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Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.16, n.1, p.22-7, jan./mar.

2009 ISSN 1809-2950

Relação entre alinhamento postural e desempenho motor


em crianças com paralisia cerebral
Relationship between postural alignment and motor performance in
children with cerebral palsy
Andréa Baraldi Cunha1, Graziela Jorge Polido2, Geruza Perlato Bella3, Daniela Garbellini4, Carlos Alberto Fornasari5

Estudo desenvolvido na Clínica RESUMO: O objetivo deste estudo foi verificar se há correlação entre alinhamento
de Fisioterapia da Unimep – postural e desempenho motor em crianças com paralisia cerebral (PC), além de
Universidade Metodista de compará-las com crianças de desenvolvimento motor típico. Participaram 14
Piracicaba, Piracicaba, SP, crianças com PC tipo espástico, entre 4 e 12 anos, classificadas nos níveis III, IV e
Brasil V no sistema de classificação de função motora ampla (GMFCS); e 20 com idades
1 entre 4 e 8 anos e desenvolvimento motor adequado, que constituíram o grupo
Fisioterapeuta especialista em controle. Foi avaliado o alinhamento de lordose cervical e cifose torácica na postura
Reabilitação Infantil; mestranda sentada por meio de fotometria; o desempenho motor foi avaliado pelo índice de
em Fisioterapia na
Universidade Federal de São função motora ampla (Gross motor function measure, GMFM) apenas nas dimensões
Carlos, São Carlos, SP sentar (B) e ficar em pé (D). O subgrupo de PC nível III obteve maiores escores no
GMFM do que o dos níveis IV e V, com diferença significativa nas dimensões B
2
Fisioterapeuta especialista em (p=0,00) e D (p=0,016). Quanto ao alinhamento postural, os dois subgrupos de PC
Reabilitação Infantil apresentaram menor angulação da lordose cervical do que o GC, com diferença
significativa; também foram medidos ângulos menores da cifose torácica nos
3
Profa. Ms. do Curso de subgrupos PC, sendo que o subgrupo dos níveis IV e V apresentou diferença
Especialização em Reabilitação significativa tanto em relação ao outro subgrupo PC quanto ao controle. Foi
Infantil da Faculdade de encontrada correlação positiva (r=0,748) entre o desempenho motor e o
Ciências Médicas da alinhamento postural nos subgrupos de PC, mostrando que, quanto melhor o
Universidade Estadual de alinhamento postural, melhor o desempenho motor dessas crianças.
Campinas, Campinas, SP
DESCRITORES: Avaliação; Criança; Curvaturas da coluna vertebral; Paralisia cerebral
4
Profa. Ms. do Curso de
Fisioterapia da Unimep ABSTRACT: The purpose was to search for a correlation between postural alignment
5
and motor performance of children with cerebral palsy (CP), and to compare them
Prof. Dr. do Curso de to typical development children. Twenty of these, aged 4 to 8 years old, formed the
Fisioterapia da Unimep control group (CG); and 14 children with CP, aged 4 to 12 years old, were divided
into two subgroups (level III, and levels IV and V) according to their classification
ENDEREÇO PARA by the Gross Motor Function Classification System. Cervical lordosis and thoracic
CORRESPONDÊNCIA
kyphosis angles in sitting posture were assessed by photometry; motor performance
Andréa Baraldi Cunha was assessed at dimensions B (sitting) and D (standing) of the Gross motor function
R. Marechal Deodoro 1140 ap. measure (GMFM). PC level III subgroup had higher GMFM scores than levels IV
131 Centro and V subgroup, with significant differences at the B (p=0.00) and D (p=0.016)
15400-000 Olímpia SP dimensions. As to posture alignment, significantly lesser cervical lordosis angles
e-mail: were found at both PC subgroups when compared to control group; both subgroups
andreabaraldi@gmail.com also showed lesser thoracic kyphosis angles; significant differences were found
when comparing CP levels IV and V subgroup both to level III subgroup and to CG.
Trabalho apresentado no XVII Also found was a positive correlation between motor performance and posture
Congresso Brasileiro de alignment in children with CP (r=0.748), showing that the better the postural
Fisioterapia, 2007, com alignment, the better the motor performance in these children.
publicação de resumo. KEY WORDS: Cerebral palsy; Child; Evaluation; Spinal curvatures
APRESENTAÇÃO
jul. 2008
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO
fev. 2009

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Cunha et al. Postura e desempenho motor em crianças com PC

INTRODUÇÃO pequena superfície de contato, que au-


menta a demanda do sistema de con-
vado de PC, que tivessem capacidade
de se manter sentadas de forma inde-
Paralisia cerebral (PC) pode ser defi- trole postural. Consequentemente, mui- pendente ou com apoio do terapeuta; e
nida, de acordo com um consenso in- tas crianças com PC desempenham mais cujos responsáveis assinassem o termo
ternacional, como uma desordem de atividades diárias na postura sentada, que de consentimento livre e esclarecido
movimento e postura devido a um de- oferece uma situação de maior estabili- (TCLE). Os critérios de não-inclusão fo-
feito ou lesão do encéfalo em desenvol- dade e menor grau de liberdade para ser ram ter dificuldade de entendimento de
vimento1,2. O problema motor dos indi- controlado5. Crianças com PC se bene- ordens simples e hipotonia. O Quadro
víduos com PC origina-se de disfunção ficiam de terapias no contexto do con- 1 resume as características desse grupo.
do sistema nervoso central, que interfe- trole postural, melhorando assim a qua- A média de idade foi de 7,7±3,1 anos.
re diretamente no desenvolvimento do lidade do movimento, desde que não O GMFCS é um sistema de classifi-
controle postural contragravidade e im- haja alterações posturais fixas12. cação utilizado para crianças com PC
pede o desenvolvimento motor normal3. baseado no movimento auto-iniciado,
Considerando que a PC é uma desor-
A disfunção no controle postural inter- com ênfase no sentar e andar, contendo
dem de movimento e postura e que al-
fere nas atividades funcionais diárias, cinco níveis diferenciados pela limitação
terações posturais podem interferir no
sendo um dos problemas principais nes- funcional e necessidade de assistência
desempenho motor, requerem-se estu-
sa população4,5. externa13. As crianças classificadas no
dos que relacionem esses fatores, para
Considerando o modelo de Classifi- que a intervenção em crianças com PC nível III do GMFCS necessitam de um
cação Internacional de Funcionalidade, esteja baseada em evidência, desenvol- dispositivo auxiliar para marcha e as dos
Incapacidade e Saúde proposta pela vendo um plano de tratamento adequa- níveis IV e V têm limitações funcionais
Organização Mundial de Saúde, a PC do que permita não só prevenção de graves, principalmente na postura em pé.
geralmente interfere no funcionamento deformidades como também atividades
do sistema musculoesquelético no que funcionais com melhor qualidade. Quadro 1 Características das crianças
se refere à função de órgãos e sistemas6. com PC
Nesse nível, os distúrbios da motricidade O objetivo deste estudo foi verificar se
há correlação entre o alinhamento Paciente Idade* Sexo Topografia Nível†
e do tônus se manifestam por caracte-
rísticas específicas, como a falta de con- postural e o desempenho motor de crian- 1 4 F Quadriplegia V
trole sobre os movimentos, modificações ças com PC do tipo espástico, bem como 2 4 M Quadriplegia V
adaptativas do comprimento muscular comparar o desempenho motor dessas 3 4 M Quadriplegia V
e, em alguns casos, podem levar a de- crianças com as de desenvolvimento
4 5 F Quadriplegia V
formidades ósseas. Isso ocorre nos perío- motor adequado.
5 6 F Diplegia III
dos em que a criança apresenta ritmo
6 6 M Quadriplegia IV
acelerado de desenvolvimento, compro-
metendo o processo de aquisição de METODOLOGIA 7 7 M Diplegia III
8 8 M Diplegia III
marcos motores básicos (rolar, sentar, Este estudo foi aprovado pelo Comi-
engatinhar, andar) e, também, nas ativi- 9 8 M Diplegia III
tê de Ética da Universidade Estadual de
dades de vida diária (tomar banho, ali- 10 9 M Quadriplegia V
Campinas.
mentar-se, vestir-se)7,8. 11 12 M Diplegia III
Foram selecionadas 34 crianças de 12 12 F Quadriplegia IV
Deformidades musculoesqueléticas
forma não-aleatória, com base em crité- 13 12 F Quadriplegia IVI
associadas ao desalinhamento de tron-
rios de inclusão previamente determina- 14 12 F Quadriplegia V
co prejudicam o desenvolvimento da
dos para cada grupo. Quatorze crianças
criança, acarretam alterações na marcha * em anos; † = segundo o GMFCS, sistema de
com PC do tipo espástica foram dividi-
e até mesmo a funcionalidade na postu- classificação de função motora ampla; F=
das em dois subgrupos, de acordo com
ra sentada9,10. Há também uma associa- feminino; M = masculino
o sistema de classificação de função
ção entre a direção da escoliose e
motora ampla (Gross motor function
obliqüidade pélvica na PC, sendo que a Assim, as crianças com PC foram clas-
classification system, GMFCS13), sendo
convexidade leva a alterações nos mo- sificadas de acordo com sua limitação
cinco diplégicas (grupo de PC nível III)
vimentos do tronco, sugerindo que a al- funcional na postura em pé e na marcha
e nove quadriplégicas (grupo de PC ní-
teração postural está relacionada à difi- por meio do GMFCS, sendo subdivididas
veis IV e V), de ambos os sexos, atendi-
culdade de ativação da musculatura de em dois subgrupos, um com crianças do
das na Clínica de Fisioterapia da
forma adequada11. nível III (n=5) e outro com as crianças dos
Unimep. As crianças que se locomoviam
níveis IV e V (n=9).
Limitações no desempenho de ativida- com algum dispositivo foram classifica-
des e tarefas do cotidiano das crianças com das como no nível III e as que não se Constituindo o grupo controle (GC),
PC estão relacionadas a deficiências locomoviam, nos níveis IV e V. Para par- foram recrutadas em escolas da cidade
neuromotoras que comprometem seu ticipação no grupo de PC, os critérios de Piracicaba 20 crianças com idades
controle postural. Assim, a dificuldade em de inclusão foram: crianças entre 4 e 12 entre 4 e 8 anos (média=6,1±1,4), de
manter a postura em pé relaciona-se à anos, com diagnóstico médico compro- ambos os sexos, que não apresentavam

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diagnóstico de PC, com desenvolvimen- Tabela 1 Pontuação no GMFM (média ± desvio padrão) de função motora dos dois
to motor típico, nascidas a termo com subgrupos de crianças com PC nas duas dimensões avaliadas
idade gestacional de 37 a 41 semanas e Dimensão PC níveis IV e V PC nível III p
seis dias, sem qualquer tipo de compli-
cação pré, peri ou pós-natal, com mar- Sentar (B) 28,2±5,0 55,0±2,3* 0,00
cha independente, sem alterações Ficar em pé (D) 3,09±1,1 12,5±3,4* 0,016
posturais graves e cujos responsáveis
Tabela 2 Ângulos (em °, média ± desvio padrão) das curvaturas cifose torácica e
assinaram o TCLE.
lordose cervical nos dois subgrupos de crianças com PC e no grupo
controle (GC)
Procedimentos
Grupo Cifose torácica Lordose cervical
Foi realizada uma análise de corte GC (n=20) 159,3± 5,65 137,35±7,18
transversal das avaliações de desempe-
PC nível III (n=5) 150,5±11,24 107,75±3,77*
nho motor funcional e do alinhamento
na postura sentada. PC níveis IV-V (n=9) 133,73±17,15*† 112,55±12,09*

Para avaliar o desempenho motor, foi nhamento postural. Na vista lateral, os de crianças com PC (nível III e níveis IV
utilizado o índice de função motora pontos de referência utilizados foram os e V) foi utilizado o teste t. O nível de
ampla Gross motor function measure ápices de cada curvatura encontrados significância foi fixado em p=0,05. Para
(GMFM), que avalia o quanto de um item por meio de linhas guias traçadas verti- comparar os ângulos do alinhamento
uma criança pode realizar (em vez de calmente e horizontalmente no software. postural entre os dois subgrupos de crian-
medir a qualidade de desempenho na Por meio desses pontos, os ângulos das ças com PC e o grupo controle, foi utili-
atividade). O GMFM consiste em 88 curvaturas foram mensurados16. Foram zada a análise de variância Anova
itens agrupados em cinco diferentes di- feitas duas medições em cada foto (pelo (p<0,05) seguida de teste de Tukey. As
mensões14, atribuindo-se pontos a cada mesmo avaliador) e calculado seu valor análises foram realizadas utilizando o
item. Quanto maior o escore obtido, me- médio. Quando a diferença das duas programa estatístico R versão 2.7. Para
lhor o desempenho da criança. Foram medidas excedeu os critérios aceitos verificar a correlação entre a angulação
utilizadas somente as dimensões B, sen- (três graus de diferença entre elas), uma da cifose torácica e o desempenho mo-
tar (escore máximo=60) e D, ficar em terceira medida foi realizada e a mais tor (apenas na dimensão B, sentar) nos
pé (escore máximo=39) nos dois subgru- discrepante, descartada17. Foi avaliado dois subgrupos de crianças com PC foi
pos de PC, para efeito de padronização. o alinhamento da lordose cervical e da aplicado o teste de correlação de
cifose torácica na postura sentada. Não Pearson (o coeficiente r varia de -1,0 a
O alinhamento postural da coluna foi
foi avaliada a lordose lombar, pois as 1,0 e, quanto mais próximo de 1,0, mais
avaliado por fotometria, que é uma
crianças com PC não apresentam essa forte é a correlação).
metodologia de interpretação dos valo-
curvatura fisiológica, somente uma
res obtidos a partir de uma fotografia,
cifose tóraco-lombar.
sendo um instrumento de caráter quan-
titativo que permite uma avaliação
RESULTADOS
confiável dos desalinhamentos apresen- Análise dos dados A Tabela 1 mostra a pontuação mé-
tados pelo segmento corporal em análi- Para comparação dos escores de de- dia de função motora dos dois subgrupos
se15,16. As crianças de ambos os grupos sempenho motor entre os dois subgrupos de crianças com PC, evidenciando mai-
foram fotografadas uma única vez na
vista lateral do lado dominante, senta- 170
das em um banco, com a mão dominan-
te no ombro oposto, adução de ombro 160
Cifose torácica (°)

e flexão de cotovelo, flexão de 90º de


joelho com 10º de abdução de coxofe- 150
moral, os pés afastados em relação à li-
140
nha do ombro e calcanhares alinhados.
Para fotografar os sujeitos foi utiliza- 130
da uma câmera fotográfica PhotoPC
120
(750Z, Megapixel Zoom Digital Câmera,
Epson). A distância entre o tripé da 110
câmera fotográfica e o simetrógrafo foi
de 180 cm, e a altura da objetiva foi ajus- 100
0 10 20 30 40 50 60
tada à altura da cicatriz onfálica de cada
criança. Pontuação na dimensão B (sentar) no teste de função motora
O programa Corel Draw (v.8) foi uti- Gráfico 1 Correlação entre cifose torácica e função motora na dimensão sentar no
lizado para quantificar em graus o ali- grupo de crianças com PC

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ores escores do subgrupo nível III, com tronco, mau posicionamento da pelve e trutural com hipertonia flexora de pes-
diferença significativa entre ambos nas falta de aquisição das reações de equilí- coço e tórax, ficando os quadris em
dimensões sentar e ficar em pé. brio. flexão. Crianças com PC frequentemente
apresentam amplitude restrita de movi-
Quanto aos ângulos das curvaturas, Kapandji18 afirma que, na primeira
mento em muitas articulações, incluindo
as crianças dos dois subgrupos de PC semana de vida, a criança levanta a cabe-
tornozelo, joelho e quadril. As contra-
apresentaram menor angulação da ça, graças à musculatura antigravitacional
turas dos músculos dessas articulações
lordose cervical, com diferença signifi- do pescoço, formando a lordose cervical.
resultam em posturas atípicas quando o
cativa (p<0,05) quando comparadas ao Aos nove meses, quando a criança já se
sujeito está sentado e em pé. As postu-
GC, porém não foi encontrada diferen- senta e começa a engatinhar, ocorre ati-
ras habituais influenciam a forma pela
ça significativa entre os dois subgrupos. vação da musculatura da região
qual os músculos são recrutados e coor-
Quanto à angulação da cifose torácica, antigravitacional lombar, que molda a
denados para a recuperação da estabili-
também foi encontrada angulação me- curvatura lombar. Na PC, a falta de con-
dade23.
nor, com diferença significativa (p<0,05) trole postural resulta em ativação anor-
do subgrupo de PC níveis IV e V tanto mal da musculatura, causando a manu- Segundo Koman et al.9, as deformi-
em relação ao GC quanto ao subgrupo tenção da postura cifótica e ineficientes dades de coluna estão associadas à PC.
PC nível III (Tabela 2). estratégias de movimento19. Além da ati- A freqüência de escoliose na PC é de
vação anormal da musculatura, a fraque- 25%, sendo que 60 a 75% dos envolvi-
Quanto à correlação entre alinha- dos são os que apresentam sérios com-
za muscular é um dos fatores agravan-
mento postural e função motora na di- prometimentos e quadriplegia. A progres-
tes das alterações posturais dessas cri-
mensão sentar nos dois subgrupos de são da escoliose acarreta dor, interfere na
anças20.
crianças com PC, constatou-se correla- função motora e comprometimento
ção significativa (r=0,748; p=0,01), su- Como mencionado, não foi possível cardiopulmonar. Ostenjo et al.24 mos-
gerindo que, quanto melhor o alinha- comparar a lordose lombar entre os gru- tram que os quadriplégicos apresentam
mento postural, melhor a função motora pos de PC e GC. Não é possível men- maior comprometimento referente à
na dimensão avaliada (Gráfico 1). surar essa angulação em crianças com espasticidade que os diplégicos e, ain-
PC porque estas apresentam cifose da, que crianças com maior comprome-
tóraco-lombar que pode ser justificada timento no controle motor seletivo apre-
DISCUSSÃO pela retroversão pélvica. Sullivan et al.21 sentam pior desempenho na função
mostram que a prevalência da retro- motora ampla. Assim, é preciso preve-
Nas crianças com PC, foi encontrada
versão pélvica em PCs é de 37%, o que nir que essas contraturas e/ou deformi-
uma correlação positiva entre o ângulo
leva ao aumento da cifose e ao compro- dades se instalem, corrigindo as altera-
de cifose torácica e o desempenho mo-
metimento da função motora na postu- ções posturais que interferem diretamen-
tor na postura sentada, mostrando que,
ra sentada. A retroversão pélvica na PC te na qualidade de movimento dessas
quanto melhor o alinhamento postural,
está associada à retração de flexores e crianças.
melhor o desempenho motor dessas
rotadores internos de quadris e é um dos
crianças nessa posição. Quanto ao desempenho motor, como
fatores que leva a criança a sentar-se
No que se refere ao alinhamento sobre o sacro, levando o corpo para fren- esperado, o subgrupo de PC nível III
postural, foi encontrada diferença signi- te e flexionando a coluna, o que provo- obteve escore mais alto na dimensão B
ficativa nos ângulos de lordose cervical ca postura cifótica10,21,22. Outros autores (sentar) do que o subgrupo de PC níveis
entre os dois subgrupos de PC compa- afirmam que, aos 10 anos de idade, a IV e V, coerente com as respectivas clas-
rados ao GC, que apresenta desenvolvi- criança já apresenta as curvaturas fisio- sificações no GMFCS. Ostensjo et al.24
mento motor e alinhamento postural lógicas semelhantes às dos adultos18. E relatam que a maioria das crianças
adequados. A menor angulação nas cri- que na posição em pé a coluna lombar diplégicas se enquadra no nível III e a
anças com PC pode ser propiciada pelo está em posição de lordose; na posição maioria dos quadriplégicos se enquadra
desequilíbrio muscular. sentada, a pelve e o sacro estão rodados no nível V do GMFCS. Mancini et al.6
posteriormente e a curvatura lombar está mostraram que crianças com nível mais
Nota-se também diferença significa- grave de PC apresentam desempenho
diminuída18. Isso explica que, além da
tiva na cifose torácica no grupo de PC inferior às de comprometimento leve em
retroversão pélvica, a postura sentada
níveis IV e V quando comparado tanto todas as áreas funcionais. Também como
pode ter influenciado a ausência de
ao grupo de PC nível III como ao GC. esperado, o subgrupo de PC nível III
lordose lombar das crianças com PC.
Os resultados mostram que crianças do apresenta melhor desempenho motor na
grupo PC nível III apresentaram angu- Estudos têm evidenciado que as de- postura de pé, já que nas crianças dos
lação de cifose torácica semelhante ao formidades e falta de ativação muscular níveis IV e V a deficiência motora limita
GC, o que é coerente com o melhor geram limitações e uma menor capaci- a funcionalidade na postura em pé.
controle postural que essas crianças dade de realizar tarefas. Segundo Ostensjo et al.25 constataram que crian-
apresentam. O pior alinhamento das cri- Howle3, crianças que não apresentam ças com comprometimento moderado
anças do grupo PC níveis IV e V está pro- funcionalidade nos membros superiores (nível III) apresentam mais atividades
vavelmente relacionado à diminuição de apresentam flexão da coluna, o que, referentes à mobilidade que aquelas com
ativação muscular em extensores de com o tempo, provocará uma cifose es- limitações graves. Voorman et al.26 e

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Bjornson et al. 27 mostram ainda que O presente estudo tem limitações mostrou que crianças com paralisia ce-
crianças com muita espasticidade, como devido ao número reduzido de sujeitos. rebral classificadas no GMFCS como
as quadriplégicas, com pior controle nível III apresentam melhor desempenho
seletivo, fraqueza muscular, limitações motor e alinhamento postural que aque-
no quadril e extensão de joelho, mos- CONCLUSÃO las nos níveis IV e V; e, ainda, foi encon-
tram curso de comprometimento da fun- trada correlação positiva entre essas duas
ção motora menos favorável que crian- Considerando que o alinhamento variáveis, mostrando que, quanto melhor
ças menos afetadas, principalmente na postural é a base para um adequado o alinhamento postural, melhor o de-
mobilidade. controle de movimento, este estudo sempenho motor dessas crianças.

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