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Resumo

Este relatório tem o objetivo de apresentar a pesquisa realizada para a criação de coleção
de estampas para moda feminina inspirada nas raízes e cultura afrodescendente,
caracterizada por símbolos e códigos da cultura de matriz africana Adinkra, a fim de
valorizar e propagar a identidade cultural brasileira. Assim, desenvolveu-se uma
investigação sobre a simbologia de manifestações religiosas e de movimentos culturais da
música afro-brasileira. A partir da revisão bibliográfica referente à formação da sociedade
brasileira, aprofundou-se a análise de Darcy Ribeiro acerca das questões étnico raciais.
Todas essas referências embasaram a identidade visual do projeto de moda feminino,
“Mulheres Coloridas”, que integra a marca “Criola Fulô”, criada com a finalidade de
contribuir para a divulgação e valorização da cultura afro-brasileiro no cenário da moda em
nosso país.

Palavras-chave: Cultura Afrodescendente; Adinkra; Coleção de Moda; estamparia têxtil;


Identidade Visual.

Abstract

This report aims to present the research carried out for creation of a collection of prints for
women’s fashion inspired the roots and Afro-descendant culture, characterized by symbols
and codes of the African culture of Adinkra, in order to enhance and propagate the Brazilian
cultural identity. Thus, an investigation was carried out on the symbolism of religious
manifestations and cultural movements of Afro-Brazilian music. From the bibliographic
review referring to the formation of Brazilian society, Darcy Ribeiro analysis of racial ethnic
issues was deepened. All these references
supported the visual identity of the women's fashion project, “Mulheres Coloridas”, which is
part of the “Criola Fulô” brand, created with the purpose of contributing to the dissemination
and enhancement of Afro-Brazilian culture in the fashion scene in our country.

Key words: Afro-descendant culture; Adinkra; Fashion collection; textile printing; Visual
identity.

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“Temos o direito a sermos iguais quando a diferença nos
Inferioriza. Temos o direito a sermos diferentes
quando a igualdade nos descaracteriza”.
(Boaventura de Souza Santos)

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 5
2. OBJETIVOS .......................................................................................................... 6
2.1 Objetivo Geral ................................................................................................. 6
2.2 Objetivos Específicos ...................................................................................... 6
3. REFERÊNCIAL TEÓRICO .................................................................................... 7
3.1 Breves notas sobre a construção do social e imaginária de racismo .............. 7
3.2 Favelas: lugar onde nasce a cultura afrodescendente ................................... 10
3.3 Quem é o Afrodescendente brasileiro? .......................................................... 13
3.4 A Cultura Afrodescendente .............................................................................. · 17

4. METODOLOGIA ................................................................................................... 28
5. DESCRIÇÃO DAS ETAPA.................................................................................... 29
5.1 Público-alvo .................................................................................................... 29
5.2 Tendências ..................................................................................................... 30
5.3 Cartela de Cor................................................................................................. 32
5.4 Tecidos e aviamentos ..................................................................................... 33
5.5 Tema da Coleção: “Mulheres Coloridas” ........................................................ 34
5.6 Criação da Coleção ........................................................................................ 36
5.6.1 Mix 1 – Resgate às origens .................................................................. 37
5.6.2 Mix 2 – Equilíbrio .................................................................................. 46
5.6.3 Mix 3 – Vibração ................................................................................... 60
5.7 Identidade Visual ............................................................................................ 62
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS E CONCLUSÃO ...................................................... 66
7. BIBLIOGRAFIA...................................................................................................... 67

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1. INTRODUÇÃO

Esse projeto surge de uma necessidade percebida no contexto da moda brasileira:


há poucas coleções representativas da cultura afrodescendente, se comparar com roupas
inspiradas no biótipo da mulher europeia.

A constatação é baseada nos dados de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e


Estatística – IBGE (IBGE, 2010), informando que 43,1% dos brasileiros são formados por
pessoas de pele parda e 7,6% de pessoas com a cor da pele preta, totalizando 50,7% de
pessoas que não são brancas. Números que revelam a miscigenação entre negros, brancos
e índios no Brasil, ocorrida de forma tão intensa que até hoje o número de afrodescendentes
é a maioria da população brasileira. Porém, quando se trata de moda no Brasil, o número
de lojas que apresenta coleções com a temática representando a cultura do povo
afrodescendente é irrisória. Além desses dados, o censo brasileiro revela que 43% dos afro-
brasileiros declararam que não são adeptos de nenhuma religião, refletindo fatores ligados
ao processo de branqueamento, projeto nacional racista implementado por meio de uma
miscigenação seletiva.

Assim, a coleção “Mulheres Coloridas” tem a proposta de buscar entender a


problemática decorrente da colonização do Brasil e a vinda dos povos pretos da África,
realizando um estudo focado na cultura afrodescendente, a fim de aplicar em produtos de
moda.

Para tanto, será realizada uma revisão bibliográfica do contexto histórico da chegada
dos povos pretos no Brasil, em 1550, da culminância da multiculturalização e a da
construção social e imaginária da identidade do povo brasileiro. Uma narrativa escrita por
brancos com ideais europeus, permeada de equívocos, histórias de abusos, injustiças,
difamações, mutilações e racismos vivenciados pelos pretos escravizados. Conforme os
registros oficiais, a libertação dos escravizados se dá em 1888, quando são abandonados
à própria sorte, sem ações e políticas públicas capazes de sociabilizar de maneira digna. A
substituição da mão de obra escravizada pela remunerada, a partir da imigração italiana, e
os problemas decorrentes desse evento, deflagraram a formação das favelas brasileiras,
categoria de análise importante na pesquisa para criação da identidade visual da marca
“Criola Fulô”.

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A partir do estudo da iconografia e simbologia Adinkra, africanos da região de Gana,
que já tem a tradição de utilizar tecidos com símbolos culturais, haverá uma investigação
acerca do campo da música afro-brasileira, dos costumes e da religião.

A segunda parte desta pesquisa apresentará a sistematização do desenvolvimento


do projeto de coleção estampas e os impactos de uma marca adequada à identidade do
público alvo, atendendo uma lacuna do mercado da moda brasileira.

Espera-se, assim, propagar um conceito na moda, que se adeque as características


das raízes do povo brasileiro, gerando empoderamento étnico através de produtos de
moda, posto que não foi percebido no Brasil, salvo por umas poucas marcas existentes na
Bahia, um mercado inclinado às questões étnicas raciais.

Trazer à tona estes questionamentos e mostrar a verdadeira face do Brasil é a


intenção deste trabalho, diferente daquele Brasil que buscava deixar invisível os povos
pretos e seus descendentes; portanto, espera-se que a moda possa ser usada como
ferramenta para dialogar, denunciar ou empoderar grupos étnicos, como os afro-brasileiros.

2. OBJETIVOS
2.1 OBJETIVO GERAL

Este relatório tem o objetivo de apresentar a pesquisa realizada para a criação de de


estampas aplicada em uma coleção de moda feminina pautada na estamparia
caracterizada por símbolos e códigos da cultura de matriz africana Adinkra, a fim de
valorizar e propagar a identidade cultural brasileira.

2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS


● Perpetuar a cultura e costumes dos povos afrodescendentes;
● Compreender a simbologia do povo de Gana, conhecida como cultura Adinkra;
● Demonstrar as manifestações musicais e religiosas, traduzidas no formato de
imagens e estampas;
● Discutir questões estéticas em ralação à beleza dos códigos e símbolos referentes
aos afrodescendentes;
● Contribuir para maior valorização da cultura africana no Brasil.

3. REFERÊNCIAL TÉORICO
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3.1. Breves notas sobre a construção social e imaginária de racismo

Conforme Nascimento (2008), o racismo vivenciado pelos povos pretos devido ao


tom da sua pele é uma forma de tentar desarticular um grupo social, da sua própria
existência e de sua personalidade coletiva, já que são reduzidos à condição de “negros”.
Desta forma, a condição humana lhes é roubada, posto que foram retirados o seu
referencial histórico e cultural. O processo de desumanizar os povos pretos, através de
processos de dominação desses povos, não iniciou com o escravismo colonialista
ocidental, mas ele é anterior ao escravismo árabe dos séculos VIII e IX e, inclusive ao
império Romano.

De acordo com Ribeiro (1995), o número de pretos introduzidos no Brasil como


escravos até 1850 chegou a 6 milhões. Vindos de diversas partes da África para trabalhar
nas lavouras de cana de açúcar, principalmente na Bahia, a primeira cidade a surgir no
Brasil. O advento da multiculturalização dos povos foi um fator muito prejudicial para as
culturas africanas, já que o preto não era mais identificado nem como africano nem como
brasileiro, mas resumido a “coisa nenhuma”.

A história da colonização do Brasil que compreende o período seiscentista foi


marcada pela escrita de Frei Vicente do Salvador, Padre Antônio Vieira da Costa e o poeta
Gregório de Matos, que contribuíram para influenciar negativamente o imaginário das
pessoas, desconstruindo a identidade dos povos pretos vindos da África para o Brasil.

A estrutura montada para a formação da sociedade Brasileira, desde o princípio,


ocupou-se de se inspirar no referencial europeu, beneficiando a camada branca da
sociedade, em prol da discriminação tanto do índio como do negro, que eram usados como
mercadoria e massa de manobra da classe dominante.

De acordo com Rubin e Ramos (2008), o Padre Antônio Vieira durante os seus
sermões para senhores e escravos induzia os homens pretos a aceitarem a sua condição
servil de homem escravizado, enquanto fornecia à plateia branca um discurso de
preservação da ideologia e das práticas escravistas.

Já o poeta Gregório de Matos (MATOS, 1882, p.211), provido de um espírito


libertário e satírico, compartilhava poesias articuladas para depreciar os pretos e os crioulos

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nascidos no Brasil, trazendo à tona referências pornográficas das mulheres pretas e
mestiças, um misto de escárnio e racismo em formato de poesia.

Muito mentes, mulatinha!


Não sei quem, sendo tu tão escura,
Ti ensina a mentir às claras.
Tal vestido não é teu,
Nem tu tens, Damázia, cara
Para ganhar um vestido,
Que custa tantas patacas
Tu ganhas dous, tres tostões
Por duas ou tres topadas,
Não chegam as galaduras
Para deitar uma gala.

(GUERRA, Gregório de Matos. O poema “Damásia”, do livro: Obras Poéticas


de Gregório de Matos, p.211)

O poema acima, retrata a situação aviltante, e preconceituosa em torno das mulheres


pretas na sociedade da época, o poeta faz o leitor acreditar que as relações sexuais tidas
entre o colonizador e o escravo eram realizadas de forma pacífica por parte da escravizada.
Entretanto, e de acordo com Freyre (1943), esta perspectiva é uma visão estereotipada do
problema de uma sociedade onde imperava a escravidão, e a mulher mulata era vista como
uma mercadoria, sujeita às leis da procura e da oferta e parte das relações de dominação,
inclusive no âmbito sexual.

Os autores Gregório de Matos, Frei Vicente do Salvador e Padre Antônio Vieira da


Costa tiveram lugares de fala evidenciados, sendo responsáveis por um discurso
preconceituoso em relação aos pretos e afrodescendentes. De acordo com Candido (1964),
a produção textual no período do barroco foi muito importante para a compreensão da
formação da sociedade brasileira, porém ela colaborou de forma negativa, expondo as
questões dos pontos vindos da África com preconceito ajudando a formar um imaginário
racista, já que pregava o racismo.

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Conforme Ribeiro (1995), no decorrer dos anos, apesar de toda resistência dos
pretos, a transfiguração psicocultural foi inevitável, ocorrendo não só nas comunidades
indígenas, como também nas populações afro-brasileiras, legitimada pelo preconceito
social e a discriminação, interiorizada em seus valores básicos, que representam um papel
etnocida.

Figura 1- Obra intitulada Negra Escrava Fujona com Gargalheira e Grande Pote de Barro à Cabeça.
Fonte: artista Joaquim Cândido Guillobel.

Joaquim Cândido Guillobel, nascido em Lisboa, veio para o Brasil no ano de 1808,
para trabalhar como tenente do Imperial Corpo de Engenheiros. Aqui, passou a exercer a
função de desenhista, retratando cenas urbanas do Rio de Janeiro daquela época, bem
como a rotina dos escravos, visualizadas em aguadas e aquarela sobre papel.

Para Nascimento (2008), a identidade “negra” sobretudo na América Latina, sofre


até hoje a falta de referência histórica, de onde poderiam construir a sua auto-imagem, com
respeito e autoestima. A “cultura negra” é definida pelos padrões da sociedade branca
dominante. Para a autora, as atividades intelectuais, científicas, políticas econômicas,
técnica e tecnológicas, são considerados atributos dados às pessoas brancas, enquanto os
“negros” são excluídos dessas atividades, e pior que isso, a criança e o jovem negro
passam a deixar de desejar um cargo nessas áreas, por acreditarem que eles não têm
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potencial desejável.

3.2 Favelas: lugar onde nasce a cultura afrodescendente

De acordo com Ribeiro (1995), as favelas surgiram devido o descaso das


autoridades que comandaram o Brasil. O fenômeno teve início logo após a abolição da
escravatura, no momento que a mão de obra escrava foi substituída por imigrantes italianos
que vieram para trabalhar nas lavouras de café. A Europa passava por uma crise de
desemprego e 7 milhões de imigrantes desembarcaram no Brasil, sendo por volta de 4
milhões em São Paulo e foram os responsáveis pelo primeiro surto industrial ocorrido no
Brasil. Os pretos foram descartados, e entregues a sua própria sorte; sem a posse de
pequenos pedaços de terra, onde pudessem cultivar e tirar dela o sustento para sua
sobrevivência, assim, sem acesso a trabalho, educação ou assistência médica, tornaram-
se marginais da sociedade.

Grande parte dos ex-escravos se dirigiram às cidades em busca de trabalho e se


fixaram nas encostas de morros, a margem da sociedade, segregados em espaços que
não lhes oferecia dignidade, porém, um espaço de convivência menos hostil do que as
senzalas. Algumas pretas conseguiram trabalho como lavadeiras, cozinheiras ou faxineiras,
já os homens tinham mais dificuldades em arrumar trabalho.

A independência derramou quantidades de lusitanos por toda a parte, todos


muito voltados ao comércio [...] E a abolição, dando alguma oportunidade de
ir e vir aos negros, encheu as cidades do Rio e da Bahia de núcleos chamados
africanos, que se desdobraram nas favelas de agora. (RIBEIRO, 1995)

Ainda conforme Ribeiro (1995), esses pequenos povoados que se formaram,


originalmente eram chamados de bairros africanos, e mais tarde abrigava construções
denominadas de cortiços. De acordo com relato de Aluísio Azevedo autor da crônica “Casa
de Cômodos”, essas casas, eram alugadas na sua maioria por portugueses, e elas
continham pequenos quartos, que eram sublocados, por famílias inteiras, e moravam todos
juntos em um pequeno quarto, geralmente eram habitadas por muita gente humilde,
trabalhadores e desemparados.

[...] estudantes pobres, carteiros e praticantes do correio, repórteres de jornais


efêmeros, moços de botequim, operários de todas as profissões, comparsas
e figurantes de teatro, pianistas de contrato por noite, cantores de igreja,
costureiras sem oficina, cigarreiros sem fábrica, barbeiros sem loja,
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tipógrafos, guarda-freios, limpa- trilhos, bandeiras de bondes, enfim toda essa
gente, para quem se inventaram os postos mais ingratos na luta pela vida, os
mais precários e os mais arriscados” (AZEVEDO, 1944, p.56).

De acordo com Mattos, (2008) no ano de 1905, um engenheiro civil do Rio de Janeiro
e professor da escola Politécnica, chamado Everardo Backheuser escreveu um artigo para
a revista “Renascença”, denunciando o cortiço, classificando-o como a pior de todas as
habitações. De acordo com Backheuser (1905, apud MATTOS, 2008, p.47), as casas de
cômodos eram: - “a mais anti-higiênica e a mais detestável das habitações coletivas”, e
além disso, as chamou de obscuras, precárias e lúgubres moradas onde vegeta a
população indigente da cidade.

Para o engenheiro, se ocorresse a derrubada dos cortiços, a situação das pessoas


que residia nessas casas, se agravaria, a primeira solução descrita por ele era deixá-las se
acabar sozinhas com o tempo, em prol de no futuro, florescer vilas operárias, no lugar
destas, porém, nesse mesmo artigo ele concorda que esses casarões deveriam ser
demolidos.

De acordo com Ribeiro (1995) sempre existiu um plano para tornar os


afrodescendentes invisíveis aos olhos da sociedade branca e a conclusão que Matos (2008)
chega, sobre o artigo escrito pelo engenheiro Everardo Backheuser, é exatamente este, ou
seja, com a substituição dos cortiços, pelas vilas operárias, o esperado era que os hábitos
e costumes populares, relacionados as festas que ocorriam nos cortiços do Rio de Janeiro
seriam erradicados quando surgissem as tais vilas operárias.

Como são muitas [essas habitações] perdurarão por certo emprestando à


cidade um aspecto pitoresco com o seu tic de originalidade de costumes, de
onde sairá gravado o tipo dos trovadores notívagos de viola e sanfona
perdendo-se pela noite adentro em melopéias insípidas ou em fandangos em
que muitas vezes termina a função pelo rolo ou pela navalha. Backheuser
(1905, apud MATTOS, 2008, p.48).

Para Mattos (2008) essas reuniões musicais, ocorridas nos cortiços eram as
principais diversões da população que ali morava, e foram se tornando cada vez mais
comum, até que em 1920 receberam uma ressignificação, relacionada a valorização da
cultura popular através do samba.

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Além dos casarões, esses bairros denominados de africanos, possuía vários
casebres que na época eram denominadas de choças.

O “morro da Favela”, nada mais é que o antigo morro da Providência [...] É


assim chamado depois da luta de Canudos, pelos soldados que de lá voltaram
e que por certo acharam o seu quê de semelhança entre o reduto dos
fanáticos e o reduto da miséria do Rio de Janeiro. Backheuser (1905, apud
MATTOS, 2008, p.49).

Conforme Mattos (2008), a citação acima faz referência ao Morro da Providência


existente na cidade de Monte Santo na Bahia, local esse, onde tropas republicanas foram
derrotadas pelos jagunços de Canudos e esse morro era coberto por uma planta conhecida
como favela, e por esse motivo, esse morro passou a ser chamado de Morro da favela.
Sobre isso, Pinto (1930), diz que a favela é o nome popular de uma planta típica da Caatinga
do nordeste brasileiro sendo seu nome original Cnidoscolus quercifolius. Esta planta era
encontrada na encosta do arraial de Canudos na Bahia, e servia como proteção, alimento,
remédio natural, para os sertanejos, durante a guerra de Canudos, entre outros benefícios.
O Fruto é uma cápsula que contém sementes oleaginosas, semelhantes às sementes de
fava, de onde saíram os nomes de "favela", "faveleiro" e "faveleira". Este arbusto, possui
folhas largas, espinhos pontiagudos e apresenta várias flores miúdas na cor branca.

Bem antes desse artigo ser escrito, por volta do ano de 1902, os jornais e revistas
ilustradas, contribuíam para que esse nome ficasse gravado na mente das pessoas, a
medida que foram sendo estampando fotos da população pobre formada na sua maioria
por pretos, e colunas das revistas descreviam a semelhanças entre o Morro da Favela
existente na Bahia, associado a Guerra de Canudos, e considerado como não “civilizado”,
formado por “classes perigosas”, com os morros do Rio de Janeiro, que figuravam as
colunas policiais. Esse estigma foi propagando de uma forma que o termo favela ou
aglomerados subnormais no Brasil foi adotado oficialmente pelo IBGE a partir do Censo de
2010 e de acordo com dicionário Houaiss (2001), o nome favela é aplicado a qualquer
conjunto de habitações populares precárias.

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Figura 2- Plantação de favela no Nordeste brasileiro.
Fonte: Laceildo Veloso.

De acordo com Fernandes, (1972), foi muito difícil os negros lutar por um espaço
naquela sociedade desumana; eles estavam completamente sozinhos “abandonados à
própria sorte”. Não tiveram nenhum plano de assistência dada pela Estado, não foram
incluídos à sociedade que estava nascendo. Eles competiam com os imigrantes brancos
mais bem estruturados, contra o preconceito da escravidão, da cor, dos seus hábitos,
costumes e religião.

Ribeiro (1995) concorda com Fernandes, quando diz que a favela é um campo que
gera grandes conflitos, porque a população foi deixada ao abandono, porém, com hábitos
muito integrados e criativos. Ela é representada por uma urbanização caótica, cheia de
problemas não resolvidos, que perpassa pela falta de saneamento básico, abastecimento
de água potável, falta de iluminação pública, falta de policiamento, edificações que vão se
erguendo em encostas íngremes, sem um estudo prévio, e ainda como se não bastasse,
as casas são tão estreitas e apertadas, que permitem que crianças visualizem e tenham
contato muito cedo com a vida sexual dos “pais”, o que pode vir a influenciar na gravidez
precoce, além do problema das drogas, decorrente da falta de emprego, e se tornou uma
fonte de renda para os moradores desses vários mundos e abismos, que separam as
favelas das cidades de forma abrupta, em espaços que segregam.

3.3 Quem é o Afrodescendente brasileiro?

De acordo com estudos realizados por Nina Rodrigues (1935), os africanos introduzidos
no Brasil se distingue por três grandes grupos culturais. O primeiro deles, se refere as
culturas sudanesas, representado, pelos grupos Yoruba – chamados Nagô –, pelos

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Dahomey, designados geralmente como Gegê e pelos Fanti-Ashanti, conhecidos como
minas. O segundo grupo identificado, foi os Peuhl, os Mandinga e os Haussa, do Norte da
Nigéria, identificados na Bahia como negros Malé e no Rio de Janeiro como negros Alufá,
eles trouxeram ao Brasil as culturas africanas islamizadas, bem como os povos que vieram
de Gana e da Costa do Martim. O terceiro grupo cultural africano era integrado por tribos
Bantu, do grupo congo-angolês, provenientes da área hoje compreendida pela Angola e a
“Contra Costa”, que corresponde ao atual território de Moçambique.

Os afro-brasileiros de hoje, são os descendentes dos grupos culturais africanos que


vieram para o Brasil e viveram ao redor dos engenhos. Devido as políticas escravagistas,
foram obrigados a desaculturar-se, e se formaram a partir dos relacionamentos entre o
branco, o preto e o índio.

De acordo com Nascimento (2003) termo afrodescendente foi criado pelo movimento
negro a fim de incluir todos os descendentes africanos de vários lugares do mundo. No
Brasil, se usa o termo afro-brasileiro para substituir o termo negro que tem seu conceito
ligado à escravidão, pois esse termo automaticamente nos arremete para navios negreiros,
termo esse que causa grande sofrimento a essa comunidade, além de ser pejorativo. Além
disso, o termo negro está ligado à raça, conforme Guimarães (1999) e com os avanços da
Ciência, o termo raça em seu aspecto Biológico foi sendo contestado á medida que as
pesquisas, como o exame do DNA, apontavam que os indivíduos de “raças diferentes” eram
biologicamente iguais.
Descobriu-se que todos os seres humanos descendiam de um ancestral de origem
africana. Logo, o embasamento científico do termo raça foi invalidado e o seu conceito
passou a ser visto como algo ficcional, Guimarães (1999). Para os antropólogos, o conceito
de raça estaria ligado a um grupo com descendência em comum.
Segundo Nascimento (2003), usar o termo raça como referência à ancestralidade, a
aspectos culturais e históricos sem associação a teorias biológicas é mais adequado do
que o uso do termo etnia que, assim, perderia o seu uso. Kabengele Munanga (2004) vai
pela mesma linha de pensamento ao afirmar que o conceito de raça não tendo
embasamento científico, não se pode deixar de justificar o seu uso como conceito de
construção sociológica e categoria racial de dominação e exclusão.

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Nascimento (2003) defende que suprimir o termo raça seria uma forma utópica,
porque as pessoas já têm desenvolvido em seu imaginário o conceito das raças simbólicas,
o que para autora favoreceria o racismo simbólico. Aliás, isso seria o que acontece no Brasil
onde o termo raça foi substituído por cor com validade acadêmica a fim de consolidar o
pensamento que o país seria antirracista, mascarando a supremacia branca. Porém
segundo (GUIMARÃES, 2003) é importante se refletir que o termo cor: admite uma leitura
essencial e ao mesmo tempo espontânea, objetiva e subjetiva. A cor não se encontra
atrelada a nenhuma teoria social específica, enquanto categoria natural, todavia, pode
tornar importantes, ideias e valores no plano estético e moral.
Conforme Nascimento (2006) o primeiro censo demográfico foi realizado no Brasil
em 1872, as raças eram classificadas em: branco preto, pardo e caboclo, já em 1940 a
palavra raça foi substituída por cor: branco, preto e amarelo, assim segundo a autora a cor
tornou-se “o suporte para as representações ambíguas que satisfizeram o ideário de nação
que visava agregar e não dividir” (NASCIMENTO, 2006, p.138). Refletindo sobre essa nova
abordagem Camargo (2010, p.254 apud NOTA TÉCNICA IBGE), considera que ocorre
neste momento uma mudança radical de ponto de vista, “pois o que se valoriza não é mais
os tipos raciais originários, mas a ‘cor’, isto é, as tonalidades de pele, sem a antiga
referencia a continuidade sanguínea”.
O conceito de Afrodescendente é utilizado por diferentes áreas das ciências
humanas, dentre elas, estudos históricos e antropológicos, educacionais, literários e
políticos. Conforme Teixeira (2014, p.4) o conceito, designa “todos os descendentes de
africanos no novo mundo, segundo decisão da Conferência Preparatória da América Latina
ocorrida em Santiago do Chile no ano 2000”. Também, a Conferência Mundial contra o
Racismo, a Discriminação Racial, Xenofobia e todas as formas de Intolerância que
aconteceu em Durban, África do Sul, em 2001 instituiu que o termo afrodescendente torna-
se linguagem consagrada nas Nações Unidas e designa um grupo específico de vítimas do
racismo e da discriminação (TEIXEIRA 2014, p.4).
No Brasil esta mesma definição foi referendada pela Campanha Nacional contra o
Racismo em 2003, enfatizando o caráter político dessa decisão com a publicação da Lei
10.639. Na sequência, a Resolução nº 1 do Conselho Nacional de Educação em 2004
instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Étnico - Raciais
e para o Ensino da História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Quem é o afrodescendente
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brasileiro? O que se sabe é que o termo envolve memórias de gerações que o ligam a
determinada etnia, religiosidade afro-brasileira, cor e questões ligadas as causas políticas
anti-racistas, que combatem o preconceito e a discriminação.
Assim, se compreende que o termo afro pode abranger muitas tonalidades de pele,
sobre isso a artista Adriana Varejão em uma de suas exposições questiona: qual a sua cor?
Ela se inspirou nos dados do censo de 1976 onde IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia
Estatística), resolveu abrir essa questão para que as pessoas definissem a sua cor e foram
encontradas mais de 100 cores onde a artista escolheu 33 desses nomes de cores de pele
e a partir deles criou suas próprias tintas a óleo interpretando-as visualmente. Na exposição
ela reproduziu seu rosto diversas vezes e em cada representação ela pintou uma parte do
rosto com as tintas criadas por ela. A artista contribui com a sua arte para percebermos que
além das cores: branco, preto, amarelo e pardo, os brasileiros (as) se definem com outras
tonalidades como: café com leite, encerada, morenão, cor firme, sapecada, queimada de
sol, morena escura, mulata, morena-bem-chegada, bugresinha escura, chocolate, samba,
mel, turva, cabocla, etc.
Nesse sentido, se entende uma estratégia discursiva de redefinição do termo como
forma de superação da discriminação, aplicadas aos conceitos já usuais. Numa pesquisa
realizada neste estudo em sites da internet se verificou que o mercado esta se abrindo para
a criação de novos produtos baseados nos tons de pele; algumas marcas perceberam a
necessidade de mercado e já estão atendendo o público especificado, adaptando seus
produtos a diversidade de raças, corpos e cultura. Por exemplo, a marca Matel, fez a
evolução da boneca Barbie, criando outros tons de pele incluindo a boneca Black Power e
novas silhuetas para a mesma. Esse feito recebeu diversos comentários e entre os mais
comentados lemos: “agora ela se parece comigo”.
Os produtos de maquilagem, também, evoluíram criando novas linhas diversificando
as tonalidades do tom nude. As marcas de lingeries estão criando peças com diversas
nuances de pele, o segmento dos calçados acompanha essa evolução. Foi percebido uma
abertura, para o mercado de produtos afro, mas criar produtos de moda com os tons de
pele, não é suficiente para inserir um sujeito na sociedade, é necessário mais, reafirmar
sua cultura, seus costumes perante os demais, como forma de engrandecer e enaltecer a
história de um povo.

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3.4 Cultura Afrodescendente

De acordo com Tylor (1877, apud MINTIZ, 2009, p.224), o termo “cultura” refere-se
a todos os produtos comportamentais, espirituais e materiais da vida social humana. Assim,
a cultura inclui as artes, a ciência, o conhecimento, a moral, a lei, os costumes e todo os
demais hábitos e comportamentos adquirido pelo humano dentro da sociedade.
Conforme Darcy Ribeiro (1995) a mestiçagem fez nascer um novo gênero humano
nova gente, mestiça na carne e no espírito; “novo porque surge como uma etnia nacional,
diferenciada culturalmente de suas matrizes formadoras, fortemente mestiça, dinamizada
por uma diversidade cultural ou cultura formada por vários elementos de origem distingas”.
Ao contrário do que se podia imaginar, um conjunto tão variado de matrizes
formadoras não resultou num conjunto multiétnico. Para Darcy, (1995), “os brasileiros se
sabem, se sentem e se comportam como uma só gente, pertencente a uma mesma etnia”.
Mas essa unidade não significa uniformidade, pois o homem se adaptou ao meio ambiente,
criando modos de vida diferentes e com a urbanização houve uma uniformização dos
brasileiros, sem eliminar suas diferenças. Segundo Darcy (1995), fala-se em todo o país
uma mesma língua, só diferencia por sotaques regionais, “Mais do que uma simples etnia,
o Brasil é um povo nação, assentado num território próprio para nele viver seu destino”.

Ribeiro (1995) chama de área cultural crioula à conformação histórico-cultural


resultante da implantação da economia açucareira, que possibilitou outras formas de
vivencias cotidianas das pessoas ao redor dos engenhos, relacionadas a produção da
aguardente, rapadura, lavouras produtoras de tabaco para fabricação do fumo e a produção
do cacau, que corresponde a faixa litorânea do Nordeste brasileiro, que vai do Rio Grande
do Norte à Bahia.

Os primeiros escravos trazidos para as américas, foram os povos Akan que


pertenceram a civilizações antigas da África Ocidental, esse povo constitui grupos étnicos
com uma rica cultura, e habitaram a costa da África conhecida como Gana e a Costa do
Marfim. De acordo com nascimento (2009) o povo Akan, possui uma riquíssima cultura,
conhecida como Adinkra, que se define por uma escrita, formulada a partir de símbolos
pictóricos e transmitem provérbios ou valores culturais e espirituais preservados pelos
povos, como uma filosofia de vida. Para autora, existe uma ligação entre os povos do Egito

17
e os povos Akan, principalmente na simbologia, usada para se comunicarem, e de acordo
com a autora, há evidências que sacerdotes do Egito, ao serem expulsos, migraram para o
ocidente africano.
Segundo Menezes e Paschoarelli, (2009 p.41) a cultura da civilização akan é
retratada por ideogramas como forma de comunicar e como forma de vida; esses
ideogramas são chamados de Adinkra que significa “dizer adeus, e por isso eles
estampavam manualmente os tecidos, para ocasiões como funerais ou festividades.
Hoje, os tecidos com os símbolos da cultura Adinkra são usados por outros grupos
étnicos em Gana em uma variedade de eventos sociais, em ocasiões de festividade. Além
disso, os símbolos migraram para outras planos e plataformas, devido a sua importância e
beleza de significados, podem ser vistos em cerâmicas, prédios, casas, tatuagens, e em
estudos para criar ícones na internet, entre outros
Para o povo Akan a cultura é muito importante, estar sempre em contado as suas
raízes e as histórias dos antepassados, que devem ser transmitidas para os descendentes
no futuro, e dessa forma colaborar para a identidade do grupo no intuito de fortalecer os
elos.
Nesse sistema de comunicação, cada símbolo possui seu significado; o símbolo
Sankofa, é representada por dois símbolos: por um pássaro mítico com a cabeça voltada
para trás, e o coração estilizado. Ambos significam “volte e pegue”, ou seja, voltar ao
passado, para adquirir conhecimento e sabedoria, e dessa forma construir um futuro
melhor.

Figura 3- Sankofa 1.
Fonte: WILLIS (1998).

A segunda representação da simbologia Sankofa é feita pelo coração estilizado, que está
relacionado a sabedoria, para passar a mensagem adiante, e construir um futuro melhor, e
para isso é necessário mapear o passado.
18
Figura 4- Sankofa 2.
Fonte: WILLIS (1998).

A linguagem original o símbolo Nyame Dua significa, árvore de Deus. Ele simboliza o
altar local onde os rituais sagrados são realizados, ocorrendo o momento para purificação
e benção, representando a proteção e presença de Deus.

Figura 5- Nyame Dua.


Fonte: WILLIS (1998).

O símbolo - Dwennimmen – “Chifres de Carneiro” representa a humildade e força;


ou seja, o carneiro lutará com o adversário, mas também se submete humildemente ao
massacre, enfatizando que até os fortes precisam ser humildes.

Figura 6- Dwennimmen.
Fonte: WILLIS (1998).

Símbolo do conhecimento, educação ao longo da vida uma busca contínua de


conhecimentos.
19
Figura 7- Nea Onnim No Sua A, Ohu.
Fonte: WILLIS (1998).

O símbolo abaixo, representa divisões cruzadas feitas no tecido adinkra antes de


carimbar, uma habilidade e precisão exercida por artesãos, para garantir que os símbolos
fiquem alinhados geometricamente, está técnica é usualmente realizada, com uso de
carimbos africanos.

Figura 8- Nkyimu.
Fonte: WILLIS (1998).

De acordo com Nascimento (2009), a simbologia Adinkra, carrega consigo mais de


oitenta símbolos e seu conteúdo visual e estético, incorpora e preserva aspectos da história
e da filosofia juntamente com seus valores socioculturais. Eles podem representar aspectos
da vida vegetal, do corpo humano, elementos geométricos e abstratos.
Os africanos da civilização Akan que vieram para o Brasil, devido as circunstancias
cruéis de sobrevivência, perderam a possibilidade de passar adiante a sua cultura, e os que
vieram depois, também viveram momentos de crueldade e se preocuparam em aprender o
português, para entender porque os capatazes lhes gritavam tanto. Conforme Darcy Ribeiro
(1985), após terem conseguido aportuguesar no Brasil, influenciaram de muitas maneiras
as áreas culturais onde mais se concentraram. No âmbito das religiões, praticadas nos
terreiros e outras tendências foram se firmando a partir da população crioula que surgiu no
lugar. Essa religião, que hoje, após ser trabalhada por gerações e gerações, constituiu-se

20
uma expressão da consciência negra, frente as lutas travadas com os senhores de
engenho.

“A empresa escravista, atuou como uma mó desumanizadora e deculturadora de


eficácia incomparável. Submetido a essa compressão, qualquer povo é
desapropriado de si, deixando de ser ele próprio, primeiro, para ser ninguém ao ver-
se reduzido a uma condição de bem semovente, como um animal de carga; depois,
para ser outro, quando transfigurado etnicamente na linha consentida pelo senhor,
que é a mais compatível com a preservação dos seus interesses”. (DARCY RIBEIRO,
1995)

Os cultos religiosos africanos, representam uma parte da cultura repleta de


elementos mitológicos, e hoje são vivenciados principalmente nos locais onde receberam
maiores contingentes de pretos, como por exemplo na São Luís, Bahia, Recife e Rio de
Janeiro. Nessas regiões brasileiras, os afrodescendentes gozam de maior liberdade para
praticar a sua religião.

Ainda conforme o autor, esses cultos, foram construídos como uma forma de
resistência dos tempos de escravidão, o Candomblé, a Umbanda, o Xangô, constitui o
centro de vida religiosa, onde a população pobre mais ativa, é formada por pretas e pardas
como brancas.

Os mitos cultuados na religião africana, abrange vários deuses; e de acordo com


Prandi (2001) os orixás são deuses que receberam de Olodumare ou Olorum, ou seja, a
incumbência de criar e governar o mundo. O panteão iorubano na América é constituído de
uma vintena de orixás e tanto no Brasil como em Cuba cada uma das divindades, ou orixás,
são responsáveis por alguns aspectos ligado à natureza, bem como, aspectos ligados a
vida em sociedade, relacionados a condição humana.

Nesse sentido, ainda conforme o autor, Exu é o orixá sempre presente, identificado
como o papel de mensageiro, portanto responsável pela comunicação; ele foi
grosseiramente interpretado pelos europeus com o diabo, uma forma de preconceito com
a religião africana, já que os africanos acreditam no politeísmo, e portanto, se encontram
do lado aposto da religião católica. Na crença afro, Ogum governa o ferro a metalurgia,
portanto ele é considerado o Deus da guerra, e é o que abre os caminhos da tecnologia,
das oportunidades de realização pessoal. Oxóssi ou Odé é o responsável pelos caçadores,
21
dono da vegetação e da fauna, detém a chave da sobrevivência do homem através do
trabalho. Nanã é a guardiã do saber ancestral, e dona da lama dos lagos, com a qual foi
usada para modelar o ser humano. Oxumarê, faz parte da família de Nanã e é ligado ao
arco-íris, é o deus serpente que controla a chuva, a fertilidade da terra e a prosperidade
das colheitas; Euá é um orixá feminino das fontes e também é parte da família de Nanã,
preside o solo sagrado onde repousam os mortos. Abaluaê é o senhor conhecer dos
segredos da cura para doenças infectocontagiosas. Xangô é o dono do trovão, conhecedor
dos caminhos do poder secular e governador da justiça. Oiá ou Iansã dirige o vento, as
tempestades e a sensualidade feminina, e é ela quem encaminha os espíritos dos mortos
para o outro mundo. Oxum preside o amor e a fertilidade. Iemanjá, a senhora das grandes
águas, mãe dos deuses, do homem e dos peixes, aquela que rege o equilíbrio emocional e
a loucura. Além dos citados acima, a matriz religiosa africana, abriga outros orixás e os
sacerdotes chamados de babalaôs, são considerados sábios, e usam seus mistérios para
resolver problemas e curar as pessoas. Um orixá pode se multiplicar em vários, cada qual
com um repertório específico de ritos, cantos, danças, paramentos, cores, preferências
alimentares.

Oxalá encabeça o panteão da criação, formado de orixás que criaram o mundo


natural, a humanidade e o mundo social. Oxalá é considerado o senhor absoluto,
responsável pela criação do homem. Os mitos dos orixás fazem parte dos poemas
oraculares cultivados pelos babalaôs, e o primeiro documento escrito contendo esses ritos,
na Bahia, foi escrito em 1928, porque a maioria das pessoas que integravam a vida dos
terreiros eram analfabetas. Foi somente a partir de 1930 que escritores e cientistas sociais,
se interessaram em reproduzir os estudos realizados em torno desse assunto. Uma das
grandes contribuições é dada pelo Francês Pierre Verger, e escreveu sua obra monumental
sobre o assunto. Além deste, Agenor Miranda Rocha (1928) escreveu sobre o assunto,
Artur Ramos (1935); Roger Bastide (1954); René Ribeiro (1978), entre outros.

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Figura 9- Cultos africanos representando divindades: Euá, Oxum, Oiá.
Fonte: PRANDI (2001, p.22-25).

A cultura popular afro-brasileira, de acordo com Ribeiro (1995), foi se assentando e


se unificando com seus valores, tradições participativas e foi expressa no folclore, nas
crenças no artesanato, nos costumes e até chegar na música brasileira. Esse processo se
deu com algumas dificuldades, já que o povo não tinha acesso a civilização letrada e aos
novos sistemas mundiais de intercomunicação cultural. Rubim (2008), concorda com
Ribeiro quando ele diz que a ausência de uma cultura escrita massificada, decorre da falta
de condições educacionais, sociais e econômicas, decorrente da alta concentração de
renda, da ampla desigualdade social e do forte índice de desemprego.

Para o Ribeiro (1995), milagrosamente o povo, sobretudo a massa dos povos pretos,
continua tendo erupções de criatividade e assim os afrodescendentes construíram uma
cultura própria, feita de retalhos do que o africano guardara no peito nos longos anos de
escravidão, como sentimentos musicais, ritmos, sabores e religiosidade.

As heranças podem ser saboreadas na culinária afro-brasileira, o Brasil, recebeu


grandes contribuições desse povo, nascida pelas mãos das pretas africanas, que regaram
a comida brasileira com o azeite de dendê e apimentaram o paladar com a malagueta. A
culinária brasileira partindo das referências africanas, teve tanto sucesso, hoje em dia,
vários pratos com raiz africana, foram inseridos no cardápio de restaurantes brasileiros;
entre os pratos podemos destacar: a feijoada, cocada, vatapá, sarapatel, acarajé, caruru,
moqueca, abará, mungunzá, aberém, além de tantas outras delícias. Muitas características
ligadas à cultura raiz dos povos africanos desapareceram com o tempo; outras
permaneceram, e outras nem chegaram a ser desenvolvidas no Brasil, devido as

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circunstancias dos acontecimentos, que levaram os povos africanos a perderem a sua
identidade.

Figura 10- Acarajé da baiana.


Fonte: Francisco Moreira da Costa, 2003.

A partir dessas precárias bases, os afrodescendentes, se sobressaíram, na cultura


popular brasileira e com base nela é que se estruturou o Carnaval, a capoeira, e
inumeráveis manifestações culturais, incluindo a música popular e o samba, como um
componente mais criativo da cultura brasileira e aquele que mais singulariza o nosso povo
e encontra sua identidade.

As cantigas de Mãe Menininha dos Gantois, as cantigas de terreiro, foram as


precursoras, na história da música dos povos pretos no Brasil, e de acordo com Rubim
(2008) a música deixa marcas profundas na vida e no imaginário brasileiro, funcionando
como um dos elementos de maior poder de integração nacional. A raiz da cultura dos
terreiros de crioulos, deu voz a batida dos tambores do grupo Baiano Olodum.

O nome do grupo Olodum, surgiu de Olodumaré e representa o “Deus dos Deuses”


ou o “Deus maior” e possui raiz iorubá, ou seja, faz parte do ritual religioso do candomblé.
A banda Olodum, representa a cultura afro-brasileira, e surgiu em 1979 para trazer lazer
aos moradores do Pelourinho na Bahia; além disso, eles queriam contar a história dos
povos pretos que foram escravizados e por isso suas canções são de protestos.

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As letras das músicas são de responsabilidade do Grupo, e a principal temática é a
crítica social, envolvendo questões sobre desigualdade, preconceito, fome e outros
problemas sociais, além de trazer as histórias de amor, mitos religiosos criados por reis e
rainhas da África, como a história de Akehenaton e Nefertiti sacerdotisa do antigo Egito.

Figura 11- Banda Olodum.


Fonte: https://journals.openedition.org/factsreports/docannexe/image/1361/img-4.png

A banda Olodum é formada por dezenove integrantes, sendo três cantores, seis
músicos de harmonia e dez percussionistas; a matriz Afro é a base da música do Olodum,
eles analisam o contexto social da sua comunidade e relacionam o vocabulário Afro com
as letras das músicas, levando para o campo da significação.

O maestro Neguinho do Samba, já falecido, foi um dos fundadores da banda,


considerado o “pai do samba-reggae”, responsável por introduzir esse estilo da batida
rítmica nas músicas do Olodum. O reggae é um gênero musical que surgiu na Jamaica por
volta de 1960, que por sua vez, foi influenciado pela música tradicional Africana e
Caribenha; além de, receber influencias do movimento religioso Rastafari. O Rastafari foi
um movimento que teve como precursor Hailé Selassie um imperador da Etiópia nascido
em Tafari Makonnem conhecido como (Ras Tafari).

A banda Olodum, trouxe as cores reggae para compor o figurino e os instrumentos


musicais usados pelos componentes do grupo. Originalmente a simbologia das cores do
reggae é inspirado na bandeira da Etiópia (vermelho, amarelo e verde), sendo que o verde
representa as florestas equatoriais da África, o vermelho o sangue da raça negra que foi
derramado, o amarelo o ouro da África. A banda olodum inseriu mais duas cores ao figurino

25
(o preto e o branco), onde o preto representa o orgulho da raça negra e o branco que
representa a paz mundial.

Devido a importância do grupo para os afrodescendentes da Bahia, o nome da banda


Olodum virou patrimônio do povo baiano, porque a música foi insuficiente para atingir todos
os objetivos almejados pelo grupo, que trabalha no combate, na discriminação racial, no
respeito as tradições para a construção de uma identidade afro-brasileira.

Cada ação e atividade desenvolvida pelo grupo, merece destaque, porém a escola
Olodum, criada para crianças e adolescentes afrodescendentes, representa um caminho
para o futuro das crianças do pelourinho, em Salvador. O grupo oferece aulas gratuitas de
percussão, dança Afro, canto, teatro, e produção cultural, em consequência, emprega
centenas de jovens artistas no cenário local e nacional.

Figura 12- Escola Olodum.


Fonte: Foto de Tancredo Calheira.

A ideia da escola é aproximar as crianças da sua cultura raiz, e assim, gerar uma
transformação na sociedade relacionada a diminuição do preconceito, bem como perpetuar
a história desse povo, através da arte, da música e da dança. A escola proporciona o
conhecimento e gera o sentimento de identidade ao grupo, com respeito, diversidade
cultural e singularidade humana;

A batida da percussão, estimula a elevação espiritual, a auto estima das crianças


que lutam para defender a sua identidade, e contribui nesse universo de ações, agregando

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resultados positivos e construindo um legado cultural único para o país, com transparência
e ética.

A declaração Universal dos Direitos do Homem proclamada pela Organização dos


Direitos da Criança (ONU, 1948) centram-se na afirmação e proteção dos direitos
elementares do ser humano, em particular da criança, como o direito a uma
identidade e nacionalidade, a uma família, como o direito a uma identidade e
nacionalidade, a uma família, à saúde, à educação, proteção social, a uma vida
digna, comprometendo-se os Estados a trabalhar para a concretização destes
direitos e necessidades fundamentais. Contudo, estes direitos e necessidades estão
ainda longe de ser uma realidade para muitas crianças adultos e famílias, em
diferentes países e continentes. (RUBIM, 2009, p.273)

Os governos do partido dos trabalhadores (PT), foram os que mais investiram em


educação pensando nas pessoas menos favorecidas. Existem vários críticos, como a
professora Lia Calabre da (UFF) Universidade Federal Fluminense que discorda disso,
porém quem viveu dentro de uma escola profissionalizando como o SENAI por mais de dez
anos, sabe a quantidade e variedade de projetos que foram criados e ofertados, levando
em consideração o número de pessoas, de diferentes faixas etárias, que foram beneficiados
com os programas setoriais criados. Os principais programas realizados, dentro da escola
Senai, foi o Vira Vida, PLANSEC (Plano Setorial de Qualificação Profissional) e
PRONATEC (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego), todos esses
programas, com a finalidade de realizar uma educação voltada para o trabalho e inserção
dessas pessoas no mercado de trabalho. Esses alunos recebiam desde o uniforme, ao
lanche, vale transporte, curso pago e material didático. Foi dessa forma que muitos
conseguir ser reinseridos no mercado de trabalho, já que até então as portas da
Universidade e das escolas técnicas estavam fechadas, para esses grupos.

A partir do Ministro Gilberto Gil foram feitas proposições inovadoras e provocações


criativas, e como foi dito acima, várias portas se abriram e pessoas foram beneficiadas, os
diálogos foram abertos, e parcerias surgiram. O Ministério ousou, ampliou a pasta
intensificando os debates sobre a cultura na Brasil, de uma forma de diminuir os
distanciamentos sociais, fabricados principalmente porque uns tem acesso a educação e
outros não tem esse direito garantido.

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4. METODOLOGIA

Este trabalho foi realizado a partir de pesquisa bibliográfica, compreendendo leitura


de livros, monografias, teses, revistas, sites, dentre outros materiais com objetivo de
conhecer o contexto social e os fatores históricos, importantes e significativo do
comportamento cultural da África, influenciadores da moda afro-brasileira, além dos
aspectos relevantes para a criação de uma coleção e uma marca pautados na cultura
afrodescendentes.
A abordagem da pesquisa tem caráter qualitativo, visto que o ambiente
correspondente a elaboração da coleção foi o recurso para a coleta de dados.
A abordagem a ser usada para suporte na criação da marca e coleção será realizada
por etapas, buscando-se o entendimento dos símbolos da civilização akan e o
conhecimento da cultura afro-brasileira na qual está inserida as raízes da sociedade
brasileira.
● A primeira etapa para o desenvolvimento da coleção e da marca para o público afro,
do curso de pós-graduação em Design de moda, iniciou com a disciplina Projeto de
Moda, que apresentou alguns briefings para que selecionássemos um perfil e partir
dele e dessa forma, desenvolver a marca e um projeto de coleção para o público
escolhido. Na disciplina anterior, Moda, Cultura e identidade foi realizado o estudo
de diversos tipos de púbico.
● A segunda etapa, depois de escolhido o público será realizar uma pesquisa de
campo, em lojas de rua, shopping Center e sites de compras, para constatar as
marcas existentes no mercado que criam roupas para o público afro.
● A terceira fase, compreenderá a pesquisa através de revistas de moda, sites, para
verificar as tendências de moda, que abrange desde os tecidos, formas, cores,
aviamentos, estampas e ferragens.
● Após as pesquisas será realizado o projeto de coleção, que pretende explorar peças
de vestuário, produzidas a partir do cruzamento de dois temas a serem explorados
em conjunto: África e moda. Assim o tema “Mulheres coloridas”, desenvolvido dentro
dessa temática, pretende realizar um estudo sobre os signos e símbolos
socioculturais para produtos de moda identitários. A transposição da temática será

28
realizada através das estampas e cores nos produtos contextualizados para a
coleção de camisetas e blusas.
● A parte final do trabalho será desenvolvido o estudo da identidade da marca, a
criação da logo, que perpassa pelo estudo da Gestalt ou seja, as leis que regem a
percepção humana em relação as formas, para melhor compreender as imagens,
abrangendo elementos como: semelhança da forma, tamanho, cor, interpretando os
signos, símbolos, formato, cores, a tipologia. Estudo esse que abrange os 7 pilares
da Gestalt: a unidade, semelhança, proximidade, continuidade, fechamento e
pregnância.

5. DESCRIÇÃO DAS ETAPAS


5.1 Público alvo

Segundo Polly, (2010)


Os consumidores na atualidade estão muito diversificados e não é mais tão
simples determinar quem vai consumir determinado produto [...] no Brasil,
especificamente, a facilidade de crédito possibilita que trabalhadores
comuns adquiram produtos que há pouco tempo, eram considerados
privilégios da classe A.

Assim sendo a maioria dos designers da atualidade, antes de realizarem a criação


das coleções recorrem às empresas que pesquisam e ajudam a definir o perfil do público
escolhido; Morace apud Centeno destaca que um dos mais conceituados centros de
pesquisa da atualidade é o Future Concept Lab, onde os consumidores são classificados
por faixa etária, tipo de comportamento, segundo ele o que realmente conta são as
experiências de vida das consumidoras, o que os define na hora de separá-los por grupos
geracionais1. Ainda segundo autor, o consumidor tem apresentado mudanças de
comportamento geradas principalmente pela crise global, estando ele mais preocupado
com a própria atuação enquanto autor e protagonista de suas escolhas pessoais.

1Grupos geracionais – grupos que se formam em gerações pautadas não por idades, mas por comportamentos, e que
geram novos conceitos.
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Baseado nos grupos geracionais de Francisco Morace (2009), e na disciplina Projeto
de Moda, e na disciplina Moda, Cultura e identidade, foi selecionado o público denominado
Singular Women, pois esse público, possui todas as qualidades que se assemelham ao tipo
de público, que compraria as peças da coleção desenhada; na faixa etária dos 25 aos 40
anos.
Formado por estudantes que precisam trabalhar para viver, focado na classe C e
classe D e simpatizantes da cultura afro-brasileira. Espera-se com isso abranger uma
grande fatia do mercado, para um público popular de mulheres versáteis, que trabalham
em casa, trabalham fora, dão conta de marido e filhos quando os tem, e ainda acho um
tempinho para se divertir. Gostam de esportes ao ar livre, pedalar, fotografar a sua rotina
diária e repassar para as amigas em grupos de amizades, são pessoas abertas ao novo, e
acima de tudo, não são ligadas a preconceitos.

Figura 13- Colagem revista – Público alvo.


Fonte: Gotos: Revista Capricho/vogue; símbolos Willis (1998).

5.2 Tendências

Os países que formam o “Brics” estão na tendência de moda da próxima coleção; e


representam os novos emergentes. Entre eles estão (Brasil, Rússia Índia, China e Soul
30
África). Alguns elementos que compõem a paisagem desses países estão sendo levadas
para as roupas, principalmente na estamparia. A África é a bola da vez, e as imagens dos
animais estão em alta, como por exemplo, o tigre, que vem formando uma estampa
denomina animal print, e podem ser visualizadas em vitrines do Brasil, Nova York e outros
países, além do tigre, o elefante a zebra, entre outros.

Segundo Amorim (2010, p.39)


“O designer de moda, através da sua arte na criação de vestuários, é
responsável pela grande mudança na indústria de confecções no Brasil.”.
Dando ênfase à produção personalizada, com estilos bem diferentes dos
produtos importados da China e da Índia, despertou o interesse dos
consumidores internos e externos, situados nas classes de renda mais
favorecidas, por estes produtos estilizados.

Outro elemento de tendência, são as batas, vendidas em lojas indianas, e muito


pouco com a temática afro. Elas são muito usadas como saída de praia, principalmente
quem mora ao lado da Orla marítima. Em um país de clima tropical, as blusas coloridas,
estampadas, nunca saem de tendência, bem como os shorts curtos, saias, calças cada vez
mais justas, que ganham nova roupagem a cada estação.

Figura 14- Colagem revista – Painel de tendência.


Fonte: Revista Capricho e Vogue.

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5.3 Cartela de Cor

A coleção “Mulheres Coloridas” traz uma cartela de cores alegre; foram escolhidas
vinte cores que comporão a cartela de cores dessa coleção; entre elas as cores quentes e
as frias para fazer um contraponto na coleção. A pesquisa sobre a religiosidade
afrodescendente, demonstrou que cada orixá possui cores, que os representam, como por
exemplo, a Iemanja, é representada pela cor azul, Iansã é representada por uma vestimenta
(amarelo, dourado e vermelho-coral); o orixá Nanã (Lilás, Azul claro e roxo); Oxum usa as
cores (rosa, azul e amarelo); Oxossi (verde, azul escuro e magenta); Oxalá, (branco); Oiá
(Azul escuro, branco, preto e prata), e assim por diante. Os colares sagrados, usados como
guias nos terreiros de Candomblé, foi um elemento a mais que a coleção resolveu explorar,
já que trazer os santos em estampas, pode ocasionar em uma grande polemica.
O costume de usar muitos colares coloridos ao redor do pescoço tem um significado
sagrado para os afrodescendentes no Brasil, indicando a iniciação nessa religião e na
umbanda. Eles são confeccionados com contas de vidros, búzios e missangas, sendo que
cada cor corresponde a um orixá. E as cores escolhidas para compor a cartela foi o
vermelho, coral, marrons, branco, azul caro e o azul escuro.
Essa coleção, explora as cores dos elementos africanos, como por exemplo, a
bandeira da Etiopia, que é formada pelo vermelho, amarelo e o verde e representa as cores
do Reggae, utilizada no figurino da Banda Olodum, além branco e preto. A cor branca tem
a intenção de transmitir a paz, e realizar a integração dos povos.

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Figura 15- Colagem revista –Cartela de cores.
Fonte: Revista Capricho.

5.4 Tecidos e aviamentos

A matéria prima escolhida para o desenvolvimento do projeto de coleção, está


relacionado a tecidos que fornecem uma boa ergonomia e conforto, a partir da composição
com alguma elasticidade.
A pesquisa realizada detectou que cada vez mais os consumidores de todas as
idades, almejam e prezam pelo conforto, esse fato pode ser comprovado, quando
analisamos a quantidade de tecidos elásticos que foram inseridos no mercado e ganham
cada vez mais novas composições e misturas de fibras.
Assim a coleção escolheu trabalhar com tecidos malha 100% algodão, tecidos leves
e composição em elastano, poliamida e poliéster, como exemplo a Liganete Aero, feita
especialmente para vestidos, e blusas em cortes variados, com excelente caimento; o
Lumini, tecido de poliamida, para blusas leves estilo segunda pele e pode ser estampado
devido ao bom comportamento do tecido ele aceita estampas com a técnica de transfer ou
a quadro; a Helanca, um tecido com a composição de poliéster, e excelente elasticidade e
caimento ideal para roupas femininas.
A ideia é dar preferencia para tecidos que aceitam processos de estamparia
diversificado, bem como bordados diferenciados, que tornem a roupa básica com
33
diferencial. Podemos inserir na coleção tecidos de microfibra sintéticos, porque eles
proporcionam um visual sportswear moderno. Para as partes inferiores, e roupas mais
estruturadas, o brim estampado com pequenas porcentagens de elastano, o que garante o
conforto às consumidoras, além de possibilitar ser uma roupa que pode abraçar uma
quantidade maior de corpos diferenciados.
Para compor a coleção, optamos por inserir o zíper colorido, já que, ele é um item
responsável pela abertura das peças, melhorando a ergonomia do vestuário, trazendo
características que venham a somar na coleção que será apresentada.

5.5 Tema da Coleção: “Mulheres Coloridas”

O Brasil por ser um pais recortado por um imenso litoral, as mulheres se


acostumaram a vestir roupas coloridas e leves; no Nordeste é verão, praticamente o ano
inteiro. O fato do Brasil ser um pais de clima tropical, ajuda na programação de uma coleção
estampada e no desenvolvimento de peças coloridas.
Após entender o contexto vivenciado pelo consumidor brasileiro e para desenvolver
o tema da coleção, foi realizado uma pesquisa, e busca, sobre cantores, principalmente
porque eles têm lugar de fala, e podem influenciar outras pessoas, relacionadas a causa
do racismo no Brasil. Dessa forma o cantor afrodescente, mais carismático que conversa
com o público e que tem um reportório lindíssimo sobre as questões raciais é o cantor Jorge
Ben Jor; por isso o tema da coleção foi inspirado em uma letra da música dele.
Ele diz ser um amante da mulher brasileira, principalmente das afrodescendentes
as quais são direcionadas as letras das suas músicas, traz referências, passagens, história
e todo um conteúdo narrativo, com mensagens positivas, buscando enaltecer a beleza da
mulher afro-brasileira.
Portanto o tema da coleção e o nome da marca foi inspirado no perfil da mulher
afrodescendente, descrita nas letras das músicas de Jorge Ben Jor; uma mulher forte,
poderosa e guerreira; ao mesmo tempo ela é sensual e colorida por natureza. Abaixo segue
um trecho da letra da música, que inspirou o tema da coleção “Mulheres Coloridas”.

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Uma linda dama negra
A rainha do samba mais bela da festa
A dona da feira, uma fiel representante brasileira
E como já dizia o poeta Gil
Que negra é a soma de todas as cores
Você criola é colorida por natureza
Você criola é o poder negro da beleza
(Letra da música de: Jorge Ben Jor – Criola)

De acordo com Queiroz (2010) quando pensamos que vivemos em uma sociedade
com identidade plural, pós-moderna e que convive com uma série de informações, imagens
e possibilidades de convívio, ficam abertos muitos caminhos para a criação de produtos,
lugares e serviços.
Ao lidar com este mundo complexo, devemos pensar e agir estrategicamente para
que, desta forma a inovação esteja integrada aos desejos da sociedade, ou seja, uma
proposta de um projeto, desenhada para a sociedade contemporânea, para que ela, possa
usar e se orgulhar dessa nova pele que está vestindo.
Pensando em inovar e procurando conquistar clientes através da oportunidade
percebida, ou seja, uma brecha que o mercado oferece, ligado a ausência de produtos de
moda para o público afro-brasileiro, e com a intenção promover a cultura afro-brasileira, a
a proposta da coleção traz o tema “Mulheres Coloridas”.

Figura 16- Colagem revista – Mulheres coloridas


Fonte: Revista Capricho.

35
5.6 Criação da Coleção

O trabalho de pesquisa para a realização deste relatório está embasado na


necessidade verificada pela falta de opção do mercado, em oferecer um produto condizente
com a cultura do público alvo afrodescendentes, levando em consideração a sua cultura e
leis sancionadas que beneficiam os mesmos.
O projeto de coleção tem a proposta de apresentar as estampas e possíveis
aplicações das mesmas em uma pequena coleção de blusas, camisetas, batas, shorts e
calças. As batas podem ser usadas como saída de praia, as blusas e as peças inferiores,
fazem parte do vestuário usado no dia a dia, composto para um público que trabalha,
estuda, e anda de transporte público. As características principal das estampas é enaltecer
a mulher afro-brasileira, com uma pegada descontraída e divertida.
O foco das estampas, estão voltados para três pontos relacionados a cultura
afrodescendente, o primeiro ponto abordado é o resgate da simbologia Adinkira, que parte
da filosofia de vida, revisitar o passado, aprender com ele, e construir um futuro melhor; o
segundo ponto abordado na construção das estampas é a religiosidade que proporciona o
equilíbrio e traz a tranquilidade, e o terceiro ponto, trazer a alegria, o colorido inspirado na
banda Olodum. Esses três pontos, acabam se convergindo para a religiosidade, uma
filosofia de vida, onde eles buscam conhecer o passado, através da religiosidade, das
danças, e assim obter bênçãos e proteção dos orixás.
Esta abordagem tem a finalidade de apresentar os povos pretos e afrodescendentes,
através de estampas com a intenção de melhorar a representatividade dos mesmos na
moda.
A partir de dados coletados, que ajudaram a definir os tecidos, as formas, cores e
elementos para estamparia, imprescindíveis para o desenvolvimento da coleção e
responsáveis pelo conceito do produto e consequentemente a criação das peças.
Foram considerados elementos que inspiraram o desenvolvimento de conceitos, que
irão auxiliar no desenvolvimento do mix da coleção, e foram denominados subtemas para
cada um dos três mix que serão apresentados.
O Mix 1 foi nomeado “Resgate as Origens”, porque fala dos costumes dos povos
afrodescendentes; partindo da escrita, sua comunicação e simbologia da etnia dos povos
Akas. O Mix 2 “Equilíbrio”, busca retratar elementos das manifestações religiosas baseada

36
na cultura de terreiro da Bahia. Para o Mix 3 “Vibração” foi realizado a partir de elementos
retirados do repertorio musical e do figurino do bloco Afro Olodum, que compõem e emana
a vibração cultural do povo baiano.
Resgatar algumas preciosidades do universo cultural dos povos afros, e inserir em
produtos de moda, nos faz acreditar que possa ser relevante para aumentar a auto estima
dos povos mesmos, além de visualizar possibilidade para abertura de novos espaços,
empreendimentos, com foco nesse público.

5.6.1 Mix 1 - Resgate às origens

Para esse conceito foram desenvolvidos alguns modelos, de camisetas estampas


utilizando e a simbologia Sankofa, definida por um conjunto de ideogramas que compõem
a escrita dos povos Akan. A riqueza de significados, dos símbolos, está relacionada a
filosofia de vida desses povos e são importantes para o desenvolvimento dos mesmos na
contemporaneidade, e a valorização dessa identidade. Assim a história dos adinkra nos
remete a outras formas de comunicação visual e significação desses símbolos.
A proposta de criação de qualquer traje, na função de um discurso, é feita a
partir da percepção do meio circundante, que consegue imprimir na criação
do traje as qualidades ou problemáticas que envolvem a sua
contemporaneidade. (CASTILHO, 2004, p. 133)

Figura 17- Símbolos Adinkra.


Fonte: Willis (1998).

Foram desenvolvidas estampas utilizando os cinco símbolos acima, relacionados a


cultura adinkra, e os seus significados estão descritos no capitulo anterior.
37
Abaixo destacaremos todo o desenvolvimento das estampas para cada mix de
produto denominado Resgate às origens, e a aplicação das estampas em shorts, saias,
calças, vestidos, batas, blusas e camisetas.

Mix1 - Resgate às origens (Rapport e aplicação da estampa)

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Mix1- Resgate às origens (Padrão 1 - estampa corrida fundo colorido)

39
Mix1 - Resgate às origens (aplicação da estampa)

Mix1- Resgate às origens (Padrão 2 - estampa corrida fundo colorido)

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Mix1 - Resgate às origens (aplicação da estampa)

Mix1- Resgate às origens (Padrão 1 - estampa corrida fundo colorido)

41
Mix1- Resgate às origens (Padrão 3 - estampa corrida fundo colorido)

Mix1- Resgate às origens (Padrão 3 - estampa corrida fundo colorido)

42
Mix1 - Resgate às origens (aplicação da estampa)

Mix1- Resgate às origens (Padrão 4 - estampa corrida fundo colorido)

43
Mix1 - Resgate às origens (aplicação da estampa)

Mix1- Resgate às origens (Padrão 5 - estampa corrida fundo colorido)

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Mix1- Resgate às origens (aplicação da estampa corrida)

Mix1 - Resgate às origens (aplicação da estampa corrida)

45
Mix1 - Resgate às origens (aplicação da estampa corrida)

5.6.2 Mix 2 - Equilíbrio

Este conceito está busca retratar as manifestações religiosas, através dos colares
com bolas filigranadas, que são enfiadas em cordões ou combinadas com contas de ouça,
coral, contas africanas. De acordo com Lody (2001) o tipo de joalheria, está ligado as bases
ibéricas ancestrais e as interpretações e apropriações de matriz africana, conhecidos na
Bahia como colares de aliança. Os adornos das baianas, podemos destacar as correntes
com rosáceas de ouro, a pomba do Divino Espírito Santo e as cruzes de vários tipos.
Os registros iconográficos de alguns documentaristas, mostram a indumentária das
baianas e destaque para os vários tipos de turbantes, batas, saias brancas rodadas,
penteados e o uso de objetos mágicos, como a figas, saquinhos de couro conhecidos como
patuás, dentes de animais, medalhinhas, crucifixos, ligados aos rituais. Os povos afro-

46
brasileiros trazem junto ao corpo esses objetos, que lhe dão a sensação de proteção, como
por exemplo os bentinhos, fitinhas, tecido contendo materiais do axé entre eles temos
(folhas, búzios, trechos de rezas de santos).
De acordo com Lody, as missangas, enfiadas em cordões de palha, cordonê ou
náilon, em cores diferenciadas, cumprem um papel emblemático social e religioso, para
cada tipo de conta e cor existe um código que determinam a identidade do próprio fio de
contas. Depois de confeccionados os colares, existe um ritual, onde os mesmos são
lavados e sacralizados.
Os cordões possuem significado sagrado, pois identificam os fiéis aos deuses e
esses cordões servem como condensadores enérgicos. As peças na sua maioria são feitas
de missangas coloridas e cada cor representa um orixá, inkice ou vodun2, sendo que
existem muitos orixás e cada um deles são representados por uma ou mais cores, pouco
difundido comparada a mitologia grega.
Além dos colares, que serviram de inspiração para criação das estampas, as vestes
das baianas, com seus vestidos branco rodados, usados no cotidiano para vender acarajés
nas feiras, também presente na religiosidade, na lavagem das escadarias do Senhor do
Bonfim, um ritual realizado todo ano, com água perfumada e flores.
Para o mix 2 denominado equilíbrio foram desenvolvidos apenas dois modelos de
vestido em comprimento diferenciado apenas para mostrar a aplicação das estampas;
também foram desenvolvidos alguns modelos de camisetas, para mostrar a aplicação da
estampa.

2Orixá, inkiceou vodun. Segundo o minidicionário Houaiss da língua, orixá significa cada uma das divindades
de origem Africana cultuadas no Candomblé, na Umbanda etc. No dicionário informal da web significa: "A luz
que se releva", ou seja, no principio da criação, DEUS, manifestou sua intenção, e sua intenção são os orixás
que são o mesmo que divindades e esse termo africanizado, significa "ori" = cabeça, "xá" = iluminação, então,
temos "cabeça iluminada" ou "espirito iluminado".
47
Figura 18- Baianas no Pelourinho.
Fonte: Fotografia de Pierre Verger.

Mix 2 - Equilíbrio (Rapport com barrado e aplicação da estampa)

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Mix 2 - Equilíbrio (aplicação da estampa)

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Mix 2- Equilíbrio (estampa corrida c/ barrado - fundo colorido)

Mix 2- Equilíbrio (estampa corrida c/ barrado - fundo colorido)

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Mix 2 - Equilíbrio (aplicação da estampa)

51
Mix 2- Equilíbrio (Padrão 1- estampa corrida fundo colorido)

52
Mix 2- Equilíbrio (Padrão 1- estampa corrida fundo colorido)

53
Mix 2 - Equilíbrio (aplicação da estampa)

54
Mix 2 - Equilíbrio (aplicação da estampa)

55
Mix 2- Equilíbrio (Padrão 2 - estampa corrida fundo colorido)

56
Mix 2 - equilíbrio (aplicação da estampa)

57
Mix 2- Equilíbrio (Padrão 3 - estampa corrida fundo branco)

58
Mix 2- Equilíbrio (Padrão 4 - estampa corrida fundo colorido/ para lenço de cabelo)

59
Mix 2 - Equilíbrio (aplicação da estampa)

5.6.3 Mix3 – Vibração

O tema Vibração, foi desenvolvido com inspiração na Banda Olodum; a pesquisa


mostrou uma quantidade enorme de instrumentos usado pelo bloco Olodum, entre eles
podemos destacar: o bongo, pandeiro, surdo, tam tam, repique de mão, caixa, reco reco,
tamborim, timbal, timba Djêmbe, carrilhão atabaque, agôgo, cuíca, rebolo, congas gope,
entre outros. Esses instrumentos, são fontes de inspiração para criação de diversas
estampas, retratando esse universo musical, que as pessoas são apaixonadas.

60
Alguns dos instrumentos foram retratados bem com a beleza da mulher afro-
brasileira, evidenciado nos traços do rosto, o tom da pele, o colorido dos cabelos, ou
simplesmente o seu charme que pode vir do seu cabelo black.
As cores utilizadas para o mix 3 de produto denominado “Vibração”, foram inspirados
nas cores usadas no figurino da banda Olodum, que contempla o (branco, preto, vermelho,
verde e amarelo), e que tem ligação com o reggae.

Figura 19- Pelourinho - Bahia.


Fonte: Edson Ruiz/Arquivo Correio.

Mix3 – Vibração (aplicação da estampa localizadas)

61
Mix3 – Vibração (aplicação da estampa localizadas e corridas)

5.7 Identidade Visual

A marca Criola Fulô surgiu da miscigenação dos povos, ou seja, o relacionamento


entre brancos e pretos resultou no mameluco, também conhecido como crioulo, uma
designação que pode representar os afrodescendentes nascidos no Brasil.
De acordo com dicionário espanhol, a palavra ‘criollo’ é designada a todo
descendente espanhol que tenha nascido na América, sendo que, no Brasil a palavra é
traduzida para crioulo; já “criolo”, é uma palavra que faz parte da linguagem coloquial.
No Brasil existem muitas letras de música que representam a linguagem coloquial,
ao invés da linguagem culta, como por exemplo Jorge Bem Jor, escreveu uma letra onde
ele diz que a criola, é colorida por natureza, e é a mais fiel representante brasileira. Além
dele temos no samba o Partido alto que se utiliza dessa linguagem, temos o cantor Cult,
mais próximo as vanguardas do momento, que se denomina Criolo. Ao fazê-lo, significa
que essas pessoas, ou melhor, esses cantores, estão mantendo um elo de ligação com o
seu público, querem se aproximar deles, através da linguagem coloquial, em nenhum
momento eles querem se apresentar acima do público, tanto assim, que ao final do show
de Jorge Bem Jor, na maioria das vezes ele pede para o público subir ao palco e dançar
com ele, fazendo um fechamento impressionante, ele junto dançando junto com a sua
plateia no palco.

62
Dessa forma, a criação da marca para o público alvo C/D, buscou realizar esse elo
de ligação com público alvo, através da fala coloquial, mostrando que pretende ser uma
marca que está ao lado do público, na mesma vibração, e não acima desse público.
Dessa forma nasceu a identidade da marca, batizada com o nome de “Criola Fulô”,
inspirada na letra da música de Jorge Bem Jor.
O primeiro símbolo usado para criar a marca, é um pente ou garfo de cabelo, ele faz
parte dos símbolos da cultura adinkra, e representa a feminilidade, além disso, o pente,
pode trazer recordações agradáveis na memória de algumas pessoas, já que, nos tempos
de nossas avós era um costume o uso desses pentes, para prender os cabelos, ou usado
para se pentear; de uma forma muito prática ele servia como um acessório de cabelo e ao
mesmo tempo possuía uso prático.
Segundo Jordan (2000) as pessoas amam usar produtos que as recordem de
lembranças passadas pois esses objetos trazem afetividade e possuem significados
simbólicos, eles comunicam a identidade e podem trazer satisfação social, através da
interação com os outros.
O segundo símbolo usado para criação da marca, chamado de kuntunkantan,
também faz parte da cultura Adinkira, e é um símbolo formado por círculos que se
conectam, e lembra uma flor estilizada, para essa cultura ele representa a vaidade,
Segundo Paschoarelli (2009, p.57), o circulo é representado por diversas culturas, ele
transmite a sensação de união, continuidade e tem uma representação profunda do “eu”, e
representa o egoísmo.

Figura 20- Símbolos da Cultura Africana adinkira.


Fonte: Willis (1998).

63
Para o estudo da marca, foram usados os dois símbolos da cultura adinkira e
representam a feminilidade e a vaidade; a tipografia escolhida foi a Gabriola, porque ela
demonstra simplicidade nas formas. Abaixo o estudo demonstra a primeira proposta
realizada, com os testes do positivo e negativo.

Figura 21- Identidade Visual / positivo e negativo.


Fonte: do autor.

O segundo teste para a criação da logomarca, une os símbolos adinkira, e a flor do


arbusto Favela. Essa espécie pertence à família botânica Euphorbiaceae, e chega a medir
12 metros de altura, possui folhas largas, e muitos espinhos pontiagudos; obrigando os
vaqueiros da região, a cavalgar com roupas de couro, pois somente elas, conseguem
protege-los.
Conforme o pesquisador, Marcus Nadruz, do Jardim Botânico, essa planta é
endêmica do bioma Caatinga, e demonstra diversos potenciais: ela fornece óleo,
proveniente da semente para a produção de biocombustíveis, extratos para usos
medicinais, e é usada na recuperação de áreas degradadas, e ainda, uma variedade de
pássaros se alimentam das suas sementes.
Ela produz um tipo de feijão, também conhecido com fava, que originou nome dela,
a fava, foi muito consumida pelos sertanejos na região de Canudos, como alimento em
tempo difíceis; possui uma afloração miúda anual, na cor branca que lhe confere uma
beleza sem igual.

64
Figura 22- Flor da Favela ou Faveleira.
Fonte: Google imagem.

Para Klotler e Keller (1996, p.271), a marca deve traduzir uma promessa de
experiência sobre a qual repousa o seu processo de identificação com o consumidor.
O trabalho se embasou na necessidade verificada, para o público alvo
afrodescendentes, para a construção de uma marca, pois não fazia sentido criar uma
coleção de estampas e inserir em uma marca, que não representa o público alvo.
No segundo teste realizado para criação da logomarca, foram realizadas
mortificações, para se aproximar do elemento de inspiração, que é a flor da Favela,
modificando a quantidade de pétalas. A tipografia usada, foi a Rosewel Black, porque ela
demonstra ser uma tipografia com movimento, própria para o público jovem, descolado.

Figura 23- Identidade Visual / positivo e negativo.


Fonte: do autor.

65
Figura 24- Identidade Visual /três cores.
Fonte: do autor.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS E CONCLUSÕES

O trabalho foi desenvolvido para um público feminino denominado Singular Women


que abrange mulheres de 20 a 45 anos, formado por um grupo de mulheres jovens e
audaciosas, sem preconceitos e com vitalidade, disposta a sair para se divertir. O filme
Dreams Girls, é um filme que pode ser usado como forma de entender melhor o público, de
mulheres independentes, engajadas em causas importantes. Assim o projeto de coleção
focou na cultura afrodescendente como foi descrito nas etapas anteriores e a marca criada
Criola Fulô, foi desenvolvida com propósito de incentivar outras pessoas, a levar essa
cultura a diante, enaltecendo os seus antepassados.
Sabemos que o design tem como característica principal atender a necessidade do
público alvo, conforme a identidade da sociedade investigada, já que cada povo possui sua
cultura, interesses em comum, crenças, valores, signos e tradições. Criar produtos de moda
que favoreçam os tons de pele não é suficiente para inserir um sujeito na sociedade, é
necessário algo mais para reafirmar sua cultura e seus costumes perante os demais, a fim
de engrandecer e enaltecer a história de um povo.
A coleção e a marca buscaram informação e elementos do povo Akan, que possui
raízes fincadas na África; com uma cultura riquíssima em simbologias, e em fontes com
raízes afro-brasileiras, pautada em elementos da Gestalt, como: unidade, semelhança,
proximidade, continuidade fechamento e pregnância da forma para a criação da coleção e
marca.
66
Conclui-se que a coleção proposta para marca criada Criola Fulô, traz os signos e
os elementos necessários para que o público se reconheça como um grupo pertencente a
cultura afrodescendente, criando uma identidade a partir de elementos desse universo, com
perspectivas de ser bem aceita, por ter a proposta de exercer funções sociais. O trabalho
seguiu todas as etapas e orientações necessárias para a obtenção de um produto final,
com a “cara” do público alvo pesquisado.
O resultado deste trabalho possibilitou compreender a importância da disseminação
da cultura afro que perpassa pela simbologia, idioma, cores, costumes, religião, música, e
serviram como fonte e referências para a pesquisa de moda, culminando na construção de
uma marca e produtos de moda ligados ao vestuário com a intenção enaltecer a cultura e
combater o preconceito.

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