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Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1990),
em vigor desde 1° de janeiro de 2016.
Os personagens e as situações desta obra são reais apenas no universo da ficção; não se
referem a pessoas e fatos, e sobre eles não emitem opinião.
É proibida a reprodução total e parcial desta obra, de qualquer forma ou por qualquer meio
eletrônico, mecânico, inclusive por meio de processos xerográficos, incluindo ainda o uso da internet,
sem permissão expressa da Editora, na pessoa de seu editor (Lei 9.610 de 19/02/1998).
Anna Julia
Esfrego minhas mãos frias e meus olhos turvam ao encarar a porta
fechada do quarto de Nate. Uma mão delicada pousa em meu ombro e me
viro, encontrando os olhos de âmbar preocupados e inchados de minha mãe.
Por quê? Lhe pergunto com meu olhar. Essa pergunta tem se repetido em
minha mente desde que soubemos, há oito meses, que meu namorado, meu
lindo namorado de apenas dezessete anos, foi diagnosticado com uma
espécie de câncer no intestino. Eu e Nataniel Marshal estávamos
namorando há apenas um ano, embora tenhamos sido amigos desde a
educação infantil. Nossas famílias são amigas muito antes de nosso
nascimento.
Deixo minha mente vagar para longe, para qualquer lembrança dele
e de nosso tempo juntos. Lembranças são tudo que terei a partir de hoje.
— O que é, figlia? — Minha mãe perguntou em tom suave. — Sabe
que pode me contar qualquer coisa, principessa mia. Qualquer coisa.
A encarei, alívio me enchendo por conseguir, enfim, contar para ela.
— Eu acho que estou apaixonada, mamãe. — Murmurei com o
sorriso que era reflexo do amor adolescente crescendo em meu peito. Ela
ficou emocionada por sua garotinha estar se transformando numa mulher.
— Oh, figlia. — Abriu-me um de seus sorrisos lindos e amorosos,
chegando mais perto, me abraçando bem apertado. Suspirei feliz e ela se
afastou para me encarar, sua mão tocando meu rosto com um misto de
orgulho e nostalgia, acho. Ela e meu pai têm reclamado que eu e Lipe
estamos crescendo rápido demais. — Quem é o menino sortudo que ganhou
o coração da minha princesinha?
Sei que já desconfia. As mães não deixam passar esse tipo de coisa
em branco, jamais. Eu ri travessa, dando-lhe um beijo estalado na
bochecha.
— A senhora já sabe, mãe. É Nate. — Revelei com todo o amor se
espalhando dentro de mim.
Seu rosto mostrou sua satisfação imediatamente. Nataniel Marshal
é o neto do presidente Jonathan Marshal. Eu e Lipe crescemos em muita
proximidade com os Marshal de Washington, D.C. desde que meu pai
apoiou a campanha do primeiro Marshal para a presidência dos Estados
Unidos. O primeiro perdeu as eleições, mas seu outro irmão ganharia anos
depois, há três anos para ser exata, também com o apoio de nossa família.
Esse é o avô do meu Nate.
— Oh, bambina… — A voz terna de minha mãe soou meio
embargada. — Ele é um bom menino. Eu e seu pai aprovamos, tenha
certeza.
Fiz careta.
— Ele ainda não sabe que me sinto assim, mãe. — Resmunguei,
angustiada por ainda não ter tido coragem de falar para meu melhor
amigo sobre meus sentimentos.
Ela veio para mais perto, recostando-se contra os travesseiros da
minha cama, puxando-me para os seus braços novamente. Eu ri, adorando
ser mimada.
— Eu acho que ele já sabe, querida — murmurou, beijando meus
cabelos.
Levantei o rosto para ela, alegria me invadindo.
— Acha mesmo, mãe? Será que vai me pedir em namoro logo? —
Cerrei o cenho. — Eu não aguento mais esperar.
Isso a fez rir.
— Ele não vai demorar, se for o menino inteligente que acho que é.
— Um sorriso brincou na minha boca, apreciando suas palavras. — Mas
não fique ansiosa, viva cada momento dessa fase tão bonita, figlia. O
momento de vocês vai chegar, não o apresse. Tudo a seu tempo, tesoro mio.
— Grazie, mamma — sussurrei, olhando-a com adoração. Seus
olhos brilharam por eu usar sua língua materna.
— Você está se tornando uma mulher tão bonita, querida. —
Acariciou minha face, seus olhos transbordando. — Tua mamma ti ama
tantissimo.
Meus olhos marejaram também e me enrolei mais em seu colo.
Felicidade imensa me invadia naquele momento.
— Also, mamma.
Eu tinha apenas quatorze anos quando me descobri apaixonada pelo
meu melhor amigo. Mas minha mãe estava certa, meu tempo e de Nate
chegou dois anos depois, quando começamos a namorar oficialmente. Foi o
ano mais feliz da minha vida, sem sombra de dúvidas. O menino mais
bonito da escola me amava e eu o amava. Nos tornamos um só. Foi lindo.
Tudo que vivi ao lado dele ficou gravado em meu coração. Nosso primeiro
beijo, nosso primeiro encontro, nossa primeira noite de amor. Nossa única
noite de amor. Se eu fechar os olhos, ainda consigo sentir tudo, cada
emoção, o calor em seus olhos azuis quando me fez sua. Minha pele
ganhando vida, meu corpo pulsando nas emoções novas e arrebatadoras que
ele me fez sentir. Ali prometemos pertencer um ao outro, para sempre.
O menino loiro com os mais lindos olhos azuis cristalinos foi meu
amigo, meu amor. Porém, não sabíamos que o nosso para sempre seria
breve demais. Apenas dois dias depois que lhe entreguei a minha
virgindade, Nate passou mal e foi levado às pressas para o hospital. A partir
daquele dia, travou uma batalha dura e desleal contra um câncer muito
agressivo. Em poucos meses, nosso inimigo foi minando sua resistência e
forças, até que veio o veredito final: meu namorado não se recuperaria, a
doença o havia tomado por inteiro. Lhe restariam, no máximo, dois meses
de vida.
Suspiro tremulamente, meu coração esmagado pela certeza cruel de
que ele está morrendo lá dentro. Nunca mais o verei, tocarei seu rosto,
sentirei seu cheiro, sua pele quente na minha. Nunca mais o ouvirei
sussurrando que me ama, descrevendo como será o nosso casamento.
Nossos sonhos nunca se concretizarão por um golpe perverso de Deus. Eu
odeio Deus neste momento!
— Anna? — A voz tensa de meu pai me faz olhar para meu outro
lado. Ele está com os olhos vermelhos, a exemplo de minha mãe, aliás,
como todos nesta antessala. Todos que vieram dar seu último adeus a Nate.
— Ele está chamando por você, filha.
Eu volto das minhas lembranças e olho para a porta. Os pais e o
irmão mais novo de Nate estão saindo. Eles são a imagem da devastação. A
mãe chorando, amparada pelo marido, e o caçula de dezesseis anos está
com o olhar mais perdido que já vi em seu rosto. Buscando forças não sei
de onde, me levanto para me despedir do menino que sempre irei amar, não
importa o que aconteça. Meu pai me ajuda chegar até a porta, mas antes de
me deixar entrar, me puxa contra seu peito. Um soluço desconsolado
irrompe da minha garganta.
— Nós estamos aqui fora, princesinha. — Sua voz tem o tom mais
triste que ouvi vindo dele. Sinto seu beijo carinhoso em minha têmpora.
— Obrigada, papai — murmuro, entalada, levantando meus olhos
para os seus.
Não gosto de ver meu pai triste. Ele é a pessoa mais divertida e
otimista que conheço. Sua expressão feroz me diz que ele faria qualquer
coisa para não me ver nesta situação. Todavia, não há nada que um de nós
possa fazer. Eu só posso ir para Nate e passar suas últimas horas ao seu
lado.
Antes de eu entrar, há uma comoção na entrada da antessala. Arrasto
minha atenção para lá e mais lágrimas enchem meus olhos ao ver que é o
restante da minha família. Ella está correndo para mim, sem se preocupar
com o decoro. Assim que sou envolvida no abraço da minha querida prima,
mais soluços me escapam. Eu os forço a cessar, no entanto, não posso
perder o controle agora. Nate não pode me ver destruída dessa forma. Ele
verá minha melhor versão. Lhe darei isso. Me afasto suavemente de Ella.
Seus grandes olhos verdes estão inchados e vermelhos também. Ela segura
minhas mãos, dando um aperto suave, me passando força silenciosamente.
— Estou aqui, principessa mia — murmura, se inclinando e me
beijando com ternura no rosto.
— Grazie, carissima — digo embargada.
— Vá. — Me diz com mais um aperto em minhas mãos antes de me
libertar.
Eu encaro minha família, um a um. Minha mãe e Lipe estão
abraçados, fungando. Meus tios e padrinhos Leon e Júlia, Dam e Max me
dão olhares consternados. Tio Jay, tia Cassie, Mike, Luc, Samu, Sam e Em
me encaram da mesma forma, com profundo pesar. Consigo formular um
pequeno sorriso triste. Eles vieram. Sei que esta noite mudará o resto da
minha vida, mas é reconfortante saber que a minha família inteira está aqui,
para mim.
Então, me viro e entro para enfrentar a crueldade que o destino me
reservou. O barulho do bip da máquina ligada ao corpo de Nate é baixo,
porém, com o silêncio, ele reverbera no ambiente. Respiro fundo e ajeito
meu vestido, o mesmo que usei em nosso primeiro encontro como
namorados oficiais. Ele pediu que eu o vestisse. É em cetim vermelho,
tomara que caia, a saia rodada, alguns centímetros acima do joelho. Ele ama
me ver de vermelho. Fiz cabelo e maquiagem para que meu amor me visse
do jeito que ele gosta. Quando levanto meu olhar, já o encontro me olhando.
Seu físico em nada lembra o vigor que tinha antes. A maldita doença o
devorou. Dói muito vê-lo assim; sua cabeça, antes coberta com os
abundantes cachos loiros, agora é careca; suas bochechas, outrora coradas,
estão ocas, a pele sem vida.
Me resigno a guardar todas essas observações e revolta para mim
mesma. Quando soubemos, há dois meses, que não tinha cura, eu
enlouqueci. Briguei muito com Deus, principalmente. Nunca entenderei ou
aceitarei a razão disso. Nunca. Porém, percebi que meu estado de tristeza e
lamentação estava deixando Nate pior. Foi aí que engoli tudo o que penso e
decidi fazer os últimos sessenta dias serem memoráveis para ele. Eu
comprei ingressos para vermos os Knicks, seu time de basquete preferido,
jogarem no Madison Square Garden. Fomos com dois enfermeiros para
garantir, mas eles ficaram longe, nos dando privacidade. Emma, sua mãe,
me apoiou em tudo que fiz nesses dois meses para fazer o nosso menino
feliz.
O levei para um musical na Broadway. Fechei um cinema só para
nós quando estreou a sequência de Velozes e Furiosos, que ele ama. Há duas
semanas foi o baile da nossa turma e eu chamei todos para cá, ocupamos
um dos salões no piso inferior e trouxemos a festa até ele. Me permiti ser
feliz naquela noite. Nate já estava bem debilitado, só que fez questão de
usar um smoking e eu me vesti com esmero para ser seu par, como havia
sonhado desde o primeiro ano. Dançamos a nossa música quase inteira e
parei para não o cansar muito. Ele dormiu com o mais lindo sorriso no rosto
naquela noite.
Nesse meio-tempo, Nate desenvolveu o hábito de escrever. Ele não
me deixou ver nada, disse que são cartas. Vai me entregar quando se for…
infelizmente, o momento está se aproximando. Forço um sorriso no rosto ao
vê-lo sorrindo. A luz está se apagando pouco a pouco dos seus olhos azuis,
contudo, ele ainda quer parecer bem para mim. Eu giro no meio do quarto,
dando-lhe a completa visão da minha produção. Sua risada fraca logo se
transforma em tosse. Corro, colocando-me ao lado do leito. É um lugar
espaçoso. Pedi à equipe que o providenciasse para que eu possa dormir
aqui, para estar o mais próxima dele, tanto quanto for possível. E o fiz por
todas as noites desde o veredito final.
— Linda… — Diz baixinho, rindo da sua própria crise de tosse.
Meus olhos marejam testemunhando sua força, seu bom humor, mesmo
tendo sido vencido pelo inimigo letal. — Estava com saudades… da minha
garota. — Completa.
Pego sua mão direita, livre da intravenosa, sentindo um choque. Sua
mão parece ainda mais fria do que a minha. Levanto-a até a minha boca e
deposito um beijo reverente. Ele sorri sem som, os olhos ganhando um
pouco do brilho que costumava ter quando me olhava.
— E eu do meu garoto. — Digo, tentando não tremer, não
desmoronar e cair chorando aos pés da cama com a injustiça disso tudo.
Brinco: — Se afaste para o lado, seu folgado. Me deixe deitar aí também.
Sou recompensada quando sua risada soa baixa, mas limpa e feliz,
seus olhos vivos para mim.
— Não pense que será.… Tão fácil se deitar comigo, gatinha. —
Brinca também. — Olhe no criado-mudo, Anna.… Comprei algo para você.
— Hum.… Um presente, Sr. Marshal? — Sorrio-lhe e ele me
encoraja, inclinando a cabeça em direção ao criado-mudo. Me viro e vejo
uma caixa retangular de veludo preto. — Para mim? — Continuo
descontraindo. Ele me olha com um sorriso suave enquanto pego a caixa e a
abro. Não consigo segurar as lágrimas ao ver a delicada corrente de ouro
com um camafeu aberto. Nossas fotos estão lá, lado a lado. Esta tiramos na
noite em que fizemos amor. Vê-lo como era, lindo, vivaz, quase faz minhas
pernas fraquejarem. Respiro fundo e a retiro com cuidado da almofada.
Levo o colar até seu campo de visão para que aprecie também.
— Coloque-o, princesa — murmura, com emoção marcando as
feições magras. Eu o faço com cuidado e fico um instante admirando o
camafeu antes de fechá-lo. Sua mão pega a minha e está inexplicavelmente
mais quente. — Lembre-se de mim, Anna.
— Sempre, meu amor. Sempre — prometo-lhe.
— Agora, venha aqui comigo, gatinha. — Me chama e sorrio, me
sentando e retirando minhas sandálias de salto alto. Me deito ao seu lado e
nos aconchegamos. Ficamos um tempo em silêncio apenas sentindo o
momento. Fico atenta ao som da sua respiração, no entanto. — Eu amo
você, Anna.
Levanto o rosto do seu ombro e encaro seu rosto de perto. Seus
olhos recuperaram de alguma forma o brilho e vivacidade perdida nesta
última semana. Sua expressão está serena, feliz. Sempre será uma incógnita
para mim a maneira como esse menino lidou dignamente com a doença
desde o princípio. Houve alguns poucos momentos em que ele chorou e
reclamou, mas, depois, Nate aceitou e lutou o quanto pôde. Na verdade, ele
ainda está lutando. Esse brilho em seus olhos e suas mãos quentes são mais
um presente para mim.
— Eu também te amo, Nate. Para sempre. — Me inclino,
depositando um beijo suave em seus lábios ressequidos e sem cor.
— Não, princesa — sussurra, pegando minha mão, mas está sem
forças para entrelaçar nossos dedos, então o faço. — Você vai usar esse
colar até encontrar um cara que mereça seu coração, ent…
— Não, por favor, pare. Não quero ouvir isso — reclamo.
Nessa semana, Nate começou com esse papo esquisito de que devo
seguir em frente depois que ele partir. Não consegue ver como o amo? Que
meu coração jamais baterá por outro homem?
— Então, você irá tirá-lo e guardar. — Continua como se não
tivesse sido interrompido. Sua mão vem para o meu rosto e eu a seguro,
beijando a palma. Toco seu rosto também. Seus olhos se fecham e sua
respiração fica um pouco irregular quando retoma, voltando a me fitar: —
Nós cumprimos nosso tempo juntos, minha princesa. — Meu coração
aperta, lágrimas brotando dolorosamente em meus olhos. — Você é a
melhor garota que um cara poderia querer, Anna. Você é especial demais
para acabar sozinha. — Abro a boca, mas seus dedos pousam em meus
lábios. — Não discuta comigo, pare de ser encrenqueira. — Brinca, mas
posso ver a seriedade em seu semblante. — Você me fez plenamente feliz,
Anna. Nosso tempo juntos como amigos e, depois, esse um ano e oito
meses de namoro foram incríveis.
Eu não seguro mais e choro, meu rosto sendo queimado pelas
lágrimas. Eu daria qualquer coisa, qualquer maldita coisa para não o perder.
— Eu tive você… Eu tive o seu amor. — Sua voz começa a ficar
pausada e cansada de novo. Não o interrompo porque sei que ele precisa
falar. Essa pode ser nossa última conversa. — Há muitas pessoas que vivem
cem anos e não encontram metade do que vivi com você.
Assinto, vencida pelo seu último argumento. Nós fomos felizes,
mesmo que em pouco tempo juntos. — Me prometa que.… Vai viver,
princesa. — Sua voz é apenas um sopro agora. Percebo que ele estava
bancando o durão desde que entrei.
— Sim, sim, prometo qualquer coisa. — Me inclino, beijando sua
boca com ternura. — Agora descanse um pouco.
Ele ousa sorrir. Esse garoto…
— Ben vai lhe entregar as cartas que escrevi para você, gatinha. —
Refere-se ao seu irmão mais novo, Benjamim. — Prometa que o chamará
de vez em quando.… Para saber como o bobalhão está?
Assinto, minha garganta tampada. Eles são muito unidos, como eu e
Lipe. Ben irá sofrer muito, isso é certo.
— E sua mãe também. — Complemento, poupando-o de ter que
falar. — Seu pai é o único que saberá lidar com isso, é mais forte.
Ele assente, seus dedos suaves em meu rosto.
— Como já disse… A melhor garota. — Sussurra, seus olhos presos
aos meus. — Agora, sobre o colar.… Prometa-me.
Rolo os olhos, sabendo que não vai sossegar enquanto eu não
concordar.
Tranquilizo-o, mesmo sabendo que jamais darei meu coração a
outro:
— Prometo. — Digo baixinho. Ele suspira, relaxando um pouco.
— Viva, meu amor. Viva plenamente. — Me diz e depois se cala.
Fica me encarando e eu a ele. Gravo cada tonalidade de azul que há em seus
belos olhos na memória.
— Eu amo você, Nataniel Marshal — digo-lhe, minha voz tremente.
— Haja o que houver, você nunca sairá do meu coração.
Nate sorri e suas pálpebras se fecham devagar. Fico vigiando seu
sono. Não vou nem mesmo ao banheiro por medo de ele ir sem que eu veja.
São quatro da manhã quando sua respiração para. Não pude ver seus olhos
abertos de novo. Ele se foi enquanto dormia, seu rosto sereno, como se
tivesse cumprido sua missão na Terra. Pensei que gritaria, faria um
escândalo quando o temível momento chegasse. Mas não, eu cobri seu rosto
de beijos e chorei silenciosamente, sentindo meu coração explodir de tanta
dor em meu peito.
Um mês depois…
Eu rolo na cama, acordando imediatamente ao som de… Hey DJ, de
CNCO? Me sento e esfrego os olhos, vendo minha prima Ella perto do meu
home theater, em seguida aperta o controle remoto, fazendo as cortinas do
meu quarto se abrirem.
— Ei! — Reclamo da claridade. — Quer fechar as malditas cortinas,
prima?
Ela não mostra abalo, embora eu saiba que está preocupada com
meu estado aqui, enfiada no quarto desde o enterro. Meus pais vêm e vão,
Lipe também. Ninguém consegue me convencer a sair daqui. Ella, por sua
vez, se recusou a voltar para Ardócia enquanto eu não reagisse. A encaro
com desagrado enquanto tira um papel do bolso do short.
— Nate me deixou uma carta também, com algumas instruções para
o dia de hoje… Ele sabia que você iria dificultar as coisas, prima. — Isso
me faz ficar de pé em cima do colchão, me recordando que é hoje o dia da
abertura da primeira carta. — O volume está agradável? Será que devo
aumentar um pouco mais?
Estreito meus olhos sobre a minha prima. Ella parece doce e
sensível, mas não se enganem com a sua carinha de boneca. Bufo, pulando
da cama. Ela ousa sorrir, satisfeita. Corro até minha gaveta de joias em meu
closet e pego a caixa contendo todas as cartas de Nate, que Ben me
entregou após o enterro. Localizo o envelope com a data de hoje e o abro,
minhas mãos trêmulas, meu coração voltando a bater acelerado.
Oi, princesa.
Você deve estar puta com Ella, não é? Eu sabia que você iria ficar
esse tempo jogada na cama, estava escrito em seu rosto, mesmo que
tentasse parecer forte. Entendo, gatinha. Por isso, escrevi uma carta para
Ella também, com algumas instruções bem específicas para arrancá-la
desse quarto.
Não pense que pode me fazer promessas e depois fugir delas, Anna.
Tire sua bunda preguiçosa da cama e vá cumprir tudo, garota! Aposto que
essa é a primeira vez que está ouvindo sua banda preferida desde que parti,
não é?
Droga, agora? Ele quer que eu cante agora? Esse menino… Eu não
sei se consigo, não posso. Meus olhos se enchem de lágrimas doloridas.
Estou morrendo por dentro. Encaro minha prima, que está com um sorriso
suave e lágrimas nos olhos. Ela começa a puxar o refrão e a porta se abre,
Sam e Em passando para dentro. Meus olhos transbordam e torno a olhar
para Ella, vendo o seu amor por mim. Sua persistência em me tirar da
tristeza. Então, eu faço a única coisa que posso fazer pelo meu Nate, por
ela, pela minha família, ignorando a dor em meu coração, eu canto!
(...) Hey, DJ! Toca a música que ela gosta. Uma para que ela se mexa e
arrase e dance comigo, apenas comigo, ei! [1](…)
***
Kamar – Sudoeste da Ásia, nove anos antes.
Karim Amihaj
Eu sigo pelo corredor até o quarto de Ayla. Estou no piloto
automático, ainda anestesiado, sem acreditar que tamanha tragédia tenha se
abatido sobre mim, sobre nós. As babás aparecem em meu campo de visão
quando entro no aposento. Suas feições estão devastadas, olhos inchados.
Murmuram suas condolências e abaixam as cabeças em respeito, se
retirando do meu caminho em seguida.
Yasmina era muito amada por todos os nossos funcionários. Meu
peito aperta dolorosamente, minha linda princesa se foi. Sem aviso, da
forma mais estúpida possível. Acabo de voltar do local do desastre. O jato
real caiu nas cadeias rochosas da nossa fronteira com o Catar, matando a
minha esposa junto com a comitiva de oito funcionários que a
acompanhava. O acidente foi ontem e ordenei as buscas imediatamente, na
esperança de encontrá-la com vida. Todavia, para meu desespero, não
encontraram ninguém vivo. A aeronave ficou destruída pelo impacto contra
as rochas. Não houve chances para quem estava a bordo. Os corpos foram
bastante machucados, mas foi possível reconhecê-los. Graças a Allah o
avião não explodiu, nos tirando o direito de preparar nossos mortos e lhes
dar um enterro mulçumano digno.
Yasmina estava indo me representar em um evento oficial na capital
daquele país, uma vez que tive outro compromisso com os chefes das nove
tribos do nosso emirado. Fui inserindo minha esposa pouco a pouco na
agenda real, mesmo contra as convicções arcaicas de meu tio, o grão-
vizir[2]. O mundo árabe está se modernizando e algumas princesas e rainhas
já possuem grande notoriedade no cenário social e político, inclusive. Ela
estava tão feliz que começou a participar de eventos sem a minha presença,
ganhando cada vez mais confiança, mostrando que era capacitada para
reinar ao meu lado, quando chegasse a hora. Após a morte de meu pai, há
três anos, seu irmão mais novo, Jafar, tem me ajudado a governar, mas as
nove tribos não têm facilitado a minha vida, vetando as mudanças que
preciso introduzir para que meu país consiga fazer frente ao Catar e
Emirados Árabes Unidos, nossos vizinhos e concorrentes.
Respiro fundo, me aproximando do berço da minha filha. Uma
confusão de sentimentos fervilhando dentro de mim. Ainda não chorei. Em
minha posição, um homem não pode demonstrar fraqueza para o público,
mesmo se estiver perdendo o amor de sua vida.
Ayla está adormecida, seu rostinho tranquilo, não tendo ideia de que
sua mãe nos deixou para sempre. Apoio as mãos na borda do berço,
sentindo o peso da perda caindo sobre meus ombros. Me permitindo sentir
agora, em privado. Meus olhos correm pelo corpinho envolto numa manta
dourada. Estendo a mão direita, tocando os cabelos negros e macios, as
bochechas e lábios rosados, uma miniatura de minha mãe. Aos dois anos já
dá para ver como herdou os traços belos e delicados da avó. O aperto vai se
intensificando até que não consigo mais fingir que não estou morrendo
também. As lágrimas queimam meus olhos e as deixo cair, apenas aqui, na
presença da nossa princesinha. Como iremos nos recuperar disso, não tenho
ideia.
— Ela se foi, nour hayati[3]. — Digo embargado. Minha pequena se
remexe, choraminga, como se ouvisse, mesmo no sono, que sua mãe nunca
mais estará conosco, não nesta vida, pelo menos. Meu rosto é coberto por
lágrimas quentes. Eu sei que reencontrarei o meu amor no paraíso, mas isso
não ameniza em nada a minha devastação nesse momento. Saber que nesta
vida não a terei mais em meus braços, não beijarei seus doces lábios, não
terei mais seu corpo acolhedor, sua paixão, me traz a certeza de que, de
certa forma, estarei morto junto com ela. — Eu vou te proteger, ‘amirat
saghira[4]. Vamos passar por isso. Ainda não sei como, mas lhe prometo que
o faremos.
Me debruço beijando sua cabecinha e me deixo cair, escorregando
sentado no piso, as costas apoiadas nas grades intrincadas do berço. Coloco
meu rosto entre as mãos e choro copiosamente. Nossa vida juntos, nossa
breve vida juntos, espocando em minha mente. Eu a conheci a vida inteira.
Yasmina é filha de uma das nove tribos influentes em nosso reino. Nunca
fomos exatamente amigos, no entanto, sempre nos víamos quando eu
acompanhava meu pai em suas reuniões com os clãs tribais no deserto. Fui
estudar na escola secundária e superior na Inglaterra e, ao retornar, já
homem formado, sete anos depois, vi a moça linda que a tímida menina
havia se transformado e me apaixonei. Na verdade, Yasmina sempre me
encantou de alguma maneira quando éramos crianças. Eu a quis para mim e
comuniquei meu desejo ao meu pai. Sua tribo ficou em festa ao saber da
minha intenção de tomá-la como minha princesa.
Fecho os olhos, ainda posso lembrar exatamente a expressão em seu
rosto bonito quando lhe disse que iria me casar com ela. Primeiro ficou
branca como papel, depois vermelha. Então, gaguejou e não conseguiu me
dizer muita coisa naquela noite. Linda. A cortejei usando as artimanhas que
havia aprendido na cultura ocidental, mas nunca deixando de lado nossos
costumes. Ela amava o deserto, como eu. Cavalgar era um de seus hobbies
favoritos, como eu. Como farei isso sem ela ao meu lado de agora em
diante? Nosso noivado durou quatro anos e nos casamos há três. Ela
engravidou no primeiro ano, graças a Allah, ou agora não teria nada dela
para me confortar e seria mil vezes pior. Olho através das portas abertas da
grande sacada, avistando as luzes brilhantes da nossa capital Jawahra. Ela
amava essa vista através dos dez quilômetros de deserto.
Mandei construir esse palácio para podermos nos refugiar da
agitação urbana e Yasmina adorou. Meu peito comprime, soluços
derrotados vibrando em minha garganta. Torno a fechar os olhos, a imagem
dela no nosso último passeio, há dois dias, antes de ela se preparar para a
viagem da qual não mais voltaria.
— Amihaj! Vem, habib![5] — Gritou eufórica por cima do ombro. O
véu azul voando enquanto incitava sua égua à minha frente num de seus
galopes atrevidos. Os raios do sol poente fazendo um jogo de luzes na
pequena faixa de cabelos negros, aparentes através do véu.
Era o único momento em que perdia completamente sua timidez,
quando estava em cima de um cavalo, talvez pela sensação de liberdade
que a atividade traz.
Eu ri e a segui com o meu garanhão negro, competindo, livres,
como sempre adoramos fazer. Cavalgamos na direção do pequeno oásis,
onde gostávamos de parar à sombra das tamareiras e damasqueiros, que
ela mesma plantou quando lhe mostrei o pequeno pedaço do paraíso. A
ultrapassei e comecei a descer a duna, avistando a pequena porção de
água e verde em meio ao mar de areia.
— Vem, habibti! — A provoquei, olhando por cima do ombro. Ela
abriu o sorriso mais luminoso e tornou a incitar a égua.
Em poucos minutos, estávamos desmontando e deixando os cavalos
às margens das águas plácidas. Nós espalhamos os cobertores e nos
amamos enquanto a noite engolia o dia. Ficamos pelo que pareceram horas
em silêncio, nus e entrelaçados.
— Estava com saudades disso, ser sua em nosso lugar especial —
murmurou contra o meu peito, levantando o rosto para o meu. Eu a
aconcheguei mais contra mim, inalando o perfume de seus cabelos, sua
pele.
— Nour hayati… — Sussurrei reverente, traçando seu rosto com os
dedos, tão apaixonado como no dia em que regressei e a vi no oásis, perto
das terras de sua tribo. — As coisas andam agitadas, mas é só até eu
conseguir a aprovação dos clãs para a construção do complexo hoteleiro.
Temos que tomar como exemplo o progresso do nosso vizinho Catar.
— Você irá conseguir, amiri[6]. — Disse suavemente, os dedos
fazendo carícia em meu peito. — Meu pai está convencendo os outros,
conte com ele.
— Eu sei, princesa. — Assenti. — Sei que com ele posso contar,
porém, entre as outras tribos há líderes que preferiam meu tio governando
em vez de mim. Eles estavam esperando uma virada como na Arábia
Saudita. Isso está ficando cada vez mais claro.
Seu rosto ficou contrariado. É a verdade, todos nós sabíamos que os
clãs estavão instáveis e divididos desde a morte de meu pai. Eles não
aceitavam principalmente que eu, um príncipe árabe, tivesse recebido
educação ocidental e, além disso, que tentasse implantar algumas ideias
progressistas por aqui. São apegados demais às tradições e não aceitam as
mudanças sem muito debate.
— Você é o príncipe de Kamar, Amihaj, o legítimo herdeiro do trono
— disse-me com ferocidade. — E é só a você que as tribos devem lealdade.
Eu sorri, felicidade não cabendo em mim. Minha linda, amada e
leal princesa.
— Te amo, ‘amira[7]. — Murmurei, puxando-a para cima de mim.
Ela sorriu alto, feliz, seus longos cabelos fazendo uma cortina ao redor do
meu rosto. — Eu nunca poderia encontrar melhor mulher para ser a minha
rainha.
Seus olhos escuros amoleceram, brilhando de lágrimas, de amor.
— Te amo, Amihaj — sussurrou emocionada. — Eu nunca entendi
bem o que um príncipe viu em mim…
— O príncipe viu a sua princesa, sua futura rainha, a mulher que
irá governar e envelhecer ao seu lado. — Confidenciei-lhe, como fiz nas
muitas vezes em que levantou essa questão.
— Amiri… — Me fitou com tanto amor. Eu mergulhei minha boca
na sua, tendo a certeza de que fiz a escolha perfeita.
Nenhuma mulher faria meu coração bater da forma que ela faz.
Apenas ela, a minha escolhida. Em nossa região não é comum casamentos
por amor, mas nós conseguimos isso, nos unimos por amor. E será assim
até ficarmos velhinhos.
As coisas esquentaram e nos amamos mais uma vez antes de
levantar acampamento de volta ao palácio. Yasmina parecia uma criança
enquanto disputávamos uma corrida por todo o percurso de retorno. Feliz,
uma luz resplandecendo e irradiando por toda ela.
Jantamos com meu tio Jafar, que aproveitou para me dizer que os
clãs solicitavam uma reunião para o dia seguinte. Estava pretendendo ir
com Yasmina para Doha, levaríamos Ayla e passaríamos uns dias em
algum resort, depois do meu compromisso oficial, só nós três. Todavia,
ultimamente estou tendo que aparar muitas arestas e conter os ímpetos dos
chefes tribais. Meu pai governava mais no deserto do que em seu palácio e
eles parecem esperar que eu siga esse modelo de gestão. Mesmo frustrado,
concordei em atender os clãs. Meu nome precisava ser fortalecido e
conseguiria pontos com eles recebendo-os, mesmo que a solicitação tivesse
chegado tão em cima da hora que beirava o desrespeito. Pedi a eles que
agendem suas demandas, pelo menos, com uma semana de antecedência de
agora em diante, exceto por situações emergenciais.
Preciso do seu apoio, no entanto, me recuso a me tornar refém dos
caprichos daqueles homens. Há uma grande diferença entre um príncipe
ser acessível ao seu povo e se deixar fazer de idiota por esse mesmo povo.
— Os líderes apreciarão sua ação de boa vontade, amiri. — A voz
de meu tio é neutra e isenta de emoção, uma característica dele.
Ele tem sido leal a mim, porém. Meu pai confiava no irmão
cegamente e me disse em seu leito de morte que eu teria sua lealdade
também. Acreditei nisso, embora alguns clãs estejam mostrando uma
deferência exacerbada ao meu grão-vizir. Confio nele, todavia, não
cegamente como meu pai. A casa real da Arábia Saudita se transformou em
um campo minado e não quero isso em minha casa. Meu desejo é unir as
tribos de tal forma que nunca mais se separem. E para isso preciso de
tempo, que, por sua vez, só será concedido por meio da confiança dos
chefes.
— Estou contando com isso, tio. — Assenti, encarando-o
firmemente. Meu tio é um homem duro, muito diferente de meu pai. Jamais
senti nada remotamente parecido com carinho vindo dele enquanto crescia,
muito menos agora que sou homem com minha família se formando. Mas
foi o braço direito de meu pai e agora o exerce com a mesma dedicação a
mim.
— Peça desculpas ao governante de Doha e diga-lhe que enviará
presentes. — Meu tio orientou, seu rosto uma máscara de pedra. — Não
mencione a reunião com as tribos. Eles podem pensar que há algo errado
por aqui para você desmarcar um compromisso diplomático.
Ele tinha razão. Nossos vizinhos são como tubarões, sempre
procurando o menor vestígio de sangue, porque onde há sangue certamente
há uma ferida. E, aí, não há paz relativa que os segure. O Oriente Médio é
um barril de pólvora que oscila entre períodos de acordos de paz bem-
sucedidos com períodos sangrentos.
Porém, estou atrás de um novo tempo. Eu olhei de lado, para a
minha esposa, pegando sua mão e beijando seus dedos amorosamente antes
de dizer com convicção:
— Yasmina irá me representar, tio. — Minha princesa arregalou os
olhos, surpresa e felicidade tingindo seu rosto bonito. — Ela está
preparada para representar a casa de Kamar.
— Meu senhor, não acho sábio enviar uma mulher como
representante em um evento de tal porte…
A observação antiquada de meu tio me fez desviar a atenção para
ele de novo. Não consigo conter meu desagrado. As palavras mais iradas
me vieram à cabeça, mas as contive, não as deixando sair, pois, lhe devo
respeito pela idade e parentesco.
— Com todo respeito, tio, não estou enviando qualquer mulher.
Estou enviando a futura rainha de Kamar — retruquei firmemente.
Vi um brilho de desagrado, bem rápido passando em seus olhos
escuros, no entanto, ele assentiu e curvou a cabeça.
— Como queira, amiri. — Disse em tom baixo e voltou a comer.
Yasmina estava me olhando com adoração quando tornei a encará-
la. Terminamos o jantar e, depois de passar nos aposentos de nossa
princesa, fomos para os nossos. Ela andou linda à minha frente, sua túnica
bege com detalhes dourados tremulando atrás. Nos servi duas taças de
vinho de tâmara e a segui até nossa imensa sacada. Ela ama essa vista.
Daqui podemos ver quase toda a extensão do reino, principalmente as luzes
de nossa capital. A abracei por trás e lhe entreguei sua taça. Ela suspirou
profundamente e ficamos tomando a bebida em silêncio, observando nossos
domínios.
— Eu vou honrar nossa casa, amiri — sussurrou, virando o rosto
para mim. O amor que sempre vejo em seus olhos me faz sentir o homem
mais realizado do mundo.
Eu sorri, me inclinando e depositando um beijo suave em sua boca.
— Eu sei que sim, ‘amira. — Ela girou em meus braços. Sorrimos
depositando as taças sobre o topo da balaustrada de concreto. Aprofundei
o beijo, segurando seu rosto dos lados, meu desejo reacendendo. — Você
me quer de novo, habibti?
Ela ficou vermelha. Minha esposa é tímida e, mesmo com três anos
de casados, ainda cora quando a chamo para fazer amor.
— Sempre, habib. — Sorriu encabulada, mas a felicidade cintilando
em seu olhar. — Sempre irei querê-lo.
Eu a levantei nos braços e voltei para dentro dos nossos aposentos.
Uma certeza tão grande de que ficaremos juntos pelo resto da vida
borbulhando em mim. Ela irá me dar mais uns dois filhos, já discutimos e
planejamos tudo. Allah irá nos manter juntos. Para sempre.
Eu pisco, voltando das lembranças felizes, as lágrimas ainda caindo.
As luzes de Jawahra voltam a tomar minha visão. Não haverá para sempre.
Meu coração dói tanto que fico sem ar.
— Não fisicamente, nour hayati, mas daqui — murmuro, tocando
meu peito esquerdo — você nunca sairá. Eu morrerei te amando. —
Prometo-lhe com toda a convicção do meu coração esmagado.
Fico recostado ao berço de minha filha durante tanto tempo que
acabo adormecendo ali mesmo. Me sobressalto ao sentir uma mão em meu
ombro.
— Amiri, estamos autorizados a iniciar a preparação do corpo. —
Meu tio informa em tom baixo, olhando de relance para minha filha que
dorme no berço.
Eu limpo os olhos imediatamente, lamentando que tenha me
encontrado assim e veja minha tristeza pela morte de minha esposa como
um sinal de fraqueza. Me levanto e me surpreendo ao senti-lo me ajudando
na tarefa.
— Todos estamos devastados, Amihaj. — Percebo um ínfimo sinal
de emoção em seu rosto e voz. — Imagino o quanto está sofrendo agora,
mas ao passarmos por aquelas portas, guarde isso para si mesmo. Não
permita que ninguém veja através da sua dor, amiri. Os impérios são
destruídos assim, em momentos de fragilidade do governante.
Eu quero resmungar, mandá-lo calar a maldita boca, mas ele tem
razão. Haverá inúmeros tubarões no funeral e preciso manter a compostura,
mesmo que também esteja morrendo.
— Shukran[8], tio. — Digo, reunindo todas as forças para soar firme
e neutro, como ele próprio. — Eu devia ter seguido sua orientação e
enviado presentes, em vez disso, enviei minha esposa para a morte.
— Não diga algo assim, jamais, Amihaj! — Ele rebate ainda em
tom baixo para não acordar a princesa. — Foi uma fatalidade, amiri. Não se
culpe.
Não posso evitar, a culpa está me corroendo desde que soube do
acidente. A caixa-preta ainda não foi identificada e estou ansioso para saber
o que aconteceu, pois o jato era novo; foi adquirido há dois anos, apenas.
— Estarei envolvido com o funeral, mas quero que fique a postos e,
no momento que localizarem a caixa preta, me avise.
— Fique tranquilo, meu senhor. — Me diz com seriedade. — Irei
ficar a par de tudo.
— Vou tomar um banho rápido e já seguimos para a mesquita. —
Digo no mesmo tom firme e sério.
Ele me olha como se quisesse dizer mais, só que nada sai. Por Allah!
Nunca vi ninguém tão hábil em questões de Estado e tão incapaz no quesito
pessoal. Ele se curva e deixa o quarto. Olho minha filha dormindo e um
pequeno e triste sorriso curva minha boca. Ela é tudo que me restou de
Yasmina. A beijo uma vez mais e deixo o recinto, o governante de Kamar
assumindo a partir de agora.
Estou terminando de me vestir quando meu celular toca. O pego,
vendo o nome de meu amigo Mike. Suspiro longamente. Ele estará se
casando hoje, em Ardócia, a casa de sua noiva, a princesa Antonella Di
Castellani. Meu amigo carrega o título de príncipe também. Sua história é
surpreendente, era menino de rua e teve a sorte de ser adotado pelo irmão
mais novo do rei da ilha ao sul da Itália. Era para eu e Yasmina estarmos lá,
inclusive. Mike me convidou para ser seu padrinho, e isso me honrou. Fico
com o telefone na mão, retardando atender porque neste momento não sei o
que lhe dizer. Ele está se casando com o amor de sua vida, enquanto estou
perdendo o meu. Fecho os olhos, me recriminando pelo pensamento egoísta
e rabugento. Meu amigo merece ser feliz com sua princesa depois de tantos
percalços em seu caminho.
— Mike. — Cumprimento-o em tom morto.
— Amihaj, tenho tentado ligar o dia todo para saber das buscas…
— Ele pigarreia desconfortável. — Mas acabei de ver pelo noticiário que
não houve sobreviventes…
— Sinto muito, amigo, desliguei meu celular para não enlouquecer
com tantas ligações. — Me desculpo, terminando de ajeitar a túnica sobre o
meu peito, pegando um dos turbantes para cerimônias oficiais. Irei banhar
minha princesa pela última vez e quero me vestir adequadamente para a
função.
— Não, amigo, eu que sinto muito. Sei que não há palavras que
darão conta de amenizar a sua dor. — Posso sentir o pesar em sua voz. —
Mas saiba que pode contar comigo para qualquer coisa, Amihaj. Qualquer
coisa.
— Eu sei, Mike. Shukran, meu amigo. Por favor, dê meus
cumprimentos à Ella e sua família por mim.
— Obrigado, darei sim. Quando voltarmos da lua de mel, iremos
visitá-lo.
— Não, Mike. — Peço rapidamente. — Vou fingir para os outros,
mas para você não. Nos próximos meses, não serei boa companhia para
ninguém, amigo, muito menos para recém-casados. — Posso sentir sua
decepção através da linha. Os ocidentais agem diferente em muitas
situações.
— Amihaj, somos amigos — ele argumenta.
— E continuaremos a sê-lo — garanto. — Estou devastado pela
morte prematura e estúpida da minha mulher, Mike, e não quero ser visto
assim. Preciso de tempo para me recuperar, aceitar os desígnios de Allah e
entender que só a verei de novo no paraíso.
Mike suspira do outro lado.
— Está bem, amigo. Me avise quando poderei vê-lo e à Ayla.
A menção da minha pequena faz meus olhos arderem outra vez, a
emoção ameaçando me dominar.
— Farei isso, amigo. Shukran. Preciso desligar, estou indo preparar
o corpo da minha princesa.
— Vá. Que Deus esteja com vocês. — Ele diz com leve emoção na
voz.
Apesar de ter incorporado o príncipe inabalável de Kamar, quando
entro na sala reservada ao ritual fúnebre na mesquita privada, no térreo do
palácio, não há como não sentir o choque. O corpo sem vida da minha
princesa sobre a pedra de mármore é a visão mais dolorosa que já tive. Me
aproximo, minhas pernas instáveis, meu peito comprimindo de forma
sufocante. As mulheres saem, me dando privacidade. Em nossa religião, é
permitido, ao marido ou esposa, banhar o cônjuge morto pela última vez no
ritual sagrado. A desenrolo do tecido branco e as lágrimas inundam meus
olhos ao ver o corpo todo machucado. Escoriações e feridas feias por todos
os lugares. Ofego ao ver o roxo no pescoço, confirmando o que a equipe de
resgate havia dito, seu pescoço fora quebrado com o impacto. Me conforto
em saber que foi instantânea sua morte, ela não sentiu a dilaceração do
corpo em seguida.
Meu olhar pousa em seu rosto e uma pequena parte do meu coração
se alegra por não haver machucados lá, apenas um leve arranhão na testa.
Sua expressão está tranquila, como se estivesse dormindo. Encaro e recebo
isso como um presente de Allah para mim, me permitindo ver o rosto da
minha princesa como sempre foi: lindo, perfeito. Então, inicio o ritual,
banhando-a três vezes com as essências especiais, livrando-a de todas as
impurezas desta terra. Quando termino, enrolo-a com os tecidos brancos de
algodão, deixando seu rosto de fora. Penteio os cabelos negros, partindo-os
no meio e fico lá, venerando-a, absorvendo cada detalhe pela última vez.
Quando o caixão chega e a coloco gentilmente lá dentro, o
desespero me engolfa. É a despedida final. Toco seus cabelos, não
conseguindo conter as lágrimas diante dos religiosos. É mais do que
consigo suportar.
— Adeus, nour hayati. — Murmuro, lutando para não gritar,
tamanha a dor me dilacerando. — Você viverá em meu coração. Para
sempre.
CAPÍTULO UM
Nova York, cinco anos antes...
“Ser humano é amar. Mesmo quando for demais. Não estou pronta para
desistir.”
(Sia – To Be Human)
Anna Julia
— Uhuuuuuu! — Grito, abrindo os braços, sentindo o vento bater
em meu peito e rosto. Liberdade absoluta! O mundo aos meus pés! Saltar de
paraquedas é uma sensação indescritível. É sério, é maravilhoso. Meu
sorriso amplia, olhando para o lado direito, vendo meu irmão Lipe gritando
também. À minha esquerda, meu pai está num salto duplo com minha mãe.
Ela só salta com ele. Grito mais. Nesses momentos, confirmo que nasci na
melhor família. Aproveito um pouco mais a queda livre e puxo o cordão do
meu paraquedas. O sol está se levantando, lançando seus raios sobre nós, e
eu fecho os olhos por um instante quando o equipamento abre,
estabilizando o salto. Logo estou voando suavemente, a brisa me levando.
Reabro os olhos, apreciando tudo, cada detalhe, cada sensação. É algo que
nunca fica velho. Meu pai ama essa adrenalina e passou para mim e Lipe
também. Eu fui um pouco além, me aventurando nos saltos de bungee
jumping.
Meus pés tocam o chão arenoso e estabilizo o passo habilmente,
ouvindo as exclamações eufóricas de meus pais e irmão. Sim, nasci na
família certa, sem sombra de dúvidas.
— Eu amo fazer isso com vocês! — Digo, me livrando do macacão.
— Você anda preferindo o bungee jumping e nos deixando de lado
— Lipe resmunga.
— Não tenho culpa se sou mais habilidosa e corajosa do que você,
irmãozinho. — Dou de ombros, provocando-o.
— Meu último salto não foi tão ruim assim. — Ele faz carranca, se
livrando do seu equipamento também. Nossos pais estão rindo da nossa
implicância de irmãos.
Eu rio, me rendendo ao charme de seus belos olhos cor de uísque,
herdados de nossa mãe.
— Está bem, fedelho. Não foi nada mal, admito. — Ele abre um
sorriso arrogante, enquanto os ajudantes chegam até nós, começando a
recolher nossos equipamentos.
— Hoje o dia vai ser corrido com todos os preparativos para a
viagem, mas quero almoçar com a minha família. — Os intimo indo para
meus pais, que estão se beijando agora. — Pai, mãe?
Meu pai abre um de seus sorrisos lindos e irreverentes, dando mais
um selinho em minha mãe antes de me dar atenção.
— Concordo com seu irmão, você tem nos deixado pelo bungee
jumping, princesinha. — Ele reclama, mas sua expressão não é tão séria. Eu
rio, abraçando-o, me derretendo quando meus velhos me acolhem em seus
braços.
— Será que o senhor está se tornando um velho reclamão, papai? —
Brinco e ele meneia a cabeça, beijando minha têmpora.
— Você me disse que sou um coroa enxuto, esqueceu? — Seus
olhos verde-escuros no mesmo tom dos meus estão cintilando.
Amoleço. Não é porque é o meu pai, mas ele é o homem mais
bonito para mim. Eu toco seu rosto e me inclino, o beijando na bochecha.
— Pare de querer elogios o tempo todo, senhor Harper. — Rio,
adorando essa camaradagem que tenho com meu pai. — Sabe perfeitamente
que é o homem mais bonito no mundo inteiro.
Seus olhos ficam ainda mais brilhantes e seu sorriso se alarga,
indicando que vem algum de seus comentários espirituosos:
— Bem, é o que sua mãe não cansa de dizer para mim, querida. —
Ele olha para minha mãe e pisca maliciosamente. Ela ri descontraída, os
olhos âmbares muito brilhantes, meneando a cabeça.
— Você precisa parar de inflar o ego de seu pai, bambina. — Se
inclina, me beijando no rosto. — Ele já é impossível por si só.
Todos nós caímos na risada. Eu amo ver a relação de meus pais.
Eles sempre se mostraram dessa forma, apaixonados e felizes enquanto eu e
Lipe crescíamos.
— Temos reunião às dez, podemos marcar à uma? Assim não
chegaremos atrasados. — É Lipe quem informa. Ele está trabalhando com
nosso pai na Harper Technology desde que se formou, há dois anos. Minha
mãe cuida da fundação Anna Harper, criada em homenagem à minha avó
paterna, e de algumas contas especiais que exigem suas habilidades de
diplomata e poliglota. Eu? Não tenho tino para o ramo de negócios de meu
pai. Cursei licenciatura em Letras e depois Fotografia, que sempre foi a
minha paixão desde criança, então, não me encaixo na Harper.
— Claro, maninho. — Assinto e começamos a andar de volta para o
galpão, para trocar nossas roupas.
Alguns minutos depois, tomamos café numa delicatessen próxima
da Harper, onde meu pai e Lipe se despediram para iniciar seu expediente.
— Eu cancelei meu expediente na fundação hoje. — Minha mãe
avisa quando eles se afastam da mesa. — Vou ficar com a minha bambina
até a hora do embarque.
Um sorriso terno se abre em meu rosto. Me deixem mencionar que
minha mãe é a mulher mais linda e amorosa do mundo. Eu amo ser a sua
filha. Estendo a mão sobre a mesa e ela a pega, dando um aperto suave.
Está preocupada com minha viagem para Kamar, por causa de alguns
conflitos que aconteceram no país no começo do ano.
— É seguro agora, mamma, fique tranquila — murmuro e ela
assente. Mas está me enchendo de recomendações desde o momento que
comprei a passagem, no começo da semana.
— Tome cuidado, tesoro, per favore — sussurra com preocupação.
— E quando chegar me ligue imediatamente.
Eu rio, anuindo.
— Prometo, mãe. Vai dar tudo certo, relaxa — digo-lhe com toda a
convicção.
Algumas horas mais tarde, nós almoçamos em um de meus
restaurantes preferidos em TriBeCa.
— Não esqueça de ligar quando chegar, imediatamente, filha. —
Meu pai endossa as recomendações e eu rolo os olhos. — Isso não é
brincadeira, mocinha.
Eu rio alto com sua tentativa de bronca.
— Papai, tenho vinte e quatro, quase vinte e cinco — retruco com
um sorriso malicioso. — Não sou mais uma mocinha faz tempo.
— Bambina… — Minha mãe murmura em repreensão.
Meu velho ri. Eu juro, ele é o pai mais descolado que uma garota
poderia sonhar.
— Certo, mas isso ainda não a isenta de nos dar notícias, princesa.
Não irei ceder nesse sentido.
— Papai e mamãe estão certos, Anna. Não sabemos se realmente é
seguro para estrangeiros entrar naquele país — Lipe endossa, sua cara
incrivelmente séria. Eu suspiro, vencida.
— Está bem, está bem, vocês venceram. Avisarei a todos
imediatamente, prometo.
— Vai levar pelo menos dois seguranças, querida. — Meu pai me
intima.
— Não, papai. Vou com o pessoal da universidade. — Fecho a cara.
— Será extremamente pedante andar com seguranças por toda parte
enquanto o resto da turma são pessoas simples.
— Você é uma princesa de Ardócia, bambina. — Minha mãe
intervém, seu tom muito sério agora. — Não é pedante, são necessidades da
sua linhagem. Eu ficaria mais tranquila se aceitasse pelo menos um.
Meu Deus, eles não entendem que não quero andar como uma
princesa em Kamar? Quero passar incógnita. Na verdade, nem mesmo vou
avisar o príncipe governante, para que não venham com pompas. Essa
viagem é para eu conhecer e imergir na cultura das tribos beduínas. Isso não
será possível se souberem da minha linhagem. Quero parecer uma estudante
normal, sem grandes alardes.
— Posso levar, mas ele ficará na capital. Não o levarei para o
deserto. — Cedo apenas um pouco.
Meus pais não parecem muito satisfeitos, porém concordam. Quero
dar uma pausa dos holofotes. Já badalei e brinquei demais com a mídia.
Eles acham que me conhecem, mas estão muito longe disso. Quero fazer
algo sério pela primeira vez em anos. Ella me garantiu que me ajudaria com
a exposição quando regressasse. Além disso, é a exigência da última carta
aberta de Nate. Ele me deixou uma para cada ano de sua morte. Saltar de
bungee jumping foi um pedido dele. Cursar fotografia também. A cada ano,
meu garoto me pede para fazer algo especial e que me faça feliz. Ele sabia
de cada sonho meu, cada desejo do meu coração, e suas cartas foram
baseadas nisso.
Já se foram seis anos. Seis anos sem o meu amor. Todavia, com o
passar do tempo, reaprendi a sorrir e me permiti a seguir vivendo, conforme
lhe prometi. Ainda dói, principalmente quando vejo o envelope cujo
lembrete é: abra quando seu coração encontrar o amor outra vez, princesa.
Eu fico brava toda vez que o vejo, quero rasgá-lo em pedaços, só que não
posso contrariar aquele menino. Então o deixo lá, intocado, como sei que
permanecerá. Meu coração jamais será de outro. Essa é outra promessa que
faço questão de cumprir.
***
Karim Amihaj
Conduzo meu cavalo galopando à frente. A lua se escondeu entre as
nuvens e a noite está escura. Minha sorte é que conheço esta região como a
palma da minha mão e posso cavalgar por horas no escuro sem correr o
risco de me perder. Na verdade, já fiz muito isso… Quando Yasmina se foi.
Costumava correr como um louco pelo deserto na madrugada. Algumas
vezes chegava ao cúmulo de levar sua égua junto para me iludir de que ela
estaria comigo de alguma forma. Meu tio refreou meus arroubos e inclusive
me convenceu a escolher uma nova esposa, uma vez que não dá mais para
adiar a minha subida ao trono como rei de Kamar. Todos foram
compreensivos com meu luto, no entanto, é consenso que o estendi por
tempo demais. As tribos estão me pressionando também para me casar e
sentar no trono de meu pai. Depois que viram os lucros do complexo
hoteleiro, da aliança comercial que fizemos com o Catar, país com o maior
PIB dos emirados, eles me apoiam veementemente.
Todavia, uma insatisfação descabida foi crescendo entre as camadas
mais pobres. Movimentos insurgentes, que a princípio não preocupavam,
foram ganhando força até que, no fim do ano, uma onda de ataques
sangrentos explodiu em meu país. Foram meses trabalhando para
conseguirmos prender o líder e seus principais homens. Há dois meses, os
sete homens estão trancafiados, aguardando as suas execuções, marcadas
para daqui quatro meses. Antes de executá-los, estamos tentando fazê-los
dar mais informações sobre os revoltosos, para que possamos neutralizá-los.
Contudo, os miseráveis não estão falando muito e os homens que ficaram
livres não estão contentes com as prisões. Desde o começo desse mês,
alguns incidentes — como saqueamento de vilas e sequestro de turistas no
deserto — voltaram a ser registrados. Não anunciamos para não criar
alardes na população outra vez, no entanto, receio que estejamos nos
encaminhando para outro grande conflito. O espaço aéreo e as fronteiras
terrestres foram fechados ontem, por precaução.
O barulho dos cascos dos cavalos batendo na areia fofa me traz de
volta. Meus homens estão logo atrás, nos guardando e escoltando os cinco
rebeldes que capturamos no resgate da princesa. Por falar nela… está na
minha garupa, os braços enrolados firmemente em meu torso. Ela deve estar
familiarizada com equitação, pois seu corpo aderiu com perfeição à
cavalgada de Hércules, meu garanhão predileto. Isso ajuda no sobrepeso do
animal, uma vez que teremos mais uns cinco quilômetros para alcançar o
helicóptero, que nos levará em segurança até o palácio. Tivemos que deixá-
lo distante e usar os cavalos para nos aproximar do cativeiro de forma
discreta. Não foi tão fácil como mencionei para a garota. Quando Mike me
ligou, aflito, informando que sua prima já estava em meu país e que não
havia dado sinal de vida desde sua chegada, fui obrigado a perceber o
tamanho do problema caindo sobre a minha cabeça: uma princesa foi
sequestrada nas minhas barbas!
Isso é inadmissível. Não podia deixar o incidente diplomático tomar
maiores proporções, então, acionei minha guarda pessoal e iniciamos uma
investigação intensa, que nos levou ao mesmo grupo rebelde insatisfeito
pela prisão de seus líderes. Conseguimos descobrir onde estavam mantendo
a princesa prisioneira hoje de manhã e montamos uma rápida ação para
invadir o local. Meu tio não gostou nem um pouco de eu insistir em vir
junto, porém, sou tão bem treinado quanto meus guardas, e um bom
governante deve estar preparado para combates diretos. Prometi ao meu
amigo que resgataria a princesa e a levaria para minha casa em segurança, e
é o que farei. Intensifico a cavalgada e sinto o corpo feminino moldar-se
ainda mais no meu. Os seios estão esmagados contra as minhas costas e, por
mais que odeie sentir atração por outra mulher, não há como impedir meu
corpo de reagir à sua proximidade. Meu pau engrossa, ficando tão duro que
a cavalgada dói.
Quero empurrar suas mãos de cima de mim, mas ao mesmo tempo
não quero, gosto da sensação do corpo quente cercando o meu. Quando
cheguei ao pequeno quarto sujo onde a colocaram e a vi, fiquei boquiaberto
por uns ridículos minutos. Já havia visto fotos da prima de Mike na internet,
quase sempre acompanhada de algum riquinho da moda. A imprensa a
retrata como a “princesa namoradeira”. Também, com um rosto e corpo
desses, não é de admirar que os homens fiquem loucos pela garota. Mesmo
eu, que não permito mais me levar por paixões mundanas, não fiquei imune.
A princesa é ainda mais bonita pessoalmente. Meu sangue todo correu para
lugares que não deveria quando nossos olhares se encontraram pela
primeira vez. Foi o encontro mais impactante que já tive. Seus olhos verde-
escuros estavam mais claros e assustados, ainda assim, belos. A pele
morena clara, a boca de lábios exuberantes e rosados mesmo sob as
péssimas condições do cativeiro de três dias.
Os seios estavam bicudos pelo sutiã molhado, dando-me a visão
perfeita das auréolas grandes e redondas. Um desejo insano e fora de hora
tomou meu corpo. Sou homem, claro que fiz sexo depois que perdi minha
esposa, mas geralmente me contenho e só o faço quando estou muito
necessitado. E quando vou é um ato mecânico, não sinto tesão pelas
mulheres que me saciam. É um meio para um fim. Servem apenas para me
fazer gozar. Então, por que estou percebendo tudo sobre essa garota? Por
que estou gostando de tê-la em minha garupa, agarrada em mim?
— Senhor, estão vindo atrás de nós! — Um de meus homens avisa,
me alcançando. — Siga com a princesa, ficaremos para despistá-los
enquanto pegam o helicóptero!
— Quantos? — pergunto, tentando não deixar o pânico dominar. A
princesa fica tensa às minhas costas, mas não diz nada, não grita, não faz
escândalo como qualquer mulher faria. Ela só aperta ainda mais os seus
braços à minha volta. Isso me irrita e agrada ao mesmo tempo. Ainda faltam
uns quatro quilômetros para estarmos seguros na aeronave.
— São muitos, meu sen… — Ele se interrompe a tempo. Em
operações que estou junto não é seguro me tratar com a deferência que
revele a minha identidade. Me deixaria vulnerável para os inimigos. — Vá!
Nós os atrasaremos o quanto pudermos para que consigam escapar!
Assinto e volto a atiçar o galope do cavalo.
— Fique tranquila, princesa. Eu a manterei a salvo — digo por cima
do meu ombro. Ela não responde. Talvez não fez escândalo porque está em
choque. — Segure-se que ainda estamos longe do helicóptero!
Galopamos em direção à primeira Duna, e sim, tenho certeza de que
a princesa é uma amazona, e uma das boas. Ela não me dá trabalho algum,
ou a Hércules. Cavalgamos como se fôssemos um só, descendo para uma
lagoa de água salgada. Tudo corre bem pelos próximos minutos até que o
zumbido característico das tempestades de areia chega aos meus ouvidos.
Isso sim, me arrepia de medo.
— O que é isso? — Ela pergunta, pressentindo o perigo.
— Tempestade de areia, princesa. — Informo, reduzindo a
intensidade. — Precisamos parar e encontrar abrigo, ou seremos engolidos
por ela. — Sinto-a estremecer contra mim, mas não diz mais nada. — Há
formações rochosas depois da próxima duna, vamos nos esconder entre as
fendas e…
— Meu Deus! E os escorpiões? Eles vivem no deserto, não é? — Há
pânico em sua voz neste momento. Eu solto um grunhido.
— Me desculpe, princesa, mas eu prefiro ser picado por um
escorpião do que engolido e morto por toneladas de areia — retruco.
— Os escorpiões podem ser mortais! — rebate.
— Então, você quer ficar ao ar livre esperando a areia te encontrar?
— resmungo.
— Você é tão idiota! — resmunga também. — Claro que não, mas
tenho medo de bichos entre essas rochas.
— Devia ter pensado nesses perigos quando decidiu vir para o
deserto, Vossa Alteza — zombo. — A região é cheia de armadilhas e não
apenas de animais, princesa, como está vendo.
— Eu pensei que era seguro… — Seu tom me faz frear a série de
reprimendas que estão em minha garganta. Ela me irrita, mexe comigo.
Além disso, colocou a nós dois em perigo. Então, sem lhe dar chance de
reclamar mais, volto a atiçar o cavalo em direção à pequena, mas bem-
vinda, formação rochosa.
— O que está fazendo? — ela grita.
— Salvando seu traseiro teimoso e mimado, Vossa Alteza. — Torno
a zombar. — Portanto, me faça um favor: cale a boca!
— Imbecil! Vou reportar ao…
—Faça o que quiser, princesa, mas agora cale a maldita boca! —
Rosno e ela resmunga às minhas costas.
Depois de alguns minutos em silêncio, graças a Allah, chegamos às
rochas. Não há cavernas, o que seria mais adequado nesta situação. Ela
desce sem que precise pedir e desmonto em seguida. A lua está
despontando por entre as nuvens outra vez, mas pego minha pequena
lanterna presa ao cinto e me ponho a inspecionar melhor o local para nos
abrigarmos. Encontro uma fenda grande, livre de animais peçonhentos, e
deixo Hércules. Ele fica quieto, as orelhas em pé, pressentindo a tempestade
das grandes.
— Fique em segurança, garoto. Já venho te pegar. — O acaricio na
crina e dou tapinhas em seu pescoço. A princesa está me olhando com
curiosidade enquanto me afasto do meu cavalo, indo em sua direção. Está
louca para ver meu rosto, posso ver pela forma atenta como observa cada
detalhe do que está à mostra. — Venha comigo. — Pego-a pelo cotovelo e é
como se uma corrente elétrica percorresse meu sistema. Tocar sua pele
macia é bom, muito bom, porém, está fria e só agora percebo que deve estar
morrendo de frio e não me disse. Sem lhe dizer nada, me livro de um dos
meus caftans[10] e começo a passar pela sua cabeça.
— O que está fazendo? — Questiona porque é uma tagarela de
primeira.
— Evitando que morra de frio — respondo num grunhido. — Por
que não me disse que estava com frio, princesa?
— Meu nome é Anna Julia. Pare de ficar me chamando de princesa
o tempo todo, isso é irritante. — Me desafia, dá para ver o brilho verde de
suas íris sob a luz da lua. Os longos cabelos negros contrastando com os
olhos claros me deixaram hipnotizado desde o primeiro momento. Ela é a
mulher mais bonita em que já pus os olhos, e essa constatação me deixa
enraivecido. Não quero achar outra mulher bonita e atraente. Yasmina
sempre será a mais bonita para mim. Sempre. — Espera, você é irritante.
Ela que é irritante!
— Que pena que sou sua única esperança de sobrevivência,
princesa. — Provoco, terminando de ajeitar a túnica, suas mãos dando tapas
nas minhas para não a tocar.
— Não ouse me tocar, seu abusado! — Range os dentes e eu rio. Na
verdade, eu gargalho. Mas o que deu em mim para rir mesmo com os
zumbidos de toneladas de areia vindo em nossa direção? Recrimino-me
rapidamente.
— Wallah, fique quieta e me deixe protegê-la da tempestade! —
Brado com seriedade e ela cede, abaixando os braços. — Viu? Não é tão
difícil obedecer, é?
— Não conte com isso, seu, seu… Qual é mesmo o seu nome? —
Não esconde seu desagrado. — É extremamente deselegante não ter se
apresentado ainda. Pela minha experiência, você pode ser outro bandido do
deserto.
Isso me faz rir alto de novo. Tenho que admitir: ela está me
divertindo com sua implicância.
— Estou aqui para salvá-la, não para confraternizarmos, princesa.
— Continuo provocando-a, retirando um dos lenços do meu cinto. Sua
respiração fica suspensa quando o levanto para seu rosto, meus dedos
tocando suas faces enquanto cubro sua boca exuberante e o nariz pequeno e
altivo. Minha própria respiração também trava quando meus olhos sobem,
fixando nos seus. Ela fica ainda mais bonita, apenas os olhos verdes
brilhando como joias acima do tecido negro. Pego mais um lenço,
envolvendo sua cabeça, cabelos e ouvidos. Nossas respirações estão
alteradas, há uma atração indesejada crepitando entre nós, mesmo que a
garota esteja me insultando desde o primeiro instante em que me viu e eu
esteja igualmente rabugento sobre isso. — Puxe o tecido para cobrir os
olhos quando a areia vier — murmuro, minha voz rouca, tensa.
Ela apenas assente, o olhar segurando o meu. Pego-a pelo cotovelo e
nos levo para a única fenda capaz de nos proteger da fúria dos ventos, que
normalmente são de 60 km/h, pegando tudo em seu caminho, não apenas
areia. Ficar a céu aberto, desprotegido, é pedir para se machucar feio ou até
mesmo morrer. Inspeciono toda a cavidade da rocha com a minha lanterna e
ouço o suspiro aliviado de Anna Julia ao ver que está limpa. O zumbido
aumenta e guardo-a em meu cinto antes de empurrar a princesa gentilmente
para a cavidade. Em seguida, me movo, ficando à sua frente, ajudando a
mantê-la segura. Ela me dá um olhar surpreso, especulativo, estamos mais
próximos do que antes, mas ainda irei pegar muita areia e o que mais a
tempestade trouxer.
— Você pode vir completamente para dentro. — Sua voz baixa
também soa tensa.
— Estou bem. — Murmuro, não querendo encostar nela, sentindo
medo dessa coisa se intensificar e também me culpando por ter decidido ir
buscá-la. Talvez, se a visse apenas no palácio não teria esse tipo de reação a
ela.
— Venha para dentro, droga! — Ordena como se estivesse em seu
palácio. Solto um grunhido, ficando imóvel, e suas mãos pequenas seguram
minha cintura, me puxando com uma força surpreendente. Ranjo os dentes,
minha frente pressionando a sua contra a superfície dura. A posição é muito
íntima e agora imagens inadequadas começam a povoar a minha mente.…
Espalmo as mãos na pedra acima de sua cabeça, me sentindo pouco à
vontade, mas gostando de estar colado em seu corpo macio e feminino.
Nossos olhares se fixam e não os desviamos, o zumbido do vento
aumentando rapidamente. — Se não sobrevivermos a isso — ela diz
temerosa, o corpo estremecendo contra o meu —, quero que saiba que já
sou grata por tudo que está fazendo.
Fico em silêncio, absorvendo o que parecem ser suas desculpas pela
implicância. Estou surpreso que tenha exigido que me protegesse também.
Talvez não seja tão mimada quanto pensei.
— Nós vamos sobreviver, ‘amira. — Sussurro com toda a
convicção dentro de mim. — Allah nos guiou para este abrigo.
Ficamos em silêncio um instante. Sua respiração, seus olhos, o
corpo macio colado ao meu é tentação demais para um homem em minha
situação resistir. Já tem mais de quatro meses que não sei o que é estar
dentro de uma mulher. Por mais que tente, não consigo evitar meu pau
engrossar, pulsando contra seu ventre. Ela ofega ao sentir-me duro, pronto,
excitado como há muito não estive. Uma vontade esmagadora de puxar os
tecidos das nossas bocas e uni-las em um beijo me assalta. Chego a salivar,
cobiçando-a sem qualquer vergonha nesse momento. A insanidade me toma
e desço as mãos para o seu rosto.
— Não se atreva a me tocar assim… — Seu murmúrio é petulante,
mas fraco demais para ser levado a sério. A lua torna a se esconder e
aproveito para abaixar o tecido da minha boca. Ela sente isso e suas mãos
vêm imediatamente para o meu rosto, tateando, tocando com delicadeza.
Um gemido rouco me escapa, gostando do seu toque, mesmo me
recriminando por sentir essas coisas. — Você é bonito. — Sussurra, seus
dedos traçando meu rosto inteiro. — Irritante, mas bonito. — Seu tom é
ofegante com um toque de diversão.
— Você também. — Murmuro, segurando sua cintura com uma mão
e começando a puxar o tecido da sua boca com a livre. Nossas bocas se
aproximam, respirando asperamente uma na outra. Empurro meu pau,
esfregando-me em sua barriga, nossas respirações se alteram ainda mais.
Estou louco pelo seu gosto, porém, antes que consiga tocar seus lábios, um
estrondo do outro lado da rocha nos assusta. A tempestade! Por um
momento louco e breve, me esqueci do perigo a que estamos expostos. Só
queria sua boca na minha. Wallah… Que está havendo comigo esta noite?
Recrimino-me, cobrindo sua boca e nariz com rapidez. Seus olhos estão
aterrorizados agora. — Feche os olhos, Anna Julia. — É a primeira vez que
uso seu nome e ela obedece sem discussão. — Só volte a abri-los quando
tudo passar. — Oriento e puxo o tecido cobrindo todo o seu rosto e faço o
mesmo com o meu turbante, apertando meus olhos com força apenas um
segundo antes de sentir o vento e a areia passando por cima da rocha.
Tempestades assim são devastadoras em locais planos, por isso,
proteger-se dentro ou atrás de rochas e terrenos elevados é o mais eficaz.
Anna Julia me puxa contra si com mais força e eu vou de bom grado. Nos
protegemos um ao outro, agarrados firmemente, enquanto o vento parece
sacodir até mesmo as estruturas rochosas. O uivo é alto, junto com o
barulho de objetos sólidos se chocando contra a pedra atrás de nós. A garota
em meus braços está tremendo. Seguro sua cintura com as duas mãos,
mantendo-a bem junto de mim, passando-lhe calma e a certeza de que
ficaremos bem. Após o que, acredito, foram mais de trinta minutos
ensurdecedores, o vento enfim vai diminuindo a velocidade.
Permaneço quieto até que o último uivo passa por nós, já quase
inaudível. Quando o deserto volta a ficar silencioso, sinto o corpo da
princesa ficar tenso contra o meu.
— Já é seguro sairmos daqui, não? — Pergunta, as mãos que antes
me puxavam, me empurrando agora.
Não discuto, me afasto com a mesma rapidez com que está me
empurrando. Prometi ao Mike salvá-la, apenas isso, e é o que farei. Isso que
senti aqui foi uma loucura induzida pela adrenalina. Convenço-me. Me
sacudo, fazendo a terra cair e retiro o shemagh[11] de meus olhos e ouvidos,
mantendo a parte de baixo de modo a proteger a boca e nariz. Ela está de
costas para mim fazendo o mesmo, se limpando da areia. Antes que
aconteça mais algum momento estranho, me viro, indo conferir Hércules.
Ele está se sacudindo também, o pelo negro agora é pardo de tanta areia. O
ajudo a se limpar melhor e o levo para perto de Anna Julia. Monto num
gesto fluído e só então a encaro. Ela olha para todos os lados, menos para
mim. Bem, isso foi constrangedor mesmo. Quase nos beijamos e não vou
me perdoar por isso. Em quatro anos, nunca beijei outra mulher e não irei
voltar a fazê-lo. É só uma mulher bonita, você consegue se controlar.
Ordeno a mim mesmo.
Estendo-lhe a mão e a iço com força e habilidade, acomodando-a
atrás de mim. Voltamos a cavalgar o resto do percurso em silêncio, porém,
as sensações perturbadoras não vão embora. Seu corpo moldado ao meu é
uma tortura. Quando alcançamos a última duna e começo a descer,
avistando o helicóptero e alguns dos meus homens nos aguardando em jipes
e cavalos, suspiro aliviado. Em instantes, estamos desmontando. Entrego
meu cavalo ao meu primo Jalal, chefe da Guarda Real e filho mais velho de
meu tio Jafar.
— Tempestade de areia. — Digo a ele, respondendo ao olhar
interrogativo que está nos dando pela nossa sujeira. — Venha comigo,
princesa. Vou tirá-la daqui. — Chamo-a, pegando seu cotovelo e nos
dirigimos para o grande pássaro negro que nos aguarda. Antes de chegar lá,
sinto uma picada aguda em meu ombro direito e cambaleio com o impacto.
— Khara![12] — Jalal solta o palavrão e começa a gritar ordens em
árabe para o resto dos homens. — Eles estão descendo a duna, senhor!
Precisam sair daqui! Rápido!
— Oh, meu Deus! Você levou um tiro?! — A princesa está em
pânico. Foi corajosa até agora, mas creio que as coisas ficaram complicadas
demais para uma menina da cidade lidar. Ela me ampara, me ajudando a
chegar ao nosso meio de transporte. — Suba! Precisamos sair daqui!
Agora!
Estremeço, me amparando à porta do piloto. O sangue está
inundando minha roupa enquanto a dor rasga minha carne. Tento e não
consigo mover o braço, deve ter atingido algum nervo importante. Sim,
khara, levei um maldito tiro! Meu ombro está queimando e doendo demais.
Jamais tomei um tiro em toda a minha vida militar e vejo que dói, não é
alarde.
— Jalal, volte! Eu não posso pilotar! — Brado para meu primo, que
já está dentro de um dos jipes, uma expressão sanguinária em sua cara.
— Não! Vá atrás do bastardo que o acertou! — A voz de Anna Julia
é potente, com autoridade, e quase faz meus olhos saltarem das órbitas
quando completa: — Eu posso pilotar!
— O quê?! — A minha voz é incrédula. — Você é uma princesa…
Revira os olhos e arranca os lenços da sua cabeça e boca, vindo para
mim.
— Hora de calar essa boca machista e ficar quieto enquanto estanco
esse sangramento. — Avisa, passando os tecidos por baixo do meu braço
esquerdo, pressionando a ferida no ombro direito. Estremeço, mas me
mantenho firme, sem gemer ou reclamar. — Vamos, não podemos perder
tempo. — Me ampara, me levando para o lado do passageiro. Reluto em
subir. — Bem, eu acho que andou lendo algumas histórias de princesas bem
ultrapassadas. Essa princesa aqui pilota desde os vinte, e seus homens
precisam conter os bandidos que não param de brotar neste maldito deserto!
Então, o que me diz? Vai entrar ou prefere continuar com esse tratamento
cinco estrelas?
Eu resmungo. Ela está usando minhas palavras sarcásticas contra
mim. Mesmo contrariado, reconheço que a garota não poderia me
surpreender mais. Ela pilota! Concordo, aceitando sua ajuda para subir e
colocar o cinto. Percebo que suas mãos pequenas e ensanguentadas estão
tremendo. Nossos olhares se encontram, nossos rostos bem próximos pela
ação.
— Sinto muito que tenha se machucado por minha causa. —
Murmura, com lágrimas brilhando nas íris verdes. — E me desculpe por ser
rabugenta quando deveria estar agradecida. Eu.… Sinto muito. — Sua voz
treme e posso sentir seu pavor. A culpa está assolando-a. Engulo em seco,
lutando contra a vontade de tocar seu rosto e confortá-la. Puxa uma
respiração profunda e seus olhos ganham uma determinação feroz ao
completar: — Você vai ficar bem, eu prometo.
Ela corre para o outro lado e nos próximos minutos fico mudo,
completamente atordoado e fascinado ao ver a irreverente princesa
dominando todos os botões e comandos, colocando a aeronave para subir.
Quando ganhamos altura, olho para baixo, vendo que meus homens estão
em maior número e certamente farão os desordeiros se renderem. Um
pouco de alívio me toma. Espero que não haja nenhuma baixa nos meus.
Rogo silenciosamente, me sentindo um pouco tonto. Pelo menos o
sangramento deu uma diminuída. Chegaremos ao palácio a tempo.
— A rota para o hospital? — A voz da princesa me faz encará-la
outra vez e não dá para negar, estou afetado por ela, por tudo que estamos
passando juntos nesta noite.
— Vamos para casa. Ten… — Limpo a garganta. — O príncipe tem
um excelente ambulatório no palácio, bem como médicos a serviço
exclusivo. Fique tranquila, eu vou sobreviver. — Ouso brincar. Ela não
sorri. Está preocupada, olhando de relance para meu ombro atingido.
— Não seja um babaca. — Bufa. Me pergunto se falaria comigo
dessa forma se soubesse quem sou. Um sorriso repuxa em minha boca
enquanto a observo. Algo me diz que ela não me pouparia de suas opiniões
e língua afiada por causa do meu título. Mike me avisou da natureza
irreverente da princesa, mas não pensei que fosse me sentir tão fascinado
quando a visse. — E saiba que ainda vou reclamar para o príncipe. — Essa
última frase é dita com um toque divertido e provocador. Me observa de
canto de olho. — Agora cale a boca e aproveite o passeio, cavaleiro do
deserto.
— Cavaleiro do deserto? — Franzo o cenho.
— Bem, você não me deu a cortesia do seu nome, então eu
improvisei — diz com um sorriso maroto brincando na boca.
Não posso evitar sorrir, mas paro com a pontada no ombro me
lembrando de que tomei um tiro. — Quando poderei retornar a Nova York?
— Sua pergunta me faz franzir novamente a testa. Claro, ela irá embora. A
encaro sem entender que loucura é essa que estou sentindo, mas saber que
irá embora me traz uma sensação desconfortável. O que é totalmente
insano, porque acabei de conhecê-la e ela não pertence aqui.
— Sua Alteza deve liberar o espaço aéreo assim que os conflitos
voltarem a cessar. — Meu tom sai o mais diplomático possível. Ela me olha
de esguelha.
— Preciso agradecê-lo por se empenhar em meu resgate — diz em
tom sério. — Foi muito atencioso da parte de Sua Alteza. Mike diz que ele
é um bom homem.
Pigarreio, me sentindo desconfortável por falar de mim mesmo em
terceira pessoa.
— Ele aprecia a amizade de seu primo também — digo-lhe.
— Agora, me conte uma coisa: por que diabos esses caras parecem
tão irritados com o príncipe? — pergunta à queima-roupa.
— São questões de Estado, princesa, não posso compartilhar. — Me
esquivo, sentindo-me cansado. São meses que não consigo dormir em paz.
— Ah, então você tem um cargo importante no governo? — Ela
pesca e eu rio um pouco ao ver que a minha recusa em me apresentar
instigou sua curiosidade.
— Algo assim, ‘amira. — Murmuro, gostando desse jogo de me
esconder.
Ela geme em frustração.
— Tudo bem, continue sendo um babaca. — Zomba e eu rio alto,
gemendo de dor em seguida. Ela me lança um olhar vingativo ao ouvir meu
lamento.
Cerca de vinte minutos depois, sobrevoamos o palácio e a instruo a
aterrissar no terraço da ala norte, onde ficam meus aposentos. Uma equipe
médica já nos aguardava junto ao meu tio. Jalal deve ter passado rádio
avisando que fui atingido. Me viro para Anna Julia quando as hélices param
de girar. Estou sentindo mais dor e meu corpo esfriando pelo sangue
perdido, todavia, percebo que está estranhamente calada. Um gemido vem
dela e suas mãos vão para o estômago e só agora percebo que está
tremendo, o rosto pálido como cera.
— Princesa?! O que você tem? — Toco seu ombro, preocupado.
— Ah, Deus, sinto muito. — Balbucia e sorri fracamente. — Minha
pose de princesa fodona está arruinada agora, não está?
Eu riria se não estivesse vendo que parece mal. Provavelmente está
desidratada e desnutrida devido às péssimas condições a que foi submetida.
Estava fingindo uma força que não sentia, só agora vejo. Retiro meu cinto e
pulo do assento, esquecendo meu ferimento nesse momento, dando a volta
para o seu lado. A ajudo a se livrar do cinto, sua pele está fria. Antes que a
puxe para fora, faz um barulho na garganta e, então, vomita em seus pés.
Mais aflição me enche e me aproximo mais, segurando seus cabelos
enquanto coloca tudo para fora. — Oh, Jesus, isso é tão humilhante. —
Grunhe, limpando a boca com as costas da mão.
— Shh, venha aqui. — Puxo-a, levantando-a com o braço esquerdo
e amparando-a com o direito. Gemo de dor, mas ela está pior do que eu
nesse momento.
— Não pode me carregar. Está ferido. — Reclama, sua voz fraca, o
corpo frio e tremendo muito. — Prometa-me que vai contar esse final com
mais glamour, por favor. — Ainda tenta ser espirituosa. Meus olhos
prendem os seus enquanto ando pelo terraço, ouvindo meu tio me
repreendendo por estar forçando o ombro ferido.
— Eu prometo. — Sussurro, sentindo-me estranhamente protetor
com ela. Meu ombro está me matando, mas não quero passá-la para
ninguém. — Não é culpa sua ter ficado doente, ‘amira.
— Nate me deu forças. — Ela diz baixinho, fechando os olhos.
Acho que está um pouco delirante agora. Quem é Nate?
— Amiri, passe a moça para um dos homens. — Meu tio diz com
firmeza. — Está ferido.
A encaro. Ela está tentando manter os olhos abertos, mas está
perdendo a batalha. Contrariado, passo-a para um dos homens da minha
segurança.
— Leve-a para os aposentos ao lado de Ayla. E um médico deve
examiná-la imediatamente. — Ordeno, não deixando qualquer emoção
transparecer.
— Meu senhor, ela não é da família, instale-a na ala sul. — Meu tio
diz com sua frieza em dia.
— Ela é uma princesa, prima de meu grande amigo e está doente, tio
— rebato. — Não a colocarei na ala sul, é muito distante.
Ele respira fundo, mas concorda.
— Ouviu seu príncipe, leve-a para os aposentos perto da princesa
Ayla. — Ordena ao homem e se vira para mim. — Agora, venha, precisa
cuidar desse ombro.
Me rendo e deixo os médicos me rodearem, já me examinando ali
mesmo. Meus olhos procuram meu segurança se afastando com Anna Julia
nos braços. Espero que fique boa logo. Olho-a angustiado enquanto me
examinam. Pensei que ela estava bem, com toda sua implicância e língua
afiada. Acho que a adrenalina também ajudou a derrubá-la.
Cerca de quarenta minutos depois, doutor Nassib termina de suturar
minha ferida após retirar o projétil. Pegou um nervo e uma artéria
importante, mas os tecidos foram reparados e ficarei bem depois de um
período de molho. Imobiliza meu braço com uma tipoia e me recomenda
ficar pelo menos uma semana sem sobrecarregar o braço. Agradeço o
doutor, em seguida saio do ambulatório e meu tio me acompanha na
caminhada até meus aposentos.
— Como se sente? — pergunta no tom neutro que é sua marca.
— Com dor, mas os remédios irão agir em breve, espero. —
Resmungo, seguindo pelo corredor, parando do lado de fora dos aposentos
de minha filha. Uma das enfermeiras me ajudou com o banho antes da
pequena cirurgia, e se não estou completamente bem, estou pelo menos
limpo.
— Recebemos a confirmação de mais dois emirados agora há
pouco. Eles enviarão suas filhas para o baile de meu senhor.
Wallah! Ele não vê que discutir o baile onde serei obrigado a
encontrar uma nova esposa não é um de meus assuntos preferidos?
— Fico satisfeito, tio. — Meu tom é lacônico. — Vou ver Ayla e
depois só quero descansar.
Seus olhos escuros me sondam.
— Você se arriscou demais hoje, Amihaj. Essa princesa ocidental é
mimada e imatura para vir ao nosso país em meio a essa onda de
instabilidade. É uma irresponsável. — Diz, deixando claro mais uma vez
seu descontentamento por eu ter decidido ir resgatar a princesa
pessoalmente. — É valioso demais para o seu povo, evite se expor dessa
forma no futuro.
Trinco os dentes, irritado pela forma como está diminuindo Anna
Julia.
— O senhor viu quem estava pilotando o helicóptero, tio? —
Inquiro, angustiado para ter notícias dela. — Anna Julia é mais corajosa do
que todos nós juntos. Não estava se sentindo bem, mas pilotou com
eficiência como qualquer homem faria, me trouxe para casa em segurança.
— Seu olhar não amolece.
— Ótimo. Daremos uma recompensa para a princesa — diz com
arrogância.
Sua audácia me desagrada. Ele sabe que sua família é bilionária e
influente na Europa.
— Boa noite, tio. — Me despeço para não lhe dar uma resposta
malcriada.
Ele curva a cabeça e se vai pelo corredor.
Entro no quarto de minha filha e sigo até sua cama. Ternura invade o
meu peito ao vê-la dormindo tranquilamente. Aos seis anos minha
princesinha não é fácil, herdou mais do que a aparência de minha amada
mãe, falecida antes de meu pai, há muitos anos. Me sento na borda do
colchão e fico olhando-a, como faço muitas vezes. Ela é o meu maior
orgulho. Tive que aprender rápido a suprir a falta de sua mãe. Ayla não se
lembra de Yasmina, era muito novinha, mas sempre lhe falo sobre ela.
Crescerá sabendo que sua mãe foi o amor da vida de seu pai. Me debruço,
beijando sua testinha suavemente, e deixo o quarto. Uma enfermeira está
deixando os aposentos ao lado, onde mandei instalarem a princesa. Sem
controlar minhas pernas, eu sigo até lá.
— Como a princesa está? — Pergunto no meu tom de príncipe
formal.
— Meu senhor. — Ela se curva e fica sem jeito, não me encarando
diretamente. — Foi medicada e está dormindo agora. Revezarei com outra
enfermeira para a noite — informa.
— Shukran. — Digo-lhe e ela faz reverência antes de sair.
Olho a porta, a vontade de entrar me dominando. Não penso muito,
apenas me movo, estou com dor e não vou conseguir dormir agora mesmo.
Entro nos aposentos à meia-luz. Atravesso a sala de estar em direção à
grande cama dossel. A avisto lá, um lençol cor bege com fios dourados
cobrindo-a até o peito. Está tomando soro na intravenosa. Suas coisas foram
trazidas do hotel para cá hoje à tarde. O penhoar branco que está usando
deve ser seu. Suas feições estão relaxadas e um pouco da cor voltou às suas
bochechas, embora haja sinais de esgotamento nos círculos sob seus olhos.
Eu fico aos pés da cama, olhando-a por um tempo. Seus longos cabelos
negros e lisos estão espalhados no travesseiro. Sei que estou invadindo sua
privacidade olhando-a dormir, mas meus pés têm vida própria quando
andam devagar para o lado da cama. Ela é sim a mulher mais bonita que já
vi.
— Karim Amihaj. — Murmuro minha apresentação tardia, esse
encantamento inesperado enchendo meu peito. Meus olhos nunca deixam
seu rosto bonito e calmo. — Fique tranquila, iremos contar o final da nossa
aventura como você desejar. Manteremos sua reputação fodona. — Digo-
lhe com um sorriso brincando em minha boca. Meu ombro dói, indicando
que preciso descansar também. — Fique boa logo, ‘amira. — Torno a
sussurrar e me viro, encaminhando-me para a porta.
CAPÍTULO DOIS
Dois dias depois…
“Aqueles olhos selvagens, uma silhueta psicodélica. Eu nunca quis me
apaixonar por você, mas eu estava enterrada… Minha salvação. Minha,
minha…”
(Gabrielle – Salvation)
Anna Julia
Meus olhos se abrem direto para um dossel de tecidos bege com fios
dourados. Me remexo na cama agradavelmente macia, meu corpo parece
descansado, relaxado. Me sento com rapidez, observando tudo ao redor,
estranhando o quarto. Antes de o pânico me tomar, tudo volta à minha
mente. O sequestro, o resgate. Estou no palácio do príncipe. O cavaleiro do
deserto.… Fique boa logo, ‘amira. Tive a impressão de ouvir sua voz aqui
no quarto. Ou foi delírio devido ao meu estado precário? O verei hoje para
agradecer? Meu Jesus! Ele tomou um tiro por minha causa. Meu coração se
agita ao recordar aquele momento aterrorizante. Será que está bem?
Levanto a mão direita para meu rosto e faço careta com a dor no dorso.
Inspeciono-a, notando a picada arroxeada da intravenosa. Sim, tomei
medicação e soro. Gemo, recordando o gran finale do meu resgate.
Urgh.… Vomitei na frente do cara. Humilhante. Eu segurei a pose
fodona o quanto pude. Mas estava muito fraca.
Devo ter contraído alguma infecção alimentar daquela gororoba que
me serviram, com certeza. Lembro-me que acordei algumas vezes. Uma
moça simpática me dava um líquido morno na boca. Sopa. Me levava ao
banheiro e me trazia de volta para a cama, onde capotava de novo. Há
quanto tempo estou aqui? Quantos dias se passaram? Me arrasto para a
borda do colchão e sou surpreendida, só agora notando uma menina sentada
na ponta da poltrona, a alguns passos da cama.
— Quem é você? — Pergunta com seus olhinhos escuros brilhando
de curiosidade.
Eu que pergunto. Quem é ela e como entrou aqui?
— Minha nome é Ayla Yasmina. Pode me chamar de Ayla. — A
pequena diz, talvez para me encorajar a falar. — Minha pai não queria que
eu saísse aqui, mas eu fiquei curiosa. — Dá de ombros, um sorriso travesso
cruzando seu rostinho infantil. Seu inglês é péssimo, mas ela é uma
coisinha linda. As pernas curtas balançando sem tocar o chão, as mãozinhas
cruzadas sobre o colo, como uma mocinha. Os cabelos negros e compridos
presos numa trança. — Você não fala a meu linguajar? Minha inglês ainda é
pouco bom. — Torna a confundir tudo e simpatizo com ela e sua tentativa
de se comunicar comigo. Que gracinha.
Então, a ficha cai. Deve ser a filha do príncipe. Tinha apenas dois
anos quando sua mãe morreu num trágico acidente aéreo, recordo-me. Deve
ter uns seis agora, acho.
— Oi, pequena. Sou Anna Julia, mas pode me chamar apenas de
Anna. — Falo pausadamente em inglês. Ela ouve atenta e sorri quando
compreende. — Seu pai é o príncipe Karim?
— Sim, mas ninguém o atende assim. Ele não prefere Amihaj. —
Diz devagar, esticando a coluna na pose educada, novamente fazendo
bagunça na língua.
Eu coloco minhas pernas para fora da cama, encontrando pantufas
macias à minha espera. Estico meus braços acima da cabeça,
espreguiçando-me. Parece que fiquei nesta cama tempo demais. A garotinha
continua me encarando quando volto a olhá-la.
— Você são bonita. — Diz e torno a sorrir do seu inglês
atrapalhado. A observo e me inclino em sua direção.
— Shukran, ‘amirat saghira. — Murmuro, encantada pelo seu
jeitinho esperto e direto. — ‘Ant ‘aydaan jamila[13].
Seus olhinhos cintilam quando a chamo de princesinha e devolvo o
elogio em árabe.
— Você fala minha língua! — Exclama, seus pés balançando
euforicamente.
— Você consegue guardar segredo? — Sussurro em árabe. Ela
balança a cabeça concordando. — Eu falo, mas não conte a ninguém ainda,
está bem? Vou falar em sua língua apenas com você.
— Está bem! Não vou contar! — Repete, seus olhinhos brilhantes
por compartilharmos um segredo. Estendo o meu dedo mindinho em sua
direção e ela enruga a testa.
— Você tem que entrelaçar seu mindinho com o meu. — Murmuro,
fazendo-a sorrir, mostrando a ausência de um dente da frente. Ela é
adorável. — É assim que as meninas do Ocidente guardam segredos.
— O que é o Ocidente? — Pergunta, enrolando o dedinho no meu.
— É de onde eu venho, pequena. — Esclareço, tocando seu rostinho
bonito.
— E lá é bonito? — Continua com sua curiosidade infantil.
— Sim, muito bonito — respondo.
— Vou pedir ao meu pai para me levar para o Ocidente! — Diz,
eufórica, pulando da poltrona. — Ele sempre faz tudo que eu peço. —
Complementa em tom de conspiração.
Meu peito aperta um pouco pela garotinha bonita e esperta. Seu pai
deve se desdobrar para suprir a falta de sua mãe, com certeza.
— Ele deve te amar muito, princesinha — murmuro com suavidade.
— Eu também o amo, muito, muito! — Abre os bracinhos esticados,
indicando o tamanho de seu amor. — Meu pai é tão bonito, você o
conhece? — Solta com a expressão de adoração para sua figura paterna que
conheço bem. O que me lembra que preciso ligar para meus pais. Sei que a
essa altura já sabem que estou a salvo, mas só ficarão tranquilos quando
conferirem com seus próprios olhos em uma chamada de vídeo.
— Ainda não vi seu pai, Ayla. — Me levanto, sentindo-me muito
bem, embora meu estômago ronque vergonhosamente alto. — Talvez o
encontre hoje.
— Hoje não. Meu pai acordou muito cedo e está reunido com os
clãs tribais. — Informa com toda a seriedade, como se de fato soubesse do
que se trata.
— Você sabe o que é um clã tribal, menininha esperta? — Pergunto,
fascinada por sua desenvoltura.
— Não. Mas papai disse que são nove e que eles o ajudam a
governar nosso país. — Informa com um ar professoral que me desmonta.
Um sorriso curva a minha boca, apreciando cada vez mais a conversa com a
pequena. Que menininha encantadora.
— Você é uma princesinha muito inteligente, não é? — Sorrio,
tocando meu dedo na pontinha do seu nariz. Seus olhinhos cintilam de pura
satisfação.
— Você também é uma princesa, Anna? — pergunta. — Minha
babá disse que meu pai havia hospedado uma princesa neste quarto e que
você era muito bonita. — Ri, travessa. — Por isso fiquei curiosa para ver…
Ah, essa menina é das minhas. Rio, adorando sua irreverência
infantil.
— Sim, também sou uma princesa, Ayla. — Assinto. — Uma
princesa que precisa urgentemente de um banho e depois de uma montanha
de comida! — Completo, meu estômago tornando a roncar alto. A pequena
sorri, colocando a mãozinha na boca.
— Toque aquele botão e alguém virá. — Aponta para uma espécie
de campainha perto da cabeceira da cama. — Posso ficar aqui com você?
Minha professora de inglês é muito chata. — Faz cara de cachorrinho. —
Meu pai não pode saber que fugi da aula, promete que não conta? — Torna
a sorrir conspiratória.
Ah, definitivamente é das minhas! Sorrio com vontade. Mas sou a
adulta aqui, senhoras e senhores.
— Você não pode fugir da aula, pequena. — Seu rostinho cai ao ver
que não vou apoiá-la. Suspiro, adicionando: — Bem, a não ser que a
professora seja mesmo muito chata — sussurro com cumplicidade.
— Obrigada, Anna! — Um sorriso gigante se abre em seu rostinho
bonito. — Eu não gosto dela — reclama, fazendo careta. — Vive
reclamando para meu pai que não estou indo bem.
— Certo. Você pode ficar aqui comigo. Será a minha convidada para
o café, que tal? — Proponho e ela pula de entusiasmo.
— Você é tão boa, Anna! Você vai ser minha amiga? — Seus
olhinhos estão novamente de cachorrinho. Meu peito aperta de empatia pela
pequena tagarela, mas também porque irei embora em breve. Não é uma
boa ideia deixá-la se apegar a mim.
— Você não tem algum amiguinho ou amiguinha da escola? —
Inquiro e vejo a tristeza invadir seu semblante.
— Eu não vou à escola. Meu tio Jafar diz que uma princesa precisa
estudar em casa.
Em outras palavras, ela nasceu mulher e não pode fazer muita coisa
por aqui. Mas é claro que não digo isso à menina. Preciso me lembrar de
que não estou na América.
— Bem, eu não sei por quanto tempo ficarei aqui, princesinha. Mas
serei sua amiga, está bem? — murmuro.
Ela bate palmas e estende o mindinho para mim. Ah, que linda! Me
abaixo, ficando em seu nível e entrelaço nossos dedos outra vez.
— Seus olhos são verdes. — Me observa bem de perto. — Nunca vi
olhos dessa cor antes.
Eu rio, tocando seu narizinho de novo, deslizando meus dedos pelo
rostinho macio.
— Você gosta?
— Sim. Eles são muito bonitos! — exclama.
— Os seus também são, pequena. — Observo seus olhos escuros
com raias caramelo. — Agora fique aí quietinha que vou tomar um banho e
ligar para meus pais.
***
Karim Amihaj
Termino de ajustar a gravata, encarando minha figura no espelho.
Pedi que minha secretária avisasse a Anna Julia que o traje para o jantar
seria ocidental. É uma maneira, ainda que tardia, de fazê-la se sentir à
vontade em minha casa. Estou disposto a tratá-la bem de agora em diante.
Todavia, me irrita que tenha passado o dia inteiro inquieto, ansiando vê-la
de novo. Sem mencionar que as imagens dela nadando nua dificilmente
sairão da minha mente. Meneio a cabeça, tentando expulsá-las. E a forma
descarada como lidou com minha intrusão me deixou ainda mais louco de
desejo. Confiro meu terno escuro e deixo o closet, saindo do meu quarto
para o de Ayla. Marquei uma hora mais cedo para minha princesa poder
participar também. Nem preciso dizer que ficou eufórica quando disse que
Anna irá jantar conosco hoje.
— Papai, estou bonita? — Minha menina esperta gira no centro do
seu aposento ao me ver entrar.
Rio e bato palmas, incentivando sua alegria. A babá se põe de lado,
rindo discretamente para nossa interação.
— Muito bonita, nour hayati. — Elogio-a, andando para perto. Ela
pega na saia rodada do seu vestido amarelo-ouro e sorri mais. — Não há
menina mais bonita no mundo todo.
— No mundo todo? — Seu sorriso se alarga, gostando do meu
exagero, afinal é uma criança. Me abaixo, beijando seus cabelos presos
numa trança pendendo no meio das costas.
— Vamos, minha senhora? — Faço uma mesura, lhe estendendo a
mão. Meu coração canta ao ver a alegria estampada em seu rostinho amado.
— Será que a Anna vai me achar bonita também? — Coloca a
mãozinha sobre a minha, os olhinhos cheios de expectativa. Pressinto que
teremos um problema quando a princesa partir. Minha filha está se
apegando rápido demais. Terei de rever sobre não a mandar a uma escola de
verdade. Tenho percebido sua solidão e isso não é bom para ela. Meu tio é
terminantemente contra uma menina estudar fora de casa. Preciso levantar
esse tópico com ele de novo, em breve.
— Ela vai, filha. — Garanto, nos dirigindo para a porta. —
Impossível não ver que você é a princesa mais bonita nesta noite.
— Mas ela também é uma princesa. E é muito bonita. — Observa
alegre enquanto saímos para o corredor. — Você acha, papai?
— Sim, nour hayati. A princesa é muito bonita. — Sou obrigado a
concordar e minha filha desvia o olhar para algo atrás de mim, um novo
sorriso brilhante se espalhando em seu rostinho.
— Anna! Vamos com a gente? — Grita em inglês. Noto uma
melhora significante em sua pronúncia.
— Princesinha!
Meu corpo acorda ao ouvir a voz. O barulho dos saltos batendo
suavemente sobre o mármore faz meu pulso correr, antecipando o momento
em que entrará na minha linha de visão. Tento resistir ao impulso de virar a
cabeça e conferir sua aparência, mas acabo vencido e giro o pescoço e,
Wallah, prendo a respiração. Ela está espetacularmente bela, usando um
vestido branco e longo de um ombro só. O tecido ajusta-se ao torso esguio,
um cinto dourado de cordas intrincadas marcando a cintura delicada, a saia
se alargando nos quadris. A cada passo que dá, uma fenda frontal se abre
sedutoramente, mostrando as pernas longas e as sandálias no mesmo tom do
cinto, tiras sexys enroladas nos tornozelos. Cerro a mandíbula, tentando
refrear o efeito de sua aparência no meu pau. Está elegante, porém, é
sensual. Não é a roupa, é ela. É a forma confiante com que as usa, uma
princesa da cabeça aos pés. Sabe o efeito que causa no sexo oposto? Bufo.
Claro que sabe. Ela com certeza se olha no espelho.
Subo o olhar para seu rosto e já a encontro me encarando. Está
linda. Ficamos nos olhando em silêncio, num momento de apreciação
mútua. Seus cabelos negros estão presos num rabo de cavalo rente à nuca,
comportado, embora sexy. Seu olhar continua no meu. Nós dois sabemos
que isso é mútuo. A atração não irá sumir porque não queremos agir sobre
ela. Seus olhos verdes cintilam, percorrendo meu comprimento, e voltam
para o meu rosto. O rosto bem maquiado, os cílios longos e negros
deixando os olhos ainda mais verdes. O batom vermelho destacando a boca
carnuda é o prego no caixão de qualquer homem com sangue nas veias.
— Boa noite, Alteza. — Inclina a cabeça educadamente.
— Boa noite, princesa. — Respondo, devolvendo-lhe a reverência.
— Fico satisfeito que tenha decidido aceitar o meu convite. Confesso que
tive receio de que não fosse aparecer.
Seus olhos brilham e um sorriso tremula em sua boca.
— Um Di Castellani jamais faria desfeita ao seu anfitrião, honorável
senhor. — Suas palavras e sorriso educados encobrem seu deboche. Porém,
já a conheço um pouco e está me alfinetando sutilmente porque estamos na
presença de Ayla. Isso só se confirma quando me dispensa e se abaixa,
ficando ao nível de minha filha, abrindo um sorriso luminoso, livre de
zombaria. — Oi, Ayla! — Exclama, dando um beijo suave na bochecha da
menina, que se desmancha para a garota. Desliza os dedos pela face de Ayla
e lhe dá mais um beijo, dessa vez na ponta do nariz, e murmura: — Você
está linda, princesinha.
E até eu me desmancho diante da cena. Nunca as tinha visto juntas.
Por isso minha filha está tão encantada, a princesa está lhe dando atenção e
carinho. Qualquer criança em seu lugar estaria da mesma forma.
— Você também, Anna. — Ayla diz, devolvendo o beijo no rosto de
Anna Julia. — Não é, papai? — Minha filha me intima a concordar. Eu
limpo a garganta, subitamente seca. Vou precisar de uma bebida, e logo.
— Sim, nour hayati. — Respondo e Anna Julia desvia o olhar de
Ayla, a boca curvando num meio-sorriso malicioso. — Estamos indo para o
salão, quer se juntar a nós? — Convido-a porque sei que minha filha vai
querer isso.
— Que atencioso, Alteza. — Novamente seu sorriso e tom são
veladamente gentis. Certo, eu mereço. — Obrigada. Eu adoraria. — Olha
para baixo, piscando para uma Ayla completamente apaixonada. Que Allah
nos ajude.
Nos viramos e começamos a andar pelo corredor, dobrando a
esquina que leva direto para o salão de refeições mais íntimas. O utilizo
apenas com a minha família e convidados próximos. Ayla puxa assunto com
sua nova amiga o tempo todo, e fico surpreso como a princesa a ouve
pacientemente, respondendo, puxando assunto de volta. Parecem duas
crianças, animadas para a noite. Encontramos Jalal e Nuria com seu
pequeno Naim nos braços, na entrada do salão, e paramos. Não perco o
olhar aguçado de meu primo e sua esposa para o fato de a princesa estar
chegando comigo e Ayla.
— Jalal, Nuria. — Os cumprimento, indicando a princesa ao lado de
Ayla. — Conheçam a nossa ilustre hóspede, a princesa Anna Julia Di
Castellani. — A princesa em questão me lança mais um olhar que diz: Oh,
você é tão falso, Alteza. Mas abre seu sorriso verdadeiramente simpático
para meus familiares. — Meu primo mais velho, príncipe Jalal Al-
Abdallah; e sua esposa, a princesa Nuria. — Completo.
— Prazer em conhecê-los, Altezas. — Anna Julia oferece a mão ao
meu primo e em seguida para sua mulher. — Salaam Aleikum[16].
A encaro surpreso. Ela fala árabe? Figo intrigado, recordando que
nunca cogitei, ou perguntei. Bem, como iria se a estive evitando por dias?
Zombo de mim mesmo.
— O prazer é nosso, Alteza. — Jalal faz uma reverência respeitosa.
— Seja bem-vinda à casa Al-Abdallah.
— Que a paz esteja contigo também, Vossa Alteza. — Nuria inclina
a cabeça cortesmente.
— Shukran. — Anna Julia torna a falar em árabe.
— Você fala a nossa língua? — Nuria pergunta encantada, a
exemplo de Ayla.
— Oh, não, não. — Nega rapidamente. — Apenas algumas palavras
soltas. — Dá de ombros e meus olhos estreitam sobre ela. Será mesmo? —
E esse bebê adorável é seu? — Muda o assunto, chegando mais perto e
afagando a cabeleira escura de Naim, nos braços da mãe, que, para variar,
se derrete em um sorriso babado para a princesa. Ninguém está imune a ela
nessa família? A princesa vira as costas totalmente para mim e prendo a
respiração com a visão do seu decote. É bem baixo, rente ao cinto, deixando
as costas todas à mostra, meu olhar pousa na fênix de asas abertas, atraente
e irreverente, como a dona. Afrouxo um pouco o nó da gravata e ouço a
risada baixa de Jalal. Meu primo idiota está se divertindo à minha custa.
— Ei, vejam se não é a princesa mais bonita deste reino! — Ele olha
para baixo, brincando com minha filha.
— Tio Jalal! — Ayla vai até ele, que a levanta alto, começando a
brincadeira que a pequena adora.
Enfio as mãos nos bolsos, meus olhos errantes insistindo em ir para
as costas nuas e tentadoras da princesa. Wallah…
— Tragam a nossa convidada para dentro, Amihaj, Jalal. — A voz
fria de meu tio quebra o momento caloroso.
Olho de lado, vendo-o andar em nossa direção, acompanhado de tia
Samira e o caçula Zafyr, solteiro, que já tem sua atenção nas costas sexys de
Anna Julia. Não gosto do que sinto ao ver meu primo comendo-a com os
olhos. Pego no cotovelo da princesa e a viro, com a desculpa de apresentá-
la aos meus tios. A pele macia é gostosa demais ao toque. Sinto-a tensa
também. Khara, isso vai ser difícil.
— Tio Jafar, tia Samira, conheçam a princesa Anna Julia Di
Castellani. — Digo entrando de vez no papel de bom anfitrião. — Princesa,
conheça meus tios, o príncipe e grão-vizir Jafar Al-Abdallah e sua esposa, a
princesa Samira.
— Oh, Amihaj, não me disseram que é tão bonita. — Minha tia está
abrindo o maior sorriso para Anna Julia, que o devolve, simpática. — Seja
bem-vinda à nossa casa, minha jovem.
— Shukran, minha senhora. — Anna Julia inclina a cabeça em
respeito. — Prazer em conhecê-la.
— Já troquei algumas palavras com a princesa. — Meu tio se
inclina, olhando-a com algo que não consigo decifrar, para variar. Ele é
paranoico com ocidentais. — Bem-vinda à nossa casa, minha senhora.
—Obrigada, meu senhor. — A princesa sorri para meu tio, mas não
é o sorriso que deu aos outros. É contido. — Sempre tão simpático. — Eu a
olho imediatamente para ver se ouvi direito. Ela sorri e seus olhos brilham
com irreverência quando pergunta: — A propósito, como anda o
aprimoramento do seu inglês?
Meu tio faz um som enfezado, acho, o que é novo para mim. Ele é
sempre tão irritantemente controlado.
— Nós dois sabemos que não preciso aprimorar meu inglês, Alteza.
Queria apenas ficar livre da pobre e ingênua senhora Prescott. — Diz em
tom baixo, mas não menos intimidante.
— A metodologia da pobre senhora Prescott é sofrível, senhor. Ayla
é cheia de vida, merece aulas mais empolgantes. — Anna Julia defende a
minha filha e eu fico confuso, sem saber do que estão falando.
— Aulas como as suas? — Meu tio inquire.
— Sim, aulas como as minhas. Sou licenciada em Letras, meu
senhor, portanto, perfeitamente habilitada para lecionar inglês. — Ela se
gaba e fico surpreso mais uma vez com essa garota.
— Vossa Alteza estava dançando com a princesa Ayla e chamando
isso de aula. — Meu tio diz com nítido desagrado.
— A música, além de ser fonte de terapia, também é uma excelente
metodologia de ensino, Vossa Alteza. — Anna Julia sorri, um tipo de
sorriso de quem procura encrenca. — Se quiser experimentar, por favor,
junte-se a nós na segunda, iremos cantar e dançar One Direction. — Oh,
não, ela não disse isso. Ouço todos prendendo a respiração. — Nossas aulas
são das nove às onze. Às vezes se estendem um pouco mais porque, bem, é
uma atividade contagiante.
— Eu não sabia que estava dando aulas de inglês para minha filha.
— Digo, atordoado com a conversa.
— Ela está, e me levou a pensar que meu senhor sabia. — Meu tio
me encara e depois à princesa, que está com a mesma cara de Ayla quando
uma travessura é descoberta.
— Ah, ops… — Ri, travessa. — Não foi nada pessoal, meu senhor,
é que tenho percebido suas opiniões um tanto restritas quanto ao papel
feminino, e Ayla é muito inteligente para viver confinada neste castelo. Só
queria dar um pouco de diversão para a menina.
Meu tio está contrariado, embora se contenha.
— As mulheres de nosso país são como criaturas sagradas, Alteza,
elas precisam agir conforme os preceitos do Profeta. — Se defende e em
seguida seu tom é acusador: — Vossa Alteza mentiu para mim quando disse
que Amihaj sabia da sua cantoria sem fim com a princesa.
Anna Julia amplia um pouco os olhos e volta a sorrir com
irreverência.
— Como mencionei, meu senhor, o senhor é um forte concorrente à
coroa de Mister Simpatia. — Menina abusada. — Adoraria lhe apresentar
minhas ideias sobre como as mulheres devem ser tratadas, Alteza. E não
esqueça, nossa cantoria sem fim começa às nove na segunda. — Ousa dar
uma piscadinha no final.
— Eu gosto dela, primo. — Zafyr vem para a frente, estendendo a
mão para Anna Julia, um sorriso de pateta se abrindo na cara paqueradora.
— Sou Zafyr, princesa, é um prazer conhecê-la. — Seu sorriso alarga, com
malícia, e murmura: — Bela tatuagem.
O filho de uma.… Paro a ofensa, lembrando que sua mãe é minha
tia.
— O prazer é meu, Alteza. — Anna Julia o cumprimenta com um
sorriso simpático e, antes que se estendam, interrompo:
— Devemos ir para a mesa. — Anuncio no tom de autoridade de
governante. — Ayla e Naim precisam dormir cedo.
— Eu não estou com sono, papai. — Minha pequena se apressa em
falar.
Eu rio. Claro que não. Ela vai querer aproveitar ao máximo essa
noite.
Nos dirigimos para a mesa oval e durante o jantar meu tio relaxa um
pouco, dando trégua para nossa convidada. Não posso dizer o mesmo de
Zafyr, que continuou cercando a princesa de forma irritante. Como meu
lugar é à cabeceira da mesa, o folgado aproveitou para sentar-se ao lado
dela. Minha pequena também a monopolizou sempre que pôde. Anna Julia
riu e conversou com todos, seus comentários espirituosos arrancando
sorrisos da mesa. Depois da partida de Yasmina, não acho que tenhamos
feito alguma refeição tão animada quanto a de hoje. Olhando para a alegria
e espontaneidade da princesa, é como se ela brilhasse, irradiando uma luz
contagiante à qual ninguém fica imune. Bem, talvez meu tio fique. Ele
esteve olhando a mim e a ela com seus olhos investigadores.
— Eu realmente apreciei conhecer todos vocês. — Ela se virou para
mim e murmurou com o ar provocador: — Obrigada por me tirar do
confinamento, Alteza.
— O que é confinamento, papai? — Minha inocente filha cai na
armadilha da princesa. Eu estreito meus olhos sobre a garota insolente.
— É, meu senhor, explique para a princesa o que significa um
confinamento. — A espertinha atiça e ouço as risadas de Jalal e Zafyr.
Eu demorei alguns minutos para explicar tudo de forma a não deixar
minha filha saber que não tenho sido educado com sua nova amiga.
***
Anna Julia
Ando de um lado a outro em meus aposentos. É sábado, mas acordei
cedo, aliás, quase não dormi, angustiada. Mal toquei no café da manhã,
esperando algum sinal do príncipe e da minha corrente. Ele prometeu que a
encontraria. Tento me acalmar. Me pergunto se não foi castigo porque tenho
me sentido tão atraída por outro homem. Eu não quero tirar a minha
corrente. Nunca irei tirá-la. Me perdoe, meu amor. Me perdoe. Continuo
implorando a Nate. A campainha toca e corro, atravessando o cômodo para
abrir a porta. O príncipe está lá. Minha angústia adquire outro significado
agora. Ele está trajando jeans e uma camiseta azul-marinho de mangas
compridas. Os cabelos compridos estão amarrados no estilo samurai,
deixando a metade de baixo caindo sobre os ombros largos. Engulo em
seco, lambendo meus lábios. Seus olhos de ônix cintilam ao conferir minha
calça jeans cintura baixa e minha regata de seda alguns centímetros acima
do umbigo.
— Bom dia, princesa. — Sua voz sai rouca e levanta uma caixinha
na mão. — Posso entrar?
Alegria e alívio me enchem.
— Bom dia, Alteza. Você o encontrou? — pergunto ansiosa, lhe
dando passagem.
— Eu sempre cumpro minhas promessas, ‘amira — murmura,
enquanto passa por mim, seu corpo moreno roçando no meu. Gosto que me
chame de princesa em árabe. Soa bonito e íntimo em sua voz profunda. Mas
o que estou pensando? Me repreendo e ando à sua frente para a sala de
estar. Posso sentir seu olhar sobre o meu corpo, isso me excita e incomoda,
tudo junto.
— Onde estava? — pergunto, lutando contra essa atração louca.
Puxo uma respiração e me viro. Seu olhar negro sobe pelo meu corpo,
parando na barriga de fora, me fazendo lamentar a escolha da roupa, mesmo
que a tenha escolhido porque é confortável para ficar presa aqui neste
quarto. Meus seios arrepiam quando sua atenção os encontra. Não há como
parar a quentura se espalhando em minha barriga, umidade se reunindo em
minha calcinha. Nunca senti nada parecido com isso antes e fico
aterrorizada.
— Estava perto dos aposentos de Ayla, logo ao virar a esquina —
diz, limpando a garganta e andando devagar para perto. Quero dizer-lhe
para não se aproximar, mas seu olhar me deixa fraca, a mente não
funcionando com a mesma velocidade. Urgh. É humilhante isso. — O fecho
estava quebrado e tive que acionar o joalheiro da família. Por isso demorei
a trazê-lo — explica, parando à minha frente. — Vire-se e levante os
cabelos, princesa, vou colocá-lo em você. — Franzo o cenho diante da
proposta. — Posso? — pergunta suavemente e percebo que estou sendo
ingrata. Ele foi atrás, encontrou e consertou minha corrente preciosa.
— Claro. — Assinto, me virando, levantando meus cabelos. Tenho a
impressão de ouvi-lo grunhir baixinho. O sinto atrás de mim, o calor do
corpo grande e másculo, sua respiração soprando em minha nuca. Alguns
segundos se passam, então, ele coloca o cordão pela minha frente, os dedos
roçando a minha pele, ateando fogo por onde toca. Estremeço, arquejando
baixo, minha pele arrepiando inteira. Seguro um gemido na garganta,
esperando-o concluir a tarefa, mas não parece ter qualquer pressa. Quando
enfim termina, sinto seus dedos descendo e tocando minha omoplata, minha
tatuagem.
— É bonita. — Sussurra, o hálito morno soprando em minha pele,
provocando-me sensações loucas. Seu cheiro de macho me seduz sem pena,
sem pudor. Meu Deus, por que de repente estou percebendo o sexo oposto
dessa maneira tão ultrajante? Não quero isso, não quero. — Irreverente,
sexy. — Continua traçando a minha fênix. — Como você.
— Shukran. — Minha voz quase não sai e me obrigo a me afastar,
colocando dois passos entre nós. Me viro para encará-lo, tentando não
transparecer o quanto seu toque me afeta, o quanto estar em sua presença
mexe com lugares proibidos dentro de mim.
— Eu sei pelo que passou e sinto muito. — Murmura, enfiando as
mãos nos bolsos do jeans, seus olhos cheios de empatia. Sim, empatia
porque ele também perdeu o seu amor e sabe o quanto dói. Seu olhar, suas
palavras me fazem querer chorar.
— Sinto muito por sua esposa também — murmuro. Seu maxilar
aperta e balança a cabeça suavemente. — Você viu a foto? — pergunto. Ele
torna a balançar a cabeça.
— Desculpe, foi invasivo da minha parte. — Parece constrangido.
Sorrio para quebrar o gelo e expulsar esse climão.
— Você entrou em meu quarto sem bater e me observou nadando
nua. — O provoco. — Olhar a foto é o menor dos seus pecados, honorável
Alteza.
Isso o faz soltar uma risada. Minha respiração para com o quanto
fica lindo, o rosto todo relaxado, livre da tensão que sempre vejo nele. Bem,
dada a situação em seu país, o homem tem razão em estar tenso. Franzo o
cenho, notando pela primeira vez que não tinha feito essa reflexão antes. Eu
o categorizei como o pior anfitrião da história e esqueci o conflito que
Kamar está vivendo. Outro dia, um atentado matou uma pessoa e feriu
outras tantas no centro de Jawahra. E outra coisa me bate direto na cara: eu
ainda não tive a decência de agradecê-lo por me resgatar naquela noite. Uh,
muito bem, Anna!
— Como está o ombro? — Sussurro, vendo a surpresa em seu rosto.
— Estive tão preocupada com você… — Arregalo meus olhos ao falar isso
e me apresso em corrigir: — Com o cavaleiro; eu não sabia que era você,
claro.
Um arremedo de sorriso curva sua boca, apreciando ver meu raro
embaraço.
— Está melhorando. — Responde, empurrando a gola V para o
lado, me mostrando a ferida da bala ainda um pouco avermelhada. Me vejo
encurtando a distância entre nós de novo.
— Ainda dói? — Pergunto e seu rosto franze em desconforto
quando rola o ombro.
— Um pouco. Mas a bala não fez tanto estrago, então, ficarei bem
em breve, não se preocupe.
É involuntário e, antes que me contenha, minha mão direita se
levanta para seu ombro. Um assobio baixo escapa da sua boca quando meus
dedos tocam ao redor da ferida. Os pontos foram retirados e, apesar de
avermelhada, está seca, o que é um bom sinal. Sua pele é quente, firme, e o
desejo de tocar mais me invade, imprudente, impulsivo. Levo meus olhos
para seu rosto já encontrando os olhos negros intensos sobre mim.
— Shukran. — Lambo meus lábios, minha garganta seca sob seu
olhar penetrante. — Eu sinto muito que tenha se machucado por minha
causa.
Nossos olhares permanecem presos, minha mão sobre sua pele
quente.
— Valeu a pena, princesa — murmura e quero fechar os olhos,
apreciando a nota profunda.
— Me chame de Anna — peço e retiro minha mão, minha pele
formigando, querendo mais contato. Estamos tão perto que seu perfume
másculo enche meus sentidos confusos. — É assim que os meus amigos me
chamam. — Jesus, ele é o homem mais bonito que já vi na vida, tenho
absoluta certeza. — Você salvou a minha vida. Sempre lhe serei grata.
— Chame-me de Amihaj — pede também, seus olhos nunca
deixando os meus. — É assim que meus amigos me chamam.
Coloco uma mecha de cabelo atrás da minha orelha e sorrio,
tentando agir como eu mesma.
— Eu prefiro Karim. — Ele levanta uma sobrancelha.
— Apenas minha mãe me chamava assim — informa com certa
nostalgia. — Mas se você gosta, use-o.
— Feito — murmuro e torno a me afastar, procurando uma distância
segura dele. O brilho presunçoso em seu olhar me diz que ele sabe o quanto
me afeta. — Então, o que ia me falar ontem, antes de eu notar a perda do
colar? — Mudo o assunto.
Ele limpa a garganta e seu rosto assume a seriedade do governante
de Kamar.
— Estou iniciando uma negociação com uma empresa alemã e
pensei em… — Ele para e me meneia a cabeça, como se só agora lembrasse
de algo. — Alemão está entre as línguas que domina? Diga que sim, porque
minha intérprete mais capacitada está em licença para tratamento de saúde e
o substituto não domina muito bem essa língua.
Não posso deixar de sorrir e aproveitar o momento.
— Parece que precisa de uma poliglota, honorável Alteza —
provoco.
— Karim. — Ele aponta. — Você mesma disse que usaria esse.
Rio, levantando as mãos em sinal de trégua.
— Está bem, Karim. — Testo o nome confirmando que gosto muito
mais da sonoridade do que Amihaj. Karim é mais.… Sexy. É claro que não
direi nada disso a ele. — Você está com sorte, alemão foi a terceira língua
que aprendi. — Ele solta um som aliviado. — Diga-me como ajudar.
— Teremos uma webconferência na segunda à tarde. Seria de
grande ajuda se puder participar — informa. — Será basicamente traduzir
todo o teor da conversação.
— Ótimo! Farei com prazer. — Aceito, sentindo uma alegria boba
me invadindo por ele ter pensado a respeito do meu pedido. E por
finalmente acabar com o meu tédio.
Karim me observa um instante em silêncio.
— Tem estado a maior parte do tempo aqui no quarto?
— Sim, o príncipe babaca não me deixou outra opção, sabe. — O
alfineto. — Além disso, tenho medo de sair, fazer algo inadequado e ir
parar no calabouço.
Karim sorri profundamente. Meu peito vibra apreciando seu
momento descontraído.
— É uma preocupação válida levando em conta sua língua solta,
princ… — Levanto minha sobrancelha e ele corrige: — Anna.
— Touché. — Concordo, rindo. — Mas é sábado, o que se faz por
aqui nos fins de semana?
— Hoje Nuria está recebendo as três sobrinhas na faixa etária de
Ayla e nem preciso dizer como minha filha estava animada quando a deixei
na ala leste. Então, estou sozinho. Geralmente fico com Ayla nos fins de
semana. — Me derreto com o amor com que fala da princesinha. Meu
encantamento pela pequena esperta só tem crescido nessas quase duas
semanas. — Às vezes, visito as tribos no deserto. Meu pai amava o deserto
e passou esse amor para mim. — Seu olhar fica mais nostálgico ainda
quando murmura: — Yasmina amava também.
Meu coração aperta ao ouvi-lo mencionar a esposa morta.
— O deserto é mesmo fascinante — concordo. — Pena que não
terei outra oportunidade para fotografar as tribos — lamento. Estou sem a
minha segurança, pois Lawrence foi enviado de volta a Nova York, junto
com meu professor e colegas de curso, antes do fechamento do espaço
aéreo e fronteiras terrestres. Quando Karim descobriu o meu sequestro, agiu
rápido, enviando os outros para casa.
Seu rosto franze um pouco. Em seguida, seus olhos cintilam.
— Em duas semanas, no máximo, os conflitos já terão cessado. —
Me diz em tom de confidência. — Vamos pegar os dois grupos restantes e
tudo voltará ao normal.
— Isso é ótimo! — Exclamo, torcendo para que tenha razão e eu
possa voltar para casa.
— E se ainda quiser fotografar as tribos, eu mesmo a levarei.
Minha respiração trava, euforia me tomando por completo.
— Se ainda quiser? Eu vou amar! — Minha euforia faz o brilho de
seus olhos se intensificar.
— Então, temos um acordo — diz solenemente. — Mas, por ora,
topa dar um passeio de jipe comigo? Prefiro os cavalos normalmente, mas
ainda não fui liberado para cavalgar. — Sua proposta me deixa ressabiada e
ele ri, percebendo. — Não é um encontro, Anna. Estou apenas tentando ser
o anfitrião que devia ter sido desde o começo.
Sua sinceridade e esforço me convencem. Mas não resisto a uma
provocação:
— E se eu pular em cima de você, Alteza? Seu charme de príncipe
do deserto pode ser demais para essa pobre garota ocidental…
Seus olhos escuros ficam mais intensos e ele sorri, um tipo de
sorriso que faz borboletas saltitarem em minha barriga.
— Você é sempre tão debochada? — pergunta em tom mais baixo.
Um sorriso enrola minha boca.
— Nah, apenas metade do tempo.
— E na outra? — inquire, um brilho divertido em seus olhos.
— Na outra, adoro provocar príncipes convencidos, meu senhor. —
Murmuro. Ele solta a risada profunda que abala minhas estruturas. Jesus…
— Então, você vem? — pergunta, voltando ao passeio.
— Tudo bem. Posso pegar minha máquina fotográfica? — Estou
quase saltitando, parecendo Ayla quando lhe apresentei CNCO em nossa
aula de ontem.
— Sim, também levarei a minha. — Ele diz e o encaro abismada.
— Você gosta de fotografia? — inquiro.
— Sim, desde muito novo. Minha mãe me presenteou com a
primeira máquina ainda adolescente e, desde então, não parei mais de
registrar o mundo à minha volta. — Sua voz empolgada me faz sentir
estranhamente mais próxima dele. É como se estivéssemos nos conhecendo
hoje, aqui e agora, e eu gosto do que vejo. Gosto muito. — Vou esperar lá
fora. E troque essa blusa, por Allah — adverte. —Embora sua barriga nua
seja uma visão agradável, pode chocar meus funcionários. — Sinto meu
rosto corando com sua observação e elogio.
Cubro minha cintura com meus braços e um sorriso perverso curva
sua boca.
— Até já, ‘amira — sussurra, passando bem perto de mim.
***
Anna Julia
Eu giro com Ayla nos braços e a pequena sorri, jogando a cabeça
para trás. A cabeleira está solta hoje, para dar um efeito dramático no
reggaeton de CNCO. Rodo pela sala inteira enquanto os versos de Quisiera
espocam no sistema de som do seu quarto. Pedi às duas babás que
aproveitassem para fazer uma pausa, gosto de ficar à vontade com a
princesinha. Ela é muito podada, todo mundo dizendo o que pode e o que
não pode. Muito chato! Afastei os móveis e o espaço conseguido é quase
um salão de baile. Tiramos as sandálias e estamos bailando desde que
encerramos a aula de inglês. Giro pela varanda, sob o sol. A pequena
gargalha, as mãozinhas apoiadas em meus ombros.
— Cante, pequenina! — Atiço-a. Sua risadinha infantil ressoa na
varanda enchendo meu coração de leveza e alegria. Estou apaixonada por
essa menininha esperta. Ao longe, através do primeiro muro, podemos ver
os funcionários cuidando dos seus afazeres. Quando me lembro que estou
usando apenas o top e calça de malhar, volto para dentro rapidamente, nós
duas gargalhando pela nossa travessura. Não quero ser presa por atentado
ao pudor. Canto bem alto e Ayla me segue. A sapequinha vai acabar
aprendendo espanhol também de tanto que gostou dos meus meninos
preferidos.
(...) E se você for quem vai me dar tudo o que eu sempre sonhei? Quem vai
dizer ao coração que eu nunca mais vou te ter? [17](…)
Coloco a pequena no chão ao chegar no meio da sala. Começo a
dançar os passos marcados. Ela me segue. Ficamos frente a frente,
marcando os passos como lhe ensinei. Balanço meus ombros para frente e
para trás, bem espalhafatosa. Ela ri, fazendo o mesmo. Jogo meu cabelo
solto, balançando-o no ritmo da música. Ayla gargalha jogando o seu
também.
— Isso, Aylinha! — Sopro-lhe um beijo. — Linda! — Continuamos
agitando os ombros e nossos cabelos, fazendo algazarra. Estou suada,
pegajosa. Adoro dançar. Libera todas as energias negativas e ainda ajuda a
manter a forma. Embora nessa semana eu tenha malhado na academia
pessoal de Karim. Pois é, o cretino não me disse nada e quase me matou de
tédio nas primeiras semanas!
— Anninha, vou fazer xixi! — Ayla anuncia, colocando a mãozinha
na boca, encobrindo uma risada. Eu lhe disse que só pode falar dessa forma
em privado. Ela corre, atravessando o amplo espaço, sumindo pelo corredor
do seu closet e banheiro.
Rio e me jogo na dança, faço os passos mais difíceis, requebro os
quadris com movimentos sensuais que não são convenientes de se ensinar à
pequena. Giro pelo salão, mesclando passos de balé, que pratiquei por
muitos anos, com o reggaeton. Giro nas pontas dos pés e sorrio mais,
fechando os olhos, sentindo a endorfina me tomar por inteiro. Suor desce
pelo meu pescoço, escorrendo entre os seios. Estou envolvida na música,
nos passos, girando, girando, mexendo os quadris, correndo as mãos pelo
meu corpo, até que colido com um corpo duro. Mãos mornas me seguram
pela cintura nua e engasgo, abrindo os olhos, arregalando-os ao dar de cara
com uma barba bem-cuidada, que conheço bem. Continuo subindo até
encontrar os olhos escuros de Karim, flamejando, fixos em meu rosto.
Apoio as mãos em seus ombros, minha respiração entrecortada, tanto pela
atividade física quanto pela proximidade dele. CNCO continua cantando
enquanto nos fitamos.
(...) E venha, minha princesa, que o tempo não volta. E eu por você coloco
o mundo de cabeça para baixo. Rosas, chocolate eu quero te dar. Um
milhão de beijos eu tenho para te dar (...)
Seu olhar desce pelo meu colo, os seios mal contidos pelo top
pequeno. Meus mamilos ficam duros, excitação espiralando em minha
barriga. Sinto minha calcinha molhando. Seu rosto abaixa, a boca
respirando asperamente na minha, nossos lábios quase se tocando. Seus
polegares deslizam em minha pele logo abaixo do top, na base dos seios,
ateando fogo em cada célula do meu corpo. Arquejo baixinho, minhas
pálpebras querendo se fechar, minhas pernas ficando moles. Seu corpo, suas
mãos, seu cheiro me tentando a me entregar à atração esmagadora que sinto
por esse homem. Seus olhos negros estão me devorando, sem máscaras.
Temos feito isso cada vez mais, sempre que estamos perto, e foram muitos
os momentos nos últimos dias. O príncipe realmente está levando a sério a
coisa de ser um bom anfitrião. Ao mesmo tempo que acho difícil resistir a
ele, gosto muito da sua companhia e continuo aceitando os convites,
ansiando estar perto, pelo menos conversar com ele.
— Nour Al sabah. — Murmura, as narinas alargando. Ele acabou de
me chamar de “luz da manhã”? — ‘Amira, espero que não esteja ensinando
esse movimento de quadris para minha pequena.
Sua voz tem um toque de diversão, mas sua expressão não suaviza,
o desejo é nítido, queimando nas íris negras. A essa altura, nós dois
sabemos que sentimos tesão um no outro. Não dá mais para disfarçar, por
mais que tentemos e nos empenhemos muito. Quando nossos olhares se
cruzam, nos tocamos, como agora, não há palavras que possam negar isso.
— Ela foi ao banheiro. Não me viu fazer… — Minha voz sai rouca,
quase um gemido. Seus polegares tornam a fazer círculos provocadores em
minha pele, o brilho em seus olhos se tornando perverso, observando
minhas reações. — Você já pode me soltar. — Murmuro, acionando cada
grama de controle dentro de mim.
Suas mãos apertam a minha cintura, sua respiração quente batendo
em minha boca. Por um instante agonizante ele parece que vai sucumbir e
me beijar. Minha boca saliva, esperando, desejando. Emite um som
frustrado, inalando fortemente, então me solta. No primeiro momento, ainda
fico na mesma posição, minhas mãos em seus ombros, minhas pernas não
obedecendo meu cérebro para manter distância. Sua boca desliza pela
minha face suada e ele respira na minha orelha, me fazendo arrepiar e
minha calcinha alagar completamente. Deus… Meu corpo estremece
inteiro, nunca desejei sentir um homem dentro de mim como o desejo
agora.
— Você precisa ir ou vou colocar minhas mãos de volta, Anna. —
Sussurra com aspereza no meu ouvido. Eu acordo do transe e me afasto
finalmente, tomando uns bons passos de distância. Um sorriso malvado e
masculino brinca em sua boca, enfiando as mãos nos bolsos das calças e
aproveito para olhá-lo também. Está usando uma calça escura e camisa
branca com gravata. Ele se veste de acordo com a pessoa com quem irá se
reunir, já percebi. Isso é atencioso. Se é um chefe de uma das nove tribos,
ele usa as vestes típicas. Se é alguém do Ocidente, ele se veste a caráter
para deixar o visitante à vontade. Seus cabelos longos estão no coque
masculino que tanto adoro. Ele fica com uma aparência exótica de sheik do
deserto. Lindo.
— Papai! Você já chegou! — A voz animada de Ayla entrando no
recinto quebra a nossa troca carregada de tensão sexual. Desvia a atenção
para a filha que corre, pulando em seus braços. Ele a pega, mesmo sabendo
que está suada. É um pai maravilhoso. Os observo interagindo, percebendo
que sentirei falta não apenas da menininha bonita, mas de seu pai também
quando eu voltar para casa, e o momento está perto. Ontem, conseguiram
prender o grupo insurgente que estava no deserto. De acordo com Karim e
Jalal, o da capital está com os dias contados. Eles estão tendo apoio de
alguns emirados vizinhos na caçada aos revoltosos. O Catar foi o que mais
enviou reforço militar.
Karim tem me falado sobre tudo e, inclusive, parece apreciar a
minha opinião sobre o assunto. O aconselhei a ouvir cada um dos rebeldes,
separadamente, evitando aplicar a mesma sentença para todos. Pelo menos
nisso eu e o grão-vizir concordamos, de acordo com o príncipe.
— Você dançou muito, nour hayati? — Ele pergunta, beijando-a na
bochecha rosada. Acho linda a forma como a chama “luz da minha vida”.
— Sim, a Anninha dança tão bem, você precisa ver, papai. — Ayla
responde na sua euforia característica.
Os olhos penetrantes de seu pai vêm para mim. Ofego baixinho
quando descem lentamente pelo meu corpo e sobem de volta, prendendo-
me.
— Eu já vi, princesinha — murmura com um meio-sorriso. — Ela é
muito boa mesmo.
Rolo meus olhos e viro as costas, indo pegar meu caftan na
poltrona. Sinto os olhos negros às minhas costas e minha veia provocadora
leva a melhor quando me abaixo sem necessidade, fingindo estar
procurando algo no estofado, minha bunda virada para ele. Depois de uns
instantes me endireito, puxando a túnica sobre a cabeça e prendendo meus
cabelos em um nó. Minha respiração ainda está normalizando enquanto
calço minhas sandálias baixas. Pego o controle desligando o som e só então
me viro. Karim tem uma sobrancelha irônica levantada para a minha
pequena exibição. Pego minha bolsa, colocando o celular dentro e ando até
eles.
— Almoce com a gente, ‘amira. — Sua voz está rouca, alcançando
todos os recantos proibidos dentro de mim, me arrepiando.
Fico tensa, lambendo os lábios. Nas outras vezes tem sido Ayla a
exigir que me junte a eles em suas refeições, geralmente o almoço. Estar
mais tempo perto dele é brincar com fogo. Um de nós pode sair queimado.
— Eu não quero atrapalhar seu momento com Ayla. Posso comer
em meus aposentos — digo com sinceridade.
— Anninha, por favor, almoça comigo e meu papai. — Ayla faz
beicinho e, Jesus, eu juro, essa menina pode conseguir tudo de mim, isso
em menos de um mês. — Por favor — repete.
— Sua sapequinha linda. — Brinco, afagando seus cabelos e
rostinho suados. — Está bem, pequena, eu vou. Vá tomar um banho bem
gostoso que estou indo tomar o meu também. — Ela sorri; agora são dois
dentes faltando na frente. Levo minha atenção para Karim: — Nos
encontramos em trinta minutos? — Seus olhos estão ainda me fitando
intensamente.
— Leve o tempo que precisar, meu primeiro compromisso da tarde é
só às 15h30. — Seu olhar continua fixo no meu e murmura: — Estou
inclinado a me inscrever nessa aula, gostei bastante da sua metodologia,
‘amira… — Seu tom e olhar são sexys. Ele é um sádico. Sempre vem com
esses flertes aparentemente inocentes que me deixam explodindo de
excitação.
— Shukran. Talvez eu use uma banheira de espumas para relaxar os
músculos depois da dança. — Devolvo na mesma moeda. Seus olhos
estreitam, o brilho flamejante intensificando me deixa saber que está
recordando que me viu nua, nadando na piscina. Encaro a pequena: — Até
daqui a pouco, princesinha.
Dou um aceno para seu pai perigosamente gostoso e giro nos
calcanhares. Saio de lá fingindo uma leveza que estou longe de sentir
quando o príncipe está por perto.
Tomo meu banho, lavando e secando os cabelos com tranquilidade.
Visto uma calça jeans skinny e uma blusa de seda branca com mangas
compridas, sandálias Anabela. Deixo os cabelos soltos, optando por aplicar
apenas um rímel e brilho nos lábios. Meu celular toca em algum lugar e eu
saio procurando-o até encontrar sobre um dos sofás. Um sorriso repuxa
meus lábios ao ver o nome de Ella no visor. Nos falamos todos os dias, é
uma prática nossa desde pequenas.
— Ei, prima! — Exclamo, aceitando a chamada de vídeo. Logo o
rosto bonito preenche a minha tela. Ela sorri, os olhos verdes brilhantes.
— Me diga que as coisas com o príncipe já evoluíram, prima.
Preciso me distrair dessa barriga enorme aqui. — Jorra em cima de mim,
focando sua barriga realmente grande de oito meses. Minha afilhada, Ciara,
chega no próximo mês e já estou ansiosa para corromper essa menina.
— Sua barriga está linda, Ella, pare de drama. — Rolo os olhos e
resmungo: — Quanto às coisas com o príncipe, elas não vão a lugar
nenhum, sossegue.
Ela faz uma careta.
— Mas você disse que está atraída por ele, que se sente viva quando
está…
— Oh, meu Deus, eu disse tudo isso, não foi? — Zombo,
dissimulando meus sentimentos. Minha prima estreita os olhos. Ela me
conhece bem. — É uma atraçãozinha. Não sinto quase nada, na verdade…
— Quase nada? Então por que seus olhos brilham quando menciona
o príncipe? — Inquire com um ar de espertalhona.
— Meus olhos não brilham. — Faço uma careta. — Você está vendo
coisas, prima. Devem ser os hormônios da gravidez.
— Isso, principessa mia, minta para uma pobre mulher grávida. —
Suspiro, ela vai recorrer à chantagem emocional.
— Você está longe de ser uma pobre mulher grávida, Ella. Mike
beija seus pés a cada cinco minutos.
Seu rosto adquire uma expressão maliciosa antes de murmurar:
— Os pés e outras partes também…
Uh, Ella ficou tão sem-vergonha depois que começou a namorar
nosso primo e depois se casou com ele. Mike, como vocês sabem, é um
dominador no quarto e, bem, minha prima me contou algumas coisas que
fazem, como a vez que a pendurou em cordas… Me preocupa a logística de
uma transa nessas condições… Porém, de acordo com Ella, nosso primo é
muito experiente nesse tipo de jogo. Por falar em logística, meus primos
gostosões Luc e Samu retornaram há duas semanas da lua de mel. Eles se
casaram com a mesma mulher, vocês sabem, Chloe. Garota corajosa… Rio
porque Lilla, a melhor amiga de Chloe, me colocou a par da dinâmica do
sexo a três na ocasião do casamento escandaloso de meus primos e minha
nova prima. Enfim, como diria meu pai, os Di Castellani não são de
brincadeira.
— Como está a minha afilhada? — Mudo o assunto. — No próximo
mês, estarei aí para assistir ao parto. — Seu rosto franze.
— Uh, de jeito nenhum, prima. Não quero você se intrometendo no
trabalho dos médicos. — Diz e faço uma cara injustiçada.
— Calúnia isso, prima. Sou a madrinha, tenho todo direito —
argumento.
Ella sorri suavemente.
— Estou com saudades já, Anna. Está tudo bem mesmo por aí? —
pergunta com um toque de preocupação.
— Está sim, carissima. Além disso, Karim prometeu me levar para
fotografar as tribos logo que tudo normalizar.
Seu rosto se ilumina com malícia.
— Humm, Karim, hein? — Diz com um sorriso vitorioso curvando
sua boca. — Minha intuição diz que você será feliz de novo, Anna. O
príncipe é um bom homem, dê uma chance, prima. — Não posso negar que
suas palavras fazem meu coração vibrar. Eu quero isso? Avançar, dar uma
chance a outro homem? — Ah! Aí está o brilho em seus olhos!
Faço uma carranca para a trapaceira.
— Você está trapaceando, como faz no cassino. — Reclamo e ela ri,
as mãos acariciando seu ventre protuberante. — Onde está Mike, que não
está aí beijando seus pés? — Alfineto.
— Ei, eu ouvi isso! — A voz de Mike vem de algum lugar no quarto
fora do meu campo de visão.
— Ella! Você comentou com Mike que estou atraída por Karim? —
Faço nova carranca. Seus olhos astutos brilham de satisfação.
— Ah, então temos uma admissão, prima? — Inquire e rolo os
olhos.
— Nem sob tortura, principessa. — Resmungo e ouço a risada
divertida dos dois intrometidos através do aparelho.
Conversamos por mais alguns minutos ainda, e quando nos
despedimos um sorriso suave se abre no rosto de minha prima.
— Ti amo, carissima. Cuide-se. — Meu coração fica mole com seu
carinho e amor por mim.
— Ti amo, principessa mia — murmuro. — Cuide de você e da
minha afilhada também.
Um sorriso afetuoso permanece em meu rosto todo o caminho para
os aposentos de Karim. Quando tem tempo para almoçar com Ayla, ele não
gosta da formalidade dos salões espalhados pelo palácio. Em seus aposentos
tem uma cozinha e mesa de refeições com quatro lugares. Ele me recebe à
porta, seu olhar quente percorrendo-me dos pés à cabeça. Me conduz para
dentro, uma mão apoiada na parte baixa das minhas costas, causando a
familiar ebulição em meu corpo. Ayla faz festa ao me ver. Está linda, num
conjuntinho de saia e blusa colorido. Percebo que a pequena tem um
guarda-roupa ocidental também. Seu pai é muito cuidadoso e atencioso com
ela e suas necessidades, falta apenas abrir os olhos para o papel que a
mulher conquistou na sociedade moderna, mesmo nas islâmicas. Precisa
garantir que sua filha, ainda que não herde o trono, não seja um mero
adorno para algum idiota que tente desposá-la no futuro. A princesinha me
pegou de jeito. Já estou pensando em defendê-la de um casamento
arranjado.
Quando seu pai começa a falar da nossa ida ao deserto e a minha
volta para casa, Ayla para de comer imediatamente.
— Papai, não quero que a Anninha vá embora. — A pequena solta a
colher no meio da sua sobremesa (creme de chocolate branco com frutas
vermelhas). Seus olhinhos suplicantes vêm para mim. — Você não vai, não
é, Anna?
Engulo em seco, meu coração apertando. Ah, Deus, vai doer me
despedir. Karim está com uma expressão reservada, me sondando.
— Ayla, nós já conversamos sobre isso, filha. — Ele vem em meu
socorro e agradeço porque não tenho condições de quebrar o coraçãozinho
dela neste momento. — Anna tem uma casa, família no Ocidente.
— Então vamos para o Ocidente também! — Oferece no alto da sua
inocência. Sorrio, meus olhos ardendo, testemunhando o carinho da
pequena por mim.
— Prometa que a levará para me ver. — Peço, tentando me
controlar. Karim traz o olhar escuro para o meu. Eu expiro lentamente. —
Sinto muito, eu não tenho nenhum direito de pedir isso. — Caio em mim,
percebendo o quanto meu pedido é descabido.
— Eu a levarei. — Me surpreende ao afirmar em tom mais baixo, o
olhar nunca deixando o meu. — Você é bem-vinda para nos visitar também,
‘amira.
Meu coração dá uma cambalhota no peito. O que isso significa? Ele
quer manter contato comigo? Por quê? Isso entre nós não vai a lugar
nenhum. Não pode ir. Levanto minha mão pegando minha corrente,
segurando o camafeu. Karim acompanha meu gesto e, em vez de aparentar
irritação como muitos dos caras que tentaram me namorar ao longo de seis
anos, seu olhar fica mais suave. Me compreende, e isso só me faz gostar
mais e mais dele.
Depois do almoço, Ayla e eu ainda ficamos por algum tempo com
seu pai. Pouco depois das duas da tarde, levei a pequena para a biblioteca,
onde teria aula de artes. De volta ao meu quarto, aproveitei para traduzir o
relatório enviado pela empresa alemã que está negociando gás natural com
Karim. No fim da tarde, estou me preparando para ir ao estábulo quando
meu celular apita, indicando uma mensagem. Farei um passeio pelas
redondezas, agora mais aliviada que o perigo no deserto passou. Termino de
ajeitar o boné sobre o meu rabo de cavalo e pego o aparelho sobre a cama,
desbloqueando a tela. Quando abro o aplicativo de mensagem, minha
respiração acelera ao ver o conteúdo.
Não está assinada, o número não está em meus contatos, mas sei de
quem é. Meu coração também sabe porque está disparando, batendo contra
a caixa torácica. Eu devia dizer não e acabar com esse sentimento que está
crescendo dentro de mim antes que seja tarde. Demoro a responder, duas
vontades guerreando em meu íntimo. Fecho os olhos, sua imagem nítida em
minha mente. Moreno, sexy, me convidando para passar um tempo com ele.
Meus dedos tremem, suam segurando o aparelho e, antes que responda,
outra chega:
Torno a fechar os olhos. Ele sabe que estou em conflito aqui. Oh,
Deus, eu quero, quero muito estar com ele. Resisto por alguns minutos,
então me levanto, decidida a ir. Todavia, não o respondo; se a razão voltar,
eu debando e me tranco aqui no quarto. Um pensamento bem covarde.
Urgh. Troco as botas de montaria por um tênis, uma vez que nosso destino é
a grama do campo de golfe. Um dos funcionários me leva de mini buggy até
o estábulo, fora do portão principal. Entro no local silencioso, exceto pelos
animais bufando. Sigo para a baia de Hércules, o preferido de Karim, e meu
coração volta a enlouquecer no peito quando paro na porta. Ele está
conversando em sua língua com o garanhão árabe. Fico em silêncio,
apreciando o porte majestoso de ambos. Karim está vestindo jeans, camisa
polo preta, boné sobre os cabelos soltos, caindo sobre os ombros largos.
Vejo o momento em que sente a minha chegada, ele para a conversa e olha
por cima do ombro. Seu olhar tem uma mistura de apreciação e alívio
quando me cataloga dos pés à cabeça na minha calça jeans justa e baby look
branca, gola polo.
— Olá — digo, sentindo-me como uma adolescente sem saber como
agir perto de um homem desse calibre.
— Você veio — murmura. De repente, parece que há um significado
implícito nessa simples frase. Faz sinal com a mão. — Vem, me deixe
apresentá-la à rainha daqui. — Brinca e me ordeno a manter o controle.
Ando devagar, incerta até ele, que apoia a mão em minhas costas.
Estremeço. Como um toque despretensioso pode inflamar tanto?
Me apresenta uma magnífica égua branca, seu nome é Queen, por
isso a brincadeira. Falo com ela, acariciando sua crina. Posso sentir o olhar
de seu dono sobre mim, estou nervosa, excitada. Ela é linda. Acaricio seu
focinho e ela me cheira, abaixando a cabeça, querendo mais do meu toque.
Me pergunto se pertencia à sua esposa falecida.
— Ela gosta de você. — A voz de Karim é rouca. — Chegou no
mês passado, junto com mais dois. Vieram do Reino Unido — esclarece,
me fazendo sentir aliviada e me odeio por isso. Não posso ter ciúmes de
uma mulher que não está mais aqui, seria muito egoísta e descabido da
minha parte. Expulso rapidamente o sentimento. — Monte-a, ‘amira —
sussurra; sua voz e seu corpo próximos demais para a minha sanidade.
— Karim, seu ombro. — Lambo os lábios, minha garganta seca. —
Já está liberado para montar? — Seus olhos cintilam, apreciando a minha
preocupação.
— Está tudo bem, Anna — murmura, sua voz uma nota mais
profunda. — O médico me liberou para montar. — Volto a engolir em seco.
Parece haver um duplo sentido na última frase e isso me deixa agitada. —
Vamos, quero aproveitar o resto da tarde.
Montamos nossos cavalos e em minutos ganhamos o deserto.
Suspiro, uma sensação gostosa se espalhando dentro de mim enquanto
cavalgamos lado a lado. Hércules vira para a direita e o sigo, o campo de
golfe surgindo num espetáculo cercado de areia por todos os lados. Há
palmeiras, pequenas e grandes árvores e um lago artificial dividindo
sinuosamente a área extensa. Passamos por uma espécie de guarita, onde
um funcionário reverencia seu príncipe e abre o portão de acesso com
presteza. Sigo atrás de Karim até que ele para numa área calçada de blocos,
árvores frondosas ladeando. Ele desmonta e faço o mesmo. Dois
funcionários surgem pegando as rédeas dos cavalos. Karim coloca a mão
em minhas costas e me guia para um dos caminhos ladeado de grama bem
baixa. Paramos numa elevação do terreno e é algo bonito de se ver. Mesmo
sendo uma construção artificial, é cuidadosamente planejada para
impressionar.
— Eu não sei jogar golfe, acho que é um bom momento para dizer.
— Digo, mordendo meu lábio. Ele me olha de soslaio e sorri. Meu
estômago se agita. Deus, parece que a cada dia que passamos juntos o
homem fica mais bonito. Isso vai ser difícil.
— Eu sou um bom professor. — Diz de forma enigmática,
estendendo a mão para mim e murmura: — Vem, ‘amira.
Fico encarando sua mão por alguns instantes tensos. Subo meus
olhos para os seus, não conseguindo resistir à intensidade com que me fita,
seu rosto moreno, perfeito, estendo minha mão sabendo que estou indo com
ele em mais de um sentido. Estou trilhando um caminho que talvez não
tenha volta. Sua mão engole a minha e meu corpo inteiro arrepia. Ele sente
isso e dá um aperto suave, talvez para me tranquilizar. Então, descemos
pelo estreito caminho, nossas mãos unidas e meu coração galopando
freneticamente. Outros dois funcionários estão nos esperando na borda do
gramado mais à frente com o buggy equipado com tacos e bolas. Karim
agradece aos homens e me ajuda a entrar no pequeno veículo. Cruzamos a
ponte por cima do lago, tomando distância de onde estão os funcionários. A
brisa do fim de tarde está agradável. O deserto esfria à noite. O carro para
próximo do primeiro buraco. Sou péssima nesse esporte. Dam, que é um
exímio praticante, já tentou me ensinar. Mike também, mas não levo jeito.
Pego o saco de bolas enquanto Karim segura a alça do saco de tacos,
colocando-o no ombro esquerdo. Sua mão direita estende em minha direção
outra vez e eu a seguro me sentindo… Feliz. Posso admitir isso, estar com
ele me faz feliz. Chegamos ao primeiro buraco e o observo organizar tudo,
pegar os tacos, inspecionando-os, e faz o mesmo com as bolas. Coloca uma
bola pronta para a minha iniciação. Pega um taco menor.
— Sinta-o. Um taco é como um sapato, precisa se ajustar
perfeitamente. — Estende-o para mim. O pego, testando, sentindo o peso.
Parece bom para o tamanho da minha mão. Assinto. — Não queremos essas
lindas mãos e pulsos com calos ou torções. — Murmura e pega meu
cotovelo, me levando até a bola. Prendo a respiração quando o sinto atrás de
mim, as mãos pousando em minha cintura. — Relaxe o corpo, Anna. —
Como se fosse possível. Bufo mentalmente. Aperta minha cintura
suavemente me fazendo ofegar. Minhas costas apoiam contra a sua frente.
Estamos perto, tentadoramente perto. — Abra as pernas e flexione
levemente os joelhos. — Sua voz soa bem no meu ouvido. Eu convulsiono,
estremecendo. Umidade se reúne em minha calcinha, meus seios arrepiam,
implorando para serem tocados. Sinto-o me cheirando, e isso termina de
descontrolar meu corpo. — Levante o taco, assim, Anna. — Diz
enrouquecido, suas mãos deixam minha cintura e seguram as minhas, me
ajudando com o movimento. — Pronta?
— Sim. — Minha voz é quase um choramingo. Estou pronta pra
caramba! Torno a senti-lo me cheirando, a ponta do nariz arrastando
perversamente em meu pescoço. Sinto-me toda molhada, respirando
ofegante.
— Sim, ‘amira, você está. — Sussurra e parece uma eternidade o
tempo que ficamos na mesma posição, colados, nossas respirações erráticas.
Ele murmura algumas palavras em árabe, mas não consigo compreender, é
muito baixo. — Vamos lá, princesa! — Exclama, rompendo o momento
carregado de sensualidade, e movimenta o taco, me forçando a realizar um
giro de quadril e é nesse momento que o sinto duro, roçando em minha
bunda. Arfo, o taco acertando a bola, e em seguida lamento ao sentir seu
corpo deixar o meu. — Vem, vamos perseguir sua bola, Tiger Woods. —
Tenta descontrair, mas isso ainda sai tenso e rouco.
Me estende a mão e a pego sem hesitação, descendo o declive.
Perseguimos bolas por não sei quanto tempo. Ele me ajudou nas tacadas
muito mais do que era realmente necessário, todavia, não reclamei porque
estava, estou sedenta pelo seu toque. No jogo, porém, ficou constatado que
não sou digna nem mesmo de carregar os tacos do Tiger Woods — meu
desempenho foi sofrível. Humilhante. Karim se divertiu horrores me vendo
errar os buracos que, segundo ele, eram jogo ganho. No fim, ele acabou
dizendo que seu fisioterapeuta recomendou o golfe como exercício para a
recuperação do ombro. Pude ver um pouco da sua habilidade antes de
encerrarmos nosso passeio. Já havia escurecido, a lua e as luzes do palácio
nos guiando na nossa cavalgada de volta. Me lembrei da noite em que ele
entrou em minha vida, me salvando, se colocando na linha frente, se
ferindo. E me fazendo sentir coisas que estavam adormecidas há muito
tempo.
Andamos em silêncio pelo corredor de nossos aposentos. Meu
coração já apertado por ter que deixá-lo. Foi diferente hoje, mais… íntimo.
Paro à frente da minha porta. Essa cena tem se repetido muito nos últimos
dias. Ele para também, muito perto, os olhos de ônix penetrantes nos meus.
Sua mão levanta e minha respiração altera quando toca meu rosto,
deslizando os dedos numa carícia suave pela face direita. Seu olhar vai
ficando mais inflamado, faminto, contrastando com o toque suave.
— Anna… — murmura asperamente, o olhar caindo para a minha
boca. Cada pequena parte minha pulsa, desejando-o além do que consigo
entender.
— Karim… — sussurro, me afogando em seu olhar. — Eu… Eu…
— Eu sei, ‘amira… — Assente, praguejando em sua língua. — Eu
gosto de estar com você. — Confessa e meu coração canta.
— Eu também gosto de estar com você — murmuro de volta.
Posso ver o seu conflito interno, o mesmo que está em mim. Sua
mão aproxima da minha boca e minha calcinha alaga completamente ao
sentir seus dedos tocando meus lábios. Seu olhar me devora.
— Tão bonita — sussurra.
— Você disse que já tinha visto melhores. — O lembro e ele meio
que sorri, meneando a cabeça, seus olhos segurando os meus.
— Eu menti — murmura, inflamando-me inteira. Ficamos nos
olhando nessa queda de braço em que nenhum quer ceder, mas também não
quer abrir mão.
— Eu também. — Admito e seus olhos cintilam, um sorriso lindo
curvando sua boca. Ele a aproxima da minha.
— Boa noite, Anna — murmura, os olhos intensos fixos nos meus,
seu hálito vindo para dentro dos meus lábios entreabertos. Eu o bebo,
sedenta. Torna a passar o polegar em meu lábio inferior. — Durma bem,
‘amira. — E então se vira, andando rapidamente para o seu quarto. Fico
olhando-o até vê-lo entrar e abro a minha porta, passando para dentro.
Atravesso o living e paro na entrada do amplo aposento. Meu coração e
corpo estão quentes.
— Boa noite, amiri — sussurro, minha mão indo imediatamente
para o meu colar.
Meu peito aperta, dói, lágrimas turvando meus olhos. Estou
chorando por querer manter a promessa a Nate. Estou chorando porque
quero o homem que acabou de sair daqui. Não dá mais para mentir para
mim mesma.
— Me perdoe, por favor. Não consigo parar de querê-lo. Não
consigo.
***
Anna Julia
Eu olho o vídeo pela milésima vez. Sim, eu baixei. E agora estou
como uma retardada assistindo-o. Precisava ser tão bonito? Deus, preciso
superar esse príncipe. Alimentar esse sentimento só me fará mal. Gemo. Já
está fazendo mal. É tarde demais. Ele está em mim por toda parte. Olho
para sua imagem enquanto conversa comigo, então, me joga em seu ombro
parecendo um sultão otomano, me sequestrando para seu palácio. Urgh,
pare de ser tola, Anna. Ele irá escolher uma esposa perfeita no sábado. Uma
virgem, subserviente, tediosa até dizer chega. Todos aqueles passeios
estúpidos foram apenas porque o idiota queria entrar em sua calcinha.
Advirto-me. Ainda bem que faltam poucos dias para esse maldito baile, em
seguida iremos para o deserto. Dentro de quinze dias, no máximo, estarei
voltando para casa.
Meu coração aperta ao pensar nisso. O fim. O rostinho de Ayla me
vem à mente. Hoje de manhã não tive coragem de me despedir dela, então
apenas escrevi uma carta e pedi à babá para lhe entregar quando acordasse.
Eu a olhei dormindo, a beijei e saí, chorando por todo o caminho até o
aeroporto. Aquela menininha ganhou o meu coração. Ela e seu pai. Uma
voz enxerida em minha mente corrige. Quando voltei e esclareci as coisas
com seu pai idiota, fui até seu quarto, dando graças a Deus por ela não ter
acordado ainda, e peguei a carta de volta com a babá. A brisa da noite sopra
em meu rosto e fecho o penhoar, deixando a sacada, voltando para dentro
do quarto. Passa das dez da noite e estou inquieta. Jantei no quarto depois
que passei nos aposentos de Ayla para jogar xadrez com a pequena. A estou
ensinando, nem um pouco surpresa com a rapidez com que a sapequinha
tem aprendido. Sim, vou sentir muita falta da princesinha. Esses poucos
dias serão sempre lembrados com carinho.
E meu pensamento recai nele. Onde está? Entretendo a morena
bonita candidata a esposa perfeita? Me pergunto não deixando amargura e
despeito de lado. Estou angustiada, me segurando para não enviar uma
mensagem, dizendo que estou queimando para terminarmos o que
começamos no estábulo. Toco meus lábios ainda dormentes dos beijos
ardentes e famintos que trocamos. Meu corpo não vai sossegar e me deixar
dormir. Eu o quero. Desesperadamente. Foram dias desejando, sedenta para
provar sua boca. E agora que provei, estou em chamas. Se aquele
funcionário não nos tivesse interrompido… Meu Deus, eu o queria lá,
naquela baia rústica. Tenho fantasiado um final diferente do nosso
interlúdio desde então. Em minha mente, ele arranca a minha calça e me
penetra contra a parede, eu gritando com o volume grande e grosso de seu
pau me fazendo mulher de novo. Arfo, minha calcinha molhando
miseravelmente. Já usei meu mini vibrador, mas em nada aliviou, só me
deixou ainda mais incomodada e consciente de que preciso de mais. Depois
de seis anos, meu corpo está exigindo mais. Preciso de Karim.
Estou prestes a ligar para Ella, chorar minhas desventuras amorosas
no deserto. Ainda são oito horas em Londres, minha prima ainda está
acordada. A campainha tocando faz meu coração saltar, meu corpo voltando
a pulsar descontrolado. É ele? Pergunto-me. Uma parte de mim rezando
para que seja e a outra, uma bem pequena, desejando que não seja, será
mais fácil para mim. Ajeito meu penhoar branco, afofo os cabelos e me
dirijo para a porta, abrindo-a. E meu corpo esfria drasticamente porque
parada do lado de fora do meu quarto está a tal morena. Latyfa. Nuria me
colocou a par de tudo que Karim não teve a decência de me dizer. A mulher,
na casa dos trinta, acho, é mesmo muito bonita. Mas sua cara não é nada
agradável neste momento.
— Podemos conversar um instante, princesa? — pergunta, me
medindo dos pés à cabeça. Um frio desconfortável percorre a minha pele.
— O que teríamos para conversar? — pergunto, levantando uma
sobrancelha altiva, tão logo me recupero da surpresa indesejada.
Um sorriso de escárnio se abre em sua boca.
— Eu a vi de pouca vergonha, em vias de fazer sexo com o príncipe
Karim no estábulo. — Cospe com nojo.
Isso me faz retesar. Ela está nos vigiando?
— Pois é, nós quase fodemos — digo com petulância para chocá-la.
— Fomos interrompidos, uma pena. Mas não vejo como isso possa ser da
sua conta. — Atiro. Ela fecha a cara.
— Tive que enviar aquele garoto para conter a empolgação… — Ela
diz com desprezo e despeitos óbvios. — Você está sendo tola e estúpida se
acha que o príncipe vai deixar seu dever. Você é apenas diversão para ele.
— Bem, isso ainda não é da sua conta, e tenha certeza de que não é
bem-vinda. Portanto, retire-se da minha porta. — Levanto o queixo, não me
deixando intimidar pelo olhar gelado da morena.
— Não antes de dar o meu recado, ocidental. — Ela me chama de
forma pejorativa e isso me irrita muito. Quem essa infeliz pensa que é?
— Escute aqui, minha filha, quem diabos pensa que é para vir me
incomodar em meu quarto?
Seus olhos escuros me assustam quando murmura:
— Sou a futura esposa de Sua Alteza. Ele vai me escolher. —
Assegura com uma certeza que me irrita. Pega o celular e abre, em seguida
me mostra a tela. Gelo desliza em meu estômago, ela está com Karim e
Ayla no salão de refeições. Meus olhos ardem ao vê-la segurando Ayla no
colo enquanto sorri para seu pai. Ele também está sorrindo. Fecho os olhos,
empurrando o aparelho para ela. — Tivemos um jantar muito agradável
ainda há pouco. — Sinto a dor da traição cortando fundo. Ele queria transar
comigo, sabendo que jantaria com ela? Está me encarando vitoriosa quando
arrasto minha atenção para seu rosto bonito, mas frio, parece uma estátua de
pedra. É assustadoramente frio. Muito diferente da imagem sorridente do
jantar. — Não fique triste, é assim que os homens árabes são. Eles adoram
comer as putas ocidentais, mas sempre se casam com as mulheres de sua
terra. Mulheres como eu, adequadas, respeitáveis, que nunca o exporão
como você fez hoje.
Meu íntimo torce com sua ofensa escancarada. Tristeza, decepção
tomando conta de mim. Era tudo que ele queria, me foder? O veneno da
mulher me atinge, não posso evitar.
— Saia da minha porta ou vou chamar a segurança. — Ameaço,
além de irritada. — Por que se deu ao trabalho de vir aqui me mostrar sua
encenação de família feliz com o príncipe?
— Para que saiba o seu lugar. Você pode ser uma princesa, mas
nunca será uma de nós — diz friamente. — Vá embora. Pare de se rebaixar,
tentando atrair a atenção de um homem que nunca a levará a sério.
— Saia. — Cerro os dentes.
— É a verdade. Ele ia te comer num estábulo, isso mostra que não a
respeita. — Continua destilando veneno. — Ele sabe que ocidentais são
fáceis, sem moral. Vá embora e pare de envergonhar sua família agindo
como uma prostituta.
Mas que merda! Aí já é demais.
— Escuta, sua cadela, vá para o inferno com seus conselhos! — A
empurro da minha frente. Ela desequilibra um pouco, afastando-se, me
lançando um olhar mortal. — E se voltar a abrir essa boca nojenta para me
ofender, vou te meter um processo nessa sua bunda recalcada. Mas não
antes de meter a mão na sua cara! Será que fui clara?
Ela levanta o queixo, olhando o corredor vazio, e volta a me encarar.
— Não diga que não avisei, princesa. — Lança a ameaça. Faz uma
mesura debochada e se vai, finalmente. Fico olhando-a por um momento,
sem acreditar na ousadia da cadela.
— Cadela louca — murmuro e fecho a porta.
Avanço pela sala, com raiva do atrevimento da vadia. Com raiva de
Karim por me tratar como a uma qualquer. Ela tem razão. Fecho os olhos
envergonhada porque desejei que tivesse me feito sua lá naquele estábulo.
Ele tinha um jantar com ela e queria se divertir comigo antes.
— Estúpida. Estúpida! — Rosno para mim mesma.
Nosso primeiro beijo, tão especial para mim, agora parece uma
coisa sórdida. Ela tem razão, ele nunca colocará uma ocidental como sua
esposa e rainha. Oh, Deus, eu não pertenço a este lugar, por que me mata
saber que não terei nenhuma chance com ele? Lamento ter decidido vir a
este país. Lamento tê-lo conhecido e bagunçado minhas emoções.
Fico remoendo meu infortúnio por um tempo, então, ligo para Ella.
Preciso conversar com alguém ou vou explodir.
— Prima, está tudo bem? — Seu rosto está preocupado quando
surge na tela. Já nos falamos hoje logo após o imbecil ter me arrastado
daquele voo.
— Não, nada está bem, prima. — Suspiro longamente. — Você
estava certa, eu… — Limpo a garganta, desconfortável em admitir isso. —
Eu me envolvi com o príncipe. — Faço uma careta. — Mais do que deveria.
Seu rosto fica ainda mais preocupado. Se recosta nos travesseiros da
cama.
— Oh, Anna, e por que isso é ruim? — pergunta com suavidade.
— Não temos futuro juntos, Ella. — Pronunciar isso em voz alta me
causa um aperto doloroso no peito. — Ele tem um dever com seu povo.
Precisa fazer um casamento de Estado.
Ela fica calada por um tempo, seus olhos verdes cheios de empatia
para mim. — Pelo que Mike me conta, Kamar é um emirado muito
conservador. — Concorda, triste.
— Por outro lado, se depois de tanto tempo seu coração se abriu
para outra pessoa, talvez deva tentar conversar com o príncipe. Você já
disse a ele como se sente?
Eu bufo. Foda-se o cretino!
— Não, eu não disse e não vou dizer. — Ranjo os dentes. — O
imbecil estava brincando comigo. Todos aqueles passeios estúpidos eram só
para entrar na minha calcinha. Ele tem a porra de um baile marcado para
sábado onde vai escolher uma cadela treinada.
— Uma cadela treinada? — Franze a testa.
Reviro os olhos.
— Sim, uma esposa adequada, dessas que pulam num pé só,
colocam a língua para fora e rolam no chão, se o honorável príncipe
ordenar. — Explico, meu despeito claro.
Minha prima acaba rindo da minha analogia. Faço carranca e ela
põe a mão na boca, contendo o riso. Seus olhos vão se iluminando com algo
depois de um instante. Ela tinha esse mesmo brilho quando decidiu ir atrás
de nosso primo e tornar a vida dele muito difícil…
— Onde está a minha prima ousada que me aconselhou ficar nua no
quarto de Mike? — pergunta, levantando uma sobrancelha travessa.
Ops… Rio. Culpada. Eu realmente lhe dei esse conselho. Valeu
totalmente a pena, pelo que ela me contou depois.… Gemo, me sentando na
cama.
— Eu acho que não é tão fácil quando é com a gente, prima —
zombo.
Ela sorri, terna.
— Si, prima, nunca é fácil quando sentimos na pele — concorda. —
Você disse que está se dando bem com Nuria, não é? — Assinto, sem
entender aonde quer chegar. — Ela é a chave, principessa mia — diz com
um ar de sabichona. — Você vai pedir a ela que a leve ao melhor estilista da
capital e vai encomendar o vestido mais arrasador.
— O que…
— Ainda não terminei, ouça. — Ralha. — Você vai se vestir com os
trajes típicos de uma princesa árabe, Anna. Mostre a esse príncipe o quanto
será um grande tolo se não escolher você, prima.
Me levanto, suas palavras me inflamando, fazendo um sorriso
satisfeito rastejar em minha boca. Eu não disse que Ella só tem uma carinha
de boneca delicada? Essa menina não é de brincadeira.
— Ele é um grande tolo, um idiota completo. — Desdenho e ela ri,
sabendo que estou de birra. — Mas não posso negar que sua ideia é
esplêndida, Ella!
Minha prima sorri satisfeita e seus olhos verdes ficam ainda mais
perversos quando murmura:
— E se tiver um carinha que possa dar atenção nesse meio-tempo?
— Sorri baixinho e olha de lado. Percebo que Mike deve estar no quarto. —
Nada como uma boa concorrência para fazer os príncipes tolos ficarem bem
espertos, carissima.
— Com quem está falando, boneca? — Ouço a voz do meu primo
em segundo plano.
— Com Anna, amore mio. Não demore a vir para a cama. — Ela diz
na sua melhor voz melosa para o marido.
— Já estou concluindo aqui, princesa. Vou beijar você inteira
quando chegar aí… — Mike responde.
Uh. Reviro os olhos e ela sorri, malícia e safadeza tomando seu
rosto.
— Entendeu meu ponto, prima? — Balança as sobrancelhas, se
parecendo muito comigo mesma neste momento. — Nunca pensei que diria
isso, mas é hora da velha e boa Anna balançar um pouco as estruturas da
Arábia.
Rio alto e em seguida finjo choque:
— Oh, prima, é sério que está me incentivando a ser mal
comportada? — Ela sorri, seus olhos brilhando na nossa velha
cumplicidade. A imagem de Zafyr, o irmão de Jalal, espoca em minha
mente e meu sorriso se torna muito malvado quando sussurro: — Traje das
mil e uma noites, anotado. Outro príncipe, que por acaso é o primo do
honorável, anotado!
Tornamos a rir alto. Mike pergunta o que é tão engraçado. Eu grito
que sua mulher é um perigo e ele ri, concordando. Quando me despeço,
minha mente já está girando, criando mil cenários para esse baile.
No dia seguinte, Nuria me mostrou que as princesas árabes também
sabem provocar uma boa cena de ciúmes. Ela adorou a ideia de Ella e
fomos a Jawahra, na sua estilista particular. A moça muito simpática
pareceu verdadeiramente encantada em vestir uma princesa ocidental com
trajes do Oriente.
— Acha que Zafyr não vai se ofender por eu estar usando-o de
forma descarada? — pergunto preocupada. Nuria desvia a atenção da janela
e me olha. Estamos numa das limusines reais voltando para o palácio. O sol
está se pondo no horizonte. A tarde foi muito proveitosa e divertida.
Aproveitamos para ir ao mercado e acabei comprando alguns hijabs[22]
coloridos para usar quando formos para o deserto. Comprei uns lindinhos
para Ayla também, embora Nuria tenha me deixado a par de que as meninas
só começam a usar o hijab quando entram na puberdade. A pequena vai
adorar fazer farra comigo em privado.
— Meu cunhado é o rapaz mais apropriado para o que está
planejando, acredite-me, Anna. — Nuria sorri, e isso a deixa ainda mais
bonita. Ela é uma morena curvilínea de grandes olhos amendoados. Gosto
dela. Tem sido muito simpática comigo desde que fomos apresentadas. —
Zafyr pode levá-la para sair, circular fora do palácio, ele conhece algumas
“baladas” quentes, como costuma dizer.
Eu bato palmas, eufórica. É um bom plano. Não me sentirei como
uma mercadoria usada e deixada de lado quando entrar naquele baile.
Discutimos os detalhes, isoladas pela divisória, para não chocar o motorista.
Todavia, quando o carro para no pátio central, ladeado de palmeiras
majestosas, noto alguns carros pomposos mais à frente. Nuria emite um
som abafado e me olha com pena.
— Mais candidatas chegando… — murmura.
Meu íntimo retorce, meu coração saltando, e não de um jeito bom. A
limusine para e descemos. Mesmo que não queira, meus olhos vão para a
pequena comitiva à frente da escadaria e tudo termina de piorar quando o
vejo lá, sorridente, recebendo suas candidatas virgens perfeitas. Nuria
confirmou para mim que a noiva do príncipe precisa ser virgem, pura. Ando
ao lado de minha amiga, precisando passar por eles para alcançar o elevador
que leva aos meus aposentos. Ela aperta meu braço sutilmente, me passando
sua empatia, e pega o desvio do jardim que leva à ala leste, onde reside com
a família. Eu sigo em frente, andando com uma elegância e calma que estou
longe de sentir. Ele levanta a cabeça, seu olhar se fixando no meu enquanto
me aproximo do pequeno grupo. Ofego, meu corpo se descontrolando sob
seu olhar penetrante. As imagens de nós dois naquele estábulo invadem a
minha mente.
Minhas mãos ficam frias, suadas. Seu gosto, seu corpo junto ao meu
se confundem com sua imagem bem-composta de príncipe recepcionando
as potenciais esposas. Eu estava errada, continuo me sentindo como
mercadoria usada e descartada. Meus olhos ardem e os desvio dos seus. Me
obrigo a engolir o orgulho, a dor persistente em meu coração e abro um
sorriso ao chegar perto do grupo. Cumprimento-os como manda a boa
educação e subo os degraus. Talvez eu só deva ir embora de uma vez. Penso
ao entrar no elevador. Me encaro na parede espelhada. Estou pálida, meus
olhos cheios de lágrimas. Abaixo a cabeça, ciente de que há câmeras aqui,
não quero dar o gosto de ninguém me ver chorando.
Anna Julia
Saímos da limusine para o ar quente de Jawahra. O prédio do clube
é todo iluminado por arandelas. Amarelas, alaranjadas, verdes, num
espetáculo de luzes. É uma construção moderna em meio aos prédios do
centro histórico. Mais adiante, pode-se avistar o Museu Islâmico, uma
magnífica obra de arte em forma de construção na orla da única praia
liberada ao público. As outras são pagas e o acesso é só para quem tem
muita grana. É uma cidade linda, exótica, sofisticada, fascinante. Como o
seu príncipe. A voz estraga-prazeres buzina na minha cabeça. Rolo os
olhos. Zafyr coloca a mão em minhas costas e me guia por um caminho
estreito, cortando um jardim extravagante, pequenas luminárias ladeando os
blocos. Há uma fila enorme de pessoas aguardando entrada. Os seguranças
se curvam e retiram o cordão de isolamento imediatamente. Zafyr sorri do
seu jeito fácil e descontraído e dá tapas amigáveis nos ombros dos caras
grandes.
Ele é mesmo um príncipe rebelde, não é? Sorrio, gostando de ter
saído daquele palácio. Dois guarda-costas de Zafyr nos acompanham
discretamente. Puxo uma respiração profunda, olhando em volta, me
sentindo livre. Minha nossa, eu estava mofando naquele quarto! Ainda bem
que Ella me deu uma situada. Karim vai se casar com uma cadela treinada?
Bem, foda-se! Vou me esbaldar hoje, bebendo e dançando, amanhã volto a
pensar sobre o assunto desagradável. Estamos em um clube de dança latina,
pedi especificamente por algo assim para Zafyr. A essa altura já perceberam
que tenho um fraco por música latina, não? Pois é, meu pai cresceu no
Brooklin, o bairro mais latino de Nova York. Aprendi com ele a gostar
desse estilo musical. Minha mãe também ouve muita música espanhola,
então, foi muita influência. Apenas Lipe não curte essa vibe lá em casa.
Entramos no prédio e o clima ameno do ar-condicionado me acolhe.
Suspiro, meus olhos correndo satisfeitos pelo ambiente, confirmando ao
vivo o que vi pela página online. É um clube de luxo, com três pisos, bares
estrategicamente dispostos nos quatro cantos dos ambientes. Visto que é um
clube dançante, as pistas ficam desobstruídas, centralizadas, abaixo de três
degraus. Está tocando uma salsa agitada, muita gente dançando e meu corpo
começa a acordar, ansioso para mostrar alguns passos. Zafyr me garantiu
que dançaria comigo e não me faria passar vergonha.
— Quer tomar algo antes de deixar os caras babando ao redor da
pista, princesa? — Sorri, meio de lado. O cara está tentando sua sorte
comigo agora. Acha que pode transformar isso em um encontro de verdade.
A suspeita deve transparecer na minha cara, porque ele sorri mais uma vez.
— Não estou te cantando, Anna. Amihaj ameaçou cortar meu pau e mãos se
fosse além de um anfitrião agradável para você.
Não posso evitar, meu coração tolo gosta de ouvir que o príncipe
idiota está com ciúmes de mim. Ou talvez seja apenas o complexo do
brinquedo deixado de lado. Freud explica. Sorrio, me sentindo mais como
eu mesma esta noite. Quer o brinquedo de volta? Que pena, Alteza. Zombo.
— Alguns shots de tequila, para começar! — Digo com empolgação
e Zafyr arregala os olhos. — O quê? É um clube latino, amigo, não vou
pedir um Cosmopolitan de jeito nenhum! Vamos entrar no clima! —
Balanço meus quadris para enfatizar e ele gargalha.
— Você é como uma explosão de fogos de artifício, princesa. —
Uma expressão conhecedora se espalha em seu semblante. — Posso
entender o porquê meu primo está tão louco por você.
Novamente, meu coração salta ao ouvir isso.
— Ele não está — rebato, deixando-o me guiar pelas laterais do
salão sofisticado, desviando das mesas até um dos bares no canto. Há gente
bonita e animada por todos os lados, e sorrio satisfeita por conseguir sair e
pelo menos fingir que o idiota do príncipe não me afeta.
— Está, vai por mim — afirma, me ajudando a acomodar-me num
dos bancos vazios na extremidade do balcão. Pede uma garrafa de tequila e
sorrio largamente. O bartender, um loiro de olhos verdes risonhos,
providencia tudo, dispondo a bebida, o sal e as fatias de limão numa
travessa de prata sobre a bancada. Isso é o que chamo de beber tequila em
grande estilo! Deslizo a língua no dorso da minha mão e salpico sal,
lambendo-o. Pego o shot, viro-o com tudo na garganta, em seguida, chupo
uma fatia de limão. — Tenho que dizer, se meu pau não tivesse sido sofrido
ameaças, eu investiria em algo mais. — Seu olhar está aquecido em minha
boca. — Você é o meu tipo de garota, princesa. — O safado pisca e toma
seu shot.
Porque quero manter minha ousadia, eu pisco de volta.
— Você é mais divertido do que seu primo — digo levianamente.
— Amihaj tem um dever com seu povo, Anna. — Ele aponta e fico
contente em ver que não aproveitou a deixa para falar mal de seu primo. Já
notei que Karim mantém uma relação de carinho com seus primos. O
mesmo não pode ser dito sobre o tio Jafar. Urgh. Estremeço só de pensar
naquele homem arcaico. Está preso a valores de uma sociedade antes de
Cristo, com toda certeza. Debocho. — Não é fácil ser um governante.
Ainda bem que não herdei o trono. — Ele gargalha. — Eu não saberia o que
fazer com ele.
É a minha vez de rir. Ele é divertido. A noite não será um completo
suplício como pensei quando encontramos Karim no corredor antes de
sairmos. Ele todo lindo de negro, os cabelos presos no coque que eu amo.
Droga, não ama não, Anna! Tenha um pouco de decência, garota! O cara
vai escolher uma esposa no sábado. Esqueça-o! Agora! Ordeno-me e tomo
outro shot. A bebida começa a se espalhar em minha corrente sanguínea e
me sinto bem, muito bem.
— Então, você vai me tirar para dançar em algum momento? — O
atiço. Ele torna a rir. O DJ muda para um ritmo cubano e exclamo, tornando
a mexer os quadris: — Adoro essa!
— Definitivamente uma explosão de fogos, ‘amira — provoca,
virando outra dose. — Sorte a minha que está comigo esta noite.
Balança as sobrancelhas sugestivamente e rolo os olhos para seu
flerte barato.
— Não vou transar com você, querido. Então talvez não tenha tanta
sorte assim. — Desdenho e seu rosto fica chocado, depois explode numa
gargalhada.
— Porra, meu tipo de garota. Odeio o meu primo nesse momento —
resmunga baixinho.
Tomamos mais um shot e seus seguranças se aproximam à mínima
inclinação de cabeça de seu chefe. Os homens grandes cercam o balcão,
guardando nossa bebida e lugares. Aproveito e deixo minha carteira sob
seus cuidados, enquanto Zafyr pega minha mão, me conduzindo para os
degraus de acesso à pista. Descemos e nos viramos de frente. Sua mão pega
minha cintura com firmeza e, então, o irreverente príncipe me prova que
realmente dá uma boa diversão para uma garota. Nós dançamos no ritmo
quente cubano, salsa, rumba. Já estou suada, colocando toda a frustração na
dança. Eu me jogo, rebolando, gingando e Zafyr não fica atrás, me
conduzindo com a desenvoltura de quem é frequentador assíduo de baladas.
Nuria estava certa, seu cunhado era tudo que eu precisava para me divertir
um pouco.
Damos uma pausa, voltando para o bar, onde bebemos mais shots e
rimos das besteiras ditas um pelo outro. Acabo pedindo um Cosmo porque
eu amo esse drink. É uma coisa minha e de Ella, o que me lembra de que
temos que marcar uma noite de meninas depois que der à luz à minha
afilhada. Peço uma cerveja também e Zafyr parece bem impressionado
comigo e minha resistência ao álcool. Mas a verdade é que já estou um
pouco tonta, me sentindo mais leve e atrevida. Quero mais diversão! O
arrasto para a pista de novo, danço e danço sem me preocupar com nada
mais. Em dado momento, quando olho na direção de onde ficaram nossas
bebidas, engasgo. Karim está lá em pé, perto dos seguranças, uma carranca
em sua linda cara. Usa a mesma roupa de quando nos encontramos antes.
Minha libido não será contida depois da quantidade de álcool que ingeri.
Seus olhos negros estão cravados em meu corpo, subindo faminto
até que se fixam nos meus e resfolego, minhas entranhas sofrendo espasmos
de prazer. Droga, eu não disse? Adeus, controle. Porém, gosto de saber que
veio atrás de mim. Ele veio por mim, não foi? As bebidas em meu sistema e
seu olhar intenso fazem o líquido grosso de excitação molhar minha
calcinha. A música acaba e Zafyr beija minha mão galantemente.
— A cavalaria chegou, princesa. Faça o seu pior. — Pisca
maliciosamente e vira as costas, sumindo por entre os casais na pista.
Antes que possa sequer pensar, um braço forte está me puxando
contra um corpo grande e duro. Ofego, meus sentidos sendo incendiados
pelo cheiro dele. Levanto meu rosto encontrando o seu bem próximo. As
luzes diminuem neste lado da pista e outra música inicia. Não é latina, é
árabe, um som instrumental sensual e uma batida alegre, porém mais lenta.
— Dance comigo. — Sua voz é rouca, quase rude, e não tenho
tempo de negar, pois ele já inicia os passos. Seguro sua mão esquerda para
não me desequilibrar e pouso a minha esquerda em seu ombro. Me puxa
com mais firmeza, colando nossas frentes, e meu corpo inteiro estremece.
Ah, meu Deus… Karim ri, perverso, sabendo que por mais que eu
esperneie, me rebele, estou completamente louca por ele. Minha respiração
está ainda mais errática agora. Ele abaixa a boca perigosamente perto da
minha, seus olhos flamejando, me devorando. E nós dançamos. Já ouvi e vi
vídeos de música árabe, embora nunca tenha tentado dançar, me deixo ser
conduzida por ele. Suas coxas fortes roçando nas minhas. O ritmo
instrumental vai ganhando força, a sensualidade do som, o governante de
tudo isso me apertando em seus braços. Estou ofegando, salivando para
sentir seu gosto de novo. Ele também quer, o sinto duro, pronto, pulsando
contra o meu ventre.
Não conseguindo resistir mais, eu giro meus quadris, me esfregando
o máximo que posso nele e em sua enorme ereção. Nossas bocas se abrem,
desejosas, respirando uma na outra. Seu braço está enrolado firmemente em
minha cintura. Eu juro que posso gozar apenas assim, nos olhando e nos
esfregando no ritmo da música. Aproveitamos a escuridão e nos movemos
com mais e mais paixão, nossa tensão sexual sendo elevada à máxima
potência. Não falamos nada. Não precisa. Está tudo em nossos olhares, que
nunca se desgrudam. Seu nariz desliza pelo meu rosto de forma quase
reverente, então me lança num giro rápido para o lado. Eu acho que agora
ele misturou um pouco os ritmos. Rio, me permitindo aproveitar o
momento. Amanhã vou analisar essa merda direito, prometo. Mas agora,
agora eu só preciso dos seus braços à minha volta. Volto para ele, mexendo
os quadris sinuosamente. Suas mãos seguram minha cintura e me puxa
diretamente em seu pau.
— Karim… — Convulsiono, gemendo, completamente enfeitiçada
pelo príncipe e música exóticos.
Ele geme com aspereza, subindo uma mão pelas minhas costas, e
pega minha trança, dando um puxão. Ofego, me molhando toda. Droga. Ok,
retiro o que disse mais cedo, o honorável príncipe consegue ser divertido.
Sua boca vem para o meu queixo e seus dentes raspam em minha carne
numa mordida gostosa, safada. Meu Jesus.… Cada centímetro da minha
pele formiga, pulsa, implorando pelo seu toque. Então, novamente, me
lança num giro para o salão. Dessa vez me solta e continuo girando,
acrescentando o balé, já que ousou misturar o ritmo latino. As aberturas do
meu macacão tremulam, ar frio entrando em minhas pernas. Eu volto para
ele, seus braços enrolando em minha cintura imediatamente. O abraço pelos
ombros, respiramos forte, nossas bocas quase se tocando. Nossos
movimentos vão ficando mais lentos, nossos olhares fixos um no outro,
devorando-nos sem qualquer contenção nesse momento.
— ‘Amira… — Murmura contra a minha boca. Com um mordiscar
suave em meu lábio superior, ele para a dança. — Vamos para casa. —
Grunhe se virando e, sem aviso, uma mão se fecha em meu pulso, não me
dando outra alternativa a não ser me deixar ser praticamente arrastada. As
luzes voltam a ficar claras e uma comoção se inicia quando o público nos
nota juntos. Celulares apontam para nós e em instantes somos cercados por
homens enormes (sua segurança). Meus saltos dificultam caminhar mais
rápido e me assusto quando ele me levanta nos braços. O seguro pelo
pescoço e encosto minha cabeça em seu peito enquanto nos leva
rapidamente por um corredor. Logo estamos saindo para o ar abafado da
noite. É um pátio e noto o helicóptero pousado no centro. Ele abre a porta
do passageiro, me acomodando e puxando o cinto. Fico calada, não
confiando em mim ou no que pode sair da minha boca alcoolizada.
Karim também não disse nada na viagem. Quando pousamos, me
ajuda a descer e andamos lado a lado, tomando o corredor para nossos
aposentos. Estou numa confusão de sentimentos e hormônios. Olho-o,
bebendo seu porte alto, todo de negro, o coque sexy. Ele olha de lado, me
flagrando no ato. Seu maxilar trinca, seus olhos fervendo, e volta a olhar à
frente. Quando chegamos à minha porta, paramos, a tensão sexual ainda
pairando sobre nós.
— Entre, Anna. — Rosna, o olhar selvagem.
— Por que foi lá, Karim? — Pergunto, querendo ouvi-lo admitir que
está com ciúmes. Ele fica calado, engolindo audivelmente. — Será que o
seu harém te deixa duro como eu deixo? — Minha embriaguez guia minhas
palavras. Ele ruge e no instante seguinte está girando a maçaneta da porta,
abrindo-a. Numa rapidez que faz minha cabeça girar, me empurra para
dentro do quarto e me espreme contra ela, seu pau ainda duro esfregando
em meu ventre. — Eu acho que isso é um não. — Rio atrevida.
— Você é muita tentação para um homem, porra. — Suas mãos
pegam meus ombros e deslizam pelos meus braços nus. Convulsiono
escandalosamente com seu toque. Sua boca roça na minha e arrepios
eclodem em minha pele, ofego, entreabrindo meus lábios, quase implorando
por um beijo. — Será que meu primo te faz tremer assim, princesa? — Seu
tom é desafiador também.
— Isso não é da sua conta. Me faça um enorme favor, vá cuidar das
suas virgens perfeitas e me deixe em paz, Alteza — digo com petulância.
Um sorriso lento vai se espalhando em sua boca e me assusto quando pega
minha trança outra vez e dá um puxão firme. Um gemido esganiçado sai da
minha boca e ele rosna, mordiscando meus lábios. Estou tão molhada agora
que tenho até vergonha de falar.
— Sim, é da minha conta. Está despeitada porque você não é uma
virgem? — Tem a audácia de me provocar e o álcool mais uma vez dá uma
força na minha ousadia.
Sorrio maliciosa e sussurro com deboche:
— Bem, eu nunca fiz anal, será que serve, honorável Alteza? — Ele
engasga, as narinas inflando, os olhos ficando em brasa. — Eu acho que
serve. — Continuo atiçando-o. Ele rosna e torna a puxar minha trança.
— Você quer me matar de tesão, não é, princesa? — murmura e,
então, sua boca mergulha na minha.
Volto a estremecer sem controle ao sentir seu hálito quente com
gosto de uísque. Um gemido torturado sai dos seus lábios. Um braço enrola
em minha cintura, colando-nos gostosamente e me entrego, suspirando,
arfando de tanto desejo. Sua língua lambe a costura da minha boca e a abro,
lhe dando passagem. Gememos os dois. Pego seus ombros, sentindo seus
músculos tensos, e toco-o até a nuca, meus braços cingindo seu pescoço.
Ele geme rouco, a mão descendo para a minha bunda, apertando, sovando.
Murmuramos os nomes um do outro, nossas línguas numa dança insinuante
como a que fizemos no clube. Seus lábios me sugam toda, boca, língua,
raspa os dentes, lambe. Meu Deus, nunca fui beijada dessa forma, com essa
fome. Tento imitá-lo. Minha bravata é apenas na teoria. Domino a logística
da coisa, mas na prática a coisa se complica.…
Ele não me dá tempo para pensar sobre minha falta de experiência,
me devora, me levantando pela bunda. O abraço com as pernas,
choramingando quando o cume duro esfrega em meu centro. Chupa a
minha língua tão gostoso que me liquefaço em seus braços. Sua boca arrasta
pelo meu rosto, indo para o ouvido, onde mordisca meu lóbulo, sugando-o
depois. O quadril não parando de empurrar no meu. Sua boca desce mais
pelo pescoço. Ele geme, me chupando com força. Minhas unhas arranham
suas costas. Estamos os dois fora de controle. Sua boca continua descendo
pelo colo, lambendo, beijando cada centímetro de pele que encontra até
encontrar o seio direito. Karim o chupa por cima do tecido e em seguida
olha para mim, seus olhos intensos e famintos nunca deixando os meus
enquanto desce a alça do macacão. Olha para meu seio nu e volta a me
encarar. Estou pegando fogo. Ele abaixa a cabeça e uma enxurrada de
excitação inunda minha vagina ao sentir sua boca morna engolindo meu
seio.
— Ahh, Jesus… — Choramingo, sentindo-o chupando minha
auréola inteira. Seguro sua cabeça, arqueando-me, me dando a ele. Rebolo
contra seu pau, procurando mais fricção para acabar com essa dor oca entre
minhas coxas. Ele puxa a outra alça e muda para o outro seio, mordendo o
bico delicada e depois perversamente. — Por favor… — Balbucio e ele
rosna, me chupando com mais força, alternando entre um seio e outro.
— Eu quero você, ‘amira. — Sua voz é áspera como lixa. — Me
deixe tê-la.
— Sim.… Me tenha — digo fora de mim, puxando sua boca de
volta para a minha. Nos beijamos com mais ânsia, nossas bocas gulosas
tomando tudo um do outro. Ele desce o zíper frontal do meu macacão e
segura meus seios, amassando-os com fome. Pego sua camiseta pela barra,
começando a puxá-la. Gememos completamente entregues. E é nesse
momento que seu celular começa a tocar. Karim faz um som de desagrado e
ignora o aparelho, deixando tocar até ir para a caixa postal. O alívio não
dura muito, logo recomeça a tocar.
— Amihaj, atenda à porra do telefone, primo! Estou aqui fora,
ouvindo a merda tocar. — Vem a voz sussurrada de Jalal do outro lado da
porta.
Paramos no mesmo instante, congelados. Nossas respirações estão
ofegantes e agora um tanto frustradas. Ele encosta a testa na minha e fecha
os olhos com força.
— Jalal, eu juro que vou te matar…
— Odeio interromper, primo, mas é sério, jogaram um vídeo de
vocês no clube por toda a internet! — O primo de Karim rosna através da
porta e de novo gelo.
— O quê?! — Exclamamos em uníssono.
E agora a excitação foi pelo ralo. Respiro longamente, tentando
entender como viemos parar aqui, arrancando nossas roupas, prestes a
transar contra a minha porta. Meu Deus, onde estava com a merda da minha
cabeça? Ele deve ver minhas emoções estampadas em meu rosto, porque
toca meu queixo suavemente.
— Não, não se arrependa disso — murmura. Seu tom e rosto são
torturados, mas seus olhos me dizem que também sabe que estávamos indo
longe demais. — Sinto muito, ‘amira. — Essa frase me diz que nosso
momento passou.
— Pare de dizer que sente muito. É a pior coisa que uma garota
pode ouvir depois de quase se entregar a um cara que não pode ser dela.
Sua mandíbula trinca e ele torna a fechar os olhos, praguejando em
sua língua. Então se afasta e passamos a nos recompor em silêncio
sepulcral. Ando para dentro da sala e o deixo receber Jalal, me sentindo
muito envergonhada pelo que quase deixei acontecer. Vou ao banheiro e
jogo um pouco de água no rosto. Enxugo-me e volto para enfrentar minha
realidade. Os dois estão conversando freneticamente em árabe.
Compreendo que Karim está muito irado por estar exposto outra vez na
internet. Jalal lhe garante que já acionou os advogados para controle de
danos, mas que seu pai está possesso. Rolo os olhos, imaginando o que o
homem está falando sobre mim.
Mas esse não é comprometedor. Deve ter sido do momento em que
saímos na parte clara e o público nos notou. Não há realmente um controle
de danos. Me aproximo e pergunto só para confirmar:
— Qual o teor do vídeo?
Os dois se entreolham. Karim parece tenso, mas estende seu celular
aberto num vídeo do YouTube. Clico na tela para iniciar a reprodução e
engasgo. Oh, Jesus… Esse é da nossa dança. Mesmo escuro, dá para ver
que somos nós perfeitamente. E a forma como nos movemos, sensuais,
colados, nos esfregando quase de forma indecente. Nossos olhares se
devorando. Uh. Fecho os olhos, mortificada. Lhe devolvo o aparelho e viro
as costas sem coragem para encarar ninguém neste momento.
— Anna… — Ele chama com uma porra de voz suave que é a gota
d’água para que eu exploda. Me viro, andando até ele, empurrando um dedo
em seu peito.
— Qual é a porra do seu problema, Karim? — pergunto, com raiva.
— Por que tinha que ir lá e arruinar tudo?
— Acalme-se. Está zangada pelo que houve depois e não o que
fizemos no clube. — Tem a audácia de dizer e eu rio da sua cara, mesmo
que esteja dizendo a verdade.
Meço forças com ele através de nossos olhares, então, suspiro
cansada disso tudo. É hora de deixar ir. Ele tem um dever pesando em suas
costas e jamais irá me colocar em primeiro plano. Ofego, lágrimas
queimando meus olhos. Pisco, tentando refreá-las, não desmoronar em sua
frente e de seu primo. Aquela mulher horrível tem razão, ele jamais me
escolheria. É melhor acabar com minhas esperanças estúpidas de vez.
— Farei um post em meu Instagram amanhã, esclarecendo a
situação — digo, meu tom sério. Ele me sonda enxergando de alguma
forma o que está em minha mente. — Direi que somos apenas bons amigos
e que tudo não passou de uma brincadeira. Seu baile ainda será crível, fique
tranquilo.
— ‘Amira… — murmura, seus olhos tão tristes quanto os meus.
— Por favor, não me fala outra vez que sente muito — peço e
coloco o máximo de firmeza na voz quando completo: — Você tem um
dever, cumpra-o.
— Por que sinto que está se despedindo de mim? — pergunta,
tentando se aproximar, mas levanto a mão e ele para.
— Porque estou — murmuro, me sentindo morrer por dentro. —
Não voltaremos a falar sobre isso. — Faço um gesto entre eu e ele. Olho-o
longamente, bebendo dele, cada detalhe do porte majestoso e lindo.
Lágrimas insistem em queimar meus olhos, lamentando tudo que não pode
ser. Ele vem para perto e, dessa vez, não tenho forças para afastá-lo. Nos
abraçamos. Esse abraço é diferente dos outros, é calmo, possuindo uma
tristeza e aceitação do nosso destino.
Jalal limpa a garganta e anuncia numa voz desconcertada:
— Eu vou esperar lá fora, Amihaj.
Sinto seus lábios beijando meus cabelos suavemente, e é com muito
esforço que não desmorono. Fecho meus olhos, inalando-o para guardar seu
cheiro, esse momento na memória. Ele se afasta devagar e nossos olhares se
encontram. Seus dedos acariciam meu rosto. Na verdade, é quase como se
estivesse memorizando o contorno. Toco seu rosto, amando a textura da
barba, guardando essa sensação também. Há um brilho feroz em suas íris
escuras que nunca vi antes, então fecha os olhos por um instante e quando
os reabre está mais controlado.
— Seja um grande rei, amiri — murmuro e seu semblante se
ilumina um pouco comigo o chamando de “meu príncipe”. Sua boca pousa
na minha no mais suave dos beijos.
— Seja feliz, nour Al sabah — murmura e então se vira e sai sem
me olhar novamente, o que é bom porque meus olhos estão transbordando
de lágrimas.
Karim Amihaj
Eu saio do quarto dela e passo por Jalal evitando encará-lo, ou meu
primo verá que meus olhos estão queimando com lágrimas. Sempre me
orgulhei de ser um homem forte. Sempre me orgulhei de ser filho de meu
pai. Mas, neste momento, tudo que sinto é que ser o herdeiro do trono é a
minha maldição. Entro em meus aposentos e vou direto para o bar, me
servindo de uma generosa dose do meu Bourbon mais forte. Ouço os passos
de meu primo atrás de mim. Ele se mantém calado, obviamente tendo a
confirmação do quanto a princesa é importante para mim. Tomo um grande
gole, a bebida queimando minha garganta é uma boa distração da
queimação no peito. Eu só queria poder mandar as tribos irem se foder e
tomá-la como minha rainha. Ser egoísta pelo menos uma vez e pegar o que
eu quero, o que meu corpo e coração estão clamando: Anna.
— Ela jamais seria aceita pelas tribos, Amihaj — Jalal diz, como se
lesse meus pensamentos. Sua voz está tensa.
— Eu sei, primo. — Respiro fundo, olhando para o deserto através
da minha varanda. Tomo mais um gole. — Cumprirei meu dever. —
Garanto, meu tom sem vida.
Ele fica em silêncio um instante.
— Talvez seja melhor enviar alguém para guiá-la pelo deserto,
primo. Nenhum de vocês tem condições de estar perto um do outro, pelo
que acabei de presenciar. — Sugere cautelosamente.
Ele está mais do que certo. Não temos estrutura para estarmos perto
sem cair em tentação, mas não posso ficar longe também. Esses quinze dias
no deserto serão tudo que terei dela pelo resto da minha vida infeliz ao lado
de outra mulher.
— Eu não posso. Sei que não posso estar perto, mas também não
quero ficar longe. — Exalo de frustração, olhando-o quando se apoia na
bancada ao meu lado.
— Você precisar deixá-la ir, Amihaj. — Me encara seriamente. —
Sei que não é o quer ouvir neste momento, mas é o melhor. Quanto mais
adiar, pior será quando ela for embora, primo. A princesa não é uma de nós,
por mais simpática e boa gente que seja, ela não pertence aqui.
Trinco os dentes e tomo mais um gole grande da bebida.
— Assunto encerrado. Vamos tratar do controle de danos na
internet. — Mudo o tema. Só que dessa vez vou baixar e salvar o vídeo
antes de ser removido. Vou assisti-lo sempre que a saudade dela bater.
Jalal passa a explicar que os advogados terão mais trabalho dessa
vez porque o vídeo foi postado em várias redes sociais, não apenas no
YouTube. Me preocupa a minha imagem, claro, mas também me preocupa a
imagem que o público fará de Anna. Estamos em uma região extremamente
conservadora, sobretudo, em relação à liberdade da mulher.
— Meu pai acha que deve escolher Latyfa. — Ele volta ao assunto,
como um disco arranhado. — Se me perguntar, não acho que deva escolhê-
la.
— Por quê? — pergunto, intrigado com sua observação.
— Porque aquela mulher me dá calafrios, primo. — Finge um
estremecimento. — Sim, ela é muito bonita, mas há algo nela que me
incomoda. Não sei bem o que é.
Viro o copo e bato na bancada. Sim, a mulher parece a porra de um
iceberg. Todavia, ganharia muitos pontos com as tribos escolhendo uma de
nós, pura. Anna zombou das candidatas virgens mais cedo. Em outros
tempos não acharia bonito ou ficaria excitado com a revelação descarada de
que é virgem apenas na bunda. Mas com ela, fiquei ainda mais louco para
tê-la, fazer todas as sacanagens ocidentais que aprendi em minha temporada
em Londres, mas não coloquei em prática com Yasmina porque era muito
tímida. Yasmina. Suspiro, me sentindo culpado por ter entregado meu
coração a outra. Mas não consegui evitar, foi tudo rápido demais. A
princesa chegou como um furacão, me levando em seu caminho.
— Latyfa pode ser uma opção — murmuro, desapaixonado. — Na
verdade, não descarto nenhuma. Pelas fichas são todas candidatas
potenciais.
Ele assente. Então, seu semblante fecha, como que recordando de
algo. Me fita parecendo incomodado. — O quê? — Antecipo-me.
— Al-Shalleen está implorando por uma audiência com você,
primo.
Meu corpo inteiro retesa, ira se infiltrando rapidamente em minhas
veias. Esse é o maldito que orquestrou o atentado que matou Yasmina. Sua
casa caiu em desgraça quando tudo veio à tona. O sheik El-Baham, pai de
Latyfa e tio de minha esposa, foi quem descobriu tudo e prestou um serviço
incomensurável ao reino, delatando o infeliz. O homem está preso há quase
quatro anos desde que tudo foi desvendado. Em todos esses anos ele nunca
quis me ver, então, por que agora? Pedir clemência em sua sentença de
morte? Bufo com escárnio. Sim, só pode ser isso, uma vez que a data da
execução está se aproximando.
— Diga a ele que só o verei quando estiver estrebuchando, pagando
com sua maldita vida por assassinar minha esposa e outros inocentes. —
Ranjo os dentes.
— Eu acho que deveria ir vê-lo, Amihaj. — Jalal opina, seu
semblante sério. — Sei que não deve ser fácil olhar na cara do homem. —
Exala pesadamente. — Mas ele está alegando haver coisas sobre o atentado
que não mencionou antes e que só falará para você.
Torno a bufar, irritado com o verme e sua ousadia.
— Ele só está querendo escapar da execução, Jalal. Diga-lhe que
tenho data e hora marcada para vê-lo indo para o inferno!
— Ei, calma, primo. — Levanta as mãos em trégua. — Me autoriza
a conversar com o infeliz? — pergunta. Meu primo quando cisma é páreo
duro. — Saberei se é conversa fiada.
— Faça-o. Então, o infeliz terá que aceitar seu destino — autorizo.
— A ideia da princesa é boa. Você devia se pronunciar também,
negando um envolvimento, visto que o baile será depois de amanhã… —
Faço uma careta. — Até mesmo um príncipe precisa se retratar numa
situação dessas.
— Não negarei nada e tampouco permitirei que a princesa o faça —
digo firmemente. — Estaríamos mentindo. Nos queremos, Jalal, e muito,
porra!
— Uh, não mate o mensageiro. — Me devolve a careta. — O povo
ficará em dúvida, primo. Sabe que mesmo quando os advogados
conseguirem tirar o vídeo de circulação, ainda ficará rodando porque muitos
baixam esse tipo de conteúdo — argumenta. — E deixe-me dizer, vocês não
parecem apenas apaixonados naquele vídeo, estão fazendo sexo a seco. Soa
como uma afronta da sua parte estando tão perto de escolher uma esposa,
Amihaj.
Respiro fundo, frustrado ao extremo.
— Merda, sim, ela me deixou louco de ciúmes do idiota do Zafyr —
admito, irritado, me sentindo possesso de novo. Quando a vi toda linda
naquele macacão sexy, marcando o corpo perfeito, aquela boca indecente
pintada de vermelho, eu quis matar meu primo conquistador, lentamente.
Jalal ousa sorrir da minha miséria. Faço uma carranca. — Não vou negar
nada, repito. Farei a merda do casamento de Estado, porém, não podem me
obrigar a dizer que não sinto nada por Anna. E não finja que tem alguém
fantasiando que me casarei apaixonado por uma das candidatas de sábado,
primo. Ninguém por aqui é tão ingênuo. Todos sabem que o casamento
serve unicamente para a minha subida ao trono.
— Certo, você tem razão. De uma maneira torta, mas tem. — Dá de
ombros. — Bem, então, vou indo. Preciso contornar os arroubos de meu pai
sobre o vídeo…
— Faça isso, primo. — Gemo acintosamente. — Não estou com
cabeça para ouvir meu tio dizendo o quanto a princesa é inadequada e
debochada, sendo que dessa vez eu fui o culpado.
— Ela o provocou, Amihaj, e você caiu direitinho… — Ele ousa
sorrir mais uma vez, o idiota.
Solto um grunhido. Sim, eu caí e cairia de novo se fosse para
experimentar o que tive com ela hoje. Beijá-la, tocar seu corpo do jeito que
me deixou tocar. Se meu primo não nos tivesse interrompido, teria me
enterrado nela ali mesmo, contra aquela porta. Meu corpo volta a inflamar,
recordando seu cheiro, o sabor de sua boca. A textura dos peitos firmes
quando os suguei com vontade, matando minha fome desde que os vi
através da camiseta molhada naquela cabana.
— Boa noite, primo. Vou tentar dormir um pouco, me preparar para
falar com a família da Anna de novo amanhã. — Faço uma careta. — Não
tem uma semana que nos falamos pelo mesmo motivo.
Ele gargalha dessa vez.
— Primo, você está ficando malfalado com o pai da moça —
provoca.
— Cai fora, idiota — resmungo.
Jalal sorri mais e me deixa sozinho.
***
***
Anna Julia
Entro correndo para o quarto, minha visão embaçada pelas lágrimas.
Ele escolheu outra. Ele vai se casar com outra mulher. Soluço, sentindo uma
dor sufocante no peito. A dor de saber que o homem a quem entreguei meu
coração não pode ser meu. Eu o amo. O amo. Não é uma atração qualquer
como pensei a princípio, é amor. Eu o quero para mim, e saber que não
posso tê-lo me rasga por dentro. A constatação veio quando não consegui
ficar lá no salão, vendo-o anunciar a sua escolhida. Sei que precisava fazer,
é o seu dever, mas em meus devaneios Karim se recusaria a escolher outra
porque me ama, como eu a ele. Mais soluços desiludidos me escapam.
Minhas faces queimam com as lágrimas caindo sem controle. Demorei
tanto a entregar meu coração de novo e agora amo um homem que não pode
ser meu. Arquejo, a dor horrível se intensificando. Respiro tremulamente,
atravessando o quarto, indo para a varanda, tomar um pouco de ar. Abraço a
mim mesma, olhando tudo, guardando cada detalhe na memória.
Estou indo embora agora. Minhas malas estão prontas, as arrumei
hoje à tarde, me preparando para esse final. Ir ao deserto com ele seria uma
tortura cruel. Eu não suportaria vê-lo. Não posso mais olhar para ele. Não
sou tão forte assim. Eu só preciso ir embora. Choro, olhando para a
escuridão da noite engolindo a areia além dos muros do palácio. Eu repasso
tudo, cada momento, desde que o vi naquele cativeiro. A maneira como
mexeu com minhas emoções mesmo sem ver seu rosto. Me senti muito
atraída e isso só foi aumentando a cada dia que passei em sua companhia, a
cada conversa, cada passeio. Cada toque roubado, cada olhar apaixonado. A
imagem de Ayla, minha princesinha esperta, me vem à mente. Meu coração
aperta mais pela saudade que sentirei da pequena. Como seu pai, ela ganhou
meu coração desde o primeiro olhar para seu rostinho lindo. Eu amo os
dois, amo muito, mas outra mulher irá tê-los.
Meu celular toca dentro da carteira e o pego, sabendo quem é.
Confirmo ao ver o nome de Dam. Meu primo esteve em visita diplomática a
Dubai nesses três dias e está indo para Nova York, onde tem um encontro
com o presidente dos Estados Unidos. Quando me ligou ontem perguntando
se estava tudo bem e se eu precisava de algo, lhe disse que sim, precisava
de uma carona. No fundo eu já sabia que não conseguiria seguir com o
plano inicial. Estar perto de Karim agora só vai me machucar. Suspiro,
tentando me controlar para não o assustar.
— Oi, Dam. — Minha voz sai ainda trêmula e chorosa.
— Anna? Você está chorando? — Sua preocupação é imediata. Dam
pode ser irônico na maior parte do tempo, mas com Ella e sua primas não é
um cuzão. — Me diga a quem tenho que torcer o pescoço, prima.
Eu bufo com sua truculência. Ele tem um temperamento difícil.
— Não é nada. Só estou emotiva por ter que ir embora. — Nego,
tentando soar impessoal. — Me apeguei ao lugar e…
— Pelas imagens naquele vídeo, você se apegou a mais coisas,
prima… — Aponta com seu sarcasmo em dia. Faz um breve silêncio e seu
tom é mais suave ao continuar: — Sei que não sou Ella, mas sabe que pode
contar comigo, não sabe?
Isso faz novas lágrimas turvarem meus olhos. Meu primo marrento e
orgulhoso sendo fofo é demais para mim e meu estado abalado.
— Grazie, carissimo — murmuro.
— Pousaremos em Jawahra dentro de uma hora, Anna — avisa.
— Pousaremos? Quem está com você, primo? — inquiro e ele fica
em silêncio um instante.
— Isadora está comigo — diz em tom mais baixo e eu fico surpresa.
Ok, não tão surpresa porque todos na família já sabem que os dois andam se
enroscando desde o casamento dos gêmeos, há dois meses.
— Uh, então…
— Então nada. — Ele corta. — Somos dois adultos que por acaso
sentem atração um pelo outro e estão tendo um bom tempo juntos, nada
mais.
Eu rolo os olhos para sua desculpa pronta. Homens.… São tão
idiotas! Incluindo Sua honorável Alteza, que acabou de escolher outra!
— E quanto a Olga, sua namorada? — pergunto e ele grunhe. — Ela
sabe que anda tendo um bom tempo com a doutora?
— Anna… — Seu tom é impaciente. — Sou homem, prima.
Bufo com seu machismo.
— Diz como se fosse a coisa mais normal do mundo trair porque
tem um pau e testículos, Dam.
— Dio mio! Não fale dessa forma para mim. — Ele resmunga, mas
então começa a rir, sua voz voltando ao tom suave. — É preferível ouvi-la
dizendo palavrões do que chorando, no entanto.
Isso me comove de novo.
— Grazie, primo — murmuro. — Estarei esperando por você.
— Até daqui a pouco, principessa — murmura de volta. — Está
tudo bem mesmo? Tem certeza de quem não preciso ver Amihaj?
— Para que iria querer vê-lo? — Franzo a testa.
— Para lembrá-lo de que você é uma princesa e, claro, socá-lo por
fazer a minha priminha chorar. — Ele atira.
Eu meio que rio, mesmo com o coração esmagado. Amo isso, o
amor e apoio que sempre damos uns aos outros.
— Não é necessário. Só quero que me leve embora. Estarei no
aeroporto. — Garanto e meu tom enternece ao me despedir: — Ti amo,
carissimo.
— Also, principessa mia. — Diz no mesmo tom terno e adiciona: —
Cuide-se.
Desligo o telefone e suspiro alto, a tristeza volta a se apoderar de
mim. Nuria prometeu me ajudar com o transporte para o aeroporto. Dessa
vez o príncipe não irá me deter. Não, está muito ocupado entretendo sua
escolhida. Ando até a balaustrada, depositando carteira e celular, apoiando
minhas mãos no topo, as lágrimas tornam a me cegar, as imagens dele com
outra insistindo em se formar em minha mente. As palavras venenosas de
Latyfa martelando, zombando de mim. Não sou elegível. Eu quero odiá-lo,
mas não posso. É o seu dever como herdeiro do trono. Precisa colocar o seu
povo acima de tudo. Sou apenas uma estrangeira, uma ocidental. Ele
pensou por algum momento em ficar comigo? Me quis verdadeiramente, ou
era só atração da sua parte? Choro mais alto, meu coração doendo por não
poder vê-lo uma última vez antes de partir. Eu daria tudo para poder tocá-lo
apenas mais uma vez.
— Adeus, amiri — sussurro engasgada.
— Anna… — A voz baixa e angustiada chama às minhas costas e
meu coração começa a saltar vertiginosamente.
Karim?! Mas o que… Minhas pernas começam a tremer, minha
respiração suspensa. Oh, meu Deus.… Me viro devagar, não acreditando
que é ele mesmo. O que está fazendo aqui? Por que… Meu peito está
subindo e descendo ofegante quando nossos olhares se encontram. Mesmo
em meio ao caos, me permito admirá-lo no traje oficial mais uma vez. No
salão foi muito difícil não o olhar o tempo todo. Está lindo, soberano,
usando um caftan branco, com uma b-shirt preta (espécie de sobretudo em
tecido fino, usado em solenidades e eventos especiais). Há detalhes
dourados nas bordas com o brasão da casa Al-Abdallah. Na cabeça, um
turbante negro com pequenas joias douradas nas bordas. Nuria disse que ele
usaria essa roupa e que combinaríamos. Sonhei que ao me ver num traje
típico das mulheres do Oriente perceberia que posso pertencer ao deserto.
Posso ser a sua princesa se me der uma chance. Seus olhos estão ainda mais
intensos e penetrantes, sombreados por lápis preto. Os cabelos soltos sobre
os ombros largos, deixando-o com a mistura exótica de príncipe e pirata. Eu
o bebo com avidez, a saudade já tomando conta de mim. Mais lágrimas
turvam meus olhos, não consigo controlar. Eu o amo.
— Karim… — murmuro, entrecortado. Seu rosto está cheio de
angústia e anda para perto, me confundindo demais. O que ainda quer de
mim? Ele acabou de escolher outra mulher. — O que está fazendo aqui?
Para à minha frente, o olhar correndo por todo o meu rosto.
— ‘Amira… — Estende a mão direita, tocando minha face, pegando
uma lágrima. Ofego ao sentir seu toque suave. Vou desmoronar se me tocar.
— Você está chorando… — Engole com força, seus olhos ferozes, intensos
e um pouco arrependidos presos aos meus. — Por quê?
— Você sabe o porquê. — Digo baixinho.
Ele segura meu rosto com as duas mãos, me forçando a encará-lo.
— Eu preciso ouvir isso da sua boca, Anna. — Sua voz é torturada.
— Diga-me o porquê está chorando.
Respiro fundo e decido me desnudar completamente para ele. O
estou perdendo, mas não sairei como uma covarde.
— Porque te amo. — Minha voz embarga e ele arfa, os olhos
ficando mais brilhantes. Parece incrédulo e emocionado. — Te amo e você
não pode ser meu. É por isso que estou chorando, droga!
— Anna… Wallah… — Murmura asperamente, seus polegares
limpando minhas lágrimas.
— Mas entendo que é seu dever escolher seu povo acima de tudo.
— Me apresso em acrescentar para que não pense que estou mendigando
seu amor. — Eu só preciso ir embora. Dam estava em Dubai essa semana e
está passando por aqui para me levar para casa. Por favor, me deixe partir
dessa vez — imploro.— Preciso esquecer você.
— Você conseguiria me esquecer? — pergunta parecendo magoado.
— Ayla? Conseguiria seguir em frente sem nós?
Soluço com a menção da minha princesinha.
— Não, eu não conseguirei esquecer nenhum de vocês — sussurro
derrotada. — Eu os amo. Amo muito. — Engasgo. — Seu tio sugeriu que
eu ficasse e me tornasse sua segunda esposa. — Ele pragueja em árabe, os
olhos ficando selvagens. — Eu disse não. Não suportaria dividir você com
outra.
Ele fecha os olhos e aproxima o rosto do meu, a boca respirando
bem próxima da minha. Quando os reabre, eu quero morar lá, na expressão
preenchendo seus olhos de ônix.
— Não pude escolher nenhuma daquelas mulheres, ‘amira —
murmura e meu coração dispara tão forte que tenho de me segurar em seus
ombros. — Não pude porque você é a minha escolhida. — Meus olhos
voltam a turvar, não acreditando no que está saindo da sua boca. — Eu amo
você, Anna. Eu te amei no primeiro momento em que pus meus olhos sobre
você. — Seus olhos são ao mesmo tempo selvagens e ternos. Me sinto
mole, completamente entregue em seus braços. Choro como uma torneira
quebrada. — Pensei que jamais amaria de novo, que meu coração jamais se
abriria para outra mulher, mas você estava no meu destino.
— Também pensei, jurei jamais entregar meu coração a outro….
Mas eu te encontrei… — Engasgo, chorando como uma menina tola na
frente de um homem feito. — E o seu dever, Karim… Como fará? Como
faremos?
— Sim, tenho um dever, mas cumpri-lo me faria infeliz para o resto
da vida. Eu escolho você, a garota que faz meu coração e corpo pulsarem na
mesma sintonia. — Sua voz é solene e o olhar firme. — Você não veio
parar aqui por acaso… — Um braço enrola em minha cintura, cingindo
nossos corpos. Eu fico tonta pelo contato, pela sua declaração linda, seus
olhos me devorando, e ele diz com intensidade: — Você pertence ao
deserto, Anna. Você pertence a mim, amirati.[26] Eu nunca te deixarei ir
embora.
Sua boca cobre a minha e todo o meu corpo treme. Vertigem de
prazer perpassando meu corpo e sentidos. Me agarro a ele, meu coração
vibrando, aquecendo pela reviravolta da noite. Ele veio para mim.
— Amiri… — Chamo-o, entreabrindo os lábios, recebendo-o com
desespero, chorando, gemendo de prazer. Escorrega a mão do meu rosto
para a minha nuca e me segura com firmeza, sua boca se apossando da
minha, exigente, faminta. Chupa a minha língua, mordisca-me. Sinto-o
ficando duro contra mim e ele me suspende, encaixando sua ereção entre
minhas coxas. Me penduro em seu pescoço e o deixo se esfregar em mim
grosseiramente enquanto come a minha boca com uma voracidade que me
deixa toda molhada.
— Anna… — Geme rouco, segurando a minha bunda, me puxando
mais e mais contra seu pau volumoso. — Estou queimando por você… —
Sussurra, a boca caindo pelo meu pescoço, sugando-me gostoso, forte. Eu
latejo, a calcinha ficando empapada.
— Eu também… — murmuro, fora de mim, arqueando-me quando
a boca gulosa pousa em meu seio esquerdo, por cima da roupa. Ele me
chupa com força, me mantendo suspensa, como se não pesasse nada. —
Preciso de você…
Karim geme rouco, passando para o outro seio, mordiscando-o
deliciosamente. As mãos apertando minha cintura, mantendo-me bem em
cima do cume duro. A sensação é tão erótica que estremeço inteira.
— Como precisa de mim? — Sobe a boca para o meu queixo, me
mordiscando, seu olhar é cheio de luxúria e está fixo no meu. — Diga-me,
nour Al sabah.
Levo minhas mãos para seu rosto, segurando dos lados. Quero gritar
de tanta felicidade. Ele me escolheu! Esse príncipe lindo me escolheu acima
do seu dever. Meu coração não cabe no peito. Como tudo isso aconteceu?
Em pouco mais de um mês, estou perdidamente apaixonada por esse
homem.
— Quero senti-lo dentro de mim — murmuro, lambendo sua boca,
sugando o lábio inferior levemente. Ele range, agarrando minha bunda com
mais força, empurrando o pau entre minhas coxas como se quisesse romper
a barreira das roupas e me penetrar aqui, assim. — Eu quero que me faça
sua mulher, Karim.
Seu olhar suaviza um pouco em meio à lascívia e seu nariz desliza
pela minha face direita. Ele tem uma ternura que me encantou quando me
permitiu chegar mais perto e conhecê-lo.
— Estarei dentro de você ainda hoje. — Morde minha pele. Eu
gemo, delirando com sua pegada firme, gostosa, todo o meu corpo
implorando a sua posse. — Tenho algo planejado — murmura, voltando a
boca para perto da minha, o olhar se fixando no meu. — Vou levá-la para
fotografar as tribos, mas antes faremos um acampamento no deserto por
alguns dias… — Sua voz profunda e seu olhar negro vibram em minha
pele. — Só nós dois, longe de tudo e todos. E lá, a farei minha mulher.
Eu alago, minhas paredes latejando, imaginando como será a
sensação de tê-lo dentro do meu corpo, me possuindo. Me tornando sua.
— Por mim está perfeito, honorável Alteza. — Assinto,
provocando-o, mas minha voz está rouca e isso o faz curvar a boca num
meio-sorriso safado e conhecedor. Rio também e nos beijamos de novo, ele
rodopiando comigo pendurada nele. E mesmo que uma parte de mim esteja
pedindo desculpas a Nate, a outra está feliz porque encontrei o amor nesse
homem maravilhoso. Rogo para que ele cuide do meu coração com o
mesmo amor e dedicação que cuidarei do seu.
Quando paramos para respirar, ele liga para Dam e avisa que não eu
não irei mais pegar a carona, para eles desviarem a rota. Meu primo exige
falar comigo e confirmo, enquanto meu príncipe beija meu pescoço, as
mãos acariciando meu ventre, indo perigosamente perto da minha vagina e
voltando.
Anna Julia
Eu ando até o parapeito da varanda dos aposentos de Karim. Inspiro
o ar da noite, lembrando a primeira vez que estive aqui. Ainda resistindo a
tudo que estava mudando dentro de nós. Tentando ignorar e parar a todo
custo a intensa atração que nos puxava em direção um ao outro. Ele
mandou os funcionários transferirem minhas coisas para cá antes de nós
chegarmos. Então, não tive como discutir e, vamos ser sinceras aqui, eu não
causaria uma cena de jeito nenhum! Vou dormir em sua cama! Suspiro feliz.
E daqui a pouco me apresentará para sua família como sua noiva. Queria ler
pensamentos para entrar na cabeça do “tio” Jafar. Rio maldosamente. É, eu
sei, isso não é muito elegante, mas o homem não me engole e não se
preocupa em disfarçar, por que eu teria de fazê-lo? Certo, por Karim. Ok, só
por isso serei educada com o homem chato. E ainda há mais uma pessoa
que, com sorte, morderá a própria língua e morrerá envenenada, a naja que
atende pelo nome de Latyfa. Imagine só voltar de dezoito dias maravilhosos
com o homem de seus sonhos e a primeira cara que vê na recepção é a da
ex-candidata a sua noiva?
Pois é. Quando pousei o helicóptero no terraço da ala norte, a cobra
peçonhenta estava na escadaria abaixo, junto com Jalal, Nuria e o Mister
Simpatia (que vocês já sabem quem é). Me irritei de imediato, primeiro
porque achei que a mulher assustadora já havia ido embora junto com as
outras cadelas adestradas, com o rabo entre as pernas. Mas não, ela não só
resolveu ficar como veio com uma conversa fiada de que quer passar um
tempo com Ayla, a filha de sua única prima, que era como uma irmã para
ela. Irmã.… Sei. Considerava tanto a prima que quer deitar com o marido
dela. Ardilosa. Aquela mulher não me engana. Ayla também estava lá com
uma das babás. Karim veio abrir a minha porta, me ajudando a descer, me
lembrando da noite em que nos conhecemos e me deixou pilotar. Pegou
minha mão na sua, nos direcionando para ir encontrar sua família. Foram
cumprimentos breves e ele anunciou que queria jantar com todos à noite.
Minha princesinha mal prestou atenção nas palavras de seu pai, veio
correndo, quebrando toda a baboseira de protocolo das princesas, e se jogou
sobre mim. Eu ri, levantando-a, abraçando-a bem apertado, meu peito tão
cheio de amor pela sapequinha.
— Você voltou, Anninha! — Exclamou inúmeras vezes, cobrindo
meu rosto de beijos, fazendo meus olhos lacrimejarem.
— Sim, habibti. — Eu ri, emocionada, beijando seu rostinho lindo.
— Eu voltei.
Ela me apertou pelo pescoço de novo, sua alegria palpável. A
família se espalhou, descendo os degraus, tomando direções diferentes, e
Karim se virou para nós. Seus cabelos escapando do rabo de cavalo o
deixando ainda mais sexy. Ele andou devagar, seu olhar terno indo e vindo
entre eu e sua pequena. Ela não precisou de convite, pulando para os
braços fortes de seu pai, cobrindo-o de beijos como fez comigo. Ele se
derreteu e meu coração foi junto, observando-os. Lindos. E agora são
meus.
Um sorriso suave se abre em meu rosto relembrando aquele
momento. Chegamos pela manhã, e foi um dia cheio. Almoçamos com
Ayla, porém, logo depois seu pai teve que ir para uma tarde de
compromissos em Jawahra e não o vi desde então. Tio Jafar ávido para tirar
seu sobrinho de perto de mim. Zombo. Trocamos mensagens antes de eu
entrar no banho, ele dizendo que já estava a caminho de casa. Eu ri como
uma boba, gostando disso, de como já estamos parecendo um casal.
Respondi dizendo que a banheira era grande demais para mim.… Mandou
emoticons rindo e garantindo que amanhã não vai abrir mão de me foder na
dita banheira, mas hoje me quer em sua cama. Me senti sensual, trocando
mensagens safadas com o meu homem. Volto para dentro do quarto para
esperá-lo sair do banho e pego meu celular, decidindo chamar meus pais
nesse meio-tempo. Antes de sair com Karim para o deserto, liguei para eles
e lhes disse em poucas palavras que o príncipe e eu estávamos envolvidos e
que não perguntassem muito naquele momento — quando voltássemos, eu
explicaria tudo.
Eles respeitaram minha vontade, e é por isso que os amo além da
conta. A diferença do fuso é de sete horas de Jawahra para Nova York.
Agora são 19h aqui e lá por volta das 13h. Devem estar no almoço. Faço
uma chamada de vídeo conjunta e logo os rostos de meus pais preenchem a
tela, parecem estar dentro da limusine. Eu sorrio, saudade apertando meu
peito.
— Bambina. — Minha mãe murmura amorosamente. — Acabamos
de almoçar em seu restaurante favorito. Tuo padre queria matar um pouco
da saudade. — Ela sorri com suavidade.
— Oi, mamma. — Digo, me sentando numa poltrona. — Estou com
saudades também. Muita! — Me derreto como uma garotinha. — Sinto
muito tê-los deixado apreensivos…
— Princesinha. — Meu pai me chama com sua voz e rosto suaves
para mim. — Como você está, filha?
— Oi, papai! — Eu arrasto um bonde pelo meu velho, já
perceberam, né? — Estou bem. — Respiro fundo. — Agora está tudo bem.
— Só isso? Não tem mais nada a nos dizer, mocinha? — Ele
encarna o pai durão. Eu rio, amando-o, amando-os tanto.
— Eu e Karim decidimos que vamos ficar juntos. — Solto de uma
vez e seus rostos ficam incrédulos na tela, suas bocas escancaradas. Eu sei,
eles já tinham perdido as esperanças comigo. — Nós nos amamos, mamma,
pai. — Meus olhos ardem com lágrimas de felicidade. — Eu encontrei o
amor outra vez.
Eles meio que engasgam, ainda em silêncio. Até meu pai, que
sempre tem um comentário espirituoso na ponta da língua, não diz nada por
alguns instantes.
— Ah, piccola… — Minha mãe está visivelmente emocionada, seus
olhos de uísque cintilando com lágrimas não derramadas. — Eu e tuo padre
pedimos tanto a Dio para que a fizesse feliz de novo, tesoro mio.
Eu assinto, incapaz de falar. Meu pai limpa a garganta.
— Querida, é muito bom ouvir isso, ver a felicidade em seu rosto.
— Diz emocionado também, seus olhos verdes estão marejados. — Eu e
sua mãe realmente rogamos muito a Deus para fazê-la feliz de novo, filha.
— Ele torce o nariz um pouco e se parece com meu pai descolado quando
adiciona: — E, por favor, diga a Amihaj que se for mentir para mim de
novo, que pelo menos faça uma boa argumentação. Jesus, ele é muito ruim
para inventar desculpas!
Eu rio e minha mãe meneia a cabeça, rindo de seu marido também.
— Papai, pare. — Peço, ainda rindo. — No próximo mês iremos
para o nascimento de Ciara e ele fará o pedido oficialmente…
— Pedido?! Que pedido, mocinha? — Ele levanta uma sobrancelha.
Eu reviro os olhos.
— Pai, tenho vinte e quatro! — reclamo. — Nós não queremos
perder mais tempo. Vamos nos casar — digo e eles ficam boquiabertos mais
uma vez. — Me sinto viva outra vez, pai, mamma. E é tudo por causa dele.
Eu o amo.
— Ah, bambina… — Minha mãe está chorando agora e me sinto
emotiva também. — Isso me faz tão feliz. Ti amo tantissimo, piccola mia.
— Also, mamma — murmuro. — Ti amo tanto.
Meu pai limpa a garganta mais uma vez.
— É claro que estou feliz pela minha princesinha, mas casar? —
Meio que resmunga. — Você não está grávida, está?
— Pai!
— Dom!
Eu e minha mãe exclamamos juntas.
— Certo, opção A descartada — diz com seu bom humor voltando.
— Te amo, querida. E prometo me esforçar para não rir das desculpas
fracas de seu futuro marido.
— Dom, amore mio, comporte-se — mamãe diz seu mantra quando
se trata de conter os arroubos de meu pai.
Eu rio alto. Eles me fazendo feliz mesmo à distância.
— Eu te amo, papai. Ti amo, mamma — digo, me levantando,
andando pela sala. — Preciso desligar agora. Vou falar com Lipe um pouco.
Eles me jogam beijos e nos despedimos.
Ligo para meu irmãozinho. Quando seu rosto bonito e vivaz aparece
na tela, eu rio, me sentindo completa.
— Ei, maninha! — Sua voz bem-humorada me saúda. Está andando
por um corredor, acho que na empresa. — Indo para uma reunião, mas vou
te dar uns dez minutos, que tal? — Me provoca e eu lhe mostro a língua.
— Pare a encenação, fedelho. — O provoco de volta. — Aposto que
será o garoto do café nessa reunião.
Ele gargalha com vontade e me vejo rindo também.
— Espertinha. — Seu olhar fica terno. — Estou com saudades da
minha irmãzinha. Quando você volta? — Eu mordo meu lábio e ele franze
o cenho pela minha hesitação.
— Eu não vou voltar, Lipe. Pelo menos não para morar aí — revelo
baixinho. — Lembra que disse que o príncipe era um babaca?
— Lembro. — Ele ri, seus olhos de âmbar brilhando com
travessura.
— Bem, acontece que ele não é um babaca e eu me apaixonei,
irmãozinho. — Solto de uma vez.
— Então nossos velhos estavam certos — murmura, com um sorriso
malicioso. — Eles estavam desconfiados, ainda mais depois dos vídeos no
YouTube… — Ele tem o ar de deboche que conheço bem, herdamos de
nosso pai. — Vocês estavam sendo tão óbvios, Anna. — Rola os olhos.
— Não estávamos não — resmungo, fazendo-o sorrir mais. — Eu o
amo, Lipe. Agora entendo o porquê decidi vir para cá contra tudo e todos.
Ele estava me esperando para vivermos a nossa história.
— Isso foi profundo. — Assobia, então seu rosto e olhar ficam
cheios de ternura. — Estou feliz por você, maninha. Sentirei sua falta, mas
sempre podemos pegar um jato e ir encher o saco um do outro, não é? —
Eu rio, assentindo. — Jesus, pensei que você fosse morrer encalhada, sabe?
— Cale a boca, garoto. — Reviro os olhos.
— Eu te amo, maninha — murmura, seu rosto ficando sério. — Eu e
nossos velhos só queremos que seja feliz.
Meus olhos marejam sentindo o amor do meu irmãozinho.
— Obrigada, maninho. Eu serei feliz — digo um pouco embargada.
— Também te amo, bonitão. Se cuida, depois nos falamos mais. — Sopro-
lhe um beijo e ele devolve um estalado na minha tela.
Suspiro ao desligar, me sentindo inabalável com o apoio deles.
Quando me viro para voltar ao quarto, Karim está lá, parado, me olhando
com uma expressão suave em seu rosto. Usa um caftan preto com um
sobretudo branco. Os cabelos estão sem turbante, amarrados no estilo
samurai. Seus olhos estão sombreados por lápis preto e eu amo o efeito que
isso tem em seu olhar, deixa mais intenso, um brilho perverso que me deixa
molhada. Lindo. Me contempla dos pés à cabeça, o brilho de aprovação e
desejo tingindo as íris escuras. Estou usando um vestido-caftan vermelho de
seda egípcia. As mangas são em renda ajustadas, indo até o punho. Um
decote em V, mostrando um pouco do meu colo, mas com elegância. Há
bordados em bronze e ouro marcando o decote das costas, que é bem
profundo, atingindo o cinto de ouro, e voltando para a frente, as abas se
unindo pelo meu torso até se separarem numa abertura frontal sexy,
mostrando até a metade das minhas coxas. Uso sandálias douradas de tiras
enroladas até os joelhos. Eu sei que elas deixam meu príncipe com tesão.
Meus cabelos estão soltos, partidos para o lado direito. Não trouxe nada de
joias ou prendedores sofisticados para essa viagem. Então, fiz alguns
cachos com o babyliss, deixando-os cair sobre as costas, diminuindo o
impacto do decote.
— Amirati… — O tom reverente na voz do meu homem me dá a
certeza de que o agradei. Ele vem para mim, descendo os degraus, todo
lindo, imponente. Faço uma nota mental para agradecer à Nuria. Ela me
convenceu a encomendar mais dois modelos com sua estilista na ocasião do
bendito baile. Acho que minha amiga já desconfiava que eu não iria
embora. Os vestidos foram entregues nessa semana, esperando meu retorno.
Tal como Karim está devendo para Jalal, também estou em dívida com sua
esposa. Vou sugerir que façamos algo especial para eles. Quando para à
minha frente e seu cheiro exótico e másculo invade meus sentidos, meu
corpo responde imediatamente. Minha vagina fica úmida, pulsando, minha
pele comichando pelo seu toque, e ele vem. Suas mãos correm pelos meus
ombros até os pulsos. Ele os pega, levando-os até sua boca, beijando minha
pele com carinho e sensualidade, os olhos escuros presos aos meus. Arfo,
minhas pálpebras pesando, meu corpo querendo-o com uma fome
avassaladora. Tem sido assim desde que o tive dentro de mim pela primeira
vez.
— Amiri… — sussurro ofegante. Seus lábios tremulam num
arremedo de sorriso arrogante, perversamente masculino. Sabe o quanto sou
louca por ele.
— Você é a mulher mais bonita que já vi, habibti. — Sua voz é
áspera como lixa, a luxúria misturada ao amor em seu olhar. Suas mãos
tornam a subir pelos meus braços, os dedos tocando meu pescoço, minha
pele nua, descendo, insinuando-se pelo decote. Meus seios arrepiam, os
bicos implorando para serem sugados, do jeito que ele adora fazer, bem
forte.
— Eu não sou. — Rio baixinho, ainda mais ofegante.
Seu braço enrola em minha cintura e me puxa suavemente, colando-
me ao seu corpo grande. Sua ereção sólida e pronta pressiona em minha
barriga, ele ri baixinho e abaixa a boca bem próxima da minha.
— Sim, você é, ‘amira — sussurra, raspando os dentes em meu
lábio inferior.— E pertence a mim. É toda minha.
Oh, Jesus, eu termino de molhar com sua declaração de posse. Nós
temos feito muito sexo desde que nos embrenhamos no deserto. Na cama,
em cima de um cavalo… O quê? Eu precisava comprovar a questão da
logística. Ella me contou da sua experiência com Mike em Ibiza e não pude
evitar, fiquei curiosa. Rio internamente. Não me culpem. E, sim, a logística
é meio louca, exige um monte de equilíbrio, mas o resultado é de outro
mundo! Me excito toda vez que recordo como Karim me segurou e me
empalou rudemente em seu pau, me comendo sem restrições. Eu nua,
montando-o, tendo apenas aquele mundão de areia como testemunha. Foi
mágico, delicioso. Ele também me teve enquanto tomávamos banho nus no
oásis. Me teve na encosta de uma duna, sob a luz das estrelas. Cada uma
dessas experiências me deu a certeza de que realmente pertenço ao deserto,
pertenço a ele.
— Você que é o homem mais bonito e perfeito que já vi, meu
príncipe. — Ele solta um grunhido e segura minha nuca com a mão livre,
ofegamos forte, o tesão nos tomando, então rimos e nossas bocas se
encontram num beijo lento, excitante, quente. Sua língua lambe a minha em
pinceladas deliciosas, me fazendo latejar, gemer, me esfregar na coluna
grande e grossa de seu pau.
— Eu quero você, Anna. — Geme, mordendo minha boca. — Senti
falta de gozar em sua bocetinha gostosa hoje.
— Oh, Jesus… Você não está sendo justo… — Resmungo,
mordendo-o de volta, rodeando-o pelo pescoço. Praticamente me
pendurando nele. — Sua família está nos esperando.
— Sim… — Ele ri, respirando agudamente na minha boca, as mãos
pegando minha cintura, apertando-me contra si, descendo para a bunda,
alinhando nossas pélvis. — Uma rapidinha não me satisfaria.… Preciso de
você nua na minha cama, à minha disposição, pela noite adentro… —
Desce a boca, dando uma mordida suave em meu pescoço, depois mais
forte. Vai para o meu ouvido e suga o lóbulo, murmurando com aspereza:
— Eu quero você por inteiro hoje, amirati. Estou louco para estar dentro
dessa bundinha linda. — O safado amassa minhas bochechas, a fome em
seu olhar é voraz.
Engasgo, excitação sem tamanho queimando em minhas entranhas.
Eu quero, também estou louca para ter essa experiência. Ella me disse que
dói muito na primeira vez, mas a dor é excitante. Bem, minha prima é uma
submissa, vive uma relação BDSM com seu marido, é claro que a dor é
algo tranquilo para ela. Duh! No entanto, quero isso com o meu homem.
Quero ser dele completamente.
— Também quero ser sua por inteiro, amiri. Quero que me possua
de todas as formas que quiser. — Sussurro com o atrevimento em dia
mesmo que esteja me borrando de medo de ser penetrada com seu volume
avantajado na retaguarda… Ai, meu Jesus!
— Garota atrevida… — Ele rosna, uma mão subindo para o meu
rosto, o polegar tocando, esfregando meus lábios. — Amo essa boca
irreverente. — Eu engulo seu dedo, rolando a língua na ponta, sugando-o
inteiro, e Karim grunhe palavras no seu dialeto particular, parecendo pronto
para me comer bem aqui e agora. — Vamos sair logo antes que eu perca a
cabeça… — Grunhe puxando o dedo da minha boca. Faço beicinho e ele ri,
ficando tão lindo que é injusto com pobres moças ocidentais. — Eu tenho
algo para você, habibti. Acabei esquecendo quando a vi desse jeito,
parecendo uma deusa… — Sorri e se afasta subindo os degraus, sumindo
no quarto. Volta segundos depois, segurando uma caixa de veludo vermelho
retangular. Abre-a e ofego, vendo uma tiara delicada, em ouro e rubis. —
Para você, nour Al sabah. — Murmura, fazendo meus olhos marejarem de
emoção. Claro que a joia é simplesmente linda, mas não é pela tiara em si,
eu tenho várias em minha casa, é pelo gesto atencioso.
— Foi de minha mãe.
E isso faz as lágrimas turvarem minha visão. Seu gesto acaba de se
tornar ainda mais significativo e especial.
— E-eu não sei o que dizer, Karim… — Minha voz sai embargada.
Ele sorri, vendo minha emoção, e se inclina colocando a caixa sobre um dos
sofás, em seguida retira a joia de dentro.
— Você pode usá-la — murmura, trazendo-a para mim. Eu abaixo a
cabeça, sentindo-o colocá-la com cuidado até se encaixar. Pega meu queixo,
nossos olhares se encontrando. — Amirati… A minha escolhida… —
sussurra com esses olhos negros me hipnotizando com sua intensidade.
— Shukran, habib — digo, pegando seu rosto moreno de cada lado.
— Não por isso, habibti. — Seu olhar fica suave e ele se inclina,
depositando um beijo suave na minha testa. — O restante da coleção de
minha mãe será trazido do museu para você ainda nesta semana. — Franze
o cenho, parecendo um pouco desconcertado. — A outra parte está nos
pertences de.… Eu dei como presente de casamento para…
— Yasmina — murmuro, acariciando seu rosto e tranquilizando-o.
— Você não tem que evitar falar o nome dela na minha frente, Karim.
Lembra como nos aproximamos? Nós falamos de nossos amores perdidos.
Eu respeito-a, respeito a sua história com a mulher que amou e é a mãe da
sua filha. — Seus olhos ficam brilhantes de lágrimas, me fitando com clara
adoração. — Yasmina faz parte da sua história como Nate faz parte da
minha. Abri meu coração para você no instante em que em perguntou sobre
ele. E sei que abriu o seu para mim pela mesma razão. Eles sempre estarão
em nossos corações, merecem ser lembrados com todo o respeito.
— Você é a mais linda e perfeita mulher. — Sua voz é emocionada,
seus dedos traçando meu rosto. — Eu nunca soube a razão de não entregar
todas as joias para Yasmina. Mas agora eu sei. — Roça o nariz no meu
rosto. Nós nos cheiramos, apaixonados, emocionados. — Allah sabia que o
que vivi com a mãe de Ayla foi muito especial, mas você ainda viria para
mim. Você é o meu destino, habibti.
Uma lágrima escorre pelo meu rosto. Eu me inclino, beijando sua
boca com reverência.
— E você é o meu. Eu amo você, amiri.
— Eu amo você, amirati — murmura, segurando minha nuca,
aprofundando o beijo.
***
Karim Amihaj
Entramos em meus… Nossos aposentos e Anna solta a minha mão,
andando à minha frente. Está esplendorosa esta noite. Sobe os degraus para
o segundo ambiente, onde fica o home theater. Ando atrás dela, fascinado.
Me dirijo para o bar, nos servir uma bebida.
— O que quer beber, habibti? — pergunto.
— Um Bourbon está ótimo. Eu tomo com você, pode ser? —
responde enquanto liga o som.
— Perfeita escolha, ‘amira — digo, pegando a garrafa e um copo.
Despejo uma dose grande e me viro, encostando na bancada.
Em instantes um som que parece um hip-hop soa em volume
agradável pelo quarto. Ela se vira e sorri, dando de ombros, então,
compreendo, é música latina. Minha princesa ama esse estilo musical, já
percebi. Anda devagar para mim e eu a contemplo, embevecido por sua
figura linda e aristocrática, a abertura frontal do vestido mostrando as coxas
firmes que salivo para ter enroladas em minha cintura. Temos feito muito
sexo nesses dezoito dias. Muito. Gostoso. Quente. Estamos adquirindo cada
vez mais familiaridade. Ela é fogosa, atrevida, safada na cama e meu
sangue ferve cada vez que afundo nela. Cada vez que gozo dentro dela,
enchendo-a com a minha porra. Ela para à minha frente e enrolo um braço
em sua cintura, puxando-a para o meu corpo. Suas mãos pousam em meus
ombros, seus olhos verdes estão maquiados com delineador, deixando-os
ainda mais brilhantes e sensuais. Tomo um pequeno gole, olhando-a por
cima da borda do copo.
— Beba — murmuro, levando a bebida para seus lábios gordos e
vermelhos. Ela bebe me encarando também.
— A noite foi perfeita. Obrigada, amiri. — Ela sussurra, enfiando as
mãos delicadas por entre meus cabelos. Meu corpo arrepia pelo prazer do
toque. Está ainda mais linda usando a tiara de minha mãe.
— A noite mal está começando, princesa — digo, aproximando
minha boca da sua, mordendo seu lábio superior. — Eu quero você. —
Puxo sua bunda, fazendo-a sentir meu pau duro, babando por ela.
— Eu também quero você. — Ofega, o hálito morno vindo para a
minha boca. — Dance comigo, Alteza. — Sua carinha se transforma num
riso provocador.
Eu rio, tomando mais um gole, e lhe dou mais outro. A bebida, a
música com batida sexy e a garota perfeita em meus braços fazem meu
sangue esquentar rápido. Meu corpo inteiro pulsando, gritando pela
satisfação, por ela.
— Vamos dançar, amirati — murmuro, depositando o copo sobre a
bancada de mármore. Corro as mãos pelos seus ombros e desço meus
dedos, percorrendo o decote. Seu peito arfa, subindo e descendo. — Tire o
vestido para mim, Anna. Quero-a nua em meus braços. — Meu pedido sai
áspero.
Ela lambe os lábios, me fazendo pulsar, meu pau querendo tê-los
enrolados nele o quanto antes. Suas mãos vão para trás do vestido. Se afasta
uns passos para me dar uma vista melhor do espetáculo. Minha atenção vai
para os peitinhos redondos, empinados quando as mangas vão caindo,
desnudando-os. Wallah! Ela esteve sem sutiã todo o jantar. Não seguro um
gemido, minha boca salivando ao ver as auréolas grandes e suculentas.
Cada centímetro da pele morena clara que vai sendo revelado me deixa aos
seus pés. Quando o tecido escorrega pelos quadris, eu rosno e pego meu
pau, apertando a cabeça por cima das minhas vestes. Depois dos segundos
mais longos, fica no meio da ilha de tecido, usando apenas uma calcinha
vermelha de seda e as benditas sandálias douradas de salto alto com tiras
enroladas até os joelhos. A visão me enche de tesão. Tomo meu tempo
apenas bebendo dela. A calcinha é fina e está manchada com sua excitação.
Dá para ver os lábios delicados da bocetinha rosada. Me aproximo devagar,
tentando me manter no controle.
— Seu corpo é lindo, gostoso demais. — Minhas mãos famintas
pegam suas laterais, delineando sua cintura fina. Sinto-a estremecendo. Está
muito excitada, como eu. Passo os dedos pela barriguinha linda e reta e
subo, agarrando os peitos deliciosos. Ela geme lamentosa e passo a apertar,
sovar os dois montes, beliscando os mamilos, deixando-os bem eriçados.
Me debruço, engolindo um com fome enquanto amasso o outro.
— Ahh… Karim… — Meu nome cai da boca carnuda quando
chupo, engolindo a auréola macia todinha em minha boca. Mordo
perversamente e ela grita, ofegando: — Oh, Jesus… — Lambo o biquinho
agredido, sacudindo a língua delicadamente. Suas mãos enfiam em meus
cabelos, arqueando-se. Sopro-o e volto a mamar de novo. Seu corpo todo
convulsiona em espasmos. Desço uma mão pelo ventre macio e escavo
entre suas coxas. Um sorriso arrogante curva a minha boca quando as afasta
mais, dando-me acesso, mostrando sua ansiedade e fome por mim. A
calcinha está toda empapada, me fazendo rugir com satisfação por excitá-la
dessa forma.
— Sua boceta quente quer o meu pau, não é, ‘amira? — Rosno e
minha boca viaja pela clavícula, sugando seu pescoço, mordisco-o em
seguida. O cara da música está dizendo que vai comer a sua garota toda. Eu
rio sacana, não poderia concordar mais neste momento. Afastando a
calcinha para o lado, empurro um dedo em sua vulva melada.
— Ahh… Sim… Por favor… — Choraminga, ondulando
fortemente, suas mãos buscando apoio em meus ombros.
Subo do seu pescoço para sua orelha, chupando, lambendo,
mordendo a ponta. Começo a comer sua boceta com o dedo, indo e vindo.
Nossos olhos se encontram, os dela estão quentes, as pupilas engolindo o
verde, e ela resfolega quando acrescento mais um dedo. Esfrego seu
montículo inchado com o polegar, meu olhar nunca desviando do seu,
duramente. Passa a respirar entrecortado, o hálito embriagador saindo dos
lábios doces bem perto dos meus. Posso sentir seu gozo vindo e a como
com força, indo e vindo, massageando perversamente suas paredes até que
ela grita meu nome e goza, a coisa mais linda, e não resisto, mergulhando a
boca na sua. Bebo seus gemidos e choramingos enquanto molha a minha
mão com seus líquidos. Quando seus tremores param, arranco a boca da sua
e puxo os dedos de sua boceta, enfiando-os em minha boca, sem
cerimônias. Ela geme me vendo lamber seu gozo em meus dedos. Sem mais
delongas, livro-me das minhas vestes e Anna geme ao me ver nu. Adora me
tocar, me explorar, como eu a ela. Retiro sua tiara com cuidado e coloco
sobre a bancada. Pego meu pau duro e rosno vendo-a lamber os lábios
gordos, olhos cravados em meu eixo.
— Fique de joelhos para mim, Anna. — Minha voz é só um
grunhido torturado. Ela faz o que peço imediatamente, seu rosto rosado
levanta, nossos olhos se fixando. Meu pau salta diante da boca indecente, a
língua saindo e lambendo os lábios. Meu pré-sêmen está vazando na ponta.
Seguro-o pela base e me aproximo mais, esfregando a cabeça grossa na
boca carnuda. Ela ofega, as narinas expandindo, cheirando-me, um gemido
chorado deixa sua garganta. Espalho meu pré-gozo em sua boca, rugindo
com a devassidão inflamando meu corpo. — Mama no meu pau.
A boca macia e quente se abre e ela lambe delicadamente a ponta.
Seguro sua cabeça, enfiando minhas mãos em seus cabelos negros. Junto
um punhado e o seguro firmemente no topo da cabeça. Puxo com firmeza,
grosseiro, e Anna ofega, gemendo, abrindo mais a boca, levando o meu
eixo para dentro, fazendo-me urrar de prazer.
— Tão atrevida, safada… Isso, leve-me para dentro dessa boca
quente… — Forço-me entre seus lábios, esticando-os. Torna a gemer, o
som reverberando em meu pau, os sons de prazer em sua sucção me
enlouquecem. Suas sugadas vão aumentando a pressão, enquanto continuo
comendo sua boca. Puxo seus cabelos com mais força e empurro tudo até
sua garganta. Minha princesa atrevida engasga, os olhos ficando lacrimosos
pelo meu volume. Paro um pouco, dando-lhe tempo para se recuperar.
Choraminga, pedindo mais, entalada em meu pau, e puxo para fora,
voltando a estocar em sua quentura molhada. A fito com tesão e adoração
fora do comum. Suas mãos pousam em minhas coxas, relaxando
completamente a garganta. Solto um rugido, maravilhado, e vou
aumentando os golpes, comendo a boca faminta. A imagem me deixa a
ponto de gozar, os olhos verdes lindos, fixos nos meus, os lábios enrolados
em volta do meu eixo grosso. Estendo a mão livre e pego o seio esquerdo,
puxando o mamilo delicado, depois torcendo-o malvado. Lascívia toma o
rosto de Anna, que geme lamentosa, olhos grudados nos meus. — Boa
garota.… Chupa o meu pau. — Gemo rouco.
Estamos os dois gemendo, perdidos em nosso tesão mútuo. Seguro
sua cabeça com as duas mãos e fodo sua boca com força. Minhas bolas
doem, meu corpo todo estremecendo, o gozo vindo como um trem
desgovernado. Eu rosno, praguejo em minha língua nativa e, então, encho
sua boca de porra. Gozo forte, despejando em sua garganta. Os sons dela
engolindo tudo, sedenta pelo meu sêmen, as lágrimas escorrendo pela face
rubra, me deixam fora de mim. Tudo com ela é além das expectativas. Dou
mais uma, duas estocadas, ela me chupando com ganância. Rio, arrogante,
satisfeito e me retiro de sua quentura viciante. Puxo-a para cima, os lábios
estão inchados, agredidos da minha, da nossa luxúria, mas é uma visão
linda.
— Porra, que gostoso foder essa boca — sussurro, doido de amor,
de tesão por essa garota. Seu rosto está afogueado e ela ousa sorrir, o som
rouco por chupar o meu pau com tanto vigor. — Você é uma putinha safada,
princesa. — Rosno, a levantando pela bunda, e ela geme me abraçando com
as pernas. — Vou comer você em cima da mesa primeiro. Fantasiei isso a
cada maldita vez que esteve almoçando aqui comigo. — Torna a sorrir,
safada, atrevida e a boca encontra a minha enquanto ando com ela. Nos
beijamos, nossas línguas se lambendo, sua boceta molhada moendo em meu
pau. A deposito sobre a borda da mesa e a ajudo se deitar, empurrando-a
suavemente. Meu olhar ganancioso corre por todo o seu corpo, os cabelos
longos espalham sobre a madeira brilhante. Nunca mais me sentarei aqui
sem que essa imagem dela esparramada, esperando meu pau, me venha à
mente. — Apoie os pés na borda, amirati. — Oriento roucamente e ela
obedece. Toco sua calcinha com as duas mãos, ela arfa e rio malvado,
esfregando-a através do tecido empapado. Meu olhar encontra o seu e subo
uma mão pela barriguinha linda, vagarosamente, até um peitinho durinho. O
amasso, raspando minhas unhas na carne tenra. É deliciosa, toda ela.
— Amiri… — Choraminga, arqueando as costas.
— Você quer foder, princesa? — Provoco-a, segurando nas laterais
da calcinha e a rasgo num puxão forte. Anna grita, surpresa tingindo seu
rosto. — Vamos, diga-me, quer foder? Sentir o meu pau grosso esticando
sua boceta gostosa e apertada? — Continuo instigando-a lascivamente,
meus olhos caindo para a bocetinha rosada, os lábios delicados escorrendo
sua excitação.
— Ahh… Merda! Sim, eu quero foder… Preciso do seu pau dentro
de mim, por favor… — Geme entrecortado. Rio satisfeito e esfrego meu
polegar na pequena protuberância, arrastando meu olhar para o dela. Seu
peito está subindo e descendo, seu rosto transformado pelo tesão. Olhando-
a fixamente, me abaixo e deslizo minha língua por entre os lábios fininhos.
Anna mia, convulsionando toda. Eu gemo rouco, amo seu sabor perfeito e
único em minha língua. Seguro suas coxas, puxando-a mais para a borda e,
então, enfio a língua em sua vulva, cavando o creme delicioso.
— Karim, habib… — Lamenta. Enfio dois dedos substituindo a
língua e ela grita alto. A como lentamente, retardando, construindo seu
segundo orgasmo. Puxo os dedos, deixando apenas as pontas, e massageio o
pequeno ponto em seu interior. Ela resfolega, mais líquidos inundam a
vulva, pingando em meus dedos. Arreganho o feixe de nervos, expondo a
parte mais sensível, e a chupo com força. Anna quebra, berrando, enchendo
nosso quarto com os sons de satisfação luxuriosa. Coloco mais pressão na
sucção e seu gozo jorra em minha mão. — Amiri… Que gostoso… —
Balbucia ofegante, engasgada.
Continuo a sugar sua carne quente, bebendo seus líquidos
abundantes. Ela geme fracamente, desgastada. Meu pau está em ponto de
bala de novo e a puxo pela bunda, levantando seus quadris da mesa,
abocanhando-a, preparando-a para me ter dentro dela. Devoro-a,
esfomeado. Sempre gostei de foder, mas nunca foi assim antes. Quando está
ofegante, a respiração entrecortada, sei que está pronta para mim. A abaixo
e enfio um dedo em sua vulva, cavando os líquidos. Olhando-a fixamente,
deslizo o indicador até seu cuzinho, sinto-a um pouco tensa. Sei que quer a
experiência, mas é sua primeira vez, terei de ir com cuidado. Me debruço,
arreganhando mais suas coxas, então deslizo a língua em seu buraco
traseiro. Anna estremece, gemendo baixinho, ainda tensa, mas gostando
disso. Eu rio maliciosamente e passo a lamber seu cuzinho com vontade,
forçando a língua em seu buraquinho. Meu pau começa a babar,
antecipando estar enterrado nele até o punho. Lambo-a sem pressa,
voltando a esfregar seu clitóris inchado. Seus sons de prazer me excitam
demais.
— Estou louco para meter bem fundo nessa bundinha, princesa. —
Ranjo.
— Droga, sim. — Geme entrecortado, me fazendo rosnar com seu
atrevimento.
— Vamos fazer tudo que quisermos na cama — murmuro, a
depravação tomando conta de mim com sua entrega. Substituo a língua pelo
dedo. Ela se retesa um pouco. Dou um tapa em sua nádega. — Relaxe. —
Se lamenta e assente, seu rosto denotando sua apreensão. Empurro o dedo
devagar. — Isso, habibti. — Bajulo-a, metendo até o fundo, um gemido
rouco saindo da garganta ao sentir seu aperto quente. — Vou gozar tão
gostoso comendo esse cuzinho, princesa — digo asperamente. Como-a
assim, olhando-a atentamente, vendo cada mudança em seu rosto lindo e
corado. Me inclino e deslizo a língua em seu clitóris suavemente e ela
arqueja, o tesão voltando a predominar. Acrescento mais um dedo, entrando
justo, apertado. Anna choraminga, arqueia, e não paro, empurrando os
dedos profundamente, massageando o canal virgem, chupando seu
montículo com mais pressão.
— Ohh, Deus… — Pega meus cabelos, puxando-os, enquanto se
esfrega em minha cara. — Me come, por favor, amiri.… Me foda! Agora!
Seu tom desesperado e sem qualquer vergonha me faz grunhir e
parar de provocá-la. Retiro os dedos, cessando a tortura em seu monte, e
Anna se apoia nos cotovelos para me ver melhor. Massageio meu pau para
cima e para baixo, adorando a fome que vejo em seus incríveis olhos
verdes. Me encaixando entre suas coxas arreganhadas, esfrego a ponta
bulbosa em seu clitóris já sensível e, em seguida, bato sobre ele, com
perversão. Ela choraminga, a pequena protuberância ficando molhada,
mostrando que minha princesa está pronta para ser fodida. Me alinho em
sua vulva, a visão da cabeça gorda entre os lábios finos me fazendo ranger
os dentes. Seguro sua bunda por baixo e a encaro. Sua boca inchada está
aberta, olhos fixos em nossos sexos, ofegando, esperando. Com um gemido
áspero, estoco com força, penetrando-a até o fundo. Ela grita alto, o corpo
todo estremecendo pela invasão. É muito apertada ainda que esteja bem
lubrificada. Sua vulva pequena sofre com o meu tamanho e não vou mentir,
amo isso, comer sua bocetinha pequena.
— Wallah, tão apertada que parece que vai rasgar no meu pau… —
Puxo quase todo e meto tudo nela, devagar e profundamente. Anna grita e
geme, pendendo a cabeça para trás, seu rosto completamente transformado
pelo prazer. — Assim, princesa, leva meu pau todo.… Toma mais.… Toma
tudo, porra… — Como-a com rudeza, sacudindo-a, a mesa andando com
meus impulsos dentro de seu corpo magnífico. Ela choraminga,
resfolegando, tomando meu pau até o cabo, minhas bolas batendo em sua
bundinha. A devassidão nos invade de tal forma que estamos grunhindo os
dois. Corro as mãos pelo seu corpo inteiro, onde consigo agarrar,
amassando sua carne, esfomeado, comendo-a gostoso e duro, meus olhos
presos aos dela. Ela me recebe da mesma forma, as coxas arreganhadas, me
deixando meter tudo, bruto, fundo. Acaricio seu ventre e subo para os
peitinhos, fecho-as, deslumbrado pela maciez, firmeza, suculência. —
Ahhh, gostosa! Vou rasgar essa bocetinha… — Rosno animalesco, socando
com força, comendo-a com uma fome nunca experimentada antes dela.
Ela geme, me puxando sobre seu corpo, e eu fico louco sentindo sua
pele gostosa, suada na minha. Pego seus pulsos, estendendo-os acima da
cabeça. Fodo sua boceta, encarando-a bem dentro dos olhos, minha boca
toma a sua e nos beijamos com lascívia, minhas estocadas brutas, socando
até o punho dentro dela. Uivo, judiando de seu pequeno canal, forçando-a a
tomar cada centímetro do meu pau, gostando de fazê-la submeter-se a mim,
seu homem. Suor está cobrindo nossas peles agora. Levo a boca para o seu
ouvido e chupo a concha da orelha, descendo para o pescoço, onde mordo
com força. Anna grita, arquejando. Eu resmungo e solto seus pulsos,
segurando-a pela bunda, puxando-a para cima. Ela me abraça com as pernas
pela cintura e a faço montar o meu pau como naquele entardecer sobre
Hércules no deserto. Eu a seguro e rasgo sua vulva para baixo em meu eixo
grande e grosso. Seus braços rodeiam meu pescoço, se pendurando,
firmando enquanto a como. Nossas bocas ficam bem próximas, ofegando,
gemendo uma na outra, olhos fixos, tesão avassalador inflamando nossos
corpos. Urro, gemo, solto grunhidos, comendo-a sem parar. Ando com ela e
bato suas costas na parede mais próxima, eu meto sem dó, socando de baixo
para cima. Abaixo a boca, sugando, lambendo sua pele, até abocanhar o
seio direito, passando a mamar grosseiramente.
— Oh, estou tão perto, habib.… Tão perto! — Ela geme e não paro
de meter fundo e forte, a fricção de minha pelve em seu clitóris a ajuda e
logo seu corpo convulsiona. Anna goza gritando, empalada em meu eixo, a
boceta apertando meu pau sem pena.
— Goza gostoso, minha garota atrevida.… Molha todo o meu pau…
— Bato em sua bunda. Ela me aperta, gemendo e gemendo, me fazendo
ranger os dentes, me segurando para não gozar junto. Estoco fundo,
comendo-a até passar os últimos tremores do seu gozo, e a levo para a cama
sem sair de dentro dela. Paro na beirada do colchão, depositando-a no
centro da cama king size dossel. Pego cada pé e livro-a das sandálias
sensuais que garantem meu pau duro em segundos. — Fique de bruços. —
Peço, a excitação de finalmente tomá-la por inteiro me tomando.
Anna se vira, fazendo o que pedi, e me debruço sobre suas costas,
afastando a cabeleira negra para um ombro. Pressiono beijos e chupadas
pelas costas, com atenção especial à sua fênix. Subo pelos ombros,
raspando os dentes, fazendo-a arrepiar e choramingar. Mordo-a na nuca e
ela grita, serpenteando o corpo gostoso sobre os lençóis. Rio, levando a
boca para o pescoço e ouvido.
— Empine essa bunda linda para mim, princesa.
Obedece e desço os lábios novamente pelas costas esguias, beijando,
lambendo o suor de sua pele. Minha respiração trava quando chego às
bochechas redondinhas da bunda firme. Escorrego pelo seu corpo,
escarranchando suas coxas, e seguro os dois globos, sovando a carne
vorazmente. Ela fica um pouco tensa comigo brincando com sua
retaguarda. Eu rio perverso e abro as bochechas, expondo o cuzinho virgem.
Meu pau dá uma guinada, louco para se enterrar bem fundo. Esfrego os
polegares em seu buraquinho, observando tudo, cada reação. Sua carne
pulsa com minha massagem lasciva. Escorrego um pouco mais, me
deitando e enfiando a cara entre suas bochechas. Minha língua desliza numa
lambida indecente da boceta até o cuzinho. Ela geme alto, um pouco
desgastada, mas ainda querendo mais. Lambo-a, chupo-a até senti-la
relaxando, então massageio seu buraquinho de novo, metendo um dedo,
fodendo-a devagar.
Anna chama o meu nome com necessidade devassa. Eu rosno e
acrescento mais um dedo, voltando a alargá-la, fodendo-a até o fundo,
girando-os com força. Seu rosto está afogueado, está arquejando, as mãos
cravadas nos lençóis de cada lado da sua cabeça.
— Vou te fazer completamente minha agora, amirati — sussurro,
tomado pelo desejo embriagador que ela me desperta. — Serei cuidadoso,
prometo. — Aliso a carne de sua bunda antes de dar dois tapas, um de cada
lado. Ela geme, se empinando toda. Me viro e abro uma gaveta do criado-
mudo, pegando o lubrificante comprado especialmente para o nosso sexo
safado. Rasgo a embalagem, lambuzo meu pau inteiro e o resto lubrifico
bem o seu buraquinho. — De quatro, Anna — peço roucamente, agarrando
sua pequena cintura, ajudando-a na tarefa. Meu sangue esquenta ainda mais
ao ver a bocetinha toda vermelha e inchada, judiada pela voracidade com
que a comi. Seguro meu pau e levo para o seu cuzinho. Anna resfolega,
tensão clara em seu corpo. — Eu não vou te machucar, habibti, confie em
mim. — Ela geme e assente. Massageio a cabeça em seu buraquinho, então,
vou fazendo pressão, forçando a passagem. Seguro seus quadris, mantendo-
a na posição, estou suando rios de tanto tesão e expectativa. — Empurre de
volta quando eu meter. Isso vai facilitar a penetração. — Ranjo e empurro a
cabeça. Ela grita, estremecendo.
— Ai, minha nossa, isso dói… — lamenta e eu rio um pouco. —
Droga, não tenho coragem para fazer isso… — Eu paro e me debruço em
suas costas, subindo minha boca para seu ouvido. Chupo a ponta da orelha,
mordendo-a em seguida. Ela geme em lamúria. — Ah, Deus, eu quero ser
sua por inteiro… Mas vai doer muito, Karim… — resmunga. Me seguro
para rir dela e seu medo. Levo uma mão por baixo, entre suas pernas,
encontrando seu clitóris, e o esfrego sem pressa. Ela ofega, o prazer
fazendo-a relaxar um pouco.
— Isso… Você quer me dar o cuzinho, sabe que quer… — Torturo-
a levando a boca para seu pescoço, chupando forte, faminto. — Quer ser
minha por completo?
— Sim, você sabe que sim, droga… — Range os dentes e eu rio.
— Perfeito, amirati. — Bajulo-a. — Agora, relaxe e empurre para
fora, enquanto vou metendo… — Oriento-a, voltando a empurrar em seu
pequeno buraco, meus dedos não parando o estímulo em sua boceta. Anna
geme alto, choraminga, mas me obedece, começando a empurrar contra
mim. Olho para baixo e gemo rouco vendo meu pau abrir seu anelzinho
virgem, entrando pouco a pouco até a metade. — Ahhhh, porra, que
cuzinho quente e gostoso… — Puxo e volto a meter, entrando um pouco
mais fundo. Ela geme suspensa, ainda tensa, mas me deixando abrir sua
bundinha linda. — Segure as bochechas bem abertas para mim, Anna.
Ela debruça, encostando o rosto no colchão e as mãos vêm sem
hesitação, abrindo a bunda, arreganhando-se para se tornar toda minha. Eu
fico tirando e metendo de volta, indo e vindo vagarosamente, a cada
impulso indo mais fundo, até que, numa estocada dura, me enterro até as
bolas.
Nossos gritos reverberam no aposento. Meu coração dispara, meu
sangue correndo mais denso nas veias. É a sensação mais hedonista,
pecaminosa e deliciosa que já senti. Já fiz anal com algumas mulheres no
Ocidente e aqui quando meu corpo precisou de alívio, mas nunca, jamais,
foi assim. É com muito esforço que não a encho de porra logo no começo.
Fico parado, tentando me controlar e para deixá-la se acostumar comigo em
sua bunda. Então, a seguro firme nos quadris e começo a meter lentamente,
comendo-a com estocadas fundas. Anna choraminga, me deixando enterrar
meu pau todo, a força das metidas aumentando aos poucos. Geme e começa
a rebolar junto comigo, arquejando a cada estocada firme. Pego seu cabelo
na nuca, puxando-a para trás, e bato dentro dela mais forte, mais fundo. Ela
berra, porém não para de rebolar em meu eixo. Torno a olhar para baixo e
rosno, vendo seu buraquinho sendo sodomizado pelo meu pau, me sugando
até as bolas.
— Assim, princesa, me deixa meter bem fundo nesse cuzinho
virgem. — Meu tom pinga luxúria. — Vamos, rebola no meu pau, Anna. —
A puxo para trás, me apoiando sobre os meus calcanhares, trazendo-a para
sentar no meu colo. Mordo sua nuca, correndo para o ombro, costas. —
Abra bem as coxas sobre as minhas pernas, eu quero te comer nessa
posição. — Ela geme com meu linguajar chulo, mas faz o que pedi. Ajudo-
a, escancarando bem suas coxas sobre as minhas. — Gosta do meu pau todo
em seu cuzinho, habibti? — Minha boca vai para o seu ouvido e continuo
atiçando-a perversamente: — Minha putinha… Que gostoso comer você,
princesa… Gosta de foder comigo? Gosta de me deixar te comer sem
qualquer receio ou tabu?
— Ahh, droga… Sim… Eu gosto muito… Amo foder com você…
— balbucia. — Está perfeito seu pau dentro da minha bunda — diz
atrevidamente e solto um rugido alto, pegando-a pela cintura, trazendo suas
costas suadas para mim. Seu rosto vira para o meu e mergulho a boca na
sua, sedento, esfomeado, comendo seu cu de baixo para cima, meu pau
entrando todo. A posição é deliciosa, fazendo meu corpo inteiro arrepiar e
minhas bolas doerem para jorrar dentro dela. Minhas mãos igualmente
famintas correm pela sua pele inteira. Nos beijamos duro, nos chupando,
mordendo, enquanto fodemos gostoso demais. Seguro os peitinhos lindos e
me esbaldo, espremendo-os, puxando os biquinhos.
— Tão gostosa ‘amira… Vou meter em você assim o tempo todo,
porra… — Meu corpo todo está tremendo e nos arrasto para fora da cama,
carregando-a empalada em meu pau até uma das janelas. Ela apoia as mãos
no batente, o ar frio da noite nos envolve, o deserto à nossa frente, e eu
deliro, tocando seu corpo inteiro, socando meu pau com golpes fundos e
gananciosos. Acaricio o ventre macio, as coxas, desço a mão, pegando sua
boceta toda molhada. Enfio dois dedos e ela solta um ganido choroso. Passo
a comer seu cu e sua boceta, metendo fundo e forte nos dois buraquinhos
apertados. A mão livre sobe para os peitinhos e passo a judiar deles,
arranhando a pele com as unhas.
Anna está quase gozando, sinto seu corpo mudando, seus gemidos
ficando mais erráticos. Eu esfrego seu clitóris e seguro seu quadril, metendo
com força em sua bunda e boceta. Ela começa a convulsionar, gemidos
lindos caindo da boca exuberante.
— Isso, bem assim, princesa.… Goza me dando esse cuzinho
gostoso.
Ela berra e arranha o concreto enquanto goza, pulsando
gostosamente em meu pau. Eu a levanto do chão, meus braços amparando-a
por baixo dos ombros. Mordo sua nuca, estocando freneticamente, sem dó,
socando bem fundo, rasgando-a para baixo em meu pau. Seus braços vêm
para trás pegando, segurando meus cabelos. Está perdida no orgasmo,
chamando meu nome uma e outra vez. Não consigo retardar mais, empalo-a
e urro absurdamente alto, gozando, meu corpo inteiro convulsionando
enquanto encho sua bundinha com a minha porra.
— Ah, Deus, sim, me enche assim… — Ousa gemer, e minha
resposta é meter mais fundo, duro, punindo-a por me mostrar esse nível de
loucura e tesão. Como-a vorazmente, despejando tudo nela. Tremores e
espasmos perpassando nossos corpos. Minhas estocadas vão perdendo força
até que paro todo enterrado, e não preciso pedir, ela traz sua boca gostosa
para a minha. Gememos baixinho nos beijando bem desgastados, mas
saciados. Ando de volta para a cama e a empurro com gentileza para a
frente, saindo de dentro dela. Cai de bruços sobre o colchão, respirando
agudamente.
Me jogo ao seu lado, puxando-a para os meus braços. Ela geme,
então ri, é um som de quem fez travessura. Eu acabo rindo também.
— Você acabou comigo, honorável Alteza — provoca, ainda de
olhos fechados, se aconchegando em meu peito.
— Bem, você acabou de me viciar completamente em seu corpo,
‘amira — digo com reverência. Meus braços enrolando à sua volta.
— Você já tinha feito esse tipo de sexo? — pergunta, levantando o
rosto para o meu.
— Sim, quando estudei em Londres aprendi algumas coisas
ocidentais… — Ela revira os olhos, me fazendo rir. — E fiz sempre que
precisei de uma mulher.… Nunca fiz com Yasmina porque ela era muito
tímida e reservada. — Admito. — Mas com você eu quero tudo, amirati.
Tudo com você tem um valor e significado diferente.
Seu olhar amolece e ela sorri, se aconchegando mais em meu peito.
— Boa resposta, Alteza — zomba e suspira baixinho. — Dói como
o inferno e amanhã estarei andando esquisito. — É a minha vez de sorrir
pela sua espontaneidade. — Mas amo ser completamente sua, amiri —
murmura, tocando minha barba. Vejo uma sombra passando em seus
expressivos olhos verdes. — Karim, se você insistir em se casar comigo, é
verdade que as tribos podem obrigá-lo a tomar uma segunda esposa em um
casamento de Estado?
Meu corpo retesa. Quem andou lhe falando sobre essa merda? Não
posso mentir para ela, no entanto.
— Sim, é verdade — digo e ela fica tensa, puxo-a para mais perto,
olhando-a bem dentro dos olhos. — Eles podem tentar me obrigar, ‘amira.
Mas eu nunca irei tomar outra esposa. — Seguro seu queixo. — Você é a
única para mim, habibti. Meu coração e corpo pertencem a você.
Seu rosto relaxa visivelmente e ela assente, suspirando.
— Meu coração e corpo pertencem a você também — diz baixinho,
seus olhos cheios de amor. — Só a você.
— Eu te amo, habibti. Ninguém irá nos separar — garanto. — Eu
não vou deixar.
— Shukran por ser sincero comigo. — Ela rola, me montando, os
cabelos fazendo uma cortina ao redor do meu rosto. — Eu também te amo,
habib.
E sua boca abaixa na minha num beijo suave, cheio de promessas.
As tribos irão me pressionar, eu sei disso. Mas terão que ceder e aceitar a
minha escolhida para rainha. Nós vamos conseguir. Rogo a Allah que
proteja nossos planos.
CAPÍTULO NOVE
Uma semana depois…
Anna Julia
A limusine desliza suavemente pela avenida principal de Jawahra e
vejo os olhinhos de Ayla brilhando de excitação pelo nosso passeio. Seu pai
está do meu lado direito, respondendo algo em seu celular. Ele tinha
compromissos nesta tarde, mas encaixou a mim e à princesinha em sua
agenda. Ayla precisa sair mais daquele palácio. É uma criança vivaz e sua
rotina é sufocante, presa o dia inteiro com tantas tarefas para cumprir como
se fosse uma adulta em miniatura. Argumentei a respeito com Karim e ele
me deu autorização para flexibilizar as aulas da sapequinha, introduzindo
atividades mais divertidas, condizentes com a sua idade. Além da nossa
aula de inglês, seguida da dança. Vou levá-la para cavalgar dois dias na
semana. Estou pensando em incluir natação também. A pequena vai amar
uma farra na piscina! Não esqueço o olhar apaixonado e orgulhoso que seu
pai me deu quando propus as mudanças.
— Você ama mesmo a minha filha, amirati — sussurrou, me
puxando pela cintura, me fitando com encantamento.
— Sim, habib, eu amo muito aquela sapequinha — sussurrei de
volta, meu coração aquecido por ele, por ela. — Sou loucamente
apaixonada por vocês dois, amiri.
— Eu quero você. Aqui e agora. — Rosnou, me empurrando em
direção à mesa. Estávamos em seu escritório no palácio residencial. Ele
trabalhou lá essa manhã. Seus olhos negros estavam famintos, as mãos
começando a abrir minha calça jeans. — Você é uma necessidade que
nunca é saciada. Minhas mãos coçam para te tocar o tempo todo. Desejo
estar dentro de você o tempo todo… — Tornou a rosnar, já puxando a calça
até minhas coxas com calcinha e tudo… E ele me teve em cima de sua
mesa.
Um arrepio percorre minha coluna lembrando do sexo quente,
excitante, delicioso. De como me debruçou sobre o tampo de madeira da
mesa e me comeu por trás, com impulsos fortes e fundos. Ele é tão gostoso.
Mordo o lábio para não gemer, mas acho que suspirei, porque ele sorri; a
boca se aproximando do meu ouvido, sussurrando:
— Foi delicioso, ‘amira. — Ri perversamente ao sentir minha
respiração alterando. — Você é deliciosa.
Gemo baixinho, fechando brevemente os olhos.
— Você não pode ficar me tentando assim — reclamo. — Não
quando sabe que não podemos nos tocar em passeios públicos.
Em países mulçumanos, os casais não podem nem mesmo andar de
mãos dadas em locais públicos. Apenas homens têm permissão para se
tocarem, inclusive andarem de mãos dadas e se cumprimentarem com
beijos nas faces. É cultural. Não há o que discutir, apenas respeitar. Bom,
pelo menos por enquanto.
Karim sorri e guarda o celular dentro de um compartimento lateral.
— Desculpe por isso. Estava respondendo a uns e-mails urgentes. —
Ele passa o braço por cima dos meus ombros. — Sim, não podemos nos
tocar lá fora, então vamos aproveitar aqui dentro. — A divisória nos isola
do motorista e Ayla está contemplando a cidade, a testinha colada à janela.
Ele segura minha coxa direita, dando um leve aperto, e sua boca
morna encontra uma faixa de pele nua em meu pescoço, sugando
gostosamente. Ofego, meu centro umedecendo, começando a pulsar.
Mesmo com sua agenda lotada, fazemos sexo pelo menos duas vezes ao
dia. Esse príncipe exótico e lindo se tornou rapidamente um vício, uma
necessidade tão pungente que minha vagina chega a doer quando não está
preenchida por ele. O sentimento só não é mais inquietante porque percebo
a mesma necessidade e desespero nele em relação a mim. Nos apegamos
rápido demais. Talvez porque tenhamos ficado de luto por muito tempo. Ele
me contou que ainda que tenha transado nos quatro anos que perdeu a
esposa, o contato físico não era algo apreciado, era quase que um castigo.
Eu também abominava ver o interesse de outros caras nesses seis anos.
Abrimos nossos corações e corpos apenas para o outro e isso tornou tudo
muito maior, mais significativo. Nós escolhemos um ao outro.
— Habib, Ayla… — murmuro.
Ele pega meu queixo e no instante seguinte estou me derretendo
com sua boca mergulhando na minha. Entreabro meus lábios e sua língua
penetra, quente, molhada, lambendo a minha. Meu corpo inteiro treme e
seguro outro gemido. Karim ri, mordiscando-me suavemente antes de
encerrar o beijo.
— Chegamos, habibti — sussurra, me dando mais um selinho antes
de se afastar.
O carro para e Ayla está saltitante agora. Ela nunca veio ao mercado
e está eufórica para essa aventura. A vesti com um mini caftan amarelo, do
mesmo tom do meu, e ela adorou. Coloquei um hijab torcido como uma
tiara em sua cabeça, visto que ainda não tem idade para começar a usá-lo
como as mulheres adultas. Estou usando um branco, envolvendo toda a
minha cabeça, escondendo meus cabelos. Embora eu seja ocidental, o país
não exige tal vestimenta dos turistas, serei a esposa de Karim, então, terei
que me vestir conforme os costumes das origens de meu futuro marido. Ele
sai do carro e dá a volta para pegar Ayla. Eu pego minha câmera fotográfica
e penduro o cordão no pescoço. Estou tão animada quanto a pequena para
um passeio com o príncipe!
— Não esqueça, Anna. Não pode fotografar as pessoas sem
autorização, principalmente se for mulher — Karim diz baixinho quando
me junto a eles. Seguranças estão saindo de outro carro e se colocando a
postos para nos acompanhar. — É considerado um desrespeito fotografar
uma mulher sem o sem consentimento por aqui.
— Está bem. Sou uma profissional responsável, Alteza — digo com
uma piscada. Ele sorri, os olhos cintilando com algo sexual.
— Você não pode piscar para mim desse jeito também, ‘amira. —
Parece levemente divertido. — Pode ser presa por assédio.
Minha boca cai em descrença.
— Jesus… Nem uma piscadinha inocente? — Faço uma cara nada
inocente, batendo os cílios.
— Não. Comporte-se, amirati — murmura com um meio-sorriso
tremulando sua boca linda. — Não pense que será fácil para mim também
não poder te tocar.
— Em casa… — sussurro, meus olhos lhe fazendo uma promessa
sacana. Ele assente e levanta Ayla nos braços fortes, começando a andar
pelo pátio enorme do mercado central.
— Você está animada, nour hayati? — Sua atenção muda para a
pequena, que rodeia seu pescoço com os braços imediatamente.
— Muito, ‘abi! — A menininha exclama. — Sabia que a Anninha
vai me ensinar a cavalgar?
— Sim, habibti? — A voz profunda é cheia de amor pela pequena e
eu emparelho com eles. Ainda que não possa tocá-lo, estou feliz por estar
com eles em público, mostrando a família que seremos em breve.
— Sim! E quero que ela me ensine a pilotar um helicóptero
também! Posso, papai? — diz em sua inocência, e isso faz seu pai rir. O
som profundo viajando em meu corpo.
— Você é ainda muito jovem para uma tarefa como essa, amirati
saghira — Karim diz em tom amoroso. Gosto do fato de ele não a
repreender e, sobretudo, não lhe dizer que não pode porque é mulher.
— Mas, quando for da altura da Anna, posso? — Agora sou eu que
rio. Ah, ela não é linda?
— Nós vamos conversar sobre isso quando chegar o momento,
habibti. — Ele lhe dá um beijo carinhoso na bochecha.
— A Anninha pilota. Quero pilotar também! — A pequena insiste
me fazendo rir baixinho. Karim me olha de esguelha.
— A Anninha veio do Ocidente, nour hayati. Lá as meninas podem
fazer coisas que aqui não podem. — Ele diz ainda no tom amoroso e
cuidadoso. Rolo os olhos mesmo assim.
— Então, eu quero ir para o Ocidente. — Ayla lança a alternativa
inocente para seu dilema.
— Seu pai tem razão, minha sapequinha. Você ainda é muito jovem
para se preocupar com coisas de adultos — intervenho, ganhando o sorriso
de aprovação de Karim. — Quando for uma moça, eu mesma lhe ensinarei
a pilotar. — Seu pai estreita os olhos para mim em advertência. — Mas, até
lá, você precisa estudar muito para ficar cada vez mais inteligente. — Dou
uma piscadinha para a pequena, que sorri, parecendo momentaneamente
aplacada.
Levanto minha câmera e tiro uma foto deles. Estão lindos. Karim
está com a vestimenta tradicional com caftan branco e uma cafia preta na
cabeça presa por um igal dourado. Ele parece um faraó do antigo Egito.
Meus olhos o cobiçam e me pergunto se posso ser presa por isso. Ele sorri,
certamente percebendo o meu receio. Bato mais uma foto e me ponho a
registrar a fachada da construção antiga quando paramos na porta do
complexo. Nós entramos em seguida, e imediatamente a temperatura amena
nos envolve. Toda a área tem uma espécie de ar-condicionado, mesmo as
vielas a céu aberto. Metade da construção data do século XII. No complexo
que engloba o centro histórico, o mercado abriga galerias antigas,
restaurantes lojas de grifes famosas e hotéis luxuosos da rede Jawahra, de
propriedade de Karim. O hóspede pode usufruir das comodidades de todos
eles, basta se registrar em um para ter acesso aos outros.
Nós andamos por várias galerias da parte histórica. Os aromas das
especiarias, os sons dos comerciantes vendendo seus produtos, as pessoas
transitando, comprando, tudo isso penetra em meus sentidos, transformando
o passeio numa experiência única. Karim está agora segurando a mão de
Ayla, que quer ver e experimentar quase tudo. Os comerciantes parecem
extasiados quando veem seu príncipe e a princesinha em seus humildes
estabelecimentos. Eles fazem questão de dar presentes, mas Karim é
consciente de que esse é o ganha-pão deles, então, faz uma compra que
supera o valor do presente para que os homens não fiquem no prejuízo. Isso
é doce e atencioso da parte dele. Tiro muitas fotos. Os comerciantes
parecem contentes com meus registros e sorriem para a minha câmera. Vi
algumas mulheres e ousei pedir que me autorizassem tirar uma foto. Me
negavam no começo, mas quando Karim aparecia e me apresentava como
sua noiva, elas cediam. Eu não reclamei porque isso me daria muito
material para juntar aos muitos registros do deserto.
O sol está se pondo quando atravessamos a ponte do canal que liga o
lado histórico ao moderno. Karim está carregando Ayla no colo de novo.
Ela está tomando um sorvete, o brilho em seus olhinhos é a coisa mais
linda. Não resisto e tiro uma foto assim, espontânea. Seu pai olha para a
câmera e meu fôlego se vai. Jesus, ele é lindo demais. Bato mais algumas e
seu sorriso vai abrindo.
— Venha aqui e tire uma com a gente — pede suavemente. Eu
programo a câmera para nos dar tempo de fazer a pose e vou até eles,
ficando ao lado de Ayla (com cuidado para não tocar seu pai lindo, ou posso
ser presa). Fazemos várias poses, a sapequinha rindo, nos fazendo rir de
forma espontânea. — Agora eu quero mimar as minhas meninas — diz
enigmaticamente, seu olhar encontrando o meu, e é como se estivesse me
acariciando com ele, compensando a falta do toque. — Vem, habibti.
Nós andamos, passando na calcada de cafés e lojas de grifes
famosas. Uma fachada escandalosa em ouro e bronze é onde Karim entra. A
parte da parede de vidro mostra que é uma joalheria. O ambiente é muito
sofisticado, com sofás e poltronas de estofados vermelhos e bordas de
madeira douradas. Os tapetes, toda a decoração é de extremo requinte e
bom gosto.
— Meu senhor. — O homem vestido em trajes tradicionais se curva
numa mesura respeitosa. — É sempre uma honra recebermos a sua visita.
— Shukran, Burak. — Karim diz em tom amigável e me olha com
orgulho. — Esta é a minha noiva, a princesa Anna Julia Di Castellani.
Meu coração sempre fica todo mole quando me apresenta dessa
forma.
— Minha senhora. — Inclina a cabeça, me olhando com simpatia.
— É uma honra recebê-la também.
— Shukran, senhor. — Agradeço-o, com um sorriso cortês.
— Este é Burak, joalheiro exclusivo do palácio, ‘amira — Karim
esclarece.
— Minha família tem servido à casa Al-Abdallah por muitas
gerações, minha senhora — Burak adiciona com a voz solene e orgulhosa.
— Será uma honra servir a nova rainha. — Torna a se inclinar.
— Shrukran. É muito gentil. — Sorrio-lhe.
— Mostre-nos as joias especiais que encomendei semana passada,
meu bom homem — Karim pede e o encaro rapidamente. Ele já havia
encomendado? Sua boca linda se curva num meio-sorriso, adorando me
surpreender. — Sim, amirati. Eu quis fazer uma surpresa para as minhas
princesas.
— Eu vou ganhar joias também, papai?! — Ayla exclama, batendo
palmas.
— Claro que sim, habibti. — Karim a coloca no chão. — Além das
que encomendei, você pode escolher o que quiser.
— Shukran! Eu te amo, papai! — Ela torna a exclamar com os
olhinhos apaixonados para seu pai.
— Eu também te amo, nour hayati. — Ele diz suavemente, tocando
o rostinho eufórico da filha.
Uma funcionária se aproxima e se encarrega de levar a princesinha
para conhecer a loja. Os seguranças estão parados do lado de fora,
impedindo a entrada de outros clientes, nos dando privacidade. Karim se
aproxima e eu olho ao redor, lambendo meus lábios.
— Você quer que eu vá para a cadeia, Alteza? — murmuro. —
Porque vou beijar sua boca se chegar muito perto de mim, estou avisando.
Seus olhos queimam com a paixão que já conheço tão bem, mas há
uma diversão sacana nas íris de ônix. Ele pega a minha mão direita e a leva
até a boca, os lábios depositando um beijo no pulso. Arfo, meu corpo
acordando, querendo mais. Querendo puxá-lo para mais perto, colando-me
em seu corpo, que sei, também já está pronto para mim. Sua língua sai,
lambendo a minha pele levemente.
— Eu jamais a deixaria ir presa, amirati. — Sua voz é engrossada.
— Eu quero a sua boca — imploro.
Ele sorri perversamente e se inclina, a boca vindo para o meu
ouvido:
— E eu quero a sua boceta — sussurra me fazendo convulsionar e
fechar os olhos. Minha vagina umedece, latejando. Então, ele se afasta, os
olhos quentes, me dizendo que está travando a mesma batalha que estou. —
Mas terei que esperar até mais tarde. — Assinto, incapaz de falar. — Nosso
bom anfitrião está vindo, comporte-se, Anna. — Avisa com um brilho
malvado nos olhos. Eu bufo, fazendo-o rir divertido. — Prometo compensar
toda essa tortura de falta de toques, habibti.
— Eu espero por isso ansiosamente, Alteza. — Provoco-o,
lambendo meu lábio superior lentamente. Ele rosna baixo, cravando o olhar
em minha boca. — Comporte-se também, meu senhor. — Rio impertinente.
Burak volta todo entusiasmado com várias caixas de veludo
vermelho. E meu queixo cai a cada joia por ele apresentada. Tenho muitas
joias em casa, de todos os tipos. Meu tio-avô, Max, dividiu as joias de sua
falecida rainha entre as sobrinhas-netas, e a minha parte consiste num baú
lotado de tiaras, anéis, colares, pulseiras… como disse, de todos os tipos.
No entanto, essas joias são diferentes. Há um inconfundível padrão oriental
em cada peça. Há colares que abraçam o pescoço e metade do colo. Pedras
variadas, com predominância para rubis e esmeraldas. Ele diz que fico bem
com rubis e que as esmeraldas realçam meus olhos. Karim me observa
experimentar todas, seu olhar possessivo, flamejante com cada peça que
coloco. Ele não me tocou mais, contudo, sentir seu olhar sobre mim era
quase como se me tocasse fisicamente. Eu acho que isso é de certa forma
estimulante, a excitação vai acumulando e, quando pudermos nos tocar, será
ainda mais delicioso.
— Eu vou ver minha princesinha experimentar as suas também,
‘amira. Já volto — diz com suavidade e se dirige para onde Ayla está
tagarelando com a vendedora o tempo inteiro.
— Você está feliz, nour hayati? — Ele pergunta e eu os contemplo,
meu peito preenchido de amor.
— Muito, papai! Eu vou levar todas! — Ela sorri, lhe mostrando a
tiara de diamante amarelo perfeitamente encaixada em sua cabeça.
Karim a levanta no colo e gira com ela numa dança imaginária. A
risadinha infantil invade o ambiente e os funcionários riem também,
encantados com a cena. Eu sei que sou muito suspeita, mas eles são lindos.
Quando encerramos a compra, Burak informa que enviará tudo ao palácio
ainda hoje. Deixamos a loja após os agradecimentos e nos dirigimos para
um dos hotéis de Karim, para jantarmos. A comida deliciosa me conquistou
de primeira. O restaurante possui uma área privada e foi lá que ficamos, a
mesa perto de uma parede de vidro imensa nos dando a vista de toda a
cidade muitos metros abaixo.
— Vou ter que pensar em um presente para você também — digo,
provando minha sobremesa.
— Você não tem que fazer isso, ‘amira. Os homens árabes adoram
encher suas mulheres de presentes. — Ele sorri e pega a minha mão,
beijando o dorso gentilmente. Sua frase me faz torcer o nariz.
— Suas mulheres? — indago, levantando uma sobrancelha. Ele dá
uma risada profunda, fazendo minha carranca aprofundar.
— Me refiro às mulheres da família, amirati. No meu caso, você e
Ayla. — Torna a beijar minha mão, com esses olhos negros e intensos me
seduzindo. — E quantas outras meninas você me der, habibti.
Eu rio, querendo me debruçar e beijar sua boca. Ele sabe disso
porque torna a rir, sacana, gostando de me deixar doida para tocá-lo.
— Precisamos discutir melhor suas expectativas quanto a filhos,
meu senhor — digo, levantando meu queixo. — Eu não vou parir cinco,
oito, dez filhos, como vejo relatos de mulheres árabes por aí! — Isso o
diverte. Sua risada linda soa de novo. — Embora deva admitir que amo o
processo de reprodução com você…
— Teremos quantos você quiser, amirati. Fique tranquila —
murmura, seus olhos ficando mais penetrantes nos meus. — E eu também
amo cada segundo do processo de reprodução com você…
Estou toda quente e excitada outra vez. Esses estúpidos passeios
sem toque são uma merda!
Nós terminamos de comer, Ayla está ainda elétrica, apontando cada
prédio lá embaixo. A viagem de volta foi feita no helicóptero. Nenhum de
nós pilotou. Karim e eu fomos atrás com a pequena entusiasmada, que
tornou a dizer que quer aprender a pilotar. Na chegada ao palácio, um
homem estava nos esperando junto com o senhor Jafar tão logo descemos
da aeronave. Karim segurou minha mão e pegou Ayla no colo enquanto
descíamos os degraus do terraço. Pude sentir certa tensão nele e me
perguntei quem era aquele homem.
— Amiri. — O homem moreno, na mesma faixa etária de Jafar, se
inclina numa mesura respeitosa. — Desculpe vir sem avisar, é que surgiu
algo que julguei importante compartilhar com meu senhor.
Ele está vestido em trajes tradicionais também. Tem um ar de
autoridade e certa arrogância em seus olhos escuros.
— Sheik El-Baham. — Karim o cumprimenta na voz firme de
governante e eu reconheço o nome. Esse é o pai da naja, um dos líderes dos
clãs tribais. — Se é um assunto urgente, irei atendê-lo. Creio que ainda não
conhece a princesa Anna Julia Di Castellani, minha noiva. — Me apresenta
e vejo algo sutil no olhar do homem.
Sinto a mesma vibração ruim emanando dele. Deve ser de família.
Zombo. Os olhos do sheik cravam em mim e sinto um arrepio estranho
percorrer minha pele.
— Ainda não tive o prazer, embora tenha visto a repercussão de sua
estada em Kamar na internet — ele diz. Seu comentário parece espirituoso,
mas sua expressão é sombria. Me sinto incomodada com o escrutínio
velado do homem. — Minha senhora. — Inclina levemente a cabeça. —
Seja bem-vinda ao nosso humilde emirado.
— Shukran, senhor — respondo educadamente.
Karim vira o rosto para o meu. Ele está sério, mas sua expressão
suaviza.
— Vá com Ayla, amirati — murmura e sua boca encosta na minha
num beijo suave. Sua atenção foca em Ayla: — Vá com Anninha, passarei
para dar um beijo de boa-noite mais tarde. Você gostou do passeio, habibti?
Ela cobre seu rosto de beijos e seu pai sorri, beijando sua testinha.
— Muito, papai. — Um bocejo lhe escapa. A pequena está
finalmente abatida das atividades de hoje.
— Não esqueça de agradecer a Anna, ela quem planejou tudo. —
Toca o rostinho da filha e murmura: — Eu amo você, nour hayati.
— Também te amo, papai — diz de volta, seus olhinhos pesando de
sono.
Eu a pego dos braços de Karim. Ela vem sorrindo, adora ser
paparicada.
— A princesinha está cada dia mais bonita e esperta. — O sheik
comenta, numa tentativa de ser simpático. — Se não for pedir demais, leve-
a mais vezes para estar com sua família materna, meu senhor. Ela precisa
saber que estamos lá sempre que precisar.
— É verdade, sheik. — Karim anui, embora o rosto não mostre
muita empolgação com a chegada inesperada do homem. — Farei isso. Na
próxima reunião que tivermos no deserto, a levarei comigo.
— E a princesa Di Castellani? Soube que esteve fotografando os
beduínos recentemente. — Ele volta a atenção para mim e novamente sinto
aquela vibração ruim vindo em minha direção. — Seria bom levá-la e
apresentá-la aos clãs.
— Farei isso no momento certo, sheik — Karim diz numa voz um
tanto impaciente. — Queira me acompanhar até o salão norte.
— Claro, amiri. Aproveitando o momento, quero que saiba que
terão o meu voto para a união. — O homem anuncia, me surpreendendo pra
caramba. Karim também o encara com certa incredulidade, mas disfarça
muito bem as emoções. — Sou um aliado seu, é pai de minha sobrinha-
neta, além de meu príncipe. Nosso emirado cresceu muito desde que
assumiu como príncipe regente, não há como negar seu progresso. Sempre
terá o meu apoio e me empenharei em conseguir muitos mais para o seu
lado, para meu senhor. — Garante em tom solene e bajulador.
— É bom contar com a sua lealdade, sheik — Karim diz
cortesmente e começa a andar sendo seguido pelos homens. O tio Jafar
esteve o tempo todo calado e mal olhou em minha direção. Continuo fora
da sua lista de Natal para presentes, pelo visto. Zombo.
Coloco a pequena no chão e andamos até seus aposentos. A ajudo a
tomar um banho e escovar os dentes e a coloco na cama, me sentando na
borda.
— Shukran, habibti. — Ela boceja, um sorriso feliz no rosto, os
olhinhos brilhantes pelo tempo que passamos com seu pai. — Anninha?
— Sim, habibti? — Olho-a em expectativa.
— Você vai ser a minha mãe?
Sua pergunta me pega de surpresa e meu coração se alegra que
esteja cogitando isso. Porém, não seria justo com Yasmina. Não posso
tomar seu posto com sua filha. Toco seu rostinho e me inclino, beijando
seus cabelos suavemente.
— Não, Ayla, você já tem uma mãe, princesinha — murmuro. — E
ela te amava muito.
— Eu não me lembro dela. — Seu rostinho cai.
— Eu sei, sapequinha. Ainda assim ela não deixa de ser sua mãe —
digo pacientemente. — Mas saiba que cuidarei de você como se fosse
minha também. É assim que te amo, habibti.
Seu rostinho se ilumina e ela sorri.
— Quanto você me ama? — pergunta, soltando mais um bocejo.
— Assim, menininha bonita. — Abro bem os braços, rindo para ela.
— É assim que te amo também, habibti — diz, a voz já pesando de
sono.
— Durma bem, princesinha. — Lhe dou mais um beijo na testa e
seus olhinhos se fecham, o sorriso permanecendo em sua expressão.
Eu entro nos aposentos de Karim.… Não, nossos aposentos. Me
corrijo. Espero que aquele homem não tenha vindo trazer más notícias. Não
gostei dele. Como sua filha, há algo sinistro vibrando à sua volta. Me forço
a expulsar o desconforto da minha mente e seleciono uma boa música latina
no som. Envio uma mensagem para meu príncipe dizendo que o esperarei
na banheira. É um de meus lugares favoritos para fazer amor. Coloco-a para
encher, meu corpo já antecipando tudo o que faremos, a paixão
avassaladora que tem nos consumido noite após noite.
Karim Amihaj
— Os líderes me elegeram para vir em seu nome, amiri. — El-
Baham diz tão logo que nos acomodamos na mesa de reuniões de um dos
salões da ala norte, que uso para assuntos emergenciais. Meu tio se coloca
ao meu lado na cabeceira da mesa.
— Então, agora, estão trabalhando com representantes entre si? —
pergunto, mantendo meu tom neutro.
El-Baham, embora tenha mostrado lealdade até agora, também é um
dos que compactuam com as ideias atrasadas das tribos. Não posso baixar a
guarda com nenhum deles.
— Não é uma máxima, meu senhor. — Ele sorri apaziguador. —
Apenas para essa questão em particular.
— E qual é a questão? — inquiro, mesmo que já saiba do que se
trata. Vão começar o maldito cerco.
— Todos estão preocupados que não queira mais fazer um
casamento de Estado, meu senhor. — O homem diz em tom cauteloso.
Respiro fundo. Não há como adiar mais isso.
— Eu não vou mais fazer um casamento de Estado, sheik El-Baham.
— Digo com minha voz calma e plana, exatamente do jeito que aprendi
com meu pai e tio. — Me casarei com Anna Julia, a mulher que amo.
Seus olhos denotam insatisfação e ele balança a cabeça.
— E as nossas tradições, amiri? Um Al-Abdallah nunca se negou a
fazer um casamento de Estado — aponta.
— Sim, é verdade, sheik — concordo. — Meus ancestrais, herdeiros
diretos ao trono, aceitaram os casamentos convenientes e tiveram sorte em
encontrar boas mulheres que os fizeram felizes. Mas não estamos mais
naqueles tempos remotos. — O encaro firmemente, não recuando.
— Sua escolhida não será aceita pela maior parte das tribos, meu
senhor — El-Baham verbaliza. — Tem a minha lealdade e voto, como já
disse lá fora, tentarei trazer mais líderes para o seu lado, porém, pode haver
conflitos. — Engole audivelmente. — As tribos podem se dividir ainda
mais caso insista em se unir a uma moça ocidental.
Sim. Ele também está certo em seu prospecto sombrio. Contudo,
não vou recuar. Anna será a minha rainha, não vou abrir mão dela.
— Esse é o recado que veio me dar, sheik? — Olho-o de forma
intimidante. — Que haverá conflitos entre meu próprio povo se não ceder
aos caprichos dos clãs?
— Não é um recado, meu senhor. — Nega com a cabeça. — É uma
preocupação minha enquanto seu fiel súdito. Em minha opinião, será o rei
mais próspero e sábio que tivemos em séculos. Com todo o respeito ao seu
pai, que Allah o tenha — acrescenta. — Mas, mesmo os reis progressistas
precisam se submeter às tradições de seu povo.
— Não estou querendo me casar com uma qualquer. Minha
escolhida é uma princesa. Pertence a uma das casas mais prestigiadas da
realeza europeia. — Meu tom se eleva uma nota. — E eu a amo!
Ele assente. Sua expressão não muda, no entanto.
— Eles insistirão no casamento de Estado, Sua Alteza. Esteja
preparado para enfrentar resistência. — El-Baham aperta os lábios. — Mas
podemos tentar convencê-los para que suba ao trono solteiro. Dessa forma
poderá ir discutindo e tentando mudar algumas exigências para o príncipe
herdeiro.
Sim. Jalal já me sugeriu que fizesse isso. Observo o homem
atentamente. Talvez ele, de fato, seja leal a mim. Meu tio me ensinou a
nunca confiar cegamente na lealdade das tribos. Elas são voláteis.
— Se me permite, amiri — meu tio fala pela primeira vez, sua
atenção vai para o líder à nossa frente —, Jalal já havia discutido essa
alternativa com Sua Alteza há alguns dias.
Os olhos de El-Baham brilham pela aprovação do grão-vizir.
— Shrukran, meu senhor — diz respeitosamente ao meu tio.
— A princesa pertence a uma das famílias mais importantes da
Europa, como meu senhor já mencionou — meu tio retoma e agora ele tem
a minha atenção. É impressão minha ou ele está defendendo Anna? —
Pense nas conexões que conseguiremos com o Ocidente. Seu pai é um
bilionário do ramo da tecnologia. Precisamos de tecnologia de ponta em
nosso emirado. Isso para citar apenas um aspecto positivo da união da casa
Al-Abdallah com a casa Di Castellani. — Me forço a me manter
impassível, mas por dentro estou me perguntando que bicho mordeu ele!
Wallah! De onde veio essa defesa? — A moça pode não ser uma de nós,
mas essa aliança pode trazer inúmeros benefícios para nosso emirado.
El-Baham franze a testa, assimilando tudo que meu tio disse.
Embora não concorde com o aspecto puramente comercial detalhado por
meu tio, é bom ver que conseguiu enxergar que Anna tem um berço forte.
— Eu consigo enxergar, meu senhor. E me esforçarei para que os
outros enxerguem também, fiquem certos disso. — O homem garante,
satisfação se espalhando em seu semblante. — Quando teremos uma
reunião geral?
— Na próxima semana irei a Londres. É o nascimento da filha de
um grande amigo, que por acaso é sobrinha e afilhada de Anna Julia. Meu
tio irá chamá-los e marcar tão logo eu retorne, sheik — informo.
— Certo, amiri. Até lá já terei conversado com cada um dos líderes
— promete.
— Shukran. Sua ajuda não será esquecida, tem a minha palavra —
digo sustentando seu olhar. Isso o deixa ainda mais satisfeito.
— Não faço por recompensa, meu senhor. Saiba que terá sempre um
súdito fiel em mim. — Ele bate no peito esquerdo. — Minha casa sempre
serviu e sempre servirá à casa Al-Abdallah.
— Vou precisar que me mantenha informado das conversas com os
outros clãs, sheik El-Baham — meu tio o intima. — Meu senhor precisa ir
preparado para essa reunião.
— Certamente, meu senhor. — O homem assente. — Manterei meu
grão-vizir informado sobre cada passo e, principalmente, sobre quem não é
confiável. Que Allah nos guie para um denominador comum.
Eu e meu tio assentimos.
— Há algo mais que queira discutir comigo, sheik? — pergunto,
impaciente para ir continuar a noite com a minha princesa.
— Meu senhor se incomodaria se eu ficasse por um ou dois dias
aqui no palácio? Minha filha Latyfa precisa de um novo pretendente e
gostaria de discutir isso com ela antes de retornar ao deserto.
— Claro que pode ficar. Fique o tempo que quiser. É tio da minha
filha — digo, me sentindo um pouco incomodado quando menciona ter de
encontrar outro pretendente para Latyfa. Sei que pai e filha tinham
esperanças de que ela fosse escolhida dessa vez. Contudo, não posso fazer
nada a respeito.
— É muita bondade sua, amiri. — Ele está até mesmo sorrindo
agora.
Me levanto, dando por encerrada a reunião.
— Sinta-se em casa e, mais uma vez, obrigado por sua lealdade —
digo e ele se levanta também. Despedindo-se com uma mesura respeitosa, o
sheik nos deixa.
Meu olhar vai para o meu tio quando o homem sai, fechando a porta
atrás de si.
— Então agora está defendendo a princesa?
Ele se levanta também, vindo para a minha frente. Seu rosto sério e
impassível, como sempre.
— A princesa ainda não é a minha candidata ideal para sua rainha,
amiri. Mas prometi ao seu pai que cuidaria de você — diz com um lampejo
mínimo de emoção na voz. — Como grão-vizir, discordo da decisão que
está tomando, pois isso trará muitas consequências para o emirado. Mas,
como tio, quero a sua felicidade também, e é por isso que irei apoiar sua
união com a princesa escandalosa.
Isso me faz rir um pouco. Finalmente!
— Ela não é escandalosa — defendo-a. — É linda, vibrante e me fez
viver de novo, tio.
Seu rosto suaviza um pouco.
— Como tio, posso ver isso, Amihaj. — Anui, me olhando
firmemente. — E falei sério sobre os pontos positivos dessa união…
— Não, tio. — Corto-o. — Eu a amo. Essa é única razão pela qual a
escolhi. Não quero elencar vantagens materiais quando estou me casando
por amor.
Ele não parece gostar, mas assente.
— Então, vamos nos concentrar na sua argumentação para subir ao
trono solteiro — aponta.
— Sim. Isso merece atenção imediata. Amanhã mesmo vamos nos
sentar e montar um bom discurso para essa reunião — concordo e paro um
instante. — Acha que tenho chances de conseguir?
Me estuda em silêncio por um tempo.
— Nenhum Al-Abdallah subiu ao trono solteiro, Amihaj. Mas se
está disposto a lutar pelo direito de se casar com essa moça…
— Anna Julia, tio, chame-a pelo nome, por favor. — O interrompo.
Novamente não parece satisfeito, mas respira fundo e retoma:
— Se quer mesmo se casar com Anna Julia, terá que ser
convincente.
Olho em direção à porta e volto a encará-lo.
— E quanto ao sheik El-Baham? Acha que posso confiar nele? —
inquiro.
— Um príncipe herdeiro não deve confiar em ninguém, meu senhor
— responde na voz solene e fatalista que tanto usou comigo desde a morte
de meu pai.
— Nem mesmo em seu grão-vizir? — Não resisto à pergunta. Por
incrível que pareça, acho que vejo algo parecido com diversão nos olhos
escuros de meu sisudo tio.
— Deixarei essa questão para o seu julgamento, amiri. —
Sabiamente sai pela tangente. — Agora, sobre El-Baham, é bom mantermos
um olho sobre o homem. — Isso me faz levantar as sobrancelhas. — Ele
parece preocupado demais em provar sua lealdade.
— E isso não é bom? — inquiro, confuso.
— Sim, se a lealdade realmente existir, é bom, amiri — diz com
seriedade. — O vigiarei, fique tranquilo.
— Shukran, tio. — Levanto minha mão, pousando-a em seu ombro.
Ele fica desconfortável com a demonstração de afeto. — Seu apoio é
importante para mim.
— Eu prometi ao seu pai, como irmão e como grão-vizir, que nunca
deixaria de apoiar seu filho. — Reforça, colocando a mão sobre a minha. —
E não pretendo falhar.
Meu tio é um homem tradicional. Sua promessa deve ser uma forma
de demonstrar seu amor pelo irmão e por seu filho. Eu acho. Nos
despedimos e sigo para os aposentos de Ayla. Sorrio ao ver a minha
pequena ressonando quando me aproximo da cama. Ela estava tão radiante
com nosso passeio hoje. Anna tem razão, eu a deixei presa aqui comigo por
muito tempo. Me isolei depois da morte de Yasmina e minha filha acabou
sendo sentenciada a sofrer junto comigo. As vezes que a levei à capital,
posso contar nos dedos. Nunca a levei para cavalgar comigo. Nunca fiz
nada divertido com ela, e isso é imperdoável. Eu estava de luto, não ela.
Decidido a mudar isso de agora em diante, eu beijo sua testinha e saio do
quarto.
Pego meu celular, passando as mensagens, e meu peito e outra parte
da anatomia vibram ao ver uma que Anna me enviou há uns trinta minutos.
Ela diz que vai me esperar nua na banheira. Eu apresso o passo e entro em
nossos aposentos. Surpreendentemente, música árabe está tocando no home
theater. Me livro das sandálias, cafia, igal e me dirijo ao banheiro. Quando
alcanço a porta, paro, me recostando ao batente, e aprecio a cena por um
instante. Ela está de olhos fechados, a cabeça apoiada sobre a borda da
banheira. Não há espumas, o que me permite ver seu corpo lindo submerso.
Me aproximo devagar, meu corpo respondendo à visão da perfeição que ela
é. Os peitinhos durinhos, os biquinhos e auréolas deliciosas. O ventre liso, a
bocetinha bem depilada me faz salivar. Arranco minha roupa e só quando
estou dentro da banheira ela abre os olhos. Um sorriso preguiçoso curva a
boca carnuda.
— Amiri… — Sussurra, me estendendo a mão.
— Oi, habibti. — Pego sua mão e me abaixo, me sentando na outra
extremidade, puxando-a para o meu colo. Ela vem ansiosa, desejosa e
quando sua pele encosta na minha, tudo o mais some da minha mente.
— Obrigado por se preocupar com Ayla. Eu fui tão insensível com
ela… — Murmuro, enrolando meus braços em sua cintura. Sua boceta
quente está sobre o meu pau duro. — Eu a fiz ficar de luto junto comigo e
isso foi muito ruim para ela.
Seu rosto bonito suaviza e ela segura meu rosto de cada lado. Seus
cabelos estão presos num coque no alto da cabeça, deixando seu pescoço
aristocrático todo à mostra.
— Não tem que me agradecer. Eu a amo. — Diz com esses lindos
olhos verdes brilhantes. É por isso que enfrentarei quaisquer consequências.
Por ela, para receber esse olhar que está me dando, todos os dias.
— Amirati… — Sussurro rouco, pegando sua nuca, trazendo sua
boca para a minha. E então, me perco nela e em seu corpo…
Anna Julia
Eu enfio o nariz no peito de meu pai e inspiro o cheiro amado e
familiar. Seus braços estão à minha volta e seus lábios depositam beijos
suaves em meus cabelos. A sensação enche meu coração de calor.
— Eu senti saudades, papai — murmuro, levantando meu rosto,
encontrando seus olhos verdes, geralmente divertidos, mas estão brilhantes
de emoção neste momento.
— Eu também, princesinha. Eu também — diz, me dando mais um
beijo amoroso na testa.
— Bambina. Ficamos tão aflitos no começo — minha mãe reclama,
me fazendo olhá-la. Tenho um braço em volta dela também. Eu entrei na
sala e corri para eles, como uma garotinha do papai e da mamãe.
— Eu sei, mamma — digo suavemente, recebendo seus beijos
carinhosos. — Estou bem. Tudo não passou de um susto.
— Ei, maninha, e eu não ganho abraço? — Lipe vem para perto com
sua cara travessa.
— Vem aqui, meu fedelho preferido. — Meus pais me soltam e eu
vou até meu irmãozinho, suspirando feliz quando seus braços me engolem
num abraço. Ele está maior e mais forte ou é impressão minha? — Você
está mais bonito e mais forte. Está pegando pesado na academia? Esses
músculos não estavam aqui há dois meses. — Observo, apalpando seus
ombros e bíceps duros.
— Funciona com as garotas. — Ele pisca safado e me dá um beijo
na têmpora. — Senti saudades, Anna.
Me estico, beijando-o na bochecha.
— Eu também, bonitão. — Estendo a mão para o lado e uma mão
grande e familiar a segura. Olho de lado, notando Karim um tanto sem jeito
segurando a mão de Ayla, que está com os olhinhos curiosos correndo por
todos no recinto. Chegamos há pouco para o nascimento da minha afilhada.
Minha família está em peso na sala de espera da maternidade. Me coloco ao
lado de meu príncipe para deixá-lo mais à vontade. — Pai, mãe, Lipe,
conheçam Karim e sua filha Ayla — digo com orgulho e amor na voz. —
Habib, princesinha, estes são meus pais, Dom e Helena, e meu irmão mais
novo, Felipe.
— É um prazer conhecê-los pessoalmente, senhor, senhora. —
Karim estende a mão, a voz firme.
— O prazer é nosso, Amihaj. — Meu pai aceita o cumprimento, um
sorriso enrolando sua boca ao completar: — É bom vê-los fora da
internet…
— Pai… — resmungo e ele me dá uma piscada. Já vi que vai
continuar zoando Karim.
— E, por favor, sem essa de senhor, sou ainda muito jovem —
retruca e ouço um bufo, que acredito ser de meu tio Jay. Rio. Meu pai e tios
nunca param de zoar uns aos outros. — Prazer em conhecê-la, mocinha —
acrescenta, dirigindo a atenção para Ayla, que parece momentaneamente
tímida.
— Concordo com meu marido, não precisa tanta formalidade,
apenas Helena, por favor. — Minha mãe estende a mão. — É um prazer
conhecê-lo e a essa menininha adorável — complementa, afagando os
cabelos escuros de minha sapequinha.
— Ei, cara! Bom te conhecer! — Lipe estende a mão e dá tapas
amigáveis nas costas de Karim. Meu príncipe parece fora da sua zona de
conforto. Tadinho. Enfrentar todos os Di Castellani de uma vez não é para
qualquer um.
— Bom te conhecer também, Felipe — ele responde.
— Apenas Lipe. — Meu irmão pede e acaricia a cabecinha de Ayla.
— E você, princesinha? Soube que gosta muito de dançar. É
verdade?
Ayla abre um sorriso tímido.
— Sim. A Anninha me ensina — responde e vejo nos rostos de
meus pais a satisfação ao ver o carinho com que a pequena se referiu a
mim.
Antes que a conversa se estenda, os outros chegam para perto. Meus
padrinhos Leon e Júlia. Tio Jay e tia Cassie. Luc, Samu e Chloe, que está
com uma barriga enorme! Minha nossa! Sam e Em e Dam e Max. Sou
abraçada e beijada por cada um deles. Todos estavam ansiosos para me ver
em pessoa e conferir se realmente estou bem. Em seguida, apresento Karim
e Ayla. Apenas Mike e Ella os conheciam pessoalmente e eles estão na sala
de parto neste momento.
— É bom ver que está bem, figlia mia. — Meu padrinho beija
minha testa. — Ficamos tão preocupados com a sua segurança.
— Tudo passou, padrinho. Grazie a Dio — murmuro, recebendo o
carinho dele. Meus tios são muito amorosos com os sobrinhos. Meu pai e
seus irmãos nos criaram como se fôssemos irmãos. Somos muito unidos.
— Ainda bem, querida. — Minha madrinha também me beija. Me
sinto paparicada e tão amada aqui com eles. Seu tom abaixa um pouco, seus
grandes olhos verdes encontrando os meus ao murmurar: — Estou tão feliz
por você, principessa mia.
Assinto. Sei que minha família se preocupava muito com o meu
luto. Achavam que o estendi por tempo demais.
— Grazie, madrinha — sussurro.
— Você nos deu algumas rugas e cabelos brancos, querida. — Meu
tio Jay sorri, me puxando para um abraço de urso, beijando meus cabelos.
Ele sempre foi o mais caloroso dos irmãos. — Graças a Deus que tudo se
resolveu.
— Obrigada, tio. — Sorrio-lhe.
— Sim, todos nós ficamos desesperados com essa sua travessura,
querida. — Tia Cassie ri antes de me dar um beijo suave na bochecha.
— Desculpe preocupá-los, tia. — Sorrio, me sentindo a menina
arteira que sempre aprontava nas férias que passava com meus primos.
Chloe se aproxima com seus homens a tiracolo. Ainda é meio
chocante ver os três interagindo livremente, como um trisal. Foi uma
verdadeira loucura para eles conseguirem a liberação do parlamento para se
unirem, mas tudo se resolveu e conseguiram ficar juntos. É meio
escandaloso, porém meus primos e sua escolhida formam um lindo e
harmonioso trio. Nós os apoiamos, como sempre fazemos com os nossos.
— Que barrigão é esse, menina?! — Exclamo, estendendo a mão,
colocando a palma no ventre protuberante de minha amiga.
— Nós esperamos você chegar para contar a novidade, Anna. —
Luc espalma o ventre da esposa e sorri todo arrogante para mim. —
Estamos esperando trigêmeos, prima!
Eu engasgo. Mil vezes uau!
— Jesus! Vocês não brincam mesmo em serviço, hein, bonitões? —
Rio, olhando entre ele e Samu, que tem o mesmo sorriso arrogante do
gêmeo estampado em sua cara.
— Estamos ainda um pouco assustados, mas muito felizes, prima —
Samu complementa.
— Tirando a parte que eles já começaram a chutar forte e parecem
estar jogando futebol aqui dentro — Chloe dá de ombros, um sorrisão feliz
em seu rosto —, estou muito feliz com a novidade.
Em seguida todos começam a falar sobre a gravidez deles e sorrio.
Essa é a minha família. Meus pais deram um jeito de puxar Karim de lado e
iniciam uma conversa. Jesus, eles já vão começar a interrogá-lo agora?
Sério?
— Você parece feliz, Anna. — A voz de Dam para minha intenção
de ir socorrer meu noivo.
— É porque estou, Dam — digo e ele sorri, seus olhos escuros livres
do sarcasmo. — Muito feliz, primo.
— Fico contente que não vou precisar quebrar a cara de nenhum
bastardo. — Ele abaixa o tom, o sorriso irônico voltando no rosto bonito.
— Tente ser civilizado, futuro rei. — Reviro os olhos.
— Isso é o máximo que consigo. — Seu sorriso arrogante se
espalha.
— Anna! — Sam e Em vêm para perto de nós, seus rostos estão
com uma expressão sapeca que conheço bem.
— Ele é um gato! — Em sussurra.
— Simmm! Muito gato, prima! — Sam endossa.
Dam grunhe, rolando os olhos, prevendo a conversa de meninas que
virá a seguir, então nos deixa, se dirigindo para seus pais.
— Sim, ele é — concordo, rindo da euforia delas. — Estou tão feliz,
primas!
Seus rostos e olhares ficam suaves e elas vêm me envolver em um
abraço duplo.
— Também estamos por você, prima.
— Nós também, prima.
Murmuram e meu coração aquece no peito. Agora só falta a minha
afilhada chegar para fazer a alegria geral da família.
— Então, a minha prima descolada e irreverente foi mesmo laçada?
— Max chega para perto, a voz e semblantes divertidos. Ele também parece
maior e mais gato do que há dois meses. Os homens Di Castellani são
muito, muito bonitos. Não, não é uma opinião parcial, é a verdade. O DNA
é forte e muito abençoado no departamento beleza, acreditem.
— Sim, bonitão. Eu fui — assumo. — E você, quando será laçado?
Ele faz o sinal da cruz duas vezes e ri com uma cara de quem não
vai sossegar tão cedo.
— Dio non voglia![28] — Exclama, nos fazendo rir da sua safadeza.
Ele e meu irmãozinho ainda vão dar muito trabalho antes de
sossegarem. Por falar nele, Lipe chega, passando um braço por cima dos
ombros de Max.
— Tudo pronto para hoje à noite? — Lipe pergunta.
— Si. Solo la crema…[29] — Nosso primo responde com um sorriso
lento e pervertido.
Uh. Não quero nem imaginar do que esses dois estão falando.
E, de repente, toda a conversa na sala cessa. Olho para a entrada e
Mike está lá, segurando um pequeno pacote nos braços. Seus olhos estão
vermelhos e emoção marcando suas feições.
— Ciara chegou! — Meu primo anuncia e corremos todos, como
um enxame de abelhas, rodeando os dois. Eu contemplo o pequeno
embrulho em seus braços. O rostinho corado, a boquinha tremendo em um
bocejo, os olhinhos verdes se abrindo. Sorrio, meus olhos se enchendo de
lágrimas emocionadas.
— Ela é linda! — murmuro. Mais destes soam no recinto. Minha
afilhada. Um braço forte enrola em minha cintura e eu apoio a cabeça no
peito de Karim. Levanto meu rosto, nossos olhares se encontrando e se
conectando. — Obrigada por estar comigo nesse momento, amiri.
— É um prazer. Você parece radiante aqui no seio da sua família. —
Ele diz, sua boca pairando sobre a minha.
— É porque os amo muito — digo. Ele assente, uma expressão terna
em seu rosto, então seus lábios pousam com suavidade nos meus. É apenas
um selinho, mas me deixa ainda mais enlevada. Pego Ayla e a levanto nos
braços para que possa ver a nova integrante da família. — Essa é a sua
priminha, habibti — sussurro e minha sapequinha ri, me abraçando pelo
pescoço.
***
Dois dias depois, Ella teve alta e seguimos para o seu castelo, onde
estão morando há mais de três anos, nos arredores de Londres. Eu seguro
minha afilhada enquanto Mike entra no quarto com Ella nos braços. Meus
padrinhos e Max estão todos em volta da cama, cada um tentando fazer
algo. Mike a deposita suavemente contra os travesseiros ajeitados por
minha madrinha.
— Você está bem, boneca? Está sentindo dor? — pergunta e Ella
sorri para o marido, traçando seu rosto com os dedos, o olhar apaixonado
sobre ele.
— Grazie, amore mio. Estou ótima, não se preocupe — diz
suavemente. Olha para sua mãe e sorri com ternura. — Grazie, mamma.
— Tem um rapazinho aqui muito impaciente pedindo por sua
mamma. — Dam entra no quarto com Rico, o bebê mais velho de Ella e
Mike, no colo.
— Mamma! Quer mia mamma! — O pequeno exige no momento
em que vê sua mãe, estendendo os bracinhos rechonchudos. Ele tem dois
anos e meio agora. É a cara do pai. Mas os olhos são uma mistura do verde
de Ella e do negro de Mike, resultando numa linda tonalidade avelã. Lindo,
meu sobrinho. Dam e Max são os padrinhos e as gêmeas são as madrinhas.
De Ciara, eu sou a madrinha; e os gêmeos os padrinhos. Eles dosaram bem.
— Piccolo mio.… Vem com tua mamma. — Ella observa o filho
com os olhos cheios de amor. — Trago-o para mim, fratello — pede a Dam.
Ele o leva, o pequeno rindo, fazendo barulho à medida que todos
fazem carinho em sua cabeça. Rico era o centro das atenções, como único
bebê Di Castellani. Agora terá que dividir seu posto de reizinho com esta
coisa linda em meus braços. Olho para baixo e a encontro de olhinhos
abertos, bem esperta. Ela se parece com Ella, loirinha, olhos verdes vívidos,
que podem mudar de cor ou não conforme for crescendo. Torno a olhar para
a cama e Mike está lá, contendo os arroubos de Rico, explicando que sua
mamma não pode pegá-lo no colo. O menino faz um bico de choro,
chamando sua mãe, e Ella sorri, se inclinando e cobrindo seu rostinho de
beijos.
— Tua mamma está dodói agora, tesoro. Mas logo ficarei bem e vou
poder brincar com mio bambino. — Minha prima diz com o tom repleto de
amor e paciência. — Fique com tuo padre que nostra princesinha chegou.
Lembra que estávamos esperando por ela? — O pequeno começa a se
acalmar e eu ando até a cama, entregando o pequeno pacote para Ella. —
Nostra Ciara chegou, Rico! — Murmura suavemente, beijando a cabecinha
loira da filha.
— Nosta Ciara. — Rico repete, os olhinhos presos à irmã no colo da
mãe.
— Si, mio principi. Tua sorella está aqui. — Ella continua
conversando com o pequeno, que parece deslumbrado e curioso com a
bebê.
— Mia sorella. — Repete como um papagaio.
Eu rio, meus olhos lacrimejando com a imagem deles lá. Mike
contempla a esposa e os filhos como se fossem a coisa mais preciosa no
mundo e aproxima o rosto do de Ella, suas bocas se unindo num beijo cheio
de amor. É tão bom ver minha prima feliz, aumentando sua linda família.
Meus pensamentos vão inevitavelmente para Karim. Ele está lá embaixo na
sala com os outros. Pensei que algo assim não fosse para mim. Pensei que
nunca formaria minha família, mas agora me vejo querendo exatamente
isso. Quero me casar com ele, amar e cuidar de Ayla como se fosse minha e
lhe dar mais filhos.
Meus padrinhos, Dam e Max saem e me aproximo da cama. Ella
está amamentando a Ciara agora, a pequena fazendo sons suaves de sucção.
— Eu vou levar Rico para tomar banho e se alimentar — Mike
avisa, dando um beijo reverente na boca de Ella, em seguida outro na
cabecinha de Ciara. Então, se levanta da borda da cama com Rico no colo.
— Qualquer coisa me chame, boneca.
— Fique tranquilo, amore mio, estou bem. — Sorri, acariciando a
cabecinha da Ciara. — Nós estamos bem.
— Eu cuido dela. Fique tranquilo, primo — digo chegando mais
perto deles e fazendo carinho na cabeleira negra de Rico. O malandrinho se
derrete, estendendo os braços. Eu o pego e beijo sua testinha. — Você é o
menino mais bonito, não é? — Ele ri, os bracinhos envolvendo meu
pescoço. Como disse, o pequeno adora ser o centro das atenções. Lhe dou
mais beijos no rostinho bonito e o devolvo para Mike. — Vá com seu papai
que tia Anna vai cuidar de tua mamma agora.
— Mia mamma. — Ele repete, olhando para Ella, a boca fazendo
um bico, iniciando uma birra.
— Nada disso, campeão. Vamos tomar banho, jantar e depois trago
você para ver a mamãe de novo. — Mike o leva rapidamente, saindo do
nosso campo de visão.
Ouvimos as reclamações do pequeno até que deixam o quarto. Eu
me aproximo mais, me sentando à borda do colchão.
— Estou feliz que tenha conseguido vir, carissima — Ella murmura,
sua mão nunca parando o carinho na cabecinha da filha.
— Eu não perderia a chegada de minha afilhada por nada,
principessa mia — digo com a mesma suavidade. — Ela é linda, prima.
Parabéns de novo.
— Grazie, prima — sussurra, seus grandes olhos verdes me
contemplando com um brilho terno. — Estou ainda mais feliz por ver esse
brilho em seus olhos, esse sorriso de volta em seu rosto, principessa mia.
Eu pedi tanto a Dio por isso, Anna, te ver feliz de novo.
Suas palavras fazem lágrimas borrarem a minha visão. Ela, dentre
todos, é a que sabe realmente a extensão de tudo que sonhei viver com
Nate. De tudo que perdi quando ele foi embora tão cedo. Há coisas que só
compartilhei com ela, como há coisas sobre Mike que só compartilha
comigo. Nós temos esse tipo de ligação. Seguro meu colar num gesto
instintivo. Isso faz meu coração apertar porque terei que tirá-lo. Esse era o
desejo de Nate. Há também aquela carta temível esperando para ser aberta
em meu quarto em Nova York. Quero fazer as duas coisas no fim do mês,
quando irei em casa, passar uns dias com meus pais. Já conversei com
Karim a respeito e ele organizará sua agenda para me acompanhar e
levarmos Ayla conosco também.
— Você terá que tirá-lo agora que encontrou o amor de novo —
murmura, ao me ver segurando o colar de Nate.
— Eu sei. É só que meu coração ainda sente como se tivesse traindo
Nate. — Expiro lentamente. — Por outro lado, mantê-lo não parece justo
com Karim.
Seu rosto suaviza, mostrando compreensão.
— Mantenha-o junto com as cartas. Você pode abrir e se conectar
com ele sempre que quiser, prima. Karim entenderia isso, tenho certeza.
— Sim, ele entenderia. — Suspiro, o amor por meu príncipe
suplantando um pouco do aperto em relação ao meu primeiro amor perdido.
— Ele é maravilhoso, Ella. Eu pensei que não fosse possível, mas encontrei
o amor de novo, encontrei um homem que fez meu coração bater outra vez
— digo com voz levemente embargada. — Encontrei o homem que estava
destinado a mim e que tem me feito muito feliz.
— Eu quis apresentá-los. Cheguei a sugerir isso para Mike certa vez
— confidencia, me deixando surpresa.
— Mesmo? Por que nunca me falou nada?
— Porque Amihaj estava amargo, mergulhado no luto, e você
também estava fechada para relacionamentos — diz séria, todavia, um
sorriso vai se abrindo aos poucos. — Mas o destino se encarregou de
colocá-los juntos. Isso é extraordinário, prima.
— Sim. Embora eu tenha andado muito chateada com Deus nos
últimos seis anos, parece que Ele agiu em meu favor dessa vez, guiando-me
até Karim.
— E guiando Karim até você — emenda. — Porque o príncipe não
tinha obrigação nenhuma de ir pessoalmente resgatá-la, Anna.
— Não tinha, é verdade. — Rio, relembrando aquela noite, os
primeiros dias no palácio. Suspiro. — Estou tão apaixonada, Ella.
A expressão suave volta em seu rosto.
— Você merece, prima — murmura. — Vocês dois merecem viver o
amor de novo. — Seus olhos brilham com malícia e adiciona: — Agora me
conte os detalhes calientes.
Eu rio, me sentindo corar, mas retomo minha irreverência.
— Geralmente sou eu quem está curiosa por detalhes assim de sua
vida BDSM, principessa. — A provoco. Ella ri um pouco, meneando a
cabeça. — Eu andei testando a logística de fazer em cima de um cavalo…
— Minha prima arregala os olhos e um sorriso de quem tem uma vida
sexual bem agitada curva sua boca. — É meio confuso e desajeitado no
começo, mas depois é perfeito…
— Si? E o que mais andou testando a logística, prima? — pergunta
com um meio-sorriso, mudando Ciara para o outro seio.
— Exótica só essa situação mesmo, porém, cada noite que passo nos
braços dele é intensa à sua maneira. — Assumo, compartilhando um sorriso
cúmplice com ela.
— É assim com Mike — murmura com um ar sonhador. — Mesmo
quando fazemos baunilha, ainda é intenso e perfeito. É a pessoa com quem
estamos que importa, carissima. — Assinto e ela muda o assunto: — Então,
você vai voltar com ele para Kamar?
— Sim. Há algo que ainda não lhe disse, prima. — Ela me sonda
atenta. — Karim vai me pedir em casamento para meus pais na sexta!
— Ah, Dio mio! — Exclama, arregalando os olhos. — Isso é
maravilhoso, Anna! Vou pedir à minha mãe que organize tudo para um
jantar especial. Já estarei sem dores até lá e poderei participar também. —
Ella está radiante. Sua mão estende para a minha. — Você será feliz, prima.
Dio não esqueceu de você.
— Grazie, ti amo, principessa mia — murmuro, dando um aperto
suave em sua mão, sentindo meus olhos marejando de novo.
— Also, principessa mia — responde ternamente.
Nós ainda conversamos por um tempo até que terminou de
amamentar e coloquei Ciara no berço para que pudesse descansar na cama.
Os namorados de Sam e Em, Will e Nolan Belmont, chegaram para
o jantar e passamos momentos agradáveis. Will é piloto da Fórmula 1 e
conquistou o tetracampeonato recentemente. Os dois pertencem a uma das
famílias mais ricas da Fórmula 1, dona da equipe Belmont, da qual Will é o
principal piloto. Minhas primas parecem muito apaixonadas pelos caras,
muito gatos, diga-se de passagem. E eles por elas. Jantamos todos no salão
maior, ao redor de uma mesa oval enorme. Bem, quase todos. Mike subiu
para jantar com Ella em seus aposentos. Karim e Ayla pareciam mais à
vontade com minha família. Tio Jay e meu pai emendaram uma conversa
sobre petróleo e o turismo crescente em Kamar. Era nítido o orgulho de
Karim ao falar do seu emirado. Meu olhar o procurou o tempo todo e vice-
versa.
Estamos hospedados com Ella e Mike desde que chegamos há dois
dias, mas não estamos dividindo o mesmo quarto porque a família inteira
também está aqui nessa primeira semana. O nascimento de um Di
Castellani é um evento especial e a família toda se mobiliza para estar
presente. Tomamos uma bebida na sala de estar. Todos interagindo. Neste
momento, os gêmeos estão contando de um novo projeto e Chloe está
falando do sucesso de seu primeiro livro por uma editora famosa de Nova
York. A danadinha escreve ménage, e embora o tema ainda seja um tanto
escandaloso para a família, estamos empolgados por ela. Eu os observo e de
repente percebo que vão precisar de uma nova logística com esse barrigão
dela que não para de crescer… Rio da minha indiscrição.
Dam está com a antipática da namorada oficial, Olga, mas está
absorto, em pé perto da janela, seus olhos grudados no celular. De vez em
quando sua boca torce num de seus raros sorrisos para algo na tela. A
doutora? Que safado! Qual é a dele? Me pergunto observando-o. Quando
meus pais e tios se recolhem, eu e Karim subimos com Ayla para nossos
aposentos. Cuidamos da higiene da pequena, trocamos sua roupa para um
pijama e a colocamos na cama. A babá reclamando que não precisamos
fazer isso e minha sapequinha dizendo que gosta quando a Anninha e o
papai a colocam na cama. Ayla adormece rapidamente. Pelo que a babá nos
contou, ela explorou bem a propriedade hoje e deve estar cansada. Dou um
beijo em sua testa, seu pai faz o mesmo e nos dirigimos para fora.
Ele segura a minha mão e me leva até a minha porta, seus olhos
escuros me prometendo uma noite movimentada tão logo que o resto da
casa se recolha. Na primeira noite, ele ficou relutante em vir ao meu quarto,
então eu fui para o seu e ele não resistiu. Se despede com um beijo suave e
entro em meus aposentos. Tomo um banho, escovo os dentes, mudo para
uma camisola e penhoar vermelho curtos para esperar o meu homem.
Seleciono uma pasta pop no sistema de som e me dirijo ao bar, perto das
portas enormes de madeira maciça que levam à sacada. Eu sirvo duas taças
de vinho sobre a bancada do bar e pego uma delas. Ando alguns passos e
tomo um pequeno gole, inspirando o ar puro e perfumado. Nesta ala,
estamos de frente para um campo dos mais variados tipos de flores. Durante
o dia é uma vista incrível. A introdução de Diamonds, da Rihanna, soa em
volume baixo. Amo essa. Minha mãe a adora também. Tomo mais um gole
e me assusto quando um braço forte enrola em minha cintura, puxando
minhas costas contra um peito duro.
— Amirati… — A voz profunda sussurra, a boca caindo para a
lateral do meu pescoço, onde deposita um beijo suave. Um arrepio gostoso
me perpassa e gemo baixinho, sentindo os lábios quentes e macios
explorando minha pele, sugando-me levemente. — Passei o dia inteiro
louco para te tocar assim.
— Eu também, amiri. — Choramingo, levando minha mão para
trás, pegando sua nuca. Viro o rosto, nossos olhares se conectando. É
sempre um baque delicioso em meu estômago sentir esses olhos escuros e
intensos sobre mim.
— Nour Al sabah… — Murmura asperamente, sua boca vindo para
perto da minha.
— Minha família pode ser assustadora, eu sei. — Rio. — Mas eles
são leais, habib.
— Eu sei, habibti. — Roça a boca na minha. — Sua família é muito
acolhedora e estou me sentindo bem entre eles. É só que em Kamar me
acostumei a ter você sempre que eu quisesse…
— Oh, honorável Alteza, você está se sentindo negligenciado, é
isso? O que posso fazer por você, meu senhor? — O provoco e ele ri,
mordendo minha boca com uma pressão deliciosa, fazendo-me pulsar e
palpitar.
— Também não gosto de estarmos enganando seus pais, mas odeio
ter que dormir sem você na minha cama — resmunga. Eu rio, lambendo sua
boca bem-feita.
— Tão certinho, Alteza… — Zombo, fazendo-o grunhir, tomando
um gole da sua taça. Sua mão livre começa a acariciar meu ventre, subindo
devagar para os seus, pegando o direito em cheio. Minha respiração acelera
sob seu toque firme e o brilho perverso invadindo as íris de ônix.
— Eu vou mostrar o quanto sou certinho, princesa. — Seu tom é
rude, e isso vai entre minhas pernas. Sinto seu pau duro cavando em minha
bunda e ofego. Ele ri, lento e malvado, e então a mão desce se enfiando
entre minhas coxas, pegando minha vagina nua. Ele ruge ao me encontrar
sem calcinha. Nossas bocas estão respirando forte uma na outra, desejo,
luxúria se infiltrando em nossas veias. — Você e seu rabo atrevido vão
sofrer essa noite…
— Estou ansiosa para isso, meu senhor. — Continuo provocando-o
e sua boca mergulha na minha. Embora estejamos cheios de tesão, o beijo é
lento, nossos lábios sugando um ao outro, nossas línguas se lambendo
devagar. A paixão vai se agigantando e Karim me gira de frente. Ele se
estica e coloca nossas taças sobre a bancada de mármore, então os braços
enrolam em minha cintura, me puxando contra seu corpo. Gemo quando
nossas bocas se encontram de novo, mais urgentes dessa vez. Suas mãos
passeiam pelo meu corpo, a sensação deliciosa sobre o cetim macio da
camisola. As minhas também o exploram com fome. Ombros, peitoral,
costas arranhando minhas unhas sobre a sua camiseta preta. Não demora
muito e ele está me livrando do penhoar, da camisola. A brisa de fora
alcança minha pele nua e estremeço quando suas mãos se fecham sobre
meus seios, massageando a carne, rolando os bicos entre os dedos.
— Sim, amiri. — Arqueio-me, me dando sem reservas.
Depois de me enlouquecer com mãos e boca, me levanta nos braços
e nos leva para a cama, onde nos amamos por horas.
Eu também sentiria falta de dormir sem seu calor me envolvendo. É
inexplicável como me sinto tão ligada a ele em tão pouco tempo. Nos
conchegamos depois de extravasar nosso tesão, seus braços firmemente
enrolados em minha cintura e um sorriso feliz curva minha boca. Eu
adormeço assim, nua nos braços do homem que me possui completamente.
Karim Amihaj
Dois dias depois, Mike me puxa para a biblioteca após o jantar.
Imagino que queira conversar sobre minha situação com Anna. Ele deu
sinais disso desde a nossa chegada, porém, tem estado bem ocupado
cuidando de Ella e sua filha recém-nascida. Meu amigo é um homem
completamente dedicado à sua esposa e filhos.
— Parabéns mais uma vez, amigo. — Digo pegando o copo de
uísque das mãos de Mike. Ele se senta na poltrona de frente para a minha
em sua biblioteca. Ele tem círculos escuros embaixo dos olhos, as noites
maldormidas cobrando seu preço, mas, em contrapartida, há uma expressão
feliz e realizada em seu rosto que certamente compensa todo o resto.
— Obrigado, amigo. — Expira, tomando um gole da sua bebida e
me estuda por um momento. — Então, irá mesmo pedir a mão de minha
prima depois de amanhã?
— Sim. — Assinto, não evitando o sorriso orgulhoso se espalhando
em minha boca.
— Estou muito contente por você e por Anna. Todavia, não acha
muito cedo, Amihaj? Vocês se conheceram há dois meses apenas. — Ele
está preocupado com Anna, é nítido em seu semblante e tom.
— Achei que meu luto nunca teria fim, Mike. — Meu tom é baixo
enquanto tomo um gole do meu copo. — Então, sua prima foi até mim e me
fez sentir vivo de novo. Não sei se acredita em destino, amigo, mas Anna é
o meu. — Ele me olha com interesse. — Parece pouco tempo, mas a amo
como se a conhecesse a vida inteira. — Ele acena, compreensão descendo
em seu rosto.
— Me perdoe, parece que estou sendo estraga-prazeres, amigo. —
Ele ri um pouco. — Só estou preocupado com minha prima. É a primeira
vez que ela se abre para outro relacionamento e ainda tem a situação em seu
país… — Seu olhar fica mais aguçado no meu. — Como pretende
convencer as tribos e se casar com uma ocidental, Amihaj?
Isso me faz torcer o rosto numa careta. O assunto tem martelado em
minha cabeça desde que não consegui escolher uma das candidatas
adequadas. Não tenho uma solução ainda.
— Eu ainda não sei como, Mike. Mas esteja certo de que irei. Anna
será a minha rainha. — Afirmo, olhando-o com determinação. — Isso não é
negociável.
Minha afirmação categórica parece aplacar os receios de meu
amigo. Mike abre um pequeno sorriso de aprovação e estende seu copo para
o meu, tocando-o num brinde mudo.
— Então, vamos aproveitar o momento festivo, a família toda
reunida, e comemorar o seu noivado também — diz com entusiasmo. — Eu
já conversei com Anna ontem — revela com um de seus sorrisos irônicos,
torcendo a boca. — Minha prima parece bem impressionada com essa sua
cara feia. Não há nada que possamos fazer para dissuadi-la da ideia de se
casar com você.
Isso me faz rir, meu peito ficando leve com a menção dessa
conversa.
— O que ela disse? — pergunto, parecendo uma garotinha no
colegial. Meu amigo percebe, porque torna a rir de forma irritante.
— Basicamente a mesma coisa que acabou de me dizer. Que sente
como se o conhecesse a vida inteira e se sente viva quando está com você.
— Ele revira os olhos, me fazendo rir mais, alegria me invadindo. Ele fica
sério um instante. — Não me faça ter que quebrar a sua cara, Amihaj. Por
favor, cuide bem dela.
— Eu adoraria vê-lo tentar, Mike. — Eu bufo em desdém. — Mas
quanto a isso, jamais brigaremos, amigo. Vou amá-la e respeitá-la como
merece, fique tranquilo.
Ele anui, ingerindo mais um gole do uísque.
— E quanto ao tio Dom? Ele não tem te deixado em saia justa, tem?
— pergunta com diversão aberta e eu gemo alto.
— Wallah! Ele não vai me deixar esquecer dos malditos vídeos na
internet e muito menos das desculpas esfarrapadas que usei com ele.
Mike gargalha e eu o fulmino.
— Desculpe, amigo, mas, Santa Mãe, você foi mesmo péssimo! —
Continua rindo. — Meu conselho é: tente relaxar. Tio Dom é um dos caras
mais divertidos que conheço e você deveria agradecer. Já pensou se fosse o
meu velho no lugar dele? — Engulo em seco. O pai de Mike, embora tenha
sido simpático comigo e minha filha, parece ter um temperamento difícil.
Tal como o rei Leon. Os dois são diferentes do pai de Anna, é perceptível.
— Não haverá mais vídeos como aqueles. Vou nos resguardar de
agora em diante — prometo.
— Para meus tios, bem como para o resto de nós, a felicidade de
Anna é a única coisa que importa, Amihaj — diz com seriedade agora. —
Faça-a feliz, amigo.
— Eu farei. — Toco meu punho em meu peito esquerdo. É a forma
mais solene de juramento em meu país e ele sabe disso. Mike acena.
— Eu e Ella estamos muito felizes por vocês. Quando minha boneca
estiver recuperada do parto, vamos visitá-los — ele adiciona e aceno em
concordância.
Nós ainda conversamos por algum tempo e depois meu amigo se
despediu para ir checar sua mulher e filha. Encontro Anna do lado de fora
da biblioteca quando saio.
— Meus primos estão jogando no térreo. Quer se juntar a eles? —
pergunta, os braços rodeando meu pescoço. Seus olhos verdes estão
brilhantes. Seus cabelos longos estão presos numa trança igual à que usou
na noite do clube em Jawahra. O corpo perfeito delineado num macacão
amarelo-berrante, o tom casando com sua pele morena clara. Ela está
radiante aqui, junto com sua família. A enlaço pela cintura, puxando seu
corpo delicioso para bem perto do meu.
— Você fica ainda mais deliciosa em macacões, ‘amira — murmuro
roucamente, meu corpo acendendo com sua proximidade, seu aroma sexy,
ousado.
— Você também não está nada mal, Alteza. — Sua voz baixa e
provocante viaja pelo meu corpo indo parar no pau, deixando-o em riste.
Quero pegar sua bunda e me esfregar em sua boceta por cima das roupas,
mas não posso, estamos em um corredor da casa de seu primo. Sua família
inteira sob o mesmo teto. Suas mãos correm pelos meus ombros, seu olhar
me seduzindo, me inflamando.
— Tenho algo planejado depois do nosso jantar de noivado — digo,
acariciando suas costas esguias e nuas. — Vamos dormir em Londres, em
minha cobertura.
— Você não me disse que tinha uma cobertura em Londres. — Ela
sorri, sua boca linda aproximando da minha, me dando beijos suaves.
— Eu tenho imóveis espalhados em alguns lugares no Ocidente,
‘amira. Mas esse de Londres é do período em que estudei por aqui.
Seus olhos brilham com algo que identifico como ciúme.
— Você pegava muitas garotas nessa cobertura? — Me morde com
um pouco de pressão e eu gemo. — Porque se sim, Alteza, é bom refazer
seus planos. Eu não vou dormir com você aonde trepava com outras.
— Wallah! De onde veio isso? — Eu rio um pouco, me sentindo
enlevado por seu ciúme. Ela estreita os olhos bonitos em mim. — Sempre
fui uma pessoa reservada, Anna. Jamais estive com outra mulher nessa
cobertura.
— Nem mesmo Yasmina? — pergunta, franzindo as sobrancelhas.
— Não. Ela não gostava de sair para o Ocidente. Me acompanhou
poucas vezes a Washington, D.C., apenas — revelo e ela acena. Seu rosto
volta a se iluminar com a irreverência que já conheço bem.
— Então, se tiver sorte, Alteza, eu dormirei com você lá. —
Ronrona e eu fico doido de tesão. Pego sua trança, puxando-a firmemente,
arqueando seu rosto para o meu, e levo minha boca para o seu ouvido.
— Quem falou em dormir, princesa? — digo perversamente em sua
orelha. Ela estremece, gemendo baixinho. Mordo seu lóbulo, em seguida
sugando a concha da orelha. Anna se agarra a mim, colando-se
gostosamente em meu corpo. — Vem, vamos nos juntar aos seus primos e
torcer para que durmam logo, porra. — Rosno, dando um tapa em sua
bundinha dura.
Ela ri, ofegante, antes de me dar uma mordidinha no pescoço.
Seguro sua mão sendo o mais respeitoso possível e seguimos para o salão
de jogos. A animação nos saúda tão logo que pisamos para dentro do amplo
espaço. Estive aqui uma vez no ano passado, quando em visita diplomática
a Londres, vim jantar com Mike e Ella. Na ocasião, Mike me deu uma surra
no bilhar. Eu não domino muito os jogos recreativos ocidentais. Meu forte
são atividades que exigem algum esforço físico, como tiro ao alvo e lutas
com espada, nas quais sou imbatível desde os dezesseis. Boxe e artes
marciais também me atraem. Os primos de Anna estão espalhados pelo
recinto. Seu irmão Lipe e o irmão mais novo de Ella, Max, estão tomando
cerveja e jogando numa sinuca. As gêmeas Sam e Em estão jogando com
seus namorados em outra sinuca mais afastada. E, jogados sobre um dos
sofás de couro marrom no extremo da sala, estão Dam, irmão mais velho de
Ella, os gêmeos Lucas e Samuel, irmãos de Mike, e sua esposa Chloe. É
ainda chocante para mim, admito. Em minha região é comum um homem
desposar várias mulheres, o contrário, porém, jamais seria aceito.
Tenho certeza de que as tribos usarão essas informações sobre os Di
Castellani para desmerecer Anna. Tenho que bolar um plano urgentemente.
Meu tio me garantiu que pensaria em algo, além da ajuda do sheik El-
Baham. Anna me arrasta para os sofás.
Eles parecem animados numa conversa quando chegamos.
— Ei, primos! — Anna os saúda, já me puxando para nos sentarmos
no estofado vazio à frente dos outros.
— Oi, pessoal. — Os cumprimento, me sentindo um pouco fora de
lugar. A faixa etária aqui é mais baixa. Tenho trinta e três, com Mike não
me sinto deslocado, sendo que nossa diferença é de apenas três anos. Nessa
roda ninguém chegou aos trinta ainda. Eles me cumprimentam de volta.
— O que querem beber? Sirvam-se. — É Dam quem toma a
iniciativa, indicando os baldes de bebida na mesinha de centro. Há cervejas
long neck dentro de vários baldes e garrafas de uísque sobre o tampo de
vidro. Ele está tomando uísque; os gêmeos, cerveja; e Chloe está tomando o
que parece ser cerveja sem álcool, devido a sua gravidez. — Então, você
está mesmo disposto a ficar noivo de nossa prima? Já viu o quanto ela pode
ser enxerida? — Ele continua num tom provocador. Anna bufa ao meu lado.
— Quero uma cerveja, habib — diz carinhosa e rola os olhos para
Dam quando o primo sorri. — Você não é a pessoa mais indicada para falar
de relacionamentos, primo. Está enrolando duas mulheres atualmente —
zomba e Dam faz uma carranca.
— Eu não disse? Ela nunca vai deixar de ser intrometida. —
Aponta, tomando um gole da sua bebida. — Não estou enrolando ninguém,
prima. Elas sabem exatamente o que podem ter de mim.
— Uh. Tão machista, futuro rei. — Ela rebate, virando sua cerveja,
tomando no gargalo. Eu gosto dessa sua natureza intrépida e despojada.
Pego uma cerveja para mim também e me divirto com a interação entre
eles.
— Fora os vídeos na rede, Anna não aprontou mais nada em
Kamar? — É Lucas quem me pergunta. Eu rio, notando que eles estão
provocando a prima. — Parece que nossa prima perdeu o jeito, não é,
mano? — Incita seu gêmeo Samuel a entrar na brincadeira. Chloe sorri,
meneando a cabeça.
— Não ligue para eles, prima. — A loira sai em defesa de Anna, a
mão livre acariciando o ventre avantajado. — A propósito, adorei o
segundo vídeo e talvez use a ideia para meu novo romance.
Anna abre um sorriso malicioso.
— Só que, em vez de um cara, a garota dançará com dois, não é,
prima?
Chloe fica vermelha, mas assente.
— Eu acho que Anna pode estar amadurecendo, mano. — Samuel
diz, divertido.
— Eu, no seu lugar estaria mais preocupado com a logística, uma
vez que a barriga de Chloe tende a ficar muito maior do que agora,
bonitões… — Anna lança um olhar atrevido para seus primos e lhes dá uma
piscadinha. — E não esqueçam de me contar como isso funcionou depois.
Eu não seguro uma risada baixa e Dam faz o mesmo. Allah, minha
princesa não tem mesmo nenhuma cerimônia. As provocações continuam e
começo a relaxar em torno deles. Dam me pergunta sobre a candidatura de
Kamar para sediar a próxima final do Mundial de Clubes e confirmo que
estamos concorrendo. Os gêmeos entram na conversa e logo estamos
discutindo a construção de um estádio maior para investir no campeonato
nacional de futebol, como nossos vizinhos emirados têm feito. Estou
completamente relaxado quando meu celular toca. Puxo-o do bolso, ficando
intrigado ao ver o nome de Jalal na tela. Nos falamos à tarde.
— É Jalal, ‘amira, preciso atender. — Dou um beijo suave nos
lábios de Anna e me levanto, indo para um canto mais afastado. — Primo.
— Atendo-o, meu tom apreensivo. Ele não me ligaria duas vezes no dia se
não fosse algo importante.
Há um breve silêncio na linha.
— Primo. É sobre El-Shalleen. — Sua voz está tensa e meu corpo
também fica ao ouvir o nome do assassino de Yasmina.
— O que há com esse maldito? — Rosno.
— Ele foi encontrado morto em sua cela agora há pouco, Amihaj.
— Meu primo diz e nova surpresa me toma.
— Morto?! Como?! — Inquiro, confuso. Nenhum condenado morre
na cela. Não em meu país.
— Os médicos legistas estão suspeitando de ataque cardíaco
fulminante. — Novo silêncio. — Todavia, meu pai está suspeitando que
possa ser algo mais…
— Que algo mais?
— Veneno. Meu pai acha que o homem pode ter sido envenenado.
— Mas, por quê? — pergunto, aturdido. — Quem teria interesse em
envenenar um condenado que estava só aguardando o momento da
execução?
— De acordo com um dos guardas, El-Shalleen havia escrito uma
carta para você, primo — revela, e fico cada vez mais confuso. — Ele tinha
algo mais para falar sobre o atentado de Yasmina.
— Ele era o maldito assassino e me tirou o direito de vê-lo
estrebuchar na minha frente! — Eu brado.
Há novo silêncio e ele respira fundo.
— Há algo mal esclarecido nessa história, Amihaj. — Seu tom é
muito sério agora. — O guarda para quem El-Shalleen confiou a carta
também foi encontrado morto em sua casa.
— O quê?! — Ele tem minha completa atenção agora.
— Meu pai, e agora eu também, acha que prendemos o homem
errado, Amihaj — ele diz numa voz consternada. — Tudo indica que
predemos e sentenciamos um homem inocente à morte.
Meu corpo gela e respiro irregularmente. Uma mão suave toca meu
ombro. Eu me viro, enlaçando um braço na pequena cintura de Anna.
— Estou indo para casa, Jalal — aviso, a sensação horrível de ter
cometido uma injustiça se espalhando dentro de mim.
— E quanto ao pedido que faria aos pais de Anna? — pergunta
apreensivo.
— Terei que antecipar para hoje. Agora — digo, meus olhos
encontrando os de Anna. Ela está tensa, seu rosto mostrando confusão. —
Até logo, primo — despeço-me e guardo o celular no bolso.
— O que está havendo? — ela pergunta.
— Aconteceu algo que exige meu retorno a Kamar, ‘amira — digo,
segurando seu rosto dos lados, e conto tudo a respeito do suposto engano
sobre o homem que acreditei ser o assassino de Yasmina. Ela ouve tudo
atenta e preocupada. — Seus pais já estão dormindo?
Odeio ter de suspender os planos para um jantar especial, fazer um
pedido do jeito que uma princesa merece.
— Vamos marcar o pedido para outra ocasião, fique tranquilo. —
Oferece, mas posso ver em seu rosto o desapontamento. — Eu gostaria de
ficar com minha família mais um pouco. Ella ainda precisa de mim.
Me sinto egoísta por ficar decepcionado com seu posicionamento.
Ela esteve longe por dois meses e está há apenas poucos dias com eles. Sei
que é errado querer levá-la comigo, mas não quero ir sem ela.
— Eu quero pedir sua mão hoje, habibti. Agora — murmuro. — Se
eu tenho de deixá-la para trás, que seja com o meu anel em seu dedo.
Seus olhos cintilam como duas joias e ela segura meu rosto dos
lados também.
— Então, faremos isso agora. Eu não me importo com pompas,
amiri — diz com essa irreverência que amo tanto.
Alguns minutos depois, todos reunidos no salão de jantar. Não é
nem de longe como pensei em pedir a mão da minha princesa, mas me
recuso a partir sem deixar meu anel em seu dedo. Encaro seu pai e ele
levanta uma sobrancelha, diversão brilhando nos olhos verdes. Os braços de
Anna apertam sutilmente à minha volta. Eu olho para baixo, encontrando
seu olhar. Sua bochecha encostada em meu ombro. Ela tem a mais linda
expressão no rosto delicado. Lágrimas brilham em seus olhos e me sinto
mais confiante. Me inclino, beijando-a suavemente na boca. Ouço uma
garganta sendo limpada e ela ri, sabendo que é o seu pai. Eu volto a encarar
a minha missão.
— Dom, Helena, primeiro quero me desculpar com vocês por isto
— digo, encarando-os com seriedade. — Anna merece um pedido especial
e prometo fazer algo em breve. Pode, inclusive, parecer apressado para
vocês. No entanto, espero que entendam minha urgência em colocar meu
anel em seu dedo. — Olho para ela de novo e seu sorriso me encoraja a
continuar. — Eu amo a sua filha. — Há pequenos murmúrios entre a
família, porém meus olhos permanecem fixos nos dela. — Ela me fez
querer viver de novo. Encontrá-la foi como sentir a luz do sol me
despertando de uma longa noite sombria. — Mais murmúrios e
exclamações das mulheres. Uma lágrima escorre na bochecha de Anna.
Sinto meus olhos ficando úmidos pela sua, a nossa emoção. Limpo sua face
com o polegar e arrasto minha atenção para seus pais. Sua mãe está
visivelmente emocionada, o marido abraçando-a. — Se me concederem a
honra de me tornar o seu marido, prometo amar e cuidar dela até meu
último suspiro.
Há um breve silêncio no qual seu pai me encara seriamente.
— Meu lado racional me diz que é realmente cedo…
— Essa é nova. Dom tendo um lado racional… — Ouço a voz
sussurrada do senhor King, o pai de Mike.
— Cáspita, Jay! O assunto é sério. — O rei Leon resmunga para o
mais novo.
— Cale a boca, bastardo. — Dom grunhe, rolando os olhos, e volta
a me encarar. — É pura intriga da oposição, Amihaj. Eu tenho um lado
racional, claro. — Uma onda de risos ecoa entre a família dessa vez.
Wallah.… Mas meu futuro sogro, em vez de ficar bravo, abre um lento
sorriso irreverente, me lembrando muito sua filha. Ele limpa a garganta e a
seriedade desce sobre seu rosto. — Saiba que Anna é preciosa para mim e
sua mãe. Embora ache cedo, posso ver a felicidade brilhando no rosto de
minha filha. — Ele parece um pouco emocionado agora. — Ver o sorriso no
rosto dela outra vez é tudo que eu e sua mãe queríamos. Para nós, o que
importa é que a faça feliz, então, nós concordamos com a união.
— Faça nostra bambina feliz, apenas isso. — Sua mãe recomenda
com lágrimas banhando suas faces bonitas.
— Não chore, princesa. — Dom murmura, beijando a esposa na
têmpora.
— Pai, mamma, eu amo vocês. — Anna murmura embargada. E
agora há mais fungados pela sala.
— Shukran. Obrigado, muito obrigado. — Digo, meu coração
saltando com força. Me desvencilho de Anna e nova onda de exclamações
soa quando desço sobre meu joelho direito, puxando a caixa do anel do
bolso do meu jeans. Anna está chorando abertamente agora. Abro a caixa,
mostrando-lhe o anel. É um modelo delicado com um diamante rosa. Ela
não gostaria de um branco, tenho certeza. Anna gosta de cor. Seus olhos
competem com o brilho da pedra ao ver a joia.
— Amirati… — murmuro, minha voz emocionada. — Continue
sendo o meu sol, a luz e o calor que me mantêm vivo. — Ela soluça e meus
olhos transbordam, uma lágrima escorrendo pela minha face.
Tio Jafar diria que é sinal de fraqueza, mas não me importo. Neste
momento, quero mostrar tudo a ela, à sua família.
— Anna Julia Marcollini Harper Di Castellani, aceita ser a minha
esposa, a minha rainha?
— Oh, meu Jesus! — Ela ofega, as mãos um pouco trêmulas
cobrindo a boca. — Sim, amiri! Sim!
Eu retiro o anel e o empurro em seu dedo trêmulo. Então, me
levanto e a puxo para meus braços sob o coro de palmas e exclamações
altas. Eu a beijo suavemente na boca, me contendo porque seu pai está
olhando, e embora seja um cara de humor tranquilo, não é bom abusar.
— Eu amo você, habib — ela sussurra contra minha boca.
— Eu amo você, habibti — murmuro de volta e lhe dou mais um
beijo suave.
Tomamos o champanhe que eu já havia encomendado e brindamos
como se deve. Ella também desceu e brindou com água. Todos nos
parabenizam e abraçam. Anna tem uma família muito calorosa, muito
diferente da minha.
— Não sabia que tinha inclinação poética, meu futuro genro. —
Dom se aproxima de nós, sorrindo do seu jeito impertinente. — Sua falta de
imaginação para desculpas precisava ser compensada, não é mesmo?
— Papai, pare… — Anna sorri.
— Você não é a pessoa mais indicada para caçoar de alguém que foi
parar na internet, amore mio — Helena diz para o marido, que abre um
sorriso malicioso, olhando sua mulher.
— Bons tempos aqueles… — Ele a puxa para seus braços, os dois
compartilhando um olhar cúmplice e amoroso. — Eu te amo, princesa.
A mãe de Anna derrete e diz o mesmo para o marido. Anna está
com olhos brilhantes, observando seus pais, quando a encaro. Trocamos um
olhar e deixamos seus velhos à vontade.
Vamos até Mike e Ella, que já parece mais corada e recuperada.
— Seja feliz, prima — diz quando Anna a abraça com cuidado.
— Eu já sou, prima. — Meu peito aquece ao ouvi-la dizendo isso.
— Parabéns, amigo! Nos dê notícias quando chegar a Kamar —
Mike me intima, me puxando para um abraço rápido, nossas mãos dando
tapas amigáveis em nossas costas.
Não demora muito, subo e retorno com Ayla dormindo em meu
ombro. Me despeço de todos e me dirijo para o helicóptero de Mike, me
aguardando no heliponto. Anna nos segue em silêncio. Acomodo minha
pequena dentro da aeronave e me volto para ela. A minha noiva agora. Nos
abraçamos calados por alguns instantes.
— Só ficarei mais alguns dias, habib — ela sussurra em meu peito e
a aperto mais em meus braços.
Quero pedir que venha comigo, mas seria muito injusto com ela,
com sua família. Mesmo com o coração apertado por ter que deixá-la, me
afasto um pouco, levantando seu rosto para o meu, deslizando meus dedos
pela face suave. Ela me olha com o mesmo pesar e saudade antecipada.
— Fique com sua família mais um pouco — murmuro, encostando
minha testa na sua, e respiramos o mesmo ar. — Mas vá para mim de novo,
amirati.
Ela assente, seus olhos brilhantes de lágrimas.
— Eu amo você, Alteza. — Tenta sorrir e brincar.
— Eu amo você, princesa. — Sorrio de volta para não deixar
transparecer minha tristeza. Minha boca encosta na dela e este não é um
beijo comportado. Eu a seguro contra mim, devorando sua boca com todo o
amor e paixão queimando dentro de mim.
Subo no helicóptero e levantamos voo. A imagem dela parada no
mesmo lugar, nos olhando subir, me prende até que as árvores me impedem
de vê-la. Cerca de quarenta minutos depois, com o jato abastecido, eu olho
para Ayla adormecida em sua poltrona. Confiro seus cintos e toco seus
cabelos macios. Ela não vai gostar nada de estarmos voltando sem Anna. O
sentimento de perda volta a apertar em meu peito. Por que estou me
sentindo assim? Ela está usando o meu anel. Irá para mim em poucos dias.
Por outro lado, se meu tio está desconfiado é porque algo sério está por trás
da morte de El-Shalleen, dessas mortes. Eu olho as luzes do aeroporto por
alguns momentos enquanto meu piloto se prepara para nos colocar no ar.
Merda, e se algo acontecer e novos conflitos estourarem? Se tivermos que
interditar o espaço aéreo outra vez? Ela não poderá ir até mim. Aquela
sensação horrível de perda vai se agigantando. Eu gemo, querendo ligar
para ela, implorar para que vá comigo. Fecho os olhos, enfiando as mãos
em meus cabelos, refreando a vontade louca. Eu não tenho esse direito.
— Karim?
A voz suave vindo da porta do avião me faz estacar. Meu corpo
inteiro treme de surpresa e júbilo enquanto me viro e a vejo lá, parada. Seu
rosto está corado, sua respiração ofegante, e Anna corre para mim. Se joga
em meus braços e eu a pego, suspendendo-a do chão, mantendo-a bem
junto por um momento. Meu coração está saltando como um louco, o aperto
ruim sendo varrido para longe.
— O que significa isso, habibti? — sussurro, colocando-a em seus
pés de novo, nossos rostos ficando bem próximos.
— Significa que irei com você para enfrentar seja lá o que for que
esteja nos esperando, amiri — murmura com esses incríveis olhos verdes
me adorando. — Eu não vou arriscar não poder ir até você se outros
conflitos explodirem. Se voltar a acontecer, quero estar lá, do seu lado e de
Ayla.
Eu arfo, procurando as palavras certas para dizer a ela nesse
momento. Essa garota corajosa está deixando sua família para me seguir.
Meu país está instável, ela sabe disso e ainda assim quer ir comigo.
— Malikati…[30]. — Chamo-a reverentemente, minha boca tomando
a sua num beijo repleto do amor e orgulho que sinto por ela.
Eu não tenho a mínima ideia do que nos espera em Kamar. Mas me
sinto egoisticamente melhor agora que estou com ela de volta em meus
braços.
CAPÍTULO ONZE
“À beira do paraíso. Cada pedaço da sua pele é um Santo Graal que tenho
que encontrar. Só você pode incendiar meu coração. Sim, vou te deixar
determinar o ritmo… Você é a luz, você é a noite. Você é a cor do meu
sangue. Você é a cura, você é a dor. Você é a única coisa que eu quero
tocar. Nunca soube que isso poderia significar tanto, tanto…”
(Ellie Goulding - Love Me Like You Do)
Anna Julia
Contemplo a vastidão de areia a alguns quilômetros à frente e
encosto na balaustrada da varanda de nossos aposentos. Levanto a minha
mão e suspiro, admirando o lindo anel em meu dedo. O grande diamante
rosa cintilando é um reflexo de mim mesma desde o pedido do meu
príncipe, há mais de uma semana, em Londres. Eu tinha que vir com ele e
Ayla. Uma sensação horrível de perda me tomou depois que os vi ir embora
no helicóptero. O medo de as coisas voltarem a ficar tensas por aqui e eu
não conseguir voltar logo para eles me fez tomar a decisão de correr até o
aeroporto. Ella me encorajou, dizendo que já estava bem e que Mike não
sairá de perto dela enquanto não estiver completamente recuperada. Meu
pai não gostou muito, mas minha mãe o convenceu. Me despedi de todos e
segui atrás do homem que também é a minha vida agora. Mais um suspiro
sai da minha boca ao recordar o jeito apaixonado e intenso com que fez
amor comigo naquela noite. Depois que levamos Ayla para um dos três
quartos menores, fomos para o principal.
Foi maravilhoso.
— O que foi esse suspiro, amirati? — Braços fortes enrolam em
minha cintura por trás e uma boca macia e morna deposita um beijo suave
em meu pescoço. Um arrepio de excitação desce em minha coluna, sua
barba causa um atrito delicioso em minha pele. Afasta meus cabelos para o
lado e morde suavemente a minha nuca. Eu arquejo, meu corpo inteiro
esquentando, meus seios arrepiando.
— Mmm… — Gemo baixinho. — Relembrando nossa
comemoração do noivado no jato, amiri…
Ele geme rouco e me gira de frente. Meus braços vão imediatamente
para seus ombros, meus olhos devorando cada detalhe do rosto moreno.
Está usando um turbante negro com as pedrarias nas bordas, os olhos
sombreados com lápis preto. Me excita demais vê-lo em trajes típicos. Ele
sabe disso porque um riso lento e arrogante levanta os cantos de sua boca.
Suas mãos grandes passeiam pelas minhas costas, a renda do decote não me
impedindo de arfar com o calor do toque. Estou usando um vestido-caftan
amarelo-ouro. Não há nenhuma fenda ousada dessa vez, apenas o decote
falso nas costas. Estou usando um hijab negro com pedrarias e joias
penduradas nas bordas também, cobrindo meus cabelos, como mandam os
costumes.
O tal sheik El-Baham irá jantar conosco. Ele e a naja da filha.
Preciso encontrar uma forma de exportar aquela vaca de volta para seu
curral, digo tribo. Rio levianamente. Ela me confrontou novamente ontem,
tornando a garantir que será a segunda esposa de Karim, me aconselhando a
apenas esperar para ver. Eu disse que a vadia podia sentar em cima das suas
teias de aranha e esperar também, porque isso nunca irá acontecer. Ela está
me tirando do sério. Ainda não deixei Karim saber que anda me enchendo o
saco porque não sou de ficar choramingando e pedindo proteção de homem.
Prefiro lutar minhas batalhas.
— Por que essa expressão se fechando? — Ele pergunta, me
estudando atento.
— Nada, habib. — Coloco um sorriso no rosto. Não vou dar ibope
para a vaca. Acaricio sua nuca, deslizando a mão para a barba. Ele me olha
com tanto amor que meu peito fica todo mole. — E você, alguma novidade
sobre o mistério das mortes? — pergunto suavemente.
Seu semblante muda. Ele tem estado tenso desde que voltamos.
Muitas reuniões e visitas ao departamento de polícia. Não quer me contar
tudo para não me preocupar, mas tenho sentido seu receio de os conflitos
voltarem a estourar na região. Outra coisa que não estou gostando é da
presença constante do tal pai da naja no palácio. Duas cobras são demais
para lidar. O homem tem uma aura sombria ao redor dele. Cada vez que o
encontro sinto um arrepio gelado. Mas Karim está contando com o apoio
dele na reunião que fará com os líderes dentro de dois dias.
— Ainda não, mas meu tio e Jalal estão empenhados. Todos os
guardas estão sendo interrogados pela terceira vez, uma estratégia para
fazer o traidor, ou traidores, entrarem em contradição — informa com nítido
desgosto. — Estamos certos de que foi um ou mais deles que facilitou o
envenenamento de El-Shalleen. — Ouço-o com atenção. Dois exames
toxicológicos no corpo do morto acusaram a presença de uma substância
não reconhecida cientificamente, mas que provocou a dilatação das artérias
coronárias, fazendo o coração do homem praticamente explodir no peito. —
Nós vamos descobrir e punir os culpados severamente.
— Vai dar tudo certo, habib — murmuro, alisando a ruga de
preocupação entre suas sobrancelhas.
— Shukran por estar aqui comigo, habibti — sussurra, seu rosto
suavizando um pouco. — Nosso país voltará a ser um lugar seguro, eu
prometo.
Eu aceno. Torço para que tudo se resolva logo e que essa reunião
com as tribos tenha o resultado que meu príncipe está esperando. Acaricio
sua barba, adorando a sensação em meus dedos. Ele segura meu queixo e
desliza os dedos pela minha face, o rosto se aproximando mais do meu. Eu
o amo e ficarei perto dele mesmo que mais conflitos surjam.
— Estarei bem aqui com você, não importa o que aconteça, amiri —
murmuro, olhando-o fixamente. A intensidade tomando seus olhos escuros
faz meus joelhos tremerem.
— Você nasceu para ser minha — afirma baixinho, seu polegar
esfregando suavemente meu lábio inferior. — Minha princesa, minha
rainha. — Completa e sua boca captura a minha, seus lábios cálidos rolando
nos meus num beijo deliciosamente lento. Eu me entrego, beijando-o,
provocando de volta com sugadas eróticas em sua língua. Estamos
ofegando quando me libera. Seu riso perverso faz meu centro pulsar.
— E você nasceu para ser meu. — Digo ousada, fazendo-o rir
baixinho, esfregando o nariz em meu rosto. — Meu príncipe, meu rei.
— Vem, vamos para aquele jantar para podermos voltar logo e eu te
foder em cada canto deste quarto. — Grunhe e eu termino de molhar. Adoro
sua gentileza, mas amo sua sacanagem também.
Eu rio e saímos de mãos dadas dos aposentos. O jantar será no salão
que sempre usamos para refeições familiares. Ayla já está recolhida. Karim
não a quer por perto porque pode surgir o assunto das mortes e nossa
sapequinha é muito curiosa. Seguimos pelo corredor, virando a esquina, e
noto a movimentação através das portas duplas do salão. A música árabe
em volume agradável vai nos envolvendo à medida que nos aproximamos.
— Eu vou começar as aulas de dança do ventre na próxima semana.
— Me inclino, sussurrando em seu ouvido. Ele geme baixo, me olhando de
esguelha. — Quero poder dançar para meu príncipe muito em breve.…
— Você está tentando me fazer entrar no salão ostentando um pau
duro, princesa? — Range no meu ouvido e é a minha vez de sorrir.
— Eu?! Calúnia isso, meu senhor. — O provoco ainda mais. Ele dá
um tapa em minha bunda, me assustando pela sua ousadia em pleno
corredor.
Entramos no salão ainda rindo. Todos se voltam em nossa direção,
vindo nos receber com mesuras reverentes para seu príncipe e alguns
fingindo que são para mim também. Embora o tio Jafar esteja ligeiramente
menos azedo comigo, desde que voltamos do deserto, ainda percebo a
reserva dele e sei que nunca seria a sua escolha para esposa do sobrinho.
Mas meu príncipe me quer. Sua mão em minha cintura me diz exatamente
isso. Ele cumprimenta a todos, não saindo de perto de mim. Nos dirigimos
para a mesa e me sento à sua direita, enquanto o tio Jafar à esquerda,
seguido por Jalal. Zafyr se acomoda ao lado de sua mãe e Nuria na outra
extremidade, perto de Latyfa e a cobra-pai. Os ironizo.
Nos primeiros minutos, comemos em silêncio. O assado de carneiro
está desmanchando na boca e o molho agridoce que o acompanha,
simplesmente divino. A culinária árabe também me pegou de jeito. Ainda
bem que herdei o metabolismo bom de minha mãe, que mantém a forma
sem esforços mesmo aos cinquenta. Em dado momento, o sheik El-Baham
puxa a conversa sobre o homem infeliz que morreu na prisão. Eu tento não
fulminar o idiota pelo tema pesado. Karim precisa relaxar.
— Um ataque do coração… — O sheik bufa com desagrado. — Era
para ele morrer decapitado, na minha frente!
Uh. Eu franzo o cenho. Ele ainda não sabe que foi comprovado o
envenenamento do tal Al-Shalleen? Karim pega minha mão e dá um aperto
sutil.
— Compartilho a sua indignação, sheik. Eu também queria vê-lo
pagar pelo que fez à Yasmina. — Karim diz indignado. Ou simulando
indignação… — Agora só nos resta aceitar que o homem morreu antes por
causas naturais.
O sheik não parece feliz.
— Eu mantinha um olho naquele assassino maldito, para que não
escapasse do seu destino. — Sua voz é irada e me ocorre que, talvez, esteja
exagerando sua reação. — Alguns policiais me davam informações sobre
ele sempre que pedia. Yasmina era como uma filha para mim. Por causa
daquela escória a perdemos, e acabei perdendo meu irmão também, uma
vez que sua saúde definhou desde a morte de sua amada filha.
— Todos nós sabemos do seu apreço pela princesa e por seu
falecido irmão, sheik. — O tio Jafar entra na conversa. Seu tom não dando
nenhuma indicação de seu estado emocional, para variar. — Mas o homem
escapou da execução, infelizmente.
— O direito legítimo de vingança das famílias de suas vítimas deve
ser preservado, amiri. — El-Baham volta a atenção para Karim, sua
expressão é sombria quando propõe: — O exemplo precisa ser dado, meu
senhor. El-Shalleen zombou de nós apressando sua morte.
— O que está querendo dizer, sheik? — Karim indaga. — O que
quis dizer com o “exemplo precisa ser dado”?
— Condene o filho mais velho do assassino. — Diz baixo e mortal.
O quê?! — Mate-o em praça pública e ninguém mais ousará burlar uma
sentença.
Seu pedido choca não só a mim, mas a todos em volta da mesa, que
ofegam. Jesus…
— Isso é um completo absurdo, sheik! — Karim objeta com
veemência e estupefação. — Compreendo que esteja se sentindo
injustiçado, como também estou, mas essa prática foi abolida de nosso
emirado há mais de um século.
— O exemplo deve ser dado. — O homem louco repete. — Com o
sangue do assassino derramado na praça.
Há um breve silêncio na mesa e Karim se inclina para a frente,
encarando El-Baham.
— Eu não vou derramar sangue inocente só porque você quer, sheik.
— Seu tom e olhar são intimidantes, e me assusto, me dando conta de que
nunca o vi rugindo como o príncipe governante. Olho-o fascinada pela
postura dura e firme. — Eu decido sobre o assunto.
— Meu senhor, não me leve a mal. — O homem balbucia,
percebendo que irritou seu príncipe. — Sou apenas muito apegado às
tradições.
— Sugiro que desapegue. — Karim diz entre dentes, não
abrandando o tom. — Farei algumas mudanças muito necessárias em nosso
emirado.
— O que meu senhor quer dizer é que tal tradição de exigir
derramamento de sangue de parentes em casos como este é uma prática que
deve ficar no passado, sheik. — Jafar ameniza a reação de Karim. — Sua
Alteza tem se esforçado para colocar Kamar entre as principais potências
dos emirados, e isso não será possível mantendo costumes sanguinários.
— Alguns são necessários, meu senhor. — O homem argumenta.
— Este não é um deles, El-Baham. — Karim torna a falar, seu tom
definitivo.
A cobra-pai assente e se cala.
Zafyr começa a contar sobre sua viagem a Mônaco em seguida,
numa clara tentativa de descontrair. Me vejo sorrindo pela sua conversa
fácil. Sinto a tensão de Karim ao meu lado. Ele ainda está com ciúmes do
primo? Não é possível. A conversa volta a fluir — sem temas fortes, graças
a Deus! Quando terminamos de comer, nos levantamos e nos dirigimos para
o buffet das sobremesas. Me delicio com uma esfiha de chocolate e Nuria
me acompanha. Está animada para minhas aulas de dança do ventre. Ela
possui uma moça que a ensina alguns truques para usar com Jalal, e estou
excitada para incorporar a odalisca para meu príncipe. Tenho praticado
muita atividade física com Karim também. Insisti para que me ensinasse
atirar e estou adorando nossas aulas.… Bem como a luta com espadas. Me
sinto poderosa, forte, praticando esses esportes restritos aos homens, mas
Karim não está me podando de nada. Ainda bem. Não surtiria muito efeito
se tentasse o contrário, vocês me conhecem. Eu rio internamente.
— Princesa, Salaam Aleikum. — A voz conhecida e que estive
evitando alcança meus ouvidos. Me viro para ver a cobra-filha, me
encarando com seu antagonismo dissimulado.
— Aleikum Assalam, Latyfa. — Respondo como manda a etiqueta
das princesas. — É sempre um prazer encontrá-la. — Seus olhos estreitam
com minha simpatia também dissimulada. — Quanto tempo já tem mesmo
que está encostada aqui no palácio?
— Vou levar esse doce para Jalal, Anna. — Nuria avisa e se afasta.
Ela sabe que as gentilezas irão para o espaço rapidinho.
— Talvez eu nem vá mais embora, minha senhora. — A vaca
cantarola em desdém.
— Que diabos está dizendo? — Eu cerro os dentes, tentando
disfarçar minha reação a todo custo.
— Apenas o que você já sabe, querida. — Ela sibila, os olhos
geralmente frios estão mais ousados e zombadores esta noite. — Eu serei a
segunda esposa de Sua Alteza. É melhor aceitar os costumes de seu futuro
marido se quiser ser levada a sério pelo povo dele.
Meu sangue gela. Essa infeliz está batendo nessa mesma tecla já tem
um tempo. Karim não me conta muita coisa sobre as tribos, mas sei que eles
são arcaicos. E se eles de fato exigirem um casamento de Estado para seu
príncipe?
— Está delirante, sua vaca. — Rosno. — Vou te exportar de volta
para sua porra de curral.
Ela dá um risinho debochado, muito seguro para o meu gosto.
— Quer saber a verdade mesmo, princesa? — Seu riso alarga com
prazer em me espezinhar. — O príncipe pode escolher você para primeira
esposa, mas oficialmente quem vai herdar o trono são os meus filhos. As
tribos nunca deixariam os filhos de uma forasteira ditarem o futuro do
nosso povo. — Eu recuo um pouco, suas palavras me cortando fundo. —
Sim, eu acho que está conseguindo vislumbrar seu futuro aqui, afinal. Você
será a prostituta de luxo do rei, nada mais.
Eu arfo, sentindo o golpe da vadia. Meu sangue ferve, mas minha
réplica fica na garganta quando ela se vira e me dá uma piscada
provocadora, como a que lhe dei em outro jantar. Anda em direção aos
homens do outro lado da sala. Karim está em uma conversa baixa com o tio
Jafar e a cobra-pai. É com espanto que vejo a vaca tropeçando e se jogando
sobre Karim. Eu fecho meus punhos vendo-o segurá-la, mostrando bons
reflexos. Fumaça sai pelo meu nariz e marcho em direção a eles.
— Oh, Shukran, amiri. — Latyfa diz fazendo uma cara de dor, se
pendurando nos ombros de Karim. — Wallah! Eu acho que torci o
tornozelo.
A expressão de Karim é confusa, mas continua amparando-a.
— Vamos até aquela poltrona. Não faça força no tornozelo ferido.
— Ele orienta com preocupação genuína e eu rosno. Está se deixando
enganar pela mulher ardilosa. Para confirmar, a vaca me olha por cima dos
ombros do meu homem e vejo o indício de sorriso, a expressão triunfante
em sua cara de puta, mesmo que seja uma porra de virgem.
Eu avanço, o ciúme e o veneno anterior que a vaca jogou sobre mim
me deixando cega neste momento. Foda-se qualquer civilidade! Ela vai
aprender a não brincar comigo!
— Solte a vadia, Karim. — Minha voz é apenas um grunhido baixo
e vejo a tensão nos ombros dele ao ouvir minha ofensa. — Solte essa vaca
agora, ou eu mesma vou arrancá-la daí!
Ele se vira para mim, seu rosto estupefato, os olhos amplos. A puta
está fingindo ultraje, seus olhos se enchendo de lágrimas.
— Anna, o que deu em você para ofender Latyfa dessa forma? —
Ele tem a ousadia de perguntar. Homens… Bufo, desgostosa. Eles são tão
fodidos, não são?
— Solte a vadia. Agora! — Berro e ouço as exclamações dos
presentes. Acho que escuto o riso de Zafyr também.
Algo duro brilha nos olhos de Karim e ele levanta o queixo. É a
mesma postura que usou com o sheik quando o desagradou no começo do
jantar.
— Você está sendo muito deselegante. Espero que se desculpe pela
grosseria.
— Me desculpar pela grosseria? Aqui estão minhas sinceras
desculpas, sua vaca! — Eu avanço como uma fera, enfiando as mãos nos
cabelos de Latyfa, seu hijab cai e a puxo, arrancando-a dos braços de
Karim. Agora são mais exclamações.
— Wallah! Está machucando a minha filha! Ela não tem nenhuma
educação!
É o pai. Mas não me importo. Eu a empurro para longe e ela precisa
se equilibrar para não cair, então, anda sem mancar, esquecendo-se da
encenação.
— Vejam se não é um milagre! — Eu zombo, olhando para Karim.
— Ela estava encenando. Essa vaca tem me afrontado desde que chegou
como uma das candidatas a cadelas treinadas de Sua Alteza. — Karim cerra
a mandíbula. Sei que estou envergonhando-o perante sua família, mas estou
além da razão agora. — Mande-a de volta para a porra do seu curral ou não
respondo por mim. — Cuspo.
— Latyfa e seu pai são da família, e meus convidados. — Seu tom é
duro.
O príncipe quer mostrar pulso firme com a noiva estrangeira. Eu
arfo, lágrimas se reunindo em meus olhos. Me sinto traída com sua defesa
das duas cobras. Latyfa está certa, eu sempre serei uma forasteira por aqui.
— Então fique com seus convidados, Karim. — Digo em tom mais
baixo, decepcionado. Vejo-o respirar profundamente, a percepção de que
está me ferindo tomando seu rosto. — Eu sou a intrusa aqui. — Seus olhos
brilham arrependidos com essa última frase. — Boa noite, Alteza.
E eu me viro, correndo para fora do salão. Lágrimas borram a minha
visão enquanto volto para o quarto, não o dele, o que usei quando cheguei.
Entro e tranco a porta, rapidamente. Ando até a sala, meu corpo agitado,
meu peito doendo pela decepção. As palavras da cobra martelam com força
em meu cérebro, ampliadas pela reação dura de Karim. Ele ficou do lado
dela, deles. Será assim a minha vida aqui? Sempre sendo lembrada de que
não passo de uma estrangeira, indesejada? Eu nunca havia sentido isso
vindo da parte de Karim, mas acabo de ver em primeira mão que sua
lealdade está com seu povo, não comigo.
Sim, eu acho que está conseguindo vislumbrar seu futuro aqui,
afinal. Você será a prostituta de luxo do rei, nada mais.
As palavras continuam reverberando em minha mente. Meus olhos
transbordam de raiva da vadia e decepção com Karim. Nas outras vezes em
que fui insultada, não me senti uma intrusa, mas agora me sinto. Talvez meu
pai tenha razão: nos comprometemos cedo, muito cedo. Ele não me conhece
e tampouco eu a ele. Ficamos tempo demais em luto e nos apegamos fácil.
A campainha começa a tocar, me sobressaltando. Mais lágrimas se
reúnem em meus olhos, sabendo que é ele. Permaneço parada. Não quero
falar agora. Ele que volte para seus preciosos convidados! O som continua
ininterrupto, impaciente, mas não vou atender. Então, ele enfim para de
insistir. Depois de uns minutos o som da porta sendo aberta não muito
gentilmente me faz virar para a entrada. Karim entra em meu campo de
visão, sua carranca tão profunda quanto a minha.
Karim Amihaj
Eu entro no quarto que a princesa, em sua birra, resolveu usar para
se esconder de mim. Allah, ela se comportou muito mal lá no salão. Isso irá
reverberar nas tribos. O sheik El-Baham está com uma carranca do tamanho
do mundo neste momento pelas ofensas ditas para sua filha. Por outro lado,
as lágrimas de decepção que vi nos olhos de Anna me fizeram vir atrás dela.
Sei que todos no salão estão me achando um fraco agora por não conseguir
conter os arroubos de minha noiva ocidental e me condenando por isso, por
escolher uma mulher que não se importa em fazer escândalos em público.
Estou irritado, mas ver seu rosto corado e coberto de lágrimas me causa um
aperto no peito. Eu a amo.
— Você me envergonhou lá. — Aponto, tentando conter minha
insatisfação.
— E você me decepcionou lá. Então estamos quites, Alteza. —
Rebate, com raiva e nítida mágoa. — Faça um favor para nós dois e saia do
meu quarto, Karim.
Fico tenso ao ouvir suas palavras magoadas. Já passamos dessa fase.
Ela está comigo, em nosso quarto.
— Você está sendo infantil, Anna. — Falo entre dentes. — Volte
para o nosso quarto.
— Por que me quer lá? Porque sou sua prostituta de luxo? — Cospe
as palavras e me afasto um pouco, chocado com sua explosão. Chocado que
pense isso a seu respeito.
— Wallah! O que está havendo com você hoje? — Inquiro, me
sentindo atordoado e magoado também. — Sabe exatamente o que você
significa para mim, Anna. Suas palavras me ofendem.
— Não mais do que a mim, pode ter certeza, Karim. — Limpa suas
faces com gestos irritados. — Sua convidada me disse essas palavras ainda
há pouco, antes de ir se jogar em cima de você.
Eu paro, mais choque me tomando. O quê?!
— Latyfa? Ela não ousaria… — Não quero acreditar que Latyfa
seria tão ousada para insultar a minha noiva, mas estudo o rosto de Anna
com seriedade. Ela está transtornada, magoada e também não acredito que
esteja inventando isso. Ela não é leviana.
— Ela tem me hostilizado desde quando chegou para o seu baile. —
Revela em tom enraivecido. Eu rosno baixo. — Sim, pode não acreditar,
mas é verdade. Ela me contou sobre a possibilidade de um casamento de
Estado. Me garantiu que será sua segunda esposa.
— Mas que porra ela está dizendo? — Praguejo em meu dialeto,
passando uma mão pelo rosto.
— Me disse que, como forasteira, serei apenas a puta do rei,
enquanto ela será considerada a esposa oficial e seus filhos herdarão o
trono.
Fecho meus punhos, ira percorrendo meu corpo. Latyfa a
desrespeitou desde o começo e ela nunca me falou nada!
— Porra… — Solto um grunhido angustiado. Olho-a, meu coração
doendo de arrependimento. — Anna, por favor, me perdoe. — Tento me
aproximar para confortá-la, dizer que nada disso é verdade, mas estende a
mão, detendo-me. — ‘Amira…
— Você a defendeu lá fora, Karim. — Sua voz soa trêmula, mais
lágrimas se reunindo nos olhos verdes, geralmente alegres, mas agora estão
tristes, desapontados. — Eu nunca tinha me sentido uma intrusa aqui,
mesmo com os olhares atravessados de seu tio, ou com as ofensas que a
vadia sempre me fez. Mas esta noite estou me sentindo assim, uma intrusa
em seu país.
Meu coração dói ao ouvi-la. Passo as mãos pelo meu rosto,
exasperado, enraivecido comigo mesmo por ter contribuído com a mulher
que a ofendeu. Por ter defendido a mulher que a tratou de forma tão
desrespeitosa pelas minhas costas.
— Não, amirati — murmuro, meu peito pesado, insatisfeito comigo
mesmo. — Você não é uma intrusa. Me perdoe se a fiz se sentir assim. Eu te
amo.
Seu rosto retorce com minha declaração e vejo que não será fácil
contornar minha cegueira em relação à minha convidada.
— Deixe-me sozinha, por favor — pede, abraçando a si mesma.
Desespero me toma. Eu falhei com ela. Fiz com que se sentisse inadequada,
indesejada em minha, sua casa. Me recrimino, tornando a fechar meus
punhos.
— A cadela infeliz pagará por hostilizá-la, eu garanto. — Asseguro,
entre dentes. — Será enviada para sua casa, imediatamente! — Completo,
mal me contendo.
Anna continua em silêncio, fazendo-me sentir mil vezes pior.
Preciso reparar a injustiça que cometi lá no salão.
— Converse comigo, por favor — peço num sussurro angustiado.
Tenho medo do que está se passando em sua mente neste momento. Não
posso perdê-la. Demorei tanto tempo para encontrá-la.
— Eu preciso ficar sozinha. — Torna a pedir.
— Você virá para nosso quarto? — pergunto, sentindo que está se
distanciando de mim.
— Eu não sei — murmura, parecendo exausta. — Estou confusa.
Nós não nos conhecemos, Karim. Isso foi rápido demais.…
— O que está dizendo? Eu amo você! Escolhi você, porra! —
Explodo, o medo de perdê-la se tornando pungente. Tento alcançá-la, mas
se afasta e gemo de raiva e desgosto.
— Não! Me deixe sozinha, Karim! Saia! — Se afasta ainda mais de
mim.
Flexiono meus punhos, abrindo e fechando de novo. Quero agarrá-
la, puxá-la para meu peito e lhe garantir que não foi rápido demais. Que
estamos no nosso momento. É agora. Não antes, não depois. É agora.
— Não pense que pode se esconder de mim aqui, Anna. — Forço
meu tom mais controlado, mantendo meus olhos fixos nos dela. — Vou
deixar você sozinha para esfriar a cabeça. Mas se não voltar para o nosso
quarto, virei te buscar — digo seriamente, deixando-a saber que vamos
conversar e resolver tudo.
— Foda-se. — Sua audácia volta num rosnado baixo, insolente e
sexy, como só ela consegue ser.
Solto um grunhido, querendo insistir e jogá-la por cima do meu
ombro. Sempre funciona quando está agindo assim. Mas tenho de voltar ao
salão e fazer o que precisa ser feito — defender a honra da mulher certa
dessa vez. A encaro por alguns instantes, as duas vontades guerreando
dentro de mim, então me viro com passadas largas e duras em direção à
porta. Faço todo o percurso de volta com raiva me guiando. A música me
saúda quando viro a esquina. Avanço e paro no limiar das portas duplas.
Latyfa está sorrindo e acenando para algo que seu pai está lhe dizendo. A
conversa morre quando me notam e marcho até pai e filha, com um único
propósito.
— Confesse e talvez não te jogue na prisão por insultar a sua futura
rainha. — Digo a ela friamente, a civilidade ameaçando me abandonar. Sua
postura vitoriosa quando entrei me diz que estava se vangloriando por ter
tirado Anna do sério, induzindo-a a fazer aquela cena desagradável.
— Meu senhor, acalme-se. — Meu tio vem para perto, seu rosto
tenso. Sei que está pensando na reunião com as tribos e no quanto estamos
contando com o apoio de El-Baham, todavia, não posso deixar passar
tamanho desrespeito com a minha escolhida.
— Confesse. Agora. — Torno a intimar a mulher, que está branca
como papel, os olhos arregalados. Seu pai a ampara, o rosto angustiado.
— Amiri, minha filha não sabe do que meu senhor está falando. Não
vê o seu estado? Não sei o que a princesa lhe disse, mas é mentira. — El-
Baham defende a filha, claro.
O encaro e ele inclina a cabeça, não sustentando meu olhar raivoso.
— Ela sabe exatamente do que estou falando. E minha noiva não é
uma mentirosa, aconselho-o a medir suas palavras, sheik. — Atiro.
— Amiri, do que exatamente a princesa está acusando Latyfa? —
Meu tio torna a intervir.
— Latyfa tem insultado Anna desde que chegou ao palácio, na
ocasião do baile. — Digo ao meu tio e volto a encarar Latyfa, que está
tremendo agora. — Continuou mesmo depois que a apresentei para a
família como a minha escolhida. Ela hostilizou a minha noiva a cada
oportunidade que teve e estive completamente alheio, defendendo-a hoje
quando deveria ter ficado do lado de Anna. — Todos arfam, surpresos. Os
outros chegam para perto também. Minha tia Samira, Zafyr, Jalal, Nuria.
— Meu senhor, peço sua misericórdia… — A mulher falsa ousa me
encarar, seus olhos culpados.
Bufo, encarando-a com asco.
— Você teve a audácia de dizer à mulher que amo que ela seria
apenas uma puta de luxo para mim. — Profiro as ofensas sentindo o teor
ultrajante me cortar na carne. Wallah, isso deve ter doído muito em Anna.
Todos em volta arfam, soltando exclamações indignadas. — Ousou deixá-la
insegura, mencionando um casamento de Estado que está definitivamente
fora dos meus planos. — Olho-a friamente e adicionando: — Não quero
você, ou qualquer outra, deixei isso bem claro no baile. Eu amo aquela
garota que você achou que podia insultar e ela iria aceitar placidamente.
Embora não gostando inicialmente da sua explosão, a minha princesa é
assim, verdadeira, autêntica, vibrante. E é exatamente por isso que me
apaixonei por ela.
Latyfa começa a chorar convulsivamente. O medo da punição está
estampado em seu rosto.
— Confesse. Essa é a sua última chance — intimo.
— Sim, eu fiz isso. — Assume e mais exclamações soam. — Não
sei o que me deu, meu senhor. Eu imploro sua clemência, por favor. — Cai
de joelhos no chão. Eu apenas a olho com repulsa, lamentando a
consideração que tive deixando-a ficar aqui.
— Expulse-a, amiri. — Meu tio se antecipa. Seu tom duro. — Você
sabia que a princesa se tornaria sua rainha. Devia respeito, mas em vez
disso a insultou, desagradando o seu príncipe.
Latyfa está chorando no chão e seu pai está com o rosto torcido
também.
— Eu não sabia, meu senhor. — O homem diz com desagrado.
O encaro fixo e irado.
— Fique a par do que sua filha está fazendo de agora em diante,
sheik. Isso pode evitar dores de cabeça no futuro. — Cuspo com frieza. —
Agora, tire-a da minha frente. Ela está banida do palácio!
Algo cintila nos olhos do homem. Sei que não gosta da minha
sentença, mas inclina a cabeça, aceitando mesmo assim.
— Como queira, meu senhor — murmura e arrasta a mulher falsa
para fora.
Um silêncio tenso paira no recinto depois que eles se vão.
— Bem, já era hora, primo! — Zafyr exclama, levantando seu copo
de uísque na sugestão de um brinde. Estreito meus olhos sobre meu primo
abusado.
— Shukran. Aconselho-o a parar de cobiçar a minha mulher, primo.
— Advirto e ele tem a audácia de piscar para mim. — Estou falando sério.
— Relaxa, Amihaj. A princesa está completamente na sua. — Diz
dando de ombros.
Sua afirmação me faz relaxar um pouco. Quero voltar àquela merda
de quarto e foder duro com ela, mostrar que pertence a mim, não importa
quanta birra faça. Mas vou lhe dar tempo para se acalmar.
— Você agiu bem, primo. — Jalal dá tapas amistosos em meu
ombro. — Eu já havia percebido certa animosidade entre as duas.
— Você sabia disso, Nuria? — inquiro, desviando a atenção para a
esposa de Jalal. Ela amplia os olhos.
— Eu sabia que Latyfa estava sendo desagradável para Anna. Mas a
princesa sempre respondia à altura e também não queria que você soubesse
— diz em tom de desculpas.
— Por que não queria que eu soubesse? — pergunto, confuso.
— Até parece que não conhece Anna, Amihaj. — Sorri com
admiração. — Ela não gosta de precisar de um homem para defendê-la.
— Sim, essa é a minha princesa — murmuro em tom apaixonado e
reverente, um sorriso orgulhoso brincando em minha boca. Os encaro um a
um. — Já lhes disse isso, mas vou repetir, eu amo aquela garota, mesmo
com sua boca irreverente e modos atrevidos do Ocidente. — Pauso um
instante, conclamando-os: — Vocês são a minha família. Preciso que me
ajudem a fazer que com ela se sinta em casa.
— Faremos isso, Amihaj. — Meu tio garante. — Embora não
aprove seu comportamento hoje, ela apenas respondeu ao desrespeito de
Latyfa. — O encaro, agradecido por finalmente entender e ficar do lado de
Anna. — Minha lealdade é com a minha futura rainha, não precisa pedir
isso, amiri.
— A minha também, meu senhor. — Jalal bate no peito esquerdo,
usando a formalidade rara entre nós.
Os outros repetem as palavras de meu tio e Jalal. Meu peito está
mais leve agora.
— Que Allah se compadeça de quem insultar a minha mulher de
agora em diante! Nunca mais irei permitir que ela se sinta intrusa como
hoje. Isso jamais se repetirá! — digo para que não restem dúvidas. Eles
assentem. Meus tios se despedem e se retiram em seguida.
— Ela está bem? — Nuria pergunta, preocupada.
— Está fazendo birra no antigo quarto. — Torço a boca insatisfeito
e Jalal ousa sorrir, o idiota.
— Vai dormir no sofá hoje, primo. Já vi tudo. — Zafyr também não
perde a chance.
— Cale a boca. — Ranjo os dentes para o outro idiota. Expiro e
passo uma mão pelo rosto. — Vou suar na academia enquanto a princesa se
acalma.
Eu saio de lá ouvindo as risadas deles às minhas costas. Reviro os
olhos. Uma hora. Esse é o tempo que darei a Anna. Se quando voltar para
nosso quarto não estiver lá, irei arrastar aquela bunda linda e insolente e,
então, fodê-la até o esquecimento!
Anna Julia
Suspiro, enrolada sobre um dos sofás, e fico assim, repassando os
eventos da noite. Odiando a cadela maldita com todas as minhas forças
porque sei que no fundo suas palavras são verdadeiras. Meu coração aperta
pela primeira briga com Karim depois que nos entendemos. Levanto meu
anel e meu peito dói mais, vendo a pedra rosa, linda. Ele sabia que não me
agradaria um diamante branco. Gosto de cores vibrantes. De repente,
percebo que minha alegação de que não nos conhecemos não é totalmente
verdadeira. Ainda que seja cedo, eu sei que é um pai maravilhoso para Ayla,
que uma parte do seu coração pertence a sua esposa falecida. Sei que ele
não se abriu para nenhuma mulher antes de mim. E ele sabe que sou
explosiva, ousada, que uma parte do meu coração pertence a Nate e que
nunca me abri para outro homem antes dele. Um nó se forma em minha
garganta e eu choro, percebendo que o pouco tempo nem sempre é o que
conta. Eu o amo tanto. E por isso machucou vê-lo defendendo à vaca e não
a mim.
Não sei quanto tempo fico lá, enrolada, pesando os prós e os contras
de meu comportamento no jantar. Eu faria tudo de novo! Mas agora, já mais
calma, entendo que explodindo daquela forma dei Ibope demais para a
cadela desprezível. É hora de voltar para o nosso quarto e conversar com
Karim. Me levanto, pegando as sandálias, não me dando o trabalho de
calçá-las de novo e saio. Sigo pelo corredor respirando fundo e giro a
maçaneta da porta de nossos aposentos, passando para dentro. O silêncio
me saúda. Ando pelo cômodo à sua procura, mas nenhum sinal dele. Então,
o toque do meu celular chama a minha atenção sobre a cama. Franzo o
cenho ao ver o nome de Nuria.
— Nuria. — Atendo-a.
— Amihaj a expulsou do palácio, Anna. — Ela murmura e meu
coração salta ao escutar isso. — Ele voltou ao salão e fez Latyfa admitir que
a estava hostilizando.
— Ele fez isso? — pergunto, meu íntimo aquecendo.
— Sim. Ainda rosnou na cara da naja que é a você que ele ama e
não vai tomar uma segunda esposa, muito menos ela. — Eu ofego, meus
olhos se enchendo de lágrimas de novo. Só que dessa vez são alegres. Ele
me defendeu. O meu príncipe lindo me defendeu.
— Onde ele está? Não o encontrei aqui no quarto — pergunto com
urgência.
— Ele disse que ia para a academia, suar um pouco enquanto você
esfriava a cabeça. — Pausa um pouco. — Você já está mais calma?
Expiro longamente.
— Sim — murmuro, um sorriso se formando em minha boca. —
Estou indo suar com meu príncipe agora… — Ela sorri do outro lado. —
Shukran, Nuria.
— Por nada. Vá procurar o seu homem. — Encoraja. Ela está
ficando menos tímida à minha volta. Gosto disso, de ter alguém em quem
confiar por aqui além de Karim.
Me despeço dela e entro no closet, mudando rapidamente meu
vestido para um conjunto de calça e top vermelho. A calça justa se agarra à
minha bunda, deixando-a bem arrebitada, além disso, não uso calcinha.
Sim, eu vou numa missão: fazer as pazes adequadamente com meu
príncipe. O top é um dos menores que tenho e mal contém meus seios, os
bicos quase aparecendo. Prendo meu cabelo num rabo de cavalo, calço tênis
e deixo o quarto rumo à academia, a apenas alguns metros depois do quarto
de Ayla. Entro e fecho a porta, trancando-a. Meu coração dispara, meus
olhos correndo pelo amplo espaço com os mais variados equipamentos.
Uma música árabe está tocando nas caixas acústicas. Estou amando esse
ritmo. É sensual, exótico, como meu príncipe. Karim não está à vista, mas
posso ouvir as batidas de socos e seus gemidos ofegantes. Ando devagar em
direção à sala que ele usa para o boxe e, mais ao fundo, para lutas com
espada. Ofego ao vê-lo de costas, distribuindo socos potentes no pobre saco
de boxe. Está usando apenas um short escuro.
Minha boca saliva acompanhando o ondular dos músculos das
costas e ombros largos. Seu cabelo está contido no coque que o deixa ainda
mais sexy, delicioso. A sala é ampla, sem outros equipamentos, apenas o
saco de boxe e a espécie de tatame rente à parede espelhada ao fundo.
Observo seus movimentos ágeis e ferozes, fascinada, até que nossos olhares
se encontram na parede espelhada. Os olhos negros fumegam, correndo
pelo meu corpo, o brilho predatório me faz estremecer, minha vagina
umedecendo e pulsando. Eu entro no recinto e ele diminui a força dos
socos, seu corpo está coberto por uma camada de suor e quero lambê-lo.
— Karim… — murmuro. É baixo, mas sei que ouviu porque seus
ombros ficam tensos. Ele grunhe e soca com mais força o pobre saco. —
Habib, olhe para mim. — Ele para os socos e retira as luvas, sua respiração
irregular, e crava os olhos escuros nos meus. Ainda em silêncio, se dirige
para o espaço das espadas. Ele usa espadas sem corte nos treinos comigo,
mas ainda são de aço e pesadas. Porém, estou me familiarizando com elas
desde que começamos a treinar, há duas semanas. — É assim que vai ser?
Você não vai conversar comigo?
Ele bufa, pegando uma espada pela lâmina e jogando-a para mim.
Pego o cabo com a agilidade que me ensinou e não perco o brilho orgulhoso
passando em suas íris. Então, seu olhar desce lentamente pelo meu corpo de
novo.
— Eu não quero conversar agora, princesa. — Sua voz profunda faz
meu centro vibrar. — Ganhe um tempo de mim e talvez eu converse com
você.
É a minha vez de bufar. Ele está sendo um idiota arrogante agora.
Nunca ganhei sequer um terço do tempo nos treinos. Apenas Jalal consegue
ser um oponente digno para ele nesse esporte.
— Vamos lá, Alteza. — Debocho e me livro do tênis, pisando no
chão levemente acolchoado. Ando até o centro e, segurando a espada com
as duas mãos, me coloco na posição de defesa. Minhas pernas abertas, meus
joelhos ligeiramente flexionados. Seu olhar faminto desce pelos meus seios,
barriga nua, e para entre minhas pernas. Meus seios ficam túrgidos e me
molho toda sob seu escrutínio perverso. Ele está vendo que estou sem
calcinha e um lento e malvado sorriso enrola sua boca antes de o olhar
arrastar de volta para o meu.
— Pronta, ‘amira? — pergunta com o brilho lascivo cintilando nos
olhos de ônix.
Levanto o queixo, mesmo excitada pra caramba, precisando manter
a pose.
— Pode vir, honorável senhor. — O instigo e ele sorri mais uma vez
antes de se lançar em minha direção. O barulho do aço contra aço ecoando
no espaço quando defendo o golpe. Ele torna a sorrir, me rodeando, e eu
rapidamente giro meu corpo, medindo-o, tentando antecipar o momento do
novo golpe. Seu abdome e peitoral definidos e suados são uma distração e
não percebo o ataque vindo. Karim me puxa contra seu corpo e arfo,
sentindo o pau grande e grosso pressionando em minha barriga. Está duro,
pronto para mim, como estou para ele. Então, com a mesma rapidez com
que me puxou, ele me empurra e investe novamente. Eu faço um bloqueio
perfeito e giro em meus calcanhares, tentando pegá-lo desprevenido, e
ataco. Isso o faz rir, o som tão indolente que me irrita. Já estou um pouco
ofegante pelo esforço de segurar a espada pesada, mas rosno, investindo
uma, duas, três vezes.
— Isso, princesa! Vamos, me ataque! — Ele incentiva e eu
continuo, empolgada. Suor brota em minha pele, seus olhos intensos
seguindo cada movimento meu, a fome queimando lá nas profundezas.
Quando roçamos um no outro, nossas peles deslizam suadas, seu cheiro de
sândalo e algo viril, primitivo, invadindo minhas narinas. Estou ofegando e
não só pelo treino. Empunhando uma espada, ele parece um daqueles
piratas temidos de tempos remotos. Luto, tentando não entregar a vitória tão
fácil, minha competitividade o fazendo rir por não entregar os pontos.
A música muda para outra mais lenta, os instrumentos numa perfeita
harmonia sensual. Nossos movimentos em volta um do outro se
assemelham a uma dança. Até que, num golpe ágil, ele pega minha mão da
espada, girando-a para trás das costas, seu agarre em meu pulso é forte, o
pau duro encostando em minha frente de novo. Meu peito sobe e desce,
minha respiração errática, ofegante.
— Deliciosa… — Rosna, se inclinando, lambendo meu pescoço.
Sua língua morna lança arrepios eróticos por todo o meu corpo. Sua boca
suga a minha carne suada e convulsiono. Solto a espada no tatame. Ele faz
o mesmo com a sua, a boca subindo para a minha orelha, raspando os
dentes, suas mãos agarram minha bunda e aperta a carne. Acaricio seus
ombros e me inclino, deslizando a língua em seu peito suado, envolvendo a
boca no mamilo direito, sugando-o. Karim geme rouco, as mãos subindo e
puxando meu top para baixo, grosseiramente. Quando meus seios ficam
nus, suas mãos os cobrem, esfregando os mamilos rígidos com os
polegares. A ereção grossa pressiona meu abdômen e o calor dentro de mim
aumenta, fazendo cada parte pulsar. Com um choramingo, puxo sua cabeça
para baixo e capturo sua boca, gememos os dois, nos agarrando numa
explosão de desejo.
— Me perdoe, habibti — ele sussurra asperamente, mordendo
minha boca.
— Me perdoe também, amiri — murmuro de volta, completamente
perdida de amor e tesão. — Eu te amo tanto.
— Eu também te amo tanto, amirati — diz, seu olhar cintilante de
amor e luxúria. Meu coração canta, inchando no peito. Pertencemos a
mundos diferentes, mas somos um agora e nada mais importa. — Você é
minha. Minha, está me ouvindo, Anna? Nunca vou te deixar ir embora. —
Rosna, mordendo meu queixo, voltando a mergulhar a boca exigente na
minha. Eu estremeço, pingando, latejando. Começa a puxar seu short para
baixo, com gestos apressados. O ajudo, gananciosa para tê-lo nu. Nosso
sexo é intenso, faminto, luxurioso e estou completamente viciada em tomá-
lo várias vezes ao dia. Quando está nu, o pau longo e espesso,
orgulhosamente duro, me faz lamber os lábios, minha boca enchendo de
saliva. Karim ri com perversão e me livra do top, em seguida da calça, me
empurrando com urgência contra a parede lateral, uma mão possessiva
vindo entre minhas pernas.
— Ahh, Karim… — Eu choramingo, sentindo seus dedos
deslizando em minhas dobras meladas. Com um rugido, ele mete um e em
seguida dois dedos grossos em mim. Gemo alto, me agarrando em seus
ombros, meu corpo inteiro tremendo de prazer.
— Sim, princesa, sua boceta precisa do meu pau, não é? — Seu tom
é indulgente enquanto esfrega meus lábios e clitóris numa fricção
enlouquecedora. Estou pingando em sua mão, tão excitada que ficaria com
vergonha, mas esse é o meu homem. — Isso, habibti, não se envergonhe
por estar toda molhada para tomar meu pau. Essa bocetinha apertada é
minha. — Suas palavras sacanas me deixam ainda mais louca. Sua boca
desce pelo meu pescoço e colo até engolir um mamilo, passando a sugar-me
gulosamente. Pego seus cabelos da nuca, arqueando-me, deixando-o mamar
em mim. Passa para o outro seio, lambendo, mordendo o bico com
perversão. Meus líquidos estão escorrendo em minhas coxas agora.
Levanta minha perna direita, enrolando acima de sua cintura, fico
toda esticada. Seus olhos escuros sobem para os meus enquanto se divide
entre um seio e outro, chupando minha carne com força, me marcando.
Choramingo, pendurada, arfando para tê-lo todo dentro de mim.
Com um sorriso perverso curvando sua boca, Karim se alinha em minha
entrada e me segura por trás do ombro direito enquanto segura a perna
direita com força, mantendo-me bem aberta. Sua boca vem para perto da
minha, seus olhos intensos e penetrantes se fixando nos meus, e ele empurra
o pau grande e grosso, socando bem fundo em mim. Eu grito, minhas unhas
cravando em seus ombros, meu corpo inteiro convulsionando. O prazer
perverso de tomá-lo até o punho quase me faz gozar. Sua pegada é dolorosa
às vezes, mas é inexplicavelmente gostosa, excitante. Karim me segura
imobilizada e retira quase inteiro, os olhos nunca deixando os meus,
voltando a me penetrar com força. Nós dois gritamos, nossas peles grudadas
de suor. Tesão cru reverberando em nós. Nossos sexos pulsam juntos, o meu
engolindo o dele, com fome. A sensação de ser completamente preenchida,
esticada é a mais luxuriosa e viciante que já senti. Minha cabeça roda e ele
passa a me comer com vigor, prensando-me à parede a cada estocada
profunda.
— Habib… Assim mesmo. Isso… — respiro entrecortado e minha
atenção vai para a parede espelhada ao lado. Arfo, luxúria varrendo meus
sentidos ao ver nossa imagem refletida lá. Meu príncipe viril e moreno me
comendo com força. Os músculos do corpo perfeito se contraindo a cada
estocada que dá em mim. Me penduro a ele e me dou, rebolando o máximo
que posso, recebendo-o todo, longo, grosso.
— Amirati… — Geme roucamente, sua boca vindo para a minha, e
o recebo com urgência. Nos beijamos com paixão lasciva, nossas línguas se
lambendo, dançando, num vai e vem gostoso. Seu pau me arreganhando
toda, me abrindo com golpes fundos, fortes. Eu deliro, deixando-o me foder
com voracidade. Quase não tenho mobilidade da cintura para baixo, seu
agarre é forte, me mantendo presa à parede, enquanto me fode. Minhas
unhas deslizam em seus ombros e eu mio em sua boca, levando cada
centímetro do pau grande. Resfolego, meu corpo estremecendo, minhas
entranhas queimando, a quentura descendo meu canal vaginal, meus
músculos internos se contraem em espasmos intensos e os líquidos inundam
minhas paredes. Eu grito alto, o gozo vindo denso, impiedoso, labaredas
líquidas encharcando minha vagina. Grito, choramingo, enquanto o
orgasmo reverbera em cada célula do meu corpo e Karim rosna, sua boca
deixando a minha, indo para o pescoço, onde chupa com fome. Todo o
tempo me comendo com socadas fundas, aumentando os tremores do meu
gozo.
— Me abrace com a outra perna, Anna. Vou te comer no chão agora.
— Grunhe e elevo minha perna esquerda. Estou mole, ainda trêmula e
ofegante do orgasmo arrasador. Ele me abraça apertado, colando-me
completamente em seu corpo grande e suado. Gemo e ele ri da minha
reação ainda faminta.
Me carrega uns passos, me deitando no centro do tatame preto, seu
corpo cobrindo o meu. Choramingo, sentindo seu peso me esmagando
gostosamente, seu pau entrando ainda mais profundo, as bolas colando em
minha bunda. Ele grunhe, seus olhos intensos sobre mim. Vejo amor, paixão
e luxúria queimando nas íris escuras. Me segura pela nuca e pega minha
perna direita, voltando a enrolá-la em seu quadril, e ele bate em mim,
fundo, duro. Eu berro pela dor e prazer se misturando. Nossos olhares
permanecem fixos e passa a me comer com golpes mais lentos, seu olhar
me devorando como seu pau avantajado está fazendo. Parece encantado.
O encaro com a mesma intensidade e encantamento, minhas mãos
acariciando seus ombros, peitoral, costas. Seus lábios deslizam pelo meu
rosto indo parar no ouvido, mordiscando o lóbulo, sugando-o depois, nunca
parando de meter bem fundo. Gememos, sussurramos nossos nomes, nossos
corpos suados deslizando um no outro, nesse encontro perfeito e devasso
que esse homem lindo me viciou. Arreganho-me mais e Karim grunhe,
descendo a boca para o meu pescoço, mordendo-me com perversão e posse.
Minha excitação começa a enrolar em minha barriga de novo. Meu corpo
começando a acordar, querendo gozar mais uma vez. Lábios quentes
encontram meu seio esquerdo, chupando duro. Arqueio-me, arfando,
enquanto ele dá atenção ao outro seio; fica indo e voltando, lambendo e
mordendo os mamilos sensíveis.
— Levante as pernas para os meus ombros. Quero entrar até as
bolas nessa boceta gostosa, princesa. — Grunhe, já pegando meus
tornozelos, me abrindo até não poder mais. Minha bunda levanta do tatame
e eu choramingo de boca aberta, vendo-o puxar o pau longo e grosso e
meter tudo dentro de mim de novo. Olho de lado, buscando-nos no espelho
outra vez, e estremeço pela imagem hedonista. Karim me montando com
seu corpo grande e musculoso, o pau entrando e saindo da minha vagina,
meus lábios estão esticados ao limite, recebendo-o até o punho. As bolas
batendo em minha bunda a cada estocada profunda. Minha vulva está toda
dolorida da sua voracidade, mas ao mesmo tempo é gostoso demais ter seu
pau grande e volume dentro de mim. — Gostosa… — Ruge guturalmente,
seu olhar indo para o espelho também, observando sua performance me
montando.
— Me faça gozar de novo, habib… — Peço desavergonhada. Ele ri
perverso e abaixa a boca bem perto da minha, o olhar escuro dentro do meu.
— Você vai gozar de novo, minha putinha… — Choramingo com
essa expressão chula. Minha vagina lateja e molha mais. Karim sente,
batendo com força brutal dentro de mim e eu berro, me pendurando em seus
ombros, perdendo meu ar. — Eu sei do que você precisa, habibti. Toma
tudo.… Vamos, leva bem fundo e goza no meu pau. Vamos, Anna!
Meu corpo todo convulsiona, depravação sem limites percorrendo
minhas veias e eu explodo, choramingando de prazer. Karim urra e mete
fundo, então, os jorros quentes alagam minha vagina. Gozamos gostoso,
agarrados, resfolegando, ele não parando de meter até descarregar tudo.
Sinto os líquidos descendo para o meu ânus. Sem aviso, ele sai da minha
vagina e me gira de bruços. Eu ofego vendo-o pelo espelho enfiar o rosto
em minha bunda, a língua habilidosa lambendo minha vulva e subindo para
o ânus. Arranho o couro do tatame e gemo enquanto ele abre bem minhas
bochechas e me chupa, lambe sem qualquer vergonha. Seus dedos cavam os
líquidos em minha vulva, levando para meu pequeno buraco, e relaxo,
deixando enfiar um.
Já fizemos algumas vezes e, embora seja um pouco doloroso, é
gostoso. Ele o mete todo, bem devagar, passando a me comer assim, sua
boca sobe pelas minhas costas, mordendo, sugando, lambendo até a minha
fênix. Ele adora essa tatuagem e amo sua boca sobre ela, beijando,
mordiscando de leve. Logo, acrescenta mais um dedo e me come ainda
devagar, alargando-me. A mão livre enrola em meu rabo de cavalo e o
puxa, rosnando quando gemo alto. Amo quando pega meu cabelo assim.
Seu corpo escala o meu, as coxas musculosas escarranchando minha bunda.
Fico tensa ao sentir a cabeça larga substituindo os dedos. Ele ainda está
duro mesmo tendo gozado há poucos minutos. Tem um vigor
impressionante aos trinta e três anos.
— Abra a bundinha linda para mim, princesa. — Sua voz em meu
ouvido me faz estremecer e eu faço, levando as mãos para trás, abrindo-me
sem vergonha. As mãos grandes passeiam em minhas costas quase
reverentemente. — Tão perfeita, ‘amira. — Geme rouco e então sinto a
pressão da cabeça bulbosa empurrando para dentro. Gemo em lamúria
sentindo-o penetrar o esfíncter. Karim urra baixo, empurrando devagar
centímetro a centímetro até estar todo enterrado. Eu estremeço e ele acaricia
minhas costas de novo, antes de puxar e voltar numa estocada mais forte,
funda, dolorosa, ainda assim deliciosa.
— Ahh, sim… — Lamento, entorpecida de tanto tesão por esse
homem e pelo prazer devasso de pertencer a ele de todas as formas. — Me
come assim, amiri…
Um som animalesco sai da sua garganta e puxa de novo, socando de
volta com força, me fazendo berrar alto. Sua mão torna a enrolar em meu
rabo de cavalo, subjugando-me, e me fode sem pena, sem restrição, me
comendo bruta e deliciosamente.
— Você ama meu pau todo enterrado nesse cuzinho apertado, não é,
princesa? — Instiga, me olhando através do espelho. Arfo, sendo montada e
fodida sem pena e amando cada momento.
— Muito.… Muito.… — Balbucio, perdida em seu olhar intenso,
suas estocadas vorazes em meu ânus. Mais suor está brotando em nossos
corpos. — Amo tudo que faz comigo. Tudo.
Ele sorri, arrogante, lindo, todo moreno, perfeito, e se debruça
lambendo minhas costas até a nuca. Sua boca chega ao meu ouvido e rolo
os olhos quando suga a concha da orelha, seu pau me comendo mais
devagar agora. Ele gira o quadril, metendo gostoso e profundo a cada golpe.
Suas mãos pegam as minhas e enfia seus dedos entre os meus, apoiando-as
dos lados da minha cabeça. Está todo em cima de mim, esmagando-me no
tatame.
— Abra um pouco as pernas, habibti — sussurra em meu ouvido e
eu faço. Quando volta a meter, meu clitóris esfrega no couro embaixo de
mim. Ofego e ele ri no meu ouvido, a boca gostosa descendo para o
pescoço, ombro, onde morde e passa a aumentar a força das estocadas
gradativamente, até que está batendo em mim, sem dó. Os sons de sexo
despudorado rivalizam com a música instrumental. — Quer gozar me dando
essa bundinha gostosa, princesa? — pergunta perversamente, me encarando
no espelho. Eu gemo em resposta. — Sim, a minha putinha quer. É claro
que quer… — Ri perverso e resfolego, sua sacanagem, a fricção em meu
feixe de nervos me lançando para a borda pela terceira vez.
— Oh, Jesus! Karim… — Eu me desmancho, recebendo suas
estocadas fundas e gozando mais uma vez, arquejando, quase sem som.
— Anna… — Ele geme meu nome, me comendo com força. Suas
estocadas fazem um barulho ritmado no ambiente. — Isso, goza bem
gostoso no meu pau outra vez! Goza comigo, amirati! — Rosna, metendo
mais e mais e urra guturalmente, estremecendo e esporrando dentro de mim.
Meu gozo intensifica, meu ânus recebendo os jorros do seu esperma quente.
Meu canal está dolorido, ardendo, mas é perfeito. Karim continua entrando
fundo, gananciosamente, despejando tudo, mordendo minhas costas e
rosnando alto. Vejo-o pelo espelho, tão apaixonada que meu peito dói.
Ficamos os dois gozando e nos olhando fixamente, ofegantes, nossos olhos
dizendo tudo o que as bocas ofegantes não conseguem neste momento.
Com um beijo suave em meu ombro, ele para os movimentos e se retira
devagar. Imediatamente, me gira, me puxando para seus braços.
Nos agarramos e ficamos grudados, arfantes, completamente
abatidos pela paixão voraz. Sua mão esfrega minhas costas e curva do
quadril, o toque delicioso e suave, e eu acho que cochilo um pouco, porque
acordo com ele rindo baixinho, seus lábios mornos em minha testa. Mio, me
agarrando mais a ele, minha perna por cima do seu quadril.
— Seu temperamento pode colocá-la em problemas, ‘amira —
murmura e eu abro os olhos, encontrando-o me encarando com a
intensidade que amei desde o primeiro momento. Eu rio um pouco.
— Sim, reconheço, Alteza, posso ter exagerado um pouco… — Ele
bufa e eu fico séria. — Aquela vaca merecia muito mais. Só não dei a surra
que a vadia estava pedindo justamente por causa das minhas boas maneiras,
fique sabendo, Alteza.
Grunhe com meus palavrões, mas sua expressão fica séria também.
— Sinto muito por não ter ficado do seu lado no primeiro momento.
Você é a minha escolhida, habibti — diz com voz áspera e puxa meu
queixo, levando meu rosto mais próximo do seu. — Que Allah proteja
quem ousar insultá-la de novo. Você é a minha mulher.
Meu coração aquece de tanto amor por ele e eu rio, me
aconchegando mais.
— Nuria me disse que você a mandou embora, então, está tudo bem,
amiri. — Tranquilizo-o, beijando suavemente sua boca.
Seus dedos contornam meu rosto e seu olhar fica mais suave quando
murmura:
— Aqui é a sua casa agora, Anna. Nunca mais quero ouvi-la dizer
que se sente uma intrusa.
— Eu sei, Karim. Exagerei, admito — sussurro. — É que as
palavras dela me envenenaram e você a defendendo me deixou fora de
controle.
— Wallah! Totalmente fora de controle, ‘amira. Meu tio confirmou
sua teoria de que você é uma princesa escandalosa — resmunga.
— Droga, agora o Mister Simpatia me odeia mais um pouco. —
Aponto, desgostosa.
Karim não segura uma risada profunda, seus braços me apertando
gostosamente contra seu peito.
— Embora tenha sido um tanto divertido, você será a minha rainha.
Tente não escandalizar mais ninguém em público — pede ainda em tom de
diversão.
— Mas qual a graça de escandalizar se não for em público, habib?
Me encara com olhos estreitos.
— Comporte-se, habibti. — Seu tom me lembrou o que minha mãe
usa com meu pai sempre que precisa contê-lo. Rio, aninhando-me no corpo
quente do meu amor e o provoco um pouco mais:
— Eu não sou e nunca serei uma de suas cadelas treinadas, Karim.
Ele rosna.
— Você não pode repetir essas merdas em público, Anna. Uma
rainha precisa manter certo decoro, sabe muito bem disso — retruca.
Reviro os olhos, adorando provocá-lo.
— Está bem, prometo me comportar — digo com um sorriso
brincando na boca e meus olhos fechando de novo. Suspiro feliz voltando a
encará-lo. — Amo você, amiri — sussurro.
Seus olhos escuros flamejam com a intensidade que me derruba. Seu
nariz roça o meu delicada e reverentemente.
— E eu amo você, amirati — murmura, me mantendo no casulo dos
braços fortes. — Minha casa é a sua casa. Sempre, nour Al Sabah
CAPÍTULO DOZE
Karim Amihaj
A contemplo cavalgando ao meu lado, um sorriso bobo escancarado
em meu rosto. Anna conseguiu me seduzir para suspender a agenda de hoje
e ficar com ela, elas. Ayla está comigo, acomodada na sela à minha frente.
Sua risadinha feliz termina de me aquecer por dentro. Minha princesinha
está empolgada com Anna lhe ensinando a montar, mas ainda vai demorar
até que eu fique seguro em deixá-la andar sozinha.
— Mais rápido, papai! — Ayla dá um gritinho eufórico quando
incito Hércules a aumentar o galope.
— Não podemos ir muito rápido, nour hayati. Você é pequena
ainda. — Advirto, mas rio da sua euforia e coragem. Por isso se deu tão
bem com Anna. Minha filha tem a mesma inquietação que vejo na princesa.
Prevejo que ganharei alguns cabelos brancos com essas duas.
— Não sou pequena — retruca, me fazendo rir mais, apertando meu
braço enrolado em seu pequeno corpo, mantendo-a bem junto de mim.
— Para essa atividade em especial, você é, habibti. Agora pare de
retrucar para seu pai, mocinha — repreendo e ela torna a soltar a risadinha
contagiante.
Anna nos observa, o mesmo sorriso bobo e apaixonado está em seu
rosto. Masha Allah![31] Como é linda. Está usando uma calça escura e justa,
tênis vermelho-escuro, um caftan no mesmo tom do calçado, os cabelos
negros soltos tremulando sobre as costas e ombros a cada galope. É
hipnotizante vê-la montando Queen, sua postura majestosa como uma
rainha. A minha rainha. Minha mente é preenchida com imagens dela hoje
de manhã cavalgando meu pau, os peitinhos lindos saltando a cada descida,
o brilho safado, ousado em seus olhos verdes enquanto me fitava me
levando até o punho. Reprimo as imagens para me impedir de ficar duro,
afinal, não estamos sozinhos. Continuamos nos observando, nossos olhares
cobiçando um ao outro. Sou completamente louco por ela. Não consigo
mais imaginar minha vida sem essa garota linda e irreverente. Seguimos
lado a lado, o sol já começando a baixar no mundaréu de areia. Inspiro,
absorvendo a sensação de liberdade que isso me traz. Anna está fazendo o
mesmo quando torno a observar seu perfil esguio sobre sua égua. Abre os
braços e fecha os olhos, o rosto inclinando para cima.
Não resisto e pego minha câmera pendurada no pescoço, com uma
só mão, deixando as rédeas de Hércules sobre a ponta da sela. A enquadro.
Tenho algumas fotos dela desde o nosso primeiro passeio. Já estava
fascinado, tentando lutar contra, mas irremediavelmente atraído pela sua
irreverência, sua luz. Disparo um, dois cliques e seu rosto vira para mim, os
olhos verdes cintilantes, vibrantes, encontrando os meus através da lente.
Meu coração pula no peito, meu corpo inteiro sendo tomado de amor,
paixão, desejo, devoção, um misto de sentimentos intensos que ela me
desperta. Linda. Linda demais. Nunca vou parar de agradecer a Allah por
trazê-la para mim. Continuo clicando e ela sorri, seus olhos cada vez mais
brilhantes.
— Eu amo você, amiri — sussurra. Eu disparo mais um clique,
pegando essa expressão, esse olhar, quando declara seu amor.
— Eu amo você também, amirati — digo de volta, tocado, tomado
de todas as formas.
Anna torna a sorrir e então levanta sua câmera. Eu faço uma careta
de brincadeira, me tornando o seu foco agora. Ela gargalha roucamente, o
som ecoando no deserto, e tira várias fotos. Abaixa a câmera, seu olhar me
bebendo por um instante, como fiz antes com ela. Lindo. Consigo ler em
seus lábios. Volta a disparar mais cliques e sua atenção vem para Ayla.
— Aylinha? Olhe para mim, sapequinha! — E ela começa a clicar,
um sorriso doce e amoroso curvando sua boca ao focar minha filha. —
Assim mesmo, menininha bonita! — Incentiva sob os risos entusiasmados
da pequena.
Anna encerra a sessão e voltamos a galopar em ritmo mais intenso.
Pegamos o desvio ao norte, ainda dentro da grande muralha, em direção ao
campo de golfe. Vamos levar nossa pequena aventureira para se divertir um
pouco e, depois, faremos um lanche sobre a grama — ideia de Anna, e Ayla
deu pulos de alegria quando lhe contamos ainda há pouco. Nós fomos
almoçar em Jawahra e voltamos no meio da tarde.
— Anninha, você vai me ensinar a jogar golfe? — pergunta,
ansiedade escorrendo em seu tom.
— Eu não sou nada boa nesse esporte, habibti. — Anna nega com
um leve sorriso. A suavidade com que trata minha filha sempre me deixa de
joelhos. Seus olhos vêm para os meus e vão ficando brilhantes com
atrevimento antes de adicionar: — Mas para nossa sorte, seu pai é muito
bom e vai nos ensinar.
Devolvo o sorriso malicioso, aproveitando que Ayla não pode me
ver. Na única vez que a trouxe aqui, eu me aproveitei bastante da
inexperiência da princesa nesse esporte, não tenho vergonha em admitir.
Estávamos os dois muito atraídos, a tensão sexual quase insuportável entre
nós. Sentir seu corpo delicioso junto ao meu, respirar seu cheiro
embriagador, era tudo que eu me permitia naquele período, ainda assim,
foram momentos perfeitos. Eu acordava louco para vê-la e inventava algum
passeio para estar perto dela.
Chegamos ao campo e o funcionário da guarita nos recebe com
reverência, abrindo a corrente e nos dando passagem. Atravessamos a área
calçada de blocos e mais três funcionários vêm nos ajudar a desmontar e
pegar as cestas de comida. Dois cuidam dos cavalos e um segue com as
cestas em direção a um carrinho perto da faixa extensa de grama à nossa
direita. Eu seguro a mão direita de Ayla e Anna segura a esquerda. Minha
princesinha está radiante. Seu traje se assemelha ao de Anna, incluindo o
tênis vermelho que a princesa encomendou na capital. As ajudo a se
acomodar no carrinho e dirijo, nos levando pelo caminho tortuoso cortando
a grama. Nem me lembro quando trouxe Ayla aqui. Acho que foi apenas
uma vez e, vendo a felicidade brilhando nos olhinhos de minha filha, me
recrimino por isso.
— É tão bonito, papai! — Minha menina exclama quando
começamos a subir a ponte, atravessando para o outro lado, onde teremos
mais privacidade. A encaro, sentada no colo de Anna.
— Sim, nour hayati. Você está gostando do nosso dia de hoje? —
pergunto suavemente.
— Sim! Anninha disse que o senhor seria todo nosso hoje.
— Ela disse, é? — Sorrio, desviando o olhar para sua cúmplice.
— Seu papai é maravilhoso por tirar o dia para suas garotas, não é,
princesinha? — Ela diz, beijando o topo da cabecinha de Ayla.
— Sim! Meu papai é maravilhoso. Amanhã o senhor vai tirar folga
de novo, papai? — pergunta em sua inocência, me fazendo rir alto e Anna
também.
— Amanhã não posso, habibti. — Olho-a com ternura. — Mas
prometo tirar outro dia para minhas garotas em breve.
Anna me encara, uma sombra passando em seus olhos. Amanhã será
a reunião com os clãs tribais. Estou apreensivo, confesso. Essa folga hoje
veio em boa hora e está sendo boa para limpar um pouco a cabeça dos
pensamentos e prospectos que só me deixam mais ansioso. Temos uma
defesa montada para solicitar o apoio dos líderes para minha subida ao
trono solteiro. O sheik El-Baham garantiu que o ocorrido com Latyfa não
interferirá em nossa relação e continuará me apoiando. Espero que tudo dê
certo. Paro perto do ponto de partida. Carrego o saco com os tacos e Ayla
segura a mão de Anna enquanto andamos pela grama. Pela próxima hora
nós rodamos os buracos. Ensinei minha pequena a bater na bola algumas
vezes e outras a deixei correr livremente, tentando suas tacadas com um
taco menor e mais leve. E, claro, não perdi a oportunidade de ajudar Anna
em suas tacadas também.…
Quando Ayla mostrou sinais de cansaço, pegamos as cestas no
buggy e estendemos uma manta sobre a grama, à margem do lago artificial.
Comemos as frutas, esfihas doces e salgadas, tomando suco de tâmara e
amora. Tiro várias fotos de Anna e Ayla juntas e depois, foco o rosto lindo
de Anna. A expressão de adoração enquanto interage com a minha filha
amolecendo meu coração. Ayla vem sentar em meu colo, pedindo a câmera
para tirar fotos de Anna também. A ajudo e ela sorri, tão encantada com a
nossa princesa quanto eu.
— Isso, habibti! — incentiva como Anna fez com ela antes. — Está
linda!
Nós rimos da espontaneidade da pequena.
— Shukran, menininha esperta! — Anna sorri, fazendo poses.
Anna torna a pegar sua câmera e registra o pôr do sol do outro lado
do lago. O clima vai ficando mais ameno, uma brisa suave nos envolvendo.
E pelos próximos minutos ela se perde, fazendo o que ama. Seus olhos
brilham a cada ponto que capta seu interesse e sua lente volta para mim.
— Me dê um sorriso, honorável Alteza — murmura, um misto de
provocação e reverência em seu tom fazendo meu corpo acordar. Estendo a
mão, puxando-a para o meu lado, precisando tocá-la. Ela sorri, se
desequilibrando, caindo de costas em meu colo. Ayla faz algazarra,
pegando-a, enrolando os pequenos braços em seu pescoço. Ajusto as duas
sobre as minhas pernas. Anna se aconchega, o rosto corado levantando para
o meu. Me inclino, dando um beijo suave em sua boca. Nossas mãos
entrelaçam e ficamos assim, vendo os últimos raios de sol sendo engolidos
pelo deserto.
— Quando tudo estiver tranquilo por aqui, eu quero fazer a
exposição que lhe falei, habib — murmura, quebrando o silêncio. Sim, ela
me disse que o objetivo de fotografar os beduínos era fazer uma ou mais
exposições. — Preciso esperar Ella terminar o resguardo, porém. Ela é
curadora honorária do Museu de Ardócia. Além de ter os contatos certos,
minha prima é fodona nesse negócio de arte. — Sorrio da sua forma de
falar. — É uma apaixonada por arte e está salivando para me ajudar desde
que lhe contei sobre esse projeto.
— Você também é uma apaixonada pela arte, ‘amira — murmuro,
deslizando meus dedos entre seus cabelos. — Nunca vi ninguém capturar
tão bem a essência das coisas como você com suas lentes.
Seus olhos se iluminam com meu elogio.
— Shukran, habib — sussurra. — Você também consegue isso. Vi
suas fotos.
— Não, Anna. Sou apenas um curioso que aprendeu sozinho.
Fotografar é apenas mais um hobby para mim. — Dou de ombros. — Mas
você eleva isso a outro patamar. Você coloca a alma em cada clique e isso
faz toda a diferença. Essa, ou essas exposições, serão um sucesso, tenho
certeza.
Ela solta uma risadinha suave.
— Você me envaidece, meu senhor. — Brinca. Eu rio, tocando seu
rosto, deslizando os dedos reverentemente pela face macia. — Quero
reverter os lucros para a Fundação Anna Harper e também para a fundação
da família Marshal — complementa, seus olhos ficando sérios. Assinto. —
Isso me lembra de que preciso ligar para Emma e Ben. Eles irão gostar de
participar. — Estes são a mãe e irmão mais novo de Nate, pelo que já
conversamos. Anna mantém contato com eles, um dos pedidos das cartas
que o menino escreveu para ela enquanto estava em estágio terminal. Meu
olhar vai para a corrente em seu pescoço. Não quero me sentir incomodado
por isso, mas não consigo evitar, eu sinto. Ela vai continuar usando-a
mesmo agora que se abriu para o amor outra vez? Mesmo agora com meu
anel em seu dedo?
— Onde quer fazer, habibti? — pergunto, expulsando o mal-estar
para longe. Ela vai tirá-lo quando estiver pronta. Nós respeitamos as
histórias um do outro desde o começo, não posso ter esse tipo de
pensamento egoísta com um garoto que foi tão importante para ela.
— Vamos tentar em Nova York primeiro. Além disso, é o meu
trabalho de conclusão de curso, meu professor precisa estar presente —
informa e eu assinto. Essa é a sua segunda graduação. A primeira foi
licenciatura em Letras, por isso tem tanta facilidade para ensinar inglês.
Ayla melhorou consideravelmente sua pronúncia depois da metodologia
diferente da princesa.
— Nós estaremos com você. — Garanto-lhe. Ela sorri, levantando a
mão para o meu rosto. — Em qualquer cidade, em qualquer lugar, eu e Ayla
estaremos lá para prestigiar a nossa princesa.
— Shukran, amiri — murmura, o polegar acariciando minha boca.
— Nós vamos para o Ocidente de novo, papai? — Ayla interrompe
a nossa troca de olhares, nos fazendo rir da sua fascinação pelo Ocidente.
Ou talvez seja apenas porque Anna veio de lá e minha pequena está
completamente apaixonada por ela.
— Nós vamos, nour hayati. Anninha vai fazer uma exposição das
fotos que tirou aqui — explico.
— O que é uma exposição? — Franze a testinha, concentrada.
Eu e Anna passamos os minutos seguintes explicando para nossa
pequena curiosa o que é uma exposição. A temperatura já estava baixa
quando levantamos acampamento. A viagem de volta foi feita com Ayla
cochilando em meu colo sobre a sela. O dia atípico nocauteou a pequena
aventureira. A levamos para seus aposentos ao chegarmos ao palácio.
Cuidamos da sua higiene e a colocamos na cama.
Quando entramos em nossos aposentos, Anna anda em direção ao
banheiro, me lançando um olhar convidativo por cima do ombro.
— Uma banheira morna, honorável Alteza? — murmura com sua
voz rouca e safada.
— Pode apostar que sim, princesa. — Eu rosno, já começando a
segui-la. Então, meu celular toca no bolso do jeans. Eu rosno mais, puxando
o aparelho para fora. É Jalal. Estendo o indicador para Anna, solicitando um
minuto, e me dirijo para a sacada, já atendendo meu primo. — Fala, primo.
— Desculpe estar interrompendo. Sei que tirou o dia para Anna e
Ayla, mas surgiu algo que precisa saber, Amihaj. — Seu tom me tem atento
imediatamente.
— O quê? — inquiro, apreensivo.
— Um dos guardas abriu a boca e contou que o guarda para quem
Al-Shalleen havia entregue a carta destinada a você entregou-a para um
irmão guardá-la antes de morrer. — Agora isso é digno de nota. O guarda
que estava com a carta foi assassinado a tiros em sua casa enquanto dormia.
Mais um inocente pego por alguém que quer claramente apagar seus
rastros, o verdadeiro assassino de Yasmina. Meu tio e Jalal estão submersos
nessa investigação, mas até agora não havia surgido nada que apontasse
uma direção consistente.
— Me diga que já conseguiu pegar esse irmão, Jalal. — Eu peço,
ansioso.
— Infelizmente não, primo. — Seu tom é desgostoso. — Ele mora
numa vila próxima a Jawahra, mas a casa estava vazia quando chegamos
aqui.
— Você ainda está aí? — pergunto. — Revire tudo! Essa maldita
carta pode estar escondida aí!
— Eu tenho um palpite que não, Amihaj. — Expira na linha. — Ele
deve ter lido o conteúdo depois que o irmão foi assassinado e fugiu
amedrontado.
Solto um som insatisfeito, impotente.
— Então precisamos encontrar esse homem, primo. Só ele pode
esclarecer essa merda e nos ajudar a prender o verdadeiro assassino. Eu
devo isso à família Al-Shalleen. Eles precisam ter sua honra reparada.
— Eu sei, Amihaj. Vou encontrá-lo, tem a minha palavra — promete
seriamente. — Estou voltando para o palácio agora.
— Está bem. Shukran, Jalal. — Agradeço e me despeço.
O sentimento de culpa se infiltrou dentro de mim sobre esse caso. A
carta revela o nome do verdadeiro assassino, meu tio e Jalal me
convenceram disso. Nós condenamos um homem inocente à morte. Eu o
condenei e me recusei a ouvi-lo quando pediu por uma audiência e agora
sua morte pesa sobre os meus ombros. A sua e do guarda que aceitou pegar
a carta. Respiro fundo, rogando a Allah que nos guie para a direção certa
dessa vez. Volto ao quarto, expulsando toda a tensão e angústia para não
preocupar Anna. Ela merece a minha melhor versão, sempre.
***
Anna Julia
Termino a chamada de vídeo com Ella e um sorriso permanece em
meu rosto. Ciara já ganhou peso em poucos dias, o rostinho rosado está
mais redondo e os olhinhos verdes bem espertos, me encantando através da
tela. Rico balbuciando no colo de Mike enquanto seu pai babava na esposa
e filhos. Eles são uma família linda demais. Ella tornou a garantir que me
ajudará com a exposição quando acabar seu resguardo e já estou animada
para mostrar todo o material conseguido com os beduínos. Sou suspeita,
mas as imagens estão incríveis! Eu guardo meu celular no bolso do jeans e
me preparo para ir até a biblioteca, onde Ayla está na aula de artes.
Coincidentemente, a campainha toca ao mesmo tempo em que alcanço a
porta. A abro e estaco, dando de cara com o visitante inesperado. Franzo o
cenho, encarando o tal sheik El-Baham.
— Minha senhora. — Me cumprimenta com uma mesura educada,
seu olhar me causando os calafrios que sempre sinto em sua presença. —
Perdoe-me por abordá-la dessa forma, mas será que teria tempo para uma
conversa?
— Uma conversa? Sobre o que exatamente, senhor? — inquiro
receosa e um tanto assustada.
O homem observa ao longo do corredor e volta o olhar frio para
mim.
— Na verdade, quero lhe mostrar algo. — Sua voz é mansa,
preocupada até, eu diria. — Estamos em reunião com Sua Alteza, como
deve ser de seu conhecimento. — Aceno, cada vez mais aturdida com sua
visita estranha. — Gostaria de acompanhar a votação do pedido de nosso
príncipe?
— Mulheres não são permitidas nestas ocasiões e, além disso, não
sou…
— A rainha. Minha senhora, ainda não é a sua rainha. — Ele
completa, os olhos brilhando com algo que não consigo decifrar. Só sei que
esse homem me dá medo. — Há uma entrada pelos fundos da sala, a
princesa pode usá-la se quiser.
— Por que está fazendo isso? — Me mantenho ainda dentro do
quarto, não confiando em estar perto do homem.
— Para que veja que as tribos são importantes para manter o
equilíbrio em nosso emirado. — Continuo confusa. — Sua Alteza está
prestes a desencadear uma guerra entre seu próprio povo para poder se
casar com a senhora.
Meu coração começa a saltar, e não de uma forma boa. — Por isso,
estou convidando-a para ir lá e ver com seus próprios olhos como tudo pode
sair do controle caso meu senhor não siga as tradições com um casamento
de Estado.
— Não. Ele não tomará uma segunda esposa. — Minha voz sai
aflita. Será que nunca me livrarei dessa ameaça?
O sheik aperta os lábios e meneia a cabeça.
— Ele terá que fazer, minha senhora. Não é um ponto negociável
com as tribos.
— Por que está aqui na minha porta? Eu não quero escutar isso —
retruco, tentando fechar a porta. Ele impede.
— Porque estou contando com o bom senso da senhora para
convencê-lo a tomar uma segunda esposa, pela paz de Kamar — o sheik
diz, seu tom inalterado e parecendo genuinamente preocupado.
— Deixe-me adivinhar: sua filha? — Atiro, levantando meu queixo.
— Não, minha senhora. A escolha cabe à Sua Alteza — diz ainda
calmo. — Mas neste momento ele precisa da sua compreensão.
— Não estou entendendo…
— A senhora precisa entender e aceitar os costumes do país de seu
futuro marido. Nosso príncipe não quer cumprir o dever porque claramente
está apaixonado e não quer magoá-la impondo uma segunda esposa. — Seu
olhar segura o meu, sério quando afirma: — Cabe à senhora chamá-lo à
razão antes que uma tragédia aconteça. A casa Al-Abdallah entrará em
desgraça caso ele insista ir contra as tribos. Perder o apoio dos clãs é a ruína
de um governante.
Eu engulo em seco. Odiando esse homem por vir aqui me dizer
essas coisas. Karim tem andado muito preocupado e sei que é por causa do
iminente enfrentamento com as tribos. Ele pode mesmo perder seu trono se
insistir em se casar comigo? A pergunta corrói minhas entranhas. O sheik
percebe meu abalo e torna a falar:
— Sim, princesa, ele pode perder o trono. Cada clã abrange uma
vasta região de Kamar e, se dois ou mais se juntarem numa guerra contra a
casa Al-Abdallah, não só Sua Alteza, mas a família inteira, será dizimada.
Eu engasgo. Meu corpo inteiro gelando. Não. Oh, meu Deus.…
Não. Lágrimas brotam em meus olhos e eu pisco, sentindo um aperto
horrível comprimindo meu peito.
— Eu devia dizer a Karim que está aqui, me atormentando com
essas histórias. — Tento não mostrar abalo, mas ele já viu minha fragilidade
e dúvidas.
— Tem todo o direito de ficar desconfiada, minha senhora. —
Continua ainda no tom irritantemente calmo. — Mas insisto, vá até lá e veja
como Sua Alteza está indo por um caminho que pode levar à sua ruína.
— Não. Eu não confio no senhor — digo, ainda tentando não lhe dar
ouvidos.
— Entendo perfeitamente o seu receio. — Acena. — Todavia, se
quiser ir conferir a votação, pegue o corredor à direita do escritório de Sua
Alteza e siga até o final… — O homem continua dando as coordenadas
para uma espécie de esconderijo nos fundos da sala de reunião. Me
pergunto se Karim sabe que o sheik está tão à vontade no palácio que já
conhece esses atalhos. Confere o relógio caro em seu pulso e adiciona: — A
reunião será retomada em poucos minutos. Pense no que lhe falei, princesa.
— Com uma reverência, ele se despede e toma seu caminho de volta.
Eu fico estática por uns instantes. Respirando irregularmente,
minhas mãos suando, abalada por tudo o que ouvi do homem assustador.
Não quero ir lá. Parece que estou fazendo algo errado, bisbilhotando uma
reunião para a qual não fui convidada. Porém, o sheik conseguiu plantar a
angústia dentro de mim. Decido ir e, antes que perca a coragem, marcho
para o elevador.
Alguns minutos depois, ando pelo corredor à direita do escritório de
Karim. Suspiro aliviada quando alcanço o final, não vendo ninguém para
me flagrar entrando sorrateiramente pela porta estreita. De acordo com o
sheik, leva aos fundos da sala onde está acontecendo a reunião. Está escuro
quando entro e vejo uma parede de madeira com detalhes vazados,
lembrando um confessionário. Dá para ouvir as vozes dos homens e, me
aproximando mais, observo através de uma das pequenas fendas. Karim
está de pé, lindo em seu traje formal, ladeado por seu tio e primos. Vejo o
pai de Latyfa entrar na sala e logo os líderes se reúnem ao redor da grande
mesa oval. Dá para sentir a tensão pairando no ambiente.
— A sessão está retomada, senhores. — O tio Jafar se adianta. —
Votaremos o pedido de Sua Alteza, respeitando a faixa etária de nossos
honrados sheiks.
— Eu e minha casa sempre servimos aos Al-Abdallah com honra.
— Um senhor, que deve ser o mais idoso do grupo, se levanta e faz uma
reverência respeitosa para Karim. — No entanto, não posso votar a favor de
Sua Alteza subir ao trono solteiro. Ainda mais sabendo que está em seus
planos tomar uma moça estrangeira como esposa, nos impondo uma rainha
que não escolhemos, que nada conhece da nossa cultura.
Meu coração afunda com o desprezo claro nas palavras e tom do
homem. Observo Karim. Vejo apenas seu perfil, mas seu maxilar trinca e
seus ombros expandem, mostrando o quanto a negativa do ancião o
desagradou. No entanto, ele não diz nada. Acho que é de praxe ouvir a
votação primeiro para replicar depois. Um a um, os líderes vão se
levantando e votando contra. Apenas El-Baham vota a favor, e me pergunto
se o homem está sendo sincero. É um massacre. Meus olhos estão ardendo,
cheios de lágrimas amargas. Eles não me querem aqui. Todos eles proferem
palavras de ofensa e preconceito contra mim. Como podem fazer isso? Nem
me conhecem. Não estão nem mesmo me dando a chance de mostrar quem
sou, que amo o seu príncipe, que faria qualquer coisa para poder estar ao
lado dele.
— Meu voto é não, meu senhor. — Outro diz. Eles são todos uns
hipócritas! Se inclinando, seus tons respeitosos, quando o estão soterrando
com suas malditas tradições.
— Eu também voto não, amiri. — Um mais novo diz. — Deve
seguir a honradez de sua casa e tomar uma mulher de nosso povo como
esposa. Essa princesa ocidental não merece qualquer respeito da nossa
parte, sendo a sua concubina, meu senhor.
E as lágrimas rolam pela minha face, quentes, dolorosas de
vergonha. Ele acabou de me chamar de prostituta do rei, como Latyfa fez
antes. E, então, percebo que jamais serei aceita por essas pessoas. Dói ouvi-
los me diminuindo porque sou uma estrangeira. Eu coloco a mão na boca
para me impedir de soluçar alto.
— Retire suas ofensas, sheik Malik. — A voz de Karim soa
estrondosa na sala. — Peça desculpas por ofender a minha mulher. Agora.
— Lhe devo respeito, Alteza. — O homem continua, parecendo
ultrajado. — Mas não para essa concubina disfarçada de princesa. Ela está
se deitando com o senhor, vivendo em pecado, portanto não terá nenhum
respeito da minha parte.
Soluço baixo, engasgando com as palavras ainda mais
desrespeitosas. Me apoio na parede e choro baixinho aqui, escondida, me
sentindo suja, indesejada.
— Prenda-o, Jalal! — Karim brada, cerrando os punhos. Sua
expressão é irada para o homem que me ofendeu. Jalal parece hesitar no
primeiro momento, então Karim volta a bradar: — Prenda-o, agora!
A sala inteira entra em comoção, muitas exclamações estupefatas, os
homens falando rápido em sua língua. Eu choro mais, percebendo o que El-
Baham havia alertado se concretizando na minha frente. Karim será
prejudicado por minha causa. Ele está me defendendo acima de seu povo, e
isso eles não vão perdoar. Jalal anda até o tal Malik e o pega pelo cotovelo,
arrastando-o até a saída. Karim dá alguns passos ameaçadores, ficando mais
perto dos homens. Eles se entreolham, surpresos, mas visivelmente
insatisfeitos com a postura de seu príncipe.
— O sheik Malik responderá por ofensa à Coroa — informa, e há
uma série de expressões insatisfeitas entre os líderes. — Que votem contra a
minha moção, eu posso até aceitar. Não gosto, mas aceito. No entanto, as
ofensas à mulher que amo e escolhi para esposa, isso não dá para aceitar,
senhores. — Há um breve silêncio, e então ele prossegue: — Continuem
com o massacre, não se intimidem — diz ironicamente.
— Eu voto contra a moção, porém, posso apoiar a união de meu
senhor com a princesa Anna Julia. — Outro líder se levanta. Ele não me
ofendeu e me chamou pelo nome, todavia sinto um “mas” em sua oferta, e
ele vem a seguir: — Se amiri concordar em tomar uma segunda esposa no
casamento de Estado que as tribos almejam.
Torno a forçar um soluço para dentro. Eles estão encurralando o
meu príncipe. Karim torna a cerrar a mandíbula, sua postura exalando uma
ira contida a muito custo. Seu tio coloca a mão em seu ombro, como que lhe
dando um aviso para se controlar.
— Eu não vou fazer um casamento de Estado, senhores. Pensei ter
deixado isso claro através do sheik El-Baham. — Ele diz em tom plano,
mas posso sentir sua raiva e decepção.
El-Baham se levanta e o encara com preocupação. Me pergunto até
onde sua lealdade vai.
— Pense melhor, amiri. Talvez a princesa Anna Julia entenda e
aceite que Sua Alteza tem um dever com seu povo. — O homem assustador
diz no mesmo tom calmo que usou comigo.
Meu coração parece que para enquanto espero a resposta de Karim.
Minhas mãos suam mais, meu corpo inteiro está tremendo diante do que
estou vendo. Só agora tendo a dimensão exata de como funcionam as coisas
por aqui.
— Eu a amo. Nunca tomarei uma segunda esposa, isso iria
machucá-la demais. — Meu príncipe diz, sua voz mostrando certo cansaço.
Meus olhos voltam a se encher de lágrimas, vendo-o lá, sendo
derrotado porque se apaixonou por mim, porque nos apaixonamos. Meu
coração dói quando percebo que não posso fazer isso com ele. Não posso
fazê-lo perder tudo por minha causa. Choro mais, meus ombros sacudindo
sem controle e mordo minha mão para evitar chamar a atenção para cá.
— Então, pressinto que teremos conflitos, meu senhor. — Outro
líder fala, a boca achatada com desapontamento. — Tenho certeza de que
todos os clãs aceitariam essa sua princesa, mesmo não sendo nossa primeira
opção, se amiri não fosse contra a tradição de sua casa.
— Eu não vou voltar atrás. Me casarei com Anna Julia, a mulher
que escolhi e amo. — Karim torna a garantir no tom solene de governante.
— E saibam que a forma como estão olhando para mim e minha escolhida
agora será determinante para como os verei de agora em diante.
— Vossa Alteza está nos ameaçando? — O ancião pergunta,
mostrando desagrado.
— Não sou homem de fazer ameaças, senhor. — Karim diz
enganosamente calmo. — Estou lhes dizendo que a forma como estão
lidando com meu pedido hoje influenciará nossas interações futuras. Isso é
um fato.
— Não vamos mudar de ideia, meu senhor. — O ancião informa. —
E solte o sheik Malik. Ele não ofendeu a Coroa, visto que a princesa ainda
não é sua esposa oficialmente.
— Não vou soltá-lo. Não importa se não oficializamos ainda, ela é a
minha mulher e, como tal, exijo que a respeitem. — Karim rosna baixo.
Há um silêncio tenso na sala, então o sheik El-Baham propõe:
— Sugiro adiar a votação. — Encara cada um de seus pares. —
Vamos deixar Sua Alteza pensar com calma sobre nossa contraproposta e
daqui a quinze dias retomamos, concordam, senhores? — Os homens se
entreolham e depois de um tempo acenam, concordando. El-Baham leva a
atenção para Karim. — Concorda, meu senhor?
— Eu não vou mudar de ideia, sheik. — Karim se mantém firme.
— Nem os clãs, amiri. — O ancião, com o qual já antipatizei, torna
a falar. — O senhor precisa escolher o que é mais importante, Alteza. —
Meu corpo gela antecipando o que o velho odioso vai dizer. — Sentar-se no
trono, honrando seus ancestrais, ou levar a cabo a paixão por uma
estrangeira.
E eu não suporto ouvir mais nada. Não consigo mais ficar aqui. Eu
tropeço para fora, minha visão turva de lágrimas. O trajeto de volta aos
nossos aposentos é como um borrão. Eu entro alguns minutos depois e ando
direto para o closet. Minhas faces são banhadas incessantemente enquanto
pego minhas malas. Meu coração dói absurdamente a cada peça de roupa
que coloco dentro. Termino de arrumar tudo e fico olhando os volumes,
ainda não acreditando que a vida que sonhei com ele e Ayla não será mais
possível. Ayla, minha princesinha. Soluço alto, o som reverberando no
quarto. Não posso deixar seu pai fazer a escolha errada e destruir a sua casa,
sua linhagem. Eu não conseguiria viver com essa culpa, e Karim em algum
momento se ressentiria de mim. Preciso decidir por ele, por nós. Não era
para ser. Eu engasgo e escorrego na porta do armário, caindo sentada no
chão. Olho o diamante rosa em meu dedo e minha visão borra novamente.
Eu choro mais e mais, deixando o som sair, os soluços me sacudindo, a dor
rasgando meu peito por ter de me afastar do homem que amo com tudo que
tenho.
Não sei quanto tempo passou até que o escuto entrando no quarto e
me chamando. Não respondo no primeiro momento. Sua voz fazendo as
lágrimas voltarem a brotar com força total.
— Anna? — Ele está na porta do closet e levanto minha cabeça,
nossos olhares se encontrando. Franze as sobrancelhas ao ver o meu estado,
em seguida, o olhar vai para as minhas malas prontas e uma expressão
atordoada toma seu semblante para, em seguida, algo desesperado cintilar
em suas íris escuras. — Habibti, o que houve? Por que está chorando? E o
que são essas malas.…
— Nós precisamos conversar. — Minha voz sai nasalada de tanto
chorar e me levanto. Ando, limpando meu rosto, e passo por ele, que ainda
está sem ação, indo para o quarto. Atravesso o cômodo, parando perto das
imensas janelas. A paisagem do deserto me recepciona e me sinto morrendo
por dentro, sabendo que nunca mais verei isso. Nunca mais estarei aqui.
Viro para Karim. Nunca mais estarei com ele como sua mulher. Talvez
nunca mais o veja. — Eu amo você. — Eu choro, não conseguindo me
conter, e ele avança, o rosto torcendo com preocupação e medo.
— Eu amo você também, ‘amira — diz com voz tensa, seus olhos
apreensivos. Estendo a mão, pedindo-o para parar. — O que está havendo,
Anna? Por que está nesse estado, habibti?
Eu o observo, bebendo cada detalhe dele em trajes formais. Vou
guardar tudo na memória. A forma como os olhos escuros são bonitos,
penetrantes, sua pele morena, seu porte imponente. Ele nasceu para ser rei.
Nasceu para cumprir seu destino e eu não tenho o direito de desviá-lo.
— Estou indo embora, Karim. — Dizer essas palavras me matam, e
a sensação horrível se intensifica quando vejo o efeito delas no homem que
amo. Ele fica estupefato. Não diz nada no primeiro momento, apenas me
observando, confusão em seu rosto bonito. — Eu ouvi a segunda parte da
reunião.
— Como?! — pergunta ainda mais surpreso. — Como ouviu?
Pondero se conto sobre a visita de El-Baham, mas percebo que não
importa mais.
— Eu descobri a porta de acesso nos fundos da sala. — Realização
desce em seu rosto, sua mandíbula trincando. — Eu ouvi e vi tudo, Karim.
— Sinto muito que ouviu tudo aquilo, ‘amira. Eu não vou ceder, eu
não…
— Eles jamais irão me aceitar, habib. — Choro, abraçando a mim
mesma, me sentindo tão desamparada e desiludida. — E não vou deixar que
me escolha acima de seu povo. Não conseguiria viver com isso, sabendo
que lhe tirei do trono.
— Eu não vou perder o trono, Anna. — Ele tenta se aproximar de
novo. — Eles terão que aceitá-la.
— Não, por favor, fique aí — peço com o coração pesado, doendo
demais olhar para ele. — Eles não vão ceder também. Pelo que ouvi, as
tribos estão dispostas a entrar em conflito com você e sua família, Karim.
Eu não posso mais ficar aqui, fingindo que não estou te destruindo.
— Pare com isso, por favor! Você é o meu amor. — Ele arranca o
turbante, jogando-o sobre um dos sofás. — Você me fez querer viver de
novo, ‘amira. — Seus olhos ficam brilhantes de lágrimas. — Perder você
vai me matar, é isso que quer, Anna? Isso sim me destruiria, ficar sem você.
— Não faz assim. — Torno a pedir, novas lágrimas queimando
minhas faces. — Não posso mais ficar. Não posso ser a responsável pelo
caos que está prestes a se instalar. Não posso. — Inconscientemente, toco a
minha corrente e fecho os olhos.
— É disso que se trata? — Sua voz sussurrada me faz encará-lo. Ele
tem o mesmo tom cansado que ouvi na reunião. Seu rosto é uma mistura de
devastação e um pouco de raiva. — É por causa dele, não é? — Aponta
para meu colar e me afasto um pouco, surpresa com essa pergunta e a
carranca descendo em seu rosto.
— O que está dizendo? — pergunto atordoada.
Karim sorri amargamente.
— Você não me ama o suficiente, Anna. Seja sincera e me conte a
maldita verdade! — Cerra os dentes, os olhos mais brilhantes. Ele passa as
mãos pelos cabelos soltos.
— Como não o amo o suficiente? Eu te amo tanto que estou abrindo
mão de você para que cumpra o que é esperado pelo seu povo! — digo de
volta, alterada, desolada.
— Não. Você o ama mais. — Uma lágrima rola pela sua face e ele a
afasta, irritado, os olhos duros e magoados cravados nos meus. — Você é
uma mentirosa, princesa. Me enganou com suas declarações vazias, mas
nunca tirou esse colar porque é a ele que ainda ama! Fale a maldita verdade
para mim ao menos agora, porra!
Suas palavras são como tapas na minha cara. De onde vieram essas
acusações? Ele estava se sentindo assim o tempo todo e não me falou nada?
— Não manche a nossa história com essas acusações, por favor —
murmuro, embargada, sentindo minha garganta fechando com o bolo se
formando nela.
Mágoa brilha em seus olhos bonitos e ele balança a cabeça,
negando.
— Você é a única manchando nossa história, princesa. — Seu tom é
duro. — Se for embora agora, eu nunca vou te perdoar por me deixar.
Minhas faces são queimadas com mais lágrimas e eu soluço,
querendo mais do que tudo me jogar em seus braços e nunca precisar partir.
Mas não posso. Isso o destruiria. Melhor tê-lo zangado e magoado agora,
mas ainda mantendo a paz em seu lar. Meu coração está comprimido, se
negando a aceitar o que meu lado racional sabe que é o único caminho. Eu
sou apenas uma forasteira.
— Eu não vou voltar atrás — digo com voz tremente. Seu maxilar
cerra, lágrimas descendo em sua face e ele me encara por longos e
dolorosos instantes. Então, gira nos calcanhares e começa a andar em
direção à porta. — Me perdoe, amiri. Eu vou te amar para sempre.
Karim para e torna a fechar os punhos, tensão emanando do seu
grande corpo. Me lança um olhar magoado por cima do ombro.
— Me desculpe, mas não dá mais para acreditar nisso — diz me
matando por dentro. — Apenas vá e prove que todos estavam certos, você
não passa de uma princesinha mimada, que provavelmente está sentindo
falta dos holofotes sobre si.
Ele sai apressado e eu caio no chão, um choro convulsivo me
tomando.
— Sinto muito, meu amor. Sinto muito — murmuro uma e outra
vez.
Eu fico assim por um tempo, mas sei que preciso sair. Preciso me
despedir de Ayla. Ligo para Jalal, solicitando um carro para me levar ao
aeroporto. Ele está tenso, mas me garante que haverá transporte e que o jato
real irá me levar. A princípio penso em recusar por não querer enfrentar as
memórias recentes de minha viagem a Londres com Karim e Ayla, mas
acabo aceitando por não querer enfrentar o movimento no aeroporto num
voo comercial. Meus olhos vermelhos e inchados agradecem. Quando
desligo, vou até o quarto de Ayla. Não é uma despedida fácil. Ela chora e eu
também. Nos agarramos e eu a levanto em meus braços, inalando seu
cheiro.
— Eu amo você, querida — murmuro embargada, afundando meu
rosto em seus cabelos.
Ela aperta meu pescoço, seu pequeno corpo sacudindo com os
soluços.
— Não vá embora, Anninha. Por favor, habibti. — Sua súplica corta
meu coração. Mas não há outro jeito.
— Eu preciso ir, habibti — digo, olhando seu rostinho banhado de
lágrimas. Encosto minha testa na sua e choro copiosamente. — Seja uma
boa menina. Cuide de seu papai para mim, está bem?
Ela acena e nos abraçamos um pouco mais. Nuria entrou no quarto e
nos despedimos também. Deixei abraços para Jalal e Zafyr, então, segui
para o aeroporto.
Cerca de vinte minutos depois, eu observo a paisagem desértica
passando através da janela da limusine. Quando estava entrando no carro, vi
Karim ao longe, na janela de seu escritório, na ala oeste. O orgulho não o
deixou insistir para eu ficar e agradeci. Ele precisa seguir em frente e
cumprir o seu dever. Quanto a mim, vou sofrer com mais um amor perdido,
só que dessa vez a dor é diferente porque ele está vivo. Apenas não pode ser
meu. Minha visão turva novamente. Pego meu celular na bolsa e decido
deixar uma mensagem de despedida.
Oi, amiri.
Sei que está com raiva de mim e não entende minha decisão. Mas
peço que nunca duvide do amor que sinto por você, por Ayla. Ele é imenso.
Meu coração está esmagado porque sonhei em ter vocês para mim.
Todavia, não podemos ir contra a realidade, habib, e a nossa é esta. Seu
destino é subir ao trono e honrar sua linhagem. Eu vou acompanhar e
torcer por você, mesmo de longe.
E sobre o colar… Estava esperando chegar em casa para guardá-lo
na caixa junto com as cartas de Nate. Ele sempre será o meu garoto
especial, mas você, Karim, é o meu homem especial. Eu vou guardar nossos
momentos em meu coração, para sempre. Seja o melhor rei que Kamar já
viu, habib. Eu amo você, amiri.
Anna.
Clico em enviar e sinto as lágrimas quentes em minhas bochechas.
Guardo o aparelho na bolsa de mão e limpo meu rosto, resignada. O som
está ligado tocando o ritmo árabe e pego minha câmera, me obrigando a me
distrair, registrando o caminho. Cada vez que olhar para essas fotos, sentirei
essa mesma dor. Jamais abrirei meu coração para outro homem de novo.
— Eu vou te amar para sempre, amiri. — Murmuro, perdida em
minha dor. Então, percebo cavalos se aproximando pelas laterais do carro.
Meu coração dispara, medo percorrendo minha espinha dorsal quando vejo
que os cavaleiros têm os rostos encobertos, como os que me sequestraram.
— Oh, meu Jesus! — Ofego, vendo uma espécie de van vindo em nossa
direção pela frente, forçando o motorista e segurança a frear bruscamente.
Eu puxo meu cinto e caio para o assoalho do carro, quando os tiros
começam.
— Fique aí dentro, princesa! Não saia por nada! — O outro
segurança, sentado no banco do passageiro, grita, sacando sua arma. Mais
tiros, e me atrevo a olhar para fora através dos vidros escuros. Os homens
estão descendo dos cavalos e vindo para perto. Mesmo com a adrenalina me
invadindo, eu os observo à procura de algo que os identifique e percebo que
um deles tem uma tatuagem no dorso da mão direita. É uma cobra naja. Em
seguida, noto mais alguns com a mesma insígnia. A coisa feia, com as
presas salientes de fora. Dá uma sensação ruim só de olhar. Eles podem ser
identificados por essas tatuagens? Meu Deus, espero que sim. Eu aproveito
que eles não podem me ver e tiro algumas fotos de corpo inteiro, e depois
focando apenas as mãos.
— Eu fui atingido! Wallah! — Olho o motorista gritando, segurando
a barriga, se curvando, evitando levar mais balas. Logo seu parceiro
também geme de dor e se curva, se sentando no assoalho do carro.
— Eles vão pegá-la! Há muitos deles, meu senhor! — Ouço o
motorista falando ao telefone. Com Karim? Não, provavelmente Jalal, que é
o chefe da guarda. Terror absoluto me engolfa quando mãos enormes batem
no vidro traseiro. Eles me descobriram. Oh, meu Deus! Aproveitando
minha posição agachada, enfio minha câmera debaixo do banco do
motorista, torcendo para que quando Jalal vier ou mandar alguém,
consigam encontrá-la. É com horror que vejo as portas da frente sendo
arregaçadas brutalmente e, em seguida, os seguranças machucados são
arrastados para fora. Meu coração retumba no peito. Não os deixe morrer,
meu Deus. Eu imploro. Eles estavam me guardando. Os proteja, eu imploro.
Respiro aliviada quando não ouço tiros, apenas vejo os homens arrastando
os guardas para a areia na lateral do asfalto. Eles estão ensanguentados, mas
vivos. Que Jalal não demore a enviar resgate.
Então, meu pavor dobra quando é a vez das portas traseiras serem
forçadas a abrir. Uma mão grande enfia em meus cabelos e me arrasta para
fora, sem qualquer gentileza. Eu seguro um grito, não querendo dar o
gostinho de me ver apavorada para esses infelizes. Ele me empurra no
asfalto e caio de joelhos, silvando de dor, sentindo meu jeans rasgando e
minha pele se ferindo com o impacto.
— Seu infeliz! Eu vou acabar com você! — Sibilo, lutando para não
chorar, agora por outro motivo. Eu estou sendo levada de novo. E agora não
sei se terei tanta sorte como da primeira vez.
— Me disseram que ela era assim, altiva… — O grandalhão ri alto,
jocoso, os outros seguindo-o. — Talvez o chefe deixe nos divertir um pouco
com a prostituta de Sua Alteza. Que tal, rapazes?
Bile sobe à minha garganta com a insinuação e ofensa do bandido.
Oh, meu Deus, não deixe que eu morra assim!
— Você devia ter ido embora quando teve a chance, princesa. — Ele
tira algo do bolso. Eles estão usando calças normais. É uma seringa. Eu o
chuto quando chega perto, o que só o faz rir mais. Faz um gesto com a
cabeça e logo dois comparsas agarram meus braços, me virando de bruços,
meu rosto machucando no asfalto quente. — Bem-vinda ao deserto, Alteza!
— O imbecil zomba e não posso mais frear as lágrimas. Vou morrer aqui.
Eu só queria poder ver o rosto de Karim outra vez.
Eu vou te amar para sempre, amiri. Esse é o meu último
pensamento antes da picada dolorosa em meu pescoço.
CAPÍTULO TREZE
“Nada pode ficar entre nós. Você e eu. Nem mesmo os deuses lá em cima
podem separar nós dois. Não, nada pode ficar entre você e eu. Oh, você e
eu…”
(One Direction – You & I)
Anna Julia
Abro os olhos, momentaneamente confusa. Tento me mover, mas
percebo que estou contida, minhas mãos amarradas atrás das costas, deitada
contra um chão duro, frio e fétido. Mesmo com a confusão, as lembranças
vão voltando e minha respiração trava ao recobrar o momento em que
cercaram a limusine e me sequestraram. Seguro um gemido angustiado. O
lugar está escuro, não consigo ver nada, mas isso não quer dizer que não
haja um ou vários bandidos por perto. Tento controlar o pânico e regularizar
minha respiração, enquanto apuro a vista, procurando enxergar algo, uma
pista de onde estou. Uma fresta na parede deixa passar um feixe de luz e
isso ajuda minha visão a se adaptar ao ambiente. Parece uma espécie de
alojamento e noto que está muito frio também. Movimento as pernas e um
pouco de alívio me toma, não sentindo nenhuma restrição. Me arrasto, me
posicionando sentada, e olho tudo com mais atenção. O teto é baixo e o
formato do cômodo é um retângulo. Me arrasto, apoiando as costas na
parede mais próxima. Sinto o frio em minhas costas, a parede é de metal.
Isso é um contêiner?
Minha boca está seca, muito seca, minha cabeça latejando, o que me
lembra da seringa, a agulha no meu pescoço. Os malditos injetaram drogas
em mim. Ouço vozes se aproximando e congelo, meu coração batendo de
pavor. Oh, meu Deus, eles estão voltando! Pense rápido, Anna! Pense! Eu
volto imediatamente à mesma posição de antes e fecho os olhos, tentando
regularizar a respiração e não dar pistas de que estou consciente. A porta se
abre e as vozes se misturam com choramingos. Espera, choramingos de
crianças. Meu coração corre mais depressa. Eles sequestraram crianças
também? Isso é muito baixo.
— Parece que a princesa ainda está nocauteada. Tem certeza que
não exagerou na dose? — Ouço uma voz jocosa, enquanto algo cutuca a
minha perna. Algo duro… Tento não entrar em pânico porque parece o cano
de uma arma.
— Essas princesinhas ocidentais… — A voz já conhecida bufa em
desdém. É o grandalhão que me puxou de dentro do carro e jogou no asfalto
sem qualquer cuidado. Ódio mortal ferve dentro de mim, rivalizando com o
medo. — Deixe a vadia. Melhor para ela acordar só na hora de morrer. —
Seu sorriso fica mais sinistro quando adiciona: — Ou com meu pau dentro
dela.
— Se você comer a vadia, eu quero também. — O outro fala e sinto
lágrimas queimando em meus olhos, horror ameaçando dominar meus
sentidos com os planos desses monstros para mim.
— Ainda preciso convencer o chefe a nos deixar foder a cadela. Dá
para acreditar nisso? O homem mata sua própria família, envenena qualquer
um que atravesse seu caminho, mas diz que tem certos “princípios”. — O
grandalhão zomba.
Minha mente começa a trabalhar, processando suas palavras. Quem
é esse homem asqueroso? Matou sua própria família? Oh, meu Jesus…
As crianças continuam choramingando enquanto ouço baques no
chão. Os malditos devem estar empurrando-os, sem qualquer cuidado,
como fizeram comigo. Estes não estão para brincadeira. Os primeiros que
me sequestraram não tinham esse nível de crueldade, acho. Pelo menos não
senti essa energia sinistra emanando dos outros como estou sentindo agora.
— Calem a boca, porra! — Outra voz irritada soa. Eles são muitos,
percebo em agonia. Dificilmente escaparei daqui com vida.
— Cara, não gosto de sequestrar crianças. — Mais uma voz vem na
escuridão. — Eu tenho irmãos pequenos…
— Você não vai chorar, vai? — O grandalhão zomba e ouço o som
de um tapa. — Concentre-se no objetivo final, seu veadinho! Nesse
momento, nosso chefe está articulando para explodirem os conflitos entre
os clãs e o príncipe. O sequestro e morte desses meninos serão colocados na
conta de Sua Alteza, caso o imbecil continue recusando um casamento de
Estado.
Oh, meu Deus! Oh, meu Deus.… É uma luta não fazer nenhum
barulho ao ouvir as revelações sombrias. A armação para Karim.
— O príncipe será morto se continuar a se recusar a cumprir com a
porra do seu dever. — Meu coração para, lágrimas silenciosas escorrendo
por cima do meu nariz. Aperto meus olhos com força, rogando a Deus que
não deixe isso acontecer. — A casa Al-Abdallah pode estar com os dias
contados.
— E a princesa? Precisamos mesmo matá-la? — Soa a mesma voz
que declarou não gostar de sequestrar crianças. Fico alerta, guardando-a na
memória para, quem sabe, me aproximar de seu dono em algum momento.
— Já derramamos sangue demais. Podemos libertá-la quando o príncipe
ceder…
Ouço um novo tapa cortando a fala do rapaz. Seu tom sugere que é
um jovem, presumo. E raiva me inunda, me vejo tomando suas dores
porque não parece tão ruim quanto seus companheiros.
— Vamos fazer o que o chefe ordenar, está entendendo? — A voz
do grandalhão soa ameaçadora. — Quem não está do nosso lado está contra
nós.
Não há mais reclamações depois desse ultimato.
— Quem bom que entendeu, primo. — O idiota debocha e
acrescenta: — Nassif ficará de guarda lá fora. O dia não vai demorar a
amanhecer e logo voltaremos.
— Posso ficar de guarda e… — O que nos defendeu ainda oferece.
— Não. Você é mole demais, seu mijão. — O imbecil continua
zombando do rapaz, e lá se vão minhas esperanças de me aproximar dele.
Não temos muito tempo. — Só vamos encontrar o chefe na nossa sede e
juntar mais homens, nos preparar para a guerra. Você vem comigo. Não me
faça arrepender de ter te trazido para o meu lado.
Depois disso, eles saem e permaneço quieta até não ouvir mais
vozes. Já é noite, madrugada, de acordo com o infeliz. Por isso, está tudo
tão escuro aqui dentro. Dormi o dia inteiro e parte da noite. Me deram uma
dose muito forte da droga. Torno a me arrastar na posição sentada, me
recostando à parede. Eu forço as mãos, testando as amarras. São cordas e
estão bem apertadas. Então, toco algo em meu pulso que me traz algum
alento: meu relógio. Ele tem um dispositivo de GPS que vai dar a minha
localização precisa. Suspiro, a euforia murchando um pouco. Não me
recordo de dizer a Karim sobre isso, e se ele não entrou em contato com
meus pais ainda, nunca saberá que posso ser rastreada. Minha garganta está
muito seca, preciso de água.
Forço minha mente a se acalmar tanto quanto é possível numa
situação dessas, e penso numa forma de atrair o vigia para dentro. Eu
poderia ao menos tentar aplicar alguns dos golpes de autodefesa que Karim
me ensinou nas últimas semanas. Se conseguisse pegar sua arma, ajudaria e
muito. Não sou nenhuma campeã de tiros, mas já estou razoavelmente boa.
Tenho de pensar em várias frentes aqui. Não é uma situação em que posso
hesitar. Preciso agir, tentar escapar daqui, e logo. A noite nos ajudará a
camuflar. Sim, porque não vou deixar essas crianças aqui à mercê dos
bandidos. Eu tenho de rir para a minha audácia, já contando que vou
escapar. Engulo em seco, uma parte minha se borrando de medo, mas a
outra parte, a que quer sobreviver, está gritando para a outra ficar quieta e
deixá-la tomar as rédeas. Olho em direção às crianças, amontoadas num
canto. Então, uma ideia surge…
— Qual o mais velho entre vocês? — sussurro em árabe, apurando a
vista para divisar algo além das pequenas silhuetas e murmúrios no escuro.
Eles param o choro na hora e o silêncio reina.
— Eu, senhora. Tenho quinze anos. — Uma voz de adolescente
sussurra e tento enxergá-lo, mas não consigo nada além de um vulto branco.
— A senhora é a princesa ocidental?
Esperança borbulha dentro de mim. Se o garoto topar me ajudar,
podemos sair todos juntos daqui. Não gosto de arriscar uma criança, mas é
isso ou esperarmos pela nossa morte, já anunciada ainda há pouco.
— Sim, sou Anna Julia. Qual é o seu nome, pequeno? — Tento ir
devagar para não o assustar com minha ideia.
— Youssef, senhora. — Ele murmura de volta. Sua voz é firme,
percebo. Não está tão aterrorizado quanto os outros menores. Isso é um
bom sinal.
— Vocês são quantos? — Continuo a rodeá-lo.
— Somos nove. Eles pegaram um filho de cada tribo. — O menino
diz. Noto que sua voz treme um pouco, mostrando que está abalado, afinal.
Não o culpo. Eu também estou aterrorizada, mas não posso me permitir
ficar aqui parada, esperando a morte.
Agora o plano revelado pelos bandidos faz sentido. Essas crianças
pertencem aos clãs tribais e quem quer que seja o mentor por trás disso
tudo, realmente vai fazer com que Karim pareça culpado. Relembrando a
tensão daquela reunião, os líderes não duvidarão. Isso não pode acontecer.
Torno a rogar a Deus que não permita que tamanha atrocidade aconteça.
— Youssef, não temos muito tempo até aqueles homens voltarem…
— Torno a falar, adrenalina começando a me percorrer. — Escute o que
estou pensando, por favor. Nós dois precisamos trabalhar juntos para
conseguirmos sair daqui. — Lambo os lábios ressequidos pela falta de água.
Estou sentindo os efeitos da droga, mas agora sei que também é falta de
hidratação pelas tantas horas que estou sem beber. — Está amanhecendo,
pelo que os malditos disseram. Não há tempo. Precisamos agir agora.
— Como, senhora? — O garoto deixa transparecer a urgência e o
medo em sua voz.
— Vou atrair o vigia aqui para dentro. Estou com sede e vou usar
isso para ter o homem perto de mim. Uma vez que minhas mãos estão
amarradas, ele precisará me dar água na boca — murmuro. — Seus pulsos e
pés estão contidos?
— Apenas as mãos, senhora — responde com uma nota de
desconfiança.
— Ótimo! Eu sei que é difícil, mas procure ficar calmo. Vamos
fazer assim… — Sussurro, forçando meu tom a lhe passar confiança e
explico devagar meu plano para dominarmos o vigia.
— Eu não sei se consigo, senhora. — O garoto soa em pânico.
— Consegue, Youssef. Precisamos tentar ou seremos todos mortos.
Você ouviu os planos deles para nós — digo com meu coração na garganta.
— Eles vão voltar, e quando o fizerem, será para nos matar. — Os
choramingos dos menores recomeçam e me desespero. — Não, pequenos,
eles não vão nos encontrar quando voltarem. Estaremos longe. — Tento
contê-los. — Youssef, por favor, os acalme. Nós vamos sair daqui se
trabalharmos juntos. É a nossa única chance.
Faz-se um silêncio angustiante.
— Está bem, senhora. Eu vou ajudá-la. — Ele diz e eu expiro.
Novo silêncio se segue enquanto meu cérebro tenta enviar os passos
do plano para meus nervos, para que se controlem. Respiro fundo. Oh,
Jesus, é agora. Tem de ser agora.
— Tem alguém aí? Por favor, estou passando mal. — Minha voz
nem precisa de encenação, está fraca; medo, fome, sede debilitando meu
corpo. — Preciso de água. Por favor! — Ouço um resmungo e em seguida
silêncio. Volto a implorar: — Por favor, apenas um pouco d’água!
Depois de uns instantes, um homem abre a porta e a deixa assim,
permitindo a luz da lua entrar no recinto. Meu coração salta com força,
agradecendo a Deus por essa bênção. Com a claridade, podemos enxergar
melhor o nosso captor. Não olho na direção de Youssef para não dar
bandeira, continuo recostada à parede, passando uma imagem pior do que
realmente estou. O homem deixa seu fuzil modelo AK-47 encostado na
parede, perto da entrada, e vem para perto com uma garrafa de água
mineral. Ele se abaixa e meu olhar capta uma arma presa no coldre em seu
tórax. É uma 9 mm, estou familiarizada com essa. Há uma faca presa em
seu cinto também. Seu rosto está encoberto, como os primeiros que me
sequestraram. Só que a maldade nos olhos escuros deste faz um arrepio
gelado descer pela minha coluna. Ele pega meu queixo e coloca o gargalo
na minha boca. Eu abro, meus olhos se enchendo de lágrimas ao sentir o
líquido refrescante descendo pela minha garganta. Ele sorri, o som
desdenhoso, despejando mais em minha boca, quase me afogando. Eu
tusso.
— Nessas horas a princesinha dá valor a um simples gole d’água,
não é? — Ele zomba, a voz desconhecida. Não é mesmo o outro que não
queria me matar. Me sinto menos mal pelo que estou prestes a fazer com
este. O homem retira a garrafa da minha boca e sua mão apalpa meu seio
direito. Eu engasgo, mais lágrimas ardendo em meus olhos. Estas, de
ultraje. — Eu vou comer sua boceta aristocrática, sua cadela. — Rosna e
bile sobe à minha garganta. Ele rasga a minha camiseta e abaixa o sutiã, as
mãos grosseiras amassando meus seios. — E vai ficar bem quietinha.
Quando os outros chegarem, você não vai falar nada, entendeu?
Eu fico paralisada por alguns momentos, enquanto o maldito me
molesta, tentando abrir meu jeans. Ele se agiganta sobre mim, abrindo as
pernas e, então, reajo em meio ao completo pavor de ser estuprada. Puxo
meu joelho para trás e solto o pé com toda a força da perna, num chute em
suas bolas. O grunhido alto me enche de raiva e repito o chute rapidamente,
atingindo-o de novo. Youssef vem para perto e puxa a faca que estava em
sua cintura.
— Filha da puta! — O estuprador de merda grunhe, tombando para
o lado, e eu me coloco de pé, Youssef se juntando a mim. Então, nós o
chutamos com força na barriga, na cara, não lhe dando chance de levantar.
— Seu monte de lixo! — Eu rosno, ira se juntando à adrenalina.
Dou um chute raivoso em sua cabeça, lançando-a para trás, e ele geme,
parecendo prestes a perder a consciência. — Vai aprender a não tocar nunca
mais numa mulher com essas mãos sujas, seu maldito! — Dou mais um
chute em seu queixo e o bandido enfim tomba, de olhos fechados. O
nocauteei. — Rápido, Youssef! Tente cortar suas cordas e depois as minhas!
Ele não vai ficar desacordado por muito tempo!
As mãos do menino estão amarradas à sua frente, graças a Deus! Ele
pega a faca pelo cabo e força a lâmina nas cordas, desajeitadamente. Eu
apenas olho, torcendo para que consiga ou estaremos fodidos quando esse
monte de lixo acordar. Enquanto isso, me abaixo e me contorço, puxando a
9 mm do coldre do homem abatido no chão. Coloco-a sobre uma pequena
mesa, que agora é visível com a luz entrando pela porta. Youssef consegue
se libertar e sorrimos os dois. É um riso desesperado, ainda não totalmente
aliviado porque sabemos que não temos muito tempo. Ele empurra a lâmina
afiada em minhas cordas. O homem no chão geme e meu coração salta, mas
o último elo se parte, e então eu pego a 9 mm e aponto para a cabeça do
maldito.
— Não ouse se mexer, filho da puta! — Ele abre um olho inchado
dos nossos pontapés e então o arregala, espanto tomando sua íris escura. —
Vire-se de barriga para baixo e coloque as mãos nas costas. Meu amigo vai
amarrar seus pulsos. — Ele tenta rolar e alcançar Youssef e eu atiro em sua
perna.
— Porra! Sua cadela, você atirou em mim! — Urra de dor, as mãos
indo para o ferimento na coxa. Eu tremo, o medo, a adrenalina zumbindo
em meus ouvidos. Meu Jesus! Atirei em um homem! Por um momento
estou perto de hiperventilar, mas forço o pânico a retroceder. Depois posso
cair, desmaiar, vomitar, como na primeira vez que passei por isso. Bem, não
exatamente dessa forma, visto que aqueles homens não me fizeram nenhum
mal e nem ameaçaram me violentar. Há uma diferença entre aqueles
insurgentes e estes.
— O próximo será nessa sua cabeça cheia de merda, seu maldito! —
Ranjo os dentes. Ele está estupefato, posso ver o medo em seus olhos. —
Vire-se, eu não vou falar outra vez!
Com um olhar mortal, ele se vira e leva as mãos para trás das costas.
Youssef se aproxima, meio relutante, mas o amarra, reaproveitando as
cordas que estavam nos prendendo. — Amarre os pés também, Youssef. —
Oriento e o bandido me dá mais um olhar feio. — Foi um erro deixar
nossos pés livres, como já deve ter percebido. — Eu zombo, ainda muito
irada com esse infeliz que ousou colocar as mãos sujas em cima de mim.
Quando Youssef termina, me encara. — Reviste todos os seus bolsos,
amigo. Pegue tudo. Ele não pode se libertar para nos perseguir. — Torno a
orientar e o garoto olha tudo, encontrando mais dois canivetes e uma arma
menor que não me recordo o nome. — Pegue-a. Você sabe atirar? —
pergunto e o menino assente.
Respiro um pouco mais aliviada.
— Nós vamos conseguir sair daqui. O príncipe já deve estar me
procurando. — Bem, assim espero. — Vamos desamarrar os outros e sair o
quanto antes.
Nós libertamos todos os pequenos, que ainda estão com olhares
assustados, as roupas sujas.
— Quando os pegaram? — pergunto a Youssef.
— De manhã. — O menino está olhando para mim como se eu fosse
alguma heroína, os olhos escuros brilhando de admiração. — Shukran,
minha senhora.
Olho-o mais detidamente. É franzino, o rosto fino, bonito, ainda
com aparência de menino. Sorrio-lhe.
— Obrigada você também. Sem sua ajuda não teríamos conseguido.
Agora vamos. — Ajeito meu sutiã e blusa rasgada da melhor forma que
consigo e tomo a frente para a saída. A AK-47 me chama a atenção perto da
porta. Ela tem um coice forte como o de um cavalo, mas se quiser aumentar
nossas chances, tenho que usá-la. Não é hora para ser mulherzinha.
Decidida, enfio a 9 mm no cós da minha calça jeans e pego a arma
imponente. É pesada, e a possibilidade de eu ter que atirar em alguém com
isso me aterroriza. Ela é mortal. Até agora há pouco eu só havia atirado em
alvos e coisas inanimadas. Meu corpo ainda está tremendo. — Fiquem atrás
de mim. Não sabemos o que há lá fora. — Oriento e saio.
Quando piso fora, a brisa do deserto me bate no rosto. A sensação
de liberdade é gostosa, porém, não tenho tempo para apreciá-la. Há muitos
homens chegando, neste exato momento. Eu estaco, meu coração quase
saindo pela boca, me vendo sob as miras de suas armas, tão mortais como a
que estou segurando.
— Ora, ora, o que temos aqui… — O grandalhão que me hostilizou
diz num tom baixo e letal. Sua AK-47 apontada para mim. Meu sangue se
transforma em gelo. Meu corpo inteiro treme mais e mais. É o meu fim e
dessas crianças. O conhecimento disso faz meus olhos turvarem. O homem
sorri, um sorriso sinistro. — Me entregue essa arma, princesa, antes que
atire em seu próprio pé. — Debocha e uma onda de risos masculinos ecoa à
sua volta.
Meu sangue esquenta com a zombaria e preconceito com o meu
sexo. Eu levanto a arma, lutando para controlar o tremor em meus ombros.
Miro em sua cabeça e ele se afasta um passo, os olhos estreitando, a mesma
surpresa de seu comparsa dominado dentro do casebre tomando seus olhos
maus.
— Mande o resto da corja abaixar as armas ou estouro seus miolos,
seu filho da puta! — Rosno, mesmo sabendo que esse meu fim é aqui. O
conhecimento disso faz meus olhos transbordarem. Nunca mais verei as
pessoas que amo. É aqui o fim.
— Não sei como fez, mas deve ter se livrado do imbecil do Nassif,
se está de posse da arma dele. — Ele rosna, então, torna a sorrir, zombando:
— Mas duvido que consiga acertar um de nós com essa belezinha. Ela
exige controle e força, coisa que você, uma coisinha delicada, não teria.
Eu continuo mirando sua cabeça.
— Com uma cabeça desse tamanho, você é um alvo ambulante, seu
infeliz. — Debocho. Ele ameaça vir para frente. — Fique aí, seu maldito!
— Miro numa lata jogada na areia e meto bala. A lata se estilhaça para
todos os lados e ele para, os olhos arregalados. Eu sinto o coice do disparo
em meus ossos, mas me mantenho firme, voltando a mirar sua cabeça, com
rapidez. — A próxima vai derramar seu cérebro de merda no chão!
— Você é uma cadela corajosa, princesa. Tenho que admitir isso. —
Encara a casa atrás de mim. — Mas aqui é o seu fim, sabe disso, não é?
— Vamos explodir essa putinha! — Um deles fala, mas não tiro
minha atenção do líder.
— Mande-os largarem as armas ou te mato! Eu não estou blefando!
— Brado, lágrimas descendo pelas minhas faces.
Eles não obedecem. Devem estar vendo o medo em minha
expressão. Então, miram suas armas para mim e eu me preparo para ser
alvejada. Pai, mãe, Lipe, eu amo vocês. Karim… Adeus, meu amor. Eu
soluço, meu corpo sacudindo, o frio da morte me rondando. Levanto meu
queixo, me recusando a morrer como uma covarde. Nesse momento um
som alto, seguido de outro estrondo assustador, soam bem atrás deles,
levantando areia e jogando em nossa direção. Eu não conto história,
aproveito o momento de distração e corro de volta para a segurança do
contêiner.
— Se deitem no chão, meninos! Agora! — Grito para as crianças,
que estavam na porta, mas voltaram quando nos deparamos com o bando.
Me jogo no chão, imediatamente volto a segurar o fuzil em posição de fogo.
Agora a situação é diferente. Se vierem, vou derrubar alguns. Minhas
chances são maiores, embora me aterrorize ter que matar um ser humano.
A conversa que tive com Karim em uma das primeiras vezes que
treinei tiros com ele me vem à mente:
— O pensamento na hora da mira é para matar, habibti — disse
numa voz escura, de quem está preparado para lidar com a morte. —
Espero que nunca precise se defender contra outro sequestro de novo, mas
começo a pensar que é útil que minha mulher saiba manejar armas.
— E se eu não quiser matar meu oponente? — questionei,
apreensiva.
— Quando se parte para usar armas, é porque as opções civilizadas
se esgotaram, ‘amira. — Seu tom ficou mais sério. — A não ser que tenha
um bom motivo para deixá-lo vivo, em caso de combate direto, você não
pode hesitar. Seu inimigo não terá a mesma consciência que você, acredite
em mim. Você é mulher, tem aparência delicada, precisa ser letal. Não é
machismo, mas não dê a chance de seu inimigo encontrar uma fraqueza e
te dominar.
— Não vou hesitar — digo em voz alta, como que para me dar
forças para fazer o que for preciso. — O primeiro que vier, eu derrubo.
Os meninos estão choramingando de novo. Mais um barulho alto lá
fora. Parece o som de uma bomba. Não que já tenha escutado uma
estourando assim. Então, os tiros começam e meu coração salta
vertiginosamente, alegria me invadindo. Oh, meu Deus, meu resgate
chegou! Karim… Ele veio me salvar dessa vez também? Permaneço
deitada, em posição de abrir fogo, ouvindo os tiros, vozes alteradas. Os tiros
vão diminuindo até pararem completamente. Meu coração está quase
saltando para fora sem saber quem vai passar por essa porta.
— Anna? Você está bem?
Um soluço me escapa, meu corpo inteiro sacudindo de alívio ao
escutar a voz tão amada. Karim… Amiri. Eu choro, soluçando alto.
— ‘Amira… — Sua voz está angustiada, aliviada, urgente. — Fique
calma. Eles estão todos no chão. Vou entrar agora, está bem? — Anuncia e
pisa no batente da porta. Seus olhos vêm imediatamente para mim no chão,
ainda segurando o fuzil, meu rosto uma bagunça de lágrimas. Ele pragueja
em sua língua e se abaixa, retirando a arma da minha mão. Pega meus
ombros, me ajudando a levantar. Estou tremendo, parece que todo o terror
da situação caiu sobre mim de uma vez, o que é absurdo, uma vez que estou
salva. Seus olhos notam minha blusa rasgada e um brilho mortal tinge suas
íris escuras. — Eles te machucaram? Eles…
— Não, não. — Nego balbuciando. — O único que tentou está ali,
amarrado. — Indico o estuprador preso no canto. Os olhos do homem
ampliam, ainda mais aterrorizados. Ele sabe que está mais do que fodido
agora.
Karim ruge e encara o homem, fúria exalando de seu corpo grande.
— Jalal! Entre e pegue esse verme! Quero interrogá-lo
pessoalmente, mais tarde! — Brada para seu primo.
Em seguida, ele retira uma de suas túnicas e a passa por cima da
minha cabeça, me fazendo lembrar de outra noite. A noite que mudou
nossas vidas. Lágrimas frescas enchem meus olhos. Nossa situação ainda é
a mesma. Preciso ir embora e ele tem um dever a cumprir. Vejo o mesmo
conhecimento e aceitação em seus olhos escuros quando nossos olhares se
encontram de novo e se prendem numa conversa silenciosa. Limpo a
garganta, me afastando de seu toque, meu coração pesado, doendo demais.
— Shukran por vir me buscar de novo — digo engasgada. Seus
olhos intensos me fixam sem piscar e ele engole em seco.
— Precisamos sair agora. Os helicópteros estão a alguns
quilômetros — diz sem desviar os olhos dos meus. — Você foi muito
corajosa — murmura; orgulho, amor, mágoa e resignação brilhando em seu
olhar intenso.
— Você me salvou. Nosso treinamento me ajudou a tentar lutar de
volta — murmuro, limpando uma lágrima antes de ela cair. — Essas
crianças estão desidratadas, traumatizadas e machucadas. Posso usar um
dos helicópteros para levá-las a um hospital.
— Você está bem para pilotar? — pergunta, o olhar correndo pelo
meu corpo.
Meus joelhos estão rasgados e o lado direito do meu rosto está um
pouco machucado também, de quando me jogaram no asfalto. Mas, tirando
isso, estou bem agora que estamos a salvo.
— Sim — digo simplesmente. Ele me sonda por alguns instantes e
acena.
— Então, vamos! — Chama, encarando os meninos. — Vocês
estarão de volta às suas casas em breve. Estão a salvo agora.
— A princesa Anna Julia é muito destemida, meu senhor — Youssef
diz, se curvando numa reverência respeitosa.
Karim volta a me olhar. Vejo a mesma mistura de emoções
cintilando em seus olhos.
— Sim, ela é — murmura. — Você vem em meu cavalo e os
meninos irão com os guardas. — Anuncia e vira as costas.
Nós o seguimos para fora. Eu monto em sua garupa. É um garanhão
negro, mas não Hércules, devemos estar muito longe do palácio. As
lembranças se misturam em minha mente conforme ele atiça o cavalo numa
corrida intensa. Cortamos o deserto, deixando o contêiner e muitos corpos
destroçados para trás. Tenho que rodeá-lo com os braços, para aderir melhor
e facilitar sua cavalgada. Inalo seu cheiro, querendo arrastar esse momento
para sempre. Porém, rápido demais chegamos aos dois helicópteros. Eu
salto e Karim em seguida. Os meninos são levados para dentro do que já é
familiar para mim. Eu ando em direção à aeronave, sentindo-o às minhas
costas. Abro a porta do piloto e fecho os olhos por um momento,
procurando forças para me despedir dele de novo. Os reabro e me viro,
encontrando seu olhar brilhante. Nos olhamos fixamente por um tempo
longo, até que ele limpa a garganta.
— Seu pai está vindo lhe buscar — diz numa voz tensa. — Demorei
a avisá-lo que estava em perigo de novo. — Sua mandíbula trinca. — Tenho
que me desculpar por colocar a vida de sua filha em risco.
— Não é culpa sua — rebato. — É o seu país, a sua casa. Eu que me
enfiei aqui impulsivamente e…
Seus olhos ficam mais intensos e vejo a dor tomando seu semblante
ao fitar o meu colar. Eu o pego instintivamente e seu olhar fica duro.
— Não vamos lamentar, Anna. — Seu tom é de despedida e novas
lágrimas turvam meus olhos. — Cuide-se, ‘amira. — Sussurra asperamente
e vira as costas, cada passo que dá para longe de mim me matando.
— Cuide-se também. — Soluço baixinho e subo no helicóptero.
Dou uma olhada nas crianças amontoadas atrás. Infelizmente não é hora
para se preocupar com os cintos. O perigo é outro. — Quem não está com
cintos, sente no chão e se agarre a alguma coisa com força. Mantenham-se
firmes, meus amiguinhos. — Eles acenam, seus choramingos mais fracos
agora. Coloco o fone de ouvido e aciono os comandos no painel.
Olho de lado e vejo Karim abrindo a porta do piloto do outro
helicóptero, onde Jalal o espera no banco do passageiro. Ele para, virando a
cabeça, nossos olhares buscando um ao outro, mesmo que não consigamos
nos ver claramente sob a luz da lua. Com um aceno de cabeça, ele sobe.
— Adeus, amiri — murmuro sentindo meu coração se partir em
pedaços. Então, eu decolo, nos tirando da zona de perigo.
***
— Você está bem, querida? — Meu pai pergunta, seu semblante
sério, quando nos acomodamos no jato três horas depois. O dia está claro.
Ele chegou há duas horas, me encontrando no hospital, onde os meninos
foram atendidos e eu também.
— Não, pai — murmuro com voz quebrada e seu rosto suaviza na
poltrona à minha frente. — Vai demorar um tempo para que eu fique bem
de novo.
Nenhuma quantidade de tempo irá me fazer ficar bem outra vez.
Sinto em minhas entranhas. Essa perda me marcará para sempre. Mas não
posso dizer isso ao meu pai e deixá-lo ainda mais preocupado do que já
está. O avião da Harper começa a taxiar, se preparando para decolar, e olho
pela janela a bela Jawahra passando rapidamente conforme a velocidade
aumenta. Quando levantamos voo, minhas lágrimas descem pelas faces. Eu
pensei, sonhei, eu quis egoisticamente que ele viesse atrás de mim. Que me
pedisse para não ir embora. Mas ele não veio. Ele não podia.
— Lipe está pensando em fazer uma viagem com você. Só vocês
dois, o que acha, princesinha? — Meu pai tenta me animar.
— Eu vou gostar, papai. — Sussurro, tentando abrir um sorriso e
falhando. — Obrigada por vir me buscar. — Embargo e seus olhos ficam
brilhantes de emoção.
— Eu e sua mãe quase morremos de preocupação, filha. — Diz
ferozmente e puxa uma respiração aguda. — Mas o importante é que está
indo para casa agora. — Eu aceno, me sentindo drenada de tanto chorar. —
Descanse um pouco, querida. Logo estará de volta em sua casa e tudo ficará
melhor. — Seu tom é cheio de amor.
Assinto e ele abre seu notebook, passando a encarar a tela do
aparelho, me deixando ter um tempo comigo mesma. Olho para fora de
novo, a cidade ficando pequena, meus olhos vão para a vastidão do deserto
abaixo de nós. Tudo em mim dói pela injustiça disso tudo. Nosso breve
tempo juntos passa em minha mente. Tudo que vivemos. Uma lágrima
grossa e dolorida rola, queimando a minha face. Suspiro trêmula e desolada.
— Seja o melhor rei que esse país já viu, meu amor — murmuro
quase para mim mesma. — Adeus, amiri.
Oi, amiri.
Sei que está com raiva de mim e não entende minha decisão. Mas
peço que nunca duvide do amor que sinto por você, por Ayla. Ele é imenso.
Meu coração está esmagado porque sonhei em ter vocês para mim.
Todavia, não podemos ir contra a realidade, habib, e a nossa é esta. Seu
destino é subir ao trono e honrar sua linhagem. Eu vou acompanhar e
torcer por você, mesmo de longe.
E sobre o colar… Estava esperando chegar em casa para guardá-lo
na caixa junto com as cartas de Nate. Ele sempre será o meu garoto
especial, mas você, Karim, é o meu homem especial. Eu vou guardar nossos
momentos em meu coração, para sempre. Seja o melhor rei que Kamar já
viu, habib. Eu amo você, amiri.
Anna.
***
Karim Amihaj
Dou mais um soco forte no olho do infeliz que tentou se aproveitar
de Anna no cativeiro. A cabeça do terrorista tomba para trás. Está nu,
amarrado a uma cadeira. Estamos numa sala especial no departamento de
polícia. Ele foi o único que restou do pequeno grupo que atuou no sequestro
de Anna e das crianças. No entanto, sei que ainda há muitos da sua
organização criminosa em Kamar, e preciso exterminá-los urgentemente.
Sua cara já estava bem machucada, minha princesa fez um bom número
nele. Não posso parar o orgulho me enchendo toda vez que relembro aquela
noite. Ela foi esplêndida! Se não tivesse reagido junto com o garoto
Youssef, eles teriam morrido.
— É melhor entregar logo o nome do seu chefe, seu terrorista de
merda! — Eu rosno, puxando seu cabelo, com força. O homem grunhe, os
olhos completamente fechados pelo tratamento especial que estou lhe
dando desde ontem.
— Os Al-Kidir não têm um chefe, seu idiota. — Sua voz, embora
cansada, tem um tom de deboche. — Somos autossuficientes.
Jalal avança dois passos, rosnando. Eu coloco minha mão em seu
ombro, contendo-o. Se batermos mais nesse verme, ele pode morrer antes
de nos contar o que precisamos saber. Aceno para os dois guardas no canto
da sala.
— Suspendam-no pelos braços. — Digo baixo, frio. O bandido
cospe sangue e tem a ousadia de rir para mim. Os guardas se aproximam e o
desamarram da cadeira, o arrastando para o canto onde tem um gancho e
uma corda pendendo do teto. Eles levantam seus braços e o suspendem,
amarrando-o, logo, o corpo está esticado, os pés pendurados. Sei que pode
parecer cruel. Está bem, é cruel, mas eficaz. Ele não durará trinta minutos
assim. — Vamos, primo. Amanhã voltamos para visitar nosso amigo.
Jalal abre um sorriso perverso e me segue para fora.
— Seus malditos! Não vão tirar nada de mim, ouviram? — O
homem brada às nossas costas.
Nós apenas rimos, andamos e nos recostamos à parede no final do
corredor, de frente para uma janela. Expiro, passando as mãos pelo rosto.
Estou além de exausto. Não durmo desde o sequestro de Anna e os
meninos. Marquei com os líderes para me encontrarem na tribo de El-
Baham, para entregar as crianças pessoalmente. Os homens ainda estavam
com suas caras de merda, como se eu fosse o culpado por tamanha
atrocidade. Youssef, que ironicamente é filho do sheik Malik, o líder que
está preso por ofender Anna, contou como a princesa os acalmou e salvou.
Contou fascinado como sabia atirar com um fuzil e pilotar um helicóptero.
As mulheres ficaram chocadas, mas também admiradas, enquanto os
homens tiveram de abaixar as cabeças e reconhecer que julgaram
levianamente uma pessoa que não conheciam, por puro preconceito
cultural. O menino sorria, narrando tudo, completamente encantado por
Anna. Um sorriso amargo curva minha boca porque o entendo
perfeitamente. Não tem como não se encantar pela princesa.
Aproveitei para dizer aos líderes o que realmente achava de suas
posturas. Não fui brando. Não, eu estava muito além de qualquer controle.
O sentimento de perder a mulher da minha vida ainda pungente,
esmagando-me, então não tive nenhuma pena, como não tiveram de Anna.
— Seus filhos estão retornando sãos e salvos por causa daquela que
tanto rechaçaram e humilharam. — Cuspi entre dentes. Os homens se
entreolharam, abaixando as cabeças. — Olhem para mim, olhem nos meus
olhos, como olharam naquela reunião e ofenderam a mulher que amo e
escolhi para esposa. Olhem nos meus olhos e admitam que seus filhos estão
vivos por causa da concubina do príncipe!
— Meu senhor, sinto muito. — O sheik Al-Hansur, um dos que
proferiu ofensas, se adiantou no grupo. Estávamos a céu aberto, no círculo
entre as tendas. Me encarou com pesar e vergonha, admitindo: —
Acreditamos que estávamos fazendo o certo.
— Hostilizando uma garota que nem sequer conheciam? Os
senhores não lhe deram a chance de lhes mostrar a pessoa que ela é. —
Interrompi-o, irado.
— Perdão, meu senhor. — O sheik Bashar, outro que disse palavras
pesadas naquela reunião, se manifestou: — Eu aceito a punição que amiri
julgar melhor.
Eu encaro o homem até então altivo abaixando a cabeça e o tom.
— Não é a mim que terão que pedir perdão, sheik. É a ela. — Digo
solenemente. Eles me encaram atentamente. — A princesa Anna Julia será
a minha rainha, meus planos continuam os mesmos.
— Me desculparei com a princesa quando ela regressar, amiri. — O
sheik Faheem disse, visivelmente desconfortável pela injustiça cometida. —
E também apoiarei sua união. Ela trouxe meu filho de volta e nunca serei
capaz de agradecer ou me desculpar o suficiente.
Ele me surpreende e sinto um ínfimo lampejo de esperança. Talvez
consigamos passar por isso sem uma rachadura permanente. Todavia,
revelei, para que sentissem ainda mais remorso:
— Ela ouviu e viu a segunda parte da nossa reunião, senhores. —
Eles exclamaram horrorizados e envergonhados. — Sim, ela se sentiu tão
indesejada e humilhada que foi embora para que eu pudesse cumprir o meu
maldito dever! Um dever assentado em tradições arcaicas e tolas! — Eu
rosnei. Eles tiveram o bom senso de ficar calados. — Faremos outra
reunião, conforme sugeriu o sheik El-Baham, e minha moção sofreu
alterações. Haverá um contrato lavrado entre as tribos, isentando o
príncipe governante de um casamento de Estado. — Eles se mantiveram
calados. — Um príncipe de Kamar só fará um casamento de Estado se essa
for a sua vontade.
— Creio que precisaremos discutir melhor esse assunto, amiri. —
Foi El-Baham quem falou e eu o encarei. — Acabamos de ter nossos
meninos de volta.
— Sim, sheik, precisamos discutir sobre muitas coisas. — Avisei,
lançando-lhe um olhar severo. O homem não me enganaria mais com sua
conversa mansa. Olhei cada um deles e soltei logo minhas intenções: —
Subirei ao trono solteiro e me casarei por amor.
— Alteza, insisto…
— Não. — Cortei qualquer que fosse a argumentação de El-Baham.
— Eu sou o príncipe herdeiro e vou me sentar no meu trono. A questão é:
será com o apoio de vocês ou teremos de guerrear em vez disso? — Eles me
olham espantados. — Meu pai amava o deserto, acreditava que os clãs são
indispensáveis para o governo equilibrado. Eu também cresci acreditando
nisso, todavia, nos últimos anos, tenho percebido a necessidade exacerbada
de vocês em ganhar mais e mais poder.
— Meu senhor está nos acusando de ganância? — El-Baham torna,
fechando a cara.
— Eu não sei; estou, sheik? — O encarei com uma sobrancelha
levantada. Expirei e encarei todos eles, cansado demais da queda de braço.
— Os Al-Kidir estão agindo em nosso emirado. Foram eles quem
sequestraram Anna e as crianças — revelei. Exclamações soaram altas.
Todos sabem e temem esses terroristas. — Se estivermos rachados, seremos
encurralados e exterminados em nosso próprio país, como alguns vizinhos
já ficaram. Proponho pensarmos no bem comum neste momento. — Bato o
punho em meu peito esquerdo. — Lutarei na frente dessa guerra. Serão dias
instáveis, mas tenham a certeza de que o inimigo cairá aos nossos pés.
Morrerei defendendo nosso povo.
Eles ficaram em silêncio perturbador. Então, o sheik Al-Hansur bate
o punho no peito e eleva a voz:
— Eu e minha tribo lutaremos ao seu lado, meu senhor.
Lhe dei um aceno. E o que parecia impossível aconteceu: um a um,
eles foram fazendo o juramento. Um sorriso se abriu em meu rosto
cansado. Jalal me olhou orgulhoso, seu punho contra o peito. Então, nós
bradamos para a noite:
— Morreremos defendendo a nossa linhagem!
— Bem, fazia algum tempo que não o via em ação, primo. — A voz
brincalhona de meu primo cessa as lembranças. — Não com essa
ferocidade toda, pelo menos. Me lembra nosso período no serviço militar.
Eu me viro para ele, acenando. Nós nos alistamos e servimos juntos.
Uma precaução de meu pai para me proteger, ele era tão previsível. Rio
nostálgico. E meu primo cumpriu bem sua função. Ele sempre cumpriu seu
dever com o príncipe herdeiro, mas sempre senti seu amor por mim desde
que éramos pequenos. Jalal é como um irmão. Corrigindo, ele é meu irmão.
— O imbecil merecia um tratamento cinco estrelas. — Ironizo,
fazendo-o rir. — Shukran, primo.
— Pelo que exatamente está me agradecendo? — Franze a testa.
— Por ser meu irmão — digo, pegando seu ombro, dando um aperto
fraternal. Bato no meu peito esquerdo. — Morreremos defendendo a nossa
linhagem.
Seus olhos ficam brilhantes, emoção marcando suas feições. Ele
estende uma mão para meu ombro e fecha o punho sobre o coração
também.
— Morreremos defendendo a nossa linhagem — repete ferozmente.
— Sim, você é meu irmão, meu sangue, te amo e defendo, como a Zafyr.
Eu aceno, me sentindo emotivo demais. Acho que é o cansaço, mas
principalmente pela partida de Anna. Ainda estou em carne viva, evitando
pensar, mas as lembranças não vão embora.
De fato, não demora vinte minutos, o terrorista sucumbe, gritando
para tirá-lo de lá que irá cooperar. Troco um sorriso triunfante com Jalal e
voltamos para dentro. Os guardas retiram o bandido da corda e o colocam
sobre a cadeira novamente.
— Estamos ouvindo. — Cruzo os braços, encarando-o impaciente.
O homem engasga e movimenta os braços, que estão roxos pelo
tempo suspenso.
— Quem encomendou o sequestro da garota e dos meninos foi um
dos seus sheiks, seu imbecil. — Ele tem a audácia de rir. — Você tem uma
maçã podre no seu cesto e nunca percebeu.
Congelo, descruzando os braços.
— O que está dizendo… Um dos líderes dos clãs, você está
dizendo? — Inquiro, aproximando meu rosto do seu, vendo os olhos
inchados, mas ainda abertos em fendas. Estudo-o, tentando descobrir se está
dizendo a verdade. — Quem? Me dê o nome ou vou cortar seu maldito pau!
Não esqueci que tentou violentar a minha mulher! — Ranjo os dentes.
— El-Baham. Abdul El-Baham, esse é o nome do homem. — Ele
grunhe e me afasto imediatamente. O frio da traição penetrando meus ossos.
— Porra… — Jalal diz ao meu lado. — Está dizendo a verdade,
terrorista?
— É muito fácil conferir. Haverá uma reunião dentro de três dias
num casebre abandonado a oeste da tribo do sheik. — O homem diz e não
noto nenhuma hesitação. Eu viro as costas para o verme e respiro fundo,
passando as mãos pelo rosto. Minha cabeça está começando a doer pelo
meu esgotamento físico.
— Conte-me quais os planos do morto ambulante. — Rosno ainda
de costas. Vou puni-lo exemplarmente por essa traição. Por isso, os líderes
estavam tão reticentes e ariscos comigo. A cobra estava os manipulando,
com certeza.
— Eu só sei que o plano com o sequestro era jogar as mortes das
crianças nas suas costas. E a princesa também seria morta para puni-lo. Não
sei o que Vossa Alteza fez para o homem, mas ele parece nutrir fortes
sentimentos por você. — Zomba.
Estou estarrecido, abalado demais para sequer lhe dar uma réplica.
— Dê a localização da reunião e lhe entregarei para a justiça
comum. — Viro de frente para ele, voltando a abaixar o rosto para o seu. —
Do contrário, eu mesmo irei julgá-lo, e lhe garanto, não gostará da minha
sentença.
Pela primeira vez, algum sinal de medo no bandido. Ele cede e nos
entrega tudo pelos minutos seguintes. Deixamos o departamento de polícia
e Jalal pilota o helicóptero, nos levando de volta para casa. Precisamos
planejar como encurralar o maldito traidor do El-Baham e seus comparsas.
As tribos estão fechadas comigo, não estão? Pergunto-me, apreensivo.
Agora não sei de mais nada. Diante das revelações, terei que confiar
desconfiando. Então, lembro de algo que revolve o meu estômago: El-
Baham ordenou o sequestro de seu próprio sobrinho, filho da irmã mais
nova. Meu sangue esquenta nas veias, de pura revolta. Ele ia derramar o seu
sangue. Que tipo de monstro é esse homem? O ódio por mim é tão grande?
Ou é a ganância?
Quando chegamos ao palácio, tio Jafar nos chama na sala de
reuniões menor, na ala de meus aposentos. A reunião será dentro de três
dias e preciso descansar, repor as forças, do contrário não serei de grande
ajuda caindo de cansaço e faminto.
— Descobrimos uma linha privada de El-Baham e interceptamos
uma conversa agora há pouco. — Meu tio revela e o encaro com interesse.
Seus lábios se comprimem em seguida e sei que mais merda virá sobre o
homem, no qual confiei ingenuamente. — O homem enlouqueceu, Amihaj.
Ele quer matar a todos nós e usurpar o trono.
Jalal bufa atrás de mim. Não estou mais conseguindo raciocinar
direito. Preciso de um banho, comer alguma coisa e dormir.
— Eu adoraria vê-lo tentar. Vou esmagá-lo quando o encontrar. —
Digo baixo e frio, então expiro longamente. — Bom trabalho, tio.
Meu tio não parece feliz com o elogio.
— Não, amiri, eu falhei com meu senhor — diz desgostoso.
— Quando? — Franzo o cenho.
— Ele chegou a esse ponto porque nunca percebi que era um traidor.
— Abana a cabeça. — Era minha responsabilidade mantê-lo seguro,
Amihaj, como tio e grão-vizir.
— O senhor não tem culpa nenhuma, tio. O homem é um terrorista.
Ia assassinar seu próprio sobrinho em nome da ganância — digo com
desprezo. — Ele sempre passou uma imagem ilibada e leal a nós, nunca
desconfiei de nada também.
Me estuda com seus olhos escuros ainda insatisfeitos. Se aproxima e
coloca uma mão em meu ombro.
— Sua família estará com você, amiri. — Engole em seco, está
muito preocupado, vejo em seu semblante. Bate o punho sobre o seu
coração. — Para o melhor ou pior. Morreremos defendendo a nossa
linhagem!
Pego seu rosto, notando que meu tio envelheceu nos últimos anos.
Mesmo que não haja muitas demonstrações de afeto da sua parte, sei que
ele me ama. Está estampado em seu rosto cansado, tanto pela idade quanto
pela situação crítica que estamos vivendo. Bato meu punho em meu peito
também.
— Shukran, meu tio. Por tudo que fez e ainda faz por mim, pela
nossa casa. — Me inclino e beijo seu rosto. Seus olhos ficam brilhantes e
ele torna a engolir em seco, quando me afasto e digo solenemente: —
Morreremos defendendo a nossa linhagem!
Acena, as mãos vindo para meu rosto. Agora sou eu quem fica
assustado.
— Você será um grande rei, meu sobrinho — murmura, toda a
formalidade de grão-vizir o abandonando nesse momento. — Quando subir
ao trono e tudo se resolver, vá buscar sua princesa de volta. — Meus olhos
ampliam, estupefação me tomando. — Ela pode não ser uma nativa, mas
tem a fibra e coragem necessárias para uma rainha.
Eu sorrio, sentindo meus olhos arderem, a falta dela doendo demais.
— Sim, ela tem — concordo. — Shukran, tio.
— Você deve descansar um pouco agora. Eu, Jalal e Zafyr ficaremos
a postos.
— Zafyr? — Levanto uma sobrancelha.
Ele meio que ri e resmunga:
— Sim, ele pode apreciar as farras no Ocidente, mas sabe que é um
príncipe Al-Abdallah e, portanto, está preparado para lutar, vencer ou
morrer pelo sangue, como todos antes de nós — diz solenemente.
Aceno, e com mais um aperto em seu ombro, me retiro para meus
aposentos.
Amiri,
Eu sei o tamanho do ódio que meu senhor tem por mim, e está certo,
sou um ser humano repugnante. Aceitei tomar parte de um plano maligno
que tirou a vida de nossa princesa e mais oito pessoas. Fiquei calado e
levei a culpa sozinho por muito tempo porque o demônio por trás de tudo
ameaçou matar toda a minha família.
Wallah, então ele tinha mesmo sua parcela de culpa. Continuo
lendo:
A mente por trás de tudo foi o sheik El-Baham, Vossa Alteza. Ele é o
verdadeiro assassino de sua esposa.
***
Olá, Princesa,
Não sei quanto tempo demorou para você abrir esta carta… Se foi
logo, fico feliz que não tenha sofrido tanto. Espero que não tenha esperado
ficar velha e rabugenta, porque vou ter pena do pobre coitado que caiu na
sua. Você é tão teimosa, Anna!
Eu não consigo segurar um sorriso. Esse garoto bobo…
Falando sério, estou orgulhoso que cumpriu com o prometido e
tenha vivido, princesa. Como lhe disse uma vez, você é especial demais
para terminar sozinha. Retire a corrente e guarde onde achar melhor. Nós
cumprimos nosso tempo juntos e nos amamos tanto que daria para muitas
vidas. Seja feliz, princesa. Case, tenha filhos. Ame esse cara que ganhou
seu coração, porque sei que ele deve ser bacana. E nunca, jamais, perca
esse sorriso e esse brilho irreverente nos olhos. Viva, Anna! Continue
vivendo!
Nate.
***
Karim Amihaj
Eu observo a desenvoltura de Anna ao meu lado direito quando se
dirige a Latyfa. Está se mostrando verdadeiramente magnânima. Uma
rainha. Desde o momento em que chegamos. A forma carinhosa como
chamou e abraçou as crianças que viveram os horrores do sequestro com ela
foi muito especial. Isso terminou de cimentar sua aceitação nas tribos.
Todos estão olhando-a com encantamento. Ela tem uma beleza diferente, os
brilhantes olhos verdes são como ímãs, atraindo e hipnotizando a atenção.
Ela é magnífica. Meus olhos estão sempre a procurando, não querendo ficar
sem contemplar seu brilho. Está maravilhosa, vestida como as mulheres das
tribos. Percebo que as mulheres parecem encantadas com ela também. Anna
sente o meu olhar e vira o rosto para o meu, as duas joias verdes cintilantes
se fixando em mim, fazendo meu coração aquecer no peito. Pego sua mão e
a beijo suavemente no dorso.
— Está quebrando o protocolo, meu senhor? — Um sorriso
irreverente insinua na boca carnuda. — Não pode me tocar em público. —
Seu sorriso perverso se alarga. — São as regras.
— Eu posso tudo, amirati — digo com presunção. — Sou o rei.
Sei que quer revirar os olhos, mas não pode porque estamos em
público. Então, ela os estreita de uma maneira que a deixa ainda mais linda.
— Oh, você ainda precisa trabalhar nesse seu ego, honorável
Majestade — zomba sussurrando.
— Meu rei. — A voz de Latyfa interrompe meu momento com
Anna. Eu encaro a mulher, que está ajoelhada à minha frente agora. Ela já
teve dias melhores. Também não é para menos, seu pai a arrastou para a
lama junto com ele. Os clãs irão rechaçá-la e será quase impossível
conseguir um casamento para ela nessas condições. É filha de um traidor,
assassino e terrorista, e isso pesa na linhagem. — Quero pedir-lhe minhas
desculpas mais uma vez pela forma que tratei a sua escolhida. — Bate no
peito e diz solene, embora sua postura esteja derrotada: — Prometo ser leal
à minha senhora como sou ao meu rei!
Eu a encaro, tentando lê-la. A mulher já me enganou uma vez e,
além disso, é filha de seu pai. Porém, hoje é dia de festa e não quero
estragá-lo para Anna fazendo uma cena aqui. Talvez se eu mostrar
clemência diante das tribos, ainda haja alguma chance de ela arranjar um
bom casamento.
— Aceito sua retratação, Latyfa — digo e ela solta a respiração que
estivera prendendo. Meus olhos fixam nos dela e me inclino para frente, lhe
mandando um recado: — E jamais, em hipótese alguma, pense em
desrespeitá-la outra vez, estamos entendidos?
— Meu senhor, é muita bondade sua. Shukran, shukran. — Ela
assente, balançando freneticamente a cabeça. — Serei leal até o meu último
suspiro.
Para o seu bem, espero que esteja dizendo a verdade. Tenho vontade
de adverti-la, mas me seguro. Ela já sabe que não sou de perdoar traição.
Lhe dou um aceno e faço um gesto para que se levante.
O resto do banquete transcorreu tranquilo. Os membros das tribos
nos oferecendo suas felicitações e presentes. A cerimônia oficial de noivado
é amanhã à noite, mas faz parte da nossa cultura comemorarmos os
noivados e casamentos por dias, às vezes por uma semana. Contudo,
ficaremos aqui apenas por três dias. Não ficarei nem mais um dia sem ter
Anna na minha cama. Foram dois meses sem ela e não estou muito razoável
nesse sentido. Estou ainda faminto. Tem apenas uma semana que a tomei
para mim de novo, e se não fosse para o benefício dela, não faria o noivado
aqui junto com as tribos. Eu só estou fazendo para que ela seja recebida,
aclamada, e ouça as devidas desculpas dos líderes. Esse foi um ponto que
não abri mão e os sheiks não relutaram, pois sabiam que só uma retratação
pública iria me contentar e também mostrar para sua futura rainha que se
arrependeram verdadeiramente.
Eu acredito neles. Esses homens, embora gananciosos, foram
manipulados habilmente pelo maldito Abdul. Se não fosse o infeliz, eu teria
conseguido me entender com os sheiks sem tantos desgastes. Todavia, tudo
se resolveu e estamos em bons termos agora. Que Allah nos permita
continuar assim. Estou cansado de conflitos. Só quero paz agora. Meu olhar
procura por ela de novo. Eu só quero amar a minha mulher e construir uma
vida próspera, em todos os sentidos. E olho do meu lado esquerdo para a
minha princesinha. Ela está com os olhinhos acesos de curiosidade,
observando tudo ao redor. Nunca a trouxe para as reuniões no deserto. Ela
era muito pequena também, mas a partir de agora sempre a trarei comigo e
Anna.
— Você está gostando, nour hayati? — pergunto e ela vira o
rostinho lindo para mim.
— Muito, papai! Quando a Anninha for conversar com as mulheres,
eu posso ir junto?
Eu rio da sua vivacidade infantil.
— É uma reunião, habibti. É assunto sério — digo amorosamente.
— Mas eu nunca fui a uma reunião — reclama. — Eu quero me
reunir com as mulheres também. A Anninha disse que serei uma princesa
muito bem informada e engajada.
Isso me faz gargalhar. Minha filha é tão precoce que me diverte em
muitos momentos.
— E você sabe o que é ser engajada, Ayla? — Levanto uma
sobrancelha.
— A Anninha me explicou, mas esqueci. — Coloca a mãozinha
sobre a boca, contendo um sorriso. — Vou perguntar a ela de novo.
— Faça isso. — Toco o indicador em seu pequeno nariz. — Mas,
por enquanto, minha princesa não precisa se preocupar com assuntos de
gente grande. Enquanto a Anninha estiver em reunião, aproveite para
brincar com seus primos, habibti.
Seus olhinhos se iluminam.
— Está bem, malkaa. — Sorri, fazendo meu coração derreter. Ela
adora me chamar assim depois que viu minha coroação.
No dia seguinte…
— Você está contando o primeiro pedido aos pais de Anna para o
período do Mangni?[36] — Jalal questiona com uma risada, enquanto coloca
minha cafia e a coroa prendendo-a. — Então, só resta um mês para o
casamento a partir de hoje.
— Você pegou o espírito da coisa, primo — digo condescendente e
ele rola os olhos. — Porém, só vamos poder nos casar daqui a dois meses,
uma vez que, no final desse, os trigêmeos dos primos de Anna irão nascer.
O nascimento de um Di Castellani é um evento à parte e a família se
reúne em peso para comemorar, então, nosso casamento terá que esperar.
— Porra, eu também contaria os dias e noites juntos se estivesse em
seu lugar, primo. — Zafyr, que está colocando o manto sobre os meus
ombros, dá uma risada provocadora.
— Você jamais estará em meu lugar, seu idiota. — Ranjo e ele ri
mais. — Pare de cobiçar a minha mulher antes que eu corte o seu maldito
pau!
Os dois riem de mim com vontade.
— Relaxa, Amihaj. A princesa está completamente na sua, cara —
Zafyr resmunga, alisando meus ombros, terminando o seu serviço. Os
irmãos do noivo o ajudam a se vestir. Como eles dois são os únicos irmãos
que conheço, os idiotas estão me ajudando e me irritando.
— É, primo, relaxa. Está parecendo uma noiva. — Jalal entra na
provocação do irmão.
— Cale a boca, idiota. Nem venha me dizer que não ficou nervoso
quando foi a sua vez com Nuria — retruco.
Os dois riem mais uma vez à minha custa.
Eu bufo e vou conferir minha aparência no espelho. Eu e a princesa
estamos em tendas separadas. Quase não dormi, sentindo a falta dela e
lutando contra a vontade insana de me esgueirar para a sua tenda. Mas não
posso fazer isso, ou estarei descumprindo ainda mais os ensinamentos do
Profeta. Embora os líderes tenham sido excessivamente hostis com Anna,
eles disseram uma verdade naquela reunião: nós estamos em pecado desde
que começamos a dormir juntos. Sem falar no nosso sexo quente e
despudorado. Todavia, quando estivermos casados, isso ameniza. Confiro
meu reflexo e gosto do que vejo. Uso um caftan branco com um manto
dourado e preto. Uma cafia preta e a coroa de ouro com rubis. Estou
ansioso para ver a minha princesa. As moças solteiras das tribos estão
preparando-a para se apresentar para mim. A tradição manda que ela se
converta ao islamismo no noivado. Em Kamar, uma rainha não pode ter
religião diferente do seu rei.
Ela virá para mim e se ajoelhará, jurando amor e lealdade, em
seguida, nossas mãos serão unidas por um lenço vermelho e ouviremos a
pregação do ancião e de meu tio. Anna pronunciará o testemunho diante de
todos e será uma mulçumana a partir de então. Dentro de um mês, será
nosso casamento. Farei sua coroação na mesma ocasião. Respiro
profundamente, tentando me acalmar. Jalal tem razão, estou parecendo a
noiva. Wallah! Acalme-se, homem! Ordeno-me. Meus primos continuam
rindo, e reviro os olhos.
— Vamos, espertalhões — resmungo. Eles seguram suas risadas de
merda e saem da tenda à minha frente. O cortejo com os outros homens das
tribos segue atrás de mim, me conduzindo ao altar.
Eu sigo até a minha cadeira e me acomodo. Então, meu coração
falta sair pela boca quando a vejo saindo da sua tenda, cercada de mulheres,
que seguram seus véus, enquanto ela anda pelo tapete vermelho. É tradição
reproduzirmos o ritual das tribos beduínas que ocupam nossas terras desde
os tempos remotos. Ela está usando um vestido- caftan todo dourado e um
hijab no mesmo tecido, dando voltas em sua cabeça, cobrindo sua boca e
nariz. Usa uma das tiaras que lhe dei de presente. Meu coração retumba no
peito enquanto se aproxima, andando com graça, até que para à minha
frente. Com os olhos lindos presos aos meus, ela se ajoelha na almofada aos
meus pés e coloca a mão em punho sobre o peito esquerdo, abaixando a
cabeça em reverência. Quando seus olhos levantam para os meus, estão
brilhantes de emoção e lágrimas.
— Eu, princesa Anna Julia Di Castellani, declaro meu amor e minha
lealdade a Sua Majestade, Karim Amihaj Al-Abdallah, meu rei, e somente a
ele — diz solenemente, embora emocionada. Eu rio, meus olhos ardendo de
emoção. Então, lhe estendo a mão e a ajudo se levantar, nos levando para a
frente do ancião e de meu tio, como o mais próximo de pai que tenho no
momento.
Meu tio pega nossas mãos direitas, envolve nossos pulsos com o
lenço e continua as segurando enquanto nos diz algumas palavras:
— De hoje em diante, este homem, Sua Majestade, Karim Amihaj
Bin Khallifa Al-Abdallah, e esta mulher, Sua Alteza, Anna Julia Di
Castellani, estão prometidos um ao outro, conforme os preceitos do Profeta
— diz solenemente, me encarando com emoção nas íris escuras. — Como
representante de seu pai, o rei Khalil Amihaj Al-Abdallah, que Allah o
tenha, abençoo esta união.
Eu aceno para meu tio, meu coração leve, feliz. Então, ele se afasta
e o ancião profere suas palavras em seguida. Anna profere seu testemunho
La ilaha illa Allah, Muhammad rasoolu Allah (Não há verdadeiro Deus,
exceto Allah, e Muhammad é o Mensageiro de Deus). Todo o tempo eu a
contemplo com amor e orgulho. Ela agora é uma de nós. Quando termina o
ritual, levanto nossos pulsos amarrados pelo lenço para a multidão. Eles
ovacionam, entoando pedidos de proteção e preces em nosso nome. Meu tio
se aproxima, desenrolando nossos pulsos, e o banquete começa. Eu quebro
um pouco do protocolo descendo das cadeiras reservadas para mim e Anna
no fundo da tenda, e andamos lado a lado, cumprimentando e conversando
com o povo. Ela me aconselhou a me aproximar mais do povo, não apenas
dos líderes dos clãs, e eu achei a sugestão válida. Anna me pediu, inclusive,
para conversar com cada um dos insurgentes responsáveis pelos primeiros
conflitos que culminaram em seu primeiro sequestro. Ela acredita que
precisamos saber os reais motivos dos conflitos e ser clementes com os que
colaborarem para a manutenção da paz em nosso emirado. Ela já é uma
rainha da cabeça aos pés.
Em dado momento, Nuria a chama para ir conversar com algumas
mulheres e ela se vai. Eu fico olhando-a como um bobo apaixonado, sem o
menor receio de parecer fraco perante o meu povo. Eles já sabem que estou
longe de ser fraco e que a minha escolhida merece a minha admiração. Eu
me perco numa conversa com Jalal, meu tio e alguns homens simples dos
clãs, ouvindo-os sobre os progressos do pastoreio e como a produção de lã
será grande esse ano. Quando olho na direção de Anna, vejo Latyfa se
aproximando com dois cálices dourados nas mãos. Franzo o cenho, uma
sensação ruim se espalhando em mim. Sem dizer nada para o grupo, eu
saio, me dirigindo para Anna. Latyfa a alcança e eu aperto o passo, a coisa
ruim se intensificando. Ela sorri para a princesa, se curvando
respeitosamente, e acho que está propondo que beba com ela. Anna abre os
braços, me surpreendendo ao querer essa proximidade com sua antiga rival.
Minha princesa. Eu fico orgulhoso por estar se mostrando tão aberta e
disposta a superar os desentendimentos do passado.
Latyfa apoia os cálices sobre a mesa mais próxima e envolve a
princesa num abraço. Anna sorri quando se separam. Finalmente as alcanço
e Anna está envolvida numa conversa animada com Latyfa agora.
Aproveitando que Latyfa está de costas para mim, eu me estico e troco os
cálices de posição. Podem me chamar de paranoico, pode ser apenas um
pressentimento, porém, não vou arriscar a vida e o bem-estar de Anna.
— Shukran, princesa. — Latyfa se inclina mais uma vez e volta a
olhar para Anna. — Minha senhora é muito bondosa e tenho certeza que
terá tudo que merece — diz, e detecto certa tensão em sua voz quando se
vira e pega as taças; sem perceber a ordem desfeita, entrega a que seria sua
para Anna e vice-versa. — À sua felicidade, ‘amira. Que Sua Majestade
seja tão feliz quanto foi em seu primeiro casamento.
Anna franze um pouco o cenho e me vê. Eu aceno, dando o
consentimento para ir em frente.
— Shukran, Latyfa. Que você também seja feliz — diz em resposta,
levantando seu cálice e virando-o em seguida.
— Eu serei, princesa. Serei muito feliz, esteja certa disso. — Latyfa
abre um sorriso sinistro e vira o seu também.
Eu me adianto e fico ao lado de Anna, querendo acompanhar o
desenrolar de minha suspeita.
— Estava delicioso o vinho de tâmaras. Shukran. — Anna diz ainda
no papel de rainha benevolente.
— Sim, espere só mais um pouco, sua prostituta! — Latyfa rosna e,
então, leva a mão à garganta, seu rosto ficando vermelho rapidamente. Seu
olhar vem para mim e eu sorrio friamente de volta.
— Você está morrendo, sua vadia estúpida! — Rosno baixo e Anna
solta uma exclamação horrorizada. — Morrendo porque, como seu pai,
decidiu me trair!
— O-o quê?! — Anna torna a exclamar.
— Fique calma, habibti. — Eu envolvo meus braços em sua cintura,
puxando-a para mim. — Essa víbora vingativa tentou lhe envenenar, mas
troquei os cálices.
— Oh, meu Deus! Como quer que fique calma, Karim? Uma pessoa
está morrendo na minha frente! — Ela diz histérica.
— Que o inferno os carregue para baixo! — Latyfa range os dentes,
olhos esbugalhados, os vasos sanguíneos dilatando, o branco ficando
carmesim rapidamente. Ela cai no chão, começando a estrebuchar, e o povo
corre para ver o que está acontecendo. — Eu odeio… Vocês…. Todos
vocês! — Espuma misturada com sangue está escorrendo de sua boca
agora, a pele ficando arroxeada, quase preta. É uma imagem grotesca de se
ver, mas olho até que dá o último suspiro.
— Que o inferno a carregue para baixo, infeliz! — Olho o corpo
sem vida, mas ainda irado que a maldita tenha ousado atentar contra a vida
de Anna. A princesa enfia o rosto em meu pescoço, obviamente abalada
com a cena. Eu quebro completamente os rituais e a levanto nos braços. —
Essa mulher traiu seu rei, tentando envenenar sua futura rainha! Tirem-na
daqui e a deixem bem longe da tribo para os abutres comerem sua carne!
Ela não pertence a lugar nenhum agora! — Brado, olhando todos em volta,
que também estão horrorizados com a situação do corpo preto no chão.
Então, eu saio da tenda central e não quero saber de porra de
tradição, levo Anna para a minha tenda. Atravesso o amplo recinto e sigo
direto para o quarto, deposito-a suavemente sobre a cama; como estamos
descalços, apenas me deito junto e a puxo para o meu peito. A abraço bem
apertado contra mim.
— Ela queria me matar. — Anna estremece em soluços e eu rosno,
querendo reviver a maldita só para matá-la de novo.
— Shh, ela não conseguiu, amirati. Não fique tão abalada. Passou
— murmuro, retirando seu hijab e tiara para poder tocar seus cabelos.
— Ela teria conseguido se não fosse por você, Karim. — Sua voz
está trêmula e entrecortada e seu rosto banhado de lágrimas levanta para o
meu. — Ela teria conseguido.
— Eu sempre irei protegê-la, nour Al sabah — sussurro, limpando
suas faces com delicadeza. — Aquela miserável era a última erva daninha
entre o nosso povo. Eles agora a respeitam e logo irão aprender a amá-la
como eu aprendi, amirati.
Ela apenas acena e se aconchega mais em meu peito. Seu corpo
ainda estremecendo e soluços baixos deixando sua boca. Eu acaricio suas
costas, esfregando com ternura, e a sinto relaxando, os tremores cessando
até que passam de vez.
— Não fique triste pelo acontecido, Anna. — Pego seu queixo,
fazendo-a me encarar. Seus olhos estão molhados, o rosto corado, mas está
linda demais. — Ela mereceu esse fim. Você será uma rainha, e às vezes
nós, os governantes, temos que endurecer para conseguir passar por esse
tipo de coisa…
— Eu sei, meu rei — murmura, seu tom já mais controlado. — É só
que foi um choque vê-la estrebuchando daquela forma e saber que era eu
quem poderia ter morrido. — Seus olhos ficam aflitos e sua mão vem para o
meu rosto. — Eu não quero deixar você, habib. Quero viver plenamente o
nosso amor. Amar e cuidar de Ayla como se fosse minha, te dar mais filhos,
vê-los crescer e ser a sua companheira até ficarmos velhinhos.
— Malikati… — Eu digo com todo o meu amor e reverência,
rolando por cima dela, segurando seu rosto entre minhas mãos. Ela acaricia
meus ombros, as pedras verdes cintilantes para mim. — Nós viveremos,
habibti. Nós viveremos plenamente o nosso amor. Allah nos colocou no
destino um do outro. — Eu a beijo suavemente, então sussurro: — Maktub,
minha rainha.
— Maktub, meu rei. — Sorri, linda, confiante em minhas palavras, e
eu mergulho em sua boca aprofundando o beijo.
CAPÍTULO DEZESSEIS
Dois meses depois…
“Agora você é tudo que eu quero. E eu soube isso desde o primeiro
momento. Porque uma luz se acendeu quando ouvi aquela música… Você
entrou na sala e agora meu coração foi roubado. Você me levou de volta ao
tempo quando era inteiro.”
(James Arthur – Can I Be Him)
Anna Julia
Eu olho pela sacada de nossos aposentos e a visão do deserto me
arrebata, como sempre acontece. No jardim principal, perto da primeira
muralha, tendas estão montadas, esperando nosso retorno do salão do trono
mais tarde. Lá trocaremos as alianças e depois serei coroada rainha. Hoje é
o primeiro dos três dias de comemoração do nosso casamento e estou
envolta numa nuvem de felicidade desde que abri os olhos hoje de manhã.
Karim estava sentado na cama, seus olhos negros me vigiando no sono. Há
tanta fascinação cintilando em suas íris quando me olha que me deixa além
de envaidecida.
— Jawhariin althamin[37]. — Murmurou, os dedos traçando meu
rosto numa carícia delicada. Meu coração e corpo cantaram com sua
reverência e amor. — Hoje é o começo de nossa vida como marido e
mulher, ‘amira. Quero que saiba que meu coração nunca esteve tão cheio
de amor como está agora, Anna.
— Sim, habib… O meu também está transbordando de amor, por
você, pela nossa princesinha bonita — murmurei com voz rouca do sono.
Seus olhos ficaram mais intensos e brilhantes com a menção à Ayla. —
Estou tão feliz, Karim. — Levantei minha mão para seu rosto moreno,
adorando a simetria perfeita. — Ser sua mulher, sua rainha, é uma honra
para mim, malkaa.
Ele rosnou, os olhos inflamados de paixão, o polegar deslizando,
roçando meus lábios.
— Porra.… Queria me enterrar em você agora. Mas não posso até
o terceiro dia, amirati. É o que manda a lei. — Gemi, antevendo horas
torturantes sem poder ter seu corpo. No entanto, precisamos respeitar a lei
sagrada. Eu me converti ao islã para poder ser dele completamente.
— Será uma tortura, mas será uma noite perfeita, eu prometo, meu
rei… — disse com um sorriso enigmático. Seus olhos acenderam com
luxúria e curiosidade.
— O que essa cabecinha linda está maquinando, princesa? —
sussurrou com um meio-sorriso safado.
Eu tive muitas aulas de dança do ventre nesse mês e, modéstia à
parte, estou bem desenvolta. Minha experiência no balé e minha
flexibilidade ajudaram bastante. Vou dançar para o meu rei em nossa noite
de núpcias. Além disso, amanhã o dia será inteiro dedicado a mim e terei o
meu corpo todo tatuado com o seu nome em hena. Minha segunda surpresa
para ele. Não nos veremos amanhã, pois ficará com os homens da sua e da
nossa família, enquanto eu ficarei com as mulheres. Só voltaremos a nos
encontrar no terceiro dia, como manda a tradição, quando trocaremos as
alianças outra vez e desfrutaremos do banquete com nossas famílias e
convidados.
— Você terá que esperar até a terceira noite, honorável Majestade.
— Provoquei-o, sugando seu dedo em minha boca. Ele gemeu alto, o olhar
quente correndo pelo meu corpo nu. Nós aproveitamos bem ontem, uma vez
que seríamos impedidos por três dias.
— Vem, temos que nos preparar, ‘amira. — Se inclinou, me dando
um beijo delicioso na boca, e se levantou, moreno, nu, o corpo todo duro e
malhado, a ereção matinal me fazendo salivar para tê-lo na boca. Lambi
meus lábios e quando o encarei um canto de boca perverso subiu, seus
olhos brilhando com arrogância masculina ao perceber o que estava
querendo naquele exato momento. — Você terá que esperar até a terceira
noite, habibti — disse com indulgência, me fazendo gemer de frustração, e
sua risada profunda soou no quarto. — Vamos, levante-se. Temos um dia
cheio com nossas famílias, amirati.
Volto daqueles momentos ternos e excitantes e giro nos calcanhares,
retornando ao quarto. É hora de me preparar para ir ao encontro daquele
que ganhou meu coração.
***
Karim Amihaj
Os tambores rufam e trombetas ressoam pelo jardim quando faço
minha entrada em nosso banquete debaixo da grande tenda. Os convidados
ovacionam e fazem preces para uma união feliz e abençoada com muitos
filhos. Para o árabe, a fertilidade é um fator importante nos casamentos. A
linhagem é tudo que um homem tem de mais valioso e ele precisa perpetuar
seu nome na Terra. Não terei esse problema porque a minha rainha é
saudável e perfeitamente capaz de gerar meus herdeiros. Minha rainha. Eu
saboreio esse termo em minha mente, um sorriso bobo e apaixonado
curvando minha boca. Anna foi coroada na primeira noite e trocamos as
alianças a primeira vez. Foi uma cerimônia linda e nos emocionamos em
vários momentos. Depois das apresentações em nossa honra, o sharbat[40]
foi servido e tomamos a bebida com nossas famílias e os convidados. Todos
foram avisados previamente que não haveria bebida álcoolica, uma vez que
em nosso país é proibido ingeri-la em público. Ontem foi o dia da noiva e
ela ficou com suas primas, mãe e tias, além das mulheres da minha família.
Eu entreti os homens da sua e da minha família. Fomos jogar golfe e
presenteei meu sogro e cunhado com Rolex de ouro personalizados.
Na primeira noite, presenteei a minha sogra e as primas de Anna
com joias, uma vez que ela não tem irmãs. Houve troca de presentes entre
as nossas famílias também, como manda a tradição. Me sento na poltrona
de dois lugares e espero pela entrada dela. Olho de lado e vejo minha filha
sentada junto de Ella, rindo e brincando com Rico. Sorrio satisfeito com a
interação entre nossas famílias. Nos tornamos uma só agora. Eu contemplo
os convidados e vejo Faysal, irmão mais novo de Yasmina. Ele está
sorrindo para mim. É o novo sheik El-Baham e tem se mostrado estudioso e
comprometido em restabelecer a honra de sua linhagem. E inevitavelmente
a memória de minha esposa falecida me vem à mente. Eu estou aqui,
novamente casado, quando relutei o quanto pude não tomar ou amar outra
mulher. O que vivi com Yasmina foi lindo e ficará em minha memória para
sempre. Mas não pude resistir quando vi Anna porque ela era o meu
destino. Ela estava destinada a ser a minha rainha.
Converso com Yasmina em pensamentos:
Shukran por ter me dado tanto. Nossa filha está cada dia mais linda
e encontrei uma boa mulher que a ama e cuida como se fosse dela. Você
sempre será a minha princesa, Yasmina. Sei que está feliz em saber que
meu coração está preenchido de amor outra vez, que não vou passar
sozinho através da vida. Encontrei uma garota linda e vibrante que vai
cuidar de mim e de nossa filha. Você nunca será esquecida por mim e Ayla,
eu prometo, amirati.
Um novo rufar de tambores leva minha atenção para a ponta do
tapete vermelho e meu coração dispara loucamente ao ver a minha garota
linda no trono suspenso. Os convidados voltam a ovacionar, jogando pétalas
de rosas sobre ela. Eu me levanto, meus olhos absorvendo cada minúsculo
detalhe da sua beleza incomparável enquanto é trazida para mim. Seu trono
é abaixado cuidadosamente à minha frente e estendo-lhe a mão, ajudando-a
a se levantar. Allah, está linda demais. No primeiro dia quando a vi
atravessar o túnel de espadas, fiquei sem palavras, mas agora parece que
conseguiu o impossível, está ainda mais perfeita num tradicional vestido
branco de seda e rendas delicadas. Consigo ver as pontas das tatuagens de
hena nos dorsos de suas mãos e meu corpo inflama, antecipando o momento
em que a levarei para os nossos aposentos e a tomarei como minha esposa
pela primeira vez. Um véu de renda longo cobre seu rosto perfeitamente
maquiado. Seus cabelos estão presos num coque elegante e uma joia de
pérolas adorna sua cabeça, uma esmeralda caindo no meio da testa. Os
olhos verdes bem marcados, a boca vermelha me deixando ainda mais
louco de amor, paixão, desejo feral.
— Você conseguiu ficar ainda mais linda nesta noite, malikati —
murmuro, pegando suas mãos e beijando-as ternamente.
— Você também, meu amor — murmura de volta com esses lindos
olhos verdes me adorando.
Lhe dou mais um beijo em cada mão e a levo para a frente do xeque.
Ele repete o ritual de orar sobre nossas cabeças, em seguida, eu e Anna
trocamos alianças de novo, completando o rito e tornando nosso casamento
oficial aos olhos dos homens e de Allah. A multidão eclode em palmas
junto com “viva os noivos” dos ocidentais e preces dos mulçumanos. A
levo para sentar-se junto comigo na poltrona e entrelaço nossos dedos,
apoiando nossas mãos unidas sobre a minha coxa.
Assistimos a apresentações de dança e corais enquanto o banquete é
servido. Em seguida, um círculo se forma e é a nossa vez de dançar. Retiro
seu véu com delicadeza, a conduzo pela mão até o centro e uma música
árabe começa, a mesma que dançamos na casa noturna. Anna adora essa. A
enlaço pela cintura com o braço direito e seguro sua mão direita com a
minha esquerda, então, nós dançamos, nossos olhares fixos um no outro.
Seus olhos brilham, me hipnotizando, e eu abaixo minha cabeça, nossas
bocas quase se tocando. A conduzo girando-a, trazendo-a de volta para
mim, seu corpo, seu cheiro delicioso tornando quase impossível meu pau
não ficar duro. Em pouco tempo estamos ofegantes, e não apenas pela
dança. O tesão está claro em nossos rostos, não dá mais para disfarçar.
Porém, quando me lembro que seus pais, sua família estão aqui, forço
minha empolgação a ceder. Teremos todo o tempo mais tarde. Dançamos
mais três músicas, mais casais se juntando a nós, sob os aplausos
entusiasmados do grande círculo.
Em dado momento, nos separamos para dar atenção às nossas
famílias. A vejo conversando animadamente com suas primas e sorrio
quando ela olha de lado e me flagra cobiçando-a sem parar.
— Allah, você ainda parece a noiva, primo. — Jalal zomba, com um
sorriso de merda. Eu volto minha atenção para ele, fulminando-o. — Tudo
bem, desculpe. Ela está realmente encantadora.
— Shukran, idiota — resmungo.
— Fique calmo, primo. Logo poderá arrastar sua esposa para o
quarto e acabar com esse seu humor de merda. — Zafyr também caçoa.
Eu rolo os olhos, rosnando.
— Eu não estou mal-humorado. — Nego e os dois riem, me fazendo
fulminá-los mais uma vez.
— É claro que não, Amihaj. — Jalal continua zombando.
— Cale a boca. — Solto um grunhido. — Eu não lembrava que as
comemorações eram tão estendidas.
— Eu não sei se terei saco para casar de acordo com a lei. — Zafyr
estremece e completa com uma careta: — Na verdade, nem sei se vou me
casar.
— É claro que vai, seu idiota. Um homem precisa garantir que sua
linhagem não morra com ele. — Jalal o repreende.
Um sorriso malicioso cruza o rosto de meu primo mais novo.
— Bem, eu posso tomar duas, três, ou mais esposas, não é? — Diz
levianamente. — A lei me garante esse direito.
— Você só lê as partes do Corão que lhe convêm, primo. — Digo
ironicamente.
— E não é assim em toda religião, primo? — Ele levanta uma
sobrancelha cética.
— Não diga blasfêmias, meu filho. — A voz de tio Jafar soa às
minhas costas. — Um homem só deve tomar uma segunda esposa por
necessidade de Estado ou se a primeira não for fértil. Nenhum homem deve
tomar várias esposas por vaidade.
Zafyr fecha a cara.
— Bem, nesses termos, dificilmente irei me casar, meu pai. — Tem
a audácia de dizer e pede licença se afastando em direção à tia Samira. Tio
Jafar observa seu filho mais novo, meneando a cabeça.
— Ele vai mudar de ideia quando a mulher certa aparecer, meu pai.
— Jalal tenta apaziguar.
— Que Allah coloque juízo na cabeça de seu irmão, meu filho. —
Meu tio roga com as mãos para o alto. Então, se recompõe e me encara com
seriedade, mas ultimamente tenho vislumbrado certa ternura em seu
semblante: — Que Allah o proteja, meu sobrinho. Agora que o ritual
completou o ciclo, é um homem casado novamente.
— Shukran, meu tio. — Digo, inclinando a cabeça em respeito.
Anna me contou que ele foi procurá-la antes da cerimônia da primeira noite
e se desculpou pela animosidade com que a tratou em seu primeiro mês no
palácio. Seu olhar vai para Anna conversando e rindo com sua família.
Agora ela está com Ayla em seus braços, minha filha ostenta o maior
sorriso deslumbrado, os bracinhos em volta do pescoço de sua Anninha.
— Você estava certo o tempo todo, Amihaj. — Ele diz em tom
ameno e eu o encaro. — Ela é a mulher certa para você e para a sua filha.
Meu peito fica leve, pois ele agora não está apenas aceitando porque
não teve escolha. Meu tio está conseguindo enxergar a pessoa especial que
a minha garota é.
— Sim, tio, ela é a mulher da minha vida. Eu tive que sofrer para,
enfim, encontrá-la. — Ele me olha e estende uma mão para o meu ombro,
acenando. Sua expressão fica mais séria e parece desconfortável. Sinto que
há algo mais que quer me falar. — Há algo mais o preocupando, tio?
— Sei que não é o momento, meu rei, mas gostaria que soubesse
que pretendo abdicar da posição de grão-vizir em favor de Jalal.
— O quê?! Por quê? — Me sobressalto. Sua boca comprime numa
linha apertada.
— Eu falhei com você, Amihaj. Falhei como grão-vizir e tio. —
Balanço a cabeça negando, mas ele levanta a mão e eu calo a negativa. —
Sua primeira esposa foi assassinada em minhas barbas e eu nunca
desconfiei de nada. Isso tem me tirado o sono.
— Meu tio, não pense assim. Ninguém sabia da podridão que
habitava Abdul El-Baham. Não foi culpa ou negligência sua.…
— Shukran por dizer isso, malkaa. — Ele suaviza um pouco a
expressão carregada. — Mas já está decidido. Tenho andado cansado e
Samira está pedindo para eu cuidar mais da saúde. — Um quase sorriso
curva sua boca. — É hora de deixar nosso emirado nas mãos da nova
geração Al-Abdallah.
— Meu pai, me perdoe a intromissão, mas estou ouvindo… — Jalal
entra na conversa, seu rosto preocupado para o pai. — O senhor está
doente? Por que não me falou nada?
— Não, não, meu filho. — Meu tio apazigua. — É só preocupação
excessiva de sua mãe. Estou bem, mas não sou mais nenhum jovem, não é?
Eu meio que rio com sua tentativa de ser espirituoso. Talvez ele
precise mesmo descansar. E não posso dizer que me desagrada meu primo
mais velho assumir a função de meu braço direito no governo.
— Se essa é a sua vontade verdadeira, eu aceito sua abdicação, meu
tio. — Digo, estendendo minha mão para seu ombro. — Shukran por cuidar
de mim e ser leal acima de tudo. Nossa família é honrada como poucas
nesta região.
— E continuaremos assim, meu sobrinho. — Ele se emociona. —
Nunca um Al-Abdallah trairá o seu sangue.
— Morreremos defendendo a nossa linhagem — murmuramos ao
mesmo tempo.
Me inclino e beijo sua face em ambos os lados.
— Ainda posso contar com seus conselhos?
— Será uma honra, malkaa. — Faz uma reverência respeitosa e eu
lhe faço a mesma gentileza. Com mais um aperto em meu ombro, ele volta
para tia Samira e eu encaro Jalal.
— Bem, parece que terei que aturar sua cara feia muito mais
próxima de mim de agora em diante — resmungo. Meu primo ri, o braço
passando por cima dos meus ombros.
— Admita, primo, você não pode viver sem mim. — O idiota se
parece com Zafyr neste momento. Eu acabo rindo também. Ele me
acotovela e percebo meu sogro e cunhado se aproximando. — Bem, eu vou
deixá-lo confraternizar com sua nova família.
Ele segue em direção a Nuria, que está conversando com Anna
agora, e eu o invejo.
— Meu sogro, meu cunhado. — Os saúdo cordialmente.
— Agora que o rito foi completado, conforme a tradição de sua
religião, posso chamá-lo de meu genro também. — Dom sorri. Ele tem o
bom humor invejável que Anna herdou. — Sei que já lhe disse, mas nunca
é demais repetir: Anna é a minha única filha e me custa muito a deixar tão
longe de mim, sua mãe e seu irmão. — Aceno. O compreendo, sou pai
também e me mataria ver Ayla indo para longe. — Porém, é o curso da
vida. Nós criamos os filhos e depois precisamos deixá-los viver. — Seus
olhos brilham com emoção clara. — E minha Anna precisava disso, viver.
— O entendo perfeitamente, Dom. Acho que já percebeu o quanto
sua filha é preciosa para mim — murmuro. — Cuidarei dela com a minha
vida, tenha certeza disso.
— Eu sei. Você já provou isso, duas vezes, Amihaj. — Diz, com um
aceno de cabeça, então, estende a mão. — Bem-vindo oficialmente à
família, meu genro.
Eu aceito sua mão e damos um aperto de mão firme. Me surpreendo
quando me puxa para um abraço meio desajeitado de homens. Os Di
Castellani são bem expansivos com suas emoções, tenho percebido em
nossos encontros. Eu aprecio isso.
— Shukran, meu sogro. — Agradeço-o quando nos afastamos. —
Bem-vindo à minha família também. Em nossos costumes, agora somos
uma só.
Ele acena e Lipe inclina a cabeça para mim.
— Faço minhas as palavras de meu velho, cunhado. — Sorri. Ele
parece mais cordial comigo agora. Quando fui buscar Anna em Nova York,
depois do segundo sequestro, não parecia muito feliz em me ver e muito
menos ao saber que Anna aceitou voltar comigo. O entendo também e
aprecio sua preocupação e cuidado com a irmã mais velha. Os Di Castellani
têm valores de sangue semelhantes aos meus. Eles são unidos e se apoiam
incondicionalmente. Isso ficou claro ao permitirem o casamento entre dois
homens com a mesma mulher, coisa ainda não aceita mesmo com a
modernidade do Ocidente. — Cuide bem de minha irmãzinha. É só o que
peço. — Estende a mão. — Bem-vindo à família.
Eu sorrio e o puxo para um abraço. Anna o ama, portanto, preciso
me dar bem com ele.
— Eu amo sua irmã mais do que consigo colocar em palavras, Lipe.
Fique tranquilo que ela será bem-cuidada. — Garanto-lhe quando nos
afastamos. Olho os dois primeiros homens da vida de minha esposa e
completo: — Vocês serão sempre bem-vindos para nos visitar e prometo
levá-la ao Ocidente quantas vezes quiser. Anna não será a típica esposa
árabe submissa. Ela sempre terá suas vontades respeitadas por mim. —
Isso agrada aos dois, que sorriem de volta.
— Coitado de você se não respeitasse. — Seu pai zomba, o tom
orgulhoso do temperamento irreverente da filha. Sorrio também porque ele
tem razão. Anna tem um espírito livre, vibrante, e não quero que perca isso
jamais.
Quando eles se afastam, minha atenção volta para ela. O banquete
está a todo vapor, muita gente dançando, mas eu não posso esperar nem
mais um segundo para estarmos a sós, poder beijá-la, tocá-la livremente.
Ela deve estar sentindo a mesma coisa, pois anda para mim, decidida. Seus
braços envolvem meu pescoço quando me alcança e seguro sua pequena
cintura.
— Leve-me para o quarto, habib. Agora — pede, a boca carnuda
tentadoramente perto da minha.
— Todos esperam que fiquemos até o final, essa é a tradição —
sussurro e geme frustrada. Eu rio perverso, levando minha boca para seu
ouvido: — Mas meu pau não pode mais esperar mais tempo sem afundar
em você… — Ela ofega, estremecendo, a pele do pescoço arrepiando.
— Vamos subir, habibti.
Nós sorrimos e nos esgueiramos, escapando para o elevador mais
próximo. Alguns minutos eu a pego nos braços, abrindo a porta de nossos
aposentos. O cheiro de incenso entra em minhas narinas. Nuria se
encarregou de preparar nosso quarto para nossa primeira noite. Quando
avanço pelo living ladeado de velas alaranjadas, noto o chão coberto de
pétalas de rosas de várias cores. Ouço um ofego de Anna e rio, beijando-a
na têmpora. Há uma imitação de tenda beduína montada no centro da sala,
as luzes baixas de candelabros e velas espalhadas pelo chão aqui e ali
deixam o ambiente romântico e sensual ao mesmo tempo. A coloco no chão
e meus braços enlaçam imediatamente sua cintura. Ela cinge meu pescoço
com os braços e nos olhamos deixando toda a paixão e desejo escancarar
em nossos rostos. Nossos narizes deslizam pelo rosto um do outro,
inalando-nos, nossas bocas roçando uma na outra. Subo uma mão pelas
costas esguias e seguro sua nuca, meus olhos presos aos dela, então,
mergulho a boca na sua.
Nós dois gememos, aliviados por nos sentir depois de tantos dias,
mas também ansiosos para experimentar o prazer imensurável que é
estarmos ligados, unidos no ato de amor. Nossas bocas se sugam
mutuamente, nossas línguas se encontrando, se enroscando tão gostoso que
eu rosno, a mão de sua cintura descendo para a bundinha firme. Puxo sua
pelve para a minha, esfregando meu pau duro nela. Anna choraminga, antes
de aprofundarmos o beijo, seus dedos entranhados em meus cabelos da
nuca, abaixo do turbante. Mordo sua boca e desço para o queixo, sugando
devagar, raspando os dentes.
— Eu te amo tanto, habib — murmura, os olhos verdes brilhando na
parca iluminação fazendo meu coração inchar de tanto amor por ela. —
Amo ser sua — completa me olhando com tanto amor, adoração. Eu solto
um rugido satisfeito. Sua entrega me envaidece, me deixa arrogante que
tenha me escolhido.
— Eu te amo, minha rainha — sussurro com todo o meu coração e a
beijo de novo, duro, áspero, louco para me enterrar logo em seu calor
perfeito. Ela sorri, arfando, e arranca a boca da minha.
— Estou louca para ter você dentro de mim também, meu amor.
Mas preparei algo para meu rei antes. — Sopra em minha boca. — Me
ajude a tirar o vestido, habib — murmura e eu obedeço mais do que
depressa. Giro-a, colocando-a de costas para mim, e passo a abrir cada um
dos botões do lindo vestido.
Então, minha respiração é sugada para dentro dos pulmões quando
vejo a primeira tatuagem. Karim. Allah, eu abro mais e mais botões vendo
que meu nome está pintado em sua pele, a tinta escura contrastando com
sua tez morena clara. Meu pau baba nas calças e eu rosno, empurrando as
mãos pela cinturinha, tirando o vestido para que eu possa apreciar esse belo
presente de minha esposa. Retiro as mangas pelos braços delicados e vou
rosnando como um animal irracional. Mais nomes. O tecido cai aos seus
pés e me afasto um pouco para ver que sim — costas, braços, bunda, coxas:
meu nome está por todo lugar, marcando-a. Puxo suas costas contra meu
peito e mordo sua nuca. Ela estremece em meus braços e minhas mãos
sobem pelos seus braços, ombros e descem pela frente, enchendo as mãos
em seus peitinhos durinhos.
— Allah, que presente lindo, minha esposa — sussurro em seu
ouvido, sugando seu lóbulo, descendo a boca e chupando seu pescoço. Ela
geme, choraminga, pegando minha nuca por trás. Amasso os dois montes
perfeitos e puxo os bicos com mais pressão enquanto minha boca desce
mais para seu ombro, mordendo-o em cima do meu nome.
— Que bom que gostou, habib. — Ela diz ofegante. — Mas ainda
tem mais…
— Sim, terá muito mais, eu te comendo de todo jeito até me cansar,
sua garota atrevida — digo asperamente e ela tem a ousadia de rir. Eu desço
uma mão pelo ventre macio e enfio pelo cós da calcinha branca de renda.
Enlouqueço ao encontrar sua boceta pingando para mim. Esfrego os lábios
melados, trazendo umidade para o clitóris, e o massageio devagar, apenas
aumentando seu tesão. Estou a ponto de enfiar meus dedos em seu canal
quando ela escapa dos meus braços. — Volte aqui, Anna. — Rosno,
tentando puxá-la de novo, mas ela sai do meu alcance, negando com a
cabeça. Se livra da ilha de tecidos, pegando o vestido e correndo em direção
ao closet.
— Pegue uma bebida e vá para as almofadas na tenda, meu rei. —
Coloca apenas a cabeça para fora da porta e eu resmungo. — Vou fazer
valer a pena, prometo.
Eu rio da minha impaciência e me forço a relaxar, indo abrir a
champanhe no balde de gelo sobre a bancada do bar. Sirvo duas taças e me
livro da camisa da farda militar, da espada. Mantenho o turbante negro, com
pequenas joias pendendo das bordas. Anna gosta de me ver com ele, diz que
pareço um sultão otomano. Eu vou me acomodar no colchão e almofadas
colocados embaixo da tenda. Tomo um gole da minha taça e o som é ligado,
os acordes instrumentais de uma música árabe ressoam no ambiente. Então,
Anna sai do closet e minha respiração torna a travar ao ver seu traje. Está
vestida como uma dançarina típica de nosso povo. Uma saia de cós baixo,
adornada por lenços coloridos, deixando a cintura perfeita e o umbiguinho
lindo à mostra. Um sutiã vermelho adornado de joias variadas. Ela manteve
a joia de pérola sobre a cabeça, mas agora seus longos cabelos estão soltos.
Meus olhos estão presos, hipnotizados, acompanhando-a quando anda até a
frente da tenda.
Ela se curva numa mesura como as escravas faziam com os seus
sultões, se ajoelhando, e o corpo pendendo para trás, as coxas abertas, os
véus se abrindo e deixando-as de fora. Seu corpo forma um lindo arco e eu
aperto meu pau dentro das calças. Quero comê-la nessa posição. Então, ela
gira hábil e lindamente, ficando de pé, e seus olhos encontram os meus
quando começa a mexer sinuosamente a cintura. Baba se reúne em minha
boca ao ver os movimentos perfeitos. A música vai pegando ritmo e seus
movimentos vão se tornando mais ousados, sensuais, sedutores. Mistura
passos que aprendeu em seus anos de balé. Isso lhe dá uma flexibilidade
deliciosa na cama. Eu rio perverso, tomando mais champanhe, meus olhos
presos a ela por cima da borda. Ela gira pelo espaço, os quadris gingando,
ora várias vezes para um lado, ora para o outro. Ela faz um movimento de
tremer os seios, as joias balançando, me fazendo salivar mais para colocar
minhas mãos e boca sobre ela.
A música continua e Anna puxa um véu da cintura, jogando em
minha direção. Eu agarro e o levo ao nariz. Ela continua, retirando um a um
até que rosno, percebendo que está nua por baixo. Allah! Me arrasto até a
borda do colchão, ela sorri ousada e puxa o último que estava escondendo
sua bocetinha linda e depilada. Ela volta a girar, apenas com o cinto de joias
pendurado na cintura e o sutiã. Então, para de costas e abre o fecho do sutiã
puxando-o, e com um olhar malicioso por cima do ombro o joga para mim.
Eu me arrasto mais conseguindo pegar a peça e levo ao nariz de novo,
inspirando seu cheiro profundamente. Ela vira de frente e faz o movimento
sinuoso novamente, suas curvas suaves e nuas; meu nome espalhado em
cada parte do corpo delicioso me faz rosnar e me levantar, indo em sua
direção. Anna torna a sorrir e retira o cinto, ficando completamente nua
para mim.
— Deliciosa, porra. — Eu rujo, minhas mãos pegando sua cintura
possessivamente, trazendo-a para mim. — Linda demais e eu sou o mais
sortudo entre os homens, habibti. — Ela sorri, ofegante, os peitos subindo e
descendo, uma camada fina de suor brilhando em sua pele. Outra música
árabe começa e eu mergulho minha boca na dela, passando a nos mover no
ritmo sensual. Anna sorri, se pendurando em meus ombros, e nos beijamos
de olhos abertos, nossas bocas mergulhando sofregamente uma na outra,
recuando, voltando, nossas línguas se lambendo em pinceladas luxuriosas e
eróticas. Seus belos olhos são tão apaixonados para mim como os meus
para ela. Meu corpo inteiro está gritando para entrar nela e saciar meu tesão,
mas vou refreando, tomando meu tempo porque quero sentir tudo,
absolutamente tudo nesta noite.
Arfamos na boca um do outro, sentindo a música pulsando,
reverberando em nossos corpos. É lascivo dançar com ela nua enquanto
ainda estou vestido, e eu gosto disso. Me embriago nela, minha mulher,
minha rainha. Seguro sua nuca e chupo sua língua com força, uma mão
acariciando suas costas, a bunda gostosa. A puxo mais e mais para mim,
esfregando meu pau em seu corpo quente e delicioso. Nos movemos
lentamente, deixando o ambiente e a sensualidade do ritmo nos comandar.
Nos olhamos e nos esfregamos gostoso, seus peitinhos espremidos e
roçando meu peitoral nu. Nossos olhares fixos, quentes um no outro o
tempo todo. Nossas bocas se deixam e ofegam uma na outra. Passo a sugar
seu lábio inferior, mordendo-o, lambendo-o. Anna choraminga, me puxando
pelos ombros, completamente entregue a mim. Minhas mãos exploram seu
corpo todo, gananciosas. Me divido, pegando sua bunda, abrindo as
bochechas firmes e pegando sua bocetinha melada pela frente. Um
choramingo cai da sua boca e um rosnado do meu.
— Sua boceta está tão pronta para mim, habibti. Eu quero você no
meu pau a noite inteira — digo com aspereza, minhas mãos cavando em sua
boceta e cuzinho. — Quero você por completo esta noite, minha esposa.
— Ah, Karim… Sim, habib… Eu quero isso também. — Seu
gemido se transforma em grito, seu corpo convulsionando quando empurro
dois dedos em sua vulva, os dedos da outra mão circulando seu buraquinho
traseiro. Dou um tapa firme em sua bunda, fazendo a minha garota safada
ganir, serpenteando o corpo flexível no meu. Sua mão pressiona minha
nuca, me puxando mais, e mordisca minha boca. Ranjo subindo a mão livre
para sua nuca, pegando um punhado de cabelo, puxando-o com firmeza.
Seu canal pulsa, lateja em meus dedos, e rio malvado, cavando
perversamente mais fundo dentro, esfregando suas paredes cremosas num
vai e vem intenso, meu polegar passando sobre o seu montículo inchado.
Anna mergulha a boca na minha e a deixo pegar a dianteira, chupando a
minha língua. Como-a com os dedos, ela arfando em minha boca. Levo
meus lábios para o seu ouvido, lambendo a ponta da orelha, mordendo-a em
seguida. Ela estremece em meus braços. Estamos os dois enlouquecidos de
tesão, embriagados um no outro.
— Me ofereça os peitinhos para eu chupar bem gostoso, Anna. —
Peço num grunhido, ela geme, pegando os dois montes perfeitos, arqueando
as costas, oferecendo-se para mim. — Isso, minha putinha. Ofereça esse
corpo perfeito para o seu rei. — Sussurro as palavras chulas, fazendo-a
choramingar e molhar mais meus dedos. Ela adora a nossa sacanagem,
assim como eu. Com um sorriso indulgente, abaixo a cabeça e passo a
lamber os biquinhos eretos, doce e lentamente.
Ela se contorce em meus braços e rio mais, perverso antes de minha
boca engolir os dois mamilos de uma vez, abocanhando-os com gula insana.
Mamo com firmeza engolindo as auréolas inteiras. Meus dedos aceleram,
fodendo-a forte, bem fundo. Resfolega e sinto sua pele arrepiando, me
deixando saber que está perto do orgasmo. Chupo um e outro seio, cada vez
mais ganancioso, rolando a língua no mamilo, mordendo perversamente, e
minha garota explode em gozo, um gemido alto caindo da boca carnuda.
Observo o rosto lindo e transformado pelo prazer.
— Linda. Sente-se no colchão e abra essas coxas para seu marido.
— Retiro os dedos de sua boceta e os levo à boca, sugando seus líquidos
com vontade. Anna geme vendo minha luxúria. — Sua bocetinha não vê a
hora de engolir todo o meu pau, não é, minha rainha? — Digo com
condescendência, empurrando-a delicadamente em direção à tenda. Ela vai
e eu rosno, olhando sua bunda, a fênix em suas costas. Allah, ela me deixa à
beira de uma combustão. Eu retiro minhas calças e botas, o turbante,
deixando meus cabelos caírem livres pelos ombros, e ando atrás dela. Ela ri,
andando com sua sensualidade e irreverência próprias. Quando alcança o
colchão, se abaixa, ficando de quatro, me mostrando a boceta e o cuzinho
delicioso. Eu aperto meu pau, vendo-a girando o corpinho ágil, sentando-se
na borda e puxando as pernas bem arreganhadas para os lados. Gemo rouco,
contemplando cobiçosamente cada centímetro dela, meu olhar cravando na
bocetinha toda aberta para mim. — É minha rainha… — Minha voz é
baixa, repleta de luxúria enquanto me aproximo devagar. — Mas é minha
putinha também, e ama isso.
Ela arfa, seus incríveis olhos cintilando na penumbra. Paro na sua
frente e pego meu pau, esfregando meu eixo para cima e para baixo. Rio
quando seus olhos cobiçosos acompanham meus movimentos. A língua
lambendo os lábios vermelhos e indecentes. Me aproximo mais e encosto a
cabeça bulbosa em sua boca.
— Chupa meu pau bem gostoso, habibti — digo com rudeza e ela
ousa sorrir, estendendo a mão para as minhas bolas, massageando-as
provocantemente, olhos fixos nos meus.
— Como queira, meu sultão lindo — murmura e abre a boca
engolindo a ponta do meu pau e eu rosno, meu corpo todo arrepiando. Se
afasta e beija a cabeça delicadamente e pega meu eixo grosso pela base com
a outra mão. Masturba-me devagar enquanto me lambe como se fosse seu
sorvete preferido. Gemo rouco, pegando seus cabelos, juntando-os em um
rabo de cavalo. Nossos olhares fixos e ela passa a sugar a cabeça, sem
avançar muito, me deixando louco, pulsando em sua boca.
— Engole meu pau todo.… Vai, mama bem gostoso, Anna. —
Ranjo os dentes, puxando firmemente seus cabelos, subjugando-a. Ela
choraminga e enfim abre a boca, me levando bem fundo em sua garganta.
Eu urro, jogando a cabeça para trás, prazer feral se espalhando em meu
corpo todo. Passo a foder seus doces lábios com estocadas firmes e olho
para baixo, tudo em mim inflamando mais ao ver meu eixo grosso e longo
esticando seus lábios. Observo-a mamar em mim, puxando seus cabelos,
mantendo-a cativa. Lágrimas brotam em seus olhos, mas isso só a faz
aumentar o ritmo, sugando-me todo. Estremeço, o choque gostoso pesando
em minhas bolas, meu pau incha mais e o empurro até o fundo em sua
garganta. — Anna… Ohhh, eu vou gozar! — Ranjo os dentes novamente,
ela massageia meus testículos e eu urro, começando a jorrar meu sêmen em
sua boca quente. Engole tudo, seus sons engolindo minha porra me deixam
mais insano de amor e luxúria. — Habibti… Assim, minha rainha, beba
cada gota… — Continuo observando-a engolir tudo enquanto me derramo
nela.
Choraminga entalada em meu eixo, sugando e bebendo meu gozo
com ganância. Rio da sua gula e me retiro devagar de sua boca. A visão é
perfeita, seus lábios inchados, gotas do meu esperma sobre o batom
vermelho. Ela corre a língua pelos lábios, levando tudo para dentro, como
uma boa menina. Empurro-a gentilmente e ela se deita no colchão, o corpo
todo aberto à minha espera e eu vou, segurando suas coxas bem
arreganhadas; abaixo meu rosto e esfrego meu nariz em sua carne toda
encharcada, inalando-a profundamente. Seu corpo estremece todo e passo a
chupar seus lábios delicados juntos, correndo meus dentes em sua
protuberância e voltando à vulva, enfiando a língua em seu canal. Rosno
pegando o creme doce e puxo seus quadris, trazendo-a de encontro ao meu
rosto e devorando-a com voracidade. Anna gane, seus dedos enfiando em
meus cabelos.
Solto rugidos animalescos esfregando meu rosto todo em sua carne
molhada. Rodo a língua em seu clitóris construindo sua excitação mais e
mais. Enfio a língua dura em sua vulva, lambendo tudo, e desço mais
rodando a língua em seu anelzinho gostoso. Contemplo seu rosto, satisfação
arrogante me enchendo pelo prazer que lhe proporciono. Empurro dois
dedos em sua vulva melada e continuo lambendo, chupando seu cuzinho.
Anna choraminga, lamenta-se, rebolando em minha cara. Rio perverso e
levo os dedos da boceta para seu pequeno buraco. Enfio um e ela resfolega,
mas relaxa, deixando-me meter todo. Torno sugar seu clitóris aplicando
mais pressão e acrescento mais um dedo em seu cuzinho, passando a comê-
la bem fundo. Seu corpo muda, os sinais do gozo começando a aparecer,
sua respiração fica mais rápida.
— Karim, meu amor… — Geme sua declaração, e é com pesar que
retiro meus dedos e paro a sucção. — Não, por favor…
Rio, me debruçando, depositando um beijo reverente em sua boca
inchada. A carrego para o centro do colchão e a giro de bruços. Ela suspira,
as mãos juntando o lençol branco de seda egípcia. Escarrancho suas coxas e
abro bem suas bochechas firmes, meu pau saltando, ficando completamente
duro e pronto para continuar o jogo. Me debruço e lambo seu buraquinho de
novo, descendo mais e pegando os lábios da bocetinha. Minha garota linda
e devassa geme, se contorce embaixo de mim, empinando-se toda. Não
resisto e dou tapas nas bochechas, amando ver o tom rosado em sua pele.
— Eu vou comer sua boceta assim; se meu tamanho incomodar
muito, me fale. — Aviso, me debruçando sobre suas costas. Eu beijo sua
pele reverentemente, possessividade inflamando minhas veias, vendo meu
nome por todos os lados. Arrasto minha boca, mordendo-a no ombro
direito, e ela estremece, gemendo rouca, o som lamentoso, necessitado. Me
alinho em sua vulva e pego seu pescoço pela frente fazendo-a me olhar e
minha boca desce na sua num beijo invertido, então eu meto o pau todo,
abrindo suas paredes até o fundo. Anna convulsiona, gritando em minha
boca. — Demais, habibti? — Pergunto, parando todo embainhado em seu
calor apertado.
— Ahh, Jesus… — Choraminga em desamparo, palpitando à minha
volta. — Dói, mas você é delicioso, meu rei. — Rosno ao ouvi-la dizer isso.
Puxo quase tudo e volto, indo mais fundo, mais forte. Ela berra e eu rio
perverso, comendo-a com golpes duros e fundos. Pego suas mãos sobre o
colchão e entrelaço nossos dedos, meu pau empurrando profundamente
nela.
— Tão gostosa, minha rainha.… Deliciosa demais… — Sussurro
em seu ouvido, raspando os dentes em seu lóbulo, sugando-o depois.
Como-a enlouquecido de tanto prazer. Ela geme a cada estocada dura,
minha pelve batendo grosseiramente em sua bunda, meu pau se enterrando
até o punho. Continuo provocando-a com palavras lascivas: — Como amo
rasgar essa bocetinha apertada… — Ela convulsiona, arfando, empinando-
se, pedindo para levar tudo de mim e eu não tenho pena, bato com força. —
Assim, meu amor.… Toma meu pau bem fundo… — Ela choraminga, me
recebendo até as bolas. Meu corpo inteiro estremece pelo prazer abrasador
que é estar dentro dela. — Toma mais, habibti… Isso, leva tudo nessa
bocetinha gostosa… — Seu corpo inteiro arrepia e bato profundamente,
fazendo-a berrar, misturando dor e prazer, e ela goza gritando meu nome, o
quanto me ama. Continuo comendo-a com voracidade, batendo duro. Enfio
as mãos por baixo do seu torso e pego seus peitinhos, amassando, apertando
os biquinhos.
— Ah, droga… Você é tão gostoso, habib… — Diz baixinho, seu
rosto afogueado, a respiração entrecortada. Como-a até passar seus
tremores. Beijo seu pescoço, ombros e puxo para fora, devagar. Abro sua
bundinha e encosto a cabeça molhada do meu pau em seu anel. Ela geme
longamente. É um som saciado, mas ainda ganancioso. Eu rio indulgente e
passo a massagear seu pequeno orifício, preparando-a para relaxar e me
tomar.
— A mais perfeita entre as mulheres, minha rainha… — Elogio-a,
minha voz engrossada, e vou empurrando devagar. Gememos os dois
quando a cabeça rompe o esfíncter e seguro seus ombros, metendo devagar,
mas só parando quando me enterro todo. Ela berra e geme depois, seu canal
pulsando à minha volta. — Shh, abra esse cuzinho gostoso para o meu pau,
habibti. — Ela geme, pulsa mais e puxo um pouco para fora, passando a ir e
vir lentamente, comendo-a com cuidado, construindo sua excitação de
novo. Grunhindo alto, estoco profundamente, duro. Anna torna a berrar,
mas tenta rebolar, mostrando que adora isso tanto quanto eu. Me debruço e
pego seus cabelos da nuca, obrigando-a arquear-se para trás, e eu bato nela
perversamente. Ela se empina mais, convidando-me a ser mais voraz.
A puxo para trás, fazendo contorcionismo, mas nos levantamos sem
sair de seu aperto gostoso. A empalo, suspendendo-a do colchão, e ando
com ela pelo quarto em direção ao sofá mais próximo. Me sento,
colocando-a escarranchada sobre as minhas coxas. Torno a pegar seus
cabelos numa rédea, seguro sua cintura e soco meu pau todo até as bolas em
sua bundinha apertada, metendo de baixo para cima, empalando-a sem
restrição. Estamos gemendo, ofegando alto, suados, completamente
afogados em nosso amor, paixão e luxúria. Anna apoia as minhas mãos em
minhas coxas e eu urro alto, entrando até não poder mais. Acaricio-a com a
mão livre, apalpo cada centímetro perfeito dela, os peitinhos deliciosos, e
desço pelo ventre até a bocetinha. Esfrego sua carne e empurro dois dedos
em sua vulva. Ela geme, deitando a cabeça em meu ombro. Deixo seus
cabelos e agarro seus peitinhos outra vez, virando o rosto, minha boca
sugando seu pescoço. Como-a nos dois lugares, meu polegar encontrando
seu feixe de nervos e apertando-o com pressão perversa. Minha boca sobe
para a sua e nos beijamos lascivamente, enquanto a como assim por alguns
minutos. Então, me levanto com ela empalada, suspensa do chão, e ando até
a janela, nos dando a visão do deserto.
— Olhe para isso, habibti… Você pertence ao deserto. Pertence a
mim, Anna — sussurro em seu ouvido, colocando-a em seus pés. Ela se
ampara no batente, empinando-se toda.
— Sim, sim, meu rei. Eu pertenço a você, só a você — murmura,
sua voz entrecortada pelas minhas estocadas. Minhas mãos passeiam por ela
inteira, coxas, cintura, seios, bocetinha, marcando cada centímetro com a
minha posse.
— Vamos, me faça gozar de novo, minha putinha… — Rosno,
segurando seus quadris, socando nela com força. Choraminga, arranhando a
madeira da janela, arqueando-se para me tomar mais fundo, rebolando em
meu pau, e a fodo com uma fome animal. Rasgo-a sem pena, levando uma
mão para sua boceta de novo, esfregando seus lábios, seu clitóris. Torno a
enfiar dois dedos. — Ohh, Anna.… Goza comigo, habibti… — Gemo
guturalmente, comendo-a mais forte, mais rápido e, então, urramos juntos.
Nossos corpos convulsionam em ondas de gozo escandalosas,
arrebatadoras.
Pego-a pela cintura e continuo metendo, esporrando, estremecendo,
rosnando, cheirando seus cabelos. Anna vira o rosto para o meu e nossas
bocas se chocam gananciosas. Suor escorre em nossas peles. Nosso beijo
vai ficando mais suave, enquanto os tremores diminuem. Abrimos os olhos
juntos e nos encaramos fixamente, apaixonados, saciados. Sorrimos
arfantes, cúmplices. Eu saio devagar do seu calor e tomo-a nos braços,
voltando para a tenda. Ela me abraça pelo pescoço, os olhos verdes
brilhantes, lânguidos.
— Minha princesa linda e destemida… — Sussurro contra a sua
boca, nossas expressões são ternas agora que o tesão louco foi saciado. —
Minha rainha. Você nasceu para ser minha.
— E você também nasceu para ser meu. Meu cavaleiro, meu
príncipe guerreiro — murmura de volta. Eu rio, gostando desses adjetivos.
— O mais lindo e perfeito. Meu rei, meu amor.
Alcanço o colchão e nos abaixo, deitando-a sobre as almofadas.
Pego o champanhe no balde e sirvo uma taça, lhe dando na boca. Ela bebe
avidamente.
— Eu peguei muito pesado, minha rainha? — Provoco-a, tomando
um pouco do líquido gelado também. Anna bufa, irreverência marcando seu
rosto bonito.
— Eu posso aguentar a noite inteira, honorável Majestade —
ronrona e eu gargalho, me deitando de lado, puxando-a para perto. Beijo
seus cabelos e fecho meus olhos, meus braços rodeando-a, meu coração tão
cheio de amor que parece perfeito demais para acreditar.
— Shukran por me devolver a vida, Anna — murmuro e ela levanta
o rosto para o meu. Há uma expressão linda e reverente em seus belos olhos
verdes. — Você nunca irá se arrepender de me escolher para entregar seu
coração de novo, habibti.
Lágrimas se formam em seus olhos e meu peito aquece.
— Shukran por fazer meu coração bater de novo, Karim — sussurra,
me dando um beijo suave e emocionado. — Você nunca se arrependerá por
me escolher quando todos eram contra.
Eu traço seu rosto com as pontas dos dedos.
— Eu amo você, malikati. Que Allah nos permita envelhecermos
juntos, nos amando tão intensamente quanto agora — murmuro, meus olhos
ardendo de amor, devoção, verdadeira adoração por essa garota linda.
— Eu amo você, malkaa. — Sua voz soa um pouco embargada.
Seus olhos presos aos meus, sua mão vindo para o meu rosto. — Ele vai
permitir. E nosso amor só irá crescer a cada dia, cada ano que passarmos
juntos, habib.
Eu pego seu queixo e a beijo com delicadeza. Um beijo cheio de
promessas e fé no futuro. Que Allah nos guie para uma vida plena e feliz.
Eu sempre irei agradecer a Ele por me trazer essa linda princesa irreverente
e destemida. A minha amada rainha.
EPÍLOGO
Ardócia, quatro anos e cinco meses depois…
“Porque quando você me desdobra e diz me ama e olha nos meus
olhos. Você é a perfeição, minha única direção. É fogo em chamas. É fogo
em chamas.”
(Sam Smith – Fire On Fire)
Anna Julia
Olho através da janela do jato as montanhas verdejantes me fazendo
suspirar, meu peito se enchendo de alegria. Minha linda e amada Ardócia.
Essa vista sempre me encantou desde pequena. Eu amo essa ilha. Meu
padrinho sempre fez com que nos sentíssemos em casa a cada visita. Karim
cumpriu a sua promessa e visito minha família várias vezes ao ano. Quando
está com a agenda menos cheia, me acompanha. Meus olhos desviam para o
meu lindo marido na poltrona à minha frente. Está entretido, trabalhando
em seu notebook. Usa o cabelo preso no coque que amo, calça jeans escura
e uma camiseta cinza de mangas compridas. Allah, como é lindo. Mesmo
depois de quase cinco anos de casamento, olhar para ele ainda me deixa
toda boba. Eu acho que sempre irei olhá-lo dessa forma, com total
encantamento. Karim sente o meu olhar e levanta o rosto, os olhos escuros
encontrando os meus. Sua boca contorce num meio-sorriso arrogante por
me flagrar babando nele.
— Não me olhe assim, habibti. Estamos aterrissando, não temos
tempo para foder de novo — murmura asperamente, me fitando com
intensidade, mostrando que também não consegue ter o suficiente de mim.
Eu gemo baixinho e sorrio maliciosa.
— Estou satisfeita com a atenção que meu marido lindo me deu
ainda há pouco… — Ronrono, fazendo-o grunhir. Passamos as primeiras
horas do voo no quarto principal, matando um pouco do nosso tesão. Ele
esteve em viagem diplomática por uma semana na Jordânia. Chegou hoje
pela manhã e já tivemos que pegar o avião para cá. Meu padrinho está
completando sessenta e cinco anos amanhã e a família estará toda na ilha
para comemorarmos. — Mas minha saudade só será amenizada depois de
uma noite inteira com você dentro de mim.
Seus olhos brilham com mais intensidade.
— A minha também, habibti. Odeio viajar sem você — diz e fecha
o notebook. — Encerrei aqui, venha sentar-se comigo, malikati. — Um
sorriso feliz repuxa minha boca e retiro meu cinto, andando até a poltrona
do seu lado. Prendo o cinto, me aconchegando em seu peitoral largo. Seus
braços me envolvem e suspiramos os dois. É a perfeição, estar grudada em
seu corpo poderoso. Aos trinta e oito anos, meu marido está simplesmente
arrebatador. Lindo. Cada vez mais delicioso. Seus dedos pegam meu
queixo, levantando meu rosto para o seu, e nos olhamos por uns instantes,
apaixonados. — Vamos ficar alguns dias por aqui, habibti. Amo ver você
com a sua família de sangue. — Eu torno a suspirar feliz quando sua boca
roça na minha numa carícia suave.
— Shukran, malkaa. Te amo tanto — murmuro, meu coração
repleto de amor. Levantando a mão para seu rosto perfeito. Adoro-o com
meu toque e olhar. — Você me faz tão feliz, habib.
— E eu te amo tão profundamente que não há palavras que
consigam mensurar com exatidão, minha esposa — murmura, fazendo
lágrimas felizes se reunirem em meus olhos. Amo quando me chama minha
esposa. Me sinto tão dele. — Você me faz feliz também. Minha linda e
amada rainha.
Então, sua boca se apossa da minha num beijo lento e apaixonado.
Eu gemo, essa sensação, seu gosto é sempre tão perfeito. Nossas línguas se
entrelaçam e nos agarramos, namorando por alguns minutos. As
comissárias de bordo só vêm quando chamamos para nos dar privacidade, e
amo isso, poder estar com o meu rei sem interrupções. Me dá pequenos
selinhos carinhosos e afasta a boca da minha, propondo:
— Depois podemos tirar mais um tempo de folga em qualquer lugar
que você quiser. — Roça o nariz no meu. — Quero passar um tempo só
com o meu amor e nossos filhos.
E eu termino de derreter em seus braços. Nossos filhos. São três
agora. Eu lhe dei dois meninos lindos, que têm sido a alegria dos nossos
dias junto com nossa princesinha linda. Karim Nataniel tem dois anos e
meio. Sim, meu amor me deu esse presente tocante no dia do nascimento do
nosso primeiro menino. Ele nasceu de parto natural e Karim esteve lá
comigo o tempo todo segurando minha mão. E quando pegou nosso filho,
me mostrou o rostinho pequeno e corado se esgoelando.
Minha mente viaja para aquele momento:
— Essa garota linda é a sua mãe, meu príncipe — Karim
murmurou, os olhos derramando lágrimas de felicidade. Seus olhos vieram
para os meus e me encararam com a intensidade que amo antes de
sussurrar: — Vamos chamá-lo de Karim Nataniel, habibti.
E eu chorei copiosamente, meu coração tão cheio de amor pelo
homem especial que tive a sorte de encontrar. Eu vou amá-lo até o fim dos
meus dias.
— Ah, Karim… Que linda homenagem — murmurei entre soluços.
— Meu coração não cabe tanto amor por você, habib.
Ele sorriu, lindo, o rosto moreno banhado de lágrimas, e se
debruçou para mim, sua boca tomando a minha num beijo amoroso,
devotado.
Sorrio, a lembrança da delicadeza de meu rei ainda vívida na
memória. E ele tornou a me emocionar no nascimento do nosso segundo
bebê. Ele se chama Khalil Dominic, em homenagem aos nossos pais.
Completou dois meses semana passada. Por isso, não tenho acompanhado
meu marido em viagens diplomáticas. E é por isso também que estamos
loucos de tesão, aproveitando o retorno pleno da nossa vida sexual, fazendo
nosso sexo safado, gostoso, livre das restrições e cuidados no período da
gestação e resguardo.
— Eu e eles iremos amar tê-lo só para nós, meu rei — sussurro.
Ele assente, voltando a dar pequenos beijos suaves em minha boca.
— Me conte como foi a reunião com as mulheres no palácio do
governo, habibti. — Um sorriso safado repuxa sua boca. — Não
conversamos muito desde que cheguei.
Eu rio, adorando sua safadeza.
— Não, eu precisava cuidar do meu marido lindo. Mostrar o quanto
senti a sua falta — digo baixinho. Seu rosto fica ainda mais suave, gostando
de ouvir isso. — Foi ótima a reunião, meu rei. Elas estão ficando cada vez
mais conscientes do seu papel na sociedade, mesmo uma tão restrita quanto
a nossa.
— Você está criticando seu rei, minha rainha? — Ele enruga a testa,
fingindo-se de ofendido.
— Seu ego é tão frágil assim, honorável Majestade? — Eu rio,
amando provocá-lo.
— Garota atrevida. — Ele geme baixinho. — Hoje à noite, habibti
— rosna, a mão passeando pelo meu corpo, pegando minha bunda,
apertando-a com posse —, vou te mostrar o quanto meu ego é frágil…
Ah, droga, e o tesão volta a queimar meu baixo ventre.
— Voltando ao assunto… — Limpo a garganta e ele dá uma risada
gostosa e profunda. — Shukran por aprovar a lei para nossas mulheres
poderem tirar a carteira de habilitação, meu rei. — Os olhos de ônix
brilham com orgulho.
— Eu farei qualquer coisa para ver a minha rainha feliz —
murmura, a mão indo do meu traseiro para as costas, acariciando-me
deliciosamente. — Nossas mulheres precisam ganhar mais autonomia. E
precisamos inseri-las no Parlamento também.
Assinto.
Karim conseguiu transformar o sistema de governo em Kamar. Há
três anos, o modelo monárquico de Ardócia foi implantado com sucesso. Os
clãs tribais foram garantidos numa espécie de conselho especial, estando
abaixo do grão-vizir, função ocupada por Jalal desde a abdicação do tio
Jafar, poucos meses depois do nosso casamento. Minha relação com o
ancião da família é muito boa desde então. Com o tempo, percebi que ele
não era um homem ruim, é apenas muito apegado às tradições. No entanto,
parece estar mudando de opinião com minhas conquistas e defesa da
ampliação do papel da mulher em nosso emirado. Já conseguimos inclusive
que elas possam votar. O hijab também foi uma demanda que chegou até
mim pelo movimento feminista. Elas queriam ter o direito de escolha sobre
usá-lo ou não. Foi a segunda briga que comprei e levei para o Parlamento.
Após longas sessões, a maioria votou que nossas mulheres teriam o direito
de escolher se querem ou não cobrir os cabelos.
Eu amo usar hijab. Meu amor gosta e o faço para ele. Mas também
gostei de poder andar com os cabelos à mostra livremente. Depois dessa
conquista, ganhei milhões de seguidores em minhas redes sociais. Convites
de organizações em defesa dos direitos das mulheres na Europa e Estados
Unidos surgem o tempo todo para proferir palestras. Acabei descobrindo a
minha vocação. Estudar as leis e lutar pelas mulheres, não só de meu país,
mas ao redor do globo. E continuo fazendo as exposições de fotografia das
minhas viagens como defensora da mulher. Unindo o útil ao agradável,
sempre estou munida com a minha câmera fotográfica. Há alguns meses
visitei o Sudão e orientei um grupo feminista naquele país. Me envolvi com
a questão da educação. As mudanças só ocorrerão com uma educação
substancial sendo acessível a todos. Quanto mais estudadas e entendidas as
pessoas se tornarem, mais fácil será acompanhar a evolução societária.
— Sim, habib. Mas é preciso prepará-las antes de inseri-las no
cenário político. Precisamos mudar a crença popular de que mulheres não
são capazes de assumir posições importantes no governo. Precisamos de
mais escolas e tornar a educação acessível para as nossas mulheres — digo
seriamente.
Até agora temos apenas quatro mulheres no Parlamento. É um
ganho enorme se compararmos com a realidade vivida há cinco anos.
Estamos avançando aos poucos, mas nessa região é cultural a mulher ser
relegada à tarefa de esposa e mãe. As mudanças precisam ser
cuidadosamente planejadas para uma implantação de sucesso.
— Eu já disse o quanto sou orgulhoso de você e de como tem
influenciado positivamente não só nossas mulheres, mas também alguns
homens ranzinzas apegados às tradições? Meu tio que o diga. — Seu tom é
cheio de ternura e admiração e eu suspiro, acariciando seu peitoral.
— Sim, você já disse, meu amor — digo embriagada de amor e
orgulho por ele também. — E eu sou igualmente orgulhosa do meu rei e
suas conquistas. Estamos competindo de igual para igual com o Catar na
arrecadação do PIB e isso se deve a você, Karim. Você é um governante
visionário, progressista e seu povo te ama cada vez mais. —
Ele abre um sorriso lindo, deixando seu rosto ainda mais perfeito.
— Ah, habibti, nada me toca mais do que ver esses incríveis olhos
verdes com essa expressão. — Seus dedos traçam meu rosto delicadamente.
— Que expressão? — Rio me aninhando mais em seu peito.
— De amor, orgulho…
— Veneração pelo meu homem perfeito — completo e seu sorriso
alarga, sua boca descendo na minha mais uma vez.
O comandante avisa que vamos aterrissar e logo as babás retornam
com nossos pequenos, colocando-os nos assentos e tomando as medidas de
segurança. Eu peço meu bebê e Jamile traz o pequeno até mim com um
sorriso. Ele sorri para mim quando o pego nos braços.
— Você já consegue ver o quanto a mamãe é linda, não é, amiri? —
Seu pai sussurra se inclinando, dando um beijo amoroso na cabeleira negra
de Dominic. Eu o chamo assim e Karim o chama Khalil. Os dois nomes
ficam enormes.
Ouço a risadinha de Karim Nataniel na poltrona do outro lado do
corredor. Ele está sentado com Ayla. Eu os olho e meu coração é tomado de
amor por eles. Meus filhos. Ayla acabou me chamando de mãe. Eu aceitei
porque me honra que a minha menininha tenha me escolhido para ser a sua
segunda mãe. Seu pai e eu não deixamos de falar sobre Yasmina, no
entanto. Ela precisa crescer sabendo que houve uma boa mulher que a gerou
e amou muito. Da mesma forma é o nosso menino lindo. Ele irá crescer
sabendo que seu segundo nome é uma homenagem a um garoto muito
especial que agora é um anjo no céu.
— Mamãe! — Ele estende os bracinhos para mim, fazendo um
biquinho agora. — Quer mamãe! — Sua voz soa impaciente.
— A mamãe está segurando Khalil agora, al’amir alsaghir[41]. —
Ayla sorri para o irmão.
Minha menina está com onze anos, uma mocinha linda e estudiosa.
Já fala fluentemente quatro línguas e está frequentando uma escola em
Jawahra. A primeira escola abrigando meninos e meninas do nosso
emirado. Foi a primeira proposta que fiz como rainha e meu rei aprovou.
— Quer papai! — O pequeno esperto muda a demanda e Karim
sorri sendo seguido por mim e nosso staff. Ele pede à Jamile para trazê-lo e
nosso menino abre um sorrisão com alguns dentinhos faltando.
— Pronto, amiri — Karim murmura com amor, ajeitando-o em seu
colo, beijando sua testinha. Ele ri, satisfeito que está com seu pai e perto de
sua mãe. — Sei que você é louco pela sua mãe, mas vou me contentar em
ser o segundo favorito.
Eu rio e o pequeno ri também, como se estivesse compreendendo
tudo. Ele segura o rosto de seu pai e o cobre de beijos babados.
— Isso certamente apazigua seu pai, habib. — Meu amor sorri
lindo, feliz com nosso filho no colo. Me inclino, beijando sua cabecinha.
— Meu menino lindo — murmuro e ele se derrete, seus olhinhos
são verdes, como os meus, mas todo o resto é de seu pai. Ele estende a
mãozinha para o meu rosto, pegando com gana, querendo me puxar para si.
— Espere o avião pousar, meu amor. Mamãe vai lhe dar toda atenção,
prometo.
Quer voltar à birra, mas seu pai começa a conversar com ele para
distraí-lo. Meus olhos vão para minha sapequinha. — Venha sentar-se
conosco, habibti. — Chamo-a e ela retira seu cinto, vindo sorridente para a
poltrona ao meu lado. Suspiro feliz, me inclinando para beijá-la na
bochecha. — Seu pai vai tirar uns dias de folga só para nós, princesinha.
Seus olhos se iluminam e seu sorriso alarga. Minha menina será uma
moça deslumbrante. Só peço a Allah que coloque um bom rapaz em seu
caminho. Seu pai vai deixá-la livre para se casar por amor quando chegar a
hora. Já conversamos muito sobre isso.
— Sério, papai?! Vamos viajar? — Ela exclama com a vivacidade
que me conquistou logo que a vi, há cinco anos. — E para onde vamos?
— Sim, nour hayati. — Seu pai diz com a voz e expressão ternas
para sua menina. — Sua mãe vai escolher um lugar e nós iremos todos.
Quantos dias você quer ficar com o papai, amirati?
Ela se derrete para ele, assim como eu. Sempre amei ver o carinho
com que seu pai a trata.
— Eu posso escolher mesmo? — Seus olhos escuros com raias
douradas brilham de excitação. Seu pai sorri, assentindo. — Mmm. Tenho
uma pausa da escola por três semanas e o senhor só tem sessão no
Parlamento no próximo mês, então esse período está bom.
Eu e seu pai rimos da sua esperteza. Ela chama a secretária de
Karim o tempo todo para saber da agenda do pai.
— Sua esperteza me assusta, princesinha. — Ele meneia a cabeça,
rindo com orgulho da filha.
— Quando voltarmos, vou ajudá-la com o seu perfil no Instagram,
habibti — digo com suavidade. E agora ela se derrete para mim.
Convencemos seu pai a deixá-la criar um perfil nessa rede social. Ela
precisa ir socializando, aprendendo a usar a sua posição para ser uma
influenciadora de mudanças boas em nosso país. Quero a minha princesa
tão fodona que nenhum homem ousará tentar passá-la para trás.
— Shukran, habibti. — Se inclina me beijando no rosto. — Amo
tanto você, mamãe.
E meus olhos se enchem de lágrimas. Meu peito sempre se enche de
amor quando minha menininha me chama assim.
— Ah, meu amor… — murmuro emocionada. — Amo tanto você,
princesinha.
O avião pousa e começa a taxiar pela pista. Olho meu bebê no colo.
Seus olhinhos são escuros, é seu pai inteiro. Está com o punho enfiado na
boca, sugando ferozmente. Eu rio, beijando sua cabecinha perfumada. Já
quer mamar. Meus seios estão cheios e pesados.
— Quando chegarmos, a mamãe vai acabar com a sua fome, habib
— sussurro.
O jato para e as três babás vêm para perto, pegando os meninos
enquanto nos livramos dos cintos. Eu pego Karim Nataniel no colo e ele
abre um sorriso gigante, os bracinhos envolvendo meu pescoço. Seu pai
pega Dominic e Ayla segue atrás de nós para a escada. Inspiro o ar quando
piso fora e meu peito transborda de amor quando vejo meus pais e Lipe lá
embaixo, nos esperando. Na verdade, meus padrinhos, tio Jay e tia Cassie
também estão aqui. Eles são tão doces. Karim desce primeiro e eu em
seguida. Meus pais vêm rapidamente para perto, ansiosos para pegar os
netos.
— Princesinha… Que bom que estão aqui. — Meu pai se aproxima,
me dando um beijo amoroso na têmpora. Meu pais estiveram em Kamar
para o nascimento de Dominic e ficaram por mais de um mês conosco. Mas
já estava com saudades.
— Oi, papai. Já estava com saudades — digo suavemente, beijando
sua bochecha. Ele sorri e beija a cabeça de Karim Nataniel, o pegando no
colo. Meu pequeno vai sorrindo. Ele ama seus avós.
— E esse meninão do vovô? Você cresceu muito em um mês, hein?
— Conversa com o neto, os olhos verdes brilhando de amor e orgulho. Se
vira para Karim e beija a cabeça de Dominic. — E meu outro meninão?
Cada dia mais forte. — Olha meu marido e cumprimenta: — Meu genro, é
bom ver você.
— É bom ver você também, Dom. — Karim sorri para papai. —
Helena, Lipe, como estão? — Meu marido estende os cumprimentos.
— Melhor agora que estão aqui. E você, Karim, como está? —
Minha mãe responde já vindo para mim. Ouço Lipe responder ao
cumprimento de meu marido e começarem a conversar.
Meu pai chama Ayla para perto e se abaixa, beijando-a na bochecha.
— Princesinha, como está? — pergunta para minha menina, que
sorri de volta.
— Muito bem, vovô Dom, e o senhor? — Ayla responde.
Iniciam uma conversa sobre como minha pequena está na escola.
Eles a adotaram como neta também, bem como meu tio e padrinho a
tomaram como sobrinha-neta. E é por essa e outras razões que amo demais
essa família.
— Bambina, já estava com tanta saudade. — Minha mãe me abraça
com ternura, seus olhos âmbares brilhantes.
— Eu também, mamma — digo, recebendo seu abraço amoroso. A
beijo no rosto quando nos afastamos. Ela sorri e dirige a atenção para
Dominic, pegando-o dos braços de Karim.
— Ah, meu amor, você cresceu mesmo em apenas um mês. — Meu
bebê ri para sua avó. Meu pai vai para perto e ela beija Karim Nataniel. —
E você, garotão bonito da vovó? — Meu pequeno se derrete, adorando a
atenção. Ela olha para Ayla perto de meu pai e vai até ela, beijando-a
também, começando a conversar com minha filha.
— Ei, Anna. — Lipe vem me abraçar. Um abraço apertado, cheio de
carinho. Beija meu rosto quando nos separamos. — Saudades de você,
maninha.
— Saudades de você também, bonitão — murmuro docemente para
meu irmãozinho. Ele está mais forte, homem formado aos vinte e sete anos.
Lindo. Está namorando uma engenheira de softwares da Harper e acho que
meu maninho está a caminho de se amarrar em breve. Como todo homem
Di Castellani, ele demorou para assumir a moça, claro.
— Vamos passar uns dias aqui, todos nós — Lipe avisa e
compreendo que ele ou meu pai devem ter falado com Karim, por isso meu
amor fez a proposta. Ele adora fazer tudo para me deixar feliz.
— Maravilhoso, maninho. Vou amar passar um tempo com todos.
— Ele me dá mais um beijo amoroso. — Meus meninos poderão ficar mais
tempo com os primos.
Nossos pais nos criaram sempre juntos e a nova geração está
comprometida com isso. Meus filhos, os de meu irmão e os de meus primos
serão criados como irmãos. Como nós fomos. Por falar nisso, nós temos
trabalho nesse sentido, diga-se de passagem. Rio maliciosa. Eu tenho três,
Mike e Ella têm dois: Rico e minha linda princesinha Ciara; Luc, Samu e
Chloe quebraram a banca e tiveram três numa tacada só! Os gêmeos não
brincam em serviço, minha gente. Dam tem dois: uma menina, Georgia, e
um menino, Leon. Pois é, sei que parece chocante, mas lá vem bomba! Meu
primo sarcástico se casou. A doutora Isadora Moretti conseguiu laçá-lo
finalmente depois de alguns desencontros. Ah, meu primo é o novo rei de
Ardócia. Ele subiu ao trono há três anos, só que não foi nada fácil… Ok,
vou parar por aqui porque meu primo será o próximo a contar sua história
para vocês. Só mais um spoilerzinho? Ok, são dois. As gêmeas se casaram
há dois anos com os bonitões da Fórmula 1 e estão grávidas de dois meses.
Dá para acreditar nisso? Elas cronometraram esse negócio ou algo
assim? Eu perguntei exatamente isso e elas riram da minha observação. E,
por último, meu lindo primo mais novo, Max também está namorando
firme. Uma repórter intrometida escreveu um artigo denegrindo a imagem
de Dam sobre a construção de um hotel luxuoso no centro histórico de
Ardócia. Max comprou a briga, foi tirar satisfação com a garota e a obrigou
a se retratar em outro artigo. Resultado, eles se estranharam, mas meu
priminho acabou se encantando pela ragazza. Quem diria, hein? Então, é
isso, estamos todos bem encaminhados, obrigada.
A voz de Lipe brincando com meus meninos me traz de volta. Em
seguida, ele vai para Ayla. Minha menina sorri largamente. Ela é
apaixonada por ele e vice-versa. Meus padrinhos vêm para perto me
abraçando e beijando também. Tio Jay e tia Cassie. Logo viramos uma
bagunça, todos falando e nos abraçando ao mesmo tempo.
— Figlia, é tão bom ter todos em casa. — Meu padrinho diz,
parecendo emocionado. Ele adora ter todos os Di Castellani em Ardócia. —
Os Di Castellani todos juntos é sempre uma ocasião para comemoração.
— Jesus, você está parecendo uma mulherzinha choramingando
desde que chegamos, grande rei. — Meu pai sorri com sua irreverência em
dia. Meu padrinhorosna, fazendo uma carranca para o meu pai. Nós rimos,
antevendo seu velho jogo de provocação. Eu amo ver meu pai com seus
irmãos.
— O idiota tem razão, irmão. Você está ficando mole demais com a
velhice. — Tio Jay zomba também.
— Idiotas. Não preciso lembrar que nossa diferença de idade não é
grande. — Meu padrinho resmunga e vai dar atenção para meus meninos e
Ayla. Nós rimos mais.
— Uh, seu prozio[42] está tão sensível, não é, campeão? — Meu pai
continua, fazendo Karim Nataniel rir, como se estivesse entendendo tudo
que seu avô diz.
— Pronto, eles começaram… — Madrinha Julia diz baixinho,
meneando a cabeça.
— É o nosso carma, Júlia. — Tia Cassie sorri furtivamente.
Meu padrinho pega Dominic nos braços e tio Jay tenta pegar Karim
Nataniel dos braços de meu pai.
— De jeito nenhum, bastardo, você tem netos demais. Eu só tenho
três. — Papai tira Karim de seu alcance. Meu tio abre um sorrisão satisfeito.
— Pois é, serão sete. — Faz uma pausa e acrescenta: — Por
enquanto.
— Não fique se vangloriando, ainda tenho Lipe e Leon tem Max. —
Meu pai torna e eles começam a andar em direção às limusines. Vão ainda
discutindo sobre quem vai conseguir produzir mais netos.
— Eu deixo para você, irmãozinho. Fechei minha fábrica. — Brinco
com Lipe. Ele sorri, meneando a cabeça.
— Não estou pensando nisso ainda, maninha. Vamos com muita
calma. — Abre seu sorriso safado e completa: — Embora eu goste bastante
dos treinos…
Nós rimos dele e ele levanta Ayla nos braços. Ela dá um gritinho de
êxtase, rodeando-o pelo pescoço com seus braços.
— E a minha princesinha, fiquei sabendo que está querendo ser uma
digital influencer. É isso mesmo? — Brinca e minha menina ri mais.
— A mamãe vai me ajudar, Lipe — responde. Ela não o chama de
tio, não sei o porquê. Talvez porque Lipe é sempre muito despojado, parece
mais jovem do que realmente é.
Ele anda com ela, conversando, seguindo atrás de nosso pai e tios.
— Vou com seu pai, piccola. — Minha mãe me dá um beijo, seus
dedos acariciando meu rosto. — Tão linda, minha princesa. — Sorrio,
gostando de ser mimada por ela. Me inclino, beijando-a também. Ela segue
com madrinha Júlia e tia Cassie.
Karim passa um braço em minha cintura e beija o topo da minha
cabeça. Levanto o rosto para olhá-lo. Ele tem uma expressão feliz por me
ver feliz com a minha família de sangue. Nós seguimos atrás de Lipe e nos
acomodamos na mesma limusine que já está com Ayla e nos dirigimos para
o palácio.
***
Karim Amihaj
Não é uma frase vazia quando digo que ela é a mais linda e perfeita
mulher. Anna é isso para mim. A perfeição. Nós dançamos juntinhos, nos
beijando devagar, nosso amor borbulhando, nosso desejo exalando em cada
poro. A música tocando é bonita, a letra melodiosa ressoa no quarto:
(...) Mas ainda assim, você tira o meu fôlego, rouba as coisas que eu sei.
Lá vai você me salvando do frio [43](…)
Nossas bocas nunca se deixam, nosso beijo repleto do amor que nos
uniu, nos tornando um só. O refrão chega, a melodia tomando força, e
minha boca fica mais exigente. Subo uma mão pelas costas esguias e seguro
sua nuca, angulando-a para meu beijo possessivo. Ela geme em minha boca,
me mordendo suavemente, depois mais forte. Eu rosno, descendo a mão da
sua cinturinha para a bunda firme. Trago-a para o meu pau, esfregando-me
em sua pelve. Ficamos mais agitados, ofegantes, o tesão se agigantando
sem freio, exigindo ser saciado.
(...) Eles dizem que estamos fora de controle e alguns dizem que somos
pecadores, mas não deixe estragar nossos belos ritmos porque quando você
me desdobra e diz que me ama e olha nos meus olhos, você é a perfeição,
minha única direção. É fogo em chamas. É fogo em chamas (...).
A letra diz tudo que penso sobre nós, sobre ela. Acaricio seu corpo
lindo com as duas mãos. Bunda, costas, ombros, desço pelas laterais, a
cintura delicada e venho pela frente, pegando os peitinhos lindos e agora
bem volumosos pela amamentação. Eles permanecem firmes embora tenha
amamentado nosso primeiro menino e agora nosso segundo bebê. Os
amasso, rolando os bicos agora mais pontudos. Seu corpo está maduro, as
formas mais cheias. É minha mulher e mãe dos meus filhos e isso me deixa
ainda mais cheio de amor e tesão por ela. Geme quando desço uma mão e
enfio entre suas coxas. Solto um rugido ao encontrar a bocetinha toda
melada. Deslizo os dedos entre os lábios, abrindo-os. Anna espalha as
pernas, me deixando esfregar suas dobras molhadas com pressão. Empurro
dois dedos em seu canal apertado e passo a fodê-la, esfregando seu clitóris
com o polegar.
— Karim… — Choraminga meu nome e desço minha boca pelo
queixinho altivo, mordiscando-o. Continuo minha jornada chupando seu
pescoço pela frente, mordiscando sua garganta. Desço mais e abocanho o
seio direito, engolindo a auréola inteira com ganância. Como sua boceta
com mais força, empurrando fundo, enquanto mamo no seio farto. O
líquido materno sai, mas não me importo. É a minha mulher e tudo dela é
meu, como disse ainda há pouco. Assim como tudo meu é dela. Eu sugo,
engolindo seu leite. Ela resfolega. Adora quando faço isso. — Ahh, habib,
que gostoso… — Mia, rebolando em meus dedos. Está perto de gozar, seu
corpo está mais tenso, sua respiração entrecortada. Passo para o outro seio e
mamo com força, comendo-a mais e mais rápido.
— Goza, habibti. Vamos, goza para mim. — Atiço-a e ela grita,
gozando escandalosamente, esguichando o creme em minha mão. Seu corpo
inteiro convulsionando. Ainda está estremecendo com o orgasmo quando
puxo minha boxer para baixo e a levanto pela bunda. — Me abrace com as
pernas. Vou comer minha putinha assim, em pé — digo asperamente e ela
choraminga, enrolando as pernas torneadas em minha cintura.
Esfrego meu pau em suas dobras e encontro a entrada, ela se
pendura em meus ombros e a puxo para baixo, empalando-a com força,
rasgando a bocetinha apertada. Anna berra, os tremores do orgasmo se
misturando com minha entrada brusca. A levanto e abaixo de novo, indo
mais fundo, até o punho. Eu urro pelo prazer de me embainhar em seu calor
apertado.
— Tão gostosa… — Ranjo os dentes, comendo-a com vontade.
Nossos olhares fixos, nossas bocas respirando uma na outra. Firma as
pernas ao meu redor e gira os quadris, me fazendo grunhir, dando um tapa
forte em sua bunda. — Assim, minha esposa, monta meu pau, vamos, leva
tudo… — Nós fodemos freneticamente, buscando nosso prazer no corpo
um do outro, sem nenhum pudor. Ando com ela até o bar e a deposito sobre
um dos bancos. A empurro deitando as costas sobre a bancada e a
contemplo, fascinado. Pego seus peitinhos e os junto, abaixando a boca
sobre eles, chupando os bicos, mordiscando-os. Anna arranha meus braços,
gemendo de boca aberta enquanto soco até as bolas em sua boceta. Cada
estocada sacudindo-a toda. — Que gostoso comer você, porra. — Ranjo, as
mãos delineando sua cintura, coxas. Eu a amo demais. Sou completamente
alucinado por ela.
— Sim, habib, me come assim.… Me fode com força…. — Ela
ousa me atiçar e eu dou mais um tapa em sua bunda. Seguro sua cintura e
trago-a para levar meu pau todo, comendo-a fundo e forte. Suor está
brotando em nossas peles. Nossos olhares se prendem, quentes,
apaixonados um no outro.
— Minha putinha adora ser comida assim, não é? Bem forte? —
digo meio grunhindo, meio gemendo, não parando de meter profundamente,
rasgando o canalzinho estreito. — Ama me deixar rasgar essa bocetinha
pequena. — Ela choraminga, arfando o corpo indicando que vai gozar de
novo, e a pego pela bunda, levando-a para um dos sofás. Saio dela devagar.
— Fique de quatro, habibti — peço, já a colocando na posição, e ela segura
no encosto do sofá. Acaricio sua bunda linda, cravando minhas unhas na
carne macia. — Toda perfeita… — sussurro perdido de amor e lascívia.
Me alinho em sua entrada e olho para baixo enquanto empurro
devagar, apreciando meu pau abrindo as dobras delicadas. Ela fica tão
esticada à minha volta que me faz ranger os dentes. Seguro sua cintura e
puxo meu pau, deixando apenas a cabeça dentro e bato de volta,
profundamente. Anna berra, eu urro. Então, a fodo duro, metendo
vorazmente, segurando sua cintura com força, me embainhando sem dó a
cada estocada. Levo as mãos por baixo e pego os peitinhos, amassando-os,
puxando os bicos enquanto bato dentro e fora, socando gostoso, rude, voraz.
— Ahhh, eu vou gozar, habib… — Geme escandalosa e seu corpo
estremece, a boceta ordenhando meu pau nos espasmos do gozo. Eu
acelero, comendo-a fora de mim de tanto tesão. Minhas bolas estão
doloridas, pesando, e bato bem fundo, então urro guturalmente, jogando a
cabeça para trás, esporrando no fundo da bocetinha quente. Meu corpo todo
estremece, arrepia, a sensação mais intensa e deliciosa explodindo em meu
saco. Puxo-a pelos ombros, trazendo suas costas contra meu peito, e a
envolvo pela cintura, minha boca subindo para seu ouvido, rosnando
perversamente:
— Toma minha porra, minha putinha. Vou gozar tanto em você hoje,
habibti. — Anna resfolega, ainda estremecendo com seu gozo, mas geme
gananciosa. Eu rio e meus movimentos vão parando. Estou ofegando,
suado, minhas pernas bambas da gozada fora de série. Cheiro seus cabelos,
parando todo enterrado nela. Aperto o corpo gostoso em meus braços e meu
amor suspira baixinho. É um som de mulher satisfeita com seu homem.
Beijo seu ombro e em seguida as costas. Mordisco suavemente sua fênix e
puxo devagar de dentro dela. Meu olhar é atraído pelo esperma escorrendo
em suas coxas. Agora é a minha vez de gemer ganancioso. Estou longe de
estar saciado. Viro-a para mim e levanto-a nos braços. — Vamos para a
cama, malikati.
Anna enrola os braços em meu pescoço e enfia o rosto no meu peito,
cheirando-me. Sorrio satisfeito. Minha esposa é tão louca por mim quanto
sou por ela. Atravesso os aposentos e a deposito na cama. Retiro suas
sandálias sensuais e beijo cada pé. Seus lindos olhos verdes cintilam, me
olhando com tanta adoração que meu peito fica todo mole. Me deito junto
com ela e nós nos amamos noite adentro…
***
[1]
Música: Hey, DJ. Intérprete: CNCO. Sony Music Latin. EUA. 2017.
[2]
Grão-vizir: Do árabe “wazir”, designa “aquele que ajuda a carregar um peso”.
[3]
Nour hayati: Luz da minha vida, em árabe.
[4]
‘Amirat saghira: princesinha, em árabe.
[5]
Habib: amado, em árabe.
[6]
Amiri: meu príncipe, em árabe.
[7]
‘Amira: princesa, em árabe.
[8]
Shukran: obrigado, em árabe.
[9]
Wallah: expressão árabe equivalente a “por Deus!”.
[10]
Caftans são uma vestimenta típica do Sudoeste Asiático, herança do Império Otomano que
dominou a região até 1922.
[11]
Shemagh é um lenço comprido que os homens árabes enrolam em torno da cabeça.
[12]
Khara: expressão árabe equivalente a “merda”.
[13]
‘Ant ‘aydaan jamila: expressão árabe equivalente a “você também é bonita”.
[14]
Falaykun: expressão árabe equivalente a “que assim seja”.
[15]
Música Bird Set Free. Sia. Álbum: This Is Acting. RCA. EUA. 2015
[16]
Salaam Aleikum: expressão árabe equivalente a “a paz esteja contigo”.
[17]
Música: Quisiera. Intérprete: CNCO. Sony Music Latin. Estados Unidos. 2016.
[18]
Allah akbar: expressão árabe equivalente a “Deus é maior”.
[19]
‘Abi: expressão árabe equivalente a “papai”.
[20]
Cafia: lenço usado pelos homens árabes.
[21]
Igal: cordão que prende a cafia.
[22]
Hijabs: lenços usados por mulheres mulçumanas.
[23]
Marhabaan: expressão árabe equivalente a “olá”.
[24]
Jellab: Bebida árabe. É uma mistura de melaço de uva e água de rosas, com coberturas opcionais
de pinhões e passas.
[25]
Hafazna Allah: Expressão árabe equivalente a “que Deus nos proteja”.
[26]
Amirati: Minha princesa, em árabe.
[27]
Sharmuta: expressão árabe equivalente a “puta”.
[28]
Dio non voglia: Deus me livre, em italiano.
[29]
Si. Solo la crema: Só a nata, em italiano.
[30]
Malikati: expressão árabe equivalente a “minha rainha”.
[31]
Masha Allah!: expressão árabe de admiração para algo belo.
[32]
Falayfun: Expressão árabe equivalente a “que assim seja”.
[33]
Sshaykh: Termo árabe que significa “ancião”, pode ser usado por qualquer pessoa com
alguma autoridade religiosa. Líderes de ordem, diretores de universidade, chefes de tribo e ulemás
podem ser considerados xeques.
[34]
Malkaa: Meu rei, em árabe.
[35]
Maktub: Estava escrito, em árabe.
[36]
Mangni: Período de três meses correspondente ao noivado na cultura árabe.
[37]
Jawhariin althamin: Minha joia preciosa, em árabe.
[38]
Bambina, il tuo padrino è così Felice: Criança, teu padrinho está tão feliz, em italiano.
[39]
Dio te benedica, figlia mia: Deus te abençoe, minha filha, em italiano.
[40]
Sharbat: Bebida feita com flores e frutas.
[41]
Al’amir alsaghir: Princepezinho, em árabe.
[42]
Prozio: Tio-avô, em italiano.
[43]
Música: Fire On Fire. Intperprete: Sam Smith. Capitol. UK. 2018.