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6º SEMESTRE NOTURNO
NOVEMBRO de 2020
JOSÉ RICARDO BELTRAMINI DE MELO
RIBEIRÃO PRETO – SP
NOVEMBRO DE 2020
Introdução:
O presente trabalho procura analisar a obra cinematográfica “Cidadão Kane”
(1941) de Orson Welles sob o escopo da psicanálise. Para tal tarefa, nos embasamos nos
desenvolvimentos psicanalíticos de Melanie Klein, nos retendo aos conteúdos trabalhos
ao longo da disciplina, mas também nos embasando em contribuições para o campo de
estudo do filme dentro da psicanálise, visto que tal obra é um tema recorrente para a
psicanálise.
Temos, logo de início do filme, uma das mais icônicas palavras consagradas
pelo cinema: rosebud. Com a palavra sendo proferida por um corpo moribundo e um
globo de neve espatifando-se no chão temos a apresentação do argumento principal do
filme: o que é rosebud? Com isso, passamos a assistir a reprodução de um documentário
dentro do filme “Cidadão Kane”. Podemos, na verdade, interpretar que o filme nada
mais é do que a tentativa de reconstituição da vida de Charles Kane, pois
acompanhamos alguns jornalistas produzirem um documentário a respeito da vida e
morte de Charles Kane, assim como procuram decifrar o mistério por trás da última
palavra do magnata dos meios de comunicação em massa.
Metodologia:
Por mais vasta que seja a relação entre psicanálise e cinema, sempre se faz
presente a necessidade de estabelecer recortes para a análise. Recortes do material e da
metodologia que será utilizada para trabalhar esse objeto. Sendo assim, seguindo a
proposta da disciplina, o filme estará sob a ótica de um dos autores trabalhados em sala,
a saber Melanie Klein.
Klein detém diferenças quanto aos mecanismos de defesa, pois apresenta defesas
específicas para a posição esquizo-paranoide como a clivagem 1 do objeto do sujeito,
constituindo-se como a defesa mais primitiva contra a angústia, e com a clivagem do
objeto, a autora entende que também ocorre a clivagem do ego, separando-o em ego
bom e ego mau, pois para ela o ego rudimentar se desenvolve a partir da introjeção que
o sujeito faz dos objetos. Há também o mecanismo de reparação, onde o sujeito procura
reparar os efeitos produzidos nos seus objetos de amor através de suas fantasias. O
mecanismo da reparação acompanha todo o processo de angústia do sujeito.
Análise:
Ao iniciar o filme, podemos notar que mesmo sem muitas introduções a figura
de Charles Kane, o homem que acabamos de presenciar o falecimento desperta muitos
interesses. Um grupo de jornalistas estão discutindo a respeito de sua vida e morte para
1
A clivagem para Klein também se manifesta na posição depressiva, que incide no objeto total do sujeito.
a produção de um documentário. No grupo, o jornalista chefe fixa-se em um primeiro
momento na palavra Rosebud, falada de forma enfática pelo velho moribundo que
vemos derrubar o globo de neve e falecer. O mesmo jornalista posteriormente identifica
Kane como a pessoa que fora mais amada e posteriormente mais odiada de toda
américa.
Jedediah Leland, personagem que Bernstein diz ao repórter saber coisas únicas a
respeito do magnata falecido, faz a comparação da memória como uma maldição,
dizendo: “I can remember everything. That’s my curse, Young man. It’s the greatest
curse that’s ever been inflicted on the human race: memory.”. Leland ainda descreve
Kane como uma pessoa egoísta, que só acreditava em si, não vivendo nada do que
realizava, apenas tendo como parte dele, como pertencente à ele, si próprio. Talvez, em
uma análise mais cuidadosa e embasada, pode-se levantar a hipótese de uma construção
de um falso self, em que Kane nos demonstra – através do flashback – uma rigidez do
ambiente para com as suas atividades, e não consumando seus atos, não adquirindo
satisfação em suas variadas empreitadas.
Nos diálogos com sua primeira esposa Charles nos dá indícios de uma
personalidade autoritária, egocêntrica. Diz a ela que as pessoas irão pensar no que ele
quer que elas pensem ao debater com a mulher a respeito de suas críticas ao presidente,
tio de sua esposa. Complemente dizendo que o tio de sua esposa ser o presidente do país
foi um erro que logo será corrigido por ele [Kane], indicando sua vontade política.
Ao apresentar outro diálogo com Leland, o idoso revela que Charles casou-se
por amor, e por isso se desdobrou em diferentes atividades durante seu primeiro
casamento. Conclui que Charles sempre quis amor, queria o amor dos eleitores, tudo
que ele queria na vida era amor e essa é a história de Charles, assim como é o que ele
perdeu. Com essa fala do mais íntimo dos amigos de Kane, temos como consagrado a
falha de estabelecer bons vínculos com os seus objetos, demonstrando possivelmente o
mecanismo da clivagem, onde volta-se aos seus objetos de amor.
Leland ainda relata que Kane chamou sua segunda esposa de “o perfil do público
americano” – o que nos traz que seu casamento possa ter sido motivado talvez por
algum vislumbre em Susan de algo que ele havia perdido, de um amor pelo qual ele
sempre está em busca para receber. É mencionado por Charles que se sente solitário ao
conhecer Susan na calçada. Naquele momento, Charles Kane, o magnata donos de uma
das maiores riquezas do mundo, estava indo a um caminho de reencontro com sua
infância, pois iria visitar pertences de sua falecida mãe que tivera guardado por todo
esse tempo em um galpão.
Conclusão
Nas relações estabelecidas por Charlie Foster Kane, o magnata, e o jornalista, como
afirmou algumas vezes as suas duas personalidades, podemos identificar a formação de
mecanismos de defesa. Um dos recursos identificados e empreendidos pelo
protagonista, verifica-se em clivagens que realiza, ao demonstrar que suas relações
sujeito-objeto não estão bem estabelecidas, pois busca incessantemente, cada vez mais,
o amor de mais pessoas, de mais admiradores, para que assim trazer todo esse amor para
acompanhar sua angústia.
Bibliografia