Você está na página 1de 615

Copyright © LANI QUEIROZ

Copyright © 3DEA EDITORA, 2020

Editor Chefe Patrícia Azevedo


Produtor Editorial Daniela Soares
Assistente Editorial Valeria Bueno
Revisão Maciel Salles
Ilustração Mia Klein
Imagem https://www.shutterstock_1156858942

Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1990),
em vigor desde 1° de janeiro de 2016.
Os personagens e as situações desta obra são reais apenas no universo da ficção; não se
referem a pessoas e fatos, e sobre eles não emitem opinião.
É proibida a reprodução total e parcial desta obra, de qualquer forma ou por qualquer meio
eletrônico, mecânico, inclusive por meio de processos xerográficos, incluindo ainda o uso da internet,
sem permissão expressa da Editora, na pessoa de seu editor (Lei 9.610 de 19/02/1998).

Todos os direitos reservados à 3DEA Editora.


www.3deaeditora.com.br
contato@3deaeditora.com.br
Nota para os leitores
Este livro é dedicado a todos aqueles que perderam seu primeiro
amor para a morte.
Este livro é para aqueles que, mesmo em meio à dor, seguiram em
frente, continuaram vivendo e puderam encontrar o amor outra vez.
Este livro é seguramente a minha obra mais tocante até agora.
Me emocionei demais dando vida a Anna Julia e Karim, suas dores,
suas redescobertas do amor. Digitei a última palavra chorando
copiosamente, não querendo me despedir nunca porque, para mim, eles são
mais do que personagens.
São uma lição de vida, de superação, de amor.
Os amo com todo o meu coração e espero que eles consigam tocá-
los como tocaram a mim e às minha betas Wisnaya e Mari de Jesus.
Lhes convido a mergulhar neste lindo e emocionante romance.
Grande beijo!
Lani.
AGRADECIMENTOS
Agradeço sempre a Deus em primeiro lugar, pela inspiração, e
também à minha família pela compreensão nos momentos de isolamento
para criar cada trabalho.
Agradeço a todos os meus leitores, especialmente as lindas
princesas que me acompanham nos grupos do Facebook, Wattpad,
WhatsApp e outras redes sociais. Um beijo gigante para minhas “Lanéticas”
do grupo do WhatsApp.
E, claro, agradeço às minhas betas e amigas pelo apoio. Wisnaya,
Mari, suas observações sempre dão um toque todo especial a cada obra.
Obrigada por me aturar na TPM! Kkk. As minhas queridas adms e amigas
Elineuza e Lays Cristina, obrigada por segurarem as pontas nos grupos.
Minhas queridas betas e adms, amo cada uma! Obrigada! Obrigada!
Agradeço também à minha linda leitora Daiane Dib Najjar Brandão,
que possui origem árabe e me ajudou com alguns termos para passar
realismo nos diálogos. Obrigada, querida!
Meus queridos leitores, mais um trabalho encerrado! Escrevi este
livro em dois meses e fluiu tão bem que estou sofrendo com a despedida.
Me apaixonei e me encantei de tal forma por Anna Julia e Karim que nem
consigo explicar. São os amores da mamis. Espero que se encantem por eles
também. É um romance sobre perdas, superação e novas chances para o
amor. Leiam e me deem seus feedbacks, tanto em forma de avaliação na
Amazon quanto em minhas redes sociais. Vou amar interagir com vocês.
Amei dar vida a esse casal apaixonante. Meu coração foi tocado
profundamente por eles.
Para quem está conhecendo meu trabalho agora, não deixem de
conferir meus outros livros da Série Príncipes Di Castellani: Príncipe da
Vingança, Príncipe da Luxúria, Príncipe da Perdição, Princesa da
Inocência, Príncipe do Domínio e Príncipes da Tentação. Todos se
encontram no site da 3DEA Editora e na Amazon em formato físico e
ebook.
Boa leitura!
Sumário
Nota para os leitores
Agradecimentos
PRÓLOGO
CAPÍTULO UM
CAPÍTULO DOIS
CAPÍTULO TRÊS
CAPÍTULO QUATRO
CAPÍTULO CINCO
CAPÍTULO SEIS
CAPÍTULO SETE
CAPÍTULO OITO
CAPÍTULO NOVE
CAPÍTULO DEZ
CAPÍTULO ONZE
CAPÍTULO DOZE
CAPÍTULO TREZE
CAPÍTULO QUATORZE
CAPÍTULO QUINZE
CAPÍTULO DEZESSEIS
EPÍLOGO
UMA ESPIADINHA EM PRÍNCIPE DO ORGULHO
PRÓLOGO
Nova York, onze anos antes...
“Lá vai ela na minha frente. Pegue minha vida e me liberte novamente. Nós
construiremos uma memória disso.”
(Imagine Dragons - Not Today)

Anna Julia
Esfrego minhas mãos frias e meus olhos turvam ao encarar a porta
fechada do quarto de Nate. Uma mão delicada pousa em meu ombro e me
viro, encontrando os olhos de âmbar preocupados e inchados de minha mãe.
Por quê? Lhe pergunto com meu olhar. Essa pergunta tem se repetido em
minha mente desde que soubemos, há oito meses, que meu namorado, meu
lindo namorado de apenas dezessete anos, foi diagnosticado com uma
espécie de câncer no intestino. Eu e Nataniel Marshal estávamos
namorando há apenas um ano, embora tenhamos sido amigos desde a
educação infantil. Nossas famílias são amigas muito antes de nosso
nascimento.
Deixo minha mente vagar para longe, para qualquer lembrança dele
e de nosso tempo juntos. Lembranças são tudo que terei a partir de hoje.
— O que é, figlia? — Minha mãe perguntou em tom suave. — Sabe
que pode me contar qualquer coisa, principessa mia. Qualquer coisa.
A encarei, alívio me enchendo por conseguir, enfim, contar para ela.
— Eu acho que estou apaixonada, mamãe. — Murmurei com o
sorriso que era reflexo do amor adolescente crescendo em meu peito. Ela
ficou emocionada por sua garotinha estar se transformando numa mulher.
— Oh, figlia. — Abriu-me um de seus sorrisos lindos e amorosos,
chegando mais perto, me abraçando bem apertado. Suspirei feliz e ela se
afastou para me encarar, sua mão tocando meu rosto com um misto de
orgulho e nostalgia, acho. Ela e meu pai têm reclamado que eu e Lipe
estamos crescendo rápido demais. — Quem é o menino sortudo que ganhou
o coração da minha princesinha?
Sei que já desconfia. As mães não deixam passar esse tipo de coisa
em branco, jamais. Eu ri travessa, dando-lhe um beijo estalado na
bochecha.
— A senhora já sabe, mãe. É Nate. — Revelei com todo o amor se
espalhando dentro de mim.
Seu rosto mostrou sua satisfação imediatamente. Nataniel Marshal
é o neto do presidente Jonathan Marshal. Eu e Lipe crescemos em muita
proximidade com os Marshal de Washington, D.C. desde que meu pai
apoiou a campanha do primeiro Marshal para a presidência dos Estados
Unidos. O primeiro perdeu as eleições, mas seu outro irmão ganharia anos
depois, há três anos para ser exata, também com o apoio de nossa família.
Esse é o avô do meu Nate.
— Oh, bambina… — A voz terna de minha mãe soou meio
embargada. — Ele é um bom menino. Eu e seu pai aprovamos, tenha
certeza.
Fiz careta.
— Ele ainda não sabe que me sinto assim, mãe. — Resmunguei,
angustiada por ainda não ter tido coragem de falar para meu melhor
amigo sobre meus sentimentos.
Ela veio para mais perto, recostando-se contra os travesseiros da
minha cama, puxando-me para os seus braços novamente. Eu ri, adorando
ser mimada.
— Eu acho que ele já sabe, querida — murmurou, beijando meus
cabelos.
Levantei o rosto para ela, alegria me invadindo.
— Acha mesmo, mãe? Será que vai me pedir em namoro logo? —
Cerrei o cenho. — Eu não aguento mais esperar.
Isso a fez rir.
— Ele não vai demorar, se for o menino inteligente que acho que é.
— Um sorriso brincou na minha boca, apreciando suas palavras. — Mas
não fique ansiosa, viva cada momento dessa fase tão bonita, figlia. O
momento de vocês vai chegar, não o apresse. Tudo a seu tempo, tesoro mio.
— Grazie, mamma — sussurrei, olhando-a com adoração. Seus
olhos brilharam por eu usar sua língua materna.
— Você está se tornando uma mulher tão bonita, querida. —
Acariciou minha face, seus olhos transbordando. — Tua mamma ti ama
tantissimo.
Meus olhos marejaram também e me enrolei mais em seu colo.
Felicidade imensa me invadia naquele momento.
— Also, mamma.
Eu tinha apenas quatorze anos quando me descobri apaixonada pelo
meu melhor amigo. Mas minha mãe estava certa, meu tempo e de Nate
chegou dois anos depois, quando começamos a namorar oficialmente. Foi o
ano mais feliz da minha vida, sem sombra de dúvidas. O menino mais
bonito da escola me amava e eu o amava. Nos tornamos um só. Foi lindo.
Tudo que vivi ao lado dele ficou gravado em meu coração. Nosso primeiro
beijo, nosso primeiro encontro, nossa primeira noite de amor. Nossa única
noite de amor. Se eu fechar os olhos, ainda consigo sentir tudo, cada
emoção, o calor em seus olhos azuis quando me fez sua. Minha pele
ganhando vida, meu corpo pulsando nas emoções novas e arrebatadoras que
ele me fez sentir. Ali prometemos pertencer um ao outro, para sempre.
O menino loiro com os mais lindos olhos azuis cristalinos foi meu
amigo, meu amor. Porém, não sabíamos que o nosso para sempre seria
breve demais. Apenas dois dias depois que lhe entreguei a minha
virgindade, Nate passou mal e foi levado às pressas para o hospital. A partir
daquele dia, travou uma batalha dura e desleal contra um câncer muito
agressivo. Em poucos meses, nosso inimigo foi minando sua resistência e
forças, até que veio o veredito final: meu namorado não se recuperaria, a
doença o havia tomado por inteiro. Lhe restariam, no máximo, dois meses
de vida.
Suspiro tremulamente, meu coração esmagado pela certeza cruel de
que ele está morrendo lá dentro. Nunca mais o verei, tocarei seu rosto,
sentirei seu cheiro, sua pele quente na minha. Nunca mais o ouvirei
sussurrando que me ama, descrevendo como será o nosso casamento.
Nossos sonhos nunca se concretizarão por um golpe perverso de Deus. Eu
odeio Deus neste momento!
— Anna? — A voz tensa de meu pai me faz olhar para meu outro
lado. Ele está com os olhos vermelhos, a exemplo de minha mãe, aliás,
como todos nesta antessala. Todos que vieram dar seu último adeus a Nate.
— Ele está chamando por você, filha.
Eu volto das minhas lembranças e olho para a porta. Os pais e o
irmão mais novo de Nate estão saindo. Eles são a imagem da devastação. A
mãe chorando, amparada pelo marido, e o caçula de dezesseis anos está
com o olhar mais perdido que já vi em seu rosto. Buscando forças não sei
de onde, me levanto para me despedir do menino que sempre irei amar, não
importa o que aconteça. Meu pai me ajuda chegar até a porta, mas antes de
me deixar entrar, me puxa contra seu peito. Um soluço desconsolado
irrompe da minha garganta.
— Nós estamos aqui fora, princesinha. — Sua voz tem o tom mais
triste que ouvi vindo dele. Sinto seu beijo carinhoso em minha têmpora.
— Obrigada, papai — murmuro, entalada, levantando meus olhos
para os seus.
Não gosto de ver meu pai triste. Ele é a pessoa mais divertida e
otimista que conheço. Sua expressão feroz me diz que ele faria qualquer
coisa para não me ver nesta situação. Todavia, não há nada que um de nós
possa fazer. Eu só posso ir para Nate e passar suas últimas horas ao seu
lado.
Antes de eu entrar, há uma comoção na entrada da antessala. Arrasto
minha atenção para lá e mais lágrimas enchem meus olhos ao ver que é o
restante da minha família. Ella está correndo para mim, sem se preocupar
com o decoro. Assim que sou envolvida no abraço da minha querida prima,
mais soluços me escapam. Eu os forço a cessar, no entanto, não posso
perder o controle agora. Nate não pode me ver destruída dessa forma. Ele
verá minha melhor versão. Lhe darei isso. Me afasto suavemente de Ella.
Seus grandes olhos verdes estão inchados e vermelhos também. Ela segura
minhas mãos, dando um aperto suave, me passando força silenciosamente.
— Estou aqui, principessa mia — murmura, se inclinando e me
beijando com ternura no rosto.
— Grazie, carissima — digo embargada.
— Vá. — Me diz com mais um aperto em minhas mãos antes de me
libertar.
Eu encaro minha família, um a um. Minha mãe e Lipe estão
abraçados, fungando. Meus tios e padrinhos Leon e Júlia, Dam e Max me
dão olhares consternados. Tio Jay, tia Cassie, Mike, Luc, Samu, Sam e Em
me encaram da mesma forma, com profundo pesar. Consigo formular um
pequeno sorriso triste. Eles vieram. Sei que esta noite mudará o resto da
minha vida, mas é reconfortante saber que a minha família inteira está aqui,
para mim.
Então, me viro e entro para enfrentar a crueldade que o destino me
reservou. O barulho do bip da máquina ligada ao corpo de Nate é baixo,
porém, com o silêncio, ele reverbera no ambiente. Respiro fundo e ajeito
meu vestido, o mesmo que usei em nosso primeiro encontro como
namorados oficiais. Ele pediu que eu o vestisse. É em cetim vermelho,
tomara que caia, a saia rodada, alguns centímetros acima do joelho. Ele ama
me ver de vermelho. Fiz cabelo e maquiagem para que meu amor me visse
do jeito que ele gosta. Quando levanto meu olhar, já o encontro me olhando.
Seu físico em nada lembra o vigor que tinha antes. A maldita doença o
devorou. Dói muito vê-lo assim; sua cabeça, antes coberta com os
abundantes cachos loiros, agora é careca; suas bochechas, outrora coradas,
estão ocas, a pele sem vida.
Me resigno a guardar todas essas observações e revolta para mim
mesma. Quando soubemos, há dois meses, que não tinha cura, eu
enlouqueci. Briguei muito com Deus, principalmente. Nunca entenderei ou
aceitarei a razão disso. Nunca. Porém, percebi que meu estado de tristeza e
lamentação estava deixando Nate pior. Foi aí que engoli tudo o que penso e
decidi fazer os últimos sessenta dias serem memoráveis para ele. Eu
comprei ingressos para vermos os Knicks, seu time de basquete preferido,
jogarem no Madison Square Garden. Fomos com dois enfermeiros para
garantir, mas eles ficaram longe, nos dando privacidade. Emma, sua mãe,
me apoiou em tudo que fiz nesses dois meses para fazer o nosso menino
feliz.
O levei para um musical na Broadway. Fechei um cinema só para
nós quando estreou a sequência de Velozes e Furiosos, que ele ama. Há duas
semanas foi o baile da nossa turma e eu chamei todos para cá, ocupamos
um dos salões no piso inferior e trouxemos a festa até ele. Me permiti ser
feliz naquela noite. Nate já estava bem debilitado, só que fez questão de
usar um smoking e eu me vesti com esmero para ser seu par, como havia
sonhado desde o primeiro ano. Dançamos a nossa música quase inteira e
parei para não o cansar muito. Ele dormiu com o mais lindo sorriso no rosto
naquela noite.
Nesse meio-tempo, Nate desenvolveu o hábito de escrever. Ele não
me deixou ver nada, disse que são cartas. Vai me entregar quando se for…
infelizmente, o momento está se aproximando. Forço um sorriso no rosto ao
vê-lo sorrindo. A luz está se apagando pouco a pouco dos seus olhos azuis,
contudo, ele ainda quer parecer bem para mim. Eu giro no meio do quarto,
dando-lhe a completa visão da minha produção. Sua risada fraca logo se
transforma em tosse. Corro, colocando-me ao lado do leito. É um lugar
espaçoso. Pedi à equipe que o providenciasse para que eu possa dormir
aqui, para estar o mais próxima dele, tanto quanto for possível. E o fiz por
todas as noites desde o veredito final.
— Linda… — Diz baixinho, rindo da sua própria crise de tosse.
Meus olhos marejam testemunhando sua força, seu bom humor, mesmo
tendo sido vencido pelo inimigo letal. — Estava com saudades… da minha
garota. — Completa.
Pego sua mão direita, livre da intravenosa, sentindo um choque. Sua
mão parece ainda mais fria do que a minha. Levanto-a até a minha boca e
deposito um beijo reverente. Ele sorri sem som, os olhos ganhando um
pouco do brilho que costumava ter quando me olhava.
— E eu do meu garoto. — Digo, tentando não tremer, não
desmoronar e cair chorando aos pés da cama com a injustiça disso tudo.
Brinco: — Se afaste para o lado, seu folgado. Me deixe deitar aí também.
Sou recompensada quando sua risada soa baixa, mas limpa e feliz,
seus olhos vivos para mim.
— Não pense que será.… Tão fácil se deitar comigo, gatinha. —
Brinca também. — Olhe no criado-mudo, Anna.… Comprei algo para você.
— Hum.… Um presente, Sr. Marshal? — Sorrio-lhe e ele me
encoraja, inclinando a cabeça em direção ao criado-mudo. Me viro e vejo
uma caixa retangular de veludo preto. — Para mim? — Continuo
descontraindo. Ele me olha com um sorriso suave enquanto pego a caixa e a
abro. Não consigo segurar as lágrimas ao ver a delicada corrente de ouro
com um camafeu aberto. Nossas fotos estão lá, lado a lado. Esta tiramos na
noite em que fizemos amor. Vê-lo como era, lindo, vivaz, quase faz minhas
pernas fraquejarem. Respiro fundo e a retiro com cuidado da almofada.
Levo o colar até seu campo de visão para que aprecie também.
— Coloque-o, princesa — murmura, com emoção marcando as
feições magras. Eu o faço com cuidado e fico um instante admirando o
camafeu antes de fechá-lo. Sua mão pega a minha e está inexplicavelmente
mais quente. — Lembre-se de mim, Anna.
— Sempre, meu amor. Sempre — prometo-lhe.
— Agora, venha aqui comigo, gatinha. — Me chama e sorrio, me
sentando e retirando minhas sandálias de salto alto. Me deito ao seu lado e
nos aconchegamos. Ficamos um tempo em silêncio apenas sentindo o
momento. Fico atenta ao som da sua respiração, no entanto. — Eu amo
você, Anna.
Levanto o rosto do seu ombro e encaro seu rosto de perto. Seus
olhos recuperaram de alguma forma o brilho e vivacidade perdida nesta
última semana. Sua expressão está serena, feliz. Sempre será uma incógnita
para mim a maneira como esse menino lidou dignamente com a doença
desde o princípio. Houve alguns poucos momentos em que ele chorou e
reclamou, mas, depois, Nate aceitou e lutou o quanto pôde. Na verdade, ele
ainda está lutando. Esse brilho em seus olhos e suas mãos quentes são mais
um presente para mim.
— Eu também te amo, Nate. Para sempre. — Me inclino,
depositando um beijo suave em seus lábios ressequidos e sem cor.
— Não, princesa — sussurra, pegando minha mão, mas está sem
forças para entrelaçar nossos dedos, então o faço. — Você vai usar esse
colar até encontrar um cara que mereça seu coração, ent…
— Não, por favor, pare. Não quero ouvir isso — reclamo.
Nessa semana, Nate começou com esse papo esquisito de que devo
seguir em frente depois que ele partir. Não consegue ver como o amo? Que
meu coração jamais baterá por outro homem?
— Então, você irá tirá-lo e guardar. — Continua como se não
tivesse sido interrompido. Sua mão vem para o meu rosto e eu a seguro,
beijando a palma. Toco seu rosto também. Seus olhos se fecham e sua
respiração fica um pouco irregular quando retoma, voltando a me fitar: —
Nós cumprimos nosso tempo juntos, minha princesa. — Meu coração
aperta, lágrimas brotando dolorosamente em meus olhos. — Você é a
melhor garota que um cara poderia querer, Anna. Você é especial demais
para acabar sozinha. — Abro a boca, mas seus dedos pousam em meus
lábios. — Não discuta comigo, pare de ser encrenqueira. — Brinca, mas
posso ver a seriedade em seu semblante. — Você me fez plenamente feliz,
Anna. Nosso tempo juntos como amigos e, depois, esse um ano e oito
meses de namoro foram incríveis.
Eu não seguro mais e choro, meu rosto sendo queimado pelas
lágrimas. Eu daria qualquer coisa, qualquer maldita coisa para não o perder.
— Eu tive você… Eu tive o seu amor. — Sua voz começa a ficar
pausada e cansada de novo. Não o interrompo porque sei que ele precisa
falar. Essa pode ser nossa última conversa. — Há muitas pessoas que vivem
cem anos e não encontram metade do que vivi com você.
Assinto, vencida pelo seu último argumento. Nós fomos felizes,
mesmo que em pouco tempo juntos. — Me prometa que.… Vai viver,
princesa. — Sua voz é apenas um sopro agora. Percebo que ele estava
bancando o durão desde que entrei.
— Sim, sim, prometo qualquer coisa. — Me inclino, beijando sua
boca com ternura. — Agora descanse um pouco.
Ele ousa sorrir. Esse garoto…
— Ben vai lhe entregar as cartas que escrevi para você, gatinha. —
Refere-se ao seu irmão mais novo, Benjamim. — Prometa que o chamará
de vez em quando.… Para saber como o bobalhão está?
Assinto, minha garganta tampada. Eles são muito unidos, como eu e
Lipe. Ben irá sofrer muito, isso é certo.
— E sua mãe também. — Complemento, poupando-o de ter que
falar. — Seu pai é o único que saberá lidar com isso, é mais forte.
Ele assente, seus dedos suaves em meu rosto.
— Como já disse… A melhor garota. — Sussurra, seus olhos presos
aos meus. — Agora, sobre o colar.… Prometa-me.
Rolo os olhos, sabendo que não vai sossegar enquanto eu não
concordar.
Tranquilizo-o, mesmo sabendo que jamais darei meu coração a
outro:
— Prometo. — Digo baixinho. Ele suspira, relaxando um pouco.
— Viva, meu amor. Viva plenamente. — Me diz e depois se cala.
Fica me encarando e eu a ele. Gravo cada tonalidade de azul que há em seus
belos olhos na memória.
— Eu amo você, Nataniel Marshal — digo-lhe, minha voz tremente.
— Haja o que houver, você nunca sairá do meu coração.
Nate sorri e suas pálpebras se fecham devagar. Fico vigiando seu
sono. Não vou nem mesmo ao banheiro por medo de ele ir sem que eu veja.
São quatro da manhã quando sua respiração para. Não pude ver seus olhos
abertos de novo. Ele se foi enquanto dormia, seu rosto sereno, como se
tivesse cumprido sua missão na Terra. Pensei que gritaria, faria um
escândalo quando o temível momento chegasse. Mas não, eu cobri seu rosto
de beijos e chorei silenciosamente, sentindo meu coração explodir de tanta
dor em meu peito.

Um mês depois…
Eu rolo na cama, acordando imediatamente ao som de… Hey DJ, de
CNCO? Me sento e esfrego os olhos, vendo minha prima Ella perto do meu
home theater, em seguida aperta o controle remoto, fazendo as cortinas do
meu quarto se abrirem.
— Ei! — Reclamo da claridade. — Quer fechar as malditas cortinas,
prima?
Ela não mostra abalo, embora eu saiba que está preocupada com
meu estado aqui, enfiada no quarto desde o enterro. Meus pais vêm e vão,
Lipe também. Ninguém consegue me convencer a sair daqui. Ella, por sua
vez, se recusou a voltar para Ardócia enquanto eu não reagisse. A encaro
com desagrado enquanto tira um papel do bolso do short.
— Nate me deixou uma carta também, com algumas instruções para
o dia de hoje… Ele sabia que você iria dificultar as coisas, prima. — Isso
me faz ficar de pé em cima do colchão, me recordando que é hoje o dia da
abertura da primeira carta. — O volume está agradável? Será que devo
aumentar um pouco mais?
Estreito meus olhos sobre a minha prima. Ella parece doce e
sensível, mas não se enganem com a sua carinha de boneca. Bufo, pulando
da cama. Ela ousa sorrir, satisfeita. Corro até minha gaveta de joias em meu
closet e pego a caixa contendo todas as cartas de Nate, que Ben me
entregou após o enterro. Localizo o envelope com a data de hoje e o abro,
minhas mãos trêmulas, meu coração voltando a bater acelerado.

Oi, princesa.
Você deve estar puta com Ella, não é? Eu sabia que você iria ficar
esse tempo jogada na cama, estava escrito em seu rosto, mesmo que
tentasse parecer forte. Entendo, gatinha. Por isso, escrevi uma carta para
Ella também, com algumas instruções bem específicas para arrancá-la
desse quarto.
Não pense que pode me fazer promessas e depois fugir delas, Anna.
Tire sua bunda preguiçosa da cama e vá cumprir tudo, garota! Aposto que
essa é a primeira vez que está ouvindo sua banda preferida desde que parti,
não é?

Eu paro um instante e respiro fundo, meus olhos turvando, mas


dessa vez um sorriso brota em meus lábios. Ver sua letra, ler suas palavras,
para mim, é como se estivesse conversando com ele, e isso de certa forma
ameniza a minha dor.

Nunca pare de ouvir música, Anna. Música é vida. Cada carta


minha trará algumas tarefas para você cumprir. Você não vai me enrolar,
não é? A primeira é cantar essa música de CNCO, sei o quanto ama esses
caras feios.
Eu rio. Ah, esse garoto bobo…

A segunda é passar um dia de menina com as suas primas. Vamos,


levante-se e cante! Tenho certeza de que Ella seguiu minhas instruções e
chamou Sam e Em para essa pequena festa de meninas. Vamos, princesa!
Viva!

Droga, agora? Ele quer que eu cante agora? Esse menino… Eu não
sei se consigo, não posso. Meus olhos se enchem de lágrimas doloridas.
Estou morrendo por dentro. Encaro minha prima, que está com um sorriso
suave e lágrimas nos olhos. Ela começa a puxar o refrão e a porta se abre,
Sam e Em passando para dentro. Meus olhos transbordam e torno a olhar
para Ella, vendo o seu amor por mim. Sua persistência em me tirar da
tristeza. Então, eu faço a única coisa que posso fazer pelo meu Nate, por
ela, pela minha família, ignorando a dor em meu coração, eu canto!

(...) Hey, DJ! Toca a música que ela gosta. Uma para que ela se mexa e
arrase e dance comigo, apenas comigo, ei! [1](…)

As ruivinhas sorriem e se juntam a nós, cantando, pulando. Minhas


primas me abraçam e continuamos cantando. Em instantes, sinto uma
leveza inexplicável em meu peito. Ele sabia o quanto amo música, dançar.
E, assim, Nataniel Marshal, mesmo não estando mais fisicamente entre nós,
me puxou de volta à vida.
Eu vou viver, meu amor. Por você.

***
Kamar – Sudoeste da Ásia, nove anos antes.

Karim Amihaj
Eu sigo pelo corredor até o quarto de Ayla. Estou no piloto
automático, ainda anestesiado, sem acreditar que tamanha tragédia tenha se
abatido sobre mim, sobre nós. As babás aparecem em meu campo de visão
quando entro no aposento. Suas feições estão devastadas, olhos inchados.
Murmuram suas condolências e abaixam as cabeças em respeito, se
retirando do meu caminho em seguida.
Yasmina era muito amada por todos os nossos funcionários. Meu
peito aperta dolorosamente, minha linda princesa se foi. Sem aviso, da
forma mais estúpida possível. Acabo de voltar do local do desastre. O jato
real caiu nas cadeias rochosas da nossa fronteira com o Catar, matando a
minha esposa junto com a comitiva de oito funcionários que a
acompanhava. O acidente foi ontem e ordenei as buscas imediatamente, na
esperança de encontrá-la com vida. Todavia, para meu desespero, não
encontraram ninguém vivo. A aeronave ficou destruída pelo impacto contra
as rochas. Não houve chances para quem estava a bordo. Os corpos foram
bastante machucados, mas foi possível reconhecê-los. Graças a Allah o
avião não explodiu, nos tirando o direito de preparar nossos mortos e lhes
dar um enterro mulçumano digno.
Yasmina estava indo me representar em um evento oficial na capital
daquele país, uma vez que tive outro compromisso com os chefes das nove
tribos do nosso emirado. Fui inserindo minha esposa pouco a pouco na
agenda real, mesmo contra as convicções arcaicas de meu tio, o grão-
vizir[2]. O mundo árabe está se modernizando e algumas princesas e rainhas
já possuem grande notoriedade no cenário social e político, inclusive. Ela
estava tão feliz que começou a participar de eventos sem a minha presença,
ganhando cada vez mais confiança, mostrando que era capacitada para
reinar ao meu lado, quando chegasse a hora. Após a morte de meu pai, há
três anos, seu irmão mais novo, Jafar, tem me ajudado a governar, mas as
nove tribos não têm facilitado a minha vida, vetando as mudanças que
preciso introduzir para que meu país consiga fazer frente ao Catar e
Emirados Árabes Unidos, nossos vizinhos e concorrentes.
Respiro fundo, me aproximando do berço da minha filha. Uma
confusão de sentimentos fervilhando dentro de mim. Ainda não chorei. Em
minha posição, um homem não pode demonstrar fraqueza para o público,
mesmo se estiver perdendo o amor de sua vida.
Ayla está adormecida, seu rostinho tranquilo, não tendo ideia de que
sua mãe nos deixou para sempre. Apoio as mãos na borda do berço,
sentindo o peso da perda caindo sobre meus ombros. Me permitindo sentir
agora, em privado. Meus olhos correm pelo corpinho envolto numa manta
dourada. Estendo a mão direita, tocando os cabelos negros e macios, as
bochechas e lábios rosados, uma miniatura de minha mãe. Aos dois anos já
dá para ver como herdou os traços belos e delicados da avó. O aperto vai se
intensificando até que não consigo mais fingir que não estou morrendo
também. As lágrimas queimam meus olhos e as deixo cair, apenas aqui, na
presença da nossa princesinha. Como iremos nos recuperar disso, não tenho
ideia.
— Ela se foi, nour hayati[3]. — Digo embargado. Minha pequena se
remexe, choraminga, como se ouvisse, mesmo no sono, que sua mãe nunca
mais estará conosco, não nesta vida, pelo menos. Meu rosto é coberto por
lágrimas quentes. Eu sei que reencontrarei o meu amor no paraíso, mas isso
não ameniza em nada a minha devastação nesse momento. Saber que nesta
vida não a terei mais em meus braços, não beijarei seus doces lábios, não
terei mais seu corpo acolhedor, sua paixão, me traz a certeza de que, de
certa forma, estarei morto junto com ela. — Eu vou te proteger, ‘amirat
saghira[4]. Vamos passar por isso. Ainda não sei como, mas lhe prometo que
o faremos.
Me debruço beijando sua cabecinha e me deixo cair, escorregando
sentado no piso, as costas apoiadas nas grades intrincadas do berço. Coloco
meu rosto entre as mãos e choro copiosamente. Nossa vida juntos, nossa
breve vida juntos, espocando em minha mente. Eu a conheci a vida inteira.
Yasmina é filha de uma das nove tribos influentes em nosso reino. Nunca
fomos exatamente amigos, no entanto, sempre nos víamos quando eu
acompanhava meu pai em suas reuniões com os clãs tribais no deserto. Fui
estudar na escola secundária e superior na Inglaterra e, ao retornar, já
homem formado, sete anos depois, vi a moça linda que a tímida menina
havia se transformado e me apaixonei. Na verdade, Yasmina sempre me
encantou de alguma maneira quando éramos crianças. Eu a quis para mim e
comuniquei meu desejo ao meu pai. Sua tribo ficou em festa ao saber da
minha intenção de tomá-la como minha princesa.
Fecho os olhos, ainda posso lembrar exatamente a expressão em seu
rosto bonito quando lhe disse que iria me casar com ela. Primeiro ficou
branca como papel, depois vermelha. Então, gaguejou e não conseguiu me
dizer muita coisa naquela noite. Linda. A cortejei usando as artimanhas que
havia aprendido na cultura ocidental, mas nunca deixando de lado nossos
costumes. Ela amava o deserto, como eu. Cavalgar era um de seus hobbies
favoritos, como eu. Como farei isso sem ela ao meu lado de agora em
diante? Nosso noivado durou quatro anos e nos casamos há três. Ela
engravidou no primeiro ano, graças a Allah, ou agora não teria nada dela
para me confortar e seria mil vezes pior. Olho através das portas abertas da
grande sacada, avistando as luzes brilhantes da nossa capital Jawahra. Ela
amava essa vista através dos dez quilômetros de deserto.
Mandei construir esse palácio para podermos nos refugiar da
agitação urbana e Yasmina adorou. Meu peito comprime, soluços
derrotados vibrando em minha garganta. Torno a fechar os olhos, a imagem
dela no nosso último passeio, há dois dias, antes de ela se preparar para a
viagem da qual não mais voltaria.
— Amihaj! Vem, habib![5] — Gritou eufórica por cima do ombro. O
véu azul voando enquanto incitava sua égua à minha frente num de seus
galopes atrevidos. Os raios do sol poente fazendo um jogo de luzes na
pequena faixa de cabelos negros, aparentes através do véu.
Era o único momento em que perdia completamente sua timidez,
quando estava em cima de um cavalo, talvez pela sensação de liberdade
que a atividade traz.
Eu ri e a segui com o meu garanhão negro, competindo, livres,
como sempre adoramos fazer. Cavalgamos na direção do pequeno oásis,
onde gostávamos de parar à sombra das tamareiras e damasqueiros, que
ela mesma plantou quando lhe mostrei o pequeno pedaço do paraíso. A
ultrapassei e comecei a descer a duna, avistando a pequena porção de
água e verde em meio ao mar de areia.
— Vem, habibti! — A provoquei, olhando por cima do ombro. Ela
abriu o sorriso mais luminoso e tornou a incitar a égua.
Em poucos minutos, estávamos desmontando e deixando os cavalos
às margens das águas plácidas. Nós espalhamos os cobertores e nos
amamos enquanto a noite engolia o dia. Ficamos pelo que pareceram horas
em silêncio, nus e entrelaçados.
— Estava com saudades disso, ser sua em nosso lugar especial —
murmurou contra o meu peito, levantando o rosto para o meu. Eu a
aconcheguei mais contra mim, inalando o perfume de seus cabelos, sua
pele.
— Nour hayati… — Sussurrei reverente, traçando seu rosto com os
dedos, tão apaixonado como no dia em que regressei e a vi no oásis, perto
das terras de sua tribo. — As coisas andam agitadas, mas é só até eu
conseguir a aprovação dos clãs para a construção do complexo hoteleiro.
Temos que tomar como exemplo o progresso do nosso vizinho Catar.
— Você irá conseguir, amiri[6]. — Disse suavemente, os dedos
fazendo carícia em meu peito. — Meu pai está convencendo os outros,
conte com ele.
— Eu sei, princesa. — Assenti. — Sei que com ele posso contar,
porém, entre as outras tribos há líderes que preferiam meu tio governando
em vez de mim. Eles estavam esperando uma virada como na Arábia
Saudita. Isso está ficando cada vez mais claro.
Seu rosto ficou contrariado. É a verdade, todos nós sabíamos que os
clãs estavão instáveis e divididos desde a morte de meu pai. Eles não
aceitavam principalmente que eu, um príncipe árabe, tivesse recebido
educação ocidental e, além disso, que tentasse implantar algumas ideias
progressistas por aqui. São apegados demais às tradições e não aceitam as
mudanças sem muito debate.
— Você é o príncipe de Kamar, Amihaj, o legítimo herdeiro do trono
— disse-me com ferocidade. — E é só a você que as tribos devem lealdade.
Eu sorri, felicidade não cabendo em mim. Minha linda, amada e
leal princesa.
— Te amo, ‘amira[7]. — Murmurei, puxando-a para cima de mim.
Ela sorriu alto, feliz, seus longos cabelos fazendo uma cortina ao redor do
meu rosto. — Eu nunca poderia encontrar melhor mulher para ser a minha
rainha.
Seus olhos escuros amoleceram, brilhando de lágrimas, de amor.
— Te amo, Amihaj — sussurrou emocionada. — Eu nunca entendi
bem o que um príncipe viu em mim…
— O príncipe viu a sua princesa, sua futura rainha, a mulher que
irá governar e envelhecer ao seu lado. — Confidenciei-lhe, como fiz nas
muitas vezes em que levantou essa questão.
— Amiri… — Me fitou com tanto amor. Eu mergulhei minha boca
na sua, tendo a certeza de que fiz a escolha perfeita.
Nenhuma mulher faria meu coração bater da forma que ela faz.
Apenas ela, a minha escolhida. Em nossa região não é comum casamentos
por amor, mas nós conseguimos isso, nos unimos por amor. E será assim
até ficarmos velhinhos.
As coisas esquentaram e nos amamos mais uma vez antes de
levantar acampamento de volta ao palácio. Yasmina parecia uma criança
enquanto disputávamos uma corrida por todo o percurso de retorno. Feliz,
uma luz resplandecendo e irradiando por toda ela.
Jantamos com meu tio Jafar, que aproveitou para me dizer que os
clãs solicitavam uma reunião para o dia seguinte. Estava pretendendo ir
com Yasmina para Doha, levaríamos Ayla e passaríamos uns dias em
algum resort, depois do meu compromisso oficial, só nós três. Todavia,
ultimamente estou tendo que aparar muitas arestas e conter os ímpetos dos
chefes tribais. Meu pai governava mais no deserto do que em seu palácio e
eles parecem esperar que eu siga esse modelo de gestão. Mesmo frustrado,
concordei em atender os clãs. Meu nome precisava ser fortalecido e
conseguiria pontos com eles recebendo-os, mesmo que a solicitação tivesse
chegado tão em cima da hora que beirava o desrespeito. Pedi a eles que
agendem suas demandas, pelo menos, com uma semana de antecedência de
agora em diante, exceto por situações emergenciais.
Preciso do seu apoio, no entanto, me recuso a me tornar refém dos
caprichos daqueles homens. Há uma grande diferença entre um príncipe
ser acessível ao seu povo e se deixar fazer de idiota por esse mesmo povo.
— Os líderes apreciarão sua ação de boa vontade, amiri. — A voz
de meu tio é neutra e isenta de emoção, uma característica dele.
Ele tem sido leal a mim, porém. Meu pai confiava no irmão
cegamente e me disse em seu leito de morte que eu teria sua lealdade
também. Acreditei nisso, embora alguns clãs estejam mostrando uma
deferência exacerbada ao meu grão-vizir. Confio nele, todavia, não
cegamente como meu pai. A casa real da Arábia Saudita se transformou em
um campo minado e não quero isso em minha casa. Meu desejo é unir as
tribos de tal forma que nunca mais se separem. E para isso preciso de
tempo, que, por sua vez, só será concedido por meio da confiança dos
chefes.
— Estou contando com isso, tio. — Assenti, encarando-o
firmemente. Meu tio é um homem duro, muito diferente de meu pai. Jamais
senti nada remotamente parecido com carinho vindo dele enquanto crescia,
muito menos agora que sou homem com minha família se formando. Mas
foi o braço direito de meu pai e agora o exerce com a mesma dedicação a
mim.
— Peça desculpas ao governante de Doha e diga-lhe que enviará
presentes. — Meu tio orientou, seu rosto uma máscara de pedra. — Não
mencione a reunião com as tribos. Eles podem pensar que há algo errado
por aqui para você desmarcar um compromisso diplomático.
Ele tinha razão. Nossos vizinhos são como tubarões, sempre
procurando o menor vestígio de sangue, porque onde há sangue certamente
há uma ferida. E, aí, não há paz relativa que os segure. O Oriente Médio é
um barril de pólvora que oscila entre períodos de acordos de paz bem-
sucedidos com períodos sangrentos.
Porém, estou atrás de um novo tempo. Eu olhei de lado, para a
minha esposa, pegando sua mão e beijando seus dedos amorosamente antes
de dizer com convicção:
— Yasmina irá me representar, tio. — Minha princesa arregalou os
olhos, surpresa e felicidade tingindo seu rosto bonito. — Ela está
preparada para representar a casa de Kamar.
— Meu senhor, não acho sábio enviar uma mulher como
representante em um evento de tal porte…
A observação antiquada de meu tio me fez desviar a atenção para
ele de novo. Não consigo conter meu desagrado. As palavras mais iradas
me vieram à cabeça, mas as contive, não as deixando sair, pois, lhe devo
respeito pela idade e parentesco.
— Com todo respeito, tio, não estou enviando qualquer mulher.
Estou enviando a futura rainha de Kamar — retruquei firmemente.
Vi um brilho de desagrado, bem rápido passando em seus olhos
escuros, no entanto, ele assentiu e curvou a cabeça.
— Como queira, amiri. — Disse em tom baixo e voltou a comer.
Yasmina estava me olhando com adoração quando tornei a encará-
la. Terminamos o jantar e, depois de passar nos aposentos de nossa
princesa, fomos para os nossos. Ela andou linda à minha frente, sua túnica
bege com detalhes dourados tremulando atrás. Nos servi duas taças de
vinho de tâmara e a segui até nossa imensa sacada. Ela ama essa vista.
Daqui podemos ver quase toda a extensão do reino, principalmente as luzes
de nossa capital. A abracei por trás e lhe entreguei sua taça. Ela suspirou
profundamente e ficamos tomando a bebida em silêncio, observando nossos
domínios.
— Eu vou honrar nossa casa, amiri — sussurrou, virando o rosto
para mim. O amor que sempre vejo em seus olhos me faz sentir o homem
mais realizado do mundo.
Eu sorri, me inclinando e depositando um beijo suave em sua boca.
— Eu sei que sim, ‘amira. — Ela girou em meus braços. Sorrimos
depositando as taças sobre o topo da balaustrada de concreto. Aprofundei
o beijo, segurando seu rosto dos lados, meu desejo reacendendo. — Você
me quer de novo, habibti?
Ela ficou vermelha. Minha esposa é tímida e, mesmo com três anos
de casados, ainda cora quando a chamo para fazer amor.
— Sempre, habib. — Sorriu encabulada, mas a felicidade cintilando
em seu olhar. — Sempre irei querê-lo.
Eu a levantei nos braços e voltei para dentro dos nossos aposentos.
Uma certeza tão grande de que ficaremos juntos pelo resto da vida
borbulhando em mim. Ela irá me dar mais uns dois filhos, já discutimos e
planejamos tudo. Allah irá nos manter juntos. Para sempre.
Eu pisco, voltando das lembranças felizes, as lágrimas ainda caindo.
As luzes de Jawahra voltam a tomar minha visão. Não haverá para sempre.
Meu coração dói tanto que fico sem ar.
— Não fisicamente, nour hayati, mas daqui — murmuro, tocando
meu peito esquerdo — você nunca sairá. Eu morrerei te amando. —
Prometo-lhe com toda a convicção do meu coração esmagado.
Fico recostado ao berço de minha filha durante tanto tempo que
acabo adormecendo ali mesmo. Me sobressalto ao sentir uma mão em meu
ombro.
— Amiri, estamos autorizados a iniciar a preparação do corpo. —
Meu tio informa em tom baixo, olhando de relance para minha filha que
dorme no berço.
Eu limpo os olhos imediatamente, lamentando que tenha me
encontrado assim e veja minha tristeza pela morte de minha esposa como
um sinal de fraqueza. Me levanto e me surpreendo ao senti-lo me ajudando
na tarefa.
— Todos estamos devastados, Amihaj. — Percebo um ínfimo sinal
de emoção em seu rosto e voz. — Imagino o quanto está sofrendo agora,
mas ao passarmos por aquelas portas, guarde isso para si mesmo. Não
permita que ninguém veja através da sua dor, amiri. Os impérios são
destruídos assim, em momentos de fragilidade do governante.
Eu quero resmungar, mandá-lo calar a maldita boca, mas ele tem
razão. Haverá inúmeros tubarões no funeral e preciso manter a compostura,
mesmo que também esteja morrendo.
— Shukran[8], tio. — Digo, reunindo todas as forças para soar firme
e neutro, como ele próprio. — Eu devia ter seguido sua orientação e
enviado presentes, em vez disso, enviei minha esposa para a morte.
— Não diga algo assim, jamais, Amihaj! — Ele rebate ainda em
tom baixo para não acordar a princesa. — Foi uma fatalidade, amiri. Não se
culpe.
Não posso evitar, a culpa está me corroendo desde que soube do
acidente. A caixa-preta ainda não foi identificada e estou ansioso para saber
o que aconteceu, pois o jato era novo; foi adquirido há dois anos, apenas.
— Estarei envolvido com o funeral, mas quero que fique a postos e,
no momento que localizarem a caixa preta, me avise.
— Fique tranquilo, meu senhor. — Me diz com seriedade. — Irei
ficar a par de tudo.
— Vou tomar um banho rápido e já seguimos para a mesquita. —
Digo no mesmo tom firme e sério.
Ele me olha como se quisesse dizer mais, só que nada sai. Por Allah!
Nunca vi ninguém tão hábil em questões de Estado e tão incapaz no quesito
pessoal. Ele se curva e deixa o quarto. Olho minha filha dormindo e um
pequeno e triste sorriso curva minha boca. Ela é tudo que me restou de
Yasmina. A beijo uma vez mais e deixo o recinto, o governante de Kamar
assumindo a partir de agora.
Estou terminando de me vestir quando meu celular toca. O pego,
vendo o nome de meu amigo Mike. Suspiro longamente. Ele estará se
casando hoje, em Ardócia, a casa de sua noiva, a princesa Antonella Di
Castellani. Meu amigo carrega o título de príncipe também. Sua história é
surpreendente, era menino de rua e teve a sorte de ser adotado pelo irmão
mais novo do rei da ilha ao sul da Itália. Era para eu e Yasmina estarmos lá,
inclusive. Mike me convidou para ser seu padrinho, e isso me honrou. Fico
com o telefone na mão, retardando atender porque neste momento não sei o
que lhe dizer. Ele está se casando com o amor de sua vida, enquanto estou
perdendo o meu. Fecho os olhos, me recriminando pelo pensamento egoísta
e rabugento. Meu amigo merece ser feliz com sua princesa depois de tantos
percalços em seu caminho.
— Mike. — Cumprimento-o em tom morto.
— Amihaj, tenho tentado ligar o dia todo para saber das buscas…
— Ele pigarreia desconfortável. — Mas acabei de ver pelo noticiário que
não houve sobreviventes…
— Sinto muito, amigo, desliguei meu celular para não enlouquecer
com tantas ligações. — Me desculpo, terminando de ajeitar a túnica sobre o
meu peito, pegando um dos turbantes para cerimônias oficiais. Irei banhar
minha princesa pela última vez e quero me vestir adequadamente para a
função.
— Não, amigo, eu que sinto muito. Sei que não há palavras que
darão conta de amenizar a sua dor. — Posso sentir o pesar em sua voz. —
Mas saiba que pode contar comigo para qualquer coisa, Amihaj. Qualquer
coisa.
— Eu sei, Mike. Shukran, meu amigo. Por favor, dê meus
cumprimentos à Ella e sua família por mim.
— Obrigado, darei sim. Quando voltarmos da lua de mel, iremos
visitá-lo.
— Não, Mike. — Peço rapidamente. — Vou fingir para os outros,
mas para você não. Nos próximos meses, não serei boa companhia para
ninguém, amigo, muito menos para recém-casados. — Posso sentir sua
decepção através da linha. Os ocidentais agem diferente em muitas
situações.
— Amihaj, somos amigos — ele argumenta.
— E continuaremos a sê-lo — garanto. — Estou devastado pela
morte prematura e estúpida da minha mulher, Mike, e não quero ser visto
assim. Preciso de tempo para me recuperar, aceitar os desígnios de Allah e
entender que só a verei de novo no paraíso.
Mike suspira do outro lado.
— Está bem, amigo. Me avise quando poderei vê-lo e à Ayla.
A menção da minha pequena faz meus olhos arderem outra vez, a
emoção ameaçando me dominar.
— Farei isso, amigo. Shukran. Preciso desligar, estou indo preparar
o corpo da minha princesa.
— Vá. Que Deus esteja com vocês. — Ele diz com leve emoção na
voz.
Apesar de ter incorporado o príncipe inabalável de Kamar, quando
entro na sala reservada ao ritual fúnebre na mesquita privada, no térreo do
palácio, não há como não sentir o choque. O corpo sem vida da minha
princesa sobre a pedra de mármore é a visão mais dolorosa que já tive. Me
aproximo, minhas pernas instáveis, meu peito comprimindo de forma
sufocante. As mulheres saem, me dando privacidade. Em nossa religião, é
permitido, ao marido ou esposa, banhar o cônjuge morto pela última vez no
ritual sagrado. A desenrolo do tecido branco e as lágrimas inundam meus
olhos ao ver o corpo todo machucado. Escoriações e feridas feias por todos
os lugares. Ofego ao ver o roxo no pescoço, confirmando o que a equipe de
resgate havia dito, seu pescoço fora quebrado com o impacto. Me conforto
em saber que foi instantânea sua morte, ela não sentiu a dilaceração do
corpo em seguida.
Meu olhar pousa em seu rosto e uma pequena parte do meu coração
se alegra por não haver machucados lá, apenas um leve arranhão na testa.
Sua expressão está tranquila, como se estivesse dormindo. Encaro e recebo
isso como um presente de Allah para mim, me permitindo ver o rosto da
minha princesa como sempre foi: lindo, perfeito. Então, inicio o ritual,
banhando-a três vezes com as essências especiais, livrando-a de todas as
impurezas desta terra. Quando termino, enrolo-a com os tecidos brancos de
algodão, deixando seu rosto de fora. Penteio os cabelos negros, partindo-os
no meio e fico lá, venerando-a, absorvendo cada detalhe pela última vez.
Quando o caixão chega e a coloco gentilmente lá dentro, o
desespero me engolfa. É a despedida final. Toco seus cabelos, não
conseguindo conter as lágrimas diante dos religiosos. É mais do que
consigo suportar.
— Adeus, nour hayati. — Murmuro, lutando para não gritar,
tamanha a dor me dilacerando. — Você viverá em meu coração. Para
sempre.
CAPÍTULO UM
Nova York, cinco anos antes...
“Ser humano é amar. Mesmo quando for demais. Não estou pronta para
desistir.”
(Sia – To Be Human)

Anna Julia
— Uhuuuuuu! — Grito, abrindo os braços, sentindo o vento bater
em meu peito e rosto. Liberdade absoluta! O mundo aos meus pés! Saltar de
paraquedas é uma sensação indescritível. É sério, é maravilhoso. Meu
sorriso amplia, olhando para o lado direito, vendo meu irmão Lipe gritando
também. À minha esquerda, meu pai está num salto duplo com minha mãe.
Ela só salta com ele. Grito mais. Nesses momentos, confirmo que nasci na
melhor família. Aproveito um pouco mais a queda livre e puxo o cordão do
meu paraquedas. O sol está se levantando, lançando seus raios sobre nós, e
eu fecho os olhos por um instante quando o equipamento abre,
estabilizando o salto. Logo estou voando suavemente, a brisa me levando.
Reabro os olhos, apreciando tudo, cada detalhe, cada sensação. É algo que
nunca fica velho. Meu pai ama essa adrenalina e passou para mim e Lipe
também. Eu fui um pouco além, me aventurando nos saltos de bungee
jumping.
Meus pés tocam o chão arenoso e estabilizo o passo habilmente,
ouvindo as exclamações eufóricas de meus pais e irmão. Sim, nasci na
família certa, sem sombra de dúvidas.
— Eu amo fazer isso com vocês! — Digo, me livrando do macacão.
— Você anda preferindo o bungee jumping e nos deixando de lado
— Lipe resmunga.
— Não tenho culpa se sou mais habilidosa e corajosa do que você,
irmãozinho. — Dou de ombros, provocando-o.
— Meu último salto não foi tão ruim assim. — Ele faz carranca, se
livrando do seu equipamento também. Nossos pais estão rindo da nossa
implicância de irmãos.
Eu rio, me rendendo ao charme de seus belos olhos cor de uísque,
herdados de nossa mãe.
— Está bem, fedelho. Não foi nada mal, admito. — Ele abre um
sorriso arrogante, enquanto os ajudantes chegam até nós, começando a
recolher nossos equipamentos.
— Hoje o dia vai ser corrido com todos os preparativos para a
viagem, mas quero almoçar com a minha família. — Os intimo indo para
meus pais, que estão se beijando agora. — Pai, mãe?
Meu pai abre um de seus sorrisos lindos e irreverentes, dando mais
um selinho em minha mãe antes de me dar atenção.
— Concordo com seu irmão, você tem nos deixado pelo bungee
jumping, princesinha. — Ele reclama, mas sua expressão não é tão séria. Eu
rio, abraçando-o, me derretendo quando meus velhos me acolhem em seus
braços.
— Será que o senhor está se tornando um velho reclamão, papai? —
Brinco e ele meneia a cabeça, beijando minha têmpora.
— Você me disse que sou um coroa enxuto, esqueceu? — Seus
olhos verde-escuros no mesmo tom dos meus estão cintilando.
Amoleço. Não é porque é o meu pai, mas ele é o homem mais
bonito para mim. Eu toco seu rosto e me inclino, o beijando na bochecha.
— Pare de querer elogios o tempo todo, senhor Harper. — Rio,
adorando essa camaradagem que tenho com meu pai. — Sabe perfeitamente
que é o homem mais bonito no mundo inteiro.
Seus olhos ficam ainda mais brilhantes e seu sorriso se alarga,
indicando que vem algum de seus comentários espirituosos:
— Bem, é o que sua mãe não cansa de dizer para mim, querida. —
Ele olha para minha mãe e pisca maliciosamente. Ela ri descontraída, os
olhos âmbares muito brilhantes, meneando a cabeça.
— Você precisa parar de inflar o ego de seu pai, bambina. — Se
inclina, me beijando no rosto. — Ele já é impossível por si só.
Todos nós caímos na risada. Eu amo ver a relação de meus pais.
Eles sempre se mostraram dessa forma, apaixonados e felizes enquanto eu e
Lipe crescíamos.
— Temos reunião às dez, podemos marcar à uma? Assim não
chegaremos atrasados. — É Lipe quem informa. Ele está trabalhando com
nosso pai na Harper Technology desde que se formou, há dois anos. Minha
mãe cuida da fundação Anna Harper, criada em homenagem à minha avó
paterna, e de algumas contas especiais que exigem suas habilidades de
diplomata e poliglota. Eu? Não tenho tino para o ramo de negócios de meu
pai. Cursei licenciatura em Letras e depois Fotografia, que sempre foi a
minha paixão desde criança, então, não me encaixo na Harper.
— Claro, maninho. — Assinto e começamos a andar de volta para o
galpão, para trocar nossas roupas.
Alguns minutos depois, tomamos café numa delicatessen próxima
da Harper, onde meu pai e Lipe se despediram para iniciar seu expediente.
— Eu cancelei meu expediente na fundação hoje. — Minha mãe
avisa quando eles se afastam da mesa. — Vou ficar com a minha bambina
até a hora do embarque.
Um sorriso terno se abre em meu rosto. Me deixem mencionar que
minha mãe é a mulher mais linda e amorosa do mundo. Eu amo ser a sua
filha. Estendo a mão sobre a mesa e ela a pega, dando um aperto suave.
Está preocupada com minha viagem para Kamar, por causa de alguns
conflitos que aconteceram no país no começo do ano.
— É seguro agora, mamma, fique tranquila — murmuro e ela
assente. Mas está me enchendo de recomendações desde o momento que
comprei a passagem, no começo da semana.
— Tome cuidado, tesoro, per favore — sussurra com preocupação.
— E quando chegar me ligue imediatamente.
Eu rio, anuindo.
— Prometo, mãe. Vai dar tudo certo, relaxa — digo-lhe com toda a
convicção.
Algumas horas mais tarde, nós almoçamos em um de meus
restaurantes preferidos em TriBeCa.
— Não esqueça de ligar quando chegar, imediatamente, filha. —
Meu pai endossa as recomendações e eu rolo os olhos. — Isso não é
brincadeira, mocinha.
Eu rio alto com sua tentativa de bronca.
— Papai, tenho vinte e quatro, quase vinte e cinco — retruco com
um sorriso malicioso. — Não sou mais uma mocinha faz tempo.
— Bambina… — Minha mãe murmura em repreensão.
Meu velho ri. Eu juro, ele é o pai mais descolado que uma garota
poderia sonhar.
— Certo, mas isso ainda não a isenta de nos dar notícias, princesa.
Não irei ceder nesse sentido.
— Papai e mamãe estão certos, Anna. Não sabemos se realmente é
seguro para estrangeiros entrar naquele país — Lipe endossa, sua cara
incrivelmente séria. Eu suspiro, vencida.
— Está bem, está bem, vocês venceram. Avisarei a todos
imediatamente, prometo.
— Vai levar pelo menos dois seguranças, querida. — Meu pai me
intima.
— Não, papai. Vou com o pessoal da universidade. — Fecho a cara.
— Será extremamente pedante andar com seguranças por toda parte
enquanto o resto da turma são pessoas simples.
— Você é uma princesa de Ardócia, bambina. — Minha mãe
intervém, seu tom muito sério agora. — Não é pedante, são necessidades da
sua linhagem. Eu ficaria mais tranquila se aceitasse pelo menos um.
Meu Deus, eles não entendem que não quero andar como uma
princesa em Kamar? Quero passar incógnita. Na verdade, nem mesmo vou
avisar o príncipe governante, para que não venham com pompas. Essa
viagem é para eu conhecer e imergir na cultura das tribos beduínas. Isso não
será possível se souberem da minha linhagem. Quero parecer uma estudante
normal, sem grandes alardes.
— Posso levar, mas ele ficará na capital. Não o levarei para o
deserto. — Cedo apenas um pouco.
Meus pais não parecem muito satisfeitos, porém concordam. Quero
dar uma pausa dos holofotes. Já badalei e brinquei demais com a mídia.
Eles acham que me conhecem, mas estão muito longe disso. Quero fazer
algo sério pela primeira vez em anos. Ella me garantiu que me ajudaria com
a exposição quando regressasse. Além disso, é a exigência da última carta
aberta de Nate. Ele me deixou uma para cada ano de sua morte. Saltar de
bungee jumping foi um pedido dele. Cursar fotografia também. A cada ano,
meu garoto me pede para fazer algo especial e que me faça feliz. Ele sabia
de cada sonho meu, cada desejo do meu coração, e suas cartas foram
baseadas nisso.
Já se foram seis anos. Seis anos sem o meu amor. Todavia, com o
passar do tempo, reaprendi a sorrir e me permiti a seguir vivendo, conforme
lhe prometi. Ainda dói, principalmente quando vejo o envelope cujo
lembrete é: abra quando seu coração encontrar o amor outra vez, princesa.
Eu fico brava toda vez que o vejo, quero rasgá-lo em pedaços, só que não
posso contrariar aquele menino. Então o deixo lá, intocado, como sei que
permanecerá. Meu coração jamais será de outro. Essa é outra promessa que
faço questão de cumprir.

***

A despedida de meus pais e Lipe foi mais uma vez cheia de


recomendações, mas relevei porque os amo. Estou com um bom
pressentimento sobre essa viagem. Farei uma megaexposição quando
voltar! O voo foi tranquilo e chegamos a Jawahra, capital de Kamar, às seis
da manhã. Eu, Lawrence (meu segurança), o professor e mais dez alunos da
minha turma fomos direto para uma sala no aeroporto, aonde fomos
interrogados. As autoridades queriam mais detalhes sobre a natureza do
trabalho a ser feito no país e nosso tempo de permanência. Fomos
informados que a partir daquele momento estaríamos sob a tutela do
príncipe Karim Amihaj, o governante local, e, portanto, tudo que fizermos
em seu território será reportado a ele. Em seguida, fomos para o hotel.
Durante todo o percurso observei a arquitetura moderna e arrojada da
cidade. Nas fotos aéreas disponibilizadas no site do hotel, a vista é
fascinante: de um lado, o mar do Golfo Pérsico com suas águas muito azuis
e, do outro, os quilômetros e quilômetros de deserto.
A capital foi construída como uma ilha suspensa invadindo o mar,
com o formato perfeito de uma espada. De acordo com historiadores,
representa a resistência do emirado em não ser engolido por um de seus
vizinhos. A economia, até a década de 30, tinha sua fonte predominante na
pesca e comércio da pérola — um dos motivos que envolveu o país em
disputas com o Catar por rotas e compradores. Na década de 60, o petróleo
foi descoberto e, aliado a isso, o reino se libertou do domínio da Inglaterra,
o que impulsionou o crescimento e a riqueza de Kamar.
Quando chegamos ao hotel, suspiro ao entrar em meu quarto. Só
temos atividade à tarde, um guia nos levará até a primeira tribo. Percebo
que meu celular arriou a bateria, mas resolvo tomar um banho relaxante
antes de recarregá-lo, para avisar que cheguei. Foram treze cansativas horas
de Nova York até aqui e estou acabada. Odeio viagens longas, sobretudo de
avião, onde não posso me mover.
Porém, minha ilusão de descanso cai por terra ao sair do banheiro e
meu professor bater à porta, avisando que houve uma mudança de planos e
que o guia já está nos aguardando, para irmos conhecer a tribo. Ele informa
que a mudança ocorreu em razão do líder do primeiro clã não aceitar mais
nossa expedição. Agora iremos para uma mais distante da capital e,
portanto, precisamos partir pela manhã para chegarmos à noite. Que filho
de uma cadela!
— Vamos lá, Anna, o que são mais oito ou nove horas de viagem
pelo deserto? Tranquilo. — Debocho, pegando meus itens pessoais e
arrumando rapidamente em apenas uma das malas. Olho o celular
descarregado e gemo, sabendo que vou ouvir um monte de meus pais
quando o recarregar e conseguir ligar.
Fizemos a viagem em três jipes. Meu mau humor pela falta de
descanso foi rapidamente substituído quando as construções arrojadas da
cidade foram dando lugar à areia. As habitações e as pessoas foram
desaparecendo até o deserto estar por todos os lados. Deixei minha máquina
à mão e não perdi nada do percurso. Encontramos três vilas no caminho, as
construções em nada lembrando a opulência da capital. Outra coisa que nos
deslumbrou foram as lagoas de água salgada formadas pela ação do vento
nas regiões mais baixas do deserto. Um espetáculo da natureza digno de
registro, abrigando muitos pássaros às suas margens.
Ao chegarmos finalmente à tribo, o chefe não parecia muito à
vontade de nos receber. O homem parecia nervoso, amedrontado, mas não
liguei muito, só rezava para ter um gerador de energia elétrica ou alguma
bateria especial, uma vez que percebi ter esquecido a minha no hotel. Não
tive muito tempo para me lamentar a esse respeito, no entanto. Uma gritaria
explodiu ao meu redor e, em seguida, quase morri do coração quando vi que
a duna do lado direito estava tomada por cavaleiros, galopando e emitindo
algum tipo de grito de guerra assustador. Enquanto olhávamos a duna à
nossa frente, fomos surpreendidos com mais cavalos vindo pela retaguarda.
Meu professor me pegou pelo braço e me enfiou na primeira tenda que
encontrou.
— Se esconda, Anna! — Sua voz soa assombrada. — Eles não
podem descobrir quem você é.
Meu coração galopa mais do que os cavalos, as recomendações e
preocupações de minha mãe vindo à cabeça. Oh, meu Deus! Os conflitos
não cessaram completamente. Ouço disparos e logo a tenda é invadida por
três homens antes que eu consiga me esconder.
— Princesa Di Castellani, fomos enviados pelo príncipe Karim
Amihaj. — Um dos homens com rostos encobertos fala num inglês sofrível.
— Terá que vir conosco.
Eles não parecem confiáveis. De jeito nenhum. Meu professor está
tremendo de medo, os óculos quase saltando do rosto e os homens riem da
sua situação. Eu aproveito e avanço, socando o nariz de um, pegando-o
desprevenido. O idiota grita e me empurra grosseiramente, me fazendo cair
no chão. Me levanto e me coloco em posição de luta.
— Eu não vou me render facilmente! Terão de lutar comigo! —
Digo com todo o desprezo que consigo, disfarçando meu medo. Eles tornam
a rir, menos o que acertei no nariz, que está bufando de raiva. Eles vêm e eu
distribuo socos com vontade. Acerto alguns, mas eles são maiores e mais
fortes, me dominam com rapidez.
— Durma bem, Vossa Alteza. — A voz irônica do imbecil do nariz
quebrado é a última coisa que ouço antes de algo acertar minha cabeça e
minha visão turvar; minhas pálpebras pesando para a escuridão.

Três dias depois…


Me mexo sobre o colchão fino e com cheiro de mofo. Minha cabeça
lateja. Estou desorientada, desidratada, meu corpo dói como se tivesse
levado uma surra. Tento abrir meus olhos, mas a fraqueza me vence. Estou
consciente de que há uma cuia com um angu qualquer dentro dela e uma
jarra de barro com água. Um dos carcereiros, filhos de uma cadela, as
trouxe no começo da tarde. Não consigo comer essa gororoba. Tentei, mas
vomitei tudo no primeiro dia que me pegaram naquela tribo beduína e me
jogaram nesta cela sem nenhuma explicação. Já faz três dias e nenhum
deles fala comigo.
Droga, me arrependo de não conter meus impulsos aventureiros e
insistir em vir para Kamar. Para piorar, o relógio em que meu pai colocou
um GPS especialmente projetado pela Harper acabou ficando no hotel. Não
há como me monitorarem. Lawrence ficará de pés e mãos atadas sem saber
notícias minhas. Após o sequestro de Ella, meu padrinho Leon está
utilizando a tecnologia de papai para nos manter seguros, todos nós usamos
algo com os GPS. Gemo decepcionada comigo mesma. Os conflitos não
cessaram completamente. Mike tinha razão, devia ter esperado mais um
pouco, até a zona estar segura. Teimosa. Me recrimino, começando a ficar
desesperançada.
— Anna? — A voz suave e tão amada me chama.
— Nate? — Soluço fracamente, procurando-o. — É você, meu
amor?
Sua risada penetra em mim e eu me vejo rindo também. Sei que
estou num estado de semiconsciência, não é real, mas não me importo.
Aprecio cada vez que meu garoto fala comigo.
— Sou eu, gatinha — murmura com um toque de diversão.
Exatamente como ele era antes de… Antes de o câncer maldito o levar de
mim. — Você precisa comer, Anna.
— Não. Eu não tenho forças. — Começo a chorar.
— Sim, você tem. — Me viro, olhando-o. Choro mais vendo seu
rosto bonito, os cabelos loiros revoltos, os olhos azuis cristalinos. Ele se
parece com um anjo agora. — Precisa estar forte quando o resgate vier.
— Ninguém está vindo para mim. — Soluço, lamentando não ter
avisado em casa imediatamente quando cheguei. Sou tão idiota com essa
mania de autossuficiência. — Não avisei ninguém em casa. Minha família
não sabe que já cheguei e muito menos o príncipe de Kamar. — Gemo
desgostosa. — Não o avisei também. Vou mofar nesta cela, Nate. Vão
encontrar apenas a minha múmia e…
— Múmias são práticas do antigo Egito, não da região em que está
agora, gatinha. — Ele torna a sorrir com sua leveza e bom humor. —
Agora, levante-se e coma.
— Vou vomitar de novo! — exclamo.
— Não vai. Mantenha em mente que precisa de energia. Sua família
já está procurando por você, tenho certeza. Eles jamais a abandonariam
assim. — Murmura suave, mas firme. Suspiro alto. Sim, ele está certo.
Estou tão confusa, chocada e desorientada por esse sequestro que acabei
com ideias tolas. Os Di Castellani nunca abandonam os seus. Nunca. Eles
virão por mim. — Você sairá daqui, Anna. — Meus olhos se enchem de
lágrimas olhando dentro dos seus, sentindo meu coração doer de saudade.
Tento tocá-lo, mas minha mão atravessa a sua imagem, uma espécie de
holograma. — Não é a sua hora. Você ainda tem muito para realizar, minha
princesa. Prometa para mim que vai comer, que vai viver.
Minhas lágrimas descem pela face, quentes, saudosas, tristes, ainda
revoltada com Deus por tê-lo levado tão cedo de mim. Assinto, porque não
há nada que eu não faria por esse menino, meu único e eterno amor. Nate
abre um sorriso lindo e suave e estende a mão para o meu rosto. Fecho os
olhos e é quase como se pudesse sentir seu toque. Não é real, eu sei, ele é
apenas fruto da minha imaginação. Mas isso é tudo que tenho dele desde
que a doença maligna o venceu.
— Viva, Anna. Você me prometeu, lembra? Viva — sussurra.
Quando abro os olhos, ele já não está mais no pequeno cômodo.
— Nate… — Minha voz está rouca, a garganta ressequida. Respiro
fundo, deixando suas palavras de conforto e esperança me dotarem da força
que preciso para não sucumbir antes de o socorro chegar. — Eu vou viver.
Manterei minha promessa, meu amor.
Reunindo toda a energia restante em meu corpo me levanto, indo até
a gororoba sobre a pequena mesa e me sento na única cadeira disponível.
Devoro tudo e em seguida bebo a água direto da jarra. Pelo menos a água
tem um gosto bom. Ironizo. Torno a me levantar e ando até o canto oposto
onde tem um barril com água e uma toalha, que não me arrisco a usá-la,
dada sua cor encardida. Urgh! Faço uma careta, arrancando minha camiseta,
a calça jeans, ficando apenas de sutiã e calcinha, e faço o que posso para me
sentir melhor neste buraco em que me enfiaram. Há creme dental e uma
escova nova que me entregaram junto com sabonete na primeira manhã.
Não vou ficar fétida, menos mal. Faço minha higiene e me seco com as
mãos, tornando a vestir a mesma roupa, pois tudo meu ficou na tribo.
Penteio os cabelos com os dedos, estremecendo ao sentir o local sensível
onde me deram a pancada que me desacordou. Mike me treinou bem no
boxe, e consegui acertar o nariz de um dos homens, mas isso só os deixou
mais irritados e o resultado é esse tratamento vip que estou tendo.
Um barulho na porta me faz ficar alerta e dou passos largos para trás
da mesa. Meu Deus! Eles estão vindo me matar? Cortar pedaços meus e
enviar para meus pais? Esses pensamentos me fazem estremecer de pavor.
Meu coração dispara, bile subindo à minha garganta quando uma figura alta
escancara a porta, passando para dentro rapidamente. Minhas pernas ficam
moles e me apoio no espaldar da cadeira. A figura vem para a luz da
lamparina e um ofego aterrorizado sai da minha boca. O homem é grande,
ombros largos todo vestido de negro. Mesmo me borrando de medo e quase
fazendo xixi nas calças, me forço a olhar seu rosto. Consigo divisar apenas
seus olhos, o restante está encoberto pelo traje comum aos homens do
deserto. Seus olhos são negros e estão levemente estreitos sobre mim.
Nossos olhares permanecem fixos por um longo tempo. Ele parece surpreso
de alguma forma, um brilho intenso surgindo nas pupilas escuras. Então,
seu olhar desce, passeando pelo comprimento do meu corpo, e se detém em
meus seios. O sutiã molhado faz meus mamilos ficarem pontudos e tenho
certeza de que o tarado está tendo uma excelente visão disso.
— Você nunca viu uma garota antes? — Bufo, insultada pelo olhar
do beduíno abusado. Ele parece um pouco surpreso com minha pergunta,
então, algo acende em suas profundezas de ônix e, em vez de responder,
pragueja em sua língua materna. — Gosta do que vê? — Torno a zombar.
— Fala a minha língua? Saiba que sou muito bem treinada no boxe e artes
marciais. Vou quebrar seu nariz e bolas se ousar se aproximar de mim, estou
avisando!
Volto a fazer a pose de luta que Mike me ensinou e lanço meu olhar
mais ameaçador. Ele torna a praguejar, mas me surpreende quando solta
uma risada baixa, seus olhos subindo para os meus, deixando meus pobres
mamilos em paz.
— Me avisaram sobre a sua língua afiada, princesa. — O homem
diz e sua voz tem um timbre profundo. É… Bonito, me vejo apreciando.
Paro um instante analisando sua cadência e pronúncia do inglês, que parece
mais sofisticado do que o dos brutamontes que me enfiaram aqui. — Eu
vim para buscá-la. — Completa e eu quase caio de alívio. Meus olhos
ardem de alegria. Minha família…
— Quem é você? — Inquiro ainda na posição de defesa. O homem
levanta as mãos grandes, num gesto de paz.
— Não tema. Vim a pedido de seu primo, o príncipe Mike. Eu
sou… — Para um instante e limpa a garganta, olhos presos aos meus, um
brilho fugaz passa em suas íris antes de voltar a falar: — Estou a mando de
Sua Alteza, o príncipe Karim Amihaj.
Dessa vez, minhas pernas quase cedem de alívio. Minha família
realmente estava me procurando.
— Como posso confiar em você? — Ainda resisto, afinal, meus
sequestradores me disseram exatamente isso, que estavam na tribo a mando
do príncipe Karim Amihaj.
— Você não tem muita escolha aqui, princesa. — Ele diz com um
toque de arrogância. — Vem comigo, ou pode continuar neste serviço cinco
estrelas… — Me irrito com seu sarcasmo. — Então, o que vai ser? —
pergunta em tom entediado.
— Como se eu realmente tivesse uma escolha — resmungo, lhe
atirando um olhar mortal. — Saiba que vou reportar seu comportamento
grosseiro ao príncipe. — Levanto o queixo com altivez.
— E quando fui grosseiro? — Me encara com uma expressão meio
divertida, meio zombadora.
— Você ficou encarando meus seios como se nunca tivesse visto
uma mulher em sua maldita vida. Isso foi extremamente grosseiro. — Atiro.
— Irei reclamar, esteja certo.
Ele torna a rir baixinho. Eu não sei o que é, mas seu timbre de voz
está fazendo minha barriga vibrar de uma forma que não gosto. Não quero
gostar. Acho que estou muito fraca pela má alimentação nesses três dias, é
isso.
— Esteja à vontade, minha senhora. — O homem idiota diz com
indulgência, se inclinando teatralmente, e no instante seguinte se lança
sobre mim, me pegando e jogando sobre o ombro. O quê?!
— Que diabos está fazendo?! Me coloque no chão, seu abusado!
Imediatamente! — Brado, esmurrando suas costas duras.
— Wallah![9] Cale a boca, princesa. — Grunhe com dentes cerrados.
— Se continuar berrando como uma cabra, vai matar a nós dois!
Engulo em seco, chocada com o comportamento do homem. Ele
acabou de me comparar a uma cabra? Idiota. Nem conheço e já o odeio!
Porém, me calo, reconhecendo que está certo: gritar só trará meus
sequestradores até aqui. Espera, como conseguiu entrar? Me pergunto
enquanto se esgueira pelo corredor comigo pendurada de ponta-cabeça.
Para, e em instantes estamos cercados por mais homens. Eu me reteso, mas
os escuto falar em sua língua, em tom amistoso. Os outros parecem se
referir a ele com certa deferência. Não parecem rebeldes, então me permito
relaxar um pouco, rezando para estarem realmente a mando do príncipe.
— Vou vomitar se continuar comigo pendurada assim. — Aviso ao
sentir a brisa noturna tocar meu rosto, indicando que conseguimos sair do
meu cativeiro. Ele me coloca em meus pés, finalmente. Me ampara pelos
ombros quando oscilo e um arrepio me percorre, sentindo o calor das mãos
firmes através do algodão da camiseta. Seu olhar escuro encontra o meu e
sinto uma emoção indesejada e incômoda. Olho ao redor, notando que é
uma construção com aspecto abandonado onde me deixaram.
— Eles não deixaram muitos vigiando para não chamar atenção para
este local — esclarece. — Ainda bem que não deu tanto trabalho quanto
pensei…
— É tão lisonjeiro ouvir que estou sendo um estorvo. — Empurro
suas mãos de cima de mim, incomodada com a forma que seus olhos negros
me deixam agitada, com o aroma gostoso de sândalo e outra essência que
emana dele.
— Mulheres ocidentais… — Resmunga em sua língua materna.
Resisto à vontade de enfiar um dedo na garganta e vomitar pelo
machismo escancarado desse troglodita. Será que este é um bom momento
para dizer que compreendo perfeitamente o seu idioma? Um sorriso
impertinente curva minha boca. E perder toda a diversão? Nah. Vamos
deixá-lo na ignorância. Mulheres ocidentais o caramba! Quem o idiota
pensa que é? Vou fazer sua caveira para o príncipe quando chegarmos ao
palácio. Vou adorar vê-lo recebendo um corretivo. Talvez cinco, não, dez
chibatadas.
Uh, eu acho que esses costumes já foram banidos do mundo árabe
há algumas décadas. Eu rio com a ideia de vê-lo receber um merecido
corretivo.
— O que é tão engraçado, princesa? — Aqueles olhos escuros como
a meia-noite tornam a se fixar nos meus. Toda vez que o faz me causa essa
sensação estranha. Uma euforia fora de propósito, uma vez que nunca vi
esse cara na minha vida. O encaro detidamente, mas não vejo nada além de
seus olhos e um nariz afilado, ligeiramente aquilino. Seu rosto está todo
encoberto pelo tecido negro que também cobre sua cabeça em voltas
intrincadas, descendo pelo pescoço. Um pescoço grosso, um peito muito
masculino, visível pelo traje negro. Ele parece um guerreiro. Um lindo
guerreiro, alto, forte, moreno… Fecho a cara. Por que esse cara está
despertando essas coisas em mim? Eu não sentia algo como borboletas no
estômago há algum tempo. Seis anos, para ser exata.
Arrasto meu olhar para o seu e há um leve humor brilhando lá.
Merda. Ele acaba de me flagrar checando seus atributos cruamente
masculinos. O quê? Ele pode ser um cretino, mas é um cretino gostoso. Fiz
uma promessa a Nate, mas não estou morta, ou cega, ok? Posso supor que
tem um rosto impressionante apenas vendo seus olhos e nariz. Ah, Jesus, o
que estou pensando? Provavelmente é todo deformado como o Fantasma da
Ópera. É isso, deve ser feio como o inferno. Eu rio de novo. Ele levanta
uma sobrancelha.
— Mostre-me seu rosto. — Digo isso numa voz inflexível, imitando
o tom que Ella diz que Mike usa no quarto de jogos e a tem de joelhos
imediatamente. Anna, a dominatrix. Eu gosto da ideia. O grandalhão apenas
me olha mais aguçado como se eu fosse uma doida, o que eu meio que sou.
Acho que isso me diz que ele não é um submisso. Certo, lá se vai minha
curta carreira de dominatrix. — Quem é você? O chefe da guarda ou algo
assim? — Mudo de estratégia.
Algo brilha nos olhos negros, vejo a sugestão de um sorriso se
formar por baixo do tecido em sua boca. Hum, parece que ele tem uma boca
bonita também pelo contorno que vejo. Lábios cheios… Sacudo a cabeça
para limpar esses pensamentos tolos e reações anômalas.
— Algo assim… — Sua voz profunda tem uma mescla de mistério e
divertimento. Um enorme cavalo negro é trazido por um de seus homens e,
em um movimento rápido e majestoso, ele pula para a sela. Uau! Estou
ainda um pouco atordoada com todos os acontecimentos desta noite fora de
série. O imponente guerreiro me estende a mão. — Venha, princesa.
Estendo a mão e ele a segura, rapidamente içando meu corpo. Grito,
levando um susto, mas me ponho a me equilibrar na sela do animal enorme.
Sou assaltada pelo cheiro de sândalo outra vez. É um cheiro limpo, o que
me diz que o guerreiro não está há muitos dias no deserto. Perco
completamente a noção quando inclino meu nariz mais perto das suas
costas… Minha nossa, suas costas muito largas…
— Tudo bem aí? — Percebo novamente a nota divertida em sua
voz. Duh. Rolo os olhos. Controle-se, Anna. Fecho meus olhos,
mortificação me atingindo. Jesus! Não sei o que está havendo comigo.
— Tudo ótimo! — Respondo com petulância, afastando o nariz que
estava enfiado em suas costas. Uh… estou sendo patética. Acho que o
idiota ri de novo antes de colocar o cavalo em movimento. Definitivamente,
irei reclamar com o príncipe quando chegarmos ao palácio. Quem esse cara
pensa que é para caçoar de mim?

Karim Amihaj
Conduzo meu cavalo galopando à frente. A lua se escondeu entre as
nuvens e a noite está escura. Minha sorte é que conheço esta região como a
palma da minha mão e posso cavalgar por horas no escuro sem correr o
risco de me perder. Na verdade, já fiz muito isso… Quando Yasmina se foi.
Costumava correr como um louco pelo deserto na madrugada. Algumas
vezes chegava ao cúmulo de levar sua égua junto para me iludir de que ela
estaria comigo de alguma forma. Meu tio refreou meus arroubos e inclusive
me convenceu a escolher uma nova esposa, uma vez que não dá mais para
adiar a minha subida ao trono como rei de Kamar. Todos foram
compreensivos com meu luto, no entanto, é consenso que o estendi por
tempo demais. As tribos estão me pressionando também para me casar e
sentar no trono de meu pai. Depois que viram os lucros do complexo
hoteleiro, da aliança comercial que fizemos com o Catar, país com o maior
PIB dos emirados, eles me apoiam veementemente.
Todavia, uma insatisfação descabida foi crescendo entre as camadas
mais pobres. Movimentos insurgentes, que a princípio não preocupavam,
foram ganhando força até que, no fim do ano, uma onda de ataques
sangrentos explodiu em meu país. Foram meses trabalhando para
conseguirmos prender o líder e seus principais homens. Há dois meses, os
sete homens estão trancafiados, aguardando as suas execuções, marcadas
para daqui quatro meses. Antes de executá-los, estamos tentando fazê-los
dar mais informações sobre os revoltosos, para que possamos neutralizá-los.
Contudo, os miseráveis não estão falando muito e os homens que ficaram
livres não estão contentes com as prisões. Desde o começo desse mês,
alguns incidentes — como saqueamento de vilas e sequestro de turistas no
deserto — voltaram a ser registrados. Não anunciamos para não criar
alardes na população outra vez, no entanto, receio que estejamos nos
encaminhando para outro grande conflito. O espaço aéreo e as fronteiras
terrestres foram fechados ontem, por precaução.
O barulho dos cascos dos cavalos batendo na areia fofa me traz de
volta. Meus homens estão logo atrás, nos guardando e escoltando os cinco
rebeldes que capturamos no resgate da princesa. Por falar nela… está na
minha garupa, os braços enrolados firmemente em meu torso. Ela deve estar
familiarizada com equitação, pois seu corpo aderiu com perfeição à
cavalgada de Hércules, meu garanhão predileto. Isso ajuda no sobrepeso do
animal, uma vez que teremos mais uns cinco quilômetros para alcançar o
helicóptero, que nos levará em segurança até o palácio. Tivemos que deixá-
lo distante e usar os cavalos para nos aproximar do cativeiro de forma
discreta. Não foi tão fácil como mencionei para a garota. Quando Mike me
ligou, aflito, informando que sua prima já estava em meu país e que não
havia dado sinal de vida desde sua chegada, fui obrigado a perceber o
tamanho do problema caindo sobre a minha cabeça: uma princesa foi
sequestrada nas minhas barbas!
Isso é inadmissível. Não podia deixar o incidente diplomático tomar
maiores proporções, então, acionei minha guarda pessoal e iniciamos uma
investigação intensa, que nos levou ao mesmo grupo rebelde insatisfeito
pela prisão de seus líderes. Conseguimos descobrir onde estavam mantendo
a princesa prisioneira hoje de manhã e montamos uma rápida ação para
invadir o local. Meu tio não gostou nem um pouco de eu insistir em vir
junto, porém, sou tão bem treinado quanto meus guardas, e um bom
governante deve estar preparado para combates diretos. Prometi ao meu
amigo que resgataria a princesa e a levaria para minha casa em segurança, e
é o que farei. Intensifico a cavalgada e sinto o corpo feminino moldar-se
ainda mais no meu. Os seios estão esmagados contra as minhas costas e, por
mais que odeie sentir atração por outra mulher, não há como impedir meu
corpo de reagir à sua proximidade. Meu pau engrossa, ficando tão duro que
a cavalgada dói.
Quero empurrar suas mãos de cima de mim, mas ao mesmo tempo
não quero, gosto da sensação do corpo quente cercando o meu. Quando
cheguei ao pequeno quarto sujo onde a colocaram e a vi, fiquei boquiaberto
por uns ridículos minutos. Já havia visto fotos da prima de Mike na internet,
quase sempre acompanhada de algum riquinho da moda. A imprensa a
retrata como a “princesa namoradeira”. Também, com um rosto e corpo
desses, não é de admirar que os homens fiquem loucos pela garota. Mesmo
eu, que não permito mais me levar por paixões mundanas, não fiquei imune.
A princesa é ainda mais bonita pessoalmente. Meu sangue todo correu para
lugares que não deveria quando nossos olhares se encontraram pela
primeira vez. Foi o encontro mais impactante que já tive. Seus olhos verde-
escuros estavam mais claros e assustados, ainda assim, belos. A pele
morena clara, a boca de lábios exuberantes e rosados mesmo sob as
péssimas condições do cativeiro de três dias.
Os seios estavam bicudos pelo sutiã molhado, dando-me a visão
perfeita das auréolas grandes e redondas. Um desejo insano e fora de hora
tomou meu corpo. Sou homem, claro que fiz sexo depois que perdi minha
esposa, mas geralmente me contenho e só o faço quando estou muito
necessitado. E quando vou é um ato mecânico, não sinto tesão pelas
mulheres que me saciam. É um meio para um fim. Servem apenas para me
fazer gozar. Então, por que estou percebendo tudo sobre essa garota? Por
que estou gostando de tê-la em minha garupa, agarrada em mim?
— Senhor, estão vindo atrás de nós! — Um de meus homens avisa,
me alcançando. — Siga com a princesa, ficaremos para despistá-los
enquanto pegam o helicóptero!
— Quantos? — pergunto, tentando não deixar o pânico dominar. A
princesa fica tensa às minhas costas, mas não diz nada, não grita, não faz
escândalo como qualquer mulher faria. Ela só aperta ainda mais os seus
braços à minha volta. Isso me irrita e agrada ao mesmo tempo. Ainda faltam
uns quatro quilômetros para estarmos seguros na aeronave.
— São muitos, meu sen… — Ele se interrompe a tempo. Em
operações que estou junto não é seguro me tratar com a deferência que
revele a minha identidade. Me deixaria vulnerável para os inimigos. — Vá!
Nós os atrasaremos o quanto pudermos para que consigam escapar!
Assinto e volto a atiçar o galope do cavalo.
— Fique tranquila, princesa. Eu a manterei a salvo — digo por cima
do meu ombro. Ela não responde. Talvez não fez escândalo porque está em
choque. — Segure-se que ainda estamos longe do helicóptero!
Galopamos em direção à primeira Duna, e sim, tenho certeza de que
a princesa é uma amazona, e uma das boas. Ela não me dá trabalho algum,
ou a Hércules. Cavalgamos como se fôssemos um só, descendo para uma
lagoa de água salgada. Tudo corre bem pelos próximos minutos até que o
zumbido característico das tempestades de areia chega aos meus ouvidos.
Isso sim, me arrepia de medo.
— O que é isso? — Ela pergunta, pressentindo o perigo.
— Tempestade de areia, princesa. — Informo, reduzindo a
intensidade. — Precisamos parar e encontrar abrigo, ou seremos engolidos
por ela. — Sinto-a estremecer contra mim, mas não diz mais nada. — Há
formações rochosas depois da próxima duna, vamos nos esconder entre as
fendas e…
— Meu Deus! E os escorpiões? Eles vivem no deserto, não é? — Há
pânico em sua voz neste momento. Eu solto um grunhido.
— Me desculpe, princesa, mas eu prefiro ser picado por um
escorpião do que engolido e morto por toneladas de areia — retruco.
— Os escorpiões podem ser mortais! — rebate.
— Então, você quer ficar ao ar livre esperando a areia te encontrar?
— resmungo.
— Você é tão idiota! — resmunga também. — Claro que não, mas
tenho medo de bichos entre essas rochas.
— Devia ter pensado nesses perigos quando decidiu vir para o
deserto, Vossa Alteza — zombo. — A região é cheia de armadilhas e não
apenas de animais, princesa, como está vendo.
— Eu pensei que era seguro… — Seu tom me faz frear a série de
reprimendas que estão em minha garganta. Ela me irrita, mexe comigo.
Além disso, colocou a nós dois em perigo. Então, sem lhe dar chance de
reclamar mais, volto a atiçar o cavalo em direção à pequena, mas bem-
vinda, formação rochosa.
— O que está fazendo? — ela grita.
— Salvando seu traseiro teimoso e mimado, Vossa Alteza. — Torno
a zombar. — Portanto, me faça um favor: cale a boca!
— Imbecil! Vou reportar ao…
—Faça o que quiser, princesa, mas agora cale a maldita boca! —
Rosno e ela resmunga às minhas costas.
Depois de alguns minutos em silêncio, graças a Allah, chegamos às
rochas. Não há cavernas, o que seria mais adequado nesta situação. Ela
desce sem que precise pedir e desmonto em seguida. A lua está
despontando por entre as nuvens outra vez, mas pego minha pequena
lanterna presa ao cinto e me ponho a inspecionar melhor o local para nos
abrigarmos. Encontro uma fenda grande, livre de animais peçonhentos, e
deixo Hércules. Ele fica quieto, as orelhas em pé, pressentindo a tempestade
das grandes.
— Fique em segurança, garoto. Já venho te pegar. — O acaricio na
crina e dou tapinhas em seu pescoço. A princesa está me olhando com
curiosidade enquanto me afasto do meu cavalo, indo em sua direção. Está
louca para ver meu rosto, posso ver pela forma atenta como observa cada
detalhe do que está à mostra. — Venha comigo. — Pego-a pelo cotovelo e é
como se uma corrente elétrica percorresse meu sistema. Tocar sua pele
macia é bom, muito bom, porém, está fria e só agora percebo que deve estar
morrendo de frio e não me disse. Sem lhe dizer nada, me livro de um dos
meus caftans[10] e começo a passar pela sua cabeça.
— O que está fazendo? — Questiona porque é uma tagarela de
primeira.
— Evitando que morra de frio — respondo num grunhido. — Por
que não me disse que estava com frio, princesa?
— Meu nome é Anna Julia. Pare de ficar me chamando de princesa
o tempo todo, isso é irritante. — Me desafia, dá para ver o brilho verde de
suas íris sob a luz da lua. Os longos cabelos negros contrastando com os
olhos claros me deixaram hipnotizado desde o primeiro momento. Ela é a
mulher mais bonita em que já pus os olhos, e essa constatação me deixa
enraivecido. Não quero achar outra mulher bonita e atraente. Yasmina
sempre será a mais bonita para mim. Sempre. — Espera, você é irritante.
Ela que é irritante!
— Que pena que sou sua única esperança de sobrevivência,
princesa. — Provoco, terminando de ajeitar a túnica, suas mãos dando tapas
nas minhas para não a tocar.
— Não ouse me tocar, seu abusado! — Range os dentes e eu rio. Na
verdade, eu gargalho. Mas o que deu em mim para rir mesmo com os
zumbidos de toneladas de areia vindo em nossa direção? Recrimino-me
rapidamente.
— Wallah, fique quieta e me deixe protegê-la da tempestade! —
Brado com seriedade e ela cede, abaixando os braços. — Viu? Não é tão
difícil obedecer, é?
— Não conte com isso, seu, seu… Qual é mesmo o seu nome? —
Não esconde seu desagrado. — É extremamente deselegante não ter se
apresentado ainda. Pela minha experiência, você pode ser outro bandido do
deserto.
Isso me faz rir alto de novo. Tenho que admitir: ela está me
divertindo com sua implicância.
— Estou aqui para salvá-la, não para confraternizarmos, princesa.
— Continuo provocando-a, retirando um dos lenços do meu cinto. Sua
respiração fica suspensa quando o levanto para seu rosto, meus dedos
tocando suas faces enquanto cubro sua boca exuberante e o nariz pequeno e
altivo. Minha própria respiração também trava quando meus olhos sobem,
fixando nos seus. Ela fica ainda mais bonita, apenas os olhos verdes
brilhando como joias acima do tecido negro. Pego mais um lenço,
envolvendo sua cabeça, cabelos e ouvidos. Nossas respirações estão
alteradas, há uma atração indesejada crepitando entre nós, mesmo que a
garota esteja me insultando desde o primeiro instante em que me viu e eu
esteja igualmente rabugento sobre isso. — Puxe o tecido para cobrir os
olhos quando a areia vier — murmuro, minha voz rouca, tensa.
Ela apenas assente, o olhar segurando o meu. Pego-a pelo cotovelo e
nos levo para a única fenda capaz de nos proteger da fúria dos ventos, que
normalmente são de 60 km/h, pegando tudo em seu caminho, não apenas
areia. Ficar a céu aberto, desprotegido, é pedir para se machucar feio ou até
mesmo morrer. Inspeciono toda a cavidade da rocha com a minha lanterna e
ouço o suspiro aliviado de Anna Julia ao ver que está limpa. O zumbido
aumenta e guardo-a em meu cinto antes de empurrar a princesa gentilmente
para a cavidade. Em seguida, me movo, ficando à sua frente, ajudando a
mantê-la segura. Ela me dá um olhar surpreso, especulativo, estamos mais
próximos do que antes, mas ainda irei pegar muita areia e o que mais a
tempestade trouxer.
— Você pode vir completamente para dentro. — Sua voz baixa
também soa tensa.
— Estou bem. — Murmuro, não querendo encostar nela, sentindo
medo dessa coisa se intensificar e também me culpando por ter decidido ir
buscá-la. Talvez, se a visse apenas no palácio não teria esse tipo de reação a
ela.
— Venha para dentro, droga! — Ordena como se estivesse em seu
palácio. Solto um grunhido, ficando imóvel, e suas mãos pequenas seguram
minha cintura, me puxando com uma força surpreendente. Ranjo os dentes,
minha frente pressionando a sua contra a superfície dura. A posição é muito
íntima e agora imagens inadequadas começam a povoar a minha mente.…
Espalmo as mãos na pedra acima de sua cabeça, me sentindo pouco à
vontade, mas gostando de estar colado em seu corpo macio e feminino.
Nossos olhares se fixam e não os desviamos, o zumbido do vento
aumentando rapidamente. — Se não sobrevivermos a isso — ela diz
temerosa, o corpo estremecendo contra o meu —, quero que saiba que já
sou grata por tudo que está fazendo.
Fico em silêncio, absorvendo o que parecem ser suas desculpas pela
implicância. Estou surpreso que tenha exigido que me protegesse também.
Talvez não seja tão mimada quanto pensei.
— Nós vamos sobreviver, ‘amira. — Sussurro com toda a
convicção dentro de mim. — Allah nos guiou para este abrigo.
Ficamos em silêncio um instante. Sua respiração, seus olhos, o
corpo macio colado ao meu é tentação demais para um homem em minha
situação resistir. Já tem mais de quatro meses que não sei o que é estar
dentro de uma mulher. Por mais que tente, não consigo evitar meu pau
engrossar, pulsando contra seu ventre. Ela ofega ao sentir-me duro, pronto,
excitado como há muito não estive. Uma vontade esmagadora de puxar os
tecidos das nossas bocas e uni-las em um beijo me assalta. Chego a salivar,
cobiçando-a sem qualquer vergonha nesse momento. A insanidade me toma
e desço as mãos para o seu rosto.
— Não se atreva a me tocar assim… — Seu murmúrio é petulante,
mas fraco demais para ser levado a sério. A lua torna a se esconder e
aproveito para abaixar o tecido da minha boca. Ela sente isso e suas mãos
vêm imediatamente para o meu rosto, tateando, tocando com delicadeza.
Um gemido rouco me escapa, gostando do seu toque, mesmo me
recriminando por sentir essas coisas. — Você é bonito. — Sussurra, seus
dedos traçando meu rosto inteiro. — Irritante, mas bonito. — Seu tom é
ofegante com um toque de diversão.
— Você também. — Murmuro, segurando sua cintura com uma mão
e começando a puxar o tecido da sua boca com a livre. Nossas bocas se
aproximam, respirando asperamente uma na outra. Empurro meu pau,
esfregando-me em sua barriga, nossas respirações se alteram ainda mais.
Estou louco pelo seu gosto, porém, antes que consiga tocar seus lábios, um
estrondo do outro lado da rocha nos assusta. A tempestade! Por um
momento louco e breve, me esqueci do perigo a que estamos expostos. Só
queria sua boca na minha. Wallah… Que está havendo comigo esta noite?
Recrimino-me, cobrindo sua boca e nariz com rapidez. Seus olhos estão
aterrorizados agora. — Feche os olhos, Anna Julia. — É a primeira vez que
uso seu nome e ela obedece sem discussão. — Só volte a abri-los quando
tudo passar. — Oriento e puxo o tecido cobrindo todo o seu rosto e faço o
mesmo com o meu turbante, apertando meus olhos com força apenas um
segundo antes de sentir o vento e a areia passando por cima da rocha.
Tempestades assim são devastadoras em locais planos, por isso,
proteger-se dentro ou atrás de rochas e terrenos elevados é o mais eficaz.
Anna Julia me puxa contra si com mais força e eu vou de bom grado. Nos
protegemos um ao outro, agarrados firmemente, enquanto o vento parece
sacodir até mesmo as estruturas rochosas. O uivo é alto, junto com o
barulho de objetos sólidos se chocando contra a pedra atrás de nós. A garota
em meus braços está tremendo. Seguro sua cintura com as duas mãos,
mantendo-a bem junto de mim, passando-lhe calma e a certeza de que
ficaremos bem. Após o que, acredito, foram mais de trinta minutos
ensurdecedores, o vento enfim vai diminuindo a velocidade.
Permaneço quieto até que o último uivo passa por nós, já quase
inaudível. Quando o deserto volta a ficar silencioso, sinto o corpo da
princesa ficar tenso contra o meu.
— Já é seguro sairmos daqui, não? — Pergunta, as mãos que antes
me puxavam, me empurrando agora.
Não discuto, me afasto com a mesma rapidez com que está me
empurrando. Prometi ao Mike salvá-la, apenas isso, e é o que farei. Isso que
senti aqui foi uma loucura induzida pela adrenalina. Convenço-me. Me
sacudo, fazendo a terra cair e retiro o shemagh[11] de meus olhos e ouvidos,
mantendo a parte de baixo de modo a proteger a boca e nariz. Ela está de
costas para mim fazendo o mesmo, se limpando da areia. Antes que
aconteça mais algum momento estranho, me viro, indo conferir Hércules.
Ele está se sacudindo também, o pelo negro agora é pardo de tanta areia. O
ajudo a se limpar melhor e o levo para perto de Anna Julia. Monto num
gesto fluído e só então a encaro. Ela olha para todos os lados, menos para
mim. Bem, isso foi constrangedor mesmo. Quase nos beijamos e não vou
me perdoar por isso. Em quatro anos, nunca beijei outra mulher e não irei
voltar a fazê-lo. É só uma mulher bonita, você consegue se controlar.
Ordeno a mim mesmo.
Estendo-lhe a mão e a iço com força e habilidade, acomodando-a
atrás de mim. Voltamos a cavalgar o resto do percurso em silêncio, porém,
as sensações perturbadoras não vão embora. Seu corpo moldado ao meu é
uma tortura. Quando alcançamos a última duna e começo a descer,
avistando o helicóptero e alguns dos meus homens nos aguardando em jipes
e cavalos, suspiro aliviado. Em instantes, estamos desmontando. Entrego
meu cavalo ao meu primo Jalal, chefe da Guarda Real e filho mais velho de
meu tio Jafar.
— Tempestade de areia. — Digo a ele, respondendo ao olhar
interrogativo que está nos dando pela nossa sujeira. — Venha comigo,
princesa. Vou tirá-la daqui. — Chamo-a, pegando seu cotovelo e nos
dirigimos para o grande pássaro negro que nos aguarda. Antes de chegar lá,
sinto uma picada aguda em meu ombro direito e cambaleio com o impacto.
— Khara![12] — Jalal solta o palavrão e começa a gritar ordens em
árabe para o resto dos homens. — Eles estão descendo a duna, senhor!
Precisam sair daqui! Rápido!
— Oh, meu Deus! Você levou um tiro?! — A princesa está em
pânico. Foi corajosa até agora, mas creio que as coisas ficaram complicadas
demais para uma menina da cidade lidar. Ela me ampara, me ajudando a
chegar ao nosso meio de transporte. — Suba! Precisamos sair daqui!
Agora!
Estremeço, me amparando à porta do piloto. O sangue está
inundando minha roupa enquanto a dor rasga minha carne. Tento e não
consigo mover o braço, deve ter atingido algum nervo importante. Sim,
khara, levei um maldito tiro! Meu ombro está queimando e doendo demais.
Jamais tomei um tiro em toda a minha vida militar e vejo que dói, não é
alarde.
— Jalal, volte! Eu não posso pilotar! — Brado para meu primo, que
já está dentro de um dos jipes, uma expressão sanguinária em sua cara.
— Não! Vá atrás do bastardo que o acertou! — A voz de Anna Julia
é potente, com autoridade, e quase faz meus olhos saltarem das órbitas
quando completa: — Eu posso pilotar!
— O quê?! — A minha voz é incrédula. — Você é uma princesa…
Revira os olhos e arranca os lenços da sua cabeça e boca, vindo para
mim.
— Hora de calar essa boca machista e ficar quieto enquanto estanco
esse sangramento. — Avisa, passando os tecidos por baixo do meu braço
esquerdo, pressionando a ferida no ombro direito. Estremeço, mas me
mantenho firme, sem gemer ou reclamar. — Vamos, não podemos perder
tempo. — Me ampara, me levando para o lado do passageiro. Reluto em
subir. — Bem, eu acho que andou lendo algumas histórias de princesas bem
ultrapassadas. Essa princesa aqui pilota desde os vinte, e seus homens
precisam conter os bandidos que não param de brotar neste maldito deserto!
Então, o que me diz? Vai entrar ou prefere continuar com esse tratamento
cinco estrelas?
Eu resmungo. Ela está usando minhas palavras sarcásticas contra
mim. Mesmo contrariado, reconheço que a garota não poderia me
surpreender mais. Ela pilota! Concordo, aceitando sua ajuda para subir e
colocar o cinto. Percebo que suas mãos pequenas e ensanguentadas estão
tremendo. Nossos olhares se encontram, nossos rostos bem próximos pela
ação.
— Sinto muito que tenha se machucado por minha causa. —
Murmura, com lágrimas brilhando nas íris verdes. — E me desculpe por ser
rabugenta quando deveria estar agradecida. Eu.… Sinto muito. — Sua voz
treme e posso sentir seu pavor. A culpa está assolando-a. Engulo em seco,
lutando contra a vontade de tocar seu rosto e confortá-la. Puxa uma
respiração profunda e seus olhos ganham uma determinação feroz ao
completar: — Você vai ficar bem, eu prometo.
Ela corre para o outro lado e nos próximos minutos fico mudo,
completamente atordoado e fascinado ao ver a irreverente princesa
dominando todos os botões e comandos, colocando a aeronave para subir.
Quando ganhamos altura, olho para baixo, vendo que meus homens estão
em maior número e certamente farão os desordeiros se renderem. Um
pouco de alívio me toma. Espero que não haja nenhuma baixa nos meus.
Rogo silenciosamente, me sentindo um pouco tonto. Pelo menos o
sangramento deu uma diminuída. Chegaremos ao palácio a tempo.
— A rota para o hospital? — A voz da princesa me faz encará-la
outra vez e não dá para negar, estou afetado por ela, por tudo que estamos
passando juntos nesta noite.
— Vamos para casa. Ten… — Limpo a garganta. — O príncipe tem
um excelente ambulatório no palácio, bem como médicos a serviço
exclusivo. Fique tranquila, eu vou sobreviver. — Ouso brincar. Ela não
sorri. Está preocupada, olhando de relance para meu ombro atingido.
— Não seja um babaca. — Bufa. Me pergunto se falaria comigo
dessa forma se soubesse quem sou. Um sorriso repuxa em minha boca
enquanto a observo. Algo me diz que ela não me pouparia de suas opiniões
e língua afiada por causa do meu título. Mike me avisou da natureza
irreverente da princesa, mas não pensei que fosse me sentir tão fascinado
quando a visse. — E saiba que ainda vou reclamar para o príncipe. — Essa
última frase é dita com um toque divertido e provocador. Me observa de
canto de olho. — Agora cale a boca e aproveite o passeio, cavaleiro do
deserto.
— Cavaleiro do deserto? — Franzo o cenho.
— Bem, você não me deu a cortesia do seu nome, então eu
improvisei — diz com um sorriso maroto brincando na boca.
Não posso evitar sorrir, mas paro com a pontada no ombro me
lembrando de que tomei um tiro. — Quando poderei retornar a Nova York?
— Sua pergunta me faz franzir novamente a testa. Claro, ela irá embora. A
encaro sem entender que loucura é essa que estou sentindo, mas saber que
irá embora me traz uma sensação desconfortável. O que é totalmente
insano, porque acabei de conhecê-la e ela não pertence aqui.
— Sua Alteza deve liberar o espaço aéreo assim que os conflitos
voltarem a cessar. — Meu tom sai o mais diplomático possível. Ela me olha
de esguelha.
— Preciso agradecê-lo por se empenhar em meu resgate — diz em
tom sério. — Foi muito atencioso da parte de Sua Alteza. Mike diz que ele
é um bom homem.
Pigarreio, me sentindo desconfortável por falar de mim mesmo em
terceira pessoa.
— Ele aprecia a amizade de seu primo também — digo-lhe.
— Agora, me conte uma coisa: por que diabos esses caras parecem
tão irritados com o príncipe? — pergunta à queima-roupa.
— São questões de Estado, princesa, não posso compartilhar. — Me
esquivo, sentindo-me cansado. São meses que não consigo dormir em paz.
— Ah, então você tem um cargo importante no governo? — Ela
pesca e eu rio um pouco ao ver que a minha recusa em me apresentar
instigou sua curiosidade.
— Algo assim, ‘amira. — Murmuro, gostando desse jogo de me
esconder.
Ela geme em frustração.
— Tudo bem, continue sendo um babaca. — Zomba e eu rio alto,
gemendo de dor em seguida. Ela me lança um olhar vingativo ao ouvir meu
lamento.
Cerca de vinte minutos depois, sobrevoamos o palácio e a instruo a
aterrissar no terraço da ala norte, onde ficam meus aposentos. Uma equipe
médica já nos aguardava junto ao meu tio. Jalal deve ter passado rádio
avisando que fui atingido. Me viro para Anna Julia quando as hélices param
de girar. Estou sentindo mais dor e meu corpo esfriando pelo sangue
perdido, todavia, percebo que está estranhamente calada. Um gemido vem
dela e suas mãos vão para o estômago e só agora percebo que está
tremendo, o rosto pálido como cera.
— Princesa?! O que você tem? — Toco seu ombro, preocupado.
— Ah, Deus, sinto muito. — Balbucia e sorri fracamente. — Minha
pose de princesa fodona está arruinada agora, não está?
Eu riria se não estivesse vendo que parece mal. Provavelmente está
desidratada e desnutrida devido às péssimas condições a que foi submetida.
Estava fingindo uma força que não sentia, só agora vejo. Retiro meu cinto e
pulo do assento, esquecendo meu ferimento nesse momento, dando a volta
para o seu lado. A ajudo a se livrar do cinto, sua pele está fria. Antes que a
puxe para fora, faz um barulho na garganta e, então, vomita em seus pés.
Mais aflição me enche e me aproximo mais, segurando seus cabelos
enquanto coloca tudo para fora. — Oh, Jesus, isso é tão humilhante. —
Grunhe, limpando a boca com as costas da mão.
— Shh, venha aqui. — Puxo-a, levantando-a com o braço esquerdo
e amparando-a com o direito. Gemo de dor, mas ela está pior do que eu
nesse momento.
— Não pode me carregar. Está ferido. — Reclama, sua voz fraca, o
corpo frio e tremendo muito. — Prometa-me que vai contar esse final com
mais glamour, por favor. — Ainda tenta ser espirituosa. Meus olhos
prendem os seus enquanto ando pelo terraço, ouvindo meu tio me
repreendendo por estar forçando o ombro ferido.
— Eu prometo. — Sussurro, sentindo-me estranhamente protetor
com ela. Meu ombro está me matando, mas não quero passá-la para
ninguém. — Não é culpa sua ter ficado doente, ‘amira.
— Nate me deu forças. — Ela diz baixinho, fechando os olhos.
Acho que está um pouco delirante agora. Quem é Nate?
— Amiri, passe a moça para um dos homens. — Meu tio diz com
firmeza. — Está ferido.
A encaro. Ela está tentando manter os olhos abertos, mas está
perdendo a batalha. Contrariado, passo-a para um dos homens da minha
segurança.
— Leve-a para os aposentos ao lado de Ayla. E um médico deve
examiná-la imediatamente. — Ordeno, não deixando qualquer emoção
transparecer.
— Meu senhor, ela não é da família, instale-a na ala sul. — Meu tio
diz com sua frieza em dia.
— Ela é uma princesa, prima de meu grande amigo e está doente, tio
— rebato. — Não a colocarei na ala sul, é muito distante.
Ele respira fundo, mas concorda.
— Ouviu seu príncipe, leve-a para os aposentos perto da princesa
Ayla. — Ordena ao homem e se vira para mim. — Agora, venha, precisa
cuidar desse ombro.
Me rendo e deixo os médicos me rodearem, já me examinando ali
mesmo. Meus olhos procuram meu segurança se afastando com Anna Julia
nos braços. Espero que fique boa logo. Olho-a angustiado enquanto me
examinam. Pensei que ela estava bem, com toda sua implicância e língua
afiada. Acho que a adrenalina também ajudou a derrubá-la.
Cerca de quarenta minutos depois, doutor Nassib termina de suturar
minha ferida após retirar o projétil. Pegou um nervo e uma artéria
importante, mas os tecidos foram reparados e ficarei bem depois de um
período de molho. Imobiliza meu braço com uma tipoia e me recomenda
ficar pelo menos uma semana sem sobrecarregar o braço. Agradeço o
doutor, em seguida saio do ambulatório e meu tio me acompanha na
caminhada até meus aposentos.
— Como se sente? — pergunta no tom neutro que é sua marca.
— Com dor, mas os remédios irão agir em breve, espero. —
Resmungo, seguindo pelo corredor, parando do lado de fora dos aposentos
de minha filha. Uma das enfermeiras me ajudou com o banho antes da
pequena cirurgia, e se não estou completamente bem, estou pelo menos
limpo.
— Recebemos a confirmação de mais dois emirados agora há
pouco. Eles enviarão suas filhas para o baile de meu senhor.
Wallah! Ele não vê que discutir o baile onde serei obrigado a
encontrar uma nova esposa não é um de meus assuntos preferidos?
— Fico satisfeito, tio. — Meu tom é lacônico. — Vou ver Ayla e
depois só quero descansar.
Seus olhos escuros me sondam.
— Você se arriscou demais hoje, Amihaj. Essa princesa ocidental é
mimada e imatura para vir ao nosso país em meio a essa onda de
instabilidade. É uma irresponsável. — Diz, deixando claro mais uma vez
seu descontentamento por eu ter decidido ir resgatar a princesa
pessoalmente. — É valioso demais para o seu povo, evite se expor dessa
forma no futuro.
Trinco os dentes, irritado pela forma como está diminuindo Anna
Julia.
— O senhor viu quem estava pilotando o helicóptero, tio? —
Inquiro, angustiado para ter notícias dela. — Anna Julia é mais corajosa do
que todos nós juntos. Não estava se sentindo bem, mas pilotou com
eficiência como qualquer homem faria, me trouxe para casa em segurança.
— Seu olhar não amolece.
— Ótimo. Daremos uma recompensa para a princesa — diz com
arrogância.
Sua audácia me desagrada. Ele sabe que sua família é bilionária e
influente na Europa.
— Boa noite, tio. — Me despeço para não lhe dar uma resposta
malcriada.
Ele curva a cabeça e se vai pelo corredor.
Entro no quarto de minha filha e sigo até sua cama. Ternura invade o
meu peito ao vê-la dormindo tranquilamente. Aos seis anos minha
princesinha não é fácil, herdou mais do que a aparência de minha amada
mãe, falecida antes de meu pai, há muitos anos. Me sento na borda do
colchão e fico olhando-a, como faço muitas vezes. Ela é o meu maior
orgulho. Tive que aprender rápido a suprir a falta de sua mãe. Ayla não se
lembra de Yasmina, era muito novinha, mas sempre lhe falo sobre ela.
Crescerá sabendo que sua mãe foi o amor da vida de seu pai. Me debruço,
beijando sua testinha suavemente, e deixo o quarto. Uma enfermeira está
deixando os aposentos ao lado, onde mandei instalarem a princesa. Sem
controlar minhas pernas, eu sigo até lá.
— Como a princesa está? — Pergunto no meu tom de príncipe
formal.
— Meu senhor. — Ela se curva e fica sem jeito, não me encarando
diretamente. — Foi medicada e está dormindo agora. Revezarei com outra
enfermeira para a noite — informa.
— Shukran. — Digo-lhe e ela faz reverência antes de sair.
Olho a porta, a vontade de entrar me dominando. Não penso muito,
apenas me movo, estou com dor e não vou conseguir dormir agora mesmo.
Entro nos aposentos à meia-luz. Atravesso a sala de estar em direção à
grande cama dossel. A avisto lá, um lençol cor bege com fios dourados
cobrindo-a até o peito. Está tomando soro na intravenosa. Suas coisas foram
trazidas do hotel para cá hoje à tarde. O penhoar branco que está usando
deve ser seu. Suas feições estão relaxadas e um pouco da cor voltou às suas
bochechas, embora haja sinais de esgotamento nos círculos sob seus olhos.
Eu fico aos pés da cama, olhando-a por um tempo. Seus longos cabelos
negros e lisos estão espalhados no travesseiro. Sei que estou invadindo sua
privacidade olhando-a dormir, mas meus pés têm vida própria quando
andam devagar para o lado da cama. Ela é sim a mulher mais bonita que já
vi.
— Karim Amihaj. — Murmuro minha apresentação tardia, esse
encantamento inesperado enchendo meu peito. Meus olhos nunca deixam
seu rosto bonito e calmo. — Fique tranquila, iremos contar o final da nossa
aventura como você desejar. Manteremos sua reputação fodona. — Digo-
lhe com um sorriso brincando em minha boca. Meu ombro dói, indicando
que preciso descansar também. — Fique boa logo, ‘amira. — Torno a
sussurrar e me viro, encaminhando-me para a porta.
CAPÍTULO DOIS
Dois dias depois…
“Aqueles olhos selvagens, uma silhueta psicodélica. Eu nunca quis me
apaixonar por você, mas eu estava enterrada… Minha salvação. Minha,
minha…”
(Gabrielle – Salvation)

Anna Julia
Meus olhos se abrem direto para um dossel de tecidos bege com fios
dourados. Me remexo na cama agradavelmente macia, meu corpo parece
descansado, relaxado. Me sento com rapidez, observando tudo ao redor,
estranhando o quarto. Antes de o pânico me tomar, tudo volta à minha
mente. O sequestro, o resgate. Estou no palácio do príncipe. O cavaleiro do
deserto.… Fique boa logo, ‘amira. Tive a impressão de ouvir sua voz aqui
no quarto. Ou foi delírio devido ao meu estado precário? O verei hoje para
agradecer? Meu Jesus! Ele tomou um tiro por minha causa. Meu coração se
agita ao recordar aquele momento aterrorizante. Será que está bem?
Levanto a mão direita para meu rosto e faço careta com a dor no dorso.
Inspeciono-a, notando a picada arroxeada da intravenosa. Sim, tomei
medicação e soro. Gemo, recordando o gran finale do meu resgate.
Urgh.… Vomitei na frente do cara. Humilhante. Eu segurei a pose
fodona o quanto pude. Mas estava muito fraca.
Devo ter contraído alguma infecção alimentar daquela gororoba que
me serviram, com certeza. Lembro-me que acordei algumas vezes. Uma
moça simpática me dava um líquido morno na boca. Sopa. Me levava ao
banheiro e me trazia de volta para a cama, onde capotava de novo. Há
quanto tempo estou aqui? Quantos dias se passaram? Me arrasto para a
borda do colchão e sou surpreendida, só agora notando uma menina sentada
na ponta da poltrona, a alguns passos da cama.
— Quem é você? — Pergunta com seus olhinhos escuros brilhando
de curiosidade.
Eu que pergunto. Quem é ela e como entrou aqui?
— Minha nome é Ayla Yasmina. Pode me chamar de Ayla. — A
pequena diz, talvez para me encorajar a falar. — Minha pai não queria que
eu saísse aqui, mas eu fiquei curiosa. — Dá de ombros, um sorriso travesso
cruzando seu rostinho infantil. Seu inglês é péssimo, mas ela é uma
coisinha linda. As pernas curtas balançando sem tocar o chão, as mãozinhas
cruzadas sobre o colo, como uma mocinha. Os cabelos negros e compridos
presos numa trança. — Você não fala a meu linguajar? Minha inglês ainda é
pouco bom. — Torna a confundir tudo e simpatizo com ela e sua tentativa
de se comunicar comigo. Que gracinha.
Então, a ficha cai. Deve ser a filha do príncipe. Tinha apenas dois
anos quando sua mãe morreu num trágico acidente aéreo, recordo-me. Deve
ter uns seis agora, acho.
— Oi, pequena. Sou Anna Julia, mas pode me chamar apenas de
Anna. — Falo pausadamente em inglês. Ela ouve atenta e sorri quando
compreende. — Seu pai é o príncipe Karim?
— Sim, mas ninguém o atende assim. Ele não prefere Amihaj. —
Diz devagar, esticando a coluna na pose educada, novamente fazendo
bagunça na língua.
Eu coloco minhas pernas para fora da cama, encontrando pantufas
macias à minha espera. Estico meus braços acima da cabeça,
espreguiçando-me. Parece que fiquei nesta cama tempo demais. A garotinha
continua me encarando quando volto a olhá-la.
— Você são bonita. — Diz e torno a sorrir do seu inglês
atrapalhado. A observo e me inclino em sua direção.
— Shukran, ‘amirat saghira. — Murmuro, encantada pelo seu
jeitinho esperto e direto. — ‘Ant ‘aydaan jamila[13].
Seus olhinhos cintilam quando a chamo de princesinha e devolvo o
elogio em árabe.
— Você fala minha língua! — Exclama, seus pés balançando
euforicamente.
— Você consegue guardar segredo? — Sussurro em árabe. Ela
balança a cabeça concordando. — Eu falo, mas não conte a ninguém ainda,
está bem? Vou falar em sua língua apenas com você.
— Está bem! Não vou contar! — Repete, seus olhinhos brilhantes
por compartilharmos um segredo. Estendo o meu dedo mindinho em sua
direção e ela enruga a testa.
— Você tem que entrelaçar seu mindinho com o meu. — Murmuro,
fazendo-a sorrir, mostrando a ausência de um dente da frente. Ela é
adorável. — É assim que as meninas do Ocidente guardam segredos.
— O que é o Ocidente? — Pergunta, enrolando o dedinho no meu.
— É de onde eu venho, pequena. — Esclareço, tocando seu rostinho
bonito.
— E lá é bonito? — Continua com sua curiosidade infantil.
— Sim, muito bonito — respondo.
— Vou pedir ao meu pai para me levar para o Ocidente! — Diz,
eufórica, pulando da poltrona. — Ele sempre faz tudo que eu peço. —
Complementa em tom de conspiração.
Meu peito aperta um pouco pela garotinha bonita e esperta. Seu pai
deve se desdobrar para suprir a falta de sua mãe, com certeza.
— Ele deve te amar muito, princesinha — murmuro com suavidade.
— Eu também o amo, muito, muito! — Abre os bracinhos esticados,
indicando o tamanho de seu amor. — Meu pai é tão bonito, você o
conhece? — Solta com a expressão de adoração para sua figura paterna que
conheço bem. O que me lembra que preciso ligar para meus pais. Sei que a
essa altura já sabem que estou a salvo, mas só ficarão tranquilos quando
conferirem com seus próprios olhos em uma chamada de vídeo.
— Ainda não vi seu pai, Ayla. — Me levanto, sentindo-me muito
bem, embora meu estômago ronque vergonhosamente alto. — Talvez o
encontre hoje.
— Hoje não. Meu pai acordou muito cedo e está reunido com os
clãs tribais. — Informa com toda a seriedade, como se de fato soubesse do
que se trata.
— Você sabe o que é um clã tribal, menininha esperta? — Pergunto,
fascinada por sua desenvoltura.
— Não. Mas papai disse que são nove e que eles o ajudam a
governar nosso país. — Informa com um ar professoral que me desmonta.
Um sorriso curva a minha boca, apreciando cada vez mais a conversa com a
pequena. Que menininha encantadora.
— Você é uma princesinha muito inteligente, não é? — Sorrio,
tocando meu dedo na pontinha do seu nariz. Seus olhinhos cintilam de pura
satisfação.
— Você também é uma princesa, Anna? — pergunta. — Minha
babá disse que meu pai havia hospedado uma princesa neste quarto e que
você era muito bonita. — Ri, travessa. — Por isso fiquei curiosa para ver…
Ah, essa menina é das minhas. Rio, adorando sua irreverência
infantil.
— Sim, também sou uma princesa, Ayla. — Assinto. — Uma
princesa que precisa urgentemente de um banho e depois de uma montanha
de comida! — Completo, meu estômago tornando a roncar alto. A pequena
sorri, colocando a mãozinha na boca.
— Toque aquele botão e alguém virá. — Aponta para uma espécie
de campainha perto da cabeceira da cama. — Posso ficar aqui com você?
Minha professora de inglês é muito chata. — Faz cara de cachorrinho. —
Meu pai não pode saber que fugi da aula, promete que não conta? — Torna
a sorrir conspiratória.
Ah, definitivamente é das minhas! Sorrio com vontade. Mas sou a
adulta aqui, senhoras e senhores.
— Você não pode fugir da aula, pequena. — Seu rostinho cai ao ver
que não vou apoiá-la. Suspiro, adicionando: — Bem, a não ser que a
professora seja mesmo muito chata — sussurro com cumplicidade.
— Obrigada, Anna! — Um sorriso gigante se abre em seu rostinho
bonito. — Eu não gosto dela — reclama, fazendo careta. — Vive
reclamando para meu pai que não estou indo bem.
— Certo. Você pode ficar aqui comigo. Será a minha convidada para
o café, que tal? — Proponho e ela pula de entusiasmo.
— Você é tão boa, Anna! Você vai ser minha amiga? — Seus
olhinhos estão novamente de cachorrinho. Meu peito aperta de empatia pela
pequena tagarela, mas também porque irei embora em breve. Não é uma
boa ideia deixá-la se apegar a mim.
— Você não tem algum amiguinho ou amiguinha da escola? —
Inquiro e vejo a tristeza invadir seu semblante.
— Eu não vou à escola. Meu tio Jafar diz que uma princesa precisa
estudar em casa.
Em outras palavras, ela nasceu mulher e não pode fazer muita coisa
por aqui. Mas é claro que não digo isso à menina. Preciso me lembrar de
que não estou na América.
— Bem, eu não sei por quanto tempo ficarei aqui, princesinha. Mas
serei sua amiga, está bem? — murmuro.
Ela bate palmas e estende o mindinho para mim. Ah, que linda! Me
abaixo, ficando em seu nível e entrelaço nossos dedos outra vez.
— Seus olhos são verdes. — Me observa bem de perto. — Nunca vi
olhos dessa cor antes.
Eu rio, tocando seu narizinho de novo, deslizando meus dedos pelo
rostinho macio.
— Você gosta?
— Sim. Eles são muito bonitos! — exclama.
— Os seus também são, pequena. — Observo seus olhos escuros
com raias caramelo. — Agora fique aí quietinha que vou tomar um banho e
ligar para meus pais.

***

Eu ando através da passarela coberta de plantas no jardim da ala


norte. Os jardins do palácio de Ardócia são lindos, mas este aqui não fica
atrás. Aliás, a magnífica construção com influência da arquitetura otomana,
com suas cúpulas pomposas, é digna de muitos suspiros. Parece que caí
bem no meio das filmagens de Aladim. Sorrio. Não vi muito ainda, mas o
pouco que vi, gostei muito. Saio da passarela, suspirando ao ver uma vasta
área gramada e uma fonte belíssima no centro. Pequenas plantas rastejam
pelos muros baixos e há canteiros com uma variedade de flores com
predominância de rosas do deserto. Uma profusão de cores. É lindo! A
noite está caindo. Observo o tom alaranjado do céu acima de mim. O dia
passou devagar, só não foi um completo tédio porque Ayla esteve comigo a
maior parte do tempo, em meu quarto. Um sorriso suave curva a minha
boca ao pensar na menininha bonita e esperta. Ela me colocou a par de todo
o funcionamento do palácio. Quero dizer, dentro da sua lógica infantil,
claro.
Fiz uma chamada de vídeo para meus pais e Lipe, logo que saí do
banho pela manhã. Deram um suspiro coletivo quando me viram, alívio
enchendo seus rostos e o meu. Chamei Ella e depois cada um dos primos,
porque somos assim, nossos pais nos criaram como irmãos, e nos
preocupamos uns com os outros. A família estava em polvorosa, planejando
enviar o serviço secreto para Kamar se eu não fosse resgatada. Porém, todos
foram aplacados desde que o príncipe Karim Amihaj ligou informando que
estou sob a sua proteção até os conflitos cessarem e eu poder voltar para
casa. Por falar no homem, preciso pedir uma audiência para agradecer seus
esforços em me resgatar. Além disso, estou angustiada, querendo notícias
do cavaleiro que arriscou sua vida por mim. Não gosto da forma como me
afetou, mas não consigo evitar repassar cada detalhe da nossa aventura.
Aquele momento nas rochas, nos protegendo da tempestade de areia…
Mesmo agora, meu corpo reage, meu baixo ventre esquentando. Seu
corpo excitado contra o meu, me fazendo sentir cada músculo firme
pressionado em mim. Seu membro duro, grande e grosso… Aqueles olhos
escuros fixos nos meus, nossas respirações se misturando quando sua boca
quase tocou a minha. Ele é um homem bonito, tenho certeza pelo formato
do rosto. Meu Deus! O que deu em mim para me deixar levar daquela
forma? Toquei seu rosto, sua barba. Foi muito íntimo e nem mesmo sei o
seu nome. A lua estava escondida e não me permitiu ver quase nada quando
retirou o tecido da boca. Eu ansiei por vê-lo e me recriminei muitas vezes
desde que recobrei a lucidez. Todavia, não posso negar que que foi uma
experiência marcante, talvez pelo perigo a que fomos expostos. Deve ter
sido isso, a adrenalina fez nossa interação e reações um ao outro se
elevarem. Aquela não era eu. Foi a adrenalina, claro. Toco meu colar,
pedindo desculpas a Nate silenciosamente.
Um movimento à minha direita, no corredor externo, capta minha
atenção e vejo uma túnica branca tremulando atrás de um homem grande e
apressado. Outro homem o segue, tomando o caminho que leva aos
aposentos do príncipe. De acordo com Ayla, estou bem perto dela e de seu
pai. Pareceu-me um gesto atencioso, porém o homem ainda não se dignou a
reconhecer a minha presença desde que cheguei. Isso é grosseiro. Estou
começando a achar que sua hospitalidade é uma merda! Ouço vozes
alteradas em árabe, mas não consigo discernir nada pela distância. Mais
vozes exaltadas e, então, um deles se vira e começa a descer os degraus
para o jardim. Para à minha frente, percebo que deve ter em torno de
sessenta anos, acho. Seu traje é típico, inclusive com o turbante. Mesmo
com sua cara de poucos amigos, noto que deve ter sido um homem bonito
quando mais jovem.
— Princesa Anna Julia. — Cumprimenta, fazendo uma leve
reverência. — Sou Jafar Al-Abdallah, grão-vizir e tio de Sua Alteza real, o
príncipe Karim Amihaj Bin Khallifa Al-Abdallah. — Então esse é o tio que
insiste para Ayla estudar em casa, isolada do mundo, só porque é mulher.
Fecho a minha cara também, tomando as dores da pequena.
— Senhor Jafar. — Me forço a devolver o cumprimento educado.
— Meu senhor deseja saber como a senhora está se sentindo hoje.
— Torna a falar e meu desagrado com o príncipe por sua falta de
hospitalidade volta a crescer.
Antes que consiga deter, as palavras saem da minha boca:
— Bem, diga à Sua Alteza que se quiser saber como estou que
venha perguntar ele mesmo. — Meu tom é petulante. O grão-vizir arregala
os olhos, depois os estreita, deixando claro seu desprezo pelo sexo
feminino, ou talvez seja apenas para mim.
— Minha senhora, se me permite um conselho, não esqueça de que
não está na América. — Diz em tom mais baixo.
— Impossível esquecer-me disso, senhor. — Levanto o queixo. —
Eu exijo uma audiência com o príncipe.
Seus olhos ficam ainda mais frios e desapaixonados quando
informa:
— Imagino que o conceito de responsabilidade seja desconhecido
para Vossa Alteza, mas, meu senhor tem inúmeras obrigações com o reino e
seu povo. — Seu tom não se altera, todavia, a hostilidade está implícita em
suas palavras. — Ele a receberá quando ou se puder.
Mas que filho de uma.… Está insinuando que sou uma
irresponsável? Eu respiro fundo, contando até mil para não lhe dar uma
resposta malcriada. Então, me lembro do cavaleiro. Talvez consiga
informações com o velhote do Polo Norte. Ironizo-o.
— Tudo bem, vou esperar a boa vontade de Sua Alteza. — Rio com
falsa simpatia. — Por favor, preciso de uma informação, o homem que me
salvou… — Peço com uma urgência que me incomoda. — Levou um tiro.
Pode me dizer como ele está?
Os olhos do homem voltam a se estreitar, me analisando em silêncio
por alguns instantes.
— Ele está se recuperando. — Responde laconicamente. —
Arriscou-se demais para salvá-la, portanto, seja grata e não cause mais
problemas enquanto for hóspede de Sua Alteza. — Inclina levemente a
cabeça e vira as costas, voltando para a escada.
Resisto à vontade de colocar a língua para fora às suas costas.
Adivinhem para quem vai a coroa de Mister Simpatia? Eu bufo, sentindo
que meus dias aqui não serão muito agradáveis. Tirando a pequena
princesa, o resto parece uma merda. Seu pai mesmo está precisando de
aulas de boas maneiras. Vou tentar amanhã de novo, quem sabe Sua
honorável Alteza me receba? Debocho.

Três dias depois…


O idiota do príncipe só concordou em me receber hoje. Estive várias
vezes na porta do seu escritório, na ala oeste do palácio, mas sua secretária
informava que não havia horário vago na agenda. Ontem tentei entrar em
seus aposentos na surdina, mas o que penso ser um de seus seguranças me
pegou no ato e me escoltou até meu quarto. Não foi nada agradável ser pega
no flagra. Eu gemo relembrando a cena.
Me aproximei da porta dos aposentos do príncipe e olhei para
ambos os lados do corredor. Ele vai ter que me receber! Estava mais do que
irritada com o babaca. Peguei a maçaneta e, quando estava girando, uma
mão grande cobriu a minha. Meu coração faltou sair pela boca e me virei,
olhando o homem. Ele estava me encarando com curiosidade. Então, o
reconhecimento me bateu, estava num dos jipes na noite do meu resgate. O
cavaleiro o chamou pelo nome, mas não consigo me lembrar.
— Sua Alteza a está esperando? — Perguntou, olhos escuros sérios
nos meus. Engoli em seco. Uh, Anna, que ótima ideia essa, hein? Zombei de
mim mesma.
— Sua Alteza está me esperando sim. — Levantei o queixo, tentando
não entregar a mentira. Mas o homem parecia bem treinado e ficou claro
em seu rosto que não acreditou em mim. Era um tipo bonito. Pele cor de
oliva, usando trajes ocidentais, calça jeans e camiseta branca. Seus cabelos
escuros e bem curtos.
— Vou acompanhá-la de volta aos seus aposentos, minha senhora.
— Disse em tom respeitoso, mas inflexível. — Sua Alteza não gosta de ser
incomodado em seus aposentos.
Eu bufei, avaliando se daria tempo de girar a maçaneta e correr
para dentro. O homem pareceu ler meus pensamentos, porque meneou a
cabeça.
— Venha, minha senhora, por favor. — Apesar de ser educado, seu
tom não dava margem para recusa. Suspirei vencida, xingando o tal
príncipe em minha mente.
Andei de volta para meus aposentos e o homem se inclinou numa
reverência. Irritada, parei e resmunguei:
— Me faz um favor? Diga ao seu senhor que a hospitalidade dele é
uma merda!
Ele pareceu assustado com minha ousadia. Não me importei. O
príncipe é um babaca de marca maior!
— Não posso dizer isso a ele, princesa. — Ele meio que sorriu e
acrescentou: — Sua Alteza pode jogá-la na masmorra.
Minha boca caiu em choque.
— O quê?! Há uma masmorra por aqui? — Perguntei e o homem
pareceu se divertir. Decerto estava zoando com a minha cara, aproveitando
que estou completamente fora do meu mundo aqui.
— Mantenha-se longe dos aposentos de Sua Alteza. Em nossa
cultura, uma mulher não pode entrar no quarto de um homem que não é
seu marido. — Se curvou com respeito e murmurou: — Minha senhora. —
Virou as costas e saiu pelo corredor. Fiquei boquiaberta quando o vi entrar
nos aposentos do príncipe. Fiz um som chateado, detestando o tal príncipe
de merda.
Grrr!
Volto da lembrança. Estou além de irritada e sem notícias do
cavaleiro. Pensei que o veria aqui no palácio em algum momento, mas não,
o homem parece ter cavado um buraco no chão e se enfiado dentro.
Empurro a última colher do labneh (uma espécie de coalhada seca) na boca
e dou mais uma mordida no falafel (salgadinho delicioso típico desta
região). Meu estômago está completamente recuperado e graças a Deus
posso me esbaldar na culinária exótica daqui. Tomo o último gole do café,
olhando da sacada dos meus aposentos para a vastidão construída lá
embaixo e, mais à frente, quilômetros de areia. É muito bonito. Não sei que
apelo há no deserto, mas algo me fascina. Pena que não vou conseguir
fotografar os beduínos com os conflitos voltando.
Depois que termino o desjejum, visto um caftan de seda verde. O
modelo é na altura dos joelhos porque não sou daqui, então não preciso me
cobrir inteira. Comprei alguns para não me sentir tão deslocada. Uso um
cinto acobreado marcando minha cintura, sandálias no mesmo tom, salto
alto e tiras enrolando nas panturrilhas; aplico apenas um rímel, batom cor
de boca, e prendo os cabelos em um nó elegante. O tempo todo resmungo
desaforos para o honorável príncipe. Zombo. Quem ele pensa que é para me
cozinhar dessa forma? Quando Ella foi sequestrada, Mike foi pessoalmente
resgatá-la, inclusive, quase morreu na tarefa. Humpt! Não se fazem
príncipes desse calibre por aqui. O babaca nem se dignou a reconhecer
minha presença em sua casa. Além disso, estou entediada demais e preciso
fazer algo ou vou pirar trancada aqui neste castelo. Duas horas da minha
manhã estão preenchidas com as aulas de inglês que estou dando para Ayla.
A menina detesta a professora, e eu também, tendo por base a aula que
assisti há dois dias. A mulher é chata com força! Enquanto eu estiver por
aqui, combinei com ela de trabalhar o inglês com a princesinha, assim a
menina não precisa mais fugir da aula. A professora não queria ceder no
começo e, não resistindo, lhe disse que procurasse o grão-vizir, pois o
homem estava precisando aperfeiçoar seu inglês. Sorrio. Eu sei, isso foi um
golpe baixo da minha parte. Em minha defesa, ele foi antipático comigo e
estou entediada…
Alguns minutos depois, sou escoltada até a ala oeste por um homem
grande que disse pertencer à guarda pessoal de Sua Alteza. Meu coração
salta, imaginando os mais diversos cenários. Ele pode me jogar no
calabouço por tentar invadir sua privacidade? Ou me cortar as mãos?
Estremeço ante o pensamento. Acho que essa última opção é só em casos
de roubo. A secretária nos recebe na antessala e sorri polidamente para
mim, indo abrir a grande porta do escritório do honorável. Cumprimento-a
cortesmente e entro, de repente me sentindo nervosa agora que vou,
finalmente, ver esse príncipe grosseiro. Sigo em frente pelo living decorado
em tons de ouro e bege, como no resto do palácio. Há quadros enormes nas
paredes com o que acredito ser seus ancestrais. Tento não fazer barulho com
meus saltos e avanço até sair no amplo recinto. Há uma estante gigantesca
do chão ao teto, abarrotada com livros, no outro extremo estão sofás de
couro marrom. Observo tudo sem pressa e meu coração dispara ao ver a
figura grande parada no limiar das portas para uma ampla varanda.
Ele olha de lado, não diretamente para mim, mas sentindo a minha
presença. Seu perfil é imponente, majestoso. Os cabelos compridos estão
contidos num coque e usa uma barba aparada, porém bem cheia, pelo que
consigo ver daqui. Já vi algumas fotos dele na internet, só que não me
recordo da sua aparência. Avanço devagar e paro, decidida a deixá-lo saber
exatamente o que penso dele, mas antes preciso de notícias do cavaleiro.
— Ouça, prometo não tomar muito do seu precioso tempo. — Solto
no meu melhor tom altivo e percebo a tensão nos ombros largos do homem.
— Só me diga onde está o homem que me resgatou, eu preciso de notícias
dele. — Minha demanda o faz emitir um som surpreso, acho. — Peça para
alguém me levar até ele, é só o que preciso de Vossa Alteza. Ele arriscou
sua vida por mim, tenho que agradecê-lo adequadamente.
Silêncio.
Ouço-o praguejar em árabe antes de se virar, começando a andar em
minha direção. Meus olhos estão contra a claridade, não me permitindo ver
seu rosto, apenas confirmo que seu porte é definitivamente imponente. Suas
vestes negras tremulam a cada passo que dá. A túnica possui duas faixas
douradas na frente, quebrando a sobriedade do traje. Dá para ver que seu
corpo está em forma, mesmo através da largura do caftan. Seu abdômen é
reto, percebo, e minha inspeção continua subindo para um peitoral largo.
Meu cenho franze ao notar seu braço direito imobilizado por uma tipoia.
Ele para à minha frente e, como um trem desgovernado, meu olhar sobe.
Seus ombros, seu pescoço grosso, parecem muito familiares. Quando chego
ao rosto e meu olhar encontra o seu, engasgo. Os olhos escuros e
penetrantes que têm povoado minha mente desde o meu resgate estão aqui,
olhando fixamente para mim. Meu Jesus… Ofego baixinho, estupefata. É
ele! O cavaleiro.… É o príncipe! Mas, como? Pisco, atordoada.
— Mesmo? Interessante.… Me disseram que tinha reclamações
sobre o pobre homem, princesa. — Sua voz baixa soa um pouco
enrouquecida, e as borboletas começam a saltitar em meu estômago. A voz
profunda, aquele timbre que mexeu tanto comigo naquela noite, vibra em
minha pele, arrepiando-me. O encaro embasbacada no primeiro momento.
Seus olhos de ônix cintilam, fixos nos meus. Sinto meu corpo acordando,
esquentando sob seu olhar. — Permita me apresentar, minha senhora. —
Estende a mão esquerda, uma vez que a direita está contida. — Karim
Amihaj Bin Khallifa Al-Abdallah.
Eu não pego sua mão, me rebelando claramente. Então, sua atenção
desce, vagando pelo meu comprimento, sua mandíbula apertando um
pouco, conforme me dá uma checada básica. Enquanto isso, estou presa em
seu apelo sensual, captando cada detalhe do belo rosto moreno. Droga…
Ele não é apenas bonito como o descrevi naquelas rochas, o príncipe babaca
é um homem lindo. Traz seu olhar de volta para o meu e as borboletas
estúpidas continuam fazendo festa em minhas entranhas, meu coração
disparando sem controle. Nunca estive a sós com um homem desse calibre
antes. Quantos anos tem? Acho que trinta, ou um pouco mais? Divago e
paro, percebendo que estou parecendo uma menina boba aqui. Ele me
enganou deliberadamente, o cretino.
— Vossa Alteza. — Cumprimento, não me preocupando em
esconder minha insatisfação. — Espero que tenha se divertido à minha
custa.
Seu maxilar fica tenso com minhas palavras, o olhar firme não
desviando do meu.
— Não foi pessoal, princesa. Há um protocolo em operações que
estou presente. Por uma questão de segurança, não é permitido revelar a
minha identidade. — Explica num tom que em nada lembra o cavaleiro que
me salvou. Este diante de mim é o governante de Kamar, excessivamente
contido e, de repente, quero tirá-lo do sério.
— Eu não sou uma estúpida, meu senhor. — Rebato e seus olhos
estreitam um pouco. — Enquanto estávamos com os outros, compreendo
suas razões, mas e depois, quando pilotei o helicóptero para trazer seu
traseiro em segurança para casa? — Seu rosto mostra aborrecimento por
minha ofensa e um sorriso irônico curva sua boca, que agora sei, é tão
bonita quanto o resto dele, lábios levemente cheios.… Uh, pare com isso,
Anna!
— Considerando que arrisquei o meu traseiro para salvar a sua
bunda insolente e mal-agradecida, princesa, então estamos quites. — Me
olha duramente. — Aconselho-a a tomar cuidado com a língua. Você é
minha convidada aqui, não abuse da hospitalidade.
Isso me faz rir sarcasticamente, cruzando os braços.
— Hospitalidade? Essa palavra certamente não faz parte do seu
vocabulário, Vossa Alteza. — Zombo. — Precisei tentar invadir seu quarto
para que finalmente me recebesse.
Ele nem se abala, apenas grunhe. Qual é o seu problema? Pensei que
tínhamos encerrado aquela noite em bons termos. Bem, eu quase vomitei
em cima dele, será que é isso? Ele é um completo babaca, mas, mesmo
agora com sua animosidade escancarada, ainda me sinto atraída. Seus olhos
são hipnóticos, dois poços escuros e intensos cravados sobre mim. Quero
pedir, não, exigir que pare de me olhar assim. E ele está perto também,
muito perto, o cheiro agora familiar flutuando em minhas narinas. Jesus,
pensei que fosse a adrenalina, mas estou vendo que não foi. Era ele. Era eu.
Minha pele está quente, seu olhar me incomodando além da minha
compreensão, meus seios pesando sob o sutiã. Isso me amedronta. Nunca
senti algo assim por outro homem depois de Nate. Não quero sentir isso!
Tento me afastar, mas sua mão grande se fecha em meu pulso, puxando-me
para mais perto. Arquejo pelo susto e pela sensação eletrizante do toque
másculo, quente, firme. Nossos corpos roçam um no outro e não posso
parar o desejo, despertando em minhas entranhas. Meu Jesus.… Estou fora
de mim.
— O que você queria no meu quarto, princesa? — Sua voz soa
ainda mais profunda e isso vibra em minha barriga. Levanto o rosto,
sentindo sua respiração quente bater em minha pele, a poucos centímetros.
Excitação se espalha em minhas veias, mesmo que me odeie por reagir
assim a outro homem. É algo visceralmente físico, não consigo conter por
mais que meu cérebro ordene o contrário.
Ainda tento lutar e manter minha mente funcionando, quando
murmuro:
— Eu queria apenas conhecê-lo e talvez dizer que suas maneiras
com hóspedes são uma merda. — Sua boca curva num quase sorriso
irônico, os olhos escuros nunca deixando os meus se estreitam em fendas.
— Além disso, sou poliglota, quero saber se há algo para passar o meu
tempo, antes que morra de tédio trancada neste palácio. — Minha voz sai
mais baixa e rouca, embora queira parecer petulante. Deus, odeio isso que
estou sentindo. Limpo a garganta, incomodada demais com esse homem e
seu poder de atração sobre meu corpo.
— Pare de me olhar assim. — Seu olhar adquire um brilho perverso,
a boca perigosamente próxima da minha. — Aqui não é a América. Acha
que pode me tentar com esse corpo e rostinho bonitos e não ter
consequências, princesa? — Arfo, estupefata com sua acusação.
— O quê?! — Puxo meu pulso sem sucesso. Ele não me solta. —
Solte-me, seu babaca egocêntrico! — Ranjo os dentes. — Solte-me! Agora!
— Empurro seu peito com a mão livre e o homem resolve ceder, me
soltando. Me afasto imediatamente, colocando uns bons passos nos
separando. O encaro furiosa: — Pelo visto, Mike estava errado quando me
disse que o príncipe era um homem bom e honrado.
Ele passa a mão esquerda pelo rosto e diz um palavrão em árabe.
Quando volta a me encarar, sua expressão é cautelosa.
— Ouça…
— Não, ouça-me você. — Interrompo-o, levantando meu queixo em
altivez. — Não sei por que acha que quero dormir com você, mas
aconselho-o a baixar sua bola. — Faço um som zombeteiro. — Você pode
se achar a última Coca-Cola do deserto, isso pode ser um golpe duro em seu
ego, meu caro, mas aqui vai: você não é tão atraente assim. — Minto
descaradamente, rolando os olhos. — Já vi melhores, acredite.
Isso o faz levantar uma sobrancelha negra muito bem-feita.
— Você parecia bem interessada naquelas rochas… — O idiota não
é um cavalheiro também. Tinha que me lembrar daquele momento insano?
— Eu poderia tê-la beijado, se quisesse.
— Bem, você certamente queria, a julgar pela forma como seu pau
estava ultrajantemente duro contra mim. — Rebato e ele arregala os olhos
pela minha língua solta. — E mais uma vez, baixe a bola, minha reação foi
induzida pela elevação da adrenalina, nada mais, Alteza. — Digo fingindo
indiferença. Seus olhos estreitam e não sei como é possível, mas o homem
fica ainda gato quando faz isso. Jesus… Só que agora terei que guardar
muito bem minhas reações a ele. Não quero ser mal interpretada de novo.
— Eu interessada em você.… É o cúmulo da presunção. — Continuo
desdenhando. Não sei o que me dá, só quero tirar o brilho de seus olhos e o
meio-sorriso sarcástico se abre em sua cara.
De repente, ele se retesa, como se estivesse se admoestando por
algo. O rosto se fecha e me vira as costas.
— Foi realmente um prazer revê-la, princesa. — Sua voz é
monótona. —Se não se importa, minha agenda está cheia…
— O quê?! Está me dispensando? — Minha boca cai aberta com sua
falta de educação.
— Exatamente. Você é muito perceptiva. — Seu tom pinga
sarcasmo. — Feche a porta quando sair, por favor.
— Você é mesmo um babaca! — Explodo com dentes cerrados. Que
homem irritante. — Entendo perfeitamente aqueles caras irritados agora.
Trate de liberar logo a porcaria do aeroporto para eu ir embora!
— Você não entende porra nenhuma, princesa. Agora saia. — Ele
retorque.
Eu bufo irritada, mas me viro, marchando para fora da sala. Foda-se
ele! Ah, merda, nem consegui agradecer por me salvar. Por que parece que,
de repente, ele queria se livrar de mim? Tão simpático quanto o tio. Deve
ser de família. Faço uma careta. Urgh.

Quatro dias depois…


Karim Amihaj
— Xeque-mate! — A voz divertida de meu primo Jalal ecoa na
varanda de meu escritório. Estivemos ocupados a tarde inteira com os
planos para conseguir encurralar os dois últimos grupos de revoltosos. Um
está agindo em Jawahra, enquanto o outro se embrenhou no deserto,
aparentemente sem deixar rastros. Foram duas semanas de trabalho intenso
nas quais presenciamos a destruição tanto na capital quanto no deserto.
Uma bomba explodiu na praça perto do monumento de meus antepassados.
Parte desmoronou, uma pessoa morreu e outras dez ficaram feridas. Esses
terroristas não estão para brincadeira. O sequestro da princesa tinha como
objetivo servir de moeda de troca pelos líderes do movimento. Eu agi
rápido, frustrando seus planos, e agora estão retaliando, machucando meu
povo.
Resmungo vendo o espertalhão do meu primo encurralando o meu
rei. Passo as mãos pelo meu rosto cansado e me levanto, impaciente, indo
até o minibar dentro da minha sala. Preciso de uma bebida. Pouco tenho
dormido nesses dias, pensando, arquitetando planos e mais planos para
restabelecer a paz em meu país. A bebida alcóolica é proibida em Kamar
apenas nos estabelecimentos comerciais. Pouquíssimos locais possuem
licença para vender — é o caso de casas noturnas e os hotéis da minha rede.
O cidadão pode ingerir abrigado nessas dependências ou em privado, em
sua casa, desde que não se embriague e cause danos a terceiros. É
estritamente proibido andar na rua com bebida alcóolica, a pena é de seis
meses de reclusão para quem desobedecer. Não somos tão rigorosos nesse
sentido e isso ajudou o turismo a crescer em nosso emirado na última
década. Derramo duas doses do Dalmore Scotch 50 anos que Mike me
presenteou em sua última visita.
Por falar nele, nossa conversa de hoje de manhã me deixou ainda
mais incomodado comigo e minhas ações, desde que Anna Julia chegou ao
palácio. Meu amigo me pediu para cuidar da prima, pois ela parece durona,
mas é frágil. Torno a resmungar. Frágil? Estamos falando da mesma garota
que mesmo sofrendo com os sintomas de uma intoxicação alimentar ainda
conseguiu pilotar um maldito helicóptero por oitenta quilômetros?
Volto para a varanda.
— Estou sem cabeça para o jogo, primo. — Me desculpo,
entregando seu copo. Ele me sonda atentamente antes de pegá-lo. Ando até
a balaustrada de concreto e me debruço, olhando minhas terras até onde
minha vista alcança.
— Ela é realmente muito bonita. — Jalal murmura, debruçando-se
sobre a haste também. O encaro, seu olhar escuro é uma provocação aberta.
— Quem? — Me faço de tosco. Ele sorri, ingerindo um gole do
líquido âmbar.
— Está no limite desde aquela noite, primo, não se faça de tolo. —
Aponta. — A princesa mexeu com você, admita.
— Se tudo correr como estamos planejando, ela estará liberada para
ir embora na próxima semana. Fim de papo. — Digo o mais neutro
possível. Exceto que Jalal me conhece muito bem, afinal, fomos criados
juntos. É como um irmão para mim, já que sou filho único. Me dou bem
com os dois filhos de tio Jafar e sua esposa Samira. Porém, minha ligação
com Jalal é mais estreita. Ele me acompanhou em meu período de estudos
no Ocidente, e foi meu primo quem me levantou quando Yasmina se foi.
Sua esposa, Nuria, também foi de grande ajuda com a minha Ayla. E é por
isso que meu primo sabe que estou afetado pela jovem princesa, embora
não vá admitir ou agir a respeito.
— Sim, você tem uma escolha para fazer em breve, Amihaj. — Me
lembra e eu bufo. — Tê-la perto por mais tempo será uma distração
perigosa.
— Você está exagerando, Jalal. — Retruco, tomando um pequeno
gole da minha bebida. — É apenas tesão porque não tenho dado muita
atenção às necessidades do meu corpo… — Meu primo me olha com as
sobrancelhas levantadas, não acreditando em nada do que estou dizendo. —
Foi a adrenalina. Por isso, tudo pareceu tão emocionante, excitante.
— Claro que sim. Nada teve a ver com uma bela princesa, longos
cabelos escuros e olhos verdes audaciosos… — Debocha. Faço carranca e
meu primo idiota ri.
— A garota é uma insolente, mimada, uma língua solta. — Falo,
sentindo o familiar fogo nas veias quando penso nela.
— Eu vi em primeira mão quando ela gritou para eu encontrar o
bastardo que tinha lhe atingido. — Jalal gargalha com diversão.
Recordo-me daquele momento. Ela ficou aflita, preocupada comigo.
Paro o copo a caminho da boca, lembrando que a primeira coisa que fez ao
entrar em meu escritório, há quatro dias, foi perguntar por notícias do
cavaleiro, no caso, eu. Contra a minha vontade, meus lábios tremulam, sua
reação atrevida e comentários espertinhos vindo-me à mente. Quando
ficamos frente a frente naquela manhã, tudo se agitou dentro de mim. O
primeiro plano era ignorar sua presença no palácio. Por isso, não a procurei
e não a atendi quando esteve em meu escritório. Eu sei, isso foi muito rude
e ela estava certa ao reclamar da minha hospitalidade. Não queria vê-la para
refrear essa empatia e atração descabidas. Precisava parar o encantamento
bobo que senti naquela noite. Nunca senti nada disso depois de Yasmina e
lhe pedi perdão muitas vezes, prometendo que não iria mais ver a princesa.
Além disso, como todos fazem questão de me lembrar, estou prestes
a escolher uma noiva adequada e não posso me dar ao luxo de me distrair,
ainda que a distração seja a coisa mais linda em que já pus meus olhos.
Olhar bem dentro das duas pedras verdes à luz do dia me deixou mexido de
novo, foi como se ouvisse minha filha dizendo eufórica: Anna tem olhos
verdes, papai! Viu como são bonitos? Pois é, Ayla também está empolgada.
Tem enchido meus ouvidos todos os dias sobre suas conversas com Anna.
Me contou que a princesa lhe deu permissão para chamá-la assim. Me
recordo que Mike também a chama dessa forma. Meu tio é quem não está
nada feliz com a proximidade de Ayla com a jovem ocidental sem modos.
Palavras dele.
Voltando àquela manhã e respondendo às perguntas eufóricas de
minha filha, sim, eu vi aqueles olhos e, sim, eles são fascinantes, vibrantes.
Possuem um toque de irreverência que me faz querer me afogar neles. A
princesa estava afetada também pelo encontro às claras. Primeiro, porque
estava chateada por eu protelar em recebê-la e, depois, ficou ainda mais
irritada quando descobriu que era eu o tempo todo, que seu cavaleiro nunca
existiu. Ela me tirou do sério com sua língua afiada ao me insultar e não
resisti, puxando-a pelo pulso, precisando sentir seu corpo perto do meu. Seu
cheiro doce e feminino provocou meus instintos mais lascivos desde que me
virei e a vi usando um caftan verde, a cor ressaltando seus olhos vivazes.
Umas sandálias de salto sensuais com tiras enroladas nas panturrilhas bem
torneadas me deram uma ereção sólida. Não consegui evitar, por mais que
me odeie por quebrar a promessa feita à minha esposa. Preciso foder
urgentemente! Do contrário, será difícil resistir à garota.
Antes do nosso encontro acalorado em meu escritório, culpei a
adrenalina. Achei que tudo foi exagerado porque estávamos sob uma
situação de vida ou morte. Mas não foi só isso. Continuei me sentindo
atraído, talvez até mais quando a vi corada, cheirosa, totalmente recuperada
e usando um traje típico de nossas mulheres. Sua pequena cintura marcada
com um cinto, dando um indicativo das curvas esguias e elegantes por
baixo. Recordei a sensação de ter seu corpo junto ao meu naquela rocha, o
momento em que quase provei sua boca carnuda e rosada. Minha boca fica
seca, sabendo que isso é errado, mas desejando descobrir seu gosto mesmo
assim. Como seria possuí-la, estar dentro dela? Olhar naquelas duas pedras
verdes enquanto afundo meu pau todo nela.… Expiro, o tesão voltando a
inflamar meu corpo, tomo mais um gole do uísque, rogando a Allah que tire
essa garota da minha cabeça.
— Você não a viu depois do escritório? — A pergunta de Jalal me
faz olhá-lo de lado.
— Não. Estou me mantendo longe. — Admito. Ele exala devagar.
Seu olhar me sondando.
— Agora você está exagerando, primo. — Adverte, sério. — Esse
não é o tratamento que damos aos convidados da realeza. Nem mesmo a
convidou para fazer uma refeição conosco.
Eu fecho a cara e meus ombros caem. Sim, ele tem razão. Estou
agindo como um imbecil, mantendo-a reclusa em seus aposentos. Não a
apresentei à minha família. Não lhe dei o respeito e honraria que merece
porque estive mais preocupado comigo e minha ridícula atração por ela.
Estou falhando com os Di Castellani. Admoesto-me e cerro o punho direito,
sentindo uma pontada no ombro, na ferida cicatrizando. Viro o restante do
líquido.
— Você está certo. Se Mike soubesse que estou tratando sua prima
como a uma leprosa, nunca mais falaria comigo. — Falo decepcionado e
resignado a mudar o quadro. — Preciso corrigir isso.
— O que vai fazer? — Meu primo tem um sorriso estúpido se
abrindo na cara.
— Ela disse que é poliglota. Está entediada. — Informo, recordando
parte da nossa conversa, há quatro dias. Uma conversa que cortei
abruptamente por não querer ficar mais tempo perto dela. Sua beleza, seu
cheiro, seus olhos, sua boca, tudo me tentando ferozmente. — Talvez possa
me ajudar com o relatório dos alemães, uma vez que Sayd não domina bem
esse idioma.
— Parece um bom plano. Quem sabe assim ela não fale tão mal de
você quando chegar em casa. — Jalal alfineta.
— Acha que ela falará mal de mim? — Pergunto e meu primo me
encara ironicamente.
— Claro que sim, espertalhão. Se Allah abençoar nossos planos,
tudo voltará ao normal e em uma semana ela estará indo para casa. — Fala
seriamente. — Então, meu conselho é: pare de agir como um lunático,
controle esse tesão e trate-a com a deferência que merece por esse tempo.
— Tenho que concordar com ele. — Ah, primo, e por favor, procure uma
mulher para foder, quem sabe essa sua cara amarrada melhore.
Solto um grunhido. Sim, preciso ver isso, com urgência. Sempre
retardo o quanto posso as fodas aleatórias, mas sou homem, gosto de foder,
gozar profundamente enterrado numa boceta.
— Farei isso, primo. — Afirmo, voltando para dentro do escritório.
Ele me segue e depositamos os copos sobre a bancada de mármore. Confiro
o relógio, vendo que já passa das nove. Vou passar no quarto de Ayla e
seguir para o meu, onde comerei algo antes de tentar dormir. — Desculpe
tê-lo tirado do jantar com Nuria e Naim.
Meu primo e sua esposa foram abençoados com um filho há um ano.
Eles estavam impacientes com a demora, visto que já tinham seis anos de
casados quando Nuria engravidou.
— Você também é a minha família, Amihaj. — Estende a mão para
meu ombro esquerdo e o aperta fraternalmente. — Nós vamos conseguir
pegar esses miseráveis e nossas vidas voltarão ao normal.
— Falaykun[14]. — Murmuro, cansado.
Deixamos a sala e tomamos direções opostas. Eu para a ala norte e
ele para a leste, onde o restante da minha família vive. Dez minutos depois,
estou entrando no quarto da minha pequena, ouvindo-a dizer para a babá
que não vai dormir enquanto seu pai não chegar. Um sorriso satisfeito
repuxa minha boca e, quando entro em seu campo de visão, ela grita, os
olhinhos escuros brilhando ao me ver.
— Papai! Você veio! — Corre para mim, se jogando em meus
braços. A levanto e giro com ela pelo quarto. Sua risada aquece meu
coração por completo. É para isso que vivo, para ela.
— Desculpe não ter vindo enquanto estava acordada ontem, nour
hayati. — Sussurro, beijando seus cabelos macios. Hoje não tive tempo de
vê-la, isso me faz odiar ainda mais esses malditos terroristas, os odeio por
tirarem meu tempo precioso com ela. Aperto-a em meus braços, precisando
disso para recarregar as energias. Seus bracinhos enrolam em meu pescoço
e ela sorri, cobrindo meu rosto de beijos. — Papai está muito ocupado por
esses dias.
— Eu sei, os homens maus explodiram uma bomba em Jawahra. —
Seu rostinho cai. — Ainda bem que nenhum inocente se feriu. — Fala
como se tivesse repetindo uma notícia.
Eu olho a babá, que parece sem jeito.
— Amiri, a princesa é muito inteligente e ativa. — Fala baixinho em
tom de desculpas. — Ela já sabe acessar a internet do celular e viu sobre os
conflitos no noticiário online, visto que não a deixo ver a TV sem
supervisão.
Leio em seu olhar significativo que não deixou minha filha ver a
notícia completa da morte e feridos no atentado. Vou ter que restringir os
sites de buscas em seu celular. Detesto ser um ditador com a minha
pequena, mas ainda é muito nova para ficar vendo notícias como essa. Fico
dividido entre dar uma bronca ou sorrir, porque ela é, de fato, muito esperta.
— Você é mesmo neta de sua avó, não é? — Opto por suavizar a
bronca, andando com ela até sua caminha. — Já escovou os dentes? —
Sorri, anuindo. — antou direitinho? — Torna a assentir. Eu puxo as
cobertas, deitando-a sobre os travesseiros. Seus olhinhos estão dando sinais
de sono e ela boceja.
— Deita comigo, papai. — Pede, as pálpebras pesando. Eu sorrio e
me deito de lado, por cima dos lençóis, mantendo meus pés para fora.
— Te amo, ‘amirat saghira. — Murmuro e meu peito vibra ao vê-la
suspirando, o sorriso mais bonito tomando seu rosto.
— Também te amo, papai lindo. — Diz e boceja mais uma vez. Rio,
acariciando seus cabelos suavemente até que seus olhos se fecham devagar.
Fico observando-a ressonar por alguns instantes.
— Durma bem, nour hayati. — Sussurro, dando um beijo em sua
testinha e me levanto, deixando o quarto.
Fecho a porta de Ayla e meus olhos vão para os aposentos ao lado.
A princesa ainda está acordada? É cedo para um adulto. Talvez seja uma
boa hora para ir me desculpar e estender bandeira branca. Antes que eu
perca a determinação, marcho até sua porta, agradecendo o fato de o
corredor estar vazio. Não quero nenhum criado especulando sobre o que
estou fazendo no quarto de uma jovem solteira sob a minha tutela. Pego a
maçaneta e é com alívio que percebo, a porta não está trancada. Empurro-a
suavemente e entro. Mas o que estou fazendo? Me pergunto. Estou
invadindo sua privacidade mais uma vez, a diferença é que, naquela noite,
ela estava desacordada, não me viu. A primeira coisa que sinto é o perfume
gostoso, uma nota sexy, ousada.
Ando devagar, percebendo as luzes baixas, apenas as luminárias em
cantos extremos do aposento estão ligadas. Avanço e ouço uma melodia
fraca vindo da área onde ficam a piscina, a sauna e a hidromassagem. Paro,
o homem decente que há em mim guerreando com o outro que renasceu
para a luxúria na noite em que a viu. Este último vence, e ainda que possa
me arrepender depois, minhas pernas e meu desejo insano me impelem a
continuar. Empurro a porta devagar e corro os olhos pelo local abafado. Ela
acionou o aquecedor. Procuro-a e finalmente a localizo, e então meu
coração dispara, fogo líquido se espalhando em minhas veias. Está nadando
na piscina. Nua. Aperto a porta até meus dedos ficarem brancos, nova luta
travando dentro mim. Outra vez a parte decente perde para a insana e passo
para dentro, andando até a borda da piscina. A voz da cantora ocidental,
Sia, ressoa no ambiente.

(...) Eu luto para voar agora[15] (…)

A princesa está submersa e a acompanho, andando pela borda, meus


olhos correndo por cada centímetro da pele morena clara. As pernas esguias
e longas, a bunda redonda, bem-feita, a cintura fina, as costas elegantes, e
engasgo ao notar algo em sua omoplata direita.… Uma tatuagem! Apuro a
vista, conseguindo identificar o desenho de uma fênix, com as asas abertas,
em pleno voo. Isso não me surpreende tanto, para ser sincero. Ela é o tipo
de garota que não se importa com a opinião alheia, pelo que os tabloides
dizem. Admiro o pássaro e seu corpo bem-feito, meu corpo pulsando de
desejo contido. E tudo piora quando gira, passando a nadar de costas.
Wallah! Eu sou um babaca, como ela própria já me acusou, mas não
consigo sair. Pelo contrário, vou acompanhando-a, salivando pelos
peitinhos cheios, firmes, os mamilos pontudinhos. O formato da auréola é
do jeito que imaginei através do sutiã molhado naquela noite, bem redonda
e inchada. A barriguinha reta, e meu pau baba quando vejo a bocetinha
depilada entre as coxas torneadas.

(…) Mas há um grito interior que todos tentamos esconder. Nós


suportamos tanto, não podemos negar. Nos come vivos, isso nos come
vivos. É, há um grito interior que todos tentamos esconder. Nós suportamos
tanto, mas eu não quero morrer. Não, eu não quero morrer, eu não quero
morrer (…).

Eu a quero. Não gosto dessa constatação, mas a quero. É o desejo


mais visceral, animal que já senti. Meu corpo inteiro pulsa, querendo
reclamá-la, possuí-la. Estou novamente em conflito comigo mesmo quando
gira a cabeça para o meu lado e abre os olhos, como se soubesse que estava
aqui o tempo todo. Congelo, parecendo um adolescente tolo pego no flagra.
Ela boia, me oferecendo uma visão mais desobstruída do corpo, totalmente
sem vergonha. Sua expressão é irônica e provocante quando solta acima da
música:
— Gosta do que vê, Alteza?
Fico mudo, sem qualquer reação. Ela me atira punhais com os olhos
e começa a nadar para a escada. Logo, está me dando um ataque cardíaco
ao sair da água, andando nua e linda até uma das espreguiçadeiras, onde
está sua toalha e roupão. Engulo em seco, vendo-a pegar uma toalha,
enxugando-se sem qualquer pressa. Estreito meus olhos, percebendo que
está me provocando agora. Essa garota é muito petulante. Com um brilho
malicioso nos olhos verdes, ela gira lentamente, me deixando ver cada
centímetro do corpo esguio e lindo. Trinco os dentes, meu pau
completamente duro dentro das calças.
— Grave bem na memória, meu senhor, para usar naqueles
momentos… — Um sorriso irreverente curva sua boca e ela me deixa louco
quando completa: — Você sabe, quando quiser ter um pouco de diversão
com os cinco dedos… — Tem o atrevimento de me dar uma piscada.
Solto um palavrão em árabe. A garota é muito debochada,
desavergonhada também. Ela torce os longos cabelos, sem a mínima pressa,
os enrolando com a toalha, só então pega o roupão e o veste, uma
sobrancelha debochada levantada para mim.
— A quem devo reportar esse tipo de invasão, visto que estou sendo
assediada pelo príncipe em pessoa? — Levanta o queixo na pose que estou
começando a me familiarizar. Parou a provocação agora. Parece zangada.
Eu rio, saindo do meu torpor sexual. Ainda duro como uma rocha,
mas tentando encontrar alguma dignidade depois do que acabei de fazer.
Então, sigo pelo caminho mais fácil: o embate.
— Eu, assediando você? — Olho-a de cima a baixo e rio, um tipo de
sorriso malvado antes de lhe devolver na mesma moeda: — Já vi melhores,
acredite, princesa.
Seu rosto fica vermelho de afronta e, talvez, um pouco de vergonha.
Isso só dura um segundo e ela bufa, revirando os olhos.
— Deve ser por isso que estava aí babando como um maldito tarado,
Vossa Alteza. — Range os dentes. — Saia do meu quarto! O palácio é seu,
mas neste quarto mando eu! Leve seu traseiro real para fora! Agora!
Levanto as mãos em sinal de paz.
— Ouça, a razão de eu vir até seu quarto.… É porque percebi que
tenho sido rude com você.
Ela me observa, voltando a enxugar os cabelos. Os torce e aproveito
para admirar seu rosto limpo, corado da água aquecida da piscina. É linda.
— Um babaca, você quer dizer?
Linda e atrevida.
— Sim, um babaca. — Concordo e vejo a surpresa em seu rosto. —
Eu pensei que você iria confundir as coisas depois daquela noite e de como
nos sentimos atraídos…
— Foi a adrenalina, já disse. — Rebate, revirando os olhos.
Não foi a porra da adrenalina. Eu sei. Ela sabe. Todavia, vou deixar
como está.
— Sim, a adrenalina. — Concilio. — A questão é: eu a tenho
evitado.
— Jura? Ninguém percebeu no palácio. —Abre um sorrisinho
debochado.
— Estou tentando pedir desculpas. — Aponto, contrariado. — Pare
de ser petulante e debochada.
— Só se você diminuir um pouco esse seu ego. — Me encara
desdenhosamente. — Nem toda mulher vai se sentir atraída por você, sei
que é duro ouvir isso, mas é a verdade. Eu, por exemplo, não sinto
absolutamente nada, nadinha.
Eu rio. Ela quase consegue me convencer de que não sente tesão por
mim. Quase. Não sei o que é, se seu deboche ou apenas o desejo louco
queimando dentro de mim. Me aproximo dela. Seus olhos ampliam um
pouco, denunciando seu desconforto. Paro bem perto e mostra que é
corajosa não se afastando. Mantém o rosto levantado, em claro desafio.
Aproximo meu rosto e sussurro em seu ouvido:
— Nós dois sabemos que não foi a adrenalina. — Ela ofega. — Não
gosto de joguinhos. Sou um homem experiente e estou agindo como um
fedelho desde aquela noite. Isso não me agrada. — Me afasto para encará-
la. Seus olhos estão cintilantes, os longos cílios negros molhados
tremulando sedutoramente. Eu acho que nem percebe isso. — E sim, estou
louco de tesão por você. — Abre a boca para falar e coloco o polegar sobre
seus lábios. Quase gemo com a maciez, tudo em mim gritando para que a
beije, prove seu gosto. — Mas garanto que não serei mais um imbecil por
causa disso. Reúna-se comigo e minha família para o jantar amanhã. Irei
apresentá-la adequadamente. — Sua respiração fica alterada enquanto nos
encaramos. — Me deixe lhe mostrar a verdadeira hospitalidade dos Al-
Abdallah.
Chego a salivar, olhando seus lábios cheios e tentadores. Engole em
seco, o olhar caindo para a minha boca também. Então, se afasta e segura
uma corrente delicada que já tinha percebido em seu pescoço. Seu rosto e
olhar estão momentaneamente desprovidos da irreverência.
— Aprecio seu esforço. — Murmura muito séria. — Agora, por
favor, saia.
Observo-a, percebendo uma sombra encobrindo sua alegria e
petulância que já me são tão familiares.
— Eu fui um idiota. Mas gostaria de lhe mostrar quem realmente
sou. — Sussurro e me congratulo quando seus olhos vêm para os meus
outra vez. — Boa noite, ‘amira.
Me viro e a deixo sozinha. Sua mudança de humor repentina
martelando em minha mente.
CAPÍTULO TRÊS
“Você é a luz, você é a noite. Você é a cor do meu sangue.
Você é a cura, você é a dor. Você é a única coisa que eu quero tocar.
Nunca soube que isso poderia significar tanto, tanto.”
(Ellie Goulding – Love Me Like You Do)

Karim Amihaj
Termino de ajustar a gravata, encarando minha figura no espelho.
Pedi que minha secretária avisasse a Anna Julia que o traje para o jantar
seria ocidental. É uma maneira, ainda que tardia, de fazê-la se sentir à
vontade em minha casa. Estou disposto a tratá-la bem de agora em diante.
Todavia, me irrita que tenha passado o dia inteiro inquieto, ansiando vê-la
de novo. Sem mencionar que as imagens dela nadando nua dificilmente
sairão da minha mente. Meneio a cabeça, tentando expulsá-las. E a forma
descarada como lidou com minha intrusão me deixou ainda mais louco de
desejo. Confiro meu terno escuro e deixo o closet, saindo do meu quarto
para o de Ayla. Marquei uma hora mais cedo para minha princesa poder
participar também. Nem preciso dizer que ficou eufórica quando disse que
Anna irá jantar conosco hoje.
— Papai, estou bonita? — Minha menina esperta gira no centro do
seu aposento ao me ver entrar.
Rio e bato palmas, incentivando sua alegria. A babá se põe de lado,
rindo discretamente para nossa interação.
— Muito bonita, nour hayati. — Elogio-a, andando para perto. Ela
pega na saia rodada do seu vestido amarelo-ouro e sorri mais. — Não há
menina mais bonita no mundo todo.
— No mundo todo? — Seu sorriso se alarga, gostando do meu
exagero, afinal é uma criança. Me abaixo, beijando seus cabelos presos
numa trança pendendo no meio das costas.
— Vamos, minha senhora? — Faço uma mesura, lhe estendendo a
mão. Meu coração canta ao ver a alegria estampada em seu rostinho amado.
— Será que a Anna vai me achar bonita também? — Coloca a
mãozinha sobre a minha, os olhinhos cheios de expectativa. Pressinto que
teremos um problema quando a princesa partir. Minha filha está se
apegando rápido demais. Terei de rever sobre não a mandar a uma escola de
verdade. Tenho percebido sua solidão e isso não é bom para ela. Meu tio é
terminantemente contra uma menina estudar fora de casa. Preciso levantar
esse tópico com ele de novo, em breve.
— Ela vai, filha. — Garanto, nos dirigindo para a porta. —
Impossível não ver que você é a princesa mais bonita nesta noite.
— Mas ela também é uma princesa. E é muito bonita. — Observa
alegre enquanto saímos para o corredor. — Você acha, papai?
— Sim, nour hayati. A princesa é muito bonita. — Sou obrigado a
concordar e minha filha desvia o olhar para algo atrás de mim, um novo
sorriso brilhante se espalhando em seu rostinho.
— Anna! Vamos com a gente? — Grita em inglês. Noto uma
melhora significante em sua pronúncia.
— Princesinha!
Meu corpo acorda ao ouvir a voz. O barulho dos saltos batendo
suavemente sobre o mármore faz meu pulso correr, antecipando o momento
em que entrará na minha linha de visão. Tento resistir ao impulso de virar a
cabeça e conferir sua aparência, mas acabo vencido e giro o pescoço e,
Wallah, prendo a respiração. Ela está espetacularmente bela, usando um
vestido branco e longo de um ombro só. O tecido ajusta-se ao torso esguio,
um cinto dourado de cordas intrincadas marcando a cintura delicada, a saia
se alargando nos quadris. A cada passo que dá, uma fenda frontal se abre
sedutoramente, mostrando as pernas longas e as sandálias no mesmo tom do
cinto, tiras sexys enroladas nos tornozelos. Cerro a mandíbula, tentando
refrear o efeito de sua aparência no meu pau. Está elegante, porém, é
sensual. Não é a roupa, é ela. É a forma confiante com que as usa, uma
princesa da cabeça aos pés. Sabe o efeito que causa no sexo oposto? Bufo.
Claro que sabe. Ela com certeza se olha no espelho.
Subo o olhar para seu rosto e já a encontro me encarando. Está
linda. Ficamos nos olhando em silêncio, num momento de apreciação
mútua. Seus cabelos negros estão presos num rabo de cavalo rente à nuca,
comportado, embora sexy. Seu olhar continua no meu. Nós dois sabemos
que isso é mútuo. A atração não irá sumir porque não queremos agir sobre
ela. Seus olhos verdes cintilam, percorrendo meu comprimento, e voltam
para o meu rosto. O rosto bem maquiado, os cílios longos e negros
deixando os olhos ainda mais verdes. O batom vermelho destacando a boca
carnuda é o prego no caixão de qualquer homem com sangue nas veias.
— Boa noite, Alteza. — Inclina a cabeça educadamente.
— Boa noite, princesa. — Respondo, devolvendo-lhe a reverência.
— Fico satisfeito que tenha decidido aceitar o meu convite. Confesso que
tive receio de que não fosse aparecer.
Seus olhos brilham e um sorriso tremula em sua boca.
— Um Di Castellani jamais faria desfeita ao seu anfitrião, honorável
senhor. — Suas palavras e sorriso educados encobrem seu deboche. Porém,
já a conheço um pouco e está me alfinetando sutilmente porque estamos na
presença de Ayla. Isso só se confirma quando me dispensa e se abaixa,
ficando ao nível de minha filha, abrindo um sorriso luminoso, livre de
zombaria. — Oi, Ayla! — Exclama, dando um beijo suave na bochecha da
menina, que se desmancha para a garota. Desliza os dedos pela face de Ayla
e lhe dá mais um beijo, dessa vez na ponta do nariz, e murmura: — Você
está linda, princesinha.
E até eu me desmancho diante da cena. Nunca as tinha visto juntas.
Por isso minha filha está tão encantada, a princesa está lhe dando atenção e
carinho. Qualquer criança em seu lugar estaria da mesma forma.
— Você também, Anna. — Ayla diz, devolvendo o beijo no rosto de
Anna Julia. — Não é, papai? — Minha filha me intima a concordar. Eu
limpo a garganta, subitamente seca. Vou precisar de uma bebida, e logo.
— Sim, nour hayati. — Respondo e Anna Julia desvia o olhar de
Ayla, a boca curvando num meio-sorriso malicioso. — Estamos indo para o
salão, quer se juntar a nós? — Convido-a porque sei que minha filha vai
querer isso.
— Que atencioso, Alteza. — Novamente seu sorriso e tom são
veladamente gentis. Certo, eu mereço. — Obrigada. Eu adoraria. — Olha
para baixo, piscando para uma Ayla completamente apaixonada. Que Allah
nos ajude.
Nos viramos e começamos a andar pelo corredor, dobrando a
esquina que leva direto para o salão de refeições mais íntimas. O utilizo
apenas com a minha família e convidados próximos. Ayla puxa assunto com
sua nova amiga o tempo todo, e fico surpreso como a princesa a ouve
pacientemente, respondendo, puxando assunto de volta. Parecem duas
crianças, animadas para a noite. Encontramos Jalal e Nuria com seu
pequeno Naim nos braços, na entrada do salão, e paramos. Não perco o
olhar aguçado de meu primo e sua esposa para o fato de a princesa estar
chegando comigo e Ayla.
— Jalal, Nuria. — Os cumprimento, indicando a princesa ao lado de
Ayla. — Conheçam a nossa ilustre hóspede, a princesa Anna Julia Di
Castellani. — A princesa em questão me lança mais um olhar que diz: Oh,
você é tão falso, Alteza. Mas abre seu sorriso verdadeiramente simpático
para meus familiares. — Meu primo mais velho, príncipe Jalal Al-
Abdallah; e sua esposa, a princesa Nuria. — Completo.
— Prazer em conhecê-los, Altezas. — Anna Julia oferece a mão ao
meu primo e em seguida para sua mulher. — Salaam Aleikum[16].
A encaro surpreso. Ela fala árabe? Figo intrigado, recordando que
nunca cogitei, ou perguntei. Bem, como iria se a estive evitando por dias?
Zombo de mim mesmo.
— O prazer é nosso, Alteza. — Jalal faz uma reverência respeitosa.
— Seja bem-vinda à casa Al-Abdallah.
— Que a paz esteja contigo também, Vossa Alteza. — Nuria inclina
a cabeça cortesmente.
— Shukran. — Anna Julia torna a falar em árabe.
— Você fala a nossa língua? — Nuria pergunta encantada, a
exemplo de Ayla.
— Oh, não, não. — Nega rapidamente. — Apenas algumas palavras
soltas. — Dá de ombros e meus olhos estreitam sobre ela. Será mesmo? —
E esse bebê adorável é seu? — Muda o assunto, chegando mais perto e
afagando a cabeleira escura de Naim, nos braços da mãe, que, para variar,
se derrete em um sorriso babado para a princesa. Ninguém está imune a ela
nessa família? A princesa vira as costas totalmente para mim e prendo a
respiração com a visão do seu decote. É bem baixo, rente ao cinto, deixando
as costas todas à mostra, meu olhar pousa na fênix de asas abertas, atraente
e irreverente, como a dona. Afrouxo um pouco o nó da gravata e ouço a
risada baixa de Jalal. Meu primo idiota está se divertindo à minha custa.
— Ei, vejam se não é a princesa mais bonita deste reino! — Ele olha
para baixo, brincando com minha filha.
— Tio Jalal! — Ayla vai até ele, que a levanta alto, começando a
brincadeira que a pequena adora.
Enfio as mãos nos bolsos, meus olhos errantes insistindo em ir para
as costas nuas e tentadoras da princesa. Wallah…
— Tragam a nossa convidada para dentro, Amihaj, Jalal. — A voz
fria de meu tio quebra o momento caloroso.
Olho de lado, vendo-o andar em nossa direção, acompanhado de tia
Samira e o caçula Zafyr, solteiro, que já tem sua atenção nas costas sexys de
Anna Julia. Não gosto do que sinto ao ver meu primo comendo-a com os
olhos. Pego no cotovelo da princesa e a viro, com a desculpa de apresentá-
la aos meus tios. A pele macia é gostosa demais ao toque. Sinto-a tensa
também. Khara, isso vai ser difícil.
— Tio Jafar, tia Samira, conheçam a princesa Anna Julia Di
Castellani. — Digo entrando de vez no papel de bom anfitrião. — Princesa,
conheça meus tios, o príncipe e grão-vizir Jafar Al-Abdallah e sua esposa, a
princesa Samira.
— Oh, Amihaj, não me disseram que é tão bonita. — Minha tia está
abrindo o maior sorriso para Anna Julia, que o devolve, simpática. — Seja
bem-vinda à nossa casa, minha jovem.
— Shukran, minha senhora. — Anna Julia inclina a cabeça em
respeito. — Prazer em conhecê-la.
— Já troquei algumas palavras com a princesa. — Meu tio se
inclina, olhando-a com algo que não consigo decifrar, para variar. Ele é
paranoico com ocidentais. — Bem-vinda à nossa casa, minha senhora.
—Obrigada, meu senhor. — A princesa sorri para meu tio, mas não
é o sorriso que deu aos outros. É contido. — Sempre tão simpático. — Eu a
olho imediatamente para ver se ouvi direito. Ela sorri e seus olhos brilham
com irreverência quando pergunta: — A propósito, como anda o
aprimoramento do seu inglês?
Meu tio faz um som enfezado, acho, o que é novo para mim. Ele é
sempre tão irritantemente controlado.
— Nós dois sabemos que não preciso aprimorar meu inglês, Alteza.
Queria apenas ficar livre da pobre e ingênua senhora Prescott. — Diz em
tom baixo, mas não menos intimidante.
— A metodologia da pobre senhora Prescott é sofrível, senhor. Ayla
é cheia de vida, merece aulas mais empolgantes. — Anna Julia defende a
minha filha e eu fico confuso, sem saber do que estão falando.
— Aulas como as suas? — Meu tio inquire.
— Sim, aulas como as minhas. Sou licenciada em Letras, meu
senhor, portanto, perfeitamente habilitada para lecionar inglês. — Ela se
gaba e fico surpreso mais uma vez com essa garota.
— Vossa Alteza estava dançando com a princesa Ayla e chamando
isso de aula. — Meu tio diz com nítido desagrado.
— A música, além de ser fonte de terapia, também é uma excelente
metodologia de ensino, Vossa Alteza. — Anna Julia sorri, um tipo de
sorriso de quem procura encrenca. — Se quiser experimentar, por favor,
junte-se a nós na segunda, iremos cantar e dançar One Direction. — Oh,
não, ela não disse isso. Ouço todos prendendo a respiração. — Nossas aulas
são das nove às onze. Às vezes se estendem um pouco mais porque, bem, é
uma atividade contagiante.
— Eu não sabia que estava dando aulas de inglês para minha filha.
— Digo, atordoado com a conversa.
— Ela está, e me levou a pensar que meu senhor sabia. — Meu tio
me encara e depois à princesa, que está com a mesma cara de Ayla quando
uma travessura é descoberta.
— Ah, ops… — Ri, travessa. — Não foi nada pessoal, meu senhor,
é que tenho percebido suas opiniões um tanto restritas quanto ao papel
feminino, e Ayla é muito inteligente para viver confinada neste castelo. Só
queria dar um pouco de diversão para a menina.
Meu tio está contrariado, embora se contenha.
— As mulheres de nosso país são como criaturas sagradas, Alteza,
elas precisam agir conforme os preceitos do Profeta. — Se defende e em
seguida seu tom é acusador: — Vossa Alteza mentiu para mim quando disse
que Amihaj sabia da sua cantoria sem fim com a princesa.
Anna Julia amplia um pouco os olhos e volta a sorrir com
irreverência.
— Como mencionei, meu senhor, o senhor é um forte concorrente à
coroa de Mister Simpatia. — Menina abusada. — Adoraria lhe apresentar
minhas ideias sobre como as mulheres devem ser tratadas, Alteza. E não
esqueça, nossa cantoria sem fim começa às nove na segunda. — Ousa dar
uma piscadinha no final.
— Eu gosto dela, primo. — Zafyr vem para a frente, estendendo a
mão para Anna Julia, um sorriso de pateta se abrindo na cara paqueradora.
— Sou Zafyr, princesa, é um prazer conhecê-la. — Seu sorriso alarga, com
malícia, e murmura: — Bela tatuagem.
O filho de uma.… Paro a ofensa, lembrando que sua mãe é minha
tia.
— O prazer é meu, Alteza. — Anna Julia o cumprimenta com um
sorriso simpático e, antes que se estendam, interrompo:
— Devemos ir para a mesa. — Anuncio no tom de autoridade de
governante. — Ayla e Naim precisam dormir cedo.
— Eu não estou com sono, papai. — Minha pequena se apressa em
falar.
Eu rio. Claro que não. Ela vai querer aproveitar ao máximo essa
noite.
Nos dirigimos para a mesa oval e durante o jantar meu tio relaxa um
pouco, dando trégua para nossa convidada. Não posso dizer o mesmo de
Zafyr, que continuou cercando a princesa de forma irritante. Como meu
lugar é à cabeceira da mesa, o folgado aproveitou para sentar-se ao lado
dela. Minha pequena também a monopolizou sempre que pôde. Anna Julia
riu e conversou com todos, seus comentários espirituosos arrancando
sorrisos da mesa. Depois da partida de Yasmina, não acho que tenhamos
feito alguma refeição tão animada quanto a de hoje. Olhando para a alegria
e espontaneidade da princesa, é como se ela brilhasse, irradiando uma luz
contagiante à qual ninguém fica imune. Bem, talvez meu tio fique. Ele
esteve olhando a mim e a ela com seus olhos investigadores.
— Eu realmente apreciei conhecer todos vocês. — Ela se virou para
mim e murmurou com o ar provocador: — Obrigada por me tirar do
confinamento, Alteza.
— O que é confinamento, papai? — Minha inocente filha cai na
armadilha da princesa. Eu estreito meus olhos sobre a garota insolente.
— É, meu senhor, explique para a princesa o que significa um
confinamento. — A espertinha atiça e ouço as risadas de Jalal e Zafyr.
Eu demorei alguns minutos para explicar tudo de forma a não deixar
minha filha saber que não tenho sido educado com sua nova amiga.

***

No geral, o jantar foi muito bom. Após a sobremesa e uma xícara de


café, nos despedimos e seguimos para nossos aposentos. Embora tenha
resistido bem, Ayla adormeceu em meu ombro. Anna Julia anda lado a lado
comigo, o silêncio nos envolve até que paro à porta de Ayla. Ela se vira
para mim, linda e surpreendentemente acanhada.
— Obrigada pelo jantar. — Seu tom é livre do deboche habitual.
Seus olhos verdes brilham com sinceridade e isso me agrada. — Você
consegue ser um príncipe, quem diria. — Seus lábios curvam levemente. Eu
sabia que vinha alguma provocação no final.
— Eu gostaria de discutir algo com você. — Digo, alisando as
costas de minha pequena. — Me espera colocar Ayla na cama? Só vai levar
um minuto.
Ela me sonda primeiro, olhos estreitando-se sutilmente, então
balança a cabeça, anuindo. Em poucos minutos cuido de minha princesa e a
coloco na cama, voltando para o corredor. Anna Julia está de costas,
olhando para o jardim, o luar banhando as plantas, o barulho suave da fonte
jorrando. Eu ando devagar, tomando o meu tempo para apreciar seu porte e
beleza aristocráticos. As costas nuas fazem minhas mãos coçarem. Quero
deslizar meus dedos pela sua coluna, beijar cada centímetro de pele exposta.
Ela me sente e olha por cima do ombro, me pegando no flagra. De novo.
Me coloco ao seu lado, perto da escada que dá acesso ao jardim.
— Venha para o meu quarto.
— O quê?! — Se afasta rapidamente. Droga, isso não saiu como
devia.
— Não é isso que está pensando. — Rolo os olhos. — Teremos mais
privacidade do que aqui neste corredor, não acha?
Seus olhos bonitos semicerram com desconfiança.
— Melhor não. Com esse seu ego monumental, é capaz de voltar a
me acusar de querer transar com você, ó, pobre homem indefeso. — Caçoa.
Seu semblante vai se abrindo, um brilho divertido surge nas íris verdes. Não
posso deixar de sorrir. Ela meneia a cabeça, seu sorriso vai aos poucos
adquirindo outra expressão, uma leveza que não havia visto nela, não para
mim. Nós rimos, nos olhando, compartilhando um sorriso pela primeira
vez. — Está bem. Vamos lá. — Murmura depois de uns instantes.
Uso a educação como desculpa e coloco a mão em suas costas. Um
choque gostoso de excitação percorre meu braço, viajando em meu corpo,
indo se alojar na virilha. Sinto-a tensa, prendendo a respiração, sei que é
estúpido, mas, me congratulo por saber que não sinto essa merda sozinho.
Abro a porta lhe dando passagem e quase gemo por precisar parar de tocá-
la, mas retiro a mão. É impressão minha ou ela suspirou?
— O que gostaria de beber? — pergunto já indo para o bar.
— Uma cerveja vai bem — responde e não discuto porque ela não é
daqui, seus costumes são bem diferentes dos meus. Despejo uma dose de
Bourbon para mim e pego uma cerveja long neck para ela.
— Vamos para o terraço. — A chamo, entregando sua garrafa e
liderando o caminho.
— Por favor, fale logo. Isso está ficando estranho. — Reclama
andando à minha frente. Está me provocando com esse decote ousado? —
Oh, meu Deus… — Ela murmura com a vista da minha varanda. É metade
deserto, metade as luzes de Jawahra. Os antigos aposentos que dividi com
Yasmina ficam na ala oeste. Me mudei para essa ala com minha filha
quando não suportei mais ficar naquele quarto. — É lindo!
Meu olhar volta para suas costas. Não tem como não concordar.
Bufo, tomando um gole do meu copo. Ela se debruça sobre a balaustrada e
inspira profundamente. Fico apenas olhando-a por alguns instantes. Ando
devagar até me colocar ao seu lado. Perto, mas ainda a uma distância segura
para nós.
— O que te fez mudar de ideia? Por que está sendo atencioso agora?
— Pergunta à queima-roupa, tomando um gole no gargalo da sua garrafa, e
acho-a fascinante fazendo isso. Me encara, levantando uma sobrancelha
altiva.
— Eu sinto muito — murmuro, e é a verdade. — Não é você, sou
eu.
Sua boca linda tremula no familiar sorriso provocador.
— Nossa, por aqui também se usa esse clichê?
Praguejo em minha língua e seu sorriso aumenta. Essa garota adora
provocar.
— Estou fora do mercado há algum tempo. — Dou de ombros. —
Queira desculpar minha total falta de tato com o sexo feminino, princesa.
Faz tempo que não sinto uma mulher tão perto, então, eu…
— Hum, você está na seca. Entendi. — Continua caçoando de mim.
— Isso são desculpas? — Inquire, seu rosto suavizando um pouco. — Você
pode fazer melhor, Vossa Alteza. Vamos, se esforce um pouco mais.
Acabo rindo e ela também. E novamente compartilhamos um
sorriso. Uma sensação leve e gostosa me invade junto com a brisa do
deserto soprando em nós.
— Tem razão, minha hospitalidade tem sido lastimável. Aceite
minhas desculpas, princesa — digo com toda a intenção de agir como um
anfitrião de agora em diante. Sou um homem, não um adolescente
assustado, saberei lidar com a bela princesa e seu poder de atração. Estendo
a mão para ela. — Que tal tentarmos de novo? Karim Amihaj. É um prazer
conhecê-la.
Ela olha a minha mão por um tempo, então a pega.
— Anna Julia. — Sussurra e vejo como seus olhos brilham quando
nossas peles se tocam, a delicada mão apertando a minha. Meu pau incha,
pulsando dentro das calças. Não consigo, não há como evitar essa reação.
Seu perfume, sua boca, seus olhos me provocam. Toda ela é uma
provocação. — Desculpas aceitas — diz baixinho.
Nossas mãos permanecem unidas, nossos olhares presos. O tesão
inflama meu corpo e ela pisca, soltando-se do meu contato, afastando-se um
pouco. Vejo sua mão indo para o pescoço e ela congela.
— Oh, meu Deus! Eu perdi o meu colar! — O tom de voz tem algo
que me preocupa. Ela ofega, colocando a cerveja sobre o topo da amurada.
— Eu não posso perdê-lo! — Gira, me encarando, os olhos cheios de
lágrimas. — Me ajude a procurá-lo, por favor! Esse colar é muito
importante para mim.
— Fique calma, princesa. — Peço, livrando-me do meu copo e
segurando seus ombros. Ela está transtornada, as lágrimas transbordando e
descendo pelas faces, uma expressão cheia de dor em seus olhos.
— Por favor, me ajude a encontrá-lo. — Implora entre soluços.
— Eu vou achá-lo, prometo. — Sem saber o que fazer, me atrevo a
limpar suas faces com meus polegares. Ela não se afasta, seu estado de
aflição não a deixando registrar que a estou tocando. — Vem, princesa, vou
te levar para seus aposentos e depois farei o percurso do salão até aqui. O
colar estará de volta em seu pescoço amanhã de manhã. — Ela soluça, me
olhando desconsolada. — Você confia em mim para isso?
— Você levou um tiro me salvando. É claro que confio. — Rola os
olhos, tentando ser espirituosa. Mas já vi sua fragilidade.
— Bem, levar um tiro é certamente uma boa credencial. — Eu
brinco. Ela me lança outro olhar estranho e se afasta do meu toque.
Não fiz mais perguntas, nem comentários bobos, apenas a levei para
seu quarto e voltei, refazendo nosso caminho desta noite. Achei a corrente
logo depois da esquina para o nosso corredor. Sei que estou invadindo sua
privacidade mais uma vez, mas ao notar que o pingente é um camafeu, o
abri. Uma linda garota adolescente e um garoto estão sorrindo para mim.
No primeiro momento fiquei confuso, mas, depois, vim para o meu quarto e
fiz algo que nunca fiz antes: pesquisei sobre uma mulher na internet. Uma
enxurrada de matérias e títulos surgem na tela do meu celular, provando que
a princesa é acompanhada de perto pela imprensa. Então, uma manchete de
seis anos atrás me chama a atenção:

A PRINCESA ANNA JULIA DI CASTELLANI DÁ ADEUS AO SEU


AMOR ADOLESCENTE.

Nataniel Marshal, neto do presidente Marshal, faleceu nesta


madrugada no hospital onde estava internado, desde que descobriu um
câncer no intestino…
— Wallah… — Murmuro no silêncio do quarto.

PRINCESA ANNA JULIA EMOCIONA O MUNDO NO ENTERRO DE


NATANIEL MARSHAL.

A jovem princesa ficou ao lado de Nate, como era chamado pelos


parentes e amigos, até o seu último suspiro. De acordo com familiares, o
adolescente morreu em seus braços enquanto dormia…
Allah…. Meu coração aperta ao ver as imagens. Ela tão jovem, linda
aos dezessete anos, de acordo com a matéria. Mike me contou sobre isso em
algum momento. Porém, havia esquecido e lamento muito agora. Ela sofreu
a mesma dor que sofri. Soube como é perder alguém precioso ainda
menina. Dá para ver sua devastação nas fotos do enterro. Mesmo usando
um bonito vestido vermelho, seus olhos, que achei tão bonitos e expressivos
agora, na minha tela estão mortos. Não há esperança em seu olhar. A garota
em minha tela está quebrada, destruída. Eu sei porque já estive lá, nesse
mesmo lugar. Fecho a busca, me sentindo mal com o que vi. Inspeciono a
corrente, notando que o fecho está quebrado. Temos um joalheiro exclusivo
da família e o chamarei imediatamente. Amanhã terá sua corrente de volta.
Olho as fotos sorridentes uma vez mais, lamentando pelo garoto, por ela.
— Sinto muito, ‘amira. — Sussurro, sentindo-me próximo dela
como jamais pensei que poderia estar. Ela também perdeu o seu amor. —
Sinto muito. — Repito tocado com a descoberta.

Anna Julia
Ando de um lado a outro em meus aposentos. É sábado, mas acordei
cedo, aliás, quase não dormi, angustiada. Mal toquei no café da manhã,
esperando algum sinal do príncipe e da minha corrente. Ele prometeu que a
encontraria. Tento me acalmar. Me pergunto se não foi castigo porque tenho
me sentido tão atraída por outro homem. Eu não quero tirar a minha
corrente. Nunca irei tirá-la. Me perdoe, meu amor. Me perdoe. Continuo
implorando a Nate. A campainha toca e corro, atravessando o cômodo para
abrir a porta. O príncipe está lá. Minha angústia adquire outro significado
agora. Ele está trajando jeans e uma camiseta azul-marinho de mangas
compridas. Os cabelos compridos estão amarrados no estilo samurai,
deixando a metade de baixo caindo sobre os ombros largos. Engulo em
seco, lambendo meus lábios. Seus olhos de ônix cintilam ao conferir minha
calça jeans cintura baixa e minha regata de seda alguns centímetros acima
do umbigo.
— Bom dia, princesa. — Sua voz sai rouca e levanta uma caixinha
na mão. — Posso entrar?
Alegria e alívio me enchem.
— Bom dia, Alteza. Você o encontrou? — pergunto ansiosa, lhe
dando passagem.
— Eu sempre cumpro minhas promessas, ‘amira — murmura,
enquanto passa por mim, seu corpo moreno roçando no meu. Gosto que me
chame de princesa em árabe. Soa bonito e íntimo em sua voz profunda. Mas
o que estou pensando? Me repreendo e ando à sua frente para a sala de
estar. Posso sentir seu olhar sobre o meu corpo, isso me excita e incomoda,
tudo junto.
— Onde estava? — pergunto, lutando contra essa atração louca.
Puxo uma respiração e me viro. Seu olhar negro sobe pelo meu corpo,
parando na barriga de fora, me fazendo lamentar a escolha da roupa, mesmo
que a tenha escolhido porque é confortável para ficar presa aqui neste
quarto. Meus seios arrepiam quando sua atenção os encontra. Não há como
parar a quentura se espalhando em minha barriga, umidade se reunindo em
minha calcinha. Nunca senti nada parecido com isso antes e fico
aterrorizada.
— Estava perto dos aposentos de Ayla, logo ao virar a esquina —
diz, limpando a garganta e andando devagar para perto. Quero dizer-lhe
para não se aproximar, mas seu olhar me deixa fraca, a mente não
funcionando com a mesma velocidade. Urgh. É humilhante isso. — O fecho
estava quebrado e tive que acionar o joalheiro da família. Por isso demorei
a trazê-lo — explica, parando à minha frente. — Vire-se e levante os
cabelos, princesa, vou colocá-lo em você. — Franzo o cenho diante da
proposta. — Posso? — pergunta suavemente e percebo que estou sendo
ingrata. Ele foi atrás, encontrou e consertou minha corrente preciosa.
— Claro. — Assinto, me virando, levantando meus cabelos. Tenho a
impressão de ouvi-lo grunhir baixinho. O sinto atrás de mim, o calor do
corpo grande e másculo, sua respiração soprando em minha nuca. Alguns
segundos se passam, então, ele coloca o cordão pela minha frente, os dedos
roçando a minha pele, ateando fogo por onde toca. Estremeço, arquejando
baixo, minha pele arrepiando inteira. Seguro um gemido na garganta,
esperando-o concluir a tarefa, mas não parece ter qualquer pressa. Quando
enfim termina, sinto seus dedos descendo e tocando minha omoplata, minha
tatuagem.
— É bonita. — Sussurra, o hálito morno soprando em minha pele,
provocando-me sensações loucas. Seu cheiro de macho me seduz sem pena,
sem pudor. Meu Deus, por que de repente estou percebendo o sexo oposto
dessa maneira tão ultrajante? Não quero isso, não quero. — Irreverente,
sexy. — Continua traçando a minha fênix. — Como você.
— Shukran. — Minha voz quase não sai e me obrigo a me afastar,
colocando dois passos entre nós. Me viro para encará-lo, tentando não
transparecer o quanto seu toque me afeta, o quanto estar em sua presença
mexe com lugares proibidos dentro de mim.
— Eu sei pelo que passou e sinto muito. — Murmura, enfiando as
mãos nos bolsos do jeans, seus olhos cheios de empatia. Sim, empatia
porque ele também perdeu o seu amor e sabe o quanto dói. Seu olhar, suas
palavras me fazem querer chorar.
— Sinto muito por sua esposa também — murmuro. Seu maxilar
aperta e balança a cabeça suavemente. — Você viu a foto? — pergunto. Ele
torna a balançar a cabeça.
— Desculpe, foi invasivo da minha parte. — Parece constrangido.
Sorrio para quebrar o gelo e expulsar esse climão.
— Você entrou em meu quarto sem bater e me observou nadando
nua. — O provoco. — Olhar a foto é o menor dos seus pecados, honorável
Alteza.
Isso o faz soltar uma risada. Minha respiração para com o quanto
fica lindo, o rosto todo relaxado, livre da tensão que sempre vejo nele. Bem,
dada a situação em seu país, o homem tem razão em estar tenso. Franzo o
cenho, notando pela primeira vez que não tinha feito essa reflexão antes. Eu
o categorizei como o pior anfitrião da história e esqueci o conflito que
Kamar está vivendo. Outro dia, um atentado matou uma pessoa e feriu
outras tantas no centro de Jawahra. E outra coisa me bate direto na cara: eu
ainda não tive a decência de agradecê-lo por me resgatar naquela noite. Uh,
muito bem, Anna!
— Como está o ombro? — Sussurro, vendo a surpresa em seu rosto.
— Estive tão preocupada com você… — Arregalo meus olhos ao falar isso
e me apresso em corrigir: — Com o cavaleiro; eu não sabia que era você,
claro.
Um arremedo de sorriso curva sua boca, apreciando ver meu raro
embaraço.
— Está melhorando. — Responde, empurrando a gola V para o
lado, me mostrando a ferida da bala ainda um pouco avermelhada. Me vejo
encurtando a distância entre nós de novo.
— Ainda dói? — Pergunto e seu rosto franze em desconforto
quando rola o ombro.
— Um pouco. Mas a bala não fez tanto estrago, então, ficarei bem
em breve, não se preocupe.
É involuntário e, antes que me contenha, minha mão direita se
levanta para seu ombro. Um assobio baixo escapa da sua boca quando meus
dedos tocam ao redor da ferida. Os pontos foram retirados e, apesar de
avermelhada, está seca, o que é um bom sinal. Sua pele é quente, firme, e o
desejo de tocar mais me invade, imprudente, impulsivo. Levo meus olhos
para seu rosto já encontrando os olhos negros intensos sobre mim.
— Shukran. — Lambo meus lábios, minha garganta seca sob seu
olhar penetrante. — Eu sinto muito que tenha se machucado por minha
causa.
Nossos olhares permanecem presos, minha mão sobre sua pele
quente.
— Valeu a pena, princesa — murmura e quero fechar os olhos,
apreciando a nota profunda.
— Me chame de Anna — peço e retiro minha mão, minha pele
formigando, querendo mais contato. Estamos tão perto que seu perfume
másculo enche meus sentidos confusos. — É assim que os meus amigos me
chamam. — Jesus, ele é o homem mais bonito que já vi na vida, tenho
absoluta certeza. — Você salvou a minha vida. Sempre lhe serei grata.
— Chame-me de Amihaj — pede também, seus olhos nunca
deixando os meus. — É assim que meus amigos me chamam.
Coloco uma mecha de cabelo atrás da minha orelha e sorrio,
tentando agir como eu mesma.
— Eu prefiro Karim. — Ele levanta uma sobrancelha.
— Apenas minha mãe me chamava assim — informa com certa
nostalgia. — Mas se você gosta, use-o.
— Feito — murmuro e torno a me afastar, procurando uma distância
segura dele. O brilho presunçoso em seu olhar me diz que ele sabe o quanto
me afeta. — Então, o que ia me falar ontem, antes de eu notar a perda do
colar? — Mudo o assunto.
Ele limpa a garganta e seu rosto assume a seriedade do governante
de Kamar.
— Estou iniciando uma negociação com uma empresa alemã e
pensei em… — Ele para e me meneia a cabeça, como se só agora lembrasse
de algo. — Alemão está entre as línguas que domina? Diga que sim, porque
minha intérprete mais capacitada está em licença para tratamento de saúde e
o substituto não domina muito bem essa língua.
Não posso deixar de sorrir e aproveitar o momento.
— Parece que precisa de uma poliglota, honorável Alteza —
provoco.
— Karim. — Ele aponta. — Você mesma disse que usaria esse.
Rio, levantando as mãos em sinal de trégua.
— Está bem, Karim. — Testo o nome confirmando que gosto muito
mais da sonoridade do que Amihaj. Karim é mais.… Sexy. É claro que não
direi nada disso a ele. — Você está com sorte, alemão foi a terceira língua
que aprendi. — Ele solta um som aliviado. — Diga-me como ajudar.
— Teremos uma webconferência na segunda à tarde. Seria de
grande ajuda se puder participar — informa. — Será basicamente traduzir
todo o teor da conversação.
— Ótimo! Farei com prazer. — Aceito, sentindo uma alegria boba
me invadindo por ele ter pensado a respeito do meu pedido. E por
finalmente acabar com o meu tédio.
Karim me observa um instante em silêncio.
— Tem estado a maior parte do tempo aqui no quarto?
— Sim, o príncipe babaca não me deixou outra opção, sabe. — O
alfineto. — Além disso, tenho medo de sair, fazer algo inadequado e ir
parar no calabouço.
Karim sorri profundamente. Meu peito vibra apreciando seu
momento descontraído.
— É uma preocupação válida levando em conta sua língua solta,
princ… — Levanto minha sobrancelha e ele corrige: — Anna.
— Touché. — Concordo, rindo. — Mas é sábado, o que se faz por
aqui nos fins de semana?
— Hoje Nuria está recebendo as três sobrinhas na faixa etária de
Ayla e nem preciso dizer como minha filha estava animada quando a deixei
na ala leste. Então, estou sozinho. Geralmente fico com Ayla nos fins de
semana. — Me derreto com o amor com que fala da princesinha. Meu
encantamento pela pequena esperta só tem crescido nessas quase duas
semanas. — Às vezes, visito as tribos no deserto. Meu pai amava o deserto
e passou esse amor para mim. — Seu olhar fica mais nostálgico ainda
quando murmura: — Yasmina amava também.
Meu coração aperta ao ouvi-lo mencionar a esposa morta.
— O deserto é mesmo fascinante — concordo. — Pena que não
terei outra oportunidade para fotografar as tribos — lamento. Estou sem a
minha segurança, pois Lawrence foi enviado de volta a Nova York, junto
com meu professor e colegas de curso, antes do fechamento do espaço
aéreo e fronteiras terrestres. Quando Karim descobriu o meu sequestro, agiu
rápido, enviando os outros para casa.
Seu rosto franze um pouco. Em seguida, seus olhos cintilam.
— Em duas semanas, no máximo, os conflitos já terão cessado. —
Me diz em tom de confidência. — Vamos pegar os dois grupos restantes e
tudo voltará ao normal.
— Isso é ótimo! — Exclamo, torcendo para que tenha razão e eu
possa voltar para casa.
— E se ainda quiser fotografar as tribos, eu mesmo a levarei.
Minha respiração trava, euforia me tomando por completo.
— Se ainda quiser? Eu vou amar! — Minha euforia faz o brilho de
seus olhos se intensificar.
— Então, temos um acordo — diz solenemente. — Mas, por ora,
topa dar um passeio de jipe comigo? Prefiro os cavalos normalmente, mas
ainda não fui liberado para cavalgar. — Sua proposta me deixa ressabiada e
ele ri, percebendo. — Não é um encontro, Anna. Estou apenas tentando ser
o anfitrião que devia ter sido desde o começo.
Sua sinceridade e esforço me convencem. Mas não resisto a uma
provocação:
— E se eu pular em cima de você, Alteza? Seu charme de príncipe
do deserto pode ser demais para essa pobre garota ocidental…
Seus olhos escuros ficam mais intensos e ele sorri, um tipo de
sorriso que faz borboletas saltitarem em minha barriga.
— Você é sempre tão debochada? — pergunta em tom mais baixo.
Um sorriso enrola minha boca.
— Nah, apenas metade do tempo.
— E na outra? — inquire, um brilho divertido em seus olhos.
— Na outra, adoro provocar príncipes convencidos, meu senhor. —
Murmuro. Ele solta a risada profunda que abala minhas estruturas. Jesus…
— Então, você vem? — pergunta, voltando ao passeio.
— Tudo bem. Posso pegar minha máquina fotográfica? — Estou
quase saltitando, parecendo Ayla quando lhe apresentei CNCO em nossa
aula de ontem.
— Sim, também levarei a minha. — Ele diz e o encaro abismada.
— Você gosta de fotografia? — inquiro.
— Sim, desde muito novo. Minha mãe me presenteou com a
primeira máquina ainda adolescente e, desde então, não parei mais de
registrar o mundo à minha volta. — Sua voz empolgada me faz sentir
estranhamente mais próxima dele. É como se estivéssemos nos conhecendo
hoje, aqui e agora, e eu gosto do que vejo. Gosto muito. — Vou esperar lá
fora. E troque essa blusa, por Allah — adverte. —Embora sua barriga nua
seja uma visão agradável, pode chocar meus funcionários. — Sinto meu
rosto corando com sua observação e elogio.
Cubro minha cintura com meus braços e um sorriso perverso curva
sua boca.
— Até já, ‘amira — sussurra, passando bem perto de mim.

***

Vinte minutos depois, o jipe cruza os muros do palácio, entrando na


área construída para os estábulos e as moradias para os empregados dos Al-
Abdallah. Há muralhas cercando tudo, e destas não podemos passar devido
aos conflitos. Ainda assim, já estou feliz por sentir o vento soprando em
meu rosto. Tirei inúmeras fotos. Do estábulo, do povo trabalhando, dos
jardins da frente do palácio. Da estátua enorme de Karim, bem perto do
portão. Estou parecendo uma criança em loja de doces. Avisto um campo de
golfe do lado direito, o verde da grama e árvores nas redondezas mostram
um rico e elaborado trabalho de paisagismo, considerando que estamos em
cima de areia. Karim não nos leva para lá, continua descendo uma duna
baixa. O oásis se descortina na minha frente e uma exclamação eufórica sai
da minha garganta. Estacionamos e pulo para fora, não esperando seu
cavalheirismo em vir abrir a porta.
— Lindo! — murmuro ao senti-lo emparelhando comigo.
Olho de lado, notando que está com a sua câmera também. Por um
instante, fico presa nele e à expressão triste invadindo seu rosto. Ele tira
várias fotos, o jeito de pegar no equipamento mostrando que realmente sabe
o que está fazendo. Parece alheio, perdido em pensamentos quando para e
olha para a água, a margem do outro lado, onde tamareiras oferecem
sombra.
— É um lugar especial? — Pergunto apenas para confirmar, seu
rosto me diz claramente que é.
Me olha de lado, parando de registrar. Meu coração aperta ao ver a
tristeza em seu semblante. Para minha surpresa, está usando boné, o rabo de
cavalo puxado pela abertura de trás. Mudou a camiseta para uma de manga
curta, e seus braços morenos com músculos bem definidos são difíceis de
não olhar. Seu visual ocidental o deixa com ar jovial e ainda mais atraente,
para o meu sofrimento. Eu vesti uma camiseta básica, cobrindo a barriga, e
pus um boné dos Yankees.
— Sim. Eu costumava vir aqui com Yasmina. — Pronuncia o nome
da esposa com uma reverência que me lembra a mim mesma com Nate. E
mais uma vez sinto que nos aproximamos nas últimas vinte e quatro horas.
— Ela era linda — murmuro e seu olhar me sonda. — Vi fotos na
ala oeste — informo e seu rosto relaxa. — Fale-me sobre ela. — Me vejo
pedindo.
— As mulheres não me pedem para falar sobre ela. — Parece
chocado com meu pedido. Rolo os olhos para aliviar o clima e solto:
— As mulheres que querem entrar em suas calças, você quer dizer?
— Zombo. — Eu não te acho tão atraente, pensei que estivesse claro.
Vejo a mudança em seu rosto, o brilho divertido tingindo as íris
negras.
— Você não mente muito bem, ‘amira — murmura e meu corpo
aquece com seu tom e olhar.
— Cuide desse seu ego monumental, honorável Alteza. — Bufo e
ele sorri. Me congratulo por ter feito a tristeza ir embora.
— Sim, ela era linda. — Diz depois de um tempo. O encaro,
esperando-o continuar e ele respira fundo, então, me conta como a
conheceu, o noivado, o casamento e o trágico acidente.
— Quando Nate estava em suas últimas horas, na cama daquele
hospital, eu reclamando, odiando Deus por levá-lo tão cedo, ele me disse
uma coisa que, por mais que não aceite, é a verdade — sussurro. Karim me
olha, dando-me a mesma atenção. — Disse que muitas pessoas vivem cem
anos e não encontram o amor. — Algo como admiração cintila nas
profundezas escuras. — Nós o encontramos, Karim. Nós fomos felizes com
as pessoas que escolhemos; mesmo que por um curto período, nós amamos
e fomos amados.
Balança a cabeça, anuindo em silêncio.
— Ele era um bom garoto? — pergunta. Ele tem razão, é estranho,
mas nenhum cara me pergunta sobre meu namorado morto. Todos que se
aproximam de mim estão mais interessados em entrar na minha calcinha.
— Sim, ele era o melhor garoto. — Rio suavemente. Então, lhe
conto tudo também.
Ficamos nos olhando depois de abrir nossos corações um para o
outro. Um sorriso solidário é trocado e começamos a tirar as fotos. Eu miro
os pássaros bebericando na outra margem. Me desligo dele por um
momento, absorvendo tudo com a minha lente. Ouço a sua trabalhando
também. Estou focando o último pássaro voando após saciar a sede e, ao
mover a câmera para o lado, Karim entra em foco. Está distraído,
conferindo seu material, e num impulso involuntário tiro a primeira foto.
Seu porte majestoso mesmo usando jeans, camiseta e boné me faz querer
tirar mais e mais. Como se pressentisse o que estou fazendo furtivamente,
sua cabeça gira para mim. Borboletas se agitam em meu estômago, seus
olhos penetrantes olhando diretamente nos meus. Bato mais uma e na
próxima ele coloca a palma da mão na frente. Eu rio e continuo meu
trabalho de paparazzo.
Com um sorriso vingativo, ele levanta sua câmera e passa a tirar
fotos minhas também. Eu faço careta, fico vesga e coloco a língua para
fora. Karim solta uma risada e continua clicando sobre mim. Por fim, paro a
palhaçada e sorrio. Ela bate mais uma e abaixa a câmera, seus olhos escuros
ficando intensos dentro dos meus. Ele anda até mim e meu coração salta,
amedrontado.
— Vamos, princesa, ainda há coisas para lhe mostrar. — Murmura,
seu corpo roçando no meu quando passa por mim.
Eu o sigo com as pernas bambas, mesmo sem querer admitir,
gostando de estar com esse príncipe lindo e exótico.
E nós rodamos cerca de duas horas. Conheci mais duas lagoas de
água salgada, e perto das onze pegamos o caminho de volta. Eu dirigi, uma
vez que percebi sua cara de desconforto pelo ombro ainda em recuperação.
Ele me acompanha até a porta de meus aposentos e sou obrigada a
reconhecer que foi um passeio incrível, lhe digo exatamente isso:
— O passeio foi incrível. Viu? Não é tão difícil ser um bom
anfitrião. — O provoco, fazendo-o rir. — Shukran.
Retira o boné, passando a mão esquerda pelos cabelos, algumas
mechas escapando do rabo de cavalo. Jesus… Esse homem é bonito com
força! Passou várias vezes na fila da beleza, pelo visto.
— Quando tudo voltar ao normal, vou fazer você se apaixonar pelo
deserto, ‘amira. — Diz no tom profundo que faz minhas entranhas
vibrarem. Seus olhos intensos seguram os meus antes de se despedir: —
Cuide-se, Anna.
— Cuide-se, Karim — murmuro de volta e entro no quarto.
Oh, meu Jesus.… Me recosto à porta, meu coração disparado no
peito. Cada vez que ele olha para mim, sorri, fala comigo, meu corpo inteiro
reage. Não há como parar. Me sinto diferente com ele. Me sinto.… Viva.
CAPÍTULO QUATRO
Cinco dias depois…
“Eu tenho mil e uma razões para que você não vá. Se você deixar, eu vou
ancorar o coração. Que sejam meus cada um dos seus beijos. E à noite te
entregar o Universo.”
(CNCO – Quisiera)

Anna Julia
Eu giro com Ayla nos braços e a pequena sorri, jogando a cabeça
para trás. A cabeleira está solta hoje, para dar um efeito dramático no
reggaeton de CNCO. Rodo pela sala inteira enquanto os versos de Quisiera
espocam no sistema de som do seu quarto. Pedi às duas babás que
aproveitassem para fazer uma pausa, gosto de ficar à vontade com a
princesinha. Ela é muito podada, todo mundo dizendo o que pode e o que
não pode. Muito chato! Afastei os móveis e o espaço conseguido é quase
um salão de baile. Tiramos as sandálias e estamos bailando desde que
encerramos a aula de inglês. Giro pela varanda, sob o sol. A pequena
gargalha, as mãozinhas apoiadas em meus ombros.
— Cante, pequenina! — Atiço-a. Sua risadinha infantil ressoa na
varanda enchendo meu coração de leveza e alegria. Estou apaixonada por
essa menininha esperta. Ao longe, através do primeiro muro, podemos ver
os funcionários cuidando dos seus afazeres. Quando me lembro que estou
usando apenas o top e calça de malhar, volto para dentro rapidamente, nós
duas gargalhando pela nossa travessura. Não quero ser presa por atentado
ao pudor. Canto bem alto e Ayla me segue. A sapequinha vai acabar
aprendendo espanhol também de tanto que gostou dos meus meninos
preferidos.
(...) E se você for quem vai me dar tudo o que eu sempre sonhei? Quem vai
dizer ao coração que eu nunca mais vou te ter? [17](…)
Coloco a pequena no chão ao chegar no meio da sala. Começo a
dançar os passos marcados. Ela me segue. Ficamos frente a frente,
marcando os passos como lhe ensinei. Balanço meus ombros para frente e
para trás, bem espalhafatosa. Ela ri, fazendo o mesmo. Jogo meu cabelo
solto, balançando-o no ritmo da música. Ayla gargalha jogando o seu
também.
— Isso, Aylinha! — Sopro-lhe um beijo. — Linda! — Continuamos
agitando os ombros e nossos cabelos, fazendo algazarra. Estou suada,
pegajosa. Adoro dançar. Libera todas as energias negativas e ainda ajuda a
manter a forma. Embora nessa semana eu tenha malhado na academia
pessoal de Karim. Pois é, o cretino não me disse nada e quase me matou de
tédio nas primeiras semanas!
— Anninha, vou fazer xixi! — Ayla anuncia, colocando a mãozinha
na boca, encobrindo uma risada. Eu lhe disse que só pode falar dessa forma
em privado. Ela corre, atravessando o amplo espaço, sumindo pelo corredor
do seu closet e banheiro.
Rio e me jogo na dança, faço os passos mais difíceis, requebro os
quadris com movimentos sensuais que não são convenientes de se ensinar à
pequena. Giro pelo salão, mesclando passos de balé, que pratiquei por
muitos anos, com o reggaeton. Giro nas pontas dos pés e sorrio mais,
fechando os olhos, sentindo a endorfina me tomar por inteiro. Suor desce
pelo meu pescoço, escorrendo entre os seios. Estou envolvida na música,
nos passos, girando, girando, mexendo os quadris, correndo as mãos pelo
meu corpo, até que colido com um corpo duro. Mãos mornas me seguram
pela cintura nua e engasgo, abrindo os olhos, arregalando-os ao dar de cara
com uma barba bem-cuidada, que conheço bem. Continuo subindo até
encontrar os olhos escuros de Karim, flamejando, fixos em meu rosto.
Apoio as mãos em seus ombros, minha respiração entrecortada, tanto pela
atividade física quanto pela proximidade dele. CNCO continua cantando
enquanto nos fitamos.
(...) E venha, minha princesa, que o tempo não volta. E eu por você coloco
o mundo de cabeça para baixo. Rosas, chocolate eu quero te dar. Um
milhão de beijos eu tenho para te dar (...)
Seu olhar desce pelo meu colo, os seios mal contidos pelo top
pequeno. Meus mamilos ficam duros, excitação espiralando em minha
barriga. Sinto minha calcinha molhando. Seu rosto abaixa, a boca
respirando asperamente na minha, nossos lábios quase se tocando. Seus
polegares deslizam em minha pele logo abaixo do top, na base dos seios,
ateando fogo em cada célula do meu corpo. Arquejo baixinho, minhas
pálpebras querendo se fechar, minhas pernas ficando moles. Seu corpo, suas
mãos, seu cheiro me tentando a me entregar à atração esmagadora que sinto
por esse homem. Seus olhos negros estão me devorando, sem máscaras.
Temos feito isso cada vez mais, sempre que estamos perto, e foram muitos
os momentos nos últimos dias. O príncipe realmente está levando a sério a
coisa de ser um bom anfitrião. Ao mesmo tempo que acho difícil resistir a
ele, gosto muito da sua companhia e continuo aceitando os convites,
ansiando estar perto, pelo menos conversar com ele.
— Nour Al sabah. — Murmura, as narinas alargando. Ele acabou de
me chamar de “luz da manhã”? — ‘Amira, espero que não esteja ensinando
esse movimento de quadris para minha pequena.
Sua voz tem um toque de diversão, mas sua expressão não suaviza,
o desejo é nítido, queimando nas íris negras. A essa altura, nós dois
sabemos que sentimos tesão um no outro. Não dá mais para disfarçar, por
mais que tentemos e nos empenhemos muito. Quando nossos olhares se
cruzam, nos tocamos, como agora, não há palavras que possam negar isso.
— Ela foi ao banheiro. Não me viu fazer… — Minha voz sai rouca,
quase um gemido. Seus polegares tornam a fazer círculos provocadores em
minha pele, o brilho em seus olhos se tornando perverso, observando
minhas reações. — Você já pode me soltar. — Murmuro, acionando cada
grama de controle dentro de mim.
Suas mãos apertam a minha cintura, sua respiração quente batendo
em minha boca. Por um instante agonizante ele parece que vai sucumbir e
me beijar. Minha boca saliva, esperando, desejando. Emite um som
frustrado, inalando fortemente, então me solta. No primeiro momento, ainda
fico na mesma posição, minhas mãos em seus ombros, minhas pernas não
obedecendo meu cérebro para manter distância. Sua boca desliza pela
minha face suada e ele respira na minha orelha, me fazendo arrepiar e
minha calcinha alagar completamente. Deus… Meu corpo estremece
inteiro, nunca desejei sentir um homem dentro de mim como o desejo
agora.
— Você precisa ir ou vou colocar minhas mãos de volta, Anna. —
Sussurra com aspereza no meu ouvido. Eu acordo do transe e me afasto
finalmente, tomando uns bons passos de distância. Um sorriso malvado e
masculino brinca em sua boca, enfiando as mãos nos bolsos das calças e
aproveito para olhá-lo também. Está usando uma calça escura e camisa
branca com gravata. Ele se veste de acordo com a pessoa com quem irá se
reunir, já percebi. Isso é atencioso. Se é um chefe de uma das nove tribos,
ele usa as vestes típicas. Se é alguém do Ocidente, ele se veste a caráter
para deixar o visitante à vontade. Seus cabelos longos estão no coque
masculino que tanto adoro. Ele fica com uma aparência exótica de sheik do
deserto. Lindo.
— Papai! Você já chegou! — A voz animada de Ayla entrando no
recinto quebra a nossa troca carregada de tensão sexual. Desvia a atenção
para a filha que corre, pulando em seus braços. Ele a pega, mesmo sabendo
que está suada. É um pai maravilhoso. Os observo interagindo, percebendo
que sentirei falta não apenas da menininha bonita, mas de seu pai também
quando eu voltar para casa, e o momento está perto. Ontem, conseguiram
prender o grupo insurgente que estava no deserto. De acordo com Karim e
Jalal, o da capital está com os dias contados. Eles estão tendo apoio de
alguns emirados vizinhos na caçada aos revoltosos. O Catar foi o que mais
enviou reforço militar.
Karim tem me falado sobre tudo e, inclusive, parece apreciar a
minha opinião sobre o assunto. O aconselhei a ouvir cada um dos rebeldes,
separadamente, evitando aplicar a mesma sentença para todos. Pelo menos
nisso eu e o grão-vizir concordamos, de acordo com o príncipe.
— Você dançou muito, nour hayati? — Ele pergunta, beijando-a na
bochecha rosada. Acho linda a forma como a chama “luz da minha vida”.
— Sim, a Anninha dança tão bem, você precisa ver, papai. — Ayla
responde na sua euforia característica.
Os olhos penetrantes de seu pai vêm para mim. Ofego baixinho
quando descem lentamente pelo meu corpo e sobem de volta, prendendo-
me.
— Eu já vi, princesinha — murmura com um meio-sorriso. — Ela é
muito boa mesmo.
Rolo meus olhos e viro as costas, indo pegar meu caftan na
poltrona. Sinto os olhos negros às minhas costas e minha veia provocadora
leva a melhor quando me abaixo sem necessidade, fingindo estar
procurando algo no estofado, minha bunda virada para ele. Depois de uns
instantes me endireito, puxando a túnica sobre a cabeça e prendendo meus
cabelos em um nó. Minha respiração ainda está normalizando enquanto
calço minhas sandálias baixas. Pego o controle desligando o som e só então
me viro. Karim tem uma sobrancelha irônica levantada para a minha
pequena exibição. Pego minha bolsa, colocando o celular dentro e ando até
eles.
— Almoce com a gente, ‘amira. — Sua voz está rouca, alcançando
todos os recantos proibidos dentro de mim, me arrepiando.
Fico tensa, lambendo os lábios. Nas outras vezes tem sido Ayla a
exigir que me junte a eles em suas refeições, geralmente o almoço. Estar
mais tempo perto dele é brincar com fogo. Um de nós pode sair queimado.
— Eu não quero atrapalhar seu momento com Ayla. Posso comer
em meus aposentos — digo com sinceridade.
— Anninha, por favor, almoça comigo e meu papai. — Ayla faz
beicinho e, Jesus, eu juro, essa menina pode conseguir tudo de mim, isso
em menos de um mês. — Por favor — repete.
— Sua sapequinha linda. — Brinco, afagando seus cabelos e
rostinho suados. — Está bem, pequena, eu vou. Vá tomar um banho bem
gostoso que estou indo tomar o meu também. — Ela sorri; agora são dois
dentes faltando na frente. Levo minha atenção para Karim: — Nos
encontramos em trinta minutos? — Seus olhos estão ainda me fitando
intensamente.
— Leve o tempo que precisar, meu primeiro compromisso da tarde é
só às 15h30. — Seu olhar continua fixo no meu e murmura: — Estou
inclinado a me inscrever nessa aula, gostei bastante da sua metodologia,
‘amira… — Seu tom e olhar são sexys. Ele é um sádico. Sempre vem com
esses flertes aparentemente inocentes que me deixam explodindo de
excitação.
— Shukran. Talvez eu use uma banheira de espumas para relaxar os
músculos depois da dança. — Devolvo na mesma moeda. Seus olhos
estreitam, o brilho flamejante intensificando me deixa saber que está
recordando que me viu nua, nadando na piscina. Encaro a pequena: — Até
daqui a pouco, princesinha.
Dou um aceno para seu pai perigosamente gostoso e giro nos
calcanhares. Saio de lá fingindo uma leveza que estou longe de sentir
quando o príncipe está por perto.
Tomo meu banho, lavando e secando os cabelos com tranquilidade.
Visto uma calça jeans skinny e uma blusa de seda branca com mangas
compridas, sandálias Anabela. Deixo os cabelos soltos, optando por aplicar
apenas um rímel e brilho nos lábios. Meu celular toca em algum lugar e eu
saio procurando-o até encontrar sobre um dos sofás. Um sorriso repuxa
meus lábios ao ver o nome de Ella no visor. Nos falamos todos os dias, é
uma prática nossa desde pequenas.
— Ei, prima! — Exclamo, aceitando a chamada de vídeo. Logo o
rosto bonito preenche a minha tela. Ela sorri, os olhos verdes brilhantes.
— Me diga que as coisas com o príncipe já evoluíram, prima.
Preciso me distrair dessa barriga enorme aqui. — Jorra em cima de mim,
focando sua barriga realmente grande de oito meses. Minha afilhada, Ciara,
chega no próximo mês e já estou ansiosa para corromper essa menina.
— Sua barriga está linda, Ella, pare de drama. — Rolo os olhos e
resmungo: — Quanto às coisas com o príncipe, elas não vão a lugar
nenhum, sossegue.
Ela faz uma careta.
— Mas você disse que está atraída por ele, que se sente viva quando
está…
— Oh, meu Deus, eu disse tudo isso, não foi? — Zombo,
dissimulando meus sentimentos. Minha prima estreita os olhos. Ela me
conhece bem. — É uma atraçãozinha. Não sinto quase nada, na verdade…
— Quase nada? Então por que seus olhos brilham quando menciona
o príncipe? — Inquire com um ar de espertalhona.
— Meus olhos não brilham. — Faço uma careta. — Você está vendo
coisas, prima. Devem ser os hormônios da gravidez.
— Isso, principessa mia, minta para uma pobre mulher grávida. —
Suspiro, ela vai recorrer à chantagem emocional.
— Você está longe de ser uma pobre mulher grávida, Ella. Mike
beija seus pés a cada cinco minutos.
Seu rosto adquire uma expressão maliciosa antes de murmurar:
— Os pés e outras partes também…
Uh, Ella ficou tão sem-vergonha depois que começou a namorar
nosso primo e depois se casou com ele. Mike, como vocês sabem, é um
dominador no quarto e, bem, minha prima me contou algumas coisas que
fazem, como a vez que a pendurou em cordas… Me preocupa a logística de
uma transa nessas condições… Porém, de acordo com Ella, nosso primo é
muito experiente nesse tipo de jogo. Por falar em logística, meus primos
gostosões Luc e Samu retornaram há duas semanas da lua de mel. Eles se
casaram com a mesma mulher, vocês sabem, Chloe. Garota corajosa… Rio
porque Lilla, a melhor amiga de Chloe, me colocou a par da dinâmica do
sexo a três na ocasião do casamento escandaloso de meus primos e minha
nova prima. Enfim, como diria meu pai, os Di Castellani não são de
brincadeira.
— Como está a minha afilhada? — Mudo o assunto. — No próximo
mês, estarei aí para assistir ao parto. — Seu rosto franze.
— Uh, de jeito nenhum, prima. Não quero você se intrometendo no
trabalho dos médicos. — Diz e faço uma cara injustiçada.
— Calúnia isso, prima. Sou a madrinha, tenho todo direito —
argumento.
Ella sorri suavemente.
— Estou com saudades já, Anna. Está tudo bem mesmo por aí? —
pergunta com um toque de preocupação.
— Está sim, carissima. Além disso, Karim prometeu me levar para
fotografar as tribos logo que tudo normalizar.
Seu rosto se ilumina com malícia.
— Humm, Karim, hein? — Diz com um sorriso vitorioso curvando
sua boca. — Minha intuição diz que você será feliz de novo, Anna. O
príncipe é um bom homem, dê uma chance, prima. — Não posso negar que
suas palavras fazem meu coração vibrar. Eu quero isso? Avançar, dar uma
chance a outro homem? — Ah! Aí está o brilho em seus olhos!
Faço uma carranca para a trapaceira.
— Você está trapaceando, como faz no cassino. — Reclamo e ela ri,
as mãos acariciando seu ventre protuberante. — Onde está Mike, que não
está aí beijando seus pés? — Alfineto.
— Ei, eu ouvi isso! — A voz de Mike vem de algum lugar no quarto
fora do meu campo de visão.
— Ella! Você comentou com Mike que estou atraída por Karim? —
Faço nova carranca. Seus olhos astutos brilham de satisfação.
— Ah, então temos uma admissão, prima? — Inquire e rolo os
olhos.
— Nem sob tortura, principessa. — Resmungo e ouço a risada
divertida dos dois intrometidos através do aparelho.
Conversamos por mais alguns minutos ainda, e quando nos
despedimos um sorriso suave se abre no rosto de minha prima.
— Ti amo, carissima. Cuide-se. — Meu coração fica mole com seu
carinho e amor por mim.
— Ti amo, principessa mia — murmuro. — Cuide de você e da
minha afilhada também.
Um sorriso afetuoso permanece em meu rosto todo o caminho para
os aposentos de Karim. Quando tem tempo para almoçar com Ayla, ele não
gosta da formalidade dos salões espalhados pelo palácio. Em seus aposentos
tem uma cozinha e mesa de refeições com quatro lugares. Ele me recebe à
porta, seu olhar quente percorrendo-me dos pés à cabeça. Me conduz para
dentro, uma mão apoiada na parte baixa das minhas costas, causando a
familiar ebulição em meu corpo. Ayla faz festa ao me ver. Está linda, num
conjuntinho de saia e blusa colorido. Percebo que a pequena tem um
guarda-roupa ocidental também. Seu pai é muito cuidadoso e atencioso com
ela e suas necessidades, falta apenas abrir os olhos para o papel que a
mulher conquistou na sociedade moderna, mesmo nas islâmicas. Precisa
garantir que sua filha, ainda que não herde o trono, não seja um mero
adorno para algum idiota que tente desposá-la no futuro. A princesinha me
pegou de jeito. Já estou pensando em defendê-la de um casamento
arranjado.
Quando seu pai começa a falar da nossa ida ao deserto e a minha
volta para casa, Ayla para de comer imediatamente.
— Papai, não quero que a Anninha vá embora. — A pequena solta a
colher no meio da sua sobremesa (creme de chocolate branco com frutas
vermelhas). Seus olhinhos suplicantes vêm para mim. — Você não vai, não
é, Anna?
Engulo em seco, meu coração apertando. Ah, Deus, vai doer me
despedir. Karim está com uma expressão reservada, me sondando.
— Ayla, nós já conversamos sobre isso, filha. — Ele vem em meu
socorro e agradeço porque não tenho condições de quebrar o coraçãozinho
dela neste momento. — Anna tem uma casa, família no Ocidente.
— Então vamos para o Ocidente também! — Oferece no alto da sua
inocência. Sorrio, meus olhos ardendo, testemunhando o carinho da
pequena por mim.
— Prometa que a levará para me ver. — Peço, tentando me
controlar. Karim traz o olhar escuro para o meu. Eu expiro lentamente. —
Sinto muito, eu não tenho nenhum direito de pedir isso. — Caio em mim,
percebendo o quanto meu pedido é descabido.
— Eu a levarei. — Me surpreende ao afirmar em tom mais baixo, o
olhar nunca deixando o meu. — Você é bem-vinda para nos visitar também,
‘amira.
Meu coração dá uma cambalhota no peito. O que isso significa? Ele
quer manter contato comigo? Por quê? Isso entre nós não vai a lugar
nenhum. Não pode ir. Levanto minha mão pegando minha corrente,
segurando o camafeu. Karim acompanha meu gesto e, em vez de aparentar
irritação como muitos dos caras que tentaram me namorar ao longo de seis
anos, seu olhar fica mais suave. Me compreende, e isso só me faz gostar
mais e mais dele.
Depois do almoço, Ayla e eu ainda ficamos por algum tempo com
seu pai. Pouco depois das duas da tarde, levei a pequena para a biblioteca,
onde teria aula de artes. De volta ao meu quarto, aproveitei para traduzir o
relatório enviado pela empresa alemã que está negociando gás natural com
Karim. No fim da tarde, estou me preparando para ir ao estábulo quando
meu celular apita, indicando uma mensagem. Farei um passeio pelas
redondezas, agora mais aliviada que o perigo no deserto passou. Termino de
ajeitar o boné sobre o meu rabo de cavalo e pego o aparelho sobre a cama,
desbloqueando a tela. Quando abro o aplicativo de mensagem, minha
respiração acelera ao ver o conteúdo.

Karim: Me acompanha numa partida de golfe?

Não está assinada, o número não está em meus contatos, mas sei de
quem é. Meu coração também sabe porque está disparando, batendo contra
a caixa torácica. Eu devia dizer não e acabar com esse sentimento que está
crescendo dentro de mim antes que seja tarde. Demoro a responder, duas
vontades guerreando em meu íntimo. Fecho os olhos, sua imagem nítida em
minha mente. Moreno, sexy, me convidando para passar um tempo com ele.
Meus dedos tremem, suam segurando o aparelho e, antes que responda,
outra chega:

Karim: Me encontre no estábulo, ‘amira.

Torno a fechar os olhos. Ele sabe que estou em conflito aqui. Oh,
Deus, eu quero, quero muito estar com ele. Resisto por alguns minutos,
então me levanto, decidida a ir. Todavia, não o respondo; se a razão voltar,
eu debando e me tranco aqui no quarto. Um pensamento bem covarde.
Urgh. Troco as botas de montaria por um tênis, uma vez que nosso destino é
a grama do campo de golfe. Um dos funcionários me leva de mini buggy até
o estábulo, fora do portão principal. Entro no local silencioso, exceto pelos
animais bufando. Sigo para a baia de Hércules, o preferido de Karim, e meu
coração volta a enlouquecer no peito quando paro na porta. Ele está
conversando em sua língua com o garanhão árabe. Fico em silêncio,
apreciando o porte majestoso de ambos. Karim está vestindo jeans, camisa
polo preta, boné sobre os cabelos soltos, caindo sobre os ombros largos.
Vejo o momento em que sente a minha chegada, ele para a conversa e olha
por cima do ombro. Seu olhar tem uma mistura de apreciação e alívio
quando me cataloga dos pés à cabeça na minha calça jeans justa e baby look
branca, gola polo.
— Olá — digo, sentindo-me como uma adolescente sem saber como
agir perto de um homem desse calibre.
— Você veio — murmura. De repente, parece que há um significado
implícito nessa simples frase. Faz sinal com a mão. — Vem, me deixe
apresentá-la à rainha daqui. — Brinca e me ordeno a manter o controle.
Ando devagar, incerta até ele, que apoia a mão em minhas costas.
Estremeço. Como um toque despretensioso pode inflamar tanto?
Me apresenta uma magnífica égua branca, seu nome é Queen, por
isso a brincadeira. Falo com ela, acariciando sua crina. Posso sentir o olhar
de seu dono sobre mim, estou nervosa, excitada. Ela é linda. Acaricio seu
focinho e ela me cheira, abaixando a cabeça, querendo mais do meu toque.
Me pergunto se pertencia à sua esposa falecida.
— Ela gosta de você. — A voz de Karim é rouca. — Chegou no
mês passado, junto com mais dois. Vieram do Reino Unido — esclarece,
me fazendo sentir aliviada e me odeio por isso. Não posso ter ciúmes de
uma mulher que não está mais aqui, seria muito egoísta e descabido da
minha parte. Expulso rapidamente o sentimento. — Monte-a, ‘amira —
sussurra; sua voz e seu corpo próximos demais para a minha sanidade.
— Karim, seu ombro. — Lambo os lábios, minha garganta seca. —
Já está liberado para montar? — Seus olhos cintilam, apreciando a minha
preocupação.
— Está tudo bem, Anna — murmura, sua voz uma nota mais
profunda. — O médico me liberou para montar. — Volto a engolir em seco.
Parece haver um duplo sentido na última frase e isso me deixa agitada. —
Vamos, quero aproveitar o resto da tarde.
Montamos nossos cavalos e em minutos ganhamos o deserto.
Suspiro, uma sensação gostosa se espalhando dentro de mim enquanto
cavalgamos lado a lado. Hércules vira para a direita e o sigo, o campo de
golfe surgindo num espetáculo cercado de areia por todos os lados. Há
palmeiras, pequenas e grandes árvores e um lago artificial dividindo
sinuosamente a área extensa. Passamos por uma espécie de guarita, onde
um funcionário reverencia seu príncipe e abre o portão de acesso com
presteza. Sigo atrás de Karim até que ele para numa área calçada de blocos,
árvores frondosas ladeando. Ele desmonta e faço o mesmo. Dois
funcionários surgem pegando as rédeas dos cavalos. Karim coloca a mão
em minhas costas e me guia para um dos caminhos ladeado de grama bem
baixa. Paramos numa elevação do terreno e é algo bonito de se ver. Mesmo
sendo uma construção artificial, é cuidadosamente planejada para
impressionar.
— Eu não sei jogar golfe, acho que é um bom momento para dizer.
— Digo, mordendo meu lábio. Ele me olha de soslaio e sorri. Meu
estômago se agita. Deus, parece que a cada dia que passamos juntos o
homem fica mais bonito. Isso vai ser difícil.
— Eu sou um bom professor. — Diz de forma enigmática,
estendendo a mão para mim e murmura: — Vem, ‘amira.
Fico encarando sua mão por alguns instantes tensos. Subo meus
olhos para os seus, não conseguindo resistir à intensidade com que me fita,
seu rosto moreno, perfeito, estendo minha mão sabendo que estou indo com
ele em mais de um sentido. Estou trilhando um caminho que talvez não
tenha volta. Sua mão engole a minha e meu corpo inteiro arrepia. Ele sente
isso e dá um aperto suave, talvez para me tranquilizar. Então, descemos
pelo estreito caminho, nossas mãos unidas e meu coração galopando
freneticamente. Outros dois funcionários estão nos esperando na borda do
gramado mais à frente com o buggy equipado com tacos e bolas. Karim
agradece aos homens e me ajuda a entrar no pequeno veículo. Cruzamos a
ponte por cima do lago, tomando distância de onde estão os funcionários. A
brisa do fim de tarde está agradável. O deserto esfria à noite. O carro para
próximo do primeiro buraco. Sou péssima nesse esporte. Dam, que é um
exímio praticante, já tentou me ensinar. Mike também, mas não levo jeito.
Pego o saco de bolas enquanto Karim segura a alça do saco de tacos,
colocando-o no ombro esquerdo. Sua mão direita estende em minha direção
outra vez e eu a seguro me sentindo… Feliz. Posso admitir isso, estar com
ele me faz feliz. Chegamos ao primeiro buraco e o observo organizar tudo,
pegar os tacos, inspecionando-os, e faz o mesmo com as bolas. Coloca uma
bola pronta para a minha iniciação. Pega um taco menor.
— Sinta-o. Um taco é como um sapato, precisa se ajustar
perfeitamente. — Estende-o para mim. O pego, testando, sentindo o peso.
Parece bom para o tamanho da minha mão. Assinto. — Não queremos essas
lindas mãos e pulsos com calos ou torções. — Murmura e pega meu
cotovelo, me levando até a bola. Prendo a respiração quando o sinto atrás de
mim, as mãos pousando em minha cintura. — Relaxe o corpo, Anna. —
Como se fosse possível. Bufo mentalmente. Aperta minha cintura
suavemente me fazendo ofegar. Minhas costas apoiam contra a sua frente.
Estamos perto, tentadoramente perto. — Abra as pernas e flexione
levemente os joelhos. — Sua voz soa bem no meu ouvido. Eu convulsiono,
estremecendo. Umidade se reúne em minha calcinha, meus seios arrepiam,
implorando para serem tocados. Sinto-o me cheirando, e isso termina de
descontrolar meu corpo. — Levante o taco, assim, Anna. — Diz
enrouquecido, suas mãos deixam minha cintura e seguram as minhas, me
ajudando com o movimento. — Pronta?
— Sim. — Minha voz é quase um choramingo. Estou pronta pra
caramba! Torno a senti-lo me cheirando, a ponta do nariz arrastando
perversamente em meu pescoço. Sinto-me toda molhada, respirando
ofegante.
— Sim, ‘amira, você está. — Sussurra e parece uma eternidade o
tempo que ficamos na mesma posição, colados, nossas respirações erráticas.
Ele murmura algumas palavras em árabe, mas não consigo compreender, é
muito baixo. — Vamos lá, princesa! — Exclama, rompendo o momento
carregado de sensualidade, e movimenta o taco, me forçando a realizar um
giro de quadril e é nesse momento que o sinto duro, roçando em minha
bunda. Arfo, o taco acertando a bola, e em seguida lamento ao sentir seu
corpo deixar o meu. — Vem, vamos perseguir sua bola, Tiger Woods. —
Tenta descontrair, mas isso ainda sai tenso e rouco.
Me estende a mão e a pego sem hesitação, descendo o declive.
Perseguimos bolas por não sei quanto tempo. Ele me ajudou nas tacadas
muito mais do que era realmente necessário, todavia, não reclamei porque
estava, estou sedenta pelo seu toque. No jogo, porém, ficou constatado que
não sou digna nem mesmo de carregar os tacos do Tiger Woods — meu
desempenho foi sofrível. Humilhante. Karim se divertiu horrores me vendo
errar os buracos que, segundo ele, eram jogo ganho. No fim, ele acabou
dizendo que seu fisioterapeuta recomendou o golfe como exercício para a
recuperação do ombro. Pude ver um pouco da sua habilidade antes de
encerrarmos nosso passeio. Já havia escurecido, a lua e as luzes do palácio
nos guiando na nossa cavalgada de volta. Me lembrei da noite em que ele
entrou em minha vida, me salvando, se colocando na linha frente, se
ferindo. E me fazendo sentir coisas que estavam adormecidas há muito
tempo.
Andamos em silêncio pelo corredor de nossos aposentos. Meu
coração já apertado por ter que deixá-lo. Foi diferente hoje, mais… íntimo.
Paro à frente da minha porta. Essa cena tem se repetido muito nos últimos
dias. Ele para também, muito perto, os olhos de ônix penetrantes nos meus.
Sua mão levanta e minha respiração altera quando toca meu rosto,
deslizando os dedos numa carícia suave pela face direita. Seu olhar vai
ficando mais inflamado, faminto, contrastando com o toque suave.
— Anna… — murmura asperamente, o olhar caindo para a minha
boca. Cada pequena parte minha pulsa, desejando-o além do que consigo
entender.
— Karim… — sussurro, me afogando em seu olhar. — Eu… Eu…
— Eu sei, ‘amira… — Assente, praguejando em sua língua. — Eu
gosto de estar com você. — Confessa e meu coração canta.
— Eu também gosto de estar com você — murmuro de volta.
Posso ver o seu conflito interno, o mesmo que está em mim. Sua
mão aproxima da minha boca e minha calcinha alaga completamente ao
sentir seus dedos tocando meus lábios. Seu olhar me devora.
— Tão bonita — sussurra.
— Você disse que já tinha visto melhores. — O lembro e ele meio
que sorri, meneando a cabeça, seus olhos segurando os meus.
— Eu menti — murmura, inflamando-me inteira. Ficamos nos
olhando nessa queda de braço em que nenhum quer ceder, mas também não
quer abrir mão.
— Eu também. — Admito e seus olhos cintilam, um sorriso lindo
curvando sua boca. Ele a aproxima da minha.
— Boa noite, Anna — murmura, os olhos intensos fixos nos meus,
seu hálito vindo para dentro dos meus lábios entreabertos. Eu o bebo,
sedenta. Torna a passar o polegar em meu lábio inferior. — Durma bem,
‘amira. — E então se vira, andando rapidamente para o seu quarto. Fico
olhando-o até vê-lo entrar e abro a minha porta, passando para dentro.
Atravesso o living e paro na entrada do amplo aposento. Meu coração e
corpo estão quentes.
— Boa noite, amiri — sussurro, minha mão indo imediatamente
para o meu colar.
Meu peito aperta, dói, lágrimas turvando meus olhos. Estou
chorando por querer manter a promessa a Nate. Estou chorando porque
quero o homem que acabou de sair daqui. Não dá mais para mentir para
mim mesma.
— Me perdoe, por favor. Não consigo parar de querê-lo. Não
consigo.

Dois dias depois…


Karim Amihaj
Eu giro a caneta por entre os dedos, meu olhar preso em algum
ponto no deserto além da sacada do meu escritório. Ela está em minha
mente e em cada parte do meu corpo. Estou dolorido, pulsando, precisando
me aliviar, mas nenhuma servirá. Meu corpo clama por ela, o que é
inadequado de muitas formas. Preciso refrear esse sentimento, pois não nos
levará a nada. Somos de extremos opostos em todos os sentidos. Wallah,
mas como queria poder tê-la, senti-la, ao menos uma vez. Ontem, quase
cedi e provei sua boca, conseguindo me conter a tempo. Se beijá-la, vou
querer ir mais fundo, por isso é melhor não avançar. Mesmo que seja uma
tortura vê-la, estar perto, tocá-la e não poder fazer nada a respeito, não irei
abrir mão da sua companhia. Olhar para ela é como ver o sol despontando
de manhã depois de uma longa noite escura. Lhe darei boas recordações do
deserto, vou garantir que se lembre de mim quando tiver que ir embora. Se
tudo correr bem, dentro de alguns dias a levarei para fotografar as tribos.
— Amiri? Está me ouvindo?
A voz de meu tio me tira dos pensamentos sobre a garota que tem
mexido com meu corpo e mente. Limpo a garganta, minha atenção voltando
para meu grão-vizir, que tem a boca apertada, nada satisfeito pela minha
evasão.
— Desculpe, tio. Pode repetir? — Digo em tom firme, me ajeitando
na cadeira, expulsando os pensamentos errantes. Ele me sonda astutamente.
— Mande a princesa embora tão logo que o aeroporto reabra, meu
senhor. — Diz descontente. — Ela é distração desnecessária. Tenho
percebido como está lhe dando uma atenção que em nada tem a ver com
hospitalidade.
Cerro a mandíbula, desconfortável pela sua observação e, mais uma
vez, implicância com Anna.
— Ela não é uma distração, tio. É minha hóspede, respeite-a. —
Meu desagrado é claro e ele abaixa a cabeça respeitando, ainda que não
goste. Suspiro agudamente e completo para a alegria dele: — Com as
fronteiras terrestres sendo abertas, podemos marcar uma data para o baile.
Escolherei minha esposa e subirei ao trono dentro de dois meses.
Vejo a mudança positiva em seu rosto.
— Farei os arranjos, amiri. — Ele quase sorri de tanta satisfação.
Pena que não estou com a mesma empolgação para escolher uma mulher
puramente por conveniência. Serei profundamente infeliz nesse casamento,
tenho certeza. No entanto, é meu dever me casar e produzir um herdeiro
homem para seguir com a minha linhagem. — Eu dizia que o sheik El-
Baham está enviando sua primogênita Latyfa para apreciação de meu
senhor. Ela chega hoje à tarde, um pouco adiantada para o baile, mas, como
faz parte da família da princesa Yasmina, que Allah a guarde, creio que não
será nenhum inconveniente. — Seu tom é respeitoso ao mencionar minha
esposa morta.
Franzo o cenho. O sheik El-Baham é um dos nove líderes tribais de
Kamar e é também irmão do pai de Yasmina. Meu sogro sofreu um ataque
cardíaco fulminante no ano passado e seu irmão mais novo assumiu o papel
de líder do clã. Latyfa é muito bonita e andou me cercando quando
regressei dos estudos em Londres. Queria se casar comigo, porém, não
mostrou rancor quando escolhi sua prima. Talvez cheguemos a um
entendimento agora. Além disso, não posso esquecer a ajuda de seu pai para
desvendar o atentado que tirou a vida da minha esposa. Sim, minha
Yasmina foi assassinada. A caixa-preta revelou que o avião tinha sido
sabotado. O líder de uma das tribos que estavam insatisfeitas comigo e
exigindo meu tio no trono planejou a morte dela friamente. A reunião
marcada em cima da hora tinha seu propósito: me fazer ficar e mandar
minha esposa me representando. Sabiam que faria isso porque estava
introduzindo Yasmina na vida política. Eles não aprovavam e ainda não
aprovam uma mulher tendo voz ativa em nenhum aspecto da vida pública.
Estamos muito atrasados nesse quesito. Temos uma dívida imensa
com nossas mulheres, coisa que pretendo reparar tão logo suba ao trono.
Resumindo, o sheik El-Baham tem crédito comigo e há uma boa chance de
eu escolher sua filha. É tia de Ayla, sangue é sangue, ela pode vir a ser uma
boa madrasta para minha filha. Outra imagem invade a minha mente
atropelando esse pensamento, Ayla encarando Anna com os olhinhos
apaixonados e vice-versa. A princesa também se apaixonou pela minha
filha, é nítida sua afeição. A porta se abre e Jalal passa para dentro, seu
sorriso está mordendo as orelhas e me agito, levantando da minha cadeira.
Isso só pode significar uma coisa.
— O último bando foi encurralado numa vila nos arredores de
Jawahra! — Exclama, agitando um pulso no ar.
— Allah akbar![18] — Sorrio. Pelo menos uma boa notícia. Encontro
meu primo no meio da sala. Ele não faz cerimônias, me dando um abraço
empolgado. Torno a sorrir. Nem parece que é filho de seu pai. Ironizo.
— Conte-me tudo, primo — intimo.
Me dirijo para o bar, nos servindo de um bom uísque. Meu tio aceita
um copo, ele está feliz também, pelo seu semblante observando seu
primogênito contar como nosso exército conseguiu prender os últimos
desordeiros. Ficamos em pé ao redor da bancada, bebericando nossas
bebidas. Em meio ao alívio de saber que meu povo está seguro outra vez,
vem o sentimento amargo de saber que Anna está livre para partir. Não
quero que ela vá. Wallah, por que estou sentindo todas essas coisas por uma
mulher que não pode ser minha? Meu coração aperta, antecipando o
inevitável. Ela não pertence ao deserto. Pertence às grandes metrópoles
ocidentais; a imprensa a seguindo e idolatrando. Ela parece gostar disso, da
atenção da mídia. Então, franzo o cenho, notando que algo não bate. A
Anna que tenho conhecido nesses dias em que me permiti aproximar dela
em nada se parece com a princesa festeira e namoradeira retratada nos
tabloides.
Ainda carrega nitidamente a dor da perda do seu namoradinho da
adolescência. É doce, delicada, atenciosa, mesmo que isso tudo fique
mascarado pela sua irreverência. Acho que usa a ousadia como uma espécie
de escudo protetor.
— Parabéns, filho! — Meu tio me tira do transe, me surpreendendo.
O que ele acaba de dizer? Jalal está estupefato também. Seu pai não é uma
pessoa muito fácil. — Excelente trabalho. — Estende a mão pousando-a no
ombro de meu primo. — Quando chegar o momento, será um grande grão-
vizir para seu primo.
— Shukran, ‘abi[19]. — Jalal diz meio engasgado e limpa a garganta,
se inclinando respeitosamente para seu pai.
— A casa Al-Abdallah não cairá enquanto estiver unida. — Meu tio
diz e desvia o olhar para mim, sua mão livre vindo para o meu ombro.
Agora sou eu quem fica engasgado. O que há com ele? — Você é forte e
destemido como seu pai, que Allah o tenha. — Murmura, um vislumbre de
emoção passando em seu rosto. — Kamar terá um rei em dois meses e isso
afastará as revoltas.
— Shukran, tio. — Murmuro e suspiro. — Reconheço que protelei
demais minha subida ao trono.
— Tudo ao seu tempo, Amihaj. — Diz em tom de tio e não de grão-
vizir. — Você está pronto agora. Mais maduro, consciente do seu papel
perante seu povo.
Torno a agradecê-lo. Ele termina de me colocar a par da chegada de
Latyfa. É um tanto antecipada, para dizer a verdade, mas isso pode ser bom
para observá-la e tomar uma decisão segura. Quando meu tio se vai, Jalal
me encara, franzindo as sobrancelhas.
— Você não parece muito empolgado para a chegada de uma
candidata a esposa, primo. — Aponta.
Bufo, fazendo uma careta.
— Você é muito observador, primo. — Digo com sarcasmo. O idiota
sorri.
— Você está confundindo ser um bom anfitrião, Amihaj. — Me olha
preocupado. — Anna não está entre as candidatas. Precisa se distanciar um
pouco. Com as coisas voltando ao normal, ela irá embora…
— Vou levá-la ao deserto primeiro. — Me apresso em dizer e ele
sacode a cabeça, ainda preocupado. — Sei o que estou fazendo, Jalal. Nos
damos bem, eu e a princesa, mas ambos sabemos que em breve voltaremos
para nossas realidades.
Eu não sei o que estou fazendo, essa é a verdade. Tudo que sei é que
a quero por perto. Ela é a primeira mulher que deixo chegar perto. Não
estou pronto para deixar isso ir ainda.
Meu primo deve ver o conflito em meu rosto, porque adverte:
— Tome cuidado, primo. Não procure complicações logo agora que
todos esperam sua subida ao trono junto com um casamento de Estado.
Ele está certo. Sua advertência permanece em minha cabeça por
horas. O dia seguiu intenso, fomos ao palácio do governo na capital. Depois
de dias, pude acalmar meu povo com um pronunciamento em rede nacional
anunciando o fim dos movimentos insurgentes. Amanhã o expediente
retomará sua rotina e atenderei durante meio período na capital, como é
costume.
Quando retornamos para casa no fim da tarde, passo no escritório e
minha secretária avisa que Anna está lá dentro, imprimindo a tradução dos
relatórios que os alemães enviaram ontem. Meu coração e corpo se agitam
com a notícia. Com os acontecimentos do dia, não tive tempo para vê-la
hoje. Abro a porta e entro, meus olhos ansiosos para pousar sobre ela e,
quando finalmente a localizo, tudo em mim se agita. Meu coração
tamborilando como um adolescente diante da menina que o está
encantando. Está em pé, usando a impressora no canto onde fica a minha
mesa. Ando devagar, apreciando seu porte esguio e elegante. Usa um
macacão amarelo com um cinto dourado marcando a pequena cintura.
Sapatos de salto alto. Os cabelos presos num rabo de cavalo alto, deixando
a nuca e boa parte da coluna graciosa à mostra. Meu olhar sedento pousa na
tatuagem, parte da fênix aparecendo. Alcanço minha mesa e me recosto na
borda, fico observando-a em silêncio. Então, vejo a forma como para o
serviço, notando a minha presença. Me olha por cima do ombro, um sorriso
provocativo curvando a boca linda pintada num batom alaranjado.
— Oh, honorável Alteza.… É bom saber que ainda está vivo… —
murmura com sua voz rouca e debochada que deixa meu pau duro como
rocha.
Eu rio, meu peito sendo preenchido pelo sentimento mais louco e
quente enquanto nos olhamos fixamente.
— Dia intenso. Sentiu a minha falta, princesa? — murmuro,
provocando-a, flertando. Ela se vira e encosta o quadril na mesa da
impressora enquanto o equipamento trabalha. Seus olhos verdes me
catalogam, cintilando com interesse indisfarçável. Estou em traje para
cerimônias públicas. Caftan, cafia[20] e igal[21] sobre a cabeça.
— Nós realmente precisamos trabalhar esse seu ego, meu senhor —
caçoa. Torno a sorrir. A tensão e cansaço escoando rapidamente do meu
corpo e em seu lugar se instalando o desejo descomunal que estou sentindo
por ela.
— Você é boa em me colocar em meu lugar — murmuro. É a sua
vez de gargalhar e meu fôlego se vai, deslumbrado com o brilho em seu
rosto lindo. — Acho até que deviria te contratar em tempo integral.
Seu sorriso vai sumindo e ficamos nos olhando, cobiçando
abertamente. Não há como dissimular o que estamos sentindo. É forte
demais.
— Não sou assim tão fácil, Alteza. — Seu sorriso e tom
provocativos voltam. Eu rio como um bobo, olhando-a. — Eu vi seu
pronunciamento, Karim — sussurra em tom mais sério e meu corpo inteiro
vibra ao ouvir o meu nome saindo de sua boca. É estranho ter alguém me
chamando assim depois da minha mãe, mas a forma como a princesa o
pronuncia em nada lembra o tom maternal. — Fico feliz que seu povo
esteja seguro agora.
— Shukran, ‘amira. — Minha voz está muito rouca, minha garganta
seca, estou sedento por ela. — Jante comigo esta noite. — Peço, não me
contendo mais e ela ofega baixinho, os olhos brilhando como duas joias. Eu
a quero. A quero muito, não dá mais para guardar isso dentro de mim. —
Em Jawahra. Me deixe apresentar a minha terra para você.
— Eu adorar…
— Amiri, espero não estar interrompendo.
A voz um tanto tensa de meu tio me faz olhar rápido para a entrada
e congelo. Ele está ao lado de uma morena muito bonita, vestida com os
trajes de sua tribo. Latyfa. Minha realidade me dá um forte tapa na cara. Me
afasto da mesa e fico ereto, meu coração angustiado sabendo que tudo virá
à tona no pior momento possível. Meu tio traz a mulher até o meio da sala.
Ela se curva em respeito.
— Meu senhor, não posso dizer o quanto estou contente em ter a
oportunidade de ser a sua escolhida. Se me escolher, prometo ser a melhor e
mais compreensiva esposa, com a graça de Allah — diz em nossa língua,
seu tom reverente.
Meu olhar vai imediatamente para Anna, que está pálida,
observando Latyfa. Então, seus olhos vêm para os meus e é com horror que
descubro: ela entende a nossa língua. Sua expressão chocada me diz
claramente isso. Quero lhe dizer que não é verdade. Porém, não posso. Ela
compreende isso também, a verdade. Então, se vira, pega os papéis da
impressora, organiza-os meticulosamente, o silêncio como uma espada
sobre a minha cabeça. Vem para mim e os entrega. A luz se apagou de seu
olhar, percebo com tristeza. Ela murmura em árabe:
— Aqui está a conclusão do meu trabalho com os alemães.
Obrigada por sua hospitalidade, Alteza.
Gira nos calcanhares e passa pelos visitantes sem ao menos os olhar.
— Anna… — Chamo-a, meu coração doendo pela decepção que vi
em seus olhos. Passo as mãos pelo rosto, sentindo que tudo está errado. Eu
quero aquela garota que saiu. Apenas ela. Que Allah se compadeça de mim.
Fecho meus olhos, pedindo perdão à Yasmina também porque estou
entregando meu coração a outra. — Anna, ‘amira. — Torno a repetir, me
movendo para ir atrás dela.
— Não, amiri. Deixe-a ir. — Meu tio segura meu braço quando
emparelho com ele. Me encara e lança um olhar significativo para Latyfa.
— Seu compromisso é com o seu povo, não se esqueça disso, meu senhor.
CAPÍTULO CINCO
Karim Amihaj
Confiro meu celular pela milésima vez. Lhe enviei mil mensagens e
ela não retornou uma sequer! Olho a mulher à minha frente, vendo sua boca
se movendo, mas não ouvindo nada do que diz. Latyfa é muito bonita, não
sou cego. Todavia, há um problema grave: ela não é Anna, e isso anula
todos os seus atrativos. Tio Jafar insistiu para que a mulher me
acompanhasse a Jawahra, com a justificativa de que preciso usar sua estada
para nos familiarizarmos. Fui aos aposentos de Anna, toquei a campainha
até cansar os malditos dedos e não me atendeu. Tive que sair logo cedo para
o expediente no palácio do governo e vim preocupado, angustiado por não
ter tido oportunidade de conversar com ela. Ontem se trancou no quarto
depois da chegada de Latyfa e não me atendeu também. Não a culpo. Foi
estúpido da minha parte flertar com ela, alimentar o que estávamos sentindo
quando o tempo todo sabia que não havia futuro para nós.
Pouco dormi. Fiquei rolando na cama, tentando descobrir uma
forma de me tornar rei sem ter de perder o que encontrei com Anna. É
muito mais que tesão, atração carnal. É uma cumplicidade que só
experimentei com Yasmina. Eu a quero de todas as formas, saber que não
posso tê-la me deixa com vontade de gritar e chutar coisas.
— Amiri, está tudo bem? Por favor, não quero entediá-lo — Latyfa
diz, seu rosto vermelho mostrando uma timidez que, sim, me entedia.
Eu quero o desafio, a ousadia que vejo nos olhos verdes de Anna
quando me olha diretamente, não se abaixando, se curvando
excessivamente porque sou o príncipe. Antes que dispense a mulher
insípida, meu celular toca. Suspiro, agradecendo a Allah por me salvar da
conversa tediosa.
— Amihaj, achei que gostaria de saber disso. — A voz de Jalal está
frenética e fico alerta, me levantando da cadeira. — Anna está nesse
momento a bordo de um voo da Falcon Emirates para Nova York.
Eu paro, meu coração disparando com força. Ela está indo embora?
Wallah, não posso deixar que vá assim, sem falar comigo. Passo uma mão
pelo rosto; medo, agonia tomando conta de mim. A subestimei. Imaginei
que pediria um jato de sua família, eu seria informado tão logo que a
aeronave pousasse em solo kamariano. Tudo estaria sob o meu controle,
exceto que Anna não é previsível, nem uma princesa convencional, ela
chegou aqui em um voo comercial, não em jato particular — por que não
me lembrei desse detalhe?
— Detenha a porra do voo, primo! — Ordeno, cerrando meu punho,
tomando uma decisão arbitrária, mas a única que irá pará-la. Não vou
liberá-la para partir. Estará sob a minha tutela até se acalmar e
conversarmos adequadamente. Me viro para a mulher que não parece muito
feliz agora. — Peça ao meu tio para providenciar um transporte de volta ao
palácio, Latyfa. Surgiu um imprevisto que exige minha atenção.
— Claro, Alteza. — Diz se levantando da cadeira, fazendo uma
mesura obediente. Estávamos tomando um café em minha sala. Novamente
me desagrada sua subserviência, me irrita a maneira como fala comigo,
como se eu fosse um deus. Ela sai e ando para a varanda, subindo os
degraus para o heliponto.
Meu helicóptero particular está lá, pedi que o deixassem pronto para
usá-lo na volta para casa. Meu piloto sai de seu posto, aceno, dispensando-
o. Não preciso de testemunha para o que irei fazer. Eu mesmo vou pilotar.
— Como ela conseguiu deixar o palácio? E por que ninguém se
dignou a me avisar dessa merda? — Brado, desgostoso, abrindo a porta da
aeronave, me acomodando no assento do piloto.
Silêncio.
— Meu pai, Amihaj — revela em tom contrariado. — Ele
providenciou prontamente a condução para levá-la. Só fiquei sabendo há
pouco porque ela enviou uma mensagem de despedida para Nuria. — Meu
sangue ferve. Meu tio está passando dos limites. Preciso lhe dizer algumas
verdades, e logo. Não vou mais admitir que me trate como um menino, se
intrometendo em minha vida pessoal. — Parece que a princesa estava
gritando e ameaçando estourar as bolas dos guardas caso não a levassem
para o aeroporto — completa em tom de diversão.
Isso faz um sorriso tremular em minha boca, embora a situação não
seja das melhores. Essa é a minha garota. É disso que estou falando. Não
quero uma mulher submissa, sem vontades.
— Isso se parece muito com ela — digo e ele ri. Começo a mexer
nos comandos, me preparando para ir retirar a princesa e sua bunda linda e
atrevida daquele avião. — Atrase o voo o quanto puder, estou indo para o
aeroporto agora! — Aviso e ouço sua risada divertida do outro lado. O
idiota.
— Ora, você me conhece, primo, o avião está em solo, com ordens
expressas do príncipe para não decolar — anuncia com orgulho de seu feito.
— Vou pensar numa forma de agradecer adequadamente, primo —
prometo e ele bufa.
— Eu sei, sou demais — se vangloria.
Solto um grunhido, mas o agradeço.
— Shukran, Jalal. — Desligo, pegando o headset e colocando-o em
meus ouvidos.
Em instantes, ganho o céu claro de Jawahra e alguns minutos depois
avisto o avião da Falcon Emirates, uma das companhias aéreas das quais
sou sócio majoritário. O único voo para Nova York na pista dos portões 12
a 45. Não foi difícil identificar. Desço e aterrisso, deixando a aeronave
funcionando, isso não vai demorar. Assim espero.
Entro, peço educadamente para me acompanhar e ela virá, claro. É
um bom plano.
Marcho para o avião. Estou vestido em traje oficial e todos me
identificam rapidamente, se curvando por onde passo.
A ponte de embarque já foi retirada, mas providenciaram uma
escada para mim. Jalal realmente fez um bom serviço. Faço uma nota
mental para retribuir à altura. Subo rapidamente. A tripulação está perfilada
quando atinjo o último degrau, passando para dentro do avião. O piloto e as
comissárias de bordo me reverenciam e, em seguida, os passageiros me
notam e começa a agitação. Aceno, me sentindo muito exposto. Só agora
me ocorre que talvez não tenha sido uma boa ideia subir a bordo de um
avião lotado para impedir a partida de uma mulher que não é elegível para
minha esposa. Não faz sentido para ninguém, exceto para mim.
— Bom dia, senhoras e senhores, desculpem o transtorno. — Elevo
a minha voz. — Há uma pessoa nesse voo que não tem permissão para
deixar o emirado. — Há comoção. Oh! Ah! Ressoando no ambiente. —
Assim que ela vier até mim, o voo será liberado para decolar
imediatamente. — Asseguro e todos começam a se entreolhar se
perguntando quem é a pessoa que procuro.
Encaro o vagão imenso à minha frente e nada, todos permanecem
sentados, nenhuma princesa se levantando para me seguir. Avanço devagar,
meu olhar inspecionando cada conjunto de quatro poltronas da primeira
classe. Começo a me perguntar se realmente está neste voo, então a
localizo. Meu coração dá um solavanco no peito quando meus olhos
encontram os seus, que estão vermelhos, por mais que tenha tentado
disfarçar com maquiagem. Engulo em seco, me sentindo mal por tê-la
colocado nessa situação. Ela não desvia o olhar do meu, não abaixa a
cabeça. Me enfrenta, valente, e meu coração se alegra porque já estava
sentindo falta desse seu nariz empinado. Allah, como a quero.
— ‘Amira. — Murmuro em tom reverente, não consigo evitar, o
avião lotado sendo colocado em segundo plano. Seus olhos brilham muito e
ela os desvia para fora da janela. Paro ao lado do seu conjunto de poltronas.
Está do lado da janela, as outras vazias. — Venha comigo, por favor, vamos
conversar. — Peço em tom mais baixo, me lembrando dos muitos ouvidos
aqui dentro. Ela não me olha, apenas engole em seco. Seus cabelos negros
estão amontoados em um nó no meio da cabeça. Usa uma calça jeans e
camiseta branca simples. Ela quis passar incógnita e arruinei seu plano de
fuga. — Eu posso explicar, Anna.
Seu rosto vira e seus olhos estão em chamas agora.
— Aposto que pode, Alteza. — Diz com sarcasmo. — Faça um
favor para nós dois e vá embora! — Se altera, os olhos inflamados.
Escuto cochichos e olho discretamente o vão atrás e à frente, todos
estão nos observando com expressões surpresas e curiosas. Formidável.
Resmungo. Zero privacidade.
— Você não vai sair de Kamar, princesa. — Meu tom é firme, pela
frustração de sua recusa. Levanta uma sobrancelha debochada e percebo
que vou vivenciar uma exposição pessoal sem precedentes. — Desça
comigo e não cause mais problemas para os passageiros. Eles precisam
chegar aos seus destinos.
Isso a irrita. Vejo como se levanta e vem para a minha frente, me
fazendo recuar um pouco, e ficamos no corredor, cara a cara. Eu sei que
deveria estar em pânico pela exposição, mas tudo que consigo fazer é
devorá-la com meus olhos. É linda demais. E está pronta para me arrancar a
cabeça nesse momento.
— Eu exijo falar com a Embaixada dos Estados Unidos da América!
— Rebate em tom alto e petulante e todos soltam exclamações sem
restrições nenhuma agora. Wallah, o que ela está fazendo? — E a
Embaixada de Ardócia. Só saio com Vossa Alteza se me deixar falar com as
duas. — Como se não bastasse, empurra um dedo em meu peito. —
Conheço meus direitos, não pode me prender aqui contra a minha vontade.
— Range os dentes.
— Você está em meu país, sob a minha tutela. — Abaixo meu rosto,
ficando bem perto do dela. Anna ofega, um pouco da bravata vacilando pela
minha proximidade, porque a afeto da mesma forma que ela a mim. Rio
perverso e completo: — Você só irá embora quando eu liberar, princesa. As
coisas funcionam assim por aqui.
— Eu quero falar com a polícia. — Rosna na minha cara, seus olhos
tão verdes que estão vítreos.
— Minha vontade é soberana. Não há para onde correr. — Asseguro
e mais exclamações explodem no recinto. Meus olhos não saem dos seus
quando murmuro: — E minha vontade é que você fique, ‘amira.
Seus olhos brilham com mágoa ao ouvir isso e ela pisca, bufando, a
expressão desdenhosa enchendo seu rosto.
— Você está ocupado demais escolhendo uma esposa como quem
escolhe tapetes no mercado, amiri. — Ironiza a mim e à minha situação. —
Eu não vou sair desse avião com você, esse é meu último aviso.
Eu bufo e seguro seu pulso.
— Foda-se, Karim! — Grunhe baixo, sabendo que é crime falar
palavrões em público. — Deixe-me, agora, seu idiota!
— Eu não posso deixá-la, ‘amira — murmuro, tentando acalmá-la.
— Precisamos conversar.
— Não precisamos merda nenhuma! Você me escondeu coisas… —
Olha em volta, notando que estão todos nos olhando. — Vá embora e
esqueça que existo!
— Impossível — digo baixinho e ela me lança um olhar mortal.
— Foda-se!
— Me desculpe, princesa, mas você virá comigo. — Rosno e num
instante a pego pela bunda, içando-a para o meu ombro esquerdo.
— Karim! Me ponha no chão, imediatamente! — Berra, e a essa
altura o povo está rindo escancaradamente. Allah, que situação
constrangedora. — Karim! Solte-me! — Esmurra minhas costas. — Ele
está me sequestrando! Chamem as autoridades, me ajudem! — Berra a
plenos pulmões.
— Eu sou a autoridade máxima, princesa. Está em boas mãos —
zombo. E ela me bate mais forte nas costas.
— Karim, deixe-me, seu estúpido! Odeio você!
— Ela não odeia — falo para uma senhora que parece horrorizada
com minha atitude. — Só está um pouco zangada…
— Muito! Muito zangada, seu imbecil! Seu… Seu déspota! — Grita
enquanto a carrego corredor afora. — Eu exijo falar com as embaixadas!
— Você terá acesso a tudo, ‘amira — digo e ela para um instante. —
Assim que estivermos de volta ao palácio.
Ela volta a gritar, espernear, esmurrar minhas costas. Não me abalo,
a carrego para fora, descendo a escada e me dirigindo rapidamente para o
helicóptero. Abro a porta do passageiro e a coloco no assento. Ela respira
fundo, percebendo que não adianta sua rebeldia. Tento ajudá-la com o cinto,
mas suas mãos estapeiam as minhas, seus olhos me fulminando. Ela mesma
o prende, desviando o olhar para frente, o queixo levantado em afronta.
A viagem para casa foi feita em silêncio tenso. Não tentei puxar
conversa, pois sabia que não teria sucesso. Quando pousamos no terraço da
ala norte, ela pulou para fora como um raio e eu saí atrás dela, não me
importando de meus funcionários estranharem me ver correndo atrás de
uma mulher. Abre a porta do seu quarto e tenta fechá-la, mas coloco o pé,
impedindo-a. Ela grunhe, desistindo e me virando as costas, entrando no
amplo aposento. Para no meio da sala, permanecendo de costas para mim.
Suspiro, me sentindo um imbecil por ter feito esse papelão, impedindo-a de
partir. Mas deixá-la ir seria pior. A agonia que senti quando meu primo me
ligou e depois o alívio quando a encontrei. Porra, estou fora das minhas
faculdades mentais.
— ‘Amira… — sussurro. — Sinto muito. — Ela permanece calada.
— Tenho deveres com o meu povo. Preciso subir ao trono e fazer um
casamento de Estado para fortalecer nosso emirado, evitando conflitos
como esse do qual também foi uma vítima.
Anna suspira longamente. Então, se vira devagar e nossos olhares se
encontram. Ainda há fogo e mágoa em seu olhar quando rosna:
— Ajudaria se tivesse me falado a respeito antes de ser surpreendida
pela chegada de uma candidata a sua esposa, Alteza.
— Eu sei, foi errado. E estou dizendo que sinto muito. — Meu tom
é arrependido, mas vejo que não vai facilitar.
Ela sorri sarcasticamente e anda alguns passos, olhos flamejantes.
Allah, linda demais!
— Ah, claro, meu senhor está dizendo “sinto muito” — zomba, sua
petulância em dia. — Leia meus lábios, honorável Alteza. — Ri mais, como
a debochada que é, e grunhe: — Foda-se!
— Os casamentos de Estado são comuns também nas monarquias
do Ocidente. — Apelo para seu bom senso. — Você pertence à realeza,
compreende muito bem a situação, Anna. Não sou dono das minhas
vontades nesse sentido.
Ela não responde a isso. Ainda me olha de queixo erguido, mas aos
poucos a calma e entendimento vão dando sinais em seu rosto corado.
Permanecemos nos encarando, conversando o restante apenas com nossos
olhares. Há coisas que não nos atrevemos verbalizar, não nos ajudaria em
nada. Ela suspira.
— Eu entendo. Saí sem me despedir porque esse foi o primeiro
impulso — diz em tom mais controlado, a irreverência bem longe do seu
rosto. Fecha os olhos por um instante. — Droga, esqueci completamente
que me prometeu levar ao deserto. — Mágoa tinge seu olhar quando
pergunta: — Ainda conseguirá me acompanhar, ou se casará por esses dias
e não estou sabendo?
Cerro a mandíbula, incomodado com seu sarcasmo no final.
— Ainda irei com você. Sempre cumpro minhas promessas,
princesa — retruco, magoado, e ela me lança um olhar desapaixonado.
— Muito honrado, Alteza. — O tom zombador está afiado
novamente. — Irei porque é o que Nate pediu na última carta que abri. —
Ouvir o nome do garoto morto que ela ainda idolatra me faz queimar de
ciúmes. Fecho meus punhos, tentando refrear o sentimento. Não é decente
da minha parte. O menino está morto, Wallah! — Nunca o desapontei em
nenhum dos pedidos e não vou começar agora. — Estas últimas palavras
trazem um recado implícito. Está claro que lamenta ter baixado a guarda,
me permitindo me aproximar nessas últimas semanas. — Quando
partiremos?
— O baile será no sábado — falo. Meu tio marcou a data ontem e já
formalizou o convite feito antes de os conflitos estourarem. Vejo a mágoa
passar no olhar de Anna, então, dissimula com um sorriso zombador.
— Ótimo! Boa sorte, Alteza! Espero que encontre a mulher que está
procurando.
Eu já a encontrei, ‘amira. Quero lhe dizer, porém, isso só nos traria
mais complicações.
— Gostaria que fosse diferente — digo-lhe, encarando-a com meu
coração pesado. — Eu pertenço ao deserto, Anna, e minha esposa também
precisa pertencer.
Seus olhos verdes se enchem de tristeza, a mesma que está nos
meus. Assente devagar.
— Você está certo. — Abraça a si mesma. — Irei embora em breve.
Estávamos indo por um caminho que não levaria a lugar nenhum. — Nos
encaramos por um instante e ela torce a boca, seus olhos acendendo com
algo perverso ao adicionar: — Acho que deve estar preparado para um
vídeo da sua pequena travessura surgindo na internet, Alteza.
— O quê?! — Exclamo, meu sangue gelando.
— Oh, não pensou nessa possibilidade quando entrou naquele avião
e me jogou por cima do ombro como um maldito Tarzan, Karim? — Ela
está novamente debochando de mim. — Somos pessoas públicas e devo
dizer que sou um tanto perseguida pela mídia. — Torce o nariz altivo e sorri
maliciosamente. — Estou acostumada com tal exposição, no entanto. Sei
que sempre haverá alguma celebridade fazendo merda e o público acaba
indo atrás de fofocas novas.
— É claro que está acostumada, você é uma debochada de primeira.
— Acuso-a, me sentindo enciumado de cada foto que vi dela com um
mauricinho diferente. — Nem consigo contar as fotos que vi suas com um
cara diferente a cada vez.
Seus olhos brilham ainda mais maliciosos.
— Está com ciúmes, amiri? — Ronrona de forma zombadora. Não
respondo nada, apenas passo as mãos pelo rosto.
— Não quero perder o que tivemos nesses dias. — Murmuro, me
sentindo impotente. — Quero estar com você, a respeito, eu…
Anna fica séria e se afasta alguns passos.
— Também gosto de estar com você, mas nossos momentos a sós
não acontecerão mais, Karim. — Avisa, seu rosto cheio de determinação. —
É o melhor.
Nos encaramos medindo forças e expiro, precisando aceitar e parar
isso entre nós.
— Como quiser, ‘amira. — Aceito, desolado, sem poder lhe falar o
que realmente está em meu coração.
— Me deixe sozinha agora, por favor — pede.
Eu a olho por mais alguns instantes e, então, atendo ao seu pedido.

***

— Uma suspeita de atentado?! — A voz masculina em meu ouvido


parece meio divertida com minha desculpa para ter arrancado Anna do
avião à força. É seu pai, Dominic Harper, o irmão do meio do rei Leon. Ele
me ligou trinta minutos depois que descobri que minha interação com sua
filha de manhã foi filmada por algum filho da puta naquele avião e jogada
no YouTube! Anna estava certa. Allah! Nunca tive minha vida exposta dessa
forma. Sempre fui muito reservado. O que deu em mim para fazer tal cena?
Mas, pensando bem, não me arrependo. Se não fosse aquela ação extrema,
ela estaria longe agora e eu não suportaria isso. Suspiro, passando uma mão
nos cabelos. Estou tão ferrado, porra.
— Sim, senhor Harper. — Reforço e vejo Jalal segurando um riso
na minha frente. Faço uma carranca para meu primo. — Eu não tinha ideia
de que a coisa tomaria uma proporção dessas.… Mas saiba que minha
equipe de advogados já está trabalhando para retirar o vídeo de circulação.
Não era minha intenção expor a princesa, senhor.
Jalal está sorrindo agora, o idiota. O homem fica em silêncio do
outro lado. Merda, que situação. Afrouxo a minha gravata.
— Entendo.… Fique tranquilo que logo uma dessas celebridades
apronta uma das suas e a sua pequena cena será esquecida. — Novamente
sinto que o homem parece estar se divertindo com o acontecido. Anna me
disse a mesma coisa. — Anna me disse que seguirão com o plano de ir ao
deserto, então espero que cuide bem dela, príncipe Amihaj. — Seu tom é
sério agora. — Já lhe agradeci por salvá-la, tem muito crédito comigo e
com a mãe dela por isso, mantenha-o e envie nossa filha para casa em
segurança quando chegar o momento.
Engulo em seco.
— Certamente, senhor. Tem sido muito bom ter a princesa aqui
esses dias. — Informo, fazendo a diversão de meu primo. Rolo os olhos.
— Confiarei em você, Amihaj. — O homem adiciona: — Se me
permite um conselho, caso precise parar outro avião no futuro, leve flores…
— Franzo o cenho. — Rosas, de preferência. Elas foram muito eficazes
para mim uma vez…
Fecho os olhos, tendo a certeza de que o homem não acreditou em
minha mentira deslavada. Nos despedimos e expulso Jalal do meu
escritório. Já era fim de tarde quando os advogados conseguiram retirar o
vídeo da internet, porém, avisaram que muita gente baixa esse tipo de
arquivo, e quanto a esses não podemos fazer nada.
Tio Jafar entrou no escritório, ele esteve o dia inteiro fora — muito
providencial. Ironizo-o.
— Amiri, vim tão logo recebi sua mensagem…
— Como já deve estar a par, Anna está de volta ao palácio. O senhor
vai parar de persegui-la e desrespeitá-la, tio, e isso não é um pedido. — O
recebo com a mesma raiva que senti pela manhã quando Jalal contou quem
tinha a ajudado em sua fuga.
Seu maxilar aperta e ele não parece satisfeito. Mas pouco me
importo.
— Você está exposto por toda a internet, Amihaj! Isso é apenas o
começo se insistir em manter essa ocidental por perto.
— Pare agora! — Advirto-o. — Lhe devo respeito como meu tio e
grão-vizir, mas o senhor não vai mais interferir em minha vida pessoal. —
Ele aperta os lábios, desgostoso, mas se inclina em respeito. — A princesa é
importante para mim e não vou admitir que ninguém a desrespeite dentro da
minha casa, está claro?
Ele assente. Um silêncio desconfortável desce sobre nós.
— Ainda haverá um baile no sábado? — Tem a audácia de
perguntar.
— Sim, ainda escolherei uma esposa no sábado. — Assinto num
grunhido angustiado. — E serei infeliz pelo resto da vida.
Meu tio engole audivelmente, seu rosto mostrando um flash de
suavidade.
— O fardo de um governante às vezes é pesado. — Permaneço
calado. — Mas se a princesa é tão importante assim para meu senhor, há
uma solução… — O encaro, expectante. Aonde está indo? — Tome-a como
segunda esposa, amiri.
Eu o encaro, considerando a sugestão por um ínfimo instante porque
estou louco para encontrar uma forma de não a perder.
— Não. — Nego, a tristeza me tomando de novo. — Não posso
fazer isso com ela.
— Por quê? É um costume do seu povo e…
— Anna é única, não merece ser a segunda em nada, é por isso. —
Afirmo e ele balança a cabeça.
Meu tio nunca tomou uma segunda esposa, nem meu pai; embora
seja um costume de nosso povo, os homens Al-Abdallah raramente buscam
uma segunda mulher.
— As tribos nunca aceitarão uma moça ocidental como sua rainha,
ainda que tenha sangue azul, Amihaj — aponta.
— Eu sei. Farei o casamento de Estado que meu povo espera, tio —
falo em tom firme.
Ele sai depois de me informar que amanhã mais duas princesas estão
chegando. Formidável. Anna se sentirá incomodada. Está claramente
magoada comigo, não quer mais estar perto de mim. Sei que é o mais
prudente a ser feito, mas meu coração e meu corpo discordam disso. Já
sinto sua falta. Fico no escritório lendo os relatórios dos alemães traduzidos
pela princesa. Fico tentado a cheirar os papéis porque ela os tocou. Allah,
meu peito está apertado pela impotência diante disso. Preciso deixá-la ir. É
o mais honrado a fazer. Meu celular toca em cima da mesa, pego-o vendo o
nome de Mike na tela.
— Olá, Mike — saúdo-o. Nos falamos há dois dias, com certeza
quer mais esclarecimentos sobre o maldito vídeo também.
— Amihaj, vi que as coisas por aí andam, como dizer… agitadas?
— Sua voz é um misto de diversão e malícia. — Me explique como diabos
você e minha prima foram parar no YouTube, amigo?
— Não posso lhe dar a mesma desculpa que inventei para o pai de
Anna — resmungo. Ele ri.
— Que seria…?
— Eu disse que havia uma suspeita de atentado, por isso tive que
retirar a princesa do avião — respondo fazendo uma careta.
Sua gargalhada explode em meu ouvido.
— Amigo, tio Dom é um expert quando se trata de ir parar no
YouTube. — Solta, então passa a me contar que o pai de Anna é o menos
conservador dos irmãos e que aprontou muitas quando jovem. O homem,
inclusive, protagonizou uma cena parecida como a minha de hoje, retirando
a mãe de Anna de dentro de um avião. Allah. Gemo lamentando por não ter
conversado com Mike antes. — Mas tudo se resolveu, não é? Ella acabou
de testar o link e o vídeo foi retirado.
— Sim, meus advogados agiram rápido, amigo — exalo alto. — Sua
prima não é fácil.
— Não, ela não é. — Ele ri, um som mais suave e menos
provocativo. — Anna é especial, Amihaj, não sei o que está havendo entre
vocês. — Faz uma pausa. — Não a magoe. Ela já carrega uma carga pesada
do passado.
— Eu sei, Mike. Anna e eu… — Engulo em seco, incomodado, não
havíamos tocado nesse assunto ainda. Sou sempre muito reservado e a
garota em questão é prima do meu amigo. Mike a considera como uma irmã
pelas recomendações que me fez quando avisou que ela estava vindo para
cá e, depois, sua aflição quando Anna não deu notícias ao chegar. — Nós
nos aproximamos nesses dias, amigo. Mas você sabe que tenho um dever
com meu povo.
Ele fica quieto um instante.
— Sim, eu sei, Amihaj. — Assente em tom mais baixo. —
Novamente, não a machuque. Seja sincero com ela.
— Eu já fui, sabemos que não há futuro para nós. — Pronunciar isso
é muito pior do que pensar, parece que fica mais contundente. — Dentro de
dois meses subirei ao trono e farei um casamento de Estado, como meu
povo espera.
— Ainda irão ao deserto? Anna estava muito animada quando
contou a Ella que você iria levá-la.
— Sim, manterei minha palavra e a levarei — confirmo. Será a
nossa despedida. Acrescento para mim mesmo.
— Está bem, amigo. Cuide-se e cuide de Anna também enquanto
estiver por aí. — Ele diz num tom que não consigo ler bem.
Nos despedimos após mais algumas palavras e volto para os
relatórios. Termino, conferindo o relógio. Não são seis ainda, o sol está alto
no horizonte. Dá tempo para uma cavalgada. Com esse pensamento encerro
o expediente, e alguns minutos depois estou entrando na baia de Hércules e
Queen. Meu coração e corpo vibram. Anna está aqui dentro, conversando
com Queen, acariciando seu focinho. A égua se inclina, esfregando a cara
na princesa. Invejo o animal. Fico parado na porta, aproveitando esse
momento roubado. Está linda numa calça justa e botas de montaria. Uma
camiseta agarrada ao torso, me lembrando das curvas perfeitas que estão
por baixo. Ela me nota, vejo pela tensão em seus ombros. Olha por cima do
ombro e nossos olhares conversam sem palavras.
— Está tudo bem se eu montar Queen enquanto estiver por aqui? —
pergunta, sua voz rouca. Ando para dentro, alcançando Hércules, que me
recebe com empolgação, me cheirando.
— Só se eu puder ir junto — murmuro, mesmo sabendo que não é a
decisão mais acertada. O conflito toma seu rosto. Ela quer a minha
companhia tanto quanto estou sedento para estar perto dela. — Apenas
hoje, ‘amira — peço.
Anna reflete um instante e assente, limpando a garganta, desviando
a atenção para a magnífica égua branca. E nós saímos juntos, mais uma vez.
Como uma despedida.
Nós cavalgamos impondo um ritmo forte para nossos cavalos. Não
conversamos, apenas montamos, corremos como se quiséssemos expurgar
nossas preocupações. Fomos mais longe do que nas outras vezes. Ora eu na
frente, ora ela, ora lado a lado. Eu a olhei muitas vezes, fascinado pela
postura elegante de amazona, seus cabelos negros soltos voando ao vento.
Nunca vi outra mulher tão bonita e meu coração se comprime toda vez que
a olho, sabendo que não pode ser minha. Eu a quero com uma necessidade
avassaladora. Estou possuído, cada parte minha tomada por ela. Passei
quatro anos morto para o mundo, então essa garota veio e em poucos dias
me fez mais vivo do que nunca.
Fico cheio de tesão vendo-a cavalgar como uma corredora
profissional, os quadris levantados da sela, as coxas tensas, os joelhos
curvados, o vento batendo em seus cabelos, os peitos lindos, redondos,
saltando pelo ritmo forte. Quando retornamos à baia, minhas emoções estão
transbordando. Anna desmonta rapidamente e faço o mesmo. A cavalgada
mexeu com ela, comigo. Meu corpo está quente, desejoso. Estou duro,
querendo-a mais do que a próxima respiração. Tenta passar por mim para a
saída, mas pego seu braço, sentindo-a estremecer. Seus olhos encontram os
meus, suas pupilas estão gigantes, me desejando como eu a ela.
— Karim, não… — Implora. Um rugido sai da minha garganta, a
represa de tesão se rompendo. Enrolo o braço livre em sua cintura,
trazendo-a para mim. Ela arfa, as mãos pousando em meus ombros. A
levanto do chão, carregando-a grosseiramente e, no segundo seguinte, estou
prensando-a contra a parede mais próxima. Nossas respirações
enlouquecem, as bocas quase encostando, meu pau esmagado em sua
barriga.
— Sim, ‘amira — sussurro asperamente, correndo meu nariz pelo
seu rosto, ela fecha os olhos e geme baixinho. — Eu quero você. Preciso ter
você, ou vou enlouquecer. — Pego-a pela bunda, levantando-a, nivelando
meu pau entre suas coxas. Ela abraça minha cintura com as pernas e
estremece ao sentir meu volume esfregando em sua boceta. Está parecendo
uma fornalha. Suas mãos vêm para meus cabelos, enfiando os dedos por
entre os fios. Gemo rouco, segurando sua nuca, respirando em sua boca.
Estamos além do tesão, é algo indescritível, esmagador. — Diga que sente
isso também, Anna. Diga. — Exijo.
— Sim, sim, amiri. — Choraminga e me deixa ainda mais louco
ouvindo-a me chamar de “meu príncipe” em minha língua, sem o tom
zombador. Colo nossas bocas não podendo esperar nem mais um segundo.
No primeiro momento, eu apenas aprecio o contato tão esperado; em
seguida, gememos cheios dessa necessidade inexplicável e nossas bocas se
abrem ofegantes. Eu sugo seu lábio inferior. Ela suga o meu. Nossos
quadris giram, procurando cada vez mais por fricção. Estremecemos
quando nossas línguas por fim se encontram. Nos lambemos. Mais
gemidos, ofegos desesperados e a beijo como tenho desejado desde que a vi
naquele cativeiro. Chupo sua língua com força, minha boca dominando a
sua, devorando-a com fome. Mordisco seus lábios e língua, ela geme
gostoso, rendida. Então, vou suavizando aos poucos, adorando seus lábios
carnudos, chupando-os juntos, separados, delicadamente. Anna resfolega e
me mordisca também, as mãos puxando meus cabelos. Gemo baixo e rouco,
puxando seus cabelos da nuca, angulando sua boca gostosa, passando a
devorá-la outra vez, com uma voracidade que me assusta.
— ‘Amira, tão linda… Tão gostosa… — Venero-a, completamente
rendido. Nos devoramos mais e mais, minha boca nunca deixando a sua,
sedenta, faminta. Nossos sexos esfregando um no outro, causando o atrito
perfeito.
— Allah! Perdão, meu senhor!
A voz vindo da entrada nos faz congelar. Anna se retesa, arrancando
a boca da minha. Olho de lado, vendo um dos jovens que cuidam do
estábulo. Ranjo os dentes, querendo arrancar a cabeça do moleque pela
interrupção. Ele está aterrorizado, os olhos arregalados.
— Saia. — Rosno entre dentes. Ele arregala os olhos ainda mais, se
curvando numa reverência desajeitada antes de correr para fora. Volto a
encarar Anna, que tem a cabeça encostada à parede, os olhos fechados com
força.
— Me coloque no chão, Karim — pede, sem olhar para mim. —
Droga! — Geme com nítido desgosto e abre os olhos. — Me coloque no
chão, por favor.
— Não, eu te quero e você me quer também. — Tento trazer sua
boca para a minha de novo, mas ela se esquiva. — Não faça isso, ‘amira.
— Se eu ceder, me entregar a você, ainda haverá o baile de sábado.
— Me lembra e é como um balde de gelo sendo derramado em minha
cabeça. Me empurra e me vejo obrigado a soltá-la. Meu corpo inteiro
pulsando de desejo insatisfeito. Ela se afasta, ajeitando as roupas, respiração
arfante. Nossos olhares se encontram de novo e Anna murmura: — Essa foi
a nossa despedida, Karim.
Então, vira as costas e sai.

Anna Julia
Eu olho o vídeo pela milésima vez. Sim, eu baixei. E agora estou
como uma retardada assistindo-o. Precisava ser tão bonito? Deus, preciso
superar esse príncipe. Alimentar esse sentimento só me fará mal. Gemo. Já
está fazendo mal. É tarde demais. Ele está em mim por toda parte. Olho
para sua imagem enquanto conversa comigo, então, me joga em seu ombro
parecendo um sultão otomano, me sequestrando para seu palácio. Urgh,
pare de ser tola, Anna. Ele irá escolher uma esposa perfeita no sábado. Uma
virgem, subserviente, tediosa até dizer chega. Todos aqueles passeios
estúpidos foram apenas porque o idiota queria entrar em sua calcinha.
Advirto-me. Ainda bem que faltam poucos dias para esse maldito baile, em
seguida iremos para o deserto. Dentro de quinze dias, no máximo, estarei
voltando para casa.
Meu coração aperta ao pensar nisso. O fim. O rostinho de Ayla me
vem à mente. Hoje de manhã não tive coragem de me despedir dela, então
apenas escrevi uma carta e pedi à babá para lhe entregar quando acordasse.
Eu a olhei dormindo, a beijei e saí, chorando por todo o caminho até o
aeroporto. Aquela menininha ganhou o meu coração. Ela e seu pai. Uma
voz enxerida em minha mente corrige. Quando voltei e esclareci as coisas
com seu pai idiota, fui até seu quarto, dando graças a Deus por ela não ter
acordado ainda, e peguei a carta de volta com a babá. A brisa da noite sopra
em meu rosto e fecho o penhoar, deixando a sacada, voltando para dentro
do quarto. Passa das dez da noite e estou inquieta. Jantei no quarto depois
que passei nos aposentos de Ayla para jogar xadrez com a pequena. A estou
ensinando, nem um pouco surpresa com a rapidez com que a sapequinha
tem aprendido. Sim, vou sentir muita falta da princesinha. Esses poucos
dias serão sempre lembrados com carinho.
E meu pensamento recai nele. Onde está? Entretendo a morena
bonita candidata a esposa perfeita? Me pergunto não deixando amargura e
despeito de lado. Estou angustiada, me segurando para não enviar uma
mensagem, dizendo que estou queimando para terminarmos o que
começamos no estábulo. Toco meus lábios ainda dormentes dos beijos
ardentes e famintos que trocamos. Meu corpo não vai sossegar e me deixar
dormir. Eu o quero. Desesperadamente. Foram dias desejando, sedenta para
provar sua boca. E agora que provei, estou em chamas. Se aquele
funcionário não nos tivesse interrompido… Meu Deus, eu o queria lá,
naquela baia rústica. Tenho fantasiado um final diferente do nosso
interlúdio desde então. Em minha mente, ele arranca a minha calça e me
penetra contra a parede, eu gritando com o volume grande e grosso de seu
pau me fazendo mulher de novo. Arfo, minha calcinha molhando
miseravelmente. Já usei meu mini vibrador, mas em nada aliviou, só me
deixou ainda mais incomodada e consciente de que preciso de mais. Depois
de seis anos, meu corpo está exigindo mais. Preciso de Karim.
Estou prestes a ligar para Ella, chorar minhas desventuras amorosas
no deserto. Ainda são oito horas em Londres, minha prima ainda está
acordada. A campainha tocando faz meu coração saltar, meu corpo voltando
a pulsar descontrolado. É ele? Pergunto-me. Uma parte de mim rezando
para que seja e a outra, uma bem pequena, desejando que não seja, será
mais fácil para mim. Ajeito meu penhoar branco, afofo os cabelos e me
dirijo para a porta, abrindo-a. E meu corpo esfria drasticamente porque
parada do lado de fora do meu quarto está a tal morena. Latyfa. Nuria me
colocou a par de tudo que Karim não teve a decência de me dizer. A mulher,
na casa dos trinta, acho, é mesmo muito bonita. Mas sua cara não é nada
agradável neste momento.
— Podemos conversar um instante, princesa? — pergunta, me
medindo dos pés à cabeça. Um frio desconfortável percorre a minha pele.
— O que teríamos para conversar? — pergunto, levantando uma
sobrancelha altiva, tão logo me recupero da surpresa indesejada.
Um sorriso de escárnio se abre em sua boca.
— Eu a vi de pouca vergonha, em vias de fazer sexo com o príncipe
Karim no estábulo. — Cospe com nojo.
Isso me faz retesar. Ela está nos vigiando?
— Pois é, nós quase fodemos — digo com petulância para chocá-la.
— Fomos interrompidos, uma pena. Mas não vejo como isso possa ser da
sua conta. — Atiro. Ela fecha a cara.
— Tive que enviar aquele garoto para conter a empolgação… — Ela
diz com desprezo e despeitos óbvios. — Você está sendo tola e estúpida se
acha que o príncipe vai deixar seu dever. Você é apenas diversão para ele.
— Bem, isso ainda não é da sua conta, e tenha certeza de que não é
bem-vinda. Portanto, retire-se da minha porta. — Levanto o queixo, não me
deixando intimidar pelo olhar gelado da morena.
— Não antes de dar o meu recado, ocidental. — Ela me chama de
forma pejorativa e isso me irrita muito. Quem essa infeliz pensa que é?
— Escute aqui, minha filha, quem diabos pensa que é para vir me
incomodar em meu quarto?
Seus olhos escuros me assustam quando murmura:
— Sou a futura esposa de Sua Alteza. Ele vai me escolher. —
Assegura com uma certeza que me irrita. Pega o celular e abre, em seguida
me mostra a tela. Gelo desliza em meu estômago, ela está com Karim e
Ayla no salão de refeições. Meus olhos ardem ao vê-la segurando Ayla no
colo enquanto sorri para seu pai. Ele também está sorrindo. Fecho os olhos,
empurrando o aparelho para ela. — Tivemos um jantar muito agradável
ainda há pouco. — Sinto a dor da traição cortando fundo. Ele queria transar
comigo, sabendo que jantaria com ela? Está me encarando vitoriosa quando
arrasto minha atenção para seu rosto bonito, mas frio, parece uma estátua de
pedra. É assustadoramente frio. Muito diferente da imagem sorridente do
jantar. — Não fique triste, é assim que os homens árabes são. Eles adoram
comer as putas ocidentais, mas sempre se casam com as mulheres de sua
terra. Mulheres como eu, adequadas, respeitáveis, que nunca o exporão
como você fez hoje.
Meu íntimo torce com sua ofensa escancarada. Tristeza, decepção
tomando conta de mim. Era tudo que ele queria, me foder? O veneno da
mulher me atinge, não posso evitar.
— Saia da minha porta ou vou chamar a segurança. — Ameaço,
além de irritada. — Por que se deu ao trabalho de vir aqui me mostrar sua
encenação de família feliz com o príncipe?
— Para que saiba o seu lugar. Você pode ser uma princesa, mas
nunca será uma de nós — diz friamente. — Vá embora. Pare de se rebaixar,
tentando atrair a atenção de um homem que nunca a levará a sério.
— Saia. — Cerro os dentes.
— É a verdade. Ele ia te comer num estábulo, isso mostra que não a
respeita. — Continua destilando veneno. — Ele sabe que ocidentais são
fáceis, sem moral. Vá embora e pare de envergonhar sua família agindo
como uma prostituta.
Mas que merda! Aí já é demais.
— Escuta, sua cadela, vá para o inferno com seus conselhos! — A
empurro da minha frente. Ela desequilibra um pouco, afastando-se, me
lançando um olhar mortal. — E se voltar a abrir essa boca nojenta para me
ofender, vou te meter um processo nessa sua bunda recalcada. Mas não
antes de meter a mão na sua cara! Será que fui clara?
Ela levanta o queixo, olhando o corredor vazio, e volta a me encarar.
— Não diga que não avisei, princesa. — Lança a ameaça. Faz uma
mesura debochada e se vai, finalmente. Fico olhando-a por um momento,
sem acreditar na ousadia da cadela.
— Cadela louca — murmuro e fecho a porta.
Avanço pela sala, com raiva do atrevimento da vadia. Com raiva de
Karim por me tratar como a uma qualquer. Ela tem razão. Fecho os olhos
envergonhada porque desejei que tivesse me feito sua lá naquele estábulo.
Ele tinha um jantar com ela e queria se divertir comigo antes.
— Estúpida. Estúpida! — Rosno para mim mesma.
Nosso primeiro beijo, tão especial para mim, agora parece uma
coisa sórdida. Ela tem razão, ele nunca colocará uma ocidental como sua
esposa e rainha. Oh, Deus, eu não pertenço a este lugar, por que me mata
saber que não terei nenhuma chance com ele? Lamento ter decidido vir a
este país. Lamento tê-lo conhecido e bagunçado minhas emoções.
Fico remoendo meu infortúnio por um tempo, então, ligo para Ella.
Preciso conversar com alguém ou vou explodir.
— Prima, está tudo bem? — Seu rosto está preocupado quando
surge na tela. Já nos falamos hoje logo após o imbecil ter me arrastado
daquele voo.
— Não, nada está bem, prima. — Suspiro longamente. — Você
estava certa, eu… — Limpo a garganta, desconfortável em admitir isso. —
Eu me envolvi com o príncipe. — Faço uma careta. — Mais do que deveria.
Seu rosto fica ainda mais preocupado. Se recosta nos travesseiros da
cama.
— Oh, Anna, e por que isso é ruim? — pergunta com suavidade.
— Não temos futuro juntos, Ella. — Pronunciar isso em voz alta me
causa um aperto doloroso no peito. — Ele tem um dever com seu povo.
Precisa fazer um casamento de Estado.
Ela fica calada por um tempo, seus olhos verdes cheios de empatia
para mim. — Pelo que Mike me conta, Kamar é um emirado muito
conservador. — Concorda, triste.
— Por outro lado, se depois de tanto tempo seu coração se abriu
para outra pessoa, talvez deva tentar conversar com o príncipe. Você já
disse a ele como se sente?
Eu bufo. Foda-se o cretino!
— Não, eu não disse e não vou dizer. — Ranjo os dentes. — O
imbecil estava brincando comigo. Todos aqueles passeios estúpidos eram só
para entrar na minha calcinha. Ele tem a porra de um baile marcado para
sábado onde vai escolher uma cadela treinada.
— Uma cadela treinada? — Franze a testa.
Reviro os olhos.
— Sim, uma esposa adequada, dessas que pulam num pé só,
colocam a língua para fora e rolam no chão, se o honorável príncipe
ordenar. — Explico, meu despeito claro.
Minha prima acaba rindo da minha analogia. Faço carranca e ela
põe a mão na boca, contendo o riso. Seus olhos vão se iluminando com algo
depois de um instante. Ela tinha esse mesmo brilho quando decidiu ir atrás
de nosso primo e tornar a vida dele muito difícil…
— Onde está a minha prima ousada que me aconselhou ficar nua no
quarto de Mike? — pergunta, levantando uma sobrancelha travessa.
Ops… Rio. Culpada. Eu realmente lhe dei esse conselho. Valeu
totalmente a pena, pelo que ela me contou depois.… Gemo, me sentando na
cama.
— Eu acho que não é tão fácil quando é com a gente, prima —
zombo.
Ela sorri, terna.
— Si, prima, nunca é fácil quando sentimos na pele — concorda. —
Você disse que está se dando bem com Nuria, não é? — Assinto, sem
entender aonde quer chegar. — Ela é a chave, principessa mia — diz com
um ar de sabichona. — Você vai pedir a ela que a leve ao melhor estilista da
capital e vai encomendar o vestido mais arrasador.
— O que…
— Ainda não terminei, ouça. — Ralha. — Você vai se vestir com os
trajes típicos de uma princesa árabe, Anna. Mostre a esse príncipe o quanto
será um grande tolo se não escolher você, prima.
Me levanto, suas palavras me inflamando, fazendo um sorriso
satisfeito rastejar em minha boca. Eu não disse que Ella só tem uma carinha
de boneca delicada? Essa menina não é de brincadeira.
— Ele é um grande tolo, um idiota completo. — Desdenho e ela ri,
sabendo que estou de birra. — Mas não posso negar que sua ideia é
esplêndida, Ella!
Minha prima sorri satisfeita e seus olhos verdes ficam ainda mais
perversos quando murmura:
— E se tiver um carinha que possa dar atenção nesse meio-tempo?
— Sorri baixinho e olha de lado. Percebo que Mike deve estar no quarto. —
Nada como uma boa concorrência para fazer os príncipes tolos ficarem bem
espertos, carissima.
— Com quem está falando, boneca? — Ouço a voz do meu primo
em segundo plano.
— Com Anna, amore mio. Não demore a vir para a cama. — Ela diz
na sua melhor voz melosa para o marido.
— Já estou concluindo aqui, princesa. Vou beijar você inteira
quando chegar aí… — Mike responde.
Uh. Reviro os olhos e ela sorri, malícia e safadeza tomando seu
rosto.
— Entendeu meu ponto, prima? — Balança as sobrancelhas, se
parecendo muito comigo mesma neste momento. — Nunca pensei que diria
isso, mas é hora da velha e boa Anna balançar um pouco as estruturas da
Arábia.
Rio alto e em seguida finjo choque:
— Oh, prima, é sério que está me incentivando a ser mal
comportada? — Ela sorri, seus olhos brilhando na nossa velha
cumplicidade. A imagem de Zafyr, o irmão de Jalal, espoca em minha
mente e meu sorriso se torna muito malvado quando sussurro: — Traje das
mil e uma noites, anotado. Outro príncipe, que por acaso é o primo do
honorável, anotado!
Tornamos a rir alto. Mike pergunta o que é tão engraçado. Eu grito
que sua mulher é um perigo e ele ri, concordando. Quando me despeço,
minha mente já está girando, criando mil cenários para esse baile.
No dia seguinte, Nuria me mostrou que as princesas árabes também
sabem provocar uma boa cena de ciúmes. Ela adorou a ideia de Ella e
fomos a Jawahra, na sua estilista particular. A moça muito simpática
pareceu verdadeiramente encantada em vestir uma princesa ocidental com
trajes do Oriente.
— Acha que Zafyr não vai se ofender por eu estar usando-o de
forma descarada? — pergunto preocupada. Nuria desvia a atenção da janela
e me olha. Estamos numa das limusines reais voltando para o palácio. O sol
está se pondo no horizonte. A tarde foi muito proveitosa e divertida.
Aproveitamos para ir ao mercado e acabei comprando alguns hijabs[22]
coloridos para usar quando formos para o deserto. Comprei uns lindinhos
para Ayla também, embora Nuria tenha me deixado a par de que as meninas
só começam a usar o hijab quando entram na puberdade. A pequena vai
adorar fazer farra comigo em privado.
— Meu cunhado é o rapaz mais apropriado para o que está
planejando, acredite-me, Anna. — Nuria sorri, e isso a deixa ainda mais
bonita. Ela é uma morena curvilínea de grandes olhos amendoados. Gosto
dela. Tem sido muito simpática comigo desde que fomos apresentadas. —
Zafyr pode levá-la para sair, circular fora do palácio, ele conhece algumas
“baladas” quentes, como costuma dizer.
Eu bato palmas, eufórica. É um bom plano. Não me sentirei como
uma mercadoria usada e deixada de lado quando entrar naquele baile.
Discutimos os detalhes, isoladas pela divisória, para não chocar o motorista.
Todavia, quando o carro para no pátio central, ladeado de palmeiras
majestosas, noto alguns carros pomposos mais à frente. Nuria emite um
som abafado e me olha com pena.
— Mais candidatas chegando… — murmura.
Meu íntimo retorce, meu coração saltando, e não de um jeito bom. A
limusine para e descemos. Mesmo que não queira, meus olhos vão para a
pequena comitiva à frente da escadaria e tudo termina de piorar quando o
vejo lá, sorridente, recebendo suas candidatas virgens perfeitas. Nuria
confirmou para mim que a noiva do príncipe precisa ser virgem, pura. Ando
ao lado de minha amiga, precisando passar por eles para alcançar o elevador
que leva aos meus aposentos. Ela aperta meu braço sutilmente, me passando
sua empatia, e pega o desvio do jardim que leva à ala leste, onde reside com
a família. Eu sigo em frente, andando com uma elegância e calma que estou
longe de sentir. Ele levanta a cabeça, seu olhar se fixando no meu enquanto
me aproximo do pequeno grupo. Ofego, meu corpo se descontrolando sob
seu olhar penetrante. As imagens de nós dois naquele estábulo invadem a
minha mente.
Minhas mãos ficam frias, suadas. Seu gosto, seu corpo junto ao meu
se confundem com sua imagem bem-composta de príncipe recepcionando
as potenciais esposas. Eu estava errada, continuo me sentindo como
mercadoria usada e descartada. Meus olhos ardem e os desvio dos seus. Me
obrigo a engolir o orgulho, a dor persistente em meu coração e abro um
sorriso ao chegar perto do grupo. Cumprimento-os como manda a boa
educação e subo os degraus. Talvez eu só deva ir embora de uma vez. Penso
ao entrar no elevador. Me encaro na parede espelhada. Estou pálida, meus
olhos cheios de lágrimas. Abaixo a cabeça, ciente de que há câmeras aqui,
não quero dar o gosto de ninguém me ver chorando.

Dois dias depois…


Eu giro na frente do espelho, soltando um suspiro. Estou usando um
macacão pantalona vermelho-escuro de tecido fino. As pernas possuem
aberturas laterais, indo até as coxas. Sandálias de tiras enroladas nos
tornozelos. Meus cabelos presos numa trança, suspensa num rabo de cavalo
no meio da cabeça. Caprichei na maquiagem também, batom vermelho-
sangue dando-me minha ousadia de volta. Era para estar animada porque
Zafyr tem sido muito atencioso desde que lhe contatei e perguntei se
gostaria de me mostrar a noite de Jawahra. Ele é um gato também, não será
nenhum sacrifício sairmos. Exceto que não é ele quem eu gostaria que
estivesse indo me mostrar os encantos noturnos da capital. Exalo,
segurando meu colar, tentando buscar a força que sempre encontrei em Nate
durante todos esses anos. Minhas emoções estão confusas, conflitantes
desde que coloquei os olhos sobre Karim, naquele cativeiro. Fecho os
olhos, lamentando as coisas não serem diferentes.
— Só mais quinze dias — digo-lhe. Então, estarei em casa, em
segurança. — Eu vou esquecê-lo, prometo — murmuro, não acreditando
realmente nessa promessa. — Eu preciso esquecê-lo — corrijo-me.
A campainha toca e meu estômago se agita. Sempre que ouço o
som, meu coração dispara desejando que seja Karim. Porém, ele não
apareceu mais. Nos vimos apenas duas vezes nesses dias, no quarto de
Ayla. Agora que tem muitas opções, fui deixada de lado. Pego minha
carteira, guardando o celular dentro, e marcho até a porta. Zafyr está lá,
todo bonito numa jaqueta de couro preta e calça jeans escura. Uau. Temos
um príncipe rebelde, meninas. Sorrio. Eu vou precisar de doses disso para
conseguir passar por esses dias. Ele sorri e isso o deixa parecido com seu
maldito primo. Droga. Eles são da mesma família, claro que possuem
semelhanças, Anna.
— Marhabaan[23], ‘amira. — Cumprimenta, estendendo a mão. Meu
peito aperta ao ouvi-lo me chamando de princesa em sua língua.
Novamente, Karim invadindo meus pensamentos. Sua voz tem um tom
mais profundo quando me chama assim. Quando chamava assim, Anna.
Pare de ser tola e vá se divertir com o gato do primo e expulse o príncipe da
sua cabeça, agora! Ordeno-me. — Você está linda!
— Zafyr, Marhabaan! — Coloco o máximo de empolgação em
minha voz e abro meu melhor sorriso. — Shukran. — Pego sua mão e
levanta a minha até a boca, depositando um beijo galante.
Ele abre aquele sorriso charmoso que o deixa muito parecido com
vocês sabem quem. Oh, Jesus.… Gemo mentalmente. Terei que passar a
noite com o genérico enquanto sonho com o original. Fecho minha porta e
sua mão pousa em minhas costas, meu decote é baixo, sinto sua pele na
minha, mas isso não me causa nenhuma emoção. Nenhumazinha. Ele
começa a me falar sobre a casa noturna que estamos indo e é nesse
momento que uma figura alta vira a esquina para este lado do corredor.
Engulo em seco, minhas entranhas entrando em ebulição ao ver a razão da
minha aflição lá, todo lindo numa camiseta preta de mangas compridas,
puxadas, deixando os antebraços musculosos à mostra. Uma calça escura.
Ele fica deslumbrante de preto, me encantou desde o primeiro momento.
Sua cabeça levanta e Karim diminui os passos, seu rosto transparecendo um
pouco de surpresa. Observo cada nuance à procura de algo, qualquer coisa
que me faça sentir menos insignificante.
Noto seu maxilar apertando enquanto seus olhos escuros me bebem
inteira. Meu corpo esquenta, não posso controlar, infelizmente. Lamento.
Ele continua vindo devagar, seu olhar subindo lentamente pelo meu
comprimento até se fixar no meu. Estremeço com a fome que vejo em seu
rosto. Seus olhos me devoram, intensos, penetrantes e ficam ainda mais
selvagens quando desvia a atenção para seu primo. Paramos frente a frente
no corredor.
— Ei, primo! — Zafyr parece estar alheio ao olhar de morte que
Karim está lhe dando. — Quase não nos vimos esses dias. Semana agitada,
hein? — Percebo um tom de provocação do primo mais novo.
Karim emite um som baixo em sua garganta, se aproximando de
Zafyr, e diz uma enxurrada de palavras em árabe, mas parece um dialeto
secreto. Não consigo entender nada. Merda.
— Claro, Amihaj. Relaxa. — O primo ri com uma cara de quem
está adorando isso.
Karim bufa, ainda fuzilando o primo, porém o abandona, seus olhos
se fixando nos meus outra vez. Arfo baixinho e ele anda, ficando bem perto,
seu antebraço nu roçando no meu. Ondas de eletricidade disparam em
minha pele, arrepiando-a. Seu rosto vem mais perto. Eu pisco, nervosa,
meus seios ficando pesados, minha vagina umedecendo.
— Alteza. — Cumprimento-o em tom talvez um pouco mordaz, não
posso evitar. Seus olhos se estreitam.
— Indo conhecer a noite de Jawahra, princesa? — pergunta em tom
tenso. — Espero que consiga se divertir.
— Farei isso, meu senhor — zombo de seu tratamento cerimonioso.
— Da mesma forma que deve ter desfrutado do jantar com o seu harém. Por
falar nisso, dê meus cumprimentos a Latyfa. — Dou um risinho debochado
e murmuro: — Realmente uma boa estratégia essa de manter as coisas em
família… — Seu rosto fica tenso, mas depois relaxa, um meio-sorriso
brincando na boca bonita, os olhos negros presos aos meus. Querendo ser
má, precisando disfarçar o quanto estar perto dele me desestrutura, pisco
maliciosamente e adiciono: — Tomei a liberdade de fazer o mesmo. Espero
que não se importe.
Ele meio que rosna, os olhos voltando a ficar selvagens. Oh, isso
será interessante. Preciso agradecer à minha prima por ter trazido a velha
Anna à tona. Karim me olha insistentemente por um tempo longo demais.
Ficamos na costumeira queda de braço, respirações alterando. Se inclina
mais, a boca vindo para meu ouvido. Sinto-o me cheirando, a ponta do nariz
esfregando em minha pele. Meus joelhos tremem, as pernas ficando
moles… A reação visceral causando um estrago em minhas entranhas.
— Você está linda — sussurra asperamente e eu fecho os olhos,
quase gemendo ao ouvir sua voz, esse tom. — Linda demais, e estou
tentado a quebrar a mão de meu primo idiota por ousar tocá-la. — Não
quero, mas uma alegria idiota rasteja para dentro de mim com o ciúme que
percebo em seu tom. Me afasto, lutando para me manter no controle de meu
corpo e coração. Nossos olhos se prendem e sinto os meus arderem. Eu o
quero, meu Deus. A vontade de estar em seus braços me esmaga. É preciso
muito esforço para manter minha pose fodona. Seu rosto e olhar suavizam e
sua mão estende, tocando meu rosto. — Cuide-se, ‘amira.
E então passa por nós, seguindo seu caminho. Literal e
figurativamente. Meus olhos se enchem de lágrimas e eu me forço a fazer o
mesmo.
CAPÍTULO SEIS
“Mas, eu sobrevivi. Eu ainda estou respirando. Ainda estou respirando…
Eu estou vivo! Eu estou vivo!”
(Sia – Alive)

Anna Julia
Saímos da limusine para o ar quente de Jawahra. O prédio do clube
é todo iluminado por arandelas. Amarelas, alaranjadas, verdes, num
espetáculo de luzes. É uma construção moderna em meio aos prédios do
centro histórico. Mais adiante, pode-se avistar o Museu Islâmico, uma
magnífica obra de arte em forma de construção na orla da única praia
liberada ao público. As outras são pagas e o acesso é só para quem tem
muita grana. É uma cidade linda, exótica, sofisticada, fascinante. Como o
seu príncipe. A voz estraga-prazeres buzina na minha cabeça. Rolo os
olhos. Zafyr coloca a mão em minhas costas e me guia por um caminho
estreito, cortando um jardim extravagante, pequenas luminárias ladeando os
blocos. Há uma fila enorme de pessoas aguardando entrada. Os seguranças
se curvam e retiram o cordão de isolamento imediatamente. Zafyr sorri do
seu jeito fácil e descontraído e dá tapas amigáveis nos ombros dos caras
grandes.
Ele é mesmo um príncipe rebelde, não é? Sorrio, gostando de ter
saído daquele palácio. Dois guarda-costas de Zafyr nos acompanham
discretamente. Puxo uma respiração profunda, olhando em volta, me
sentindo livre. Minha nossa, eu estava mofando naquele quarto! Ainda bem
que Ella me deu uma situada. Karim vai se casar com uma cadela treinada?
Bem, foda-se! Vou me esbaldar hoje, bebendo e dançando, amanhã volto a
pensar sobre o assunto desagradável. Estamos em um clube de dança latina,
pedi especificamente por algo assim para Zafyr. A essa altura já perceberam
que tenho um fraco por música latina, não? Pois é, meu pai cresceu no
Brooklin, o bairro mais latino de Nova York. Aprendi com ele a gostar
desse estilo musical. Minha mãe também ouve muita música espanhola,
então, foi muita influência. Apenas Lipe não curte essa vibe lá em casa.
Entramos no prédio e o clima ameno do ar-condicionado me acolhe.
Suspiro, meus olhos correndo satisfeitos pelo ambiente, confirmando ao
vivo o que vi pela página online. É um clube de luxo, com três pisos, bares
estrategicamente dispostos nos quatro cantos dos ambientes. Visto que é um
clube dançante, as pistas ficam desobstruídas, centralizadas, abaixo de três
degraus. Está tocando uma salsa agitada, muita gente dançando e meu corpo
começa a acordar, ansioso para mostrar alguns passos. Zafyr me garantiu
que dançaria comigo e não me faria passar vergonha.
— Quer tomar algo antes de deixar os caras babando ao redor da
pista, princesa? — Sorri, meio de lado. O cara está tentando sua sorte
comigo agora. Acha que pode transformar isso em um encontro de verdade.
A suspeita deve transparecer na minha cara, porque ele sorri mais uma vez.
— Não estou te cantando, Anna. Amihaj ameaçou cortar meu pau e mãos se
fosse além de um anfitrião agradável para você.
Não posso evitar, meu coração tolo gosta de ouvir que o príncipe
idiota está com ciúmes de mim. Ou talvez seja apenas o complexo do
brinquedo deixado de lado. Freud explica. Sorrio, me sentindo mais como
eu mesma esta noite. Quer o brinquedo de volta? Que pena, Alteza. Zombo.
— Alguns shots de tequila, para começar! — Digo com empolgação
e Zafyr arregala os olhos. — O quê? É um clube latino, amigo, não vou
pedir um Cosmopolitan de jeito nenhum! Vamos entrar no clima! —
Balanço meus quadris para enfatizar e ele gargalha.
— Você é como uma explosão de fogos de artifício, princesa. —
Uma expressão conhecedora se espalha em seu semblante. — Posso
entender o porquê meu primo está tão louco por você.
Novamente, meu coração salta ao ouvir isso.
— Ele não está — rebato, deixando-o me guiar pelas laterais do
salão sofisticado, desviando das mesas até um dos bares no canto. Há gente
bonita e animada por todos os lados, e sorrio satisfeita por conseguir sair e
pelo menos fingir que o idiota do príncipe não me afeta.
— Está, vai por mim — afirma, me ajudando a acomodar-me num
dos bancos vazios na extremidade do balcão. Pede uma garrafa de tequila e
sorrio largamente. O bartender, um loiro de olhos verdes risonhos,
providencia tudo, dispondo a bebida, o sal e as fatias de limão numa
travessa de prata sobre a bancada. Isso é o que chamo de beber tequila em
grande estilo! Deslizo a língua no dorso da minha mão e salpico sal,
lambendo-o. Pego o shot, viro-o com tudo na garganta, em seguida, chupo
uma fatia de limão. — Tenho que dizer, se meu pau não tivesse sido sofrido
ameaças, eu investiria em algo mais. — Seu olhar está aquecido em minha
boca. — Você é o meu tipo de garota, princesa. — O safado pisca e toma
seu shot.
Porque quero manter minha ousadia, eu pisco de volta.
— Você é mais divertido do que seu primo — digo levianamente.
— Amihaj tem um dever com seu povo, Anna. — Ele aponta e fico
contente em ver que não aproveitou a deixa para falar mal de seu primo. Já
notei que Karim mantém uma relação de carinho com seus primos. O
mesmo não pode ser dito sobre o tio Jafar. Urgh. Estremeço só de pensar
naquele homem arcaico. Está preso a valores de uma sociedade antes de
Cristo, com toda certeza. Debocho. — Não é fácil ser um governante.
Ainda bem que não herdei o trono. — Ele gargalha. — Eu não saberia o que
fazer com ele.
É a minha vez de rir. Ele é divertido. A noite não será um completo
suplício como pensei quando encontramos Karim no corredor antes de
sairmos. Ele todo lindo de negro, os cabelos presos no coque que eu amo.
Droga, não ama não, Anna! Tenha um pouco de decência, garota! O cara
vai escolher uma esposa no sábado. Esqueça-o! Agora! Ordeno-me e tomo
outro shot. A bebida começa a se espalhar em minha corrente sanguínea e
me sinto bem, muito bem.
— Então, você vai me tirar para dançar em algum momento? — O
atiço. Ele torna a rir. O DJ muda para um ritmo cubano e exclamo, tornando
a mexer os quadris: — Adoro essa!
— Definitivamente uma explosão de fogos, ‘amira — provoca,
virando outra dose. — Sorte a minha que está comigo esta noite.
Balança as sobrancelhas sugestivamente e rolo os olhos para seu
flerte barato.
— Não vou transar com você, querido. Então talvez não tenha tanta
sorte assim. — Desdenho e seu rosto fica chocado, depois explode numa
gargalhada.
— Porra, meu tipo de garota. Odeio o meu primo nesse momento —
resmunga baixinho.
Tomamos mais um shot e seus seguranças se aproximam à mínima
inclinação de cabeça de seu chefe. Os homens grandes cercam o balcão,
guardando nossa bebida e lugares. Aproveito e deixo minha carteira sob
seus cuidados, enquanto Zafyr pega minha mão, me conduzindo para os
degraus de acesso à pista. Descemos e nos viramos de frente. Sua mão pega
minha cintura com firmeza e, então, o irreverente príncipe me prova que
realmente dá uma boa diversão para uma garota. Nós dançamos no ritmo
quente cubano, salsa, rumba. Já estou suada, colocando toda a frustração na
dança. Eu me jogo, rebolando, gingando e Zafyr não fica atrás, me
conduzindo com a desenvoltura de quem é frequentador assíduo de baladas.
Nuria estava certa, seu cunhado era tudo que eu precisava para me divertir
um pouco.
Damos uma pausa, voltando para o bar, onde bebemos mais shots e
rimos das besteiras ditas um pelo outro. Acabo pedindo um Cosmo porque
eu amo esse drink. É uma coisa minha e de Ella, o que me lembra de que
temos que marcar uma noite de meninas depois que der à luz à minha
afilhada. Peço uma cerveja também e Zafyr parece bem impressionado
comigo e minha resistência ao álcool. Mas a verdade é que já estou um
pouco tonta, me sentindo mais leve e atrevida. Quero mais diversão! O
arrasto para a pista de novo, danço e danço sem me preocupar com nada
mais. Em dado momento, quando olho na direção de onde ficaram nossas
bebidas, engasgo. Karim está lá em pé, perto dos seguranças, uma carranca
em sua linda cara. Usa a mesma roupa de quando nos encontramos antes.
Minha libido não será contida depois da quantidade de álcool que ingeri.
Seus olhos negros estão cravados em meu corpo, subindo faminto
até que se fixam nos meus e resfolego, minhas entranhas sofrendo espasmos
de prazer. Droga, eu não disse? Adeus, controle. Porém, gosto de saber que
veio atrás de mim. Ele veio por mim, não foi? As bebidas em meu sistema e
seu olhar intenso fazem o líquido grosso de excitação molhar minha
calcinha. A música acaba e Zafyr beija minha mão galantemente.
— A cavalaria chegou, princesa. Faça o seu pior. — Pisca
maliciosamente e vira as costas, sumindo por entre os casais na pista.
Antes que possa sequer pensar, um braço forte está me puxando
contra um corpo grande e duro. Ofego, meus sentidos sendo incendiados
pelo cheiro dele. Levanto meu rosto encontrando o seu bem próximo. As
luzes diminuem neste lado da pista e outra música inicia. Não é latina, é
árabe, um som instrumental sensual e uma batida alegre, porém mais lenta.
— Dance comigo. — Sua voz é rouca, quase rude, e não tenho
tempo de negar, pois ele já inicia os passos. Seguro sua mão esquerda para
não me desequilibrar e pouso a minha esquerda em seu ombro. Me puxa
com mais firmeza, colando nossas frentes, e meu corpo inteiro estremece.
Ah, meu Deus… Karim ri, perverso, sabendo que por mais que eu
esperneie, me rebele, estou completamente louca por ele. Minha respiração
está ainda mais errática agora. Ele abaixa a boca perigosamente perto da
minha, seus olhos flamejando, me devorando. E nós dançamos. Já ouvi e vi
vídeos de música árabe, embora nunca tenha tentado dançar, me deixo ser
conduzida por ele. Suas coxas fortes roçando nas minhas. O ritmo
instrumental vai ganhando força, a sensualidade do som, o governante de
tudo isso me apertando em seus braços. Estou ofegando, salivando para
sentir seu gosto de novo. Ele também quer, o sinto duro, pronto, pulsando
contra o meu ventre.
Não conseguindo resistir mais, eu giro meus quadris, me esfregando
o máximo que posso nele e em sua enorme ereção. Nossas bocas se abrem,
desejosas, respirando uma na outra. Seu braço está enrolado firmemente em
minha cintura. Eu juro que posso gozar apenas assim, nos olhando e nos
esfregando no ritmo da música. Aproveitamos a escuridão e nos movemos
com mais e mais paixão, nossa tensão sexual sendo elevada à máxima
potência. Não falamos nada. Não precisa. Está tudo em nossos olhares, que
nunca se desgrudam. Seu nariz desliza pelo meu rosto de forma quase
reverente, então me lança num giro rápido para o lado. Eu acho que agora
ele misturou um pouco os ritmos. Rio, me permitindo aproveitar o
momento. Amanhã vou analisar essa merda direito, prometo. Mas agora,
agora eu só preciso dos seus braços à minha volta. Volto para ele, mexendo
os quadris sinuosamente. Suas mãos seguram minha cintura e me puxa
diretamente em seu pau.
— Karim… — Convulsiono, gemendo, completamente enfeitiçada
pelo príncipe e música exóticos.
Ele geme com aspereza, subindo uma mão pelas minhas costas, e
pega minha trança, dando um puxão. Ofego, me molhando toda. Droga. Ok,
retiro o que disse mais cedo, o honorável príncipe consegue ser divertido.
Sua boca vem para o meu queixo e seus dentes raspam em minha carne
numa mordida gostosa, safada. Meu Jesus.… Cada centímetro da minha
pele formiga, pulsa, implorando pelo seu toque. Então, novamente, me
lança num giro para o salão. Dessa vez me solta e continuo girando,
acrescentando o balé, já que ousou misturar o ritmo latino. As aberturas do
meu macacão tremulam, ar frio entrando em minhas pernas. Eu volto para
ele, seus braços enrolando em minha cintura imediatamente. O abraço pelos
ombros, respiramos forte, nossas bocas quase se tocando. Nossos
movimentos vão ficando mais lentos, nossos olhares fixos um no outro,
devorando-nos sem qualquer contenção nesse momento.
— ‘Amira… — Murmura contra a minha boca. Com um mordiscar
suave em meu lábio superior, ele para a dança. — Vamos para casa. —
Grunhe se virando e, sem aviso, uma mão se fecha em meu pulso, não me
dando outra alternativa a não ser me deixar ser praticamente arrastada. As
luzes voltam a ficar claras e uma comoção se inicia quando o público nos
nota juntos. Celulares apontam para nós e em instantes somos cercados por
homens enormes (sua segurança). Meus saltos dificultam caminhar mais
rápido e me assusto quando ele me levanta nos braços. O seguro pelo
pescoço e encosto minha cabeça em seu peito enquanto nos leva
rapidamente por um corredor. Logo estamos saindo para o ar abafado da
noite. É um pátio e noto o helicóptero pousado no centro. Ele abre a porta
do passageiro, me acomodando e puxando o cinto. Fico calada, não
confiando em mim ou no que pode sair da minha boca alcoolizada.
Karim também não disse nada na viagem. Quando pousamos, me
ajuda a descer e andamos lado a lado, tomando o corredor para nossos
aposentos. Estou numa confusão de sentimentos e hormônios. Olho-o,
bebendo seu porte alto, todo de negro, o coque sexy. Ele olha de lado, me
flagrando no ato. Seu maxilar trinca, seus olhos fervendo, e volta a olhar à
frente. Quando chegamos à minha porta, paramos, a tensão sexual ainda
pairando sobre nós.
— Entre, Anna. — Rosna, o olhar selvagem.
— Por que foi lá, Karim? — Pergunto, querendo ouvi-lo admitir que
está com ciúmes. Ele fica calado, engolindo audivelmente. — Será que o
seu harém te deixa duro como eu deixo? — Minha embriaguez guia minhas
palavras. Ele ruge e no instante seguinte está girando a maçaneta da porta,
abrindo-a. Numa rapidez que faz minha cabeça girar, me empurra para
dentro do quarto e me espreme contra ela, seu pau ainda duro esfregando
em meu ventre. — Eu acho que isso é um não. — Rio atrevida.
— Você é muita tentação para um homem, porra. — Suas mãos
pegam meus ombros e deslizam pelos meus braços nus. Convulsiono
escandalosamente com seu toque. Sua boca roça na minha e arrepios
eclodem em minha pele, ofego, entreabrindo meus lábios, quase implorando
por um beijo. — Será que meu primo te faz tremer assim, princesa? — Seu
tom é desafiador também.
— Isso não é da sua conta. Me faça um enorme favor, vá cuidar das
suas virgens perfeitas e me deixe em paz, Alteza — digo com petulância.
Um sorriso lento vai se espalhando em sua boca e me assusto quando pega
minha trança outra vez e dá um puxão firme. Um gemido esganiçado sai da
minha boca e ele rosna, mordiscando meus lábios. Estou tão molhada agora
que tenho até vergonha de falar.
— Sim, é da minha conta. Está despeitada porque você não é uma
virgem? — Tem a audácia de me provocar e o álcool mais uma vez dá uma
força na minha ousadia.
Sorrio maliciosa e sussurro com deboche:
— Bem, eu nunca fiz anal, será que serve, honorável Alteza? — Ele
engasga, as narinas inflando, os olhos ficando em brasa. — Eu acho que
serve. — Continuo atiçando-o. Ele rosna e torna a puxar minha trança.
— Você quer me matar de tesão, não é, princesa? — murmura e,
então, sua boca mergulha na minha.
Volto a estremecer sem controle ao sentir seu hálito quente com
gosto de uísque. Um gemido torturado sai dos seus lábios. Um braço enrola
em minha cintura, colando-nos gostosamente e me entrego, suspirando,
arfando de tanto desejo. Sua língua lambe a costura da minha boca e a abro,
lhe dando passagem. Gememos os dois. Pego seus ombros, sentindo seus
músculos tensos, e toco-o até a nuca, meus braços cingindo seu pescoço.
Ele geme rouco, a mão descendo para a minha bunda, apertando, sovando.
Murmuramos os nomes um do outro, nossas línguas numa dança insinuante
como a que fizemos no clube. Seus lábios me sugam toda, boca, língua,
raspa os dentes, lambe. Meu Deus, nunca fui beijada dessa forma, com essa
fome. Tento imitá-lo. Minha bravata é apenas na teoria. Domino a logística
da coisa, mas na prática a coisa se complica.…
Ele não me dá tempo para pensar sobre minha falta de experiência,
me devora, me levantando pela bunda. O abraço com as pernas,
choramingando quando o cume duro esfrega em meu centro. Chupa a
minha língua tão gostoso que me liquefaço em seus braços. Sua boca arrasta
pelo meu rosto, indo para o ouvido, onde mordisca meu lóbulo, sugando-o
depois. O quadril não parando de empurrar no meu. Sua boca desce mais
pelo pescoço. Ele geme, me chupando com força. Minhas unhas arranham
suas costas. Estamos os dois fora de controle. Sua boca continua descendo
pelo colo, lambendo, beijando cada centímetro de pele que encontra até
encontrar o seio direito. Karim o chupa por cima do tecido e em seguida
olha para mim, seus olhos intensos e famintos nunca deixando os meus
enquanto desce a alça do macacão. Olha para meu seio nu e volta a me
encarar. Estou pegando fogo. Ele abaixa a cabeça e uma enxurrada de
excitação inunda minha vagina ao sentir sua boca morna engolindo meu
seio.
— Ahh, Jesus… — Choramingo, sentindo-o chupando minha
auréola inteira. Seguro sua cabeça, arqueando-me, me dando a ele. Rebolo
contra seu pau, procurando mais fricção para acabar com essa dor oca entre
minhas coxas. Ele puxa a outra alça e muda para o outro seio, mordendo o
bico delicada e depois perversamente. — Por favor… — Balbucio e ele
rosna, me chupando com mais força, alternando entre um seio e outro.
— Eu quero você, ‘amira. — Sua voz é áspera como lixa. — Me
deixe tê-la.
— Sim.… Me tenha — digo fora de mim, puxando sua boca de
volta para a minha. Nos beijamos com mais ânsia, nossas bocas gulosas
tomando tudo um do outro. Ele desce o zíper frontal do meu macacão e
segura meus seios, amassando-os com fome. Pego sua camiseta pela barra,
começando a puxá-la. Gememos completamente entregues. E é nesse
momento que seu celular começa a tocar. Karim faz um som de desagrado e
ignora o aparelho, deixando tocar até ir para a caixa postal. O alívio não
dura muito, logo recomeça a tocar.
— Amihaj, atenda à porra do telefone, primo! Estou aqui fora,
ouvindo a merda tocar. — Vem a voz sussurrada de Jalal do outro lado da
porta.
Paramos no mesmo instante, congelados. Nossas respirações estão
ofegantes e agora um tanto frustradas. Ele encosta a testa na minha e fecha
os olhos com força.
— Jalal, eu juro que vou te matar…
— Odeio interromper, primo, mas é sério, jogaram um vídeo de
vocês no clube por toda a internet! — O primo de Karim rosna através da
porta e de novo gelo.
— O quê?! — Exclamamos em uníssono.
E agora a excitação foi pelo ralo. Respiro longamente, tentando
entender como viemos parar aqui, arrancando nossas roupas, prestes a
transar contra a minha porta. Meu Deus, onde estava com a merda da minha
cabeça? Ele deve ver minhas emoções estampadas em meu rosto, porque
toca meu queixo suavemente.
— Não, não se arrependa disso — murmura. Seu tom e rosto são
torturados, mas seus olhos me dizem que também sabe que estávamos indo
longe demais. — Sinto muito, ‘amira. — Essa frase me diz que nosso
momento passou.
— Pare de dizer que sente muito. É a pior coisa que uma garota
pode ouvir depois de quase se entregar a um cara que não pode ser dela.
Sua mandíbula trinca e ele torna a fechar os olhos, praguejando em
sua língua. Então se afasta e passamos a nos recompor em silêncio
sepulcral. Ando para dentro da sala e o deixo receber Jalal, me sentindo
muito envergonhada pelo que quase deixei acontecer. Vou ao banheiro e
jogo um pouco de água no rosto. Enxugo-me e volto para enfrentar minha
realidade. Os dois estão conversando freneticamente em árabe.
Compreendo que Karim está muito irado por estar exposto outra vez na
internet. Jalal lhe garante que já acionou os advogados para controle de
danos, mas que seu pai está possesso. Rolo os olhos, imaginando o que o
homem está falando sobre mim.
Mas esse não é comprometedor. Deve ter sido do momento em que
saímos na parte clara e o público nos notou. Não há realmente um controle
de danos. Me aproximo e pergunto só para confirmar:
— Qual o teor do vídeo?
Os dois se entreolham. Karim parece tenso, mas estende seu celular
aberto num vídeo do YouTube. Clico na tela para iniciar a reprodução e
engasgo. Oh, Jesus… Esse é da nossa dança. Mesmo escuro, dá para ver
que somos nós perfeitamente. E a forma como nos movemos, sensuais,
colados, nos esfregando quase de forma indecente. Nossos olhares se
devorando. Uh. Fecho os olhos, mortificada. Lhe devolvo o aparelho e viro
as costas sem coragem para encarar ninguém neste momento.
— Anna… — Ele chama com uma porra de voz suave que é a gota
d’água para que eu exploda. Me viro, andando até ele, empurrando um dedo
em seu peito.
— Qual é a porra do seu problema, Karim? — pergunto, com raiva.
— Por que tinha que ir lá e arruinar tudo?
— Acalme-se. Está zangada pelo que houve depois e não o que
fizemos no clube. — Tem a audácia de dizer e eu rio da sua cara, mesmo
que esteja dizendo a verdade.
Meço forças com ele através de nossos olhares, então, suspiro
cansada disso tudo. É hora de deixar ir. Ele tem um dever pesando em suas
costas e jamais irá me colocar em primeiro plano. Ofego, lágrimas
queimando meus olhos. Pisco, tentando refreá-las, não desmoronar em sua
frente e de seu primo. Aquela mulher horrível tem razão, ele jamais me
escolheria. É melhor acabar com minhas esperanças estúpidas de vez.
— Farei um post em meu Instagram amanhã, esclarecendo a
situação — digo, meu tom sério. Ele me sonda enxergando de alguma
forma o que está em minha mente. — Direi que somos apenas bons amigos
e que tudo não passou de uma brincadeira. Seu baile ainda será crível, fique
tranquilo.
— ‘Amira… — murmura, seus olhos tão tristes quanto os meus.
— Por favor, não me fala outra vez que sente muito — peço e
coloco o máximo de firmeza na voz quando completo: — Você tem um
dever, cumpra-o.
— Por que sinto que está se despedindo de mim? — pergunta,
tentando se aproximar, mas levanto a mão e ele para.
— Porque estou — murmuro, me sentindo morrer por dentro. —
Não voltaremos a falar sobre isso. — Faço um gesto entre eu e ele. Olho-o
longamente, bebendo dele, cada detalhe do porte majestoso e lindo.
Lágrimas insistem em queimar meus olhos, lamentando tudo que não pode
ser. Ele vem para perto e, dessa vez, não tenho forças para afastá-lo. Nos
abraçamos. Esse abraço é diferente dos outros, é calmo, possuindo uma
tristeza e aceitação do nosso destino.
Jalal limpa a garganta e anuncia numa voz desconcertada:
— Eu vou esperar lá fora, Amihaj.
Sinto seus lábios beijando meus cabelos suavemente, e é com muito
esforço que não desmorono. Fecho meus olhos, inalando-o para guardar seu
cheiro, esse momento na memória. Ele se afasta devagar e nossos olhares se
encontram. Seus dedos acariciam meu rosto. Na verdade, é quase como se
estivesse memorizando o contorno. Toco seu rosto, amando a textura da
barba, guardando essa sensação também. Há um brilho feroz em suas íris
escuras que nunca vi antes, então fecha os olhos por um instante e quando
os reabre está mais controlado.
— Seja um grande rei, amiri — murmuro e seu semblante se
ilumina um pouco comigo o chamando de “meu príncipe”. Sua boca pousa
na minha no mais suave dos beijos.
— Seja feliz, nour Al sabah — murmura e então se vira e sai sem
me olhar novamente, o que é bom porque meus olhos estão transbordando
de lágrimas.

Karim Amihaj
Eu saio do quarto dela e passo por Jalal evitando encará-lo, ou meu
primo verá que meus olhos estão queimando com lágrimas. Sempre me
orgulhei de ser um homem forte. Sempre me orgulhei de ser filho de meu
pai. Mas, neste momento, tudo que sinto é que ser o herdeiro do trono é a
minha maldição. Entro em meus aposentos e vou direto para o bar, me
servindo de uma generosa dose do meu Bourbon mais forte. Ouço os passos
de meu primo atrás de mim. Ele se mantém calado, obviamente tendo a
confirmação do quanto a princesa é importante para mim. Tomo um grande
gole, a bebida queimando minha garganta é uma boa distração da
queimação no peito. Eu só queria poder mandar as tribos irem se foder e
tomá-la como minha rainha. Ser egoísta pelo menos uma vez e pegar o que
eu quero, o que meu corpo e coração estão clamando: Anna.
— Ela jamais seria aceita pelas tribos, Amihaj — Jalal diz, como se
lesse meus pensamentos. Sua voz está tensa.
— Eu sei, primo. — Respiro fundo, olhando para o deserto através
da minha varanda. Tomo mais um gole. — Cumprirei meu dever. —
Garanto, meu tom sem vida.
Ele fica em silêncio um instante.
— Talvez seja melhor enviar alguém para guiá-la pelo deserto,
primo. Nenhum de vocês tem condições de estar perto um do outro, pelo
que acabei de presenciar. — Sugere cautelosamente.
Ele está mais do que certo. Não temos estrutura para estarmos perto
sem cair em tentação, mas não posso ficar longe também. Esses quinze dias
no deserto serão tudo que terei dela pelo resto da minha vida infeliz ao lado
de outra mulher.
— Eu não posso. Sei que não posso estar perto, mas também não
quero ficar longe. — Exalo de frustração, olhando-o quando se apoia na
bancada ao meu lado.
— Você precisar deixá-la ir, Amihaj. — Me encara seriamente. —
Sei que não é o quer ouvir neste momento, mas é o melhor. Quanto mais
adiar, pior será quando ela for embora, primo. A princesa não é uma de nós,
por mais simpática e boa gente que seja, ela não pertence aqui.
Trinco os dentes e tomo mais um gole grande da bebida.
— Assunto encerrado. Vamos tratar do controle de danos na
internet. — Mudo o tema. Só que dessa vez vou baixar e salvar o vídeo
antes de ser removido. Vou assisti-lo sempre que a saudade dela bater.
Jalal passa a explicar que os advogados terão mais trabalho dessa
vez porque o vídeo foi postado em várias redes sociais, não apenas no
YouTube. Me preocupa a minha imagem, claro, mas também me preocupa a
imagem que o público fará de Anna. Estamos em uma região extremamente
conservadora, sobretudo, em relação à liberdade da mulher.
— Meu pai acha que deve escolher Latyfa. — Ele volta ao assunto,
como um disco arranhado. — Se me perguntar, não acho que deva escolhê-
la.
— Por quê? — pergunto, intrigado com sua observação.
— Porque aquela mulher me dá calafrios, primo. — Finge um
estremecimento. — Sim, ela é muito bonita, mas há algo nela que me
incomoda. Não sei bem o que é.
Viro o copo e bato na bancada. Sim, a mulher parece a porra de um
iceberg. Todavia, ganharia muitos pontos com as tribos escolhendo uma de
nós, pura. Anna zombou das candidatas virgens mais cedo. Em outros
tempos não acharia bonito ou ficaria excitado com a revelação descarada de
que é virgem apenas na bunda. Mas com ela, fiquei ainda mais louco para
tê-la, fazer todas as sacanagens ocidentais que aprendi em minha temporada
em Londres, mas não coloquei em prática com Yasmina porque era muito
tímida. Yasmina. Suspiro, me sentindo culpado por ter entregado meu
coração a outra. Mas não consegui evitar, foi tudo rápido demais. A
princesa chegou como um furacão, me levando em seu caminho.
— Latyfa pode ser uma opção — murmuro, desapaixonado. — Na
verdade, não descarto nenhuma. Pelas fichas são todas candidatas
potenciais.
Ele assente. Então, seu semblante fecha, como que recordando de
algo. Me fita parecendo incomodado. — O quê? — Antecipo-me.
— Al-Shalleen está implorando por uma audiência com você,
primo.
Meu corpo inteiro retesa, ira se infiltrando rapidamente em minhas
veias. Esse é o maldito que orquestrou o atentado que matou Yasmina. Sua
casa caiu em desgraça quando tudo veio à tona. O sheik El-Baham, pai de
Latyfa e tio de minha esposa, foi quem descobriu tudo e prestou um serviço
incomensurável ao reino, delatando o infeliz. O homem está preso há quase
quatro anos desde que tudo foi desvendado. Em todos esses anos ele nunca
quis me ver, então, por que agora? Pedir clemência em sua sentença de
morte? Bufo com escárnio. Sim, só pode ser isso, uma vez que a data da
execução está se aproximando.
— Diga a ele que só o verei quando estiver estrebuchando, pagando
com sua maldita vida por assassinar minha esposa e outros inocentes. —
Ranjo os dentes.
— Eu acho que deveria ir vê-lo, Amihaj. — Jalal opina, seu
semblante sério. — Sei que não deve ser fácil olhar na cara do homem. —
Exala pesadamente. — Mas ele está alegando haver coisas sobre o atentado
que não mencionou antes e que só falará para você.
Torno a bufar, irritado com o verme e sua ousadia.
— Ele só está querendo escapar da execução, Jalal. Diga-lhe que
tenho data e hora marcada para vê-lo indo para o inferno!
— Ei, calma, primo. — Levanta as mãos em trégua. — Me autoriza
a conversar com o infeliz? — pergunta. Meu primo quando cisma é páreo
duro. — Saberei se é conversa fiada.
— Faça-o. Então, o infeliz terá que aceitar seu destino — autorizo.
— A ideia da princesa é boa. Você devia se pronunciar também,
negando um envolvimento, visto que o baile será depois de amanhã… —
Faço uma careta. — Até mesmo um príncipe precisa se retratar numa
situação dessas.
— Não negarei nada e tampouco permitirei que a princesa o faça —
digo firmemente. — Estaríamos mentindo. Nos queremos, Jalal, e muito,
porra!
— Uh, não mate o mensageiro. — Me devolve a careta. — O povo
ficará em dúvida, primo. Sabe que mesmo quando os advogados
conseguirem tirar o vídeo de circulação, ainda ficará rodando porque muitos
baixam esse tipo de conteúdo — argumenta. — E deixe-me dizer, vocês não
parecem apenas apaixonados naquele vídeo, estão fazendo sexo a seco. Soa
como uma afronta da sua parte estando tão perto de escolher uma esposa,
Amihaj.
Respiro fundo, frustrado ao extremo.
— Merda, sim, ela me deixou louco de ciúmes do idiota do Zafyr —
admito, irritado, me sentindo possesso de novo. Quando a vi toda linda
naquele macacão sexy, marcando o corpo perfeito, aquela boca indecente
pintada de vermelho, eu quis matar meu primo conquistador, lentamente.
Jalal ousa sorrir da minha miséria. Faço uma carranca. — Não vou negar
nada, repito. Farei a merda do casamento de Estado, porém, não podem me
obrigar a dizer que não sinto nada por Anna. E não finja que tem alguém
fantasiando que me casarei apaixonado por uma das candidatas de sábado,
primo. Ninguém por aqui é tão ingênuo. Todos sabem que o casamento
serve unicamente para a minha subida ao trono.
— Certo, você tem razão. De uma maneira torta, mas tem. — Dá de
ombros. — Bem, então, vou indo. Preciso contornar os arroubos de meu pai
sobre o vídeo…
— Faça isso, primo. — Gemo acintosamente. — Não estou com
cabeça para ouvir meu tio dizendo o quanto a princesa é inadequada e
debochada, sendo que dessa vez eu fui o culpado.
— Ela o provocou, Amihaj, e você caiu direitinho… — Ele ousa
sorrir mais uma vez, o idiota.
Solto um grunhido. Sim, eu caí e cairia de novo se fosse para
experimentar o que tive com ela hoje. Beijá-la, tocar seu corpo do jeito que
me deixou tocar. Se meu primo não nos tivesse interrompido, teria me
enterrado nela ali mesmo, contra aquela porta. Meu corpo volta a inflamar,
recordando seu cheiro, o sabor de sua boca. A textura dos peitos firmes
quando os suguei com vontade, matando minha fome desde que os vi
através da camiseta molhada naquela cabana.
— Boa noite, primo. Vou tentar dormir um pouco, me preparar para
falar com a família da Anna de novo amanhã. — Faço uma careta. — Não
tem uma semana que nos falamos pelo mesmo motivo.
Ele gargalha dessa vez.
— Primo, você está ficando malfalado com o pai da moça —
provoca.
— Cai fora, idiota — resmungo.
Jalal sorri mais e me deixa sozinho.

***

— Deixe-me adivinhar: outra suspeita de atentado? — O pai de


Anna pergunta em seu tom divertido, ao qual já estou me familiarizando.
Limpo a garganta, lamentando a situação desconfortável em que me
meti.
— Não, senhor. Dessa vez não houve nenhuma suspeita. — Sou
obrigado a ser sincero. — Espero que acredite, senhor Harper, nunca foi
minha intenção expor sua filha dessa forma… — Gemo internamente.
Estou parecendo um adolescente me explicando pelas ações impensadas.
— Há algo que queira nos contar, Alteza? — Ele está todo formal
agora. — Porque está ficando estranho eu e a mãe de Anna acessarmos a
internet e encontrar sempre um vídeo seu arrastando a nossa filha de algum
lugar.
Merda.
— Senhor, eu…
Ele exala do outro lado.
— Ok, acho que podemos deixar a porra das formalidades de lado,
que tal? Me chame de Dom. Prefiro que me chamem assim, odeio as
etiquetas e frescuras da realeza. — Usa o tom debochado que conheço bem
e descubro de quem Anna herdou sua ousadia. — Ouça, minha filha
garantiu para mim e sua mãe que não há nada para nos preocuparmos, que
tudo não passou de uma brincadeira, que vocês são apenas bons amigos.
— A sua filha é uma garota especial, Dom. — Me permito admitir
isso. — Eu e minha filha estamos apreciando esse tempo com ela. —
Adiciono para que o homem não queira me arrancar a cabeça.
— Mas você está escolhendo uma nova esposa no sábado, pelo que
minha filha informou. — Ele diz me deixando saber que não está totalmente
no escuro.
— Sim, tenho um dever com meu povo — digo sucintamente.
— Entendo. Não teremos mais surpresas na internet, então — diz
em tom sério agora. — Reforço meu pedido anterior, Amihaj, cuide bem de
minha filha enquanto estiver por aí. Ela é teimosa e não quer voltar sem
conhecer o deserto e retratá-lo com suas lentes. — Seu tom é apreensivo
quando completa: — Anna é a minha única filha, não quero vê-la correndo
riscos.
Parece haver um significado implícito na palavra riscos. O homem
está desconfiado. Claro que está. Qualquer um com dois olhos e uma boa
visão enxergou o que há entre mim e Anna naquele vídeo.
— Ela não correrá riscos aqui, Dom. Cuidarei dela. — Tranquilizo-
o, mesmo sabendo que o outro risco que insinuou não há como dar
garantias.

***

Eu paro na entrada do salão de festas, na ala oeste, e o burburinho


cessa imediatamente. Todos se voltam para me olhar. É um jantar íntimo,
levando em conta que são vinte candidatas e apenas um familiar homem
lhes acompanhando. Minha família também está presente, todos esperando
o momento em que farei o anúncio que mudará a minha vida para sempre.
— Sua Alteza real, o príncipe herdeiro Karim Amihaj Bin Khallifa
Al-Abdallah!
O cerimonialista me anuncia em sua voz pomposa e todos se curvam
enquanto eu passo para dentro.
Avanço pelo corredor formado pelos convidados, recebendo sua
reverência, meu coração aperta dolorosamente no peito, mas ergo a cabeça,
aceitando meu destino, e ando até os degraus no fim do tapete vermelho.
Subo-os e me sento em meu trono provisório de príncipe herdeiro, com
estofados em escarlate e bordas douradas. Tio Jafar em pé do meu lado
direito e Jalal e Zafyr do lado esquerdo. Faço sinal com a mão para que
relaxem e voltem ao normal. Os sons retornam, a música árabe em volume
baixo, as conversas. Respiro e puxo o colarinho do meu caftan, me sentindo
sufocando, impotente. Uma bandeja de ouro surge do meu lado direito.
Pego um cálice com o jellab[24] “batizado” com uísque, que Jalal avisou que
prepararia para mim. Ele sabe que vou precisar entorpecer os sentidos para
conseguir passar por esse suplício. Tomo um grande gole, correndo meus
olhos pelo salão. As moças estão todas vestidas para impressionar, exceto
que nada pode me impressionar esta noite. Latyfa está radiante ao lado de
Faysal, o irmão mais novo de Yasmina, que a está acompanhando. Ayla
amou ver o tio. Ele vem com frequência ver a sobrinha, a única coisa que
lhe restou da irmã.
Meus pensamentos são cortados abruptamente quando meus olhos
pousam na entrada do salão e minha respiração falha. Anna está lá, parada,
parecendo um oásis, atraindo a minha atenção, me seduzindo, chamando-
me para ela. Usa um caftan verde, no tom exato de seus olhos. Mas, em vez
de deixá-lo solto, ela destaca seu corpo perfeito com um cinto dourado na
pequena cintura. Uma capa longa e negra com fios dourados cai sobre seus
ombros. Ela dá o primeiro passo entrando no espaço e, embora o
cerimonialista não a anuncie porque está chegando depois do príncipe,
ainda consegue a atenção de todos. Avança pelo tapete vermelho, a cabeça
erguida, majestosa, corajosa. Linda. Está usando um hijab negro, um lenço
adornado de joias cobrindo sua boca, como uma princesa das mil e uma
noites. Me remexo na cadeira, meu corpo reagindo miseravelmente. Posso
sentir a tensão emanando do meu tio Jafar.
Ela para à frente dos degraus e nossos olhares se fixam. Vejo que
seus olhos estão mais brilhantes, misteriosos, destacados pela maquiagem
estilo árabe. Na verdade, todo o traje é típico de nossas mulheres. Ofego
quando percebo que seus braços estão nus, cobertos apenas pelo tecido
transparente da capa, e estão tatuados também. Wallah… Os símbolos
pintados em sua pele me atraem, me deixando duro, desejando poder
arrastá-la daqui e fazê-la minha. Ela faz uma reverência respeitosa para
mim, a cabeça abaixada, mas os olhos permanecem presos aos meus:
— Amiri — murmura e sinto a mão de meu tio em meu ombro,
contendo-me porque quero me levantar e ir até ela.
Há comoção, os burburinhos recomeçam e ela sorri, um vislumbre
da sua irreverência como um presente seu nesta noite infeliz. Se inclina
mais uma vez e em seguida vira as costas, indo se misturar aos convidados.
Meus olhos permanecem nela, minha boca seca, cobiçando suas
panturrilhas que aparecem sedutoramente através das fendas na barra do
caftan. Usa as sandálias que tanto me excitam, as tiras douradas enroladas
subindo muito além do que minha visão me permite ir.
— Receba a primeira candidata, meu senhor — Tio Jafar me faz cair
na real, sua voz está desgostosa, mas polida.
Olho-o tentado a dizer que mande todo esse povo embora. Mas
respiro fundo e me resigno a não olhar mais na direção de Anna, ou não
conseguirei cumprir o meu papel aqui. Assinto, dando autorização para
trazerem a primeira moça.
Uma cadeira mais simples é colocada do meu lado esquerdo e o
show começa. A primeira é princesa de um emirado vizinho. É bonita, bem
articulada, conversamos por alguns minutos. Vem a segunda, igualmente
bonita, educada, mal me olhou nos olhos. A terceira me respondeu com
monossílabos, o olhar preso em suas mãos. A quarta diz que podemos
colocar Ayla numa escola interna para meninas, na capital, pois estudou em
uma e aprendeu tudo sobre como ser uma boa esposa. Não mencionou ser
uma boa mãe. Essa foi riscada da lista sumariamente.
E meus pensamentos voltam para esta manhã. Quando fui buscar
Ayla em seu quarto para irmos almoçar, encontrei Anna conversando com
ela, as duas ainda animadas e coradas depois da sua sessão de dança. Minha
filha vai sentir muito a falta da princesa e dessas aulas diferentes.
— Você pode ir me ver em Nova York, menininha sapeca. Sempre
que quiser, estarei lá para você, habibti. — A voz rouca e linda de Anna
invadiu meu corpo e eu parei um instante, não me mostrando para elas,
não querendo atrapalhar sua conversa. O termo que usou com a minha
filha, o tom emocionado me diz que é verdade. Ela ama a minha pequena,
não está fazendo tipo para me impressionar. Estiquei o pescoço e meu
coração vibrou ao vê-la sentada no tapete no meio da sala, com Ayla
aconchegada em seu colo, os bracinhos enrolados em seu pescoço, como se
tivesse medo de soltar e sua amiga desaparecer.
— Eu amo você, Anninha — murmurou, sua vozinha triste, fazendo
meu coração doer por ela, por elas, por nós.
— Eu também te amo, ‘amirat saghira — Anna sussurrou de volta e
as duas ficaram lá, abraçadas. Um bolo se formou em minha garganta e saí
do quarto, amaldiçoando todas as tradições que me impedem de fazer o que
meu coração deseja.
A voz estridente da outra candidata (não me lembro mais qual é,
afinal, foram muitas) me traz ao presente. Suspiro resignado e me forço a
prestar atenção em sua conversa. Ela faz excelentes bordados e também
pinturas de porcelana. Formidável. Ironizo. Outra, mais outra e já estou sem
paciência para tantos relatos tediosos. O banquete começa a ser servido
depois que atendo a última e exalo cansado, pegando mais um cálice de
jellab.
— Você ficará bêbado antes de anunciar a escolhida, Amihaj —
Jalal murmura do meu lado esquerdo tão logo que retiram a cadeira das
candidatas. — Seja discreto sobre o meu cuidado com o seu jellab, primo
— zomba.
Não podemos ingerir bebidas alcóolicas em público.
Bufo. Zafyr está rindo discretamente. Ainda estou com raiva do
idiota pela ousadia em sair com a princesa. Não apenas sair, ele dançou,
tocou nela, e quero arrancar seus malditos braços. O jantar é servido nas
mesas em forma de um grande retângulo, deixando um espaço no meio para
os músicos. Anna se sentou na outra ponta, ao lado de Nuria e minha tia
Samira. Embora tenha tentado ferrenhamente não a olhar, nossos olhares se
encontram em muitos momentos e se prendem. Posso ver o despeito nos
rostos das outras moças; a encaram e cochicham entre si, provavelmente
comentários depreciativos. O vídeo foi retirado das redes, mas a imprensa
local está atacando Anna, chamando-a de arruaceira. Fiquei muito irritado.
Eles não a conhecem como eu. Eles não sabem o que está por baixo dessa
atitude ousada. Quis fazer um pronunciamento, defendendo-a, mas fui
impedido por meu tio e Jalal.
— Chegou a hora, amiri. Faça o brinde oficial e anuncie a sua
escolhida. — Tio Jafar pronuncia as palavras que irão me assombrar por
muito tempo, tenho certeza.
Meus olhos buscam os de Anna quando me levanto, segurando o
cálice dourado. Seus olhos cintilam e a tristeza tinge seu rosto. Me perdoe,
‘amira. Peço-lhe com meu olhar. Ela pisca e desvia sua atenção para Nuria,
dizendo algo para a esposa de meu primo. A princesa se levanta e começa a
andar para a saída. Sigo-a, mudo, ainda não conseguindo falar nada. Ela
para no limiar das portas, respira fundo e, então, volta a andar, seus passos
rápidos agora, quase correndo. Meu coração dói com cada passo que dá
para longe de mim. Estou perdendo-a para sempre. Minha mão treme
segurando o cálice, todos em silêncio ansioso.
Vejo o sorriso confiante no rosto de Latyfa. Acha que pelo tempo
maior que passamos juntos a escolherei. Olho novamente para a entrada,
Anna se foi. Meus olhos ardem de tristeza, meu coração doendo, minha
boca se recusando a anunciar outra que não seja ela. Eu a amo. Allah, eu a
amo! Estive em coma por quatro anos e ela me trouxe de volta à vida.
Ofego, me recusando a desistir dela, de nós. O destino a trouxe para mim
em meio aos conflitos. E tudo vai ficando claro em minha cabeça. Não
posso abrir mão dela. Essa é a minha segunda chance para o amor e não
posso deixá-la ir. Não posso!
— Boa noite a todos. — Digo na voz solene de governante e todos
ficam mais tensos. — Shukran por atenderem o meu chamado. — Inclino a
cabeça em respeito, respiro fundo e solto: — As senhoras são adoráveis e
darão alegria ao homem de sorte que as desposarem. Peço desculpas por
tomar o seu tempo, mas não posso escolher nenhuma de vocês. — Meu
peito incha, pronto para pronunciar a frase que me trará muitos problemas,
porém, não me importo mais. — Meu coração escolheu por mim. — Mais
comoção, expressões surpresas. — São meus convidados para continuar a
desfrutar do banquete. Aproveitem!
Então, eu pego o cotovelo de Jalal, puxando-o para fora da mesa.
Começo a andar rapidamente rumo à saída.
— Preciso de você, primo. Cuide de tudo, peça a Nuria para manter
um olho em Ayla. — Jorro as palavras, apressado.
— Amihaj, o que está fazendo, primo? — Pergunta, o espanto em
sua voz e rosto.
Eu lhe passo todas as instruções para o que preciso. Ele assente,
ficando sério, percebendo que estou decidido.
— Amiri, está tomando uma decisão muito ruim. — Meu tio chega
ao meu lado, está ofegante.
Me viro para encará-lo e finalmente me libertar:
— Discordo, tio. Acaba aqui a tradição ridícula dos reis de Kamar
se submeterem cegamente às exigências arcaicas de nove tribos que se
acham as donas do emirado. — Digo entre dentes.
Seus olhos ampliam com minha declaração acalorada.
— Meu senhor, está mesmo disposto a começar uma guerra com as
tribos por causa dessa moça?
Minha determinação só fica mais forte a cada segundo que passa.
— Anna é a minha escolhida, tio. Será a minha rainha e por ela
brigarei com quem estiver no caminho. — Lhe digo com um significado
implícito.
Seus lábios apertam em desagrado.
— Hafazna Allah![25] — Levanta as mãos para o céu,
exageradamente.
Troco um olhar cúmplice com Jalal e ele assente, ficando do meu
lado, mesmo sabendo que não será uma tarefa fácil. Então, me viro e sem
cerimônias começo a correr pelo corredor, me sentindo livre e leve, em
anos.
— Eu escolho você, ‘amira — murmuro, correndo, angustiado para
chegar logo até ela.
CAPÍTULO SETE
“Eu já estava morta por dentro. Eu não podia sair. Apaguei as luzes. As
vozes aqui dentro são tão altas… Você me amou para eu voltar à vida.
Voltar do coma…”
(Sai – Loved me Back to Life)

Anna Julia
Entro correndo para o quarto, minha visão embaçada pelas lágrimas.
Ele escolheu outra. Ele vai se casar com outra mulher. Soluço, sentindo uma
dor sufocante no peito. A dor de saber que o homem a quem entreguei meu
coração não pode ser meu. Eu o amo. O amo. Não é uma atração qualquer
como pensei a princípio, é amor. Eu o quero para mim, e saber que não
posso tê-lo me rasga por dentro. A constatação veio quando não consegui
ficar lá no salão, vendo-o anunciar a sua escolhida. Sei que precisava fazer,
é o seu dever, mas em meus devaneios Karim se recusaria a escolher outra
porque me ama, como eu a ele. Mais soluços desiludidos me escapam.
Minhas faces queimam com as lágrimas caindo sem controle. Demorei
tanto a entregar meu coração de novo e agora amo um homem que não pode
ser meu. Arquejo, a dor horrível se intensificando. Respiro tremulamente,
atravessando o quarto, indo para a varanda, tomar um pouco de ar. Abraço a
mim mesma, olhando tudo, guardando cada detalhe na memória.
Estou indo embora agora. Minhas malas estão prontas, as arrumei
hoje à tarde, me preparando para esse final. Ir ao deserto com ele seria uma
tortura cruel. Eu não suportaria vê-lo. Não posso mais olhar para ele. Não
sou tão forte assim. Eu só preciso ir embora. Choro, olhando para a
escuridão da noite engolindo a areia além dos muros do palácio. Eu repasso
tudo, cada momento, desde que o vi naquele cativeiro. A maneira como
mexeu com minhas emoções mesmo sem ver seu rosto. Me senti muito
atraída e isso só foi aumentando a cada dia que passei em sua companhia, a
cada conversa, cada passeio. Cada toque roubado, cada olhar apaixonado. A
imagem de Ayla, minha princesinha esperta, me vem à mente. Meu coração
aperta mais pela saudade que sentirei da pequena. Como seu pai, ela ganhou
meu coração desde o primeiro olhar para seu rostinho lindo. Eu amo os
dois, amo muito, mas outra mulher irá tê-los.
Meu celular toca dentro da carteira e o pego, sabendo quem é.
Confirmo ao ver o nome de Dam. Meu primo esteve em visita diplomática a
Dubai nesses três dias e está indo para Nova York, onde tem um encontro
com o presidente dos Estados Unidos. Quando me ligou ontem perguntando
se estava tudo bem e se eu precisava de algo, lhe disse que sim, precisava
de uma carona. No fundo eu já sabia que não conseguiria seguir com o
plano inicial. Estar perto de Karim agora só vai me machucar. Suspiro,
tentando me controlar para não o assustar.
— Oi, Dam. — Minha voz sai ainda trêmula e chorosa.
— Anna? Você está chorando? — Sua preocupação é imediata. Dam
pode ser irônico na maior parte do tempo, mas com Ella e sua primas não é
um cuzão. — Me diga a quem tenho que torcer o pescoço, prima.
Eu bufo com sua truculência. Ele tem um temperamento difícil.
— Não é nada. Só estou emotiva por ter que ir embora. — Nego,
tentando soar impessoal. — Me apeguei ao lugar e…
— Pelas imagens naquele vídeo, você se apegou a mais coisas,
prima… — Aponta com seu sarcasmo em dia. Faz um breve silêncio e seu
tom é mais suave ao continuar: — Sei que não sou Ella, mas sabe que pode
contar comigo, não sabe?
Isso faz novas lágrimas turvarem meus olhos. Meu primo marrento e
orgulhoso sendo fofo é demais para mim e meu estado abalado.
— Grazie, carissimo — murmuro.
— Pousaremos em Jawahra dentro de uma hora, Anna — avisa.
— Pousaremos? Quem está com você, primo? — inquiro e ele fica
em silêncio um instante.
— Isadora está comigo — diz em tom mais baixo e eu fico surpresa.
Ok, não tão surpresa porque todos na família já sabem que os dois andam se
enroscando desde o casamento dos gêmeos, há dois meses.
— Uh, então…
— Então nada. — Ele corta. — Somos dois adultos que por acaso
sentem atração um pelo outro e estão tendo um bom tempo juntos, nada
mais.
Eu rolo os olhos para sua desculpa pronta. Homens.… São tão
idiotas! Incluindo Sua honorável Alteza, que acabou de escolher outra!
— E quanto a Olga, sua namorada? — pergunto e ele grunhe. — Ela
sabe que anda tendo um bom tempo com a doutora?
— Anna… — Seu tom é impaciente. — Sou homem, prima.
Bufo com seu machismo.
— Diz como se fosse a coisa mais normal do mundo trair porque
tem um pau e testículos, Dam.
— Dio mio! Não fale dessa forma para mim. — Ele resmunga, mas
então começa a rir, sua voz voltando ao tom suave. — É preferível ouvi-la
dizendo palavrões do que chorando, no entanto.
Isso me comove de novo.
— Grazie, primo — murmuro. — Estarei esperando por você.
— Até daqui a pouco, principessa — murmura de volta. — Está
tudo bem mesmo? Tem certeza de quem não preciso ver Amihaj?
— Para que iria querer vê-lo? — Franzo a testa.
— Para lembrá-lo de que você é uma princesa e, claro, socá-lo por
fazer a minha priminha chorar. — Ele atira.
Eu meio que rio, mesmo com o coração esmagado. Amo isso, o
amor e apoio que sempre damos uns aos outros.
— Não é necessário. Só quero que me leve embora. Estarei no
aeroporto. — Garanto e meu tom enternece ao me despedir: — Ti amo,
carissimo.
— Also, principessa mia. — Diz no mesmo tom terno e adiciona: —
Cuide-se.
Desligo o telefone e suspiro alto, a tristeza volta a se apoderar de
mim. Nuria prometeu me ajudar com o transporte para o aeroporto. Dessa
vez o príncipe não irá me deter. Não, está muito ocupado entretendo sua
escolhida. Ando até a balaustrada, depositando carteira e celular, apoiando
minhas mãos no topo, as lágrimas tornam a me cegar, as imagens dele com
outra insistindo em se formar em minha mente. As palavras venenosas de
Latyfa martelando, zombando de mim. Não sou elegível. Eu quero odiá-lo,
mas não posso. É o seu dever como herdeiro do trono. Precisa colocar o seu
povo acima de tudo. Sou apenas uma estrangeira, uma ocidental. Ele
pensou por algum momento em ficar comigo? Me quis verdadeiramente, ou
era só atração da sua parte? Choro mais alto, meu coração doendo por não
poder vê-lo uma última vez antes de partir. Eu daria tudo para poder tocá-lo
apenas mais uma vez.
— Adeus, amiri — sussurro engasgada.
— Anna… — A voz baixa e angustiada chama às minhas costas e
meu coração começa a saltar vertiginosamente.
Karim?! Mas o que… Minhas pernas começam a tremer, minha
respiração suspensa. Oh, meu Deus.… Me viro devagar, não acreditando
que é ele mesmo. O que está fazendo aqui? Por que… Meu peito está
subindo e descendo ofegante quando nossos olhares se encontram. Mesmo
em meio ao caos, me permito admirá-lo no traje oficial mais uma vez. No
salão foi muito difícil não o olhar o tempo todo. Está lindo, soberano,
usando um caftan branco, com uma b-shirt preta (espécie de sobretudo em
tecido fino, usado em solenidades e eventos especiais). Há detalhes
dourados nas bordas com o brasão da casa Al-Abdallah. Na cabeça, um
turbante negro com pequenas joias douradas nas bordas. Nuria disse que ele
usaria essa roupa e que combinaríamos. Sonhei que ao me ver num traje
típico das mulheres do Oriente perceberia que posso pertencer ao deserto.
Posso ser a sua princesa se me der uma chance. Seus olhos estão ainda mais
intensos e penetrantes, sombreados por lápis preto. Os cabelos soltos sobre
os ombros largos, deixando-o com a mistura exótica de príncipe e pirata. Eu
o bebo com avidez, a saudade já tomando conta de mim. Mais lágrimas
turvam meus olhos, não consigo controlar. Eu o amo.
— Karim… — murmuro, entrecortado. Seu rosto está cheio de
angústia e anda para perto, me confundindo demais. O que ainda quer de
mim? Ele acabou de escolher outra mulher. — O que está fazendo aqui?
Para à minha frente, o olhar correndo por todo o meu rosto.
— ‘Amira… — Estende a mão direita, tocando minha face, pegando
uma lágrima. Ofego ao sentir seu toque suave. Vou desmoronar se me tocar.
— Você está chorando… — Engole com força, seus olhos ferozes, intensos
e um pouco arrependidos presos aos meus. — Por quê?
— Você sabe o porquê. — Digo baixinho.
Ele segura meu rosto com as duas mãos, me forçando a encará-lo.
— Eu preciso ouvir isso da sua boca, Anna. — Sua voz é torturada.
— Diga-me o porquê está chorando.
Respiro fundo e decido me desnudar completamente para ele. O
estou perdendo, mas não sairei como uma covarde.
— Porque te amo. — Minha voz embarga e ele arfa, os olhos
ficando mais brilhantes. Parece incrédulo e emocionado. — Te amo e você
não pode ser meu. É por isso que estou chorando, droga!
— Anna… Wallah… — Murmura asperamente, seus polegares
limpando minhas lágrimas.
— Mas entendo que é seu dever escolher seu povo acima de tudo.
— Me apresso em acrescentar para que não pense que estou mendigando
seu amor. — Eu só preciso ir embora. Dam estava em Dubai essa semana e
está passando por aqui para me levar para casa. Por favor, me deixe partir
dessa vez — imploro.— Preciso esquecer você.
— Você conseguiria me esquecer? — pergunta parecendo magoado.
— Ayla? Conseguiria seguir em frente sem nós?
Soluço com a menção da minha princesinha.
— Não, eu não conseguirei esquecer nenhum de vocês — sussurro
derrotada. — Eu os amo. Amo muito. — Engasgo. — Seu tio sugeriu que
eu ficasse e me tornasse sua segunda esposa. — Ele pragueja em árabe, os
olhos ficando selvagens. — Eu disse não. Não suportaria dividir você com
outra.
Ele fecha os olhos e aproxima o rosto do meu, a boca respirando
bem próxima da minha. Quando os reabre, eu quero morar lá, na expressão
preenchendo seus olhos de ônix.
— Não pude escolher nenhuma daquelas mulheres, ‘amira —
murmura e meu coração dispara tão forte que tenho de me segurar em seus
ombros. — Não pude porque você é a minha escolhida. — Meus olhos
voltam a turvar, não acreditando no que está saindo da sua boca. — Eu amo
você, Anna. Eu te amei no primeiro momento em que pus meus olhos sobre
você. — Seus olhos são ao mesmo tempo selvagens e ternos. Me sinto
mole, completamente entregue em seus braços. Choro como uma torneira
quebrada. — Pensei que jamais amaria de novo, que meu coração jamais se
abriria para outra mulher, mas você estava no meu destino.
— Também pensei, jurei jamais entregar meu coração a outro….
Mas eu te encontrei… — Engasgo, chorando como uma menina tola na
frente de um homem feito. — E o seu dever, Karim… Como fará? Como
faremos?
— Sim, tenho um dever, mas cumpri-lo me faria infeliz para o resto
da vida. Eu escolho você, a garota que faz meu coração e corpo pulsarem na
mesma sintonia. — Sua voz é solene e o olhar firme. — Você não veio
parar aqui por acaso… — Um braço enrola em minha cintura, cingindo
nossos corpos. Eu fico tonta pelo contato, pela sua declaração linda, seus
olhos me devorando, e ele diz com intensidade: — Você pertence ao
deserto, Anna. Você pertence a mim, amirati.[26] Eu nunca te deixarei ir
embora.
Sua boca cobre a minha e todo o meu corpo treme. Vertigem de
prazer perpassando meu corpo e sentidos. Me agarro a ele, meu coração
vibrando, aquecendo pela reviravolta da noite. Ele veio para mim.
— Amiri… — Chamo-o, entreabrindo os lábios, recebendo-o com
desespero, chorando, gemendo de prazer. Escorrega a mão do meu rosto
para a minha nuca e me segura com firmeza, sua boca se apossando da
minha, exigente, faminta. Chupa a minha língua, mordisca-me. Sinto-o
ficando duro contra mim e ele me suspende, encaixando sua ereção entre
minhas coxas. Me penduro em seu pescoço e o deixo se esfregar em mim
grosseiramente enquanto come a minha boca com uma voracidade que me
deixa toda molhada.
— Anna… — Geme rouco, segurando a minha bunda, me puxando
mais e mais contra seu pau volumoso. — Estou queimando por você… —
Sussurra, a boca caindo pelo meu pescoço, sugando-me gostoso, forte. Eu
latejo, a calcinha ficando empapada.
— Eu também… — murmuro, fora de mim, arqueando-me quando
a boca gulosa pousa em meu seio esquerdo, por cima da roupa. Ele me
chupa com força, me mantendo suspensa, como se não pesasse nada. —
Preciso de você…
Karim geme rouco, passando para o outro seio, mordiscando-o
deliciosamente. As mãos apertando minha cintura, mantendo-me bem em
cima do cume duro. A sensação é tão erótica que estremeço inteira.
— Como precisa de mim? — Sobe a boca para o meu queixo, me
mordiscando, seu olhar é cheio de luxúria e está fixo no meu. — Diga-me,
nour Al sabah.
Levo minhas mãos para seu rosto, segurando dos lados. Quero gritar
de tanta felicidade. Ele me escolheu! Esse príncipe lindo me escolheu acima
do seu dever. Meu coração não cabe no peito. Como tudo isso aconteceu?
Em pouco mais de um mês, estou perdidamente apaixonada por esse
homem.
— Quero senti-lo dentro de mim — murmuro, lambendo sua boca,
sugando o lábio inferior levemente. Ele range, agarrando minha bunda com
mais força, empurrando o pau entre minhas coxas como se quisesse romper
a barreira das roupas e me penetrar aqui, assim. — Eu quero que me faça
sua mulher, Karim.
Seu olhar suaviza um pouco em meio à lascívia e seu nariz desliza
pela minha face direita. Ele tem uma ternura que me encantou quando me
permitiu chegar mais perto e conhecê-lo.
— Estarei dentro de você ainda hoje. — Morde minha pele. Eu
gemo, delirando com sua pegada firme, gostosa, todo o meu corpo
implorando a sua posse. — Tenho algo planejado — murmura, voltando a
boca para perto da minha, o olhar se fixando no meu. — Vou levá-la para
fotografar as tribos, mas antes faremos um acampamento no deserto por
alguns dias… — Sua voz profunda e seu olhar negro vibram em minha
pele. — Só nós dois, longe de tudo e todos. E lá, a farei minha mulher.
Eu alago, minhas paredes latejando, imaginando como será a
sensação de tê-lo dentro do meu corpo, me possuindo. Me tornando sua.
— Por mim está perfeito, honorável Alteza. — Assinto,
provocando-o, mas minha voz está rouca e isso o faz curvar a boca num
meio-sorriso safado e conhecedor. Rio também e nos beijamos de novo, ele
rodopiando comigo pendurada nele. E mesmo que uma parte de mim esteja
pedindo desculpas a Nate, a outra está feliz porque encontrei o amor nesse
homem maravilhoso. Rogo para que ele cuide do meu coração com o
mesmo amor e dedicação que cuidarei do seu.
Quando paramos para respirar, ele liga para Dam e avisa que não eu
não irei mais pegar a carona, para eles desviarem a rota. Meu primo exige
falar comigo e confirmo, enquanto meu príncipe beija meu pescoço, as
mãos acariciando meu ventre, indo perigosamente perto da minha vagina e
voltando.

Cerca de duas horas depois…


Respiro profundamente, tentando me acalmar. Estamos numa tenda
luxuosa montada em tempo recorde, de acordo com as reclamações de Jalal
quando chegamos. Ele estava aqui para nos recepcionar e dizer que agora
Karim lhe deve duas. Não entendi direito sobre o que falaram depois.
Adoram usar um dialeto só deles. A localização é perto de um oásis, a cem
quilômetros do palácio. Há até mesmo um banheiro químico às margens da
pequena lagoa. Eles não brincam em serviço. A guarda real ficará acampada
em círculo, nos dando alguns quilômetros de privacidade, no entanto, nos
deixando no centro, para garantir a segurança de seu príncipe. Além disso, o
helicóptero está perto da tenda em caso de necessidade. Estamos seguros,
abastecidos com comida, frutas e bebidas, Karim se vangloriou de suas
habilidades de sobrevivência no deserto, como militar. Ainda estou usando
a mesma roupa e ele também. Estou no quarto, querendo desesperadamente
fingir que sou a fodona na cama. Oh, Jesus, a quem quero enganar? Ele verá
que sou uma falácia total.
Meus olhos caem sobre a cama luxuosa, cheia de almofadas
vermelhas e douradas. Há cortinas de seda, lenços de cores variadas
pendendo sedutoramente no dossel. É um cenário digno das mil e uma
noites. As luminárias de tons alaranjados são mantidas por um pequeno
gerador de energia. Também temos sinal de wi-fi. Jalal tem razão em
reclamar, tenho certeza de que montar isso tudo em menos de duas horas
não foi nada fácil. Fico aqui escondida, sabendo que preciso achar uma
maneira de dizer a Karim que não sou tão descolada quanto quero parecer.
Não no quesito sexo, pelo menos. Pouco entendo da coisa real… Urgh.
Humilhante, Anna. Deprecio-me. Ouço-o se despedindo de Jalal e, em
seguida, a introdução de uma música vindo da sala faz meu coração correr
rápido. Ele escolheu o ritmo árabe e me recordo da nossa dança no clube, a
sensualidade com que me pegou naquela pista. Estou tão sobrecarregada e
nervosa que não o noto entrando no quarto. Me sobressalto com suas mãos
circulando minha cintura, puxando minhas costas contra seu peito. Seu
nariz enterra em meu pescoço, deslizando a ponta numa carícia que me faz
arrepiar e estremecer inteira. Ele sorri baixinho, apertando minha cintura
suavemente.
— Relaxe, Anna… — Murmura em meu ouvido, provavelmente
sentindo minha tensão. Suas mãos sobem pelos meus braços e puxam a
capa negra pelos ombros. Sua boca substitui o nariz em meu pescoço e
choramingo, sentindo seus dentes raspando com pressão, arranhando a
minha pele eroticamente, em seguida, chupa a minha carne. Uma dor
incômoda começa a crescer entre as minhas coxas. Ofego, fechando os
olhos, me deixando ser cuidada por ele e sua experiência. Esfrega a ereção
em minha bunda e geme contra a minha pele. — Eu quero me afundar
completamente em seu corpo, amirati. — Sussurra, suas mãos indo para
meu ventre, acariciando por cima do tecido de seda. Minha excitação vaza
da calcinha ao senti-lo subindo para meus seios, amassando-os com
delicadeza, depois com mais firmeza. Morde o meu ombro e puxa meus
mamilos, o choque indo direto em meu clitóris. — Você quer isso também,
não é, habibti? — O termo carinhoso faz meu coração cantar.
— Sim, eu quero muito… — Murmuro e puxo meu caftan,
querendo mostrar pelo menos um pouco da minha velha ousadia. Ele emite
um som de satisfação ao sentir minha pele nua. Passo o tecido por cima da
cabeça e suas mãos estão de volta em meu corpo, por todos os lugares. Nas
laterais, braços, coxas, bunda, seios. Pendo a cabeça em seu ombro,
rendida. Desliza as alças do sutiã, retirando-o com habilidade, em seguida,
seus dedos descem pelo meu ventre, a mão enfiando pelo cós da calcinha.
— Ahh… — Gemo, sentindo seus dedos roçarem meu montículo inchado,
levemente, depois esfregando-me com círculos preguiçosos; a outra mão
pega meu queixo e me faz encará-lo. Seu rosto é uma obra de arte, lindo,
cheio de desejo por mim. O olhar negro queima no meu, enquanto vai
descendo mais, encontrando minhas dobras molhadas.
— Tão molhada para mim, princesa. — Abaixa a boca na minha,
mordiscando meus lábios juntos, antes de correr a língua por eles. Então,
desliza mais os dedos e afasto as pernas, dando-lhe passagem. Ele geme
rouco, empurrando um dedo em meu canal encharcado. Arde um pouco e
prendo a respiração, pegando sua nuca por trás. — Tão apertada também,
porra. — Pragueja baixo, passando a me beijar com sofreguidão,
empurrando o dedo todo, me fazendo arfar, estremecer.
Gemo, dando minha boca, meu corpo, tudo que ele quiser. Me fode
lentamente a princípio, depois vai aumentando o ritmo, combinando as
metidas com uma massagem circular em meu clitóris. A mão do meu
queixo desce para os seios nus e começo a me desmanchar quando os sova,
apertando a carne, puxando, raspando as unhas nos bicos. Quando sua boca
desvia para meu pescoço e morde na junção com o ombro, eu convulsiono,
gritando alto, sem nenhuma vergonha, o gozo irrompendo em meu ventre,
jorrando quente na vagina.
— Linda! Goza para mim.
Eu gozo mais com suas palavras sacanas sussurradas contra a minha
pele. Respiro de forma errática, fechando os olhos pela sensação deliciosa.
Não é assim com o meu brinquedinho a pilha.… Impossível não comparar.
Meu corpo precisa disso, o contato, pele com pele, a coisa real. Me viro em
seus braços e me arrepio inteira com a intensidade e fome que vejo em seu
rosto moreno.
A música sensual lançando seus acordes instrumentais me dá a
coragem que preciso e levo minhas mãos para seu turbante. Ele me olha
sem piscar, me observando desenrolar o tecido devagar. Corro os dedos
pelos cabelos longos e escuros, quando termino Karim geme, seu hálito
morno e gostoso soprando em minha face. Suas mãos passeiam pelo meu
corpo, segurando minha cintura, bunda, abrindo-a, amassando as
bochechas. Estou toda escorregadia no topo das coxas. Puxo seu sobretudo
pelos ombros poderosos e ele me ajuda a puxar o caftan. Meus olhos
sedentos pousam em seu peitoral e abdômen definidos, rígidos, minhas
mãos têm vontade própria, tocando a pele cor de oliva, quente, gemendo
pelo contato. Ele tem o corpo mais perfeito que já vi em um homem.
— Wallah… — Rosna, pegando minha nuca, puxando meus cabelos
de uma maneira que me deixa mais louca. Finalmente desço a mão,
alcançando o pau grande e grosso, que tanto quis tocar. Ofego, mais
líquidos descendo em meu canal quando tento circundá-lo. Massageio-o
para cima e para baixo, conhecendo seu corpo como fez comigo. — Eu
quero a sua boceta… — Sussurra e seus termos chulos me fazem palpitar e
molhar mais. — Você está protegida? Quero gozar nu em você, ‘amira.
Oh, Jesus… Engasgo com seu linguajar — muito ocidental, diga-se
de passagem. Mas convulsiono, cada pedacinho meu pulsando para ser dele.
— Tomo anticoncepcional para controlar meu fluxo menstrual de
tempos em tempos. — Informo, me inclinando, mordendo seu queixo. —
Você é um homem de sorte, honorável Alteza. — Rio, tentando soar
atrevida. — Estou tomando desde o mês passado. — Ele ruge, arrancando o
calção e cueca boxer, em seguida me levanta pela bunda, me fazendo
abraçá-lo com as pernas. O encaro apaixonada, enquanto me carrega. Seus
olhos lindos, negros, intensos, me devorando inteira, me fazem sentir a
garota mais especial neste momento. Esfrego meus seios em seu peitoral e
ele ri, lindo, profundo. As mãos grandes apertam minha bunda contra ele,
nos levando para a cama, meu centro molhado esfregando em seu eixo
quente e duro. Me deposita sentada na beira do colchão e retira minhas
sandálias. Se livra das suas, vindo para cima de mim, me obrigando a deitar
de costas nos lençóis macios. Ele se afasta um pouco, o olhar aquecido
percorrendo cada centímetro da minha pele exposta. Acaricia meus braços
tatuados com hena, costume das mulheres kamarianas. Eu as fiz para atiçá-
lo, seduzi-lo e me congratulo agora ao ver o quanto está fascinado, traçando
cada uma delas.
— Quando voltarmos ao palácio, quero seu corpo inteiro com
hena… — Diz com o tom de príncipe herdeiro que já ouvi algumas vezes.
— Me enche de tesão sua pele clara coberta com a tinta do meu povo,
mostrando que é minha. — As mãos descem pelo meu colo, agarrando
meus seios, massageando, e se inclina, levando o direito na boca. Arqueio-
me, juntando os lençóis em meus dedos aos lados do meu corpo. Karim
chupa meus seios alternando entre um e outro, lambendo os bicos,
mordendo levemente. Uma mão serpenteando pelo meu ventre, me fazendo
arrepiar, e sua boca acompanha a mão. — Levante as pernas e coloque os
pés nas bordas do colchão, habibti. Quero seu gosto na minha língua
primeiro. — Orienta suavemente e eu faço, meu corpo cantarolando pelos
prazeres que seu toque e palavras sacanas estão me despertando.
Karim se abaixa, me puxando pela bunda até a borda, e choramingo
ao sentir a lambida em meu monte depilado. Nuria me enviou uma moça
que cuidou da minha depilação ontem. Lhe serei eternamente grata! Ele
pega minha vagina, espalhando minha carne molhada com as duas mãos,
esfregando meu clitóris com os polegares. Ainda querendo ser atrevida,
levanto meu torço, me apoiando nos cotovelos, e nossos olhares se
encontram. Ele sorri perverso antes de abrir meus lábios, arreganhando-me
bem, então sua língua me penetra bem fundo. Gemo longamente, minha
pele sendo coberta com uma camada fina de suor. Sua boca habilidosa me
suga, lambe, mordisca e recomeça tudo de novo. Em pouco tempo estou
arfando, levantando minha bunda do colchão, rebolando em seu rosto,
procurando mais fricção. Ele sorri e, depois de uma última lambida, sobe
pelo meu corpo. Vou me arrastando até ficar no centro da cama, sobre as
almofadas macias.
Meu coração dispara quando seu corpo másculo se acomoda em
cima do meu. Seu olhar é selvagem, mas há aquela ternura lá também. Seus
dedos traçam o meu rosto, lábios. Minhas mãos correm pelos seus ombros
largos, sabendo que é agora, ele será o meu homem e isso me deixa nervosa
de novo.
— Há uma coisa que precisa saber — murmuro e ele assente,
esperando, ainda traçando meu rosto preguiçosamente. Ele sabe que estou
nervosa e quer me acalmar, está nítido em seu semblante. — Eu só fiz isso
uma vez… — Sua testa franze um pouco e explico melhor: — Só fiz sexo
uma vez, Karim, e isso tem mais de seis anos… — Seus olhos arregalam,
surpresos. Então, entendimento vai tomando seu semblante e o olhar que
me dá agora é de pura reverência, sua testa encostando na minha. — Tudo
que saiu na mídia sobre mim não passou de encenação. Nunca quis parecer
fraca e derrotada para o público. A verdade é que por muito tempo eu nunca
quis ser de ninguém, mas agora quero, anseio ser sua, amiri.
— Shukran, habibti. Serei cuidadoso, prometo. — Sua voz soa mais
profunda, áspera, e seu pau duro está cavando em minha coxa. — E eu
nunca beijei outra mulher em quatro anos, Anna. Nunca quis outra mulher
antes — sussurra com emoção. — Só você, amirati. Só você. — Sua boca
toma a minha e nos beijamos por não sei quanto tempo, nossas mãos
acariciando cada centímetro um do outro, nossa excitação sendo elevada
mais e mais. Até que ele ruge, mordendo a minha boca, a mão procurando
minha vagina, empurrando um dedo, me comendo suavemente, preparando-
me para levá-lo. Quando estamos os dois gemendo em lamúria, para e se
acomoda entre minhas coxas. Me penduro em seus ombros, a respiração
suspensa, sentindo a cabeça larga esfregando entre minhas dobras. Ele
massageia meu clitóris, me fazendo rolar os olhos com a sensação, e desce
encontrando a minha entrada. Suas mãos enterram em meus cabelos de cada
lado, mantendo meu rosto bem perto do seu e nossos olhares não
desgrudam enquanto vai forçando-se para dentro. — Relaxe, Anna —
murmura, os olhos escuros me fazendo tão dele quanto seu pau entrando em
mim.
— Ahh, Deus… Ai… — Choramingo, tentando relaxar, recebendo
o pau grande e grosso, abrindo-me lentamente. Estou tremendo, Karim
trincando os dentes, metendo centímetro a centímetro do pau avantajado em
meu canal pequeno. Dói, sua espessura queima minhas paredes ainda que
esteja muito molhada. — Karim… — Gemo seu nome numa mistura de
tesão, reverência, prazer e dor. Mordisca meu queixo, puxando um pouco e
voltando numa estocada mais funda. Convulsiono toda e ele geme rouco.
— Sua boceta está me estrangulando tão gostoso, Anna… —
Enterra mais os dedos em meus cabelos, o pau esticando-me devagar até
colar nossas pélvis. Eu busco ar, me sentindo tão cheia que é impossível
respirar. — Calma, ‘amira… Vou deixá-la se acostumar comigo —
murmura, ficando parado uns instantes, nossas respirações alteradas no
quarto, o som árabe ressoando na tenda, o príncipe mais lindo dentro de
mim, me possuindo. — Você é a minha mulher agora — afirma em tom
áspero e puxa devagar, voltando num golpe lento, indo até o fundo. Gemo,
respirando rápido, me acostumando a ele, palpitando à sua volta, esticada
dolorosamente.
— Sim, habib, sou sua mulher agora — repito, isso o faz gemer
longo e alto, torturado por não poder se mover mais rápido, acho. — Me
tenha, amiri. Toma-me com força, do jeito que sei você quer — sussurro
corajosamente e o abraço com as pernas, abrindo-me ao máximo para levá-
lo. Karim solta um grunhido profundo e abaixa a boca, descendo pelo meu
pescoço, desce mais chupando um seio, depois o outro, os dois. Me morde
e, então, começa a ir e vir dentro de mim, com mais vigor. Estremecemos
de prazer, seu rosto subindo para me encarar, seus olhos dentro dos meus
como seu pau em minha vagina. Arranho suas costas e Karim estoca fundo,
batendo-me no colchão. — Ahhh! — Grito, me abrindo, rebolando,
recebendo-o todo, meu ventre começando a incendiar, se preparando para
outro orgasmo.
Está suado me montando, me comendo com força, metendo até o
punho, socando sem nenhuma restrição agora. Seus olhos me sondando à
procura de qualquer desconforto, mas não vê nenhum. A dor foi substituída
pelo prazer descomunal de me tornar dele.
Suas mãos descem para a minha cintura e ele me fode
profundamente a cada estocada. Nossas peles coladas deslizando uma na
outra. Nossas bocas arfantes. Chupa meu lábio inferior e empurra a língua
em minha boca. O recebo, rebolando em seu pau, nos beijando com uma
paixão que faz meus olhos lacrimejarem. Encontrei o amor de novo.
Quando sente que vou gozar, Karim pega minhas mãos, entrelaçando
nossos dedos, e as coloca dos lados da minha cabeça, prensando,
subjugando as minhas sobre as almofadas. Ele me come, grunhindo rouco, a
boca roçando na minha.
— Você quer gozar no meu pau, Anna? — Ruge contra meus lábios.
A boca viajando para o meu ouvido, onde sussurra perversamente: — Goza
para mim, ‘amira. — E eu não tenho qualquer chance: me desmancho em
gozo à sua volta. Ele urra longo e duro, batendo tão fundo que grito alto,
então os jatos mornos de sêmen inundam a minha vagina dolorida.
Convulsiono pelo prazer de senti-lo me enchendo com sua essência, me
tornando sua mulher, da forma mais primal possível.
— Habib… — Balbucio, minha pele parecendo que tem vida
própria, pulsando com a força do orgasmo. Ele ainda está me comendo,
sussurrando asperamente naquele dialeto que não consigo entender. Aos
poucos vai se acalmando, pequenos gemidos escapando dos seus lábios.
— Eu te amo, amirati. — Sua boca vem para a minha e o recebo ao
mesmo tempo com ânsia e saciedade.
— Também te amo, amiri. — Murmuro de volta, entre beijos,
puxando-o com mais força pelos ombros. Nos agarramos, suados, arfantes.
Pelo menos um pouco da tensão sexual saciada. Ele me beija por um longo
tempo, ainda todo enterrado em mim. Sinto nossos líquidos combinados
escorrendo em minha bunda para os lençóis.
Quando finalmente para o beijo, suas mãos tornam a enfiar em meus
cabelos. Supreendentemente ainda está duro, preenchendo meu canal.
Sinto-o pulsando. Será que está querendo de novo?! Minha pergunta deve
ter aparecido em minha cara, porque sua boca se curva num sorriso lento e
safado.
— Eu posso fazer pelo menos mais uma vez antes de pegar uma
pausa… — Murmura, começando a se movimentar devagar. — Está muito
dolorida, nour Al sabah?
Apenas gemo em resposta, passando a rebolar, acompanhando seus
movimentos lentos. Como posso reclamar com ele me chamando de “luz da
manhã”? Ele é lindo. — Eu quis tanto isso, ‘amira. — Geme, entrando,
saindo, indo e voltando. Seus olhos escuros prendem os meus. — Não
posso colocar em palavras como gostei de saber que era quase uma
virgem…
— Tão machista, honorável Alteza. — Zombo e ele ri, passando a
aumentar os golpes.
— Fui criado assim, Anna. — Se defende. — Eu te amaria
independente disso, mas não posso negar que está sendo ainda mais
especial para mim.
— Para mim também. — Assumo. — Estou feliz por me guardar
todo esse tempo. Estou feliz que tenha sido você, Karim.
Abre um largo e lindo sorriso. Os dentes brancos e retos destacando
no rosto moreno. Jesus, como é bonito!
— Estou feliz que você foi teimosa o suficiente para ousar vir a meu
país mesmo em um período instável. — Provoca, girando o quadril,
metendo bem fundo.
Eu grito e ele ri mais, o safado. Então, nos rola, me colocando por
cima, montando-o como uma cowgirl. Ofego, apoiando as mãos em seu
peito. Seu olhar corre pelo meu torso, seios, barriga, a junção de nossos
sexos, e fica mais aquecido. Suas mãos me tocam, cheias de posse e
reverência. Arqueio-me quando pega meus seios, espremendo-os
deliciosamente, rolando os bicos.
Minha excitação fica mais e mais intensa e passo a me movimentar,
escarranchada nele, girando os quadris por puro instinto. Karim geme,
descendo as mãos para a minha cintura, me levanta e abaixa enquanto sobe
em estocadas deliciosas. Estou bem dolorida, mas sinto o fogo familiar do
orgasmo queimando em meu ventre. Me debruço e ele toma um seio na
boca, chupando, mamando eroticamente, não parando de me comer com
vigor. O cavalgo, apertando meus músculos internos, decidida a lhe dar
tanto prazer quanto está me dando.
— Ahh… Anna… — Seu gemido misturado com grunhido me diz
que estou fazendo certo. Pega minha bunda, abrindo-a, e passa a meter com
mais força, a cabeça do pau batendo em algum local secreto em meu
interior. Meu corpo inteiro estremece, um choramingo saindo da minha
boca.
— Sim, habibti, você está quase gozando de novo, não é? — Sua
voz profunda penetra em mim como seu pau está fazendo e eu gozo,
gritando alto. Seus olhos ficam selvagens, me observando me desfazer em
cima dele, logo em seguida vem o jorro quente em minhas entranhas,
acompanhado de um rugido gutural e longo.
Caio sobre seu peito, precisando da sua boca. Ele segura meu rosto e
me beija com a mesma ânsia. Não há palavras para definir tudo que estou
sentindo, tudo que esse homem me fez sentir em seus braços. O meu
homem. Não posso evitar, lágrimas de alegria enchendo meus olhos.
— Eu amo você, Karim. Obrigada por ter me escolhido — sussurro
embargada contra seus lábios. Ele para o beijo, seus olhos escuros se
abrindo para os meus e suavizam ao ver a minha emoção. Seus dedos
traçam meu rosto com suavidade.
— E eu amo você, Anna — murmura. — Você será a minha rainha.
— E eu choro mais. Uma alegria como há muito não sentia se espalhando
dentro de mim.
— Você terá que brigar com as tribos por minha causa, habib. Sinto
muito — digo, me lembrando do triste fato de que não sou a escolhida do
seu povo.
— Por você, habibti, eu enfrento tudo — afirma com convicção,
olhando bem dentro dos meus olhos. Suspiro, derretida, apaixonada. Sim,
eu encontrei o amor de novo.

Três dias depois…


Karim Amihaj
Acordo e imediatamente um sorriso repuxa meus lábios ao sentir
uma perna macia e quente sobre as minhas. Abro os olhos e a vejo. Ela é
minha mulher agora. A tomei de muitas formas desde que chegamos de
madrugada, há três dias. Nós só saímos da cama para preparar comida.
Nossa fome pelo outro era, é grande. Está deitada de bruços, o lençol
cobrindo apenas uma parte da bundinha redonda e firme. Corro o olhar
pelas costas esguias, a fênix voando em sua omoplata. Tudo nela me
fascina, seduz. Vejo algumas marcas arroxeadas em sua pele, me lembrando
da intensidade com que a fiz minha. Allah, ela era quase uma virgem! Se
guardou depois da morte de seu primeiro amor. Eu a entendo perfeitamente,
uma vez que nunca apreciei ter de foder com outras mulheres depois que
Yasmina se foi. Eu não queria dar nada meu para nenhuma. Mas, então,
essa princesa linda e irreverente chegou e sacudiu meu mundo. Agora quero
lhe dar tudo, absolutamente tudo.
Quando entrei nela, esticando seu canal apertado, fazendo-a minha,
foi ainda mais especial. Não sou machista, não, longe disso, mas gosto de
saber que sou o segundo e o último a estar dentro dela. Não resistindo,
estendo a mão, tocando sua tatuagem. Ela suspira, ressona, mas ainda não
acorda. Está cansada da nossa maratona de sexo. Me inclino e deposito
beijos suaves em suas costas, seguindo a linha da coluna graciosa até a
fênix, onde mordisco. Anna geme o meu nome, inflamando meu sangue,
minha ereção matinal babando para se enterrar em seu calor, no entanto,
tenho planos para o dia, e não inclui ficarmos na cama. Quero lhe mostrar
um pouco de quem sou e do que costumo fazer no deserto.
— Acorde, amirati — murmuro, subindo a boca para a nuca,
sugando-a suavemente.
— Karim… — Torna a gemer meu nome, me tentando a fodê-la.
— Pare de gemer meu nome assim, habibti. — Rosno, dando um
tapa suave em sua bunda linda. Ela ri, choraminga e vira de frente para
mim, os olhos verdes sonolentos. — Temos um passeio, lembra que
mencionei ontem?
— Mmmm… Amo passear com você, honorável Alteza. — Sua voz
rouca cheia de provocação faz meu pau pulsar. Abaixo a cabeça,
mergulhando a boca na sua, num beijo gostoso. — Amo acordar assim
também.
Eu rio, meu coração quente, uma felicidade que pensei que nunca
mais sentiria se apossando de cada parte de mim. Dou mais um tapa em sua
nádega e me arrasto para fora da cama.
— Eu também, princesa. Mas hoje temos uma programação e
pretendo segui-la. — Me mantenho firme e ela se espalha sobre os lençóis,
me tentando com sua cara atrevida. —Vamos, levante-se. Temos que sair
logo para aproveitarmos bem o dia.
Anna rola na cama, me mostrando o corpo esguio, as curvas suaves,
elegantes, como uma modelo. Solto um grunhido e ela ri, o som lindo
reverberando em meu corpo. Enfim, se levanta e vem em minha direção,
nua, a tinta em seus braços perdendo a cor, mas ainda me inflamando. Vê-la
usando as tatuagens de hena que nossas mulheres usam em cerimônias e
eventos importantes despertou-me um sentimento de posse. Já estou
fantasiando meu nome tatuado por toda a sua pele morena clara.
Nós cuidamos da nossa higiene matinal, nos vestimos e montamos
nossos cavalos, nos dirigindo para a área onde instruí a guarda a montar
uma tenda para passarmos o dia. Anna vestiu um caftan branco e cobriu a
cabeça com um hijab vermelho, a cor vibrante como a sua personalidade.
Ela aprendeu a enrolá-lo, cobrindo a boca e nariz, deixando apenas os olhos
verdes expressivos à mostra. Eu acho que nunca vou me cansar de olhar
para ela, admirar sua beleza. Eu a cobiço enquanto cavalga ao meu lado,
montando Queen com sua postura impecável de amazona. Me olha de lado
e sorri, gostando de me flagrar babando nela. Incito Hércules num galope,
ultrapassando-a. Sua risada gostosa ressoa no deserto e vem atrás, dando
um grito de comando para sua égua competir à altura. Cavalgamos no ritmo
forte que tanto gostamos e quando chegamos perto do local diminuo para
um trote. Anna faz o mesmo e paro em cima da duna, esperando-a
emparelhar comigo.
— Faremos um piquenique no deserto, ou algo assim? — murmura
ao meu lado, seu olhar preso à tenda montada lá embaixo para passarmos o
dia.
— Algo assim, ‘amira — respondo enigmático. Ela revira os olhos.
— Vem, vamos começar a diversão! — Chamo-a começando a atiçar
Hércules de novo, mas a princesa estava atenta e disparou na minha frente.
— Pegue-me, se conseguir, Alteza! — Ousa gritar por cima do
ombro.
Rio, na verdade, gargalho, descendo atrás dela.
Há seis homens da minha guarda nos esperando na pequena tenda.
Desmonto, olhando para Anna pulando habilmente da sela de Queen para a
areia. Ela nunca me deixa ajudá-la a desmontar, como uma dama
comportada faria. Todavia, gosto da sua independência. Meus homens se
curvam respeitosamente, dois vindo cuidar dos cavalos. Anna retira sua
câmera de dentro da mochila presa aos arreios de Queen. Ela já tem umas
mil fotos minhas, nossas em nosso acampamento e está sedenta para
capturar imagens externas. Tomo sua mão na minha e nos dirijo para um
terceiro homem nos aguardando. Mohamed, um excelente falcoeiro que me
ajuda no treinamento e lida com minhas aves de rapina.
— Bom dia, meu senhor. — Ele cumprimenta, curvando-se. — Está
tudo pronto, como solicitado.
— Shukran. — Agradeço-o com uma leve inclinação de cabeça. —
Essa é a princesa Anna Julia Di Castellani, minha noiva. — Ouço um ofego
ao meu lado. Certo, eu acho que não tinha avisado a moça em questão…
— Salaam Aleikum, minha senhora… — Mohamed se inclina para
Anna.
— Aleikum Assalam, senhor. — Ela o cumprimenta também e o
homem sorri com sua pronúncia perfeita do árabe.
— Espero poder contar com a sua discrição, Mohamed. — Lhe
intimo. Não quero ninguém especulando sobre a minha relação com Anna,
por enquanto. Sei que terei uma dor de cabeça das grandes com os chefes
tribais, mas não quero pensar a respeito agora. Só quero desfrutar desses
dias com ela, longe de tudo.
— Prefiro cortar minha língua a desagradá-lo, amiri. — Mohamed
entoa, com a cabeça baixa. — Que Allah os cubra de bênçãos!
— Shukran, meu bom homem. — Torno a agradecer. — A princesa
está ansiosa para conhecer as aves.
— Aves?! Que aves? — Anna pergunta e rio, adorando deixá-la
curiosa. — Pare de ser malvado — reclama.
— Estamos quase lá, tenha paciência. — Atiço-a.
Nós seguimos Mohamed ao redor da tenda e então vejo meus
falcões lá, em suas gaiolas, prontos para a ação.
— Falcões! Uau! — Anna exclama, soltando minha mão e já
posicionando a câmera. — Eles são lindos, Karim! De quem são? —
Pergunta já clicando as aves.
Sigo Mohamed para as gaiolas, vestimos as luvas e só então
libertamos as três aves enormes. Eles voam alto, rápido, indo para longe.
— Ah, magníficos! — A princesa está parecendo uma criança,
registrando tudo. Eu sabia que iria gostar. Anna adora coisas que saiam da
trivialidade e me mostrou logo em nosso primeiro encontro que está longe
de ser uma princesinha frágil e indefesa. — Eles estão voltando!
Eu e Mohamed sorrimos pela sua euforia.
— Eles são treinados, Anna — digo-lhe. — E são meus. Pratico
falcoaria desde criança. — Seus olhos verdes vêm para mim, gostando de
me ouvir compartilhando algo sobre minha infância. — Aprendi com meu
pai, que aprendeu com seu pai e por aí vai…
— Parece fascinante para mim — murmura. — Vamos, faça uma
demonstração para as minhas lentes! Onde está a diversão, honorável
Alteza?
Eu gargalho e dou um grito de comando para o meu preferido, o
maior deles. A ave vem rapidamente, se empoleirando sobre a luva em meu
braço. Anna não perde tempo, clicando sem parar. Mohamed também
recebe alguns clicks e sorri, parecendo encantado pela princesa. Não posso
culpá-lo. Ela é contagiante.
— Fale-me um pouco sobre isso. Gosto de saber a história por trás
das minhas fotos — ela pede, nos enquadrando em vários ângulos.
— A falcoaria é um dos desportos mais exclusivos dos emirados.
Nas famílias nobres, a tradição é repassada de pai para filho. — Ofereço e
Anna para os clicks, ouvindo atentamente. — Venha, faça carinho em seu
peito. — Convido e ela parece apreensiva, embora seus olhos estejam
cintilando de curiosidade. — Ele não vai machucá-la, ‘amira. Está sob o
meu comando. — Garanto-lhe e ela vem devagar, esticando a mão delicada
até tocar a penugem no peito do imponente falcão. A ave gorjeia e tenho a
impressão de que revirou os olhos. Anna solta uma risadinha.
— Eu acho que tenho um rival, habibti. Ele se apaixonou por você.
— Seu ego está tão frágil assim, Alteza? — Me olha, o tom
zombador me inflamando.
— Quando voltarmos ao acampamento, vou lhe mostrar o quanto
meu ego está abalado, princesa — provoco-a em tom baixo para Mohamed
não ouvir. Ela ri, os olhos brilhando com sua ousadia característica.
— Espero ansiosamente, amiri — murmura ainda acariciando o
peito de Hashid, meu falcão apaixonado.
— Continuando sobre a falcoaria… — Limpo a garganta e ela sorri,
atrevida. — Sua história remonta há seis mil anos nesta região. Houve
períodos em que o falcão era uma ferramenta de caça, por excelência.
Mesmo após a expansão e riqueza da região, essa tradição continua
atravessando gerações.
— Ele parece quase dócil. — Aponta, analisando a ave quieta em
meu braço.
— Ele não é tão patético normalmente — resmungo. Anna solta
uma risada gostosa. — Acredite, princesa, meu falcão se apaixonou por
você.
Um sorriso e olhar suaves mudam sua expressão.
— Ele é lindo, imponente, majestoso — sussurra, seus olhos me
seduzindo. — Como o seu dono.
Me inclino, não me importando com Mohamed por perto, e lhe dou
um beijo suave na boca carnuda. Se eu já era louco apenas olhando para
seus lábios, o formato exuberante, depois da nossa intensa ação no
acampamento, meu corpo ferve de luxúria cada vez que olho sua boca. A
primeira vez que chupou meu pau, ajoelhada aos meus pés, engolindo-me
até a garganta, com clara inexperiência, mas seus lindos olhos verdes
cintilando de amor para mim, por mim, eu fui à loucura. Em países
islâmicos existem algumas restrições e orientações em relação ao sexo.
Diversas (e, na maioria das vezes, errôneas) interpretações do Alcorão são
feitas de acordo com as conveniências. O sexo oral e o anal, por exemplo,
são considerados sacrilégios em algumas regiões. Porém, não quero que
haja tabu na minha cama e de Anna. Quero-a inteira.
— Você está com aquele olhar, Alteza. — Sua voz provocadora me
faz sorrir.
— Minha mente foi completamente afetada pela imagem dessa boca
mamando meu pau, habibti. — Gemo baixinho. Seus olhos ficam anuviados
e me mata quando lambe os lábios luxuriosos.
— Talvez eu faça de novo quando voltarmos… — sussurra, um
sorriso travesso acendendo seu rosto. — Talvez, Alteza.
— Eu sei que vai, princesa. — Entro na provocação.
— Odeio abalar seu ego outra vez, honorável Alteza. Mas você
sabe, não te acho tão bonito assim. — Revira os olhos em claro flerte.
Gargalho e mordo seu lábio inferior antes de me afastar. Estamos
dando um show à parte para Mohamed.
— Quer tentar alguma diversão com ele? — Ofereço, indicando
Hashid em meu braço.
— Não é perigoso? Ele vai assim, com qualquer pessoa? — inquire,
claramente querendo a experiência.
— Oh, mas não estamos falando de qualquer pessoa, estamos
falando da mais nova paixão de Hashid. — Brinco e ela gargalha.
— Oh, então vamos nos tornar mais íntimos, Hashid. — Entra no
clima e dou o comando para a ave voar. Mudo minha luva para seu braço
delicado. Ela me encara, parecendo fascinada. — Shukran, amiri. Obrigada
por dividir isso comigo.
— Eu vou dividir tudo com você de agora em diante, nour Al sabah
— murmuro, meus olhos fixos nos dela.
E a minha garota destemida passa a próxima hora interagindo,
aprendendo os comandos básicos da falcoaria. Almoçamos um prato
simples, típico das tribos beduínas e, mais uma vez, Anna amou. À tarde, a
surpresa maior foi um avião da empresa de paraquedismo que Jalal
contratou na capital. Anna pulou como louca quando viu a logo da empresa
na pequena aeronave. Quando pedi um equipamento, ela me olhou
rapidamente, seu semblante mostrando surpresa.
— Você faz paraquedismo?!
Eu adoro quando a surpreendo.
— Sim. Estive no exército Kamariano, ‘amira, e não foi só para
cumprir um protocolo. — Me gabo, em tom arrogante. — Posso fazer
muitas coisas fora do meu palácio.
Minha princesa parece orgulhosa. Então, um sorriso malicioso curva
sua boca.
— Oh, sim, eu sei que pode, amiri… — Sua voz tem a intenção de
me dar uma ereção em pleno salto.
— Comporte-se, garota atrevida. — Dou um tapa em sua bunda.
— Eu vou retribuir essa surpresa, habib. — Me dá um olhar
misterioso e começa a vestir seu macacão.
— Eu quero saltar com você — digo e ela assente.
— Você literalmente sabe levar uma garota às alturas, Alteza. —
Sorri travessa e seu rosto suaviza adicionando: — Eu vou amar estar com
você lá em cima.
O avião subiu a 1.200 pés e o instrutor abriu a porta da aeronave, o
vento nos assaltando. O instrutor nos conecta, checando os detalhes de
segurança. Nos encaramos, frente a frente, colados. Ela me abraça, os
braços envolvendo meus ombros, meus braços enrolam em sua cintura, a
adrenalina começando a correr em minhas veias. Eu amo saltar, e quando
Mike me disse que poderia surpreender sua prima com paraquedismo ou
bungee jumping, que ela iria adorar, eu não podia acreditar. Aí eu fui
pesquisar outra vez sobre a princesa e abri suas redes sociais, encontrando
inúmeras postagens sobre os dois esportes radicais. Ela realmente parece
apreciar a prática. Com um grito de Anna me fazendo rir alto, saltamos para
o céu azul, o vento batendo com força em nós. Ela grita mais, não por
medo, mas porque essa garota é fora de série. Eu rio, nossos braços
firmemente enrolados um no outro, apreciando a queda livre.
Puxo o cordão e o paraquedas abre, a queda estabilizando. Ela fecha
os olhos, inspirando o ar longamente. Eu bebo dela e seus olhos se abrem
diretos para os meus, então sua boca vem para a minha. A brisa nos carrega
enquanto nos beijamos completamente entregues, meu coração bombeando
forte tanto pela adrenalina quanto pela mulher em meus braços. Nossa
aterrissagem é suave, mas ela me puxa para a areia, rindo, me montando, a
boca procurando a minha de novo.
— Vou pedir a Jalal que encontre um bom ponto onde possa praticar
o bungee jumping, ‘amira — murmuro, segurando sua mão, voltando para a
pequena tenda, pegar nossos cavalos. O sol está se pondo e o passeio
acabou.
— Você andou dando um “Google” em mim? — pergunta me
encarando divertida. Eu franzo a testa e ela explica: — É uma expressão
comum no Ocidente para quando alguém andou pesquisando o outro na
internet.
— Ah, sim, eu com certeza dei um “Google” em você. — Sorrio.
Ela me lança um sorriso travesso, dando de ombros.
— Tudo bem, Alteza, eu também dei um “Google” em você. —
Assume, então faz uma careta. — Embora não tenha encontrado muita
coisa. Suas redes sociais são praticamente inexistentes.
— Sou muito reservado. Não gosto de exposição na internet.
Ela gargalha, a boca indecente me tentando.
— Bem, isso foi antes de dar uma de Tarzan dentro de um avião
lotado, e em seguida ser flagrado dançando no escuro com uma moça do
Ocidente, meu senhor — zomba.
Eu rio. Sim, ela me pegou. Nos despedimos de Mohamed e os
outros guardas e seguimos na cavalgada de volta. Ela disse que queria
voltar junto comigo em Hércules e apreciei sua decisão quando sentou-se à
minha frente, me permitindo envolver sua cintura com um braço enquanto
segurava as rédeas com a outra mão. Lembranças da noite em que nos
conhecemos povoaram minha mente. O ar está mudando com o cair da
noite. Enfio o nariz em seus cabelos cheirosos, agora livres do hijab, meu
pau gostando muito da sua bunda esfregando nele a cada solavanco do
galope de meu garanhão. Queen nos acompanha como uma boa menina.
Seu braço enrola em meu pescoço por trás e gira o rosto para me encarar.
Abaixo o meu, minha boca roçando na sua. Ela esfrega a bunda em meu
pau com mais pressão e rosno, mordendo seu queixo.
— Amei o passeio, amiri — sussurra, lambendo a minha boca. Meu
pau está completamente duro agora. — Mas ainda não acabou. Quero tentar
algo…
— O quê? — Minha voz é apenas um grunhido. A atrevida sorri.
— Ouvi dizer que o sexo em cima de um cavalo pode ser… —
Lambe os lábios tentadores. — Interessante.
— Porra, quem lhe disse isso? — pergunto, fazendo-a rir mais.
— Segredo de meninas… — Murmura e pega as rédeas de
Hércules, fazendo-o parar. Meu sangue todo corre para o pau quando Anna
arranca o caftan por cima da cabeça, ficando apenas de sutiã e calcinha.
Não contente, faz uma manobra habilidosa, virando-se de frente para mim,
as coxas escarranchando as minhas.
— Wallah… — Balbucio, toda a capacidade de raciocínio lógico
fugindo de meu cérebro. Ela desce as alças do sutiã e juro, vou gozar aqui,
olhando-a se preparando para me foder em cima do maldito cavalo.
— Me foda, Karim. É a minha retribuição pelo dia incrível que me
deu, habib — sussurra, acariciando meu pau por cima do jeans.
Eu saio da inércia, agarrando seus peitos firmes, macios. Puxo os
bicos e rosno vendo as marcas das minhas chupadas nos dois montes
perfeitos. Anna geme, abrindo meu zíper, puxando meu pau de dentro da
boxer. Ranjo os dentes, sentindo a mão macia me masturbando. Firmo meus
pés no arreio, me mantendo equilibrado para tê-la me montando. Pego sua
boceta, encontrando a calcinha toda molhada. Resmungo, afastando a borda
para o lado, e deslizo os dedos nas dobras encharcadas. Ela respira
entrecortado, fechando os olhos brevemente. Não a penetro, temos que ir
rápido ou Hércules vai ficar estressado e sair da posição.
— Segure meu pau e o coloque dentro de você, Anna — digo,
segurando sua bunda, firmando-a. — Vem, monta meu pau, princesa.
Ela geme e pega meu pau, enquanto a levanto e nos encaixamos.
Meu corpo inteiro estremece quando sua boceta quente vai engolindo meu
eixo. Anna choraminga, sofrendo com meu tamanho. Então, se pendura em
meus ombros e desce, me levando até o punho, atrevida, gananciosa. Nós
dois gritamos, nossos sexos grudados, colados. Ela estremece inteira. Sou
grande e grosso e sua bocetinha é muito delicada. Hércules recomeça a
andar sem comando, e isso nos faz gemer alto pela sensação gostosa do
atrito com cada trote do animal. Nos agarramos bem firmes e a levanto,
saindo quase todo, voltando a me embainhar em seu calor.
— Karim… Ohh… — Geme, e a como devagar a princípio,
apreciando suas paredes molhadas e apertadas, me sugando deliciosamente
para dentro. Abaixo a boca, passando a chupar seus peitinhos deliciosos, e
vou aumentando o ritmo. Anna não consegue se mexer por causa do
equilíbrio precário, então o trabalho é comigo. A sustento, levantando-a e
abaixando no meu pau, com mais força, batendo fundo. O trote do meu
amigo de patas ajudando. Em pouco tempo estamos gemendo os nomes um
do outro, o gozo vindo com tudo. Eu a como com uma voracidade que me
deixa louco, amando sua irreverência. Querendo nunca mais sair de dentro
dela. Querendo morar aqui, em sua boceta quente e acolhedora. — Ah,
Deus… Eu vou gozar… — Choraminga, convulsionando, seu canal
palpitando, molhando ainda mais o meu pau. Urro, metendo com força
brutal, empalando-a grosseiramente, perdido, perseguindo meu gozo.
— Porra, ‘amira… — Praguejo, comendo-a ensandecido, minhas
bolas doendo, tensas, antes de eu explodir meu esperma dentro dela. Urro
guturalmente, o som ecoando pelo deserto. Enchê-la com meu sêmen me
deixa louco de prazer. Aproximo meu rosto do seu, tomando sua boca,
rasgando sua boceta com golpes bruscos, bem fundo, puxando-a para cima
de mim, punindo-a por ser tão gostosa e ousada. Depois de alguns minutos,
a loucura toda vai passando, até estarmos ofegando baixo, nos sugando
suavemente. — Gostosa demais… — Gemo em sua boca. Ela sorri
baixinho, seu corpo suado. — Você está bem? — pergunto, lembrando que
a comi com rudeza.
— Melhor impossível — sussurra, suspirando, seus olhos verdes me
fitando com mais amor do que luxúria depois de foder meus miolos.
— Você é deliciosamente louca, princesa. — Rio, sentindo uma
leveza que há muito não sentia.
Anna ri, me brindando com sua cara atrevida.
— Eu não o vi recusando, honorável Alteza — zomba.
— Tenho sangue nas veias, Alteza — provoco-a também. — Além
disso, sua boceta é gostosa demais para ser recusada, não importa a
situação. — Rio perverso. — Ou lugar.
— Você também não é nada mal. — A garota continua me zoando.
Mas seu rosto vai ficando terno e ela murmura: — Shukran por todas as
experiências incríveis de hoje, amiri.
Toco seu rosto, apaixonado além do que sou capaz de mensurar.
— Shukran por se tornar minha — digo, beijando-a delicadamente.
— Eu estava morto quando te encontrei. Você me devolveu a vida, ‘amira.
Ela arfa, seus belos olhos ficando muito brilhantes, amolecidos para
mim.
— Eu também estava, Karim — diz seriamente, tocando meu rosto
também. — Te encontrar, me tornar sua, me fez viva de novo, habib.
Hércules bufa, mostrando que não está gostando dessa conversa
aqui em cima. Nós rimos e a levanto devagar, saindo do seu calor. Nos
recompomos depois de muito malabarismo; retomamos nossa cavalgada, e
Hércules agradece voltando a correr. Algum tempo depois, já perto do
acampamento, reduzo para um trote vagaroso, poupando as forças do
garanhão. Anna encosta a cabeça em meu ombro e a envolvo pela cintura,
apreciando cada segundo do seu corpo junto ao meu.
— Então, noiva, hein? — pergunta em tom divertido.
Eu rio baixinho, esfregando meu nariz em seu pescoço.
— Alguma objeção, princesa? — inquiro.
— Eu não, mas terá que convencer meus pais; meu pai,
especificamente.
Seu tom indica que está brincando, porém, sei que terei certo
trabalho pela frente nesse quesito. Sua família não vai aceitar de bom grado
sua filha se mudar para o outro lado do mundo. Ou vai? Começo a me
perguntar.
— Estou brincando, habib. Meus pais ficarão felizes por mim. —
Ela vira o rosto me encarando de perto. — Eu pensei que nunca fosse
encontrar o amor de novo.
— Eu também não. Mas agora que o encontrei, ninguém me
impedirá de vivê-lo. — Garanto-lhe, dando um beijo suave em sua boca.
A noite está começando a engolir o dia e nosso acampamento surge
quando alcançamos a duna. Sei que uma tempestade de problemas nos
espera assim que encerrarmos nosso idílio, mas por enquanto eu só quero
saber disso: ela em meus braços.
CAPÍTULO OITO
Palácio Real de Kamar, quinze dias depois.
“Eu conheço você. Vejo isso em seu rosto. Não se comporte comigo. Você
pode ser má.… Se prepara, gata, porque hoje eu quero comer você toda…”
(Alex Rose – Toda)

Anna Julia
Eu ando até o parapeito da varanda dos aposentos de Karim. Inspiro
o ar da noite, lembrando a primeira vez que estive aqui. Ainda resistindo a
tudo que estava mudando dentro de nós. Tentando ignorar e parar a todo
custo a intensa atração que nos puxava em direção um ao outro. Ele
mandou os funcionários transferirem minhas coisas para cá antes de nós
chegarmos. Então, não tive como discutir e, vamos ser sinceras aqui, eu não
causaria uma cena de jeito nenhum! Vou dormir em sua cama! Suspiro feliz.
E daqui a pouco me apresentará para sua família como sua noiva. Queria ler
pensamentos para entrar na cabeça do “tio” Jafar. Rio maldosamente. É, eu
sei, isso não é muito elegante, mas o homem não me engole e não se
preocupa em disfarçar, por que eu teria de fazê-lo? Certo, por Karim. Ok, só
por isso serei educada com o homem chato. E ainda há mais uma pessoa
que, com sorte, morderá a própria língua e morrerá envenenada, a naja que
atende pelo nome de Latyfa. Imagine só voltar de dezoito dias maravilhosos
com o homem de seus sonhos e a primeira cara que vê na recepção é a da
ex-candidata a sua noiva?
Pois é. Quando pousei o helicóptero no terraço da ala norte, a cobra
peçonhenta estava na escadaria abaixo, junto com Jalal, Nuria e o Mister
Simpatia (que vocês já sabem quem é). Me irritei de imediato, primeiro
porque achei que a mulher assustadora já havia ido embora junto com as
outras cadelas adestradas, com o rabo entre as pernas. Mas não, ela não só
resolveu ficar como veio com uma conversa fiada de que quer passar um
tempo com Ayla, a filha de sua única prima, que era como uma irmã para
ela. Irmã.… Sei. Considerava tanto a prima que quer deitar com o marido
dela. Ardilosa. Aquela mulher não me engana. Ayla também estava lá com
uma das babás. Karim veio abrir a minha porta, me ajudando a descer, me
lembrando da noite em que nos conhecemos e me deixou pilotar. Pegou
minha mão na sua, nos direcionando para ir encontrar sua família. Foram
cumprimentos breves e ele anunciou que queria jantar com todos à noite.
Minha princesinha mal prestou atenção nas palavras de seu pai, veio
correndo, quebrando toda a baboseira de protocolo das princesas, e se jogou
sobre mim. Eu ri, levantando-a, abraçando-a bem apertado, meu peito tão
cheio de amor pela sapequinha.
— Você voltou, Anninha! — Exclamou inúmeras vezes, cobrindo
meu rosto de beijos, fazendo meus olhos lacrimejarem.
— Sim, habibti. — Eu ri, emocionada, beijando seu rostinho lindo.
— Eu voltei.
Ela me apertou pelo pescoço de novo, sua alegria palpável. A
família se espalhou, descendo os degraus, tomando direções diferentes, e
Karim se virou para nós. Seus cabelos escapando do rabo de cavalo o
deixando ainda mais sexy. Ele andou devagar, seu olhar terno indo e vindo
entre eu e sua pequena. Ela não precisou de convite, pulando para os
braços fortes de seu pai, cobrindo-o de beijos como fez comigo. Ele se
derreteu e meu coração foi junto, observando-os. Lindos. E agora são
meus.
Um sorriso suave se abre em meu rosto relembrando aquele
momento. Chegamos pela manhã, e foi um dia cheio. Almoçamos com
Ayla, porém, logo depois seu pai teve que ir para uma tarde de
compromissos em Jawahra e não o vi desde então. Tio Jafar ávido para tirar
seu sobrinho de perto de mim. Zombo. Trocamos mensagens antes de eu
entrar no banho, ele dizendo que já estava a caminho de casa. Eu ri como
uma boba, gostando disso, de como já estamos parecendo um casal.
Respondi dizendo que a banheira era grande demais para mim.… Mandou
emoticons rindo e garantindo que amanhã não vai abrir mão de me foder na
dita banheira, mas hoje me quer em sua cama. Me senti sensual, trocando
mensagens safadas com o meu homem. Volto para dentro do quarto para
esperá-lo sair do banho e pego meu celular, decidindo chamar meus pais
nesse meio-tempo. Antes de sair com Karim para o deserto, liguei para eles
e lhes disse em poucas palavras que o príncipe e eu estávamos envolvidos e
que não perguntassem muito naquele momento — quando voltássemos, eu
explicaria tudo.
Eles respeitaram minha vontade, e é por isso que os amo além da
conta. A diferença do fuso é de sete horas de Jawahra para Nova York.
Agora são 19h aqui e lá por volta das 13h. Devem estar no almoço. Faço
uma chamada de vídeo conjunta e logo os rostos de meus pais preenchem a
tela, parecem estar dentro da limusine. Eu sorrio, saudade apertando meu
peito.
— Bambina. — Minha mãe murmura amorosamente. — Acabamos
de almoçar em seu restaurante favorito. Tuo padre queria matar um pouco
da saudade. — Ela sorri com suavidade.
— Oi, mamma. — Digo, me sentando numa poltrona. — Estou com
saudades também. Muita! — Me derreto como uma garotinha. — Sinto
muito tê-los deixado apreensivos…
— Princesinha. — Meu pai me chama com sua voz e rosto suaves
para mim. — Como você está, filha?
— Oi, papai! — Eu arrasto um bonde pelo meu velho, já
perceberam, né? — Estou bem. — Respiro fundo. — Agora está tudo bem.
— Só isso? Não tem mais nada a nos dizer, mocinha? — Ele
encarna o pai durão. Eu rio, amando-o, amando-os tanto.
— Eu e Karim decidimos que vamos ficar juntos. — Solto de uma
vez e seus rostos ficam incrédulos na tela, suas bocas escancaradas. Eu sei,
eles já tinham perdido as esperanças comigo. — Nós nos amamos, mamma,
pai. — Meus olhos ardem com lágrimas de felicidade. — Eu encontrei o
amor outra vez.
Eles meio que engasgam, ainda em silêncio. Até meu pai, que
sempre tem um comentário espirituoso na ponta da língua, não diz nada por
alguns instantes.
— Ah, piccola… — Minha mãe está visivelmente emocionada, seus
olhos de uísque cintilando com lágrimas não derramadas. — Eu e tuo padre
pedimos tanto a Dio para que a fizesse feliz de novo, tesoro mio.
Eu assinto, incapaz de falar. Meu pai limpa a garganta.
— Querida, é muito bom ouvir isso, ver a felicidade em seu rosto.
— Diz emocionado também, seus olhos verdes estão marejados. — Eu e
sua mãe realmente rogamos muito a Deus para fazê-la feliz de novo, filha.
— Ele torce o nariz um pouco e se parece com meu pai descolado quando
adiciona: — E, por favor, diga a Amihaj que se for mentir para mim de
novo, que pelo menos faça uma boa argumentação. Jesus, ele é muito ruim
para inventar desculpas!
Eu rio e minha mãe meneia a cabeça, rindo de seu marido também.
— Papai, pare. — Peço, ainda rindo. — No próximo mês iremos
para o nascimento de Ciara e ele fará o pedido oficialmente…
— Pedido?! Que pedido, mocinha? — Ele levanta uma sobrancelha.
Eu reviro os olhos.
— Pai, tenho vinte e quatro! — reclamo. — Nós não queremos
perder mais tempo. Vamos nos casar — digo e eles ficam boquiabertos mais
uma vez. — Me sinto viva outra vez, pai, mamma. E é tudo por causa dele.
Eu o amo.
— Ah, bambina… — Minha mãe está chorando agora e me sinto
emotiva também. — Isso me faz tão feliz. Ti amo tantissimo, piccola mia.
— Also, mamma — murmuro. — Ti amo tanto.
Meu pai limpa a garganta mais uma vez.
— É claro que estou feliz pela minha princesinha, mas casar? —
Meio que resmunga. — Você não está grávida, está?
— Pai!
— Dom!
Eu e minha mãe exclamamos juntas.
— Certo, opção A descartada — diz com seu bom humor voltando.
— Te amo, querida. E prometo me esforçar para não rir das desculpas
fracas de seu futuro marido.
— Dom, amore mio, comporte-se — mamãe diz seu mantra quando
se trata de conter os arroubos de meu pai.
Eu rio alto. Eles me fazendo feliz mesmo à distância.
— Eu te amo, papai. Ti amo, mamma — digo, me levantando,
andando pela sala. — Preciso desligar agora. Vou falar com Lipe um pouco.
Eles me jogam beijos e nos despedimos.
Ligo para meu irmãozinho. Quando seu rosto bonito e vivaz aparece
na tela, eu rio, me sentindo completa.
— Ei, maninha! — Sua voz bem-humorada me saúda. Está andando
por um corredor, acho que na empresa. — Indo para uma reunião, mas vou
te dar uns dez minutos, que tal? — Me provoca e eu lhe mostro a língua.
— Pare a encenação, fedelho. — O provoco de volta. — Aposto que
será o garoto do café nessa reunião.
Ele gargalha com vontade e me vejo rindo também.
— Espertinha. — Seu olhar fica terno. — Estou com saudades da
minha irmãzinha. Quando você volta? — Eu mordo meu lábio e ele franze
o cenho pela minha hesitação.
— Eu não vou voltar, Lipe. Pelo menos não para morar aí — revelo
baixinho. — Lembra que disse que o príncipe era um babaca?
— Lembro. — Ele ri, seus olhos de âmbar brilhando com
travessura.
— Bem, acontece que ele não é um babaca e eu me apaixonei,
irmãozinho. — Solto de uma vez.
— Então nossos velhos estavam certos — murmura, com um sorriso
malicioso. — Eles estavam desconfiados, ainda mais depois dos vídeos no
YouTube… — Ele tem o ar de deboche que conheço bem, herdamos de
nosso pai. — Vocês estavam sendo tão óbvios, Anna. — Rola os olhos.
— Não estávamos não — resmungo, fazendo-o sorrir mais. — Eu o
amo, Lipe. Agora entendo o porquê decidi vir para cá contra tudo e todos.
Ele estava me esperando para vivermos a nossa história.
— Isso foi profundo. — Assobia, então seu rosto e olhar ficam
cheios de ternura. — Estou feliz por você, maninha. Sentirei sua falta, mas
sempre podemos pegar um jato e ir encher o saco um do outro, não é? —
Eu rio, assentindo. — Jesus, pensei que você fosse morrer encalhada, sabe?
— Cale a boca, garoto. — Reviro os olhos.
— Eu te amo, maninha — murmura, seu rosto ficando sério. — Eu e
nossos velhos só queremos que seja feliz.
Meus olhos marejam sentindo o amor do meu irmãozinho.
— Obrigada, maninho. Eu serei feliz — digo um pouco embargada.
— Também te amo, bonitão. Se cuida, depois nos falamos mais. — Sopro-
lhe um beijo e ele devolve um estalado na minha tela.
Suspiro ao desligar, me sentindo inabalável com o apoio deles.
Quando me viro para voltar ao quarto, Karim está lá, parado, me olhando
com uma expressão suave em seu rosto. Usa um caftan preto com um
sobretudo branco. Os cabelos estão sem turbante, amarrados no estilo
samurai. Seus olhos estão sombreados por lápis preto e eu amo o efeito que
isso tem em seu olhar, deixa mais intenso, um brilho perverso que me deixa
molhada. Lindo. Me contempla dos pés à cabeça, o brilho de aprovação e
desejo tingindo as íris escuras. Estou usando um vestido-caftan vermelho de
seda egípcia. As mangas são em renda ajustadas, indo até o punho. Um
decote em V, mostrando um pouco do meu colo, mas com elegância. Há
bordados em bronze e ouro marcando o decote das costas, que é bem
profundo, atingindo o cinto de ouro, e voltando para a frente, as abas se
unindo pelo meu torso até se separarem numa abertura frontal sexy,
mostrando até a metade das minhas coxas. Uso sandálias douradas de tiras
enroladas até os joelhos. Eu sei que elas deixam meu príncipe com tesão.
Meus cabelos estão soltos, partidos para o lado direito. Não trouxe nada de
joias ou prendedores sofisticados para essa viagem. Então, fiz alguns
cachos com o babyliss, deixando-os cair sobre as costas, diminuindo o
impacto do decote.
— Amirati… — O tom reverente na voz do meu homem me dá a
certeza de que o agradei. Ele vem para mim, descendo os degraus, todo
lindo, imponente. Faço uma nota mental para agradecer à Nuria. Ela me
convenceu a encomendar mais dois modelos com sua estilista na ocasião do
bendito baile. Acho que minha amiga já desconfiava que eu não iria
embora. Os vestidos foram entregues nessa semana, esperando meu retorno.
Tal como Karim está devendo para Jalal, também estou em dívida com sua
esposa. Vou sugerir que façamos algo especial para eles. Quando para à
minha frente e seu cheiro exótico e másculo invade meus sentidos, meu
corpo responde imediatamente. Minha vagina fica úmida, pulsando, minha
pele comichando pelo seu toque, e ele vem. Suas mãos correm pelos meus
ombros até os pulsos. Ele os pega, levando-os até sua boca, beijando minha
pele com carinho e sensualidade, os olhos escuros presos aos meus. Arfo,
minhas pálpebras pesando, meu corpo querendo-o com uma fome
avassaladora. Tem sido assim desde que o tive dentro de mim pela primeira
vez.
— Amiri… — sussurro ofegante. Seus lábios tremulam num
arremedo de sorriso arrogante, perversamente masculino. Sabe o quanto sou
louca por ele.
— Você é a mulher mais bonita que já vi, habibti. — Sua voz é
áspera como lixa, a luxúria misturada ao amor em seu olhar. Suas mãos
tornam a subir pelos meus braços, os dedos tocando meu pescoço, minha
pele nua, descendo, insinuando-se pelo decote. Meus seios arrepiam, os
bicos implorando para serem sugados, do jeito que ele adora fazer, bem
forte.
— Eu não sou. — Rio baixinho, ainda mais ofegante.
Seu braço enrola em minha cintura e me puxa suavemente, colando-
me ao seu corpo grande. Sua ereção sólida e pronta pressiona em minha
barriga, ele ri baixinho e abaixa a boca bem próxima da minha.
— Sim, você é, ‘amira — sussurra, raspando os dentes em meu
lábio inferior.— E pertence a mim. É toda minha.
Oh, Jesus, eu termino de molhar com sua declaração de posse. Nós
temos feito muito sexo desde que nos embrenhamos no deserto. Na cama,
em cima de um cavalo… O quê? Eu precisava comprovar a questão da
logística. Ella me contou da sua experiência com Mike em Ibiza e não pude
evitar, fiquei curiosa. Rio internamente. Não me culpem. E, sim, a logística
é meio louca, exige um monte de equilíbrio, mas o resultado é de outro
mundo! Me excito toda vez que recordo como Karim me segurou e me
empalou rudemente em seu pau, me comendo sem restrições. Eu nua,
montando-o, tendo apenas aquele mundão de areia como testemunha. Foi
mágico, delicioso. Ele também me teve enquanto tomávamos banho nus no
oásis. Me teve na encosta de uma duna, sob a luz das estrelas. Cada uma
dessas experiências me deu a certeza de que realmente pertenço ao deserto,
pertenço a ele.
— Você que é o homem mais bonito e perfeito que já vi, meu
príncipe. — Ele solta um grunhido e segura minha nuca com a mão livre,
ofegamos forte, o tesão nos tomando, então rimos e nossas bocas se
encontram num beijo lento, excitante, quente. Sua língua lambe a minha em
pinceladas deliciosas, me fazendo latejar, gemer, me esfregar na coluna
grande e grossa de seu pau.
— Eu quero você, Anna. — Geme, mordendo minha boca. — Senti
falta de gozar em sua bocetinha gostosa hoje.
— Oh, Jesus… Você não está sendo justo… — Resmungo,
mordendo-o de volta, rodeando-o pelo pescoço. Praticamente me
pendurando nele. — Sua família está nos esperando.
— Sim… — Ele ri, respirando agudamente na minha boca, as mãos
pegando minha cintura, apertando-me contra si, descendo para a bunda,
alinhando nossas pélvis. — Uma rapidinha não me satisfaria.… Preciso de
você nua na minha cama, à minha disposição, pela noite adentro… —
Desce a boca, dando uma mordida suave em meu pescoço, depois mais
forte. Vai para o meu ouvido e suga o lóbulo, murmurando com aspereza:
— Eu quero você por inteiro hoje, amirati. Estou louco para estar dentro
dessa bundinha linda. — O safado amassa minhas bochechas, a fome em
seu olhar é voraz.
Engasgo, excitação sem tamanho queimando em minhas entranhas.
Eu quero, também estou louca para ter essa experiência. Ella me disse que
dói muito na primeira vez, mas a dor é excitante. Bem, minha prima é uma
submissa, vive uma relação BDSM com seu marido, é claro que a dor é
algo tranquilo para ela. Duh! No entanto, quero isso com o meu homem.
Quero ser dele completamente.
— Também quero ser sua por inteiro, amiri. Quero que me possua
de todas as formas que quiser. — Sussurro com o atrevimento em dia
mesmo que esteja me borrando de medo de ser penetrada com seu volume
avantajado na retaguarda… Ai, meu Jesus!
— Garota atrevida… — Ele rosna, uma mão subindo para o meu
rosto, o polegar tocando, esfregando meus lábios. — Amo essa boca
irreverente. — Eu engulo seu dedo, rolando a língua na ponta, sugando-o
inteiro, e Karim grunhe palavras no seu dialeto particular, parecendo pronto
para me comer bem aqui e agora. — Vamos sair logo antes que eu perca a
cabeça… — Grunhe puxando o dedo da minha boca. Faço beicinho e ele ri,
ficando tão lindo que é injusto com pobres moças ocidentais. — Eu tenho
algo para você, habibti. Acabei esquecendo quando a vi desse jeito,
parecendo uma deusa… — Sorri e se afasta subindo os degraus, sumindo
no quarto. Volta segundos depois, segurando uma caixa de veludo vermelho
retangular. Abre-a e ofego, vendo uma tiara delicada, em ouro e rubis. —
Para você, nour Al sabah. — Murmura, fazendo meus olhos marejarem de
emoção. Claro que a joia é simplesmente linda, mas não é pela tiara em si,
eu tenho várias em minha casa, é pelo gesto atencioso.
— Foi de minha mãe.
E isso faz as lágrimas turvarem minha visão. Seu gesto acaba de se
tornar ainda mais significativo e especial.
— E-eu não sei o que dizer, Karim… — Minha voz sai embargada.
Ele sorri, vendo minha emoção, e se inclina colocando a caixa sobre um dos
sofás, em seguida retira a joia de dentro.
— Você pode usá-la — murmura, trazendo-a para mim. Eu abaixo a
cabeça, sentindo-o colocá-la com cuidado até se encaixar. Pega meu queixo,
nossos olhares se encontrando. — Amirati… A minha escolhida… —
sussurra com esses olhos negros me hipnotizando com sua intensidade.
— Shukran, habib — digo, pegando seu rosto moreno de cada lado.
— Não por isso, habibti. — Seu olhar fica suave e ele se inclina,
depositando um beijo suave na minha testa. — O restante da coleção de
minha mãe será trazido do museu para você ainda nesta semana. — Franze
o cenho, parecendo um pouco desconcertado. — A outra parte está nos
pertences de.… Eu dei como presente de casamento para…
— Yasmina — murmuro, acariciando seu rosto e tranquilizando-o.
— Você não tem que evitar falar o nome dela na minha frente, Karim.
Lembra como nos aproximamos? Nós falamos de nossos amores perdidos.
Eu respeito-a, respeito a sua história com a mulher que amou e é a mãe da
sua filha. — Seus olhos ficam brilhantes de lágrimas, me fitando com clara
adoração. — Yasmina faz parte da sua história como Nate faz parte da
minha. Abri meu coração para você no instante em que em perguntou sobre
ele. E sei que abriu o seu para mim pela mesma razão. Eles sempre estarão
em nossos corações, merecem ser lembrados com todo o respeito.
— Você é a mais linda e perfeita mulher. — Sua voz é emocionada,
seus dedos traçando meu rosto. — Eu nunca soube a razão de não entregar
todas as joias para Yasmina. Mas agora eu sei. — Roça o nariz no meu
rosto. Nós nos cheiramos, apaixonados, emocionados. — Allah sabia que o
que vivi com a mãe de Ayla foi muito especial, mas você ainda viria para
mim. Você é o meu destino, habibti.
Uma lágrima escorre pelo meu rosto. Eu me inclino, beijando sua
boca com reverência.
— E você é o meu. Eu amo você, amiri.
— Eu amo você, amirati — murmura, segurando minha nuca,
aprofundando o beijo.

***

Alguns minutos depois, entramos no salão de festas da ala oeste. O


mesmo usado no baile. Karim, quis usá-lo hoje para tirar a má experiência
que tive naquela noite. Foi horrível, eu estava morrendo por dentro a cada
mulher que chegava perto dele, por isso, meu príncipe lindo quis me trazer
aqui e apresentar como a sua escolhida no mesmo lugar que me causou
sofrimento. Alguma dúvida de que ele é o mais lindo e perfeito homem? E é
meu. Todo meu. Nós entramos, minha mão apoiada em seu antebraço
direito, e do outro lado está a minha sapequinha preferida, um sorriso
imenso fazendo seu rostinho ficar ainda mais lindo. Noto a decoração
parecida com a daquela noite, como se fosse uma festa, ainda que apenas a
sua família esteja aqui. Meu coração incha de tanto amor, mal cabendo no
peito. Então, eu vejo a naja. Seu olhar maligno está preso em mim, posso
sentir sua inveja e hostilidade veladas. Foda-se, sua vaca! Lhe digo com
meu olhar e sorrio simpática em seguida, porque as princesas não podem
ser mal-educadas. Rio maldosamente. Não em público, pelo menos.
— Boa noite, meu senhor, minha senhora. — O tio Jafar vem para
perto, inclinando-se respeitosamente. Seu olhar passa rapidamente por mim
e se concentra em Karim. Tao simpático…
— Boa noite, tio, tia Samira. — Karim os saúda com o mesmo
respeito.
— Boa noite, meu senhor, minha senhora. — Cumprimento-os,
abrindo um sorriso sincero para sua simpática esposa.
Logo Jalal, Nuria, o pequeno Naim e o divertido Zafyr chegam para
perto também.
— Amiri, minha senhora. — Jalal se inclina reverentemente, um
sorriso divertido em seu rosto bonito. Os homens Al-Abdallah possuem
uma genética abençoada. Mesmo o Mister Simpatia, com sua cara fechada,
ainda é bonito. Sorrio da minha implicância com o homem.
Eu e Karim cumprimentamos a ele e à Nuria. Ayla tagarelando,
sendo paparicada por Jalal e sua esposa. Ele e Nuria são muito carinhosos
com ela, acredito que se apegaram à pequena enquanto não conseguiam
conceber seu bebê.
— Boa noite, meu senhor. — Zafyr vem para a roda, os olhos
maliciosos prendendo os meus, murmurando: — Minha senhora.
— Olá, meu senhor. — Devolvo o cumprimento, me mantendo séria
diante do flerte do primo conquistador de Karim.
— Primo, recorda o que lhe disse na outra noite? — Karim lança um
olhar intimidante para Zafyr, que sorri e levanta as mãos em rendição.
— Com todas as letras, primo. — O primo mais novo finge um
estremecimento.
— Ótimo. — Karim grunhe.
— Amiri. — A voz, melosa demais para o meu gosto, me faz retesar
e segurar o antebraço de Karim com mais firmeza. A naja se curva em sua
reverência exagerada e ridícula para meu homem, então, seu olhar vem para
o meu e completa: — Minha senhora.
— Boa noite, Latyfa. Que bom que se juntou a nós nesta noite. —
Karim a cumprimenta como se essa infeliz não tivesse sido sua candidata a
esposa dias antes. Homens.… Eles são sem noção em qualquer parte do
mundo!
— Boa noite, Latyfa. — Cumprimento-a educada, mas
suscintamente.
Depois de mais uma rodada de conversa, nos dirigimos para a mesa
ostentando um verdadeiro banquete. Karim não poupou esforços e a tensão,
pela presença de Latyfa, vai se dissipando durante o jantar. Sentei-me do
lado direito dele e Ayla ao meu lado. Eu a sirvo e a ajudo cortar a carne e
ela abre seu sorriso banguelo para mim. Minha pequena mudou mais um
dente na arcada superior.
— Shukran, Anninha.
— Por nada, minha princesinha sapeca. — Eu me debruço, roçando
meu nariz no seu. Ela gargalha lindamente. — Agora coma tudo para ficar
forte, habibti.
— Tia Nuria, sabia que meu pai vai se casar com a Anninha? — Ela
surpreende a todos ao tagarelar. — Ela não vai mais embora para o
Ocidente, não é, habibti?
Eu olho para seu pai que, em vez de bravo por ela estragar seu
anúncio, tem um sorriso orgulhoso se abrindo em seu rosto. Ele se levanta e
ergue o cálice dourado, é como um déjà vu, exceto que naquela ocasião
meu coração estava esmagado. Esta noite a história é outra. Meus olhos se
fixam em sua figura majestosa.
— Bem, a princesa Ayla antecipou a razão para eu convidá-los aqui
nesta noite… — Sua voz é um misto de solene e divertida. Nós rimos. Seu
olhar negro vem para mim. — Vocês já conhecem a princesa Anna Julia Di
Castellani, minha hóspede desde o seu sequestro pelo movimento
insurgente. Todavia, o que poucos sabem é que nos apaixonamos. — Meus
olhos lacrimejam de emoção. — Eu a amo e a farei minha rainha. —
Murmura, me fazendo a mais feliz das mulheres. Eu lhe digo que o amo
com meus olhos. Ele sorri, a mesma felicidade brilhando em seu rosto
lindo, e volta a atenção para os familiares em volta da mesa. — Recebam-
na como a sua futura rainha!
E o salão se enche de expressões entusiasmadas, todos pedindo a
proteção de Allah para nós e nossa união. Mesmo a cobra está sorrindo e
desejando coisas boas. Urgh. Falsa. Somos cumprimentados e em seguida
nos levantamos para a sobremesa que está servida numa mesa do outro lado
do amplo espaço. O tio Jafar solicita uma palavra com Karim e Jalal os
segue. Fico com Nuria e Ayla nos servindo no buffet com uma diversidade
de iguarias orientais. Pego uma taça de Malabie (manjar de leite com calda
de flor de laranjeira). Eu gemo ao provar uma colherada. Dizer que é um
manjar dos deuses seria redundante.
— Então, minha senhora… — Nuria faz uma mesura divertida. —
Eu pedi tanto a Allah que colocasse bom senso na cabeça de Amihaj.
Suas palavras fazem meu peito aquecer. Uma grande amizade está
florescendo entre nós, e isso é bem-vindo. Já percebi que a competição pela
afeição do príncipe é um grande empecilho para a amizade verdadeira entre
as mulheres na corte. Saber que não está de olho no meu homem é um
alívio e tanto.
— Shukran, Nuria. Estou em dívida com você — digo-lhe e ela
meneia a cabeça. — Estou sim e vou lhe retribuir à altura, prometo.
— Ver o sorriso no rosto de Amihaj já é recompensa suficiente,
Anna. Jalal e eu pensamos que ele seria infeliz pelo resto da vida. —
Admite e sua voz abaixa um tom. — Mas sabe que não será fácil, não é? As
tribos são muito influentes e ele terá que lutar muito para se casar com uma
mulher que não seja do nosso povo.
— Eu sei. — Meu rosto cai.
— Ei, não estou dizendo para deixá-la triste. Só quero que esteja
preparada e seja forte para seu marido e rei. Além disso, muitas mulheres
tentarão conquistar a admiração dele ao longo da vida. — Torce o nariz. —
Jalal, que não é o herdeiro direto ao trono, já recebeu inúmeras propostas
para tomar outras esposas. Meu marido me garantiu que nunca tomará outra
esposa. Mas em nossa região não dá para nos fiarmos nesse tipo de
promessa. — Ela parece resignada, o que me assusta. — Se houver a
necessidade, se conflitos surgirem e para restaurar a paz meu marido
precisar tomar outra esposa em um casamento de Estado, eu precisarei
aceitar. — Merda. Eu ofego, não gostando dessa revelação. — Essa é a
nossa cultura, Anna. Você precisa entender e aceitar a cultura de seu rei e
apoiar qualquer decisão sua, mesmo que isso implique em dividi-lo com
outra, ou outras mulheres.
Engulo em seco, meus olhos arregalados.
— Uh, muita informação para a minha noite de noivado. — Faço
uma careta e ela sorri, meneando a cabeça.
— Desculpe, eu sinto um carinho muito grande por você e não
quero que seja surpreendida. Nossa cultura é muito diferente da sua e
algumas coisas irão chocá-la. — Respira fundo e sorri. — Mas, em nosso
favor, os homens Al-Abdallah não costumam tomar segundas esposas. Eles
são leais e apaixonados. São poucos na linhagem que o fizeram até agora.
— Ela olha para o lado vendo seu cunhado vindo em nossa direção e sorri
em tom conspiratório. — Bem, Zafyr tomará pelo menos dez esposas, com
toda certeza.
Eu dou risada, me permitindo aliviar o clima.
— Fogos de artifício, você está linda. — Ele assobia me olhando de
cima a baixo.
— Meu cunhado, não é apropriado olhar para a sua futura rainha
desse jeito. — Nuria o repreende.
— Ouça Nuria, meu bom príncipe. Além disso, parece que as
ameaças de meu noivo para as suas partes baixas permanecem… — Não
resisto a provocá-lo. Isso o faz gargalhar atraindo a atenção dos outros,
inclusive de Karim, que franze o cenho nos lançando um olhar sério.
Conversamos amenidades depois disso. Zafyr contando que está
indo para Mônaco no fim de semana. Ele é mesmo um príncipe playboy.
Me lembra Lipe e meu primo Max, dois mulherengos de marca maior.
Nuria sai para entregar Naim à babá; Ayla também é levada a contragosto
pela sua babá até o quarto. Zafyr se despede indo para o lado dos homens e
estou me preparando para sair de perto dos doces ou vou devorar mais uma
taça do manjar, quando alguém para do meu outro lado.
— Parabéns, princesa! — Latyfa exclama, seu tom baixo e seu rosto
não mostrando qualquer sinal de empolgação. — Eu subestimei você,
confesso. — Finge estar pegando uma sobremesa, seus gestos tensos, dá
para sentir a raiva e despeito emanando dela. Embora esteja toda produzida
e bonita num caftan salmão, seus olhos frios não me enganam mais. —
Parece que é uma sharmuta[27] experiente e sabe o que está fazendo para
cegar o príncipe de forma tão vil e baixa.
Eu arfo, meu sangue esquentando com a ofensa escancarada. A
vadia me chamou de puta!
— Oh, você deve estar morrendo de inveja agora. — Rio friamente,
fingindo pegar outro manjar. Não vou mostrar aos outros toda a
indelicadeza guardada apenas para ela. — Não posso te chamar de puta, já
que ainda é ridiculamente virgem aos trinta. Jesus, deve ter uma teia de
aranha gigante aí, hein, minha filha! — Debocho, fazendo uma careta. —
No entanto, posso chamar de vaca! Uma vaca despeitada que ainda está
claramente tendo esperanças de fisgar o meu homem. — Rosno baixo para
os outros não me ouvirem.
Ela ri, os olhos gélidos me causando calafrios.
— As tribos irão exigir um casamento de Estado, princesa. Não
cante vitória antes do tempo. — Meu corpo gela, a conversa de Nuria
voltando à minha mente. — Você está prejudicando o príncipe e sua relação
com seu povo, se deitando com ele, vivendo em pecado. Ele ruirá se você
não entender que Kamar precisa de equilíbrio. Um equilíbrio que só um
casamento de Estado pode dar. Acredite em mim, Sua Alteza vai ceder, e
quando esse momento chegar estarei lá e me tornarei sua esposa também.
— Não, ele nunca tomará outra esposa — digo, minha voz tão
horrorizada quanto estou me sentindo. — Ele me ama.
— Não se trata de amor, querida. — Ela debocha. — Se trata de
fazer alianças, conseguir muitos herdeiros, garantir a permanência da
linhagem no trono.
Olho-a e respiro fundo, me recusando a deixar essa víbora me abalar
de novo. Preciso lhe mostrar com quem está lidando. Me aproximo mais,
rindo para os outros não desconfiarem, e digo bem perto do seu ouvido:
— Um trono no qual você quer muito sentar a sua bunda ambiciosa,
não é, querida? Escute-me bem, porque não vou ficar repetindo essa merda,
Karim é meu, todo meu, entendeu? — Ela bufa, incitando meu pior
comportamento. — Oh, não é triste que nunca saberá como é ser possuída
por ele? Tão lindo, viril, gostoso, todo enterrado dentro de mim, sua voz
sussurrando em meu ouvido o quanto me ama, o quanto o faço gozar forte e
gostoso…
— Meretriz. — Ela cospe, seu corpo quase explodindo de raiva. Eu
rio e dou o último golpe:
— Ele é meu. Para a sua integridade física, aconselho-a a jamais
esquecer disso. — Ela arfa, talvez com medo de eu jogá-la no calabouço
por me insultar. Afinal, serei sua rainha. — Não, não, eu não preciso de
guardas para lutar em meu lugar. Sei me defender muito bem e saiba que, se
necessário, terei prazer em dar uns bons socos nessa sua cara de vaca
recalcada. Vou te dar uma surra, está me entendendo? — Engole em seco.
Ótimo. Meu recado foi assimilado. Me afasto e completo um pouco alto
para encenar: — É tão bom que tenha decidido ficar um pouco mais
conosco, Latyfa. Farei seus dias memoráveis, querida.
Me encara sem saber o que fazer, porque estou sendo muito
dissimulada.
— Você…
— Desculpe não lhe dar mais atenção, mas temos que nos retirar
para nossos aposentos… — Espezinho-a porque posso agora. Foda-se! —
Karim está ansioso para me foder em sua cama. — Lhe dou uma piscada
maliciosa e sopro um beijo.
Então, viro as costas, indo buscar o meu homem. Uhuuuuu! Sim, eu
venci a naja nesse round. Aplausos, senhoras e senhores! Rio contente
comigo mesma.

Karim Amihaj
Entramos em meus… Nossos aposentos e Anna solta a minha mão,
andando à minha frente. Está esplendorosa esta noite. Sobe os degraus para
o segundo ambiente, onde fica o home theater. Ando atrás dela, fascinado.
Me dirijo para o bar, nos servir uma bebida.
— O que quer beber, habibti? — pergunto.
— Um Bourbon está ótimo. Eu tomo com você, pode ser? —
responde enquanto liga o som.
— Perfeita escolha, ‘amira — digo, pegando a garrafa e um copo.
Despejo uma dose grande e me viro, encostando na bancada.
Em instantes um som que parece um hip-hop soa em volume
agradável pelo quarto. Ela se vira e sorri, dando de ombros, então,
compreendo, é música latina. Minha princesa ama esse estilo musical, já
percebi. Anda devagar para mim e eu a contemplo, embevecido por sua
figura linda e aristocrática, a abertura frontal do vestido mostrando as coxas
firmes que salivo para ter enroladas em minha cintura. Temos feito muito
sexo nesses dezoito dias. Muito. Gostoso. Quente. Estamos adquirindo cada
vez mais familiaridade. Ela é fogosa, atrevida, safada na cama e meu
sangue ferve cada vez que afundo nela. Cada vez que gozo dentro dela,
enchendo-a com a minha porra. Ela para à minha frente e enrolo um braço
em sua cintura, puxando-a para o meu corpo. Suas mãos pousam em meus
ombros, seus olhos verdes estão maquiados com delineador, deixando-os
ainda mais brilhantes e sensuais. Tomo um pequeno gole, olhando-a por
cima da borda do copo.
— Beba — murmuro, levando a bebida para seus lábios gordos e
vermelhos. Ela bebe me encarando também.
— A noite foi perfeita. Obrigada, amiri. — Ela sussurra, enfiando as
mãos delicadas por entre meus cabelos. Meu corpo arrepia pelo prazer do
toque. Está ainda mais linda usando a tiara de minha mãe.
— A noite mal está começando, princesa — digo, aproximando
minha boca da sua, mordendo seu lábio superior. — Eu quero você. —
Puxo sua bunda, fazendo-a sentir meu pau duro, babando por ela.
— Eu também quero você. — Ofega, o hálito morno vindo para a
minha boca. — Dance comigo, Alteza. — Sua carinha se transforma num
riso provocador.
Eu rio, tomando mais um gole, e lhe dou mais outro. A bebida, a
música com batida sexy e a garota perfeita em meus braços fazem meu
sangue esquentar rápido. Meu corpo inteiro pulsando, gritando pela
satisfação, por ela.
— Vamos dançar, amirati — murmuro, depositando o copo sobre a
bancada de mármore. Corro as mãos pelos seus ombros e desço meus
dedos, percorrendo o decote. Seu peito arfa, subindo e descendo. — Tire o
vestido para mim, Anna. Quero-a nua em meus braços. — Meu pedido sai
áspero.
Ela lambe os lábios, me fazendo pulsar, meu pau querendo tê-los
enrolados nele o quanto antes. Suas mãos vão para trás do vestido. Se afasta
uns passos para me dar uma vista melhor do espetáculo. Minha atenção vai
para os peitinhos redondos, empinados quando as mangas vão caindo,
desnudando-os. Wallah! Ela esteve sem sutiã todo o jantar. Não seguro um
gemido, minha boca salivando ao ver as auréolas grandes e suculentas.
Cada centímetro da pele morena clara que vai sendo revelado me deixa aos
seus pés. Quando o tecido escorrega pelos quadris, eu rosno e pego meu
pau, apertando a cabeça por cima das minhas vestes. Depois dos segundos
mais longos, fica no meio da ilha de tecido, usando apenas uma calcinha
vermelha de seda e as benditas sandálias douradas de salto alto com tiras
enroladas até os joelhos. A visão me enche de tesão. Tomo meu tempo
apenas bebendo dela. A calcinha é fina e está manchada com sua excitação.
Dá para ver os lábios delicados da bocetinha rosada. Me aproximo devagar,
tentando me manter no controle.
— Seu corpo é lindo, gostoso demais. — Minhas mãos famintas
pegam suas laterais, delineando sua cintura fina. Sinto-a estremecendo. Está
muito excitada, como eu. Passo os dedos pela barriguinha linda e reta e
subo, agarrando os peitos deliciosos. Ela geme lamentosa e passo a apertar,
sovar os dois montes, beliscando os mamilos, deixando-os bem eriçados.
Me debruço, engolindo um com fome enquanto amasso o outro.
— Ahh… Karim… — Meu nome cai da boca carnuda quando
chupo, engolindo a auréola macia todinha em minha boca. Mordo
perversamente e ela grita, ofegando: — Oh, Jesus… — Lambo o biquinho
agredido, sacudindo a língua delicadamente. Suas mãos enfiam em meus
cabelos, arqueando-se. Sopro-o e volto a mamar de novo. Seu corpo todo
convulsiona em espasmos. Desço uma mão pelo ventre macio e escavo
entre suas coxas. Um sorriso arrogante curva a minha boca quando as afasta
mais, dando-me acesso, mostrando sua ansiedade e fome por mim. A
calcinha está toda empapada, me fazendo rugir com satisfação por excitá-la
dessa forma.
— Sua boceta quente quer o meu pau, não é, ‘amira? — Rosno e
minha boca viaja pela clavícula, sugando seu pescoço, mordisco-o em
seguida. O cara da música está dizendo que vai comer a sua garota toda. Eu
rio sacana, não poderia concordar mais neste momento. Afastando a
calcinha para o lado, empurro um dedo em sua vulva melada.
— Ahh… Sim… Por favor… — Choraminga, ondulando
fortemente, suas mãos buscando apoio em meus ombros.
Subo do seu pescoço para sua orelha, chupando, lambendo,
mordendo a ponta. Começo a comer sua boceta com o dedo, indo e vindo.
Nossos olhos se encontram, os dela estão quentes, as pupilas engolindo o
verde, e ela resfolega quando acrescento mais um dedo. Esfrego seu
montículo inchado com o polegar, meu olhar nunca desviando do seu,
duramente. Passa a respirar entrecortado, o hálito embriagador saindo dos
lábios doces bem perto dos meus. Posso sentir seu gozo vindo e a como
com força, indo e vindo, massageando perversamente suas paredes até que
ela grita meu nome e goza, a coisa mais linda, e não resisto, mergulhando a
boca na sua. Bebo seus gemidos e choramingos enquanto molha a minha
mão com seus líquidos. Quando seus tremores param, arranco a boca da sua
e puxo os dedos de sua boceta, enfiando-os em minha boca, sem
cerimônias. Ela geme me vendo lamber seu gozo em meus dedos. Sem mais
delongas, livro-me das minhas vestes e Anna geme ao me ver nu. Adora me
tocar, me explorar, como eu a ela. Retiro sua tiara com cuidado e coloco
sobre a bancada. Pego meu pau duro e rosno vendo-a lamber os lábios
gordos, olhos cravados em meu eixo.
— Fique de joelhos para mim, Anna. — Minha voz é só um
grunhido torturado. Ela faz o que peço imediatamente, seu rosto rosado
levanta, nossos olhos se fixando. Meu pau salta diante da boca indecente, a
língua saindo e lambendo os lábios. Meu pré-sêmen está vazando na ponta.
Seguro-o pela base e me aproximo mais, esfregando a cabeça grossa na
boca carnuda. Ela ofega, as narinas expandindo, cheirando-me, um gemido
chorado deixa sua garganta. Espalho meu pré-gozo em sua boca, rugindo
com a devassidão inflamando meu corpo. — Mama no meu pau.
A boca macia e quente se abre e ela lambe delicadamente a ponta.
Seguro sua cabeça, enfiando minhas mãos em seus cabelos negros. Junto
um punhado e o seguro firmemente no topo da cabeça. Puxo com firmeza,
grosseiro, e Anna ofega, gemendo, abrindo mais a boca, levando o meu
eixo para dentro, fazendo-me urrar de prazer.
— Tão atrevida, safada… Isso, leve-me para dentro dessa boca
quente… — Forço-me entre seus lábios, esticando-os. Torna a gemer, o
som reverberando em meu pau, os sons de prazer em sua sucção me
enlouquecem. Suas sugadas vão aumentando a pressão, enquanto continuo
comendo sua boca. Puxo seus cabelos com mais força e empurro tudo até
sua garganta. Minha princesa atrevida engasga, os olhos ficando lacrimosos
pelo meu volume. Paro um pouco, dando-lhe tempo para se recuperar.
Choraminga, pedindo mais, entalada em meu pau, e puxo para fora,
voltando a estocar em sua quentura molhada. A fito com tesão e adoração
fora do comum. Suas mãos pousam em minhas coxas, relaxando
completamente a garganta. Solto um rugido, maravilhado, e vou
aumentando os golpes, comendo a boca faminta. A imagem me deixa a
ponto de gozar, os olhos verdes lindos, fixos nos meus, os lábios enrolados
em volta do meu eixo grosso. Estendo a mão livre e pego o seio esquerdo,
puxando o mamilo delicado, depois torcendo-o malvado. Lascívia toma o
rosto de Anna, que geme lamentosa, olhos grudados nos meus. — Boa
garota.… Chupa o meu pau. — Gemo rouco.
Estamos os dois gemendo, perdidos em nosso tesão mútuo. Seguro
sua cabeça com as duas mãos e fodo sua boca com força. Minhas bolas
doem, meu corpo todo estremecendo, o gozo vindo como um trem
desgovernado. Eu rosno, praguejo em minha língua nativa e, então, encho
sua boca de porra. Gozo forte, despejando em sua garganta. Os sons dela
engolindo tudo, sedenta pelo meu sêmen, as lágrimas escorrendo pela face
rubra, me deixam fora de mim. Tudo com ela é além das expectativas. Dou
mais uma, duas estocadas, ela me chupando com ganância. Rio, arrogante,
satisfeito e me retiro de sua quentura viciante. Puxo-a para cima, os lábios
estão inchados, agredidos da minha, da nossa luxúria, mas é uma visão
linda.
— Porra, que gostoso foder essa boca — sussurro, doido de amor,
de tesão por essa garota. Seu rosto está afogueado e ela ousa sorrir, o som
rouco por chupar o meu pau com tanto vigor. — Você é uma putinha safada,
princesa. — Rosno, a levantando pela bunda, e ela geme me abraçando com
as pernas. — Vou comer você em cima da mesa primeiro. Fantasiei isso a
cada maldita vez que esteve almoçando aqui comigo. — Torna a sorrir,
safada, atrevida e a boca encontra a minha enquanto ando com ela. Nos
beijamos, nossas línguas se lambendo, sua boceta molhada moendo em meu
pau. A deposito sobre a borda da mesa e a ajudo se deitar, empurrando-a
suavemente. Meu olhar ganancioso corre por todo o seu corpo, os cabelos
longos espalham sobre a madeira brilhante. Nunca mais me sentarei aqui
sem que essa imagem dela esparramada, esperando meu pau, me venha à
mente. — Apoie os pés na borda, amirati. — Oriento roucamente e ela
obedece. Toco sua calcinha com as duas mãos, ela arfa e rio malvado,
esfregando-a através do tecido empapado. Meu olhar encontra o seu e subo
uma mão pela barriguinha linda, vagarosamente, até um peitinho durinho. O
amasso, raspando minhas unhas na carne tenra. É deliciosa, toda ela.
— Amiri… — Choraminga, arqueando as costas.
— Você quer foder, princesa? — Provoco-a, segurando nas laterais
da calcinha e a rasgo num puxão forte. Anna grita, surpresa tingindo seu
rosto. — Vamos, diga-me, quer foder? Sentir o meu pau grosso esticando
sua boceta gostosa e apertada? — Continuo instigando-a lascivamente,
meus olhos caindo para a bocetinha rosada, os lábios delicados escorrendo
sua excitação.
— Ahh… Merda! Sim, eu quero foder… Preciso do seu pau dentro
de mim, por favor… — Geme entrecortado. Rio satisfeito e esfrego meu
polegar na pequena protuberância, arrastando meu olhar para o dela. Seu
peito está subindo e descendo, seu rosto transformado pelo tesão. Olhando-
a fixamente, me abaixo e deslizo minha língua por entre os lábios fininhos.
Anna mia, convulsionando toda. Eu gemo rouco, amo seu sabor perfeito e
único em minha língua. Seguro suas coxas, puxando-a mais para a borda e,
então, enfio a língua em sua vulva, cavando o creme delicioso.
— Karim, habib… — Lamenta. Enfio dois dedos substituindo a
língua e ela grita alto. A como lentamente, retardando, construindo seu
segundo orgasmo. Puxo os dedos, deixando apenas as pontas, e massageio o
pequeno ponto em seu interior. Ela resfolega, mais líquidos inundam a
vulva, pingando em meus dedos. Arreganho o feixe de nervos, expondo a
parte mais sensível, e a chupo com força. Anna quebra, berrando, enchendo
nosso quarto com os sons de satisfação luxuriosa. Coloco mais pressão na
sucção e seu gozo jorra em minha mão. — Amiri… Que gostoso… —
Balbucia ofegante, engasgada.
Continuo a sugar sua carne quente, bebendo seus líquidos
abundantes. Ela geme fracamente, desgastada. Meu pau está em ponto de
bala de novo e a puxo pela bunda, levantando seus quadris da mesa,
abocanhando-a, preparando-a para me ter dentro dela. Devoro-a,
esfomeado. Sempre gostei de foder, mas nunca foi assim antes. Quando está
ofegante, a respiração entrecortada, sei que está pronta para mim. A abaixo
e enfio um dedo em sua vulva, cavando os líquidos. Olhando-a fixamente,
deslizo o indicador até seu cuzinho, sinto-a um pouco tensa. Sei que quer a
experiência, mas é sua primeira vez, terei de ir com cuidado. Me debruço,
arreganhando mais suas coxas, então deslizo a língua em seu buraco
traseiro. Anna estremece, gemendo baixinho, ainda tensa, mas gostando
disso. Eu rio maliciosamente e passo a lamber seu cuzinho com vontade,
forçando a língua em seu buraquinho. Meu pau começa a babar,
antecipando estar enterrado nele até o punho. Lambo-a sem pressa,
voltando a esfregar seu clitóris inchado. Seus sons de prazer me excitam
demais.
— Estou louco para meter bem fundo nessa bundinha, princesa. —
Ranjo.
— Droga, sim. — Geme entrecortado, me fazendo rosnar com seu
atrevimento.
— Vamos fazer tudo que quisermos na cama — murmuro, a
depravação tomando conta de mim com sua entrega. Substituo a língua pelo
dedo. Ela se retesa um pouco. Dou um tapa em sua nádega. — Relaxe. —
Se lamenta e assente, seu rosto denotando sua apreensão. Empurro o dedo
devagar. — Isso, habibti. — Bajulo-a, metendo até o fundo, um gemido
rouco saindo da garganta ao sentir seu aperto quente. — Vou gozar tão
gostoso comendo esse cuzinho, princesa — digo asperamente. Como-a
assim, olhando-a atentamente, vendo cada mudança em seu rosto lindo e
corado. Me inclino e deslizo a língua em seu clitóris suavemente e ela
arqueja, o tesão voltando a predominar. Acrescento mais um dedo, entrando
justo, apertado. Anna choraminga, arqueia, e não paro, empurrando os
dedos profundamente, massageando o canal virgem, chupando seu
montículo com mais pressão.
— Ohh, Deus… — Pega meus cabelos, puxando-os, enquanto se
esfrega em minha cara. — Me come, por favor, amiri.… Me foda! Agora!
Seu tom desesperado e sem qualquer vergonha me faz grunhir e
parar de provocá-la. Retiro os dedos, cessando a tortura em seu monte, e
Anna se apoia nos cotovelos para me ver melhor. Massageio meu pau para
cima e para baixo, adorando a fome que vejo em seus incríveis olhos
verdes. Me encaixando entre suas coxas arreganhadas, esfrego a ponta
bulbosa em seu clitóris já sensível e, em seguida, bato sobre ele, com
perversão. Ela choraminga, a pequena protuberância ficando molhada,
mostrando que minha princesa está pronta para ser fodida. Me alinho em
sua vulva, a visão da cabeça gorda entre os lábios finos me fazendo ranger
os dentes. Seguro sua bunda por baixo e a encaro. Sua boca inchada está
aberta, olhos fixos em nossos sexos, ofegando, esperando. Com um gemido
áspero, estoco com força, penetrando-a até o fundo. Ela grita alto, o corpo
todo estremecendo pela invasão. É muito apertada ainda que esteja bem
lubrificada. Sua vulva pequena sofre com o meu tamanho e não vou mentir,
amo isso, comer sua bocetinha pequena.
— Wallah, tão apertada que parece que vai rasgar no meu pau… —
Puxo quase todo e meto tudo nela, devagar e profundamente. Anna grita e
geme, pendendo a cabeça para trás, seu rosto completamente transformado
pelo prazer. — Assim, princesa, leva meu pau todo.… Toma mais.… Toma
tudo, porra… — Como-a com rudeza, sacudindo-a, a mesa andando com
meus impulsos dentro de seu corpo magnífico. Ela choraminga,
resfolegando, tomando meu pau até o cabo, minhas bolas batendo em sua
bundinha. A devassidão nos invade de tal forma que estamos grunhindo os
dois. Corro as mãos pelo seu corpo inteiro, onde consigo agarrar,
amassando sua carne, esfomeado, comendo-a gostoso e duro, meus olhos
presos aos dela. Ela me recebe da mesma forma, as coxas arreganhadas, me
deixando meter tudo, bruto, fundo. Acaricio seu ventre e subo para os
peitinhos, fecho-as, deslumbrado pela maciez, firmeza, suculência. —
Ahhh, gostosa! Vou rasgar essa bocetinha… — Rosno animalesco, socando
com força, comendo-a com uma fome nunca experimentada antes dela.
Ela geme, me puxando sobre seu corpo, e eu fico louco sentindo sua
pele gostosa, suada na minha. Pego seus pulsos, estendendo-os acima da
cabeça. Fodo sua boceta, encarando-a bem dentro dos olhos, minha boca
toma a sua e nos beijamos com lascívia, minhas estocadas brutas, socando
até o punho dentro dela. Uivo, judiando de seu pequeno canal, forçando-a a
tomar cada centímetro do meu pau, gostando de fazê-la submeter-se a mim,
seu homem. Suor está cobrindo nossas peles agora. Levo a boca para o seu
ouvido e chupo a concha da orelha, descendo para o pescoço, onde mordo
com força. Anna grita, arquejando. Eu resmungo e solto seus pulsos,
segurando-a pela bunda, puxando-a para cima. Ela me abraça com as pernas
pela cintura e a faço montar o meu pau como naquele entardecer sobre
Hércules no deserto. Eu a seguro e rasgo sua vulva para baixo em meu eixo
grande e grosso. Seus braços rodeiam meu pescoço, se pendurando,
firmando enquanto a como. Nossas bocas ficam bem próximas, ofegando,
gemendo uma na outra, olhos fixos, tesão avassalador inflamando nossos
corpos. Urro, gemo, solto grunhidos, comendo-a sem parar. Ando com ela e
bato suas costas na parede mais próxima, eu meto sem dó, socando de baixo
para cima. Abaixo a boca, sugando, lambendo sua pele, até abocanhar o
seio direito, passando a mamar grosseiramente.
— Oh, estou tão perto, habib.… Tão perto! — Ela geme e não paro
de meter fundo e forte, a fricção de minha pelve em seu clitóris a ajuda e
logo seu corpo convulsiona. Anna goza gritando, empalada em meu eixo, a
boceta apertando meu pau sem pena.
— Goza gostoso, minha garota atrevida.… Molha todo o meu pau…
— Bato em sua bunda. Ela me aperta, gemendo e gemendo, me fazendo
ranger os dentes, me segurando para não gozar junto. Estoco fundo,
comendo-a até passar os últimos tremores do seu gozo, e a levo para a cama
sem sair de dentro dela. Paro na beirada do colchão, depositando-a no
centro da cama king size dossel. Pego cada pé e livro-a das sandálias
sensuais que garantem meu pau duro em segundos. — Fique de bruços. —
Peço, a excitação de finalmente tomá-la por inteiro me tomando.
Anna se vira, fazendo o que pedi, e me debruço sobre suas costas,
afastando a cabeleira negra para um ombro. Pressiono beijos e chupadas
pelas costas, com atenção especial à sua fênix. Subo pelos ombros,
raspando os dentes, fazendo-a arrepiar e choramingar. Mordo-a na nuca e
ela grita, serpenteando o corpo gostoso sobre os lençóis. Rio, levando a
boca para o pescoço e ouvido.
— Empine essa bunda linda para mim, princesa.
Obedece e desço os lábios novamente pelas costas esguias, beijando,
lambendo o suor de sua pele. Minha respiração trava quando chego às
bochechas redondinhas da bunda firme. Escorrego pelo seu corpo,
escarranchando suas coxas, e seguro os dois globos, sovando a carne
vorazmente. Ela fica um pouco tensa comigo brincando com sua
retaguarda. Eu rio perverso e abro as bochechas, expondo o cuzinho virgem.
Meu pau dá uma guinada, louco para se enterrar bem fundo. Esfrego os
polegares em seu buraquinho, observando tudo, cada reação. Sua carne
pulsa com minha massagem lasciva. Escorrego um pouco mais, me
deitando e enfiando a cara entre suas bochechas. Minha língua desliza numa
lambida indecente da boceta até o cuzinho. Ela geme alto, um pouco
desgastada, mas ainda querendo mais. Lambo-a, chupo-a até senti-la
relaxando, então massageio seu buraquinho de novo, metendo um dedo,
fodendo-a devagar.
Anna chama o meu nome com necessidade devassa. Eu rosno e
acrescento mais um dedo, voltando a alargá-la, fodendo-a até o fundo,
girando-os com força. Seu rosto está afogueado, está arquejando, as mãos
cravadas nos lençóis de cada lado da sua cabeça.
— Vou te fazer completamente minha agora, amirati — sussurro,
tomado pelo desejo embriagador que ela me desperta. — Serei cuidadoso,
prometo. — Aliso a carne de sua bunda antes de dar dois tapas, um de cada
lado. Ela geme, se empinando toda. Me viro e abro uma gaveta do criado-
mudo, pegando o lubrificante comprado especialmente para o nosso sexo
safado. Rasgo a embalagem, lambuzo meu pau inteiro e o resto lubrifico
bem o seu buraquinho. — De quatro, Anna — peço roucamente, agarrando
sua pequena cintura, ajudando-a na tarefa. Meu sangue esquenta ainda mais
ao ver a bocetinha toda vermelha e inchada, judiada pela voracidade com
que a comi. Seguro meu pau e levo para o seu cuzinho. Anna resfolega,
tensão clara em seu corpo. — Eu não vou te machucar, habibti, confie em
mim. — Ela geme e assente. Massageio a cabeça em seu buraquinho, então,
vou fazendo pressão, forçando a passagem. Seguro seus quadris, mantendo-
a na posição, estou suando rios de tanto tesão e expectativa. — Empurre de
volta quando eu meter. Isso vai facilitar a penetração. — Ranjo e empurro a
cabeça. Ela grita, estremecendo.
— Ai, minha nossa, isso dói… — lamenta e eu rio um pouco. —
Droga, não tenho coragem para fazer isso… — Eu paro e me debruço em
suas costas, subindo minha boca para seu ouvido. Chupo a ponta da orelha,
mordendo-a em seguida. Ela geme em lamúria. — Ah, Deus, eu quero ser
sua por inteiro… Mas vai doer muito, Karim… — resmunga. Me seguro
para rir dela e seu medo. Levo uma mão por baixo, entre suas pernas,
encontrando seu clitóris, e o esfrego sem pressa. Ela ofega, o prazer
fazendo-a relaxar um pouco.
— Isso… Você quer me dar o cuzinho, sabe que quer… — Torturo-
a levando a boca para seu pescoço, chupando forte, faminto. — Quer ser
minha por completo?
— Sim, você sabe que sim, droga… — Range os dentes e eu rio.
— Perfeito, amirati. — Bajulo-a. — Agora, relaxe e empurre para
fora, enquanto vou metendo… — Oriento-a, voltando a empurrar em seu
pequeno buraco, meus dedos não parando o estímulo em sua boceta. Anna
geme alto, choraminga, mas me obedece, começando a empurrar contra
mim. Olho para baixo e gemo rouco vendo meu pau abrir seu anelzinho
virgem, entrando pouco a pouco até a metade. — Ahhhh, porra, que
cuzinho quente e gostoso… — Puxo e volto a meter, entrando um pouco
mais fundo. Ela geme suspensa, ainda tensa, mas me deixando abrir sua
bundinha linda. — Segure as bochechas bem abertas para mim, Anna.
Ela debruça, encostando o rosto no colchão e as mãos vêm sem
hesitação, abrindo a bunda, arreganhando-se para se tornar toda minha. Eu
fico tirando e metendo de volta, indo e vindo vagarosamente, a cada
impulso indo mais fundo, até que, numa estocada dura, me enterro até as
bolas.
Nossos gritos reverberam no aposento. Meu coração dispara, meu
sangue correndo mais denso nas veias. É a sensação mais hedonista,
pecaminosa e deliciosa que já senti. Já fiz anal com algumas mulheres no
Ocidente e aqui quando meu corpo precisou de alívio, mas nunca, jamais,
foi assim. É com muito esforço que não a encho de porra logo no começo.
Fico parado, tentando me controlar e para deixá-la se acostumar comigo em
sua bunda. Então, a seguro firme nos quadris e começo a meter lentamente,
comendo-a com estocadas fundas. Anna choraminga, me deixando enterrar
meu pau todo, a força das metidas aumentando aos poucos. Geme e começa
a rebolar junto comigo, arquejando a cada estocada firme. Pego seu cabelo
na nuca, puxando-a para trás, e bato dentro dela mais forte, mais fundo. Ela
berra, porém não para de rebolar em meu eixo. Torno a olhar para baixo e
rosno, vendo seu buraquinho sendo sodomizado pelo meu pau, me sugando
até as bolas.
— Assim, princesa, me deixa meter bem fundo nesse cuzinho
virgem. — Meu tom pinga luxúria. — Vamos, rebola no meu pau, Anna. —
A puxo para trás, me apoiando sobre os meus calcanhares, trazendo-a para
sentar no meu colo. Mordo sua nuca, correndo para o ombro, costas. —
Abra bem as coxas sobre as minhas pernas, eu quero te comer nessa
posição. — Ela geme com meu linguajar chulo, mas faz o que pedi. Ajudo-
a, escancarando bem suas coxas sobre as minhas. — Gosta do meu pau todo
em seu cuzinho, habibti? — Minha boca vai para o seu ouvido e continuo
atiçando-a perversamente: — Minha putinha… Que gostoso comer você,
princesa… Gosta de foder comigo? Gosta de me deixar te comer sem
qualquer receio ou tabu?
— Ahh, droga… Sim… Eu gosto muito… Amo foder com você…
— balbucia. — Está perfeito seu pau dentro da minha bunda — diz
atrevidamente e solto um rugido alto, pegando-a pela cintura, trazendo suas
costas suadas para mim. Seu rosto vira para o meu e mergulho a boca na
sua, sedento, esfomeado, comendo seu cu de baixo para cima, meu pau
entrando todo. A posição é deliciosa, fazendo meu corpo inteiro arrepiar e
minhas bolas doerem para jorrar dentro dela. Minhas mãos igualmente
famintas correm pela sua pele inteira. Nos beijamos duro, nos chupando,
mordendo, enquanto fodemos gostoso demais. Seguro os peitinhos lindos e
me esbaldo, espremendo-os, puxando os biquinhos.
— Tão gostosa ‘amira… Vou meter em você assim o tempo todo,
porra… — Meu corpo todo está tremendo e nos arrasto para fora da cama,
carregando-a empalada em meu pau até uma das janelas. Ela apoia as mãos
no batente, o ar frio da noite nos envolve, o deserto à nossa frente, e eu
deliro, tocando seu corpo inteiro, socando meu pau com golpes fundos e
gananciosos. Acaricio o ventre macio, as coxas, desço a mão, pegando sua
boceta toda molhada. Enfio dois dedos e ela solta um ganido choroso. Passo
a comer seu cu e sua boceta, metendo fundo e forte nos dois buraquinhos
apertados. A mão livre sobe para os peitinhos e passo a judiar deles,
arranhando a pele com as unhas.
Anna está quase gozando, sinto seu corpo mudando, seus gemidos
ficando mais erráticos. Eu esfrego seu clitóris e seguro seu quadril, metendo
com força em sua bunda e boceta. Ela começa a convulsionar, gemidos
lindos caindo da boca exuberante.
— Isso, bem assim, princesa.… Goza me dando esse cuzinho
gostoso.
Ela berra e arranha o concreto enquanto goza, pulsando
gostosamente em meu pau. Eu a levanto do chão, meus braços amparando-a
por baixo dos ombros. Mordo sua nuca, estocando freneticamente, sem dó,
socando bem fundo, rasgando-a para baixo em meu pau. Seus braços vêm
para trás pegando, segurando meus cabelos. Está perdida no orgasmo,
chamando meu nome uma e outra vez. Não consigo retardar mais, empalo-a
e urro absurdamente alto, gozando, meu corpo inteiro convulsionando
enquanto encho sua bundinha com a minha porra.
— Ah, Deus, sim, me enche assim… — Ousa gemer, e minha
resposta é meter mais fundo, duro, punindo-a por me mostrar esse nível de
loucura e tesão. Como-a vorazmente, despejando tudo nela. Tremores e
espasmos perpassando nossos corpos. Minhas estocadas vão perdendo força
até que paro todo enterrado, e não preciso pedir, ela traz sua boca gostosa
para a minha. Gememos baixinho nos beijando bem desgastados, mas
saciados. Ando de volta para a cama e a empurro com gentileza para a
frente, saindo de dentro dela. Cai de bruços sobre o colchão, respirando
agudamente.
Me jogo ao seu lado, puxando-a para os meus braços. Ela geme,
então ri, é um som de quem fez travessura. Eu acabo rindo também.
— Você acabou comigo, honorável Alteza — provoca, ainda de
olhos fechados, se aconchegando em meu peito.
— Bem, você acabou de me viciar completamente em seu corpo,
‘amira — digo com reverência. Meus braços enrolando à sua volta.
— Você já tinha feito esse tipo de sexo? — pergunta, levantando o
rosto para o meu.
— Sim, quando estudei em Londres aprendi algumas coisas
ocidentais… — Ela revira os olhos, me fazendo rir. — E fiz sempre que
precisei de uma mulher.… Nunca fiz com Yasmina porque ela era muito
tímida e reservada. — Admito. — Mas com você eu quero tudo, amirati.
Tudo com você tem um valor e significado diferente.
Seu olhar amolece e ela sorri, se aconchegando mais em meu peito.
— Boa resposta, Alteza — zomba e suspira baixinho. — Dói como
o inferno e amanhã estarei andando esquisito. — É a minha vez de sorrir
pela sua espontaneidade. — Mas amo ser completamente sua, amiri —
murmura, tocando minha barba. Vejo uma sombra passando em seus
expressivos olhos verdes. — Karim, se você insistir em se casar comigo, é
verdade que as tribos podem obrigá-lo a tomar uma segunda esposa em um
casamento de Estado?
Meu corpo retesa. Quem andou lhe falando sobre essa merda? Não
posso mentir para ela, no entanto.
— Sim, é verdade — digo e ela fica tensa, puxo-a para mais perto,
olhando-a bem dentro dos olhos. — Eles podem tentar me obrigar, ‘amira.
Mas eu nunca irei tomar outra esposa. — Seguro seu queixo. — Você é a
única para mim, habibti. Meu coração e corpo pertencem a você.
Seu rosto relaxa visivelmente e ela assente, suspirando.
— Meu coração e corpo pertencem a você também — diz baixinho,
seus olhos cheios de amor. — Só a você.
— Eu te amo, habibti. Ninguém irá nos separar — garanto. — Eu
não vou deixar.
— Shukran por ser sincero comigo. — Ela rola, me montando, os
cabelos fazendo uma cortina ao redor do meu rosto. — Eu também te amo,
habib.
E sua boca abaixa na minha num beijo suave, cheio de promessas.
As tribos irão me pressionar, eu sei disso. Mas terão que ceder e aceitar a
minha escolhida para rainha. Nós vamos conseguir. Rogo a Allah que
proteja nossos planos.
CAPÍTULO NOVE
Uma semana depois…
Anna Julia
A limusine desliza suavemente pela avenida principal de Jawahra e
vejo os olhinhos de Ayla brilhando de excitação pelo nosso passeio. Seu pai
está do meu lado direito, respondendo algo em seu celular. Ele tinha
compromissos nesta tarde, mas encaixou a mim e à princesinha em sua
agenda. Ayla precisa sair mais daquele palácio. É uma criança vivaz e sua
rotina é sufocante, presa o dia inteiro com tantas tarefas para cumprir como
se fosse uma adulta em miniatura. Argumentei a respeito com Karim e ele
me deu autorização para flexibilizar as aulas da sapequinha, introduzindo
atividades mais divertidas, condizentes com a sua idade. Além da nossa
aula de inglês, seguida da dança. Vou levá-la para cavalgar dois dias na
semana. Estou pensando em incluir natação também. A pequena vai amar
uma farra na piscina! Não esqueço o olhar apaixonado e orgulhoso que seu
pai me deu quando propus as mudanças.
— Você ama mesmo a minha filha, amirati — sussurrou, me
puxando pela cintura, me fitando com encantamento.
— Sim, habib, eu amo muito aquela sapequinha — sussurrei de
volta, meu coração aquecido por ele, por ela. — Sou loucamente
apaixonada por vocês dois, amiri.
— Eu quero você. Aqui e agora. — Rosnou, me empurrando em
direção à mesa. Estávamos em seu escritório no palácio residencial. Ele
trabalhou lá essa manhã. Seus olhos negros estavam famintos, as mãos
começando a abrir minha calça jeans. — Você é uma necessidade que
nunca é saciada. Minhas mãos coçam para te tocar o tempo todo. Desejo
estar dentro de você o tempo todo… — Tornou a rosnar, já puxando a calça
até minhas coxas com calcinha e tudo… E ele me teve em cima de sua
mesa.
Um arrepio percorre minha coluna lembrando do sexo quente,
excitante, delicioso. De como me debruçou sobre o tampo de madeira da
mesa e me comeu por trás, com impulsos fortes e fundos. Ele é tão gostoso.
Mordo o lábio para não gemer, mas acho que suspirei, porque ele sorri; a
boca se aproximando do meu ouvido, sussurrando:
— Foi delicioso, ‘amira. — Ri perversamente ao sentir minha
respiração alterando. — Você é deliciosa.
Gemo baixinho, fechando brevemente os olhos.
— Você não pode ficar me tentando assim — reclamo. — Não
quando sabe que não podemos nos tocar em passeios públicos.
Em países mulçumanos, os casais não podem nem mesmo andar de
mãos dadas em locais públicos. Apenas homens têm permissão para se
tocarem, inclusive andarem de mãos dadas e se cumprimentarem com
beijos nas faces. É cultural. Não há o que discutir, apenas respeitar. Bom,
pelo menos por enquanto.
Karim sorri e guarda o celular dentro de um compartimento lateral.
— Desculpe por isso. Estava respondendo a uns e-mails urgentes. —
Ele passa o braço por cima dos meus ombros. — Sim, não podemos nos
tocar lá fora, então vamos aproveitar aqui dentro. — A divisória nos isola
do motorista e Ayla está contemplando a cidade, a testinha colada à janela.
Ele segura minha coxa direita, dando um leve aperto, e sua boca
morna encontra uma faixa de pele nua em meu pescoço, sugando
gostosamente. Ofego, meu centro umedecendo, começando a pulsar.
Mesmo com sua agenda lotada, fazemos sexo pelo menos duas vezes ao
dia. Esse príncipe exótico e lindo se tornou rapidamente um vício, uma
necessidade tão pungente que minha vagina chega a doer quando não está
preenchida por ele. O sentimento só não é mais inquietante porque percebo
a mesma necessidade e desespero nele em relação a mim. Nos apegamos
rápido demais. Talvez porque tenhamos ficado de luto por muito tempo. Ele
me contou que ainda que tenha transado nos quatro anos que perdeu a
esposa, o contato físico não era algo apreciado, era quase que um castigo.
Eu também abominava ver o interesse de outros caras nesses seis anos.
Abrimos nossos corações e corpos apenas para o outro e isso tornou tudo
muito maior, mais significativo. Nós escolhemos um ao outro.
— Habib, Ayla… — murmuro.
Ele pega meu queixo e no instante seguinte estou me derretendo
com sua boca mergulhando na minha. Entreabro meus lábios e sua língua
penetra, quente, molhada, lambendo a minha. Meu corpo inteiro treme e
seguro outro gemido. Karim ri, mordiscando-me suavemente antes de
encerrar o beijo.
— Chegamos, habibti — sussurra, me dando mais um selinho antes
de se afastar.
O carro para e Ayla está saltitante agora. Ela nunca veio ao mercado
e está eufórica para essa aventura. A vesti com um mini caftan amarelo, do
mesmo tom do meu, e ela adorou. Coloquei um hijab torcido como uma
tiara em sua cabeça, visto que ainda não tem idade para começar a usá-lo
como as mulheres adultas. Estou usando um branco, envolvendo toda a
minha cabeça, escondendo meus cabelos. Embora eu seja ocidental, o país
não exige tal vestimenta dos turistas, serei a esposa de Karim, então, terei
que me vestir conforme os costumes das origens de meu futuro marido. Ele
sai do carro e dá a volta para pegar Ayla. Eu pego minha câmera fotográfica
e penduro o cordão no pescoço. Estou tão animada quanto a pequena para
um passeio com o príncipe!
— Não esqueça, Anna. Não pode fotografar as pessoas sem
autorização, principalmente se for mulher — Karim diz baixinho quando
me junto a eles. Seguranças estão saindo de outro carro e se colocando a
postos para nos acompanhar. — É considerado um desrespeito fotografar
uma mulher sem o sem consentimento por aqui.
— Está bem. Sou uma profissional responsável, Alteza — digo com
uma piscada. Ele sorri, os olhos cintilando com algo sexual.
— Você não pode piscar para mim desse jeito também, ‘amira. —
Parece levemente divertido. — Pode ser presa por assédio.
Minha boca cai em descrença.
— Jesus… Nem uma piscadinha inocente? — Faço uma cara nada
inocente, batendo os cílios.
— Não. Comporte-se, amirati — murmura com um meio-sorriso
tremulando sua boca linda. — Não pense que será fácil para mim também
não poder te tocar.
— Em casa… — sussurro, meus olhos lhe fazendo uma promessa
sacana. Ele assente e levanta Ayla nos braços fortes, começando a andar
pelo pátio enorme do mercado central.
— Você está animada, nour hayati? — Sua atenção muda para a
pequena, que rodeia seu pescoço com os braços imediatamente.
— Muito, ‘abi! — A menininha exclama. — Sabia que a Anninha
vai me ensinar a cavalgar?
— Sim, habibti? — A voz profunda é cheia de amor pela pequena e
eu emparelho com eles. Ainda que não possa tocá-lo, estou feliz por estar
com eles em público, mostrando a família que seremos em breve.
— Sim! E quero que ela me ensine a pilotar um helicóptero
também! Posso, papai? — diz em sua inocência, e isso faz seu pai rir. O
som profundo viajando em meu corpo.
— Você é ainda muito jovem para uma tarefa como essa, amirati
saghira — Karim diz em tom amoroso. Gosto do fato de ele não a
repreender e, sobretudo, não lhe dizer que não pode porque é mulher.
— Mas, quando for da altura da Anna, posso? — Agora sou eu que
rio. Ah, ela não é linda?
— Nós vamos conversar sobre isso quando chegar o momento,
habibti. — Ele lhe dá um beijo carinhoso na bochecha.
— A Anninha pilota. Quero pilotar também! — A pequena insiste
me fazendo rir baixinho. Karim me olha de esguelha.
— A Anninha veio do Ocidente, nour hayati. Lá as meninas podem
fazer coisas que aqui não podem. — Ele diz ainda no tom amoroso e
cuidadoso. Rolo os olhos mesmo assim.
— Então, eu quero ir para o Ocidente. — Ayla lança a alternativa
inocente para seu dilema.
— Seu pai tem razão, minha sapequinha. Você ainda é muito jovem
para se preocupar com coisas de adultos — intervenho, ganhando o sorriso
de aprovação de Karim. — Quando for uma moça, eu mesma lhe ensinarei
a pilotar. — Seu pai estreita os olhos para mim em advertência. — Mas, até
lá, você precisa estudar muito para ficar cada vez mais inteligente. — Dou
uma piscadinha para a pequena, que sorri, parecendo momentaneamente
aplacada.
Levanto minha câmera e tiro uma foto deles. Estão lindos. Karim
está com a vestimenta tradicional com caftan branco e uma cafia preta na
cabeça presa por um igal dourado. Ele parece um faraó do antigo Egito.
Meus olhos o cobiçam e me pergunto se posso ser presa por isso. Ele sorri,
certamente percebendo o meu receio. Bato mais uma foto e me ponho a
registrar a fachada da construção antiga quando paramos na porta do
complexo. Nós entramos em seguida, e imediatamente a temperatura amena
nos envolve. Toda a área tem uma espécie de ar-condicionado, mesmo as
vielas a céu aberto. Metade da construção data do século XII. No complexo
que engloba o centro histórico, o mercado abriga galerias antigas,
restaurantes lojas de grifes famosas e hotéis luxuosos da rede Jawahra, de
propriedade de Karim. O hóspede pode usufruir das comodidades de todos
eles, basta se registrar em um para ter acesso aos outros.
Nós andamos por várias galerias da parte histórica. Os aromas das
especiarias, os sons dos comerciantes vendendo seus produtos, as pessoas
transitando, comprando, tudo isso penetra em meus sentidos, transformando
o passeio numa experiência única. Karim está agora segurando a mão de
Ayla, que quer ver e experimentar quase tudo. Os comerciantes parecem
extasiados quando veem seu príncipe e a princesinha em seus humildes
estabelecimentos. Eles fazem questão de dar presentes, mas Karim é
consciente de que esse é o ganha-pão deles, então, faz uma compra que
supera o valor do presente para que os homens não fiquem no prejuízo. Isso
é doce e atencioso da parte dele. Tiro muitas fotos. Os comerciantes
parecem contentes com meus registros e sorriem para a minha câmera. Vi
algumas mulheres e ousei pedir que me autorizassem tirar uma foto. Me
negavam no começo, mas quando Karim aparecia e me apresentava como
sua noiva, elas cediam. Eu não reclamei porque isso me daria muito
material para juntar aos muitos registros do deserto.
O sol está se pondo quando atravessamos a ponte do canal que liga o
lado histórico ao moderno. Karim está carregando Ayla no colo de novo.
Ela está tomando um sorvete, o brilho em seus olhinhos é a coisa mais
linda. Não resisto e tiro uma foto assim, espontânea. Seu pai olha para a
câmera e meu fôlego se vai. Jesus, ele é lindo demais. Bato mais algumas e
seu sorriso vai abrindo.
— Venha aqui e tire uma com a gente — pede suavemente. Eu
programo a câmera para nos dar tempo de fazer a pose e vou até eles,
ficando ao lado de Ayla (com cuidado para não tocar seu pai lindo, ou posso
ser presa). Fazemos várias poses, a sapequinha rindo, nos fazendo rir de
forma espontânea. — Agora eu quero mimar as minhas meninas — diz
enigmaticamente, seu olhar encontrando o meu, e é como se estivesse me
acariciando com ele, compensando a falta do toque. — Vem, habibti.
Nós andamos, passando na calcada de cafés e lojas de grifes
famosas. Uma fachada escandalosa em ouro e bronze é onde Karim entra. A
parte da parede de vidro mostra que é uma joalheria. O ambiente é muito
sofisticado, com sofás e poltronas de estofados vermelhos e bordas de
madeira douradas. Os tapetes, toda a decoração é de extremo requinte e
bom gosto.
— Meu senhor. — O homem vestido em trajes tradicionais se curva
numa mesura respeitosa. — É sempre uma honra recebermos a sua visita.
— Shukran, Burak. — Karim diz em tom amigável e me olha com
orgulho. — Esta é a minha noiva, a princesa Anna Julia Di Castellani.
Meu coração sempre fica todo mole quando me apresenta dessa
forma.
— Minha senhora. — Inclina a cabeça, me olhando com simpatia.
— É uma honra recebê-la também.
— Shukran, senhor. — Agradeço-o, com um sorriso cortês.
— Este é Burak, joalheiro exclusivo do palácio, ‘amira — Karim
esclarece.
— Minha família tem servido à casa Al-Abdallah por muitas
gerações, minha senhora — Burak adiciona com a voz solene e orgulhosa.
— Será uma honra servir a nova rainha. — Torna a se inclinar.
— Shrukran. É muito gentil. — Sorrio-lhe.
— Mostre-nos as joias especiais que encomendei semana passada,
meu bom homem — Karim pede e o encaro rapidamente. Ele já havia
encomendado? Sua boca linda se curva num meio-sorriso, adorando me
surpreender. — Sim, amirati. Eu quis fazer uma surpresa para as minhas
princesas.
— Eu vou ganhar joias também, papai?! — Ayla exclama, batendo
palmas.
— Claro que sim, habibti. — Karim a coloca no chão. — Além das
que encomendei, você pode escolher o que quiser.
— Shukran! Eu te amo, papai! — Ela torna a exclamar com os
olhinhos apaixonados para seu pai.
— Eu também te amo, nour hayati. — Ele diz suavemente, tocando
o rostinho eufórico da filha.
Uma funcionária se aproxima e se encarrega de levar a princesinha
para conhecer a loja. Os seguranças estão parados do lado de fora,
impedindo a entrada de outros clientes, nos dando privacidade. Karim se
aproxima e eu olho ao redor, lambendo meus lábios.
— Você quer que eu vá para a cadeia, Alteza? — murmuro. —
Porque vou beijar sua boca se chegar muito perto de mim, estou avisando.
Seus olhos queimam com a paixão que já conheço tão bem, mas há
uma diversão sacana nas íris de ônix. Ele pega a minha mão direita e a leva
até a boca, os lábios depositando um beijo no pulso. Arfo, meu corpo
acordando, querendo mais. Querendo puxá-lo para mais perto, colando-me
em seu corpo, que sei, também já está pronto para mim. Sua língua sai,
lambendo a minha pele levemente.
— Eu jamais a deixaria ir presa, amirati. — Sua voz é engrossada.
— Eu quero a sua boca — imploro.
Ele sorri perversamente e se inclina, a boca vindo para o meu
ouvido:
— E eu quero a sua boceta — sussurra me fazendo convulsionar e
fechar os olhos. Minha vagina umedece, latejando. Então, ele se afasta, os
olhos quentes, me dizendo que está travando a mesma batalha que estou. —
Mas terei que esperar até mais tarde. — Assinto, incapaz de falar. — Nosso
bom anfitrião está vindo, comporte-se, Anna. — Avisa com um brilho
malvado nos olhos. Eu bufo, fazendo-o rir divertido. — Prometo compensar
toda essa tortura de falta de toques, habibti.
— Eu espero por isso ansiosamente, Alteza. — Provoco-o,
lambendo meu lábio superior lentamente. Ele rosna baixo, cravando o olhar
em minha boca. — Comporte-se também, meu senhor. — Rio impertinente.
Burak volta todo entusiasmado com várias caixas de veludo
vermelho. E meu queixo cai a cada joia por ele apresentada. Tenho muitas
joias em casa, de todos os tipos. Meu tio-avô, Max, dividiu as joias de sua
falecida rainha entre as sobrinhas-netas, e a minha parte consiste num baú
lotado de tiaras, anéis, colares, pulseiras… como disse, de todos os tipos.
No entanto, essas joias são diferentes. Há um inconfundível padrão oriental
em cada peça. Há colares que abraçam o pescoço e metade do colo. Pedras
variadas, com predominância para rubis e esmeraldas. Ele diz que fico bem
com rubis e que as esmeraldas realçam meus olhos. Karim me observa
experimentar todas, seu olhar possessivo, flamejante com cada peça que
coloco. Ele não me tocou mais, contudo, sentir seu olhar sobre mim era
quase como se me tocasse fisicamente. Eu acho que isso é de certa forma
estimulante, a excitação vai acumulando e, quando pudermos nos tocar, será
ainda mais delicioso.
— Eu vou ver minha princesinha experimentar as suas também,
‘amira. Já volto — diz com suavidade e se dirige para onde Ayla está
tagarelando com a vendedora o tempo inteiro.
— Você está feliz, nour hayati? — Ele pergunta e eu os contemplo,
meu peito preenchido de amor.
— Muito, papai! Eu vou levar todas! — Ela sorri, lhe mostrando a
tiara de diamante amarelo perfeitamente encaixada em sua cabeça.
Karim a levanta no colo e gira com ela numa dança imaginária. A
risadinha infantil invade o ambiente e os funcionários riem também,
encantados com a cena. Eu sei que sou muito suspeita, mas eles são lindos.
Quando encerramos a compra, Burak informa que enviará tudo ao palácio
ainda hoje. Deixamos a loja após os agradecimentos e nos dirigimos para
um dos hotéis de Karim, para jantarmos. A comida deliciosa me conquistou
de primeira. O restaurante possui uma área privada e foi lá que ficamos, a
mesa perto de uma parede de vidro imensa nos dando a vista de toda a
cidade muitos metros abaixo.
— Vou ter que pensar em um presente para você também — digo,
provando minha sobremesa.
— Você não tem que fazer isso, ‘amira. Os homens árabes adoram
encher suas mulheres de presentes. — Ele sorri e pega a minha mão,
beijando o dorso gentilmente. Sua frase me faz torcer o nariz.
— Suas mulheres? — indago, levantando uma sobrancelha. Ele dá
uma risada profunda, fazendo minha carranca aprofundar.
— Me refiro às mulheres da família, amirati. No meu caso, você e
Ayla. — Torna a beijar minha mão, com esses olhos negros e intensos me
seduzindo. — E quantas outras meninas você me der, habibti.
Eu rio, querendo me debruçar e beijar sua boca. Ele sabe disso
porque torna a rir, sacana, gostando de me deixar doida para tocá-lo.
— Precisamos discutir melhor suas expectativas quanto a filhos,
meu senhor — digo, levantando meu queixo. — Eu não vou parir cinco,
oito, dez filhos, como vejo relatos de mulheres árabes por aí! — Isso o
diverte. Sua risada linda soa de novo. — Embora deva admitir que amo o
processo de reprodução com você…
— Teremos quantos você quiser, amirati. Fique tranquila —
murmura, seus olhos ficando mais penetrantes nos meus. — E eu também
amo cada segundo do processo de reprodução com você…
Estou toda quente e excitada outra vez. Esses estúpidos passeios
sem toque são uma merda!
Nós terminamos de comer, Ayla está ainda elétrica, apontando cada
prédio lá embaixo. A viagem de volta foi feita no helicóptero. Nenhum de
nós pilotou. Karim e eu fomos atrás com a pequena entusiasmada, que
tornou a dizer que quer aprender a pilotar. Na chegada ao palácio, um
homem estava nos esperando junto com o senhor Jafar tão logo descemos
da aeronave. Karim segurou minha mão e pegou Ayla no colo enquanto
descíamos os degraus do terraço. Pude sentir certa tensão nele e me
perguntei quem era aquele homem.
— Amiri. — O homem moreno, na mesma faixa etária de Jafar, se
inclina numa mesura respeitosa. — Desculpe vir sem avisar, é que surgiu
algo que julguei importante compartilhar com meu senhor.
Ele está vestido em trajes tradicionais também. Tem um ar de
autoridade e certa arrogância em seus olhos escuros.
— Sheik El-Baham. — Karim o cumprimenta na voz firme de
governante e eu reconheço o nome. Esse é o pai da naja, um dos líderes dos
clãs tribais. — Se é um assunto urgente, irei atendê-lo. Creio que ainda não
conhece a princesa Anna Julia Di Castellani, minha noiva. — Me apresenta
e vejo algo sutil no olhar do homem.
Sinto a mesma vibração ruim emanando dele. Deve ser de família.
Zombo. Os olhos do sheik cravam em mim e sinto um arrepio estranho
percorrer minha pele.
— Ainda não tive o prazer, embora tenha visto a repercussão de sua
estada em Kamar na internet — ele diz. Seu comentário parece espirituoso,
mas sua expressão é sombria. Me sinto incomodada com o escrutínio
velado do homem. — Minha senhora. — Inclina levemente a cabeça. —
Seja bem-vinda ao nosso humilde emirado.
— Shukran, senhor — respondo educadamente.
Karim vira o rosto para o meu. Ele está sério, mas sua expressão
suaviza.
— Vá com Ayla, amirati — murmura e sua boca encosta na minha
num beijo suave. Sua atenção foca em Ayla: — Vá com Anninha, passarei
para dar um beijo de boa-noite mais tarde. Você gostou do passeio, habibti?
Ela cobre seu rosto de beijos e seu pai sorri, beijando sua testinha.
— Muito, papai. — Um bocejo lhe escapa. A pequena está
finalmente abatida das atividades de hoje.
— Não esqueça de agradecer a Anna, ela quem planejou tudo. —
Toca o rostinho da filha e murmura: — Eu amo você, nour hayati.
— Também te amo, papai — diz de volta, seus olhinhos pesando de
sono.
Eu a pego dos braços de Karim. Ela vem sorrindo, adora ser
paparicada.
— A princesinha está cada dia mais bonita e esperta. — O sheik
comenta, numa tentativa de ser simpático. — Se não for pedir demais, leve-
a mais vezes para estar com sua família materna, meu senhor. Ela precisa
saber que estamos lá sempre que precisar.
— É verdade, sheik. — Karim anui, embora o rosto não mostre
muita empolgação com a chegada inesperada do homem. — Farei isso. Na
próxima reunião que tivermos no deserto, a levarei comigo.
— E a princesa Di Castellani? Soube que esteve fotografando os
beduínos recentemente. — Ele volta a atenção para mim e novamente sinto
aquela vibração ruim vindo em minha direção. — Seria bom levá-la e
apresentá-la aos clãs.
— Farei isso no momento certo, sheik — Karim diz numa voz um
tanto impaciente. — Queira me acompanhar até o salão norte.
— Claro, amiri. Aproveitando o momento, quero que saiba que
terão o meu voto para a união. — O homem anuncia, me surpreendendo pra
caramba. Karim também o encara com certa incredulidade, mas disfarça
muito bem as emoções. — Sou um aliado seu, é pai de minha sobrinha-
neta, além de meu príncipe. Nosso emirado cresceu muito desde que
assumiu como príncipe regente, não há como negar seu progresso. Sempre
terá o meu apoio e me empenharei em conseguir muitos mais para o seu
lado, para meu senhor. — Garante em tom solene e bajulador.
— É bom contar com a sua lealdade, sheik — Karim diz
cortesmente e começa a andar sendo seguido pelos homens. O tio Jafar
esteve o tempo todo calado e mal olhou em minha direção. Continuo fora
da sua lista de Natal para presentes, pelo visto. Zombo.
Coloco a pequena no chão e andamos até seus aposentos. A ajudo a
tomar um banho e escovar os dentes e a coloco na cama, me sentando na
borda.
— Shukran, habibti. — Ela boceja, um sorriso feliz no rosto, os
olhinhos brilhantes pelo tempo que passamos com seu pai. — Anninha?
— Sim, habibti? — Olho-a em expectativa.
— Você vai ser a minha mãe?
Sua pergunta me pega de surpresa e meu coração se alegra que
esteja cogitando isso. Porém, não seria justo com Yasmina. Não posso
tomar seu posto com sua filha. Toco seu rostinho e me inclino, beijando
seus cabelos suavemente.
— Não, Ayla, você já tem uma mãe, princesinha — murmuro. — E
ela te amava muito.
— Eu não me lembro dela. — Seu rostinho cai.
— Eu sei, sapequinha. Ainda assim ela não deixa de ser sua mãe —
digo pacientemente. — Mas saiba que cuidarei de você como se fosse
minha também. É assim que te amo, habibti.
Seu rostinho se ilumina e ela sorri.
— Quanto você me ama? — pergunta, soltando mais um bocejo.
— Assim, menininha bonita. — Abro bem os braços, rindo para ela.
— É assim que te amo também, habibti — diz, a voz já pesando de
sono.
— Durma bem, princesinha. — Lhe dou mais um beijo na testa e
seus olhinhos se fecham, o sorriso permanecendo em sua expressão.
Eu entro nos aposentos de Karim.… Não, nossos aposentos. Me
corrijo. Espero que aquele homem não tenha vindo trazer más notícias. Não
gostei dele. Como sua filha, há algo sinistro vibrando à sua volta. Me forço
a expulsar o desconforto da minha mente e seleciono uma boa música latina
no som. Envio uma mensagem para meu príncipe dizendo que o esperarei
na banheira. É um de meus lugares favoritos para fazer amor. Coloco-a para
encher, meu corpo já antecipando tudo o que faremos, a paixão
avassaladora que tem nos consumido noite após noite.

Karim Amihaj
— Os líderes me elegeram para vir em seu nome, amiri. — El-
Baham diz tão logo que nos acomodamos na mesa de reuniões de um dos
salões da ala norte, que uso para assuntos emergenciais. Meu tio se coloca
ao meu lado na cabeceira da mesa.
— Então, agora, estão trabalhando com representantes entre si? —
pergunto, mantendo meu tom neutro.
El-Baham, embora tenha mostrado lealdade até agora, também é um
dos que compactuam com as ideias atrasadas das tribos. Não posso baixar a
guarda com nenhum deles.
— Não é uma máxima, meu senhor. — Ele sorri apaziguador. —
Apenas para essa questão em particular.
— E qual é a questão? — inquiro, mesmo que já saiba do que se
trata. Vão começar o maldito cerco.
— Todos estão preocupados que não queira mais fazer um
casamento de Estado, meu senhor. — O homem diz em tom cauteloso.
Respiro fundo. Não há como adiar mais isso.
— Eu não vou mais fazer um casamento de Estado, sheik El-Baham.
— Digo com minha voz calma e plana, exatamente do jeito que aprendi
com meu pai e tio. — Me casarei com Anna Julia, a mulher que amo.
Seus olhos denotam insatisfação e ele balança a cabeça.
— E as nossas tradições, amiri? Um Al-Abdallah nunca se negou a
fazer um casamento de Estado — aponta.
— Sim, é verdade, sheik — concordo. — Meus ancestrais, herdeiros
diretos ao trono, aceitaram os casamentos convenientes e tiveram sorte em
encontrar boas mulheres que os fizeram felizes. Mas não estamos mais
naqueles tempos remotos. — O encaro firmemente, não recuando.
— Sua escolhida não será aceita pela maior parte das tribos, meu
senhor — El-Baham verbaliza. — Tem a minha lealdade e voto, como já
disse lá fora, tentarei trazer mais líderes para o seu lado, porém, pode haver
conflitos. — Engole audivelmente. — As tribos podem se dividir ainda
mais caso insista em se unir a uma moça ocidental.
Sim. Ele também está certo em seu prospecto sombrio. Contudo,
não vou recuar. Anna será a minha rainha, não vou abrir mão dela.
— Esse é o recado que veio me dar, sheik? — Olho-o de forma
intimidante. — Que haverá conflitos entre meu próprio povo se não ceder
aos caprichos dos clãs?
— Não é um recado, meu senhor. — Nega com a cabeça. — É uma
preocupação minha enquanto seu fiel súdito. Em minha opinião, será o rei
mais próspero e sábio que tivemos em séculos. Com todo o respeito ao seu
pai, que Allah o tenha — acrescenta. — Mas, mesmo os reis progressistas
precisam se submeter às tradições de seu povo.
— Não estou querendo me casar com uma qualquer. Minha
escolhida é uma princesa. Pertence a uma das casas mais prestigiadas da
realeza europeia. — Meu tom se eleva uma nota. — E eu a amo!
Ele assente. Sua expressão não muda, no entanto.
— Eles insistirão no casamento de Estado, Sua Alteza. Esteja
preparado para enfrentar resistência. — El-Baham aperta os lábios. — Mas
podemos tentar convencê-los para que suba ao trono solteiro. Dessa forma
poderá ir discutindo e tentando mudar algumas exigências para o príncipe
herdeiro.
Sim. Jalal já me sugeriu que fizesse isso. Observo o homem
atentamente. Talvez ele, de fato, seja leal a mim. Meu tio me ensinou a
nunca confiar cegamente na lealdade das tribos. Elas são voláteis.
— Se me permite, amiri — meu tio fala pela primeira vez, sua
atenção vai para o líder à nossa frente —, Jalal já havia discutido essa
alternativa com Sua Alteza há alguns dias.
Os olhos de El-Baham brilham pela aprovação do grão-vizir.
— Shrukran, meu senhor — diz respeitosamente ao meu tio.
— A princesa pertence a uma das famílias mais importantes da
Europa, como meu senhor já mencionou — meu tio retoma e agora ele tem
a minha atenção. É impressão minha ou ele está defendendo Anna? —
Pense nas conexões que conseguiremos com o Ocidente. Seu pai é um
bilionário do ramo da tecnologia. Precisamos de tecnologia de ponta em
nosso emirado. Isso para citar apenas um aspecto positivo da união da casa
Al-Abdallah com a casa Di Castellani. — Me forço a me manter
impassível, mas por dentro estou me perguntando que bicho mordeu ele!
Wallah! De onde veio essa defesa? — A moça pode não ser uma de nós,
mas essa aliança pode trazer inúmeros benefícios para nosso emirado.
El-Baham franze a testa, assimilando tudo que meu tio disse.
Embora não concorde com o aspecto puramente comercial detalhado por
meu tio, é bom ver que conseguiu enxergar que Anna tem um berço forte.
— Eu consigo enxergar, meu senhor. E me esforçarei para que os
outros enxerguem também, fiquem certos disso. — O homem garante,
satisfação se espalhando em seu semblante. — Quando teremos uma
reunião geral?
— Na próxima semana irei a Londres. É o nascimento da filha de
um grande amigo, que por acaso é sobrinha e afilhada de Anna Julia. Meu
tio irá chamá-los e marcar tão logo eu retorne, sheik — informo.
— Certo, amiri. Até lá já terei conversado com cada um dos líderes
— promete.
— Shukran. Sua ajuda não será esquecida, tem a minha palavra —
digo sustentando seu olhar. Isso o deixa ainda mais satisfeito.
— Não faço por recompensa, meu senhor. Saiba que terá sempre um
súdito fiel em mim. — Ele bate no peito esquerdo. — Minha casa sempre
serviu e sempre servirá à casa Al-Abdallah.
— Vou precisar que me mantenha informado das conversas com os
outros clãs, sheik El-Baham — meu tio o intima. — Meu senhor precisa ir
preparado para essa reunião.
— Certamente, meu senhor. — O homem assente. — Manterei meu
grão-vizir informado sobre cada passo e, principalmente, sobre quem não é
confiável. Que Allah nos guie para um denominador comum.
Eu e meu tio assentimos.
— Há algo mais que queira discutir comigo, sheik? — pergunto,
impaciente para ir continuar a noite com a minha princesa.
— Meu senhor se incomodaria se eu ficasse por um ou dois dias
aqui no palácio? Minha filha Latyfa precisa de um novo pretendente e
gostaria de discutir isso com ela antes de retornar ao deserto.
— Claro que pode ficar. Fique o tempo que quiser. É tio da minha
filha — digo, me sentindo um pouco incomodado quando menciona ter de
encontrar outro pretendente para Latyfa. Sei que pai e filha tinham
esperanças de que ela fosse escolhida dessa vez. Contudo, não posso fazer
nada a respeito.
— É muita bondade sua, amiri. — Ele está até mesmo sorrindo
agora.
Me levanto, dando por encerrada a reunião.
— Sinta-se em casa e, mais uma vez, obrigado por sua lealdade —
digo e ele se levanta também. Despedindo-se com uma mesura respeitosa, o
sheik nos deixa.
Meu olhar vai para o meu tio quando o homem sai, fechando a porta
atrás de si.
— Então agora está defendendo a princesa?
Ele se levanta também, vindo para a minha frente. Seu rosto sério e
impassível, como sempre.
— A princesa ainda não é a minha candidata ideal para sua rainha,
amiri. Mas prometi ao seu pai que cuidaria de você — diz com um lampejo
mínimo de emoção na voz. — Como grão-vizir, discordo da decisão que
está tomando, pois isso trará muitas consequências para o emirado. Mas,
como tio, quero a sua felicidade também, e é por isso que irei apoiar sua
união com a princesa escandalosa.
Isso me faz rir um pouco. Finalmente!
— Ela não é escandalosa — defendo-a. — É linda, vibrante e me fez
viver de novo, tio.
Seu rosto suaviza um pouco.
— Como tio, posso ver isso, Amihaj. — Anui, me olhando
firmemente. — E falei sério sobre os pontos positivos dessa união…
— Não, tio. — Corto-o. — Eu a amo. Essa é única razão pela qual a
escolhi. Não quero elencar vantagens materiais quando estou me casando
por amor.
Ele não parece gostar, mas assente.
— Então, vamos nos concentrar na sua argumentação para subir ao
trono solteiro — aponta.
— Sim. Isso merece atenção imediata. Amanhã mesmo vamos nos
sentar e montar um bom discurso para essa reunião — concordo e paro um
instante. — Acha que tenho chances de conseguir?
Me estuda em silêncio por um tempo.
— Nenhum Al-Abdallah subiu ao trono solteiro, Amihaj. Mas se
está disposto a lutar pelo direito de se casar com essa moça…
— Anna Julia, tio, chame-a pelo nome, por favor. — O interrompo.
Novamente não parece satisfeito, mas respira fundo e retoma:
— Se quer mesmo se casar com Anna Julia, terá que ser
convincente.
Olho em direção à porta e volto a encará-lo.
— E quanto ao sheik El-Baham? Acha que posso confiar nele? —
inquiro.
— Um príncipe herdeiro não deve confiar em ninguém, meu senhor
— responde na voz solene e fatalista que tanto usou comigo desde a morte
de meu pai.
— Nem mesmo em seu grão-vizir? — Não resisto à pergunta. Por
incrível que pareça, acho que vejo algo parecido com diversão nos olhos
escuros de meu sisudo tio.
— Deixarei essa questão para o seu julgamento, amiri. —
Sabiamente sai pela tangente. — Agora, sobre El-Baham, é bom mantermos
um olho sobre o homem. — Isso me faz levantar as sobrancelhas. — Ele
parece preocupado demais em provar sua lealdade.
— E isso não é bom? — inquiro, confuso.
— Sim, se a lealdade realmente existir, é bom, amiri — diz com
seriedade. — O vigiarei, fique tranquilo.
— Shukran, tio. — Levanto minha mão, pousando-a em seu ombro.
Ele fica desconfortável com a demonstração de afeto. — Seu apoio é
importante para mim.
— Eu prometi ao seu pai, como irmão e como grão-vizir, que nunca
deixaria de apoiar seu filho. — Reforça, colocando a mão sobre a minha. —
E não pretendo falhar.
Meu tio é um homem tradicional. Sua promessa deve ser uma forma
de demonstrar seu amor pelo irmão e por seu filho. Eu acho. Nos
despedimos e sigo para os aposentos de Ayla. Sorrio ao ver a minha
pequena ressonando quando me aproximo da cama. Ela estava tão radiante
com nosso passeio hoje. Anna tem razão, eu a deixei presa aqui comigo por
muito tempo. Me isolei depois da morte de Yasmina e minha filha acabou
sendo sentenciada a sofrer junto comigo. As vezes que a levei à capital,
posso contar nos dedos. Nunca a levei para cavalgar comigo. Nunca fiz
nada divertido com ela, e isso é imperdoável. Eu estava de luto, não ela.
Decidido a mudar isso de agora em diante, eu beijo sua testinha e saio do
quarto.
Pego meu celular, passando as mensagens, e meu peito e outra parte
da anatomia vibram ao ver uma que Anna me enviou há uns trinta minutos.
Ela diz que vai me esperar nua na banheira. Eu apresso o passo e entro em
nossos aposentos. Surpreendentemente, música árabe está tocando no home
theater. Me livro das sandálias, cafia, igal e me dirijo ao banheiro. Quando
alcanço a porta, paro, me recostando ao batente, e aprecio a cena por um
instante. Ela está de olhos fechados, a cabeça apoiada sobre a borda da
banheira. Não há espumas, o que me permite ver seu corpo lindo submerso.
Me aproximo devagar, meu corpo respondendo à visão da perfeição que ela
é. Os peitinhos durinhos, os biquinhos e auréolas deliciosas. O ventre liso, a
bocetinha bem depilada me faz salivar. Arranco minha roupa e só quando
estou dentro da banheira ela abre os olhos. Um sorriso preguiçoso curva a
boca carnuda.
— Amiri… — Sussurra, me estendendo a mão.
— Oi, habibti. — Pego sua mão e me abaixo, me sentando na outra
extremidade, puxando-a para o meu colo. Ela vem ansiosa, desejosa e
quando sua pele encosta na minha, tudo o mais some da minha mente.
— Obrigado por se preocupar com Ayla. Eu fui tão insensível com
ela… — Murmuro, enrolando meus braços em sua cintura. Sua boceta
quente está sobre o meu pau duro. — Eu a fiz ficar de luto junto comigo e
isso foi muito ruim para ela.
Seu rosto bonito suaviza e ela segura meu rosto de cada lado. Seus
cabelos estão presos num coque no alto da cabeça, deixando seu pescoço
aristocrático todo à mostra.
— Não tem que me agradecer. Eu a amo. — Diz com esses lindos
olhos verdes brilhantes. É por isso que enfrentarei quaisquer consequências.
Por ela, para receber esse olhar que está me dando, todos os dias.
— Amirati… — Sussurro rouco, pegando sua nuca, trazendo sua
boca para a minha. E então, me perco nela e em seu corpo…

Quatro dias depois…


Anna torna a disparar e quase acerta o alvo. Ela pragueja em
italiano. Já vi que faz muito isso. Vou para trás dela, segurando sua cintura,
e levo uma mão para seu cotovelo, firmando-o.
— Você está indo muito bem para pouco treino. Tente de novo,
‘amira. — Encorajo-a.
Comecei a treiná-la com armas desde que me viu treinando com
Jalal e aí agiu parecido com Ayla, só faltou dar saltos, pedindo para que eu
a ensinasse. Acabei cedendo porque acho que é algo necessário, e minha
princesa está longe de ser uma donzela convencional. Ela gosta de ação,
emoção, então, por que não?
— Ainda não acertei o alvo. Por que é tão difícil? — resmunga. Seu
cabelo está suspenso num rabo de cavalo e me inclino beijando a pele
gostosa. Ela estremece. — Não me distraia.
Rio e mantenho seu cotovelo amparado, ajudando-a.
— Atire! — Ordeno. Ela não conta história, apertando o gatilho, o
projetil acertando o alvo.
— Oh, meu Deus! Eu acertei! — Agora ela realmente dá os saltos.
— O pensamento na hora da mira é para matar, habibti — digo o
mesmo que me disseram no exército. — Espero que nunca precise se
defender contra outro sequestro de novo, mas começo a pensar que é útil
que minha mulher saiba manejar armas.
— E se eu não quiser matar meu oponente? — questiona, com uma
dose de apreensão na voz.
— Quando se parte para usar armas, é porque as opções civilizadas
se esgotaram, ‘amira — digo sério. — A não ser que tenha um bom motivo
para deixá-lo vivo, em caso de combate direto, você não pode hesitar. Seu
inimigo não terá a mesma consciência que você, acredite em mim. Você é
mulher, tem aparência delicada, precisa ser letal. Não é machismo, mas não
dê a chance de seu inimigo encontrar uma fraqueza e te dominar.
Ela assente, atenta. É uma excelente aluna e começo a gostar disso,
de ensiná-la a se defender, caso venhamos a precisar. Estamos no galpão
perto do estábulo que eu e Jalal usamos para praticar. Há algumas armas e
equipamentos para treino. Selecionei os modelos mais utilizados, variando
de uma pistola 9 mm a um fuzil M16. Ela cismou com uma AK-47, embora
seu corpo seja delicado demais para usar uma desse calibre. Então, a trouxe
para a área de tiro. Há vários alvos instalados em intervalos diferentes. Fiz
com que ela começasse com o alvo mais próximo, amanhã passaremos para
latas e garrafas. A princesa viu isso em filmes e quer tentar acertar esses
objetos. Entreguei a pistola 9 mm a ela, instruí como usá-la. Para meu
choque, acertou os alvos mais vezes com essa. Surpreso e impressionado,
fiz com que tentasse as outras armas. Anna não se assustou com nenhum
modelo, pelo contrário, parecia fascinada a cada uma que era apresentada.
Todavia, seus braços tremeram quando tentou mirar a AK-47 e, por isso,
tive que ajudá-la.
— Você teria que ser mais forte para usar essa sozinha, habibti. —
Esclareço tirando a arma de sua mão. Ela anui pegando uma garrafa de água
e tomando um grande gole. Me oferece e bebo também. Embora tenha ar-
condicionado aqui dentro, a atividade e a adrenalina fazem a temperatura do
corpo subir.
— Sim — Anna concorda. — Quero continuar treinando para
conseguir usar todas, como você e Jalal.
Rio da sua fascinação pelas armas e mordo seu pescoço suavemente.
Ela geme, encostando a bunda gostosa em meu pau. Está usando uma calça
jeans e camiseta simples. Eu também estou casual.
— Minha princesa destemida — sussurro em seu ouvido, puxando o
lóbulo entre os dentes. Empurro meu pau duro entre as bochechas da
bundinha firme. — Tente mais vezes com a 9 mm — oriento, subindo as
mãos para os peitinhos deliciosos, puxando o bojo do sutiã para cima,
desnudando-os montinhos perfeitos.
— Ahh… Eu vou errar assim, habib — reclama sorrindo, mas não
para de esfregar a bunda em mim.
— Vamos, tente, princesa. Faz parte do treinamento. — Puxo os
biquinhos durinhos e ela ofega alto. — Vamos, me mostre que pode ser uma
boa atiradora, mesmo em condições adversas… — digo perversamente,
amassando os peitinhos gostosos.
— Você está sendo malvado. — Torna a reclamar, mas está
preparando a arma, tentando mirar o alvo. Mordo seu ombro, apertando
seus mamilos e ela dispara, choramingando com meu ataque safado. —
Droga, eu errei…
— Seu tom não parece muito decepcionado, ‘amira — sussurro em
seu ouvido.
Ela me dá um olhar perverso por cima do ombro.
— Talvez deva me mostrar como se atinge o alvo em situações
adversas, meu senhor — ronrona, se virando e pegando meu pau por cima
do meu jeans. Sai da sua posição me impelindo a tomar seu lugar. —
Vamos, use qualquer uma que quiser, habib — murmura, descendo meu
zíper, me fazendo assobiar quando a mão macia pega minha carne inchada e
pulsante.
— Acha que não consigo acertar, princesa? — Rio arrogante e ela
estreita os olhos.
— Acho que não, Alteza — zomba com um risinho malvado,
passando a me masturbar para cima e para baixo, lenta e torturantemente.
— Que tal apostarmos alguma coisa para ficar mais interessante? —
Sugiro e ela levanta uma sobrancelha linda. Minha princesa é tão
competitiva.
— E o que seria? — indaga, seu olhar ficando mais estreito.
— Sua boceta apertada. — Anna ofega quando sussurro isso. —
Aqui mesmo. Se eu perder, está livre para me cobrar o que quiser. — Pauso
e sorrio perversamente, aproximando minha boca do seu ouvido. — Mas se
ganhar, princesa, eu vou te debruçar sobre essa mesa de tiro e te comer bem
duro por trás.
— Ah, droga… — Ela geme, seu corpo todo já pronto para mim, eu
sei. — Você é tão safado.
— Você também. Aposto que já está me imaginando em ação nesse
exato momento — provoco-a. Ela torna a gemer e eu rio satisfeito.
Pego a AK-47 e prendo seu olhar por um segundo antes de voltar
minha atenção para os alvos. Miro, me esforçando para me concentrar na
tarefa e tudo fica mais difícil quando uma boca quente suga a cabeça do
meu pau.
— Ahh, porra… — Solto um rugido, torcendo para ela me engolir
todo e ela o faz, então eu torno a rugir, apertando o gatilho. Anna para a
trapaça e lamento a boquinha quente deixando minha carne necessitada. Ela
fica ereta, os olhos grudados no alvo, e rio vendo a fumaça saindo do
buraco na cabeça do boneco mais distante.
— Droga, você é bom, honorável Alteza. — Me olha de esguelha.
— Parece que você ganhou algo… — Eu empurro todas as armas para o
lado e a puxo pela cintura, minha boca comendo a dela num beijo quente,
indecente. — E se alguém vier até aqui, Karim? — pergunta enquanto
minhas mãos já trabalham no botão e zíper do seu jeans.
— Ninguém em sã consciência viria aqui. — Rosno, mordendo seus
lábios juntos. — Agora, fique na posição para eu pegar meu prêmio,
amirati… — digo condescendente e ela bufa, mas se debruça sobre a mesa.
Eu puxo sua calça e calcinha juntas até as coxas e minha boca
saliva, meu pau babando. Quando me empurro todo dentro dela, tudo se
dissolve à minha volta. A tensão com as tribos vai embora e nada mais
importa, apenas senti-la assim, minha. Completamente minha. Ela é a
mulher perfeita para mim. A cada dia que passo ao seu lado, tenho mais
certeza disso. Eu vou lutar para que ela continue aqui, sendo a minha
mulher. A minha rainha.
CAPÍTULO DEZ
Londres, dois dias depois.
“Brilhe intensamente como um diamante… Eu escolho ser feliz. Você e eu,
você e eu, nós somos como diamantes no céu…”
(Rihanna – Diamonds)

Anna Julia
Eu enfio o nariz no peito de meu pai e inspiro o cheiro amado e
familiar. Seus braços estão à minha volta e seus lábios depositam beijos
suaves em meus cabelos. A sensação enche meu coração de calor.
— Eu senti saudades, papai — murmuro, levantando meu rosto,
encontrando seus olhos verdes, geralmente divertidos, mas estão brilhantes
de emoção neste momento.
— Eu também, princesinha. Eu também — diz, me dando mais um
beijo amoroso na testa.
— Bambina. Ficamos tão aflitos no começo — minha mãe reclama,
me fazendo olhá-la. Tenho um braço em volta dela também. Eu entrei na
sala e corri para eles, como uma garotinha do papai e da mamãe.
— Eu sei, mamma — digo suavemente, recebendo seus beijos
carinhosos. — Estou bem. Tudo não passou de um susto.
— Ei, maninha, e eu não ganho abraço? — Lipe vem para perto com
sua cara travessa.
— Vem aqui, meu fedelho preferido. — Meus pais me soltam e eu
vou até meu irmãozinho, suspirando feliz quando seus braços me engolem
num abraço. Ele está maior e mais forte ou é impressão minha? — Você
está mais bonito e mais forte. Está pegando pesado na academia? Esses
músculos não estavam aqui há dois meses. — Observo, apalpando seus
ombros e bíceps duros.
— Funciona com as garotas. — Ele pisca safado e me dá um beijo
na têmpora. — Senti saudades, Anna.
Me estico, beijando-o na bochecha.
— Eu também, bonitão. — Estendo a mão para o lado e uma mão
grande e familiar a segura. Olho de lado, notando Karim um tanto sem jeito
segurando a mão de Ayla, que está com os olhinhos curiosos correndo por
todos no recinto. Chegamos há pouco para o nascimento da minha afilhada.
Minha família está em peso na sala de espera da maternidade. Me coloco ao
lado de meu príncipe para deixá-lo mais à vontade. — Pai, mãe, Lipe,
conheçam Karim e sua filha Ayla — digo com orgulho e amor na voz. —
Habib, princesinha, estes são meus pais, Dom e Helena, e meu irmão mais
novo, Felipe.
— É um prazer conhecê-los pessoalmente, senhor, senhora. —
Karim estende a mão, a voz firme.
— O prazer é nosso, Amihaj. — Meu pai aceita o cumprimento, um
sorriso enrolando sua boca ao completar: — É bom vê-los fora da
internet…
— Pai… — resmungo e ele me dá uma piscada. Já vi que vai
continuar zoando Karim.
— E, por favor, sem essa de senhor, sou ainda muito jovem —
retruca e ouço um bufo, que acredito ser de meu tio Jay. Rio. Meu pai e tios
nunca param de zoar uns aos outros. — Prazer em conhecê-la, mocinha —
acrescenta, dirigindo a atenção para Ayla, que parece momentaneamente
tímida.
— Concordo com meu marido, não precisa tanta formalidade,
apenas Helena, por favor. — Minha mãe estende a mão. — É um prazer
conhecê-lo e a essa menininha adorável — complementa, afagando os
cabelos escuros de minha sapequinha.
— Ei, cara! Bom te conhecer! — Lipe estende a mão e dá tapas
amigáveis nas costas de Karim. Meu príncipe parece fora da sua zona de
conforto. Tadinho. Enfrentar todos os Di Castellani de uma vez não é para
qualquer um.
— Bom te conhecer também, Felipe — ele responde.
— Apenas Lipe. — Meu irmão pede e acaricia a cabecinha de Ayla.
— E você, princesinha? Soube que gosta muito de dançar. É
verdade?
Ayla abre um sorriso tímido.
— Sim. A Anninha me ensina — responde e vejo nos rostos de
meus pais a satisfação ao ver o carinho com que a pequena se referiu a
mim.
Antes que a conversa se estenda, os outros chegam para perto. Meus
padrinhos Leon e Júlia. Tio Jay e tia Cassie. Luc, Samu e Chloe, que está
com uma barriga enorme! Minha nossa! Sam e Em e Dam e Max. Sou
abraçada e beijada por cada um deles. Todos estavam ansiosos para me ver
em pessoa e conferir se realmente estou bem. Em seguida, apresento Karim
e Ayla. Apenas Mike e Ella os conheciam pessoalmente e eles estão na sala
de parto neste momento.
— É bom ver que está bem, figlia mia. — Meu padrinho beija
minha testa. — Ficamos tão preocupados com a sua segurança.
— Tudo passou, padrinho. Grazie a Dio — murmuro, recebendo o
carinho dele. Meus tios são muito amorosos com os sobrinhos. Meu pai e
seus irmãos nos criaram como se fôssemos irmãos. Somos muito unidos.
— Ainda bem, querida. — Minha madrinha também me beija. Me
sinto paparicada e tão amada aqui com eles. Seu tom abaixa um pouco, seus
grandes olhos verdes encontrando os meus ao murmurar: — Estou tão feliz
por você, principessa mia.
Assinto. Sei que minha família se preocupava muito com o meu
luto. Achavam que o estendi por tempo demais.
— Grazie, madrinha — sussurro.
— Você nos deu algumas rugas e cabelos brancos, querida. — Meu
tio Jay sorri, me puxando para um abraço de urso, beijando meus cabelos.
Ele sempre foi o mais caloroso dos irmãos. — Graças a Deus que tudo se
resolveu.
— Obrigada, tio. — Sorrio-lhe.
— Sim, todos nós ficamos desesperados com essa sua travessura,
querida. — Tia Cassie ri antes de me dar um beijo suave na bochecha.
— Desculpe preocupá-los, tia. — Sorrio, me sentindo a menina
arteira que sempre aprontava nas férias que passava com meus primos.
Chloe se aproxima com seus homens a tiracolo. Ainda é meio
chocante ver os três interagindo livremente, como um trisal. Foi uma
verdadeira loucura para eles conseguirem a liberação do parlamento para se
unirem, mas tudo se resolveu e conseguiram ficar juntos. É meio
escandaloso, porém meus primos e sua escolhida formam um lindo e
harmonioso trio. Nós os apoiamos, como sempre fazemos com os nossos.
— Que barrigão é esse, menina?! — Exclamo, estendendo a mão,
colocando a palma no ventre protuberante de minha amiga.
— Nós esperamos você chegar para contar a novidade, Anna. —
Luc espalma o ventre da esposa e sorri todo arrogante para mim. —
Estamos esperando trigêmeos, prima!
Eu engasgo. Mil vezes uau!
— Jesus! Vocês não brincam mesmo em serviço, hein, bonitões? —
Rio, olhando entre ele e Samu, que tem o mesmo sorriso arrogante do
gêmeo estampado em sua cara.
— Estamos ainda um pouco assustados, mas muito felizes, prima —
Samu complementa.
— Tirando a parte que eles já começaram a chutar forte e parecem
estar jogando futebol aqui dentro — Chloe dá de ombros, um sorrisão feliz
em seu rosto —, estou muito feliz com a novidade.
Em seguida todos começam a falar sobre a gravidez deles e sorrio.
Essa é a minha família. Meus pais deram um jeito de puxar Karim de lado e
iniciam uma conversa. Jesus, eles já vão começar a interrogá-lo agora?
Sério?
— Você parece feliz, Anna. — A voz de Dam para minha intenção
de ir socorrer meu noivo.
— É porque estou, Dam — digo e ele sorri, seus olhos escuros livres
do sarcasmo. — Muito feliz, primo.
— Fico contente que não vou precisar quebrar a cara de nenhum
bastardo. — Ele abaixa o tom, o sorriso irônico voltando no rosto bonito.
— Tente ser civilizado, futuro rei. — Reviro os olhos.
— Isso é o máximo que consigo. — Seu sorriso arrogante se
espalha.
— Anna! — Sam e Em vêm para perto de nós, seus rostos estão
com uma expressão sapeca que conheço bem.
— Ele é um gato! — Em sussurra.
— Simmm! Muito gato, prima! — Sam endossa.
Dam grunhe, rolando os olhos, prevendo a conversa de meninas que
virá a seguir, então nos deixa, se dirigindo para seus pais.
— Sim, ele é — concordo, rindo da euforia delas. — Estou tão feliz,
primas!
Seus rostos e olhares ficam suaves e elas vêm me envolver em um
abraço duplo.
— Também estamos por você, prima.
— Nós também, prima.
Murmuram e meu coração aquece no peito. Agora só falta a minha
afilhada chegar para fazer a alegria geral da família.
— Então, a minha prima descolada e irreverente foi mesmo laçada?
— Max chega para perto, a voz e semblantes divertidos. Ele também parece
maior e mais gato do que há dois meses. Os homens Di Castellani são
muito, muito bonitos. Não, não é uma opinião parcial, é a verdade. O DNA
é forte e muito abençoado no departamento beleza, acreditem.
— Sim, bonitão. Eu fui — assumo. — E você, quando será laçado?
Ele faz o sinal da cruz duas vezes e ri com uma cara de quem não
vai sossegar tão cedo.
— Dio non voglia![28] — Exclama, nos fazendo rir da sua safadeza.
Ele e meu irmãozinho ainda vão dar muito trabalho antes de
sossegarem. Por falar nele, Lipe chega, passando um braço por cima dos
ombros de Max.
— Tudo pronto para hoje à noite? — Lipe pergunta.
— Si. Solo la crema…[29] — Nosso primo responde com um sorriso
lento e pervertido.
Uh. Não quero nem imaginar do que esses dois estão falando.
E, de repente, toda a conversa na sala cessa. Olho para a entrada e
Mike está lá, segurando um pequeno pacote nos braços. Seus olhos estão
vermelhos e emoção marcando suas feições.
— Ciara chegou! — Meu primo anuncia e corremos todos, como
um enxame de abelhas, rodeando os dois. Eu contemplo o pequeno
embrulho em seus braços. O rostinho corado, a boquinha tremendo em um
bocejo, os olhinhos verdes se abrindo. Sorrio, meus olhos se enchendo de
lágrimas emocionadas.
— Ela é linda! — murmuro. Mais destes soam no recinto. Minha
afilhada. Um braço forte enrola em minha cintura e eu apoio a cabeça no
peito de Karim. Levanto meu rosto, nossos olhares se encontrando e se
conectando. — Obrigada por estar comigo nesse momento, amiri.
— É um prazer. Você parece radiante aqui no seio da sua família. —
Ele diz, sua boca pairando sobre a minha.
— É porque os amo muito — digo. Ele assente, uma expressão terna
em seu rosto, então seus lábios pousam com suavidade nos meus. É apenas
um selinho, mas me deixa ainda mais enlevada. Pego Ayla e a levanto nos
braços para que possa ver a nova integrante da família. — Essa é a sua
priminha, habibti — sussurro e minha sapequinha ri, me abraçando pelo
pescoço.

***

Dois dias depois, Ella teve alta e seguimos para o seu castelo, onde
estão morando há mais de três anos, nos arredores de Londres. Eu seguro
minha afilhada enquanto Mike entra no quarto com Ella nos braços. Meus
padrinhos e Max estão todos em volta da cama, cada um tentando fazer
algo. Mike a deposita suavemente contra os travesseiros ajeitados por
minha madrinha.
— Você está bem, boneca? Está sentindo dor? — pergunta e Ella
sorri para o marido, traçando seu rosto com os dedos, o olhar apaixonado
sobre ele.
— Grazie, amore mio. Estou ótima, não se preocupe — diz
suavemente. Olha para sua mãe e sorri com ternura. — Grazie, mamma.
— Tem um rapazinho aqui muito impaciente pedindo por sua
mamma. — Dam entra no quarto com Rico, o bebê mais velho de Ella e
Mike, no colo.
— Mamma! Quer mia mamma! — O pequeno exige no momento
em que vê sua mãe, estendendo os bracinhos rechonchudos. Ele tem dois
anos e meio agora. É a cara do pai. Mas os olhos são uma mistura do verde
de Ella e do negro de Mike, resultando numa linda tonalidade avelã. Lindo,
meu sobrinho. Dam e Max são os padrinhos e as gêmeas são as madrinhas.
De Ciara, eu sou a madrinha; e os gêmeos os padrinhos. Eles dosaram bem.
— Piccolo mio.… Vem com tua mamma. — Ella observa o filho
com os olhos cheios de amor. — Trago-o para mim, fratello — pede a Dam.
Ele o leva, o pequeno rindo, fazendo barulho à medida que todos
fazem carinho em sua cabeça. Rico era o centro das atenções, como único
bebê Di Castellani. Agora terá que dividir seu posto de reizinho com esta
coisa linda em meus braços. Olho para baixo e a encontro de olhinhos
abertos, bem esperta. Ela se parece com Ella, loirinha, olhos verdes vívidos,
que podem mudar de cor ou não conforme for crescendo. Torno a olhar para
a cama e Mike está lá, contendo os arroubos de Rico, explicando que sua
mamma não pode pegá-lo no colo. O menino faz um bico de choro,
chamando sua mãe, e Ella sorri, se inclinando e cobrindo seu rostinho de
beijos.
— Tua mamma está dodói agora, tesoro. Mas logo ficarei bem e vou
poder brincar com mio bambino. — Minha prima diz com o tom repleto de
amor e paciência. — Fique com tuo padre que nostra princesinha chegou.
Lembra que estávamos esperando por ela? — O pequeno começa a se
acalmar e eu ando até a cama, entregando o pequeno pacote para Ella. —
Nostra Ciara chegou, Rico! — Murmura suavemente, beijando a cabecinha
loira da filha.
— Nosta Ciara. — Rico repete, os olhinhos presos à irmã no colo da
mãe.
— Si, mio principi. Tua sorella está aqui. — Ella continua
conversando com o pequeno, que parece deslumbrado e curioso com a
bebê.
— Mia sorella. — Repete como um papagaio.
Eu rio, meus olhos lacrimejando com a imagem deles lá. Mike
contempla a esposa e os filhos como se fossem a coisa mais preciosa no
mundo e aproxima o rosto do de Ella, suas bocas se unindo num beijo cheio
de amor. É tão bom ver minha prima feliz, aumentando sua linda família.
Meus pensamentos vão inevitavelmente para Karim. Ele está lá embaixo na
sala com os outros. Pensei que algo assim não fosse para mim. Pensei que
nunca formaria minha família, mas agora me vejo querendo exatamente
isso. Quero me casar com ele, amar e cuidar de Ayla como se fosse minha e
lhe dar mais filhos.
Meus padrinhos, Dam e Max saem e me aproximo da cama. Ella
está amamentando a Ciara agora, a pequena fazendo sons suaves de sucção.
— Eu vou levar Rico para tomar banho e se alimentar — Mike
avisa, dando um beijo reverente na boca de Ella, em seguida outro na
cabecinha de Ciara. Então, se levanta da borda da cama com Rico no colo.
— Qualquer coisa me chame, boneca.
— Fique tranquilo, amore mio, estou bem. — Sorri, acariciando a
cabecinha da Ciara. — Nós estamos bem.
— Eu cuido dela. Fique tranquilo, primo — digo chegando mais
perto deles e fazendo carinho na cabeleira negra de Rico. O malandrinho se
derrete, estendendo os braços. Eu o pego e beijo sua testinha. — Você é o
menino mais bonito, não é? — Ele ri, os bracinhos envolvendo meu
pescoço. Como disse, o pequeno adora ser o centro das atenções. Lhe dou
mais beijos no rostinho bonito e o devolvo para Mike. — Vá com seu papai
que tia Anna vai cuidar de tua mamma agora.
— Mia mamma. — Ele repete, olhando para Ella, a boca fazendo
um bico, iniciando uma birra.
— Nada disso, campeão. Vamos tomar banho, jantar e depois trago
você para ver a mamãe de novo. — Mike o leva rapidamente, saindo do
nosso campo de visão.
Ouvimos as reclamações do pequeno até que deixam o quarto. Eu
me aproximo mais, me sentando à borda do colchão.
— Estou feliz que tenha conseguido vir, carissima — Ella murmura,
sua mão nunca parando o carinho na cabecinha da filha.
— Eu não perderia a chegada de minha afilhada por nada,
principessa mia — digo com a mesma suavidade. — Ela é linda, prima.
Parabéns de novo.
— Grazie, prima — sussurra, seus grandes olhos verdes me
contemplando com um brilho terno. — Estou ainda mais feliz por ver esse
brilho em seus olhos, esse sorriso de volta em seu rosto, principessa mia.
Eu pedi tanto a Dio por isso, Anna, te ver feliz de novo.
Suas palavras fazem lágrimas borrarem a minha visão. Ela, dentre
todos, é a que sabe realmente a extensão de tudo que sonhei viver com
Nate. De tudo que perdi quando ele foi embora tão cedo. Há coisas que só
compartilhei com ela, como há coisas sobre Mike que só compartilha
comigo. Nós temos esse tipo de ligação. Seguro meu colar num gesto
instintivo. Isso faz meu coração apertar porque terei que tirá-lo. Esse era o
desejo de Nate. Há também aquela carta temível esperando para ser aberta
em meu quarto em Nova York. Quero fazer as duas coisas no fim do mês,
quando irei em casa, passar uns dias com meus pais. Já conversei com
Karim a respeito e ele organizará sua agenda para me acompanhar e
levarmos Ayla conosco também.
— Você terá que tirá-lo agora que encontrou o amor de novo —
murmura, ao me ver segurando o colar de Nate.
— Eu sei. É só que meu coração ainda sente como se tivesse traindo
Nate. — Expiro lentamente. — Por outro lado, mantê-lo não parece justo
com Karim.
Seu rosto suaviza, mostrando compreensão.
— Mantenha-o junto com as cartas. Você pode abrir e se conectar
com ele sempre que quiser, prima. Karim entenderia isso, tenho certeza.
— Sim, ele entenderia. — Suspiro, o amor por meu príncipe
suplantando um pouco do aperto em relação ao meu primeiro amor perdido.
— Ele é maravilhoso, Ella. Eu pensei que não fosse possível, mas encontrei
o amor de novo, encontrei um homem que fez meu coração bater outra vez
— digo com voz levemente embargada. — Encontrei o homem que estava
destinado a mim e que tem me feito muito feliz.
— Eu quis apresentá-los. Cheguei a sugerir isso para Mike certa vez
— confidencia, me deixando surpresa.
— Mesmo? Por que nunca me falou nada?
— Porque Amihaj estava amargo, mergulhado no luto, e você
também estava fechada para relacionamentos — diz séria, todavia, um
sorriso vai se abrindo aos poucos. — Mas o destino se encarregou de
colocá-los juntos. Isso é extraordinário, prima.
— Sim. Embora eu tenha andado muito chateada com Deus nos
últimos seis anos, parece que Ele agiu em meu favor dessa vez, guiando-me
até Karim.
— E guiando Karim até você — emenda. — Porque o príncipe não
tinha obrigação nenhuma de ir pessoalmente resgatá-la, Anna.
— Não tinha, é verdade. — Rio, relembrando aquela noite, os
primeiros dias no palácio. Suspiro. — Estou tão apaixonada, Ella.
A expressão suave volta em seu rosto.
— Você merece, prima — murmura. — Vocês dois merecem viver o
amor de novo. — Seus olhos brilham com malícia e adiciona: — Agora me
conte os detalhes calientes.
Eu rio, me sentindo corar, mas retomo minha irreverência.
— Geralmente sou eu quem está curiosa por detalhes assim de sua
vida BDSM, principessa. — A provoco. Ella ri um pouco, meneando a
cabeça. — Eu andei testando a logística de fazer em cima de um cavalo…
— Minha prima arregala os olhos e um sorriso de quem tem uma vida
sexual bem agitada curva sua boca. — É meio confuso e desajeitado no
começo, mas depois é perfeito…
— Si? E o que mais andou testando a logística, prima? — pergunta
com um meio-sorriso, mudando Ciara para o outro seio.
— Exótica só essa situação mesmo, porém, cada noite que passo nos
braços dele é intensa à sua maneira. — Assumo, compartilhando um sorriso
cúmplice com ela.
— É assim com Mike — murmura com um ar sonhador. — Mesmo
quando fazemos baunilha, ainda é intenso e perfeito. É a pessoa com quem
estamos que importa, carissima. — Assinto e ela muda o assunto: — Então,
você vai voltar com ele para Kamar?
— Sim. Há algo que ainda não lhe disse, prima. — Ela me sonda
atenta. — Karim vai me pedir em casamento para meus pais na sexta!
— Ah, Dio mio! — Exclama, arregalando os olhos. — Isso é
maravilhoso, Anna! Vou pedir à minha mãe que organize tudo para um
jantar especial. Já estarei sem dores até lá e poderei participar também. —
Ella está radiante. Sua mão estende para a minha. — Você será feliz, prima.
Dio não esqueceu de você.
— Grazie, ti amo, principessa mia — murmuro, dando um aperto
suave em sua mão, sentindo meus olhos marejando de novo.
— Also, principessa mia — responde ternamente.
Nós ainda conversamos por um tempo até que terminou de
amamentar e coloquei Ciara no berço para que pudesse descansar na cama.
Os namorados de Sam e Em, Will e Nolan Belmont, chegaram para
o jantar e passamos momentos agradáveis. Will é piloto da Fórmula 1 e
conquistou o tetracampeonato recentemente. Os dois pertencem a uma das
famílias mais ricas da Fórmula 1, dona da equipe Belmont, da qual Will é o
principal piloto. Minhas primas parecem muito apaixonadas pelos caras,
muito gatos, diga-se de passagem. E eles por elas. Jantamos todos no salão
maior, ao redor de uma mesa oval enorme. Bem, quase todos. Mike subiu
para jantar com Ella em seus aposentos. Karim e Ayla pareciam mais à
vontade com minha família. Tio Jay e meu pai emendaram uma conversa
sobre petróleo e o turismo crescente em Kamar. Era nítido o orgulho de
Karim ao falar do seu emirado. Meu olhar o procurou o tempo todo e vice-
versa.
Estamos hospedados com Ella e Mike desde que chegamos há dois
dias, mas não estamos dividindo o mesmo quarto porque a família inteira
também está aqui nessa primeira semana. O nascimento de um Di
Castellani é um evento especial e a família toda se mobiliza para estar
presente. Tomamos uma bebida na sala de estar. Todos interagindo. Neste
momento, os gêmeos estão contando de um novo projeto e Chloe está
falando do sucesso de seu primeiro livro por uma editora famosa de Nova
York. A danadinha escreve ménage, e embora o tema ainda seja um tanto
escandaloso para a família, estamos empolgados por ela. Eu os observo e de
repente percebo que vão precisar de uma nova logística com esse barrigão
dela que não para de crescer… Rio da minha indiscrição.
Dam está com a antipática da namorada oficial, Olga, mas está
absorto, em pé perto da janela, seus olhos grudados no celular. De vez em
quando sua boca torce num de seus raros sorrisos para algo na tela. A
doutora? Que safado! Qual é a dele? Me pergunto observando-o. Quando
meus pais e tios se recolhem, eu e Karim subimos com Ayla para nossos
aposentos. Cuidamos da higiene da pequena, trocamos sua roupa para um
pijama e a colocamos na cama. A babá reclamando que não precisamos
fazer isso e minha sapequinha dizendo que gosta quando a Anninha e o
papai a colocam na cama. Ayla adormece rapidamente. Pelo que a babá nos
contou, ela explorou bem a propriedade hoje e deve estar cansada. Dou um
beijo em sua testa, seu pai faz o mesmo e nos dirigimos para fora.
Ele segura a minha mão e me leva até a minha porta, seus olhos
escuros me prometendo uma noite movimentada tão logo que o resto da
casa se recolha. Na primeira noite, ele ficou relutante em vir ao meu quarto,
então eu fui para o seu e ele não resistiu. Se despede com um beijo suave e
entro em meus aposentos. Tomo um banho, escovo os dentes, mudo para
uma camisola e penhoar vermelho curtos para esperar o meu homem.
Seleciono uma pasta pop no sistema de som e me dirijo ao bar, perto das
portas enormes de madeira maciça que levam à sacada. Eu sirvo duas taças
de vinho sobre a bancada do bar e pego uma delas. Ando alguns passos e
tomo um pequeno gole, inspirando o ar puro e perfumado. Nesta ala,
estamos de frente para um campo dos mais variados tipos de flores. Durante
o dia é uma vista incrível. A introdução de Diamonds, da Rihanna, soa em
volume baixo. Amo essa. Minha mãe a adora também. Tomo mais um gole
e me assusto quando um braço forte enrola em minha cintura, puxando
minhas costas contra um peito duro.
— Amirati… — A voz profunda sussurra, a boca caindo para a
lateral do meu pescoço, onde deposita um beijo suave. Um arrepio gostoso
me perpassa e gemo baixinho, sentindo os lábios quentes e macios
explorando minha pele, sugando-me levemente. — Passei o dia inteiro
louco para te tocar assim.
— Eu também, amiri. — Choramingo, levando minha mão para
trás, pegando sua nuca. Viro o rosto, nossos olhares se conectando. É
sempre um baque delicioso em meu estômago sentir esses olhos escuros e
intensos sobre mim.
— Nour Al sabah… — Murmura asperamente, sua boca vindo para
perto da minha.
— Minha família pode ser assustadora, eu sei. — Rio. — Mas eles
são leais, habib.
— Eu sei, habibti. — Roça a boca na minha. — Sua família é muito
acolhedora e estou me sentindo bem entre eles. É só que em Kamar me
acostumei a ter você sempre que eu quisesse…
— Oh, honorável Alteza, você está se sentindo negligenciado, é
isso? O que posso fazer por você, meu senhor? — O provoco e ele ri,
mordendo minha boca com uma pressão deliciosa, fazendo-me pulsar e
palpitar.
— Também não gosto de estarmos enganando seus pais, mas odeio
ter que dormir sem você na minha cama — resmunga. Eu rio, lambendo sua
boca bem-feita.
— Tão certinho, Alteza… — Zombo, fazendo-o grunhir, tomando
um gole da sua taça. Sua mão livre começa a acariciar meu ventre, subindo
devagar para os seus, pegando o direito em cheio. Minha respiração acelera
sob seu toque firme e o brilho perverso invadindo as íris de ônix.
— Eu vou mostrar o quanto sou certinho, princesa. — Seu tom é
rude, e isso vai entre minhas pernas. Sinto seu pau duro cavando em minha
bunda e ofego. Ele ri, lento e malvado, e então a mão desce se enfiando
entre minhas coxas, pegando minha vagina nua. Ele ruge ao me encontrar
sem calcinha. Nossas bocas estão respirando forte uma na outra, desejo,
luxúria se infiltrando em nossas veias. — Você e seu rabo atrevido vão
sofrer essa noite…
— Estou ansiosa para isso, meu senhor. — Continuo provocando-o
e sua boca mergulha na minha. Embora estejamos cheios de tesão, o beijo é
lento, nossos lábios sugando um ao outro, nossas línguas se lambendo
devagar. A paixão vai se agigantando e Karim me gira de frente. Ele se
estica e coloca nossas taças sobre a bancada de mármore, então os braços
enrolam em minha cintura, me puxando contra seu corpo. Gemo quando
nossas bocas se encontram de novo, mais urgentes dessa vez. Suas mãos
passeiam pelo meu corpo, a sensação deliciosa sobre o cetim macio da
camisola. As minhas também o exploram com fome. Ombros, peitoral,
costas arranhando minhas unhas sobre a sua camiseta preta. Não demora
muito e ele está me livrando do penhoar, da camisola. A brisa de fora
alcança minha pele nua e estremeço quando suas mãos se fecham sobre
meus seios, massageando a carne, rolando os bicos entre os dedos.
— Sim, amiri. — Arqueio-me, me dando sem reservas.
Depois de me enlouquecer com mãos e boca, me levanta nos braços
e nos leva para a cama, onde nos amamos por horas.
Eu também sentiria falta de dormir sem seu calor me envolvendo. É
inexplicável como me sinto tão ligada a ele em tão pouco tempo. Nos
conchegamos depois de extravasar nosso tesão, seus braços firmemente
enrolados em minha cintura e um sorriso feliz curva minha boca. Eu
adormeço assim, nua nos braços do homem que me possui completamente.

Karim Amihaj
Dois dias depois, Mike me puxa para a biblioteca após o jantar.
Imagino que queira conversar sobre minha situação com Anna. Ele deu
sinais disso desde a nossa chegada, porém, tem estado bem ocupado
cuidando de Ella e sua filha recém-nascida. Meu amigo é um homem
completamente dedicado à sua esposa e filhos.
— Parabéns mais uma vez, amigo. — Digo pegando o copo de
uísque das mãos de Mike. Ele se senta na poltrona de frente para a minha
em sua biblioteca. Ele tem círculos escuros embaixo dos olhos, as noites
maldormidas cobrando seu preço, mas, em contrapartida, há uma expressão
feliz e realizada em seu rosto que certamente compensa todo o resto.
— Obrigado, amigo. — Expira, tomando um gole da sua bebida e
me estuda por um momento. — Então, irá mesmo pedir a mão de minha
prima depois de amanhã?
— Sim. — Assinto, não evitando o sorriso orgulhoso se espalhando
em minha boca.
— Estou muito contente por você e por Anna. Todavia, não acha
muito cedo, Amihaj? Vocês se conheceram há dois meses apenas. — Ele
está preocupado com Anna, é nítido em seu semblante e tom.
— Achei que meu luto nunca teria fim, Mike. — Meu tom é baixo
enquanto tomo um gole do meu copo. — Então, sua prima foi até mim e me
fez sentir vivo de novo. Não sei se acredita em destino, amigo, mas Anna é
o meu. — Ele me olha com interesse. — Parece pouco tempo, mas a amo
como se a conhecesse a vida inteira. — Ele acena, compreensão descendo
em seu rosto.
— Me perdoe, parece que estou sendo estraga-prazeres, amigo. —
Ele ri um pouco. — Só estou preocupado com minha prima. É a primeira
vez que ela se abre para outro relacionamento e ainda tem a situação em seu
país… — Seu olhar fica mais aguçado no meu. — Como pretende
convencer as tribos e se casar com uma ocidental, Amihaj?
Isso me faz torcer o rosto numa careta. O assunto tem martelado em
minha cabeça desde que não consegui escolher uma das candidatas
adequadas. Não tenho uma solução ainda.
— Eu ainda não sei como, Mike. Mas esteja certo de que irei. Anna
será a minha rainha. — Afirmo, olhando-o com determinação. — Isso não é
negociável.
Minha afirmação categórica parece aplacar os receios de meu
amigo. Mike abre um pequeno sorriso de aprovação e estende seu copo para
o meu, tocando-o num brinde mudo.
— Então, vamos aproveitar o momento festivo, a família toda
reunida, e comemorar o seu noivado também — diz com entusiasmo. — Eu
já conversei com Anna ontem — revela com um de seus sorrisos irônicos,
torcendo a boca. — Minha prima parece bem impressionada com essa sua
cara feia. Não há nada que possamos fazer para dissuadi-la da ideia de se
casar com você.
Isso me faz rir, meu peito ficando leve com a menção dessa
conversa.
— O que ela disse? — pergunto, parecendo uma garotinha no
colegial. Meu amigo percebe, porque torna a rir de forma irritante.
— Basicamente a mesma coisa que acabou de me dizer. Que sente
como se o conhecesse a vida inteira e se sente viva quando está com você.
— Ele revira os olhos, me fazendo rir mais, alegria me invadindo. Ele fica
sério um instante. — Não me faça ter que quebrar a sua cara, Amihaj. Por
favor, cuide bem dela.
— Eu adoraria vê-lo tentar, Mike. — Eu bufo em desdém. — Mas
quanto a isso, jamais brigaremos, amigo. Vou amá-la e respeitá-la como
merece, fique tranquilo.
Ele anui, ingerindo mais um gole do uísque.
— E quanto ao tio Dom? Ele não tem te deixado em saia justa, tem?
— pergunta com diversão aberta e eu gemo alto.
— Wallah! Ele não vai me deixar esquecer dos malditos vídeos na
internet e muito menos das desculpas esfarrapadas que usei com ele.
Mike gargalha e eu o fulmino.
— Desculpe, amigo, mas, Santa Mãe, você foi mesmo péssimo! —
Continua rindo. — Meu conselho é: tente relaxar. Tio Dom é um dos caras
mais divertidos que conheço e você deveria agradecer. Já pensou se fosse o
meu velho no lugar dele? — Engulo em seco. O pai de Mike, embora tenha
sido simpático comigo e minha filha, parece ter um temperamento difícil.
Tal como o rei Leon. Os dois são diferentes do pai de Anna, é perceptível.
— Não haverá mais vídeos como aqueles. Vou nos resguardar de
agora em diante — prometo.
— Para meus tios, bem como para o resto de nós, a felicidade de
Anna é a única coisa que importa, Amihaj — diz com seriedade agora. —
Faça-a feliz, amigo.
— Eu farei. — Toco meu punho em meu peito esquerdo. É a forma
mais solene de juramento em meu país e ele sabe disso. Mike acena.
— Eu e Ella estamos muito felizes por vocês. Quando minha boneca
estiver recuperada do parto, vamos visitá-los — ele adiciona e aceno em
concordância.
Nós ainda conversamos por algum tempo e depois meu amigo se
despediu para ir checar sua mulher e filha. Encontro Anna do lado de fora
da biblioteca quando saio.
— Meus primos estão jogando no térreo. Quer se juntar a eles? —
pergunta, os braços rodeando meu pescoço. Seus olhos verdes estão
brilhantes. Seus cabelos longos estão presos numa trança igual à que usou
na noite do clube em Jawahra. O corpo perfeito delineado num macacão
amarelo-berrante, o tom casando com sua pele morena clara. Ela está
radiante aqui, junto com sua família. A enlaço pela cintura, puxando seu
corpo delicioso para bem perto do meu.
— Você fica ainda mais deliciosa em macacões, ‘amira — murmuro
roucamente, meu corpo acendendo com sua proximidade, seu aroma sexy,
ousado.
— Você também não está nada mal, Alteza. — Sua voz baixa e
provocante viaja pelo meu corpo indo parar no pau, deixando-o em riste.
Quero pegar sua bunda e me esfregar em sua boceta por cima das roupas,
mas não posso, estamos em um corredor da casa de seu primo. Sua família
inteira sob o mesmo teto. Suas mãos correm pelos meus ombros, seu olhar
me seduzindo, me inflamando.
— Tenho algo planejado depois do nosso jantar de noivado — digo,
acariciando suas costas esguias e nuas. — Vamos dormir em Londres, em
minha cobertura.
— Você não me disse que tinha uma cobertura em Londres. — Ela
sorri, sua boca linda aproximando da minha, me dando beijos suaves.
— Eu tenho imóveis espalhados em alguns lugares no Ocidente,
‘amira. Mas esse de Londres é do período em que estudei por aqui.
Seus olhos brilham com algo que identifico como ciúme.
— Você pegava muitas garotas nessa cobertura? — Me morde com
um pouco de pressão e eu gemo. — Porque se sim, Alteza, é bom refazer
seus planos. Eu não vou dormir com você aonde trepava com outras.
— Wallah! De onde veio isso? — Eu rio um pouco, me sentindo
enlevado por seu ciúme. Ela estreita os olhos bonitos em mim. — Sempre
fui uma pessoa reservada, Anna. Jamais estive com outra mulher nessa
cobertura.
— Nem mesmo Yasmina? — pergunta, franzindo as sobrancelhas.
— Não. Ela não gostava de sair para o Ocidente. Me acompanhou
poucas vezes a Washington, D.C., apenas — revelo e ela acena. Seu rosto
volta a se iluminar com a irreverência que já conheço bem.
— Então, se tiver sorte, Alteza, eu dormirei com você lá. —
Ronrona e eu fico doido de tesão. Pego sua trança, puxando-a firmemente,
arqueando seu rosto para o meu, e levo minha boca para o seu ouvido.
— Quem falou em dormir, princesa? — digo perversamente em sua
orelha. Ela estremece, gemendo baixinho. Mordo seu lóbulo, em seguida
sugando a concha da orelha. Anna se agarra a mim, colando-se
gostosamente em meu corpo. — Vem, vamos nos juntar aos seus primos e
torcer para que durmam logo, porra. — Rosno, dando um tapa em sua
bundinha dura.
Ela ri, ofegante, antes de me dar uma mordidinha no pescoço.
Seguro sua mão sendo o mais respeitoso possível e seguimos para o salão
de jogos. A animação nos saúda tão logo que pisamos para dentro do amplo
espaço. Estive aqui uma vez no ano passado, quando em visita diplomática
a Londres, vim jantar com Mike e Ella. Na ocasião, Mike me deu uma surra
no bilhar. Eu não domino muito os jogos recreativos ocidentais. Meu forte
são atividades que exigem algum esforço físico, como tiro ao alvo e lutas
com espada, nas quais sou imbatível desde os dezesseis. Boxe e artes
marciais também me atraem. Os primos de Anna estão espalhados pelo
recinto. Seu irmão Lipe e o irmão mais novo de Ella, Max, estão tomando
cerveja e jogando numa sinuca. As gêmeas Sam e Em estão jogando com
seus namorados em outra sinuca mais afastada. E, jogados sobre um dos
sofás de couro marrom no extremo da sala, estão Dam, irmão mais velho de
Ella, os gêmeos Lucas e Samuel, irmãos de Mike, e sua esposa Chloe. É
ainda chocante para mim, admito. Em minha região é comum um homem
desposar várias mulheres, o contrário, porém, jamais seria aceito.
Tenho certeza de que as tribos usarão essas informações sobre os Di
Castellani para desmerecer Anna. Tenho que bolar um plano urgentemente.
Meu tio me garantiu que pensaria em algo, além da ajuda do sheik El-
Baham. Anna me arrasta para os sofás.
Eles parecem animados numa conversa quando chegamos.
— Ei, primos! — Anna os saúda, já me puxando para nos sentarmos
no estofado vazio à frente dos outros.
— Oi, pessoal. — Os cumprimento, me sentindo um pouco fora de
lugar. A faixa etária aqui é mais baixa. Tenho trinta e três, com Mike não
me sinto deslocado, sendo que nossa diferença é de apenas três anos. Nessa
roda ninguém chegou aos trinta ainda. Eles me cumprimentam de volta.
— O que querem beber? Sirvam-se. — É Dam quem toma a
iniciativa, indicando os baldes de bebida na mesinha de centro. Há cervejas
long neck dentro de vários baldes e garrafas de uísque sobre o tampo de
vidro. Ele está tomando uísque; os gêmeos, cerveja; e Chloe está tomando o
que parece ser cerveja sem álcool, devido a sua gravidez. — Então, você
está mesmo disposto a ficar noivo de nossa prima? Já viu o quanto ela pode
ser enxerida? — Ele continua num tom provocador. Anna bufa ao meu lado.
— Quero uma cerveja, habib — diz carinhosa e rola os olhos para
Dam quando o primo sorri. — Você não é a pessoa mais indicada para falar
de relacionamentos, primo. Está enrolando duas mulheres atualmente —
zomba e Dam faz uma carranca.
— Eu não disse? Ela nunca vai deixar de ser intrometida. —
Aponta, tomando um gole da sua bebida. — Não estou enrolando ninguém,
prima. Elas sabem exatamente o que podem ter de mim.
— Uh. Tão machista, futuro rei. — Ela rebate, virando sua cerveja,
tomando no gargalo. Eu gosto dessa sua natureza intrépida e despojada.
Pego uma cerveja para mim também e me divirto com a interação entre
eles.
— Fora os vídeos na rede, Anna não aprontou mais nada em
Kamar? — É Lucas quem me pergunta. Eu rio, notando que eles estão
provocando a prima. — Parece que nossa prima perdeu o jeito, não é,
mano? — Incita seu gêmeo Samuel a entrar na brincadeira. Chloe sorri,
meneando a cabeça.
— Não ligue para eles, prima. — A loira sai em defesa de Anna, a
mão livre acariciando o ventre avantajado. — A propósito, adorei o
segundo vídeo e talvez use a ideia para meu novo romance.
Anna abre um sorriso malicioso.
— Só que, em vez de um cara, a garota dançará com dois, não é,
prima?
Chloe fica vermelha, mas assente.
— Eu acho que Anna pode estar amadurecendo, mano. — Samuel
diz, divertido.
— Eu, no seu lugar estaria mais preocupado com a logística, uma
vez que a barriga de Chloe tende a ficar muito maior do que agora,
bonitões… — Anna lança um olhar atrevido para seus primos e lhes dá uma
piscadinha. — E não esqueçam de me contar como isso funcionou depois.
Eu não seguro uma risada baixa e Dam faz o mesmo. Allah, minha
princesa não tem mesmo nenhuma cerimônia. As provocações continuam e
começo a relaxar em torno deles. Dam me pergunta sobre a candidatura de
Kamar para sediar a próxima final do Mundial de Clubes e confirmo que
estamos concorrendo. Os gêmeos entram na conversa e logo estamos
discutindo a construção de um estádio maior para investir no campeonato
nacional de futebol, como nossos vizinhos emirados têm feito. Estou
completamente relaxado quando meu celular toca. Puxo-o do bolso, ficando
intrigado ao ver o nome de Jalal na tela. Nos falamos à tarde.
— É Jalal, ‘amira, preciso atender. — Dou um beijo suave nos
lábios de Anna e me levanto, indo para um canto mais afastado. — Primo.
— Atendo-o, meu tom apreensivo. Ele não me ligaria duas vezes no dia se
não fosse algo importante.
Há um breve silêncio na linha.
— Primo. É sobre El-Shalleen. — Sua voz está tensa e meu corpo
também fica ao ouvir o nome do assassino de Yasmina.
— O que há com esse maldito? — Rosno.
— Ele foi encontrado morto em sua cela agora há pouco, Amihaj.
— Meu primo diz e nova surpresa me toma.
— Morto?! Como?! — Inquiro, confuso. Nenhum condenado morre
na cela. Não em meu país.
— Os médicos legistas estão suspeitando de ataque cardíaco
fulminante. — Novo silêncio. — Todavia, meu pai está suspeitando que
possa ser algo mais…
— Que algo mais?
— Veneno. Meu pai acha que o homem pode ter sido envenenado.
— Mas, por quê? — pergunto, aturdido. — Quem teria interesse em
envenenar um condenado que estava só aguardando o momento da
execução?
— De acordo com um dos guardas, El-Shalleen havia escrito uma
carta para você, primo — revela, e fico cada vez mais confuso. — Ele tinha
algo mais para falar sobre o atentado de Yasmina.
— Ele era o maldito assassino e me tirou o direito de vê-lo
estrebuchar na minha frente! — Eu brado.
Há novo silêncio e ele respira fundo.
— Há algo mal esclarecido nessa história, Amihaj. — Seu tom é
muito sério agora. — O guarda para quem El-Shalleen confiou a carta
também foi encontrado morto em sua casa.
— O quê?! — Ele tem minha completa atenção agora.
— Meu pai, e agora eu também, acha que prendemos o homem
errado, Amihaj — ele diz numa voz consternada. — Tudo indica que
predemos e sentenciamos um homem inocente à morte.
Meu corpo gela e respiro irregularmente. Uma mão suave toca meu
ombro. Eu me viro, enlaçando um braço na pequena cintura de Anna.
— Estou indo para casa, Jalal — aviso, a sensação horrível de ter
cometido uma injustiça se espalhando dentro de mim.
— E quanto ao pedido que faria aos pais de Anna? — pergunta
apreensivo.
— Terei que antecipar para hoje. Agora — digo, meus olhos
encontrando os de Anna. Ela está tensa, seu rosto mostrando confusão. —
Até logo, primo — despeço-me e guardo o celular no bolso.
— O que está havendo? — ela pergunta.
— Aconteceu algo que exige meu retorno a Kamar, ‘amira — digo,
segurando seu rosto dos lados, e conto tudo a respeito do suposto engano
sobre o homem que acreditei ser o assassino de Yasmina. Ela ouve tudo
atenta e preocupada. — Seus pais já estão dormindo?
Odeio ter de suspender os planos para um jantar especial, fazer um
pedido do jeito que uma princesa merece.
— Vamos marcar o pedido para outra ocasião, fique tranquilo. —
Oferece, mas posso ver em seu rosto o desapontamento. — Eu gostaria de
ficar com minha família mais um pouco. Ella ainda precisa de mim.
Me sinto egoísta por ficar decepcionado com seu posicionamento.
Ela esteve longe por dois meses e está há apenas poucos dias com eles. Sei
que é errado querer levá-la comigo, mas não quero ir sem ela.
— Eu quero pedir sua mão hoje, habibti. Agora — murmuro. — Se
eu tenho de deixá-la para trás, que seja com o meu anel em seu dedo.
Seus olhos cintilam como duas joias e ela segura meu rosto dos
lados também.
— Então, faremos isso agora. Eu não me importo com pompas,
amiri — diz com essa irreverência que amo tanto.
Alguns minutos depois, todos reunidos no salão de jantar. Não é
nem de longe como pensei em pedir a mão da minha princesa, mas me
recuso a partir sem deixar meu anel em seu dedo. Encaro seu pai e ele
levanta uma sobrancelha, diversão brilhando nos olhos verdes. Os braços de
Anna apertam sutilmente à minha volta. Eu olho para baixo, encontrando
seu olhar. Sua bochecha encostada em meu ombro. Ela tem a mais linda
expressão no rosto delicado. Lágrimas brilham em seus olhos e me sinto
mais confiante. Me inclino, beijando-a suavemente na boca. Ouço uma
garganta sendo limpada e ela ri, sabendo que é o seu pai. Eu volto a encarar
a minha missão.
— Dom, Helena, primeiro quero me desculpar com vocês por isto
— digo, encarando-os com seriedade. — Anna merece um pedido especial
e prometo fazer algo em breve. Pode, inclusive, parecer apressado para
vocês. No entanto, espero que entendam minha urgência em colocar meu
anel em seu dedo. — Olho para ela de novo e seu sorriso me encoraja a
continuar. — Eu amo a sua filha. — Há pequenos murmúrios entre a
família, porém meus olhos permanecem fixos nos dela. — Ela me fez
querer viver de novo. Encontrá-la foi como sentir a luz do sol me
despertando de uma longa noite sombria. — Mais murmúrios e
exclamações das mulheres. Uma lágrima escorre na bochecha de Anna.
Sinto meus olhos ficando úmidos pela sua, a nossa emoção. Limpo sua face
com o polegar e arrasto minha atenção para seus pais. Sua mãe está
visivelmente emocionada, o marido abraçando-a. — Se me concederem a
honra de me tornar o seu marido, prometo amar e cuidar dela até meu
último suspiro.
Há um breve silêncio no qual seu pai me encara seriamente.
— Meu lado racional me diz que é realmente cedo…
— Essa é nova. Dom tendo um lado racional… — Ouço a voz
sussurrada do senhor King, o pai de Mike.
— Cáspita, Jay! O assunto é sério. — O rei Leon resmunga para o
mais novo.
— Cale a boca, bastardo. — Dom grunhe, rolando os olhos, e volta
a me encarar. — É pura intriga da oposição, Amihaj. Eu tenho um lado
racional, claro. — Uma onda de risos ecoa entre a família dessa vez.
Wallah.… Mas meu futuro sogro, em vez de ficar bravo, abre um lento
sorriso irreverente, me lembrando muito sua filha. Ele limpa a garganta e a
seriedade desce sobre seu rosto. — Saiba que Anna é preciosa para mim e
sua mãe. Embora ache cedo, posso ver a felicidade brilhando no rosto de
minha filha. — Ele parece um pouco emocionado agora. — Ver o sorriso no
rosto dela outra vez é tudo que eu e sua mãe queríamos. Para nós, o que
importa é que a faça feliz, então, nós concordamos com a união.
— Faça nostra bambina feliz, apenas isso. — Sua mãe recomenda
com lágrimas banhando suas faces bonitas.
— Não chore, princesa. — Dom murmura, beijando a esposa na
têmpora.
— Pai, mamma, eu amo vocês. — Anna murmura embargada. E
agora há mais fungados pela sala.
— Shukran. Obrigado, muito obrigado. — Digo, meu coração
saltando com força. Me desvencilho de Anna e nova onda de exclamações
soa quando desço sobre meu joelho direito, puxando a caixa do anel do
bolso do meu jeans. Anna está chorando abertamente agora. Abro a caixa,
mostrando-lhe o anel. É um modelo delicado com um diamante rosa. Ela
não gostaria de um branco, tenho certeza. Anna gosta de cor. Seus olhos
competem com o brilho da pedra ao ver a joia.
— Amirati… — murmuro, minha voz emocionada. — Continue
sendo o meu sol, a luz e o calor que me mantêm vivo. — Ela soluça e meus
olhos transbordam, uma lágrima escorrendo pela minha face.
Tio Jafar diria que é sinal de fraqueza, mas não me importo. Neste
momento, quero mostrar tudo a ela, à sua família.
— Anna Julia Marcollini Harper Di Castellani, aceita ser a minha
esposa, a minha rainha?
— Oh, meu Jesus! — Ela ofega, as mãos um pouco trêmulas
cobrindo a boca. — Sim, amiri! Sim!
Eu retiro o anel e o empurro em seu dedo trêmulo. Então, me
levanto e a puxo para meus braços sob o coro de palmas e exclamações
altas. Eu a beijo suavemente na boca, me contendo porque seu pai está
olhando, e embora seja um cara de humor tranquilo, não é bom abusar.
— Eu amo você, habib — ela sussurra contra minha boca.
— Eu amo você, habibti — murmuro de volta e lhe dou mais um
beijo suave.
Tomamos o champanhe que eu já havia encomendado e brindamos
como se deve. Ella também desceu e brindou com água. Todos nos
parabenizam e abraçam. Anna tem uma família muito calorosa, muito
diferente da minha.
— Não sabia que tinha inclinação poética, meu futuro genro. —
Dom se aproxima de nós, sorrindo do seu jeito impertinente. — Sua falta de
imaginação para desculpas precisava ser compensada, não é mesmo?
— Papai, pare… — Anna sorri.
— Você não é a pessoa mais indicada para caçoar de alguém que foi
parar na internet, amore mio — Helena diz para o marido, que abre um
sorriso malicioso, olhando sua mulher.
— Bons tempos aqueles… — Ele a puxa para seus braços, os dois
compartilhando um olhar cúmplice e amoroso. — Eu te amo, princesa.
A mãe de Anna derrete e diz o mesmo para o marido. Anna está
com olhos brilhantes, observando seus pais, quando a encaro. Trocamos um
olhar e deixamos seus velhos à vontade.
Vamos até Mike e Ella, que já parece mais corada e recuperada.
— Seja feliz, prima — diz quando Anna a abraça com cuidado.
— Eu já sou, prima. — Meu peito aquece ao ouvi-la dizendo isso.
— Parabéns, amigo! Nos dê notícias quando chegar a Kamar —
Mike me intima, me puxando para um abraço rápido, nossas mãos dando
tapas amigáveis em nossas costas.
Não demora muito, subo e retorno com Ayla dormindo em meu
ombro. Me despeço de todos e me dirijo para o helicóptero de Mike, me
aguardando no heliponto. Anna nos segue em silêncio. Acomodo minha
pequena dentro da aeronave e me volto para ela. A minha noiva agora. Nos
abraçamos calados por alguns instantes.
— Só ficarei mais alguns dias, habib — ela sussurra em meu peito e
a aperto mais em meus braços.
Quero pedir que venha comigo, mas seria muito injusto com ela,
com sua família. Mesmo com o coração apertado por ter que deixá-la, me
afasto um pouco, levantando seu rosto para o meu, deslizando meus dedos
pela face suave. Ela me olha com o mesmo pesar e saudade antecipada.
— Fique com sua família mais um pouco — murmuro, encostando
minha testa na sua, e respiramos o mesmo ar. — Mas vá para mim de novo,
amirati.
Ela assente, seus olhos brilhantes de lágrimas.
— Eu amo você, Alteza. — Tenta sorrir e brincar.
— Eu amo você, princesa. — Sorrio de volta para não deixar
transparecer minha tristeza. Minha boca encosta na dela e este não é um
beijo comportado. Eu a seguro contra mim, devorando sua boca com todo o
amor e paixão queimando dentro de mim.
Subo no helicóptero e levantamos voo. A imagem dela parada no
mesmo lugar, nos olhando subir, me prende até que as árvores me impedem
de vê-la. Cerca de quarenta minutos depois, com o jato abastecido, eu olho
para Ayla adormecida em sua poltrona. Confiro seus cintos e toco seus
cabelos macios. Ela não vai gostar nada de estarmos voltando sem Anna. O
sentimento de perda volta a apertar em meu peito. Por que estou me
sentindo assim? Ela está usando o meu anel. Irá para mim em poucos dias.
Por outro lado, se meu tio está desconfiado é porque algo sério está por trás
da morte de El-Shalleen, dessas mortes. Eu olho as luzes do aeroporto por
alguns momentos enquanto meu piloto se prepara para nos colocar no ar.
Merda, e se algo acontecer e novos conflitos estourarem? Se tivermos que
interditar o espaço aéreo outra vez? Ela não poderá ir até mim. Aquela
sensação horrível de perda vai se agigantando. Eu gemo, querendo ligar
para ela, implorar para que vá comigo. Fecho os olhos, enfiando as mãos
em meus cabelos, refreando a vontade louca. Eu não tenho esse direito.
— Karim?
A voz suave vindo da porta do avião me faz estacar. Meu corpo
inteiro treme de surpresa e júbilo enquanto me viro e a vejo lá, parada. Seu
rosto está corado, sua respiração ofegante, e Anna corre para mim. Se joga
em meus braços e eu a pego, suspendendo-a do chão, mantendo-a bem
junto por um momento. Meu coração está saltando como um louco, o aperto
ruim sendo varrido para longe.
— O que significa isso, habibti? — sussurro, colocando-a em seus
pés de novo, nossos rostos ficando bem próximos.
— Significa que irei com você para enfrentar seja lá o que for que
esteja nos esperando, amiri — murmura com esses incríveis olhos verdes
me adorando. — Eu não vou arriscar não poder ir até você se outros
conflitos explodirem. Se voltar a acontecer, quero estar lá, do seu lado e de
Ayla.
Eu arfo, procurando as palavras certas para dizer a ela nesse
momento. Essa garota corajosa está deixando sua família para me seguir.
Meu país está instável, ela sabe disso e ainda assim quer ir comigo.
— Malikati…[30]. — Chamo-a reverentemente, minha boca tomando
a sua num beijo repleto do amor e orgulho que sinto por ela.
Eu não tenho a mínima ideia do que nos espera em Kamar. Mas me
sinto egoisticamente melhor agora que estou com ela de volta em meus
braços.
CAPÍTULO ONZE
“À beira do paraíso. Cada pedaço da sua pele é um Santo Graal que tenho
que encontrar. Só você pode incendiar meu coração. Sim, vou te deixar
determinar o ritmo… Você é a luz, você é a noite. Você é a cor do meu
sangue. Você é a cura, você é a dor. Você é a única coisa que eu quero
tocar. Nunca soube que isso poderia significar tanto, tanto…”
(Ellie Goulding - Love Me Like You Do)

Anna Julia
Contemplo a vastidão de areia a alguns quilômetros à frente e
encosto na balaustrada da varanda de nossos aposentos. Levanto a minha
mão e suspiro, admirando o lindo anel em meu dedo. O grande diamante
rosa cintilando é um reflexo de mim mesma desde o pedido do meu
príncipe, há mais de uma semana, em Londres. Eu tinha que vir com ele e
Ayla. Uma sensação horrível de perda me tomou depois que os vi ir embora
no helicóptero. O medo de as coisas voltarem a ficar tensas por aqui e eu
não conseguir voltar logo para eles me fez tomar a decisão de correr até o
aeroporto. Ella me encorajou, dizendo que já estava bem e que Mike não
sairá de perto dela enquanto não estiver completamente recuperada. Meu
pai não gostou muito, mas minha mãe o convenceu. Me despedi de todos e
segui atrás do homem que também é a minha vida agora. Mais um suspiro
sai da minha boca ao recordar o jeito apaixonado e intenso com que fez
amor comigo naquela noite. Depois que levamos Ayla para um dos três
quartos menores, fomos para o principal.
Foi maravilhoso.
— O que foi esse suspiro, amirati? — Braços fortes enrolam em
minha cintura por trás e uma boca macia e morna deposita um beijo suave
em meu pescoço. Um arrepio de excitação desce em minha coluna, sua
barba causa um atrito delicioso em minha pele. Afasta meus cabelos para o
lado e morde suavemente a minha nuca. Eu arquejo, meu corpo inteiro
esquentando, meus seios arrepiando.
— Mmm… — Gemo baixinho. — Relembrando nossa
comemoração do noivado no jato, amiri…
Ele geme rouco e me gira de frente. Meus braços vão imediatamente
para seus ombros, meus olhos devorando cada detalhe do rosto moreno.
Está usando um turbante negro com as pedrarias nas bordas, os olhos
sombreados com lápis preto. Me excita demais vê-lo em trajes típicos. Ele
sabe disso porque um riso lento e arrogante levanta os cantos de sua boca.
Suas mãos grandes passeiam pelas minhas costas, a renda do decote não me
impedindo de arfar com o calor do toque. Estou usando um vestido-caftan
amarelo-ouro. Não há nenhuma fenda ousada dessa vez, apenas o decote
falso nas costas. Estou usando um hijab negro com pedrarias e joias
penduradas nas bordas também, cobrindo meus cabelos, como mandam os
costumes.
O tal sheik El-Baham irá jantar conosco. Ele e a naja da filha.
Preciso encontrar uma forma de exportar aquela vaca de volta para seu
curral, digo tribo. Rio levianamente. Ela me confrontou novamente ontem,
tornando a garantir que será a segunda esposa de Karim, me aconselhando a
apenas esperar para ver. Eu disse que a vadia podia sentar em cima das suas
teias de aranha e esperar também, porque isso nunca irá acontecer. Ela está
me tirando do sério. Ainda não deixei Karim saber que anda me enchendo o
saco porque não sou de ficar choramingando e pedindo proteção de homem.
Prefiro lutar minhas batalhas.
— Por que essa expressão se fechando? — Ele pergunta, me
estudando atento.
— Nada, habib. — Coloco um sorriso no rosto. Não vou dar ibope
para a vaca. Acaricio sua nuca, deslizando a mão para a barba. Ele me olha
com tanto amor que meu peito fica todo mole. — E você, alguma novidade
sobre o mistério das mortes? — pergunto suavemente.
Seu semblante muda. Ele tem estado tenso desde que voltamos.
Muitas reuniões e visitas ao departamento de polícia. Não quer me contar
tudo para não me preocupar, mas tenho sentido seu receio de os conflitos
voltarem a estourar na região. Outra coisa que não estou gostando é da
presença constante do tal pai da naja no palácio. Duas cobras são demais
para lidar. O homem tem uma aura sombria ao redor dele. Cada vez que o
encontro sinto um arrepio gelado. Mas Karim está contando com o apoio
dele na reunião que fará com os líderes dentro de dois dias.
— Ainda não, mas meu tio e Jalal estão empenhados. Todos os
guardas estão sendo interrogados pela terceira vez, uma estratégia para
fazer o traidor, ou traidores, entrarem em contradição — informa com nítido
desgosto. — Estamos certos de que foi um ou mais deles que facilitou o
envenenamento de El-Shalleen. — Ouço-o com atenção. Dois exames
toxicológicos no corpo do morto acusaram a presença de uma substância
não reconhecida cientificamente, mas que provocou a dilatação das artérias
coronárias, fazendo o coração do homem praticamente explodir no peito. —
Nós vamos descobrir e punir os culpados severamente.
— Vai dar tudo certo, habib — murmuro, alisando a ruga de
preocupação entre suas sobrancelhas.
— Shukran por estar aqui comigo, habibti — sussurra, seu rosto
suavizando um pouco. — Nosso país voltará a ser um lugar seguro, eu
prometo.
Eu aceno. Torço para que tudo se resolva logo e que essa reunião
com as tribos tenha o resultado que meu príncipe está esperando. Acaricio
sua barba, adorando a sensação em meus dedos. Ele segura meu queixo e
desliza os dedos pela minha face, o rosto se aproximando mais do meu. Eu
o amo e ficarei perto dele mesmo que mais conflitos surjam.
— Estarei bem aqui com você, não importa o que aconteça, amiri —
murmuro, olhando-o fixamente. A intensidade tomando seus olhos escuros
faz meus joelhos tremerem.
— Você nasceu para ser minha — afirma baixinho, seu polegar
esfregando suavemente meu lábio inferior. — Minha princesa, minha
rainha. — Completa e sua boca captura a minha, seus lábios cálidos rolando
nos meus num beijo deliciosamente lento. Eu me entrego, beijando-o,
provocando de volta com sugadas eróticas em sua língua. Estamos
ofegando quando me libera. Seu riso perverso faz meu centro pulsar.
— E você nasceu para ser meu. — Digo ousada, fazendo-o rir
baixinho, esfregando o nariz em meu rosto. — Meu príncipe, meu rei.
— Vem, vamos para aquele jantar para podermos voltar logo e eu te
foder em cada canto deste quarto. — Grunhe e eu termino de molhar. Adoro
sua gentileza, mas amo sua sacanagem também.
Eu rio e saímos de mãos dadas dos aposentos. O jantar será no salão
que sempre usamos para refeições familiares. Ayla já está recolhida. Karim
não a quer por perto porque pode surgir o assunto das mortes e nossa
sapequinha é muito curiosa. Seguimos pelo corredor, virando a esquina, e
noto a movimentação através das portas duplas do salão. A música árabe
em volume agradável vai nos envolvendo à medida que nos aproximamos.
— Eu vou começar as aulas de dança do ventre na próxima semana.
— Me inclino, sussurrando em seu ouvido. Ele geme baixo, me olhando de
esguelha. — Quero poder dançar para meu príncipe muito em breve.…
— Você está tentando me fazer entrar no salão ostentando um pau
duro, princesa? — Range no meu ouvido e é a minha vez de sorrir.
— Eu?! Calúnia isso, meu senhor. — O provoco ainda mais. Ele dá
um tapa em minha bunda, me assustando pela sua ousadia em pleno
corredor.
Entramos no salão ainda rindo. Todos se voltam em nossa direção,
vindo nos receber com mesuras reverentes para seu príncipe e alguns
fingindo que são para mim também. Embora o tio Jafar esteja ligeiramente
menos azedo comigo, desde que voltamos do deserto, ainda percebo a
reserva dele e sei que nunca seria a sua escolha para esposa do sobrinho.
Mas meu príncipe me quer. Sua mão em minha cintura me diz exatamente
isso. Ele cumprimenta a todos, não saindo de perto de mim. Nos dirigimos
para a mesa e me sento à sua direita, enquanto o tio Jafar à esquerda,
seguido por Jalal. Zafyr se acomoda ao lado de sua mãe e Nuria na outra
extremidade, perto de Latyfa e a cobra-pai. Os ironizo.
Nos primeiros minutos, comemos em silêncio. O assado de carneiro
está desmanchando na boca e o molho agridoce que o acompanha,
simplesmente divino. A culinária árabe também me pegou de jeito. Ainda
bem que herdei o metabolismo bom de minha mãe, que mantém a forma
sem esforços mesmo aos cinquenta. Em dado momento, o sheik El-Baham
puxa a conversa sobre o homem infeliz que morreu na prisão. Eu tento não
fulminar o idiota pelo tema pesado. Karim precisa relaxar.
— Um ataque do coração… — O sheik bufa com desagrado. — Era
para ele morrer decapitado, na minha frente!
Uh. Eu franzo o cenho. Ele ainda não sabe que foi comprovado o
envenenamento do tal Al-Shalleen? Karim pega minha mão e dá um aperto
sutil.
— Compartilho a sua indignação, sheik. Eu também queria vê-lo
pagar pelo que fez à Yasmina. — Karim diz indignado. Ou simulando
indignação… — Agora só nos resta aceitar que o homem morreu antes por
causas naturais.
O sheik não parece feliz.
— Eu mantinha um olho naquele assassino maldito, para que não
escapasse do seu destino. — Sua voz é irada e me ocorre que, talvez, esteja
exagerando sua reação. — Alguns policiais me davam informações sobre
ele sempre que pedia. Yasmina era como uma filha para mim. Por causa
daquela escória a perdemos, e acabei perdendo meu irmão também, uma
vez que sua saúde definhou desde a morte de sua amada filha.
— Todos nós sabemos do seu apreço pela princesa e por seu
falecido irmão, sheik. — O tio Jafar entra na conversa. Seu tom não dando
nenhuma indicação de seu estado emocional, para variar. — Mas o homem
escapou da execução, infelizmente.
— O direito legítimo de vingança das famílias de suas vítimas deve
ser preservado, amiri. — El-Baham volta a atenção para Karim, sua
expressão é sombria quando propõe: — O exemplo precisa ser dado, meu
senhor. El-Shalleen zombou de nós apressando sua morte.
— O que está querendo dizer, sheik? — Karim indaga. — O que
quis dizer com o “exemplo precisa ser dado”?
— Condene o filho mais velho do assassino. — Diz baixo e mortal.
O quê?! — Mate-o em praça pública e ninguém mais ousará burlar uma
sentença.
Seu pedido choca não só a mim, mas a todos em volta da mesa, que
ofegam. Jesus…
— Isso é um completo absurdo, sheik! — Karim objeta com
veemência e estupefação. — Compreendo que esteja se sentindo
injustiçado, como também estou, mas essa prática foi abolida de nosso
emirado há mais de um século.
— O exemplo deve ser dado. — O homem louco repete. — Com o
sangue do assassino derramado na praça.
Há um breve silêncio na mesa e Karim se inclina para a frente,
encarando El-Baham.
— Eu não vou derramar sangue inocente só porque você quer, sheik.
— Seu tom e olhar são intimidantes, e me assusto, me dando conta de que
nunca o vi rugindo como o príncipe governante. Olho-o fascinada pela
postura dura e firme. — Eu decido sobre o assunto.
— Meu senhor, não me leve a mal. — O homem balbucia,
percebendo que irritou seu príncipe. — Sou apenas muito apegado às
tradições.
— Sugiro que desapegue. — Karim diz entre dentes, não
abrandando o tom. — Farei algumas mudanças muito necessárias em nosso
emirado.
— O que meu senhor quer dizer é que tal tradição de exigir
derramamento de sangue de parentes em casos como este é uma prática que
deve ficar no passado, sheik. — Jafar ameniza a reação de Karim. — Sua
Alteza tem se esforçado para colocar Kamar entre as principais potências
dos emirados, e isso não será possível mantendo costumes sanguinários.
— Alguns são necessários, meu senhor. — O homem argumenta.
— Este não é um deles, El-Baham. — Karim torna a falar, seu tom
definitivo.
A cobra-pai assente e se cala.
Zafyr começa a contar sobre sua viagem a Mônaco em seguida,
numa clara tentativa de descontrair. Me vejo sorrindo pela sua conversa
fácil. Sinto a tensão de Karim ao meu lado. Ele ainda está com ciúmes do
primo? Não é possível. A conversa volta a fluir — sem temas fortes, graças
a Deus! Quando terminamos de comer, nos levantamos e nos dirigimos para
o buffet das sobremesas. Me delicio com uma esfiha de chocolate e Nuria
me acompanha. Está animada para minhas aulas de dança do ventre. Ela
possui uma moça que a ensina alguns truques para usar com Jalal, e estou
excitada para incorporar a odalisca para meu príncipe. Tenho praticado
muita atividade física com Karim também. Insisti para que me ensinasse
atirar e estou adorando nossas aulas.… Bem como a luta com espadas. Me
sinto poderosa, forte, praticando esses esportes restritos aos homens, mas
Karim não está me podando de nada. Ainda bem. Não surtiria muito efeito
se tentasse o contrário, vocês me conhecem. Eu rio internamente.
— Princesa, Salaam Aleikum. — A voz conhecida e que estive
evitando alcança meus ouvidos. Me viro para ver a cobra-filha, me
encarando com seu antagonismo dissimulado.
— Aleikum Assalam, Latyfa. — Respondo como manda a etiqueta
das princesas. — É sempre um prazer encontrá-la. — Seus olhos estreitam
com minha simpatia também dissimulada. — Quanto tempo já tem mesmo
que está encostada aqui no palácio?
— Vou levar esse doce para Jalal, Anna. — Nuria avisa e se afasta.
Ela sabe que as gentilezas irão para o espaço rapidinho.
— Talvez eu nem vá mais embora, minha senhora. — A vaca
cantarola em desdém.
— Que diabos está dizendo? — Eu cerro os dentes, tentando
disfarçar minha reação a todo custo.
— Apenas o que você já sabe, querida. — Ela sibila, os olhos
geralmente frios estão mais ousados e zombadores esta noite. — Eu serei a
segunda esposa de Sua Alteza. É melhor aceitar os costumes de seu futuro
marido se quiser ser levada a sério pelo povo dele.
Meu sangue gela. Essa infeliz está batendo nessa mesma tecla já tem
um tempo. Karim não me conta muita coisa sobre as tribos, mas sei que eles
são arcaicos. E se eles de fato exigirem um casamento de Estado para seu
príncipe?
— Está delirante, sua vaca. — Rosno. — Vou te exportar de volta
para sua porra de curral.
Ela dá um risinho debochado, muito seguro para o meu gosto.
— Quer saber a verdade mesmo, princesa? — Seu riso alarga com
prazer em me espezinhar. — O príncipe pode escolher você para primeira
esposa, mas oficialmente quem vai herdar o trono são os meus filhos. As
tribos nunca deixariam os filhos de uma forasteira ditarem o futuro do
nosso povo. — Eu recuo um pouco, suas palavras me cortando fundo. —
Sim, eu acho que está conseguindo vislumbrar seu futuro aqui, afinal. Você
será a prostituta de luxo do rei, nada mais.
Eu arfo, sentindo o golpe da vadia. Meu sangue ferve, mas minha
réplica fica na garganta quando ela se vira e me dá uma piscada
provocadora, como a que lhe dei em outro jantar. Anda em direção aos
homens do outro lado da sala. Karim está em uma conversa baixa com o tio
Jafar e a cobra-pai. É com espanto que vejo a vaca tropeçando e se jogando
sobre Karim. Eu fecho meus punhos vendo-o segurá-la, mostrando bons
reflexos. Fumaça sai pelo meu nariz e marcho em direção a eles.
— Oh, Shukran, amiri. — Latyfa diz fazendo uma cara de dor, se
pendurando nos ombros de Karim. — Wallah! Eu acho que torci o
tornozelo.
A expressão de Karim é confusa, mas continua amparando-a.
— Vamos até aquela poltrona. Não faça força no tornozelo ferido.
— Ele orienta com preocupação genuína e eu rosno. Está se deixando
enganar pela mulher ardilosa. Para confirmar, a vaca me olha por cima dos
ombros do meu homem e vejo o indício de sorriso, a expressão triunfante
em sua cara de puta, mesmo que seja uma porra de virgem.
Eu avanço, o ciúme e o veneno anterior que a vaca jogou sobre mim
me deixando cega neste momento. Foda-se qualquer civilidade! Ela vai
aprender a não brincar comigo!
— Solte a vadia, Karim. — Minha voz é apenas um grunhido baixo
e vejo a tensão nos ombros dele ao ouvir minha ofensa. — Solte essa vaca
agora, ou eu mesma vou arrancá-la daí!
Ele se vira para mim, seu rosto estupefato, os olhos amplos. A puta
está fingindo ultraje, seus olhos se enchendo de lágrimas.
— Anna, o que deu em você para ofender Latyfa dessa forma? —
Ele tem a ousadia de perguntar. Homens… Bufo, desgostosa. Eles são tão
fodidos, não são?
— Solte a vadia. Agora! — Berro e ouço as exclamações dos
presentes. Acho que escuto o riso de Zafyr também.
Algo duro brilha nos olhos de Karim e ele levanta o queixo. É a
mesma postura que usou com o sheik quando o desagradou no começo do
jantar.
— Você está sendo muito deselegante. Espero que se desculpe pela
grosseria.
— Me desculpar pela grosseria? Aqui estão minhas sinceras
desculpas, sua vaca! — Eu avanço como uma fera, enfiando as mãos nos
cabelos de Latyfa, seu hijab cai e a puxo, arrancando-a dos braços de
Karim. Agora são mais exclamações.
— Wallah! Está machucando a minha filha! Ela não tem nenhuma
educação!
É o pai. Mas não me importo. Eu a empurro para longe e ela precisa
se equilibrar para não cair, então, anda sem mancar, esquecendo-se da
encenação.
— Vejam se não é um milagre! — Eu zombo, olhando para Karim.
— Ela estava encenando. Essa vaca tem me afrontado desde que chegou
como uma das candidatas a cadelas treinadas de Sua Alteza. — Karim cerra
a mandíbula. Sei que estou envergonhando-o perante sua família, mas estou
além da razão agora. — Mande-a de volta para a porra do seu curral ou não
respondo por mim. — Cuspo.
— Latyfa e seu pai são da família, e meus convidados. — Seu tom é
duro.
O príncipe quer mostrar pulso firme com a noiva estrangeira. Eu
arfo, lágrimas se reunindo em meus olhos. Me sinto traída com sua defesa
das duas cobras. Latyfa está certa, eu sempre serei uma forasteira por aqui.
— Então fique com seus convidados, Karim. — Digo em tom mais
baixo, decepcionado. Vejo-o respirar profundamente, a percepção de que
está me ferindo tomando seu rosto. — Eu sou a intrusa aqui. — Seus olhos
brilham arrependidos com essa última frase. — Boa noite, Alteza.
E eu me viro, correndo para fora do salão. Lágrimas borram a minha
visão enquanto volto para o quarto, não o dele, o que usei quando cheguei.
Entro e tranco a porta, rapidamente. Ando até a sala, meu corpo agitado,
meu peito doendo pela decepção. As palavras da cobra martelam com força
em meu cérebro, ampliadas pela reação dura de Karim. Ele ficou do lado
dela, deles. Será assim a minha vida aqui? Sempre sendo lembrada de que
não passo de uma estrangeira, indesejada? Eu nunca havia sentido isso
vindo da parte de Karim, mas acabo de ver em primeira mão que sua
lealdade está com seu povo, não comigo.
Sim, eu acho que está conseguindo vislumbrar seu futuro aqui,
afinal. Você será a prostituta de luxo do rei, nada mais.
As palavras continuam reverberando em minha mente. Meus olhos
transbordam de raiva da vadia e decepção com Karim. Nas outras vezes em
que fui insultada, não me senti uma intrusa, mas agora me sinto. Talvez meu
pai tenha razão: nos comprometemos cedo, muito cedo. Ele não me conhece
e tampouco eu a ele. Ficamos tempo demais em luto e nos apegamos fácil.
A campainha começa a tocar, me sobressaltando. Mais lágrimas se
reúnem em meus olhos, sabendo que é ele. Permaneço parada. Não quero
falar agora. Ele que volte para seus preciosos convidados! O som continua
ininterrupto, impaciente, mas não vou atender. Então, ele enfim para de
insistir. Depois de uns minutos o som da porta sendo aberta não muito
gentilmente me faz virar para a entrada. Karim entra em meu campo de
visão, sua carranca tão profunda quanto a minha.

Karim Amihaj
Eu entro no quarto que a princesa, em sua birra, resolveu usar para
se esconder de mim. Allah, ela se comportou muito mal lá no salão. Isso irá
reverberar nas tribos. O sheik El-Baham está com uma carranca do tamanho
do mundo neste momento pelas ofensas ditas para sua filha. Por outro lado,
as lágrimas de decepção que vi nos olhos de Anna me fizeram vir atrás dela.
Sei que todos no salão estão me achando um fraco agora por não conseguir
conter os arroubos de minha noiva ocidental e me condenando por isso, por
escolher uma mulher que não se importa em fazer escândalos em público.
Estou irritado, mas ver seu rosto corado e coberto de lágrimas me causa um
aperto no peito. Eu a amo.
— Você me envergonhou lá. — Aponto, tentando conter minha
insatisfação.
— E você me decepcionou lá. Então estamos quites, Alteza. —
Rebate, com raiva e nítida mágoa. — Faça um favor para nós dois e saia do
meu quarto, Karim.
Fico tenso ao ouvir suas palavras magoadas. Já passamos dessa fase.
Ela está comigo, em nosso quarto.
— Você está sendo infantil, Anna. — Falo entre dentes. — Volte
para o nosso quarto.
— Por que me quer lá? Porque sou sua prostituta de luxo? — Cospe
as palavras e me afasto um pouco, chocado com sua explosão. Chocado que
pense isso a seu respeito.
— Wallah! O que está havendo com você hoje? — Inquiro, me
sentindo atordoado e magoado também. — Sabe exatamente o que você
significa para mim, Anna. Suas palavras me ofendem.
— Não mais do que a mim, pode ter certeza, Karim. — Limpa suas
faces com gestos irritados. — Sua convidada me disse essas palavras ainda
há pouco, antes de ir se jogar em cima de você.
Eu paro, mais choque me tomando. O quê?!
— Latyfa? Ela não ousaria… — Não quero acreditar que Latyfa
seria tão ousada para insultar a minha noiva, mas estudo o rosto de Anna
com seriedade. Ela está transtornada, magoada e também não acredito que
esteja inventando isso. Ela não é leviana.
— Ela tem me hostilizado desde quando chegou para o seu baile. —
Revela em tom enraivecido. Eu rosno baixo. — Sim, pode não acreditar,
mas é verdade. Ela me contou sobre a possibilidade de um casamento de
Estado. Me garantiu que será sua segunda esposa.
— Mas que porra ela está dizendo? — Praguejo em meu dialeto,
passando uma mão pelo rosto.
— Me disse que, como forasteira, serei apenas a puta do rei,
enquanto ela será considerada a esposa oficial e seus filhos herdarão o
trono.
Fecho meus punhos, ira percorrendo meu corpo. Latyfa a
desrespeitou desde o começo e ela nunca me falou nada!
— Porra… — Solto um grunhido angustiado. Olho-a, meu coração
doendo de arrependimento. — Anna, por favor, me perdoe. — Tento me
aproximar para confortá-la, dizer que nada disso é verdade, mas estende a
mão, detendo-me. — ‘Amira…
— Você a defendeu lá fora, Karim. — Sua voz soa trêmula, mais
lágrimas se reunindo nos olhos verdes, geralmente alegres, mas agora estão
tristes, desapontados. — Eu nunca tinha me sentido uma intrusa aqui,
mesmo com os olhares atravessados de seu tio, ou com as ofensas que a
vadia sempre me fez. Mas esta noite estou me sentindo assim, uma intrusa
em seu país.
Meu coração dói ao ouvi-la. Passo as mãos pelo meu rosto,
exasperado, enraivecido comigo mesmo por ter contribuído com a mulher
que a ofendeu. Por ter defendido a mulher que a tratou de forma tão
desrespeitosa pelas minhas costas.
— Não, amirati — murmuro, meu peito pesado, insatisfeito comigo
mesmo. — Você não é uma intrusa. Me perdoe se a fiz se sentir assim. Eu te
amo.
Seu rosto retorce com minha declaração e vejo que não será fácil
contornar minha cegueira em relação à minha convidada.
— Deixe-me sozinha, por favor — pede, abraçando a si mesma.
Desespero me toma. Eu falhei com ela. Fiz com que se sentisse inadequada,
indesejada em minha, sua casa. Me recrimino, tornando a fechar meus
punhos.
— A cadela infeliz pagará por hostilizá-la, eu garanto. — Asseguro,
entre dentes. — Será enviada para sua casa, imediatamente! — Completo,
mal me contendo.
Anna continua em silêncio, fazendo-me sentir mil vezes pior.
Preciso reparar a injustiça que cometi lá no salão.
— Converse comigo, por favor — peço num sussurro angustiado.
Tenho medo do que está se passando em sua mente neste momento. Não
posso perdê-la. Demorei tanto tempo para encontrá-la.
— Eu preciso ficar sozinha. — Torna a pedir.
— Você virá para nosso quarto? — pergunto, sentindo que está se
distanciando de mim.
— Eu não sei — murmura, parecendo exausta. — Estou confusa.
Nós não nos conhecemos, Karim. Isso foi rápido demais.…
— O que está dizendo? Eu amo você! Escolhi você, porra! —
Explodo, o medo de perdê-la se tornando pungente. Tento alcançá-la, mas
se afasta e gemo de raiva e desgosto.
— Não! Me deixe sozinha, Karim! Saia! — Se afasta ainda mais de
mim.
Flexiono meus punhos, abrindo e fechando de novo. Quero agarrá-
la, puxá-la para meu peito e lhe garantir que não foi rápido demais. Que
estamos no nosso momento. É agora. Não antes, não depois. É agora.
— Não pense que pode se esconder de mim aqui, Anna. — Forço
meu tom mais controlado, mantendo meus olhos fixos nos dela. — Vou
deixar você sozinha para esfriar a cabeça. Mas se não voltar para o nosso
quarto, virei te buscar — digo seriamente, deixando-a saber que vamos
conversar e resolver tudo.
— Foda-se. — Sua audácia volta num rosnado baixo, insolente e
sexy, como só ela consegue ser.
Solto um grunhido, querendo insistir e jogá-la por cima do meu
ombro. Sempre funciona quando está agindo assim. Mas tenho de voltar ao
salão e fazer o que precisa ser feito — defender a honra da mulher certa
dessa vez. A encaro por alguns instantes, as duas vontades guerreando
dentro de mim, então me viro com passadas largas e duras em direção à
porta. Faço todo o percurso de volta com raiva me guiando. A música me
saúda quando viro a esquina. Avanço e paro no limiar das portas duplas.
Latyfa está sorrindo e acenando para algo que seu pai está lhe dizendo. A
conversa morre quando me notam e marcho até pai e filha, com um único
propósito.
— Confesse e talvez não te jogue na prisão por insultar a sua futura
rainha. — Digo a ela friamente, a civilidade ameaçando me abandonar. Sua
postura vitoriosa quando entrei me diz que estava se vangloriando por ter
tirado Anna do sério, induzindo-a a fazer aquela cena desagradável.
— Meu senhor, acalme-se. — Meu tio vem para perto, seu rosto
tenso. Sei que está pensando na reunião com as tribos e no quanto estamos
contando com o apoio de El-Baham, todavia, não posso deixar passar
tamanho desrespeito com a minha escolhida.
— Confesse. Agora. — Torno a intimar a mulher, que está branca
como papel, os olhos arregalados. Seu pai a ampara, o rosto angustiado.
— Amiri, minha filha não sabe do que meu senhor está falando. Não
vê o seu estado? Não sei o que a princesa lhe disse, mas é mentira. — El-
Baham defende a filha, claro.
O encaro e ele inclina a cabeça, não sustentando meu olhar raivoso.
— Ela sabe exatamente do que estou falando. E minha noiva não é
uma mentirosa, aconselho-o a medir suas palavras, sheik. — Atiro.
— Amiri, do que exatamente a princesa está acusando Latyfa? —
Meu tio torna a intervir.
— Latyfa tem insultado Anna desde que chegou ao palácio, na
ocasião do baile. — Digo ao meu tio e volto a encarar Latyfa, que está
tremendo agora. — Continuou mesmo depois que a apresentei para a
família como a minha escolhida. Ela hostilizou a minha noiva a cada
oportunidade que teve e estive completamente alheio, defendendo-a hoje
quando deveria ter ficado do lado de Anna. — Todos arfam, surpresos. Os
outros chegam para perto também. Minha tia Samira, Zafyr, Jalal, Nuria.
— Meu senhor, peço sua misericórdia… — A mulher falsa ousa me
encarar, seus olhos culpados.
Bufo, encarando-a com asco.
— Você teve a audácia de dizer à mulher que amo que ela seria
apenas uma puta de luxo para mim. — Profiro as ofensas sentindo o teor
ultrajante me cortar na carne. Wallah, isso deve ter doído muito em Anna.
Todos em volta arfam, soltando exclamações indignadas. — Ousou deixá-la
insegura, mencionando um casamento de Estado que está definitivamente
fora dos meus planos. — Olho-a friamente e adicionando: — Não quero
você, ou qualquer outra, deixei isso bem claro no baile. Eu amo aquela
garota que você achou que podia insultar e ela iria aceitar placidamente.
Embora não gostando inicialmente da sua explosão, a minha princesa é
assim, verdadeira, autêntica, vibrante. E é exatamente por isso que me
apaixonei por ela.
Latyfa começa a chorar convulsivamente. O medo da punição está
estampado em seu rosto.
— Confesse. Essa é a sua última chance — intimo.
— Sim, eu fiz isso. — Assume e mais exclamações soam. — Não
sei o que me deu, meu senhor. Eu imploro sua clemência, por favor. — Cai
de joelhos no chão. Eu apenas a olho com repulsa, lamentando a
consideração que tive deixando-a ficar aqui.
— Expulse-a, amiri. — Meu tio se antecipa. Seu tom duro. — Você
sabia que a princesa se tornaria sua rainha. Devia respeito, mas em vez
disso a insultou, desagradando o seu príncipe.
Latyfa está chorando no chão e seu pai está com o rosto torcido
também.
— Eu não sabia, meu senhor. — O homem diz com desagrado.
O encaro fixo e irado.
— Fique a par do que sua filha está fazendo de agora em diante,
sheik. Isso pode evitar dores de cabeça no futuro. — Cuspo com frieza. —
Agora, tire-a da minha frente. Ela está banida do palácio!
Algo cintila nos olhos do homem. Sei que não gosta da minha
sentença, mas inclina a cabeça, aceitando mesmo assim.
— Como queira, meu senhor — murmura e arrasta a mulher falsa
para fora.
Um silêncio tenso paira no recinto depois que eles se vão.
— Bem, já era hora, primo! — Zafyr exclama, levantando seu copo
de uísque na sugestão de um brinde. Estreito meus olhos sobre meu primo
abusado.
— Shukran. Aconselho-o a parar de cobiçar a minha mulher, primo.
— Advirto e ele tem a audácia de piscar para mim. — Estou falando sério.
— Relaxa, Amihaj. A princesa está completamente na sua. — Diz
dando de ombros.
Sua afirmação me faz relaxar um pouco. Quero voltar àquela merda
de quarto e foder duro com ela, mostrar que pertence a mim, não importa
quanta birra faça. Mas vou lhe dar tempo para se acalmar.
— Você agiu bem, primo. — Jalal dá tapas amistosos em meu
ombro. — Eu já havia percebido certa animosidade entre as duas.
— Você sabia disso, Nuria? — inquiro, desviando a atenção para a
esposa de Jalal. Ela amplia os olhos.
— Eu sabia que Latyfa estava sendo desagradável para Anna. Mas a
princesa sempre respondia à altura e também não queria que você soubesse
— diz em tom de desculpas.
— Por que não queria que eu soubesse? — pergunto, confuso.
— Até parece que não conhece Anna, Amihaj. — Sorri com
admiração. — Ela não gosta de precisar de um homem para defendê-la.
— Sim, essa é a minha princesa — murmuro em tom apaixonado e
reverente, um sorriso orgulhoso brincando em minha boca. Os encaro um a
um. — Já lhes disse isso, mas vou repetir, eu amo aquela garota, mesmo
com sua boca irreverente e modos atrevidos do Ocidente. — Pauso um
instante, conclamando-os: — Vocês são a minha família. Preciso que me
ajudem a fazer que com ela se sinta em casa.
— Faremos isso, Amihaj. — Meu tio garante. — Embora não
aprove seu comportamento hoje, ela apenas respondeu ao desrespeito de
Latyfa. — O encaro, agradecido por finalmente entender e ficar do lado de
Anna. — Minha lealdade é com a minha futura rainha, não precisa pedir
isso, amiri.
— A minha também, meu senhor. — Jalal bate no peito esquerdo,
usando a formalidade rara entre nós.
Os outros repetem as palavras de meu tio e Jalal. Meu peito está
mais leve agora.
— Que Allah se compadeça de quem insultar a minha mulher de
agora em diante! Nunca mais irei permitir que ela se sinta intrusa como
hoje. Isso jamais se repetirá! — digo para que não restem dúvidas. Eles
assentem. Meus tios se despedem e se retiram em seguida.
— Ela está bem? — Nuria pergunta, preocupada.
— Está fazendo birra no antigo quarto. — Torço a boca insatisfeito
e Jalal ousa sorrir, o idiota.
— Vai dormir no sofá hoje, primo. Já vi tudo. — Zafyr também não
perde a chance.
— Cale a boca. — Ranjo os dentes para o outro idiota. Expiro e
passo uma mão pelo rosto. — Vou suar na academia enquanto a princesa se
acalma.
Eu saio de lá ouvindo as risadas deles às minhas costas. Reviro os
olhos. Uma hora. Esse é o tempo que darei a Anna. Se quando voltar para
nosso quarto não estiver lá, irei arrastar aquela bunda linda e insolente e,
então, fodê-la até o esquecimento!

Anna Julia
Suspiro, enrolada sobre um dos sofás, e fico assim, repassando os
eventos da noite. Odiando a cadela maldita com todas as minhas forças
porque sei que no fundo suas palavras são verdadeiras. Meu coração aperta
pela primeira briga com Karim depois que nos entendemos. Levanto meu
anel e meu peito dói mais, vendo a pedra rosa, linda. Ele sabia que não me
agradaria um diamante branco. Gosto de cores vibrantes. De repente,
percebo que minha alegação de que não nos conhecemos não é totalmente
verdadeira. Ainda que seja cedo, eu sei que é um pai maravilhoso para Ayla,
que uma parte do seu coração pertence a sua esposa falecida. Sei que ele
não se abriu para nenhuma mulher antes de mim. E ele sabe que sou
explosiva, ousada, que uma parte do meu coração pertence a Nate e que
nunca me abri para outro homem antes dele. Um nó se forma em minha
garganta e eu choro, percebendo que o pouco tempo nem sempre é o que
conta. Eu o amo tanto. E por isso machucou vê-lo defendendo à vaca e não
a mim.
Não sei quanto tempo fico lá, enrolada, pesando os prós e os contras
de meu comportamento no jantar. Eu faria tudo de novo! Mas agora, já mais
calma, entendo que explodindo daquela forma dei Ibope demais para a
cadela desprezível. É hora de voltar para o nosso quarto e conversar com
Karim. Me levanto, pegando as sandálias, não me dando o trabalho de
calçá-las de novo e saio. Sigo pelo corredor respirando fundo e giro a
maçaneta da porta de nossos aposentos, passando para dentro. O silêncio
me saúda. Ando pelo cômodo à sua procura, mas nenhum sinal dele. Então,
o toque do meu celular chama a minha atenção sobre a cama. Franzo o
cenho ao ver o nome de Nuria.
— Nuria. — Atendo-a.
— Amihaj a expulsou do palácio, Anna. — Ela murmura e meu
coração salta ao escutar isso. — Ele voltou ao salão e fez Latyfa admitir que
a estava hostilizando.
— Ele fez isso? — pergunto, meu íntimo aquecendo.
— Sim. Ainda rosnou na cara da naja que é a você que ele ama e
não vai tomar uma segunda esposa, muito menos ela. — Eu ofego, meus
olhos se enchendo de lágrimas de novo. Só que dessa vez são alegres. Ele
me defendeu. O meu príncipe lindo me defendeu.
— Onde ele está? Não o encontrei aqui no quarto — pergunto com
urgência.
— Ele disse que ia para a academia, suar um pouco enquanto você
esfriava a cabeça. — Pausa um pouco. — Você já está mais calma?
Expiro longamente.
— Sim — murmuro, um sorriso se formando em minha boca. —
Estou indo suar com meu príncipe agora… — Ela sorri do outro lado. —
Shukran, Nuria.
— Por nada. Vá procurar o seu homem. — Encoraja. Ela está
ficando menos tímida à minha volta. Gosto disso, de ter alguém em quem
confiar por aqui além de Karim.
Me despeço dela e entro no closet, mudando rapidamente meu
vestido para um conjunto de calça e top vermelho. A calça justa se agarra à
minha bunda, deixando-a bem arrebitada, além disso, não uso calcinha.
Sim, eu vou numa missão: fazer as pazes adequadamente com meu
príncipe. O top é um dos menores que tenho e mal contém meus seios, os
bicos quase aparecendo. Prendo meu cabelo num rabo de cavalo, calço tênis
e deixo o quarto rumo à academia, a apenas alguns metros depois do quarto
de Ayla. Entro e fecho a porta, trancando-a. Meu coração dispara, meus
olhos correndo pelo amplo espaço com os mais variados equipamentos.
Uma música árabe está tocando nas caixas acústicas. Estou amando esse
ritmo. É sensual, exótico, como meu príncipe. Karim não está à vista, mas
posso ouvir as batidas de socos e seus gemidos ofegantes. Ando devagar em
direção à sala que ele usa para o boxe e, mais ao fundo, para lutas com
espada. Ofego ao vê-lo de costas, distribuindo socos potentes no pobre saco
de boxe. Está usando apenas um short escuro.
Minha boca saliva acompanhando o ondular dos músculos das
costas e ombros largos. Seu cabelo está contido no coque que o deixa ainda
mais sexy, delicioso. A sala é ampla, sem outros equipamentos, apenas o
saco de boxe e a espécie de tatame rente à parede espelhada ao fundo.
Observo seus movimentos ágeis e ferozes, fascinada, até que nossos olhares
se encontram na parede espelhada. Os olhos negros fumegam, correndo
pelo meu corpo, o brilho predatório me faz estremecer, minha vagina
umedecendo e pulsando. Eu entro no recinto e ele diminui a força dos
socos, seu corpo está coberto por uma camada de suor e quero lambê-lo.
— Karim… — murmuro. É baixo, mas sei que ouviu porque seus
ombros ficam tensos. Ele grunhe e soca com mais força o pobre saco. —
Habib, olhe para mim. — Ele para os socos e retira as luvas, sua respiração
irregular, e crava os olhos escuros nos meus. Ainda em silêncio, se dirige
para o espaço das espadas. Ele usa espadas sem corte nos treinos comigo,
mas ainda são de aço e pesadas. Porém, estou me familiarizando com elas
desde que começamos a treinar, há duas semanas. — É assim que vai ser?
Você não vai conversar comigo?
Ele bufa, pegando uma espada pela lâmina e jogando-a para mim.
Pego o cabo com a agilidade que me ensinou e não perco o brilho orgulhoso
passando em suas íris. Então, seu olhar desce lentamente pelo meu corpo de
novo.
— Eu não quero conversar agora, princesa. — Sua voz profunda faz
meu centro vibrar. — Ganhe um tempo de mim e talvez eu converse com
você.
É a minha vez de bufar. Ele está sendo um idiota arrogante agora.
Nunca ganhei sequer um terço do tempo nos treinos. Apenas Jalal consegue
ser um oponente digno para ele nesse esporte.
— Vamos lá, Alteza. — Debocho e me livro do tênis, pisando no
chão levemente acolchoado. Ando até o centro e, segurando a espada com
as duas mãos, me coloco na posição de defesa. Minhas pernas abertas, meus
joelhos ligeiramente flexionados. Seu olhar faminto desce pelos meus seios,
barriga nua, e para entre minhas pernas. Meus seios ficam túrgidos e me
molho toda sob seu escrutínio perverso. Ele está vendo que estou sem
calcinha e um lento e malvado sorriso enrola sua boca antes de o olhar
arrastar de volta para o meu.
— Pronta, ‘amira? — pergunta com o brilho lascivo cintilando nos
olhos de ônix.
Levanto o queixo, mesmo excitada pra caramba, precisando manter
a pose.
— Pode vir, honorável senhor. — O instigo e ele sorri mais uma vez
antes de se lançar em minha direção. O barulho do aço contra aço ecoando
no espaço quando defendo o golpe. Ele torna a sorrir, me rodeando, e eu
rapidamente giro meu corpo, medindo-o, tentando antecipar o momento do
novo golpe. Seu abdome e peitoral definidos e suados são uma distração e
não percebo o ataque vindo. Karim me puxa contra seu corpo e arfo,
sentindo o pau grande e grosso pressionando em minha barriga. Está duro,
pronto para mim, como estou para ele. Então, com a mesma rapidez com
que me puxou, ele me empurra e investe novamente. Eu faço um bloqueio
perfeito e giro em meus calcanhares, tentando pegá-lo desprevenido, e
ataco. Isso o faz rir, o som tão indolente que me irrita. Já estou um pouco
ofegante pelo esforço de segurar a espada pesada, mas rosno, investindo
uma, duas, três vezes.
— Isso, princesa! Vamos, me ataque! — Ele incentiva e eu
continuo, empolgada. Suor brota em minha pele, seus olhos intensos
seguindo cada movimento meu, a fome queimando lá nas profundezas.
Quando roçamos um no outro, nossas peles deslizam suadas, seu cheiro de
sândalo e algo viril, primitivo, invadindo minhas narinas. Estou ofegando e
não só pelo treino. Empunhando uma espada, ele parece um daqueles
piratas temidos de tempos remotos. Luto, tentando não entregar a vitória tão
fácil, minha competitividade o fazendo rir por não entregar os pontos.
A música muda para outra mais lenta, os instrumentos numa perfeita
harmonia sensual. Nossos movimentos em volta um do outro se
assemelham a uma dança. Até que, num golpe ágil, ele pega minha mão da
espada, girando-a para trás das costas, seu agarre em meu pulso é forte, o
pau duro encostando em minha frente de novo. Meu peito sobe e desce,
minha respiração errática, ofegante.
— Deliciosa… — Rosna, se inclinando, lambendo meu pescoço.
Sua língua morna lança arrepios eróticos por todo o meu corpo. Sua boca
suga a minha carne suada e convulsiono. Solto a espada no tatame. Ele faz
o mesmo com a sua, a boca subindo para a minha orelha, raspando os
dentes, suas mãos agarram minha bunda e aperta a carne. Acaricio seus
ombros e me inclino, deslizando a língua em seu peito suado, envolvendo a
boca no mamilo direito, sugando-o. Karim geme rouco, as mãos subindo e
puxando meu top para baixo, grosseiramente. Quando meus seios ficam
nus, suas mãos os cobrem, esfregando os mamilos rígidos com os
polegares. A ereção grossa pressiona meu abdômen e o calor dentro de mim
aumenta, fazendo cada parte pulsar. Com um choramingo, puxo sua cabeça
para baixo e capturo sua boca, gememos os dois, nos agarrando numa
explosão de desejo.
— Me perdoe, habibti — ele sussurra asperamente, mordendo
minha boca.
— Me perdoe também, amiri — murmuro de volta, completamente
perdida de amor e tesão. — Eu te amo tanto.
— Eu também te amo tanto, amirati — diz, seu olhar cintilante de
amor e luxúria. Meu coração canta, inchando no peito. Pertencemos a
mundos diferentes, mas somos um agora e nada mais importa. — Você é
minha. Minha, está me ouvindo, Anna? Nunca vou te deixar ir embora. —
Rosna, mordendo meu queixo, voltando a mergulhar a boca exigente na
minha. Eu estremeço, pingando, latejando. Começa a puxar seu short para
baixo, com gestos apressados. O ajudo, gananciosa para tê-lo nu. Nosso
sexo é intenso, faminto, luxurioso e estou completamente viciada em tomá-
lo várias vezes ao dia. Quando está nu, o pau longo e espesso,
orgulhosamente duro, me faz lamber os lábios, minha boca enchendo de
saliva. Karim ri com perversão e me livra do top, em seguida da calça, me
empurrando com urgência contra a parede lateral, uma mão possessiva
vindo entre minhas pernas.
— Ahh, Karim… — Eu choramingo, sentindo seus dedos
deslizando em minhas dobras meladas. Com um rugido, ele mete um e em
seguida dois dedos grossos em mim. Gemo alto, me agarrando em seus
ombros, meu corpo inteiro tremendo de prazer.
— Sim, princesa, sua boceta precisa do meu pau, não é? — Seu tom
é indulgente enquanto esfrega meus lábios e clitóris numa fricção
enlouquecedora. Estou pingando em sua mão, tão excitada que ficaria com
vergonha, mas esse é o meu homem. — Isso, habibti, não se envergonhe
por estar toda molhada para tomar meu pau. Essa bocetinha apertada é
minha. — Suas palavras sacanas me deixam ainda mais louca. Sua boca
desce pelo meu pescoço e colo até engolir um mamilo, passando a sugar-me
gulosamente. Pego seus cabelos da nuca, arqueando-me, deixando-o mamar
em mim. Passa para o outro seio, lambendo, mordendo o bico com
perversão. Meus líquidos estão escorrendo em minhas coxas agora.
Levanta minha perna direita, enrolando acima de sua cintura, fico
toda esticada. Seus olhos escuros sobem para os meus enquanto se divide
entre um seio e outro, chupando minha carne com força, me marcando.
Choramingo, pendurada, arfando para tê-lo todo dentro de mim.
Com um sorriso perverso curvando sua boca, Karim se alinha em minha
entrada e me segura por trás do ombro direito enquanto segura a perna
direita com força, mantendo-me bem aberta. Sua boca vem para perto da
minha, seus olhos intensos e penetrantes se fixando nos meus, e ele empurra
o pau grande e grosso, socando bem fundo em mim. Eu grito, minhas unhas
cravando em seus ombros, meu corpo inteiro convulsionando. O prazer
perverso de tomá-lo até o punho quase me faz gozar. Sua pegada é dolorosa
às vezes, mas é inexplicavelmente gostosa, excitante. Karim me segura
imobilizada e retira quase inteiro, os olhos nunca deixando os meus,
voltando a me penetrar com força. Nós dois gritamos, nossas peles grudadas
de suor. Tesão cru reverberando em nós. Nossos sexos pulsam juntos, o meu
engolindo o dele, com fome. A sensação de ser completamente preenchida,
esticada é a mais luxuriosa e viciante que já senti. Minha cabeça roda e ele
passa a me comer com vigor, prensando-me à parede a cada estocada
profunda.
— Habib… Assim mesmo. Isso… — respiro entrecortado e minha
atenção vai para a parede espelhada ao lado. Arfo, luxúria varrendo meus
sentidos ao ver nossa imagem refletida lá. Meu príncipe viril e moreno me
comendo com força. Os músculos do corpo perfeito se contraindo a cada
estocada que dá em mim. Me penduro a ele e me dou, rebolando o máximo
que posso, recebendo-o todo, longo, grosso.
— Amirati… — Geme roucamente, sua boca vindo para a minha, e
o recebo com urgência. Nos beijamos com paixão lasciva, nossas línguas se
lambendo, dançando, num vai e vem gostoso. Seu pau me arreganhando
toda, me abrindo com golpes fundos, fortes. Eu deliro, deixando-o me foder
com voracidade. Quase não tenho mobilidade da cintura para baixo, seu
agarre é forte, me mantendo presa à parede, enquanto me fode. Minhas
unhas deslizam em seus ombros e eu mio em sua boca, levando cada
centímetro do pau grande. Resfolego, meu corpo estremecendo, minhas
entranhas queimando, a quentura descendo meu canal vaginal, meus
músculos internos se contraem em espasmos intensos e os líquidos inundam
minhas paredes. Eu grito alto, o gozo vindo denso, impiedoso, labaredas
líquidas encharcando minha vagina. Grito, choramingo, enquanto o
orgasmo reverbera em cada célula do meu corpo e Karim rosna, sua boca
deixando a minha, indo para o pescoço, onde chupa com fome. Todo o
tempo me comendo com socadas fundas, aumentando os tremores do meu
gozo.
— Me abrace com a outra perna, Anna. Vou te comer no chão agora.
— Grunhe e elevo minha perna esquerda. Estou mole, ainda trêmula e
ofegante do orgasmo arrasador. Ele me abraça apertado, colando-me
completamente em seu corpo grande e suado. Gemo e ele ri da minha
reação ainda faminta.
Me carrega uns passos, me deitando no centro do tatame preto, seu
corpo cobrindo o meu. Choramingo, sentindo seu peso me esmagando
gostosamente, seu pau entrando ainda mais profundo, as bolas colando em
minha bunda. Ele grunhe, seus olhos intensos sobre mim. Vejo amor, paixão
e luxúria queimando nas íris escuras. Me segura pela nuca e pega minha
perna direita, voltando a enrolá-la em seu quadril, e ele bate em mim,
fundo, duro. Eu berro pela dor e prazer se misturando. Nossos olhares
permanecem fixos e passa a me comer com golpes mais lentos, seu olhar
me devorando como seu pau avantajado está fazendo. Parece encantado.
O encaro com a mesma intensidade e encantamento, minhas mãos
acariciando seus ombros, peitoral, costas. Seus lábios deslizam pelo meu
rosto indo parar no ouvido, mordiscando o lóbulo, sugando-o depois, nunca
parando de meter bem fundo. Gememos, sussurramos nossos nomes, nossos
corpos suados deslizando um no outro, nesse encontro perfeito e devasso
que esse homem lindo me viciou. Arreganho-me mais e Karim grunhe,
descendo a boca para o meu pescoço, mordendo-me com perversão e posse.
Minha excitação começa a enrolar em minha barriga de novo. Meu corpo
começando a acordar, querendo gozar mais uma vez. Lábios quentes
encontram meu seio esquerdo, chupando duro. Arqueio-me, arfando,
enquanto ele dá atenção ao outro seio; fica indo e voltando, lambendo e
mordendo os mamilos sensíveis.
— Levante as pernas para os meus ombros. Quero entrar até as
bolas nessa boceta gostosa, princesa. — Grunhe, já pegando meus
tornozelos, me abrindo até não poder mais. Minha bunda levanta do tatame
e eu choramingo de boca aberta, vendo-o puxar o pau longo e grosso e
meter tudo dentro de mim de novo. Olho de lado, buscando-nos no espelho
outra vez, e estremeço pela imagem hedonista. Karim me montando com
seu corpo grande e musculoso, o pau entrando e saindo da minha vagina,
meus lábios estão esticados ao limite, recebendo-o até o punho. As bolas
batendo em minha bunda a cada estocada profunda. Minha vulva está toda
dolorida da sua voracidade, mas ao mesmo tempo é gostoso demais ter seu
pau grande e volume dentro de mim. — Gostosa… — Ruge guturalmente,
seu olhar indo para o espelho também, observando sua performance me
montando.
— Me faça gozar de novo, habib… — Peço desavergonhada. Ele ri
perverso e abaixa a boca bem perto da minha, o olhar escuro dentro do meu.
— Você vai gozar de novo, minha putinha… — Choramingo com
essa expressão chula. Minha vagina lateja e molha mais. Karim sente,
batendo com força brutal dentro de mim e eu berro, me pendurando em seus
ombros, perdendo meu ar. — Eu sei do que você precisa, habibti. Toma
tudo.… Vamos, leva bem fundo e goza no meu pau. Vamos, Anna!
Meu corpo todo convulsiona, depravação sem limites percorrendo
minhas veias e eu explodo, choramingando de prazer. Karim urra e mete
fundo, então, os jorros quentes alagam minha vagina. Gozamos gostoso,
agarrados, resfolegando, ele não parando de meter até descarregar tudo.
Sinto os líquidos descendo para o meu ânus. Sem aviso, ele sai da minha
vagina e me gira de bruços. Eu ofego vendo-o pelo espelho enfiar o rosto
em minha bunda, a língua habilidosa lambendo minha vulva e subindo para
o ânus. Arranho o couro do tatame e gemo enquanto ele abre bem minhas
bochechas e me chupa, lambe sem qualquer vergonha. Seus dedos cavam os
líquidos em minha vulva, levando para meu pequeno buraco, e relaxo,
deixando enfiar um.
Já fizemos algumas vezes e, embora seja um pouco doloroso, é
gostoso. Ele o mete todo, bem devagar, passando a me comer assim, sua
boca sobe pelas minhas costas, mordendo, sugando, lambendo até a minha
fênix. Ele adora essa tatuagem e amo sua boca sobre ela, beijando,
mordiscando de leve. Logo, acrescenta mais um dedo e me come ainda
devagar, alargando-me. A mão livre enrola em meu rabo de cavalo e o
puxa, rosnando quando gemo alto. Amo quando pega meu cabelo assim.
Seu corpo escala o meu, as coxas musculosas escarranchando minha bunda.
Fico tensa ao sentir a cabeça larga substituindo os dedos. Ele ainda está
duro mesmo tendo gozado há poucos minutos. Tem um vigor
impressionante aos trinta e três anos.
— Abra a bundinha linda para mim, princesa. — Sua voz em meu
ouvido me faz estremecer e eu faço, levando as mãos para trás, abrindo-me
sem vergonha. As mãos grandes passeiam em minhas costas quase
reverentemente. — Tão perfeita, ‘amira. — Geme rouco e então sinto a
pressão da cabeça bulbosa empurrando para dentro. Gemo em lamúria
sentindo-o penetrar o esfíncter. Karim urra baixo, empurrando devagar
centímetro a centímetro até estar todo enterrado. Eu estremeço e ele acaricia
minhas costas de novo, antes de puxar e voltar numa estocada mais forte,
funda, dolorosa, ainda assim deliciosa.
— Ahh, sim… — Lamento, entorpecida de tanto tesão por esse
homem e pelo prazer devasso de pertencer a ele de todas as formas. — Me
come assim, amiri…
Um som animalesco sai da sua garganta e puxa de novo, socando de
volta com força, me fazendo berrar alto. Sua mão torna a enrolar em meu
rabo de cavalo, subjugando-me, e me fode sem pena, sem restrição, me
comendo bruta e deliciosamente.
— Você ama meu pau todo enterrado nesse cuzinho apertado, não é,
princesa? — Instiga, me olhando através do espelho. Arfo, sendo montada e
fodida sem pena e amando cada momento.
— Muito.… Muito.… — Balbucio, perdida em seu olhar intenso,
suas estocadas vorazes em meu ânus. Mais suor está brotando em nossos
corpos. — Amo tudo que faz comigo. Tudo.
Ele sorri, arrogante, lindo, todo moreno, perfeito, e se debruça
lambendo minhas costas até a nuca. Sua boca chega ao meu ouvido e rolo
os olhos quando suga a concha da orelha, seu pau me comendo mais
devagar agora. Ele gira o quadril, metendo gostoso e profundo a cada golpe.
Suas mãos pegam as minhas e enfia seus dedos entre os meus, apoiando-as
dos lados da minha cabeça. Está todo em cima de mim, esmagando-me no
tatame.
— Abra um pouco as pernas, habibti — sussurra em meu ouvido e
eu faço. Quando volta a meter, meu clitóris esfrega no couro embaixo de
mim. Ofego e ele ri no meu ouvido, a boca gostosa descendo para o
pescoço, ombro, onde morde e passa a aumentar a força das estocadas
gradativamente, até que está batendo em mim, sem dó. Os sons de sexo
despudorado rivalizam com a música instrumental. — Quer gozar me dando
essa bundinha gostosa, princesa? — pergunta perversamente, me encarando
no espelho. Eu gemo em resposta. — Sim, a minha putinha quer. É claro
que quer… — Ri perverso e resfolego, sua sacanagem, a fricção em meu
feixe de nervos me lançando para a borda pela terceira vez.
— Oh, Jesus! Karim… — Eu me desmancho, recebendo suas
estocadas fundas e gozando mais uma vez, arquejando, quase sem som.
— Anna… — Ele geme meu nome, me comendo com força. Suas
estocadas fazem um barulho ritmado no ambiente. — Isso, goza bem
gostoso no meu pau outra vez! Goza comigo, amirati! — Rosna, metendo
mais e mais e urra guturalmente, estremecendo e esporrando dentro de mim.
Meu gozo intensifica, meu ânus recebendo os jorros do seu esperma quente.
Meu canal está dolorido, ardendo, mas é perfeito. Karim continua entrando
fundo, gananciosamente, despejando tudo, mordendo minhas costas e
rosnando alto. Vejo-o pelo espelho, tão apaixonada que meu peito dói.
Ficamos os dois gozando e nos olhando fixamente, ofegantes, nossos olhos
dizendo tudo o que as bocas ofegantes não conseguem neste momento.
Com um beijo suave em meu ombro, ele para os movimentos e se retira
devagar. Imediatamente, me gira, me puxando para seus braços.
Nos agarramos e ficamos grudados, arfantes, completamente
abatidos pela paixão voraz. Sua mão esfrega minhas costas e curva do
quadril, o toque delicioso e suave, e eu acho que cochilo um pouco, porque
acordo com ele rindo baixinho, seus lábios mornos em minha testa. Mio, me
agarrando mais a ele, minha perna por cima do seu quadril.
— Seu temperamento pode colocá-la em problemas, ‘amira —
murmura e eu abro os olhos, encontrando-o me encarando com a
intensidade que amei desde o primeiro momento. Eu rio um pouco.
— Sim, reconheço, Alteza, posso ter exagerado um pouco… — Ele
bufa e eu fico séria. — Aquela vaca merecia muito mais. Só não dei a surra
que a vadia estava pedindo justamente por causa das minhas boas maneiras,
fique sabendo, Alteza.
Grunhe com meus palavrões, mas sua expressão fica séria também.
— Sinto muito por não ter ficado do seu lado no primeiro momento.
Você é a minha escolhida, habibti — diz com voz áspera e puxa meu
queixo, levando meu rosto mais próximo do seu. — Que Allah proteja
quem ousar insultá-la de novo. Você é a minha mulher.
Meu coração aquece de tanto amor por ele e eu rio, me
aconchegando mais.
— Nuria me disse que você a mandou embora, então, está tudo bem,
amiri. — Tranquilizo-o, beijando suavemente sua boca.
Seus dedos contornam meu rosto e seu olhar fica mais suave quando
murmura:
— Aqui é a sua casa agora, Anna. Nunca mais quero ouvi-la dizer
que se sente uma intrusa.
— Eu sei, Karim. Exagerei, admito — sussurro. — É que as
palavras dela me envenenaram e você a defendendo me deixou fora de
controle.
— Wallah! Totalmente fora de controle, ‘amira. Meu tio confirmou
sua teoria de que você é uma princesa escandalosa — resmunga.
— Droga, agora o Mister Simpatia me odeia mais um pouco. —
Aponto, desgostosa.
Karim não segura uma risada profunda, seus braços me apertando
gostosamente contra seu peito.
— Embora tenha sido um tanto divertido, você será a minha rainha.
Tente não escandalizar mais ninguém em público — pede ainda em tom de
diversão.
— Mas qual a graça de escandalizar se não for em público, habib?
Me encara com olhos estreitos.
— Comporte-se, habibti. — Seu tom me lembrou o que minha mãe
usa com meu pai sempre que precisa contê-lo. Rio, aninhando-me no corpo
quente do meu amor e o provoco um pouco mais:
— Eu não sou e nunca serei uma de suas cadelas treinadas, Karim.
Ele rosna.
— Você não pode repetir essas merdas em público, Anna. Uma
rainha precisa manter certo decoro, sabe muito bem disso — retruca.
Reviro os olhos, adorando provocá-lo.
— Está bem, prometo me comportar — digo com um sorriso
brincando na boca e meus olhos fechando de novo. Suspiro feliz voltando a
encará-lo. — Amo você, amiri — sussurro.
Seus olhos escuros flamejam com a intensidade que me derruba. Seu
nariz roça o meu delicada e reverentemente.
— E eu amo você, amirati — murmura, me mantendo no casulo dos
braços fortes. — Minha casa é a sua casa. Sempre, nour Al Sabah
CAPÍTULO DOZE
Karim Amihaj
A contemplo cavalgando ao meu lado, um sorriso bobo escancarado
em meu rosto. Anna conseguiu me seduzir para suspender a agenda de hoje
e ficar com ela, elas. Ayla está comigo, acomodada na sela à minha frente.
Sua risadinha feliz termina de me aquecer por dentro. Minha princesinha
está empolgada com Anna lhe ensinando a montar, mas ainda vai demorar
até que eu fique seguro em deixá-la andar sozinha.
— Mais rápido, papai! — Ayla dá um gritinho eufórico quando
incito Hércules a aumentar o galope.
— Não podemos ir muito rápido, nour hayati. Você é pequena
ainda. — Advirto, mas rio da sua euforia e coragem. Por isso se deu tão
bem com Anna. Minha filha tem a mesma inquietação que vejo na princesa.
Prevejo que ganharei alguns cabelos brancos com essas duas.
— Não sou pequena — retruca, me fazendo rir mais, apertando meu
braço enrolado em seu pequeno corpo, mantendo-a bem junto de mim.
— Para essa atividade em especial, você é, habibti. Agora pare de
retrucar para seu pai, mocinha — repreendo e ela torna a soltar a risadinha
contagiante.
Anna nos observa, o mesmo sorriso bobo e apaixonado está em seu
rosto. Masha Allah![31] Como é linda. Está usando uma calça escura e justa,
tênis vermelho-escuro, um caftan no mesmo tom do calçado, os cabelos
negros soltos tremulando sobre as costas e ombros a cada galope. É
hipnotizante vê-la montando Queen, sua postura majestosa como uma
rainha. A minha rainha. Minha mente é preenchida com imagens dela hoje
de manhã cavalgando meu pau, os peitinhos lindos saltando a cada descida,
o brilho safado, ousado em seus olhos verdes enquanto me fitava me
levando até o punho. Reprimo as imagens para me impedir de ficar duro,
afinal, não estamos sozinhos. Continuamos nos observando, nossos olhares
cobiçando um ao outro. Sou completamente louco por ela. Não consigo
mais imaginar minha vida sem essa garota linda e irreverente. Seguimos
lado a lado, o sol já começando a baixar no mundaréu de areia. Inspiro,
absorvendo a sensação de liberdade que isso me traz. Anna está fazendo o
mesmo quando torno a observar seu perfil esguio sobre sua égua. Abre os
braços e fecha os olhos, o rosto inclinando para cima.
Não resisto e pego minha câmera pendurada no pescoço, com uma
só mão, deixando as rédeas de Hércules sobre a ponta da sela. A enquadro.
Tenho algumas fotos dela desde o nosso primeiro passeio. Já estava
fascinado, tentando lutar contra, mas irremediavelmente atraído pela sua
irreverência, sua luz. Disparo um, dois cliques e seu rosto vira para mim, os
olhos verdes cintilantes, vibrantes, encontrando os meus através da lente.
Meu coração pula no peito, meu corpo inteiro sendo tomado de amor,
paixão, desejo, devoção, um misto de sentimentos intensos que ela me
desperta. Linda. Linda demais. Nunca vou parar de agradecer a Allah por
trazê-la para mim. Continuo clicando e ela sorri, seus olhos cada vez mais
brilhantes.
— Eu amo você, amiri — sussurra. Eu disparo mais um clique,
pegando essa expressão, esse olhar, quando declara seu amor.
— Eu amo você também, amirati — digo de volta, tocado, tomado
de todas as formas.
Anna torna a sorrir e então levanta sua câmera. Eu faço uma careta
de brincadeira, me tornando o seu foco agora. Ela gargalha roucamente, o
som ecoando no deserto, e tira várias fotos. Abaixa a câmera, seu olhar me
bebendo por um instante, como fiz antes com ela. Lindo. Consigo ler em
seus lábios. Volta a disparar mais cliques e sua atenção vem para Ayla.
— Aylinha? Olhe para mim, sapequinha! — E ela começa a clicar,
um sorriso doce e amoroso curvando sua boca ao focar minha filha. —
Assim mesmo, menininha bonita! — Incentiva sob os risos entusiasmados
da pequena.
Anna encerra a sessão e voltamos a galopar em ritmo mais intenso.
Pegamos o desvio ao norte, ainda dentro da grande muralha, em direção ao
campo de golfe. Vamos levar nossa pequena aventureira para se divertir um
pouco e, depois, faremos um lanche sobre a grama — ideia de Anna, e Ayla
deu pulos de alegria quando lhe contamos ainda há pouco. Nós fomos
almoçar em Jawahra e voltamos no meio da tarde.
— Anninha, você vai me ensinar a jogar golfe? — pergunta,
ansiedade escorrendo em seu tom.
— Eu não sou nada boa nesse esporte, habibti. — Anna nega com
um leve sorriso. A suavidade com que trata minha filha sempre me deixa de
joelhos. Seus olhos vêm para os meus e vão ficando brilhantes com
atrevimento antes de adicionar: — Mas para nossa sorte, seu pai é muito
bom e vai nos ensinar.
Devolvo o sorriso malicioso, aproveitando que Ayla não pode me
ver. Na única vez que a trouxe aqui, eu me aproveitei bastante da
inexperiência da princesa nesse esporte, não tenho vergonha em admitir.
Estávamos os dois muito atraídos, a tensão sexual quase insuportável entre
nós. Sentir seu corpo delicioso junto ao meu, respirar seu cheiro
embriagador, era tudo que eu me permitia naquele período, ainda assim,
foram momentos perfeitos. Eu acordava louco para vê-la e inventava algum
passeio para estar perto dela.
Chegamos ao campo e o funcionário da guarita nos recebe com
reverência, abrindo a corrente e nos dando passagem. Atravessamos a área
calçada de blocos e mais três funcionários vêm nos ajudar a desmontar e
pegar as cestas de comida. Dois cuidam dos cavalos e um segue com as
cestas em direção a um carrinho perto da faixa extensa de grama à nossa
direita. Eu seguro a mão direita de Ayla e Anna segura a esquerda. Minha
princesinha está radiante. Seu traje se assemelha ao de Anna, incluindo o
tênis vermelho que a princesa encomendou na capital. As ajudo a se
acomodar no carrinho e dirijo, nos levando pelo caminho tortuoso cortando
a grama. Nem me lembro quando trouxe Ayla aqui. Acho que foi apenas
uma vez e, vendo a felicidade brilhando nos olhinhos de minha filha, me
recrimino por isso.
— É tão bonito, papai! — Minha menina exclama quando
começamos a subir a ponte, atravessando para o outro lado, onde teremos
mais privacidade. A encaro, sentada no colo de Anna.
— Sim, nour hayati. Você está gostando do nosso dia de hoje? —
pergunto suavemente.
— Sim! Anninha disse que o senhor seria todo nosso hoje.
— Ela disse, é? — Sorrio, desviando o olhar para sua cúmplice.
— Seu papai é maravilhoso por tirar o dia para suas garotas, não é,
princesinha? — Ela diz, beijando o topo da cabecinha de Ayla.
— Sim! Meu papai é maravilhoso. Amanhã o senhor vai tirar folga
de novo, papai? — pergunta em sua inocência, me fazendo rir alto e Anna
também.
— Amanhã não posso, habibti. — Olho-a com ternura. — Mas
prometo tirar outro dia para minhas garotas em breve.
Anna me encara, uma sombra passando em seus olhos. Amanhã será
a reunião com os clãs tribais. Estou apreensivo, confesso. Essa folga hoje
veio em boa hora e está sendo boa para limpar um pouco a cabeça dos
pensamentos e prospectos que só me deixam mais ansioso. Temos uma
defesa montada para solicitar o apoio dos líderes para minha subida ao
trono solteiro. O sheik El-Baham garantiu que o ocorrido com Latyfa não
interferirá em nossa relação e continuará me apoiando. Espero que tudo dê
certo. Paro perto do ponto de partida. Carrego o saco com os tacos e Ayla
segura a mão de Anna enquanto andamos pela grama. Pela próxima hora
nós rodamos os buracos. Ensinei minha pequena a bater na bola algumas
vezes e outras a deixei correr livremente, tentando suas tacadas com um
taco menor e mais leve. E, claro, não perdi a oportunidade de ajudar Anna
em suas tacadas também.…
Quando Ayla mostrou sinais de cansaço, pegamos as cestas no
buggy e estendemos uma manta sobre a grama, à margem do lago artificial.
Comemos as frutas, esfihas doces e salgadas, tomando suco de tâmara e
amora. Tiro várias fotos de Anna e Ayla juntas e depois, foco o rosto lindo
de Anna. A expressão de adoração enquanto interage com a minha filha
amolecendo meu coração. Ayla vem sentar em meu colo, pedindo a câmera
para tirar fotos de Anna também. A ajudo e ela sorri, tão encantada com a
nossa princesa quanto eu.
— Isso, habibti! — incentiva como Anna fez com ela antes. — Está
linda!
Nós rimos da espontaneidade da pequena.
— Shukran, menininha esperta! — Anna sorri, fazendo poses.
Anna torna a pegar sua câmera e registra o pôr do sol do outro lado
do lago. O clima vai ficando mais ameno, uma brisa suave nos envolvendo.
E pelos próximos minutos ela se perde, fazendo o que ama. Seus olhos
brilham a cada ponto que capta seu interesse e sua lente volta para mim.
— Me dê um sorriso, honorável Alteza — murmura, um misto de
provocação e reverência em seu tom fazendo meu corpo acordar. Estendo a
mão, puxando-a para o meu lado, precisando tocá-la. Ela sorri, se
desequilibrando, caindo de costas em meu colo. Ayla faz algazarra,
pegando-a, enrolando os pequenos braços em seu pescoço. Ajusto as duas
sobre as minhas pernas. Anna se aconchega, o rosto corado levantando para
o meu. Me inclino, dando um beijo suave em sua boca. Nossas mãos
entrelaçam e ficamos assim, vendo os últimos raios de sol sendo engolidos
pelo deserto.
— Quando tudo estiver tranquilo por aqui, eu quero fazer a
exposição que lhe falei, habib — murmura, quebrando o silêncio. Sim, ela
me disse que o objetivo de fotografar os beduínos era fazer uma ou mais
exposições. — Preciso esperar Ella terminar o resguardo, porém. Ela é
curadora honorária do Museu de Ardócia. Além de ter os contatos certos,
minha prima é fodona nesse negócio de arte. — Sorrio da sua forma de
falar. — É uma apaixonada por arte e está salivando para me ajudar desde
que lhe contei sobre esse projeto.
— Você também é uma apaixonada pela arte, ‘amira — murmuro,
deslizando meus dedos entre seus cabelos. — Nunca vi ninguém capturar
tão bem a essência das coisas como você com suas lentes.
Seus olhos se iluminam com meu elogio.
— Shukran, habib — sussurra. — Você também consegue isso. Vi
suas fotos.
— Não, Anna. Sou apenas um curioso que aprendeu sozinho.
Fotografar é apenas mais um hobby para mim. — Dou de ombros. — Mas
você eleva isso a outro patamar. Você coloca a alma em cada clique e isso
faz toda a diferença. Essa, ou essas exposições, serão um sucesso, tenho
certeza.
Ela solta uma risadinha suave.
— Você me envaidece, meu senhor. — Brinca. Eu rio, tocando seu
rosto, deslizando os dedos reverentemente pela face macia. — Quero
reverter os lucros para a Fundação Anna Harper e também para a fundação
da família Marshal — complementa, seus olhos ficando sérios. Assinto. —
Isso me lembra de que preciso ligar para Emma e Ben. Eles irão gostar de
participar. — Estes são a mãe e irmão mais novo de Nate, pelo que já
conversamos. Anna mantém contato com eles, um dos pedidos das cartas
que o menino escreveu para ela enquanto estava em estágio terminal. Meu
olhar vai para a corrente em seu pescoço. Não quero me sentir incomodado
por isso, mas não consigo evitar, eu sinto. Ela vai continuar usando-a
mesmo agora que se abriu para o amor outra vez? Mesmo agora com meu
anel em seu dedo?
— Onde quer fazer, habibti? — pergunto, expulsando o mal-estar
para longe. Ela vai tirá-lo quando estiver pronta. Nós respeitamos as
histórias um do outro desde o começo, não posso ter esse tipo de
pensamento egoísta com um garoto que foi tão importante para ela.
— Vamos tentar em Nova York primeiro. Além disso, é o meu
trabalho de conclusão de curso, meu professor precisa estar presente —
informa e eu assinto. Essa é a sua segunda graduação. A primeira foi
licenciatura em Letras, por isso tem tanta facilidade para ensinar inglês.
Ayla melhorou consideravelmente sua pronúncia depois da metodologia
diferente da princesa.
— Nós estaremos com você. — Garanto-lhe. Ela sorri, levantando a
mão para o meu rosto. — Em qualquer cidade, em qualquer lugar, eu e Ayla
estaremos lá para prestigiar a nossa princesa.
— Shukran, amiri — murmura, o polegar acariciando minha boca.
— Nós vamos para o Ocidente de novo, papai? — Ayla interrompe
a nossa troca de olhares, nos fazendo rir da sua fascinação pelo Ocidente.
Ou talvez seja apenas porque Anna veio de lá e minha pequena está
completamente apaixonada por ela.
— Nós vamos, nour hayati. Anninha vai fazer uma exposição das
fotos que tirou aqui — explico.
— O que é uma exposição? — Franze a testinha, concentrada.
Eu e Anna passamos os minutos seguintes explicando para nossa
pequena curiosa o que é uma exposição. A temperatura já estava baixa
quando levantamos acampamento. A viagem de volta foi feita com Ayla
cochilando em meu colo sobre a sela. O dia atípico nocauteou a pequena
aventureira. A levamos para seus aposentos ao chegarmos ao palácio.
Cuidamos da sua higiene e a colocamos na cama.
Quando entramos em nossos aposentos, Anna anda em direção ao
banheiro, me lançando um olhar convidativo por cima do ombro.
— Uma banheira morna, honorável Alteza? — murmura com sua
voz rouca e safada.
— Pode apostar que sim, princesa. — Eu rosno, já começando a
segui-la. Então, meu celular toca no bolso do jeans. Eu rosno mais, puxando
o aparelho para fora. É Jalal. Estendo o indicador para Anna, solicitando um
minuto, e me dirijo para a sacada, já atendendo meu primo. — Fala, primo.
— Desculpe estar interrompendo. Sei que tirou o dia para Anna e
Ayla, mas surgiu algo que precisa saber, Amihaj. — Seu tom me tem atento
imediatamente.
— O quê? — inquiro, apreensivo.
— Um dos guardas abriu a boca e contou que o guarda para quem
Al-Shalleen havia entregue a carta destinada a você entregou-a para um
irmão guardá-la antes de morrer. — Agora isso é digno de nota. O guarda
que estava com a carta foi assassinado a tiros em sua casa enquanto dormia.
Mais um inocente pego por alguém que quer claramente apagar seus
rastros, o verdadeiro assassino de Yasmina. Meu tio e Jalal estão submersos
nessa investigação, mas até agora não havia surgido nada que apontasse
uma direção consistente.
— Me diga que já conseguiu pegar esse irmão, Jalal. — Eu peço,
ansioso.
— Infelizmente não, primo. — Seu tom é desgostoso. — Ele mora
numa vila próxima a Jawahra, mas a casa estava vazia quando chegamos
aqui.
— Você ainda está aí? — pergunto. — Revire tudo! Essa maldita
carta pode estar escondida aí!
— Eu tenho um palpite que não, Amihaj. — Expira na linha. — Ele
deve ter lido o conteúdo depois que o irmão foi assassinado e fugiu
amedrontado.
Solto um som insatisfeito, impotente.
— Então precisamos encontrar esse homem, primo. Só ele pode
esclarecer essa merda e nos ajudar a prender o verdadeiro assassino. Eu
devo isso à família Al-Shalleen. Eles precisam ter sua honra reparada.
— Eu sei, Amihaj. Vou encontrá-lo, tem a minha palavra — promete
seriamente. — Estou voltando para o palácio agora.
— Está bem. Shukran, Jalal. — Agradeço e me despeço.
O sentimento de culpa se infiltrou dentro de mim sobre esse caso. A
carta revela o nome do verdadeiro assassino, meu tio e Jalal me
convenceram disso. Nós condenamos um homem inocente à morte. Eu o
condenei e me recusei a ouvi-lo quando pediu por uma audiência e agora
sua morte pesa sobre os meus ombros. A sua e do guarda que aceitou pegar
a carta. Respiro fundo, rogando a Allah que nos guie para a direção certa
dessa vez. Volto ao quarto, expulsando toda a tensão e angústia para não
preocupar Anna. Ela merece a minha melhor versão, sempre.

***

Eu entro na sala de reuniões ao lado do meu escritório, ladeado por


tio Jafar e Jalal. Zafyr segue alguns passos atrás. Embora meu primo mais
novo odeie esses momentos, não foge às suas responsabilidades como
príncipe Al-Abdallah. Todos os líderes se levantam de suas cadeiras ao
redor da grande mesa oval. Em seguida, se curvam respeitosamente
enquanto me dirijo para o trono, colocado na elevação à frente da mesa.
Permaneço de pé ao chegar lá, meu tio e primos se colocam dos meus lados.
Levanto a mão indicando que podem relaxar e tomarem seus assentos
novamente. Eles se sentam e eu abro a reunião como manda o ritual.
— Eu, o príncipe herdeiro, Karim Amihaj, saúdo e recebo as nove
tribos na casa Al-Abdallah — digo solenemente. — Que Allah nos guie
nesta manhã.
— Salaam Aleikum, amiri! — Suas vozes ecoam em uníssono na
sala. — Falayfun[32], Vossa Alteza.
Aceno com a cabeça e tomo meu lugar no trono, enquanto meu tio e
primos permanecem de pé nesse primeiro momento. Cada um deles saúda
os homens presentes. Jalal e Zafyr se colocam em ambos os lados do trono
e meu tio avança uns passos, se colocando mais perto da mesa. O grão-vizir
faz a ponte entre os líderes e o governante. É uma tradição milenar que
nunca abolimos.
— Salaam Aleikum, meus honrados sheiks! — Cumprimenta e os
homens retornam a saudação. — Hoje discutiremos assuntos pertinentes aos
lucros dos clãs na negociação com a empresa alemã que irá exportar nosso
gás natural. — Eles abrem sorrisos satisfeitos. Claro, vão abocanhar
grandes porcentagens nesse negócio. Além das gordas somas que já ganham
com a exploração de nossas jazidas de petróleo por uma empresa
americana. — Sua Alteza, o príncipe Karim Amihaj, deseja saber também
como estão em suas casas. Ele quer poder visitá-los em breve. — Eles
sorriem, acenando, gostam de ter o governante indo até as tribos. Eu não
discordo de estar perto do meu povo, em tudo. Só não aprecio suas
tradições arcaicas em relação a isso. Não somos como os beduínos, soltos
pelo deserto. Kamar sempre teve um governante em um local fixo, um
ponto de referência para eles.
— O percentual correspondente aos lucros da petrolífera estatal de
Kamar, conforme proposta do nosso príncipe herdeiro no começo do ano.
— Meu tio continua, depois faz uma pausa, e agora virá a parte
preocupante: — E, por último, uma moção de Sua Alteza, na qual pleiteia o
direito de subir ao trono sem a necessidade de contrair matrimônio no
primeiro momento. — O desconforto se estampa rapidamente, como previ,
nos rostos dos sheiks. — Vamos ao primeiro ponto, então. — Ele diz não
denotando abalo pelas caras feias dos líderes.
Meu tio é uma raposa nesse jogo e sugeriu colocarmos os dois
pontos de interesse dos clãs em primeiro lugar na pauta, deixando a minha
moção por último, quando eles estivessem felizes com suas comissões com
a negociação junto aos alemães e com o início das operações da estatal
petrolífera previsto para o próximo semestre. E a reunião começa. Os
homens estão animados com os lucros. Eu observo as discussões, intervindo
quando preciso fazer algum adendo. Nos lucros da estatal, eles queriam
50%, mas argumentei que 30% irão para a caridade. Então, ficaremos com
70, que podemos dividir em partes iguais para a casa Al-Abdallah e as
tribos. Alguns são contra, mas no fim conseguimos a maioria dos votos.
Quando meu tio torna a se levantar de sua cadeira, indo para a frente, meu
corpo volta a ficar tenso.
— Chegou o momento de Sua Alteza apresentar sua moção. Peço a
Allah que vos ilumine, oh, ilustres senhores, para que julguem o desejo de
nosso príncipe com o comprometimento que Sua Alteza precisa. — Ele
eleva a voz em tom cerimonioso.
Eu me levanto, ficando diante da mesa, e eles se levantam
inclinando-se novamente em respeito. Faço um gesto com a mão para
relaxarem e, quando se sentam, começo a minha argumentação:
— Eu vou iniciar dizendo que meu pedido não tem a intenção de
desrespeitar nossas tradições, honrados sheiks. — Elevo a minha voz no
tom sério de governante, olhando cada um deles nos olhos. — Porém, tenho
andado incomodado com algumas práticas que precisam ser reformuladas,
senão, abolidas em nome da contemporaneidade. — Vejo os sinais de
desagrado voltando, mas não me abato. — Não há nenhuma menção na lei
do Profeta que fale que um príncipe precisa contrair matrimônio para se
tornar rei. Isso é invenção do homem. — Eles franzem as caras. — E tudo
que é invenção humana está sujeito a adaptação e mudanças com a
evolução dos tempos.
— Se me permite, amiri — o sheik Al-Hansur, um dos mais
influentes, pede respeitosamente; aceno e ele continua: —, nenhum príncipe
subiu ao trono de Kamar solteiro, meu senhor. Pode ser uma invenção
humana, mas é assim que as tribos se sentem seguras, tendo um rei e uma
rainha digna e aprovada por nós.
Eu estreito meus olhos ligeiramente para o homem. Ele está
insinuando que Anna não é digna?
— Meu senhor, se me permite. — Eu desvio a atenção para El-
Baham, que parece mais relaxado do que os outros. — Senhores, o pedido
de Sua Alteza é legítimo e correto. — Fico satisfeito ao ver que o homem
não voltou atrás em sua palavra. — Nosso príncipe tem sido o regente mais
próspero em centenas de anos. Ele está nos conduzindo de forma hábil e
competente para o século 21. Já não somos inferiores a nenhum dos nossos
vizinhos pelo trabalho e comprometimento de Sua Alteza.
— Sim, não há dúvidas quanto a isso, sheik El-Baham — Al-Hansur
interrompe. — O que está em votação aqui não é a competência de nosso
príncipe para os negócios. Isso ele tem demonstrado nos últimos quatro
anos. O que não o isenta de cumprir com o seu dever como príncipe
herdeiro.
— Sheik Al-Hansur, eu nunca me neguei a cumprir com o meu
dever desde que meu pai, que Allah o tenha, nos deixou — digo, lutando
para manter minha voz neutra e livre de irritação.
O homem me encara firmemente.
— Eu sou terminantemente contra sua subida ao trono sem uma
esposa que passe pelo nosso crivo, meu senhor — diz às claras, e irritação
borbulha dentro de mim com a veemência da sua negativa.
— Meu senhor, se me permite opinar — o sheik Bashar, o ancião
dos clãs, me encara com respeito, porém, desgosto —, chegou até nós a
forma como está vivendo com essa princesa ocidental, amiri. — Meu
sangue ferve com o tom desrespeitoso com que menciona Anna. — Está
vivendo em pecado com ela, dormindo na mesma cama, como marido e
mulher, descumprindo os preceitos do Profeta.
Meu sangue gela. Como ele, eles ficaram sabendo disso? Encaro El-
Baham, estreitando meus olhos ligeiramente. As únicas pessoas que sabem
que estou dormindo com Anna no mesmo quarto são ele e sua filha. Talvez
o homem não esteja do meu lado, apesar do discurso apaziguador e
lisonjeiro que acabou de fazer. Meu tio está mantendo um olho sobre ele,
por via das dúvidas.
— Senhor, não creio que isso tenha a ver…
— Com todo respeito ao meu príncipe, tem tudo a ver. O único
propósito da sua subida ao trono solteiro é escapar do nosso crivo para sua
rainha. — Eu trinco os dentes, odiando essa merda de país arcaico. — Não
posso concordar com tamanho desrespeito às leis e tradições de nosso povo.
— Seu olhar é desapontado para mim agora. — Mande a mulher pecadora
embora. Ela não pertence aqui. Está colocando ideias em sua cabeça,
fazendo-o desrespeitar e se afastar de seu povo.
Tenho que me controlar ao máximo para não explodir com o ancião.
— Anna Julia, este é o nome dela, senhor — informo, mantendo
minha voz plena, embora queira chutar algo neste momento. — E volto a
dizer: essa exigência é descabida, uma invenção do homem, portanto,
passível de mudança, desde que queiramos manter a evolução do nosso
emirado.
— Eu voto contra, amiri. Essa ocidental jamais se sentará no trono
de nosso país — Al-Hansur reforça sua negativa.
— Entendo que esteja se divertindo com a moça estrangeira, Alteza,
mas agora é preciso colocar um ponto final nessa aventura — Al-Bashar
volta a insultar Anna e eu fecho meus punhos. Sinto a mão de meu tio em
meu ombro, me contendo.
— Peço que tenha mais respeito com a sua futura rainha, sheik. —
O reprovo em tom baixo. Meu controle por um fio.
— Com todo o respeito que lhe devemos, ela não é e nunca será
nossa rainha, amiri. — O sheik Faheem entra na conversa, seu tom e olhar
desgostosos. — É uma forasteira, que está vivendo em pecado com o
príncipe, apenas isso.
Eu quero esganá-lo! Todos eles! Quem pensam que são para falar
sobre ela dessa forma?
— Os senhores não a conhecem, então não ousem abrir suas bocas
para ofendê-la. — Ranjo, lançando um olhar duro para cada um e é neste
momento que percebo, uma guerra está a caminho. Eu não vou ceder. —
Não vou desistir da mulher que amo para atender nove homens que se
acham os donos da razão. Já me curvei demais às vontades de vocês. Isso
acaba hoje! — Brado e vejo o espanto em seus rostos. Nunca levantei a voz
antes numa reunião, mas eles conseguiram me tirar do sério. — Anna Julia
é uma princesa, tem berço, tratem-na com o respeito que merece!
Meu tio me dá mais um aperto no ombro.
— Acredito que precisamos de uma pausa para digerir melhor o
assunto. O que acha, amiri? — Ele me olha e vejo a apreensão lá. Aceno.
— Faremos uma pausa de vinte minutos. Aproveitem para desfrutar do
banquete que Sua Alteza preparou para este momento. — Meu tio ainda
tenta usar da diplomacia. Os homens se levantam e vão em direção ao buffet
no fundo da sala.
— El-Baham não estava intermediando com os outros líderes,
primo? — Zafyr pergunta em tom baixo quando os homens estão a uma
distância segura. Olho-o, espantado com seu interesse e seriedade. — Não
confio nele, só para constar.
— Também estou com a sensação de que o homem o enganou,
amiri. — Meu tio diz, insatisfação clara em sua voz. — Ainda não
encontrei nada suspeito ao seu redor. Mas continuarei cavando, ele não me
inspira mais confiança.
Esfrego minhas têmporas. Odiando essa merda. Odiando depender
da aprovação de nove homens egocêntricos e gananciosos. Eles
enriqueceram além do que sonhavam desde que assumi a regência de
Kamar e abri as portas de nosso emirado para o progresso. Ainda assim se
acham no direito de interferir diretamente na minha vida pessoal, como se
fossem ungidos por Allah. Estou quase explodindo. Então, uma ideia me
vem à cabeça. É um ato extremo, mas tempos adversos exigem medidas
enérgicas.
— Jalal, chame a guarda — murmuro, me inclinando para meu
primo, que arregala os olhos.
— Tem certeza? — murmura, o rosto mostrando receio. Ele sabe o
que pretendo fazer.
— O resultado aqui não será favorável para mim, primo — digo
baixo, olhando-o firmemente. — Não serei mais refém das tribos.
— Os fará seus reféns, em vez disso? Não é o caminho, meu senhor.
— Meu tio vem mais perto de nós, apertando a boca em descontentamento.
— Isso pode desencadear uma guerra entre você e o seu povo, Amihaj.
Observo os homens comendo, sorrindo arrogantes, certos de que me
curvarei às suas exigências, como cada príncipe antes de mim. Volto a
encarar meu tio.
— Nós já estamos em guerra, tio. — Olho para Jalal e repito: —
Convoque a guarda para ficar a postos lá fora. Chegou a hora de mostrar a
esses homens que eu sou o governante de Kamar e não vou mais me curvar.
Há um brilho de apreensão nos olhos de meu primo. Mas vejo
também orgulho de mim e da posição que estou tomando.
— Estaremos ao seu comando, meu senhor. — Bate no peito
esquerdo. — Para o melhor ou o pior.
Assinto. Infelizmente, acho que é para o pior. Eles não vão aprovar
minha moção, e que Allah nos proteja, porque as coisas vão ficar feias.

Anna Julia
Termino a chamada de vídeo com Ella e um sorriso permanece em
meu rosto. Ciara já ganhou peso em poucos dias, o rostinho rosado está
mais redondo e os olhinhos verdes bem espertos, me encantando através da
tela. Rico balbuciando no colo de Mike enquanto seu pai babava na esposa
e filhos. Eles são uma família linda demais. Ella tornou a garantir que me
ajudará com a exposição quando acabar seu resguardo e já estou animada
para mostrar todo o material conseguido com os beduínos. Sou suspeita,
mas as imagens estão incríveis! Eu guardo meu celular no bolso do jeans e
me preparo para ir até a biblioteca, onde Ayla está na aula de artes.
Coincidentemente, a campainha toca ao mesmo tempo em que alcanço a
porta. A abro e estaco, dando de cara com o visitante inesperado. Franzo o
cenho, encarando o tal sheik El-Baham.
— Minha senhora. — Me cumprimenta com uma mesura educada,
seu olhar me causando os calafrios que sempre sinto em sua presença. —
Perdoe-me por abordá-la dessa forma, mas será que teria tempo para uma
conversa?
— Uma conversa? Sobre o que exatamente, senhor? — inquiro
receosa e um tanto assustada.
O homem observa ao longo do corredor e volta o olhar frio para
mim.
— Na verdade, quero lhe mostrar algo. — Sua voz é mansa,
preocupada até, eu diria. — Estamos em reunião com Sua Alteza, como
deve ser de seu conhecimento. — Aceno, cada vez mais aturdida com sua
visita estranha. — Gostaria de acompanhar a votação do pedido de nosso
príncipe?
— Mulheres não são permitidas nestas ocasiões e, além disso, não
sou…
— A rainha. Minha senhora, ainda não é a sua rainha. — Ele
completa, os olhos brilhando com algo que não consigo decifrar. Só sei que
esse homem me dá medo. — Há uma entrada pelos fundos da sala, a
princesa pode usá-la se quiser.
— Por que está fazendo isso? — Me mantenho ainda dentro do
quarto, não confiando em estar perto do homem.
— Para que veja que as tribos são importantes para manter o
equilíbrio em nosso emirado. — Continuo confusa. — Sua Alteza está
prestes a desencadear uma guerra entre seu próprio povo para poder se
casar com a senhora.
Meu coração começa a saltar, e não de uma forma boa. — Por isso,
estou convidando-a para ir lá e ver com seus próprios olhos como tudo pode
sair do controle caso meu senhor não siga as tradições com um casamento
de Estado.
— Não. Ele não tomará uma segunda esposa. — Minha voz sai
aflita. Será que nunca me livrarei dessa ameaça?
O sheik aperta os lábios e meneia a cabeça.
— Ele terá que fazer, minha senhora. Não é um ponto negociável
com as tribos.
— Por que está aqui na minha porta? Eu não quero escutar isso —
retruco, tentando fechar a porta. Ele impede.
— Porque estou contando com o bom senso da senhora para
convencê-lo a tomar uma segunda esposa, pela paz de Kamar — o sheik
diz, seu tom inalterado e parecendo genuinamente preocupado.
— Deixe-me adivinhar: sua filha? — Atiro, levantando meu queixo.
— Não, minha senhora. A escolha cabe à Sua Alteza — diz ainda
calmo. — Mas neste momento ele precisa da sua compreensão.
— Não estou entendendo…
— A senhora precisa entender e aceitar os costumes do país de seu
futuro marido. Nosso príncipe não quer cumprir o dever porque claramente
está apaixonado e não quer magoá-la impondo uma segunda esposa. — Seu
olhar segura o meu, sério quando afirma: — Cabe à senhora chamá-lo à
razão antes que uma tragédia aconteça. A casa Al-Abdallah entrará em
desgraça caso ele insista ir contra as tribos. Perder o apoio dos clãs é a ruína
de um governante.
Eu engulo em seco. Odiando esse homem por vir aqui me dizer
essas coisas. Karim tem andado muito preocupado e sei que é por causa do
iminente enfrentamento com as tribos. Ele pode mesmo perder seu trono se
insistir em se casar comigo? A pergunta corrói minhas entranhas. O sheik
percebe meu abalo e torna a falar:
— Sim, princesa, ele pode perder o trono. Cada clã abrange uma
vasta região de Kamar e, se dois ou mais se juntarem numa guerra contra a
casa Al-Abdallah, não só Sua Alteza, mas a família inteira, será dizimada.
Eu engasgo. Meu corpo inteiro gelando. Não. Oh, meu Deus.…
Não. Lágrimas brotam em meus olhos e eu pisco, sentindo um aperto
horrível comprimindo meu peito.
— Eu devia dizer a Karim que está aqui, me atormentando com
essas histórias. — Tento não mostrar abalo, mas ele já viu minha fragilidade
e dúvidas.
— Tem todo o direito de ficar desconfiada, minha senhora. —
Continua ainda no tom irritantemente calmo. — Mas insisto, vá até lá e veja
como Sua Alteza está indo por um caminho que pode levar à sua ruína.
— Não. Eu não confio no senhor — digo, ainda tentando não lhe dar
ouvidos.
— Entendo perfeitamente o seu receio. — Acena. — Todavia, se
quiser ir conferir a votação, pegue o corredor à direita do escritório de Sua
Alteza e siga até o final… — O homem continua dando as coordenadas
para uma espécie de esconderijo nos fundos da sala de reunião. Me
pergunto se Karim sabe que o sheik está tão à vontade no palácio que já
conhece esses atalhos. Confere o relógio caro em seu pulso e adiciona: — A
reunião será retomada em poucos minutos. Pense no que lhe falei, princesa.
— Com uma reverência, ele se despede e toma seu caminho de volta.
Eu fico estática por uns instantes. Respirando irregularmente,
minhas mãos suando, abalada por tudo o que ouvi do homem assustador.
Não quero ir lá. Parece que estou fazendo algo errado, bisbilhotando uma
reunião para a qual não fui convidada. Porém, o sheik conseguiu plantar a
angústia dentro de mim. Decido ir e, antes que perca a coragem, marcho
para o elevador.
Alguns minutos depois, ando pelo corredor à direita do escritório de
Karim. Suspiro aliviada quando alcanço o final, não vendo ninguém para
me flagrar entrando sorrateiramente pela porta estreita. De acordo com o
sheik, leva aos fundos da sala onde está acontecendo a reunião. Está escuro
quando entro e vejo uma parede de madeira com detalhes vazados,
lembrando um confessionário. Dá para ouvir as vozes dos homens e, me
aproximando mais, observo através de uma das pequenas fendas. Karim
está de pé, lindo em seu traje formal, ladeado por seu tio e primos. Vejo o
pai de Latyfa entrar na sala e logo os líderes se reúnem ao redor da grande
mesa oval. Dá para sentir a tensão pairando no ambiente.
— A sessão está retomada, senhores. — O tio Jafar se adianta. —
Votaremos o pedido de Sua Alteza, respeitando a faixa etária de nossos
honrados sheiks.
— Eu e minha casa sempre servimos aos Al-Abdallah com honra.
— Um senhor, que deve ser o mais idoso do grupo, se levanta e faz uma
reverência respeitosa para Karim. — No entanto, não posso votar a favor de
Sua Alteza subir ao trono solteiro. Ainda mais sabendo que está em seus
planos tomar uma moça estrangeira como esposa, nos impondo uma rainha
que não escolhemos, que nada conhece da nossa cultura.
Meu coração afunda com o desprezo claro nas palavras e tom do
homem. Observo Karim. Vejo apenas seu perfil, mas seu maxilar trinca e
seus ombros expandem, mostrando o quanto a negativa do ancião o
desagradou. No entanto, ele não diz nada. Acho que é de praxe ouvir a
votação primeiro para replicar depois. Um a um, os líderes vão se
levantando e votando contra. Apenas El-Baham vota a favor, e me pergunto
se o homem está sendo sincero. É um massacre. Meus olhos estão ardendo,
cheios de lágrimas amargas. Eles não me querem aqui. Todos eles proferem
palavras de ofensa e preconceito contra mim. Como podem fazer isso? Nem
me conhecem. Não estão nem mesmo me dando a chance de mostrar quem
sou, que amo o seu príncipe, que faria qualquer coisa para poder estar ao
lado dele.
— Meu voto é não, meu senhor. — Outro diz. Eles são todos uns
hipócritas! Se inclinando, seus tons respeitosos, quando o estão soterrando
com suas malditas tradições.
— Eu também voto não, amiri. — Um mais novo diz. — Deve
seguir a honradez de sua casa e tomar uma mulher de nosso povo como
esposa. Essa princesa ocidental não merece qualquer respeito da nossa
parte, sendo a sua concubina, meu senhor.
E as lágrimas rolam pela minha face, quentes, dolorosas de
vergonha. Ele acabou de me chamar de prostituta do rei, como Latyfa fez
antes. E, então, percebo que jamais serei aceita por essas pessoas. Dói ouvi-
los me diminuindo porque sou uma estrangeira. Eu coloco a mão na boca
para me impedir de soluçar alto.
— Retire suas ofensas, sheik Malik. — A voz de Karim soa
estrondosa na sala. — Peça desculpas por ofender a minha mulher. Agora.
— Lhe devo respeito, Alteza. — O homem continua, parecendo
ultrajado. — Mas não para essa concubina disfarçada de princesa. Ela está
se deitando com o senhor, vivendo em pecado, portanto não terá nenhum
respeito da minha parte.
Soluço baixo, engasgando com as palavras ainda mais
desrespeitosas. Me apoio na parede e choro baixinho aqui, escondida, me
sentindo suja, indesejada.
— Prenda-o, Jalal! — Karim brada, cerrando os punhos. Sua
expressão é irada para o homem que me ofendeu. Jalal parece hesitar no
primeiro momento, então Karim volta a bradar: — Prenda-o, agora!
A sala inteira entra em comoção, muitas exclamações estupefatas, os
homens falando rápido em sua língua. Eu choro mais, percebendo o que El-
Baham havia alertado se concretizando na minha frente. Karim será
prejudicado por minha causa. Ele está me defendendo acima de seu povo, e
isso eles não vão perdoar. Jalal anda até o tal Malik e o pega pelo cotovelo,
arrastando-o até a saída. Karim dá alguns passos ameaçadores, ficando mais
perto dos homens. Eles se entreolham, surpresos, mas visivelmente
insatisfeitos com a postura de seu príncipe.
— O sheik Malik responderá por ofensa à Coroa — informa, e há
uma série de expressões insatisfeitas entre os líderes. — Que votem contra a
minha moção, eu posso até aceitar. Não gosto, mas aceito. No entanto, as
ofensas à mulher que amo e escolhi para esposa, isso não dá para aceitar,
senhores. — Há um breve silêncio, e então ele prossegue: — Continuem
com o massacre, não se intimidem — diz ironicamente.
— Eu voto contra a moção, porém, posso apoiar a união de meu
senhor com a princesa Anna Julia. — Outro líder se levanta. Ele não me
ofendeu e me chamou pelo nome, todavia sinto um “mas” em sua oferta, e
ele vem a seguir: — Se amiri concordar em tomar uma segunda esposa no
casamento de Estado que as tribos almejam.
Torno a forçar um soluço para dentro. Eles estão encurralando o
meu príncipe. Karim torna a cerrar a mandíbula, sua postura exalando uma
ira contida a muito custo. Seu tio coloca a mão em seu ombro, como que lhe
dando um aviso para se controlar.
— Eu não vou fazer um casamento de Estado, senhores. Pensei ter
deixado isso claro através do sheik El-Baham. — Ele diz em tom plano,
mas posso sentir sua raiva e decepção.
El-Baham se levanta e o encara com preocupação. Me pergunto até
onde sua lealdade vai.
— Pense melhor, amiri. Talvez a princesa Anna Julia entenda e
aceite que Sua Alteza tem um dever com seu povo. — O homem assustador
diz no mesmo tom calmo que usou comigo.
Meu coração parece que para enquanto espero a resposta de Karim.
Minhas mãos suam mais, meu corpo inteiro está tremendo diante do que
estou vendo. Só agora tendo a dimensão exata de como funcionam as coisas
por aqui.
— Eu a amo. Nunca tomarei uma segunda esposa, isso iria
machucá-la demais. — Meu príncipe diz, sua voz mostrando certo cansaço.
Meus olhos voltam a se encher de lágrimas, vendo-o lá, sendo
derrotado porque se apaixonou por mim, porque nos apaixonamos. Meu
coração dói quando percebo que não posso fazer isso com ele. Não posso
fazê-lo perder tudo por minha causa. Choro mais, meus ombros sacudindo
sem controle e mordo minha mão para evitar chamar a atenção para cá.
— Então, pressinto que teremos conflitos, meu senhor. — Outro
líder fala, a boca achatada com desapontamento. — Tenho certeza de que
todos os clãs aceitariam essa sua princesa, mesmo não sendo nossa primeira
opção, se amiri não fosse contra a tradição de sua casa.
— Eu não vou voltar atrás. Me casarei com Anna Julia, a mulher
que escolhi e amo. — Karim torna a garantir no tom solene de governante.
— E saibam que a forma como estão olhando para mim e minha escolhida
agora será determinante para como os verei de agora em diante.
— Vossa Alteza está nos ameaçando? — O ancião pergunta,
mostrando desagrado.
— Não sou homem de fazer ameaças, senhor. — Karim diz
enganosamente calmo. — Estou lhes dizendo que a forma como estão
lidando com meu pedido hoje influenciará nossas interações futuras. Isso é
um fato.
— Não vamos mudar de ideia, meu senhor. — O ancião informa. —
E solte o sheik Malik. Ele não ofendeu a Coroa, visto que a princesa ainda
não é sua esposa oficialmente.
— Não vou soltá-lo. Não importa se não oficializamos ainda, ela é a
minha mulher e, como tal, exijo que a respeitem. — Karim rosna baixo.
Há um silêncio tenso na sala, então o sheik El-Baham propõe:
— Sugiro adiar a votação. — Encara cada um de seus pares. —
Vamos deixar Sua Alteza pensar com calma sobre nossa contraproposta e
daqui a quinze dias retomamos, concordam, senhores? — Os homens se
entreolham e depois de um tempo acenam, concordando. El-Baham leva a
atenção para Karim. — Concorda, meu senhor?
— Eu não vou mudar de ideia, sheik. — Karim se mantém firme.
— Nem os clãs, amiri. — O ancião, com o qual já antipatizei, torna
a falar. — O senhor precisa escolher o que é mais importante, Alteza. —
Meu corpo gela antecipando o que o velho odioso vai dizer. — Sentar-se no
trono, honrando seus ancestrais, ou levar a cabo a paixão por uma
estrangeira.
E eu não suporto ouvir mais nada. Não consigo mais ficar aqui. Eu
tropeço para fora, minha visão turva de lágrimas. O trajeto de volta aos
nossos aposentos é como um borrão. Eu entro alguns minutos depois e ando
direto para o closet. Minhas faces são banhadas incessantemente enquanto
pego minhas malas. Meu coração dói absurdamente a cada peça de roupa
que coloco dentro. Termino de arrumar tudo e fico olhando os volumes,
ainda não acreditando que a vida que sonhei com ele e Ayla não será mais
possível. Ayla, minha princesinha. Soluço alto, o som reverberando no
quarto. Não posso deixar seu pai fazer a escolha errada e destruir a sua casa,
sua linhagem. Eu não conseguiria viver com essa culpa, e Karim em algum
momento se ressentiria de mim. Preciso decidir por ele, por nós. Não era
para ser. Eu engasgo e escorrego na porta do armário, caindo sentada no
chão. Olho o diamante rosa em meu dedo e minha visão borra novamente.
Eu choro mais e mais, deixando o som sair, os soluços me sacudindo, a dor
rasgando meu peito por ter de me afastar do homem que amo com tudo que
tenho.
Não sei quanto tempo passou até que o escuto entrando no quarto e
me chamando. Não respondo no primeiro momento. Sua voz fazendo as
lágrimas voltarem a brotar com força total.
— Anna? — Ele está na porta do closet e levanto minha cabeça,
nossos olhares se encontrando. Franze as sobrancelhas ao ver o meu estado,
em seguida, o olhar vai para as minhas malas prontas e uma expressão
atordoada toma seu semblante para, em seguida, algo desesperado cintilar
em suas íris escuras. — Habibti, o que houve? Por que está chorando? E o
que são essas malas.…
— Nós precisamos conversar. — Minha voz sai nasalada de tanto
chorar e me levanto. Ando, limpando meu rosto, e passo por ele, que ainda
está sem ação, indo para o quarto. Atravesso o cômodo, parando perto das
imensas janelas. A paisagem do deserto me recepciona e me sinto morrendo
por dentro, sabendo que nunca mais verei isso. Nunca mais estarei aqui.
Viro para Karim. Nunca mais estarei com ele como sua mulher. Talvez
nunca mais o veja. — Eu amo você. — Eu choro, não conseguindo me
conter, e ele avança, o rosto torcendo com preocupação e medo.
— Eu amo você também, ‘amira — diz com voz tensa, seus olhos
apreensivos. Estendo a mão, pedindo-o para parar. — O que está havendo,
Anna? Por que está nesse estado, habibti?
Eu o observo, bebendo cada detalhe dele em trajes formais. Vou
guardar tudo na memória. A forma como os olhos escuros são bonitos,
penetrantes, sua pele morena, seu porte imponente. Ele nasceu para ser rei.
Nasceu para cumprir seu destino e eu não tenho o direito de desviá-lo.
— Estou indo embora, Karim. — Dizer essas palavras me matam, e
a sensação horrível se intensifica quando vejo o efeito delas no homem que
amo. Ele fica estupefato. Não diz nada no primeiro momento, apenas me
observando, confusão em seu rosto bonito. — Eu ouvi a segunda parte da
reunião.
— Como?! — pergunta ainda mais surpreso. — Como ouviu?
Pondero se conto sobre a visita de El-Baham, mas percebo que não
importa mais.
— Eu descobri a porta de acesso nos fundos da sala. — Realização
desce em seu rosto, sua mandíbula trincando. — Eu ouvi e vi tudo, Karim.
— Sinto muito que ouviu tudo aquilo, ‘amira. Eu não vou ceder, eu
não…
— Eles jamais irão me aceitar, habib. — Choro, abraçando a mim
mesma, me sentindo tão desamparada e desiludida. — E não vou deixar que
me escolha acima de seu povo. Não conseguiria viver com isso, sabendo
que lhe tirei do trono.
— Eu não vou perder o trono, Anna. — Ele tenta se aproximar de
novo. — Eles terão que aceitá-la.
— Não, por favor, fique aí — peço com o coração pesado, doendo
demais olhar para ele. — Eles não vão ceder também. Pelo que ouvi, as
tribos estão dispostas a entrar em conflito com você e sua família, Karim.
Eu não posso mais ficar aqui, fingindo que não estou te destruindo.
— Pare com isso, por favor! Você é o meu amor. — Ele arranca o
turbante, jogando-o sobre um dos sofás. — Você me fez querer viver de
novo, ‘amira. — Seus olhos ficam brilhantes de lágrimas. — Perder você
vai me matar, é isso que quer, Anna? Isso sim me destruiria, ficar sem você.
— Não faz assim. — Torno a pedir, novas lágrimas queimando
minhas faces. — Não posso mais ficar. Não posso ser a responsável pelo
caos que está prestes a se instalar. Não posso. — Inconscientemente, toco a
minha corrente e fecho os olhos.
— É disso que se trata? — Sua voz sussurrada me faz encará-lo. Ele
tem o mesmo tom cansado que ouvi na reunião. Seu rosto é uma mistura de
devastação e um pouco de raiva. — É por causa dele, não é? — Aponta
para meu colar e me afasto um pouco, surpresa com essa pergunta e a
carranca descendo em seu rosto.
— O que está dizendo? — pergunto atordoada.
Karim sorri amargamente.
— Você não me ama o suficiente, Anna. Seja sincera e me conte a
maldita verdade! — Cerra os dentes, os olhos mais brilhantes. Ele passa as
mãos pelos cabelos soltos.
— Como não o amo o suficiente? Eu te amo tanto que estou abrindo
mão de você para que cumpra o que é esperado pelo seu povo! — digo de
volta, alterada, desolada.
— Não. Você o ama mais. — Uma lágrima rola pela sua face e ele a
afasta, irritado, os olhos duros e magoados cravados nos meus. — Você é
uma mentirosa, princesa. Me enganou com suas declarações vazias, mas
nunca tirou esse colar porque é a ele que ainda ama! Fale a maldita verdade
para mim ao menos agora, porra!
Suas palavras são como tapas na minha cara. De onde vieram essas
acusações? Ele estava se sentindo assim o tempo todo e não me falou nada?
— Não manche a nossa história com essas acusações, por favor —
murmuro, embargada, sentindo minha garganta fechando com o bolo se
formando nela.
Mágoa brilha em seus olhos bonitos e ele balança a cabeça,
negando.
— Você é a única manchando nossa história, princesa. — Seu tom é
duro. — Se for embora agora, eu nunca vou te perdoar por me deixar.
Minhas faces são queimadas com mais lágrimas e eu soluço,
querendo mais do que tudo me jogar em seus braços e nunca precisar partir.
Mas não posso. Isso o destruiria. Melhor tê-lo zangado e magoado agora,
mas ainda mantendo a paz em seu lar. Meu coração está comprimido, se
negando a aceitar o que meu lado racional sabe que é o único caminho. Eu
sou apenas uma forasteira.
— Eu não vou voltar atrás — digo com voz tremente. Seu maxilar
cerra, lágrimas descendo em sua face e ele me encara por longos e
dolorosos instantes. Então, gira nos calcanhares e começa a andar em
direção à porta. — Me perdoe, amiri. Eu vou te amar para sempre.
Karim para e torna a fechar os punhos, tensão emanando do seu
grande corpo. Me lança um olhar magoado por cima do ombro.
— Me desculpe, mas não dá mais para acreditar nisso — diz me
matando por dentro. — Apenas vá e prove que todos estavam certos, você
não passa de uma princesinha mimada, que provavelmente está sentindo
falta dos holofotes sobre si.
Ele sai apressado e eu caio no chão, um choro convulsivo me
tomando.
— Sinto muito, meu amor. Sinto muito — murmuro uma e outra
vez.
Eu fico assim por um tempo, mas sei que preciso sair. Preciso me
despedir de Ayla. Ligo para Jalal, solicitando um carro para me levar ao
aeroporto. Ele está tenso, mas me garante que haverá transporte e que o jato
real irá me levar. A princípio penso em recusar por não querer enfrentar as
memórias recentes de minha viagem a Londres com Karim e Ayla, mas
acabo aceitando por não querer enfrentar o movimento no aeroporto num
voo comercial. Meus olhos vermelhos e inchados agradecem. Quando
desligo, vou até o quarto de Ayla. Não é uma despedida fácil. Ela chora e eu
também. Nos agarramos e eu a levanto em meus braços, inalando seu
cheiro.
— Eu amo você, querida — murmuro embargada, afundando meu
rosto em seus cabelos.
Ela aperta meu pescoço, seu pequeno corpo sacudindo com os
soluços.
— Não vá embora, Anninha. Por favor, habibti. — Sua súplica corta
meu coração. Mas não há outro jeito.
— Eu preciso ir, habibti — digo, olhando seu rostinho banhado de
lágrimas. Encosto minha testa na sua e choro copiosamente. — Seja uma
boa menina. Cuide de seu papai para mim, está bem?
Ela acena e nos abraçamos um pouco mais. Nuria entrou no quarto e
nos despedimos também. Deixei abraços para Jalal e Zafyr, então, segui
para o aeroporto.
Cerca de vinte minutos depois, eu observo a paisagem desértica
passando através da janela da limusine. Quando estava entrando no carro, vi
Karim ao longe, na janela de seu escritório, na ala oeste. O orgulho não o
deixou insistir para eu ficar e agradeci. Ele precisa seguir em frente e
cumprir o seu dever. Quanto a mim, vou sofrer com mais um amor perdido,
só que dessa vez a dor é diferente porque ele está vivo. Apenas não pode ser
meu. Minha visão turva novamente. Pego meu celular na bolsa e decido
deixar uma mensagem de despedida.

Oi, amiri.
Sei que está com raiva de mim e não entende minha decisão. Mas
peço que nunca duvide do amor que sinto por você, por Ayla. Ele é imenso.
Meu coração está esmagado porque sonhei em ter vocês para mim.
Todavia, não podemos ir contra a realidade, habib, e a nossa é esta. Seu
destino é subir ao trono e honrar sua linhagem. Eu vou acompanhar e
torcer por você, mesmo de longe.
E sobre o colar… Estava esperando chegar em casa para guardá-lo
na caixa junto com as cartas de Nate. Ele sempre será o meu garoto
especial, mas você, Karim, é o meu homem especial. Eu vou guardar nossos
momentos em meu coração, para sempre. Seja o melhor rei que Kamar já
viu, habib. Eu amo você, amiri.
Anna.
Clico em enviar e sinto as lágrimas quentes em minhas bochechas.
Guardo o aparelho na bolsa de mão e limpo meu rosto, resignada. O som
está ligado tocando o ritmo árabe e pego minha câmera, me obrigando a me
distrair, registrando o caminho. Cada vez que olhar para essas fotos, sentirei
essa mesma dor. Jamais abrirei meu coração para outro homem de novo.
— Eu vou te amar para sempre, amiri. — Murmuro, perdida em
minha dor. Então, percebo cavalos se aproximando pelas laterais do carro.
Meu coração dispara, medo percorrendo minha espinha dorsal quando vejo
que os cavaleiros têm os rostos encobertos, como os que me sequestraram.
— Oh, meu Jesus! — Ofego, vendo uma espécie de van vindo em nossa
direção pela frente, forçando o motorista e segurança a frear bruscamente.
Eu puxo meu cinto e caio para o assoalho do carro, quando os tiros
começam.
— Fique aí dentro, princesa! Não saia por nada! — O outro
segurança, sentado no banco do passageiro, grita, sacando sua arma. Mais
tiros, e me atrevo a olhar para fora através dos vidros escuros. Os homens
estão descendo dos cavalos e vindo para perto. Mesmo com a adrenalina me
invadindo, eu os observo à procura de algo que os identifique e percebo que
um deles tem uma tatuagem no dorso da mão direita. É uma cobra naja. Em
seguida, noto mais alguns com a mesma insígnia. A coisa feia, com as
presas salientes de fora. Dá uma sensação ruim só de olhar. Eles podem ser
identificados por essas tatuagens? Meu Deus, espero que sim. Eu aproveito
que eles não podem me ver e tiro algumas fotos de corpo inteiro, e depois
focando apenas as mãos.
— Eu fui atingido! Wallah! — Olho o motorista gritando, segurando
a barriga, se curvando, evitando levar mais balas. Logo seu parceiro
também geme de dor e se curva, se sentando no assoalho do carro.
— Eles vão pegá-la! Há muitos deles, meu senhor! — Ouço o
motorista falando ao telefone. Com Karim? Não, provavelmente Jalal, que é
o chefe da guarda. Terror absoluto me engolfa quando mãos enormes batem
no vidro traseiro. Eles me descobriram. Oh, meu Deus! Aproveitando
minha posição agachada, enfio minha câmera debaixo do banco do
motorista, torcendo para que quando Jalal vier ou mandar alguém,
consigam encontrá-la. É com horror que vejo as portas da frente sendo
arregaçadas brutalmente e, em seguida, os seguranças machucados são
arrastados para fora. Meu coração retumba no peito. Não os deixe morrer,
meu Deus. Eu imploro. Eles estavam me guardando. Os proteja, eu imploro.
Respiro aliviada quando não ouço tiros, apenas vejo os homens arrastando
os guardas para a areia na lateral do asfalto. Eles estão ensanguentados, mas
vivos. Que Jalal não demore a enviar resgate.
Então, meu pavor dobra quando é a vez das portas traseiras serem
forçadas a abrir. Uma mão grande enfia em meus cabelos e me arrasta para
fora, sem qualquer gentileza. Eu seguro um grito, não querendo dar o
gostinho de me ver apavorada para esses infelizes. Ele me empurra no
asfalto e caio de joelhos, silvando de dor, sentindo meu jeans rasgando e
minha pele se ferindo com o impacto.
— Seu infeliz! Eu vou acabar com você! — Sibilo, lutando para não
chorar, agora por outro motivo. Eu estou sendo levada de novo. E agora não
sei se terei tanta sorte como da primeira vez.
— Me disseram que ela era assim, altiva… — O grandalhão ri alto,
jocoso, os outros seguindo-o. — Talvez o chefe deixe nos divertir um pouco
com a prostituta de Sua Alteza. Que tal, rapazes?
Bile sobe à minha garganta com a insinuação e ofensa do bandido.
Oh, meu Deus, não deixe que eu morra assim!
— Você devia ter ido embora quando teve a chance, princesa. — Ele
tira algo do bolso. Eles estão usando calças normais. É uma seringa. Eu o
chuto quando chega perto, o que só o faz rir mais. Faz um gesto com a
cabeça e logo dois comparsas agarram meus braços, me virando de bruços,
meu rosto machucando no asfalto quente. — Bem-vinda ao deserto, Alteza!
— O imbecil zomba e não posso mais frear as lágrimas. Vou morrer aqui.
Eu só queria poder ver o rosto de Karim outra vez.
Eu vou te amar para sempre, amiri. Esse é o meu último
pensamento antes da picada dolorosa em meu pescoço.
CAPÍTULO TREZE
“Nada pode ficar entre nós. Você e eu. Nem mesmo os deuses lá em cima
podem separar nós dois. Não, nada pode ficar entre você e eu. Oh, você e
eu…”
(One Direction – You & I)

Anna Julia
Abro os olhos, momentaneamente confusa. Tento me mover, mas
percebo que estou contida, minhas mãos amarradas atrás das costas, deitada
contra um chão duro, frio e fétido. Mesmo com a confusão, as lembranças
vão voltando e minha respiração trava ao recobrar o momento em que
cercaram a limusine e me sequestraram. Seguro um gemido angustiado. O
lugar está escuro, não consigo ver nada, mas isso não quer dizer que não
haja um ou vários bandidos por perto. Tento controlar o pânico e regularizar
minha respiração, enquanto apuro a vista, procurando enxergar algo, uma
pista de onde estou. Uma fresta na parede deixa passar um feixe de luz e
isso ajuda minha visão a se adaptar ao ambiente. Parece uma espécie de
alojamento e noto que está muito frio também. Movimento as pernas e um
pouco de alívio me toma, não sentindo nenhuma restrição. Me arrasto, me
posicionando sentada, e olho tudo com mais atenção. O teto é baixo e o
formato do cômodo é um retângulo. Me arrasto, apoiando as costas na
parede mais próxima. Sinto o frio em minhas costas, a parede é de metal.
Isso é um contêiner?
Minha boca está seca, muito seca, minha cabeça latejando, o que me
lembra da seringa, a agulha no meu pescoço. Os malditos injetaram drogas
em mim. Ouço vozes se aproximando e congelo, meu coração batendo de
pavor. Oh, meu Deus, eles estão voltando! Pense rápido, Anna! Pense! Eu
volto imediatamente à mesma posição de antes e fecho os olhos, tentando
regularizar a respiração e não dar pistas de que estou consciente. A porta se
abre e as vozes se misturam com choramingos. Espera, choramingos de
crianças. Meu coração corre mais depressa. Eles sequestraram crianças
também? Isso é muito baixo.
— Parece que a princesa ainda está nocauteada. Tem certeza que
não exagerou na dose? — Ouço uma voz jocosa, enquanto algo cutuca a
minha perna. Algo duro… Tento não entrar em pânico porque parece o cano
de uma arma.
— Essas princesinhas ocidentais… — A voz já conhecida bufa em
desdém. É o grandalhão que me puxou de dentro do carro e jogou no asfalto
sem qualquer cuidado. Ódio mortal ferve dentro de mim, rivalizando com o
medo. — Deixe a vadia. Melhor para ela acordar só na hora de morrer. —
Seu sorriso fica mais sinistro quando adiciona: — Ou com meu pau dentro
dela.
— Se você comer a vadia, eu quero também. — O outro fala e sinto
lágrimas queimando em meus olhos, horror ameaçando dominar meus
sentidos com os planos desses monstros para mim.
— Ainda preciso convencer o chefe a nos deixar foder a cadela. Dá
para acreditar nisso? O homem mata sua própria família, envenena qualquer
um que atravesse seu caminho, mas diz que tem certos “princípios”. — O
grandalhão zomba.
Minha mente começa a trabalhar, processando suas palavras. Quem
é esse homem asqueroso? Matou sua própria família? Oh, meu Jesus…
As crianças continuam choramingando enquanto ouço baques no
chão. Os malditos devem estar empurrando-os, sem qualquer cuidado,
como fizeram comigo. Estes não estão para brincadeira. Os primeiros que
me sequestraram não tinham esse nível de crueldade, acho. Pelo menos não
senti essa energia sinistra emanando dos outros como estou sentindo agora.
— Calem a boca, porra! — Outra voz irritada soa. Eles são muitos,
percebo em agonia. Dificilmente escaparei daqui com vida.
— Cara, não gosto de sequestrar crianças. — Mais uma voz vem na
escuridão. — Eu tenho irmãos pequenos…
— Você não vai chorar, vai? — O grandalhão zomba e ouço o som
de um tapa. — Concentre-se no objetivo final, seu veadinho! Nesse
momento, nosso chefe está articulando para explodirem os conflitos entre
os clãs e o príncipe. O sequestro e morte desses meninos serão colocados na
conta de Sua Alteza, caso o imbecil continue recusando um casamento de
Estado.
Oh, meu Deus! Oh, meu Deus.… É uma luta não fazer nenhum
barulho ao ouvir as revelações sombrias. A armação para Karim.
— O príncipe será morto se continuar a se recusar a cumprir com a
porra do seu dever. — Meu coração para, lágrimas silenciosas escorrendo
por cima do meu nariz. Aperto meus olhos com força, rogando a Deus que
não deixe isso acontecer. — A casa Al-Abdallah pode estar com os dias
contados.
— E a princesa? Precisamos mesmo matá-la? — Soa a mesma voz
que declarou não gostar de sequestrar crianças. Fico alerta, guardando-a na
memória para, quem sabe, me aproximar de seu dono em algum momento.
— Já derramamos sangue demais. Podemos libertá-la quando o príncipe
ceder…
Ouço um novo tapa cortando a fala do rapaz. Seu tom sugere que é
um jovem, presumo. E raiva me inunda, me vejo tomando suas dores
porque não parece tão ruim quanto seus companheiros.
— Vamos fazer o que o chefe ordenar, está entendendo? — A voz
do grandalhão soa ameaçadora. — Quem não está do nosso lado está contra
nós.
Não há mais reclamações depois desse ultimato.
— Quem bom que entendeu, primo. — O idiota debocha e
acrescenta: — Nassif ficará de guarda lá fora. O dia não vai demorar a
amanhecer e logo voltaremos.
— Posso ficar de guarda e… — O que nos defendeu ainda oferece.
— Não. Você é mole demais, seu mijão. — O imbecil continua
zombando do rapaz, e lá se vão minhas esperanças de me aproximar dele.
Não temos muito tempo. — Só vamos encontrar o chefe na nossa sede e
juntar mais homens, nos preparar para a guerra. Você vem comigo. Não me
faça arrepender de ter te trazido para o meu lado.
Depois disso, eles saem e permaneço quieta até não ouvir mais
vozes. Já é noite, madrugada, de acordo com o infeliz. Por isso, está tudo
tão escuro aqui dentro. Dormi o dia inteiro e parte da noite. Me deram uma
dose muito forte da droga. Torno a me arrastar na posição sentada, me
recostando à parede. Eu forço as mãos, testando as amarras. São cordas e
estão bem apertadas. Então, toco algo em meu pulso que me traz algum
alento: meu relógio. Ele tem um dispositivo de GPS que vai dar a minha
localização precisa. Suspiro, a euforia murchando um pouco. Não me
recordo de dizer a Karim sobre isso, e se ele não entrou em contato com
meus pais ainda, nunca saberá que posso ser rastreada. Minha garganta está
muito seca, preciso de água.
Forço minha mente a se acalmar tanto quanto é possível numa
situação dessas, e penso numa forma de atrair o vigia para dentro. Eu
poderia ao menos tentar aplicar alguns dos golpes de autodefesa que Karim
me ensinou nas últimas semanas. Se conseguisse pegar sua arma, ajudaria e
muito. Não sou nenhuma campeã de tiros, mas já estou razoavelmente boa.
Tenho de pensar em várias frentes aqui. Não é uma situação em que posso
hesitar. Preciso agir, tentar escapar daqui, e logo. A noite nos ajudará a
camuflar. Sim, porque não vou deixar essas crianças aqui à mercê dos
bandidos. Eu tenho de rir para a minha audácia, já contando que vou
escapar. Engulo em seco, uma parte minha se borrando de medo, mas a
outra parte, a que quer sobreviver, está gritando para a outra ficar quieta e
deixá-la tomar as rédeas. Olho em direção às crianças, amontoadas num
canto. Então, uma ideia surge…
— Qual o mais velho entre vocês? — sussurro em árabe, apurando a
vista para divisar algo além das pequenas silhuetas e murmúrios no escuro.
Eles param o choro na hora e o silêncio reina.
— Eu, senhora. Tenho quinze anos. — Uma voz de adolescente
sussurra e tento enxergá-lo, mas não consigo nada além de um vulto branco.
— A senhora é a princesa ocidental?
Esperança borbulha dentro de mim. Se o garoto topar me ajudar,
podemos sair todos juntos daqui. Não gosto de arriscar uma criança, mas é
isso ou esperarmos pela nossa morte, já anunciada ainda há pouco.
— Sim, sou Anna Julia. Qual é o seu nome, pequeno? — Tento ir
devagar para não o assustar com minha ideia.
— Youssef, senhora. — Ele murmura de volta. Sua voz é firme,
percebo. Não está tão aterrorizado quanto os outros menores. Isso é um
bom sinal.
— Vocês são quantos? — Continuo a rodeá-lo.
— Somos nove. Eles pegaram um filho de cada tribo. — O menino
diz. Noto que sua voz treme um pouco, mostrando que está abalado, afinal.
Não o culpo. Eu também estou aterrorizada, mas não posso me permitir
ficar aqui parada, esperando a morte.
Agora o plano revelado pelos bandidos faz sentido. Essas crianças
pertencem aos clãs tribais e quem quer que seja o mentor por trás disso
tudo, realmente vai fazer com que Karim pareça culpado. Relembrando a
tensão daquela reunião, os líderes não duvidarão. Isso não pode acontecer.
Torno a rogar a Deus que não permita que tamanha atrocidade aconteça.
— Youssef, não temos muito tempo até aqueles homens voltarem…
— Torno a falar, adrenalina começando a me percorrer. — Escute o que
estou pensando, por favor. Nós dois precisamos trabalhar juntos para
conseguirmos sair daqui. — Lambo os lábios ressequidos pela falta de água.
Estou sentindo os efeitos da droga, mas agora sei que também é falta de
hidratação pelas tantas horas que estou sem beber. — Está amanhecendo,
pelo que os malditos disseram. Não há tempo. Precisamos agir agora.
— Como, senhora? — O garoto deixa transparecer a urgência e o
medo em sua voz.
— Vou atrair o vigia aqui para dentro. Estou com sede e vou usar
isso para ter o homem perto de mim. Uma vez que minhas mãos estão
amarradas, ele precisará me dar água na boca — murmuro. — Seus pulsos e
pés estão contidos?
— Apenas as mãos, senhora — responde com uma nota de
desconfiança.
— Ótimo! Eu sei que é difícil, mas procure ficar calmo. Vamos
fazer assim… — Sussurro, forçando meu tom a lhe passar confiança e
explico devagar meu plano para dominarmos o vigia.
— Eu não sei se consigo, senhora. — O garoto soa em pânico.
— Consegue, Youssef. Precisamos tentar ou seremos todos mortos.
Você ouviu os planos deles para nós — digo com meu coração na garganta.
— Eles vão voltar, e quando o fizerem, será para nos matar. — Os
choramingos dos menores recomeçam e me desespero. — Não, pequenos,
eles não vão nos encontrar quando voltarem. Estaremos longe. — Tento
contê-los. — Youssef, por favor, os acalme. Nós vamos sair daqui se
trabalharmos juntos. É a nossa única chance.
Faz-se um silêncio angustiante.
— Está bem, senhora. Eu vou ajudá-la. — Ele diz e eu expiro.
Novo silêncio se segue enquanto meu cérebro tenta enviar os passos
do plano para meus nervos, para que se controlem. Respiro fundo. Oh,
Jesus, é agora. Tem de ser agora.
— Tem alguém aí? Por favor, estou passando mal. — Minha voz
nem precisa de encenação, está fraca; medo, fome, sede debilitando meu
corpo. — Preciso de água. Por favor! — Ouço um resmungo e em seguida
silêncio. Volto a implorar: — Por favor, apenas um pouco d’água!
Depois de uns instantes, um homem abre a porta e a deixa assim,
permitindo a luz da lua entrar no recinto. Meu coração salta com força,
agradecendo a Deus por essa bênção. Com a claridade, podemos enxergar
melhor o nosso captor. Não olho na direção de Youssef para não dar
bandeira, continuo recostada à parede, passando uma imagem pior do que
realmente estou. O homem deixa seu fuzil modelo AK-47 encostado na
parede, perto da entrada, e vem para perto com uma garrafa de água
mineral. Ele se abaixa e meu olhar capta uma arma presa no coldre em seu
tórax. É uma 9 mm, estou familiarizada com essa. Há uma faca presa em
seu cinto também. Seu rosto está encoberto, como os primeiros que me
sequestraram. Só que a maldade nos olhos escuros deste faz um arrepio
gelado descer pela minha coluna. Ele pega meu queixo e coloca o gargalo
na minha boca. Eu abro, meus olhos se enchendo de lágrimas ao sentir o
líquido refrescante descendo pela minha garganta. Ele sorri, o som
desdenhoso, despejando mais em minha boca, quase me afogando. Eu
tusso.
— Nessas horas a princesinha dá valor a um simples gole d’água,
não é? — Ele zomba, a voz desconhecida. Não é mesmo o outro que não
queria me matar. Me sinto menos mal pelo que estou prestes a fazer com
este. O homem retira a garrafa da minha boca e sua mão apalpa meu seio
direito. Eu engasgo, mais lágrimas ardendo em meus olhos. Estas, de
ultraje. — Eu vou comer sua boceta aristocrática, sua cadela. — Rosna e
bile sobe à minha garganta. Ele rasga a minha camiseta e abaixa o sutiã, as
mãos grosseiras amassando meus seios. — E vai ficar bem quietinha.
Quando os outros chegarem, você não vai falar nada, entendeu?
Eu fico paralisada por alguns momentos, enquanto o maldito me
molesta, tentando abrir meu jeans. Ele se agiganta sobre mim, abrindo as
pernas e, então, reajo em meio ao completo pavor de ser estuprada. Puxo
meu joelho para trás e solto o pé com toda a força da perna, num chute em
suas bolas. O grunhido alto me enche de raiva e repito o chute rapidamente,
atingindo-o de novo. Youssef vem para perto e puxa a faca que estava em
sua cintura.
— Filha da puta! — O estuprador de merda grunhe, tombando para
o lado, e eu me coloco de pé, Youssef se juntando a mim. Então, nós o
chutamos com força na barriga, na cara, não lhe dando chance de levantar.
— Seu monte de lixo! — Eu rosno, ira se juntando à adrenalina.
Dou um chute raivoso em sua cabeça, lançando-a para trás, e ele geme,
parecendo prestes a perder a consciência. — Vai aprender a não tocar nunca
mais numa mulher com essas mãos sujas, seu maldito! — Dou mais um
chute em seu queixo e o bandido enfim tomba, de olhos fechados. O
nocauteei. — Rápido, Youssef! Tente cortar suas cordas e depois as minhas!
Ele não vai ficar desacordado por muito tempo!
As mãos do menino estão amarradas à sua frente, graças a Deus! Ele
pega a faca pelo cabo e força a lâmina nas cordas, desajeitadamente. Eu
apenas olho, torcendo para que consiga ou estaremos fodidos quando esse
monte de lixo acordar. Enquanto isso, me abaixo e me contorço, puxando a
9 mm do coldre do homem abatido no chão. Coloco-a sobre uma pequena
mesa, que agora é visível com a luz entrando pela porta. Youssef consegue
se libertar e sorrimos os dois. É um riso desesperado, ainda não totalmente
aliviado porque sabemos que não temos muito tempo. Ele empurra a lâmina
afiada em minhas cordas. O homem no chão geme e meu coração salta, mas
o último elo se parte, e então eu pego a 9 mm e aponto para a cabeça do
maldito.
— Não ouse se mexer, filho da puta! — Ele abre um olho inchado
dos nossos pontapés e então o arregala, espanto tomando sua íris escura. —
Vire-se de barriga para baixo e coloque as mãos nas costas. Meu amigo vai
amarrar seus pulsos. — Ele tenta rolar e alcançar Youssef e eu atiro em sua
perna.
— Porra! Sua cadela, você atirou em mim! — Urra de dor, as mãos
indo para o ferimento na coxa. Eu tremo, o medo, a adrenalina zumbindo
em meus ouvidos. Meu Jesus! Atirei em um homem! Por um momento
estou perto de hiperventilar, mas forço o pânico a retroceder. Depois posso
cair, desmaiar, vomitar, como na primeira vez que passei por isso. Bem, não
exatamente dessa forma, visto que aqueles homens não me fizeram nenhum
mal e nem ameaçaram me violentar. Há uma diferença entre aqueles
insurgentes e estes.
— O próximo será nessa sua cabeça cheia de merda, seu maldito! —
Ranjo os dentes. Ele está estupefato, posso ver o medo em seus olhos. —
Vire-se, eu não vou falar outra vez!
Com um olhar mortal, ele se vira e leva as mãos para trás das costas.
Youssef se aproxima, meio relutante, mas o amarra, reaproveitando as
cordas que estavam nos prendendo. — Amarre os pés também, Youssef. —
Oriento e o bandido me dá mais um olhar feio. — Foi um erro deixar
nossos pés livres, como já deve ter percebido. — Eu zombo, ainda muito
irada com esse infeliz que ousou colocar as mãos sujas em cima de mim.
Quando Youssef termina, me encara. — Reviste todos os seus bolsos,
amigo. Pegue tudo. Ele não pode se libertar para nos perseguir. — Torno a
orientar e o garoto olha tudo, encontrando mais dois canivetes e uma arma
menor que não me recordo o nome. — Pegue-a. Você sabe atirar? —
pergunto e o menino assente.
Respiro um pouco mais aliviada.
— Nós vamos conseguir sair daqui. O príncipe já deve estar me
procurando. — Bem, assim espero. — Vamos desamarrar os outros e sair o
quanto antes.
Nós libertamos todos os pequenos, que ainda estão com olhares
assustados, as roupas sujas.
— Quando os pegaram? — pergunto a Youssef.
— De manhã. — O menino está olhando para mim como se eu fosse
alguma heroína, os olhos escuros brilhando de admiração. — Shukran,
minha senhora.
Olho-o mais detidamente. É franzino, o rosto fino, bonito, ainda
com aparência de menino. Sorrio-lhe.
— Obrigada você também. Sem sua ajuda não teríamos conseguido.
Agora vamos. — Ajeito meu sutiã e blusa rasgada da melhor forma que
consigo e tomo a frente para a saída. A AK-47 me chama a atenção perto da
porta. Ela tem um coice forte como o de um cavalo, mas se quiser aumentar
nossas chances, tenho que usá-la. Não é hora para ser mulherzinha.
Decidida, enfio a 9 mm no cós da minha calça jeans e pego a arma
imponente. É pesada, e a possibilidade de eu ter que atirar em alguém com
isso me aterroriza. Ela é mortal. Até agora há pouco eu só havia atirado em
alvos e coisas inanimadas. Meu corpo ainda está tremendo. — Fiquem atrás
de mim. Não sabemos o que há lá fora. — Oriento e saio.
Quando piso fora, a brisa do deserto me bate no rosto. A sensação
de liberdade é gostosa, porém, não tenho tempo para apreciá-la. Há muitos
homens chegando, neste exato momento. Eu estaco, meu coração quase
saindo pela boca, me vendo sob as miras de suas armas, tão mortais como a
que estou segurando.
— Ora, ora, o que temos aqui… — O grandalhão que me hostilizou
diz num tom baixo e letal. Sua AK-47 apontada para mim. Meu sangue se
transforma em gelo. Meu corpo inteiro treme mais e mais. É o meu fim e
dessas crianças. O conhecimento disso faz meus olhos turvarem. O homem
sorri, um sorriso sinistro. — Me entregue essa arma, princesa, antes que
atire em seu próprio pé. — Debocha e uma onda de risos masculinos ecoa à
sua volta.
Meu sangue esquenta com a zombaria e preconceito com o meu
sexo. Eu levanto a arma, lutando para controlar o tremor em meus ombros.
Miro em sua cabeça e ele se afasta um passo, os olhos estreitando, a mesma
surpresa de seu comparsa dominado dentro do casebre tomando seus olhos
maus.
— Mande o resto da corja abaixar as armas ou estouro seus miolos,
seu filho da puta! — Rosno, mesmo sabendo que esse meu fim é aqui. O
conhecimento disso faz meus olhos transbordarem. Nunca mais verei as
pessoas que amo. É aqui o fim.
— Não sei como fez, mas deve ter se livrado do imbecil do Nassif,
se está de posse da arma dele. — Ele rosna, então, torna a sorrir, zombando:
— Mas duvido que consiga acertar um de nós com essa belezinha. Ela
exige controle e força, coisa que você, uma coisinha delicada, não teria.
Eu continuo mirando sua cabeça.
— Com uma cabeça desse tamanho, você é um alvo ambulante, seu
infeliz. — Debocho. Ele ameaça vir para frente. — Fique aí, seu maldito!
— Miro numa lata jogada na areia e meto bala. A lata se estilhaça para
todos os lados e ele para, os olhos arregalados. Eu sinto o coice do disparo
em meus ossos, mas me mantenho firme, voltando a mirar sua cabeça, com
rapidez. — A próxima vai derramar seu cérebro de merda no chão!
— Você é uma cadela corajosa, princesa. Tenho que admitir isso. —
Encara a casa atrás de mim. — Mas aqui é o seu fim, sabe disso, não é?
— Vamos explodir essa putinha! — Um deles fala, mas não tiro
minha atenção do líder.
— Mande-os largarem as armas ou te mato! Eu não estou blefando!
— Brado, lágrimas descendo pelas minhas faces.
Eles não obedecem. Devem estar vendo o medo em minha
expressão. Então, miram suas armas para mim e eu me preparo para ser
alvejada. Pai, mãe, Lipe, eu amo vocês. Karim… Adeus, meu amor. Eu
soluço, meu corpo sacudindo, o frio da morte me rondando. Levanto meu
queixo, me recusando a morrer como uma covarde. Nesse momento um
som alto, seguido de outro estrondo assustador, soam bem atrás deles,
levantando areia e jogando em nossa direção. Eu não conto história,
aproveito o momento de distração e corro de volta para a segurança do
contêiner.
— Se deitem no chão, meninos! Agora! — Grito para as crianças,
que estavam na porta, mas voltaram quando nos deparamos com o bando.
Me jogo no chão, imediatamente volto a segurar o fuzil em posição de fogo.
Agora a situação é diferente. Se vierem, vou derrubar alguns. Minhas
chances são maiores, embora me aterrorize ter que matar um ser humano.
A conversa que tive com Karim em uma das primeiras vezes que
treinei tiros com ele me vem à mente:
— O pensamento na hora da mira é para matar, habibti — disse
numa voz escura, de quem está preparado para lidar com a morte. —
Espero que nunca precise se defender contra outro sequestro de novo, mas
começo a pensar que é útil que minha mulher saiba manejar armas.
— E se eu não quiser matar meu oponente? — questionei,
apreensiva.
— Quando se parte para usar armas, é porque as opções civilizadas
se esgotaram, ‘amira. — Seu tom ficou mais sério. — A não ser que tenha
um bom motivo para deixá-lo vivo, em caso de combate direto, você não
pode hesitar. Seu inimigo não terá a mesma consciência que você, acredite
em mim. Você é mulher, tem aparência delicada, precisa ser letal. Não é
machismo, mas não dê a chance de seu inimigo encontrar uma fraqueza e
te dominar.
— Não vou hesitar — digo em voz alta, como que para me dar
forças para fazer o que for preciso. — O primeiro que vier, eu derrubo.
Os meninos estão choramingando de novo. Mais um barulho alto lá
fora. Parece o som de uma bomba. Não que já tenha escutado uma
estourando assim. Então, os tiros começam e meu coração salta
vertiginosamente, alegria me invadindo. Oh, meu Deus, meu resgate
chegou! Karim… Ele veio me salvar dessa vez também? Permaneço
deitada, em posição de abrir fogo, ouvindo os tiros, vozes alteradas. Os tiros
vão diminuindo até pararem completamente. Meu coração está quase
saltando para fora sem saber quem vai passar por essa porta.
— Anna? Você está bem?
Um soluço me escapa, meu corpo inteiro sacudindo de alívio ao
escutar a voz tão amada. Karim… Amiri. Eu choro, soluçando alto.
— ‘Amira… — Sua voz está angustiada, aliviada, urgente. — Fique
calma. Eles estão todos no chão. Vou entrar agora, está bem? — Anuncia e
pisa no batente da porta. Seus olhos vêm imediatamente para mim no chão,
ainda segurando o fuzil, meu rosto uma bagunça de lágrimas. Ele pragueja
em sua língua e se abaixa, retirando a arma da minha mão. Pega meus
ombros, me ajudando a levantar. Estou tremendo, parece que todo o terror
da situação caiu sobre mim de uma vez, o que é absurdo, uma vez que estou
salva. Seus olhos notam minha blusa rasgada e um brilho mortal tinge suas
íris escuras. — Eles te machucaram? Eles…
— Não, não. — Nego balbuciando. — O único que tentou está ali,
amarrado. — Indico o estuprador preso no canto. Os olhos do homem
ampliam, ainda mais aterrorizados. Ele sabe que está mais do que fodido
agora.
Karim ruge e encara o homem, fúria exalando de seu corpo grande.
— Jalal! Entre e pegue esse verme! Quero interrogá-lo
pessoalmente, mais tarde! — Brada para seu primo.
Em seguida, ele retira uma de suas túnicas e a passa por cima da
minha cabeça, me fazendo lembrar de outra noite. A noite que mudou
nossas vidas. Lágrimas frescas enchem meus olhos. Nossa situação ainda é
a mesma. Preciso ir embora e ele tem um dever a cumprir. Vejo o mesmo
conhecimento e aceitação em seus olhos escuros quando nossos olhares se
encontram de novo e se prendem numa conversa silenciosa. Limpo a
garganta, me afastando de seu toque, meu coração pesado, doendo demais.
— Shukran por vir me buscar de novo — digo engasgada. Seus
olhos intensos me fixam sem piscar e ele engole em seco.
— Precisamos sair agora. Os helicópteros estão a alguns
quilômetros — diz sem desviar os olhos dos meus. — Você foi muito
corajosa — murmura; orgulho, amor, mágoa e resignação brilhando em seu
olhar intenso.
— Você me salvou. Nosso treinamento me ajudou a tentar lutar de
volta — murmuro, limpando uma lágrima antes de ela cair. — Essas
crianças estão desidratadas, traumatizadas e machucadas. Posso usar um
dos helicópteros para levá-las a um hospital.
— Você está bem para pilotar? — pergunta, o olhar correndo pelo
meu corpo.
Meus joelhos estão rasgados e o lado direito do meu rosto está um
pouco machucado também, de quando me jogaram no asfalto. Mas, tirando
isso, estou bem agora que estamos a salvo.
— Sim — digo simplesmente. Ele me sonda por alguns instantes e
acena.
— Então, vamos! — Chama, encarando os meninos. — Vocês
estarão de volta às suas casas em breve. Estão a salvo agora.
— A princesa Anna Julia é muito destemida, meu senhor — Youssef
diz, se curvando numa reverência respeitosa.
Karim volta a me olhar. Vejo a mesma mistura de emoções
cintilando em seus olhos.
— Sim, ela é — murmura. — Você vem em meu cavalo e os
meninos irão com os guardas. — Anuncia e vira as costas.
Nós o seguimos para fora. Eu monto em sua garupa. É um garanhão
negro, mas não Hércules, devemos estar muito longe do palácio. As
lembranças se misturam em minha mente conforme ele atiça o cavalo numa
corrida intensa. Cortamos o deserto, deixando o contêiner e muitos corpos
destroçados para trás. Tenho que rodeá-lo com os braços, para aderir melhor
e facilitar sua cavalgada. Inalo seu cheiro, querendo arrastar esse momento
para sempre. Porém, rápido demais chegamos aos dois helicópteros. Eu
salto e Karim em seguida. Os meninos são levados para dentro do que já é
familiar para mim. Eu ando em direção à aeronave, sentindo-o às minhas
costas. Abro a porta do piloto e fecho os olhos por um momento,
procurando forças para me despedir dele de novo. Os reabro e me viro,
encontrando seu olhar brilhante. Nos olhamos fixamente por um tempo
longo, até que ele limpa a garganta.
— Seu pai está vindo lhe buscar — diz numa voz tensa. — Demorei
a avisá-lo que estava em perigo de novo. — Sua mandíbula trinca. — Tenho
que me desculpar por colocar a vida de sua filha em risco.
— Não é culpa sua — rebato. — É o seu país, a sua casa. Eu que me
enfiei aqui impulsivamente e…
Seus olhos ficam mais intensos e vejo a dor tomando seu semblante
ao fitar o meu colar. Eu o pego instintivamente e seu olhar fica duro.
— Não vamos lamentar, Anna. — Seu tom é de despedida e novas
lágrimas turvam meus olhos. — Cuide-se, ‘amira. — Sussurra asperamente
e vira as costas, cada passo que dá para longe de mim me matando.
— Cuide-se também. — Soluço baixinho e subo no helicóptero.
Dou uma olhada nas crianças amontoadas atrás. Infelizmente não é hora
para se preocupar com os cintos. O perigo é outro. — Quem não está com
cintos, sente no chão e se agarre a alguma coisa com força. Mantenham-se
firmes, meus amiguinhos. — Eles acenam, seus choramingos mais fracos
agora. Coloco o fone de ouvido e aciono os comandos no painel.
Olho de lado e vejo Karim abrindo a porta do piloto do outro
helicóptero, onde Jalal o espera no banco do passageiro. Ele para, virando a
cabeça, nossos olhares buscando um ao outro, mesmo que não consigamos
nos ver claramente sob a luz da lua. Com um aceno de cabeça, ele sobe.
— Adeus, amiri — murmuro sentindo meu coração se partir em
pedaços. Então, eu decolo, nos tirando da zona de perigo.

***
— Você está bem, querida? — Meu pai pergunta, seu semblante
sério, quando nos acomodamos no jato três horas depois. O dia está claro.
Ele chegou há duas horas, me encontrando no hospital, onde os meninos
foram atendidos e eu também.
— Não, pai — murmuro com voz quebrada e seu rosto suaviza na
poltrona à minha frente. — Vai demorar um tempo para que eu fique bem
de novo.
Nenhuma quantidade de tempo irá me fazer ficar bem outra vez.
Sinto em minhas entranhas. Essa perda me marcará para sempre. Mas não
posso dizer isso ao meu pai e deixá-lo ainda mais preocupado do que já
está. O avião da Harper começa a taxiar, se preparando para decolar, e olho
pela janela a bela Jawahra passando rapidamente conforme a velocidade
aumenta. Quando levantamos voo, minhas lágrimas descem pelas faces. Eu
pensei, sonhei, eu quis egoisticamente que ele viesse atrás de mim. Que me
pedisse para não ir embora. Mas ele não veio. Ele não podia.
— Lipe está pensando em fazer uma viagem com você. Só vocês
dois, o que acha, princesinha? — Meu pai tenta me animar.
— Eu vou gostar, papai. — Sussurro, tentando abrir um sorriso e
falhando. — Obrigada por vir me buscar. — Embargo e seus olhos ficam
brilhantes de emoção.
— Eu e sua mãe quase morremos de preocupação, filha. — Diz
ferozmente e puxa uma respiração aguda. — Mas o importante é que está
indo para casa agora. — Eu aceno, me sentindo drenada de tanto chorar. —
Descanse um pouco, querida. Logo estará de volta em sua casa e tudo ficará
melhor. — Seu tom é cheio de amor.
Assinto e ele abre seu notebook, passando a encarar a tela do
aparelho, me deixando ter um tempo comigo mesma. Olho para fora de
novo, a cidade ficando pequena, meus olhos vão para a vastidão do deserto
abaixo de nós. Tudo em mim dói pela injustiça disso tudo. Nosso breve
tempo juntos passa em minha mente. Tudo que vivemos. Uma lágrima
grossa e dolorida rola, queimando a minha face. Suspiro trêmula e desolada.
— Seja o melhor rei que esse país já viu, meu amor — murmuro
quase para mim mesma. — Adeus, amiri.

Vinte e duas horas antes…


Karim Amihaj
Deixo o quarto e saio sem destino pelo corredor, tendo dificuldade
de registrar o que acabou de acontecer lá dentro. Não posso acreditar que
ela está me deixando. Eu vou vencer essa queda de braço com as tribos. Eu
a tornaria a minha rainha contra tudo e todos, mas parece que isso não é
suficiente. Meu coração aperta, a desconfiança de que Anna esteja usando a
instabilidade em meu país para ir embora é tão dolorosa quanto plausível. A
percepção de que não está disposta a esquecer o seu primeiro amor me
massacra. Ela mentiu para mim. Seus sentimentos por ele são maiores do
que os que desenvolveu por mim. Não sou tolo, porra. A corrente ainda está
lá em seu pescoço e ela não pretendia tirá-la. Eu me entreguei por inteiro,
enquanto a princesa me entregou apenas pequenas partes dela.
— Primo? — A voz de Jalal me tira da névoa dolorosa. Seu cenho
franze ao estudar meu rosto. — Algo errado?
Eu bufo e me dirijo para um dos salões dessa ala que usamos para
reuniões menores.
— O que não está errado hoje, primo? — resmungo, entrando,
sendo seguido por ele. Ando até as janelas amplas e enfio as mãos pelos
cabelos, expirando cansado. — Anna está indo embora — murmuro.
— Embora?! — Surpresa tinge seu tom. — Por quê?
Me viro para meu primo, apoiando-me no batente. Passo as mãos
pelo rosto.
— Ela ouviu a segunda parte da reunião, Jalal. — Digo e meu primo
comprime os lábios.
— Como? Você mostrou o fundo falso da sala? — inquire
ressabiado.
Eu franzo o cenho, só agora percebendo que ela não me disse como
descobriu. Eu não contei nada, aquela passagem é secreta. Ou era. Bufo.
— Não, mas ela descobriu de alguma forma e ouviu tudo, cada
palavra de ofensa dita por aqueles homens miseráveis e gananciosos! —
Ranjo os dentes. Mesmo irritado por ela ter me enganado sobre seu amor, as
ofensas não serão esquecidas. Seus sentimentos por mim podem não ser tão
profundos quanto pensei, mas os meus por ela são.
Jalal me observa atentamente, seu rosto franzido em concentração.
— Vocês conversaram sobre isso? — pergunta.
— Eu cheguei no quarto e a encontrei de malas prontas, Jalal. Não
há muito a ser feito nesse sentido — respondo.
Ele comprime os lábios.
— Sinto muito, Amihaj. Como está se sentindo?
— Como se alguém estivesse arrancando meu coração, não se
importando com a minha morte. — Ranjo. — Ela veio com uma conversa
de que está indo para que eu possa cumprir o meu dever.
Meu primo me estuda em silêncio por um tempo.
— Ela te ama, Amihaj. Isso é visível para qualquer um que a tenha
visto com você ou Ayla nos últimos meses — murmura, sério.
Ayla. Wallah, minha filha vai sofrer tanto com esse desprezo.
— Besteira! — Ira me toma. — Ela está arrependida de me dar, nos
dar uma chance. Brincou comigo e com a minha filha.
Ele meneia a cabeça, seu rosto franzindo.
— Anna é uma garota inteligente, primo. Percebeu que as tribos não
vão ceder e não quer complicar a sua vida — diz firmemente. — Ela ama
você e Ayla. Não seja leviano.
Eu não quero ser leviano. Não quero ter raiva dela, mas, neste
momento, estou desolado pela facilidade com que está indo embora. Pelo
ciúme de um garoto morto me corroendo.
— Que porra de amor é esse que faz a pessoa se afastar da outra? —
Explodo. — Ela não é a garota que pensei que fosse. Me enganou
direitinho.
— Você está sendo irracional. Não haverá acordo com as tribos,
primo. Depois dessa reunião, ficou muito claro. — Me sonda com interesse.
— Ou está pensando em tomar uma segunda esposa? Só assim os líderes
permitirão que se case com Anna.
Faço uma careta, enfiando as mãos pelos cabelos de novo. A
sensação de impotência, ódio dessa tradição ridícula, me deixando irado.
Sempre me orgulhei do meu nome e origem, mas agora odeio que isso
esteja mandando embora a mulher que me fez viver de novo. Eu ainda a
quero. Mesmo sabendo que não me ama o suficiente, eu ainda queria ter a
chance de poder fazê-la me amar mais. Meus olhos ardem com lágrimas de
desilusão, a dor queimando em meu peito.
— Eu a amo. Nunca tomaria uma segunda esposa. — Expiro,
cansado. Meu primo acena, desconforto claro em seu rosto.
— Você precisa deixá-la ir agora. Sinto muito se não é o que precisa
ouvir neste momento, primo. — Seu tom é sentido. — Mas a situação aqui
só tende a piorar. As tribos se sentiram afrontadas pela prisão do sheik
Malik. Meu medo é que se unam para retaliar.
— Que se unam! Que venham! — Rosno, fora de mim. — Estou
cansado dessa merda, Jalal. Não vou mais me curvar às vontades daqueles
homens, que amam enriquecer à minha custa, mas não abrem mão de uma
maldita tradição em meu benefício.
— As tribos estão no sistema de governo de nosso emirado há quase
um milênio, Amihaj. — Seu tom é preocupado agora. — Sabe que estou do
seu lado para qualquer coisa. Minha lealdade é ao meu príncipe e primo.
Morrerei por e com você se for necessário, mas precisa pensar com calma
no próximo passo em relação aos clãs. Nenhum governante se levantou
contra as tribos antes…
— Shukran, primo. — Respiro profundamente. — Tenho me
perguntado se os clãs são realmente necessários em nosso emirado, para o
governo, quero dizer. — Ele franze mais o rosto. — Eles se distanciaram
muito do que foram em séculos passados, primo. Talvez seja a hora de
criarmos outro sistema de governo.
— Que seria…?
— Tenho pensado em uma monarquia parlamentar, como na
Inglaterra e… — Meu coração aperta ao completar: — Ardócia.
— Uma guerra vai se instalar, esteja certo. — Ele diz numa voz
fatalista. — Eles nunca abririam mão do poder facilmente.
— Só há uma forma de mantê-los — digo, minha determinação
firme. — É eles se curvarem à autoridade do governante.
— O que vai fazer, então? — questiona.
— Nós vamos para a guerra, primo — digo, meus olhos não
desviando dos seus. — E nós vamos vencer.
— E depois? — inquire, seu olhar perspicaz me sondando. — Irá
trazer a princesa de volta?
Desvio o olhar para fora da janela.
— Receio que a razão da partida da princesa não seja exatamente a
instabilidade em meu país.
— Não seja um burro, Amihaj. — Ele rosna. — Quando tudo se
resolver, se não for atrás dela, será um grande tolo. Anna está sendo
rechaçada pelo seu povo. Tente se colocar no lugar dela.
Trinco o maxilar, tentando endurecer meu coração e aceitar o fim de
algo que sonhei ser para o resto da vida.
— Você a defendeu ferrenhamente naquela reunião. Para onde foi
todo aquele ímpeto?
Expiro lentamente.
— Esse assunto está encerrado. Providencie o jato para levá-la —
digo em tom definitivo.
Seu celular toca em seguida.
— Anna. — Ele atende, e suas próximas palavras aumentam a dor
em meu peito: — Claro. Um carro irá levá-la ao aeroporto. O jato estará lhe
aguardando. — Ele a ouve. — Por nada. Foi um prazer conhecer você
também. — Meu primo parece desconfortável agora. — Faça uma boa
viagem, Anna.
Um silêncio se instala entre nós. Exalo pesado.
— Cuide para que ela embarque em segurança, primo. — Minha
voz é apenas um fio. Jalal acena e em seguida me deixa sozinho.
Depois de alguns minutos, eu decido ir para o meu escritório na ala
oeste, bem longe. Preciso me manter distante para não sucumbir à vontade
louca de voltar ao quarto e implorar para Anna ficar. Eu olho para o deserto
através da minha janela por não sei quanto tempo até que a avisto ao longe,
entrando na limusine. Uma dor surda rasga meu peito enquanto a vejo olhar
em minha direção. Fecho os olhos, me recusando a vê-la me deixando, e
viro as costas. Quando volto a olhar pela janela, ela já se foi. Não sei quanto
tempo se passa e eu permaneço aqui, de pé, lutando ferrenhamente contra a
vontade de ligar para Jalal, impedi-la de sair do país, como fiz da primeira
vez. Agonia me toma por completo, meus olhos turvando. De amor, de
raiva, decepção. Tudo junto. Mas o maior deles é o amor, sem dúvidas. Eu a
amo demais. Encaro o deserto como se ele pudesse me dar respostas ou
alguma esperança nesse caso. As imagens dela preenchem meus
pensamentos. Nosso passeio ontem no campo de golfe, seu sorriso feliz
quando olhava para mim, para a minha filha. Meu peito dói mais, sabendo
que terei de ir ver Ayla e consolar minha pequena. O que direi a ela? Que
nosso amor não foi o suficiente para Anna? A amargura me invade,
escurecendo meu coração, e quero odiá-la.
— Não seja um burro, Amihaj. Quando tudo se resolver, se não for
atrás dela, será um grande tolo. Ela está sendo rechaçada pelo seu povo.
Tente se colocar no lugar dela.
As palavras de meu primo vêm à minha cabeça. Eu fico repassando
tudo, querendo desesperadamente acreditar no amor que vi tantas vezes
cintilando naqueles incríveis olhos verdes. Meu celular apita, indicando
uma mensagem, e o pego em cima da mesa. Meu coração salta apenas
vendo o nome dela na tela. Abro a mensagem e leio.

Oi, amiri.
Sei que está com raiva de mim e não entende minha decisão. Mas
peço que nunca duvide do amor que sinto por você, por Ayla. Ele é imenso.
Meu coração está esmagado porque sonhei em ter vocês para mim.
Todavia, não podemos ir contra a realidade, habib, e a nossa é esta. Seu
destino é subir ao trono e honrar sua linhagem. Eu vou acompanhar e
torcer por você, mesmo de longe.
E sobre o colar… Estava esperando chegar em casa para guardá-lo
na caixa junto com as cartas de Nate. Ele sempre será o meu garoto
especial, mas você, Karim, é o meu homem especial. Eu vou guardar nossos
momentos em meu coração, para sempre. Seja o melhor rei que Kamar já
viu, habib. Eu amo você, amiri.
Anna.

Ofego, minha visão ficando mais turva, as lágrimas transbordando,


quentes, arrependidas. Meu coração dói muito, agora por outro motivo.
Jalal estava certo. Fecho os olhos, vergonha me invadindo. Allah… Eu fui
um completo idiota com ela. Então, a determinação me toma de assalto, eu
não posso deixá-la ir! Não posso. Eu seleciono o número de Jalal, para
pedir que prepare o helicóptero. Irei interceptar aquela limusine. Ela vai
voltar e vamos discutir uma forma de lidar com tudo isso.
— Amihaj, estamos com um problema, primo! — Meu primo
invade a sala, seu telefone tocando na mão. Ele o desliga, seu rosto torcido
em consternação, e me coloco em alerta. — A limusine foi atacada a
caminho de Jawahra e… — Engole em seco. — Levaram a princesa.
Meus ouvidos começam a zumbir com a última frase. Meu corpo
inteiro gela, meu coração saltando dolorosamente, agora de pavor.
— Como?! Quem a levou?! — pergunto, correndo, encontrando-o
no meio da sala.
— Não sabemos ainda. Os seguranças enviaram uma mensagem
codificada, uma vez que seus celulares foram quebrados. Eles foram
baleados. Já liguei para uma ambulância — informa, insatisfeito. Jalal odeia
quando algo sai do seu controle. — Enviei alguns homens para checar o
local. Estou saindo para lá, pensei que gostaria de ir comigo.
Assinto, pedindo a Allah em pensamentos que a proteja, que a
mantenha segura até que eu vá buscá-la. — Isso não é tudo — retoma. —
Uma criança de cada tribo sumiu hoje pela manhã. — Me dá um olhar ainda
mais consternado. — E os líderes estão acusando você de sequestro, primo.
Me afasto um passo, a notícia me impactando como um soco forte.
— Porra! O quê?!

***

Cerca de quinze horas, deixamos os helicópteros e os jipes e


montamos os cavalos que algumas tribos beduínas das proximidades nos
cederam. Eu, Jalal e quarenta homens da guarda real cavalgamos pelo
deserto, a caminho do cativeiro de Anna. Conseguimos rastrear e encontrar
a localização graças à minha conversa com seu pai. Mesmo relutante, tive
que ligar para seus pais no começo da noite e relatar que sua filha estava,
mais uma vez, nas mãos de sequestradores, correndo risco em meu país.
Dom ficou aflito, mas revelou que o relógio de Anna tem um dispositivo de
GPS. Helena ficou desesperada e me senti envergonhado. Prometi-lhes que
iria pessoalmente resgatá-la. Só espero ter sucesso como na primeira vez.
Quando chegamos à limusine, pegamos as coisas de Anna de volta e,
revistando o veículo, encontramos sua câmera escondida embaixo de um
dos bancos.
Conferindo os arquivos, levei um chute no estômago ao ver as fotos
que tirou dos captores. Ela é muito astuta, deve ter percebido o mesmo
padrão das tatuagens e focou bem nelas. A serpente com as presas de fora,
símbolo do Al-Kidir, um grupo terrorista muito conhecido por atentados em
nossos vizinhos emirados. Um arrepio ruim me percorreu, sabendo que
foram esses homens que a raptaram. Que o grupo está agindo em meus
domínios. De posse dessa informação valiosa, tivemos que planejar o
resgate com atenção redobrada. Esses homens não são simples insurgentes,
eles matam mulheres e crianças sem nenhuma culpa. Lamento não termos a
enviado para o aeroporto em um helicóptero. Ela estaria a salvo, a caminho
de sua casa agora. A resignação se instala em mim e percebo com tristeza
que Anna tomou a decisão certa. Não posso forçá-la a ficar aqui, nesse
barril de pólvora prestes a explodir.
O galpão abandonado no meio do nada é avistado. Estamos
equipados com colete à prova de balas e um pequeno arsenal de armas
potentes e granadas. Tivemos que nos preparar conforme nosso inimigo.
Diminuímos a cavalgada e paramos a alguns quilômetros, sigo com Jalal e
metade de nossos homens, caminhando, nos arrastando e nos esgueirando,
armados com fuzis e as granadas. Quando chegamos perto do local, vejo
jipes parados na frente do galpão — que na verdade é um contêiner, vejo
claramente agora mais de perto. Há uma pequena duna do lado direito e nos
arrastamos, subindo para conseguir melhor avaliação. E meu sangue gela
nas veias ao me deparar com a cena na frente da pequena caixa retangular.
Anna está parada na porta, cercada por homens de preto, encapuzados.
Minha princesa destemida está segurando um fuzil, desafiando-os
bravamente. Um soluço desesperado irrompe da minha garganta, lágrimas
enchendo meus olhos. É o fim. A minha linda e corajosa princesa vai
morrer aqui. Não há como escapar daquela armadilha.
— Me perdoe, amirati. — Eu choro. — Eu amo você. Para sempre
você. — Me despeço, cada parte de mim morrendo em antecipação.
Então, sua voz chega até mim, corajosa, ousada como só ela saber
ser, mesmo em cruel desvantagem.
— Com uma cabeça desse tamanho, você é um alvo ambulante, seu
infeliz. — Um terrorista grande ameaça ir para frente. — Fique aí, seu
maldito! — Ela me faz engasgar quando atira numa lata ali perto, a coisa
se partindo em mil pedaços. Sua mira volta rapidamente para a cabeça do
homem. — A próxima vai derramar seu cérebro de merda no chão!
Eu choro mais, tanto amor e orgulho dessa garota.
— Você é uma cadela corajosa, princesa. Tenho que admitir isso. —
O homem diz, uma nota de admiração no tom. — Mas aqui é o seu fim,
sabe disso, não é?
— Vamos explodir essa putinha!
Um deles brada e desespero, horror absoluto me toma. Puxo uma
granada, do meu bolso e, retirando o pino, arremesso-a com toda a força do
braço para trás do bando. Vejo Jalal fazendo a mesma coisa. Dois estrondos
consecutivos soam, levantando uma nuvem de areia e rogo fervorosamente
para a minha princesa astuta usar a distração dos captores para se proteger
dentro do contêiner. Sorrio em meio às lágrimas quando a vejo fazendo
exatamente isso. Então, nós abrimos fogo, aproveitando o atordoamento dos
bandidos. Meu coração está correndo como um louco, adrenalina a mil.
Derrubo um, dois, explodo o cérebro do grandalhão que a estava
ameaçando diretamente. Os sons de tiros são intensos, com alguns deles
respondendo. Nos mantemos deitados, protegidos aqui atrás, e um a um eles
vão tombando. Quando o último cai, seu cérebro sendo lançado em todas as
direções, respiro aliviado. Rolo, descendo para o lado do contêiner e fico de
pé, correndo para ela. Chamo-a, não me importando de minha voz soar
trêmula e desesperada diante de meus homens.
Ela não responde. Ouço os choramingos de crianças e meu peito
alivia. Eles foram sequestrados pelo grupo também. Agradeço a Allah mais
uma vez. Então, ouço os soluços dela e isso me mata. Imagino que deva
estar em choque pelo terror que viveu hoje. Aviso que vou entrar e, quando
piso para dentro, a visão dela me faz sentir vergonha, culpa por tratá-la
daquela forma em nossa despedida. Está agarrada ao fuzil, olhos
lacrimosos, vidrados. Corro, me abaixando, retirando a arma de suas mãos,
ajudando-a a se levantar, e meu ar se vai dos pulmões ao ver sua blusa
rasgada, o sutiã todo de fora. Há uma escoriação no lado direito do rosto, os
joelhos machucados.
— Eles te machucaram? Eles…
— Não, não. — Nega, nitidamente abalada. — O único que tentou
está ali, amarrado. — Indica o canto onde um homem está com os pés e
mãos contidos. Lanço um olhar mortal para o infeliz, deixando-o saber que
sua vida será muito difícil na prisão. Se eu não precisasse de informações, o
mataria agora. Ele sabe disso, porque seus olhos arregalam, entregando seu
pavor.
Grito Jalal para entrar e pegar o verme, aproveitando para fazê-lo
mijar nas calças com a ameaça de meu interrogatório. Retiro uma de minhas
túnicas e a visto em Anna. Vejo lágrimas se formando nos belos olhos
verdes e sei que está recordando da noite em que nos encontramos.
Compartilhamos um olhar apaixonado, mas resignado. Ela precisa ir. Nós
dois sabemos disso. Eu aceito agora. Limpa a garganta e se afasta de mim.
— Shukran por vir me buscar de novo — murmura, embargada.
Meus olhos se recusam a deixá-la. Quero beber dela o quanto puder,
enquanto posso.
— Precisamos sair agora. Os helicópteros estão a alguns
quilômetros — digo, engolindo em seco. — Você foi muito corajosa —
murmuro, deixando todo o meu amor, admiração e orgulho transparecerem.
— Você me salvou. Nosso treinamento me ajudou a tentar lutar de
volta — murmura de volta, limpando uma lágrima antes de ela cair. —
Essas crianças estão desidratadas, traumatizadas e machucadas. Posso usar
um dos helicópteros para levá-las a um hospital. — Oferece e eu não
esperaria menos dela.
Pergunto se está mesmo em condições de pilotar e ela garante que
sim, seu rosto retomando um pouco da coragem e força que me acostumei a
ver e amar nela. Quero olhá-la mais. Quero olhar para ela. Para sempre.
Mas não é possível. Temos muito trabalho até o dia amanhecer. Vamos atrás
dos rastros do orquestrante desse ataque e puni-lo severamente.
— Então, vamos! — Chamo, olhando as crianças também e garanto:
— Vocês estarão de volta às suas casas em breve. Estão a salvo agora.
— A princesa Anna Julia é muito destemida, meu senhor. — O
garoto mais velho diz, se curvando numa mesura.
Meu olhar volta para ela. E quero egoisticamente a manter comigo.
— Sim, ela é — murmuro. — Você vem em meu cavalo e os
meninos irão com os guardas — digo a ela, virando as costas para que não
veja a dor em meu rosto.
Quando saio, os outros guardas já estão na frente com os nossos
cavalos. Monto e Anna se junta a mim no garanhão negro. Novamente as
imagens se confundem. Aquela noite, esta. Seus braços me envolvem e eu
atiço o cavalo, meu peito tão dolorido que penso que posso ter um ataque a
qualquer momento. Eu a sinto, guardo a sensação do corpo macio encostado
no meu pela última vez. Eu tento segurar as lágrimas a todo custo, mas elas
rolam, me lembrando do que estou perdendo. Quando chegamos aos
helicópteros, desmontamos. Meus homens levam as crianças para o que
Anna já está acostumada a pilotar. Sempre que olhar para ele, lembrarei
dela, minha linda princesa irreverente. Ela anda à minha frente. Posso ver
na tensão em seus ombros que estamos lutando a mesma batalha.
Alcança a porta do piloto e fica lá, parada por alguns instantes. Eu
fecho meus punhos, meu peito subindo e descendo de tanta aflição,
angústia. Ela está indo. Agora é pra valer. Quando se vira para mim, seus
olhos estão cheios de lágrimas. Nos olhamos longamente, o amor, a dor de
ter que dizer adeus em nossos semblantes. Aviso que seu pai está vindo
buscá-la e que terei que me desculpar com seus pais por colocar sua vida
em risco.
— Não é culpa sua — retruca. — É o seu país, a sua casa. Eu que
me enfiei aqui impulsivamente e…
A encaro fixamente, querendo dizer que li sua mensagem, que
acredito no seu amor. Mas isso não importa agora. Tenho que tornar meu
país seguro para ao menos cogitar me aproximar dela de novo. O risco de
perdê-la hoje me fez enxergar que preciso abrir mão de nós. Pelo menos
enquanto a instabilidade durar. Meus olhos vão para seu colar e me sinto
mal, envergonhado por dizer aquelas sandices. Ela o pega e me encara, tão
vulnerável que quero puxá-la para mim e nunca mais soltá-la.
— Não vamos lamentar, Anna — digo, meu tom resignado. Seus
olhos turvam e os meus também. — Cuide-se, ‘amira — murmuro
morrendo por dentro e viro as costas, andando apressado para o outro
helicóptero.
Abro a porta do piloto, Jalal já me esperando no banco do
passageiro. Temos muito trabalho. Eu paro, virando a cabeça, precisando de
um último vislumbre dela. Está me olhando também. Nos encaramos por
um tempo, então, com um aceno de cabeça, eu subo a bordo. A espero
levantar voo e fico vendo-a se distanciar, minhas lágrimas descendo outra
vez. Eu já não me importo que meu primo veja. Estou além da dor. Com o
coração destroçado, aceito nossa realidade conforme o pássaro negro se
distancia.
Eu vou guardar nossos momentos em meu coração também, amirati.
Para sempre.
CAPÍTULO QUATORZE
Dois dias depois…
“Você entrou na sala e agora meu coração foi roubado.
Você me levou de volta ao tempo quando era inteiro.”
(James Arthur – Can I Be Him)

Karim Amihaj
Dou mais um soco forte no olho do infeliz que tentou se aproveitar
de Anna no cativeiro. A cabeça do terrorista tomba para trás. Está nu,
amarrado a uma cadeira. Estamos numa sala especial no departamento de
polícia. Ele foi o único que restou do pequeno grupo que atuou no sequestro
de Anna e das crianças. No entanto, sei que ainda há muitos da sua
organização criminosa em Kamar, e preciso exterminá-los urgentemente.
Sua cara já estava bem machucada, minha princesa fez um bom número
nele. Não posso parar o orgulho me enchendo toda vez que relembro aquela
noite. Ela foi esplêndida! Se não tivesse reagido junto com o garoto
Youssef, eles teriam morrido.
— É melhor entregar logo o nome do seu chefe, seu terrorista de
merda! — Eu rosno, puxando seu cabelo, com força. O homem grunhe, os
olhos completamente fechados pelo tratamento especial que estou lhe
dando desde ontem.
— Os Al-Kidir não têm um chefe, seu idiota. — Sua voz, embora
cansada, tem um tom de deboche. — Somos autossuficientes.
Jalal avança dois passos, rosnando. Eu coloco minha mão em seu
ombro, contendo-o. Se batermos mais nesse verme, ele pode morrer antes
de nos contar o que precisamos saber. Aceno para os dois guardas no canto
da sala.
— Suspendam-no pelos braços. — Digo baixo, frio. O bandido
cospe sangue e tem a ousadia de rir para mim. Os guardas se aproximam e o
desamarram da cadeira, o arrastando para o canto onde tem um gancho e
uma corda pendendo do teto. Eles levantam seus braços e o suspendem,
amarrando-o, logo, o corpo está esticado, os pés pendurados. Sei que pode
parecer cruel. Está bem, é cruel, mas eficaz. Ele não durará trinta minutos
assim. — Vamos, primo. Amanhã voltamos para visitar nosso amigo.
Jalal abre um sorriso perverso e me segue para fora.
— Seus malditos! Não vão tirar nada de mim, ouviram? — O
homem brada às nossas costas.
Nós apenas rimos, andamos e nos recostamos à parede no final do
corredor, de frente para uma janela. Expiro, passando as mãos pelo rosto.
Estou além de exausto. Não durmo desde o sequestro de Anna e os
meninos. Marquei com os líderes para me encontrarem na tribo de El-
Baham, para entregar as crianças pessoalmente. Os homens ainda estavam
com suas caras de merda, como se eu fosse o culpado por tamanha
atrocidade. Youssef, que ironicamente é filho do sheik Malik, o líder que
está preso por ofender Anna, contou como a princesa os acalmou e salvou.
Contou fascinado como sabia atirar com um fuzil e pilotar um helicóptero.
As mulheres ficaram chocadas, mas também admiradas, enquanto os
homens tiveram de abaixar as cabeças e reconhecer que julgaram
levianamente uma pessoa que não conheciam, por puro preconceito
cultural. O menino sorria, narrando tudo, completamente encantado por
Anna. Um sorriso amargo curva minha boca porque o entendo
perfeitamente. Não tem como não se encantar pela princesa.
Aproveitei para dizer aos líderes o que realmente achava de suas
posturas. Não fui brando. Não, eu estava muito além de qualquer controle.
O sentimento de perder a mulher da minha vida ainda pungente,
esmagando-me, então não tive nenhuma pena, como não tiveram de Anna.
— Seus filhos estão retornando sãos e salvos por causa daquela que
tanto rechaçaram e humilharam. — Cuspi entre dentes. Os homens se
entreolharam, abaixando as cabeças. — Olhem para mim, olhem nos meus
olhos, como olharam naquela reunião e ofenderam a mulher que amo e
escolhi para esposa. Olhem nos meus olhos e admitam que seus filhos estão
vivos por causa da concubina do príncipe!
— Meu senhor, sinto muito. — O sheik Al-Hansur, um dos que
proferiu ofensas, se adiantou no grupo. Estávamos a céu aberto, no círculo
entre as tendas. Me encarou com pesar e vergonha, admitindo: —
Acreditamos que estávamos fazendo o certo.
— Hostilizando uma garota que nem sequer conheciam? Os
senhores não lhe deram a chance de lhes mostrar a pessoa que ela é. —
Interrompi-o, irado.
— Perdão, meu senhor. — O sheik Bashar, outro que disse palavras
pesadas naquela reunião, se manifestou: — Eu aceito a punição que amiri
julgar melhor.
Eu encaro o homem até então altivo abaixando a cabeça e o tom.
— Não é a mim que terão que pedir perdão, sheik. É a ela. — Digo
solenemente. Eles me encaram atentamente. — A princesa Anna Julia será
a minha rainha, meus planos continuam os mesmos.
— Me desculparei com a princesa quando ela regressar, amiri. — O
sheik Faheem disse, visivelmente desconfortável pela injustiça cometida. —
E também apoiarei sua união. Ela trouxe meu filho de volta e nunca serei
capaz de agradecer ou me desculpar o suficiente.
Ele me surpreende e sinto um ínfimo lampejo de esperança. Talvez
consigamos passar por isso sem uma rachadura permanente. Todavia,
revelei, para que sentissem ainda mais remorso:
— Ela ouviu e viu a segunda parte da nossa reunião, senhores. —
Eles exclamaram horrorizados e envergonhados. — Sim, ela se sentiu tão
indesejada e humilhada que foi embora para que eu pudesse cumprir o meu
maldito dever! Um dever assentado em tradições arcaicas e tolas! — Eu
rosnei. Eles tiveram o bom senso de ficar calados. — Faremos outra
reunião, conforme sugeriu o sheik El-Baham, e minha moção sofreu
alterações. Haverá um contrato lavrado entre as tribos, isentando o
príncipe governante de um casamento de Estado. — Eles se mantiveram
calados. — Um príncipe de Kamar só fará um casamento de Estado se essa
for a sua vontade.
— Creio que precisaremos discutir melhor esse assunto, amiri. —
Foi El-Baham quem falou e eu o encarei. — Acabamos de ter nossos
meninos de volta.
— Sim, sheik, precisamos discutir sobre muitas coisas. — Avisei,
lançando-lhe um olhar severo. O homem não me enganaria mais com sua
conversa mansa. Olhei cada um deles e soltei logo minhas intenções: —
Subirei ao trono solteiro e me casarei por amor.
— Alteza, insisto…
— Não. — Cortei qualquer que fosse a argumentação de El-Baham.
— Eu sou o príncipe herdeiro e vou me sentar no meu trono. A questão é:
será com o apoio de vocês ou teremos de guerrear em vez disso? — Eles me
olham espantados. — Meu pai amava o deserto, acreditava que os clãs são
indispensáveis para o governo equilibrado. Eu também cresci acreditando
nisso, todavia, nos últimos anos, tenho percebido a necessidade exacerbada
de vocês em ganhar mais e mais poder.
— Meu senhor está nos acusando de ganância? — El-Baham torna,
fechando a cara.
— Eu não sei; estou, sheik? — O encarei com uma sobrancelha
levantada. Expirei e encarei todos eles, cansado demais da queda de braço.
— Os Al-Kidir estão agindo em nosso emirado. Foram eles quem
sequestraram Anna e as crianças — revelei. Exclamações soaram altas.
Todos sabem e temem esses terroristas. — Se estivermos rachados, seremos
encurralados e exterminados em nosso próprio país, como alguns vizinhos
já ficaram. Proponho pensarmos no bem comum neste momento. — Bato o
punho em meu peito esquerdo. — Lutarei na frente dessa guerra. Serão dias
instáveis, mas tenham a certeza de que o inimigo cairá aos nossos pés.
Morrerei defendendo nosso povo.
Eles ficaram em silêncio perturbador. Então, o sheik Al-Hansur bate
o punho no peito e eleva a voz:
— Eu e minha tribo lutaremos ao seu lado, meu senhor.
Lhe dei um aceno. E o que parecia impossível aconteceu: um a um,
eles foram fazendo o juramento. Um sorriso se abriu em meu rosto
cansado. Jalal me olhou orgulhoso, seu punho contra o peito. Então, nós
bradamos para a noite:
— Morreremos defendendo a nossa linhagem!
— Bem, fazia algum tempo que não o via em ação, primo. — A voz
brincalhona de meu primo cessa as lembranças. — Não com essa
ferocidade toda, pelo menos. Me lembra nosso período no serviço militar.
Eu me viro para ele, acenando. Nós nos alistamos e servimos juntos.
Uma precaução de meu pai para me proteger, ele era tão previsível. Rio
nostálgico. E meu primo cumpriu bem sua função. Ele sempre cumpriu seu
dever com o príncipe herdeiro, mas sempre senti seu amor por mim desde
que éramos pequenos. Jalal é como um irmão. Corrigindo, ele é meu irmão.
— O imbecil merecia um tratamento cinco estrelas. — Ironizo,
fazendo-o rir. — Shukran, primo.
— Pelo que exatamente está me agradecendo? — Franze a testa.
— Por ser meu irmão — digo, pegando seu ombro, dando um aperto
fraternal. Bato no meu peito esquerdo. — Morreremos defendendo a nossa
linhagem.
Seus olhos ficam brilhantes, emoção marcando suas feições. Ele
estende uma mão para meu ombro e fecha o punho sobre o coração
também.
— Morreremos defendendo a nossa linhagem — repete ferozmente.
— Sim, você é meu irmão, meu sangue, te amo e defendo, como a Zafyr.
Eu aceno, me sentindo emotivo demais. Acho que é o cansaço, mas
principalmente pela partida de Anna. Ainda estou em carne viva, evitando
pensar, mas as lembranças não vão embora.
De fato, não demora vinte minutos, o terrorista sucumbe, gritando
para tirá-lo de lá que irá cooperar. Troco um sorriso triunfante com Jalal e
voltamos para dentro. Os guardas retiram o bandido da corda e o colocam
sobre a cadeira novamente.
— Estamos ouvindo. — Cruzo os braços, encarando-o impaciente.
O homem engasga e movimenta os braços, que estão roxos pelo
tempo suspenso.
— Quem encomendou o sequestro da garota e dos meninos foi um
dos seus sheiks, seu imbecil. — Ele tem a audácia de rir. — Você tem uma
maçã podre no seu cesto e nunca percebeu.
Congelo, descruzando os braços.
— O que está dizendo… Um dos líderes dos clãs, você está
dizendo? — Inquiro, aproximando meu rosto do seu, vendo os olhos
inchados, mas ainda abertos em fendas. Estudo-o, tentando descobrir se está
dizendo a verdade. — Quem? Me dê o nome ou vou cortar seu maldito pau!
Não esqueci que tentou violentar a minha mulher! — Ranjo os dentes.
— El-Baham. Abdul El-Baham, esse é o nome do homem. — Ele
grunhe e me afasto imediatamente. O frio da traição penetrando meus ossos.
— Porra… — Jalal diz ao meu lado. — Está dizendo a verdade,
terrorista?
— É muito fácil conferir. Haverá uma reunião dentro de três dias
num casebre abandonado a oeste da tribo do sheik. — O homem diz e não
noto nenhuma hesitação. Eu viro as costas para o verme e respiro fundo,
passando as mãos pelo rosto. Minha cabeça está começando a doer pelo
meu esgotamento físico.
— Conte-me quais os planos do morto ambulante. — Rosno ainda
de costas. Vou puni-lo exemplarmente por essa traição. Por isso, os líderes
estavam tão reticentes e ariscos comigo. A cobra estava os manipulando,
com certeza.
— Eu só sei que o plano com o sequestro era jogar as mortes das
crianças nas suas costas. E a princesa também seria morta para puni-lo. Não
sei o que Vossa Alteza fez para o homem, mas ele parece nutrir fortes
sentimentos por você. — Zomba.
Estou estarrecido, abalado demais para sequer lhe dar uma réplica.
— Dê a localização da reunião e lhe entregarei para a justiça
comum. — Viro de frente para ele, voltando a abaixar o rosto para o seu. —
Do contrário, eu mesmo irei julgá-lo, e lhe garanto, não gostará da minha
sentença.
Pela primeira vez, algum sinal de medo no bandido. Ele cede e nos
entrega tudo pelos minutos seguintes. Deixamos o departamento de polícia
e Jalal pilota o helicóptero, nos levando de volta para casa. Precisamos
planejar como encurralar o maldito traidor do El-Baham e seus comparsas.
As tribos estão fechadas comigo, não estão? Pergunto-me, apreensivo.
Agora não sei de mais nada. Diante das revelações, terei que confiar
desconfiando. Então, lembro de algo que revolve o meu estômago: El-
Baham ordenou o sequestro de seu próprio sobrinho, filho da irmã mais
nova. Meu sangue esquenta nas veias, de pura revolta. Ele ia derramar o seu
sangue. Que tipo de monstro é esse homem? O ódio por mim é tão grande?
Ou é a ganância?
Quando chegamos ao palácio, tio Jafar nos chama na sala de
reuniões menor, na ala de meus aposentos. A reunião será dentro de três
dias e preciso descansar, repor as forças, do contrário não serei de grande
ajuda caindo de cansaço e faminto.
— Descobrimos uma linha privada de El-Baham e interceptamos
uma conversa agora há pouco. — Meu tio revela e o encaro com interesse.
Seus lábios se comprimem em seguida e sei que mais merda virá sobre o
homem, no qual confiei ingenuamente. — O homem enlouqueceu, Amihaj.
Ele quer matar a todos nós e usurpar o trono.
Jalal bufa atrás de mim. Não estou mais conseguindo raciocinar
direito. Preciso de um banho, comer alguma coisa e dormir.
— Eu adoraria vê-lo tentar. Vou esmagá-lo quando o encontrar. —
Digo baixo e frio, então expiro longamente. — Bom trabalho, tio.
Meu tio não parece feliz com o elogio.
— Não, amiri, eu falhei com meu senhor — diz desgostoso.
— Quando? — Franzo o cenho.
— Ele chegou a esse ponto porque nunca percebi que era um traidor.
— Abana a cabeça. — Era minha responsabilidade mantê-lo seguro,
Amihaj, como tio e grão-vizir.
— O senhor não tem culpa nenhuma, tio. O homem é um terrorista.
Ia assassinar seu próprio sobrinho em nome da ganância — digo com
desprezo. — Ele sempre passou uma imagem ilibada e leal a nós, nunca
desconfiei de nada também.
Me estuda com seus olhos escuros ainda insatisfeitos. Se aproxima e
coloca uma mão em meu ombro.
— Sua família estará com você, amiri. — Engole em seco, está
muito preocupado, vejo em seu semblante. Bate o punho sobre o seu
coração. — Para o melhor ou pior. Morreremos defendendo a nossa
linhagem!
Pego seu rosto, notando que meu tio envelheceu nos últimos anos.
Mesmo que não haja muitas demonstrações de afeto da sua parte, sei que
ele me ama. Está estampado em seu rosto cansado, tanto pela idade quanto
pela situação crítica que estamos vivendo. Bato meu punho em meu peito
também.
— Shukran, meu tio. Por tudo que fez e ainda faz por mim, pela
nossa casa. — Me inclino e beijo seu rosto. Seus olhos ficam brilhantes e
ele torna a engolir em seco, quando me afasto e digo solenemente: —
Morreremos defendendo a nossa linhagem!
Acena, as mãos vindo para meu rosto. Agora sou eu quem fica
assustado.
— Você será um grande rei, meu sobrinho — murmura, toda a
formalidade de grão-vizir o abandonando nesse momento. — Quando subir
ao trono e tudo se resolver, vá buscar sua princesa de volta. — Meus olhos
ampliam, estupefação me tomando. — Ela pode não ser uma nativa, mas
tem a fibra e coragem necessárias para uma rainha.
Eu sorrio, sentindo meus olhos arderem, a falta dela doendo demais.
— Sim, ela tem — concordo. — Shukran, tio.
— Você deve descansar um pouco agora. Eu, Jalal e Zafyr ficaremos
a postos.
— Zafyr? — Levanto uma sobrancelha.
Ele meio que ri e resmunga:
— Sim, ele pode apreciar as farras no Ocidente, mas sabe que é um
príncipe Al-Abdallah e, portanto, está preparado para lutar, vencer ou
morrer pelo sangue, como todos antes de nós — diz solenemente.
Aceno, e com mais um aperto em seu ombro, me retiro para meus
aposentos.

Três dias depois…


Me dirijo para o meu escritório. Jalal me ligou logo cedo,
informando que o irmão do guarda assassinado no caso Al-Shalleen foi
localizado e está sendo escoltado para cá. Estou ansioso para ver a tal carta
e fechar esse último elo para restaurar meu país. Estou mais descansado e
otimista na operação para pegar El-Baham junto com seus amigos
terroristas. Eles serão pegos de surpresa, pois não noticiamos que um dos
Al-Kidir foi preso no caso do sequestro. Na verdade, não noticiamos nada
para a publicidade não interferir em nosso curso de ação.
— Primo, este é Hassur, irmão do guarda que recebeu a carta de Al-
Shalleen. — Jalal se adianta tão logo os alcanço, na antessala.
— Meu senhor, eu sinto muito por tudo, fiquei apavorado quando
mataram meu irmão e também com o conteúdo da carta. — O homem diz
atropeladamente, se curvando em reverência.
— Você não tem que se desculpar por nada, meu bom homem —
digo-lhe, e garanto: — Sua família será reparada pela perda de seu irmão.
Homens da minha guarda cuidarão de sua segurança até que consiga
encontrar o verdadeiro assassino.
Ele assente e estende a mão, me entregando a tão esperada carta.
Nos despedimos e sigo com Jalal para dentro do escritório. Ando até a
janela e olho a carta em minhas mãos. Meu coração está acelerando com
receio do que vou encontrar aqui. Sem mais delongas, abro o envelope e
retiro a folha de dentro. A letra tremida de Al-Shalleen me causa remorso.

Amiri,
Eu sei o tamanho do ódio que meu senhor tem por mim, e está certo,
sou um ser humano repugnante. Aceitei tomar parte de um plano maligno
que tirou a vida de nossa princesa e mais oito pessoas. Fiquei calado e
levei a culpa sozinho por muito tempo porque o demônio por trás de tudo
ameaçou matar toda a minha família.
Wallah, então ele tinha mesmo sua parcela de culpa. Continuo
lendo:
A mente por trás de tudo foi o sheik El-Baham, Vossa Alteza. Ele é o
verdadeiro assassino de sua esposa.

Eu ofego, minhas mãos começando a tremer, meu sangue gelando;


estupefação, ira — uma ira tão grande que tenho que parar para respirar —
se apossa de mim. Al-Shalleen morreu querendo uma audiência comigo e
lhe neguei. Poderia ter descoberto tudo há muito tempo.

O sheik sempre teve o coração preto de inveja do irmão enquanto


chefe da tribo, e isso só piorou quando a sobrinha foi escolhida para sua
esposa, não a filha dele. O sheik Hasek El-Baham foi envenenado pelo
próprio irmão. Seu sogro não morreu de infarto como o irmão invejoso
levou todos a pensar. Ele morreu envenenado. Abdul sempre vinha me
visitar e contar seus novos feitos tanto para se vangloriar como para
renovar suas ameaças à minha família.
Tenho filhos ainda pequenos, Alteza, eu imploro que os proteja da
ira desse demônio.
Com meu profundo pesar,
Imotep Al-Shalleen

Fico olhando a carta, ainda aturdido. Wallah, estava achando uma


monstruosidade o maldito El-Baham orquestrar o sequestro e assassinato de
seu sobrinho pequeno, sem ter nenhuma ideia de que já havia derramado
seu sangue antes. Meu peito dói de ódio e amasso o papel na mão, lágrimas
queimando minha visão. Yasmina. Minha doce Yasmina foi assassinada
pelo próprio tio, em nome da inveja e ganância.
— Você será vingada, amirati — murmuro, desolado. Queria poder
ainda a chamar de meu amor. Ela sempre será lembrada, viverá em mim,
mas meu coração pertence a Anna agora.
Uma mistura de sentimentos ruins se espalha em minhas veias. Me
viro para Jalal e ele me observa, estreitando os olhos.
— El-Baham? — pergunta. Ele é astuto. Balanço a cabeça e seu
rosto é preenchido com ira.
— Ele é meu. Matem todos os outros, mas ele é meu. — Rosno,
além da razão. Não haverá clemência para esse monstro.
Todavia, não foi fácil encurralarmos o assassino e seus terroristas.
Eles não estavam na reunião informada pelo terrorista preso. De alguma
forma, eles desconfiaram do nosso silêncio e não havia ninguém no casebre
abandonado quando chegamos lá.
Depois disso, dias sombrios se abateram sobre Kamar. Os conflitos
estouraram de vez e as tribos tiveram que reconhecer que estavam apoiando
o lado errado. Lutamos juntos contra o terrorismo e acabamos por descobrir
que Abdul El-Baham sempre foi o cabeça dos Al-Kidir. Àquela altura, nada
mais me surpreenderia sobre o homem. Fechamos o espaço aéreo,
interditamos as fronteiras terrestres e cortamos os serviços de telefonia e
internet por um mês. Apenas o nosso exército conseguia se comunicar de
forma eficiente com a tecnologia disponibilizada pela Harper Technology, a
empresa da família de Anna. Fiquei surpreso quando Dom me chamou
numa rede que nem sabia que existia e me ofereceu ajuda para facilitar
nossa comunicação enquanto os serviços gerais estavam suspensos.
Após trinta dias no deserto, sem comunicação, os suprimentos e
munição ficando escassos, os terroristas foram se tornando alvos fáceis,
saindo da toca em busca de comida e poder de fogo. Os que resistiram
foram executados sumariamente e outros tantos presos e encaminhados para
a capital. Mas ainda faltava o seu líder, o homem em que estava sedento
para colocar minhas mãos. E eu, enfim, o encontrei, muito longe, na
fronteira com a Arábia Saudita, enfiado numa caverna. Zafyr deu cabo dos
vigias na entrada e segui pelo túnel sujo e estreito, me esgueirando para não
fazer barulho.
Me recosto à parede quando o corredor acaba e, então, apuro os
ouvidos. Ouço movimentação e arrisco olhar na cavidade abaixo. Um metro
abaixo, mais ou menos, há um espaço circular, limpo, como uma sala.
Diferente dos outros que encontramos morrendo de fome e sede, há comida
e suprimentos de sobra aqui, observo o pequeno espaço e então meu sangue
ferve ao finalmente localizar a figura alta num canto.
Longe de estar debilitado, parece forte e certamente acreditando que
sairá ileso. Está de costas, penteando os cabelos; sua postura é cheia de
confiança e eu não posso mais passar um segundo sequer sem vê-lo sofrer.
Escorrego devagar para baixo e dou dois passos, ficando atrás dele.
— Vire-se, assassino. — Sibilo, encostando o cano do meu fuzil em
suas costas. Ele congela, a mão descendo para sua frente e, antes que pegue
a arma, que certamente está ali, eu bato com o cabo da minha em sua nuca.
Uma pancada forte, irada, que o leva ao chão. Cai inconsciente e eu o rolo
com o pé, tentado a pisar em sua cara até esmagá-lo. Mas não farei isso.
Não agora, pelo menos.
— Fácil assim, primo? — A voz de Zafyr atrás de mim me faz rolar
os olhos. Ele é um idiota. Eficiente, mas um idiota que faz piada sobre cada
maldito momento. Jalal está em outra missão na fronteira com o Catar, por
isso, tive que vir com meu primo mais novo debochado.
— Foram mais de trinta dias, idiota. — Ranjo os dentes para ele,
que ousa sorrir.
— Então vamos, primo. Você precisa encerrar isso, subir ao trono e
ir tirar o seu atraso com a princesa. — Sua boca torce num som debochado.
— Você não é divertido estando na seca.
— Cale a maldita boca e me ajude a amarrar e arrastar esse monte
de lixo para fora. — Rosno e ele torna a rir, levantando as mãos em sinal de
paz.

***

— Você a matou, seu maldito terrorista! — Soco-o no estômago. —


Você a tirou de mim, da nossa filha ainda pequena! — Soco-o no olho,
estourando seu supercílio. O infeliz grunhe, se encolhendo, preso à cadeira.
Está nu e desprotegido, essa é a melhor forma de ensinar uma lição a
traidores e assassinos.
— Você matou seu irmão! — Faysal, o irmão mais novo de
Yasmina, que exigiu participar do nosso tratamento cinco estrelas para o
homem que traiu e matou seu pai e irmã, desfere um soco na boca do tio. O
som alto de algo se quebrando me faz sorrir. O infeliz desmaia, a cabeça
pendendo para frente.
— Não, não, você vai ver e sentir tudo, filho da puta! — Eu pego
seus cabelos, puxando-os com força, e jogo água em sua cara. Ele acorda,
seu rosto já está moído, uma polpa sangrenta, mas abre um sorriso
vermelho, sangue pingando da boca.
— Como se você se importasse com a morte de Yasmina — zomba.
— Você estava bem contente com a sua prostituta ocidental. — Eu ranjo os
dentes, querendo destroçá-lo. O maldito me atiça mais: — Sim, eu matei
aquela vagabunda que tomou o lugar que seria da minha filha! E teria
matado a sua segunda vadia também!
Fecho o punho lançando-o para frente, mas paro bem perto do seu
nariz já quebrado. A maldade se infiltra em mim e eu rio de volta. Ele deve
perceber que algo ruim passou pela minha cabeça porque pela primeira vez
vejo o medo brilhando nos sinistros olhos escuros.
— Me dê sua faca, Jalal. — Estendo a mão de lado para meu primo.
— Amihaj… O que está pensando em fazer? Não combinamos que
seria prisão perpétua? — Meu primo questiona e eu o encaro. Ele estreita os
olhos nos meus e bufa, puxando sua faca da bainha em seu cinto. Eu a pego
e volto a encarar o prisioneiro.
— Abra a boca do maldito, primo. — Meu tom é baixo e El-Baham
estremece quando lê corretamente o que pretendo fazer. Jalal sorri e avança,
pegando o queixo do infeliz, abrindo-o grosseiramente. El-Baham grunhe,
se debatendo, olhos aterrorizados presos aos meus. Me aproximo e lhe
mostro a lâmina afiada. — Minha vontade é empurrá-la até o punho em seu
peito. — Ele torna a grunhir. — Mas não, isso seria fácil demais. Você não
sofreria quase nada, não teria tempo para se arrepender das decisões
monstruosas que tomou contra seu próprio sangue. — Pauso e me aproximo
mais, ficando nariz a nariz com ele, deixando-o ver o quanto o odeio e
desprezo. — Você ficará uma semana sentado, preso a essa cadeira. Não
queria sentar no meu trono? Esse será o seu. — Jalal sorri baixinho. Enfio a
mão em sua boca escancarada e pego a língua. Seus olhos estão além de
aterrorizados agora. — Só preciso pegar uma lembrancinha da sua lealdade
para com os Al-Abdallah antes. — Encosto a lâmina bem no pé da língua.
Ele tenta gritar, acho que é não. Olhando em seus olhos, sem um pingo de
compaixão, eu empurro a lâmina, cortando sua língua.
Os sons de agonia são música para meus ouvidos.
— Um médico cuidará disso para que não morra agora. — Jogo o
pedaço de carne no chão e o encaro, limpando a faca em minha túnica preta.
— Abdul El-Baham, pelos assassinatos da princesa Yasmina Al-Abdallah e
oito membros da sua comitiva pessoal, do sheik Hasek El-Baham, Imotep
Al-Shalleen e do guarda Mustafá Deliali, eu, Karim Amihaj Al-Abdallah,
príncipe herdeiro e governante de Kamar, o condeno à prisão perpétua!
Jalal coloca uma mão em meu ombro e eu exalo profundamente.
Acabou. Que Allah nos guie para a paz duradoura de agora em diante.

Duas semanas depois…


Paro no limiar das portas do salão do trono e respiro fundo. A
guarda está ladeando o tapete vermelho e, neste momento, retiram suas
espadas, estendendo-as, formando um arco para a minha passagem. Uma
trombeta soa e eu passo para dentro, avançando pelo túnel criado pelos
soldados. Estou usando meu uniforme militar negro, minha espada
pendendo na cintura. Sigo até o trono, meu tio me recebendo com o manto
dourado e vermelho, ostentando o brasão e as insígnias da casa Al-
Abdallah. Me ajoelho diante do trono, fazendo a minha oração enquanto ele
cobre meus ombros com o manto. Quando me levanto, fico de pé de frente
para os convidados. A realeza do Oriente Médio está presente ou enviou
seus representantes. Temos chefes de Estado do Ocidente também.
Especialmente Estados Unidos e Inglaterra, com quem mantemos uma boa
relação diplomática.
Minha luta contra o terrorismo serviu para estreitar laços com os
aliados e conseguir a simpatia dos que historicamente nunca se
aproximaram de Kamar. Meu país é seguro agora. Mas ainda há muito a
fazer, tenho consciência. Será um trabalho intenso que levará alguns meses.
Porém, subindo ao trono, dou ao meu povo o que eles esperavam há tanto
tempo e também um motivo para comemorar depois de tanta tensão e
instabilidade. Jalal e Zafyr estão em seus uniformes militares, ladeando o
trono. O xeque[33] se aproxima com a coroa e abaixo a cabeça, permitindo-
lhe colocá-la em mim. Ele segura meus ombros enquanto fazemos a oração
juntos, em seguida, entoa a sua oração, pedindo a proteção de Allah para o
rei e o reinado que se inicia. Se afasta e todos me saúdam, os nativos se
curvando na saudação oficial:
— Sangue, linhagem e honra! Que Allah proteja o rei!
Eu bato no peito e repito a primeira parte. Me sento finalmente no
trono e respiro fundo. Estou aqui, pai, como o senhor queria. Converso
com meu pai em pensamentos. Não foi fácil, mas estou aqui. É como se o
ouvisse dizer em seu tom sério, mas amoroso: Nunca é fácil, amiri. Nunca é
fácil para alguém com a nossa linhagem. Você tem que provar o tempo todo
que é digno. Sorrio, tendo meu momento com ele. Eu serei digno, pai, eu
prometo.
O xeque faz um longo discurso, me reconhecendo como o rei e
autoridade máxima de nosso emirado. Ao fim, mais uma vez meus súditos
entoam a saudação. Jalal e Zafyr vão pela frente, caindo em seus joelhos
direitos diante de mim. Zafyr estende o cetro real, com suas felicitações e
uma pequena oração. Jalal mostra o anel que foi de meu pai, de seu pai, e
tantos Al-Abdallah antes de mim. Trocamos um olhar fraternal e cúmplice e
ele pega a minha mão direita, empurrando-o no dedo anular. Ele faz sua
felicitação e oração também e, em seguida, se levanta junto com seu irmão.
Meu tio vem para a minha frente segurando o Corão. Eu me levanto,
estendendo a mão direita sobre nosso livro sagrado, e faço meu juramento,
prometendo honrar e ser fiel ao meu povo, à justiça e aos preceitos do
Profeta. Me sento novamente e olho para os guardas ladeando o tapete
vermelho. Aceno e eles tornam a erguer as espadas, formando o arco. Eu
quis fazer algo para animar minha princesinha, que tem andado triste desde
a partida de Anna. Acho até que perdeu peso. Meus pensamentos são
cortados ao ver minha filha surgindo na porta, vestida com os trajes oficiais,
com a pequena tiara que Anna me ajudou a escolher para ela em um de
nossos passeios a Jawahra. Eu me levanto em saudação, querendo tornar
minha coroação especial para ela também. Ela não me surpreende ao andar
sozinha pelo túnel. Até acena para os convidados, sorrindo, totalmente
desenvolta, me fazendo sorrir, meus olhos se enchendo de lágrimas, um
orgulho e amor profundos se espalhando dentro de mim.
Quando ela para diante de mim, quebro o ritual, pegando-a no colo.
Seus bracinhos me rodeiam o pescoço e ela me cobre de beijos, arrancando
ondas de suspiros e murmúrios.
— Você está tão bonita, nour hayati — sussurro, beijando sua
bochecha. — Vem, vamos assistir às apresentações com o papai.
Me viro e Jalal já colocou um trono em miniatura para ela ao meu
lado. Os olhinhos de minha pequena brilham.
— Estou sendo coroada princesa também, papai? — pergunta me
fazendo rir e algumas pessoas por perto também.
— Sim. Você está feliz, habibti? — pergunto, acomodando-a no seu
trono. Ela sorri, mas seu rostinho cai em seguida.
— Eu queria que a Anninha estivesse aqui…
Meu peito aperta.
— Eu também queria, princesinha. — Me aproximo e sussurro: —
Consegue guardar um segredo? — Ela acena, os olhinhos curiosos. — Nós
vamos buscar a Anninha amanhã.
Seus olhinhos arregalam e ela joga os braços ao redor do meu
pescoço de novo.
— Shukran, papai — diz baixinho, mantendo o segredo. — A
Anninha está triste também. — Me afasto para olhá-la. Eu sei que as duas
têm se falado regularmente depois que restauramos os serviços de telefonia
e internet, e ela está mais animada nesses dias.
Me sento no meu lugar e estendo a mão para ela, que coloca sua
mãozinha sobre a minha. Eu pisco com cumplicidade e ela faz o gesto do
zíper na boca. Eu rio, meu peito doendo em nostalgia porque isto se parece
com Anna. Parece uma eternidade desde que a vi, a senti contra mim, olhei
naqueles olhos verdes vibrantes. A saudade está esmagando meu coração,
mas antes não era seguro, e nessas duas semanas estivemos ainda limpando
a bagunça dos conflitos, lidando com as baixas, reparando as famílias que
perderam entes queridos. Eu levanto a mão de minha princesinha e deposito
um beijo suave e reverente.
— Eu te amo, nour hayati — murmuro.
— Eu te amo também, papai — murmura de volta e a dor em meu
coração é momentaneamente amenizada.
Focamos a atenção nas apresentações em minha homenagem pelos
próximos minutos. Respiro fundo. Não foram dias fáceis para nós, mas
vencemos. Agora só falta uma coisa: irmos buscar a nossa rainha.

Dois meses antes…


Anna Julia
Estava tão drenada de minhas forças que dormi na limusine a
caminho de casa. Acordo com meu pai me carregando no colo. Olho em
volta, reconhecendo nossa garagem.
— Papai, eu posso andar — reclamo, mas abraço-o pelo pescoço,
aconchegando-me mais. Ele ri, beijando o topo da minha cabeça.
— Eu levanto muito mais do que isso na academia, querida. — Se
gaba, me fazendo rir, ainda que esteja me sentindo destruída por dentro.
Ele nos leva para a passagem que dá direto em nossa cozinha e meus
olhos se enchem de lágrimas ao ver minha mãe e Lipe ao redor do balcão.
Eles vêm rapidamente nos encontrar e meu pai me coloca no chão.
— Bambina… — Minha mãe está chorando, me puxando para seus
braços. Eu abraço, os soluços irrompendo da minha garganta. Sinto Lipe me
abraçando por trás, depositando beijos suaves em meus cabelos. — Grazie
a Dio, Grazie a Dio, piccola. — Nossa mãe murmura uma e outra vez, me
mantendo bem apertada contra si. Inspiro, meu coração se alegrando ao
sentir seu cheiro, seu amor incondicional.
— Sinto muito, mamma. Sinto muito por preocupar vocês —
murmuro, afastando-me para poder beijar seu rosto. Ela segura meu rosto
dos lados e sorri em meio às lágrimas.
— Tuo padre nos contou tudo.… É um milagre que esteja aqui. É
um milagre.
— Passou, mamma. Passou — digo, cansada.
— Você foi muito corajosa, maninha. — Lipe me puxa para ele e eu
vou abraçando-o, amando seu cuidado e carinho. — Tivemos tanto medo,
Anna — murmura, apoiando o queixo em cima da minha cabeça. Abraço-o
mais forte, beijando seu peitoral.
— Eu também, maninho. Tive muito medo, mas a vontade de viver
me deu forças para lutar.
— Eu vou dizer umas verdades para Amihaj. Estou muito puto. —
Meu irmãozinho rosna, mesmo que suas mãos sejam suaves correndo pelos
meus ombros. — Que porra de país de merda é o dele?
— Lipe, ele não tem culpa de nada. — Me vejo defendendo Karim
veementemente. — A instabilidade não é sua culpa.
Ele rola os olhos.
— Deus, você está mesmo caidinha por esse cara, não é? — diz,
então franze o cenho para algo atrás de mim, imagino que nossos pais
estejam lhe dando um olhar de aviso. — Porra, sinto muito, maninha. Eu…
— Está tudo bem, maninho. O nome dele não está proibido nas
conversas. — Tento sorrir, mas isso sai tão falso. — Ok, estou na merda
total. — Admito.
Ele sorri, me puxando de novo, me embalando como se eu fosse
uma criança.
— Quando vai poder saltar de bungee jumping? — pergunta e
levanto a cabeça para olhá-lo. Há um brilho provocador em seus olhos de
uísque. — Andei treinando um pouco e quero chutar a sua bunda arrogante
qualquer hora.
— Oh, garoto, nem em seus melhores sonhos — resmungo e ele ri
mais.
— É bom tê-la de volta, maninha — murmura, beijando minha testa,
parecendo o irmão mais velho.
Eu rio, meu coração aquecendo de tanto amor.
Mais braços nos cercam, num abraço coletivo, fazendo mais
lágrimas turvarem meus olhos.
— Eu amo tanto vocês — sussurro embargada.
— Vem jantar, piccola. Fiz seu prato preferido. — Minha mãe diz
suavemente. Aceno, meu estômago roncando, me lembrando que não comi
o dia todo. É hora de juntar forças e seguir em frente, como sempre fiz.
Eu os deixo me guiar para o balcão e nos sentamos ao redor, me
lembrando de quando eu e Lipe éramos crianças. Nos servimos da costela
ao molho de barbecue e comemos em silêncio por alguns minutos. Eu repito
rapidamente, fazendo minha mãe sorrir, orgulhosa. Ela adora ver minha
gula por esse prato. Então, começamos a conversar. Falamos sobre a Ciara e
o quanto está grande e desenvolvida para seus poucos dias. E o assunto,
claro, acabou recaindo sobre mim e Karim. Eu lhes contei tudo, o rechaço
de seu povo, o modo como ele me defendeu, mas está preso ao seu dever.
Lipe rosnou de novo. Ele não está contente que eu tenha sido sequestrada
duas vezes naquele país.
— Filho, eu também quis dizer desaforos para Amihaj. — Meu pai
diz descansando os talheres no prato e limpando a boca com um
guardanapo. — Mas temos que reconhecer que o treinamento que ofereceu
a Anna aumentou suas chances de sobrevivência. — Seu tom é sério e Lipe
resmunga, mas aceita. O rosto de meu pai alivia um pouco a tensão e ele
exclama: — Porra, um fuzil, princesinha? Ganhei todos os cabelos brancos
da próxima década em apenas um dia!
Eu rio. É bom ver o brilho irreverente voltando em seus olhos.
— Nem me fale. Eu ainda estou processando essa parte, bambina.
— Minha mãe suspira, seu olhar ainda preocupado me sondando.
Terminamos o jantar e meu pai e Lipe vão cuidar das louças,
enquanto minha mãe sobe comigo para meu quarto. Ela me prepara uma
banheira morna com meus sais preferidos e me mima por algum tempo. Eu
lhe conto tudo que não contei para meu pai e Lipe. Há coisas que só uma
mulher pode entender.
— Quando duas almas se pertencem, piccola, elas podem se perder
por algum tempo, mas sempre encontram o caminho de volta uma para a
outra. — Me diz, massageando meu couro cabeludo enquanto lava meus
cabelos.
— Grazie, mamma. Eu o amo tanto — murmuro, sentindo a dor
persistente em meu peito.
— Deixe-o arrumar a bagunça em seu país, querida — diz
suavemente, enxaguando meus cabelos com o chuveirinho. — Talvez haja
uma saída para vocês ficarem juntos.
— Não há, mamma. As tribos exigem um casamento de Estado —
digo, desolada. Ainda está tudo fresco na minha cabeça. As ofensas daquela
reunião. O terror que vivi naquele sequestro.
— Dê tempo ao tempo, bambina. Eu vi a forma como seu príncipe
olhava para você quando pediu sua mão. — Seu tom fica mais suave,
esperançoso. — Ele dará um jeito.
Eu não digo nada. Apenas rogo silenciosamente para que ela esteja
certa e haja realmente uma forma de eu e meu príncipe ficarmos juntos. Ela
me enxuga, penteia meus cabelos, me fazendo rir do seu cuidado um tanto
exagerado, mas deixei porque eu precisava disso. Conversamos mais e,
quando começo a bocejar, me beija no rosto, deixando o quarto.
Me deito em minha cama. É familiar, mas agora parece que está
faltando algo. Rolo de lado, olhando para fora da minha sacada, e fecho os
olhos, imaginando a vastidão do deserto que via da varanda dos aposentos
de Karim. A dor da perda, da saudade me devasta.
— Habib… Eu vou morrer de tanta saudade. — Soluço, chorando
baixinho, apenas as lágrimas rolando pelo meu nariz, caindo sobre meus
travesseiros.
Instintivamente, seguro meu colar e recordo das suas palavras
amargas em nossa primeira despedida. Sei que não quis dizer aquilo. Ele
não é egoísta. Foi a situação, a nossa despedida forçada que mexeu com
suas emoções.
Embora esteja cansada, o sono me abandonou. Me levanto e sigo até
meu closet, pegando a caixa de Nate. Acendo a luz e volto para minha
cama, me sentando no centro. É hora de me despedir dessa corrente e
atender seu último desejo. Ainda há muitas cartas com pedidos de coisas
desafiadoras que pretendo cumprir. Não vou falhar com o meu garoto
especial. Não, eu jamais poderia falhar com um pedido seu. Eu toco minha
corrente, acaricio-a em meu pescoço, então, abro o fecho e a retiro com
cuidado, estendendo-a sobre a cama. Respirando fundo, abro a caixa,
procurando o envelope que nunca achei que iria abrir. No entanto, continuei
vivendo, como ele me pediu, e isso me trouxe até essa carta. Abro-o e retiro
a folha meio amarelada. As letras bonitas me trazem nostalgia e eu deslizo
meus dedos pelo papel, como fiz em cada uma, sabendo que ele as tocou.
Valorizo seu esforço em se comunicar comigo mesmo depois de separados
tão brutalmente.
— Eu estou aqui, meu garoto teimoso, como você queria —
murmuro, um pequeno sorriso repuxando minha boca. Puxo uma respiração
profunda e começo a ler.

Olá, Princesa,
Não sei quanto tempo demorou para você abrir esta carta… Se foi
logo, fico feliz que não tenha sofrido tanto. Espero que não tenha esperado
ficar velha e rabugenta, porque vou ter pena do pobre coitado que caiu na
sua. Você é tão teimosa, Anna!
Eu não consigo segurar um sorriso. Esse garoto bobo…
Falando sério, estou orgulhoso que cumpriu com o prometido e
tenha vivido, princesa. Como lhe disse uma vez, você é especial demais
para terminar sozinha. Retire a corrente e guarde onde achar melhor. Nós
cumprimos nosso tempo juntos e nos amamos tanto que daria para muitas
vidas. Seja feliz, princesa. Case, tenha filhos. Ame esse cara que ganhou
seu coração, porque sei que ele deve ser bacana. E nunca, jamais, perca
esse sorriso e esse brilho irreverente nos olhos. Viva, Anna! Continue
vivendo!
Nate.

Fecho os olhos, trazendo a carta para o meu peito. Duas lágrimas


caem pela minha face e a trago para meus lábios, beijando o papel
reverentemente.
— Eu vou, Nate — murmuro. Guardo a folha no envelope de volta e
pego a corrente, indo para o closet. Guardo a caixa e pego meu porta-joias
mais querido. Abro o camafeu, o rosto sorridente de Nate me saúda e novas
lágrimas enchem meus olhos, deslizo o dedo na pequena foto e trago-a até
meus lábios, depositando um beijo devotado. — Sim, nosso amor daria para
muitas vidas. Obrigada por ter feito parte da minha vida e dividir tantas
coisas bonitas comigo, meu garoto especial. Você sempre será lembrado por
mim. — Então, fecho e o guardo no porta-joias.
Volto para o quarto e torno a deitar, rogando a Deus que me deixe
viver plenamente essa segunda chance para o amor. Por que não me
apaixonei por um cara daqui da América? Seria tão mais fácil. Penso
amargurada, então, o rosto moreno e lindo de Karim me vem à mente e sei
que não seria nenhum outro, era ele. Tinha que ser ele. Eu fui até ele porque
tinha que ser. Me apego às palavras de minha mãe:

Quando duas almas se pertencem, piccola, elas podem se perder


por algum tempo, mas sempre encontram o caminho de volta uma para a
outra.

— Encontre o caminho de volta para mim, meu príncipe —


sussurro, meus olhos pesando, o cansaço me vencendo.

Dois meses depois…


Eu paro na área destinada à imprensa e poso para fotos com meus
pais e Lipe. Ella se aproxima com Mike. Minha prima já está linda como
sempre, nem parece que deu à luz há pouco tempo. Logo, todos estão
chegando para perto, meus padrinhos Leon e Júlia, Dam e Max. Tio Jay e
tia Cassie, Sam, Em e seus namorados. Luc, Samu e Chloe, com seu
barrigão impressionante. Ela está de quase oito meses e os gêmeos já
avisaram que não vão ficar muito tempo para sua mulher não se cansar
muito. Então, os flashes enlouquecem em cima de nós. Um Di Castellani já
atrai a mídia, imagine todos eles juntos! E quando Luc, Samu e Chloe
aparecem, então, as coisas ficam loucas porque, vamos combinar, ninguém
está acostumado a ver um trisal às claras assim. Eles são corajosos, os três.
Se amam muito também, isso é o que importa, o resto é conversa e
preconceito.
— Princesa Anna, aqui! É verdade que esteve envolvida com o rei
de Kamar?
Uma enxerida pergunta e meu coração aperta dolorosamente. Karim
é rei agora. A cerimônia de coroação foi transmitida pela TV e internet, mas
Nuria me enviou um vídeo exclusivo também. Eu chorei o tempo inteiro,
vendo-o tão bonito e imponente com o manto, a coroa e o cetro. E soube
que fiz a coisa certa. Ele nasceu para ser rei. Só me resta reaprender a seguir
em frente. Não deixei de acompanhar as coisas em Kamar, no entanto. A
situação ficou mesmo crítica, voltaram a fechar o espaço aéreo e fronteiras
terrestres, bem como cortar a telefonia e internet. Meu pai os ajudou com a
tecnologia que desenvolveu para as forças militares americanas em
operação no Oriente Médio. O programa permite que os militares se
comuniquem sem serem rastreados por nenhum satélite. Os noticiários
davam conta que Kamar estava lutando contra um perigoso grupo terrorista
chamado Al-Kidir. Por isso, percebi a diferença no tratamento e posturas
daqueles homens. Eram desumanos, diferentes dos primeiros.
Enfim, Karim venceu a guerra e subiu ao trono ontem. Os conflitos
cessaram tem duas semanas e fiquei pendurada, o tempo inteiro esperando
uma mensagem, um telefonema, qualquer coisa que me desse esperança de
que ele havia encontrado aquele jeito que minha mãe falou quando cheguei
aqui destruída. Nada veio, porém o que me esmagou foi a sua declaração na
coletiva que deu após a coroação, minutos antes de entrar no baile em sua
homenagem.
— Sim, vou me casar com a rainha escolhida pelo meu povo.
Ele dissera, encarando a câmera, e meu coração foi atingido, como
se aqueles olhos escuros estivessem olhando direto nos meus ali em meu
quarto. Ele vai fazer o casamento de Estado, como é esperado dele.
Por isso, eu não respondo nada para a repórter. Logo, estão
perguntando qualquer coisa para um de nós. Não respondemos, apenas
posamos, sorrindo e fingindo que eles não são intrometidos como o inferno!
Depois das fotos, seguimos para dentro do Metropolitan Museum of Art de
Nova York. Ella conseguiu duas exposições das minhas fotos. Essa de hoje
e outra em Londres para o próximo mês. Ela é fodona em sua área e
trabalharmos juntas me ajudou a espairecer e esquecer um pouco da merda
que está a minha vida amorosa.
Lipe pega meu braço, enfiando no seu, e me conduz para o salão
onde estão as minhas fotos. Um frisson de ansiedade e excitação está
espiralando em minha barriga enquanto ando sobre minhas sandálias altas
de tiras enroladas até os joelhos. Estou usando um longo amarelo, frente
única, deixando minhas costas à mostra. Um cinto de corda dourado marca
minha cintura, uma abertura frontal deixa minhas pernas à mostra a cada
passo. A cauda arrasta no chão atrás de mim. Meus cabelos estão presos
numa trança no alto da cabeça. Em minha maquiagem, eu quis homenagear
as mulheres kamarianas e marquei bem meus olhos com delineador preto, o
que destacou o verde, deixando-os mais vivos. Na boca um batom vermelho
que amo. E fiz tatuagens de hena nos braços também. Encontrei uma artista
oriental na 34th Street semana passada e a moça foi em minha casa hoje
pela manhã.
Entramos no salão e imediatamente sou assaltada pela emoção.
Minhas fotos estão espalhadas em tamanho grande, em vários nichos. Além
da iluminação das lâmpadas, há pequenas arandelas dos lados de cada foto.
— Oh, meu Deus! Ficou lindo demais! — Exclamo.
— Si, mas a arte dessas fotos supera qualquer organização, prima.
— Ella emparelha comigo. A olho de lado, seus olhos verdes doces estão
orgulhosos sobre mim, do mesmo jeito que os meus estão para ela.
— Eu sei que já disse, mas não custa nada repetir, você é uma fada
das artes, principessa mia — murmuro e ela sorri, meneando a cabeça,
momentaneamente encabulada.
— Ela é incrível, já lhe disse isso. — Mike beija o topo da cabeça da
esposa, um olhar orgulhoso e amoroso. — Obrigado por convencê-la a
mostrar suas telas também.
Sim, minha prima pinta telas maravilhosas. Ela tem se dedicado a
isso depois que deu à luz a Rico. Mas nunca quis mostrar para o público,
embora Mike tenha insistido e elogiado. Bom, pensando bem, Mike não é
um parâmetro porque, Jesus, ele vai elogiar tudo que sua boneca fizer. Eu
rio. Nós avançamos pelos corredores improvisados contendo fotos minhas e
telas dela, alternadas. Já há visitantes passeando por aqui e me permito
sentir pelo menos um pouquinho de felicidade.
— Perfetto, Anna. Parabéns, carissima! — Dam para ao meu lado
quando Lipe se junta a Max olhando uma tela de Ella. Se inclina, me
beijando na têmpora. Olho meu primo. Está lindo, o rosto parece mais
alegre, não sei bem o que é, mas há algo diferente nele. Ele olha para a
porta, eu sigo seu olhar e franzo o nariz. A nojenta da Olga, sua namorada,
está entrando. Bem, a oficial, pelo menos. Ironizo a safadeza de meu primo.
— Primo, você ainda não terminou com Olga? — sussurro, me
inclinando para ele. Dam rosna, parecendo irritado agora.
— Porra, essa garota não me dá mais folga! — resmunga. Pega seu
celular, digitando algo rapidamente, então, o guarda no bolso do terno
escuro. Sua cara é de poucos amigos quando a garota para perto dele. — Eu
disse que não a queria aqui, Olga.
— Por que, meu caro? Porque sua vagabunda está na cidade com
você? — Ela rosna, seus olhos fulminando meu primo. — Não pense que
não sei que a puttana chegou esta tarde no seu jato. — Range os dentes.
— Não ouse abrir a boca para falar uma palavra sequer direcionada
a Isadora, ou não respondo por mim. — Ele grunhe e arregalo os olhos.
Uh. Alguém me atualiza sobre isso. O que houve com ele, as
ofensas e comentários irônicos sobre a doutora? Onde está meu primo
Dam? Eles iniciam uma discussão sussurrada e eu saio de fininho. Avisto
Emma e Ben entrando no salão e sorrio. Eles vieram. Meu peito aperta ao
ver o quanto Ben está bonito e tão parecido com Nate. Meu lindo garoto
teria essa aparência se não tivesse ido tão cedo. Eles me veem e sorriem
também.
— Anna, que bom ver você. — Emma me envolve num abraço
caloroso. Quando se afasta, toca meu rosto. Tenho a impressão de que ela
vê seu filho perdido quando olha para mim. Seus olhos ficam brilhantes. —
Você está tão bonita, querida.
— Obrigada, Emma. Você está linda também. — Murmuro com
carinho para a mulher que sempre me tratou tão bem desde pequena.
— Minha mãe tem razão, você está uma gata, Anna. — Ben brinca,
mais uma vez me lembrando seu irmão. Ele tem o seu bom humor também.
— Até parece, você que está um gato. — Brinco de volta, recebendo
seu abraço e beijo no rosto.
— Que bom que tudo deu certo. Ficamos tão preocupados com sua
situação em Kamar. — Emma diz com carinho, seus belos olhos azuis
iguais ao de Nate e Ben me fitam com ternura.
— Sim, graças a Deus estou de volta sã e salva. — Assinto, mesmo
que uma parte de mim tenha ficado naquele país: meu coração. — Venham,
vou mostrar a vocês tudo que consegui registrar no deserto.
Enfio meus braços nos seus e os guio pelos corredores, explicando
cada foto e seu contexto. Me olham com orgulho. De certa forma, me
consideram da família, como eu a eles.
— Ben está noivando no próximo sábado. — Emma informa com
um sorriso amoroso para seu caçula.
— Uau! Sério, bonitão? — O encaro, me permitindo ficar feliz por
ele.
— Sim, Marissa e eu já estamos juntos há quatro anos. É hora de dar
o próximo passo. — Ele ri. Eu vou abraçá-lo e me afasto um pouco ainda o
segurando.
— Marissa é uma garota de sorte por tê-lo. — Murmuro, me
sentindo emotiva com o irmão de Nate. — Seja feliz, querido.
— Obrigado. — Seus olhos azuis cintilam e ele sussurra de volta: —
Seja feliz você também, Anna. Nate gostaria disso, vê-la feliz.
Percebo que Nate deve ter lhe mostrado as cartas. Eles eram muito
unidos.
— Estou tentando, Ben. Estou tentando. — Assinto.
Fico com eles por mais um tempo, e quando se despedem eu tomo o
último corredor, o que estive evitando até agora. A foto da parede do fundo
atraindo meus olhos como um ímã. É uma foto de Karim segurando Ayla no
colo. Eu ando devagar até lá, meu peito sendo comprimido na saudade que
nunca vai embora. Foi o nosso primeiro passeio a Jawahra. Paro bem perto,
bebendo dele, deles. Ayla, minha princesinha linda. Meus olhos se enchem
de lágrimas e eu toco o rostinho alegre da pequena.
— Quanta saudade, minha sapequinha. — Murmuro embargada.
Meu olhar indo para seu pai, lindo em trajes formais, os olhos negros
olhando para a câmera. Há tanto amor brilhando nas íris escuras para mim.
Eu toco-o, não contendo um soluço, sei que nunca vou esquecê-lo. — Eu
amo você, amiri. Para sempre. — Sussurro, sentindo meu coração
esmagado.
— Eu também amo você, amirati.
Eu congelo ao ouvir a voz bem atrás de mim. Oh, meu Deus… Meu
coração dispara com tanta força que acho que vou desmaiar. Não pode
ser… Ele, ele… Novas lágrimas turvam meus olhos e me viro, devagar,
com medo de meus pensamentos estarem me pregando uma peça, porque o
queria muito aqui comigo hoje, conforme me prometeu antes de tudo ir
pelos ares. Então, eu o vejo, os vejo e levo minhas mãos à boca.
— Olá, Anna. — Karim murmura, seus olhos negros intensos,
cintilantes se fixando nos meus. — Eu sempre cumpro minhas promessas,
‘amira. — Engasgo, não conseguindo falar nada.
— Anninha! Eu estava com tanta saudade, habibti! — Ayla me
salva quando solta a mão de seu pai e se joga sobre mim. Eu me abaixo,
pegando-a nos braços, saindo do meu torpor.
— Minha sapequinha linda. — Murmuro, abraçando-a bem
apertado, minhas lágrimas descendo pelas faces. Seu corpinho está
tremendo de felicidade, enquanto me rodeia o pescoço com seus bracinhos.
— Eu também estava morrendo de saudades, habibti. — Digo embargada e
encosto minha testa na sua. Ela ri, os olhinhos cheios de lágrimas também.
— Você cuidou bem do seu papai, como pedi? — Ela acena.
— Meu papai é um rei agora. — Diz em sua tagarelice e eu rio, meu
peito aquecendo. O que isso significa? Ele disse que me ama também ainda
há pouco. Vai me propor aceitar seu casamento de Estado? Porque isso me
mataria aos poucos, ter que dividi-lo com uma cadela treinada. Desvio o
olhar para seu pai e meu coração para. Ele está lindo em um terno escuro,
os cabelos presos no coque que o deixa ainda mais sexy. É impressão minha
ou seus ombros parecem mais largos? Dois meses… Dois meses sem vê-lo
e estou lutando contra a vontade de me jogar em seus braços, como Ayla fez
comigo.
— Sim, ele é, habibti. — Murmuro, meus olhos presos aos dele. Ele
olha para trás e só agora percebo Jamile, uma das babás de Ayla. Karim faz
um gesto e ela se aproxima.
— Leve a princesa para ver as outras fotos, Jamile. Eu preciso estar
a sós com Anna. — Sua voz... Deus, sua voz, meu corpo treme inteiro ao
ouvir o som lindo e profundo. Jamile vem até mim, tirando a pequena dos
meus braços.
— Eu quero ficar com a Anninha, papai. — Ayla, protesta e eu
sorrio.
— Você terá muito tempo para ficar com ela, nour hayati. Nós
vamos levá-la de volta, lembra? — Ele diz e meu coração falta sair do
peito. O encaro, levantando uma sobrancelha.
— Oi, Anna. Está tudo tão bonito! — Jamile exclama e sorrio-lhe.
— Shukran, Jamile. Bom ver você — digo com afeto. Ela sempre
me tratou muito bem desde a minha chegada ao palácio.
Ela se afasta com Ayla e fico sozinha com Karim. Nossos olhares
voltam um para o outro. Ele me contempla em cada detalhe, se detendo nas
tatuagens em meus braços. Seus olhos voltam para os meus e há um brilho
quase feroz em seu olhar penetrante. Engulo em seco, sem saber o que
dizer. Anda devagar para mim e minhas pernas viram mingau quando para
bem perto.
— Anna… Nour Al sabah… — murmura com tanta emoção na voz,
e choro ouvindo-o me chamar assim.
— Karim… Meu amor… — Não consigo não dizer o que sinto por
ele. Seus braços enrolam em minha cintura e eu apoio as mãos em seus
ombros, precisando me segurar ou vou cair. Meu corpo está tremendo de
tanta emoção. Acho que o dele também. Nós nos abraçamos bem apertado,
como se quiséssemos nos fundir, precisando desse contato depois de tanto
tempo. Então sua mão segura minha nuca e afasto meu rosto para olhá-lo.
Há lágrimas em seus olhos negros e ele abaixa o rosto, a boca respirando
pesadamente na minha.
— Wallah, senti tanto a sua falta, amirati — diz como se estivesse
sentindo dor, e então sua boca abaixa na minha, sem pedir permissão, sem
mais conversa. E eu o recebo ansiosamente, choramingando pelo prazer de
senti-lo outra vez. Seu beijo é cheio de fome no começo, a boca exigente
sobre a minha, sugando a minha língua, seu corpo delicioso, seu cheiro,
tudo nele me embriagando, me dopando de desejo, amor. Tanto amor. Nós
nos beijamos não sei por quanto tempo, perdidos para o resto do salão.
Nossas bocas nunca desgrudando, nos mordendo, sugando, agora
vagarosamente. Sua mão pega minha cintura e me puxa firmemente contra
seu corpo e gemo ao sentir a ereção longa e grossa, pronta para mim. Meu
corpo inteiro convulsiona, minha calcinha ficando toda úmida. Eu pulso,
latejo, pronta para ele também. Quando arranca a boca da minha,
respiramos irregularmente, ainda agarrados.
— Eu te amo e farei de você a minha rainha — murmura
asperamente. — Me desculpe por ter sido tão estúpido em nossa despedida,
‘amira. Tudo que disse sobre o colar, me envergonho muito. Nate sempre
será importante para você, como Yasmina sempre será para mim.
Eu meneio a cabeça. Meu coração transbordando, batendo tão forte
que sinto meus ouvidos zumbindo.
— Eu sei, habib. Você sempre respeitou a minha história, como
respeito a sua — murmuro e seu olhar fica mais intenso. Ele me cheira,
deslizando o nariz pela minha face.
— Eu estava morrendo sem você. — Grunhe e meu coração canta,
ouvindo-o.
— Eu também — sussurro, olhando-o, minhas mãos indo para seu
rosto ainda sem acreditar que está aqui. Então, me lembro da sua entrevista
ontem e congelo em seus braços. Ele sente e pega meu queixo, me fazendo
encará-lo. — Você vai fazer o casamento de Estado. Vi a sua entrevista. —
Acuso-o. — Como pode vir aqui e…
— Era de você que estava falando, habibti — diz, me encarando
intensamente. — Você é a rainha escolhida pelo meu povo.
— O-o quê?! — Balbucio, não conseguindo acreditar nisso.
— Sim, ‘amira. — Ele ousa sorrir, encostando a testa na minha. —
Eles a aceitaram. Muito antes de eu subir ao trono, mas Kamar ainda não
era seguro, por isso não a contatei antes. Se eu ouvisse sua voz, ia querer
ver você, e não podia arriscá-la de novo. — Respira tremulamente. —
Aquela noite ainda me assombra. Eu pensei que ia te perder para sempre.
— Eu também, meu amor. — E rio em meio às lágrimas, só que
agora são de felicidade. Felicidade incomensurável!
— Me beije mais um pouco antes de irmos circular — pede,
segurando minha cintura, suspendendo meus pés do chão. Eu rio, puxando
sua nuca, trazendo sua boca para a minha de novo, e chupo seus lábios
juntos. Ele geme rouco, nos girando devagar, enquanto aprofundamos o
beijo, suspirando, gemendo na boca um do outro. Meu peito parece que vai
explodir de tanto amor por esse homem. Ele voltou. Encontrou seu caminho
de volta para mim.

***

Cerca de duas horas depois, nós entramos em sua cobertura recém-


adquirida de frente para o Central Park. Ayla já dormindo em seu ombro
enquanto subíamos o elevador. Nossos olhares se devorando, a saudade, o
tesão nos inflamando. Foi uma tortura continuar na exposição depois de
beijá-lo e senti-lo contra mim, mas aguentei porque era algo importante
tanto para mim quanto para Ella. Quando enfim saímos daquele corredor,
andamos abraçados, juntinhos, vendo todas as fotos, e o orgulho estampado
em seu rosto me arrebatou. Meu pai ficou surpreso, minha mãe trocou um
olhar cúmplice comigo, e Lipe… bem, meu irmãozinho teve que ficar na
sua. O restante da família logo se reuniu ao nosso redor e depois da
exposição fomos ao terraço do museu, tomarmos uma bebida no bar,
apreciando a vista de Manhattan. O espaço foi fechado apenas para nós por
questões de segurança.
Nós colocamos nossa pequena na cama e seguimos para o quarto
principal, no fim do corredor. Um silêncio de repente se instala entre nós.
Entro quando ele abre a porta, me dando passagem. Ando até o meio do
cômodo espaçoso e requintado, com uma enorme cama dossel acima de
dois degraus. As portas para a sacada estão abertas, a brisa noturna
entrando. Nova York está brilhando em milhões de luzes lá fora. Ouço-o se
movimentando pelo quarto e logo o som soa no ambiente. É uma rádio
local, uma música pop se encerra e então, Can I Be Him, de James Arthur,
se inicia. É maravilhosa, essa música. Adoro o James. Sinto-o atrás de mim
e fecho os olhos quando as mãos mornas acariciam minhas costas nuas, sua
boca plantando beijos suaves em minha tatuagem, depois espalhando-os
pelos meus ombros e nuca, onde mordisca levemente. Meu corpo inteiro
arrepia, estremecendo. Segura minha cintura e dança comigo assim, minhas
costas contra seu peito, seus lábios caindo para meu pescoço. Me suga e
mordisca tão gostoso. Eu molho toda e junto as coxas, o vazio em mim
começando a doer para ser preenchido. Ele sorri, o som profundo vibrando
em minha pele.
Karim leva as mãos para o zíper do meu vestido e o desce
lentamente, em seguida, desprende o fecho da nuca. O tecido desliza pelo
meu corpo junto com suas mãos grandes apalpando, sovando minha pele.
Eu arquejo quando as mãos sobem pelo meu ventre se fechando em meus
seios. Ele os amassa deliciosamente, esfregando as palmas sobre os
mamilos túrgidos. Olho-o de lado e sua boca bem-feita vem respirar perto
da minha, e minha calcinha fica toda alagada. Um meio-sorriso arrogante
brinca em seus lábios. Continua sovando meus seios, agora com mais
pressão, puxando os bicos, e ofego, pendendo minha cabeça em seu ombro.
Ele me gira de frente e acaricia-me onde consegue tocar, barriga, braços,
bunda, coxas. O olhar faminto preso ao meu.
— Perfeita. Tão perfeita… Eu sonhei tanto com isso, amirati —
sussurra e enfia a mão pelo cós da minha calcinha, deslizando os dedos em
minha umidade, rosnando ao me sentir toda molhada. Segura minha nuca e
sobe pegando minha trança com a mão livre, dando um puxão que me faz
gemer e latejar. Abocanha um seio ao mesmo tempo em que empurra um
dedo grosso em minha vulva.
— Karim… — Gemo seu nome, pingando de tanto tesão, meu
ventre em chamas, querendo-o dentro de mim. — Quero tanto você,
habib… — Choramingo.
— Eu também, Anna — murmura, chupando meu seio,
mordiscando o bico, puxando-o perversamente entre os dentes. Eu seguro
sua cabeça, me oferecendo para seu ataque sensual. Acrescenta outro dedo
em minha vagina e entra ardendo pelo tempo que estou sem atividade lá
embaixo… Muda para o outro seio, mamando gostoso enquanto me come
com os dedos, seus olhos sobem segurando os meus, me encarando
intensamente. — Estava louco para sentir você assim, toda minha, habibti.
— Geme rouco, alternando chupadas e mordidas em meus seios e mio,
meus líquidos descendo, pegajosos no topo das minhas coxas. Ele não
parece apressado, mamando em um e outro.
Ele já se livrou do terno e passo a abrir os botões da sua camisa,
tremendo, desejosa para ver seu corpo nu e quente. Corro as mãos pelo
peitoral e abdome bem definidos. Me inclino, beijando seus músculos, e
sugo o mamilo devagar, raspando os dentes em seguida. Karim estremece,
gemendo alto, entorta os dedos em meu canal arrastando-os, esfregando-os
no ponto que me atira para o orgasmo. Ele conhece o meu corpo tão bem.
Eu gemo, latejando sem controle. Sua boca perversa sobe pelo meu
pescoço, sugando, mordendo-me deliciosamente. Aumenta a velocidade dos
dedos, entrando fundo, duro, passando a esfregar meu clitóris e rosna contra
o meu pescoço: — Saudade dessa bocetinha gostosa, princesa.
Choramingo, estendendo a mão para sua virilha, pegando seu pau
duro por cima das calças escuras. Ele grunhe enquanto deslizo os dedos
pelo contorno grosso e longo. Lambo meus lábios e ofego, quando esfrega
meu clitóris com mais pressão. Respiro mais e mais rápido, me pendurando
seus ombros, o orgasmo vindo com força. Labaredas se espalham em meu
ventre e eu explodo, gozando, gemendo alto, meu corpo inteiro sacudindo.
A emoção me toma junto com o prazer e eu choro, me agarrando a ele,
querendo-o impregnado em mim.
— Eu pensei que nunca mais estaria com você assim. Senti tanta
falta de você, habib. Tanta… — murmuro, entrecortado. Ele me olha com
intensidade, adoração nas pupilas negras.
— Amirati… — sussurra com tanta reverência que me faz chorar
mais. — Shh, não, habibti. Não chore.… Estou aqui e você nunca mais
ficará sem mim de novo — diz feroz e ainda suavemente. Então, me levanta
nos braços e atravessa o quarto comigo, me colocando no centro da cama.
Ele sorri para mim, lindo demais, puxando o cinto, em seguida as
calças e cueca boxer para baixo. Eu bebo dele, meus olhos adorando-o sem
qualquer cerimônia, indo em direção ao pau longo e grosso, duro. Minha
vagina pulsa, toda alagada. Seu olhar intenso prende o meu e Karim sobe na
cama, o corpo moreno e delicioso vindo para cima do meu. E sim, seus
ombros estão mais amplos. Ele andou caprichando na academia. Olho-o
maravilhada. Suas mãos pousam dos lados da minha cabeça e ele me
encara, a mesma expressão de encantamento que deve estar em meu rosto.
— Ah, esses olhos, ‘amira… Sonhei com eles me olhando assim,
cada noite que estive sem você… — sussurra e sua boca vai descendo pelo
meu pescoço, deixando minha pele pegando fogo onde toca, descendo mais
e abocanhando meu seio, chupando a carne mais duramente. Ofego,
adorando sua pegada firme. Vai mais baixo, lambendo minha barriga, as
mãos apertando minha cintura. Escorrega para baixo e eu arqueio-me ao
sentir o hálito quente sobre o meu monte. As mãos pegam as laterais da
calcinha e a puxam suavemente pelas minhas pernas; arreganha minhas
coxas, quando a retira por completo e enfia o rosto em minha carne toda
molhada e latejante. Karim me lambe toda, abrindo-me e sugando cada
reentrância, enfiando a língua em minha vulva, bebendo meus líquidos, o
som de sucção luxuriosa reverberando no quarto.
Convulsiono, arqueando-me mais, minhas mãos indo para seus
cabelos, e giro meus quadris levantando-os da cama. Ele rosna e me dá um
tapa em cada nádega, me fazendo gemer em abandono. Empurra dois dedos
em minha vulva, a boca faminta passando a sugar e mordiscar meu
montículo inchado. Uma enxurrada de líquidos quentes desce pelo meu
ventre, uma camada fina de suor brotando em minha pele. Resfolego, o
gozo vindo de novo, mais denso, voraz.
— Karim, ahhh… Meu amor… — Balbucio e ele torce os dedos em
meu canal perversamente, torturando meu ponto de ruptura, e torno a
explodir, gritando em êxtase lancinante. Ele estende a mão livre, agarrando
um seio, amassando-o, puxando o bico, passando para o outro, e as ondas
lascivas continuam reverberando pelo meu corpo. Eu gozo e gozo,
gemendo, tremendo. Ele puxa os dedos para fora e abre meu clitóris,
expondo a pequena protuberância, o dedo esfregando-a com perversão.
Engasgo, novas ondas de gozo me assaltando. Eu convulsiono, gemo,
perdida em sensações avassaladoras.
Ele sorri de forma indulgente, de macho que sabe como levar sua
fêmea à loucura na cama, e afasta a boca perversa do meu monte. Sobe
novamente, colocando-se em cima de mim, me fazendo gemer com a
sensação da pele quente na minha.
— Abra bem as coxas para mim, princesa… — Seu tom é
engrossado e faço o que orienta, arreganhando-me toda. Suas mãos
levantam minha cabeça e desfaz habilmente a trança, espalhando meus
cabelos sobre o travesseiro branco. Seguro-o pelos ombros, deslizando
minhas mãos pelos músculos firmes. Sinto a cabeça gorda abrindo meus
lábios vaginais, se alinhando em minha vulva. Me abro mais, querendo
desesperadamente tê-lo dentro de mim. Seus olhos negros estão ainda mais
intensos nos meus e ofego quando pega meus cabelos em cada lado da
minha cabeça, seu olhar nunca sai do meu e urra, metendo o pau todo em
mim. Grito, convulsiono, sendo esticada dolorosa e deliciosamente pelo
grande volume. Entra profundamente. Nós dois estamos respirando
erraticamente, nos encarando com amor, tesão, entrega.
Karim puxa quase tudo e volta, socando ainda mais fundo, suas
mãos firmes em meus cabelos, me forçando a continuar olhando em seus
intensos olhos escuros. Ele me come assim, tirando e voltando a estocar
fundo. É lento no começo, depois vai aumentando a força dos golpes,
conforme minha vagina vai cedendo à sua espessura e tamanho. Estou
muito molhada, facilitando sua posse, mas ainda dói um pouco. Eu
choramingo viciada nessa dor luxuriosa e gostosa. Estou toda esticada à sua
volta e ele aprecia isso, pelo brilho arrogante em suas íris. O deixo me
montar o quanto quiser, nunca desviando meus olhos dos seus.
— É isso, minha putinha, me deixa te comer do jeito que eu
quiser… — Grunhe as obscenidades e eu latejo, molhando-me, molhando-o
mais. Ele sorri e sua boca viaja pelo rosto até meu ouvido, mordendo,
sugando o lóbulo. Então, murmura perversamente: — Que gostoso meter
meu pau todo nessa boceta apertada… E você toma tudo tão obediente,
gananciosa por mais, não é, princesa? Vontade de rasgar essa boceta,
porra… — Gemo em desamparo com seu ataque despudorado. Sua voz é
enrouquecida, dura, enquanto me come com força agora, rasgando-me
fundo e forte. Recebo seus golpes bruscos, entrando até o punho. Eu gemo
em abandono e ele bate profundamente, sem pena, me fazendo berrar, meu
corpo todo estremecendo. Ofego de boca aberta e sua boca vem para o meu
queixo, mordendo-o, as mãos firmes em meus cabelos, me fazendo encará-
lo outra vez. Sua boca se apossa da minha num beijo molhado, cheio de
tesão, enquanto me fode mais e mais. Minhas unhas arranham suas costas e
ombros, nós dois gemendo roucamente, delirantes de prazer.
Sua boca abandona a minha e desce pelo meu pescoço, encontrando
o seio direito, chupando-o gulosamente, depois o esquerdo. Arqueio-me e
ele lambe meus mamilos, fazendo pulsos de calor líquido descerem em meu
canal. Ruge e puxa quase tudo, voltando a empurrar profundamente, duro.
Eu grito e ele pega minha coxa direita, enrolando-a em seu quadril, e me
come esfomeado, socando tão fundo quanto consegue ir. Suor está cobrindo
nossas peles e me penduro completamente em seus ombros, quase
levantando da cama com seus impulsos duros dentro de mim. Então, seu
rosto sobe e nossos olhos se encontram mais uma vez.
— Habibti… — Geme rouco e sua boca vem para a minha. — Estou
quase gozando.… Tão gostosa.… Tão perfeita, amirati… — E mergulha a
boca na minha, num beijo sedento, apaixonado. Nossas línguas se
entrelaçam numa dança luxuriosa e passo a rebolar, recebendo-o todo
dentro de mim. Abraço-o com as duas pernas, cingindo sua cintura, e Karim
grunhe, me comendo mais e mais voraz, seus braços vindo por baixo dos
meus ombros, puxando-me dolorosa e perversamente para receber seu pau
até o punho a cada estocada. Meu ventre se contorce, a sensação familiar se
espalhando mais uma vez. Arfo, respirando entrecortado, antecipando meu
gozo e ele me rasga, parecendo fora de si, o som de suas estocadas soando
no quarto. Eu o puxo pela bunda dura, me dando, deixando-o me ter como
quiser. — Porra, assim, toma meu pau todo! Goza comigo, Anna! Gostosa
demais… — Convulsiono, meu canal mamando em seu pau e ele urra
guturalmente, os jatos quentes de esperma começam a me encher. Eu berro
alto, gozando com tanta força que minha vista fica turva.
— Karim… Habib… Que gostoso gozar no seu pau… — Eu digo
sem vergonha e ele rosna, me comendo ainda com força, despejando cada
gota dentro de mim. Eu gemo seu nome uma e outra vez, como um mantra.
Nossos corpos estão tremendo, gozando juntos, completamente
apaixonados, extasiados. Sua boca volta a tomar a minha e me beija
enquanto os tremores do gozo esplendoroso nos castigam.
— Anna… — Geme meu nome também, o som rouco, profundo e
suas estocadas vão perdendo a força, até que para bem enterrado em meu
canal dolorido.
Continuamos na mesma posição, nossas bocas unidas se explorando,
agora lentamente, arfantes. Nossas peles estão grudadas e amo a sensação, o
cheiro do nosso sexo no ar. Eu gemo baixinho e ele afasta a boca da minha,
nossos olhos se abrindo, e nos contemplamos em silêncio por alguns
instantes em completo arrebatamento.
— Eu amo você, amirati — sussurra contra a minha boca. Eu pego
seu rosto dos lados, alisando a barba, me deliciando em sentir a textura de
novo. Não quero dormir esta noite para não parar de olhá-lo, senti-lo.
— E eu amo você, malkaa[34]. — Sussurro de volta. Seus olhos
ficam muito brilhantes e suas mãos vêm para o meu rosto também, os dedos
acariciando minhas faces.
— Malikati… — diz com tanta reverência que meus olhos
lacrimejam. — Você é o meu destino. Ninguém mais vai conseguir nos
separar, eu prometo.
— E você é o meu, habib — digo, tão enlevada e apaixonada que é
impossível mensurar. Ele nos rola, me colocando por cima, escarranchada
sobre seus quadris, e o sinto ainda duro, pulsando em meu canal. — Tão
vigoroso, honorável Majestade… — O provoco, rebolando, girando meus
quadris.
Um meio-sorriso safado levanta seus lábios e ele me puxa pela nuca,
a boca engolindo a minha de novo num beijo apaixonado, sôfrego. E nos
entregamos à paixão noite adentro, sabendo que enfim estamos juntos e
lutaremos para continuar assim.
CAPÍTULO QUINZE
Anna Julia
Eu acordo com uma boca macia depositando beijos pela minha
coluna. Gemo baixinho e uma risada profunda me enche de alegria. Karim.
Meu príncipe… Espera, meu rei lindo, voltou para mim. Ele acaricia
minhas costas e braços com tanta delicadeza e reverência que minha
vontade é ficar aqui deitada o dia inteiro, sentindo seu toque delicioso.
— Acorde, habibti — murmura, beijando meu ombro. —
Precisamos nos preparar para ir almoçar com sua família.
Me remexo na cama e gemo, sentindo meu corpo deliciosamente
dolorido. Quase não dormimos, matando a saudade imensa que estávamos
sentindo um do outro. Karim sorri, um som arrogante de quem sabe que
usou e abusou de mim por horas a fio. Eu rio baixinho, abrindo os olhos.
Horas a fio e eu amei cada momento. Minha mão direita está diante do meu
rosto e meu sorriso amplia ao ver meu lindo diamante rosa de volta em meu
dedo. Karim o colocou ontem à noite, depois da segunda rodada… Rolo,
ficando completamente livre do lençol, e seus olhos escuros aquecem,
varrendo meu corpo nu.
— Pare de provocar, ‘amira — murmura, o olhar queimando minha
pele. — Não temos muito tempo. Dormimos demais.
— Ou de menos… — Eu aponto, me espreguiçando sobre os lençóis
macios. — Você estava deliciosamente insaciável ontem, Majestade.
Um meio-sorriso perverso curva seus lábios. Ele se debruça,
depositando um beijo suave em minha boca, e volta a ficar em pé perto da
cama. Já está de banho tomado, os cabelos molhados caindo pelos ombros
fortes, seu cheiro gostoso me tentando os sentidos. Meu corpo acende,
mesmo estando bem desgastado da intensa atividade de ontem.
— Eu gosto de você me chamando assim. — Seu olhar fica ainda
mais malvado quando sussurra: — Principalmente se estiver de joelhos,
mamando em meu pau.
Ah, droga… As imagens minhas fazendo exatamente isso, na
terceira rodada, me atingem e eu latejo, molhando. Ele solta uma risada
profunda e se vira para o closet. Eu rio também, me levantando da cama e
andando nua para o banheiro.
Cerca de uma hora depois, chegamos à casa de meus pais. Todos já
estavam lá. Marcamos de almoçar e, no fim da tarde, cada um volta para
sua casa. O almoço foi animado, a família inteira em volta da grande mesa,
que nós só usamos nessas ocasiões. Meus pais gostam de fazer as refeições
comigo e Lipe na cozinha, num ambiente mais íntimo, e nós sempre
adoramos. Percebi Dam irritado e imagino que a discussão com a tal Olga
tenha rendido. Meu padrinho Leon também parece preocupado. Pelo que
meu pai compartilhou comigo, os movimentos antimonárquicos continuam
crescendo em Ardócia. Já tem alguns meses que isso o está preocupando.
Max chegou a sofrer um atentado dois meses antes do casamento dos
gêmeos. Espero que tudo se resolva logo e meu padrinho volte a ficar bem.
Após o almoço, nossos pais se juntaram na biblioteca para uma
bebida e colocar o papo em dia. Eu, Karim, Lipe e nossos primos fomos
para o salão de jogos, aproveitar bem as horas que ainda faltavam para nos
separarmos. As babás estão cuidando de Ayla, Rico e Ciara no andar de
cima. Eu e Karim saboreamos nossas cervejas, sentados nos estofados no
canto do salão, algo está passando na TV, mas ninguém está assistindo
porque nesses momentos em família gostamos de conversar e nos provocar.
Mike entrega uma cerveja sem álcool para Ella e se acomoda ao seu lado na
poltrona de dois lugares à nossa esquerda. Luc e Samu estão paparicando
Chloe e seu barrigão no sofá maior à nossa frente. Luc massageia os pés da
esposa enquanto está recostada no peito de Samu. É uma dinâmica meio
louca, mas é lindo vê-los juntos. Dam joga sinuca com Max e Lipe. As
gêmeas estão entrando neste exato momento com seus namorados. Os
quatro vão passar uns dias no Brasil, aproveitando a pausa da Fórmula 1.
Elas me confidenciaram que os rapazes estão pretendendo pedi-las
em casamento! Tio Jay vai pirar! Todavia, não posso dizer que é cedo, uma
vez que começaram seu namoro bem antes de mim e Karim. Não é o tempo
que conta, mas sim o sentimento. Há pessoas que namoram por uma
eternidade e acabam se separando. E há outras que se conhecem em pouco
dias ou meses e sentem como se conhecessem um ao outro por toda a vida.
Olho de lado para Karim. É assim que me sinto com ele. Parece que o
conheço há tanto tempo, mas tem apenas quatro meses. Meu coração foi
tocado pelo meu cavaleiro, meu príncipe guerreiro, desde o começo. Ele
sente o meu olhar e vira a cabeça, os olhos negros suavizando, então, abaixa
cabeça, a boca gelada da bebida tocando a minha num beijo terno.
— O que há com Dam, Ella? — Em pergunta, arrastando Nolan pelo
braço, sentando num dos sofás à nossa direita, formando um quadrado com
a mesinha no centro, onde colocamos baldes com cervejas.
— É mesmo, ele está mais irônico do que o normal desde ontem. —
Sam adiciona, acomodando-se também com o namorado Will.
Eles são dois morenaços gatos demais! Cabelos escuros e olhos
azuis intensos. Eles parecem mais irmãos do que primos, na verdade.
Parecem muito unidos também, o que é bom porque assim as meninas não
precisam ficar longe uma da outra.
— Ele está preocupado com a tensão em Ardócia. — Ella olha em
direção ao irmão mais velho, seu rosto enternece. — Mio papà também. Os
movimentos não param de crescer…
— O Serviço Secreto está suspeitando da família Lorenzatti… —
Mike entra na conversa, o tom abaixando. — Por isso, Dam está irritado. O
chefe Falconi acha que a aproximação de Olga Lorenzatti com o príncipe
herdeiro pode ter sido planejada.
— Como assim? — Franzo a testa, um tanto assustada. Meu pai não
compartilhou isso comigo ainda. — O que esses Lorenzatti podem fazer
contra os Di Castellani?
— Depois dos Di Castellani, os Lorenzatti são a linhagem mais
antiga em nossa ilha, prima. — A voz de Dam me faz olhar de lado. Ele
anda até a mesinha de centro, pegando uma cerveja, e se senta no braço do
sofá, perto de Ella. Torce a tampa da long neck e toma um gole, sua cara de
poucos amigos. — Se for comprovado que os filhos da puta estão armando
contra nós, só posso dizer que irão se arrepender amargamente.
Eu tremo um pouco com sua veemência. Dam tem uma escuridão
nele. Ele não é o tipo de príncipe politicamente correto. Ele segurou o
homem que sequestrou Ella para se vingar de Mike, há mais de quatro anos,
para que nosso primo o matasse. Embora Mike tenha ficado abalado a
princípio, Dam lhe disse para parar de besteira, que aqui nessa terra é olho
por olho, dente por dente. Pois é. Esse é o futuro rei de Ardócia, e se
alguém o está ameaçando de alguma forma, não tem ideia de com quem
está mexendo.
— O compreendo, Damien. — Karim, diz fazendo meu primo olhá-
lo. — Há momentos em que precisamos ir para a batalha, literalmente.
Como todos sabem, passei por isso recentemente em meu país. Se Kamar
puder ajudar de alguma forma, saiba que pode contar conosco.
Dam estuda meu noivo por um instante, então, abre um sorriso,
acenando.
— Grazie por isso, Amihaj. — Levanta sua cerveja num brinde à
distância para Karim. — Mas, por favor, me chame de Dam. Você será meu
primo em breve.
— Certo. — Karim devolve o sorriso amistoso. — A oferta continua
de pé.
— Se for necessário, iremos conversar melhor, grazie. — Meu
primo torna a rir e me olha dando uma piscada. — Por enquanto, apenas
mantenha esse sorriso no rosto de minha prima. Assim ela para de ser
enxerida com as vidas amorosas de todos nós.
Faço uma carranca para ele.
— Calúnia isso, primo. — Resmungo, e não só ele, mas todos em
volta riem.
Nós emendamos uma conversa sobre o início da temporada da
Fórmula 1, os primos lindões Belmont respondendo a tudo com seu carisma
e charme. Minhas primas olhando-os com seus olhos brilhantes de amor.
Bem, acho que todos nós estamos encaminhados. Uh, menos Lipe e Max.
Eu olho para trás, observando os dois jogando e bebericando suas cervejas,
parecendo leves e despojados. Eles ainda vão demorar a entrar nessa vibe
de relacionamentos sérios.
— Vocês têm que pegar o título nessa temporada também, caras. —
Samu diz para Will e Nolan. Os gêmeos gostam do esporte e estão mais
maleáveis com os futuros cunhados depois que Will ganhou o
tetracampeonato.
— Verdade. Deixem aquele palhaço do Midonnet comendo poeira
de novo! — Luc rosna. É evidente o orgulho deles. Midonnet é o rival mais
acirrado de Will na Fórmula 1.
— Isso é com Will. Eu apenas cuido da parte burocrática da coisa
e…
— Ele está sendo a porra de um modesto. — Will corta Nolan. — O
próximo carro Belmont é projeto por meu primo gênio. Ainda não
anunciamos nada para a imprensa, no entanto.
— Apenas a família; e, claro, Em e Sam já sabiam. — Nolan parece
um tanto sem jeito por ter a atenção sobre si, então se inclina, beijando
suavemente os lábios de Em.
— Estamos animados para colocar esse projeto na pista. — Will diz
com seu jeito carismático, encarando Sam, e pisca. — Eu vou ganhar mais
títulos para você, princesa. — Ele é mais expansivo do que Nolan, e Sam se
derrete toda.
Sorrio, feliz por minhas primas. Eles parecem ser decentes, embora
a imprensa sempre os retrate como baderneiros e mulherengos. Ok, eu acho
que os bonitões não eram muito pudicos, mas a imprensa às vezes exagera.
Nós ficamos juntos até que cada um se despediu e seguiu de volta
para casa.
Karim e eu ficamos em Nova York por mais três dias,
providenciando minha ida definitiva para Kamar. Na última tarde, antes de
nossa partida, ele me ajudou a embalar minhas coisas e amei tê-lo em meu
quarto. Apenas Nate havia entrado aqui e parece justo que meu futuro
marido compartilhe disso comigo também. Mostrei o porta-joias onde
guardei a corrente de Nate, a caixa com as cartas. O permiti ler algumas e
ele ficou meio sem jeito quando fechou a caixa.
— Eu nunca quis ser egoísta com ele, ‘amira — murmura, seus
olhos negros arrependidos. — Nate era um bom garoto. Sinto muito,
habibti.
— Ele era o melhor garoto — digo suavemente, me aproximando
dele perto da cama. — Eu sei, habib. Você estava chateado comigo. — O
abraço pela cintura e ele segura meu rosto, seu olhar tão intenso que me
derreto no lugar. — Eu também senti ciúmes de Yasmina em alguns
momentos. Principalmente quando descobri que te amava e não poderia tê-
lo. Me ressenti porque ela o teve e eu não.
Seus olhos ficam ternos e ele beija a ponta do meu nariz.
— Somos humanos, habibti. — Dá de ombros. — Somos falhos e
sujeitos a esse tipo de sentimento mesmo que saibamos que é errado. —
Seus dedos descem traçando minha boca. Seu olhar fica mais aquecido. —
Eu amei Yasmina, mas não é o mesmo amor que sinto por você. Com você
é mais, eu te quero com uma urgência avassaladora. Eu quis te fazer minha
desde o primeiro olhar que trocamos.
— Eu também te amo diferente da forma que amei Nate —
murmuro, beijando seus dedos delicadamente. — Nosso amor era
adolescente e não tivemos tempo de viver muita coisa no sentido homem-
mulher. O amor que sinto por você é mais maduro, meu corpo inteiro
inflama para a sua posse. Eu amo ser sua de todas as formas, malkaa.
Suas narinas inflam e ele se abaixa, a boca gostosa começando a
sugar meus lábios, raspando os dentes.
— Eu quero ter você neste quarto, em sua cama — murmura
asperamente, as mãos descendo para as alças da minha blusinha leve. —
Você vai me deixar, malikati?
Eu rio e vou para a porta, trancando-a. Na volta, arranco a blusa
bem devagar, em seguida o short jeans curto. Ele me alcança em segundos,
me levantando pela bunda, me fazendo abraçá-lo com as pernas. Gemo,
sentindo seu grande pau contido pela calça jeans.
— Meus pais estão num compromisso na Harper, mas não podemos
demorar muito, habib. Eu nunca fiz nada assim em meu quarto antes —
digo sem jeito e um rosnado vem da sua garganta, enquanto me deita na
cama e retira suas roupas em tempo recorde. Sobe na cama e puxa minha
calcinha lentamente pelas minhas pernas. Eu já estou pingando para tê-lo
dentro de mim. Nós nos beijamos e acariciamos, rolando nos lençóis,
perdidos em nossa paixão. Quando se alinhou em minha vulva, eu já estava
tremendo, completamente fora de mim. Seu olhar negro prende o meu
enquanto segura meus cabelos dos lados, mantendo-me cativa. Ele adora
me tomar assim e eu amo demais. Me sinto possuída muito além do meu
corpo.
— Maktub[35], Anna — murmura, seus olhos cintilando de amor e
luxúria. — Você tinha que ser minha, e eu tinha que ser seu, habibti. — Ele
geme rouco e empurra-se todo, bem fundo em mim. Nós dois gememos alto
e passamos a nos amar com volúpia, criando uma memória feliz em meu
quarto depois de seis anos em que essas paredes só testemunharam a minha
dor e tristeza. Ele me fez completa de novo.

Kamar – Sudoeste da Ásia, três dias depois...

Eu olho para baixo, sobrevoando as muralhas do palácio pequeno,


mas charmoso, pertencente ao clã El-Baham. Em suas cercanias há tantas
tendas que não consigo contar. Karim fez questão que eu chegasse
pilotando o helicóptero. Ele está comigo na frente e Ayla com as babás
atrás. Seus gritinhos de excitação foram ouvidos durante toda a viagem de
quase uma hora pelo deserto. Eu faço o pouso numa espécie de terraço, fora
das muralhas, perto das tendas. Há uma multidão nos aguardando e sinto
meu estômago dando voltas de nervosismo. A última vez que vi os líderes
tribais, eles estavam me rechaçando e dizendo coisas degradantes sobre
mim. Mas Karim quis fazer uma festa de noivado aqui, no deserto, juntando
todas as tribos, para começarmos do zero. A imprensa kamariana não cansa
de tecer elogios à minha exposição sobre a cultura dos beduínos de Kamar.
Os líderes fizeram questão que soubessem que tive participação importante
no resgaste de suas crianças.
Eu estou feliz. Feliz, todavia apreensiva também, porque esse é o clã
da cobra-filha. Karim me colocou a par de todas as atrocidades de Abdul
El-Baham. Para meu espanto, o homem era o cabeça do grupo terrorista que
invadiu Kamar. Contei a Karim que ele foi quem me instigou para ir assistir
à segunda parte daquela reunião. A víbora tinha tudo planejado. Ele sabia
que ouvindo tudo aquilo eu iria embora para não prejudicar Karim e, então,
seria uma presa fácil na estrada, como de fato aconteceu. Abdul foi
condenado à prisão perpétua e seus filhos homens, que também tomaram
parte do plano, morreram no deserto quando estavam sendo caçados por
Karim e seu exército. Sobrou apenas Latyfa, e Karim ainda não sabe o que
fará com ela. Ele terá uma conversa com ela hoje e daí virá seu futuro. Hoje
também será a cerimônia de nomeação do novo sheik do clã, Faysal El-
Baham, filho de Hasek, irmão de Yasmina. Ele só tinha dezessete anos
quando seu pai morreu e não pôde assumir a liderança, então, o assassino
Abdul foi quem assumiu. Na verdade, o homem usurpou a posição
importante, envenenando seu próprio irmão.
Estremeço. É muito sórdido, não é? Karim dá a volta na aeronave e
vem abrir a minha porta. Eu saio para a temperatura gostosa, ainda morna,
mas já esfriando pelo fim da tarde. Ah, Deus, como amo o deserto! Meu rei
disse maktub. É assim que me sinto quando estou com ele nesse mar de
areia. Parece que nasci para estar aqui. Ele segura meu rosto, seus olhos
lindos e pintados com lápis me deixam com tesão. Fica lindo demais em
trajes oficiais. Agora que é rei, então, fica ainda mais imponente, usando
por cima do caftan branco um manto preto e vermelho com o brasão da
casa Al-Abdallah. Uma coroa mais discreta por cima da cafia completa o
traje que me deixa babando. Eu uso um caftan vermelho com fios dourados
e sandálias baixas de tiras enroladas nos tornozelos. Um hijab amarelo-ouro
envolvendo meus cabelos com pequenas joias pendendo das bordas. Minha
maquiagem é nativa. Eu quis me vestir como as mulheres daqui.
— Você vai olhá-los de cabeça erguida, habibti — murmura, seu
amor e cuidado aquecendo meu coração. — É a futura rainha deles. —
Aceno, querendo me inclinar e beijá-lo, mas isso não será possível enquanto
estivermos em público. — Eles estão arrependidos e envergonhados por
saberem que você ouviu as ofensas naquela reunião…
— Serei magnânima no meu discurso. Só quero passar por cima de
toda a animosidade e seguir em frente, ao seu lado. — Paro, estreitando
meus olhos. — Espera, eu terei direito a falar alguma coisa, não é? É bom
saber que não serei uma rainha decorativa, meu senhor. — Levanto meu
queixo com petulância simulada e ele ri. O som profundo e sexy fazendo
minha barriga vibrar.
— Eu vou lhe dar espaço e autonomia, minha princesa destemida.
— Há provocação em seu tom e olhar, mas há também um orgulho
palpável. — Você cuidará das nossas mulheres, Anna. Fará com que elas
evoluam e conquistem alguns direitos fundamentais em países
desenvolvidos.
Eu derreto aos seus pés, envolvendo-o pelo pescoço, e foda-se a
tradição!
— Você é tão perfeito, habib — murmuro apaixonada. — Como
posso compensá-lo por tanta generosidade, meu rei? — Ronrono
maliciosamente. Ele rosna baixo. — Mmmm, acabo de me lembrar que não
consegui ter muitas aulas de dança do ventre… — Karim torna a rosnar, seu
olhar fumegando no meu. — Temos dois meses para o nosso casamento.…
Será?
— Comporte-se, princesa. — Range os dentes. — Não me deixe de
pau duro prestes a encontrar meu povo. Não seja perversa, habibti.
Eu rio e retiro os braços de seu pescoço, livrando-o do assédio.
— Prometo estar em meu melhor comportamento, Majestade. — Me
curvo numa mesura reverente. — Em público, pelo menos — completo com
uma piscada atrevida e ele meneia a cabeça, seu sorriso lindo me deixando
de pernas bambas.
Ayla chega até nós e ele segura sua mão. O tio Jafar, a esposa
Samira, Zafyr, Nuria, Jalal e seu bebê se juntam a nós. Eles vieram em
outro helicóptero. Emparelho com Karim e seguimos, sem nos tocarmos
mais até alcançar a multidão. Eles nos ovacionam, nos engolindo
rapidamente, um círculo se formando ao nosso redor. Os nativos cantam
músicas num dialeto próprio deles, o mesmo que Karim usa de vez quando
e ainda não estou muito familiarizada.
— Eles estão saudando a nossa família, e também a sua futura
rainha. — Ele sussurra perto do meu ouvido. — Sorria e acene, amirati.
Eu faço. Sorrio e aceno simpática, mesmo que esteja nervosa. Uau!
Quanta mudança, hein? Para quem estava me jogando aos leões há dois
meses, agora me ovacionando, é inacreditável. Mas isso é a vida. A roda
gira. Ela nunca para, e esta é a magia. Então, eu olho as crianças na frente e
reconheço algumas que estavam naquela noite horripilante. Sorrio-lhes e os
chamo até mim. Eles olham para Karim, como que pedindo autorização, e
meu rei sorri, dando um aceno de cabeça. Os pequenos vêm e eu os
encontro dois passos à frente, envolvendo um a um num abraço de urso.
Youssef está abrindo caminho entre a multidão e sorri meio tímido. Abro os
braços para ele, envolvendo-o num abraço de gratidão. Ele foi fundamental
também. O menino fica vermelho quando me afasto e o beijo na bochecha.
— Estou tão feliz em vê-los todos bem, meus amiguinhos — digo
olhando cada um com um carinho especial.
A multidão ovaciona e entoa novos cantos na língua que não
entendo, mas acho que estão festejando, não me xingando agora. Ironizo.
— Habibti, acho que o pobre Youssef está apaixonado por você. —
Me assusto com Karim chegando ao meu lado, seu tom brincalhão em meu
ouvido.
— Pare de ser bobo, amor. — Rio, meneando a cabeça. — Ele é um
menino adorável.
— E com os hormônios borbulhando, amirati, não se esqueça disso
quando for beijar o menino de novo. — Ele provoca.
— Você está com ciúmes, Majestade? — provoco de volta, rindo
para a multidão, disfarçando a troca maliciosa com o seu rei.
— Não há competição nesse caso, princesa. — Seu tom é
engrossado quando adiciona: — Nunca haverá porque você é minha.
— Mmm, você parece um sultão otomano neste momento, honorável
Majestade. — Zombo e ele ri.
Droga, adoro provocá-lo, mas isso me deixa excitada e não podemos
fazer praticamente nada enquanto estivermos por aqui, que serão três dias.
Três dias inteiros sem poder tê-lo dentro de mim! Não somos casados, então
não podemos dormir na mesma tenda.
Aos poucos a multidão vai parando a cantoria e tio Jafar toma a
dianteira.
— É uma honra para Sua Majestade, o rei Karim Amihaj Al-
Abdallah, estar com as tribos reunidas nesta ocasião tão importante para ele
— diz solenemente. — Da mesma forma que é uma honra para a sua
escolhida, a princesa Anna Julia Di Castellani, ser recebida pelos clãs.
A multidão grita algo que novamente não entendo, mas estão
sorrindo, então sorrio e aceno de volta.
— Estão dizendo que você é bem-vinda e que é uma heroína para
eles, habibti. — Karim me fita com seus olhos escuros cheios de orgulho e
amor. Meus olhos marejam de felicidade.
— Eles estão dizendo isso, habib? — pergunto, a alegria e respeito
me invadindo, empurrando o receio que estava sentindo para longe.
— Sim. Agora, os líderes irão lhe pedir perdão diante das tribos e de
nossa família — informa.
— Você exigiu isso? — inquiro. Não quero humilhar esses homens,
mas a perspectiva de ouvir as desculpas de suas bocas me parece boa,
excelente, na verdade.
— Sim. Eles são homens honrados e sabem que precisam se retratar,
então não tive que coagir nenhum deles. — Um brilho duro tinge suas íris e
adiciona: — Eu não teria problema algum em fazê-los se ajoelharem aos
seus pés se resistissem, amirati. Ninguém ofende a mulher que amo e sai
impune. Ninguém.
Ah, Jesus, ele é tão perfeito! Eu quero beijá-lo. Droga.
— Princesa Anna Julia. — Ouço a voz que me parece familiar e
desvio a atenção de Karim, encontrando o homem que me chamou de
concubina do rei, dizendo que nunca teria o seu respeito. O tal sheik Malik,
que por ironia do destino também é pai do adorável Youssef. O homem cai
sobre o joelho direito e abaixa a cabeça, a mão batendo em punho no peito
esquerdo. Então, sua cabeça levanta e vejo seus olhos envergonhados e
arrependidos. Karim tinha razão. — Minha senhora, diante do meu rei e das
nove tribos, quero me retratar pelas palavras infelizes proferidas sobre a
senhora naquela reunião. Somos apegados às tradições e isso foi
manipulado por um homem inescrupuloso. Quero, ainda, agradecer por sua
coragem ao salvar o meu primogênito e as outras crianças. — Ele torna a
bater no peito. — A partir de hoje, serei leal à minha senhora, como sou ao
meu rei!
Eu fico momentaneamente sem palavras. Então, limpo a garganta.
— Eu aceito sua retratação, honrado sheik Malik. Somos apenas
humanos e, portanto, sujeitos a fazermos vez ou outra algum julgamento
errado. — Forço minha voz alta e plana. — O senhor tem um filho muito
corajoso também. Sem ele não teríamos conseguido — digo e o homem
sorri, orgulhoso do filho. — Levante-se, por favor.
— Shukran, minha senhora. — Ele inclina a cabeça mais uma vez
antes de se levantar.
O próximo é o ancião, o sheik Bashar. Ele disse que eu não merecia
seu respeito e que jamais sentaria no trono de Kamar. Bem, novamente, a
roda gira, não é? E, às vezes, muito rápido. O homem cai sobre o joelho
direito e bate o punho contra o peito esquerdo.
— Princesa Anna Julia. — Abaixa a cabeça em reverência. — Eu
também preciso me desculpar por tê-la menosprezado por ser uma
estrangeira. Se há uma coisa que aprendemos nos últimos dois meses é que
nem sempre quem é nativo é confiável. — Torce o nariz, se referindo a
Abdul. — Shukran por trazer nossos meninos de volta e prometo-lhe minha
lealdade, assim como ao meu rei!
— Aceito suas desculpas, sheik Bashar. — Sorrio-lhe. — Sim,
confiança a gente conquista, não é nosso berço que determina quem é ou
não confiável, são nossas ações. — Eu olho a multidão e falo mais alto: —
E eu prometo, diante do meu rei e de seu povo, que de agora em diante
vocês são o meu povo, e os defenderei com honra e lealdade. — Bato no
meu peito esquerdo também e eles repetem o gesto, mais uma vez gritando
algo ininteligível para mim. Trago meu olhar para o ancião: — Levante-se,
meu bom homem.
— Shukran, minha senhora. — Seu tom é ainda mais respeitoso
agora e, com mais uma mesura, se levanta.
Outro se aproxima. O sheik Al-Hansur, outro que disse que nunca
uma ocidental seria sua rainha. Imagino o quanto deve estar sendo difícil
para esses homens se curvarem a mim, mas os admiro pela honradez em se
retratar. Ele se ajoelha e repete o gesto do juramento.
— Princesa Anna Julia. — Inclina a cabeça. — Venho
respeitosamente me retratar por discriminá-la pela sua origem também.
Minha senhora está certa quando diz que o berço não determina quem é
confiável. — Seu olhar levanta e mostra arrependimento e respeito agora.
Muito diferente daquela reunião. — Shukran por salvar nossos meninos e
nos conceder a honra de participar da sua festa de noivado. Que Allah
proteja sua união com o meu rei. De agora em diante, a minha lealdade é de
minha senhora, como é de meu rei!
— Eu aceito sua reparação, sheik Al-Hansur — digo-lhe. — E está
sendo um imenso prazer dividir este momento especial com o povo de Sua
Majestade, que também passa a ser o meu povo. — Eu olho de lado para
Karim. Ele está me encarando com tanto orgulho e adoração que faz
lágrimas subirem aos meus olhos. — Eu amo o seu rei e amo o deserto. —
Seus olhos ficam mais quentes e ternos sobre mim. — Ele sabe disso e
talvez exatamente por essa razão tenha me honrado ao escolher-me para sua
rainha. — Trocamos um olhar apaixonado e torno a encarar o sheik: —
Levante-se, por favor, senhor.
Um a um, os demais líderes que me ofenderam de alguma forma na
reunião vêm à frente do círculo se retratar e jurar lealdade. Eu vi
sinceridade em todos eles e aceitei suas desculpas. Seguimos para baixo de
uma enorme tenda, onde há um banquete em nossa homenagem. Hoje é
apenas o começo da comemoração. De acordo com Karim, é costume as
festas de noivado e casamento durarem até uma semana, dependendo da
tribo. A nossa durará três dias porque… Bem, ele também não quer ficar
muito tempo sem dormir comigo. Passamos dois meses separados, é muita
maldade que não fiquemos na mesma cama. Começo a me perguntar se
consigo me esgueirar para sua tenda de madrugada… Rio da minha
ousadia. Comporte-se, Anna. Agora que caiu nas graças das tribos, não
abuse da sorte, menina!
Eu ando com Karim e Ayla até nos acomodar na parte alta da tenda.
Há algumas cadeiras com estofados vermelhos e bordas douradas
destinadas ao rei e sua família. Karim senta na do centro, comigo do lado
direito e Ayla à sua esquerda. Tio Jafar, a esposa Samira do lado esquerdo,
Nuria, Jalal, o pequeno Naim e o irreverente Zafyr à minha direita. Nuria
fica próxima a mim. Ela ficou tão feliz quando cheguei ao palácio.
Passamos horas guardando minhas coisas no closet em meus aposentos e de
Karim. Ela acha diferente a minha mania de não depender muito de criados.
Digo a ela que não sou nenhuma dondoca e, além do mais, não gosto de
ninguém metendo a mão nas minhas coisas. Os membros das tribos param à
nossa frente, nos felicitando e oferecendo presentes para Karim e para mim.
— É comum em noivados e casamentos, Anna. — Nuria sussurra ao
meu lado. Eu aceno e sorrio, agradecendo-os em árabe. Eles parecem ficar
satisfeitos por eu dominar a sua língua. Bom, pelo menos a oficial. Os
dialetos ainda preciso me atualizar.
Então, a última pessoa que eu esperava vir me oferecer presentes se
ajoelha à minha frente: Latyfa.
— Princesa Anna Julia. — Ela engole em seco, me olhando nos
olhos. É a primeira vez que não vejo o brilho sinistro lá. A mulher parece
devastada e com profundas olheiras. — Minha senhora, eu quero me
retratar também. Me arrependo muito da forma como a tratei quando a
conheci. — Estreito meus olhos ligeiramente, tentando enxergar verdade
em suas desculpas, mas não consigo ver nada além do rosto inchado de
chorar, embora esteja impecavelmente vestida como sempre. — Eu não
tinha o direito de julgá-la e dizer tantas coisas desagradáveis. Sinto muito.
Shukran por trazer nossas crianças de volta.
— Crianças que o seu pai raptou! — Alguém grita na multidão e ela
fica pálida, novas lágrimas se formando em seus olhos. Me sinto mal pela
cobra. Ela perdeu todo o poder e influência que tinha através de seu pai.
Agora será hostilizada em seu próprio clã. Eu quase sinto pena. Quase.
Ela bate o punho no peito esquerdo como os homens fizeram. Como
já vi Karim e Jalal fazerem quando estão juntos. É a sua forma de
juramento.
— Prometo ser leal à minha senhora, como sou ao meu rei!
— Eu a perdoo, Latyfa. Levante-se. — Digo, não querendo olhar
para ela por mais tempo.

Karim Amihaj
Eu observo a desenvoltura de Anna ao meu lado direito quando se
dirige a Latyfa. Está se mostrando verdadeiramente magnânima. Uma
rainha. Desde o momento em que chegamos. A forma carinhosa como
chamou e abraçou as crianças que viveram os horrores do sequestro com ela
foi muito especial. Isso terminou de cimentar sua aceitação nas tribos.
Todos estão olhando-a com encantamento. Ela tem uma beleza diferente, os
brilhantes olhos verdes são como ímãs, atraindo e hipnotizando a atenção.
Ela é magnífica. Meus olhos estão sempre a procurando, não querendo ficar
sem contemplar seu brilho. Está maravilhosa, vestida como as mulheres das
tribos. Percebo que as mulheres parecem encantadas com ela também. Anna
sente o meu olhar e vira o rosto para o meu, as duas joias verdes cintilantes
se fixando em mim, fazendo meu coração aquecer no peito. Pego sua mão e
a beijo suavemente no dorso.
— Está quebrando o protocolo, meu senhor? — Um sorriso
irreverente insinua na boca carnuda. — Não pode me tocar em público. —
Seu sorriso perverso se alarga. — São as regras.
— Eu posso tudo, amirati — digo com presunção. — Sou o rei.
Sei que quer revirar os olhos, mas não pode porque estamos em
público. Então, ela os estreita de uma maneira que a deixa ainda mais linda.
— Oh, você ainda precisa trabalhar nesse seu ego, honorável
Majestade — zomba sussurrando.
— Meu rei. — A voz de Latyfa interrompe meu momento com
Anna. Eu encaro a mulher, que está ajoelhada à minha frente agora. Ela já
teve dias melhores. Também não é para menos, seu pai a arrastou para a
lama junto com ele. Os clãs irão rechaçá-la e será quase impossível
conseguir um casamento para ela nessas condições. É filha de um traidor,
assassino e terrorista, e isso pesa na linhagem. — Quero pedir-lhe minhas
desculpas mais uma vez pela forma que tratei a sua escolhida. — Bate no
peito e diz solene, embora sua postura esteja derrotada: — Prometo ser leal
à minha senhora como sou ao meu rei!
Eu a encaro, tentando lê-la. A mulher já me enganou uma vez e,
além disso, é filha de seu pai. Porém, hoje é dia de festa e não quero
estragá-lo para Anna fazendo uma cena aqui. Talvez se eu mostrar
clemência diante das tribos, ainda haja alguma chance de ela arranjar um
bom casamento.
— Aceito sua retratação, Latyfa — digo e ela solta a respiração que
estivera prendendo. Meus olhos fixam nos dela e me inclino para frente, lhe
mandando um recado: — E jamais, em hipótese alguma, pense em
desrespeitá-la outra vez, estamos entendidos?
— Meu senhor, é muita bondade sua. Shukran, shukran. — Ela
assente, balançando freneticamente a cabeça. — Serei leal até o meu último
suspiro.
Para o seu bem, espero que esteja dizendo a verdade. Tenho vontade
de adverti-la, mas me seguro. Ela já sabe que não sou de perdoar traição.
Lhe dou um aceno e faço um gesto para que se levante.
O resto do banquete transcorreu tranquilo. Os membros das tribos
nos oferecendo suas felicitações e presentes. A cerimônia oficial de noivado
é amanhã à noite, mas faz parte da nossa cultura comemorarmos os
noivados e casamentos por dias, às vezes por uma semana. Contudo,
ficaremos aqui apenas por três dias. Não ficarei nem mais um dia sem ter
Anna na minha cama. Foram dois meses sem ela e não estou muito razoável
nesse sentido. Estou ainda faminto. Tem apenas uma semana que a tomei
para mim de novo, e se não fosse para o benefício dela, não faria o noivado
aqui junto com as tribos. Eu só estou fazendo para que ela seja recebida,
aclamada, e ouça as devidas desculpas dos líderes. Esse foi um ponto que
não abri mão e os sheiks não relutaram, pois sabiam que só uma retratação
pública iria me contentar e também mostrar para sua futura rainha que se
arrependeram verdadeiramente.
Eu acredito neles. Esses homens, embora gananciosos, foram
manipulados habilmente pelo maldito Abdul. Se não fosse o infeliz, eu teria
conseguido me entender com os sheiks sem tantos desgastes. Todavia, tudo
se resolveu e estamos em bons termos agora. Que Allah nos permita
continuar assim. Estou cansado de conflitos. Só quero paz agora. Meu olhar
procura por ela de novo. Eu só quero amar a minha mulher e construir uma
vida próspera, em todos os sentidos. E olho do meu lado esquerdo para a
minha princesinha. Ela está com os olhinhos acesos de curiosidade,
observando tudo ao redor. Nunca a trouxe para as reuniões no deserto. Ela
era muito pequena também, mas a partir de agora sempre a trarei comigo e
Anna.
— Você está gostando, nour hayati? — pergunto e ela vira o
rostinho lindo para mim.
— Muito, papai! Quando a Anninha for conversar com as mulheres,
eu posso ir junto?
Eu rio da sua vivacidade infantil.
— É uma reunião, habibti. É assunto sério — digo amorosamente.
— Mas eu nunca fui a uma reunião — reclama. — Eu quero me
reunir com as mulheres também. A Anninha disse que serei uma princesa
muito bem informada e engajada.
Isso me faz gargalhar. Minha filha é tão precoce que me diverte em
muitos momentos.
— E você sabe o que é ser engajada, Ayla? — Levanto uma
sobrancelha.
— A Anninha me explicou, mas esqueci. — Coloca a mãozinha
sobre a boca, contendo um sorriso. — Vou perguntar a ela de novo.
— Faça isso. — Toco o indicador em seu pequeno nariz. — Mas,
por enquanto, minha princesa não precisa se preocupar com assuntos de
gente grande. Enquanto a Anninha estiver em reunião, aproveite para
brincar com seus primos, habibti.
Seus olhinhos se iluminam.
— Está bem, malkaa. — Sorri, fazendo meu coração derreter. Ela
adora me chamar assim depois que viu minha coroação.

No dia seguinte…
— Você está contando o primeiro pedido aos pais de Anna para o
período do Mangni?[36] — Jalal questiona com uma risada, enquanto coloca
minha cafia e a coroa prendendo-a. — Então, só resta um mês para o
casamento a partir de hoje.
— Você pegou o espírito da coisa, primo — digo condescendente e
ele rola os olhos. — Porém, só vamos poder nos casar daqui a dois meses,
uma vez que, no final desse, os trigêmeos dos primos de Anna irão nascer.
O nascimento de um Di Castellani é um evento à parte e a família se
reúne em peso para comemorar, então, nosso casamento terá que esperar.
— Porra, eu também contaria os dias e noites juntos se estivesse em
seu lugar, primo. — Zafyr, que está colocando o manto sobre os meus
ombros, dá uma risada provocadora.
— Você jamais estará em meu lugar, seu idiota. — Ranjo e ele ri
mais. — Pare de cobiçar a minha mulher antes que eu corte o seu maldito
pau!
Os dois riem de mim com vontade.
— Relaxa, Amihaj. A princesa está completamente na sua, cara —
Zafyr resmunga, alisando meus ombros, terminando o seu serviço. Os
irmãos do noivo o ajudam a se vestir. Como eles dois são os únicos irmãos
que conheço, os idiotas estão me ajudando e me irritando.
— É, primo, relaxa. Está parecendo uma noiva. — Jalal entra na
provocação do irmão.
— Cale a boca, idiota. Nem venha me dizer que não ficou nervoso
quando foi a sua vez com Nuria — retruco.
Os dois riem mais uma vez à minha custa.
Eu bufo e vou conferir minha aparência no espelho. Eu e a princesa
estamos em tendas separadas. Quase não dormi, sentindo a falta dela e
lutando contra a vontade insana de me esgueirar para a sua tenda. Mas não
posso fazer isso, ou estarei descumprindo ainda mais os ensinamentos do
Profeta. Embora os líderes tenham sido excessivamente hostis com Anna,
eles disseram uma verdade naquela reunião: nós estamos em pecado desde
que começamos a dormir juntos. Sem falar no nosso sexo quente e
despudorado. Todavia, quando estivermos casados, isso ameniza. Confiro
meu reflexo e gosto do que vejo. Uso um caftan branco com um manto
dourado e preto. Uma cafia preta e a coroa de ouro com rubis. Estou
ansioso para ver a minha princesa. As moças solteiras das tribos estão
preparando-a para se apresentar para mim. A tradição manda que ela se
converta ao islamismo no noivado. Em Kamar, uma rainha não pode ter
religião diferente do seu rei.
Ela virá para mim e se ajoelhará, jurando amor e lealdade, em
seguida, nossas mãos serão unidas por um lenço vermelho e ouviremos a
pregação do ancião e de meu tio. Anna pronunciará o testemunho diante de
todos e será uma mulçumana a partir de então. Dentro de um mês, será
nosso casamento. Farei sua coroação na mesma ocasião. Respiro
profundamente, tentando me acalmar. Jalal tem razão, estou parecendo a
noiva. Wallah! Acalme-se, homem! Ordeno-me. Meus primos continuam
rindo, e reviro os olhos.
— Vamos, espertalhões — resmungo. Eles seguram suas risadas de
merda e saem da tenda à minha frente. O cortejo com os outros homens das
tribos segue atrás de mim, me conduzindo ao altar.
Eu sigo até a minha cadeira e me acomodo. Então, meu coração
falta sair pela boca quando a vejo saindo da sua tenda, cercada de mulheres,
que seguram seus véus, enquanto ela anda pelo tapete vermelho. É tradição
reproduzirmos o ritual das tribos beduínas que ocupam nossas terras desde
os tempos remotos. Ela está usando um vestido- caftan todo dourado e um
hijab no mesmo tecido, dando voltas em sua cabeça, cobrindo sua boca e
nariz. Usa uma das tiaras que lhe dei de presente. Meu coração retumba no
peito enquanto se aproxima, andando com graça, até que para à minha
frente. Com os olhos lindos presos aos meus, ela se ajoelha na almofada aos
meus pés e coloca a mão em punho sobre o peito esquerdo, abaixando a
cabeça em reverência. Quando seus olhos levantam para os meus, estão
brilhantes de emoção e lágrimas.
— Eu, princesa Anna Julia Di Castellani, declaro meu amor e minha
lealdade a Sua Majestade, Karim Amihaj Al-Abdallah, meu rei, e somente a
ele — diz solenemente, embora emocionada. Eu rio, meus olhos ardendo de
emoção. Então, lhe estendo a mão e a ajudo se levantar, nos levando para a
frente do ancião e de meu tio, como o mais próximo de pai que tenho no
momento.
Meu tio pega nossas mãos direitas, envolve nossos pulsos com o
lenço e continua as segurando enquanto nos diz algumas palavras:
— De hoje em diante, este homem, Sua Majestade, Karim Amihaj
Bin Khallifa Al-Abdallah, e esta mulher, Sua Alteza, Anna Julia Di
Castellani, estão prometidos um ao outro, conforme os preceitos do Profeta
— diz solenemente, me encarando com emoção nas íris escuras. — Como
representante de seu pai, o rei Khalil Amihaj Al-Abdallah, que Allah o
tenha, abençoo esta união.
Eu aceno para meu tio, meu coração leve, feliz. Então, ele se afasta
e o ancião profere suas palavras em seguida. Anna profere seu testemunho
La ilaha illa Allah, Muhammad rasoolu Allah (Não há verdadeiro Deus,
exceto Allah, e Muhammad é o Mensageiro de Deus). Todo o tempo eu a
contemplo com amor e orgulho. Ela agora é uma de nós. Quando termina o
ritual, levanto nossos pulsos amarrados pelo lenço para a multidão. Eles
ovacionam, entoando pedidos de proteção e preces em nosso nome. Meu tio
se aproxima, desenrolando nossos pulsos, e o banquete começa. Eu quebro
um pouco do protocolo descendo das cadeiras reservadas para mim e Anna
no fundo da tenda, e andamos lado a lado, cumprimentando e conversando
com o povo. Ela me aconselhou a me aproximar mais do povo, não apenas
dos líderes dos clãs, e eu achei a sugestão válida. Anna me pediu, inclusive,
para conversar com cada um dos insurgentes responsáveis pelos primeiros
conflitos que culminaram em seu primeiro sequestro. Ela acredita que
precisamos saber os reais motivos dos conflitos e ser clementes com os que
colaborarem para a manutenção da paz em nosso emirado. Ela já é uma
rainha da cabeça aos pés.
Em dado momento, Nuria a chama para ir conversar com algumas
mulheres e ela se vai. Eu fico olhando-a como um bobo apaixonado, sem o
menor receio de parecer fraco perante o meu povo. Eles já sabem que estou
longe de ser fraco e que a minha escolhida merece a minha admiração. Eu
me perco numa conversa com Jalal, meu tio e alguns homens simples dos
clãs, ouvindo-os sobre os progressos do pastoreio e como a produção de lã
será grande esse ano. Quando olho na direção de Anna, vejo Latyfa se
aproximando com dois cálices dourados nas mãos. Franzo o cenho, uma
sensação ruim se espalhando em mim. Sem dizer nada para o grupo, eu
saio, me dirigindo para Anna. Latyfa a alcança e eu aperto o passo, a coisa
ruim se intensificando. Ela sorri para a princesa, se curvando
respeitosamente, e acho que está propondo que beba com ela. Anna abre os
braços, me surpreendendo ao querer essa proximidade com sua antiga rival.
Minha princesa. Eu fico orgulhoso por estar se mostrando tão aberta e
disposta a superar os desentendimentos do passado.
Latyfa apoia os cálices sobre a mesa mais próxima e envolve a
princesa num abraço. Anna sorri quando se separam. Finalmente as alcanço
e Anna está envolvida numa conversa animada com Latyfa agora.
Aproveitando que Latyfa está de costas para mim, eu me estico e troco os
cálices de posição. Podem me chamar de paranoico, pode ser apenas um
pressentimento, porém, não vou arriscar a vida e o bem-estar de Anna.
— Shukran, princesa. — Latyfa se inclina mais uma vez e volta a
olhar para Anna. — Minha senhora é muito bondosa e tenho certeza que
terá tudo que merece — diz, e detecto certa tensão em sua voz quando se
vira e pega as taças; sem perceber a ordem desfeita, entrega a que seria sua
para Anna e vice-versa. — À sua felicidade, ‘amira. Que Sua Majestade
seja tão feliz quanto foi em seu primeiro casamento.
Anna franze um pouco o cenho e me vê. Eu aceno, dando o
consentimento para ir em frente.
— Shukran, Latyfa. Que você também seja feliz — diz em resposta,
levantando seu cálice e virando-o em seguida.
— Eu serei, princesa. Serei muito feliz, esteja certa disso. — Latyfa
abre um sorriso sinistro e vira o seu também.
Eu me adianto e fico ao lado de Anna, querendo acompanhar o
desenrolar de minha suspeita.
— Estava delicioso o vinho de tâmaras. Shukran. — Anna diz ainda
no papel de rainha benevolente.
— Sim, espere só mais um pouco, sua prostituta! — Latyfa rosna e,
então, leva a mão à garganta, seu rosto ficando vermelho rapidamente. Seu
olhar vem para mim e eu sorrio friamente de volta.
— Você está morrendo, sua vadia estúpida! — Rosno baixo e Anna
solta uma exclamação horrorizada. — Morrendo porque, como seu pai,
decidiu me trair!
— O-o quê?! — Anna torna a exclamar.
— Fique calma, habibti. — Eu envolvo meus braços em sua cintura,
puxando-a para mim. — Essa víbora vingativa tentou lhe envenenar, mas
troquei os cálices.
— Oh, meu Deus! Como quer que fique calma, Karim? Uma pessoa
está morrendo na minha frente! — Ela diz histérica.
— Que o inferno os carregue para baixo! — Latyfa range os dentes,
olhos esbugalhados, os vasos sanguíneos dilatando, o branco ficando
carmesim rapidamente. Ela cai no chão, começando a estrebuchar, e o povo
corre para ver o que está acontecendo. — Eu odeio… Vocês…. Todos
vocês! — Espuma misturada com sangue está escorrendo de sua boca
agora, a pele ficando arroxeada, quase preta. É uma imagem grotesca de se
ver, mas olho até que dá o último suspiro.
— Que o inferno a carregue para baixo, infeliz! — Olho o corpo
sem vida, mas ainda irado que a maldita tenha ousado atentar contra a vida
de Anna. A princesa enfia o rosto em meu pescoço, obviamente abalada
com a cena. Eu quebro completamente os rituais e a levanto nos braços. —
Essa mulher traiu seu rei, tentando envenenar sua futura rainha! Tirem-na
daqui e a deixem bem longe da tribo para os abutres comerem sua carne!
Ela não pertence a lugar nenhum agora! — Brado, olhando todos em volta,
que também estão horrorizados com a situação do corpo preto no chão.
Então, eu saio da tenda central e não quero saber de porra de
tradição, levo Anna para a minha tenda. Atravesso o amplo recinto e sigo
direto para o quarto, deposito-a suavemente sobre a cama; como estamos
descalços, apenas me deito junto e a puxo para o meu peito. A abraço bem
apertado contra mim.
— Ela queria me matar. — Anna estremece em soluços e eu rosno,
querendo reviver a maldita só para matá-la de novo.
— Shh, ela não conseguiu, amirati. Não fique tão abalada. Passou
— murmuro, retirando seu hijab e tiara para poder tocar seus cabelos.
— Ela teria conseguido se não fosse por você, Karim. — Sua voz
está trêmula e entrecortada e seu rosto banhado de lágrimas levanta para o
meu. — Ela teria conseguido.
— Eu sempre irei protegê-la, nour Al sabah — sussurro, limpando
suas faces com delicadeza. — Aquela miserável era a última erva daninha
entre o nosso povo. Eles agora a respeitam e logo irão aprender a amá-la
como eu aprendi, amirati.
Ela apenas acena e se aconchega mais em meu peito. Seu corpo
ainda estremecendo e soluços baixos deixando sua boca. Eu acaricio suas
costas, esfregando com ternura, e a sinto relaxando, os tremores cessando
até que passam de vez.
— Não fique triste pelo acontecido, Anna. — Pego seu queixo,
fazendo-a me encarar. Seus olhos estão molhados, o rosto corado, mas está
linda demais. — Ela mereceu esse fim. Você será uma rainha, e às vezes
nós, os governantes, temos que endurecer para conseguir passar por esse
tipo de coisa…
— Eu sei, meu rei — murmura, seu tom já mais controlado. — É só
que foi um choque vê-la estrebuchando daquela forma e saber que era eu
quem poderia ter morrido. — Seus olhos ficam aflitos e sua mão vem para o
meu rosto. — Eu não quero deixar você, habib. Quero viver plenamente o
nosso amor. Amar e cuidar de Ayla como se fosse minha, te dar mais filhos,
vê-los crescer e ser a sua companheira até ficarmos velhinhos.
— Malikati… — Eu digo com todo o meu amor e reverência,
rolando por cima dela, segurando seu rosto entre minhas mãos. Ela acaricia
meus ombros, as pedras verdes cintilantes para mim. — Nós viveremos,
habibti. Nós viveremos plenamente o nosso amor. Allah nos colocou no
destino um do outro. — Eu a beijo suavemente, então sussurro: — Maktub,
minha rainha.
— Maktub, meu rei. — Sorri, linda, confiante em minhas palavras, e
eu mergulho em sua boca aprofundando o beijo.
CAPÍTULO DEZESSEIS
Dois meses depois…
“Agora você é tudo que eu quero. E eu soube isso desde o primeiro
momento. Porque uma luz se acendeu quando ouvi aquela música… Você
entrou na sala e agora meu coração foi roubado. Você me levou de volta ao
tempo quando era inteiro.”
(James Arthur – Can I Be Him)

Anna Julia
Eu olho pela sacada de nossos aposentos e a visão do deserto me
arrebata, como sempre acontece. No jardim principal, perto da primeira
muralha, tendas estão montadas, esperando nosso retorno do salão do trono
mais tarde. Lá trocaremos as alianças e depois serei coroada rainha. Hoje é
o primeiro dos três dias de comemoração do nosso casamento e estou
envolta numa nuvem de felicidade desde que abri os olhos hoje de manhã.
Karim estava sentado na cama, seus olhos negros me vigiando no sono. Há
tanta fascinação cintilando em suas íris quando me olha que me deixa além
de envaidecida.
— Jawhariin althamin[37]. — Murmurou, os dedos traçando meu
rosto numa carícia delicada. Meu coração e corpo cantaram com sua
reverência e amor. — Hoje é o começo de nossa vida como marido e
mulher, ‘amira. Quero que saiba que meu coração nunca esteve tão cheio
de amor como está agora, Anna.
— Sim, habib… O meu também está transbordando de amor, por
você, pela nossa princesinha bonita — murmurei com voz rouca do sono.
Seus olhos ficaram mais intensos e brilhantes com a menção à Ayla. —
Estou tão feliz, Karim. — Levantei minha mão para seu rosto moreno,
adorando a simetria perfeita. — Ser sua mulher, sua rainha, é uma honra
para mim, malkaa.
Ele rosnou, os olhos inflamados de paixão, o polegar deslizando,
roçando meus lábios.
— Porra.… Queria me enterrar em você agora. Mas não posso até
o terceiro dia, amirati. É o que manda a lei. — Gemi, antevendo horas
torturantes sem poder ter seu corpo. No entanto, precisamos respeitar a lei
sagrada. Eu me converti ao islã para poder ser dele completamente.
— Será uma tortura, mas será uma noite perfeita, eu prometo, meu
rei… — disse com um sorriso enigmático. Seus olhos acenderam com
luxúria e curiosidade.
— O que essa cabecinha linda está maquinando, princesa? —
sussurrou com um meio-sorriso safado.
Eu tive muitas aulas de dança do ventre nesse mês e, modéstia à
parte, estou bem desenvolta. Minha experiência no balé e minha
flexibilidade ajudaram bastante. Vou dançar para o meu rei em nossa noite
de núpcias. Além disso, amanhã o dia será inteiro dedicado a mim e terei o
meu corpo todo tatuado com o seu nome em hena. Minha segunda surpresa
para ele. Não nos veremos amanhã, pois ficará com os homens da sua e da
nossa família, enquanto eu ficarei com as mulheres. Só voltaremos a nos
encontrar no terceiro dia, como manda a tradição, quando trocaremos as
alianças outra vez e desfrutaremos do banquete com nossas famílias e
convidados.
— Você terá que esperar até a terceira noite, honorável Majestade.
— Provoquei-o, sugando seu dedo em minha boca. Ele gemeu alto, o olhar
quente correndo pelo meu corpo nu. Nós aproveitamos bem ontem, uma vez
que seríamos impedidos por três dias.
— Vem, temos que nos preparar, ‘amira. — Se inclinou, me dando
um beijo delicioso na boca, e se levantou, moreno, nu, o corpo todo duro e
malhado, a ereção matinal me fazendo salivar para tê-lo na boca. Lambi
meus lábios e quando o encarei um canto de boca perverso subiu, seus
olhos brilhando com arrogância masculina ao perceber o que estava
querendo naquele exato momento. — Você terá que esperar até a terceira
noite, habibti — disse com indulgência, me fazendo gemer de frustração, e
sua risada profunda soou no quarto. — Vamos, levante-se. Temos um dia
cheio com nossas famílias, amirati.
Volto daqueles momentos ternos e excitantes e giro nos calcanhares,
retornando ao quarto. É hora de me preparar para ir ao encontro daquele
que ganhou meu coração.

***

Eu giro diante do espelho no closet espaçoso aproximadamente duas


horas depois. Uma onda de suspiros e fungados é ouvida ao meu redor.
Meus olhos ardem de emoção ao mirar minha imagem refletida lá. Estou
usando um vestido de seda e renda vermelho-cereja. As mangas justas de
renda no mesmo tom se ajustam até meus pulsos, e bordados dourados
espiralam na ampla saia, que se estende numa cauda de meio metro. Um
hijab de renda da mesma cor envolve meus cabelos e uma das lindas tiaras
que foi da mãe de Karim repousa sobre a minha cabeça. Meus olhos estão
bem maquiados e marcados, como manda a tradição árabe. Meu batom é
vermelho. Amo que as mulheres árabes apreciem tons fortes, como eu. De
acordo com Nuria, é comum as noivas árabes desfilarem vários vestidos
durantes os três dias de casamento. Amanhã usarei um modelo verde-água
e, no último dia, o obrigatório vestido branco com véu.
Suspiro, alisando minha saia. Eu que pensei que nunca me casaria,
que nunca amaria outra vez depois que perdi Nate. Fecho meus olhos por
um instante, levantando meu rosto, agradecendo-o por não ter me deixado
definhar e me anular para o mundo quando ele se foi.
Obrigada por cuidar de mim daí de cima. Obrigada por ter sido
meu amigo, antes de tudo. Graças a você e sua insistência para eu
continuar vivendo, pude encontrar o meu homem especial. Vou me casar,
ter filhos e amar muito todos eles, como você queria. Fui tão abençoada
por ter tido o seu amor, Nate. Sou uma garota de sorte por encontrar o
amor duas vezes. Os dois homens mais incríveis que uma garota poderia
querer me escolheram para amar. Obrigada, meu garoto especial. Sua
memória nunca morrerá para mim.
— Me faltam palavras para dizer o quanto está linda, bambina. — A
voz emocionada de minha mãe me faz abrir os olhos e virar para ela, para
eles. Toda a minha família aqui, como é de praxe nos casamentos. Ela
encurta a distância entre nós e seus braços me envolvem com amor e
cuidado. Eu a abraço, tornando a fechar meus olhos, emoção me tomando.
Se afasta um pouco e seu olhar amoroso corre por mim inteira. — Que Dio
te conceda um casamento feliz, tesoro. Que você seja muito feliz em sua
nova casa, principessa mia. — Seus dedos trêmulos tocam meu rosto
delicadamente enquanto lágrimas transbordam em seus olhos de âmbar. —
Não deixaremos a distância nos separar. Viremos sempre, e vocês irão nos
ver também.
— Grazie, mamma — murmuro, sentindo os meus olhos
transbordando também. Ella me entrega um lenço e eu limpo o rosto bonito
de minha mãe com delicadeza para não borrar a maquiagem. — Eu jamais
aguentaria ficar longe de vocês por muito tempo, a senhora sabe disso.
Deixa de drama, Dona Helena. — Brinco e ela sorri em meio às lágrimas.
— Ti amo tantissimo, mamma.
Ela torna a sorrir, a expressão mais amorosa do mundo estampando
seu rosto.
— Ti amo così tanto, piccola mia — sussurra e me envolve em seus
braços de novo.
— Princesinha… — Meu pai vem para perto quando minha mãe se
afasta. Seus braços me envolvem num casulo protetor e eu inspiro seu
cheiro, fechando meus olhos, guardando seu carinho e de minha mãe para
quando a saudade bater. Ele se afasta para me encarar, seus olhos verdes
estão brilhantes de emoção. Suas mãos seguram meus ombros e ele parece
lutar para não chorar, exatamente como eu. — Você está tão bonita, filha.
Só posso pedir a Deus que a proteja junto com sua nova família. Nunca se
esqueça de nós. — Seu rosto está tomado pela emoção. — Você também
tem uma família que sempre irá te amar lá no Ocidente.
Meus olhos transbordam e ele pega o lenço que minha mãe lhe
entrega. Limpa minhas lágrimas com suavidade, mas nada adianta porque
surgem mais e mais.
— Obrigada, papai — murmuro entrecortado, tocando seu rosto
bonito. — Como poderia esquecer de vocês algum dia? Não seja bobo,
senhor Harper. — Zombo e ele ri, os olhos bonitos fazendo meu coração
aquecer de tanto amor. — Te amo tanto, papai.
Ele chora agora. As lágrimas descem e eu as limpo. Se inclina, seus
lábios depositando um beijo suave em minha testa.
— Também te amo tanto, querida — sussurra embargado. Me
abraça novamente e balança comigo por um tempo. Quando recua, sua
expressão está mais controlada. — Seja feliz, princesinha. — Seus olhos
brilham e eu sei que vem algo espirituoso agora: — E não demore a me dar
netos. Não aguento mais seu tio Jay com o time de futebol misto. Jesus, o
bastardo já está com cinco na minha frente!
Nós rimos e meu tio Jay se gaba:
— Não vejo como você ou Leon podem me alcançar, irmão. Melhor
aceitar.
Meu pai e meu padrinho Leon bufam em resposta. Todos voltam a
rir dessa interação divertida e implicante deles.
Tio Jay está todo coruja porque os trigêmeos de Luc, Samu e Chloe
nasceram no mês passado. Ah, eles são tão lindinhos! Os meninos são
idênticos, morenos com olhos azuis, como seus pais, e levaram os nomes de
seus avós, Jayden e Isaac, enquanto a menina é branquinha e loira, como a
sua mãe. Eles lhe deram o nome de Agatha. Eu, Karim e Ayla estivemos
novamente em Londres para recepcionar os pequeninos, como é de praxe
em nossa família. Aproveitei para matar a saudade de Rico e Ciara. Minha
afilhada está linda, parecendo uma bonequinha e completa cinco meses no
fim da semana.
— Ei, maninha. — Lipe chega para perto. Seu rosto está sério,
porém suave enquanto me puxa delicadamente para seus braços. Ele
balança comigo como meu pai fez e eu derreto, guardando o carinho de
meu irmãozinho também. Toma um pouco de distância para me encarar,
uma expressão orgulhosa em seus cintilantes olhos de âmbar. — Minha
irmãzinha encrenqueira será uma rainha daqui a pouco. — Sorrio, tocando
seu rosto bonito e aceno. — Você será muito feliz, Anna. Eu tenho visto
como aquele cara olha para você. — Torce a boca com irreverência e
provoca: — Chega a ser patético, para ser sincero.
— Oh, cale a boca, fedelho. — Reviro os olhos e ele sorri alto,
então volta a ficar sério.
— O que eu quero dizer é: Amihaj te fará feliz. Eu vejo isso a cada
vez que ele a olha, maninha. — Seu tom e olhar são ternos, deixando meu
coração mais aquecido. — Faço eco às palavras de nosso velho, não ouse
esquecer que estamos lá no Ocidente, ouviu?
— Seu garoto bobo. — Eu choro, respirando irregularmente.
Alguém avisa para eu não chorar mais ou vou precisar retocar a
maquiagem, mas eu não me importo. Eu quero, preciso viver isso aqui. Os
amo demais. — Eu nunca poderia esquecer meu único irmão. Você tem que
vir me ver com frequência também, está me ouvindo, bonitão?
Ele ri acenando e nos abraçamos mais uma vez antes de ele beijar
minha testa e se afastar. Meu padrinho Leon se aproxima, junto com minha
madrinha. Os dois me envolvem em seus braços, tomando cuidado para não
me amassar.
— Bambina, il tuo padrino è così felice.[38] — Ele diz com seus
olhos negros suaves para mim. Vejo lá o receio de toda a minha família,
eles achavam que eu nunca seguiria em frente. Sua mão levanta meu queixo
e ele sorri, seu rosto ficando ainda mais bonito. Meu pai e seus irmãos são
muito bonitos, deviam causar um alvoroço no sexo feminino quando
jovens. É o DNA Di Castellani, como já mencionei antes. Embora meu
padrinho se pareça mais com tio Jay, há traços compartilhados com meu pai
também. — Que Dio cuide sempre de você, principessa mia. Eu e sua
madrinha te amamos tanto. Dio te benedica, figlia mia.[39]
— Grazie, padrino — murmuro em italiano, recebendo seu beijo
suave em minha têmpora, sobre o meu hijab. Olho entre ele e minha
madrinha, que está com os olhos verdes cheios de lágrimas. — Eu amo
vocês também, tantissimo, padrino, madrina.
Ele assente e toma distância, me deixando ter meu tempo com
madrinha Júlia.
— Ah, carissima. — Ela me puxa para um abraço carinhoso e eu
sorrio feliz com sua ternura. Ela é sempre tão doce e amorosa comigo.
Coloca um pouco de espaço entre nós e seus olhos se derramam. Ella vem
para perto enxugando o rosto da mãe. Minha prima também está fungando.
Eu acho que todos aqui estão fungando. Jesus! Os Di Castellani são todos
chorões. Rio em meio à minha emoção. — É tão bom ver esse brilho em
seus olhos. Vê-la pronta para viver, ser feliz. — Como meu padrinho, ela
toca meu queixo delicadamente, seu olhar doce me passando tanto amor,
como sempre fez desde que eu era pequena. — Você é uma linda mulher
agora, minha princesa. Nós todos torcemos muito por isso, vê-la feliz,
Anna. — Eu assinto, embargada. — Que Deus a proteja sempre, filha.
— Obrigada, madrinha — murmuro, tocando seu rosto bonito
também. — Sempre tão doce a amorosa comigo.
Me dá mais um sorriso terno e recua, indo para perto de meu
padrinho. Meus tios Jay e Cassie vêm para a minha frente. Eles me cercam
com seus braços e carinhos e sorrio-lhes, enredada, tão feliz por ter todos
aqui comigo.
— Você está muito bonita, filha. — Meu tio murmura com uma
expressão enternecida em seus olhos parecidos com os de meu padrinho.
Ele é o mais alto dos irmãos e pode parecer intimidante para os de fora, mas
sempre foi muito carinhoso comigo e Lipe enquanto crescíamos. Ele passa
as mãos pelos meus ombros e sorri. É o mesmo sorriso de meu padrinho, é
orgulhoso e um tanto aliviado. — Nós todos pedimos muito a Deus para lhe
dar isso, princesa. Para fazê-la feliz de novo. — Eu aceno, tocando-o no
rosto com carinho. — Eu e sua tia te amamos e queremos ver esse sorriso
de agora em diante, filha.
— Obrigada, tio — sussurro, enquanto ele se debruça e beija minha
testa suavemente. Eu olho entre os dois e adiciono: — Eu amo vocês
também.
A exemplo de meu padrinho, ele toma distância, me deixando com
tia Cassie. Seus grandes olhos azuis me fitam com candura. Ela também é
muito especial para mim, sempre doce comigo e Lipe. Suas mãos suaves
seguram meus ombros e ela sorri, seus olhos lacrimosos.
— Desculpe-nos por estarmos parecendo discos quebrados,
princesinha — murmura e eu rio da sua brincadeira. — Mas é isso, sua
família está transbordando de felicidade porque você encontrou o amor
outra vez, Anna. Que Deus a abençoe junto com sua nova família, minha
filha.
— Obrigada, tia. Sempre tão terna. — Toco seu rosto com carinho.
Ela sorri mais uma vez e volta para junto de meu tio.
Dam e Max se aproximam. Eles estão lindos em seus ternos escuros,
e também tão parecidos. Dam me puxa para seus braços por um breve
momento.
— Você está linda, prima — murmura, puxando para trás para me
olhar nos olhos. Toca meu queixo e sorri, sua expressão livre de ironia. —
Correndo o risco de parecer piegas, eu também pedi a Dio que colocasse
esse brilho em seus olhos de novo, carissima. — Torce a boca e eu rio,
meneando a cabeça. — Você merece isso, Anna. Embora os velhos estejam
fazendo drama, basta pegar o jato e vir aqui ou vice-versa quando a saudade
bater. — Ele sorri, a ironia voltando em seu belo rosto. — Não que eu vá
sentir muita falta de você bisbilhotando minha vida amorosa.
Eu rolo os olhos, bufando.
— Você é tão chato, Dam — resmungo, mas rio quando se inclina e
me beija suavemente na têmpora. Eu apalpo seus ombros largos e
acrescento mais terna: — Grazie, primo. E não ache que vai ficar livre de
mim assim tão fácil, bisbilhotar sua vida amorosa está sendo mais divertido
do que as séries da Netflix. — Nossa família cai na risada e ele resmunga,
mas acaba rindo também. Abaixo o tom quando cochicho para ele: — Por
falar nisso, e a doutora? Pensei que a traria para cá.
Seu rosto torce com raiva.
— Isadora andou me escondendo coisas… — Range os dentes. —
Mas o que se pode esperar de uma mentirosa, não é?
Eu franzo o cenho, preocupada.
— Dam…
— Shh, hoje é o seu dia. Deixe minha fodida vida amorosa de lado,
prima — zomba, e com mais um beijo em minha têmpora, ele cede a vez
para Max:
— Então é isso, minha priminha está se amarrando totalmente. —
Ele sorri de lado, me puxando para seus braços e eu rio, acenando. — Tente
se comportar agora, Anna. Você será uma rainha, prima. — Eu rio com seu
bom humor. Então, ele fica sério e me beija na testa, se afastando um pouco
para me fitar. — Seja muito feliz, principessa mia.
— Grazie, bonitão — murmuro, tocando seus ombros quase tão
amplos quanto os de Dam. — Eu serei, primo.
Ele se vai e Sam e Em vêm para perto. Seus namorados vieram
também, mas estão aguardando lá fora. Os bonitões estão esperando passar
as festividades do meu casamento para pedirem oficialmente minhas primas
em casamento. Uau! Só agora percebo que em um curto período de tempo
teremos três casamentos dos Di Castellani! Só eu terei dois! Me deixem
explicar, eu terei uma cerimônia oficial em Ardócia também. Meu padrinho
não abre mão disso, é tradição todo príncipe ou princesa Di Castellani se
casar na ilha, de preferência na Basílica de San Domingo.
— Anna, você está lindíssima, prima! — Elas exclamam em
uníssono, me fazendo rir da sua sintonia estranha de gêmeas. As duas me
abraçam e eu me derreto mais uma vez com o carinho de meus primos.
— Você será feliz, principessa mia, eu tenho certeza — Sam
murmura, ajeitando meu hijab. Seus olhos escuros estão lacrimosos,
emoção clara em seu rosto bonito.
— Obrigada, Sam — murmuro com suavidade, tocando seu rosto, e
abaixo mais o meu tom ao acrescentar: — E você também, principessa mia.
— Você já é feliz, prima. Basta olhar esse sorriso em seu rosto —
Em sussurra, igualmente emocionada, embora queira parecer mais durona
que sua gêmea.
— Obrigada, Em — digo, tocando seu rosto também. — Você
também tem um sorriso suspeito, prima — sussurro e ela sorri, cúmplice.
— Já estamos ansiosas para fazer aquela arte em sua pele, prima…
— Ela cochicha só para os meus ouvidos. Eu rio. Apenas as moças solteiras
podem pintar o corpo da noiva com hena, e minhas primas estão em êxtase
desde que lhes contei o que vão escrever em meu corpo.
— Não mais do que eu, primas — confidencio. Elas me abraçam
mais uma vez e se vão.
Luc, Samu e Chloe vêm para perto. Minha nova prima está linda
num longo vestido azul. Ela conseguiu se libertar das neuras sobre seu
corpo de curvas voluptuosas e se assumiu de vez. Eu a admiro por isso. É
linda à sua maneira. Não dá para medir as pessoas com a mesma fôrma, isso
é ridículo. A sociedade é ridícula com seus padrões e caixinhas pré-
estabelecidos.
— Quem diria, Anna — Luc murmura com um de seus sorrisos
infames, me puxando para seus braços. — Você se casando apenas sete
meses depois do nosso, prima… — Eu rio, recordando que, na ocasião do
seu casamento, disse que nunca me casaria. Ele se inclina e me beija sobre
o hijab. Seus olhos azuis ficam suaves quando voltam a me fitar. — Não
querendo ser repetitivo, mas eu também torci para que você encontrasse o
amor de novo. Seja muito feliz, princesa.
— Obrigada, Luc. — Eu toco seu rosto bonito e sorrio, acenando.
— Você consegue ser delicado quando quer, primo. Olha só… — O
provoco e ele bufa, mas me dá um sorriso, cedendo a vez para seu gêmeo.
— Minha mãe tem razão, estamos parecendo discos quebrados,
prima. — Samu meneia a cabeça, rindo com seus olhos iguais aos de Luc,
mas com uma suavidade que seu gêmeo nem sempre mostra. Seus lábios
depositam um beijo em minha têmpora e recua para me olhar. — Mas é
isso, Anna, estamos todos em êxtase por ver o quanto está feliz construindo
uma nova família. Desejo que viva plenamente de agora em diante,
princesa.
— Obrigada, Samu — murmuro, tocando-o no rosto. — Desejo isso
para você — Desvio os olhos para Luc e Chloe. — Vocês também, primo.
Ah, e meus sobrinhos lindinhos. — Ele sorri. Eles sorriem, nitidamente
felizes com a família que estão construindo também. Samu dá lugar para
sua esposa.
— Chegou a sua vez, prima. — Ela diz com seus olhos azul-bebê
cheios de carinho para mim. Então, me abraça com cuidado. Envolvo meus
braços ao seu redor também. Eu adoro essa garota. Quando nos afastamos,
seus olhos estão mais brilhantes de lágrimas, fazendo os meus voltarem a
lacrimejar. — É redundante, mas é o que todos nós lhe desejamos, Anna.
Seja muito, muito feliz, querida!
— Obrigada, prima. — Sorrio-lhe. — Eu serei, Chloe. Eu serei. —
Ela se vai e Mike e Ella se aproximam.
— Eu estou com o idiota do Luc. Quem diria que estaríamos em seu
casamento tão cedo, prima? — Mike sorri, me envolvendo em seus braços,
e eu rio, abraçando meu primo mais velho de volta. Quando seus olhos
negros me encaram ao recuar um pouco, seu rosto está sério, mas com uma
suavidade que me acostumei a ver para mim enquanto crescíamos e ele
cuidava de todos nós. — Você encontrou um bom homem, Anna. Ele vai
amar e cuidar de você como merece, princesa.
Eu assinto, tocando seu rosto bonito. Embora não tenha o sangue Di
Castellani, ninguém diria isso olhando para ele. A semelhança dele com tio
Jay é incrível, inclusive o temperamento forte.
— Obrigada, primo mais velho. — Sorrio-lhe. — Obrigada por
sempre cuidar de mim, Mike. Graças a você Karim foi me buscar
pessoalmente naquela primeira noite. — Não resisto a uma provocação no
final: — Pensando bem, isso o torna meio que a minha fada-madrinha,
primo.
Ele bufa e todos riem em volta. Meus primos e irmão tirando sarro
dele. Seus braços me envolvem de novo, e com um beijo em minha
têmpora, recua para Ella chegar mais perto. Minha prima está deslumbrante
num longo verde e me olha com seus grandes e expressivos olhos
destacados pela cor do vestido. Ficamos assim, apenas nos encarando e
conversando em silêncio por alguns instantes. Nós temos esse tipo de laço,
então nos abraçamos, soluços irrompendo de nossas gargantas.
— Ah, Dio, não queria fazer você chorar mais, prima. Teremos que
retocar sua maquiagem — ela murmura, se afastando, suas mãos pegando
as minhas nas suas. Nossas mães vêm para perto, munidas de lenços,
limpando nossos rostos com todo cuidado. — Eu amo tanto você,
principessa mia. Tanto. Si, estamos tão repetitivos, porém, explodindo de
felicidade porque você voltou a sorrir, viver. — Aceno, tão enlevada de
amor por ela. — Seja extraordinariamente feliz, Anna. Eu te desejo isso,
carissima. Amor, muito amor.
— Grazie, principessa mia — murmuro, embargada. — Ti amo
tantissimo, Ella. Eu consegui, não foi? — Eu choro copiosamente.
— Si, prima. Você conseguiu — sussurra e ouço nova onda de
fungados ao redor. — Agora, vamos cuidar de retocar sua maquiagem
porque você será uma rainha dentro de poucos minutos e tem de estar
impecável!
Eu rio e nos abraçamos outra vez antes de os profissionais me
cercarem para cuidar dos retoques. Quando terminam, tento segurar a
emoção e entrar naquele salão impecável para meu rei. Minha família sai
antes de mim e fico com os funcionários, que me conduzirão à ala oeste,
para o salão do trono. Ao contrário das cerimônias ocidentais onde a noiva
entra no braço do pai, nos casamentos árabes a noiva entra sozinha. Além
disso, haverá a leitura do contrato para mim e Karim em salas separadas. Só
depois é que iremos nos encontrar no salão do trono para a troca de alianças
e minha coroação. Estou um tanto nervosa, mas ao mesmo tempo excitada
para vê-lo. Ele deve estar maravilhoso.
Cerca de vinte minutos depois, entro na sala em que minha família
já está me aguardando e o contrato é lido. O xeque cita trechos do Corão
exaltando o casamento. Eu concordo, tão ansiosa para ver meu noivo que
não consigo dizer o que foi lido. Sei do conteúdo porque Karim já havia
falado comigo a respeito. Só registro palmas e exclamações das mulheres e
minha família sai em direção ao salão do trono para tomar seus lugares. Eu
fico tentando respirar devagar e me acalmar. A porta da sala se abre, meu
cenho franze ao ver o tio Jafar entrando. Ele está bonito em seu traje oficial
de príncipe árabe. Até mesmo seu semblante, geralmente fechado, está
quase alegre quando para a poucos passos de mim.
— Minha senhora. — Se inclina respeitosamente. Tenho percebido
que seus olhares enviesados para mim cessaram desde que seu sobrinho foi
me buscar em Nova York. Embora nunca tenhamos trocado mais do que
cumprimentos cordiais.
— Meu senhor. — Devolvo a mesura, me perguntando o que ele
pode querer.
— Eu lhe devo uma retratação também, Alteza. — Quase engasgo
com minha saliva quando o homem diz isso. O quê?! Meu semblante deve
mostrar meu espanto, porque ele quase sorri. — Fui terminantemente contra
a sua união com meu sobrinho no começo — esclarece e eu aceno,
ouvindo-o atenta. — Porém, isso ficou no passado. A senhora provou ser
digna de Sua Majestade, digna de sentar no trono de Kamar.
— Karim o enviou até aqui? — inquiro, ressabiada. Ele de novo
quase sorri.
— Não, minha senhora. Sou um homem tradicional, não nego — diz
me olhando firmemente. — No entanto, sei reconhecer quando faço um
julgamento errado. — Ele bate o punho no peito esquerdo e recita
solenemente: — Como minha rainha, terá minha lealdade até o meu último
suspiro, como a tem o meu rei.
Eu fico estupefata por um instante, então me recupero e bato meu
punho no peito também.
— Sangue, honra e linhagem! — Recito com minha melhor voz
altiva. — Aprecio seu esforço, senhor Jafar, e é claro que tudo ficará no
passado. — Meu tom suaviza um pouco porque vamos combinar: deve ter
sido um esforço e tanto para um homem apegado às tradições como é o tio
de Karim. — Somos família agora. Por favor, me chame de Anna quando
estivermos em família.
Seus olhos brilham e ele parece gostar disso.
— Faço-o feliz, Anna — murmura com alguma emoção
transparecendo em seu rosto. — E se não for pedir demais, me chame de tio
quando estivermos em família.
Sorrio-lhe. Um sorriso verdadeiro, e me aproximo dele.
— Farei tudo ao meu alcance para fazê-lo feliz e à Ayla, eu prometo
— murmuro, e decido dar um salto de fé adicionando: — Shukran, tio.
— Não me agradeça. — Ele parece emocionado, o que é incrível
para mim. Então, limpa a garganta. — O rei a está esperando agora. — Sua
postura volta a ser reverente. — Minha senhora. — Faz mais uma mesura
antes de sair.
Uau! Coloco minha mão sobre o meu peito. Quem diria, hein? O
Mister Simpatia está levando a sério o seu título. Rio da minha leviandade e
sacudo a cabeça. Suspiro feliz que nada mais esteja entre eu e Karim e
marcho para fora da sala. Sigo pelo corredor, parando no limiar das portas
duplas do salão do trono. Meus joelhos tremem sobre as sandálias de salto
alto. Há guardas reais ladeando o tapeto vermelho e eles sacam suas
espadas ao som de uma trombeta, elevando-as para frente, formando um
túnel. Karim me avisou que minha entrada seria assim por causa da
coroação. Todavia, meu coração está quase saindo pela boca. É o meu
casamento. Estou me casando com um rei. Estou no meio de uma
respiração quando o vejo na parte elevada da sala, perto dos dois tronos. Ele
está em pé e meus joelhos tremem mais quando nossos olhares se
encontram e se fixam. Me permito beber da sua aparência por um momento.
Não há adjetivos que deem conta de descrever fielmente a sua
beleza na farda militar negra. Há uma espada pendendo de sua cintura, o
corpo grande exala um magnetismo primitivo que me fascina. Seu rosto
lindo está adornado por uma cafia branca e uma coroa de ouro puro sobre
sua cabeça. Meus olhos arrastam para os seus de novo e eles me chamam
sem palavras. Respiro fundo e entro, não conseguindo registrar nada no
recinto, exceto o homem imponente à minha frente. Seus olhos escuros
brilham intensamente a cada passo que dou em sua direção. Meus olhos
turvam, meu coração correndo rápido; emoção, amor, devoção pura para
este homem me golpeando. Ele percebe o meu estado e vem me encontrar
na saída do túnel. Não podemos nos tocar até trocarmos as alianças e
sermos marido e mulher, mas seus olhos me confortam quando paro à sua
frente.
— Amirati… — sussurra, emoção clara em sua voz. — Você é a
perfeição andando sobre a Terra.
Meus olhos transbordam com seu elogio. É um poema em seus
lábios. Ele é sincero. É o que o meu amor pensa, e isso me deixa toda mole,
querendo estender a mão e tocá-lo.
— Shukran, malkaa — murmuro, com lágrimas na garganta. Me
lembrando de onde estamos, o trato com a deferência exigida nas ocasiões
públicas, e faço uma reverência respeitosa. — Não há palavras belas o
suficiente para descrever como Vossa Majestade se parece neste momento
— digo baixinho, e seus olhos negros brilham ainda mais e ele engole
audivelmente.
— Siga comigo até o xeque, Anna — murmura, percebendo minha
emoção, e diz ainda mais baixo para mim: — Logo vamos poder nos tocar,
habibti.
Assinto e seguimos até onde um homem idoso nos espera perto dos
tronos, que estão na parte elevada por um degrau. Ele é a autoridade
religiosa que irá me consagrar rainha e abençoar a nossa união. Paramos à
frente do xeque e ele coloca as duas mãos sobre nossas cabeças entoando
uma oração, que muitos no salão acompanham. Eu não sei muita coisa do
Corão até agora, mas me comprometi a estudá-lo junto com meu marido.
Quando o ancião termina a sua bênção, Jalal surge ao nosso lado com uma
caixinha preta e a abre, mostrando duas alianças de ouro branco, toda
cravejada de pequenos diamantes rosa. Meus olhos se enchem de lágrimas
pela perfeição das joias, combinarão perfeitamente com meu anel. Olho
para Karim e já o encontro me encarando fixamente. Ele se aproxima mais
e pega minha mão esquerda. Estou tremendo e ele sorri para mim, tentando
obviamente me acalmar. Jalal entrega a minha aliança e Karim a empurra
gentilmente em meu dedo, seus olhos escuros nunca deixando os meus.
Jalal me entrega a de Karim e eu pego sua mão morna, empurrando
a joia em seu dedo, uma alegria sem tamanho se espalhando dentro de mim
enquanto nos olhamos. Somos marido e mulher agora. Meus olhos
transbordam e eu choro enquanto o salão irrompe em palmas e aclamações
efusivas. Só agora me dou conta de que muitos convidados importantes de
várias partes do mundo estão aqui para ver nosso enlace. Karim pega
minhas mãos e as leva à boca, beijando-as suave e reverentemente. Não
podemos nos beijar hoje, só no terceiro dia. Há lágrimas brilhando em seus
olhos também, e isso só o deixa mais lindo para mim.
— Vem, o xeque vai iniciar o rito da sua coroação, habibti —
sussurra e nos dirigimos para a frente dos tronos.
Ele se senta no seu e eu me ajoelho sobre a almofada à sua frente.
Ele retira a minha tiara e entrega a Zafyr, que me lança um olhar
irreverente, um sorriso brincando em sua boca. Em seguida, entoo a oração
que Karim me ensinou e sinto um manto pesado sendo colocado sobre meus
ombros. Reconheço a voz do tio Jafar enquanto segura meus ombros e faz
uma oração pedindo a proteção para a nova rainha. Ele me puxa e me
levanto, virando de frente para os convidados. Meu Jesus, muita gente! Meu
olhar passa pela primeira fileira e paro em minha mãe, chorando
copiosamente no abraço de meu pai, que também está com os olhos
orgulhosos e emocionados sobre mim. Vejo Ayla perto de Nuria e Naim e
resisto à vontade de lhe jogar beijos. Minha sapequinha está linda em trajes
oficiais. Ela, no entanto, não tem qualquer cerimônia e me joga beijos.
Sorrio-lhe, completamente arrebatada por ela, como sou por seu pai.
O xeque vem para a minha frente carregando uma coroa toda em
ouro, combinando com a de Karim, só que mais feminina, com detalhes
delicados. Abaixo a minha cabeça e me emociono mais quando a sinto em
minha cabeça. Não por me tornar uma rainha, não, eu não tenho tal vaidade.
Estou feliz por me tornar a rainha dele. Por ele ter me escolhido, pela luta
que esse homem perfeito travou para poder se casar comigo. Isso sim me
envaidece, o amor que ele sente por mim. O tio Jafar torna a se aproximar
segurando o Corão e coloco minha mão direita sobre o livro sagrado,
fazendo meu juramento de soberana. Quando termino, todos me saúdam
com aplausos e os nativos fazem a saudação tradicional:
— Sangue, honra e linhagem! Que Allah proteja a rainha! — Batem
seus punhos no peito.
Eu faço o mesmo gesto, repetindo a primeira parte. Então, me sento
em meu trono e tento sorrir, mesmo que sinta minha boca tremendo de tanto
nervoso. E Karim faz algo que choca não só a mim, mas a todos no salão,
tenho certeza. Ele sai do seu trono e cai sobre o joelho direito na frente do
meu. Há uma onda de murmúrios, suspiros e exclamações pelo salão.
— Eu, o rei Karim Amihaj Bin Khallifa Al-Abdallah, declaro meu
amor e lealdade à Sua Majestade, Anna Julia Marcollini Harper Di
Castellani Al-Abdallah, minha rainha, e somente a ela! — diz solenemente,
batendo o punho no peito. Eu o olho entre deslumbrada e estupefata. O rei
não precisa fazer isso. É uma obrigação da rainha pelas leis de Kamar, mas
meu amor sabe o quanto sou avessa às mulheres ficarem se curvando o
tempo todo aos homens e quis me tratar como uma igual perante seu povo e
nossos convidados. Eu o amo ainda mais por isso.
— Eu amo você, habib. Amo tanto que meu peito dói,
provavelmente por não caber tudo que sinto por você — murmuro, sorrindo
com lágrimas nos olhos. — Agora, levante-se, malkaa.
Seu olhar fica tão intenso que sinto minha pele esquentar mesmo
toda coberta.
— Eu amo você, malikati. — Ele pega a minha mão e beija com
ternura. — Que Allah te conceda a felicidade duradoura, porque o meu
amor você sempre terá.
Meus olhos voltam a turvar e eu levanto minha mão, tocando seu
rosto perfeito. Meu coração não cabe no peito de tanto amor. E realmente
dói, mas é uma dor boa.
— Você sempre terá o meu também, habib — sussurro, minhas
lágrimas caindo pela face. Ele as limpa delicadamente com os polegares e
só então se levanta, tornando a sentar-se ao meu lado.
Nesse momento, as apresentações em nossa homenagem se iniciam.
Eu sorrio, vendo tudo, mas não vendo nada porque meus olhos não querem
se desgrudar dele. Viro a cabeça para seu lado e dou de cara com seus olhos
negros me admirando e cobiçando também. Ele abre um de seus sorrisos
lindos e estende a mão para mim. Eu a pego e a trago para a minha boca,
depositando um beijo reverente sobre o seu anel majestoso. Seus olhos
acendem com amor, mas também luxúria cintilando nas íris negras. Um
sorriso repuxa minha boca e deposito mais um beijo, meus olhos nunca
deixando os seus. Eu o amo mais do que consigo explicar ou expressar. E
rogo a Allah que realmente nos conceda felicidade e paz duradouras, porque
amor nós temos de sobra.

Karim Amihaj
Os tambores rufam e trombetas ressoam pelo jardim quando faço
minha entrada em nosso banquete debaixo da grande tenda. Os convidados
ovacionam e fazem preces para uma união feliz e abençoada com muitos
filhos. Para o árabe, a fertilidade é um fator importante nos casamentos. A
linhagem é tudo que um homem tem de mais valioso e ele precisa perpetuar
seu nome na Terra. Não terei esse problema porque a minha rainha é
saudável e perfeitamente capaz de gerar meus herdeiros. Minha rainha. Eu
saboreio esse termo em minha mente, um sorriso bobo e apaixonado
curvando minha boca. Anna foi coroada na primeira noite e trocamos as
alianças a primeira vez. Foi uma cerimônia linda e nos emocionamos em
vários momentos. Depois das apresentações em nossa honra, o sharbat[40]
foi servido e tomamos a bebida com nossas famílias e os convidados. Todos
foram avisados previamente que não haveria bebida álcoolica, uma vez que
em nosso país é proibido ingeri-la em público. Ontem foi o dia da noiva e
ela ficou com suas primas, mãe e tias, além das mulheres da minha família.
Eu entreti os homens da sua e da minha família. Fomos jogar golfe e
presenteei meu sogro e cunhado com Rolex de ouro personalizados.
Na primeira noite, presenteei a minha sogra e as primas de Anna
com joias, uma vez que ela não tem irmãs. Houve troca de presentes entre
as nossas famílias também, como manda a tradição. Me sento na poltrona
de dois lugares e espero pela entrada dela. Olho de lado e vejo minha filha
sentada junto de Ella, rindo e brincando com Rico. Sorrio satisfeito com a
interação entre nossas famílias. Nos tornamos uma só agora. Eu contemplo
os convidados e vejo Faysal, irmão mais novo de Yasmina. Ele está
sorrindo para mim. É o novo sheik El-Baham e tem se mostrado estudioso e
comprometido em restabelecer a honra de sua linhagem. E inevitavelmente
a memória de minha esposa falecida me vem à mente. Eu estou aqui,
novamente casado, quando relutei o quanto pude não tomar ou amar outra
mulher. O que vivi com Yasmina foi lindo e ficará em minha memória para
sempre. Mas não pude resistir quando vi Anna porque ela era o meu
destino. Ela estava destinada a ser a minha rainha.
Converso com Yasmina em pensamentos:
Shukran por ter me dado tanto. Nossa filha está cada dia mais linda
e encontrei uma boa mulher que a ama e cuida como se fosse dela. Você
sempre será a minha princesa, Yasmina. Sei que está feliz em saber que
meu coração está preenchido de amor outra vez, que não vou passar
sozinho através da vida. Encontrei uma garota linda e vibrante que vai
cuidar de mim e de nossa filha. Você nunca será esquecida por mim e Ayla,
eu prometo, amirati.
Um novo rufar de tambores leva minha atenção para a ponta do
tapete vermelho e meu coração dispara loucamente ao ver a minha garota
linda no trono suspenso. Os convidados voltam a ovacionar, jogando pétalas
de rosas sobre ela. Eu me levanto, meus olhos absorvendo cada minúsculo
detalhe da sua beleza incomparável enquanto é trazida para mim. Seu trono
é abaixado cuidadosamente à minha frente e estendo-lhe a mão, ajudando-a
a se levantar. Allah, está linda demais. No primeiro dia quando a vi
atravessar o túnel de espadas, fiquei sem palavras, mas agora parece que
conseguiu o impossível, está ainda mais perfeita num tradicional vestido
branco de seda e rendas delicadas. Consigo ver as pontas das tatuagens de
hena nos dorsos de suas mãos e meu corpo inflama, antecipando o momento
em que a levarei para os nossos aposentos e a tomarei como minha esposa
pela primeira vez. Um véu de renda longo cobre seu rosto perfeitamente
maquiado. Seus cabelos estão presos num coque elegante e uma joia de
pérolas adorna sua cabeça, uma esmeralda caindo no meio da testa. Os
olhos verdes bem marcados, a boca vermelha me deixando ainda mais
louco de amor, paixão, desejo feral.
— Você conseguiu ficar ainda mais linda nesta noite, malikati —
murmuro, pegando suas mãos e beijando-as ternamente.
— Você também, meu amor — murmura de volta com esses lindos
olhos verdes me adorando.
Lhe dou mais um beijo em cada mão e a levo para a frente do xeque.
Ele repete o ritual de orar sobre nossas cabeças, em seguida, eu e Anna
trocamos alianças de novo, completando o rito e tornando nosso casamento
oficial aos olhos dos homens e de Allah. A multidão eclode em palmas
junto com “viva os noivos” dos ocidentais e preces dos mulçumanos. A
levo para sentar-se junto comigo na poltrona e entrelaço nossos dedos,
apoiando nossas mãos unidas sobre a minha coxa.
Assistimos a apresentações de dança e corais enquanto o banquete é
servido. Em seguida, um círculo se forma e é a nossa vez de dançar. Retiro
seu véu com delicadeza, a conduzo pela mão até o centro e uma música
árabe começa, a mesma que dançamos na casa noturna. Anna adora essa. A
enlaço pela cintura com o braço direito e seguro sua mão direita com a
minha esquerda, então, nós dançamos, nossos olhares fixos um no outro.
Seus olhos brilham, me hipnotizando, e eu abaixo minha cabeça, nossas
bocas quase se tocando. A conduzo girando-a, trazendo-a de volta para
mim, seu corpo, seu cheiro delicioso tornando quase impossível meu pau
não ficar duro. Em pouco tempo estamos ofegantes, e não apenas pela
dança. O tesão está claro em nossos rostos, não dá mais para disfarçar.
Porém, quando me lembro que seus pais, sua família estão aqui, forço
minha empolgação a ceder. Teremos todo o tempo mais tarde. Dançamos
mais três músicas, mais casais se juntando a nós, sob os aplausos
entusiasmados do grande círculo.
Em dado momento, nos separamos para dar atenção às nossas
famílias. A vejo conversando animadamente com suas primas e sorrio
quando ela olha de lado e me flagra cobiçando-a sem parar.
— Allah, você ainda parece a noiva, primo. — Jalal zomba, com um
sorriso de merda. Eu volto minha atenção para ele, fulminando-o. — Tudo
bem, desculpe. Ela está realmente encantadora.
— Shukran, idiota — resmungo.
— Fique calmo, primo. Logo poderá arrastar sua esposa para o
quarto e acabar com esse seu humor de merda. — Zafyr também caçoa.
Eu rolo os olhos, rosnando.
— Eu não estou mal-humorado. — Nego e os dois riem, me fazendo
fulminá-los mais uma vez.
— É claro que não, Amihaj. — Jalal continua zombando.
— Cale a boca. — Solto um grunhido. — Eu não lembrava que as
comemorações eram tão estendidas.
— Eu não sei se terei saco para casar de acordo com a lei. — Zafyr
estremece e completa com uma careta: — Na verdade, nem sei se vou me
casar.
— É claro que vai, seu idiota. Um homem precisa garantir que sua
linhagem não morra com ele. — Jalal o repreende.
Um sorriso malicioso cruza o rosto de meu primo mais novo.
— Bem, eu posso tomar duas, três, ou mais esposas, não é? — Diz
levianamente. — A lei me garante esse direito.
— Você só lê as partes do Corão que lhe convêm, primo. — Digo
ironicamente.
— E não é assim em toda religião, primo? — Ele levanta uma
sobrancelha cética.
— Não diga blasfêmias, meu filho. — A voz de tio Jafar soa às
minhas costas. — Um homem só deve tomar uma segunda esposa por
necessidade de Estado ou se a primeira não for fértil. Nenhum homem deve
tomar várias esposas por vaidade.
Zafyr fecha a cara.
— Bem, nesses termos, dificilmente irei me casar, meu pai. — Tem
a audácia de dizer e pede licença se afastando em direção à tia Samira. Tio
Jafar observa seu filho mais novo, meneando a cabeça.
— Ele vai mudar de ideia quando a mulher certa aparecer, meu pai.
— Jalal tenta apaziguar.
— Que Allah coloque juízo na cabeça de seu irmão, meu filho. —
Meu tio roga com as mãos para o alto. Então, se recompõe e me encara com
seriedade, mas ultimamente tenho vislumbrado certa ternura em seu
semblante: — Que Allah o proteja, meu sobrinho. Agora que o ritual
completou o ciclo, é um homem casado novamente.
— Shukran, meu tio. — Digo, inclinando a cabeça em respeito.
Anna me contou que ele foi procurá-la antes da cerimônia da primeira noite
e se desculpou pela animosidade com que a tratou em seu primeiro mês no
palácio. Seu olhar vai para Anna conversando e rindo com sua família.
Agora ela está com Ayla em seus braços, minha filha ostenta o maior
sorriso deslumbrado, os bracinhos em volta do pescoço de sua Anninha.
— Você estava certo o tempo todo, Amihaj. — Ele diz em tom
ameno e eu o encaro. — Ela é a mulher certa para você e para a sua filha.
Meu peito fica leve, pois ele agora não está apenas aceitando porque
não teve escolha. Meu tio está conseguindo enxergar a pessoa especial que
a minha garota é.
— Sim, tio, ela é a mulher da minha vida. Eu tive que sofrer para,
enfim, encontrá-la. — Ele me olha e estende uma mão para o meu ombro,
acenando. Sua expressão fica mais séria e parece desconfortável. Sinto que
há algo mais que quer me falar. — Há algo mais o preocupando, tio?
— Sei que não é o momento, meu rei, mas gostaria que soubesse
que pretendo abdicar da posição de grão-vizir em favor de Jalal.
— O quê?! Por quê? — Me sobressalto. Sua boca comprime numa
linha apertada.
— Eu falhei com você, Amihaj. Falhei como grão-vizir e tio. —
Balanço a cabeça negando, mas ele levanta a mão e eu calo a negativa. —
Sua primeira esposa foi assassinada em minhas barbas e eu nunca
desconfiei de nada. Isso tem me tirado o sono.
— Meu tio, não pense assim. Ninguém sabia da podridão que
habitava Abdul El-Baham. Não foi culpa ou negligência sua.…
— Shukran por dizer isso, malkaa. — Ele suaviza um pouco a
expressão carregada. — Mas já está decidido. Tenho andado cansado e
Samira está pedindo para eu cuidar mais da saúde. — Um quase sorriso
curva sua boca. — É hora de deixar nosso emirado nas mãos da nova
geração Al-Abdallah.
— Meu pai, me perdoe a intromissão, mas estou ouvindo… — Jalal
entra na conversa, seu rosto preocupado para o pai. — O senhor está
doente? Por que não me falou nada?
— Não, não, meu filho. — Meu tio apazigua. — É só preocupação
excessiva de sua mãe. Estou bem, mas não sou mais nenhum jovem, não é?
Eu meio que rio com sua tentativa de ser espirituoso. Talvez ele
precise mesmo descansar. E não posso dizer que me desagrada meu primo
mais velho assumir a função de meu braço direito no governo.
— Se essa é a sua vontade verdadeira, eu aceito sua abdicação, meu
tio. — Digo, estendendo minha mão para seu ombro. — Shukran por cuidar
de mim e ser leal acima de tudo. Nossa família é honrada como poucas
nesta região.
— E continuaremos assim, meu sobrinho. — Ele se emociona. —
Nunca um Al-Abdallah trairá o seu sangue.
— Morreremos defendendo a nossa linhagem — murmuramos ao
mesmo tempo.
Me inclino e beijo sua face em ambos os lados.
— Ainda posso contar com seus conselhos?
— Será uma honra, malkaa. — Faz uma reverência respeitosa e eu
lhe faço a mesma gentileza. Com mais um aperto em meu ombro, ele volta
para tia Samira e eu encaro Jalal.
— Bem, parece que terei que aturar sua cara feia muito mais
próxima de mim de agora em diante — resmungo. Meu primo ri, o braço
passando por cima dos meus ombros.
— Admita, primo, você não pode viver sem mim. — O idiota se
parece com Zafyr neste momento. Eu acabo rindo também. Ele me
acotovela e percebo meu sogro e cunhado se aproximando. — Bem, eu vou
deixá-lo confraternizar com sua nova família.
Ele segue em direção a Nuria, que está conversando com Anna
agora, e eu o invejo.
— Meu sogro, meu cunhado. — Os saúdo cordialmente.
— Agora que o rito foi completado, conforme a tradição de sua
religião, posso chamá-lo de meu genro também. — Dom sorri. Ele tem o
bom humor invejável que Anna herdou. — Sei que já lhe disse, mas nunca
é demais repetir: Anna é a minha única filha e me custa muito a deixar tão
longe de mim, sua mãe e seu irmão. — Aceno. O compreendo, sou pai
também e me mataria ver Ayla indo para longe. — Porém, é o curso da
vida. Nós criamos os filhos e depois precisamos deixá-los viver. — Seus
olhos brilham com emoção clara. — E minha Anna precisava disso, viver.
— O entendo perfeitamente, Dom. Acho que já percebeu o quanto
sua filha é preciosa para mim — murmuro. — Cuidarei dela com a minha
vida, tenha certeza disso.
— Eu sei. Você já provou isso, duas vezes, Amihaj. — Diz, com um
aceno de cabeça, então, estende a mão. — Bem-vindo oficialmente à
família, meu genro.
Eu aceito sua mão e damos um aperto de mão firme. Me surpreendo
quando me puxa para um abraço meio desajeitado de homens. Os Di
Castellani são bem expansivos com suas emoções, tenho percebido em
nossos encontros. Eu aprecio isso.
— Shukran, meu sogro. — Agradeço-o quando nos afastamos. —
Bem-vindo à minha família também. Em nossos costumes, agora somos
uma só.
Ele acena e Lipe inclina a cabeça para mim.
— Faço minhas as palavras de meu velho, cunhado. — Sorri. Ele
parece mais cordial comigo agora. Quando fui buscar Anna em Nova York,
depois do segundo sequestro, não parecia muito feliz em me ver e muito
menos ao saber que Anna aceitou voltar comigo. O entendo também e
aprecio sua preocupação e cuidado com a irmã mais velha. Os Di Castellani
têm valores de sangue semelhantes aos meus. Eles são unidos e se apoiam
incondicionalmente. Isso ficou claro ao permitirem o casamento entre dois
homens com a mesma mulher, coisa ainda não aceita mesmo com a
modernidade do Ocidente. — Cuide bem de minha irmãzinha. É só o que
peço. — Estende a mão. — Bem-vindo à família.
Eu sorrio e o puxo para um abraço. Anna o ama, portanto, preciso
me dar bem com ele.
— Eu amo sua irmã mais do que consigo colocar em palavras, Lipe.
Fique tranquilo que ela será bem-cuidada. — Garanto-lhe quando nos
afastamos. Olho os dois primeiros homens da vida de minha esposa e
completo: — Vocês serão sempre bem-vindos para nos visitar e prometo
levá-la ao Ocidente quantas vezes quiser. Anna não será a típica esposa
árabe submissa. Ela sempre terá suas vontades respeitadas por mim. —
Isso agrada aos dois, que sorriem de volta.
— Coitado de você se não respeitasse. — Seu pai zomba, o tom
orgulhoso do temperamento irreverente da filha. Sorrio também porque ele
tem razão. Anna tem um espírito livre, vibrante, e não quero que perca isso
jamais.
Quando eles se afastam, minha atenção volta para ela. O banquete
está a todo vapor, muita gente dançando, mas eu não posso esperar nem
mais um segundo para estarmos a sós, poder beijá-la, tocá-la livremente.
Ela deve estar sentindo a mesma coisa, pois anda para mim, decidida. Seus
braços envolvem meu pescoço quando me alcança e seguro sua pequena
cintura.
— Leve-me para o quarto, habib. Agora — pede, a boca carnuda
tentadoramente perto da minha.
— Todos esperam que fiquemos até o final, essa é a tradição —
sussurro e geme frustrada. Eu rio perverso, levando minha boca para seu
ouvido: — Mas meu pau não pode mais esperar mais tempo sem afundar
em você… — Ela ofega, estremecendo, a pele do pescoço arrepiando.
— Vamos subir, habibti.
Nós sorrimos e nos esgueiramos, escapando para o elevador mais
próximo. Alguns minutos eu a pego nos braços, abrindo a porta de nossos
aposentos. O cheiro de incenso entra em minhas narinas. Nuria se
encarregou de preparar nosso quarto para nossa primeira noite. Quando
avanço pelo living ladeado de velas alaranjadas, noto o chão coberto de
pétalas de rosas de várias cores. Ouço um ofego de Anna e rio, beijando-a
na têmpora. Há uma imitação de tenda beduína montada no centro da sala,
as luzes baixas de candelabros e velas espalhadas pelo chão aqui e ali
deixam o ambiente romântico e sensual ao mesmo tempo. A coloco no chão
e meus braços enlaçam imediatamente sua cintura. Ela cinge meu pescoço
com os braços e nos olhamos deixando toda a paixão e desejo escancarar
em nossos rostos. Nossos narizes deslizam pelo rosto um do outro,
inalando-nos, nossas bocas roçando uma na outra. Subo uma mão pelas
costas esguias e seguro sua nuca, meus olhos presos aos dela, então,
mergulho a boca na sua.
Nós dois gememos, aliviados por nos sentir depois de tantos dias,
mas também ansiosos para experimentar o prazer imensurável que é
estarmos ligados, unidos no ato de amor. Nossas bocas se sugam
mutuamente, nossas línguas se encontrando, se enroscando tão gostoso que
eu rosno, a mão de sua cintura descendo para a bundinha firme. Puxo sua
pelve para a minha, esfregando meu pau duro nela. Anna choraminga, antes
de aprofundarmos o beijo, seus dedos entranhados em meus cabelos da
nuca, abaixo do turbante. Mordo sua boca e desço para o queixo, sugando
devagar, raspando os dentes.
— Eu te amo tanto, habib — murmura, os olhos verdes brilhando na
parca iluminação fazendo meu coração inchar de tanto amor por ela. —
Amo ser sua — completa me olhando com tanto amor, adoração. Eu solto
um rugido satisfeito. Sua entrega me envaidece, me deixa arrogante que
tenha me escolhido.
— Eu te amo, minha rainha — sussurro com todo o meu coração e a
beijo de novo, duro, áspero, louco para me enterrar logo em seu calor
perfeito. Ela sorri, arfando, e arranca a boca da minha.
— Estou louca para ter você dentro de mim também, meu amor.
Mas preparei algo para meu rei antes. — Sopra em minha boca. — Me
ajude a tirar o vestido, habib — murmura e eu obedeço mais do que
depressa. Giro-a, colocando-a de costas para mim, e passo a abrir cada um
dos botões do lindo vestido.
Então, minha respiração é sugada para dentro dos pulmões quando
vejo a primeira tatuagem. Karim. Allah, eu abro mais e mais botões vendo
que meu nome está pintado em sua pele, a tinta escura contrastando com
sua tez morena clara. Meu pau baba nas calças e eu rosno, empurrando as
mãos pela cinturinha, tirando o vestido para que eu possa apreciar esse belo
presente de minha esposa. Retiro as mangas pelos braços delicados e vou
rosnando como um animal irracional. Mais nomes. O tecido cai aos seus
pés e me afasto um pouco para ver que sim — costas, braços, bunda, coxas:
meu nome está por todo lugar, marcando-a. Puxo suas costas contra meu
peito e mordo sua nuca. Ela estremece em meus braços e minhas mãos
sobem pelos seus braços, ombros e descem pela frente, enchendo as mãos
em seus peitinhos durinhos.
— Allah, que presente lindo, minha esposa — sussurro em seu
ouvido, sugando seu lóbulo, descendo a boca e chupando seu pescoço. Ela
geme, choraminga, pegando minha nuca por trás. Amasso os dois montes
perfeitos e puxo os bicos com mais pressão enquanto minha boca desce
mais para seu ombro, mordendo-o em cima do meu nome.
— Que bom que gostou, habib. — Ela diz ofegante. — Mas ainda
tem mais…
— Sim, terá muito mais, eu te comendo de todo jeito até me cansar,
sua garota atrevida — digo asperamente e ela tem a ousadia de rir. Eu desço
uma mão pelo ventre macio e enfio pelo cós da calcinha branca de renda.
Enlouqueço ao encontrar sua boceta pingando para mim. Esfrego os lábios
melados, trazendo umidade para o clitóris, e o massageio devagar, apenas
aumentando seu tesão. Estou a ponto de enfiar meus dedos em seu canal
quando ela escapa dos meus braços. — Volte aqui, Anna. — Rosno,
tentando puxá-la de novo, mas ela sai do meu alcance, negando com a
cabeça. Se livra da ilha de tecidos, pegando o vestido e correndo em direção
ao closet.
— Pegue uma bebida e vá para as almofadas na tenda, meu rei. —
Coloca apenas a cabeça para fora da porta e eu resmungo. — Vou fazer
valer a pena, prometo.
Eu rio da minha impaciência e me forço a relaxar, indo abrir a
champanhe no balde de gelo sobre a bancada do bar. Sirvo duas taças e me
livro da camisa da farda militar, da espada. Mantenho o turbante negro, com
pequenas joias pendendo das bordas. Anna gosta de me ver com ele, diz que
pareço um sultão otomano. Eu vou me acomodar no colchão e almofadas
colocados embaixo da tenda. Tomo um gole da minha taça e o som é ligado,
os acordes instrumentais de uma música árabe ressoam no ambiente. Então,
Anna sai do closet e minha respiração torna a travar ao ver seu traje. Está
vestida como uma dançarina típica de nosso povo. Uma saia de cós baixo,
adornada por lenços coloridos, deixando a cintura perfeita e o umbiguinho
lindo à mostra. Um sutiã vermelho adornado de joias variadas. Ela manteve
a joia de pérola sobre a cabeça, mas agora seus longos cabelos estão soltos.
Meus olhos estão presos, hipnotizados, acompanhando-a quando anda até a
frente da tenda.
Ela se curva numa mesura como as escravas faziam com os seus
sultões, se ajoelhando, e o corpo pendendo para trás, as coxas abertas, os
véus se abrindo e deixando-as de fora. Seu corpo forma um lindo arco e eu
aperto meu pau dentro das calças. Quero comê-la nessa posição. Então, ela
gira hábil e lindamente, ficando de pé, e seus olhos encontram os meus
quando começa a mexer sinuosamente a cintura. Baba se reúne em minha
boca ao ver os movimentos perfeitos. A música vai pegando ritmo e seus
movimentos vão se tornando mais ousados, sensuais, sedutores. Mistura
passos que aprendeu em seus anos de balé. Isso lhe dá uma flexibilidade
deliciosa na cama. Eu rio perverso, tomando mais champanhe, meus olhos
presos a ela por cima da borda. Ela gira pelo espaço, os quadris gingando,
ora várias vezes para um lado, ora para o outro. Ela faz um movimento de
tremer os seios, as joias balançando, me fazendo salivar mais para colocar
minhas mãos e boca sobre ela.
A música continua e Anna puxa um véu da cintura, jogando em
minha direção. Eu agarro e o levo ao nariz. Ela continua, retirando um a um
até que rosno, percebendo que está nua por baixo. Allah! Me arrasto até a
borda do colchão, ela sorri ousada e puxa o último que estava escondendo
sua bocetinha linda e depilada. Ela volta a girar, apenas com o cinto de joias
pendurado na cintura e o sutiã. Então, para de costas e abre o fecho do sutiã
puxando-o, e com um olhar malicioso por cima do ombro o joga para mim.
Eu me arrasto mais conseguindo pegar a peça e levo ao nariz de novo,
inspirando seu cheiro profundamente. Ela vira de frente e faz o movimento
sinuoso novamente, suas curvas suaves e nuas; meu nome espalhado em
cada parte do corpo delicioso me faz rosnar e me levantar, indo em sua
direção. Anna torna a sorrir e retira o cinto, ficando completamente nua
para mim.
— Deliciosa, porra. — Eu rujo, minhas mãos pegando sua cintura
possessivamente, trazendo-a para mim. — Linda demais e eu sou o mais
sortudo entre os homens, habibti. — Ela sorri, ofegante, os peitos subindo e
descendo, uma camada fina de suor brilhando em sua pele. Outra música
árabe começa e eu mergulho minha boca na dela, passando a nos mover no
ritmo sensual. Anna sorri, se pendurando em meus ombros, e nos beijamos
de olhos abertos, nossas bocas mergulhando sofregamente uma na outra,
recuando, voltando, nossas línguas se lambendo em pinceladas luxuriosas e
eróticas. Seus belos olhos são tão apaixonados para mim como os meus
para ela. Meu corpo inteiro está gritando para entrar nela e saciar meu tesão,
mas vou refreando, tomando meu tempo porque quero sentir tudo,
absolutamente tudo nesta noite.
Arfamos na boca um do outro, sentindo a música pulsando,
reverberando em nossos corpos. É lascivo dançar com ela nua enquanto
ainda estou vestido, e eu gosto disso. Me embriago nela, minha mulher,
minha rainha. Seguro sua nuca e chupo sua língua com força, uma mão
acariciando suas costas, a bunda gostosa. A puxo mais e mais para mim,
esfregando meu pau em seu corpo quente e delicioso. Nos movemos
lentamente, deixando o ambiente e a sensualidade do ritmo nos comandar.
Nos olhamos e nos esfregamos gostoso, seus peitinhos espremidos e
roçando meu peitoral nu. Nossos olhares fixos, quentes um no outro o
tempo todo. Nossas bocas se deixam e ofegam uma na outra. Passo a sugar
seu lábio inferior, mordendo-o, lambendo-o. Anna choraminga, me puxando
pelos ombros, completamente entregue a mim. Minhas mãos exploram seu
corpo todo, gananciosas. Me divido, pegando sua bunda, abrindo as
bochechas firmes e pegando sua bocetinha melada pela frente. Um
choramingo cai da sua boca e um rosnado do meu.
— Sua boceta está tão pronta para mim, habibti. Eu quero você no
meu pau a noite inteira — digo com aspereza, minhas mãos cavando em sua
boceta e cuzinho. — Quero você por completo esta noite, minha esposa.
— Ah, Karim… Sim, habib… Eu quero isso também. — Seu
gemido se transforma em grito, seu corpo convulsionando quando empurro
dois dedos em sua vulva, os dedos da outra mão circulando seu buraquinho
traseiro. Dou um tapa firme em sua bunda, fazendo a minha garota safada
ganir, serpenteando o corpo flexível no meu. Sua mão pressiona minha
nuca, me puxando mais, e mordisca minha boca. Ranjo subindo a mão livre
para sua nuca, pegando um punhado de cabelo, puxando-o com firmeza.
Seu canal pulsa, lateja em meus dedos, e rio malvado, cavando
perversamente mais fundo dentro, esfregando suas paredes cremosas num
vai e vem intenso, meu polegar passando sobre o seu montículo inchado.
Anna mergulha a boca na minha e a deixo pegar a dianteira, chupando a
minha língua. Como-a com os dedos, ela arfando em minha boca. Levo
meus lábios para o seu ouvido, lambendo a ponta da orelha, mordendo-a em
seguida. Ela estremece em meus braços. Estamos os dois enlouquecidos de
tesão, embriagados um no outro.
— Me ofereça os peitinhos para eu chupar bem gostoso, Anna. —
Peço num grunhido, ela geme, pegando os dois montes perfeitos, arqueando
as costas, oferecendo-se para mim. — Isso, minha putinha. Ofereça esse
corpo perfeito para o seu rei. — Sussurro as palavras chulas, fazendo-a
choramingar e molhar mais meus dedos. Ela adora a nossa sacanagem,
assim como eu. Com um sorriso indulgente, abaixo a cabeça e passo a
lamber os biquinhos eretos, doce e lentamente.
Ela se contorce em meus braços e rio mais, perverso antes de minha
boca engolir os dois mamilos de uma vez, abocanhando-os com gula insana.
Mamo com firmeza engolindo as auréolas inteiras. Meus dedos aceleram,
fodendo-a forte, bem fundo. Resfolega e sinto sua pele arrepiando, me
deixando saber que está perto do orgasmo. Chupo um e outro seio, cada vez
mais ganancioso, rolando a língua no mamilo, mordendo perversamente, e
minha garota explode em gozo, um gemido alto caindo da boca carnuda.
Observo o rosto lindo e transformado pelo prazer.
— Linda. Sente-se no colchão e abra essas coxas para seu marido.
— Retiro os dedos de sua boceta e os levo à boca, sugando seus líquidos
com vontade. Anna geme vendo minha luxúria. — Sua bocetinha não vê a
hora de engolir todo o meu pau, não é, minha rainha? — Digo com
condescendência, empurrando-a delicadamente em direção à tenda. Ela vai
e eu rosno, olhando sua bunda, a fênix em suas costas. Allah, ela me deixa à
beira de uma combustão. Eu retiro minhas calças e botas, o turbante,
deixando meus cabelos caírem livres pelos ombros, e ando atrás dela. Ela ri,
andando com sua sensualidade e irreverência próprias. Quando alcança o
colchão, se abaixa, ficando de quatro, me mostrando a boceta e o cuzinho
delicioso. Eu aperto meu pau, vendo-a girando o corpinho ágil, sentando-se
na borda e puxando as pernas bem arreganhadas para os lados. Gemo rouco,
contemplando cobiçosamente cada centímetro dela, meu olhar cravando na
bocetinha toda aberta para mim. — É minha rainha… — Minha voz é
baixa, repleta de luxúria enquanto me aproximo devagar. — Mas é minha
putinha também, e ama isso.
Ela arfa, seus incríveis olhos cintilando na penumbra. Paro na sua
frente e pego meu pau, esfregando meu eixo para cima e para baixo. Rio
quando seus olhos cobiçosos acompanham meus movimentos. A língua
lambendo os lábios vermelhos e indecentes. Me aproximo mais e encosto a
cabeça bulbosa em sua boca.
— Chupa meu pau bem gostoso, habibti — digo com rudeza e ela
ousa sorrir, estendendo a mão para as minhas bolas, massageando-as
provocantemente, olhos fixos nos meus.
— Como queira, meu sultão lindo — murmura e abre a boca
engolindo a ponta do meu pau e eu rosno, meu corpo todo arrepiando. Se
afasta e beija a cabeça delicadamente e pega meu eixo grosso pela base com
a outra mão. Masturba-me devagar enquanto me lambe como se fosse seu
sorvete preferido. Gemo rouco, pegando seus cabelos, juntando-os em um
rabo de cavalo. Nossos olhares fixos e ela passa a sugar a cabeça, sem
avançar muito, me deixando louco, pulsando em sua boca.
— Engole meu pau todo.… Vai, mama bem gostoso, Anna. —
Ranjo os dentes, puxando firmemente seus cabelos, subjugando-a. Ela
choraminga e enfim abre a boca, me levando bem fundo em sua garganta.
Eu urro, jogando a cabeça para trás, prazer feral se espalhando em meu
corpo todo. Passo a foder seus doces lábios com estocadas firmes e olho
para baixo, tudo em mim inflamando mais ao ver meu eixo grosso e longo
esticando seus lábios. Observo-a mamar em mim, puxando seus cabelos,
mantendo-a cativa. Lágrimas brotam em seus olhos, mas isso só a faz
aumentar o ritmo, sugando-me todo. Estremeço, o choque gostoso pesando
em minhas bolas, meu pau incha mais e o empurro até o fundo em sua
garganta. — Anna… Ohhh, eu vou gozar! — Ranjo os dentes novamente,
ela massageia meus testículos e eu urro, começando a jorrar meu sêmen em
sua boca quente. Engole tudo, seus sons engolindo minha porra me deixam
mais insano de amor e luxúria. — Habibti… Assim, minha rainha, beba
cada gota… — Continuo observando-a engolir tudo enquanto me derramo
nela.
Choraminga entalada em meu eixo, sugando e bebendo meu gozo
com ganância. Rio da sua gula e me retiro devagar de sua boca. A visão é
perfeita, seus lábios inchados, gotas do meu esperma sobre o batom
vermelho. Ela corre a língua pelos lábios, levando tudo para dentro, como
uma boa menina. Empurro-a gentilmente e ela se deita no colchão, o corpo
todo aberto à minha espera e eu vou, segurando suas coxas bem
arreganhadas; abaixo meu rosto e esfrego meu nariz em sua carne toda
encharcada, inalando-a profundamente. Seu corpo estremece todo e passo a
chupar seus lábios delicados juntos, correndo meus dentes em sua
protuberância e voltando à vulva, enfiando a língua em seu canal. Rosno
pegando o creme doce e puxo seus quadris, trazendo-a de encontro ao meu
rosto e devorando-a com voracidade. Anna gane, seus dedos enfiando em
meus cabelos.
Solto rugidos animalescos esfregando meu rosto todo em sua carne
molhada. Rodo a língua em seu clitóris construindo sua excitação mais e
mais. Enfio a língua dura em sua vulva, lambendo tudo, e desço mais
rodando a língua em seu anelzinho gostoso. Contemplo seu rosto, satisfação
arrogante me enchendo pelo prazer que lhe proporciono. Empurro dois
dedos em sua vulva melada e continuo lambendo, chupando seu cuzinho.
Anna choraminga, lamenta-se, rebolando em minha cara. Rio perverso e
levo os dedos da boceta para seu pequeno buraco. Enfio um e ela resfolega,
mas relaxa, deixando-me meter todo. Torno sugar seu clitóris aplicando
mais pressão e acrescento mais um dedo em seu cuzinho, passando a comê-
la bem fundo. Seu corpo muda, os sinais do gozo começando a aparecer,
sua respiração fica mais rápida.
— Karim, meu amor… — Geme sua declaração, e é com pesar que
retiro meus dedos e paro a sucção. — Não, por favor…
Rio, me debruçando, depositando um beijo reverente em sua boca
inchada. A carrego para o centro do colchão e a giro de bruços. Ela suspira,
as mãos juntando o lençol branco de seda egípcia. Escarrancho suas coxas e
abro bem suas bochechas firmes, meu pau saltando, ficando completamente
duro e pronto para continuar o jogo. Me debruço e lambo seu buraquinho de
novo, descendo mais e pegando os lábios da bocetinha. Minha garota linda
e devassa geme, se contorce embaixo de mim, empinando-se toda. Não
resisto e dou tapas nas bochechas, amando ver o tom rosado em sua pele.
— Eu vou comer sua boceta assim; se meu tamanho incomodar
muito, me fale. — Aviso, me debruçando sobre suas costas. Eu beijo sua
pele reverentemente, possessividade inflamando minhas veias, vendo meu
nome por todos os lados. Arrasto minha boca, mordendo-a no ombro
direito, e ela estremece, gemendo rouca, o som lamentoso, necessitado. Me
alinho em sua vulva e pego seu pescoço pela frente fazendo-a me olhar e
minha boca desce na sua num beijo invertido, então eu meto o pau todo,
abrindo suas paredes até o fundo. Anna convulsiona, gritando em minha
boca. — Demais, habibti? — Pergunto, parando todo embainhado em seu
calor apertado.
— Ahh, Jesus… — Choraminga em desamparo, palpitando à minha
volta. — Dói, mas você é delicioso, meu rei. — Rosno ao ouvi-la dizer isso.
Puxo quase tudo e volto, indo mais fundo, mais forte. Ela berra e eu rio
perverso, comendo-a com golpes duros e fundos. Pego suas mãos sobre o
colchão e entrelaço nossos dedos, meu pau empurrando profundamente
nela.
— Tão gostosa, minha rainha.… Deliciosa demais… — Sussurro
em seu ouvido, raspando os dentes em seu lóbulo, sugando-o depois.
Como-a enlouquecido de tanto prazer. Ela geme a cada estocada dura,
minha pelve batendo grosseiramente em sua bunda, meu pau se enterrando
até o punho. Continuo provocando-a com palavras lascivas: — Como amo
rasgar essa bocetinha apertada… — Ela convulsiona, arfando, empinando-
se, pedindo para levar tudo de mim e eu não tenho pena, bato com força. —
Assim, meu amor.… Toma meu pau bem fundo… — Ela choraminga, me
recebendo até as bolas. Meu corpo inteiro estremece pelo prazer abrasador
que é estar dentro dela. — Toma mais, habibti… Isso, leva tudo nessa
bocetinha gostosa… — Seu corpo inteiro arrepia e bato profundamente,
fazendo-a berrar, misturando dor e prazer, e ela goza gritando meu nome, o
quanto me ama. Continuo comendo-a com voracidade, batendo duro. Enfio
as mãos por baixo do seu torso e pego seus peitinhos, amassando, apertando
os biquinhos.
— Ah, droga… Você é tão gostoso, habib… — Diz baixinho, seu
rosto afogueado, a respiração entrecortada. Como-a até passar seus
tremores. Beijo seu pescoço, ombros e puxo para fora, devagar. Abro sua
bundinha e encosto a cabeça molhada do meu pau em seu anel. Ela geme
longamente. É um som saciado, mas ainda ganancioso. Eu rio indulgente e
passo a massagear seu pequeno orifício, preparando-a para relaxar e me
tomar.
— A mais perfeita entre as mulheres, minha rainha… — Elogio-a,
minha voz engrossada, e vou empurrando devagar. Gememos os dois
quando a cabeça rompe o esfíncter e seguro seus ombros, metendo devagar,
mas só parando quando me enterro todo. Ela berra e geme depois, seu canal
pulsando à minha volta. — Shh, abra esse cuzinho gostoso para o meu pau,
habibti. — Ela geme, pulsa mais e puxo um pouco para fora, passando a ir e
vir lentamente, comendo-a com cuidado, construindo sua excitação de
novo. Grunhindo alto, estoco profundamente, duro. Anna torna a berrar,
mas tenta rebolar, mostrando que adora isso tanto quanto eu. Me debruço e
pego seus cabelos da nuca, obrigando-a arquear-se para trás, e eu bato nela
perversamente. Ela se empina mais, convidando-me a ser mais voraz.
A puxo para trás, fazendo contorcionismo, mas nos levantamos sem
sair de seu aperto gostoso. A empalo, suspendendo-a do colchão, e ando
com ela pelo quarto em direção ao sofá mais próximo. Me sento,
colocando-a escarranchada sobre as minhas coxas. Torno a pegar seus
cabelos numa rédea, seguro sua cintura e soco meu pau todo até as bolas em
sua bundinha apertada, metendo de baixo para cima, empalando-a sem
restrição. Estamos gemendo, ofegando alto, suados, completamente
afogados em nosso amor, paixão e luxúria. Anna apoia as minhas mãos em
minhas coxas e eu urro alto, entrando até não poder mais. Acaricio-a com a
mão livre, apalpo cada centímetro perfeito dela, os peitinhos deliciosos, e
desço pelo ventre até a bocetinha. Esfrego sua carne e empurro dois dedos
em sua vulva. Ela geme, deitando a cabeça em meu ombro. Deixo seus
cabelos e agarro seus peitinhos outra vez, virando o rosto, minha boca
sugando seu pescoço. Como-a nos dois lugares, meu polegar encontrando
seu feixe de nervos e apertando-o com pressão perversa. Minha boca sobe
para a sua e nos beijamos lascivamente, enquanto a como assim por alguns
minutos. Então, me levanto com ela empalada, suspensa do chão, e ando até
a janela, nos dando a visão do deserto.
— Olhe para isso, habibti… Você pertence ao deserto. Pertence a
mim, Anna — sussurro em seu ouvido, colocando-a em seus pés. Ela se
ampara no batente, empinando-se toda.
— Sim, sim, meu rei. Eu pertenço a você, só a você — murmura,
sua voz entrecortada pelas minhas estocadas. Minhas mãos passeiam por ela
inteira, coxas, cintura, seios, bocetinha, marcando cada centímetro com a
minha posse.
— Vamos, me faça gozar de novo, minha putinha… — Rosno,
segurando seus quadris, socando nela com força. Choraminga, arranhando a
madeira da janela, arqueando-se para me tomar mais fundo, rebolando em
meu pau, e a fodo com uma fome animal. Rasgo-a sem pena, levando uma
mão para sua boceta de novo, esfregando seus lábios, seu clitóris. Torno a
enfiar dois dedos. — Ohh, Anna.… Goza comigo, habibti… — Gemo
guturalmente, comendo-a mais forte, mais rápido e, então, urramos juntos.
Nossos corpos convulsionam em ondas de gozo escandalosas,
arrebatadoras.
Pego-a pela cintura e continuo metendo, esporrando, estremecendo,
rosnando, cheirando seus cabelos. Anna vira o rosto para o meu e nossas
bocas se chocam gananciosas. Suor escorre em nossas peles. Nosso beijo
vai ficando mais suave, enquanto os tremores diminuem. Abrimos os olhos
juntos e nos encaramos fixamente, apaixonados, saciados. Sorrimos
arfantes, cúmplices. Eu saio devagar do seu calor e tomo-a nos braços,
voltando para a tenda. Ela me abraça pelo pescoço, os olhos verdes
brilhantes, lânguidos.
— Minha princesa linda e destemida… — Sussurro contra a sua
boca, nossas expressões são ternas agora que o tesão louco foi saciado. —
Minha rainha. Você nasceu para ser minha.
— E você também nasceu para ser meu. Meu cavaleiro, meu
príncipe guerreiro — murmura de volta. Eu rio, gostando desses adjetivos.
— O mais lindo e perfeito. Meu rei, meu amor.
Alcanço o colchão e nos abaixo, deitando-a sobre as almofadas.
Pego o champanhe no balde e sirvo uma taça, lhe dando na boca. Ela bebe
avidamente.
— Eu peguei muito pesado, minha rainha? — Provoco-a, tomando
um pouco do líquido gelado também. Anna bufa, irreverência marcando seu
rosto bonito.
— Eu posso aguentar a noite inteira, honorável Majestade —
ronrona e eu gargalho, me deitando de lado, puxando-a para perto. Beijo
seus cabelos e fecho meus olhos, meus braços rodeando-a, meu coração tão
cheio de amor que parece perfeito demais para acreditar.
— Shukran por me devolver a vida, Anna — murmuro e ela levanta
o rosto para o meu. Há uma expressão linda e reverente em seus belos olhos
verdes. — Você nunca irá se arrepender de me escolher para entregar seu
coração de novo, habibti.
Lágrimas se formam em seus olhos e meu peito aquece.
— Shukran por fazer meu coração bater de novo, Karim — sussurra,
me dando um beijo suave e emocionado. — Você nunca se arrependerá por
me escolher quando todos eram contra.
Eu traço seu rosto com as pontas dos dedos.
— Eu amo você, malikati. Que Allah nos permita envelhecermos
juntos, nos amando tão intensamente quanto agora — murmuro, meus olhos
ardendo de amor, devoção, verdadeira adoração por essa garota linda.
— Eu amo você, malkaa. — Sua voz soa um pouco embargada.
Seus olhos presos aos meus, sua mão vindo para o meu rosto. — Ele vai
permitir. E nosso amor só irá crescer a cada dia, cada ano que passarmos
juntos, habib.
Eu pego seu queixo e a beijo com delicadeza. Um beijo cheio de
promessas e fé no futuro. Que Allah nos guie para uma vida plena e feliz.
Eu sempre irei agradecer a Ele por me trazer essa linda princesa irreverente
e destemida. A minha amada rainha.
EPÍLOGO
Ardócia, quatro anos e cinco meses depois…
“Porque quando você me desdobra e diz me ama e olha nos meus
olhos. Você é a perfeição, minha única direção. É fogo em chamas. É fogo
em chamas.”
(Sam Smith – Fire On Fire)

Anna Julia
Olho através da janela do jato as montanhas verdejantes me fazendo
suspirar, meu peito se enchendo de alegria. Minha linda e amada Ardócia.
Essa vista sempre me encantou desde pequena. Eu amo essa ilha. Meu
padrinho sempre fez com que nos sentíssemos em casa a cada visita. Karim
cumpriu a sua promessa e visito minha família várias vezes ao ano. Quando
está com a agenda menos cheia, me acompanha. Meus olhos desviam para o
meu lindo marido na poltrona à minha frente. Está entretido, trabalhando
em seu notebook. Usa o cabelo preso no coque que amo, calça jeans escura
e uma camiseta cinza de mangas compridas. Allah, como é lindo. Mesmo
depois de quase cinco anos de casamento, olhar para ele ainda me deixa
toda boba. Eu acho que sempre irei olhá-lo dessa forma, com total
encantamento. Karim sente o meu olhar e levanta o rosto, os olhos escuros
encontrando os meus. Sua boca contorce num meio-sorriso arrogante por
me flagrar babando nele.
— Não me olhe assim, habibti. Estamos aterrissando, não temos
tempo para foder de novo — murmura asperamente, me fitando com
intensidade, mostrando que também não consegue ter o suficiente de mim.
Eu gemo baixinho e sorrio maliciosa.
— Estou satisfeita com a atenção que meu marido lindo me deu
ainda há pouco… — Ronrono, fazendo-o grunhir. Passamos as primeiras
horas do voo no quarto principal, matando um pouco do nosso tesão. Ele
esteve em viagem diplomática por uma semana na Jordânia. Chegou hoje
pela manhã e já tivemos que pegar o avião para cá. Meu padrinho está
completando sessenta e cinco anos amanhã e a família estará toda na ilha
para comemorarmos. — Mas minha saudade só será amenizada depois de
uma noite inteira com você dentro de mim.
Seus olhos brilham com mais intensidade.
— A minha também, habibti. Odeio viajar sem você — diz e fecha
o notebook. — Encerrei aqui, venha sentar-se comigo, malikati. — Um
sorriso feliz repuxa minha boca e retiro meu cinto, andando até a poltrona
do seu lado. Prendo o cinto, me aconchegando em seu peitoral largo. Seus
braços me envolvem e suspiramos os dois. É a perfeição, estar grudada em
seu corpo poderoso. Aos trinta e oito anos, meu marido está simplesmente
arrebatador. Lindo. Cada vez mais delicioso. Seus dedos pegam meu
queixo, levantando meu rosto para o seu, e nos olhamos por uns instantes,
apaixonados. — Vamos ficar alguns dias por aqui, habibti. Amo ver você
com a sua família de sangue. — Eu torno a suspirar feliz quando sua boca
roça na minha numa carícia suave.
— Shukran, malkaa. Te amo tanto — murmuro, meu coração
repleto de amor. Levantando a mão para seu rosto perfeito. Adoro-o com
meu toque e olhar. — Você me faz tão feliz, habib.
— E eu te amo tão profundamente que não há palavras que
consigam mensurar com exatidão, minha esposa — murmura, fazendo
lágrimas felizes se reunirem em meus olhos. Amo quando me chama minha
esposa. Me sinto tão dele. — Você me faz feliz também. Minha linda e
amada rainha.
Então, sua boca se apossa da minha num beijo lento e apaixonado.
Eu gemo, essa sensação, seu gosto é sempre tão perfeito. Nossas línguas se
entrelaçam e nos agarramos, namorando por alguns minutos. As
comissárias de bordo só vêm quando chamamos para nos dar privacidade, e
amo isso, poder estar com o meu rei sem interrupções. Me dá pequenos
selinhos carinhosos e afasta a boca da minha, propondo:
— Depois podemos tirar mais um tempo de folga em qualquer lugar
que você quiser. — Roça o nariz no meu. — Quero passar um tempo só
com o meu amor e nossos filhos.
E eu termino de derreter em seus braços. Nossos filhos. São três
agora. Eu lhe dei dois meninos lindos, que têm sido a alegria dos nossos
dias junto com nossa princesinha linda. Karim Nataniel tem dois anos e
meio. Sim, meu amor me deu esse presente tocante no dia do nascimento do
nosso primeiro menino. Ele nasceu de parto natural e Karim esteve lá
comigo o tempo todo segurando minha mão. E quando pegou nosso filho,
me mostrou o rostinho pequeno e corado se esgoelando.
Minha mente viaja para aquele momento:
— Essa garota linda é a sua mãe, meu príncipe — Karim
murmurou, os olhos derramando lágrimas de felicidade. Seus olhos vieram
para os meus e me encararam com a intensidade que amo antes de
sussurrar: — Vamos chamá-lo de Karim Nataniel, habibti.
E eu chorei copiosamente, meu coração tão cheio de amor pelo
homem especial que tive a sorte de encontrar. Eu vou amá-lo até o fim dos
meus dias.
— Ah, Karim… Que linda homenagem — murmurei entre soluços.
— Meu coração não cabe tanto amor por você, habib.
Ele sorriu, lindo, o rosto moreno banhado de lágrimas, e se
debruçou para mim, sua boca tomando a minha num beijo amoroso,
devotado.
Sorrio, a lembrança da delicadeza de meu rei ainda vívida na
memória. E ele tornou a me emocionar no nascimento do nosso segundo
bebê. Ele se chama Khalil Dominic, em homenagem aos nossos pais.
Completou dois meses semana passada. Por isso, não tenho acompanhado
meu marido em viagens diplomáticas. E é por isso também que estamos
loucos de tesão, aproveitando o retorno pleno da nossa vida sexual, fazendo
nosso sexo safado, gostoso, livre das restrições e cuidados no período da
gestação e resguardo.
— Eu e eles iremos amar tê-lo só para nós, meu rei — sussurro.
Ele assente, voltando a dar pequenos beijos suaves em minha boca.
— Me conte como foi a reunião com as mulheres no palácio do
governo, habibti. — Um sorriso safado repuxa sua boca. — Não
conversamos muito desde que cheguei.
Eu rio, adorando sua safadeza.
— Não, eu precisava cuidar do meu marido lindo. Mostrar o quanto
senti a sua falta — digo baixinho. Seu rosto fica ainda mais suave, gostando
de ouvir isso. — Foi ótima a reunião, meu rei. Elas estão ficando cada vez
mais conscientes do seu papel na sociedade, mesmo uma tão restrita quanto
a nossa.
— Você está criticando seu rei, minha rainha? — Ele enruga a testa,
fingindo-se de ofendido.
— Seu ego é tão frágil assim, honorável Majestade? — Eu rio,
amando provocá-lo.
— Garota atrevida. — Ele geme baixinho. — Hoje à noite, habibti
— rosna, a mão passeando pelo meu corpo, pegando minha bunda,
apertando-a com posse —, vou te mostrar o quanto meu ego é frágil…
Ah, droga, e o tesão volta a queimar meu baixo ventre.
— Voltando ao assunto… — Limpo a garganta e ele dá uma risada
gostosa e profunda. — Shukran por aprovar a lei para nossas mulheres
poderem tirar a carteira de habilitação, meu rei. — Os olhos de ônix
brilham com orgulho.
— Eu farei qualquer coisa para ver a minha rainha feliz —
murmura, a mão indo do meu traseiro para as costas, acariciando-me
deliciosamente. — Nossas mulheres precisam ganhar mais autonomia. E
precisamos inseri-las no Parlamento também.
Assinto.
Karim conseguiu transformar o sistema de governo em Kamar. Há
três anos, o modelo monárquico de Ardócia foi implantado com sucesso. Os
clãs tribais foram garantidos numa espécie de conselho especial, estando
abaixo do grão-vizir, função ocupada por Jalal desde a abdicação do tio
Jafar, poucos meses depois do nosso casamento. Minha relação com o
ancião da família é muito boa desde então. Com o tempo, percebi que ele
não era um homem ruim, é apenas muito apegado às tradições. No entanto,
parece estar mudando de opinião com minhas conquistas e defesa da
ampliação do papel da mulher em nosso emirado. Já conseguimos inclusive
que elas possam votar. O hijab também foi uma demanda que chegou até
mim pelo movimento feminista. Elas queriam ter o direito de escolha sobre
usá-lo ou não. Foi a segunda briga que comprei e levei para o Parlamento.
Após longas sessões, a maioria votou que nossas mulheres teriam o direito
de escolher se querem ou não cobrir os cabelos.
Eu amo usar hijab. Meu amor gosta e o faço para ele. Mas também
gostei de poder andar com os cabelos à mostra livremente. Depois dessa
conquista, ganhei milhões de seguidores em minhas redes sociais. Convites
de organizações em defesa dos direitos das mulheres na Europa e Estados
Unidos surgem o tempo todo para proferir palestras. Acabei descobrindo a
minha vocação. Estudar as leis e lutar pelas mulheres, não só de meu país,
mas ao redor do globo. E continuo fazendo as exposições de fotografia das
minhas viagens como defensora da mulher. Unindo o útil ao agradável,
sempre estou munida com a minha câmera fotográfica. Há alguns meses
visitei o Sudão e orientei um grupo feminista naquele país. Me envolvi com
a questão da educação. As mudanças só ocorrerão com uma educação
substancial sendo acessível a todos. Quanto mais estudadas e entendidas as
pessoas se tornarem, mais fácil será acompanhar a evolução societária.
— Sim, habib. Mas é preciso prepará-las antes de inseri-las no
cenário político. Precisamos mudar a crença popular de que mulheres não
são capazes de assumir posições importantes no governo. Precisamos de
mais escolas e tornar a educação acessível para as nossas mulheres — digo
seriamente.
Até agora temos apenas quatro mulheres no Parlamento. É um
ganho enorme se compararmos com a realidade vivida há cinco anos.
Estamos avançando aos poucos, mas nessa região é cultural a mulher ser
relegada à tarefa de esposa e mãe. As mudanças precisam ser
cuidadosamente planejadas para uma implantação de sucesso.
— Eu já disse o quanto sou orgulhoso de você e de como tem
influenciado positivamente não só nossas mulheres, mas também alguns
homens ranzinzas apegados às tradições? Meu tio que o diga. — Seu tom é
cheio de ternura e admiração e eu suspiro, acariciando seu peitoral.
— Sim, você já disse, meu amor — digo embriagada de amor e
orgulho por ele também. — E eu sou igualmente orgulhosa do meu rei e
suas conquistas. Estamos competindo de igual para igual com o Catar na
arrecadação do PIB e isso se deve a você, Karim. Você é um governante
visionário, progressista e seu povo te ama cada vez mais. —
Ele abre um sorriso lindo, deixando seu rosto ainda mais perfeito.
— Ah, habibti, nada me toca mais do que ver esses incríveis olhos
verdes com essa expressão. — Seus dedos traçam meu rosto delicadamente.
— Que expressão? — Rio me aninhando mais em seu peito.
— De amor, orgulho…
— Veneração pelo meu homem perfeito — completo e seu sorriso
alarga, sua boca descendo na minha mais uma vez.
O comandante avisa que vamos aterrissar e logo as babás retornam
com nossos pequenos, colocando-os nos assentos e tomando as medidas de
segurança. Eu peço meu bebê e Jamile traz o pequeno até mim com um
sorriso. Ele sorri para mim quando o pego nos braços.
— Você já consegue ver o quanto a mamãe é linda, não é, amiri? —
Seu pai sussurra se inclinando, dando um beijo amoroso na cabeleira negra
de Dominic. Eu o chamo assim e Karim o chama Khalil. Os dois nomes
ficam enormes.
Ouço a risadinha de Karim Nataniel na poltrona do outro lado do
corredor. Ele está sentado com Ayla. Eu os olho e meu coração é tomado de
amor por eles. Meus filhos. Ayla acabou me chamando de mãe. Eu aceitei
porque me honra que a minha menininha tenha me escolhido para ser a sua
segunda mãe. Seu pai e eu não deixamos de falar sobre Yasmina, no
entanto. Ela precisa crescer sabendo que houve uma boa mulher que a gerou
e amou muito. Da mesma forma é o nosso menino lindo. Ele irá crescer
sabendo que seu segundo nome é uma homenagem a um garoto muito
especial que agora é um anjo no céu.
— Mamãe! — Ele estende os bracinhos para mim, fazendo um
biquinho agora. — Quer mamãe! — Sua voz soa impaciente.
— A mamãe está segurando Khalil agora, al’amir alsaghir[41]. —
Ayla sorri para o irmão.
Minha menina está com onze anos, uma mocinha linda e estudiosa.
Já fala fluentemente quatro línguas e está frequentando uma escola em
Jawahra. A primeira escola abrigando meninos e meninas do nosso
emirado. Foi a primeira proposta que fiz como rainha e meu rei aprovou.
— Quer papai! — O pequeno esperto muda a demanda e Karim
sorri sendo seguido por mim e nosso staff. Ele pede à Jamile para trazê-lo e
nosso menino abre um sorrisão com alguns dentinhos faltando.
— Pronto, amiri — Karim murmura com amor, ajeitando-o em seu
colo, beijando sua testinha. Ele ri, satisfeito que está com seu pai e perto de
sua mãe. — Sei que você é louco pela sua mãe, mas vou me contentar em
ser o segundo favorito.
Eu rio e o pequeno ri também, como se estivesse compreendendo
tudo. Ele segura o rosto de seu pai e o cobre de beijos babados.
— Isso certamente apazigua seu pai, habib. — Meu amor sorri
lindo, feliz com nosso filho no colo. Me inclino, beijando sua cabecinha.
— Meu menino lindo — murmuro e ele se derrete, seus olhinhos
são verdes, como os meus, mas todo o resto é de seu pai. Ele estende a
mãozinha para o meu rosto, pegando com gana, querendo me puxar para si.
— Espere o avião pousar, meu amor. Mamãe vai lhe dar toda atenção,
prometo.
Quer voltar à birra, mas seu pai começa a conversar com ele para
distraí-lo. Meus olhos vão para minha sapequinha. — Venha sentar-se
conosco, habibti. — Chamo-a e ela retira seu cinto, vindo sorridente para a
poltrona ao meu lado. Suspiro feliz, me inclinando para beijá-la na
bochecha. — Seu pai vai tirar uns dias de folga só para nós, princesinha.
Seus olhos se iluminam e seu sorriso alarga. Minha menina será uma
moça deslumbrante. Só peço a Allah que coloque um bom rapaz em seu
caminho. Seu pai vai deixá-la livre para se casar por amor quando chegar a
hora. Já conversamos muito sobre isso.
— Sério, papai?! Vamos viajar? — Ela exclama com a vivacidade
que me conquistou logo que a vi, há cinco anos. — E para onde vamos?
— Sim, nour hayati. — Seu pai diz com a voz e expressão ternas
para sua menina. — Sua mãe vai escolher um lugar e nós iremos todos.
Quantos dias você quer ficar com o papai, amirati?
Ela se derrete para ele, assim como eu. Sempre amei ver o carinho
com que seu pai a trata.
— Eu posso escolher mesmo? — Seus olhos escuros com raias
douradas brilham de excitação. Seu pai sorri, assentindo. — Mmm. Tenho
uma pausa da escola por três semanas e o senhor só tem sessão no
Parlamento no próximo mês, então esse período está bom.
Eu e seu pai rimos da sua esperteza. Ela chama a secretária de
Karim o tempo todo para saber da agenda do pai.
— Sua esperteza me assusta, princesinha. — Ele meneia a cabeça,
rindo com orgulho da filha.
— Quando voltarmos, vou ajudá-la com o seu perfil no Instagram,
habibti — digo com suavidade. E agora ela se derrete para mim.
Convencemos seu pai a deixá-la criar um perfil nessa rede social. Ela
precisa ir socializando, aprendendo a usar a sua posição para ser uma
influenciadora de mudanças boas em nosso país. Quero a minha princesa
tão fodona que nenhum homem ousará tentar passá-la para trás.
— Shukran, habibti. — Se inclina me beijando no rosto. — Amo
tanto você, mamãe.
E meus olhos se enchem de lágrimas. Meu peito sempre se enche de
amor quando minha menininha me chama assim.
— Ah, meu amor… — murmuro emocionada. — Amo tanto você,
princesinha.
O avião pousa e começa a taxiar pela pista. Olho meu bebê no colo.
Seus olhinhos são escuros, é seu pai inteiro. Está com o punho enfiado na
boca, sugando ferozmente. Eu rio, beijando sua cabecinha perfumada. Já
quer mamar. Meus seios estão cheios e pesados.
— Quando chegarmos, a mamãe vai acabar com a sua fome, habib
— sussurro.
O jato para e as três babás vêm para perto, pegando os meninos
enquanto nos livramos dos cintos. Eu pego Karim Nataniel no colo e ele
abre um sorriso gigante, os bracinhos envolvendo meu pescoço. Seu pai
pega Dominic e Ayla segue atrás de nós para a escada. Inspiro o ar quando
piso fora e meu peito transborda de amor quando vejo meus pais e Lipe lá
embaixo, nos esperando. Na verdade, meus padrinhos, tio Jay e tia Cassie
também estão aqui. Eles são tão doces. Karim desce primeiro e eu em
seguida. Meus pais vêm rapidamente para perto, ansiosos para pegar os
netos.
— Princesinha… Que bom que estão aqui. — Meu pai se aproxima,
me dando um beijo amoroso na têmpora. Meu pais estiveram em Kamar
para o nascimento de Dominic e ficaram por mais de um mês conosco. Mas
já estava com saudades.
— Oi, papai. Já estava com saudades — digo suavemente, beijando
sua bochecha. Ele sorri e beija a cabeça de Karim Nataniel, o pegando no
colo. Meu pequeno vai sorrindo. Ele ama seus avós.
— E esse meninão do vovô? Você cresceu muito em um mês, hein?
— Conversa com o neto, os olhos verdes brilhando de amor e orgulho. Se
vira para Karim e beija a cabeça de Dominic. — E meu outro meninão?
Cada dia mais forte. — Olha meu marido e cumprimenta: — Meu genro, é
bom ver você.
— É bom ver você também, Dom. — Karim sorri para papai. —
Helena, Lipe, como estão? — Meu marido estende os cumprimentos.
— Melhor agora que estão aqui. E você, Karim, como está? —
Minha mãe responde já vindo para mim. Ouço Lipe responder ao
cumprimento de meu marido e começarem a conversar.
Meu pai chama Ayla para perto e se abaixa, beijando-a na bochecha.
— Princesinha, como está? — pergunta para minha menina, que
sorri de volta.
— Muito bem, vovô Dom, e o senhor? — Ayla responde.
Iniciam uma conversa sobre como minha pequena está na escola.
Eles a adotaram como neta também, bem como meu tio e padrinho a
tomaram como sobrinha-neta. E é por essa e outras razões que amo demais
essa família.
— Bambina, já estava com tanta saudade. — Minha mãe me abraça
com ternura, seus olhos âmbares brilhantes.
— Eu também, mamma — digo, recebendo seu abraço amoroso. A
beijo no rosto quando nos afastamos. Ela sorri e dirige a atenção para
Dominic, pegando-o dos braços de Karim.
— Ah, meu amor, você cresceu mesmo em apenas um mês. — Meu
bebê ri para sua avó. Meu pai vai para perto e ela beija Karim Nataniel. —
E você, garotão bonito da vovó? — Meu pequeno se derrete, adorando a
atenção. Ela olha para Ayla perto de meu pai e vai até ela, beijando-a
também, começando a conversar com minha filha.
— Ei, Anna. — Lipe vem me abraçar. Um abraço apertado, cheio de
carinho. Beija meu rosto quando nos separamos. — Saudades de você,
maninha.
— Saudades de você também, bonitão — murmuro docemente para
meu irmãozinho. Ele está mais forte, homem formado aos vinte e sete anos.
Lindo. Está namorando uma engenheira de softwares da Harper e acho que
meu maninho está a caminho de se amarrar em breve. Como todo homem
Di Castellani, ele demorou para assumir a moça, claro.
— Vamos passar uns dias aqui, todos nós — Lipe avisa e
compreendo que ele ou meu pai devem ter falado com Karim, por isso meu
amor fez a proposta. Ele adora fazer tudo para me deixar feliz.
— Maravilhoso, maninho. Vou amar passar um tempo com todos.
— Ele me dá mais um beijo amoroso. — Meus meninos poderão ficar mais
tempo com os primos.
Nossos pais nos criaram sempre juntos e a nova geração está
comprometida com isso. Meus filhos, os de meu irmão e os de meus primos
serão criados como irmãos. Como nós fomos. Por falar nisso, nós temos
trabalho nesse sentido, diga-se de passagem. Rio maliciosa. Eu tenho três,
Mike e Ella têm dois: Rico e minha linda princesinha Ciara; Luc, Samu e
Chloe quebraram a banca e tiveram três numa tacada só! Os gêmeos não
brincam em serviço, minha gente. Dam tem dois: uma menina, Georgia, e
um menino, Leon. Pois é, sei que parece chocante, mas lá vem bomba! Meu
primo sarcástico se casou. A doutora Isadora Moretti conseguiu laçá-lo
finalmente depois de alguns desencontros. Ah, meu primo é o novo rei de
Ardócia. Ele subiu ao trono há três anos, só que não foi nada fácil… Ok,
vou parar por aqui porque meu primo será o próximo a contar sua história
para vocês. Só mais um spoilerzinho? Ok, são dois. As gêmeas se casaram
há dois anos com os bonitões da Fórmula 1 e estão grávidas de dois meses.
Dá para acreditar nisso? Elas cronometraram esse negócio ou algo
assim? Eu perguntei exatamente isso e elas riram da minha observação. E,
por último, meu lindo primo mais novo, Max também está namorando
firme. Uma repórter intrometida escreveu um artigo denegrindo a imagem
de Dam sobre a construção de um hotel luxuoso no centro histórico de
Ardócia. Max comprou a briga, foi tirar satisfação com a garota e a obrigou
a se retratar em outro artigo. Resultado, eles se estranharam, mas meu
priminho acabou se encantando pela ragazza. Quem diria, hein? Então, é
isso, estamos todos bem encaminhados, obrigada.
A voz de Lipe brincando com meus meninos me traz de volta. Em
seguida, ele vai para Ayla. Minha menina sorri largamente. Ela é
apaixonada por ele e vice-versa. Meus padrinhos vêm para perto me
abraçando e beijando também. Tio Jay e tia Cassie. Logo viramos uma
bagunça, todos falando e nos abraçando ao mesmo tempo.
— Figlia, é tão bom ter todos em casa. — Meu padrinho diz,
parecendo emocionado. Ele adora ter todos os Di Castellani em Ardócia. —
Os Di Castellani todos juntos é sempre uma ocasião para comemoração.
— Jesus, você está parecendo uma mulherzinha choramingando
desde que chegamos, grande rei. — Meu pai sorri com sua irreverência em
dia. Meu padrinhorosna, fazendo uma carranca para o meu pai. Nós rimos,
antevendo seu velho jogo de provocação. Eu amo ver meu pai com seus
irmãos.
— O idiota tem razão, irmão. Você está ficando mole demais com a
velhice. — Tio Jay zomba também.
— Idiotas. Não preciso lembrar que nossa diferença de idade não é
grande. — Meu padrinho resmunga e vai dar atenção para meus meninos e
Ayla. Nós rimos mais.
— Uh, seu prozio[42] está tão sensível, não é, campeão? — Meu pai
continua, fazendo Karim Nataniel rir, como se estivesse entendendo tudo
que seu avô diz.
— Pronto, eles começaram… — Madrinha Julia diz baixinho,
meneando a cabeça.
— É o nosso carma, Júlia. — Tia Cassie sorri furtivamente.
Meu padrinho pega Dominic nos braços e tio Jay tenta pegar Karim
Nataniel dos braços de meu pai.
— De jeito nenhum, bastardo, você tem netos demais. Eu só tenho
três. — Papai tira Karim de seu alcance. Meu tio abre um sorrisão satisfeito.
— Pois é, serão sete. — Faz uma pausa e acrescenta: — Por
enquanto.
— Não fique se vangloriando, ainda tenho Lipe e Leon tem Max. —
Meu pai torna e eles começam a andar em direção às limusines. Vão ainda
discutindo sobre quem vai conseguir produzir mais netos.
— Eu deixo para você, irmãozinho. Fechei minha fábrica. — Brinco
com Lipe. Ele sorri, meneando a cabeça.
— Não estou pensando nisso ainda, maninha. Vamos com muita
calma. — Abre seu sorriso safado e completa: — Embora eu goste bastante
dos treinos…
Nós rimos dele e ele levanta Ayla nos braços. Ela dá um gritinho de
êxtase, rodeando-o pelo pescoço com seus braços.
— E a minha princesinha, fiquei sabendo que está querendo ser uma
digital influencer. É isso mesmo? — Brinca e minha menina ri mais.
— A mamãe vai me ajudar, Lipe — responde. Ela não o chama de
tio, não sei o porquê. Talvez porque Lipe é sempre muito despojado, parece
mais jovem do que realmente é.
Ele anda com ela, conversando, seguindo atrás de nosso pai e tios.
— Vou com seu pai, piccola. — Minha mãe me dá um beijo, seus
dedos acariciando meu rosto. — Tão linda, minha princesa. — Sorrio,
gostando de ser mimada por ela. Me inclino, beijando-a também. Ela segue
com madrinha Júlia e tia Cassie.
Karim passa um braço em minha cintura e beija o topo da minha
cabeça. Levanto o rosto para olhá-lo. Ele tem uma expressão feliz por me
ver feliz com a minha família de sangue. Nós seguimos atrás de Lipe e nos
acomodamos na mesma limusine que já está com Ayla e nos dirigimos para
o palácio.

***

Eu saio do closet e avisto Karim perto do bar. Está tomando uma


pequena dose de uísque. Pura satisfação feminina me invade, admirando
seus ombros largos no terno escuro. Iremos ao cassino junto com Ella e
Mike, Dam e Isa. Luc, Samu e Chloe só chegarão amanhã. Sam e Will, Em
e Nolan também só chegarão amanhã. Quando chegarem, vamos marcar
algo com eles. Meu amor olha por cima do ombro e um meio-sorriso
tremula em sua boca linda. Seus cabelos estão presos no estilo samurai. Ele
se vira e seu olhar quente e apaixonado passa pelo meu comprimento, as
pupilas negras brilhando com apreciação. Estou usando um longo verde
com decote aberto nos ombros e renda delicada nas mangas. É ajustado com
uma abertura frontal comportada. Meus cabelos estão soltos, jogados para o
lado direito, uma presilha de esmeraldas e diamantes mantendo o penteado.
Desde que me converti ao islã, meu guarda-roupa mudou, porém,
tenho ousado nas cores fortes e modelos não tão ortodoxos. Uso calças,
saias e vestidos, além do caftans. Amo me vestir em trajes típicos para meu
rei, mas ele me dá liberdade para ser o que sou. Adicionei mais sapatos
fechados de salto alto, só que não abro mão das minhas sandálias sexys de
tiras. Karim ama me ver com elas. Eu paro à sua frente e seu braço livre
enrola em minha cintura, me puxando gentilmente para seu corpo firme.
Seu cheiro gostoso flutua em minhas narinas e apoio as mãos em seu peito,
subindo para os ombros. Nossos olhares fixos um no outro.
— Tão linda, malikati — murmura, tomando o último gole,
depositando o copo sobre a bancada. O bar fica perto das portas da ampla
varanda, onde temos uma piscina privada. Meu padrinho mandou reformar
meu antigo quarto de solteira, transformando-o em um apartamento, usando
o mesmo formato de nossos aposentos em Kamar. Os quartos dos meninos e
de Ayla ficam colados ao nosso. — Não vamos demorar muito tempo por
lá. Quero voltar logo para ficar a noite inteira amando você.
— Parece um excelente plano, Majestade — sussurro, enfiando os
dedos por entre seus cabelos da nuca. Suas mãos sobem pelas minhas costas
numa carícia deliciosa e eu gemo completamente inebriada pelo meu
homem lindo. Ele sorri e sobe uma mão segurando minha nuca, e então a
boca gostosa se apossa da minha. É um beijo lento, mas cálido, com a
promessa de muito sexo para mais tarde. Nos chupamos gostoso,
lambemos, mordiscamos.
— Vamos, meu amor. Os outros já devem estar esperando por nós.
— Ele geme rouco e me beija mais um pouco, a mão possessiva descendo
para minha bunda, angulando nossos sexos. Seu pau está duro e pronto,
pressionando contra mim, e choramingo, minha vagina latejando, clamando
para tê-lo enterrado nela.
— Habib… — Gemo e ele sorri na minha boca, gostando de me
deixar louca de tesão. — Quero tanto você, malkaa.
— Eu também, minha linda esposa — murmura com sua voz
deliciosa e profunda. Me dá vários selinhos carinhosos antes de parar. Seus
olhos lindos se abrem para os meus. — Vamos, habibti. Quanto mais cedo
sairmos, mais cedo voltamos para continuar com isso… — Eu rio, ele ri,
então saímos do quarto abraçados.
Alguns minutos depois, entramos no cassino e vamos direto para as
roletas. Adoro jogar, mas nem sempre tenho sorte. Meu amor me
acompanha na cerveja sem álcool por causa da amamentação, enquanto
Mike, Ella, Dam e Isa tomam uísque. Eu observo meu primo com sua
esposa. Ele tem uma expressão suave e apaixonada quando a olha. Sorrio
feliz por eles terem conseguido se entender depois de tantos desencontros.
Vocês não têm ideia de como a história deles é complicada.… Mas não vou
contar nada, segurem a curiosidade. Eu aposto nas fichas com Ella e ganho
pela primeira vez na história. Fico eufórica, pulando ao redor da mesa.
Karim sorrindo, em vez de me repreender. Ele ama meu jeito expansivo e
nunca me poda de fazer nada. Corro o risco de me tornar enfadonha, mas
ele é perfeito.
— Você me dá sorte, habib — sussurro, enlaçando-o pelo pescoço.
Seus braços rodeiam minha cintura e ele se apoia à borda da mesa.
Aproveitamos para nos divertir assim quando estamos fora de Kamar. Ele
sabe que minhas raízes ocidentais jamais serão completamente suprimidas.
Há coisas que amo fazer e não vou parar. Acredito que a fé está no coração,
e Allah conhece nossos corações.
— Não, minha rainha, você é que me encheu de sorte quando foi
teimosa e partiu para Kamar, há cinco anos — murmura de volta, sua boca
bem próxima da minha. Sorrio, acariciando sua nuca, e seus lábios gelados
descem nos meus. Nos beijamos esquecendo de tudo ao redor.
— Meu amor… — Gemo em sua boca. Me agarrando mais a ele.
Namoramos gostoso, não nos importando com o lugar porque essa roleta
está reservada apenas para nós. Quando paramos para respirar, olho de lado
e sorrio vendo Mike e Ella envolvidos num beijo apaixonado. É lindo vê-los
tão apaixonados mesmo depois de nove anos de casados. Nossa, como o
tempo voa! Minha amada prima tem feito uma parceria comigo tanto nas
exposições quanto no engajamento na luta pelos direitos da mulher.
Fazemos, inclusive, algumas viagens diplomáticas juntas. Ela representando
a Fundação Príncipes Di Castellani e eu Kamar. Suas pinturas estouraram
no mercado de obras de arte também. Mike realmente tinha razão em querer
que a esposa mostrasse o trabalho ao público. Ella usa os valores
exorbitantes que pagam pelos seus quadros para causas beneficentes.
Ella me olha quando para de beijar seu marido e trocamos um olhar
cúmplice de felicidade. Somos tão felizes com nossos maridos. Minha visão
capta Dam do outro lado da mesa, também com Isa, bem juntinho, se
beijando e sussurrando na boca um do outro. Deixem-me dizer que essa
doutora é fodona. Vocês irão conferir em breve, fiquem atentos. Tinha que
ser ela a domar meu primo marrento. Dam não cairia por uma mulher fraca,
de jeito nenhum.
Pela próxima hora, nós jogamos e rodamos por outras mesas, nos
caça-níqueis. Então, voltamos para o palácio. Meus primos ainda ficaram
para esticar um pouco mais. Passamos nos quartos de Ayla e dos nossos
meninos. Dominic estava acordando, já esperando seu banco de leite
particular. Rio da gula do meu bebê. Amamentei meu principezinho, ele
sugando avidamente enquanto eu e seu pai o olhávamos como duas corujas.
Coloquei-o para arrotar e, depois, já adormecido no berço. O beijamos e
deixamos o quarto em direção ao nosso. Karim me pega pela cintura tão
logo que entramos em nossos aposentos, puxando minhas costas contra seu
peito. Ele já está duro, empurrando a ereção em minha bunda. Rio, amando
sua virilidade. Nossa noite será bem movimentada pela fome que estamos
um do outro.
— Eu quero dançar com meu amor antes — murmuro e ele grunhe,
a boca gostosa descendo pelo meu pescoço, sugando perversamente, as
mãos pegando meus seios por cima do vestido. Minha calcinha encharca
toda, minhas paredes latejando com força. — Karim… — Gemo seu nome
e ele me libera, dando uma mordida em meu ombro.
— Gostosa… — diz com aspereza. — Vai em frente, habibti. Se
minha esposa quer dançar, vamos dançar.
Eu rio e ando à sua frente, colocando um gingado a mais nos
quadris. Ele rosna às minhas costas. Gargalho, adorando provocar meu
homem. Alcanço o home theater e seleciono a pasta de Sam Smith, na
música Fire On Fire. Letra linda, perfeita para mim e meu amor. Me viro
para ele e ando devagar, seus olhos escuros me bebem avidamente dos pés à
cabeça. Amo ver essa expressão em seu rosto. Não apenas luxúria, mas o
amor, a devoção que esse homem tem por mim. A introdução da música soa
baixinho no ambiente e levo minhas mãos para trás, descendo lentamente o
zíper do vestido. Seus olhos sobem para os meus e segura meu olhar
enquanto vou descendo as mangas com gestos lentos. Ele começa a tirar seu
terno, o olhar nunca deixando o meu. Meu vestido vai passando pela
cintura, quadris, e então seus olhos descem, queimando minha pele, fazendo
meus seios arrepiarem, os bicos ficando túrgidos. Fico só de calcinha e faço
uma pose ousada sobre minhas sandálias de tiras até os joelhos. Karim
range os dentes, abrindo os botões da camisa branca, expondo o peito largo,
o abdome tanquinho.
— Tire a calcinha para mim, habibti. — Sua voz é engrossada pelo
tesão. Engancho meus dedos dos lados e a desço lentamente pelas coxas e
panturrilhas. Ele está retirando o cinto e abrindo as calças escuras. Me
mantenho aqui, vendo-o se livrar dos sapatos, ficando apenas na boxer
preta. Delicioso. Eu lambo meus lábios, um sorriso atrevido curvando
minha boca, então volto a andar, descendo os degraus devagar, amando seus
olhos famintos sobre cada centímetro do meu corpo. Minha barriga ainda
não voltou completamente ao normal, está levemente côncava. Semana
passada retomei os treinos de boxe e os exercícios na academia. Meu
marido é lindo e quero me manter bonita para ele. Não que seja algo que
Karim cobre, mas gosto que me ache bonita e bem-cuidada. Paro à sua
frente, bem perto. Sua respiração está alterada, o olhar fumegante caindo
para a minha vagina nua, toda depilada do jeito que ele ama. Coloco as
mãos em seus ombros e sussurro:
— Dance comigo, meu amor.
— Você é a mais linda e perfeita mulher, sabia disso? — Seu tom é
um misto de amor e luxúria. Me segura pela cintura, me puxando com as
duas mãos para seu corpo duro e quente. Gemo, meus seios espremendo
gostosamente em seu peitoral. Começamos a nos mover devagar. — Ah,
como amo você, Anna — sussurra roucamente, abaixando seu rosto, a testa
encostando na minha.
— E eu amo você, Karim. Tudo meu é seu, meu amor — murmuro,
meus olhos lacrimejando. Ele sempre me deixa emotiva com suas lindas
declarações. — Você que é o mais lindo e perfeito homem. Sou tão grata a
Allah por ter me enviado para você, habib. — Minha voz sai emocionada e
ele me puxa para mais perto, nossas bocas se unindo num beijo lento e
delicioso.
Suspiro e agradeço silenciosamente a Allah por me permitir viver
esse grande amor.
— Te amo, te amo — sussurro uma e outra vez em sua boca,
sentindo meu coração em júbilo, transbordando de tanto amor por ele.

Karim Amihaj
Não é uma frase vazia quando digo que ela é a mais linda e perfeita
mulher. Anna é isso para mim. A perfeição. Nós dançamos juntinhos, nos
beijando devagar, nosso amor borbulhando, nosso desejo exalando em cada
poro. A música tocando é bonita, a letra melodiosa ressoa no quarto:

(...) Mas ainda assim, você tira o meu fôlego, rouba as coisas que eu sei.
Lá vai você me salvando do frio [43](…)

Nossas bocas nunca se deixam, nosso beijo repleto do amor que nos
uniu, nos tornando um só. O refrão chega, a melodia tomando força, e
minha boca fica mais exigente. Subo uma mão pelas costas esguias e seguro
sua nuca, angulando-a para meu beijo possessivo. Ela geme em minha boca,
me mordendo suavemente, depois mais forte. Eu rosno, descendo a mão da
sua cinturinha para a bunda firme. Trago-a para o meu pau, esfregando-me
em sua pelve. Ficamos mais agitados, ofegantes, o tesão se agigantando
sem freio, exigindo ser saciado.

(...) Eles dizem que estamos fora de controle e alguns dizem que somos
pecadores, mas não deixe estragar nossos belos ritmos porque quando você
me desdobra e diz que me ama e olha nos meus olhos, você é a perfeição,
minha única direção. É fogo em chamas. É fogo em chamas (...).

A letra diz tudo que penso sobre nós, sobre ela. Acaricio seu corpo
lindo com as duas mãos. Bunda, costas, ombros, desço pelas laterais, a
cintura delicada e venho pela frente, pegando os peitinhos lindos e agora
bem volumosos pela amamentação. Eles permanecem firmes embora tenha
amamentado nosso primeiro menino e agora nosso segundo bebê. Os
amasso, rolando os bicos agora mais pontudos. Seu corpo está maduro, as
formas mais cheias. É minha mulher e mãe dos meus filhos e isso me deixa
ainda mais cheio de amor e tesão por ela. Geme quando desço uma mão e
enfio entre suas coxas. Solto um rugido ao encontrar a bocetinha toda
melada. Deslizo os dedos entre os lábios, abrindo-os. Anna espalha as
pernas, me deixando esfregar suas dobras molhadas com pressão. Empurro
dois dedos em seu canal apertado e passo a fodê-la, esfregando seu clitóris
com o polegar.
— Karim… — Choraminga meu nome e desço minha boca pelo
queixinho altivo, mordiscando-o. Continuo minha jornada chupando seu
pescoço pela frente, mordiscando sua garganta. Desço mais e abocanho o
seio direito, engolindo a auréola inteira com ganância. Como sua boceta
com mais força, empurrando fundo, enquanto mamo no seio farto. O
líquido materno sai, mas não me importo. É a minha mulher e tudo dela é
meu, como disse ainda há pouco. Assim como tudo meu é dela. Eu sugo,
engolindo seu leite. Ela resfolega. Adora quando faço isso. — Ahh, habib,
que gostoso… — Mia, rebolando em meus dedos. Está perto de gozar, seu
corpo está mais tenso, sua respiração entrecortada. Passo para o outro seio e
mamo com força, comendo-a mais e mais rápido.
— Goza, habibti. Vamos, goza para mim. — Atiço-a e ela grita,
gozando escandalosamente, esguichando o creme em minha mão. Seu corpo
inteiro convulsionando. Ainda está estremecendo com o orgasmo quando
puxo minha boxer para baixo e a levanto pela bunda. — Me abrace com as
pernas. Vou comer minha putinha assim, em pé — digo asperamente e ela
choraminga, enrolando as pernas torneadas em minha cintura.
Esfrego meu pau em suas dobras e encontro a entrada, ela se
pendura em meus ombros e a puxo para baixo, empalando-a com força,
rasgando a bocetinha apertada. Anna berra, os tremores do orgasmo se
misturando com minha entrada brusca. A levanto e abaixo de novo, indo
mais fundo, até o punho. Eu urro pelo prazer de me embainhar em seu calor
apertado.
— Tão gostosa… — Ranjo os dentes, comendo-a com vontade.
Nossos olhares fixos, nossas bocas respirando uma na outra. Firma as
pernas ao meu redor e gira os quadris, me fazendo grunhir, dando um tapa
forte em sua bunda. — Assim, minha esposa, monta meu pau, vamos, leva
tudo… — Nós fodemos freneticamente, buscando nosso prazer no corpo
um do outro, sem nenhum pudor. Ando com ela até o bar e a deposito sobre
um dos bancos. A empurro deitando as costas sobre a bancada e a
contemplo, fascinado. Pego seus peitinhos e os junto, abaixando a boca
sobre eles, chupando os bicos, mordiscando-os. Anna arranha meus braços,
gemendo de boca aberta enquanto soco até as bolas em sua boceta. Cada
estocada sacudindo-a toda. — Que gostoso comer você, porra. — Ranjo, as
mãos delineando sua cintura, coxas. Eu a amo demais. Sou completamente
alucinado por ela.
— Sim, habib, me come assim.… Me fode com força…. — Ela
ousa me atiçar e eu dou mais um tapa em sua bunda. Seguro sua cintura e
trago-a para levar meu pau todo, comendo-a fundo e forte. Suor está
brotando em nossas peles. Nossos olhares se prendem, quentes,
apaixonados um no outro.
— Minha putinha adora ser comida assim, não é? Bem forte? —
digo meio grunhindo, meio gemendo, não parando de meter profundamente,
rasgando o canalzinho estreito. — Ama me deixar rasgar essa bocetinha
pequena. — Ela choraminga, arfando o corpo indicando que vai gozar de
novo, e a pego pela bunda, levando-a para um dos sofás. Saio dela devagar.
— Fique de quatro, habibti — peço, já a colocando na posição, e ela segura
no encosto do sofá. Acaricio sua bunda linda, cravando minhas unhas na
carne macia. — Toda perfeita… — sussurro perdido de amor e lascívia.
Me alinho em sua entrada e olho para baixo enquanto empurro
devagar, apreciando meu pau abrindo as dobras delicadas. Ela fica tão
esticada à minha volta que me faz ranger os dentes. Seguro sua cintura e
puxo meu pau, deixando apenas a cabeça dentro e bato de volta,
profundamente. Anna berra, eu urro. Então, a fodo duro, metendo
vorazmente, segurando sua cintura com força, me embainhando sem dó a
cada estocada. Levo as mãos por baixo e pego os peitinhos, amassando-os,
puxando os bicos enquanto bato dentro e fora, socando gostoso, rude, voraz.
— Ahhh, eu vou gozar, habib… — Geme escandalosa e seu corpo
estremece, a boceta ordenhando meu pau nos espasmos do gozo. Eu
acelero, comendo-a fora de mim de tanto tesão. Minhas bolas estão
doloridas, pesando, e bato bem fundo, então urro guturalmente, jogando a
cabeça para trás, esporrando no fundo da bocetinha quente. Meu corpo todo
estremece, arrepia, a sensação mais intensa e deliciosa explodindo em meu
saco. Puxo-a pelos ombros, trazendo suas costas contra meu peito, e a
envolvo pela cintura, minha boca subindo para seu ouvido, rosnando
perversamente:
— Toma minha porra, minha putinha. Vou gozar tanto em você hoje,
habibti. — Anna resfolega, ainda estremecendo com seu gozo, mas geme
gananciosa. Eu rio e meus movimentos vão parando. Estou ofegando,
suado, minhas pernas bambas da gozada fora de série. Cheiro seus cabelos,
parando todo enterrado nela. Aperto o corpo gostoso em meus braços e meu
amor suspira baixinho. É um som de mulher satisfeita com seu homem.
Beijo seu ombro e em seguida as costas. Mordisco suavemente sua fênix e
puxo devagar de dentro dela. Meu olhar é atraído pelo esperma escorrendo
em suas coxas. Agora é a minha vez de gemer ganancioso. Estou longe de
estar saciado. Viro-a para mim e levanto-a nos braços. — Vamos para a
cama, malikati.
Anna enrola os braços em meu pescoço e enfia o rosto no meu peito,
cheirando-me. Sorrio satisfeito. Minha esposa é tão louca por mim quanto
sou por ela. Atravesso os aposentos e a deposito na cama. Retiro suas
sandálias sensuais e beijo cada pé. Seus lindos olhos verdes cintilam, me
olhando com tanta adoração que meu peito fica todo mole. Me deito junto
com ela e nós nos amamos noite adentro…

***

O salão de baile em homenagem ao sexagésimo quinto aniversário


do rei-pai já está lotado quando chegamos. O cerimonialista anuncia nossa
entrada:
— Suas Majestades reais, o rei Karim Amihaj Bin Khallifa Al-
Abdallah, e sua esposa, a rainha Anna Julia Marcollini Harper Di Castellani
Al-Abdallah!
Os convidados param tudo que estão fazendo e se levantam,
assistindo à nossa descida obrigatória pela escada imponente, com um
tapete vermelho no centro. É uma tradição que os Di Castellani também
respeitam. Cada membro da família precisa ser anunciado quando chega a
um baile real. Eu seguro a cintura de Anna quando descemos o último
degrau e andamos pelo corredor formado pelos convidados. Os
cumprimentamos com leves acenos de cabeça enquanto fazem as mesuras
respeitosas. Vejo como as mulheres observam minha rainha, os olhares
repletos de admiração. Mencionei que Anna é o meu orgulho? Então deixe-
me corrigir esse pequeno lapso. Minha garota irreverente cresceu
exponencialmente desde que nos casamos e se tornou a rainha de Kamar.
Ela estudou nossos costumes e o Corão e passou a contestar tudo que não
está no livro sagrado. Concordo com ela, muita coisa é invenção do homem,
principalmente de uma sociedade patriarcal perpetuada por centenas de
anos em nossa região.
A primeira briga foi para a criação de uma escola abrigando
meninos e meninas. A nossa princesinha estuda nessa instituição,
inaugurada há três anos. Minha menina é mais uma fonte do meu orgulho,
já fala fluentemente quatro línguas e continua curiosa, estudando mais e
mais. Ela ama e se espelha em Anna, e quando passou a chamá-la de mãe,
não objetei. Na verdade, Anna é a única figura materna de que minha
princesa se lembra. Embora ela saiba que sua mãe biológica a amou muito,
Anna ganhou um lugar permanente em seu coração. A segunda empreitada
dela foi comprar a briga do crescente movimento feminista em nosso
emirado. Elas reivindicavam o direito de escolha para usar ou não o hijab.
Anna fez uma linda campanha no Parlamento e depois de algumas sessões a
lei foi aprovada e sancionada por mim. Nossas mulheres podem escolher
agora.
Olho de lado, admirando-a como todos ao redor. Está absolutamente
deslumbrante num longo vermelho, ajustado ao corpo e se abrindo num
rabo de sereia. As mangas são curtas, o decote comportado. Ela mudou seu
guarda-roupa depois que se converteu ao islã, porém minha garota ousada
nunca deixou de usar as cores vibrantes, bem como introduzir outras peças
no vestuário feminino. Minha rainha causou uma verdadeira revolução em
Kamar. Cada mulher nativa se inspira nela, e mesmo as mais tradicionais
copiam seus turbantes estilosos e coloridos. Amo que agora ela possa andar
com sua linda cabeleira negra livre por todos os lugares. Mas amo ainda
mais que é sensível o bastante para se vestir com os trajes típicos para me
fazer feliz, usando, inclusive, o hijab. Ela sabe que amo vê-la como uma
nativa. Fica tão linda. Dessa forma ela agrada tanto os modernos quanto os
tradicionais em nosso emirado. Anna conseguiu recentemente a aprovação
para que as nossas mulheres possam tirar a carta de habilitação. Ela está
empoderando nossas mulheres de uma maneira linda e sem precedentes.
Não demora, essas mulheres vão querer pilotar helicópteros
também, como sua rainha destemida. Rio internamente sabendo que esse
momento, na verdade, não tarda. Já há alguns rumores de que nossas
mulheres estão defendendo o direito de se alistar no serviço militar.
Contudo, acredito que essa será uma briga mais acirrada. Quando o
momento chegar, ficarei do lado de minha esposa, como sempre fiz. Sei que
tudo que defende é legítimo e para a evolução de nosso emirado. Ela não
levanta bandeiras em vão. Seus ideais não são vazios. Minha garota ousada
sabe exatamente o que quer e como fazer para chegar lá. As revistas e
jornais a comparam à sheika Mozah, segunda esposa do ex-emir do Catar.
Uma mulher muito influente e além do seu tempo, que promoveu inúmeras
mudanças em seu país em prol das mulheres e da educação. Essa
comparação me deixou ainda mais orgulhoso.
Ah, e Anna ainda mantém a sua paixão pela fotografia. Nesses
quase cinco anos, ela já organizou muitas exposições em Kamar e outras
localidades na Europa e Estados Unidos, seu país natal. Alcançamos a
grande mesa reservada para a família real. Todos já estão lá, percebo.
Inclusive meus tios, meus primos e suas esposas, que chegaram hoje de
manhã. Pasmem! Zafyr, meu primo mais novo debochado, se casou há um
ano. Ele conheceu uma curadora de Nova York que ajudou Anna e Ella a
organizarem uma exposição em Jawahra há um ano e meio, e a moça
ocidental “prendeu suas bolas em nós apertado”, como dizem os homens Di
Castellani. Rio, recordando que Natália exigiu um contrato lavrado e
assinado da parte de Zafyr se comprometendo a nunca tomar uma segunda
esposa. Eu e Jalal nos divertimos muito com a saia justa em que seu irmão
mais novo se meteu. Para a surpresa de todos, ele assinou, mostrando que a
moça realmente o ganhou.
Cumprimentamos nossa família e puxo uma cadeira para Anna,
perto de Mike e Ella. Elas não se desgrudam. Se falam o tempo inteiro por
telefone e ainda viajamos muito em férias juntos. Anna está querendo
marcar uma viagem com todos os primos e seus respectivos cônjuges.
Mesmo Lipe e Max, o irmão mais novo de Ella, estão namorando firme
desde o começo do ano. Eles também eram avessos a compromissos. Nos
sentamos e logo somos envolvidos pela energia boa emanando em volta da
mesa. Eu amo ver os Di Castellani reunidos. O amor e proteção que cada
um tem em relação ao outro é muito bonito de ser ver. Depois que nos
tornamos uma só família, percebi mudanças boas em meu tio Jafar. Ele está
mais relaxado agora, sorri com frequência e demonstra mais seus
sentimentos por seus filhos, netos, por mim e seus sobrinhos-netos. Até
mesmo Anna caiu em suas graças e ele a defende e apoia em cada causa que
minha rainha se envolve.
Estamos felizes. Em Kamar tudo se acalmou, e temos vivido um
período de progresso e paz. Jalal, como meu grão-vizir, intensificou o
trabalho de nossos agentes especiais na luta contra o terrorismo. Nossos
aeroportos e fronteiras terrestres são monitorados com rigor e nunca mais
tivemos notícia de terroristas tentando entrar em nosso território. É um
trabalho contínuo e árduo. Não podemos relaxar nunca, ou a instabilidade
volta. Almejo a paz duradoura e tenho trabalhado para isso. Há três anos,
consegui mudar o sistema de governo de nosso emirado, introduzindo uma
monarquia parlamentar. O padrinho de Anna, o rei-pai Leon, foi
fundamental, me prestando um valioso serviço de consultoria. Dam, o atual
rei, também me auxiliou bastante. Minha maior preocupação era com os
clãs tribais. Depois que resolvemos nossas diferenças, me permiti me
aproximar mais deles e passei a admirar sua forma de resistência, então não
quis dissolver sua importância milenar em nosso governo. Dam sugeriu que
fosse criado um conselho especial com poderes, mas estando abaixo do
grão-vizir. Eles foram garantidos no governo e estamos coexistindo dessa
forma, unindo a tradição com a inovação.
— Si, vamos conversar amanhã com nossos irmãos e primos,
carissima. — A voz de Ella me faz olhar minha esposa, notando que as
duas já estão envolvidas numa conversa.
— Vai ser maravilhoso passarmos um tempo de qualidade, todos
juntos — Anna diz com empolgação.
— Eu topo. Desculpem, eu acabei ouvindo. — Chloe se pronuncia
do outro lado da mesa, ladeada por seus maridos Lucas e Samuel. Ainda é
um tanto estranho ver a dinâmica do trisal, admito. Mas uma coisa que se
nota imediatamente quando os vemos é que há amor e uma felicidade
estampada em seus rostos.
— Bobagem, prima. — Anna sorri. — Vai ser perfeito e, além do
mais, preciso conversar com você sobre uma ideia que tive…
— Que ideia, Anna? — É Lucas quem se pronuncia. Ele está com
um braço por cima da cadeira de Chloe, de vez em quando se inclinando e
sussurrando algo no ouvido da esposa que a deixa vermelha. Alguma
sacanagem, com certeza.
Anna me olha e abre seu sorriso que anuncia encrenca. Fico de
orelha em pé, como se diz no Ocidente.
— Pensei em levar Chloe para palestrar em nosso movimento
feminista e…
— Allah, malikati. Não vá colocar ideias na cabeça de nossas
mulheres. — Gemo, antevendo confusão, mas encaro Chloe, sorrindo e
apaziguando para que não pense que sou retrógrado. — Não estou falando
por mal, Chloe, é que…
— Em nosso emirado as mulheres têm sido burros de carga para os
homens, prima, é isso que meu marido quer dizer. — Minha garota
impertinente me olha de esguelha e os que estão próximos começam a rir.
— Habibti… — Eu passo um braço por cima de seus ombros,
tentando conter seus arroubos. — A questão naquela região é muito mais
profunda, sabe disso.
Seu rosto suaviza um pouco e ela se inclina, me dando um selinho
conciliador.
— Sim, meu rei está certo. Precisamos ir sempre com muito cuidado
— diz com autoridade. — Podemos fazer uma conversa informal com as
líderes do movimento então, o que acha, habib?
— Uma rainha sensata. — Eu brinco e ela rola os olhos, rindo em
seguida. — Sim, eu aprovo, minha esposa.
Seus olhos brilham lindamente quando a chamo assim. Ela adora.
— Chloe terá tempo para interagir com a realidade de Kamar, prima
— Samuel adiciona, ele está segurando a mão da esposa sobre a mesa, os
dedos entrelaçados. Seu irmão continua assediando Chloe e é incrível como
eles não têm ciúmes. — Ela e os meninos irão conosco quando começarem
as obras para o palácio de veraneio de vocês.
Sim, vou presentear Anna com um palácio, como fiz com Yasmina
quando nos casamos. Nos dividiremos nas duas residências porque Anna
ama nossa casa atual e não se incomoda que tenha sido um presente para
minha falecida esposa. Minha garota trava uma conversa com Chloe,
empolgada sobre passarem um tempo juntas. Mike já avisou que vai levar
Ella e os meninos também, logo Anna está em êxtase. Ela ama receber sua
família de sangue em nossa casa. Eu tomo uma cerveja sem álcool tanto
para acompanhar minha esposa, que está amamentando, quanto para me
resguardar. Não ingerimos bebida alcóolica em público. Esse é um princípio
que sempre guardamos. Observo a dinâmica da mesa, meu tio está
conversando com o rei-pai e seus irmãos. Minha sogra está conversando
com a rainha-mãe e a mãe de Mike. Dam está entretido numa conversa
baixa com Isadora. Lipe e Max conversando com suas namoradas. As
gêmeas Sam e Em também envolvidas numa conversa com seus maridos
Will e Nolan.
Meu olhar cai em Jalal, que está sussurrando algo para Nuria. Zafyr
com um olhar de cachorrinho para Natália. Quem diria, hein? Eu rio do meu
primo.
— Estou com o projeto pronto, Amihaj. Se quiser, eu e meus irmãos
podemos lhe mostrar amanhã. — A voz de Mike me faz olhar do meu lado
direito.
— Claro, amigo. Anna e Ayla estão ansiosas para ver isso — digo.
Minha pequena ficou encantada com a construção de outro palácio,
sobretudo porque é um presente para sua mãe Anna.
— Fiquei sabendo que a pequena quer se aventurar no Instagram,
amigo. — Mike sorri com carinho. Ele, todos eles a adotaram como
sobrinha, não fazendo distinção entre ela e os filhos biológicos de Anna.
— Sim, ela está muito animada, quer ser uma influência positiva
como sua mãe. — Eu expiro, sorrindo.
— E a minha sapequinha será. — Anna entra na conversa. — Será
uma princesa fodona muito em breve.
— Ayla é muito inteligente e deve ter o seu potencial sempre
incentivado. — Lipe também opina à nossa frente ao lado de Lucas. —
Estou à disposição para auxiliá-la quanto ao melhor uso da tecnologia.
— Shukran, maninho. — Anna joga beijos para seu irmão mais
novo. A namorada de Lipe, Stela, está olhando-o como se fosse a oitava
maravilha do mundo.
Lipe sempre tratou minha filha com muito carinho. Ayla é
deslumbrada por ele e vice-versa.
— Farei com prazer, maninha. — Ele pisca com cumplicidade
fraternal.
Após muita conversa, os casais vão se dirigindo para o centro do
salão, onde há casais dançando ao som do jazz sofisticado. O rei-pai vai
com sua rainha. Dom e Helena e Jay e Cassie os seguem. Dam vai com
Isadora. As gêmeas seguem com seus maridos. Lucas se levanta com Chloe
e Samuel recebe um beijo da esposa antes de ela se afastar com o outro
marido. Sim, uma dinâmica muito ousada. Mike se levanta com Ella e eu
sigo o exemplo, precisando segurar minha garota nos braços.
— Dança comigo, minha rainha? — murmuro, estendendo a mão
para Anna. Seu semblante enternece quando os olhos de joias preciosas
vêm para mim. Ela abre um sorriso feliz em sua boca vermelha.
— É uma honra, meu rei. — Sua voz sai tão cheia de amor que meu
peito amolece.
Se levanta, segurando minha mão. Enlaço sua pequena cintura e
seguimos por entre as mesas. Costuro com ela até chegarmos ao centro,
então pego sua mão e me inclino, fazendo uma mesura ensaiada. Seus olhos
cintilam, a expressão em seu rosto tão apaixonada, devotada que faz meu
coração derreter.
— Meu amor… — murmura suavemente.
Meus braços envolvem seu corpo lindo, trazendo-a para mim. Seus
braços cingem meu pescoço e começamos a nos mover no ritmo suave.
Nossos olhares se fixam e ficamos assim, dançando e nos encarando
apaixonados. A giro para o lado e ela vai sorrindo, sua risada saindo sem
restrição. Amo essa sua personalidade borbulhante. Seu vestido rodopia e
fico hipnotizado vendo-a girando de volta para meus braços. Seguro sua
cintura e a puxo mais perto, sua frente colada em mim, e ela sorri maliciosa
quando sente meu pau crescendo.
— Não posso chegar perto de você — murmuro, sorrindo do meu
tesão louco pela minha esposa.
— Então, somos dois, malkaa. Na verdade, não posso nem olhar
para você — murmura, o rosto levantando para o meu. Nossas bocas ficam
bem próximas enquanto balançamos gostosamente. — Lindo, delicioso.
— Minha linda esposa… — Roço minha boca na sua. Levando uma
mão para sua nuca, amparando-a. A outra enrolando em sua cintura. —
Minha garota atrevida… — Mordisco seus lábios e ela geme, me
inflamando ainda mais. — Deliciosa.
Então, minha boca desce na sua num beijo lento, combinando com
nossa dança. Sugo sua língua devagar, sabendo que estou provavelmente
exagerando em público, mas ela é viciante. Tocá-la sempre me deixa louco.
Paro o beijo e nós sorrimos na boca um do outro. Sim, nós exageramos.
Voltamos a dançar seriamente. A envio para frente e ela gira com a
habilidade e graça de uma bailarina. Seus longos cabelos caindo como uma
cortina negra pelas costas e ombros. Usa uma pequena presilha de rubis e
diamantes do lado da cabeça, combinando com os brincos e colar. Ela volta
para mim e emendamos outra música. Dançamos nos olhando, nossa bolha
nos envolvendo, e nos esquecemos do resto do salão movimentado.
Ella e Mike passam por nós, informando que é hora do brinde e das
homenagens ao rei-pai. Seguro a cintura de Anna e andamos de volta. Em
pouco tempo todos voltam a se reunir em torno da grande mesa oval.
Mantenho Anna à minha frente depois que pegamos nossas taças de
espumante sem álcool. Ela apoia a cabeça em meu ombro, enquanto Dam se
levanta iniciando o brinde para seu pai. O rei-pai se emociona com as
palavras de amor e orgulho de seu primogênito. Em seguida, Max levanta
sua taça, fazendo uma bonita homenagem ao seu pai também. Ella é a
próxima e anda até seu pai, entrando em seu abraço. Ela faz o brinde
olhando-o com tanta adoração que faz o rei-pai não segurar a emoção, e
chora beijando-a na têmpora. A rainha-mãe também está chorando,
beijando sua filha. Jay dá sequência, provocando o irmão mais velho. Eles
têm essa camaradagem bonita e hilária. É diversão garantida ver os três
juntos.
Dom faz seu brinde também, espirituoso como sempre. Todos riem
quando diz que Leon está ficando um velho molenga. Mas meu sogro tem
lágrimas nos olhos, mostrando que seu amor pelo irmão está lá. Anna
também vai para perto de seu padrinho e faz seu brinde emocionada, a
exemplo de Ella. O rei chora de novo e a abraça, beijando sua testa. Ela
volta para mim, os belos olhos cheios de lágrimas. A aconchego nos braços
outra vez e beijo o topo da sua cabeça. Os sobrinhos continuam as
homenagens. Eu e minha família também rendemos nossas homenagens ao
monarca dos Di Castellani e, no fim, as mulheres todas estão fungando,
emocionadas. Bem, até os homens se emocionam. Sempre fico tocado com
esses momentos entre eles. Leon discursou, emocionado, seu orgulho pela
sua linhagem é muito bonito. Elogiou o trabalho de Dam desde que foi
coroado rei, há três anos. Então, levanta sua taça, entoando a voz solene de
rei e chefe da família:
— Famiglia é sempre famiglia! Vida longa aos Di Castellani!
— Vida longa aos Di Castellani! — Todos nós entoamos e viramos
nossas taças.
Ficamos mais um tempo em volta da mesa. Conversando. Os pais de
Anna sentam-se perto de nós e minha garota passa a ser paparicada. O
garçom se aproxima, me entregando um papel. O agradeço, trocando um
olhar cúmplice. Quando chegamos, pedi a ele discretamente que entregasse
meu pedido de música para a orquestra, que está alternando entre o jazz e
um intérprete com a voz agradável. Quando os acordes da música bonita do
britânico Sam Smith soam, Anna olha para mim. Sorrio, me levantando,
estendendo a mão para ela.
— Venha comigo, minha rainha — peço e seus olhos lindos olhos
verdes voltam a ficar brilhantes. O sorriso mais suave curva sua boca e se
levanta, colocando a mão sobre a minha. Enlaço sua cintura e a conduzo na
direção oposta à pista de dança. Seu rosto gira para o meu.
— Para onde estamos indo, habib? — pergunta, curiosidade
acendendo em seu semblante.
— Olhar as estrelas, como gostamos de fazer da nossa varanda no
deserto — digo e ela sorri mais. A brisa noturna nos envolve e ando com
ela até o parapeito do grande terraço. Fico com ela nos braços, balançando
ao som da música flutuando do salão até nós. Meus braços firmemente
enrolados em volta de sua cintura. Ela me abraça pelo pescoço, os dedos
brincando com a mechas soltas de meu coque. Nossos olhos nunca desviam
um do outro. Levanto uma mão para seu rosto e traço o contorno perfeito,
tão fascinado como na primeira vez que a vi naquele cativeiro, há cinco
anos. — Shukran por me fazer o mais feliz entre os homens.
Ela ofega, seu rosto sendo preenchido com emoção. Traz uma mão
para o meu rosto também e me toca com seus belos olhos enchendo de
lágrimas. Os meus ardem também. Eu amo como posso ver tudo em seu
rosto, seus olhos. Quando me olha assim, me derruba aos seus pés.
— Obrigada você, habib. — Sua voz treme embargada. — Eu pedi a
Allah que nunca o leve antes de mim. — Seu olhar corre por todo o meu
rosto e as lágrimas escorrem pelas suas faces bonitas. — Eu nunca
conseguiria viver sem você, Karim.
Minhas lágrimas transbordam com sua emoção e limpo as suas
delicadamente com os polegares.
— Pedi a mesma coisa, habibti — murmuro asperamente pela
emoção em meu peito. — Eu nunca conseguiria viver sem você também,
Anna.
— Eu amo você, meu rei. — Ela diz suavemente e limpa meu rosto.
— Para sempre.
— E eu amo você, minha rainha — sussurro de volta, encosto a testa
na sua, nossos olhos grudados, se adorando. — Para sempre.
Ela sorri, linda em meio às lágrimas.
— Maktub, meu amor — sussurra.
Sorrio também, empurrando-a suavemente para encostar na
balaustrada.
— Sim, meu amor, maktub — murmuro e minha boca toca a sua no
mais delicado dos beijos. Ela me puxa para si, a puxo para mim e ficamos
colados, unidos como queremos ficar por toda a nossa vida. — Maktub,
nour Al sabar. — Torno a sussurrar e aprofundo o beijo.
Que Allah tenha compaixão de nós e não nos leve separados. Ela
trouxe a luz de volta para a minha vida. Essa linda garota irreverente estava
no meu destino. Sim, estava escrito que eu e ela nos encontraríamos, que
amaríamos de novo. E seria um amor tão grande e forte que curaria nossos
corações partidos. Estava escrito.
Fim.
UMA ESPIADINHA EM PRÍNCIPE
DO ORGULHO
— Você não é nada para mim além de uma boceta gostosa, que
gosto de afundar o meu pau ocasionalmente. — Ele diz com frieza e meu
corpo gela. É como se me desse um tapa forte na cara. Meus olhos ardem,
mas eu respiro, lutando contra as lágrimas. Não posso chorar. Não posso
deixá-lo tripudiar sobre mim dessa maneira. Puxo minha calcinha para cima
com o máximo de dignidade que uma mulher pode conseguir numa situação
dessas. Seu sêmen quente está escorrendo entre minhas pernas tornando
tudo mais humilhante.
Meu noivo está lá fora, na festa, enquanto eu.… Não consegui
resistir, de novo. Estico a coluna e pego a minha bolsa, me voltando para a
porta, meu corpo tremendo com ódio, repulsa, desprezo por esse homem, e
por mim mesma.
Como posso amar uma criatura tão cruel?
— Addio, Dam — murmuro lutando para controlar o tremor na
minha voz. Não posso mais permitir que continue me usando sempre que
quiser. Ele pensa que sabe de tudo, mas está enganado ao meu respeito. Tão
enganado. Se soubesse toda a sordidez que envolve meu noivado, não me
trataria com tanto desprezo. — Per favore, não me force mais a fazer.…
— Forçar você? — Sua voz sai junto com uma risada de descaso.
Eu não me viro, mas posso imaginar a expressão cruel em seu rosto
aristocrático e lindo. Por que dentre todos os homens fui me apaixonar por
um que é inalcançável para mim? Em circunstâncias normais já seria
impossível. Quero dizer, sou uma plebeia. Ele é nada mais nada menos que
o príncipe herdeiro de Ardócia, per Dio! Não há um futuro para nós. Nunca
haverá. Os príncipes podem até se divertir com garotas como eu, mas eles
se casam com princesas ou moças da nobreza. — Não seja ridícula, Isadora.
— Fecho os olhos adorando ter o meu nome pronunciado em sua voz
profunda mesmo que seja com seu desdém característico. — Vai continuar
vindo quando eu chamar. — Sua voz está de repente bem no meu ouvido e
seu braço enrola em minha cintura com força. Ele enterra o nariz em meus
cabelos e inspira profundamente. — Não vou abrir mão de você.
— Me solte, per favore… — Suplico.
— Pare de fazer charme, doutora. Sabe muito bem que nem você e
nem eu, queremos parar isso entre nós… — Arquejo, pega desprevenida,
mas dou um tapa em seu braço, tentando me esquivar. Ele ri e me puxa mais
apertado, dominando-me facilmente. — Não finja que não gosta das nossas
trepadas tanto ou mais do que eu, cara. — Morde o meu pescoço, me
fazendo gemer vergonhosamente. Odeio a reação do meu corpo a ele. Sua
outra mão enrola em meu cabelo e o puxa. — Vai continuar dando para
mim até eu decidir que estou saciado, entendeu, doutora? Não me importo
se é comprometida. Devia ter se resguardado naquela selva, mas não, você
trepou comigo como a prostituta que é. — Soluço com suas palavras cheias
de desprezo. — Agora acha que pode fugir de mim? Não, cara, vou te
comer até me fartar, só então a deixarei ir.
O empurro, dando uma cotovelada em suas costelas, envergonhada e
com nojo de mim mesma. Ele uiva e me larga. Corro os últimos passos para
a porta, segurando a maçaneta. O olho por cima do ombro. Está parado no
meio do cômodo, o smoking amassado, gravata torta, a massa de cabelos
negros revolta. Meu peito aperta com essa visão. Esse homem acaba
comigo. Tão bonito quanto cruel. Uma lágrima escorre pela minha face e eu
a afasto com raiva.
— Não. Eu não virei mais — afirmo num sussurro rouco. — Não
atenderei mais esses chamados, Alteza.
Dam ri com deboche, não acreditando em minha bravata, afinal
quem em sã consciência ousaria contrariar os desejos do príncipe herdeiro?
— Não diga bobagens. Virá, sabe que virá. — Os olhos negros
como a noite seguram os meus, intensos e intimidantes. — É minha,
Isadora. Irei atrás de você onde se esconder e a arrastarei até a minha cama,
se for necessário.
Minhas entranhas vibram com suas palavras e expressão possessiva.
Me excita esse seu lado escuro e depravado entre quatro paredes. Oh, Dio.
O deixei fazer coisas comigo que me envergonho até em pensar…
— Não estamos mais na Idade Média, em que os reis e príncipes
podiam obrigar uma mulher a compartilhar sua cama sem a menor
consideração pelos outros. Não sou uma qualquer. — Revolto-me. — Sou
honesta e…
Ele ri. Não um sorriso bonito, esse é cínico, irônico. Seus olhos
fervem, em seguida ficam frios como o Ártico.
— Então, saia da minha frente, doutora. — Sibila, as narinas
inflando. Soluço baixinho. — Volte para seu noivo idiota. Leve para ele
esse corpo usado, essa boceta inchada de tanto tomar o meu pau. — Seu
sorriso fica ainda mais cruel quando completa: — Vá para ele cheirando a
mim e inundada com a minha porra, sua vadia mentirosa!

[1]
Música: Hey, DJ. Intérprete: CNCO. Sony Music Latin. EUA. 2017.
[2]
Grão-vizir: Do árabe “wazir”, designa “aquele que ajuda a carregar um peso”.
[3]
Nour hayati: Luz da minha vida, em árabe.
[4]
‘Amirat saghira: princesinha, em árabe.
[5]
Habib: amado, em árabe.
[6]
Amiri: meu príncipe, em árabe.
[7]
‘Amira: princesa, em árabe.
[8]
Shukran: obrigado, em árabe.
[9]
Wallah: expressão árabe equivalente a “por Deus!”.
[10]
Caftans são uma vestimenta típica do Sudoeste Asiático, herança do Império Otomano que
dominou a região até 1922.
[11]
Shemagh é um lenço comprido que os homens árabes enrolam em torno da cabeça.
[12]
Khara: expressão árabe equivalente a “merda”.
[13]
‘Ant ‘aydaan jamila: expressão árabe equivalente a “você também é bonita”.
[14]
Falaykun: expressão árabe equivalente a “que assim seja”.
[15]
Música Bird Set Free. Sia. Álbum: This Is Acting. RCA. EUA. 2015
[16]
Salaam Aleikum: expressão árabe equivalente a “a paz esteja contigo”.
[17]
Música: Quisiera. Intérprete: CNCO. Sony Music Latin. Estados Unidos. 2016.
[18]
Allah akbar: expressão árabe equivalente a “Deus é maior”.
[19]
‘Abi: expressão árabe equivalente a “papai”.
[20]
Cafia: lenço usado pelos homens árabes.
[21]
Igal: cordão que prende a cafia.
[22]
Hijabs: lenços usados por mulheres mulçumanas.
[23]
Marhabaan: expressão árabe equivalente a “olá”.
[24]
Jellab: Bebida árabe. É uma mistura de melaço de uva e água de rosas, com coberturas opcionais
de pinhões e passas.
[25]
Hafazna Allah: Expressão árabe equivalente a “que Deus nos proteja”.
[26]
Amirati: Minha princesa, em árabe.
[27]
Sharmuta: expressão árabe equivalente a “puta”.
[28]
Dio non voglia: Deus me livre, em italiano.
[29]
Si. Solo la crema: Só a nata, em italiano.
[30]
Malikati: expressão árabe equivalente a “minha rainha”.
[31]
Masha Allah!: expressão árabe de admiração para algo belo.
[32]
Falayfun: Expressão árabe equivalente a “que assim seja”.
[33]
Sshaykh: Termo árabe que significa “ancião”, pode ser usado por qualquer pessoa com
alguma autoridade religiosa. Líderes de ordem, diretores de universidade, chefes de tribo e ulemás
podem ser considerados xeques.
[34]
Malkaa: Meu rei, em árabe.
[35]
Maktub: Estava escrito, em árabe.
[36]
Mangni: Período de três meses correspondente ao noivado na cultura árabe.
[37]
Jawhariin althamin: Minha joia preciosa, em árabe.
[38]
Bambina, il tuo padrino è così Felice: Criança, teu padrinho está tão feliz, em italiano.
[39]
Dio te benedica, figlia mia: Deus te abençoe, minha filha, em italiano.
[40]
Sharbat: Bebida feita com flores e frutas.
[41]
Al’amir alsaghir: Princepezinho, em árabe.
[42]
Prozio: Tio-avô, em italiano.
[43]
Música: Fire On Fire. Intperprete: Sam Smith. Capitol. UK. 2018.

Você também pode gostar