (AZEVEDO, 1987:72)

Ao longo do século XX e com o avanço das pesquisas sobre genética, a


concepção sobre “raças humanas” perde sua determinação científica, mas não o
estigma social. Dessa forma, recorremos a Fanon (2008[1962]) para ampliar o
conceito de racismo. Este seria uma linha divisória, entre o ser e o não-ser, que
constrói uma hierarquia global de superioridade e inferioridade sobre o que é
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humano, produzida e reproduzida enquanto estrutura de dominação. As pessoas


“acima da linha do que é humano” são reconhecidas socialmente como seres
humanos, com subjetividade e acesso a direitos; enquanto as pessoas “abaixo da
linha do humano” são consideradas sub-humanas, sua humanidade é questionada,
logo negada. Tal estrutura de dominação regula o acesso a direitos, os recursos de
produção da vida, nega o direito à cidade. Estrutura produzida pelo colonialismo
europeu para legitimar a expansão marítima e dominação de territórios e recursos, e
reproduzida pelas sociedades coloniais mesmo após os processos de
independência política dos países. O racismo, para Fanon, é um padrão de poder
multidimensional, presente tanto na subjetividade dos sujeitos que vivem na
sociedade racista (os racializados e os considerados não-racializados) quanto nas
relações sociais institucionais, que acabam por se materializar em práticas espaciais
(inclusive instrumentalizado no campo jurídico institucional). Consideramos que tanto
os eventos de discriminação, realizados nas relações interpessoais (e subjetivizados
através de preconceitos raciais) e na escala do indivíduo, quanto práticas que se
dirigem a um coletivo de pessoas (como processos de invisibilização e silenciamento
de grupos racializados, processo de expropriação e espoliação de grupos
racializados) são práticas racistas, expressão dessa estrutura de poder
hierarquizante que visa a manutenção de privilégios dos grupos dominantes, cujo
critério de privilégio e dominação é a raça. (SILVA, 2017)

Compreendemos que, no movimento de relações sociais contraditórias, há


muitos fatores que devem ser considerados – dentre eles a raça, gênero e
sexualidade – que constituem padrões hierarquização social quando combinados..
Kimberlé Crenshaw (2002), advogada negra norte-americana, problematiza a
metodologia das políticas que pautam direitos humanos, apontando a necessidade
de integrar raça ao gênero na análise das situações de violação de grupos
específicos. Ela ressalta que a intersecção entre duas ou mais estruturas de
dominação causa invisibilidade da problemática e exclui grupos já marginalizados.
Acreditamos que esta é uma orientação importante na análise dos processos de
produção do espaço: não se trata de priorizar a análise racial em detrimento da
análise das classes sociais, mas recortar um grupo da população que se torna mais
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marginalizado que outro, também marginalizado: ser pobre e negro na sociedade


racista é possuir acesso a menos bens que ser pobre e branco. (SILVA, 2017b)

Seguindo esta linha de raciocínio, numa sociedade capitalista e racista, um


negro rico vai estar exposto a menos opressões estruturais do que um negro pobre,
porém não deixa de ser negro. A posição em que está, se comparada a um branco
da mesma classe, é a de exceção, posição marginal no topo da hierarquia social.
Sendo assim esse negro, ao ascender socioeconomicamente tem essa taxa
reduzida - a representatividade da margem estrutural frente à totalidade social - em
medida diretamente proporcional à conjuntura em que está inserido. É uma dupla
negação: exceção à condição que o racismo delega ao negro, de isolamento em
relação à sua comunidade original; e desvantagem e marginalidade à condição que
o classismo delega aos indivíduos ricos, por ser negro. Um não lugar. Dessa forma,
o negro rico possui passabilidade dentro da estrutura social racista e classista, por
conta da mobilidade social conquistada, mas não possui representatividade na
totalidade do corpo social, porque ascendeu sozinho e a expressão da riqueza ainda
possui a cor branca.

Segundo Neuza Souza (1987), o racismo opera na sociedade capitalista como


expressão de pobreza:

“A sociedade escravista, ao transformar o africano em escravo, definiu o


negro como raça, demarcou seu lugar, a maneira de tratar e ser tratado, os
padrões de interação com o branco e instituiu o paralelismo entre cor negra e
posição social inferior. “(1987,p.19)

Àqueles que fogem a regra, são lembrados da regra que fugiram – os eventos
de discriminação racial operam para lembrar-lhes qual é o seu lugar, ou melhor, de
que são a exceção da regra: os constrangimentos raciais apresentam uma reserva
de sentido criada pelos agressores, que existem para “emergir no momento que os
negros e negras aparecem no mundo branco” (OLIVEIRA, 2011). Os eventos de
discriminação geram na vítima um estado emocional que cria dificuldades na
interação (trauma), e intervém na construção e busca por subjetividade,
interiorização de valores do embranquecimento, e negação da identidade negra – o
que Fanon chama de “máscaras brancas”.
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“A ascensão social se fazia representar, ideologicamente, para o negro, como


um instrumento de redencao economica, social e política, capaz de torná-lo
cidadão respeitável, digno de participar da ideologia nacional.” (SOUZA,
1983: 21)

Entretanto, adentrar no “mundo branco” tem seus custos, “como exceção,


perdia a cor (...) compelido a desfigurar-se material e moralmente” (idem: 23). E
sofrer os eventos de discriminação decorrentes da estigmatização histórica:

“aquelas seções de um grupo estabelecido em que os membros são mais


inseguros, mais incertos acerca de seu valor coletivo, tendem à mais aguda
hostilidade na estigmatização de grupos outsiders, a ser implacáveis na luta
pelo status quo e contra uma queda ou abolição dos limites entre
estabelecidos e outsiders. Normalmente são eles quem mais têm a perder no
caso de uma ascensão dos outsiders” (ELIAS, 2000, p. 212)

Ou seja, por mais embranquecido que o indivíduo negro tente ser, em


distintas oportunidades ele será lembrado que aquele lugar não lhe pertence.

Pensar a ascensão no capitalismo sem conceber os vetores atuantes nesse


deslocamento é escamotear os recortes existentes nessa potencialização,
invisibilizando formas estruturais de manutenção de exploração dos corpos que
consequentemente irá se sujeitar a exploração que a estrutura social designará a
este corpo.

Quando se ascende, o não lugar se instaura a partir da não identificação. Não


existe referencial de muitos negros (em relação a totalidade de pessoas nessas
posições) em posição de prestigio, assim como poucos nos movimentos de
ascensão, justamente por essas ascensões não serem coletivas. O negro não se
reconhece naquele ambiente, nos códigos morais e éticos daquele meio. Se a
estrutura hegemonicamente é composta por uma elite branca e burguesa
cisheteronormativa, temos essas características socialmente enquanto referenciais
positivos. Dessa forma toda a estrutura se movimenta e se desenvolve para se
manter e sofisticar essa hegemonia, se desdobrando nas instituições que
reproduzem a lógica de dominação racial.
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Tendo em vista o contexto pós moderno e globalizado que vivemos, a


especialização do conhecimento a partir de uma concepção branco-ocidental se dá
de forma a legitimá-la, fazendo que o ensino superior seja uma forma de
especialização do conhecimento, sendo assim um precursor de reconhecimento no
mercado de trabalho pelo menos em relação aos desprovidos desse certificado de
saber.

“Nos países racistas, as diferenças biológicas fenotípicas se tornam fatores


de dominação e exclusão, geradores de desigualdades raciais, fazendo da
educação um dos maiores terrenos da exclusão.” (MUNANGA, 2007)

A educação formal é o espaço de disputa.

3 - A COR DA VAGA E A NEUTRALIDADE AXIOLÓGICA

O REUNI é um programa do Governo Federal de Apoio a Planos de


Reestruturação e Expansão das Universidades Federais do Brasil. Foi instituído pelo
Decreto Presidencial nº 6.096, de 24 de abril de 2007 e seu objetivo é criar
condições para a ampliação do acesso e permanência na educação superior, no
nível de graduação, por meio do melhor aproveitamento da estrutura física e dos
recursos humanos existentes nas universidades federais. Concomitante à isso existe
também a preocupação em garantir qualidade no ensino de graduação da educação
pública. (UFF, 2007)

Tomando como base o ingresso de estudantes negros antes e depois deste


programa, podemos perceber uma mudança latente dentro das universidades. Isso
porque o processo de admissão (ENEM/ vestibular), tido enquanto
meritocraticamente justo, mina a possibilidade da maioria da população que não tem
acesso a boas escolas, concebendo a péssima qualidade da escola básica pública
ao concorrer com estudantes de escolas particulares e preparatórias.
16

s.

Visualizando o gráfico acima, pode-se perceber que os cursos com maior


percentual de negros são nos que tem menor relação candidato/ vaga, ou seja
menos concorrência. Normalmente esses cursos tem menos prestigio, ou menor
remuneração no mercado de trabalho. Esses dados são expressão da disparidade
dos acessos ao ensino superior, uma vez que mesmo com a entrada de pessoas
negras no ensino superior, essas entram em cursos não tão procurados pela
totalidade dos candidatos a ingressantes.

Mesmo após o ingresso do estudante na universidade, este encontra


barreiras institucionais para permanecer em seu objetivo de ascensão social. É a
partir do estudo de Maria Auxiliadora Lopes e Maria Lucia Braga (2007) avaliando
programas de ações afirmativas de diversas universidades do país que são
iluminados problemas estruturais de manutenção do estudante no ensino superior:
falta de moradia estudantil para essas pessoas, bolsas de permanência acadêmica,
restaurantes universitários a preços acessíveis, etc. Até mesmo o maior programa
federal de incentivo ao intercâmbio reproduz a manutenção do privilégio dos
privilegiados: são os alunos com maior renda, que têm fluência em idiomas
estrangeiros, e em sua maioria, brancos, que possuíram maior acesso ao Ciência
Sem Fronteiras:
17

Visualizando o gráfico acima, pode-se perceber que os cursos com maior


percentual de negros são nos que tem menor relação candidato/ vaga, ou seja
menos concorrência. Normalmente esses cursos tem menos prestigio, ou menor
remuneração no mercado de trabalho. Esses dados são expressão da disparidade
dos acessos ao ensino superior, uma vez que mesmo com a entrada de pessoas
negras no ensino superior, essas entram em cursos não tão procurados pela
totalidade dos candidatos a ingressantes.

Mesmo após o ingresso do estudante na universidade, este encontra


barreiras institucionais para permanecer em seu objetivo de ascensão social. É a
partir do estudo de Maria Auxiliadora Lopes e Maria Lucia Braga (2007) avaliando
programas de ações afirmativas de diversas universidades do país que são
iluminados problemas estruturais de manutenção do estudante no ensino superior:
falta de moradia estudantil para essas pessoas, bolsas de permanência acadêmica,
restaurantes universitários a preços acessíveis, etc. Até mesmo o maior programa
federal de incentivo ao intercâmbio reproduz a manutenção do privilégio dos
privilegiados: são os alunos com maior renda, que têm fluência em idiomas
estrangeiros, e em sua maioria, brancos, que possuíram maior acesso ao Ciência
Sem Fronteiras:
18

Já nesse segundo gráfico, podemos ver a disparidade quantitativa não só de


ingressantes como de não ingressantes, sendo possível ter uma noção da totalidade
de inscritos entre alunos negros e brancos. O somatório de alunos não-negros que
participaram do programa expressa aproximadamente 40% a mais de alunos
brancos do que negros, proporção que não corresponde ao número de estudantes
que pleitearam vaga mas não conseguiram (não participantes), expressa uma
diferença de aproximadamente 5% maior de alunos brancos do que negros. Sendo
assim, podemos perceber que a quantidade de pessoas negras que se
candidataram a vagas no programa é menor que o de pessoas brancas, diferença
que se aprofunda quando observa-se a quantidade de alunos negros que
efetivamente conseguiram ir ao intercâmbio, em relação aos alunos brancos. Esses
dados ilustram mais uma vez como a burocracia das instituições educacionais
operam afunilando os processos e estreitando o acesso a tais oportunidades.

O programa “Ciência Sem Fronteiras”, assim como bolsas permanência,


restaurantes universitários, moradia estudantil, projetos de extensão, dentre outros
benefícios universitários, são recursos estruturais materiais que existem de forma
ausente e defasada aos alunos que necessitam. A lógica da ausência de políticas
públicas reforça o entendimento de que a universidade está voltada para a elite,
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podendo assim não se preocupar com as demandas efetivas dos usuários de outros
recortes sociais, negando sua nova configuração, já que estes não eram nem para
estar ali. Contudo, não é só de defasagem material que se priva o estudante negro
e cotista da universidade.

A violência subjetiva estrutural faz com que a maioria das pessoas negras, se
entendam como margens estruturais subjetivamente mesmo que de forma
involuntária, e faz com que mal cogitem pleitear certos espaços, pois não imaginam
que possam ocupá-los.

A falta de representatividade não só na falta de professores, diretores e


trabalhadores negros em posições de prestígio, acompanha os poucos alunos que
entram e se deparam com a falta de ementas, disciplinas temáticas, autores e
movimentos negros dentro da universidade. Isso se dá devido ao reconhecimento da
racialidade enquanto um tema apêndice que é secundarizado como se fosse
opcional no entendimento da realidade social brasileira (literalmente uma optativa na
grade curricular). Esse descaso e desimportância são características latentes da
seletividade da legitimidade acadêmica.

Quando é importante falar sobre a experiência de pessoas negras na


universidade?

Quando estes não estão falando por si.

Uma expressão muito comum, que me acompanhou durante toda a


universidade foi a expressão: “Essencialista.” Todo e qualquer debate racial que
tensionava sobre o privilégio da branquitude na academia, tal expressão era
convocada à discussão, modo de deslegitimar o questionamento como se ele fosse
pejorativamente tendencioso e anti-científico.

Pelo que me lembro só tive dois professores negros na universidade, não que
o fato de ser negro lhe faça atuar enquanto militante da causa na academia, mas
acredito que a falta de experiências dessa vivência negra afasta possibilidades de
percepção da realidade por esse viés.
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Uma pessoa branca não pode sentir o que uma pessoa negra sente, nem
sabendo todo o contexto histórico e social do racismo, nem sendo especialista em
África ou qualquer outra racionalidade que a ciência proporciona. A academia
reconhece o racismo enquanto um tema, e essa é uma problemática social
reproduzida nos espaços onde supostamente se move para a diminuição dessa
disparidade racial. O descuido com a questão, entretanto, se desdobra na criação de
uma NEGROLOGIA - o negro como objeto de estudo a partir da narrativa branca.

A problematização deste fato não é uma defesa à interdição da fala/narrativa


branca sobre a vivência do negro, mas uma forma de compreensão da parcialidade
de qualquer narrativa. A narrativa de pesquisadores não parte de um ponto neutro,
independente de qualquer recurso utilizado para a construção do conhecimento. Se
o ser branco está interpretando a vivência negra, toda sua percepção vai estar
envolta da sua experiência enquanto pessoa branca, distinta da percepção da
pessoa negra. A questão é: se faz necessário identificar o ponto de partida de
qualquer processo de análise ou narrativa a fim de que se identifique como e porque
esse caminho está sendo percorrido e para aonde se quer chegar. O deslocamento
só é possível a partir do momento em que se sabe a trajetória daquele que narra, do
contrário, ocultar desses pontos se torna uma funcionalidade científica, maquiando
sua intenção ou valor, travestindo-o de neutralidade.

Por que quando uma pessoa negra fala sobre negritude é essencialista e
quando o branco fala sobre QUALQUER assunto é neutro, é ciência?

No acervo educacional superior brasileiro, há uma grande quantidade de


conhecimento formal e científico produzido sobre a vivência de pessoas negras e
desfavorecidas social e economicamente como objeto de estudo: Vide os classicos
Franz Boas ([1888] 1940; 2004; [1938] 2011) e o estudo de povos indígenas , Foote
Whyte ([1943] 2005) estudando guetos italianos nos EUA, , Malinowski ([1922] 1976;
[1927] 2013) sobre os aborígenes australianos, dentre outros.

Os povos cujas culturas foram estudadas com profundo interesse, não


tiveram, porém, acesso a esse conhecimento formal, muitas vezes nem o próprio
estudo que elas mesmas fizeram parte. Esse conhecimento não se volta aos grupos
21

estudados em nenhuma instância; a produção fica pairando entre os seminários e


congressos, quando não morrem nas bibliotecas universitárias. A Escola de Chicago,
por exemplo, nos Estados Unidos, é especializada em estudar casos de desvio
social, o clássico da antropologia etnográfica “Sociedade de Esquina” (WHYTE,
2005 [1943]) se atém a estudar um lugar marginal, cujas lógicas estariam dadas
para o bom funcionamento daquele meio social, por mais que este seja reconhecido
estruturalmente enquanto um lugar caótico - sem “leis” ou códigos sociais
estabelecidos.

Todo esse conhecimento científico produzido tem uma perspectiva que não é
do observado e sim do observador, uma vez que o ato de observar, nesse caso, é
científico e metodológico. Teoricamente ele instrumentaliza a percepção de uma
realidade que não é a sua, possibilitando o pesquisador produzir significado nas
disposições sociais observadas legitimado pela metodologia científica. Essa teoria é
denominada "neutralidade axiológica", concebida por Max Webber, como uma
tentativa de afastamento da parcialidade de sua posição sociocultural, se
desprovendo de suas convicções e valores concebidas em sua sociedade natal, a
fim de produzir uma análise científica fundamentada.

“Não existe nenhuma análise cientifica puramente objetiva da vida cultural, ou


– o que pode significar algo mais ilimitado, mas seguramente não
essencialmente diverso, para nossos propósitos – dos fenômenos sociais,
que seja independente de determinadas perspectivas especiais e parciais,
graças às quais essas manifestações possam ser, explicita e implicitamente,
consciente ou inconscientemente, selecionadas, analisadas e organizadas na
exposição, como objetivos de pesquisa “(WEBER, 2006, p.43)

Para Fonseca (1997):

“Weber viu na construção dos tipos ideais um meio do cientista de despir de


seu juízo de valor, de excluir toda avaliação. Só mediante fórmulas
conceituais típico-ideais é que é possível se chegar a compreensão e
explicação da natureza do objeto de estudo, sem a interferência das
avaliações, das falsas premissas, da subjetividade.” (FONSECA, 1997,
p.32).
22

É justamente essa suposta imparcialidade científica a qual gostaria de


destrinchar neste trabalho. Assim como o conceito de humanidade é uma
perspectiva macro científica, não há a concepção de recortes estruturais como se
todos os seres humanos coubessem nesse conceito, a própria perspectiva em si é
uma parte de alguma totalidade de percepção, sendo assim parcial.

Numa sociedade cristã onde se construiu uma identidade nacional


eugenicamente colonizada, a crença em Deus, e em Jesus à sua imagem e
semelhança, é retratada através de um homem branco. Mesmo nascido em
Jerusalém. Isso expressa não um equívoco na representação dessa santidade, mas
uma manifestação do que essa sociedade entende e identifica como perfeição, qual
o referencial é tido enquanto positivo, o que é importante que as pessoas entendam
como bom, etc. Assim também é com a crença cientifica.

Assim, tudo o que é claro é reconhecido como positivo e tudo que é escuro
faz menção à negatividade.

O corpo negro em seu não lugar de ascensão se encontra solitário e


destoante do cenário ao qual ocupa. A universidade o aceita, mas não o acolhe,
uma vez que esta não se estrutura para que ele esteja ali - se movimentando a
mascarar seus acessos na estrutura seletivamente.

A neutralidade auxilia na impressão de “democracia” da estrutura educacional


superior pública, atuando como uma negação do estreitamento entre demandas
específicas e ofertas gerais, distanciando o candidato da sua própria vaga. Esse
estudante negro e/ou cotista dificilmente irá desfrutar de sua vaga amplamente, uma
vez que esta é pensada para a branquitude mas se apresenta travestida de
universalidade. Muitas demandas atravessam sua existência na universidade.

Vejo dois caminhos na dualidade concomitante desse não lugar: o rumo do


embranquecimento, na tentativa de se manter na estrutura mesmo que reproduzindo
ideias hegemônicas da branquitude; e o rumo da marginalidade, ao se colocar
enquanto corpo negro destoante e em constante negação a estrutura.
23

Busco explicitar como a estrutura social e principalmente educacional não é


para todos, se mascarando em dificuldades de acesso, a fim de manter os indivíduos
em suas posições sociais necessárias para que esta sociedade continue regida pela
hegemonia vigente. A necessidade de mão de obra não qualificada, demanda
indivíduos dispostos, ou seja necessitados, tendo que existir estruturalmente uma
zona populacional de sacrifício que necessite desesperadamente de qualquer
emprego. Historicamente podemos perceber diversos processos estatamentais de
divisão social e racial, como por exemplo as consequências modernas do regime
escravocrata que não só espacialmente como no status social segrega brancos e
negros. Os tornando polos de referenciais simbólicos, de branco enquanto positivo e
negro enquanto negativo. Assim toda a produção renomada ou reconhecida é
proveniente de um ambiente branco, assim como o que causa medo e aversão é
ligado à treva. A própria ciência eugênica (pós abolição) aborda essa polarização
enquanto real e científica, onde o recorte biológico é recurso de critério para a
reafirmação dessa polaridade étnica.
24

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