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Curso de Astrologia e Cosmologia Medieval – Professor Luiz Gonzaga de Carvalho

Aula 03

Elementos do auto-conhecimento; relação entre corpo e mente. Intelecto possível. Sentido comum.
Pensamento e imaginação. O homem como animal capaz de perceber a realidade, capaz de inteligir.
Inteligência e consciência. Noções que o ser humano adquire quando nasce; conceitos de bom e mau
para o homem. Expectativa de escapar do mal e alcançar o bem. Primeiro componente da
psicologia humana: temperamento - extrato mineral. Problemas cognitivos do homem real: 1) Será
que a realidade é boa?; 2) Ilusão: Existem experiências boas, e a coleção de experiências boas me
deixará feliz. Segundo componente da psicologia humana: extrato vegetal. Exposição dos símbolos
dos planetas Saturno, Júpiter e Lua. Gênesis: os problemas do homem começaram quando ele
comeu o fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal. A relação de Saturno com as
experiências mais negativas: “nunca nada dá certo”; “tudo sempre dá errado”. O que fazer nessas
situações? Como discernir? Simbolismo da parábola do grão de mostarda do Evangelho.
Importância da prática religiosa para encarar o núcleo da experiência ruim. Aprender astrologia
nesse curso vai dar a chave alquímica de mapeamento da psicologia do aluno e das pessoas em
torno. Diferenças entre Astrologia e Alquimia. O que é um homem perfeito? Exposição dos
símbolos dos planetas Vênus, Marte, Sol e Mercúrio. O simbolismo do círculo na Astrologia.
Cálculo da mentalidade. Exemplo de cálculo de mentalidade com um aluno.

Gugu: ... As imagens que eu tenho na mente, as impressões que eu tenho no corpo, tudo isso acontece
comigo. Isso é uma parte do que sou “eu”. Outra parte do que sou “eu” é aquilo que percebo que posso
fazer. Por exemplo, falar. Nunca acontece de eu estar falando sem ter decidido falar primeiro. Também
nunca acontece de eu estar andando sem que eu decida ter andado antes. Então eu percebo que uma parte
do meu ser é aquilo que acontece comigo, acontece em mim; outra parte do meu ser é o que eu faço, o
que eu realizo com ele. Mas a amostra que eu tenho disso é, na verdade, muito pequena. Em qualquer
momento da minha vida, o conjunto de experiências e decisões que eu posso lembrar e que eu posso
prever é muito pequeno em relação à totalidade da minha vida. Isso quer dizer que a simples auto-
observação não é suficiente para o sujeito chegar a ter autoconhecimento. Algum método é necessário.
Por que isso? Porque o ser humano é um ser complexo. E conhecê-lo, ou mesmo conhecer-me, é, em
certa medida, recapitular toda a realidade. Isso porque, como diziam os antigos, o ser humano é um
micro-cosmo, então ele tem em si os diversos extratos da realidade que você encontra em partes nos
outros objetos.

“Ah, o temperamento é a base mineral da minha personalidade”. Na verdade, mais apropriadamente, ele é
a base mineral da nossa psicologia, de tudo o que acontece na nossa mente. Mas percebam algo
interessante: quando se fala em autoconhecimento, ninguém inclui o estudo da fisiologia ou da
mineralogia como parte desse projeto de se conhecer. Quer dizer, quando ouvimos “autoconhecimento”,
instintivamente pensamos: “O conhecimento da minha mente”. Nos localizamos quando dizemos: “Eu.
Conhecer a mim. Conhecer o eu.” Pois bem, “conhecer o eu” é conhecer a nossa psicologia. Não estou
apontando para o corpo. Então, embora o temperamento seja um dado da psicologia, ele está entre esta e a
nossa fisiologia básica. É onde nossa mente se agarra no corpo e onde o nosso corpo se comunica com a
mente. Embora o “eu” seja, de fato, mais mente do que corpo, ele existe de algum modo nesse corpo, e,
mesmo que na sua realidade fundamental ele não seja afetado pela existência do corpo, na nossa
observação do que somos, ele é [afetado]. De um lado o temperamento é a nossa base mineral. Do outro
lado, no extremo oposto da base mineral, temos a inteligência pura, tanto no seu aspecto analítico e
racional, quanto no seu aspecto sintético de captação do real; a inteligência como razão e sua capacidade
de captar as qüididades e formas universais das coisas, e também como uma capacidade de captar e
apreender o ser.

Entre o intelecto – a inteligência – e o temperamento – o elemento mineral -, temos dois meios de


comunicação: um que vai debaixo para cima, e outro que vai de cima para baixo. O que vai debaixo para
cima, corresponde àquilo que os escolásticos chamavam de intelecto possível, que seria a simples
disposição receptiva a entender. É importante notar que intelecto possível não é uma capacidade de
entender, não é que existe um poder interno de entender a que chamamos intelecto possível. Como dito, o
intelecto possível é uma disposição receptiva. E o que é isso? Olha só, temos aqui a minha mão e do outro
lado o isqueiro. Se você olhar bem, o isqueiro encaixa na palma da minha mão e não cai. Mas não é
porque eu tenho uma faculdade de pegar isqueiros que existe algo dentro de mim me orientando na
direção de concretizar essa ação. Se o isqueiro não existisse, o meu ser continuaria exatamente o mesmo.
Mas pelo fato da mão existir – e existir nessa forma -, é possível para ela ter o isqueiro sobre ela. É uma
possibilidade que se abriu pela sua existência, mas não é uma capacidade ativa. A mão tem a capacidade
ativa, de fato, de segurar qualquer objeto físico. Não uma capacidade de segurar isqueiros. Ela tem a
possibilidade de segurar isqueiros. Deu para perceber a diferença? Uma capacidade subentende a
existência de um objeto correspondente a ela. Quer dizer, a capacidade de ver subentende a existência de
luz, mas não subentende a existência desta cor ou deste objeto. (Nota do transcritor: fiquei um pouco
confuso com a explicação, mas me parece que o intelecto possível é apenas a possibilidade que temos de
chegar até a inteligência pura. Não significa que internamente, dentro de nós, há algo que nos move
mesmo sem percebermos, mesmo contra a nossa vontade, e concretiza essa passagem entre o extrato
mineral da nossa psicologia e a inteligência pura). Pois bem, o intelecto possível é a coluna ascendente
que vai da sua psicologia básica até a inteligência. Já do outro lado, na outra coluna, temos as impressões
causadas pelo sentido comum. Então, nesse momento, por exemplo, eu estou vendo a sala em que vocês
estão. E ela possui uma certa iluminação que causa um certo efeito na minha mente. É um caso
irrelevante. Eu sei que a iluminação é diferente da iluminação de onde eu estou. Eu poderia pensar que, se
não existisse diferenças de iluminação, vocês são da cor que eu estou vendo na tela; e que a parede não é
inteira branca, mas tem umas partes dela que são cinza-escuro, porque a iluminação varia de uma parte da
sala para outra. Isso seria uma impressão.

Então podemos fazer um quaternário com isso. Na base, embaixo, está o temperamento. Em cima está a
inteligência pura. Do lado esquerdo, temos o pensamento, que é o primeiro instrumento do intelecto
possível. E do lado direito, a imaginação, que é a capacidade de moldar as impressões, de construir
conteúdos mentais com base nas impressões. Então, se vocês lembrarem o esquema das cores que nós
vimos na primeira aula, vocês podem colocar, do lado esquerdo, do lado do pensamento, aquela seqüência
que passa entre o roxo, o azul e até o verde. E do lado direito, aquela seqüência que vai do amarelo,
laranja até o vermelho. A característica mais importante, tanto do lado do intelecto possível, que gera as
suas primeiras concepções sobre o que é a realidade, quanto do lado das impressões e da imaginação, é
que as nossas concepções e impressões geram disposições apetitivas ou desejos. Dependendo de como
você pensa ou imagina uma situação, é como você se sente em relação a ela. Percebam que existe uma
diferença bastante grande entre o pensamento e a imaginação. Se vocês, por exemplo, imaginarem que do
lado de fora da sala há um incêndio, vocês não irão sentir nada; talvez, dependendo da maneira como
vocês o imaginem, podem sentir satisfação ou insatisfação – alguns podem imaginar isso como a coisa
mais legal do mundo, outros não. Porém, imaginar que há um incêndio do lado de fora da sala não irá
causar uma disposição de ação em relação ao que foi imaginado. Por outro lado, se vocês pensarem que
há realmente um incêndio do lado de fora da sala, imediatamente irão sentir uma inclinação à ação. Está
clara a diferença? A imaginação não é uma opinião acerca da realidade, ela não envolve um juízo. Ela
pode ser usada para ilustrar um julgamento, ou até para reforçar uma mensagem; ela é usada para dar
eficácia e força para um pensamento. É muito importante vocês entenderem que as disposições gerais da
alma são geradas nessa coluna da esquerda [a coluna do intelecto possível]. Já a coluna da direita reforça
ou enfraquece essas disposições [a coluna da imaginação]. Quer dizer, a imaginação, por si, não produz
ação, mas pode ser usada para reforçar ou atenuar uma idéia, um pensamento, uma opinião, ou uma
crença. E toda a atividade da nossa mente se dá nessas duas colunas. De um lado, o que eu penso sobre as
coisas? O que eu estou percebendo? O que eu estou vendo, ouvindo? O que eu acho? Do outro lado,
como eu reajo a isso? E aí entra em jogo a imaginação.

Então, nós vamos associar simbolicamente essas duas colunas. A da esquerda, que é aquela ascendente, a
coluna das concepções e do pensamento, iremos associá-la simbolicamente aos vegetais – daqui a pouco
explicamos o porquê. E a coluna da direita iremos associar aos animais. A associação com as cores é
muito fácil, porque a coluna da esquerda sobe para o verde, e a maior parte dos vegetais têm algo do
verde. E a [coluna] da direita desce para o vermelho, e a maior parte dos animais têm sangue vermelho.
Por que associamos os vegetais com a coluna da esquerda? Pois ela é a coluna da atividade terrestre do
homem. Quer dizer, o homem é capaz de perceber a realidade; e como ele é um animal racional, esse
“racional” da fórmula está aí para indicar que ele é psicologicamente consciente da sua inteligência, ele é
capaz de ser cônscio da atividade intelectual, ele é capaz de inteligir. Ora, porque essa capacidade é
meramente potencial nele, ela corresponde não à coluna da influência celeste, mas à coluna da atividade
terrestre. A inteligência é onde o homem pode subir. A coluna do pensamento é por onde você sobe da
experiência bruta até a intelecção das coisas. E a coluna da direita, é a coluna de onde você desce da
intelecção à integração e reintegração ativa do seu ser na inteligência.

Agora, vejam bem, quando falamos que o ser humano pode entender, pode inteligir, o que queremos dizer
com isso? Isso quer dizer que ele tem um potencial, uma possibilidade, de trazer para a sua consciência
individual tudo aquilo que é inteligível. No conjunto da realidade, isto que é inteligível já é inteligível. As
coisas não são inteligíveis porque eu tenho a capacidade de entendê-las. São inteligíveis mesmo que eu
não exista. A própria essência, ou raiz, do real da inteligência é a inteligibilidade das coisas. Isso quer
dizer que, em nós, a consciência é posterior à existência. Não é que fomos concebidos e imediatamente
passamos a ter consciência. Não, esta veio depois, ela é progressiva, ela é um esforço de subida desde a
existência até a inteligência. Mas no momento mesmo que eu passei a existir, a inteligência passou a
operar em mim. Isso quer dizer que, no homem, a inteligência é anterior à consciência; e ela [a
inteligência] molda, determina, rege os conteúdos da consciência. E desde quando você começa a existir,
a inteligência em você ordena o seu organismo na direção da consciência. Porque a inteligência a ordena
assim, o seu organismo começa a moldar órgãos sensoriais e te inclinar na direção da percepção sensorial.

Após nascermos, começamos a sentir o mundo. Luzes, cores, sons. Neste momento, para você, o mundo é
duas informações básicas. A informação número um é que o mundo existe. Essa é a informação que a sua
inteligência recebe. Existe o mundo, os seres e um monte de coisas. Agora, a informação “coisas”,
“monte”, “um”, nenhuma delas você recebeu ainda, pois você não possui tais conceitos logo ao nascer.
Então, você tem uma informação que é o Ser. E a outra informação engloba as cores, sons, texturas,
temperaturas, ou seja, as informações sensoriais brutas. Porém, a informação sensorial bruta é de duas
espécies para o bebê. Percebam que o recém-nascido ainda não discerne os diversos tipos de entes, mas
dentre os que são percebidos pelas sensações, ele distingue duas categorias: agradável e desagradável,
bom e mau. Imediatamente ele começa a perceber isso e a classificar o mundo nessas duas categorias: o
que é bom e o que é mau. Assim que ele começa a ter um certo controle do seu corpo, a primeira coisa
que ele percebe é que pode estender a mão e agarrar as coisas. E o que ele faz quando as agarra? A
primeira coisa que os bebês fazem quando aprendem a agarrar é levar a coisa agarrada até a boca. Por que
eles colocam as coisas na boca? Para ver se é bom ou mau. Ele já aprendeu que o mundo ou é bom ou é
mau, ou é agradável ou desagradável. Então temos aqui três noções que são as primeiras que adquirimos
quando nascemos. A primeira noção é a de existência, a noção de Ser; na primeira sensação já
percebemos isso, e provavelmente já percebemos isso na vida intra-uterina, pois ali já temos sensações,
ainda que bastante atenuadas. Depois que nascemos, dois outros conceitos surgem em nossa mente,
derivados da nossa experiência do real: bom e mau; bom é o que gostamos e queremos, mau é o que não
gostamos e não queremos. Isso antes de aprendermos que existem coisas. Não temos o conceito de “eu”
ou o conceito de “coisas”. Tudo é um Ser só. E o Ser se divide em bom e mau antes de se dividir em
espécies. Só depois começamos a aprender as outras coisas. “Ah, tem a mamãe, o papai, eu - o nenê -, o
chão...” Enfim, as coisas. Começamos a adquirir vários outros conceitos. Esses conceitos são muito mais
úteis para navegarmos do que o simples conceito que tínhamos de “era bom” e “era mau”. No entanto,
esses dois conceitos ainda estão subjacentes em nossa psicologia. Com o passar dos anos, várias outras
atividades mentais continuam acontecendo. Adquirimos o conceito de “eu”, “outros”; experimentamos
com mais clareza as nossas disposições interiores e nossas capacidades; e esquecemos aquelas três
primeiras experiências do real, ou seja, a experiência de Ser, a de bom e a de mau.

Mas vejam bem: quando aplicados às coisas, os conceitos de bom e mau são muito importantes, úteis e
vantajosos. “Ser picado por uma serpente é mau, pois vou morrer ou ficar doente.” “Comprar uma casa é
bom, pois vou ficar protegido das intempéries.” Perceba como esses conceitos são extremamente
importantes para você lidar com as coisas. Porém, a verdade é que eles são profundamente inadequados
para lidarem com o Ser. E eles surgiram como uma maneira de classificar o Ser, e não as coisas. Estas [as
coisas] realmente se dividem em boas, más e indiferentes. Mas a própria existência não se divide nessas
três categorias. Mesmo sem pensar no assunto, e como essas descobertas aconteceram antes de você ser
capaz de pensar, essas três categorias são a raiz do seu pensamento. Você tem essa raiz e, lá no final, tem
essa capacidade ou possibilidade de entender toda a realidade, de entender tudo o que é inteligível. A
primeira coisa que te impede de entender o que é inteligível é ter classificado o Ser em bom e mau, sendo
que são as coisas que são boas e más. A existência não é boa ou má. Não existem duas existências. Existe
apenas uma existência. Vejam que aquela classificação em bom e mau não veio da sensação enquanto ato
de “ser”, mas da qualidade específica, da característica particular que ela tinha. E às vezes uma
característica particular completamente acidental. Uma coisa pode ser desagradável num momento, numa
circunstância, e incrivelmente agradável em outra. Porém, a informação “existe o Ser”, veio do simples
conteúdo da sensação. Como conseqüência do fato de pensarmos que o Ser se divide em bom e mau, e
simultaneamente, por ter uma disposição receptiva para captar toda a realidade, temos uma disposição,
uma expectativa passiva de escapar do mal e alcançar o bem. A primeira inclinação básica que temos,
antes de qualquer desejo particular, é a expectativa de que: “Eu vou escapar do mal e vou alcançar o
bem.”

Então nós temos bem e mal, e agora olhamos as coisas e confirmamos esse fato: algumas coisas são boas
e algumas são más, algumas experiências são boas e outras são más, e assim por diante. Isso não quer
dizer só as coisas no sentido material, mas também as coisas no sentido de experiências, no sentido do ato
da percepção. “Ah, mas como escapar do mal e alcançar o bem? Simples, eu me afasto das experiências
más e me aproximo das experiências boas.” Cada vez que passamos por uma experiência boa, por um
breve instante, esquecemos completamente a possibilidade de que ela venha a terminar e que, em seguida,
chegue a próxima experiência que será ruim. Do mesmo jeito, cada vez que sofremos uma experiência má
ou desagradável, por um breve instante pensamos: “Será que existem coisas boas mesmo? Será que existe
algum bem na realidade?” Então aí nós temos duas questões. A primeira pergunta – que na verdade é uma
ilusão, um engano-, que é o primeiro problema cognitivo humano real, é: “Será que a realidade é boa?”
Essa pergunta é gerada diante de cada experiência má. A segunda pergunta – na verdade não é uma
pergunta, é uma ilusão ou engano, uma armadilha mental na qual estamos: “Existem experiência boas, e a
coleção delas me deixará feliz.” Assim, os primeiros obstáculos (inaudível) são: uma dúvida de base e um
engano fundamental (ou uma ilusão fundamental). A dúvida, toda vez que temos uma experiência ruim, é:
“Será que a realidade é boa? Será que existe o bem mesmo?” E o engano é quando temos uma experiência
boa e pensamos: “Nossa, agora é para sempre!” Ou: “Depois dessa virá outra, e outra, e outra... E a
sucessão das boas experiências irá garantir a minha felicidade.” Veja bem que nenhuma dessas duas
coisas possui uma base intelectual no sentido puro. Uma tem uma base no esquecimento, e o
esquecimento consiste no seguinte: quando apreendemos o Ser, não apreendemos se ele era bom ou mau;
mas apreendemos junto com ele essa sensação particular que era boa ou má. Então as duas experiências
encavalaram. E o nosso juízo acerca da existência ficou esquecido, ele foi soterrado, e está enterrado por
baixo das classificações das coisas. Quanto mais olhamos as coisas e as experiências, mais na dúvida
ficamos, porque umas são boas e outras são más, e elas não nos dão uma resposta definitiva. E a ilusão, a
idéia confusa que uma hora iremos alcançar a felicidade, só dispersa a nossa inteligência, pois, com essa
expectativa, procuramos as experiências boas e fugimos das más. Num certo sentido, isso aí é uma
reverberação do elemento vegetal do nosso ser na nossa psicologia.

E aí nós entramos no segundo componente da psicologia humana. O primeiro componente, como nós
falamos, é o temperamento, a base mineral. E para explicar o que é esse componente vegetal da nossa
psicologia, precisamos explicar o que é um vegetal. Para os que já tiveram o curso de Cosmologia antes,
mas sem Astrologia, a parte do que é um vegetal é fácil e já está respondida. Porém, para quem não teve,
ainda vale o mesmo método. Eu pergunto: o que é um vegetal? É simples. O que um vegetal faz?
Primeiro, o vegetal é um corpo, que nem o mineral. Mas o que o vegetal faz que o mineral não faz? O
vegetal cresce, enquanto os minerais não. Só que, para crescer, ele apenas infla e vai ficando mais
rarefeito? Não, pois para crescer ele se alimenta. Essa é a primeira diferença entre ele [o vegetal] e o
mineral. Um mineral pode afetar outro mineral do lado dele, mas não pode transformá-lo. Por exemplo, o
ouro pode afetar a água do lado dele, mas não pode transformá-la em si próprio. Já o vegetal pega o
mineral, ou até outro vegetal que está do lado dele, e transforma em sua própria substância. Ou seja, ele se
alimenta, e ao se alimentar ele cresce. E crescendo ele alcança a maturidade. Quer dizer, ele não só cresce
em tamanho, ele se desdobra em órgãos que têm funções. Ele desenvolve órgãos e se reproduz. Percebam
isso, ele se alimenta para crescer, e ele cresce para amadurecer e se reproduzir. Existe uma hierarquia
entre essas três operações. Não é que ele é simplesmente capaz de três coisas, mas ele é capaz de uma
coisa para uma segunda, e esta para uma terceira; e esta terceira é gerar um outro da mesma espécie, algo
que é ainda mais estranho a um mineral do que se alimentar. Está claro que nas operações do vegetal,
desde a primeira operação, existe um propósito que é distinto da própria operação? Ele se alimenta não
apenas pelo fato de se alimentar, mas para crescer. E ele cresce para se reproduzir. Existe uma hierarquia
clara aí. E essa hierarquia, num certo sentido, corresponde àquelas três cores do lado esquerdo.

No homem, então, temos três estágios semelhantes ao do vegetal. E por que iremos dizer que eles são
semelhantes ao do vegetal? Pois em todas as operações, observamos que o vegetal é passivo em relação
ao ambiente em torno. Se o vegetal é colocado em um ambiente sem nutrientes que não favorecesse o seu
crescimento, ele não pode fazer nada. Quando ele é colocado num lugar onde tem alimento, ótimo, ele irá
crescer. Se tirarmos ele dali, pior para ele, que não poderá mudar em nada isso. No homem, o lado
vegetativo da psicologia humana corresponde a três operações da mente diante das quais somos passivos.
Antes de tudo temos a experiência da realidade e a sua classificação em boa ou má. E aí nós temos no
fundo de nossa psicologia uma dúvida fundamental em relação ao valor da existência. Quando temos uma
experiência ruim, pensamos: “Será que existe o bem mesmo? Será que algum dia irei escapar do
sofrimento?” Essa dúvida fundamental é a primeira circunstância. A segunda circunstância passiva é
quando acontece uma coisa boa e nós temos a ilusão de que tudo foi resolvido. Vocês percebem essa
experiência em vocês mesmos, não percebem? Quando acontece uma coisa ruim, ainda que seja por um
breve instante, fica essa dúvida; e em algumas experiências ruins essa dúvida se estende psicologicamente
durante certo tempo, de maneira que você consegue refletir e pensar sobre o assunto. Mas em toda
experiência ruim a dúvida aparece, nem que seja por um breve instante psicológico. E na experiência
agradável ou boa, há a expectativa contrária de que tudo foi resolvido e está bem. Essas duas reações são
passivas às experiências. A terceira é a conseqüência dessas duas, é a memória que temos de nossas
próprias existências. E essa memória é colorida pelas outras duas circunstâncias, é determinada pela
combinação delas. Se estamos numa experiência ruim nesse momento: “Ah, caiu uma pedra no meu
dedão. Que horrível!” Aí começamos a lembrar de outras experiências ruins em nossas vidas e pensamos:
“Pô, a minha vida é uma droga!” Ou somos levados pela memória a lembrar das experiências boas: “Ah,
mas nem tudo é ruim...” Então aqui nós temos o grande segredo alquímico-astrológico: essas instâncias
passivas da nossa psicologia tem um símbolo astrológico. Quando temos uma experiência ruim e ficamos
em dúvida sobre se a realidade é boa ou não, se existe o bem ou não, essa experiência normalmente está
colorida pela posição onde temos Saturno. Então, naquele círculo das cores, embaixo vocês coloquem
“temperamento”. Em cima, “inteligência”. Do lado esquerdo, na base, no roxo, coloquem “Saturno”. No
meio, na direção do azul, coloquem “Júpiter”, que está associado à essa ilusão ou engano de que tudo
ficará bem quando temos uma experiência boa. E em cima do verde coloquem a Lua, que representa a
reação à memória, não à circunstância presente. A memória é evocada pela circunstância presente, mas é
outra coisa.

Todos aí conhecem os símbolos dos planetas? Reparem que o símbolo de Saturno é composto de dois
elementos: em cima há uma cruz, e embaixo há um semicírculo.

Essa cruz representa o fato bruto da experiência, e o semicírculo – que é como um vaso – é o símbolo por
excelência da disposição receptiva, da capacidade de receber. Então, Saturno representa a instância da sua
psicologia em que a disposição receptiva para a realidade se encontra aprisionada pelo fato bruto da
experiência. A cruz representa esse fato bruto, porque, no nosso mundo, esse fato bruto é, em última
análise, qualificado pelos quatro elementos. O fato bruto da experiência, a experiência básica do homem é
a experiência sensível, a experiência do mundo corpóreo. E é, portanto, a experiência dos quatro
elementos.

Vamos ao próximo planeta. Todos reconhecem este daqui? É Júpiter.

Como vocês podem notar, o símbolo de Júpiter é composto dos mesmos elementos de Saturno: a cruz e o
semicírculo. Só que, agora, o semicírculo está do lado da cruz, começando no mesmo plano que ela, e
subindo um pouquinho. Então, Júpiter representa aquelas instâncias da sua experiência, ou da sua vida, ou
da sua psicologia interna, em que o fato da experiência indica uma possibilidade de receber algo, ou a
possibilidade de crescimento. Saturno é, por definição, o planeta da contração; Júpiter é o planeta da
expansão.
E, por último, a Lua.

Ela é composta pelo semicírculo dobrado. Então, ela representa aquelas circunstâncias da experiência em
que a capacidade de recepção depende apenas da sua disposição interna. Quer dizer, às vezes, a sua
impressão acerca da realidade como um todo é determinada por isso: “Será que existe alguma coisa boa?
Porque o bem está todo enterrado no fato bruto.” Depois, Júpiter: “Nossa, eu acho que agora vai dar
certo! Nessa cruz aqui tem uma abertura!” E, terceiro, a Lua: “Se o mundo é bom ou mau, depende
apenas da memória que você tem de sua vida.”

[Queda na transmissão].

Tales: Pode continuar da Lua.

Gugu: Bom, a Lua é o semicírculo dobrado sem nenhuma cruz. Isso quer dizer que, aqui, o juízo que
fazemos da realidade como um todo depende apenas de conteúdos internos da nossa mente, depende
apenas da memória que temos do passado; ou então depende do sentimento presente que temos, e não da
relação com a realidade externa, com a cruz dos fenômenos.

Se pegarmos esses três planetas, veremos então que o semicírculo foi subindo de baixo da cruz, para o
meio da cruz, e, por fim, se soltando da cruz. Soltando-se da cruz ele se acrescenta outro elemento, que é
outro semicírculo. Num certo sentido, a cruz foi transformada em outro semicírculo. Essa subida tem dois
significados: um para o homem comum, quer dizer, o homem que ainda não sabe se a realidade é boa ou
má; e outro para o homem santificado, o homem santo, o homem iluminado. Para o homem comum, essa
subida do semicírculo é simplesmente um aumento no desvio subjetivo da sua percepção da realidade. O
primeiro [desvio] é uma dúvida, da dúvida subimos para o engano, e do engano subimos para o
solipsismo. Agora estamos fechados em nossa própria psicologia, temos o nosso universozinho inventado
por nós mesmos. E não tem jeito dos fatos entrarem nela e nos libertarem. O único jeito de nos
libertarmos desse solipsismo é quando acontece uma experiência negativa e nos põe em contato com a
realidade novamente. É o famoso “tapa na cara da realidade”. E por que isso é diferente em um santo?
Porque, em cada um desses estágios, ele discerniu o conteúdo intelectivo, o conteúdo universal baseado
na experiência de Ser, do conteúdo particular baseado nas formas de cada uma das experiências. Vejam
bem que o solipsismo em que chegamos no final tem como base o fato de termos pensado, na primeira
experiência lá embaixo: “Ih, o Ser é bom ou mau.” [O solipsismo tem como base] o fato de termos
acreditado nessa estória. Não sei se vocês já repararam, se já deram uma lida no gênesis, mas lá diz que
“os problemas do homem começaram quando ele comeu o fruto da árvore do conhecimento do bem e do
mal”. Ora, que interessante! “Comeu o fruto.” Por que eles não usaram uma outra analogia? “Ele leu o
livro do conhecimento do bem e o mal.” “Ele viu o filme do conhecimento do bem e do mal.” “Ele entrou
na turma do conhecimento do bem e do mal.” Fala-se em “comer o fruto”, pois isso deriva das nossas
primeiras experiências gustativas. São nelas que primeiro experimentamos e discernimos bem e mal. É
por isso que colocamos tudo na boca. É para saber: “Que fruto é esse? Opa, esse é bom. Já esse aqui é
mau.” E essas experiências encobriram, fecharam, enterraram a nossa disposição receptiva para entender
o que é a realidade.

Comer, nutrir-se, é a primeira operação do vegetal. Psicologicamente, comer consiste no seguinte. Temos
uma primeira experiência ruim... Já repararam que existem dois tipos de experiência ruim em geral? Na
verdade não são dois tipos, são só dois extremos diferentes de uma mesma escala, não são tipos reais. De
vez em quando acontece algo ruim, cai uma pedra no meu dedão, por exemplo, e penso: “Ah, que droga!”
E chuto a pedra, esqueço o que aconteceu e sigo com a minha vida. Outras vezes acontece uma
experiência ruim e eu penso: “É sempre assim, nunca nada dá certo...” Quer dizer, algumas experiências
são ruins, mas são ruins apenas na hora em que acontecem; outras experiências evocam, no fundo da
mente, essa dúvida fundamental. “Não sei se a realidade é boa ou má, e, porque eu não sei, minha vida
será sempre ruim.” Mais adiante estudaremos o simbolismo dos signos, mas para aqueles que já
conhecem algo de astrologia, reparem que o signo e a casa em que ele tem Saturno – principalmente o
signo –, as experiências que são simbolicamente afins com o signo que o sujeito tem em Saturno, são as
experiências em que ocorrem, com mais freqüência, essa experiência: “Na minha vida tudo sempre dá
errado, nunca nada dá certo...” Reparem nessas quatro palavras que elas são muito importantes: tudo,
sempre, nunca e nada. Essas são palavras de Saturno. É óbvio e evidente que não podemos derivar da
experiência de uma coisa um juízo universal sobre a realidade, mas na hora temos essa impressão. Agora
vem a nota psicológica difícil de perceber. Embora eu esteja explicando isso e cada um de vocês se
lembrem dessas experiências – “nunca nada dá certo, sempre tudo dá errado” -, para fazermos esse
exercício que falarei agora a memória não será suficiente, pois ela [a memória] é uma faculdade diferente
da experiência, [a memória] é uma instância da sua psicologia distinta da experiência. A memória é
regida pela Lua, e não por Saturno. Então, quando temos essa experiência – “nunca nada dá certo, sempre
tudo dá errado” -, essa inclinação a formular desta maneira a realidade, surge do fato de olharmos a
experiência e sabermos que de fato ela é ruim. Se observe e se pergunte: de onde vem este conhecimento?
Pois há coisas que sabemos que são ruins por meio do estudo, de algum exercício, etc. Por exemplo, eu
sei que a minha conexão aqui é ruim, e que o Skype é uma droga; e eu sei disso pela experiência que nós
temos agora mesmo. Pois bem, quando temos a experiência do “tudo, sempre, nada, nunca”, olhemos para
nós mesmos e nos perguntemos: “Como sei que essa experiência é ruim?” Não se pergunte sobre “tudo”
ou “nada”. Sobre “tudo” ou “nada” não sabemos porcaria nenhuma! Mas que essa experiência particular
[ou seja, quando temos a experiência do “tudo, sempre, nada, nunca”] é ruim, e que ela é quase um
paradigma do ruim para nós, isso sabemos. De onde vem esse conhecimento, essa certeza? Vejam bem
que não quero colocar em dúvida a possibilidade de sabermos o que é bom ou o que é mau, e nem afirmar
que apenas Deus pode saber isso e que, portanto, temos que nos conformar. O meu propósito não é esse.
Pois, de fato, nessa hora você sabe que a experiência é ruim. Eu quero que você se pergunte: “Como é que
eu sei disso? De onde vem esse conhecimento?”

Isso é extremamente importante, porque este conhecimento não vem do objeto da experiência, mas do
sujeito que experimenta. Esse conhecimento é uma certeza que vem de dentro. Se você for rápido o
bastante na hora em que você está nessa pior, e pensar de onde vem a certeza de que essa coisa é ruim,
prestar atenção em si próprio, terá a sensação clara de que esta certeza vem do seu peito, e não da sua
cabeça. A cabeça é a sede da experiência diferenciada, da experiência sensorial; mas o peito é a sede da
certeza. Se prestarmos bastante atenção, sentiremos como se houvesse um grãozinho luminoso em nossos
peitos. Esse grãozinho luminoso é o grão de mostarda de que fala o Cristo no Evangelho. É a semente do
reino dos céus. E é interessante que foi usado um símbolo vegetal para falar da queda do homem, e
também foi usado um símbolo vegetal para falar do seu resgate, da sua subida, do seu retorno.
Conseguem perceber essa ligação? Pois bem, a verdade é que, quando o Evangelho diz que [essa certeza]
é bem pequeninha, como um grão de mostarda, minúscula, não é apenas uma alegoria. Ele está dizendo
realmente que essa coisa bem pequena simboliza, de fato, um dado da experiência humana quando
prestamos bastante atenção. Que há uma semente de certeza no peito do homem é algo que qualquer um
pode perceber se fizer esforço suficiente e, evidentemente, se tiver o apoio da graça divina. E isso
supondo que ele seja uma pessoa normal que reza, jejua e dá esmolas quando lhe pedem. Ocasionalmente
isso pode acontecer até com um sujeito que não fez nenhum esforço, simplesmente porque nele não existe
nenhuma tendência perversa muito forte, ou até porque naquele momento não havia nenhuma tendência
perversa muito forte. Pode acontecer simplesmente porque, ao invés de se afundar na idéia de que a vida
dele sempre dá errado, na hora da experiência ruim, por qualquer motivo que seja, ele coloca em dúvida
essa certeza de que a realidade ou é ruim, ou é boa e portanto há uma saída para ela; ele muda o tom da
sua atenção psicológica, e daí para curar da [inaudível] certeza que tem nele mesmo. Porém, isso é mais
possível de acontecer numa pessoa que já pratica um monte de atos baseados na crença de que, no fundo,
a realidade é Deus, portanto é boa. Essa pessoa, normalmente, tem mais disposição para enfrentar o
obstáculo daquela experiência em que tudo parece ruim.

Isso já indica também que uma prática religiosa, ou uma fé, tem um valor duplo. Por um lado, diante da
circunstância mais difícil, quando se pensa que “na vida sempre tudo dá errado”, essa experiência tem,
para esse sujeito, duas saídas: uma para dentro e outra para cima. A saída para dentro é aquela que em
princípio existe para todos, e é a melhor saída, mas nem sempre o sujeito tem a capacidade de tirar
proveito dela. Quanto à saída para cima, o sujeito pode pensar: “É, na minha vida nunca nada dá certo,
mas uma hora ela acaba e aí eu vou para o céu...” Então, a prática religiosa favorece, por um lado, para o
sujeito agüentar a experiência ruim; por outro lado, para ele encará-la cognitivamente, porque ele já
poderá ter a expectativa de haver uma resposta positiva no final.
Tales: Você pode repetir o trecho sobre a prática religiosa?

Gugu: A prática é importante porque ela fica no fundo da memória. A fé é transcendente demais, ela fica
apenas no miolo intelectivo. A prática fica no fundo da memória. Se você fez, irá lembrar alguma hora.
Se não lembrar agora, não importa, estará lá. Todos temos experiências em que, diante das coisas, pensam
que tudo é ruim, que a vida é uma droga, que nada dá certo e que tudo sempre dá errado. Diante delas,
uma pessoa que tenha fé, que tenha a prática da religião, pode pensar que a vida é mesmo ruim, mas
quando ela morrer o ruim acabará. Então, essa é uma saída para cima. Mas essa saída para cima só se
efetiva com a morte. Porém, existe ainda uma saída para dentro. “Como eu sei que essa coisa é ruim?”
Psicologicamente, quando o ser humano tem uma experiência ruim, ele não quer olhar o núcleo interno
dessa experiência. Isso porque ele teme achar o inferno ali. Ele teme encontrar a confirmação de que tudo
é ruim mesmo. Então, por isso temos medo. A prática religiosa favorece o sujeito a encarar o núcleo da
experiência ruim, porque o sujeito acredita que o fundo da realidade não pode ser má, pois o fundo da
realidade é o Criador, ou a mente Búdica, aquilo que é infinito, bom, etc.

No entanto, se a prática religiosa arma o sujeito para procurar essa saída para dentro, ela não inclina o
sujeito necessariamente a fazer essa saída. Se ela inclinasse, seria uma questão de tempo de prática
religiosa para que todos atingissem a santidade. O sujeito pode passar a vida toda praticando a religião e
não ficar santo, mas pelo menos quando ele morrer irá realmente para o céu, a saída para cima estará
realmente aberta para ele. Isso porque, quando o sujeito morreu, aquela cruz que cobria o círculo foi
desfeita para ele. Aquela cruz é o fato bruto da experiência do mundo corpóreo, e com a morte ela não
existe mais. Com a morte, a saída para cima e a saída para dentro passam a coincidir. No sujeito que
nunca teve nenhuma prática religiosa, o provável é que, quando ele morrer, simplesmente irá se confirmar
a inclinação e a disposição que ele tinha durante a vida. Como a inclinação fundamental durante a vida
era o medo de encarar esse núcleo problemático da experiência, quando ele morre, e a saída para cima é a
mesma que a saída para dentro, o medo move ele para longe do centro. E é justamente esse que é o
processo da condenação. Vejam bem que isso é uma questão de inclinação. Excepcionalmente pode
acontecer de um sujeito realizar as práticas religiosas sem colocar o interior dele de maneira nenhuma
durante a vida nessas práticas, e aí esse sujeito irá para o inferno também. E pode haver um sujeito que
não praticou nenhuma religião formal, mas a vida dele foi uma prática que, estruturalmente, seria aquilo
que a religião o mandaria praticar; e para ele a saída para cima também estará aberta. Porém, esses dois
casos são excepcionais, não são comuns.

Eu falo nessas coisas porque, no tempo em que se ensinava esse negócio de astrologia, de como nós
realmente funcionamos, de como funciona nossa alma e a nossa mente... Veja que a maior parte das
pessoas não consegue mapear isso, são vítimas passivas de suas psicologias e têm pouquíssima liberdade
interior. Quando se ensina alquimia e astrologia para alguém, é dado a ele armas de mapeamento do seu
interior. Então, quando se ensinava essas coisas, todo mundo praticava a religião. Todo mundo. Então, o
sujeito mapeava a mente dele e pensava: “Opa! Descobri que na minha mente há, de um lado, uma porta
para o céu; do outro, uma porta para o inferno. Há essas duas portas dentro de mim. Sei também mais ou
menos em que direção essas portas estão.” Como o sujeito vivia desde a infância uma vida de prática
religiosa, a inclinação dele já era em direção à porta do céu, e não da porta do inferno. Aí ele acabava
entrando nesse caminho, de maneira que o ensino de astrologia e alquimia era, em geral, favorável para as
pessoas que estudavam essas ciências. Mas uma hora isso começou a não valer mais. E o que o pessoal
que sabia essas ciências começou a fazer? Eles começaram a ensinar astrologia e não ensinar alquimia.
“Não, astrologia é só a parte teórica, é só para o sujeito fazer a colheita, é para escolher um bom
casamento para o rei...” A partir daí não conseguiram mais entender que a astrologia é uma ferramenta
para mapear a mente, e é só com a chave alquímica que o sujeito entende isso. Separou-se o ensino das
duas coisas, e começou-se a escrever manuais de astrologia cada vez mais explícitos e detalhados em
matéria preditiva; por outro lado, manuais de alquimia cada vez mais obscuros quando se tratava dos
simbolismos.

Nesse curso, pela primeira vez, estamos dando a chave completa: teoria cosmológica, astrologia e
alquimia. É por isso que, de tempos em tempos, saímos das explicações dos simbolismos e passamos a
enfatizar a prática religiosa. Eu digo isso para o próprio bem de vocês, pois, aqueles entre vocês que
aprenderem a mapear a psicologia humana do jeito que estamos ensinando, saberão como as pessoas em
torno funcionam melhor do que elas mesmas. E usar isso para lidar com as pessoas é muito perigoso, é
como um caminho em direção à porta do Inferno. Usar isso para retificar o rumo geral da sua psicologia e
da sua vida colocará vocês na direção da porta do Céu. Mas usar essas ferramentas para levar vantagem
sobre as outras pessoas os colocará na direção da porta do Inferno. E vos colocará na direção da porta do
Inferno mesmo que, supostamente, vocês queiram usar esses instrumentos para retificar a vida da pessoa
sem a autorização dela. Quem disse que vocês têm esse direito? Não podemos lidar com as camadas mais
profundas da psicologia do outro sem informá-lo, mesmo com a melhor das intenções. Só Deus pode
fazer isso. Existe um jeito de fazer isso, de tentar retificar a vida do sujeito sem que ele saiba? Preguem e
ensinem a religião. Ela trata das questões mais profundas da existência humana e atuará na raiz e no
centro do sujeito sem que ele perceba, porém é Deus que está agindo nele. O homem é apenas um veículo
de transmissão. Deus pode fazer isso porque, se o homem é consciência, em relação à Deus, ele [o
homem] é mineral, é não-consciência - nesse caso Deus é consciência no sentido supremo. Então Ele
cuida dos homens como se estes fossem criancinhas, pois em relação a ele, se chegarmos no grau de
criancinhas, isso já é um grau elevado.

É importante fazer esse aviso, pois é um vício de alguns astrólogos bancarem o papaizinho das pessoas
mesmo sem elas terem consciência. E, pior ainda, a maior parte deles [dos astrólogos] não conhecem
essas chaves alquímicas que estamos mencionando aqui. Os melhores astrólogos, hoje, não entendem
bulhufas de alquimia. A astrologia é a chave teorética: “Olha, na sua alma, na sua mente, na sua vida tem
Saturno, tem Júpiter, tem Lua, tem Sol...” Só que, organicamente, como essas coisas funcionam na
psicologia? Como esse círculo gira e como fazemos para sairmos de um círculo vicioso e passarmos para
um círculo virtuoso? Quer dizer, como saímos desse círculo que vai da dúvida para o engano, depois para
o solipsismo e para o outro lado que não mencionamos ainda? Como saímos desse círculo negativo e
passamos da certeza para a abertura espiritual e para a liberdade interior em relação aos acontecimentos e
etc.? Somente a alquimia ensina isso. A astrologia só diz: “Sabe onde você tem Saturno? É onde colocam
o dedo na ferida, é onde dói. Sabe onde tem Júpiter? É onde é legal! Sabe onde tem a Lua? É onde...
depende! Um dia é de um jeito e no outro é de outro.” Um astrólogo de hoje pode dar dicas práticas para,
num certo sentido, aliviar essas experiências e tentar localizar ela – e aí suas vidas ficarão um pouquinho
melhor. Já o pessoal que estudava alquimia sabia dessas coisas. Todos os alquimistas eram igualmente
homens perfeitos. Eles não eram santos no sentido comum da palavra. A palavra “santo” denota não
apenas um homem perfeito, mas um homem perfeito com certas qualidades características; qualidades
essas ligadas ao exemplo moral dos grandes santos e do fundador da religião. Não se trata, então, de uma
perfeição humana geral, mas uma perfeição humana à qual se acrescenta uma tipologia. Tanto é assim
que o santo hindu é diferente do santo cristão, o santo cristão é diferente do santo muçulmano, e o santo
muçulmano é diferente do santo budista. Cada um tem qualidades características que acompanham o
estado de perfeição. Em comum eles têm a perfeição humana. Um homem pode ser perfeito sem as
virtudes religiosas.

Hoje em dia isso não está no imaginário das pessoas no ocidente, pois vivemos numa sociedade pagã.
Então pensamos que somente são perfeitos como seres humanos os santos como São Francisco, São
Domingos, Santo Inácio e etc; as pessoas que só jejuavam, rezavam e faziam caridade. Porém, quando
existia a cristandade não era assim. Todos sabiam que existiam muitas pessoas perfeitas, mas que do
ponto de vista da ação eram simplesmente pessoas boas. A alma de um sujeito desses era idêntica à de um
santo, mas na ação ele era somente uma pessoa muito boa. Nos ambientes em que ainda existe a tradição
isso é muito claro. Por exemplo, aqui no Marrocos isso é muito evidente. Todo mundo sabe que o sujeito
não precisa voar para ser santo; ele não precisa brilhar, não precisa abrir o Mar Vermelho para que saibam
que ele é santo. Está cheio de gente por aqui que, durante a convivência do dia-a-dia, passa uma
serenidade, uma luz, uma bondade que é subjacente ao comportamento. É possível sentir a presença
espiritual da pessoa mesmo que ela esteja realizando uma atividade perfeitamente comum. Num ambiente
normal, essa é uma experiência comum. Está cheio de pessoas perfeitas cujas circunstâncias não pediram
virtudes heróicas.

Pois bem, a alquimia era um mapa da mente humana para o sujeito ter uma técnica para se aproximar
desse tipo de perfeição. A alquimia não era senão isso, e um dos seus sinais era o milagre da
transformação física do fungo em ouro (nota do transcritor: não sei se o termo foi exatamente “fungo” ou
“fundo”, o áudio está ruim). Uma operação realmente milagrosa e que não pode ser realizada pela mera
repetição de certas etapas. Uma transformação alquímica não é uma operação química (quer dizer, a
combinação de certo minerais numa certa ordem, numa certa proporção, numa certa circunstância); ela é
realmente uma transformação milagrosa, como a transubstanciação ou um milagre de algum santo. E os
alquimistas sabiam disso: “Olha, existem inúmeras maneiras de você produzir isso aqui. Nós te damos as
linhas gerais, mas cada um acaba fazendo de um jeito, pois isso é um milagre, e todo milagre é único.”
Então, isso aqui é um mapa para o sujeito buscar a perfeição, só que esse mapa também indica qual a
direção contrária – o caminho da imperfeição. E não é nada impossível um sujeito simplesmente seguir o
caminho contrário. Por isso que essas eram ciências ocultas. “Não, você não pode ensinar isso para que
esse conhecimento não caia em mãos erradas.” Tudo isso tem sentido. E por isso resolvi dar esse curso
dessa vez e ver o que acontece daqui a alguns anos. Depois teremos que ver quantos dos alunos teremos
que matar depois...

Alunos: Risos.

Gugu: Brincadeira, as coisas não vão tão longe assim. E a gente ensina isso porque hoje em dia há um
esquecimento total delas. E essas são coisas que realmente não devem ser perdidas.

Então, voltando. Se nos três planetas do lado lunar o semicírculo foi subindo, no lado contrário teremos
um processo semelhante. O lado contrário começa com Vênus, lá na altura do amarelo.

O símbolo de Vênus, se vocês observarem, é composto de dois elementos: a cruz e o círculo inteiro. Se o
semicírculo representa uma receptividade, uma disposição receptiva, o círculo inteiro representa um
continente, algo que já é possuído. O círculo determina um espaço fechado, então isso é o que nós já
temos. Ele representa, então, algum tipo de perfeição, de completude; representa algo perfeito que nós já
temos. No caso do símbolo de Vênus, esse algo perfeito está apoiado na cruz dos elementos. Então,
Vênus representa o quê? Representa perfeições conhecidas no mundo sensorial, aquilo que percebemos
no mundo sensível e pensamos: “Nossa, como isso é belo!” “Nossa, como isso é bom!” “Nossa, como
isso é delicado!” “Nossa, como isso é grandioso!” “Nossa, como isso é nobre!” São as imagens de
perfeição que nós temos na nossa experiência. Mas vocês podem perguntar: “O círculo não seria uma
espécie de representação do solipsismo também? Uma coisa fechada em si mesmo?” Em geral, o círculo
pode simbolizar um solipsismo, mas não no simbolismo astrológico. Veja bem, a realidade, para o
homem, é composta de três coisas: aquilo que não temos, mas que podemos receber; aquilo que não
temos e que não podemos receber; e aquilo que já temos. O que podemos receber já está lá representado
nos semicírculos. O que não temos, aquilo de que estamos separados, é o mundo! Temos dentro de nós o
nosso “eu”, nossa psicologia; e o mundo está fora disso. E esse [o círculo] é o terceiro elemento da nossa
experiência, ou seja, aquilo que já temos. Percebam que usei todos esses termos como “temos”, pois
tenho Saturno em Touro, e este é o signo da posse. “O que eu não tenho e não posso ter; o que eu não
tenho, mas posso ter; e o que eu tenho.” Mas também poderia dizer: “O que eu não sou e nem posso ser; o
que eu não sou, mas posso ser; e o que eu sou.” Ou então: “O que eu não sei e nem posso saber; o que eu
não sei, mas posso saber; e o que eu sei.” Reparem que a experiência toda sempre é dividida nesse
ternário. E, olha só, o que temos é o fato completo. O que não temos, dividimos em duas categorias:
aquilo que podemos vir a ter, e aquilo que nunca teremos. O que já está realizado, o que é pleno, é
representado pelo círculo. No caso de Vênus, é o círculo apoiado na cruz. Ele [o círculo] representa
aquilo que há de bom e agradável no mundo. É por isso que, na astrologia, Vênus é um planeta benéfico;
e Júpiter também. Eles simplesmente representam as situações de nossas vidas que são agradáveis e boas;
usando “boas” no sentido comum da palavra: “Ai, como essa comida é boa!” “Ai, como essa mulher é
boa!” Não uso essa palavra [boa] no sentido metafísico, nem no sentido moral. É no sentido concreto.

Depois de Vênus vem Marte, que também é composto dos mesmos elementos.

ou

Após começarem a ensinar astrologia sem o ensino conjunto de alquimia, o pessoal mudou o símbolo de
Marte. Quem conhece astrologia, sabe que o símbolo de Marte, hoje em dia, não tem uma cruz; ele é torto
e possui um tipo de flecha, que é o símbolo mais idiota que eu já vi. É um símbolo que não simboliza
nada. O que significa essa flecha torta aí? É um símbolo de uma marca de cueca; uma coisa meio fálica. E
é uma coisa de imbecil, porque é verdade que Vênus representa a mulher e tudo o que é feminino; mas
não é verdade que, em astrologia, Marte representa o homem e tudo o que é masculino. Isso é totalmente
mentira. Na astrologia, quem representa o homem e o que há de masculino é o Sol. Marte representa o
círculo da perfeição embaixo da cruz dos fenômenos; mas, ao contrário de Saturno, ele não representa
uma perfeição aprisionada pelos fenômenos, pois não é um ponto de partida de uma escala, é o ponto
intermediário dela. Marte, então, não representa uma prisão. Ele representa uma descida voluntária, ou
deliberada, da perfeição no miolo dos fenômenos. Representa um esforço de realização. Talvez vocês já
tenham ouvido isso em outras aulas: os santos padres diziam que “não é difícil ver o incorpóreo, difícil é
encerrar o incorpóreo no corpóreo, e este é o nosso propósito”. Não é difícil ver, entender e conceber o
que é bom e perfeito, difícil é trazer isso para dentro do nosso corpo e da nossa experiência o tempo todo.
Marte é um planeta maléfico como Saturno (que é o planeta do obstáculo), porque ele é o planeta do
esforço. Esforço esse para trazer a perfeição para o plano da nossa existência.

Aluno: Só lembrando que nos quadros que retratavam os reis, eles apareciam segurando o globo com uma
cruz em cima.

Gugu: Exatamente! Eles seguram o globo com a cruz em cima. E isso representa justamente o que eu
acabei de dizer. O rei é a ponta de lança do esforço de aperfeiçoamento da nação; o esforço para trazer a
justiça para o reino. “Ah, esse negócio de justiça que os padres ensinam é muito bonito! Mas quem é que
vai fazer isso aí?” “Ah, o povo precisa de prosperidade, de alimento e de segurança! Mas quem é que vai
fazer isso aí?” É o rei.

De Marte pulamos para o símbolo do Sol.

Aqui o círculo está liberto da cruz e há um novo ingrediente: um ponto central. É a mesma coisa que a
Lua: ela é o semicírculo separado da cruz, ao qual se acrescentou um novo semicírculo. O Sol é o círculo
separado da cruz, ao qual se acrescenta um ponto central. Ele representa o estado de posse consciente
daquele centro, daquela semente que aparecia no primeiro estágio. Lembram do que dissemos antes? Se o
sujeito analisa a experiência negativa dele da maneira correta no momento em que ela acontece, ele acaba
percebendo que existe uma semente de certeza, infinitude e paz nele mesmo. O Sol, portanto, representa a
posse perfeita desse centro.

Chegamos então ao último dos sete planetas: o bom e velho mercúrio.

Ele é o único planeta a ter no seu símbolo os três elementos: o semicírculo, o círculo e a cruz. Mercúrio é
uma síntese da psicologia total do homem. Ele é, num certo sentido, o símbolo do próprio homem. O
semicírculo é a receptividade voltada para cima, para um elemento transcendente; o círculo, no centro, é a
perfeição; e a cruz, embaixo. Então, a receptividade se tornou inteligência pura e se volta somente para o
Céu; a perfeição está no meio, e serve de ligação entre o Céu e a Terra; e esta [a Terra] está embaixo.
Mercúrio representa o instrumento, o meio com o qual lidamos com cada uma das instâncias de nossa
alma. Digamos que nossa vida possui seis capítulos: Saturno, Júpiter, Lua, Vênus, Marte e Sol. Mercúrio
é o meio que usamos para entender o significado de cada um desses capítulos, e também o meio que
usamos para colocá-los cada um em seu devido lugar. Ele é o símbolo do próprio homem.
Recapitulando. Do lado esquerdo temos esses três estágios. 1) Saturno, que representa a experiência que
nos indica que a realidade deve ser negativa; representa a experiência que gera a impressão de que a
realidade, o Ser, a existência é má. 2) Júpiter, que representa a experiência que indica que a realidade, o
Ser, a existência é boa. 3) A Lua, que indica um solipsismo. “Pode ser que a realidade é boa, pode ser que
seja má.” Na outra coluna não se trata apenas de uma percepção da realidade, mas sim de uma atividade
em relação a ela. 4) Então Vênus indica: “Ah, a realidade é boa? Oba, eu quero!” 5) Marte indica: “Ah, a
realidade é má? Então vou encher de porrada!” 6) O Sol é: “Ah, posso fazer o que quiser!” Se a Lua de
certo modo é uma indicação de dúvida quanto a realidade ser boa ou má, o Sol é onde o sujeito tem a
certeza que pode ser bom ou mau. Vênus indica que algo neste mundo é bom. “Café é bom. Cigarro é
bom, não importa o que digam os anti-tabagistas. Então eu quero e vou correr atrás.” Marte indica: “Isso é
mau, então vou tentar bater ou fugir.” Percebam que Vênus nos inclina para um tipo de ação, Marte à
outra. O Sol indica que podemos fazer tanto uma coisa quanto a outra, ele é simplesmente uma
capacidade de ação. No homem comum, no homem não santo, ele é a pura e simples liberdade de escolha
em cada ato: “Agora posso fazer ou não fazer isto.” No santo, ele não é apenas a liberdade de escolha
entendida como essa possibilidade arbitrária, e sim a percepção das possibilidades de ação a partir do
centro do estado humano (inaudível) e o conhecimento real do que realmente se quer fazer e do que
realmente é bom para o indivíduo. O santo é o sujeito que, quando olha para si mesmo, escolhe fazer
aquilo que no fundo é melhor de qualquer maneira. E toda vez que ele procura ele acha esse fundo. Em
nós não é assim. A experiência do homem comum com o Sol é a de liberdade de ação, mas essa liberdade,
em última análise, acaba tendo como critério de decisão Vênus e Marte. O que é gostoso, o sujeito vai e
pega; o que é ruim, ele ou bate ou foge.

Essa é a chave dos significados astrológicos dos planetas. Saturno significa aquilo que é difícil, aquilo
onde encontramos um obstáculo insuperável. Júpiter, ao contrário, é onde encontramos uma oportunidade
muito maior do que aquilo que podíamos esperar. A Lua é onde às vezes achamos que tudo é bom, às
vezes achamos que tudo é mau. Vênus é onde algo é bom, e, portanto, gera uma inclinação a buscar esse
algo. Marte é onde algo bem definido é mau, gerando a inclinação de combate ou de fuga do indivíduo. E
o Sol é onde podemos ou não agir, onde temos liberdade total de escolha – às vezes fazemos de um jeito,
às vezes de outro. A diferença entre a primeira e a segunda colunas é que, na primeira, os três estados são
disposições passivas: ou sentimos que nada presta, ou que tudo presta, ou que mais ou menos. Na coluna
da direita, não: “Isto aqui é bom” Não é: “Tudo é bom.” – Como em Júpiter. Júpiter também é símbolo da
preguiça. Por quê? “Ah, se tudo é bom, não precisa fazer nada...” Tanto Júpiter quanto Saturno encolhem
a ação do sujeito. Um porque “não dá para fazer nada mesmo” (Saturno); outro porque “não precisa fazer
nada” (Júpiter). A Lua encolhe a ação porque o sujeito fica fechado na sua psicologia. Já os três planetas
da coluna da direita são o contrário: os três são capacidade de ação, de atividade; os três representam
disposições ativas. E, por último, Mercúrio. Por que ele é diferente aqui? Como falamos, ele é como uma
imagem do próprio homem. Vejam bem, no temperamento lidamos com a base mais baixa da nossa
psicologia, aquilo que é menos humano em nós, a base da cruz do Mercúrio. O próprio Zodíaco
representa a nossa inteligência, o topo supra-humano da nossa existência, que está logo em cima do
semicírculo de Mercúrio. Essa inteligência – representada pelo Zodíaco - é a mesma para todos nós, então
não existe um cálculo da inteligência no homem como existe um cálculo do temperamento. Os
temperamentos são individuais, mas a inteligência pura é a mesma para todos. Aquilo que sabemos,
aquilo que temos inclinação ou hábito para entender com facilidade ou dificuldade varia de uma pessoa
para outra, mas a própria inteligência é igual para todos, e por isso ela é representada pelo Zodíaco
comum. Mas, se não existe um cálculo da inteligência, existe um cálculo da mentalidade, ou seja, da
nossa identidade humana. Bem, o cálculo do temperamento é baseado no ascendente. Já o cálculo da
mentalidade é baseado na posição de Mercúrio. As regras para o cálculo da mentalidade são:

1) Qual é o planeta que tem mais dignidades essenciais no ponto do Zodíaco em que Mercúrio se encontra
no mapa natal?

2) Os planetas que formam aspecto com Mercúrio; sendo que o Sol só esquenta (ou aumenta a disposição
ativa), e a Lua esfria (aumenta a disposição passiva). Sol e Lua não são significadores de mentalidade.
Isso quer dizer que, se o Sol ou a Lua forem os planetas com mais dignidades essenciais no ponto do
Zodíaco em que Mercúrio está, nenhum deles serão significadores de mentalidade. Nesse caso, o primeiro
significador será o próprio Mercúrio, seguido imediatamente do segundo planeta que tiver mais dignidade
essencial do lugar onde estiver.

3) Os planetas que formam aspecto com o planeta que tem mais dignidade – com exceção de Sol e Lua,
que não contam -, e o grau de dignidade geral que esse planeta tem.
Faremos um cálculo de mentalidade para exemplificar o que foi dito até agora. Para isso, vamos usar o
mapa do aluno x, nascido em 15 de agosto de 1981, em Mogi das Cruzes – SP. Vamos lá. Mercúrio está
em 28º de Leão. Quem teria mais dignidade aí, em princípio, é o Sol, pois ele é o regente. Mas, como
falamos, o Sol não é significador de mentalidade, então partimos para o segundo, que é Júpiter, o regente
da triplicidade. Júpiter então é o significador geral da mentalidade desse sujeito, ou [o significador] do
caráter dele. Em astrologia, caráter não era entendido no sentido moral, era simplesmente entendido no
sentido de uma marca fixa da pessoa. Então, aqui nós temos o significador principal que é Júpiter, um
pouco mais quente por causa do Sol, ou seja, é um Júpiter um pouco mais ativo, um pouco mais
expansivo. Se olharmos a condição de Júpiter no mapa, ele está exaltando e, também, em conjunção
perfeita com Saturno. Qual a mentalidade geral de um sujeito cujo significador principal é Júpiter? Ou:
como um sujeito desse prefere agir conscientemente? Ele prefere ser uma pessoa justa, aberta, imparcial.
Como Júpiter está exaltando e em conjunção exata com Saturno, isso indica que a pessoa é expansiva,
mas admira a seriedade e a sobriedade; a natureza geral de um sujeito assim é expansiva, mas ele acha
que a seriedade é melhor do que a expansividade. Quais as características mais positivas de Júpiter
enquanto significador da mentalidade? Realmente uma tendência à imparcialidade: “Deixa eu ver se meu
adversário não está certo.” Também uma predisposição otimista em relação à vida. Essas são as suas
melhores qualidades. Quais a piores características? “Não, o mundo é bom, as coisas são boas...” “Se o
mundo é bom, por que fazer alguma coisa?” Júpiter, às vezes, tende a um certo farisaísmo de achar que já
está no caminho bom. “Nós já somos o povo eleito, por que precisamos cumprir a lei? Isso é apenas um
detalhe menor.” Quer dizer, é um sujeito que às vezes tende a pensar o seguinte: “Olha, eu já faço tantas
coisas boas, e agora você irá me julgar só por essa coisinha ruim e pequena que eu fiz aqui?” Ou: “Você
não sabe que eu sou um cara legal em geral? Eu também tenho direito de pensar em mim mesmo de vez
em quando.” Júpiter é o planeta significador dos sacerdotes: “Mas eu já dou o sacramento, vocês ainda
querem que eu seja bom?” Porém, de modo geral, é uma mentalidade fácil de se lidar. É uma mentalidade
nobre. Júpiter é também significador da elevação, da pessoa que deseja que a sua passagem pelo mundo
não deixe este pior; para ela, o mundo é uma coisa boa e não merece ser piorado; a vida é uma coisa boa e
não merece ser diminuída.

Vejam que o temperamento é gasolina que a pessoa tem para agir; já a mentalidade é como ela vai usar
conscientemente essa gasolina. Se as duas coisas batem, então um determinado traço será muito marcante
no sujeito. Caso uma pessoa tenha Júpiter como significador da mentalidade (nota: lembrar que no
cálculo do temperamento os planetas têm qualidades dos elementos, e Júpiter é um planeta de ar), e seja
ainda de temperamento sanguíneo (também do elemento ar), ou seja, se a mentalidade dela é Jupiterina e
o temperamento sanguíneo, então esse traço será muito marcante. Podemos dizer que o temperamento é o
combustível que a pessoa usa na vida dela, ou o material de construção; já a mentalidade é o projeto. Se o
projeto e o material combinam é mais fácil, fica mais marcante aquilo no sujeito. Se você quer fazer uma
espada e tem o metal como material, então vai ser fácil; se você quiser fazer um incêndio e o material for
o fogo, sem problemas. Mas se você quiser fazer um incêndio e o material for água, aí será um pouco
mais complicado; se você quiser fazer uma casa, mas o material for o fogo, isso também não é
recomendável.

Na próxima aula lidaremos com o cálculo da mentalidade. Também explicaremos um pouco melhor a
segunda coluna, pois só falamos o básico hoje, que Vênus representa aquilo que é bom e gera uma
disposição de busca, que Marte representa aquilo que é ruim e que gera uma disposição de enfretamento e
luta, e etc. Não explicamos essa coluna tão bem como explicamos a primeira. Faremos isso na próxima,
daremos mais exemplos de cálculo de mentalidade e combinaremos esses cálculos com o cálculo do
temperamento.

Transcrição: Danilo Roberto Fernandes


Revisão: Danilo Roberto Fernandes

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