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FORTALEZA - CE
Julho de 2016
ANTONIO ALFEU DA SILVA
FORTALEZA – CEARÁ
2016
ANTONIO ALFEU DA SILVA
BANCA EXAMINADORA
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Aos meus pais, Manoel e Maria, in memoriam, pelo maior presente que me deram:
a vida.
Aos meu filhos, Nicolas, João Victor e Heitor, fontes de inspiração e de alegria na
minha vida.
Aos professores Drs. Eduardo Rocha Dias e Anil Verma, por aceitarem participar
da banca examinadora desta dissertação.
Ao meu amigo, professor José Ferreira Silva Bastos, pelo apoio e incentivo a mim
dispensados.
INTRODUÇÃO
1
Eficiente e eficaz, nesse contexto, são empregados, de forma complementar, no sentido de
resultado, efetividade, enfim, o novo modelo sindical precisa ter a maior e melhor utilidade para o
desenvolvimento social e econômico.
9
Todos esses problemas poderiam ter sido resolvidos por ocasião da Assembleia
Nacional Constituinte – ANC, que resultou na Constituição Federal de 1988. Entretanto,
a Subcomissão da ANC, responsável pela discussão do tema e apresentação da proposta,
tinha na sua composição representantes - em proporção suficiente para impor a sua
vontade - beneficiários do corrente modelo. O fato é que não se conseguiu a pretendida
emancipação do modelo corporativista getulista. O resultado desse processo foi que a Lei
maior do país não corrigiu as distorções existentes, avançando em certa medida e
retrocedendo noutra, sobretudo quando tentou, paradoxalmente, compatibilizar a
liberdade sindical com os institutos da unicidade sindical e da contribuição sindical
compulsória. Esses dois institutos também têm os seus consectários: a organização por
categoria e o sistema confederativo de estrutura hierárquica piramidal.
3. Quais seriam as alterações necessárias para mudar essa realidade? E qual seria
o modelo sindical ideal para o Brasil?
modelo proposto dependem da ação estatal, que também deve estimular, pelas vias
próprias, sobretudo pela educação, a adoção de meios alternativos de solução de conflitos.
Defende-se que esses meios são capazes de produzir melhores resultados a menor custo,
além de estarem em perfeita sintonia com o diálogo social advogado pela OIT,
contribuindo para o fortalecimento da autonomia das partes e para a pacificação social.
Como forma de valorizar e estimular a boa-fé nas negociações coletivas, propõe-se que o
Estado institua mecanismos de prevenção e combate aos atos e práticas antissindicais,
promovendo o equilíbrio entre partes. Por fim, apresenta-se um estudo, consubstanciado
em pesquisas, ressaltando as repercussões positivas da liberdade sindical e da negociação
coletiva na economia e por conseguinte na sociedade como um todo.
2
V. g.: Romita (2001); Nascimento (2008); Brito Filho (2009); Süssekind (2004); Martinez (2013).
3
Art. 138 da CF de 1937: “A associação profissional ou sindical é livre. Somente, porém, o sindicato
regularmente reconhecido pelo Estado tem o direito de representação legal dos que participarem da
categoria de produção para que foi constituído, e de defender-lhes os direitos perante o Estado e as outras
associações profissionais, estipular contratos coletivos de trabalho obrigatórios para todos os seus
associados, impor-lhes contribuições e exercer em relação a eles funções delegadas de Poder Público.”
4
Item 3, da Declaração III, da Carta del Lavoro, versão em espanhol: “La organización sindical o
professional es libre. Pero solamente el sindicato legalmente reconocido y spmetido alcontrol del
Estadotiene derecho de representar legalmente a toda la categoría de empleadores o trabajadores para la
cual se ha constituído, de defender los intereses de esta categoría frente al Estado y a otras asociaciones
profesionales, de estipular contratos colectivos de trabajo, obligatorios para todos los membros de lá
categoría, de imponer a estos membros cuotas y de ejercer frente a ellos funciones delegadas de interés
público”. (MUSSOLINI, 1933, p. 104).
5
No original, em italiano: L'associazione professionale è la formazione sindacale delle attività
produttive su base nazionale costituita per ogni categoria professionale e distinta tra datori di lavoro e
prestatori d'opera, che, legalmente riconosciuta dallo Stato, da esso fornita dei necessari poteri e
attribuzioni e sottoposta al suo controllo, ha diritto di rappresentare legalmente tutta la categoria di datori
de lavoro o di lavoratori, per cui è costituita, di tutelarne, di fronte allo Stato e alle altre associazioni
professionali, gli interessi, di stipulare contratti collettivi di lavoro obbligatori per tutti gli appartenenti
14
Adota-se, para fins deste estudo, a tese de Lothian (1986), quanto ao tipo ideal
corporativista, tese incorporada por Gacek e Gomes, A., (2015). Ambos os autores
concordam com as definições conceituais, porém, divergem quanto às consequências e
possíveis resultados que podem advir do modelo, sobretudo no que se refere a assuntos
de ordem econômica e política. Todavia, atem-se, neste particular, às questões
conceituais.
alla categoria, di imporre loro contributi e di esercitare rispetto ad essi funzioni delegate di interesse
pubblico. (BORTOLOTTO, 1934, p. 67-68).
6
No original, em inglês: “An initial feature of the corporatist model is compulsory unionization.
The entire labor force is supposed to be unionized. [...] Once a union is recognized, all workers belong,
whether they choose to or not. […]. (LOTHIAN, 1986, p. 1009).
15
A quarta seria uma estrita regulação do direito de greve, tendo em vista que, no
corporativismo, busca-se evitar o conflito e promover a harmonia entre interesses
divergentes. (LOTHIAN, 1986, p. 1001). Essa situação, bem presente durante o Estado
Novo, foi mantida até 1988, mas não subsiste na vigência da atual Constituição e da nova
lei de greve de 1989, embora, sobre esta última, ainda pesem muitas críticas, a exemplo
das que fazem Gacek e Gomes, A. (2015).
O sexto ponto seria a utilização dos sindicatos como agentes do Estado social,
distribuindo benefícios e serviços que seriam próprios da ação estatal, mas jamais de um
ente privado, com finalidades definidas, como é o sindicato. (LOTHIAN, 1986, p. 1010).
Neste ponto a realidade brasileira também já mudou, salvo exceções pontuais, e. g.:
prestação de serviços de dentista, psicólogo, colônia de férias, etc.
7
No original, em inglês: “Corporatism is more than a peculiar pattern of articulation of interests.
Rather, it is an institutionalized pattern of policy-formation in which large interest organizations cooperate
with each other and with public authorities not only in the articulation (or even “intermediation”) of
interests, but-in its developed forms-in the “authoritative allocation of values” and in the implementation
of such policies.” (LEHMBRUCH, 1977, p. 93).
8
No original, em inglês: “At the same time, corporatism and concertation appeared to be closely
linked empirically — so closely that a single term (‘neo-corporatism’) ended up designating both.”
(BACCARO, 2003, p. 685).
17
retirando-lhes o seu natural caráter privado, competitivo, fazendo dos sindicatos um braço
do Estado, e, por conseguinte, mantendo-os submissos, agrilhoados, submetidos a
inúmeras restrições de organização e atuação.
Esse sistema, segundo Boito Jr. (2012, p. 2-3), reproduz a seguinte excrescência:
“a integração ao Estado possibilita que o sindicato possa viver distante dos trabalhadores
ou – em casos extremos e que são muitos – até separado da sua base.” Mais adiante o
autor, op. cit., afirma: “A dependência do sindicato diante do Estado tem como
contrapartida sua independência diante dos trabalhadores”. O Estado criou muitos
empecilhos para uma organização sindical livre, inclusive pondo os seus membros na
mira da repressão, a partir do advento da Lei de Segurança Nacional, de 1935. Por outro
lado, instituiu vantagens e privilégios para quem fazia parte do modelo oficial. Por
exemplo: somente quem era sindicalizado em sindicatos oficiais faziam jus às férias
remuneradas, bem como podia compor a representação classista na Assembleia Nacional
Constituinte de 1934 e, posteriormente, na Justiça do Trabalho.
9
E. g.: Romita (2001); Nascimento (2008).
10
No original, em italiano: “Si tratta di realizzare la sicurezza politica e l'equilibrio economico, che
si potrà conseguire sia colla determinazione del minimo richiesto dalla condizione generali della nazione,
sia colla classifica della collettività nazionale in categorie economiche, sia fissandone il dato economico
di base, come regime di vita e di benessere normale di ogni categorie. Questo equilibrio, che rappresentarà
il fine economico del nostro regime, ne rappresenta anche il fine sociale ed etico, poi che si vuol
raggiungere la più alta giustizia sociale fra le categorie operanti per l'incremento della produzione e per
la potenza nazionale. La corporazione, ha detto il Duce, rappresenta il dato sociale della rivoluzione; e la
rivoluzione assume, acquista ed afferma il suo dato sociale, nel momento, in cui essa giunge
all'instaurazione d'un ordine nuovo tra le forze operanti in seno alla società organizzata.”
(BORTOLOTTO, 1937, p. 143).
18
corporações. O Brasil da época, década de 1930, não tinha as condições necessárias para
a implantação desse regime (DINIZ, 1978). Entretanto, não se pode olvidar que o modelo
brasileiro foi fortemente influenciado pelo regime italiano (ROMITA, 2013), sobretudo
ao considerar-se a similitude de certos institutos de Direito do Trabalho, implantados na
Itália e depois copiados no Brasil, em especial o disciplinamento das relações sindicais,
e.g.: a unicidade sindical e a contribuição sindical compulsória. Contudo, A sua melhor
compreensão será possível quando da análise dos dispositivos constitucionais e legais
instituidores do ancien régime, o que se verá um pouco mais adiante.
Pode-se dizer que o novo sindicalismo perdeu forças para continuar na luta pelas
ideias de liberdade sindical, paradoxalmente, a partir do advento da Constituição
democrática de 1988. A Constituição, em matéria de Direito Coletivo do Trabalho, criou
um sistema que, à primeira vista, segundo Nascimento (2007), ficou incompreensível, ao
garantir a liberdade sindical e ao mesmo tempo restringi-la pela regra da unicidade.
Esclarece-se que a compreensão é possível, desde que se leve em conta o contexto político
e a estrutura existente. A maioria dos sindicatos – patronais e de empregados - era
favorável à unicidade sindical e essa foi a opção política feita. Voltaremos a esse assunto
no decorrer deste trabalho.
11
E. g.: Almeida, R. (2013); Souza (1990); Boito Jr. (1994).
19
e na Lei 7.783 de 1989, entre outros significativos avanços, porém remanescem princípios
corporativistas estruturais. Destarte, os mecanismos que antes funcionavam a serviço do
velho regime, agora servem a outros interesses, cujos principais beneficiários
permanecem basicamente os mesmos, quais sejam, os próprios sindicalistas, alguns
partidos políticos e o governo - em prejuízo dos trabalhadores e da sociedade. Destaca-se
a definição de Souza, 1990, p. 101, in verbis:
do modelo sindical brasileiro. Entende-se que, a rigor, um modelo único não há. Existem
fragmentos de modelos distintos somados à práxis do movimento sindical.
Boito Junior. (1994, p. 24) relata que o neocorporativismo está presente no Brasil
desde o final da década de 70, em decorrência da superioridade socioeconômica das bases
do novo sindicalismo, tendo em vista que as organizações revolucionárias e reformistas
teriam sido aniquiladas pela ditadura militar. Entretanto, o mesmo governo ditatorial
bloqueou o neocorporativismo, por meio de uma “política salarial rígida e centralizada”,
o que teria politicamente impulsionado o movimento do novo sindicalismo a uma ação
unificada contra a ditadura. Todavia, segundo o autor, op. cit., tanto o neocorporativismo
quanto o sindicalismo de massa, naquele período, teriam sido praticados dentro de um
modelo estrutural de organização sindical corporativista de Estado, no que pese o novo
sindicalismo não se submeter às regras e agir à revelia da estrutura.
12
Art. 179: “A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por
base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela
maneira seguinte” (sic): [...]; XXIV: “Nenhum genero de trabalho, de cultura, industria, ou commercio póde
ser prohibido, uma vez que não se opponha aos costumes publicos, á segurança, e saude dos Cidadãos”
(sic).
21
13
Art. 72: “A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no paiz a inviolabilidade
dos direitos concernentes á liberdade, á segurança individual e á propriedade, nos termos seguintes” (sic):
[...]; § 8º: “A todos é licito associarem-se e reunirem-se livremente e sem armas, não podendo intervir a
policia senão para manter a ordem publica”; [...]; § 24. “É garantido o livre exercicio de qualquer profissão
moral, intellectual e industrial” (sic).
14
Transcreve-se os artigos 1º, 2º, 5º, 9º e 11: “Art. 1º É facultado aos profissionais da agricultura e
industrias ruraes de qualquer genero organizarem entre si syndicatos para o estudo, custeio e defesa dos
seus interesses. Art. 2º A organização desses syndicatos é livre de quaesquer restrições ou onus, bastando,
para obterem os favores da lei, depositar no cartorio do Registro de hipothecas do districto respectivo, com
a assignatura e rosponsabilidade dos administradores, dous exemplares dos estatutos, da acta, da installação
e da lista dos socios, devendo o escrivão do Registro enviar duplicatas á Associação Commercial do Estado
em que se organisarem os syndicatos. Art. 5º A duração do syndicato poderá ser Indefinida e o numero de
socios, podendo ser illimitado, não deverá ser inferior a sete. Art. 9º É facultado ao syndicato exercer a
funcção de intermediario do credito a favor dos socios, adquirir para estes tudo que for mister aos fins
profissionaes, bem como vender por conta delles os productos de sua exploração em especie, bonificados,
ou de qualquer modo transformados. Art. 11 É permittida aos syndicatos a formação de uniões, ou
syndicatos centraes com personalidade juridica separada podendo abranger syndicatos de diversas
circumscripções territoriais.” (sic).
22
profissional, válidos até hoje. A norma também permitiu que profissionais liberais
pudessem sindicalizar-se. Ressalte-se que nesse Decreto, assim como no Decreto 979 de
1903, afirmava-se ser livre a sindicalização; por outro lado, pregava-se o “espírito de
harmonia entre patrões e operários”15, o que mais tarde viria a ser mais fortemente
defendido e utilizado a serviço do regime ditatorial conhecido como Estado Novo.
Segundo Martinez (2013, p. 2), as citadas normas não continham nada que
visassem melhorias para os trabalhadores, sejam referentes a conquistas de vantagens ou
de melhorias nas condições de trabalho, tão precárias à época. Tinham, contudo, a
motivação “de uma ideologia de fundo liberal e católico que pugnava por uma
conveniente harmonia entre patrões e operários”. Segundo o autor, isso se prestava a
“preparar a cena da domesticação das associações de trabalhadores”, sempre com o
objetivo do controle, da dominação, da manipulação dos dirigentes sindicais em direção
aos propósitos dos próprios governantes.
15
Convém destacar os pontos mais relevantes do texto legal: “Art. 1º E' facultado aos profissionaes
de profissões similares ou connexas, inclusive as profissões liberaes, organizarem entre si syndicatos, tendo
por fim o estudo, a defesa e o desenvolvimento dos interesses geraes da profissão e dos interesses
profissionaes de seus membros. [...]. Art. 2º Os syndicatos profissionaes se constituem livremente, sem
autorização do Governo, bastando, para obterem os favores da lei, depositar no cartorio do registro de
hypothecas do districto respectivo tres exemplares dos estatutos, da acta da installação e da lista nominativa
dos membros da directoria, do conselho e de qualquer corpo encarregado da direcção da sociedade ou da
gestão dos seus bens, com a indicação da nacionalidade, da idade, da residencia, da profissão e da qualidade
de membro effectivo ou honorário [...]. Art. 8º Os syndicatos que se constituirem com o espirito de harmonia
entre patrões e operarios, como sejam os ligados por conselhos permanentes de conciliação e arbitragem,
destinados a dirimir as divergencias e contestações entre o capital e o trabalho, serão considerado como
representantes legaes da classe integral dos homens do trabalho e, como taes, poderão ser consultados em
todos os assumptos da profissão.” (sic).
23
Maranhão (1985, p. 294) afirma que a Revolução de 1930 teria dado os “contornos
mais precisos” à organização sindical brasileira, por meio do Decreto-Lei nº 19.770 de
19.3.1931, já citado, e complementado pelo Decreto-Lei nº 24.694 de 12.7.1934, o qual
exigiu um terço dos empregados da mesma profissão para formar um sindicato laboral e
cinco empresas para formar um sindicato patronal. O referido Decreto também teria
afastado a efetividade dos avanços verificados na Constituição de 1934 (mais bem
explicado adiante). O Decreto-Lei de 1931 criou a necessidade de reconhecimento oficial
do sindicato assim como fez surgir a unicidade sindical. Boito Jr. (2012) afirma que esses
dois mecanismos, somados ao imposto sindical, mais adiante instituído (em 1940), seriam
os instrumentos ideológicos que integrariam o sindicato ao Estado.
24
Pouco mais de três anos da Constituição de 1934, embora, como visto, sem
nenhuma efetividade das mudanças, já veio a Constituição de 1937 - baseada no modelo
corporativista italiano, inspirada nas ideias fascistas de Mussolini - e usurpou o pequeno
progresso que havia sido conferido pela Constituição anterior. Um dos piores retrocessos
foi a volta da unicidade sindical, teoricamente abolida três anos atrás, sem, contudo, ter
se verificado na prática.
16
“Os sindicatos e as associações profissionais serão reconhecidos de conformidade com a lei.”
25
item 3, da Declaração III, da Carta del Lavoro, de 1927 – transcrita alhures, regente do
sistema fascista italiano, deixando clara a sua influência no Estado Novo.
Em 1940, por meio do Decreto-Lei nº 2.377, art. 2º, foi criado o imposto sindical,
de natureza tributária, alcançando a todos os empregados e empregadores, sindicalizados
ou não, tendo por finalidade financiar o sistema sindical. Em 1966, por intermédio do
Decreto-Lei nº 27, o referido imposto sindical foi rebatizado, segundo Delgado (2008, p.
91), com um “epíteto mais eufemístico” de contribuição sindical. O Decreto-lei nº 229 de
1967 fez a adaptação na CLT. Dita contribuição tem previsão no art. 217, I, do Código
Tributário Nacional – CTN e nos arts. do 578 ao 610 da CLT, bem como o art. 149 da
atual Constituição também a acolheu, além do “salvo conduto” existente no inciso IV do
art. 8º, Constituição de 1988. Esse instituto, devido à importância que tem, terá um tópico
específico para a sua melhor compreensão, mais adiante.
das atividades econômicas e das profissões.17 Isso era feito de acordo com os critérios
previamente definidos, relacionando-as às suas respectivas categorias econômicas e
profissionais, sob a tutela do Ministério do Trabalho.
Sabe-se que legislar por decreto é uma forma autoritária de governar. E assim
foram editados os principais dispositivos infraconstitucionais reguladores das relações
trabalhistas e sindicais brasileiros, entre esses o mais importante deles - a CLT. Esta,
embora ultrapassada, haja vista que não acompanhou a mobilidade da relação capital-
trabalho e em muito se distanciou da nova ordem constitucional, tendo vários de seus
artigos não recepcionados pela Constituição de 1988 (AROUCA, 2009), mantém-se firme
como uma rocha e por muitos defendida.
De forma bem mais completa, Moraes Filho, E., (1978, p. 273-274) faz uma
análise da nova Constituição, comparando-a, em vários pontos, relativamente à matéria
sindical, às Constituições de 1934 e de 1937. O autor afirmou que, apesar de a nova
Constituição estar em pleno vigor, quase nada foi modificado na legislação sindical. E
acrescenta: “E isso constitui um fato deveras curioso: a sobrevivência de uma lei,
promulgada para um regime corporativo fascistizante, em pleno quadro democrático de
uma nação. Quanto à estrutura sindical em conjunto, não houve a rigor alteração alguma”.
17
O enquadramento sindical passou a ser previsto na CLT – do art. 570 ao 577.
27
Mais adiante aduz que, no que pese a Constituição de 46 ter seguido a maioria dos
princípios da Constituição de 34, esta teria sido mais assertiva do que aquela, tendo em
vista que a Constituição de 1946 teria deixado quase a totalidade do tema relações
sindicais para regulamentação por lei ordinária, o que, segundo Moraes Filho, E., teria
permitido que fossem “[...] julgados constitucionais os cânones da sindicalização do
Estado Novo”. Pela mesma razão, Süssekind (2005, p. 1126) afirma: “Daí ter o Supremo
Tribunal Federal proclamado, reiteradamente, que as normas da CLT sobre organização
sindical haviam sido recepcionadas pela nova Carta Magna”. De tal forma que a
Constituição democrática de 1946 praticamente manteve intacta a estrutura sindical
criada por Getúlio Vargas.
Outro avanço importante trazido pela Constituição Federal foi reconhecer o direito
de greve dos trabalhadores como direito fundamental. Esse reconhecimento provocou a
edição da Lei nº 7.783, de 28.6.1989, a nova lei de greve, que significou um grande
avanço em relação à lei anterior. Há de se reconhecer, todavia, a existência de algumas
imperfeições, e. g.: a lei pauta-se, conforme Gacek e Gomes, A. (2015, p. 169) - com os
quais o pesquisador concorda - “pelas mesmas dicotomias legal/ilegal, lícita/ilícita,
abusiva/não abusiva”, em lugar de ater-se ao que dispõe o § 1º do art. 9º da Constituição,
ou seja, a essencialidade e inadiabilidade das atividades dos trabalhadores proponentes
do movimento paredista.
29
Ainda conforme o autor, op. cit., o Presidente Sarney instituiu, por meio do Decreto
nº 91.450, de julho de 1985, a Comissão Provisória de Estudos Constitucionais, presidida
por Afonso Arinos, cuja redação do tema relativo à ordem social coube a Evaristo de
Moraes Filho, que optou pela pluralidade sindical. Entretanto, o estudo nem mesmo foi
encaminhado à Assembleia Nacional Constituinte de 1987, a qual teria optado pelo
regime misto: autonomia sindical num sistema em que vigora a unicidade.
18
Exemplo: Brito Filho (2009); Arouca (2009).
19
Entre eles: Almir P. Pinto, Amauri M. Nascimento, Arion S. Romita, Arnaldo L. Süssekind, João
de L. Teixeira Filho. (AROUCA, 2009, p. 451).
30
daí em diante, teve retirado o regime de urgência e foi sofrendo mutilações por meio das
propostas de substitutivos, até o seu completo aniquilamento, que veio com o
impeachment do Presidente Collor.
20
Amauri M. Nascimento, Antonio Alvares da Silva, Arnaldo L. Süssekind, Hugo Gueiros e Hugo
Gueiros Filho, José F. Siqueira Neto e Otávio B. Magano. (AROUCA, 2009, p. 454).
31
Por uma razão ou por outra, a PEC foi engavetada. Todavia, difícil acreditar que
uma proposta de tamanha importância para os interesses nacionais tenha sido arquivada
por engano, sobretudo sabendo-se das pressões que muitos sindicalistas, certamente
beneficiários do atual regime, fizeram sobre os parlamentares.
No governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), houve muita expectativa
acerca de uma eventual reforma sindical, sobretudo porque o Presidente Lula foi um
sindicalista combativo, uma das principais lideranças do novo sindicalismo, fundador da
CUT, e que, “antes mesmo de ser empossado anunciou como prioridade a reforma da
legislação trabalhista e sindical”. (AROUCA, 2009, p. 456). Lula instituiu o Conselho de
Desenvolvimento Econômico e Social, composto por oitenta e duas pessoas, de diferentes
segmentos, com vistas a elaborar as diretrizes da reforma. Concluída a primeira fase, o
resultado do trabalho foi entregue ao Fórum Nacional do Trabalho - FNT, criado no
âmbito do Ministério do Trabalho e Emprego, com composição tripartite.
21
“O esforço empreendido resultou no consenso sobre todos os pontos da agenda da Reforma
Sindical, superando as expectativas daqueles que estiveram envolvidos nas negociações. [...] Eles irão
subsidiar a elaboração do projeto legislativo sobre a Reforma Sindical, que o Governo Federal vai
encaminhar ao Congresso Nacional.” (FÓRUM N... Reforma sindical. Relatório Final. Brasília. 2004, p.
13).
32
Mesmo sem a reforma sindical, o sistema sindical brasileiro, como visto, não mais
pode ser chamado, com a aplicação correta do termo, de corporativista. Entretanto, parte
da estrutura do regime criado por Getúlio ainda está em vigor, sobretudo os institutos da
unicidade sindical e da contribuição sindical compulsória, os quais, conforme doutrina22,
são violadores da liberdade sindical. São, portanto, prejudiciais aos trabalhadores e, em
última análise, também o são em relação ao próprio patronato, ao Estado e, por derivação,
a toda a sociedade, tendo em vista que é ruim para o desenvolvimento socioeconômico.
Afirmam, ainda, que durante essas quase nove décadas de vigência do referido
regime, diferentes grupos se beneficiaram dele e, naturalmente, vêm resistindo às
mudanças. Incluem-se entre os citados grupos de resistência o próprio governo, os
partidos políticos e os empregadores, e mais, surpreendentemente, a maior resistência
vem dos próprios representantes dos trabalhadores, os quais, logicamente, também são
beneficiados23.
22
V. g.: Martinez (2013).
23
No original, em inglês: “Instead, the system is currently serving the interests of trade unions that
benefit from lack of democracy, transparency, and accountability.” (GOMES, A e PRADO, M., 2011, p.
861)
33
Além disso, conforme Martinez (2013), o próprio Estado não tem muito interesse,
considerando que parte do dinheiro arrecadado fica nos cofres públicos, i. e., dez por
cento do que é arrecadado dos trabalhadores e vinte por cento do que é arrecadado das
empresas, nos termos do que dispõe o art. 589 da CLT25. Entende-se que essa visão
imediatista do governo prejudica o próprio Estado a longo prazo.
24
No original, em inglês: “In sum, the changes in the Constitution removed the repressive elements
of the corporatist system, giving more freedom for trade unions to act, while at the same time maintaining
their privileges.” (GOMES, A. e PRADO, M., 2011, p. 876).
25
Art. 589. “Da importância da arrecadação da contribuição sindical serão feitos os seguintes
créditos pela Caixa Econômica Federal, na forma das instruções que forem expedidas pelo Ministro do
Trabalho: I - para os empregadores: a) 5% (cinco por cento) para a confederação correspondente; b) 15%
(quinze por cento) para a federação; c) 60% (sessenta por cento) para o sindicato respectivo; d) 20% (vinte
por cento) para a ‘Conta Especial Emprego e Salário’; II - para os trabalhadores: a) 5% (cinco por cento)
para a confederação correspondente; b) 10% (dez por cento) para a central sindical; c) 15% (quinze por
34
Gacek e Gomes, A. (2015, p. 158) também apontam alguns motivos que podem
servir aos interesses do Estado, e. g.: repasse de “recursos ao fundo de amparo ao
trabalhador”, forte “controle dos conflitos coletivos pelo próprio Estado”, e “a proposição
de uma reforma sindical sempre envolve um desgaste político sem ganhos aparentes”.
Acrescenta-se: isso, pensando-se somente a curto prazo e levando-se em conta apenas
interesses eleitoreiros, esquecendo-se das reais necessidades do Estado e do povo,
verdadeiro titular do poder numa democracia.
cento) para a federação; d) 60% (sessenta por cento) para o sindicato respectivo; e e) 10% (dez por cento)
para a ‘Conta Especial Emprego e Salário’.”
26
(Organização Internacional do Trabalho. Liberdade sindical na prática. ..., 2008).
35
iniciavam a luta, a qual teria sido abafada pela legislação estatal. Não poderia dar certo.
Pouco mais adiante os supracitados teóricos afirmam que “o associativismo profissional
encontra, em toda parte, seu campo de cultura no desenvolvimento industrial de um
povo”. Os autores, op. cit., aduzem que para que se desenvolvesse a cultura de um
sindicalismo forte precisaria ter havido a consciência da conquista.
Com base no entendimento do autor, op. cit., os dados históricos confirmam que
as ações ditatoriais de Getúlio Vargas tinham por finalidade a promoção do avanço
econômico - por meio da suposta bandeira do trabalhismo, com o intuito de passar de uma
economia eminentemente rural para um modo de produção industrial e mecanizado. O
fato é que fazendo isso, sem permitir as manifestações de classe, acarretou diversas
consequências maléficas, dentre elas, a prevalência de um direito das relações de trabalho
instituído pelo Estado, e não por meio do devido processo legislativo, o qual deveria
ressoar os anseios dos trabalhadores.
Ainda conforme Santos, L., (2009, p. 59): “Neste patamar, o Direito Coletivo
passou a ter uma importância secundária, pois, o Poder Estatal assumiu o papel de protetor
do trabalhador, individualmente considerado, dando-se ênfase às regras trabalhistas de
Direito Individual”. Mais uma vez os trabalhadores foram ludibriados, tendo em vista que
o Direito Coletivo é bem mais eficiente e eficaz do que o Direito Individual do Trabalho,
por vários motivos, os quais, mais adiante, serão mais bem delineados.
Como visto, as normas que dispõem sobre as relações coletivas de trabalho têm
sua origem no regime ditatorial do Estado Novo, fruto das elaborações de Oliveira
Vianna27, influenciadas pela política praticada no Governo fascista de Mussolini na Itália.
Passada a era Vargas, e já na vigência da terceira Constituição após aquele regime
ditatorial, apesar de duas delas terem sido na vigência de outra ditadura, mas a
Constituição de 1988 não, considerando que esta foi promulgada no fervor do regime
democrático, ainda assim, a estrutura sindical brasileira permanece com características
parecidas, presa às amarras estatais do passado.
27
“Pelo renome de que gozava, pela respeitabilidade de sua obra [...], tornou-se Oliveira Vianna o
centro propulsor, a autoridade máxima, quase mágica, da nova pasta, na elaboração da legislação social-
trabalhista. Verdadeiro magister dixit, seus pareceres e suas opiniões constituíam autênticos dogmas,
respeitosamente acatados e seguidos, não só pela comunidade ministerial como igualmente pela quase
totalidade dos doutrinadores ou dos interessados em matéria trabalhista”. Um pouco mais adiante diz: “O
Ministro nada decidia sem ouvir Oliveira Vianna, por ele passavam ou podiam passar todos os anteprojetos
legislativos de competência do Ministério”. Algumas páginas a frente o autor afirma que os pareceres de
Oliveira Vianna, “firmaram doutrina e vieram a ser consignados como dispositivos legais, na Consolidação
das Leis do Trabalho” (MORAES FILHO, E., 2003, p. 318-319, 338).
39
Mussolini, por serem incompatíveis com o novo ordenamento democrático que surgia.
(PERGOLESE, 1949)28.
28
No original, em italiano: “Cessata l'efficacia giuridica della carta del lavoro (d. l. lgt. 14 settembre
1944, n. 287), revocato il riconoscimento giuridico e poste in liquidazione le associazione profissionali di
ogni grado con l'abolizione anche dei contributi sindacali obbligatori (d. l. lgt. 23 novembre 1944, n. 369),
indispensabili per ogni ente pubblico, quale il sindacato riconosciuto, è da ritener abrogata implicitamente
tutta la legislazione sindacale in quanto incompatibile col nuovo orientamento democratico (e perciò
antitotalitario e comunque antifascista) dello Stato italiano (si argomenti dall'art. 15 delle preleggi).”
(PERGOLESE, 1949, p. 39).
29
Por exemplo: Romita (2007); Nascimento (2008); Brito filho (2009).
40
Concorda-se com Boito Jr. (2012, p. 2-3), quando afirma que a estrutura sindical
brasileira é anacrônica, a qual, de certo modo, continua “integrada ao Estado capitalista
graças a alguns mecanismos legais e organizativos que se reproduzem graças a
determinada ideologia”. Em tais circunstâncias os sindicatos podem existir distantes das
suas bases, às vezes completamente independentes delas, na exata medida em que
dependem da estrutura instituída pelo Estado. Segundo o autor, op. cit., com quem se
concorda, são os institutos da unicidade sindical e da contribuição sindical compulsória
que respondem, fundamentalmente, por esse problema.
pensam Süssekind (2004), Nascimento (2008), entre outros, o modelo ideal seria o da
unidade sindical, por opção dos trabalhadores, não a unicidade imposta por lei. Todavia,
a unidade somente é possível dentro de um modelo plural, como resultado de um
movimento sindical livre e maduro.
Volta-se à discussão central deste tópico, qual seja, a unicidade sindical enquanto
resquício do corporativismo getulista. Essa corresponde à exclusividade de representação,
profissional ou patronal, imposta por lei, configurando-se, fundamentalmente, por meio
de dois critérios: determinação legal de base territorial mínima; e agregação dos
30
Código do Trabalho do Canadá, no original, em inglês: Revocation of Certification and Related
Matters. Application for revocation of certification. 38 (1) If a trade union has been certified as the
bargaining agent for a bargaining unit, any employee who claims to represent at least 40% of the employees
in the bargaining unit may, subject to subsection (5), apply to the Board for an order revoking the
certification of that trade union. (CANADÁ, Canada Labour Code. R.S., 1985, c. L-2, s. 38; 1998, c. 26,
s. 20; 2014, c. 40, s. 4.).
31
No original, em inglês: “The Committee observes that the system practiced by the NMB would
appear to correspond to these essential safeguards in relation to systems based on exclusive bargaining
rights for the most representative union: (1) the certification is made by an independent body; (2) the
representative organization is chosen by a majority vote of the employees in the unit concerned; and (3) a
non-certified organization has the right to request a new election after a stipulated period.” (OIT, 357th
Report ... Case n. 2683 (United States), june, 2010).
42
A base territorial mínima constitui-se da extensão geográfica definida por lei, onde
a regra da unicidade é levada a efeito. Até 4 de outubro de 1988 esta definição era dada
pela CLT, art. 517, o qual estabelecia a possibilidade da existência de sindicato em
distintas bases geográficas, que poderiam ser um distrito, um município, um Estado ou
até mesmo sindicatos nacionais. Cabia ao Ministério do Trabalho resolver sobre a
amplitude da representação sindical. Com o advento da Constituição de 1988, por força
do inciso I do art. 8º, foi retirado do Estado o poder de decidir sobre a base de atuação do
sindicato.
Ademais, o fato de nunca se filiar ou fazê-lo e depois se desfiliar não surte efeitos
práticos relevantes, tendo em vista que o inciso III do mesmo art. 8º diz que “ao sindicato
cabe a defesa dos interesses coletivos ou individuais da categoria” e o inciso VI tornou
obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho. De tal
modo que, mesmo não sendo filiado, o trabalhador fatalmente será alcançado pelo que
44
Silva, A. (1990, p. 38) aduz que, não obstante as fundadas críticas, ainda existem
muitos em defesa da unicidade, mediante argumentos variados, tais como: “Assegura a
força do movimento sindical; evita a disputa de sindicatos rivais que enfraquece a
categoria; mantém o sindicalismo em seu caminho, evitando a agregação de seitas
religiosas ou partidos políticos; evita o fracionamento da profissão; [...]”. Motivos que
segundo o autor são fáceis de serem combatidos, bastando dizer que um movimento
sindical forte não é aquele que depende de salvaguardas autoritariamente instituídas pelo
Estado, mas sim aquele dinâmico, que desenvolve a sua ação fora dos parâmetros estatais,
eventualmente fora da lei.
32
No original, em inglês: “[…] the unicity rule is regarded as necessary due to the risk of trade
union fragmentation”. […] “Trade union fragmentation is happening in part because the unicity system
guarantees that there is no competition, and the compulsory dues keep unions alive despite the absence of
any real representation.” (GOMES, A. e PRADO, M., 2011, p. 858-859).
33
“Art. 1º As contribuições devidas aos sindicatos pelos que participem das categorias econômicas
ou profissionais representadas pelas referidas entidades, consoante as alíneas a do art. 38 e f do art. 3º do
decreto-lei nº 1.402, de 5 de julho de 1939 (2), serão, sob a denominação de "imposto sindical", pagas e
arrecadadas pela forma estabelecida neste decreto-lei. Art. 2º O imposto sindical é devido, por todos aqueles
45
A contribuição sindical foi inicialmente intitulada imposto sindical, tendo seu nome
alterado para contribuição sindical pelo Decreto-lei nº 27, de 14 de novembro de 1966,
que inseriu o art. 217 na lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Embora alterado o Código
Tributário Nacional - CTN, a redação da CLT permaneceu a mesma, a qual foi corrigida
em 28 de fevereiro de 1967, por meio do Decreto-lei nº 229.
É certo, por motivos já declinados, que a supracitada exação foi copiada do regime
fascista italiano35. Consoante Martins (2009, p. 12): “[...] no regime corporativista era
necessário que o Estado assegurasse as receitas sindicais, justamente porque o sindicato
era a longa manus daquele”. No mesmo sentido Romita (2013, p. 20), ao afirmar que o
“contributo sindacale” - contribuição sindical em italiano, é característico assim como é
determinante para a consecução dos objetivos do regime corporativista. Parece que num
primeiro momento houve um equívoco na tradução do italiano para o português, ao
nomear de imposto o que seria uma contribuição, o que foi corrigido em 1966.
35
Trecho do item 3 da Declaração III da Carta del Lavoro, quanto às prerrogativas dos sindicatos:
[...] “de imponer a estos cuotas [...]”. (MUSSOLINI, 1933, p. 105).
36
Não pagam a CSC: Profissional liberal que já tenha pago a contribuição sindical a entidade
representativa da sua profissão, desde que a exerça na empresa na qual seja empregado e como tal seja nesta
registrado, nos termos do art. 585 da CLT. O advogado empregado, independentemente do cargo ocupado,
que esteja quite com a OAB não precisa sofrer o desconto em folha, por força do art. 47 da Lei nº 8.906 de
1994. Este profissional, por ter o tema regulada em lei especial, além de mais recente, não é enquadrado no
dispositivo celetista supracitado.
47
A propósito desse assunto, bem de acordo com o que pressupõe a lei de bronze da
oligarquia de Michels, considerando-se que os sindicatos tendem a se transformar em
oligarquias (MICHELS, 1982), veja-se o que afirmou Nunes (1979, p. 15): “[...] diretor
pela primeira vez, ao familiarizar-se com o mecanismo burocrático, ao começar a mexer
num volume surpreendente de dinheiro – para ele, naturalmente, que antes era um simples
trabalhador – o sindicalista em potencial se transmuda.” Não se pode generalizar,
afirmando que todos os sindicalistas atuam dessa maneira. Contudo, é possível dizer, a
37
MP 215, de 1990, e suas reedições, até chegar na de nº 275, a qual foi apreciada pelo CN e
transformada no PL 58, de 1990. O PL foi contraditoriamente vetado pelo Presidente da República.
(MARTINS, 2009, p. 13).
48
partir da literatura38 acerca do tema e, sobretudo, pelo que se verifica na pática, que a
maioria continua agindo assim.
38
Exemplo: “Após galgarem os degraus que conduzem ao topo das respectivas entidades, eles
desenvolvem interesses próprios, particulares, desvinculados dos interesses do grupo que dizem
representar. A ação dessas entidades de classe volta-se, quase sempre, para a satisfação das vantagens ou
privilégios pessoais ou da diretoria”. (ROMITA, 2003, p. 17).
39
V. g.: Martinez (2013); Martins (2009); Romita (2013).
40
Sindicatos de gaveta são aqueles abertos sem qualquer organização social e política. Em muitos
casos, o trabalhador nem sabe que o sindicato existe. Para a criação basta ser feita uma assembleia,
normalmente esvaziada e convocada apenas por um edital publicado em jornal de grande circulação. A
finalidade é a contribuição sindical compulsória.
41
Sindicatos de carimbo são aqueles de pouquíssima ou nenhuma representatividade, na maioria das
vezes são pequenos mas eventualmente representam, apenas formalmente, grupos grandes de trabalhadores.
No corporativismo são leais ao governo e não aos trabalhadores. São criados para receber a contribuição
sindical compulsória e homologar as rescisões de contratos de trabalho.
42
Sindicalistas pelegos são aqueles com pouquíssima ou nenhuma representatividade de base,
poucos associados, quanto menor o número de associados melhor, não querem concorrência nem nada que
possa ameaçar a sua permanência no poder. Negociações no dia-a-dia nem pensar e as negociações na data
base geralmente são combinadas com o sindicato patronal, cuja minuta da convenção não é levada à
assembleia, a convenção é assinada por ele mesmo, sob uma suposta delegação daquela. Mobilizar os
trabalhadores? de jeito nenhum, pode prejudicar os seus interesses.
49
A propósito deste assunto, Garcez (2007, p. 126) assim se manifestou: “Mas que
ótimo que desapareçam, afinal, só servem para arrecadar o dinheiro do trabalhador, sem
nada dar em troca, em termos da essência da existência do sindicato.” Na opinião do autor
supracitado, isso proporcionaria o rompimento com o modelo corporativista, fortalecendo
os sindicatos verdadeiramente representativos e compromissados com os trabalhadores.
Garcez, op. cit., afirma que assim funciona no modelo deixado por Getúlio, ou
seja, os sindicatos recebem muito dinheiro sem precisar fazer nada pela classe que
representa (representação somente de direito, sem representação de fato), por conseguinte
não têm interesse em buscar associados, tampouco desejam mobilizar a categoria na luta
por conquistas para os representados. Isso iria expor as suas fragilidades e poderia surgir
concorrência, ameaçando os seus injustificáveis privilégios, em muitos casos, vitalícios.
Isso, de certo modo, explica a baixa representatividade dos sindicatos e, por conseguinte,
o desinteresse dos trabalhadores de se associarem às referidas entidades, bem como de
participarem da vida sindical, prejudicando irremediavelmente todo o sistema.
Com isso não se afirma que não deva existir uma contribuição do representado em
favor do sindicato; justamente o contrário, a contribuição sindical é necessária, o que se
combate é o tributo imposto por lei, o qual fere os pilares da democracia e da liberdade
sindical. A legítima contribuição ao sindicato, o qual deve ser escolhido pelos
trabalhadores, precisa ser objeto de deliberação dos representados em assembleia geral,
podendo alcançar, inclusive, os não associados - desde que beneficiários das respectivas
negociações coletivas. Essa, sim, estabelecida de forma democrática e livre, sem a
participação do Estado, está em perfeita consonância com o princípio da liberdade
sindical e com as orientações da OIT. (GOMES, A. e SILVA, A. ALFEU, 2016).
Com isso não se quer dizer que resolvidos esses problemas todos os demais
automaticamente também estariam. A organização política, social e econômica de um
país envolve muitos fatores, mas sem dúvida seria um passo muito importante nesse
sentido. O Estado democrático de Direito, instituído no Brasil pela Constituição de 1988,
precisa de um sistema sindical também democrático, que favoreça o desenvolvimento
socioeconômico.
43
“O bom funcionamento dos mercados de trabalho favorece a produtividade econômica, a criação
de rendimentos, a justiça social, a paz social e o desenvolvimento social e econômico sustentável.”
(Organização Internacional do Trabalho. Liberdade sindical na prática... 2008, p. XII).
51
2 SINDICATO E DEMOCRACIA
44
“[...] A economia volta a beneficiar-se da competição e a política, das eleições livres. Os sindicatos
se libertam do Estado e conquistam, no processo, sua autonomia. A greve ressurge, como instrumento de
pressão válido numa sociedade que estimula a multiplicação de centros de poder de toda ordem e retira do
Estado o ônus das decisões e da atuação como agente econômico e social para concentrá-lo na composição
de conflitos insuportáveis.” (PRADO, N., 1998, p. 275).
45
No original, em espanhol: "las relaciones laborales son en esencia un estudio de los procesos de
control sobre las relaciones que se generan en situación de trabajo; por lo tanto, las relaciones que allí se
gestan dotan a los empresarios de una autoridad predominante" (HYMAN, 1981, p. 79).
52
46
No original, em espanhol: "En la dinámica compleja de la relación capital-trabajo, el sindicato
aparece como la piedra angular de la sociedad civilizada" (GODIO, 2010, p. 4).
47
No original, em espanhol: Los empresarios –en su subconsciente– desearían que no existiesen los
sindicatos. Piensan la empresa como una entidad “paternalista” y desearían que los trabajadores
asalariados negocien en forma individual, se identifiquen con la autoridad empresarial y el destino de la
empresa, no ntorpezcan los procesos de trabajo y sean espontáneamente productivistas. Pero tal tipo de
trabajador asalariado ideal no existe. Los trabajadores valoran su trabajo, pero exigen que la empresa los
remunere satisfactoriamente, que las condiciones de trabajo tengan estándares favorables y que se los
reconozca como sujetos con criterios e intereses propios y diferenciados. [...] Los sindicatos son una
consecuencia inevitable del conflicto entre el capital y trabajo. (GODIO, 2010, p. 4-5).
48
E.g.: Romita (2007); Nascimento (2008).
53
Como forma de fazer frente à visão pessimista de Michels (1982), há estudos mais
recentes50 que ressaltam a possibilidade e a importância da democracia nos sindicatos.
Para tanto, o sindicato precisa ser realmente livre, escolhido pelos interessados,
requerendo, portanto, uma participação ativa dos seus membros, de modo que tenderia a
conformar uma comunidade política de referência para os trabalhadores, que geraria uma
importante solidariedade de classe e sentido de identidade entre lideranças e liderados.
Como consequência, esses sindicatos democráticos seriam bem mais fortes, eficientes e
eficazes para se opor ao predomínio do capital e desenvolver negociações em condições
de igualdade. (VENTRICI, 2009).
49
“A Coordenadoria Nacional de Promoção da Liberdade Sindical do MPT (Conalis) tem quase
quatro mil investigações abertas. São, em sua maioria, casos de entidades que se desviam de sua função de
defender os interesses da categoria profissional que representa perante os empregadores. Em muitos casos,
diretores se perpetuam no poder sem a realização de eleições limpas e transparentes.” MPT-RJ. Online.
2015.
50
No original, em espanhol: "una combinación de un conformación institucional que garantiza
formalmente derechos y libertades civiles y políticas, una vida política interna dinámica (participación
activa de los miembros en el ejercicio del poder) y una oposición organizada e institucionalizada"
(VENTRICI, 2009, p. 30); “Existe sin embargo um relativo consenso em utilizar el concepto de democracia
formal para definir la democracia sindical”. (AREOUS, 2000, p. 395).
54
51
(CANADÁ, Canada Labour Code (R.S.C., 1985, c. L-2)).
55
Estado52. Conforme Silva, A., (1990, p. 9): “Os sindicatos sempre tiveram destacada
atuação, não só no nascimento, mas também na evolução e estabilidade das democracias
ocidentais”. Não resta dúvida de que as associações, em geral, e em especial os sindicatos,
podem contribuir decisivamente para a consolidação da democracia.
O Sindicalismo pode ser definido como ‘ação coletiva para proteger e melhorar
o próprio nível de vida por parte de indivíduos que vendem a sua força-
trabalho’. Mas é difícil ir além desta definição abstrata e indeterminada, porque
o Sindicalismo é um fenômeno complexo e contraditório. Ele nasce, de fato,
como reação à situação dos trabalhadores na indústria capitalista, mas constitui
também uma força transformadora de toda a sociedade. Traduz-se em
organizações que gradualmente se submetem às regras de uma determinada
sociedade, mas é sustentado por fins que transcendem as próprias organizações
e que frequentemente entram em choque com elas. Gera e alimenta o conflito
dentro e fora da empresa, mas canaliza a participação social e política de
grandes massas, contribuindo para integrá-las na sociedade.
52
No original, em espanhol: “Democratizar los sindicatos es democratizar a la sociedad y en el
fondo al mismo Estado, pues um Estado democrático necesita una sociedad democrática”. (GURRÍA,
2014, p. 55).
53
No original, em inglês: “Unions aren’t faultless, but they are a crucial source of stability and
strength for our democracy.” (KAHLENBERG, 2016, p. 4).
54
No original, em inglês: “where free unions and collective bargaining are forbidden, freedom is
lost.” (KAHLENBERG, 2016, p. 3).
56
Séculos mais tarde, verificou-se - por ocasião da criação dos colégios romanos,
por Sérvio Túlio, os quais teriam sido dissolvidos oficialmente no ano 64 a.C. – certas
semelhanças com o sistema de organização sindical, no que pese este ter resultado da
abstenção do Estado, dentro da perspectiva do individualismo liberal, levando os
trabalhadores a se unirem em defesa dos seus interesses, enquanto que aquele decorreu
57
Claro que isso é somente uma pequena demonstração dos precedentes mais
remotos da organização dos trabalhadores em defesa dos seus interesses comuns, em
virtude dos vínculos estabelecidos pelo exercício das suas profissões e das suas
atividades. Apesar de todas as evidências, registros e manifestações do operariado, a
doutrina afina no mesmo diapasão de que o sindicalismo surgiu mesmo e foi levado a
efeito após a Revolução Industrial, no século XVIII, sobre o que se passa a expor, ainda
que en passant, a seguir.
55
O art. 2º da lei, no original, em francês: ”Les citoyens d’un même état ou profession, les
intrepreneurs, ceux qui on boutique ouverte, les ouvriers d’un art quelconque, ne pourront, lorsqu’ils se
trouveront ensemble, se nommer ni présidents, ni secrétaires, ni syndics, tenir des registres, prendre des
arrêtés ou délibérations, former des règlements sur leurs prétendus intérêts communs”.
59
No mesmo ano de 1919, o Tratado de Versalhes, que pôs fim à Primeira Guerra
Mundial e também criou a Organização Internacional do Trabalho – OIT, no seu art. 427,
nº 2, estabeleceu que: “O direito de associação para todos os fins não contrários às leis,
56
Alguns dispositivos da lei, no original, em francês: art. 2º: “Les syndicats ou associations
professionnelles, même de plus de vingt personnes exerçant la même profession, des métiers similaires, ou
des profession connexes concourant à l’établissement de produits déterminés, pourront se constituer
librement sans l’autorisation du gouvernement.”; art. 5º: “Les syndicats professionnels régulièrement
constitués d’après les prescriptions de la presente loi pourront librement se concerter pour l’étude et la
défense de leurs intérêts économiques, industriels, commerciaux et agricoles. Ces unions devront faire
connaître, conformément au deuxième paragrafe de l’article 4, les noms des syndicats qui les composent.
Elles ne peuvent posséder aucun immeuble ni ester em Justice”.
60
57
E. g.: Gomes, O. e Gottschalk (2005); Süssekind (2005).
58
“Ficam abolidas as Corporações de Officios, seus Juizes, Escrivães, e Mestres” (sic).
61
Ainda conforme o autor, op. cit., no início do século XX, após a edição da primeira
lei sindical brasileira, em 1903, surgiram algumas entidades sindicais e, com o passar do
tempo, foram surgindo outras. As primeiras foram: Sociedade União das Fogueiras, em
1903; União dos Operários Estivadores, também em 1903; Associação de Resistência dos
Cocheiros, Carroceiros e Classes Anexas, em 1906; União dos Operários em Fábricas de
Tecidos, em 1917; Confederação Geral dos Trabalhadores, em 1920, entre outras.
Algumas destas associações teriam sido influenciadas pelo anarcosindicalismo, resultado
da forte imigração europeia para o Brasil naquele período. A partir do segundo quarto do
século XX, estas associações se multiplicaram.
Ademais, no período supracitado, segundo Morais, J., (1994, p. 75): “Por um lado
havia uma aceitação passiva das políticas salariais dos governos militares e por outro
descrença em práticas tais como consultar e prestar contas de atos aos filiados, em
particular, e à categoria, em geral, e/ou desconsideração por essas práticas.” Ainda
conforme o autor, op. cit., em decorrência desse cenário, raramente havia mobilização
dos trabalhadores para qualquer ação sindical, assim como as reivindicações se repetiam
ano após ano, com poucas novidades, predominando o conservadorismo.
64
Esse movimento surgiu quando o governo militar já vivenciava uma grande crise
institucional, a qual viria culminar, mais tarde, na queda do regime. Boito Jr. (1994, p.
23) afirma que isso teria ocorrido “Em contraste com a prática burocrática e governista
da quase totalidade dos diretores de sindicatos oficiais de então, os dirigentes do Novo
Sindicalismo rebelaram-se contra a política salarial da ditadura e procuraram mobilizar
as suas bases para a ação grevista”. Ou seja, no que pese o Novo Sindicalismo atuar dentro
da estrutura corporativista, agia de forma diferente, contrariando a ordem posta.
organizar uma greve geral, e fez, mas sofreu uma dura repressão do regime militar, a mais
forte reação registrada, em especial a proibição oficial da realização de qualquer
negociação fora da política salarial do governo.
Fim do regime militar, eleição de Tancredo Neves, que faleceu antes de assumir,
assumindo em seu lugar o seu Vice-Presidente, José Sarney. A partir deste momento,
março de 1985, foi removido o rigor excessivo do controle do Estado sobre os sindicatos,
assim como houve vitórias relativas às liberdades, em especial as liberdades de expressão,
de manifestação do pensamento, de reunião e de greve. Contudo, a crise econômica era
forte, causando muito desassossego na sociedade, apresentação de vários pacotes
econômicos, gatilho salarial, etc., período de muita agitação do movimento sindical,
inclusive com muitas greves. A política de desenvolvimento econômico era tida como
excludente pelo Novo Sindicalismo, que buscou a unificação do movimento para
combatê-la. (BOITO Jr., 1994).
Ocorre que o Novo Sindicalismo, apesar de expressivo, era restrito a certa região
do país e a certos grupos, pequenos dentro de todo o sistema, predominantemente
neocorporativista. Naquela oportunidade, o movimento aliou-se ao sistema com a
finalidade de tentar mudá-lo por dentro, contudo não teve forças para tanto (GACEK e
GOMES, A., 2015)59. A derrocada definitiva do Novo Sindicalismo veio com a eleição
de Fernando Collor de Melo, pelas seguintes razões:
Em primeiro lugar, pelo simples fato de Collor ter assumido o poder através
do voto popular. O primeiro Presidente eleito após três décadas sem eleições
presidenciais era um político que defendia abertamente o neoliberalismo
conservador. Em condições semelhantes, é muito mais difícil fazer luta
sindical contra um governo eleito do que contra um governo ditatorial em crise
(Figueiredo) ou contra um governo civil eleito por via indireta, desfigurado
pela morte de Tancredo Neves e tutelado pelos militares (Sarney).
59
“Apesar do novo sindicalismo ter dentre os seus objetivos ‘democracia sindical e autonomia’ e ter
se posicionado em defesa da liberdade sindical, não foi forte ou suficiente para disseminar seus ideais.”
(GACEK e GOMES, A., 2015, p. 156).
66
Em segundo lugar, foi uma derrota porque embora a CUT, ainda caudatária no
plano organizativo e ideológico da estrutura sindical corporativa reformada,
não tivesse assumido de modo aberto e consequente a candidatura Lula, a
central deu apoio ao candidato do PT e tinha clareza sobre o caráter antipopular
e antissindical da candidatura Collor de Melo. (BOITO Jr., 1994, p. 25).
O supracitado movimento sindical, apesar das dificuldades enfrentadas e da sua
curta existência, obteve muitas conquistas para os seus representados e também
contribuiu fortemente para o processo de redemocratização do Brasil. Foi muito estudado,
sobretudo na década de 1990 e início dos anos 2000, embora ainda atualmente suscite
discussões acerca das suas virtudes e das razões que o levaram a fracassar. É lembrado
como um movimento sindical combativo, dinâmico e eficiente.
Tem o seu nascedouro na Grécia antiga, segundo Goyard-Fabre (2003, p. 9), por
volta do “século VI antes da nossa era”, cuja raiz etimológica é a palavra grega
demoskrátos, que pode ser dividida em demos, equivalente a povo, e krátos, equivalente
a governo. Democracia, portanto, significa governo do povo.
O povo possuiria suficiente capacidade para escolher [...], mas não para
governar. Um dos inconvenientes da democracia dos antigos era o fato de o
povo deliberar sobre os negócios públicos, capacidade que, para Montesquieu,
ele não possui, ao contrário dos seus representantes, plenamente capazes de
decidir sobre a vida pública.
As principais razões da passagem da democracia direta para a indireta foram as
condições territoriais, visto que os Estados modernos são geralmente extensos,
complexos, sendo inadequado o modelo antigo de democracia. Bobbio (2003, p. 64) traz
a seguinte definição: “[...] é mais possível que a vontade pública, expressa pelos
68
O fato é que, no exemplo brasileiro, o povo não mais enxerga o interesse público
como prioridade para os governantes eleitos, sejam eles dirigentes do Estado ou de uma
entidade sindical, os quais se preocupam mais com os seus próprios interesses. De tal
sorte que o povo, incluindo-se os trabalhadores, já não mais se sente devidamente
representado. Às vezes a sensação é justamente o contrário, até parece que o representante
eleito está trabalhando contra o interesse público. Assim, o poder soberano do povo está
desvirtuado, considerando que a sua efetividade somente existe até a eleição do
representante, que no exercício do mandato o corrompe e lhe dá destinação diversa da
devida. Tal pensamento encontra respaldo em Goyard-Fabre (2003, p. 282), in verbis:
60
“Esse ambiente de preconceitos aristocráticos, bem como sobre a sua pureza étnica, um papel
principal e eficientíssimo de tutela e resguardo – o que vai ter sobre a nossa evolução nacional uma
influência inestimável.” (VIANNA, F., 1952, p. 142).
70
Como dito alhures, a democracia é necessária não somente nos poderes executivo
e legislativo, sendo exigida também em instituições e entidades públicas e privadas,
sobretudo quando o comando for exercido mediante mandato eletivo, a exemplo das
entidades sindicais, assunto acerca do qual se abordará de forma mais detida a seguir.
principal responsável por muitos graves vícios que prejudicam severamente esse tipo de
organização social.
As causas do pouco interesse na filiação sindical não se deve somente aos fatores
acima. A solidariedade sindical também é bastante afetada por uma nova conjuntura da
sociedade do trabalho, por intermédio da qual os trabalhadores são desafiados ao êxito
individual, deixando por menos o engajamento na luta por conquistas coletivas. Mais um
motivo, entre outros, para um percentual cada vez menor de trabalhadores filiados ao
sindicato. (ROMITA, 1998).
É certo que a organização interna do sindicato precisa ser livre, assim como
preconiza a OIT, em especial na Convenção nº 87, bem como está previsto no inciso I,
art. 8º da Constituição de 1988. Entretanto, também é verdade que a liberdade de
organização interna deve ser acompanhada da liberdade externa, possibilitando a
concorrência entre as entidades, legitimando-se à representação de direito e de fato aquela
que melhor traduza os interesses dos representados, associados ou não. Para isso é
determinante que haja liberdade individual, permitindo ao trabalhador, assim como ao
empregador, escolher o sindicato que melhor o represente, sem as amarras da unicidade
sindical e da organização por categoria.
61
“O Brasil, ao contrário, [comparando-se com outros países pesquisados] não registrou queda na
densidade sindical, apresentando leve elevação de 1,8%. Em 2011 havia 17% dos ocupados sindicalizados,
enquanto em 2002 a densidade sindical atingia a 16,8% dos trabalhadores. (Fundação Perseu ... online,
2013).
62
Em 1987 havia 5536 sindicatos de trabalhadores (Instituto Bras. ... IBGE ... 2001, online); em 24
de março de 2016 chegou-se a 10972 entidades sindicais de trabalhadores registradas no MTE (Ministério
do Trab. ...MTE ... 2016, online). Portanto, no período sob exame, verifica-se um crescimento de cerca de
98,19%.
72
Portanto, como afirmam Fosh e Cohen (1990), a entidade sindical deve atender às
exigências de representatividade e responsabilidade política. A primeira refere-se a todo
o disciplinamento organizativo: normativos, políticas, critérios, eleições, etc.; enquanto a
segunda reporta-se aos meios consultivos para deliberação e posteriormente a prestação
de contas. Dessa forma, entende-se que os pontos acima são de observância obrigatória
por ocasião da necessária reforma sindical.
63
“[...] é quase insignificante a participação dos trabalhadores nas assembleias gerais”. (MARTINS
FILHO, 1998, p. 176).
64
No original: “Quando os chefes não possuem nem fortuna pessoal nem outras fontes suficientes
de renda, eles se agarram com tenacidade, por razões econômicas, ao seu emprego, o qual terminam por
considerá-lo como sua posse, como seu bem inalienável. Isto é particularmente verdadeiro para antigos
operários que se tornaram líderes e que perderam o hábito do trabalho manual. A perda do cargo seria para
eles um verdadeiro desastre financeiro" (Michels, 1982, p. 118).
73
Para a configuração acima, exemplos não faltam, mas cita-se somente o caso do
Sindicato dos Comerciários do Rio de Janeiro, no qual a família Mata Roma agiu como
dona, não como dirigente, por quase 50 anos, passando de pai para filho. A referida
família somente deixou o comando do sindicato por determinação judicial, em Ação Civil
Pública65 proposta pelo MPT-RJ. Segundo os Procuradores do Trabalho, os salários dos
membros da diretoria, que eram todos da referida família, eram superior a R$ 50.000,00
(cinquenta mil reais) por mês, representando uma enorme disparidade com os salários dos
verdadeiros comerciários. Ademais, só na parte que foi possível apurar, a família pode ter
desviado cerca R$ 100.000.000,00 (cem milhões de reais) do sindicato.
Ainda com base no processo acima, outra conclusão a que se pode chegar é que
essa prática se constitui num grande distanciamento dos dirigentes e do próprio sindicato
da sua base. O Sindicato dos Empregados no Comércio do Rio de Janeiro representa, ou
deveria representar, cerca de quinhentos mil trabalhadores, dos quais somente três e
oitocentos são sindicalizados, não se sabe à custa do quê. Não há fiscalização nem
controle por parte dos trabalhadores, tampouco há prestação de contas por parte da
entidade. Por razões óbvias, falta-lhes legitimidade.
65
TRT-RJ. ACP. Processo nº 011308-36.2014.5.01.0019, 19ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro-
RJ. Data publicação: 15 out. 2014.
74
Entretanto, alguns sindicatos - visando mais dinheiro, bem como a superação dos
obstáculos criados pela Jurisprudência do TST e do STF à cobrança de contribuições
extras de trabalhadores não sindicalizados - encontraram uma alternativa, qual seja,
convencionam ou acordam com o sindicato patronal, sem a anuência dos trabalhadores,
que as empresas abrangidas pela respectiva categoria paguem ao sindicato dos
empregados, como forma de compensar os valores não descontados, um determinado
percentual sobre a folha de pagamento. (ROMITA, 2007). Esta, sem dúvida, além de
antidemocrática, é caracterizada como uma típica prática antissindical.
Essa prática, por mais absurda que pareça, é mais comum do que se possa
imaginar, sendo realmente levada a efeito em muitos casos, embora nos últimos tempos
76
Artigo 2
1. [...]
2. Serão principalmente considerados atos de ingerência, nos termos deste
Artigo, promover a constituição de organizações de trabalhadores dominadas
por organizações de empregadores ou manter organizações de trabalhadores
com recursos financeiros ou de outra espécie, com o objetivo de sujeitar essas
organizações ao controle de empregadores ou de organizações de
empregadores.
Esta última Convenção foi ratificada pelo Brasil em 18.11.1952, estando em pleno
vigor, de tal forma que fica patente que se constitui numa ilegalidade, como se não
bastasse malferir o inciso I do art. 8º da Constituição, relativamente à autonomia sindical,
além de ser antidemocrática e antiética as práticas supracitadas, contrárias aos princípios
democráticos adotados, sobretudo, na Constituição de 1988. Ademais, tal prática é
envolta por forte suspeita de corrupção. Afinal, qual seria o interesse da empresa
patrocinar a campanha do sindicato laboral? Pode-se concluir que pretende levar alguma
vantagem nas negociações.
Consoante Brito Filho (2009, p. 141), “[...] as relações entre capital e trabalho, no
plano coletivo, principalmente, caracterizam-se pelo choque de interesses, no mais das
vezes antagônicos, o que pressupõe certa beligerância, que se acentua quando usados
meios de ação sindical direta.” O referido autor assevera que é obrigação do sindicato
77
Nascimento (2008, p. 204), no tocante à liberdade sindical, afirma que essa “[...]
não é um direito absoluto. Está, como toda garantia, sujeita a algumas restrições. Devem
ser razoáveis e justificadas.” Um pouco mais adiante, quanto à autonomia ilimitada das
entidades sindicais, o mencionado autor afirma que: “a autonomia absoluta pode levar a
uma situação que a partir de certo ponto passa a negar o próprio fim a que se destina”.
(NASCIMENTO, 2008, p. 265). Deve ser considerada a tendência oligárquica dos
sindicatos (MICHELS, 1982), precisando-se buscar mecanismos eficazes para evitá-la.
Portanto, a própria autonomia precisa estar dentro de um contexto democrático, no qual
haja transparência, supervisão pelos representados, prestação de contas e auditoria, enfim,
que seja favorecida a efetiva participação dos trabalhadores e a existência de oposição,
do contrário fatalmente terá a sua finalidade desvirtuada.
Coadunando com o pensamento até aqui esposado, Romita (2009, p. 358) delineia
um contraponto quanto à autonomia dos sindicatos, afirmando que “a autonomia da
associação profissional não significa soberania, porque a entidade, embora autônoma em
sua vida interior, obedece ao ordenamento jurídico estatal. De tal forma que a autonomia,
ressalte-se, que deve de fato existir, mas igualmente deve pautar-se pela ética profissional,
zelo na defesa dos interesses dos representados e deve garantir a alternância no poder. A
autonomia deve ser limitada pelo direito dos indivíduos e dos demais grupos sociais
representados, e jamais pode funcionar como um salvo conduto (para o mal) destinado a
78
A própria OIT admite que certos controles possam existir para assegurar a
democracia e viabilizar ao associado ou representado um acompanhamento da entidade
sindical, de modo a favorecer a transparência e garantir que os processos e ações da
entidade sindical tenham por finalidade precípua a defesa dos interesses dos
representados. “[...] como, por exemplo, a obrigatoriedade de ser apresentado, de forma
periódica, balanço financeiro, a fiscalização da contabilidade por auditores
independentes, e a obrigatoriedade de registro de livros, sem que isto viole direitos
sindicais.” (BRITO FILHO, 2009, p. 124). O que não pode, segundo a OIT, é o controle
feito pelo Estado.
Não é razoável que um presidente de sindicato laboral, que quase nada ou nada
negocia para os seus representados, seja por esses reconduzido ao cargo, mandato após
mandato, vitaliciamente. Há, no mínimo, sérias suspeitas acerca da lisura do processo
eleitoral. Não resta dúvida de que tal situação é prejudicial aos interesses da categoria
representada, com desdobramentos negativos para todos os envolvidos, inclusive para o
Estado.
nos seus processos eleitorais, critica a perpetuação dos presidentes de sindicatos no poder,
afirmando que isso somente favorece a certas pessoas e prejudica todo o restante da
classe.
Utilizando-se de um pouco mais de rigor nas ideias, há teóricos que entendem não
mais ser compatível com a nova ordem constitucional tanto a possibilidade de
indeterminadas reeleições como a eleição indireta. Entre eles, Arouca (2009, p. 62-63)
afirma que o § 1º do art. 522 da CLT - dispositivo que autoriza a diretoria eleger, dentre
os seus membros, o presidente do sindicato - não foi recepcionado pela Constituição
Federal de 1988: “Quanto à eleição indireta do presidente, fora de qualquer dúvida, não
se mantém o § 1º.” Referindo-se ao §1º do art. 522 da CLT que, segundo o autor, não foi
recepcionado pela Constituição cidadã.
Filia-se à corrente que entende que a possibilidade de eleição indireta para cargos
de direção de sindicatos, associada à falta de limites à reeleição, dentro do sistema atual
– unicidade mandatória de base territorial mínima, é importante causa da realidade
sindical que se tem no Brasil, permitindo a permanência de presidentes de sindicatos
vitalícios, assim como a sucessão hereditária de cargos. Entende-se, apoiado em ampla
doutrina66, que o modelo praticado no Brasil favorece a autocracia nos sindicatos,
resultando nas oligarquias sindicais de há muito observadas, mesmo sendo
reconhecidamente prejudiciais aos trabalhadores e ao desenvolvimento socioeconômico.
66
V.g.: Nascimento (2008); Romita (2007).
80
Silva, A., (1990, p. 39) afirma que somente a pluralidade é forma ideal de
organização sindical, bem como é a única compatível com a nova ordem constitucional e
com um Estado moderno. Entretanto, o supracitado autor não oferece muita precisão ao
modelo proposto, sobretudo acerca da questão de como assegurar a pluralidade plena,
focada na pessoa do candidato/dirigente, sem fragmentar ainda mais o sistema sindical.
Ressalte-se haver muitos vícios e permissividades, arraigados durante tanto tempo em
que o Brasil permitiu a existência e o funcionamento de um modelo inadequado, inclusive
na vigência da Constituição de 1988, sem embargo de alguns progressos, mas registrando-
se também retrocessos.
pautar-se por normas que garantam a liberdade e os direitos individuais dos trabalhadores,
sobretudo quanto à participação. Areous (2000) defende que é preciso que se combine a
democracia formal com uma ativa vida política interna, na qual existam oposição e efetiva
participação dos membros do sindicato no exercício do poder. Como dito alhures, os
dirigentes sindicais não podem se dissociar da representatividade, tampouco da
responsabilidade política. Ou seja, precisam representar legitimamente os interesses dos
trabalhadores e lhes prestar contas. (FOSH e COHEN, 1990; MORAIS, J., 1994).
67
E. g.: Nascimento (2008), Romita (2007), Brito Filho (2009), Silva, A. (1990), Süssekind (2005).
83
68
“O sindicato obrigatório não se identifica, precisamente, com o sindicato único. [...] Com efeito,
o sindicato obrigatório pode coexistir com o plurissindicalismo, quando os indivíduos, por lei, sejam
obrigados a se filiar a um sindicato de sua escolha.” (GOMES, O. e GOTTSCHALK, 2005, p. 557).
69
“Objetivamente a Convenção 87 traz discussões de divergência no movimento sindical, embora,
na essência, esteja, inclusive, de acordo com a autonomia, a liberdade e a unidade do movimento sindical.”
(PINTO, 1987, p. 163).
84
mecanismo que poderá contribuir para esse fim seria a escolha do sindicato para
representar certa unidade de trabalhadores feita somente pela comprovação da filiação
dos membros do grupo abrangido, sem a necessidade de eleição. O registro no Ministério
do Trabalho e Emprego - MTE seria parecido com o que existe atualmente, ou seja,
serviria somente para dar publicidade ao feito, informando quem oficialmente representa
determinado grupo.
Solução parecida com a sugerida acima foi pretendida nos Estados Unidos, “The
Employee Free Choice Act”, prometida e não cumprida por Barak Obama, devido a
grandes resistências enfrentadas no empresariado e no Congresso americano70. Antes de
Obama, o Presidente Bill Clinton já havia tentado, sem sucesso, promover mudanças
positivas no National Labor Relation Act – NLRA, com vistas a favorecer a liberdade
sindical e a negociação coletiva dos trabalhadores e protegê-los das condutas
antissindicais dos empregadores. Os pequenos avanços de Clinton teriam sido desfeitos
por George W. Bush. (GACEK e GOMES, A., 2015).
70
No original, em inglês: “Opponents of the Employee Free Choice Act have launched a 200 million
dollar campaign to defeat it.” (TRUMKA, 2009, p. 4).
71
Código do Trabalho do Canadá, no original, em inglês: Certification of Bargaining Agents and
Related Matters: Duty to certify trade union - 28 (1): If the Board is satisfied on the basis of the results of
a secret ballot representation vote that a majority of the employees in a unit who have cast a ballot have
voted to have a trade union represent them as their bargaining agent, the Board shall, subject to this Part,
certify the trade union as the bargaining agent for the unit. Representation vote - (2): The Board shall order
that a secret ballot representation vote be taken among the employees in a unit if the Board: (a) has received
from a trade union an application for certification as the bargaining agent for the unit;(b) has determined
that the unit constitutes a unit appropriate for collective bargaining; and (c) is satisfied on the basis of
evidence of membership in the trade union that, as of the date of the filing of the application, at least 40%
of the employees in the unit wish to have the trade union represent them as their bargaining agent.
(CANADÁ, Canada Labour Code. R.S., 1985, c. L-2, s. 28; 2014, c. 40, s. 2.).
85
72
Código do Trabalho do Canadá, no original, em inglês: DIVISION I: Basic Freedoms: Employee
freedoms - 8 (1) Every employee is free to join the trade union of their choice and to participate in its lawful
activities. Employer freedoms - (2) Every employer is free to join the employers’ organization of their
choice and to participate in its lawful activities. (CANADÁ, Canada Labour Code. R.S., 1985, c. L-2, s. 8;
1999, c. 31, s. 162(E)).
86
73
“Para enfraquecer a autoridade, dividiu-se o poder, e para garantir as liberdades, elaborou-se a
doutrina dos direitos e garantias inalienáveis, acima do Direito positivo colocado.” (VASCONCELOS,
2006a, p. 270).
74
“O Estado e o Direito assuem novas funções promocionais, e se consolida o entendimento de que
os direitos fundamentais não devem limitar o seu raio de ação às relações políticas, entre governantes e
governados, incidindo também em outros campos, como o mercado, as relações de trabalho e a família”.
(SARMENTO, 2010, p. 323).
75
“Do efeito vinculante inerente ao art. 5º, § 1º, da CF decorre, num sentido negativo, que os direitos
fundamentais não se encontram na esfera de disponibilidade dos poderes públicos, ressaltando-se, contudo,
que, numa concepção positiva, os órgãos estatais se encontram na obrigação de tudo fazer no sentido de
realizar os direitos fundamentais” (SARLET, 2011, p. 366).
88
II, que traz no seu bojo vários direitos individuais e coletivos, a Constituição de 1988, no
seu todo, apresenta certa unidade de sentido em defesa dos direitos fundamentais,
inclusive trazendo a previsão de um rol bastante expressivo desses direitos, que têm como
fundamento a dignidade da pessoa humana, de tal forma que o homem é a base da
sociedade e do Estado.
A dignidade da pessoa humana não tem somente natureza axiológica, mas também
deontológica, porque é norma, haja vista que está prevista no inciso III do art. 1º da
Constituição de 1988, como um dos fundamentos do Estado democrático de Direito. É
justamente o que dá sustentação aos direitos fundamentais. “Os conceitos axiológicos têm
por base a ideia de bom. Os deontológicos, a de dever ser.” (BARROSO, 2010, p. 9). Não
é um direito fundamental porque não teria em que se fundamentar, tendo em vista que é
o próprio fundamento para os direitos humanos positivados na Constituição. Na
Constituição brasileira, os direitos fundamentais estão previstos, expressamente, nos
artigos do 5º ao 17, todos tendo como fundamento a dignidade da pessoa humana.
Romita (2009, p. 77) afirma que “a doutrina tende a isolar a teoria dos direitos
fundamentais das ‘abstratas teorias da justiça’”. O autor preleciona que os direitos
fundamentais são, inclusive, orientadores do legislador constituinte, ideia também
respaldada em Canotilho (2003). Ainda com base em Romita (2009, p. 77), “o poder
constituinte encontra limites ‘fundamentalmente radicados em determinados direitos
fundamentais’. Mas não há dúvida de que é pela mediação dos direitos fundamentais que
se relacionam os âmbitos da ética, do direito e da justiça”. À luz do exposto, percebe-se
que a Constituinte não se conduziu muito bem em relação ao conteúdo do art. 8º da
Constituição, consoante detalhado alhures. Difícil admitir o respeito aos direitos
fundamentais, à ética e à justiça num sistema jurídico onde a liberdade é tão mitigada.
Coadunando com o pensamento acima, Romita (2009, p. 87) afirma que “um dos
direitos sociais específicos, a saber, a liberdade sindical, pressupõe a existência efetiva
dos direitos fundamentais. Tampouco é possível a plena realização dos direitos
fundamentais sem que se reconheça a liberdade sindical”. O autor supracitado, ao concluir
o seu raciocínio, assim asseverou: “é certo que a liberdade sindical depende das liberdades
individuais, e a recíproca é verdadeira: só se admite a existência de liberdades públicas e
de democracia se houver liberdade sindical”. (ROMITA, 2009. p. 88). Portanto, assegurar
a liberdade sindical não é uma opção, antes é uma obrigação de um Estado que se define
como democrático de Direito.
76
Expressando o princípio da indivisibilidade dos direitos fundamentais, o Comitê de Liberdade
Sindical considera que – texto original, em inglês: “The guarantees set out in international labour
Conventions, in particular those relating to freedom of association, can only be effective if the civil and
political rights enshrined in the Universal Declaration of Humans Rights and other international
instruments are genuinely recognized and protected”. (ILO. International labour standards…, 2001, p.36).
77
Conforme art. 62.3 da CADH c/c anexo B-32 da CIDH c/c Decreto Presidencial nº 678, de 1992.
78
No original, em espanhol: 158. “Esta Corte considera que la libertad de asociación, en materia
sindical, reviste la mayor importancia para la defensa de los intereses legítimos de los trabajadores y se
enmarca en el corpus juris de los derechos humanos.” (CIDH, Caso Ricardo Baena y otros Vs. Panamá,
Mérito, Reparações e Custas, sentença de 2 de fevereiro de 2001).
91
79
No original, em espanhol: 137. “No basta com hacer referencia a las obligaciones de respeto y
garantía de los derechos humanos laborales de todos los trabajadores migrantes, sino que es también
pertinente señalar que estas obligaciones proyectan diversos alcances y efectos para los Estados y
terceros.” (CIDH, Opinião Consultiva nº 18, 17 de setembro de 2003).
92
outras, afastar o conflito80, real e/ou potencial, de tal forma que instituiu um sistema
sindical tutelado pelo Estado, e o Direito Individual prevalecente sobre o Direito Coletivo
do Trabalho. Ficou patente o viés liberal, autoritário e antidemocrático. Segundo Martinez
(2013), aquela era uma ideia de fundo liberal-católico, cujo desiderato era a domesticação
do trabalhador.
A tese acima é reforçada em Bobbio (2000, p. 103), para quem “[...] a doutrina
liberal considera o problema da liberdade em função do indivíduo isolado e, a doutrina
democrática, em função do indivíduo enquanto partícipe de uma coletividade (de uma
vontade comum).” Portanto, a liberdade e a democracia sindicais, cruciais para o
desenvolvimento e equilíbrio da relação capital-trabalho81, foram praticamente
aniquiladas pelo regime Vargas, que criou um sistema tão eficiente que até hoje, apesar
do advento da Constituição democrática de 1988, nem a liberdade tampouco a democracia
conseguiram se impor no sistema trabalhista brasileiro.
80
Afastar o conflito é uma das piores condutas antissindicais. Como disse Porto (2008, p. 17): “Em
uma expressão sintética, costuma-se dizer que o patrão pode opor-se lealmente ao sindicato no conflito,
mas não se opor ao conflito”. O mesmo se aplica ao Estado, mutatis mutandis.
81
“A liberdade sindical e a democracia compartilham os mesmos fundamentos: liberdade,
independência, pluralismo e participação nos processos decisórios”. (GACEK e GOMES, A., 2015, p. 103).
82
Avançando um pouco mais, em respeito ao entendimento de quem defende a hierarquia dos
direitos fundamentais, a exemplo de Lopes (2001), poder-se-ia desenvolver o raciocínio por meio do qual
a observância da liberdade sindical deveria preceder aos demais direitos sociais, tendo em vista que nessa
lógica da hierarquia obedece-se primeiro o direito à vida e àquilo que mais próximo dela está, a liberdade,
e assim por diante. Tal raciocínio confere à liberdade sindical uma importância especial. Justo o contrário
do que vem ocorrendo no Brasil.
93
impede que alguns tenham, devam e possam ter aplicação imediata, como é o caso, por
exemplo, da sindicalização.” Portanto, o direito fundamental à liberdade sindical tem
curso forçado, requer aplicação imediata.
83
“vedadas ao poder público a interferência e a intervenção na organização sindical”.
96
Portanto, deixou-se para o intérprete uma difícil missão: fazer valer a liberdade
sindical tão amplamente propagada na Constituinte, num sistema cheio de restrições.
Romita (2013, p. 50) arremata: “Em suma, imperou a lógica leopardesca: é preciso mudar
alguma coisa para que tudo permaneça como está”. Ou seja, diz-se que tem mas não tem,
devido à falta de efetividade, bloqueada por mecanismos propositalmente instituídos. As
restrições à liberdade sindical inseridas na Constituição de 1988 criaram fortes barreiras
às necessárias mudanças, dado o status da norma constitucional e a dificuldade da sua
alteração. É o que Gomes, A. e Prado, M. (2011) chamam de reforma armadilha84.
No inciso III, a palavra “categoria”, que também está prevista no inciso IV,
seguindo o mesmo raciocínio, deveria ser interpretada no sentido lato sensu,
relativamente ao grupo representado, e não à categoria no sentido formal da hierarquia
estrutural do velho modelo corporativista. Os incisos II e IV não são concessivos de
84
No original, em inglês: “In this regard, the Brazilian system represents yet another instance of a
reform trap, which one of us has previously defined as a situation in which an earlier reform creates an
interest group that will resist changes or improvements to the system down the road.” (GOMES, A. e
PRADO, M., 2011, p. 861).
98
85
Para o Deputado Constituinte Augusto Carvalho (PCB-DF), “A unicidade é uma questão de
princípios para os comunistas, pois o sindicato único é fundamental para a organização do movimento
sindical.” No entendimento do parlamentar a liberdade sindical era um risco, “o pluralismo resultante dela
esfacela, inicialmente, o movimento sindical frente aos patrões.” (QUESTÃO..., ago. 1988, nº 59, p. 9).
99
não querem perder o status quo e as vantagens que auferem. Com pensamento neste
sentido, também se podem incluir, entre outros autores, Gomes, A. e Prado, M. (2011).
A propósito desse tema, Delgado (1994, p. 289) afirma que “os chamados ‘direitos
sociais’ – integrantes do núcleo de intangibilidade material da Carta de 1988 - [...]”
encontram-se presentes nos dispositivos dos artigos 6º e 7º e, segundo o autor: “Há
direitos sociais e coletivos também no artigo 8º, incisos I (‘autonomia sindical’), III e VI
(‘prerrogativas sindicais’), V (‘liberdade de filiação sindical’), VII (‘direitos sindicais do
aposentado’) e VIII (‘garantias do sindicalizado e da categoria’). Vê-se que o doutrinador
não menciona os incisos II e IV, justamente pelas razões acima expostas.
despeito de dispositivos restritivos em contrário, a exemplo das previsões nos incisos II,
III e IV da Constituição.
86
"Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio
implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É
a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio violado,
porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumácia
irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra" (Mello, 1981, p. 88).
87
Art. XXIII, nº 4: “Toda a pessoa tem o direito de fundar com outras pessoas sindicatos e de se
filiar em sindicatos para defesa dos seus interesses”.
88
Convém apresentar os arts. 2º, 3º e o item 2 do art. 8º da Convenção nº 87, por serem os mais
relevantes dentro do contexto do trabalho: Art. 2 — Os trabalhadores e os empregadores, sem distinção de
qualquer espécie, terão direito de constituir, sem autorização prévia, organizações de sua escolha, bem
como o direito de se filiar a essas organizações, sob a única condição de se conformar com os estatutos das
mesmas. Art. 3 — 1. As organizações de trabalhadores e de empregadores terão o direito de elaborar seus
estatutos e regulamentos administrativos, de eleger livremente seus representantes, de organizar a gestão e
102
seu mais importante tratado multilateral. Segundo Arouca (2009, p. 81), a origem desta
Convenção foi uma “reação ao nazi-fascismo e com o propósito de contrapor novas forças
aos sindicatos operários organizados unitariamente conforme o modelo de Mussolini”. A
referida Convenção visa garantir a liberdade sindical dos trabalhadores e empregadores
em relação aos poderes públicos.
a atividade dos mesmos e de formular seu programa de ação. 2. As autoridades públicas deverão abster-se
de qualquer intervenção que possa limitar esse direito ou entravar o seu exercício legal. Art. 8: [...] 2 – A
legislação nacional não deverá prejudicar – nem ser aplicada de modo a prejudicar – as garantias previstas
pela presente Convenção.
89
A mensagem presidencial encaminhando a ratificação da Convenção 87 foi enviada ao Congresso
Nacional em 31 de maio de 1949. É o mais antigo projeto na casa. (AROUCA, 2009).
90
“Causa um certo mal-estar saber na OIT que a Convenção nº 87 tramita aqui no Congresso há 30
anos, foi aprovada pela Câmara dos Deputados e que, na iminência de ser aprovada, houve um movimento
sindical contrário à sua aprovação. Não sei como é que vamos, perante a Comissão encarregada de verificar
a ratificação das convenções, explicar à OIT o que aconteceu no Brasil em 1987.” (PINTO, 1987, p. 164).
91
(3RD ITUC WORLD CONGRESS ... BERLIN, 2014).
92
(ORGANIZAÇÃO INT. ... OIT ... Liberdade sindical na prática. ..., 2008, p. 6).
103
numa lista que demanda uma campanha intensiva e ação imediata, a exemplo de
RD
Bangladesh, Guatemala e Turquia. (INTERNATIONAL ... 3 ITUC WORLD
CONGRESS ... BERLIN, 2014).
93
Artigo 8º: “1. Os Estados Partes do presente Pacto comprometem-se a garantir: a) O direito de toda
pessoa de fundar com outras, sindicatos e de filiar-se ao sindicato de escolha, sujeitando-se unicamente aos
estatutos da organização interessada, com o objetivo de promover e de proteger seus interesses econômicos
e sociais. O exercício desse direito só poderá ser objeto das restrições previstas em lei e que sejam
necessárias, em uma sociedade democrática, no interesse da segurança nacional ou da ordem pública, ou
para proteger os direitos e as liberdades alheias; b) O direito dos sindicatos de formar federações ou
confederações nacionais e o direito destas de formar organizações sindicais internacionais ou de filiar-se às
mesmas; c) O direito dos sindicatos de exercer livremente suas atividades, sem quaisquer limitações além
daquelas previstas em lei e que sejam necessárias, em uma sociedade democrática, no interesse da segurança
nacional ou da ordem pública, ou para proteger os direitos e as liberdades das demais pessoas; d) O direito
de greve, exercido de conformidade com as leis de cada país. 2. O presente artigo não impedirá que se
submeta a restrições legais o exercício desses direitos pelos membros das forças armadas, da política ou da
administração pública. 3. Nenhuma das disposições do presente artigo permitirá que os Estados Partes da
Convenção de 1948 da Organização Internacional do Trabalho, relativa à liberdade sindical e à proteção do
direito sindical, venham a adotar medidas legislativas que restrinjam - ou a aplicar a lei de maneira a
restringir as garantias previstas na referida Convenção.”
94
Artigo 8º: “1. Os Estados-Partes garantirão: a) o direito dos trabalhadores de organizar sindicatos
e de filiar-se ao de sua escolha, para proteger e promover seus interesses. Como projeção deste direito, os
Estados-Partes permitirão aos sindicatos formar federações e confederações nacionais e associar-se às já
existentes, bem como formar organizações sindicais internacionais e associar-se à de sua escolha. Os
Estados-Partes também permitirão que os sindicatos, federações e confederações funcionem livremente; b)
o direito de greve. 2. O exercício dos direitos enunciados acima só pode estar sujeito às limitações e
restrições previstas pela lei, que sejam próprias de uma sociedade democráticas e necessárias para
salvaguardar a ordem pública e proteger a saúde ou a moral públicas, e os direitos ou liberdades dos demais.
Os membros das forças armadas e da polícia, bem como de outros serviços públicos essenciais, estarão
sujeitos às limitações e restrições impostas pela lei. 3. Ninguém poderá ser obrigado a pertencer a
sindicato.”
104
Econômicos, Sociais e Culturais. Consoante Piovesan (2010), o Brasil não fez qualquer
reserva, atinente a essa matéria, quando ratificou esses tratados. De tal sorte que
formalmente aceitou a ampla liberdade sindical.
95
STF, RE 466.343-1, data da publicação: 04.06.2009. São Paulo – hierarquia abaixo da
Constituição mas acima da legislação interna.
96
Conforme Süssekind (2007, p. 20) a Convenção de Viena, art. 26, estabelece o princípio do pacta
sunt servanda, a boa-fé objetiva, “um dos pilares do Direito Internacional”. Complementado pelo art. 27
que assim prescreve: “uma parte não poderá invocar as disposições do seu direito interno como justificação
do incumprimento de um tratado”.
97
V. g.: Romita (2007); Nascimento (2008).
98
No original, em inglês: Brazil ratified in 1952 the Right to Organize and Collective Bargaining
Convention, 1949 (No. 98) (C.98). However, it has not yet ratified Freedom of Association and Protection
of the Right to Organize Convention, 1948 (No. 87) (C.87). YES, according to the Government: Ratification
105
Há, ainda, aqueles mais progressistas que - fazendo uma interpretação teleológica
e sistemática, considerando-se o princípio da prevalência dos direitos humanos nas
relações internacionais, consoante previsão no art. 4º, II, da Constituição de 1988, bem
como levando-se em conta o princípio da unidade da Constituição, de modo a fazer-se
uma leitura conjugada dos §§ 2º e 3º do art. 5º da Constituição – defendem a tese de que
todos os tratados de direitos humanos internalizados seriam, no mínimo, materialmente
constitucionais. Estes poderiam vir a ser, também, formalmente constitucionais se
internalizados pela regra do § 3º do art. 5º. Isso porque a cláusula aberta do § 2º do art. 5º
- bloco de constitucionalidade, salvaguardaria essa condição básica inicial. Assim pensam
Mazzuoli (2005), Sarlet (2013), entre outros. Embora o pensamento dos autores acima
faça sentido, entende-se que a sua defesa, do ponto de vista prático, enfrentaria muitas
dificuldades no atual sistema jurídico brasileiro.
of C .87 depends on: (i) the outcome of consultations within the tripartite National Congress’s approval of
Constitutional amendments; and (ii) National Labour Forum; and (iii) the labour law reform to comply
with the provisions of C. 87. Such amendments would render the Constitution compatible with the
Convention, thus allowing for its ratification. (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL ...2008, ON LINE).
106
99
A ação das centrais sindicais na luta pela ratificação da convenção nº 87 da OIT é bastante curiosa,
considerando que antes do advento da Lei 11.648 de 2008, que reconheceu as centrais sindicais e à estas
destinou 10% da receita da contribuição sindical, as centrais, que antes lutavam pela ratificação, faziam até
lobby no Congresso Nacional, após a supracitada lei, quando passaram a ser beneficiárias do atual sistema,
ironicamente silenciaram. Segundo a OIT, a CUT teria afirmado que não apoiaria a ratificação, embora
anuncie no seu site que apoia, assim como apoia a extinção da contribuição sindical compulsória. Ressalte-
se que a CUT vem recebendo a dita contribuição desde 2008. (GOMES, A. e PRADO, M., 2011).
107
Entre aqueles que se insurgem contra a posição do STF figuram nomes como o de
Pinto100 (2007), o qual contesta a posição do Supremo a respeito desse assunto, ao afirmar
ser a maioria da composição daquela Corte profunda desconhecedora da matéria, e em
razão disso teriam perdido pelo menos duas grandes chances 101 de resolver essa questão
definitivamente. Portanto, é desalentador esperar pelo avanço jurisprudencial, não
restando outra alternativa além da reforma normativa, na qual deve ser contemplada a
eliminação dos institutos corporativistas, citados alhures, estruturando-se um sistema
sindical democrático e livre, que privilegie a autonomia e a participação do trabalhador,
substituindo-se o atual modelo de formal representação pela representatividade de fato,
fortalecendo-se a negociação coletiva.
100
Almir Pazzianotto Pinto - Ex-Presidente do TST e ex-Ministro do Trabalho.
101
Segundo Pinto (2007, p. 38), o STF teria perdido a primeira oportunidade em 1946 e a segunda
em 1989. “Nas duas ocasiões, o Supremo Tribunal Federal falhou, pois optou pela defesa de interesses
corporativos e ultrapassados, em vez de adotar jurisprudência construtiva, que abriria espaço à legislação
moderna e socialmente avançada”
108
Pode-se concluir, pelo até aqui estudado, que no Brasil não existe um modelo
sindical que guarde coerência na sua estruturação. O que há, de fato, são partes de
modelos diferentes: somando-se institutos do regime corporativista da primeira metade
do Século XX; substratos do modelo apresentado pela OIT; a liberdade contraditória,
confusa e contraproducente exsurgida pelo advento da Constituição de 1988, sem
embargo dos seus avanços; e acrescido das distorções de tudo isso pela práxis do
movimento sindical brasileiro. Esse quadro caótico é de certo modo até favorecido pela
jurisprudência nacional, desencontrada e confusa, e pelo Ministério do Trabalho e
Emprego, o qual altera sua posição no que concerne à rigidez da aplicação das normas
referentes à organização sindical. (LIMA, 2014).
Ainda conforme o autor, op. cit., o que se chama de sistema sindical brasileiro na
verdade não é exatamente um sistema, na acepção técnica do termo, o que deveria guardar
certa coerência na sua estrutura e na sua funcionalidade. Mas, afinal, pode-se chamar de
quê? Opta-se, neste trabalho, por denominá-lo sistema mesmo, contudo considerando
todas essas disfunções organizativas. É fato que um modelo padrão não existe no Brasil,
constituindo-se as partes de tipos distintos e suas distorções num paradoxo de difícil
explicação, a não ser pelo atendimento a interesses e privilégios dos sindicalistas, entre
outros beneficiários, consoante tratou-se anteriormente.
Silva, A., (1990) explica que nos países onde o sistema sindical é eficiente, esse
primeiramente libertou-se da interferência indevida do Estado para em seguida trilhar o
seu próprio caminho, buscando o seu espaço por meio da negociação e, quando essa
falhava, por intermédio da ação direta. Aqui, apesar da liberdade conferida pela
Constituição, o sindicato continua agindo, renitentemente, sob algumas proteções
garantidas pelo Estado, cujos viciantes privilégios concedidos aos dirigentes sindicais os
fazem desinteressados em promover as necessárias mudanças, encorajando-os a lutar,
embora dissimulada e veladamente, contra a democracia e a liberdade sindical e, por
conseguinte, contra a adoção de um sistema sindical moderno e eficaz.
102
“A Conferência reafirma os princípios fundamentais sobre os quais repousa a Organização,
principalmente os seguintes: a) o trabalho não é uma mercadoria; b) a liberdade de expressão e de
associação é uma condição indispensável a um progresso ininterrupto; c) a penúria, seja onde for, constitui
um perigo para a prosperidade geral; d) a luta contra a carência, em qualquer nação, deve ser conduzida
com infatigável energia, e por um esforço internacional contínuo e conjugado, no qual os representantes
dos empregadores e dos empregados discutam, em igualdade, com os dos Governos, e tomem com eles
decisões de caráter democrático, visando o bem comum.” (DECLARAÇÃO DE FILADÉLFIA, 1944,
ANEXO À CONSTITUIÇÃO DA OIT, INCISO I).
103
“Quando uma coisa tem um preço, pode-se por em vez dela qualquer outra como equivalente; mas
quando uma coisa está acima de todo o preço, e portanto não permite equivalente, então tem ela dignidade.
[...] aquilo porém que constitui a condição só graças à qual qualquer coisa pode ser um fim em si mesma,
não tem somente um valor relativo, isto é, um preço, mas um valor íntimo, isto é, dignidade”. (KANT,
1948, p. 77).
110
Todo desejo que exige satisfação e toda necessidade que precisa ser coberta
constituem, pelo menos potencialmente, ocasiões para as pessoas iniciarem um
processo de negociação. De fato, sempre que estas trocam ideias com a
intenção de modificar relações ou mantêm um contato para chegar a um
acordo, estão negociando. (NIERENBERG, 1973, p. 2). (TRADUÇÃO
NOSSA).105
Ainda consoante o autor supracitado, a negociação não é uma ciência, é uma arte,
e para ser praticada com maestria requer muita preparação, conhecimentos gerais e
específicos e, em especial, acerca da conduta humana. Um bom negociador entende de
104
“Para Marx, o Estado é o reino não da razão, mas da força. Não é o reino do bem comum, mas o
bem viver daqueles que detêm o poder. (BOBBIO, 2000, p. 113).
105
No original, em espanhol: “Todo deseo que exige satisfacción y toda necesidad que precisa cubrir
constituyen, por lo menos potencialmente, ocasiones para que las personas inicien el proceso de
negociación. De hecho, siempre que las mismas intercambian ideas con la intención de modificar unas
relaciones o mantienen un contacto para alcanzar un acuerdo, están negociando. (NIERENBERG, 1973,
p. 2).
111
106
No original, em espanhol: “Lo que se ha llamado la definición francesa del amor, es decir,
‘egotismo cooperativo’, puede aplicarse a este enfoque de la negociacón.” (NIERENBERG, 1973, p. 23).
107
V. g.: (NIERENBERG, 1973); (ROBORTELLA, 1998); SILVA, C., 1999).
113
importância não somente para as partes diretamente envolvidas, mas também para a
sociedade inteira e para o Estado. Portanto, não é tarefa para amadores, como ressaltado
antes. A negociação coletiva requer competências múltiplas do negociador, geralmente
conseguida por meio de muita preparação, sem se esquecer da ética e da boa-fé.
A negociação coletiva no Brasil, no período entre os anos 1930 e 1988, não foi
incentivada, tendo sucumbido às políticas do regime corporativista, entre outros
interesses. Todavia, a partir da Constituição de 1988, o referido mecanismo foi
reconhecido e, pelo menos formalmente, bastante valorizado. Essa promoção, contudo,
ainda carece de efetividade, em virtude das demais dificuldades relacionadas à liberdade
sindical, conforme estudado nos capítulos anteriores.
A negociação coletiva não pode ser pautada nem no modelo corporativista, que
busca a harmonia dos interesses do capital e do trabalho, afastando por completo o
conflito; nem no modelo puramente adversarial, que considera insuperável o choque de
interesses, exacerbando o conflito. Propõe-se um modelo negocial, no qual se privilegie
a negociação ganha-ganha, em vez da negociação ganha-perde, afeita aos outros dois
modelos, buscando-se um progresso equilibrado para as partes. (ROBORTELLA, 1998).
Consoante afirmação de Robortella (1998, p. 248): “A empresa não deve ser mais
um campo de batalha e sim um recinto de diálogo, de parceria entre capital e trabalho, de
114
possam firmar um convênio com uma empresa para conseguir benefícios para o grupo
representado108.
108
Interpretação a que se chega a partir do princípio da proteção do trabalhador, dos arts. 7º, 8º e 11
da Constituição c/c o art. 611 e ss da CLT.
116
109
V. g.: (BRITO FILHO, 2009); (NASCIMENTO, 2008); (ROMITA, 2007); (SUSSEKIND, 2005).
110
(ORGANIZAÇÃO INT. ... OIT ... Liberdade sindical na prática. ..., 2008).
117
Para Bernardes (1998), as mudanças são muitas, tendo em vista que o atual
sistema está repleto de falhas, as quais serão exponencialmente ampliadas quando e se
houver as alterações constitucionais pleiteadas. O supracitado autor entende que a
legislação trabalhista brasileira é ultrapassada e contraproducente, em especial quanto às
relações coletivas. Neste particular, o autor, op. cit., aduz que a CLT, nos seus Títulos V
– relativos à organização sindical; e VI – referente às negociações coletivas, constitui-se
em intervenções indevidas do Estado. No mesmo sentido, Arouca (2009) defende que
mais de cinquenta por cento dos dispositivos da CLT, concernentes aos Títulos
retromencionados, sejam revogados ou alterados, pelo fato de estarem em desacordo com
a Constituição.
111
Vide Relatório Global de Acompanhamento da Declaração da OIT. (ORGANIZAÇÃO INT. ...
OIT ... Liberdade sindical na prática. ..., 2008).
112
Código do Trabalho do Canadá, no original, em inglês: DIVISION V: Federal Mediation and
Conciliation Service. 70.1 (1) The Federal Mediation and Conciliation Service, the employees of which are
employees of the Department of Employment and Social Development, advises the Minister of Labour with
respect to industrial relations matters and is responsible for fostering harmonious relations between trade
unions and employers by assisting them in the negotiation of collective agreements and their renewal and
the management of the relations resulting from the implementation of the agreements. (CANADÁ, Canada
Labour Code.1998, c. 26, s. 30; 2005, c. 34, s. 79; 2013, c. 40, s. 237).
120
A arbitragem foi instituída no Brasil por meio da Lei nº 9.307, de 1996, e constitui-
se num procedimento alternativo no qual as partes escolhem um árbitro de sua confiança
para decidir o conflito. O árbitro age como se fosse um juiz. Às partes é concedida a
chance de conciliação, antes da decisão do árbitro. Trata-se da forma alternativa que mais
se aproxima do modelo judicial, embora as partes tenham a liberdade de escolher o
árbitro, a sua decisão se assemelhará à uma sentença judicial.
A conciliação e a arbitragem podem muito bem ser utilizadas, mas entende-se que
a mediação - em virtude das suas características, sobretudo por conferir poder e
autonomia às partes, para que elas próprias, auxiliadas pelo mediador, encontrem uma
solução para o conflito que atenda aos seus interesses - seja a melhor opção para a
resolução de eventuais divergências surgidas no âmbito da negociação coletiva. O novel
CPC, art. 165, § 3º, define, de forma geral, as situações em que o mediador poderá atuar:
113
No original, em inglês: “Negotiation involves both your head and your gut - both reason and
emotion. [...]. Negotiation is more than a rational argument. Human beings are not computers. In addition
to your substantive interests, you are a part of the negotiation. Your emotions are there, and they will be
involved. So, too, will the emotions of others.” (FISHER e SHAPIRO, 2005, p. 4). Estes autores sustentam
que no conflito aparente somente aparece a ponta do iceberg, escondendo o real problema, que precisará
ser provocado para emergir, e assim poder ser solucionado. Sugerem a mediação como resposta a esse
desafio.
114
“A Justiça do Trabalho, formada por 24 Tribunais Regionais do Trabalho e por 1.564 Varas do
Trabalho, recebeu, apenas no ano de 2014, quase 4 milhões de processos. Tal quantitativo obteve aumento
crescente de 16% nos casos novos entre os anos de 2009 a 2014. [...] há 4,4 milhões de casos pendentes,
em ascensão ano após ano, acumulando crescimento de 37,3% no sexênio. Nesse sentido, a taxa de
congestionamento vem se mantendo estável, por volta dos 50%.” O CNJ informa que a despesa total do
TST em 2014 somou R$ 14,2 bilhões, desses, R$ 13,27 bilhões somente com pessoal. (CNJ ... 2015, p.
214-216).
122
115
Ao poder empregatício corresponde os poderes: diretivo, regulamentar e disciplinar – art. 2º da
CLT.
116
Segundo Robortella (1998, p. 243) o sindicato exerce uma “função de contra-poder, destinado a
diminuir a desigualdade entre empregador e trabalhador”. Portanto, o sindicato precisa ser forte para fazer
frente ao poder empregatício, mas somente será realmente profícuo se fizer bom uso da negociação coletiva.
124
um dos problemas mais graves – a má-fé nas negociações coletivas; entre outros.
(ARAÚJO, E., 2014).
117
“E poderia ser remediado se, por lei, a parte relutante fosse obrigada a apresentar motivos razoáveis
para a sua conduta, se quisesse eximir-se de uma sanção pela recusa formal ou presumida de negociar. Isto
poderia gerar toda uma Jurisprudência sobre os limites da boa-fé na negociação coletiva.” (BERNARDES,
1998, p. 159).
125
também a Lei italiana118. O art. 2, item 1, da supracitada Convenção aduz que: “As
organizações de trabalhadores e de empregadores deverão gozar de proteção adequada
contra quaisquer atos de ingerência de umas contra as outras”. A doutrina, a exemplo de
Uriarte (1989), inclui o Estado como um dos desses agentes, compondo uma certa
triangulação potencialmente causadora de atos atentatórios à liberdade sindical.
Outra necessária proteção deve ser verificável em face das práticas desleais
(unfair labor practices), originárias do Direito norte-americano, prevista na Lei Wagner,
de 1935119, incluindo-se atos do empregador tendentes a obstruir o exercício dos direitos
118
O art. 28, §1°, do Estatuto do Trabalho italiano, Lei 300 de 1970, define como condutas
antissindicais do empregador os comportamentos que objetivam impedir ou limitar o exercício da liberdade
sindical do trabalhador, incluindo-se o direito de greve. Este assunto foi bem desenvolvido por Porto (2008,
p. 17): “Cumpre notar a forma como a conduta antissindical é definida. O legislador optou, não por uma
definição estrutural, pois não fala em que consiste tal comportamento, mas sim teleológica, mencionando
os efeitos que ela causa ou pode, potencialmente, causar: a lesão dos interesses sindicais protegidos. A ratio
da opção legislativa reside na consciência da dificuldade de se definir, a priori, os comportamentos do
empregador que possam violar os direitos sindicais. Por isso, optou-se em não construir um tipo ‘fechado’,
para não limitá-lo e, assim, propiciar uma proteção mais ampla, um controle mais forte, sobre o exercício
do poder empregatício. […] O objetivo não é assegurar o resultado final almejado pelo sindicato, ou seja,
a plena realização das suas reivindicações, mas sim, garantir o enfrentamento leal entre as partes, para que
a entidade sindical possa, usando os instrumentos legítimos à sua disposição, pressionar pelo atendimento
de seus interesses.”
119
A Lei Wagner (National Labor Relations Act, 1935) – no original, em inglês: Section 7 is enforced
by § 8, which lists employer unfair labor practices prohibits employer interference with the rights
126
É certo que se precisa valorizar a boa-fé nas negociações coletivas, e para isso
igualmente se precisa de normas válidas, legítimas e eficazes, bem como de instituições
públicas eficientes para viabilizar a sua efetividade. Sem liberdade sindical e sem
negociação coletiva, o sistema sindical não prosperará, tendo em vista que o seu sucesso
120
Art. 659, X, da CLT: “conceder medida liminar, até decisão final do processo, em reclamações
trabalhistas que visem reintegrar no emprego dirigente sindical afastado, suspenso ou dispensado pelo
empregador”.
121
“Art. 4º O rompimento da relação de trabalho por ato discriminatório, nos moldes desta Lei, além
do direito à reparação pelo dano moral, faculta ao empregado optar entre: I - a reintegração com
ressarcimento integral de todo o período de afastamento, mediante pagamento das remunerações devidas,
corrigidas monetariamente e acrescidas de juros legais; II - a percepção, em dobro, da remuneração do
período de afastamento, corrigida monetariamente e acrescida dos juros legais.”
128
versa, mas a justa medida e o equilíbrio dessa relação é algo difícil de ser conseguido, e
a sua busca, em muitos casos, leva-os a beligerância. Como afirmou Godio (2010)122,
dificilmente haverá o empregado desejado pelo empregador assim como não existirá o
empregador pretendido pelo trabalhador. A negociação coletiva se apresenta como uma
boa ferramenta para a superação desse desafio.
122
No original, em espanhol: “Los empresarios – en su subconsciente – desearían que no existiesen
los sindicatos. Piensan la empresa como una entidad “paternalista” y desearían que los trabajadores
asalariados negocien en forma individual, se identifiquen con la autoridad empresarial y el destino de la
empresa, no entorpezcan los procesos de trabajo y sean espontáneamente productivistas. Pero tal tipo de
trabajador asalariado ideal no existe. Los trabajadores valoran su trabajo, pero exigen que la empresa los
remunere satisfactoriamente, que las condiciones de trabajo tengan estándares favorables y que se los
reconozca como sujetos con criterios e intereses propios y diferenciados. Entre el capital y el trabajo se
desarrolla en todos los países industrializados, desde hace 170 años, un complejo proceso de cooperación
y conflicto entre empresários y trabajadores, que no solo continúa, sino que se há hecho mas complejo y
con mayor impacto social, legitimando la existencia de los sindicatos.” (GODIO, 2010, p. 2).
130
123
E. g.: Stiglitz (2002), vencedor do Prémio Nobel de Economia - defende o impacto positivo da
liberdade sindical e da negociação coletiva no crescimento econômico e no desenvolvimento social. Nesse
sentido, Sen (1996), igualmente vencedor de um Prêmio Nobel de Economia, também desenvolve
importante trabalho relacionado às causas e consequências da observância do direito à negociação coletiva,
com base em princípios éticos, sobretudo na perspectiva do respeito aos direitos humanos.
131
viesse a ser mais bem qualificado e pudesse ter uma melhor qualidade de vida, o que
favoreceria a sua produtividade e a qualidade do seu serviço. Não há dúvida de que se
teriam melhores resultados para todos: trabalhador, empregador, Estado e sociedade.
Os modelos econométricos utilizados por Kucera (2001), acerca dos efeitos dos
custos do trabalho sobre o IDE, podem ser divididos entre aqueles que não controlam
diretamente a produtividade do trabalho e aqueles que o fazem. No primeiro grupo os
resultados são negativos ao passo que no segundo são positivos. A conclusão é que o
investimento em capital humano dá retorno, desde que adotadas práticas de gestão
apropriadas. O estudo do referido autor também indica que uma fatia considerável da
variação da produtividade do trabalho aparece quando são incluídos na análise dados do
rendimento per capita (uma medida comum de potencial de mercado), indicadores de
educação, entre outras variáveis, que favorecem a produtividade no trabalho. A qualidade
do trabalho também é beneficiada, incrementando o valor agregado.
elevadas. Fora dos Estados Unidos, os resultados da pesquisa foram desfavoráveis, porém
em modelos que incluem os custos do trabalho, mas não consideram, na análise dos dados,
a produtividade, a qualidade, entre outros reflexos tidos como positivos. O cenário é
invertido quando são consideradas as supracitadas variáveis. Portanto, o investimento em
capital humano pode dar resultado positivo, sobretudo do ponto de vista qualitativo, para
ambos os lados, mas requer contrapartida, mediante a utilização de mecanismos
adequados de gestão, os quais a norma heterônoma não é capaz de proporcionar.
Ainda conforme o autor, op. cit., os efeitos da instabilidade política e social são
muito ruins para a captação de IDE. Acrescenta-se: investimentos internos também são
dificultados nesse tipo de cenário. A insegurança pesa negativamente sobre o crédito,
assim como o aumento dos riscos prejudica as taxas de juros para captação de
financiamentos. Por outro lado, as negociações coletivas contribuem para pacificar as
relações sociais e promover a estabilidade no mercado de trabalho e na sociedade,
viabilizando os investimentos. Portanto, devem ser estimuladas.
124
No original, em inglês: “Stronger democracy and FACB [freedom of association and collective
bargaining] rights may be associated with greater stability that facilitates economic performance and
perhaps trade competitiveness as well.” (KUCERA; SARNA, 2006, p. 860).
134
na prática. ..., 2008, p. 21). Além disso, como defende Stiglitz (2002), os próprios atores
sociais chegariam à solução que melhor contemplasse os seus mútuos e eventualmente
conflitantes interesses, o que fortaleceria a participação, a democracia e a pacificação
social.
CONCLUSÃO
A pesquisa realizada para esta dissertação permitiu concluir que o sistema sindical
brasileiro é inadequado para oferecer as soluções que dele são esperadas tanto para
equacionar os conflitos surgidos nas relações trabalhistas, quanto para promover o
equilíbrio das partes e contribuir para o desenvolvimento social e econômico. A
inadequação resulta do ideário corporativista que marcou a origem do sindicalismo no
Brasil, por meio do qual o sindicato foi colocado mais próximo do Estado do que da sua
base. A autonomia do trabalhador foi suprimida e, até o presente, ainda não foi restituída
de forma plena. O Estado assumiu a função de prover as soluções que os próprios atores
sociais deveriam construir, levando-os à dependência e à passividade, mormente os
trabalhadores.
status quo e as benesses recebidas. Esses são os mais importantes motivos que impediram
que fosse realizada a reforma sindical, que vem sendo tentada desde 1946, sem sucesso,
incluindo-se a maior oportunidade perdida, pelas mesmas razões: durante a Assembleia
Nacional Constituinte de 1987.
tem faltado para que a reforma sindical seja feita, e finalmente a Convenção nº 87 possa
ser ratificada, é apenas vontade política.
O processo de filiação, que deve ter regras específicas e precisa ficar restrito aos
trabalhadores componentes do respectivo grupo, e ainda com a finalidade de protegê-los
de represálias, quando atingida a maioria, a filiação do restante do grupo seria
139
Dessa forma, a negociação coletiva - desde que associada aos meios alternativos
de solução de conflitos e mediante alterações legislativas objetivando a prevenção e o
combate aos atos e práticas antissindicais - poderá produzir significativas vantagens para
as relações trabalhistas. Na medida em que os conflitos são solucionados no âmbito
privado, há um natural fortalecimento da autonomia das partes, o que favorece as boas
práticas relativas à educação, engajamento e participação. O Estado torna-se menos
necessário, diminuindo o custo da chamada máquina pública. A pacificação social
favorece a melhoria da produção e da qualidade dos produtos e serviços, contribuindo
para o desenvolvimento socioeconômico e para a sociedade como um todo.
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