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Resumo
Diante da emergência de uma nova sociedade, não mais baseada nas
famílias tradicionais, como a “casa compacta” se manifesta na arquitetura
contemporânea brasileira? O artigo busca levantar elementos que ajudem a
responder a este questionamento. Para tanto, é analisada a produção de 25
escritórios de jovens arquitetos brasileiros, eleitos em 2010 como a “nova
geração de arquitetos brasileiros”. Quantitativamente, observa-se que
poucas são as casas compactas produzidas e que a maioria é de casas
não-urbanas e de uso esporádico. Para fundamentar o estudo do ponto de
vista qualitativo, é desenvolvida uma pequena revisão bibliográfica sobre
casas compactas na modernidade. Observa-se que os arranjos espaciais
modernos, apesar de datados no ínicio do Século XX, ainda são pertinentes
para analisar os casos contemporâneos brasileiros. Diante da reduzida
produção e pouca inovação, questiona-se: seriam estas casas capazes de
sugerir ideias para a casa brasileira do amanhã?
1
UFRGS, UFPB, UFPel, UEG, UCS.
2
http://mulher.uol.com.br/casa-e-decoracao/noticias/redacao/2010/08/17/revista-elege-
os-25-escritorios-que-devem-definir-o-perfil-da-arquitetura-brasileira-ate-2035.htm
3
Segundo o Censo do IBGE, em 2010, o perfil da família brasileira podia ser assim
caracterizado - 11,5% - pessoas sozinhas; 17,4% - casais sem filhos; 47,3% - casais com
filhos; 17,4% - mulheres solteiras com filhos; 6,2% - Outros tipos.
De modo conclusivo, são traçadas considerações quantitativas e qualitativas
sobre o universos estudado e apontada uma problematização - Seriam
estas casas capazes de sugerir ideias para a casa brasileira do amanhã?
A Habitação compacta moderna
O tema da casa mínima tem suas origens no segundo CIAM (1929), que
buscou estabelecer parâmetros mínimos para o habitar. A partir daí,
começou a ser discutida a relação entre a área dos ambientes e as
necessidades físicas e psicológicas de um “homem–comum”. Também
foram discutidos parâmetros de salubridade, decorrente da ventilação e
iluminação dos ambientes. (AYMONINO, 1973)
A discussão subsidiou, principalmente, experiências de habitação social e
coletiva. Merece destaque o pioneirismo dos conjuntos habitacionais de
Stuttgart (1927), Viena (1929 e 1934) e Frankfurt (1929-1930). Mais tarde,
as Unidades de Habitação de Le Corbusier também se transformaram em
emblemas da habitação coletiva moderna. No conjunto, foram construídas
habitações de 21m2 para pessoas solteiras; de 40m2, com dois dormitórios;
e de 57m2, com três. Discutia-se que a área mínima para uma pessoa
deveria variar de 2,5 a 14m2, considerada como “unidade biológica” ou
“célula”. (FOLZ, 2005)
Além da área reduzida, uma série de estratégias projetuais caracterizam a
habitação mínima. Fonseca (2013) destaca: 1) a planta livre, integrando os
ambientes sociais e permitindo a compartimentação por móveis e paníes
deslizantes; 2) a sobreposição ou simultaneidade de usos num mesmo
espaço; 3) a compartimentação do banheiro, com individualização do vaso
sanitário, permitindo o uso simultâneo do mesmo; 4) a compactação das
cozinhas, independente do número de moradores.
Além das estratégias destacadas, pode-se mencionar ainda as soluções
com mezanino. Dispondo dormitórios no pavimento superior e ambientes
sociais e de serviço no pavimento inferior, a solucão busca amenizar a falta
de privacidade que a sobreposição de funções impõe nas áreas restritas,
como na Casa para Artesãos (1924) (Figura 1) e na Unidade de Habitação
de Marselha (1947-1953), de Le Corbusier.
O Refúgio
Gradativa e concomitantemente, as estratégias da habitação mínima social
e coletiva também foram incorporas em habitações isoladas, nas quais não
havia necessariamente restrições econômicas. Destacam-se cabanas,
casas-refúgio ou casas de fim de semana, cujas restrições dimensionais
serviram de laboratório para experimentar soluções que inspiram o que hoje
se entende como casa compacta.
A Petit Maison (1925) e a Casa de Fim de Semana (1935), ambas de Le
Corbusier, são exemplares notáveis das décadas de 1920 e 1930. A
primeira casa aceita a sobreposição de usos e o controle da privacidade se
dá através de painéis deslizantes. Na segunda, quarto e banheiro
compartimentados deixam integrados os ambientes sociais. Nos dois casos,
a cozinha compacta e o banheiro compartimentado convergem com o
discurso da habitação moderna. (Figuras 2a e 2b)
Na década de 50, dois projetos de cabanas merecem menção - Cabanon-
de-Roqubrune (1952), de Le Corbusier, e a Cabana Peterson (1958), de
Frank Lloyd Wright. Na primeira, o detalhamento do mobiliário é entendido
como componente indispensável para o bom funcionamento da “máquina de
morar”. Na segunda, “quarto-banheiro-cozinha” configuram um núcleo
compartimentado, que se contrapõe à planta livre do setor social. (Figuras
2c e 2d)
a/b
c/d
Fig. 02 – Casas-refúgio modernas: (a) Petit Maison (1925); (b) Casa de Fim de Semana
(1935); (c) Cabanon-de-Roqubrune (1952); (d) Cabana Peterson (1958)
Fonte: (a) http://institut-architecture-nice.npage.fr/le-corbusier-die-idee-der-wohnmaschine-une-petite-maison-von-
alfred-werner-maurer2.html;
(b) http://petitcabannon.blogspot.com.br/2012/12/the-weekend-house-and-small-house-by-le.html;
(c) http://pavidillion.blogspot.com.br/2013/07/le-cabanon-de-roqubrune-le-corbusier.html;
(d) FLORIO, 2008, p. 174
b/c
d/e
Fig. 03 – Casas compactas isoladas: (a) Casa George Sturges (1958); (b) Cabana Chamberlain
(1940); (c) Casa Breuer II (1948); (d) Farnsworth (1945-50); (e) Glass House (1949).
Fonte: (a) FLORIO, 2008, p. 174; (b) http://chamberlaincottage.blogspot.com.br/;
(c) http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/06.064/428;
(d) http://www.vitruvius.com.br/media/images/magazines/grid_9/05e6_45-02-12.jpg;
(e) http://www.greatbuildings.com/buildings/Johnson_House.html
Entre as casas-refúgio e as casas compactas isoladas modernas, percebe-
se a consolidação de dois arranjos espaciais principais, além do mezanino
lecorbusieno – a organização da planta em faixas, com áreas
compartimentadas e planta livre; e a inserção isolada dos núcleos
hidráulicos na planta livre.
Algumas experiências da arquitetura moderna brasileira
As inovações espaciais modernas também foram experimentadas no
cenário brasileiro, mesmo com poucas casas isoladas compactas
produzidas. A casa moderna brasileira, prioritariamente, possui grandes
dimensões, três e mais dormitórios, e destinava-se a famílias de classe
média e alta, que cultural e financeiramente tinha condições de assimilar os
valores modernos de morar.
Como experiências isoladas e ilustrativas, que não procuram esgotar toda a
produção realizada, podem ser apontadas algumas casas de Affonso
Eduardo Reidy4, Oscar Niemeyer, Aldary Henrique Toledo, Irmãos Roberto
e Lina Bo Bardi. Quase todas as casas são inseridas em grandes glebas, e
também possuem caráter de casas de fim de semana ou uso esporádico.
Na década de 1930, Niemeyer projeta a Casa Oswaldo de Andrade (1938),
que abriga o programa em um volume de base quadrada e dormitórios
organizados num mezanino (CAVALCANTI, 2001). O arranjo remete à Casa
para artesãos (1924) de Le Corbusier, pela sua geometria, espacialidade e
zoneamento em níveis. (Figura 4a)
Na década de 40, merecem destaque a Casa Charles Ofaire (1943), de
Niemeyer, e a Casa Jorge de Castro (1948), de Toledo, que assumem
arranjos similares - uma barra horizontal, com aspecto pavilhonar e quarto
disposto no desvão da cobertura em asa de borboleta, configurando um
pequeno mezanino. No pavimento inferior, as áreas compartimentadas se
agrupam em faixas, sendo que na primeira ainda existe um pilotis. (Figuras
4b e 4c). Estas casas fundem o arranjo em mezanino de Le Corbusier com
o arranjo em faixas de Breuer.
Dois projetos de Niemeyer de 1949 retomam os modelos das casas
binucleares de Breuer - Casa em Mendes e Casa no Rio de Janeiro
(CAVALCANTI, 2001). Nos dois casos, observa-se faixas que concentram
as instalações hidráulicas, voltando quartos e salas para a paisagem.
(Figuras 4d e 4e)
A experiência de organização da planta em faixas tem continuidade na
década de 50. A casa Faria Goes (1952), dos Irmãos Roberto, revela a
concentração de banho-cozinha-quarto em uma faixa e os ambientes
sociais integrados em outra faixa, configurando um grande salão. (Figura 4f)
Em sentido oposto, Bo Bardi desenvolve a Casa Cirrel (1958), que retoma a
estratégia da casa para artesãos (1924), de Le Corbusier. Observa-se um
prisma de base quadrada e um mezanino que ocupa a sua diagonal. O
programa principal se reduz a este volume, sendo acrescido um segundo
volume de serviço. (Figura 4g) (CAVALCANTI, 2001)
4
Cita-se: Casa Itaipava (1942) e Casa na Tijuca (1948).
a
b/c
d/e
Fig. 04 – Casas compactas modernas brasileiras: (a) Casa Oswald de Andrade (1938); (b)
Casa Charles Ofaire (1943); (c) Casa Jorge de Castro (1948); (d) Casa em Mendes (1949); (e)
Casa no Rio de Janeiro (1949); (f) Casa Faria Goes (1952); (g) Casa Valéria Cirrel (1958).
Fonte: (a, b, c, d, e, f) HECK, 2005, p. 124,166, 218, 232 ,234, 296; (g)
http://www.urbipedia.org/index.php?title=Casa_Valeria_Cirell
Assim, a experiência de casa compacta moderna no Brasil, de modo
recorrente, busca referência na casa com mezanino de Le Corbusier e nos
arranjos em faixas de Wright e Breuer. As casas de Johnson e Mies, com
suas plantas livres e núcleos hidráulicos ilhados, pouco reverberaram no
cenário das casas compactas modernas brasileira.
A casa compacta contemporânea brasileira
Se a casa compacta moderna brasileira não foi quantitativamente
expressiva, o mesmo pode ser dito sobre a casa contemporânea. A análise
do website de 25 escritórios de jovens arquitetos brasileiros revela dois
aspectos fundamentais: 1) a produção de casas unifamiliares é significativa,
mas o número de casas pequenas é quase inexpressivo – dos 263 projetos
levantados, somente dezoito possuem área inferior a 150m2. O arquiteto
brasileiro ainda é solicitado a atender, prioritariamente, as demandas por
casas grandes, com três ou mais quartos; 2) a maioria das pequenas casas
são desenvolvidas para uso esporádico, são casas não-urbanas ou módulo
flexíveis que permitem a inserção em diferentes contextos. Apenas cinco
das casas estudadas estão inseridas num tecido urbano, das quais, três em
um lote urbano ordinário.
Apesar do perfil das famílias brasileiras ter mudado, o programa residencial
ainda se faz resistente aos padrões da primeira metade do século XX. As
motivações para o fato podem ser diversas5, mas o fenômeno também é
observado no mercado imobiliário de edifícios de apartamentos. Segundo
Tramontano e Villa (2000), a oferta do número generoso de quartos persiste,
sendo observada apenas a redução de suas áreas. Em alguns apartamentos de
um ou dois quartos, a ampliação a área dos quartos se deve ao novo perfil do
consumidor – “(...) singles, casais sem filhos ou com um único filho, de poder
aquisitivo alto, que preferem não ter muito trabalho com a casa (...)” e que
usufruem em paralelo de uma generosa área de lazer coletiva.
As poucas experiência brasileira inclui casas casas-refúgio, casas urbanas,
casas-protótipo, habitações sociais e casas-studio. Apesar das diferenças
programáticas, percebe-se estratégias projetuais recorrentes, condicionadas
principalmente pela tentativa de compactar áreas, estando estas analisadas
pelo número de pavimentos.
Casas térreas
A maioria das casas estudadas com um pavimento remete aos arranjos em
faixas, variando essencialmente a disposição dos núcleos hidráulicos: 1)
transversalmente dispostos na planta - entre sala e quarto ou nos seus
extremos; 2) longitudinalmente, integrando sala e quarto6.
No primeiro caso, a disposição do núcleo hidráulico entre sala e quarto
compromete a continuidade espacial e flexibilidade de uso em favor da
privacidade do quarto. (TABELA 1.1). No segundo caso, a integração da sala e
quarto responde, potencialmente, mais ao ideal de integração e sobreposição de
uso dos quartos com a sala. (TABELA 1.2)
5
Supõe-se: 1) o público-alvo da casa compacta não recorre ao suporte técnico de
arquitetos; 2) por status, as famílias constroem grandes casas, mesmo abrigando famílias
pequenas; 3) o público-alvo tem optado por morar em edifícios de apartamentos.
6
Cinco casas analisadas não são organizadas a partir dos núcleos hidráulicos, que assumem
posições fragmentadas nas plantas: Barra do Una 1 (2004 - Nitsche); Varanda e Mínima (2007 -
Juaçaba); Habitação social em Brasília e em Luanda (2010 e 2011 - Grupo SP).
Entre as casas térreas, também são encontradas aquelas em que os
núcleos hidráulicos configuram blocos isolados na planta,
compartimentando virtualmente os diversos setores. O esquema de Mies,
pouco explorado na arquitetura moderna brasileira, aparece em casas-
protótipos, reproduzíveis e transportáveis, o que exige um núcleo hidráulico
racionalizado. (TABELA 1.3)
d. Casa LP (2010)
h. Minimod (2013)