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DIREITO ADMINISTRATIVO E AMBIENTAL

GRAAL DA PROVA ORAL DO 29º CPR – 10/2018


Organizado por Valdir Monteiro Oliveira Júnior

Sumário
1. O DIREITO ADMINISTRATIVO, A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E O REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO .............. 5
1A. Conceito, objeto e fontes do Direito Administrativo. Direito Administrativo Constitucional. ...................... 5
3A. Funções (atividades) administrativas. Função consultiva. Função de regulação. Função de controle. Função
de fomento ..................................................................................................................................................... 6
20B. A Administração Pública sob os aspectos orgânico, formal e material. Administração Pública e governo. 7
22B. Ética na Administração Pública. Dever de transparência e de informação ................................................ 9
13A. Princípios da Administração Pública. ......................................................................................................12
2. PODERES ADMINISTRATIVOS ..........................................................................................................................14
17B. Poder de polícia administrativa. Poder de polícia e direitos fundamentais. .............................................14
13A. Poder Regulamentar. Espécies de Regulamento. Controle sobre a atividade regulamentar. ...................19
3. ATOS ADMINISTRATIVOS ................................................................................................................................21
17A. Fatos da Administração Pública: atos da Administração Pública e fatos administrativos. Elementos e
atributos do ato administrativo. .....................................................................................................................21
2B. Classificação dos Atos Administrativos. A Responsabilização por Atos Lesivos à Administração Pública
Nacional e Estrangeira de Acordo com a Lei nº 12.846/2013. .........................................................................24
9A. Vinculação e discricionariedade. Atos administrativos vinculados e discricionários. O mérito do ato
administrativo. ...............................................................................................................................................29
21B. Validade, vigê ncia e eficácia do ato administrativo. Autoexecutoriedade do ato administrativo .............32
3B. Vícios ou defeitos dos atos administrativos. A teoria das nulidades no Direito Administrativo. Atos
administrativos nulos, anuláveis e inexistentes...............................................................................................35
5B. Revogação, anulação, cassação e convalidação do ato administrativo. .....................................................36
4B. Teoria dos motivos determinantes. Teoria do desvio de poder. Acordo de leniência da Lei nº 12.846/2013.
......................................................................................................................................................................37
4. ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA ...................................................................................................................38
5C. Desconcentração e Descentralização administrativa. Privatização. ...........................................................38
8A. Administração Pública direta. A estrutura da Administração Pública Federal. ...........................................40
7B. Teoria do órgão. Representação judicial das pessoas de Direito Público. ..................................................42
12B. Hierarquia. Delegação e avocação de competências. Regime diferenciado de contratação (RDC) ...........44
6A. Personalidade de Direito Público. Pessoas administrativas. Autarquia. Sociedade de economia mista.
Empresa pública. Fundação pública. Consórcios públicos. Outros entes..........................................................46
16A. Setor público não-estatal. Organizações sociais. Organizações da sociedade civil de interesse público. ..50
14A. Agências executivas e agências reguladoras. Ordens e conselhos profissionais. Serviços sociais
autônomos. Fundações de apoio. ...................................................................................................................52
5. SERVIÇOS PÚBLICOS .......................................................................................................................................55

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14B. Serviço Público. Conceito. Classificação. Regime Juri ́dico. O Usuário do Serviço Público. Remuneração.
Direitos e Deveres dos Usuários. ....................................................................................................................55
19A. Concessão de serviço público. Natureza jurídica e conceito. Regime financeiro. Extinção da concessão de
serviço público. Reversão dos bens. Permissão e autorização .........................................................................60
6. AGENTES PÚBLICOS ........................................................................................................................................64
18A. Agentes públicos. Natureza da relação de emprego público. Agentes Políticos. Garantias. Estabilidade e
Vitaliciedade. Estágio probatório. Cargo em comissão. Agente de fato. Aposentadoria do servidor Público. ...64
22A. Provimento e vacância dos cargos públicos ............................................................................................68
20A. Direitos, deveres e responsabilidades do servidor público. .....................................................................70
12A. Estatuto do Ministério Público Federal. ..................................................................................................73
19B. Regime jurídico do concurso público e seu controle administrativo e judicial ..........................................75
7. RESPONSABILIDADE DO ESTADO ....................................................................................................................76
15A. Responsabilidade patrimonial do Estado: evolução histórica e fundamentos jurídicos. Teorias da culpa
administrativa, do serviço e do risco. Responsabilidade por ação e por omissão. Dano indenizável. Causas
excludentes. Direito de regresso.....................................................................................................................77
20B. Responsabilidade do Estado por atos legislativos e judiciais....................................................................82
8. BENS PÚBLICOS ..............................................................................................................................................84
21A. Bens públicos. Classificação. Natureza jurídica do domínio público .........................................................84
13B. Utilização dos bens públicos: autorização, permissão e concessão de uso; concessão de direito real de
uso; concessão de uso especial para fins de moradia; aforamento de bens; cessão de uso. ............................87
23A. Domínio público terrestre. Evolução do regime jurídico das terras públicas no Brasil. Faixa de fronteira.
Vias públicas. Domínio público do subsolo. Recursos minerais. Potenciais de energia hidráulica. Domínio
público aéreo .................................................................................................................................................91
9. INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE ................................................................................................93
2C. Limitações administrativas. Ocupação temporária. Requisição. Servidão. Parcelamento, edificação ou
utilização compulsórios ..................................................................................................................................93
7A. Desapropriação. Espécies. Indenização. Direito de extensão. Retrocessão. Desapropriação Indireta.........95
10. LICITAÇÕES PÚBLICAS ...................................................................................................................................98
4C. Licitações. Princípios. Modalidades. Dispensa e inexigibilidade de licitação...............................................98
8B. Licitação: procedimento, fases, revogação e anulação. Controle administrativo e jurisdicional. ..............102
11. CONTRATO ADMINISTRATIVO.....................................................................................................................105
6B. Contratos administrativos.......................................................................................................................106
9B. Execução do contrato administrativo. Alteração unilateral. Teoria do fato do príncipe. Teoria da
imprevisão. Caso Fortuito e força maior. Equilíbrio econômico-financeiro. ...................................................108
10B. Extinção do contrato administrativo. Adimplemento e inadimplemento. ..............................................113
11B. Convênios e consórcios administrativos. Contratos de gestão. Prestação de contas e tomada de contas
especial. .......................................................................................................................................................115
18B. Parcerias público-privadas ....................................................................................................................120
12. PROCESSO ADMINISTRATIVO......................................................................................................................123

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23B. Processo e procedimento administrativo. A instância administrativa. ...................................................123
20A. Regime disciplinar e processo administrativo-disciplinar.......................................................................125
13. CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ..................................................................................................125
11A. Controle Jurisdicional da Administração Pública. Sistemas. A teoria da reserva do possível. .................125
23B. Representação e reclamação administrativas. Pedido de reconsideração e recurso hierárquico próprio e
impróprio. Prescrição administrativa. ...........................................................................................................132
10A. Controle interno e externo da Administração Pública. Ombudsman. Procurador Federal dos Direitos do
Cidadão. .......................................................................................................................................................134
14. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA ................................................................................................................139
1B. Improbidade administrativa: sujeitos e atos. Lei nº 8.429/1992. .............................................................139
16B. Proteção da probidade administrativa. Instrumentos de atuação. As sanções na Lei nº 8.429/1992.
Prescrição.....................................................................................................................................................142
15. RESPONSABILIDADE FISCAL ........................................................................................................................145
15B. Responsabilidade fiscal. ........................................................................................................................145
1.PRINCÍPIOS DE DIREITO AMBIENTAL ..............................................................................................................148
1C. Meio ambiente e direitos fundamentais. Bens ambientais. .....................................................................148
4A. Princípios de Direito Ambiental. .............................................................................................................151
22C. Desenvolvimento sustentável. Aquecimento global. .............................................................................154
2.COMPETÊNCIAS AMBIENTAIS NA CF/88.........................................................................................................155
5A. Competências ambientais na Federação Brasileira. Ações de Cooperação. .............................................155
21C. Poder de polícia ambiental. Competências. ..........................................................................................157
3.TUTELA PREVENTIVA DO MEIO AMBIENTE ....................................................................................................162
8C. Sistema nacional do meio ambiente. Política nacional do meio ambiente. ..............................................162
10C. Espaços Territoriais Especialmente Protegidos e Sistema Nacional de Unidades de Conservação da
Natureza (SNUC) ..........................................................................................................................................163
15C. Licenciamento ambiental. Avaliação de impactos ambientais. Estudos ambientais. Audiências públicas.
....................................................................................................................................................................166
17C. Zoneamento ambiental. Natureza jurídica. Princípios. Características ...................................................168
6C. Instrumentos de incentivo à conservação do meio ambiente. Instrumentos econômicos, instrumentos
governamentais. Serviços ambientais. Servidão ambiental. ..........................................................................169
23C. Instrumentos processuais para a tutela do meio ambiente. ..................................................................171
4.PATRIMÔNIO CULTURAL ...............................................................................................................................176
11C. Proteção jurídica do patrimônio cultural brasileiro. Instrumentos: tombamento, inventários, registros e
outras formas de acautelamento e preservação. ..........................................................................................176
5.MEIO AMBIENTE URBANO.............................................................................................................................178
9C. Ordenamento urbano. Estatuto das Cidades. Cidades sustentáveis. ........................................................178
6.RESPONSABILIDADE AMBIENTAL ...................................................................................................................184
16C. O dano ambiental e sua reparação: responsabilidade civil. ...................................................................184

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7C. Responsabilidade administrativa por danos ambientais. Infrações e sanções administrativas ambientais.
....................................................................................................................................................................187
7.PROTEÇÃO DOS RECURSOS AMBIENTAIS .......................................................................................................189
14C. Política Nacional de Biossegurança: pressupostos doutrinários; regime jurídico; instrumentos.
Biossegurança, prevenção, precaução e informação. ....................................................................................189
12C. Povos e comunidades tradicionais. Acesso ao território e garantias territoriais. Diversidade biológica e
patrimônio genético. Proteção e acesso ao conhecimento tradicional associado. .........................................190
2A. Proteção jurídica da fauna ......................................................................................................................196
3C. Proteção jurídica da flora........................................................................................................................198
19C. Gestão de florestas públicas. Uso e exploração. Concessão florestal. ....................................................201
20C. Proteção jurídica do Meio Ambiente e a exploração mineral. Mineração e impactos ambientais.
Licenciamento. Deveres ambientais relativos à exploração mineral. .............................................................206
13C. Recursos Hídricos. Política Nacional de Recursos Hídricos. Instrumentos de gestão de recursos hídricos.
Regime jurídico das águas. Águas subterrâneas. ...........................................................................................208
18C. Política Nacional de Resíduos Sólidos. Objetivos e princípios. Planos de resíduos sólidos.
Responsabilidade civil e resíduos sólidos. Responsabilidade compartilhada. Licenciamento ambiental e
resíduos sólidos............................................................................................................................................212
8.DIREITO INTERNACIONAL AMBIENTAL ...........................................................................................................213
22C. Normas internacionais em matéria ambiental. .....................................................................................213

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DIREITO ADMINISTRATIVO

1. O DIREITO ADMINISTRATIVO, A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E O REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO


1.1 Conceito, objeto e fontes do Direito Administrativo. Direito Administrativo Constitucional. (1.a)
1.2 Funçõ es (atividades) administrativas. Função consultiva. Função de regulação. Função de controle. Função de
fomento. (3.a)
1.3 A Administração Pública sob os aspectos orgânico, formal e material. Administração Pública e governo. (20.b)
1.4 A ética na Administração Pública. Dever de transparê ncia e de informação. (22.b)
1.5 Princi ́pios da Administração Pública. (13.a)

1A. Conceito, objeto e fontes do Direito Administrativo. Direito Administrativo Constitucional.

Isadora Carvalho

Conceito: a) Para José dos Santos Carvalho Filho, Direito Administrativo é um ramo do Direito Público,
compreendendo o conjunto de normas e princípios que, visando sempre ao interesse público, regem as relações
jurídicas entre as pessoas e órgãos do Estado e entre este e as coletividades a quem deve servir; b) Para Odete
Medauar: conjunto de normas e princípios que regem a atuação da Administração Pública; c) Para Celso Antonio
Bandeira de Melo: “direito administrativo é o ramo do direito público que disciplina a função administrativa e os
órgãos que a exercem” (p. 37, 2007).
Outros critérios: 1 - Critério do serviço público. 2 - Critério do Poder Executivo. Disciplina a atuação do Poder
Executivo, cuja crítica é que despreza o fato de que os outros poderes do Estado também exercem a atividade
administrativa. 3 Critério das relações jurídicas. Conjunto de regras que disciplinam as relações entre a
Administração e os administrados. 4 - Critério teleológico. Sistema de princípios jurídicos que regula as atividades
concretas do Estado, para cumprimento de seus fins, na busca do interesse público. 5 - Critério negativo ou
residual. O Direito Administrativo deve ser observado em dois sentidos diferentes: no sentido positivo (representa
os institutos jurídicos pelos quais o Estado busca a realização dos seus objetivos) e no sentido negativo (representa
uma forma de definição de seus objetos, o que se faz por exclusão, afastando-se as demais funções do Estado, a
legislativa e a jurisdicional, além das atividades regidas pelo direito privado). 6 - Critério da administração pública:
o Direito Administrativo é o conjunto de princípios que regem a Administração Pública.

Objeto do Direito Administrativo: Com fundamento no critério funcional, estudo da disciplina normativa da
função administrativa e da organização e estrutura da Administração Pública. Objeto imediato: princípios e
normas que regulam a função administrativa, enquanto objeto mediato é a disciplina das atividades, agentes,
pessoas e órgãos da Administração Pública.

Administração burocrática x administração gerencial: Enquanto a administração pública burocrática (ou racional)
é centrada na legalidade, relações hierarquizadas, controle de fins, ênfase em processos e meios, a administração
gerencial atribui maior agilidade e eficiência na atuação administrativa, foca no resultado em detrimento de
processos e ritos, bem como na participação popular, com fundamento constitucional na EC 19/98. Exemplos:
contrato de gestão, agencias executivas e princípio daeficiência.

Fontes do Direito Administrativo: (a) Lei - abrangendo as normas constitucionais, a legislação infraconstitucional,
os regulamentos administrativos e os tratados internacionais; (b) Costumes – repetição de condutas (elemento
objetivo) com convicção de sua obrigatoriedade (elemento subjetivo). Parte da doutrina nega a qualidade de
fonte do direito aos costumes, considerando que sua observância depende do seu acolhimento pela lei, tal qual
ocorre no direito tributário (art. 100 do CTN). Para Lúcia Valle Figueiredo, os costumes não são fontes; (c)
Jurisprudência – seu papel é reforçado pelo fenômeno da judicialização do Direito e pelo reconhecimento da força
vinculante de determinadas decisões; (d) Doutrina; (e) Princípios; (f) Precedentes Administrativos – prática
reiterada e uniforme de atos administrativos em situações similares, sendo necessário garantir a segurança
jurídica. Há hipóteses nas quais o caráter vinculante dos precedentes administrativos tem previsão legal expressa,
como ocorre no art. 40, §1º, da LC 73/93 (Lei Orgânica da AGU), ao dispor que o parecer aprovado e publicado

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com o despacho presidencial vincula a Administração Federal.

Direito administrativo x Ciência da Administração: Ciência da Administração é o estudo das técnicas e estratégias
para melhor planejar, organizar, dirigir e controlar a gestão governamental (não é ramo jurídico, não é lei).

Administração Pública Introversa (Conjunto relação jurídica entre o Poder Público e seus agentes, órgãos e
entidades administrativas = Intra) x Administração Pública Extroversa: Nesta é o conjunto de relações jurídicas
externas, entre o Poder Público e os administrados.

Direito Administrativo Constitucional: O Direito Constitucional é o ramo do direito com maior intimidade como
Direito Administrativo, sendo certo que o Direito Constitucional fornece as diretrizes mestras, bases e parâmetros
do Direito Administrativo, tais como Princípios, normas gerais sobre servidores públicos, competências dos
poderes, normas sobre desapropriação, concessões e permissões de serviços públicos, dos contratos
administrativos e licitações, bem como a responsabilidade extracontratual do Estado. O Direito Administrativo
Constitucional é o Ramo do Direito Administrativo com fundamento na Constituição.
Nesse ponto, também merece destaque o fenômeno da constitucionalização do direito administrativo, que
abalou alguns dogmas deste ramo, gerando (Rafael Carvalho, 2015, p. 8): a) a redefinição da ideia de supremacia
do interesse público sobre o privado e a ascensão do princípio da ponderação de direitos fundamentais; b) a
superação da concepção do princípio da legalidade como vinculação positiva do administrador à Lei e a
consagração da vinculação direta à Constituição; c) a possibilidade de controle judicial da discricionariedade a
partir dos princípios constitucionais, deixando-se de lado o paradigma da insindicabilidade do mérito
administrativo; d) a releitura da legitimidade democrática da Administração, com a previsão de instrumentos de
participação dos cidadão na tomada de decisões administrativas (consensualidade na Administração).

Relação com outros ramos: Direito constitucional, civil, processual civil, trabalho, penal, processo penal,
tributário, financeiro, econômico, urbanístico, ambiental, empresarial, internacional público.

3A. Funções (atividades) administrativas. Função consultiva. Função de regulação. Função de controle. Função de
fomento

Caroline Araújo

A Função Consultiva da administração abrange os atos que visam auxiliar, esclarecer e sugerir providências a
serem adotadas. Ela é exercida mediante a elaboração de pareceres prévios e individualizados, de caráter
essencialmente técnico. Na esfera federal, esta tarefa cabe à AGU (art. 131, CF) e nos Estados e DF, a incumbência
é das respectivas Procuradorias (art. 132, CF). O STF classificou os pareceres quanto à sua obrigatoriedade da
seguinte maneira: (i) quando a consulta é facultativa, a autoridade não se vincula ao parecer proferido, sendo que
seu poder de decisão não se altera pela manifestação do órgão consultivo; (ii) quando a consulta é obrigatória, a
autoridade administrativa se vincula a emitir o ato tal como submetido à consultoria, com parecer favorável ou
contrário, e se pretender praticar ato de forma diversa da apresentada à consultoria, deverá submetê-lo a novo
parecer; (iii) quando a lei estabelece a obrigação de decidir à luz de parecer vinculante, essa manifestação de teor
jurídica deixa de ser meramente opinativa e o administrador não poderá decidir senão nos termos da conclusão
do parecer ou, então, não decidir. Na ocasião, decidiu que o parecer meramente opinativo não é capaz de gerar
responsabilização do parecerista, a não ser que se prove culpa ou erro grosseiro. Por outro lado, no parecer
vinculante, há responsabilidade, pois a manifestação é parte do ato administrativo. No caso do atraso, o processo
terá seguimento sem o parecer não-vinculante e deverá aguardar o parecer vinculante. Di Pietro sustenta que o
parecer que aprova as minutas de editais e contratos tem caráter vinculante, para fins de responsabilidade, por
força da Lei 8.666.

A Função de Regulação, segundo Marçal Justen Filho, citado por Maria Sylvia Zanella di Pietro, “[...] consiste na
atividade estatal de intervenção indireta sobre a conduta dos sujeitos públicos e privados, de modo permanente
e sistemático, para implementar as políticas de governo”(DI PIETRO, 2011, p. 55). Após, a autora define como

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“conjunto de regras de conduta e de controle da atividade econômica pública e privada e das atividades sociais
não exclusivas do Estado, com a finalidade de proteger o interesse público”. A função abrange as atividades de
normatizar, julgar (obviamente sem prejudicar o direito de acesso ao Poder Judiciário) e executar. Afirma, ainda,
que a regulação pode ser dirigir à ordem econômica ou à ordem social. José dos Santos Carvalho Filho aponta que
as expressões “regulamentar” e “regular” não guardam sinonímia: aquela significa complementar, especificar, e
pressupõe sempre que haja norma de hierarquia superior suscetível de complementação; esta, de sentido mais
amplo, indica disciplinar.

A Função de Fomento, por outro lado, é a “atividade de incentivo à iniciativa privada de utilidade pública, e
segundo Fernando Andrade de Oliveira (RDA 120/14) abrange os auxílios financeiros ou subvenções através dos
orçamentos públicos, os financiamentos, os favores fiscais que estimulem atividades consideradas
particularmente benéficas ao progresso material do país e as desapropriações que favoreçam entidades privadas
sem fins lucrativos, que realizem atividades úteis à coletividade, como os clubes desportivos e as instituições
beneficentes.” (DI PIETRO, 55/56).

A Função de Controle é “[...] o poder de fiscalização e correção que a Administração Pública (em sentido amplo)
exerce sobre sua própria atuação, sob os aspectos da legalidade e mérito, por iniciativa própria ou mediante
provocação” (DI PIETRO, 2011, p. 737). Trata-se, como se vê, do controle administrativo. O controle pode ser
tanto da legalidade dos processos internos, como de sua eficiência.

20B. A Administração Pública sob os aspectos orgânico, formal e material. Administração Pública e governo.

Renata Souza
Materiais consultados: Graal do 28º CPR; CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 28. ed. rev., ampl. e atual. até 31-12-2014.
São Paulo: Atlas, 2015; MARINELA, Fernanda. Direito Administrativo. 8. ed. Niterói: Impetus, 2014;
JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo (livro eletrônico). 5. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018;
OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Curso de Direito Administrativo. 6. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2018.

I. A Administração Pública sob os aspectos orgânico, formal e material

Para Celso Antônio Bandeira de Mello, prevalece a ideia que existe uma trilogia de funções do Estado (legislativa,
administrativa e jurisdicional), divididas em blocos orgânicos (Poderes). Cada bloco orgânico (Poder), além de suas
funções ti ́picas, exerce funções ati ́picas, em decorrência da teoria dos freios e contrapesos.

Critérios para identificar o objeto de estudo do Direito Administrativo: surgem vários critérios clássicos, a partir
das funções do Estado, que podem ser reduzidos a dois:
a) critério orgâ nico ou subjetivo, que se propõ e a identificar a função a partir de quem a produz e se refere às
entidades, órgãos e agentes designados para compor a Administração Pública; e
b) critério objetivo, que leva em consideração a atividade, um dado objeto, que se subdivide em:
b.1) critério objetivo material ou substancial, que identifica a função a partir de seus elementos intri ́nsecos,
radicados em sua natural tipologia; e
b.2) critério objetivo formal, que identifica a função a partir do tratamento normativo que lhe corresponda,
ou seja, do regime juri ́dico correspondente (preferido por Celso Antônio Bandeira de Mello, que deve ser
utilizado para correta identificação de dado objeto no Direito Administrativo).
Exemplo: Um ato praticado pela Mesa Diretora de um Parlamento, se for analisado unicamente pelo critério
orgânico/subjetivo (do Poder que a elaborou) será sempre um ato legislativo, todavia, deverá ser analisado a
partir da natureza juri ́dica na qual está inserido para sua correta caracterização (exemplo: nomeação de servidor
seria um ato administrativo).

Segundo Hely Lopes Meirelles, no sentido formal, a Administração Pública é o conjunto de órgãos institui ́dos
para consecução dos objetivos do Governo; no sentido material, é o conjunto de funções necessárias para os
serviços públicos; no sentido operacional, é o desempenho sistemático, legal, técnico dos serviços próprios do
Estado ou por ele assumidos em benefi ́cio da coletividade.

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Para José dos Santos Carvalho Filho, administração pública, no sentido objetivo consiste, “(...) na pró pria
atividade administrativa exercida pelo Estado por seus órgãos e agentes, caracterizando, enfim, a função
administrativa (...) Trata-se da própria gestão dos interesses públicos executada pelo Estado, seja através da
prestação de serviços públicos, seja por sua organização interna, ou ainda pela intervenção no campo privado,
algumas vezes até de forma restritiva (poder de poli ́cia)” – CARVALHO FILHO, p. 11. No sentido subjetivo, indica
o “conjunto de agentes, órgãos e pessoas juri ́dicas que tenham a incumbê ncia de executar as atividades
administrativas. Toma-se aqui em consideração o sujeito da função administrativa, ou seja, quem a exerce de
fato.” – CARVALHO FILHO, p. 11/12.
Para Maria Sylvia Zanella Di Pietro, o conceito de administração pública divide-se em dois sentidos: a) "em
sentido subjetivo, formal ou orgâ nico, ela designa os entes que exercem a atividade administrativa; compreende
pessoas juri ́dicas, órgãos e agentes públicos incumbidos de exercer uma das funções em que se triparte a
atividade estatal: a função administrativa; b) em sentido objetivo, material ou funcional, ela designa a natureza
da atividade exercida pelos referidos entes; nesse sentido, a Administração Pública é a pró pria função
administrativa que incumbe, predominantemente, ao Poder Executivo.” (p.49).
Observação: Administração gerencial: administração pública gerencial é aquela construi ́da sobre bases que
consideram o Estado uma grande empresa cujos serviços são destinados aos seus clientes, os cidadãos. O
gerencialismo é uma técnica de instrumentalização e operacionalização das poli ́ticas públicas previamente
desenvolvidas e aceitas pela organização. É, portanto, meio de implementação. Dentro desse conceito, a
administração gerencial caracteriza-se pela existê ncia de formas modernas de gestão pública, modificando os
critérios de aplicação do controle dos serviços públicos, as relações estabelecidas entre o Poder Público e seus
servidores e alterando, também, a própria atuação da administração, que passa a enfatizar a eficiê ncia, a
qualidade e a efetiva concretização do regime democrático, mediante a participação mais intensa dos cidadãos.
A primeira tentativa de introduzir, no Brasil, a administração pública gerencial, deu-se em 1967 – Governo Castelo
Branco - por intermédio do Decreto-Lei n° 200, que promovia uma radical descentralização da administração
pública brasileira. A Administração Gerencial também teve seus lineamentos básicos no "Plano Diretor da
Reforma do Estado" e na obra do ex-Ministro Bresser Pereira, para quem ela se apresenta como uma "nova forma
de gestão da coisa pública mais compati ́vel com os avanços tecnológicos, mais ágil, descentralizada, mais voltada
para o controle de resultados do que o controle de procedimentos, e mais compati ́vel com o avanço da
democracia em todo o mundo, que exige uma participação cada vez mais direta da sociedade na gestão pública.
A Emenda Constitucional no 19, de 4 de junho de 1998, à Constituição de 1988, que, entre outros assuntos,
“modifica o regime e dispõ e sobre princi ́pios e normas da Administração Pública, servidores e agentes poli ́ticos,
controle de despesas e finanças públicas”, deixou bastante claro o marco da transformação da administração
pública burocrática para a gerencial, no contexto mais amplo da reforma do Estado brasileiro. Os aspectos da
administração gerencial assemelham-se à s técnicas utilizadas pelas empresas privadas, em especial, o caráter
competitivo e a contenção de gastos priorizando a eficiê ncia e a qualidade dos serviços. Cabe ressaltar que a
administração gerencial teve seu notório avanço dentro da administração pública, contudo, não rompeu em todos
os sentidos com a administração burocrática.

II. Administração Pública e governo

Os conceitos de "Governo” e "Administração Pública” não podem ser confundidos.


Segundo Fernanda Marinela, Governo pode ser definido em diversas vertentes. "Em sentido formal, considera-se
o conjunto de Poderes e órgãos constitucionais, enquanto no aspecto material, por sua vez, é o complexo de
funções estatais básicas. No enfoque operacional, é a condução poli ́tica dos negócios públicos, estando constante
a expressão política de comando, de iniciativa, de fixação de objetivos do Estado e de manutenção da ordem
jurídica vigente, atuando por meio de atos de soberania e atos de autonomia, como direção suprema dos
interesses públicos. Em resumo, é uma atividade poli ́tica e discricionária, representando uma conduta
independente do administrador, como um comando com responsabilidade constitucional e política, mas sem
responsabilidade profissional pela execução (o que é natural da Administração).” – MARINELA, p. 18.
O Governo - ou a forma de se governar – é sempre provisório, temporário, em virtude do Princi ́pio Republicano,
devendo existir sempre consulta ao povo.

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Na tarefa de distinguir a função de governo (também chamada de função política) da função administrativa,
Marçal Justen Filho esclarece que a função de governo diz respeito a competências atinentes à existência do
Estado e à formulação de escolhas políticas primárias. Tanto a função de governo como a função administrativa
estão relacionadas à promoção dos direitos fundamentais, mas em níveis diversos. Enquanto a função
administrativa é instrumento de realização direta e imediata dos direitos fundamentais, a função de governo
traduz o exercício da soberania da Nação e a definição das decisões políticas mais gerais, envolvendo, também, a
realização dos direitos fundamentais, mas não como uma medida diretamente referida a isso.
Também deve ser destacadas as seguintes diferenças: a) Os atos oriundos de função poli ́tica ou de governo
possuem competê ncia extrai ́da diretamente da Constituição e são caracterizados por ampla margem de
discricionariedade, a exemplo declaração de guerra, intervenção federal e da escolha de Ministros. Em outras
palavras, não se alocam entre as classificações de atos da Administração Pública (executivo, legislativo ou
judiciário); b) Os atos da administração pública tem seu fundamento na lei, com discricionariedade comum, sendo
exemplos regulamentos, decretos, portaria e licenças.
Maria Sylvia Zanella di Pietro observa que “Costuma-se dizer que os atos emanados no exerci ́cio da função poli ́tica
não são passi ́veis de apreciação pelo Poder Judiciário; as Constituições de 1934 (art. 68) e 1937 (art. 94)
estabeleciam que as questõ es exclusivamente poli ́ticas não podiam ser apreciadas pelo Poder Judiciário. As
Constituições posteriores silenciaram, mas a vedação persiste, desde que se considerem como questõ es
exclusivamente poli ́ticas aquelas que, dizendo respeito à polis, não afetam direitos subjetivos. No entanto, se
houver lesão a direitos individuais e, atualmente, aos chamados interesses difusos protegidos por ação popular e
ação civil pública, o ato de Governo será passi ́vel de apreciação pelo Poder Judiciário. São exemplos de atos
poli ́ticos: a convocação extraordinária do Congresso Nacional, a nomeação de Comissõ es Parlamentares de
Inquérito, as nomeações de Ministros de Estado, as relações com Estados estrangeiros, a declaração de guerra e
de paz, a permissão para que forças estrangeiras transitem pelo território do Estado, a declaração de estado de
si ́tio e de emergê ncia, a intervenção federal nos Estados. Além disso, podem ser assim considerados os atos
decisórios que implicam a fixação de metas, de diretrizes ou de planos governamentais. Estes se inserem na
função poli ́tica do Governo e serão executados pela Administração Pública (em sentido estrito), no exerci ́cio da
função administrativa propriamente dita.” (p. 51).

22B. Ética na Administração Pública. Dever de transparência e de informação

Rafael Martins da Silva

Ética. A palavra Ética vem do grego ethos, que significa caráter, conduta, estando mais ligada à consciência
individual; ela busca distinguir o bem do mal, orientando sempre as ações humanas para o lado positivo.

Segundo Miguel Reale, “ética é a ciência normativa da conduta. Devemos partir da verificação de que a conduta
é própria apenas do homem. Os demais animais movem-se. Só o homem se conduz, ou seja, só o homem tem
consciência do seu agir. A tal ponto que ele pode mudar a decisão tomada, escolher outro caminho, ou deixar de
escolher. A Ética, sendo uma ciência normativa, não é mera descrição daquilo que usualmente os homens fazem,
mas assinala, ao contrário, uma aspiração no sentido de serem seguidas determinadas diretrizes onsideradas
necessárias ao aperfeiçoamento humano.” (p. 775)

Ética e Moral, embora se relacionem, são temas diferentes, já que ter valores (Moral) é diferente de refletir sobre
o agir em relação a esses valores (Ética). A Moral é a matéria com a qual a Ética trabalha. A Moral surge antes da
Ética, por meio do estabelecimento de normas que promovem o bem para determinada comunidade humana.
Ética é um conjunto de conhecimentos extraídos da investigação do comportamento humano ao tentar explicar
as regras morais de forma racional, fundamentada, científica e teórica. É uma reflexão sobre a moral.

Hans Kelsen assevera que a distinção entre Direito e Moral não está no conteúdo do que prescrevem e proíbem,
mas sim, como prescrevem ou proíbem uma determinada conduta humana. O Direito se concebe por uma ordem
de coação, procura obter uma conduta humana, ligando a conduta oposta ao ato de coerção, enquanto a Moral
não possui ato de coerção. Para Maria Sylvia Zanella di Pietro, “antiga é a distinção entre Moral e Direito, ambos

9
representados por círculos concêntricos, sendo o maior correspondente à moral, e o menor, ao direito. Licitude e
honestidade seriam os traços distintivos entre o direito e a moral, numa aceitação ampla do brocardo segundo o
qual non omne quod licet honestum est (nem tudo o que é legal é honesto)”(p. 72).

Segundo José dos Santos Carvalho Filho, “o princípio da moralidade impõe que o administrador público não
dispense os preceitos éticos que devem estar presentes em sua conduta. Deve não só averiguar os critérios de
conveniência, oportunidade e justiça em suas ações, mas também distinguir o que é honesto do que é desonesto.”
(p. 21-22).

Moralidade administrativa (art. 37, CR): a ideia de uma Moral administrativa foi desenvolvida, inicialmente, pelo
francês Maurice Hauriou, denotando a ideia de uma norma de conduta a ser seguida pela Administração Pública.
Já Bergson afirma que existem duas conceituações de moral, uma aberta, que é relativa aos valores sociais e
culturais, e outra fechada, que se insere no contexto de determinadas organizações, aproximando-se da ideia de
Hauriou.

Nesta linha, a Administração e seus agentes têm de atuar na conformidade de princípios éticos34. Agir em
desconformidade gera a ilicitude do ato. Conceito de legalidade em sentido amplo, abrange os princípios e valores
que estão na base do ordenamento jurídico. A imoralidade produz efeitos jurídicos, não se trata de uma “moral”
sem coercitividade, havendo meios judiciais de tutela (improbidade, ação popular e etc.). Para Marçal Justen35, a
distinção entre público e privado não reside apenas em questões puramente técnicas ou econômicas, mas sim
apresenta natureza ética. O interesse é público por ser indisponível, e não o contrário. O interesse público somente
pode ter vista à realização de direitos fundamentais, cuja titularidade é atribuída ao Estado pela inviabilidade de
se concretizar se atribuída aos particulares. Portanto, a ética na busca pela concretização dos direitos
fundamentais deve semear a atividade administrativa.

Boa-fé: conduta leal, honesta (aspecto objetivo), aspecto subjetivo (crença do sujeito de que está agindo
corretamente).

No âmbito da Administração Pública Federal, foi editado o Código de Ética do Servidor do Poder Executivo
(Decreto nº 1.171, de 22 de junho de 1994), que reforça os seguintes deveres de quem exerce função pública:
publicidade, probidade, eficiência, valorização da atividade pública, cortesia em relação ao administrado,
fiscalização. O código traz disposições vagas, ressalta valores e faz recomendações, sem positivar sanções. Cria
também comissão de ética para orientá-lo.

A Lei 12.813/2013 trata do conflito de interesses na Administração Pública Federal, conceituado no art. 3o, I,
como “a situação gerada pelo confronto entre interesses públicos e privados, que possa comprometer o interesse
coletivo ou influenciar, de maneira imprópria, o desempenho da função pública.” Não depende da ocorrência de
dano ou de vantagem pelo agente público ou por terceiro. Conforme o art. 12 da lei, o agente público que praticar
atos em conflito de interesses (arts. 5o e 6o) incorre em improbidade administrativa, na forma do art. 11 da LIA
(atos que atentam contra princípios da Administração Pública), quando não caracterizada qualquer das condutas
previstas nos arts. 9o e 10 (enriquecimento ilícito/prejuízo ao erário).

O conflito pode ocorrer durante o período em que o agente público está no exercício da função (art. 5°), bem
como após ele ter deixado a função pública (art. 6°). Haverá conflito de interesses se: (i) a qualquer tempo,
divulgar ou fizer uso de informação privilegiada obtida em razão das atividades exercidas; (ii) nos seis meses
posteriores ao desligamento (a) prestar serviço a pessoa com quem se relacionou em razão do exercício do cargo
ou emprego, b) trabalhar para pessoa que atue na área de competência do cargo ou emprego ocupado; c) celebrar
contratos de serviço ou consultoria vinculados com o órgão ou entidade onde trabalhava; d) intervir em favor de
interesse privado junto aos órgãos ou entidades com os quais tenha tido relacionamento relevante. A fiscalização
da ocorrência de conflito de interesses cabe à Corregedoria Geral da União e à Comissão de Ética Pública.

Dever de transparência e de informação.36 Para a concretização do princípio da publicidade, não basta que os

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atos da Administração sejam públicos, eles devem merecer a mais ampla divulgação possível entre os
administrados, como forma de lhes propiciar a possibilidade de controlar a legitimidade da conduta dos agentes
administrativos (Carvalho Filho, p. 26).

Nesse sentido, foi editada a Lei nº 12.527/11 (Lei de Acesso à Informação – LAI). A lei tem caráter nacional e geral,
aplicando-se à administração direta e indireta de todos os poderes da União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos
Municípios, ao MP, aos tribunais de contas e às entidades privadas sem fins lucrativos que recebam recursos
públicos para realização de ações de interesse público (nesse caso, a lei aplica-se apenas em relação os recursos
recebidos). De acordo com a LAI, as informações de interesse coletivo devem ser divulgadas na internet (salvo no
caso de municípios com menos de 10.000 habitantes). A publicidade é a regra, e o sigilo é exceção (art. 3 da LAI).

Por isso, é proibido o sigilo eterno. Ele é temporário e pode se dar em razão da imprescindibilidade da informação
para a segurança da sociedade e do Estado, em conformidade com o art. 5o, XXXIII, CR (a lei traz rol
exemplificativo). Os prazos máximos são 25 anos para informações ultrassecretas, 15 para secretas e 5 para as
reservadas. Foi criada no âmbito da Administração Pública Federal uma Comissão Mista de Reavaliação de
Informações, que pode prorrogar por 25 anos o prazo. A lei confere tratamento próprio aos dados que configuram
“as informações pessoais”, que são aquelas relativas à vida privada, honra e imagem de pessoas naturais. Tais
informações, independentemente de classificação, tem seu acesso restrito à agentes públicos autorizados e à
pessoa a que se referem. Essa restrição ao acesso dura por até 100 anos. Podem ser divulgados a terceiros em
caso de autorização pela pessoa ou pela lei. Em qualquer caso, aquele que tiver acesso a informações pessoais
será responsabilizado pelo uso indevido (art. 31, § 2°). A negativa não fundamentada à informação caracteriza
infração disciplinar do servidor público. Por outro lado, é proibido exigir do particular solicitante o motivo do
pedido de informações. A informação disponível deverá ser fornecida na hora. Não estando disponível, em 20 dias
deve ser fornecida ou indicado o motivo da recusa ou impossibilidade. A Lei 9.784 aplica-se subsidiariamente.

O Decreto 7.724/12, que regulamentou a LAI, determina a divulgação das remunerações, subsídios e vantagens
recebidas por funcionários públicos. A exigência foi julgada constitucional pelo STF (STF, ACO 1902 e SS 3902). Em
23.04.2015, em sede de repercussão geral (ARE 652777), a Corte, acompanhando parecer do PGR Rodrigo Janot,
decidiu que a divulgação oficial da remuneração de servidores públicos na internet é legítima. O PGR argumentou
que a remuneração dos servidores públicos constitui informação de interesse coletivo ou geral e "entendimento
em sentido contrário ensejaria risco de lesão à ordem pública", e que "em casos dessa natureza deve prevalecer
o princípio da publicidade administrativa, que preconiza o acesso à informação pública e à transparência em favor
da cidadania, ampliando-se o controle social e oficial dos gastos públicos". A manifestação também destacou que
a divulgação assegura a efetividade da Lei de Acesso de Informação (Lei 12.527/2011), garantindo maior
transparência à administração pública.

Segundo o decreto 7.724/12, não devem ser fornecidos dados referentes à atividade empresarial de particulares,
obtidos pelos órgãos de fiscalização. Por outro lado, a divulgação de informações de entidades controladas pela
União que atuem em regime de concorrência, sujeitas ao art. 173 da CF será regulamentada pela CVM, para
assegurar sua competitividade, governança corporativa e eventual interesse de acionistas minoritários.

A Lei de Responsabilidade Fiscal regula o dever do administrador público de prestar contas. Fala em “ação
planejada e transparente” (art.1°, §1°) – Portais de Transparência. O art. 48 prescreve como instrumentos de
transparência da gestão fiscal: os planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e
o respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal. A LC
131/09 alterou diversos dispositivos da LC 101/00, no que concerne à transparência, dispôs que a mesma estaria
assegurada através de: a) incentivo à participação popular e realização de audiências públicas, durante os
processos de elaboração e discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos; b) liberação ao
pleno conhecimento e acompanhamento da sociedade, em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a
execução orçamentária e financeira, em meios eletrônicos de acesso público; c) adoção de sistema integrado de
administração financeira e controle, que atenda a padrão mínimo de qualidade estabelecido pelo Poder Executivo
da União (art. 48, parágrafo único). Outrossim, incluiu o art. 48-A da LRF, determinando o acesso a informações a

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qualquer pessoa física/jurídica referentes às despesas e receitas das unidades gestoras. As contas apresentadas
pelo Chefe do Poder Executivo ficarão disponíveis, durante todo o exercício, no respectivo Poder Legislativo e no
órgão técnico responsável pela sua elaboração, para consulta e apreciação pelos cidadãos e instituições da
sociedade (art. 49, da LRF; art. 84, inc. XXIV, da CF). Verificada discrepância entre as contas prestadas/informadas,
possível ingressar com ação popular, ação de improbidade administrativa. Outrossim, o cidadão poderá
encaminhar informações sobre irregularidades para os tribunais de contas.

Questões de prova oral


→ Questionou sobre o Código de Ética e o tipo de normas que possui. Possibilidade de sanções por infrações ao
Código de Ética considerando a natureza jurídica deste. (27°CPR)

13A. Princípios da Administração Pública.

Atualizado por Felipe Fróes, em 12/09/2018


FONTES: Material do grupo MPF LEVADO À SÉRIO; Santo Graal 28CPR. ALEXANDRINO, Marcelo.
Direito Administrativo descomplicado (25 ed, 2017).

A doutrina tradicional define princípios administrativos como os postulados fundamentais que inspiram
todo o modo de agir da Administração Pública. Representam cânones pré-normativos, norteando a conduta do
Estado quando no exercício de atividades administrativas. Entretanto, a doutrina moderna aponta que as normas
jurídicas admitem classificação em duas categorias básicas: os princípios e as regras. As regras são operadas de
modo disjuntivo, ou seja, o conflito entre elas é resolvido no plano de validade: aplicáveis ambas a uma mesma
situação, uma delas apenas a regulará, atribuindo-se à outra o caráter de nulidade. Os princípios, ao revés, não
se excluem do ordenamento jurídico na hipótese de conflito: dotados que são de determinado valor ou razão, o
conflito entre eles admite a adoção do critério da ponderação, vale dizer, deverá o intérprete averiguar a qual
deles, no caso concreto, será atribuído grau de preponderância.
Dentre os princípios explícitos e implícitos previstos na Constituição de 88 (art. 37) e na legislação esparsa,
citam-se os seguintes:
LEGALIDADE. Diretriz básica da conduta dos agentes administrativos. Significa que toda e qualquer
atividade administrativa deve ser autorizada por lei. Não o sendo, a atividade é ilícita. Na clássica comparação de
Hely Lopes Meirelles, enquanto os indivíduos no campo privado podem fazer tudo o que a lei não veda, o
administrador público só pode atuar onde a lei autoriza. Com efeito, o administrador público somente pode atuar
conforme determina a lei. Alguns administrativistas mencionam a ideia de “bloco de legalidade” ou “princípio da
juridicidade”, que consiste na subordinação da Administração não apenas à lei, mas também à Constituição e
demais atos normativos, ou seja, no dever de observância a todo o ordenamento jurídico.
IMPESSOALIDADE. Reflete a necessidade de uma atuação que não discrimina as pessoas, seja para
benefício ou para prejuízo. Objetiva a igualdade de tratamento que a Administração deve dispensar aos
administrados que se encontrem em idêntica situação jurídica. Nesse ponto, representa uma faceta do princípio
da isonomia. Por outro lado, para que haja verdadeira impessoalidade, deve a Administração voltar-se
exclusivamente para o interesse público, e não para o privado. A igualdade deve ser atendida tanto em seu
critério formal quanto no critério material. Assim, justifica-se o sistema de cotas, em que se prevê reserva de
vagas pelo critério étnico-social para ingresso em instituições de nível superior e provimento de cargos no serviço
público federal. Também é fundamento para reconhecimento da validade dos atos praticados pelo “funcionário
de fato” (agente público com investidura irregular).
MORALIDADE. Impõe que o administrador público não dispense os preceitos éticos que devem estar
presentes em sua conduta. Deve não só averiguar os critérios de conveniência, oportunidade e justiça em suas
ações, mas também distinguir o que é honesto do que é desonesto. Tal forma de conduta deve existir não somente
nas relações entre a Administração e os administrados em geral, mas também internamente, ou seja, na relação
entre a Administração e os agentes públicos que a integram. Quando a imoralidade consiste em atos de
improbidade, que, como regra, causam prejuízos ao erário, o diploma regulador é a lei n. 8429/1992. Outro
instrumento relevante de tutela jurisdicional é a ação popular, contemplada no art. 5º, LXXIII, da CF/88. Também
podemos citar a ação civil pública, como uma das funções institucionais do Ministério Público, e regulamentada

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pela Lei n. 7.347, de 24/07/1985. A Lei Orgânica do Ministério Público consagra, com base naqueles bens jurídicos,
a defesa da moralidade administrativa pela ação civil pública promovida pelo Ministério Público. OBS: Súmula
Vinculante 13 (vedação ao nepotismo).
PUBLICIDADE. Proíbe a edição de atos secretos pelo poder público. Possibilita o controle da legitimidade
da conduta dos agentes administrativos. Pode ser concretizado por alguns instrumentos jurídicos específicos, tais
como o direito de petição (art. 5º, XXXIV, a, CF), direito de certidão (art. 5º, XXXIV, b, CF); a Lei de Acesso à
Informação (12.527/2011). Caso seja negado o exercício de tais direitos, o prejudicado pode usar o mandado de
segurança e o habeas data. Importante destacar que esse princípio não é absoluto, pois a própria CF ressalva que
devem ser resguardadas a segurança nacional e o relevante interesse coletivo. Nesse sentido, o STF considerou
legítima a publicação, inclusive em sítio eletrônico mantido pela Administração Pública, dos nomes dos seus
servidores e do valor dos correspondentes vencimentos e vantagens pecuniárias.
EFICIÊNCIA. Busca da produtividade e economicidade e exigência de redução do desperdício de dinheiro
público, impondo-se a execução dos serviços públicos com presteza. A EC n. 45, de 08/12/2004, acrescentou o
inciso LXXVIII ao art. 5º da Constituição, estabelecendo: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são
assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade em sua tramitação”. O novo
mandamento cuja feição é de direito fundamental, tem por conteúdo o princípio da eficiência no que se refere
ao acesso à justiça e estampa inegável reação contra a insatisfação da sociedade pela excessiva demora dos
processos, praticamente tornando inócuo o princípio do acesso à justiça para enfrentar lesões ou ameaça à direito
(art. 5º, XXXV, CF). Note-se que essa nova norma constitucional não se limita aos processos judiciais, mas também
se aplica aqueles que tramitam na via administrativa, muito destes, da mesma forma, objeto de irritante lentidão.
SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO. As atividades administrativas são desenvolvidas pelo Estado para
benefício da coletividade. Não é o indivíduo em si o destinatário da atividade administrativa, mas sim o grupo
social como um todo. Decorre dele o poder de império (“poder extroverso”) que justifica a imposição coercitiva
de obrigações ao administrado e a verticalidade na relação entre este e o Poder Público (ex. limitações
administrativas ao direito de propriedade, cláusulas exorbitantes em contratos administrativos, prazos
diferenciados à Fazenda Pública em juízo).
AUTOTUTELA. A Administração pode rever os seus próprios atos, sem precisar ser provocada. Pode fazê-
lo de ofício. Envolve dois aspectos quanto à atuação administrativa: legalidade, em relação aos quais a
Administração, de ofício, procede à revisão dos atos ilegais; mérito, em que reexamina atos anteriores quanto à
conveniência e oportunidade de sua manutenção ou desfazimento. Em nome, porém, do princípio da segurança
jurídica e da estabilidade das relações jurídicas, vêm sendo criados limites ao exercício da autotutela pela
Administração (ex. decadência e prescrição na Lei 9784/1999).
INDISPONIBILIDADE. Os bens e interesses públicos não pertencem à Administração nem a seus agentes.
Cabe-lhes apenas geri-los, conservá-los e por eles velar em prol da coletividade, esta sim a verdadeira titular dos
direitos e interesses públicos. A administração não tem a livre disposição dos bens e interesses públicos, porque
atua em nome de terceiros. Por essa razão é que os bens públicos só podem ser alienados na forma em que a lei
dispuser. Da mesma forma, os contratos administrativos reclamam, como regra, que se realize licitação para
encontrar quem possa executar obras e serviços de modo mais vantajoso para a Administração.
CONTINUIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO. Alcança toda e qualquer atividade administrativa, já que o
interesse público não guarda adequação com descontinuidades e paralisações na Administração. Guarda estreita
pertinência com o princípio da supremacia do interesse público. Em ambos se pretende que a coletividade não
sofra prejuízos em razão de eventual realce a interesses particulares. Existem situações específicas que
excepcionam o princípio, permitindo-se a paralisação temporária da atividade, como é o caso da necessidade de
proceder a reparos técnicos ou a realizar obras para a expansão e melhoria dos serviços. Por outro lado, alguns
serviços são remunerados por tarifa, de caráter tipicamente negocial. Tais serviços, frequentemente prestados
por concessionários e permissionários, admitem suspensão no caso de inadimplemento da tarifa pelo usuário,
devendo ser restabelecidos tão logo seja quitado o débito (os tribunais vêm ressalvando a impossibilidade de
suspensão da energia quando se trata de serviços essenciais)
RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. Vem sendo tratados como sinônimos pelo STF. Devem ser
observados pela Administração à medida que sua conduta se apresente dentro dos padrões normais de
aceitabilidade. Se atuar fora desses padrões, algum vício estará, sem dúvida, contaminando o comportamento
estatal. Significa dizer que não pode existir violação ao referido princípio quando a conduta administrativa é

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inteiramente revestida de licitude. Encontram fundamento nos princípios da legalidade e da finalidade, como
realça Celso Antônio Bandeira de Mello, não se podendo supor que a correção possa invadir o mérito
administrativo, que reflete o juízo de valoração em que se baseia o administrador para definir sua conduta.
Entretanto, todas as vezes que o mérito administrativo extrapola os limites da lei, seja por atuação que afronta
expresso dispositivo legal, seja pela violação ao princípio da razoabilidade, compete ao judiciário, desde que
provocado, sanar o vício da conduta estatal, determinando a anulação do ato ilícito. O princípio da
proporcionalidade vem sendo aplicado, principalmente no âmbito das sanções administrativas, como uma forma
de “proibição de excesso” (verificação da necessidade, adequação e proporcionalidade entre a reprimenda e a
gravidade do ilícito que se quer reprimir ou prevenir).

2. PODERES ADMINISTRATIVOS
2.1 Poder de poli ́cia administrativa. Poder de poli ́cia e direitos fundamentais. (17.b)
2.2 Poder regulamentar. Espécies de regulamento. Controle sobre a atividade regulamentar. (13.a)

17B. Poder de polícia administrativa. Poder de polícia e direitos fundamentais.

Luísa Maffei Costa 07/09/18

I. Poder de polícia administrativa

Quando se estuda o regime jurídico-administrativo a que se submete a Administração Pública, conclui-se que os
dois aspectos fundamentais que o caracterizam são resumidos nos vocábulos prerrogativas e sujeições, as
primeiras concedidas à Administração, para oferecer-lhe meios para assegurar o exercício de suas atividades, e
as segundas como limites opostos à atuação administrativa em benefício dos direitos dos cidadãos. Praticamente,
todo o direito administrativo cuida de temas em que se colocam em tensão dois aspectos opostos: a autoridade
da Administração Pública e a liberdade individual.
O tema relativo ao poder de polícia é um daqueles em que se colocam em confronto esses dois aspectos: de um
lado, o cidadão quer exercer plenamente os seus direitos; de outro, a Administração tem por incumbência
condicionar o exercício daqueles direitos ao bem-estar coletivo, e ela o faz usando de seu poder de polícia.
Não existe qualquer incompatibilidade entre os direitos individuais e os limites a eles opostos pelo poder de
polícia do Estado porque, como ensina Zanobini, “a ideia de limite surge do próprio conceito de direito subjetivo:
tudo aquilo que é juridicamente garantido é também juridicamente limitado”. Themístocles Brandão Cavalcanti
diz que o poder de polícia “constitui um meio de assegurar os direitos individuais porventura ameaçados pelo
exercício ilimitado, sem disciplina normativa dos direitos individuais por parte de todos”. E acrescenta que se
trata de “limitação à liberdade individual mas tem por fim assegurar esta própria liberdade e os direitos
essenciais ao homem”.
O fundamento do poder de polícia é o princípio da predominância do interesse público sobre o particular, que
dá à Administração posição de supremacia sobre os administrados.

EVOLUÇÃO

O vocábulo polícia origina-se do grego politeia, sendo utilizado para designar todas as atividades da cidade-
estado (polis), sem qualquer relação com o sentido atual da expressão.
Na Idade Média, durante o período feudal, o príncipe era detentor de um poder conhecido como jus politiae e
que designava tudo o que era necessário à boa ordem da sociedade civil sob autoridade do Estado, em
contraposição à boa ordem moral e religiosa, de competência exclusiva da autoridade eclesiástica.
Posteriormente, em fins do século XV , o jus politiae volta a designar, na Alemanha, toda a atividade do Estado,
compreendendo poderes amplos de que dispunha o príncipe, de ingerência na vida privada dos cidadãos,
incluindo sua vida religiosa e espiritual, sempre sob o pretexto de alcançar a segurança e o bem-estar coletivo.
No entanto, logo se estabeleceu uma distinção entre a polícia e a justiça; a primeira compreendia normas
baixadas pelo príncipe, relativas à Administração, e eram aplicadas sem possibilidade de apelo dos indivíduos aos
Tribunais; a segunda compreendia normas que ficavam fora da ação do príncipe e que eram aplicadas pelos juízes.

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Esse direito de polícia do príncipe foi sofrendo restrições em seu conteúdo, deixando de alcançar, paulatinamente,
primeiro as atividades eclesiásticas, depois as militares e financeiras, chegando a um momento em que se reduzia
a normas relativas à atividade interna da Administração.
Posteriormente, ainda, passou-se a ligar a polícia à ideia de coação; nesse momento, começou-se a distinguir a
atividade de polícia das demais atividades administrativas, hoje chamadas serviço público e fomento.
Em resumo, nessa fase, conhecida como Estado de Polícia, o jus politiae compreendia uma série de normas postas
pelo príncipe e que se colocavam fora do alcance dos Tribunais.
Com o Estado de Direito, inaugura-se nova fase em que já não se aceita a ideia de existirem leis a que o próprio
príncipe não se submeta. Um dos princípios básicos do Estado de Direito é precisamente o da legalidade, em
consonância com o qual o próprio Estado se submete às leis por ele mesmo postas.
Num primeiro momento, o Estado de Direito desenvolveu-se baseado nos princípios do liberalismo, em que a
preocupação era a de assegurar ao indivíduo uma série de direitos subjetivos, dentre os quais a liberdade. Em
consequência, tudo o que significasse uma interferência nessa liberdade deveria ter um caráter excepcional. A
regra era o livre exercício dos direitos individuais amplamente assegurados nas Declarações Universais de Direitos,
depois transpostos para as Constituições; a atuação estatal constituía exceção, só podendo limitar o exercício dos
direitos individuais para assegurar a ordem pública. A polícia administrativa era essencialmente uma polícia de
segurança.
Um segundo momento se inicia quando o Estado liberal começa a transformar-se em Estado intervencionista; a
sua atuação não se limita mais à segurança e passa a estender-se também à ordem econômica e social.
Antes já de iniciar-se o século XX, os autores começam a falar em uma polícia geral, relativa à segurança pública,
e em polícias especiais, que atuam nos mais variados setores da atividade dos particulares.
O crescimento do poder de polícia deu-se em dois sentidos: de um lado, passou a atuar em setores não
relacionados com a segurança, atingindo as relações entre particulares, anteriormente fora de alcance do Estado;
o próprio conceito de ordem pública, antes concernente apenas à segurança, passou a abranger a ordem
econômica e social, com medidas relativas às relações de emprego, ao mercado dos produtos de primeira
necessidade, ao exercício das profissões, às comunicações, aos espetáculos públicos, ao meio ambiente, ao
patrimônio histórico e artístico nacional, à saúde e tantas outras; de outro lado, passou a possibilitar a imposição
de obrigações de fazer, como o cultivo da terra, o aproveitamento do solo, a venda de produtos; a polícia
tradicional limitava-se a impor obrigações de não fazer. Para alguns autores, essas medidas escapam ao poder
de polícia e se apresentam como novo instrumento de que o Estado dispõe para intervir na propriedade, com
vista em assegurar o bem comum, com base no princípio da função social da propriedade.
Na realidade, quer se trate de obrigação negativa, quer se trate de obrigação positiva, a pessoa que a cumpre
está sofrendo uma limitação em sua liberdade, em benefício do interesse público. Não se pode dizer que haja
atividades estatais de conteúdo diverso quando o Estado impede que o comerciante fixe os seus próprios preços
(obrigação de não fazer) ou quando exige que ele ponha à venda determinados produtos estocados (obrigação
de fazer). Nos dois casos, o Estado intervém na economia, utilizando-se do seu poder de polícia, sempre com o
objetivo de adequar o exercício dos direitos individuais ao bem-estar geral.

CONCEITO

Pelo conceito clássico, ligado à concepção liberal do século XVIII, o poder de polícia compreendia a atividade
estatal que limitava o exercício dos direitos individuais em benefício da segurança. Pelo conceito moderno,
adotado no direito brasileiro, o poder de polícia é a atividade do Estado consistente em limitar o exercício dos
direitos individuais em benefício do interesse público. Esse interesse público diz respeito aos mais variados setores
da sociedade, tais como segurança, moral, saúde, meio ambiente, defesa do consumidor, patrimônio cultural,
propriedade. Daí a divisão da polícia administrativa em vários ramos: polícia de segurança, das florestas, das
águas, de trânsito, sanitária etc.
No direito brasileiro, encontra-se conceito legal de poder de polícia no artigo 78 do Código Tributário Nacional:
“considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito,
interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente
à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de

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atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou
ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos”.
A razão de o Código Tributário Nacional dar o conceito de poder de polícia decorre do fato de constituir o exercício
desse poder um dos fatos geradores da taxa (cf. art. 145, II, da Constituição Federal e art. 77 do referido Código).
O poder de polícia reparte-se entre Legislativo e Executivo. Tomando-se como pressuposto o princípio da
legalidade, que impede à Administração impor obrigações ou proibições senão em virtude de lei, é evidente que,
quando se diz que o poder de polícia é a faculdade de limitar o exercício de direitos individuais, está-se
pressupondo que essa limitação seja prevista em lei. O Poder Legislativo, no exercício do poder de polícia que
incumbe ao Estado, cria, por lei, as chamadas limitações administrativas ao exercício das liberdades públicas.
A Administração Pública, no exercício da parcela que lhe é outorgada do mesmo poder, regulamenta as leis e
controla a sua aplicação, preventivamente (por meio de ordens, notificações, licenças ou autorizações) ou
repressivamente (mediante imposição de medidas coercitivas). Note-se que o artigo 78 do Código Tributário
Nacional define o poder de polícia como atividade da administração pública; mas no parágrafo único considera
regular o seu exercício “quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com
observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou
desvio de poder”.
Em razão dessa bipartição do exercício do poder de polícia, Celso Antônio Bandeira de Mello dá dois conceitos de
poder de polícia:

em sentido amplo, corresponde à “atividade estatal de condicionar a liberdade e a propriedade ajustando-as aos
interesses coletivos”; abrange atos do Legislativo e do Executivo; e

em sentido restrito, abrange “as intervenções, quer gerais e abstratas, como os regulamentos, quer concretas e
específicas (tais como as autorizações, as licenças, as injunções) do Poder Executivo, destinadas a alcançar o
mesmo fim de prevenir e obstar ao desenvolvimento de atividades particulares contrastantes com os interesses
sociais”; compreende apenas atos do Poder Executivo.

POLÍCIA ADMINISTRATIVA E JUDICIÁRIA

O poder de polícia que o Estado exerce pode incidir em duas áreas de atuação estatal: na administrativa e na
judiciária. A principal diferença que se costuma apontar entre as duas está no caráter preventivo da polícia
administrativa e no repressivo da polícia judiciária.
A primeira terá por objetivo impedir as ações antissociais, e a segunda, punir os infratores da lei penal. A diferença
não é, no entanto, absoluta, pois a polícia administrativa tanto pode agir preventivamente (como, por exemplo,
proibindo o porte de arma ou a direção de veículos automotores), como pode agir repressivamente (a exemplo
do que ocorre quando apreende a arma usada indevidamente ou a licença do motorista infrator).
No entanto, pode-se dizer que, nas duas hipóteses, ela está tentando impedir que o comportamento individual
cause prejuízos maiores à coletividade; nesse sentido, é certo dizer que a polícia administrativa é preventiva.
Mas, ainda assim, falta precisão ao critério, porque também se pode dizer que a polícia judiciária, embora seja
repressiva em relação ao indivíduo infrator da lei penal, é também preventiva em relação ao interesse geral,
porque, punindo-o, tenta evitar que o indivíduo volte a incidir na mesma infração. Conforme Álvaro Lazzarini, a
linha de diferenciação está na ocorrência ou não de ilícito penal.
Com efeito, quando atua na área do ilícito puramente administrativo (preventiva ou repressivamente), a polícia é
administrativa. Quando o ilícito penal é praticado, é a polícia judiciária que age. A primeira se rege pelo Direito
Administrativo, incidindo sobre bens, direitos ou atividades; a segunda, pelo direito processual penal, incidindo
sobre pessoas. Outra diferença: a polícia judiciária é privativa de corporações especializadas (polícia civil e
militar), enquanto a polícia administrativa se reparte entre diversos órgãos da Administração, incluindo, além da
própria polícia militar, os vários órgãos de fiscalização aos quais a lei atribua esse mister, como os que atuam nas
áreas da saúde, educação, trabalho, previdência e assistência social.

MEIOS DE ATUAÇÃO

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Considerando o poder de polícia em sentido amplo, de modo que abranja as atividades do Legislativo e do
Executivo, os meios de que se utiliza o Estado para o seu exercício são:
1. atos normativos em geral, a saber: pela lei, criam-se as limitações administrativas ao exercício dos direitos e
das atividades individuais, estabelecendo-se normas gerais e abstratas dirigidas indistintamente às pessoas que
estejam em idêntica situação; também por meio de lei são definidas as infrações administrativas e respectivas
sanções, bem como as medidas preventivas e repressivas cabíveis; trata-se de exigência que decorre do princípio
da legalidade, previsto no artigo 37, caput, da Constituição e do seu artigo 5º, inciso II, pelo qual ninguém é
obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; disciplinando a aplicação da lei aos casos
concretos, pode o Executivo baixar decretos, resoluções, portarias, instruções;
2. atos administrativos e operações materiais de aplicação da lei ao caso concreto, compreendendo medidas
preventivas (fiscalização, vistoria, ordem, notificação, autorização, licença), com o objetivo de adequar o
comportamento individual à lei, e medidas repressivas (dissolução de reunião, interdição de atividade, apreensão
de mercadorias deterioradas, internação de pessoa com doença contagiosa), com a finalidade de coagir o infrator
a cumprir a lei.

CARACTERÍSTICAS

Costuma-se apontar como atributos do poder de polícia a discricionariedade, a autoexecutoriedade e a


coercibilidade, além do fato de corresponder a uma atividade negativa. Pode-se atualmente acrescentar outra
característica, que é a indelegabilidade do poder polícia a pessoas jurídicas de direito privado.
Quanto à discricionariedade, embora esteja presente na maior parte das medidas de polícia, nem sempre isso
ocorre. Às vezes, a lei deixa certa margem de liberdade de apreciação quanto a determinados elementos, como
o motivo ou o objeto, mesmo porque ao legislador não é dado prever todas as hipóteses possíveis a exigir a
atuação de polícia. Assim, em grande parte dos casos concretos, a Administração terá que decidir qual o melhor
momento de agir, qual o meio de ação mais adequado, qual a sanção cabível diante das previstas na norma legal.
Em tais circunstâncias, o poder de polícia será discricionário. Em outras hipóteses, a lei já estabelece que, diante
de determinados requisitos, a Administração terá que adotar solução previamente estabelecida, sem qualquer
possibilidade de opção. Nesse caso, o poder será vinculado. O exemplo mais comum do ato de polícia vinculado
é o da licença. Para o exercício de atividades ou para a prática de atos sujeitos ao poder de polícia do Estado, a
lei exige alvará de licença ou de autorização. No primeiro caso, o ato é vinculado, porque a lei prevê os requisitos
diante dos quais a Administração é obrigada a conceder o alvará; é o que ocorre na licença para dirigir veículos
automotores, para exercer determinadas profissões, para construir. No segundo caso, o ato é discricionário,
porque a lei consente que a Administração aprecie a situação concreta e decida se deve ou não conceder a
autorização, diante do interesse público em jogo; é o que ocorre com a autorização para porte de arma, com a
autorização para circulação de veículos com peso ou altura excessivos, com a autorização para produção ou
distribuição de material bélico.
Essa é uma distinção feita pela doutrina; no entanto, nem sempre os vocábulos licença e autorização são utilizados
no direito positivo com essas características de vinculação, para o primeiro, e discricionariedade, para o segundo;
ao intérprete cabe verificar os termos da norma legal para concluir sobre o sentido em que o vocábulo foi
utilizado. Diante disso, pode-se dizer que o poder de polícia tanto pode ser discricionário (e assim é na maior
parte dos casos), como vinculado.
A autoexecutoriedade (que os franceses chamam de executoriedade apenas) é a possibilidade que tem a
Administração de, com os próprios meios, pôr em execução as suas decisões, sem precisar recorrer previamente
ao Poder Judiciário. Alguns autores desdobram o princípio em dois: a exigibilidade (privilège du préalable) e a
executoriedade (privilège d’action d’office).
O privilège du préalable resulta da possibilidade que tem a Administração de tomar decisões executórias, ou seja,
decisões que dispensam a Administração de dirigir-se preliminarmente ao juiz para impor a obrigação ao
administrado. A decisão administrativa impõe-se ao particular ainda contra a sua concordância; se este quiser se
opor, terá que ir a juízo.
O privilège d’action d’office consiste na faculdade que tem a Administração, quando já tomou decisão executória,
de realizar diretamente a execução forçada, usando, se for o caso, da força pública para obrigar o administrado a
cumprir a decisão. Pelo atributo da exigibilidade, a Administração se vale de meios indiretos de coação. Cite-se,

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como exemplo, a multa; ou a impossibilidade de licenciamento do veículo enquanto não pagas as multas de
trânsito.
Pelo atributo da autoexecutoriedade, a Administração compele materialmente o administrado, usando meios
diretos de coação. Por exemplo, ela dissolve uma reunião, apreende mercadorias, interdita uma fábrica. A
autoexecutoriedade não existe em todas as medidas de polícia. Para que a Administração possa se utilizar dessa
faculdade, é necessário que a lei a autorize expressamente, ou que se trate de medida urgente, sem a qual
poderá ser ocasionado prejuízo maior para o interesse público.
No primeiro caso, a medida deve ser adotada em consonância com o procedimento legal, assegurando-se ao
interessado o direito de defesa, previsto expressamente no artigo 5º, inciso LV, da Constituição. No segundo caso,
a própria urgência da medida dispensa a observância de procedimento especial, o que não autoriza a
Administração a agir arbitrariamente ou a exceder-se no emprego da força, sob pena de responder civilmente o
Estado pelos danos causados (cf. art. 37, § 6º, da Constituição), sem prejuízo da responsabilidade criminal, civil e
administrativa dos servidores envolvidos.
Em resumo, pode-se dizer que a exigibilidade está presente em todas as medidas de polícia, mas não a
executoriedade (privilège d’action d’office).
A coercibilidade é indissociável da autoexecutoriedade. O ato de polícia só é autoexecutório porque dotado de
força coercitiva. Aliás, a autoexecutoriedade, tal como a conceituamos, não se distingue da coercibilidade,
definida por Hely Lopes Meirelles como “a imposição coativa das medidas adotadas pela Administração”.
Outro atributo que alguns autores apontam para o poder de polícia é o fato de ser uma atividade negativa,
distinguindo-se, sob esse aspecto, do serviço público, que seria uma atividade positiva. Neste, a Administração
Pública exerce, ela mesma, uma atividade material que vai trazer um benefício, uma utilidade, aos cidadãos: por
exemplo, ela executa os serviços de energia elétrica, de distribuição de água e gás, de transportes etc.; na
atividade de polícia, a Administração apenas impede a prática, pelos particulares, de determinados atos
contrários ao interesse público; ela impõe limites à conduta individual. O critério é útil apenas na medida em
que demonstra a diferença entre poder de polícia e serviço público. Mas tem-se que levar em conta que, ao se
qualificar o serviço público como atividade positiva, está-se considerando a posição da Administração: ela
desenvolve uma atividade que vai trazer um acréscimo aos indivíduos, isoladamente ou em conjunto; no poder
de polícia, o aspecto negativo diz respeito ao particular frente à Administração: ele sofrerá um limite em sua
liberdade de atuação, imposto pela Administração.
Ensina Celso Antônio Bandeira de Mello que o poder de polícia é atividade negativa no sentido de que sempre
impõe uma abstenção ao particular, uma obrigação de não fazer. Mesmo quando o poder de polícia impõe,
aparentemente, uma obrigação de fazer, como exibir planta para licenciamento de construção, fazer exame de
habilitação para motorista, colocar equipamento contra incêndio nos prédios, “o poder público não quer estes
atos. Quer, sim, evitar que as atividades ou situações pretendidas pelos particulares sejam efetuadas de maneira
perigosa ou nociva, o que ocorreria se realizadas fora destas condições”.
Por outras palavras, mesmo quando se exige prática de um ato pelo particular, o objetivo é sempre uma
abstenção: evitar um dano oriundo do mau exercício do direito individual.
Há que se lembrar, porém, que alguns autores consideram como inseridas no poder de polícia as obrigações de
fazer impostas ao proprietário, compelindo-o a usar o imóvel de acordo com sua função social. Nesse caso, não
se pode falar que o objetivo do poder de polícia seja uma abstenção, uma atividade negativa.
Quanto à indelegabilidade do exercício do poder de polícia a pessoas jurídicas de direito privado, essa
característica tem sido reconhecida pela jurisprudência, inclusive do Supremo Tribunal Federal, com base no
argumento de que, em se tratando de atividade típica do Estado, só pode ser por este exercida. Com efeito, o
poder de polícia envolve o exercício de prerrogativas próprias do poder público, especialmente a repressão,
insuscetíveis de serem exercidas por um particular sobre outro. Os atributos, já apontados, da
autoexecutoriedade e coercibilidade (inclusive com emprego de meios diretos de coação) só podem ser atribuídos
a quem esteja legalmente investido em cargos públicos, cercados de garantias que protegem o exercício das
funções públicas típicas do Estado.
Não se pode deixar de mencionar, no entanto, a existência de entendimento favorável à delegação de atividades
de polícia exclusivamente materiais, desde que não envolvam o exercício de autoridade por um particular sobre
outro cidadão. Seria o caso, por exemplo, da instalação de infraestrutura necessária para o exercício do poder de
polícia, a colocação de sinalizações, a pura fiscalização (sem aplicação de sanções). Tal entendimento, que serve

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para justificar situações concretas já verificadas na prática administrativa, deve ser aceito com cautela, tendo em
vista a dificuldade de distinguir a mera execução material do efetivo ato de polícia, privativo do poder público.
Jurisprudência: A jurisprudência do STF divide o poder de polícia em quatro atividades: legislação;
consentimento; fiscalização; e sanção. A jurisprudência do STF entende delegáveis aos particulares as atividades
de fiscalização e consentimento. As atividades de legislação e sanção são de exclusividade do poder público eis
que pautados na sua supremacia. O poder de polícia é exercido por meio da polícia administrativa que não se
confunde com a segurança pública exercido pela polícia judiciária. A polícia administrativa pode ser exercida por
qualquer órgão de fiscalização. Assim, não há óbice ao Município para que, dentro da competência comum
estabelecida pelo Código de Trânsito Brasileiro, crie órgão especializado no exercício de atividade de polícia
administrativa (guarda municipal) para a fiscalização e sanção decorrentes de infrações de trânsito.

II. Poder de polícia e direitos fundamentais

Como todo ato administrativo, a medida de polícia, ainda que seja discricionária, sempre esbarra em algumas
limitações impostas pela lei, quanto à competência e à forma, aos fins e mesmo com relação aos motivos ou ao
objeto; quanto aos dois últimos, ainda que a Administração disponha de certa dose de discricionariedade, esta
deve ser exercida nos limites traçados pela lei.
Quanto aos fins, o poder de polícia só deve ser exercido para atender ao interesse público. Se o seu fundamento
é precisamente o princípio da predominância do interesse público sobre o particular, o exercício desse poder
perderá a sua justificativa quando utilizado para beneficiar ou prejudicar pessoas determinadas; a autoridade que
se afastar da finalidade pública incidirá em desvio de poder e acarretará a nulidade do ato com todas as
consequências nas esferas civil, penal e administrativa. A competência e o procedimento devem observar
também as normas legais pertinentes. Quanto ao objeto, ou seja, quanto ao meio de ação, a autoridade sofre
limitações, mesmo quando a lei lhe dê várias alternativas possíveis.
Tem aqui aplicação um princípio de direito administrativo, a saber, o da proporcionalidade dos meios aos fins;
isto equivale a dizer que o poder de polícia não deve ir além do necessário para a satisfação do interesse público
que visa proteger; a sua finalidade não é destruir os direitos individuais, mas, ao contrário, assegurar o seu
exercício, condicionando-o ao bem-estar social; só poderá reduzi-los quando em conflito com interesses
maiores da coletividade e na medida estritamente necessária à consecução dos fins estatais. Na aplicação das
sanções de polícia, a Lei no 9.873, de 23-11-99, alterada pela Lei no 11.941, de 27-5-09, estabelece o prazo de
prescrição de cinco anos, passível de interrupção e suspensão nos casos expressamente previstos. Essa lei
somente se aplica à esfera federal.
Alguns autores indicam regras a serem observadas pela polícia administrativa, com o fim de não eliminar os
direitos individuais: a da necessidade, em consonância com a qual a medida de polícia só deve ser adotada para
evitar ameaças reais ou prováveis de perturbações ao interesse público; a da proporcionalidade, que significa a
exigência de uma relação necessária entre a limitação ao direito individual e o prejuízo a ser evitado; a da eficácia,
no sentido de que a medida deve ser adequada para impedir o dano ao interesse público.
Por isso mesmo, os meios diretos de coação só devem ser utilizados quando não haja outro meio eficaz para
alcançar-se o mesmo objetivo, não sendo válidos quando desproporcionais ou excessivos em relação ao interesse
tutelado pela lei.

13A. Poder Regulamentar. Espécies de Regulamento. Controle sobre a atividade regulamentar.

Atualizado por Felipe Fróes, em 12/09/2018


FONTES: Material do grupo MPF LEVADO À SÉRIO; Santo Graal 28CPR. ALEXANDRINO, Marcelo.
Direito Administrativo descomplicado (25 ed, 2017).

A Constituição consagrou o princípio da legalidade, mas reconheceu a competência normativa do


Executivo (competência reservada ao Executivo para produzir normas jurídicas). Assim, regulamento é ato
administrativo destinado a veicular normas gerais e abstratas, disciplinando a atividade futura da Administração
Pública e, eventualmente, de particulares. O poder regulamentar constitui-se em uma das formas mediante a qual
a Administração expressa sua função normativa. Consiste na atribuição dos chefes dos Poderes Executivos dos

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entes políticos mediante a qual são editadas normas complementares à lei, para sua fiel execução. O exercício do
poder regulamentar, em regra, se materializa na edição de decretos e regulamentos destinados a dar fiel execução
às leis. São denominados decretos de execução ou decretos regulamentares. Essa competência está prevista no
art. 84, inciso IV, da CF para o Presidente da República, que se aplica aos Estados, DF, e Municípios pelo princípio
da simetria.
A classificação tradicional reconhece a existência de duas espécies de regulamentos: os de execução e os
regulamentos autônomos. O primeiro encontra amparo no mencionado art. 84, IV, da CF (edição de normas para
fiel execução da lei), não autorizando a edição de normas contra legem ou ultra legem: refere-se unicamente à
forma como a lei será cumprida. O regulamento autônomo, por seu turno, é aquele que inova na ordem jurídica,
de modo que as matérias nele disciplinadas não encontram previsão em lei prévia.
Os regulamentos de execução pressupõem a existência de uma lei, cujas normas são objeto de sua
explicitação e desenvolvimento. O regulamento de execução busca explicitar e facilitar a aplicação de normas
contidas em uma lei. O seu fundamento de validade imediato é a norma legal. São atos inferiores à lei, devendo
respeitá-la. Não é possível a delegação de decretos ou regulamentos autônomos (CF, art. 84, parágrafo único).
Conforme jurisprudência do STJ: Compete ao STJ, em recurso especial, apreciar questão relativa a decreto que, a
pretexto de regulamentar determinada lei, supostamente extrapola o âmbito de incidência da norma. Conforme
já decidido pelo STF, o tema se situa no plano da legalidade, não da constitucionalidade.
Os regulamentos autônomos são aqueles desvinculados de uma lei, encontrando o seu fundamento de
validade diretamente na Constituição. Por meio do regulamento autônomo, são criados direitos e obrigações sem
prévia existência de lei. O regulamento autônomo somente é admitido no direito brasileiro nas hipóteses previstas
no art. 84, VI, a, da CF/88, na redação dada pela EC nº 32/2001: a) para organizar a estrutura administrativa
federal, desde que não implique aumento de despesa ou criação ou extinção de órgão público; b) extinguir cargo,
quando vagos. Portanto, a CF/88 expressamente prevê a possibilidade de serem editados decretos como atos
primários, isto é, atos que decorrem diretamente do texto constitucional, decretos que não foram expedidos em
função de alguma lei ou de algum outro ato infraconstitucional, podendo ser objeto de controle de
constitucionalidade (ADI 3664, 20/09/2011).
Além do decreto regulamentar, o poder normativo da Administração expressa-se por meio de
resoluções, portarias, deliberações e instruções editadas por autoridades por outras autoridades diversas do
chefe do Executivo. Acresça-se a este rol os regimentos, que são as normas estabelecidas pelos órgãos colegiados
para disciplinar seu funcionamento. Todos estes atos estabelecem normas cujo alcance limita-se ao âmbito de
atuação de seu órgão expedidor. As Agências Reguladoras têm poder normativo (Poder Normativo de
Conjuntura). Dada a dinâmica das relações reguladas, não seria viável que tais matérias ficassem sujeitas ao
moroso processo legislativo (vide ponto 14.a).
O controle da atividade regulamentar, em caso de exorbitância (ofensa ao princípio da legalidade) ou
omissão, será exercitado pelo Congresso Nacional (art. 49, V, CF – sustação de atos que exorbitem poder
regulamentar) e STF (ADI contra decreto autônomo sucedâneo de lei). Quanto à omissão, é cabível mandado de
injunção ou ADI por omissão, caso a ausência da norma regulamentadora torne inviável ao exercício dos direitos
e liberdades constitucionais e prerrogativas inerentes à nacionalidade, soberania e cidadania (art. 5º, LXXI, CF).
O controle judicial dos atos administrativos regulamentares dá-se de duas formas: a) quando o ato
regulamentar esteja em conflito com a lei que ele regulamenta, será viável apenas o controle de legalidade –
assim, se o ato administrativo extrapolou os limites da lei ou a contrariou, trata-se de questão de afronta à
legalidade e não de inconstitucionalidade. Não se admite ADI nesse caso; b) caso o ato regulamentar (decreto
autônomo) esteja em confronto diretamente com a CF, poderá ser objeto de Ação Direta.
O STF declarou constitucional ato normativo do CNJ que proibiu o nepotismo no Poder Judiciário. Na
ADC N. 12, o tribunal reconheceu que o “ato normativo que se faz de objeto desta ação declaratória densifica
apropriadamente os quatro citados princípios do art. 37 da Constituição Federal, razão por que não há antinomia
de conteúdos na comparação dos comandos que se veiculam pelos dois modelos normativos: o constitucional e
o infraconstitucional. Logo, o Conselho Nacional de Justiça fez adequado uso da competência que lhe conferiu a
Carta de Outubro, após a Emenda 45/04”.

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3. ATOS ADMINISTRATIVOS
3.1 Fatos da Administração Pública: atos da Administração Pública e fatos administrativos. Elementos e atributos
do ato administrativo. (17.a)
3.2 Classificação dos atos administrativos A responsabilização por atos lesivos à administração pública nacional e
estrangeira de acordo com a Lei nº 12.846/2013. (2.b)
3.3 Vinculação e discricionariedade. Atos administrativos vinculados e discricionários. O mérito do ato
administrativo. (9.a)
3.4 Validade, vigê ncia e eficácia do ato administrativo. Auto-executoriedade do ato administrativo. (21.b)
3.5 Vi ́cios ou defeitos dos atos administrativos. A teoria das nulidades no Direito Administrativo. Atos
administrativos nulos, anuláveis e inexistentes. (3.b)
3.6 Revogação, anulação, cassação e convalidação do ato administrativo. (5.b)
3.7 Teoria dos motivos determinantes. Acordo de leniê ncia da Lei nº 12.846/2013. (4.b)

17A. Fatos da Administração Pública: atos da Administração Pública e fatos administrativos. Elementos e atributos
do ato administrativo.

Paulo Henrique Cardozo, setembro de 2018.


Fontes: CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 31. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 201 7; CARVALHO, Matheus.
Manual de Direito Administrativo. 4ª ed. rev. ampl. e atual. Salvador: Ed. Juspodivm, 2017.

Atos da Administração Pública. A expressão atos da Administração traduz sentido amplo e indica todo e qualquer
ato que se origine dos órgãos que compõem o sistema administrativo de qualquer dos Poderes,
independentemente da natureza do ato. O critério identificativo, portanto, reside na origem da manifestação de
vontade. Assim, estão abarcados pelo conceito atos administrativos, atos privados da administração (ex.: contrato
de locação), atos materiais (fatos administrativos). Matheus Carvalho menciona, também, atos políticos ou de
governo; para Carvalho Filho, contudo, esses estariam fora dos atos da Administração. Obs.: para Matheus
Carvalho, nem todo ato administrativo seria ato da Administração propriamente dito, pois é possível a prática de
atos administrativos por particulares em delegação.

Fatos administrativos. A noção de fato administrativo não guarda relação com a de fato jurídico. Fato jurídico é o
fato capaz de produzir efeitos na ordem jurídica, de modo que dele se originem e extingam direitos. Já o fato
administrativo tem o sentido de atividade material no exercício da função administrativa, que visa a efeitos de
ordem prática para a Administração (ex.: apreensão de mercadoria, dispersão de manifestantes); não se leva em
consideração, portanto, a produção de efeitos jurídicos. Assim, a noção de fato administrativo é mais ampla que
a de fato jurídico. O fato administrativo nem sempre se consuma em virtude de algum ato administrativo,
podendo decorrer, por exemplo, de fenômenos naturais, como um raio que destrói bem público. Os fatos
administrativos podem ser voluntários e naturais. Os voluntários materializam-se por atos administrativos, que
formalizam a providência desejada por meio da manifestação da vontade; ou por condutas administrativas, que
refletem os comportamentos e as ações administrativas, precedidas ou não de ato administrativo formal. Já os
fatos administrativos naturais originam-se em fenômenos da natureza, cujos efeitos refletem na órbita
administrativa.

Atos administrativos. Os atos administrativos são espécie de atos jurídicos. Embora não haja unanimidade na
doutrina, para Carvalho Filho, ato administrativo é a exteriorização da vontade de agentes da Administração
Pública ou de seus delegatários, nessa condição, que, sob regime de direito público, vise à produção de efeitos
jurídicos, com o fim de atender ao interesse público. Dentro de tais balizas, não estão abrangidos no conceito de
ato administrativo os atos privados da Administração e os fatos administrativos não produtores de eficácia
jurídica, meros atos materiais. Para que haja um ato administrativo, é necessário que o sujeito da manifestação
de vontade esteja de alguma forma vinculado à Administração Pública e exerça, no âmbito de sua competência,
função administrativa (excluem-se, pois, os magistrados e os parlamentares no exercício de suas funções
jurisdicional e legislativa, respectivamente). No tocante aos agentes delegatários, o ato deve ser praticado no
exercício da função delegada. Ademais, o ato estar sob o regime de direito público significa dizer que há regras e

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princípios jurídicos específicos para os atos administrativos que não incidem sobre os atos privados, pois aqueles
se qualificam como atos de Poder.
O silêncio administrativo, para Carvalho Filho, não revela a prática de ato administrativo, pois não há manifestação
formal da vontade. Há apenas um fato jurídico administrativo, que deve produzir efeitos na ordem jurídica. Para
o doutrinador, é preciso distinguir a hipótese em que a lei aponta a consequência da omissão daquela em que
não há referência ao efeito. No primeiro caso, a lei pode indicar que o silêncio importa anuência tácita ou
manifestação denegatória. Caso a lei seja omissa sobre a consequência do silêncio, o interessado faz jus a uma
definição por parte da Administração, valendo-se do direito de petição (art. 5º, XXXIV, da CRFB/88). Assim, não
havendo êxito na obtenção de uma manifestação na via administrativa, poderá recorrer à via judicial, deduzindo
pedido de natureza mandamental. Para pequena parte da doutrina, o juiz poderia suprir a própria ausência de
manifestação; Carvalho Filho, por outro lado, entende que só pode o Judiciário determinar que a Administração
se manifeste.

Elementos do ato administrativo. Classicamente, são 5 os elementos do ato administrativo: competência, objeto,
forma, motivo e finalidade (art. 2º da Lei n. 4.717/65):

a) Competência – é o círculo definido por lei dentro do qual podem os agentes exercer legitimamente sua
atividade. Além da capacidade, de que é dotado o Estado, há a necessidade de que o sujeito atue dentro da esfera
que a lei traçou. De regra, a lei é a fonte da competência administrativa, encontrando-se nela os limites e a
dimensão das atribuições de pessoas administrativas, órgãos e agentes públicos. No entanto, a competência pode
estar na própria Constituição ou derivar de normas expressas de atos administrativos de organização (editados
por órgãos cuja competência, por sua vez, decorre de lei). A definição da competência decorre de critérios
relacionados à matéria, à hierarquia, ao lugar e ao tempo. A competência é imprescritível (não se extingue pela
inércia), improrrogável (não é atribuída ao agente que pratica o ato sem atribuição para tanto) e irrenunciável.
Em alguns casos, pode a norma autorizar a transferência de um agente a outro, geralmente de plano hierárquico
inferior, das competências àquele atribuídas. É a delegação de competência, cuja ocorrência depende de
autorização por norma expressa. A lei pode estabelecer funções indelegáveis (ex.: art. 13 da Lei n. 9.784/99, que
proíbe a delegação da edição de atos de caráter normativo, da decisão de recursos administrativos e das matérias
de competência exclusiva do órgão ou autoridade). A delegação não retira a competência da autoridade
delegante, que continua cumulativamente competente. O art. 93, XIV, da CRFB/88, passou a admitir que
servidores do Judiciário recebam delegação para a prática de atos de mero expediente sem caráter decisório. O
art. 84, § único, da CRFB/88, permite ao Presidente da República delegar a Ministros de Estado, ao AGU e ao PGR
algumas atribuições, como as do inciso VI, que envolvem decretos. Se a autoridade hierarquicamente superior
atrair pra si a prática de ato da competência natural de agente de hierarquia menor, ocorre a avocação. O art.
103-B, § 4º, III, admite que o CNJ avoque processos disciplinares em curso, instaurados contra membros ou órgãos
do Poder Judiciário. Tanto a delegação como a avocação devem ser consideradas figuras temporárias e
excepcionais.

b) Objeto – também denominado por alguns autores de conteúdo, o objeto consiste na alteração no
mundo jurídico que o ato administrativo se propõe a processar. É o objetivo imediato da vontade exteriorizada
pelo ato. Para que o ato seja válido, o objeto deve ser lícito, possível e determinado ou determinável. Quanto se
tratar de atividade vinculada, o agente deve limitar-se a fixar como objeto deste o estabelecido pela lei (objeto
vinculado). Em algumas hipóteses, é permitido ao agente traças linhas que limitam o conteúdo do ato, mediante
a avaliação dos elementos que constituem critérios administrativos (objeto discricionário).

c) Forma – a forma é o meio pelo qual se exterioriza a vontade. Para Carvalho Filho, o ato sem forma
sequer existe. Para que a forma seja válida, deve compatibilizar-se com o que expressamente dispõe a lei ou o
ato equivalente com força jurídica. No direito público, a regra é a solenidade das formas, devendo o ato ser escrito,
registrado e publicado. Em situações singulares, a vontade administrativa pode materializar-se por gestos
(guardas de trânsito), palavras (atos de polícia de segurança pública) ou sinais (placas de trânsito). Se a lei
estabelece determinada forma para o ato, não pode o administrador deixar de observá-la, sob pena de vício de

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legalidade. Não obstante, a análise da adequação da forma à lei exige razoabilidade pelo intérprete, podendo
haver mera irregularidade sanável.

d) Motivo – o motivo é a situação de fato ou de direito que gera a vontade do agente quando pratica o
ato administrativo. Motivo de direito é a situação de fato eleita pela norma legal como ensejadora da vontade
administrativa. Motivo de fato é a própria situação de fato ocorrida no mundo, sem descrição na norma. Se a
situação de fato está delineada na norma, ao agente incumbe praticar o ato tão logo ela seja configurada,
caracterizando ato vinculado. Se a lei não delineia a situação fática, transferindo ao agente a verificação de sua
ocorrência atendendo a critérios de caráter administrativo (conveniência e oportunidade), havendo maior
liberdade de atuação, dá-se a prática de ato discricionário. Sem motivo, o ato é nulo. Segundo Matheus Carvalho,
não se deve confundir motivo e móvel para a prática do ato administrativo: enquanto o motivo é a situação
prevista em lei que ocorre, de fato, justificando a prática do ato, o móvel é a real intenção do agente público
quando pratica a conduta estatal.

Não se deve confundir o motivo, ainda, com a motivação. A motivação é a justificativa do pronunciamento
tomado, que revela de modo expresso e textual todas as situações de fato que levaram o agente à manifestação
da vontade. A motivação pode situa-se no bojo do próprio ato (contextual) ou em local ou instrumento diverso
(aliunde). Diverge a doutrina acerca da obrigatoriedade ou não de motivação dos atos administrativos. Para a
corrente majoritária, é sempre obrigatória; para outros, a obrigatoriedade existe apenas nos atos vinculados.
Carvalho Filho entende que, como nos atos discricionários pode haver algum subjetivismo, mais necessária é a
motivação nesses, conferindo transparência ao ato e permitindo seu controle. De acordo com a Lei n. 9.784/99
(art. 50), no âmbito do processo administrativo federal, exigem motivação os aos que neguem, limitem ou afetem
direitos ou interesses (previsão extremamente ampla); imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções;
decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública; dispensem ou declarem a inexigibilidade de
processo licitatório; decidam recursos administrativos; decorram de reexame de ofício; deixem de aplicar
jurisprudência firmada sobre a questão ou discrepem de pareceres, laudos, propostas e relatórios oficiais;
importem anulação, revogação, suspensão ou convalidação de ato administrativo. Registre-se, por fim, que,
quando a motivação for obrigatória, sua ausência implicará vício de forma.

Teoria dos motivos determinantes. Essa teoria baseia-se no princípio de que o motivo do ato
administrativo deve sempre guardar compatibilidade com a situação de fato que gerou a manifestação da
vontade. A teoria tem aplicação mais importante aos atos discricionários. Assim, mesmo que um ato seja
discricionário e não exija expressa motivação, se esta existir, passa a vincular o agente a seus termos. Nesse caso,
se o interessado comprovar que inexiste a realidade fática mencionada no ato como determinante da vontade,
haverá vício de legalidade no ato (ex.: o agente nega férias ao servidor, por falta de pessoal; comprovado o excesso
de pessoal pelo interessado, o ato estará viciado em seu motivo).

e) Finalidade – é o elemento pelo qual todo ato administrativo deve estar dirigido ao interesse público. O
desrespeito a esse constitui abuso de poder, sob a forma de desvio de finalidade. Ex.: se o Estado desapropria
imóvel de desafeto do Chefe do Executivo, com o fim predeterminado de prejudicá-lo. Quando a lei define a
competência do agente, a ela vincula a finalidade a ser perseguida. Para alguns autores, o vício de finalidade é
objetivo, consistindo no distanciamento entre o exercício da competência e a finalidade legal; para Carvalho Filho,
o desvio pressupõe o animus. Segundo Matheus Carvalho, todo ato possui uma finalidade genérica (atender ao
interesse público) e uma específica. Obs.: enquanto o objeto é o fim imediato, ou seja, o resultado prático a ser
alcançado, a finalidade é o fim mediato, o interesse coletivo que o administrador deve buscar.

Atributos do ato administrativo. Segundo Carvalho Filho, são 3 os principais atributos: imperatividade, presunção
de legitimidade e autoexecutoriedade. Matheus Carvalho, por sua vez, elenca 6 atributos, a seguir expostos:
presunção de veracidade, presunção de legitimidade, imperatividade, coercibilidade e autoexecutoriedade.

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1) Presunção de veracidade – presente em todos os atos administrativos, significa que, até prova em
contrário (presunção juris tantum), o ato administrativo estampa uma situação fática real, presumindo-se
verdadeiros os fatos nele apresentados. Ocasiona a inversão do ônus da prova.

2) Presunção de legitimidade – até prova em contrário (presunção juris tantum), o ato foi editado em
conformidade com a lei e com o ordenamento jurídico.

3) Imperatividade – todo ato administrativo que cria obrigação ao particular encerra um poder dado à
administração pública de, unilateralmente e dentro dos limites da lei, estabelecer essa obrigação
independentemente da vontade do particular. Está presente apenas nos atos que dispõem sobre obrigações e
deveres, não sendo imperativos os que definem direitos e vantagens.

4) Coercibilidade – não sendo cumprida a obrigação imposta pelo ato, o poder público terá que, valendo-
se de meios indiretos de coerção, executar indiretamente o ato desrespeitado. Ex.: aplicação de multa para
cumprir a obrigação de respeito à proibição de estacionar em determinado local.

5) Executoriedade ou autoexecutoriedade – em situações pontuais, a aplicação de meios indiretos de


coerção não atende ao interesse público, sendo necessária a adoção de meios diretos de execução dos atos
administrativos. Não é preciso recorrer ao Judiciário. Ex.: guinchar carro estacionado em local proibido, demolir
obra que apresenta risco de desabamento. A diferença em relação à coercibilidade é que, na executoriedade, o
ente público pratica o ato que seria obrigação do particular. Esse atributo não está presente em todos os atos
administrativos, dependendo sempre de previsão legal ou situação de urgência. Obs.: Alguns autores denominam
de autoexecutoriedade o poder de que a Administração Pública dispõe para fazer cumprir suas determinações,
de forma indireta ou direta, abrangendo, assim, a coercibilidade e a executoriedade, respectivamente.

6) Tipicidade – atributo criado por Di Pietro. Significa a exigência de que todo ato administrativo esteja
previsto em lei, ou seja, corresponda a figuras previamente definidas pela lei. Trata-se de característica que
decorre do princípio da legalidade.

2B. Classificação dos Atos Administrativos. A Responsabilização por Atos Lesivos à Administração Pública Nacional
e Estrangeira de Acordo com a Lei nº 12.846/2013.

Renata Souza
Materiais consultados: Graal do 28º CPR; DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 30. ed. rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2017;
Aulas de Matheus Carvalho do curso Carreira Jurídica 2015 – CERS.

I. Classificação dos Atos Administrativos

1. Classificação pelo Critério da Intervenção da Vontade Administrativa:

a) Atos Simples: emanam da vontade de um só órgão ou agente.

b) Atos Complexos: segundo CARVALHO FILHO, “são aqueles cuja vontade final da Administração exige a
intervenção de agentes ou órgãos diversos, havendo certa autonomia, ou conteúdo próprio, em cada uma das
manifestações. Exemplo: a investidura do Ministro do STF se inicia pela escolha do Presidente da República; passa,
após, pela aferição do Senado Federal; e culmina com a nomeação (art. 101, parágrafo único, CF)”. Nesse caso, os
órgãos concorrem para a formação de um único ato, sendo outro exemplo a aposentadoria dos servidores
públicos, que depende de manifestação da entidade administrativa e do tribunal de contas.

Obs.: Súmula Vinculante nº 03: “Nos processos perante o Tribunal de Contas da União asseguram-se o
contraditório e a ampla defesa quando da decisã o puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo
que beneficie o interessado, excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria,

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reforma e pensã o”. Explicação: sendo o ato de aposentadoria um ato complexo, ele apenas se perfectibiliza com
a manifestação do Tribunal de Contas. Por isso, o prazo decadencial referido na Lei 9.487/99, o qual apenas
começa a fluir com a publicação dessa manifestação (STF, MS 25.552, Tribunal Pleno, 2008). Registre-se que, em
homenagem ao princi ́pio da segurança juri ́dica, o STF fixou o entendimento de que o TCU deverá assegurar a
ampla defesa e o contraditório nos casos de controle externo de legalidade para o registro de aposentadorias e
pensõ es, quando for ultrapassado o peri ́odo de cinco anos da chegada do processo administrativo no TCU sem
que haja a sua manifestação (STF, MS 24.781, Tribunal Pleno, 2011). Cabe pontuar também que, “tratando-se, na
impetração, de ato complexo, já aperfeiçoado, tem- se, como autoridade coatora, aquela que atuou na última
etapa, formalizando-o” (STF, MS 24.872/DF).

c) Atos Compostos: também são formados pela manifestação de dois órgãos, contudo um define o conteúdo do
ato e o outro órgão verifica sua legitimidade - “Enquanto a vontade do primeiro órgão é a responsável pela
elaboração do ato, a manifestação do segundo órgão possui caráter instrumental ou complementar (ex.: parecer
elaborado por agente público que depende do visto da autoridade superior para produzir efeitos)”, consoante
leciona Rafael Carvalho (p. 292, 2015). CARVALHO FILHO: “não se compõ em de vontades autô nomas, embora
múltiplas. Há, na verdade, uma só vontade autô noma, ou seja, de conteúdo próprio. As demais são meramente
instrumentais, porque se limitam à verificação de legitimidade do ato de conteúdo próprio. Exemplo: um ato de
autorização sujeito a outro ato confirmatório, um visto”. Vale salientar que Celso Antônio Bandeira de Mello e
Diógenes Gasparini não fazem referê ncia aos atos compostos.

2. Classificação quanto à Formação:

a) Ato Unilateral: é aquele que se forma com a manifestação de vontade de uma única parte (ex.: demissão de
um funcionário, multas, autorizações, o ato do CSMPF que homologa a vitaliciedade do Procurador da República).
Não afeta a unilateralidade a circunstância de o ato depender, para a sua produção ou para os seus efeitos, do
concurso da vontade do particular, seja solicitando-lhe a prática, seja aceitando os seus efeitos (p. ex.: um pedido
de alvará de licença para edificar ou de autorização para o porte de arma ou de aceitação da outorga de um
prê mio, de uma comenda etc.).

b) Ato Bilateral: é aquele formado por um acordo de vontade entre as partes. São os atos convencionais (ex.:
contrato administrativo, concessão de serviço público);

c) Ato Multilateral: é aquele formado pela manifestação de vontade de várias partes (ex.: convê nio).

3. Classificação pelo Critério dos Destinatários:

a) Atos Individuais (concretos): destinam-se a um ou vários sujeitos determinados. Havendo apenas um


destinatário, trata-se de ato individual único. Sendo dois ou mais destinatários, temos um ato individual plúrimo.
Ex.: decreto que declara a utilidade pública de imóvel para fins de desapropriação).

b) Atos Gerais (normativos): “possuem como destinatários pessoas indeterminadas que se encontram na mesma
situação juri ́dica (ex.: decreto que regulamenta a legislação ambiental)” (Rafael Carvalho, 2015, p. 292).

II. A Responsabilização por Atos Lesivos à Administração Pública Nacional e Estrangeira de Acordo com a Lei nº
12.846/2013

1. Noções Gerais

A Lei nº 12.846/2013 (Lei Anticorrupção) disciplina os ilícitos praticados por pessoas jurídicas contra a
Administração Pública nacional ou estrangeira.

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A referida lei traz uma responsabilização objetiva da pessoa jurídica nos âmbitos administrativo e civil. Os
dirigentes, administradores, bem como qualquer pessoa natural autora, coautora ou partícipe do ato ilícito,
respondem subjetivamente.

As pessoas jurídicas que funcionam como sujeitos ativos do ato lesivo podem ser nacionais ou estrangeiras, sendo
sociedades empresárias, sociedades simples, personificadas ou não, independentemente da forma de
organização ou modelo societário adotado, bem como quaisquer fundações, associações de entidades ou
pessoas, ou sociedades estrangeiras que tenham sede, filial ou representação no território brasileiro, constituídas
de fato ou de direito, ainda que temporariamente. De acordo com Maria Sylvia Zanella Di Pietro, as empresas
estatais que prestam atividade econômica também estão sujeitas à lei, embora esta não preveja isto
expressamente.

Importante destacar que a responsabilidade da pessoa jurídica subsiste mesmo nas hipóteses de alteração
contratual, transformação, incorporação, fusão ou cisão societária. No entanto, nas hipóteses de fusão e
incorporação, a responsabilidade da sucessora será restrita à obrigação de pagamento de multa e reparação
integral do dano causado, até o limite do patrimônio transferido, não lhe sendo aplicáveis as demais sanções
previstas na lei decorrentes de atos e fatos ocorridos antes da data da fusão ou incorporação, exceto no caso de
simulação ou evidente intuito de fraude, devidamente comprovados.

Além disso, as sociedades controladoras, controladas, coligadas ou, no âmbito do respectivo contrato, as
consorciadas serão solidariamente responsáveis pela prática dos atos previstos na Lei nº 12.846/2013,
restringindo-se tal responsabilidade à obrigação de pagamento de multa e reparação integral do dano causado.

No que se refere ao sujeito passivo do ato lesivo, este pode ser a Administração Pública nacional ou estrangeira.
Segundo a lei, consideram-se Administração Pública estrangeira os órgãos e entidades estatais ou representações
diplomáticas de país estrangeiro, de qualquer nível ou esfera de governo, bem como as pessoas jurídicas
controladas, direta ou indiretamente, pelo poder público de país estrangeiro. Para os efeitos da lei, equiparam-se
à Administração Pública estrangeira as organizações públicas internacionais.

Saliente-se que a aplicação das sanções da Lei nº 12.846/2013 não afeta os processos de responsabilização e
aplicação de penalidades decorrentes de ato de improbidade administrativa (Lei nº 8.429/1992) nem de atos
ilícitos alcançados pela Lei nº 8.666/1993 ou outras normas de licitações e contratos da administração pública,
inclusive no tocante ao Regime Diferenciado de Contratações Públicas - RDC instituído pela Lei nº 12.462/2011.

2. Atos Lesivos

O art. 5º, da Lei Anticorrupção, traz os atos lesivos passíveis de sancionamento. As duas hipóteses de
responsabilização (civil e administrativa) são decorrentes da prática das infrações previstas em tal rol.

Art. 5o Constituem atos lesivos à administração pública, nacional ou estrangeira, para os fins desta Lei, todos
aqueles praticados pelas pessoas jurídicas mencionadas no parágrafo único do art. 1 o, que atentem contra o
patrimônio público nacional ou estrangeiro, contra princípios da administração pública ou contra os compromissos
internacionais assumidos pelo Brasil, assim definidos: I - prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente,
vantagem indevida a agente público, ou a terceira pessoa a ele relacionada; II - comprovadamente, financiar,
custear, patrocinar ou de qualquer modo subvencionar a prática dos atos ilícitos previstos nesta Lei; III -
comprovadamente, utilizar-se de interposta pessoa física ou jurídica para ocultar ou dissimular seus reais
interesses ou a identidade dos beneficiários dos atos praticados; IV - no tocante a licitações e contratos: a) frustrar
ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo de procedimento
licitatório público; b) impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório
público; c) afastar ou procurar afastar licitante, por meio de fraude ou oferecimento de vantagem de qualquer
tipo; d) fraudar licitação pública ou contrato dela decorrente; e) criar, de modo fraudulento ou irregular, pessoa
jurídica para participar de licitação pública ou celebrar contrato administrativo; f) obter vantagem ou benefício

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indevido, de modo fraudulento, de modificações ou prorrogações de contratos celebrados com a administração
pública, sem autorização em lei, no ato convocatório da licitação pública ou nos respectivos instrumentos
contratuais; ou g) manipular ou fraudar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos celebrados com a
administração pública; V - dificultar atividade de investigação ou fiscalização de órgãos, entidades ou agentes
públicos, ou intervir em sua atuação, inclusive no âmbito das agências reguladoras e dos órgãos de fiscalização
do sistema financeiro nacional.

3. Responsabilização Administrativa e Processo Administrativo de Responsabilização

A Lei 12.846/13 regulamenta duas sanções a serem aplicadas à pessoa jurídica na esfera administrativa.

Nesta linha, na esfera administrativa, é possível a aplicação da sanção de multa, sendo que essa multa vai ser de
0,1% a 20% do faturamento bruto no último exercício anterior ao da instauração do processo administrativo,
excluídos os tributos.

Contudo, consoante a lei, quando não for possível aferir o faturamento bruto da pessoa jurídica nos moldes
requeridos pela Lei nº 12.846/2013, serão substituídos os valores percentuais por valores fixos e aí, nesse caso, a
sanção de multa vai variar de 6.000 reais a 60 milhões de reais.

Além da multa, a lei prevê a sanção de publicação extraordinária da condenação.

A lei define que compete ao administrador público, fundamentadamente e justificadamente, dentro do livre
convencimento motivado, determinar a aplicação dessas sanções administrativas de multa e publicação
extraordinária da condenação de forma isolada ou cumulativa.

Saliente-se que essas sanções de multa e de publicação extraordinária da condenação não impedem o dever
reparação do dano.

A responsabilidade administrativa depende de um processo administrativo, que é regulamentado pela própria Lei
nº 12.846/2013.

A autoridade máxima de cada órgão ou entidade dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário tem a
competência para instaurar e julgar o processo administrativo, admitindo a lei a possibilidade de delegação e
vedando a subdelegação. A Lei nº 12.846/2013 atribui igual competência à Controladoria-Geral da União, no
âmbito do Poder Executivo, podendo a CGU avocar processos instaurados por outras autoridades, para análise de
sua regularidade ou para corrigir seu andamento.

O processo é conduzido por comissão, composta por dois ou mais servidores estáveis, designada pela autoridade
instauradora. Deve ser concluído no prazo de 180 dias, prorrogável mediante ato fundamentado da autoridade
instauradora. O processo administrativo segue o seguinte trâmite: instauração (fase de competência da
autoridade instauradora), defesa, apresentação de relatório sobre os fatos, com sugestão de responsabilização
da pessoa jurídica e das sanções a serem aplicadas e julgamento (fase de competência da autoridade
instauradora).

Após o julgamento, as sanções administrativas podem ser aplicadas de imediato, sem prejuízo da instauração de
processo administrativo para reparação integral do dano. Concluído o processo e não havendo pagamento, o
crédito apurado será inscrito em dívida ativa da fazenda pública.

A lei regulamenta também a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica todas as vezes que a
pessoa jurídica tiver sido criada como uma forma de fraudar, de abusar do direito. Saliente-se que não é possível
desconsiderar a pessoa jurídica pura e simplesmente pelo ato lesivo à Administração Pública. Para que seja

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possível a desconsideração da personalidade jurídica, é preciso que a pessoa jurídica tenha sido criada com o
propósito de fraudar a lei.

4. Responsabilização Judicial

A Lei 12.846/13 também regulamenta a responsabilização judicial da pessoa jurídica. A responsabilização judicial
é uma responsabilização civil.

Necessariamente, para que haja a responsabilização civil dessa pessoa jurídica, tem que haver uma ação judicial.
A lei prevê a competência da União, Estados, DF e Municípios para, por meio das respectivas Advocacias Públicas
ou órgãos de representação judicial ou equivalente, bem como do Ministério Público, ajuizar tal ação, que seguirá
o rito da Lei nº 7.347/1985 (Lei da Ação Civil Pública).

Além da reparação do dano (que é possível tanto na esfera administrativa, como na esfera civil), a lei regulamenta,
no art. 19, algumas sanções civis que podem ser aplicadas, isolada ou cumulativamente, por meio de decisão
judicial. São elas:

I - perdimento dos bens, direitos ou valores que representem vantagem ou proveito direta ou indiretamente obtidos
da infração, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé;
II - suspensão ou interdição parcial de suas atividades;
III - dissolução compulsória da pessoa jurídica;
IV - proibição de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos de órgãos ou entidades
públicas e de instituições financeiras públicas ou controladas pelo poder público, pelo prazo mínimo de 1 (um) e
máximo de 5 (cinco) anos.

A sanção de dissolução compulsória da pessoa jurídica somente poderá ser aplicada quando comprovado: a) ter
sido a personalidade jurídica utilizada de forma habitual para facilitar ou promover a prática de atos ilícitos; ou b)
ter sido constituída para ocultar ou dissimular interesses ilícitos ou a identidade dos beneficiários dos atos
praticados.

Importante mencionar que é possível a aplicação das sanções administrativas (vistas no tópico 3) em sede de ação
civil. Se, na esfera administrativa, não forem aplicadas as sanções administrativas (multa e publicação
extraordinária da decisão condenatória) em razão de uma inércia da Administração, o juiz pode aplicar essas
sanções, caso a ação judicial tenha sido proposta pelo Ministério Público.

5. Acordo de Leniência

A Lei Anticorrupção traz a possibilidade de ser firmado um acordo de leniência. No entanto, tal temática é objeto
do subponto 4.b.

6. Cadastro Nacional de Empresas Punidas – CNEP

O art. 22, da Lei nº 12.846/2013, cria, no âmbito do Executivo Federal, o Cadastro Nacional de Empresas Punidas
– CNEP, que tem o propósito de dar publicidade às sanções impostas às pessoas jurídicas infratoras.

Depois de decorrido o prazo estabelecido no ato sancionador ou do cumprimento integral do acordo de leniência
e da reparação do dano causado, os registros das sanções e acordos de leniência serão excluídos.

7. Prescrição

Tanto na esfera administrativa, como na esfera judicial, o prazo prescricional para apuração das infrações é de
cinco anos, contados da ciência da infração ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que

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houver cessado. A interrupção da prescrição, também nas duas searas, acontece com a instauração de processo
que tenha como objeto a apuração da infração.

9A. Vinculação e discricionariedade. Atos administrativos vinculados e discricionários. O mérito do ato


administrativo.
Daniela Nadia Wasilewski Rodrigues 17/09/18

Diferentemente do particular, a Administração Pública só pode fazer o que lhe for permitido por expressa
disposição legal, sempre buscando atingir a finalidade pública, requisito esse, aliás, essencial à validade dos atos
praticados. Quanto ao grau de liberdade da Administração em sua prática, os atos administrativos classificam-se
em atos vinculados e atos discricionários. Conforme Bandeira Mello, não há que se falar em ato discricionário,
mas sim em poder discricionário para a prática de um ato (MELLO, p. 431).

ATOS VINCULADOS são aqueles em que, por existir prévia e objetiva tipificação legal do único possível
comportamento da Administração em face de situação igualmente prevista em termos de objetividade absoluta,
a Administração, ao expedi-los, não interfere com apreciação subjetiva alguma. A Administração não dispõe de
liberdade alguma, uma vez que a lei já determinou antecipadamente o comportamento a ser adotado. O
Judiciário pode revê-los em todos os seus aspectos.

ATOS DISCRICIONÁRIOS são os atos que a Administração pratica com certa margem de liberdade de
avaliação ou decisão segundo critérios de conveniência e oportunidade, formulados por ela mesma, ainda que
adstrita à lei reguladora da expedição deles. A disciplina legal deixa ao administrador certa liberdade para decidir,
em face das circunstâncias concretas do caso, impondo-lhe e simultaneamente facultando-lhe a utilização de
critérios próprios para avaliar ou decidir quanto ao que lhe pareça ser o melhor meio de satisfazer o interesse
público que a norma legal visa a realizar. Seu fundamento reside no fato de que a lei não poderia prever todas as
situações possíveis de serem enfrentadas.

Segundo Carvalho Filho, essa valoração de conveniência e oportunidade é que reflete o que
modernamente se denomina de reserva do possível, ou seja, o conjunto de elementos que tornam possível esta
ou aquela ação governamental e, por via de consequência, o que se revela inviável de ser executado pela
Administração em certo momento e dentro de determinadas condições (CARVALHO FILHO, p. 123).

A discricionariedade pode estar ligada à própria norma em si ou ao exame do caso concreto. A imprecisão
da norma, permissiva da discricionariedade, pode decorrer das seguintes situações:
a) não descreve a situação em vista da qual será praticada certa conduta;
b) é descrita por palavras que envolvem conceitos vagos e imprecisos;
c) a própria norma confere liberdade para agir.

Poderá ser assinalada a presença do mérito administrativo toda vez que a Administração decidir ou atuar
valorando internamente as consequências ou vantagens do ato. Para Meirelles, o mérito administrativo
consubstancia-se na valoração dos motivos e na escolha do objeto do ato feitas pela Administração incumbida de
sua prática, quando autorizada a decidir sobre a conveniência, oportunidade e justiça do ato a realizar.

O mérito administrativo é aspecto pertinente apenas aos atos administrativos praticados no exercício
de competência discricionária. Nos atos vinculados, não há falar em mérito, visto que toda a atuação do Executivo
se resume do atendimento das imposições legais. Diversamente, nos atos discricionários, além dos elementos
sempre vinculados (competência, finalidade e forma), os outros elementos do ato (motivo e objeto) apresentam-
se como discricionários, e sobre eles a Administração decide livremente e sem possibilidade de correção judicial,
salvo quando seu proceder caracterizar excesso ou desvio de poder. Como se vê, a discricionariedade atinge
apenas aspectos relativos ao objeto e ao motivo do ato. Não há discricionariedade nos elementos competência,
forma e finalidade. Não há, pois, atos inteiramente discricionários. Da mesma forma, sustenta doutrina abalizada
não existir atos inteiramente vinculados, uma vez que os ditames legais podem estar expostos por meio de

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conceitos jurídicos indeterminados, o que, por si só, aumenta a margem de liberdade do administrador no
momento da subsunção fato-norma. Bandeira de Mello, em posição minoritária, sustenta que pode haver certa
discricionariedade até mesmo quanto à finalidade do ato. Assevera que o fim é sempre vinculante, à medida que
só pode ser perseguido o interesse público; contudo, a expressão interesse público é dotada de certo grau de
subjetivismo e comporta, assim, um juízo discricionário (MELLO, p. 431).

A expressão “discricionariedade técnica” é comumente utilizada em dois sentidos diferentes:


a) para designar situações em que a lei pressupõe que a conduta administrativa a ser adotada depende de
uma averiguação técnica conclusiva. Ex.: a lei dispõe que devem ser abatidos animais portadores de febre aftosa.
Nesse caso, a decisão do abate será precedida de parecer técnico conclusivo no sentido da existência da doença.
Mello destaca que no caso não há propriamente discricionariedade, posto que a avaliação técnica servirá apenas
para confirmar ou não a presença de um pressuposto legal;
b) para indicar situações em que, embora o ato a ser praticado pressuponha uma averiguação técnica, a lei
regente da matéria confere à Administração o dever de avaliar se a ocorrência do fato referido na legislação,
tem ou não, nível de importância ou gravidade capaz de impor uma só conduta por parte do administrador. Ex.:
as condições de higiene e segurança de uma construção, apesar de não satisfatórias tecnicamente, podem ser
toleradas, segundo a conveniência e a oportunidade administrativas, ao tempo em que o administrador pode
entender que atendem a um patamar mínimo de suficiência (MELLO, p. 437 e 438).

DISCRICIONARIEDADE É DIFERENTE DE INTERPRETAÇÃO. Interpretação é uma operação lógica que


antecede tanto ao exercício da discricionariedade, quanto à própria prática do ato vinculado, que se revela em
um único caminho possível a ser trilhado pelo administrador. Realizada a interpretação, se remanescer ao
administrador uma pluralidade de resultados possíveis, estaremos na seara da discricionariedade. Se não
remanescer dúvidas sobre a correta providência, não se caracterizará discricionariedade.

LIMITE DO EXERCÍCIO DO PODER DISCRICIONÁRIO: 1. Lei: a descrição deve ser exercida dentro dos
limites da lei. 2. Finalidade pública: a não observância gera a invalidade do ato praticado. 3. Motivo: o motivo
consiste nos pressupostos de direito ou de fato que antecedem a prática de um ato administrativo, determinando-
o ou autorizando- o; é elemento do ato administrativo (e, portanto, sempre deve estar presente no ato) que pode
ser discricionário. A motivação, por sua vez, consiste na expressa declinação dos motivos, dos fundamentos de
fato ou de direito do ato administrativo. Sempre que um ato administrativo for motivado, a teoria dos motivos
determinantes indica que a autoridade fica vinculada aos motivos declinados: se forem falsos, inexistentes ou
incorretos, viciam o ato, ensejando sua invalidade. 4. Proporcionalidade e razoabilidade.

CONTROLE JUDICIAL DO MÉRITO ADMINISTRATIVO E DO PODER DISCRICIONÁRIO. O Judiciário, salvo


alguma ilegalidade, não pode substituir, pelo seu juízo, o mérito do ato administrativo, sob pena de afronta à
separação dos poderes. PIETRO esclarece a evolução no tratamento da questão: se antes o Judiciário recuava
diante dos aspectos discricionários do ato, sem verificar a observância dos limites da discricionariedade, deixando
de fora da apreciação judicial qualquer aspecto do mérito administrativo, hoje se entende que o Judiciário não
pode alegar, a priori, que se trata de matéria de mérito, e portanto, estando no campo da discricionariedade, não
pode haver análise judicial. Assim, o juiz deve analisar a norma diante do caso concreto, para concluir se ela
outorgou ou não diferentes opções à Administração e, em caso positivo, sendo todas elas válidas e aceitáveis
perante o interesse público, o juiz não poderá corrigir o ato adotado, substituindo-o por alguma outra opção
(PIETRO, 2015, p. 262).

No atual cenário do ordenamento jurídico, reconhece-se a possibilidade de análise pelo Judiciário dos
atos administrativos que não obedeçam à lei, bem como daqueles que ofendam princípios constitucionais, tais
como: a moralidade, a eficiência, a razoabilidade, a proporcionalidade, além de outros. Dessa forma, o Poder
Judiciário poderá, por vias tortas, atingir a conveniência e a oportunidade do ato administrativo discricionário,
mas tão somente quando essas forem incompatíveis com o ordenamento vigente, portanto, quando for ilegal
(MARINELA, 2012, p. 285).

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Ante o exposto, conclui-se ser falsa e imprecisa a ideia de que a autoridade judiciária, ao se deparar com
um ato baseado em poder discricionário, não poderia revê-lo, sob pena de ferir o princípio da separação de
poderes. Na verdade, o Judiciário pode apreciar a legalidade tanto dos atos vinculados, quanto dos atos
discricionários. Neste último caso, o exame consistirá não na avaliação do critério valorativo/subjetivo utilizado
pelo administrador, mas na verificação da adequação aos motivos declinados (teoria dos motivos determinantes),
bem como de outros elementos do ato administrativo que são vinculados (sujeito, finalidade e forma) ou a
razoabilidade e proporcionalidade. No ponto, cumpre observar que o princípio da proporcionalidade foi
expressamente categorizado como princípio da Administração Pública (art. 2o, Lei n. 9.784/99), razão pela qual
sua ofensa, em última análise, resulta em violação da própria legalidade, possibilitando, assim, o controle por
parte do Judiciário.

JURISPRUDÊNCIA:
- STJ, AgRg no REsp 1.243.276-PR, 2013, Info 515. “DIREITO ADMINISTRATIVO. CONCESSÃO DE LICENÇA
PARA ACOMPANHAMENTO DE CÔNJUGE. (...) A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que a referida
licença é um direito assegurado ao servidor público, de sorte que, preenchidos os requisitos legais, não há falar
em discricionariedade da Administração quanto a sua concessão.”
- STJ, AgRg no AREsp 128.916-SP, 2012, Info 507. “DO PRAZO DE VALIDADE DE CONCURSO PÚBLICO. ATO
DISCRICIONÁRIO. A prorrogação do prazo de validade de concurso público é ato discricionário da administração,
sendo vedado ao Poder Judiciário o reexame dos critérios de conveniência e oportunidade adotados.”
- STJ, RMS 23.878-RS, 2010, Info 424. CONCURSO PÚBLICO. SERVIÇOS NOTARIAIS. “Para o Min. Relator, os
critérios de correção de provas, atribuição de notas e avaliação de títulos adotados pela comissão de concursos,
em regra, não podem ser revistos pelo Judiciário, cuja competência restringe-se ao exame da legalidade, ou seja,
à observância dos elementos objetivos contemplados no edital e na lei que regem o certame. A justiça ou injustiça
da decisão da comissão é matéria de mérito do ato administrativo, sujeita à discricionariedade técnica da
autoridade administrativa.”
- STJ, REsp 1.181.822-SC, 2011, Info 484. ADICIONAL. QUALIFICAÇÃO. DISCRICIONARIEDADE
ADMINISTRATIVA. (...) A Turma entendeu não se tratar de hipótese de discricionariedade administrativa
relacionada ao juízo de conveniência e oportunidade da Administração. Havendo a demonstração de que o curso
realizado seja de área de interesse do Poder Judiciário da União e tenha pertinência com as atribuições do cargo,
terá o servidor direito subjetivo ao recebimento do adicional de qualificação.
- STJ, REsp 879.188-RS, 2009, Info 395. POSSIBILIDADE JURÍDICA. TERRA INDÍGENA. “o mérito do ato
administrativo não se revela da simples e isolada norma in abstrato, mas sim do confronto desta com os fatos
surgidos no caso concreto, cuja peculiaridade pode reduzir, ou até eliminar, a liberdade que o administrador
público tem para executar a conduta pretendida pela lei. Sendo assim, a possibilidade, ou não, do pedido contido
na inicial que objetiva a demarcação de terra indígena será a conclusão a que o julgador chegará após a análise
das circunstâncias que envolvem o caso concreto, não se podendo afirmar, de pronto, que o ordenamento jurídico
veda tal possibilidade apenas por se tratar de ato que, em abstrato, possui características discricionárias. Assim,
em razão da teoria da asserção (a análise das condições da ação é feita conforme a narrativa da petição inicial) e
da necessidade de dilação probatória para análise dos fatos, no caso concreto, não houve violação do art. 295, I
e p.u., III, do CPC.”
- STJ, RMS 19.741-MT, 2008, Info 348. PROCESSO DISCIPLINAR. DEMISSÃO. “Ressalte-se que, tendo em
vista o regime jurídico disciplinar, especialmente os princípios da dignidade da pessoa humana, culpabilidade e
proporcionalidade, inexiste aspecto discricionário no ato administrativo que impõe sanção disciplinar e,
inexistindo discricionariedade nesse ato, o controle jurisdicional é amplo e não se limita a aspectos formais.”
- STF, MS 31323 AgR/DF, 2015, Info 778. “Concurso público: prova objetiva e resoluções do CNMP e CSMPF.
“A Turma destacou que o exame jurisdicional da controvérsia não demonstraria potencial para que se excedesse
o controle de legalidade e se avançasse na seara do mérito administrativo. Dessa forma, o debate seria diferente
de outros precedentes relativos ao amplo tema dos concursos públicos, em que a ordem fora indeferida diante
da inviabilidade de substituição do juízo de mérito administrativo pelo jurisdicional. Asseverou que não existiria
deficiência no modo de redação das perguntas sob o aspecto da pronta resposta exigida pelas resoluções que
disciplinaram o certame, de modo a traduzir violação às normas reguladoras do concurso, nos moldes em que
postas à época, ou ao edital.”

31
- STF. RMS 34203/DF e AC 3980/DF, 2017 Info 885. A concessionária não tem direito adquirido à renovação
do contrato de concessão de usina hidrelétrica. A União possui a faculdade de prorrogar ou não o contrato de
concessão, tendo em vista o interesse público, não se podendo invocar direito líquido e certo a tal prorrogação.
Dessa forma, a prorrogação do contrato administrativo insere-se no campo da discricionariedade. A Lei 12.783/13
subordinou a prorrogação dos contratos de concessão de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica
à aceitação expressa de determinadas condições. Se estas são recusadas pela concessionária, a Administração
Pública não é obrigada a renovar a concessão. A Lei 12.783/13 pode ser aplicada para a renovação de contratos
ocorrida após a sua vigência mesmo que a assinatura do pacto original tenha ocorrido antes da sua edição.

Questões Prova Oral (MPF/27º): Distinção de ato discricionário e vinculado; discorrer sobre motivo do ato; se um
ato poderia ser inteiramente vinculado ou inteiramente discricionário.

Prova Objetiva (MPF/29º):

33. A DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA ERA TIDA COMO UM ÂMBITO INFENSO A CONTROLE


JUDICIAL QUANTO AO MÉRITO DO ATO. A CONVENIÊNCIA E A OPORTUNIDADE NÃO ADMITIAM UMA
AVALIAÇÃO JURISDICIONAL E ENCONTRAVAM ÓBICE NA TEORIA DAS QUESTÕES POLÍTICAS.
TODAVIA, ATUALMENTE, EM RELAÇÃO, POR EXEMPLO, AO FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS, À
MATRÍCULA DE CRIANÇAS EM CRECHE E À REALIZAÇÃO DE OBRAS EM PENITENCIÁRIA:
a) ( ) admite-se controle judicial, pois não se trata de direitos sociais.
b) ( ) não se admite controle judicial, pois há o óbice da reserva do possível.
c) ( ) admite-se controle judicial, pois há parâmetros jurídicos aplicáveis.
d) ( ) não se admite controle judicial, pois existe o obstáculo da separação de poderes.
Resposta C.

21B. Validade, vigê ncia e eficácia do ato administrativo. Autoexecutoriedade do ato administrativo

Renata Souza
Materiais consultados: Graal do 28º CPR; CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 28. ed. rev., ampl. e atual. até 31-12-2014.
São Paulo: Atlas, 2015; JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo (livro eletrônico). 5. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018; OLIVEIRA,
Rafael Carvalho Rezende. Curso de Direito Administrativo. 6. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2018; DI PIETRO, Maria
Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 30. ed. rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2017.

I. Validade, vigência e eficácia do ato administrativo

- Perfeição: ato administrativo perfeito é aquele que já concluiu seu ciclo de formação, isto é, já se esgotaram
todas as fases necessárias à sua formação (a perfeição diz respeito ao processo de elaboração do ato). O ato
imperfeito, ou seja, que não completou seu ciclo de formação, (como um parecer não assinado) é, como regra,
considerado inexistente.
O ato inexistente: é ineficaz, porque a existê ncia é condição da eficácia; não gera obrigatoriedade, podendo ser
ignorado; não tem presunção de legitimidade, sendo possi ́vel a reação de particulares contra a tentativa de
execução; não admite convalidação; não se submete a prazo prescricional ou decadencial.
O ato perfeito e existente pode ser válido ou inválido.

- Validade: o ato administrativo válido é aquele expedido em conformidade com o sistema normativo. Assim, é o
que provém de autoridade competente e está conforme todas as exigê ncias legais. O prazo para anulação do ato
administrativo é de 5 anos, salvo se houver comprovada má-fé do beneficiário, hipótese em que, a qualquer
tempo, será possível a anulação desse ato (art. 54, da Lei nº 9.784/99). Em razão da presunção de legitimidade,
os atos inválidos devem ser observados até que seja reconhecida a nulidade. O ato inválido pode ser anulável ou
nulo.
Nulo é o ato administrativo cuja invalidade não pode ser sanada. Assim como o anulável, deve ser respeitado até
a sua invalidação.
Anulável é o ato administrativo que apresenta defeito sanável. São sanáveis (i) o vi ́cio de competê ncia quanto à
pessoa (exceto a competê ncia exclusiva); e (ii) O vi ́cio de forma (exceto a exigida por lei como condição essencial
à validade do ato), desde que não haja lesão ao interesse público, nem prejui ́zo a terceiros.

32
- Súmula 346, STF: A Administração pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos.
- Súmula 473, STF: A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais,
porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os
direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.

- Vigência: expressa o peri ́odo de permanê ncia do ato no ordenamento juri ́dico (Diógenes Gasparini, 2004, p. 70).
“Entrada em vigor ou ini ́cio da vigê ncia consiste no momento da inserção do ato administrativo no ordenamento
juri ́dico; a entrada em vigor constitui o ponto no tempo que separa o passado do futuro dos efeitos do ato. Perda
da vigê ncia é o momento em que o ato sai do mundo juri ́dico” (MEDAUAR, 2008, p. 138).
Em regra, a vigê ncia do ato administrativo tem ini ́cio a partir de sua publicação.

- Eficácia: é a aptidão do ato administrativo para produzir efeitos. Para Celso Antô nio Bandeira de Mello, há
eficácia “quando o desencadear de seus efeitos ti ́picos não se encontra dependente de qualquer evento posterior,
como uma condição suspensiva, termo inicial ou ato controlador a cargo de outra autoridade” (MELLO, 2011, p.
388). Para José dos Santos Carvalho Filho, a eficácia é a idoneidade que o ato administrativo tem para produzir
seus efeitos; se o ato completou seu ciclo de formação (ato perfeito), ele pode ser considerado eficaz, ainda que
dependa de condição ou termo futuros para ser executado; para ele, a existência de termo ou condição pode
constituir óbice à operatividade do ato, mas não descaracteriza a sua eficácia.
Sérgio de Andréa Ferreira observa que a eficácia comporta trê s dimensõ es: “temporal, que leva em consideração
o peri ́odo da produção de efeitos (há atos de eficácia instantânea e atos de eficácia duradoura); espacial, que
considera o âmbito de incidê ncia dos efeitos (ex.: um ato de permissão originário do Munici ́pio só produz efeitos
no ci ́rculo territorial deste); e subjetiva, atinente aos indivi ́duos que estarão sob sujeição do ato.” (Apud José dos
Santos Carvalho Filho, p. 129).
O ato administrativo eficaz poderá produzir efeitos ti ́picos (inerentes à própria função do ato) ou ati ́picos. Os
efeitos atípicos se dividem em:
a) Efeitos prodrô micos ou preliminares: existem enquanto perdura a situação de pendência do ato administrativo,
ou seja, durante o período entre a produção do ato e o desencadeamento de seus efeitos típicos. Exemplo: nos
atos sujeitos a controle por parte de outro órgão, o dever-poder deste de emitir o ato controlador que funciona
como condição de eficácia do ato controlado.
b) Efeitos reflexos: são aqueles que alcançam terceiros não objetivados pelo ato administrativo.
Exemplo: é o caso do locatário de imóvel desapropriado, porque, uma vez perdido o imóvel pelo proprietário
desapropriado, o locatário vê rescindida a relação juri ́dica de locação que mantinha com o ex-proprietário.

II. Autoexecutoriedade do ato administrativo

A autoexecutoriedade um atributo do ato administrativo que permite que ele seja executado diretamente pela
Administração Pública, inclusive com o uso moderado da força, independentemente de autorização do Poder
Judiciário.

A autoexecutoriedade tem fundamento na supremacia do interesse público e, em especial, na necessidade de


salvaguardá-lo com eficiê ncia e rapidez. José dos Santos Carvalho Filho observa que “a autoexecutoriedade tem
como fundamento juri ́dico a necessidade de salvaguardar com rapidez e eficiê ncia o interesse público, o que não
ocorreria se a cada momento tivesse que submeter suas decisõ es ao crivo do Judiciário. Além do mais, nada
justificaria tal submissão, uma vez que assim como o Judiciário tem a seu cargo uma das funções estatais – a
função jurisdicional –, a Administração também tem a incumbê ncia de exercer função estatal – a função
administrativa.” – CARVALHO FILHO, p. 124.

Maria Sylvia Zanella Di Pietro explica que a autoexecutoriedade não está presente em todos os atos
administrativos, existindo apenas:

1. quando expressamente prevista em lei. Exemplo: em matéria de contratos, a Administração Pública


pode se valer de diversas medidas autoexecutórias, como a retenção da caução, a utilização de

33
equipamentos e instalações do contratado para assegurar a continuidade da execução do contrato e a
encampação. Exemplo: em matéria de polícia administrativa, existem medidas autoexecutórias previstas
em lei, como a apreensão de mercadorias, o fechamento de casas noturnas e a cassação de licença para
dirigir.

2. quando houver urgência na medida, com prejuízo maior para o interesse público se não houver a sua
adoção imediatamente. Exemplos: demolição de prédio que ameaça ruir, internamento de pessoa com
doença contagiosa e dissolução de reunião que coloca em risco a segurança de pessoas e coisas.

Exemplo ti ́pico de ato não autoexecutório é a cobrança de multas. Há importante exceção, contudo: a
Administração pode executar diretamente as multas nos contratos administrativos, por meio da reversão da
caução para si.

Relevante destacar que a autoexecutoriedade afasta o controle judicial prévio do ato administrativo. Ou seja, para
executar os atos administrativos dotados do atributo da autoexecutoriedade, a Administração não precisa
recorrer ao Judiciário. Contudo, tal circunstância não afasta o controle judicial a posteriori. Assim, como o controle
judicial, no Brasil, é inafastável, o particular que se sentir lesado pelo ato administrativo pode contestar a atuação
da Administração Pública judicialmente, hipótese em que, inclusive, poderá incidir a regra da responsabilidade
objetiva do Estado (art. 37, § 6º, da CF/88). Igualmente, o interessado pode pleitear, administrativamente ou
judicialmente, a suspensão do ato que ainda não foi executado.
Observação: Celso Antô nio Bandeira de Mello divide a autoexecutoriedade em executoriedade (execução pela
própria Administração Pública através de meios diretos, como a remoção do bem) e exigibilidade (exigê ncia do
cumprimento do ato por meios indiretos de coerção, como a aplicação de multa).
III. Jurisprudência sobre a temática

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA INDIVIDUAL. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL.


TÉCNICO DE ASSUNTOS EDUCACIONAIS DO MINISTÉRIO DA SAÚDE. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR.
PENA DE CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA. ARTS. 127, IV, 132, IV E 134, DA LEI 8.112/1990. USO DE DOCUMENTO
FALSO. DIPLOMA DE GRADUAÇÃO EM PEDAGOGIA. CUMPRIMENTO IMEDIATO DA PENALIDADE IMPOSTA.
POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. ALEGADA AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS. NÃO COMPROVAÇÃO DO PREJUÍZO.
INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. PRESCRIÇÃO DA
PRETENSÃO PUNITIVA DISCIPLINAR. INOCORRÊNCIA. SEGURANÇA DENEGADA.
(...)
2. Não há ilegalidade no cumprimento imediato da penalidade imposta a servidor público logo após o
julgamento do PAD e antes do decurso do prazo para o recurso administrativo, tendo em vista o atributo de
auto-executoriedade que rege os atos administrativos e que o recurso administrativo, em regra, carece de
efeito suspensivo (ex vi do art. 109 da Lei 8.112/1990). Precedentes: MS 14.450/DF, Rel. Ministro Gurgel de Faria,
Terceira Seção, julgado em 26/11/2014, DJe 19/12/2014; MS 14.425/DF, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Terceira
Seção, julgado em 24/09/2014, DJe 01/10/2014; MS 10.759/DF, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Terceira
Seção, julgado em 10/05/2006, DJ 22/05/2006. (...)
(MS 19.488/DF, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/03/2015, DJe
31/03/2015)

AMBIENTAL E ADMINISTRATIVO. INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA. DEMOLIÇÃO DE EDIFÍCIO IRREGULAR. AUTO-


EXECUTORIEDADE DA MEDIDA. ART. 72, INC. VIII, DA LEI N. 9.605/98 (DEMOLIÇÃO DE OBRA). PECULIARIDADES
DO CASO CONCRETO. INTERESSE DE AGIR CONFIGURADO.
1. A questão cinge-se ao debate sobre o eventual interesse processual do Ibama em ação civil pública cujo pedido
consiste na condenação dos recorridos à reparação de danos ambientais, bem como à indenização por eventual
dano coletivo causado ao meio ambiente em razão da construção de prédio na margem do "Rio Chumbo", área
de preservação permanente.

34
2. A origem entendeu que a demolição de obras é sanção administrativa dotada de auto-executoriedade, razão
pela qual despicienda a ação judicial que busque sua incidência. O Ibama recorre pontuando não ser atribuível a
auto-executoriedade à referida sanção.
3. Mesmo que a Lei n. 9.605/98 autorize a demolição de obra como sanção às infrações administrativas de
cunho ambiental, a verdade é que existe forte controvérsia acerca de sua auto-executoriedade (da demolição
de obra).
4. Em verdade, revestida ou não a sanção do referido atributo, a qualquer das partes (Poder Público e particular)
é dado recorrer à tutela jurisdicional, porque assim lhe garante a Constituição da República (art. 5º, inc. XXXV)
- notoriamente quando há forte discussão, pelo menos em nível doutrinário, acerca da possibilidade de a
Administração Pública executar manu militari a medida.
5. Além disso, no caso concreto, não se trata propriamente de demolição de obra, pois o objeto da medida é
edifício já concluído - o que intensifica a problemática acerca da incidência do art. 72, inc. VIII, da Lei n.
9.605/98.
6. Por fim, não custa pontuar que a presente ação civil pública tem como objetivo, mais do que a demolição do
edifício, também a recuperação da área degradada.
7. Não se pode falar, portanto, em falta de interesse de agir.
8. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.
(STJ - REsp: 1.246.443 - PR 2011/0075450-7, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data de Julgamento:
23/08/2011, T2 - Segunda Turma, Data de Publicação: DJe 13/04/2012)

IV. Questões de prova oral – 26º CPR:

́ demolir construção em APP? Trate da supremacia


Fale da autoexecutoriedade do ato administrativo. É possivel
do interesse pú blico.

Diferencie validade, vigência e eficácia.

3B. Vícios ou defeitos dos atos administrativos. A teoria das nulidades no Direito Administrativo. Atos
administrativos nulos, anuláveis e inexistentes.

Caroline Araújo

VÍCIOS OU DEFEITOS DOS ATOS ADMINISTRATIVOS. De acordo com DI PIETRO, “os vícios podem atingir os cinco
elementos do ato, caracterizando os vícios quanto à competência e à capacidade (em relação ao sujeito), à forma,
ao objeto, ao motivo e à finalidade.” (p. 246). O vício de competência ocorre quando o ato é praticado por agente
sem atribuição. O vício de objeto ocorre quando o objeto do ato é ilícito, impossível ou indeterminado. O vício
de forma decorre da inobservância da formalidade exigida para o ato. O vício de finalidade, também chamado
desvio de finalidade, ocorre quando o ato, em vez de buscar a satisfação de um interesse público, é praticado com
o fim de atender a um interesse particular. Por fim, o vício de motivo ocorre quando: i) inexistir o motivo exigido
para o ato; ii) o motivo alegado for falso; ou iii) o fundamento for desconexo com a finalidade do ato.

TEORIA DAS NULIDADES: a) Teoria Monista: entende que o vício acarreta sempre a nulidade do ato. É a posição
de Hely Lopes Meirelles, Diógenes Gasparini, Regis Fernandes de Oliveira e Sérgio Ferraz, por exemplo. b) Teoria
Dualista: sustenta que os atos administrativos podem ser nulos ou anuláveis. É a posição de Celso Antônio
Bandeira de Mello, Cretella Júnior, Lucia Valle Figueiredo e José dos Santos Carvalho Filho. c) Teoria Tricotômica:
Seabra Fagundes defende a divisão em nulos, anuláveis e irregulares;
Todos negam relevância jurídica à espécie de atos inexistentes, indicando que, de direito, equivalem aos atos
nulos.

ATOS ADMINISTRATIVOS NULOS, ANULÁVEIS E INEXISTENTES.


Se uma destas espécies for declarada, todos os efeitos da invalidação se operam. A maior distinção destas
modalidades de invalidação está nas suas causas.

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INEXISTÊNCIA: ocorre quando se está diante de condutas puramente criminosas, dando ensejo à legítima defesa
(resistência manu militari). Tal ato é ineficaz, porque a existência é condição da eficácia; não gera obrigatoriedade,
podendo ser ignorado; não tem presunção de legitimidade, sendo possível a mencionada reação de particulares
contra a tentativa de execução; não admite convalidação; não se submete a prazo prescricional ou decadencial.
“Consistem em comportamentos que correspondem a condutas criminosas ofensivas a direitos fundamentais da
pessoa humana, ligados à sua personalidade ou dignidade intrínseca e, como tais, resguardados por princípios
gerais de Direito que informam o ordenamento jurídico dos povos civilizados” (MELLO, 2011, p. 473). Ex:
autorização para abrir casa de prostituição;
NULIDADE: embora não corresponda a uma conduta criminosa, em razão de seus efeitos, não pode ser
convalidada. Entretanto, poderão os atos nulos, em certas situações, ser convertidos. Eles são prescritíveis (05
anos) e não admitem resistência manu militari (só admitem resistência por decisão judicial ou por conta e risco
do administrado). Podem ser invalidados de ofício pelo juiz, ou mediante provocação do Ministério Público. São
nulos os atos assim declarados por lei e os em que é impossível a convalidação sem a repetição do vício.
ANULABILIDADE: consiste num vício que pode ser convalidado. Os atos anuláveis são prescritíveis (05 anos) e
convalidáveis. Não admitem, entretanto, resistência manu militari. (CUNHA JR, 116). Só podem ser invalidados a
requerimento dos interessados. São aqueles assim declarados por lei e aqueles que podem ser convalidados sem
repetição do vício (incompetência e vício de forma), desde que não sejam lesivos ao interesse público, nem
causem prejuízo a terceiros. Obs: o STJ decidiu que há nulidade na remoção de servidor por interesse da
Administração, sem motivação. Contudo, como a ausência de motivação é vício de forma, entendeu que o vício
pode ser corrigido em momento posterior, tal como a prestação de informações em mandado de segurança (STJ,
RMS 40.427). A invalidação produz efeitos ex tunc (CARVALHO FILHO, 2011, p. 149). ). Celso Antônio Bandeira de
Mello, contudo, afirma que os atos restritivos devem ser invalidados com efeitos ex tunc, e os atos ampliativos
devem ser invalidados ex nunc (MELLO, 2011, p. 484).

5B. Revogação, anulação, cassação e convalidação do ato administrativo.

Caroline Araújo

REVOGAÇÃO DO ATO ADMINISTRATIVO


É a extinção de um ato administrativo ou de seus efeitos por outro ato administrativo, efetuada por razões de
conveniência e oportunidade (poder discricionário), respeitando-se os efeitos precedentes. Produz efeitos ex
nunc.
Não podem ser revogados: a) atos que a lei declara irrevogáveis; b) atos já exauridos; c) atos vinculados,
enquanto o sejam; d) atos administrativos puros, como as certidões, pois os efeitos deles decorrem da lei e não
de uma criação administrativa; e) atos de controle, pois a competência em relação a cada caso examinado exaure-
se uma vez expedido o ato; f) atos complexos; g) atos que geram direito adquirido; h) atos que integram
procedimento administrativo (preclusão).

ANULAÇÃO
Pode ser conceituada como “sendo a forma de desfazimento do ato administrativo em virtude da existência de
vício de legalidade”. Quanto ao prazo da anulação, estabelece o art. 54 da Lei 9.784: “o direito da Administração
de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos,
contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé. § 1o No caso de efeitos patrimoniais
contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento”. A anulação opera efeitos
ex tunc.

CASSAÇÃO
“[...] é a forma extintiva que se aplica quando o beneficiário de determinado ato descumpre condições que
permitem a manutenção do ato e de seus efeitos” (CARVALHO FILHO, José dos Santos, 2011, p. 141). A cassação
constitui ato de natureza sancionatória e vinculada.
A cassação constitui ato de natureza sancionatória e de caráter vinculado.

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CONVALIDAÇÃO
“É o processo de que se vale a Administração para aproveitar atos administrativos com vícios superáveis, de forma
a confirmá-lo no todo ou em parte” (CARVALHO FILHO, José dos Santos, 2011, p. 151). Está prevista no art. 55 da
Lei 9.874/99. Divide-se em: i) ratificação (correção de defeito de competência); ii) reforma (manutenção da parte
válida de um ato, com a exclusão da parte inválida) e iii) conversão (prática de um novo ato com a parte válida do
ato anterior, acrescida de uma nova parte). Diogo de Figueiredo Moreira Neto acrescenta ainda a possibilidade
de uma conversão legislativa, promovida por força de lei.
Apenas poderá haver convalidação de vícios de competência, em razão do sujeito (ratificação) e de forma não
essencial à validade (reforma ou conversão). Excepcionalmente, o vício de objeto, quando houver conteúdo
plúrimo.
São insanáveis, impedindo a convalidação: vícios no motivo, no objeto (quando único), na finalidade e na falta de
congruência entre o motivo e o objeto do ato.

4B. Teoria dos motivos determinantes. Teoria do desvio de poder. Acordo de leniência da Lei nº 12.846/2013.

Vanessa Andrade

Motivo é a situação de fato (circunstâncias de fato) por meio da qual é deflagrada a manifestação de
vontade da Administração. Motivação é a justificativa do pronunciamento tomado. Exprime de modo
expresso e textual todas as situações de fato que levaram o agente à manifestação da vontade. Pode ser contextual
(no próprio bojo do ato administrativo) ou aliunde (está em local ou instrumento diverso.).
A teoria dos motivos determinantes, desenvolvida no Direito Francês, baseia-se na ideia de que o motivo
do ato administrativo deve sempre guardar compatibilidade com a situação de fato que gerou a manifestação da
vontade. Se o motivo se conceitua como a própria situação de fato que impele a vontade do administrador, a
inexistência dessa situação provoca a invalidação do ato. A teoria explicita que a administração pública está sujeita
ao controle administrativo e judicial relativo à existência e pertinência/adequação dos motivos – fático e legal –
que declarou como causa determinante. Comprovada a não ocorrência o ato será nulo. Aplica-se tanto aos
vinculados como aos discricionários. Mesmo não exigindo expressa motivação, se existir passa a vincular o agente
aos termos em que foi mencionada. Exemplos: férias requeridas por servidor e indeferida por falta de pessoal; se
comprovado que há excesso de pessoal, o ato é viciado. Exoneração de servidor comissionado em razão da sua
inassiduidade; se comprovado que não faltava nem atrasava o ato será inválido.
STJ: “O motivo do ato administrativo não se confunde com a sua motivação, que é a manifestação escrita
das razões que dão ensejo ao ato, exigida quando a lei expressamente determina, mormente nos atos vinculados.
O ato administrativo, ainda quando haja margem de decisões opcionais pelo administrador (discricionariedade),
sempre terá um motivo, podendo, neste último caso não ser expresso. A teoria dos motivos determinantes
estabelece que, em havendo motivação escrita, ainda que não a lei não determine, passa o administrador a estar
vinculado àquela motivação.” (AgInt no RMS 53.434/PE).
Lei 4.717/65 (Ação Popular). Art. 2º São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas
no artigo anterior, nos casos de: d) inexistência dos motivos; Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de
nulidade observar-se-ão as seguintes normas: d) a inexistência dos motivos se verifica quando a matéria de fato
ou de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado
obtido;

Teoria do desvio de poder


Abuso de poder: é conduta ilegítima do administrador, quando atua fora dos objetivos expressa ou
implicitamente traçados na lei. Formas de abuso de poder: excesso e desvio de poder.
Excesso de Poder: o agente atua fora dos limites de sua competência administrativa, invade ou se arroga
o exercício de atividade que a lei não lhe confere.
Desvio de Poder é a modalidade de abuso em que o agente busca alcançar fim diverso daquele que a lei
lhe permitiu. Se o agente atua em descompasso com esse fim desvia-se de seu poder. Por isso é que tal vício é
também denominado de desvio de finalidade. É mais visível nos atos discricionários, e por isso difícil é obtenção

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de prova porque a ilegitimidade vem dissimulada sob a aparência de legalidade.
Lei 4.717 (Ação Popular):Art. 2º São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no
artigo anterior, nos casos de: (...) e) desvio de finalidade. Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de
nulidade observar-se-ão as seguintes normas: (...) e) o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o
ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência.
O termo “regra de competência” expresso na lei 4.717/65 é empregada como sinônimo de “lei”. O
desatendimento pode ser da finalidade 1) geral: finalidade alheia ou contrária ao interesse público; ou 2)
específica: agente pratica ato condizente com interesse público, mas lei não prevê aquela finalidade específica
para o tipo de ato praticado. (Ex. servidor removido a fim de punição, ainda que o local para onde foi removido
haja necessidade de pessoal.) Não pode ser convalidado.
STJ: “Nos atos discricionários, a vontade do agente administrativo deve se submeter à forma como a lei
regulou a matéria, de sorte que, se as razões que levaram o agente à prática do ato, forem viciadas de favoritismos
e perseguições, o ato há de ser tido como nulo, em face de sua contradição com a mens legis. (…) O instituto de
remoção dos Servidores por exclusivo interesse da Administração não pode, em hipótese alguma, ser utilizado
como sanção disciplinar, inclusive por não estar capitulado como penalidade no art. 127 da Lei 8.112/90 e significar
arbítrio inaceitável.” (RMS 26.965/RS)

Acordo de leniência da Lei nº 12.846/2013.


Competência para celebrar o acordo de leniência da LAC: cabe à autoridade máxima de cada órgão ou
entidade pública celebrar o acordo com a PJs responsáveis pela prática dos atos contra a Administração Pública
(art. 16). No âmbito do Poder Executivo federal e no caso de atos lesivos praticados contra a Administração Pública
estrangeira, o órgão competente para celebrar tais acordos será a CGU.
Requisitos cumulativos: estão previstos no §1º do art. 16, a saber: I - a pessoa jurídica seja a primeira a
se manifestar sobre seu interesse em cooperar para a apuração do ato ilícito; II - a pessoa jurídica cesse
completamente seu envolvimento na infração investigada a partir da data de propositura do acordo; e III - a pessoa
jurídica admita sua participação no ilícito e coopere plena e permanentemente com as investigações e o processo
administrativo, comparecendo, sob suas expensas, sempre que solicitada, a todos os atos processuais, até seu
encerramento.
Resultado da colaboração: a colaboração deve resultar na identificação dos demais envolvidos na infração
(quando couber) e na obtenção célere de informações e documentos que comprovem o ilícito sob apuração.
Efeitos: estão previstos no §2º do art. 16, quais sejam: isenção da PJ das sanções da publicação
extraordinária da decisão e da proibição de receber recursos públicos, bem como reduzirá em até 2/3 (dois terços)
o valor da multa aplicável.

4. ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA
4.1 Desconcentração e descentralização administrativa. Privatização. (5.c)
4.2 Administração Pública direta. A estrutura da Administração Pública federal. (8.a)
4.3 Teoria do órgão. Representação judicial das pessoas de Direito Público. (7.b)
4.4 Hierarquia. Delegação e avocação de competê ncias. Regime diferenciado de contratação (RDC). (12.b)
4.5 Personalidade de Direito Público. Pessoa administrativa. Autarquia. Sociedade de economia mista. Empresa
pública. Fundação pública. Consórcios públicos. Outros entes. (6.a)
4.6 Setor público não-estatal. Organizaçõ es sociais. Organizaçõ es da sociedade civil de interesse público. (16.a)
4.7 Agê ncias executivas e agê ncias reguladoras. Ordens e conselhos profissionais. Serviços sociais autô nomos.
Fundaçõ es de apoio. (14.a)

5C. Desconcentração e Descentralização administrativa. Privatização.

Caroline Araújo

Desconcentração, centralização e descentralização são técnicas de organização administrativa.

DESCONCENTRAÇÃO ADMINISTRATIVA

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É a “distribuição interna de plexos de competências decisórias, agrupadas em unidades individualizadas”. Na
desconcentração (ou descentralização hierárquica ou material), tem-se uma especialização de funções dentro da
própria estrutural estatal, sem criação de nova pessoa jurídica. Criam-se centros de competências denominados
órgãos públicos, dentro de uma mesma estrutura hierárquica (ex.: Ministérios, Secretarias). Em outras palavras,
o Estado (entes federativos) desmembra ÓRGÃOS internos (é a própria Administração Pública Direta) para
propiciar melhorias na sua organização territorial tomando por base critério material, grau hierárquico ou
territorial. NÃO CRIA NOVAS pessoas jurídicas, mas meros órgãos de execução direta sem personalidade jurídica.
Em razão do mencionado vínculo de hierarquia, é estabelecida uma relação de controle entre os órgãos, chamada
de controle hierárquico ou por subordinação, abrangendo todos os atos praticados pelo órgão subordinado. O
mencionado controle não depende de previsão legal. Da mesma forma, a interposição de recurso administrativo
contra atos do órgão subordinado não depende de previsão legal, embora obedeça as disposições genéricas da
Lei 9.784/99.
DESCONCENTRAÇÃO POLÍTICA – distribui funções internamente e dá origem aos poderes Legislativo, Judiciário e
Executivo.
DESCONCENTRAÇÃO ADMINISTRATIVA – distribui funções internamente na mesma pessoa jurídica e cria órgãos.

Súmula 525-STJ: A Câmara de vereadores não possui personalidade jurídica, apenas personalidade judiciária,
somente podendo demandar em juízo para defender os seus direitos institucionais.

DESCENTRALIZAÇÃO ADMINISTRATIVA
O Estado delega, por meio de lei, a atividade a outras entidades com personalidade jurídica própria
(Administração Pública Indireta). Assim descentralização pressupõe o recurso a pessoas jurídicas distintas da
Administração Direta, buscando maior eficiência e especialização no exercício da função pública. A
descentralização administrativa é dividida em: a) descentralização territorial ou geográfica: ocorre com entidade
local geograficamente delimitada, dotada de personalidade jurídica própria de direito público, com capacidade
administrativa genérica para exercer a totalidade ou maior parte dos encargos públicos de interesse da
coletividade. b) descentralização por serviços, funcional ou técnica: verificada quando a Administração Direta
cria uma pessoa jurídica de direito público ou privado e a ela transfere a titularidade e a execução de determinado
serviço público. c) descentralização por colaboração: ocorre quando a Administração transfere a execução de
determinado serviço público à pessoa jurídica de direito privado previamente existente. Nessa hipótese, o Poder
Público conserva a titularidade do serviço, podendo dispor sobre ele de acordo com o interesse público.
Tratando-se de pessoas jurídicas diferentes, não há qualquer vínculo hierárquico. Assim, a interposição de recurso
contra a decisão da pessoa descentralizada exige previsão legal expressa (trata-se do chamado recurso
hierárquico impróprio). Apesar disso, Administração Central exerce sobre a pessoa descentralizada a chamada
supervisão ministerial. Trata-se de um controle finalístico, isto é, controle quanto ao objetivo das atividades
desenvolvidas, por parte da Administração que instituiu o ente da Administração Pública indireta.

DESCENTRALIZAÇÃO POLÍTICA – VERTICAL – cria entes políticos, pessoas jurídicas de direito público interno
(União, Estados, DF e Municípios) – Administração Pública Direta.
DESCENTRALIZAÇÃO ADMINISTRATIVA – HORIZONTAL – cria a Administração Pública Indireta (Autarquias,
Empresas Públicas, Fundações e Sociedade de Economia Mista).

PRIVATIZAÇÃO EM SENTIDO AMPLO


Abrange todas as medidas adotadas com o objetivo de reduzir a presença do Estado e compreende: a)
desregulação (diminuição da intervenção do Estado no domínio econômico); b) desmonopolização de atividades
econômicas; c) a venda de ações de empresas estatais ao setor privado ; d) a concessão de serviços
públicos (com a devolução da qualidade de concessionário à empresa privada e não mais a empresas estatais,
como vinha ocorrendo); e) os contracting out (como forma pela qual a Administração Pública celebra acordos de
variados tipos para buscar a colaboração do setor privado, podendo-se mencionar, como exemplos, os convênios
e os contratos de obras e prestação de serviços, inclusive terceirização).
PRIVATIZAÇÃO EM SENTIDO ESTRITO

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Por outro lado, para Autora, privatização em sentido estrito, “abrange apenas a transferência de ativos ou de
ações de empresas estatais para o setor privado”. Tal conceito é o que decorre do art. 11 da Lei 9.491/97 (a lei
deu os moldes atuais do Plano Nacional de Desestatização – PND).

DESESTATIZAÇÃO
O objetivo da desestatização, nos termos da mencionada lei, foi transferir aos particulares atividades exploradas
pelo poder público de forma ineficiente e deficitária, para fortalecer o setor econômico e o mercado de capitais,
reduzir a dívida pública e permitir que a Administração “concentre seus esforços nas atividades em que a presença
do Estado seja fundamental para a consecução das prioridades nacionais”.
Por outro lado, a Lei 9.491/97, em seu art. 2º, § 1°, define como gênero, que abrange empresas, serviços e bens:
“a) a alienação, pela União, de direitos que lhe assegurem, diretamente ou através de outras controladas,
preponderância nas deliberações sociais e o poder de eleger a maioria dos administradores da sociedade; b) a
transferência, para a iniciativa privada, da execução de serviços públicos explorados pela União, diretamente ou
através de entidades controladas, bem como daqueles de sua responsabilidade; c) a transferência ou outorga de
direitos sobre bens móveis e imóveis da União, nos termos desta Lei.”

8A. Administração Pública direta. A estrutura da Administração Pública Federal.

Atualizado por: Daniela Nadia Wasilewski Rodrigues


Obras Consultadas: Graal 28º CPR – Graal 29º CPR – Site Dizer o Direito

A Administração Pública direta é composta pelos órgãos que estão ligados diretamente ao poder central, seja
federal estadual ou municipal, quais sejam: os próprios organismos dirigentes, seus ministérios e secretarias. (Ver
tópico específico sobre descentralização e desconcentração – 5C). A Administração Pública Direta abrange todos
os órgãos dos Poderes políticos das pessoas federativas cuja competência seja a de exercer a atividade
administrativa, e isso porque, embora sejam estruturas autônomas, os Poderes se incluem nessas pessoas e estão
imbuídos da necessidade de atuarem centralizadamente por meio de seus órgãos e agentes (CARVALHO FILHO,
p. 450).
Segundo CABM: “Nos termos do Decreto-lei 200/67, Administração direta é a que se constitui dos serviços
integrados na estrutura administrativa da Presidência da República e dos Ministérios (art. 4.º,I), e Administração
Indireta é a que compreende as seguintes categorias de entidades dotadas de personalidade jurídica própria: a)
Autarquias; b) Empresas Públicas; c) Sociedades de Economia Mista; d) Fundações Públicas (art. 4.º, II). Já no âmbito
estadual e distrital, a Administração Direta é aquela exercida pelo Governador e por seus Secretários (titulares
das diversas pastas). No Município, ela é exercida pelo Prefeito, com auxílio de Secretários Municipais.”
Fernanda Marinela destaca que os entes (políticos) que compõe a Administração direta, por serem PJ de direito
público, estão sujeitos às prerrogativas e obrigações inerentes a esse regime, o que é extensível aos seus órgãos.
O Ministério Público se aloca dentro dos órgãos da Administração Pública direta, sendo um órgão independente,
que não pertence a nenhum dos três Poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário. Possui autonomia na estrutura
do Estado e não pode ser extinto ou ter as atribuições repassadas a outra instituição. O papel do órgão é fiscalizar
o cumprimento das leis que defendem o patrimônio nacional e os interesses sociais e individuais, fazer controle
externo da atividade policial, promover ação penal pública e expedir recomendação sugerindo melhoria de
serviços públicos.

Estrutura da Administração Pública federal: Segundo Hely Lopes Meirelles: “A Administração Federal é dirigida
por um órgão independente, supremo e unipessoal, que é a Presidência da República, e por órgãos autônomos
também unipessoais, que são os Ministérios, aos quais se subordinam ou se vinculam os demais órgãos e
entidades descentralizadas”. Para CARVALHO FILHO, a Administração direta da União, no Poder Executivo,
compõe-se de duas classes distintas: a Presidência da República, órgão superior do Executivo em que se situa o
Presidente da República como chefe da administração (art. 84, II, CF), no qual se agregam outros órgãos de
assessoramento imediato (Ex. AGU) e consulta (Conselho da República e Defesa); e os Ministérios, órgãos
administrativos destinados, cada qual, a determinada área de atuação administrativa, composto por centenas de
órgãos, como secretarias, conselhos etc. Cabe aos Ministros, ademais, o auxílio ao Presidente da República na

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direção da administração. A Administração direta da União está regulada na Lei 10.683/03. Essa lei ocupa-se,
notadamente, da organização e das atribuições da Presidência e dos Ministérios. Já nos Poderes Legislativo e
Judiciário têm sua estrutura orgânica definida nos respectivos atos de organização administrativa.

PARTICULARIDADES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL


Princípio da autotutela: No âmbito da administração pública federal, a lei 9.784/99 prevê um prazo de cinco anos
para rever os atos que sejam favoráveis a particulares, salvo má-fé do beneficiado. Se não o fizer, a situação
jurídica anterior se torna legítima. Para a doutrina majoritária, trata-se de prazo decadencial.
Licitação: O Decreto n. 7.892/13 dispõe que é vedada aos órgãos e entidades da Administração Pública federal a
adesão à ata de registro de preços gerenciada por órgão ou entidade municipal, distrital ou estadual, não obstante
seja facultada aos órgãos ou entidades municipais, distritais ou estaduais a adesão à ata de registro de preços da
Administração Pública Federal.
Prescrição da sanção de polícia: No âmbito da Administração Pública Federal, a prescrição da ação punitiva é
interrompida também por qualquer ato inequívoco que importe manifestação expressa de tentativa de solução
conciliatória.
Convênios: O decreto 6.170/07 dispõe que o convênio para transferência de recursos financeiros não pode ser
firmado entre órgãos e entidades da administração pública federal, caso em que deverá ser feito o Termo de
execução descentralizada (TED).
Afastamento de servidor público: Conforme disposição da lei 8112/90, o servidor público poderá ser cedido para
ter exercício em outro órgão ou entidade dos Poderes da União, dos Estados, ou do Distrito Federal e dos
Municípios ou em serviço social autônomo instituído pela União que exerça atividades de cooperação com a
administração pública federal, para exercício de cargo em comissão ou função de confiança, ou de direção ou
gerência no caso dos serviços sociais autônomos, além de situações previstas em lei específica.
Processo administrativo: O entendimento estampado na Súmula Vinculante n. 5 do STF já encontrava a respectiva
disposição legal art. 3º, IV, L. 9784/99, para os processos no âmbito da administração pública federal, sendo cediço
que o particular pode-se fazer representar por advogado, no entanto, a ausência deste não enseja a nulidade do
processo.
Sindicância e processo administrativo disciplinar (PAD): No âmbito da administração pública federal, os
instrumentos de apuração da responsabilidade dos servidores públicos por infrações praticadas no exercício de
suas atribuições, ou que tenham relação com as atribuições do seu cargo, são a sindicância e o processo
administrativo disciplinar (PAD), regulados nos art. 143 a 182 da Lei 8.112/1990.
Conflito de interesses: Como instrumento de proteção à moralidade administrativa, a Lei no 12.813/13 regulou
os casos de conflito de interesses na Administração Pública federal, assim consideradas as situações resultantes
do confronto entre interesses públicos e privados, suscetíveis de comprometer o interesse coletivo ou influenciar
impropriamente o exercício da função pública.

QUESTÕES DE CONCURSO

Questão Prova Oral (MPF/27º):


→Fale sobre administração pública direta e indireta. O MP pertence a qual delas?
A Administração Indireta é o conjunto de pessoas administrativas que, vinculadas a respectiva Administração
Direta (União, Estados, DF e Municípios) possuem o objetivo previsto em lei de desempenhar as atividades
administrativas de forma descentralizada. Já a Administração Direta, nos dizeres do próprio jurista, consiste no
conjunto de órgãos que integram as pessoas federativas, aos quais foi atribuída a competência para o exercício,
de forma centralizada, das atividades administrativas do Estado. O Ministério Público se aloca dentro dos órgãos
da Administração Pública direta, sendo um órgão independente e não pertencente a nenhum dos três Poderes –
Executivo, Legislativo e Judiciário. Possui autonomia na estrutura do Estado e não pode ser extinto ou ter as
atribuições repassadas a outra instituição. O papel do órgão é fiscalizar o cumprimento das leis que defendem o
patrimônio nacional e os interesses sociais e individuais, fazer controle externo da atividade policial, promover
ação penal pública e expedir recomendação sugerindo melhoria de serviços públicos.

CESPE/TRF - 3ª REGIÃO (Juiz Federal - 2011) Acerca dos órgãos e entidades que integram a administração pública

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federal e dos princípios que informam o direito administrativo, assinale a opção correta.
a) Como pessoas jurídicas criadas por lei, dotadas de capacidade de autodeterminação e de patrimônio e receita
próprios, as autarquias não se submetem a controle administrativo ou legislativo, mas apenas a controle
jurisdicional, tanto pelas vias comuns quanto pelas especiais.
b) As empresas públicas, criadas por lei específica, destinam-se à realização de atividades típicas da administração
que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada.
c) Apenas os órgãos situados no ápice da pirâmide estatal, como os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário,
dispõem de personalidade jurídica própria e plena capacidade processual.
d) As entidades da administração indireta regem-se primordialmente por normas de direito privado,
subordinando- se ao ministério em cuja área de competência estiver enquadrada sua principal atividade.
e) Afora os princípios constantes do texto constitucional, a legislação determina, de forma expressa, que a
administração pública federal obedeça, entre outros, aos princípios da motivação, razoabilidade, ampla defesa e
segurança jurídica.
Resposta: E.

7B. Teoria do órgão. Representação judicial das pessoas de Direito Público.

André Batista e Silva


Principais obras consultadas: JSCF, HLM, MSZP, Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo. Dizer o Direito.
Legislação básica: Art. 1º, § 2º, Lei 9.784/99; Art. 129, 131, CF.

TEORIA DO ÓRGÃO. Sendo pessoa jurídica, o Estado manifesta sua vontade através de seus agentes, isto é, das
pessoas físicas que pertencem a seus quadros. As teorias estão voltadas para definir ou explicar a relação entre
pessoa jurídica e o agente público. Dentre as principais teorias, destacam-se:
A) Teoria do mandato: o agente seria o mandatário. Estado e agente celebram um contrato de mandato. Crítica:
o Estado, por si só, não pode manifestar vontade, inclusive a vontade para assinar esse contrato.
B) Teoria da representação: Há uma relação semelhante à da tutela e curatela, ou seja, o agente público é o
representante da pessoa jurídica. Então, essa teoria fere a CF/88, porque a pessoa jurídica de direito público não
é incapaz.
C) Teoria do órgão ou teoria da imputação (Otto Gierke): É a teoria adotada no Brasil. A atuação do agente o
poder que ele tem de manifestar a vontade do Estado decorre de imputação legal. É a lei que confere ao agente
a possibilidade de agir em nome no Estado. Toda a atuação do agente deve decorrer de autorização legal. Se
quero saber se a autoridade é ou não competente, devo me socorrer da lei. Imputação volitiva: As vontades do
agente e do Estado se confundem, de maneira que a vontade do agente é identificada como a própria vontade
do Estado, formando uma única vontade.

CELSO ANTÔNIO, elenca três teorias para caracterizar os órgãos públicos. A primeira é a teoria subjetiva,
e de acordo com ela os órgãos públicos são os próprios agentes públicos. A segunda, teoria objetiva, prega que
os órgãos públicos seriam as unidades funcionais da administração, pecando por repudiar o agente
administrativo. A terceira, por fim, é a teoria eclética, a qual, sem ignorar os dois elementos das teorias anteriores,
peca pela ausência de unidade. O pensamento moderno, então, segundo CELSO ANTONIO, reside em caracterizar
o órgão público como um círculo efetivo de poder que, para tornar efetiva a vontade do Estado, precisa estar
integrado pelos agentes. Em outras palavras, os dois elementos se reclamam entre si, mas não constituem uma
só unidade.

Segundo o art. 1º, §2º, da Lei 9.784/99, que regula o Processo Administrativo no âmbito da Administração
Pública Federal, órgão é “a unidade de atuação integrante da estrutura da Administração direta e da estrutura da
Administração indireta”. No campo jurisprudencial, a teoria do órgão tem servido ao Processo Civil para afirmar
que, em regra, os órgãos públicos não detêm legitimidade para atuar em juízo. A legitimidade processual é dada
somente às entidades detentoras de personalidade jurídica.

Algumas características relevantes:

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1. Os órgãos públicos não têm personalidade jurídica, assim, não podem ser sujeitos de direitos e obrigações;
2. Os órgãos públicos não podem assinar contratos, quem celebra os contratos é a pessoa jurídica. Mas, podem
fazer licitação, e ao final, o contrato será celebrado pela pessoa jurídica. Em que pese esta afirmação, o direito
posto prevê a possibilidade de avença envolvendo órgãos (§ 8º do art. 37, CF, acrescido pela EC 19/98, o que é
um absurdo, segundo CELSO ANTÔNIO);
3. Os órgãos públicos não têm responsabilidade civil, será responsável a pessoa jurídica;
4. Os órgãos públicos podem até ter CNPJ, mas não terão personalidade jurídica. Há instrução normativa da
Receita Federal dizendo que órgão público tem que ter CNPJ para controlar o uso do dinheiro, mas não está
relacionado à ideia de personalidade jurídica própria. Todo órgão público tem que ter CNPJ, principalmente se
recebe dinheiro;
5. Os órgãos públicos não têm capacidade processual, mas podem ir a juízo, como sujeito ativo, em busca de
prerrogativas funcionais constitucionais. Deve-se registrar, entretanto, que parte da doutrina (CARVALHO FILHO)
restringe essa excepcional capacidade processual apenas para os órgãos mais elevados do Poder Público, de
envergadura constitucional, quando defendem suas prerrogativas e competências (ex. Assembleias legislativas).
Os conflitos de órgãos de menor expressão seriam resolvidos na intimidade do ente público, forte no princípio da
hierarquia administrativa. Registre-se, por fim, que o mesmo autor critica uma solução adotada em alguns
julgados, em que se forma litisconsórcio entre a pessoa jurídica e o órgão, uma vez que ou se atribui capacidade
processual para o órgão defender seus interesses em juízo ou esta defesa será feita pela pessoa jurídica
interessada, sendo desnecessária a de falta de técnica a duplicidade no polo da lide. Destaca-se ainda, que o
Código do Consumidor em seu art. 82, III, dispõe que são legitimados para promover a liquidação e execução de
indenização “as entidades e órgãos da administração pública, direta ou indireta, ainda que sem personalidade
jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses e direitos protegidos por este Código”.
6. São criados e extintos por lei, mas a estrutura e atribuições podem ser regulamentadas por decreto do chefe
do executivo (art. 84, VI, a, CF), desde que não haja aumento de despesa.

Súmula 525-STJ: A Câmara de vereadores não possui personalidade jurídica, apenas personalidade judiciária,
somente podendo demandar em juízo para defender os seus direitos institucionais.
STJ: Associação de Municípios e Prefeitos não possui legitimidade ativa para tutelar em juízo direitos e interesses
das pessoas jurídicas de direito público. STJ. 1ª Seção. REsp 1.503.007-CE, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em
14/6/2017 (Info 610).

Classificação dos órgãos:


I. Quanto à posição estatal: Independentes: não sofrem qualquer relação de subordinação. Os que estão no
comando de cada um dos poderes. O que existe é um controle entre os órgãos dos três poderes, e não
subordinação. Ex.: Presidência da República, Governadorias, Prefeituras, Congresso Nacional, Assembleias,
Câmaras, todos os Tribunais. Autônomos: não gozam de independência. Autonomia é uma ampla liberdade, mas
está subordinado ao órgão independente. Ex.: Secretarias e Ministérios. Superiores: têm poder de decisão, mas
não tem independência nem autonomia. Estão subordinados aos órgãos independentes e autônomos. Ex.:
Gabinetes e procuradorias. Subalternos: são os meros órgãos de execução. Ex.: Zeladoria (cuida dos bens
públicos), almoxarifado, sessão de recursos humanos.
II. Quanto à estrutura: simples (unitário) – são os órgãos que não têm outros órgãos agregados à sua estrutura
(gabinetes); compostos – são os órgãos que têm outros órgãos agregados à sua estrutura (delegacia de ensino e
as escolas ligadas a ela; hospital e postos de saúde a eles ligados).
III. Quanto à atuação funcional: singulares – são os órgãos que somente têm um agente, são os ÓRGÃOS
UNIPESSOAIS (presidência da república, governadoria do estado e prefeitura municipal); colegiados – são os
órgãos que são compostos por mais de um agente (tribunais, casas legislativas).

REPRESENTAÇÃO JUDICIAL DAS PESSOAS DE DIREITO PÚBLICO: É de se destacar que os órgãos não possuem
capacidade processual e, por isso não podem figurar em um dos polos da lide, já que lhe falta capacidade de estar
em Juízo. Em decorrência desta lógica, o STF não admite ação proposta em face ao CNJ (Pet 3674) ou ao CNMP
(ACO 1660 e 1704), indicando a União como legitimada passiva. É nesse mesmo entendimento que o STJ (Resp
1.109.840) não reconheceu a capacidade processual da Câmara Municipal, a qual litigava contra o INSS a respeito

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das contribuições previdenciárias sobre subsídios de seus membros. O ponto será devidamente abordado no
Item 4.a de Processo Civil.

12B. Hierarquia. Delegação e avocação de competências. Regime diferenciado de contratação (RDC)

Eric Márcio Fantin


Atualização do texto produzido por Adriana Oliveira Martins
Obras consultadas: (JSCF) CARVALHO FILHO, José dos Santos, Manual de direito administrativo /
José dos Santos Carvalho Filho. – 31. ed. rev., atual. eampl. – São Paulo: Atlas, 2017;
(MA/VP) ALEXANDRINO, Marcelo, PAULO. Direito Administrativo descomplicado –
24. Ed. Ver. E atual. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016.
Legislação básica:Lei 9.784/99 (Processo Administrativo) artigos 11 a 15. [Leitura obrigatória].

I. Hierarquia

JSCF: Hierarquia é o escalonamento em pleno vertical dos órgão e agentes da Administração que tem como
objetivo a organização da função administrativa. Em razão desse escalonamento firma-se uma relação jurídica
entre os agente, que se denomina de relação hierárquica.
Efeitos específicos: poder de comando dos superiores, dever de obediência dos subordinados (não obriga o agente
a cumprir ordens manifestamente ilegais), poder de revisão e, por fim, a delegação e avocação.

II. Delegação e avocação de competência

JSCF: Tanto a avocação quanto a delegação são figuras excepcionais, só justificáveis ante os pressupostos que a lei
estabelecer. Serão inválidas se de alguma forma ou por via obliqua, objetive a supressão das atribuições do círculo
de competência dos administradores públicos.
DELEGAÇÃO: Possibilidade de se atribuir a órgão ou servidor, em regra inferior hierárquico, as atribuições
originalmente desempenhadas por outro órgão ou servidor. O artigo 12 da Lei 9.784/99 admite delegação mesmo
que não exista subordinação hierárquica quando for conveniente, em razão de circunstâncias de índole técnica,
social, econômica, jurídica ou territorial.
JSCF: Exemplos de delegação: Art. 84, art. 93, XIV da CF/88 e art. 12 do Decreto-Lei 200/67 (organização da Adm
Federal e Reforma Administrativa) com atenção para o seu parágrafo único que dispõe que: O ato de delegação
indicará com precisão a autoridade delegante, a autoridade delegada e as atribuições objeto de delegação.
JSCF: A lei pode impedir que algumas funções sejam objeto de delegação, é o caso do art. 13 da Lei 9.784/99
(Processo Administrativo Federal). A delegação não retira a competência da autoridade delegante.
AVOCAÇÃO: JSCF: Autoridade hierarquicamente superior atrai para sua esfera decisória a prática de ato de
competência natural de agente com menor hierarquia. É um meio de evitar decisões concorrentes e
eventualmente contraditórias.
É ato mediante o qual o superior hierárquico traz para si, temporariamente, o exercício (e não a titularidade) de
determinada competência que a lei confere a um subordinado. Somente pode ser feita quando existe hierarquia
entre os agentes. Deve ser excepcionalíssima, a fim de evitar interferências de cunho político ou de manifesto
interesses não republicanos.
JSCF: Exemplo: Art. 103-B, §4, III da CF (avocação pelo CNJ de processos disciplinares em curso).
AVOCAÇÃO E REDISTRIBUIÇÃO DE INQUÉRITOS POLICIAIS: Lei nº. 12.830/13, art. 2º, § 4o O inquérito policial ou
outro procedimento previsto em lei em curso somente poderá ser avocado ou redistribuído por superior
hierárquico, mediante despacho fundamentado, por motivo de interesse público ou nas hipóteses de
inobservância dos procedimentos previstos em regulamento da corporação que prejudique a eficácia da
investigação.

II. Regime Diferenciado de Contratação (RDC)

Atualização do texto produzido por Fernanda Cibelle Rodrigues dos Santos


Obras consultadas: Carvalho Filho, José dos Santos Manual de direito administrativo / José dos Santos Carvalho Filho. – 31. ed. rev., atual. e ampl. – São
Paulo: Atlas, 2017.Legislação básica: Lei nº 12.462/2011, que institui o Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC.

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1. Incidência (art. 1º). O procedimento licitatório previsto pela Lei nº 12.462/2011, que instituiu o Regime
Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), foi direcionado primeiramente aos megaeventos esportivos a serem
realizados no país, especialmente a Copa das Confederações (2013), a Copa do Mundo (2014) e os Jogos Olímpicos
e Paraolímpicos de 2016. Em conexão, teve ainda como alvo as obras de infraestrutura e os serviços para os
aeroportos das capitais dos Estados, até 350 km, das cidades-sede dos referidos eventos.
Posteriormente, foi ampliada a abrangência do novo regime, que passou a regular também as ações integrantes
do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC), as obras e serviços de engenharia no âmbito do Sistema Único
de Saúde (SUS) e, por último, as obras e serviços de engenharia para construção, ampliação, reforma e
administração de estabelecimentos penais e unidades de atendimento socioeducativo. Outra ampliação: o RDC
passou a aplicar-se também a (a) ações no âmbito da segurança pública; (b) obras e serviços de engenharia, para
melhorias na mobilidade urbana ou ampliação da infraestrutura logística; (c) contratos de locação de bens móveis
e imóveis, nos quais o locador faz prévia aquisição, construção ou reforma de grande porte, com ou sem
aparelhamento de bens, por si ou por terceiros, do bem indicado pela Administração; e (d) contratos e licitações
para a realização de obras e serviços de engenharia nos sistemas públicos de ensino e de pesquisa, ciência e
tecnologia. A aplicação do regime estendeu-se, ainda, às ações em órgãos e entidades dedicados à ciência, à
tecnologia e à inovação.

2. Objetivos (art. 1º, §1º). (a) ampliar a eficiência nas contratações públicas e a competitividade entre os licitantes;
(b) promover a troca de experiências e tecnologias em busca da melhor relação entre custos e benefícios para o
setor público; (c) incentivar a inovação tecnológica; e (d) assegurar tratamento isonômico entre os licitantes e a
seleção da proposta mais vantajosa para a administração pública.

3. Princípios (art. 3º). As licitações e contratações realizadas em conformidade com o RDC deverão observar os
princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da eficiência, da
probidade administrativa, da economicidade, do desenvolvimento nacional sustentável, da vinculação ao
instrumento convocatório e do julgamento objetivo.

4. Diretrizes (art. 4º). Nas licitações e contratos regidos pelo RDC serão observadas diversas diretrizes. O destaque
vai para o § 1º que dispõe que as contratações realizadas com base no RDC devem respeitar, especialmente, as
normas relativas à I - disposição final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos gerados pelas obras
contratadas; II - mitigação por condicionantes e compensação ambiental, que serão definidas no procedimento
de licenciamento ambiental; III - utilização de produtos, equipamentos e serviços que, comprovadamente,
reduzam o consumo de energia e recursos naturais; IV - avaliação de impactos de vizinhança, na forma da
legislação urbanística; V - proteção do patrimônio cultural, histórico, arqueológico e imaterial, inclusive por meio
da avaliação do impacto direto ou indireto causado pelas obras contratadas; VI - acessibilidade para o uso por
pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida; e VII ampla publicidade, em sítio eletrônico, de todas as
fases e procedimentos do processo de licitação, assim como dos contratos, respeitado o art. 6º.

5. Fases do procedimento (art. 12). (I) preparatória; (II) publicação do instrumento convocatório; (III)
apresentação de propostas ou lances; (IV) julgamento; (V) habilitação; VI) recursal; e (VII) encerramento.

6. Critérios de julgamento (Art. 18). (I) menor preço ou maior desconto; (II) técnica e preço; (III) melhor técnica
ou conteúdo artístico; (IV) maior oferta de preço; e (V) maior retorno econômico.
O julgamento por maior desconto terá como referência o preço global fixado no instrumento convocatório, sendo
o desconto estendido aos eventuais termos aditivos (art. 19, §2º).
O julgamento pela melhor técnica ou pelo melhor conteúdo artístico considerará exclusivamente as propostas
técnicas ou artísticas apresentadas pelos licitantes com base em critérios objetivos previamente estabelecidos no
instrumento convocatório, no qual será definido o prêmio ou a remuneração que será atribuída aos vencedores.
Este critério de julgamento poderá ser utilizado para a contratação de projetos, inclusive arquitetônicos, e
trabalhos de natureza técnica, científica ou artística, excluindo-se os projetos de engenharia (art. 21).
No julgamento pelo maior retorno econômico, utilizado exclusivamente para a celebração de contratos de

45
eficiência, em que o participante propicia maior economia para a Administração, inclusive mediante redução de
despesas correntes, sendo, por isso, remunerado com base em percentual da economia gerada (art. 23).

7. Contratação integrada (art.9º). Contempla a possibilidade de um só interessado ter a seu cargo não só a
elaboração e desenvolvimento dos projetos básico e executivo, como também a sua própria execução,
concentrando atividades que, por sua natureza, reclamariam executores diversos (§1º).
Em razão da grande abertura do art. 9º, que permitia a contratação integrada mediante apenas a condição de
haver justificativa técnica e econômica, a Lei nº 12.980/2014, reduziu tal amplitude, incluindo mais três requisitos:
(a) inovação tecnológica ou técnica; (b) possibilidade de execução com diferentes metodologias; ou (c)
possibilidade de execução com tecnologias de domínio restrito no mercado (incisos I a III do art. 9º). Em
consequência, a Administração deverá demonstrar claramente a presença das condições legais, de modo que, não
o fazendo, será inválida a contratação integrada.
Por outro lado, a anterior exigência de adotar-se o critério de julgamento de técnica e preço nesse tipo de
contratação foi revogada pela mesma lei, de onde se infere que o administrador pode optar pelos demais critérios
de julgamento.

8. Outros aspectos. Os contratos regidos pelo RDC passaram a admitir a incidência de mecanismos privados de
resolução de conflitos, especialmente a arbitragem, firmada no Brasil e em língua portuguesa, e a mediação,
disciplinada pela Lei nº 13.140/2015 (art. 44-A).
O então PGR entrou com ADI contra o RDC, ainda não julgada. Vejamos trecho da notícia no site do STF: “Gurgel
lembra que, de acordo com o inciso XXI do artigo 37 da Constituição Federal, ressalvados os casos especificados
na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública
que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes.
Segundo ele, essa regra não é respeitada na Lei 12.462/11 porque a norma não fixa parâmetros mínimos para
identificar as obras, os serviços e as compras que deverão ser realizadas por meio do RDC. “Não há, reitere-se,
qualquer parâmetro legal sobre o que seja uma licitação ou contratação necessária aos eventos previstos na lei,
outorgando-se desproporcional poder de decisão ao Executivo”, conclui.
Segundo Gurgel, a experiência mostra o risco que essa delegação representa para o patrimônio público. Ele lembra
que, “por ocasião dos Jogos Panamericanos de 2007, a União, estado e município do Rio de Janeiro não
conseguiram organizar-se e identificar as obras e serviços que deveriam ser realizados”. Ele afirma que “essa foi
uma das razões para que o orçamento inicial do evento, de 300 milhões de reais, tenha sido absurdamente
ultrapassado, com um gasto final na ordem de 3 bilhões de reais”.
Ele acrescenta que “já se anunciam” deficiências graves no planejamento e na organização do Poder Executivo
para a realização da Copa do Mundo de 2014. “A transferência, ao Executivo, do regime jurídico de licitação
pública, sem quaisquer critérios preordenados na lei, além da ofensa ao artigo 37, inciso XXI, da Constituição
Federal, conspira contra os princípios da impessoalidade, moralidade, probidade e eficiência administrativa".

6A. Personalidade de Direito Público. Pessoas administrativas. Autarquia. Sociedade de economia mista. Empresa
pública. Fundação pública. Consórcios públicos. Outros entes.

Atualizado por: Daniela Nadia Wasilewski Rodrigues


Obras Consultadas: Graal 28º CPR – Graal 29º CPR – Site Dizer o Direito

A personalidade de Direito Público confere privilégios e obrigações previstas na legislação, de modo que
as pessoas jurídicas de direito público assumem uma posição de superioridade sobre o particular (supremacia do
interesse público).

Pessoas administrativas são os entes da Administração Pública incumbidos da execução das políticas
públicas (entidades da Administração Indireta). Distinguem-se das pessoas políticas, que têm poder de criar o
direito, definindo as políticas públicas a serem seguidas (entes federados).

Autarquia: é pessoa jurídica criada por lei para a prestação atividades típicas do Estado (função de polícia,

46
prestação de serviços públicos, intervenção na ordem econômica e/ou social e fomento público). Possui
personalidade jurídica de direito público. Seu regime é público (são obrigadas a licitar; submetidas à
responsabilidade objetiva; seus bens são inalienáveis, imprescritíveis e impenhoráveis; débitos sujeitos ao regime
de precatórios; privilégios processuais; etc.). Não há subordinação hierárquica da autarquia com a entidade
estatal a que pertence, mas mera vinculação, com controle administrativo exercido nos limites da lei. As
autarquias em regime especial, com destaque para as agências reguladoras e executivas são objeto do tópico 14
A.

Fundação Pública: Há 03 entendimentos distintos sobre seu regime jurídico: 1. CABM: toda fundação pública deve
seguir regime de direito público, sendo espécie de autarquia, chamada de AUTARQUIA FUNDACIONAL. 2. HELY:
antes dizia que toda fundação pública deveria ser de direito privado (DL 200/67). Com a CF/88 mudou de opinião
afirmando que a fundação pública será de direito público. Com a EC/19 muda de opinião dizendo que pode ter a
fundação pública o regime de direito privado, tendo em vista que a lei autoriza a sua instituição. 3. MSZP: a
fundação pública poderá ter regime de direito público ou regime de direito privado, o que será definido pelo
administrador no momento de sua instituição. Fundação pública de direito público é uma espécie de autarquia,
sendo a ela aplicado o regime autárquico. Fundação instituída sob o regime de direito privado seguirá o mesmo
regime das empresas públicas e sociedades de economia mista ligadas à prestação de serviços públicos, são as
chamadas: FUNDAÇÕES GOVERNAMENTAIS.

Sociedade de Economia Mista e Empresa Pública: Conforme a definição na Lei 13.303/2016:


- “Art. 3o Empresa pública é a entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, com criação
autorizada por lei e com patrimônio próprio, cujo capital social é integralmente detido pela União, pelos Estados,
pelo Distrito Federal ou pelos Municípios. Parágrafo único.”
- “Art. 4o Sociedade de economia mista é a entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, com
criação autorizada por lei, sob a forma de sociedade anônima, cujas ações com direito a voto pertençam em sua
maioria à União, aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios ou a entidade da administração indireta.”
O regime é privado, mas com regras do regime público. As EPs tem capital exclusivamente público,
embora não precise ser de um único ente; podem ser constituídas por qualquer forma empresarial e as causas
que as envolvem são julgadas perante a Justiça Federal (art. 109/CF). As SEMs podem ser constituídas com capital
misto, mas a maioria votante tem que ser do poder público; somente podem ser constituídas sob a forma de S/A
e são julgadas pela Justiça Estadual. Ambas podem prestar serviços públicos ou explorar atividades econômicas.
Quando exploram atividade econômica somente podem visar a segurança nacional e interesse coletivo
(art.173/CF). Nesse caso não têm de licitar na sua atividade fim, pois competem com a iniciativa privada. Sobre a
falência das estatais, há divergência. CABM sempre defendeu que é necessário distinguir as EP e SEM prestadoras
de serviço público das exploradoras de atividades econômicas, para ele, deve-se entender que a falência somente
será possível em casos de empresas estatais que exercem estritamente atividade econômica empresarial. JSCF
entende que não se aplica o regime falimentar a essas pessoas paraestatais, independentemente da atividade
que desempenhem. Isso porque o art. 2º, I, da Lei 11.101/05 dispôs que esta não se aplica a EP e SEM. Por fim,
no tocante a criação de subsidiárias, entende-se que pode ser realizado pela mesma lei que autorizou a criação
da empresa principal, conforme ADI 1649.

Distinção entre empresas estatais prestadoras de serviços públicos e exploradoras de atividades econômicas:

Diferenças Prestadora de Serviço Público Exploradora de atividade econômica


1. Responsabilidade Civil Teoria objetiva (CF, art. 37, §6º). Teoria subjetiva.
2. Responsabilidade O Estado responde subsidiariamente O Estado não responde subsidiariamente,
Subsidiária com base no artigo 173, §1º, CF.
Se submetem ao regime falimentar
3. Falência NÃO se submetem ao regime falimentar (ressalvada a opinião de JSCF, para quem
está também não se submete ao referido

47
regime).

CABM e MSZDP entendem que os bens


quando vinculados ao serviço são públicos.
4. Bens Os demais são particulares. JSCF defende São particulares (CC, art. 98).
que todos os bens são particulares,
recaindo, entretanto, sobre os afetados ao
serviço, a característica da
impenhorabilidade.
Deve licitar para atividade- meio,
dispensada na atividade-fim. Segundo o
Deve licitar para atividade- meio, STF poderão fazer suas licitações com
5. Licitação dispensada na atividade-fim. base em regulamento próprio, que pode
ser editado por decreto (CF, art. 173, §1º,
III).
CABM, MSZDP e o TCU entendem que se
aplica a Lei n.º 8.666/93, pois somente lei
em sentido formal pode estabelecer o
regulamento próprio

Consórcios Públicos: “são ajustes celebrados entre os entes federados para gestão associada de serviços públicos,
bem como a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos
serviços transferidos” (Rafael Carvalho, 2015, p. 132). Sua fonte constitucional é o art. 241. O tema foi tratado na
Lei 11.108/2005 e no Decreto 6017/2007. É preciso autorização legislativa para que o Executivo celebre consórcios
públicos. Além disso, o consórcio precisa ser personificado com a instituição de uma pessoa jurídica de direito
público (associação pública, autarquia interfederativa ou multifederada) ou de uma pessoa jurídica de direito
privado (associação civil), para a execução do contrato de consórcio. A nova entidade passa a integrar todos os
entes federados que dela participarem. Para Di Pietro e Marçal Justen Filho, a associação pública é uma nova
entidade da Administração Indireta. Para Carvalho Filho, trata- se de espécie de autarquia.
O processo de criação constitui-se de 3 fases: a) subscrição de protocolo de intenções; b) publicação do protocolo
na imprensa oficial; c) promulgação de lei por cada um dos integrantes ratificando o protocolo; d) celebração do
correspondente contrato. Se possuir personalidade de direito público a constituição em relação a cada ente se
inicia com a promulgação de cada lei ratificadora do protocolo de intenções. Caso tenha personalidade de direito
privado, o contrato deve ser registrado no cartório, nos termos do artigo 45 do CC. Contratos de rateio e
programa: A lei nº 11.107 prevê 2 tipos de contratos firmados entre os entes associativos: contrato de rateio e
contrato de programa. O primeiro refere-se ao instrumento a partir do qual os entes consorciados entregarão os
recursos ao consórcio público (deve haver previsão orçamentária - §5º do art. 8º da Lei). Já o contrato de
programa constitui as obrigações que cada ente deve assumir para o alcance dos fins perseguidos. Para fins de
controle, deverá ser designado um dos Chefes dos Poderes Executivos para ser o representante legal do consórcio.
O controle contábil, operacional e patrimonial caberá ao tribunal de contas competente para apreciar as contas
do chefe designado, sem prejuízo do controle externo realizado sobre o quantum aportado por cada ente,
estabelecido no contrato de rateio.
Os consórcios possuem algumas prerrogativas, tais como firmar convênios, contratos, acordos, receber auxílios,
subvenções e contribuições; promover desapropriações e instituir servidões (art. 2º, §1º, II); contratar com a
Administração por dispensa de licitação e limites mais elevados para contratação (art. 2º, §1º, III); outorgar
concessão, permissão, autorização de obras ou serviços públicos, desde que previstos no contrato de consórcio)
A União somente poderá participar de consórcio em que figure Município caso o Estado em que este se situe
também seja consorciado.

Outros entes. Ver ponto 14.a. Agências executivas e agências reguladoras. Ordens e conselhos profissionais.

48
Serviços sociais autônomos. Fundações de apoio. Além do ponto 16.a., que trata das OS/OSCIP.

Julgamentos 2016/2018

A justiça comum, federal ou estadual, é competente para julgar a abusividade de greve de servidores públicos
celetistas da Administração pública direta, autarquias e fundações públicas. STF. Plenário. RE 846854/SP, rel. orig.
Min. Luiz Fux, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, j. 1º/8/17 (repercussão geral) (Info 871).

As empresas públicas e sociedades de economia mista não têm direito à prerrogativa de execução via precatório.
STF. 1ª Turma. RE 851711 AgR/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 12/12/17 (Info 888). Em regra, as empresas estatais
estão submetidas ao regime das pessoas jurídicas de direito privado (execução comum). No entanto, é possível
sim aplicar o regime de precatórios para empresas públicas e sociedades de economia mista que prestem serviços
públicos e que não concorram com a iniciativa privada. Assim, é aplicável o regime dos precatórios às empresas
públicas e sociedades de economia mista prestadoras de serviço público próprio do Estado e de natureza não
concorrencial. STF. 1ª Turma. RE 627242 AgR, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ Acórdão Min. Roberto Barroso, j.
02/05/2017. STF. Plenário. ADPF 387/PI, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 23/3/2017 (Info 858).

A Lei 12.514/11, que trata sobre as contribuições (anuidades) devidas aos Conselhos Profissionais, é
constitucional. Sob o ponto de vista formal, esta Lei, apesar de ser fruto de uma MP que originalmente dispunha
sobre outro assunto, não pode ser declarada inconstitucional porque foi editada antes de o STF declarar ilegítima
a prática do “contrabando legislativo” (ADI 5127/DF). Ainda quanto ao aspecto formal, esta Lei não trata sobre
normas gerais de Direito Tributário, motivo pelo qual não precisava ser veiculada por lei complementar. Sob o
ponto de vista material, a Lei respeitou os princípios da capacidade contributiva, da vedação ao confisco e da
legalidade. STF. Plenário. ADI 4697/DF, Rel. Min. Edson Fachin, j. 06/10/16 (Info 842).

Os Conselhos Profissionais, apesar de sua natureza autárquica, não estão isentos do pagamento de custas
judiciais, conforme previsão expressa do art. 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96. Assim, o benefício da isenção
do preparo conferido aos entes públicos previstos no art. 4º, caput, da Lei 9.289/1996 é inaplicável aos Conselhos
de Fiscalização Profissional. STF. 1ª Turma. RMS 33572 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 09/08/2016.
STJ. 1ª Seção. REsp 1338247/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 10/10/2012 (recurso repetitivo)

Informativos de Teses/MPF
AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA. ILEGITIMIDADE ATIVA. ESTADO-MEMBRO. DESCUMPRIMENTO DE CONVÊNIO.
EMPRESA PÚBLICA ESTADUAL E UNIÃO FEDERAL. PERSONALIDADE JURÍDICA PRÓPRIA. Não detém legitimidade
ativa estado-membro para ajuizamento de ação cível originária que objetiva resguardar eventuais direitos de
pessoa jurídica participante de sua administração indireta, na hipótese de inscrição de empresa pública estadual
em Sistema Integrado de Administração Financeira (SIAFI), em razão de descumprimento de convênio firmado
entre esta e a União Federal, pois, além da existência de personalidade jurídica própria, é necessária a observância
do princípio da intranscendência subjetiva.

Questões de concurso: TRF 3 /2013


73. Assinale a alternativa incorreta:
a) Autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista, fundações governamentais e consórcios
públicos personalizados integram a Administração Pública Indireta.
b) Autarquias são pessoas jurídicas de direito público, com capacidade exclusivamente administrativa, e podem,
quanto à sua estrutura ou base, serem apartadas em corporativas ou fundacionais.
c) Fundações governamentais são, todas elas, integrantes da Administração Pública Indireta, e submetem-se
ao mesmo regime jurídico porque são igualmente pessoas jurídicas de direito privado;
d) Organizações Sociais, Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público e Consórcios Públicos são espécies
de pessoas jurídicas, as duas primeiras com personalidade de direito privado, e a terceira podendo revestir-se de
personalidade de direito público ou de direito privado, nos termos da lei, dependendo da forma como forem
organizadas;

49
e) Empresas governamentais constituem gênero compreensivo das espécies empresas públicas e sociedades de
economia mista, dotadas de personalidade de direito privado, que se submetem a regime jurídico parcialmente
de direito público, exigindo-se autorização legislativa específica para criação de cada qual.

Objetiva 29-CPR
65. EM RELAÇÃO AO CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA – CADE E AO SISTEMA BRASILEIRO DE
DEFESA DA CONCORRÊNCIA – SBDC, ASSINALE A ALTERNATIVA CORRETA:
a) ( ) O CADE é formado exclusivamente pelo Tribunal Administrativo de Defesa Econômica e pelo Departamento
de Estudos Econômicos.
b) ( ) O CADE é uma autarquia federal, com sede no Distrito Federal, vinculada ao Ministério do Planejamento,
Orçamento e Gestão.
c) ( ) A Superintendência-Geral, um dos órgãos do CADE, será gerido por um Superintendente Geral, que terá
como uma de suas atribuições, a solicitação ao Departamento de Estudos Econômicos de estudos e pareceres
técnicos.
d) ( ) O Ministério Público Federal não dispõe qualquer meio de manifestação em processos administrativos que
corram junto ao CADE, por este ser um órgão autônomo

16A. Setor público não-estatal. Organizações sociais. Organizações da sociedade civil de interesse público.

Atualizado por Felipe Fróes, em 14/09/2018


FONTES: Material do grupo MPF LEVADO À SÉRIO; Santo Graal 28CPR.
ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Administrativo descomplicado (25 ed, 2017).

O tópico está ligado ao tema “Reforma Administrativa”. Passa-se de um modelo altamente


intervencionista para outro que mais se aproxima de uma intervenção mínima, daí as privatizações, etc. Foi nesse
contexto que os pensadores da Reforma Administrativa passaram a falar em terceiro setor, ao lado do primeiro
setor, que é o Estado, e do segundo setor, que é o mercado, e em entidades públicas não estatais – são “públicas”
porque prestam atividades de interesse público, e “não estatais” porque não integram a Administração Pública
Direta ou Indireta. Com o objetivo de ampliar a descentralização na prestação de serviços públicos, criou- se o
Plano Nacional de Publicização PNP (Lei n.º 9.637/98). Fala-se em publicização porque se transfere ao setor
público não-estatal, por meio de parcerias, a prestação de atividades de caráter social antes prestadas por pessoas
e órgãos administrativos, que deverão ser extintos. Carvalho Filho critica essa denominação porque nenhuma
atividade está sendo publicizada, o que só ocorreria se uma atividade prestada pela iniciativa privada fosse
transferida para órgãos governamentais; na verdade, ocorre uma desestatização.
A doutrina aponta como entidades paralelas ao Estado os serviços sociais autônomos (vide ponto 14.a),
as entidades de apoio (fundações, associações, cooperativas), organizações sociais, organizações da sociedade
civil de interesse público e organizações da sociedade civil. Elas colaboram com o Estado desempenhando
atividade não lucrativa, e a elas o Estado dispensa especial proteção. Como pontos em comum entre todas as
entidades públicas não estatais, a autora aponta: (a) não são criadas pelo Estado, embora algumas delas precisem
de autorização em lei ou impulso estatal para criação; (b) em regra, não desempenham serviço público delegado
pelo Estado, mas atividade privada de interesse público (com a ressalva das organizações sociais); (c) recebem
algum tipo de incentivo do poder público (como um título, auxílios, subvenções, cessão de servidores públicos,
outorga de bem público); (d) possuem vínculos jurídicos com o poder público; (e) seu regime jurídico é de direito
privado, parcialmente derrogado por normas de direito público (PIETRO, 2015, p. 603-604).
As Organizações Sociais não constituem uma nova espécie de entidade, são pessoas jurídicas de direito
privado, sem fins lucrativos, instituídas por iniciativa de particulares, para o desempenho de serviços sociais não
exclusivos do Estado, e que, por preencherem determinados requisitos previstos na Lei n.º 9.637/98, recebem
um tipo especial de qualificação jurídica e vinculam-se ao Poder Público, mediante instrumento jurídico
denominado “contrato de gestão” (esse ajuste não configura propriamente um contrato, assemelhando-se muito
mais com a modalidade de convênio, na medida em que por meio deles busca-se atingir objetivos paralelos,
comuns, por meio de cooperação; não existem interesses contrapostos). Esse “contrato de gestão” é diferente
daquele referente às agências executivas.

50
A Lei n.º 9.648/98 inseriu na Lei de Licitações uma nova hipótese de dispensa de licitação, qual seja, a
celebração de contrato de prestação de serviços com as organizações sociais para atividades contempladas nos
contratos de gestão (art. 24, XXIV). Os principais requisitos estabelecidos na Lei n.º 9.637/98 são: (i) ter
personalidade jurídica de direito privado; (ii) a ausência de fins lucrativos; (iii) dedicar-se ao ensino, cultura, saúde,
pesquisa científica, desenvolvimento científico e proteção ao meio ambiente; (iv) proibição de distribuição de
lucros; (v) possuir Conselho de Administração integrado por representantes do poder público e da sociedade civil.
No caso das OS, compete ao Ministério competente fiscalizar a área da atividade em que ela vai prestar serviços,
de acordo com a mencionada qualificação. Com esse título, elas poderão receber recursos orçamentários e bens
públicos (estes por meio de permissão de uso) para atingirem seus objetivos. É possível, ainda, a cessão de
servidores públicos com ônus para o governo. Essa legislação foi impugnada na ADI 1923, tendo o STF
interpretados os dispositivos conforme a Constituição no sentido de que: o procedimento de qualificação, a
celebração do contrato de gestão e as hipóteses de dispensa de licitação e outorga de permissão de uso de bem
público sejam conduzidas de forma pública, pessoal e objetiva; os contratos com terceiros, usando recursos
públicos, e a seleção de pessoal ocorram conforme regulamento próprio e observada a forma de condução
anteriormente citada; não haja restrição do controle do MP e TCU quanto à aplicação de verbas púbicas.
Quanto à Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, seu regime de colaboração foi instituído
por meio da Lei 9.790/99. Da mesma forma que as OSs, são pessoas jurídicas de direito privado, que por
atenderem a determinados requisitos previstos na Lei, recebem um tipo especial de qualificação jurídica conferida
por meio de “termo de parceria”. Essas entidades não podem ter fins lucrativos e devem ter um dos seguintes
objetivos: promoção da saúde, educação, cultura, assistência social, segurança alimentar e nutricional, assistência
jurídica complementar, defesa do meio ambiente, promoção do desenvolvimento econômico e social, incluindo
o combate à pobreza, experimentação de novos modelos sócio- produtivos, promoção do voluntariado, realização
de estudos, pesquisas, desenvolvimento de tecnologias alternativas relacionados a esses objetivos, promoção de
valores universais, como ética, paz, cidadania, direitos humanos, democracia. Além disso, não podem estar
incluídas no rol das pessoas jurídicas impedidas, previsto no art. 2º da Lei (cooperativas, sindicatos, organizações
sociais, etc). Compete ao Ministério da Justiça conferir a essas entidades a qualificação de OSCIP.
No entanto, cumpre anotar que, diferentemente das OSCIP, as OSs são discricionariamente qualificadas
pelo Ministério correspondente à sua área de atuação, porque possuem vínculo direto com o Ministério que
mantêm identidade (art. 2º, II, Lei 9.637/98). Também não possuem as OSCIP um Conselho de Administração,
mas sim um Conselho Fiscal, sendo que este não existe nas OS. Não predomina nas OSCIPs o regramento de direito
público, a despeito do art. 10, V, da Lei 9790/99. A fiscalização pelos Tribunais de Contas restringe-se às verbas
públicas repassadas às entidades (art. 4º, VII, d, da Lei 9790/99). A Lei 13.019/2014 introduziu algumas inovações
no tratamento das OSCIPs. Por exemplo, o chamamento público tornou-se obrigatório em todas as esferas de
governo, colocando-se como instrumento adequado para a seleção de entidade com a qual a Administração
Pública pretenda fazer parceria. Foram exigidos certos requisitos para a seleção de entidade em chamamento
público (art. 24, par. 1, VII c/c art. 28) (PIETRO, 2015, p. 627-629). Além disso, a partir da vigência da Lei, para se
qualificarem como OSCIPs, as entidades deverão ser pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos que
tenham sido constituídas e se encontrem em funcionamento regular há, no mínimo, 3 (três) anos.
Caso descumpram as regras do contrato de gestão/termo de parceria, as OSs ou OSCIPs poderão ser
desqualificadas, com a reversão de bens e recursos públicos ao erário e seus dirigentes responsabilizados pelos
danos ocasionados. Por receberem recursos públicos, devem prestar contas e qualquer irregularidade deve ser
prontamente comunicada ao TCU, MPF e AGU, para fins de adoção das medidas administrativas e judiciais
cabíveis. Membros de ambas podem responder por improbidade administrativa. Ademais, a necessidade de
concurso público limita-se aos entes de direito público, bem como às sociedades de economia mista e às empresas
públicas.
Pode-se elencar, dentre as principais diferenças entre essas duas qualificações, as seguintes: pretendeu-
se com as OS que elas assumissem determinadas atividades desempenhadas por entidades da administração,
resultando na extinção destas. Nas OSCIP, essa intenção não resulta, implícita ou explicitamente, da lei, pois a
qualificação da entidade como tal não afeta a existência ou as atribuições de entidades ou órgãos integrantes da
administração. A OS recebe ou pode receber delegação para prestação de serviço público, enquanto a OSCIP
exerce atividade de natureza privada, com a ajuda do Estado (PIETRO, 2015, p. 624). CABM cita mais duas
diferenças: o poder público não participa dos quadros diretivos das OSCIP, como acontece com as OS, não

51
obstante seja possível a participação de servidores públicos, sem direito à remuneração; o objeto das OSCIP é
muito mais amplo que o das OS. Além disso, as OS firmam contrato de gestão, e as OSCIP, termo de parceria.
Enfim, as OS são mais atreladas ao poder público do que as OSCIP.
OBS: recomenda-se a leitura da Lei 13.019/2914 (marco regulatório das organizações da sociedade civil),
apesar de essa legislação nas se aplicar às OSs e às OSCIPs (art. 3º da referida lei).

14A. Agências executivas e agências reguladoras. Ordens e conselhos profissionais. Serviços sociais autônomos.
Fundações de apoio.

Atualizado por Felipe Fróes, em 14/09/2018


FONTES: Material do grupo MPF LEVADO À SÉRIO; Santo Graal 28CPR.
ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Administrativo descomplicado (25 ed, 2017).

O vocábulo agência foi importado do direito norte americano. No Brasil, as agências autárquicas
classificam-se em duas categorias: a) agências reguladoras, que possuem a função básica de controle e
fiscalização, que surgiram por força do regime de desestatização; b) agências executivas, mais apropriadas para
a execução efetiva e descentralizada de certas atividades administrativas típicas de Estado (CARVALHO FILHO, p.
483).
As agências reguladoras (manifestação da “administração policêntrica”), são qualificadas como
autarquias sob o regime especial. Possuem as características gerais das autarquias, sendo também pessoa jurídica
de direito público, integrante da Administração Indireta, criada por lei específica para desempenhar funções que,
despidas de caráter econômico, sejam próprias e típicas do Estado. Entretanto, possuem características
peculiares. As agências surgiram com o objetivo de disciplinar e controlar certas atividades, tais como: serviços
públicos propriamente ditos; atividades de fomento e fiscalização da atividade privada; atividades que o Estado
também protagoniza, mas que, paralelamente, são facultadas aos particulares, dentre outras.
Da mesma forma que as autarquias tradicionais, possuem como elementos intrínsecos: independência
administrativa ou autonomia administrativa; autonomia funcional e patrimonial da gestão de recursos humanos
ou de quaisquer outros que lhe pertençam; autonomia nas suas decisões técnicas (suas leis de criação possuem
baixa densidade normativa); ausência de subordinação hierárquica. O que de fato caracteriza a agência
reguladora como autarquia especial são as disposições atinentes à investidura do mandato dos seus dirigentes.
Eles são nomeados pelo Presidente da República, sob aprovação do Senado, e exercem mandatos fixos, somente
podendo perdê-los em caso de renúncia, de condenação judicial transitada em julgado ou de processo
administrativo disciplinar (ver artigos, 5º, 6º e 9º da Lei 9.986/00). Essa característica da investidura dos
dirigentes é o ponto principal para caracterizar as agências reguladoras como autarquias especiais, sendo, para
muitos, uma entidade sui generis. Sobre a nomeação de dirigentes, o STF declarou constitucionais leis estaduais
que exigiam a aprovação prévia da Assembleia Legislativa, vedando apenas a exigência de fornecimento de
declaração de bens e poderes de destituição exclusivos ao órgão (ADIs 2225 e 1949).
A principal função das agências é a reguladora1, que pode ser considerada como uma competência de as
agências expedirem normas com o intuito de regularem a prestação, a fiscalização e a fruição dos serviços públicos
que lhe são afetos. São criadas com a finalidade de absorver as matérias antes concentradas no Executivo, não
havendo controle de subordinação ou hierarquia, mas uma tutela administrativa quanto aos fins. Nesse passo, a
essas autarquias reguladoras foi atribuída a função de controlar, em toda a sua extensão, a prestação de serviços
públicos e o exercício de atividades econômicas, bem como a própria atuação das pessoas privadas que passaram
a executá-los, inclusive impondo sua adequação aos fins colimados pelo Governo e às estratégias econômicas e
administrativas que inspiraram o processo de desestatização. Ademais, tais autarquias deverão ser fortes e
atentas à área sob seu controle, de modo a evitar que as pessoas privadas pratiquem abuso de poder econômico,
visando à dominação dos mercados e à eliminação da concorrência, provocando aumento arbitrário de seus
lucros. Sobre a relação jurídica entre as agências e as entidades de direito privado, são necessários mecanismos
para evitar a ingerência destas naquelas. Com base nisso, surgiu a chamada teoria da captura, pela qual se busca

1 Segundo Mello, as Agências Reguladoras não possuem competência regulamentar propriamente dita, uma vez que está é, nos termos da CF, declarada
privativa do Chefe do Executivo. Para Alexandrino, o desempenho dessa competência normativa pode ser denominado de “discricionariedade técnica”.

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impedir uma vinculação promíscua entre a agência, de um lado, e o governo instituidor ou os entes regulados, de
outro, com flagrante comprometimento da independência da pessoa controladora (CARVALHO FILHO, p. 466).
Os seus servidores devem sujeitar-se ao regime jurídico estatutário (Lei 8.112). Os Estados, DF e
Municípios também podem criar suas próprias agências autárquicas quando se tratar de serviço público de sua
respectiva competência, cuja execução tenha sido delegada a pessoas do setor privado, inclusive e principalmente
concessionários e permissionários. O que se exige é que a entidade seja instituída por lei, nela sendo definidas a
organização, as competências e a devida função controladora, como exige o artigo 37, XIX, da CF (CARVALHO
FILHO, p. 486). Exemplos: ANEEL; ANATEL; ANP; ANVISA; ANS; ANA; ANTT; Agência Nacional do Cinema - ANCINE;
ANAC.
Por sua vez, considera-se agência executiva a autarquia ou fundação pública assim qualificada por ato
do chefe do Executivo, que celebra com o órgão da Administração Pública direta ao qual se acha vinculado um
contrato de gestão (diferente daquele firmado com as OS, conforme ponto 16.a), com vistas à melhoria da
qualidade de gestão e redução de gastos, passando, com isso, a gozar de maiores privilégios. Assim, as agências
executivas, ao contrário das agências reguladoras, não são criadas para o desempenho de competências
específicas (CUNHA JUNIOR, p. 199). A base de sua atuação é a operacionalidade, ou seja, visam à efetiva execução
e implementação da atividade descentralizada (CARVALHO FILHO, p. 486). Di Pietro destaca que se trata de
medida que visa a melhorar a eficiência das entidades autárquicas e fundacionais (DI PIETRO, p. 524). A previsão
inicial dessa categoria de autarquias ocorreu com o advento da Lei 9.649/98, que dispõe sobre a organização da
Presidência da República e dos Ministérios na Administração Pública Federal. Conforme o disposto no art. 51 do
referido diploma, ato do Presidente da República poderá qualificar como agência executiva autarquias e
fundações, desde que: 1) tenham plano estratégico de reestruturação e de desenvolvimento institucional em
andamento; 2) tenham celebrado contrato de gestão com o Ministério supervisor.
A tais agências, a lei assegura autonomia de gestão e a disponibilidade de recursos orçamentários e
financeiros para que possam cumprir suas metas e seus objetivos institucionais. As agências executivas não se
configuram como categoria nova de pessoas administrativas; a expressão corresponde apenas a uma qualificação
(ou título) atribuída a autarquias ou fundações governamentais. A agência executiva é um status (CUNHA JUNIOR,
p. 199). Os contratos de gestão serão celebrados com periodicidade mínima de 01 (um) ano e estabelecerão os
objetivos, metas e respectivos indicadores de desempenho da entidade, bem como os recursos necessários e os
critérios e instrumentos para a avaliação do seu cumprimento.
A autarquia ou fundação qualificada como agência executiva poderá ter um tratamento diferenciado
relativamente às demais autarquias ou fundações. Por exemplo, são destinatárias de um privilégio, não extensivo
às demais, consistente na dispensa de licitação para os contratos cujos valores correspondem ao dobro do limite
estipulado para a dispensa de licitação das autarquias e fundações que não são agências executivas (vide
parágrafo único do art. 24 da Lei 8.666/93).
A qualificação como agência executiva será feita por meio de decreto e ficará mantida desde que o
contrato de gestão seja sucessivamente renovado e que o plano estratégico de reestruturação e de
desenvolvimento institucional tenha prosseguimento ininterrupto, até a sua conclusão. Se descumprida essa
condição, será desqualificada a autarquia ou a fundação como agência executiva, por meio de decreto do chefe
do Executivo, por iniciativa do Ministério supervisor. Os Estados e Municípios, dentro de sua competência
material, poderão qualificar suas autarquias ou fundações públicas como agências executivas. Exemplos: Instituto
Nacional de Metrologia, Normatização e Qualidade Industrial (INMETRO) e a Agência de Inteligência, instituída
pela Lei 9.883/99. Com a mesma natureza foram reinstituídas a SUDAN - Superintendência do Desenvolvimento
da Amazônia e a SUDENE – Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste. Todas essas entidades continuam
a ser autarquias.
Quanto às Ordens e Conselhos Profissionais, são chamadas de autarquias profissionais ou corporativas,
incumbidas da inscrição de certos profissionais e de fiscalizar sua atividade. Segundo Carvalho Filho, a Lei
9.649/98, que teve o escopo de reorganizar a administração federal, passou a estabelecer que os serviços de
fiscalização de profissões regulamentadas seriam exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público,
mediante autorização legislativa (art. 58). Consignava, ainda que os conselhos de fiscalização teriam
personalidade jurídica de direito privado, sem vínculo funcional ou hierárquico com os órgãos da Administração
Pública (art. 58, §2º). Sua organização e estrutura seriam fixadas por decisão interna do plenário (art. 58, §8º).
Todos esses dispositivos foram declarados inconstitucionais, já que inviável é a delegação, a entidade privada, de

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atividade típica do Estado, ainda mais quando se sabe que nele está incluído o exercício do poder de polícia, de
tributação e de punição, no que tange a atividades profissionais regulamentadas (ADI 1717). Por outro lado, foi
declarada constitucional a Lei 12.514/2011 (que trata sobre as anuidades devidas aos conselhos profissionais),
pois foi editada antes de o STF proibir a prática do “contrabando legislativo” em MPs, não trata sobre normas
gerais de direito tributário (logo, não precisava ser uma lei complementar) e respeitou os princípios da capacidade
contributiva, vedação ao confisco e legalidade (ADI 4697). Os conselhos profissionais (com exceção da OAB,
tratada abaixo) não podem ajuizar ADI, ADC e ADPF.
Sobre a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), decidiu-se que tal autarquia não integra a Administração
Indireta da União, configurando-se como entidade independente; assim, não está vinculada a qualquer órgão
administrativo, nem se sujeita ao respectivo controle ministerial. Na verdade, foi utilizada a terminologia
autarquia sui generis pelo STJ para qualificar a OAB, nos moldes do Resp. 915.753/RS: “A OAB possui natureza de
autarquia especial ou sui generis, pois, mesmo incumbida de realizar serviço público, nos termos da lei que a
instituiu, não se inclui entre as demais autarquias federais típicas, já que não busca realizar os fins da
Administração. As contribuições pagas pelos filiados à OAB não têm natureza tributária. As cobranças das
anuidades da OAB, por não possuírem natureza tributária, seguem o rito do Código de Processo Civil, e não da Lei
n. 6.830/80. A OAB é entidade que não pode ser comparada às demais autarquias profissionais, porque, além de
seu objetivo básico – de representação da categoria dos advogados – tem ainda função institucional de natureza
constitucional. Seu pessoal é regido pela CLT, mas não se submete ao art. 37, II, da CF, que exige prévia aprovação
em concurso público para a contratação dos servidores.” (ADI 3.026 -DF). As contribuições pagas pelos inscritos
não tem natureza tributária. A entidade não se sujeita às normas da Lei 4.320/64 (direito financeiro), nem ao
controle contábil, financeiro, orçamentário, operacional e patrimonial exercido pelo Tribunal de Contas da União.
Trata-se de regime especial, diverso do adotado para as autarquias em geral. Não é idêntico, com certeza, ao
adotado para as agências reguladoras – autarquias de regime especial - mas é inegável que ostenta caráter de
excepcionalidade em relação ao sistema autárquico comum. Exemplos de ordens e conselhos profissionais: OAB;
CRM (Conselho Regional de Medicina); CREA (Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura), e outras do gênero
(CARVALHO FILHO, p. 469 a 471).
Sobre os Serviços Sociais autônomos, tais entidades privadas criadas diretamente por lei, para prestar,
sem fins lucrativos, certos serviços sociais consistentes em ministrar assistência ou ensino a determinadas
categorias sociais ou profissionais. São entes paraestatais, de cooperação com o Poder Público, e não prestam
serviço público delegado pelo Estado, mas atividade privada de interesse público (serviços não exclusivos do
Estado) (DI PIETRO, 2012, págs. 558-559). Recebem do Estado incentivo através de dotações orçamentárias
específicas ou contribuições parafiscais instituídas em seu favor e pagas pelos empresários e todos que exercem
atividade industrial. As contribuições parafiscais são espécies de contribuições sociais (art. 149 CF), assim
denominadas porque são destinadas a entidades paralelas do Estado. Apesar de não pertencerem ao Estado, os
serviços sociais autônomos são instituídos por lei. Para existirem, dependem de atos constitutivos de
responsabilidade das respectivas Confederações Nacionais. Exemplos: SESI- Serviço Social de Indústria, o SESC –
Serviço Social do Comércio, o SENAI – Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial, o SENAC – Serviço de
Aprendizagem Comercial, o SENAR – Serviço de Aprendizagem Rural (CUNHA JUNIOR, p. 230 e 231). Gozam de
imunidade tributária, mas não possuem prerrogativa processual de Fazenda Pública. Em regra, a competência
para julgamento de demandas contra eles é da Justiça Comum Estadual (Súmula 516 do STF).
Finalmente, sobre as Fundações de Apoio (ou entidade de apoio) diga-se que são pessoas jurídicas de
natureza privada que exercem, sem fins lucrativos, a atividade social (serviços sociais não exclusivos do Estado)
relacionada à ciência, pesquisa, saúde e educação (comumente, elas atuam junto a hospitais públicos e
universidades públicas). São instituídas por particulares, em regra diretamente por servidores públicos, que agem
em nome próprio e com recursos próprios, para exercerem atividade de interesse social relativa ao serviço
prestado pela entidade estatal ou administrativa em que estes servidores atuam. Recebem fomento do Estado,
quer através de dotações orçamentárias específicas, quer por meio de cessão provisória de servidores públicos
quer por permissão provisória de uso de bens públicos. São geralmente instituídas sob a forma de fundação de
natureza privada (mas podem ser instituídas também sob a forma de associação ou cooperativa), mas que
precisam celebrar vínculos jurídicos com o Estado, em regra sob a forma de convênios. Não se sujeitam ao regime
jurídico-administrativo, uma vez que prestam atividade de natureza privada. Assim, os seus contratos são de
direito privado, celebrados sem licitação e seus empregados são celetistas, contratados sem concurso público.

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Exemplo: Fundação Faculdade de Direito Bahia, vinculada à Universidade Federal da Bahia (CUNHA JUNIOR, p.
231 e 232). Essas entidades não tinham disciplina legal específica, apenas existindo a Lei 8.958/94, que veio
estabelecer as normas que disciplinam as relações entre as instituições federais de ensino superior e de pesquisa
científica e tecnológica e as fundações de apoio. São regidas pelo Código Civil, e sujeitas, em especial, à fiscalização
do Ministério Público, nos termos do CC e do CPC, à legislação trabalhista e ao prévio registro e credenciamento
no Ministério da Educação e do Desporto e no Ministério da Ciência e Tecnologia, renovável bienalmente. O
Decreto presidencial 5.205/04 regulamentou a Lei 8.958/94, E foi depois revogado pelo Decreto nº 7.423, de 31
de dezembro de 2010. Recentemente, a Lei n. 13.019/2014 veio suprir a lacuna existente, uma vez que abrange
todas as entidades privadas sem fins lucrativos que firmam parceria com o poder público de todos os entes
federativos, e algumas de suas normas atingirão as fundações de apoio, como as constantes nos artigos 39 a 41
(PIETRO, 2015, p. 617618).

5. SERVIÇOS PÚBLICOS
5.1 Serviço público. Conceito. Classificação. Regime juri ́dico. Remuneração. Direitos e deveres dos usuários. (14.b)
5.2 Concessão de serviço público. Natureza juri ́dica e conceito. Regime financeiro. (19.a)
5.3 Extinção da concessão de serviço público. Reversão dos bens. (19.a)
5.4 Permissão e autorização. (19.a)

14B. Serviço Público. Conceito. Classificação. Regime Juri ́dico. O Usuário do Serviço Público. Remuneração.
Direitos e Deveres dos Usuários.

Renata Souza
Materiais consultados: Graal do 28º CPR; CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 28. ed. rev., ampl. e atual. até 31-12-2014.
São Paulo: Atlas, 2015; DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 30. ed. rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2017;
Comentários do site Dizer o Direito.

I. Conceito de Serviço Público

Serviço público é toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material destinada à satisfação da
coletividade em geral, mas frui ́vel singularmente pelos administrados, que o Estado assume como pertinente a
seus deveres e presta por si mesmo ou por quem lhe faça à s vezes, sob um regime de Direito Público – portanto,
consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais –, institui ́do em favor dos interesses
definidos como públicos no sistema normativo (MELLO, p. 679).

José dos Santos Carvalho Filho conceitua serviço público como “toda atividade prestada pelo Estado ou por seus
delegados, basicamente sob regime de direito público, com vistas à satisfação de necessidades essenciais e
secundá rias da coletividade.” – CARVALHO FILHO, p. 333.

II. Classificações

1. Serviços públicos pró prios x impró prios:


- Serviços públicos próprios: são aqueles que, atendendo a necessidades coletivas, o Estado assume como seus e
os executa direta (por meio de seus agentes) ou indiretamente (por meio de concessionários e permissionários).
- Serviços públicos impróprios: são os que, embora atendendo também a necessidades coletivas, não são
assumidos nem executados pelo Estado, seja direta ou indiretamente, mas apenas por ele autorizados,
regulamentados e fiscalizados; correspondem a atividades privadas e recebem impropriamente o nome de
serviços públicos. Exemplos: os serviços prestados por instituições financeiras, os de seguro e de previdê ncia
privada.
* José dos Santos Carvalho Filho prefere utilizar a classificação em serviços delegáveis (por sua natureza,
comportam ser executados pelo Estado ou por particulares colaboradores) e indelegáveis (só podem ser
prestados pelo Estado diretamente).

2. Serviços públicos administrativos x comerciais (ou industriais) x sociais:

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- Serviços públicos administrativos: são os que a Administração Pública executa para atender às suas
necessidades internas ou preparar outros serviços que serão prestados ao público. Exemplo: imprensa oficial.
- Serviços públicos comerciais ou industriais: aqueles que a Administração pública executa, direta ou
indiretamente, para atender a necessidades coletivas de ordem econô mica. Exemplos: transportes, energia
elétrica, telecomunicações, etc.
- Serviços públicos sociais: aqueles que atendem a necessidades coletivas em que a atuação do Estado é essencial,
mas que convivem com a iniciativa privada. Exemplos: saúde, educação, previdê ncia, cultura e meio ambiente.

3. Serviços públicos gerais/coletivos (uti universi) x individuais/singulares (uti singuli):


- Serviços públicos gerais/coletivos (uti universi): são aqueles prestados a grupos indeterminados de indivi ́duos,
de acordo com as opções e prioridades da Administração Pública, e em consonância com os recursos disponíveis.
Exemplos: serviços de pavimentação de ruas, de iluminação pública, de implantação do serviço de abastecimento
de água e de prevenção de doenças.
- Serviços públicos individuais/singulares (uti singuli): dirigem-se a destinatários individualizados, sendo
mensurável a utilização por cada um destes indivi ́duos. Exemplos: energia domiciliar e uso de linha telefô nica.
* Pelo conceito restrito de serviço público adotado por Celso Antônio Bandeira de Mello, somente os serviços uti
singuli efetivamente consistem em serviços públicos.

4. Serviços públicos exclusivos x não exclusivos:


- Serviços públicos exclusivos: o poder público deve prestá-los de forma exclusiva. Exemplos: serviço postal e
correio aéreo nacional.
- Serviços públicos não exclusivos: podem ser prestados pelo Estado ou pelo particular (mediante autorização do
Poder Público). Exemplos: saúde, previdência social, assistência social e educação.

5. Serviços públicos administrativos x de utilidade pública:


- Serviços públicos administrativos: são aqueles que o Estado executa para compor melhor a sua organização.
Exemplo: serviço de implantação de centro de pesquisas
- Serviços públicos de utilidade pública: destinam-se diretamente aos indivi ́duos, isto é, são proporcionados para
sua fruição direta. Exemplos: energia domiciliar, fornecimento de gás, atendimento em postos médicos e ensino.

III. Regime Jurídico

Sobre o tema, José dos Santos Carvalho Filho esclarece: “Como o serviço é institui ́do pelo Estado e alveja o
interesse coletivo, nada mais natural que ele se submeta a regime de direito pú blico. Na verdade, não se precisa
admitir que a disciplina seja integralmente de direito público, porque, como é sabido, alguns particulares prestam
serviços em colaboração com o Poder Público. Embora nessas hipóteses incidam algumas regras de direito
privado, nunca incidirão elas integralmente, sendo necessário que algumas normas de direito público disciplinem
a prestação do serviço. Pode-se até mesmo dizer que nesses casos o regime será híbrido, predominando, porém,
o regime de direito público quando em rota de colisão com o de direito privado. Inúmeras são as normas de direito
público aplicáveis aos serviços públicos, destacando-se a que impõ e a fiscalização do serviço; a supremacia do
Estado no que toca à execução; a prestação de contas e outras do gê nero.” – CARVALHO FILHO, p. 334.

IV. Princípios

Regem os serviços públicos os seguintes princípios:

a) dever inescusável do Estado de promover-lhe a prestação direta ou indiretamente;



b) supremacia do interesse público;

c) adaptabilidade ou atualidade (atualização e modernização dentro das possibilidades econômicas do Poder
Público);


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d) universalidade ou generalidade (o serviço público deve ser prestado a todas as pessoas ou, pelo menos, ao maior
universo possível de pessoas);

e) impessoalidade (não discriminação entre usuários);

f) continuidade (direito dos usuários à não suspensão ou interrupção – Obs.: há uma exceção expressa na Lei nº
8.987/95: o art. 6º, §3º estabelece que não viola o princípio da continuidade a interrupção do serviço por razões de
ordem técnica ou de segurança ou pelo inadimplemento do usuário. A interrupção por razões de ordem técnica é
indiscutível (exemplo: caiu um poste). E a interrupção por inadimplemento, hoje, também é admitida pela doutrina
majoritária, desde que haja o prévio aviso e resguardados os interesses da coletividade; assim, não pode haver a
interrupção de um serviço essencial à coletividade (exemplo: hospital).
g) transparência (acesso ao público do conhecimento relativo ao serviço e a sua prestação);
h) motivação (dever de fundamentar as decisões atinentes ao serviço);

i) modicidade das tarifas (também aplicável às taxas, se esta for a modalidade de contraprestação);
j) controle interno e externo sobre as condições de sua prestação;
k) cortesia (impõe a educação, a urbanidade na prestação do serviço público);
l) regularidade;
m) efetividade;
n) segurança.

V. O Usuário do Serviço Pú blico

De acordo com a Lei nº 13.460/2017, usuário é a pessoa física ou jurídica que se beneficia ou utiliza, efetiva ou
potencialmente, de serviço público. A figura central em tema de serviço público é o usuário, haja vista que o
serviço é institui ́do unicamente em seu favor. O agente executivo do serviço, seja a própria Administração ou o
concessionário, tem obrigação de prestar o serviço ao usuário ou consumidor, nos termos fixados nas leis e
regulamentos. De fato, a justificativa substancial para a existê ncia do próprio Estado é a de oferecer aos
administrados as utilidades e comodidades que se constituem nos serviços públicos (MELLO, p. 751 e 752).

VI. Remuneração

Os serviços públicos podem ser gratuitos ou remunerados.

1. Serviços públicos gratuitos:

Os serviços públicos gratuitos possuem cunho basicamente social e devem levar em consideração fatores
singulares de indivi ́duos ou comunidades. Como regra, são gratuitos os serviços de assistê ncia médica, educação,
apoio a coletividades carentes, entre outros. Obs.: Nada impede, contudo, que, em serviços dessa natureza, seja
cobrada remuneração (taxa, em regra) de alguns sujeitos em favor de outros de baixa condição socioeconômica.

2. Serviços públicos remunerados:

O serviço público, de outro lado, é dito remunerado quando os indivíduos têm um dever pecuniário como
contraprestação do serviço. A forma de remuneração varia.

Alguns serviços são remunerados por taxas, espécie de tributo (art. 145, II, da CF). São remunerados por taxas os
serviços obrigatórios, impostos aos administrados. José dos Santos Carvalho Filho, no entanto, alerta para o fato
de que “a cobrança da taxa só é legi ́tima se o serviço público, prestado ou disponibilizado ao usuário, for especi ́fico
e divisi ́vel, como expressa o art. 145, II, da Constituição. Será especi ́fico, quando tiver linhas próprias de
identificação, e divisi ́vel, quando o usuário receber parcelas individualizadas do serviço.” – CARVALHO FILHO, p.
351. Exemplos de serviços remunerados por taxas: serviço de prevenção de incêndio e serviço de coleta de lixo.

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Obs.: É preciso diferenciar o serviço de coleta individual regular dos resi ́duos sólidos, remunerado por taxa
(presença dos requisitos da divisibilidade e especificidade, bem como o exerci ́cio do poder de poli ́cia), do serviço
de limpeza pública consistente em varrição, lavagem e capinação das vias e logradouros públicos, e no
desentupimento de bueiros, de outro, cujos custos devem ser cobertos pelos recursos advindos do pagamento
dos impostos em geral (caráter geral e constitui atividade ti ́pica do Poder Público e essencial para a coletividade).

A remuneração também pode se dar por tarifa. Nesta linha, os serviços facultativos são remunerados por tarifa,
que é caracterizada como preço público. O pagamento é devido pela efetiva utilização do serviço, e dele poderá
o particular não mais se utilizar se assim desejar. Exemplos de serviços remunerados por tarifas: energia elétrica
e transportes urbanos.

Por fim, José dos Santos Carvalho Filho destaca que “(...)não se pode deixar de registrar que, em última análise,
impostos e contribuições de melhoria, modalidades tributárias, também são idô neos a remunerar certos serviços
públicos. Os impostos destinam-se à execução de serviços gerais do Estado, não havendo vinculação entre o
pagamento e os fins a que se destinam os respectivos recursos. Por outro lado, a contribuição de melhoria visa a
reembolsar o Estado por despesas efetuadas na execução de obras que tenham produzido valorização nos imóveis
por elas beneficiados (art. 145, III, CF).” – CARVALHO FILHO, p. 352/353.

VII. Direitos e Deveres dos Usuários

- Direitos:

De acordo com José dos Santos Carvalho Filho, o direito fundamental do usuário é o direito ao recebimento do
serviço, desde que aparelhado devidamente para tanto. Além disso, a doutrina reconhece o direito à indenização
no caso de o serviço ser mal prestado ou de ser interrompida a sua prestação, provocando prejui ́zos ao particular.

A Lei nº 12.007/2009, assegurou aos usuários consumidores o direito à declaração de quitação anual de débitos,
a ser emitida pelas pessoas juri ́dicas prestadoras de serviços públicos (ou privados). Ressalte-se que tal direito
refere-se apenas aos serviços especi ́ficos e individuais, nos quais o usuário é identificado, como energia elétrica e
uso de linha telefônica.

“Alguns diplomas legais, reguladores de serviços públicos, tê m dedicado normas ou capi ́tulos especiais através
dos quais se asseguram os direitos dos usuários. Vale a pena citar, entre outras, a Lei nº 8.987/95, que regula as
concessõ es e permissõ es de serviços públicos (arts. 7º e 7º-A); a Lei no 11.445/2007, que dispõ e sobre o
saneamento básico, exigindo que o titular dos serviços fixe os referidos direitos (art. 9º, IV) e prevendo o controle
social, em que os usuários devem participar dos respectivos órgãos de controle (art. 47, IV); e a Lei no
12.587/2012, que institui a Poli ́tica Nacional de Mobilidade Urbana, com realce para o serviço de transportes
coletivos (art. 14), prevendo-se também a participação do usuário em órgãos de controle (art. 15).” – CARVALHO
FILHO, p. 354.

Em 2017, foi editada a Lei nº 13.460, que dispõe sobre participação, proteção e defesa dos direitos do usuário dos
serviços públicos da administração pública. A lei afirma que o usuário de serviço público tem direito à adequada
prestação dos serviços, devendo os agentes públicos e prestadores de serviços públicos observar diversas
diretrizes, quais sejam: I - urbanidade, respeito, acessibilidade e cortesia no atendimento aos usuários; II -
presunção de boa-fé do usuário; III - atendimento por ordem de chegada, ressalvados casos de urgência e aqueles
em que houver possibilidade de agendamento, asseguradas as prioridades legais às pessoas com deficiência, aos
idosos, às gestantes, às lactantes e às pessoas acompanhadas por crianças de colo; IV - adequação entre meios e
fins, vedada a imposição de exigências, obrigações, restrições e sanções não previstas na legislação; V - igualdade
no tratamento aos usuários, vedado qualquer tipo de discriminação; VI - cumprimento de prazos e normas
procedimentais; VII - definição, publicidade e observância de horários e normas compatíveis com o bom
atendimento ao usuário; VIII - adoção de medidas visando a proteção à saúde e a segurança dos usuários; IX -
autenticação de documentos pelo próprio agente público, à vista dos originais apresentados pelo usuário, vedada

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a exigência de reconhecimento de firma, salvo em caso de dúvida de autenticidade; X - manutenção de instalações
salubres, seguras, sinalizadas, acessíveis e adequadas ao serviço e ao atendimento; XI - eliminação de
formalidades e de exigências cujo custo econômico ou social seja superior ao risco envolvido; XII - observância dos
códigos de ética ou de conduta aplicáveis às várias categorias de agentes públicos; XIII - aplicação de soluções
tecnológicas que visem a simplificar processos e procedimentos de atendimento ao usuário e a propiciar melhores
condições para o compartilhamento das informações; XIV - utilização de linguagem simples e compreensível,
evitando o uso de siglas, jargões e estrangeirismos; e XV - vedação da exigência de nova prova sobre fato já
comprovado em documentação válida apresentada.

O art. 6º, da Lei nº 13.460/2017, elenca como direitos básicos do usuário de serviço público: I - participação no
acompanhamento da prestação e na avaliação dos serviços; II - obtenção e utilização dos serviços com liberdade
de escolha entre os meios oferecidos e sem discriminação; III - acesso e obtenção de informações relativas à sua
pessoa constantes de registros ou bancos de dados, observado o disposto no inciso X do caput do art. 5º da
Constituição Federal e na Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011; IV - proteção de suas informações pessoais,
nos termos da Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011; V - atuação integrada e sistêmica na expedição de
atestados, certidões e documentos comprobatórios de regularidade; e VI - obtenção de informações precisas e de
fácil acesso nos locais de prestação do serviço, assim como sua disponibilização na internet, especialmente
sobre: a) horário de funcionamento das unidades administrativas; b) serviços prestados pelo órgão ou entidade,
sua localização exata e a indicação do setor responsável pelo atendimento ao público; c) acesso ao agente público
ou ao órgão encarregado de receber manifestações; d) situação da tramitação dos processos administrativos em
que figure como interessado; e e) valor das taxas e tarifas cobradas pela prestação dos serviços, contendo
informações para a compreensão exata da extensão do serviço prestado.

- Deveres:

Os usuários possuem não somente direitos, mas também deveres, os quais podem ser de trê s ordens:
administrativa, concernente a dados a serem apresentados pelo interessado junto à Administração; técnica,
relativa à s condições técnicas necessárias para a Administração prestar o serviço; e pecuniá ria, no que diz respeito
à remuneração do serviço.

A Lei nº 13.460/2017, no seu art. 8º, traz um rol de deveres do usuário de serviços públicos, a saber: I - utilizar
adequadamente os serviços, procedendo com urbanidade e boa-fé; II - prestar as informações pertinentes ao
serviço prestado quando solicitadas; III - colaborar para a adequada prestação do serviço; e IV - preservar as
condições dos bens públicos por meio dos quais lhe são prestados os serviços de que trata esta Lei.

VIII. Súmulas e julgados sobre a temática

Súmula Vinculante 19: A taxa cobrada exclusivamente em razão dos serviços públicos de coleta, remoção e
tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis não viola o artigo 145, II, da Constituição
Federal.

Súmula Vinculante 27: Compete à Justiça estadual julgar causas entre consumidor e concessioná ria de serviço
público de telefonia, quando a ANATEL nã o seja litisconsorte passiva necessá ria, assistente, nem opoente.

Súmula Vinculante 41: O serviço de iluminação pública não pode ser remunerado mediante taxa.

Súmula nº 407, STJ: É legítima a cobrança da tarifa de água fixada de acordo com as categorias de usuários e as
faixas de consumo.

Súmula nº 412, STJ: A ação de repetição de indébito de tarifas de água e esgoto sujeita-se ao prazo prescricional
estabelecido no Código Civil.

59
- STJ, REsp 890572, Rel. Min. Herman Benjamin, Data da Publicação 13/04/2010: o débito tanto de água como de
energia elétrica é de natureza pessoal, não se vinculando ao imóvel. A obrigação não é propter rem.

- STF, ADI 3558/RJ (Pleno, 29/11/2011): por entender violada a competê ncia da União, o pleno do STF julgou
inconstitucionais leis fluminenses que determinavam a instalação de medidores individuais de consumo e a
cobrança individualizada dos serviços de consumo coletivo por parte das concessionárias de serviços públicos
fornecedoras de luz, água, telefonia fixa e gás naquela unidade federativa.

- STF, RESP 1246070 (2 a Turma, 18/6/2012): É paci ́fico o entendimento do STJ no sentido de que a cobrança em
face de concessionária de serviço público pelo uso de solo, subsolo ou espaço aéreo é ilegal (seja para a instalação
de postes, dutos ou linhas de transmissão, p. ex.), porque (i) a utilização, neste caso, reverte em favor da
sociedade - razão pela qual não cabe a fixação de preço público - e (ii) a natureza do valor cobrado não é de taxa,
pois não há serviço público prestado ou poder de poli ́cia exercido.

- STF, AgRg nos EREsp 1003667 (1a seção, 25/8/2010): considerado o interesse da coletividade, segundo a
jurisprudê ncia, a concessionária ou permissionária não pode interromper a prestação do serviço pú blico quando
isso possa inviabilizar o funcionamento de estabelecimentos de interesse do grupo social, como escolas, hospitais,
repartições públicas, dentre outros. Nesses casos, cabe a ela ingressar com ação de cobrança.

- STF, AgRg no REsp 1122762/SP (2a Turma, 24/11/2009): em relação aos particulares, o STJ entende que a
concessionária não pode paralisar o serviço por conta de débitos antigos, isto é, o inadimplemento deve ser atual.
Para as faturas antigas, ela deve entrar com ação de cobrança.

- STJ, AgRg no AREsp 284.187/RS, 2013. O corte de serviços essenciais, como água e energia elétrica, pressupõ e o
inadimplemento de conta regular, relativa ao mês do consumo, sendo inviável, pois, a suspensão do
abastecimento em razão de débitos antigos.

19A. Concessão de serviço público. Natureza jurídica e conceito. Regime financeiro. Extinção da concessão de
serviço público. Reversão dos bens. Permissão e autorização

Milton Tiago Souza Jr.

Concessão de Serviço Público (Lei n. 8987/95) é o Contrato Administrativo pelo qual a Administração transfere à
pessoa jurídica ou consórcio de empresas a execução de certa atividade de interesse coletivo, remunerada
através do sistema de tarifas pagas pelos usuários (delegação de poderes para prestação de serviços públicos). É
admitida a subconcessão, nos termos previstos no contrato de concessão, desde que expressamente autorizada
pelo poder concedente, precedida de concorrência (art. 26). A L. 8.987/95 tem caráter nacional, podendo os entes
federados editar leis próprias sobre o tema pertinentes à sua esfera de competência, desde que não contrariem
as normas gerais daquela lei.

Acerca de sua natureza jurídica, a doutrina se divide em teorias unilaterais, teorias bilaterais e teoria mista. As
teorias unilaterias se dividem (1) nas que consideram a concessão um ato unilateral do Poder Público, porque as
cláusula são estabelecidas unilateralmente pela Administração, achando-se as partes em posição de
desigualdade, e (2) nas que compreendem que a concessão consiste em dois atos unilaterais, um da
Administração (que seria ato de império – fixando condições) e um do particular (de direito privado – declaração
do particular aceitando condições). Por outro lado, as teorias bilaterais se subdividem em (3) concessão como
contrato de direito privado, que não difere dos contratos regidos pelo direito comum, e (4) concessão como
contrato de direito público, com regime jurídico publicístico, derrogatório e exorbitante do direito comum. (5) A
teoria mista enxerga a concessão como um ato unilateral do Poder Público (ato administrativo), estabelecendo as
condições (cláusulas regulamentares), e um contrato concernente ao equílibrio econômico-financeiro (contrato
de direito privado).

60
Prevalece que sua Natureza Jurídica é de contrato administrativo, bilateral, comutativo, intuitu personae e
formal, com cláusulas regulamentares (referentes à organização e funcionamento do serviço, pode a
Administração inovar unilateralmente) e cláusulas financeiras (deve ser preservado o equilíbrio econômico-
financeiro). (CR88 art. 175 p.u. e L 8987 art. 4º)

Acerca do Regime Financeiro, como remuneração pelo serviço, o Poder Concedente fixa a tarifa a ser paga pelos
usuários. O concessionário tem direito à fixação das tarifas em montante suficiente para ser devidamente
prestado o serviço. Necessária a sua revisão periódica para manutenção do equilíbrio, sob pena de indenização
pelo Poder concedente. O concessionário deve suportar sozinho os prejuízos que advenham da sua ineficiência,
assim como os advindos de erro quanto à estimativa de captação e manutenção de usuários. Benefícios tarifários
são condicionados à previsão em lei da origem dos recursos ou à concomitante revisão da estrutura financeira do
contratado. Possibilidade de outras fontes provenientes de receitas alternativas, complementares, acessórias ou
de projetos associados, com ou sem exclusividade, com vistas a favorecer a modicidade das tarifas (art. 11).
Em Regra, a remuneração do particular prestador de serviço público advém diretamente de tarifa, mas são
possíveis outras formas de remuneração, como no caso de concessionárias do serviço de conservação de
estradas de rodagem que obtêm receita da locação de espaços para afixação de publicidade às margens da
rodovia. CABM ensina que descaracteriza, contudo, o contrato de concessão a hipótese de o particular prestador
de serviço público ser remunerado exclusivamente por fontes estranhas à exploração. Não é vedado, entretanto,
que parte da remuneração provenha de subvenções do poder público cujo escopo seja assegurar a modicidade
das tarifas. Cabe lembrar, todavia, que será desclassificada da licitação a proposta que, para sua viabilização,
necessite de vantagens ou subsídios que não estejam previamente autorizados em lei e à disposição de todos os
concorrentes (art. 17).
Deve-se respeitar a uniformidade de tarifas para um mesmo serviço prestado (Art. 13). Todavia, há possibilidade
de cobrança de tarifas “diferenciadas” em função de características técnicas dos custos específicos provenientes
do atendimento aos distintos segmentos dos usuários. A manutenção da equação financeira estabelecida no
momento da celebração do contrato é um direito subjetivo da concessionária. Daí a necessidade de revisão do
contrato, para restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro tanto nas hipóteses de fato do príncipe quanto nas
de fato da administração (art. 9º, § 3º e 4º).
Reajuste é mera atualização, com periodicidade pré-estabelecida, para manter o valor real da tarifa. Basta a
homologação dos cálculos apresentados pela concessionária pelo poder concedente.
Por sua vez, a Revisão é a alteração da tarifa para restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro; só se justifica,
como regra, nas hipóteses de álea extracontratual e extraordinária. Faz-se necessário procedimento
administrativo que deve ser inteiramente realizado pelo poder concedente.
Segundo o art. 35, caput e p.u., da L. 9.074/95, os benefícios tarifários novos dependem de previsão em lei da
origem dos recursos ou da simultânea revisão da estrutura tarifária, preservando-se o equíbrlio-financeiro do
contrato, sendo que qualquer benefício tarifário somente pode ser atribuído a uma classe ou coletividade de
usuários.
Além disso, é relevante destacar que, de acordo com o § 1º do art. 9º da L. 8.987/95, a cobrança de tarifas
somente poderá ser condicionada à existência de serviço público alternativo e gratuito para o usuário nos casos
expressamente previstos em lei. Logo, tal dispositivo não chancela a orientação de parte da doutrina no sentido
da impossibilidade de serem cobrados pedágios sob o regime de tarifa quando a rodovia seja a única via de acesso
a determinada região. Nesse sentido decidiu também o STF, ao definir que a natureza jurídica do pedágio é de
tarifa, sendo, segundo o Min. Teori Zavascki, irrelevante, para a definição da natureza jurídica do pedágio, a
existência ou não de via alternativa gratuita para o usuário trafegar. Isso porque essa condição não está
estabelecida na CF/88. (ADI 800/RS, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 11/6/2014 (Info 750).
Embora tratados como sinônimos, a doutrina que aduz que a tarifa seja espécie do gênero preço público, pois é
o nome dado ao preço público que representa a contraprestação pecuniária de um serviço público pago
diretamente pelo usuário ao respectivo prestador.

Destacam-se as seguintes Definições Legais (art. 2º): Concessão de serviço público (inc. II): a delegação de sua
prestação, feita pelo poder concedente, mediante licitação, na modalidade de concorrência, à pessoa jurídica ou
consórcio de empresas que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco e por prazo

61
determinado; (A lei não fixa prazo máximo de duração); Concessão de serviço público precedida da execução de
obra pública (inc. III): a construção, total ou parcial, conservação, reforma, ampliação ou melhoramento de
quaisquer obras de interesse público, delegada pelo poder concedente, mediante licitação, na modalidade de
concorrência, à pessoa jurídica ou consórcio de empresas que demonstre capacidade para a sua realização, por
sua conta e risco, de forma que o investimento da concessionária seja remunerado e amortizado mediante a
exploração do serviço ou da obra por prazo determinado;
A lei prevê a possibilidade de as concessionárias executarem desapropriações e constituírem servidões
administrativas, quando isso for necessário para a prestação do serviço público a elas delegado, ou para a
realização da obra necessária à respectiva prestação (art. 31, VI). Cumpre, contudo, destacar que a prévia
decretação da utilidade ou da necessidade pública do bem a ser desapropriado é atribuição exclusiva do poder
público; apenas a execução da desapropriação é que pode ser encargo do poder público ou da concessionária.
Essas regras, aliás, também valem para a constituição de servidões administrativas.
Em face da imperatividade do art. 175 da CRFB, Alexandrino e Paulo, acompanhando o entendimento de Di Pietro,
asseveram não ter aplicação às concessões e permissões de serviço público os casos de dispensa de licitação.
Todavia, Di Pietro admite a incidência das hipóteses de inexigibilidade às concessões e permissões, caso
demonstrada a inviabilidade de competição, enquanto aqueles autores repudiam, por entendê-las absolutamente
incompatíveis com o art. 175 da CRFB (p. 706).
Regra geral, é ausente exclusividade na outorga de concessão ou permissão, sendo exceção por
inviabilidade técnica ou econômica da coexistência de duas ou mais concessões ou permissões para o mesmo
serviço (art. 16).
Na SUBCONCESSÃO ocorre a transferência d parcela do objeto próprio da concessão. É subconcedida a prestação
do serviço público (e não meras atividades acessórias ou complementares); somente é possível a subconcessão
parcial; a subconcessão tem que estar prevista no contrato de concessão e tem que ser expressamente autorizada
pelo poder concedente; o contrato de subconcessão será sempre precedido de concorrência, portanto, quem
efetivamente outorga a subconcessão é o poder concedente, e não a concessionária (esta se limita a pedir ao
poder concedente que promova a subconcessão); a subconcessionária assume todos os direitos e obrigações que
eram da concessionária, relativamente à parte da concessão que foi subconcedida; se formam, portanto, relações
jurídicas tão somente entre a subconcessionária e o poder concedente, bem como entre a subconcessionária e
os usuários do serviço público subconcedido. A subconcessão não se confunde com outras duas figuras: (i)
subcontratação parcial do objeto do contrato (art. 72 da L. 8.666/93), admitida se estiver prevista no edital de
licitação e no próprio contrato, e constitui contrato privado; (ii) contratação da concessionária com terceiros para
o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço concedido, bem como a
implementação de projetos associados (par. 1º do art. 25 da L. 8.987/95), que se trata de contrato privado, que
não representa a transferência a terceiros, nem mesmo parcial, do objeto principal da concessão. Não afasta a
responsabilidade da concessionária.
O art. 27 traz duas figuras assemelhadas à subconcessão: a transferência de concessão (entendida pela doutrina
como inconstitucional, por consubstanciar transferência de concessão sem licitação prévia) e a transferência do
controle societário da concessionária.

A EXTINÇÃO DA CONCESSÃO pode ocorrer pelas seguintes causas: a) o Advento do termo contratual
(ou Reversão da Concessão), que consiste no vencimento do prazo estipulado no contrato; b) a Rescisão Judicial,
que ocorre quando o contratado não tem mais interesse no contrato e busca a via judicial; c) a Rescisão
consensual ou amigável, na qual a contratante e o contratado podem de comum acordo extinguir o contrato; d)
a Anulação, que decorre de uma ilegalidade do contrato (ex: vício na licitação); e) a Rescisão administrativa, que
ocorre quando a própria administração, por ato unilateral, decide extinguir o contrato, podendo acontecer quando
há descumprimento de cláusula contratual ou por razões de interesse público; e) a Encampação ou Resgate, que
se trata da extinção do contrato de concessão por meio de ato motivado por razões de interesse público da
Administração, na qual se toma posse da empresa privada. A Encampação gera dever de indenizar e depende de
autorização legislativa. Os requisitos da Encampação são A) Interesse público; B) Lei autorizativa específica; e C)
Pagamento prévio da indenização. Serão indenizadas as parcelas não depreciadas ou não amortizadas dos
investimentos efetuados nos bens reversíveis com o objetivo de garantir a continuidade do serviço concedido.
Apesar do silêncio da lei, CABM defende que cabe indenização por lucros cessantes. f) Caducidade ou Decadência,

62
que se trata da extinção do contrato de concessão em razão do descumprimento de cláusula contratual
(inadimplência do concessionário), seja ela gerada por fato comissivo, omissivo, doloso ou culposo. A Caducidade
não gera necessariamente a obrigação de indenizar e não requer autorização legislativa. Requisitos da caducidade:
A) Comunicação da concessionária, antes da instauração do processo administrativo, acerca dos descumprimentos
contratuais que lhe são imputados, com fixação de prazo para que ela corrija as falhas e transgressões apontadas;
B) Não corrigidas as falhas, será decretada a extinção por decreto do poder concedente; C) Indenização, que não
é prévia, dos investimentos realizados nos bens reversíveis com o objetivo de garantir a continuidade e atualidade.
Salvo no caso de transferência da concessão sem anuência do concedente – em que a declaração de caducidade
é obrigatória –, nos demais casos, sua decretação, ou a aplicação de outras sanções, ficará a critério do
concedente. f) Extinção de pleno direito: Trata-se da extinção em razão de circunstâncias estranhas à vontade
das partes (Ex: falência, incapacidade, morte). Desapropriação não é forma de extinção da concessão, pois não se
desapropriam pessoas, mas apenas bens, não sendo cabível a desapropriação de uma concessionária.
Já a REVERSÃO DE BENS é a transferência dos bens do concessionário, que são utilizados por ele na
realização do serviço, ao poder concedente, quando extinta a concessão (art. 35, § 2o). Fundamenta-se na noção
de que a utilidade dos bens aplicados ao serviço só existe para o concessionário enquanto ele desfruta dessa
situação jurídica, ao passo que para o concedente eles ainda serão úteis para a continuidade do serviço. A
reversão não é forma de extinção da concessão, mas sim uma consequência dela. Sem a extinção da concessão,
não há reversão.
A PERMISSÃO de serviço público, segundo o art. 2o, IV, da Lei 8.987/1995, é a “delegação, a título
precário, mediante licitação, da prestação de serviços públicos feita pelo poder concedente à pessoa física ou
jurídica que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco.”
Para a doutrina clássica, a pemissão era o ato unilateral e precário, intuitu personae, por meio do qual
o Poder Público transferia a alguém o desempenho de um serviço de sua alçada, proporcionando, assim como na
concessão, a possibilidade de cobrança de tarifas dos usuários (CABM, p. 767). JSCF observa que, tradicionalmente
a diferença entre concessão e permissão residia na caracterização da primeira como contrato administrativo, ao
passo que a permissão de serviço público se qualificava como ato administrativo: “Dessa distinção quanto à
caracterização formal dos institutos emanavam nitidamente algumas consequências jurídicas diversas, como as
relativas à indenizabilidade, à precariedade, à estabilidade da delegação etc.
Entretanto, a Lei n. 8.897/1995 atribuiu à permissão de serviço público a natureza de contrato de
adesão (art. 40), provocando justificável confusão sobre essa forma de delegação. Com essa fisionomia,
atualmente inexiste, na prática, distinção entre a concessão e a permissão de serviço público” (JSCF, p. 381).
Assim, em razão do caráter precário, a permissão deveria ser utilizada em situações transitórias e efêmeras, em
que não há aporte de grande investimento pelo concessionário, e que haja rentabilidade do serviço em curto
prazo. Assim, controvérsia entre a posição tradicional e a previsão legal gerou diferentes entendimentos
doutrinários: a) Para CABM é uma impropriedade jurídica redacional do artigo 175, inciso I, da CRFB, e a
permissão permanece com a natureza de ato administrativo unilateral e precário, assim, se for firmada contrato
com prazo certo, é imprópria a designação permissão adotada para a relação jurídica, e os efeitos do ato irão
equiparar-se a uma concessão. b) Para JSCF, permissão de serviço Público é o contrato administrativo através do
qual o Poder Público (permitente) transfere a um particular (permissionário) a execução de certo serviço público
nas condições estabelecidas em normas de direito público, inclusive quanto a fixação de tarifas. (JSCF, pg 422). Na
ADI nº 1.491- DF, em que se discutia questão relativa à forma de delegação do serviço móvel celular, prevista na Lei
nº 9295/1996, o STF decidiu que o artigo 175, p. ú., da CRFB afastou qualquer distinção conceitual entre
permissão e concessão ao conferir àquela o caráter contratual próprio desta. (ADI nº 1.491-DF, Rel. Min. CARLOS
VELLOSO, voto de desempate do Min. SIDNEY SANCHES, j. 1º.7.1998; Informativo STF nº 117, jul.1998)
Diferenças entre concessão e permissão de acordo com a L. 8.987/95: i) a concessão pode ser
contratada com pessoas jurídicas ou consórcios de empresas, ao passo que as permissões podem ser celebradas
com pessoas físicas ou jurídicas; ii) as concessões obrigatoriamente devem ser precedidas de licitação na
modalidade concorrência, enquanto as permissões devem ser precedidas de licitação, mas a lei não especifica
modalidade; iii) a lei afirma que as permissões devem ser formalizadas em “contrato de adesão”, aludindo à
“precariedade e à revogabilidade unilateral do contrato” pelo poder concedente, mas não se refere a “contrato
de adesão” para qualificar o contrato de concessão, tampouco a “precariedade” ou a “revogabilidade unilateral”

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desse contrato. Entretanto, advertem Alexandrino e Paulo que, incontroversamente, todo e qualquer contrato
administrativo propriamente dito é um contrato de adesão, sem possibilidade de “negociação” pelo particular
contratante (p. 702). Ressalvam, ainda, os autores que, apesar de a lei haver destacado apenas em relação às
concessões que nestas o contrato é por prazo determinado, omitindo-se a tal respeito no tocante às permissões,
certo é que os contratos de permissão também devem ser celebrados por prazo determinado. Tal conclusão
decorre do art. 23, I, e art. 40, parágrafo único da lei e dos princípios norteadores da atividade administrativa e
da própria CRFB. A precariedade, para JSCF, não traduz “marca distintiva convincente”. Caso se entenda a
precariedade como a ausência de indenizabilidade em razão do desfazimento unilateral do contrato por razões
de interesse público, tem-se que não se aplica ao contrato de permissão, posto que o permissionário, nesse caso,
faz jus a indenização; “caso se pretenda entender que a precariedade tem o sentido de poder o permitente (Poder
Público) rescindir unilateralmente o contrato de permissão, também aí não se constataria qualquer diferença,
porque, como vimos, o contrato de concessão também se sujeita à encampação, nome que a lei dispensouàquele
tipo de rescisão (art. 37).” (JSCF, p. 424).
Há consenso na doutrina quanto a serem inaplicáveis aos contratos de concessão e de permissão se serviços
públicos as regras sobre prazos máximos constantes do art. 57 da L. 8666/93.
Por fim, a AUTORIZAÇÃO, para JSCF, é ato administrativo discricionário e precário pelo qual a
Administração consente que o indivíduo desempenhe atividade de seu exclusivo e predominante interesse, não se
caracterizando a atividade como serviço público. (p. 450). Em relação à previsão do art. 21 XII, da CR, o autor diz
que algumas vezes as atividades elencadas nem sempre são típicos serviços públicos; algumas vezes são exercidas
por particulares no próprio interesse destes. Assim, a interpretação cabível para o art. 21, da CR, reside em que a
concessão e permissão são os institutos próprios para a prestação de serviços públicos, e a autorização o adequado
para o desempenho da atividade do próprio interesse do autorizatário. (p. 451). Assim, para JSCF, a CRFB, ao
referir-se à delegação de serviços públicos, refere-se apenas à concessão e permissão (art. 175). CABM diz que a
controvérsia existente entre os artigos 21, incisos XI e XII e o disposto nos artigo 175, inciso I, todos da CRFB, deve
considerar que a regra é a delegação do serviço público por meio da concessão e permissão (artigo 175, inciso I)
e a expressão autorização, que aparece nos artigos 21 XI e XII do diploma constitucional, se subsome a duas
hipóteses: A) Uma que corresponde a hipóteses em que efetivamente há serviço de telecomunicação, como o de
radio amador ou de interligação de empresas por cabos de fibras ópticas, mas não propriamente serviço público,
mas serviço de interesse privado delas próprias. Para o autor, a palavra autorização foi utilizada no sentido de
polícia administrativa, que libera alguma conduta privada propriamente dita, mas cujo exercício depende de
manifestação administrativa aquiescente para verificação se com ela não haverá gravames ao interesse público.
B) Outra, a de abranger casos em que efetivamente está em pauta um serviço público, mas se trata de resolver
emergencialmente uma dada situação, até a adoção dos convenientes procedimentos por força dos quais se
outorga a permissão ou concessão. Por isto mesmo a palavra autorização está prevista no artigo 223 da CRFB.
(CABM, pg 669). c) Exemplo de atividade autorizada. O exemplo, tradicionalmente utilizado pela doutrina, é o
serviço de táxi, considerado atividade privada exercida sob o regime de autorização. Ocorre que a lei 12.587/2012,
que instituiu a Política Nacional de Mobilidade Urbana, classificou o serviço de táxi como transporte público
individual, caracterizando-o como serviço público, prestado sob o regime de permissão (art. 4º, VIII, e 12, Lei
12.587/2012). Todavia, em relação ao transporte privado coletivo, definido no art. 4º, VII, como “serviço de
transporte de passageiros não aberto ao público para a realização de viagens com características operacionais
exclusivas para cada linha e demanda”, o consentimento estatal se formaliza por autorização.

6. AGENTES PÚBLICOS
6.1 Agentes públicos. Servidor e funcionário público. Natureza juri ́dica da relação de emprego público. (18.a)
6.2 Agentes poli ́ticos. Funcionário efetivo e vitali ́cio. Garantias. Estágio probatório. Cargo em comissão. Agente
de fato. Aposentadoria do servidor público. (18.a)
6.3 Provimento e vacância dos cargos públicos. (22.a)
6.4 Direitos, deveres e responsabilidades do servidor público. (20.a)
6.5 Estatuto do Ministério Púbico Federal. (12.a)
6.6 Regime juri ́dico do concurso público e seu controle administrativo e judicial. (19.b)

18A. Agentes públicos. Natureza da relação de emprego público. Agentes Políticos. Garantias. Estabilidade e

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Vitaliciedade. Estágio probatório. Cargo em comissão. Agente de fato. Aposentadoria do servidor Público.

Gilberto Batista Naves Filho 02/09/18

AGENTES PÚBLICOS. A expressão agente público é ampla e abrange todos aqueles que – exprimindo de
algum modo a vontade do Estado – exercem funções públicas, independentemente do vínculo jurídico, com ou
sem remuneração, temporária ou permanentemente.
a. Agentes políticos. Exprimem a vontade superior do Estado, integrando a estrutura de Poder. São
titulares de cargos que integram o arcabouço constitucional do Estado com estatutos previstos na própria
Constituição. Abrange os membros do poder Executivo e Legislativo, auxiliares imediatos do Executivo (Ministros
e Secretários). Liame político.
Magistrados e membros do MP: a maioria da doutrina (Bandeira de Mello, Carvalho Filho, Gasparini)
entende que não seriam agentes políticos, MAS, há precedentes do STF (RE 228977, de 5.3.02; RE 579799, de
2.12.08) dizendo o contrário: que seriam agentes políticos.
Atenção: A jurisprudência do STF entende que a nomeação de parentes da autoridade nomeante para
cargos considerados agentes políticos NÃO CONFIGURA NEPOTISMO. Portanto, não viola a súmula vinculante nº
13.
“Agravo regimental em reclamação. 2. Nomeação de esposa e filho do prefeito como secretários
municipais. Agentes políticos. 3. Ausência de violação ao disposto na Súmula Vinculante 13. 4. Falta de
qualificação técnica. Necessidade de exame das circunstâncias fáticas. Inviabilidade em sede reclamatória. 5. Não
cabimento da reclamação. 6. Agravo regimental a que se nega provimento.”
(Rcl 28449 AgR, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 23/03/2018, PROCESSO
ELETRÔNICO DJe-066 DIVULG 06-04-2018 PUBLIC 09-04-2018)
b. Particular em colaboração. Categoria de agente público. São particulares que executam funções
públicas especiais, públicas, como os jurados, os convocados para serviço eleitoral etc. JSCF cita os titulares de
cartório não oficializados e os concessionários e permissionários de serviço público. LFG conceitua como “aquele
que não perde a qualidade de particular, mas num dado momento exerce função pública, por exemplo, o jurado
no Tribunal do Júri”.
c. Servidores Públicos. Trabalham para entes da AP (Direta ou Indireta), com personalidade jurídica de
direito público. Liame profissional (não político). A CRFB/88 exigiu regime único: ou estatutário (cargo público) ou
celetista (emprego público). EC 19/98: aboliu a unicidade do regime para o mesmo ente. Porém, a cautelar na ADI
2135, em 2.8.2007, suspendeu, com efeito ex nunc, a eficácia do caput do art. 39, da CR, restabelecendo o RJU. A
decisão em cautelar permanece até hoje. Podem ser titulares de cargo de provimento efetivo (selecionados por
concurso público) ou de cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração (admitidos sem
concurso público).

d. empregados públicos. Não são detentores de cargo público de provimento efetivo. São regidas pela
CLT. É o vínculo predominante (como exceção é possível citar diretores e dirigentes admitidos sem vínculo
celetista regidos pela Lei 6.404 em empresas públicas e sociedades de economia mista) nas pessoas jurídicas de
direito privado que integram a Administração Indireta. Como os servidores titulares de cargo de provimento
efetivo, são selecionados, em regra, por meio de concurso público.
Algumas características: (a) Regime jurídico trabalhista (contratual). (b) Obrigatório para as pessoas
jurídicas de direito privado; nas de direito público, é facultativa. (c) Estados e Municípios não podem editar lei,
como a 9.962/00 (federal) nem aplicá-la, pois a competência para legislar sobre Direito do trabalho é da União.
Aplicam diretamente a CLT. Mas podem editar lei que imponha autolimitação quanto aos poderes atribuídos pela
CLT ao empregador em geral. (d) Lei 9.962 prevê contrato por tempo indeterminado, desde que haja prévia
aprovação em concurso público, permitindo a resilição unilateral apenas quando houver: d.1) falta grave; d.2)
acumulação ilegal de cargos ou funções públicas; d.3) excesso de despesa; d.4) insuficiência de desempenho.
e. temporários. Regidos na esfera federal pela Lei 8735/93. Não se confundem com os celetistas (regidos
pela CLT). Nos termos do art. 37, IX, são contratados por tempo determinado para atender a necessidade
temporária de excepcional interesse público. São admitidos por meio de procedimento seletivo (não é concurso
Público).

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f. agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias. O art. 198, § 4º, da CF permite a
contratação pelos gestores locais do sistema único de saúde de agentes comunitários de saúde e agentes de
combate às endemias por meio de processo seletivo público, de acordo com a natureza e complexidade de suas
atribuições e requisitos específicos para sua atuação.
São regidos pela Lei 11.350/2006, que dispõe
“Art. 8o Os Agentes Comunitários de Saúde e os Agentes de Combate às Endemias admitidos pelos
gestores locais do SUS e pela Fundação Nacional de Saúde - FUNASA, na forma do disposto no § 4o do art. 198 da
Constituição, submetem-se ao regime jurídico estabelecido pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, salvo
se, no caso dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, lei local dispuser de forma diversa.
(...)
Art. 16. É vedada a contratação temporária ou terceirizada de Agentes Comunitários de Saúde e de
Agentes de Combate às Endemias, salvo na hipótese de combate a surtos epidêmicos, na forma da lei aplicável.”

“Notícias STF (Segunda-feira, 11 de julho de 2016)


Lei que transforma regime de trabalho de agentes de combate a endemias é questionada no STF
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) a Ação Direta
de Inconstitucionalidade (ADI) 5554, com pedido de liminar, contra dispositivos da Lei 13.026/2014, na parte em
que cria o Quadro em Extinção de Combate às Endemias e autoriza a transformação dos empregos, criados pela
Lei 11.350/2006, no cargo de agente de combate às endemias. Na avaliação de Janot, os dispositivos violam os
artigos 7º, inciso I, 37, caput e inciso II, e 198, parágrafos 4º e 5º, da Constituição Federal (CF), e o artigo 2º,
parágrafo único, da Emenda Constitucional (EC) 51/2006.
Para o procurador-geral, a lei, ao transformar os ocupantes de empregos públicos de agente de combate
a endemias em ocupantes de cargos públicos, efetuou provimento derivado e contrariou o artigo 37, inciso II, da
CF, que exige a aprovação em concurso público para a investidura em cargo ou emprego público. Ele explica que,
antes da edição da EC 51/2006, os gestores locais do Sistema Único de Saúde (SUS) costumavam contratar esses
funcionários por meio de contratos temporários por excepcional interesse público. “Tais contratações, não raro,
tinham sua natureza jurídica desnaturada em razão de prorrogações sucessivas”, observa.

‘No intuito de obstar tais práticas, o artigo 198, parágrafo 4º, da Constituição, com a redação da EC
51/2006, determinou a admissão dos agentes comunitários e de combate a endemias somente mediante
processo seletivo público. A Lei 11.350/2006 regulamentou a emenda, criou 5.365 empregos públicos de agente
de combate a endemias e submeteu-os à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)’, aponta.
(...)
Pedidos
Na ADI 5554, Janot requer liminar para suspender a eficácia dos artigos 3º, parágrafos 1º, 2º, 3º e 5º, 4º,
parágrafo único, 5º, caput e parágrafo único, e 6º da Lei 13.026/2014. Ao final, pede que os dispositivos sejam
declarados inconstitucionais.”
3. GARANTIAS. ESTABILIDADE E VITALICIEDADE. O cargo público é um vínculo estatutário, regido pela lei
(no âmbito federal, a Lei 8112) e pela CF. É a mais indivisível unidade de competências (atribuições e
responsabilidades), em regra criado por lei. Pode ser em comissão (livre nomeação/exoneração) efetivo (concurso
público), ou vitalício (também por concurso público). NATUREZA JURÍDICA DA RELAÇÃO ENTRE TITULARES DE
CARGO E O PODER PÙBLICO: - Estatutária, institucional e não contratual; - Estado pode alterar por lei o regime
jurídico. Não há garantia de continuidade do regime (entendimento pacífico do STF pela ausência de direito
adquirido a regime jurídico).
Vitaliciedade x Estabilidade x Efetividade.
Para Marçal Justen Filho “vitaliciedade significa que a demissão do sujeito depende de sentença judicial
que reconheça a comprovação de infração a que seja cominada sanção dessa ordem. A vitaliciedade não significa
a garantia de titularidade do cargo por toda a vida, uma vez que o servidor vitalício está sujeito à aposentadoria
compulsória, e não há impedimento à extinção do cargo. A Constituição atribui o regime da vitaliciedade aos
magistrados (art. 95, I), aos membros dos Tribunais de Contas (art. 73, §3º) e do Ministério Público (art. 128, §5º,
a)”. (MARÇAL, Justen Filho. Curso de direito administrativo. 8 ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p.906)

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Há 2 súmulas do STF a respeito do assunto: 11 (A vitaliciedade não impede a extinção do cargo, ficando o
funcionário em disponibilidade, com todos os vencimentos) e 36 (Servidor vitalício está sujeito a aposentadoria
compulsória, em razão da idade).
Aquisição da vitaliciedade: 1ª inst.: juízes e membros do MP - após 2 anos de exercício. Nas demais
hipóteses, a vitaliciedade é imediata (ex. juízes que entram pelo “quinto” da advocacia, ministros de Tribunais
Superiores).
Perda da vitaliciedade: somente com sentença judicial transitada em julgado. Efeitos da vitaliciedade são
mais benéficos do que os da estabilidade, que submete a extinção da relação estatutária a processo administrativo
ou judicial destinado a apurar a prática de infração a que seja cominada a pena de demissão, ressalvada a hipótese
específica de perda do cargo para redução das despesas com pessoal (autorizada constitucionalmente nos artigos
169, parágrafos 4º a 7º, e 247). (MARÇAL, Justen Filho. Op. cit. p.904).
Quanto à estabilidade, a CF, Art. 41, §1º, dispõe: somente perde a estabilidade o servidor nomeado para
cargo de provimento efetivo mediante sentença judicial transitada em julgado ou procedimento administrativo
com garantia de ampla defesa ou procedimento de avaliação periódica de desempenho.
STJ: estabilidade diz respeito ao serviço público, e não ao cargo. Servidor estável investido em novo cargo
não está dispensado de cumprir o estágio probatório. Adquirida a estabilidade, só poderá ser demitido: a) se
cometer falta grave; b) se houver processo administrativo para apurar a falta; c) for garantida a ampla defesa.
Diferença entre estabilidade e efetividade: estabilidade é a garantia constitucional do servidor público
estatutário de permanecer no serviço público, após o período de três anos de efetivo exercício. Efetividade é a
situação jurídica que qualifica a titularização de cargos efetivos, para distinguir-se da relativa aos cargos em
comissão. Além da estabilidade/vitaliciedade, detentores de cargos têm a prerrogativa da irredutibilidade salarial
(apenas nominal); garantia de isonomia remuneratória conforme a complexidade/responsabilidade do cargo.
Garantia de permanência: prerrogativa para assegurar a independência desses agentes. Previsão para os
membros do MP, TC e magistrados (respectivamente, 128, § 5º, I, a; 73, § 3º; 95, I, da CF). Não podem as
Constituições estaduais ou Leis Orgânicas municipais ou lei de qualquer outra esfera criar cargos vitalícios (STF,
Informativo 409). Vitaliciedade mediata: depende de prévio estágio confirmatório; imediata: adquirida na
investidura.
Art. 19 do ADCT: “Os servidores públicos civis da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,
da administração direta, autárquica e das fundações públicas, em exercício na data da promulgação da
Constituição, há pelo menos cinco anos continuados, e que não tenham sido admitidos na forma regulada no art.
37, da Constituição, são considerados estáveis no serviço público.” A estabilidade concedida não implica
transformação do vínculo em efetivo.
4. ESTÁGIO PROBATÓRIO (art. 20 e §§ da Lei 8112/90). Período de três anos dentro do qual o servidor é
avaliado quanto aos requisitos necessários para o desempenho do cargo. Mesmo nesse período o STF entende
que o servidor não pode ser exonerado sem inquérito ou sem as formalidades legais de apuração de sua
capacidade (Sum. 21). Há entendimento de que o prazo de 3 anos para a aquisição da estabilidade não está
vinculado ao prazo do estágio probatório (STJ, MS 9373/DF, Rel. Min. Laurita Vaz).
5. CARGO EM COMISSÃO. Ocupação transitória de cargo público. Não há estabilidade. Livre nomeação e
exoneração ad nutum (art. 37, II, da CF). EC 19/98 alterou o art. 37, V, CF: o exercício de funções de confiança
deve ser realizado por servidores ocupantes de cargo efetivo. Já os cargos em comissão podem ser atribuídos a
servidores de carreira, nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, devendo as atribuições de
tais funções e cargos destinar-se apenas à chefia, direção e assessoramento (podem ser ocupados por não
titulares de cargos efetivos). Regime Geral de Previdência Social – RGPS, salvo quando ocupados por servidores
que integram o RPPS.
6. AGENTE DE FATO. Mesmo sem ter investidura normal e regular, executa uma função pública em nome
do Estado. a) Agente necessário: praticam atos e executam atividades em situações excepcionais em colaboração
com o Poder Público e como se fossem agentes de direito. Atos confirmados em regra em razão do interesse
público e da segurança jurídica; ou b) Agente putativo: desempenha atividade pública na presunção de que há
legitimidade, embora não tenha havido investidura dentro do procedimento legalmente exigido. Teoria da
aparência: alguns atos podem ser questionados internamente na Administração, mas externamente devem ser
convalidados para evitar que terceiros de boa-fé sejam prejudicados através da frustração de suas legítimas
expectativas. Agente de fato recebe remuneração, mesmo sendo ilegítima a investidura, pois trabalhou

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efetivamente, ressalvada a hipótese de má-fé. Princípios da boa-fé e da segurança jurídica. Não se confunde com
a usurpação de função (não há sequer investidura ou qualquer vínculo com o poder público), em que o ato é
considerado inexistente (RMS 25.104, STF).
7. APOSENTADORIA DO SERVIDOR PÚBLICO. Direito, garantido pela CF, ao servidor público, de perceber
determinada remuneração na inatividade, diante da ocorrência de certos fatos jurídicos previamente
estabelecidos (JSCF). Natureza jurídica: jurisprudência dominante do STF e do STJ: é ato administrativo complexo,
(aperfeiçoa-se com a fusão da vontade de pelo menos dois órgãos públicos). Para STF e STJ, embora já seja apto
a produzir efeitos desde a expedição pelo ente administrativo ao qual o servidor se encontra vinculado, somente
se completa com o registro pelo TC, cuja competência consiste em examinar e confirmar a aposentadoria
concedida pelo órgão de origem do servidor. SV. 3. Estatutários: regras do art. 40, CF – RPPS. Observar o regime
complementar para os servidores que ingressaram após a entrada em vigor da Lei 12618/2012 e dos que optaram
pelo regime. Trabalhistas, temporários e ocupantes de cargo em comissão (art. 40, § 3º, CF): RGPS (arts. 201 e
202 da CF). Modalidades de aposentadoria do servidor público (art. 40, §§ 1º ao 6º, da CF): voluntária;
compulsória; invalidez.
Professores: art. 40, § 5º, CF. Ver Súmula 726 do STF (Para efeito de aposentadoria especial de
professores, não se computa o tempo de serviço prestado fora da sala de aula.) e ADI 3772 (o tempo de serviço
prestado por professor fora da sala de aula, em funções relacionadas ao magistério, deve ser computado para a
concessão da aposentadoria especial). Aposentadoria especial: (art. 40, § 4º, CF). SV. 33 (aplica-se aos servidores
públicos a disciplina do regime geral até a edição da lei que trate do assunto).

22A. Provimento e vacância dos cargos públicos

Paulo Henrique Cardozo, setembro de 2018.


Fontes: CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 31. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2017; CARVALHO, Matheus.
Manual de Direito Administrativo. 4ª ed. rev. ampl. e atual. Salvador: Ed. Juspodivm, 2017. Legislação básica: Art. 37 da CRFB/88 e Lei n. 8.112/90.

Provimento. O provimento consiste na forma de ocupação do cargo público pelo servidor. Para Matheus Carvalho,
é o ato administrativo por meio do qual o cargo é preenchido. José dos Santos Carvalho Filho entende que o
provimento é fato administrativo, o qual é materializado por um ato administrativo. O provimento originário é o
primeiro provimento do agente em determinada carreira, iniciando uma relação estatutária nova. Já o provimento
derivado é aquele em que o cargo é preenchido por alguém que já tenha vínculo anterior com outro cargo, sujeito
ao mesmo estatuto, na mesma carreira. SV 43: “É inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie
ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que
não integra a carreira na qual anteriormente investido”. O provimento derivado pode ser vertical (em que o
servidor ocupa cargos mais altos na carreira de ingresso – caso da promoção), horizontal (em que o cargo ocupado
é do mesmo nível da carreira – caso da readaptação) e por reingresso (em que o servidor retorna ao serviço
público após extinta a relação estatutária – casos de recondução, reintegração, reversão e aproveitamento).

Formas de provimento.
a) Nomeação – Na Lei n. 8.112/90, é a única forma de provimento originário. Em se tratando de cargo vitalício ou
efetivo, deve ser precedida de aprovação em concurso público; sendo cargo em comissão, o concurso é
dispensável. A nomeação não confere a qualidade de servidor público, sendo necessária, ainda, a posse, por meio
da qual ocorre a investidura no cargo. A posse, segundo a lei, deve ocorrer no prazo de 30 dias, podendo ser
realizada mediante procuração específica. Após, o servidor possui 15 dias para entrar em exercício (efetivo
desempenho das funções do cargo). Não observado o prazo para a posse, a nomeação é tornada sem efeito; não
respeitado o prazo para exercício, há a exoneração.
b) Promoção – é a forma de provimento pelo qual o servidor sai de seu cargo e ingressa em outro situado em
classe mais elevada da carreira, alternadamente por antiguidade e merecimento. A promoção não se confunde
com a progressão funcional em sentido estrito, que configura aumento remuneratório sem mudança de cargo,
possível nas carreiras em que o cargo possui escalonamento com vencimentos progressivos, sempre em
decorrência de antiguidade.

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c) Readaptação – é a forma de provimento pela qual o servidor passa a ocupar cargo diverso do que ocupada, em
razão da necessidade de compatibilizar o exercício da função pública com a limitação sofrida em sua capacidade
física ou psíquica. A readaptação será efetivada em cargo de atribuições afins, respeitada a habilitação e o nível
de escolaridade exigidos, bem como a equivalência de vencimentos. Não havendo cargo na carreira com funções
compatíveis, o servidor será aposentado por invalidez.
d) Recondução – é o retorno do servidor estável ao cargo que ocupava anteriormente, por motivo de inabilitação
em estágio probatório referente a outro cargo ou pela reintegração de outro servidor ao cargo do qual teve que
se afastar.
e) Reintegração – é o retorno do servidor ao cargo que ocupava após o reconhecimento da ilegalidade de sua
demissão. Apesar de estar prevista a exigência de estabilidade para que o servidor faça jus à reintegração, a
jurisprudência do STF vem sendo orientada no sentido de que basta que este agente seja detentor de cargo
público efetivo que terá direito a ser reintegrado por demissão ilegal, mesmo que esteja em estágio probatório.
A recondução não gera direito à percepção de indenização.
f) Reversão – é forma de reingresso específico para o servidor inativo e se consuma nos seguintes casos: 1)
mediante o restabelecimento, por laudo médico, do servidor aposentado por invalidez, ou reconhecida a
ilegalidade na concessão da aposentadoria; 2) no interesse da Administração, a pedido do servidor aposentado
voluntariamente, que tenha solicitado a reversão e fosse estável na atividade, desde que a aposentadoria tenha
ocorrido nos cinco anos anteriores à solicitação e haja cargo vago. Parte da doutrina (ex.: Carvalho Filho) e da
jurisprudência vem entendendo que a reversão, no segundo caso, seria inconstitucional, sendo o retorno ao
serviço público possível apenas mediante novo concurso.
g) Aproveitamento – trata-se do retorno do servidor público que se encontra em disponibilidade, para assunção
de cargo com funções compatíveis com as que exercia antes de ter sido extinto o cargo que ocupava. Segundo o
art. 41, § 3º, da CRFB/88, extinto o cargo ou declarada sua desnecessidade, o servidor estável será posto em
disponibilidade, com remuneração proporcional ao tempo de serviço, até seu adequado aproveitamento.
Obs. 1: A Lei n. 8.112/90 previa como formas de provimento a ascensão e a transferência. A ascensão é a forma
de progressão pela qual o servidor é elevado do cargo situado na classe mais alta de uma carreira para o cargo da
classe inicial de carreira diversa/complementar (ex.: de Técnico para Analista). A transferência, por sua vez, é a
passagem do servidor de seu cargo efetivo para outro de igual denominação, situado em quadro funcional diverso.
No entanto, tais formas de provimento ofendem o princípio da acessibilidade aos cargos mediante prévia
aprovação em concurso público (art. 37, II, da CRFB/88).
Obs. 2: a remoção e a redistribuição não são formas de provimento derivado por não ensejarem investidura em
nenhum cargo. Em ambas há apenas o deslocamento do servidor: na remoção, dentro do mesmo quadro; e na
redistribuição, para cargo diverso. Em qualquer caso, porém, o servidor continua titularizando seu cargo.
Vacância. A vacância consiste na desocupação do cargo público. Para Carvalho Filho, é o fato administrativo que
indica que determinado cargo não está provido. Formas de vacância:
a) Exoneração – dispensa do servidor, sem caracterização de infração disciplinar. Pode se dar 1) a pedido do
servidor; 2) de ofício, nos casos de não aprovação no estágio probatório; do servidor que toma posse, mas não
entra em exercício no prazo legal; de cargo em comissão, a critério da autoridade competente; de excesso de
despesas com pessoal (LC n. 101/00); de insuficiência de desempenho, comprovada em processo administrativo
(art. 41, § 1º, III, da CRFB;88);
b) Demissão – perda do cargo pelo cometimento de infração funcional, nos casos previstos em lei com tal punição.
Há necessidade de contraditório e ampla defesa.
c) Promoção e d) Readaptação – formas de provimento e vacância, já trabalhadas.
e) Aposentadoria – é a passagem do servidor para a inatividade mediante ato praticado pela Administração
Pública. Tema abordado no ponto “18.a”.
f) Posse em cargo inacumulável – a posse em cargo inacumulável implica a vacância do então ocupado. Caso o
servidor não opte por um dos cargos após a concessão de prazo de 10 dias, o poder público poderá instaurar
processo administrativo sumário, culminando em demissão.
g) Falecimento – fato administrativo alheio ao interesse do servidor ou da Administração.
Obs.: a ascensão e a transferência, já comentadas, também eram formas de vacância.

Jurisprudência correlata.

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Tema 161/STF – RE 598099: O candidato aprovado em concurso público dentro do número de vagas previsto no
edital possui direito subjetivo à nomeação.
Tema 454/STF – RE 629392: A nomeação tardia de candidatos aprovados em concurso público, por meio de ato
judicial, à qual atribuída eficácia retroativa, não gera direito às promoções ou progressões funcionais que
alcançariam houvesse ocorrido, a tempo e modo, a nomeação.
Tema 476/STF, RE 608482: Não é compatível com o regime constitucional de acesso aos cargos públicos a
manutenção no cargo, sob fundamento de fato consumado, de candidato não aprovado que nele tomou posse
em decorrência de execução provisória de medida liminar ou outro provimento judicial de natureza precária,
supervenientemente revogado ou modificado.
Tema 671/STF – RE 724347: Na hipótese de posse em cargo público determinada por decisão judicial, o servidor
não faz jus a indenização, sob fundamento de que deveria ter sido investido em momento anterior, salvo situação
de arbitrariedade flagrante.
Tema 784/STF – RE 837311: O surgimento de novas vagas ou a abertura de novo concurso para o mesmo cargo,
durante o prazo de validade do certame anterior, não gera automaticamente o direito à nomeação dos candidatos
aprovados fora das vagas previstas no edital, ressalvadas as hipóteses de preterição arbitrária e imotivada por
parte da administração, caracterizada por comportamento tácito ou expresso do Poder Público capaz de revelar
a inequívoca necessidade de nomeação do aprovado durante o período de validade do certame, a ser
demonstrada de forma cabal pelo candidato. Assim, o direito subjetivo à nomeação do candidato aprovado em
concurso público exsurge nas seguintes hipóteses:
I – Quando a aprovação ocorrer dentro do número de vagas dentro do edital;
II – Quando houver preterição na nomeação por não observância da ordem de classificação;
III – Quando surgirem novas vagas, ou for aberto novo concurso durante a validade do certame anterior, e ocorrer
a preterição de candidatos de forma arbitrária e imotivada por parte da administração nos termos acima.
STJ – Jurisprudência em teses, edição n. 103:
4) A administração pública pode anular, a qualquer tempo, o ato de provimento efetivo flagrantemente
inconstitucional, pois o decurso do tempo não possui o condão de convalidar os atos administrativos que
afrontem a regra do concurso público.
5) A investidura em cargo público efetivo submete-se a exigência de prévio concurso público, sendo vedado o
provimento mediante transposição, ascensão funcional, acesso ou progressão.
7) A nomeação ou a posse tardia de candidato aprovado em concurso público, por força de decisão judicial, não
configura preterição ou ato ilegítimo da Administração Pública a justificar uma contrapartida indenizatória, salvo
situação de arbitrariedade flagrante.
8) A nomeação tardia de candidatos aprovados em concurso público, por meio de decisão judicial, à qual atribuída
eficácia retroativa, não gera direito às promoções e às progressões funcionais que alcançariam caso a nomeação
houvesse ocorrido a tempo e a modo.
9) A vedação de execução provisória de sentença contra a Fazenda Pública inserida no art. 2º-B da Lei n.
9.494/1997 não incide na hipótese de nomeação e de posse em razão de aprovação em concurso público.

20A. Direitos, deveres e responsabilidades do servidor público.

José Moreira Falcão Neto. 30/08/2018

Direitos do servidor público: A CR prevê os seguintes direitos: a) Irredutibilidade de vencimentos e subsídios (art.
37, XV), observado o teto constitucional; b) Direito de greve e de livre associação sindical (art. 37, VI e VII): este
último é autoaplicável, enquanto o primeiro exige lei específica regulamentar (segundo DI PIETRO, a lei será
editada por cada esfera de governo, vez que a matéria não é privativa da União). O STF, ao julgar os MI 670, 708
e 712, decidiu pela aplicação da Lei nº 7.783/89 até que seja suprida a omissão legislativa. O STF também tem
afastado o direito de greve a categorias que exercem atividades relacionadas à manutenção da ordem pública (v.g.,
policiais civis); c) Estabilidade, em razão da qual somente poderão perder o cargo em virtude de sentença judicial
transitada em julgado ou mediante processo administrativo em que lhes sejam assegurada ampla defesa; d)
Alguns dos direitos sociais assegurados aos trabalhadores (art. 39, §3º): salário-mínimo; garantia de salário,
nunca inferior ao mínimo, para os que percebem remuneração variável; 13º salário; remuneração do trabalho

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noturno superior à do diurno; salário-família para os dependentes; duração do trabalho normal não superior a 8
horas diárias e 44 semanais; repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos; remuneração do
serviço extraordinário superior, no mínimo, em 50% à normal; gozo de férias anuais remuneradas com, pelo
menos, 1/3 a mais que o salário normal; licença à gestante, sem prejuízo do emprego ou do salário, com duração
de 120 dias (a lei nº 11.770/2008 permitiu a prorrogação da licença por 60 dias adicionais); licença- paternidade;
proteção do mercado de trabalho da mulher, redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de saúde, higiene
e segurança; proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão, por motivo de
sexo, idade, cor ou estado civil, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza
do cargo o exigir; e) Direito a regime de previdência social de caráter contributivo e solidário, consoante regras
fixadas no art. 40.
Os direitos e deveres do servidor público estatutário constam do Estatuto do Servidor de cada ente federativo.
CABM distingue os diversos direitos previstos na Lei 8.112/90 em duas grandes categorias: i) Direitos e
vantagens que beneficiam diretamente o servidor (de ordem pecuniária, na ativa; de ausência ao serviço;
aposentadoria; ii) Direitos e vantagens que beneficiam seus dependentes (pensão; auxílio funeral; auxílio
reclusão.) No caso do empregado público ou da inexistência de estatuto próprio, estão previstos na CLT. Em
qualquer hipótese, devem ser observadas as normas da CR. Os servidores possuem os seguintes direitos: férias;
licenças; vencimento e demais vantagens de ordem pecuniária; assistência; direito de petição; direito de
disponibilidade; aposentadoria; outros previstos no estatuto. Com relação à retribuição pecuniária, com o
advento da EC 19/98 foi introduzido, ao lado do regime de remuneração ou vencimento, o subsídio. Nesse, o
estipêndio é composto de parcela única, sendo vedada qualquer espécie de outra vantagem. Para os servidores
remunerados pelo sistema de remuneração, continuam a existir as vantagens pecuniárias acrescidas ao
vencimento básico fixado em lei.
A remuneração do servidor público tem natureza alimentar. Assim, não pode ser objeto de penhora, nos do art.
833, IV, CPC/2015 (IV - os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de
aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como ... destinadas ao sustento do devedor e de sua
família, (...)”. Observe-se, em relação à impenhorabilidade, temperamento em julgado do STJ: “Valores
caracterizados como verbas alimentares somente manterão essa condição enquanto destinadas ao sustento do
devedor e sua família, ou seja, enquanto se prestarem ao atendimento das necessidades básicas do devedor e seus
dependentes. Na hipótese do provento de índole salarial se mostrar, ao final do período - isto é, até o
recebimento de novo provento de igual natureza - superior ao custo necessário ao sustento do titular e seus
familiares, essa sobra perde o caráter alimentício e passa a ser uma reserva ou economia, tornando-se, em
princípio, penhorável.” (STJ, 3a T, REsp 1330567/RS, Rel Min. Nancy Andrighi,
j. 16.05.2013). Quanto à impenhorabilidade de valores até o limite de 50 SM (era 40 no CPC/73), embora o STJ já
tenha conferido interpretação restritiva para restringir o dispositivo a aplicações em caderneta de poupança, há
julgados que sustentam uma interpretação extensiva para abranger outras formas de investimento, desde que
não haja indícios de má-fé, abuso, fraude, ocultação de valores ou sinais exteriores de riqueza (STJ, 2ª Seção, REsp
1230060/PR, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, j. 13.08.2014)
Não é devida a reposição ao Erário de valores pagos a servidor público de boa-fé, por força de interpretação
errônea ou má aplicação da lei por parte da Administração. 1ª S do STJ (repetitivo 1.244.182/PB). O mesmo se
aplica nos casos de mero equívoco operacional da Administração Pública. O fundamental é a boa-fé do servidor.
Não ter concorrido para o erro (confiança legítima) STJ. 1ª Turma. AgRg no REsp 1447354/PE.STJ. 2ª Turma. AgRg
no REsp 1560973/RN j em 05/04/2016. Diferentemente, É devida a restituição ao erário dos valores de natureza
alimentar pagos em cumprimento a decisão judicial precária posteriormente revogada. não se pode falar em boa-
fé do servidor, considerando que ele sabia que poderia haver alteração da decisão que tinha caráter precário
(provisório). STJ. 1ª Seção. EAREsp 58820-AL. Caso o recebimento pelo servidor se dê por força de definitiva
rescindida em Rescisória, aplica-se a regra geral da boa-fé, porque embasada em coisa julgada

TETO. O art. 37, XI (EC 41/2003) determina que o teto máximo do estipêndio dos servidores públicos federais é o
subsídio mensal, em espécie, dos Min. do STF. Na aplicação do teto, serão consideradas todas as importâncias
recebidas pelo servidor, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza. Excetuam- se, nos termos
do art. 37, § 11 (EC 47/2005), as parcelas de caráter indenizatório. O art. 37, XV determina que os vencimentos e
os subsídios dos ocupantes de cargos públicos são irredutíveis, ressalvado o disposto nos incisos XI e XIV do artigo

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37 e nos artigos 39, § 4º, 150, II, 153, § 2º, I. Assim, a irredutibilidade de vencimentos e subsídios não impede a
observância do teto fixado pelo inciso XI. O art. 9º da EC nº 41/2003 determinou que quaisquer remunerações ou
proventos que estivessem sendo recebidos acima do teto deveriam ser imediatamente reduzidos ao limite fixado,
não podendo a pessoa invocar direito adquirido.o STF entendeu que o pagamento de remunerações superiores
aos tetos de retribuição, além de se contrapor aos princípios da moralidade, da transparência e da austeridade
na administração dos gastos com custeio, representa gravíssima quebra da coerência hierárquica essencial à
organização do serviço público. Modulou os efeitos para valores recebidos de boa fé até a data do julgamento
(repercussão geral 2015) . Outra Casuística recente: Se a pessoa acumular licitamente dois cargos públicos ela
poderá receber acima do teto, pois o teto incidirá sobre a remuneração de cada cargo, e não sobre o somatório
(repercussão geral).
Acumulação de cargos. Casuística recente: um cargo tem natureza técnica se ele exigir, no desempenho de suas
atribuições, a aplicação de conhecimentos especializados de alguma área do saber. Não podem ser considerados
cargos técnicos aqueles que impliquem a prática de atividades meramente burocráticas (STF 1T, 2014, Inf 747)
Direito de greve dos servidores públicos: previsto no art. 37, VII. O STF mudou de posição, decidindo que, tendo
em vista a mora do legislador, deve-se aplicar a Lei 7.783/89, que disciplina o direito de greve dos trabalhadores
(MI 670-ES, MI 708-DF e MI 712-PA, em 25.10.2007). O direito à livre associação sindical é previsto no art. 37, VI
da CR, sendo autoaplicável. O art. 142, § 3º, IV, proíbe a greve e sindicalização ao militar, sendo aplicado, também,
aos militares dos Estados, DF e territórios por força do artigo 42, § 1º.
Deveres dos servidores públicos: vêm normalmente previstos nas leis estatutárias, abrangendo, dentre outros,
os de assiduidade, pontualidade, discrição, urbanidade, obediência, lealdade. Art. 116 da Lei 8.112/90: são
deveres do servidor público: exercer com zelo e dedicação as atribuições do cargo; ser leal às instituições a que
servir; observar as normas legais e regulamentares; cumprir as ordens superiores, exceto quando manifestamente
ilegais; atender com presteza ao público em geral, à expedição de certidões; às requisições para a defesa da
Fazenda Pública; levar ao conhecimento da autoridade superior as irregularidades de que tiver ciência em razão
do cargo; zelar pela economia do material e a conservação do patrimônio público; guardar sigilo sobre assunto da
repartição; manter conduta compatível com a moralidade dentre outros. O art. 117, por sua vez, traz um extenso
rol de proibições. A transgressão de ambos os dispositivos dá ensejo à responsabilidade administrativa.

O servidor público sujeita-se à responsabilidade civil, penal e administrativa.

A responsabilidade civil é de ordem patrimonial, na forma prevista na regra geral do art. 186 do CC, segundo o
qual todo aquele que causa dano a outrem é obrigado a repará-lo. Responsabilidade subjetiva (requisitos
ordinários). O dano pode ser causado ao Estado ou a terceiros. o STF, no julgamento do MS nº 24182/DF, rel. Min.
Maurício Corrêa, j. 12.02.04, afastou a aplicabilidade de dispositivo previsto na Lei nº 8.112/90 que autorizava
desconto em folha de dano causado ao Estado. Em caso de dano causado a terceiros, aplica-se a norma do art.
37, §6º, da CF, pela qual o Estado responde objetivamente e o servidor responde regressivamente em caso de
culpa ou dolo.
A responsabilidade administrativa decorre da prática de ilícitos administrativos definidos na legislação
estatutária, cujos elementos básicos são os mesmos do ilícito civil. As sanções, por seu turno, são previstas na lei
definidora do regime jurídico estatutário de cada ente, e dependem, para sua aplicação, de processo
administrativo prévio com as garantias a ele inerentes e de decisão motivada. As diversas responsabilidades são
independentes entre si (art. 125, Lei 8.112/1990). Pode ser aplicada pena de demissão mesmo que ação penal
pelo mesmo fato esteja em curso (STF).
A responsabilidade criminal do servidor público é apurada mediante processo judicial, sendo que o conceito
adotado pelo art. 327 do CP relativo a funcionário público para fins criminais é mais amplo que o de servidor
público, aproximando-se do conceito de agente público.
Na hipótese de o fato repercutir simultaneamente em mais de uma instância, aplicam-se as seguintes regras: a)
“A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato,
ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal.” (CC, art.
935); b) “Faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhecer ter sido o ato praticado em estado de
necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.” (CPP.
art. 65); c) “Não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser proposta quando não

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tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato.” (CPP, art.66)

12A. Estatuto do Ministério Público Federal.

Vanessa Andrade

A Constituição de 1988 estabelece, no § 5º do artigo 128, que leis complementares da União e dos Estados,
cuja iniciativa é facultada aos respectivos Procuradores-Gerais, estabelecerão a organização, as atribuições e o
estatuto de cada Ministério Público, observadas, relativamente a seus membros: I - as seguintes garantias: a)
vitaliciedade, após dois anos de exercício, não podendo perder o cargo senão por sentença judicial transitada em
julgado; b) inamovibilidade, salvo por motivo de interesse público, mediante decisão do órgão colegiado
competente do Ministério Público, pelo voto da maioria absoluta de seus membros, assegurada ampla defesa
(EC45/04); c) irredutibilidade de subsídio, fixado na forma do art. 39, § 4º, e ressalvado o disposto nos arts. 37, X
e XI, 150, II, 153, III, 153, § 2º, I (EC19/98); II - as seguintes vedações: a) receber, a qualquer título e sob qualquer
pretexto, honorários, percentagens ou custas processuais; b) exercer a advocacia; c) participar de sociedade
comercial, na forma da lei; d) exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função pública, salvo uma de
magistério; e) exercer atividade político-partidária (EC45/04); f) receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou
contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei
(EC45/04). § 6º Aplica-se aos membros do Ministério Público o disposto no art. 95, parágrafo único, V (aos juízes
é vedado exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos três anos do afastamento
do cargo por aposentadoria ou exoneração). Art. 129, § 2º As funções do Ministério Público só podem ser exercidas
por integrantes da carreira, que deverão residir na comarca da respectiva lotação, salvo autorização do chefe da
instituição (EC45/04). § 3º O ingresso na carreira do Ministério Público far-se-á mediante concurso público de
provas e títulos, assegurada a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em sua realização, exigindo-se do
bacharel em direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica e observando-se, nas nomeações, a ordem de
classificação (EC45/04) § 4º Aplica-se ao Ministério Público, no que couber, o disposto no art. 93 (EC45/04).
Lei Complementar nº 75, de 20 de maio de 93 (Dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do
Ministério Público da União). Das Garantias e das Prerrogativas. Art. 17. Os membros do Ministério Público da
União gozam das seguintes garantias: I - vitaliciedade, após dois anos de efetivo exercício, não podendo perder o
cargo senão por sentença judicial transitada em julgado; II - inamovibilidade, salvo por motivo de interesse público,
mediante decisão do Conselho Superior, por voto de dois terços [maioria absoluta] de seus membros, assegurada
ampla defesa; III – (Vetado). Razões do veto: O artigo 17 é mera reprodução do item I do § 5° do artigo 128 da
Constituição. No entanto, o item III, suprimiu-se a remissão que o aludido item I faz ao artigo 153, III, da
Constituição, que atribuiu competência à União para instituir impostos sobre a renda e proventos de qualquer
natureza. O projeto, destarte, altera o texto constitucional, modificando-o na sua essência. Art. 18. São
prerrogativas dos membros do Ministério Público da União: I – institucionais: a) sentar-se no mesmo plano e
imediatamente à direita dos juízes singulares ou presidentes dos órgãos judiciários perante os quais oficiem; b)
usar vestes talares; c) ter ingresso e trânsito livres, em razão de serviço, em qualquer recinto público ou privado,
respeitada a garantia constitucional da inviolabilidade do domicílio; d) a prioridade em qualquer serviço de
transporte ou comunicação, público ou privado, no território nacional, quando em serviço de caráter urgente; e)
o porte de arma, independentemente de autorização; f) carteira de identidade especial, de acordo com modelo
aprovado pelo Procurador-Geral da República e por ele expedida, nela se consignando as prerrogativas constantes
do inciso I, alíneas c, d e e do inciso II, alíneas d, e e f, deste artigo; II – processuais: a) do Procurador-Geral da
República, ser processado e julgado, nos crimes comuns, pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Senado Federal,
nos crimes de responsabilidade; b) do membro do Ministério Público da União que oficie perante tribunais, ser
processado e julgado, nos crimes comuns e de responsabilidade, pelo Superior Tribunal de Justiça; c) do membro
do Ministério Público da União que oficie perante juízos de primeira instância, ser processado e julgado, nos crimes
comuns e de responsabilidade, pelos Tribunais Regionais Federais, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral
[O Procurador da República é julgado pelo TRF em cuja área exerce suas atribuições]; d) ser preso ou detido
somente por ordem escrita do tribunal competente ou em razão de flagrante de crime inafiançável, caso em que
a autoridade fará imediata comunicação àquele tribunal e ao Procurador-Geral da República, sob pena de
responsabilidade; e) ser recolhido à prisão especial ou à sala especial de Estado-Maior, com direito a privacidade

73
e à disposição do tribunal competente para o julgamento, quando sujeito a prisão antes da decisão final; e a
dependência separada no estabelecimento em que tiver de ser cumprida a pena; f) não ser indiciado em inquérito
policial, observado o disposto no parágrafo único deste artigo; g) ser ouvido, como testemunhas, em dia, hora e
local previamente ajustados com o magistrado ou a autoridade competente; h) receber intimação pessoalmente
nos autos em qualquer processo e grau de jurisdição nos feitos em que tiver que oficiar. [STJ: O termo inicial da
contagem do prazo para impugnar decisão judicial é, para o Ministério Público, a data da entrega dos autos na
repartição administrativa do órgão, sendo irrelevante que a intimação pessoal tenha se dado em audiência, em
cartório ou por mandado. REsp 1349935-SE, recurso repetitivo]. Parágrafo único. Quando, no curso de
investigação, houver indício da prática de infração penal por membro do Ministério Público da União, a autoridade
policial, civil ou militar, remeterá imediatamente os autos ao Procurador-Geral da República, que designará
membro do Ministério Público para prosseguimento da apuração do fato. Art. 19. O Procurador-Geral da República
terá as mesmas honras e tratamento dos Ministros do Supremo Tribunal Federal; e os demais membros da
instituição, as que forem reservadas aos magistrados perante os quais oficiem. Art. 20. Os órgãos do Ministério
Público da União terão presença e palavra asseguradas em todas as sessões dos colegiados em que oficiem. Art.
21. As garantias e prerrogativas dos membros do Ministério Público da União são inerentes ao exercício de suas
funções e irrenunciáveis. Parágrafo único. As garantias e prerrogativas previstas nesta Lei Complementar não
excluem as que sejam estabelecidas em outras leis.
Dos Deveres e Vedações. Art. 236. O membro do Ministério Público da União, em respeito à dignidade de
suas funções e à da Justiça, deve observar as normas que regem o seu exercício e especialmente: I - cumprir os
prazos processuais; II - guardar segredo sobre assunto de caráter sigiloso que conheça em razão do cargo ou
função; III - velar por suas prerrogativas institucionais e processuais; IV - prestar informações aos órgãos da
administração superior do Ministério Público, quando requisitadas; V - atender ao expediente forense e participar
dos atos judiciais, quando for obrigatória a sua presença; ou assistir a outros, quando conveniente ao interesse do
serviço; VI - declarar-se suspeito ou impedido, nos termos da lei; VII - adotar as providências cabíveis em face das
irregularidades de que tiver conhecimento ou que ocorrerem nos serviços a seu cargo; VIII - tratar com urbanidade
as pessoas com as quais se relacione em razão do serviço; IX - desempenhar com zelo e probidade as suas funções;
X - guardar decoro pessoal. Art. 237. É vedado ao membro do Ministério Público da União: I - receber, a qualquer
título e sob qualquer pretexto; honorários, percentagens ou custas processuais; II - exercer a advocacia; III - exercer
o comércio ou participar de sociedade comercial, exceto como cotista ou acionista; IV - exercer, ainda que em
disponibilidade, qualquer outra função pública, salvo uma de magistério; V - exercer atividade político-partidária,
ressalvada a filiação e o direito de afastar-se para exercer cargo eletivo ou a ele concorrer. (A EC 45/04 alterou a
redação do o art. 128, § 5º, II, “e”, da CF, suprimindo a autorização de previsão em lei de exceções à vedação de
exercício de atividade político-partidária)

São órgãos do Ministério Público Federal: Procurador-Geral da República; Colégio de Procuradores da


República; Conselho Superior do Ministério Público Federal; Câmaras de Coordenação e Revisão do Ministério
Público Federal; Corregedoria do Ministério Público Federal; Subprocuradores-Gerais da República; Procuradores
Regionais da República; Procuradores da República.
A carreira do Ministério Público Federal é constituída pelos cargos de Subprocurador-Geral da República,
Procurador Regional da República e Procurador da República.
O Procurador-Geral da República é o Chefe do Ministério Público Federal. Incumbe ao Procurador-Geral
da República exercer as funções do Ministério Público junto ao Supremo Tribunal Federal, manifestando-se
previamente em todos os processos de sua competência. O Procurador-Geral da República designará os
Subprocuradores-Gerais da República que exercerão, por delegação, suas funções junto aos diferentes órgãos
jurisdicionais do Supremo Tribunal Federal. As funções do Ministério Público Federal junto aos Tribunais
Superiores da União, perante os quais lhe compete atuar, somente poderão ser exercidas por titular do cargo de
Subprocurador-Geral da República. Em caso de vaga ou afastamento de Subprocurador-Geral da República, por
prazo superior a trinta dias, poderá ser convocado Procurador Regional da República para substituição, pelo voto
da maioria do Conselho Superior. Incumbe ao Procurador-Geral da República propor perante o Superior Tribunal
de Justiça: a representação para intervenção federal nos Estados e no Distrito Federal, no caso de recusa à
execução de lei federal; a ação penal, nos casos previstos no art. 105, I, "a", da Constituição Federal. Tal
competência poderá ser delegada a Subprocurador-Geral da República.

74
A ação penal pública contra o Procurador-Geral da República, quando no exercício do cargo, caberá ao
Subprocurador-Geral da República que for designado pelo Conselho Superior do Ministério Público Federal.
O Colégio de Procuradores da República, presidido pelo Procurador-Geral da República, é integrado por
todos os membros da carreira em atividade no Ministério Público Federal.
O Conselho Superior do Ministério Público Federal, presidido pelo Procurador-Geral da República, tem a
seguinte composição: I - o Procurador-Geral da República e o Vice-Procurador-Geral da República, que o integram
como membros natos; II - quatro Subprocuradores-Gerais da República eleitos, para mandato de dois anos, na
forma do art. 53, III, permitida uma reeleição; III - quatro Subprocuradores-Gerais da República eleitos, para
mandato de dois anos, por seus pares, mediante voto plurinominal, facultativo e secreto, permitida uma reeleição.
As Câmaras de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal são os órgãos setoriais de
coordenação, de integração e de revisão do exercício funcional na instituição.
A Corregedoria do Ministério Público Federal, dirigida pelo Corregedor-Geral, é o órgão fiscalizador das
atividades funcionais e da conduta dos membros do Ministério Público.
Os Subprocuradores-Gerais da República serão designados para oficiar junto ao Supremo Tribunal
Federal, ao Superior Tribunal de Justiça, ao Tribunal Superior Eleitoral e nas Câmaras de Coordenação e Revisão.
Os Procuradores Regionais da República serão designados para oficiar junto aos Tribunais Regionais
Federais.
Os Procuradores da República serão designados para oficiar junto aos Juízes Federais e junto aos Tribunais
Regionais Eleitorais, onde não tiver sede a Procuradoria Regional da República.
O Procurador-Geral Eleitoral é o Procurador-Geral da República, e designará, dentre os Subprocuradores-
Gerais da República, o Vice-Procurador-Geral Eleitoral, que o substituirá em seus impedimentos e exercerá o cargo
em caso de vacância, até o provimento definitivo.
O Procurador Regional Eleitoral, juntamente com o seu substituto, será designado pelo Procurador-Geral
Eleitoral, dentre os Procuradores Regionais da República no Estado e no Distrito Federal, ou, onde não houver,
dentre os Procuradores da República vitalícios, para um mandato de dois anos.

27º CPR: 1) Na estrutura do Poder Judiciário e do MP, há algum órgão de controle que pode realizar avocação de
competência, inclusive em matéria disciplinar? Em que hipóteses isso pode se dar? 2) Quais são os direitos dos
membros do MP? Quais são seus deveres? 3) Sobre o direito a 60 dias de férias: qual é o fundamento disso? Você
concorda? Fundamente.

19B. Regime jurídico do concurso público e seu controle administrativo e judicial

Eric Márcio Fantin


Obras consultadas: Direito Administrativo; DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella; Editora Forense; 31ª Edição; 2018.

O concurso público realiza os princípios constitucionais da igualdade, da eficiência, da impessoalidade e


da moralidade, entre outros. Nos termos da CF, a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação
prévia em concurso público de provas ou provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo
ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de
livre nomeação e exoneração.

A regra é a obrigatoriedade do concurso. Nesse sentido, o STF editou a Súmula Vinculante nº 43: “É
inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em
concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente
investido”. (vedação do instituto da ascensão)

Tanto a administração direta quanto a indireta, aqui incluídos os conselhos profissionais, devem se
submeter a realização de concurso público. Por outro lado, o sistema “S” (serviços sociais autônomos), as
organizações sociais e a OAB não precisam realizar concursos.

Para a contratação de servidores temporários, adota-se procedimento seletivo simplificado, ante a

75
urgência da situação. “O STF entende que as leis que autorizam contratações temporárias não podem fixar
hipóteses abrangentes e genéricas, sem especificar a contingência fática que, presente, indicaria a exigência de
um estado de emergência. Desta forma, não basta que a lei simplesmente atribua ao Chefe do Executivo
interessado na contratação a competência para estabelecer os casos em que a mesma seria possível (ADI 3.430,
Relator Min. Ricardo Lewandowski, j. 12-4-09, Plenário, Informativo 555).” (nota de rodape nº. 8, pág. 856 da obra
consultada).

Prazo de validade: até 2 (dois) anos, prorrogável por IGUAL período. Nomeação tardia, em regra, não gera
direito a indenização: Na hipótese de posse em cargo público determinada por decisão judicial, o servidor não
faz jus à indenização, sob fundamento de que deveria ter sido investido em momento anterior, salvo situação
de arbitrariedade flagrante. (STF. Plenário. RE 724347/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min.
Roberto Barroso, julgado em 26/2/2015 (repercussão geral) (Info 775).

Exigência de psicotécnico: Súmula vinculante 44-STF: Só por lei se pode sujeitar a exame psicotécnico a
habilitação de candidato a cargo público.

Diferenciação por sexo: Faz-se necessária justificativa adequada. Ex. Vagas reservadas às mulheres para
trabalharem como agentes penitenciária em presídio feminino.

Idade máxima: Súmula 683, STF: O limite de idade para a inscrição em concurso público só se legitima em
face do art. 7º, XXX, da Constituição, quando possa ser justificado pela natureza das atribuições do cargo a ser
preenchido.

Direito subjetivo à nomeação: “Decidindo pelo direito à nomeação para a posse que vier a ser dada nos
cargos vagos existentes ou nos que vierem a vagar no prazo de validade do concurso, decisões do STF, in RE
227480/RJ, rel. Min. Menezes Direito, rel. para o acórdão Min. Cármen Lúcia, Dje de 14-9-09. No mesmo sentido,
decisões do STJ in RMS no 20.718/SP, 6a Turma, Rel. Min. Paulo Medina, j. em 4-12-07, com citação
de precedentes; RMS 25501, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 14-9-09; em outro acórdão, in RMS 32.105-DF,
Rel. Min. Eliana Calmon, DJe de 30-8-10, o STJ vai além para admitir o direito à nomeação, mesmo fora do número
de vagas previstas no edital, se a Administração manifesta, por ato inequívoco, a necessidade de novas vagas.”
(Nota de rodapé nº 11, pag. 856, da obra consultada)(grifei).

Cotas: A CF determina a reserva de vagas aos portadores de necessidades especiais. A Lei 8.112/90, art.
5º, §2o reserva até 20% das vagas. A lei 12.990/2014 reserva 20% das vagas em concursos federais aos negros. O
STF, por unanimidade, reconheceu a constitucionalidade desta ação afirmativa.

Controle Judicial: “É possível que o Poder Judiciário anule questão objetiva de concurso público que foi
elaborada de maneira equivocada? É possível que seja alterada a pontuação dada ao candidato na questão sob o
argumento de que a correção feita pela banca foi inadequada? Regra: NÃO. Os critérios adotados por banca
examinadora de concurso público não podem ser revistos pelo Poder Judiciário. Não é possível controle
jurisdicional sobre o ato administrativo que corrige questões de concurso público. Não compete ao Poder
Judiciário substituir a banca examinadora para reexaminar o conteúdo das questões e os critérios de correção
utilizados. Exceção: apenas em casos de flagrante ilegalidade ou inconstitucionalidade, a Justiça poderá ingressar
no mérito administrativo para rever critérios de correção e de avaliação impostos pela banca examinadora. STF.
Plenário. RE 632853/CE, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 23/4/2015 (repercussão geral) (Info 782)”. (Dizer o
Direito)

7. RESPONSABILIDADE DO ESTADO
7.1 Responsabilidade patrimonial do Estado: evolução histórica e fundamentos juri ́dicos. Teorias da culpa
administrativa, do serviço e do risco. Responsabilidade por ação e por omissão. Dano indenizável. Causas
excludentes. Direito de regresso. (15.a)

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7.2 Responsabilidade do Estado por atos legislativos e judiciais. (20.b)

15A. Responsabilidade patrimonial do Estado: evolução histórica e fundamentos jurídicos. Teorias da culpa
administrativa, do serviço e do risco. Responsabilidade por ação e por omissão. Dano indenizável. Causas
excludentes. Direito de regresso.

Atualizado por Igor Lima Goettenauer de Oliveira


Material usado: CARVALHO FILHO, “Manual de Direito Administrativo” (2018); BALTAR NETO, TORRES, “Sinopse de direito administr ativo” (2017); site
Dizer o Direito; jurisprudência do STF/STJ; material de apoio

A responsabilidade do Estado constitui a obrigação, atribuída ao Poder Público, de recompor os danos


causados por seus agentes no exercício de suas funções ou agindo nessa qualidade. Os pressupostos para
reparação civil são: ação/omissão do poder público, dano e nexo causal. Para o ressarcimento do prejuízo é
necessário que este seja certo, especial e anormal (esses dois últimos requisitos em se tratando de
comportamentos estatais lícitos, segundo CABM).

1. EVOLUÇÃO HISTÓRICA E TEORIAS DA RESPONSABILIDADE DO ESTADO


a) Irresponsabilidade do Estado: o Estado não respondia por qualquer prejuízo causado a terceiros. Ocorreu no
período do Absolutismo Europeu. Prevalecia a máxima The King can do no wrong. As duas últimas nações
ocidentais a abandoná-la foram Inglaterra e EUA, em 1947 e 1946, conforme aponta MSDP.
b) Responsabilidade subjetiva ou com culpa (Teoria Civilista): com o fim do Estado Absolutista, surge a teoria da
responsabilidade subjetiva que, essencialmente, responsabiliza o Estado por danos decorrentes de atos da
administração regidos pelo direito privado, quando praticados ao menos com culpa do agente. Tal teoria
diferencia atos de império, de atos de gestão. Os primeiros, por decorrerem das prerrogativas e privilégios do
regime de direito público, não gerariam a responsabilização do Estado, sendo a responsabilidade civil aplicável
apenas aos atos de gestão, estes sim sujeitos ao regime de direito privado. Por fim, segundo esta teoria, caberia
ao lesado diferenciar atos de império de atos de gestão, bem como identificar a conduta dolosa ou culposa do
agente público responsável pelo ato.
c) Teoria da culpa administrativa: também chamada de “teoria da culpa do serviço”, “teoria da faute du servisse”,
“teoria da culpa anônima” ou “teoria da culpa não individualizada”, foi desenvolvida pelo Conselho de Estado
francês. Essa teoria não exige do lesado a identificação do agente público causador do dano, nem diferencia atos
de império de atos de gestão, bastando que se demonstre culpa na prestação do serviço, ou seja, a falta no serviço
público. A falta do serviço público, por outro lado, necessita da demonstração de que o Estado tinha o dever legal
de agir e falhou por: 1. Não prestar o serviço; 2. Prestar o serviço de forma insuficiente; 3. Prestar o serviço com
atraso.
d) Teoria do risco administrativo: Esta teoria tem como fundamento o princípio da isonomia na distribuição dos
ônus e bônus decorrentes da atividade estatal, devendo eventuais prejuízos ser repartidos por toda a sociedade.
Assim, mesmo que não se vislumbre intenção de causar dano ou mesmo culpa por parte dos agentes públicos na
prestação dos serviços públicos, deverá a Fazenda Pública suportar o prejuízo, em face do risco inerente à
atividade administrativa. A responsabilidade aqui é objetiva, sem necessidade de demonstrar culpa ou dolo, nem
sequer identificar o agente causador do dano. Basta a demonstração do nexo de causalidade entre a ação estatal
e a lesão provocada. Apesar de fundada na responsabilidade objetiva, tal teoria admite as seguintes excludentes
ou atenuantes da responsabilidade estatal, quando forem capazes de romper o nexo de causalidade entre a
conduta estatal e o dano gerado: 1. Caso fortuito/força maior; 2. Ato de terceiros; 3. Culpa exclusiva (excludente)
ou concorrente (atenuante) da vítima.
e) Teoria do risco integral: Também chamada de teoria da responsabilidade integral. Novamente, fundada na
teoria objetiva. Contudo, não admite as excludentes ou atenuantes de responsabilidade da teoria do risco
administrativo. Aplica-se aos danos ambientais e àqueles advindos de acidentes nucleares.

2. HISTÓRICO NO BRASIL:
a) Constituição 1824 – “Art. 178, n. 29. Os empregados públicos são estritamente responsáveis pelos abusos e
omissões praticados no exercício de suas funções e por não fazerem efetivamente responsáveis aos seus

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subalternos”, cujo equivalente constava do art. 82 da Constituição de 1891. Para CABM, significava que o agente
respondia solidariamente com o Estado.
b) Constituição de 1937 - “Art. 158: Os funcionários públicos são responsáveis, solidariamente, com a Fazenda
Nacional, Estados e Municípios, por quaisquer prejuízos decorrentes de negligência, omissão ou abuso no
exercício de seus cargos.” Não havia necessidade de ação de regresso, uma vez que o funcionário público
respondia solidariamente, podendo ser acionado conjuntamente com a Fazenda. Existia a chamada
responsabilidade subjetiva solidária.
c) Constituição de 1946 - “Art. 194: As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis
pelos danos que seus funcionários, agindo nesta qualidade, causarem a terceiro. Parágrafo único. Caber-lhes-á
ação regressiva contra os funcionários causadores do dano, quando tiver havido culpa destes”. O funcionário só
respondia se fosse comprovada a sua culpa em ação regressiva, desaparecendo a solidariedade. Introduziu a
teoria da responsabilidade objetiva.
d) Constituição de 1967 e 1969 - “Art. 105: As pessoas jurídicas de direito público respondem pelos danos que
seus funcionários, nesta qualidade, causarem a terceiros. Parágrafo único. Caberá ação de regresso contra o
funcionário que agiu com culpa ou dolo”. Acrescenta a possibilidade de ação regressiva no caso de dolo do agente.
e) Constituição de 1988 – “Art. 37, § 6.º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado, prestadoras
de serviços públicos, responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros,
assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.” Ou seja, adotou-se no Brasil,
ao menos para os atos comissivos (vide abaixo) a teoria do risco administrativo. Os requisitos para a ação de
regresso são condenação com trânsito em julgado e caracterização de culpa ou dolo. A Lei n. 4.619/65 estabelece
o prazo de 60 dias para acionar o agente, a partir do trânsito em julgado da sentença condenatória.

3. CASOS ESPECÍFICOS:
a) concessionárias e permissionárias de serviço público: respondem objetivamente, pela teoria do risco
administrativo, inclusive em relação aos danos causados a terceiros não-usuários do serviço público.
b) responsabilidade dos notários: apesar do serviço notarial ser um serviço de direito público, em razão de
recente mudança legislativa (L13.286/2016), a responsabilidade dos notários, que era tida como objetiva, passou
a ter caráter subjetivo. (Art. 22. Os notários e oficiais de registro são civilmente responsáveis por todos os
prejuízos que causarem a terceiros, por culpa ou dolo, pessoalmente, pelos substitutos que designarem ou
escreventes que autorizarem, assegurado o direito de regresso. (Redação dada pela Lei nº 13.286, de 2016))
c) responsabilidade por danos decorrentes de atividades nucleares: em tal situação, a doutrina majoritária
afirma que se adotou a teoria do risco integral, por força do art. 22, XXIII, “d”, da CRFB.
d) responsabilidade do Estado por atos legislativos: em regra, o Estado não responde por atos legislativos.
Entretanto, se a lei for julgada inconstitucional, poderá ensejar a responsabilidade civil do Estado (para doutrina
majoritária, apenas pode gerar a responsabilização estatal quando a inconstitucionalidade for declarada pelo
controle concentrado). Ainda, leis de efeitos concretos também geram responsabilização do Estado, uma vez que,
embora produzidas pelo Legislativo, quanto ao conteúdo, caracterizam-se como verdadeiros atos administrativos.
Em geral, a doutrina e a jurisprudência não admitem responsabilidade do Estado por atos legislativos
constitucionais, nem pela omissão legislativa.
e) responsabilidade por atos judiciais: o art. 143 do NCPC dispõe que o juiz responde por perdas e danos quando,
no exercício de suas funções, procede dolosamente, bem como quando recusa, omite ou retarda, sem justo
motivo, providência que deva ordenar de ofício ou a requerimento da parte. Note-se que a responsabilidade,
neste caso, é individual do juiz. Se o dano deriva de ato culposo, haverá responsabilização se a decisão que o
ensejou foi proferida em processo penal, por força da norma constitucional do art. 5º, LXXV (“O Estado indenizará
o condenado por erros judiciários, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença”). Note-se
que atos culposos não geram responsabilização no processo civil.
f) responsabilidade por morte de detento: em regra, o Estado deverá indenizar a família da vítima, com
fundamento na teoria do risco administrativo, em decorrência da sua omissão específica em cumprir o dever
especial de proteção que lhe é imposto pelo art. 5º, XLIX, da CF/88 (“Art. 5º (...) XLIX - é assegurado aos presos o
respeito à integridade física e moral”) (STF. Plenário. RE 841526/RS, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 30/3/2016
(repercussão geral) - Info 819). Mesmo em casos de suicídio de detento, o STF e o STJ têm aplicado a
responsabilidade objetiva. Contudo, tal responsabilidade admite as excludentes ou atenuantes vistas acima,

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restando afastada caso não se verifique a falha estatal de inobservância do dever específico de cuidado previsto
no art. 5º, XLIX (STJ. 2ª Turma. REsp 1305259/SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 08/02/2018).
g) reponsabilidade pelas péssimas condições carcerárias: “Considerando que é dever do Estado, imposto pelo
sistema normativo, manter em seus presídios os padrões mínimos de humanidade previstos no ordenamento
jurídico, é de sua responsabilidade, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição, a obrigação de ressarcir os danos,
inclusive morais, comprovadamente causados aos detentos em decorrência da falta ou insuficiência das condições
legais de encarceramento. STF. Plenário. RE 580252/MS, rel. orig. Min. Teori Zavascki, red. p/ o ac. Min. Gilmar
Mendes, julgado em 16/2/2017 (repercussão geral) (Info 854).”
h) teoria do risco criado: o Estado responde objetivamente pela sua atuação que venha a gerar dano. Ex.: fuga de
presidiários frequentes e o Estado não adota providências.
i) responsabilidade por obra pública: ainda que não possa se caracterizar ilícita a atividade estatal, a
responsabilidade decorre da própria teoria do risco administrativo. Contudo, será a responsabilidade subsidiária
quando se atribuir ao empreiteiro privado a responsabilidade subjetivo, sabido que cumpre o contrato sob sua
conta e risco. Na hipótese de responsabilidade pelo simples fato da obra, esta causa dano sem que tenha havido
culpa de alguém, decorrendo da existência da obra, por si só, sendo irrelevante saber quem está a executado.
Logo, a responsabilidade será objetiva quando for pelo simples fato da obra.

4. RESPONSABILIDADE CIVIL POR ATOS COMISSIVOS E OMISSIVOS


a) Responsabilidade por ato comissivo: as pessoas jurídicas de direito público e as pessoas jurídicas de direito
privado, quando prestadoras de serviço público, em regra, responderão de forma objetiva, na modalidade do
risco administrativo. No entanto, excepcionando-se tal regra, tem-se a responsabilidade na modalidade do risco
integral em se tratando de dano nuclear (art. 21, XXIII, d, da CF), e dano ambiental (art. 225,§3º). Ressalta-se que,
as pessoas jurídicas de direito privado que prestem atividades econômicas podem vir a responder de modo
objetivo por força da aplicação do CDC ou do art. 944 do CC.
b) Responsabilidade por omissão: Segundo Hely a responsabilidade é objetiva na modalidade é de risco
administrativo, não importando a natureza do dano (se advindo da omissão ou ação do Estado). Para CABM, cuja
tese é majoritária, se o dano for decorrente de omissão, significa que a responsabilidade recaiu sobre a não
prestação de serviço, ou prestação deficiente, sendo a responsabilidade, na visão deste doutrinador, subjetiva
(faute du service). No entanto, o STF tem admitido a responsabilização de forma objetiva da Administração Pública
quando restar comprovado que a própria Administração se colocou na posição de garante ou quando houver o
descumprimento de um dever legal por parte da Administração (RE 633138, 1ª Turma, 2012) e desde que haja
um nexo causal direto entre o dano e a conduta. Nesse sentido:
RE 841526, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, j. 30/03/2016, Repercussão geral): “Deveras, é fundamental
ressaltar que, não obstante o Estado responda de forma objetiva também pelas suas omissões, o nexo de
causalidade entre essas omissões e os danos sofridos pelos particulares só restará caracterizado quando o Poder
Público ostentar o dever legal específico de agir para impedir o evento danoso, não se desincumbindo dessa
obrigação legal. Entendimento em sentido contrário significaria a adoção da teoria do risco integral, repudiada
pela Constituição Federal, como já mencionado acima.”; RE 607771, 2º Turma, STF, 2010: reconheceu-se a
responsabilidade objetiva no caso de latrocínio cometido por foragido, visto que a “A negligência estatal no
cumprimento do dever de guarda e vigilância dos presos sob sua custódia, a inércia do Poder Público no seu dever
de empreender esforços para recaptura do foragido são suficientes para caracterizar o nexo de causalidade”. - RE
409203, 2º Turma, STF, 2006: foi reconhecida a responsabilidade objetiva em caso de estupro cometido por
foragido, pois no caso houve flagrante descumprimento da Lei de Execução Penal, pois um condenado submetido
a regime prisional aberto praticou, em sete ocasiões, falta grave de evasão, sem que as autoridades responsáveis
pela execução da pena lhe aplicassem a regressão do regime prisional. Na oitava vez que se evadiu ele cometeu
o crime de estupro contra uma menor de 12 anos. - AI 734689, 2ª Turma, STF, 2012: reconhecimento da
responsabilidade objetiva em caso de tratamento hospitalar inadequado, por indisponibilidade da UTI pediátrica
e de aparelho de respiração artificial que levou a morte. O STJ também tem reconhecido a responsabilidade
objetiva do Estado no caso de morte de preso sob a sua custódia em delegacia de polícia (Resp 1022798, 2ª Turma,
2008) e no interior do presídio (Resp 1054443, 2ª Turma, 2009).

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5. DANO INDENIZÁVEL: é pacífico na doutrina e na jurisprudência que o dano indenizável pode ser o material ou
o moral. Recentemente, a jurisprudência ainda vem reconhecendo também o dano pela perda de uma chance:
“o objeto da reparação é a perda da possibilidade de obter um ganho como provável, sendo que há que se fazer
a distinção entre o resultado perdido e a possibilidade de consegui-lo.” (Resp n. 1.2544.141 – PR)

6. DIREITO DE REGRESSO
Configura a responsabilização do agente por danos causados a terceiros quando se constatar dolo ou culpa deste
na sua conduta, ensejando a possibilidade de regresso pelo Estado.
Observa-se que, a regra, é que o particular não poderá propor diretamente a ação em face do agente público
causador do dano, pois a CF estabeleceu a responsabilidade estatal. É o que se convencionou denominar teoria
da dupla garantia, à vítima e ao agente, não admitindo a propositura per saltum da ação. Todavia, o STJ já se
manifestou admitindo a propositura da ação pela vítima diretamente em desfavor do agente, em virtude da busca
por economicidade e eficiência processual (STJ, REsp 1.325.862/2013).

Denunciação à lide do agente público: entendimento majoritário é de que não é cabível a intervenção. O STJ,
porém, já admitiu a intervenção, deixando manifesto que o Estado não estará obrigado a fazê-lo para garantir o
direito de regresso (STJ, AgRg no REsp 631.723/2004). Obs.: o NCPC não exige, tal como exigia o VCPC, sendo uma
faculdade ao réu (art. 125).

Lei nº 4.619 – ação regressiva da União contra seus agenteS


Obrigatoriedade aos PRs: os Procuradores da República são obrigados a propor as competentes ações regressivas
contra os funcionários de qualquer categoria declarados culpados por haverem causado a terceiros lesões de
direito que a Fazenda Nacional, seja condenada judicialmente a reparar.
Prazo ajuizamento: o prazo para ajuizamento da ação regressiva será de sessenta dias a partir da data em que
transitar em julgado a condenação imposta à Fazenda.
Exação no cumprimento do dever: a não obediência, por ação ou omissão, ao disposto nesta lei, apurada em
processo regular, constitui falta de exação no cumprimento do dever.
Competência: a competência para iniciar a ação regressiva cabe ao Procurador lotado no Estado em que haja
corrido o processo judicial cuja decisão contra a Fazenda haja transitado em julgado. No Distrito Federal e nos
Estados em que funcionem mais de um Procurador, a obrigação cabe ao que tenha funcionado no feito de que
tenha resultado a condenação da Fazenda; e se mais de um houver funcionado, qualquer deles terá competência
para propor a consequente ação regressiva contra, o funcionário ou pessoa investida em função pública,
incorrendo todos na mesma falta, se nenhum deles intentar a referida ação. Ocorrendo a falta coletiva, o
Procurador-Geral designará um dos Procuradores para propor imediatamente a ação regressiva.
Cessação do exercício e permanência da responsabilidade: a cessação, por qualquer forma, do exercício da
função pública, não exclui o funcionário, ou pessoa nela investida, da responsabilidade perante a Fazenda.
Liquidação: a liquidação do que for devido pelo funcionário estável à Fazenda Nacional poderá ser feita mediante
desconto em folha de pagamento, o qual não excederá de uma quinta parte, da importância de seu vencimento
ou remuneração.

7. OUTROS PONTOS
b) Ação direta contra o agente público: para o STF (RE 327904, 1ª Turma, 2006) não há possibilidade de ingressar
com ação diretamente contra o agente, porque o § 6.º do art. 37 da Constituição Federal dispõe que a
responsabilidade é do Estado que tem direito regressivo contra o causador do dano, estabelecendo uma dupla
garantia.
c) Prazo Prescricional: a 1ª Seção do STJ, no julgamento do EREsp 1.200.764 (2012), reafirmou que o prazo de
reparação pelos danos causados pela Fazenda Pública é de 05 anos, nos termos da lei 9494/97.
d) Indenização por dano moral em virtude de superlotação carcerária: Resp 962934/MS (2ª Turma, 2011) -
pleiteava-se a indenização por dano moral em favor de detento, por superlotação do sistema carcerário. Tal
pretensão restou indeferida nos seguintes termos: “A condenação do Estado à indenização por danos morais
individuais, como remédio isolado, arrisca a instituir uma espécie de pedágio-masmorra, ou seja, deixa a
impressão de que ao Poder Público, em vez de garantir direitos inalienáveis e imprescritíveis de que são titulares,

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por igual, todos os presos, bastará pagar, aos prisioneiros que disponham de advogado para postular em seu
favor, uma ‘bolsa-indignidade’ pela ofensa diária, continuada e indesculpável aos mais fundamentais dos direitos,
assegurados constitucionalmente. 3. A questão não trata da incidência da cláusula da reserva do possível, nem de
assegurar o mínimo existencial, mas sim da necessidade urgente de aprimoramento das condições do sistema
prisional, que deverá ser feito por meio de melhor planejamento e estruturação física, e não mediante pagamento
pecuniário e individual aos apenados.”

8. CASUÍSTICA
- STJ, AgInt no AREsp 1292086 / RJ, DJ 06.09.2018: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO
NO AGRAVO RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ERRO MÉDICO. SEQUELAS
NEUROLÓGICAS EM RECÉM-NASCIDO. FALECIMENTO DO MENOR NO CURSO DO
PROCESSO. DANOS MORAIS. IMPOSSIBILIDADE DA APRECIAÇÃO DE AFRONTA A
DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS, EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL. RAZÕES DO
AGRAVO QUE NÃO IMPUGNAM, ESPECIFICAMENTE, A DECISÃO AGRAVADA. SÚMULA
182/STJ. TEORIA DA DISTRIBUIÇÃO DINÂMICA DO ÔNUS DA PROVA.
HIPOSSUFICIÊNCIA DA VÍTIMA. APLICABILIDADE. JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE
DO STJ. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.
- STJ, REsp 1.443.038-MS, 2015, Info 556. “O termo inicial da prescrição de pretensão indenizatória decorrente
de suposta tortura e morte de preso custodiado pelo Estado, nos casos em que não chegou a ser ajuizada ação
penal para apurar os fatos, é a data do arquivamento do inquérito policial.”
- STJ, REsp 1.492.710-MG, 2014, Info 553. “O consumidor faz jus a reparação por danos morais caso comprovada
a existência de cadáver em avançado estágio de decomposição no reservatório do qual a concessionária de serviço
público extrai a água fornecida à população. De início, fica configurada a responsabilidade subjetiva por omissão
da concessionária decorrente de falha do dever de efetiva vigilância do reservatório de água. Ainda que se alegue
que foram observadas todas as medidas cabíveis para a manutenção da segurança do local, fato é que ele foi
invadido, e o reservatório passível de violação quando nele foi deixado um cadáver humano. Ficou caracterizada,
ademais, a falha na prestação do serviço, indenizável por dano moral, quando a concessionária não garantiu a
qualidade da água distribuída à população, porquanto inegável que, se o corpo estava em decomposição, a água
ficou por determinado período contaminada. Outrossim, é inegável, diante de tal fato, a ocorrência de afronta à
dignidade da pessoa humana, consistente no asco, angústia, humilhação, impotência da pessoa que toma ciência
que consumiu água contaminada por cadáver em avançado estágio de decomposição. Sentimentos que não
podem ser confundidos com o mero dissabor cotidiano. Ainda que assim não fosse, há que se reconhecer a
ocorrência de dano moral in re ipsa, o qual dispensa comprovação do prejuízo extrapatrimonial, sendo suficiente
a prova da ocorrência de ato ilegal, uma vez que o resultado danoso é presumido.”
- STF, ARE 1116016 AgR / SC, 31.08.2018: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM
AGRAVO. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO. INDENIZAÇÃO POR DANOS
MORAIS. AGRESSÃO FÍSICA SOFRIDA POR DETENTO NO INTERIOR DE ESTABELECIMENTO PRISIONAL.
NECESSIDADE DE REEXAME DE PROVAS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 279/STF. DEVER DO ESTADO DE ZELAR PELA
INTEGRIDADE FÍSICA DO PRESO. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
- STF, ADI 2255/ES, 2014, Info 768. “ADI: reconhecimento de responsabilidade civil do Estado e iniciativa
legislativa. O Plenário julgou improcedente pedido formulado em ação direta ajuizada em face da Lei 5.645/1998
do Estado do ES. A referida norma, de iniciativa parlamentar, autoriza o Poder Executivo estadual a reconhecer
sua responsabilidade civil pelas violações aos direitos à vida e à integridade física e psicológicamdecorrentes das
atuações de seus agentes contra cidadãos sob a guarda legal do Estado. A Corte destacou não haver, na espécie,
a alegada violação ao art. 61, § 1o, II, b, da CF, que fixa a competência privativa do Presidente da República (...).
Ademais, a disciplina estabelecida na norma impugnada, a dispor sobre responsabilidade civil — matéria de
reserva legal —, seria, inclusive, salutar. Permitiria que a Administração reconhecesse, “motu proprio”, a
existência de violação aos direitos nela mencionados.”
- STF, ADI 1358/DF, 2015, Info 773. “Responsabilidade civil do Estado e instituição de pensão especial para vítimas
de crimes. O Plenário confirmou medida cautelar (noticiada no Informativo 16) e julgou procedente pedido
formulado em ação direta para declarar a inconstitucionalidade da Lei 842/1994 do DF, na redação dada pela Lei
913/1995, bem como do art. 2º da Lei 913/1995, também daquele ente federativo. As normas impugnadas, ao

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instituírem pensão especial a ser concedida pelo Governo do Distrito Federal em benefício dos cônjuges de
pessoas vítimas de determinados crimes hediondos — independentemente de o autor do crime ser ou não agente
do Estado —, ampliariam, de modo desmesurado, a responsabilidade prevista no art. 37, § 6º, da CF”.

Questão da prova oral do 27CPR: 1) Responsabilidade do Estado. Fale sobre o histórico. Hoje, como é? Como é
nos atos omissivos? Cabe em atos judiciais? Atos legislativos?

20B. Responsabilidade do Estado por atos legislativos e judiciais.

Renata Souza
Materiais consultados: Graal do 28º CPR; CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 28. ed. rev., ampl. e atual. até 31-12-2014.
São Paulo: Atlas, 2015; MARINELA, Fernanda. Direito Administrativo. 8. ed. Niterói: Impetus, 2014;
JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo (livro eletrônico). 5. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018;
OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Curso de Direito Administrativo. 6. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2018.

I. Responsabilidade do Estado por atos legislativos

1. Regra geral:

De acordo com José dos Santos Carvalho Filho, a regra geral é a de que, no caso de atos legislativos, não deve ser
atribuída responsabilidade civil ao Estado, se a lei é produzida em estrita conformidade com os mandamentos
constitucionais.

No entanto, o referido autor chama a atenção para o fato de que "(...) moderna doutrina tem reconhecido, em
situações excepcionais, a obrigação do Estado de indenizar, ainda que a lei produza um dano jurídico lícito. Isso
ocorre particularmente quando a lei atinge direitos de determinado grupo de indivi ́duos (p. ex.: o de propriedade),
à custa de algum outro benefi ́cio conferido a um universo maior de destinatários. Trata-se aqui de dano lícito
indenizá vel, sujeito, no entanto, a que seja (a) economicamente mensurável, (b) especial e (c) anormal. De
qualquer modo, sempre será necessária certa precaução no que tange à análise de tais situações, em ordem a
evitar que lei contrária a meros interesses possa gerar pretensõ es reparatórias despidas de fundamento juri ́dico.”
– CARVALHO FILHO, p. 594.

Tendo em vista a regra geral citada por José dos Santos Carvalho Filho, é preciso atentar para algumas situações
específicas, a seguir enfrentadas.

2. Leis inconstitucionais:

Se a hipótese é de lei inconstitucional, não se aplica a regra geral de não responsabilização do Estado por atos
legislativos. É que a lei inconstitucional reflete atuação indevida do órgão legislativo, equiparando-se à noção de
ato ilícito.

José dos Santos Carvalho Filho destaca alguns aspectos sobre a responsabilidade civil do Estado em razão de leis
inconstitucionais: i) a responsabilidade civil só existe se a lei inconstitucional efetivamente gerou danos ao
particular; ii) é preciso que a lei tenha sido declarada inconstitucional, uma vez que milita em seu favor a
presunção de constitucionalidade; e iii) não se pode confundir o dano proveniente da lei inconstitucional com
aquele derivado de ato praticado com base na lei inconstitucional, situações nas quais o Estado será civilmente
responsável, mas, no primeiro caso, sendo a inconstitucionalidade causa direta da responsabilidade, e, no
segundo caso, causa indireta.

Por fim, é preciso salientar que a responsabilidade estatal decorrente de inconstitucionalidade de lei abrange
tanto a inconstitucionalidade material como a formal. Ademais, não só a inconstitucionalidade que decorre de
controle concentrado pode gerar a responsabilidade, mas também aquela derivada do controle incidental.

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3. Leis de efeitos concretos:

De acordo com José dos Santos Carvalho Filho, "Leis de efeitos concretos são aquelas que se apresentam como
leis sob o aspecto formal, mas que, materialmente, constituem meros atos administrativos. (...) Se uma lei de
efeitos concretos provoca danos ao indivi ́duo, fica configurada a responsabilidade civil da pessoa juri ́dica
federativa de onde emanou a lei, assegurando-se ao lesado o direito à reparação dos prejui ́zos.” – CARVALHO
FILHO, p. 596.

4. Omissões legislativas:

Sobre a omissão no dever de legislar, José dos Santos Carvalho Filho explica que se a Constituição fixa determinado
prazo para o ato legislativo e há a apresentação de projeto de lei ou a edição de medida provisória antes do prazo,
uma vez que isto consolidaria o cumprimento do dever constitucional, ainda que o ato final seja produzido em
momento posterior, não haverá responsabilidade civil do Estado.

Se não é cumprida a obrigação no prazo constitucional, e decretando o Poder Judiciário a mora do legislador,
sem a fixação de prazo para o cumprimento, mas há diligê ncia do Executivo ou do Legislativo em prazo situado
dentro de padrõ es de razoabilidade, também não há responsabilidade civil do Estado. Contudo, fora de tais
padrõ es, deve ser reconhecida a culpa omissiva do legislador e eventuais prejudicados tê m direito à reparação
dos danos sofridos.

II. Responsabilidade do Estado por atos judiciais

Afirma-se que a atividade jurisdicional não acarreta a responsabilidade civil do Estado, com exceção das hipóteses
expressamente previstas no ordenamento jurídico.

Os argumentos frequentemente invocados para afastar a responsabilidade do Estado por atos judiciais são: a)
recorribilidade das decisões judiciais e coisa julgada; b) atuação jurisdicional como emanação da soberania estatal;
e c) independência do magistrado.

Na forma do art. 5º, LXXV e LXXVIII, da CF/88, a responsabilização do Estado por atos judiciais pode ocorrer nas
seguintes hipóteses:

1. Erro judiciário:

O erro judiciário que enseja a responsabilidade civil do Estado é o erro substancial e inescusável. Para a
responsabilização, além da comprovação do erro judiciário, exige-se a desconstituição da coisa julgada (por meio
de ação rescisória ou revisão criminal).
A doutrina diverge se a responsabilização restringe-se ao erro judiciário observado na seara penal ou se também
se faz possível na esfera cível.

2. Prisão além do tempo fixado na sentença:

A prisão além do tempo fixado na sentença também ocasiona a responsabilidade civil do Estado. Todavia, é
preciso pontuar que o descumprimento do prazo prisional pode decorrer da má prestação jurisdicional
(decorrendo efetivamente da atividade jurisdicional e configurando, em última análise, espécie de erro judiciário,
aplicando-se o art. 5º, LXXV, da CF/88) ou da atividade prestada pelo Executivo no âmbito da administração
penitenciária (e aí o fundamento da responsabilização é o art. 37, § 6º, da CF/88).

3. Demora na prestação jurisdicional:

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A demora na prestação jurisdicional também pode ensejar a responsabilidade do Estado, ante a violação do direito
à razoável duração do processo, previsto no art. 5º, LXXVIII, da CF/88. No entanto, é preciso destacar que, para a
responsabilização do Estado, não basta o descumprimento de um prazo processual pelo magistrado, fazendo-se
necessária a ocorrência de um dano desproporcional ao jurisdicionado, analisado no caso concreto.

Observação: prisão cautelar e posterior absolvição: a doutrina diverge sobre a possibilidade de responsabilização
do Estado na hipótese de o sujeito preso cautelarmente ser, ao final do processo, absolvido.
A jurisprudência tem se posicionado no sentido de que o simples fato de a pessoa ser absolvida ao final não
acarreta a responsabilidade civil do Estado pela prisão cautelar se esta tiver sido regularmente decretada.

Observação: responsabilização pessoal do magistrado: de acordo com o art. 143, do novo CPC, aventa-se a
possibilidade de responsabilidade pessoal dos magistrados, em ação regressiva, apenas nas seguintes situações:
a) dolo ou fraude; e b) recusa, omissão ou retardamento, sem justo motivo, de providência que deva ordenar de
ofício ou a requerimento da parte.

IV. Questão de prova oral – 26º CPR:


Conceito de Administração Pública: orgânico, formal, gerencial.

8. BENS PÚBLICOS
8.1 Bens públicos. Classificação. Natureza juri ́dica do domi ́nio público. (21.a)
8.2 Utilização dos bens públicos: autorização, permissão e concessão de uso; concessão de direito real de uso;
concessão de uso especial para fins de moradia; aforamento de bens; cessão de uso. (13.b)
8.3 Domi ́nio público terrestre. Evolução do regime juri ́dico das terras públicas no Brasil. Faixa de fronteira. Vias
públicas. (23.a)
8.4 Domi ́nio público aéreo. (23.a)

21A. Bens públicos. Classificação. Natureza jurídica do domínio público

Valmor Piazza

Conceito: BENS PÚBLICOS são os bens que pertencem às pessoas jurídicas de Direito Público, isto é, União,
Estados, DF, Municípios, respectivas autarquias e fundações de Direito Público; todos os outros são particulares,
seja qual for a pessoa a que pertençam (definição do art. 98 do CC/02). Assim, os bens pertencentes a uma
empresa pública ou sociedade de economia mista, por exemplo, não são públicos. Para José dos Santos Carvalho
Filho, “Com base no vigente dispositivo do novo Código, podemos, então, conceituar bens públicos como todos
aqueles que, de qualquer natureza e a qualquer título, pertençam às pessoas jurídicas de direito público, sejam
elas federativas, como a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, sejam da Administração
descentralizada, como as autarquias, nestas incluindo-se as fundações de direito público e as associações
Públicas.” (p. 1157).

Características:

I. Inalienabilidade: são absolutamente inalienáveis os bens que, por sua própria natureza, não gozam de valor
patrimonial, como os mares, praias etc. Nos demais, a alienabilidade é condicionada à desafetação, a qual
transforma o bem público em dominical. Os bens dominicais são alienáveis desde que haja demonstração do
interesse público, prévia avaliação, licitação e, caso se trate de bem imóvel, de autorização legislativa específica
– art. 17, Lei 8.666/93). Atenção: Afetação e desafetação são fatos administrativos. Não requerem um ato
administrativo. Assim, o simples abandono de um prédio público pelo Poder Público já torna o bem desafetado.
Exceção: a própria Constituição Federal atribui o caráter de indisponibilidade às terras devolutas ou arrecadadas
pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais (artigo 225, §5o da
CR/88).

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II. Impenhorabilidade: os bens públicos são impenhoráveis, independentemente de sua finalidade. Há, contudo,
possibilidade de sequestro de valores nos seguintes casos: I) preterição no pagamento de precatórios na ordem
cronológica de apresentação (no tema, observe-se a tese n. 4, do Gabinete do PGR, edição de 11.06.2015:
PRECATÓRIO DE NATUREZA NÃO ALIMENTAR. PAGAMENTO ANTES DO PRECATÓRIO DE NATUREZA ALIMENTAR.
SEQUESTRO DO VALOR PRETERIDO. Tem preferência os créditos de natureza alimentar sobre todos os demais,
admitindo-se o sequestro nas hipóteses de preterimento do direito de precedência ou não alocação orçamentária,
conforme entendimento do STF, não se havendo falar em independência entre listas de classes ou de naturezas
diversas (RE 612.707); II) não alocação orçamentária do valor necessário à satisfação do crédito previsto no
precatório (nova hipótese trazida na EC 62/09, que foi mantida pelo STF na ADI 4357); fornecimento de
medicamentos (exceção criada pelo STJ). O entendimento está pacificado pelo REsp 1.110.906/SP). Atenção: o
STF julgou constitucional o art. 12 do DL 509/69, que estabelece a impenhorabilidade dos bens dos Correios (RE
220.906). Após, sob repercussão geral, decidiu que o entendimento não se aplica às sociedades de economia
mista prestadoras de serviço público que atuem sob o regime de concorrência ou que objetivem distribuir lucro
aos seus acionistas (RE 599628), mas se aplica quando as sociedades de economia mista ou empresas públicas
prestar serviço público essencial, ex. saneamento básico (RE 627242 AgR).

III. Imprescritibilidade: seja qual for sua natureza, móveis ou imóveis, são insuscetíveis de aquisição por meio de
usucapião. Trata-se de regra de força constitucional, prevista nos arts. 183, §3º, e 191 da Constituição. Todavia,
os bens pertencentes à empresa pública ou sociedade de economia mista poderão sofrer usucapião - pois são
bens privados -, salvo nas hipóteses de impenhorabilidade (serviço público essencial). “O imóvel da CEF vinculado
ao Sistema Financeiro de Habitação, porque afetado à prestação de serviço público, deve ser tratado como
bem público, sendo, pois, imprescritível” (REsp 1270055)

IV. Não onerabilidade: os bens públicos não podem ser dados em garantia ou gravados de qualquer forma.

Principais Espécies:

a) terras devolutas: são áreas que, integrando o patrimônio das pessoas federativas, não são utilizadas para
quaisquer finalidades públicas específicas (são bens dominicais, portanto); são terras que nunca pertenceram a
um particular, mesmo estando ocupadas. Todos os entes possuem terras devolutas. A regra constitucional
subsidiária, todavia, é que pertençam aos Estados. Pertencem à União as terras devolutas indispensáveis à defesa
das fronteiras, das fortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação
ambiental, definidas em lei (art. 20, II). Para solucionar conflitos de propriedade das terras, foi editada a Lei
6.383/76, que previu uma fase administrativa prévia e a própria ação discriminatória, cujo desfecho é definir as
linhas demarcatórias do domínio público e privado. Atenção: de acordo com a jurisprudência do STJ a inexistência
de registro de propriedade do imóvel, por si só, não gera presunção de que o imóvel está situado em terra
devoluta.

b) terrenos de marinha: – são as áreas pertencentes à União que, banhadas pelas águas do mar ou dos rios
navegáveis, em sua foz, se estendem à distância de 33 metros para a área terrestre, contados da linha do preamar
médio de 1831. O domínio federal se dá em virtude da necessidade de defesa e de segurança nacional. ADI 4264:
STF declarou, em sede de cautelar (j. 16.03.2011), a inconstitucionalidade do art. 11 do Decreto-lei 9.760/46,
entendendo que, na demarcação dos terrenos de marinha é necessário o chamamento dos terceiros certos por
notificação pessoal, e não por edital. Atenção: conforme Súmula 496, STJ, “os registros de propriedade particular
de imóveis situados em terrenos de marinha não são oponíveis à União”. O STJ entende, ainda, que a ausência de
demarcação não interfere na discussão entre particulares sobre domínio, pois a sentença respectiva não é
oponível à União, em razão da mencionada Súmula. Os terrenos de marinha podem ser objeto de aforamento,
sendo devido o laudêmio no caso da transmissão onerosa entre vivos do domínio útil. O STJ entende que o
laudêmio também incide: na transferência para integralização de capital social (REsp 1165276 – recurso
repetitivo); nas transmissões de direitos sobre benfeitorias (AgRg no REsp 1434998/SC). Não incide: nas cessões
de direitos de compra e venda, mas só posteriormente, no momento da transmissão do direito real de uso (REsp

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1254326/SE); nas sucessões não onerosas de empresas, como nas cisões sem contraprestação financeira, por
inexistir onerosidade (REsp 987.886/PE).

c) terras tradicionalmente ocupadas pelos índios: são as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas
para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-
estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições. São bens de
uso especial, vez que afetados ao objetivo social de proteção ao índio. Quaisquer títulos dominiais nas referidas
terras são nulos e os atos de reconhecimento dos direitos dos índios não geram direito de indenização ao
particular (art. 236, §6° da CF/88). Importante: de acordo com o STJ, embora a proteção tenha surgido apenas
com Constituição Federal de 1988, são indevidas também as indenizações decorrentes dos atos praticados antes
dela (REsp 1133648/RS). Atenção: As terras de comunidades quilombolas não pertencem à União, mas sim aos
remanescentes de quilombos.

d) Ilhas: as lacustres e fluviais pertencem aos estados-membros, salvo se estiverem em zonas limítrofes com
outros países ou nos rios que banham mais de um Estado, casos em que pertencerão à União (art. 20, III, CF). Ilhas
costeiras ou oceânicas pertencem à União, salvo as que forem sede de municípios (mesmo nessas, áreas afetadas
ao serviço federal são da União).

d) Terrenos Reservados ou Marginais: aqueles formados pelas correntes navegáveis, fora do alcance das marés,
estendendo-se até 15 metros para a terra. Conforme Súmula n. 479 do STF, "as margens dos rios navegáveis são
domínio público, insuscetíveis de expropriação e, por isso mesmo, excluídas de indenização". Porém, conforme
posicionamento jurisprudencial do STJ, esse entendimento deve ser mitigado quando comprovado que o
particular possui justo título sobre a área desapropriada (REsp 863.577/RS).

e) Plataforma Continental: extensão das áreas continentais sob o mar até a profundidade de cerca de 200 metros.
Trata-se de bem da União. O Brasil exerce sobre a plataforma continental direitos de soberania para efeitos de
exploração dos recursos naturais.

CLASSIFICAÇÕES.

1) Quanto à titularidade: Podem ser federais, estaduais, distritais ou municipais. A Constituição Federal, em rol
não taxativo, discrimina bens públicos da União (art. 20) e dos Estados (art. 26). Os Municípios não foram
contemplados com a partilha constitucional de bens, embora efetivamente tenham bens. De acordo com o STF,
a propriedade particular situada nas florestas e matas mencionadas no artigo 225, § 4º, CF (Mata Atlântica, etc)
permanece como bem privado, pois a expressão patrimônio nacional contida na norma constitucional não as
converteu em bens públicos da União (RE 259267).

2) Quanto à destinação: a) Bens de uso comum do povo: são aqueles destinados à utilização geral pelos indivíduos,
que podem ser utilizados por todos em igualdade de condições, independentemente de consentimento
individualizado por parte do poder público. Ex: ruas, praças, estradas, mares, rios navegáveis, etc. Em regra, são
colocados à disposição da população gratuitamente, mas nada impede que haja cobrança como retribuição (art.
103 CC). Ex: cobrança de estacionamento em áreas públicas por alguns municípios. b) Bens de uso especial:
aqueles que visam à execução dos serviços administrativos e dos serviços públicos em geral. São os bens utilizados
pela administração para a execução dos serviços públicos. Ex: edifícios das repartições públicas; c) Bens
dominicais: aqueles que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito
pessoal ou real de cada uma dessas entidades. São aqueles que não possuem uma destinação pública definida,
que podem ser utilizados pelo Estado para fazer renda. Aqueles que não são de uso comum do povo ou de uso
especial (conceito residual). Ex: terras devolutas, terrenos de marinha, prédios públicos desativados, dívida ativa.

3) Quanto à disponibilidade. a) Bens indisponíveis por natureza: aqueles que, dada a sua natureza não-
patrimonial, não podem ser alienados ou onerados pelas entidades a que pertencem. Ex: bens de uso comum do
povo (rios, mares). b) Bens patrimoniais indisponíveis: embora tenham natureza patrimonial, em razão de estarem

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afetados a uma destinação pública específica. Ex: bens de uso especial (prédios das repartições públicas). c) Bens
patrimoniais disponíveis: possuem natureza patrimonial e não afetados a certa finalidade pública, podendo ser
alienados na forma da lei. Ex: bens dominicais em geral (art. 101, CC).
NATUREZA JURÍDICA DO DOMÍNIO PÚBLICO: domínio público é o poder de dominação ou de regulamentação que
o Estado exerce sobre os bens do seu patrimônio (bens públicos) ou sobre os bens do patrimônio privado (bens
particulares de interesse público), ou sobre as coisas não apropriáveis individualmente, mas de fruição geral da
coletividade. Para Cretella Júnior, domínio público é “o conjunto de bens móveis e imóveis destinado ao uso direto
do Poder Público ou à utilização direta ou indireta da coletividade, regulamentados pela Administração e
submetidos a regime de direito público” (Apud José dos Santos Carvalho Filho, p. 1156). Divide- se em domínio
eminente (poder político), que autoriza as limitações impostas pelo Estado ao exercício de direitos em todo
território nacional, e, em domínio patrimonial, poder do Estado sobre bens de sua propriedade ou sob sua
administração.

Teses correlatas: 1) A ocupação irregular de imóvel público não configura posse, mas mera detenção, de forma
que não há direito a indenização ou de retenção pelas benfeitorias realizadas. 2) Diferença entre bens públicos e
bens ambientais: Bens públicos são aqueles sob o domínio patrimonial do Estado e constituem o patrimônio
público. Sua proteção decorre dos princípios da supremacia e da indisponibilidade do interesse público e implicam
sujeição ao regime jurídico-administrativo, cujas principais características são a impenhorabilidade, a
imprescritibilidade e a indisponibilidade relativa (disponibilidade condicionada). Já os bens ambientais são
aqueles necessários à garantia do equilíbrio ambiental e à sadia qualidade de vida. Referida noção não é
estritamente patrimonial e está relacionada ao princípio da função socioambiental da propriedade, motivo pelo
qual os bens ambientais poderão ser públicos ou privados. Nesse contexto, o meio ambiente foi definido pelo art.
225 da CF como “bem de uso comum do povo”, o que implica a titularidade difusa do direito ao equilíbrio
ecológico independentemente da propriedade em sua concepção privatista.

QUESTÕES JÁ COBRADAS EM EXAME ORAL: Fale sobre a classificação de bens públicos. Dê Exemplos. Diga Um
bem público que não pode ser alienado nunca. Trate do Regime jurídico das terras devolutas. (26°CPR) Os bens
das empresas estatais são públicos? (27°CPR).

13B. Utilização dos bens públicos: autorização, permissão e concessão de uso; concessão de direito real de uso;
concessão de uso especial para fins de moradia; aforamento de bens; cessão de uso.

Renata Muniz.
Fonte. Graal do 28º e Manual de Direito Administrativo. Carvalho Filho. 31 ed. 2017.

GESTÃO DOS BENS PÚBLICOS: a) em sentido estrito- compreende a administração dos bens públicos, admitindo
unicamente sua utilização e conservação, segundo a destinação natural ou legal de cada coisa; b) em sentido
amplo – além da utilização e conservação, abrange também a alienação dos bens que se revelarem inúteis ou
inconvenientes ao domínio público e a aquisição de novos bens, necessários ao serviço público.
Em princípio, a gestão dos bens públicos é executada pelo ente que detém sua titularidade. Mas é lícita a
transferência de gestão a outra entidade pública, conforme as condições estabelecidas em lei editada pelo titular.
A Lei nº 13.240, de 30.12.2015, por exemplo, autorizou a União a transferir aos Municípios litorâneos a gestão
das praias marítimas urbanas, incluindo-se as áreas situadas em bens de uso comum com exploração econômica
(art. 14).

USO DOS BENS PÚBLICOS: Os bens públicos podem ser usados pela pessoa jurídica de direito público a que
pertencem, independentemente de serem de uso comum, de uso especial ou dominicais. O uso do bem pode ser
normal – quando compatível com os fins do bem público; ou anormal – quando indiretamente se compatibiliza
com os fins naturais do bem. Ex: ruas de lazer, fechadas ao transito de carros aos domingos. É possível o uso dos
bens públicos por particulares, devendo atender ao interesse público. Não se presta para atender interesses
meramente particulares. Nesse contexto o uso pode ser: COMUM - pelos membros da coletividade sem que haja
discriminação entre os usuários, nem consentimento estatal específico para esse fim. Tantos os bens de uso

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comum, como o de uso especial (ex. Repartições publicas, nas quais as pessoas podem ingressar livremente).
Caracteristicas: a) a generalidade da utilização do bem; b) a indiscriminação dos administrados no que toca ao uso
do bem; c) a compatibilização do uso com os fins normais a que se destina; e d) a inexistência de qualquer gravame
para permitir a utilização. ESPECIAL. Uso especial é a forma de utilização de bens públicos em que o indivíduo se
sujeita a regras específicas e consentimento estatal, ou se submete à incidência da obrigação de pagar pelo uso.
Características: a) exclusividade do uso aos que pagam a remuneração ou aos que recebem consentimento estatal
para o uso; b) a onerosidade, nos casos de uso especial remunerado; c) a privatividade, nos casos de uso especial
privativo; d) existência de ato administrativo formal de consentimento por parte do poder público. USO
COMPARTILHADO - assim considerado aquele em que pessoas públicas ou
privadas, prestadoras de serviços públicos, precisam utilizar-se de espaços integrantes de áreas da propriedade
de pessoas diversas.

INSTRUMENTOS DE USO PRIVATIVO DE BENS PÚBLICOS


I - AUTORIZAÇÃO DE USO é o ato administrativo unilateral, discricionário e precário, pelo qual o Poder público
consente que determinado indivíduo utilize bem público de modo privativo, atendendo primordialmente a seu
próprio interesse. Em regra, não possui previsão de prazo de duração e não gera direito de indenização.
Excepcionalmente, todavia, pode ser outorgada com prazo certo (Autorização Condicionada), o que é
severamente criticado pela doutrina, e, somente nesse caso, a revogação antes do prazo pode acarretar o direito
de indenização ao particular. Não depende de lei ou licitação prévia. Há o predomínio do interesse particular
(como todo ato administrativo deve atender ao interesse público, mas na autorização prepondera o interesse do
particular que pode, ou não, utilizar o bem). Ex: autorização de fechamento de uma rua para a realização de uma
festa junina, Autorização de uso de terreno baldio, de áreas para estacionamento, de retirada de água de fontes
não abertas ao público. Obs: Difere da “Autorização de uso de imóvel publico de natureza urbanística” (art. 9º,
MP 2220/01): nesta há limitações à discricionariedade – pressupostos legais: temporal até 22 de dezembro de
2016 (Redação dada pela lei nº 13.465, de 2017); territorial (até 250 m2), finalístico (fins comerciais), além de não
haver precariedade.

II - PERMISSÃO DE USO é o ato administrativo unilateral, discricionário e precário pelo qual a Administração
consente que certa pessoa utilize privativamente bem público, atendendo ao mesmo tempo aos interesses
público e privado. Diferentemente da Autorização, em que prepondera o interesse privado, aqui os interesses –
público e privado – são nivelados. Há controvérsia na doutrina sobre o cabimento de licitação prévia à permissão,
porque ela é um mero ato administrativo e não um contrato. Majoritariamente, entende-se que ela é uma espécie
excepcional de ato administrativo que exige licitação prévia. A precariedade é maior na autorização, mas ambas
são precárias e não exigem indenização ao particular (salvo quando por prazo certo). Ex: permissão para a
ocupação de área de passeio público para a instalação de uma banca de jornais, feiras de artesanato em praças
públicas, para vestuários públicos; para banheiros públicos; para restaurantes turísticos.

III - CONCESSÃO DE USO: contrato administrativo, pelo qual o Poder Público confere a certa pessoa o uso privativo
de bem público, independentemente do maior ou menor interesse público da pessoa concedente. Semelhança
com os anteriores: uso privativo mediante consentimento formal da Adm e a discricionariedade. Elementos
diferenciais são: (i) a forma jurídica é o contrato administrativo (bilateralidade), ao passo que os citados se
formalizam por atos administrativos (unilateralidade); (ii) ausência de precariedade (há uma maior estabilidade,
haja vista que o concessionário assume obrigações perante terceiros e encargos financeiros elevados, o que
reflete na fixação de prazos mais prolongados). Se o Poder Público, instado por conveniências administrativas,
pretender rescindi-la antes do termo estipulado, terá de indenizar o concessionário. Por serem contrato
administrativo, as concessões de uso de bem público recebem a incidência normativa própria do instituto. Assim,
exige-se licitação prévia para seleção do concessionário com melhores condições para o uso de bem público –
salvo nos casos de inviabilidade de competição (inexigibilidade de licitação). Duas espécies de concessão de uso:
1)Concessão remunerada de uso de bem público – com ônus para o concessionário; 2) Concessão gratuita de uso
de bem público- sem ônus para o concessionário.

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IV - CONCESSÃO DE DIREITO REAL DE USO - Decreto-Lei no 271/1967: é o contrato administrativo pelo qual o
Poder público confere ao particular o direito real resolúvel de uso de um terreno público ou sobre o espaço aéreo
que o recobre, para os fins que, prévia e determinadamente, o justificaram (JSCF, pag. 1010). “É instituída a
concessão de uso de terrenos públicos ou particulares remunerada ou gratuita, por tempo certo ou
indeterminado, como direito real resolúvel, para fins específicos de regularização fundiária de interesse social,
urbanização, industrialização, edificação, cultivo da terra, aproveitamento sustentável das várzeas, preservação
das comunidades tradicionais e seus meios de subsistência ou outras modalidades de interesse social em áreas
urbanas” (Art. 7º).
Características:
1) diferencia-se da concessão de uso: a) dado que esta versa sobre direito pessoal e não possui objetivos
previamente fixados pela lei; b) destinação de interesse social, a concessão de uso nem sempre possuirá esses
fins;
2) Pode incidir hipoteca sobre a concessão, mas se ela for outorgada por prazo determinado, o direito de
garantia fica limitado à duração deste;
3) Pode ser objeto de alienação fiduciária, desde que passível de alienação;
4) É transmissível por ato inter vivos ou causa mortis, salvo reserva contratual e desde que observados os
fins da concessão;
5) Formaliza-se por meio de escritura pública ou termo administrativo que devem ser inscritos no Registro
de Imóveis;
6) Requer lei autorizadora e licitação prévia, salvo se estiver dentro das hipóteses de dispensa
7) Pode ser por prazo certo ou indeterminado (configura exceção de contrato administrativo por prazo
indeterminado) e remunerada ou gratuita;
8) É uma proteção ao patrimônio da Administração, pois evita a alienação, que as vezes não oferece
vantagens. Ex.: Concessão de uso de área estadual quando o Estado pretende implantar região industrial para
desenvolver a economia em seu território. Ou concessão de terrenos públicos quando o Município pretende
incentivar a edificação em determinada área.

V - CONCESSÃO DE USO ESPECIAL PARA FINS DE MORADIA: (art. 1º MP 2.220/2001 – com redação dada pela lei
nº 13.465, de 2017) consiste em um direito-meio para realizar um direito-fim (direito à moradia). Foi concebida
para desempenhar papel semelhante ao da usucapião especial para imóveis urbanos (art. 183, §3o, CF), tendo
em vista que os bens públicos são imprescritíveis (não podem ser usucapidos). Requisitos: a) posse por cinco anos
até 22 de dezembro de 2016 (prorrogação da Lei 13.465/17); b) posse ininterrupta e pacífica (sem oposição); c)
imóvel urbano público de até 250 m2; d) uso do terreno para fins de moradia do possuidor ou de sua família; e d)
não ter o possuidor a propriedade de outro imóvel urbano ou rural (art. 1o).
Natureza jurídica: ato administrativo vinculado (direito subjetivo + requisitos legais), de outorga de direito real
de uso em imóvel público, para fins de moradia, que é formalizado por meio de termo administrativo ou sentença
judicial (natureza declaratória). Em ambos os casos deve haver o registro em cartório.
Características: natureza real; transmissível inter vivos ou causa mortis; pode ser objeto de garantia real;
finalidade exclusiva de moradia; discricionariedade quanto à transferência do local de ocupação, salvo se houver
riscos aos possuidores; só será reconhecida uma vez ao mesmo possuidor; gratuita.
Distinção concessão p/ moradia vs usucapião: 1) neste o objeto é privado, naquela é público; 2) na concessão só
se confere o direito se os pressupostos forem atendidos até 22 de dezembro de 2016 (prorrogação da Lei
13.465/17), ao passo que no usucapião não há um termo final previsto.
Abrangência: na área federal aplica-se as áreas de propriedade da União, inclusive os terrenos de marinhas e
acrescidos, no entanto não incide sobre imóveis funcionais.
Extinção: 1ª) desvio de finalidade: concessionário não utiliza o imóvel para sua moradia ou de sua família; 2ª)
aquisição de propriedade ou concessão de uso outro imóvel urbano ou rural. Extinta, deve-se averbar no Registro
de Imóveis por meio de declaração da Adm.

VI - CONCESSÃO COLETIVA DE USO ESPECIAL PARA FINS DE MORADIA: (art. 2º, MP 2220/01 (com redação dada
pela lei nº 13.465, de 2017).

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Nos imóveis públicos situados em área com características e finalidade urbanas, com mais de duzentos e
cinquenta metros quadrados, ocupados até 22 de dezembro de 2016, por população de baixa renda para sua
moradia, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, cuja área total dividida pelo número de possuidores
seja inferior a duzentos e cinquenta metros quadrados por possuidor, a concessão de uso especial para fins de
moradia será conferida de forma coletiva, desde que os possuidores não sejam proprietários ou concessionários,
a qualquer título, de outro imóvel urbano ou rural. (Redação dada pela lei nº 13.465, de 2017). Aqui também há
a exigência de que o possuidor não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. Na concessão coletiva, a
cada concessionário será atribuída igual fração ideal do terreno, e isso sem levar em conta a dimensão do
terreno que cada possuidor ocupe. Ressalva-se apenas a celebração de acordo entre os ocupantes, no qual pode
ser pactuada a atribuição de frações ideais diferenciadas. A fração ideal outorgada a cada possuidor não poderá
exceder a 250 m2. Sem dúvida é singular, e até mesmo se afigura esdrúxulo, que a concessão seja outorgada para
incidir sobre uma fração ideal do terreno. Entretanto, deve considerar-se que o instituto tem caráter urbanístico
e visa a regularizar a situação imobiliária de infinito número de pessoas, integrantes do que a lei denominou de
“população de baixa renda”. Além disso, procurou o legislador assemelhar esse tipo de concessão ao usucapião
especial de imóvel urbano privado, figura em que, pela formação de condomínio, o domínio de fração ideal de
terreno não acarreta qualquer estranheza. Por fim, é preciso aceitar que a ordem urbanística está mesmo a
reclamar medidas jurídicas novas, ainda mais quando se cuida de garantir o bem-estar, a segurança e a
comodidade das populações.
OBS: É lícito deflagrar a tutela jurisdicional através do Mandado de Segurança Coletivo quando houver lesão a um
direito meta individual líquido e certo, de uma Concessão de Uso para Moradia coletiva, de uma ocupação ou
conjunto de ocupações. Tutela-se o direito dos posseiros de terem a posse legalizada, a moradia concretizada e a
área urbanizada. O fundamento da pretensão é o art. 5º, LXX, ‘b’ da Constituição Federal (a matéria é
controvertida, sendo certo que existem Tribunais que sustentam, equivocadamente, o descabimento, por
entenderem pela exclusividade da via para defesa de associados, concluindo que, em se tratando de direitos
difusos, será adequada a Ação Civil Pública). Ocorre o fenômeno da substituição processual, sendo dispensável,
por outro lado, a autorização assembleia, podendo a execução ser promovida pela própria entidade associativa,
por qualquer de seus membros, ou ainda pelo Ministério Público. O remédio jurídico se mostra, ainda, eficaz para
impugnar decisão judicial destituída de recurso imediato no âmbito da Concessão de Uso para Moradia coletiva.
De qualquer forma, trata-se de um dos instrumentos de maior repercussão no tratamento dos direitos lesados no
âmbito da Medida Provisória 2220. Por outro lado, a sentença de procedência transitada em julgado produz
efeitos ultrapartes, desde que considerada a natureza de direito difuso (o pedido poderá ser renovado em caso
de sentença de improcedência por insuficiência probatória).

VII CESSÃO DE USO: o Poder Público consente o uso gratuito de bem público por órgãos da mesma pessoa ou de
pessoa diversa, incumbida de desenvolver atividade que, de algum modo, traduza interesse para a coletividade.
Fundamento: é a colaboração entre as entidades públicas e privadas com objetivo de atender, global e
parcialmente, a interesses coletivos. O benefício coletivo a diferencia das formas. Trata-se de transferência de
posse e não de propriedade. Ex: TJ cede uso de uma sala para o TCU. Alguns autores limitam a cessão às entidades
públicas, outros estendem para a Administração Indireta e pessoas privadas, desde que sem fins lucrativos.
Forma: A formalização da cessão de uso se efetiva por instrumento firmado entre os representantes das pessoas
cedente e cessionária, normalmente denominado de “termo de cessão” ou “termo de cessão de uso”. O prazo
pode ser determinado ou indeterminado, e o cedente pode a qualquer momento reaver a posse do bem cedido.
Por outro lado, entendemos que esse tipo de uso só excepcionalmente depende de lei autorizadora, porque o
consentimento se situa normalmente dentro do poder de gestão dos órgãos administrativos (JSCF). Logicamente,
é vedado qualquer desvio de finalidade, bem como a extensão de dependências cedidas com prejuízo para o
regular funcionamento da pessoa cedente.

ENFITEUSE OU AFORAMENTO é o instituto pelo qual o Estado permite ao particular o uso privativo de bem
público a título de domínio útil, mediante a obrigação de pagar ao proprietário uma pensão ou foro anual, certo
e invariável. Propicia a aquisição de direito real por parte do enfiteuta, titular do domínio útil. Esse direito pode
ser transferido a terceiro, mas é preciso que o senhorio direto renuncie a seu direito de preferência para reaver
o imóvel. Nesse caso, o enfiteuta deverá pagar, pela transmissão do domínio útil, a importância denominada de

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laudêmio, calculada sobre o preço da alienação. Já o foro anual, trata-se de obrigação que o enfiteuta não pode
deixar de cumprir. Se deixar de pagar o foro durante 3 anos consecutivos ou 4 anos intercalados, o
inadimplemento acarretará a caducidade da enfiteuse (art.101, p.u, Dec.-Lei 9.760/46). O novo Código Civil
excluiu o instituto da categoria dos direitos reais, e ainda proibiu a nova constituição de enfiteuses e subenfiteuses
(art.2.038), mesmo por entidades públicas, apenas assegurando a eficácia das já existentes. (ato jurídico perfeito).
Exemplos de áreas conferidas por enfiteuse: terrenos de marinhas (art. 49, § 3o, do ADCT CF ), que foi a única
forma ressalvada pelo novo CC/02, com a previsão de que seria regulada por lei especial.

23A. Domínio público terrestre. Evolução do regime jurídico das terras públicas no Brasil. Faixa de fronteira. Vias
públicas. Domínio público do subsolo. Recursos minerais. Potenciais de energia hidráulica. Domínio público aéreo

Priscila Ianzer Jardim Lucas


Legislação básica: Constituição Federal; Código de Minas; Lei 12.734/2012.

Domínio Público. Segundo José dos Santos Carvalho Filho, a expressão domínio público não tem sentido unívoco.
De um lado, pode significar bens que pertencem ao domínio do Estado ou que estejam sob sua
administração/regulamentação. Por outro, pode significar conjunto de bens destinados à coletividade. Cretella
Júnior define o domínio público como conjunto de bens móveis e imóveis destinados ao uso direto do Poder Público
ou a utilização direta ou indireta da coletividade, regulamentados pela Administração e submetidos a regime de
direito público. Celso Antônio Bandeira de Mello classifica os bens públicos quanto à natureza física em: i) bens
de domínio hídrico e; ii) bens de domínio terrestre. Os bens de domínio terrestre compreendem os do solo e do
subsolo. Domínio do solo: i) terras devolutas; ii) terrenos da marinha; iii) terrenos reservados; iv) terrenos
acrescidos; e v) ilhas. Domínio do subsolo: i) cavidades subterrâneas; e ii) jazidas minerais.

Evolução do regime jurídico das terras públicas no Brasil. A história da propriedade rural no Brasil compreende
quatro fases: de sesmarias, de posses, a que se inicia com a Lei de Terras (Lei n. 601/1850) e a que tem por marco
a instauração da República, com a Constituição de 1891. No Brasil todas as terras foram, originariamente, públicas,
pois pertencentes à Coroa Portuguesa, por direito de conquista. Depois, passaram ao Império e à República,
sempre como domínio do Estado. A primeira medida adotada com vistas à colonização foi a divisão das terras em
capitanias hereditárias, incluindo entre os direitos outorgados aos donatários o de distribuir sesmarias, assim
consideradas as glebas de terras públicas que eram concedidas aos particulares interessados em cultivá-las,
mediante o pagamento de uma renda calculada sobre os frutos. A concessão de sesmarias, feita sob o regime
enfitêutico, gerou os grandes latifúndios. Em 1822, pouco antes da Independência, foi suspensa a concessão de
sesmarias, iniciando-se a segunda fase, de ocupação; como não havia legislação disciplinando o uso das terras, as
pessoas tomavam posse e começavam a cultivá-las. A partir de então, a morada habitual e o cultivo da terra foram
considerados fatores essenciais à legitimação da posse. Com o intuito de regularizar a situação das terras públicas
e legitimar as ocupações, foi promulgada a primeira lei de terras no Brasil – a Lei n. 601/1850, que: a) definiu as
terras devolutas e proibiu sua aquisição a não ser por compra, salvo as limítrofes com outros países; b) tratou da
revalidação das concessões de sesmarias; c) dispôs sobre a legitimação de posses e instituiu o processo de
discriminação das terras públicas das particulares. Pelo conceito da Lei n. 601/1850, terras devolutas eram terras
vagas, abandonadas, não utilizadas quer pelo poder público, quer por particulares. Esta lei foi regulamentada pelo
Dec. Imperial 1.318/1854 que instituiu as terras reservadas e a faixa de fronteira. A quarta fase da evolução do
regime de terras se inicia com a Constituição de 1891, que reservou para a União a porção de terras indispensável
à defesa das fronteiras, fortificações, construções militares e estradas de ferro federais; e transferiu as demais
aos Estados. O Dec. Federal 19.924/31 reafirmou o direito dos Estados-membros sobre as terras que lhes foram
transferidas pela Constituição de 1891. O Decreto-lei n. 9.760/46 define as terras devolutas federais em seu artigo
5º: são devolutas, na faixa da fronteira, nos Territórios Federais e no Distrito Federal, as terras que, não sendo
próprias nem aplicadas a algum uso público federal, estadual ou municipal, não se incorporaram ao domínio
privado. A CF de 1988, no art. 20, enumera os bens pertencentes à União. As terras públicas compõem-se de
terras devolutas, terrenos de marinha e seus acrescidos, terrenos reservados (também chamados de terrenos
marginais), terras tradicionalmente ocupadas pelos índios, plataforma continental, ilhas, álveos abandonados,
além das vias e logradouros públicos e áreas ocupadas como fortificações e edifícios públicos.

91
Faixa de Fronteira e Vias Públicas. Segundo José dos Santos Carvalho Filho, faixa de fronteira é a área de 150 km
de largura que corre paralelamente à linha terrestre demarcatória da divisa entre o território nacional e países
estrangeiros, considerada fundamental para a defesa do território nacional (ver art. 20, §2º, da CF). São de
domínio da União as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras. Porém, nem toda área situada na
faixa de fronteira é de domínio público. Há áreas nessa faixa que são de domínio privado. Outrossim, conforme
Súmula 477 do STF, há transferência tão somente do uso das terras devolutas, permanecendo o domínio com a
União. Se os Estados-membros concederem títulos a terceiros serão considerados alienação a non domino. A Lei
nº 6634/79 disciplina as restrições, condições de uso e de alienação das terras situadas na faixa de fronteira. No
julgamento da Pet. 3388 (Demarcação Raposa Serra do Sol), o relator Min. Carlos Brito, considerou que há
compatibilidade entre a apropriação usufrutuária de terras indígenas e faixa de fronteira, sobretudo, porque a
Constituição não faz ressalva nenhuma quanto à demarcação abrangente de faixa de fronteira ou nela totalmente
situada, deixando expressa a possibilidade de seu uso e ocupação não estatal, a serem regulados em lei. Segundo
Hely Lopes Meirelles, as terras ocupadas com as vias e logradouros públicos pertencem às Administrações que os
construíram. Tais áreas podem constituir bens de uso comum do povo ou de uso especial. Estradas há que, embora
de domínio público, são reservadas a determinadas utilizações ou a certos tipos de veículos. As estradas de
rodagem compreendem, além da faixa de terra ocupada com o revestimento da pista, os acostamentos e as faixas
de arborização, áreas essas pertencentes ao domínio público da entidade que as constrói, como elementos
integrantes da via pública. A legislação rodoviária geralmente impõe uma limitação administrativa aos terrenos
marginais das estradas de rodagem, consistente na proibição de construções a menos de 15 metros da rodovia.
Tal limitação só abrange a zona rural, cessando quando a rodovia ingressa no perímetro urbano na condição de
avenida ou rua. De acordo com Maria Sylvia di Pietro, pode-se conjugar o uso comum do povo com uso privativo,
exercido por particulares para diversas finalidades. A Administração Pública detém a gestão do domínio público,
o poder de consentir nessa utilização. É possível o uso privado das vias públicas para realização de feiras-livres,
distribuição de jornais, etc. Cuida-se de uso privado, exercido por particular em seu próprio interesse, no entanto,
há utilidade pública.

Domínio público do subsolo. Recursos minerais. Potenciais de energia hidráulica. Nos termos do artigo 20, IX e
X da CF são bens da União: os recursos minerais, inclusive os do subsolo; as cavidades naturais subterrâneas e os
sítios arqueológicos e pré-históricos. Assim, fora desses casos, o domínio do subsolo é privado, pertencendo ao
proprietário do solo, até uma profundidade que lhe seja útil. O artigo 176 da CF prevê que “as jazidas, em lavra
ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do
solo, para efeitos de exploração ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário a
propriedade do produto da lavra”. Como se observa os recursos minerais são bens da União, fazendo parte do
denominado domínio público do subsolo. Jazida é “toda massa individualizada de substância mineral ou fóssil,
aflorando à superfície ou existente no interior da terra e que tenha valor econômico” (art. 4º, Decreto-lei 227/67
– Código de Mineração). Mina é a jazida em lavra. A jazida é fenômeno geológico, da natureza, enquanto a mina
é o resultado de exploração da jazida, traduzindo uma atividade econômica e produtiva. Ao proprietário do solo
é assegurada a participação nos resultados da lavra, na forma e no valor que dispuser a lei. Além disso, o artigo
20, §1º, assegura aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como a órgãos da Administração Direta
da União, participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de
geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar
territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação por essa exploração. A pesquisa e a lavra dependem da
autorização ou concessão da União e só podem ser dadas, no interesse nacional, a brasileiros ou empresa
constituída sob as leis brasileiras e que tenha sede e administração no País, na forma da lei, que estabelecerá as
condições específicas quando essa atividades se desenvolverem em faixa de fronteira ou terra indígenas (art. 176,
§1º da CF). Nos termos do §3º do artigo 176, a autorização de pesquisa será sempre por prazo determinado e as
autorizações e concessões não poderão ser cedidas ou transferidas, total ou parcialmente, sem prévia anuência
do poder concedente. A Lei 12.734/2012 dispõe sobre o pagamento e a distribuição dos royalties devidos em
função da produção de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos.

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Domínio público aéreo. Insuscetível de apropriação particular, soberania exclusiva do país. Basicamente rege-se
pelo Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei 7565/86) e por Convenções Internacionais (Convenção de Chicago
sobre a aviação civil internacional; Convenção de Varsóvia sobre transporte aéreo internacional; Convenção de
Montreal sobre transporte aéreo internacional). Projeta-se sobre todo o território nacional, inclusive sobre o mar
territorial subjacente. Não há direito à passagem inocente de aeronaves, todo o sobrevoo precisa de autorização.
Entretanto, a Convenção sobre Aviação Civil Internacional (Convenção de Chicago) permite que as aeronaves de
outros Estados contratantes que não se dediquem a serviços aéreos internacionais regulares, tenham direito a
voar e transitar sem fazer escala sobre seu território, e a fazer escalas para fins não comerciais sem necessidades
de obter licença prévia. O Código Brasileiro de Aeronáutica (art. 303, §2°) autoriza o abatimento de aeronave
classificada como hostil.

9. INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE


9.1 Limitaçõ es administrativas. Ocupação temporária. Requisição. Servidão. Parcelamento, edificação ou
utilização compulsórios. (2.c)
9.2 Desapropriação. Espécies. Indenização. Direito de extensão. Retrocessão. (7.a)
9.3 Desapropriação indireta. (7.a)

2C. Limitações administrativas. Ocupação temporária. Requisição. Servidão. Parcelamento, edificação ou


utilização compulsórios

Caroline Araújo

Limitações administrativas são limitações impostas por ato administrativo genérico, não destinado a propriedades
determinadas, visando atender ao interesse público por meio de obrigações de não fazer. Atingem o caráter
absoluto do direito de propriedade (o poder de usar, gozar e dispor da coisa). A limitação não acarreta o direito
de indenização, salvo se indevida ou ilegal, gerando a apuração da responsabilidade civil e o consequente dever
de indenizar o prejuízo causado. Exemplo: as limitações de altura de edifícios. José dos Santos Carvalho Filho
afirma que limitações administrativas são determinações de caráter geral, por meio das quais o Poder Público
impõe a proprietários indeterminados obrigações positivas, negativas ou permissivas, para o fim de condicionar
as propriedades ao atendimento da função social. Exemplo: obrigação de limpar terrenos (positiva) e proibição de
construir além de determinado número de andares (negativa). A propósito, “a pretensão reparatória do
esvaziamento do conteúdo econômico da propriedade decorrente de limitações administrativas prescreve em cinco
anos, nos termos do art. 10, parágrafo único, do Decreto-Lei n. 3.365/1941” (STJ, AgRg no REsp 1.317.806-MG, j.
6.11.12).

Ocupação temporária corresponde ao aproveitamento de propriedade imóvel particular para utilização


temporária pelo Poder Público, para a execução de obras, serviços ou atividades públicas ou de interesse público.
Tem previsão no art. 36 do Decreto-Lei nº 3.365/41, o qual determina que somente imóveis não edificados
poderão ser ocupados. A indenização é condicionada à ocorrência de prejuízo ao proprietário. A instituição
ocorre pelo ato pela autoridade administrativa competente, que deverá fixar, desde logo a indenização devida (se
for o caso). Sua extinção se dá com a conclusão da obra ou serviço. Pode ser transferida para a Administração
indireta. Para José dos Santos Carvalho Filho, a ocupação temporária é a forma de intervenção pela qual o Poder
Público usa transitoriamente imóveis privados, como meio de apoio à execução de obras e serviços públicos (ex.:
utilização de terrenos particulares contíguos a estradas). Difere da requisição pelo fato de que nesta há uma
situação emergencial de perigo público. Na ocupação vinculada à desapropriação haverá indenização (art. 36,
Decreto-lei 3.365/41) e o ato não terá autoexecutoriedade; na desvinculada, somente indeniza-se havendo
comprovado prejuízo.

Requisição “é o ato pelo qual o Estado, em proveito de um interesse público, constitui alguém, de modo unilateral
e autoexecutório, na obrigação de prestar-lhe um serviço ou ceder-lhe transitoriamente o uso de uma coisa “in
natura”, obrigando-se a indenizar os prejuízos que tal medida efetivamente acarretar ao obrigado” (JSCF, p. 912).
Todos os entes poderão efetivar a requisição administrativa, desde que presentes os requisitos constitucionais e

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legais. No entanto, somente a União pode sobre ela legislar (art. 22, III, CR). É possível nos casos de iminente
perigo público, tempo de guerra, ou quando haja outra autorização legal. O STJ considerou como requisição a
retenção das quantias depositadas em cadernetas de poupança, quando da implementação do Plano Collor (Lei
nº 8.024/90) (REsp 178.073/RS, Rel. Ministro Humberto Gomes de Barros, 1ª T, j. 05/10/1999, DJ 29/11/1999, p.
124). Somente haverá indenização ulterior e condicionada à existência de prejuízo. Ela pode ser decretada de
imediato, não dependendo de prévia autorização judicial. Sua extinção se dá assim que desapareça a situação de
perigo público iminente ou a situação que ensejou a requisição. Ela é um ato de império do Poder Público,
discricionária quanto ao objeto e oportunidade, mas condicionada à existência de perigo público iminente e
vinculada à lei quanto à competência da autoridade requisitante, à finalidade do ato e ao procedimento adequado.
É possível a requisição a título definitivo de bens móveis fungíveis. No caso da requisição definitiva de bens móveis
infungíveis há, em verdade, desapropriação.

Servidão administrativa “é o direito real que assujeita um bem [imóvel] a suportar uma utilidade pública, por força
da qual ficam afetados parcialmente os poderes do proprietário quanto ao seu uso ou gozo” (CABM). Na servidão
há um verdadeiro sacrifício, embora parcial, do direito. Nelas atingem-se bens concreta e especificamente
determinados. Nas servidões administrativas há um ônus real, de tal modo que o bem gravado fica em um estado
de especial sujeição à utilidade pública, proporcionando um desfrute direto, parcial, do próprio bem
(singularmente fruível pela Administração ou pela coletividade em geral). Nelas há uma obrigação de suportar.
Por ser direito real, deverá ser averbada no Cartório de Registro de Imóveis a fim de produzir eficácia erga omnes.
Seguindo procedimento semelhante ao da desapropriação (art. 40 do DL 3365/41), as servidões exigem prévia
declaração de utilidade pública e podem ser instituídas por acordo administrativo entre o Poder Público e o
particular (por escritura pública), ou por sentença judicial, no caso de dissenso. Caso o Poder Público instale a
servidão sem acordo prévio (servidão manu militari), caberá ao proprietário pleitear judicialmente o
reconhecimento da servidão, pedindo a indenização cabível. Deverão ser citados nessa ação os proprietários e os
eventuais possuidores, já que suas esferas jurídicas serão afetadas. As servidões devem ser indenizadas sempre
que impliquem real declínio da expressão econômica do bem ou subtraiam de seu titular uma utilidade que
frua. A indenização será prévia nunca poderá corresponder ao valor do imóvel, já que a servidão não é causa de
perda da propriedade; entretanto, poderá ocorrer que o Poder Público dissimule a desapropriação como se
servidão fosse, esvaziando o proveito econômico proporcionado pela propriedade. Nesse caso, caberá indenização
integral, já que configurada a desapropriação indireta. Pontue-se que, conforme Súmula 56/STJ, “Na
desapropriação para instituir servidão administrativa são devidos os juros compensatórios pela limitação de uso
da propriedade. Carvalho Filho entende que, por força do art. 40 do DL 3365/41, aplica-se às servidões, o art. 2, §
2, do referido Decreto-lei, que diz que “Os bens do domínio dos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios
poderão ser desapropriados pela União, e os dos Municípios pelos Estados, mas, em qualquer caso, ao ato deverá
preceder autorização legislativa”. Havendo concomitâncias, deve prevalecer a servidão da União. O artigo adota
o critério da abrangência do interesse, havendo um escalonamento: nacional, regional e local (assim, município
não pode instituir servidão sobre bem da União). A servidão é permanente, e se mantém até a consecução
definitiva dos objetivos originários de sua criação. Entretanto, caso o bem se perca, caso seja incorporado ao
patrimônio público ou desapareça o interesse público, a servidão se extinguirá.

O tombamento busca proteger o patrimônio cultural, artístico, estético, histórico e paisagístico. Poderá recair
tanto sobre bens móveis quanto imóveis. Pode ser geral (ex: Ouro Preto) ou de um bem específico. Em regra, não
enseja indenização. Se acarretar a impossibilidade total de exercício dos poderes inerentes ao domínio, será ilegal
e implicará desapropriação indireta, dando direito à indenização integral dos prejuízos sofridos. O tombamento
pode ser voluntário (o proprietário consente ou solicita o tombamento), compulsório (há resistência do
proprietário) ou de ofício (sobre bem público – processa-se mediante notificação à entidade proprietária). Pode,
ainda, ser definitivo (após a conclusão do processo administrativo) ou provisório (no curso do processo
administrativo, a partir da notificação da Administração Pública). O tombamento definitivo será inscrito no
Registro de Imóveis. “Como o tombamento não implica em transferência da propriedade, inexiste a limitação
constante no art. 1º, § 2º, do DL 3.365/1941, que proíbe o Município de desapropriar bem do Estado” (STJ, RMS
18.952/RJ). Após efetivado o tombamento (que se aperfeiçoa com o registro no livro de tombamento, pois, de
acordo com o TRF1, o registro no cartório de imóveis está relacionado apenas à segurança jurídica de terceiros),

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o proprietário: não pode destruir o bem; somente poderá repará-lo com autorização da Administração; deverá
conservar o bem tombado, salvo se não tiver recursos, devendo, em tal caso, comunicar ao Poder Público, que
custeará a obra ou desapropriará a coisa (se não o fizer, o particular pode requerer o cancelamento do
tombamento). Em caso de transferência de propriedade, o adquirente deve averbar o ato de transmissão no prazo
de 30 dias de sua ocorrência e a comunicá-la à Autoridade responsável, sob pena de multa. Havendo interesse em
alienar onerosamente o bem tombado, o proprietário deverá oferecê-lo à União, ao Estado e ao Município, nessa
ordem, para que exerçam, pelo mesmo preço, o direito de preferência na aquisição da coisa. Se o bem não for
ofertado, a alienação será nula. O tombamento não impede o proprietário de gravar seu bem com ônus real. É
proibida a realização de construções no entorno que prejudiquem visibilidade do bem. No RE 219.292, o STF
afirmou que o chamado tombamento de uso (restringir a utilização do imóvel apenas à atividade cultural) deve
ser considerado desapropriação. Cabe registrar que, para Celso Antônio Bandeira de Mello, o tombamento é
espécie de servidão, porque “sempre que seja necessário um ato específico da Administração impondo um
gravame, por conseguinte criando uma situação nova, atingiu-se o próprio direito e, pois, a hipótese é de servidão.
Por este motivo entendemos que tanto o tombamento pelo Patrimônio Histórico quanto a declaração de que uma
determinada área particular é de reserva florestal são casos de servidão e não de limitação administrativa, como
normalmente se afirma”.

Por fim, o parcelamento, a edificação ou utilização compulsórias são espécies de limitações administrativas.
Incidem apenas sobre imóveis situados em área inclusa no plano diretor de desenvolvimento urbano do
Município para a qual haja lei municipal específica autorizando exigir que os proprietários promovam adequada
utilização do bem. Os referidos proprietários serão notificados pelo Poder Executivo municipal para o
cumprimento da obrigação, devendo a notificação – que se pode fazer por edital – ser averbada no cartório de
Registro de Imóveis. Os prazos para o cumprimento de tais obrigações não poderão ser inferiores a um ano, a
partir da notificação, para que seja protocolado o projeto no órgão municipal competente, ou dois anos, a partir
da aprovação do projeto, para iniciar as obras do empreendimento. A transmissão do imóvel, por ato inter vivos
ou causa mortis, posterior à data da notificação, transfere as obrigações de parcelamento, edificação ou
utilização, sem interrupção de quaisquer prazos. Deve ser cumprida a seguinte ordem: a) parcelamento ou
edificação compulsória; b) IPTU progressivo; c) desapropriação, que só pode ocorrer cinco anos após a cobrança
do ITPU progressivo (arts. 5o, 6o e 8o, Lei 10.257/01).

7A. Desapropriação. Espécies. Indenização. Direito de extensão. Retrocessão. Desapropriação Indireta.

José Moreira Falcão Neto. 01/10/2018

Conceito: forma de intervenção do Estado na propriedade alheia, para transferi-la compulsoriamente, de maneira
originária, para seu patrimônio, após o devido processo legal, mediante indenização. Trata-se de intervenção
drástica, supressiva, na propriedade alheia, forma de aquisição originária da propriedade, pois independe da
vontade do antigo titular. O bem não pode ser posteriormente reivindicado e é transferido livre de ônus reais.
Eventuais credores se sub-rogam no preço pago pelo Poder Público (art. 31 do DL 3365/41). A medida deve ter
por justificativa o interesse público (utilidade pública, necessidade pública ou interesse social). Pode haver
tredestinação lícita, se houver destinação de interesse público diverso daquele previsto no decreto de
desapropriação (exceção à teoria dos motivos determinantes).

Em regra, a desapropriação pressupõe indenização prévia, justa e em dinheiro, mas o texto constitucional traz
algumas exceções, a saber, nas desapropriações sancionatórias. Ímóveis urbanos ou rurais em desacordo com a
função social legalmente caracterizada para eles. Nesses casos, a indenização far-se-á em títulos da dívida pública,
resgatáveis em parcelas anuais e sucessivas, preservado seu valor real (CABM, p. 872 e 873). Em 10 anos se
urbanos. Em 20 anos se rurais.

Espécies de Desapropriação (JSCF, p. 752 a 754). a) Comum (art. 5o, XXIV, CF): por necessidade ou utilidade pública
ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro. Para a maioria da doutrina, a
necessidade relaciona-se com a urgência e a utilidade com o juízo de conveniência. CABM não faz tal distinção.

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Competência administrativa comum a todos os entes federados. b) Urbanística (art. 182, §4, III, CF): para imóveis
situados na área urbana, que não atendam a respectiva função social (imóvel não edificado, não utilizado ou
subutilizado). Deve haver lei específica para área incluída no plano diretor, determinando o parcelamento, a
edificação ou a utilização do bem. Competência exclusiva do Município ou DF. É a última medida a ser tomada,
após a notificação do proprietário para parcelamento, edificação ou utilização compulsórios e à a fixação de IPTU
progressivo no tempo. A partir da incorporação do bem ao patrimônio público, o Município tem 5 anos para
proceder ao adequado aproveitamento do imóvel. c) Rural (art. 184, CF, com caráter sancionatório e finalidade
específica): incide sobre imóveis rurais para fins de reforma agrária. Trata-se de modalidade específica da
desapropriação por interesse social que objetiva a perda da propriedade quando esta não estiver cumprindo sua
função social (art. 186, CF) - “Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende,
simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: I -
aproveitamento racional e adequado; II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do
meio ambiente; III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho; IV - exploração que favoreça
o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores”. Não podem ser desapropriadas a pequena e a média
propriedade rural, desde que seu proprietário não possua outra, bem como a propriedade produtiva. Essa
desapropriação para fins de reforma agrária é de competência exclusiva da União. As benfeitorias úteis e
necessárias serão pagas em dinheiro (precatório). Efetuada a desapropriação, a União terá três anos, a partir do
registro do titulo translativo de domínio, para destinar a área aos beneficiários da reforma agrária (art. 16, Lei
8629/93). São isentas de impostos federais, estaduais e municipais as operações de transferência de imóveis
desapropriados para fins de reforma agrária (art. 184, §5º, CRFB). Estado-membro pode promover desapropriação
de imóvel rural desde que por interesse social e não para reforma agrária. d) Confiscatória (art. 243, CF) - “As
propriedades rurais e urbanas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas
psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo na forma da lei serão expropriadas e destinadas à reforma
agrária e a programas de habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras
sanções previstas em lei, observado, no que couber, o disposto no art. 5º”. Competência exclusiva da União,
dispensado o decreto expropriatório. CABM entende que a indenização é um dos requisitos de qualquer
desapropriação, razão pela qual entende que o art. 243 trata de confisco e não de desapropriação. STF (RE
543974/MG): toda a propriedade será suprimida, e não apenas o local da plantação.

Direito de Extensão. Direito do expropriado de exigir que a desapropriação e a indenização alcancem a totalidade
do bem, quando o remanescente da desapropriação parcial resultar esvaziado de seu conteúdo econômico (JSCF,
p. 809). Pode ser invocado pelo réu, em contestação de ação de desapropriação, pois envolve discussão de preço.

Retrocessão. Efetivada uma desapropriação, o poder público deve aplicar o bem à finalidade pública que suscitou
o desencadeamento do procedimento expropriatório. Não o fazendo, terá ocorrido a tredestinação, que é
caracterizada como sendo a destinação desconforme com o plano inicialmente previsto. A tredestinação pode ser
lícita quando o Poder Público não satisfaz o interesse público inicialmente previsto, mas satisfaz outro (ao invés
de construir uma escola no terreno desapropriado, constrói um hospital). Será ilícita quando não se observa
qualquer interesse público, mas sim um interesse privado (ex.: aliena o debm desapropriado). Segundo o STJ,
apenas a tredestinação ilícita acarreta a retrocessão. Da mesma forma, o art. 519 do CC admite a retrocessão
quando a coisa expropriada “não tiver o destino para que se desapropriou, ou não for utilizada em obras ou
serviços públicos”. Retrocessão, por sua vez, é o direito de o expropriado exigir a devolução do bem
desapropriado. Gasparini defende que a retrocessão é direito pessoal, podendo o expropriado pedir indenização,
mas não a devolução do bem, tendo em vista o art. 35 do DL 3365/41 e o art. 519 do CC (direito de preferência).
A segunda corrente (STJ, CABM e José Carlos Moreira Salles) diz ser direito real, podendo o expropriado exigir a
devolução do bem desapropriado, pois a desapropriação que não satisfaz o interesse público é inconstitucional.
Por fim, a terceira corrente (Di Pietro) entende que a retrocessão é direito misto, podendo o expropriado optar
por receber perdas e danos (direito pessoal) ou por exigir a devolução do bem (direito real). Destaque-se que o
art. 5º, §3º do DL 3365/41 veda a retrocessão no caso de desapropriação de imóvel para implantação de
parcelamento popular, destinado às classes de menor renda”

Desapropriação Indireta. Designação dada ao abusivo e irregular apossamento do imóvel particular pelo Poder

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Público, com a sua consequente integração no patrimônio público, sem obediência às formalidades e cautelas do
procedimento expropriatório (CABM, p. 897). Tem natureza jurídica de fato administrativo e alguns autores a
classificam como esbulho possessório (JSCF 797 a 799). Seu fundamento é o art. 35 do DL 3365/41, que prevê:
“Os bens expropriados, uma vez incorporados à Fazenda Pública, não podem ser objeto de reivindicação, ainda
que fundada em nulidade do processo de desapropriação. Qualquer ação, julgada procedente, resolver-se-á em
perdas e danos”. Pode ocorrer também em casos nos quais o Poder Público não tem a posse do imóvel, mas atos
estatais lícitos geram para um para alguns particulares restrições substanciais que impedem o uso normal da
propriedade. A partir da afetação do bem ao interesse público, não é mais possível devolvê-lo ao particular,
mesmo que o Poder Público tenha desrespeitado o devido processo legal. A pretensão será meramente
indenizatória. O STF e o STJ entendem que a ação de desapropriação indireta, não obstante se tratar de ação
indenizatória, tem natureza real, pois a indenização tem íntima ligação com a perda da propriedade. A
competência é do foto de situação da coisa (art. 95 do CPC/73 e 47 do NCPC) e a prescrição segue o prazo para
consumação do usucapião extraordinário (sem justo título e sem boa-fé). Afinal, o Poder Público só adquire
formalmente o bem quando efetua o pagamento ou quando se consuma a usucapião. Antes disso, pode o
proprietário pedir indenização. O STJ tem aplicado o prazo decenal do art. 1238, par. único do CC para ações de
desapropriação indireta (o prazo do usucapião extraordinário é de 15 anos, mas, se for estabelecida moradia
habitual no imóvel, ou forem realizadas obras/serviços de caráter produtivo, o prazo cai para 10 anos). Os juros
compensatórios incidem desde a ocupação do imóvel, tendo como base de cálculo o valor da indenização.

Julgamentos recentes de destaque envolvendo desapropriação (fonte: DOD)

JUROS COMPENSATÓRIOS. O STF analisou a constitucionalidade do art. 15-A do DL 3.365/41 e chegou às


seguintes conclusões: 1) em relação ao “caput” do art. 15-A do DL 3.365/41: 1.a) reconheceu a constitucionalidade
do percentual de juros compensatórios no patamar fixo de 6% ao ano para remuneração do proprietário pela
imissão provisória do ente público na posse de seu bem; 1.b) declarou a inconstitucionalidade do vocábulo “até”;
1.c) deu interpretação conforme a Constituição ao “caput” do art. 15-A, de maneira a incidir juros compensatórios
sobre a diferença entre 80% do preço ofertado em juízo pelo ente público e o valor do bem fixado na sentença;
2) declarou a constitucionalidade do § 1º do art. 15-A, que condiciona o pagamento dos juros compensatórios à
comprovação da “perda da renda comprovadamente sofrida pelo proprietário”; 3) declarou a constitucionalidade
do § 2º do art. 15-A, afastando o pagamento de juros compensatórios quando o imóvel possuir graus de utilização
da terra e de eficiência iguais a zero; 4) declarou a constitucionalidade do § 3º do art. 15-A, estendendo as regras
e restrições de pagamento dos juros compensatórios à desapropriação indireta. 5) declarou a
inconstitucionalidade do § 4º do art. 15-A, QUE PREVIA QUE O Poder Público não ficaria onerado por juros
compensatórios relativos a período anterior à aquisição da propriedade ou posse pelo autor da ação de
desapropriação indireta; 6) declarou a constitucionalidade da estipulação de parâmetros mínimo (0,5%) e máximo
(5%) para a concessão de honorários advocatícios e a inconstitucionalidade da expressão “não podendo os
honorários ultrapassar R$ 151.000,00 (cento e cinquenta e um mil reais)” prevista no § 1º do art. 27. STF. Plenário.
ADI 2332/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 17/5/2018 (Info 902).

Nas ações de desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária descabe a restituição, pelo
expropriado sucumbente, de honorários periciais aos assistentes técnicos do INCRA e do MPF (isso porque já
são servidores públicos, não sendo remunerados especificamente para aquele trabalho, que já está inserido em
suas atribuições). STJ. 1ª Turma. REsp 1306051-MA, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 08/05/2018
(Info 626)

Quilombolas. art. 13 do Decreto 4887 estabelece que o INCRA poderá realizar a desapropriação de determinadas
áreas caso os territórios ocupados por remanescentes das comunidades dos quilombos estejam situados em locais
pertencentes a particulares. O STF reputou válida essa previsão tendo em vista que, em nenhum momento a
Constituição afirma que são nulos ou extintos os títulos eventualmente incidentes sobre as terras ocupadas por
remanescentes das comunidades dos quilombos. Assim, o art. 68 do ADCT, apesar de reconhecer um direito aos
quilombolas, não invalida os títulos de propriedade eventualmente existentes, de modo que, para que haja a
regularização do registro em favor das comunidades quilombolas, exige-se a realização do procedimento

97
de desapropriação. STF. Plenário. ADI 3239/DF, rel. orig. Min. Cezar Peluso, red.p/ o ac. Min. Rosa Weber, julgado
em 8/2/2018 (Info 890).

Conversão da ação reintegratória em indenizatória. O terreno de proprietário invadido por inúmeras pessoas de
baixa renda. o Município e o Estado fizeram toda a infraestrutura para a permanência das pessoas no local. Diante
disso, o juiz, de ofício, converteu a ação reintegratória em indenizatória(desapropriação indireta), determinando
a emenda da inicial, a fim de promover a citação do Município e do Estado para apresentar contestação e, em
consequência, incluí-los no polo passivo da demanda. O STJ afirmou que isso estava correto e que a ação
possessória pode ser convertida em indenizatória(desapropriação indireta) - ainda que ausente pedido explícito
nesse sentido - a fim de assegurar tutela alternativa equivalente (indenização) ao particular que teve suas térreas
invadidas. STJ. 1ª Turma.REsp 1442440-AC, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 07/12/2017 (Info 619).

O ente desapropriante não responde por tributos incidentes sobre o imóvel desapropriado nas hipóteses em
que o período de ocorrência dos fatos geradores é anterior ao ato de aquisição originária da propriedade. STJ.
2ª Turma. REsp 1668058-ES, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 8/6/2017 (Info 606).

A expropriação prevista no art. 243 da Constituição Federal pode ser afastada, desde que o proprietário
comprove que não incorreu em culpa, ainda que in vigilando ou in eligendo. STF. Plenário. RE 635336/PE, Rel.
Min. Gilmar Mendes, julgado em 14/12/2016 (repercussão geral) (Info 851).

Não se encontrando averbada no registro imobiliário antes da vistoria, a reserva florestal não poderá ser excluída
da área total do imóvel desapropriando para efeito de cálculo da produtividade do imóvel rural. STJ. 2ª Turma.
AgRg no REsp 1301751/MT, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 08/04/2014 (Info 539).

10. LICITAÇÕES PÚBLICAS


10.1 Licitação. Princi ́pios. Modalidades. Dispensa e inexigibilidade de licitação. (4.c)
10.2 Licitação: procedimento, fases, revogação e anulação. Controle administrativo e jurisdicional. (8.b)

4C. Licitações. Princípios. Modalidades. Dispensa e inexigibilidade de licitação.

Caroline Araújo

Licitação é o procedimento administrativo vinculado, por meio do qual os entes da Administração Pública e
aqueles por ela controlados selecionam a melhor proposta entre as oferecidas pelos vários interessados, com dois
objetivos – a celebração do contrato, ou a obtenção do melhor trabalho técnico, artístico ou científico (José dos
Santos Carvalho Filho).
A licitação tem base constitucional no art. 37, inciso XXI, da CF/88. A competência para legislar sobre normas
gerais aplicáveis a licitação e contratos administrativos é privativa da União. Todavia os Estados, DF, e Municípios
podem legislar sobre questões específicas dessas matérias.
PRINCÍPIOS: 1. Formalismo; 2. Publicidade; 3. Isonomia entre os licitantes; 4. Competitividade; 5. Legalidade; 6.
Impessoalidade; 7. Moralidade; 8. Vinculação ao instrumento convocatório; 9. Julgamento Objetivo; 10.
Fiscalização; 11. Adjudicação obrigatória ao vencedor.
Precisam licitar: Administração direta; Administração indireta; Ordens e Conselhos Profissionais, exceto OAB (são
entidades da Administração indireta). Obs: As entidades estatais que explorem a atividade econômica em sentido
estrito não se sujeitam a licitação quando o contrato que pretendem celebrar tenha objeto relacionado às
atividades-fim da entidade.
Não precisam licitar: delegatários de serviço público (concessionários, permissionários, franqueados).
Não precisam licitar, mas devem observar os princípios da licitação (e, em nível federal, fazer cotação prévia de
preços), sempre que se valerem de recurso públicos: Serviços sociais autônomos; Associações públicas; OS e
OSCIP; Entidades de apoio.
A concorrência é a modalidade com maiores formalidades, exigida, normalmente, para contratações de grande
vulto econômico – obras e serviços de engenharia com valor acima de R$ 3.300.000,00, compras e demais serviços

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com valor acima de R$ 1.430.000,00, sendo que, para os consórcios públicos, aplicar-se-á o dobro desse valor, se
formado por até 3 entes da Federação, e o triplo, quando formado por maior número. Em alguns casos, a Lei exige
a concorrência em razão da natureza do futuro contrato, independentemente do valor – concessões de direito
real de uso, licitações internacionais, compra/alienação de bens imóveis, ressalvados os casos previstos no art.
19, bem como concessão de serviço público. Deve ser permitida a participação de qualquer interessado na fase
de habilitação preliminar (princípio da universalidade), com ampla divulgação do certame.
A tomada de preços, por sua vez, é exigida para contratações de médio vulto econômico. Podem participar os
“interessados devidamente cadastrados ou que atenderem a todas as condições exigidas para cadastramento até
o terceiro dia anterior à data do recebimento das propostas, observada a necessária qualificação”.
Já o convite é a modalidade menos formal, para contratações de menor vulto econômico, podendo participar os
convidados (cadastrados ou não) e não convidados, cadastrados, que manifestarem interesse com 24h de
antecedência da apresentação das propostas. A Administração deve convidar, no mínimo, três pessoas. Prevalece
a interpretação no sentido de que não basta enviar a carta-convite a três pessoas, é necessário receber,
efetivamente, no mínimo três propostas.
Quanto ao concurso, seu objetivo é escolher trabalho técnico, científico ou artístico, mediante a instituição de
prêmios ou remuneração aos vencedores. O concurso não depende do valor estimado do contrato e permite a
participação de todos os interessados.
O leilão é adotado para a alienação de bens móveis inservíveis, de produtos legalmente apreendidos ou
penhorados e de imóveis adquiridos em procedimentos judiciais ou mediante dação em pagamento. O bem deve
ser avaliado, para definição do valor mínimo de arrematação, sagrando-se vencedor aquele que oferecer o maior
lance, igual ou superior à avaliação.
Já o pregão é a modalidade prevista na Lei 10520/2002, para aquisição de bens e serviços comuns, pela União,
Estados, DF, e Municípios, independentemente do valor estimado do futuro contrato. O fato que define a sua
utilização é a natureza do objeto da contratação – aquisição de bens ou serviços comuns. Bens e serviços comuns:
aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de
especificações usuais no mercado. Na modalidade pregão sempre se adota como critério de julgamento o menor
preço da proposta. É realizado por propostas e lances em sessão pública. O autor da oferta de valor mais baixo e
os das ofertas com preços até 10% superiores a ela poderão fazer novos lances verbais e sucessivos, até a
proclamação do vencedor. Outra característica do pregão é que há uma inversão das fases de habilitação e
julgamento das propostas. No pregão a habilitação é sempre posterior à fase de julgamento e classificação. Há
duas modalidades de pregão: o presencial e o eletrônico (Decreto 5.450/05). A Administração não pode exigir
garantia de proposta, nem a aquisição do edital pelos licitantes como condição para participar do certame ou
pagamento de taxas e emolumentos. A adjudicação do objeto ao vencedor é anterior à homologação do
procedimento. Para a União, vale o seguinte: “nas licitações para aquisição de bens e serviços comuns será
obrigatória a modalidade pregão, sendo preferencial a utilização da sua forma eletrônica”. O pregão ainda deve
ser utilizado na forma eletrônica, salvo nos casos de comprovada inviabilidade, a ser justificada pela autoridade
competente.
Por fim, a consulta (art. 37 da Lei 9986/2000) foi prevista para licitações realizadas por agências reguladoras,
quando não for possível o pregão, sem relação com o valor estimado do futuro contrato.
ATENÇÃO: DECRETO Nº 9.412, DE 18 DE JUNHO DE 2018
Atualiza os valores das modalidades de licitação de que trata o art. 23 da Lei nº 8.666/93.
Art. 1º Os valores estabelecidos nos incisos I e II do caput do art. 23 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993,
ficam atualizados nos seguintes termos:
I – para obras e serviços de engenharia:
a) na modalidade convite – até R$ 330.000,00 (trezentos e trinta mil reais);
b) na modalidade tomada de preços – até R$ 3.300.000,00 (três milhões e trezentos mil reais); e
c) na modalidade concorrência – acima de R$ 3.300.000,00 (três milhões e trezentos mil reais); e
II – para compras e serviços não incluídos no inciso I:
a) na modalidade convite – até R$ 176.000,00 (cento e setenta e seis mil reais);
b) na modalidade tomada de preços – até R$ 1.430.000,00 (um milhão, quatrocentos e trinta mil reais); e
c) na modalidade concorrência – acima de R$ 1.430.000,00 (um milhão, quatrocentos e trinta mil reais).
Art. 2º Este Decreto entra em vigor trinta dias após a data de sua publicação.

99
Lei de Licitações - Art. 23. As modalidades de licitação a que se referem os incisos I a III (concorrência, tomada
de preços e convite) do artigo anterior serão determinadas em função dos seguintes limites, tendo em vista o
valor estimado da contratação.

INEXIGIBILIDADE E DISPENSA DE LICITAÇÃO


“A diferença básica entre as duas hipóteses está no fato de que, na dispensa, há possibilidade de competição
que justifique a licitação; de modo que a lei faculta a dispensa, que fica inserida na competência discricionária da
Administração. Nos casos de inexigibilidade, não há possibilidade de competição, porque só existe um objeto ou
uma pessoa que atenda às necessidades da Administração; a licitação é, portanto, inviável.
Existem, contudo, casos de dispensa que escapam à discricionariedade administrativa, por estarem já
determinados por lei; é o que decorre do artigo 17, incisos I e II, da Lei nº 8.666/93 (...)” (DI PIETRO, 2014, p. 395).
Os casos do art. 17 são conhecidos como de licitação dispensada e dizem respeito à alienação de bens móveis e
imóveis da Administração Pública. A doutrina tradicional entende que a licitação dispensada é uma dispensa legal
– a decisão de não licitar já foi tomada pelo legislador, não subsistindo qualquer discricionariedade para o
administrador, vide DI PIETRO.
As hipóteses de dispensa estão taxativamente previstas em lei, dividindo-se em quatro categorias: a) em razão
do pequeno valor; b) em razão de situações excepcionais; c) em razão do objeto; d) em razão da pessoa.
Por fim, temos a inexigibilidade de licitação (art. 25). Segundo Rafael Carvalho, “trata-se da não incidência da
regra constitucional da licitação, em razão da ausência do seu pressuposto lógico: a competição”. A inviabilidade
de competição decorre de duas situações, a saber, da impossibilidade fática (quantitativa), quando o produto ou
o serviço é fornecido por apenas um fornecedor, ou da impossibilidade jurídica (qualitativa), quando não há
critérios objetivos para definir a melhor proposta. O rol do art. 25 é exemplificativo.
A INEXIGIBILIDADE e a DISPENSA devem ser sempre expressamente motivadas, com o apontamento das causas
que levaram a Administração Pública a concluir pela impossibilidade jurídica de competição. No caso de licitação
dispensada, não se exige justificativa em todas as hipóteses. De outro lado, a lei estabelece (art. 26) como
condição obrigatória da eficácia do ato de dispensa ou inexigibilidade, que ele seja comunicado, dentro de três
dias, à autoridade superior, para ratificação e publicação na imprensa oficial, no prazo de 05 dias.
Sistema de Registro de Preços (SRP): não é modalidade de licitação. Trata-se de procedimento pelo qual a
Administração seleciona as melhores propostas, por concorrência ou pregão. Essas propostas ficam registradas
em ata, para futuras e eventuais contratações, dentro de um prazo, na medida das necessidades administrativas.
O SRP é preferencial (art. 15, II, Lei nº 8.666/93) e seu objetivo é racionalizar as contratações (economicidade).
Ao invés de realizar uma licitação para cada compra de produtos e serviços do dia a dia, a Administração realiza
um único certame, para registrar os preços e realizar futura e discricionariamente, as contratações. A ata de
registro de preço vale por um ano e não obriga a Administração a contratar. É lícita a realização de novas licitações
ou contratações diretas, assegurada ao beneficiário do registro preferência em igualdade de condições. o Decreto
Federal nº 7.892/2013 foi instituído de forma a regulamentar o Sistema de Registro de Preços revogando o
Decreto Federal nº 3.931/2001.
Efeito carona: os caronas são os órgãos e entidades administrativas que não participaram do registro, mas que
pretendem usar a ata para suas contratações. O limite temporal estabelece que a adesão deverá ser feita durante
a vigência da ata e o contrato decorrente do sistema de registro de preços também deverá ser assinado no prazo
de validade da ata de registro de preços, além disso, o órgão gerenciador somente poderá autorizar adesão à ata
após a 1ª aquisição ou contratação por órgão integrante da ata, exceto quando, justificadamente, não houver
previsão no edital para aquisição ou contratação pelo órgão gerenciador. O limite global determina que o
instrumento convocatório deverá prever que o quantitativo decorrente das adesões à ata de registro de preços
não poderá exceder, na totalidade, ao quíntuplo do quantitativo de cada item registrado na ata de registro de
preços para o órgão gerenciador e órgãos participantes, independente do número de órgãos não participantes
que aderirem, não restringindo o número de adesões (caronas). O limite subjetivo impõe que é vedada aos
órgãos e entidades da administração pública federal a adesão a ata de registro de preços gerenciada por órgão
ou entidade municipal, distrital ou estadual. Noutro diapasão, nas atas federais é permitida a adesão por órgãos
ou entidades municipais, distritais ou estaduais. Com o limite formal a adesão precisa ser autorizada pelo órgão

100
gerenciador que, caso pretenda admitir adesões, precisa prever no edital a estimativa de quantidades a serem
adquiridas por órgãos não participantes. A inexistência de tal previsão impede a adesão.

ME e EPP. Tratamento diferenciado nas licitações (LC 123/2006).


As microempresas e empresas de pequeno porte, por ocasião da participação em certames licitatórios, deverão
apresentar toda a documentação exigida para efeito de comprovação de regularidade fiscal, mesmo que esta
apresente alguma restrição. Empate ficto ou presumido: Entende-se por empate aquelas situações em que as
propostas apresentadas pelas microempresas e empresas de pequeno porte sejam iguais ou até 10% (5% no
pregão) superiores à proposta mais bem classificada. No desempate as microempresas e EPPs têm preferência,
de forma que a mais bem classificada poderá apresentar proposta de preço inferior àquela considerada vencedora
do certame, situação em que será adjudicado em seu favor o objeto licitado.

SERVIÇOS DE PUBLICIDADE
A Lei n. 12.232/10, de incidência nacional, estabelece normas gerais sobre licitações e contratações de serviços
de publicidade prestados por intermédio de agências de propaganda, isto é, as atividades realizadas “com o
objetivo de promover a venda de bens ou serviços de qualquer natureza, difundir ideias ou informar o público em
geral”. Não seguem o procedimento dessa lei as contratações de as atividades de assessoria de imprensa,
comunicação e relações públicas ou relacionadas à realização de eventos festivos, que seguiram os procedimentos
normais (art. 2º, § 2º). A lei faculta que a Administração, mediante justificativa no processo de licitação, realize a
adjudicação do objeto a mais de uma agência de propaganda. Essa “multiadjudicação” é promovida para, em
seguida, permitir que o órgão ou entidade contratante institua procedimento de seleção interna entre as
contratadas. Trata-se de uma licitação dentro da licitação. O rito licitatório especial definido pela lei deve
obrigatoriamente observar os critérios de “melhor técnica” ou “técnica e preço”. Assim como no pregão, na
licitação para contratação dos serviços de publicidade o julgamento das propostas antecede a habilitação (art. 11,
X e XI).
RDC – Regime diferenciado de contratações (Lei 12.462/2011).
Criado para simplificar as contratações para realização dos eventos esportivos no Brasil – Copa do Mundo 2014,
entre outros. Aplica-se exclusivamente às hipóteses taxativamente indicadas, como por exemplo: licitações e
contratos vinculados a ações integrantes do PAC; a obras de engenharia no âmbito do SUS; a obras e serviços de
engenharia no âmbito dos sistemas públicos de ensino; às obras e serviços de engenharia, relacionadas a
melhorias na mobilidade urbana ou ampliação de infraestrutura logística; às obras e serviços de engenharia para
construção, ampliação e reforma de estabelecimentos penais e unidades de atendimento socioeducativo, bem
como às ações no âmbito da Segurança Pública. Tem como objetivos: ampliar a eficiência nas contratações
públicas e a competitividade entre os licitantes; promover a troca de experiências e tecnologias em busca da
melhor relação entre custos e benefícios para o setor público; incentivar a inovação tecnológica; e assegurar
tratamento isonômico entre os licitantes e a seleção da proposta mais vantajosa para a administração pública.
Tem Função regulatória (promoção de valores): preservação do meio ambiente (licitações verdes), respeito à
ordem urbanística, proteção do patrimônio cultural, histórico, arqueológico e imaterial, bem como promoção da
acessibilidade para pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida. Inclusive, o impacto negativo sobre os bens
do patrimônio cultural, histórico, arqueológico e imaterial tombados deverá ser compensado.
Algumas características: a)regime de contratação integrada de obras e serviços de engenharia – “a contratação
integrada compreende a elaboração e o desenvolvimento dos projetos básico e executivo, a execução de obras e
serviços de engenharia, a montagem, a realização de testes, a pré-operação e todas as demais operações
necessárias e suficientes para a entrega final do objeto” (art. 9º, §1º). b) possibilidade de remuneração variável,
na contratação de obras e serviços, vinculada ao desempenho da contratada, transformando os contratos por
prazo determinado e por escopo em contratos de performance; c) inversão das fases de habilitação e julgamento;
d) orçamento sigiloso – o orçamento estimado para a contratação não será divulgado aos licitantes; e) a licitação
pode adotar os modos de disputa aberto (lances públicos e sucessivos) e fechado (propostas sigilosas até a data
de abertura); f) critérios de julgamento – menor preço ou maior desconto, técnica e preço, melhor técnica ou
conteúdo artístico, maior oferta de preço ou maior retorno econômico. g) possibilidade de a administração
pública contratar mais de uma empresa ou instituição para executar o mesmo serviço (multiadjudicação), desde
que não implique perda de economia de escala, quando o objeto da contratação puder ser executado de forma

101
concorrente e simultânea por mais de um contratado ou a múltipla execução for conveniente para atender à
administração pública. A propósito, o art. 4º, VI, prevê como diretriz do RDC o parcelamento do objeto, visando
à ampla participação de licitantes, sem perda de economia de escala; h) uso preferencial da forma eletrônica.

PROCEDIMENTO SIMPLIFICADO DA LEI Nº 13.303/16 (LEI DAS ESTATAIS)


O procedimento licitatório simplificado não é ausência de licitação, trata-se de norma constitucional que impõe
um modelo mais compatível com as necessidades do mercado, para as chamadas “estatais”.
A Lei das Estatais trouxe expressamente a possibilidade de tais entidades se valerem do procedimento de
manifestação de interesse privado (PMI). O PMI deverá ser utilizado para “atender necessidades previamente
identificadas”, o autor do projeto poderá participar da futura licitação; o financiador do projeto poderá ser
ressarcido dos custos, devidamente aprovados pela empresa estatal, nos quais tiver incorrido para a realização
dos estudos, caso não vença a futura licitação e desde que ceda os direitos autorais à entidade promotora do
certame e há a possibilidade de aplicação do PMI a todos os empreendimentos que venham a ser contratados
pelas empresas estatais, e não apenas pela empresa que solicitou o projeto. O que hoje se convencionou chamar
de “inversão das fases” nas licitações passou a ser a regra na Lei das Estatais. O caput de seu artigo 51 estipula
que a fase de habilitação será realizada após a apresentação, julgamento e negociação dos lances ou propostas.

8B. Licitação: procedimento, fases, revogação e anulação. Controle administrativo e jurisdicional.

Daniela Nadia Wasilewski Rodrigues 17/09/18

O procedimento licitatório objetiva a escolha da proposta mais vantajosa para a Administração e a


observância da igualdade na disputa. Art. 37, XXI, CF: “Ressalvados os casos especificados na legislação, as obras,
serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade
de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as
condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica
e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações”.

Fases da licitação
Interna - a autoridade competente determina sua realização, define seu objeto e indica o recurso
orçamentário. Nesse primeiro momento, a Administração deve realizar uma cotação de preços, verificar a
existência de recursos orçamentários suficientes para contratação do objeto, designar a comissão de licitação,
elaborar as minutas do instrumento convocatório e do contrato e remetê-las à assessoria jurídica, para análise.
Em alguns casos, exige-se a realização de audiência pública (pela Lei 8666/93, a depender do valor e, em leis
especiais, para as concessões florestais e PPPs) ou a autorização legislativa, esta quando se tratar de alienação de
imóveis da Administração;

Externa – inicia-se com a publicação do instrumento convocatório, que pode ser o edital ou o convite.
Os elementos obrigatórios do edital estão no art. 40 da Lei 8666/93. O instrumento convocatório é a lei interna
da licitação. Depois, vem a habilitação, momento no qual a Administração verifica a aptidão dos licitantes para
celebração do futuro contrato, sem que possa fazer exigências indevidas. A própria Constituição indica que o
processo de licitação "somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à
garantia do cumprimento das obrigações” (art. 37, XXI). São quatro os aspectos que medem a habilitação do
candidato: habilitação jurídica (regularidade formal do candidato, relativa à sua personalidade jurídica);
qualificação técnica (é a aptidão profissional e operacional do candidato); qualificação econômico-financeira
(capacidade para satisfazer os encargos econômicos do contrato; demonstração de forma objetiva); regularidade
fiscal (CND dos entes federados exigidos, da seguridade social e do FGTS); e regularidade trabalhista (comprovante
que não emprega menor de 18 anos em trabalho noturno, perigoso ou insalubre e nem menores de 14 anos, em
quaisquer condições). A comprovação de regularidade fiscal das microempresas e empresas de pequeno porte
somente será exigida para efeito de assinatura do contrato. Tendo em vista o objeto da contratação, pode a
Administração estabelecer exigência de capital mínimo, ou de patrimônio líquido mínimo, desde que prevista no
edital. O capital mínimo ou o valor do patrimônio líquido, porém, não poderão exceder a 10% do valor do contrato.

102
A habilitação é anterior ao julgamento das propostas, de acordo com a Lei 8666/93. Legislações mais novas,
porém, estabelecem a inversão de fases, com o julgamento antes da habilitação (pregão, PPP, etc.). As exigências
para habilitação devem ser adequadas à complexidade do objeto a ser contratado e o vencedor deve manter os
requisitos de habilitação durante toda a execução do contrato. A inabilitação do licitante importa preclusão do
seu direito de participar das fases subsequentes (art. 41, § 4º), motivo pelo qual o recurso contra a inabilitação
tem efeito suspensivo. Ultrapassada a fase de habilitação e abertas as propostas, não cabe mais a desclassificação
por inabilitação, salvo em razão de fatos supervenientes ou só conhecidos após o julgamento (art. 43, § 5º). Em
seguida, temos o julgamento das propostas, com a consequente classificação das mesmas, segundo critérios
objetivos (tipos de licitação), elencados no art. 45 da Lei 866/93, a saber, menor preço, melhor técnica, técnica e
preço e maior lance ou oferta. Serão desclassificados os licitantes que apresentarem propostas em
desconformidade com as exigências do ato convocatórios ou que tiverem preços excessivos ou manifestamente
inexequíveis. Quando todas as propostas são desclassificadas, tem-se a licitação fracassada ou frustrada, podendo
a Administração fixar prazo de 8 dias úteis para apresentação de nova documentação ou de outras propostas.
Depois de classificados os licitantes, ocorre a homologação, atestando a validade do procedimento e confirmando
o interesse na contratação. O ato final é a adjudicação, por meio do qual a Administração atribui ao licitante
vencedor o objeto da licitação. “Não se confunde a adjudicação formal com a assinatura do contrato. O princípio
da adjudicação compulsória significa que o objeto da licitação deve compulsoriamente ser adjudicado ao primeiro
colocado, o que não significa reconhecer o direito ao próprio contrato” (Rafael Carvalho, 2015, p. 416). Doutrina
majoritária entende que a homologação e adjudicação não geram direito à celebração do contrato, podendo a
Administração revogar ou anular o certame, por fatos supervenientes (Di Pietro, Villela Souto, Lucas Rocha
Furtado e STJ). Em sentido contrário, entendendo que a homologação acarreta o direito de o licitante vencedor
ser contratado, José dos Santos Carvalho Filho.

Revogação e anulação
Art. 49 da Lei 8.666/93: “A autoridade competente para a aprovação do procedimento somente poderá
revogar a licitação por razões de interesse público decorrente de fato superveniente devidamente comprovado,
pertinente e suficiente para justificar tal conduta, devendo anulá-la por ilegalidade, de ofício ou por provocação
de terceiros, mediante parecer escrito e devidamente fundamentado. [...] § 3º - No caso de desfazimento do
processo licitatório, fica assegurado o contraditório e a ampla defesa.”

A anulação pode ser declarada pelo próprio Executivo, no exercício da autotutela, ou pelo Judiciário. Por
outro lado, a revogação é medida exclusiva do Poder que promoveu a licitação. Anulação e revogação podem
ocorrer a qualquer momento, mesmo depois de adjudicado o objeto do certame ao vencedor, e a nulidade da
licitação induz a nulidade do contrato. Quanto ao dever de indenizar: “A nulidade não exonera a Administração
do dever de indenizar o contratado pelo que este houver executado até a data em que ela for declarada e por
outros prejuízos regularmente comprovados, contanto que não lhe seja imputável, promovendo- se a
responsabilidade de quem lhe deu causa” (art. 59, parágrafo único).

→ “Mesmo após a homologação ou a adjudicação da licitação, a Administração Pública está autorizada a


anular o procedimento licitatório, verificada a ocorrência de alguma ilegalidade, e a revogá-lo, no âmbito de seu
poder discricionário, por razões de interesse público superveniente.” (RMS 28.927/RS, Rel. Ministra DENISE
ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/12/2009.)

Controle administrativo:
Quanto ao edital - qualquer cidadão pode impugnar o edital, quando houver irregularidade, até cinco
dias úteis antes da data fixada para a abertura dos envelopes de habilitação. Igualmente, pode haver impugnação
por parte dos licitantes, dentro de determinado prazo decadencial. Passado este, a Administração ainda pode
corrigir os vícios, no exercício de sua autotutela. Além disso, ver art. 113, §§ 1º e 2º: “Qualquer licitante,
contratado ou pessoa física ou jurídica poderá representar ao Tribunal de Contas ou aos órgãos integrantes do
sistema de controle interno contra irregularidades na aplicação desta Lei, para os fins do disposto neste artigo” e
“Os Tribunais de Contas e os órgãos integrantes do sistema de controle interno poderão solicitar para exame, até
o dia útil imediatamente anterior à data de recebimento das propostas, cópia de edital de licitação já publicado,

103
obrigando-se os órgãos ou entidades da Administração interessada à adoção de medidas corretivas pertinentes
que, em função desse exame, lhes forem determinadas”. Frise-se que “a norma não estabelece controle geral e
indiscriminado sobre todos os editais de licitação, mas apenas quando houver solicitação do Tribunal de Contas,
sob pena de violação ao princípio da separação de poderes” (Rafael Carvalho, 2015, p. 411).

Recursos administrativos (art. 109 da Lei 8.666/93)


Recurso em sentido estrito, cabível no prazo de 5 (cinco) dias úteis a contar da intimação do ato ou da
lavratura da ata, nos casos de: habilitação ou inabilitação do licitante; julgamento das propostas; anulação ou
revogação da licitação; indeferimento do pedido de inscrição em registro cadastral, sua alteração ou
cancelamento; rescisão do contrato, a que se refere o inciso I do art. 79 desta Lei; f) aplicação das penas de
advertência, suspensão temporária ou de multa.

Representação, no prazo de 5 (cinco) dias úteis da intimação da decisão relacionada com o objeto da
licitação ou do contrato, de que não caiba recurso hierárquico.

Pedido de reconsideração, de decisão de Ministro de Estado, ou Secretário Estadual ou Municipal, na


hipótese de aplicação de sanção de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração.

Controle exercido pelo Poder Judiciário: decorre do direito fundamental, previsto no art. 5º, XXXV,
consagrado no próprio princípio da inafastabilidade da jurisdição. Contudo, deve-se ter em mente que não é dado
ao Judiciário revogar atos administrativos, devendo, se for o caso, decretar a nulidade dos atos eivados de
ilegalidade (legalidade aferida em sentido amplo, a englobar os princípios constitucionais da administração
pública) editados durante o procedimento licitatório. Não pode invadir o mérito do ato administrativo, sob pena
de malferir o princípio da separação dos poderes. Em regra, somente pode ser realizado após a prática do ato
(controle a posteriori). Situações excepcionais, entretanto, autorizam o controle de forma prévia, com
fundamento no artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal, visando afastar o risco de lesão irreparável pelo decurso
do tempo (ameaça de lesão).

IMPORTANTE – Alteração dos valores e limites das modalidades de licitação.

No dia 19/6/2018, foi publicado o Decreto 9.412/2018, que atualiza os valores das modalidades de
licitação de que trata o art. 23 da Lei nº 8.666/1993. Os valores são os seguintes (para quem já havia decorado os
valores antigos, basta multiplicar por 2,2 para saber os novos):

Obras e serviços de engenharia:


- Concorrência: acima de R$ 3,3 milhões
- Tomada de preços: R$ até R$ 3,3 milhões
- Convite: até R$ 330 mil
- Dispensa de licitação: até R$ 33 mil

Demais compras e serviços:


- Concorrência: acima de R$ 1,43 milhões
- Tomada de preços: até R$ 1,43 milhões
- Convite: até R$ 176 mil
- Dispensa de licitação: até R$ 17,6 mil

Além dos limites para definição da modalidade de licitação, as seguintes referências também foram
alteradas, pois fazem remissão aos valores das modalidades de licitação:

- Definição de obras, serviços e compras de grande vulto (art. 6º, V): R$ 82,5 milhões (= 25 vezes o valor
da concorrência para obras e serviços de engenharia).
- Limite para utilização do leilão para venda de bens móveis (art. 17, §6º): até R$ 1,43 milhões.

104
- Limite para aquisição por dispensa de licitação de produto para pesquisa e desenvolvimento (art. 24,
XXI): R$ 660 mil (=20% do valor da tomada de preços para obras e serviços de engenharia).
- Limite para realização de audiência pública – licitações de imenso vulto (art. 39): R$ 330 milhões (=100
vezes o alor da concorrência para obras e serviços de engenharia).
- Limite para celebração de contrato verbal – pequenas compras de pronto pagamento (art. 60, parágrafo
único): R$ 8.800,00.
- Limite para dispensa do recebimento provisório de obras e serviços (art. 74, III): R$ 176 mil.

Jurisprudência

É inconstitucional regra prevista na Constituição Estadual que determine que o Tribunal de Contas não
pode sustar licitação, dispensa ou inexigibilidade que estejam sendo analisadas naquela Corte. STF. Plenário. ADI
3715/TO, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 21/8/2014 (Info 755).
O edital da licitação poderá exigir que a empresa a ser contratada tenha, em seu acervo técnico, um
profissional que já tenha conduzido serviço de engenharia similar àquele previsto para a licitação. Além disso, o
edital também poderá exigir que a própria empresa já tenha atuado em serviço similar. STJ. 2a Turma. RMS
39.883- MT, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 17/12/2013.
O TCU tem competência para declarar a inidoneidade de empresa privada para participar de licitações
promovidas pela Administração Pública. Essa previsão está expressa no art. 46 da Lei 8.443/92, sendo considerada
constitucional: Art. 46. Verificada a ocorrência de fraude comprovada à licitação, o Tribunal declarará a
inidoneidade do licitante fraudador para participar, por até cinco anos, de licitação na Administração Pública
Federal. STF. Plenário. MS 30788/MG, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Roberto Barroso,
julgado em 21/5/2015 (Info 786).
É inconstitucional lei estadual que exija Certidão negativa de Violação aos Direitos do Consumidor dos
interessados em participar de licitações e em celebrar contratos com órgãos e entidades estaduais. Esta lei é
inconstitucional porque compete privativamente à União legislar sobre normas gerais de licitação e contratos (art.
22, XXVII, da CF/88). STF. Plenário. ADI 3.735/MS, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 8/9/16 (Info 838).
O Governo do Rio Grande do Sul editou uma lei estadual determinando que a administração pública do
Estado, assim como os órgãos autônomos e empresas sob o controle do Estado utilizarão preferencialmente em
seus sistemas e equipamentos de informática programas abertos, livres de restrições proprietárias quanto à sua
cessão, alteração e distribuição (“softwares” livres).
Determinado partido político ajuizou uma ADI contra essa lei afirmando que ela teria
inconstitucionalidades materiais e formais. O STF julgou improcedente a ADI e afirmou que a lei é constitucional.
A preferência pelo “software” livre, longe de afrontar os princípios constitucionais da impessoalidade, da
eficiência e da economicidade, promove e prestigia esses
postulados, além de viabilizar a autonomia tecnológica do País. Não houve violação à competência da União para
legislar sobre licitações e contratos porque a competência da União para legislar sobre licitações e contratos fica
restrita às normas gerais, podendo os Estados complementar as normas gerais federais. A referida lei também
não viola o art. 61, II, “b”, da CF/88 porque a competência para legislar sobre “licitação” não é de iniciativa
reservada ao chefe do Poder Executivo, podendo ser apresentada por um parlamentar, como foi o caso dessa lei.
STF. Plenário. ADI 3059/RS, rel. orig. Min. Ayres Britto, red. p/ o acórdão Min. Luiz Fux, julgado em 9/4/2015 (Info
780).

11. CONTRATO ADMINISTRATIVO


11.1 Contratos administrativos. (6.b)
11.2 Execução do contrato administrativo. Alteração unilateral. Teoria do fato do pri ́ncipe. Teoria da imprevisão.
Caso fortuito e força maior .Equili ́brio econô mico-financeiro. (9.b)
11.3 Extinção do contrato administrativo. Adimplemento e inadimplemento. (10.b)
11.4 Convê nios e consórcios administrativos. Contratos de gestão. Prestação de contas e tomada de contas
especial. (11.b)
11.5 Parcerias público-privadas. (18.b)

105
6B. Contratos administrativos

Atualizado por: Daniela Nadia Wasilewski Rodrigues


Obras Consultadas: Graal 28º CPR – Graal 29º CPR – Site Dizer o Direito

Contratos da Administração: equivale a toda espécie de compromissos recíprocos celebrados pelo Estado com
terceiros, incluindo: a) Contratos privados da Administração - ajustes da Administração Pública com particulares,
como por exemplo, compra e venda, permuta, doação, dentre outros, regidos pelo direito privado; b)
CONTRATOS ADMINISTRATIVOS - ajustes da Administração Pública com terceiros regidos pelo regime jurídico
administrativo (direito público). O tópico trata apenas deste último, do contrato administrativo.

“Nesse ponto, é de toda conveniência observar que nem o aspecto subjetivo nem o objetivo servem como
elemento diferencial. Significa que só o fato de ser o Estado sujeito na relação contratual não serve isoladamente,
para caracterizar o contrato como administrativo. O mesmo se diga quanto ao objeto: é que não só os contratos
administrativos, como também os contratos privados da Administração, há de ter, fatalmente, um objetivo que
traduza interesse público. Assim, tais elementos têm que ser sempre conjugados com o regime jurídico, este sim
o elemento marcante e diferencial dos contratos” (CARVALHO FILHO, 2013, p. 175).

A competência para legislar sobre normas gerais de contratação é da União, sendo a Lei nº 8.666/93 o diploma
normativo base para a matéria. Contudo, contratos e licitações de pessoas administrativas que exercem atividade
econômica serão regidos por lei específica (art. 173 par. 1º CF/88), – na ausência de lei podem ser regidas pela lei
8.666/93;

Características dos contratos administrativos


a) formalismo moderado – em regra, dependem de licitação prévia, forma escrita, prazo determinado,
cláusulas necessárias (art. 55 da Lei 8666/93), etc.
b) bilateralidade – depende da manifestação da vontade das duas partes contratantes
c) comutatividade – as obrigações das partes contratantes são equivalentes e previamente estabelecidas.
d) personalíssimo (intuitu personae) – o contrato deve ser executado pelo licitante vencedor, sob pena de
burla aos princípios da oralidade e da impessoalidade, salvo exceções legais, como os arts. 72 e 78, VI, da Lei
8666/93, que admitem subcontratação parcial, até o limite permitido pela Administração, desde que essa
possibilidade esteja prevista no edital e no contrato.
e) desequilíbrio – as partes estão em posição de desigualdade, ante a presença de cláusulas exoorbitantes
que consagram prerrogativas da Administração.

Cláusulas exorbitantes
a) alteração unilateral, art. 65, I e II – (1) qualitativa, quando há alteração do projeto ou das especificações
para melhor adequação técnica aos seus objetivos; (2) quantitativa, quando há alteração da quantidade do objeto
contratual, nos limites permitidos pela Lei. É necessário motivar o ato, a alteração deve decorrer de fato
superveniente à contratação e não pode descaracterizar o objeto contratual. Destaque-se que apenas as cláusulas
regulamentares (ou de serviço) podem ser alteradas unilateralmente, sendo necessário manter o equilíbrio
econômico-financeiro do contrato.
b) rescisão unilateral, art. 58, II – possibilidade de a Administração rescindir unilateralmente o contrato, sem
necessidade de propor ação judicial.
c) fiscalização, art. 58, III - “art. 67. A execução do contrato deverá ser acompanhada e fiscalizada por um
representante da Administração especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para assisti-lo e
subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição”.
d) aplicação de sanções, no caso de inexecução total ou parcial do ajuste, respeitado o direito ao
contraditório e à ampla defesa (art. 58, IV) – advertência, multa, suspensão temporária de participação em
licitação e impedimento de contratar com a Administração por até dois anos e declaração de inidoneidade para
licitar ou contratar com a Administração Pública.
e) ocupação provisória – no caso dos serviços essenciais, pois a lei permite o apossamento provisório dos

106
bens móveis e imoveis, bem como a utilização de pessoal e serviços do contratado, quando for necessário apurar
administrativamente as faltas contratuais e na hipótese de rescisão.

Sujeitos do contrato: Administração Pública (art. 6, XIV lei 8666/93) e pessoa física ou jurídica que firma o ajuste
(art. 6º XV lei 8666/93).

Requisitos contratos administrativos: criação de projeto básico, projeto executivo, padronização e integralidade
do orçamento a ser disponibilizado.

Tipos de contrato: empreitada por preço global, empreitada por preço unitário (exemplo: xxx metros quadrados
de galpão), empreitada integral e tarefa (pequenos trabalhos por preço certo).

Duração dos contratos: os contratos administrativos têm prazo determinado e sua duração é, normalmente,
adstrita à vigência dos créditos orçamentários (art. 57 da Lei 8666/93 e art. 167, I e II da CRFB). As exceções se
encontram no art. 57 da Lei 8666/93, podendo-se mencionar os projetos previstos no PPA, os serviços contínuos,
contratos de aluguel de equipamentos e de utilização de serviços de informática, etc. Destaque-se que a regra do
prazo anual só se aplica a contratos nos quais a Administração tenha a obrigação de pagar o contratado com
recursos orçamentários, o que não ocorre na concessão de serviço público (Lei 8987/95). No caso da PPP, a Lei
admite duração entre 5 e 35 anos.

Prorrogação dos contratos: apenas no casos previstos em lei (art. 57), com justificativa por escrito, manutenção
das demais cláusulas e do equilíbrioeconômico-financeiro.

Controle exercido pelo Tribunal de Contas: a CF dispõe que a prerrogativa para sustar o contrato irregular é do
Congresso Nacional e, se a medida não for tomada em 90 dias, o Tribunal de Contas “decidirá a respeito” (art. 71,
X e §§1º e 2º). Luís Roberto Barroso e Marcos Juruena Viellela Souto entendem que o Tribunal de Contas
realmente não pode sustar os contratos administrativos, mas apenas rejeitar as contas. Por sua vez, Egon
Bockmann Moreira, Jessé Torres Pereira Junior e Jorge Ulisses Jacoby Fernandes consideram que o Tribunal de
Contas pode sustar contratos administrativos (Rafael Carvalho, 2015, p. 473/474).

Responsabilidade civil
A responsabilidade primária é do contratado, frente à Administração ou a terceiros, sendo o Estado responsável
subsidiariamente.
Tratando-se de encargos previdenciários, há responsabilidade solidária entre a Administração e o contratado (art.
71, §2º, da Lei 8666/93). Já no caso de encargos trabalhistas da empresa terceirizada, a Administração não tem
responsabilidade automática, sendo necessário comprovar a falta de fiscalização estatal no cumprimento das
referidas obrigações → Súmula 331 do TST, “V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta
respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no
cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das
obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não
decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada”.

obs.: os “contratos de empréstimo público” não são contratos, sendo considerado espécie tributária.

→ Os outros temas sobre contratos são tratados nos itens 9.b e 10.b.

Julgamentos 2016/2018
A divulgação do Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas - CEIS pela CGU tem mero caráter
informativo, não sendo determinante para que os entes federativos impeçam a participação, em licitações, das
empresas ali constantes. STJ. 1ª Seção. MS 21.750-DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 25/10/17 (Info
615).
O inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere automaticamente ao

107
Poder Público contratante a responsabilidade pelo seu pagamento, seja em caráter solidário ou subsidiário, nos
termos do art. 71, § 1º, da Lei 8.666/93. Obs: a tese acima foi a fixada pelo STF. No entanto, penso que é
importante um esclarecimento revelado durante os debates: é possível sim, excepcionalmente, que a
Administração Pública responda pelas dívidas trabalhistas contraídas pela empresa contratada e que não foram
pagas, desde que o ex-empregado reclamante comprove, com elementos concretos de prova, que houve efetiva
falha do Poder Público na fiscalização do contrato. STF. Plenário. RE 760931/DF, rel. orig. Min. Rosá Weber, red.
p/ o ác. Min. Luiz Fux, j. 26/4/17 (repercussão geral) (Info 862).
É inconstitucional lei estadual que exija Certidão negativa de Violação aos Direitos do Consumidor dos
interessados em participar de licitações e em celebrar contratos com órgãos e entidades estaduais. Esta lei é
inconstitucional porque compete privativamente à União legislar sobre normas gerais de licitação e contratos (art.
22, XXVII, da CF/88). STF. Plenário. ADI 3.735/MS, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 8/9/16 (Info 838).

Objetiva 29-CPR

34. UMA EMPRESA PRIVADA TEM CONTRATOS VULTOSOS COM O PODER PÚBLICO E É SUSPEITA DE LESAR O
ERÁRIO, POR MEIO DA CORRUPÇÃO DE POLÍTICOS E SERVIDORES.
Assinale, ao final, a alternativa que contém hipóteses aceitáveis.
I – A empresa reparará completamente o dano causado e, no âmbito administrativo, por não se conseguir utilizar
como parâmetro o valor do faturamento bruto da empresa, ela arcará com uma multa de valor fixo, mas não
haverá a publicação extraordinária da decisão condenatória na Internet.
II – A autoridade administrativa provavelmente obterá dados que demonstrem cabalmente o cometimento de
ilicitudes e já verificou que não existem outros envolvidos. Contudo, devido à grande dificuldade e à longa demora
estimada para a apuração, a autoridade administrativa aceita a importante e efetiva colaboração oferecida desde
logo pela empresa, que parou definitivamente com as práticas ilícitas.
III – O dano causado afetou exclusivamente o Estado-membro com o qual a empresa mantém relações contratuais
e a Procuradoria do Estado, tendo em vista a inadimplência da empresa, promove ação em que pleiteia,
fundamentadamente, a dissolução compulsória.
a) ( ) Nenhuma hipótese é aceitável.
b) ( ) São aceitáveis apenas as hipóteses I e II.
c) ( ) São aceitáveis apenas as hipóteses II e III.
d) ( ) Todas as hipóteses são aceitáveis.

Discursiva 29-CPR

O controle da Administração Pública realizado pelo TCU tem qual natureza jurídica e em que medida interfere na
atuação do MPF?

9B. Execução do contrato administrativo. Alteração unilateral. Teoria do fato do príncipe. Teoria da imprevisão.
Caso Fortuito e força maior. Equilíbrio econômico-financeiro.

Graal Oral 28º CPR

I. Execução do contrato administrativo. Alteração unilateral.

O parágrafo 1º do art. 54 da Lei 8666/93 determina que os contratos devem estabelecer com clareza e precisão
as condições para sua execução, expressas em cláusulas que definam os direitos, obrigações e responsabilidades
das partes, em conformidade com os termos da licitação e da proposta a que se vinculam. Nesse contexto, a lei
estabelece cláusulas essenciais dos contratos (art. 55 da Lei 8666/93): objeto; regime de execução; preço,
condições de pagamento e forma de atualização monetária; prazos de início das etapas de execução e conclusão;
crédito pelo qual correrá a despesa; garantias oferecidas; direitos e responsabilidades das partes, penalidades e
valores das multas; previsão dos casos de rescisão; vinculação ao edital da licitação, dentre outras. Há, ainda, a

108
necessidade de prévia formalização por escrito, salvo para contrato de pequenas compras para pronto
pagamento. Finalmente, todos os contratos devem ser arquivados em ordem cronológica, com publicação no
órgão oficial, sob pena de ineficácia do ajuste (art. 60 da Lei 8666).

Duração do contrato administrativo: deve ser por prazo determinado (art. 57, par. 3º) e condicionado à existência
de créditos orçamentários (art. 57 e 7, par. 2º, III), vale dizer, como regra precisam indicar dotação orçamentária
específica. Exceções, previstas no incisos do caput do art. 57: projetos cujos produtos estejam previstos como
metas no Plano Plurianual, prestação de serviços contínuos, aluguel de equipamentos e utilização de programas
de informática; certas hipóteses em que há dispensa de licitação (como compras de material pelas Forças
Armadas). Pietro salienta ainda que as limitações do art. 57 não atingem (PIETRO, 2015, p. 311-312):
- Contratos relativos a uso de bens públicos por particulares, como o contrato de concessão de direito real de uso
de bem público (art. 7º, Decreto-lei 271/67), porque não acarretam ônus aos cofres públicos;
- Contratos relativos a imóveis do patrimônio da União (submetidos ao Decreto-Lei 9.760/46), (art. 121, p.u., Lei
8666);
- Contratos de concessão de obra pública e serviço público (porque a remuneração fica a cargo do usuário da obra
ou serviço e pela própria natureza desses contratos);
- Contratos de direito privado celebrados pela Administração (o art. 62, par. 3º, não faz menção ao art. 57).

Prorrogação do contrato: trata-se de uma exceção a regra geral. A prorrogação traduz-se na possibilidade de
continuar o que foi pactuado além do prazo estabelecido, pressupondo assim a permanência do objeto inicial (art.
57, §1º, Lei 8666/93). Hely Lopes Meirelles utiliza o termo renovação do contrato para indicar a inovação no todo
ou em parte do ajuste, mantido o objeto inicial. Atualmente, tal expressão tem sido utilizada como sinônimo de
prorrogação do contrato. Os motivos que autorizam a prorrogação estão previstos nos incisos do par. 1º do art.
57.

Cláusulas exorbitantes são as prerrogativas especiais conferidas pela lei à Administração Pública na relação do
contrato administrativo, em virtude de sua posição de supremacia em relação à parte contratada (CARVALHO
FILHO, 191). Pietro afirma que são aquelas que seriam ilícitas em um contrato celebrado entre particulares, por
conferirem prerrogativas a uma das partes em relação à outra (PIETRO, 2015, p. 314).

->Espécies de Cláusulas Exorbitantes:

1) Alteração unilateral de contrato de maneira quantitativa ou qualitativa: objetiva permitir alguma


flexibilização na relação contratual, em razão do advento de novos fatos administrativos (CARVALHO FILHO, p.
192). As alterações unilaterais podem ser de duas ordens (art. 65, I, a e b, Lei 8666/93): a) Alteração qualitativa -
quandohá modificação do projeto ou das especificações, com vistas à melhor adequação técnica aos fins do
contrato; b) Alteração quantitativa - quando é preciso modificar o valor em virtude do aumento ou diminuição
quantitativa do objeto contratual. A Administração pode obrigar o particular a aceitar alterações ou supressões
no contrato que resultem em até 25% do valor do contrato, ou até 50 % no caso de reforma de edifício ou
equipamento. (Art. 65, §1º, Lei 8666/93). Há certa divergência na doutrina sobre o alcance do mencionado
dispositivo que fixa os limites de alteração contratual. Para Marçal Justen Filho, tais limites não se aplicariam às
alterações qualitativas por serem com elas incompatíveis pela sua própria natureza. Para Carvalho Filho, o
mencionado §1º não faz qualquer distinção entre os tipos de alteração contratual, não cabendo ao intérprete fazê-
lo. Logo, conclui que tais limites são aplicáveis tanto às limitações quantitativas, como às qualitativas. Esses limites
não podem ser excedidos, salvo se a hipótese for de supressão consensual (art. 65, §2º, Lei 8666/93). Pietro
informa que o TCU tem entendido que tanto alterações contratuais quantitativas quanto unilaterais qualitativas
estão sujeitas aos limites dos §§1º e 2º do art. 65, tendo em vista os direitos dos contratados, e que, nas hipóteses
de alterações contratuais consensuais, qualitativas e excepcionalíssimas de contratos e serviços, é facultado à
Administração ultrapassar esses limites, observados os princípios da finalidade, da razoabilidade e da
proporcionalidade, além dos direitos patrimoniais do contratante privado (PIETRO, 2015, p. 316, nota 3). Pietro
lembra também que ao poder de alteração unilateral conferido à Administração corresponde o direito o
contratado de ver mantido o equilíbrio econômico-financeiro do contrato (“relação que se estabelece, no

109
momento da celebração do ajuste, entre o encargo assumido pelo contratado e a prestação pecuniária assegurada
pela Administração”) (PIETRO, 2015, p. 316). Isso ficou estabelecido para a alteração unilateral dos contratos nos
parágrafos 4º, 5º e 6º do art. 65 da Lei 8666/93. Assim, se o contratado já houver adquirido os materiais necessários
ao cumprimento do objeto contratual e os tiver colocado no lugar da execução, a Administração, no caso de
supressão, poderá estar sujeita a duplo ônus: i) ficará obrigada a reembolsar o contratado pelos custos do material
adquirido; ii) terá o dever de indenizar o contratado por outros danos decorrentes da supressão. Nas duas
situações, cumpre ao contratado comprovar tais custos e prejuízos (art. 65, §4º, Lei 8666/93). Segundo Carvalho
Filho: não se submetendo às alterações, o contratado é considerado como descumpridor do contrato, dando
margem a que a Administração rescinda o ajuste, atribuindo-lhe culpa pela rescisão (CARVALHO FILHO, p. 193).
Se a alteração imposta aumentar os encargos do particular contratado, ele terá o direito de receber as diferenças
respectivas (art. 65, §6º); o mesmo ocorrerá se forem criados tributos ou encargos legais que tenham repercussão
no preço e venham a ocorrer após a celebração do ajuste (podendo haver revisão dos preços contratados para
mais ou para menos, nos termos do art. 65, §5º). Recorde-se que a alteração bilateral não constitui cláusula
exorbitante, já que resulta da vontade das partes.

2) Rescisão unilateral: A Administração pode rescindir unilateralmente o contrato administrativo pelos motivos
elencados no art. 78 da Lei 8666/93, dentre os quais, pode-se enumerar: a) o não cumprimento ou cumprimento
irregular de cláusulas contratuais, incluída a morosidade indevida e o atraso imotivado; b) o interesse da própria
administração; c) o descumprimento da regra protetiva do menor trabalhador; d) a falência, insolvência ou o
falecimento do contratado; e) a dissolução da sociedade contratada. Efeitos da rescisão unilateral: via de regra, a
administração indenizará a parte contrária quando der causa à rescisão, havendo ou não culpa (ex.: rescisão por
razões de interesse público). No caso de inadimplemento do contratado, a Administração nada tem a pagar-lhe,
sendo, ao contrário, credora de indenização, desde que provados os prejuízos. Nesse caso, a Administração terá
o direito de reter créditos, executar garantia contratual, assumir imediatamente o objeto do contrato e ocupar
os locais necessários à execução (art. 80, I a IV, Lei 8666/93). A propósito, a 2ª turma do STJ, no julgamento do
RESP 1223306/PR (8/11/2011), entendeu ser desnecessário o prévio processo administrativo quando se tratar de
rescisão unilateral de contrato baseada no interesse público da Administração (art. 78, XII, Lei 8666/93). Isso porque
a concessão do direito à ampla defesa do contratado, no caso, é inócua, à medida que se trata de ato
fundamentado no poder discricionário.

3) Sanções extracontratuais: A Administração tem a prerrogativa de aplicar sanções ao particular inadimplente,


ainda que elas não estejam previstas no instrumento contratual (art. 58, IV, da Lei 8666/93). Pode-se vislumbrar
dois grupos de sanções:
a) aquelas que geram um fato administrativo (ex.: ocupação e utilização do local, das instalações, dos
equipamentos, do material e do pessoal empregados na execução do contrato; a tomada de direção do objeto do
contrato; a execução da garantia contratual; a retenção dos créditos do particular inadimplente);
b) aquelas que geram um ato administrativo, também chamadas de sanções administrativas (ex.: advertência,
multa, suspensão do direito de contratar com a Administração por prazo não superior a dois anos; declaração de
inidoneidade - arts. 86 a 88).

4) Fiscalização do contrato. Nos termos do art. 67 da Lei 8666/93, deverá ser designado um representante da
administração para acompanhar e fiscalizar a execução do contrato, permitida a contratação de terceiros para
assisti-lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição. Trata-se de poder-dever permanente, isto é,
abrange todo o período de execução do contrato. A fiscalização não exclui ou reduz a responsabilidade do
contratado pelos danos que venha a causar a terceiros (art. 70, Lei 8666/93)

5) Ocupação provisória dos bens. Tal ocupação pode ocorrer em duas situações distintas (art. 58, V, Lei 8666/93):
a) como medida acautelatória para a apuração de irregularidade na execução do contrato; b) imediatamente após
a rescisão unilateral do contrato.

A EXCEÇÃO DO CONTRATO NÃO CUMPRIDO NO CONTRATO ADMINISTRATIVO: prevalece que incide sobre os
contratos administrativos uma exceptio non adimpleti contractus mitigada (CARVALHO FILHO, p. 196). Isso

110
porque, ao contrário do que ocorre no direito privado (art. 477 do CC), no direito administrativo há que se
observar os princípios da continuidade do serviço público e da supremacia do interesse público sobre o particular
(PIETRO, 2015, p. 322). O artigo 78, XV da lei 8666/93 prevê que o atraso dos pagamentos superior a 90 (noventa)
dias devidos pela Administração decorrentes de obras, serviços ou fornecimento, ou parcelas destes, já recebidos
ou executados, salvo em caso de calamidade pública, grave perturbação da ordem interna ou guerra, constituem
motivo para o contratado rescindir o contrato, assegurado a ele o direito de optar pela suspensão do
cumprimento de suas obrigações até que seja normalizada a situação. Logo, a regra da exceptio é temperada e
não tem caráter absoluto. De qualquer maneira, ressalta-se que sempre o contratado poderá pleitear,
especialmente na esfera judicial, o restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato. Carvalho
Filho defende que em situações especiais, se o prejudicado, mesmo antes desse prazo, ficar impedido de dar
continuidade ao contrato por força da falta de pagamento, tem ele direito à rescisão do contrato com culpa da
Administração (CARVALHO FILHO, p. 196). Registre-se, outrossim, que no âmbito dos contratos de concessão e
permissão de serviços públicos a vedação à regra da exceção do contrato não cumprido é absoluta (art. 39, Lei
8987/95).
Pietro bem sistematiza as áleas a que estão submetidas os particulares quando contratam com a Administração,
além do caso da força maior:
1) Álea ordinária ou empresarial: presente em qualquer tipo de negócio, sendo os riscos previsíveis. O particular
responde por ele.
2) Álea administrativa: abrange a alteração unilateral do contrato pela Administração, fato do príncipe, fato do
príncipe, fato da Administração.
3) Álea econômica: diz respeito a situações externas ao contrato, imprevisíveis e inevitáveis, que causam grande
desequilíbrio ao contrato e ensejam a aplicação da teoria da imprevisão (PIETRO, 2015, p. 323- 324).

II. Teoria do fato do príncipe. Teoria da imprevisão. Caso Fortuito e força maior.

FATO DO PRÍNCIPE: trata-se de evento excepcional e imprevisível amplo e geral causado pelo Estado, não
diretamente relacionado ao contrato, mas que altera o seu equilíbrio econômico-financeiro. Apesar de ser
caracterizado pela sua generalidade, atinge o contratado de modo reflexo. O fato do príncipe está previsto no art.
65, II, “d”, da Lei 8666/93, e no art. 5o, III, da Lei 11079/04 (PPP).

FATO DA ADMINISTRAÇÃO: trata-se de ação ou omissão do Poder Público, especificamente relacionada ao


contrato, que impede ou retarda sua execução. Ex.: retardamento de pagamentos, não liberação tempestiva do
terreno onde se executará a obra, omissão em efetuar desapropriações necessárias ao início das obras (MELLO,
p. 654). Difere do fato do príncipe, porque este é sempre uma determinação geral do Estado (não atuando como
parte do contrato, mas como autoridade pública) e que atinge o contrato apenas reflexamente.

A TEORIA DA IMPREVISÃO fundamenta-se no princípio da cláusula rebus sic stantibus, segundo o qual o contrato
deve ser cumprido desde que presentes as mesmas condições existentes no cenário dentro do qual foi o pacto
ajustado. Mudadas profundamente tais condições, rompe-se o equilíbrio contratual, e não se pode impor culpa à
parte inadimplente (CARVALHO FILHO, p. 210). Tal teoria incide quando no curso do contrato sobrevêm eventos
excepcionais e imprevisíveis que subvertem a equação econômico-financeira, podendo ensejar a rescisão ou
revisãodo contrato por prazo continuado.

III. Equilíbrio econômico-financeiro.

EQUILÍBRIO ECONÔMICO FINANCEIRO: trata-se da relação de adequação entre o objeto e o preço, que deve estar
presente no momento em que se firma o ajuste e deve se manter até o final do contrato (art. 37, XXI da CF/88).

Espécies:

111
a) Reajuste: fórmula preventiva e prevista expressamente em contrato para preservação do valor em face dos
efeitos inflacionários. É a terminologia apropriada para denominar a atualização do valor remuneratório ante as
perdas inflacionárias ou majoração nos insumos. Normalmente, as regras de reajuste têm previsão contratual e
são formalizadas por meio de instituto denominado apostila (MAZZA: 2012, p. 423).

b) Revisão: surge de um fato superveniente e não conhecido de antemão pelos contratantes e que compromete
o equilíbrio do contrato. Ex.: descobre-se que há uma imensa rocha no terreno onde se realizará a obra e que
ocasionará um aumento de custo não previsto. Por sua relevância e relação com o tema da revisão contratual,
transcreve-se o art. 65, §5º e 6º, da Lei 8666/93: “§5º Quaisquer tributos ou encargos legais criados, alterados
ou extintos, bem como a superveniência de disposições legais, quando ocorridas após a data da apresentação da
proposta, de comprovada repercussão nos preços contratados, implicarão a revisão destes para mais ou para
menos, conforme o caso. §6º Em havendo alteração unilateral do contrato que aumente os encargos do contratado,
a Administração deverá restabelecer, por aditamento, o equilíbrio econômico-financeiro inicial.”

Obs.: No reajuste é promovida uma simples atualização monetária da remuneração, ao passo que na revisão
ocorre um aumento real no valor pago ao contratado. Vale lembrar também, a respeito do tema, a Orientação
Normativa n. 22 da AGU: “O reequilíbrio econômico-financeiro pode ser concedido a qualquer tempo,
independentemente de previsão contratual, desde que verificadas as circunstâncias elencadas na letra ‘d’ do inc.
II do art. 65, da Lei n. 8.666, de 993”.

Circunstâncias excepcionais que autorizam a revisão tarifária. Há controvérsias doutrinárias acerca da


classificação das situações que autorizam revisão na remuneração do contratado. A esse respeito, MAZZA (2012,
p. 423-424) resume as figuras identificadas por CABM, HLM, MSZP e JSCF: 1) alteração unilateral do contrato; 2)
fato do príncipe; 3) fato da Administração; 4) álea econômica (teoria da imprevisão); 5) sujeições imprevistas ou
interferências imprevistas; 6) agravos econômicos resultantes da inadimplência da Administração.

JURISPRUDÊNCIA DESTACADA

->STJ, REsp 1129738/SP, 2010. PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. CONTRATO ADMINISTRATIVO. PLANO REAL.
CONVERSÃO EM URV. TEORIA DA IMPREVISÃO. INAPLICABILIDADE AO CASO. (...) 2. Esta Corte já se pronunciou
que a instituição da Unidade Real de Valor – URV, se consubstanciou, em si mesma, cláusula de preservação da
moeda. Sendo assim, in casu, não se aplica a teoria da imprevisão, uma vez que este Tribunal entende não estarem
presentes quaisquer de seus pressupostos. 3. É requisito para a aplicação da teoria da imprevisão, com o
restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, que o fato seja imprevisível quanto à sua
ocorrência ou quanto às suas consequências; estranho à vontade das partes; inevitável e causa de desequilíbrio
muito grande no contrato. E conforme entendimento desta Corte, a conversão de Cruzeiros Reais em URVs,
determinada em todo o território nacional, já pressupunha a atualização monetária (art. 4º da Lei n. 8.880/94),
ausente, portanto, a gravidade do desequilíbrio causado no contrato.

->STJ, REsp 1.352.497-DF, 2014, Info 535. DIREITO ADMINISTRATIVO. EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO EM
CONTRATO DE PERMISSÃO DE SERVIÇO PÚBLICO. Não há garantia da manutenção do equilíbrio econômico-
financeiro do contrato de permissão de serviço de transporte público realizado sem prévia licitação.

->STF, RE 571969/DF, 2014, Info 738. “A União, na qualidade de contratante, possui responsabilidade civil por
prejuízos suportados por companhia aérea em decorrência de planos econômicos existentes no período objeto
da ação. Essa a conclusão do Plenário ao finalizar o julgamento de três recursos extraordinários nos quais se
discutia eventual direito a indenização de companhia aérea em virtude da suposta diminuição do seu patrimônio
decorrente da política de congelamento tarifário vigente, no País, de outubro de 1985 a janeiro de 1992. A
empresa, ora recorrida, requerera também o restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato
de serviço de transporte aéreo, com o ressarcimento dos prejuízos suportados, acrescidos de danos emergentes,
lucros cessantes, correção monetária e juros, em face de cláusula contratual.

112
Questões Prova Oral (MPF/27º):
 Diferença entre teoria do fato do príncipe e teoria da imprevisão.
 Podem existir contratos administrativos verbais?

10B. Extinção do contrato administrativo. Adimplemento e inadimplemento.

Graal Oral 28º CPR

I. Introdução

Os contratos administrativos são uma das formas nominadas de manifestação de vontades juridicamente
relevantes pela Administração Pública, se inserindo dentro do gênero contrato (relação jurídica bilateral). De
forma semelhante aos atos administrativos, constituem-se de competência, finalidade, forma, motivo, objeto,
capacidade e (consenso).

II. Conceito de extinção do contrato administrativo:

Extinção do contrato administrativo é o término do vínculo obrigacional existente entre a Administração e o


particular contratado. Carvalho Filho aponta como hipóteses de extinção do contrato: (a) cumprimento (ou
conclusão do objeto); (b) término do prazo; (c) impossibilidade material; (d) impossibilidade jurídica; (e)
invalidação ou anulação (ex.: vícios de legalidade relativos à competência, forma e motivo; ausência de prévia
licitação; contrato verbal, quando não tiver por escopo pequenas compras, nos termos do art. 60, parágrafo
único); e (f) rescisão amigável, judicial, administrativa ou por arbitragem.

III. Formas normais de extinção do contrato administrativo (arts. 73 a 76, L. 8666):

a) Adimplemento do contrato: Significa o cumprimento do contrato, quando as partes conseguiram o que


pactuaram, e voltam, sem a menor dificuldade, às respectivas situações anteriores.
b) Término do prazo: Utilizado nos contratos com obrigações contínuas no tempo, e diferentemente do
cumprimento do contrato, quando o cumprimento de determinada tarefa extingue o contrato, nos contratos com
prazo certo e determinado a simples expiração do prazo já é motivo suficiente para a extinção. Recebido pela
administração o objeto do contrato ou chegado ao fim o seu prazo de duração, considera-se automaticamente
extinto o contrato administrativo. Diferentemente, a anulação e a rescisão são formas de extinção contratual que
exigem atuação da administração pública ou do Poder Judiciário, ou, se for o caso, acordo entre as partes.

IV. Formas anormais de extinção do contrato administrativo

a) Impossibilidade material, quando o fato constitui óbice instransponível para a execução das obrigações
ajustadas (ex: desaparecimento do objeto, como no caso de contrato de pintura de um hospital que vem a desabar
em virtude de terremoto), ou impossibilidade jurídica quando se admite o cumprimento das obrigações em
condições jurídicas diversas das previstas no contrato (ex: morte do contratado, pois o contrato administrativo é,
em regra, intuitu personae; falência do contratado ou dissolução da sociedade (art. 78, IX e X));

b) Invalidação ou anulação (art. 59, Lei 8666): quando ocorrer vício de legalidade no contrato. Súmula 473 STF:
Necessidade da observância do contraditório e ampla defesa quando existir hipótese justificadora de invalidação
do contrato. Em regra, com efeitos ex tunc. No caso do p.u. do art. 59, entende-se que a indenização abrange
apenas os danos emergentes (mas JSCF entende que incluiria também os lucros cessantes, se a invalidação ocorrer
por culpa da Administração).
Segundo CABM (2008: p. 648-649), “para identificar as consequências de contratos administrativos inválidos é
preciso distinguir as seguintes situações: i) casos em que a relação é invalidada antes de qualquer prestação ou
despesa em que o contratado tenha incorrido por força do contrato e sem que haja sofrido algum prejuízo
indireto, isto é, oriundo do atrelamento contratual; ii) casos em que, não tendo havido má-fé por parte do

113
administrado a invalidação ocorre depois de prestações contratuais ou da efetivação de despesas efetuadas em
razão do contrato ou mesmo quando, por força da vinculação a ele, o contrato ficou privado de comprováveis
proveitos econômicos que, não fora por isto, teria inquestionavelmente obtido em outra relação jurídica; iii) casos
em que, mesmo sem contrato, mas diante de situações fáticas comprovadas, sem má-fé, efetuou prestações
aceitas, ainda que implicitamente, pela Administração. Segundo o autor, na primeira hipótese a fulminação do
contrato não propõe qualquer problema. Na segunda e terceira hipóteses o administrado faz jus a indenização,
nos termos supostos no contrato, pelas prestações que realizou e, ainda, pelas despesas em que terá que incorrer
por força do contrato viciado, e terá direito ao acobertamento dos prejuízos indiretos, ou seja, dos proveitos
que deixou de captar em outra relação jurídica, por força da vinculação contratual”.

c) Rescisão, que é um fato jurídico superveniente ao início do contrato nascido de manifestação volitiva, podendo
ser:
i) amigável, (art. 79, II) quando decorre da manifestação bilateral dos contratantes;
ii) judicial (art. 79, III): quando decorre de decisão emanada de autoridade investida na função jurisdicional
(lembrar da atenuação da regra da exceptio non adimpleti contractus – atraso no pagamento maior de 90 dias por
parte da Administração). É a modalidade normalmente adotada pelos contratados pela Administração quando
esta, de algum modo, descumpre as obrigações pactuadas;
iii) administrativa (ou rescisão unilateral) – art. 79, I, quando a decisão decorre de ato unilateral e escrito da
Administração, em situações como o inadimplemento do contrato, com ou sem culpa (as consequências irão
variar, nos termos do art. 78), ou razões de interesse público (art. 78, XII), devendo serem fundamentadas e
motivadas, não podendo o contratado se opor à rescisão. Na rescisão administrativa por razões de interesse
público, para evitar abusos, são exigidos 4 requisitos: 1) as razões administrativas sejam altamente relevantes; 2)
a Administração promova amplo conhecimento desses motivos; 3) as razões sejam justificadas e determinadas
pela mais alta autoridade administrativa, na respectiva esfera 4) tudo fique formalizado no processo
administrativo. Já se anulou ato de rescisão contratual por falta de devida motivação (TJ-RS).
iv) por arbitragem (Lei 9.307/96): Há discussão acerca da sua possibilidade, mas de acordo com Carvalho Filho,
seria possível, desde que prevista na lei de cada entidade federativa, e que se refira a questão
preponderantemente sobre aspecto patrimonial, e não sobre atos decorrentes do exercício de autoridade (há
previsão expressa na Lei de PPP – Lei 11.079/04 – art. 11, III e na Lei 8.987/95 – Concessões e permissões de
serviço público – art. 23-A). Observação: Para Hely Lopes, existe a hipótese da rescisão contratual de pleno
direito, que independe da vontade das partes e produz efeitos automaticamente pela ocorrência de fato extintivo
previsto em lei, exemplo: falência, insolvência civil ou falecimento.

V. Inadimplemento do contrato administrativo

Há inadimplemento na ocorrência de qualquer conduta mantida pelas partes violando ou não cumprindo as
normas e dispositivos contratuais a que se obrigaram, podendo ocorrer com ou sem culpa:
a) Inexecução com culpa: Gera a rescisão do contrato administrativo. Quando ocorre culpa (lato sensu) do
contratado, o estatuto estabelece a possibilidade de assunção imediata do objeto pelo Poder Público, ocupação,
execução dos valores e multas, retenção dos créditos devidos (não há, no caso de culpa, necessidade de
autorização judicial para impor as sanções administrativas dos arts. 86 e 87). Quando ocorre culpa da
Administração, deverá o contratado ser indenizado de todos os prejuízos suportados, com juros de mora e
correção monetária.
b) Inexecução sem culpa: Gera a resolução do contrato, conforme artigo 478 CC (aplicável aqui comonorma
geral). Quando uma das partes não consegue cumprir o contrato sem culpa, mas em decorrência de fatos
supervenientes que dificultaram ou impediram o término do contrato (entram aqui: teoria da imprevisão, fato do
príncipe, fato da Administração, caso fortuito/força maior).

Efeitos: Rescisão do contrato, reassunção do contrato pelo Poder Público, indenização por perdas e danos,
retenção de créditos do contratado, suspensão de contratar com o Poder Público.

114
Questão da Prova Oral (MPF/27º): Extinção do contrato administrativo. Pediu 5 modalidades, sendo duas da Lei
8.987. Comentários: A extinção do contrato administrativo configura o término do vínculo obrigacional existente
entre a Administração e o particular contratado. Hipóteses: (a) cumprimento (ou conclusão do objeto); (b)
término do prazo; (c) impossibilidade material; (d) impossibilidade jurídica; (e) invalidação ou anulação; e (f)
rescisão amigável, judicial, administrativa ou por arbitragem. Na lei de concessão de serviços públicos, são
formas de extinção do contrato administrativo de concessão: Termo final do prazo; Anulação; Revogação;
Caducidade, Encampação, falência e extinção da concessionária (vide item 19.B).

11B. Convênios e consórcios administrativos. Contratos de gestão. Prestação de contas e tomada de contas
especial.

Atualizado por Marília Siqueira.

Base constitucional dos convênios e consórcios administrativos: art. 241 da CF. Para os convênios, também o
art. 23, p único, CF.
Diferença dos convênios e consórcios administrativos com contratos administrativos: enquanto nos contratos
os interesses das partes são divergentes (interesse público Administração x interesse lucro prestador serviços),
nos convênios e consórcios administrativos, ambos os partícipes possuem interesses comuns e paralelos e não
contrapostos.

1. CONVÊNIOS ADMINISTRATIVOS: Ajustes firmados por pessoas administrativas entre si, ou entre estas e
entidades particulares2, com vistas a ser alcançado determinado objetivo de interesse público comum, mediante
mútua colaboração e independentemente de licitação e autorização legislativa3. O elemento fundamental é a
cooperação, e não o lucro; com base nisso, tem sido admitida a participação, como pactuantes, de órgãos públicos
(sem personalidade jurídica) (Carvalho Filho, 2017, p. 233)4. No entanto, deve-se pontuar que o art. 2º, III, Decreto
6170/07 veda a celebração de convênios entre órgãos e entidades da administração pública federal, caso em que
deve ser celebrado termo de execução descentralizada.
Os convênios são oriundos da reforma administrativa de 1967, que objetivou descentralizar as atividades, e são
instrumentos de parcerias para execução das políticas públicas. Nos convênios estão ausentes as cláusulas
exorbitantes e há possibilidade de se liberar unilateralmente dos termos da avença (denúncia unilateral). Essa
modalidade de ajuste está disciplinada no art. 116, caput e parágrafos, da Lei 8666. No âmbito federal, as
transferências de recursos da União mediante convênios e contratos de repasse são disciplinadas pelo Decreto
6170/2007. Atenção para a Lei 13.019, de julho/2014.
Apesar de não ser precedido de licitação, para garantir a impessoalidade, é necessária a realização de
chamamento público, no qual deve conter a descrição dos programas a serem executados e os critérios objetivos
de seleção do vencedor. De acordo com a portaria interministerial 424/16, pode ser inexigível (competição
inviável) ou dispensável, conforme o caso.
TCU - Súmula 286 (2014): “A pessoa jurídica de direito privado destinatária de transferências voluntárias de
recursos federais feitas com vistas à consecução de uma finalidade pública responde solidariamente com seus
administradores pelos danos causados ao erário na aplicação desses recursos.”.
Prestação de contas. Como o particular convenente recebe benefícios pagos pelos cofres públicos, é devida a
prestação de contas a respeito da execução correta do objeto do convênio e boa utilização da verba pública. De
acordo com a Portaria Interministerial 424/16, a prestação de contas deve ser apresentada à administração no
prazo de 60 dias a contar do término do acordo, podendo ser prorrogado por mais 45 dias, sob pena de instaurar
tomada de contas especial.

2
De acordo com o art. 84-A, Lei 13.019/2014, somente podem ser celebrados convênios nas hipóteses do parágrafo único do art. 84 da mesma
lei, isto é, entre entes federados e pessoas jurídicas a eles vinculadas e entre os entes federados e entidades filantrópicas ou sem fins lucrativos.
3
(STF, ADI 342/PR: “a regra que subordina a celebração de acordos ou convênios firmados por órgãos do Poder Executivo à autorização
prévia ou ratificação da Assembleia Legislativa, fere o princípio da independência e harmonia dos poderes”)
4
Consórcios administrativos: Há autores que se referem ainda aos consórcios administrativos, distinguindo-os dos convênios, pelo fato de
aqueles serem ajustados sempre entre entidades estatais, autárquicas e paraestatais da mesma espécie (Marinela, p. 444), ao passo que os
convênios o seriam entre pessoas de espécies diferentes. Carvalho Filho considera desnecessária a distinção (2017, p. 235).

115
2. CONSÓRCIOS PÚBLICOS (Lei 11.107/05): Negócio jurídico plurilateral de direito público, com o conteúdo
de cooperação mútua entre os pactuantes, que necessariamente são entes federativos, visando a realização de
atividades e metas de interesse comum (prestar serviços e executar atividades de interesse comum). Ajustadas
as partes, devem constituir uma pessoa jurídica, sob a forma de associação pública ou pessoa jurídica de direito
privado, com necessidade de protocolo prévio de intenções e autorização legislativa de cada entidade federativa
participante do consórcio. Como se percebe, diferenciam-se dos convênios e consórcios administrativos, dentre
outras peculiaridades, por gerarem nova pessoa jurídica e por dependerem de autorização legislativa.
2.1. Requisitos formais prévios: a) subscrição de protocolo de intenções entre os partícipes: b) publicação do
protocolo na imprensa oficial; c) promulgação de lei por cada um dos integrantes ratificando o protocolo de
intenções5; d) celebração do correspondente contrato.
2.2. Natureza jurídica dúplice: a) se for pessoa jurídica de direito público: Autarquia. Integrará a administração
indireta de todos os entes consorciados. A natureza enquanto autarquia encontra divergência na doutrina: para
Carvalho Filho (2017, p. 239), é uma categoria de autarquia (associação pública), já para Di Pietro, é uma nova
espécie de entidade da Adm. Indireta (2006, p. 466). Prevalece que a personalidade jurídica somente será
adquirida quando da vigência da última lei de ratificação, pois o suporte fático-jurídico da criação do consórcio é
a vigência das leis de ratificação (CARVALHO FILHO, 2017, p. 240). b) se for pessoa jurídica de direito privado:
Associação civil. O regime jurídico será híbrido (privado e público). Para Carvalho Filho, nesse caso também
integrará a administração indireta (divergência). Adquire personalidade jurídica com o regular registro público.
Em qualquer caso, integrado a adm indireta, irá se submeter a controle ministerial.
2.3. Contrato de programa: Obrigatoriedade: deve ser celebrado quando um ente da Federação (ou uma
entidade de sua administração indireta) estiver incumbido da prestação de serviço público perante outro ente da
Federação ou para com consórcio público. Objeto: constituição e regulação das obrigações pertinentes do ente ou
entidade prestador(a), não abrangendo as obrigações cujo descumprimento não acarrete qualquer ônus a ente
da Federação ou a consórcio público. Condição de validade: o atendimento ao objeto. Cláusula proibida: é nula a
atribuição ao contratado dos poderes de planejamento, regulação e fiscalização dos serviços por ele próprio
prestados. Obediência e previsão: o contrato de programa deve: a) atender à legislação de concessões e
permissões e à de regulação dos serviços; e, b) prever procedimentos de transparência da gestão
econômica/financeira de cada serviço. Vigência: permanece vigente mesmo quando extinto o consórcio público
ou o convênio de cooperação que autorizou a gestão associada de serviços públicos. Celebração por entidade da
administração indireta dos entes consorciados ou conveniados: possibilidade mediante previsão no contrato de
consórcio/convênio enquanto for integrante da administração indireta de ente consorciado/conveniado.
Convênio dos consórcios públicos com a União: poderá ser celebrado para viabilizar a descentralização e a
prestação de políticas públicas em escala adequada.
2.4. Contrato de rateio: instrumento pelo qual os entes consorciados se comprometem a fornecer recursos
financeiros ao consórcio público para realização de suas despesas. Periodicidade: será formalizado em cada
exercício financeiro, salvo programas previstos no plano plurianual e em caso de remuneração por preço
público/tarifa. Aplicação vedada de recursos: os recursos entregues por meio de contrato de rateio não podem
atender a despesas genéricas (tidas em orçamento como de aplicação indefinida). Legitimidade para cobrar
obrigações: qualquer ente consorciado em dia com as parcelas (isolado ou em conjunto) e o próprio consórcio
público podem exigir o cumprimento de obrigações previstas no contrato de rateio. Dever de informar despesas:
as despesas realizadas com os recursos decorrentes de contrato de rateio devem ser informadas aos entes
consorciados para que possam ser contabilizadas nas suas respectivas contas. Exclusão por inadimplência: o ente
consorciado que não consignar, em sua lei orçamentária ou em créditos adicionais, as dotações para as despesas
assumidas em contrato de rateio pode ser excluído, após prévia suspensão.
2.5. Gestão Associada de Serviços Públicos: Exercício de atividades de planejamento, regulação ou fiscalização
de serviços públicos pelo consórcio público ou por meio de convênio de cooperação acompanhadas ou não da: (a)
Prestação de serviços públicos; OU (b) Transferência (total ou parcial) de encargos, serviços, pessoal ou bens

5
Se a ratificação for realizada após 2 (dois) anos da subscrição do protocolo de intenções, a entrada do ente no consórcio dependerá de
homologação da assembleia geral do consórcio público; é dispensado da ratificação o ente da Federação que, antes de subscrever o
protocolo de intenções, disciplinar por lei a sua participação no consórcio público. A ratificação pode ser realizada com reserva que,
aceita pelos demais entes subscritores, implicará consorciamento parcial ou condicional. Logo, as reservas necessariamente devem ser
aceitas.

116
necessários à continuidade dos serviços transferidos.
2.6. O consórcio poderá: (i) firmar convênios (inclusive com a União), contratos, acordos, receber auxílios,
subvenções e contribuições; (ii) promover desapropriações e instituir servidões; (iii) ser contratado pela AP direta
ou indireta dos entes da federação consorciados, dispensada a licitação; (iv) outorgar concessão, permissão,
autorização de obras ou serviços públicos, desde que previstos no contrato de consórcio - interessante é que a lei
previu que o consórcio pode fazer a delegação de serviços públicos mediante autorização, o que é inconstitucional
por afrontar o art. 175 da CR/88; (v) gozar de limites diferenciados para a dispensa de licitação.
2.7. A Lei nº 11.107 introduziu os incisos XIV e XV no art. 10 da Lei de Improbidade Administrativa e promoveu
alterações nos arts.23 e 24 Lei 8.666/93.
2.8. Licitação e Controle. Os consórcios públicos, sejam de direito público ou privado, deverão observar as
normas públicas de contratação de pessoal, prestação de contas e licitação; entretanto, o consórcio público de
direito privado terá pessoal celetista. Para fins de controle, deverá ser designado um dos Chefes dos Poderes
Executivos para ser o representante legal do consórcio. O controle contábil, operacional e patrimonial caberá ao
tribunal de contas competente para apreciar as contas do chefe designado, sem prejuízo do controle externo
realizado sobre o quantum aportado por cada ente, estabelecido no contrato de rateio. Responsabilidade dos
agentes públicos na gerência do consórcio: a) NÃO RESPONDEM pessoalmente pelas obrigações contraídas pelo
consórcio público; b) RESPONDEM pelos atos praticados ilegalmente ou contra disposição do respectivo estatuto.
2.9. Críticas: a) pode acarretar uma indevida interferência da União, em virtude do poder político e financeiro
deste ente, em questões locais de Estados e Municípios, representando risco à autonomia destes entes públicos
(Marinela, p. 446); b) com todos os poderes que lhes são conferidos, os consórcios públicos podem ser
inconstitucionalmente equiparados, em diversos aspectos, às unidades da Federação brasileira (Marinela, p. 448).
2.10. Extinção do consórcio: é possível que um ente federativo se retire do consórcio, desde que haja edição
de ato formal de seu representante perante a assembleia geral; os bens destinados ao consórcio pelo consorciado
que se retira somente serão revertidos ou retrocedidos em caso de expressa previsão no instrumento do
consórcio ou no de transferência/alienação.

3. CONTRATOS DE GESTÃO: O termo “contratos de gestão” designa duas situações distintas, uma que se
refere às agências executivas e a outra referente às organizações sociais. Primeira. No contexto da Reforma
administrativa que teve início em 1995, foi prevista pela Lei 9.649/98, a possibilidade de celebração de contrato
de gestão entre Ministérios e as autarquias ou fundações públicas, dando origem às agências executivas. A lei não
conceitua contrato de gestão. No âmbito constitucional, a EC 19/98 inseriu a previsão de contrato de gestão no
art. 37, § 8º, embora não tenha utilizado este termo, possibilitando ao Poder Público a celebração deste contrato
com órgãos e entidades da administração direta e indireta6. Segunda. Por sua vez, a Lei 9.637/98 utilizou o termo
“contrato de gestão” para definir o vínculo entre a Administração Pública e as organizações sociais.
3.1. No contrato de gestão previsto na Lei 9.649/98, celebrado com autarquias e fundações, o objetivo é
aumentar a eficiência destas pessoas jurídicas na operacionalização de suas atividades, conferindo-lhes maior
autonomia e estabelecendo, em contrapartida, objetivos, metas, critérios e indicadores de desempenho para a
aferição do cumprimento do plano de reestruturação definido no próprio contrato de gestão. Este contrato de
gestão é requisito para a classificação de tais pessoas jurídicas como agências executivas; não se trata de figura
nova da estrutura formal da administração pública, mas apenas uma qualificação atribuída às autarquias ou
fundações; extinto o contrato de gestão, volta a ser autarquia comum. Igualmente, destaque-se que não
necessariamente o fato da autarquia ou fundação celebrar contrato de gestão fará com que se torne uma agência
executiva7. A base da sua atuação é a operacionalidade, ou seja, visam à efetiva execução e implementação da
atividade descentralizada. A qualificação da agência executiva depende de decreto qualificador (nos termos do
Decreto 2.487/98), assim como a desqualificação. O prazo de vigência do CG: no mínimo, um ano. São privilégios
concedidos pela celebração do CG: (i) ampliação dos limites de valor de dispensa de licitação; (ii) possibilidade de
rescisão unilateral do contrato de trabalho, nas taxativas hipóteses previstas por lei (isso se encontra atualmente
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Art. 37, §8º: A autonomia gerencial, orçamentária e financeira dos órgãos e entidades da administração direta e indireta poderá ser ampliada
mediante contrato, a ser firmado entre seus administradores e o poder público, que tenha por objeto a fixação de metas de des empenho para
o órgão ou entidade, cabendo à lei dispor sobre: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) I - o prazo de duração do contrato; II -
os controles e critérios de avaliação de desempenho, direitos, obrigações e responsabilidade dos dirigentes; III - a remuneração do pessoal.
7
São dois os requisitos para uma autarquia/fundação se tornar agência executiva: (i) ter um plano estratégico de reestruturaçã o e
desenvolvimento institucional em andamento e (ii) ter celebrado contrato de gestão com o respectivo Ministério Supervisor.

117
prejudicado com a medida cautelar na ADI 2.135 que restaurou o RJU). Crítica: A doutrina critica o instituto
afirmando que a instituição de pessoa jurídica é feita por lei e esse diploma igualmente define os seus limites, não
pode o contrato dar mais liberdade do que fez a lei, garantindo a essas entidades maior autonomia, sob pena,
inclusive, de violação ao princípio da separação dos poderes. Outra crítica é a ausência de personalidade jurídica
de Ministérios e demais órgãos públicos para a celebração de contratos.
3.2. Quanto ao contrato de gestão celebrado com as organizações sociais, a finalidade é a prestação de
serviços públicos. ORGANIZAÇÕES SOCIAIS: trata-se de qualificação jurídica dada a pessoa jurídica de direito
privado, sem fins lucrativos, que desempenha, mediante contrato de gestão, serviço público não exclusivos do
Estado de natureza social. Elas somente podem atuar nas áreas de ensino, cultura, saúde, pesquisa científica,
desenvolvimento tecnológico e preservação do meio ambiente. Para ser uma Organização Social, não é
imprescindível a assinatura do Contrato de Gestão. A qualificação é um ato apartado, antefase necessária, no
entanto, para que a entidade privada sem fins lucrativos eventualmente celebre o CG. Com a qualificação, a
entidade é declarada de interesse social e utilidade pública, para todos os efeitos legais daí decorrentes. Exercem
serviços em seu próprio nome, com incentivo do Estado. A celebração do CG é um ato discricionário do Estado.
As OS podem receber recursos orçamentários e usar bens públicos necessários à consecução de seus objetivos,
neste último caso por meio de permissão de uso (art. 11 e 12). Por isso, a lei exige (art. 8º) fiscalização das
atividades e exame da prestação de contas das entidades. Elas devem possuir Conselho de Administração
composto por representantes do Poder Público, de entidades da sociedade civil, de membros da Associação civil,
se for o caso, de membros eleitos pelos demais integrantes do conselho e membros indicados na forma do
Estatuto. Estão sujeitas à fiscalização do TCU, no âmbito federal, relativamente aos recursos públicos que
receberem, assim como em relação ao desempenho. Nos Contratos de Gestão firmados pela Organização Social,
deve constar o programa de trabalho, especificando as metas a serem atingidas; os critérios de avaliação de
desempenho; limites e critérios de remuneração a serem percebidos pelos dirigentes e empregados. A
fiscalização cabe ao órgão supervisor da área de atuação da atividade. O Poder Executivo pode realizar a
desqualificação se verificado o descumprimento do CG, garantidos a ampla defesa e o contraditório em processo
administrativo. Os dirigentes da organização social responderão individual e solidariamente pelos danos ou
prejuízos decorrentes de sua ação ou omissão.
A ADI 1.923/DF: (i) Contratações dos serviços prestados pela OS: governo é dispensado de licitação quanto aos
bens/serviços previstos no Contrato de Gestão; (ii) Contratações pela OS com os recursos para ela repassados
pelo Governo: STF entende que deve haver um procedimento seletivo, como a cotação prévia de preços; (iii)
Critério de seleção da entidade privada com a qual se celebrará Contrato de Gestão e que será qualificada como
OS: STF vem entendendo que é necessário realizar chamamento público (iv) Contratação de pessoal pela OS: não
precisa licitar, já que serão empregados privados regidos pela CLT. Na ADI 1.923, apesar de ter reconhecido a
constitucionalidade da Lei 9.637/98, o STF conferiu interpretação conforme a diversos de seus dispositivos,
afirmando, em síntese, que devem ser conduzidos de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos
princípios do “caput” do art. 37 da CF, os procedimentos de: qualificação de OS, celebração de contrato de gestão,
dispensa de licitação ou outorga de permissão de uso de bem público e seleção de pessoal, bem assim que
qualquer interpretação que restringisse o controle, pelo Ministério Público e pelo Tribunal de Contas da União,
da aplicação de verbas públicas deveria ser afastada.

4. PRESTAÇÃO DE CONTAS: Atualmente, a função do instituto da prestação de contas parte da obrigação social e
pública de prestar informações sobre algo pelo qual é responsável (atribuição, dever).
Objetivos básicos da prestação de contas: verificar a regularidade do uso dos recursos e avaliar se a alocação dos
recursos atende às necessidades mais legítimas da sociedade.
Aspectos de análise: legalidade, legitimidade, economicidade, eficiência e eficácia.
Organização do processo. A organização do processo de contas se inicia no ambiente do próprio gestor (fase
externa), mediante a reunião dos elementos definidos por norma regulamentar expedida pelo Tribunal (instrução
normativa), incluindo o relatório de gestão, o relatório de auditoria do controle interno, a certificação das contas
pelo competente órgão de controle interno e a declaração, se for o caso, do Ministro da área supervisora ou da
autoridade equivalente, de que tomou conhecimento das irregularidades consignadas na respectiva prestação ou
tomada de contas, inclusive especial (arts. 7º e 9º da Lei nº 8.443, de 1992, c/c arts. 188 a 196 do RITCU).
Objetivo final do processo de contas. Emitir um juízo de mérito que julgue as contas de cada gestor do rol de

118
responsáveis, que, se for o caso, condene o responsável ao pagamento da dívida decorrente de dano devidamente
quantificado e, por fim, se cabível, aplique as devidas sanções.
Resultados. As contas podem ser julgadas regulares, regulares com ressalvas, irregulares ou iliquidáveis. A
primeira hipótese ocorre quando a conta expressa, de forma clara e objetiva, a exatidão dos demonstrativos
contábeis, a legalidade, a legitimidade e a economicidade dos atos de gestão do responsável. As ressalvas, por
sua vez, decorrem da existência de impropriedades ou falhas de natureza formal de que não resultem danos ao
erário. Já as contas são irregulares em função da omissão no dever de prestar as contas (presunção relativa da
ocorrência de dano); prática de ato de gestão ilegal, ilegítimo, antieconômico, ou infração a norma legal ou
regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional ou patrimonial; dano ao erário
decorrente de ato de gestão ilegítimo ou antieconômico; desfalque ou desvio de dinheiros, bens ou valores
públicos; e reincidência no descumprimento de determinação de que o responsável tenha tido ciência, feita em
processo de tomada ou prestação de contas (art. 16 da LOTCU). Por fim, as contas serão consideradas iliquidáveis
quando ocorrer situação de caso fortuito ou força maior, alheia a vontade do responsável, tornar materialmente
impossível o julgamento de mérito, oportunidade em que o Tribunal ordenará o trancamento das contas (arts. 20
e 21 da LOTCU c/c o art. 211 do RITCU). Destaca-se que não há quitação na hipótese de contas iliquidáveis.
Lei de Responsabilidade Fiscal. A LRF prevê a prestação de contas pelos Chefes do Poder Executivo, incluindo,
além das suas próprias, as dos Presidentes dos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário e do Chefe do Ministério
Público, sendo que as contas do Poder Judiciário da União serão apresentadas pelos Presidentes do Supremo
Tribunal Federal e dos Tribunais Superiores, consolidando as dos respectivos tribunais; e a do Poder Judiciário dos
Estados, pelos Presidentes dos Tribunais de Justiça, consolidando as dos demais tribunais. Deverá a prestação de
contas evidenciar o desempenho da arrecadação em relação à previsão, destacando as providências adotadas no
âmbito da fiscalização das receitas e combate à sonegação, as ações de recuperação de créditos nas instâncias
administrativa e judicial, bem como as demais medidas para incremento das receitas tributárias e de
contribuições.
Obs: Em se tratando de prestação de contas de Prefeito Municipal, relativas a recursos federais repassados por
convênio a Município, compete ao Tribunal de Contas da União emitir parecer prévio sobre a regularidade, ou
não, da aplicação das verbas, cabendo o julgamento definitivo dessas contas à Câmara de Vereadores.

5. TOMADA DE CONTAS ESPECIAL: A tomada de contas especial é um processo administrativo devidamente


formalizado, com rito próprio, para apurar responsabilidade por ocorrência de dano à administração pública
federal, com apuração de fatos, quantificação do dano e identificação dos responsáveis, e obter o respectivo
ressarcimento. É pressuposto para sua instauração a existência de elementos fáticos e jurídicos suficientes para
comprovação da ocorrência de dano e identificação das pessoas físicas ou jurídicas que deram causa ou
concorreram para a ocorrência de dano.
Irregularidades que justificam TCE. 1) Omissão no dever de prestar contas; 2) Não comprovação da aplicação dos
recursos repassados pela União; 3) Ocorrência de desfalque ou desvio de dinheiros, bens ou valores públicos; 4)
Prática de qualquer ato ilegal, ilegítimo ou antieconômico de que resulte dano ao erário.
Quem deve instaurar TCE?. Em regra, a TCE deve ser instaurada pela autoridade competente do próprio órgão ou
entidade jurisdicionada (responsável pela gestão dos recursos), em face de pessoas físicas ou jurídicas que deram
causa ou concorreram para a materialização do dano, depois de esgotadas as medidas administrativas internas
com vista à recomposição do erário ou à elisão da irregularidade (art. 8º da Lei 8.443/1992). A TCE pode
igualmente ser instaurada por recomendação dos órgãos de controle interno (art. 50, III, da Lei 8.443/92) ou por
determinação do próprio Tribunal, nos casos de omissão na prestação de contas ou inércia na instauração da TCE
pelo gestor. Os processos instaurados nas demais instâncias deverão ser remetidos ao Tribunal de Contas da
União, no prazo máximo de cento e oitenta dias, a contar do término do exercício financeiro de sua instauração,
conforme o art. 11 da IN TCU 71/2012.
Vale lembrar que compete ao Tribunal de Contas da União julgar as contas daqueles que derem causa à perda,
extravio ou outra irregularidade com dano ao Erário, nos termos do art. 71, II, da Constituição Federal.
Ao exercer a fiscalização dos atos de que resulte receita ou despesa, se configurada a ocorrência de desfalque,
desvio de bens ou outra irregularidade de que resulte dano ao Erário, o Tribunal ordenará, desde logo, a conversão
do processo em tomada de contas especial.
Valor de alçada atual – R$100 mil. As TCE’s só devem ser instauradas se o dano ao erário, atualizado

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monetariamente, for de valor igual ou superior à R$ 100 mil (valor de alçada vigente – IN 76/2016). Se existirem
débitos de um mesmo responsável, diante do mesmo órgão ou entidade repassadora, em valores inferiores ao
limite de alçada, poderá ocorrer a consolidação de valores para constituição de TCE, caso o seu somatório atinja
ou supere o valor de alçada. Se o dano for de valor inferior, a autoridade administrativa federal competente, ainda
assim, deverá esgotar as medidas administrativas visando ao ressarcimento pretendido.
Procedimento administrativo. A TCE, no âmbito no TCU, possui etapas de instrução e julgamento, garantidos o
contraditório e a ampla defesa, havendo, ainda, a possibilidade de interposição de recursos.
Regularidades e irregularidades. Os processos de TCE no TCU poderão ser julgados regulares (dando quitação
plena aos responsáveis), regulares com ressalva (falhas formais) e irregulares. Podem ainda ser considerados
iliquidáveis (trancamento das contas por impossibilidade de julgamento) ou arquivados sem apreciação do mérito
quando verificada a ausência de pressupostos de constituição ou de desenvolvimento válido e regular do
processo.
Imputação de débito/multa. Quando as contas são julgadas irregulares há imputação de débito e/ou multa,
decisão que tem eficácia de título executivo extrajudicial (art. 71, § 3º, da CF/88 e art. 585, VII, do CPC), tornando
a dívida líquida e certa.
Sanções. Outras sanções podem, ainda, ser aplicadas: a) declaração de inidoneidade do particular para licitar ou
contratar com a administração; b) declaração de inabilitação para o exercício de cargo ou função pública; c)
comunicação ao Ministério Público Federal e solicitação do arresto de bens para garantir o ressarcimento.
Concomitância entre ação judicial e TCE. A existência de ação judicial em tramitação não implica suspensão de
processos que tratem do mesmo objeto no TCU, em virtude do princípio da independência das instâncias. O
julgamento de tomada de contas especial decorrente de irregularidades de que resultem prejuízo ao erário é
competência constitucional originária conferida ao TCU pela Constituição da República (art. 71, inciso II). Inclusive,
informações colhidas pelo TCU costumam ser solicitadas e enviadas ao Poder Judiciário e ao Ministério Público
para complementar processos judiciais. Portanto, é importante que conste do processo de TCE informações
acerca de eventuais ações judiciais.

27º CPR: 1) O que leva uma autarquia a ser uma agência? Quais os requisitos? (obs. a examinadora adora este
ponto)? 2) Como o dirigente é indicado? Em que caso ele pode sair antes do mandato (atenção. A examinadora
tentou enganar a candidata perguntando: quando ele pode ser demitido ad nutum). 3) Convênios e consórcios
administrativos? Contratos de gestão? 4) O que são convênios? O que são consórcios? A examinadora perguntou
qual a personalidade jurídica do consórcio?

18B. Parcerias público-privadas

Vanessa Andrade

O tema surgiu com o programa de Reforma do Estado a partir da década de 90, cujo ápice foi o Governo
FHC, com a privatização de empresas federais, flexibilização de monopólios de serviços públicos e estímulos ao
Terceiro Setor. A primeira lei surgiu em Minas Gerais (2003), seguida de São Paulo (2004), dentre outras. Em
sentido amplo, as PPP’s são os vínculos negociais de trato continuado entre Administração e particulares, sob a
responsabilidade destes, tendo em vista atividades de interesse comum relevante (concessão de serviço público,
contratos de gestão com OS’s, termos de parceria com OSCIP’s e uso privado de bem público). Em sentido estrito,
encontram-se as figuras da concessão patrocinada e da concessão administrativa.
A Lei das PPP’s (Lei 11.079/2004) estabeleceu um sistema de garantias de proteção do concessionário
contra o inadimplemento do concedente. Não é uma lei geral de parcerias, mas uma lei sobre duas de suas
espécies: a concessão patrocinada e a concessão administrativa. A Lei 11.079/04 traz, ao lado de normas gerais
– aplicáveis a todas as esferas de governo – regras endereçadas exclusivamente à União (arts. 14 a 22).
As PPP’s têm como objetivo atrair o setor privado, nacional e estrangeiro, basicamente para investimentos
em projetos de infraestrutura de grande vulto. Com efeito, a principal vantagem das PPP’s é a diluição dos riscos
e proveitos entre o parceiro público (concedente) e o privado (concessionário), tornando assim, a concessão mais
atraente para este último. Essa diluição de riscos se dá com a garantia ao parceiro privado de um “retorno mínimo”,
proporcionado pela contraprestação paga pelo parceiro público.

120
Destacam-se, como cláusulas essenciais dos contratos de PPP (art. 5º): a repartição de riscos entre as
partes, inclusive os referentes a caso fortuito, força maior, fato do príncipe e álea econômica extraordinária (alínea
“c”) e o compartilhamento com a Administração Pública de ganhos econômicos efetivos do parceiro privado
decorrentes da redução do risco de crédito dos financiamentos utilizados pelo parceiro privado (alínea “f”). A
contraprestação da Administração Pública nos contratos de PPP pode ser feita por (art. 6º): a) ordem bancária; b)
cessão de créditos não tributários; c) outorga de direitos em face da Administração Pública; d) outorga de direitos
sobre bens públicos dominicais; e) outros meios admitidos em lei.
O contrato poderá prever o pagamento ao parceiro privado de remuneração variável vinculada ao seu
desempenho. O art. 7º exige que a contraprestação seja obrigatoriamente precedida da disponibilização do
serviço objeto da PPP. É possível, entretanto, haver pagamento de contraprestação pela disponibilização parcial do
serviço, quando a parte disponibilizada puder ser fruída de forma independente. NÃO é obrigatória a previsão de
que sejam concedidas garantias da contraprestação do parceiro público ao parceiro privado (art. 11, p. ú.).
Tendo em vista tratar de investimentos de longo prazo, a L. 11.079/04 traz dispositivos a fim de evitar o
desequilíbrio fiscal. Despesas geradas pelos contratos de PPP: podem ser consideradas despesas obrigatórias de
caráter continuado (17 LRF) ou dívida pública (29, 30 e 32 LRF), a depender a classificação dos critérios fixados
pela Secr. do Tesouro Nacional. Riscos dos contratos de PPP: a) comprometimento irresponsável de recursos
públicos futuros (daí a exigência legal do debate público prévio dos projetos e a criação de órgão gestor
centralizado para definir prioridades), b) contratações de longo prazo mal planejadas e estruturadas (necessidade
de ponderar ônus e vantagens entre um contrato PPP e um contrato administrativo comum), c) abuso populista
no patrocínio estatal das concessões (exigência de autorização legislativa específica para concessão patrocinada
em que mais de 70% da remuneração do concessionário fiquem a cargo da Administração), e d) desvio no uso da
concessão administrativa (banalização).
Vedações à celebração de PPP (art. 2º, § 4º): a) valor do contrato inferior a R$ 10 milhões (alterado pela
Lei n. 13.529/2017 – antes era R$20 milhões); b) período de prestação do serviço inferior a 5 anos (período max.
é de 35 anos); c) objeto único o fornecimento de mão de obra, o fornecimento e instalação de equipamentos ou
a execução de obra pública. Indelegabilidade das funções de regulação, jurisdicional, do exercício do poder de
polícia e de outras atividades exclusivas do Estado (art. 4º, III).
Todavia, a própria Lei nº 10.079/04 prevê limites de valores e prazos para a contratação de PPP’s que
devem ser observados pela Administração não na perspectiva dos contratos individualmente celebrados, mas sim
em relação à situação da própria Administração, especialmente no tocante ao cumprimento de normas e metas
de caráter financeiro (art. 10, I, II e V; art. 22 e art. 28).
Antes da celebração do contrato de PPP, deverá ser constituída sociedade de propósito específico,
incumbida de implantar e gerir o objeto da parceria (art. 9º). A transferência do controle da sociedade de propósito
específico é condicionada à autorização expressa da Administração Pública, nos termos do edital e do contrato,
devendo o pretendente à aquisição do controle: a) atender às exigências de capacidade técnica, idoneidade
financeira e regularidade jurídica e fiscal necessárias à assunção do serviço; b) comprometer-se a cumprir todas
as cláusulas do contrato em vigor. Entretanto, na hipótese específica de o contrato de PPP conter cláusula
prevendo a possibilidade de o parceiro público autorizar a transferência do controle da sociedade de propósito
específico para os financiadores desta, com o objetivo de promover sua reestruturação financeira e assegurar a
continuidade da prestação dos serviços, a obtenção da autorização do Poder Público, pelos financiadores que
adquirirão o controle, não é condicionada ao atendimento das exigências de capacidade técnica, idoneidade
financeira e regularidade jurídica e fiscal (art. 5º, §2º, I). A sociedade de propósito específico poderá assumir a
forma de companhia aberta. É vedado à Administração Pública ser titular da maioria do capital votante das
sociedades de propósito específico, exceto na hipótese de aquisição da maioria do capital votante daquelas por
instituição financeira controlada pelo Poder Público, quando tal aquisição decorra de inadimplemento de
contratos de financiamento (art. 9º, §§ 4º e 5º).
A contratação nas PPP’s será sempre precedida de licitação na modalidade concorrência. Entretanto, a L.
11.079/04 traz algumas inovações ao procedimento licitatório, possibilitando que o edital inclua regras similares
às aplicáveis ao pregão, como a apresentação de propostas escritas seguidas de lances em viva voz e a autorização
de que o edital estabeleça a inversão da ordem das fases de habilitação e julgamento. O art. 12 da lei prevê a
aplicação subsidiária da Lei 8.666/93 ao procedimento licitatório prévio à celebração das PPP’s. Para Di Pietro, a
L. 11.079/04 atribuiu ampla competência discricionária à Administração Pública, no que atine à fixação das regras

121
a que estará sujeito o procedimento licitatório prévio à celebração da PPP.
A L. 11.079/04 impõe como condição para a abertura da licitação que o objeto da PPP esteja previsto no
plano plurianual em vigor no âmbito onde o contrato será celebrado, prescrevendo, ainda, a necessidade de
obtenção de licença ambiental prévia, ou a expedição das diretrizes para o licenciamento ambiental do
empreendimento, sempre que o objeto do contrato a ser celebrado o exija. A minuta do edital e do contrato de
PPP deve ser submetida à consulta pública. O edital de licitação conterá a minuta do futuro contrato, podendo
prever o emprego dos mecanismos privados de resolução de disputas, inclusive a arbitragem. Deverão estar
especificadas no edital, quando houver, as garantias da contraprestação do parceiro público a serem concedidas
ao parceiro privado. Destaque-se que, nas PPP’s, assim como nas concessões comuns e nas permissões de serviços
públicos, os autores ou responsáveis economicamente pelos projetos básico ou executivo podem participar, direta
ou indiretamente, da licitação ou da execução das obras ou serviços (L. 9074/95, art. 31; L. 11.079/04, art. 3º,
caput e § 1º; Dec. 5.977/06), diferentemente do que ocorre nos contratos administrativos em geral (art. 9º, I e II,
da L. 8.666/93).

Concessões patrocinadas: concessões de serviços públicos a serem prestados pelo concessionário aos
administrados – incluindo exploração de obra pública – que envolvem o pagamento de adicional de tarifa pela
Administração. Regime remuneratório: cobrança de tarifa dos usuários + contraprestação do concedente em
forma pecuniária. MSZP observa que embora o art. 2o, §1o, da Lei 11.079 fale em contraprestação pecuniária, a
contraprestação pode assumir todas as formas previstas no art. 6 o da lei, o que significa que nem sempre será
paga diretamente pelo poder público, “já que a lei permite que esse pagamento seja efetuado de forma indireta”.
Regime contratual: há direito do concessionário à homologação tácita do reajuste ou correção do preço. Há
possibilidade de cláusulas contratuais para proteção dos agentes financeiros que contrataram com o
concessionário (ex.: assunção do controle acionário do concessionário diretamente pelo BNDES - há limite legal
de 70% para operação de crédito, salvo Norte, Nordeste e Centro-Oeste: 80% e 90%). É outorgada apenas a
sociedade de propósito específico, criada exclusivamente para tal fim. A alocação de riscos é matéria contratual.
A licitação é por concorrência tradicional ou por concorrência-pregão (julgamento primeiro e exame da habilitação
do vencedor depois). A Lei 8.987/95 é aplicada de forma subsidiária (exceto quanto à sub-concessão, que é
incabível). As concessões comuns também envolvem prestação de serviços públicos aos administrados, mas não
há adicional de tarifa pela Administração (aplica-se só a Lei 8.987/95 e não a Lei da PPP). É possível que a concessão
comum se transforme em concessão patrocinada, alterando-se o regime remuneratório (a alteração do contrato
será lícita e não importará violação à isonomia).

Concessões administrativas: é nova fórmula contratual para a Administração obter serviços, seja usuária
direta (6º, Lei 8.666/93) ou indireta (175 CR; art. 2o, §2o, Lei 11.079). Têm a mesma lógica econômico-contratual
da concessão tradicional (investimento inicial, vigência por longo prazo, remuneração vinculada a resultados,
flexibilização na escolha de meios para atingir os fins previstos nos contratos), acrescida de sistema de garantias e
destinada a serviços administrativos em geral (infra-estrutura pública penitenciária, policial, educacional,
sanitária, salvo as atividades exclusivas do Estado, como poder de polícia). Antes tais serviços só eram possíveis
mediante o contrato administrativo de serviço da Lei 8.666/93, que continua a existir. Mas aqui a definição do
objeto e modo de prestação do serviço não precisa ser exaustiva, o contratado fará investimento mínimo de R$10
milhões (não há discriminação contra entes federados pobres, pois simplesmente podem se valer dos contratos
administrativos comuns), o serviço será prestado por no mínimo 5 anos (prazo de amortização em favor da
Administração) e no máximo 35 anos, e a remuneração dependerá da fruição dos resultados (não mais derivando
automaticamente da execução da prestação). Regime remuneratório: concessionário não recebe tarifas dos
usuários, mas há contraprestação do concedente. MSZP observa que “não há impedimento a que o concessionário
receba recursos de outras fontes de receitas complementares, acessórias, alternativas ou decorrentes de projetos
associados, até porque o inciso V do artigo 6o, ao falar em “outros meios admitidos em lei”, deixa claro que a
indicação das formas de contraprestação não é taxativa. Regime contratual: igual ao das patrocinadas. Para fins
de garantia do pagamento de obrigações pecuniárias federais foi concebida uma entidade jurídica nova: o Fundo
Garantidor de Parcerias Público-Privadas - FGP (se enquadra no gênero “empresa pública”, seu capital é todo
público, mas o patrimônio é constituído por bens privados oriundos de bens públicos transferidos ou desafetados,
cuja execução não obedece ao art. 100 CF, mas à execução extrajudicial do CPC, sendo gerente necessariamente

122
instituição financeira federal). A Lei 11.079 especificou, para aplicação suplementar, alguns dispositivos das Leis
8.987/95 (arts. 21, 23, 25, 27-39) e 9.074/95 (art. 31).
QUESTÕES JÁ COBRADAS EM EXAME ORAL: (26º CPR – Oral) PPP's: valor e prazo.

12. PROCESSO ADMINISTRATIVO


12.1 Processo e procedimento administrativo. A instância administrativa. (23.b)
12.2 Regime disciplinar e processo administrativo disciplinar. (20.a)

23B. Processo e procedimento administrativo. A instância administrativa.


Renata Muniz.
Fonte. Graal do 28º e Manual de Direito Administrativo. Carvalho Filho, 31 ed. 2017.

1. Noções Gerais. Esses institutos possuem fundamento constitucional no direito de petição, como
possibilidade do cidadão obter informações ou o reparo de ilegalidades. (CR, 5º, XXXIV). O processo, caracterizado
como uma marcha adiante, é o meio de que o Estado se utiliza para atingir seus fins, seja na seara judicial,
legislativa ou administrativa, conforme o devido processo legal. A instauração do processo administrativo é
obrigatória quando o exercício da autotutela produzir efeito na esfera de interesses individuais (REsp 1090884).
Para o STJ, a Lei nº 9.784/99 pode ser aplicada de forma subsidiária no âmbito dos demais Estados-Membros, se
ausente lei própria regulando o processo administrativo no âmbito local (REsp 1148460).
2. Conceito de procedimento. Série de atos coordenados para a realização dos fins estatais.
3. PROCESSO E PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. Processo: Relação jurídica integrada por
pessoas que nela exercem atividades direcionadas para determinado fim, existindo nas três funções do Estado:
processo legislativo, processo administrativo e processo judicial. Procedimento administrativo: Modo pelo qual
os diversos atos se relacionam na série constitutiva de um processo. Para Carvalho Filho, é inadequada a
expressão procedimento administrativo como substituta de processo administrativo, pois não são figuras
antagônicas, mas ligadas entre si: todo processo demanda uma tramitação de atos, que seria o procedimento.
Diferença entre processo judicial e administrativo: Além da diversidade de julgador (Administração Pública e
Judiciário), no processo administrativo o Estado é, ao mesmo tempo, parte e julgador, não ocorrendo a coisa
julgada judicial, mas tão somente a coisa julgada administrativa. O processo administrativo pode iniciar-se de
ofício ou a pedido do interessado (não se aplica o princípio da inércia). São capazes, para fins de processo
administrativo, os maiores de dezoito anos, ressalvada previsão especial em ato normativo próprio. Tipos de
processo administrativo: gracioso (sem lide) e o contencioso (com lide, ou seja, com interesses contrapostos,
como no processo administrativo disciplinar).
Princípios de processo administrativo: a) legalidade: dever de atuação conforme a lei e o direito; b)
finalidade: atendimento a fins de interesse geral, vedada a renúncia total ou parcial de poderes ou competências,
salvo autorização em lei; c) impessoalidade: objetividade no atendimento do interesse público, vedada a
promoção pessoal de agentes ou autoridades; d) moralidade: atuação segundo padrões éticos de probidade,
decoro e boa-fé; e) publicidade: divulgação oficial dos atos administrativos, ressalvadas as hipóteses de sigilo
previstas na Constituição; f) razoabilidade ou proporcionalidade: adequação entre meios e fins, vedada a
imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao
atendimento do interesse público; g) motivação: indicação dos pressupostos de fato e de direito que
determinarem a decisão; h) segurança jurídica: observância das formalidades essenciais à garantia dos direitos
dos administrados, bem como interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o
atendimento do fim público a que se dirige, vedada a aplicação retroativa de nova interpretação; i) informalismo:
os atos só dependem de forma determinada quando a lei expressamente exigir. Atenção: os atos devem ser
produzidos por escrito, em vernáculo, com data, local e assinatura da autoridade responsável (art. 22, § 1° da
Lei 9.784); j) gratuidade: proibição de cobrança de despesas processuais, ressalvadas as previstas em lei; k)
oficialidade ou impulso oficial: impulsão, de ofício, do processo administrativo, inclusive na busca de provas
(verdade material), sem prejuízo da atuação dos interessados; l) contraditório e ampla defesa: garantia dos
direitos à comunicação, à apresentação de alegações e à produção de provas, nos processos de que possam

123
resultar agravamento da situação e outras situações de litígio. SV 5: “A falta de defesa técnica por advogado no
processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição”. Obs.: no procedimento disciplinar que apura falta
grave de apenado, STF e STJ entendem necessária a presença de advogado (STF, RE398269; STJ, HC171364).

SV 3: “Nos processos perante o Tribunal de Contas da União asseguram-se o contraditório e a ampla defesa
quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado,
excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão”. Atenção:
a concessão inicial não necessita de contraditório porque, nesse momento, a relação travada é entre TCU e
Administração. Mas, após a concessão definitiva, é necessário instaurar processo administrativo e observar o
contraditório (STF, MS 24268). O mesmo se aplica no caso de inércia superior a 5 anos a partir do registro do
protocolo do processo no TCU, porque, após esse prazo o aposentado ou pensionista tem justa expectativa
quanto ao recebimento de verba alimentar (STF, MS 25.116).

O processo inicia-se perante a autoridade competente de menor nível hierárquico. A instrução é


promovida de ofício, mas os interessados podem propor provas. As propostas podem ser recusadas se forem
ilícitas, impertinentes, desnecessárias ou protelatórias. São inadmissíveis as obtidas por meios ilícitos. Aplica-se
a regra de que aquele que alega tem o ônus de provar. A intimação deve ser feita por meio que assegure a
ciência do interessado. A mera publicação só é possível no caso de interessados indeterminados, desconhecidos
ou com domicílio indefinido. Atenção: a revelia não importa reconhecimento da verdade dos fatos, em razão do
princípio da verdade material, que é consectário do princípio da oficialidade. Se um parecer obrigatório e
vinculante deixar de ser emitido no prazo fixado, o processo não terá seguimento até a respectiva
apresentação. Se o mencionado parecer for obrigatório e não vinculante, o processo poderá ter prosseguimento
e ser decidido com sua dispensa. Após o encerramento da instrução, o interessado terá o direito de manifestar-
se no prazo máximo de dez dias, salvo se outro prazo for legalmente fixado. Encerrada a instrução, a
Administração tem até trinta dias para decidir, salvo prorrogação motivada, por igual período. O interessado pode
desistir, total ou parcialmente, ou renunciar ao direito.
Os recursos administrativos não têm efeito suspensivo, podendo ser interpostos no prazo de 10 dias da
ciência ou divulgação da decisão, por: a) que for parte no processo; b) aqueles cujos direitos ou interesses forem
indiretamente afetados pela decisão recorrida; c) as organizações e associações representativas, no tocante a
direitos e interesses coletivos; d) os cidadãos ou associações, quanto a direitos ou interesses difusos. A
Administração tem o prazo de 30 dias para decidir o recurso. A autoridade recorrida tem 5 dias para reconsiderar,
devendo remeter os autos à Autoridade julgadora, após esse prazo. Os recursos intempestivos não serão
conhecidos, mas a Administração Pública pode rever a decisão em favor do Administrado de ofício, desde que
não consumada a prescrição judicial da pretensão do particular (art. 63, § 2°, da Lei 9.784). Conforme a SV 21, “É
inconstitucional a exigência de depósito ou arrolamento prévio de dinheiro ou bens para admissibilidade de
recurso administrativo”. Haverá no máximo 3 instâncias administrativas, salvo disposição legal. É possível a
reformatio em pejus, mas a lei exige a ciência ao recorrente para que possa apresentar alegações antes da
decisão (art. 64, p.u., Lei 9.784/99). Quando o recorrente alegar contrariedade a SV, a autoridade recorrida
deverá reconsiderar a decisão ou esclarecer sobre a inaplicabilidade da súmula. A autoridade que julgar o
recurso, por sua vez, deve tratar da aplicabilidade ou não da súmula ao caso.

4. A INSTÂNCIA ADMINISTRATIVA: Meio do qual o Estado se utiliza para promover o processo


administrativo, podendo ser classificado em: a) sistema da jurisdição una: todas as causas podem ser julgadas
pelo Judiciário, inspirada no modelo inglês, atualmente utilizado no Brasil (CF, 5º XXXV). Obs.: Salvo expressa
disposição legal, não é necessário o esgotamento da instância administrativa para ingressar na via judicial; b)
sistema do contencioso administrativo: inspirado no modelo francês, caracteriza-se pela repartição da função
jurisdicional entre o Judiciário e Tribunais administrativos, encabeçados por um Conselho de Estado (Obs.: não
existe contencioso administrativo nesses moldes no Brasil).

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Sindicância administrativa: meio sumário de que se utiliza a Administração para sigilosa ou publicamente
proceder à apuração de ocorrências anômalas no serviço público, que caso confirmadas fornecerão elementos
concretos para a imediata abertura de processo administrativo disciplinar (caso tenha o poder de punir o
investigado, mesmo em casos de penas leves, deve observar o contraditório e a ampla defesa).

20A. Regime disciplinar e processo administrativo-disciplinar.

José Moreira Falcão Neto. 30/08/2018

Regime disciplinar e processo administrativo-disiciplinar: em instância administrativa, parcialmente


independente da penal, por violação aos deveres funcionais. Sanções disciplinares (art. 127 c/c 142): advertência
(prescreve em 180 dias), suspensão (prescreve em 180 dias ou 2 anos), demissão (prescreve em 5 anos), cassação
de aposentadoria (5 anos), destituição de cargo em comissão. Caso a infração também seja capitulada como crime
e haja persecução penal (inquérito, processo etc), aplicam-se os prazos prescricionais previstos na lei penal (art.
142, §2o). Prazo do PAD: 60 + 60, a contar da constituição da comissão. Não é prazo para julgamento pela
autoridade, apenas para a conclusão do PAD, que possui mais 20 dias para decidir.

13. CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA


13.1 Controle jurisdicional da Administração Pública. Sistemas. A teoria da Reserva do possiv́el. (11.a)
13.2 Representação e reclamação administrativas. Pedido de reconsideração e recurso hierárquico próprio e
impróprio. Prescrição administrativa. (23.b)
13.3 Controle interno e externo da Administração Pública. Ombudsman. Procurador Federal dos Direitos do
Cidadão. (10.a)

11A. Controle Jurisdicional da Administração Pública. Sistemas. A teoria da reserva do possível.

Luísa Maffei Costa 07/09/18

I. Controle Jurisdicional da Administração Pública

O controle jurisdicional envolve a apreciação pelo Poder Judiciário da juridicidade dos atos oriundos dos Poderes
Executivo, Legislativo e do próprio Judiciário.
O controle judicial constitui, juntamente com o princípio da legalidade, um dos fundamentos em que repousa o
Estado de Direito. De nada adiantaria sujeitar-se a Administração Pública à lei se seus atos não pudessem ser
controlados por um órgão dotado de garantias de imparcialidade que permitam apreciar e invalidar os atos ilícitos
por ela praticados.
O controle jurisdicional sobre os atos oriundos dos demais Poderes (Executivo e Legislativo) restringe aos aspectos
de legalidade (juridicidade), sendo vedado ao Poder Judiciário substituir-se ao administrador e ao legislador para
definir, dentro da moldura normativa, qual a decisão mais conveniente ou oportuna para o atendimento do
interesse público, sob pena de afronta ao princípio constitucional da separação de poderes. Dessa forma, o
Judiciário deve invalidar os atos ilegais da Administração, mas não pode revogá-los por razões de conveniência e
oportunidade.
A implementação do controle judicial dos atos administrativos em harmonia com as exigências de legitimidade
democrática e de eficiência administrativa depende do reconhecimento das limitações institucionais do Poder
Judiciário. Nesse contexto, há cinco tendências do controle judicial da atividade administrativa:
a) Relativização do formalismo e ênfase no resultado: supressão de controles meramente formais ou cujo custo
seja evidentemente superior ao risco e predomínio da verificação das consequências da ação administrativa. Ex.:
não obstante a nulidade dos contratos administrativos verbais, na forma do art. 60, parágrafo único, da Lei
8.666/1993, tem prevalecido o entendimento doutrinário e jurisprudencial no sentido de que deve haver o
pagamento por parte do Estado, tendo em vista a boa-fé do contratado e o princípio que veda o enriquecimento
sem causa do Poder Público, que efetivamente se beneficiou da execução da avença.

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b) Predomínio do controle a posteriori em detrimento do controle preventivo: o intuito é evitar que os órgãos
de controle se transformem em administradores ou gestores. No tocante ao Judiciário, ainda que sejam ampliados
os mecanismos de controle de eventuais omissões estatais, a atuação judicial deve ser limitada à fixação de prazos
e parâmetros para que o administrador e o legislador formulem as políticas públicas, evitando-se, com isso, a
instituição do juiz-administrador. Isto não quer dizer que o controle preventivo não seja importante ou necessário,
mas não devem ser admitidos excessos que invertam a ordem da separação de poderes. Ex.: em que pese a
possibilidade de solicitação pelos Tribunais de Contas e órgãos de controle interno, até o dia útil imediatamente
anterior à data de recebimento das propostas, de “cópia de edital de licitação já publicado” para fins de controle,
conforme previsão contida no art. 113, § 2.º, da Lei 8.666/1993, o STF declarou a inconstitucionalidade de norma
que estipulava o dever genérico de envio de todas as minutas de editais de licitação e de contratos à Corte de
Contas, tendo em vista o princípio da separação de poderes.
c) Controle judicial primordialmente ablativo e não substitutivo: a atividade judicial, em respeito às capacidades
das instituições dos demais Poderes (teoria dos diálogos institucionais) e às próprias limitações institucionais do
Poder Judiciário (ex.: ausência de visão sistêmica das questões; falta de aparelhamento técnico adequado para
análise de questões complexas que demandam conhecimentos extrajurídicos; exiguidade do tempo e excesso de
trabalho para prolação de decisões rápidas etc.), deve ser predominantemente corretiva da atividade
administrativa, sem substituí-la. Há, aqui, um equilíbrio entre o controle judicial (judicial review) e a democracia,
uma vez que o Judiciário corrige os desvios das ações/omissões administrativas sem afastar a reavaliação das
decisões estatais pelas instâncias democráticas, notadamente nas questões que envolvem discricionariedade
administrativa. Ex.: em relação ao controle dos atos regulatórios, o STJ reconheceu a impossibilidade de
intromissão do Judiciário na decisão final quanto à emissão pela ANATEL de autorização para funcionamento de
rádio comunitária, tendo em vista tratar-se de questão eminentemente técnica e complexa. Todavia, em razão
de demora desproporcional em relação ao requerimento feito por entidade privada, o Judiciário pode assinalar
prazo para que a Agência resolva o requerimento de autorização de funcionamento da emissora, em razão dos
princípios da eficiência e da moralidade.
d) Reforço da legitimidade das decisões judiciais: necessidade de maior legitimidade democrática da atuação
jurisdicional, com destaque para exigências reforçadas de fundamentação das decisões judiciais e diálogo com a
sociedade (democracia deliberativa). Por essa razão, tem sido cada vez mais comum a presença do amicus curiae
no controle concentrado de constitucionalidade dos atos normativos (art. 7.º, § 2.º, da Lei 9.868/1999), bem como
a realização de audiências públicas (art. 9.º, § 1.º, da Lei 9.868/1999).26 Ex.: em 2008, o STF realizou audiências
públicas no processo em que se discutia a (anti)juridicidade do aborto do feto anencéfalo (ADPF 54/DF) e, em
2009, para coleta de informações relacionadas ao direito à saúde, objeto de diversos processos perante a Corte.
e) Novos mecanismos de controle social e deferência judicial: o ordenamento jurídico tem previsto, de forma
crescente, instrumentos de participação do cidadão na elaboração de políticas públicas, bem como no controle
da ação administrativa. Ex.: a Lei 9.784/1999, que dispõe sobre o processo administrativo federal, prevê, nos arts.
31 a 35, a realização de consultas e audiências públicas, bem como outras formas de participação do administrado
na tomada de decisões em processos administrativos em geral; as leis de criação das agências reguladoras,
outrossim, estabelecem instrumentos de participação do cidadão (usuário) na regulação do respectivo setor,
como forma de reforçar a legitimação democrática da regulação (ANEEL – art. 4.º, § 3.º, da Lei 9.427/1996;
ANATEL – arts. 3.º, X e XI, e 89, II, da Lei 9.472/1997; ANP – art. 19 da Lei 9.478/1997 etc.). A participação popular
em procedimentos administrativos permite a elaboração da decisão pública a partir das necessidades e
expectativas da sociedade civil. Com isso, a atuação administrativa torna-se potencialmente mais adequada e
legítima, evitando discussões posteriores que tendem a gerar instabilidade social. O próprio Judiciário,
eventualmente provocado, deve assumir uma posição de maior deferência à legitimidade reforçada da decisão
administrativa, apenas invalidando-a em casos de reconhecida e notória ilegalidade.
Com base no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição, que serve de fundamento para o direito de ação ou de
exceção contra lesão ou ameaça a direito, o administrado pode utilizar dos vários tipos de ações previstos na
legislação ordinária, para impugnar os atos da Administração; pode propor ações de indenização, possessórias,
reivindicatórias, de consignação em pagamento, cautelar etc.
Mas a Constituição prevê ações específicas de controle da Administração Pública, às quais a doutrina se refere
com a denominação de remédios constitucionais. São assim chamadas porque têm a natureza de garantias dos
direitos fundamentais; estão inseridas no Título II da Constituição, concernente aos “direitos e garantias

126
fundamentais”: o seu objetivo é provocar a intervenção de autoridades, em geral a judiciária, para corrigir os atos
da Administração lesivos de direitos individuais ou coletivos. Têm, porém, a dupla natureza de direitos e de
garantias. São direitos em sentido instrumental, da mesma forma que o é o direito de ação decorrente do inciso
XXXV do artigo 5º, e são garantias porque reconhecidos com o objetivo de resguardar outros direitos
fundamentais (em sentido material) previstos no artigo 5º.
São remédios constitucionais o habeas corpus, o habeas data, o mandado de segurança individual, o mandado
de segurança coletivo, o mandado de injunção, a ação popular e o direito de petição; ressalvado este último,
todos os demais são meios de provocar o controle jurisdicional de ato da Administração. Eventualmente, a ação
civil pública, embora não prevista no artigo 5º da Constituição, serve à mesma finalidade, quando o ato lesivo
seja praticado pela Administração. O mandado de segurança individual, o habeas data, o habeas corpus e o
mandado de injunção são garantias de direitos individuais; o mandado de segurança coletivo, a ação popular e a
ação civil pública são garantias de interesses coletivos ou difusos, ainda que acessoriamente possam garantir
também interesses individuais.
Meios de controle:
Habeas protege o direito de locomoção (art. 5º, LXVIII, da CF); não cabível em relação a punições
corpus disciplinares militares (art. 142, § 2º, da CF); é gratuito; pode ser impetrado por qualquer pessoa,
nacional ou estrangeira, em benefício próprio ou de terceiro; tem como pressupostos: 1.
ilegalidade ou abuso de poder, por parte de autoridade pública ou de particular; 2. violência,
coação ou ameaça à liberdade de locomoção
Habeas protege o direito à informação sobre a pessoa (art. 5º, LXXII, da CF; Lei nº 9.507, de 12-11-97) e
data não o direito à informação do art. 5º, XXXIII, da CF (passível de proteção via mandado de
segurança); objetivo: conhecer e retificar informações sobre a pessoa, constantes de registros ou
bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público; Súmula 2, do STJ: “não cabe
habeas data se não houver recusa por parte da autoridade administrativa”; mesma restrição no
art. 8º, parágrafo único, da Lei nº 9.507; – sujeito ativo: pessoa, brasileira ou estrangeira, a que se
refere a informação; – sujeito passivo: entidade governamental ou de caráter público que tenha
registro ou banco de dados sobre a pessoa; – objeto: informação, retificação ou anotação de
esclarecimentos ou justificativas; – processo: rito sumaríssimo: despacho inicial, notificação à
autoridade coatora para prestar informações no prazo de 10 dias; audiência do MP no prazo de 5
dias; sentença no prazo de 5 dias; – execução: por comunicação ao coator; – recursos: apelação
contra o indeferimento, apelação da decisão de mérito (com efeito devolutivo, se a sentença for
concessiva do habeas data), agravo contra decisão do Presidente do Tribunal ao qual competir o
conhecimento do recurso que suspender a execução da sentença; – outras características:
possibilidade de renovação do pedido de habeas data, se a decisão denegatória não apreciou o
mérito; prioridade do processo sobre todos os demais, exceto habeas corpus e mandado de
segurança; gratuidade do processo administrativo e judicial
Mandado cabível quando a falta de norma regulamentadora tornar inviável o exercício dos direitos e
de liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania
injunção (art. 5º, LXXI, da CF; Lei nº 13.300, de 23-6-16); – objeto: regulamentação provisória
(entendimento do STF); ou seja, o Judiciário supre a omissão do legislador, dizendo o conteúdo da
norma que se aplicará no caso concreto; definição do objeto pelo art. 8º da Lei nº 13.300: fixação
de prazo para que o impetrado edite a norma regulamentadora e, na mesma decisão, condições
em que o direito poderá ser exercido se não editada a norma no prazo estabelecido; –
pressupostos: omissão de norma de natureza regulamentar ou legal, de competência de qualquer
das autoridades, órgãos e pessoas jurídicas dos três Poderes, inclusive da administração indireta;
omissão total ou parcial que torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais; –
modalidades: mandado de injunção individual (para garantir o exercício de direitos de pessoas
físicas ou jurídicas determinadas) e coletivo (interposto pelas entidades indicadas no art. 12 da Lei
nº 13.300 para defesa de interesses de uma coletividade indeterminada de pessoas); – legitimados
ativos: indicados no art. 3º da Lei nº 13.300 (mandado de injunção individual), e no art. 12
(mandado de injunção coletivo); – legitimado passivo: autoridades competentes para emitir a

127
norma regulamentadora; – rito: sumaríssimo; semelhante ao do mandado de segurança e habeas
data; – efeitos da sentença: apenas entre as partes, salvo se a eficácia ultra partes ou erga omnes
for inerente ou indispensável ao exercício do direito; possibilidade de extensão dos efeitos aos
casos análogos por decisão monocrática do relator; perduram até o advento da norma
regulamentadora; – coisa julgada no mandado de segurança coletivo: apenas em relação às
pessoas integrantes da coletividade, grupo, classe ou categoria substituídos pelo impetrante; em
caso de demanda individual concomitante, deverá haver pedido de desistência para que o
impetrante se beneficie dos efeitos da decisão coletiva; – recursos: agravo, no prazo de 5 dias,
contra a decisão do relator que indeferir o pedido; demais recursos do CPC (aplicação subsidiária
previsto no art. 14 da Lei nº 13.300)
Mandado art. 5º, LXIX, da CF; Lei nº 12.016, de 7-8-09; – conceito: é a ação civil de rito sumaríssimo pela qual
de qualquer pessoa física ou jurídica pode provocar o controle jurisdicional quando sofrer lesão ou
segurança ameaça de lesão a direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus nem habeas data, em
individual decorrência de ato de autoridade, praticado com ilegalidade ou abuso de poder; – pressupostos:
a) ato de autoridade (praticado por pessoa investida de uma parcela de poder público): atos de
agentes da administração pública direta ou indireta, e de particulares que ajam por delegação do
poder público e nos limites da delegação; Súmula 510, do STF: “praticado o ato por autoridade, no
exercício de competência delegada, contra ela cabe o mandado de segurança ou medida judicial”;
– hipóteses aceitas pela jurisprudência: mandado de segurança contra agentes de
estabelecimentos particulares de ensino, sindicatos (no que diz respeito à cobrança de
contribuição sindical), agentes financeiros que executam planos governamentais, serviços sociais
autônomos; b) ilegalidade ou abuso de poder: vícios quanto aos elementos do ato administrativo
(sujeito, objeto, forma, motivo ou finalidade); c) lesão ou ameaça de lesão: mandado de segurança
repressivo ou preventivo; d) direito líquido e certo: comprovado de plano; os fatos devem estar
comprovados juntamente com a petição inicial; possibilidade de requisição, de ofício, pelo juiz, se
o documento estiver em poder de terceiro que se recuse a entregá-lo; possibilidade de juntada
posterior de parecer jurídico; – requisitos: (i) certeza quanto aos fatos; (ii) certeza jurídica (o direito
deve decorrer de norma expressa); (iii) direito subjetivo (e não simples interesse) próprio do
impetrante, ressalvada a possibilidade de a pessoa jurídica defender direito individual de seu
associado); (iv) objeto determinado (impossibilidade de pleitear prestações indeterminadas,
genéricas, fungíveis ou alternativas, salvo na hipótese de pedido de pagamento de vencimentos e
vantagens pecuniárias de servidor público, conforme art. 29 da Lei nº 12.016, hipótese em que o
pagamento abrangerá as parcelas devidas a partir do ajuizamento da ação); – restrições quanto
ao cabimento de mandado de segurança: (i) para assegurar a liberdade de locomoção, protegida
por habeas corpus (art. 5º, LXIX, da CF); (ii) nos casos em que cabe habeas data; (iii) para corrigir
lesão decorrente de lei em tese (Súmula 266 do STF), salvo caso de lei de efeito concreto (que tem
a forma de lei, mas o conteúdo de ato administrativo) e de lei autoexecutória (que independe de
ato administrativo para aplicar-se aos casos concretos); possibilidade de mandado de segurança
preventivo, para evitar a concretização da ameaça de lesão; (iv) contra ato do qual caiba recurso
com efeito suspensivo, independente de caução (art. 5º, I, da Lei nº 12.016); possibilidade de
impetração se o interessado deixou transcorrer o prazo, sem recorrer administrativamente;
possível a impetração em caso de omissão do poder público (Súmula 429 do STF); (v) contra
decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo (art. 5º, II, da Lei nº 12.016);
cabimento de mandado de segurança para dar efeito suspensivo a agravo; (vi) contra decisão
judicial transitada em julgado; – rito sumaríssimo: despacho da inicial, com ou sem concessão de
liminar, e notificação da autoridade coatora para prestar informações no prazo de 10 dias;
audiência do MP no prazo de 10 dias; sentença no prazo de 30 dias; – legitimado ativo: pessoa,
física ou jurídica, pública ou privada, órgão ou universalidade patrimonial, titular de direito líquido
e certo, lesado ou ameaçado de lesão; possibilidade de litisconsórcio, não admitido após o
despacho da inicial; – legitimado passivo: pessoa jurídica de direito público ou privado no exercício
de atribuições do poder público (embora o mandado seja impetrado contra a autoridade coatora,
é a pessoa jurídica que sofre os efeitos decorrentes da decisão); litisconsórcio possível (art. 24 da

128
Lei nº 12.016); assistência não é possível (entendimento do STF); – objeto: (i) anulação de ato ilegal
ofensivo a direito líquido e certo; (ii) a prática de ato omitido; (iii) ordem de não fazer (mandado
de segurança preventivo); – causa de pedir: ilegalidade ou abuso de poder e lesão ou ameaça de
lesão a direito líquido e certo; – sentença: mandamental e de execução imediata; só no caso de
pagamento de vantagens pecuniárias a servidor público existe liquidação por cálculo do contador;
– recursos: (i) apelação com efeito devolutivo contra a sentença que negue ou conceda a
segurança ou que indefira desde logo o pedido; possibilidade de execução provisória, exceto nas
hipóteses do art. 7º, § 2º, da Lei nº 12.016; (ii) recurso de ofício da sentença que conceder
mandado de segurança; (iii) agravo de instrumento da decisão do juiz de 1º grau que conceder ou
denegar a liminar; (iv) agravo de decisão do relator que conceder ou denegar a liminar; (v) agravo,
sem efeito suspensivo, da decisão do Presidente do Tribunal que suspender a execução da
sentença ou da liminar para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia pública
(art. 15 da Lei nº 12.016); (vi) recurso especial e extraordinário nas hipóteses previstas nos arts.
105, III, e 102, III, da CF; (vii) recurso ordinário ao STF contra decisão denegatória, em única
instância, dos Tribunais Superiores (art. 102, II, a, da CF); – legitimados para recorrer: pessoa
jurídica e autoridade coatora (art. 14, § 2º, da Lei nº 12.016), além do terceiro prejudicado (art.
996 do CPC); – possibilidade de renovação do pedido de mandado de segurança: dentro do prazo
decadencial, se a decisão denegatória não houver apreciado o mérito; decisão denegatória, não
fazendo coisa julgada contra o impetrante, não impede o uso de ação própria (Súmula 304, do
STF); – requisitos para concessão de liminar: que seja relevante o fundamento e do ato impugnado
possa resultar a ineficácia da medida, caso seja deferida; possibilidade de suspensão da liminar, a
pedido da pessoa jurídica interessada, para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à
economia popular; – prazo para impetração: 120 dias (decadência); início do prazo: (i) do ato lesivo
já praticado; (ii) se o recurso administrativo tiver efeito suspensivo: o prazo começa a correr
quando decidido o último recurso ou quando se esgotar o prazo para recorrer
administrativamente; (iii) em caso de mandado de segurança contra omissão: a partir da data em
que se encerrar o prazo para a Administração praticar o ato omitido; se não houver prazo para a
prática do ato administrativo: não se cogita de prazo para o mandado de segurança; (iv) em caso
de ameaça de lesão: não se cogita de decadência.
Mandado art. 5º, LXX, da CF; Lei nº 12.016/09. – pressupostos: os mesmos do mandado de segurança
de individual; – sujeito ativo: a) partido político com representação no Congresso Nacional; b)
segurança organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em
coletivo funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados;
– objeto: no caso dos partidos políticos, o objeto é a proteção dos “interesses legítimos relativos
a seus integrantes” e as “finalidades partidárias” (art. 21 da Lei nº 12.016); finalidades partidárias
são as definidas no art. 1º da Lei nº 9.096, de 19-9-95: autenticidade do sistema representativo e
defesa dos direitos humanos fundamentais definidos na CF; no caso dos sindicatos, o objeto é
apenas a “defesa dos interesses de seus membros ou associados”; – interesses protegidos: (i) os
coletivos (transindividuais, de natureza indivisível, de que seja titular grupo ou categoria de
pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica básica); (ii) os individuais
homogêneos (decorrentes de origem comum e da atividade ou situação específica da totalidade
ou de parte dos associados ou membros do impetrante); – desnecessidade de autorização
expressa: art. 21 da Lei nº 12.016, parte final; e Súmula 629 do STF; – processo: o mesmo do
mandado de segurança individual; – sentença: efeitos erga omnes; a coisa julgada não impede a
propositura de mandado de segurança individual, se a sentença for desfavorável no mandado de
segurança coletivo
Ação art. 5º, LXXIII, da CF; Lei nº 4.717, de 29-6-65. – conceito: é a ação civil pela qual qualquer cidadão
popular pode pleitear a invalidação de atos praticados pelo poder público ou entidades de que participe,
lesivos ao patrimônio público, ao meio ambiente, à moralidade administrativa ou ao patrimônio
histórico e cultural, bem como a condenação por perdas e danos dos responsáveis pela lesão; –
pressupostos: a) qualidade de cidadão no sujeito ativo: brasileiro, nato ou naturalizado, que está

129
no gozo dos direitos políticos de votar e ser votado; b) ilegalidade ou imoralidade praticada pelo
Poder Público ou entidade de que ele participe; definição, no art. 2º da Lei nº 4.717, de atos nulos
(em relação a cada um dos elementos do ato administrativo) e atos anuláveis (qualquer outro vício
não incluído no conceito de atos nulos); a imoralidade (não definida na Lei nº 4.717, porque só
prevista na CF de 1988) constitui fundamento autônomo para propositura da ação popular; c)
lesão ao patrimônio público, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio
histórico e cultural; abrange o patrimônio das entidades referidas no art. 1º da Lei nº 4.717;
mesmo pressuposto da ação civil pública, distinguindo-se da mesma quanto ao sujeito ativo e
passivo; possibilidade de propositura de ação popular preventiva, em caso de ameaça de lesão; a
lesão ou ameaça de lesão pode resultar de ato ou omissão, desde que produza efeitos concretos;
inadmissível ação popular contra lei em tese, salvo se for lei de efeitos concretos ou
autoexecutória; – inadmissibilidade de ação popular contra ato judicial: se a decisão não é
definitiva, deve ser impugnada pelos recursos previstos em lei ou, na falta deles, por mandado de
segurança; se já se tornou definitiva, pelo trânsito em julgado, só pode ser impugnado por ação
rescisória; – sujeito ativo: o cidadão; possibilidade de litisconsórcio ativo facultativo (art. 6º, § 5º,
da Lei nº 4.717) e de sucessão (possibilidade de o MP ou qualquer cidadão dar continuidade à ação
se o autor desistir ou der causa à absolvição de instância, conforme art. 9º da Lei nº 4.717,
combinado com os arts. 485, II, III e VIII, do CPC); – sujeito passivo: (i) pessoas jurídicas, públicas
ou privadas, de que emanou o ato; (ii) autoridades, funcionários ou administradores, que
houverem autorizado, aprovado, ratificado ou praticado o ato impugnado ou que, por omissão,
tiverem dado oportunidade à lesão; (iii) os beneficiários diretos do mesmo, se houver;
litisconsórcio passivo necessário; – opções da pessoa jurídica de que emanou o ato: (i) contestar a
ação; (ii) abster-se de contestar; (iii) atuar ao lado do autor; – funções obrigatórias do MP: (i)
acompanhar a ação (art. 6º, § 4º, da Lei nº 4.717); (ii) promover a responsabilidade, civil ou
criminal, dos que nela incidirem, atuando como autor (mesmo artigo); (iii) providenciar para que
as requisições de documentos e informações previstas no art. 7º, I, b, sejam atendidas dentro dos
prazos fixados pelo juiz (art. 7º, § 1º); (iv) promover a execução da sentença condenatória quando
o autor não o fizer (art. 16); – funções facultativas do MP: (i) dar continuidade ao processo em
caso de desistência ou de absolvição de instância (art. 9º); (ii) recorrer das decisões contrárias ao
autor (art. 19, § 2º); as duas possibilidades também se aplicam a qualquer cidadão; – vedação ao
MP: defesa do ato impugnado ou dos seus autores (art. 6º, § 4º); – objeto: (i) anulação do ato
lesivo; e (ii) condenação dos responsáveis ao pagamento de perdas e danos ou à restituição de
bens ou valores (art. 14, § 4º); – processo: rito ordinário, com as alterações previstas na Lei nº
4.717: citação de todos os réus; defesa no prazo de 20 dias, prorrogável por mais 20; instrução por
todos os tipos de provas; sentença no prazo de 15 dias, sob pena de perda, na promoção por
antiguidade, de tantos dias quantos forem os do retardamento; possibilidade de liminar; decisão
denegatória sujeita ao duplo grau de jurisdição; possibilidade de recurso por qualquer cidadão e
pelo MP; isenção de custas e do ônus da sucumbência, para o autor (art. 5º, LXXIII, da CF);
prescrição: 5 anos
Ação civil Lei nº 7.347, de 24-7-85, e art. 129, III, da CF – conceito: meio processual de que se podem valer o
pública MP e as pessoas jurídicas indicadas em lei para proteção de interesses difusos e gerais; –
pressupostos: dano ou ameaça de dano a interesse difuso ou coletivo, abrangidos o dano ao
patrimônio público e social, incluindo o dano material e o dano moral; – interesse difuso ou
coletivo: interesses públicos concernentes a grupos indeterminados de pessoas (interesse difuso)
ou a toda a sociedade (interesse geral): abrange: a) proteção ao meio ambiente (art. 225 da CF),
em que a responsabilidade é objetiva (art. 14, § 1º, da Lei nº 6.938, de 31-8-81); b) defesa do
consumidor: prevista como direito individual e coletivo (art. 5º, XXXII, da CF, e como princípio da
ordem econômica (art. 170, V , da CF); c) patrimônio histórico e artístico nacional, definido no art.
1º do Decreto-lei nº 25, de 30-1137 (lei do tombamento); proteção pelo tombamento e pela ação
civil pública (tombamento decorrente de decisão judicial); – Súmula 329 do STJ: “o MP tem
legitimidade para propor ação civil pública em defesa do patrimônio público”; – uso da ação civil
pública para punir os responsáveis por improbidade administrativa; – sujeito ativo: MP, Defensoria

130
Pública, União, Estados, Municípios, autarquias, empresas públicas, fundações, sociedades de
economia mista, bem como as associações constituídas há pelo menos um ano e que incluam entre
as suas finalidades institucionais a proteção a interesse difuso ou coletivo (arts. 129, § 1º, da CF e
5º da Lei nº 7.347); no caso das associações atuando na defesa de interesses ou direitos dos
associados, a sentença abrangerá apenas os substituídos que tenham, na data da propositura da
ação, domicílio no âmbito de competência territorial do órgão prolator (art. 2º-A da Lei nº 7.347);
– sujeito passivo: qualquer pessoa, física ou jurídica, pública ou privada, responsável por dano ou
ameaça de dano a interesse difuso ou geral; – funções do MP: a) atuar como autor; b) fiscal da lei,
quando não for o autor, podendo requisitar de qualquer organismo, público ou privado,
documentos, exames ou perícias, no prazo que assinalar, não inferior a 10 dias (art. 8º, § 1º); ele
atua de ofício ou mediante provocação feita por qualquer pessoa ou por servidor público (art. 6º);
c) promover a execução, se o autor não o fizer no prazo de 60 dias do trânsito em julgado da
sentença condenatória; d) assumir a titularidade ativa, em caso de desistência infundada ou
abandono da ação por entidade associativa (art. 112 do CDC); e) realizar o inquérito civil previsto
no art. 8º, § 1º, da Lei nº 7.347 e no art. 129, III, da CF; – objeto: a) na ação principal: condenação
do réu em perdas e danos, sendo o valor da indenização destinado ao Fundo de Defesa dos Direitos
Difusos (art. 13 da Lei nº 7.347, regulamentado pelo Decreto nº 1.306, de 9-11-94, na esfera
federal, e pelo Decreto 6.536, de 13-11-89, no Estado de São Paulo); b) na ação cautelar:
cumprimento de obrigação de fazer (prestação de atividade ou cessação de atividade nociva), sob
pena de execução específica ou cominação de multa diária; – rito ordinário, podendo ser sumário
nas hipóteses previstas no CPC; cabimento de liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão
passível de agravo; cabimento de agravo de instrumento no caso de concessão de liminar (art. 12
da Lei nº 7.347); possível a suspensão da liminar pelo Presidente do Tribunal a quem competir o
conhecimento do recurso, para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia
pública (art. 12, § 1º); possibilidade de os agravos serem recebidos com efeito suspensivo (art. 14);
sentença com efeito erga omnes, exceto se a ação for julgada procedente por falta de prova,
hipótese em que qualquer legitimado pode intentar outra ação com idêntico fundamento (art. 16);
isenção do pagamento prévio de custas de despesas processuais, salvo comprovada má-fé (art.
18); em caso de litigância de má-fé, a entidade associativa autora e os diretores responsáveis pela
propositura da ação serão solidariamente condenados em honorários advocatícios e o décuplo das
custas, sem prejuízo da responsabilidade por perdas e danos (art. 17); prescrição: aplicação do art.
37, § 5º, da CF, ressalvado o entendimento do STF de que a imprescritibilidade somente se aplica
nas ações de improbidade

II. Sistemas

a) sistema da dualidade de jurisdição (sistema do contencioso administrativo ou da jurisdição administrativa):


originado na França e adotado em diversos países europeus (ex.: Alemanha, Portugal etc.), o sistema consagra
duas ordens de jurisdição:
a.1) ordinária ou comum: exercida pelo Judiciário sobre os atos dos particulares em geral; e
a.2) administrativa: exercida por juízes e Tribunais administrativos, que tem na cúpula o denominado Conselho
de Estado, dotados de forte independência em relação ao Poder Executivo; e
b) sistema da jurisdição una (unidade de jurisdição): de origem inglesa e norte-americana, o sistema atribui ao
Poder Judiciário o poder de decidir de maneira definitiva sobre a juridicidade de todos os atos praticados por
particulares ou pela Administração Pública.
O direito brasileiro adotou o sistema da jurisdição una, pelo qual o Poder Judiciário tem o monopólio da função
jurisdicional, ou seja, do poder de apreciar, com força de coisa julgada, a lesão ou ameaça de lesão a direitos
individuais e coletivos. Afastou, portanto, o sistema da dualidade de jurisdição em que, paralelamente ao Poder
Judiciário, existem os órgãos do Contencioso Administrativo que exercem, como aquele, função jurisdicional
sobre lides de que a Administração Pública seja parte interessada. O fundamento Constitucional do sistema da
unidade de jurisdição é o artigo 5o, inciso XXXV, da Constituição Federal, que proíbe a lei de excluir da apreciação

131
do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. Qualquer que seja o autor da lesão, mesmo o poder público, poderá
o prejudicado ir às vias judiciais.

III. A Teoria da Reserva do Possível

Esta teoria deve ser analisada dentro do contexto dos limites da atuação do Poder Judiciário ao controlar a
Administração. O Judiciário pode: a) apreciar aspectos de legalidade; b) anular atos normativos do Poder
Executivo, por via de ADIN ou ADPF, de competência do STF, ressalvada a competência dos Tribunais de Justiça
para invalidar atos normativos municipais; c) apreciar a legalidade ou constitucionalidade dos atos normativos do
Poder Executivo nos casos concretos, com efeitos entre as partes (art. 97 da CF); d) anular ato administrativo que
contrarie súmula vinculante (art. 103-A da CF); e) apreciar atos políticos que causem lesão a direitos individuais
ou coletivos; f) apreciar atos interna corporis (Regimentos dos órgãos colegiados), se exorbitarem em seu
conteúdo, ferindo direitos individuais e coletivos.
- Controle das políticas públicas: não pode o Judiciário interferir em políticas públicas, quanto aos aspectos de
discricionariedade legislativa ou administrativa; o cumprimento das metas constitucionais exige planejamento e
destinação orçamentária de recursos públicos; na prática, vem ocorrendo a judicialização das políticas públicas,
por diferentes tipos de ações: individuais (interferência é indireta, pela quantidade de ações propostas e julgadas
procedentes) e coletivas (interferência é direta: o juiz julga procedentes pedidos de prestações positivas a toda
uma coletividade de pessoas); aplicabilidade do princípio da reserva do possível (desde que não utilizado com
desvio de poder).
- O princípio da reserva do possível: A origem dessa expressão é da jurisprudência constitucional alemã.
Reserva do possível fática: “a razoabilidade da universalização da prestação exigida, considerando os recursos
efetivamente existentes. Por este critério, se, por exemplo, um portador de determinada doença grave postular
a condenação do Estado a custear o seu tratamento no exterior, onde, pelo maior desenvolvimento tecnológico,
a sua patologia tiver maiores chances de cura, o juiz não deve indagar se o custo decorrente daquela específica
condenação judicial é ou não suportável para o Erário. A pergunta correta a ser feita é sobre a razoabilidade ou
não da decisão do Poder Público de não proporcionar este tratamento fora do país, para todos aqueles que se
encontrem em situação similar à do autor. Trata-se, em suma, de avaliar a legitimidade constitucional de uma
omissão em matéria de política pública, o que demanda um olhar focado não só na árvore, mas em toda a
floresta”.
A reserva do possível jurídica diz respeito, não a existência dos recursos, mas à sua disponibilidade jurídica, a
possibilidade de que os recursos sejam gastos sem infringência da ordem jurídica. O ponto nodal é do orçamento.
Mas além do orçamento, a reserva do possível jurídica também pode envolver a Lei de responsabilidade fiscal
(limite de gastos impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal aos entes).

Em suma, o componente fático diz respeito à efetiva disponibilidade dos recursos econômicos necessários à
satisfação do direito prestacional, enquanto o componente jurídico relaciona-se à existência de autorização
orçamentária para o Estado incorrer nos respectivos custos.

23B. Representação e reclamação administrativas. Pedido de reconsideração e recurso hierárquico próprio e


impróprio. Prescrição administrativa.
Renata Muniz.
Fonte. Graal do 28º e Manual de Direito Administrativo. Carvalho Filho, 31 ed. 2017.

1. REPRESENTAÇÃO. Forma de manifestação administrativa pelo qual o interessado denuncia irregularidades,


ilegalidades e condutas abusivas oriundas de agentes da administração pública, postulando a apuração e a
regularização destas situações, com fundamento constitucional no art. 74 par. 2º CR e 198 CPC (específico contra
juízes que retardam processos além dos prazos), bem como em diversos outros diplomas legislativos.
2. RECLAMAÇÃO ADMINISTRATIVA. Espécie de recurso em que o interessado critica algum serviço da
administração pública ou postula a revisão de ato que lhe prejudica direito ou interesse. Regulamentado no Dec.
20.910/32, extingue-se em um ano caso não exista previsão de outro prazo. Obs.: Existe a previsão de reclamação

132
constitucional na lei 11.417/06 contra ato administrativo que contrarie, negue vigência ou aplique indevidamente
SV. Para Carvalho Filho, trata-se de hipótese de impugnação de caráter jurisdicional e não administrativo (p. 971).
Contra omissão ou ato da administração pública, o uso da reclamação só será admitido após esgotamento das
vias administrativas (art. 7o, §1o, Lei 11.417).
3. PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO. Recurso dirigido à mesma autoridade que praticou o ato recorrido, podendo
ser utilizado independentemente de previsão legal, com fundamento no direito constitucional de petição. Súmula
430 STF – Pedido de reconsideração na via administrativa não interrompe o prazo para MS.
4. RECURSOS HIERÁRQUICOS PRÓPRIOS. Trata- se de recurso inerente à organização escalonada da
administração e pode ser interposto sem necessidade de previsão legal. Diferem-se dos recursos hierárquicos
impróprios8, pois nesses o recorrente se dirige a autoridades em pessoa jurídica distinta daquele de onde se
originou o ato impugnado, não havendo entre o agente recorrido e o prolator da nova decisão relação de
subordinação, mas de vinculação, típica de entidades jurídicas distintas (Ex: recurso para Ministro de Estado
oriundo de Presidente de Autarquia Federal). Esse tipo de recurso exige previsão legal.
5. PRESCRIÇÃO ADMINISTRATIVA. Para HLM seria o escoamento dos prazos para a interposição de recurso no
âmbito da administração, ou para a manifestação da administração sobre a conduta de seus servidores ou sobre
direitos e obrigações dos particulares perante o poder público. Não pode ser confundido com a prescrição judicial,
pelo fato de esta representar a perda da ação judicial. Fundamento: segurança jurídica (lembrar do Princípio da
confiança legítima, cobrado no 25º concurso do MPF) e estabilidade das relações jurídicas. São prazos extintivos:
prescrição, decadência e preclusão. PRESCRIÇÃO ADMINISTRATIVA PARA OS ADMINISTRADOS – deve consignar-
se que, em relação ao administrado, não ocorre a prescrição na via administrativa. Com efeito, só ocorre a
prescrição quando o administrado perde a pretensão e, por conseguinte, a ação para proteger seu direito
material. Ora, essa é exatamente a prescrição quinquenal prevista no art. 1o do Decreto no 20.910. Sendo assim,
esse prazo extintivo sempre refoge aos limites da via administrativa. Apenas à guisa de melhor compreensão, é
possível que o administrado tenha sofrido os efeitos da decadência pelo transcurso do prazo para a reclamação
administrativa, mas ainda não tenha sofrido os efeitos da prescrição quinquenal (cujo prazo é obviamente maior),
de modo que, mesmo perdido o direito à reclamação, subsiste a possibilidade de ajuizamento da ação judicial
protetiva de seu direito material. PRESCRIÇÃO ADMINISTRATIVA PARA A ADMINISTRAÇÃO - Em diversos
diplomas legais, é possível encontrar essa competência, associada à fixação de prazos extintivos. Como exemplo,
cite-se: (a) poder punitivo de polícia (Lei no 9.873/1999: cinco anos); (b) poder disciplinar funcional (estatutos
funcionais; na esfera federal, Lei no 8.112/1990). Nesses casos, a Administração é dotada de pretensão punitiva,
de modo que, transcorrido o prazo legal sem a punição, sucederá a prescrição da referida pretensão. A rigor, é
esta a única hipótese de prescrição administrativa, vez que ocorre a perda da ação punitiva no âmbito da
própria Administração. Os diplomas acima, aliás, empregam o verbo “prescrever”, estando tecnicamente
corretos quanto à qualificação desses prazos extintivos. Obs: Existe o prazo de 05 anos para a própria
administração pública rever seus atos quando favoreçam particulares, conforme art. 54 da lei 9.784/99, salvo em
caso de má fé do particular. Esse prazo tem natureza decadencial e não prescricional, pois com o término do prazo
extingue-se o direito potestativo da administração rever os próprios atos, salvo caso de má-fé. O STF
recentemente decidiu que o prazo se aplica ao TCU, nos casos em que esse já aprovara a concessão de
aposentadoria há mais de 5 anos (MS 31.344). No caso de atos praticados antes da Lei 9.784, o prazo corre da
publicação dela (RESP 794.809).
6. COISA JULGADA ADMINISTRATIVA. Possuindo fundamento na garantia da eficácia da segurança jurídica,
podemos definir como a impossibilidade da Administração Pública rever seus próprios atos após processo formal

8 OBS: Recurso hierárquico impróprio contra decisões das Agencias Reguladoras: Discussão doutrinária.
1a corrente (majoritária) – Maria Sylvia Di Pietro e Celso Antônio): impossibilidade, em razão da inexistência de previsão legal. Visa assegurar que a decisão
final na esfera administrativa seja da autarquia regulatória. A possibilidade de revisão de ofício ou mediante recurso hierár quico impróprio dos atos
regulatórios pelo Executivo central aniquilaria a autonomia inerente às agências.
2a corrente: viabilidade de revisão pelo chefe do Executivo ou respetivo Ministério da decisão da agência por meio de provocação do interessado (recurso
hierárquico impróprio) ou de ofício (avocatória), com fundamento na direção superior exercida pelo chefe do Executivo sobre toda a Administração Pública
(art. 84, II, da CF e Parecer AC – 051 da AGU, que entendeu possível quando o ato da agência extrapole os limites legais de competência ou viole políticas
públicas setoriais de competência do Ministério ou da Administração Central. Este parecer foi aprovado pelo Presidente da República e passou a ostentar
caráter vinculante para toda a Administração Pública Federal, na forma do art. 40, p. 1o, da LC 73/93).
3a corrente (Marcos Juruena Villela Souto): cabimento do recurso impróprio por ilegalidade (anulação da decisão ilegal da agência) – art. 84, II, da CF – e
descabimento do recurso por conveniência e oportunidade (impossibilidade de revogação da decisão regulatória).

133
e interno com o particular, também não podendo a mesma recorrer ao Poder Judiciário, tornando-se, pois,
imutável a respectiva decisão administrativa em prol do administrado. Obs: os processos administrativos de que
resultem sanções são passíveis de revisão, que pode ser realizada a qualquer tempo, quando surgirem fatos
novos, podendo ser realizada a pedido ou de ofício, não podendo resultar agravamento da decisão (art. 65, Lei
9.784/99).

Questões de prova oral: Fale sobre o recurso hierárquico próprio e impróprio. (27°CPR); A administração pode
anular seus próprios atos após ocorrida a prescrição? E após recurso hierárquico próprio e impróprio? (27°CPR)

10A. Controle interno e externo da Administração Pública. Ombudsman. Procurador Federal dos Direitos do
Cidadão.

Luísa Maffei Costa 07/09/18

I. Controle da Administração Pública

No exercício de suas funções, a Administração Pública sujeita-se a controle por parte dos Poderes Legislativo e
Judiciário, além de exercer, ela mesma, o controle sobre os próprios atos. Esse controle abrange não só os órgãos
do Poder Executivo, incluindo a administração direta e a indireta, mas também os dos demais Poderes, quando
exerçam função tipicamente administrativa; em outras palavras, abrange a Administração Pública considerada
em sentido amplo.
A finalidade do controle é a de assegurar que a Administração atue em consonância com os princípios que lhe
são impostos pelo ordenamento jurídico, como os da legalidade, moralidade, finalidade pública, publicidade,
motivação, impessoalidade; em determinadas circunstâncias, abrange também o controle chamado de mérito e
que diz respeito aos aspectos discricionários da atuação administrativa.
Atualmente, uma instituição que desempenha importante papel no controle da Administração Pública é o
Ministério Público, em decorrência das funções que lhe foram atribuídas pelo artigo 129 da Constituição. Além
da tradicional função de denunciar autoridades públicas por crimes no exercício de suas funções, ainda atua como
autor na ação civil pública, seja para defesa de interesses difusos e coletivos, seja para repressão à improbidade
administrativa. Embora outras entidades disponham de legitimidade ativa para a propositura da ação civil pública,
a independência do Ministério Público e os instrumentos que lhe foram outorgados pelo referido dispositivo
constitucional (competência para realizar o inquérito civil, expedir notificações, requisitar informações e
documentos, requisitar diligências investigatórias) fazem dele o órgão mais bem estruturado e mais apto para o
controle da Administração Pública.
O controle constitui poder-dever dos órgãos a que a lei atribui essa função, precisamente pela sua finalidade
corretiva; ele não pode ser renunciado nem retardado, sob pena de responsabilidade de quem se omitiu. Ele
abrange a fiscalização e a correção dos atos ilegais e, em certa medida, dos inconvenientes ou inoportunos. Com
base nesses elementos, pode-se definir o controle da Administração Pública como o poder de fiscalização e
correção que sobre ela exercem os órgãos dos Poderes Judiciário, Legislativo e Executivo, com o objetivo de
garantir a conformidade de sua atuação com os princípios que lhe são impostos pelo ordenamento jurídico.
No âmbito do Estado Democrático de Direito, a Administração Pública encontra-se limitada pelo ordenamento
jurídico, devendo exercer suas funções (deveres-poderes) com o intuito de promover e defender os direitos
fundamentais. Em razão disso, o ordenamento consagra diversas espécies de controle da atuação administrativa
que serão exercidas no âmbito da própria Administração ou por órgãos externos.
O controle da ação administrativa pode ser classificado a partir de vários critérios. Quanto ao órgão, entidade ou
pessoa responsável por sua efetivação, o controle pode ser dividido em três categorias: a) autocontrole (ou
controle interno): é efetivado pelo próprio Poder Executivo; b) controle externo: é exercido pelo Poder Judiciário
e pelo Poder Legislativo, com o auxílio do Tribunal de Contas respectivo; e c) controle social: é implementado pela
sociedade civil, por meio da participação nos processos de planejamento, acompanhamento, monitoramento e
avaliação das ações da gestão pública e na execução das políticas e programas públicos (ex.: participação em
consulta pública ou audiência pública; direito de petição ou de representação etc.). Para MSZP, é interno o
controle que cada um dos poderes exerce sobre seus próprios atos e agente. É externo o controle exercido por

134
um dos poderes sobre o outro, como também o controle da Administração Direta sobre a Indireta. Em sua visão,
a CF/88, no capítulo concernente à fiscalização contábil, financeira e orçamentária, prevê o controle externo, a
cargo do Congresso Nacional, com o auxílio do Tribunal de Contas (artigo 71, da CF/88) e o controle interno que
cada poder exercerá sobre seus próprios atos (artigos 70 e 74, da CF/88).

II. Controle interno da Administração Pública

Controle administrativo é o poder de fiscalização e correção que a Administração Pública (em sentido amplo)
exerce sobre sua própria atuação, sob os aspectos de legalidade e mérito, por iniciativa própria ou mediante
provocação.
Na esfera federal, esse controle é denominado de supervisão ministerial pelo Decreto-lei no 200, de 25-2-67.
Abrange os órgãos da Administração Direta ou centralizada e as pessoas jurídicas que integram a Administração
Indireta ou descentralizada.
O controle sobre os órgãos da Administração Direta é um controle interno e decorre do poder de autotutela que
permite à Administração Pública rever os próprios atos quando ilegais, inoportunos ou inconvenientes.
Esse poder é amplamente reconhecido pelo Poder Judiciário em cujo âmbito foram formuladas as Súmulas nos
346 e 473, pelo STF; nos termos da primeira, “a Administração Pública pode declarar a nulidade de seus próprios
atos”; e, em conformidade com a segunda, “a Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de
vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou
oportunidade, respeitados os direitos adquiridos e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial”.
O poder de autotutela encontra fundamento nos princípios a que se submete a Administração Pública, em
especial o da legalidade e o da predominância do interesse público, dos quais decorrem todos os demais. Com
efeito, se a Administração está sujeita à observância da lei e à consecução do interesse público, não há por que
negar-lhe o controle sobre os próprios atos para assegurar a observância daqueles princípios, mesmo porque, não
o fazendo, sujeita-se ao controle pelos demais Poderes, aumentando os ônus do Estado na missão suprema de
tutela do direito.
Esse controle sobre os próprios atos pode ser exercido ex officio, quando a autoridade competente constatar a
ilegalidade de seu próprio ato ou de ato de seus subordinados; e pode ser provocado pelos administrados por
meio dos recursos administrativos.
Não confundir: o controle sobre as entidades da Administração Indireta, também chamado de tutela, é um
controle externo que só pode ser exercido nos limites estabelecidos em lei, sob pena de ofender a autonomia
que lhes é assegurada pela lei que as instituiu. Esses limites dizem respeito aos órgãos encarregados do controle,
aos atos de controle possíveis e aos aspectos sujeitos ao controle.

III. Controle externo da Administração Pública

Há uma rede de controladores externos, ou seja, de “órgãos estranhos” que exercem o controle em relação à
Administração Pública (e não em relação aos outros poderes e, ainda, não em relação ao controle externo de
instituições, como o controle pelos conselhos – como exemplo, o Conselho Nacional do Ministério Público e o
Conselho Nacional de Justiça), o que irá abranger, portanto, além do controle parlamentar direto pelo Poder
Legislativo, o controle pelos Tribunais de Contas, o controle exercido pelo Poder Judiciário e, por fim, o controle
popular ou social como forma democrática de fiscalização.
A) O controle parlamentar direto pelo Poder Legislativo: o Poder Legislativo é, em teoria, poder de maior
representatividade popular e tem a reserva do exercício fundamental do poder que lhe é conferido pelo povo,
qual seja, a criação de leis. As leis, como atos próprios do Poder Legislativo, já constituem, por si mesmas, o
instrumento de maior controle da Administração Pública. Isso porque o administrador público deve atuar dentro
dos parâmetros fixados pelo legislador, refletindo-se no próprio princípio da legalidade administrativa.
Entretanto, o controle pelo Poder Legislativo não se esgota na elaboração de leis. Ao contrário, existem situações
em que a CF/88 permite o controle legislativo concreto sobre atos e atividades da Administração Pública. O
fundamento desse controle é eminentemente constitucional e é denominado de controle político do Poder
Legislativo, como define IRENE PATRÍCIA NOHARA, é a fiscalização a ele outorgada pela Constituição de decidir
sobre alguns aspectos fundamentais relativos à organização e à atuação do Poder Executivo (como também do

135
Poder Judiciário). Seu escopo, em última análise, é o de proteger os interesses superiores do Estado e da
coletividade.
B) O controle pelos Tribunais de Contas: para auxiliar o Poder Legislativo na específica modalidade de controle –
contábil, financeiro, orçamentário, operacional e patrimonial externo – o Congresso Nacional atua em conjunto
com um dos órgãos constitucionalmente independentes, conformado como um colegiado e provido de
habilitação técnica para exercê-la, qual seja, o Tribunal de Contas da União, cuja competência vem estabelecida
na Constituição (artigo 71, da CF/88), existindo, simetricamente, Tribunais de Contas para os Estados, o Distrito
Federal e os Municípios do Rio de Janeiro e de São Paulo, sujeitos todos, no que couber, às mesmas normas,
estabelecidas nos artigos 70 a 75 da CF/88. São cinco as áreas de atuação sujeitas ao controle financeiro pelos
Tribunais de Contas: contábil, financeiro (em sentido estrito), orçamentário, operacional e patrimonial (cf. artigo
70, da CF/88). A área contábil é aquela em que se formalizam os registros das receitas e despesas. Na área
financeira stricto sensu, o controle se executa sobre os depósitos bancários, os empenhos, o pagamento e o
recebimento de valores, etc. O controle orçamentário visa ao acompanhamento do orçamento e à fiscalização
dos registros nas rubricas adequadas. Restam os controles operacional e patrimonial. No primeiro, a fiscalização
incide sobre a execução das atividades administrativas em geral, verificando-se notadamente a observância dos
procedimentos legais para cada fim, bem como a necessidade de sua adequação à maior celeridade, eficiência e
economicidade. O controle patrimonial recai sobre os bens do patrimônio público, exigindo-se sejam fiscalizados
os almoxarifados, os bens em estoque, os bens de uso, os bens consumíveis, etc.
C) O controle exercido pelo Poder Judiciário: constitui, juntamente com o princípio da legalidade, um dos
fundamentos em que repousa o Estado de Direito. De nada adiantaria sujeitar-se a Administração Pública à lei se
seus atos não pudessem ser controlados por um órgão dotado de garantias de imparcialidade que permitam
apreciar e invalidar os atos ilícitos por ela praticados. O sistema adotado no Brasil é o de jurisdição una (o Poder
Judiciário tem o monopólio da função jurisdicional, ou seja, do poder de apreciar, com força de coisa julgada, a
lesão ou ameaça de lesão a direitos individuais e coletivos - afastou-se, portanto, o sistema da dualidade de
jurisdição em que, paralelamente ao Poder Judiciário, existem os órgãos do Contencioso Administrativo que
exercem, como aquele, função jurisdicional sobre lides de que a Administração Pública seja parte interessada,
como é o caso do modelo adotado pelo direito francês). Ressalte-se, ademais, que ao controle judicial é atribuído,
constitucionalmente, a decisão final sobre a lesão de direito ou ameaça de direito (artigo 5.º, XXXV, da CF/88),
cabendo-lhe empregar a hiperatividade estatal como seu last enforcing power – ou seja, ministrando a decisão
constritiva final – que pode obrigar qualquer pessoa, física ou jurídica, inclusive os próprios entes estatais, seus
órgãos e agentes, a fazer ou deixar de fazer alguma coisa exigida em lei. O Poder Judiciário pode examinar os
atos da Administração Pública, de qualquer natureza, sejam gerais ou individuais, unilaterais ou bilaterais,
vinculados ou discricionários, mas sempre sob o aspecto da legalidade e, agora, pela CF/88, também sob o
aspecto da moralidade (artigos 5º, inciso LXXIII, e 37, ambos da CF/88). Quanto aos aspectos discricionários, em
resumo, pontuamos que estes sujeitam-se à apreciação judicial, desde que não se invadam os aspectos
reservados à apreciação subjetiva da Administração Pública, conhecidos sob a denominação de mérito
(oportunidade e conveniência). Ademais, MSZP afirma que não há invasão do mérito administrativo quando o
Poder Judiciário aprecia os motivos, ou seja, os fatos que precedem a elaboração do ato, sendo que a ausência
ou falsidade do motivo caracteriza ilegalidade, suscetível de invalidação pelo Poder Judiciário. Destaca-se, por
fim, como aspecto elementar que a regra geral é a de que o controle judicial é posterior (a posteriori). Depois que
os atos administrativos são produzidos e ingressam no mundo jurídico é que o Judiciário atua para, a pedido dos
interessados, examinar a legalidade, ou não, dos atos. Estes têm a seu favor a prerrogativa da presunção de
legitimidade e da autoexecutoriedade, de modo que a Administração Pública, como regra, os pratica sem que
precise de qualquer autorização. Se o ato estiver contaminado de vício de legalidade, o controle judicial é que vai
permitir que seja invalidado, restaurando-se a situação de legalidade anteriormente existente.

D) O controle popular ou social: JSCF define como “aquele exercido diretamente por cidadãos, por setores da
sociedade civil organizada ou por instituições concebidas para a representação dos interesses sociais, sobre
órgãos estatais, com o escopo de reforçar ou suprir a efetividade do controle, e empregado como meio de
concretização do regime democrático”. É, portanto, uma forma de controle exógeno do Poder Público, o qual
emerge das diversas demandas de grupos sociais. Cuida-se, sem dúvida, de poderoso instrumento democrático,
permitindo a efetiva participação dos cidadãos em geral no processo de exercício do poder. Já se vislumbra a

136
existência de mecanismos jurídicos que, gradativamente, vão inserindo a vontade social como fator de avaliação
para a criação, o desempenho e as metas a serem alcançadas no âmbito de algumas políticas públicas. A
ampliação do controle social tem incidido de forma mais expressiva sobre a função administrativa, ou seja, sobre
o Estado Administração. Coloca-se que a efetivação do controle social pode ocorrer basicamente de duas formas.
De um lado, o controle natural, executado diretamente pelas comunidades, quer através dos próprios indivíduos
que as integram, quer por meio de entidades representativas, como associações, fundações, sindicatos e outras
pessoas do terceiro setor. De outro, o controle institucional, exercido por entidades e órgãos do Poder Público
instituídos para a defesa de interesses gerais da coletividade, como é o caso do Ministério Público, dos Procons,
da Defensoria Pública, dos órgãos de ouvidoria e outros do gênero. Como meio de estímulo a este controle citar
como avanço o instrumental trazido pelo Decreto nº 8.243, de 23 de maio de 2014, o qual instituiu a Política
Nacional de Participação Social (PNPS) e o Sistema Nacional de Participação Social (SNPS), tendo a primeira “o
objetivo de fortalecer e articular os mecanismos e as instâncias democráticas de diálogo e a atuação conjunta
entre administração pública federal e a sociedade civil”. O referido decreto, portanto, teve como base o incentivo
e a consolidação do controle social pela participação popular direta. Seu instrumental (conselhos, comissões,
conferências nacionais, ouvidorias, mesas de diálogo, fóruns interconselhos) pode ser utilizado para o controle,
seja pelos indivíduos, seja por meio de associações do setor privado, das contratações diretas realizadas pela
Administração Pública.

IV. Ombudsman

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:


II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados
nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia;
Essa função é conhecida como função ombudsman ou de Defensor do Povo, denominações que evocam os
modelos que lhe serviram de parâmetro nos debates constituintes. Mais correto seria denominar tal função de
Defensor dos Direitos Constitucionais.
Nos debates e estudos que precederam a Constituição Federal de 1988 identificou-se a conveniência de se criar
no Brasil função inspirada no modelo sueco de ombudsman, destinada a receber e apurar as mais diversas
reclamações de interesse dos cidadãos contra as autoridades e serviços públicos nos casos de desrespeito aos
direitos constitucionais, e diligenciar para sua solução, normalmente sem provocação do Poder Judiciário. Esse
mesmo modelo orientara, em vários países de língua espanhola, a criação de um órgão denominado Defensor dei
Pueblo, assim como o ombudsman, de regra ligado ao Parlamento. Os constituintes não vislumbraram
necessidade de criação de mais um organismo incumbido de função que melhor poderia ser desempenhada
pelo Ministério Público, decidindo por confiar-lhe também as funções de ombudsman ou defensor do povo.
Prevaleceu o entendimento de que o Ministério Público podia substituir “com muito mais vantagem e menos
despesa e também menos protocolo a figura do defensor do povo”, submetendo-se à votação a redação ao final
aprovada, tendo havido, inclusive, rejeição pelo Plenário de emenda apresentada para restabelecer o Defensor
do Povo como Instituição.
O exercício dessa função pelo Ministério Público não se dirige apenas a assegurar o respeito aos direitos
constitucionais pelos poderes públicos, mas igualmente pelos particulares prestadores de serviços de relevância
pública.
A função ombudsman do Ministério Público Federal segue, como regra geral, o critério delimitador de sua
atribuição no contexto do Ministério Público brasileiro: a competência da Justiça Federal. Há na LC 75 uma
disciplina peculiar do modo de atuação dos Procuradores dos Direitos do Cidadão que reproduz o modo próprio
dos ombudsmen e está definido no Capítulo IV do Título 1 da LC 75, intitulado Da Defesa dos Direitos
Constitucionais, cujo artigo inaugural guarda direta e evidente relação com a função constitucional em análise,
redigido nestes termos "Art. 11. A defesa dos direitos constitucionais do cidadão visa à garantia do seu efetivo
respeito pelos Poderes Públicos e pelos, prestadores de serviços de relevância pública". Nos artigos seguintes se
lê que o Procurador dos Direitos do Cidadão age de ofício ou mediante representação, podendo notificar a
autoridade questionada para prestar informações no prazo que assinar (art. 12), devendo, se concluir que direitos
constitucionais foram ou estão sendo desrespeitados, "notificar o responsável para que tome as providências
necessárias a prevenir a repetição ou que determine a cessação do desrespeito verificado" (art. 13).

137
Essa notificação para providências é um instrumento tipicamente de ombudsman e pode, inclusive, extrapolar
as atribuições do membro que a expede, pois estabelece o art. 14 que, se não atendida a notificação, a
Procuradoria dos Direitos do Cidadão - para este fim, necessariamente o Procurador Federal dos Direitos do
Cidadão, por expressa disposição legal (art. 42, LC 75) - representará ao poder ou autoridade competente para
promover a responsabilidade pela ação ou omissão constitucionais.
Outro instrumento de atuação típico dessa função é a recomendação visando à melhoria dos serviços públicos e
de relevância pública (art. 6e, XX, primeira parte) ou visando o respeito aos interesses, direitos e bens cuja defesa
lhe cabe promover (art. 69 segunda parte). Ademais, podem ser utilizados para a defesa dos direitos
constitucionais perante a Administração Pública e os prestadores de serviços de relevância pública a ação civil
pública, o inquérito civil, o compromisso de ajustamento de conduta e a audiência pública, esta última também
bastante identificada com a função ombudsman.

V. Procurador Federal dos Direitos do Cidadão9

O PFDC e os PRDCs têm disciplina própria na primeira seção do capítulo destinado ao Ministério Público Federal
na LC 75. Lê-se no art. 40 que o PFDC será designado pelo Procurador-Geral da República dentre os
Subprocuradores-Gerais da República mediante prévia aprovação do nome pelo Conselho Superior, e que
exercerá as funções do seu ofício pelo prazo de dois anos, permitida uma recondução. No art. 41, lê-se que em
cada Estado e no Distrito Federal será designado órgão do Ministério Público Federal para exercer as funções do
ofício de Procurador Regional dos Direitos do Cidadão. O dispositivo remete ao art. 49, III, no qual consta ser
atribuição do PGR, designar o PFDC e "o titular da Procuradoria [Regional dos Direitos do Cidadão] nos Estados".
A configuração legal é própria de um Ofício que, no Ministério Público Federal, corresponde a um conjunto de
funções ou, mais especificamente, atribuições titularizáveis por um órgão de execução, equivale dizer, um
membro da carreira. No caso do Ofício de Procurador Federal dos Direitos do Cidadão (ou da Procuradoria Federal
dos Direitos do Cidadão), necessariamente um membro no último nível da carreira (Subprocurador-Geral da
República).
A LC 75, nos arts. 12 a 14 do Capítulo intitulado "Da Defesa dos Direitos Constitucionais", ainda faz expressa
referência ao "Procurador dos Direitos do Cidadão" e à Procuradoria dos Direitos do Cidadão. À luz dessa disciplina
legal, cumpre assentar que a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, as Procuradorias Regionais dos
Direitos do Cidadão e as Procuradorias dos Direitos do Cidadão não são órgãos, mas sim ofícios do Ministério
Público Federal.
A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão10, as Procuradorias Regionais e as Procuradorias dos Direitos do
Cidadão são os ofícios que primordialmente concentram as funções de ombudsman no Ministério Público
Federal, ou, na terminologia da LC 75, a defesa dos direitos constitucionais do cidadão. Afirma-se
primordialmente porque a função ombudsman não é exclusiva dos PDCs, podendo ser exercida pelos demais
membros no âmbito de suas atribuições temáticas (defesa do consumidor e do meio ambiente, por exemplo)
quando recomendável a conjugação dessa função com a de legitimado coletivo.
Sob uma perspectiva temática, esses ofícios concentram a defesa dos direitos à saúde e educação e outros
direitos constitucionais fundamentais arrolados nos artigos 5º e 6º da Constituição Federal (direito à igualdade,
direito de petição, direito ao livre exercício profissional, direito à moradia).
Pode-se afirmar que o Procurador Federal dos Direitos do Cidadão é também o correspondente brasileiro ao
ombudsman nacional ou, como a função é denominada na Península Ibérica e na América Latina, o Defensor do
Povo [Defensor del Pueblo) nacional.

9 Ela Wiecko comenta que a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão passou a se assemelhar cada vez mais a uma Câmara. São considerados órgãos de coordenação e não de execução. Não instauram,
em regra, inquéritos civis públicos (já PRDCs e PDCs sim). Traz também a reflexão de que no desenho institucional traçado pela LC n. 75/93 o cidadão não percebe o PFDC como ombudsman nacional, pois sua
escolha está submetida ao CSMPF e aprovação do PGR e, afirma: “Portanto, em princípio, é imprescindível uma alteração da LC n. 75/93 para a efetiva institucionalização do(a) titular da PFDC como ombudsman.
Contudo, novamente a pergunta se impõe: é viável e/ou necessária? (..) A eventual proposta teria que levar em conta uma realidade inexistente na década de 1980: centenas de ouvidorias criadas na
administração pública direta e indireta, em todos os níveis e em todos os poderes”. A autora conclui que não utilização dos termos Defensor do Povo ou Ombudsman na Constituição de 1988 deu margem à
escassa visibilidade da função no âmbito do Ministério Público e o mesmo teria acontecido na LC n. 75/93. Todavia, na prática, ela vem sendo exercida da forma como os constituintes desejaram o que, por si
só, não afasta a necessidade de propor, no âmbito do MPU, uma configuração mais clara da Procuradoria dos Direitos do Cidadão como ombudsman ou defensor do povo para o seu reconhecimento interno
e externo. Isso seria fundamental para alocação de estrutura física e de recursos humanos que possibilitem a resposta rápida e efetiva às demandas.
10 A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) passou a integrar oficialmente a Federação Iberoamericana de Ombudsman (FIO), sendo reconhecida como instituição pública no Brasil dotada de

autonomia e destinada à proteção dos direitos humanos. A incorporação da PFDC à FIO se deu, por unanimidade, durante a 18ª Assembleia Anual da Federação, realizada de 4 a 7 de novembro d e 2013, em
San Juan, Porto Rico. Para ser ombudsman, é necessário ser uma instituição pública dotada de autonomia e cuja finalidade principal seja proteger os direitos humanos dos cidadãos frente à Administração
Pública de seu respectivo país.

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O Procurador Federal dos Direitos do Cidadão, por um paralelismo com as Câmaras de Coordenação e Revisão
que se consolidou na prática institucional e pela função de coordenação que lhe atribui o art. 41, parágrafo único
da LC 75 desempenha, no Ministério Público Federal, funções típicas de órgão da administração superior,
especificamente as funções de revisão dos arquivamentos promovidos nos inquéritos civis pelos PRDCs e PDCs
e a coordenação da respectiva atuação em âmbito nacional.
Para auxiliar o PFDC nessa função de coordenação e revisão, recentemente o Procurador-Geral da República
instituiu os Núcleos de Apoio Operacionais da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (NAOPs-PFDC),
integrados por procuradores regionais da República (3 titulares e igual número de suplentes) e com atribuições
de revisão e coordenação da atuação extraprocessual dos PRDCs e PDCs (promoção de arquivamento em
inquéritos civis, declínio de atribuição etc.) sujeitas a recurso ao Procurador Federal dos Direitos do Cidadão.
A LC 75 estabelece, no art. 42, caber ao Procurador Federal dos Direitos do Cidadão representar ao poder ou
autoridade competente para promover a responsabilidade pela ação ou omissão inconstitucionais sempre que
não atendidas as notificações expedidas pelos procuradores dos direitos dos cidadãos fora das suas próprias
atribuições ou mesmo das atribuições do Ministério Público Federal (art. 14 c/c 42 da LC 75). Trata-se de uma
típica atuação de ombudsman nacional. Por fim, o Procurador Federal dos Direitos do Cidadão não tem
capacidade postulatória, faltando-lhe, pois, atribuição para atuação judicial.

14. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA


14.1 Improbidade Administrativa: sujeitos e atos. Lei 8.429/1992. (1.b)
14.2 Proteção da probidade administrativa. Instrumentos de atuaçã o. As sançõ es na Lei 8.429/1992. Prescrição.
(16.b)

1B. Improbidade administrativa: sujeitos e atos. Lei nº 8.429/1992.

Vanessa Andrade

Sujeitos passivos da improbidade (vítimas do ato): principais: entes da Administração Pública Direta;
entidades da Administração Pública Indireta; empresa incorporada ao patrimônio público; pessoa para cuja
criação ou custeio o erário haja contribuído ou contribua com mais de 50% do patrimônio ou da receita anual, a
exemplo das pessoas de cooperação governamental (serviços sociais autônomos), que são destinatárias de
contribuições parafiscais instituídas por lei; secundários: entidade que receba subvenção, benefício ou incentivo,
fiscal ou creditício, de órgão público; entidades para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra
com menos de 50% do patrimônio ou da receita anual. No caso dos sujeitos passivos secundários, a tutela incide
apenas sobre o patrimônio e a sanção patrimonial se limita à repercussão do ilícito sobre a parcela oriunda do
erário.

Sujeitos ativos da improbidade (responsáveis pela prática do ato ímprobo): (a) agentes públicos de
direito (agentes políticos, servidores públicos estatutários, celetistas e temporários, bem como particulares em
colaboração) ou de fato (putativos e necessários). “Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele
que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração , por eleição, nomeação, designação, contratação
ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades
mencionadas no artigo anterior” (art. 2º da LIA). Notários e registradores estão abrangidos no amplo conceito de
"agentes públicos", na categoria dos "particulares em colaboração com a Administração". (REsp 1186787/MG). O
estagiário que atua no serviço público, ainda que transitoriamente, remunerado ou não, está sujeito a
responsabilização por ato de improbidade administrativa. (REsp 1352035-RS). Os agentes políticos, com exceção
do Presidente da República, encontram-se sujeitos a um duplo regime sancionatório, de modo que se submetem
tanto à responsabilização civil pelos atos de improbidade administrativa, quanto à responsabilização político-
administrativa por crimes de responsabilidade (STF, Pet 3240 AgR); (b) terceiros: Art. 3° As disposições desta lei
são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática
do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta. Somente é possível a análise da
responsabilização de particular, por ato de improbidade administrativa, se este for atribuído,
139
concomitantemente, a agente público, restando inviável o ajuizamento de ação civil pública de improbidade
administrativa exclusivamente em face do eventual terceiro beneficiário. (AgInt no REsp 1442570/SP). Inexiste
litisconsórcio necessário entre o agente público e os terceiros beneficiados com o ato ímprobo. A pessoa jurídica
tem legitimidade para figurar no polo passivo de ação de improbidade, ainda que desacompanhada de seus sócios
(REsp 1186389/PR).

Atos ímprobos. A Lei nº 8429/92 agrupou os atos de improbidade em três categorias, de acordo com os
bens jurídicos afetados pela conduta, em ordem decrescente de gravidade: atos que importem enriquecimento
ilícito (art. 9º), atos que causem prejuízo ao erário (art. 10º) e atos que atentem contra os princípios da
Administração Pública (art. 11). No caput de cada um desses dispositivos, está descrita a conduta genérica
configuradora da improbidade e, em seus incisos, condutas específicas, exemplificadoras da conduta do caput. O
legislador utilizou a técnica legislativa dos conceitos jurídicos indeterminados, e não das tipificações cerradas do
direito penal.
Elemento subjetivo: a improbidade é ilegalidade tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo da
conduta do agente. Por isso mesmo, a jurisprudência do STJ considera indispensável, para a caracterização de
improbidade, que a conduta do agente seja dolosa, para a tipificação das condutas descritas nos artigos 9º e 11
da Lei 8.429/92, ou pelo menos eivada de culpa grave, nas do artigo 10 (AgInt nos EAREsp 178.852/RS). *Opinião
divergente de Rothenburg: a culpa grave também deveria ser responsabilizada em qualquer modalidade de
improbidade. Fundamento: Lei de Improbidade, art. 5º (“ocorrendo lesão ao patrimônio público, dolosa ou
culposa, dar-se-á o integral ressarcimento do dano”); (i) como o dispositivo está na parte geral da Lei, deveria valer
para todas as espécies de improbidade; (ii) “patrimônio público” deveria ser interpretado amplamente, e não
apenas como “erário”, previsto no art. 10 da LIA. Ex: sujeito que, por culpa grave, deixe chegar a terceiro
informação sobre medida política ou econômica que influencie preços (LIA, art. 11, VII) deveria responder por
improbidade.
Recebimento da inicial: Existindo meros indícios de cometimento de atos enquadrados como
improbidade administrativa, a petição inicial da ação de improbidade deve ser recebida pelo juiz, pois, na fase
inicial prevista no art. 17, §§ 7º, 8º e 9º da Lei nº 8.429/92, vale o princípio do in dubio pro societate, a fim de
possibilitar o maior resguardo do interesse público (AgRg no REsp 1.317.127-ES).
Indisponibilidade de bens. A indisponibilidade pode recair sobre bens adquiridos tanto antes quanto
depois da prática do ato de improbidade (REsp 1301695/RS). É desnecessária a individualização dos bens sobre os
quais se pretende fazer recair a indisponibilidade (AgRg no REsp 1307137/BA). A decretação da indisponibilidade
e do sequestro de bens em improbidade administrativa é possível antes do recebimento da ação (AgRg no REsp
1317653/SP). A medida constritiva deve recair sobre o patrimônio dos réus em ação de improbidade
administrativa, de modo suficiente a garantir o integral ressarcimento de eventual prejuízo ao erário, levando-se
em consideração, ainda, o valor de possível multa civil como sanção autônoma (REsp 1176440/RO).
Penalidades: O magistrado não está obrigado a aplicar cumulativamente todas as penas do art. 12 da LIA,
podendo fixá-las e dosá-las segundo a natureza, a gravidade e as consequências da infração. As sanções por
improbidade independem da aprovação ou rejeição das contas por controle interno ou Tribunal de Contas (art.
21, II, LIA). Ainda que não haja dano ao erário, é possível a condenação por ato de improbidade administrativa
que importe enriquecimento ilícito (art. 9º da Lei nº 8.429/92), excluindo-se, contudo, a possibilidade de aplicação
da pena de ressarcimento ao erário (REsp 1412214-PR). Não existe autorização na lei para estipular sanções abaixo
do patamar legal (REsp 1582014-CE). A demissão por ato de improbidade administrativa de membro do Ministério
Público não só pode ser determinada pelo trânsito em julgado de sentença condenatória em ação específica, cujo
ajuizamento foi provocado por procedimento administrativo e é da competência do Procurador-Geral, como
também pode ocorrer em decorrência do trânsito em julgado da sentença condenatória proferida em ação civil
pública prevista na Lei n. 8.429/1992 (REsp 1191613/MG). As penalidades aplicadas em decorrência da prática de
ato de improbidade administrativa podem ser revistas em recurso especial desde que esteja patente a violação
aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. (EREsp 1.215.121-RS). Em se tratando de matéria de
Direito Sancionador e revelando-se patente o excesso ou a desproporção da sanção aplicada, pode o Tribunal
reduzi-la, ainda que não tenha sido alvo de impugnação recursal. (REsp 1293624-DF).
Não configura bis in idem a coexistência de título executivo extrajudicial (acórdão do TCU) e sentença
condenatória em ação civil pública de improbidade administrativa que determinam o ressarcimento ao erário e se

140
referem ao mesmo fato, desde que seja observada a dedução do valor da obrigação que primeiramente foi
executada no momento da execução do título remanescente. (REsp 1413674-SE)
Competência legislativa: a União tem competência privativa para legislar sobre atos de improbidade,
porque as sanções previstas têm natureza civil e eleitoral (art. 22 da CF/88). Além disso, a Lei 8.429/92 traz
disposições de natureza processual. Haveria apenas três dispositivos da lei que tratam de Direito Administrativo
e, por isso, somente se aplicariam à União: o art. 13, caput (a posse dos servidores é condicionada à declaração
de seus bens); art. 14, § 3º (no caso de servidores federais os fatos serão apurados administrativamente na forma
da Lei 8.112); art. 20, parágrafo único (Administrador pode afastar o funcionário público de sua função, para
facilitar a instrução processual).
O princípio da insignificância é aplicável à improbidade, na fase de investigação (arquiva-se o inquérito
civil) ou na fase judicial (em parecer ou alegações finais, propugna-se pelo desprovimento da ação).
Aplicação: a Lei 8.429 não pode alcançar fatos anteriores a sua vigência, ainda que ocorridos após a edição
da Constituição Federal de 1988 (REsp 1129121/GO). Nesse caso, o o controle dos atos lesivos ao erário deve ser
feito com fundamento no art. 159 do CC/16 ou nas Leis 4.717/65 e 7.347/85 (REsp 1197330).
Transação. Na ação civil pública é comum termo de ajustamento de conduta. Na literalidade da LIA tal
acordo não é possível na ação de improbidade. A MP 703/2015 revogou a previsão do art. 17, §1º, da LIA (§ 1º É
vedada a transação, acordo ou conciliação nas ações de que trata o caput) Ocorre que tal MP perdeu sua eficácia,
de modo que a redação anterior da LIA foi reestabelecida. A vedação, todavia, tem sido flexibilizada. No MPF já
foram celebrados TAC em AIA. O Conselho Nacional do Ministério Público, por meio da Resolução CNMP nº 179,
de 26 de julho de 2017, ao regulamentar o termo de compromisso de ajustamento de conduta, expressamente
autorizou a composição em relação aos atos de improbidade administrativa, sem prejuízo do ressarcimento ao
erário e da aplicação de uma ou algumas das sanções previstas em lei, de acordo com a conduta ou o ato praticado
(artigo 1º, §2º).
Prescrição: Art. 23. As ações destinadas a levar a efeitos as sanções previstas nesta lei podem ser
propostas: I - até cinco anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de função de
confiança; II - dentro do prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com
demissão a bem do serviço público, nos casos de exercício de cargo efetivo ou emprego. III - até cinco anos da data
da apresentação à administração pública da prestação de contas final pelas entidades referidas no parágrafo único
do art. 1o desta Lei. (Incluído pela Lei nº 13.019, de 2014). Art. 23, inciso I: o prazo prescricional previsto no art.
23, I, da Lei 8.429/92, começa a fluir a partir do dia subsequente ao encerramento do vínculo do agente com a
Administração Pública (AgRg no AREsp 686.390/MG). Em se tratando de reeleição de prefeito municipal para
mandatos sucessivos, o prazo prescricional previsto no inc. I do art. 23 da Lei n.º 8.429/92 começa a fluir a partir
da extinção do segundo mandato (AgRg no AREsp 23.443/SP). Art. 23, inciso II: L8.112/90, Art. 142. A ação
disciplinar prescreverá: I - em 5 (cinco) anos, quanto às infrações puníveis com demissão, cassação de
aposentadoria ou disponibilidade e destituição de cargo em comissão. § 1 o O prazo de prescrição começa a correr
da data em que o fato se tornou conhecido. § 2o Os prazos de prescrição previstos na lei penal aplicam-se às
infrações disciplinares capituladas também como crime. § 3o A abertura de sindicância ou a instauração de
processo disciplinar interrompe a prescrição, até a decisão final proferida por autoridade competente. § 4 o
Interrompido o curso da prescrição, o prazo começará a correr a partir do dia em que cessar a interrupção.
Interrupção da contagem do prazo prescricional. Na instauração de sindicância, interrompe-se a contagem do
prazo de prescrição pelo período do processamento do procedimento disciplinar, desde que não exceda a 140
dias, ao termo do qual volta a correr pela íntegra (REsp 1407249/PB). Apenas a sindicância instaurada com caráter
punitivo tem o condão de interromper o prazo prescricional, e não aquelas meramente investigatórias ou
preparatórias de um processo disciplinar. (STJ, MS 12.153/DF). Aplicação do prazo do Código Penal. Deve ser
considerada a pena em abstrato para o cálculo do prazo prescricional, a um porque o ajuizamento da ação civil
pública por improbidade administrativa não está legalmente condicionado à apresentação de demanda penal. Não
é possível, desta forma, construir uma teoria processual da improbidade administrativa ou interpretar dispositivos
processuais da Lei n. 8.429/92 de maneira a atrelá-las a institutos processuais penais, pois existe rigorosa
independência das esferas no ponto. A dois porque o lapso prescricional não pode variar ao talante da existência
ou não de ação penal, justamente pelo fato de a prescrição estar relacionada ao vetor da segurança jurídica (EDv
nos EREsp 1656383/SC). Cumulação de cargo efetivo e cargo comissionado: caso sejam exercidos
cumulativamente, cargo efetivo e cargo comissionado, ao tempo do ato reputado ímprobo, deve prevalecer o

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primeiro para fins de contagem da prescrição, em razão do vínculo mantido pelo agente com a Administração
Pública (AgRg no REsp 1500988/RS, julgado em 12/02/2015). Interrupção com o ajuizamento da ação. O prazo de
prescrição, na ação de improbidade administrativa, interrompe-se com a propositura da ação,
independentemente da data da citação, que, mesmo efetivada em data posterior, retroage à data do ajuizamento
da ação (REsp 1374355/RJ). Prescrição intercorrente. O art. 23 da Lei 8.429/1992, que regula o prazo prescricional
para propositura da ação de improbidade administrativa, não possui comando a permitir a aplicação da prescrição
intercorrente nos casos de sentença proferidas há mais de 5 (cinco) anos do ajuizamento ou do ato citatório na
demanda (REsp 1289993/RO). Particulares. Aplica-se a mesma sistemática atribuída aos agentes públicos para
fins de fixação do termo inicial da prescrição (AgRg no AREsp 161.126/SP). Em caso de concurso de agentes, a
prescrição da ação de improbidade é contada individualmente. O art. 23 é claro no sentido de que o início do
prazo prescricional ocorre com o término do exercício do mandato ou cargo em comissão, sendo tal prazo
computado individualmente, mesmo na hipótese de concurso de agentes, haja vista a própria natureza subjetiva
da pretensão sancionatória e do instituto em tela (REsp 1230550/PR). Imprescritibilidade. São imprescritíveis as
ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade
Administrativa (STF. Plenário. RE 852475/SP).
Reexame necessário. A sentença que concluir pela carência ou pela improcedência de ação de
improbidade administrativa está sujeita ao reexame necessário, com base na aplicação subsidiária do CPC e por
aplicação analógica da primeira parte do art. 19 da Lei nº 4.717/65. (STJ. 1ª Seção. EREsp 1220667-MG).
5ª CCR: Enunciado 13: ARQUIVAMENTO DE PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS POR AJUIZAMENTO DE
AÇÃO. Proposta ação penal e/ou ação de improbidade administrativa, é desnecessária a remessa do Procedimento
Administrativo correlato à 5ª CCR, com vistas à homologação do seu arquivamento, exceto quando restar matéria
ou imputação não incluída na pretensão deduzida no processo judicial. Referência: L.C. 75/93, art. 62, IV, e 6º, XX;
L. 7.347/85, art. 9º. Enunciado 23: PROMOÇÃO DE ARQUIVAMENTO POR PRESCRIÇÃO QUANDO INVESTIGADO
PREFEITO MUNICIPAL OU GOVERNADOR DE ESTADO. A promoção de arquivamento, de procedimento
administrativo ou inquérito civil público, em que apurada eventual improbidade administrativa atribuída a prefeito
municipal ou governador de Estado, em razão de prescrição, deve registrar a ocorrência ou não de reeleição.
Enunciado 24: ATUAÇÃO MINISTERIAL NAS AÇÕES POR ATO DE IMPROBIDADE PROPOSTAS POR ENTE NÃO
FEDERAL. Nas ações por ato de improbidade administrativa propostas por entidades não federais por lesão a bens
ou interesses federais, se a petição inicial atender aos pressupostos legais e não houver outro defeito processual,
deve o Ministério Público Federal ingressar no polo ativo, para garantir a tramitação do feito na Justiça Federal.
Enunciado 25: ATUAÇÃO MINISTERIAL NAS AÇÕES POR ATO DE IMPROBIDADE PROPOSTAS POR ENTE NÃO
FEDERAL. Nas ações por ato de improbidade administrativa propostas por entidades não federais por lesão a bens
ou interesses federais, havendo inépcia ou outro defeito processual grave, compete ao Procurador oficiante: a) se
sanável o defeito, ingressar no polo ativo; b) se insanável o defeito, manifestar-se como custos legis pela extinção
e ajuizar nova ação ou instaurar procedimento administrativo no MPF. Enunciado 29: SOCIEDADE DE ECONOMIA
MISTA. RESPONSABILIDADE PENAL, POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA E DA LEI ANTICORRUPÇÃO. PREJUÍZO AO
CAPITAL DE ENTE FEDERAL. ATRIBUIÇÃO DO MPF. O Ministério Público Federal tem atribuição para promover
medidas tendentes à responsabilização penal e por improbidade administrativa e, também, as previstas na Lei
12.846, de 2013, em face de atos lesivos a sociedade de economia mista cuja acionista majoritária seja a União,
sempre que evidenciado o interesse direto desta, como no caso em que o prejuízo sofrido pela sociedade
empresarial repercuta ou possa repercutir no capital do ente político federal. Enunciado 35: SONEGAÇÃO E NÃO
REPASSE DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. A persecução dos atos de improbidade administrativa relativos à
sonegação de contribuições previdenciárias ou não repasse destas à Previdência Social, quando imputados a
agente público das esferas estadual e municipal, é da atribuição do Ministério Público Estadual se efetivado o
pagamento ou se existir parcelamento dos respectivos débitos. Enunciado 41: A prática de assédio moral por
agente público federal pode configurar ato de improbidade administrativa. Enunciado 42: O representante legal
do estabelecimento credenciado no Programa Farmácia Popular do Brasil é equiparado a agente público para os
efeitos da Lei Improbidade Administrativa.

16B. Proteção da probidade administrativa. Instrumentos de atuação. As sanções na Lei nº 8.429/1992.


Prescrição.

142
Carime Medrado Ribeiro

A etimologia da palavra probidade vem de probus (“o que brota bem”) e, historicamente, a expressão foi utilizada
de forma figurativa para caracterizar o indivíduo honrado, íntegro, reto, honesto e virtuoso. O termo improbidade,
por outro lado, está relacionado a desonestidade, má fama, incorreção, imoralidade. Não há definição legal de
probidade/improbidade, mas a doutrina majoritária tende a conceituar a expressão como especificação do
princípio da moralidade administrativa do art. 37 da CRFB/88. GARCIA e ALVES indicam que a definição da
probidade não passa unicamente pelo princípio da moralidade, mas pressupõe o cotejo da conduta do sujeito
com o princípio da juridicidade, termo genérico que abarca todos os princípios administrativos explícitos (art. 37
CF) e implícitos (proporcionalidade, razoabilidade...), e com as regras definidas em norma infraconstitucional.
Predomina o entendimento de que o conceito de improbidade não é equivalente ao de moralidade, sendo
aquele muito mais abrangente que esse. Com efeito, é possível que alguém pratique um ato de improbidade
administrativa mesmo quando não haja violação ao princípio da moralidade, como é o caso, por exemplo, do
agente que nega publicidade a atos oficiais (art. 11, IV, da LIA). Proteção da probidade e dispositivos da CRFB/88:
a) art. 14, § 9º, que permite o estabelecimento, por lei complementar, de causas de inelegibilidade que visam
proteger a probidade administrativa; b) art. 15, V, que traz a condenação por improbidade como causa de
suspensão dos direitos políticos; c) art. 85, V, que prevê ser crime de responsabilidade do Presidente aquele que
atente contra a probidade. O dispositivo constitucional mais importante sobre o tema é o art. 37, § 4º, que prevê:
a) um rol mínimo – ou seja, não taxativo - de sanções imputáveis aos sujeitos ativos dos atos de improbidade
(suspensão dos direitos políticos, perda da função pública; ressarcimento ao erário); b) a medida cautelar de
indisponibilidade de bens (art. 7º da 8.429/92); e c) a independência das esferas criminal e político-
administrativa.
É possível dividir o controle da probidade na administração em preventivo e repressivo. O Controle preventivo:
pode se dar por meio de normas deontológicas (códigos de ética); regras de incompatibilidade (art. 9º da
8.666/93; art. 18 da 9.784/99 e Súmula vinculante 13 STF); monitoramento da evolução patrimonial (art. 13 da
8.429/92). A figura do Ombudsman, não incorporada na CR, mas cujas atribuições guardam grande sintonia com
aquelas atribuídas ao PFDC (art. 11 ao 16 e 39 ao 42 da LC 75/93) é muito relevante para a implementação do
controle preventivo. Controle repressivo: pode se dar na esfera administrativa, legislativa e judicial, todas
autônomas e independentes. Controle administrativo: decorre do poder-dever de autotutela (346 STF e 473 STF)
e do poder hierárquico, podendo ser deflagrado de ofício, por requisição do MP (art. 22 da 8.429/92) ou por
representação de qualquer pessoa (art. 14 da 8.429/92). Deve-se observar o procedimento administrativo
disciplinar do estatuto do acusado, havendo a necessidade de que a comissão processante dê conhecimento ao
MP e ao TC, que terão a faculdade de designar representante para acompanhar o feito (art. 15 da 8.429/92).
Controle Legislativo: é feito por meio dos Tribunais de Contas (sendo irrelevante a aprovação ou rejeição das
contas para a aplicação das sanções da 8.429/92 – art. 21, II) e das CPIs (conclusões podem ser encaminhadas ao
MP para que promova a responsabilização civil ou criminal dos infratores – art. 58, § 3º CF). Controle judicial: é
feito por meio do procedimento previsto na Lei 8.429/92, devendo o legitimado ativo buscar não pecar nem pela
insuficiência (ex: utilização leviana do argumento da reserva do possível pelos gestores), nem pelo excesso.
Majoritariamente, entende-se que a notificação prévia é dispensada quando houver prévio inquérito civil ou outra
espécie de procedimento administrativo, por analogia com a súmula 330 do STJ. O STJ entende que a ausência
da notificação é causa de nulidade relativa, a qual somente poderá ser reconhecida se a parte alegar sua
ocorrência na primeira oportunidade em que puder falar nos autos – sob pena de preclusão – bem como se restar
demonstrado o efetivo prejuízo. Viola direito fundamental a aplicação retroativa da lei de improbidade.

As Sanções da Lei de Improbidade possuem caráter extrapenal, podendo ser aplicadas isoladas ou
cumulativamente, levando-se em consideração na individualização da pena a gravidade do fato, a extensão do
dano e o proveito patrimonial obtido pelo agente (art. 12, § único). O STJ não vem aplicando a insignificância
(REsp 892.818, 2ª Turma, 2008). Segundo o art. 8º da LIA, a pena patrimonial aplicada ao réu pode ser transmitida
aos seus sucessores até os limites da herança. Quanto à extensão punitiva da condenação, o juiz não precisa se
ater às sanções requeridas pelo autor na inicial, podendo aplicar alguma outra sanção não mencionada no pedido.
Segundo José dos Santos Carvalho Filho, a pretensão do autor é a de que o juiz, julgando procedente o pedido,
reconheça a prática do ato de improbidade e a consequente submissão à LIA. As sanções são mero corolário da

143
procedência do pedido e, por esse motivo, sua dosimetria compete ao julgador, considerando os elementos que
cercam cada caso. A indicação errônea ou inadequada do dispositivo concernente à conduta do réu não impede
que o juiz profira sentença fundada em dispositivo diverso, pois o réu se defende dos fatos que lhe são imputados,
independentemente da norma na qual se fundou o pedido veiculado na ação, sem que haja violação ao princípio
da congruência entre pedido e decisão. O STJ tem manifestado adesão a esse mesmo entendimento. Ainda, o STJ
tem permitido que a medida cautelar de indisponibilidade alcance bens em quantidade suficiente para garantir
não só a pena de ressarcimento ao erário, mas também a pena de multa. Recentemente o STJ tem reafirmado
o entendimento de que, para a aplicação da medida de indisponibilidade dos bens, basta que seja demonstrado
o fumus boni iuris, já que nas ações de improbidade o periculum in mora é presumido (REsp 1319515/ES). Por
fim, é de se ressaltar que a indisponibilidade pode ser decretada antes de recebida a petição inicial, sem a oitiva
do réu e em qualquer hipótese de ato de improbidade, mesmo naquelas hipóteses em que o ato de improbidade
somente viola princípios da Administração Pública (AgRg no REsp 1311013/RO, DJe 13/12/2012).

Prescrição da Ação de Improbidade. O prazo será de 5 anos para os casos de agentes que exercem mandato,
cargo em comissão ou função de confiança, sendo o termo inicial o momento em que o agente deixa o cargo. O
prazo será aquele previsto para as faltas disciplinares punidas com demissões nos casos dos servidores
permanentes, ocupantes de cargo efetivo ou de emprego público.

Quanto a terceiro, a doutrina diverge. JSCF entende aplicável o prazo de 10 anos (art. 205, CC).
No caso de reeleição de ocupante de cargo eletivo: prazo prescricional só se inicia após o término do segundo
mandato, ainda que tenha havido descontinuidade entre o 1º e 2º mandato em razão da anulação de pleito
eleitoral, com posse provisória do presidente da casa legislativa.

*Decisão do STF sobre (im)prescritibilidade da sanção de ressarcimento ao erário  Apesar da redação do § 5º


do art. 37, CR (§ 5º A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor
ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento), muitos eram contra
a tese da imprescritibilidade, sob o argumento de que não teria sido essa a intenção do Constituinte. Sustentam
que a correta interpretação dos §§ 4º e 5º do art. 37 deveria ser a seguinte: o constituinte deu um comando ao
legislador infraconstitucional para que fosse feita uma lei prevendo atos de improbidade administrativa (§ 4º); as

144
sanções para os atos de improbidade são a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a
indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário (§ 4º); a lei deverá prever prazos prescricionais para a
imposição dessas sanções (§ 5º); enquanto não houver lei prevendo quais são os atos de improbidade
administrativa, não poderão ser ajuizadas ações de improbidade administrativa pedindo a aplicação das sanções
previstas no § 4º; ficam ressalvadas dessa proibição as ações de ressarcimento (parte final do § 5º), ou seja,
mesmo sem lei expressa, as ações de ressarcimento já poderiam ser propostas. Desse modo, para essa tese, o
que a parte final do § 5º quis dizer foi unicamente que, mesmo sem LIA, poderiam ser ajuizadas ações pedindo o
ressarcimento ao erário. Isso porque o § 5º deve ser interpretado em conjunto com o § 4º. Como reforço a esse
argumento, alegaram que a LIA foi editada em 92. Logo, o objetivo do constituinte foi o de evitar que se alegasse
que o ressarcimento ao erário somente poderia ser exigido com a edição de lei. Por fim, argumentavam que a
Constituição Federal, quando quis, determinou a imprescritibilidade de forma expressa. Ex: art. 5º, XLII (racismo)
e XLIV (ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático). Não
foi esse o entendimento firmado pelo STF. Prevaleceu no Supremo a imprescritibilidade, nos seguintes termos
(tese para fins de repercussão geral): São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática
de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa. STF. Plenário. RE 852475/SP, julgado em
08/08/2018.

15. RESPONSABILIDADE FISCAL


15.1 Responsabilidade fiscal (15.b)

15B. Responsabilidade fiscal.

Gilberto Batista Naves Filho 02/09/18

É um instituto que visa propiciar o equilíbrio nas contas públicas. Encontra respaldo principalmente na
Constituição Federal (artigos 165 a 169), na Lei nº 4.320/1964 (recepcionada com status de lei complementar),
e na LC 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF). Tem como significado o zelo na arrecadação das receitas
e realização das despesas públicas, obrigando o gestor a cumprir os limites de gasto com pessoal, e da dívida
pública, agindo com transparência, e de forma planejada.

Nos termos do art. 1º , parágrafo 1º , da LC 101/2000 (LRF): “A responsabilidade na gestão fiscal pressupõe
a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das
contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a
limites e condições no que tange a renúncia de receita, geração de despesas com pessoal, da seguridade social e
outras, dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de
garantia e inscrição em Restos a Pagar.”

Cabe citar os instrumentos de gestão de gastos públicos previstos na legislação há o plano plurianual
(PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LOA) e a Lei Orçamentária Anual (LOA).

Conforme o sítio eletrônico a Câmara dos Deputados (http://www2.camara.leg.br/orcamento-da-


uniao/leis-orcamentarias/ppa), acessado em 28/09/2018), o PPA “é um planejamento de médio prazo, que deve
ser realizado por meio de lei. Nele, são identificados as prioridades para o período de quatro anos e os
investimentos de maior porte. O projeto do PPA é encaminhado pelo Executivo ao Congresso até 31 de agosto
do primeiro ano de cada governo, mas ele só começa a valer no ano seguinte. Sua vigência vai até o final do
primeiro ano do governo seguinte. Essa passagem do PPA de um governo para outro visa promover a
continuidade administrativa, de forma que os novos gestores possam avaliar e até aproveitar partes do plano
que está sendo encerrado.” (Grifei)

Quanto à LDO, o site da Câmara (http://www2.camara.leg.br/orcamento-da-uniao/leis-


orcamentarias/ldo), informa que “estabelece quais serão as metas e prioridades para o ano seguinte. Para isso,
fixa o montante de recursos que o governo pretende economizar; traça regras, vedações e limites para as

145
despesas dos Poderes; autoriza o aumento das despesas com pessoal; regulamenta as transferências a entes
públicos e privados; disciplina o equilíbrio entre as receitas e as despesas; indica prioridades para os
financiamentos pelos bancos públicos.” (Grifei).

Ademais, conforme o sítio eletrônico do Senado Federal


(https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2003/05/06/estabelecer-metas-e-prioridades-e-funcao-da-
ldo) , a “LRF criou mais três anexos ao projeto da LDO: o Anexo de Metas Fiscais, que contém os valores dos
resultados fiscais e o montante da dívida pública, entre outras informações; o Anexo de Riscos Fiscais, que
apresenta a avaliação de possíveis dívidas (passivos contingentes) que poderão afetar as contas públicas; e o
Anexo das Políticas Monetária, Creditícia e Cambial, com seus objetivos, bem como os parâmetros e as projeções
para seus principais agregados e variáveis, e ainda as metas de inflação para o exercício subsequente”. (Grifei)

A LOA, com vigência anual, estima das receitas e fixa as despesas. Conterá, em anexo, demonstrativo da
compatibilidade da programação dos orçamentos com os objetivos e metas da LDO. Conforme o § 5º do art.
165 da Constituição, a LOA compreenderá o orçamento fiscal, o orçamento de investimento das empresas, e o
orçamento da seguridade social.

A LRF limita os gatos com pessoal em percentuais da receita corrente líquida (União: 50% ; Estados: 60%;
e III - Municípios: 60%). Entende-se como despesa total com pessoal o somatório dos gastos do ente da Federação
com os ativos, os inativos e os pensionistas. Os valores dos contratos de terceirização de mão-de-obra que se
referem à substituição de servidores e empregados públicos serão contabilizados como "Outras Despesas de
Pessoal".

Limite de alerta de gastos com pessoal: os Tribunais de Contas alertarão os Poderes ou órgãos quando
constatarem que o montante da despesa total com pessoal ultrapassou 90% (noventa por cento) do limite.

A LRF institui o prudencial de gastos com pessoal, pelo qual se a despesa total com pessoal exceder a
95% (noventa e cinco por cento) do limite, são vedados ao Poder ou órgão que houver incorrido no excesso: I -
concessão de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a qualquer título, salvo os derivados
de sentença judicial ou de determinação legal ou contratual, ressalvada a revisão prevista no inciso X do art. 37
da Constituição; II - criação de cargo, emprego ou função; III - alteração de estrutura de carreira que implique
aumento de despesa; IV - provimento de cargo público, admissão ou contratação de pessoal a qualquer título,
ressalvada a reposição decorrente de aposentadoria ou falecimento de servidores das áreas de educação, saúde
e segurança; V - contratação de hora extra, salvo no caso do disposto no inciso II do § 6o do art. 57 da Constituição
e as situações previstas na lei de diretrizes orçamentárias.

Se a despesa total com pessoal ultrapassar os limites totais definidos na LRF, o percentual excedente
terá de ser eliminado nos dois quadrimestres seguintes, sendo pelo menos um terço no primeiro.

No que tange às operações de crédito, impõe-se citar a chamada REGRA DE OURO, que consiste na
vedação da “realização de operações de créditos que excedam o montante das despesas de capital, ressalvadas
as autorizadas mediante créditos suplementares ou especiais com finalidade precisa, aprovados pelo Poder
Legislativo por maioria absoluta” (art. 167, III, da CF).

Quanto aos instrumentos de transparência da gestão fiscal, são, conforme o art. 48 da LRF, os planos,
orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o respectivo parecer prévio; o Relatório
Resumido da Execução Orçamentária (publicado até trinta dias após o encerramento de cada bimestre) e o
Relatório de Gestão Fiscal (emitido ao final de cada quadrimestre); e as versões simplificadas desses documentos.

A LRF estabelece como uma das sanções ao ente que descumpra deveres referentes à responsabilidade
fiscal, inclusive quanto à prestação de contas de recursos transferidos por outros entes, a vedação à realização

146
de transferências voluntárias de recursos, excetuadas aquelas relativas a ações de educação, saúde e
assistência social.

Cabe apontar que a jurisprudência do STF consolidou que para a aplicação da sanção aos entes devem ser
observados o devido processo legal e os princípios da ampla defesa e do contraditório. Cita-se julgado:

“Ementa: AGRAVO INTERNO NA AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO.


FINANCEIRO. TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. INSCRIÇÃO DE ESTADO-MEMBRO EM CADASTRO DE
INADIMPLENTES. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA
NA VIA ADMINISTRATIVA. PRECEDENTES. AGRAVO INTERNO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Em razão de
expressa determinação constitucional, na medida em que a atuação da Administração Pública é pautada pelo
princípio da legalidade (CF, art. 37, caput), inexiste, em princípio, qualquer ilegalidade na atuação da União em
proceder à inscrição do órgão ou ente nos cadastros de restrição. 2. In casu, diante de hipótese excepcional,
autoriza-se a exclusão judicial da inscrição nos cadastros de inadimplência, no afã de neutralizar a ocorrência de
risco que possa comprometer, de modo grave e/ou irreversível, a continuidade da execução de políticas públicas
ou a prestação de serviços essenciais à coletividade. 3. A anotação de ente federado em tais cadastros exige a
prévia e efetiva observância do devido processo legal, em suas dimensões material e processual. 4. A tomada de
contas especial é medida de rigor com o ensejo de alcançar-se o reconhecimento definitivo de irregularidades,
permitindo-se, só então, a inscrição do ente nos cadastros de restrição ao crédito organizados e mantidos pela
União. Precedentes: ACO 1.848-AgR, rel. Min. Celso Mello, Tribunal Pleno, DJe de 6/11/2014; AC 2.032, Rel. Min.
Celso de Mello, Tribunal Pleno, DJe de 20/03/2009. 5. Agravo interno a que se nega provimento.”

(ACO 2917 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 07/05/2018, PROCESSO
ELETRÔNICO DJe-096 DIVULG 16-05-2018 PUBLIC 17-05-2018)

Ademais, a jurisprudência também consolidou a aplicação da teoria da intranscendência subjetiva das


sanções. O impede que sanções e restrições superem a dimensão estritamente pessoal do infrator e atinjam
pessoas que não tenham sido as causadoras do ato ilícito.

Sobre o tema, cita-se o enunciado da Súmula 615 do STJ: Não pode ocorrer ou permanecer a inscrição
do município em cadastros restritivos fundada em irregularidades na gestão anterior quando, na gestão
sucessora, são tomadas as providências cabíveis à reparação dos danos eventualmente cometidos. No mesmo
sentido a Súmula 46 da AGU, que diz que: "Será liberada da restrição decorrente da inscrição do município no
SIAFI ou CADIN a prefeitura administrada pelo prefeito que sucedeu o administrador faltoso, quando tomadas
todas as providências objetivando o ressarcimento ao erário."

Além do caso acima explicado, o princípio da intranscendência subjetiva das sanções pode ser aplicado
também nas situações em que uma entidade estadual/municipal (ex: uma autarquia) descumpriu as regras do
convênio e a União inscreve não apenas essa entidade, como também o próprio ente (Estado/Município) nos
cadastros restritivos.

“(...) O postulado da intranscendência impede que sanções e restrições de ordem jurídica superem a
dimensão estritamente pessoal do infrator. Em virtude desse princípio, as limitações jurídicas que derivam da
inscrição, em cadastros públicos de inadimplentes, das autarquias, das empresas governamentais ou das
entidades paraestatais não podem atingir os Estados-membros, projetando, sobre estes, consequências
jurídicas desfavoráveis e gravosas, pois o inadimplemento obrigacional – por revelar-se unicamente imputável
aos entes menores integrantes da administração descentralizada – só a estes pode afetar.
Os Estados-membros e o Distrito Federal, em consequência, não podem sofrer limitações em sua esfera
jurídica, motivadas pelo só fato de se acharem administrativamente vinculadas a eles as autarquias, as entidades
paraestatais, as sociedades sujeitas a seu poder de controle e as empresas governamentais alegadamente
inadimplentes e que, por tal motivo, hajam sido incluídas em cadastros federais (CAUC, SIAFI, CADIN, v.g.). (...)
(STF. Plenário. ACO 1848 AgR, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 06/11/2014)

147
Por fim, o princípio da intranscendência subjetiva das sanções impede que o ente seja responsabilizado
por atos de poderes autônomos e independentes distintos do Executivo. Cita-se julgado:
“A imposição de sanções ao Executivo estadual em virtude de pendências dos Poderes Legislativo e
Judiciário locais constitui violação do princípio da intranscendência, na medida em que o Governo do Estado
não tem competência para intervir na esfera orgânica daquelas instituições, que dispõem de plena autonomia
institucional a elas outorgadas por efeito de expressa determinação constitucional.”
STF. Plenário. ACO 2995 AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 23/02/2018.

Salienta-se ainda, no que toca a realização de despesas e assunção de obrigações por parte dos entes
públicos, a lei 10.028/00, que incluiu no CP o capítulo IV, crimes contra as finanças públicas (arts. 359-A a 359-H).

DIREITO AMBIENTAL

1.PRINCÍPIOS DE DIREITO AMBIENTAL


1.1 Meio ambiente e direitos fundamentais. Bens ambientais. Caracteri ́sticas. (1.c)
1.2 Princi ́pios de Direito Ambiental. (4.a)
1.3 Desenvolvimento sustentável. Aquecimento global. (22.c)

1C. Meio ambiente e direitos fundamentais. Bens ambientais.

Laiz Mello

I. Meio ambiente e direitos fundamentais

O esverdeamento das Constituições (“greening”) constitui fenômeno político decorrente do caráter cada
vez mais analítico da maioria das constituições sociais, assim como da importância da elevação das regras e
princípios do meio ambiente ao ápice dos ordenamentos, a fim de conferir maior segurança jurídico-ambiental.

Os benefícios da constitucionalização do Direito Ambiental podem ser subdivididos da seguinte forma:

1) Subjetivamente: i) estabelecimento de um dever constitucional genérico de não degradar; ii) base do


regime de explorabilidade limitada e condicionada; iii) ecologização da propriedade e da sua função social; iv) a
proteção ambiental como direito fundamental; v) a legitimação constitucional da função estatal reguladora; vi)
a redução da discricionariedade administrativa e a ampliação da participação pública;

2) Formalmente: i) máxima preeminência (superioridade) e proeminência (perceptibilidade) dos direitos


ambientais; ii) deveres e princípios ambientais; iii) a segurança normativa; iv) a substituição do paradigma da
legalidade ambiental para a constitucionalidade ambiental; v) controle de constitucionalidade da lei e o reforço
exegético pró-ambiente das normas infraconstitucionais.

O legislador constituinte reconheceu expressamente o direito ao meio ambiente ecologicamente


equilibrado como um direito fundamental (art. 225, caput), de terceira dimensão, pois coletivo, transindividual,
com aplicabilidade imediata, vez que sua incidência independe de regulamentação11.

Consoante Frederico Amado, o bem ambiental é autônomo, imaterial e de natureza difusa,


transcendendo à tradicional classificação dos bens em públicos (das pessoas jurídicas de direito público) e
privados, pois toda a coletividade é titular desse direito (bem de uso comum do povo). Assim, o meio ambiente
ecologicamente equilibrado foi afetado ao uso comum do povo, não podendo ser desafetado, sob pena de

11 Art.
225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-
se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

148
violação constitucional. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é, ainda, condição para a
realização da dignidade da pessoa humana, base dos demais direitos fundamentais. Por ser direito fundamental,
há vedação ao retrocesso ecológico.

No artigo “Jurisdição Constitucional Ambiental no Brasil” (p. 829 e seguintes), Walter Claudius
Rothenburg afirma que o tema do ambiente deve ser considerado materialmente constitucional por se tratar de
direito humano, seja por sua vinculação à saúde, à cultura, à democracia (participação e informação), seja como
bem jurídico autônomo. A ligação do meio ambiente com a dignidade do ser humano é evidente. O direito a um
ambiente ecologicamente equilibrado é considerado um direito social, de marcante feição prestacional, dito de
terceira dimensão. Sua positivação nas constituições e em equivalentes internacionais, bem como sua afirmação
por tribunais que realizam jurisdição constitucional, tudo isso mostra seu fortalecimento, sua possível passagem
de direito humano frágil para direito humano forte.

Édis Milaré também coloca o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito
constitucional fundamental e explica sua evolução:
“(...) ainda que sem previsão expressa, os diversos países, inclusive o nosso, promulgaram (e promulgam)
leis e regulamentos de proteção do meio ambiente. Isso acontecia porque o legislador se baseava no poder geral
que lhe cabia para proteger a “saúde humana”. Aí está, historicamente, o primeiro fundamento para a tutela
ambiental, ou seja, a saúde humana, tendo como pressuposto, explícito ou implícito, a saúde ambiental.
Nos regimes constitucionais modernos, como o português (1976), o espanhol (1979) e o brasileiro (1988),
a proteção do meio ambiente, embora sem perder seus vínculos originais com a saúde humana, ganha identidade
própria, porque é mais abrangente e compreensiva. Nessa nova perspectiva, o meio ambiente deixa de ser
considerado um bem jurídico per accidens e é elevado à categoria de bem jurídico per se, isto é, com autonomia
em relação a outros bens protegidos pela ordem jurídica, como é o caso da saúde humana.
De fato, a Carta brasileira erigiu-o à categoria de um daqueles valores da ordem social, dedicando-lhe,
a par de uma constelação de regras esparsas, um capítulo próprio que, definitivamente, institucionalizou o
direito ao ambiente sadio como um direito fundamental do indivíduo.
Deveras, a Constituição define o meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito de todos e lhe
dá a natureza de bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo a corresponsabilidade
do cidadão e do Poder Público pela sua defesa e preservação (art. 225, caput).
Ao proclamar o meio ambiente como “bem de uso comum do povo”, foi reconhecida a sua natureza de
“direito público subjetivo”, vale dizer, exigível e exercitável em face do próprio Estado, que tem também a missão
de protegê-lo.
(…)
Lembrando que a proteção do meio ambiente é pressuposto para o atendimento de outro valor
fundamento – o direito à vida –, cuidou o ordenamento constitucional de prescrever uma série de garantias ou
mecanismos capazes de assegurar a cidadania os meios de tutela judicial daquele bem (dentre outros: ação direta
de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, ação civil pública, ação popular constitucional; mandado de
segurança coletivo; mandado de injunção)” (Édis Milaré, 2007, p. 142/143).

Em suma, o meio ambiente ecologicamente equilibrado é formalmente direito fundamental (previsão


normativa) e materialmente direito fundamental (condição indispensável para a realização da dignidade da
pessoa humana, fonte da qual provêm todos os direitos fundamentais). Dessa forma, possui todas as
características dos direitos fundamentais: a) historicidade (decorre de conquistas por lutas dos povos em prol da
defesa do meio ambiente); b) universalidade (dirige-se a toda a população mundial); c) irrenunciabilidade (o povo
não pode abrir mão do direito ao equilíbrio ambiental); d) inalienabilidade (está fora do comércio); e)
limitabilidade (são direitos relativos, pois nenhum direito fundamental é absoluto); e f) imprescritibilidade (não
prescrevem pelo não exercício).

Ademais, o meio ambiente ecologicamente equilibrado é presente no Brasil na dimensão objetiva e na


subjetiva. A objetiva impõe diretrizes ambientais aos poderes constituídos e a toda a coletividade no sentido
de respeitar a normatização para a preservação ambiental e o desenvolvimento sustentável. Logo, houve a

149
irradiação desse direito fundamental às relações privadas, bem como a sua elevação à categoria de princípio
constitucional. Da mesma forma, deflagrou-se a eficácia vinculante aos três Poderes da República, a sua
aplicabilidade direta e eficácia imediata, inclusive entre terceiros, ou seja, entre seus pares, e não só entre
particular e Estado. Por conseguinte, é possível concluir pela eficácia dirigente do direito fundamental ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado (pois este vincula os três Poderes do Estado na busca de sua efetivação) e
pela eficácia irradiante (que norteia a interpretação e aplicação das disposições infraconstitucionais), da qual
decorre a eficácia horizontal que alonga tal direito ao plano privado. Já a dimensão subjetiva fez nascer um
direito prestacional positivo e negativo ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, em que todos os
integrantes da sociedade brasileira são simultaneamente credores e devedores, obrigando-se a prestações de
fazer ou não fazer, conforme prescrito pelas leis ambientais.

São efeitos importantes do reconhecimento como direito fundamental12: i) imprescritibilidade da


pretensão de reparação do dano ambiental, em decorrência da imprescritibilidade dos direitos fundamentais; ii)
vedação ao retrocesso ecológico e previsão de um mínimo existencial ecológico; iii) criação de deveres
ambientais por simples ato regulamentar: efeito da eficácia imediata dos direitos fundamentais.

II. Bens Ambientais

Os bens ambientais são de uso comum do povo e têm como características serem autônomos, imateriais
e de natureza difusa. A doutrina os classifica em: a) Meio Ambiente Natural (ou físico): são os elementos que
existem mesmo sem a influência do homem. Art. 225, CRFB/88, Ex. solo, água, ar, fauna, flora; b) Meio Ambiente
Artificial: são os elementos criados pelo homem, na interação com a natureza. Ex.: casa, prédio, art. 182, CRFB/88;
c) Meio Ambiente Cultural: são os elementos criados ou utilizados pelo homem, mas que detém valor especial
para a sociedade. Ex.: valor científico, turístico, cultural, arqueológico, ligado à cultura, à memória arts. 215 e 216,
da CRFB/88; d) Meio Ambiente do Trabalho: consiste no ambiente de trabalho onde o homem exerce suas
atividades laborais, podendo ser um espaço fechado ou aberto. Esse meio ambiente está previsto na CF no artigo
220, inciso VIII, tendo sido expressamente reconhecido pelo STF no julgamento da ADI 3540; e) Meio ambiente
genético (controverso): o meio ambiente genético é composto pelos organismos vivos do planeta Terra, que
formam a sua diversidade ecológica. A maioria da doutrina o entende abarcado no meio ambiente natural, contra
Celso Antônio Pacheco Fiorillo e Terence Trennepohl.

Discorrendo sobre bens ambientais, Édis Milaré destaca o seguinte:


“a) O meio ambiente, bem de uso comum do povo, é bem público essencial considerado communes
omnium, consistente no equilíbrio ecológico e na higidez do meio e dos recursos naturais. É bem comum, geral,
difuso, indissociável da qualidade dos seus constitutivos e, por conseguinte, indivisível, indisponível e
impenhorável. Esse bem é alvo necessário da solicitude do Poder Público e da coletividade, que devem, em
conjunto, zelar continuamente por ele.
b) Os recursos naturais de origem biótica ou abiótica, que ordinariamente mantêm inter-relações se
inseridos num determinado ecossistema, são bens ambientais considerados res communes omnium; significa que
são bens tangíveis, reificados ou “coisificados”, vale dizer, são “coisas”. E, na medida em que se inserem no bem
maior, que, no caso, é a qualidade ambiental decorrente do equilíbrio entre as partes, eles são objetos de
legislação específica, no que tange à propriedade, à preservação, à manutenção, ao domínio, ao usufruto, à
sustentabilidade e a outros itens mais. Da proteção desses bens depende a qualidade geral do meio ambiente.
c) Os bens chamados de culturais, que, sem dúvida, integram o patrimônio ambiental nacional, devem ser
definidos como tais por meio de atos jurídicos e de gestão ambiental e, por isso, protegidos, mantidos e
perpetuados. Sem embargo, devem ser tratados como res communes omnium, na medida em que traduzem

12O STF já reconheceu, na ADPF n° 101, a existência dos “Princípios constitucionais (art. 225) a) do desenvolvimento sustentável e b) da equidade e
responsabilidade intergeracional”, bem como que “a busca de desenvolvimento econômico sustentável” é um preceito fundamental. No julgamento,
ratificou-se o entendimento manifestado na ADI 3.540-MC, no sentido de que a preservação do meio ambiente goza de regime de proteção especial,
decorrente de sua própria expressão constitucional, enquanto direito fundamental que assiste à generalidade das pessoas. Ao final, o STF entendeu que a
importação de pneus usados ou remoldados afronta os preceitos constitucionais de saúde e do meio ambiente ecologicamente equilibrado (arts. 170, inc. I
e VI e seu parágrafo único, 196 e 225 da Constituição do Brasil).

150
criações especiais do espírito humano e da sociedade, representam a memória nacional, alimentam valores de
ordem cultural e espiritual e contribuem para a qualidade de vida tomada como fato biológico ou como fato
existencial.
d) Em virtude da visão holística do meio ambiente, é necessário rever o conceito de “bens ambientais”:
são os que integram o Patrimônio Ambiental Nacional, não apenas os “naturais”. Assim, todo recurso ou bem
natural é ambiental; porém, nem todo bem ambiental é natural. De fato, o patrimônio ou os bens culturais não
figuram no elenco dos elementos naturais, embora constituam objeto do Direito e da Gestão do Ambiente, sendo
também alvo das políticas ambientais e da avaliação de impactos (...)”.

4A. Princípios de Direito Ambiental.

Fábio Milhas (30/09/2018)

1. Princípio do Meio Ambiente como Direito Humano Fundamental.


Apesar de não estar contido no rol do art. 5º da CR/88, o meio ambiente é considerado um direito fundamental,
sendo uma extensão do direito à vida e necessário à pessoa humana, previsto no artigo 225 da Constituição.
Cabe mencionar que, em vários momentos, a Constituição da República refere-se a princípios e normas-princípio
de conteúdo ambientalista, instituindo uma ordem constitucional ambiental, preocupada com a sadia qualidade
de vida e a dignidade da pessoa humana.

2. Princípio da Prevenção.
Previsto implicitamente no art. 225, da CR/88, traz a ideia de que se há base científica para prever os danos
ambientais decorrentes de determinada atividade lesiva ao meio ambiente, deve-se impor ao empreendedor
condicionantes no licenciamento ambiental para mitigar ou elidir os prejuízos.
O aludido princípio trabalha com a ideia de risco certo, conhecido ou concreto.
Por fim, este princípio, ao lado do princípio do poluidor-pagador, formam a base sobre a qual o Direito
Ambiental foi construído, sendo certo que o referido princípio foi previsto na Declaração de Estocolmo (1972 –
princípios 6 e 21) e na Declaração do Rio (ECO – 92 – princípio 2).
Já a Política Nacional do Meio Ambiente faz alusão à manutenção e proteção (Lei 6.938/81), sendo certo que
a CR/88, em seu art. 225, §1º, IV dispõe sobre a obrigatoriedade de EIA em obras ou atividades potencialmente
causadoras de significativa degradação ao meio ambiental.

3. Princípio da Precaução (vorsorgeprinzip).


Se determinado empreendimento puder, dentro de uma base razoável de probabilidade, causar danos
ambientais sérios ou irreversíveis, apesar da inexistência de certeza científica quanto aos efeitos dos danos e sua
extensão, o empreendedor deverá ser compelido a adotar medidas de precaução para elidir ou reduzir os riscos
ambientais para a população.
Este princípio se volta ao risco incerto, desconhecido ou abstrato, incidindo a máxima in dubio pro natura ou
salute, pois, quando houver ameaça de danos sérios ou irreversíveis, a ausência de absoluta certeza científica não
deve ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para precaver a
degradação ambiental.
Foi previsto expressamente na Declaração do Rio (ECO 92), sendo que a primeira lei que expressamente previu
o princípio foi a da Biossegurança (Lei nº 11.105/05 – art. 1º).
Há, ainda, duas convenções internacionais promulgadas pelo Brasil que inseriram o princípio da precaução
em seus textos: a CONVENÇÃO DA DIVERSIDADE BIOLÓGICA e a CONVENÇÃO QUADRO DAS NAÇÕES UNIDAS
SOBRE A MUDANÇA DO CLIMA.
Por fim, cabe esclarecer que existem três correntes que diferenciam o conteúdo, a extensão e a acepção desse
princípio: 1) radical: não tolera qualquer risco; 2) minimalista: exige a presença de riscos sérios e irreversíveis; e
3) intermediária: o risco deve ser baseado na ciência e deve ser crível, mas não exclui a moratória e adota a teoria
dinâmica da distribuição do ônus da prova.

4. Princípio do desenvolvimento sustentável ou do ecodesenvolvimento.

151
O desenvolvimento sustentável tem como pilar a harmização das seguintes vertentes: crescimento econômico,
preservação ambiental e equidade social. Logo, o aludido princípio prega que haja um desenvolvimento
econômico que observe a capacidade máxima de suporte dos ecossistemas, pois as presentes gerações deverão
consumir as parcelas necessárias dos recursos naturais sem privar as futuras gerações das suas porções.
Numa visão ecointegradora, trata-se de estabelecer um liame entre o direito ao desenvolvimento, em todas as
suas dimensões (humana, física, econômica, política, cultural, social), e o direito a um ambiente sadio, edificando
condições para que a humanidade possa projetar o seu amanhã.
O conceito de desenvolvimento sustentável é fornecido pelo chamado Relatório Brundtland (“Nosso Futuro
Comum”), produzido em 1987 pela Comissão Mundial sobe o Meio Ambiente e Desenvolvimento (Comissão da
ONU), como sendo “um desenvolvimento que faz face às necessidades das gerações presentes sem comprometer
a capacidade das gerações futuras na satisfação de suas próprias necessidades”.
A Constituição Federal, por sua vez, alberga esse princípio, no art. 170, caput, e inc. VI, e art. 225, caput.
E muito antes do Texto Constitucional, a Lei n. 6.938/1981, que adotou a Política Nacional do Meio Ambiente,
já elencava entre os objetivos da PNMA a compatibilização do desenvolvimento econômico e social com a
preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico (art. 4º, I).
A Declaração de Estocolmo já acentuava, também, no Princípio 4, que os Estados, ao planejarem o
desenvolvimento econômico, devem atribuir atenção especial à conservação da natureza, evitando-se, ao mesmo
tempo, o risco de esgotamento dos recursos naturais (Princípio 5).
A Declaração do Rio de Janeiro de 1992 seguiu essa mesma diretriz. O desenvolvimento sustentável traz em si
o reconhecimento de que os recursos naturais não são inesgotáveis.
A diversidade de concepções sobre a sustentabilidade pode ser resumida através de três distintas
configurações/correntes trazidas por Renn, citado por Romeu Thomé: a) antropocentrismo utilitarista: considera
a natureza como principal fonte de recurso para atender as necessidades do ser humano. Predominante desde a
Revolução Industrial até meados de 1950; b) antropocentrismo protecionista (atual corrente): tem a natureza
como um bem coletivo essencial que deve ser preservado como garantia de sobrevivência e bem-estar do homem.
Impõe-se, por conseguinte, equilíbrio entre as atividades humanas e os processos ecológicos essenciais; c)
ecocêntrica: entende que a natureza pertence a todos os seres vivos, e não apenas ao homem, exigindo uma
conduta de extrema cautela em relação à proteção dos recursos naturais, com clara orientação holística.
Nosso ordenamento jurídico adotou a visão antropocêntrica protecionista, tal como a maioria das normas
ambientais nacionais e internacionais.

5. Princípio do Poluidor-Pagador ou da responsabilidade ou da reparação.

Tem previsão constitucional no art. 225, § 3º, sendo certo que deverá o empreendedor responder pelos custos
sociais da degradação causada por sua atividade impactante, devendo-se agregar esse valor no custo produtivo
da atividade, para se evitar que se privatizem os lucros e se socializem os prejuízos ambientais, que também
deverão ser internalizados (internalização das externalidades negativas).

Cumpre esclarecer que este princípio não deverá ser interpretado de forma que haja abertura para a poluição
incondicionada, desde que se pague (não é pagador-poluidor), só podendo o poluidor degradar o meio-ambiente
dentro dos limites de tolerância previstos na legislação ambiental, após regular licenciamento ambiental.

Oportuno mencionar que tal princípio também foi previsto na Declaração do Rio de 1992 (princípio 16).

Por fim, há o Enunciado nº 22 da 4ª CCR/MPF sobre o tema: “Enunciado nº 22 - As Ações Civis Públicas relativas
a meio ambiente e a patrimônio cultural deverão contemplar, em atenção ao princípio do poluidor-pagador, o
repasse ao infrator de todos os custos administrativos, inclusive do trabalho pericial.”

6. Princípio do Usuário-Pagador.
Trata-se de evolução do princípio do poluidor-pagador, sendo oportuno observar que o uso gratuito de recursos
naturais às vezes pode representar enriquecimento ilícito por parte do usuário, pois a comunidade que não usa
ou usa em menor escala fica onerada.

152
Não deve ser encarado como punição, pois poderá ser implementado mesmo sem haver comportamento ilícito
(art. 4º, VII, da Lei 6.938/81).

Por esse princípio, as pessoas que utilizam os recursos naturais (escassos) devem pagar pela sua utilização,
mesmo que não haja poluição, sendo mais abrangente que o Princípio do Poluidor-pagador, a fim de demonstrar
a economicidade dos recursos naturais.

7. Princípio da Cooperação entre os povos.


A integração e a cooperação no campo da proteção do meio ambiente determinam a conjugação de esforços
entre sociedade e Estado, no sentido da realização de uma política ambiental consentânea com o valor a ser
protegido.
Nessa mesma linha, o caráter transfronteiriço do processo de degradação do meio ambiente aponta para a
necessidade de implementação de mecanismos de cooperação internacional, mediante a inspiração do princípio
em tela.
A cooperação internacional no campo da proteção do meio ambiente encontra-se prevista na Declaração sobre
o Ambiente Humano, resultante da Conferência de Estocolmo, em 1972, ou a Agenda 21 e nos Princípios 7, 9, 12,
18, 19 e 27 da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (ECO/1992).

8. Princípio da Solidariedade intergeracional ou princípio da equidade intergeracional.


O princípio surge na década de 1980, relacionado às mudanças globais que caracterizaram a segunda metade
do século XX, como o vertiginoso aumento populacional, os efeitos relacionados à diminuição da camada de
ozônio, a depleção de recursos ambientais, e a constatação de sua escassez.

Inspirado na parte final do caput do art. 225, da CR/88, e também previsto no princípio 3 da Declaração do
Rio de 1992, prevê que as presentes gerações devem preservar o meio ambiente e adotar políticas ambientais
para a presente e as futuras gerações, não podendo utilizar os recursos ambientais de maneira irracional de modo
que prive seus descendentes do seu desfrute.

9. Princípio da natureza pública ou obrigatoriedade da proteção ambiental ou princípio da obrigatoriedade da


intervenção (atuação) estatal.
Decorre da declaração de Estocolmo (1972), possui previsão na CR/88 (art. 225 – dever de defender e preservar
o meio ambiente), na Declaração do Rio de 1992, bem como no art. 2º, inc. I, da Lei 6.938/81, prevendo que é
dever irrenunciável do Poder Público promover a proteção do meio ambiente, por ser bem difuso e indispensável
à vida humana sadia e também da coletividade, onde dimensão coletiva deve preponderar, via de regra, sobre os
interesses individuais

10. Princípio da Participação Comunitária ou participação cidadã/popular ou princípio democrático.


Possui previsão no caput do art.225 da CR/88 e no Princípio nº 10 da Declaração do Rio de Janeiro de 1992,
dispondo que as pessoas têm o direito de participar ativamente das decisões políticas ambientais, em decorrência
do sistema democrático semidireto, uma vez que os danos ambientais são transindividuais. Esse princípio se
concretiza nas audiências públicas em licenciamentos ambientais mais complexos (EIA/RIMA).

11. Princípio da função socioambiental da propriedade.


O direito de propriedade é relativo e deve ser exercido em consonância com a sua função social, em especial a
função socioambiental (art. 186, III, CR/88), sendo o princípio que justifica serem as obrigações ambientais propter
rem.

12. Princípio da Informação ou da Publicidade.


Segundo esse princípio, o Poder Público deve propiciar à sociedade o pleno acesso às informações relativas às
políticas públicas sobre meio ambiente, bem como sobre a existência de atividades potencialmente nocivas ao
bem estar das comunidades.

153
13. Princípio do Limite ou Controle do poluidor pelo Poder Público.
Cuida-se de dever estatal de editar e efetivar normas jurídicas que instituam padrões máximos de poluição, a
fim de mantê-la dentro de bons níveis para não afetar o equilíbrio ambiental e a saúde pública, tendo previsão no
art.225, § 1º, V da CR/88 e no art.9º, inc. I, da Lei nº 6.938/81.

14. Princípio da correção, prioritariamente na fonte ou princípio do produtor-eliminador ou princípio da auto-


suficiência ou princípio da proximidade (José Joaquim Gomes Canotilho).
Para ele, o aludido princípio relaciona-se, de certo modo, com o princípio da prevenção, onde se deve buscar
o desenvolvimento de ações preventivas no sentido de corrigir na origem, tanto quanto possível, os fatos
geradores de degradação ambiental.

15. Princípio da reparação integral.


Invocado pelo STJ em seus julgados (ex: REsp 1.328.753-MG), o princípio em questão indica que se deve conduzir
o meio ambiente e a sociedade a uma situação, na medida do possível, equivalente à anterior ao dano.

16. Princípio da vedação do retrocesso ecológico (José Joaquim Gomes Canotilho) ou non cliquet ambiental ou
da vedação do retrocesso ambiental.
O fundamento desse princípio encontra-se na necessidade de preservação da vida e como o direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado é dotado de status de direito fundamental, as garantias de proteção
ambiental, uma vez conquistadas, não podem retroceder, sendo inadmissível o recuo da salvaguarda ambiental
para níveis de proteção inferiores aos já consagrados, a não ser que as circunstâncias de fato sejam
significativamente alteradas.

17. Princípio do Protetor-recebedor.


É a outra face da moeda do princípio do poluidor-pagador, e defende que os indivíduos responsáveis pela
proteção do meio ambiente devem ser agraciados com benefícios de alguma ordem, pois estão colaborando com
toda a sociedade, tendo previsão expressa no art. 6º, II, da Lei nº 12.305/10 (Política Nacional de Resíduos Sólidos),
bem como no Código Florestal (art. 1-A).

22C. Desenvolvimento sustentável. Aquecimento global.

Sadi Machado 5/10/18

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL.
O princípio do desenvolvimento sustentável objetiva harmonizar as vertentes do crescimento
econômico; da preservação ambiental e da equidade intergeracional (justo equilíbrio entre os imperativos da
economia e da ecologia). Segundo a definição do Relatório Brundtland (“Nosso Futuro Comum”, publicado em
1987, desenvolvimento sustentável é que “satisfaz as necessidades do presente sem pôr em risco a capacidade
das gerações futuras de terem suas próprias necessidades satisfeitas”. Tal Relatório resultou dos esforços de
avaliação quanto aos avanços dos processos de degradação ambiental e a eficácia das políticas ambientais para
combatê-los, realizadas no âmbito da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, criada em
1984 pelo então Secretário Geral das Nações Unidas (ONU), Javier Pérez de Cuellar. O Relatório Brundtland
cunhou a expressão “equidade intergeracional” (intergeneration equity), e suas recomendações inspiraram a
realização da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento do Rio de Janeiro de 1992
(ECO 92), resultando na Declaração do Rio, que consolida tal princípio sob diversos enfoques.
A CF/88 incorpora a dimensão intergeracional do princípio do desenvolvimento sustentável, ao dispor,
no caput do art. 225 da CF/88, “o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
Também se consagra, no art. 170, VI, da CR/88, que a ordem econômica, fundada na livre iniciativa e na valorização
do trabalho humano, deverá regrar-se pelos ditames da justiça social e da defesa do meio ambiente.
A “promoção do desenvolvimento sustentável” é um dos objetivos do Sistema Nacional de Unidades
de Conservação (SNUC). “Reserva de Desenvolvimento Sustentável” é uma das categorias de unidade de

154
conservação que constituem o grupo das unidades de uso sustentável, sendo definida como “uma área natural
que abriga populações tradicionais, cuja existência baseia-se em sistemas sustentáveis de exploração dos recursos
naturais, desenvolvidos ao longo de gerações e adaptados às condições ecológicas locais e que desempenham um
papel fundamental na proteção da natureza e na manutenção da diversidade biológica”.
O STF já reconheceu (ADPF 101) a existência do princípio do desenvolvimento sustentável e da equidade
e responsabilidade intergeracional”, bem como que “a busca de desenvolvimento econômico sustentável” é um
preceito fundamental.
O pagamento por serviços ambientais fundamenta-se nos princípios da prevenção e do
desenvolvimento sustentável (27º CPR).

AQUECIMENTO GLOBAL
“A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima” (UNFCCC) é o 1º documento
internacional a tratar do tema. Assinada durante a Rio-92, é um marco histórico, que reconhece que a estabilidade
do sistema climático do planeta pode ser afetada por emissões de dióxido de carbono e outros gases causadores
do efeito estufa por fontes antrópicas. Objetiva estabilizar as concentrações de gases de efeito estufa na atmosfera
em um nível que impeça uma interferência antrópica perigosa no sistema climático. Esse nível deverá ser
alcançado em um prazo suficiente que permita aos ecossistemas se adaptarem naturalmente à mudança do clima,
assegurando que a produção de alimentos não seja ameaçada e que o desenvolvimento econômico prossiga de
maneira sustentável.
A partir de sua assinatura, os países signatários se reunem anualmente em Conferências das Partes
Signatárias da Convenção-Quadro sobre Mudanças Climáticas (COPs), para debate das questões relacionadas ao
aquecimento global. Dentre estes se destaca o realizado no Japão, em 1997, originário do Protocolo de Kyoto
(COP 7). O documento ostenta autonomia em relação à Convenção-Quadro: os EUA, p. ex., embora signatários da
Convenção-Quadro, não assinaram o Protocolo. O Protocolo estipula metas e prazos para todos 4 gases que
produzem efeito estufa: dióxido de carbono, metano, óxido nitroso e hexafluoreto de enxofre; e duas famílias de
gases: hidrofluorcarbonos (HFCs) e perfluorcarbonos (PFCs). As reduções de tais gases devem ser traduzidas em
“equivalentes de CO2”.
COP-21 (Acordo de Paris): segundo o art. 2º, busca-se "o reforço da implementação" da UNFCCC através
de: "(a) Assegurar que o aumento da temperatura média global fique abaixo de 2°C acima dos níveis pré-industriais
e prosseguir os esforços para limitar o aumento da temperatura a até 1,5°C acima dos níveis pré-industriais,
reconhecendo que isto vai reduzir significativamente os riscos e impactos das alterações climáticas; (b) Aumentar
a capacidade de adaptação aos impactos adversos das alterações climáticas e promover a resiliência do clima e o
baixo desenvolvimento de emissões de gases do efeito estufa, de maneira que não ameace a produção de
alimentos; (c) Criar fluxo financeiros consistentes na direção de promover baixas emissões de gases de efeito
estufa e o desenvolvimento resistente ao clima".

2.COMPETÊNCIAS AMBIENTAIS NA CF/88


2.1. Competê ncias ambientais na federação brasileira. Açõ es de cooperação. (5.a)
2.2 Poder de poli ́cia ambiental. Competê ncias. (21.c)

5A. Competências ambientais na Federação Brasileira. Ações de Cooperação.

Elaborado por Robert Rigobert Lucht.


Fonte: Direito Ambiental. Frederico Amado, 2017, 5ª ed.

Competência administrativa (material): comum (art. 23, III, IV, VI, VII e XI, da CF). Fiscalização pelo IBAMA
(autarquia federal), órgãos estaduais e municipais.

Excepcionalmente:
Competências exclusivas da União Competência exclusiva dos
(art. 21, IX, XVIII, XIX, XX e XXIII, CF) Municípios
(art. 30, VIII, da CF)

155
IX - planos nacionais e regionais de ordenação do território e de Promoção do adequado
desenvolvimento econômico e social; ordenamento territorial, mediante
XVIII - defesa permanente contra as calamidades públicas, planejamento e controle do uso, do
especialmente secas e inundações; parcelamento e da ocupação do solo
XIX - sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos e urbano.
critérios de outorga de direitos de seu uso;
XX - diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação,
saneamento básico e transportes urbanos;
XXIII - serviços e instalações nucleares de qualquer natureza e exercer
monopólio estatal sobre a pesquisa, a lavra, o enriquecimento e
reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios
nucleares e seus derivados, atendidos os seguintes princípios e
condições:
a) toda atividade nuclear em território nacional somente para fins
pacíficos e mediante aprovação do Congresso Nacional;
b) no regime de permissão, é autorizado comércio de radioisótopos
para pesquisa e usos médicos, agrícolas e industriais;
c) no regime de permissão, é autorizado comércio de radioisótopos
de meia-vida igual ou inferior a 2 hs; e
d) responsabilidade civil por danos nucleares independe da existência
de culpa.

Competência legislativa: concorrente, com legislação suplementar municipal, cfe interesse local.
(arts. 24, VI, VII e VIII e 30, I e II, CF)

STF (Pleno, jun/2017): Município tem competência para legislar sobre meio ambiente e controle da poluição,
quando se tratar de interesse local. A competência para legislar sobre o meio ambiente é concorrente, cfe. art.
24, VI e VIII.

STF (ADI/MC 1893, de 18/12/1998): Meio ambiente do trabalho está fora da competência legislativa concorrente.

Não há competência concorrente para legislar sobre águas, energia, jazidas, minas e outros recursos minerais,
cabendo privativamente à União tratar do tema (art. 22, IV, XII, XXVI, da CF).

Alcance da expressão “direito de águas”: CF diz que é competência privativa da União. Contudo, Cid Tomanik
Pompeu defende a competência legislativa dos Estados em alguns casos, pois estes entes são proprietários das
águas, nos termos do art. 26, I, da CF.

LC 140/11 regulamentou a competência administrativa comum:


U, E, DF e M: devem harmonizar suas políticas e ações administrativas, para evitar a sobreposição de atuação.
As competências da União, dos Estados e dos Municípios foram listadas nos arts. 7, 8 e 9, respectivamente (LER).

Principais critérios definidores da competência material para licenciamento ambiental:


a) dimensão do impacto ambiental (decorre do princípio da preponderância do interesse)
- impacto regional ou nacional: da União. Ex.: destinação dos rejeitos radioativos está sujeita a
licenciamento exclusivamente federal, independentemente da titularidade dos terrenos selecionados para
depósitos finais.
- impacto estadual: do Estado
- impacto local: do Município
b) dominialidade do bem público: ente que possui o domínio tem a competência.

Exceções:

156
- caso se trate de competência para licenciamento em unidades de conservação (salvo Áreas de Preservação
Ambiental – APAs): critério do ente federativo instituidor (ente que instituiu, licencia).
- caso se trate de licenciamento em APAs, a competência do licenciamento será:
Do IBAMA Dos Estados Dos Municípios
- no Brasil + país limítrofe Atribuição residual Impacto local
- no mar
- em mais de um Estado
- de caráter militar
- estabelecida por ato do
Executivo.

Outro critério, que é residual, é o da atuação supletiva (a seguir).

Conceitos importantes da LC 140/2011:


a) atuação supletiva: ação do ente da Federação que se substitui ao ente federativo originariamente detentor
das atribuições. Ocorre quando:
I – inexiste órgão ambiental no Estado ou no DF: União deve desempenhar as ações administrativas estaduais;
II – inexiste órgão ambiental no Município: Estado deve desempenhar as ações administrativas municipais; e
III – inexiste órgão ambiental no Estado e no Município: União deve desempenhar as ações administrativas.
b) atuação subsidiária: ação do ente da Federação que visa a auxiliar no desempenho das atribuições decorrentes
das competências comuns, quando solicitado pelo ente federativo originariamente detentor das atribuições
definidas na LC.

Ações de cooperação: LC 140/2011 estabeleceu as normas de cooperação no que pertine às competências


ambientais e possibilitou a delegação, mediante convênio, da execução das ações administrativas, condicionada
à existência de estrutura adequada do ente delegatário. Os instrumentos de cooperação são:
a) consórcios públicos – celebrados pelas entidades políticas (Lei 11.107/05);
b) convênios – ajustes realizados entre PJs de direito público ou entre estas e particulares, com interesses
convergentes. Pode ser por prazo indeterminado;
c) fundos públicos e privados, podendo ser citado o Fundo Nacional do Meio Ambiente (foi criado pela Lei
7.797/89);
d) delegação de atribuições ambientais de um ente a outro, mediante convênio, desde que o destinatário de
delegação possua órgão ambiental capacitado a executar as ações administrativas e conselho de meio ambiente;
e) comissões com poderes para deliberar sobre a competência para promoção de licenciamento ambiental.

Órgão que licencia e autoriza empreendimento  fiscaliza e lavra auto de infração. Mas é possível também a
fiscalização por outros entes federativos de atribuição comum. Prevalecerá auto de infração ambiental lavrado
por órgão que detenha a atribuição de licenciamento ou autorização.

Lei 9.873/99 (estabelece prazo de prescrição para o exercício de ação punitiva pela Administração Pública Federal,
direta e indireta, e dá outras providências) se aplica às ações administrativas punitivas dos Estados e Municípios?
Não. Trata-se de Lei Federal, cfe art. 1° (STJ, ago/2017).

21C. Poder de polícia ambiental. Competências.

Aline Morais

CONCEITO: Poder-Dever estatal de limitar o exercício de direitos de liberdade e de propriedade em prol


do meio ambiente.
Segundo Paulo Affonso Leme Machado, o Poder de Polícia Ambiental é "a atividade da Administração
Pública que limita ou disciplina direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou a abstenção de fato
em razão de interesse\público concernente à saúde da população, à conservação dos ecossistemas, à

157
disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividade econômica ou de outras atividades
dependentes de concessão, autorização/premissão ou licença do Poder Público de cujas atividades possam
decorrer poluição ou agressão à natureza"
CARACTERÍSTICAS E ATRIBUTOS: Em face do princípio da obrigatoriedade da proteção ambiental é
vinculado na face repressiva – visto ser o meio ambiente bem indisponível (que não admite ser objeto de
transação) e discricionário na face preventiva; dotado de autoexecutoriedade (execução independente de
autorização judicial) e coercibilidade (imposição coativa).
FUNDAMENTOS JURÍDICOS - art 225 CRFB – direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, dever
de todos; Art 23 CRFB – competência material comum (administrativa), III - proteger os documentos, as obras e
outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios
arqueológicos”; VI - “proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas” ; VII -
“preservar as florestas, fauna e flora; LC 140/2011 – COMPETÊNCIA COMUM MATERIAL- proteger, defender e
conservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado, promovendo gestão descentralizada, democrática e
eficiente. Competência administrativa para fiscalizar, exercer o poder de polícia ambiental. O responsável pelo
licenciamento é o responsável pela fiscalização (Tema controvertido objeto da ADI 4757)
Principais alegações: (a) A LC deveria apenas prever mecanismos de cooperação (parágrafo único do art.
23 da CF), mas estabeleceu competências privativas, impedindo a atuação dos órgãos federais, que antes era
irrestrita; (b) a segregação das atribuições seria tão grande que afetaria a própria competência comum. Assim,
agridiria o art. 225, CR, que impõe que a proteção do meio ambiente é dever do Poder Público (o que abrangeria
todos os entes); (c) foram atribuídos poderes normativos irrestritos à Comissão Tripartite, que poderá impor
obrigações e deveres por meio de “proposição”, fixando direitos e deveres sem previsão legal, violando o art. 5º
e inc. II e art. 37 da CR.
Parecer PGR(Duprat) - deferimento parcial do pedido liminar, tão só para que se confira interpretação
conforme a Constituição ao art. 17, § 3º, da LC 140/2011, de tal modo que a cláusula final, 'prevalecendo o auto
de infração ambiental lavrado por órgão que detenha a atribuição de licenciamento ou autorização a que se
refere o caput', opere quando idônea para impedir ou fazer cessar o dano ambiental. E também para que se
entenda que a LC 140/2011, em tudo aquilo que diga respeito à atividade de fiscalização, rege-se pelos
princípios da subsidiariedade e da proibição de proteção deficiente.
Duprat negou a existência de vício formal ou material quanto à repartição de competências. Afirmou que
no caso da competência comum não se exige que todas as ações sejam integradas e que a atuação conjunta
deveria ser por meio de políticas públicas e diretrizes. (https://mpf.jusbrasil.com.br/noticias/3171594/pgr-lei-
que-trata-da-cooperacao-na-protecao-ambiental-nao-possui-vicio-formal)
Paulo de Bessa Antunes é favorável à lei por dar segurança ao cidadão que vivia uma situação de fiscalização
lotérica sem saber o verdadeiro responsável pelo exercício do poder de polícia ambiental. Observa ainda que a
visibilidade do trabalho de fiscalização despertava o interesse em atuar fora dos limites de suas atribuições, bem
como abria margem para a corrupção.
Por ser fruto da competência comum, em interpretação conforme (principios da subsidiariedade e da vedação à
proteção deficiente), admite fiscalização pelos órgãos ambientais de execução, de qualquer esfera de governo. Caso haja
concorrência de laudos de infração, prevalece o do órgão responsável pelo licenciamento.

PODER DE POLÍCIA AMBIENTAL PREVENTIVO - Marcelo Dawalibi afirma que "os atos de polícia em
matéria ambiental são instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente” Artigo 9º da lei 6938/81: o
estabelecimento de padrões de qualidade ambiental (inciso I); zoneamento ambiental (inciso II); avaliação de
impactos, licenciamento ambiental e a respectiva revisão das atividades potencialmente poluidoras.
LICENCIAMENTO AMBIENTAL. Ocorre para evitar ilícitos e danos ao meio ambiente. A exigência de
licenciamento para atividades potencialmente poluidoras, que causem degradação ambiental ou use recursos
ambientais é sua principal forma de exercício.
O licenciamento é feito pelo único ente competente, conforme LC 140/2011 e vale para todo o território
nacional.
Regra geral: localização e abrangência do empreendimento e do impacto.
Município – impacto local
Estado - mais de um município de seu território ou estadual; além da competência residual

158
União – impacto nacional ou mais de um Estado, terra indígena; Atividade nuclear ou militar – quando a)
localizados ou desenvolvidos conjuntamente no Brasil e em país limítrofe; b) localizados ou desenvolvidos no mar
territorial, na plataforma continental ou na zona econômica exclusiva; c) localizados ou desenvolvidos em terras
indígenas; d) localizados ou desenvolvidos em 2 (dois) ou mais Estados;
obs: Área terrestre e marítima da zona costeira afetadas de forma concomitante – União só se ato do Poder
Executivo o definir, a partir de proposição da Comissão Tripartite (União não quer se ocupar com pequenos
empreendimentos, a exemplo de pequenas barracas e aluguéis de bananas boat).
Intervenção de órgãos externos no licenciamento ambiental: Paulo de Bessa Antunes anota que houve
necessidade de elencar os juridicamente interressados em opinar nos casos de licenciamento pela União. A
Portaria Interministerial nº 419, 26/10/2011 enumera a atuação da Fundação Nacional do Índio-FUNAI, da
Fundação Cultural Palmares-FCP, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional-IPHAN e do Ministério
da Saúde, incumbidos da elaboração de parecer em processo de licenciamento ambiental de competência federal,
a cargo do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis-IBAMA. Para fins de aplicação
da Portaria, foram dadas algumas definições, tais como a de “estudos ambientais”; “bens culturais acautelados”;
“Ficha de Caracterização de Atividade - FCA”; “licença ambiental”; “licenciamento ambiental”; “órgãos e entidades
envolvidos no licenciamento ambiental”; “regiões endêmicas de malária”; “termo de referência - TR”; “termos de
referência específicos”; “terra indígena”; “terra quilombola”.

Licenciamento em Unidades de Conservação – ente instituidor, exceto APAs (seguem regra geral). Órgão
responsável pela administração deve autorizar caso o empreendimento afete a UC (independente do grupo) ou
sua zona de amortecimento (poder de veto). Deverá ainda ser uma das beneficiárias da compensação definida na
legislação. Norma aplicável: Res. CONAMA 428/2010: Dispõe, no âmbito do licenciamento ambiental sobre a
autorização do órgão responsável pela administração da Unidade de Conservação (UC), de que trata o § 3º do artigo
36 da Lei nº 9.985 de 18 de julho de 2000, bem como sobre a ciência do órgão responsável pela administração da
UC no caso de licenciamento ambiental de empreendimentos não sujeitos a EIA-RIMA e dá outras providências.

ATUAÇÃO SUPLETIVA - ação do ente da Federação que substitui o ente federativo originariamente detentor
das atribuições. Se o município não tiver órgão ambiental capacitado ou conselho de meio ambiente, o Estado
deve atuar. Caso o Estado também não possua, a atribuição é da União.
ATUAÇÃO SUBSIDIÁRIA - Ação do ente da Federação que visa a auxiliar no desempenho das atribuições
decorrentes das competências comuns, quando solicitado pelo ente federativo. Da-se por meio de apoio técnico,
científico, administrativo ou financeiro, sem prejuízo de outras formas de cooperação.
INSTRUMENTOS DE COOPERAÇÃO –Destaca-se a possibilidade de delegação, mediante convênio, caso o
ente delegado disponha de órgão ambiental capacitado (arts. 4 e 5).

Medidas para aceleração do licenciamento ambiental (procedimentos simplificados): editadas pelo


Ministério do Meio Ambiente a fim de agilizar os procedimentos de licenciamento perante o IBAMA. Exs.: Portaria
420/2011 (procedimentos a serem aplicados pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis - IBAMA - na regularização e no licenciamento ambiental das rodovias federais.); Portaria 421/2011
(Dispõe sobre o licenciamento e a regularização ambiental federal de sistemas de transmissão de energia elétrica
e dá outras providências); Portaria 422/2011 (Dispõe sobre procedimentos para o licenciamento ambiental federal
de atividades e empreendimentos de exploração e produção de petróleo e gás natural no ambiente marinho e
em zona de transição terra-mar.); Portaria 423/2011 (Institui o Programa de Rodovias Federais Ambientalmente
Sustentáveis para a regularização ambiental das rodovias federais.); Portaria 425/2011 (Institui o Programa
Federal de Apoio à Regularização e Gestão Ambiental Portuária - PRGAP de portos e terminais portuários
marítimos, inclusive os outorgados às Companhias Docas, vinculadas à SEP/PR.). Para Paulo de Bessa Antunes, as
Portarias são frutos de uma tentativa de solução para problemas reais; todavia, estariam eivadas de vício de
iniciativa, “haja vista que dispor sobre licenciamento ambiental federal é atribuição do Conselho Nacional do
Meio Ambiente” (p. 23).
Licença especial para fins científicos: art. 14 da Lei 5197/67 (Código de Caça). É referente à coleta de
material para fins científicos e é outorgada a cientistas devidamente credenciados. Regulamentação: Portaria
332/1990 do IBAMA.

159
PODER DE POLÍCIA AMBIENTAL PUNITIVO – viés repressivo do poder de polícia ambiental. Ocorre com a
autuação e lavratura de auto de infração ambiental. Como base no princípio da simetria, a LC 140/2011 prevê
que a sanção é aplicada pelo mesmo ente que licenciou.
Em respeito à competência comum e à vedação à proteção deficiente, a lei prevê que todos os entes podem
fiscalizar e lavrar autos de infração. A legislação ainda define que no caso de dupla sanção prevalece a aplicada
pelo responsável pelo licenciamento. O dispositivo aperfeiçoa o art. 76 da Lei 9.605/99, que dizia simplesmente
que a multa do Estado prevalecia sobre a da União.
Obs.: Na ADI 2544/RS o STF julgou inconstitucional lei do RS que atribuía aos municípios a proteção, guarda
e responsabilidade pelos sítios arqueológicos e seus acervos. O problema residiu na atribuição exclusiva desse
encargo aos Municípios, por tratar-se de competência material comum. Entendimento semelhante foi adotado nas
ADIs 2303 e 3525.
Os responsáveis pela fiscalização e exercício do poder de polícia ambiental têm atribuição para autuar,
inclusive, outros entes estatais que estejam infringindo a legislação e causando degradação ao meio ambiente. A
legislação não excepciona empreendimentos públicos ou atos de integrantes da administração – direta ou
indireta.

JURISPRUDÊNCIA
O IBAMA possui interesse jurídico e pode exercer poder de polícia administrativa ambiental dentro de área cuja
competência para o licenciamento seja do Município ou do Estado. A atividade fiscalizatória das atividades
nocivas ao meio ambiente concede ao IBAMA interesse jurídico suficiente para exercer seu poder de polícia
administrativa, ainda que o bem esteja situado em área cuja competência para o licenciamento seja do Município
ou do Estado. Nos termos da legislação federal de regência, a competência concorrente não inibe a atuação do
IBAMA, ainda mais não tendo havido a interferência de órgão ambiental local. STJ. 2ª Turma. REsp 1560916/AL,
Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 06/10/2016.
Ante a omissão do órgão estadual na fiscalização o IBAMA pode exercer o seu poder de polícia administrativa.
Havendo omissão do órgão estadual na fiscalização, mesmo que outorgante da licença ambiental, o IBAMA pode
exercer o seu poder de polícia administrativa, porque não se pode confundir competência para licenciar com
competência para fiscalizar. STJ. 1ª Turma. AgInt no REsp 1484933/CE, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em
21/03/2017.

• FATO CONSUMADO

Súmula 613-STJ: Não se admite a aplicação da teoria do fato consumado em tema de Direito Ambiental.
STJ. 1ª Seção. Aprovada em 09/05/2018, DJe 14/05/2018 (Info 624).
OBS: O que é a teoria do fato consumado? Segundo a teoria do fato consumado, as situações jurídicas
consolidadas pelo decurso do tempo, amparadas por decisão judicial, não devem ser desconstituídas, em
razão do princípio da segurança jurídica e da estabilidade das relações sociais (STJ. REsp 709.934/RJ). Trata-
se de uma espécie de convalidação da situação pelo decurso de longo prazo.

A teoria do fato consumado não se aplica para violações ao meio ambiente. Constatado que houve
edificação irregular em área de preservação permanente, o fato de ter sido concedido licenciamento
ambiental, por si só, não afasta a responsabilidade pela reparação do dano causado ao meio ambiente,
mormente quando reconhecida a ilegalidade do aludido ato administrativo (STJ. 2ª Turma. AgInt nos EDcl no
AREsp 359.140/MS, Rel. Min. Assusete Magalhães, julgado em 07/12/2017).
Declarada a sua nulidade, a situação fática deve retornar ao estado ex ante, sem prejuízo de eventual
reparação civil do lesado caso presentes os pressupostos necessários para tal. (STJ. 2ª Turma. REsp
1362456/MS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 28/06/2013).

O STJ possui precedentes negando a aplicação da teoria mesmo em casos envolvendo residências familiares
localizadas em área de proteção ambiental: tratando-se de construção irregular em Área de Proteção
Ambiental-APA, a situação não se consolida no tempo. Isso porque, a aceitação da teoria equivaleria a

160
perpetuar o suposto direito de poluir, de degradar. STJ. 1ª Turma. AgRg no RMS 28.220/DF, Rel. Min. Napoleão
Nunes Maia Filho, julgado em 18/04/2017.

obs: Se a ocupação for por comunidade tradicional, orienta-se a compatibilização e não a retirada.

QUESTÕES
29 Obj 39. SOBRE O PRINCÍPIO DO POLUIDOR PAGADOR É CORRETO AFIRMAR:
b) O princípio do poluidor pagador não elide a responsabilidade pela prevenção ao dano ambiental.
Obs das outras alternativas: princípio aplicável para prevenção e repressão - internalizar externalidade negativas,
reponsabilidade objetiva; prefere recuperação ambiental, mas não elide o ressarcimento.

29 Obj 40. ASSINALE, AO FINAL, A ALTERNATIVA QUE CORRESPONDE ÀS AFIRMATIVAS ABAIXO QUE ESTÃO
CORRETAS:
II – Embora cada Município tenha responsabilidade pela gestão integrada dos resíduos sólidos gerados no
respectivo território, é recomendável a criação de consórcios entre Municípios.

Art. 70. LEI 9605/1998 - Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole
as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente. (TJPR-2010)
(TJBA-2012-CESPE): A omissão da autoridade ambiental competente, sendo ela obrigada a agir, poderá
configurar infração administrativa ambiental.
Explicação: infração administrativa ambiental é toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso,
gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente. A Administração é solidária, objetiva e
ilimitadamente responsável, nos termos da Lei 6938/81, por danos urbanístico-ambientais decorrentes da
omissão do seu dever de controlar e fiscalizar, na medida em que contribua, direta ou indiretamente, tanto
para a degradação ambiental em si mesma, como para o seu agravamento, consolidação ou perpetuação,
tudo sem prejuízo de adoção, contra o agente público relapso ou desidioso, de medidas disciplinares, penais
e civis e no campo da improbidade administrativa (STJ, REsp 1071741-SP).

§ 1º São autoridades competentes para lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo
administrativo os funcionários de órgãos ambientais integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente -
SISNAMA, designados para as atividades de fiscalização, bem como os agentes das Capitanias dos Portos, do
Ministério da Marinha. (TJPR-2010)
(TJPE-2015-FCC): O auto de infração ambiental é um ato administrativo dotado de presunção relativa de
legalidade e veracidade.

161
3.TUTELA PREVENTIVA DO MEIO AMBIENTE
3.1 Sistema nacional do meio ambiente (SISNAMA). Poli ́tica nacional do meio ambiente. Princi ́pios e objetivos.
(8.c)
3.2 Espaços territoriais especialmente protegidos. Sistema nacional de unidades de conservação da natureza
(SNUC). (10.c)
3.3 Licenciamento ambiental. Avaliação de impactos ambientais. Estudos ambientais. Audiê ncias públicas. (15.c)
3.4 Zoneamento ambiental. Natureza juri ́dica. Princi ́pios. Caracteri ́sticas. (17.c)
3.5 Instrumentos de incentivo à conservação do meio ambiente. Instrumentos econô micos, instrumentos
governamentais. Serviços ambientais. Servidão ambiental. (6.c)
3.6 Instrumentos processuais para a tutela do meio ambiente. (23.c)

8C. Sistema nacional do meio ambiente. Política nacional do meio ambiente.

Fabio Milhas

SISNAMA - Conceito. é o conjunto de órgãos e instituições dos diversos níveis do Poder Público incumbidos da
proteção do ambiente. É uma estrutura político-administrativa oficial/governamental, mas que permite a
participação de instituições não governamentais e da sociedade, ainda que por delimitadas vias. Não possui
personalidade jurídica. Podem ser implantados Sistemas Estaduais e Municipais. A finalidade da criação do
SISNAMA é estabelecer uma rede de agências governamentais, nos diversos níveis da federação, visando a
assegurar mecanismos capazes de, eficientemente, implementar a política nacional do meio ambiente. Estrutura:
Órgão Superior: Conselho de Governo – com objetivo de formular políticas públicas e diretrizes relacionadas aos
recursos naturais, composta somente por representantes de órgãos do Governo Federal. Órgão Consultivo e
Deliberativo: CONAMA. Presidido pelo Ministro do Meio Ambiente. Tem composição paritária (há previsão de um
representante do MPF na condição de Conselheiro Convidado). Com a finalidade de assessorar, estudar e propor
ao Conselho de Governo diretrizes de políticas governamentais para o meio ambiente e deliberar, no âmbito de
sua competência, sobre normas e padrões compatíveis com o meio ambiente ecologicamente equilibrado. Câmara
Especial Recursal – É a instância administrativa do CONAMA responsável pelo julgamento, em caráter final, das
multas e outras penalidades administrativas impostas pelo IBAMA. Suas decisões têm caráter terminativo. Órgão
Central: Ministério do Meio Ambiente. OBS: Serviço Florestal Brasileiro – integra a estrutura do Ministério do Meio
Ambiente, possui autonomia financeira e administrativa e é o órgão responsável pela gestão de florestas públicas
no âmbito federal (inclusive das concessões florestais) e gestor do Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal.
Órgãos Executores: a) IBAMA – autarquia federal de regime especial vinculada ao Ministério do Meio Ambiente;
principais atribuições: executar ações das polícias nacionais de meio ambiente, referentes às atribuições federais,
relativas ao licenciamento ambiental, ao controle da qualidade ambiental, à autorização de uso dos recursos
naturais e à fiscalização, monitoramento e controle ambiental; b) ICM-Bio – autarquia federal de natureza especial,
com autonomia financeira e administrativa, com competência para administrar as unidades de conservação
previstas e criadas no âmbito federal, representou a redefinição de competências antes atribuídas ao IBAMA.
Exerce o poder de polícia ambiental para a proteção das unidades de conservação instituídas pela União. Órgãos
Setoriais: entes integrantes da Administração Federal direta e indireta, cujas atividades se direcionem ao meio
ambiente. Órgãos Seccionais e Locais: órgãos ou entidades estaduais e municipais, que executam programas e
exercem função de fiscalização e controle. A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTN-Bio) – não integra
o SISNAMA. Vincula-se à estrutura do Ministério de Ciência e Tecnologia.
Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA) – Conceito. O PNMA é o plano de ação governamental, integrando
União, Estados e Municípios, objetivando a preservação do meio ambiente. Princípios e Objetivos: a PNMA tem
por objetivo geral a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando a
assegurar, no país, condições ao desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança nacional e à
proteção da dignidade da vida humana. Instrumentos: os instrumentos da PNMA são mecanismos legais e
institucionais postos à disposição da Administração Pública para sua implementação. São eles: a) padrões de
qualidade ambiental; b) zoneamento ambiental (zoneamento ecológico-econômico) – estabelece medidas e
padrões de proteção ambiental destinados a assegurar a qualidade ambiental dos recursos hídricos e do solo e a
conservação da biodiversidade, com a garantia do desenvolvimento sustentável e a melhoria das condições de

162
vida da população; c) avaliação de impactos ambientais (AIA) – aplicável às atividades e empreendimentos que
efetiva ou potencialmente possam causar poluição ou degradação ambiental. Não se confunde com o estudo
prévio de impacto ambiental (EIA). A AIA é o gênero dos estudos ambientais e inclui o EIA como espécie. Outras
espécies: relatório ambiental, plano e projeto de controle ambiental, relatório ambiental preliminar, diagnóstico
ambiental, plano de manejo, plano de recuperação de área degradada e análise preliminar de risco. OBS: Estudo
de Impacto de Vizinhança (EIV) – é um dos instrumentos associados à PNMA, embora não conste explicitamente
no texto legal com esse nome. Encerra um desdobramento ou modalidade da AIA, a ser aplicado para estudo de
impactos ambientais urbanos. O EIV não dispensa o EIA nem outros procedimentos licenciatórios nos casos em
que esses são expressamente exigidos em lei; sua aplicação está prevista no Estatuto da Cidade. d) licenciamento
ambiental; e) incentivos à produção e instalação de equipamentos e a criação ou absorção de tecnologia voltados
para a melhoria da qualidade ambiental – pode se dar através de incentivos fiscais e econômicos; f) criação de
espaços territoriais especialmente protegidos – (SNUC); g) sistema nacional de informações sobre o meio
ambiente (SINIMA) – é responsável por organizar, sistematizar e divulgar as informações ambientais dos órgãos e
entes integrantes do SISNAMA, nos três níveis de governo. Decorre do princípio da informação; h) cadastro técnico
federal de atividades e instrumentos de defesa ambiental – é um censo ambiental, destinado a conhecer os
profissionais e suas técnicas e tecnologias ambientais, subsidiando o SINIMA. O cadastro é público. Sua renovação
ocorre a cada dois anos, sob pena de multa; i) penalidades disciplinares – poder de polícia ambiental; j) relatório
de qualidade do meio ambiente; k) garantia de acesso a informações relativas ao meio ambiente; l) cadastro
técnico federal de atividades potencialmente poluidoras e/ou utilizadoras dos recursos ambientais – objetiva o
registro obrigatório de pessoas físicas ou jurídicas que se dedicam a atividades potencialmente poluidoras e/ou a
extração, produção, transporte e comercialização de produtos potencialmente perigosos ao meio ambiente, assim
como de produtos e subprodutos da fauna e flora; m) instrumentos econômicos – a lei traz um rol exemplificativo
desses instrumentos: 1. servidão ambiental – consiste na possibilidade de o proprietário renunciar, em caráter
permanente ou temporário, total ou parcialmente, ao direito de uso, exploração ou supressão de recursos naturais
existentes na propriedade, mediante a anuência do órgão ambiental competente. Não pode ser instituída sobre
áreas de preservação permanente e reservas legais. A limitação ao uso ou exploração da vegetação da área sob
servidão ambiental deve ser, no mínimo, a mesma estabelecida para a reserva legal. A servidão ambiental deve
ser averbada à margem da matrícula no Cartório de Registro de Imóveis, permitindo-se que a área utilizada para
a servidão ambiental seja objeto de compensação de reserva legal, o que obriga a averbação dos imóveis
envolvidos. Com a instituição permanente ou temporária da servidão ambiental, o proprietário não poderá alterar
a destinação da área nos casos de transmissão do imóvel a qualquer título, de desmembramento ou de retificação
dos limites da propriedade; 2. concessão florestal – delegação onerosa, feita pelo poder concedente, do direito de
praticar manejo florestal sustentável para exploração de produtos e serviços numa unidade de manejo, mediante
licitação, à pessoa jurídica, em consórcio ou não, que atenda às exigências do respectivo edital de licitação e
demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco e por prazo determinado. Por produtos
florestais entende-se a exploração de produtos madeireiros e não madeireiros, tais como frutos e sementes. Já os
serviços florestais identificam-se com o turismo ecológico, a recreação em contato com a natureza e a educação
ambiental; 3.seguro ambiental – ainda encontra-se pendente de regulamentação. É instrumento de
implementação do princípio da reparação integral do dano ambiental, pois garante a disponibilidade dos recursos
financeiros necessários à repristinação total do dano causado ao meio ambiente, mesmo na hipótese de
insolvência do poluidor. 4. Outros instrumentos econômicos: ICMS ecológico; índice de sustentabilidade
empresarial; “princípios do equador” – referem-se a um conjunto de procedimentos utilizados espontaneamente
por instituições financeiras na gestão de questões socioambientais associadas a operações de financiamento de
projetos; “mecanismo de desenvolvimento limpo” (MDL) – torna eficaz o Protocolo de Kyoto, mediante a
instituição de um mercado de venda de créditos de carbono, visando a facilitar o atingimento das metas de
redução de emissão de gases de efeito estufa definidas para os países que o ratificaram. A proposta do MDL
consiste em que cada tonelada de CO² que deixar de ser emitida ou for retirada da atmosfera por um país em
desenvolvimento poderá ser negociada no mercado mundial.

10C. Espaços Territoriais Especialmente Protegidos e Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza
(SNUC)

163
Caroline Araújo

Espaços territoriais especialmente protegidos são áreas geográficas, públicas ou privadas, dotadas de especiais
atributos ambientais que requeiram sua sujeição, pela lei, a um regime jurídico de interesse público. Esse regime
implica na sua relativa imodificabilidade e sua utilização sustentável, tendo em vista a preservação e proteção da
integridade de amostras de toda diversidade de ecossistemas, a proteção ao processo evolutivo das espécies, a
preservação e proteção dos recursos naturais. São, portanto, limitações ambientais ao direito de propriedade.
1. ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS EM SENTIDO AMPLO (LATO SENSU)
(I) Área de Preservação Permanente – APP: nos termos do art. 3º, II, do Novo Código Florestal, consiste na área
protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a
paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e
assegurar o bem-estar das populações humanas. Trata-se, pois de obrigação acessória que tem por finalidade a
proteção de características ambientais frágeis. Devem estar descritas no CAR (cadastro ambiental rural). Para
obtenção de benefícios fiscais devem estar registradas no Registro de Imóveis. A obrigação de manutenção de
APPs atinge tanto Propriedades rurais quanto urbanas (diferentemente do que ocorre com a Reserva Legal).
Podem ser Áreas de preservação permanente por imposição legal (elencadas no art. 4º do Código Florestal, são
objeto de proteção pelo só fato de se enquadrarem nas condições previstas na lei) ou Áreas de preservação
permanente por ato do poder público (previstas no art. 6º, o Poder Público identifica, demarca e declara, podendo
fazê-lo por meio de ato administrativo).
(II) Reserva [Florestal] Legal: é uma limitação inerente ao atendimento da função social no exercício do direito de
propriedade rural, independentemente da vegetação ali existente (natural, primitiva, regenerada ou plantada).
Art. 3º, III do Novo Código Florestal: “área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, delimitada
nos termos do art. 12 (do NCFlo), com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos
naturais do imóvel rural, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a
conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa”. Todo
proprietário de imóvel rural tem a obrigação de reservar uma área de floresta ou outra forma de vegetação nativa
para fins de proteção da biodiversidade. O proprietário de imóvel originariamente rural somente terá extinta a
obrigação de manter área de reserva legal após a aprovação do parcelamento do solo, não bastando a inserção
do imóvel em perímetro urbano definido em lei municipal. Percentuais: 80% no imóvel localizado em área de
florestas na Amazônia Legal; b) 35%, no imóvel situado em área de cerrado na Amazônia Legal; c) 20%, no imóvel
situado nas demais regiões do país. Não precisam mais ser averbadas na matrícula de registro de imóveis, mas
cadastradas no CAR (cadastro ambiental rural). Exceção: as RLs em sistema de compensação ou recomposição em
outra área mediante limites estabelecidos pelo órgão ambiental deverão ser averbadas no registro de imóveis,
além de estarem cadastradas no CAR. O proprietário de imóvel com reserva legal com área superior aos
percentuais estabelecidos em lei pode utilizar o excedente para fins de constituição de servidão ambiental e Cota
de Reserva Ambiental. As reservas podem ainda existir em regime de condomínio. De outro lado, caso não se
atinja os percentuais mínimos de RL, pode haver compensação com outras áreas da mesma microbacia ou bacia
hidrográfica. O Código Florestal admite excepcionalmente o cômputo das áreas de vegetação nativa protegidas a
título de áreas de preservação permanente no cálculo do percentual da reserva legal desde que não resulte em
conversão de novas áreas para o uso alternativo do solo e a soma da vegetação nativa em área de preservação
permanente e de reserva legal exceder aos percentuais indicados pelo art. 15. Pode haver a exploração econômica
para fins comerciais e não comerciais, desde que seja organizada, sustentável e autorizado no plano de manejo
pelo órgão ambiental competente.
(III) Servidão Florestal: o proprietário rural renuncia voluntariamente, em caráter permanente ou temporário, aos
direitos de supressão ou exploração da vegetação nativa, localizada fora da reserva legal e da área de preservação
permanente. Sobre o “excedente” de floresta pode-se instituir servidão florestal, a qual deve ser averbada à
margem da inscrição da matrícula do imóvel, no registro de imóveis competente. Um outro proprietário rural que
não esteja cumprindo o mínimo previsto para a sua reserva legal pode então compensá-la com tal excedente,
mediante o arrendamento da área sob regime de servidão florestal ou da aquisição de cotas (Cota de Reserva
Florestal – CRF).
2. ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS EM SENTIDO ESTRITO (STRICTO SENSU). SISTEMA
NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA – SNUC.

164
Ao SNUC se subsumem as Unidades de Conservação típicas (previstas expressamente na Lei nº 9985/2000) e
aquelas áreas que, embora não expressamente arroladas, apresentam características que se amoldam ao conceito
enunciado no art. 2º, I, da referida Lei, que seriam então chamadas de Unidades de Conservação atípicas. É uma
obrigação de fazer imposta pelo Poder Público (por lei, decreto ou ato declaratório); A instituição e a alteração de
unidade de conservação, desde que para ampliá-la, poderão ser feitas por meio de ato do Poder Público diverso
de lei, por outro lado, a supressão (desafetação – retirada de interesse público sobre algum bem) ou a redução de
seus limites somente poderão ser feitas por lei específica. Podem ser de nível federal, estadual ou municipal,
dependendo da lei que as instituiu;
2.2. ESPÉCIES: UNIDADES DE CONSERVAÇÃO TÍPICAS: (A) Unidades de proteção integral: têm por objetivo
proteger a natureza, livrando-a quanto possível da inferência humana; nelas, como regra, só se admite o uso
indireto dos seus recursos, com exceção dos casos previstos na própria lei do SNUC. A formação de Conselhos
Consultivos é obrigatória. Podem ser: Estação Ecológica: destina-se a preservar a natureza e realizar pesquisas
científicas; posse e o domínio público (áreas particulares serão desapropriadas); visitação pública proibida, exceto
quando com objetivo educacional; a pesquisa científica depende de prévia autorização do órgão ambiental
responsável. Reserva Biológica: visa preservar integralmente a biota e demais atributos naturais existentes; posse
e domínio público (áreas particulares serão desapropriadas); visitação pública proibida, exceto quando com
objetivo educacional; a pesquisa científica depende de prévia autorização do órgão ambiental responsável. Parque
Nacional: visa preservar ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica; posse e domínio
público (áreas particulares serão desapropriadas); a visitação está sujeita a normas e restrições previstas no Plano
de Manejo; a pesquisa científica depende de prévia autorização do órgão ambiental responsável. Monumento
Natural: visa preservar sítios naturais raros, singulares ou de grande beleza cênica; pode ser constituído em áreas
particulares, desde que haja compatibilidade de objetivos da unidade; a visitação está sujeita a normas e restrições
previstas no Plano de Manejo; a pesquisa científica depende de prévia aprovação do órgão ambiental responsável.
Refúgio da Vida Silvestre: visa proteger ambientes naturais para a existência ou reprodução de espécies ou
comunidades de flora local e da fauna residente migratória; pode ser constituído em áreas particulares, desde que
haja compatibilidade de objetivos da unidade com a utilização pelo proprietário; a visitação está sujeita a normas
e restrições previstas no Plano de Manejo; a pesquisa científica depende de prévia aprovação do órgão ambiental
responsável. B) Unidades de uso sustentável. visa compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável
de parcela dos seus recursos naturais. Podem ser: Área de Proteção Ambiental: área em geral extensa, com um
certo grau de ocupação humana, dotada de atributos especialmente importantes para a qualidade de vida e o
bem-estar das populações, e tem como objetivos básicos proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo
de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais; pode constituir-se sobre terras públicas
ou particulares (sobre estas, podem incidir restrições ao uso e ocupação); a pesquisa e a visitação seguem as
condições estabelecidas pelo órgão gestor se sob domínio público e pelo proprietário se em domínio privado; deve
dispor de um Conselho presidido pelo órgão responsável pela sua administração. Área de Relevante Interesse
Ecológico: área em geral de pequena extensão, com pouca ou nenhuma ocupação humana, com características
naturais extraordinárias ou que abriga exemplares raros da biota regional, e visa manter os ecossistemas naturais
de importância regional ou local e regular o uso admissível dessas áreas, de modo a compatibilizá-lo com os
objetivos de conservação da natureza; pode constituir-se sobre terras públicas ou particulares (sobre estas, podem
incidir restrições ao uso e ocupação); deve possuir Zona de Amortecimento e, quando conveniente, corredores
ecológicos. Floresta Nacional: área com cobertura florestal de espécies predominantemente nativas e tem como
objetivo básico o uso múltiplo sustentável dos recursos florestais e a pesquisa científica, com ênfase em métodos
para exploração sustentável de florestas nativas; posse e domínio público (as áreas particulares serão
desapropriadas); visitação pública permitida; a pesquisa é permitida e incentivada, sujeitando-se à prévia
autorização do órgão responsável pela administração; deve possuir Zona de Amortecimento e, quando
conveniente, corredores ecológicos; deve possuir Conselho Consultivo. Reserva Extrativista: utilizada por
populações extrativistas tradicionais (extrativismo e, complementarmente, agricultura de subsistência e criação
de animais de pequeno porte), visa proteger os meios de vida e a cultura dessas populações, e assegurar o uso
sustentável dos recursos naturais; domínio público, com uso concedido (contrato de concessão de direito real de
uso) às populações extrativistas tradicionais (as áreas particulares serão desapropriadas); visitação pública
permitida; a pesquisa é permitida e incentivada, sujeitando-se à prévia autorização do órgão responsável pela
administração; deve possuir Zona de Amortecimento e, quando conveniente, corredores ecológicos; deve possuir

165
Conselho Deliberativo, a quem cabe aprovar o Plano de Manejo. Reserva de Fauna: área natural com animais de
espécies nativas, terrestres ou aquáticas, residentes ou migratórias, adequadas para estudos técnico-científicos
sobre o manejo econômico sustentável de recursos faunísticos; posse e domínio público (as áreas particulares
serão desapropriadas); visitação pública permitida; deve possuir Zona de Amortecimento e, quando conveniente,
corredores ecológicos. Reserva de Desenvolvimento Sustentável: área natural que abriga populações tradicionais
(exploração dos recursos naturais, desenvolvidos ao longo de gerações e adaptados às condições ecológicas locais,
que desempenham um papel fundamental na proteção da natureza e na manutenção da diversidade biológica);
domínio público, com uso concedido (contrato de concessão de direito real de uso) às populações tradicionais
(áreas particulares serão desapropriadas); visitação pública permitida; deve possuir Zona de Amortecimento e,
quando conveniente, corredores ecológicos; possui Conselho Deliberativo. Reserva Particular do Patrimônio
Natural: área privada, gravada com perpetuidade, visa conservar a diversidade biológica; visitação com objetivos
turísticos, recreativos e educacionais; pesquisa científica permitida.
2.2.2. UNIDADES DE CONSERVAÇÃO ATÍPICAS. 1) Reservas Ecológicas: UCs não mantidas pelo SNUC, já que delas
a Lei n.° 9.985/00 não tratou. No entanto, não houve revogação, ou cancelamento das pré-existentes ao novo
sistema em respeito ao ato jurídico perfeito e acabado. Porém, há autores que entendem que houve revogação,
é o caso de Frederico Amado. 2) Jardins Botânicos: Parques científicos e culturais destinados à pesquisa sobre
espécies em extinção; Sítios ecológicos de relevância cultural. 3) Jardins Zoológicos: qualquer coleção de animais
silvestres e mantidos vivos em cativeiro ou semi-liberdade e expostos à visitação pública; Patrimônio público ou
privado; animais silvestres são propriedade estatal; Funcionamento autorizado pelo Poder Público. 4) Horto
Florestal: diferem dos Jardins Botânicos porque os hortos são mais voltados ao aprimoramento e armazenamento
de exemplares da flora e neles o aspecto do lazer é menos saliente. 5) Cavidades naturais. Propriedades da União.
É proibido em um raio de 1.000 metros no entorno de cavernas o desenvolvimento de atividades de
terraplanagem, mineração, dragagem e escavação que causem danos ou degradação do meio ambiente ou perigo
para pessoas ou para a biota.
2.3. Zona de amortecimento: é o entorno de uma unidade de conservação, onde as atividades humanas estão
sujeitas a restrições específicas, objetivando minizar os impactos negativos sobre a UC. Zona de amortecimento
de UC de proteção integral não poderá ser transformada em zona urbana.
2.4. Corredores ecológicos: são porções de ecossistemas naturais ou seminaturais, que ligam UCs, possibilitando
entre elas fluxo de genes e o movimento da biota, facilitando a dispersão de espécies e a recolonização de áreas
degradadas, bem como a manutenção de populações que demandem para sua sobrevivência de áreas com maior
extensão.
2.5. Mosaico: conjunto de Unidades, próximas, justapostas ou sobrepostas, com gestão integrada.
2.6. Plano de Manejo: com fundamento nos objetivos gerais da UC, estabelece-se o seu zoneamento e as normas
que devem presidir o uso da área e o manejo dos recursos naturais, inclusive a implantação das estruturas físicas
necessárias à gestão da unidade. Em alguns casos pode ser assegurada a ampla participação da população
residente. Deve ser elaborado no prazo de 05 anos a partir da data de sua criação. Em razão da inércia do Poder
Público, o MPF tem ajuizado ACP que, muitas vezes, culminam com a proibição, por liminar, de licenciamentos no
entorno de 2km das UCs enquanto não criado o Plano e definida a respectiva Zona de Amortecimento.
2.7. Compensação por significativo impacto ambiental: espécie de indenização ambiental, com fundamento no
princípio do Poluidor-pagador (para o STF, no principio do usuário pagador).
2.9. Reserva da biosfera: é modelo internacional de gestão integrada da UNESCO, participativa e sustentável dos
recursos naturais, podendo o domínio ser público ou privado. O Brasil possui as seguintes: Mata Atlântica, Cinturão
Verde da cidade de São Paulo, Pantanal-Mato Grossense, Caatinga, Amazônia Central e Serra do Espinhaço.

15C. Licenciamento ambiental. Avaliação de impactos ambientais. Estudos ambientais. Audiências públicas.

Caroline Araújo

LICENCIAMENTO AMBIENTAL: é um dos instrumentos da PNMA, baseado nos princípios do desenvolvimento


sustentável, da prevenção, precaução e do poluidor-pagador. Constitui um procedimento administrativo
destinado a produzir um ato-condição para a construção, instalação, ampliação e funcionamento de
estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, considerados efetiva ou potencialmente

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poluidores, bem como capazes de, sob qualquer forma, causar degradação ambiental, sejam eles públicos ou
privados. Destina-se não só à instalação das atividades, mas também para a localização, ampliação e operação,
pois sendo o meio ambiente patrimônio público a ser assegurado tendo em vista o uso coletivo, não há um direito
subjetivo à sua livre utilização, e disso resulta a necessidade de que haja consentimento estatal – isso se dá pelo
procedimento de licenciamento ambiental. Destinando-se ao controle prévio pelo poder público, o licenciamento
integra a tutela preventiva administrativa do meio ambiente. É composto por diversas etapas: publicação do
pedido, estudos ambientais, audiências públicas e LP, LI, LO. Concluídas as etapas, a Administração Pública expede
a licença ambiental, que é ato administrativo em que o poder público estabelece as condições, restrições e
medidas de controle a serem observadas pelo empreendedor. Diante do fato de a legislação. Há divergência na
doutrina quanto a natureza jurídica da “licença ambiental”. A lei pode trazer outras espécies de licenças
ambientais ou de licenciamento ambiental, assim como o CONAMA, por meio de Resoluções.
O licenciamento, por constituir exercício do poder de polícia, enquadra-se na competência material comum da
União, Estados, DF e Municípios. A LC 140 utiliza critérios variados para determinar a competência: (i) ente
instituidor da unidade de conservação, com exceção das APASs; (ii) a localidade/desenvolvimento das atividades
licenciadas; (iii) a natureza militar, radioativa ou nuclear do empreendimento; (iv) abrangência do impacto.
Também trouxe a competência residual dos Estados e acrescentou, no âmbito da competência federal as
atividades que atendam tipologia estabelecida por ato do Poder Executivo considerados os critérios de porte,
potencial poluidor e natureza da atividade ou empreendimento. Conservou a realização do licenciamento em um
único nível de competência, visando evitar conflitos e sobreposições de atribuições entre os entes federados. Há
previsão de hipóteses de licenciamento obrigatório, podendo ser exigidos em outros casos. Considera-se
constitucional o licenciamento por dois entes e há possibilidade de delegação por convênio da execução das ações
administrativas desde que o ente destinatário possua órgão ambiental capacitado a executar as ações
administrativas a serem delegadas e de conselho do meio ambiente. A atuação supletiva (substitutiva) e
subsidiária (auxiliar). A inexistência de órgão ambiental capacitado ou conselho de meio ambiente nos Estados e
DF implica a atuação supletiva da União; a inexistência daqueles órgãos nos Municípios acarreta a atuação
supletiva dos Estados; e a inexistência dos citados órgãos nos Municípios e Estados implica a ação supletiva da
União, sempre enquanto perdurar a ausência. Outro fator que gera a atuação supletiva é o decurso dos prazos de
licenciamento sem a emissão de licença ambiental. Já a ação subsidiária, dá-se por meio de apoio técnico,
administrativo ou financeiro, devendo ser solicitada pelo ente originariamente detentor da competência. As
renovações de licenças devem ser requeridas com antecedência mínima de 120 dias da expiração do prazo de
validade, ficando este automaticamente prorrogado até a manifestação definitiva do órgão ambiental. Houve
vinculação da competência para lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo
ambiental ao órgão responsável pelo licenciamento/autorização, há prevalência ao auto de infração lavrado pelo
órgão detentor da atribuição para licenciar, com ressalva do exercício pelos demais entes federativos da atribuição
comum de fiscalização, bem como a possibilidade de, em casos de iminência ou ocorrência de degradação
ambiental, o ente federativo que tiver conhecimento, tomar as medidas para evitá-la, mitigá-la ou cessá-la. O
licenciamento, apesar de ter prazo de validade, está sujeito ao princípio rebus sic stantibus.
ESTUDOS AMBIENTAIS são todos e quaisquer estudos relativos aos aspectos ambientais relacionados à
localização, instalação, operação e ampliação de uma atividade ou empreendimento, apresentado como subsídio
para a análise da licença requerida, tais como: relatório ambiental, plano e projeto de controle ambiental, relatório
ambiental preliminar, diagnóstico ambiental, plano de manejo, plano de recuperação de área degradada e análise
preliminar de risco”.
AVALIAÇÃO DE IMPACTO AMBIENTAL é instrumento de política ambiental formado por um conjunto de
procedimentos capazes de assegurar, desde o início do processo, que se faça um exame sistemático dos impactos
ambientais de uma ação proposta e de suas alternativas, e que os resultados sejam apresentados de forma
adequada ao público a aos responsáveis pela tomada de decisão, e por eles considerados. Além disso, os
procedimentos devem garantir a adoção das medidas de proteção do meio ambiente determinadas, no caso de
decisão sobre a implantação do projeto. Sendo distintas as gradações de degradações ambientais, há também
diferentes espécies de AIAs, sendo esse um gênero. Em casos de empreendimentos com potencial de significativo
impacto ambiental, a avaliação em impacto ambiental é o EIA-RIMA.
O ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL é uma espécie de AIA, sendo exigível obrigatoriamente como fase
dos licenciamentos de obra ou atividade causadora de significativa degradação ambiental. A realização do EPIA

167
não impede que sejam exigidos outros estudos. Deve ser prévio à concessão da licença prévia (princípio da
prevenção). Excetuado os casos de presunção absoluta, verifica-se que a exigência do EPIA pelo órgão ambiental
constitui ato administrativo discricionário, uma vez que cabe à equipe responsável deste determinar a realização
ou não do referido estudo. O EPIA não vincula a decisão do órgão ambiental, o que não exime, todavia, eventual
apuração de responsabilidade da Administração Pública e do empreendedor em caso de omissão. O EPIA deve ser
elaborado por equipe multidisciplinar, às custas do empreendedor, e conter todos os possíveis impactos do
empreendimento e as medidas mitigadoras e compensatórias. Juntamente com o EPIA, deve ser elaborado o
RIMA, em linguagem clara e objetiva, com as conclusões do EPIA, tornando-o inteligível à população, que possui
direito de acessá-lo, salvo nos casos de comprovado sigilo industrial.
AUDIÊNCIA PÚBLICA. Apesar de não possuir caráter deliberativo, mas apenas consultivo, é considerada uma
importante ferramenta de participação da sociedade no processo de licenciamento ambiental. Norteada pelo
princípio da informação, pressuposto do princípio da participação, a AP presta-se a dar publicidade ao RIMA e a
recolher críticas e sugestões da população. São legitimados a requerer sua realização o órgão ambiental, o
Ministério Público, as entidades civis ou, pelo menos, cinquenta pessoas por escrito. Após o recebimento do RIMA,
o órgão ambiental, mediante publicação na imprensa local e abertura de edital, deverá abrir prazo, não inferior a
45 dias, para que os legitimados solicitem a AP, a ser realizada em local de fácil acesso. O representante do órgão
licenciador será o responsável pela condução da AP, em cujo término será lavrada ata que orientará a decisão do
órgão licenciador. Eventual omissão do órgão quanto ao pedido de AP acarreta a invalidade da licença concedida
e a responsabilidade solidária do órgão ambiental.

17C. Zoneamento ambiental. Natureza jurídica. Princípios. Características

Caroline Araújo

Natureza Jurídica. O zoneamento é uma medida não jurisdicional, oriunda do poder de polícia administrativa, com
dois fundamentos: a repartição do solo e a designação do seu uso. É uma modalidade de limitação administrativa,
incidindo sobre o território, a fim de reparti-lo em zonas, consoante o melhor interesse na preservação ambiental
e no uso sustentável dos recursos naturais. Existem outras espécies de zoneamento, a exemplo do agrícola, assim
como o da Zona Costeira. A doutrina consagra que a natureza jurídica do zoneamento é de limitação administrativa
da propriedade, com esteio no princípio constitucional de que a propriedade deve cumprir sua função social.
Princípios. O princípio do desenvolvimento sustentável (equidade intergeracional) prevê o dever da coletividade
e do Poder Público de preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações. O zoneamento ambiental
é um tema que se encontra relacionado ao aludido princípio, porquanto objetiva disciplinar a forma como será
compatibilizado o desenvolvimento industrial, as zonas de conservação da vida silvestre e a própria habitação do
homem, tendo em vista sempre a manutenção de uma vida com qualidade às presentes e futuras gerações. O
Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE) deverá observar os princípios da função socioambiental da propriedade,
da prevenção, da precaução, do poluidor-pagador, do usuário-pagador, da participação informada, do acesso
equitativo e da integração.
Características. É o instrumento de organização do território a ser obrigatoriamente seguido na implantação de
planos, obras e atividades públicas e privadas, estabelecendo medidas e padrões de proteção ambiental
destinados a assegurar a qualidade ambiental, dos recursos hídricos e do solo e a conservação da biodiversidade,
garantindo o desenvolvimento sustentável e a melhoria das condições de vida da população. O zoneamento
ambiental, que pode ser chamado de zoneamento ecológico-econômico (ZEE), é um dos instrumentos para a
efetivação da Política Nacional do Meio Ambiente. O Decreto 4.297/2002 exige expressamente processo legislativo
para a alteração do zoneamento, assim, implicitamente pressupõe a sua aprovação por lei, à luz do princípio da
simetria. Nas demais esferas, dependerá do conteúdo das respectivas legislações distritais, estaduais e municipais.
O ZEE tem por objetivo geral organizar, de forma vinculada, as decisões dos agentes públicos e privados quanto a
planos, programas, projetos e atividades que, direta ou indiretamente, utilizem recursos naturais, assegurando a
plena manutenção do capital e dos serviços ambientais dos ecossistemas. Competirá à União, elaborar o
zoneamento ambiental de âmbito nacional e regional. Os Estados terão a incumbência de elaborar o zoneamento
ambiental de âmbito estadual, em conformidade com os de âmbito nacional e regional. Não existe previsão
expressa, na referida lei, para que os municípios promovam zoneamentos ambientais locais, sendo apenas

168
elencada a competência para elaborar o Plano Diretor, observando os zoneamentos ambientais, o que não impede
o ente político local de elaborá-los, desde que sejam compatíveis com o zoneamento nacional, regional e estadual.
O ZEE dividirá o território em zonas, tendo em vista as necessidades de proteção, conservação e recuperação dos
recursos naturais e do desenvolvimento sustentável. Deve se orientar pelos princípios da utilidade e da
simplicidade, de modo a facilitar a implementação de seus limites e restrições pelo Poder Público, bem com sua
compreensão pelos cidadãos. A alteração do ZEE, bem como as mudanças nos limites das zonas e indicação de
novas diretrizes gerais e específicas, somente poderá ser realizada depois de decorrido o prazo mínimo de dez
anos de sua conclusão, ou de sua última modificação. Esse prazo não será exigido na hipótese de ampliação do
rigor da proteção ambiental da zona a ser alterada, ou de atualizações decorrentes de aprimoramento técnico-
científico. Mesmo assim, essa alteração dependerá de consulta pública e aprovação pela comissão estadual do
ZEE e pela Comissão Coordenadora do ZEE, mediante processo legislativo de iniciativa do Poder Executivo.
Entretanto, a restrição de iniciativa legislativa ao Poder Executivo, por simples decreto, parece ser inconstitucional,
pois tal reserva não está prevista no artigo 61 Constituição Federal. Por fim, cabe ressaltar que a alteração do ZEE
não poderá reduzir o percentual da reserva legal definido em legislação específica, nem as áreas protegidas, com
unidades de conservação ou não.
Zoneamento Ambiental Industrial: deverá ser aprovado por lei, observado a seguinte divisão: zonas de uso
estritamente industrial, zonas de uso predominantemente industrial, zonas de uso diversificado e zonas de reserva
ambiental. As zonas de uso estritamente industrial destinam-se, preferencialmente, à localização de
estabelecimentos industriais cujos resíduos sólidos, líquidos e gasosos, ruídos, vibrações, emanações e radiações
possam causar perigo à saúde, ao bem-estar e à segurança das populações, mesmo depois da aplicação de
métodos adequados de controle e tratamento de efluentes, nos termos da legislação vigente. Quando se tratar
de delimitação e autorização de implantação de zonas de uso estritamente industrial que se destinem à localização
de polos petroquímicos, cloroquímicos, bem como de instalações nucleares e outras definidas em lei, a
competência será exclusiva da União, ouvidos os Estados e Municípios.
As zonas de uso predominantemente industrial destinam-se, preferencialmente, à instalação de indústrias cujos
processos, submetidos a métodos adequados de controle e tratamento de efluentes, não causem incômodos
sensíveis às demais atividades urbanas e nem perturbem o repouso noturno das populações. As zonas de uso
diversificado destinam-se à localização de estabelecimentos industriais, cujo processo produtivo seja
complementar das atividades do meio urbano ou rural que se situem, e com elas se compatibilizem,
independentemente do uso de métodos especiais de controle da poluição, não ocasionando, em qualquer caso,
inconvenientes à saúde, ao bem-estar e à segurança das populações vizinhas. Ainda estão previstas as zonas de
reserva ambiental, nas quais, por suas características culturais, ecológicas, paisagísticas, ou pela necessidade de
preservação de mananciais e proteção de áreas especiais, ficará proibida a localização de estabelecimentos
industriais. As indústrias que não estejam confinadas nas zonas industriais definidas por ela, serão submetidas à
instalação de equipamentos especiais de controle e, nos casos mais graves, à relocalização, haja vista a inexistência
do direito adquirido de poluir. O direito de indenização no caso da relocalização dependerá da análise casuística
da situação, a fim de se mensurar se os prejuízos experimentados pela empresa decorrem ou não diretamente de
uma postura comissiva ou omissiva da Administração Pública.

6C. Instrumentos de incentivo à conservação do meio ambiente. Instrumentos econômicos, instrumentos


governamentais. Serviços ambientais. Servidão ambiental.

Camila Lauton
Fonte utilizada: atualização do Graal 28; livro do Romeu Thomé – manual de direito ambiental.

Introdução. A Constituição Federal dispõe que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
que deverá ser conservado e protegido pela sociedade e pelo poder público, visando ao equilíbrio ecológico. É
justamente por tal razão que as leis ambientais preveem institutos (instrumentos econômicos e governamentais)
para auxiliar na realização do comando constitucional.

1. Instrumentos econômicos. Um dos mecanismos mais estudados atualmente é a utilização de instrumentos


econômicos de proteção ambiental com o objetivo de incitar a adoção de gestões "ecológicas". Tais instrumentos

169
podem ser utilizados como forma de:
a) incentivar a preservação ambiental, como nos casos de concessão de benefícios econômicos àqueles que
preservam o meio ambiente (ex: servidão ambiental; ICMS ecológico);
b) desestimular atividades poluidoras, por exemplo através do aumento de tributos (extrafiscalidade), ou redução
de subsídios governamentais;
c) assegurar a reparação de danos ambientais através da exigência de garantias (ex: seguro ambiental).
A Lei de Política Nacional de Meio Ambiente (lei 6.938/81) elenca em seu artigo 9º, inciso XIII os seguintes
instrumentos econômicos: concessão florestal, servidão ambiental, seguro ambiental, em rol meramente
exemplificativo, o que não impede a existência e o fomento de outros por parte do Estado. Os incentivos
econômicos são instrumentos de regulação ambiental estatal, delineados na Declaração do Rio de Janeiro de
1992, artigo 16 - “ As autoridades nacionais devem procurar promover a internalização dos custos ambientais e o
uso de instrumentos econômicos, tendo em vista a abordagem segundo a qual o poluidor deve, em princípio, arcar
com o custo da poluição, com a devida atenção ao interesse público e sem provocar distorções no comércio e nos
investimentos internacionais”. Os instrumentos econômicos funcionam incentivando ou desestimulando
atividades, através de vantagens ou de ônus. No Brasil, citam-se: a cobrança pelo uso da água; o ICMS ecológico;
o Pagamento por Serviços Ambientais; Seguros; taxas florestais; concessão florestal; servidão ambiental; royalties,
entre outros.

1.1.Concessão florestal. Consiste no contrato de concessão oneroso celebrado por entidades políticas com
pessoas jurídicas, consorciadas ou não, precedido de licitação na modalidade concorrência, visando a transferir
ao concessionário o direito de explorar de maneira sustentável os recursos florestais por prazo determinado.
Apenas pessoas jurídicas instituídas sob as leis brasileiras e com sede e administração no Brasil poderão celebrar
este ajuste. Tem como finalidade a conservação da cobertura vegetal das florestas brasileiras, por meio da
melhoria da qualidade de vida da população que vive em seu entorno e do estímulo à economia formal com
produtos e serviços oriundos de florestas manejadas. O objeto da concessão florestal é a prática pelo
concessionário do manejo florestal, que envolve a exploração de produtos e de serviços florestais. Por produtos
florestais entende-se a exploração de produtos madeireiros e não madeireiros, sendo esses frutos, sementes etc.
Já os serviços florestais identificam-se com o ecoturismo (hospedagem, atividades esportivas, visitação e
observação da natureza e esportes de aventura). Não poderá ser cobrada a visitação para fins científicos e de
educação ambiental. A gestão das concessões cabe ao Serviço Florestal Brasileiro – SFB, integrante do MMA, na
esfera federal. O prazo mínimo é o equivalente a um ciclo de corte e o máximo é de 40 anos. Na hipótese de
exploração de serviços florestais – turismo e outras atividades que não envolvam o consumo de produtos florestais
– o prazo é de 5 a 20 anos.
Obs.: a concessão não transfere a titularidade da floresta, não dá acesso ao patrimônio genético, não permite o
uso de recursos hídricos e minerais, a exploração da fauna nem a comercialização de créditos de carbono.
Obs.: os produtos de uso tradicional e de subsistência para as comunidades locais serão excluídos do objeto da
concessão e explicitados no edital. É garantido o acesso gratuito da comunidade local à área de concessão para a
coleta de produtos não madeireiros considerados essenciais à sua subsistência, além da coleta de sementes para
a produção de artesanatos, tais como biojóias (informações retiradas do site do Serviço Florestal Nacional).

1. 2. Serviços Ambientais/Pagamento por Serviços Ambientais - PSA


Serviços Ecossistêmicos X Serviços Ambientais: os primeiros são os benefícios gerados pela natureza,
independentemente da atuação do homem, como exemplo a purificação do ar e o ciclo hidrológico. Já os serviços
ambientais dizem respeito às iniciativas humanas que favorecem e fomentam a oferta dos serviços ecossistêmicos.
"Os serviços ambientais prestados por um agricultor, por exemplo, figurar-se-iam por meio do cercamento e
preservação de suas áreas protegidas (matas ciliares, nascentes, topos de morros), pelo não depósito de efluentes
no curso d’água (esgoto, agrotóxicos) e pela implementação de boas práticas agrícolas. Consequentemente, a
médio e longo prazo, a sociedade teria como resultado melhorias na qualidade das águas, do ar, dos alimentos,
entre outros (serviços ecossistêmicos)” (DERANI e JODAS, 2015).
Pagamento por Serviços Ambientais – PSA: “instrumento baseado no mercado para financiamento da conservação
que considera os princípios do usuário-pagador e provedor-recebedor, pelos quais aqueles que se beneficiam dos

170
serviços ambientais (como os usuários de água limpa) devem pagar por eles, e aqueles que contribuem para a
geração desses serviços (como os usuários de terra a montante) devem ser compensados por proporcioná-los.
O fundamento do PSA é o princípio do protetor-recebedor, pois o PSA visa impulsionar condutas sustentáveis
capazes de conservar e manter, indiretamente, os serviços ecossistêmicos almejados.

1.3. Servidão ambiental: pela servidão ambiental, prevista no artigo 9°-A da LPNMA, o proprietário ou possuidor
de imóvel rural, pessoa natural ou jurídica, voluntariamente limita o uso de toda a sua propriedade ou de parte
dela para preservar, conservar ou recuperar os recursos ambientais existentes. Por óbvio, no caso das florestas,
trata-se da vegetação localizada fora da Reserva Legal mínima exigida e das Áreas de Preservação Permanente -
APP, eis que nesses espaços a preservação decorre da lei. Assim, a propriedade cujo percentual de área
ambientalmente protegida seja inferior ao estipulado pelas normas ambientais poderá compensar seu déficit
naquelas propriedades em que há proteção ambiental além dos limites legais. Portanto, sobre o excedente de
áreas protegidas institui-se a servidão, que poderá ser negociada com os proprietários ou possuidores das terras
deficitárias. Por se tratar de relevante instrumento de proteção ambiental, caso haja transmissão,
desmembramento ou retificação dos limites do imóvel, é vedada a alteração da destinação da área em que foi
instituída a servidão ambiental durante o prazo de sua vigência. A servidão ambiental pode ser estabelecida por
prazo determinado (temporária) ou não (perpétua). No caso de servidão ambiental temporária, o prazo mínimo
de sua vigência é de quinze anos. Pode a servidão ambiental ser onerosa ou gratuita. O regime de proteção deve
ser, no mínimo, igual ao da reserva legal. Logo, não é possível a supressão vegetal, salvo sob a forma de manejo
sustentável. Permite-se que a área utilizada para a servidão ambiental seja objeto de compensação de reserva
legal, o que obriga a averbação dos imóveis envolvidos.
1.4. Seguro ambiental: contrato de seguro específico para reparar eventuais danos causados ao meio ambiente.
Não é uma liberação à poluição, mas uma garantia adicional, em caso de danos ao meio ambiente.

1.5. ICMS Ecológico. Trata-se de imposto sobre valor agregado coletado pelos governos estaduais. Parte dessas
receitas deve ser redistribuída entre os municípios do estado, sendo que três quartos dessa redistribuição são
definidos pela Constituição Federal, mas o quarto restante é alocado de acordo com a legislação estadual
específica. Dessa forma, alguns estados passaram a redistribuir uma parcela desses 25% aos municípios segundo
critérios ambientais pré-definidos, o que se convencionou chamar ICMS Ecológico.

1.6. Mercado de Crédito de Carbono: “A partir dos anos 2000, entrou em cena um mercado voltado para a criação
de projetos de redução da emissão dos gases que aceleram o processo de aquecimento do planeta. Trata-se do
mercado de créditos de carbono, que surgiu a partir do Protocolo de Quioto, que criou o Mecanismo de
Desenvolvimento Limpo (MDL), que prevê a redução certificada das emissões. Uma vez conquistada essa
certificação, quem promove a redução da emissão de gases poluentes tem direito a créditos de carbono e pode
comercializá-los com os países que têm metas a cumprir”

1.7. Outras formas de incentivos: Na política ambiental urbana constam dispositivos de incentivo econômico à
preservação de áreas de interesse ambiental, como a transferência do direito de construir, existente no artigo 35
do Estatuto das Cidades. Cite-se, ainda, o imposto de renda ecológico; o índice de sustentabilidade empresarial;
os “princípios do equador” – referem-se a um conjunto de procedimentos utilizados espontaneamente por
instituições financeiras na gestão de questões socioambientais associadas a operações de financiamento de
projetos.

2. Instrumentos governamentais. Pode-se citar como instrumentos governamentais de conservação do meio


ambiente o estabelecimento de padrões de qualidade ambiental pelo poder público, o zoneamento ambiental, o
licenciamento ambiental, a criação de espaços territoriais especialmente protegidos.
Princípios do Equador: trata-se de documento internacional que define critérios socioambientais mínimos para a
concessão de crédito. De acordo com esse documento, o mercado financeiro internacional compromete-se a
revisar cuidadosamente todas as propostas para as quais os clientes solicitam financiamento de projetos.

23C. Instrumentos processuais para a tutela do meio ambiente.

171
Gilberto Batista Naves Filho /09/18

Art. 129 da CF: “São funções institucionais do Ministério Público: (...) III - promover o inquérito civil e a
ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses
difusos e coletivos;”
Art. 170 da CF: “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa,
tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes
princípios: (...)VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto
ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;”
Art. 225 da CF: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum
do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-
lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações”.

Os principais instrumentos para tutela do meio ambiente são os seguintes:

INQUÉRITO CIVIL: proced. adm. criado pela Lei 7.347/85. Caráter pré-processual e inquisitorial. Âmbito
interno e exclusivo do MP (presidido pelo PR ou Promotor), destinado a fornecer provas e elementos que
fundamentem a ação do MP na defesa de valores, direitos e interesses metaindividuais. Em caso de arquivamento,
sob pena de falta grave, os autos deverão ser submetidos em 3 dias ao CSMP (no âmbito dos MPEs) ou à Câmara
de Coordenação e Revisão competente (MPU).
Enunciados da 4º CCR:
Procedimento
Nº 1. As promoções de arquivamento e outras decisões sujeitas à revisão pela 4ª Câmara de Coordenação
e Revisão – Meio Ambiente e Patrimônio Cultural – devem estar contidas em regular procedimento, devendo ser
previamente autuadas, mesmo como Notícia de Fato, possibilitando assim o adequado registro e controle.
Nº 2. Nas portarias de instauração de procedimentos preparatórios e inquéritos civis, em matérias
ambiental e de patrimônio cultural, devem constar a câmara revisora e o tema objeto de apuração conforme
tabela unificada de temas/assuntos do CNMP.
Competência
Nº 5. A atribuição é do Ministério Público Federal sempre que houver ofensa a bem ou interesse da União,
independentemente do órgão responsável pelo licenciamento.
Nº 6. Obras ou atividades localizadas na APA do Planalto Central e na APA de Petrópolis/RJ não atraem,
por si só, a atribuição federal.
Mineração
Nº 7. O MPF tem atribuição para atuar, na área cível, buscando a prevenção ou reparação de danos
ambientais decorrentes da atividade de mineração, quando: a) o dano, efetivo ou potencial, atingir bem do
domínio federal ou sob a gestão/proteção de ente federal, tais como unidades de conservação federais e suas
respectivas zonas de amortecimento, rios federais, terras indígenas, terrenos de marinha, bens tombados pelo
IPHAN e seu entorno, sítios arqueológicos e pré-históricos, cavidades naturais subterrâneas; b) o dano, efetivo ou
potencial, atingir mais de uma unidade da federação ou países limítrofes; c) o licenciamento ambiental da
atividade se der perante o IBAMA; ou d) for possível responsabilizar a União, o DNPM, o IBAMA, o ICMBio, o
IPHAN ou outro ente federal pela omissão no dever de fiscalização da atividade.

Material
Nº 20. Toda e qualquer atividade econômica de grande porte, com riscos iminentes de impacto
ambiental, deve ser identificada com antecedência, a fim de possibilitar uma atuação preventiva na tutela do
meio ambiente e do patrimônio cultural.
Arquivamento
Nº 8. Nos termos do art. 62, IV, da Lei Complementar n.º 75/93, as decisões de arquivamento dos
Procedimentos Preparatórios ou Inquéritos Civis, que tratam de meio ambiente e patrimônio cultural,
fundamentadas no declínio de atribuições ao Ministério Público Estadual, devem ser submetidas à homologação

172
da 4ª Câmara de Coordenação e Revisão - Meio Ambiente e Patrimônio Cultural, nos autos originais, para exercício
do poder revisional e terão prioridade na análise.
Nº 11. A promoção de arquivamento fundada na judicialização do feito deve ser instruída com cópia da
respectiva petição inicial, de forma a se comprovar que o objeto do procedimento foi integralmente abordado.
Nº 32. É admissível o arquivamento do Inquérito Civil com fundamento na instauração de PA para o
acompanhamento de Termo de Ajustamento de Conduta, porém, em atenção ao princípio constitucional da
segurança jurídica, deverão os autos do PA ser encaminhados à 4ª CCR, ao final, para verificação do efetivo
cumprimento do TAC.
Nº 12. A existência de investigação criminal, em matérias de meio ambiente e patrimônio cultural, não
obsta a continuidade dos procedimentos extrajudiciais no âmbito cível, mesmo no caso de transação penal, sendo
necessário observar a independência entre as esferas, sem prejuízo de que a solução num feito possa autorizar o
arquivamento do outro.

O IC pode embasar a propositura de ACP, sem a necessidade de abertura de proced. admin. prévio (AREsp
113.436-SP). Porém, é dispensável para o exercício da ACP em defesa do meio ambiente, caso já haja elementos
mínimos para o ajuizamento. Constitui instrumento adequado também p/ a ação penal (STJ - HC 175596; e art.
19 da Lei 9.605/98 e art. 39 § 5º do CPP), dispensando o IP. Em ambos os casos, na dúvida deve promover a ação
judicial (in dubio pro societate).
O MP tem poderes de notificação e requisição. O procedimento tem função preventiva, quando
obstaculiza um dano iminente; reparatória: quando enseja ação civil pública; repressiva: quando se presta para
ajuizamento de ação penal pública. Pressupõe a existência de fato determinado de que decorra ou possa decorrer
lesão a interesse ou direitos velados pelo MP.
A competência é do representante do MP com ofício no local onde ocorreu ou possa ocorrer o dano,
respeitadas exceções constitucionais e legais. Dano de âmbito microrregional (Comarcas de um mesmo Estado),
regional (Comarcas de mais de um Estado): o inquérito poderá ser instaurado pelo representante do MP do Estado
de qualquer das circunscrições atingidas. Instaurados vários inquéritos, devem ser reunidos e conduzidos perante
o órgão que primeiro atuou. Judiciário: controle de legalidade do IC, especialmente dos desvios de poder ou
finalidade e violação a direito de 3os. Conclusão do IC: propositura da ACP ou coletiva ou arquivamento.
Enunciados da 5ª CCR: nº 4: “A promoção de arquivamento de procedimento administrativo ou inquérito civil
público deve registrar a existência ou não de medidas no âmbito penal”; c) nº 5: “Não é cabível revisão de
promoção de arquivamento quando os autos do PA ou ICP respaldaram integralmente a propositura de ação civil
pública. Havendo necessidade de preservação dos autos para eventual consulta ou acompanhamento da
respectiva ação é cabível a homologação do arquivamento físico e os autos devolvidos à origem.”; d) nº 6: “As
Portarias de instauração de PA ou ICP, os Termos de Ajustamento de Condutas, as Recomendações e as Petições
iniciais de ações serão encaminhadas para publicação, se for o caso, e registros”; e) nº 8: “Promovido o
arquivamento de ICP ou PIC por ausência de infração ou por prescrição, o órgão do MPF fica dispensado de adotar
medidas ressarcitórias quando o fato investigado também for objeto de acórdão condenatório do TCU.”

AÇÃO CIVIL PÚBLICA: instrumento processual para reparação dos danos causados ao patrimônio
público, bem como para reprimir ou impedir danos ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor
artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico e por infrações de ordem econômica, protegendo, assim,
interesses difusos da sociedade. Os legitimados podem agir de forma concorrente e independente (disjuntiva). P/
doutrina majoritária, trata-se de legitimidade extraordinária (substituição processual), porque os legitimados
atuam em nome próprio na defesa de interesse alheio (coletividade). Atenção: reconhecida a ilegitimidade ativa
ou no caso de desistência, deve ser aberto prazo para que outros legitimados prossigam na ação (RESp 1177453
e art. 5º, § 3º, da Lei n. 7.347/85), em razão do princípio da “primazia do conhecimento de mérito nas ações
coletivas”.
Por outro lado, no caso do MPF, “A desistência de ação civil pública demanda prévia consulta à Câmara instruída
com razões de fato e de direito.” (Enunciado 1 da 5° CCR). É possível o litisconsórcio entre legitimados (ou entre
o legitimado e a vítima, nos casos excepcionais de defesa direito individual).

173
Legitimados ativos: a) entes da Administração Pública direta e indireta;. b) Defensoria Pública (deverá
demonstrar que o interesses tem pertinência com as suas finalidades institucionais); c) Associações - pertinência
temática, previsão estatutária e constituição há pelo menos 1 ano, que pode ser dispensada – art. 5o, §4o).
Necessidade de autorização dos associados como regra doutrina defende que seria desnecessária para direitos
difusos e coletivos, aplicando-se aos individuais homogêneos), uma vez que atua com representante processual
(salvo MS coletivo). Lei 9.494/97 previu que a propositura de ACP contra o Poder Público por associações depende
de autorização dos associados.; d) Sindicatos: desde que haja pertinência temática. Não se exige pré-constituição
anual; e) Ministério Público: todos os MP’s podem propor ACP, excetuado o MP dos Tribunais de Contas, que não
atua em juízo. Defesa de interesses coletivos e difusos. Individuais homogêneos: deve-se demonstrar que o direito
tem expressão para a coletividade ou é socialmente relevante.

Legitimidade passiva: qualquer pessoa (pública ou privada). Em decorrência da responsabilidade solidária


em matéria ambiental, o litisconsórcio passivo ocorre, figurando como réus o responsável direto, indireto, ou
ambos (Ex: no licenciamento com dispensa de prévio estudo de impacto ambiental exigido por lei, a ação será
dirigida contra o empreendedor e o ente federado que irregularmente a licenciou).

Competência: Art. 2º da Lei 7347: As ações previstas nesta Lei serão propostas no foro do local onde
ocorrer o dano, cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa.
Se o dano atingir mais de uma Comarca ou Seção Judiciária, será competente a capital do Estado (art. 93,
CDC). Ajuizamento: prevenção para todas as posteriores com a mesma causa de pedir ou objeto (art. 2, p.u, LACP).
Danos que abrangerem mais de um Estado: possível ajuizar a ação na capital dos Estados ou no DF (REsp
1018214), aplicando-se a mesma regra de prevenção acima.

Instrução: é crime o retardamento ou recusa na entrega de informações requisitadas pelo MP a fim de


instruir ACP (art. 10). Rito ordinário, com possibilidade ampla de produção probatória. Atenção: o STJ tem
invertido o ônus da prova nas ações coletivas em matéria ambiental, com fundamento no princípio da precaução
(REsp 1237893/SP). Liminar contra PJ de direito público: após a audiência do representante no prazo de 72 h (art.
2o, L8437/92).
Não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas,
nem condenação, salvo no caso da associação ou sindicato (RESP 1181410), quando comprovada má-fé. O ente a
que pertencer o MP arcará com o custo da prova pericial ao final, se esse for vencido (RESP 1237893).
Cabe reexame necessário da sentença que indeferir o pedido em ACP. Analogia o art. 19 da Lei da Ação
Popular para reconhecê-lo na ACP (REsp 1108542), inclusive quando trate de improbidade admisnitrativa.
Em caso de “desistência infundada ou abandono da ação por associação legitimada”, o MP ou outro
legitimado “assumirá” a titularidade ativa.

Sentença, condenação, execução: “a reparação ambiental deve ser feita da forma mais completa
possível, de modo que a condenação a recuperar a área lesionada não exclui o dever de indenizar, sobretudo pelo
dano que permanece entre a sua ocorrência e o pleno restabelecimento do meio ambiente afetado (= dano
interino ou intermediário), bem como pelo dano moral coletivo e pelo dano residual (= degradação ambiental que
subsiste, não obstante todos os esforços de restauração.” (REsp 1180078/MG). A responsabilização por dano
ambiental é objetiva, aplicando-se a teoria do risco integral (recurso repetitivo 1354536).
Enunciado nº 9 da 5° CCR: “É cabível ao Ministério Público Federal o ajuizamento de ação civil pública por
danos morais causados ao patrimônio público e social, como base no art. 1º c/c o inciso V da Lei 7.347/85”. A 2a
Turma do STJ reconhece que a degradação do meio ambiente pode dar ensejo ao dano moral coletivo (REsp
1367923, j. 27.08.2013).
Execução: Nas condenações em dinheiro, esse será destinado a um fundo (sistema de fluid recovery - art.
13 da LACP). Os fundos não precisam guardar pertinência temática nem territorial com o dano. Porém, se for
matéria ambiental, o valor deve ser destinado a um Fundo ambiental. No caso de direitos individuais homogêneos,
a sentença será genérica. Todas as pessoas prejudicadas deverão e terão o direito de ser reparadas. A legitimação
para execução é, em primeiro lugar, dos titulares do direito. Caso esses não a promovam em até um ano, os

174
legitimados para propor a ACP poderão executar a sentença, revertendo os valores para um fundo (art. 100, CDC).
A sentença pode ser executada no domicílio dos beneficiários (RESP 1.243.887/PR).
A extensão da coisa julgada depende do direito e do tipo de julgamento proferido (coisa julgada
secundum eventum litis ou secundum eventum probationem): a) Coisa julgada na ACP por direito difuso: será
erga omnes, salvo se denegatória por falta de provas; (b) Coisa julgada na ACP por direito coletivo: será inter
partes, entre as pessoas pertencentes ao grupo afetado; (c) Coisa julgada na ACP por direito individual
homogêneo: só há coisa julgada para os titulares dos direitos individuais, e isso se a ação for julgada procedente
em favor deles (no caso e direitos individuais homogêneos, o julgamento pela improcedência do pedido por
ausência de provas VINCULA outros legitimados COELTIVOS). Se improcedente, eles poderão mover suas próprias
ações individuais (salvo não aceitaram a suspensão de seu processo individual após intimado, caso em que a coisa
julgada dessa prevalece sobre a da ACP, ainda que essa seja mais favorável).
Em relação à extensão objetiva, a lei de ACP determina que a coisa julgada só produzirá efeitos nos limites
da competência jurisdicional do órgão que prolatou a decisão. STJ entende pela impossibilidade de limitação dos
efeitos da coisa julgada ao limite da competência do órgão prolator. STF tem julgado entendendo pela
possibilidade de limitação de efeitos.

COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA: é instrumento tradicionalmente utilizado para solução


extra-judicial. Pode ser firmado após o ajuizamento de ação. Lei de ACP “art. 5º (...) § 6º Os órgãos públicos
legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais,
mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial.”
O compromisso deve priorizar a recuperação do dano ambiental através da restauração natural. Deverão
ser estipuladas cominações para o caso de inadimplemento. É possível a cumulação de obrigações de não fazer,
fazer e condenação em dinheiro (STJ, REsp 625.249/PR). O compromisso de ajustamento é título executivo
extrajudicial. Para garantir a certeza e liquidez do título, deve conter (a) qualificação das partes investigadas e
correta representação; (b) Descrição da situação lesiva; (c) descrição das condições de tempo, modo e lugar do
cumprimento das obrigações. O termo de ajustamento pode ser convencionado antes do ajuizamento da ação,
sem intervenção judicial. Nesse caso, o ajustamento não transita em julgado, pois não há homologação judicial e,
dessa forma, não impossibilita outro legitimado, que não tenha intervindo no acordo, propor ação civil pública.
O compromisso tomado pelo órgão do MP nos autos do inquérito civil enseja seu arquivamento,
necessitando, assim, para se completar e operar efeitos válidos do aval do Conselho Superior. Homologado e
cumpridas as obrigações avençadas, na forma, prazo e condições fixadas, serão elas consideradas extintas,
desaparecendo o interesse de agir dos legitimados. Os órgãos integrantes do SISNAMA são obrigados a publicar
a relação dos compromissos firmados em matéria ambiental (art. 4, IV, da Lei 10.650/03).

AÇÃO POPULAR: remédio constitucional (art. 5°, LXXIII) que permite a qualquer cidadão a anulação de
“ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio
ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais
e do ônus da sucumbência”. Inspira-se na intenção de fazer de todo cidadão um fiscal do bem comum.
Atenção: tratando-se de defesa do meio ambiente, o procedimento a ser adotado será o previsto na Lei
de ACP e no CDC, e não o da Lei da Ação Popular (n° 4.717/65). A cidadania é comprovada por meio do título de
eleitor. Seu ajuizamento exige capacidade postulatória. O MP acompanhará a ação, cabendo-lhe apressar a
produção da prova e promover a responsabilidade, civil ou criminal, dos que nela incidirem, sendo-lhe vedado,
em qualquer hipótese, assumir a defesa do ato impugnado ou dos seus autores (art. 6º, § 4º da Lei nº 4.717/65).

INQUÉRITO PENAL: procedimento administrativo prévio, de natureza inquisitória, destinado a apurar


infrações penais e a fundamentar a ação penal. Não se sujeita ao contraditório e ampla defesa, e eventuais vícios
ou irregularidades não implicam a nulidade da ação penal. O inquérito penal não é indispensável e, em matéria
ambiental, vem sendo substituído pelo inquérito civil. Pode ser sigiloso quando a autoridade policial necessitar
surpreender uma situação lesiva grave ou quando tiver acesso a dados sigilosos. O prazo para conclusão é o
previsto no art. 10 do CPP (10 dias – preso, 30 dias – solto). Ao receber o inquérito o MP poderá oferecer denúncia,
requerer diligências imprescindíveis ou pedir seu arquivamento. Arquivado o inquérito, não mais poderá servir de

175
base para denúncia, salvo se surgirem novas provas e desde que não operada a prescrição. Se não houver indícios
de autoria e materialidade pode ser trancado por ordem judicial concedida em habeas corpus.
Como a ação penal em matéria ambiental é sempre pública incondicionada (Lei nº 9.605/98, art. 26), o
inquérito policial tem início em portaria da autoridade policial ou por requisição do Juiz ou do MP. Também pode
se iniciar pelo auto de prisão em flagrante. Não há um rito preestabelecido para o inquérito.

AÇÃO PENAL PÚBLICA: Nas infrações penais ambientais da Lei nº 9.605/98, a ação penal é pública
incondicionada. Concretiza o princípio do poluidor-pagador, ao exigir a composição do dano ambiental
(composição = acordo tendente à reparação) como pré-requisito à transação penal (art. 27) e a efetiva reparação
para a suspensão condicional do processo (art. 28, I), para a extinção da punibilidade e para o sursis especial (art.
17).
O art. 3º da Lei nº 9.605/98 e o art. 225, § 3º, da CF introduzem a responsabilidade criminal das pessoas
jurídicas. A jurisprudência não mais adota a teoria da dupla imputação. A punibilidade das pessoas jurídicas
independe da condenação de pessoas físicas pelo mesmo crime.

4.PATRIMÔNIO CULTURAL
4.1 Proteção do patrimô nio cultural brasileiro. Instrumentos: tombamento, inventários, registros e outras formas
de acautelamento e preservação. (11.c)

11C. Proteção jurídica do patrimônio cultural brasileiro. Instrumentos: tombamento, inventários, registros e
outras formas de acautelamento e preservação.

Caroline Araújo

A Constituição Federal em seu artigo 216, caput, ampliou o conceito de patrimônio cultural para abranger os bens
de natureza material e bens de natureza imaterial. Desse modo, está superada a restrita composição do
patrimônio histórico e artístico nacional que se limitava a bens tangíveis.
Para Sandra Cureau “a Constituição de 1988 ampliou a ideia de patrimônio cultural, que ‘começou a ser formulada
como fator, produto ou imagem de constituição e identidade dos povos, vinculada ao sentido de pertença e
multiplicidade de elementos formadores da sociedade humana e à preservação de sua memória’. A interpretação
do conceito, previsto no artigo 1º do Decreto-Lei 25/1937 continua, no entanto, englobando apenas o tratamento
excepcional do valor do bem cultural.” Além disso, “‘o que importa, agora, é a atenção especial que se dá à cultura
material e imaterial dos grupos sociais formadores da sociedade’, valorizando não mais somente o fundamento
estético, mas o conceito de patrimônio relacionado à identidade, à ação e à memória dos diferentes grupos
formadores da sociedade brasileira, isto é, levando em consideração os bens culturais e históricos, como um reflexo
dos valores, das crenças, dos conhecimentos e das tradições.[21] Acesso em 17.02.2013.”
Tanto os bens materiais quanto os intangíveis dependem de proteção. Cumpre registrar que a proteção do
patrimônio cultural brasileiro se insere na competência material e legislativa de todos os entes federativos. Nos
termos da CF, há um rol exemplificativo das formas de tutela conforme se demonstra a seguir.
Formas de tutela: inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação.
A) INVENTÁRIO: é a identificação e registro por meio de pesquisa e levantamento das características e
particularidades de determinado bem, adotando-se, para sua execução, critérios técnicos objetivos e
fundamentados de natureza histórica, artística, arquitetônica, sociológica, paisagística e antropológica. O
inventário é um instrumento de proteção consistente em uma lista de bens culturais, materiais ou imateriais, em
que se descreve e identifica de maneira pormenorizada o bem, que poderá ser alvo posteriormente de registro,
tombamento ou mesmo desapropriação. Embora o inventário não tenha sido regulamentado em termos federais,
é de grande utilização pelo IPHAN.
B) REGISTRO: É o instrumento de tutela de bens imateriais, uma vez que em relação a estes é incompatível a
proteção por meio do tombamento. Esta forma de tutela foi regulamentada pelo Decreto 3.551/2000. A doutrina
entende que, assim como o tombamento, é possível a instituição judicial ou legal do registro, esta interpretação
confere máxima efetividade a este instrumento de proteção instituído pela CF. São quatro os livros de registro
(Livro de Registro de Saberes, o Livro de Registro das Celebrações, o Livro de Registro das Formas de Expressão e

176
o Livro de Registro dos Lugares), cujo rol é exemplificativo, assim possível a abertura de novos. Os pressupostos
para inscrição nos Livros de Registro é a continuidade histórica do bem e sua relevância nacional para a memória,
a identidade e a formação da sociedade brasileira. O Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural (órgão colegiado
do IPHAN), após parecer do IPHAN, é o responsável pela decisão final sobre o registro, que, caso seja positiva,
concede o título de Patrimônio Nacional do Brasil. O bem registrado terá a seguinte proteção jurídica: I-
documentação por todos os meios técnicos admitidos, cabendo ao IPHAN manter banco de dados com o material
produzido durante a instrução do processo; II- ampla divulgação e promoção. Exemplo de bem imaterial
recentemente registrado: a capoeira, foi incluída em dois livros: o Livro dos saberes em relação ao ofício dos
mestres da capoeira e o Livro das Formas de Expressão em relação à roda de capoeira.
C) TOMBAMENTO: procedimento administrativo que veicula uma modalidade não supressiva de intervenção
concreta do Estado na propriedade privada ou mesmo pública, de índole declaratória que tem o condão de limitar
o uso, gozo e a disposição de um bem, gratuito (em regra), permanente e indelegável, destinado à preservação do
patrimônio cultural material (móvel ou imóvel), dos monumentos naturais e dos sítios e paisagens de feição
notável, pela própria natureza ou por intervenção humana. Quanto à natureza jurídica, a doutrina se divide entre
servidão administrativa, limitação administrativa e modalidade autônoma de intervenção. Pode ser: a) Quanto ao
procedimento: de ofício, voluntário e compulsório. b) Quanto à eficácia: provisório ou definitivo. c) Quanto aos
destinatários: individual ou geral. Efeitos: a) Necessidade de transcrição no Registro Público - o registro apenas
confere publicidade e não constitui o tombamento. Este terá eficácia desde a notificação do tombamento
provisório ou inscrição em Livro de Tombo. Se imóvel o registro deverá ser no cartório de Registro de Imóveis e,
se móvel, no Cartório de Registro de Títulos e Documentos; b) Se público, só pode ser alienado entre entes
públicos. Se particular, deve observar ordem de preferência (União, Estados e Municípios) para alienar; c) O
proprietário não pode modificar o bem, sob pena de multa; d) Caberá ao proprietário arcar com os custos, salvo
se demonstrar não possuir recursos disponíveis, neste caso deve o Poder Público arcar com os custos dentro de
seis meses, sob pena de cancelamento do tombamento; e) A área do entorno do bem tombado deve garantir
visibilidade e ambiência, não podendo haver redução ou impedimento destes. Neste caso, trata-se de servidão
administrativa, onde a coisa dominante é o bem tombado e serviente os imóveis vizinhos.
Indenização: em regra não caberá, salvo com a demonstração do prejuízo efetivo, desde que haja restrição ao
exercício do direito de propriedade, sendo este o entendimento do STJ.
Tombamento constitucional: incide sobre os documentos e sítios detentores de reminiscências históricas dos
antigos quilombos (§ 5º, do artigo 216 da CRFB).
Destombamento: pode ocorrer, por exemplo, no equívoco na valoração cultural de um bem, ou vício no processo
administrativo. Possibilidade de cancelamento do Tombamento quando o poder público não arcar com as obras
de restauração, na hipótese de o proprietário não possuir os recursos disponíveis.
Sanções administrativas: multas por agressões ao patrimônio cultural, bem como embargo e demolição de obra,
que, por exemplo, impeça ou reduza a visibilidade de bem protegido.
Estatuto da Cidade: Art.35 prevê a possibilidade de lei municipal autorizar o proprietário de imóvel urbano a
exercer em outro local, ou alienar, o direito de construir quando o referido imóvel for considerado necessário para
o interesse cultural. É uma medida “compensatória”.
ACP e Ação Popular em face da omissão do Poder Público: O fato de a Administração Pública não adotar a
providência de tombamento não impede a obtenção de medida de proteção na esfera jurisdicional. O
tombamento não constitui o valor cultural de um bem, mas apenas o declara. A ausência de tombamento não
implica, portanto, inexistência de relevância histórica ou cultural. Esta pode ser reconhecida na via judicial,
sanando-se, por este caminho, a omissão da autoridade administrativa. A decisão judicial na ACP ou na ação
popular pode declarar o valor cultural do bem e constituir o gravame daí decorrente, em substituição ao
tombamento, com eficácia erga omnes. O autor defende que a proteção judicial estaria incluída entre as “outras
formas de acautelamento e preservação” previstos no artigo 216, § 1º da CRFB.
Jurisprudência: Segundo o STJ, o tombamento não implica transferência de propriedade, inexiste a limitação que
proíbe o município de desapropriar bem do Estado.
D) VIGILÂNCIA: A vigilância é um instrumento que decorre do poder de polícia administrativa, para a vigia de bens
tombados, conforme previsão do artigo 20 do Decreto-lei 25/1937. Embora este instrumento de proteção esteja
previsto em nível constitucional, não há lei regulamentando esta forma de tutela. Embora haja previsão restrita
para os tombamentos, deve ser aplicado a todos os bens culturais, uma vez que o poder público tem dever de

177
fiscalização, como garantia de proteção.
E) DESAPROPRIAÇÃO: A desapropriação é uma modalidade supressiva de intervenção do Estado na propriedade
privada, ou mesmo na pública. Decerto, para a proteção de bens culturais, a modalidade adequada é a
desapropriação por utilidade pública nos moldes do decreto-lei 3.365/1941.

5.MEIO AMBIENTE URBANO


5.1 Ordenamento urbano. (9.c)
5.2 Estatuto das Cidades. Cidades sustentáveis. (9.c)

9C. Ordenamento urbano. Estatuto das Cidades. Cidades sustentáveis.

Atualizado e complementado por Valmor Cella Piazza

Tema inserido no contexto do direito administrativo e do meio ambiente artificial, compreendido pelo
espaço urbano construído (espaço urbano fechado = conjunto de edificações; espaço urbano aberto =
equipamentos públicos), bem como por todos os espaços habitáveis pelo homem. O termo “urbano” não se
contrapõe a “campo” ou “rural”, pois qualifica todos os espaços habitáveis, ligando-se ao território, abrangendo
todos. A cidade, com o advento da CF/88, passa a ter natureza jurídica de bem ambiental.
I. ORDENAMENTO URBANO. A CF fixa como objetivos da política urbana:
a) a realização do pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade. Visa, em última instância, o
cumprimento dos direitos do art. 5°, caput, CF, bem como dos direitos sociais, em relação aos seus habitantes.
Assim, cumprida estará a função social da cidade quando possibilitar moradia digna, com habitação adequada e
fiscalização da ocupação. Fiorillo identifica cinco aspectos da função social da cidade, vinculando-a à realização:
1) da habitação; 2) da circulação (rede viária e transportes adequados - coletivos); 3) do lazer; 4) do trabalho; e 5)
do consumo.
b) a garantia do bem estar dos seus habitantes. Notar aqui que a referência ao termo “habitante”
abrange qualquer indivíduo que esteja no território, e não somente domiciliados e residentes.
Cabe à União traçar normas gerais e parâmetros para a consecução dos objetivos de desenvolvimento
da política urbana (art. 21, XX, CF), e aos Estados e Municípios, em especial aos últimos, a execução das medidas,
no interesse local.

Os parâmetros do cumprimento da função social da propriedade urbana são extraídos dos §§ 1° e 2°


do art. 182 da CF c/c art. 39 da L10.257/01 (quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade
expressas no plano diretor, assegurando o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de
vida, à justiça social e ao desenvolvimento das atividades econômicas, respeitadas as diretrizes previstas no art.
2°). Conjugando os arts. 30, VIII, e 182 da CF, verificamos que o Poder Público municipal recebeu do texto
constitucional o dever de promover o adequado ordenamento territorial, de acordo com o planejamento e
controle do uso do parcelamento e da ocupação do solo urbano, observadas as diretrizes da lei federal. O solo
urbano e as funções sociais da cidade estão atrelados, já que é naquele que esta se projeta, externando-se em
formas e ocupação do seu uso para os mais diversos fins.
Há três situações nas quais a propriedade urbana não atende sua função social: (i) não edificação, (ii)
subutilização e (iii) não utilização. O critério da intensidade de uso da propriedade para atividades urbanas tem
que ser compatível com a capacidade de infraestrutura urbana de equipamentos e serviços.

O direito à concessão de uso especial para fins de moradia foi reconhecido pela Constituição Federal,
(art. 183, §1º). Na medida em que é vedada a aquisição do domínio pleno sobre as terras públicas através de
usucapião, esta concessão é instrumento hábil para a regularização fundiária das terras públicas informalmente
ocupadas pela população de baixa renda.

II. Lei 6.766/79 - Parcelamento do Solo Urbano


Há dois critérios para diferenciar área urbana de área rural: O primeiro encontra-se no art. 32, §1º do
CTN, qual seja, deve o imóvel possuir ao menos 2 dos 5 seguintes serviços públicos: I - meio-fio, com calçamento

178
e canalização de águas pluviais; II - abastecimento água; III - sistema de esgotamento sanitário; IV - rede de
iluminação pública com ou sem posteamento de distribuição domicilar; e V - escola primária ou posto de saúde a
no máximo 3km. O segundo localiza-se no DL57/1966 (art. 15), e possui respaldo do STJ em sua aplicação:
destinação econômica do imóvel. Portanto, o ponto fulcral para definição seria a destinação econômica do imóvel.

A competência para legislar sobre Direito Urbanístico é concorrente da União, Estados e Distrito Federal
(art. 24, I, CF); detendo o Município competência supletiva no que tange à legislação de interesse local, como
zoneamento, e limitação administrativa do solo urbano (art. 30, I) e promover, no que couber, adequado
ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo
urbano (art. 30, VIII).

Lado outro, no que tange à competência administrativa, à União compete instituir diretrizes para o
desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos; (art. 21, XX) e a todos
os entes (competência comum) promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições
habitacionais e de saneamento básico (art. 23, IX).

O art. 2º da L6.766/79 define parcelamento como a divisão do solo urbano em porção juridicamente
autônomas, através de loteamento ou desmembramento. Loteamento, por sua vez, consiste na subdivisão de
gleba em lotes para edificação, com abertura de novas vias de circulação, logradouros público ou prolongamento,
modificação ou ampliação das vias existentes. Ao final, desmembramento constitui-se na subdivisão de gleba em
lotes para edificação, com aproveitamento de sistema viário existente, sem a abertura de novas vias e logradouros
públicos.

O loteamento somente pode ocorrer de modo voluntário, sempre através de registro. Ao revés, o
desmembramento pode ser voluntário ou judicial, e se dá mediante averbação.

Considera-se lote o terreno servido de infraestrutura básica cujas dimensões atendam aos índices
urbanísticos definidos pelo plano diretor ou lei municipal para a zona em que se situe. A dimensão mínima é de
125m², com frente mínima de 5 metros (art. 4, II, L6.766).

A infraestrutura básica do parcelamento consiste em: (I) escoamento de águas pluviais; (II) ilumunição
pública; (III) esgotamento sanitário; (IV) abastecimento de água potável; (V) energia elétrica pública e domiciliar;
e (VI) vias de circulação. Todavia, tratando-se de Zonas de Habitação de Interesse Social, limita-se ao I, III, IV e V.

Fundamental consignar que a L6.766/79 somente possui aplicação nos casos de oferta pública de
parcelamento urbano, com finalidade comercial. Caso se permite o parcelamento para fins urbanos em zona
urbana, de expansão urbana ou de urbanização específica, constituindo o loteamento em área rural crime (art.
50, L6.766/79).

III. AS FUNÇÕES SOCIAIS DA CIDADE13


A cidade é, notadamente, um espaço marcado por tensões e conflitos que retratam as desigualdades
sociais e os problemas urbanos. Ao urbanismo, portanto, cabe a tarefa de identificar as necessidades reais da
cidade para elaborar soluções factíveis, devendo colocar as relações sociais existentes como preocupação em
primeiro plano, o que muitas vezes não acontece, isto é, as medidas urbanísticas acabam por tensionar as relações
sociais. A definição de Hely Lopes Meirelles resume bem a tarefa primordial do urbanismo que é resolver os
problemas e conflitos ocorridos na cidade: “Urbanismo é o conjunto de medidas estatais destinadas a organizar
os espaços habitáveis, de modo a propiciar melhores condições de vida ao homem na comunidade, entendido
como espaços habitáveis, todas as áreas e que o homem exerce coletivamente qualquer das quatro funções
sociais: habitação, trabalho, circulação e recreação". A cidade, para cumprir então suas funções sociais, deve
garantir a todos os cidadãos, indistintamente, o direito e a garantia individual e coletiva ao meio ambiente, à

13
PIETRO, Élisson Cesar. O Estatuto da Cidade e o Meio Ambiente. (http://www.ibdu.org.br/imagens/OEstatutodaCidadeeoMeioAmbiente.pdf)

179
moradia, à terra urbana, ao saneamento e infra-estrutura, ao transporte e serviços públicos, ao trabalho e ao
lazer, tanto para as gerações presentes, quanto para as futuras.
É com base nessa ideia que o poder público, para atender as funções sociais da cidade, pode e deve
redirecionar os recursos e a riqueza de forma mais justa, com vistas a combater as situações de desigualdade
econômica e social vivenciadas em nossas cidades. Além disso, o poder público deve estabelecer regras jurídicas
para determinar, por exemplo, a disciplina do uso e ocupação do solo, a regulação do sistema viário, o
planejamento urbano. Essas regras constituem o direito das relações sociais na cidade, conhecido como direito
urbanístico, que teve sua consolidação normativa a partir da Constituição Federal de 1988.

A Constituição, estabeleceu um capítulo sobre a Política Urbana, em que foi explicitado o princípio das
funções sociais da cidade como constante da política de desenvolvimento urbano no país, como se denota do
próprio texto. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes
gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir
o bem-estar de seus habitantes.

O Estatuto da Cidade e o Meio Ambiente (autor: Élisson Cesar Prieto). Artigo destinado ao IV Congresso
Brasileiro de Direito Urbanístico São Paulo, 05 a 09 de dezembro de 2006 (encontrado em
http://www.ibdu.org.br/imagens/OEstatutodaCidadeeoMeioAmbiente.pdf)

Mais tarde, a lei federal de desenvolvimento urbano, que conhecemos como Estatuto da Cidade, veio
explicitar o significado desse direito à cidade, nos seguintes termos: “a garantia do direito a cidades sustentáveis,
entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao
transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações" (art. 2°, inciso I).
Na acepção de Nelson Saule Júnior, esse direito à cidade sustentável “compreende os direitos inerentes às pessoas
que vivem nas cidades de ter condições dignas de vida, de exercitar plenamente a cidadania, de ampliar os direitos
fundamentais (individuais, econômicos, sociais, políticos e ambientais), de participar da gestão da cidade, de viver
num meio ambiente ecologicamente equilibrado e sustentável". O que se pode concluir, portanto, é que as cidades
também devem cumprir determinadas funções sociais para o bem-estar da coletividade. E essas funções sociais
da cidade estão atreladas ao meio ambiente, que assegura a qualidade de vida das populações que vivem em
assentamentos urbanos. Dessa análise, devemos partir para o significado da relação das questões urbanas e
ambientais nas cidades.
III.ESTATUTO DAS CIDADES. Disciplina, mais que o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo,
em consonância com os artigos 182 e 183, as principais diretrizes do meio ambiente artificial, fundado no
equilíbrio ambiental, a segurança e o bem estar dos cidadãos (art. 1° da Lei 10.257/2001). A propriedade urbana
deixa de ser considerada simples imóvel localizado dentro de limites impostos pelo legislador, assumindo feição
metaindividual.
As inovações contidas no Estatuto situam-se em três campos: (i) um conjunto de novos instrumentos
de natureza urbanística voltados para induzir - mais do que normatizar - as formas de uso ocupação do solo; (ii) a
ampliação das possibilidades de regularização das posses urbanas e também (iii) uma nova estratégia de gestão
que incorpora a ideia de participação direta do cidadão em processos decisórios sobre o destino da cidade.
O Estatuto da Cidade define a obrigatoriedade do Plano Diretor, nas hipóteses do art. 41 (Município (I)
com mais de vinte mil habitantes; (II) integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas; (IV) em
região de interesse turístico; (V) incluídos no cadastro nacional de municípios com áreas suscetíveis à ocorrência
de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlato -
notar que estabelece hipóteses de obrigatoriedade mais amplas do que a CF), e, no artigo 42, exige o conteúdo
mínimo do Plano: I - delimitação das áreas urbanas onde poderá ser aplicado o parcelamento, edificação ou
utilização compulsórios, considerando a existência de infra-estrutura e de demanda para utilização, na forma do
art. 5° desta Lei; II - disposições requeridas pelos arts. 25, 28, 29, 32 e 35 da Lei; III - sistema de acompanhamento
e controle.
O Plano Diretor é requisito obrigatório para o poder público municipal aplicar, de forma sucessiva, o
parcelamento ou edificação compulsórios (art. 5° e 6°), imposto sobre a propriedade predial e territorial

180
progressivo no tempo (art. 7°) e a desapropriação para fins de reforma urbana (art. 8°), (§4°, art. 182). Não é
válida previsão genérica de parcelamento, edificação ou utilização. É necessário que, além da existência do plano
diretor, seja editada, em cada caso, uma lei municipal específica, prevendo a instituição da obrigação em uma
área determinada.
Os princípios constitucionais fundamentais norteadores do Plano Diretor são: a função social da
propriedade; desenvolvimento sustentável; as funções sociais da cidade; a igualdade e a justiça social; a
participação popular (gestão democrática da cidade - arts. 43 a 45).
São ainda instrumentos da política urbana e regularização fundiária: direito de superfície (arts. 21 a
24), usucapião especial de imóvel urbano (art. 9°), usucapião urbano coletivo (art. 10°). É também incumbência
do Plano Diretor a definição dos critérios para a utilização dos instrumentos estabelecidos no Estatuto da Cidade,
tais como a outorga onerosa do direito de construir (art. 29), as operações urbanas consorciadas (art. 32 a 34), o
direito de preempção (art. 25 a 27 - preferência para aquisição de imóvel urbano objeto de alienação onerosa
entre particulares) e a transferência do direito de construir (art. 35).
O Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) previsto no art. 4°, VI e arts. 36 a 38 do Estatuto, embora
semelhante ao EIA/RIMA, com ele não se confunde. É mais usado em empreendimentos típicos do contexto
urbano, sem grandes impactos no ambiente natural. O EIV não substitui o EIA, quando exigido. Mas o EIA, mais
abrangente, pode tornar o EIV dispensável. O direito de preempção e o EIV são exemplos de limitações
administrativas, ou seja, intervenção do Poder Público na propriedade privada.
A Lei 11.977/09 incluiu dois novos instrumentos da política urbana: demarcação urbanística para fins
de regularização fundiária e legitimação de posse (art. 4°, V, alíneas t, u, Estatuto).
IV. CIDADE SUSTENTÁVEL. O desenvolvimento sustentável é uma combinação de diversos elementos
ou princípios: a integração da prestação ambiental e o desenvolvimento económico (princípio da integração), a
necessidade de preservar os recursos naturais para o benefício das gerações futuras (equidade intergeracional:
“responder às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das gerações futuras de prover suas
próprias necessidades” - PALSULE, 2004), o objetivo de explorar os recursos naturais de forma sustentável (uso
sustentável) e, o uso equitativo dos recursos (equidade intrageracional). Entende-se também que o
desenvolvimento sustentável visa promover a harmonia entre os seres humanos e a natureza, e, para alcançá-lo,
são necessários vários requisitos, como um sistema político que assegure efetiva participação dos cidadãos no
processo decisório, além de um sistema económico capaz de gerar excedentes, também um sistema social que
possa resolver tensões causadas por um desenvolvimento não equilibrado, um sistema de produção que respeite
a obrigação de preservar a base ecológica do desenvolvimento, mais um sistema tecnológico que vise novas
soluções, um sistema internacional que estimule padrões sustentáveis de comércio e financiamento e, ainda, um
sistema administrativo flexível capaz de corrigir-se (CANEPA, 2007). A CF/88 não utiliza a expressão
'desenvolvimento sustentável', mas a inserção do dever de defender e preservar o meio ambiente para as
presentes e futuras gerações representa a essência do princípio da sustentabilidade. Trata- se de um princípio
implícito. Em termos de proteção internacional ao meio ambiente, o desenvolvimento sustentável aparece em
diversas normas internacionais. O conceito demorou muito tempo para influenciar as políticas da cidade, e o lugar
que ocupa no direito urbanístico é ainda modesto.
‘Cidade sustentável’ representa uma noção recentemente consagrada no plano internacional
(Declaração das Nações Unidas sobre cidades e outros assentamentos humanos, 2001), inclusive quanto à
percepção da cidade como património comum do povo e, principalmente, como possível sujeito de direito e
deveres (Carta das cidades europeias para a sustentabilidade - Carta de Aalborg, 1994: nós as cidade europeias...
declaramos que... direito à qualidade de vida, saneamento básico e à miscigenação do habitat [...] cada cidade é
diferente... é seu dever encontrar seu próprio caminho para alcançar a sustentabilidade). Em síntese, a gestão
sugerida no plano europeu é de responsabilidade descentralizada das coletividades, com grande apelo à
participação dos cidadãos.
No Brasil, as iniciativas legislativas estão consubstanciadas na Lei n° 12.305/2010 (política nacional de
resíduos sólidos), Lei n° 6.766/ 1979 (parcelamento do solo urbano), Lei n° 11.445/2007 (diretrizes nacionais para

181
o saneamento básico), Lei n° 10257/2001 (Estatuto da Cidade).
Nesse norte, é com fundamento nos direitos constitucionais e nos instrumentos que proporcionam a
melhoria das cidades, que se formam os elementos para a constituição e consolidação de um novo direito, o
direito à cidade sustentável aparece como diretriz geral da política urbana. O binómio sustentabilidade-cidade
está progressivamente sendo fortificado pelas políticas urbanas, chegando até mesmo a ser considerado como
termos incindíveis (CANEPA, 2007). O binómio sustentabilidade-cidade, portanto, da mesma forma que
estabelece uma concretude ao discurso sobre a sustentabilidade, está também modificando radicalmente o modo
de ver e governar a cidade e o território. Nessa perspectiva, a cidade sustentável significa a concretização da
justiça distributiva, o equilíbrio das relações de todos os atores sociais, e ainda implica o desenvolvimento
económico compatível com a preservação ambiental e qualidade de vida dos seus habitantes (CAVALLAZZI, 2007).
Nesse contexto, regulamentando os artigos 182 e 183 da CRFB, a Lei n. 10.257 previu, no inciso I de seu
artigo 2°, o direito às cidades sustentáveis, entendida como aquela que garante o direito à terra urbana, à
moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte, ao trabalho, ao lazer, para as
presentes e futuras gerações. O direito à cidade sustentável encontra fundamento em diversos direitos
fundamentais inseridos expressamente na Constituição Federal; por isso, é considerado por muitos como um
direito fundamental implícito. Encontra guarida na função social da propriedade, no direito à democracia
participativa, no direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, e ainda no princípio da dignidade da
pessoa humana. O direito à cidade sustentável engloba, assim, os seguintes direitos:
a) direito à terra urbana (art. 2° , I do Estatuto da Cidade): é a partir do território que todos os demais
direitos sociais inscritos na CR/88 podem ser exercidos;
b) direito à moradia (art. 2° , I do Estatuto da Cidade): reforça o plano do piso vital mínimo; está
associado ao direito à casa, observadas as necessidades da família e a possibilidade económica do município como
executor da política de desenvolvimento urbano;
c) direito ao saneamento ambiental (art. 2° , I do Estatuto da Cidade): refere-se às condições urbanas
adequadas de saúde pública quanto ao controle de águas, esgotos etc. Orienta-se pelo direito (1) ao uso de águas,
(2) ao esgoto sanitário, (3) ao ar atmosférico e sua circulação e (4) ao descarte de resíduos. Observa, ainda, as
diretrizes nacionais para o saneamento básico consubstanciadas na Lei n° 11.445/2007;
d) direito à infraestrutura urbana (art. 2° , I do Estatuto da Cidade): traduz o direito à efetivação, por
parte do Poder Público municipal, de obras, instalações, artefatos ou atividades destinadas a efetivar o pleno
desenvolvimento das funções sociais da cidade;
e) direito ao transporte (art. 2° , I do Estatuto da Cidade): revela o direito aos meios necessários à livre
locomoção dos brasileiros e estrangeiros residentes no País, sobretudo quanto à necessidade de utilização de vias
urbanas adequadas à circulação de pessoas e cargas e descargas fundamentais às relações de consumo. Compete,
nesse sentido, ao Poder Público municipal transportar fundamentalmente as pessoas nas cidades e propiciar boas
condições às vias, dentro dos critérios de trânsito estabelecidos pelo Código de Trânsito Brasileiro. Como reflexo
desse direito, o STJ já chegou a decidir o acesso de idosos ao transporte coletivo gratuito sem limite do número
de viagens, manteve a proibição dos transportes alternativos e decidiu que o preço pago pelo vale-transporte no
estado de São Paulo deveria ser o mesmo da passagem comum;
f) direito aos serviços públicos: compete aos municípios organizar e prestar os serviços públicos de
interesse local (art. 30, CR/88), tais como a rede de esgotos, abastecimento de água, energia elétrica, coleta de
águas pluviais, rede telefónica etc.;
g) direito ao lazer: compõe o bem-estar físico e psíquico da pessoa humana, revelando-se na
disponibilização dos meios necessários para que a população realize atividades de entretenimento, como
cinemas, teatros, praças, áreas arborizadas etc.
Vê-se, portanto, que o conceito de sustentabilidade das cidades, não é só ambiental, mas também social
e económico e que a diretriz expressa a preocupação do legislador com as questões ambientais ao elevar o
saneamento ambiental a uma das funções sociais da cidade.

182
INOVAÇÕES LEGISLATIVAS

• ALTERAÇÕES NO ESTATUTO DA CIDADE


O Estatuto da Cidade foi alterado pela Lei 12.836/2013, para inserir como diretriz geral o “estímulo à
utilização, nos parcelamentos do solo e nas edificações urbanas, de sistemas operacionais, padrões construtivos e
aportes tecnológicos que objetivem a redução de impactos ambientais e a economia de recursos naturais’’ (art.
2°, XVII)
A Lei n° 13.089 (Estatuto da Metrópole), de 2015, incluiu no Estatuto da Cidade o art. 34-A, para prever
que: “Nas regiões metropolitanas ou nas aglomerações urbanas instituídas por lei complementar estadual,
poderão ser realizadas operações urbanas consorciadas interfederativas, aprovadas por leis estaduais
específicas”.

• ESTATUTO DA METRÓPOLE14
A Lei 13.089/2015, instituiu o Estatuto da Metrópole, estabelecendo diretrizes gerais para o
planejamento, a gestão e a execução das funções públicas de interesse comum em regiões metropolitanas e em
aglomerações urbanas instituídas pelos Estados. A lei trouxe alguns conceitos importantes:
Região
Aglomeração urbana Metrópole
metropolitana

unidade territorial urbana constituída espaço urbano com continuidade territorial que,
pelo agrupamento de 2 ou mais em razão de sua população e relevância política e aglomeração
Municípios limítrofes, caracterizada por socioeconômica, tem influência nacional ou sobre urbana que
complementaridade funcional e uma região que configure, no mínimo, a área de configure uma
integração das dinâmicas geográficas, influência de uma capital regional, conforme os metrópole
ambientais, políticas e socioeconômicas critérios adotados pelo IBGE

As regiões metropolitanas e aglomerações urbanas são instituídas com o objetivo de realizar funções
públicas de interesse comum, e são criadas por lei complementar estadual. Ou seja, são criadas para a
concretização de políticas públicas cuja realização seria inviável a um Município isoladamente ou que impactam
Municípios limítrofes, razão pela qual devem ser planejadas e executadas em conjunto. Essas funções públicas de
interesse comum são realizadas pelos Estados e Municípios envolvidos por meio da governança interfederativa,
que é o compartilhamento de responsabilidades e ações entre os entes da Federação integrantes do agrupamento
para que todos participem daquele objetivo. São princípios da governança interfederativa: prevalência do
interesse comum sobre o local, compartilhamento de responsabilidades para a promoção do desenvolvimento
urbano integrado, autonomia dos entes da Federação, observância das peculiaridades regionais e locais, gestão
democrática da cidade, efetividade no uso dos recursos públicos e busca do desenvolvimento sustentável.
Antes do Estatuto da Metrópole, já haviam regiões metropolitanas criadas no Brasil, com fundamento
do art. 225, §3o, da CF/88. Mas a Lei trouxe novos requisitos, tornando-se necessário um regime de transição. As
unidades territoriais urbanas criadas antes da lei continuarão existido, ainda que tenham recebido o nome de
“região metropolitana”, passando a ser enquadradas como “aglomerações urbanas” para fins de políticas públicas
a cargo do Governo Federal.
É possível a existência de região metropolitana ou aglomeração urbana envolvendo Municípios
pertencentes a Estados-membros diferentes, exigindo-se a aprovação de leis complementares pelas assembleias

14Todo o tópico foi feito com base no “Resumo esquematizado sobre a LEI 13.089/2015”, de Márcio André Lopes Cavalcante, extraíd o de
www.dizerodireito.com.br

183
legislativas de cada um dos Estados envolvidos.
A Lei também contém um rol de instrumentos de desenvolvimento urbano integrado, exemplificativo,
dentre os quais estão: planos setoriais interfederativos, fundos públicos, operações urbanas consorciadas
interfederativas, zonas para aplicação compartilhada dos instrumentos urbanísticos, consórcios públicos,
convênios de cooperação, contratos de gestão, compensação por serviços ambientais ou outros serviços
prestados pelo Município à unidade territorial urbana, parcerias público-privadas interfederativas.

6.RESPONSABILIDADE AMBIENTAL
6.1 O dano ambiental e sua reparação: responsabilidade civil. (16.c)
6.2 Responsabilidade administrativa por danos ambientais. Infraçõ es e sançõ es administrativas ambientais. (7.c)

16C. O dano ambiental e sua reparação: responsabilidade civil.

José Moreira Falcão Neto. 01/10/2018

1. NOÇÕES GERAIS. Preceitua o art. 225, caput, da CF/88 ser o meio ambiente “bem de uso comum do povo e
essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê- lo e
preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. A CF evidencia, com isso, a responsabilidade solidária de todos
aqueles que, de alguma forma, contribuíram para a ocorrência do dano ambiental (Fiorillo, p. 122).

2. DANO AMBIENTAL. Dentro da teoria da responsabilidade civil, não há falar em dever de indenizar sem a
ocorrência de dano. Acerca do tema, Fiorillo ressalta a inexistência de relação indissociável entre a
responsabilidade civil e o ato ilícito, ou seja, haverá dano ainda que este não derive de ato ilícito. Desta feita,
complementa “ocorrendo lesão a um bem ambiental, resultante de atividade praticada por pessoa física ou
jurídica, pública ou privada, que direta ou indiretamente seja responsável pelo dano, não só há a caracterização
deste como a identificação do poluidor, aquele que terá o dever de indenizar.” (Fiorillo, p. 108). José Rubens
Morato Leite (p. 194) frisa ainda que, ante o dever genérico a todos imposto pela CF, em seu art. 225, de proteção
e conservação do meio ambiente, o dano ambiental pode perfeitamente decorrer de omissão do agente – que,
caso houvesse agido, poderia impedir a ocorrência do dano, ou, ao menos, minorá-lo – hipótese em que restaria
caracterizada sua responsabilidade pelo dano ocorrido.

3. RESPONSABILIDADE OBJETIVA PELO DANO AMBIENTAL. A partir da Revolução Industrial, o mundo jurídico
passou a perceber que a necessidade da demonstração do trinômio dano, culpa e nexo de causalidade (elementos
da teoria subjetiva da culpa) para a caracterização da responsabilidade civil, por vezes, criava embaraços para
atender aos anseios da população. Surgiu, assim, a teoria objetiva, que retira a culpa dos elementos necessários
à configuração da responsabilidade. O direito ambiental, considerando a extrema importância dos bens jurídicos
por ele tutelados, adotou a teoria da responsabilidade civil objetiva desde antes da CF/88, na lei 6.938/81, a Lei
da Política Nacional do Meio Ambiente. Com a promulgação da Lei Maior, referida norma infraconstitucional
restou por ela recepcionada (Fiorillo, p. 103). O art. 225, § 3o, da CF previu a tríplice penalização do poluidor do
meio ambiente: penal, administrativa e civil, e consagrou a regra da cumulatividade das sanções, até porque as
sanções administrativa, penal e cível protegem objetos distintos e estão sujeitas a regimes jurídicos diversos. A
responsabilidade civil por danos ao meio ambiente é objetiva e solidária. O Poder Público, tendo outorgado a
licença de operação, será responsável pelos danos civis causados pela atividade do empreendedor. O STF tem
decisões entendendo inclusive que esta responsabilidade será objetiva mesmo no caso de omissão (RE 409203).
Se não houve EIA/RIMA, tendo o Poder Público exigido apenas o Relatório de impacto ambiental, também será
responsabilizado. Se houve EIA/RIMA totalmente favorável, inexiste a responsabilidade do Estado. Se o EIA/RIMA
favorável em razão de erro da equipe multidisciplinar, a equipe deverá responder solidária e objetivamente,
segundo o nexo de causalidade. Se o EIA/RIMA tiver sido desfavorável, no todo ou em parte, tendo sido concedida
a licença, há responsabilidade solidária do Estado. Se, em razão do EIA/RIMA desfavorável, não tiver sido
concedida a licença, inexiste, como regra, responsabilidade do Estado, exceto se restar provado inércia (na
fiscalização, por exemplo) e, por conta da omissão, ocorreu o dano ambiental.

184
4. EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE: Depois de muita discussão doutrinária e jurisprudencial, o STJ vem se
inclinando a acolher a teoria do risco integral nos danos ambientais, afastando a possibilidade do reconhecimento
das excludentes de responsabilidade do caso fortuito e força maior, consoante se verifica do voto do Min. Sidnei
Beneti (Recurso Especial 1.114.398/PR, Rel. Min .Sidnei Beneti, 2ª S., DJe de 16/02/2012), ao tratar do noticiado
caso dos danos infligidos aos pescadores artesanais das Baías de Antonina e Paranaguá/PR, em virtude de poluição
ambiental decorrente de acidentes de responsabilidade da empresa PETRÓLEO BRASILEIRO S/A – PETROBRAS
(Min. Beneti – “a alegação de culpa exclusiva de terceiro pelo acidente em causa, como excludente de
responsabilidade, deve ser afastada, ante a incidência da teoria do risco integral e da responsabilidade objetiva
ínsita ao dano ambiental”). – STJ, EDcl REsp 1346430/PR, 2013. Trecho do Voto do Min. Luis Felipe Salomão:
irrelevante a discussão acerca da ausência de responsabilidade por culpa exclusiva de terceiro ou pela ocorrência
de força maior”.

5. RESSARCIMENTO DO DANO AMBIENTAL. O ressarcimento do dano ambiental pode ser feito de duas formas:
por meio da reparação natural ou específica (em que há o ressarcimento “in natura”) ou através de indenização
em dinheiro (Fiorillo, p. 103). Isso não significa, entretanto, que a reparação possa se dar de um ou de outro modo,
indistintamente. Deve-se, preferencialmente, buscar o retorno ao status quo ante, por meio da reparação
específica e, somente ante a absoluta impossibilidade desta, é que deve ser admitida a reparação pecuniária. José
Rubens Morato Leite (p. 221) alerta que a reparação especifica do dano ambiental, quando viável, deve se dar de
forma integral, ou, quando não puder ocorrer totalmente, que se dê no máximo possível. É de se observar ainda
que “a cumulação de pedidos de ressarcimento pelos danos materiais e morais, ou até mesmo uma ação em que
sejam pleiteados somente danos morais causados aos usuários do bem ambiental, por violação a este bem, que
é de natureza difusa, não tem o condão de afastar a reparação específica, porquanto, como bem difuso, ele
pertence a toda a coletividade, e a reparação específica faz-se inafastável, quando possível.” (Fiorillo, p 104). Ingo
Sarlet (p. 239), ao tratar do dano ambiental ocorrido em área de proteção ambiental no interior de propriedade
privada, respaldado pela atual jurisprudência do STJ, salienta que a reparação, nestes casos, é obrigação de
natureza propter rem, ou seja, independe da culpa do atual proprietário pela degradação ambiental ocorrida em
sua propriedade, sendo dele, portanto, o ônus de arcar com a reparação dos danos ocasionados por proprietários
anteriores. Ainda segundo o STJ, principais critérios para o arbitramento da compensação dos danos morais no
caso de danos ambientais são: a intensidade do risco criado; a gravidade do dano; o tempo durante o qual a
degradação persistirá; a reversibilidade ou não do dano; o grau de proteção jurídica atribuído ao bem ambiental
lesado. Afirma ainda o STJ que é inadequado pretender conferir à reparação civil dos danos ambientais caráter
punitivo imediato, pois a punição é função que incumbe ao direito penal e administrativo. Assim, não há falar em
danos punitivos (punitive damages) no caso de danos ambientais, haja vista que a responsabilidade civil por dano
ambiental prescinde da culpa e revestir a compensação de caráter punitivo propiciaria o bis in idem (pois, como
afirmado, a punição imediata é tarefa específica do direito administrativo e penal). Por fim, prevalece no STJ o
entendimento de que é cabível a condenação por dano moral coletivo em razão de dano ambiental.

6. JURISPRUDÊNCIA

- As empresas adquirentes da carga transportada pelo navio Vicuña no momento de sua explosão não respondem
pela reparação dos danos alegadamente suportados por pescadores da região atingida, haja vista a ausência de
nexo causal a ligar tais prejuízos (proibição temporária da pesca) à conduta por elas perpetrada (mera aquisição
pretérita do metanol transportado). STJ. 2ª Seção. REsp 1602106-PR, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado
em 25/10/2017 (Info 615).

STJ, REsp 1120117/AC, 2009. No voto da Min. Eliana Calmon restou consignado, por força da “fundamentalidade
material” do direito ao ambiente, que a lesão ao patrimônio ambiental “está protegida pelo manto da
imprescritibilidade, por se tratar de direito inerente à vida, fundamental e essencial à afirmação dos povos (...)
antecedendo todos os demais direitos, pois sem ele não há vida, nem saúde, nem trabalho, nem lazer (...)”.

- STJ, REsp 1.374.284-MG, 2014, Info 545, REPETITIVO. “a) a resp. por dano ambiental é objetiva, informada pela

185
teoria do risco integral, sendo o nexo de causalidade o fator aglutinante que permite que o risco se integre na
unidade do ato, sendo descabida a invocação, pela empresa responsável pelo dano ambiental, de excludentes de
responsabilidade civil para afastar a sua obrigação de indenizar; b) em decorrência do acidente, a empresa deve
recompor os danos materiais e morais causados; e c) na fixação da indenização por danos morais, recomendável
que o arbitramento seja feito caso a caso e com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível
socioeconômico dos autores, e, ainda, ao porte da empresa recorrida, orientando-se o juiz pelos critérios
sugeridos pela doutrina e jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e bom senso, atento
à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso, de modo a que, de um lado, não haja enriquecimento sem
causa de quem recebe a indenização e, de outro lado, haja efetiva compensação pelos danos morais
experimentados por aquele que fora lesado.”

- STJ, REsp 1.354.536-SE, 2014, Info 538. “(...) para demonstração da legitimidade para vindicar indenização por
dano ambiental que resultou na redução da pesca na área atingida, o registro de pescador profissional e a
habilitação ao benefício do seguro-desemprego, durante o período de defeso, somados a outros elementos de
prova que permitam o convencimento do magistrado acerca do exercício dessa atividade, são idôneos à sua
comprovação.” (...) “(...) está consolidando no âmbito do STJ a aplicação aos casos de dano ambiental da teoria
do risco integral, vindo daí o caráter objetivo da responsabilidade.” (...) “A doutrina realça que, no caso da
compensação de danos morais decorrentes de dano ambiental, a função preventiva essencial da responsabilidade
civil é a eliminação de fatores capazes de produzir riscos intoleráveis, visto que a função punitiva cabe ao direito
penal e administrativo, propugnando que os principais critérios para arbitramento da compensação devem ser a
intensidade do risco criado e a gravidade do dano, devendo o juiz considerar o tempo durante o qual a degradação
persistirá, avaliando se o dano é ou não reversível, sendo relevante analisar o grau de proteção jurídica atribuído
ao bem ambiental lesado. Assim, não há falar em caráter de punição à luz do ordenamento jurídico brasileiro –
que não consagra o instituto de direito comparado dos danos punitivos (punitive damages) –, haja vista que a
responsabilidade civil por dano ambiental prescinde da culpa e que, revestir a compensação de caráter punitivo
propiciaria o bis in idem (...).” (...) “o dano material somente é indenizável mediante prova efetiva de sua
ocorrência, não havendo falar em indenização por lucros cessantes dissociada do dano efetivamente
demonstrado nos autos; assim, se durante o interregno em que foi experimentado os efeitos do dano ambiental,
houve o período de "defeso" – incidindo a proibição sobre toda atividade de pesca do lesado –, não há que se
cogitar em indenização por lucros cessantes durante essa vedação.”

- STJ, REsp 1.373.788-SP, 2014, Info 544. “O particular que deposite resíduos tóxicos em seu terreno, expondo-os
a céu aberto, em local onde, apesar da existência de cerca e de placas de sinalização informando a presença de
material orgânico, o acesso de outros particulares seja fácil, consentido e costumeiro, responde objetivamente
pelos danos sofridos por pessoa que, por conduta não dolosa, tenha sofrido, ao entrar na propriedade, graves
queimaduras decorrentes de contato com os resíduos. A responsabilidade civil por danos ambientais, seja por
lesão ao meio ambiente propriamente dito (dano ambiental público), seja por ofensa a direitos individuais (dano
ambiental privado), é objetiva, fundada na teoria do risco integral, em face do disposto no art. 14, § 1o, da Lei
6.938/1981, que consagra o princípio do poluidor-pagador.” (...) “na responsabilidade civil pelo dano ambiental,
não são aceitas as excludentes de fato de terceiro, de culpa da vítima, de caso fortuito ou de força maior. Nesse
contexto, a colocação de placas no local indicando a presença de material orgânico não é suficiente para excluir
a responsabilidade civil.”

PLUS: SAMARCO
Em 02 de maio de 2016 foi ajuizada a ACP, nº 23863- 07.2016.4.01-3800, contra as empresas Samarco, Vale, BHP
Billiton e entes públicos, vindicando a reparação integralmente dos danos sociais, econômicos e ambientais
causados pelo rompimento da barragem de Fundão, além da condenação das empresas ao pagamento de dano
moral coletivo.
O rompimento da barragem de Fundão provocou destruição ao longo de toda a bacia do rio Doce, chegando ao
mar, no município de Linhares/ES. Houve perdas de vidas humanas, poluição e contaminação de recursos hídricos
(córrego Santarém, rio Gualaxo do Norte, rio do Carmo, rio Doce e seus afluentes, regiões estuarina, costeira e
marinha), do solo, do ar e do meio ambiente cultural.

186
Houve acordos entre União, ES, MG e empresas. Acertos de gabinete – comunidades não ouvidas. MPF entende
que o Termo de Ajustamento e de Transação celebrado entre o Poder Público e as empresas Samarco, Vale e BHP
não tutela de forma integral, adequada e suficiente os direitos coletivos afetados, violando preceitos
constitucionais como o princípio democrático e o princípio do poluidor-pagador.
“diante da extensão dos danos decorrentes do desastre ocorrido em Mariana/MG, seria rigorosamente
recomendável o mais amplo debate para a solução negociada da controvérsia, por meio da realização de
audiências públicas, com a participação dos cidadãos, da sociedade civil organizada, da comunidade científica e
dos representantes dos interesses locais envolvidos, a exemplo das autoridades municipais”
Responsabilidade do Poder Público pelo dano ambiental – Para o MPF, a tragédia em Mariana demonstrou que
as autoridades públicas foram omissas ou negligentes, desde a emissão da licença ambiental, que autorizou o
exercício da operação da barragem, até a sua execução.
Há, ainda, recomendação para que órgaos públicos e empresas adotem medidas com vistas a resguardar a saúde
da população, do meio ambiente e dos profissionais que têm como sustento a pesca no Rio Doce e sua foz. E
também pedido para destinação ambientalmente adequada de resíduos de mineração (mineração sustentável)
Em 2016, mpf conseguiu liminar para suspender acordo entre Samarco, Vale, Estados e União.

7C. Responsabilidade administrativa por danos ambientais. Infrações e sanções administrativas ambientais.

Camila Lauton
Fonte utilizada: atualização do Graal 28; livro do Romeu Thomé – manual de direito ambiental.

O art. 225, § 3o, da CF previu a tríplice penalização do poluidor do meio ambiente: penal, administrativa e civil,
consagrando a regra da cumulatividade das sanções, até porque as sanções administrativa, penal e cível protegem
objetos distintos e estão sujeitas a regimes jurídicos diversos. A responsabilidade cível é de índole objetiva. A
responsabilidade penal, por sua vez, é subjetiva. Por fim, a responsabilidade ambiental administrativa é de cunho
subjetivo, exigindo dolo ou culpa para sua configuração. A apuração de infrações administrativas e a imposição
de sanções decorrem do exercício do poder de polícia ambiental e são atribuições eminentemente estatais. Trata-
se de competência comum.
Obs.: a natureza da responsabilidade administrativa ambiental é tema polêmico na doutrina e jurisprudência.
Alguns doutrinadores defendem como regra a responsabilidade objetiva (Paulo Affonso leme Machado). Outros
defendem ser subjetiva (Horaldo Garcia Vitta). Há ainda quem defensa ser de natureza hibrida (Edis Milaré). É
importante observar que em relação à multa administrativa simples no artigo 72, §3º, da lei 9.605, dispõe
expressamente que a responsabilidade administrativa em matéria ambiental é subjetiva, haja vista a necessidade
de comprovar negligência ou dolo. O precedente mais recente do STJ consagra o caráter subjetivo da
responsabilidade administrativa ambiental.
Responsabilidade administrativa por danos ambientais. Cada ente federado pode instituir suas próprias infrações
administrativo-ambientais, por lei. No âmbito federal, coube à Lei nº 9605/98 definir o tratamento da matéria -
“Art. 70. Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso,
gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente”. Os tribunais pátrios entendem que não ofendem o
princípio da legalidade a instituição de um tipo genérico por lei, com regulamentação via decreto, como ocorre
em matéria ambiental, sendo as condutas previstas no Decreto 6514/2008.
Destaque-se que, para haver infração administrativa, não é necessária a superveniência de dano ambiental,
bastando a violação à legislação administrativa ambiental, por ação ou omissão, tudo em obediência ao princípio
da prevenção. Os responsáveis podem ser pessoas físicas ou jurídicas, sendo que, no caso destas, é preciso que a
infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no
interesse ou benefício da sua entidade. Importa mencionar que a responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui
a das pessoas físicas, autoras, coautoras ou partícipes do mesmo fato. A responsabilidade administrativa é pessoal,
sendo necessário demonstrar a autoria do ilícito. A responsabilização propter rem é restrita à responsabilidade
civil por danos causados ao meio ambiente.
Competência para apurar as infrações ambientais. A competência para o licenciamento não se confunde com a
atribuição de fiscalização ambiental, sendo possível o exercício de cada uma, por esferas diferentes. No entanto,
a LC 140/11 deu preferência ao órgão ambiental licenciador para o exercício do poder de polícia ambiental:

187
“compete ao órgão responsável pelo licenciamento ou autorização, conforme o caso, de um empreendimento ou
atividade, lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo para a apuração de infrações à
legislação ambiental cometidas pelo empreendimento ou atividade licenciada ou autorizada” (art. 17, caput). A
regra, pois, é a de que quem licencia, fiscaliza, sem excluir a possibilidade de atuação dos demais entes, nos termos
do art. 17, §3º, da LC 140/11: “o disposto no caput deste artigo não impede o exercício pelos entes federativos da
atribuição comum de fiscalização da conformidade de empreendimentos e atividades efetiva ou potencialmente
poluidores ou utilizadores de recursos naturais com a legislação ambiental em vigor, prevalecendo o auto de
infração ambiental lavrado por órgão que detenha a atribuição de licenciamento ou autorização a que se refere o
caput”.
→ Enunciado nº 18 – 4ª CCR. A atribuição é do Ministério Público Federal sempre que houver ofensa a bem ou
interesse da União, independentemente do órgão responsável pelo licenciamento.
Sanções administrativas
a) advertência. A advertência pode ser cumulada com outras sanções administrativas.
b) multa simples, aplicada sempre que o agente, por negligência ou dolo, advertido por irregularidades que
tenham sido praticadas, deixar de saná-las, no prazo assinalado por órgão competente. A multa simples pode ser
convertida em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente.
c) multa diária, aplicada sempre que o cometimento da infração se prolongar no tempo. Os valores arrecadados
em pagamento de multas diárias por infração ambiental serão revertidos ao Fundo Nacional do Meio Ambiente,
criado pela Lei nº 7.797/89, Fundo Naval, criado pelo Decreto nº 20.923/32, fundos estaduais ou municipais de
meio ambiente, ou correlatos, conforme dispuser o órgão arrecadador.
*Non bis in idem: De acordo com o artigo 76 da Lei 9.605/98, o pagamento de multa imposta pelos Estados,
Municípios, Distrito Federal ou Territórios substitui a multa federal na mesma hipótese de incidência.
d) apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora, instrumentos, petrechos,
equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração. Inicialmente, é importante observar que,
de acordo com a regra geral do art. 91, do CP, a apreensão dos instrumentos e dos produtos do crime é efeito da
condenação. Todavia, no caso de infrações relacionadas ao meio ambiente, não se espera a condenação do infrator
para a realização da apreensão dos produtos e instrumentos da infração ou crime ambiental, tendo em vista
muitas vezes tratar-se de animais ou de produtos perecíveis. Assim, de acordo com o artigo 25 da Lei de Crimes
Ambientais, os produtos e instrumentos serão apreendidos logo que verificada a infração, dando-se a eles
destinação estabelecida nos parágrafos 1 ° a 4° do mesmo artigo.
e) destruição ou inutilização do produto – quando não há utilidade, ou seu uso é ilícito.
f) suspensão de venda e fabricação do produto.
g) embargo de obra ou atividade.
h) demolição de obra – o STJ já decidiu que essa penalidade não é autoexecutória. Aplicável quando (I) verificada
a construção de obra em área ambientalmente protegida em desacordo com a legislação ambiental ou (II) quando
a obra ou construção realizada não atenda às condicionantes da legislação ambiental e não seja passível de
regularização.
i) suspensão parcial ou total de atividades;
j) restritiva de direitos.
O Decreto nº 6.514/2008 enumera, nos seus artigos 24 a 93, um rol exemplificativo de infrações administrativas
ambientais, organizados na seguinte disposição: Das Infrações Contra a Fauna: arts. 24 a 42; Das Infrações Contra
a Flora: arts. 43 a 60-A; Das Infrações Relativas à Poluição e outras Infrações Ambientais: arts. 6 1 a 7 1 -A; Das
Infrações Contra o Ordenamento Urbano e o Patrimônio Cultural: arts. 72 a 75; Das Infrações Administrativas
Contra a Administração Ambiental: arts. 76 a 83; Das Infrações Cometidas Exclusivamente em Unidades de
Conservação: ares. 84 a 93.
Prescrição administrativa ambiental: Súmula 467/STJ: “Prescreve em cinco anos, contados do término do
processo administrativo, a pretensão da Administração Pública de promover a execução da multa por infração
ambiental". Frise-se que a prescrição da pretensão punitiva da administração não elide a obrigação de reparar o
dano ambiental.
Prescrição intercorrente: incide a prescrição no procedimento de apuração do auto de infração paralisado por
mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante
requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da

188
paralisação.
Juris em tese STJ:
2) É vedado ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA impor sanções
administrativas sem expressa previsão legal.
11) Prescreve em cinco anos, contados do término do processo administrativo, a pretensão da Administração
Pública de promover a execução da multa por infração ambiental. (Súmula n. 467/STJ)(Tese julgada sob o rito do
art. 543-C/1973)

7.PROTEÇÃO DOS RECURSOS AMBIENTAIS


7.1 Poli ́tica Nacional de Biossegurança: pressupostos doutrinários; regime juri ́dico; instrumentos. Biossegurança,
prevenção, precaução e informação. (14.c)
7.2 Povos e comunidades tradicionais. Acesso ao território e garantias territoriais. Diversidade biológica e
patrimô nio genético. Proteção e acesso ao conhecimento tradicional associado. (12.c)
7.3 Proteção juri ́dica da fauna. Proteção Juri ́dica da Flora. (2.a e 3.c)
7.4 Gestão de florestas públicas. Uso e exploração. Concessão florestal. (19.c)
7.5 Proteção juri ́dica do meio ambiente e a exploração mineral. Mineração e impactos ambientais licenciamento.
Deveres ambientais relativos à exploração mineral.. (20.c)
7.6 Recursos hi ́dricos. Poli ́tica Nacional dos Recursos Hi ́dricos. Instrumentos de gestão de recursos hi ́dricos.
Regime Juri ́dico das AÍguas. AÍguas subterrâneas. (13.c)
7.7 Poli ́tica Nacional dos Resi ́duos Sólidos. Objetivos e princi ́pios. Planos de resi ́duos sólidos. Responsabilidade
civil e resi ́duos sólidos. Responsabilidade compartilhada. Licenciamento ambiental e resi ́duos sólidos. (18.c)

14C. Política Nacional de Biossegurança: pressupostos doutrinários; regime jurídico; instrumentos. Biossegurança,
prevenção, precaução e informação.

Leonardo Gomes Lins Pastl

A CF/88 destaca, por um lado, a necessidade de proteção da diversidade e integridade do


patrimônio genético, e, por outro, estipula para o Poder Público o dever de fiscalizar as entidades que se
dediquem à pesquisa e à manipulação de material genético, quando essas atividades possam oferecer riscos para
a vida, a saúde e o meio ambiente. A regulamentação infraconstitucional é feita pela Lei nº 11.105/05, que botou
em destaque a tutela jurídica relativa ao patrimônio genético da pessoa humana, afixando sanções civis, penais e
administrativas. Todavia, a Lei de Biossegurança (LB) não está adstrita ao patrimônio genético humano,
compreendendo igualmente as informações de origem genética contidas em amostras de espécimes vegetais,
fúngicos, microbianos e animais.
A biossegurança consiste no conjunto de procedimentos que têm por objetivo controlar os
eventuais problemas suscitados por pesquisas biológicas e aqueles decorrentes de suas aplicações. A
biotecnologia, de outro turno, materializa o uso da ciência para a produção de organismos vivos com
características particulares, notadamente pela manipulação de material genético. Esse estímulo à pesquisa e ao
avanço científico é voltado especialmente para a solução de problemas nacionais e desenvolvimento do sistema
produtivo nacional.
Regulamentando o art. 225, II, da CF/88, a LB estabelece normas de segurança e mecanismos
de fiscalização sobre o trato (manipulação, transporte, pesquisa, comercialização, etc.) de organismos
geneticamente modificados – OGM e seus derivados, tendo como diretrizes: 1) o estímulo ao avanço científico
na área de biossegurança e biotecnologia, 2) a proteção à vida e à saúde humana, animal e vegetal, e 3) a
observância do princípio da precaução para a proteção do meio ambiente.
A LB vedou a clonagem humana (clonagem para fins reprodutivos); permitiu, por outro lado,
a clonagem terapêutica, isto é, a utilização, fins terapêuticos e de pesquisa, de células-tronco embrionárias
obtidas de embriões humanos produzidos in vitro e não utilizáveis, por serem inviáveis, ou por estarem
congelados há mais de três anos, sendo necessário, em qualquer caso, o consentimento dos genitores, vedada a
comercialização do material, o que é crime.

189
Esse permissivo legal é altamente polêmico e para alguns viola o direito fundamental à vida,
que não possui o seu termo inicial definido expressamente na legislação brasileira. Sabe-se somente que
legalmente a morte ocorre com a cessação da atividade cerebral (Lei nº 9.434/1997). Quanto à vida, há diversos
entendimentos doutrinários sobre qual seria o termo inicial: fecundação, nidação, início da atividade cerebral,
possibilidade de sobrevivência do feto sem a mãe, nascimento com vida. Como a pesquisa para fins terapêuticos
dá-se com embriões fecundados, caso se compreenda que nesse estágio já haveria vida humana, haveria, pois,
ofensa a tal direito. No julgamento da ADI 3.510, o STF, embora sem definir de forma expressa quando a vida tem
início, declarou a validade do permissivo legal que autoriza a pesquisa com células-tronco embrionárias. Nesse
ponto, também é importante mencionar que o STF decidiu que a interrupção de gravidez de feto anencefálico
não configura o crime de aborto (ADPF 54).
Quanto ao princípio da precaução, é possível salientar que se apresenta como uma garantia
contra os riscos potenciais que, em harmonia com o estado atual de conhecimento, não são passíveis, ainda, de
identificação. Em havendo ausência de certeza científica formal, a possível existência de um dano robusto ou
mesmo irreversível reclama a estruturação de medidas e instrumentos que possam minimizar e/ou evitar este
dano. De outro turno, o princípio da prevenção, por ter relação com impactos ambientais já conhecidos ou de
possível sapiência, com mais razão exige a adoção de mecanismos para o impedimento desses danos, que são
estimáveis. Em tema de biossegurança o princípio da precaução tem grande relevância, pois não é possível prever
com certeza científica a repercussão dos OGMs sobre a saúde humana e dos demais seres vivos. Daí porque
emerge o dever de informação previsto na LB, que determina, por exemplo, que os alimentos e ingredientes
alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de OGM ou
derivados deverão conter informação nesse sentido em seus rótulos.
A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança - CTNBio é uma instância colegiada
multidisciplinar de caráter consultivo e deliberativo, que estabelece normas técnicas vinculantes aos demais
órgãos e entidades da Administração Pública, bem como delibera sobre os casos em que a atividade é potencial
ou efetivamente causadora de degradação ambiental, e ainda sobre a necessidade do licenciamento ambiental e
de EIA-RIMA. Embora a Resolução nº 305/2002 CONAMA apenas preveja expressamente a atribuição do IBAMA
nos casos de licenciamento para liberação comercial de OGMs, a doutrina entende que o licenciamento será
sempre de competência do IBAMA, pois se trata de atividade que poderá gerar danos ambientais regionais ou
nacionais.
A pesquisa e liberação comercial de OGMs (entidade biológica que teve o seu material genético
modificado por qualquer técnica de engenharia genética) exige prévia autorização do órgão competente, e
licenciamento quando a CTNBio assim exigir. Ademais, os patrocinadores das pesquisas devem exigir previamente
o Certificado de Qualidade em Biossegurança previamente emitido pela CTNBio, sob pena de se tornarem
corresponsáveis pelo descumprimento legal, inclusive criminalmente, pois caracterizar-se-á, ao menos, dolo
eventual. A LB prevê, ainda, solidariedade entre todos aqueles que participaram do dano ambiental,
independentemente da existência de culpa, prevendo como infração administrativa toda ação ou omissão que
viole as normas previstas na legislação correlata.
Por derradeiro, impende sinalar que o Brasil é signatário do Protocolo de Cartagena sobre
Biossegurança (2003), importante marco normativo internacional para a proteção do meio ambiente e da saúde
humana, bem como do comércio internacional. O Protocolo estabelece procedimento para um acordo de aviso
prévio para assegurar que os países tenham as informações necessárias para tomar decisões conscientes antes
de aceitarem a importação de OGMs para seus territórios. O Brasil tem papel de destaque nessas discussões, por
ser um expressivo produtor de OGMs e o maior exportador agrícola a se vincular ao Protocolo.

12C. Povos e comunidades tradicionais. Acesso ao território e garantias territoriais. Diversidade biológica e
patrimônio genético. Proteção e acesso ao conhecimento tradicional associado.

Rafael Martins da Silva

I. POPULAÇÕES TRADICIONAIS: NOÇÕES GERAIS E CONCEITUAÇÃO

Segundo Duprat, a CF/88, ao reconhecer o Estado brasileiro como pluriétnico, e não mais pautado em

190
pretendidas homogeneidades e assimilacionismos sócio-culturais, o fez de forma absolutamente explícita.
Primeiro, impondo ao Estado garantir a todos o pleno exercício dos direitos culturais (...), apoiando e
incentivando a valorização e a difusão das manifestações culturais (...) populares, indígenas e afro-brasileiras, e
das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional (art. 215, caput, e seu § 1º), que se
traduzem, dentre outros, em suas formas de expressão e em seus modos de criar, fazer e viver (art. 216, I e II).
Tratou, ainda, exaustivamente e em caráter paradigmático, do território cultural necessário ao exercício desses
direitos pelas populações indígenas, emprestando-lhe significado especial, divorciado da pauta patrimonial,
porquanto espaço essencial à existência de uma coletividade singular (art. 231, caput, e § 1º).

Assim, para Duprat, não há diferença entre indígenas, remanescentes de quilombolas e comunidades
tradicionais, pois tais distinções são externas a estes grupos, são classificações produzidas por terceiros, sem
maiores compromissos com os grupos que se pretende estejam ali refletidos. Segundo a autora, com a Convenção
169, da OIT, toda essa discussão perdeu sua razão de ser. A uma, pelo critério da auto-atribuição; a duas, porque
ela coloca, num grande bloco a que denomina povos tribais, grupos cujas condições sociais, econômicas e
culturais os distinguem. Temos aí comunidades remanescentes de quilombos e populações tradicionais. O que há
de diferente são os direitos que cabem a cada qual e que ficam a depender exatamente do modo específico de
vida de cada um deles.

Neste sentido, o Decreto 6040/07, que estabelece a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável
dos Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT), apenas concretiza o paradigma pluriétnico constitucional,
definindo povos e comunidades tradicionais como “grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem
como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos
naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando
conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição” (art. 3º, I). Além disto, traz a
definição de territórios tradicionais como sendo “os espaços necessários a reprodução cultural, social e
econômica dos povos e comunidades tradicionais, sejam eles utilizados de forma permanente ou temporária,
observado, no que diz respeito aos povos indígenas e quilombolas, respectivamente, o que dispõem os arts. 231
da Constituição e art. 68 do ADCT e demais regulamentações” (art. 3º, CONCLUSÃO: Assim sendo, como defende
Santilli, quando se fala em comunidades tradicionais, incluímos neste conceito não apenas as comunidades
indígenas, como também outras populações que vivem em estreita relação com o ambiente natural, dependendo
de seus recursos naturais para a sua reprodução sócio-cultural, por meio de atividades de baixo impacto
ambiental: são as comunidades extrativistas, de pescadores, indígenas, remanescentes de quilombolas, etc.
Portanto, segundo Duprat, o que realmente há de diferente entre os indígenas, os remanescentes de quilombolas
e povos tradicionais são apenas os direitos que cabem a cada qual e que ficam a depender exatamente do modo
específico de vida de cada um deles.

II. ACESSO AO TERRITÓRIO E GARANTIAS TERRITORIAIS

Regime Jurídico Internacional. A partir das premissas de Duprat, os povos tradicionais merecem uma
proteção similar à outorgada aos indígenas pela Convenção n. 169 da OIT, pois, enquanto povos tribais, formam
uma coletividade de indivíduos que possuem uma íntima conexão com seus territórios, imprescindíveis que são
para a reprodução cultural, social e econômica do grupo inteiro (art. 13. 1). Assim sendo, seguindo o raciocínio da
autora, pode-se afirmar que é aplicável aos povos tradicionais, guardadas as peculiaridades relativas aos povos
indígenas e aos remanescentes de quilombolas previstas na CF/88, o regime de acesso e proteção territorial
previsto nos artigos 13 a 19 da referida Convenção, primeiro porque tais dispositivos não restringem sua aplicação
aos indígenas e segundo porque todos eles fazem referência a “povos interessados”.

Regime jurídico Interno. No plano jurídico interno, o tratamento dado às populações tradicionais no que
se refere ao acesso territorial e garantias territoriais, é basicamente disciplinado pelas Leis 11.428/2006 e 9985/00
(Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação/SNUC). A Lei 11.428/2006, que dispõe sobre o regime
jurídico da Mata Atlântica, além de trazer uma definição do que considera como sendo populações tradicionais,
autoriza por parte destes últimos a sua permanência no referido Bioma em regime de desenvolvimento

191
autossustentável, sendo que a exploração eventual, sem propósito comercial direto ou indireto de espécies da
flora nativa, para consumo nas propriedades ou posses das populações tradicionais, independe de autorização
dos órgãos competentes, devendo os órgãos competentes assisti-las no manejo e exploração sustentáveis (art.
9º). Excepcionalmente será autorizado a tais populações o corte, a supressão e a exploração da vegetação
secundária em estágio médio de regeneração do Bioma quando necessários para o exercício de atividades ou usos
agrícolas, pecuários ou silviculturais imprescindíveis à sua subsistência e de sua família, ressalvadas as áreas de
preservação permanente e, quando for o caso, após averbação da reserva legal, nos termos do Código Florestal
(art. 23, III).

Ademais, a referida Lei ainda garante a prioridade na concessão de crédito agrícola às populações
tradicionais que tenham vegetação primária ou secundária em estágios avançado e médio de regeneração na
Mata Atlântica. Já a Lei 9985/00 (Lei do SNUC) dispõe dentre seus objetivos “proteger os recursos naturais
necessários à subsistência de populações tradicionais, respeitando e valorizando seu conhecimento e sua cultura
e promovendo-as social e economicamente” (art. 4º, XIII), bem como uma de suas diretrizes garantir “às
populações tradicionais cuja subsistência dependa da utilização de recursos naturais existentes no interior das
unidades de conservação meios de subsistência alternativos ou a justa indenização pelos recursos perdidos” (art.
5º, X).

A lei do SNUC se encarrega de disciplinar a permanência e/ou exploração por parte de populações
tradicionais nas áreas de proteção de uso sustentável, tais como nas Áreas de Relevante Interesse Ecológico, nas
Florestas Nacionais, nas Reservas Extrativistas (exploração direta em bases sustentáveis de acordo com o plano
de manejo da área) e nas Reservas de Desenvolvimento Sustentável (definição autoexplicativa), sendo que quanto
às duas últimas a posse e ocupação será regulada por contrato que estabelecerá condicionantes e vedações (art.
23).

III. O PROTOCOLO DE CARTAGENA SOBRE BIOSSEGURANÇA

É um tratado sobre biossegurança assinado durante a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) em
Cartagena, Colômbia. Em vigor desde setembro de 2003. A Convenção sobre a Diversidade Biológica, estabelece,
em seu preâmbulo: “a preservação da biodiversidade é uma preocupação comum da humanidade”. Kofi Annan
asseverou: biodiversidade “permeia todo o espectro da atividade humana” e “está diretamente ligada ao bem-
estar do nosso planeta e ao progresso da humanidade em longo prazo.” A Corte internacional de Justiça também
reconheceu, em sua decisão do Caso da Competência em matérias pesqueiras”, o dever dos Estados de ter “o
cuidado devido” para com “a necessidade da conservação para o beneficio de todos”. Além disso, a UNCBD não
aceita reservas e prevê que caso haja tratados cujos dispositivos ao serem aplicados possam causar danos
desnecessários à biodiversidade, as disposições da Convenção devem prevalecer.

NORMAS QUE TRATAM DA BIODIVERSIDADE: CARÁTER ERGA OMNES. De acordo com a decisão da CIJ, no
caso Barcelona Traction, obrigações erga omnes são: “... as obrigações de um Estado para com a Comunidade
Internacional como um todo... Por sua própria natureza, essas obrigações dizem respeito todos os Estados. Tendo
em conta a importância dos direitos envolvidos, pode-se considerar que todos os Estados têm um interesse legal
em sua proteção; são as obrigações... que um Estado assume perante todos os demais”. Um dos argumentos
favoráveis com relação às obrigações oriundas de normas sobre a biodiversidade serem erga omnes é a
preservação e proteção desta como um interesse comum da Comunidade Internacional. A biodiversidade
representa recursos genéticos insubstituíveis, que colaboram com a prosperidade do planeta: são fontes
alimentícias, de matéria farmacêutica e contribuem para o equilíbrio na biosfera. Há também a responsabilidade
intergeracional: Principio 1 da Declaração de Estocolmo (O Homem... carrega a solene responsabilidade de
proteger e melhorar o meio ambiente para os presentes e futuras gerações.)

IV. DIVERSIDADE BIOLÓGICA; ENGENHARIA GENÉTICA; PATRIMÔNIO GENÉTICO; PROTEÇÃO E ACESSO AO


CONHECIMENTO TRADICIONAL ASSOCIADO

192
Noções gerais e normativa internacional. A CF/88 determina que o Poder Público e a coletividade têm que
preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do país e fiscalizar as entidades dedicadas à
pesquisa e manipulação de material genético (art. 225, § 1º, II). No âmbito internacional, a Convenção da
Diversidade Biológica - CDB define diversidade biológica como sendo “a variabilidade de organismos vivos de
todas as origens, compreendendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres, marinhos e outros ecossistemas
aquáticos e os complexos ecológicos de que fazem parte; compreendendo ainda a diversidade dentro de
espécies, entre espécies e de ecossistemas” (art. 2º da CDB), noção esta que possui um valor intrínseco, cuja
proteção independe de qualquer valoração econômica ou utilização pelo homem, e da soberania dos Estados
sobre seus próprios recursos biológicos, pertencendo aos governos nacionais a autoridade para determinar o
acesso aos recursos genéticos.

Os OBJETIVOS da CDB são a) a conservação da diversidade biológica, b) a utilização sustentável de seus


componentes e c) a repartição justa e equitativa dos benefícios derivados da utilização dos recursos genéticos,
mediante, inclusive, o acesso adequado aos recursos genéticos e a transferência adequada de tecnologias
pertinentes, levando em conta todos os direitos sobre tais recursos e tecnologias, e mediante financiamento
adequado.
A conservação da diversidade biológica deixou de ser encarada apenas em termos de proteção das espécies ou
dos ecossistemas ameaçados, adquirindo uma nova abordagem a partir da conciliação entre a necessidade de
conservação com a preocupação do desenvolvimento, baseada em considerações de igualdade e partilha de
responsabilidades. Reconhece-se assim que a conservação da diversidade biológica é uma preocupação comum
da Humanidade e parte integrante do processo do desenvolvimento econômico e social. A Convenção promove
uma nova forma de parceria entre os países, onde a cooperação científica e técnica, o acesso aos recursos
financeiros e genéticos, e a transferência de tecnologias limpas constituem as bases principais (arts. 15 e 16). Pela
primeira vez, no contexto da conservação da diversidade biológica, um instrumento legal internacional declara os
direitos e as obrigações das suas Partes Contratantes relativamente à cooperação científica, técnica e tecnológica.
Com base na CDB foi elaborada a Política Nacional da Biodiversidade – PNB (Decreto 4.339/02), que estabelece
um programa de ação relativo à biodiversidade.

BIOPIRATARIA. A biopirataria é a exploração, manipulação, exportação e/ou comercialização


internacional de recursos biológicos que contrariam as normas da Convenção sobre Diversidade Biológica, de
1992. Não refere-se apenas ao contrabando de diversas espécies naturais da flora e da fauna, mas,
principalmente, à apropriação e monopolização dos conhecimentos das populações tradicionais no âmbito do uso
dos recursos naturais. Estas populações estão perdendo o controle sobre esses recursos. Um caso de biopirataria
foi o contrabando de sementes da seringueira, pelo inglês Henry Wickham. Essas sementes foram levadas para a
Malásia, e após algumas décadas este país passou a ser o principal exportador de látex do mundo.

Engenharia Genética e patrimônio genético no regime jurídico interno. *Segundo a doutrina, há uma
grande estrutura legislativa voltada ao controle estatal sobre nosso banco genético, com a finalidade de reprimir
a biopirataria, pois o Brasil é a nação mais rica do mundo em diversidade biológica.

A fim de regulamentar a CF e a CDB no que tange à tutela da biodiversidade, do patrimônio genético e do


conhecimento tradicional associado, e assuntos correlatos, foi editada a MP 2.186-16/01, a qual veio a ser
substituída pela Lei 13.123, de 20 de maio de 2015, e que entrou em vigor no final de 2015.

A Lei dispõe sobre o acesso ao patrimônio genético, à proteção e ao acesso ao conhecimento tradicional
associado e sobre a repartição de benefícios para a conservação e uso sustentável da biodiversidade.

O art. 2o da Lei 13.123/2015 contempla uma série de definições, mencionando-se expressamente que
elas se somam aos conceitos e definições constantes da Convenção sobre Diversidade Biológica. Destacam-se
alguns:
1. - patrimônio genético – informação de origem genética de espécies vegetais,
animais, microbianas ou espécies de outra natureza, incluindo substâncias

193
oriundas do metabolismo destes seres vivos;
2. - conhecimento tradicional associado – informação ou prática de população
indígena, comunidade tradicional ou agricultor tradicional sobre as
propriedades ou usos diretos ou indiretos associada ao patrimônio genético;
3. - conhecimento tradicional associado de origem não identificável –
conhecimento tradicional associado em que não há a possibilidade de vincular
a sua origem a, pelo menos, uma população indígena, comunidade tradicional
ou agricultor tradicional;
4. - comunidade tradicional – grupo culturalmente diferenciado que se reconhece
como tal, possui forma própria de organização social e ocupa e usa territórios e
recursos naturais como condição para a sua reprodução cultural, social,
religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas
geradas e transmitidas pela tradição;
5. - provedor de conhecimento tradicional associado – população indígena,
comunidade tradicional ou agricultor tradicional que detém e fornece a
informação sobre conhecimento tradicional associado para o acesso;
6. - consentimento prévio informado – consentimento formal, previamente
concedido por população indígena ou comunidade tradicional segundo os seus
usos, costumes e tradições ou protocolos comunitários;
7. - protocolo comunitário – norma procedimental das populações indígenas,
comunidades tradicionais ou agricultores tradicionais que estabelece, segundo
seus usos, costumes e tradições, os mecanismos para o acesso ao conhecimento
tradicional associado e a repartição de benefícios de que trata esta Lei;
8. - acesso ao patrimônio genético – pesquisa ou desenvolvimento tecnológico
realizado sobre amostra de patrimônio genético;
9. - acesso ao conhecimento tradicional associado – pesquisa ou
desenvolvimento tecnológico realizado sobre conhecimento tradicional
associado ao patrimônio genético que possibilite ou facilite o acesso ao
patrimônio genético, ainda que obtido de fontes secundárias tais como feiras,
publicações, inventários, filmes, artigos científicos, cadastros e outras formas de
sistematização e registro de conhecimentos tradicionais associados;

V. PROTEÇÃO E ACESSO AO CONHECIMENTO TRADICIONAL ASSOCIADO.

NOÇÕES GERAIS. Indissociavelmente ligada à biodiversidade, de maneira mutuamente implicativa,


está a sociodiversidade, fonte de um extenso patrimônio sociocultural, que envolve os conhecimentos,
inovações e práticas de populações tradicionais relevantes para a conservação e o uso sustentável da
diversidade biológica. Inês Virgínia Prado Soares define conhecimentos tradicionais como “os saberes, técnicas
e práticas que os índios e outras comunidades locais (tais como os quilombolas, os caiçaras, os seringueiros,
os pescadores, os ribeirinhos, entre outras) têm e utilizam para sua sobrevivência e para o atendimento de
necessidades culturais, espirituais, materiais e financeiras das presentes e futuras gerações. São
conhecimentos que vão desde formas técnicas de manejo e gestão de recursos naturais, métodos de caça e
pesca e, principalmente, conhecimentos sobre sistemas ecológicos e espécies com propriedades
farmacêuticas, alimentícias e agrícolas”. Enfim, segundo Santilli, “são formas culturais diferenciadas de
apropriação do meio ambiente, em seus aspectos materiais e imateriais.” Os conhecimentos tradicionais
associados fazem parte do patrimônio cultural brasileiro tutelado pela CF/88 conforme o disposto nos artigos
215 e 216, e no artigo 8º, § 2º da Lei 13.123/15.

Regime jurídico Internacional. Segundo a Convenção para a Salvaguarda do Patrimônio Cultural


Imaterial, “entende-se por patrimônio cultural imaterial as práticas, representações, expressões,
conhecimentos e técnicas – junto com os instrumentos, objetos, artefatos e lugares que lhe são associadas -
que as comunidades, os grupos e, em alguns casos, os indivíduos reconhecem como parte integrante de seu

194
patrimônio cultural. Este patrimônio cultural imaterial que se transmite de geração em geração, é
constantemente recriado pelas comunidades e grupos em função de seu ambiente, de sua interação com a
natureza e de sua história, gerando um sentimento de identidade e continuidade, contribuindo assim para
promover o respeito à diversidade cultural e à criatividade humana” (art. 2º,1), manifestado principalmente
no campo dos “conhecimentos e práticas relacionados à natureza e ao universo”.

Regime jurídico Interno. No plano infraconstitucional, o tema é tratado pelo Decreto 6.040/07 (que
institui o PNPCT e traz as definições sobre “povos e comunidades tradicionais”, bem como sobre “territórios
tradicionais”) e pela Lei 13.123, de 20 de maio de 2015.

A Questão da Anuência Prévia. A PNB (Decreto 4.339/02) prevê o princípio do consentimento prévio
informado (art. 2º, XIII), exigindo que o consentimento deva ser instruído com informações, em linguagem
compreensível, sobre os riscos, os benefícios e as consequências econômicas, jurídicas e políticas do acesso
aos recursos genéticos e ao conhecimento associado. Segundo Ela WIECKO, a necessidade de alterações e
modificações no curso das atividades de pesquisa também deverá ser informada aos detentores de
conhecimento tradicional, estando sujeitas ao consentimento prévio. A aplicação do princípio do
consentimento prévio informado pode levar à hipótese de uma determinada comunidade negar o acesso ao
seu conhecimento (direito de objeção cultural).

A Lei 13.123/2015 exige o consentimento prévio informado (“consentimento formal, previamente


concedido por população indígena ou comunidade tradicional segundo os seus usos, costumes e tradições ou
protocolos comunitários”) para o acesso ao conhecimento tradicional associado de origem identificável, que
poderá ocorrer, a critério da população indígena, da comunidade tradicional ou do agricultor tradicional, pelos
seguintes instrumentos: assinatura de termo de consentimento prévio; registro audiovisual do consentimento;
parecer do órgão oficial competente; ou adesão na forma prevista em protocolo comunitário. Entretanto, não
o exige em outras hipóteses, como de acesso a conhecimento tradicional associado de origem não
identificável, que compreende também o “acesso ao patrimônio genético de variedade tradicional local ou
crioula ou à raça localmente adaptada ou crioula para atividades agrícolas”, nos termos do Lei (ver art. 9o,
caput e parágrafos).

A importância da proteção do conhecimento tradicional associado à biodiversidade:


As práticas, processos, atividades e inovações das populações indígenas e locais exercem significativa
contribuição para a preservação da biodiversidade, tendo em vista o intenso manejo e interação mantidos
com ela.

A diversidade biológica não é apenas fruto da própria natureza, mas é produto da ação humana, que
por meio da convivência, do manejo e da manipulação propicia o aumento da biodiversidade. Outro fator
revelador da importância dos conhecimentos tradicionais associados à biodiversidade é a dispensa que esses
proporcionam da bioprospecção aleatória, onde se possui ínfima possibilidade de sucesso na identificação de
princípios ativos. Pela etnoprospecção (identificação de propriedades e princípios ativos de recursos biológicos
através do conhecimento tradicional), parte-se para um estudo direcionado e racional, pois já se sabe que
determinada comunidade local ou indígena faz o uso de um recurso natural com uma finalidade específica, o
que garante a empresas interessadas em pesquisa nessa área economia com pesquisas, tempo e dinheiro. A
ausência de proteção efetiva e adequada abre espaço para a pirataria. Tais práticas devem ser coibidas por
meio da criação de um regime de proteção eficaz e apropriado, que se preocupe muito mais com a
perpetuação dos conhecimentos, práticas e inovações de povos indígenas e locais, tão essenciais para a vida
em geral do planeta, do que com a obtenção de direitos exclusivos sobre os mesmos, sob a falsa e escusa
argumentação de que tais mecanismos estimulariam a criatividade humana ao oferecer uma recompensa.

27 CPR: 1) O que são comunidades tradicionais? 2) Como se dá o acesso à terra por parte dessas comunidades?
Como o nosso ordenamento trata isso? 3) Qual a proteção que nosso ordenamento dá ao conhecimento
tradicional?

195
4) Por meio de que instrumento da política nacional de meio ambiente pode ser compatibilizado o acesso à
terra com a proteção do meio ambiente?

2A. Proteção jurídica da fauna

Elaborado por Robert Rigobert Lucht.


Fonte: Direito Ambiental. Frederico Amado, 2017, 5ª ed.

Conceito de fauna: conjunto de animais próprios de uma região ou de um período geológico (Dicionário Aurélio
da Língua Portuguesa). CF protege a fauna no art. 225, § 1º, VII, mas não a definiu. O inciso VII é de inspiração
biocêntrica, com a proteção da fauna e da flora contra as intervenções humanas que coloquem em risco sua
existência ou provoquem crueldade.
STF adota teoria do antropocentrismo mitigado ou moderado: desenvolvimento sustentável (utilização dos
recursos naturais sem comprometer as gerações futuras) + bem-estar dos animais.

Visão antropocêntrica Visão biocêntrica Visão ecocêntrica


Bem ambiental está voltado para Animais não devem ser A natureza existe em si mesma e deve
a satisfação das necessidades usados apenas com a prevalecer sobre o homem. Trata da
humanas, protegendo finalidade do lucro. Deve- proteção da natureza do ponto de vista da
“indiretamente” outras formas se proteger os seres vivos, Lei Espiritual que não pode ser tratada
de vida. analisando a natureza dos como um objeto útil em benefício do
pontos de vista filosófico, homem. Natureza não pode servir como
econômico e jurídico. meio de lucro, porque o valor intrínseco do
mundo natural não nos pertence. Visão
absolutamente contrária à
antropocêntrica.
CF, art. 225 CF, art. 225, § 1°, VII
Não impede que haja proteção +
de qualquer outra forma de vida, Lei 6.938/81 (Lei da
pois a proteção do meio Política Nacional do Meio
ambiente ecologicamente Ambiente)
equilibrado protege o próprio ser
humano.

Competência administrativa (material): comum (art. 23, VII, CF).

Competência legislativa: concorrente, com legislação suplementar municipal, cfe interesses locais.
(arts. 24, VI e 30, I e II, CF)
STF (Pleno, jun/2017): Município tem competência para legislar sobre meio ambiente e controle da poluição,
quando se tratar de interesse local. A competência para legislar sobre o meio ambiente é concorrente, cfe. art.
24, VI e VIII.

Competências cfe LC 140/11:


→ União (art. 7º)
XVI - listar espécies da fauna e da flora ameaçadas de extinção e de espécies sobre-explotadas no território
nacional, mediante laudos e estudos técnico-científicos, fomentando as atividades que conservem essas
espécies in situ;
XVII - controlar a introdução no País de espécies exóticas potencialmente invasoras que possam ameaçar os
ecossistemas, habitats e espécies nativas;
XVIII - aprovar a liberação de exemplares de espécie exótica da fauna e da flora em ecossistemas naturais frágeis;
XIX - controlar a exportação de componentes da biodiversidade brasileira na forma de espécimes silvestres da
flora, micro-organismos e da fauna, partes ou produtos deles derivados;

196
XX - controlar a apanha de espécimes da fauna silvestre, ovos e larvas;
XXI - proteger a fauna migratória e as espécies inseridas na relação prevista no inciso XVI.

→ Estados/DF (art. 8º)


XVII - elaborar a relação de espécies da fauna e da flora ameaçadas de extinção no respectivo território, mediante
laudos e estudos técnico-científicos, fomentando as atividades que conservem essas espécies in situ;
XVIII - controlar a apanha de espécimes da fauna silvestre, ovos e larvas destinadas à implantação de criadouros
e à pesquisa científica, ressalvado o disposto no inciso XX do art. 7º;
XIX - aprovar o funcionamento de criadouros da fauna silvestre;

Obs.: no que diz respeito à fauna, não houve previsão expressa de competência administrativa municipal, o que
não impede a atuação dos Municípios, pois se trata de competência comum.

Composição da fauna:
Animais silvestres Aqueles de quaisquer espécies, em qualquer fase de desenvolvimento e que vivem
naturalmente fora do seu cativeiro (art. 1°, Lei 5.197/67), sendo de propriedade do
Estado, por disposição legal. Ainda que haja indivíduos domesticados em determinada
espécie, os outros da mesma espécie não perderão o atributo de silvestre.
Prevalece o entendimento de que são bens da União.
Animais exóticos Aqueles cuja distribuição geográfica não inclui o território brasileiro.
Animais domésticos Aqueles que vivem em cativeiro e dependentes do convívio humano.

Lei de Proteção à Fauna (Lei 5.197/67): restringiu tutela da fauna à silvestre e não à fauna doméstica. Logo, não
é toda a fauna objeto de tutela. Tal limitação encontra guarida na CF, já que art. 225, § 1º, VII, protege a fauna
na forma da lei, sendo esta integrada por meio da Lei 5.197/67. CF afirma que é lei ordinária quem define o
conceito de fauna, sendo possível ampliar-se o conceito atual.
Justifica-se a tutela da fauna quando:
1) as espécies estão ameaçadas de extinção;
2) imprescindível à sua proteção ecológica; e
3) a lesão for praticada por meio de tratamento cruel.

É proibida a crueldade contra animais (CF não trouxe nenhuma exceção) mesmo em:
- rinhas de galo
- farra do boi
- vaquejadas (STF, Pleno, 6 x 5, out/2016 – apenas para lei do Ceará)
- manifestações religiosas
- benefício da ciência e da evolução do ser humano
- práticas alimentares (foie gras).

Após a declaração de inconstitucionalidade da lei cearense pelo STF, o Congresso aprovou a EC 96/2017. Esta é
um claro exemplo de efeito backlash: reação conservadora de parcela da sociedade ou das forças políticas (em
geral, do parlamento) diante de uma decisão liberal do Judiciário em um tema polêmico.

EC 96/2017 é inconstitucional?
Polêmico. Sim, se a EC ofender cláusula pétrea ou processo legislativo para edição de EC.

A proibição de que animais sofram tratamento cruel é considerada como uma garantia individual (art. 60, § 4º,
IV)?
Sim, segundo o Prof. Márcio, do “Dizer o Direito”. Direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é direito
fundamental de 3ª geração, não podendo ser abolido nem restringido, ainda que por EC.

197
Caça:
No Brasil, a caça profissional é proibida (Lei 5.197/67, art. 2º), sendo possível a autorização de:
1) caça amadorista (finalidade esportiva): argumenta-se que este tipo de caça deveria ser proibido, pois a CF veda
práticas que submetam os animais à crueldade, adotando um viés biocentrista. Atualmente, só Rio Grande do Sul
regulamentou a caça esportiva, mas seu exercício está suspenso desde 2005.
2) caça de controle: visa à destruição de animais silvestres nocivos à agricultura ou à saúde pública.

Por sua vez, o art. 14 da Lei 5.197/67 permite a caça científica (esta se subdivide em letal ou não letal).
A caça de subsistência ou de sobrevivência não está prevista explicitamente pela lei. Praticam-na as populações
indígenas nas reservas reconhecidas, como as populações interioranas que não têm acesso fácil aos produtos
oriundos da fauna domesticada, sendo também permitida.

Comercialização da fauna silvestre:


É proibido o comércio de espécimes da fauna silvestre e de seus produtos e objetos, exceto os provenientes de
criadouros previamente legalizados (Lei 5.197/67, art. 3º).
Também é proibida a inserção de espécie no Brasil sem licenciamento ambiental, de competência do IBAMA, bem
como proibida a exportação de peles e couros de anfíbios e répteis, em bruto.

Utilização de animais em ensino e pesquisa:


É possível uso de animais em pesquisas científicas. Deve haver minimização da dor e do sofrimento. Deve
obedecer aos critérios estabelecidos na Lei 11.794/2008, que restringe a utilização em atividades educacionais
em estabelecimentos de ensino superior e em estabelecimentos de educação profissional técnica de nível médio
da área biomédica.

Pesca: depende de autorização do órgão ambiental competente. Há proibição:


I – em épocas e locais definidos pelo órgão competente;
II – quanto às espécies que devam ser preservadas ou com tamanhos não permitidos pelo órgão competente;
III – sem licença, permissão, concessão, autorização ou registro expedido pelo órgão competente;
IV – em quantidade superior à permitida pelo órgão competente;
V – em locais próximos ao lançamento de esgoto nas águas, com distância estabelecida em norma específica;
VI – em locais que causem embaraço à navegação;
VII – mediante a utilização de explosivos ou técnicas com efeito semelhante, substâncias tóxicas e métodos não
permitidos ou predatórios (Lei nº 11.959/09, art. 5º, §1º).
Obs.: também é proibida a pesca de cetáceos no Brasil, a exemplo das baleias, botos e golfinhos (Lei 7.643/87).

Práticas vedadas: colocam em risco a função ecológica ou provocam extinção de espécies da fauna.
(a) caça profissional;
(b) pesca clandestina com explosivos; e
(c) introdução de espécies exóticas ou alienígenas (atualmente, esta é a 2ª causa mais significativa de perda de
biodiversidade, superada somente pelo desmatamento).

Fonte: Direito Ambiental. Frederico Amado, 2017, 5ª ed.


Elaborado por Robert Rigobert Lucht.

3C. Proteção jurídica da flora

Elaborado por Robert Rigobert Lucht.


Fonte: Direito Ambiental. Frederico Amado, 2017, 5ª ed.

Conceitos:
Flora: conjunto das espécies vegetais de uma determinada localidade (Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa).
Florestas Públicas: florestas, naturais ou plantadas, localizadas nos diversos biomas brasileiros, em bens sob o

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domínio da União, dos Estados, dos Municípios, do DF ou das entidades da administração indireta (Lei 11.284/06).
Vegetação: cobertura vegetal de certa área do país.

Competência material: comum (art. 23, VII, CF).

Competência legislativa: concorrente, com legislação suplementar municipal, cfe interesse local.
(arts. 24, VI e 30, I e II, CF)
Competências cfe LC 140/11:
→ União (art. 7º)
XVI - listar espécies da fauna e da flora ameaçadas de extinção e de espécies sobre-explotadas no território
nacional;
XVII - controlar a introdução no País de espécies exóticas potencialmente invasoras;
XVIII - aprovar a liberação de exemplares de espécie exótica da fauna e da flora em ecossistemas naturais frágeis;
XIX - controlar a exportação de componentes da biodiversidade brasileira.

→ Estados (art. 8º)


XVI - aprovar o manejo e a supressão de vegetação, de florestas e formações sucessoras em:
a) florestas públicas estaduais ou unidades de conservação do Estado, exceto em Áreas de Proteção Ambiental;
b) imóveis rurais, observadas as atribuições previstas no inciso XV do art. 7°; e
c) atividades ou empreendimentos licenciados ou autorizados, ambientalmente, pelo Estado;
XVII - listar espécies da fauna e da flora ameaçadas de extinção no respectivo território.

Disposições constitucionais: Cabe ao Poder Público preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e
prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas, bem como instituir espaços territoriais ambientais
especialmente protegidos (art. 225, §1º, I e III, da CF), a exemplo da área de reserva legal (ARL), das APPs e das
unidades de conservação (UC). A Floresta Amazônica, a Mata Atlântica, o Pantanal Mato-Grossense, a Serra do
Mar e a Zona Costeira são “patrimônio nacional”. Cerrado e Caatinga NÃO são patrimônio nacional.

STF (Pleno, fev/2018): Declarou a inconstitucionalidade das expressões “gestão de resíduos” e “instalações
necessárias à realização de competições esportivas estaduais, nacionais ou internacionais”, contidas no art. 3º,
VIII, b, do Cód. Florestal. Não se pode aceitar que um Estado conceba a gestão de resíduos (construção de aterros
sanitários) e o lazer como hipóteses de intervenção e supressão de vegetação em APPs e em áreas de uso restrito.
Em outras palavras, é incompatível com a CF autorizar-se a relativização da proteção da vegetação nativa
protetora de nascentes, por exemplo, para “gestão de resíduos” ou para a realização de competições
esportivas.

STF (Pleno, fev/2018): Deu interpretação conforme a Constituição ao art. 3º, VIII e IX, do Cód. Florestal, de modo
a se condicionar a intervenção excepcional em APPs, por interesse social ou utilidade pública, à inexistência de
alternativa técnica e/ou locacional à atividade proposta.

Uso alternativo do solo: substituição da vegetação nativa e formações sucessoras por outras coberturas do solo,
como atividades agropecuárias, assentamentos urbanos, atividades industriais, etc. Só é possível fora das áreas
ambientais protegidas e deve ser amparado em licença. Para os imóveis rurais, ainda é necessária a inscrição no
CAR.

Competência para instituir florestas: é do Poder Público, por meio do Legislativo ou Executivo de todas as esferas
da Federação, a competência para a criação de áreas especiais protegidas, de APPs e de unidades de conservação,
bem como do particular para criar reserva legal e servidão ambiental.

Proibição do uso de fogo e do controle dos incêndios (art. 38 a 40 do Cód. Florestal):


Regra: proibição. Exceções:
i) queima controlada autorizada, inclusive em UC de acordo com o plano de manejo;

199
ii) pesquisa científica;
iii) prevenção e combate a incêndio;
iv) agricultura de subsistência. Responsabilização exige prova do nexo causal (ação do proprietário/preposto e
dano).

STF (Pleno, mar/2015): Município é competente para legislar sobre o meio ambiente, assim como União e Estados,
no limite do seu interesse local e desde que esse regramento seja harmônico com a disciplina estabelecida pelos
demais entes federados (art. 24, VI, c/c o art. 30, I e II, da CF/88). STF julgou inconstitucional lei municipal que
proíbe, sob qualquer forma, o emprego de fogo para fins de limpeza e preparo do solo no referido município,
inclusive para o preparo do plantio e para a colheita de cana-de-açúcar e de outras culturas. Fundamentos:
- Proteção do meio ambiente x preservação dos empregos: prepondera este último.
- Normas federais preveem extinção gradativa do uso do fogo para corte da cana (art. 40, Cód. Florestal + Decr.
2.661/98).

Comércio e exportação de plantas vivas e outros produtos oriundos da flora nativa (art. 37): dependerão,
respectivamente, de licença dos órgãos estadual e federal competente do Sisnama e de registro no Cadastro
Técnico Federal de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais.

Cadastro Ambiental Rural (CAR) (arts. 29 e 30): inovação do Cód. Florestal. Trata-se de registro público eletrônico
de âmbito nacional, obrigatório para todos os imóveis rurais, com a finalidade de integrar as informações
ambientais das propriedades e posses rurais, compondo base de dados para controle, monitoramento,
planejamento ambiental e econômico e combate ao desmatamento. O CAR não será considerado título para fins
de reconhecimento do direito de propriedade ou posse, tampouco elimina outros cadastramentos necessários.

CAR contém:
i) identificação do proprietário/possuidor e comprovação da posse ou propriedade (título);
ii) situação ambiental (plantas, memorial descritivo, coordenadas, APPs, etc.). Dispensada se imóvel < 4 módulos
fiscais.

Cota de Reserva Ambiental (“CRA”): A compensação da Reserva Legal é um mecanismo previsto no Código
Florestal segundo o qual o proprietário ou possuidor que não estiver cumprindo os percentuais de Reserva Legal
em sua propriedade poderá regularizar a situação adquirindo (comprando) CRAs.
Quem tem uma propriedade que cumpre os percentuais de Reserva Legal e possui vegetação excedente (“a mais”
do que exige a lei) pode emitir CRA e quem tem déficit de Reserva Legal pode compensá-lo comprando CRA.
O novo Código Florestal adotou o critério do bioma para fins de compensação da Reserva Legal.
Contudo, STF (Pleno, fev/2018) deu ao art. 48, § 2°, do Cód. Florestal interpretação conforme a CF para permitir
compensação apenas entre áreas com identidade ecológica (bioma + identidade ecológica como critérios).
Assim a aquisição de uma área no mesmo bioma é insuficiente como mecanismo de compensação. Isso porque
pode acontecer de, dentro de um mesmo bioma, existir uma alta heterogeneidade de formações vegetais. Em
outras palavras, não basta que a área seja do mesmo bioma, é necessário também que haja identidade ecológica
entre elas.

Programa de Regularização Ambiental (“PRA”) Federal: objetivo de regularizar atividade produtiva em


descompasso com o antigo Código Florestal. A assinatura do termo de compromisso suspende as sanções e a
punibilidade por crimes definidos nos arts. 38, 39 e 48 da Lei 9.605/98 enquanto o TC estiver sendo cumprido,
impede novas autuações por infrações cometidas antes de 22.7.09 em APP, RL e uso restrito. O cumprimento do
TC implica na regularização do uso e, se houver multa já aplicada, esta é convertida em serviços de preservação
do meio ambiente, extinguindo a punibilidade.

Principais alterações do Novo Código Florestal:


(i) estendeu as APPs ao redor de lagos e lagoas naturais e reservatórios artificiais (art. 4°, I e III);
STF (Pleno, fev/2018) deu ao art. 3º, XVII e ao art. 4º, IV, do Cód. Florestal, interpretação conforme a CF para dizer

200
que os entornos das nascentes e dos olhos d´água intermitentes configuram APP. A definição de nascente
envolve perenidade (característica do que é perene = duradouro). Assim, a interpretação deve ser a de que os
entornos das nascentes e dos olhos d´água, mesmo que intermitentes, também configuram APP.
(ii) dispensou o estabelecimento das faixas de APPs no entorno das acumulações naturais ou artificiais de água
com superfície inferior a 1 hectare;
(iii) beneficiou, em inúmeras situações, a produção na pequena propriedade ou posse rural familiar, conceituada
como “aquela explorada mediante o trabalho pessoal do agricultor familiar e empreendedor familiar rural,
incluindo os assentamentos e projetos de reforma agraria, e que atenda ao disposto no art. 3° da Lei
11.326/2006”;
(iv) instituiu o CAR no âmbito do SINIMA;
(v) inovou, ao dispor que o registro da ARL no CAR desobriga a averbação no Cartório de Registro de Imóveis;
permitiu ao proprietário/possuidor computar as APPs existentes em sua propriedade no cálculo da ARL;
(vi) apresentou às propriedades rurais instrumentos compensatórios em caso de ARL com percentual inferior ao
mínimo exigido em lei. Um deles, nos casos de propriedades rurais contíguas, é a denominada Reserva Legal
condominial;
(vii) previu o DOF – Documento de Origem Florestal, documento que formaliza o licenciamento ambiental
necessário para o transporte, por qualquer meio, e o armazenamento de madeira, lenha, carvão e outros produtos
ou subprodutos florestais oriundos de florestas de espécies nativas, para fins comerciais ou industriais (art. 36,
caput e parágrafos).

STF (Pleno, fev/2018): são inconstitucionais as expressões “demarcadas” e “tituladas”, contidas no art. 3º,
parágrafo único, do Cód. Florestal. Este diploma, em diversos dispositivos, estabeleceu um tratamento
diferenciado para a “pequena propriedade ou posse rural familiar”. Seu art. 3º, parágrafo único, confere o mesmo
tratamento diferenciado às terras indígenas demarcadas e demais áreas tituladas de povos e comunidades
tradicionais. O STF declarou a inconstitucionalidade das expressões “demarcadas” e “tituladas”, de forma que tais
terras e áreas poderão receber o tratamento diferenciado mesmo sem demarcação e titulação. Isso porque a
titulação do território das comunidades tradicionais e dos povos indígenas representa uma mera “formalidade”,
de caráter declaratório (e não constitutivo).

STF (Pleno, fev/2018): deu interpretação conforme ao art. 59, §§ 4º e 5º, do Cód. Florestal, de modo que, durante
a execução dos termos de compromissos subscritos nos programas de regularização ambiental, não corra o prazo
de decadência ou prescrição, aplicando-se extensivamente o disposto no § 1º do art. 60 da Lei 12.651/2012,
segundo o qual “a prescrição ficará interrompida durante o período de suspensão da pretensão punitiva”.

→ Os espaços territorialmente protegidos são objeto do item 10.c.

19C. Gestão de florestas públicas. Uso e exploração. Concessão florestal.

Renata Muniz

Gestão das florestas públicas - Lei 11.284/2006

A Lei 11.284/2006 estabelece no plano jurídico um sistema de gestão de florestas destinado a criar produtos e
serviços em proveito do desenvolvimento sustentável, concebendo a floresta como um instrumento de
exploração econômica eficiente e de largo alcance, compreendendo: I - a criação de florestas nacionais, estaduais
e municipais (...) e sua gestão direta; II - a destinação de florestas públicas às comunidades locais, nos termos do
art. 6º desta Lei; III - a concessão florestal, incluindo florestas naturais ou plantadas e as unidades de manejo das
áreas protegidas referidas no inciso I do caput deste artigo.

A lei 11.284/2006 é tida como norma geral, de modo que as leis estaduais e municipais deverão se adequar às
suas normas de contornos gerais, bem como, pela competência suplementar, poderão elaborar normas supletivas
e complementares e estabelecer padrões relacionados à gestão florestal.

201
Princípios da gestão de florestas públicas: Constituem princípios da gestão de florestas públicas:

I - a proteção dos ecossistemas, do solo, da água, da biodiversidade e valores culturais associados, bem como do
patrimônio público;

II - o estabelecimento de atividades que promovam o uso eficiente e racional das florestas e que contribuam
para o cumprimento das metas do desenvolvimento sustentável local, regional e de todo o País;

III - o respeito ao direito da população, em especial das comunidades locais, de acesso às florestas públicas e aos
benefícios decorrentes de seu uso e conservação;

IV - a promoção do processamento local e o incentivo ao incremento da agregação de valor aos produtos e


serviços da floresta, bem como à diversificação industrial, ao desenvolvimento tecnológico, à utilização e à
capacitação de empreendedores locais e da mão-de-obra regional;

V - o acesso livre de qualquer indivíduo às informações referentes à gestão de florestas públicas, nos termos da
Lei no 10.650, de 16 de abril de 2003;

VI - a promoção e difusão da pesquisa florestal, faunística e edáfica, relacionada à conservação, à recuperação


e ao uso sustentável das florestas;

VII - o fomento ao conhecimento e a promoção da conscientização da população sobre a importância da


conservação, da recuperação e do manejo sustentável dos recursos florestais;

VIII - a garantia de condições estáveis e seguras que estimulem investimentos de longo prazo no manejo, na
conservação e na recuperação das florestas.

Da gestão direta

O Poder Público poderá exercer diretamente a gestão de florestas nacionais, estaduais e municipais, sendo-lhe
facultado, para execução de atividades subsidiárias, firmar convênios, termos de parceria, contratos ou
instrumentos similares com terceiros, observados os procedimentos licitatórios e demais exigências legais
pertinentes.

A duração dos contratos e instrumentos similares a que se refere o caput deste artigo fica limitada a 120 (cento
e vinte) meses.

Nas licitações para as contratações, além do preço, poderá ser considerado o critério da melhor técnica previsto
no inciso II do caput do art. 26 desta Lei.

Da destinação às comunidades locais

As comunidades locais são “populações tradicionais e outros grupos humanos, organizados por gerações
sucessivas, com estilo de vida relevante à conservação e à utilização sustentável da diversidade biológica” e,
antes da realização das concessões florestais, as florestas públicas ocupadas ou utilizadas por comunidades locais
serão identificadas para a destinação, pelos órgãos competentes. A destinação pode ser feita nas seguintes
formas: I - criação de reservas extrativistas e reservas de desenvolvimento sustentável; II - concessão de uso,
por meio de projetos de assentamento florestal, de desenvolvimento sustentável, agroextrativistas ou outros
similares; III - outras formas previstas em lei.

202
O Poder Público poderá, com base em condicionantes socioambientais definidas em regulamento, regularizar
posses de comunidades locais sobre as áreas por elas tradicionalmente ocupadas ou utilizadas, que sejam
imprescindíveis à conservação dos recursos ambientais essenciais para sua reprodução física e cultural, por meio
de concessão de direito real de uso ou outra forma admitida em lei, dispensada licitação.

Estas destinações serão feitas de forma não onerosa para o beneficiário e efetuada em ato administrativo próprio
(art. 6º, § 1º).

A previsão dos instrumentos de destinação não impede que as comunidades locais participem das licitações
destinadas à concessão florestal, por meio de associações comunitárias, cooperativas ou outras pessoas jurídicas
admitidas.

Concessão florestal

É “a delegação onerosa, feita pelo poder concedente, do direito de praticar manejo florestal sustentável para
exploração de produtos e serviços numa unidade de manejo, mediante licitação, à pessoa jurídica, em consórcio
ou não, que atenda às exigências do respectivo edital de licitação e demonstre capacidade para seu
desempenho, por sua conta e risco e por prazo determinado”.

Já a unidade de manejo é o “perímetro definido a partir de critérios técnicos, socioculturais, econômicos e


ambientais, localizado em florestas públicas, objeto de um Plano de Manejo Florestal Sustentável - PMFS,
podendo conter áreas degradadas para fins de recuperação por meio de plantios florestais” (art. 3º, VII e VIII).
A concessão florestal será autorizada em ato do poder concedente e formalizada mediante contrato, que deverá
observar os termos desta Lei, das normas pertinentes e do edital de licitação (art. 7º). O poder concedente
publicará, previamente ao edital de licitação, ato justificando a conveniência da concessão florestal,
caracterizando seu objeto e a unidade de manejo (art. 12). Também, as licitações para concessão florestal serão
realizadas na modalidade concorrência e outorgadas a título oneroso, sendo vedada a declaração de
inexigibilidade prevista na Lei 8666/93

A publicação do edital de licitação de cada lote de concessão florestal deverá ser precedida de audiência pública,
por região, realizada pelo órgão gestor, nos termos do regulamento, sem prejuízo de outras formas de consulta
pública.

São elegíveis para fins de concessão as unidades de manejo previstas no Plano Anual de Outorga Florestal –
PAOF, que é proposto pelo órgão gestor e definido pelo poder concedente, contendo a descrição de todas as
florestas públicas a serem submetidas a processos de concessão no ano em que vigorar (art. 10), o qual será
submetido ao órgão consultivo da respectiva esfera de governo. Se for federal, ainda requer a manifestação da
SPU/MPOG e se situado em faixa de fronteira, deverá ouvir o Conselho de Defesa Nacional.

Objeto da concessão - A concessão florestal terá como objeto a exploração de produtos e serviços florestais,
contratualmente especificados, em unidade de manejo de floresta pública, com perímetro georreferenciado,
registrada no respectivo cadastro de florestas públicas e incluída no lote de concessão florestal.

É vedada a outorga de qualquer dos seguintes direitos no âmbito da concessão florestal (art. 16, §1º): I -
titularidade imobiliária ou preferência em sua aquisição;

II - acesso ao patrimônio genético para fins de pesquisa e desenvolvimento, bioprospecção ou constituição de


coleções;

203
III - uso dos recursos hídricos acima do especificado como insignificante, nos termos da Lei no 9.433, de 8 de
janeiro de 1997;

IV - exploração dos recursos minerais;

V - exploração de recursos pesqueiros ou da fauna silvestre;

VI - comercialização de créditos decorrentes da emissão evitada de carbono em florestas naturais.

Licenciamento ambiental

Prevê-se, ainda, licenciamento ambiental, compreendendo a licença prévia e a licença de operação, não se
exigindo a licença de instalação.

A licença prévia para uso sustentável da unidade de manejo será requerida pelo órgão gestor, mediante a
apresentação de relatório ambiental preliminar ao órgão do SISNAMA.

O início das atividades florestais na unidade de manejo somente poderá ser efetivado com a aprovação do
respectivo PMFS pelo órgão do SISNAMA e a obtenção da licença de operação pelo concessionário.

Licitação: Habilitação: além dos requisitos da Lei 8.666/93, exige-se a comprovação da ausência de débitos
inscritos na dívida ativa relativos a infrações ambientais e de decisões condenatórias, com trânsito em julgado,
em ações penais relativas a crime contra o meio ambiente ou a ordem tributária ou a crime previdenciário. A
habilitação é exclusiva para empresas ou outras pessoas jurídicas constituídas sob as leis brasileiras e que tenham
sede e administração no País. Os requisitos do edital constam dos arts. 20 e ss da LGFP. Critérios de seleção: a
proposta é escolhida com base nos critérios de maior preço ofertado e melhor técnica, esta considerando i) o
menor impacto ambiental; ii) os maiores benefícios sociais diretos; iii) a maior eficiência; iv) a maior agregação
de valor ao produto ou serviço florestal na região da concessão.

Contrato de concessão: para cada unidade de manejo licitada, será assinado um contrato de concessão exclusivo
com um único concessionário, que será responsável por todas as obrigações nele previstas, além de responder
pelos prejuízos causados ao poder concedente, ao meio ambiente ou a terceiros, sem que a fiscalização exercida
pelos órgãos competentes exclua ou atenue essa responsabilidade. Sem prejuízo de sua responsabilidade, o
concessionário poderá contratar terceiros para o desenvolvimento de atividades inerentes ou subsidiárias ao
manejo florestal sustentável dos produtos e à exploração dos serviços florestais concedidos, sendo vedada a
subconcessão na concessão florestal. Prazo: os prazos dos contratos de concessão florestal serão estabelecidos
de acordo com o ciclo de colheita ou exploração, considerando o produto ou grupo de produtos com ciclo mais
longo incluído no objeto da concessão, podendo ser fixado prazo equivalente a, no mínimo, um ciclo e, no
máximo, 40 anos. O prazo dos contratos de concessão exclusivos para exploração de serviços florestais será de,
no mínimo, 5 e, no máximo, 20 anos. Extinção da concessão: por i) esgotamento do prazo contratual; ii) rescisão;
iii) anulação; iv) falência ou extinção do concessionário e falecimento ou incapacidade do titular, no caso de
empresa individual; v) desistência e devolução, por opção do concessionário, do objeto da concessão. Outras
cláusulas: As cláusulas contratuais essenciais e outras características desses instrumentos estão previstos nos
arts. 27 a 35 da LGFP, ao passo que o regime econômico e financeiro da concessão florestal está disciplinado nos
arts. 36 a 41.

204
Órgãos: a LGFP institui o Serviço Florestal Brasileiro - SFB, na estrutura do Ministério do Meio Ambiente, e cria o
Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal - FNDF. O SFB atua exclusivamente na gestão das FP e tem suas
atribuições delineadas no art. 55 da LGFP. Dentre elas, criar e manter o Sistema Nacional de Informações
Florestais e gerenciar o Cadastro Nacional de Florestas Públicas. Será dirigido por um Conselho Diretor, composto
por um Diretor-Geral e 4 diretores, em regime de colegiado. O Poder Executivo poderá assegurar ao SFB
autonomia administrativa e financeira, no grau conveniente ao exercício de suas atribuições, mediante a
celebração de contrato de gestão e de desempenho. O FNDF tem natureza contábil e será gerido pelo órgão gestor
federal, objetivando fomentar o desenvolvimento de atividades sustentáveis de base florestal no Brasil e a
promover a inovação tecnológica do setor. É vedada ao FNDF a prestação de garantias.

Supressão vegetal: qualquer atividade que envolva a supressão de vegetação nativa depende de autorização.
Quando a exploração de florestas e formações sucessoras implicar em corte raso da vegetação arbórea natural, a
Autorização de Supressão para Uso Alternativo do Solo deve ser requisitada.

Uso Alternativo do Solo: significa a substituição de florestas e formações sucessoras por outras coberturas do
solo, tais como projetos de assentamento para Reforma Agrária, agropecuários, industriais, de geração e
transmissão de energia, de mineração e de transporte. O aproveitamento da matéria-prima florestal nas áreas
onde houver supressão para o uso alternativo do solo será permitido mediante Autorização para Utilização de
Matéria-Prima Florestal - AUMPF, que é expedida somente depois de constatada pela vistoria técnica a existência
de matéria-prima florestal e após conferência do volume e espécie. As florestas públicas não destinadas a manejo
florestal ou unidades de conservação ficam impossibilitadas de conversão para uso alternativo do solo, até que
sua classificação de acordo com o ZEE esteja oficializada e a conversão seja plenamente justificada.

Reposição florestal (vide Decreto nº 5.975/06): é a compensação do volume de material-prima extraído de


vegetação natural pelo volume de material-prima resultante de plantio florestal para geração de estoque ou
recuperação de cobertura florestal. É obrigada a reposição florestal à pessoa física ou jurídica que: a) utiliza
matéria-prima florestal oriunda de supressão de vegetação natural; b) detenha a autorização de supressão de
vegetação natural. É dispensado da obrigatoriedade de reposição florestal aquele que comprovadamente
utilize: a) resíduos provenientes de atividade industrial, tais como costaneiras, aparas, cavacos e similares; b)
matéria-prima florestal não-madeireira ou oriunda de PMFS, de floresta plantada ou de supressão da vegetação
autorizada, para benfeitoria ou uso doméstico dentro do imóvel rural de sua origem. Permanece a obrigação de
comprovar junto à autoridade competente da origem do recurso florestal utilizado. Fica desobrigado da reposição
o pequeno proprietário rural ou possuidor familiar, assim definidos no art. 1º, § 2º, inc. I, da Lei nº 4.771/65,
detentor da autorização de supressão de vegetação natural, que não utilizar a matéria-prima florestal ou destiná-
la ao consumo.

Transporte: o Documento de Origem Florestal – DOF é a licença obrigatória, em âmbito federal, para o transporte,
por qualquer meio, e o armazenamento de madeira, lenha, carvão e outros produtos ou subprodutos florestais
oriundos de florestas de espécies nativas, para fins comerciais ou industriais. O DOF contém informações.

Recursos financeiros oriundos dos preços da concessão florestal

Os recursos financeiros oriundos dos preços da concessão florestal, via de regra, serão destinados aos Estados,
aos Municípios e ao Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal no sentido de propiciar recursos econômicos
em face do uso da floresta como bem ambiental.

A Lei 11.284/06 e o Decreto (regulamentador) Federal nº 6.063/2007, prevêem o pagamento de duas formas de
preço pela outorga:

1. O preço sobre os custos de realização do edital de licitação da concessão florestal federal de cada unidade de
manejo, que deve ser pago ao concessionário, excluído do custo do edital aqueles relacionados às ações realizadas

205
pelo poder público e que, por sua natureza, geram benefícios permanentes ao patrimônio público (art. 37, Decreto
6063/2007).
2. O preço da concessão florestal: calculado em função da quantidade de produto ou serviço auferido do objeto
da concessão ou do faturamento líquido ou bruto.

O art. 36, §3º da Lei 11284/06, prevê que “será fixado, nos termos de regulamento, valor mínimo a ser exigido
anualmente do concessionário, independentemente da produção ou dos valores por ele auferidos com a
exploração do objeto da concessão”, valor este que integrará os pagamentos anuais devidos pelo concessionário.

20C. Proteção jurídica do Meio Ambiente e a exploração mineral. Mineração e impactos ambientais.
Licenciamento. Deveres ambientais relativos à exploração mineral.

Camila Lauton
Fonte utilizada: atualização do Graal 28; livro do Romeu Thomé – manual de direito ambiental.

Proteção jurídica do Meio Ambiente e a exploração mineral. O desenvolvimento econômico de muitas cidades
depende da exploração mineral. A exploração mineral envolve bem jurídico ambiental não renovável. É
incontroversa, portanto, a necessidade de harmonização das atividades mineiras e petrolíferas com a proteção
dos ecossistemas naturais, em obediência aos princípios do desenvolvimento sustentável e da equidade
intergeracional.

Disposições constitucionais: os recursos minerais, inclusive os do subsolo, são de propriedade da União (CRFB,
art. 20, IX). Em razão disto, a pesquisa e a lavra dos recursos minerais só poderão ser feitas com autorização ou
concessão da União (art. 176, §1º).
CRFB, art. 225, §2º: “Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado,
de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei”. A solução técnica é o
Plano de Recuperação de Área Degradada – PRAD.
CRFB, art. 174, §3º: “O Estado favorecerá a organização da atividade garimpeira em cooperativas, levando em
conta a proteção do meio ambiente e a promoção econômico-social dos garimpeiros”.
CRFB, art. 91, §1º, III: Ao Conselho de Defesa Nacional compete “propor os critérios e condições de utilização de
áreas indispensáveis à segurança do território nacional e opinar sobre seu efetivo uso, especialmente na faixa de
fronteira e nas relacionadas com a preservação e a exploração dos recursos naturais de qualquer tipo”.
CRF, art. 49, XVI, e 231, §3°: É do Congresso Nacional a competência exclusiva para autorizar a pesquisa e a lavra
das riquezas minerais em terras indígenas mediante decreto-legislativo, que não é dado substituir por medida
provisória. Não a usurpa, contudo, a medida provisória que - visando resolver o problema criado com a existência,
em poder de dada comunidade indígena, do produto de lavra de diamantes já realizada, disciplina-lhe a
arrecadação, a venda e a entrega aos indígenas da renda líquida resultante de sua alienação. (ADI 3.352-MC, Rel.
Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 2- 1 2-04, DJ de 1 5-4-05)
Obs.: os recursos minerais são bens da União (art. 20, IX) , mas a sua exploração econômica não se configura como
atividade de monopólio da União (art. 1 76) . Quando a Constituição quis atribuir o regime de monopólio para a
exploração de determinados bens, ela o fez expressamente, como no caso dos minérios e minerais nucleares
(artigo 1 77, inciso V e § 1 °).
“Como se vê, a atividade mineradora é permitida em território nacional, sendo expressamente vedada apenas: (a)
se praticada em áreas definidas como intocáveis (ex.: se localizada em faixa de fronteira e não houver autorização
do Conselho de Defesa Nacional); e (b) se realizada em área indígena sem autorização do Congresso Nacional e
sem que a comunidade indígena seja consultada (CRFB, art. 231, §3º). No plano infraconstitucional, destacam-se,
em matéria de proteção ambiental da exploração mineral, o Código de Mineração (Decreto-Lei nº 227/67) e a Lei
nº 7.805/89 (que dispõem sobre o regime de permissão de lavra garimpeira). Na esfera federal, o órgão
responsável pela fiscalização da atividade de exploração mineral é o Departamento Nacional da Produção Mineral
– DNPM, autarquia vinculada ao Ministério das Minas e Energia, cujo objetivo é controlar e fiscalizar o exercício
das atividades de mineração em todo o território nacional, e inclusive promover a outorga dos títulos minerários
relativos à exploração e ao aproveitamento dos recursos minerais (art. 3º, Lei nº 8.876/94).”

206
Para Paulo de Bessa Antunes, “o Código tem duas preocupações básicas, a primeira é a de assegurar que a lavra
seja efetuada dentro de padrões técnicos que garantam a salubridade da atividade, e a segunda, com o objetivo
de manter um determinado grau de sustentabilidade da atividade minerária. Sabemos, entretanto, que os
recursos minerais não são renováveis e que, para a sua extração, não raro, são necessárias atividades que criam
modificações ambientais irreversíveis. Tais modificações, durante a realização das atividades de extração mineral,
não podem ser impedidas. Como exemplo é possível apresentar o desmonte de um morro para a extração de
determinado minério. Dificilmente o morro poderá ser reconstruído e, em seu lugar, poderá surgir uma cratera.
Bem se vê que, no caso, não se poderá falar em repristinação ambiental ante a total impossibilidade, pelo menos
em nível de nossa melhor tecnologia atualmente existente. Penso que a situação que está colocada é interessante,
pois, de fato, não se poderia adotar a designação degradação para as atividades minerárias, regularmente
realizadas e praticadas segundo os ditames do licenciamento, inclusive o ambiental. Assim é porque, nos termos
da lei, a degradação é uma alteração adversa do meio ambiente e, portanto, proibida. Analisando-se a questão
sob outro prisma, observa-se que o legislador, diante das importantes repercussões econômicas e sociais das
atividades minerárias, estabeleceu um critério diferenciado para a prática de tais atividades. Embora tenha exigido
que as mesmas se façam com respeito à legislação de proteção do meio ambiente e mediante critérios bastante
rígidos de segurança, admitiu que, durante a fase de extração, são inevitáveis os resultados negativos sobre o meio
ambiente. A recuperação dos danos ambientais causados pela mineração é, precipuamente, uma atividade de
compensação, pois raramente é possível o retorno, ao status quo ante, de um local que tenha sido submetido a
atividades de mineração.”

Conceitos importantes.
a) Jazidas: Considera-se jazida roda massa individualizada de substância mineral ou fóssil, aflorando à superfície
ou existente no interior da terra, e que tenha valor econômico (art. 4° do Código de Mineração).
b) Mina: A partir do momento em que a jazida é explorada economicamente, passa a ter a denominação mina.
c) Lavra: O conjunto de operações coordenadas objetivando o aproveitamento industrial da jazida, desde a
extração das substâncias minerais úteis que contiver, até o beneficiamento das mesmas.

Garimpo. O garimpo constitui uma modalidade de extração de riquezas utilizando-se, na maioria das vezes, de
parcos recursos, baixo investimento, equipamentos simples e ferramentas rústicas. A atividade garimpeira é
considerada uma forma legal de extração de riquezas minerais caso atenda a determinadas exigências, como
executar os trabalhos de mineração com observância das normas técnicas e regulamentares.

Licenciamento. “A localização, a construção, a instalação, a ampliação, modificação e operação de


empreendimentos utilizadores de recursos naturais passíveis de causar degradação ambiental dependem de
prévio licenciamento do órgão ambiental competente. As atividades minerárias, geralmente potencialmente
causadoras de significativo impacto ambiental, devem, nesse caso, obter o licenciamento ambiental para iniciar
suas atividades regularmente. Aos empreendimentos de exploração mineral significativamente impactantes
exige-se, em regra, o EIA, a ser apresentado ao órgão ambiental na ocasião da solicitação da Licença Prévia (LP).
O licenciamento é obrigatório tanto para a permissão de lavra garimpeira (art. 3º da Lei nº 7.805/89) quanto para
a concessão de lavra (art. 16 da Lei nº 7.805/89), concedido pelos órgãos ambientais competentes na estrutura
do SISNAMA. Exploração mineral em áreas de conservação: depende de prévia autorização do órgão ambiental
que a administre (art. 17, Lei nº 7.805/89). EIA: sempre necessário (Resolução 01/86, art. 2º, IX; e Resolução nº
09/90, ambas do CONAMA)”.

Deveres ambientais relativos à exploração mineral.


“A Constituição de 1988, aplicando o princípio da reparação, determina que aquele que explorar recursos minerais
fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público
competente, na forma da lei (art. 225, §2° da CRFB/ 1988). Em decorrência dos dispositivos constitucionais, o
exercício da atividade mineradora no País está condicionado a três instrumentos específicos de controle do Poder
Público, no que tange aos riscos potenciais de danos ao meio ambiente resultantes da lavra: o Estudo Prévio de
Impacto Ambiental (EIA), o Licenciamento Ambiental (LA) e o Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD)”.
PRAD - Plano de Recuperação da Área Degradada: “A recuperação das áreas degradadas está disciplinada pelo

207
Decreto 97.632/89,90 segundo o qual os empreendimentos de mineração estão obrigados, quando do momento
da apresentação do Estudo de Impacto Ambiental e do Relatório de Impacto Ambiental, a submeter PRAD à
aprovação do órgão estadual de meio ambiente competente. A mineração, atividade de exploração de bens
naturais não renováveis, tem por atributo a transitoriedade. As reservas minerais se exaurem. Dessa forma, a
elaboração do PRAD pelo empreendedor desde o início da atividade mineral está calcada nas ideias de
esgotabilidade dos recursos minerais, de rigidez locacional da jazida e do impacto socioambiental inerente à
atividade minerária. É essencial considerar a dimensão das reservas e o tempo provável para a sua exaustão, além
de investigar alternativas para as comunidades que se desenvolveram baseadas nas atividades de mineração
superem as dificuldades oriundas da paralisação da extração mineral após sua exaustão”. “Além do PRAD, o plano
de fechamento de mina apresenta-se como outro instrumento de relevância socioambiental direcionado ao
encerramento da atividade minerária. Trata-se de um documento em que o empreendimento minerário
compromete-se a tomar uma série de medidas protetivas do meio ambiente cultural, social e biológico,
possibilitando o uso futuro da área explorada e a reinserção econômico-social do município e de sua população”.

Deveres do titular da concessão (art. 47 do Código de Mineração): “II - Lavrar a jazida de acordo com o plano de
lavra aprovado pelo D.N.P.M., e cuja segunda via, devidamente autenticada, deverá ser mantida no local da mina;
III - Extrair somente as substâncias minerais indicadas no Decreto de Concessão; (...) V - Executar os trabalhos de
mineração com observância das normas regulamentares; (...) VII – Não dificultar ou impossibilitar, por lavra
ambiciosa, o aproveitamento ulterior da jazida; VIII - Responder pelos danos e prejuízos a terceiros, que
resultarem, direta ou indiretamente, da lavra; IX - Promover a segurança e a salubridade das habitações existentes
no local; X - Evitar o extravio das águas e drenar as que possam ocasionar danos e prejuízos aos vizinhos; XI - Evitar
poluição do ar, ou da água, que possa resultar dos trabalhos de mineração; XII - Proteger e conservar as Fontes,
bem como utilizar as águas segundo os preceitos técnicos quando se tratar de lavra de jazida da Classe VIII; XIII -
Tomar as providências indicadas pela Fiscalização dos órgãos Federais; (...)”. Deveres do DNPM (art. 3º da Lei nº
8.876/94): “V – fomentar a produção mineral e estimular o uso racional e eficiente dos recursos minerais”; “VI –
fiscalizar a pesquisa, a lavra, o beneficiamento e a comercialização dos bens minerais, podendo realizar vistorias,
autuar infratores e impor as sanções cabíveis, na conformidade do disposto na legislação minerária”; “VII – baixar
normas, em caráter complementar, e exercer fiscalização sobre o controle ambiental, a higiene e a segurança das
atividades de mineração, atuando em articulação com os demais órgãos responsáveis pelo meio ambiente e pela
higiene, segurança e saúde ocupacional dos trabalhadores”.
ENUNCIADO nº 32 6ªCCR: Depende de consulta, conforme previsto na Convenção nº 169 da OIT, a expedição de
alvará de pesquisa e títulos de lavra minerários sobre áreas ocupadas por povos e comunidades tradicionais,
independentemente de titulação, sob pena de nulidade.
Mineração em Unidades de Conservação: tema polêmico na doutrina. Deve-se analisar o objetivo da unidade de
conservação e vê se a exploração mineral é cabível naquele caso concreto. “A definição da extensão do impacto
ambiental da atividade minerária, as finalidades de cada categoria de unidade de conservação e, sobretudo, o
plano de manejo individualizado para a unidade nortearão a possibilidade de compatibilização entre o regime
especial de proteção e o desenvolvimento de extração mineral”.

13C. Recursos Hídricos. Política Nacional de Recursos Hídricos. Instrumentos de gestão de recursos hídricos.
Regime jurídico das águas. Águas subterrâneas.

Ana Carolina Castro Tinelli 27/09/18

Recursos hídricos podem ser conceituados como as águas superficiais e subterrâneas disponíveis para
uso. A CF/88 promoveu uma guinada na tutela dos recursos hídricos, ao estabelecer que toda água é pública.
Anteriormente, tais recursos eram disciplinados pelo Código de Águas de 1934, em que havia previsão de água
com natureza particular.
Quanto à titularidade, são bens da União os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu
domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a territórios
estrangeiros ou deles provenham, bem como os terrenos marginais, as praias fluviais e o mar territorial (artigo
20, III e IV, CF/88). Por outro lado, são bens dos Estados as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes,

208
emergentes e em depósito, ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as decorrentes de obras da União. (art. 26,
I). O texto constitucional nada diz sobre rios pertencentes aos Municípios, estando revogado o artigo 29 do Código
de Águas na parte que a eles atribuía as águas situadas em seus territórios. A doutrina entende que o legislador
não deferiu aos entes a “propriedade” da água, mas sim a responsabilidade pela gestão em benefício e no
interesse de todos, uma vez que se trata de recurso ambiental e, portanto, direito difuso.
Águas subterrâneas são bens dos Estados, em relação às quais o particular não tem o domínio, mas
apenas o direito à exploração mediante autorização do Poder Público, cobrada a devida contraprestação. Embora
a dominialidade seja dos Estados-membros, as águas subterrâneas são tratadas em programa nacional, haja vista
a necessidade da gestão integrada e o fato de os aquíferos quase sempre extrapolarem os limites das bacias
hidrográficas (Estados e países), sendo necessários mecanismos de articulação entre os entes, inclusive
Municípios, pois responsáveis pela política de uso e ocupação do solo, que tem relação direta com a proteção das
águas subterrâneas.
Resolução 399, ANA – estabelece os critérios para classificar o curso d á́ gua como de domínio da União,
do Estado ou do Distrito Federal.
STF Súmula 479 - As margens dos rios navegáveis são domínio público, insuscetíveis de expropriação e,
por isso mesmo, excluídas de indenização.
Competência: Do ponto de vista administrativo ou material, o art. 21, inciso XIX, da CF/88 fixa a
competência da União para “instituir sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos e definir critérios de
outorga de direitos de seu uso”. Por outro lado, no que tange à competência formal (legislativa), a CF/88, no art.
22, inciso IV, determinou a competência privativa da União para legislar sobre águas. No parágrafo único é
previsto que lei complementar poderá autorizar os Estados a legislarem sobre aspectos específicos. Os Estados e
o Distrito Federal têm competência para legislar sobre o gerenciamento de suas águas (entre elas as
subterrâneas), pois precisam regular o seu uso, podendo editar leis que disponham sobre o poder de polícia.
Logo, embora seja da União a competência privativa para legislar a respeito de águas, a ordem jurídica nacional
reconhece a competência comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios para a proteção do meio
ambiente e fiscalização e exploração de recursos hídricos. O STJ entender ser possível que decreto e portaria
estaduais disponham sobre a obrigatoriedade de conexão do usuário à rede pública de água, bem como sobre a
vedação ao abastecimento por poço artesiano, ressalvada a hipótese de inexistência de rede púbica de
saneamento básico. Ainda, entende que o Município tem competência para fiscalizar a exploração de recursos
hídricos, superficiais e subterrâneos, em seu território, o que lhe permite, por certo, também coibir a perfuração
e exploração de poços artesianos, no exercício legítimo de seu poder de polícia urbanístico, ambiental, sanitário
e de consumo.
A Lei n. 9.433/1997 institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, baseada nos seguintes
FUNDAMENTOS (artigo 1o):
I – a água é um bem de domínio público. Sobre tal aspecto, o STJ já asseverou que a água é bem público
de uso comum (art. 1o da Lei 9.433/97), motivo pelo qual é insuscetível de apropriação pelo particular. O particular
tem, apenas, o direito à exploração das águas subterrâneas mediante autorização do Poder Público, cobrada a
devida contraprestação (arts. 12, II e 20, da Lei n. 9.433/97). Ausente a autorização para exploração a que alude
o art. 12 da Lei 9.433/97, revela-se ausente o direito à indenização pelo desapossamento de aquífero.
II – a água é um recurso natural limitado, dotado de valor econômico. Princípio da finitude. Racionaliza
o uso e concretiza o princípio do usuário pagador.
III – em situação de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano (necessidades
básicas e não supérfluas) e a dessedentação de animais. A declaração de escassez depende de ato da
Administração. Poderá ocorrer suspensão total ou parcial da outorga. Medidas restritivas devem ser temporárias.
IV – a gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas. Consumo direto,
agricultura, recreação, geração de energia elétrica, navegabilidade, atividades industriais, etc.
V – a bacia hidrográfica é a unidade territorial para implementação da Política Nacional de Recursos
Hídricos e atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos. A bacia hidrográfica é a área
ou região de drenagem de um rio principal e seus afluentes. É a porção do espaço em que as águas das chuvas,
das montanhas, subterrâneas ou de outros rios escoam em direção a um determinado curso d’água, abastecendo-
o. Cada bacia terá um Comitê correspondente (colegiado formado por usuários e representantes do poder
público), que será responsável pela gestão da bacia. A região hidrográfica é o espaço territorial brasileiro

209
compreendido por uma bacia, grupo de bacias ou sub-bacias hidrográficas contíguas com características naturais,
sociais e econômicas homogêneas ou similares, com vistas a orientar o planejamento e gerenciamento dos
recursos hídricos. O Conselho Nacional de Recursos Hídricos editou a Resolução 32/2003, que instituiu 12 Regiões
Hidrográficas.
VI – a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder
Público, dos usuários e das comunidades. Gestão democrática, tripartite, que atende ao princípio da participação
comunitária ou cidadã.
OBJETIVOS da PNRH (artigo 2º): I. assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de
água, em padrões de qualidade adequados; II. a utilização racional e integrada dos recursos hídricos, incluindo o
transporte aquaviário, com vistas ao desenvolvimento sustentável; III. a prevenção e a defesa contra eventos
hidrológicos críticos de origem natural ou decorrentes do uso inadequado dos recursos naturais (enchentes); IV.
incentivar e promover a captação, a preservação e o aproveitamento de águas pluviais. DIRETRIZES da
PNRH (artigo 3º): I. a gestão sistemática dos recursos hídricos, sem dissociação dos aspectos de quantidade e
qualidade; II. a adequação da gestão de recursos hídricos às diversidades físicas, bióticas, demográficas,
econômicas, sociais e culturais das diversas regiões do País; III. a integração da gestão de recursos hídricos com
a gestão ambiental; IV. a articulação do planejamento de recursos hídricos com o dos setores usuários e com os
planejamentos regional, estadual e nacional; V. a articulação da gestão de recursos hídricos com a do uso do solo;
VI. a integração da gestão das bacias hidrográficas com a dos sistemas estuarinos e zonas costeiras.
Instrumentos de gestão de recursos hídricos (artigo 5º):
- Planos de Recursos Hídricos: são planos diretores que visam fundamentar e orientar a implementação da
PNRH e o seu gerenciamento, devendo ser elaborados: Plano Nacional, Plano Estadual e Plano por Bacia
Hidrográfica. São planos de longo prazo e terão conteúdo mínimo (diagnóstico da situação atual dos recursos
hídricos, balanço entre disponibilidade e demandas futuras, prioridades para outorga, diretrizes e critérios de
cobrança, propostas para restrição de uso de áreas, entre outros).
- Enquadramento dos corpos de água em classes, segundo os usos preponderantes, conforme a
regulamentação da Resolução CONAMA 357/2005. O objetivo é assegurar às águas qualidade compatível com os
usos mais exigentes a que forem destinadas, além de diminuir os custos de combate à poluição mediante açoes
preventivas permanentes. A classificação das águas federais, de competencia da União, é feita pelo Conselho
Nacional de Recursos Hídricos, e a classificação das águas estaduais incumbe aos órgão estaduais respectivos.
- Outorga dos direitos de uso de recursos hídricos: tem como objetivo assegurar o controle quantitativo e
qualitativo dos usos e o efetivo exercício dos direitos de acesso à água.
- Cobrança do uso de recursos hídricos: visa reconhecer a água como bem econômico e dar notoriedade ao
seu real valor, bem como incentivar a racionalização do seu uso e obter recursos financeiros para o financiamento
de programas e intervenções contemplados nos planos de recursos hídricos. A cobrança pelo uso internaliza os
custos ambientais. Na fixação dos valores cobrados deverá ser observada a quantidade da água retirada, bem
como o montante de esgotos lançados e sua nocividade ao meio ambiente. Os valores serão aplicados
prioritariamente na bacia hidrográfica em que foram gerados (financiamento de estudos, programas, projetos,
obras, e custeio administrativo de órgãos e entidades do Sistema Nacional de Recursos Hídricos). STJ, REsp
1117903, repetitivo: A natureza jurídica da remuneração dos serviços de água e esgoto, prestados por
concessionária de serviço público, é de tarifa ou preço público (dívida ativa não-tributária, não são taxas, não
aplica o CTN). É irrelevante a natureza pública ou privada do concessionário (eventual condição autárquica, por
ex.), a cobrança sempre será tarifária. Súmula 407: É legítima a cobrança da tarifa de água, fixada de acordo
com as categorias de usuários e as faixas de consumo (atende ao interesse público, porquanto estimula o uso
racional). STJ Súmula 412: A ação de repetição de indébito de tarifas de água e esgoto sujeita-se ao prazo
prescricional estabelecido no Código Civil (não se aplica o Decreto 20.910/32). STJ e STF: a água fornecida à
população, após ser tratada pelas empresas concessionárias, permissionárias ou autorizadas, não caracteriza
mercadoria, não incidindo, portanto, ICMS.
- Compensação aos municípios. Muito embora prevista na lei como instrumento da PNRH o artigo 24, que
o regulamentava, foi vetado pelo Presidente.
- Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos. Visa a coleta, o tratamento, o armazenamento e a
recuperação de informações sobre os recursos hídricos e fatores que intervêm em sua gestão. Seus princípios

210
básicos são a descentralização da obtenção e produção de dados e informações, a coordenação unificada do
sistema e o acesso aos dados e informações garantido a toda a sociedade.
SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS: é formado pelo Conselho Nacional de
Recursos Hídricos, Agência Nacional de Águas, Conselhos de Recursos Hídricos dos Estados e do Distrito Federal,
Comitês de Bacias Hidrográficas, Órgãos dos poderes públicos federal, estaduais, do Distrito Federal e municipais
cujas competências se relacionem a gestão de recursos hídricos e Agências de Águas. Princípio da participação:
presença de representantes de usuários e de organizações civis de recursos hídricos no Conselho Nacional de
Recursos Hídricos e nos Comitês de Bacia Hidrográfica. → Organizações civis de recursos hídricos podem atuar
por delegação do Conselho Nacional ou Estadual, quando não houver agência de águas. → Nos comitês de bacias
cujos territórios abranjam terras indígenas devem ser incluídos representantes da FUNAI e das comunidades
residentes ou interessadas.
Regime Jurídico das Águas. A utilização da água, em regra, exige outorga, que representa legítimo
exercício do poder de polícia, possuindo natureza jurídica de autorização. Não há necessidade de licitação e não
configura prestação de serviço público, tampouco integra o patrimônio do beneficiário (as águas são inalienáveis).
Discute-se se a outorga é ato vinculado ou discricionário. Há entendimento doutrinário no sentido de que o Poder
Público não poderá deixar de conceder a outorga caso preenchidos os requisitos, mas há precedente pela
insindicabilidade do mérito do ato de outorga pelo Poder Público. Paulo Affonso Leme Machado entende que o
ato administrativo de outorga é vinculado em algumas partes (deve observar as prioridades dos Planos de
Recursos Hídricos, por ex.) e possui certa discricionariedade, mas deve ser amplamente motivado. STJ: a
concessão da outorga não pode ser conferida pelo Judiciário, em sede de mandado de segurança, por ser
atribuição exclusiva da autoridade do Poder Executivo. O artigo 12 da Lei 9433/97 traz um rol exemplificativo das
hipóteses que exigem outorga: I. derivação ou captação de parcela da água existente em um corpo de água para
consumo final, inclusive abastecimento público, ou insumo de processo produtivo; II. extração de água de aquífero
subterrâneo para consumo final ou insumo de processo produtivo; III. lançamento em corpo de água de esgotos e
demais resíduos líquidos ou gasosos, tratados ou não, com o fim de sua diluição, transporte ou disposição final;
IV. aproveitamento dos potenciais hidrelétricos; V. outros usos que alterem o regime, a quantidade ou a qualidade
da água existente em um corpo de água. A outorga, portanto, é exigida para usos que alterem a quantidade, a
qualidade e o regime das águas. As outorgas têm prazo máximo de 35 anos, admitida renovação. Não dependem
de outorga: I. o uso de recursos hídricos para a satisfação das necessidades de pequenos núcleos populacionais,
distribuídos no meio rural; II. as derivações, captações e lançamentos considerados insignificantes e, III. as
acumulações de volumes de água consideradas insignificantes. Se a água for bem da União, competirá à Agência
Nacional de Águas – ANA outorgar o seu uso, cabendo delegação aos Estados e ao Distrito Federal. Caso a água
seja estadual ou distrital, a estes entes caberá exercer essa competência. Pode ser suspensa total ou parcialmente,
em definitivo ou por prazo determinado, de acordo com o disposto no art. 15 da Lei 9433/97 (descumprimento
dos termos da outorga, ausência de uso por 3 anos consecutivos, necessidade premente de água em situação de
calamidade, etc). As outorgas de direito de uso de recursos hídricos para concessionárias e autorizadas de serviços
públicos e de geração de energia hidrelétrica vigorarão por prazos coincidentes com os dos correspondentes
contratos de concessão ou atos administrativos de autorização. A concessão da outorga não dispensa o prévio
licenciamento ambiental, inclusive a elaboração do EIA-RIMA, caso a atividade seja apta a causar significativa
degradação ambiental. Outorga preventiva: prevista na lei que criou a ANA (Lei 9984/2000) e na Resolução
CONAMA 237: algumas atividades que utilizam recursos hídricos, além da outorga, estão sujeitas ao
licenciamento. Nesse casos, a outorga deve preceder ao licenciamento. Declaração de reserva de disponibilidade
hídrica: emitida pela ANA antes da licitação a ser promovida pela ANEEL para exploração de potenciais de energia
hidráulica da União; é convertida em outorga posteriormente.
A Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos prevê infrações administrativas (art. 49). Ex. Utilizar
recursos hídricos sem outorga, em desacordo com a outorga, perfurar poços ou operá-los sem autorização,
fraudar medições dos volumes de água, infringir normas legais e regularmentares, obstar ação fiscalizadora.
O CÓDIGO DE ÁGUAS disciplina a classificação e utilização da água sob o enfoque econômico e dominial.
Alguns de seus dispositivos não foram recepcionados pela CF. Definia que as águas públicas eram as águas
navegáveis ou flutuáveis. As águas comuns eram bens de todos e águas particulares eram as contidas em terras
privadas. Atualmente, vigora o princípio da dominialidade pública.

211
Por sua vez, o Código Civil está em nítido confronto com a CF/88 ao firmar a propriedade privada das
nascentes, ao permitir ao possuidor do imóvel superior poluir águas dispensáveis às primeiras necessidades dos
possuidores do imóvel inferior, desde que proceda ao devido ressarcimento, ao aduzir que o proprietário tem
direito de construir barragens, açudes, ou outras obras para represamento de água em seu prédio, entre outros
dispositivos.
Para o aproveitamento dos recursos hídricos em terras indígenas, a comunidade deve ser ouvida e
depende de autorização do Congresso Nacional (art. 231§3° CF). Vale lembrar do Caso da Usina Hidrelétrica de
Belo Monte, em que a consulta livre, prévia e informada não foi realizada.

18C. Política Nacional de Resíduos Sólidos. Objetivos e princípios. Planos de resíduos sólidos. Responsabilidade
civil e resíduos sólidos. Responsabilidade compartilhada. Licenciamento ambiental e resíduos sólidos

Leonardo Gomes Lins Pastl

A Lei nº 12.305/2010 instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), integrante da


Política Nacional do Meio Ambiente. Resíduo sólido pode ser definido como o material, substância, objeto ou
bem descartado resultante de atividades humanas em sociedade, a cuja destinação final se procede nos estados
sólido ou semissólido, bem como gases contidos em recipientes e líquidos com particularidades que tornem
inviável o seu lançamento na rede pública de esgotos ou em corpos d’água, ou exijam para isso soluções que
sejam técnica ou economicamente inviáveis em face da melhor tecnologia disponível.

A Lei é aplicável às pessoas físicas ou jurídicas (de direito público ou privado) responsáveis,
direta ou indiretamente, pela geração de resíduos sólidos, assim como àquelas que desenvolvam ações
relacionadas à gestão integrada ou ao gerenciamento de resíduos sólidos. Os rejeitos radioativos possuem
disciplina específica dada pela Lei nº 10.308/2001. São as principais inovações trazidas pela Lei: 1) proibição de
lixões (observada regra de transição); 2) responsabilidade das indústrias pela destinação dos resíduos sólidos
que produzem (decorrência do princípio do poluidor-pagador); 3) inclusão social das organizações de catadores;
4) logística reversa, que determina o recolhimento das embalagens usadas pelos fabricantes e vendedores dos
respectivos; 5) responsabilidade compartilhada, que envolve a sociedade, as empresas, os governos das três
esferas na gestão dos resíduos sólidos; 6) previsão dos planos de resíduos sólidos; 7) responsabilidade das
pessoas de acondicionar de forma adequada o lixo para o seu recolhimento, devendo fazer a separação onde
houver a coleta seletiva.

Para além dos princípios ambientais gerais (prevenção, precaução, poluidor-pagador,


protetor-recebedor, desenvolvimento sustentável, razoabilidade, proporcionalidade, etc.), plenamente aplicáveis
à PNRS, há outros princípios específicos: visão sistêmica (consideração das variáveis ambientais, sociais, culturais,
econômicas e de tecnologia); ecoeficiência (compatibilização do fornecimento de bens e serviços a preços
competitivos, com a redução do impacto ambiental e do consumo de recursos naturais em nível sustentável);
cooperação; reconhecimento do resíduo sólido reutilizável e reciclável como um bem econômico e de valor
social; respeito às diversidades regionais; direito da sociedade à informação e ao controle social;
responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos.

O objetivo geral da PNRS é a proteção da saúde pública e da qualidade ambiental. Ademais,


há outros objetivos específicos listados no art. 7º da Lei 12.305/2010: observância da ordem de prioridade no
gerenciamento dos resíduos (não geração, redução, reutilização, reciclagem, tratamento dos resíduos sólidos e
disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos); estímulo à adoção de padrões sustentáveis de produção
e consumo de bens e serviços; adoção tecnologias limpas; reduzir volume e periculosidade de resíduos perigosos;
incentivo à indústria da reciclagem; gestão integrada de resíduos sólidos; capacitação técnica continuada na área
de resíduos sólidos; prioridade para produtos reciclados nas contratações governamentais; integração dos
catadores nas ações de responsabilidade compartilhada.

212
Os planos de resíduos sólidos são os principais instrumentos para a consecução da PNRS.
Depois de publicizados, devem ser objeto de controle social durante sua formulação e implementação. O Plano
Nacional de Resíduos Sólidos: elaborado pela União, com a coordenação do Ministério do Meio Ambiente, tem
vigência por prazo indeterminado e horizonte de 20 (vinte) anos, sendo atualizada a cada quatro. A aprovação
dos planos estaduais de resíduos sólidos é pressuposto para que os Estados tenham acesso aos recursos da União,
ou por ela controlados, destinados a empreendimentos e serviços relacionados à gestão de resíduos sólidos (há,
ainda, previsão de planos, microrregionais, intermunicipais e municipais). Por outro lado, foram previstos planos
de gerenciamento de resíduos sólidos, que são reputados partes integrantes do processo de licenciamento
ambiental; devem ser elaborados pelos geradores de resíduos das áreas industriais, de serviços públicos de
saneamento básicos e de saúde, e de mineração. Igualmente, são obrigados à apresentação de plano de
gerenciamento no processo de licenciamento ambiental os seguintes estabelecimentos: aqueles que gerem
resíduos perigosos; empresas de construção civil; que gerem resíduos de serviços de transportes; responsáveis
por atividades agrossilvopastoris, se assim exigido pela autoridade administrativa competente. No concernente
aos resíduos perigosos, cabe observar que a LC nº 140/2011 atribuiu à União a competência administrativa para
o exercício do controle ambiental sobre o transporte marítimo, interestadual, fluvial ou terrestre desses produtos.
Ainda quanto aos resíduos perigosos, cumpre referir que a Lei nº 12.305/2010 inovou ao prever a possibilidade
de imposição, pelo órgão competente do SISNAMA, da contratação de seguro de responsabilidade civil como
condição para o deferimento de uma licença ambiental (art. 40).

Outros instrumentos da PNRS (rol exemplificativo): coleta seletiva; sistemas de logística


reversa; monitoramento e fiscalização ambiental, sanitária e agropecuária; educação ambiental; incentivos fiscais
e de crédito; termos de ajustamento de conduta. A logística reversa é o instrumento de desenvolvimento
econômico e social caracterizado por um conjunto de ações e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição
dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, proporcionando, assim, uma destinação final
ambientalmente adequada. São obrigados a implementar sistemas de logística reversa, independentemente do
serviço público de limpeza urbana e manejo de recurso sólidos, os fabricantes, distribuidores e comerciantes de
agrotóxicos, assim como outros produtos cuja embalagem, após o uso, constitua resíduo perigoso: pilhas e
baterias; pneus; óleos lubrificantes, seus resíduos e embalagens; lâmpadas fluorescentes. Os consumidores
desses produtos devem promover a devolução após o uso, aos comerciantes desses produtos, que encaminham
aos fabricantes para a destinação ambientalmente adequada.

A responsabilidade civil pelo ciclo de vida dos produtos, compartilhada entre todos os
integrantes da cadeia produtiva, independe da existência de culpa (responsabilidade objetiva), e deve ser
implementada de forma individualizada e encadeada. As pessoas físicas e jurídicas geradoras de resíduos sólidos
deverão formular e executar o seu plano de gerenciamento de resíduos sólidos, e, independentemente da
contratação de serviços terceirizados para a realização de serviços de coleta e destinação final de resíduos sólidos,
permanecem civilmente responsáveis pelo gerenciamento inadequado dos respectivos resíduos. O Poder Público
atua de forma subsidiária, para cessar lesões ao meio ambiente de que tome conhecimento, assegurado o
regresso em face dos responsáveis, para fins de recomposição do erário. Por sua vez, no concernente ao gerador
de resíduos domiciliar, a sua responsabilidade cessa assim que disponibiliza os resíduos corretamente para
coleta ou devolução. A responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos consiste no conjunto de
atribuições de cada um dos participantes da cadeia produtiva; é o encadeamento das diversas responsabilidades
(fabricantes, consumidores e titulares de serviços públicos de limpeza e manejo de resíduos sólidos), com a
finalidade de minimização do volume de rejeitos gerados e de redução dos impactos causados à saúde humana e
à qualidade ambiental decorrentes do ciclo de vida dos produtos.

8.DIREITO INTERNACIONAL AMBIENTAL


8.1Normas internacionais em tema ambiental. (22.c)

22C. Normas internacionais em matéria ambiental.

Sadi Machado 5/10/18

213
NORMAS INTERNACIONAIS EM MATÉRIAS AMBIENTAL
A questão ambiental ganha força no pós-II Guerra Mundial, a partir da progressiva constatação quanto
aos impactos do modelo de desenvolvimento aplicado a partir da Revolução Industrial sobre o meio ambiente.
Nesse cenário, passam a ser positivadas normas internacionais a respeito do tema, à luz de princípios que
congregam os avanços científicos à evolução da proteção jurídica do meio ambiente.
i) Declaração de Estocolmo (1972): considerada o ponto de partida da construção do atual sistema
internacional de proteção ambiental, estabelece princípios comuns para orientar a humanidade no esforço de
preservação e de melhoria do meio ambiente. Foi também criado o Programa das Nações Unidas para o Meio
Ambiente (PNUMA), a fim de coordenar a ação dos organismos internacionais no campo da preservação
ambiental.
ii) Declaração do Rio (1992): adotada por ocasião da Eco 92, atualiza os valores consagrados na
Declaração de Estocolmo, afirmando o princípio do desenvolvimento sustentável e sinalizando a compreensão
de que os Estados têm responsabilidades comuns, porém diferenciadas. Os países desenvolvidos reconheceram
a maior responsabilidade que lhes cabe na busca internacional do desenvolvimento sustentável, tendo em vista
as pressões exercidas por suas sociedades sobre o meio ambiente global e por conta das tecnologias e recursos
financeiros que controlam. Ao mesmo tempo, as ações internacionais na área do meio ambiente e do
desenvolvimento devem também atender aos interesses e às necessidades de todos os países, prioritariamente
aqueles ainda em desenvolvimento.
iii) Agenda 21: aprovada na Eco 92, é um programa de ação que visa garantir o desenvolvimento
econômico em condições equitativas para toda a humanidade, dentro de parâmetros de respeito ao meio
ambiente. Não é juridicamente vinculante, ostentando natureza jurídica de soft law.
iv) Rio+20: Conferência realizada em 2012, a fim de renovar o compromisso com o desenvolvimento
sustentável. O resultado foi tímido em relação aos aspectos especificamente relacionados ao meio ambiente,
negligenciando temas como o aquecimento global. De uma forma geral, o documento apontou a pobreza como
o maior desafio para que os países atinjam a excelência nos pilares econômico, social e ambiental.
v) Acordo de Paris (2015): tratado no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a
Mudança do Clima (UNFCCC), que rege medidas de redução de emissão dióxido de carbono a partir de 2020. Foi
negociado durante a COP-21, em Paris, e aprovado em 12 de dezembro de 2015. O líder da conferência, Laurent
Fabius, ministro das Relações Exteriores da França, disse que esse plano "ambicioso e equilibrado" foi um "ponto
de virada histórica" na meta de reduzir o aquecimento global. Segundo o Artigo 28 do acordo, as partes podem
começar a enviar notificações para a retirada depositária no mínimo 3 anos após o acordo entrar em vigor, o que
seria em 4 de novembro de 2019. A retirada é eficaz 1 ano após a notificação ao depositário. Em 1º de junho de
2017, o presidente Donald Trump anunciou que os Estados Unidos iriam deixar o acordo.
Algumas normas internacionais setorias em matéria ambiental: i) Convenção para Proteção da Flora,
Fauna e Belezas Cênicas Naturais dos Países da América (1949); ii) Convenção sobre Comércio Internacional das
Espécies da Fauna e Flora Selvagens em Perigo de Extinção – CITES (1975): prevê a expedição de certificados e
licenças que, no Brasil, cabe ao IBAMA. Contém 4 anexos: I - espécies reconhecidamente ameaçadas de extinção
(proibida a comercialização, exceto para pesquisas); II - espécies que poderão estar ameaçadas em breve
(comercialização restrita); III - espécies com proteção especial em pelo menos 1 país signatário; IV - espécies com
grande volume de importação; iii) Convenção sobre Diversidade Biológica (1992) - refere-se à biodiversidade em
três níveis (ecossistemas, espécies e recursos genéticos). Deu início à negociação de um Regime Internacional
sobre Acesso aos Recursos Genéticos e Repartição dos Benefícios resultantes desse acesso; estabeleceu
programas de trabalho temáticos; e levou a diversas iniciativas transversais. Ver https://www.cbd.int/; iv)
Convenção-quadro das Nações Unidas sobre mudança do clima (1992); v) Protocolo de Kyoto à Convenção-
Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (1997); vi) Acordo-quadro sobre complementação
energética regional entre os Estados-partes do Mercosul e Estados associados (2005); vii) Acordo de
Copenhague (2009): objetivava a instituição de novas metas de redução dos gases que causam o efeito estufa,
mas não surtiu os resultados esperados, devido a discordâncias entre os Estados.

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