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Neli Castro de Almeida

Ariadna Patricia Alvarez


Carolina Con Andrades Luiz
Angela Pereira Figueiredo
Maria Emyllia Poleshuck
Neli Castro de Almeida
Ariadna Patricia Alvarez
Carolina Con Andrades Luiz
Angela Pereira Figueiredo
Maria Emyllia Poleshuck

1ª edição

Rio de Janeiro - RJ

WalPrint Gráfica e Editora

2017
Neli Castro de Almeida
Ariadna Patricia Alvarez
Carolina Con Andrades Luiz
Angela Pereira Figueiredo
Maria Emyllia Poleshuck

1ª edição

Rio de Janeiro - RJ

Apoio
Dá para fazer!
Guia prático de economia solidária e saúde mental

Editoria: WalPrint Gráfica e Editora e Bel Coronel Design e Comunicação

Revisão editorial: Daniele Mendes e João Paulo Balbino

Projeto gráfico e editoração eletrônica: Bel Coronel Design e Comunicação

Tratamento de imagens: Isabel Coronel

Capa e ilustrações: Samy

Equipe ITCP – campus Realengo / IFRJ


Bolsistas CNPq
Erivaldo Santos de Jesus
Maria Emyllia Poleshuck Castelo Branco
Coordenadora
Neli Maria Castro de Almeida

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Dá para fazer! : guia prático de economia


solidária e saúde mental / Neli Castro de
Almeida...[et al.]. -- 1. ed. -- Rio de Janeiro :
WalPrint Gráfica e Editora : Bel Lab Design e
Comunicação, 2017.

Outras autoras: Ariadna Patricia Alvarez, Carolina


Con Andrades Luiz, Angela Pereira Figueiredo, Maria
Emyllia Poleshuck.
Vários colaboradores.
Bibliografia.
ISBN 978-85-62109-25-6 (WalPrint)

1. Cooperativas 2. Economia solidária 3. Geração


de trabalho 4. Inclusão social 5. Políticas públicas
6. Políticas sociais 7. Psicologia social 8. Renda
(Economia) 9. Saúde mental 10. Serviços de saúde
I. Almeida, Neli Maria Castro de. II. Alvarez,
Ariadna Patricia Estevez. III. Luiz, Carolina Con
Andrades. IV. Figueiredo, Angela Pereira. V. Castelo
Branco, Maria Emyllia Poleshuck.

17-11218 CDD-334
Índices para catálogo sistemático:

1. Usuários dos serviços de saúde mental : Incentivo


aos empreendimentos de geração de renda e
trabalho : Cooperativas populares : Economia
solidária 334
Sumário
Agradecimentos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1

Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 2

Prefácio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

1. Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6

2. Economia Solidária e Saúde Mental . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8

3. Ferramentas teórico-conceituais para

a geração de trabalho e renda. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20


4. Oficina de escrita de projeto:
vamos escrever juntos? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30

5. Dá para fazer! Experiências exitosas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42


6. À guisa de conclusão: apontamentos para
alcançar o futuro! . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66

Bibliografia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68

Anexos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72
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Agradecimentos
Queremos dirigir nossas palavras de agradecimento a pessoas e instituições que facultaram a
realização deste guia.

Em primeiro lugar, ao professor Paul Singer, em consideração ao seu fundamental trabalho de


estruturação do campo da Economia Solidária enquanto esteve à frente da gestão da Secretaria
Nacional de Economia Solidária – Senaes. O prof. Paul Singer encarna todas as esperanças de
um mundo economicamente solidário e humano!

Igualmente agradecemos ao professor Valmor Schiochet por suas importantes mediações junto
ao campo das políticas públicas e dos grupos de iniciativas em economia solidária, sempre
disponibilizando a Senaes como uma parceira fundamental para a consolidação do campo das
experiências em economia solidária.

Também ao professor Pedro Gabriel Delgado, pela parceria com o Núcleo de Políticas Públicas
de Saúde Mental da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Nuppsam/UFRJ) e por seu perma-
nente incentivo aos projetos de geração de trabalho e renda no campo da saúde. Sua contribui-
ção foi fundamental para a elaboração deste guia.

Por fim, ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Tecnológico e Científico (CNPq),


que atendeu as demandas provenientes do campo da Economia Solidária e, mediadas pela
Senaes, possibilitou o incremento de experiências de geração de trabalho e renda em todo
território nacional.

Assim, este guia é fruto deste esforço conjunto de pessoas e instituições!


Nossos agradecimentos!
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Apresentação
Dá pra fazer! Guia prático de Economia Solidária e Saúde Mental é uma publica-
ção1 dirigida a usuários e usuárias, familiares, trabalhadoras e trabalhadores que
já desenvolvem, ou pretendem desenvolver, iniciativas em geração de trabalho e
renda junto à Rede de Atenção Psicossocial.

O título escolhido para este guia de economia solidária e saúde mental faz alusão
ao filme italiano Si puo fare, de 20082, traduzido em português para Dá pra fazer!.
O filme conta a história de um grupo de pessoas que estava no hospital psiqui-
átrico levando uma vida monótona e isolada da sociedade. A partir da chegada
de um sindicalista chamado Nello, que compartilha com eles o sonho de montar
uma cooperativa para produzir um trabalho não-subordinado, autogestionário e
que tenha sentido para seus autores, uma série de transformações na vida de
cada participante começa a acontecer. Quando eles(as) saem do lugar de doen-
tes-internos(as) do hospital e passam a ser reconhecidos(as) socialmente como
trabalhadores(as) da cooperativa 180 que produz parquet, novas formas de viver,
de experimentar a amizade, o amor e o dinheiro começam a surgir.

O filme mostra que apesar de toda a complexidade e desafios existentes em tra-


balhar e conviver num grupo com características tão peculiares, dá pra fazer!
Quando o modo de se relacionar muda, tudo muda.

Serve-nos de inspiração o aspecto do filme que aponta que dá para trabalhar


sem apagar as singulares, dá para colocar as limitações de cada um(a) entre pa-
rênteses, dá para despertar o olhar para as potências de cada um(a), e que é no
encontro, é no coletivo que se amplia o poder de agir.

Os sócios da cooperativa ativamente participam dos conflitos inerentes e de-


cisões necessárias ao processo de trabalho: como conseguir um espaço para
produção e para os materiais? Como lidar com o resultado que sai diferente do
esperado? Como atender às expectativas dos clientes? Como cumprir contratos
em meio a todas as variações e equívocos que acontecem no percurso? Aceitar
ou não uma grande encomenda sem saber se terá condições de entregar?

1. Este guia técnico foi elaborado no âmbito do projeto aprovado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Tecnológico e
Científico, Edital MCTI/SECIS/MTE/SENAES/CNPq N° 89/2013.

2. “Si puo fare”, direção de Giulio Manfredonia, 2008, (Si puo fare - Dá pra fazer) - disponível em: https://www.youtube.com/
watch?v=x7rV__SKuL0
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Todas essas questões só aparecem porque o trabalho ampliou a vida. Arriscar-se é viver, a vida
compreende muitos riscos que fazem parte do caminho. Este guia traz experiências de várias
cidades brasileiras, de grupos que arriscaram, experimentaram, aprenderam e sustentam uma
forma de trabalhar que tem como principal matéria-prima o desejo de tornar-se mais autônomo.       

É preciso acreditar que é possível trabalhar de uma maneira mais justa e solidária. É preciso se
contagiar com a alegria que o coletivo gera. É preciso sentir que cada coração é uma célula revo-
lucionária que pulsa a favor de um outro mundo possível. 

Este guia foi sonhado junto e hoje é realidade. Desejamos que ele possa alimentar novos sonhos,
e que sejam sonhados juntos e sejam também transformados em realidade.

Sonho que se sonha só, é só um sonho que se sonha só.


Mas, sonho que se sonha junto é realidade.

Raul Seixas
Apresentação
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Sobre as autoras:
Neli Maria Castro de Almeida
Psicóloga, formada pelo Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ), mestra em Psicologia Social e das Organizações pelo Instituto Superior de Ciências do
Trabalho e da Empresa (ISCTE) de Lisboa, Portugal, e doutora em Serviço Social pela Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro, PUC-Rio. Professora efetiva do Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ), Coordenadora da Incubadora Tecno-
lógica de Cooperativas Populares do IFRJ/campus Realengo (ITCP/IFRJ).

Ariadna Patricia Estevez Alvarez


Psicóloga, mestra e doutoranda em Psicologia pela Universidade Federal Fluminense (UFF),
onde integra o Núcleo de Estudos e Intervenções em Trabalho, Subjetividade e Saúde (Nu-
tras).Professora-pesquisadora no Grupo de Trabalho em Saúde Mental no Laboratório de Edu-
cação Profissional em Atenção à Saúde da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio
(EPSJV / Fiocruz). Tem experiência em serviços da rede de atenção psicossocial e foi assesso-
ra técnica de trabalho, geração de renda e cultura na coordenação de saúde mental do municí-
pio do Rio de Janeiro.

Carolina Con Andrades Luiz


Terapeuta Ocupacional, mestra em Saúde Coletiva, Política Planejamento e Gestão pela Uni-
versidade Estadual de Campinas (Unicamp). Integrante do Grupo de Saúde Coletiva e Saúde
Mental Interfaces da Unicamp. Militante e trabalhadora da Rede de Saúde Mental de Campinas,
atuando como coordenadora de oficina de geração de trabalho e renda do Núcleo de Oficinas
e Trabalho (NOT).

Angela Pereira Figueiredo


Psicóloga, mestra e doutoranda em Saúde Coletiva pelo Instituto de Medicina Social
(IMS/UERJ). Integrante do Projeto Transversões, sendo colaboradora do Programa de Grupos
de Ajuda e Suporte Mútuos e supervisora da Comunidade de Fala-RJ, ambos projetos de incen-
tivo ao protagonismo de usuários, usuárias e familiares dos serviços de saúde mental. 

Maria Emyllia Poleshuck Castelo Branco


Formada em Terapia Ocupacional pelo Instituto Federal de Educação, Ciências e Tecno-
logia do Rio de Janeiro. Bolsista CNPq da Incubadora Tecnológica de Cooperativas Popu-
lares do Campus Realengo, na modalidade de Desenvolvimento Tecnológico e Industrial.
Estuda o tema saúde mental e trabalho cooperativado vinculado à economia solidária.
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Prefácio
A aproximação entre a Política da Economia Solidária com a Política Nacional da Saúde Men-
tal – consolidada no ano de 2005, com implementação do grupo de trabalho conjunto entre
Ministério do Trabalho e Ministério da Saúde –, contribuiu efetivamente para uma agenda de
atividades na implementação de políticas sociais, abrangendo ações de educação/capacitação,
autogestão dos empreendimentos de geração de renda e trabalho, financiamento, atuação em
redes, participação em fóruns e nas estratégias para o desenvolvimento local e comunitário.

É fato que os empreendimentos de geração de renda e trabalho desempenham atividades so-


ciais e econômicas significativas para os usuários da rede de saúde mental. É fato, também, que
necessitam estar articulados com redes sociais e comunitárias para vivenciarem um espaço
real de trocas em suas práticas cotidianas, no exercício efetivo de direitos e cidadania.

A implementação de novos empreendimentos de geração de renda e trabalho e a sustentabi-


lidade dos já existentes necessitam de políticas públicas permanentes. Também precisam do
apoio de diferentes instituições comprometidas com uma ética, além de ações transformadoras
dirigidas a populações em situação de vulnerabilidade social em nosso país.

A iniciativa da Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares do Instituto Federal de Edu-


cação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ) na elaboração do Guia Prático de Economia
Solidária e Saúde Mental está em oferecer importantes conceitos, informações e orientações,
apresentados de forma consolidada aos diferentes atores que participam da implementação
dos empreendimentos de geração de renda e trabalho nos serviços de saúde mental e nos
serviços comunitários. Esse auxílio aponta para a relevante parceria e intercâmbio entre ins-
tituições formadoras e o campo da saúde mental e da economia solidária, no apoio para a
consolidação de conquistas de direitos sociais para os usuários dos serviços de saúde mental.

Teresa Monnerat

Psicóloga / Ministério da Saúde, ex-membro do GT


Saúde Mental e Economia Solidária (MS/MTb)
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1
Introdução
[...] o poder de sonhar com o que quiser, menos sonhar com o que é da terra.
Fernando Diniz3

Se a natureza e a terra constituem, de modo geral, a condição da vida humana, então o


mundo e as coisas do mundo constituem a condição na qual esta vida e especificamente
humana pode sentir-se à vontade na terra.
Hannah Arendt4

A partir da Lei 10.216/2001, considerada a Lei da Reforma Psiquiátrica brasileira, abre-se um


conjunto de desafios importantes para a consolidação de uma rede de serviços em saúde men-
tal, que busca responder às demandas do tratamento em liberdade e do cuidado ampliado, rom-
pendo com a lógica da tutela, do assistencialismo e do confinamento da população atendida.

Podemos afirmar que cuidar em liberdade também é enfrentar as questões advindas das de-
sigualdades sociais e do aprofundamento da precarização das condições de vida daqueles
que dependem de acolhimento nos serviços de saúde mental.

Acreditamos que o acesso universal às condições materiais da existência humana é um fa-


tor determinante para a garantia do bem-estar social, em direção de uma sociedade justa,
solidária e igualitária. Contudo, uma grande parcela da população brasileira não tem esse
acesso garantido, ocasionando grandes sofrimentos e restrição de oportunidades para que
as pessoas possam viver em condições dignas e humanas.

É assim que, num depoimento expressivo à Nise da Silveira, Fernando Diniz, ao falar de sua
infância pobre, aponta que em uma vida restrita de bens materiais e confinada se pode so-
nhar com muitas coisas, menos com as coisas que são da terra. Ou seja, o sonho aparece em
decorrência de uma real impossibilidade de acessar às materialidades do mundo e de poder
compartilhar dos bens materiais produzidos pela atividade humana. Hannah Arendt parece
concordar com o pensamento lúcido de Fernando Diniz: “...o mundo e as coisas do mundo
constituem a condição na qual esta vida e especificamente humana pode sentir-se à vontade
na terra”.

3. Nise da Silveira, 1981, p. 181, também ver documentário “Em busca de espaços cotidianos”, de Leon Hirszman,disponível em https://www.

youtube.com/watch?v=9-uN1lsWFjM

4. Hannah Arendt, 1991, p. 147.


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Esta publicação é uma iniciativa que busca contribuir para que todos e todas interessados(as)
possam encontrar neste guia prático elementos necessários à elaboração de projetos de geração
de trabalho e renda em saúde mental. A ideia final é que, a partir do testemunho de Diniz, e de
muitos outros, eles(as) passem a sonhar com as coisas que são da terra!

Assim, organizamos este guia da seguinte forma: uma primeira seção que trata das interfaces
entre a economia solidária e a saúde mental; uma segunda seção que discute as diretrizes e os
conceitos fundamentais norteadores das práticas solidárias; uma terceira seção voltada para
instrumentalizar a escrita e o desenvolvimento de projetos de geração de trabalho e renda; e, por
último, uma quarta seção que apresenta um conjunto de experiências exitosas no eixo Rio-São
Paulo, no intuito de demonstrar que sim, Dá para fazer!

Sugerimos que a leitura deste guia possa ser feita de forma coletiva junto com os usuários, usu-
árias, familiares, trabalhadores e estudantes. A ideia é que este livro possa se tornar o próprio
material de trabalho das oficinas realizadas nos serviços de saúde, de assistência social e/ou ou-
tros. Este guia foi organizado tendo em vista estimular a reflexão e a incorporação dos conceitos
do campo da geração de trabalho e renda. Assim, a cada final de seção, apresentamos algumas
questões para que possam ser discutidas nos grupos, nas oficinas, nas rodas de conversa ou em
outros espaços, tendo por objetivo final a escrita coletiva de um projeto de geração de trabalho e
renda, conforme previsto na seção 4 deste guia.

Também idealizamos construir pontes de comunicação entre a equipe responsável pelo desen-
volvimento deste guia e as experiências já existentes e/ou que estão se estruturando em suas
redes. Assim, disponibilizamos o e-mail de contato guia.daprafazer@gmail.com.

À guisa de conclusão, fizemos alguns apontamentos e reflexões para indicar os próximos passos
na direção de ampliar e consolidar as políticas de inclusão social pelo trabalho.

Desejamos a todos uma boa leitura!


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2
Economia Solidária
e Saúde Mental
Que relação existe entre saúde mental, trabalho, geração de renda e economia
solidária? O que significa trabalhar? O que queremos dizer quando falamos em saúde?

Consideramos que essas perguntas devem ser abordadas no manual, no sentido de


explicar de que trabalho e de que saúde estamos falando. Temos como horizonte par-
tilhar de uma linguagem comum para facilitar a nossa comunicação.

Trabalho, Economia Solidária, Saúde, Luta antimanicomial: histórias e conceitos

De acordo com o dicionário de etimologia – ciência que investiga a origem das pala-
vras e sua evolução histórica –, a palavra trabalho se origina em tri-palium, Tri significa
três e palium significa pau, ou seja, tripalium era um instrumento composto de três
paus que era usado para tortura. O sentido inicial associado ao sofrer passou-se ao de
se esforçar, de lutar, até chegar ao sentido de exercer ofício, ocupar-se de algo.

Karl Marx, um dos autores mais renomados nos estudos sobre as relações sociais, nos
deixou uma importante contribuição para compreender o mundo do trabalho ao criticar
a organização capitalista da sociedade. Ao longo de sua obra – sendo a principal delas
O Capital, escrita no fim do século XIX e que repercute até os dias atuais –, Marx afirma
que o humano dispõe da capacidade de criar e recriar através do trabalho sua própria
existência, que vai para além de responder ao meio instintivamente. Podemos projetar,
planejar, criar alternativas, avaliar opções e tomar decisões. Além disso, o trabalho é
uma condição necessária ao ser humano em qualquer tempo histórico nos diferentes
modos de produção da existência humana. Na perspectiva marxista, o trabalho é en-
tendido como processo. É através do trabalho que nós, humanos, transformamos o
mundo ao nosso redor, e também somos transformados por esse processo de traba-
lhar. Marx define trabalho como:

[...] um processo entre o homem e a natureza, um processo em que o


homem, por sua própria ação, medeia, regula e controla seu metabolismo
com a Natureza. Ele mesmo se defronta com a matéria natural como uma
força natural. Ele põe em movimento as forças naturais pertencentes à
sua corporeidade, braços, pernas, cabeça e mãos, a fim de se apropriar da
matéria natural numa forma útil à própria vida. Ao atuar, por meio desse
movimento, sobre a natureza externa a ele e ao modificá-la, ele modifica,
ao mesmo tempo, sua própria natureza.” (MARX, 1983, p.149).
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o sumário

Com o início da Revolução Industrial, em meados do séc. XVIII, o que se enxergava nas fábricas
era a exploração desmedida de seus trabalhadores. Não havia lei que assegurasse a saúde dos
operários, crianças eram empregadas assim que começavam a andar, as jornadas de trabalho
eram tão longas que debilitavam fisicamente os operários. Ao mesmo tempo em que as novas
fábricas se estabeleciam, a miséria dominava a maior parte do cenário social.

É nesse contexto que a economia solidária se apresenta pouco depois ao capitalismo industrial,
aproximadamente no séc. XIX, como resposta ao rápido empobrecimento dos artesãos, pelo es-
tabelecimento da produção nas fábricas. Surge como alternativa na busca por soluções contra
a miséria, a exclusão, o desemprego e a cultura individualista dominante, trazendo a ideia de
igualdade, cooperação e solidariedade.

Ao fim do século XIX, os movimentos operários foram conquistando direitos. As forças sindicais
se mostram cada vez mais potentes e presentes, garantindo a seus trabalhadores melhores con-
dições de serviço, melhores salários, menor carga horária. Esses fatores, contudo, geram uma
espécie de comodismo entre os assalariados e um desinteresse pela economia solidária.

Mas a década de 1970 chega trazendo, novamente, a crise do desemprego. Com


isso, os sindicatos perdem seus associados e sua força de reivindicação. Novamen-
te os olhares se voltam para a economia solidária como combate à miséria. Agora as no-
vas cooperativas são marcadas pelo grande valor atribuído à democracia e igualdade dentro
dos empreendimentos.

O fortalecimento da economia solidária até então tem se mostrado diretamente relacionado à fa-
lha do capitalismo em relação à sociedade. Sendo assim, seu crescimento poderá se desacelerar
no futuro, ou pior, pode não passar de uma forma complementar da economia capitalista (SIN-
GER, 2002). Para que esse quadro se transforme, fazem-se necessárias ações do governo, com a
criação de normas que assegurem e proporcionem estrutura para que as ações se desenvolvam.

A economia solidária é caracterizada como resultado da vontade de se construir uma sociedade


melhor do que a atual, surge como alternativa a um modelo econômico excludente, sem violar o
direito de escolha do consumidor, como afirma Singer (2002):

É um modo de produção cujos princípios básicos são a propriedade coletiva ou asso-


ciada do capital e o direito à liberdade individual. A aplicação desses princípios une
todos os que produzem numa única classe de trabalhadores que são possuidores de
capital por igual em cada cooperativa ou sociedade econômica. (SINGER,2002 p10.)

A economia solidária adapta-se aos princípios e valores de quem a aplica. Dessa maneira, é um
modelo socioeconômico que objetiva o desenvolvimento econômico aliado ao bem-estar social.
Busca desenvolver sujeitos de direitos, proporcionando melhor qualidade de vida aos públicos
marginalizados socialmente.

Desde 1948, a declaração universal dos direitos humanos, em seu artigo 23, afirma que todo
ser humano, sem qualquer distinção, tem direito ao trabalho, a condições justas de trabalho e à
proteção contra o desemprego. O trabalho como direito humano proporciona uma mudança de
paradigma, pois passa a ser entendido como um direito de cidadania.

Ao compreendermos que o trabalho também é formador, ou seja, é possível aprender e ensinar


através do trabalho, afirmamos que existe um saber que vem da experiência, da prática, e pode-
2 - Economia Solidária e
Saúde Mental 10 Voltar para
o sumário

mos tomar o trabalho como princípio educativo. Nesse sentido, o trabalho é ao mesmo tempo
um direito e um dever15. É um direito por ser o ser humano um ser da natureza que necessita es-
tabelecer, por sua ação consciente, um metabolismo que transforma bens para sua produção e
reprodução. E é um dever por ser justo que todos colaborem na produção dos bens materiais,
culturais e simbólicos, fundamentais à produção da vida humana.

No século XXI, observamos um fortalecimento das teorias das chamadas ‘clínicas do trabalho’
– psicodinâmica do trabalho, ergonomia, clínica da atividade, ergologia, psicossociologia –, que
nos fornecem importantes ferramentas para a compreensão do trabalho na atualidade. Existem
muitas variações entre elas, porém alguns pontos em comum nos ajudam a refletir e intervir nas
relações de trabalho. Nesse caso, trabalho não é usado como sinônimo de emprego, o que inte-
ressa primordialmente é a atividade, a ação no trabalho, o poder de agir dos sujeitos no trabalho.
E a atividade pode ser definida como aquilo que se passa entre o sujeito que a realiza, o objeto de
trabalho e o(s) outro(s) para quem ela se dirige.

As clínicas do trabalho buscam, através de suas pesquisas e intervenções, focar nos processos
emancipatórios dos trabalhadores, ocupando-se com as práticas que interferem nos processos
de subjetivação. Parte-se da premissa de que existe uma ligação entre “mundo psíquico” e “mundo
social”, ou seja, em qualquer situação de trabalho há uma relação entre os três: 1)sujeito, 2) trabalho,
3)meio (BENDASSOLI & SOBOLL, 2011).

Outro ponto que merece ser lembrado é que, para as clínicas do trabalho, o trabalho prescrito
(aquele que está previsto, que foi concebido inicialmente) e o trabalho real (aquele que é efetiva-
mente realizado pelos trabalhadores) nunca coincidem totalmente. Isso significa que é possível
criar no trabalho, pois o que se faz efetivamente não se restringe apenas ao cumprimento de
tarefas e normas preestabelecidas.

Nesse sentido, o trabalho pode operar saúde (Osorio Silva & Ramminger, 2014), isto é, quando se
exerce a capacidade criativa no trabalho, ele pode ser fonte de vida, de fortalecimento dos víncu-
los, de expansão das possibilidades de se relacionar e estabelecer trocas materiais e imateriais
(simbólicas) no mundo.

Vale destacar que entendemos saúde não como ausência de doença, nem como completo bem-
-estar físico, mental e social (definição da Organização Mundial de Saúde), mas sim saúde como
a capacidade que temos de criar novas normas (ser normativo) frente às adversidades que o
meio nos apresenta. Desse modo, saúde não é o oposto de doença, pelo contrário. Para a filosofia
vitalista, doença é uma expressão da vida, uma modificação da vida, talvez diminuída, que permi-
te a procura dela. (CLOT, 2010). Por isso, doença e saúde não se opõem, pois “saúde é ser capaz
de ficar doente e reestabelecer-se.” (CANGUILHEM, 2007).

Normatividade, diferente de normalidade, refere-se à capacidade de ser normativo, ou seja, de criar


normas novas de acordo com as variações que a vida enfrenta. “O que caracteriza a saúde é a pos-
sibilidade de ultrapassar a norma que define o normal momentâneo, a possibilidade de tolerar in-
frações à norma habitual e de instituir normas novas em situações novas”.(CANGUILHEM, 2007).

Nessa perspectiva, o conceito de saúde se aproxima da ideia de exercício de autonomia, em


que auto (próprio) e nomos (norma) têm a ver com o sujeito criar as próprias normas para viver.

5. Afirmativa extraída do verbete trabalho do Dicionário de Educação profissional em Saúde. EPSJV / Fiocruz. Disponível em: http://www.epsjv.fiocruz.

br/dicionario/verbetes/tra.html, acessado em: 25/10/2017.


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o sumário

Diferentemente de independência, autonomia não significa não depender, mas pelo contrário,
“somos mais autônomos quanto mais dependentes de tantas mais coisas pudermos ser” (TI-
KANORY, 2001). Nesse manual temos um item que se dedica exclusivamente ao tema da auto-
nomia. Contudo, nos cabe afirmar que para o trabalho produzir saúde é critério fundamental que
ocorra a gestão coletiva dos conflitos inerentes às situações de trabalho. Decisões partilhadas
tornam-se mais leves para todos os envolvidos.

Trabalho, saúde mental e construção da cidadania


Ao longo da história da humanidade, a palavra trabalho tem sido compreendida de modos va-
riados. Os significados dados ao trabalho das pessoas com questões de saúde mental tam-
bém apresentam modificações ao longo do tempo. Dentro do hospital psiquiátrico desde sempre
aqueles que eram reconhecidos como doentes foram colocados a trabalhar para passar o tem-
po, para ter direito ao cigarro, para substituir o trabalho dos funcionários, para reencontrar uma
disciplina perdida, como norma moral, entretenimento, como punição, entre outras atribuições
dadas a esse “trabalho” (SARACENO, 2001).

Com isso, o direito ao trabalho foi cerceado aos “loucos” durante mais de um século, pela irrever-
sibilidade da internação no hospital psiquiátrico, garantindo assim o controle sobre os processos
de inclusão e exclusão dessas pessoas do mercado de trabalho, com a justificativa da inabilidade
e cronicidade da doença mental. Os excluídos da organização produtiva de uma sociedade tam-
bém não encontram lugar na ordem racional dessa mesma sociedade (BASAGLIA, 1924).

Essa exclusão das relações de trabalho imposta pelo modelo manicomial excluiu as pessoas
com questões de saúde mental, não só da participação em atividades laborais como também
de todas as relações de trocas que compõem as tramas sociais. Só
após as mudanças de paradigmas trazidas pelas lutas sociais, pela
luta antimanicomial, é que começaram a pensar na questão do di-
reito à cidadania dessas pessoas. A cidadania da qual nos referimos
pode ser entendida como construção de direitos substanciais ligados
ao acesso a trocas afetivas, relacionais, materiais, ao morar (habitar/
casa) e produtivas (produzir mercadorias e valores). A proposta de
reabilitação psicossocial é um dos caminhos possíveis para o
aumento, a partir desses eixos, de recursos dos sujeitos com
questões de saúde mental para realizar trocas sociais e,
como consequência, aquisição da cidadania so-
cial, isto é, da possibilidade de conquista
da contratualidade social dos sujeitos
(SARACENO, 2001).
2 - Economia Solidária e
Saúde Mental 12 Voltar para
o sumário

Cooperativas populares e reforma psiquiátrica


como políticas públicas no Brasil
Como alternativa à dificuldade de inclusão dos usuários e usuárias da saúde mental no mercado
capitalista de produção, os empreendimentos solidários, cooperativas e as oficinas de geração
de trabalho e renda ligadas à saúde mental, dentro dos pressupostos da reforma psiquiátrica26,
da reabilitação psicossocial e dos princípios da economia solidária, têm se apresentado como
importantes recursos de inclusão social pelo trabalho da rede de atenção psicossocial brasileira.
Além de importantes estratégias de promoção do protagonismo dos usuários, usuárias e fami-
liares para o exercício da cidadania (BRASIL, 2015).

De acordo com a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), o cooperativismo é um modelo


socioeconômico que objetiva o desenvolvimento econômico aliado ao bem-estar social. O coo-
perativismo tem como princípios a participação democrática, a solidariedade, a independência e
a autonomia (MORAIS et al. 2011).

A ideia de cooperativa surgiu na Europa em meados do século XX, ao longo do contexto de lutas
e resistências dos trabalhadores, devido à pauperização do trabalho e à exploração capitalista
(FUSINATO, 2005). Nessa nova prática econômica, os trabalhadores poderiam experimentar os
princípios de democracia e igualdade, equidade e solidariedade, e serem donos de sua própria
produção.

Dentro do modelo de cooperativismo existem diversos subgrupos, como cooperativismo de


consumo; cooperativismo educacional; cooperativismo de transporte; cooperativismo agrope-
cuário etc. No presente manual vamos nos ater a falar da modalidade de cooperativismo social,
que tem por proposta inserir no mercado de trabalho sujeitos em situações de desvantagem.

A ideia de cooperativismo social surge como um modelo emancipatório trazido do intercâmbio


de militantes brasileiros da reforma psiquiátrica antimanicomial com a experiência de desinsti-
tucionalização ocorrida na província italiana de Trieste. Nessa província, as cooperativas sociais
foram determinantes para o fechamento do manicômio local e para a desconstrução da lógica
manicomial que dirigia a relação com as pessoas internadas no manicômio. Passados 40 anos
da fundação da primeira cooperativa social triestina, o cenário é outro: não estão mais necessa-
riamente atreladas ao campo da saúde, interagindo com outras empresas no mercado em toda a
sua amplitude (MARTINS, 2014).

Segundo Rottelli (2000), na Itália, as Empresas Sociais têm as seguintes características:

Empresa Social é sair do mundo da improdutividade. Na Empresa Social produzir não é apenas
trabalhar, mas transformar socialmente.

Produzir é ter status, é estar incluído na grande sociedade do mercado humano, do trabalho, da
produção, da relação entre os homens.

No Brasil, o modelo de cooperativismo social, atrelado à saúde mental, surge na década de 1990,
junto aos debates sobre a lei de reforma psiquiátrica. A Lei 9.867/1999, que institui o cooperati-

6. Reforma Psiquiátrica definida como um processo político e social complexo, composto de atores, instituições e forças de diferentes proveniências,
e que incide em territórios diversos, nos governos federal, estadual e municipal, nas universidades, no mercado dos serviços de saúde, nos conselhos
profissionais, nas associações de pessoas com transtornos mentais e de seus familiares, nos movimentos sociais e nos territórios do imaginário social e
da opinião pública. Compreendida como um conjunto de transformações de práticas, saberes, valores culturais e sociais, é no cotidiano da vida das insti-
tuições, dos serviços e das relações interpessoais que o processo da Reforma Psiquiátrica avança, marcado por impasses, tensões, conflitos e desafios
(BRASIL, 2005, pg.06).
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o sumário

vismo social no Brasil, definia a cooperativa social a partir das especificidades de seus trabalha-
dores (transtorno mental, dependência química, deficiência, egresso do sistema prisional). Para
os sujeitos com experiência em sofrimento psíquico, as cooperativas, baseadas na economia
solidária, são uma forma real de inserção no mercado de trabalho, possibilitando o sujeito de
afirmar os seus direitos e suas possibilidades de vida (NICACIO, KINKER, 1997).

A criação do modelo de cooperativismo representou uma importante resposta para dialogar com
pessoas em desvantagens sociais, como o público de saúde mental. Esses, anteriormente sub-
metidos a tutela asilar, passaram a ter suas relações institucionais e sociais transformadas e
potencializadas.

Para os cooperativados, a experiência de ser trabalhador possibilita experimentar um modo


diferente de estar no mundo e de participar das trocas sociais, assim possibilitando a diver-
sificação de atividades e oportunidades, e de inclusão na vida econômica e social da cidade
(NICÁCIO et al. 2005).

Os princípios fundamentais do cooperativismo são37: participação democrática, solidariedade, in-


dependência e autonomia, promovendo o convívio e transformações pessoais. Possibilita então
a organização de pessoas e se baseia em valores de ajuda mútua e responsabilidade, além da
democracia, igualdade, equidade e solidariedade. Seus objetivos econômicos e sociais são co-
muns a todos.

Os atuais princípios orientadores das práticas cooperativas são48:

1º - Adesão voluntária e livre - as cooperativas são organizações voluntárias, abertas


a todas as pessoas aptas a utilizar os seus serviços e assumir as responsabilidades
como membros, sem discriminações sociais, de sexo, raciais, políticas e religiosas.

2º - Gestão democrática - as cooperativas são organizações democráticas controla-


das pelos seus membros, que participam ativamente na formulação das suas políticas
e na tomada de decisões. Os homens e as mulheres, eleitos como representantes dos
demais membros, são responsáveis perante esses. Nas cooperativas de primeiro grau,
os membros têm igual direito de voto (um membro, um voto); as cooperativas de grau
superior são também organizadas de maneira democrática.

3º - Participação econômica dos membros - os membros contribuem equitativamen-


te para o capital das suas cooperativas e controlam-no democraticamente. Parte des-
se capital é, normalmente, propriedade comum da cooperativa. Os membros recebem,
habitualmente, se houver, uma remuneração limitada ao capital integralizado, como
condição de sua adesão.

4º - Autonomia e independência  - as cooperativas são organizações autônomas,


de ajuda mútua, controladas pelos seus membros. Se firmarem acordos com outras
organizações, incluindo instituições públicas, ou recorrerem a capital externo, devem
fazê-lo em condições que assegurem o controle democrático pelos seus membros e
mantenham a autonomia da cooperativa.

7. Disponível em: http://www.brasilcooperativo.coop.br/site/cooperativismo/identidade.asp. Acesso em 12 de maio de 2016.

8. Disponível em: <http://www.brasilcooperativo.coop.br/site/cooperativismo/principios.asp>. Acesso em 12 de maio de 2016


2 - Economia Solidária e
Saúde Mental 14 Voltar para
o sumário

5º - Educação, formação e informação  - as cooperativas promovem a educação e


a formação dos seus membros, dos representantes eleitos e dos trabalhadores, de
forma que esses possam contribuir, eficazmente, para o desenvolvimento das suas
cooperativas; informam o público em geral, particularmente os jovens e os líderes de
opinião, sobre a natureza e as vantagens da cooperação.

6º - Intercooperação - as cooperativas servem de forma mais eficaz aos seus mem-


bros e dão mais força ao movimento cooperativo, trabalhando em conjunto por meio
das estruturas locais, regionais, nacionais e internacionais.

7º - Interesse pela comunidade - as cooperativas trabalham para o desenvolvimento


sustentado das suas comunidades por meio de políticas aprovadas pelos membros.

Esse sistema é fundamentado na reunião de pessoas e não no capital. Visa às necessidades do


grupo e não do lucro. Busca prosperidade conjunta e não individual. Essas diferenças fazem do
Cooperativismo a alternativa socioeconômica que leva ao sucesso com equilíbrio e justiça entre
os participantes, além de ser um lugar de produção de sentido, de valor e emancipação, consti-
tuindo uma nova forma de pensar e agir em relação ao homem, ao trabalho e à economia.

Existem dispositivos legais que orientam o sistema cooperativo brasileiro. A Lei Federal nº 5.764,
de 1971, nasceu ainda quando as cooperativas brasileiras estavam sob a responsabilidade do
Estado. A lei cooperativista adotou critérios da época associados à legislação cooperativista já
existente no mundo. Trata-se da atual normativa que regula o sistema cooperativo brasileiro.

No Brasil, a economia solidária surgiu com mais força em projetos de governo, a partir de 2001.
Em 2003, no Fórum Social Mundial de Porto Alegre, foi aprovada a proposta, encaminhada ao
recém-empossado presidente Lula, de criação da Secretária Nacional de Economia Solidária, que
foi implantada ainda naquele ano, sob a liderança de Paul Singer. Assim começa a economia
solidária como política pública (DELGADO, 2014). Entre a economia solidária e a reforma psiqui-
átrica existe uma matriz comum. Ambas nascem da força dos movimentos sociais, na luta para
tornar a sociedade mais inclusiva e solidária, de movimentos de transformações profundas nas
concepções sobre a loucura e sobre a diferença, e na busca de estratégias de enfrentamento das
condições adversas do mercado, que exclui as pessoas em processo de vulnerabilidade social
(DELGADO in BRASIL, 2005).

Sendo assim, essa política demanda ações que articulem instrumentos das várias áreas do go-
verno e do Estado (educação, saúde, meio ambiente, trabalho, habitação, desenvolvimento eco-
nômico, tecnologia, crédito e financiamento, entre outras) para criar um contexto efetivamente
emancipatório e sustentável (PRAXEDES, 2009).

Porém, o que temos até então são pequenos avanços que ainda não colocam a economia soli-
dária no centro das políticas públicas. Em nível federal, temos os desafios da aprovação de uma
lei geral para a economia solidária e a constituição de um fundo de fomento que dê apoio a es-
sas iniciativas. Como parte da estratégia nacional, contamos com a implementação dos Centros
Públicos de Economia Solidária, que foi realizada pela Senaes (Secretaria Nacional de Economia
Solidária) em parceria com municípios e governos estaduais. Esses centros se constituem em
espaço que agregam as mais variadas iniciativas do campo da economia solidária, propiciando a
participação de diversos atores presentes no território.

Já em âmbito municipal e estadual, merece ser comentado o aumento na aprovação de leis insti-
tuindo políticas de apoio e fomento à economia solidária, como a Lei nº 5.435, de 12 de junho de
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15
o sumário

2012 , que institui uma política de fomento à economia solidária pelo município do Rio de Janeiro,
ou a Lei nº 7.368, de 14 de julho 2016, que autoriza o poder executivo a criar o fundo estadual de
fomento à economia popular solidária no estado do Rio de Janeiro.

Muitos outros estados também mostram avanços com leis que asseguram o fomento estadual à
economia solidária, como a Lei nº 15.028, de 19 de janeiro de 2004, do estado de Minas Gerais; a
Lei nº 8.798, de 22 de fevereiro de 2006, do estado do Rio Grande do Norte; a Lei nº 12.368, de 13
de dezembro de 2011, do estado da Bahia; a nº 6.057, de 17 de janeiro de 2011, do estado do Piauí;
e a nº 2.493, de 25 de agosto de 2011, do estado de Tocantins. Esses são apenas alguns exemplos.

Incubadoras
As Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares (ITCPs) surgiram do questionamento
sobre o que as universidades poderiam fazer para reverter o quadro de miséria de populações
pobres. Será que toda aquela tecnologia que era pesquisada e gerada nas universidades poderia
se reverter em geração de renda e melhores condições de vida para os trabalhadores?

Hoje as ITCPs são projetos universitários responsáveis por difundir a economia solidária no am-
biente acadêmico. Para a criação de uma incubadora é importante uma conscientização popular,
ou seja, é necessária uma mobilização política, promovida com o objetivo de que a população en-
tenda o seu significado e relevância para a cidade, para a região e para cada cidadão. Sua equipe
de técnicos é multidisciplinar, composta por profissionais de diferentes áreas do conhecimento,
que exercem o papel de mediadores entre os participantes. Na composição das equipes, os ser-
vidores públicos municipais ou estaduais contribuem de forma decisiva para a implantação da
economia solidária (PRAXEDES, 2009).

Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares. Por que de cada termo?

O termo “tecnológica” é aplicado, pois tecnologia é todo conhecimento que se instrumentaliza


com fins específicos. O modelo de cooperativa é o mais acessível, juridicamente, a grupos de
trabalhadores que precisam montar uma empresa e não possuem capital, somado ao seu cará-
ter igualitário. E o termo “populares” é aplicado pela característica do público a que se dirige as
ações da ITCP, sujeitos historicamente marginalizados.

A primeira ITCP, que se caracterizou com essa sigla, e que impulsionou o surgimento de outras
ITCPs, apareceu na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em 1996. Instaurou-se com
algumas ideias, como a incubação deveria ser feita no local de funcionamento das cooperativas;
a prioridade para a incubação deveria caber aos grupos de trabalhadores em condições de maior
risco social; a incubação deveria constituir-se como um processo de longo tempo, de 2 a 3 anos;
viabilidade econômica (qualidade e competitividade) e solidariedade interna (autogestão) eram
pressupostos da eficácia da incubação etc.

Contudo, não é possível compor uma metodologia única para realidades diversas, pois cada uni-
versidade busca escolhas metodológicas e estruturas diferenciadas, considerando suas condi-
ções de trabalho, suas histórias institucionais, além das representações sociais das pessoas que
compõem a incubadora.
2 - Economia Solidária e
Saúde Mental 16 Voltar para
o sumário

ITCP - IFRJ Campus Realengo

A Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares do Campus Realengo localiza-se dentro


do Instituto Federal de Educação, Ciências e Tecnologia do Rio de Janeiro – Campus Realengo.
Ela surgiu em meados de 2015, com a proposta de fortalecer o diálogo entre a saúde mental, a
universidade, os serviços de saúde e a geração de renda na zona oeste do Rio de Janeiro.

Desse modo, as cooperativas sociais seriam uma alternativa de organização formal de trabalho
de pessoas em situação de vulnerabilidade social, o que facilitaria a expansão das experiências
de inclusão social pelo trabalho para além dos muros e abrangência das experiências construí-
das dentro da área da saúde. A falta de um marco conceitual do associativismo e cooperativismo
social brasileiro dificultou ao longo desse tempo a constituição de empreendimentos com essa
conformação jurídica e conceitual. Felizmente, recentemente no ano de 2016, no Conselho Na-
cional de Economia Solidária, tivemos a aprovação de termo de referência contendo o novo Mar-
co Conceitual do Associativismo e Cooperativismo Social, o que poderá ajudar na conformação
de novos empreendimentos como alternativa de trabalho das pessoas em situação de desvanta-
gem social (PINHO e RODRIGUES PINHO, 2016). No novo marco conceitual esta é a definição de
cooperativa social:

[...] as cooperativas sociais são empreendimentos econômicos solidários que promovem


o direito ao trabalho, fundamentando-se na igualdade de oportunidades e no interesse
geral da comunidade em promover a pessoa humana e a inclusão socioeconômica dos
cidadãos (PINHO e RODRIGUES PINHO, 2016, pg09).

Em relação à composição das cooperativas sociais, também foi adotada uma nova redação:

[...] as organizações devem incluir entre seus participantes no mínimo cinquenta por cento
mais um de pessoas que se encontram em situações de desigualdade por desvantagem.
Assim, o associativismo e cooperativismo e cooperativismo social devem considerar o
protagonismo das pessoas que se encontram em situações de desigualdade por desvan-
tagem, mas também promover a interação destas com as demais pessoas em condição de
igualdade na gestão das organizações (PINHO e RODRIGUES PINHO, 2016, pg09).

Empreendimentos econômicos solidários na saúde mental


Ainda que nem todos os empreendimentos ligados às redes de saúde mental sejam formalizados
juridicamente como cooperativas, as oficinas de geração de trabalho e renda se inspiram e se-
guem os princípios do cooperativismo e da economia solidária. E apresentam formas de organi-
zações solidárias que, além das cooperativas, podem ser associações, empresas de autogestão,
grupos solidários; redes solidárias e clubes de trocas que podem ajudar a equacionar alguns
obstáculos de ordem conceitual e operacional dos empreendimentos (ARANHA, 2012).

No último levantamento do Cadastro de Iniciativas da Saúde Mental de Inclusão Social pelo


Trabalho (CIST), feito em 2013, dos empreendimentos econômicos solidários e das estratégias
de geração de trabalho e renda desenvolvidos dentro da saúde mental, foram identificadas
1.008 iniciativas no Brasil todo, sendo 352 empreendimentos presentes na região Sudeste do
país (BRASIL, 2015).
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17
o sumário

Nos artigos e nas publicações relacionados ao 4. Buscar o aprimoramento das habilidades


tema da inclusão social pelo trabalho na litera- profissionais e das técnicas de gestão, produ-
tura brasileira, as oficinas de geração de traba- ção e/ou comercialização;
lho e renda podem:
5. Participar da articulação de arranjos produ-
1. Contribuir para o processo de emancipação tivos solidários – redes – e na implementação
do usuário; de estratégias para o desenvolvimento local;

2. Favorecer a participação de pessoas 6. Buscar parcerias, tanto de apoio técnico


da comunidade; e tecnológico, como de participação na vida
social e comunitária²9 .
3. Incentivar a autogestão e a participação de-
mocrática;
_______________

Fonte: Alvarez, 2009

9. Fonte: Relatório Final do Grupo de Trabalho Saúde Mental e Economia Solidária, Brasília, Março 2006.

Apesar da grande potência das oficinas de geração de trabalho e renda, na produção de autono-
mia, protagonismo dos usuários e construção de laços afetivos, é preciso ficar atento aos riscos
de se tornarem espaços de pouca reflexão, assistencialistas e das relações reduzirem-se apenas
à questão do capital, como ilustrado no quadro a seguir.

OFICINA DE TRABALHO E GERAÇÃO E RENDA

POTÊNCIAS RISCOS

Produção de autonomia.
Movimentos por outros circuitos além da
Tornar-se espaço pouco reflexivo - “tarefeiro”.
saúde mental.

Exercício da tutela - “assistencialismo”.


Protagonismo na criação de normas para a
própria vida.
Enfraquecimento das relações visando exclu-
sivamente o capital.
Construção de novos laços afetivos.

Após contextualizarmos a importância do encontro da economia solidária e da reforma psiquiátrica


na construção de alternativas possíveis de inclusão social pelo trabalho de pessoas em processo
de vulnerabilidade social, suas potências e desafios, buscaremos contribuir com: 1) a identifica-
ção das principais ferramentas de trabalho e conceitos que possam potencializar as experiências,
2) a exemplificação de diversas iniciativas de geração de trabalho e renda pautadas pelos princí-
pios do trabalho solidário, criativo, produtor de vida e sentido.
2 - Economia Solidária e
Saúde Mental 18 Voltar para
o sumário

Desafios na construção do lugar de trabalhador que é usuário da


saúde mental
A complexa passagem do lugar de usuário-trabalhador para o lugar de trabalhador que
é usuário de serviços de saúde mental no campo da Economia Solidária compreende a
superação de uma série de obstáculos legislativos, trabalhistas, de direitos individuais e
previdenciários (ARANHA, 2012 p. 106).

Precisamos aprofundar a discussão sobre o desafio da transformação dos usuários da saúde


mental em trabalhadores de fato. O imaginário popular ainda é permeado pela figura do “louco”,
pela exclusão das pessoas com questões de saúde mental das relações de trabalho, trazidas
pela lógica manicomial, como já abordado nesse manual.

Um estudo quantitativo, realizado com empresários no Rio Grande do Sul, discute as percepções
dos empresários sobre as pessoas com questões de saúde mental. Os autores Dalnei Delevati
e Lílian Palazzo chegam à conclusão, após as entrevistas, de que os empresários apresentam
ideias protecionistas, de irrecuperabilidade e periculosidade em relação aos usuários da saúde
mental, e são favoráveis à restrição social dos mesmos (DELEVATI, 2008).

A relação do trabalho no mercado capitalista com o adoecimento mostra a responsabilidade da


sociedade e da psiquiatria no processo de exclusão das pessoas com questões de saúde mental.
O etiquetamento diagnóstico não identifica apenas uma condição de sofrimento, mas traz, asso-
ciado a ele, além da crença na impossibilidade de reversão do estado descrito pelo diagnóstico,
a desvalorização da pessoa. Todo e qualquer ato da pessoa, lido pela lente da doença, “autoriza”
a exclusão (BASAGLIA, 1924).

Na dissertação de mestrado de Carolina Con Andrades Luiz (2017), realizada com usuários e
usuárias da rede de saúde mental de Campinas (S.P), os usuários e usuárias da saúde mental tra-
zem em suas narrativas experiências de violência, humilhação e submissão no trabalho realizado
dentro dos moldes capitalistas de mercado. As narrativas também apontam que pessoas em
processo de vulnerabilidade social, para garantirem a sua subsistência, não se sentem em con-
dições de escolherem suas atividades de trabalho, se submetem a funções com alto grau de des-
gaste emocional e físico e, nesses casos, experimentam o trabalho como fator desencadeante do
próprio processo de adoecimento. Além de experimentarem mudanças nas relações de confiança
dentro do ambiente de trabalho após um “surto”, pois o sentido atribuído ao adoecimento mental
ainda é de pessoas que tornam-se perigosas para o convívio com os outros, por isso não são
mais dignas de confiança, mesmo após a melhora do quadro. Quando esses usuários e usuárias
comparam essas experiências no mercado capitalista com experiências de geração de trabalho e
renda em oficinas de trabalho ligadas à rede de saúde mental, trazem que são espaços de menos
competição em que experimentam sentimentos de união, solidariedade e cuidado. Relacionam
a valorização do papel deles enquanto trabalhadores nos espaços das oficinas, quanto maior o
domínio da técnica e autonomia na confecção dos produtos, além de aumento da quantidade de
pedidos e do ganho financeiro (LUIZ, 2017).

Desafios atuais:

A questão da geração de renda para a subsistência dos usuários e usuárias da saúde mental nas
oficinas de trabalho ligadas à rede de saúde mental ainda é um desafio para os empreendimen-
tos. Essa dificuldade também é enfrentada por outros empreendimentos econômicos solidários,
ligados à economia solidária, pois ainda encontram barreiras para a introdução e comercializa-
ção de seus produtos no mercado.
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19
o sumário

Por isso a importância do reconhecimento e da valorização social do trabalho dentro da proposta


da economia solidária e do cooperativismo social, em que o respeito e a solidariedade são cami-
nhos para a inclusão de pessoas não só com questões de saúde mental, mas também de todas
as pessoas em processo de vulnerabilidade social. Para que isso ocorra, é importante a supera-
ção da lógica assistencialista e o trabalho no sentido da ampliação e produção de trocas sociais
e de valores, direitos e emancipação desses sujeitos (NICÁCIO et al, 2005).

Portanto, pretendemos nesse capítulo apontar os principais desafios enfrentados pelas pessoas
com questões de saúde mental no campo do trabalho ao longo da história, e as alternativas pos-
síveis para sua inclusão.

Agora lançamos o desafio de você leitor/leitora desse manual pensar na sua reali-
dade local, com relação às principais potências e dificuldades enfrentadas por seu
grupo, empreendimento/oficina na inclusão social pelo trabalho.

1) Na sua comunidade, bairro ou região de sua referência, existem empreendimentos econô-


micos solidários que incluam pessoas com questões de saúde mental (oficinas/cooperati-
vas/associações)? Quantas pessoas participam?

2) Quais os pontos fortes desses empreendimentos?

3) Quais os principais desafios enfrentados pelos usuários/usuárias da saúde mental nes-


ses locais?

4) Quais as sugestões para melhorar a renda e trabalho nesses espaços? Ou quais suges-
tões vocês dariam para implantar ou ampliar esse tipo de trabalho na sua comunidade?
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o sumário

3
Ferramentas
teórico-conceituais
para a geração de
trabalho e renda
O trabalho na perspectiva dos usuários e das usuárias na reforma psiquiátrica

A partir das homologações da Lei Federal 10.216/2001 (BRASIL, 2001), mais conhe-
cida como a Lei da Reforma Psiquiátrica, e da Portaria GM/MS n°336 (BRASIL, 2002),
as quais, respectivamente, dispõem sobre os direitos das pessoas com questões de
saúde mental e o redirecionamento do modelo assistencial, tornou-se vigente um novo
modelo de atenção de dispositivos comunitários, trazendo à tona uma nova configura-
ção de desafios a serem enfrentados.

Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) propostos são dispositivos comunitários


que visam “(...) facilitar ao indivíduo com limitações, a restauração, no melhor nível
possível de autonomia do exercício de suas funções na comunidade” (PITTA, 2016,
p.27). A rede de serviços substitutivos às instituições manicomiais possibilita cuida-
dos destinados a seus usuários e usuárias a fim de que eles e elas possam se exercer
como sujeitos em meio à sociedade.

Com a configuração territorial dos dispositivos de atenção psicossocial, um novo mo-


delo de cuidado se faz necessário, pautado na liberdade e na cidadania. Tal modelo
também traz desafios a serem enfrentados, como a desconstrução social do estigma
e dos estereótipos vinculados à loucura e à figura do “doente mental”, que devem ser
substituídos por atitudes de respeito e tolerância aos sujeitos que se encontram com
suas normatividades psíquicas restringidas, na produção de uma nova sensibilidade
cultural em relação à loucura e ao sofrimento psíquico (BEZERRA JR, 2007).

Considerando principalmente os pressupostos do desenvolvimento da cidadania e da


vida social estabelecida por meio da liberdade, faz-se necessário o debate que inclua
a dimensão do trabalho, que se relaciona também às formas de se exercerem como
sujeitos de direitos na sociedade.
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21
o sumário

O desenvolvimento do senso funcional do usuário e da usuária, a despeito de suas questões de


saúde mental, é considerado fundamental para os processos de protagonismo, incluindo as di-
mensões de empoderamento e de recuperação (DAVIDSON et al, 1992). Nesse sentido, o trabalho
é visto como um dos fatores fundamentais para que ocorra a inclusão de fato desses sujeitos e
sua valorização social, o que é considerado como um dos principais impasses da reforma (FIO-
CRUZ, FUNDAÇÃO CALOUSTE GULBENKIAN, 2015).

A partir do trabalho – que aqui se aproxima de valores solidários e do cooperativismo/associati-


vismo –, atributos como o sentimento de produtividade, a vida em coletivo ou a manutenção de
laços sociais são facilitados às pessoas com questões de saúde mental.

Nesses moldes, ele pode contribuir para a organização pessoal de cada um, dada a importância
do trabalho digno e solidário na vida das pessoas, e auxiliar na construção de uma vida mais
funcional, constituindo-se como alternativa ao desemprego e consequente geração de renda.
Subsidia também a diminuição do isolamento e da exclusão das pessoas com questões de saú-
de mental das redes sociais e das relações de trabalho e renda, que podem representar uma das
piores dimensões na vida de quem vivencia o adoecimento.

Assim, o trabalho pode ser entendido dentro das estratégias da reabilitação psicossocial
como importante fator de ampliação do protagonismo e do empoderamento dos usuários e
das usuárias da saúde mental. Por meio do desenvolvimento do senso funcional, da amplia-
ção da autoestima e da autoconfiança, contribui inclusive para a redução do estigma difun-
dido na sociedade a despeito de seus diagnósticos psiquiátricos.

Esta seção do manual visa contribuir para a compreensão do papel que o trabalho pode ter na
vida dos usuários e das usuárias. Vale ressaltar, no entanto, que ele é escrito em tempos de
importantes retrocessos para o país510, de modo geral, e também mais especificamente para a
saúde mental e para a reforma psiquiátrica611.

Pitta et al (2015) chamam a atenção para a dificuldade de garantir a concretização dos direitos
sociais e a inclusão social daqueles com questões de saúde mental em um país de grande ini-
quidade, com baixa magnitude de gastos sociais e de saúde e que passa por um movimento de
minimização da atuação do Estado em relação aos compromissos sociais em favor de um plano
neoliberal. Acentuadas as desigualdades, são prejudicadas a cidadania e a qualidade de vida da
população.

Vasconcelos (2016) compreende o atual contexto de saúde mental e de reforma psiquiátrica


no Brasil por “tempos sombrios e de resistência”. Para ele, é preciso identificar e sustentar es-
tratégias mais realistas de luta, no preparo para a resistência de médio e longo prazos. Assim,
tornam-se necessárias, aos diversos atores que se inserem na área, estratégias tanto na esfera
macropolítica, quanto na micropolítica e política institucional.

Dentro dessas estratégias, localizamos também o trabalho da escrita deste manual, na defesa da
sustentação de fazeres que subsidiem as práticas na reforma psiquiátrica e para a saúde mental.
Defendemos e buscamos avanços para as políticas públicas que as asseguram, criando resis-
tências a partir de nossos trabalhos cotidianos frente aos retrocessos que se instalam.

10. Aqui, nos referimos ao golpe jurídico-midiático articulado no país em 2016, que resultou no processo de impeachment da presidente eleita Dilma
Rouseff e sucessível instauração de um governo ilegítimo, que ainda vigora atualmente. Consideramos que as lutas pela saúde mental não devem ser
tomadas descoladas de um contexto maior, macropolítico, no qual vemos nossa democracia e conquistas sociais sofrerem graves retrocessos.

11. Especialmente no que diz respeito à reforma psiquiátrica, vemos algumas de suas diretrizes principais serem questionadas pelo ministério que se
instalou a partir da mudança no governo, como por exemplo a defesa do retorno do modelo manicomial, já tão duramente combatido, e o desmantela-
mento das políticas que sustentam a rede substitutiva de serviços, conquistadas a partir do processo da reforma.
3 - Ferramentas teórico-conceituais para
a geração de trabalho e renda 22
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o sumário

Dentro desse contexto, encaramos os desafios de resistir e de mostrar que dá para fazer! É pre-
ciso enfrentar as dificuldades e encarar a luta por avanços na política de saúde mental. Nesse
sentido, buscamos ilustrar aqui como podemos contribuir para os fazeres possíveis no cotidiano,
na contribuição aos processos de protagonismo dos usuários e das usuárias de saúde mental,
que também se relacionam às lutas e resistências mais amplas no contexto brasileiro atual.

Para os fazeres da geração de trabalho e renda, desenvolvemos, aqui nesta seção, algumas fer-
ramentas teórico-conceituais que podem lhes subsidiar. Quando pensamos em práticas de eco-
nomia solidária na saúde mental, lidamos com questões relacionadas à saúde e ao trabalho dos
usuários e das usuárias, que são dimensões de ordens diferentes e exigem o suporte de toda a
rede para que possam ser asseguradas, além da prática da intersetorialidade e da entrada em
cena de diferentes atores.

Para ilustrar, temos como exemplo o caso de um usuário do CAPS que participa de diversas
atividades nesse dispositivo e realiza também atividades de trabalho em uma associação ou
cooperativa. Sua participação nesses dois espaços distintos é importante para que ele atinja a
dimensão tanto da saúde como do trabalho. Quando o usuário-trabalhador vai vender seus pro-
dutos em uma feira em conjunto com outros artesãos, ele tem a oportunidade de romper com os
estigmas que o diagnóstico carrega, como o de pessoa “incapaz” para o trabalho. Para exercer
esse papel, agora de trabalhador, ele precisa de ferramentas que ampliem seus processos de em-
poderamento e de ganho de autonomia, caminhando na direção do protagonismo e da cidadania.

É importante, desse modo, localizar algumas ferramentas teórico-conceituais quando vislum-


bramos esses fazeres. O que queremos dizer quando defendemos avanços na saúde mental e
na reforma psiquiátrica? O que desejamos encorajar quando mencionamos que é preciso resistir
frente aos retrocessos? Que tipos de ferramentas teórico-conceituais nos guiam diante das prá-
ticas que gostaríamos de vislumbrar a partir deste manual?

Dentro do grande guarda-chuva da ampliação do protagonismo dos usuários e das usuárias da


saúde mental com relação ao campo do trabalho e da geração de renda, as noções de autonomia,
empoderamento e recovery são algumas das que se fazem importantes. Esses conceitos serão
desenvolvidos a seguir como ferramentas que podem nos guiar e auxiliar diante dos fazeres da
economia solidária na saúde mental.

Autonomia

Em relação ao conceito de autonomia dentro do paradigma da reforma psiquiátrica, Leal (2001)


defende que muitas vezes a “produção de autonomia” é associada a um certo ideal de “cura” e
considerada o que de mais importante o processo de tratamento tem a produzir. A autora defen-
de que é preciso relativizar, desse modo, o conceito de autonomia no campo da reforma, quais os
seus sentidos, como têm sido guiadas as ações dentro dos serviços e de que maneira o cuidado
tem sido pautado a fim de conquistá-la (LEAL, 2001).

A autonomia, para Onocko-Campos et al (2015), deve ser entendida como a capacidade do sujei-
to de lidar com sua rede de dependências e de agir sobre o mundo, devendo ser tomada de “(...)
uma forma relativa, em gradientes, passíveis de terem seus limites sempre tensionados, muda-
dos” (ONOCKO-CAMPOS, 2015 p.724). O seu exercício, desse modo, deve ser colocado sempre
em situação, não há uma autonomia pronta para todos, mas que se constrói nas relações.
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23
o sumário

Ainda para a autora (2015), é preciso buscar também graus maiores de autonomia aos profissio-
nais do cuidado, que devem pautar suas intervenções quanto ao desenvolvimento da autonomia
possível, no reconhecimento da categoria sujeito e não dissociando as ações coletivas e as in-
dividuais.

A autonomia possível do usuário, assim, é um dos pontos principais a serem buscados no mode-
lo de cuidado que se almeja com o advento da reforma. Deve-se tê-la sempre em mente, agindo
em situação e levando em conta cada sujeito em seu contexto.

De acordo com os pressupostos da reforma psiquiátrica, o exercício da autonomia e da cidadania


são fundamentais no que visa à inclusão das pessoas com questões de saúde mental que foram
secularmente estigmatizadas e excluídas da sociedade. Nesse sentido, é necessária a constru-
ção de novos espaços, para além dos limites dos serviços substitutivos, onde são estimuladas a
sua participação.

Dentro desses serviços, é importante que os profissionais do cuidado se atentem a formas mais
autônomas de os usuários e as usuárias se estabelecerem diante das práticas possíveis dentro
dos dispositivos e, mais fundamental ainda, fora deles, na vida social, no contato com o mundo e
com os fazeres com os quais se relacionam.

Quanto às práticas de geração de trabalho e renda, elas se relacionam aos modos mais autô-
nomos de vida dos usuários e das usuárias. É importante, assim, que profissionais do cuidado
se atentem e incentivem práticas que subsidiem o protagonismo. São importantes, quando vis-
lumbramos processos mais autônomos de vida, os acessos a direitos e serviços, oportunidades
educacionais ou moradia para integração na vida social. O trabalho, desse modo, é atividade
fundamental diante do estímulo ao protagonismo e ao empoderamento (VASCONCELOS, 2016).

Empoderamento

No que diz respeito às formas de protagonismo e de ativismo dos usuários, das usuárias e de
seus familiares, o empoderamento (VASCONCELOS 2003; 2008) se relaciona a uma perspectiva
ativa de fortalecimento do poder, da participação e da organização desses sujeitos no próprio
âmbito da produção de cuidado em saúde mental, dentro dos serviços ou em dispositivos autô-
nomos de cuidado e suporte e na sociedade em geral.

Como formulação geral do conceito, Vasconcelos (2003) propõe o “aumento do poder e autono-
mia pessoal e coletiva de indivíduos e grupos sociais nas relações interpessoais e institucionais,
principalmente daqueles submetidos a relações de opressão, dominação e discriminação social”
(VASCONCELOS, 2003 p.55).

São importantes para o desenvolvimento do empoderamento as estratégias de ajuda e suporte


mútuos, a defesa de direitos, a luta contra a discriminação e o estigma. Esse conjunto envolve
iniciativas e eventos de caráter social, cultural e artístico para mudar as atitudes discriminatórias
nas relações cotidianas, na comunidade local, na mídia e na sociedade mais ampla, bem como a
3 - Ferramentas teórico-conceituais para
a geração de trabalho e renda 24 Voltar para
o sumário

participação no sistema de saúde e de saúde mental e a militância social e política mais ampla
na sociedade e no Estado (VASCONCELOS, 2013b, 2014).

Por meio do empoderamento daqueles que antes foram delegados ao silêncio e à incapacida-
de, uma nova produção de cuidado e de vida deve ser vislumbrada, na busca de uma militância
política cujo pressuposto e objetivo são a autonomia e a intensificação da potência de vida e da
possibilidade de decisão de cada usuário e usuária (ALMEIDA et al, 2010).

O empoderamento, desse modo, é vislumbrado quando defendemos ultrapassar alguns impas-


ses na reforma, avançando em relação a modos de controle social, à cidadania e à autonomia, na
“possibilidade de que indivíduos e coletivos venham a desenvolver competências para participar
da vida em sociedade, o que inclui habilidades, mas também um pensamento reflexivo que qua-
lifique a ação política” (CARVALHO, 2004, p.1092).

Ainda no que diz respeito à ação política, na defesa do protagonismo enquanto questão pertinen-
te ao tema do controle social e para o enfrentamento das cristalizações institucionais, Costa et al
(2012) atentam para a capacidade de o usuário e a usuária serem os atores principais na criação
de seus próprios caminhos, fazendo com que “o ‘nada mais para nós, sem nós!’ deixe de ser um
pedido isolado de um usuário... e se torne um imperativo ético para toda política pública de nosso
país” (COSTA et al, 2012 p.581).

O empoderamento enquanto dimensão do processo de protagonismo deve ser considerado, as-


sim, de modo complexo, permeando todo o contexto de vida do usuário e da usuária. Alguns de
seus elementos são ligados principalmente ao modo como a pessoa lida com o adoecimento;
outros, no entanto, são mais profundamente incorporados às estruturas da sociedade e da co-
munidade, que podem prover mais ou menos recursos e oportunidades para as jornadas de cada
um (ADENPOLE; KIRMAYER, 2012).

Quando vislumbramos os processos de protagonismo como um todo, devemos considerar as


características mais gerais da estrutura social de cada país, tais como a pobreza, baixas taxas
de educação formal, exclusão social, desigualdade de gênero ou conflito armado, que devem ser
relacionadas intrinsecamente às questões em saúde mental de uma determinada população.

Esses processos, desse modo, quando levados em consideração para os fazeres de geração
de trabalho e renda, devem ser incluídos em análises contextuais que possam facilitar mais ou
menos cada prática. Para tanto, torna-se importante o levantamento do que pode contribuir a
cada prática, dentro das possibilidades de cada um, nos diferentes contextos em que possam
se inserir.

Recovery (Recuperação)

O recovery, particularmente na perspectiva da política de saúde mental, relaciona-se à recupera-


ção de questões trazidas pelo adoecimento, que não deve ser confundida com a noção de cura,
mas associada à provisão de acomodações e suportes que ajudem na capacitação de pessoas
Voltar para
25
o sumário

com essas questões para conduzirem suas próprias vidas de maneira segura e digna na socieda-
de. O conceito diz respeito também a um processo pessoal e único, no qual o usuário e a usuária
se engajam a fim de manejar e de viver sua própria vida apesar do adoecimento. Dentro desse
processo, podem assumir suas próprias tomadas de decisões, esperanças, sonhos, espiritua-
lidades, aspirações, escolhas e participações em atividades nas quais se sintam à vontade ou
atribuam significado a despeito de suas dificuldades (DAVIDSON, 2006).

Para a apropriação dessa dimensão do protagonismo no contexto brasileiro, Vasconcelos (2007)


propõe o termo “recuperação”712 como tentativa de tradução de recovery para adaptá-lo à rea-
lidade de nosso país. Para ele, esse diz respeito ao processo de retomada de uma vida usual
relativamente ativa por parte do usuário e da usuária, a despeito das limitações associadas ao
adoecimento, e particularmente relacionado ao suporte, mudanças sociais, ambientais e cultu-
rais que foram colocadas às suas disposições.

Dentro do processo de recuperação, os usuários e as usuárias precisam de conhecimentos, ha-


bilidades e suporte necessários para que possam ter vida satisfatória e ativa, contribuindo em
suas comunidades e/ou famílias. A eles devem ser assegurados os lugares de pessoas ativas e
de desejos como outras quaisquer, e, para isso, é necessária a luta contra o rótulo e estigma dos
quais sempre foram vítimas (DAVIDSON, 2006).

Para a discussão do que facilita ou não no processo de recuperação de cada usuário ou usuária,
é fundamental que eles próprios definam o que cabe em cada jornada pessoal, que sejam os pro-
tagonistas principais de seus processos, que são únicos.

O processo de recuperação diz respeito à vivência, apesar do adoecimento, e à luta pelo alcance
dos objetivos de vida. Tais objetivos, para Deegan, usuária e pesquisadora norte-americana, “não
são necessariamente associados ao pertencimento de uma sociedade dominante, mas às expe-
riências de cada pessoa, na busca do alcance de objetivos ou aspirações que ele ou ela coloca
para si” (DEEGAN apud DAVIDSON, 2003, p. 44).

Ao relatar sua experiência, Boevink (2012), também usuária, chama a atenção para o fato de a
pessoa que sofre com questões de saúde mental ter a capacidade de liderar sua própria vida, e
que há uma enorme diferença entre sua identidade e o problema em saúde mental que possui.
Em seu relato, a autora defende que “não somos distúrbios psiquiátricos com necessidades de
cuidados, mas sim pessoas com vidas a serem vividas cujos alguns aspectos podem requerer
cuidado profissional ou assistência” (BOEVINK, 2012, p.16).

Assim, no que tange à perspectiva dos sujeitos que vivenciam o processo, essa se associa à res-
tauração da vida, à busca de objetivos na adição de significados, papéis sociais, empoderamento
pessoal e cidadania. Todos são considerados capazes de se recuperar utilizando o suporte ou o
tratamento que julgar necessário (DAVIDSON, 2003).

Nesse sentido, são indicados quatro aspectos básicos do processo de recuperação, envolvendo
a redescoberta e a reconstrução de um funcional senso de si: a descoberta da possibilidade de
possuir um senso de si mais ativo; a percepção das forças e fraquezas e o acesso à possibilidade
de mudanças; colocar em ação algumas características próprias e integrar os resultados dessas
ações como reflexos das capacidades; e, por fim, o combate aos aspectos negativos, tais como o
estigma e a discriminação, com os aspectos positivos (DAVIDSON; STRAUSS, 1992).

12. A tradução “recuperação” para o termo inglês recovery é a proposta de Vasconcelos (2007). Não há consenso, no entanto, para a tradução. Muitos
ainda preferem manter o termo em sua língua de origem para evitar restringi-lo a um significado. Para este manual, optamos pela tradução proposta
pelo autor (2007) por esta ser mais acessível ao público leitor e para facilitar a leitura do termo, apesar de considerarmos o conceito complexo e difícil
de ser traduzido.
3 - Ferramentas teórico-conceituais para
a geração de trabalho e renda 26
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o sumário

São identificadas, desse modo, diversas ênfases que compõem a vida da pessoa com questões
de saúde mental. Os aspectos ligados à ênfase social, tais como o trabalho, a educação ou o la-
zer, podem evoluir independentemente e concomitante aos sintomas apresentados pelo sujeito
(DAVIDSON, 2009).

Torna-se importante, desse modo, que os usuários e as usuárias desenvolvam autonomia peran-
te a participação na comunidade do modo que julgarem apropriado. Assim, são importantíssimas
as questões como busca de cidadania, inclusão social e garantia de direitos – considerados os
aspectos mais difíceis de serem alcançados após o adoecimento (DAVIDSON, 2006).

É extremamente relevante, nesse sentido, a consideração dos problemas sociais que incidem di-
retamente nas questões de saúde mental. Fatores ligados à moradia, ao emprego e às atividades
de lazer estão intrinsecamente relacionados aos processos individuais de recuperação (SHAMIR,
2012; ADENPOLE, 2012).

Esses processos não devem incluir somente o reestabelecimento de senso e papel de valor na
comunidade, mas também a recuperação dos efeitos de ter um diagnóstico psiquiátrico, incluin-
do todos os seus aspectos, tais como a discriminação, o desempoderamento, o desemprego e
os sonhos frustrados, além dos próprios efeitos e sintomas relacionados ao adoecimento (AN-
THONY et al, 1993; 2002; FARKAS, 2007).

O processo de recuperação ocorre por meio da participação social e das relações com os outros.
As redes sociais e os familiares são fontes importantes de suporte e de interdependência. Ter
acesso aos recursos sociais como a habitação, o trabalho e a educação são fundamentais aos
processos, que ocorrem através do fortalecimento pessoal com relação à tomada de decisões
sobre suas próprias vidas e comunidades, e se relacionam à recuperação de dimensões sociais e
políticas, na busca por igualdade de oportunidades e cidadania (DUARTE, 2007).

Assim, o trabalho, no sentido do desenvolvimento da dimensão funcional de si, se insere forte-


mente no processo de recuperação de cada usuário ou usuária. É fundamental que cada um iden-
tifique o sentido das práticas de geração de trabalho e renda dentro de seu processo pessoal, da
sua rede de suportes, para que desse modo todos esses fazeres contribuam para papéis sociais
mais ativos, repletos de cidadania e de direitos que lhes cabem.

Superação do estigma, ganho de autonomia e empoderamento

Após passarmos pelos principais conceitos e ferramentas para ampliação do protagonismo dos
usuários e das usuárias da saúde mental, é importante, dentro dos pressupostos éticos e polí-
ticos da reforma psiquiátrica e da economia solidária, compreendermos os empreendimentos
econômicos solidários como importantes dispositivos, e também revolucionários, de inclusão
social pelo trabalho desses sujeitos.

Os trabalhos realizados por eles nesses empreendimentos, assim como a beleza dos produtos e
a sua competitividade no mercado, são fundamentais para a superação do estigma que acompa-
nha os processos de adoecimento e diagnóstico em saúde mental. O retorno financeiro dado ao
trabalho também ajuda na construção dos papéis de trabalhadores dos usuários e das usuárias
nesses empreendimentos.
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27
o sumário

Desse modo, o enfrentamento do estigma começa com o reconhecimento que os usuários e as


usuárias da saúde mental são cidadãos, trabalhadores, e que pressupostos como o respeito e a
dignidade são necessários. O engajamento em movimentos como o da Luta Antimanicomial e a
participação em espaços de controle social são fundamentais para a garantia de direitos, empo-
deramento, autonomia e para a recuperação dos usuários e das usuárias da saúde mental.

Os usuários e as usuárias podem agir e mudar a situação por si mesmos, se forem reconhecidos
como sujeitos de direitos, e não vítimas passivas de uma doença, podendo tomar decisões sobre
suas próprias vidas. Com isso, podem conduzir seus processos de recuperação, como nos suge-
re Patrícia Deegan:

“Aqueles de nós que têm sido diagnosticados, não somos objetos para agirem sobre nós.
Nós somos sujeitos humanos completos, que podem agir e, em agindo, mudar nossa situ-
ação. Nós somos seres humanos e podemos falar por nós mesmos. Nós temos uma voz
e podemos aprender a usá-la. Nós temos o direito de sermos ouvidos e de ouvirmos. Nós
podemos nos tornar autodeterminados. Nós podemos nos erguer em direção ao que está
nos afligindo e não precisamos ser vítimas passivas de uma doença. Nós podemos tornar-
-nos “experts” em nossa própria viagem de recuperação” (DEEGAN,1995, p.2).

Agora que passamos pelas principais ferramentas/conceitos que ajudam no ganho


de autonomia e protagonismo, vamos pensar em algumas questões para melhorar
ou ampliar o empoderamento no seu empreendimento/oficina de geração de trabalho
e renda.

1) O que vocês entenderam e o que acham que significa então essas palavras: empo-
deramento e protagonismo?

2) Vocês acham que poderiam aumentar o empoderamento de vocês dentro das ofi-
cinas/empreendimentos? O que precisaria ser feito para conseguir?
3 - Ferramentas teórico-conceituais para
a geração de trabalho e renda 28
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o sumário

3) Quais espaços na comunidade, bairro, serviços de saúde, entre outros, vocês partici-
pam e são discutidos direitos e ações coletivas? Quais lugares vocês acham que pode-
riam participar para conversar sobre melhora de trabalho e renda?

4) Se já participam de oficinas/empreendimentos de geração de trabalho e renda, o que


pode melhorar com relação à participação e aumento de autonomia de vocês nesses
espaços?
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29
o sumário

5) O que tem de positivo na oficina/empreendimento que vocês participam que ajudam na


sua recuperação?

6) O adoecimento deixou mais difícil fazer atividades de trabalho? No que as oficinas/em-


preendimentos podem ajudar?
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o sumário

4
Oficina de escrita
de projeto: vamos
escrever juntos?
Como vimos ao longo dos capítulos anteriores, um grupo de geração de trabalho e
renda baseado nos princípios da economia solidária se caracteriza por práticas de
autogestão e de cooperativismo entre os seus membros. Essas práticas têm por ob-
jetivo principal estabelecer relações de trabalho capazes de proporcionar bem-estar
emocional e social aos seus praticantes. Assim, a partir desses referenciais, pensa-
mos em organizar uma parte deste Manual destinada, especificamente, à elaboração
de projetos de geração de trabalho e renda, tendo em vista contribuir para ampliação
dessas iniciativas de interface entre a economia solidária e a saúde mental.

A elaboração de projetos para organização de oficinas de geração de trabalho e renda


apresenta duas finalidades básicas: a primeira é a construção de uma ferramenta de
gestão voltada para a captação de recursos junto a potenciais agências financiado-
ras; a segunda finalidade é recorrer a essa ferramenta para acompanhar e monitorar
as ações desenvolvidas nas oficinas. Dessa forma, assinalamos que a escrita de um
projeto, tornando-o bem definido e estruturado, é o primeiro passo para obtenção de
recursos financeiros necessários à realização de uma oficina de geração de renda. E
o projeto elaborado, em suas dimensões conceitual e metodológica, também é impor-
tante para o acompanhamento e avaliação dos resultados advindos da implantação
das iniciativas de geração de trabalho e renda.

Nesse sentido, vamos apresentar um passo a passo da Elaboração de Projetos de


Geração de Trabalho e Renda em Saúde Mental13, seguido de sugestões e comentários
sobre os modos de organização das oficinas. A ideia é que possamos aqui incentivar a
escrita desses projetos de forma coletiva, junto com os usuários, familiares técnicos e
demais interessados da comunidade.

13. Este roteiro foi elaborado a partir do Roteiro de Elaboração de Projetos do Programa Desenvolvimento e Cidadania da Petrobras,
e outros.
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31
o sumário

Nossa primeira sugestão, então, é que a escrita do projeto possa ser em grupo, e realizada em
três etapas:

1
-a primeira etapa: reunir todo o grupo para discutir todos os tópicos do roteiro, anotando
as ideias, registrando-se os consensos; essa etapa pode ser dividida em 3 a 4 encontros
de aproximadamente 2 horas cada encontro.

2
-a segunda etapa: o grupo deve indicar uma comissão de 2 a 3 membros no máximo para
fazer a redação final de cada tópico do roteiro; a comissão pode pactuar junto com o grupo
um prazo para fazer a devolutiva; sugerimos que esse prazo não ultrapasse o período de 15
dias, para evitar um distanciamento grande de tempo entre a discussão inicial de ideias e
sua formulação final.

3
-a terceira etapa: a comissão apresenta a redação do projeto para submeter à avaliação
final do grupo. Pode ser necessário mais um encontro para os ajustes finais da redação
do projeto.

1. O nome do projeto

O nome do projeto deve ser curto, no máximo de 11 a 15 palavras, e já deve indicar o propósito
principal do projeto. É interessante quando o título é criativo e o subtítulo indica a natureza da
proposta. Um exemplo: “Alice, prepara o gato! Ponto de Cultura CAPS Ad Alameda”14. Esse nome
foi escolhido em reuniões junto com os usuários dos serviços e se refere às brincadeiras no co-
tidiano do serviço. É um nome especial, que já confere à iniciativa uma característica de criativi-
dade e singularidade. Ponto para o projeto!

O nome do projeto, ou o título do projeto, embora apareça em primeiro lugar, também pode ser
definido por último. É comum o melhor título surgir no grupo após todas as ideias estarem mais
organizadas! Experimente:

14. Projeto apresentado pelo Instituto Franco Basaglia ao Programa Ponto de Cultura do Ministério da Cultura, aprovado em 2008.
32
4 - Oficina de escrita de projeto:
vamos escrever juntos?

Sugira o nome para o projeto, discuta com o grupo:

2. Sobre a organização proponente:


Neste tópico é importante apresentar a instituição a qual o projeto está vinculado. O nome da
instituição, data de fundação e o seu histórico, a sua missão e seus objetivos, as experiências
anteriores da instituição no campo da geração de renda, a inserção da instituição no campo pú-
blico da assistência, indicar a abrangência territorial da instituição (distrital, municipal, estadual,
nacional) e outras informações que sejam relevantes para descrever a sua instituição. Também é
importante assinalar as parcerias e apoios à iniciativa, e informar como essas parcerias/apoios
contribuem para o desenvolvimento da experiência.

A partir dos tópicos acima, descreva sua instituição aqui:

Apresente também as parcerias e apoios, e suas contribuições. Aqui é importante iden-


tificar o tipo de instituição em parceria com o projeto (orgãos públicos, universidades,
empresas privadas, organizações não governamentais, outros).
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33
o sumário

Um aspecto importante é a participação da instituição proponente, ou do projeto,


em redes ampliadas, articulação com movimentos sociais, participação de conse-
lhos municipal, estadual e federal, fóruns específicos do tema a ser tratado, e co-
nexão com outras redes sociais e/ou institucionais afins. No caso específico de
projetos de geração de trabalho e renda, identificam-se as redes e os fóruns de eco-
nomia solidária, os Conselhos nas esferas das Secretarias de Trabalho e de Cultura,
por exemplo.

Seu grupo está vinculado a alguma rede de articulação? Identifique:

3. Qual é o público-alvo da iniciativa:

Um projeto bem estruturado deve especificar o seu público-alvo. Ou seja, definir o grupo de pes-
soas para o qual o projeto está sendo elaborado e que pretende beneficiar a partir das ações
planejadas. Quem são essas pessoas, quais são suas características principais, quantidade de
homens e mulheres, faixa etária, classe social, raça e escolaridade. Para fundamentar o projeto,
é interessante recorrer às estatísticas disponíveis sobre a população atendida. Como se trata de
um projeto de geração de trabalho e renda, é oportuno especificar a faixa de renda dos partici-
pantes e outros dados relativos à vida laboral/profissional. No caso de um grupo atendido nas
unidades de serviços de saúde mental, pode ser uma ótima oportunidade para os participantes
do projeto discutirem sobre suas principais características socieconômicas.

Descreva aqui o público-alvo do projeto, indicando suas principais características.


Itens: faixa etária, escolaridade, sexo, faixa de renda, raça, experiência anterior de
trabalho (mercado formal/informal de trabalho):
34
4 - Oficina de escrita de projeto:
vamos escrever juntos?

4. Justificativa do projeto
Neste tópico, a ideia principal é explicar as razões que justificam a realização do projeto em
causa. A pergunta a ser respondida é: por que este projeto deve ser executado? Considerando
o campo da saúde mental, deve se estabelecer uma relação entre a condição socioeconômica
dos participantes e a necessidade de se criar espaços de produção e de geração de renda como
espaços de produção de positividade de valoração dos usuários dos serviços de saúde mental.
É importante também aqui inserir dados estatísticos sobre a condição econômica dos usuá-
rios atendidos, buscando informações sobre os Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) das
regiões de moradia dos usuários beneficiários do projeto. São indicados também os dados do
Ministério da Saúde e da Coordenação Nacional de Saúde Mental sobre as iniciativas de geração
de trabalho e renda em território nacional.

Por que o grupo considera que este projeto deve ser executado? Responda aqui:

5. Relevância do projeto
Neste tópico, a pergunta central a ser respondida é: este projeto vai contribuir em que para a
sociedade? E para o campo da saúde mental? Fundamental trazer os temas da desconstrução
de preconceitos, do estigma associado à doença mental, da necessidade de se ressignificar a
loucura e os modos de sofrimento psíquico em sociedade. No item sobre relevância, deve ser de-
monstrada também a importância dos resultados a serem obtidos a partir das ações planejadas
no projeto e o seu alcance para a transformação social.

Responda a pergunta: como este projeto poderá contribuir para a promoção do bem-
-estar social dos seus participantes e para a transformação da sociedade?
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35
o sumário

6. Definição dos objetivos:


Neste item, é necessário assinalar com bastante clareza o objetivo geral e os objetivos especí-
ficos para que estejam bem delineados o propósito e as ações planejadas do projeto. De forma
direta, o objetivo geral é a meta idealizada do projeto, onde se quer chegar, a missão estabelecida
no escopo da experiência. Exemplo: “Contribuir para a implantação e o desenvolvimento de prá-
ticas de geração de trabalho e renda autogestionárias no campo da saúde mental” ou “Contribuir
para ampliar o acesso de usuários e familiares da rede de saúde mental a projetos de economia
solidária”. No objetivo geral, portanto, não devem constar números e descrição de ações.

Por sua vez, os objetivos específicos são as ações necessárias para atingir o objetivo geral. De-
ve-se agrupar o conjunto dessas ações fundamentais para garantir os resultados previstos, defi-
nindo quantidades e os intervalos de tempo para a sua realização. Para os exemplos de objetivo
geral indicados acima, podemos definir como sugestão de objetivos específicos:

“Formar duas turmas de 15 alunos em Economia Solidária no prazo de 2 meses”.

“Adquirir material de artesanato para a realização de 10 aulas a serem desenvolvidas no período


de 10 semanas”.

Vejamos no exemplo a seguir:

Objetivo geral: Ampliar e sistematizar oficinas de geração de trabalho e renda junto aos serviços
de saúde mental, garantindo-se a sustentabilidade do projeto.

Mês Mês Mês M ê s


Objetivos específicos Ações
01 02 03 n
A. Comprar material e equipa-
mento necessários para produ-
ção artesanal
1. Introduzir técnicas de produ-
ção artesanal como ferramenta B. Preparar os espaços físicos
de trabalho em oficinas de gera- em cada unidade de saúde men-
ção de trabalho e renda em uni- tal para desenvolver os pólos
dades de saúde mental de produção
C. Formar três turmas em Eco-
nomia Solidária e Artesanato
compostas por técnicos, usuá-
rios e familiares, totalizando
60 pessoas.

Indicar os demais objetivos específicos, indicando as ações correspondentes e assinalando os


meses de execução.

E os objetivos do projeto do grupo? Quais são:


36
4 - Oficina de escrita de projeto:
vamos escrever juntos?

Objetivo geral:

Objetivos específicos: (indicar no máximo 5 objetivos):

7. Metodologia
Na etapa referente à metodologia, deve-se descrever como o projeto será desenvolvido ao
longo de sua execução. Uma sugestão é dividir por etapas, apresentando de forma sequen-
cial o conjunto de atividades previstas. Indique os processos, as rotinas, técnicas, instru-
mentos e procedimentos a serem empregados. Há um plano pedagógico? Quais são os prin-
cípios teóricos de embasamento ao método utilizado? Se houver experiências anteriores
semelhantes também podem ser indicadas como referência à proposta do projeto. Será uti-
lizada alguma tecnologia social15? Como será feito o processo de seleção dos participantes?
8

15. Define-se Tecnologia Social todo produto, método, processo ou técnica criados para solucionar algum tipo de problema social e que atendam
aos quesitos de simplicidade, baixo custo, fácil aplicabilidade e impacto social comprovado.

Desenvolva aqui uma proposta de metodologia para o seu projeto:


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37
o sumário

8. Avaliação do projeto foram alcançados a partir das ações desen-


cadeadas pelo projeto. Podem ser expressos
Neste tópico, está prevista a descrição dos por números, por exemplo, a quantidade de
processos avaliativos do projeto. Isto é, as alunos formados em uma turma ou por ava-
ações propostas devem ser acompanhadas liação de desempenho, por exemplo, se os
de indicadores de avaliação para o devido participantes aprenderam de forma satisfa-
monitoramento dos processos e dos resulta- tória uma determinada técnica de artesanato
dos almejados. Assim, os indicadores quan- apresentada no projeto. Em caso específico
titativos e qualitativos devem ser capazes de para projetos de geração de trabalho e renda,
avaliar os processos e os resultados desen- pode ser avaliado se os participantes obtive-
cadeados no projeto. ram incremento de sua renda após a partici-
pação no projeto.
Podemos estabelecer que existem dois tipos
de indicadores. Os indicadores de processos e Para que o projeto alcance um bom desenvol-
os indicadores de resultados. Esses indicado- vimento, é necessário que sejam definidos os
res podem ser qualitativos e quantitativos. meios de verificação dos processos de traba-
lho e dos resultados obtidos. Os meios de veri-
Para melhor compreensão, define-se que os ficação são instrumentos e/ou procedimentos
indicadores de processo avaliam as atividades utilizados para a construção dos indicadores, e
em seu próprio desenvolvimento, permitem devem estar associados à descrição das fon-
acompanhar se as atividades estão aconte- tes dos dados a serem coletados.
cendo conforme o previsto, se os procedimen-
tos adotados estão sendo executados con- Vejamos, no exemplo a seguir 16, como é pos- 9

forme o planejamento prévio. Ou seja, esses sível construir uma tabela em que todas essas
indicadores avaliam os processos de trabalho informações sobre a avaliação do projeto po-
e apontam a necessidade de ajuste e/ou rea- dem ser organizadas.
valiação dos procedimentos adotados.

Por sua vez, os indicadores de resultado


16. Exemplo baseado no Projeto Éfeito de Papel proposto pelo Instituto
avaliam se os objetivos gerais e específicos Franco Basaglia e aprovado pelo programa Desenvolvimento e Cidadania
da Petrobras/2008.

Matriz de Avaliação Processual

Perguntas de Indicadores Indicadores Fontes de Meios de


Objetivo específico
avaliação quantitativos qualitativos informação verificação
Número de dife-
Coordenador Relatórios
rentes tipos de
1. Introduzir téc- das oficinas Técnicos
1. As oficinas estão peças produzidas
nicas de produção
sendo capazes de Frequência nas Participantes Folha de
artesanal como
introduzir satisfato- oficinas do projeto frequência
ferramenta de tra-
riamente as técnicas
balho em oficinas de Qualidade Coordenadores Relatórios
de produção artesanal
geração de trabalho das peças artístico e geral técnicos
para os usuários, fa-
e renda em unidades
miliares e técnicos? Satisfação
de saúde mental Participantes Entrevistas
dos partici-
do projeto dirigidas
pantes

Indicar os demais objetivos, as respectivas perguntas de avaliação, definindo-se os indicadores,


as fontes de informação e os meios de verificação.
38
4 - Oficina de escrita de projeto:
vamos escrever juntos?

Matriz de Avaliação de Resultados

Perguntas de Indicadores quanti- Indicadores Fontes de Meios de


Objetivo específico
avaliação tativos qualitativos informação verificação
Número de arte- Relatório
Participantes
sãos que dominam técnico de
do projeto
as técnicas atividades
1. Introduzir téc- Número de varia-
nicas de produção ções das técnicas Relatório
Participantes
artesanal como 1. Os usuários, que foram as- técnico de
do projeto
ferramenta de tra- familiares e técnicos similadas pelos atividades
balho em oficinas de estão habilitados para artesãos
geração de trabalho atuarem como moni- Coordenador Relatório
Oficina
e renda em unidades tores das oficinas de das oficinas/ de reuniões
autossusten-
de saúde mental artesanato? participantes de avalia-
tável
do projeto ção
Coordenador Relatório
Oficina auto- das oficinas/ de reuniões
gestionária participantes de avalia-
do projeto ção

Dar continuidade ao preenchimento da tabela, indicando os demais objetivos es-


pecíficos, as respectivas perguntas de avaliação de resultados, definindo-se os
indicadores, fontes de informação e os meios de verificação.

9. Participação da comunidade nas fases de elaboração,


execução e avaliação do projeto.
Os movimentos sociais voltados para garantia de direitos, autonomia e autodeterminação dos
diversos grupos minoritários (negros, mulheres, pessoa com deficiência, pessoa com transtorno
mental, e outros) partem do princípio de “nada sobre nós sem nós”, significando uma inequívoca
apropriação de tudo que se refere aos seus interesses e suas experiências. Nesse sentido, todo
e qualquer projeto que tenha como foco os movimentos sociais deve igualmente respeitar essa
posição de autodeterminação estruturante dos movimentos sociais e de seus agentes. Portanto,
é de fundamental importância a participação da comunidade nas diversas etapas do projeto,
Voltar para
39
o sumário

contribuindo para o empoderamento e o protagonismo de seus participantes, conforme assina-


lado no tópico 3 deste Guia.

Desse modo, busque responder sobre a participação da comunidade nos se-


guintes pontos:

Como foram identificadas as demandas da comunidade? A comunidade parti-


cipou nesta etapa?

De que forma a comunidade participou da elaboração do projeto? E do acompa-


nhamento das ações, da aplicação dos recursos, outros?

Há representantes da comunidade no desenvolvimento do projeto?


40
4 - Oficina de escrita de projeto:
vamos escrever juntos?

10. Interação com políticas públicas e controle social,


participação e transparência
Neste tópico, deve ser articulada a relação entre as iniciativas de projetos de geração de trabalho
e renda e as políticas públicas existentes, buscando demonstrar a pertinência e a legitimidade
destas experiências junto a políticas de estado e/ou governamentais. Para o campo da saúde
mental e da economia solidária, identifica-se inúmeras legislações de apoio a essas iniciativas,
conforme apontado no tópico 2 deste Guia.

Importante também frisar se representantes do projeto integram alguma comissão ou conselho


de controle social, e se os resultados são divulgados conferindo transparência às ações desen-
volvidas pelo projeto. Fomentar a participação nos projetos e garantir a sua plena divulgação são
aspectos muito relevantes na formulação do projeto.

Busque responder a estas perguntas:

Em que legislação está amparada a formulação do projeto do seu grupo? Nas se-
ções anteriores, é possível identificar elementos fundamentais para responder a
este ponto.

Como será feita a divulgação dos resultados do projeto? Responda aqui:


Voltar para
41
o sumário

11. Apresente a equipe técnica do projeto


Neste item, deve-se inserir todos os integrantes da equipe técnica, especificando a formação/es-
colaridade de cada membro e a função que irá desenvolver no projeto de forma objetiva e direta.
Veja a tabela a seguir:

Equipe Técnica

Nome do técnico Escolaridade/formação Função/cargo no projeto

12. Orçamento físico-financeiro

Chegamos na etapa de elaboração do orçamento! Todo projeto ao ser formulado deve apresen-
tar uma planilha de custos, especificando as despesas necessárias para a execução das ações.
É importante relacionar todos os itens de despesas, incluindo os impostos e encargos de paga-
mento de pessoal.

Veja o modelo de planilha orçamentária na página 70.


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o sumário

5
Dá para fazer!
Experiências exitosas

Em São Paulo:

Ponto de Economia, Comércio Justo, Cooperativismo Social e


Cultura do Butantã
Fundação: ano 2016 – São Paulo (SP)

Vínculo institucional: Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo

Empreendimentos/produtos
Livraria Louca Sabedoria – venda de livros novos e usados

Comedoria Quiririm – restaurante saudável (orgânico)

Orgânicos no Ponto – venda de produtos orgânicos e agroecológicos

Ybi Atã – produção de artesanato

Loja Pé à Biru – artesanato urbano

Horta – produção de mudas (em formação)

Comunicação – registros de eventos e difusão (em formação)

Breve história
Voltar para
43
o sumário

O Ponto de Economia Solidária do Butantã é


um equipamento público
municipal concebido e con-
quistado a partir das ex-
periências de inclusão no
mundo do trabalho, realiza-
das nos serviços de saúde
mental da região oeste da
cidade de São Paulo e vin-
culadas à Rede Estadual
de Saúde Mental e Econo-
mia Solidária. Tem como
missão promover o direito
ao trabalho com prioridade
para pessoas em situação
de desvantagem social. É
um espaço de produção e
comercialização orientado por meio da sua Escola de Formação em Eco-
pelos princípios da autogestão e da sustenta- nomia Solidária, da realização de Feira de Tro-
bilidade que sustenta a formação e o desen- cas, de debates sobre consumo responsável e
volvimento de empreendimentos econômicos consciente. A gestão do Ponto é compartilha-
solidários. Atualmente conta com sete empre- da, sendo a assembleia soberana sua principal
endimentos e mais de 30 trabalhadores, além instância decisória. Tem como parceiros atu-
de 15 artesãos que participam da gestão da ais a Incubadora Tecnológica de Cooperativas
Loja Pé à Biru. Populares da USP, a Faculdade de Arquitetura e
o Curso de Terapia Ocupacional da Faculdade
Funciona regularmente de segunda a sexta-
de Medicina, ambos da USP, a Associação de
-feira, das 7h às 18h, e, excepcionalmente, aos
Mulheres na Economia Solidária e o Instituto
fins de semana e à noite. O Ponto apoia peque-
Paulo Freire, além de colaboradores vinculados
nos produtores e iniciativas locais e regionais
a serviços da rede de saúde local (CAPS Bu-
para a geração de renda, facilitando o consu-
tantã, CAPS Lapa e Centro de Conivência Par-
mo e a distribuição de seus produtos nos pró-
que da Previdência) e outros que se agregam
prios empreendimentos ou por meio de feiras,
espontaneamente.
como Associação das Mulheres na Economia
Solidária, Quilombo Ivaporunduva, produtores Autoras
de alimentos orgânicos, artesãos da Rede de
Artesanato da Incubadora Pública Municipal, Maria Cristina Tissi – Terapeuta ocupacional e
além de grupos mestra em Saúde Coletiva
com atuação na
região do Bu- Gisela de Souza Nigro –  Terapeuta ocupacio-
tantã. Desen- nal
volve ativida-
des formativas Lucia Filomena Carrero – Assistente social
abertas para
Coordenadora: Maria Cristina Tissi
a comunidade
Dá para fazer!
Experiências exitosas 44 Voltar para
o sumário

Núcleo de Oficinas e Trabalho (NOT)


Fundação: ano 1991 – Campinas (SP)

Vínculos institucionais: Serviço de Saúde Dr. Cândido Ferreira em parceria com a Asso-
ciação Cornélia M.E.H Vlieg

Empreendimentos/produtos

Marcenaria: confecção em madeira e marche-


taria, como porta-retratos, caixas, bandejas
giratórias, petisqueiras, entre outros produ-
tos, além de móveis e produtos personaliza-
dos sob encomenda.

Serralheria: confecção de artigos para deco-


ração e utilitários em ferro, como cabideiros,
flores, mesas, cadeiras, pés de abajures, en-
tre outros.

Mosaico: utiliza a cerâmica para formar os de-


senhos das peças de mosaico, compondo me-
sas, porta-retratos, artigos para cozinha, qua-
cascas de cebola, folhas, flores.
dros, entre outros produtos.
Gráfica: produtos feitos com a técnica de car-
Vitral artesanal: confecciona produtos de ilu-
tonagem para a confecção de agendas, blocos,
minação, como abajures, velas, arandelas, tan-
cadernos.
to com a técnica de mosaico em vidro, quanto
com tecidos. Culinária: produção de refeições para os CAPS
da rede de Campinas e para o restaurante.
Vitral plano: realiza a produção sob encomen-
da de vitrais artísticos para portas e janelas, Culinária/eventos: produção de refeições para
com a técnica do mosaico em vidro, além de os CAPS da rede de Campinas, como marmitex
peças menores para decoração. e salgados para o café, além da preparação e
organização de eventos externos, como coffee
Costura: produz artigos para decoração de ca-
break, almoços, festas.
sas, como almofadas, tapetes, flores em teci-
do, panos de prato, além de bonecas de pano, Doceria: produção de bolos e doces.
carteiras, bolsas, chaveiros, utilizando técnicas
como tricô, crochê, costura em máquina indus- Agrícola: horta orgânica, serviço de jardinagem
trial, entre outras. e limpeza ambiental.

Papel artesanal: confecção de folhas de papel Ladrilho hidráulico: confecção de ladrilhos hi-
artesanal, feitas com a reutilização de papéis e dráulicos artesanalmente.
a mistura com elementos, fibra de bananeira,
Voltar para
45
o sumário

Breve história

O Núcleo de Oficinas e Trabalho (NOT) é uma riais, o pagamento da Bolsa Oficina e a comer-
tecnologia social, desenvolvida no campo da cialização dos produtos. Ao Serviço de Saúde
saúde mental, voltada à promoção de estraté- Dr. Cândido Ferreira cabe a responsabilidade
gias de reabilitação psicossocial e de inclusão pela alimentação, transporte e assistência
social pelo trabalho aos usuários da Rede de prestada aos usuários. E ao Sistema Único
Atenção Psicossocial do município de Campi- de Saúde, o reconhecimento e financiamento
nas (SP). de parte das ações desenvolvidas.

O NOT surgiu em 1991 com o objetivo de res- Essa tríade permite desenvolver um conjun-
ponder uma nova demanda social, produzida a to de estratégias com o objetivo de promover
partir do processo da Reforma Psiquiátrica, em processos de ampliação da contratualidade
que o cuidado, o tratamento e a reabilitação social, de reabilitação psicossocial e de trans-
dos usuários da saúde mental se deslocaram formação de identidades, com o deslocamento
do isolamento e da exclusão social para o cui- de lugar de “usuário de saúde mental” para o
dado em liberdade, nas cidades. de “oficineiro”, de alguém que produz e cria sua
própria história, seu protagonismo, através de
A nova estratégia de cuidado despertou a ne- um ofício.
cessidade de promoção efetiva dos direitos
humanos dos usuários, entre eles o direito ao As ações desenvolvidas no interior das
trabalho e a inclusão produtiva. oficinas, além do processo em si de geração
de trabalho e renda, potencializam proces-
Com 26 anos de história e de dedicação exclu- sos de aprendizado, de ampliação de socia-
siva ao desenvolvimento de atividades de ge- bilidade, além de estimular novas relações
ração de trabalho e renda, atualmente o NOT interpessoais, de expressão da subjetividade,
conta com 13 oficinas de trabalho que ofertam de protagonismo social, político e comunitário
300 vagas distribuídas em atividades artesa- de cada oficineiro.
nais, de prestação de serviços e agricultura or-
gânica, que funcionam de segunda a sexta-fei- Um diferencial do NOT é possuir um ponto co-
ra das 8h às 16h. mercial de comércio justo e solidário chamado

Para gestão, fun-


cionamento e via-
bilidade do serviço
foi constituída, em
1993, a Associação
“Cornélia Vlieg”,
que viabiliza a
aquisição dos equi-
pamentos e mate-

Loja Armazém
das Oficinas
Dá para fazer!
Experiências exitosas 46 Voltar para
o sumário

Armazém das Oficinas, no qual os produtos das oficinas e de outros empreendimentos ligados à
rede de economia solidária e de saúde mental podem expor e vender seus produtos. Isso ajuda na
divulgação e na venda dos produtos e acaba sendo, para a maioria das oficinas, a principal fonte
para manutenção dos grupos e geração de renda dos oficineiros. No local também funciona um
café e um restaurante.

Autoras

Kátia Liane Rodrigues Pinho – Terapeuta ocupacional, mestra em Ciência, Tecnologia e Socieda-
de pela Universidade Federal de São Carlos. Coordenadora da oficina de papel artesanal do NOT.

Carolina Con Andrades Luiz – Terapeuta ocupacional, mestra em Saúde Coletiva, Área de Política,
Planejamento e Gestão pela Universidade Estadual de Campinas. Coordenadora da oficina de
costura do NOT.

Oficina de Marcenaria – Núcleo de Oficinas e Trabalho (NOT) /


Associação Cornélia Vlieg – Armazém das Oficinas
Fundação: ano 1998 – Campinas (SP)

Vínculo institucional: Núcleo de Oficinas e Trabalho (NOT) do Serviço de Saúde Dr. Cândi-
do Ferreira, em parceria com a Associação Cornélia M.E.V.H. Vlieg.

Empreendimentos/produtos

Peças artesanais de madeira com marchetaria de cipó, bambu, retalhos de madeira. Móveis
sob encomenda.

Breve história

A oficina de marcenaria iniciou suas atividades são organizadas diariamente pelo grupo, de
em 1998, com maquinários modestos e pouca acordo com a demanda de pedidos (externos e
especialização na mão de obra. Com o tempo, estoque) e planejamento da produção. As ati-
novas máquinas foram adquiridas e um profis- vidades são as seguintes:
sional marceneiro experiente foi contratado.
A) Aparelhar madeiras e mdf (medir, cortar, de-
As atividades são realizadas de segunda a sengrossar, desempenar, esquadrejar, canali-
sexta-feira, das 8h às 16h, por 20 oficineiros, zar, furar etc);
dois monitores e um coordenador. As tarefas
Voltar para
47
o sumário

B) Montar as peças;

C) Aplicar o cipó, bambu e retalhos de madeira;

D) Acabamento e lustração;

E) Limpeza, manutenção, organização do espaço e entregas. Bandeja giratória em


marchetaria em cipó

Cada grupo de atividades é realizado por um subgrupo de


oficineiros monitorados. Em um dia rotineiro, o subgrupo
que opera as máquinas estacionárias e manuais está pro-
duzindo um tipo de produto, enquanto outro subgrupo está
aplicando o cipó, bambu e retalhos de madeira em peças
que foram produzidas em dias anteriores, bem como o gru-
po responsável pela lustração está fazendo o acabamento
em outros tipos de peças previamente preparadas. Desse
modo, criamos um fluxo, organizado por um “mapa de pro-
dução” que auxilia na organização das tarefas e no tipo de
intervenção que será realizada em cada produto.

Esse tipo de organização é importante para a otimização


do trabalho e profissionalização dos oficineiros, bem como
na pontualidade dos prazos assumidos. Isso reflete na
qualidade dos produtos, sempre buscada por nós e ressal-
tada pelos clientes.

Realizamos rodas de conversa semanais para discutir as-


suntos pertinentes às atividades (organização, gastos,

Produção da oficina
de marcenaria
Dá para fazer!
Experiências exitosas 48 Voltar para
o sumário

vendas, planejamento, limpeza, atividades extras etc). Reflexões sobre temas como economia
solidária, saúde mental e seus cenários atuais e mercado de trabalho também são estimuladas
pela equipe e pelos oficineiros.

As peças são comercializadas em nossa loja (Armazém das Oficinas), em feiras de decoração,
brindes e artesanato (Gift Fair, Craft Design, Mercado Mundo Mix, Brazil Promotion etc) e para
lojistas de todo o Brasil.

Interessante ressaltar que os produtos da oficina


criaram uma identidade visual percebida por nossos
clientes e com ampla aceitação no mercado. Esses
produtos já nos oportunizaram realizar vendas de
brindes para empresas do ramo bancário, farmacêu-
tico, automotivo e de consultoria. O maior número de
peças produzidas para um brinde foi de 1.500 unida-
des de petisqueiras. São negociados com o grupo a
aceitação do pedido, o modo de produzir e a entre-
ga. Apesar do grande volume de trabalho e prazos
apertados, esses pedidos de brinde auxiliam muito
na formação do caixa da oficina, melhorando assim
a bolsa-oficina recebida e os investimentos neces-
sários.

Autor

Lairto Alves Tosta Junior – Psi-


cólogo, pós-graduação latu-
-sensu em Saúde Mental pela
FCM-Unicamp. Coordenador da
oficina de marcenaria do NOT.
Petisqueira com
marchetaria em cipó

Gerente do serviço NOT: Cleusa


Ogera Cayres, assistente social.
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49
o sumário

Coletivo Central Unida de Pessoas Inventando Novas Saídas -


C.U.P.I.N.S
Fundação: ano 2006 – Santo André (SP)

Vínculo institucional: Núcleo de Projetos Especiais (NUPE) – Santo André (SP)

Empreendimentos/produtos

Cadernos, agendas, camisetas e serigrafias em geral.

Breve história

Desde 2006, um grupo de pessoas que está em processo de cuidado e tratamento, reabilitação e
promoção de saúde mental se reunia às quintas-feiras nas dependências de uma sala de terapia
ocupacional num CAPS em Santo André para integrar e compor o ofício de xilogravar.

Com o passar dos anos, o grupo conseguiu realizar pequenas exposições em eventos vinculados
à saúde mental no município e em cidades adjacentes. Passou a perceber que seu trabalho tinha
desenvolvido valores estéticos e políticos que auxiliavam na ruptura de preconceitos, construin-
do novas culturas e lugares sociais aos participantes.

Ao longo de quatro anos (2006-2010), o coletivo elegeu diversas obras e inscreveu mais de 20
trabalhos em concursos de arte. Num deles, o VI Prêmio Arthur Bispo do Rosário, desenvolvido
pelo Conselho Regional de Psicologia (CRP), teve dois trabalhos selecionados, que ficaram ex-
postos na estação Sé do me-
trô, na capital de São Paulo.
Em 2011, no fim do concurso,
o grupo foi contemplado com
o primeiro e o terceiro lugares
em categorias distintas.

A partir da premiação, o cole-


tivo decidiu aplicar a metade
do montante na produção de
xilogravuras e camisetas, tor-

Foto da parceria Coleti-


vo C.U.P.I.N.S, Instituto
Ecotece e Cavalera
Dá para fazer!
Experiências exitosas 50 Voltar para
o sumário

Mostra de cadernos e agendas feitos pelo grupo com as técnicas de


xilogravura, stencil e serigrafia

nando-se um empreendimento econômico. Em 2014, passou a compor a protocooperati-


As gravuras passaram a ser comercializadas va social Teia de Trabalho (www.teiadetraba-
entre conhecidos e vizinhança, gerando pe- lho.com), além de estruturar novas parcerias.
quena renda dividida entre todos e uma parte Em 2015, aproximou-se do Instituto Ecote-
para a construção de um capital de giro. Essa ce, em que participou do projeto Lab Moda
experiência abre portas para aproximação dos (2016/2017), que culminou no projeto COOLAB
campos de conhecimento e fazer da economia (#feitaporsereshumanos), desenvolvido junta-
solidária e dos fundos rotativos solidário. mente à marca Cavalera, o Instituto Ecotece e o
Coletivo C.U.P.I.N.S, onde uma pocket coleção
Em 2012, o coletivo passou a integrar a Rede foi totalmente criada em parceria e estampada
de Saúde Mental e Economia Solidária, en- pelo coletivo.
volvendo-se na construção das políticas pú-
blicas de trabalho e renda, assim como na Autores:
construção de produtos em rede. Em 2013,
passou a compor o Núcleo de Projetos Espe- André Luis Campos Nunes – Terapeuta Ocu-
ciais (NUPE), veiculando e articulando ações pacional
de divulgação de eventos e temáticas afins
em suas páginas eletrônicas, panfletos, cami- Roseli Tadeu Montanari  – Psicóloga
setas, agendas artísticas.
Coordenadora NUPE: Thaís Caiano
Voltar para
51
o sumário

Arte e Convívio Café e Café da Loucura


Fundação: Arte e Convívio Café (2015) / Café da Loucura (2017) Botucatu - SP

Vínculo institucional: Associação Arte e Convívio

Empreendimentos/produtos

Prestação de serviço à comunidade através de gênero alimentício. Comercialização e manipula-


ção de produtos alimentícios, atendimento ao público, limpeza, organização do local, pedido de
mercadorias aos fornecedores, controle de estoque e caixa.

Breve história
A Arte e Convívio (ONG) foi fundada na dé-
cada de 1990 com o objetivo de inserção no
mercado de trabalho (formal e informal) dos
usuários dos serviços de saúde mental de
Botucatu (SP). Possui núcleos de trabalho,
que incluem costura, encadernação, mosai-
co, loja e cafés. Será relatada aqui a mais
recente experiência de comercialização e
prestação de serviços na área de alimenta-
ção, a saber, a Arte e Convívio Café e o Café
da Loucura.

A experiência surgiu a partir da formação


em Economia Solidária, que nos motivou a
aumentar a renda gerada aos trabalhadores através do ramo alimentício. O programa se divi-
de em dois pontos: um que funciona de segunda a sexta-feira, dentro do Centro Oncológico do
Hospital Estadual, vinculado à UNESP, cuja clientela é composta de acompanhantes, pacientes
em tratamento e funcionários do complexo hospitalar, e demais serviços de saúde que funcio-
nam ao redor. O processo de trabalho foi todo construído pelos trabalhadores, equipe técnica e
coordenação, sendo hoje executado prioritariamente pelos próprios trabalhadores do café: com-
pra, escolha do fornecedor e pagamento dos produtos, regulação de estoque, limpeza, pedido de
mercadorias etc., estando a coordenação como apoio para as atividades, mediação de conflitos
e outras questões administrativas. A autonomia que os trabalhadores construíram e o papel so-
cial que eles conquistaram é o que nos impulsiona. Hoje, os trabalhadores do café usufruem do
mesmo acesso que os funcionários do hospital, como crachá, acesso a todas as dependências
do hospital, uso de refeitório, armário de funcionário e banheiro de funcionário, tendo ocupado
outro papel social de suma importância para eles.
Dá para fazer!
Experiências exitosas 52 Voltar para
o sumário

Café da Loucura

O segundo ponto é o Café da Loucura, que vem Alessandra de Fátima Sanches Vicençotto   –
apostando na aproximação da sociedade com Assistente Social na Arte e Convívio Botucatu/
a loucura, uma vez que está instalado ao lado SP desde 2005. Possui graduação em Estágio
da sede da ONG, em uma casa onde funciona a Curricular pelo Centro de Saúde Escola (1998-
loja e o café. Esse ambiente proporciona essa 1999) e graduação em Bacharelado em Serviço
integração mais visceral com a sociedade, por Social pela Associação de Ensino de Botucatu
meio da realização de eventos culturais, como (1999). Aprimoramento profissional em Servi-
saraus, reuniões, comemorações e afins, além ço Social em Saúde Mental (2000-2001) pela
de proporcionar que o público tenha a oportu- Universidade Estadual Paulista Júlio de Mes-
nidade de um contato mais direto com a ONG. quita Filho (UNESP).
Avaliamos que um ponto exitoso nesse núcleo
de trabalho é vivenciar no dia a dia a desmis- Carolina Corvino dos Santos  – Terapeuta
tificação da loucura, em que o diagnóstico de ocupacional na Associação Arte e Convívio.
cada um fica entre parênteses e eles são ali Graduação em Terapia Ocupacional pela Uni-
trabalhadores potentes e eficazes no atendi- versidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita
mento ao público. Filho, 2016.

Deborah Mendes Araújo de Andrade – Psicólo-


ga e psicoterapeuta esquizoanalista. Faz parte
Autoras da equipe técnica da Associação Arte e Con-
vívio desde maio de 2008. Assessora e coor-
Maria Della Coletta   – Coordenadora do Arte dena núcleos de trabalho de geração de ren-
e Convívio Café e Café da Loucura, fundado- da e oficinas de expressão corporal voltados
ra, presidente e coordenadora técnica da AAC, aos usuários dos serviços de saúde mental.
assistente social, psicodramatista com apri- Curso de Teoria e Técnica da Esquizoanálise
moramento profissional em Serviço Social em e Esquizodrama com o professor Dr. Gregório
Saúde Mental (2000-2001) pela Universida- Baremblitt através do Instituto Félix Guatarri
de Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2003). Aprimoramento profissional em Saúde
(UNESP) e militante da Luta Antimanicomial.
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53
o sumário

Mental e Saúde Pública pela FUNDAP,


DIR-VIII, Assis-SP. Concluiu gradua-
ção em Psicologia pela Universidade
Estadual Paulista Júlio de Mesquita
Filho - UNESP, em 2000. É militante do
Movimento da Luta Antimanicomial,
membro da ABRAPSO Núcleo Cuesta e
membro do Fórum Permanente Interse-
torial de Saúde Mental de Botucatu.

Elen Patrícia Gomes Zaponi – Tera-


peuta Ocupacional na Associação Arte
Convívio, Botucatu/SP desde 2008. Arte e Convívio Café
Possui graduação em Terapia Ocupacio-
nal pela Universidade do Sagrado Coração (2005). Aprimoramento profissional em Saúde Men-
tal  – Reabilitação Infanto-Juvenil pela Faculdade de Medicina de Botucatu - UNESP. Especializa-
ção em Terapia Ocupacional na área de Neurologia pelo Centro Universitário Católico Salesiano
“Auxilium”, UNISALESIANO - Lins/SP (2008).

Coordenadora: Maria Della Coletta.

Rede Estadual de Saúde Mental e Economia Solidária de São Paulo

A Rede Estadual de Saúde Mental e Economia Solidária de São Paulo é um dispositivo de articu-
lação da diversidade de formas organizativas, de inclusão produtiva, que tratam o eixo reabilita-
ção psicossocial da RAPS (portaria 3.088/2011 do Ministério da Saúde) e se destina a promover
atividades de formação, de assessoria técnica, de comercialização e de mobilização social e
comunitária.

A diversidade da Rede se manifesta tanto na sua composição social (usuários, profissionais,


familiares, estudantes, professores universitários, entidades de apoio e fomento, centrais de re-
presentação de cooperativas e empreendedores sociais e comunitários), como nos processos de
organização coletiva dos empreendimentos e seus processos de identificação (oficinas, grupos
de geração de renda e associações).

Compreendida enquanto um movimento social organizado, tem como princípio organizativo a


autogestão entre seus membros e coletivos. Suas pautas políticas e sociais são voltadas à pro-
Dá para fazer!
Experiências exitosas 54 Voltar para
o sumário

moção e ao fortalecimento dos empreendimentos econômicos solidários do cooperativismo e do


associativismo social, buscando promover o direito à cidade e aos direitos econômicos e sociais
dos usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) e do Sistema Único de Assistência Social (SUAS).

A metodologia de autogestão e de organização em Rede tem possibilitado sua ampliação,


desenvolvendo novos dinamismos territoriais e comunitários, o que culminou na formação de
12 “redinhas”:

Na cidade de São Paulo: Sul, Sudeste, Leste, Norte, Oeste, Centro;

Na grande São Paulo: Alto do Tietê, Guarulhos, ABCDMRR;

E no interior do estado: Campinas, Rio Claro e Região, Botucatu e Jundiaí

Feira na Avenida Paulista - promovida e organizada pela Rede Ecosol e Saúde Mental
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55
o sumário

Tanto a Rede quanto as redinhas se encontram em reuniões mensais. As redinhas com pau-
tas mais voltadas às necessidades e dinâmicas territoriais e a Rede com as pautas coletivas,
de interesse comum. Contamos com uma comissão executiva, composta pela livre adesão dos
membros que operacionaliza as decisões tomadas na reunião mensal e uma comissão que faz a
gestão do fundo solidário da Rede.

Atualmente a Rede conta com 160 projetos e aproximadamente 1.500 pessoas envolvidas. Por
meio de parcerias e trocas de experiências, conseguiu replicar sua experiência na formação da
LiberSol, Rede de Saúde Mental e Economia Solidária de Curitiba e Região e na Rede de Saúde
Mental e Economia Solidária no Vale do Itajaí, em Santa Catarina.

Para mais informações: www.saudeecosol.org

Autores

Iris Smaniotto Roschel Rotger – Fisioterapeuta e usuária do Cecco Ibirapuera. Participante do


empreendimento de economia solidária Girodez.

Isadora Candian dos Santos – Cientista Social, mestra em Ciência, Tecnologia e Sociedade pela
UFSCar, diretora-tesoureira da Central de Cooperativas e Empreendimentos Solidários - UNISOL
Brasil, sócia da COOPERIDEÁRIO - Colaboração, Inovação Social e Design, integrante da Rede
Design Possível, coordenou o “Projeto Redes” da Rede de Saúde Mental e Economia Solidária,
pelo Instituto Integra.

Kátia Liane Rodrigues Pinho – Terapeuta Ocupacional, mestra em Ciência, Tecnologia e Socieda-
de pela UFSCar, coordenadora da oficina de Papel Artesanal do Núcleo de Oficinas e Trabalho do
Serviço de Saúde Dr. Cândido Ferreira.

Leonardo Penafiel Pinho – Conselho Nacional de Direitos Humanos, Conselho Nacional de Eco-
nomia Solidária, presidente da Central de Cooperativas e Empreendimentos Solidários - UNISOL
Brasil.

Thatiane Santos – Psicóloga, trabalhou no projeto Redes


Dá para fazer!
Experiências exitosas 56 Voltar para
o sumário

No Rio de Janeiro:

Coletivo Carnavalesco e Ponto de Cultura Tá Pirando,


Pirado, Pirou!
Fundação: ano 2004, Rio de Janeiro, RJ

Vínculos institucionais: Instituto Municipal Philippe Pinel, Instituto de Psiquiatria da


UFRJ - IPUB, Rede de CAPS da SMS/RJ, Instituto Franco Basaglia - IFB, e Associação
de Moradores da Lauro Müller - ALMA

Empreendimentos/produtos

Desfiles carnavalescos, rodas de samba, concursos de samba, participações em eventos cul-


turais da cidade e oficinas de composição e registro fonográfico, oficinas de artes e oficinas de
percussão.

Breve história:

O Coletivo Carnavalesco Tá Pirando, Pirado, Pirou! é um bloco formado por usuários e profissio-
nais da rede pública de saúde mental do Rio de Janeiro, familiares dos usuários e simpatizantes
da causa de uma sociedade sem manicômios. Criado no bojo do movimento de revitalização do
carnaval de rua carioca, o coletivo é fruto da percepção de que há afinidades entre a festa popular
e democrática do carnaval de rua e o espírito da Reforma Psiquiátrica Brasileira, pautado pela
lógica da integração social. O nome do bloco foi sugerido por um cliente do Pinel, que argumen-
tou: “”Não vamos fazer carnaval só pra quem já pirou, e está aqui dentro do Pinel. Vamos pra rua
brincar com quem ainda tá pirando... Tá Pirando, Pirado, Pirou! É todo mundo junto!”.

A luta antimanicomial, que se esforça para reverter o processo secular de exclusão social dos
diferentes e promover a cidadania do louco, encontra na folia de rua uma poderosa aliada, por
se tratar de uma festa popular catalisadora de encontros sociais. Só criando redes podemos
combater a exclusão. Ao longo de todo o ano, o coletivo promove oficinas semanais ligadas às
artes carnavalescas, onde desenvolve fantasias, adereços, sambas e batucadas. A cada ano,
um novo enredo é escolhido e uma nova pesquisa é empreendida, resultando em nova safra de
composições, uma delas eleita em concurso para animar o desfile do bloco. Essas atividades
proporcionam um rico espaço de convivência, circulação de afetos, trocas de ideias e experi-
mentações estéticas.
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57
o sumário

O trabalho de intervenção cultural realizado pelo Tá Pirando, Pirado, Pirou! visa desconstruir re-


presentações estigmatizantes da loucura, ajudando a criar um novo imaginário social, no qual
o louco é reconhecido como cidadão possuidor de direitos e como alguém capaz de criar e de
contribuir para a construção de um mundo mais inclusivo, mais amoroso e mais plural. Por isso,
é simbolicamente significativo que o bloco desfile pela Avenida Pasteur, endereço do primeiro
hospício da América Latina, fundado por D. Pedro II em 1852, local em que os loucos eram con-
finados no passado e que hoje é invadido no carnaval por uma louca alegria, a “prova dos nove”,
como dizia Oswald de Andrade. A apoteose acontece em frente ao Pão de Açúcar, onde o ilustra-
dor oficial do bloco, que se trata no Centro de Atenção Psicossocial Franco Basaglia, enxergou as
ancas de uma gigantesca passista. No desenho que estampa as camisas do bloco, o bondinho
é um detalhe do biquíni da passista. “No Pão de Açúcar de cada dia, dai-nos, Senhor, a poesia de
cada dia!”. 

Desde 2014, o bloco integra a Rede Carioca de Pontos de Cultura, tornando-se o Ponto de Cultura
Tá Pirando, Pirado, Pirou! Folia, Arte e Cidadania.

Coordenador: Alexandre Ribeiro Wanderley – psicanalista, mestre e doutor em Saúde Coletiva


(IMS/UERJ), coordenador do Ponto de Cultura Tá Pirando, Pirado, Pirou! e presidente da Associa-
ção dos Amigos do Cais.
Dá para fazer!
Experiências exitosas 58 Voltar para
o sumário

Papel Pinel
Fundação: ano 2000, Rio de Janeiro, RJ

Vínculo institucional: Instituto Municipal Philippe Pinel (IMPP)

Empreendimentos/produtos
Papel artesanal, cadernos, agendas, bolsas,
desenhos, objetos artesanais, outros.

Breve história:

O Papel Pinel é uma “fábrica terapêutica” situa-


da no Instituto Municipal Philippe Pinel (IMPP),
localizado na Zona Sul do Rio de Janeiro.

Oferece atendimento intensivo a clientes dos


serviços de saúde mental visando à reorgani-
zação, a ressocialização e a reabilitação para a
vida e para o trabalho. As atividades são feitas
em grupo, potencializando um espaço de ex- beleza e possibilidades de uso. Ficou claro
pressão criadora para a produção de objetos, que reciclar, dentro do contexto psiquiátrico,
mas também de reflexão, de cuidado e de tro- tornava-se uma atividade terapêutica, permi-
cas subjetivas. tindo dar outros sentidos a conteúdos antes
descaracterizados ou “jogados fora”, extrain-
Sua ação aponta para a inclusão social, o res- do novos valores e abrindo mais um campo de
gate à cidadania, a geração de renda e a trans- produção.
formação cultural do estigma que cerca a lou-
cura, valorizando a Ecologia do Meio Ambiente Brincando, “fazendo arte”, ficou claro que o tra-
e Humana. O lema é: “Recicle ideias, jogue fora balho proporcionava uma plenitude, paciente e
preconceitos”. criação amalgamados. Pessoa e produto como
passagem – de si para si, de si para o outro, do
A Oficina de Papel Artesanal foi criada em 2000. outro para o mundo.
O início se deu no Pátio Central, compartilhan-
do a tarefa com pacientes, técnicos, familiares A experimentação e criação de novos produtos
e curiosos que por ali transitavam. e sua produção passou a tomar formas mais
concretas, com uma linha própria: tinha “cara”,
O processo de recriação do papel, inclusive a forma e conceito. Tomava a forma de uma as-
partir de bulas de remédio, surpreendeu pela sinatura coletiva.
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59
o sumário

Com a transformação do “gato do Samy” em volvidos, possibilitando ainda que se tornem


logomarca, passou à condição de “griffe” Papel agentes ativos na luta contra a discriminação.
Pinel, reafirmando a capacidade de trabalho
desse coletivo, conferindo-lhe um novo status, O paciente sabe que vai a um lugar em que sua
um papel social, uma “marca” (http://www.pa- individualidade, sua arte e seu esforço são va-
pelpinel.com.br/) lorizados tanto sociais como financeiramen-
te. Recebem visitas e interesse genuínos de
Hoje, o Papel Pinel situa, nomeia e legitima uma comunidade de estudantes, jovens, artis-
cada um de nossos clientes, devolvendo-lhes tas, produtores, fornecedores e da mídia, que
o estatuto de sujeitos, de cidadãos, antes des- se encantam com seu trabalho e que dele se
qualificados pelo rótulo da doença e do pre- tornam formadores de opi­nião, quebrando ta-
conceito. bus e recons­truindo a maior moeda possível:
esperança, futuro e reconstrução de projetos
de vida.

Resultados Terapêuticos A eficácia terapêutica transparece na mudança


de postura em relação à doença, pois modifi-
ca o sentido do tratamento, que toma cono-
tação de trabalho, compromisso, sentimento
Este projeto reafirma a necessidade e a capaci-
de pertencimento e não mais de alienação e
dade de trabalho de uma clientela considerada
exclusão. Observou-se também a diminuição
incapaz pela dificuldade da sociedade em con-
na frequência de internações, maior adesão ao
viver com a diferença. Marca, ao contrário, que
tratamento e à medicação.
essa diferença traz em si a força da criativida-
de, da singularidade e que, se acolhida, é pro- Para expressar os resultados em relação ao
dutiva, demonstra qualidade e apurado senso impacto da iniciativa sobre a con­dição de saú-
estético. Possibilita a inclusão no mercado de de, pensa-se na imagem da “arte do arco e fle-
trabalho de forma original e feliz, gera renda, cha”. O arco como essa força que leva a aderir
devolve valor social e reconhecimento aos en- ao tratamento e a flecha que
alcança seu objetivo, nes-
sa deli­cada tensão de cons-
trução de um sujeito pleno,
cônscio de si, mais feliz, inte-
grado: a mudança de atitude.
É com essa força que traba-
lham para seguir adiante.

Coordenadora: Esther Marco


Wenna – Psicóloga clínica do
Instituto Municipal Philippe
Pinel-RJ, especialista em Psi-
quiatria Social.
Dá para fazer!
Experiências exitosas 60 Voltar para
o sumário

Geração & Harmonia - Programa de Geração de Trabalho e Renda do


Centro Psiquiátrico Rio de Janeiro
Fundação: ano 2002 –  Rio de Janeiro, RJ

Vínculo  institucional: Centro Psiquiátrico Rio de Janeiro, sob gestão da Fundação Estadual


de Saúde e da Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro

Empreendimentos/produtos

Oficina e Quiosque Bazarte  -  Produtos artesanais  em tecido, madeira e material reci-


clado com comercialização no CPRJ,  em feiras, barracas, lojas e eventos na cidade.

 Breve história
O Geração & Harmonia teve início em 2002, com o projeto Cantina, expandindo-se com os pro-
jetos Culinária e Bazarte. O Bazarte, inaugurado em 2011, fez uma importante parceria com a
Ecosol, que abriu portas para a comercialização dos produtos e ofereceu formação através do
Núcleo Estadual de Assistência Técnica aos Empreendimentos Solidários no Estado do Rio de
Janeiro (NEATES). Em 2015, a Oficina Bazarte teve início, produzindo artesanato em tecido, ma-
deira e material reciclado que são comercializados no Quiosque do Bazarte no CPRJ, nas feiras,
em loja e eventos.

Desde 2016, o Bazarte vem participando, com outros Projetos da Rede de Atenção Psicossocial
(RAPS) do município do Rio de Janeiro, da organização da barraca Loucomotivos, ponto de co-
mercialização a ser inaugurado em breve, próximo à estação Botafogo do metrô. Lá, serão comer-
cializados, entre outros, produtos das Oficinas Bazarte e Bem Arteiras do CPRJ, do projeto Loucos
por você do CAPS de
Quissamã. Em 2017,
o Bazarte  partici-
pou do Dia das Boas
Ações, evento inter-
nacional organiza-
do pela  ONG Atados
no Parque Garota de
Ipanema e do evento
Loucos pela UERJ,
na defesa da Educa-
ção e da Luta Anti-
manicomial. 
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61
o sumário

Desde 2012, o Programa Geração & Harmonia iniciou o Projeto de Inclusão Social pelo Traba-
lho de Usuários de Serviços de Saúde Mental (PISTRAB) do Núcleo de Saúde Mental e Trabalho
(NUSAMT) da Secretaria de Estado de Trabalho e Renda do Rio de Janeiro (SETRAB/RJ), sendo
reconhecido por essa iniciativa com uma menção honrosa no Prêmio Inclusão Social promovido
pelo Conselho Federal de Psicologia em parceria com o Laboratório de Estudos em Saúde Mental
e Atenção Psicossocial (LAPS/Fiocruz).

Coordenadora: Doris Rangel Diogo, psicóloga, coordenadora técnica do Programa  Geração &
Harmonia e do Polo PISTRAB/NUSAMT no Centro Psiquiátrico Rio de Janeiro.
Dá para fazer!
Experiências exitosas 62
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o sumário

Cooperativa Praia Vermelha


Fundação: ano de 1995, Rio de Janeiro, RJ

Vínculo Institucional: Instituto Municipal Philippe Pinel (IMPP)

Empreendimentos/produtos

Pães, bolos, biscoitos, salgados, bombons, outros.

Breve história
A Cooperativa da Praia Vermelha é uma iniciativa pioneira no campo da geração de trabalho e
renda na modalidade de cooperativismo social, voltada para a rede pública e privada de saúde
mental, funcionando desde sua implantação, em 1995, dentro do Instituto Municipal Philippe
Pinel – IMPP. Constituiu-se como um marco histórico na política de inclusão social pelo traba-
lho cooperativado, motivado pelo desejo recorrente dos usuários, que buscavam sua reinserção
social pelo trabalho. A Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares da Coppe/UFRJ, que
ofereceu assessoria técnica à constituição do projeto Cooperativa da Praia Vermelha, desem-
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63
o sumário

penhou um papel fundamental na estruturação multiplicadores de todo o processo de trabalho


dessa experiência. envolvido na produção e venda dos alimentos.
Atualmente, existe uma ferramenta de controle
Os cooperativados produzem bolos, biscoitos, de produção que gera autonomia a cada um,
bombons e pães, que são vendidos em vários fazendo com que, ao fim do mês, saibam exa-
locais, inclusive dentro do IMPP. Participam de tamente o que produziram, quanto ganham por
feiras e eventos em várias instituições, como cada produto e qual o valor total da retirada.
universidades, escolas, empresas, além de ofe-
recerem serviços como coffee break e peque- A longevidade da Cooperativa da Praia Verme-
nos coquetéis, circulando pela cidade, de acor- lha é a prova do êxito desse projeto, demons-
do com a demanda. trando por meio da adesão ao tratamento a
consequente estabilização do quadro psíqui-
A Cooperativa da Praia Vermelha conta com co e o aumento da autonomia, entre outros
uma cozinha industrial, mantendo desde o iní- fatores, sendo o mais importante a transfor-
cio a tradição de que os cooperativados sejam mação do papel social de todos os que aqui
passaram. Ressaltamos
que este trabalho segue
sempre as diretrizes da
Reforma Psiquiátrica, em
defesa da política pública
de saúde mental brasileira.

Coordenadora: Vera Lobato,


Terapeuta Ocupacional.
Dá para fazer!
Experiências exitosas 64 Voltar para
o sumário

Programa Geração de Trabalho e Renda do Museu Bispo do Rosário


Arte Contemporânea
Fundação: 1º de março de 2002, Rio de Janeiro, RJ

Vínculos institucionais: IMAS Colônia Juliano Moreira, Museu Bispo do Rosário.

Empreendimentos/produtos
Mosaico, costura e bordado, culinária, Bistrô do Bispo, Loja B

Breve história
O Programa de Geração de Trabalho e Renda integra as atividades realizadas pela Escola Livre
de Artes do Museu Bispo do Rosário Arte Contemporânea. Direcionado aos usuários da rede de
saúde mental, seus familiares e a comunidade em geral, visa desenvolver ações que estimulem a
reinserção social por meio do trabalho, desenvolvendo possibilidades de criação e produção de
um cotidiano mais digno, empoderando os sujeitos, trabalhando suas singularidades e amplian-
do a autonomia, num espaço de aprendizagem, trocas, convivência e trabalho. O programa de
geração de trabalho e renda baseia-se em noções do cooperativismo e a lógica da economia so-
lidária, estabelecendo assim uma rede de sustentabilidade. Comporta a elaboração de produtos,
a venda e a prestação de serviços, a partir das oficinas de mosaico, culinária, costura e bordado
e dos espaços Bistrô do Bispo, cantinas e Loja B.
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65
o sumário

As oficinas funcionam de maneira articulada e em diálogo com o programa de exposições, dando


suporte aos eventos e criando produtos.

Coordenadoras: Diana Kolker, coordenadora de educação, historiadora, especialista em Pedago-


gia da Arte, mestranda em Estudos Contemporâneos das Artes (UFF).

Margarete Araújo, coordenadora de saúde do Museu Bispo do Rosário Arte Contemporânea,


psicóloga, mestranda em Atenção Psicossocial (IPUB-UFRJ).

Coordenadora do Museu Bispo do Rosário Arte Contemporânea: Raquel Pardo Lucas Fernan-
des, graduação em cinema pela Universidade Estácio de Sá (2007) e graduação em Medicina
pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1991). MBA em Gestão de Museus pela Universi-
dade Cândido Mendes (2016).
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o sumário

6
À guisa de conclusão:
apontamentos para
alcançar o futuro!
O momento em que vivemos no país recoloca para o campo das políticas públicas –
embasadas no modelo de um estado de bem-estar social – novos e importantes desa-
fios para a sustentação de práticas sociais de emancipação e ampliação da cidadania
da população brasileira.

Nesse contexto de diminuição do tamanho do estado brasileiro, o campo da saúde


mental tem agora diante de si, simultaneamente, a urgência de defender o grande lega-
do da Reforma Psiquiátrica brasileira e do Movimento da Luta Antimanicomial e con-
tinuar o trabalho de criação e reinvenção de novos espaços de cuidado para pessoas
que vivem com algum tipo de sofrimento psíquico.

Contudo, a política pública de saúde mental e todos aqueles que militam nesse campo
já conseguiram avanços significativos na estruturação de uma rede de serviços de
saúde, que interage diretamente com os temas da cidadania, da inclusão social e de
acesso equânime aos espaços públicos. Neste guia, a apresentação das experiências
exitosas objetivou mostrar esse caminho já realizado por muitos, comprovando que
“dá para fazer!”.

E intencionou ainda um pouco mais: indicar a necessidade de políticas públicas que


apoiem a implantação, em território nacional, de Centros de Convivência voltados à
população atendida na rede de saúde e para a comunidade de uma forma geral. Con-
forme as experiências assinaladas na seção anterior, essas políticas devem ser in-
tersetoriais, reunindo diversas secretarias públicas implicadas no desenvolvimento
social e econômico da população.

Outro futuro a ser alcançado por todos aqueles que concebem o campo da saúde
mental, em constante processo de transformação e de reinvenção dos seus “lugares
de partida e de chegada”, refere-se ao projeto de Centros Públicos preconizados pela
política da Economia Solidária. Trata-se de verdadeiros espaços pensados para dar
materialidade às demandas dos movimentos sociais em contar com ambientes estru-
turados para a comercialização, a produção, a formação e a capacitação em coopera-
tivismos e economia solidária.
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67
o sumário

A ITCP-campus Realengo/IFRJ, junto com sua rede de colaboradores e apoiadores institucionais,


buscou neste guia trazer elementos teóricos e operacionais para o campo da geração de trabalho
e renda e inclusão social pelo trabalho.

A ideia norteadora foi trazer o futuro para perto de nós, e nessa direção caminharmos juntos
construindo, quase de forma artesanal, esse futuro que já teremos alcançado sob o trabalho cui-
dadoso de nossas mãos!
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o sumário

Bibliografia
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69
o sumário

Bibliografia

ARANHA E SILVA AL. Construção de um projeto de Reforma dos Serviços de Saúde Mental : 15 anos depois
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In: PITTA AMF. Reabilitação Psicossocial no Brasil. 2ª ed.
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e economia solidária no Brasil. Serv. Soc. São Paulo,
2011.
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71
o sumário

VASCONCELOS EM. O poder que brota da dor e da __________________, et al. Manual [de] ajuda e suporte
opressão: empowerment, sua história, teorias e mútuos em saúde mental: para facilitadores,
estratégias. São Paulo: Paulus; 2003. trabalhadores e profissionais de saúde e saúde mental.
Rio de Janeiro: Escola do Serviço Social da UFRJ. Brasília:
____________________. Dispositivos associativos de luta e Ministério da Saúde. Fundo Nacional de Saúde, 2013b.
empoderamento de usuários, familiares e trabalhadores
em saúde mental no Brasil. Vivência (Natal), 2007. __________________, et al. Manual de direitos e deveres
dos usuários e familiares em saúde mental e drogas.
_________________. Reinvenção da cidadania no campo Rio de Janeiro: Escola do Serviço Social da UFRJ;
da saúde mental e estratégia política no movimento Brasília: Ministério da Saúde. Fundo Nacional de
de usuários. In: VASCONCELOS EM (org). Saúde Saúde, 2014. Disponível em < https://drive.google.
mental e serviço social: o desafio da subjetividade e com/file/d/0B0O0KmIfoMGzV2YxMEFtdUwyUnc/
interdisciplinaridade. São Paulo: Cortez, 2008a. view?usp=sharing >.

__________________. Abordagens psicossociais. Volume II: __________________. Reforma Psiquiátrica, tempos


reforma psiquiátrica e saúde mental na ótica da cultura e sombrios e resistência: diálogos com o marxismo e o
das lutas populares. São Paulo: Hucitec, 2008b. serviço social. Campinas: Papel Social; 2016.
Anexos
72
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o sumário

Anexo A:
 
Modelo de orçamento1

1. Custos fixos – aluguel, luz, telefone, água etc.

2. Pessoal – coordenadores, equipe, administradores, monitores, gerentes, bolsistas, contador.

3. Encargos sociais – décimo terceiro salário, férias, Previdência Social, FGTS,


despesas bancárias.

4. Manutenção – consertos, reparos, pequenas obras etc.

5. Material – material de consumo, material para higiene/limpeza, material para participan-


tes dos módulos, equipamentos.

6. Transporte – combustível, estacionamento, pedágio, ônibus, táxi, outros.

7. Alimentação – alimentação fora da instituição, alimentação dentro da instituição.

8. Viagens – passagem de avião, hospedagem, alimentação.

9. Eventos/divulgação – equipamentos de divulgação, faixa de palco para sinalização,


cartaz/convites.

10. Assessoria de imprensa.

11. Outros gastos – seguro de equipamentos, Correios e mala direta.

Total mensal geral

1.Este roteiro foi elaborado a partir do Roteiro de Elaboração de Projetos do Programa Desenvolvimento e Cidadania da Petrobras, e outros.
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73
o sumário

Anexo B:
Decreto N° 8.163, de 20 de dezembro de 2013

Presidência da República que realizam atividades econômicas, cujos par-


ticipantes sejam pessoas em desvantagem, nos
Casa Civil termos do art. 3º da Lei nº 9.867, de 1999, e exer-
çam democraticamente a gestão das atividades
Subchefia para Assuntos Jurídicos e a alocação dos resultados.
DECRETO Nº 8.163, DE 20 DE DEZEMBRO DE Art. 3o São princípios do Pronacoop Social:
2013
I - respeito à dignidade e independência da pes-
Institui o Programa Nacional de Apoio ao Asso- soa, inclusive a autonomia individual e coletiva;
ciativismo e Cooperativismo Social - Pronacoop
Social, e dá outras providências. II - não discriminação e promoção de igualdade
de oportunidades;
A PRESIDENTA DA REPÚBLICA, no uso da atri-
buição que lhe confere o art. 84, caput, inciso VI, III - participação e inclusão de pessoas em des-
alínea “a”, da Constituição, vantagem na sociedade e respeito pela diferença
como parte da diversidade humana;
DECRETA:
IV - geração de trabalho e renda a partir da or-
Art. 1o Fica instituído o Programa Nacional de ganização do trabalho com foco na autonomia e
Apoio ao Associativismo e ao Cooperativis- autogestão;
mo Social - Pronacoop Social, com a finalidade
de planejar, coordenar, executar e monitorar as V - articulação e integração de políticas públicas
ações voltadas ao desenvolvimento das coope- para a promoção do desenvolvimento local e re-
rativas sociais e dos empreendimentos econô- gional; e
micos solidários sociais.
VI - coordenação de ações dos órgãos que de-
Parágrafo único. O Pronacoop Social será de- senvolvem políticas de geração de trabalho e
senvolvido pela União em parceria com Estados, renda para as pessoas em desvantagem.
Distrito Federal e Municípios, a iniciativa privada,
e pessoas em situação de desvantagem, seus fa- Art. 4o São objetivos do Pronacoop Social:
miliares e entidades de representação.
I - incentivar a formalização dos em-
Art. 2 Para os fins deste Decreto, consideram-
o
preendimentos econômicos so-
-se: lidários sociais em cooperativas
sociais;
I - cooperativas sociais - cooperativas cujo ob-
jetivo é promover a inserção social, laboral e II - promover o fortalecimento institucional das
econômica de pessoas em desvantagem, nos cooperativas sociais e dos empreendimentos
termos do art. 3o da Lei nº 9.867, de 10 de no- econômicos solidários sociais, e a qualificação e
vembro de 1999; e formação dos cooperados e associados;

II - empreendimentos econômicos solidários III - promover o acesso ao crédito;


sociais - organizações de caráter associativo
Anexos
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IV - promover o acesso a mercados e à comer- I - coordenar e acompanhar a implementação
cialização da produção das cooperativas sociais das ações previstas neste Decreto;
e dos empreendimentos econômicos solidários
sociais; II - propor metas e normas operacionais para o
Programa;
V - incentivar a formação de redes e cadeias
produtivas constituídas por cooperativas sociais III - promover estratégias de articulação de pro-
e empreendimentos econômicos solidários so- gramas, projetos e atividades voltadas ao desen-
ciais; e volvimento do cooperativismo e do associativis-
mo social;
VI - monitorar e avaliar os resultados e alcances
sociais e econômicos das políticas de apoio ao IV - propor ações de formação e capacitação em
cooperativismo e ao associativismo social. cooperativismo e associativismo social para téc-
nicos e gestores que atuem junto às pessoas em
Art. 5o Serão utilizados os seguintes instru- situação de desvantagem;
mentos para o cumprimento dos objetivos do
Pronacoop Social: V - propor critérios para aprovação de projetos,
aplicação de recursos e avaliação dos resulta-
I - programas de formação continuada que aten- dos das cooperativas sociais e dos empreendi-
dam às necessidades dos trabalhadores das co- mentos econômicos solidários sociais, obser-
operativas sociais e dos empreendimentos eco- vada a legislação em vigor;
nômicos solidários sociais;
VI - propor iniciativas para o acesso ao crédito;
II - oferta de padrões tecnológicos e gerenciais
para a condução de suas atividades; VII - manter banco de dados atualizado do coo-
perativismo e do associativismo social no Brasil;
III - capacitação tecnológica e gerencial de pes- e
soas em situação de desvantagem que desejem
ingressar ou formar cooperativas sociais e em- VIII - propor adequações e aperfeiçoamentos ao
preendimentos econômicos solidários sociais; marco legal das cooperativas sociais.

IV - linhas de crédito existentes ou a serem cria- Art. 7o O Comitê Gestor do Pronacoop Social
das, nos termos da lei; será composto por um representante, titular e
suplente, dos seguintes órgãos:
V - abertura de canais de comercialização dos
produtos e serviços, que possibilitem o acesso I - Ministério do Trabalho e Emprego;
das cooperativas sociais e empreendimentos
econômicos solidários sociais às compras públi- II - Ministério do Desenvolvimento Social e Com-
cas; e bate à Fome;

VI - transferência de recursos, nos termos da le- III - Ministério da Saúde;


gislação vigente.
IV - Ministério da Justiça;
Parágrafo único. O acesso dos empreendimen-
V - Secretaria de Direitos Humanos da Presidên-
tos econômicos solidários sociais aos instru-
cia da República; e
mentos previstos nos incisos IV, V e VI do caput
depende de sua constituição como pessoa jurí- VI - Secretaria-Geral da Presidência da Repúbli-
dica. ca.

Art. 6o O Pronacoop Social será coordenado por § 1o Serão convidados a compor o Comitê Gestor
um Comitê Gestor, que terá as seguintes atribui- seis representantes de entidades da sociedade
ções: civil, de caráter nacional, a serem selecionadas
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75
o sumário

segundo critérios objetivos previamente defini- Art. 8o As despesas decorrentes da execução


dos em ato conjunto dos órgãos previstos nos das ações e projetos do Pronacoop Social se-
incisos I a VI do caput. rão custeadas pelas dotações orçamentárias da
União, consignadas anualmente nos orçamentos
§ 2o O Comitê Gestor será coordenado pela Se- dos órgãos e entidades envolvidos no Programa,
cretaria Nacional de Economia Solidária do Mi- observados os limites de movimentação, de em-
nistério do Trabalho e Emprego. penho e de pagamento da programação orça-
mentária e financeira anual.
§ 3o O regimento interno do Comitê Gestor dis-
porá sobre sua organização e funcionamento, Parágrafo único. As despesas necessárias ao
e será aprovado pela maioria absoluta de seus funcionamento do Comitê Gestor serão custea-
membros e publicado por portaria do Ministro de das por dotações orçamentárias consignadas no
Estado do Trabalho e Emprego. orçamento do Ministério do Trabalho e Emprego.

§ 4o O Comitê Gestor poderá convidar represen- Art. 9o Este Decreto entra em vigor na datada de
tantes de outros órgãos e entidades públicas ou sua publicação.
instituições da sociedade civil para participar das
reuniões.

§ 5o Os membros a que se referem os incisos I Brasília, 20 de dezembro de 2013; 192º da Inde-


a VI do caput e seus suplentes serão indicados pendência e 125º da República.
pelos titulares dos órgãos e designados por ato
do Ministro de Estado do Trabalho e Emprego. DILMA ROUSSEFF

§ 6o Os membros a que se refere o § 1o e seus José Eduardo Cardozo


suplentes serão indicados pelos titulares das en- Manoel Dias
tidades e designados por ato do Ministro de Es- Alexandre Rocha Santos Padilha
tado do Trabalho e Emprego. Tereza Campello
Gilberto Carvalho
§ 7o A participação dos membros do Comitê Maria do Rosário Nunes
Gestor é considerada prestação de serviço públi-
co relevante e não será remunerada.
Anexos
76

Anexo C:
Vale a pena visitar!

Fórum Brasileiro de Economia Solidária


http://fbes.org.br/

Rede de Gestores de Políticas Públicas


de Economia Solidária
http://www.rededegestoresecosol.org.br/

Cirandas Saúde Mental e Economia Solidária


http://cirandas.net/sm-ecosol/

Unisol Brasil
http://www.unisolbrasil.org.br/quem-somos/

Rede de Saúde Mental e Economia Solidária


https://saudeecosol.wordpress.com/tag/ecosol/

Associação Brasileira de Saúde Coletiva


https://www.abrasco.org.br/site/

Associação Brasileira de Saúde Mental


http://www.abrasme.org.br
Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares -
campus Realengo / IFRJ
Contato: itcp.creal@ifrj.edu.br

Endereço: Rua Professor Carlos Wenceslau, 343 - Realengo,


Rio de Janeiro - RJ, 21710-240

1ª Edição: setembro de 2017


Formato: 20,0 x 29,7 cm
Miolo: Papel Offset - LD 90g/m2.
Capa: Papel Triple - LD 250g/m2.
Tipografia: Roboto
Impressão: WalPrint Gráfica e Editora

Projeto gráfico e edição:

www.belcoronel.com.br
Neli Castro de Almeida Ariadna Patricia Alvarez
Carolina Con Andrades Luiz Angela Pereira Figueiredo
Maria Emyllia Poleshuck

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro - Incubadora


Tecnológica de Cooperativas Populares / ITCP - campus Realengo / IFRJ

Apoio

ISBN: 978-85-62109-25-6

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