“Púlpito não é picadeiro! Púlpito não é lugar para palhaços entreterem uma
massa de gente caminhando a passos largos para o inferno. Púlpito é lugar de
macho! De homens com seriedade, hombridade, intrepidez, temor e tremor,
diante de um Deus santo, e de pessoas que precisam ser confrontadas com a
Verdade de Deus. Lamentavelmente, o hodierno púlpito brasileiro tem sido
dominado por muitos charlatães do evangelho, cães gulosos e cafetões gospel.
Procura-se homens da estirpe de João Batista, Paulo, Agostinho, Lutero,
Calvino, Edwards, que não temam a ira dos homens, mas a de Deus; Que
desafiam impérios, reinos, com um evangelho genuíno, ainda que a cabeça
venha rolar. Creio que este exemplar, dileto pregador, o desafiará e lhe
conscientizará do peso da responsabilidade que paira sobre seus ombros no abrir
do Livro santo e, em transmitir os arcanos divinos. É uma leitura forte, séria e
comprometida com a dinâmica da pregação. Se você não está disposto a ser
confrontado, sugiro que você leia outra literatura, menos esta. Avante, homens!
(PH Pereira, membro da Primeira Igreja Presbiteriana de Criciúma - SC.
Formado em Teologia pelo IBITEK; administrador da página "Teólogo
Reformador" (facebook); e dono do canal "Mergulhando nas Escrituras"
(YouTube).)
“Vivemos em um tempo onde a pura pregação da palavra de Deus tornou-se uma
raridade, e os púlpitos estão contaminados com diversas filosofias e
elucubrações da mente humana. É comum ouvirmos mensagens que buscam
massagear o ego do homem e que deturpam os textos bíblicos. Além disso,
muitos púlpitos estão contaminados com a teologia liberal, sendo esta a autora
da mentira que tomou o lugar da verdade em diversas igrejas. A obra que o leitor
tem em mãos é como um grande alerta para os falsos profetas que assumem o
púlpito em diversas congregações. É ainda uma obra de caráter motivador para
que os pregadores fiéis continuem exercendo sua vocação com zelo. O livro não
tem a finalidade de ser uma obra acadêmica, mas simples e objetiva, com uma
linguagem clara, acessível e bíblica. Com diversas referências bíblicas e alusões
aos grandes eruditos e pregadores do passado, a obra cumpre o que propõe:
alertar para o perigo de ser um pregador nas mãos de um Deus irado.”
(Rafael de Castro, Seminarista no Instituto Reformado Santo evangelho,
Graduando em Direito pelo Instituto de Educação Superior de Brasília.)
"Em Pregadores nas mãos de um Deus irado, os autores conseguiram externar
um sentimento de grande necessidade em nossos púlpitos atualmente: "o temor a
Deus diante da exposição da sua Palavra". Além disso, foram também muito
perspicazes em inflamar e fomentar no leitor uma consciência vívida diante da
morbidade que presenciamos em nossos púlpitos da cristandade atual.
Pregadores sem compromisso, sem afeição a Deus e à sua Palavra, estes estão
criando uma geração totalmente irreverente, inerte e fria. Pregadores nas mãos
de um Deus Irado sem dúvidas trará um grande confronto, não só aos iniciantes
deste santo ministério, como também aos que já estão a algum tempo pregando a
Palavra. Creio que todos farão uma avaliação de como tem exercido aquilo que
Deus tem entregado em suas mãos, pois, se não houver uma mudança, estarão
assegurando para si mesmos a fumegante Ira de Deus. Por isso, pregadores,
assumam seu compromisso como Atalaia, e exerça seu ministério visando
unicamente a glória de Deus.”
(Alisson Bruno Teixeira - Pensador cristão, blogueiro, escritor - Presbítero da
Igreja Assembleia de Deus - Nova Serrana, Minas Gerais)
“A cada ano que passa, a sociedade brasileira vem mudando significativamente
em todos os setores, e com essas mudanças vêm as situações positivas e
negativas. No campo da religião, essas mudanças têm contribuído para o
surgimento de muitas igrejas, ministérios, seminários ou escola de treinamento
bíblico. Contribuindo para esse crescimento, podemos destacar a grande
utilização das mídias sociais e dos vários meios de comunicação. Porém, algo
muito preocupante é o fato de muitos buscarem estar na liderança, nos púlpitos,
na ministração da palavra ou do louvor sem nenhuma qualificação ou
treinamento para esses serviços. Quanto a isso, esse livro traz uma proposta de
reflexão, chamando atenção para a grande responsabilidade do pregador ou do
ministro do evangelho, mas principalmente daquele que pastoreia, para
entenderem a seriedade do ofício pastoral, como também a responsabilidade do
estudo sistemático das Escrituras Sagradas. O ponto central do livro é tornar
claro o perigo e as consequências de ensinar a palavra de Deus de forma
superficial ou equivocada, e porque não dizer também, de forma errada,
falsificando e distorcendo o verdadeiro sentido do texto divino. Por fim, os
autores convidam você, meu querido leitor, para uma mudança de atitude. É
apresentado a ti vários personagens que, ao longo da história do cristianismo,
contribuíram para mudanças de paradigmas, tendo como principal objetivo a
verdadeira exposição das Sagradas Escrituras! Que o Deus todo poderoso nos
ajude a influenciar nossa geração!
(Jairo Fernandes Pereira, Lic. em Educação Musical pela UFPB, Bacharelando
em Teologia pelo Seminário Russell Shedd, e Prof. do Seminário CETAD-PB.)
“Caro leitor, eis que tu tens em mãos um excelente livro, sabiamente intitulado
Pregadores nas mãos de um Deus irado, escrito pelo meu amigo pastor Rodrigo
Caeté e pelo Jadson Targino. O conteúdo desse livro é extremamente atual, pois
vemos pessoas irresponsáveis querendo ensinar a Escritura Sagrada de qualquer
maneira. É fato que devemos instruir os homens, porque a Bíblia é para
absolutamente tudo (2Tm. 3:16-17). No entanto, o problema está em como
instruir. Nesse caso, este livro trata desse assunto em sua totalidade. Ele é
recomendável a todos os pregadores atuais, para quem já é pastor, para quem
está fazendo seminário, para quem quer ser um pregador e ainda não o é, e para
quem também não pensa nem em pregar, mas tem interesse em identificar um
bom pregador e diferenciá-lo dos falsos mestre. Esse livro é recomendado a todo
ser que respira! Sabemos que a Mensagem da Cruz tem sido adulterada com o
passar dos anos por alguns pregadores que, sem zelo nenhum, têm procurado
adaptar a Bíblia ao homem moderno, ensinando, assim, um outro evangelho
(Gl.1:8); colocando acréscimos à mensagem do evangelho; colocando adereços
na mensagem da cruz, entre tantas outras bizarrices contemporâneas. O fato é
que é o homem que deve adaptar-se à Escritura e não a Escritura ao homem. E
cabe, finalmente, ao preletor ensinar de forma correta e zelosa, para que o
homem não entenda a Escritura de forma errada e equivocada; cabe a ele
manejar bem a Escritura (2 tm. 2:15) algo mencionado muitas vezes neste livro,
mas pouco praticado em muitos púlpitos. Portanto, eis as razões pelas quais
recomendo 100% a leitura deste livro, para que, por meio dele, o nobre leitor
possa identificar os erros de alguns pregadores de hoje, que pouco ligam para o
arrependendo, continuando, assim, debaixo da ira de Deus (2 Pe. 2:2-3.” Faça
essa leitura para a Glória de Deus (1 Co 10:31), apreciando cada página lida,
pois eu garanto que vai valer muito a pena, como valeu para mim. Boa leitura!
Soli Deo Gloria!”
(David P. Viana - Igreja presbiteriana de vila formosa – Anápolis, GO.)
SUMÁRIO
Agradecimentos
apresentação
Prefácio
Sobre o Livro
Introdução
Um exemplo de um pastor aprovado
Capítulo 1 – O ofício da pregação: a seriedade de expor a Palavra de Deus
1.1. Três marcas de um ministério sério
1.2. Considerações Finais
Capítulo 2 – Expondo todo o Conselho de Deus: O método de Paulo
Capítulo 3 – O Inferno, o Lago de Fogo e os Pregadores
3.1. A dádiva do ministério e suas reais responsabilidades
3.2. O juízo sobre os falsos profetas: Inferno e Lago de Fogo e Enxofre
3.3. Indo direto ao ponto!
Capítulo 4 – Um chamado ao arrependimento: convocação dos pregadores
4.1. “Ó sacerdotes que desprezais o meu nome”
4.2. Convocação ao arrependimento
Capítulo 5: Púlpitos poderosos que levaram o ofício da pregação a sério no
decorrer da história
5.1 Martinho Lutero
5.2 Charles H. Spurgeon
5.3 John Knox
5.4 John Wesley
5.5 João Calvino
5.6 Jonathan Edwards
5.1.1 O Pregador Ideal
Capítulo 6 – Falsos profetas levantados por Deus: de quem é a culpa?
Conclusão
Referências Bibliográficas:
Apêndice – indicação de leitura
Agradecimentos
Agradeço primeiramente ao Deus Trino Todo-poderoso Pai, Filho e
Espirito Santo. A Ele toda glória. E agradeço em especial a minha Igreja local, a
Igreja Presbiteriana de Cruz das Armas, e ao meu pastor, rev. Alcimar Dantas,
que prontamente nos ajudou. Agradeço também aos irmãos da congregação da
Assembleia de Deus Missões na rua Ana Nery, ao pastor Jailson Marinho e o
presbítero Jailson Azevedo por todo auxílio. A minha família, especialmente
meus pais; aos meus irmãos em Cristo Rafael, Efraim, Gustavo, Paulo César
(que fez a magnífica capa desta obra); aos professores Jairo e Bruno César. Não
posso me esquecer também de fazer menção a todos os meus irmãos do
seminário CETAD/PB e aos diretores Ângela Reiner e Eduardo Leandro, os
quais oram e apoiam com muito carinho pelo meu ministério. Que Deus
recompense a todos! O vosso galardão vem dEle. Finalmente, ao meu corajoso
companheiro de escrita, Rodrigo Caeté, a quem passo a bola para seus devidos
agradecimentos.
Obrigado, senhor Targino, amigo fiel e companheiro de tribulação e de
grandes alegrias. Nunca é demais agradecer ao nosso bendito Deus Trindade,
que nos agracia com dons provenientes dEle mesmo, como o da escrita. Quero
expressar aqui minha alegria e gratidão a igreja de Goiânia, que tem me recebido
com muita hospitalidade como seu pastor. A Deus a glória por essa amada igreja;
Quero ainda agradecer aos meus amigos que prontamente ajudaram nessa obra:
PH Pereira, David Viana, Alisson Bruno e pr. Luis Filipe. Muito obrigado pela
contribuição de vocês! Ah, não posso me esquecer de meus familiares, a quem,
apesar de maior distância agora, os amo imensuravelmente: pai, mãe e meus 3
irmãos. E, minha eterna gratidão a minha família, não tão grande, ainda, mas
família, minha família, eu e minha esposa: não és tu melhor do que 10 filhos?
Certamente que sim! Dedico esta obra aos nossos futuros filhos: que eles nunca
se esqueçam que tiveram um pai que não considerou a vida por demais preciosa
para si mesmo, contanto que completasse a sua carreira e o ministério que
recebeu do Senhor Jesus para testemunhar o evangelho da graça de Deus. Vivam
para Cristo, sabendo que temos apenas uma vida, que logo passará, e que apenas
o que é feito para Jesus durará. Amém!
APRESENTAÇÃO
O Senhor Jesus Cristo passou grande parte do seu ministério terreno pregando a
Palavra de Deus. Ele fez o mesmo que os profetas antes dele fizeram, e mandou
que os apóstolos e discípulos depois dele fizessem o mesmo. Isso significa que
Jesus Cristo exerceu o trabalho da pregação com a maior seriedade possível e
que nós devemos seguir o exemplo do Filho de Deus.
Numa época onde muitos pregadores posam de artistas, buscam ser engraçados e
bem quistos pela comunidade evangélica, este excelente livro vem como um
bálsamo para os verdadeiros pregadores do evangelho de Cristo. Em qualquer
que seja a tradição cristã, os legítimos pregadores sempre estão preocupados em
apresentar com fidelidade a Palavra de Deus e em ver isso se perpetuar naqueles
que os sucederão. Por isso digo que este livro é um bálsamo, pois alivia a alma
desses tais.
Porém, este livro também é uma advertência divina. Neste caso, para os que
ainda podem se arrepender dos seus pecados. Especificamente, me refiro àqueles
que não pregam a Bíblia com a devida fidelidade e não levam à sério o ofício da
pregação. Também àqueles que são muito engraçadinhos, mas que não
transmitem graça da parte de Deus. Esses mesmos, que você deve estar se
lembrando agora. Todos nós conhecemos pregadores que buscam ser
engraçados, quando na verdade deveriam buscar ser como Jesus, que recebeu o
seguinte testemunho de sua pregação “Nunca ninguém falou como este homem”
(João 7:46), e que também nunca buscou pregar para agradar quem quer que
fosse, nem mesmo os apóstolos. Quando foi abandonado por milhares de
pessoas, Jesus não ficou triste ou pediu desculpas, mas olhou para os doze e
perguntou: “Vós também quereis retirar-vos?” (João 6:67). Aqueles que buscam
popularidade mais cedo ou mais tarde buscarão fazer um bezerro de ouro para
agradar a plateia, como fez Arão.
Parabenizo a iniciativa e a escrita deste livro que tenho a honra e
responsabilidade de apresentar e publicar. Para mim é uma alegria incrível poder
trabalhar com dois irmãos em Cristo numa grande obra. Eles fizeram um grande
trabalho e estão prestando um serviço imenso ao corpo de Cristo neste país.
Jadson é um brilhante aluno de teologia e logo será um grande teólogo formado,
falo isso em 2019. Quanto ao irmão Rodrigo, que já exerce o ministério pastoral,
ainda não tive o privilégio de conhecer, mas espero que isso não demore muito.
Aliás, este é mais um diferencial nesta obra: foi composta em parceria entre os
autores à distância, o que demonstra que além de escrever um livro maravilhoso,
sabem utilizar as ferramentas da tecnologia para a glória de Deus.
Que Deus utilize este material para a edificação dos que estão no caminho certo
da pregação, para advertir os que andam titubeando no trabalho do Senhor e
esclarecendo que os falsos mestres serão por isso julgados, em breve. E que tudo
isso sirva para a glória de Deus!
Bruno César Santos de Sousa.
Professor de Teologia. Servo de Cristo.
João Pessoa-PB. Setembro de 2019.
“Cuidemos de nós mesmos, para que não perecemos, enquanto clamamos a
outros que cuidem de si, para que não pereçam! Podemos morrer de fome,
enquanto preparamos comida para outros.”
(Richard Baxter – O Pastor Aprovado)
Prefácio
Quem quer ouvir uma pregação bíblica em nossos dias? Numa época em
que as pessoas estão dopadas pela televisão, inebriadas pela internet, distraídas
pelas redes sociais e entretidas pelas séries de tevê, hostis à autoridade, cansadas
de tantas palavras, quando propomos uma pregação bíblica, elas ficam logo
impacientes, inquietas e entediadas. Muitas coisas concorrem com a pregação
hoje. E, por isso, não podemos pressupor que as pessoas queiram nos ouvir;
todavia devemos lutar para conseguir sua atenção, mas somente com a pura
pregação da palavra de Deus centrada em Cristo Jesus apenas, sem ceder às
pressões deste mundo. Não obstante, nada dessas coisas citadas no início
justificam o abandono da Palavra pelo pregador, mesmo que muitos de nós
preguemos a quem não nos queiram ouvir. Assim ocorreu com os profetas, com
os apóstolos e com o próprio Cristo.
Costumo dizer que, se somos fiéis pregadores da Palavra, atendendo ao
imperativo paulino dado ao jovem pregador Timóteo (1Tm 4.1-2), se o auditório
não nos der ouvidos, ele terá que se ver com Deus, ouvindo a declaração de ira
eterna sobre eles. Agora, se os pregadores que têm a oportunidade de transmitir a
Palavra de Deus aos homens por meio da pregação, e usa desse expediente de
um modo infiel, inadvertidamente, tais “pregadores” terão que prestar contas a
Deus. É exatamente isso que os autores, Rodrigo Caeté e Jadson Targino,
pretendem aborda nesta obra. Com base no título do sermão Pecadores nas
Mãos de Um Deus Irado, de Jonathan Edward, famoso pastor congregacional
norte-americano e um dos mais destacados teólogos da Nova Inglaterra no
século XVIII, eles dão o título altamente sugestivo Pregadores nas Mãos de Um
Deus Irado. Digo altamente sugestivo porque hoje muitos pregadores parecem
não acreditar na suficiência da pregação bíblica como o modo poderoso de
proclamação do evangelho e de transformação de vidas. Nosso tempo é de crise
de pregadores e pregações centrados no evangelho de Cristo.
Creio que muitos “evangélicos” desconhecem o evangelho e a missão de
Deus pela igreja, justamente por conta da carência que temos de bons pregadores
e boas pregações. Devido a falta de confiança na Palavra, já não se dão à labuta e
transpiração de estudá-la com profundidade para anunciá-la com fidelidade. Por
esse motivo, são “pregadores nas mãos de um Deus irado”. Da introdução à
conclusão do livro, capítulo a capítulo, os autores deixam bem claro que o
propósito da obra é denunciar a existência histórica de falsos mestres, falsos
pregadores, que não podem produzir outra coisa senão um falso ensino, uma
falsa pregação e, por conseguinte, um falso evangelho. Tais pregadores, dizem os
autores, terão suas pregações julgadas por um Deus santo e justo, naquele
Grande Dia da prestação de contas. Mais para o fim do livro, é dito que o Senhor
sempre dá aos seus eleitos a oportunidade de se arrependerem de seus pecados.
Não é diferente com os pastores mestres e pregadores.
Ministros que, consciente ou inconscientemente, têm sido infiéis na
exposição da Palavra, serão despertados por Deus pela leitura desse livro para o
arrependimento diante do Senhor Justo Juiz que há de nos julgar pelas nossas
obras, sejam elas boas ou más. Os autores concluem de um modo magistral,
elencando nomes da história do cristianismo que se destacaram na pregação fiel
da Palavra. Homens como Martinho Lutero, C.H. Spurgeon, John Knox, John
Wesley e Jonathan Edwards, que, juntos, reuniram as melhores características de
pregações fiéis e eficazes, como a sã doutrina, a vida de oração e, sobretudo, o
senso de estar exercendo o ministério com excelência, como a maior e mais
nobre de todas as tarefas que um homem pode realizar, para a glória de Deus.
Segundo os autores, se seguirmos tais exemplos, não precisaremos nos
preocupar em ter que prestar contas com Deus como “pregadores nas mãos de
um Deus irado”!
Por fim, o que mais surpreenderá o leitor dessa obra é o fato de que é o
próprio Deus quem usa os falsos profetas e falsos mestres para iniciar uma
prévia punição àqueles que não suportam ouvir a boa pregação da Palavra. Os
autores, para reforçar essa doutrina com argumento de autoridade, citam uma
impactante frase do Rev. Paul Washer: “Falsos profetas são o juízo de Deus para
as pessoas que não querem Deus [...]”. Essa frase, segundo a obra, apenas
confirma o que a Bíblia Sagrada ensina sobre a tratativa divina com os ouvintes
infiéis. Depois da leitura de Pregadores Nas Mãos de Um Deus Irado, posso
concluir dizendo que temos duas urgentes necessidades quanto à temática
abordada. Primeira, de pregadores e pregações mais fiéis à Palavra. Segunda, de
bons e ávidos ouvintes de pregações bíblicas e expositivas centradas no
evangelho. Creio ser essas as nossas maiores e mais profundas carências hoje.
Púlpitos mais fortes e crentes mais famintos da genuína Palavra de Deus.
Que Deus nos ajude a ser e ter essas duas grandes necessidades de nossos
dias, sendo supridas em nossas igrejas locais. Parabéns aos autores e uma
excelente jornada de leitura a todos os que adquiriram essa obra.
(Luís Filipe de Azevedo Corrêa, Pastor da Igreja Congregacional de Vila
Paraíso, Bacharel em Teologia e Licenciado em Letras, professor de Teologia
Sistemática e Homilética, com Especialização em Pregação Expositiva.)
Sobre o Livro
Este livro não tem a proposta de ser revolucionário, pois sabemos que
realmente nada há de novo debaixo do sol (Eclesiastes 1:9). Na realidade, a
nossa proposta é apenas relatar aquilo que é por demais antigo: a existência de
falsos profetas e pregadores mal preparados, além das consequências terríveis
para estes, que usam a palavra de forma deliberadamente equivocada ou até
mesmo para enganar de forma propositada. Se passearmos pelo Antigo
Testamento, encontraremos vários deles por lá. Se adentrarmos no Novo, eles
nos saltarão aos olhos. Portanto, a existência de falsos pastores, falsos profetas, e
pregadores inaptos não são maldições apenas de nossa época. Assim como o sol
se põe e renasce, da mesma forma acontece com os enganadores e enganados na
igreja.
Como já mencionado, nossa proposta é trazer à baila uma análise sucinta
e nada revolucionária a respeito daquilo que chamamos de “pregadores nas
mãos de um Deus irado”. Amamos Jonathan Edwards, e nos inspiramos sim no
famoso sermão “pecadores nas mãos de um Deus irado”. Na introdução deste
livro, veremos um pouco do histórico por traz desse sermão, bem como sua
relação com esta obra. Mas por hora, queremos apenas deixar claro que o ponto
de contato com o citado sermão é a existência de um Deus irado que julgará as
obras dos pecadores naquele Grande Dia. Entretanto, a diferença crucial está em
para quem Deus direciona sua face irada. Enquanto Edwards apontava para os
pecadores de maneira geral, nós queremos apontar para os pregadores. Mas não
porque ser pregador é estar debaixo da ira, mas ser um mau pregador sim. Não
mal no sentido de inábil intelectualmente, mas no sentido moral do termo,
quando estes detentores da palavra da verdade a usam para a mentira; para
enganar; para ofender ao Deus da palavra; ou mesmo para benefício próprio e
enriquecimento financeiro. São para essas pessoas que a ira de Deus está sendo
direcionada neste livro.
Nós sabemos da seriedade que é pregar a verdade de que há um cálice de
ira preparado para os ímpios, mas sabemos também que é tão verdade quanto
que sobre os líderes o peso da ira será infinitamente maior, caso este líder seja
um impenitente falso profeta ou desqualificado mestre. É para estes que nós
queremos direcionar a face irada de Deus. É urgente dizer que existem nesse
exato momento pregadores nas mãos de um Deus extremamente irado, e a única
razão que impede que esse lobo em pele de ovelha seja dizimado imediatamente
é a maravilhosa graça preservadora de Deus.
Nós somos pregadores também, e pretendemos escrever este livro como
um alerta misericordioso primeiramente para nós, pois aquele que hoje está de
pé deve sempre ter cuidado, pois o chão é perto demais para qualquer homem, e
a queda é sempre eminente para qualquer descuidado[1]. Na verdade, todo
cuidado é pouco para qualquer ser humano.
Desejamos tornar evidente as características dos falsos profetas e inaptos
pregadores; desejamos fazer uma denúncia grave; desejamos fazer o coração de
cada pregador estremecer ao ler cada palavra deste livro; desejamos, entretanto,
trazer ânimo para os verdadeiros pregadores de Deus, à medida que mostrarmos
que haverá punição para aqueles que desdenham da Palavra do SENHOR. Isso
porque ficamos por demais tristes quando vemos o santo evangelho sendo
difamado pelas bocas de lobos.
Portanto, para nós, e para todos os demais pregadores, as palavras do
apóstolo Paulo são por demais urgentes: “Procura apresentar-te a Deus aprovado,
como obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da
verdade.” (2 Timóteo 2.15) Isso porque não há nada mais terrível para um
homem do que se apresentar diante de Deus como um reprovado. Que o nosso
Santo Deus tenha misericórdia de todos nós. Amém!
Os autores
Introdução
“Talvez seja tolice, mas sou tentado a comparar os puritanos aos Alpes,
Lutero e Calvino ao Himalaia e Jonathan Edwards ao Monte Everest! Para
mim, ele sempre foi o homem mais parecido com o apóstolo Paulo”[2]
(Dr. Martyn Lloyd-Jones)
Quem conhece um pouco da nossa trajetória literária, seja através dos
livros já lançados, ou por meio de postagens em redes sociais, sabe muito bem o
quanto admiramos o ministério profícuo do pastor congregacional Jonathan
Edwards. Todavia, desejamos deixar claro que não o idolatramos e nem
concordamos com toda a sua teologia. Como reformados que somos,
entendemos que ele foi apenas mais um miserável depravado graciosamente
resgatado pelo SENHOR, sem que Edwards O tenha buscado por si só, pois em
seu coração só havia naturalmente ódio por Deus. Em suma, ele foi mais um, e
apenas isso: instrumento nas mãos de um Deus bom! Parafraseando o que certa
vez disse um dos puritanos, somos como uma pena nas mãos do Grande Escritor,
e que valor há na pena? Somos vasos de barro carregando um grande tesouro;
somos como barro nas mãos do Oleiro, cuja perícia é perfeita. Portanto,
inicialmente queremos declarar que absolutamente toda a glória deve ser dada
unicamente a Deus.
Mas esse homem foi grandemente usado por Deus. Amplamente
considerado por muitos como o último representante da teologia e do
pensamento puritano no Novo Mundo[3], e por alguns como o último dos
teólogos Escolásticos Medievais[4]. Edwards é também visto como o primeiro
dos modernos filósofos-teólogos norte-americanos[5]. Além disso, nas próprias
palavras de Steven Lawson,
“Muitos consideram Edwards como o mais eminente pregador
vindo do lugar agora chamado de Estados Unidos. Ele pregou
o sermão que muitos creem ser o mais famoso da América do
Norte: Pecadores nas Mãos de um Deus Irado. Outros
avaliam Edwards como um dos maiores teólogos da América.
Ele é reconhecido como ‘o teólogo do Primeiro Grande
Avivamento’, pois se posicionou exatamente na nascente dos
despertamentos, nas décadas de 1730 e 1740. Também se diz
que Edwards foi ‘o maior [teólogo] em todos os aspectos’, e
um ‘dentre a meia dúzia dos maiores teólogos de todos os
tempos’”[6].
Diante dessa breve exposição e consideração, cremos que não há mais
necessidade de justificar nossa inspiração para esse livro. Todavia, apenas como
meio pedagógico de ‘’linkar’’ os temas, colocaremos abaixo o famoso e
conhecido contexto do referido sermão:
“Quanto ao sermão em questão, segundo Franklin Ferreira,
‘Pecadores nas mãos de um Deus irado (1740), baseado em
Deuteronômio 32.25, é seu sermão mais famoso. Antes desse
sermão, por três dias, Edwards não se alimentara nem
dormira; rogara a Deus sem cessar: “Dá-me a Nova
Inglaterra!”. O povo, ao entrar para o culto, se mostrava
indiferente e mesmo desrespeitoso diante dos cinco
pregadores que estavam presentes. Edwards iria pregar, e, ao
dirigir-se para o púlpito, alguém disse que ele tinha o
semblante de quem fitara, por algum tempo, o rosto de Deus.
Sem quaisquer gestos, encostado num braço sobre o púlpito,
segurava o manuscrito e o lia numa voz calma e penetrante. O
resultado do sermão foi como se Deus arrancasse um véu dos
olhos da multidão para contemplar a realidade e o horror em
que estavam. Em certa altura, um homem correu para frente,
clamando, suplicando por oração, sendo interrompido pelos
gemidos de homens e mulheres; quase todos ficaram de pé ou
prostrados no chão, alguns se agarrando às colunas da igreja,
pensando que o juízo final havia chegado. Durante a noite
inteira ouviu-se na cidade, em quase todas as casas, o clamor
daqueles que, até aquela hora, confiavam em sua própria
justiça.’”[7]
“Algo comum a toda a teologia e piedade de Edwards era uma paixão
pela glória de Deus... Edwards defendeu cuidadosa e logicamente a posição de
que o propósito supremo de Deus é glorificar a si mesmo em todas as suas
obras.”[8]
(James Montgomery Boice)
“Edwards passou a sua vida inteira se preparando para morrer.”[9]
(George Marsden)
A glória de Deus como fim último de todas as coisas e uma vida
absurdamente dedicada a Deus e desmamada dos prazeres deste mundo são o
alicerce para o fato de um homem de Deus viver como se seu coração fosse
parar a qualquer instante, e ainda se alegrar nisso, já que morrer é ganho. Esse é
um exemplo de um pregador que não está nas mãos de um Deus irado, mas nas
mãos de um Deus bondoso. Isso porque a preocupação de se apresentar a Deus
sempre como um homem aprovado era bastante evidente em sua vida, como
pode ser observado conferindo suas famosas 70 resoluções[10].
“Procura apresentar-te a Deus aprovado, como obreiro que não tem de
que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade.” (2 Timóteo 2.15)
Não era à toa que a leitura pessoal repetitiva da Escritura era um método
ordenado por Deus (Deuteronômio 17.19). Era também ordenança do SENHOR
que a Lei de Deus fosse repetida e transmitida de geração em geração para os
filhos dos filhos (Deuteronômio 6; Salmo 145:4). Isso por, no mínimo, duas
razões: para que a geração seguinte não crescesse sem ouvir a respeito do Deus
que os libertou do cativeiro do Egito; e também porque (conjectura destes
autores) os homens têm uma capacidade impressionante de esquecer os
mandamentos de Deus. Não é sem razão, portanto, que a Escritura menciona o
imperativo de guardarmos no coração a Palavra para não pecarmos contra Deus.
É óbvio que o sentido de guardar aqui é mais amplo que simplesmente
memorizar, isto é, sobretudo ter a lei de Deus sempre em vista diante de qualquer
decisão a se tomar. Entretanto, não podemos desprezar a repetição como método
de memorização. Eis porque estamos propositadamente repetindo o texto de 2
Timóteo 2.15 (“Procura apresentar-te a Deus aprovado, como obreiro que não
tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade”), para que o
leitor não apenas memorize esse texto, mas que o mesmo possa ser também o
padrão máximo de pensamento de todo pregador em qualquer decisão que vier a
tomar no seu ministério. Nesse sentido, cada palavra, cada pensamento, cada
sermão, cada aconselhamento, cada disciplina, cada exortação, ou qualquer outra
administração do ministério devem ser feitas com as palavras do Apóstolo Paulo
ecoando fortemente nos ouvidos e no coração: “Procura apresentar-te a Deus
aprovado, como obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a
palavra da verdade” (2 Timóteo 2.15).
O propósito do apóstolo Paulo com este verso é mostrar também qual é o
maior motivo de vergonha que um pregador pode ter. Muitos ficam
envergonhados por coisas banais e não tão importantes: a roupa simples que se
veste, a linguagem coloquial que se usa, a pouca cultura intelectual, etc. É obvio
que um pregador deve sempre buscar o progresso em todas essas áreas, mas o
não progresso não é, em última análise, condição máxima para o sentimento de
vergonha. O que traz mesmo vergonha ao pregador diante de Deus, segundo a
Santa Escritura, é a falta de manejo da palavra da verdade.
Muitos pregadores apresentam excelentes manejos e pomposas oratórias,
mas trazem a palavra da mentira; não trazem o evangelho genuíno, puro,
impactante; o evangelho que fere para depois curar; que rebaixa o homem para
só depois dignifica-lo mediante os méritos de Cristo. O ponto é que de nada
adianta que um pregador não tenha razões banais para se envergonhar perante a
sociedade se no último dia ele for motivo de grande vergonha por ter pregado a
mentira. Mais vale, portanto, um simples pregador, mas que de forma humilde
maneja bem a palavra da verdade que um coaching famoso que corre atrás de
likes, manejando a palavra de forma mercantil e, assim, propagando a mentira e
trazendo para si condenação eterna.
Finalmente, cabe ainda ressaltar a ênfase do apóstolo Paulo no início do
verso: “Procura apresentar-te a Deus aprovado”. A forma de se apresentar a Deus
aprovado já foi falada no parágrafo anterior, bem como a única razão de
vergonha de qualquer pregador. Todavia, essa aprovação não é algo que se
conquista e pronto; não é algo que se ganha de uma vez por todas. A exortação a
todo pregador é “procura”. A ideia é de uma constante busca por ser firme na
palavra da verdade, pois o relaxamento após uma aprovação inicial é uma porta a
posterior reprovação. Todo pregador, portanto, que quiser chegar ao Grande Dia
sendo considerado aprovado por Deus deve viver uma vida de constante procura
e luta por preservar a palavra da verdade.
Um exemplo de um pastor aprovado
Richard C. Halverson nos diz o seguinte na introdução do livro “O pastor
aprovado”, de Richard Baxter:
“Pode ser, porém, que eu não tivesse sabido apreciar
devidamente O Pastor Aprovado quando eu era estudante.
Talvez o tivesse relegado aos domínios da teoria. Talvez esta
seja uma obra só apreciada pelos já iniciados no ministério,
pois é quando a pessoa está envolvida no trabalho pastoral e
começa a perceber a relevância e ou a irrelevância de uma
educação de seminário para a vida real”.[11]
O ponto de Halverson não é apontar a inutilidade dos seminários, pois,
quanto a isso, não é necessário criar grandes argumentos. Basta entender que o
autor quis nos trazer a informação de que a transformação de seminários em
centros de formação de pastores é fruto da má administração ministerial da igreja
local. Isso porque cremos que quem forma pastor é outro pastor, sobretudo da
igreja local, em comunhão com os membros da igreja. Não queremos demonizar
os seminários que foram transformados nesses centros de formação. Eles são um
mal necessário, pois têm suprido a carência da igreja brasileira nesses últimos
tempos. É através deles que muitos dos novos pregadores, inclusive estes que
vos falam, adquirem conhecimento teológico, já que a maioria de seus líderes
locais não tem tempo, paciência ou mesmo conhecimento suficiente para formar
um pastor. Mas, embora tenhamos adjetivado esse mal de necessário, isso não
significa que devemos perpetrar esse mal por justamente ser visto como
necessário. É bom que fique claro que nem tudo que está dando certo é certo. Eis
claramente a situação dos seminários de formação de pastores, que têm
contribuído para o crescimento da igreja brasileira, mas nem por isso devem ser
melhor vistos em detrimento da formação bíblica de um pastor, conforme já
mencionado acima.
Essa crítica anterior deve-se somente aos seminários com fins claros de
formação ministerial. Não somos contra aqueles centros de educação formal que
objetivam a discussão e o aprofundamento teológico, sendo assim direcionado a
todos, tanto a homens quanto a mulheres, visto o objetivo não ser a formação
pastoral. Cremos ser esse um ótimo ambiente para o prosseguimento dos estudos
teológico dos pastores já formados em suas igrejas.
Então, o ponto de Halverson é mostrar a lacuna que há muitas vezes entre
a teoria e a prática. Ler O Pastor Aprovado durante o seminário e não ser
impactado para ter um ministério abençoado só pode ser por duas razões: ou esse
homem não entendeu o que leu, pois na verdade nem sabe o que está fazendo ali;
ou é um falso profeta que adentrou traiçoeiramente em tal seminário, querendo
apenas as credenciais para poder aprontar na igreja. Nesse caso, estamos diante
de falsos profetas mais elegantes, que se dão ao trabalho de perder seu tempo
estudando, pois, a maioria são fajutos mesmos, que abrem qualquer porta de
igreja sem nenhuma formação. O mais triste é que o povo abraça. Veremos mais
a frente que esse abraço nada mais é que a perfeita e bela junção entre os
pecadores nas mãos de um Deus irado e os pregadores nas mãos de um Deus
ainda mais irado.
Em seu livro, Baxter, entre vários conselhos iniciais, traz aquele que para
nós é essencial a todo pastor:
“O primeiro e principal ponto que submeto à sua apreciação é
que constitui um inquestionável dever de todos os ministros
da Igreja catequizar e ensinar pessoalmente todos os que são
entregues aos seus cuidados”.[12]
Talvez você, caro leitor, não tenha prestado a atenção numa palavra
fundamental nessa citação: “pessoalmente”. Isso mesmo. O básico de um pastor
aprovado é ensinar pessoalmente todos os que são entregues aos seus cuidados.
Em épocas ditas pós-modernas, onde a falta de tempo e o pragmatismo
têm imperado mais do que aquilo que é mandamento bíblico, pensar nessa
orientação de Baxter beira ao absurdo. Hoje temos megaigrejas; templos
gigantescos; vivemos no tempo dos 4 cultos por domingo, através de escalas de
membros, pois a igreja tem uns 3 mil deles. Então temos que saber gerenciar
isso, e, para não nos cansarmos, pregar o mesmo sermão 4 vezes por domingo.
Diante dessa estupidez disfarçada de pós-modernismo, onde o pastor deve
repetir 4 ou 5 vezes o mesmo sermão no mesmo dia[13], correndo o risco de
robotizar ou banalizar o sermão, vejamos, numa citação mais longa, como que
Baxter lidava com isso e orientava seus auxiliares nessa questão de cuidado e
ensino pessoal:
“Não me atrevo a prescrever regras e formas para vocês, nem
a animá-los a usar o mesmo catecismo ou as mesmas
exortações que usamos. Mas deixem-me dizer-lhes o que faço
em meu campo de trabalho. Passamos as segundas e terças-
feiras, desde cedo de manhã até ao cair da noite, envolvendo
umas quinze ou dezesseis famílias, toda semana, nesta obra de
catequese. Com dois assistentes, percorremos completamente
a congregação, que tem cerca de oitocentas famílias, e
ensinamos cada família durante o ano. Nem uma só família se
negou a visitar-me a meu pedido. E vejo mais sinais externos
de sucesso com os que vêm do que em toda a minha pregação
pública. O grande número me força a tomar uma família
completa por vez, uma hora cada. O secretário da igreja vai
adiante, com uma semana de antecipação, para organizar os
programas de horário e itinerário. Também guardo anotações
daquilo que cada membro da família aprendeu, para poder
continuar a ensiná-lo sistematicamente. Meus conservos,
vocês puseram a mão no arado de Deus. Foram duplamente
santificados por Ele e estão duplamente dedicados a Ele, como
cristãos e como pastores. Ousariam, então, retroceder e
recusar-se a fazer o Seu trabalho? [...] Mostrarão os seus
rostos a uma igreja cristã reunida, como ministros do
evangelho, e orarão por avivamento, quando vocês mesmos se
negam a usar os meios pelos quais isso pode ser feito? Rogo-
lhes encarecidamente, em nome de Deus e por amor às almas
dos seus rebanhos, que não exerçam o seu ministério
descuidada e superficialmente. Façam-no vigorosamente e
com todas as suas forças. Seja a sua grandiosa e séria
atividade ensinar os fundamentos da fé a todos os membros
das suas igrejas por meio destas instruções ministradas
particularmente. [...] O que mais temo são os ministros que
pregam bem e que são ineptos para a nutrição particular dos
membros das suas igrejas”.[14]
Não, o trabalho de Baxter não era apenas o de pregador de sermões. Isso
é importante, aliás, isso é extremamente importante e também fundamental para
a maturidade da igreja. Todavia, ele enxergou que, mais do que isso, o ministro
aprovado deveria lidar com gente ao descer do púlpito; deveria olhar nos olhos
de cada um e enxergar suas lágrimas ocultas; deveria ser capaz de cuidar de todo
o rebanho de modo pessoal e particular.
Finalmente, Baxter encerra esse ponto, usando o texto de atos 20.28, que
diz: “olhai por vós e por todo o rebanho sobre o qual o Espírito Santo vos
constituiu bispos, para pastoreardes a igreja de Deus, a qual ele comprou com o
seu próprio sangue.” Deste verso, ele enfatiza a parte “olhai – cuidai – de todo o
rebanho...” para asseverar da seguinte forma:
“Vê-se, então, que, se o rebanho deve ser cuidado. Nenhuma
igreja deve ser numericamente maior que a capacidade de
supervisão pessoal dos pastores, para que estes possam olhar
‘por todo o rebanho’”[15]
Antes de falarmos especificamente sobre os falsos profetas, desejamos
encerrar esta parte, orientando os verdadeiros ministros sobre a importância de
“cuidar de todos”. Muitas vezes desejamos ter igrejas grandes com muitos
membros, mas acabamos perdendo de vista a necessidade de um cuidado
especial com cada membro. Muitas são as razões: a) uma prebenda maior; b)
visibilidade; c) status; d) fama; e) etc., mas nenhum homem de Deus pode se
deixar levar por todas essas coisas escusas diante do precioso evangelho. A parte
“b” do verso citado por Baxter, Atos 20.28, deve gerar em cada verdadeiro
pastor um profundo temor – “para pastoreardes a igreja de Deus, a qual ele
comprou com o seu próprio sangue” – pois sabemos qual sangue foi derramado e
que preço foi pago. E se a Igreja é assim tão preciosa para o SENHOR, que
tratemos de reconhecê-la como especial que ela é para cada um de nós, ministros
do evangelho.
Quanto aos falsos profetas, esses que denominamos de “pregadores nas
mãos de um Deus irado”, a parte que lhes cabe é tão eminente quanto um
próximo piscar de olhos. Mal percebemos a piscada; assim será o fim deles:
quando menos perceberem, serão levados para beber o cálice da ira de Deus. A
Escritura é rica de versos que falam a respeito da existência deles, bem como de
suas punições. Eis abaixo um pequeno aperitivo:
“Mas o profeta que ousar falar em meu nome alguma coisa que não lhe
ordenei, ou que falar em nome de outros deuses, terá que ser morto’. “Mas talvez
vocês se perguntem: ‘Como saberemos se uma mensagem não vem do Senhor?’
Se o que o profeta proclamar em nome do Senhor não acontecer nem se cumprir,
essa mensagem não vem do Senhor. Aquele profeta falou com presunção. Não
tenham medo dele.”
(Deuteronômio 18:20-22)
“Cuidado com os falsos profetas. Eles vêm a vocês vestidos de peles de
ovelhas, mas por dentro são lobos devoradores. Vocês os reconhecerão por seus
frutos. Pode alguém colher uvas de um espinheiro ou figos de ervas daninhas?
Semelhantemente, toda árvore boa dá frutos bons, mas a árvore ruim dá frutos
ruins. A árvore boa não pode dar frutos ruins, nem a árvore ruim pode dar frutos
bons. Toda árvore que não produz bons frutos é cortada e lançada ao fogo.
Assim, pelos seus frutos vocês os reconhecerão!”
(Mateus 7:15-20)
“Recomendo, irmãos, que tomem cuidado com aqueles que causam
divisões e põem obstáculos ao ensino que vocês têm recebido. Afastem-se deles.
Pois essas pessoas não estão servindo a Cristo, nosso Senhor, mas a seus
próprios apetites. Mediante palavras suaves e bajulação, enganam o coração dos
ingênuos”.
(Romanos 16:17-18)
“Se alguém ensina falsas doutrinas e não concorda com a sã doutrina de
nosso Senhor Jesus Cristo e com o ensino que é segundo a piedade, é orgulhoso
e nada entende. Esse tal mostra um interesse doentio por controvérsias e
contendas acerca de palavras, que resultam em inveja, brigas, difamações,
suspeitas malignas e atritos constantes entre aqueles que têm a mente
corrompida e que são privados da verdade, os quais pensam que a piedade é
fonte de lucro”.
(1 Timóteo 6:3-5)
“Amados, não creiam em qualquer espírito, mas examinem os espíritos
para ver se eles procedem de Deus, porque muitos falsos profetas têm saído pelo
mundo”.
(1 João 4:1)
“Pois aparecerão falsos cristos e falsos profetas que realizarão sinais e
maravilhas para, se possível, enganar os eleitos. Por isso, fiquem atentos: avisei-
os de tudo antecipadamente”.
(Marcos 13:22-23)
“No passado surgiram falsos profetas no meio do povo, como também
surgirão entre vocês falsos mestres. Estes introduzirão secretamente heresias
destruidoras, chegando a negar o Soberano que os resgatou, trazendo sobre si
mesmos repentina destruição. Muitos seguirão os caminhos vergonhosos desses
homens e, por causa deles, será difamado o caminho da verdade. Em sua cobiça,
tais mestres os explorarão com histórias que inventaram. Há muito tempo a sua
condenação paira sobre eles, e a sua destruição não tarda”.
(2 Pedro 2:1-3)
“Sim, estou contra os que profetizam sonhos falsos”, declara o Senhor.
“Eles os relatam e com as suas mentiras irresponsáveis desviam o meu povo. Eu
não os enviei nem os autorizei; e eles não trazem benefício algum a este povo”,
declara o Senhor”.
(Jeremias 23:32)
“Portanto assim diz o Soberano, o Senhor: Por causa de suas palavras
falsas e de suas visões mentirosas, estou contra vocês. Palavra do Soberano, o
Senhor. Minha mão será contra os profetas que têm visões falsas e proferem
adivinhações mentirosas. Eles não pertencerão ao conselho do meu povo, não
estarão inscritos nos registros da nação de Israel e não entrarão na terra de Israel.
Então vocês saberão que eu sou o Soberano, o Senhor”.
(Ezequiel 13:8-9)
“Assim diz o Senhor: “Aos profetas que fazem o meu povo desviar-se, e
que, quando lhes dão o que mastigar, proclamam paz, mas proclamam guerra
santa contra quem não lhes enche a boca: Por tudo isso a noite virá sobre vocês,
noite sem visões; haverá trevas, sem adivinhações. O sol se porá e o dia se
escurecerá para os profetas. Os videntes envergonhados e os adivinhos
constrangidos, todos cobrirão o rosto porque haverá resposta da parte de Deus”.
(Miquéias 3:5-7)
“Mas a besta foi presa, e com ela o falso profeta que havia realizado os
sinais milagrosos em nome dela, com os quais ele havia enganado os que
receberam a marca da besta e adoraram a imagem dela. Os dois foram lançados
vivos no lago de fogo que arde com enxofre”.
(Apocalipse 19:20)
Os autores
Capítulo 1 – O ofício da pregação: a seriedade de expor a Palavra de Deus
(Por Jadson Targino)
“Mesmo se o proprietário de um bordel prostituísse diariamente virgens,
esposas religiosas, freiras, por mais terrível e abominável que seja tais coisas,
ele não seria pior nem causaria mais dano que esses pregadores que pregam um
evangelho falso e qualquer outro que ouse manipular a Palavra de Deus"[16]
(Martinho Lutero)
O povo protestante sempre foi conhecido como o povo da Bíblia
Sagrada. Temos as Santas Escrituras como nossa Regra e Autoridade suprema
em matéria de fé e prática. Como povo centrado na Bíblia que somos, temos de
honrar esse título. Temos também que, nas palavras do teólogo anglicano
Graeme Goldsworthy,
“ser diligentes em desenvolver nosso entendimento da
mensagem da Bíblia e de seus efeitos na maneira como
percebemos o mundo e procuramos viver nele como povo de
Deus. (...) Como pregadores evangélicos, precisaremos
trabalhar muito para garantir que a natureza de nossa
pregação seja verdadeiramente bíblica”[17].
A pregação e ensino das Sagradas Escrituras foram os fatores que nos
fizeram conhecidos dessa forma. Esse é o meio principal pelo qual
reconhecemos a magnificência e majestade da Palavra escrita de Deus:
anunciando-a para exortação, consolo, repreensão e edificação.
Eis então a seriedade do ofício santo da pregação: nos púlpitos não nos
dedicamos a expor as elucubrações de homens falíveis, errôneos e incertos, mas
sim a Palavra de um Deus perfeitíssimo, santo e absoluto. Isso significa que não
podemos de forma alguma expor as Santas Escrituras de maneira leviana. E, a
fim de evitar essa profanação, o pregador deve ser vocacionado, bem preparado
e ter uma intensa vida de oração.
A verdade de que a ministração da Palavra é algo seríssimo não se chega
apenas por dedução lógica da informação de que ela é a Palavra de um Deus
terrivelmente glorioso. Essa é também uma verdade explícita no ensino do Novo
Testamento. Paulo escreveu que um ministro deve ser “poderoso, tanto para
admoestar com a sã doutrina, como para convencer os contradizentes” (Tito 1:9),
“apto para ensinar” (1 Tm 3:2), “idôneo para ensinar” (cf. 2 Tm 2:2), “obreiro
que maneja bem a palavra da verdade” (cf. 2 Tm 2:15).
No seu comentário em Tito capítulo 2, o exegeta da Reforma, João Calvino
escreve:
“[A capacidade de reter com firmeza a Palavra de Deus] é o
principal dom do bispo que é eleito especificamente para o
magistério sagrado, porquanto a Igreja não pode ser
governada senão pela Palavra. (...) [O desejo do apóstolo
Paulo] é que o bispo a mantenha firme, de modo que não seja
só bem instruído nela, mas inabalável em transmiti-la. (...) Em
suma, não se requer de um pastor apenas cultura, mas também
inabalável fidelidade pela sã doutrina, a ponto de jamais
apartar-se dela”[18].
Como a Igreja de Deus só pode ser governada pelo seu Cetro, que é a Sua
Palavra (1 Tm 3:14-15; 2 Tm 3:15-17), no momento em que falsos mestres e
pregadores mal preparados assumem o púlpito há uma inevitável rebelião contra
o Domínio do Senhor sobre o seu povo. Essa rebelião consiste no fato de que os
membros da Igreja não mais terão suas condutas regidas pela vontade revelada
de Deus, mas sim pelas invenções pecaminosas dos homens. É por isso que o
preparo e aptidão para ensinar são tão importantes para o ministério.
Deus estabeleceu um nítido padrão pelo qual devemos medir sem exceção
todos os que ministram ou querem ministrar a Palavra na reunião de uma
congregação. Não devemos nos contentar com qualquer outro nível a não ser o
exigido por Deus. É ilícito nos contentar e aceitar aquilo que Deus claramente
aborrece e desaprova.
A pregação da Palavra foi o meio estabelecido por Deus para alcançar os
pecadores e resgatá-los em todo o mundo. A fé vem pelo ouvir a Palavra de Deus
(Rm 10:17). A fim de que os seus possam ser alcançados, Jesus comissionou
pregadores para ensinar às nações (Mt 28:19-20), ensinando cada um dos que
forem discipulados a guardar todos os mandamentos de Cristo. Como
comissionados por Deus, os pregadores são “embaixadores de Cristo” – Deus
“nos confiou a mensagem” – quando os pregadores ministram, é “como se o
próprio Deus fizesse o apelo por meio” deles (2 Co 5:18-20). São mordomos, tão
somente despenseiros dos “mistérios de Deus” (1 Co 4:1-2).
Um bom mensageiro é aquele que transmite a mensagem daquele que o
enviou com o máximo de fidedignidade possível: sem tirar e sem acrescentar. O
papel do pregador, como mensageiro do Rei Supremo do universo, o Deus
Triúno, consiste nisso: tão somente levar a Sua Palavra às pessoas assim como
ela foi entregue a nós, na Escritura, fielmente. Não devemos misturar a pregação
com acréscimos ou reter qualquer uma das doutrinas que lá estão para serem
proclamadas (Dt 4:2, Ap 22:18-19). Nosso trabalho é expor.
A pregação da Palavra pode assumir várias formas: expositiva, temática
ou textual. A palavra pode ser aplicada de diversas maneiras, além da pregação:
disciplina eclesiástica, louvor, oração etc. A questão é garantir que todas essas
atividades onde a Palavra é utilizada sejam verdadeiramente bíblicas. A “Palavra
de Cristo” deve “habitar ricamente em nós” (cf. Cl 3:16). E quando se fala
especificamente de pregação, o emblema que testifica da seriedade no exercício
do ofício é o esforço em todas as áreas (preparação, oração, etc.) para assegurar
que as doutrinas contidas na Sagrada Escritura sejam tornadas realmente claras a
todos que as ouvem do púlpito.
A passagem de Filipe e do Eunuco é muito bem utilizada em diversos
livros para explicar como se deve fazer uma boa evangelização. Porém, também
podemos fazer outra aplicação daquele contexto ao papel do pregador. Assim
narra Lucas em Atos dos Apóstolos:
“E o anjo falou a Filipe, dizendo: Levanta-te, e vai para o lado
do sul, ao caminho que desce de Jerusalém para Gaza, que
está deserta. E levantou-se, e foi; e eis que um homem etíope,
eunuco, mordomo-mor de Candace, rainha dos etíopes, o qual
era superintendente de todos os seus tesouros, e tinha ido a
Jerusalém para adoração, regressava e, assentado no seu
carro, lia o profeta Isaías. E disse o Espírito a Filipe: Chega-
te, e ajunta-te a esse carro. E, correndo Filipe, ouviu que lia o
profeta Isaías, e disse: Entendes tu o que lês? E ele disse:
Como poderei entender, se alguém não me ensinar? E
rogou a Filipe que subisse e com ele se assentasse. E o lugar
da Escritura que lia era este: Foi levado como a ovelha para o
matadouro; e, como está mudo o cordeiro diante do que o
tosquia, assim não abriu a sua boca. Na sua humilhação foi
tirado o seu julgamento; E quem contará a sua geração?
Porque a sua vida é tirada da terra. E, respondendo o eunuco
a Filipe, disse: Rogo-te, de quem diz isto o profeta? De si
mesmo, ou de algum outro? Então Filipe, abrindo a sua
boca, e começando nesta Escritura, lhe anunciou a Jesus”
(At 8:26-35).
Ernest H. Trenchard comenta o que segue a respeito dessa passagem:
“O significado do texto bíblico nem sempre é auto-evidente,
nem mesmo para o que busca sinceramente, e Deus prepara
aqueles que, eles mesmos tendo sido ensinados, são capazes
de guiar outros (...) Podemos estar certos de que Filipe
incluiu Is 53.4-6 quando pregou as boas novas de Jesus com
base nesse texto. A ministração dessa lição pode ter durado
horas, visto que a carruagem avançava lentamente, e trouxe
completa convicção ao coração dessa autoridade (...). Jesus
Cristo era o Messias, o Cordeiro de Deus, o que carregou todo
o pecado!”[19].
Reparem: não bastou que o Eunuco simplesmente tivesse acesso a
Escritura. Ele necessitava do auxílio elucidativo de um dos homens que recebeu
o dom para ministrar a Palavra (cf. Ef 4:11) para que os Santos Escritos ficassem
claros em sua compreensão. Esse homem no caso foi Filipe, que, ocupando
cargo no magistério sagrado como evangelista, cumpriu excelentemente o seu
papel, ao ponto que o Eunuco se converteu e foi batizado (At 8:36-40).
No Antigo Testamento, os sacerdotes também se dedicavam a exposição
dos escritos de Moisés - a Palavra de Deus - ao povo. Como relatam as
escrituras:
“Todo o povo se ajuntou como um só homem, na praça, diante
da porta das águas; e disseram a Esdras, o escriba, que
trouxesse o livro da lei de Moisés, que o SENHOR tinha
ordenado a Israel. E Esdras, o sacerdote, trouxe a lei perante
a congregação (...) e os ouvidos de todo o povo estavam
atentos ao livro da lei. (...) E Esdras abriu o livro perante à
vista de todo o povo; porque estava acima de todo o povo; e,
abrindo-o ele, todo o povo se pôs em pé. Os levitas
ensinavam o povo na lei; e o povo estava no seu lugar. E
leram no livro, na lei de Deus; e declarando, e explicando o
sentido, faziam que, lendo, se entendesse” (Nm 8:1-8).
Talvez a palavra seriedade seja insuficiente para descrever o
comportamento da congregação israelita para receber o Ensino da Lei de Deus.
Todo o povo tinha temor e reverência na hora da exposição da Palavra, ouvindo
atentamente e se pondo de pé. Os homens escolhidos e vocacionados por Deus
(os levitas) declaravam (expunham) a lei (a Palavra), explicando o sentido,
fazendo com que aquilo que era lido fosse compreendido. O resultado do
exercício correto do ofício da pregação? “Todo o povo chorava, ouvindo as
palavras da lei” (Nm 8:9).
Deus se agrada em abençoar com conversões a Igreja que tem pregadores
que levam a sério o ofício da pregação. A Bíblia diz que na Igreja apostólica
todos os dias “acrescentavam-se o número dos que iam sendo salvos” (cf. At
2:40-42). Cada um dos ministros planta e rega, mas é Deus quem dá o
crescimento (1 Co 3:7), abrindo o coração dos pecadores para que recebam de
bom grado a Palavra (At 16:14). Contudo, isso não significa que todo pregador
sério e fiel terá um número notável de conversões acompanhando o seu
ministério.
O Evangelho é o poder de Deus para a salvação dos que creem (Rm 1:16).
Isto, porém, não anula o fato de que é também uma sentença de morte para
aqueles que não recebem a mensagem (2 Co 2:16). A Palavra de Deus
proclamada jamais volta vazia e opera sempre o que apraz ao desígnio divino (Is
55:11). O ministério de converter é atribuição exclusiva do Espírito Santo (Jo
16:8). Portanto, o pregador fidedigno deve descansar no Senhor, sabendo que o
seu papel, como já foi dito, é tão somente pregar a Palavra, seja ela para salvação
ou para condenação dos ouvintes.
A ordem do Apóstolo Paulo a Timóteo continua atual e aplica-se a cada um
dos ministros da Igreja de Deus: “prega a Palavra, insiste em tempo e fora de
tempo!” (1 Tm 4:2). Paulo também ordena: “Manda estas coisas e ensina-as. (...)
Persiste em ler, exortar e ensinar (...) Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina.
Persevera nestas coisas; porque, fazendo isto, te salvarás, tanto a ti mesmo como
aos que te ouvem” (1 Tm 4:11, 13, 16).
Sobre isso, o comentário bíblico Beacon (CBB) afirma:
“A palavra grega traduzida por manda tem “conotação militar”
e o jovem pastor deve tê-la ouvido com força resoluta. (...)
está nitidamente subentendido que é tarefa dos ministros
cristãos pregar e ensinar com autoridade devidamente
reconhecida. (...) Trata-se de autoridade espiritual que se
origina de um andar diário em comunhão íntima com Cristo e
um ministério de pregação e ensino que traga as marcas
evidentes da unção do Espírito Santo”[20].
Podemos caracterizar um ministério sério de pregação da Palavra em três
marcas: vocação, preparação e oração. Discorreremos adiante sobre estas
marcas.
1.1. Três marcas de um ministério sério
Vocação
O ministério da palavra só pode ser exercido por aqueles que “têm dons
suficientes, e são devidamente aprovados e chamados para o ministério”[21].
Conforme a Sagrada Escritura, no tocante ao santo ofício, “ninguém toma para si
esta honra, senão o que é chamado por Deus” (Hb 5:4). É nos homens
vocacionados verdadeiramente que o povo de Deus deve buscar a lei. Sem
vocação, um ministério não pode ter real eficácia espiritual para edificação:
“Porque os lábios do sacerdote devem guardar o conhecimento, e da sua boca
devem os homens buscar a lei porque ele é o mensageiro do Senhor dos
Exércitos” (Ml 2:7). Não são todos os homens chamados a esse ministério (1
Co 12:28-29).
O Apóstolo Paulo escreveu: “Mas, quando aprouve a Deus, que desde o
ventre de minha mãe me separou, e me chamou pela sua graça, revelar seu Filho
em mim, para que o pregasse entre os gentios” (Gl 1:15,16). Deus é quem
separa para a pregação da Palavra.
Ao comentar gálatas 1:1, Calvino escreveu:
“Lembremo-nos sempre de que na Igreja devemos nos atentar
tão somente para Deus e para Jesus Cristo, a quem ele
designou para ser nosso mestre. Portanto, quem quer que
deseje ser um mestre deve falar no nome de Deus ou de
Cristo”[22].
E mais tarde, sobre o chamado para ministrar do Apóstolo Paulo ele
também afirma:
“O primeiro fato – de que ele não fora chamado da parte de
homens - ele tinha em comum com todos os ministros de
Cristo. Como nenhum homem tomaria tal honra [de conceder
cargo de ensino na Igreja de Cristo] para si mesmo, tampouco
está no poder dos homens concedê-la a quem porventura
queiram. A Deus pertence com exclusividade o governo de
sua Igreja. Portanto, a vocação não pode ser legítima a não ser
que proceda dele”[23].
Aqueles que são verdadeiramente vocacionados por Cristo serão
reconhecidos como capacitados e ordenados devidamente por seu Corpo, que é a
Igreja (At 6:1-6; 14:23, 1 Tm 4:14). A esse ensino bíblico resume
excelentemente bem a Confissão de Fé Batista londrina de 1689:
“O modo designado por Cristo para o chamamento de uma
pessoa capacitada e dotada pelo Espírito Santo, ao ofício de
bispo ou ancião da igreja, é a escolha pelo consenso da igreja.
Os bispos serão consagrados solenemente, com jejum, oração,
e a imposição de mãos pelos anciãos da igreja (caso exista
algum). Os diáconos serão escolhidos por igual eleição e
consagrados por oração e imposição de mãos”[24] (Capítulo
XXVI, parágrafo 9).
O princípio aqui é que quando alguém é genuinamente chamado, a Igreja
em consenso reconhecerá isso. Uma vocação verdadeira vem de Deus e Deus
testifica por meio do seu Espírito a Igreja.
Preparação
Como os ministros devem ser aptos e idôneos para ensinar, faz parte da
formação de um bom ministro ser versado em Teologia. Não falo aqui do
conhecimento de teólogos. Falo do conhecimento direto da fonte: a Sagrada
Escritura. Até mesmo os apóstolos mais iletrados, como judeus que eram,
conheciam de “cabo a rabo” os Santos Escritos do Antigo Testamento: Moisés, a
lei e os profetas. Paulo era aluno de Gamaliel, o mais célebre rabino de sua
época. Não é possível querer posição de docência para lecionar acerca da
Palavra sem saber manuseá-la, o que inclui a capacidade de memorizar, explicar
e aplicar a Bíblia. Isso só se consegue folheando-a para estudá-la com diligência
e dedicação. É claro que, depois da leitura direta da Bíblia, ler bons livros
escritos por outros teólogos é muito importante também no acúmulo de
conhecimento necessário para o bom manuseio da Palavra.
Expondo 2 Tm 2:15, Matthew Henry diz:
“Os ministros precisam ser obreiros. Eles têm trabalho para
realizar e precisam se esforçar nele. Os obreiros que são
inexperientes, infiéis ou preguiçosos devem se envergonhar
(...) E qual é o seu trabalho? Eles devem manejar bem a
palavra da verdade. Eles não devem inventar um novo
evangelho, mas manejar bem o evangelho que é confiado ao
seu depósito. (...) Observe aqui: (1) A Palavra que os ministros
pregam é a Palavra da verdade, porque o autor dela é o Deus
da verdade. (2) Necessita-se de muita sabedoria, estudo e
cuidado para manejar bem essa palavra da verdade.
Timóteo devia estudar para que pudesse fazer isso bem”.[25]
Oração
A oração é essencial para uma pregação que traz vida a congregação. O
pregador sério é, portanto, um pregador que tem uma vida sólida de
devoção.
“E é por Cristo que temos tal confiança em Deus; Não
que sejamos capazes, por nós, de pensar alguma coisa,
como de nós mesmos; mas a nossa capacidade vem de
Deus, O qual nos fez também capazes de ser ministros de
um novo testamento, não da letra, mas do Espírito;
porque a letra mata e o Espírito vivifica” (2 Co 3:4-6).
É o Senhor que nos torna capazes, em especial na Nova Aliança, de
sermos ministros - não da letra que traz morte - mas da Palavra acompanhada da
ação que vivifica do Espírito. No contexto original, Paulo rebate aqui, na
segunda carta aos coríntios, o estilo de vida dos judeus da época pós-pentecostes
que insistiam em viver pela letra da Lei entregue no Antigo Testamento
conquanto rejeitassem ser habitados pelo Espírito Santo, resultando num
legalismo morto (como se via, por exemplo, na vida dos escribas, fariseus e
mestres da lei da época). Aplicando aos dias atuais, existem pregadores que
ministram a lei, isto é, a boa letra da sã doutrina sem se preocuparem em
dependerem do poder e da habitação do Espírito para o seu ministério[26]. Letra
que mata se refere aqui a essa pregação que “pode estar em boa forma e bem
ordenada, mas ainda é a letra, letra árida e áspera, concha vazia”[27].
Ou seja, é a pregação sem a ação revitalizadora do Espírito. E.M. Bounds
continua:
“A pregação da letra tem a verdade. Mas, até mesmo a
verdade divina não carrega sozinha a energia doadora de
vida; precisa ser energizada pelo Espírito, com todas as
forças de Deus a dar-lhe suporte. A verdade que não foi
vivificada pelo Espírito de Deus mortifica tanto
quanto o erro, ou ainda mais. Pode ser uma verdade
sem outras adições; mas, sem o Espírito, a sua sombra e
toque são mortais; é o erro da verdade, é a luz das trevas.
A pregação na letra não tem unção, não é suavizada
nem azeitada pelo Espírito”[28].
A pregação que mata é a preleção desacompanhada da oração. Um
ministério eficaz é um ministério dependente da capacitação divina. Sem oração,
o pregador acredita ser independente de Deus, soberbo, crê que por suas próprias
forças pode produzir edificação nos ouvintes. Deus resiste aos soberbos (cf. Tg
4:6). Portanto,
“O pregador que é débil na oração, é débil em forças
vivificantes. O pregador que se afastou da oração
como elemento conspícuo e predominante do seu
próprio caráter despojou sua pregação do
característico poder vivificador”[29].
Quando nos preocupamos mais com a preparação intelectual do que com o
fortalecimento espiritual é isso que acontece: ortodoxia morta. Isso é
completamente indesejável para o pregador, visto que o alvo mais proeminente
do sacro ofício da pregação é a salvação das almas. Por isto, pregadores,
oremos! “Orai sem cessar” (1 Ts 5:17). Estejamos “orando em todo o tempo” (Ef
6:18). Sejamos como Paulo, que tendo ministrado o evangelho aos efésios,
depois orava por aqueles que haviam sido alvos de sua ministração. Como está
escrito:
“Não cesso de dar graças a Deus por vós,
lembrando-me de vós nas minhas orações: Para
que o Deus de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai da
glória, vos dê em seu conhecimento o espírito de
sabedoria e de revelação; Tendo iluminados os olhos
do vosso entendimento, para que saibais qual seja a
esperança da sua vocação, e quais as riquezas da
glória da sua herança nos santos” (Ef 1:16-18).
Da mesma forma, devem os ministros orarem por suas Igrejas locais,
rogando a iluminação do entendimento dos seus ouvintes; pedindo que o Pai os
conceda “espírito de sabedoria e revelação”, para que eles compreendam as
riquezas as quais obtiveram como herança por causa da Palavra de Deus.
Concluindo, Bounds exorta-nos:
“Não deveríamos abandonar para sempre a pregação
execrável que mata e a oração que mata para
começar a fazer o que é legítimo, a coisa mais
poderosa – oração em espírito de oração, pregação
que gera vida, fazendo que a força mais poderosa se
ancore no céu e na terra, que retira de Deus, tesouro
inexaurível e aberto em favor das necessidades
penúrias do homem?”[30].
1.2. Considerações Finais
Diferente do que ensinam muitos falsos evangelhos pregados por aí, Deus
é amor, mas também é “fogo consumidor” (Hb 12:29). Deus está irado
infinitamente contra o pecado, contra os pecadores que insistem em continuar se
rebelando (Sl 5:4-5, Is 61:8, Jo 3:36) e não tolerará para sempre aqueles que não
levam em conta a seriedade do ofício da pregação – sejam por serem falsos
profetas ou pregadores mal preparados. Existe um padrão (conforme já foi
exposto anteriormente) estabelecido pelo SENHOR e ele exigirá prestação de
contas de cada um dos homens por suas obras em relação à responsabilidade
dada a cada um deles por ocasião de sua posição. Ao que muito foi dado, muito
será cobrado! (Lc 12:48).
Que possamos ser pregadores conforme o que a Lei de Deus estabelece a
nós, a saber:
“Aqueles que são chamados a trabalhar no ministério
da Palavra devem pregar a sã doutrina,
diligentemente, em tempo e fora de tempo,
claramente, não em palavras persuasivas de humana
sabedoria, mas em demonstração do Espírito e de
poder; fielmente, tornando conhecido todo o
conselho de Deus; sabiamente, adaptando-se às
necessidades e às capacidades dos ouvintes;
zelosamente, com amor fervoroso para com Deus e
para com as almas de seu povo; sinceramente, tendo
por alvo a glória de Deus e procurando converter,
edificar e salvar as almas”[31].
Sejamos zelosos! Lembrando que “o que desvia os ouvidos da Lei, até a
sua oração será abominável” (Pv 28:9).
Capítulo 2 – Expondo todo o Conselho de Deus: O método de Paulo
(Por Jadson Targino)
“Este volume [a Bíblia] é o escrito do Deus vivo; cada letra inscrita com
dedo do Todo-Poderoso, cada palavra, provinda de lábios eternos, cada
sentença ditada pelo Espírito Santo. (...) em toda parte, ouço a voz de Deus que
fala. É voz de Deus, não de homens. São palavras de Deus as palavras, palavras
do Eterno, Invisível, Todo Poderoso Jeová desta terra”[32]
(Charles Haddon Spurgeon)
Nem mesmo um til que consta na Palavra de Deus foi colocado em vão.
Tudo que nela consta foi colocado ali com um propósito. O propósito de TODA
a Escritura (e não só partes dela) é ser “útil para fazer o homem de Deus perfeito
e preparado para toda boa obra” (2 Tm 3:16-17).
Sendo assim, por que muitos pregadores não se preocupam em pregar
TODA a Escritura como Palavra de Deus relevante HOJE para todos os
homens? Como triste exemplo, um ex-ministro presbiteriano que apostatou da fé
declarou em rede nacional que “a Bíblia diz sobre a própria Bíblia que parte
dela caducou (...) toda a lei de Moisés caducou. A mensagem do apóstolo
Paulo fala da caducidade, da caduquice, da senilidade das leis passadas diante da
revelação de consciência nova que chegou em Jesus e que relativizou todos os
manuais e receitinhas primitivos; ‘sentencinhas’ tolas do tempo que a
consciência humana estava reduzida a fragmentos de percepção”[33]. Além de
chamar as leis santas entregues a Israel por intermédio de Moisés, leis estas de
um Deus Santo e Absoluto, de “sentencinhas tolas” e “manuais primitivos”,
como se não bastasse, o falso profeta também afirmou que “há partes do Novo
Testamento que caducaram”[34]!
Muitos pregadores não seguem o terrível exemplo do blasfemo liberal
mencionado anteriormente, o qual está debaixo da ira de Deus[35]. Eles não
dizem com sua boca que partes da Bíblia foram relativizadas ou caducaram.
Porém, mesmo sem declarar com seus lábios, sua prática pastoral e de ensino
desleixada ou aproveitadora deixa claro que em seu coração eles não consideram
ensinar TODA a Escritura, algo importante para o povo de Deus. Afinal, se eles
considerassem, eles realmente se esforçariam em ministrar toda ela.
Pregam trezentos sermões sobre as vidas dos heróis da fé, mas nunca
sequer pregaram um sermão sobre a justificação pela fé em Romanos. Ministram
dezenas de reflexões sobre problemas psicológicos: depressão, traumas, stress
etc., contudo nunca conseguiram expor as doutrinas da regeneração,
santificação, glorificação. Até, de vez em quando, abrem os capítulos dos
Evangelhos para ler na congregação (um milagre!), mas quando o fazem, é para
focar nas bênçãos concedidas por Jesus em resposta a fé das pessoas, sem focar
no significado maior de todos esses sinais e prodígios na Escritura. Alguns deles
– geralmente mais instruídos - sabem falar dez mil palavras sobre graça, mas não
conseguem falar sequer dez sobre a Lei Santa de Deus, usando a justificativa de
que fazer isso é uma atitude “legalista”.
São esses pregadores que ANUNCIAM todo o conselho de Deus? Não!
De forma alguma. Esse não foi o exemplo deixado pelo Apóstolo Paulo. O
evangelista Lucas testifica acerca do ministério de Paulo:
“E de Mileto mandou a Éfeso, a chamar os anciãos da igreja.
E, logo que chegaram junto dele, disse-lhes: Vós bem sabeis,
desde o primeiro dia em que entrei na Ásia, como em todo
esse tempo me portei no meio de vós, Servindo ao Senhor
com toda a humildade, e com muitas lágrimas e tentações, que
pelas ciladas dos judeus me sobrevieram; Como nada, que
útil seja, deixei de vos anunciar, e ensinar publicamente e
pelas casas, Testificando, tanto aos judeus como aos
gregos, a conversão a Deus, e a fé em nosso Senhor Jesus
Cristo. E agora, eis que, ligado eu pelo espírito, vou para
Jerusalém, não sabendo o que lá me há de acontecer, Senão o
que o Espírito Santo de cidade em cidade me revela, dizendo
que me esperam prisões e tribulações. Mas de nada faço
questão, nem tenho a minha vida por preciosa, contanto que
cumpra com alegria a minha carreira, e o ministério que
recebi do Senhor Jesus, para dar testemunho do evangelho da
graça de Deus. E agora, na verdade, sei que todos vós, por
quem passei pregando o reino de Deus, não vereis mais o meu
rosto. Portanto, no dia de hoje, vos protesto que estou
limpo do sangue de todos. Porque nunca deixei de vos
anunciar todo o conselho de Deus. Olhai, pois, por vós, e por
todo o rebanho sobre que o Espírito Santo vos constituiu
bispos, para apascentardes a igreja de Deus, que ele resgatou
com seu próprio sangue. Porque eu sei isto que, depois da
minha partida, entrarão no meio de vós lobos cruéis, que não
pouparão ao rebanho; E que de entre vós mesmos se
levantarão homens que falarão coisas perversas, para atraírem
os discípulos após si. Portanto, vigiai, lembrando-vos de
que durante três anos, não cessei, noite e dia, de admoestar
com lágrimas a cada um de vós. Agora, pois, irmãos,
encomendo-vos a Deus e à palavra da sua graça; a ele que é
poderoso para vos edificar e dar herança entre todos os
santificados. De ninguém cobicei a prata, nem o ouro, nem o
vestuário. Sim, vós mesmos sabeis que para o que me era
necessário a mim, e aos que estão comigo, estas mãos me
serviram. Tenho-vos mostrado em tudo que, trabalhando
assim, é necessário auxiliar os enfermos, e recordar as
palavras do Senhor Jesus, que disse: Mais bem-aventurada
coisa é dar do que receber. E, havendo dito isto, pôs-se de
joelhos, e orou com todos eles” (Atos 20:17-36).
O comentarista bíblico William MacDonald explica que Paulo não ter
deixado de “anunciar todo o conselho de Deus” (vers. 27) tem o sentido de que
“[O apóstolo] os instruíra não apenas quanto à base do
evangelho, mas também com respeito a todas as verdades
essenciais para uma vida agradável a Deus”[36].
Ademais, ressalta que “Paulo não reteve dos efésios nada que pudesse ser
espiritualmente proveitoso”.[37] Esse sim é um ministério exemplar que deve ser
imitado[38] por todos os pregadores que pisam sobre esta terra: o trabalho ilibado
de um ministro que não ocultou nenhuma das doutrinas bíblicas a seus ouvintes
– em suma, ele expôs tudo. Nada deixou de anunciar, ainda que fosse ofensivo
aos ouvintes ou os confrontasse.
Exatamente por Paulo ter anunciado todo o Conselho de Deus àquele
povo, ele não poderia ser culpabilizado pelo sangue daquelas vidas. Cada um
deles era ciente das bases do evangelho e das doutrinas fundamentais para ter
uma vida correta diante do Senhor. Sabiam exatamente aquilo que Deus exigia
deles e no que se deve crer para ser salvo. Deus, como justo juiz e irado contra o
pecado que é, fará cada um de nós prestarmos conta de nossas obras nesta vida
(Ap 20:10-15). Paulo não poderia ser responsabilizado por deixar de alertar
aquelas vidas no grande dia do Juízo. Ele cumpriu a missão. No que se refere ao
versículo 26 – ‘protesto que estou limpo do sangue de todos vós’, O dr. Craig
Keener elucida:
“A imagem da culpa indireta pelo sangue de uma
pessoa é comum no Antigo Testamento (p. ex. Dt
21:1-9), mas Paulo, aqui, se refere especialmente ao
sentinela que não adverte os ímpios a que se
arrependam”[39].
O ministério profético é comparado ao trabalho de uma sentinela. Uma
sentinela era responsável por alertar a população em períodos de guerra, acerca
de qualquer perigo vindouro (um ataque inimigo, por exemplo), possibilitando a
cidade proteger-se corretamente. Os profetas eram responsáveis por declarar a
Vontade de Deus ao povo. Nesse sentido, Paulo e todo pregador também têm um
ministério profético: devemos expor o desígnio de Deus (que agora se encontra
completo e suficientemente registrado nas Sagradas Escrituras) aos homens. A
diferença é que um pregador expõe a vontade já revelada; o profeta não. O
profeta era um meio pelo qual Deus revelava a sua Vontade.
“Se eu disser ao ímpio: Oh ímpio, certamente morrerás; e tu
não falares, para dissuadir ao ímpio do seu caminho, morrerá
esse ímpio na sua iniqüidade, porém o seu sangue eu o
requererei da tua mão. Mas, se advertires o ímpio do seu
caminho, para que dele se converta, e ele não se converter do
seu caminho, ele morrerá na sua iniqüidade; mas tu livraste a
tua alma” (Ez 3:18-19, 33:8-9).
“Também, quando um justo se desviar de sua justiça e fizer o
mal, e eu puser uma pedra de tropeço diante dele, ele morrerá.
Uma vez que você não o advertiu ele morrerá pelo pecado
que cometeu. As práticas justas dele não serão lembradas;
para mim, porém, você será responsável pela morte dele.
Se, porém, você advertir o justo e ele não pecar, certamente
ele viverá, porque aceitou a advertência, e você estará livre
de culpa” (Ez 3:20,21).
A ordem para aqueles incumbidos de anunciar o Conselho de Deus é
“fala e não te cales” (At 18:9). Caso retenhamos a mensagem destinada tanto aos
justos como aos injustos, conforme visto nos versículos anteriormente citados, a
culpa pela morte deles recairá sobre nós. No contexto referido a Ezequiel, a
morte ali é a morte física, morte decorrente do juízo quando Deus enviava
nações para punir com a espada no meio de guerra àqueles que não eram fieis. Já
a preocupação do Evangelho com os ímpios é outra: o perigo vindouro é a Ira de
Deus prestes a ser derramada.
“Não temais os que matam o corpo e não podem matar a alma. Temei
antes, AQUELE QUE PODE fazer perecer no inferno o corpo e alma” (Mt
10:28)
É a Deus - em sua ira santíssima e infinita contra o pecado - quem
devemos temer. Como dizia Jonathan Edwards em seu famoso sermão,
ressaltando a iminência do juízo divino que paira sobre cada um dos homens:
“Não há nada, a não ser a boa vontade de Deus, que impeça os
ímpios de caírem no inferno a qualquer momento. Por mera
boa vontade de Deus, me refiro à sua vontade soberana, ao seu
livre arbítrio, o qual não é restringido por nenhuma obrigação,
nem tolhido por qualquer tipo de dificuldade. Em última
análise, sob qualquer aspecto, nada, exceto a vontade de Deus,
tem poder para preservar os ímpios da destruição por um
instante sequer (...) Essa mensagem pode despertar as pessoas
não convertidas para o significado do perigo que estão
correndo. Isso que vocês escutaram é o caso de todo aquele
que não está em Cristo. Esse mundo de tormento, isto é, o
lago de enxofre incandescente, está aberto debaixo de vossos
pés. Ali se encontra o terrível abismo de chamas que ardem
com a fúria de Deus, e o inferno com sua imensa boca
escancarada. E vocês não têm onde se apoiarem, nem coisa
alguma onde se segurarem. Não existe nada entre vocês e o
inferno, senão o ar, e só o poder e o favor de Deus podem vos
suster”[40].
A ira de Deus paira sobre todos os pregadores, sejam eles inaptos[41] ou
falsos profetas, que pecam deliberadamente, deixando de anunciar todo o
designío, isto é, toda a Palavra de Deus ao povo.
Considerem por alguns segundos a seriedade do pecado que estão
cometendo. “Não se deixem enganar: de Deus não se zomba. Pois o que o
homem semear, isso também colherá” (Gl 6:7). Cada ser humano impenitente,
incluindo os maus pregadores que podem estar lendo esse livro nesse exato
momento, é como um equilibrista que está andando sobre uma corda bamba,
podendo despencar para o precipício ardente a qualquer momento. Enquanto
houver chance, devem se arrepender e tornar para Deus.
Se você não leva a sério seu ofício, sinto dizer: Deus leva. O pregador e
missionário batista Paul Washer dá um conselho que também se aplica aos
pregadores:
“Pastores, rogo-lhes: ouçam-me – isto é tão importante:
vocês não são rapazes de recados. Vocês não devem gastar
seus dias agradando clérigos carnais. Mantenha-se no estudo
da Palavra. Beba profundo. Seja tão absorvido no
conhecimento de Deus, que as pessoas dirão: “Onde ele
está?” (...) Somos homens de Deus. Ministros do Altíssimo.
Em nós deve haver algo diferente (...) para que, ao abrirmos a
boca, a Palavra de Deus se manifeste”[42].
É de suma importância que fique explícito o que ressalta o especialista em
homilética Graeme Goldsworthy,
“Usar textos bíblicos, focalizar personagens bíblicos ou usar
chavões famosos que são declarados como bíblicos – tudo isso
não é em si mesmo uma garantia de que nossa pregação é
essencialmente bíblica”[43].
Se você acha que porque fez uso de quatro chavões populares e citou
dois teólogos famosos o seu sermão ficou bíblico, me perdoe à franqueza: você
está enganado! Você ainda não está cumprindo o seu papel como pregador.
Enquanto, de fato, não viermos a expor as Escrituras em nosso ministério, não
estaremos cumprindo a missão dada por Deus corretamente.
Podemos expor todo o Conselho de Deus de diversas formas. A pregação
expositiva em Lectio Continua[44] (do Latim, “leitura continua”) é considerada
por alguns a melhor forma de fazer isso. O Pr. Steven Lawson escreve a respeito
de João Calvino - considerado um dos maiores pregadores de todos os tempos –
que seguia esse método:
“Enquanto durou seu ministério, o método de Calvino
consistiu em pregar sistematicamente sobre livros inteiros da
Bíblia. (...) Parker escreveu: “Domingo após domingo, dia
após dia, Calvino subia os degraus até o púlpito. Lá, ele
pacientemente conduzia sua congregação, verso após verso,
livro após livro””[45].
Dessa forma, Calvino conseguiu pregar quase todos os livros da Bíblia a
Igreja que pastoreava em Genebra, tendo ministrado sermões expositivos do
primeiro ao último capítulo dos livros de Gênesis, Deuterônomio, Jó, Juízes, 1 e
2 Samuel, 1 e 2 Reis, [todos os] profetas maiores e os menores, os evangelhos,
Atos, 1 e 2 Coríntios, Galátas, Efésios, 1 e 2 Tessalonicenses, 1 e 2 Timóteo, Tito
e Hebreus[46]. A grande vantagem do método consiste em que o pregador não
pode escolher os assuntos que vai pregar. É o próprio texto sagrado quem dita
isso. Conforme explica Lawson:
“O estilo verso-a-verso (...) garantia que Calvino pregasse
todo o Conselho de Deus. Assuntos difíceis e controversos
não podiam ser evitados. Palavras duras não podiam ser
omitidas. Doutrinas complicadas não podiam ser
negligenciadas. Todo o Conselho de Deus pôde ser
ouvido”[47].
O método que eu indicaria a você, amigo pregador, seria esse, mas você
tem liberdade de seguir ou não o método, contanto que siga o mesmo princípio:
o de tornar claro a toda a Igreja de Deus a totalidade de seu conselho por meio
da exposição da doutrina da Sagrada Escritura.
Com urgência, voltemos a exibir essa característica em nossos ofícios - a
de anunciar todo o Conselho de Deus - se queremos que nossos ministérios
sejam realmente bíblicos.
Capítulo 3 – O Inferno, o Lago de Fogo e os Pregadores
(Por Rodrigo Caeté)
“Meus irmãos, não vos torneis, muitos de vós, mestres, sabendo que
havemos de receber maior juízo”.
(Tiago 3.1)
3.1. A dádiva do ministério e suas reais responsabilidades
A maior dádiva que um homem pode receber, após a salvação, é a graça
de ser chamado para ser ministro do Evangelho. É um presente que ao mesmo
tempo que nos constrange e nos alegra. O constrangimento é em razão de, após
conhecer as verdadeiras doutrinas da graça, saber que somos como que famintos
e sedentos dando água e pão a outros famintos e sedentos. Numa empresa, por
exemplo, um líder nunca se vê como um igual aos seus subordinados, mas o
evangelho não apenas inverte essa ideia como vai além disso. Primeiro porque,
no que tange à dignidade, todos somos indignos na mesma proporção; não é,
portanto, um cargo eclesiástico o fator preponderante a mudar o grau de
dignidade. É a dignidade de Cristo imputada a nós, cristãos, que nos iguala, e faz
todo “cristão soberbo” ser uma contradição ambulante, da mesma forma como é
incoerente um “cristão carnal” e um “quadrado redondo”.
Em segundo lugar, afirmamos que o evangelho vai além da ideia secular
de liderança e liderados a partir do que o apóstolo Paulo fala no texto abaixo:
“Assim, pois, importa que os homens nos considerem como ministros de
Cristo e despenseiros dos mistérios de Deus.” (1 Coríntios 4.1)
A expressão “ministro de louvor” traz em si a ideia de alguém que está
acima do que é ser apenas um músico. Hierarquicamente, ele está em um grau
superior aos outros músicos. Em razão de o tema do livro não ser sobre música,
não tecerei aqui minha opinião a respeito dessa invenção “ministro de
louvor”[48]. O meu ponto é associar essa assimilação de cosmovisão a respeito da
hierarquia do líder. É por conta dessa assimilação que muitos pastores lideram
suas igrejas como ditadores e autoritários, machucando, assim, o rebanho de
Cristo. Eles se acham mais dignos e superiores em comparação aos membros do
Corpo.
Em relação à palavra “ministro” em grego, Paulo poderia ter utilizado
outras palavras comuns em seu vocabulário, como doulos, diakonos, therapon,
etc., todavia, ele escolheu ὑπηρέτης, que latinizado pronunciamos huperetes. Por
que Paulo usa essa palavra e qual o significado dela?
Devemos nos lembrar a quem Paulo dirige essas palavras: a uma igreja
cheia de problemas, dentro os quais, o partidarismo. Não custa lembrar que eles
colocavam num pedestal acima seus pregadores preferidos. Alguns gostavam
mais de Apolo, outros, de Paulo, outros, de Pedro, e, os piores, aqueles que
escolhiam a Cristo, mas com motivações soberbas.[49] Diante disso, não bastava
a Paulo apenas dizer “eu plantei, Apolo regou; mas o crescimento veio de Deus.
De modo que nem o que planta é alguma coisa, nem o que rega, mas Deus, que
dá o crescimento.” (3. 6-7); ele tinha que ir além e acrescentar a palavra
huperetes em sua primeira carta; se apresentando como apenas mais um perante
os irmãos de Corinto, e deixando claro que absolutamente todos somos pequenos
diante de Deus.
A palavra huperetes significa, literalmente, “remador inferior”, “remador
subordinado”, “remador de baixa categoria” ou “remador do último porão”.
Como Paulo era acostumado a usar navios em razão de suas muitas viagens
missionárias, e estava escrevendo para uma cidade portuária, Corinto. O termo
caiu muito bem de acordo com o contexto e segundo a explicação que o apóstolo
queria dar a respeito do ministro do evangelho. Segundo Clovis Gonçalves, em
seu artigo publicado no site bereianos, a palavra huperetes
“É um termo de origem militar que servia para distinguir,
numa embarcação de guerra, o soldado dos que ficavam no
andar de baixo, remando sob o comando de um líder, ao som
de um tambor. A ideia, pois, não é de alguém à frente ou
acima de outros, mas ao contrário, de pessoas que fazem um
trabalho invisível, num nível inferior aos demais tripulantes”.
[50]