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MEDIÇÃO DA SEGREGAÇÃO

RESIDENCIAL: MEANDROS TEÓRICOS E


METODOLÓGICOS E ESPECIFICIDADE
LATINO-AMERICANA*

Francisco Sabatini
Carlos Sierralta
2006
FRANCISCO SABATINI
É sociólogo e planificador urbano. É
professor do Instituto de Estudios Urbanos
y Territoriales da PUC no Chile, e do
Centro de Desarrollo Urbano Sustentable.
Doutorado: Ph.D. en Planificación Urbana
(Universidad de California, Los Angeles,
1993) Mestrado: Magister Planificación del
Desarrollo Urbano (PUC, Chile, 1982)
Licenciatura: Sociólogo (PUC, Chile,
1977).
Temas de estudo: segregação
residencial, mercados e políticas de solo, CARLOS SIERRALTA
conflitos ambientais locais, gentrificação e
planificação urbana. É geógrafo, mestre em Desenvolvimento Urbano e
pesquisador do Instituto de Estudos Urbanos e
Territoriais da Pontifícia Universidade Católica do Chile.
Temas: ordenamento territorial, planificação urbana,
sistemas de informação geográfica, resolução de
conflitos urbanos, etc.

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OBJETIVOS

● Expor a definição conceitual de segregação residencial e das dimensões que a compõem.


● Fazer uma revisão crítica sobre a forma de medir segregação residencial
● Critica a definição multidimensional e operacional dos sociólogos Douglas Massey e Nancy
Denton, nos Estados Unidos (1988; 1993).
● Propõem a adoção de uma estratégia iterativa no estudo da segregação
IDENTIFICAÇÃO DA QUESTÃO DE PESQUISA

Como estudar a segregação residencial na realidade latinoamericana, e quais são


as melhores estratégias metodológicas para esse estudo?
CONCEITO DE SEGREGAÇÃO RESIDENCIAL

“A segregação residencial pode ser definida, em termos gerais, como o grau de


proximidade espacial ou aglomeração territorial de famílias pertencentes a um mesmo
grupo social, quer seja definida em termos étnicos , idade, preferências religiosas ou
socioeconômicas , entre outras possibilidades. (Sabatini, Cáceres e Cerda, 2001: 27).

Segregação residencial consiste em relação espacial, é um fenômeno independente,


apesar de poder estar relacionada com a renda, diferenças sociais ou influenciá-las, é
INDEPENDENTE!
DIMENSÕES DA SEGREGAÇÃO RESIDENCIAL

segregação sociológica segregação geográfica


(ausência de interação entre grupos) (desigualdade na distribuição dos grupos
no espaço)

“não obstante, segregação geográfica e sociológica estão provavelmente correlacionadas” (White,


1983:1009).

A proximidade espacial entre grupos diferentes importa! E estudar os componentes do porquê importa,
ajuda a definir segregação residencial!

Michael White é um especialista em técnicas de mensuração de segregação!


DIMENSÕES DA SEGREGAÇÃO RESIDENCIAL
1. Concentração espacial dos grupos
Tendência de certos grupos Diferenças
sociais em concentrar-se em algumas áreas da
cidade
A 1 analisa grupos sociais em termos de sua posição
2. Homogeneidade social das áreas espacial, enquanto a 2, as áreas da cidade com relação a
a conformação das áreas com alto grau de sua composição social.
homogeneidade social
Cada uma capta um atributo diferente da segregação social do
3. Percepção subjetiva espaço, com efeitos bem distintos.
Percepção subjetiva que se forma sobre o que é
segregação “objetiva”, tanto para os que pertencem a
bairros ou grupos segregados, como para os
que estão fora deles.
DIMENSÃO SUBJETIVA DA SEGREGAÇÃO RESIDENCIAL

1. Refere-se à percepção que as pessoas têm do fato de fazer parte de um grupo social que
tem uma forma peculiar de ocupar o espaço. Ex: famílias pobres, “ser marginal” -
desintegração social.

2. Relaciona-se à identidade e ao prestígio atribuídos a bairros ou áreas inteiras da cidade.


Bairros ruins, suspeitos x bairros de prestígio, “exclusivos” (status).

3. Escala. Aponta que identidade ou prestígio associado ao espaço podem abranger


grandes áreas. Ex: Santiago do Chile. Hipótese: escala geográfica de segregação está se
reduzindo.
Fonte: REVISTA VIVIENDA Y DECORACIÓN

Características peculiares do mercabo imobiliário latinoamericano:

ilegalidade, irregularidade e informalidade -> Fator de identidade negativo


que outorgam determinada importância à dimensão subjetiva da segregação.

Estigmatização: forte estigma territorial associado à ocupação de uma habitação de conjuntos


habitacionais produzidos pelas políticas habitacionais estatais.
DEFINIÇÃO MULTIDIMENSIONAL E OPERACIONAL E MASSEY E
DENTON (1988; 1993)
Em um manuscrito de 2004, Douglas conta que o objetivo
de “As Dimensões da Segregação Residencial” em 1988, Crítica dos autores:
era estudar as tendências, padrões, causas e
consequências da segregação residencial racial e étnica
nos Estados Unidos. Antes da década de 1970, a medição ● Imprópria para estudar a realidade
da segregação era uma ciência estabelecida. Em 1955, latino-americana
Duncan,Duncan concluíram que a melhor medida geral
era o Índice de Dissimilaridade (D). Nas duas décadas
seguintes, foi amplamente usada sem debate. Isso
● Frágil ao tentar dar conta das diferenças
terminou em 1976 com a publicação de uma crítica de de escala geográfica do fenômeno
Cortese, que desencadeou uma variedade de definições de
segregação, propôs uma série de novas medidas, mas
nenhum consenso foi alcançado sobre a melhor forma de
medir a segregação. Por isso, decidiram fazer uma
análise sistemática dos índices de segregação.
A DEFINIÇÃO MULTIDIMENSIONAL DE MASSEY E DENTON

Os autores distinguiram cinco dimensões, classificando os diferentes índices existentes de


segregação quanto a :

1. Uniformidade - é o grau em que a porcentagem de membros do grupo minoritário em bairros


específicos se diferencia da porcentagem minoritária em toda a área urbana.
2. Exposição - é o grau de contato potencial (ou a falta dele) entre os membros da minoria e da
maioria em bairros específicos.
3. Agrupamento - é a extensão em que bairros de minorias se unem no espaço.
4. Concentração - é a quantidade relativa de espaço físico ocupado por um grupo minoritário em
uma cidade;
5. Centralização - é o grau em que os membros minoritários se estabelecem dentro e ao redor
do centro social ou geográfico de uma área metropolitana.
A DEFINIÇÃO MULTIDIMENSIONAL DE MASSEY E DENTON
Lembra que os autores definem segregação residencial como referente à um fenômeno
espacial independente de distruibuição de renda e nível de pobreza?

1. uniformidade

2. exposição

3. concentração -> É uma forma ou dimensão da pobreza que a afeta. Medição indireta/caso
anglo americano | na américa latina, pobre não mora no centro. Será?

4. centralização - > distância da cas ao centro; mais que dimensão, é uma forma ou dimensão
da pobreza! Ex: morar num espaço pequeno. Aqui, o fenômeno é distinto e tem sua
importância! Bournazou (2005)

5. agrupamento -> não é dimensão, mas sinônimo de segregação residencial; busca medir a
segregação em outra escala espacial, em uma escala maior do que a correspondente às
áreas de medição usuais nos estudos
DIMENSÕES E ESCALA DA SEGREGAÇÃO
SEMELHANÇAS

-> podem ter


intensidade diferente
em escalas
Concentração espacial dos Uniformidade - é o grau em que a geográficas distintas.
grupos porcentagem de membros do grupo Ex: uma cidade pode ser
tendência de certos grupos minoritário em bairros específicos se mais segregada em uma
sociais em concentrar-se em diferencia da porcentagem escala do que em outra/
algumas áreas da cidade minoritária em toda a área urbana. segregação mais forte
em uma do que na outra
Homogeneidade social das Exposição - é o grau de contato
áreas potencial (ou a falta dele) entre os Para isso, autores
a conformação das membros da minoria e da maioria discutem: principais
áreas com alto grau de em bairros específicos. problemas de medição
homogeneidade social que os estudos sobre
segregação apresentam
PROBLEMAS METODOLÓGICOS COM A MEDIÇÃO DA SEGREGAÇÃO

As duas dimensões “objetivas” da segregação, são estudadas principalmente por meio de índices
que se referem à composição por grupos da população da cidade.

Principais métodos estatísticos disponíveis para medi-las:

índices de dissimilaridade (concentração espacial do grupo)

• O índice D, ainda utilizado por muitos pesquisadores, mede a relação existente entre a
composição populacional das unidades de área (por exemplo, setores ou distritos) e a
composição populacional de toda a área de estudo.

índices de exposição (isolamento social do grupo)


• São empregados para medir o grau de possível contato ou interação .Pode-se dizer que eles
medem a probabilidade de um indivíduo encontrar membros do seu próprio grupo ou de grupos
distintos.
PROBLEMAS COM A MEDIÇÃO DA DIMENSÃO 1
(CONCENTRAÇÃO ESPACIAL DOS GRUPOS)

Problema: conceitual - pequena atenção dada ao fato de que a segregação tem escalas distintas
em uma mesma cidade. Ex: cidade que está segregada em um microlocal, mas não com relação as
grandes áreas.

1. 4 limitações apresentadas no índice de Duncan: problema da validade, Tabuleiro de Xadrez,


pouco útil para estudos explicativos e o problema da Grade
1. PROBLEMA DA VALIDADE
Corresponde a uma informação estatística que não captura, com relação às áreas da medição, a
essência espacial do fenômeno (Diagrama 1 - o índice não mede exatamente o que ele diz estar
medindo). Famílias de igual condição social residentes em uma área poderiam ser aglomeradas ou
dispersadas nela e a dissimilaridade seria a mesma. As relações socioespaciais que se pretende
estudar são reduzidas a médias, porcentagens ou probabilidades.
2. TABULEIRO DE XADREZ

As medidas de segregação, como as do índice de


dissimilaridade, não captam a segregação em
uma escala maior.

No exemplo do Diagrama 2, a distribuição


territorial de famílias pobres e não pobres
apresenta distribuição de renda e índice de
dissimilaridade iguais. Contudo, no segundo
caso, existe uma notória aglomeração das
famílias pobres em uma parte da cidade

Trata-se de um problema metodológico. Ao definir


uma área, se influencia os resultados.
3. O PROBLEMA DA GRADE

O ranking das cidades que disponibiliza o índice (desde a mais até a


menos segregada) é alterado quando se modifica o tamanho da área
com base no qual seu valor urbano é calculado (WHITE, 1983).

O valor do índice de dissimilaridade modifica-se


quando a área da medição é modificada; quanto menor,
maior o valor do índice.

É um efeito previsível. Trata-se de uma questão da


escala de análise. No Diagrama 3, parece válida a
afirmação de que a aglomeração espacial das famílias
“cinza” é forte com relação ao microespacial (a divisão
de cidade em 36 áreas), e fraca se a analisarmos com
maior agregação (a divisão de cidade em seis áreas).
É preciso diferenciar este efeito metodológico esperável!
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4. POUCO ÚTIL PARA ESTUDOS


EXPLICATIVOS

O quarto problema é que o índice de


dissimilaridade é de pouca utilidade para
estudos do tipo explicativo que busquem
relacionar a segregação às suas causas
ou aos seus possíveis efeitos.
Os autores criticam:

• a segregação seja um problema que existe independentemente do que


acontece com outros fenômenos com os quais a segregação possa estar
relacionada.
• A segregação não é um problema em si mesma, mas um fenômeno de
importância central no desenvolvimento urbano, e inclui problemas e
vantagens.
• Os problemas 1, 2, 3 tres questões conceituais relativas à escala geográfica,
mais do que técnicos metodológicos.

Sugerem:
O conceito de escala geográfica da segregação deles que tenta captar as
diferenças apresentadas segundo os níveis da agregação espacial. Propõem
estudar a segregação e seus efeitos urbanos priorizando a escala.
PROBLEMAS COM A MEDIÇÃO DA DIMENSÃO 2
(HOMOGENEIDADE)

o Criticam a tendência a ignorar a importância da dimensão 2


A homogeneidade social do espaço ajuda a isolar um grupo social dos
restantes, e isso é grave quando são grupos vulneráveis (p.180).

o O grau de concentração espacial corresponde à algo positivo. Ex: enclaves


étnicos; se fortificam.
TRÊS FORMAS PRINCIPAIS COMO SE PRATICA A OMISSÃO DA
DIMENSÃO 2 NOS ESTUDOS

1. Escolha exclusiva de determinado índice de dissimilaridade, depois de saber que está


fortemente relacionado com determinado índice de isolamento.
2. A declaração inicial de que a dissimilaridade é a dimensão mais importante da
segregação. “mais importante”; “mais fácil medir”.
3. Análises que intercalam, sem profunidade, afirmações sobre ambas as dimensões
objetivas da segregação.
SUPOSIÇÕES FILOSÓFICAS NA DEFINIÇÃO DE UM CONCEITO

• Definir um fenômeno antes de estudar, antes de medir = bom senso!

• O esforço para definir a segregação se apoia na suposição de que se trata de um fenômeno


“absoluto”, no sentido de que ele teria existência em si mesmo.

Propõem:
• A definição de segregação não deveria ser apenas do ponto de vista empírico, mas também
teórico (primeiro elemento de uma possível estratégia)
• Se abster de buscar uma definição acabada de segregação antes de ir para o estudo
empírico.
ESTRATÉGIA ITERATIVA DE DEFINIÇÃO DA SEGREGAÇÃO

• Um modo diferente para se definir a segregação poderia ser a iteração, método de tentativa e
erro. Responderia as necessidades da america latina.

A segregação como uma disposição espacial aglomerada de grupos sociais que contribui para agravar
determinados problemas para alguns e atenuá-los ou resolver para outros!

• A estratégia iterativa teria as características seguintes:

 Priorizar os indicadores de segregação que melhor registrassem a composição social da área.

 Procuraria medir a aglomeração de famílias de uma mesma condição social ou segregação


residencial, priorizando a contigüidade sobre a proximidade (distância).

 Delimitar empiricamente a escala na qual a segregação espacial associa-se com mais nitidez
aos problemas que lhe atribuímos conceitualmente (importância ao teórico e empírico)
CONCLUSÃO

● Estudo estadístico quase inexistente na América Latina (crítica)


● Autores consideram a segregação residencial uma dimensão espacial da realidade social, não uma
simples manifestação espacial desta última.
● Trata-se de um fenômeno que é parte integrante dos processos urbanos (não seu simples reflexo), e isto pode
trazer efeitos tanto negativos como positivos. Não é necessariamente negativa. Deste modo, a mera
disponibilidade da estatística descritiva da evolução da segregação não é suficiente.
● É preciso criticar as etatísticas para entender que tipos de segregação acumulam consequências negativas e
CONCLUSÃO
em que escalas são mais fortes.
● A dimensão subjetiva (estigmas) tem seu lugar!
● O quantitiativo debe ser complementado com estudos qualitativos.
● Projetos metodológicos, de caráter iterativo, podem ajudar a especificar o tipo e a escala de segregação mais
prejudicial!
REFEÊNCIAS

Sabatini, F. (2004). Medición de la segregación residencial: reflexiones metodológicas desde la ciudad


latinoamericana. En F. Sabatini & G. Cáceres (eds.). Barrios cerrados en Santiago de Chile: entre la exclusión y
la integración residencial. Santiago de Chile: Pontificia Universidad Católica - The Lincoln Institute of Land
Policy.

SABATINE, F., et al (2009). “Medição da segregação residencial: meandros teóricos e metodológicos e especificidade latino-
americana”. In População, vulnerabilidade e segregação, 169–95. Campinas: Nepo, Unicamp, 2009.
http://www.nepo.unicamp.br/publicacoes/livros/vulnerabilidade/arquuivos/arquuivos/vulnera

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