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Unidade III
7 TOXICOLOGIA DOS ALIMENTOS E DOS METAIS
Para que estejamos preparados para a colheita dos frutos da informação, também teremos a
oportunidade de compreender como os praguicidas, intensamente utilizados na agricultura e na
pecuária, podem trazer riscos de intoxicação a humanos e animais. Teremos, também, a oportunidade
de caracterizar algumas classes de praguicidas e verificaremos como é possível diagnosticar e tratar as
intoxicações causadas por essas substâncias.
Vamos iniciar agora a parte da toxicologia que estuda os possíveis danos causados ao organismo
quando se expõe a substâncias químicas presentes nos alimentos: a toxicologia dos alimentos.
Para que tenhamos um visão holística dos contaminantes presentes nos alimentos, alguns autores,
como Mídio e Martins (2000), classificam os agentes tóxicos da seguinte forma, quando presentes nos
alimentos: agentes tóxicos naturalmente presentes nos alimentos, contaminantes diretos de alimentos
e contaminantes indiretos de alimentos.
Com relação aos agentes tóxicos naturalmente presentes nos alimentos, como a própria
nomenclatura propõe, a substância química que pode causar dano no organismo faz parte da
constituição do alimento. Entretanto, quando uma substância química não faz parte do alimento,
mas em algum momento se torna parte dele durante o processamento, armazenamento, transporte,
distribuição ou produção, esse agente tóxico é considerado um contaminante direto do alimento.
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TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
A substância química que não é naturalmente presente e também não é aplicada diretamente no
alimento, mas que é utilizada ou aplicada no vegetal ou animal que dá origem ao alimento e que
consequentemente esteja presente nesse alimento, é denominada de contaminante indireto.
Após essa visão geral de uma das maneiras de classificar os agentes tóxicos presentes nos alimentos,
faz-se necessário conversarmos um pouco sobre a segurança dos alimentos.
O Codex Alimentarius, ou o Código Alimentar, é uma das principais referências utilizadas pelas
autoridades brasileiras para a aprovação da comercialização de produtos alimentícios. Trata-se de um
conjunto de diretrizes, padrões e códigos criado para que haja a proteção da saúde do consumidor.
Ele auxilia na promoção de práticas adequadas na comercialização de alimentos e compõe o ponto
principal do Programa Conjunto de Normas Alimentares da Organização das Nações Unidas para a
Alimentação e Agricultura (FAO) e da OMS. Sua primeira reunião ocorreu em 1963 e suas diretrizes nos
trazem alguns importantes conceitos, como veremos agora.
Neste tópico, estudaremos os Gras, ou seja, os aditivos geralmente reconhecidos como seguros.
Exemplo de aplicação
Quando se prepara alguma refeição em sua casa, ao adicionar cloreto de sódio (sal de cozinha) na
salada, a pessoa que está cozinhando usa luvas especiais para poder pegar o cloreto de sódio e temperar
a salada? Pesa na balança analítica com quatro casas decimais a quantidade exata de cloreto de sódio
para adicionar ao alimento?
Imaginamos que não! Mas, nessa linha de raciocínio, vamos a mais uma reflexão.
Exemplo de aplicação
Quais são os danos causados a humanos quando se coloca um pouco de canela no arroz doce ou um
pouco de cravo no doce de abóbora?
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Unidade III
Não há dano no organismo humano quando se expõe a esses aditivos alimentares em baixas
quantidades. Existem alimentos que sabemos que não causam danos ao organismo nas condições em
que normalmente as pessoas se expõem.
Assim, quando se adiciona uma substância no alimento (aditivo alimentar) e essa substância é
adequadamente segura nas condições de uso, ela é conhecida como “segura” e se utiliza o acrônimo Gras
(generally recognized as safe) para identificá-la. As condições seguras de exposição são fundamentadas
na experiência do uso comum das substâncias ou caracterizadas por métodos científicos. O sal de
cozinha, o cravo-da-índia e a canela são alguns exemplos de aditivos classificados como Gras, e para
eles não existe ingestão diária aceitável (IDA), ou seja, não há quantidade máxima que possa ser utilizada
no alimento, diferentemente dos edulcorantes artificiais (ABDALLAH, 2002).
Segundo o programa conjunto FAO/OMS para padrões alimentares, a IDA é uma estimativa da
quantidade de uma substância química na água potável ou nos alimentos que pode ser ingerida
diariamente, ao longo da vida, sem considerável risco de intoxicação, sendo expressa com base no peso
corporal, cujo padrão humano é de 60 kg e é listado em unidades de miligrama (mg) da substância
química por quilo (kg) de peso corpóreo (mg.kg-1) (JOINT FAO/WHO EXPERT COMMITTEE ON FOOD
ADDITIVES, 2016).
Feita a apresentação sobre alguns importantes conceitos utilizados na segurança dos alimentos,
vamos conhecer um pouco mais sobre os riscos da exposição às substâncias químicas naturalmente
presentes neles.
7.1.3.1 Introdução
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TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
O significado maior dessas informações se associa ao fato de que pode haver substâncias químicas
presentes nos vegetais que podem causar danos ao referencial biológico, dependendo das condições
de exposição.
Lembrete
Você já parou para pensar que grande parte de nosso alimento é de origem vegetal e que alguns
desses alimentos também podem causar intoxicação em humanos ou animais? Sim, é verdade!
Imaginamos que você já tenha ouvido falar que a mandioca brava ou amarga é “venenosa”, não é?
É isso mesmo! Dependendo das condições de exposição (iremos contextualizar posteriormente, neste
tópico), a exposição à mandioca amarga pode, sim, romper a homeostase e causar danos a animais
ou a humanos.
Mas já parou para pensar na composição dos alimentos como um todo? Vamos analisar a seguir, de
forma geral, como pode ser constituído um alimento de origem vegetal.
Ao nos expor a alimentos, esperamos obter nutrientes que sejam fundamentais para o funcionamento
do nosso organismo. Você também parou para pensar que o vegetal, ou seja, o alimento, não é constituído
apenas por nutrientes?
Segundo Mídio e Martins (2000), o alimento de origem vegetal é constituído de substâncias que
apresentam propriedades nutrientes, não nutrientes e até mesmo antinutrientes.
Há substâncias químicas presentes no alimento vegetal que são aproveitadas apenas pelo vegetal,
sem representar alguma funcionalidade para humanos ou animais. São substâncias responsáveis, por
exemplo, pela sustentação ou vascularização do vegetal e não nos apresentam finalidade alguma.
Na verdade, essas substâncias são as prevalentes no vegetal.
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Unidade III
Também pode haver substâncias presentes nos alimentos que, dependendo das condições de
exposição, podem causar danos ao referencial biológico, e, nesse momento, essas substâncias compõem
o cerne de nosso estudo: os agentes tóxicos naturalmente presentes nos alimentos.
Vamos entender como podemos estar expostos a esse grupo de substâncias tóxicas.
Um produto conhecido por multimistura (MM) é utilizado em algumas regiões do Brasil, estimulado
pela Pastoral da Criança, uma organização não governamental (ONG), para que sejam disponibilizados
nutrientes para crianças carentes. Esse preparado é feito a partir de folhas verdes escuras, como couve,
mandioca, batata-doce e espinafre, e de sementes como a da abóbora, da soja e do girassol, e o preparo
desse suplemento alimentar é transformado em pó (HELBIG; BUCHWEITZ; GIGANTE, 2008).
Sabe aonde queremos chegar ao trazer a você a MM? Essa composição pode ser uma importante
fonte de substâncias antinutricionais, como oxalatos e fitatos, com consequente comprometimento na
absorção de nutrientes, a despeito de ser um preparado com o objetivo de enriquecer a alimentação
de pessoas socialmente desfavorecidas, e ainda pode conter o ácido cianídrico (HCN), proveniente do
processamento incorreto da folha de mandioca-amarga.
Observação
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TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Exemplo de aplicação
Gostaríamos que refletisse um pouco e nos trouxesse o que você entende por glicosídeo e glicosídeo
cianogênico e a sua relação com o ácido cianídrico.
Observação
A aglicona, nos glicosídeos cianogênicos, pode dar origem ao HCN, caso sejam hidrolisados. Caso
não haja a hidrólise do glicosídeo cianogênico, não há a liberação da aglicona e, consequentemente, não
há a formação do ácido cianídrico.
Cerca de 2.000 espécies vegetais contêm glicosídeos cianogênicos. Um exemplo é o angico preto,
distribuído na região Nordeste do país. Temporais podem derrubar seus galhos, e essas árvores também
podem ser derrubadas pelo homem. Depois disso, o gado ingere as folhas quentes e murchas dessa
planta e se intoxica com o HCN (AMORIM; MEDEIROS; RIET-CORREA, 2006).
Para que haja intoxicação pelos glicosídeos cianogênicos, há a necessidade de hidrólise. Apenas após
a efetiva hidrólise é que ocorre a liberação da aglicona e ela se transforma em HCN.
Observação
O HCN é popularmente chamado de cianeto ou cianureto. Entretanto, ressalta-se que para que haja
intoxicação o cianeto deve estar na forma molecular. Assim, ainda que não se fale da forma correta,
sobretudo quando há informações trocadas por leigos, deve-se entender que a substância que age no
organismo, inibe a fosforilação oxidativa e causa o dano é o ácido cianídrico em sua forma molecular,
ou seja, o HCN.
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Unidade III
A hidrólise dos glicosídeos cianogênicos pode ocorrer em três diferentes situações, segundo Mídio
e Martins (2000).
• Meio com baixo pH: quando há a exposição pelo trato digestório, em função do baixo pH do suco
gástrico, ocorre a hidrólise do glicosídeo cianogênico, com a liberação da aglicona e consequente
formação do HCN.
Dentro desse contexto, entendemos que, caso não haja a exposição por essa via, não há a interação
entre o glicosídeo cianogênio e o suco gástrico; consequentemente, não ocorre a hidrólise do glicosídeo
cianogênico condicionada ao baixo pH do meio.
• β-glicosidases: essas enzimas são produzidas pela microbiota. Assim, caso o glicosídeo
cianogênico não seja hidrolisado pelo suco gástrico, possivelmente será no intestino.
Exemplo de aplicação
Gostaríamos que fizesse mais uma reflexão: se as glicosidases específicas estão presentes no
alimento, por que não interagem com os glicosídeos cianogênicos e, consequentemente, não liberam o
ácido cianídrico normalmente?
Entretanto, caso seja feito um suco de maçã e se triture a polpa do fruto com suas sementes,
provavelmente haverá a interação entre os glicosídeos cianogênicos presentes nas sementes das maçãs
e as glicosidases específicas, que os hidrolisará, e haverá a liberação da cianidrina, como a aglicona, que
formará o HCN.
Observação
Observe que há situações em que ocorre a ruptura da estrutura celular da raiz do vegetal, como
da Manihot glaziovii, e ocorre a liberação da linamarase, uma das enzimas capazes de hidrolisar os
glicosídeos cianogênicos. Com isso, ocorre a hidrólise, a liberação do HCN, cuja exposição por via oral,
ou até mesmo pela inalação, pode levar a casos de intoxicação aguda.
Como visto em detalhe anteriormente, o HCN inibe o processo de fosforilação oxidativa e leva o
organismo ao colapso, por não produzir energia (ATP). A asfixia tissular resultante da anóxia histotóxica
faz com que o sangue apresente uma coloração vermelho-brilhante, uma vez que a oxihemoglobina
(HbO2) não libera o oxigênio para a transferência eletrônica mitocondrial.
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Unidade III
Observação
Alguns minutos após a exposição a alimentos contendo glicosídeos cianogênicos já são suficientes
para que haja a manifestação dos sinais e sintomas de intoxicação, e o tratamento precisa ser rápido,
dependendo da quantidade de glicosídeo cianogênico ao qual o organismo se expôs.
Observação
Uma das formas de tratamento é a administração de nitrito de sódio (NaNO2) (EV). Como vimos
anteriormente, essa substância química é um agente metemoglobinizante. Em um primeiro momento,
parece um contrassenso administrar essa substância em uma circunstância como essa, uma vez que
a fosforilação oxidativa está sendo inibida, ou seja, com esse tratamento, chegará uma quantidade
ainda menor de oxigênio às células, já que a metemoglobina (MeHb) é incapaz de carrear oxigênio para
tecidos remotos.
Entretanto, o recorte que se faz nesse momento é que o HCN possui mais afinidade à MeHb que o
HCN em relação à citocromo oxidase que está sendo inibida pelo HCN na mitocôndria. Dessa forma,
quando se metemoglobiniza o paciente, a MeHb retira o cianeto que está inibindo o processo de
fosforilação oxidativa mitocondrial.
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TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
muito menos de ser realizado. Vamos seguir em frente, ou melhor, vamos dar um passo para trás, para
retomar uma passagem, e já vamos evoluir no raciocínio.
Volte alguns parágrafos e releia com calma: a MeHb tem afinidade com o cianeto e o retira da
inibição enzimática que está acontecendo na mitocôndria.
Agora, a MeHb interage com o HCN que estava na mitocôndria e forma esse pigmento
denominado de CNMeHb.
Se a MeHb é um problema importante para o organismo, caso a MeHb esteja ligada ao cianeto
(CNMeHb), a situação fica ainda mais crítica, uma vez que o oxigênio precisa ser transportado para
tecidos remotos, distantes do local de absorção do oxigênio, mas não conseguirá dessa forma.
Para resolver esse problema, administra-se o tiossulfato de sódio (EV). Essa substância doará enxofre
para a CNMeHb e, por consequência, dará origem ao tiocianeto (SCN) e à MeHb.
O SCN possui importância na exposição crônica, como veremos a seguir, mas não na exposição
aguda. Assim, prioriza-se o tratamento da intoxicação pela MeHb.
Exemplo de aplicação
Resolução do problema: administra-se NaNO2 (EV), que irá metemoglobinizar o organismo e a MeHb
formada, assim como remover o ácido cianídrico que está bloqueando o sistema enzimático.
Problema gerado: forma-se a CNMeHb (HCN que foi retirado + MeHb formada).
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Unidade III
Acompanhou o raciocínio?
Lembrete
Administra-se o azul de metileno (EV), que é um carreador exógeno de elétrons. O azul de metileno,
ao doar elétrons, induz redução da MeHb a HbO2, ou seja, o ferro férrico (Fe3+) presente nos anéis
pirrólicos do grupamento heme ganha elétron e é reduzido a ferro ferroso (Fe2+). Assim, a MeHb se
transforma em HbO2, restaurando a fosforilação oxidativa e o aporte de oxigênio aos tecidos remotos.
Uma vez que a citocromo oxidase não mais estará inibida, haverá oxigênio para receber elétrons na
mitocôndria, levando à formação do ATP com subsequente produção de energia para o organismo.
Você percebeu como o tratamento desse tipo de intoxicação é bastante complexo? O cuidado não
para por aí: preste atenção no parágrafo a seguir.
Sabemos que o azul de metileno é um agente redutor para a MeHb. Entretanto, seu excesso atua
como agente metemoglobinizante. Caso o tratamento da intoxicação aguda pelo HCN seja realizado
por profissionais sem a expertise necessária, a dose administrada de azul de metileno pode ser o agente
responsável pela metemoglonização do paciente e levá-lo à morte.
A mirosinase ou tioglicosidase são diferentes nomes para a mesma enzima presente no citosol de
células vegetais e no intestino de ratos e humanos, que é capaz de hidrolisar os glicosinolatos.
Os glicosídeos tiocianogênicos estão localizados nos vacúolos. Dessa forma, não há a hidrólise dos
glicosinolatos caso o vegetal esteja íntegro, diferentemente de sementes em estado de germinação,
quando ocorre a pronta hidrólise desse glicosídeo (MÍDIO; MARTINS, 2000).
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TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Observação
Observação
Observação
Como o isotiocianato é instável em pH alcalino ou neutro, quando se encontra em meios com essa
faixa de pH, origina os tiocianatos orgânicos.
Agora, providos dessas informações, temos condição de compreender que, a partir da hidrólise
dos glicosídeos tiocianogênicos, são liberadas substâncias químicas denominadas goitrogênicas ou
bociogênicas, descritas a seguir.
• Tiocianato: o tiocianato, em uma exposição aguda, não apresenta muita importância toxicológica.
Entretanto, na exposição crônica, o tiocianato é relevante, à medida que inibe a incorporação de
iodo pelos hormônios tireoidianos e leva ao bócio, em última instância.
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Unidade III
Para que você tenha dimensão de como essas informações impactam no dia a dia das pessoas e
podem efetivamente causar danos ao organismo humano e de animais, há algumas regiões da Europa,
como na Eslováquia e na República Tcheca, em que há significativa prevalência de bócio pela exposição
crônica a elevados teores de tiocianato presentes em Brassicaceae, popularmente chamadas de vegetais
florais, como brócolis, couve, rabanete, rúcula, agrião, acelga, couve-flor e repolho.
Lembrete
Observação
7.1.3.4 Glicoalcaloides
A batata (Solanun tuberosum L.) contém glicoalcaloides como solanidina, solanidona, espirosolanos,
α-chaconina e α-solanina. Esses dois últimos representam cerca de 95% de todos os glicoalcaloides
presentes nesse tubérculo, possivelmente para conferir ao vegetal proteção contra microrganismos e
insetos. A maior quantidade de α-solanina e α-chaconina é encontrada em locais de elevada atividade
metabólica, como brotos, e imediatamente abaixo da casca (quando ainda verde) do tubérculo. Quando
há um estresse na batata, como um dano por ter batido em alguma superfície, por exemplo, há grande
depósito desses glicoalcaloides (MÍDIO; MARTINS, 2000).
Você já teve a oportunidade de comer casca frita de batata ou batata frita com casca?
Quem teve a oportunidade sabe que tem um sabor mais “picante” ou amargo e que pode gerar uma
sensação de ardor na boca ou garganta: são os glicoalcaloides que dão essa sensação.
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TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Observação
Ainda que raro de acontecer, mas não impossível, a exposição a teor de 380 mg/kg a 450 mg/kg de
α-solanina na batata pode ser fatal para humanos, e a α-chaconina é teratogênica para hamsters e
camundongos.
Será que submeter a batata a elevadas temperaturas reduz a toxicidade dos glicoalcaloides presentes
nesses tubérculos?
Há situações em que submeter o alimento a elevadas temperaturas pode, inclusive, aumentar o risco
de intoxicação, como veremos adiante.
7.1.3.5 Oxalatos
O ácido oxálico está presente em raízes como a beterraba, sementes e grãos de cereais, castanhas,
leguminosas como o feijão, alface, cenoura, chá e cacau e atua na proteção desses vegetais. A ingesta
de oxalato é praticamente inevitável, uma vez que está naturalmente presente nos alimentos.
Nos alimentos, o ácido oxálico pode formar oxalatos insolúveis, como o oxalato de cálcio, ou
solúveis, como os de sódio e de potássio, dependendo da interação com íons presentes nos alimentos
(GORDIANO et al., 2014).
Observação
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Unidade III
A elevada temperatura elimina os oxalatos solúveis dos alimentos, mas não os insolúveis, que
permanecem no vegetal praticamente íntegros.
A exposição crônica aos oxalatos pode levar a algumas situações importantes do ponto de vista
toxicológico. O pH intestinal parece favorecer a ligação dos oxalatos com o cálcio e, consequentemente,
a absorção do cálcio pode ser comprometida e levar à hipocalcemia, tendo como consequência um
quadro de acentuação da osteoporose, do raquitismo e da hipocalcemia.
A hipocalcemia também pode levar a parestesia de extremidade dos membros, espasmos musculares,
câimbras intensas, náusea, vômito, sudorese, cólicas abdominais, asma, dificuldade de realização de
movimentos pela musculatura esquelética, irritabilidade do SNC, fibrilação e convulsão. Os oxalatos
de cálcio formados podem gerar supressão da urina, hematúria e cálculos renais, caso sejam depositados
na bexiga urinária e ureteres.
A intoxicação aguda ocorre pela exposição de ao menos 1 g de oxalato por dia e é caracterizada por
náusea, vômito, dor, queimação e irritação gástricas.
Algumas pessoas utilizam espécies de Crotalaria para revestir e proteger o solo contra a erosão, mas
suas sementes podem germinar e competir pelo espaço com plantas ou até mesmo durante a colheita,
quando sementes de Crotalaria spp. podem ser coletadas juntamente a outros grãos e a pessoa ou
animal pode se contaminar ao ingerir esses grãos.
Lucena et al. (2010) demonstraram que a exposição crônica a Senecio sp. e a C. retusa, espécies que
contêm alcaloides pirrolizidínicos, é a principal causa da morte de bovinos e equinos nos estados do Rio
Grande do Sul e no semiárido brasileiro, respectivamente.
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TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Saiba mais
Agora que vimos alguns agentes tóxicos naturalmente presentes nos alimentos, vamos avançar na
matéria e entrar em um novo assunto: os contaminantes diretos de alimentos.
No ambiente, o nitrato (NO3-) é formado por meio de uma sequência de reações de oxidação, em
que o amônio (NH4+) é oxidado a nitrito (NO2-) pelas bactérias nitrosomonas e as nitrobactérias oxidam
o NO2- a NO3-, segundo as equações a seguir (MÍDIO; MARTINS, 2000):
2NO2- + O2 ↔ 2NO3-
Em uma perspectiva maior, o organismo humano apresenta dois riscos pela exposição aos NO2- e
NO3-. O primeiro associa-se aos riscos de intoxicação aguda em crianças de até seis meses de idade, e o
segundo está associado à exposição crônica de adultos.
Nesse momento, você já possui elementos para compreender por que as crianças de até seis meses
de vida são vulneráveis a agentes metemoglonizantes, não é?
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Unidade III
A exposição a alimentos que tenham significativo teor de NO2- e NO3- naturalmente presentes no
alimento, adicionados intencionalmente ou até mesmo presentes na água, pode metemoglobinizar
crianças nessa faixa etária.
Observação
Uma situação que pode acontecer, sobretudo na zona rural das cidades, é que, ao chover, fertilizantes
podem ser lixiviados do solo para a água de poço, e o nitrogênio presente nesses fertilizantes pode ser
oxidado, ficando disponível na água. Ao preparar um chá com água de poço ou mesmo servir água à
criança, pode haver exposição a elevados teores de NO2- e NO3- e, consequentemente, a criança pode
ser metemoglobinizada.
Lembrete
Adultos, diferentemente das crianças de zero a seis meses de idade, conseguem produzir quantidade
de diaforase I suficiente para que não sejam metemoglonizados, normalmente.
Um dos maiores cuidados que se deve ter para a metemoglobinização de adultos é na exposição
ocupacional, quando se trabalha com agentes metemoglobinizantes como anilina, dapsona, nitrobenzeno
e trinitrotolueno ou quando o organismo apresenta deficiência hereditária da glicose-6-fosfato
desidrogenase (G6PD).
Vimos até agora que o agente tóxico pode fazer parte do vegetal, ou seja, estar naturalmente
presente. Entretanto, durante o armazenamento de um alimento pode ocorrer uma contaminação
fúngica, e, caso esse fungo produza uma toxina como produto de metabolismo secundário, o fungo e a
toxina são considerados contaminantes diretos dos alimentos. O aditivos intencionais, metais, compostos
N-nitrosos e micotoxinas também podem ser classificados dessa forma.
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TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Lembrete
Vimos os aspectos toxicológicos da exposição aguda aos nitritos e nitratos na parte da matéria que
envolvia os agentes tóxicos naturalmente presentes nos alimentos. Agora, iremos trabalhar as mesmas
substâncias químicas, mas com abordagem na exposição crônica para adultos, principalmente porque
são substâncias químicas adicionadas nos alimentos intencionalmente. Entretanto, o raciocínio geral
sobre o mecanismo de ação para os NO2- e NO3- na exposição aguda ou crônica independe se estão
presentes naturalmente nos alimentos ou se foram adicionados intencionalmente.
Vamos agora ver quais são os danos que o NO3- e o NO2, naturalmente presentes ou adicionados
intencionalmente nos alimentos, podem causar no organismo humano, na exposição crônica.
Adultos se expõem cronicamente aos sais de NO2- e NO3- presentes na água e em alimentos naturais
ou processados: é impossível não nos expormos cronicamente a eles.
Observação
Meios de baixo pH ou elevadas temperaturas podem oxidar esses sais a anidrido nitroso (N2O3),
considerado um agente nitrosante. Mas em quais momentos pode ocorrer essa oxidação? Vamos ver
uma dessas situações agora.
Observe: quando uma pessoa come um cachorro-quente, por exemplo, pode acontecer de um resíduo
da salsicha ficar retido no espaço interdental e, eventualmente, essa pessoa não conseguir realizar a
higienização oral imediatamente após a refeição. Você normalmente come um cachorro-quente sem
beber nada ou tomando algo, como um suco ou refrigerante?
A indústria de alimentos utiliza amplamente NO3- e NO2- com os objetivos de conservar os alimentos
e realçar suas propriedades organolépticas. A conservação dos alimentos está fundamentada na adição
intencional de sais de potássio (K+) e de Na+ para prevenir a proliferação de microrganismos, sobretudo
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Unidade III
Quer pelo refrigerante ou pelo suco, o pH do meio (boca) será reduzido, e os sais de nitrogênio
presentes no alimento que eventualmente ficarem retidos entre os dentes, próximo à gengiva, poderão
dar origem ao anidrido nitroso ou trióxido de dinitrogênio (N2O3). Essa substância é capaz de interagir
com proteínas ou aminoácidos presentes na carne da salsicha, linguiça ou outros alimentos processados,
amidas e aminas secundárias ou terciárias presentes em peixes e formar um grupo de substâncias
químicas denominado de compostos N-nitrosos (MÍDIO; MARTINS, 2000).
Os compostos N-nitrosos são um conjunto de diferentes substâncias químicas, das mais simples às
mais complexas, e têm as nitrosaminas e nitrosamidas como exemplos. As nitrosaminas são mais estáveis
em relação às nitrosamidas, cuja meia vida em pH 7,0 é de minutos. Como o pH do suco gástrico é baixo,
o estômago é um órgão em que as reações químicas que levam à formação do N2O3 são intensas, e os
compostos N-nitrosos nele formados estão associados ao câncer nesse órgão.
O relativo baixo pH natural da urina faz com que também haja a formação de compostos N-nitrosos
nesse órgão, tornando a bexiga urinária mais um dos órgãos-alvo dessas substâncias.
Você se lembra de que falaríamos ainda mais sobre a influência da temperatura no alimento? Vamos lá!
Observação
A biotransformação dos compostos N-nitrosos ocorre pela oxidase de função mista, isoenzima
CYP2E1, por α-hidroxilação, que ocorre principalmente (mas não apenas) no fígado. Após a
biotransformação, há a formação da hidroximetilmetilnitrosamina, biotransformada em hidróxido
de metildiazônio, que produz o íon carbônio (CH3+). Esse íon formado possui elevada afinidade com
macromoléculas nucleofílicas, atua como agente alquilante do DNA e, consequentemente, induz à
carcinogenicidade (MÍDIO; MARTINS, 2000).
Devido à exposição pelo trato digestório, os compostos N-nitrosos podem levar ao câncer de
bexiga, boca, estômago e fígado. O fígado é bastante afetado por conta do metabolismo: as reações
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TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
de biotransformação ocorrem intensamente nesse órgão, com consequente formação de CH3+, que atua
como agente carcinogênico hepático.
A bexiga e o estômago são órgãos afetados porque possuem meio com baixo pH e,
consequentemente, há formação do N2O3. O câncer de boca pode ocorrer pela precária higienização
oral: na presença do resíduo de alimento contendo sais de NO2- ou de NO3-, forma o N2O3, que
induz a formação dos compostos N-nitrosos nesse local e aumenta o risco de carcinogenicidade
da cavidade oral.
Observação
A liberação de óxidos de nitrogênio (NOx) na atmosfera pode ocorrer por fontes móveis ou
estacionárias, como vimos anteriormente. Essas substâncias são oxidadas na atmosfera a N2O3, e as
pessoas e os animais inalam o ar contendo esse agente nitrosante, que poderá interagir com proteínas
ou aminoácidos presentes nos pulmões e formar compostos N-nitrosos.
Está mais clara a relação poluição atmosférica versus câncer pulmonar? Estamos falando apenas
de NOx, sem levar em consideração substâncias químicas carcinogênicas propriamente ditas, como o
benzo[a]pireno.
7.1.4.2 Botulismo
Você já ouviu falar que, quando uma criança está gripada, a melhor coisa a ser feita é dar mel a ela?
Pois bem! Vamos substanciá-lo de informações, e em breve você conseguirá concluir se essa é uma
recomendação plausível ou se deve ser revista.
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Unidade III
Clostridium botulinum é uma bactéria Gram-positiva formadora de esporos que produzem, por via
anaeróbica, um dos mais potentes xenobióticos: a toxina botulínica (CHERINGTON, 2004).
Muito nos impressionam os contrastes entre toxina botulínica e seu organismo produtor. Se por um
lado a toxina é termolábil, os esporos apresentam relativa resistência ao calor. Temperatura de 85 ºC é
capaz de inativar a toxina, enquanto os esporos toleram temperaturas de até 119 ºC. Quando presente
no solo, essa bactéria se prolifera mais intensamente em meio alcalino e em condição de anaerobiose.
Observação
A exposição a essa toxina leva ao botulismo, uma doença paralisante. O organismo pode se intoxicar
ao ingerir a toxina em alimentos contaminados: é a forma clássica de contaminação, quando o alimento
foi inadequadamente preparado ou conservado.
Os esporos podem se fixar e multiplicar no trato digestório, sobretudo no intestino, onde ocorrerá a
produção da toxina. A alteração da microbiota pela exposição a antibióticos, doença de Crohn e cirurgias
intestinais são condições que favorecem o botulismo intestinal.
Observação
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TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Observação
Você entendeu agora por que lactentes não podem se expor ao mel?
Ainda há o botulismo, em que ferimentos são portas de entrada para a contaminação por C. botulinum.
Há sete diferentes formas de toxina botulínica, que são denominadas por tipos de A a G. As toxinas
botulínicas tipos A, B, E e raramente a F são capazes de causar botulismo em humanos. A doença é
causada em mamíferos, peixes e pássaros pelos tipos C, D e E. A recuperação da intoxicação pela toxina
tipo A é mais lenta em relação à intoxicação pela toxina tipo E, demonstrando que o tempo de remissão
dos efeitos depende do tipo de toxina botulínica à qual o organismo se expôs (CHERRY et al., 2013).
Para que haja a manifestação do efeito tóxico, a toxina botulínica deve ser internalizada na célula.
Para isso, nos terminais pré-sinápticos, ocorre o rompimento da ligação dissulfeto que une as duas
cadeias da toxina botulínica, e a cadeia leve é internalizada na célula por vesículas de endocitose
(CHERINGTON, 2004).
Você se recorda de que, para que haja o potencial de ação, há a necessidade da exocitose da
acetilcolina que está localizada em vesículas de armazenamento? Pois bem: a toxina botulínica cliva
enzimaticamente as proteínas necessárias para a exocitose do neurotransmissor.
Os sinais e sintomas da intoxicação aparecem com mais frequência entre 12 e 36 horas, embora
possa haver uma variação de quatro horas a oito dias após a exposição (CHERRY et al., 2013).
Lembrete
357
Unidade III
Fraqueza, vertigem e acentuda fadiga precedem boca seca, visão turva, dificuldade para falar
e engolir. Também pode ocorrer inchaço abdominal, vômito, diarreia e obstipação, e a redução
da sudorese e a boca seca são consequências do bloqueio da ACh no sistema nervoso autônomo
(CHERINGTON, 2004). Não há perda da consciência, nem febre, mas pode evoluir para fraqueza
no pescoço e braços, e em seguida são afetados os músculos da parte inferior do corpo e as vias
respiratórias, levando a uma insuficiência respiratória (CHERRY et al., 2013).
Se por um lado registram-se poucos casos de intoxicação aguda no Brasil e no mundo; por outro, a
letalidade é alta (5% a 10% dos casos), e o diagnóstico e tratamento devem ser adequados e imediatos,
com a administração de soro antitoxina botulínica e cuidados respiratórios intensivos.
É importante adicionar substâncias químicas nos alimentos para que se previna sua contaminação?
Podemos adicionar qualquer quantidade do aditivo no alimento?
Agora, vamos dedicar parte de nosso material aos adoçantes de alimentos, denominados de
edulcorantes artificiais, adicionados intencionalmente nos alimentos.
A guerra contra a obesidade, assim como contra o aspartame, é onipresente. Observamos que cada
vez mais as pessoas clamam por alimentos menos calóricos. Ao recebermos café ou chá em uma padaria,
também nos são disponibilizados edulcorantes como o aspartame, a sacarina ou o ciclamato de sódio, e,
preocupados com a saúde, os utilizamos em substituição ao açúcar refinado (NILL, 2000).
É cada vez mais comum o uso de edulcorantes artificiais nas dietas para os que apresentam sobrepeso
ou obesidade. Entretanto, existe um aspecto paradoxal nesse contexto. Se, por um lado, as pessoas
estão se preocupando mais com sua saúde e aspecto físico, por outro, também há a preocupação
sobre a segurança dos edulcorantes e há, inclusive, os que criticam a Administração de Alimentos e
Medicamentos estadunidense (Food and Drug Administration – FDA) sob a alegação de que não esteja
atenta a possíveis danos à saúde causados pelos edulcorantes artificiais. Dessa forma, está montado um
cenário no qual há um consumidor que anseia por alimentos de baixa caloria, e na outra ponta há a
presença de uma indústria pujante que conduz o roteiro dos edulcorantes.
Para que você tenha uma dimensão temporal, há mais de cem anos despontaram os polos dessa
batalha entre os que enaltecem a descoberta dos substituintes do açúcar refinado e os que questionam
a segurança desses substituintes. Segundo Nill (2000), a FDA como agente reguladora, aparentemente,
permaneceu de forma relativamente neutra dentro de sua esfera de atuação, a despeito de calorosos
protestos a favor e contra a aprovação dos edulcorantes.
358
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
O início da história dos edulcorantes artificiais aconteceu acidentalmente, em 1879, quando dois
pesquisadores da Universidade Johns Hopkins, na tentativa de sintetizar um medicamento, obtiveram
a sacarina, que é um derivado não nutritivo do alcatrão do carvão, com capacidade adoçante cerca de
300 vezes superior ao do açúcar refinado (NILL, 2000).
Observação
Em 1907, a sacarina já era amplamente utilizada como edulcorante em alimentos enlatados; cinco
anos depois, foi proibida sua utilização como aditivo alimentar. Entretanto, com a escassez de alimentos,
inclusive do açúcar, durante a Primeira Guerra Mundial, a sacarina voltou a ser comercializada sob o
status de um edulcorante “seguro”, quando foi consumida até a década de 1950.
Observação
Os edulcorantes, ao longo do tempo, trouxeram mais preocupação com a segurança de seu uso do
que benefícios para a dieta da população, ainda que se deva considerar que, sob condições de algumas
doenças como diabetes mellitus, deva haver restrição da exposição ao açúcar refinado. Os críticos ao uso
dos edulcorantes artificiais alegam que a indústria de alimentos tenta associar um corpo esguio com a
exposição a adoçantes e que corpos esculturais são cultuados como padrão de beleza.
Na década de 1950, com a comercialização do ciclamato de sódio, produzido a partir de 1937 pelo
laboratório Abbot, a preocupação com os adoçantes tomou fôlego. Em 1951, o ciclamato foi aprovado
pela FDA e, em 1953, foi produzido o primeiro refrigerante diet (NILL, 2000).
O ciclamato, frequentemente utilizado em combinação com a sacarina, foi o adoçante mais popular
dos Estados Unidos em 1963. Para que você tenha dimensão da intensidade de seu uso, na época, foi
utilizado no bacon, creme dental, produtos de panificação, enlatados, batom, cereais, enxaguante bucal,
além das bebidas. Até hoje não se sabe o motivo do fenômeno de vendas/utilização do ciclamato, se
pelo seu potencial adoçante, baixo teor calórico ou pelo preço, pois era comercializado por um décimo
do preço do açúcar refinado.
Observação
Atente-se a como os parâmetros legais são fugazes, ou seja, aparecem, desaparecem e reaparecem
rapidamente. É nesse contexto que alguns pesquisadores expõem que a FDA muda de orientação com
uma incrível fluidez.
Em 1977, houve um caos na indústria de alimentos. Sabe por quê? A FDA obteve a informação de
que pesquisadores canadenses trouxeram à luz a relação direta entre o câncer de bexiga em ratos
de laboratório e a exposição à sacarina.
Opostamente, em Nova York, um estudo realizado no Albany Medical College demonstrou que a
sacarina era inócua quanto ao risco de carcinogenicidade, ou seja, era isenta de riscos para o câncer
em animais. Mas, imaginemos o cenário dos que se expõem cronicamente ao adoçante, como os
diabéticos: como ficaria o “psicológico” dessas pessoas, sabendo que houve um estudo demonstrando a
carcinogenicidade da sacarina em animais, com a exposição crônica ao edulcorante? (NILL, 2000).
A legislação de um país se fundamenta em pesquisas para que seja publicada e aplicada. É a “roda do
conhecimento” girando em benefício da sociedade. Consegue perceber como é tudo muito dinâmico?
Voltando ao histórico dos edulcorantes artificiais, porém com mais um desafio: imaginemos que
você é o(a) presidente da Anvisa. Dentro desse cenário envolvendo a sacarina, após a publicação dos
pesquisadores canadenses sobre o câncer de bexiga causado pelo edulcorante, você liberaria a utilização
da sacarina ou não permitiria sua utilização até que fossem realizados mais estudos que comprovem
sua segurança?
Você teria tomado a medida mais sensata: proibiria a comercialização desse produto. Foi exatamente
isto que a FDA fez: baniu a sacarina. O que entrou em ação nesse momento? O congresso norte‑americano,
que permitiu a venda da sacarina, a despeito do posicionamento da FDA. Mas, nesse momento, a
reputação do edulcorante já não mais podia ser reparada.
360
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Observação
Em 1973, após terem sido feitos testes e ter-se obtido respostas em termos de pesquisa científica
com maior sucesso em relação à sacarina, a empresa Searle solicitou a petição como aditivo alimentar
para o aspartame. Após alguns anos, houve sua aprovação.
Como exposto, os adoçantes artificiais são amplamente utilizados como aditivos alimentares e
substitutos do açúcar refinado na alimentação, com o objetivo de reduzir a ingesta calórica. Efetivamente,
há estudos que demonstram que a exposição a adoçantes artificiais pode auxiliar na perda de peso
corpóreo e também trazer benefícios aos que têm diabetes mellitus (BIAN et al., 2017).
Outros estudos também sugerem que o consumo de adoçante artificial pode levar à intolerância à
glicose e, inclusive, à síndrome metabólica associada ao ganho de peso corporal. Consequentemente,
poderia aumentar o risco de obesidade, ainda que o mecanismo envolvido nesse desequilíbrio do
organismo ainda seja desconhecido.
Atualmente, tem havido muita atenção da comunidade científica sobre o desequilíbrio da microbiota
intestinal, denominado de disbiose, que pode estar associado a doença inflamatória intestinal, diabetes
e obesidade.
Os efeitos específicos produzidos na microbiota intestinal pela exposição a adoçantes artificiais são
pouco conhecidos. Entretanto, Bian et al. (2017) demonstraram que ratos que se expuseram a sucralose
a 1% apresentaram prejuízo no crescimento de enterobactérias e que ensaios realizados com a mesma
espécie sugerem que a exposição a adoçantes artificiais não calóricos como a sacarina leva à redução
da tolerância à glicose e altera a composição das bactérias intestinais.
Você consegue observar quanta informação está agregada apenas à parte de edulcorantes?
Após essa apresentação dos aspectos históricos, legais e toxicológicos envolvendo os edulcorantes
artificiais, convidamos você a conhecer com mais especificidade os principais adoçantes artificiais
utilizados no Brasil.
Acessulfame de potássio
O acessulfame de potássio (veja a figura a seguir) é um dos adoçantes artificiais atuais mais utilizados
na dieta em todo o mundo. Possui poder adoçante cerca de 200 vezes superior à sacarose e longa vida
útil e apresenta poder adoçante sinérgico quando associado a outros edulcorantes (KLUG; LIPINSKI;
NABORS, 2011).
361
Unidade III
O
H3C O
S O
N-K+
Após a exposição oral em cães, ratos e humanos, a absorção do acessulfame de potássio é rápida
e completa, e ele é rapidamente excretado. Em ratos, após a exposição oral, o pico do edulcorante na
circulação sanguínea é de 30 minutos, com meia vida biológica (t½) de 4,8 horas.
Após a absorção, o edulcorante é rapidamente distribuído e excretado, sem que haja evidência de
que seja bioacumulado em algum órgão ou tecido específico. Sabe-se que 97,5% do acessulfame
de potássio marcado com carbono-14 (C-14) administrado em ratos, por via oral, são excretados em
24 horas, pela urina. Em humanos, esse teor foi de 98,4% na mesma unidade de tempo e amostra
biológica (KLUG; LIPINSKI; NABORS, 2011).
Estudos trazem à luz que, além de inibir a fermentação da glicose pelas enterobactérias, o
acessulfame de potássio também é genotóxico (BIAN et al., 2017). Um estudo recente demonstrou
que há diferenças entre a microbiota intestinal de estadunidenses adultos saudáveis que se expõem e
a dos que não se expõem aos adoçantes artificiais, incluindo o aspartame e o acessulfame de potássio.
Em animais, Bian et al. (2017) investigaram os efeitos do acessulfame de potássio em camundongos
CD-1 e concluíram que após a exposição por quatro semanas há alteração da microbiota intestinal
desses animais e ganho de peso corporal em machos, mas não em fêmeas (BIAN et al., 2017).
Observação
362
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Observação
O que poderímos concluir com esses resultados? Primeiramente, como já vimos, há marcante
alteração de efeitos no organismo dos que se expõem ao acessulfame de potássio em relação ao gênero.
Em seguida, entendemos que, ao avaliar os adoçantes, é possível estabelecer uma estreita correlação
entre a exposição a edulcorantes artificiais, a alteração da microbiota intestinal de animais decorrente
dessa exposição e o aparecimento de processo inflamatório crônico do intestino (BIAN et al., 2017).
Observação
A literatura nos mostra que, mesmo que os experimentos sejam realizados com o maior rigor
científico, os resultados podem ser questionados. Não existe uma verdade absoluta sobre os resultados;
por isso, nem sempre a conclusão é facilmente obtida. Continue acompanhando o raciocínio!
O dado anterior sobre fibroadenoma e adenocarcinoma quase nos faz concluir que o acessulfame de
potássio induz o aparecimento de adenocarcinoma em ratas, não é? Mas não!
Sabe por quê? A taxa de controle histórica de adenocarcinomas da glândula mamária é de 5%, e eles
são comuns para a espécie. A incidência dessa doença foi relativamente baixa em comparação aos dados
históricos (KLUG; LIPINSKI; NABORS, 2011).
363
Unidade III
Mesmo quando temos números fidedignos, precisamos de muita cautela para concluirmos um
experimento ou um achado científico. Essa é a visão que precisamos desenvolver ao longo de nossa
trajetória acadêmica para que, no ambiente profissional ou científico, sejamos bastante ponderados
nas colocações e conclusões de resultados. É exatamente este o contexto envolvendo os edulcorantes:
um pesquisador obtém um resultado e outro pesquisador o questiona. É assim que se faz ciência!
Há estudos de casos relatando reação alérgica ao edulcorante, ainda que o acessulfame de potássio
não esteja normalmente associado a esse tipo de reação. Há estudos in vitro que sugerem que a exposição
crônica do edulcorante compromete a estrutura da HDL e apoA-I e, consequentemente, tende a acelerar
o processo de senescência e aterosclerose.
Observação
Tudo é muito dinâmico: o organismo se expõe ao edulcorante, o excreta
e contamina o meio ambiente.
O acessulfame de potássio pode causar danos em peixes, como alteração da frequência cardíaca,
redução das taxas de sobrevivência durante a vida embrionária e de eclosão e descolamento de cauda.
Sugerimos, nesse momento, que façamos juntos uma reflexão. Observe como a literatura nos traz
à luz inúmeras informações, e paulatinamente concluímos que estamos construindo um significativo
repertório de informações e de conhecimento.
Exemplos de aplicação
Para chegar a essa resposta, você se lembrou de que 97,5% do acessulfame de potássio é excretado
inalterado na urina de ratos? E que em humanos, esse edulcorante é 98,4% excretado inalterado, na
urina? Se é excretado praticamente inalterado na urina, significa que não é biotransformado ou há
uma ínfima biotransformação.
Paraa próxima pergunta, vamos nos reportar aos ensaios de avaliação de toxicidade. Nessa parte
da matéria, vimos que as substâncias químicas podem ser persistentes no ambiente e, também, podem
causar danos à flora e à fauna.
364
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Pergunta: dentro desse contexto, o acessulfame de potássio poderia causar danos à flora e à fauna?
Vimos há pouco possíveis danos que o edulcorante pode causar a peixes. Assim, caso rejeitos
humanos (esgoto) não sejam tratados e sejam lançados diretamente em corpos d’água, o que acontece
muito no Brasil, os peixes podem ser afetados por essa substância.
Parece que o universo toxicológico é mais amplo do que poderíamos imaginar, não é verdade?
Aspartame
Em algum momento alguém já lhe falou (ou você já recebeu uma mensagem no seu celular ou e-mail
sobre o assunto) que o aspartame pode cegar? Você acredita que essas informações fazem sentido sob
a óptica toxicológica ou são mais algumas das fake news?
O aspartame é um adoçante artificial (veja a figura a seguir) com poder adoçante 180 a 200 vezes
superior à sacarose e constituído de três componentes: ácido aspártico, fenilalanina e metanol. A população
europeia consome cerca de 2 mil toneladas desse edulcorante por ano.
Fenilalanina
Ácido aspártico O
O OCH3
N
H Metanol
OH NH2 O
Ainda que, em 1988, a EFSA tenha declarado que o aspartame é considerado seguro, por pressão dos
setores públicos foi conduzida uma revisão com mais de 500 relatórios, e no ano de 2002 concluiu-se
que a IDA do aspartame deveria ser de 40 mg/kg/dia, exceto para fenilcetonúricos (PUBCHEM, s.d.).
Lembrete
Observação
Calcular a quantidade de aspartame a que a pessoa pode se expor diariamente é uma tarefa
inglória aos que não têm muito conhecimento na área da saúde, até porque fabricantes de alimentos
utilizam coquetéis adoçantes, tornando ainda mais difícil o cálculo da exposição diária do edulcorante
(LEAN; HANKEY, 2004).
Para que se ultrapasse a IDA do aspartame, faz-se necessária a exposição a dez latas de refrigerante
por dia, em média.
Observação
Nesse momento, entramos em uma seara das mais relevantes envolvendo os edulcorantes. Você já
ouviu falar do teste do pezinho para recém-nascidos? Um dos objetivos desse teste é identificar se a
criança é fenilcetonúrica.
Você poderia dizer o que significa ser fenilcetonúrico e qual é a importância sob a óptica toxicológica?
Vamos, então, compreender ainda melhor o que significa uma pessoa fenilcetonúrica.
Observação
366
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Assim, o teste do pezinho é um exame que identifica essa doença genética, uma vez que, como
exposto, a fenilalanina é neurotóxica para os fenilcetonúricos.
Saiba mais
Vimos bastante informação sobre o aspartame, mas ainda está faltando o metanol. Esse álcool pode,
efetivamente, levar à cegueira. Para que tenha dimensão dos possíveis danos que o metanol possa
causar no organismo humano, trazemos um caso que aconteceu em 2016, quando a jovem Hannah
Powell, de 23 anos, tomou uma vodka falsificada, contendo metanol. Sabe qual foi o resultado? Perdeu
a visão e os rins! É por isso que alguns escrevem que o metanol gerado pela biotransformação do
aspartame cega (WILSON, 2019).
Os que não dominam a toxicologia podem, mesmo que sem esse objetivo, causar pânico na população
ou levar a uma informação falsa. E é exatamente isso que acontece nesse contexto. O metanol pode
levar à cegueira? Sim, com certeza (não apenas à cegueira, como à morte).
Para que contextualizemos a informação, no ano de 1999, para aumentar a lucratividade na venda
do etanol, o metanol foi adquirido e acrescentado na aguardente (etanol), uma vez que ele possui
custo inferior ao etanol e, assim, haveria o aumento da lucratividade na venda da aguardente. Esse fato
ocorreu no estado da Bahia (GONZÁLEZ, 1999). Você sabe qual foi a consequência desse ato? Trinta e
cinco pessoas morreram!
367
Unidade III
Exemplo de aplicação
De posse da informação de que o metanol apresenta elevada toxicidade e pode levar à cegueira
(é verdade) e é formado no organismo após a biotransformação do aspartame (é verdade), reflita:
podemos dizer que o aspartame pode levar à cegueira?
Lembrete
Você entendeu como é importante a colocação adequada das informações para que não se crie
pânico na população ou se divulgue informações inverídicas?
Segundo Walters (2001), a exposição ao aspartame gera radicais livres e há duas consequências
diretas da formação desses compostos instáveis, mas extremamente reativos: aceleram o processo de
envelhecimento do organismo e maximizam a possibilidade do aparecimento de câncer, uma vez que
podem atuar na supressão de genes que nos protegem e maximizar a expressão dos que estimulam o
aparecimento dessa doença. Há estudos que confirmam o aparecimento de leucemias, linfomas e vários
outros tipos de câncer, inclusive os que envolvem o trato urinário, pela exposição ao aspartame, ainda
que em pequena quantidade, segundo o mesmo autor.
Ciclamatos
Os ciclamatos não ocorrem naturalmente e são produzidos a partir da ciclohexilamina, obtida pela
redução da anilina.
O ciclamato de sódio (veja a figura a seguir) é conhecido simplesmente como ciclamato e é o mais
comum dos ciclamatos.
O
NH S O-Na+
368
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
O ciclamato de cálcio (veja a figura a seguir) é mais utilizado em produtos que exijam menor
quantidade de sódio ou até mesmo sejam isentos dessa substância. Os ciclamatos de cálcio e de sódio
são edulcorantes não nutritivos.
NH S O- Ca++
O
2
Em 1992, avaliou-se que a média de exposição ao ciclamato para toda a população espanhola foi de
0,44 mg/kg (PC) por dia e de 2,44 mg/kg (PC) por dia para a população que costumeiramente se expunha
ao ciclamato, como os diabéticos. A IDA do ciclamato foi ultrapassada por apenas 0,16% das pessoas
(IARC, 1999).
Segundo a Anvisa (2012), aproximadamente 37% do ciclamato ao qual o organismo se expõe não
são biotransformados pelo fígado, e cerca de 30% do edulcorante inalterado presente no intestino
podem ser biotransformados a ciclohexilamina pela microbiota.
369
Unidade III
Ainda que a maioria das pessoas converta apenas pequenas quantidades de ciclamato em
ciclohexilamina, existe uma resposta interindividual no perfil de biotransformação que pode trazer
uma grande variação na excreção urinária da ciclohexilamina. Um dos aspectos que se faz necessário
considerar é que a microbiota do trato digestório é uma importante fonte de biotransformação a
ciclohexilamina, derivada do ciclamato, que pode apresentar efeitos adversos à saúde.
Lembrete
Uma situação que convém destacar é que o organismo se expõe aos sais de ciclamato, e uma das
palavras que você mais leu nos últimos parágrafos foi ciclohexilamina, não é? Vamos entender por quê?
Acompanhe o raciocínio a seguir.
Por exemplo: caso fôssemos questionados sobre a toxicidade da ciclohexilamina, estaríamos seguros
em afirmar que essa substância pode causar prejuízo testicular em ratos Wistar. Entretanto, também
precisa ficar bem claro que a dose que causa esse dano no animal é muito superior à IDA em humanos.
Ficou mais claro como se faz a leitura dessas informações científicas? Sempre é importante termos um
parâmetro de avaliação da exposição, e, no caso dos edulcorantes, esse parâmetro é a IDA para humanos.
Você consegue compreender ainda melhor como a mesma substância química, nas mesmas condições
de exposição, pode ter efeitos diferentes, caso haja alteração da espécie exposta?
370
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
A sacarina (veja a figura a seguir), um dos edulcorantes mais amplamente utilizados, é o mais antigo
adoçante artificial não nutritivo e não calórico. Ela possui um poder adoçante cerca de 300 vezes superior
ao da sacarose, além de um sabor residual ligeiramente amargo. É estável ao tempo e ao calor, ou seja,
pode ser utilizada em alimentos que venham a ser aquecidos ou que sejam submetidos a processamento
que envolva temperaturas elevadas, como produtos de panificação e alimentos enlatados (IARC, 1999).
O
NH
S
O
O
Segundo a Iarc (1999), aproximadamente mil, 68 mil e 225 mil trabalhadores estadunidenses
são potencialmente expostos no ambiente de trabalho à sacarina cálcica, sacarina sódica e sacarina,
respectivamente, e essa exposição ocorre durante a produção ou utilização dessas substâncias como
adoçantes nos alimentos, nas bebidas ou nos medicamentos.
Em 1993, foi determinado que a IDA da sacarina e seus sais seriam de 5 mg de sacarina por quilo de
peso corpóreo (mg/kg peso). Anteriormente, a IDA era de 2,5 mg/kg peso (IARC, 1999).
Exemplo de aplicação
Se a IDA para a sacarina era de 2,5 mg/kg (PC) e em 1993 passou a 5 mg/kg (PC), significa que as agências
reguladoras interpretaram que ao longo do tempo os dados epidemiológicos indicaram que a sacarina e
seus sais estavam trazendo mais agravos à saúde ou as informações epidemiológicas indicaram que esse
edulcorante e seus sais apresentavam menos riscos do que se esperava anteriormente? Pare e reflita.
Na prática, é exatamente assim que funciona: se ao longo do tempo não houve o incremento de
casos de câncer de bexiga urinária supostamente associado à exposição à sacarina, significa que a
exposição a ela não está causando esse dano à população de forma significativa. Opostamente, caso se
observe incremento no número de casos de câncer de bexiga urinária, significa que a população precisa
se expor menos intensamente à substância. Se precisa se expor menos, se reduz a IDA. Caso possa haver
mais exposição, aumenta-se a IDA. Assim, observe que alguns parâmetros utilizados na toxicologia
podem mudar, como a IDA, por exemplo, em razão da resposta epidemiológica do momento.
371
Unidade III
Exemplo de aplicação
Para que consolidemos a informação, pegue um lápis e papel e vamos juntos para mais um desafio
matemático-toxicológico.
Dados:
Pergunta:
Para uma pessoa de 60 kg de peso corpóreo, qual é a quantidade de sacarina e aspartame a que ela
pode se expor diariamente, por toda a vida, sem risco de se intoxicar?
Sacarina: se a pessoa pode ingerir 5 mg de sacarina por cada quilo de peso e se a pessoa pesa 60 kg,
ela pode se expor a 300 mg de sacarina por dia.
Aspartame: se a pessoa pode ingerir 40 mg de aspartame por cada quilo de peso e se a pessoa pesa
60 kg, ela pode se expor a 2400 mg (2,4 g) de aspartame por dia.
Agora, mais uma pergunta: a qual dessas duas substâncias a pessoa pode se expor em maior
quantidade, ao longo do dia, com o mesmo risco de intoxicação?
É o aspartame.
Observe: caso a pessoa se expusesse a 2,4 g de sacarina por dia, ela teria ultrapassado a IDA da
sacarina? Sim, e muito: oito vezes mais. E, nesse caso, haveria risco de intoxicação em uma exposição
crônica, diariamente, a quantidades que excedem a IDA? Sim, haveria.
Segundo a Iarc (1999), a sacarina pode causar câncer na bexiga urinária em ratos. Ela é classificada
no grupo 2B para carcinogenicidade.
372
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Saiba mais
Veremos quais danos as toxinas produzidas por fungos, quando presentes nos alimentos, podem
causar ao organismo humano.
7.1.4.4 Micotoxinas
Os fungos são ubíquos, ou seja, estão presentes em todo lugar. A exposição a eles é praticamente
incontrolável. São os principais patógenos para insetos e plantas e possuem menor importância
como agentes de doenças em vertebrados. Para humanos e animais, o maior risco de intoxicação
está associado ao metabolismo secundário do fungo, que pode produzir doenças denominadas
micotoxicoses (OSTRY et al., 2017).
O espectro dos sinais e sintomas da intoxicação causado por micotoxinas depende do tipo da
micotoxina, do tempo de exposição, da quantidade do metabólito secundário e do estado de saúde,
idade e gênero do organismo exposto, assim como o quadro clínico de intoxicação pode ser agravado por
hipovitaminose, doenças infecciosas e exposição excessiva ao etanol, enquanto as micotoxicoses podem
deixar o organismo mais suscetível a doenças microbianas, interagem com outras toxinas sinergicamente
e podem agravar os efeitos da desnutrição em humanos e em animais (OSTRY et al., 2017).
Aflatoxinas
Já aconteceu alguma vez de você estar realizando alguma atividade e de repente se lembrar de que
na sua fruteira havia bananas e que em seu armário da cozinha também tinha aveia em flocos, e você
não via a hora de chegar em casa para comer uma banana amassada com aveia?
Pois bem, após ter a banana amassada, ao pegar a aveia, você observa que a caixa de aveia já está
aberta há algumas semanas e, após o uso de parte dela, o restante foi guardado no armário da cozinha.
373
Unidade III
Nunca aconteceu isso com você? Pois bem: será que essa aveia está adequada para o consumo ou
devemos desprezá-la e deixar de comer essa banana com aveia?
Parece uma situação simples, não é? E é simples mesmo, mas também importante!
Observação
Pela sua percepção, você acha que a exposição a microgramas de uma substância tóxica por dia não
causa dano ao organismo humano?
Existe uma ampla faixa de variação da quantidade de aflatoxinas presentes no alimento. Dependendo
da origem e tipo do alimento, clima, umidade, teor de água do alimento ou condições de transporte e
armazenamento, pode haver quantidade inferior a 0,1 µg.kg-1 ou até centenas de µg.kg-1 de aflatoxina
no alimento. Em termos percentuais, os teores de aflatoxinas encontrados nos alimentos também
são amplos: de todo o amendoim e o milho importados pelo Japão, aproximadamente 4% e 30%,
respectivamente, estão contaminados com essas toxinas.
Populações de baixa renda que moram na região tropical consomem quantidades consideravelmente
elevadas de alimentos contaminados com aflatoxinas, principalmente amendoim e milho. Para que
você tenha maior dimensão dos riscos inerentes à exposição às aflatoxinas, estima-se que anualmente
morrem por câncer de fígado, por conta da exposição à aflatoxina, cerca de 26 mil africanos que vivem
ao sul do Saara.
Até programas sociais importantes são afetados por essa toxina: a contaminação de alimentos
limitou drasticamente a amplitude do Programa Mundial de Alimentos, uma vez que esse programa
utiliza considerável quantidade de milho (UNNEVEHR; GRACE, 2013).
As aflatoxinas M1 e M2 foram isoladas pela primeira vez do leite de animais lactantes que
se expunham a alimentos contaminados com aflatoxinas. Daí a designação M, milk, do inglês
(BBOSA et al., 2013).
374
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Lembrete
Aspergillus flavus e Aspergillus parasiticus são espécies de fungos responsáveis pela produção da
maior parte das aflatoxinas encontradas em alimentos no mundo, mas espécies A. ochraceoroseus,
A. nomius, A. australis, A. pseudotamarii e A. Bombycis, entre outras, também podem produzi-las
(OSTRY et al., 2017).
Os teores de A. flavus (veja a figura a seguir) em alimentos presentes em climas temperados, como nos
Estados Unidos e Europa, são normalmente baixos e incomuns, excetuando-se quando há a importação
de alimentos de países tropicais.
Países de clima temperado têm menos probabilidade de contaminação dos alimentos por
aflatoxinas em comparação aos de clima tropical, por serem localizados próximos da linha do Equador
e possuírem clima mais quente e úmido. Essas características são fundamentais para a proliferação
exacerbada dos fungos.
Você consegue concluir qual é a única variável que falta para que o fungo se desenvolva
intensamente?
375
Unidade III
Para que haja a proliferação intensa dos fungos com consequente produção de toxinas, faz-se
necessária a presença de umidade, calor e substrato (alimento). Agora fechou o ciclo: há todas
as “demandas” necessárias para a proliferação dos fungos, com consequente aumento da
produção de toxinas.
Ficou mais claro agora por que países de clima temperado têm menos casos de contaminação pelas
aflatoxinas? Porque esses países são frios em grande parte do ano, o que minimiza a possibilidade de
proliferação fúngica.
O milho e o amendoim são os mais importantes alimentos que contêm amido como substrato e
que, consequentemente, podem conter os fungos produtores das aflatoxinas. Porém, outros alimentos
também podem estar contaminados por fungos, como nozes, aveia, cevada, trigo, soja, arroz, malte,
sementes de algodão, sorgo, girassol, pimenta, pimenta preta, açafrão, coentro, amêndoas, nozes,
pistache, coco, leite e produtos lácteos (OSTRY et al., 2017; BBOSA et al., 2013).
Pode haver aflatoxina no leite, mas no leite não há amido. Não está havendo incongruência de
informações?
Guarde bem essa observação. Em breve, conseguirá vislumbrar o desfecho dessa dúvida.
As aflatoxinas são compostos presentes na forma de cristais que variam de incolor a amarelo claro.
As letras que dão origem à nomenclatura das aflatoxinas advêm da cor que fluoresce quando a luz
ultravioleta incide sobre elas. A letra B advém da primeira letra da palavra blue, do inglês, e a letra G advém
da palavra green, que começa com a letra G. A letra M não está associada exatamente à fluorescência,
mas ao alimento em que são encontradas, que é o leite (milk, em inglês) (OSTRY et al., 2017).
H O H O H O O
O O O
O OCH3 O OCH3 O OCH3
H H H
Aflatoxina G2 (D) Aflatoxina M1 (E)
O O O O
H O O OH O
O O
O OCH3 O OCH3
H H
376
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Mas a nomenclatura das aflatoxinas não para por aí. Ao serem submetidas a um processo de
separação por cromatografia em camada delgada (CCD), as frações das aflatoxinas se separam, dando
origem aos números 1 e 2. Assim, dependendo da taxa de fluxo (RF) na separação das aflatoxinas por
um processo de migração diferencial, as bandas diferentes formadas apresentam a representação 1 e 2;
daí as nomenclaturas AFB1, AFB2, AFG1 e AFG2.
Derivados da A. flavus
difurocumarociclopentenona Aflatoxina B2 (AFB2) A. minisclerotigenes
A. nomius
A. parasiticus
Aflatoxina B2a (AFB2a) A. flavus
A. flavus
377
Unidade III
O aflatoxina 8,9-epóxido formado pela reação de fase I de biotransformação catalisada por enzimas
microssomais se liga à albumina do soro e ao DNA de células, sobretudo as hepáticas, e pode levar à
aflatoxicose, ou seja, causa dano no organismo.
Você se recorda de que, ainda que não haja amido no leite, poderia haver aflatoxina nesse alimento?
Vamos entender agora por que isso acontece.
378
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Observe a explicação: se parte da AFB1 dá origem a uma grande quantidade de endo-epóxido e outra
parte dá origem à AFM1, significa que um dos produtos de biotransformação da AFB1, que é exatamente
a AFM1, é consequentemente excretado pelo leite materno. Ficou mais clara a informação para você?
Acreditamos que ao longo da leitura deste material você esteja conseguindo compreender cada vez
mais as informações. No início, demos bastante ênfase a alguns conceitos aparentemente básicos, mas
que na verdade são da mais alta relevância.
Acompanhamos, por exemplo, que pessoas diferentes podem ter reações diferentes e que a raça
é um importante ponto a ser considerado quando se versa sobre as reações de diferentes organismos
quando interagem às mesmas substâncias químicas, nas mesmas condições de exposição.
Lembrete
Vamos agora ver mais uma aplicação no âmbito prático das informações teóricas.
Estudos recentes sobre polimorfismo demonstram que a maioria dos africanos não expressam
a isoenzima CYP3A5. Também se sabe que as aflatoxinas são capazes de atravessar a placenta e,
consequentemente, pode haver uma contaminação vertical, com prejuízo para o feto ou embrião,
e a isoenzima CYP3A7 é fundamental na metabolização da AFB1 a compostos 8,9-epóxidos, estando
presente no fígado fetal humano (BBOSA et al., 2013).
Vamos a mais uma reflexão, para que possamos compreender melhor como os elementos teóricos
nos dão sustentação para a aplicação das informações na prática.
Exemplo de aplicação
Segundo exposto anteriormente, se a isoenzima CYP3A7 é expressa no fígado fetal humano, há risco
de intoxicação ao embrião ou feto caso a gestante se exponha a aflatoxinas?
Reflita e responda a esse desafio. Se necessário, reporte às informações anteriores, para você se
assegurar da resposta.
Se as aflatoxinas são capazes de atravessar a placenta, significa que são capazes de chegar ao
embrião ou feto. Se o fígado do feto humano é capaz de produzir a isoenzima CYP3A7, ocorre a
379
Unidade III
Destaca-se nesse contexto que a taxa de bioativação exposta anteriormente varia muito por conta
de diferenças entre adultos e crianças.
Lembrete
Pode haver marcantes diferenças entre humanos e animais em relação à proporção da aflatoxina
biotransformada e, consequentemente, na sua toxicidade (OSTRY et al., 2017).
Observação
Após a exposição a esse repertório de informações, possivelmente você está pensando: é por
isso que submeto os alimentos à fervura, principalmente o leite. Não foi isso que você pensou?
Permita-nos acrescentar mais algumas informações e poderemos concluir se ferver o leite elimina a
AFM desse alimento.
Essa informação responde à sua pergunta sobre a influência da fervura do leite na eliminação da
AFM? A temperatura de fervura ou cozimento do alimento não é capaz de destruir a aflatoxina M. Caso
submetamos o leite a temperatura superior a 300 ºC, degradaremos o alimento (NATIONAL TOXICOLOGY
PROGRAM, 2016).
A toxicodinâmica das aflatoxinas já foi vista neste material, mas sempre é bom retomarmos
a informação.
Como você está lembrado, a toxicodinâmica das aflatoxinas é condicionada à sua biotransformação,
ou seja, após ser biotransformada pelo citocromo P-450, as aflatoxinas formam compostos
8,9-epóxidos altamente reativos e que apresentam muita afinidade com macromoléculas nucleofílicas;
consequentemente, formam adutos de DNA e induzem a erros de codificação na replicação do DNA e
ao desenvolvimento de mutações que tendem ao processo tumoral (OSTRY et al., 2017).
380
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
O termo aflatoxicose é utilizado para designar uma exposição aguda a aflatoxinas, ou seja, quando
o organismo se expõe a “grande” quantidade dessa micotoxina, em curto período. Desde a década de
1960 se identificam os sinais e sintomas da aflatoxicose, normalmente associados a letargia, náusea e
icterícia. Geralmente, leva ao dano hepático e pode ser fatal. Durante o verão de 2016, houve mortes de
humanos por aflatoxicose, na República da Tanzânia (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2018).
Com base nas análises realizadas nos surtos mais importantes, estima-se que, quando há a exposição
por um período que varia de uma a três semanas, uma dose de 20 µg.kg-1 (PC)/dia a 120 µg.kg-1 (PC)/dia
de AFB1 é suficiente para causar a aflatoxicose e é potencialmente fatal.
Observação
Por isso, anteriormente expressamos com aspas quando falamos em “grande” quantidade dessa toxina.
Releia esse parágrafo com um olhar crítico e verificará que a “grande” quantidade dessa toxina não é tão
grande assim.
381
Unidade III
Alguns animais são muito sensíveis à exposição aguda de AFB1, como o rato, o cão e os ovinos, e
outras espécies são mais resistentes, como as galinhas e os macacos (BBOSA et al., 2013).
As aflatoxinas são substâncias químicas que compõem o grupo 1 da Iarc (OSTRY et al., 2017).
Há diferentes métodos disponíveis para identificação das aflatoxinas nos alimentos. Dependendo
da demanda, podem ser utilizados desde a cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC) acoplada à
espectrometria de massa (MS), usadas em laboratórios oficiais, até os kits de teste rápido, utilizados em
fábricas e silos de grãos.
Exemplo de aplicação
Você se lembra daquela caixa de aveia que você abriu há algumas semanas e que ainda sobrou um
pouco no armário da sua cozinha? Ante o exposto, qual é a sua percepção de risco para se expor à
banana amassada com essa aveia? Você está seguro dessa exposição?
Dados:
• Caso tenha havido a contaminação, os fungos ficaram por várias semanas em meio quente, úmido
e rico em substratos e podem ter produzido aflatoxinas, como produto do metabolismo secundário.
• O limite de tolerância das aflatoxinas é de “poucos µg/kg”. Isso significa que, caso haja mais
que 20 partes de toxina para um bilhão de partes do alimento, considera-se que o alimento
esteja contaminado.
382
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Então, qual é a sua percepção de risco? Você vai utilizar a caixa de aveia que abriu há semanas ou
vai providenciar outra para preparar sua banana amassada com aveia?
Citrinina
Espécies de Penicillium e Aspergillus podem produzir a citrinina como produto de seus respectivos
metabolismos secundários. A citrinina pode ser encontrada em grãos armazenados, como no arroz
fermentado com Monascus spp., em fermento vermelho utilizado em alimentos e na conservação
de carnes (ALI; DEGEN, 2019), e está associada à doença do arroz, no Japão, e como contribuinte na
nefropatia porcina (BENNETT; KLICH, 2014).
A citrinina tem sido encontrada juntamente com a ocratoxina-A (OTA-A) nos alimentos e rações,
com emergente preocupação com a qualidade do alimento para humanos e animais (ALI; DEGEN, 2019).
A citrinina (veja a figura a seguir) possui similaridade estrutural e de propriedades tóxicas com
a OTA-A, com organotropismo para os rins, ainda que a nefrotoxicidade seja menos intensa quando
comparada com o mesmo dano causado pela OTA.
O OH
HO O
Estudos experimentais em suínos e ratos demonstram que a citrinina exerce efeitos tóxicos sobre
os rins, fígado e coração (CHEN et al., 2019), sendo que, em doses repetidas, o principal órgão afetado
é o rim (ALI; DEGEN, 2019).
Lembrete
A DL50 da citrinina para coelhos (VO, macho) é de 134 mg.kg-1 (PC), mas respectivamente de
50 mg.kg-1 (PC) e 19 mg.kg-1 (PC) quando a exposição ocorre pelas vias intraperitoneal e intravenosa
para a mesma espécie e sexo. Diferentes suscetibilidades também foram observadas quando espécies
diferentes se expuseram à citrinina (ALI; DEGEN, 2019).
383
Unidade III
A intoxicação aguda pela citrinina é incomum e ocorre apenas quando há rações ou alimentos
altamente contaminados.
O limite permitido de citrinina no corante vermelho e produtos fermentados no Japão é de 200 g/kg,
e de 100 g/kg e 80 g/kg na União Europeia e China, respectivamente (CHEN et al., 2019).
Esterigmatocistina
O OH
O O OCH3
Ocratoxina A (OTA)
A OTA (veja a figura a seguir) pode estar presente na uva, em seus sucos e frutos secos, mas está
presente sobretudo no vinho tinto (é formada antes da fermentação alcoólica), café processado e
não processado, cacau e cereais. Contamina o alimento no campo, mas também há a possibilidade de ter
seus teores aumentados na pós-colheita, antes ou após tratamentos tecnológicos do alimento.
384
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
OH
O C O OH O
H
N O
H
H
CH3
CI
Foi isolada inicialmente em cepas de Aspergillus ochraceus, mas é produzida principalmente por
Aspergillus. Penicillium ssp. e Aspergillus carbonarius também produzem a toxina como produto de seu
metabolismo secundário, mas esse último é capaz de produzir 100 mg da toxina por quilo de peso do
alimento (BATTILANI; BARBANO; LOGRIECO, 2008).
A latitude está diretamente ligada à produção de OTA: quanto maior a latitude, menores são a
ocorrência e concentração de OTA no alimento. Na Itália, em 56 análises realizadas com vinhos vermelho,
rosé, branco e de sobremesa, foram encontradas elevadas concentrações de OTA, variando de 10 a
7600 ng/L, nas quais o vinho vermelho apresentou maiores teores em comparação com o rosé e o
branco (BATTILANI; BARBANO; LOGRIECO, 2008).
Observação
Observação
385
Unidade III
Em 47 amostras de vinho de Jeres, 74% estavam contaminadas com OTA, na ordem de grandeza
de 40 ng/L, e, de 16 amostras de vinho de sobremesa, a OTA foi detectada em 94% da amostragem,
em concentração média de 1000 ng/L. De 30 amostras de vinho marroquino, todas estavam com
concentrações de até 3200 ng/L (BATTILANI; BARBANO; LOGRIECO, 2008).
Observação
Nesse caso, 3200 ng/L podem ser lidos como 3,2 µg/kg.
Observação
A OTA é apenas parcialmente degradada em condições normais de cozimento e pode resistir até
três horas, a 121 ºC, à esterilização a vapor em alta pressão, e até mesmo temperaturas de 250 ºC são
incapazes de destruí-la completamente (EL KHOURY; ATOUI, 2010).
Ela apresenta organotropismo renal, que afeta a síntese de macromoléculas e leva a danos dos
túbulos renais proximais, por prejuízo do metabolismo de carboidratos presentes nos rins. É considerada
a mais potente micotoxina para aves e responsável por uma doença endêmica nos rins da população dos
Balcãs, que deu origem ao que se chama de nefropatia endêmica dos Balcãs (ROSMANINHO; OLIVEIRA;
BITTENCOURT, 2001), doença que afeta humanos da região sudeste da Europa, como Bósnia, Bulgária,
Croácia e Romênia, e que é considerada a maior causa de nefropatia na Tunísia (EL KHOURY; ATOUI, 2010).
A exposição vertical à OTA pode levar a malformações no SNC. Trata-se de um potente agente
teratogênico para animais de laboratório, que atravessa a barreira placentária, e a natureza e extensão
das lesões dependem da via de administração e do período gestacional (EL KHOURY; ATOUI, 2010).
386
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Patulina
A patulina (veja a figura a seguir) é uma das cerca de 300 micotoxinas produzidas por fungos, ainda
que apenas pequena parte delas desempenhe papel como contaminante alimentar. Essa micotoxina é
produzida por Aspergillus, Byssochlamys e, principalmente, por Penicillium expansum e é, provavelmente,
a toxina com maior prevalência em maçãs, peras e damascos. É considerada um problema pós-colheita
(BATTILANI; BARBANO; LOGRIECO, 2008).
O
O
O OH
Ao longo deste livro-texto você leu várias vezes a expressão dependendo das condições de
exposição. Sim, dependendo das condições de exposição, todo o cenário toxicológico é alterado.
Para contextualizar essa informação, trazemos um levantamento realizado por Battilani, Barbano
e Logrieco (2008), que demonstrou que, em condições laboratoriais, diferentes espécies de fungos
podem contaminar grãos, maçãs e sucos de uva. Entretanto, em condições naturais, a patulina é
essencialmente conhecida como um metabólito produzido por P. expansum na maçã ou no suco
desse fruto.
Observação
387
Unidade III
Observação
Exemplo de aplicação
Identifique, nas informações anteriores, quais amostras ultrapassaram os limites. Preste atenção nas
unidades utilizadas.
Outra situação que convém citar é que muitas vezes os sucos de maçãs apresentaram concentrações
de patulina inferiores às encontradas no próprio fruto de mesma origem.
Dentro desse contexto, poderíamos perguntar: por que os teores de patulina no suco de maçã
apresentam concentração de micotoxina inferior ao presente no próprio fruto? Seria o processo de
conservação do suco, de preparo ou os conservantes utilizados?
Uma das respostas plausíveis para essa questão está relacionada ao controle de qualidade das maçãs
utilizadas no suco, ou seja, aquelas que aparentemente estão fisicamente inadequadas para o suco são
desprezadas. Possivelmente, quando se identificam sinais de putrefação, os frutos são descartados e,
consequentemente, não utilizados na produção de suco.
O estudo da toxicologia é importante para a magnificação de seu conhecimento, pois oferece uma
base teórica e prática ainda maior e condiciona um empoderamento em sua atividade profissional.
388
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Você já reparou que algumas vezes, quando vamos comer uma pera ou maçã, o fruto está com parte
da casca com um certo “afundamento” e “amarronzada”? Quando nos deparamos com situações dessa
natureza (e parece que não é uma situação tão incomum), possivelmente o fruto foi submetido a algum
tipo de estresse físico, se desvitalizou parcialmente e perdeu parte da integridade da casca.
Quando o fruto perde essa proteção natural, que é a casca, o parênquima do fruto fica exposto à
ação dos fungos presentes na casca. Quando o fungo tem acesso à polpa do fruto, encontra ainda mais
substratos para seu desenvolvimento e se prolifera mais intensamente; consequentemente, os produtos
do metabolismo secundário aumentam. Estudos demonstram que a patulina foi encontrada na polpa do
fruto, dois centímetros abaixo da casca da maçã.
Nessa condição, o fruto ainda pode ser consumido. Entretanto, deve-se retirar a parte danificada da
maçã com margem mínima de 2 cm, ou seja, 4 cm da polpa do fruto serão “perdidos”. Caso a maçã seja
muito pequena e apresente partes com “afundamento” ou perda da integridade de sua casca, sugere-se
que o fruto seja desprezado.
389
Unidade III
No caso, a patulina é capaz de inativar enzimas por ligações covalentes com grupamentos sulfidrílicos
ou tiois (-SH), e essa ligação com moléculas endógenas é responsável pela toxicidade envolvida em
grande parte dos danos que veremos a partir de agora (BATTILANI; BARBANO; LOGRIECO, 2008).
A patulina impede o afluxo de aminoácidos nas membranas celulares e, por consequência, inibe o
crescimento de culturas de tecido hepático, é inibidora enzimática (sim, já presumíamos isso: não inibe
grupamentos sulfidrílicos proteicos covalentemente?) e inativa polimerases do RNA e DNA, onde atua
diretamente, inibindo a tradução e transcrição.
Também é capaz de romper a membrana celular e inibir a síntese de DNA, é imunossupressora para
camundongos e coelhos, teratogênica para embriões de galinha, mutagênica em células mamárias de
ratas, hepatotóxica e nefrotóxica, prejudica a quantidade e morfologia do esperma e induz a alterações
histopatológicas no epidídimo e na próstata.
Além disso, é genotóxica para pulmões de hamster chinês. Em cultura de células de rins, leva dano
ao DNA, uma vez que inibe a ação da glutationa (observe que a inibição da glutationa possivelmente
está acontecendo pela inibição de grupamentos sulfidrílicos). Também pode levar a náusea e vômito,
caracterizando desconforto gastrintestinal, geração de processo inflamatório e de ulceração de
estômago e intestino por inativação das fosfatases (observe novamente que as ligações covalentes
da micotoxina com grupamentos sulfidrílicos agem sobre as enzimas e macromoléculas nucleofílicas,
causando importantes danos no organismo).
Você consegue concluir com facilidade que, mesmo quando inquestionáveis agências internacionais
afirmam que uma certa substância química não é carcinogênica, não nos deve faltar prudência na
exposição a ela, não é mesmo?
Zearalenona
Quimicamente (veja a figura a seguir), a zearalenona é uma lactona do ácido fenólico resorcíclico,
conhecida pelas suas propriedades fitoestrogênicas.
HO O CH3
HO O
390
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
O que se destaca nessa toxina é que ela apresenta uma potente atividade estrogênica em animais,
como porcos, ovelhas e gado. Alguns produtos do metabolismo da zearalenona, como a-zearalenol e
b-zearalenol, também apresentam essas propriedades.
Seu potencial genotóxico não foi definitivamente estabelecido, mas apresenta potencial
significativamente tóxico para o sistema reprodutivo de animais e tem ação osteógena. Estudos atuais
sugerem que a zearalenona seja uma toxina responsável pela redução da produção de leite e induza
a infertilidade em bovinos, edema e prolapso vulvar (veja a figura a seguir), hipertrofia mamária em
mulheres e aumento das glândulas mamárias, atrofia testicular e feminização de homens em função de
sua atividade hiperestrogênica.
Figura 158 – Prolapso de vulva em leitoa recém-nascida causado pela presença de zearalenona na ração
Em Porto Rico, foi encontrada zearalenona no sangue de crianças que apresentavam desenvolvimento
sexual precoce e haviam sido expostas a alimentos contaminados (DALAGNOL, 2008).
Exemplo de aplicação
Observe a estrutura química da zearalenona que acabamos de apresentar e responda: essa toxina
possui estrutura esteroidal?
Essa é uma informação que nos chama muito a atenção. A zearalenona não é a única substância
química não esteroidal que apresenta atividade estrogênica (SHIER et al., 2001). Você sabe por
quê? Porque os receptores estrogênicos respondem a uma significativa gama de substâncias
químicas em praticamente todas as espécies de mamíferos. Assim, lignanas e isoflavonas como
a genisteína da soja e poluentes antropogênicos como as bifenilas policloradas, bisfenol-A e
2,3,7,8-tetraclorodibenzo-p-dioxina são xenobióticos que não apresentam estruturas esteroidais,
mas que exercem efeito estrogênico.
Tricotecenos
Muitas espécies de fungos toxigênicos são capazes de produzir os tricotecenos, como Fusarium
graminearum, Fusarium sporotrichioides e Fusarium poae. Stachybotrys chartarum, Myrothecium roridum e
S. chartarum são capazes de produzir tricotecenos macrocíclicos (SUDAKIN, 2003).
Os tricotecenos têm ocorrência natural na América do Norte, América do Sul, África, Ásia e Europa.
A produção dessas toxinas é mais alta quando as temperaturas variam de 6 ºC a 24 ºC. Trigo, cevada,
aveia, milho, centeio e arroz são os substratos mais comuns para essas espécies de fungos (ZAIN, 2011).
Agora, observe a resistência dessas toxinas: são compostos não voláteis, resistentes à degradação
ambiental, incluindo fatores como luz e temperatura, e apenas condições quase que extremas de pH
são capazes de decompô-las (SUDAKIN, 2003).
Aparentemente, essas toxinas são capazes de induzir a uma inibição primária da síntese proteica de
eucariontes e também dividem ativamente células que revestem a pele, o trato digestório e os tecidos
linfoides e eritroides (ZAIN, 2011).
A inibição proteica ocorre porque os tricotecenos são capazes de interagir com a enzima
peptidiltransferase pela ligação com a subunidade ribossômica 60S, e essa interação é capaz de induzir
a uma ampla faixa de intensidade de inibição da ligação peptídica.
Você se recorda de que vimos que os tricotecenos apresentam um grupamento epóxido C12-C13
comum? É esse grupo epóxido um dos maiores responsáveis pela síntese proteica (SUDAKIN, 2003).
392
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Na década de 1930, na antiga União Soviética, foi identificada uma epidemia denominada de
aleucia tóxica alimentar (ATA). Ela ocorreu em condições críticas de disponibilidade de alimento, em
que a população foi praticamente forçada a consumir qualquer tipo de grão para sua sobrevivência,
mas não sabia que esses grãos a que estava se expondo estavam contaminados por espécies de
F. poae e F. Sporotrichioides, produtores de elevadas quantidades de toxina tricoteceno T-2. Suas
amostras chegaram a apresentar 4,1 g de toxina.kg-1 de painço (ZAIN, 2011).
A primeira etapa da intoxicação é caracterizada por sintomas gastrintestinais graves, com duração
de três a nove dias. Em um segundo momento, o organismo apresenta um quadro de melhora de
seus sintomas, mas desenvolve concomitantemente trombocitopenia, leucopenia e anemia, por várias
semanas. Caso persista a exposição, o trato digestório e as vias aéreas apresentam quadro de lesão
necrótica, hemorragia e infecções. Caso seja cessada a exposição, ocorre a remissão das anormalidades
sanguíneas e das lesões necróticas.
7.1.5.1 Praguicidas
Além do desenvolvimento de técnicas agrícolas, também houve a evolução histórica dos praguicidas
utilizados para a proteção dos alimentos com o objetivo de repelir, mitigar ou eliminar as pragas
que poderiam destruir os alimentos, sobretudo com o crescimento populacional, e comprometer seu
abastecimento.
Você consegue perceber que se resolve um problema, mas cria-se outro? Além das intoxicações
diretas pelas exposições ocupacionais aos praguicidas, há outra situação: a presença dessas substâncias
como resíduo nos alimentos. Dessa forma, existe um importante problema de segurança alimentar nesse
contexto. Estima-se que 35% dos casos de câncer de cidadãos estadunidenses tenham como origem a
presença de praguicidas nos alimentos (BRASIL, 2013).
Com o objetivo de aumentar o teor nutricional, produzir organismos com maior resistência a pragas (e,
consequemente, reduzir a quantidade de praguicidas utilizados na agricultura) e viabilizar economicamente
a produção agrícola, a biologia molecular passou a ser utilizada. Atualmente, permite-se, por meio da
engenharia genética ou tecnologia do DNA recombinante, a obtenção de um organismo transgênico,
também chamado de organismo geneticamente modificado (OGM) (COSTA et al., 2011).
No início da década de 1980, foram desenvolvidas as plantas transgênicas, como o tabaco; cerca
de dez anos depois, 56 plantas transgênicas estavam sendo testadas em campo, como milho, algodão,
canola, mamão, tomate e soja. Para que você tenha dimensão, no ano de 2005, 21 países e 8,5 milhões
de agricultorres já cultivavam plantações transgênicas.
Mas a pergunta que se faz é: quem garante que esse vegetal que teve alteração genética não pode
causar danos a animais ou humanos? Será que OGMs apresentam riscos toxicológicos para a população ou,
eventualmente, algum efeito antinutriente? Ainda dentro do raciocínio de modificação genética, não haveria
a possibilidade, ainda que distante, de haver algum tipo de tranferência horizontal de genes?
Você consegue visualizar que já vimos esse cenário anteriormente? Observe que a história está se
repetindo, ou seja, se por um lado os alimentos se tornam resistentes a pragas sem a necessidade de
utilização de pesticidas e ganho de rendimento na produção desses alimentos, por outro lado aparece a
incógnita de quais são, efetivamente, os danos que podem causar aos animais ou a humanos.
Uma das principais alterações que pode haver pela exposição aos alimentos transgênicos
são as alterações pleiotrópicas, ou seja, poderiam afetar expressões fenotípicas de duas ou mais
características na própria planta, fazendo com que haja a produção de diferentes metabólitos.
Como exemplo, destaca-se a produção de agmatina e seus derivados, que podem interagir com os
receptores de glutamato, medazolínicos e adrenérgicos.
7.2 Praguicidas
Traremos um pouco da história dos praguicidas, para que você compreenda a evolução da utilização
dessas substâncias químicas.
Reduzir as perdas agrícolas causadas por ampla variedade de pragas é um dos maiores desafios
para aqueles que estão envolvidos em práticas agrícolas. Aparentemente, é impossível apontar quem
decidiu pela primeira vez que a aplicação de inseticidas minimizaria perdas, mas não é tão difícil
concluirmos que foi a própria natureza que “tomou providência” no sentido de autoproteção e
apontou alguns caminhos para que os humanos pudessem segui-la quando foi notado, por exemplo,
que compostos naturais apresentavam algumas propriedades interessantes para mitigar pragas nos
vegetais (OBEREMOK et al., 2015).
394
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Observação
Outras plantas, ainda hoje, são utilizadas popularmente como inseticidas, como o extrato aquoso de
absinto, flores de sabugueiro e extrato de tabaco, contra gorgulhos, baratas e pulgões, respectivamente
(OBEREMOK et al., 2015).
Desde o ano 1000 a.C., os produtos químicos naturais também são conhecidos pelas suas
propriedades inseticidas. Homero descreveu o ritual da “limpeza divina”, em que o enxofre
inorgânico era utilizado para livrar as pessoas dos piolhos, em suas obras A Ilíada e A Odisseia.
A partir do ano 90 d.C., o arsênio e seus sais, a criolita e o bórax começaram a ser utilizados como
inseticidas (OBEREMOK et al., 2015).
A história é fluida e não poderia ser diferente para os inseticidas. A glória das propriedades
inseticidas do DDT perdurou até a segunda metade do século XX, quando cedeu espaço a outras classes
de substâncias químicas utilizadas com a mesma finalidade, como os organofosforados e os carbamatos.
Estes, a despeito de seus possíveis danos ao meio ambiente, desempenham um importante papel no
controle de pragas e ainda representam cerca de 19% de todo o mercado mundial para esse fim.
Neste momento, faz-se necessário trazermos até você, dentro desse breve histórico dos inseticidas,
o desastre que houve em Bhopal, na Índia, na planta de produção do carbaril, um metilcarbamato.
395
Unidade III
Após o apontamento desse fato histórico que utilizamos para lhe demonstrar os riscos toxicológicos
envolvendo a exposição aos praguicidas, continuemos em nossa breve linha do tempo dos inseticidas
na história mundial.
Há algumas formas de classificar os praguicidas. Apresentamos no quadro a seguir algumas das mais
novas classes de inseticidas, exemplos de substância química e seus respectivos mecanismos de ação.
396
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Além dos inseticidas naturais e sintéticos, preparações biológicas também foram utilizadas no
controle de insetos. Na verdade, na década de 1870, Ilya Metchnikov e Louis Pasteur inovaram e foram
os primeiros a utilizar preparações microbiológicas no controle de pragas. Para esse fim e por esse meio,
podem ser utilizados agentes antibacterianos, fúngicos, virais e até mesmo inseticidas produzidos à base
de ácidos nucleicos (OBEREMOK et al., 2015).
7.2.2 Epidemiologia
Para uma perspectiva ainda mais ampla, observamos que, entre 42.309 casos de intoxicação que
houve no país entre 2007 e 2016 (veja a tabela a seguir), os praguicidas foram os responsáveis pelo
maior número de casos.
397
Unidade III
Característica do agrotóxico n %
Finalidade de utilização 15.741 100
Inseticida 6.891 43,8
Herbicida 5.692 36,2
Fungicida 999 6,3
Não se aplica 193 1,2
Carrapaticida 144 0,9
Raticida 49 0,3
Preservante/madeira 38 0,2
Outros 921 5,9
Ignorado 814 5,2
Atividade de exposição 15.760 100
Pulverização 7.390 46,9
Diluição 3.599 22,8
Colheita 1.216 7,7
Desinsetização 807 5,1
Tratamento/sementes 749 4,8
Não se aplica 261 1,7
Armazenagem 227 1,4
Transporte 166 1,1
Produção/formulação 75 0,5
Outros 722 4,6
Ignorado 548 3,4
O termo pesticida é utilizado para designar uma substância química ou uma mistura delas
utilizada para impedir ou reduzir os danos causados na agropecuária por repelir, destruir ou mitigar
a praga. São consideradas pragas os insetos, ervas daninhas, pássaros, moluscos, peixes, mamíferos,
nematoides ou microrganismos que competem com humanos por alimentos. Também podem ser
vetores de doenças, são capazes de destruir propriedades e, de uma forma geral, são vistos como
um incômodo para a sociedade. Alguns autores preferem utilizar o termo praguicida no lugar de
pesticida (YADAV; DEVI, 2017).
398
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Na área da saúde, os praguicidas são bastante utilizados para eliminar vetores de doenças como
os mosquitos. Em culturas agrícolas, são utilizados quando as pragas podem danificar de forma
significativa a plantação. Um cuidado que se deve ter é que os praguicidas não respeitam fronteiras,
ou seja, são capazes de causar danos como intoxicação aguda ou crônica a organismos que não são
seu alvo, incluindo humanos. Dentro desse contexto, o respeito quanto aos critérios do uso seguro e do
descarte adequado é fundamental (YADAV; DEVI, 2017).
Saiba mais
Para saber mais sobre o assunto, sugerimos que leia o artigo a seguir:
Praguicidas sistêmicos
Nas plantas, os praguicidas sistêmicos são transferidos para tecidos não tratados após sua absorção
e podem chegar pelo sistema vascular às folhas, raízes, caules ou outros órgãos que não foram tratados
diretamente pelo praguicida. Ervas daninhas podem ser tratadas dessa forma (YADAV; DEVI, 2017).
O movimento do praguicida nos tecidos dos vegetais pode ocorrer de forma multidirecional ou
unidirecional. Isso significa que, para alguns praguicidas, o sentido de distribuição no vegetal é único,
ou seja, dependendo do órgão do vegetal onde é aplicado o praguicida, o transporte pode ocorrer
apenas em um sentido, para cima ou para baixo. Alguns praguicidas são distribuídos apenas no
sentido de baixo para cima no vegetal. Nesse caso, não adianta aplicá-lo nas folhas, porque não será
distribuído por toda a planta. Entretanto, ressalta-se que a distribuição também pode ocorrer de
forma multidirecional.
Em mamíferos, o praguicida pode ter efeito local ou sistêmico. Uma das formas de eliminar pulgas de
um cachorro é administrar no animal um comprimido contendo um praguicida, o qual será distribuído
399
Unidade III
pelo seu organismo e eliminará as pulgas. Isso caracteriza um efeito sistêmico. O mesmo raciocínio é
válido para o tratamento de larvas e piolhos (YADAV; DEVI, 2017).
Como atuam sobre pragas após a interação físico-química, os praguicidas não sistêmicos também são
chamados de praguicidas de contato e agem apenas após penetrar nos tecidos via epiderme; portanto,
não são necessariamente distribuídos pelo sistema vascular do vegetal. O paraquat e o dibrometo de
diquat são exemplos de praguicidas de contato (YADAV; DEVI, 2017).
A intoxicação por praguicidas pelo estômago ocorre por aqueles que causam a morte do organismo
(praga) por destruição de seu estômago. A praga se expõe a esse tipo de praguicida ao ingerir o praguicida
que foi aplicado sobre as folhas e outras partes do vegetal. O malation, por exemplo, mata mosquitos
por destruição do estômago ou intestino médio de moscas e larvas (YADAV; DEVI, 2017).
Fumigantes
Os fumigantes são praguicidas capazes de matar pragas pela produção de vapor ou gás. Deve-se ter
muita atenção na utilização, armazenamento, transporte, uso e descarte dos praguicidas fumigantes.
Alguns de seus ingredientes são líquidos envasados a alta pressão que se transformam em gases ou são
líquidos voláteis, e seus vapores formam gases tóxicos quando aplicados. Dessa forma, a praga se expõe
aos vapores ou gases do praguicida pelo sistema respiratório.
Os fumigantes são bastante utilizados para eliminar pragas que contaminam grãos, vegetais e frutas,
sobretudo em condições de armazenamento, e também são muito úteis para o controle de pragas no
solo (YADAV; DEVI, 2017).
Repelentes
Os repelentes não matam, mas são desagradáveis o suficiente para manter as pragas afastadas dos
produtos agrícolas ou de áreas específicas.
Em alguns momentos, observa-se que podemos compreender os conceitos, mas nem sempre
conseguimos contextualizar seu significado. No conceito de praguicidas, foi exposto que são substâncias
químicas capazes de mitigar pragas, mas o que significa isso exatamente?
Faz-se necessário compreender que há praguicidas utilizados para o controle de mais de um tipo de
praga, como o aldicarbe, empregado com inseticida, acaricida e nematicida.
400
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Observação
Alguns praguicidas podem ser classificados segundo sua função. Como exemplo, os desfolhantes
são aqueles que induzem a queda das folhas dos vegetais; os reguladores de crescimento estimulam
ou retardam o crescimento das pragas; os dessecantes são aqueles que secam as plantas, normalmente
utilizados para facilitar a colheira mecânica; os atrativos são utilizados como armadilhas, para atrair
as pragas; os quimioesterilizantes são capazes de esterilizar as pragas e os repelentes promovem a
repelência das pragas (YADAV; DEVI, 2017).
401
Unidade III
A composição química e a natureza das substâncias são muito úteis na classificação dos praguicidas.
Essa classificação nos confere informações importantes sobre as propriedades físicas e químicas e a
eficácia dos praguicidas, sobretudo para subsidiar informações sobre a determinação de precauções,
modo de utilização e concentrações de uso.
Os praguicidas podem ser naturais ou sintéticos. Os praguicidas atuais são produtos químicos
sintéticos orgânicos. Entre eles, constam os organoclorados, organofosforados, carbamatos, piretrinas e
piretroides (veja a figura a seguir), que iremos apresentar agora.
Inseticidas
Naturais Sintéticos
Piretrum
Azadiractina
Malation Deltametrina
Temefós Propoxur Ciflutrina
DDT Fention Bendiocarbe Bifentrina
BHC Diclorvós Carbaril Lambda-cialotrina
Fenitrotion Permetrina
Pirimifós metílico
7.2.4.1 Introdução
A primeira observação que se faz para esse grupo de praguicidas é que os organoclorados estão
proibidos em vários países, sobretudo em fução de sua toxicidade e capacidade de acúmulo no ambiente
(GOEL; AGGARWAL, 2007).
402
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
7.2.4.3 Toxicocinética
Você se lembra de que os organoclorados podem estar solubilizados em solventes orgânicos? Esses
solventes podem também intoxicar o organismo e produzir pneumonite por aspiração, quando a
exposição ocorrer pelo trato digestório (GOEL; AGGARWAL, 2007).
Uma informação que deve ser relevada neste momento é que não há unanimidade sobre o
mecanismo de ação dos organoclorados. Por serem constituídos de uma ampla gama de diferentes
substâncias, podem apresentar distinção em suas respectivas toxicodinâmicas. Ainda assim, de uma
forma geral, é possível concluirmos que a maneira pela qual os inseticidas organoclorados agem
está associada à despolarização celular, ou seja, os organoclorados levam ao prejuízo da função do
SN, por despolização das membranas nervosas, e, em muitos momentos, animais e humanos podem
apresentar respostas associadas à hiperexcitabilidade.
Ressalta-se ainda que esse grupo de praguicidas parece inibir o canal do complexo ácido gama
aminobutírico-cloro (GABA-Cl), corroborando com os efeitos excitatórios. Infere-se, assim, que são
agonistas da transmissão sináptica, e, consequentemente, pode haver como sinais e sintomas de
intoxicação tremores, distúrbios do equilíbrio e convulsões, dependendo das condições de exposição
(GOEL; AGGARWAL, 2007).
403
Unidade III
Ressalta-se a variação dos efeitos tóxicos causados pelos inseticidas organoclorados, dependendo da
espécie exposta (veja o quadro a seguir).
404
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
405
Unidade III
em aproximadamente 250 mil mortes, na maior parte dos casos por praguicidas organofosforados
(NARANG; NARANG; GUPTA, 2015).
Mas não pense que é apenas na agricultura que essa classe de substâncias químicas é utilizada.
Há o que se conhece por gases dos nervos, como tabun, soman, sarin e VX, que são substâncias
organofosforadas utilizadas em situações de conflitos bélicos, como gases de guerra. Alguns dos mais
comuns praguicidas organofosforados utilizados na agricultura são clorpirifós, malation, paration,
diclorvos, diazinom, dimetoato, acefato, fentato, monocrotofos e glifosato (NARANG; NARANG;
GUPTA, 2015; GOEL; AGGARWAL, 2007).
P P
R1 X R1 X
R2 R2
A letra X representa vários grupos, por alguns chamados de grupos de saída, uma vez que
normalmente são substituídos por uma reação de substituição nucleofílica pelo oxigênio presente na
serina, sítio ativo da enzima-alvo, que é a acetilcolinesterase (AChE) (MANGAS et al., 2016).
406
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Observação
7.2.5.3 Toxicocinética
Absorção
A primeira informação de que precisamos dispor para compreender a dinâmica de absorção dos
organofosforados é que a maioria das substâncias que pertencem a esse grupo é lipofílica e não ionizada.
Concluimos, assim, que a absorção desse grupo de substâncias atravessa barreiras biológicas facilmente
(WORLD HEALTH ORGANIZATION, 1986). Veja, a seguir, as possíveis vias de exposição.
• Pele: a principal via de exposição aos organofosforados é pela pele, mas outras vias de exposição
também devem ser consideradas, como a ingestão acidental ou intencional e o trato respiratório,
sobretudo na aplicação das substâncias na agricultura (MANGAS et al., 2016).
Observação
Incontáveis casos de intoxicação aguda ocorrem quando há o contato das substâncias pertencentes
a esse grupo de praguicidas com a pele, e a intensidade da absorção está relacionada à extensão da
roupa ou pele que teve contato, à quantidade da substância derramada, à volatilidade do composto,
407
Unidade III
ao critério de lavagem do local afetado e à presença e natureza dos agentes emulsificantes e solventes
utilizados no praguicida (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 1986).
• Trato digestório: a absorção dos praguicidas organofosforados pelo trato digestório em ratos
é rápida e eficiente. Existem também algumas considerações que podem ser feitas a respeito
da exposição por essa via. Por exemplo, não se sabe exatamente se organofosforados de baixa
DL50 apresentam baixa toxicidade pela exposição por essa via por serem pouco absorvidos ou se
efetivamente sua toxicidade é superior à das demais substâncias.
Lembrete
- Dessulfuração oxidativa: de uma forma bastante simples, podemos expor que desulfuração
é uma reação química em que ocorre a remoção do enxofre da estrutura, e oxidativa significa
que há a oxidação de substâncias químicas que contenham átomos de enxofre. Vimos
anteriormente que compostos organofosforados com grupamentos tions são mais estáveis
e menos reativos em comparação com os que possuem grupamentos oxon, que são mais
reativos. No organismo, por meio das reações de fase I, catalisadas por oxidases de função
mista, está havendo uma biotransformação, com a formação de compostos oxons, bastante
reativos, com várias ordens de toxicidade superior em comparação com os grupamentos
tions (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 1986).
organofosforado que contém dois ésteres carboxílicos, é hidrolisado por carboxilesterases, por
exemplo (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 1986).
A DL50 do malation para exposição por via oral, em ratos, é reduzida de 10000 mg/kg para
100 mg/kg quando ocorre inibição das carboxilesterases teciduais. Quanto menor é a DL50 de
um xenobiótico, maior é sua toxicidade. Concluímos, assim, que há aumento de 100 vezes
da toxicidade do malation, caso sua biotransformação seja interrompida.
Distribuição
A distribuição do organofosforado ocorre para todo o organismo, com destaque para tecidos
gordurosos, ainda que não apresente tendência de se bioacumular, em função de sua rápida
biodegradação.
Excreção
A excreção dos produtos de biotransformação ocorre principalmente pela urina, mas também
pelo ar exalado e pelas fezes. As ligações covalentes e o depósito em tecidos gordurosos reduzem, em
parte, a excreção da substância. A eliminação dos praguicidas organofosforados apresenta um pico
em aproximadamente dois dias e depois cai rapidamente (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 1986).
A AChE tem como função fisiológica hidrolisar a ACh liberada nas terminações nervosas colinérgicas
e, consequentemente, reduzir os efeitos colinérgicos no organismo. Quando a AChE perde sua atividade,
pode haver como desdobramento uma variedade de efeitos oriundos do excesso de estimulação nervosa,
que pode levar o organismo à insuficiência respiratória e até mesmo à morte. O efeito bioquímico
primário dos praguicidas organofosforados está associado à inibição da ação por fosforilação da AChE,
que impede a capacidade de hidrólise da ACh, com consequente acúmulo do neurotransmissor em
vários locais (GOEL; AGGARWAL, 2007).
409
Unidade III
é relativamente rápida, opostamente à dos compostos dietílicos do mesmo grupo de praguicidas, que é
bastante lenta (GOEL; AGGARWAL, 2007).
No eletrocardiograma (ECG) pode have alterações nas ondas T e prolongamento do intervalo PR, mas
também podem existir outras, que incluem extra-sístoles ventriculares. Alguns casos podem apresentar
quadro de hiperglicemia, pancreatite aguda, hiperamilasemia (possivelmente por conta do quadro de
pancreatite) e hipotermia (GOEL; AGGARWAL, 2007).
410
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Em termos de velocidade dos efeitos tóxicos dos organofosforados, a intoxicação fatal pode ocorrer
em algumas horas. Em uma fazenda, a ingestão acidental de água contaminada por essa classe de
praguicidas, contendo também carbamatos, levou à morte de 40% do gado, poucas horas depois de ter
ingerido a água contaminada (n = 40) (veja as figuras a seguir) (OLIVEIRA-FILHO et al., 2010).
A) B)
C) D)
Figura 162 – Intoxicação bovina por carbamatos e organofosforados: A) Poça d’água contendo organofosforado e carbamato;
B) Bovino que se expôs à água da poça, em decúbito esternal. Esse animal morreu poucas horas após ter tomado essa posição;
C) Sialorreia, característica na intoxicação por organofosforado; D) A morte dos animais que se expuseram ao organofosforado
ocorreu aproximadamente ao mesmo tempo
Síndrome intermediária
Chama-nos muito a atenção este número: 20% a 47% dos pacientes que se intoxicam com os
organosfosforados também podem apresentar a síndrome intermediária. Essa síndrome normalmente
aparece entre o primeiro e o quarto dia após a exposição, mas pode aparecer mesmo após uma semana
do início da exposição. Nela, o paciente acusa uma fraqueza na flexão do pescoço, que pode progredir
para a musculatura respiratória e levar à insuficiência respiratória.
411
Unidade III
Efeitos retardados
Outra condição que pode acometer o intoxicado por organosfosforado é uma síndrome caracterizada
por parestesia e fraqueza motora. Essa neuropatia ascendente, tipo luvas e botas, ocorre após 10 a 21 dias
da exposição. Também pode haver alteração da personalidade, depressão e esquizofrenia.
7.2.5.5 Diagnóstico
O praguicida organofosforado diazinon afeta mais intensamente a BChE do que a AchE, de forma que,
em alguns casos, a determinação das colinesterases plasmáticas pode apresentar uma boa correlação
entre a exposição desse organofosforado. A AchE também pode estar “falsamente” baixa em alguns
casos, como na anemia falciforme (GOEL; AGGARWAL, 2007).
As vias aéreas, respiração e circulação sanguínea devem estar patentes. Deve-se proceder o
monitoramento com o oxímetro de pulso e a oxigenoterapia. Um cuidado que se deve ter nesse momento
é que há a possibilidade de aspiração do praguicida, caso a exposição tenha ocorrido por via oral. Para
reduzir essa possibilidade, posiciona-se o paciente do lado esquerdo, com a cabeça abaixo do nível do
corpo, e o pescoço deve permanecer estendido (EDDLESTON et al., 2008).
Episódios de convulsão são tratados com diazepam (EV) ou midazolam. Uma das formas de monitorar
o paciente é por meio da escala de Glasgow. Há indicação para a administração intravenosa de atropina
pela identificação de qualquer característica de intoxicação colinérgica, hipotensão com pressão arterial
sistólica inferior a 80 mmHg, diaforese, miose ou broncorreia (GOEL; AGGARWAL, 2007).
Caso o oxigênio não esteja disponível, não se deve retardar a administração da atropina. Entre
3 e 5 minutos após a administração, devem aparecer os efeitos da atropinização. Caso contrário,
é necessário dobrar a dose da atropina em relação à anteriormente administrada. Caso não seja
executado esse procedimento, ou seja, caso a mesma dose anterior seja administrada novamente,
a probabilidade de morte decorrente da intoxicação colinérgica antes do efeito da atropina é alta
(GOEL; AGGARWAL, 2007).
Observação
Caso o paciente apresente quadro de confusão mental, febre, agitação, bexiga cheia e sem sons
intestinais, seguramente há intoxicação pela atropina e há a necessidade de interrupção da administração
da atropina temporariamente (GOEL; AGGARWAL, 2007).
A pralidoxima (PAM) é uma oxima bastante utilizada para reverter os efeitos nicotínicos. Ainda que
a utilização da PAM seja controversa, uma vez que vários estudos apontam que não há evidências de
benefício clínico na redução da morbidade ou mortalidade pela utilização da substância, outros apontam
que elevadas doses de iodeto de PAM reduzem a morbidade e mortalidade em casos moderadamente
graves, por intoxicação aguda por praguicidas organofosforados. A despeito da controvérsia, autoridades
incluem a PAM no tratamento das intoxicações nesses casos (GOEL; AGGARWAL, 2007).
Deve-se considerar ainda que a eficácia das oximas na reativação da acetilcolinesterase depende
do organofosforado ao qual o organismo se expôs. Os organofosforados dimetílicos geram um
rápido envelhecimento enzimático, limitando bastante a eficácia da PAM. Os dietílicos induzem ao
envelhecimento mais lento da AChE, permitindo, assim, maior eficácia no tratamento da intoxicação
pela PAM, mesmo após vários dias do início do envelhecimento enzimático (GOEL; AGGARWAL, 2007).
A exposição humana também pode ocorrer por meio do consumo de alimento que foi colhido
precocemente, antes mesmo de ter havido o declínio dos níveis do praguicida que foram aplicados sobre
o alimento. A utilização dos praguicidas nos alimentos deve ocorrer mediante as boas práticas agrícolas.
Ainda assim, faz-se necessário o controle dos níveis de exposição por meio do LMR e da IDA (WORLD
HEALTH ORGANIZATION, 1986).
Observação
413
Unidade III
Além de ser uma planta bastante resistente, ela também apresenta um simbolismo: para
algumas culturas, significa sinceridade. Acreditamos que a escolha dessa planta para ser utilizada
em velórios ou cemitérios transcenda o simbolismo, mas tenha um valor agregado pela experiência
de nossos antepassados.
Para compreendermos melhor, avançaremos um pouco nas informações específicas e em breve você
compreenderá aonde queremos chegar.
Piretro é a designação dada para o extrato natural presente nas flores de Chrysanthemum
cinerariaefolium e Chrysanthemum cineum, ou seja, do crisântemo. O piretro foi reconhecido pela
primeira vez por suas propriedades inseticidas por volta de 1800 na Ásia e foi usado para matar
carrapatos, pulgas e mosquitos. O extrato de piretro possui produtos químicos com propriedades
ativas inseticidas, e esses compostos são chamados de piretrinas. O piretro, pó de coloração marrom,
é ligeiramente hidrossolúvel, mas se solubiliza bem em solventes orgânicos, como querosene,
hidrocarbonetos clorados e álcool. Quando se expõe à luz natural do sol, decompõe-se rapidamente
no ambiente (AGENCY FOR TOXIC SUBSTANCES AND DISEASE REGISTRY, 2003).
Os piretroides apresentam algumas diferenças em relação às piretrinas: são sintéticos, mais tóxicos
para mamíferos e insetos e mais estáveis, ou seja, permanecem por mais tempo no ambiente. A maioria
dos piretroides comerciais são substâncias com a mesma fórmula química, ou seja, apresentam a mesma
sequência de átomos, mas o arranjo entre esses átomos é diferente: é o que se chama de estereosinomeria.
Dessa forma, sabemos que não possuem imagens espelhadas uns dos outros e também apresentam
propriedades físicas distintas, como a solubilidade e pontos de fusão e ebulição. Compreendemos, assim,
que essa diferente isomeria espacial leva a diferentes propriedades toxicológicas e inseticidas (AGENCY
FOR TOXIC SUBSTANCES AND DISEASE REGISTRY, 2003).
Observação
A contaminação do meio ambiente pelas piretrinas e piretroides ocorre em função de seu uso como
inseticidas, quando aplicados diretamente na forma de aerossóis ou por pulverizadores terrestes ou
aéreos. Poucos dias são suficientes para degradar esses compostos no ambiente, mas há exceções.
414
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
A cialotrina e a permetrina são ligeiramente mais estáveis à luz solar em comparação com os demais
piretroides. No solo, não são muito móveis e normalmente não chegam a atingir o lençol freático, a não
ser que haja um significativo vazamento. Condições alcalinas favorecem sua hidrólise, catalisando a
biodegradação desses compostos, e são pouco absorvidos pelas raízes de plantas vasculares, uma vez que
são fortemente adsorvidos pelo solo (AGENCY FOR TOXIC SUBSTANCES AND DISEASE REGISTRY, 2003).
A ingestão de alimentos contaminados com essas substâncias é a forma mais provável de exposição,
mas não a única: após a aplicação, como na pulverização, a pessoa pode apresentar a exposição pelo
contato dérmico.
Observação
Você poderia dizer, então: “mas eu não trabalho com pulverização de inseticidas”. Não foi isso que
você pensou?
O que se deve considerar é que esses compostos estão presentes em xampus, sprays para animais de
estimação e muitos inseticidas domésticos; ou onde você mora não tem pernilongo?
Há outros importantes usos e fontes de exposição às piretrinas e aos piretroides: para tratar a
escabiose (sarna), aplicam-se substâncias diretamente sobre a pele humana ou animal, podendo também
ser aplicadas nas roupas. Outro uso bastante frequente dessa classe de inseticidas é no tratamento
contra lêndeas e piolhos, sendo aplicados diretamente na cabeça da pessoa; consequentemente, mesmo
o uso terapêutico faz com que haja a exposição a esses compostos.
Para título de referência, estima-se que um adulto estadunidense de 70 kg de peso corpóreo seja
exposto a cerca de 3,2 µg/dia do piretroide mais amplamente utilizado naquele país, a permetrina
(AGENCY FOR TOXIC SUBSTANCES AND DISEASE REGISTRY, 2003).
Observação
Essa quantidade é aproximadamente 1/1.000 vezes a IDA, ou seja, não há risco de intoxicação nessa
condição de exposição (AGENCY FOR TOXIC SUBSTANCES AND DISEASE REGISTRY, 2003).
415
Unidade III
7.2.6.2 Toxicocinética
Absorção
Lembrete
Exemplo de aplicação
Sugerimos que você interrompa a leitura deste material, vá até o armário onde você guarda os
repelentes de insetos e os inseticidas que você tem em casa e leia sua composição.
O repelente que você tem em casa contém em sua composição o DEET e os inseticidas piretrinas e
piretroides, não é mesmo?
As piretrinas e os piretroides são pouco absorvidos pela pele, mas, quando o organismo se expõe
ao mesmo tempo a essas substâncias e ao DEET, aumenta a absorção das piretrinas e piretroides
por essa via de exposição, em um efeito sinérgico. Assim, o que não tínhamos como preocupação
anteriormente, no que se refere à absorção das piretrinas e piretroides pela pele, agora passamos a ter,
pelas interações químicas.
Observação
A dinâmica de absorção das piretrinas e piretroides pelo trato respiratório é pouco conhecida.
Não se sabe como reduzir a absorção dessas substâncias após sua inalação (AGENCY FOR TOXIC
SUBSTANCES AND DISEASE REGISTRY, 2003).
416
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Quanto à exposição oral, acredita-se que a rápida absorção das piretrinas e piretroides ocorra na
mucosa intestinal, por difusão. Em humanos, a taxa e a extensão da absorção pela exposição pelo trato
digestório são pouco conhecidas.
Metabolização
Excreção
A excreção das piretrinas e piretroides é rápida, principalmente pela urina, mas eles também podem
ser eliminados pelo ar exalado e pelas fezes. Alguns deles podem também permanecer na pele e no
cabelo por bastante tempo (AGENCY FOR TOXIC SUBSTANCES AND DISEASE REGISTRY, 2003).
7.2.6.4 Toxicidade
Observação
Esses grupos de inseticidas são eficazes e normalmente apresentam baixo risco de intoxicação
para humanos, mas acidentes acontecem (AGENCY FOR TOXIC SUBSTANCES AND DISEASE
REGISTRY, 2003).
417
Unidade III
Adaptado de: Agency for Toxic Substances and Disease Registry (2003).
Classicamente, esses sinais e sintomas de intoxicação foram designados como síndrome T (tremor),
e os sinais e sintomas da neurotoxicidade expostos às piretrinas são semelhantes aos dos piretroides
tipo I (AGENCY FOR TOXIC SUBSTANCES AND DISEASE REGISTRY, 2003).
418
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Observação
Ressalta-se a possível absorção pela boca e pelo estômago. Dessa forma, ainda que modestamente,
o enxágue bucal pode minimizar a absorção por essas vias.
Como sabemos, as piretrinas e os piretroides não são bem absorvidos pela pele, e a lavagem desse
órgão com água e sabão reduz a absorção das substâncias. Procedimentos adequados de lavagem
devem ser seguidos caso os olhos sejam afetados (AGENCY FOR TOXIC SUBSTANCES AND DISEASE
REGISTRY, 2003).
A lavagem gástrica associada ao carvão ativado parece reduzir a absorção das substâncias quando
há exposição oral às piretrinas e aos piretroides (AGENCY FOR TOXIC SUBSTANCES AND DISEASE
REGISTRY, 2003).
419
Unidade III
7.2.7 Carbamatos
7.2.7.1 Introdução
Você já ouviu falar alguma vez que um gato ou cachorro perto da sua casa morreu intoxicado
por “chumbinho”?
Acreditamos que sim, uma vez que esse tipo de intoxicação intencional não nos parece ser incomum.
Vamos compreender melhor os carbamatos.
N N
O
H
S
Figura 163 – A) Estrutura química do aldicarbe; B) Chumbinho em grânulos; C) Venda ilegal do carbamato
Existe uma falta de controle muito grande sobre os carbamatos em países em desenvolvimento e,
consequentemente, o risco de acidentes e exposição intencional a esses praguicidas é elevado. Para
que tenhamos um pálida ideia da frequência de casos de intoxicação, apenas na Ásia rural ocorrem
cerca de 200.000 mortes por ano pela exposição aos carbamatos e organofosforados (SILBERMAN;
TAYLOR, 2020).
420
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
7.2.7.3 Toxicocinética
Absorção
É facilmente absorvido pela pele e pelo trato digestório. O manuseio do aldicarbe, do sulfóxido
de aldicarbe e da sulfona de aldicarbe deve ocorrer com a utilização de luvas e máscara (DURÃO;
MACHADO, 2016).
Caso a exposição ocorra pela pele íntegra, a absorção nos parece ser baixa, cenário que
é modificado quando a pele não está íntegra. Após a exposição oral, o pico de inibição das
colinesterases ocorre após 30 minutos do início da exposição em ratos, mas os sintomas podem
aparecer em cerca de cinco minutos após a exposição maciça da substância, pela mesma via
(SILBERMAN; TAYLOR, 2020).
Biotransformação
A biotransformação hepática ocorre por reação de hidrólise. Em poucos dias, 90% do carbamato
absorvido é excretado (SILBERMAN; TAYLOR, 2020), mas a biotransformação não reduz significativamente
sua toxicidade, uma vez que a sulfona de aldicarbe e o sulfóxido de aldicarbe são metabólitos que
também apresentam elevada toxicidade (DURÃO; MACHADO, 2016).
Distribuição
Carbamatos lipossolúveis são rapidamente distribuídos para o tecido gorduroso, o que faz com que
os efeitos tóxicos decaiam em um momento inicial de intoxicação (SILBERMAN; TAYLOR, 2020).
Observação
7.2.7.5 Toxicidade
Os efeitos tóxicos dos carbamatos também são parecidos com os induzidos pela exposição aos
organofosforados, com duração inferior a 24 horas (SILBERMAN; TAYLOR, 2020).
Deve-se destacar que a estimulação contínua dos receptores colinégicos nicotínicos dependentes
da ACh nos gânglios simpáticos pode gerar hipertensão, taquicardia e midríase. Os carbamatos,
semelhantemente aos organofosforados, pode levar à síndrome intermediária, mas não à síndrome
retardada, uma vez que raramente os sintomas ultrapassam 48 horas (SILBERMAN; TAYLOR, 2020).
7.2.7.6 Diagnóstico
Um dos cuidados que se deve ter durante a anamnese é que pode haver estimulação mista do
sistema nervoso simpático e parassimpático, que, consequentemente, pode causar a miose ou midríase,
bradicarcia ou taquicardia. Deve-se solicitar exames que determinam a BchE, produzida no fígado e
secretada no sangue, e a colinesterase eritrocitária (SILBERMAN; TAYLOR, 2020).
A confirmação da exposição ao aldicarbe pode ser feita pela cromatografia em fase gasosa acoplada
à espectrometria de massa (DURÃO; MACHADO, 2016).
7.2.7.7 Tratamento
Descontaminação
Um dos maiores cuidados que se deve ter ao tratar um intoxicado por organosfosforado e
carbamato é com o risco de autocontaminação. As luvas de neoprene ou nitrílicas conferem adequada
proteção, mas, além das luvas, o profissional deve utilizar, no mínimo, máscara, proteção facial e
capote (SILBERMAN; TAYLOR, 2020).
Observação
A pele do contaminado deve ser lavada por três vezes com água e sabão, após toda a roupa do
intoxicado ter sido removida.
Observação
Caso o paciente não tenha crises de êmese, a exposição tenha ocorrido há menos de uma hora, as vias
aéreas do paciente estejam protegidas, haja risco de vida e a exposição tenha ocorrido de forma maciça
ao carbamato, deve-se considerar a descontaminação do trato digestório. Como visto no tratamento
da intoxicação pelos organofosforados, não se deve aguardar o resultado dos exames quando o caso é
crítico para iniciar o tratamento (SILBERMAN; TAYLOR, 2020).
Observação
Um dos possíveis problemas associados à utilização do carvão é que o paciente pode aspirá-lo e,
assim, aumentar o risco de lesão ao organismo. Essa é a razão pela qual outros especialistas preferem
não utilizar o carvão ativado na terapia (SILBERMAN; TAYLOR, 2020).
Uma vez realizada a descontaminação, sugere-se direcionar a avaliação do paciente para garantir
que haja ventilação e consequente oxigenação adequadas. A exposição a substâncias químicas
inibidoras da AChE leva a um quadro de fraqueza muscular com possibilidade de paralisia flácida,
broncorreia e redução do impulso respiratório. Após esses efeitos, instala-se um quadro clínico
multifatorial caracterizado por insuficiência respiratória e hipoxemia, que são as principais causas de
423
Unidade III
morte após exposição aguda a inibidores da AChE. A exposição a doses elevadas pode levar a paralisia
respiratória, convulsão e coma.
Antídotos
Observação
Alguns estudos nos trazem que a administração da pralidoxima pode, inclusive, aumentar a inativação
da AChE. Opostamente, outros autores também referem possíveis benefícios da administração de oximas
no tratamento da intoxicação por carbamatos. Na exposição do organismo apenas ao carbamato, sem
exposição concomitante a organofosforado, sugere-se que não se administre as oximas.
Caso haja a exposição concomitante desses dois grupos de substâncias químicas, a administração
de oximas pode ser realizada, uma vez que o benefício de seus efeitos sobre os organofosforados é
bem descrito e possivelmente não haverá incremento da toxicidade do carbamato. Após a intubação,
os benzodiazepínicos podem ser utilizados no tratamento da agitação por conta da intubação e são
capazes de controlar as convulsões (SILBERMAN; TAYLOR, 2020).
Como você observou, os praguicidas podem ser classificados de diversas formas. Para interagirmos,
faremos uma breve classificação dos principais praguicidas organosintéticos. Um deles, o paraquat, é
um herbicida que nos chama muito a atenção pela sua toxicidade. Vamos então conhecer um pouco
mais sobre ele.
424
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Saiba mais
7.2.8 Paraquat
7.2.8.1 Introdução
O paraquat é o segundo herbicida mais vendido no mundo. Ele possui baixo custo, com ação rápida
e não seletiva. Tem a cor verde brilhante e cheiro pungente e é um líquido corrosivo. Ainda que seu uso
seja relativamente seguro na agricultura, é amplamente utilizado nas tentativas de suicídio, sobretudo
em áreas rurais (JHA; KANNAPUR; HIREMATH, 2020).
No interior das células, esse composto bipiridílico sofre reações de óxido-redução; por consequência,
são formadas espécies reativas de oxigênio (EROs) e de nitrogênio (ERN). O ciclo redox gerado pelo
paraquat consome nicotinamida adenina dinucleotídeo fosfato reduzida (NADPH)-citocromo P450
redutase, que representa uma importante forma de defesa antioxidante celular.
Os órgãos com alta demanda de oxigênio são os mais comumente afetados, como rins, coração,
fígado e pulmões (JHA; KANNAPUR; HIREMATH, 2020).
7.2.8.3 Toxicidade
Alguns autores expõem a baixa neurotoxicidade causada por esse herbicida, por pouco atravessar a
barreira hematoencefálica (JHA; KANNAPUR; HIREMATH, 2020).
Entretanto, Martins (2013) afirma que o paraquat pode levar a danos neurológicos, uma vez que,
ainda que apenas pequena quantidade do xenobiótico atravesse a barreira hematoencefálica, o encéfalo
possui baixos teores de enzimas antioxidantes e, consequentemente, é mais vulnerável ao herbicida,
mesmo quando exposto a baixas quantidades.
Observação
7.2.8.4 Tratamento
Saiba mais
Neste tópico, você irá se surpreender a respeito de como estamos expostos aos metais em nosso
cotidiano e no ambiente de trabalho e como esses toxicantes podem romper a homeostase do organismo.
Também veremos os possíveis efeitos tóxicos decorrentes da exposição aos metais e como realizar o
diagnóstico e o tratamentos das intoxicações.
8.1 Alumínio
O alumínio é um metal maleável e muito reativo. Quando exposto a agentes oxidantes como o
oxigênio ou à própria água, forma-se o óxido de alumínio, que, ao revestir o metal, lhe confere elevada
resistência à corrosão. Algumas espécies de alumínio reagem violentamente em contato com a água,
como os haletos e hidretos de alumínio (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 1997).
426
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Observação
Chamamos sua atenção aos números que vamos lhe trazer. Observe: a ingestão diária do alumínio
presente na água ou alimentos, por adultos, pode variar entre 2,5 mg e 13 mg.
Exemplo de aplicação
Após essa breve introdução sobre usos e fontes de exposição ao alumínio, reflita mais um pouco sobre
o tema e nos responda o seguinte: você se recorda de algum medicamento que contenha alumínio?
Algumas pessoas se expõem ao metal quando são expostas a alguns medicamentos antiácidos.
8.1.3 Toxicocinética
Ainda não foi completamente elucidado o mecanismo de absorção do alumínio pelo trato digestório,
mas sabe-se que algumas situações podem interferir na intensidade de absorção pela exposição por
essa via, como as característica dos sais de alumínio, força iônica, pH do meio, substâncias concorrentes
com sua absorção e presença de agentes quelantes, como silício e citrato.
Observação
427
Unidade III
Alguns autores associam a exposição ao metal presente na água com a doença de Alzheimer (DA)
e ao déficit cognitivo. Há estudos demonstrando associação direta entre a exposição ao metal e essas
alterações, mas são passíveis de alguma crítica. Assim, levando-se em consideração o atual conhecimento
sobre a patogênese da DA, as evidências epidemiológicas não suportam uma associação direta entre a
exposição ao metal presente na água potável e a DA.
Uma atenção especial deve ser dada aos que fazem hemodiálise: paciente com insuficiência renal
crônica que se exponha a medicamentos contendo alumínio ou ao alumínio presente nos fluidos de
diálise pode apresentar anemia microcítica, osteomalácia resistente à vitamina D e encefalopatia.
Prematuros podem acumular alumínio no tecido ósseo quando expostos a fontes iatrogênicas
de alumínio, mesmo quando não apresentam insuficiência renal grave. Caso o organismo apresente
insuficiência renal severa, a exposição ao alumínio pode levar a convulsões e encefalopatia.
Foi identificado que trabalhadores que se expuseram ao alumínio revestido com óleo mineral na
fabricação de explosivos para fogos de artifício apresentaram fibrose pulmonar. O quadro a seguir
lista os métodos analíticos utilizados na determinação do alumínio e seus compostos, em diferentes
matrizes biológicas.
428
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
O grupo de risco da exposição ao alumínio é constituído de pessoas de qualquer idade que tenham
insuficiência renal, por conta do risco de neurotoxicidade (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 1997).
8.1.5 Carcinogenicidade
Apresentaremos alguns métodos para reduzir os efeitos tóxicos decorrentes da exposição ao alumínio.
Entretanto, alguns tratamentos podem ser experimentais, sem a comprovação necessária. Portanto, em
casos de intoxicação envolvendo o metal, o aconselhamento médico deve ser realizado por médicos
toxicologistas em centros de controle de intoxicação, e as informações disponibilizadas neste material
não devem ser utilizadas como um guia.
As informações sobre a redução da absorção do alumínio no trato digestório são bastante limitadas.
O que se sabe é que o metal é absorvido por um processo independente de energia, mas dependente de
sódio. Dentro desse contexto, os tratamentos que utilizam procedimentos para o bloqueio de processos
pericelulares podem ser utilizados para minimizar ou até mesmo impedir a absorção intestinal do metal.
A ranitidina pode reduzir a absorção do alumínio no trato digestório (INGERMAN et al., 2008).
429
Unidade III
Uma das formas de reduzir a carga corpórea do alumínio é evitar a exposição concomitante entre
o alumínio e o citrato. A desferroxamina também pode colaborar na redução da absorção do metal.
Como esse agente quelante é capaz de complexar com o citrato, consequentemente haverá redução
na absorção do metal, uma vez que o citrato aumenta a absorção do alumínio no trato digestório.
A desferroxamina reduz significativamente a meia-vida do alumínio no encéfalo de ratos.
Observação
Lembrete
Sabe por que inserimos como lembrete o conceito de toxicodinâmica? Para que você compreenda
ainda melhor por que se faz necessário conhecer a maneira de ação tóxica do xenobiótico, do ponto
de vista bioquímico e molecular. Por exemplo, não há antídotos específicos para o tratamento da
intoxicação pelo alumínio, uma vez que seu mecanismo de ação não é totalmente compreendido. Se o
mecanismo de ação não é conhecido, como tratar especificamente? Compreendeu?
Parece haver alguns outros efeitos do metal no organismo, não muito conhecidos, como a
superexpressão da imunorreatividade no hipocampo, indução da peroxidação lipídica e alterações de
parâmetros bioquímicos. Em ratos, essas alterações são minimizadas ao se administrar fitoterápicos
como extrato de Dipsacus asper Wall e Bacopa monnieri (L.) Wettst., vitaminas C e E, centrofenoxina
(fonte de colina), selênio e, acredite, cerveja!
Sim, é isso mesmo: cerveja! Porque quanto maior a quantidade de cevada maltada e lúpulo na cerveja,
maior é a quantidade de silício, que minimiza os efeitos tóxicos do alumínio (INGERMAN et al., 2008).
8.1.7 Fosfina
Neste momento, faremos um “recorte” nas informações da intoxicação do alumínio para falar um
pouco sobre o fosfeto de alumínio.
430
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Imagine o seguinte cenário: você é o último a sair de um enterro e, no cemitério onde você está, a
noite cai rapidamente. De repente, você começa a ver chamas ao seu redor. Imaginamos que, dentro
desse cenário misterioso, você sairia correndo, não é mesmo? Pois bem: quando você corre, a chama
parece persegui-lo, ou seja, acompanhá-lo! Será que está havendo um episódio de delírio de nossa parte
ou realmente essa é uma situação que pode acontecer?
Ainda que rara em países desenvolvidos, a intoxicação por fosfeto de alumínio é uma situação
relevante por conta de sua elevada mortalidade. O fosfeto de alumínio pode ser encontrado em uma
composição de 43% de carbonato de amônio e 57% de fosfeto de alumínio (GÜMÜS et al., 2017).
A dose tóxica da substância varia de 150 mg a 500 mg e a dose letal varia de 1,0 g a 1,5 g, pela
exposição gastrintestinal. Alguns estudos apontam que 70% dos casos de intoxicação por fosfeto de
alumínio ocorreram em pacientes homens de aproximadamente 20 anos.
Vamos lhe apresentar um caso que aconteceu na Turquia, em que um jovem de 20 anos, que estava
no serviço militar, se intoxicou com a substância, exatamente dentro do contexto epidemiológico
exposto anteriormente. Relatos apontaram que o jovem havia sido exposto à substância “por boca” e
foram encontrados comprimidos da substância em sua blusa (veja a figura a seguir). Em suas mídias
sociais foram identificadas palavras sobre a morte, um pouco antes do evento (GÜMÜS et al., 2017).
Preste ainda mais atenção no que acontece com a substância química após a exposição do
organismo: além de rapidamente absorvido pela pele, pelo pulmão e trato digestório, o fosfeto de
alumínio reage com o conteúdo gástrico, água ou ar e libera a fosfina.
431
Unidade III
Esse gás formado tem odor de alho ou de peixe em estado de putrefação, é incolor e inibe a
citocromo c oxidase, com consequente comprometimento na respiração celular, que acarreta em
déficit de energia para órgãos vitais, como o miocárdio, e gera espécies radicalares, por lipoperoxidação.
Todos esses efeitos culminam no prejuízo na geração do potencial de membrana cardíaca e morte.
Observação
Não confunda a fosfina com a arsina, que também tem odor de alho.
A hematemese é caractarística, uma vez que a fosfina é corrosiva para o trato digestório (veja a
figura a seguir). Em alguns casos, pode haver metemoglobinemia e hemólise intravascular.
432
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Voltando à história das chamas no cemitério, a decomposição de matéria orgânica pode gerar a
fosfina, que é o mesmo gás formado pela interação entre o fosfeto de alumínio e o conteúdo gástrico
e é um gás inflamável. Caso o ambiente esteja muito quente, a fosfina liberada pode se inflamar
espontaneamente, gerando chamas azuladas que podem chegar a três metros de altura. O movimento
de correr da pessoa ao se deparar com essa situação desloca o ar e, consequentemente, a fosfina presente
no meio, juntamente com as chamas, tende a “acompanhar” o deslocamento da pessoa.
8.2 Arsênio
8.2.1 Introdução
O arsênio é um metal ubíquo presente no solo, ar e água. Quando na forma inorgânica, está associado
ao ferro, níquel ou cobalto, juntamente com minerais de sulfeto (acreditamos que essa informação já
lhe tenha despertado a atenção), e quando na forma orgânica, está associado ao carbono e hidrogênio.
O termo arsênio deriva da palavra grega arsenikon, que significa potente (JANG; SOMANNA; KIM, 2016).
Cerca de mil anos antes do nascimento de Paracelsius, Hipócrates já descrevia a utilização do sulfeto
de arsênio no tratamento de doenças cutâneas (IBRAHIM et al., 2006). Você consegue entender por que
é célebre a frase de Paracelsius “a diferença entre remédio e veneno é a dose”?
Veremos importantes aplicações do metaloide, com fins terapêuticos. Mas nem sempre o arsênio foi
utilizado com o mais nobre objetivo. Para quem não assistiu ao filme Arsênico e renda velha, de Frank
Capra, queira nos desculpar pelo spoiler: nesse filme, duas velhinhas solidárias resolvem “aumentar a
qualidade de vida” de alguns idosos oferecendo abrigo e proteção, para acabar com a solidão deles.
Então, adicionam arsênio ao vinho de sabugueiro oferecido a eles para que haja a intoxicação intencional
desses senhores; assim, as velhinhas acabam com a solidão dos idosos! Boazinhas, não?
Você se recorda de que no início desta obra trouxemos um pouco da história da toxicologia e
apresentamos a madame Toffana, que vendia a acqua Toffana para que as mulheres se “livrassem dos
maridos”? Pois bem: você vai entender melhor, a partir de agora, como esse produto agia no organismo
desses maridos, levando-os à morte. Sabe o que tinha na composição da acqua Toffana? Arsênio!
Ao longo da história, ainda sob a égide das intoxicações fatais de cunho criminal, suspeita-
se que muitas mortes de famosos como Mozart e Napoleão Bonaparte tenham ocorrido pela
exposição ao arsênio.
433
Unidade III
Outra situação que nos chama a atenção é o fato de o arsênio ser classificado como metaloide por
conta de suas propriedades físico-químicas, mas a fisiopatologia desse metaloide remete a características
de toxicidade associada a casos de intoxicação por metais pesados.
Atualmente, a maioria dos casos de intoxicação aguda ao arsênio em seus diferentes estados de
oxidação ocorre pela exposição acidental, sobretudo a praguicidas contendo compostos arsenicais, e,
menos frequentemente, por situações envolvendo homicídio ou autoextermínio.
Quando na forma inorgânica, o arsênio está associado ao ferro, níquel ou cobalto, juntamente com
minerais de sulfeto (acreditamos que essa informação já tenha despertado sua atenção sob a óptica
toxicológica), e o metal está associado ao carbono e ao hidrogênio, quando na forma orgânica (JANG;
SOMANNA; KIM, 2016).
É encontrado em diferentes estados de oxidação, como arsênio elementar (As0), arsenito (As3+),
arsenato (As5+) e arsina (AsH3), na forma de gás e em formas orgânicas e inorgânicas de arsenito e arsenato.
Outra característica que nos chama muito a atenção é que esse metaloide não se degrada, nem é
destruído no meio ambiente. Mais do que isso, é crescente a atenção dos especialistas sobre o arsênio
também por sua “mobilidade” na terra. Para que você tenha dimensão da intensidade de exposição da
população ao arsênio em seus diferentes estados de oxidação, os teores desse metaloide na água potável
excedem os limites preconizados pela OMS (10µg/L) em mais de 42 países, e cerca de 150 milhões
de pessoas já apresentaram algum efeito tóxico pela exposição à água contaminada com o arsênio.
Mas a água não é a única fonte de exposição: humanos e animais podem ter interação com o metal pela
ingestão direta, por inalação e pela pele.
Observação
No século XIX, a preparação contendo 1% de trióxido de arsênio foi utilizada para várias aplicações
terapêuticas. Por exemplo, antes da descoberta da penicilina por Alexander Fleming, a sífilis era tratada
com o arsênio (IBRAHIM et al., 2006).
Lembrete
O arsênio pode ser encontrado ligado ao chumbo, hidróxidos e sulfetos de ferro e de cobre.
É encontrado em matrizes aquíferas ou armazenado em rochas sedimentares. A pirita, o dissulfeto de
ferro e a estibinita tendem a acumular arsênio (JANG; SOMANNA; KIM, 2016).
Você se recorda de que utilizamos o termo mobilidade do arsênio? Vamos entender um pouco
melhor essa informação. Esse metaloide pode se deslocar no ambiente por meio de processos naturais,
como a atividade vulcânica, reações geoquímicas ou intempéries. Estima-se que a quantidade do arsênio
na crosta terrestre seja em torno de 4,0 x 1016 kg. Na Austrália, o arsênio encontrado em corpos de água
potável advém da erosão da estibinita encontrada em cidades do interior desse país.
Mas as fontes antropogênicas também não podem ser desconsideradas: são liberadas cerca de
82 mil toneladas de arsênio por ano, em todo o mundo, por conta das atividades humanas.
8.2.4 Toxicidade
Vimos como o arsênio é eclético quanto aos seus possíveis estados de oxidação. Dependendo
da especiação, há alteração da toxicidade do metaloide. A forma inorgânica do arsênio é altamente
tóxica, e o arsenito tem toxicidade 10 vezes superior ao arsenato, nas mesmas condições de exposição.
Observação
Mas o estado de oxidação não é o único fator que contribui para sua ação tóxica: a frequência e o
tempo de exposição, a taxa de ingestão, a biodisponibilidade e a via de exposição também devem ser
considerados como fatores que influenciam na toxicidade desse xenobiótico.
Para que compreendamos ainda melhor a toxicidade do metaloide, faz-se necessário conhecer
como o metal se apresenta na natureza. Como tivemos a oportunidade de acompanhar, os compostos
arsenicais podem ocorrer em três diferentes estados de oxidação: arsênio elementar, arsenito trivalente
e arsenato pentavalente; e o estado de oxidação os difere, sob a óptica toxicológica. O metaloide
elementar não é tóxico (IBRAHIM et al., 2006).
Lembrete
Assim, faz-se necessário avaliar a especiação do arsênio para que também seja possível caracterizar os
riscos toxicológicos decorrentes de sua exposição, que pode se apresentar na forma orgânica, inorgânica
e gás arsina. Observe um importante aspecto toxicológico desse metaloide: os compostos orgânicos de
435
Unidade III
arsênio possuem baixa capacidade de causar danos agudos ao organismo, opostamente às suas formas
inorgânicas e do gás arsina, que são tóxicos.
A exposição e consequente absorção do arsênio podem ocorrer, principalmente, pelo trato digestório,
ainda que também seja possível a absorção pela pele e pulmão, com consequente dano ao organismo
(IBRAHIM et al., 2006). Veja o quadro a seguir.
Aguda Dérmico por contaminação por Morte celular associada à ruptura da membrana
arseniato de cobre cromado celular e inibição da síntese de DNA e proteínas
8.2.5 Toxicocinética
8.2.5.1 Distribuição
O arsênio inorgânico se liga nos eritrócitos e é redistribuído em 24 horas, ou seja, há uma rápida
redistribuição para os pulmões, rins, coração e fígado e também para o trato digestório e o SN, ainda
que em menor proporção.
8.2.5.2 Biotransformação
436
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
8.2.6 Toxicodinâmica
Há dois diferentes mecanismos de ação tóxica associados à intoxicação pelo arsênio. O arsenito
trivalente tem a propriedade de se ligar aos grupamentos sulfidrílicos do lipoato, responsável pela síntese
de intermediários, no ciclo de Krebs. A consequência dessa inibição é a depleção de ATP por prejuízo
da fosforilação oxidativa, e o arsenato pentavalente, por outro lado, pode levar a uma arseniólise, ou
seja, uma rápida hidrólise da ligação éster fostato, no ATP, capaz de desacoplar a fosforilação oxidativa
e resultar na morte de tecidos que demandem muita energia, pela depleção da energia celular. Assim, o
desacoplamento da fosforilação oxidativa associada à inibição da respiração celular resulta na morte de
tecidos cujas células sejam dependentes de muita energia
A exposição aguda ao metaloide apresenta como manifestação clínica alterações do trato digestório,
como dor abdominal, náusea, vômito e diarreia. A diarreia causada pela exposição ao arsênio é chamada
de “água de arroz”, por sua colaração característica, e normalmente é acompanhada por perda de sangue.
Quando há significativo dano endotelial, pode ocorrer o choque hipovolêmico. Dentro de quatro dias
após o início da exposição aguda ao arsênio, aparecem as anormalidades hematológicas como depressão
da medula óssea, pancitopenia, anemia, pontilhado basofílico e hemólise (veja a figura a seguir).
437
Unidade III
Figura 169 – Hemólise causada pela exposição à arsina. A bolsa à direita representa o plasma
retirado de um paciente intoxicado com a arsina, comparado com um plasma normal, à esquerda
438
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
8.2.9 Diagnóstico
Vamos fazer um exercício para resgatar as informações e também para sugerir o diagnóstico da
intoxicação ao arsênio.
Exemplo de aplicação
Em uma exposição ao metaloide, quais são as alterações clínicas que mais lhe chamaram a atenção?
Temos certeza de que ao menos uma de suas respostas está associada às alterações cardiovasculares
e hematológicas. Pensando também dessa forma é que os especialistas sugerem o diagnóstico da
intoxicação pela exposição ao arsênio.
A história clínica sempre é muito importante e, consequentemente, a anamnese deve ser realizada
com muito critério e perspicácia, uma vez que a história da exposição ocupacional, ambiental ou
acidental ao arsênio pode ser identificada nesse momento.
Os achados físicos são representativos: escurecimento das porções distais de membro(s) inferior(es)
ou superior(es), linha de Aldrich-Mees, hipopigmentação ou hiperpigmentação da pele. Além disso, você
já tinha identificado que poderia haver alterações hematológicas, não é mesmo? Assim, solicita-se um
hemograma completo com esfregaço.
Não há alteração cardiológica? Sim, há! Logo, solicita-se um eletrocardiograma para avaliar se está
havendo o prolongamento do intervalo QT. O clínico deve se atentar para não dar um diagnóstico
falso-positivo para Guillain-Barré, caso haja evidência de axonopatia sensório-motora simétrica distal,
uma vez que a ingestão maciça do arsênio pode alterar significativamente a condução nervosa e induzir
ao erro de diagnóstico.
A solicitação de radiografia abdominal é exigida, uma vez que alguns compostos arsenicais são
radiopacos e podem ser evidenciados por esse exame.
439
Unidade III
No sangue, após exposição aguda, os teores do metaloide tendem a diminuir rapidamente depois
de 24 a 48 horas, opostamente à concentração na urina, que tende a aumentar após 24 a 48 horas do
início da exposição aguda. Assim, 1 µg/dL deve ser a máxima concentração do metaloide no sangue.
Quanto à presença do arsênio nos cabelos e unhas, não convém que seja considerada para fechar
um diagnóstico clínico que caracterize uma exposição aguda, uma vez que a interpretação da linha
de Aldrich-Mees para caracterizar uma exposição aguda ou crônica não é adequada quando se
faz isoladamente.
O tratamento da intoxicação pelo arsênio se inicia pela remoção do intoxicado do local da exposição
(IBRAHIM et al., 2006).
Observação
Quanto mais precoce for o início da terapia de quelação, melhores serão os resultados, devendo ser
iniciada em minutos ou horas após o início da exposição. Assim, caso os exames laboratoriais demorem
para ser liberados, o início da quelação não deve ser adiado em casos graves, mesmo que não haja a
confirmação labaratorial da exposição (KUIVENHOVEN; MASON, 2019).
Caso tenha havido a exposição pela pele, o metaloide é facilmente removido com água. Não se sabe,
ao certo, se a lavagem gástrica e o carvão ativado são efetivos no manejo do intoxicado. Caso haja
grande quantidade de material radiopaco observado na radiografia abdominal, pode-se considerar a
lavagem gástrica.
440
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Uma das características físico-químicas mais marcantes na exposição ao gás arsina é o seu odor de
alho. Após essa exposição, o organismo pode apresentar náusea, cefaleia, vômito, diarreia, dor no peito,
taquicardia, perda do equilíbrio, insuficiência renal e febre, que podem aparecer entre uma e 12 horas
após a exposição. Entre quatro e 48 horas após a exposição, a conjuntiva tende a ficar avermelhada,
a urina adquire uma tonalidade de vinho do Porto e ocorre uma alteração denominada de “pele de
ardósia-bronze”, consequência da icterícia. Pode haver assistolia e bloqueio na condução cardíaca e
sensibilidade aumentada no baço e fígado ao exame físico. Após algumas semanas da exposição, podem
aparecer as linhas de Aldrich-Mees (KUIVENHOVEN; MASON, 2019).
Uma das formas de reduzir a possibilidade de insuficiência renal aguda (IRA) é administrar manitol
e proceder com intensa hidratação (EV).
Observação
Os estudos sobre os efeitos dos agentes quelantes sobre a arsina não são conclusivos, mas alguns
protocolos expõem que, quando a exposição aguda à arsina ocorre em até 24 horas, pode ser utilizado o
dimercaprol, e após esse período, sugere-se a administração do succímero por via oral ou do unitiol por
via oral ou parenteral (OLSON, 2014).
Observação
8.3 Cádmio
O cádmio está presente na crosta terrestre em teor aproximado de 0,1 parte por milhão e
normalmente é encontrado como subproduto das fundições de chumbo ou zinco. Até a década
de 1960, foi utilizado juntamente com o zinco em soldas de vedações de tubulações de água.
Atualmente, o metal é utilizado em lasers, aço galvanizado, baterias, pigmentos de tintas, inclusive
de cosméticos, e até mesmo na fissão nuclear. A ingestão de vegetais folhosos, arroz de regiões
específicas da China e do Japão, crustáceos e água é uma das principais fontes de exposição ao
441
Unidade III
cádmio, e a exposição ocupacional ocorre principalmente por meio da utilização de soldas, que
pode levar à pneumonia química grave (BERNHOFT, 2013).
8.3.2 Toxicocinética
8.3.2.1 Absorção
A ingestão e inalação são as principais vias de exposição para humanos. Dependendo do diâmetro
aerodinâmico, 10% a 50% do cádmio inalado são absorvidos pelo trato respiratório.
Observação
Existe uma significativa concentração do metal no sangue e nos rins de tabagistas. Quando a
exposição ocorre pelo trato digestório, indivíduos que apresentam deficiência em zinco, cálcio ou ferro
apresentam uma absorção maior do cádmio, que pode variar de 5% a 10% (BERNHOFT, 2013).
8.3.2.2 Distribuição
Uma vez absorvido, o cádmio é distribuído para todo o organismo, normalmente pela metalotioneína,
proteína de baixo peso molecular que contém grupamentos sulfidrílicos. Cerca de 30% do metal são
depositados nos rins, sendo que o mesmo percentual é depositado no fígado, e cerca de 40% do restante
de cádmio são distribuídos para as demais partes do organismo. A meia-vida biológica do cádmio
presente no sangue varia de 75 a 128 dias, lembrando que ela está associada, sobretudo, à deposição
do metal nos órgãos, e a meia-vida biológica do cádmio no organismo é de 25 anos (BERNHOFT, 2013).
8.3.2.3 Excreção
O cádmio é excretado pela urina em baixas quantidades, e o aumento da exposição ao metal eleva,
paulatinamente, a excreção urinária. A quantidade de metal excretada nas fezes é a somatória da
excreção do cádmio excretado por via biliar, que foi desprendido da mucosa intestinal, mais a fração
que não foi absorvida pelo organismo (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2014).
Dependendo das condições de exposição ao cádmio, pode haver lesão tecidual por meio de
alterações epigenéticas na expressão do DNA, inibição competitiva das ações fisiológicas do magnésio
ou do zinco, indução do estresse oxidativo, indução da apoptose por comprometimento da função
mitocondrial, inibição da síntese do heme e depleção da glutationa. A presença do arsênio e chumbo
pode intensificar o efeito do cádmio no organismo humano, e a presença de selênio e zinco pode
minimizar seus efeitos tóxicos (BERNHOFT, 2013).
442
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Como visto anteriormente, aproximadamente 30% do cádmio são depositados nos rins, tornando-os
o principal órgão-alvo. O segmento proximal do túbulo renal é alvo da deposição do metal, o que
pode levar à síndrome de Fanconi, na qual o processo de reabsorção de fosfato, bicarbonato, glicose,
aminoácido e proteínas é comprometido, e também pode ocorrer o prejuízo no processo de transporte
de proteínas induzido por dano oxidativo, com possível indução à apoptose das células tubulares.
Se a metalotioneína protege o organismo humano dos efeitos tóxicos do cádmio, então por que o
organismo se intoxica pelo metal?
Evidências epidemiológicas apontam que o metal pode estar relacionado à morte súbita, à
hipertensão arterial e ao infarto do miocárdio.
Uma proposta de mecanismo de ação que justifique esses danos está associada à inibição da
produção de óxido nítrico e consequente vasoconstrição direta. Os monócitos podem transportar o
metal para a parede vascular e induzir ao acúmulo do metal em vasos importantes, como no endotélio
da aorta, ainda que danos diretos nos miócitos também tenham sido documentados. Pode haver
alterações hematológicas como a supressão acentuada da produção de eritropoietina, hemólise e
anemia (BERNHOFT, 2013).
443
Unidade III
O metal também pode ser considerado um desregulador endócrino, aparentemente, por alterar a
síntese de hormônios hipofisários, em que elevados teores de cádmio no sangue levam a uma supressão
da produção de hormônio tireoestimulante (TSH).
8.3.4 Carcinogenicidade
O cádmio e seus compostos são classificados no grupo 1 pela Iarc (2016). O metal é considerado
carcinogênico pulmonar, apresenta um risco potencial para o câncer de mama e de pâncreas e pode
induzir ao câncer de rim e de próstata, além de induzir à hiperplasia de células testiculares e afetar a
produção de testosterona (RAHIMZADEH et al., 2017).
8.3.5 Diagnóstico
A nefrotoxicidade é a principal manifestação tóxica pela exposição crônica ao cádmio. Alguns autores
sugerem que a exposição ao metal está associada aos danos renais quando a concentração do cádmio é
igual ou superior a 0,5 µg/g de creatinina, na urina, e danos extensos ocorrem quando há concentrações
superiores a 2,0 µg/g de creatinina, na mesma matriz biológica.
Lembrete
O cádmio pode ser determinado na saliva, que por sinal é um excelente método para verificar a
contaminação por metais, por exposição a longo prazo, e também pode ser determinado no cabelo
e nas unhas. A espectrometria de massas de plasma indutivamente acoplada e a espectrofotometria
de absorção atômica são duas técnicas analíticas que podem ser utilizadas na quantificação do
cádmio no sangue.
8.3.6 Tratamento
O carvão vegetal não é muito efetivo na descontaminação do trato digestório, por não absorver o
metal efetivamente, e a avaliação dos possíveis danos hepáticos e no trato digestório, respiratório e
urinário faz-se necessária (RAHIMZADEH et al., 2017).
444
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Observação
O dipercaprol, o succímero e o unitiol são agentes quelantes bastante utilizados nessa terapia, e a
penicilamina é insuficiente para reduzir os efeitos do cádmio no organismo.
Observe os detalhes das características dos agentes quelantes. Como o cádmio se liga fortemente à
metalotioneína e é armazenado nos rins e no fígado, e como o succímero não é um quelante intracelular,
para alguns autores, esse agente quelante não é considerado o de escolha para o tratamento da
intoxicação pelo cádmio.
8.4 Chumbo
Segundo Rahde (1991), a intoxicação pelo chumbo pela exposição ocupacional é bastante comum,
sobretudo quando as empresas não adotam as medidas adequadas de prevenção da intoxicação. Uma
das vias de exposição que devem ser consideradas no ambiente de trabalho é a exposição pelo trato
respiratório, pela inalação de fumaça ou poeira contendo o metal.
Entretanto, além da exposição ocupacional, outras fontes de exposição ao chumbo devem ser
consideradas. Pode haver a ingestão do metal pela exposição a água e alimentos contaminados pelo
metal. A cerâmica vitrificada pode conter chumbo em sua composição e, consequentemente, ao ingerir
água ou alimentos acondicionados nesse recipiente, pode haver exposição ao metal.
O que as crianças veem, colocam na boca. Não é isso o que acontece? No que se refere à exposição
ao chumbo, não é diferente.
445
Unidade III
O chumbo orgânico é cada vez menos utilizado. Entretanto, naftenatos e estearatos de chumbo
ainda são utilizados em sabões de chumbo e como estabilizantes em materiais plásticos. Em alguns
países, ainda se utiliza o chumbo tetraetila na gasolina, e durante a produção, a mistura e o transporte
desse combustível, pode haver a intoxicação do trabalhador (GIDLOW, 2004).
8.4.2 Toxicocinética
8.4.2.1 Absorção
De 5% a 15% do chumbo inorgânico a que o organismo se expõe pelo trato digestório são absorvidos.
O restante é excretado pelas fezes, mas, mais uma vez, as condições de exposição podem alterar bastante
o cenário de absorção do xenobiótico.
No início deste material vimos que o estado de plenitude ou de vacuidade gástrica pode interferir na
absorção de uma substância química, não é? Quando uma pessoa está em jejum e se expõe ao chumbo
inorgânico, pode haver um incremento de até 45% da absorção do metal. Um dos motivos pelos quais
as crianças são mais sensíveis ao chumbo decorre do fato de os lactentes e crianças terem uma absorção
do chumbo inorgânico 53% superior a adultos.
O que nos chama muito a atenção é que as informações preliminares que foram transmitidas
neste livro-texto nos substanciam para que possamos compreender, com ainda mais facilidade, as
informações posteriores.
8.4.2.2 Distribuição
A maior parte do chumbo presente no sangue está ligada aos eritrócitos. Para que você tenha
dimensão, a concentração do metal presente nos eritrócitos é cerca de 16 vezes superior à concentração
446
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
no plasma. O chumbo é distribuído para o fígado e rins e, em seguida, redistribuído para o cabelo, dentes
e ossos, sendo que cerca de 95% da carga corporal do metal concentram-se nos ossos.
A determinação da meia-vida biológica do chumbo no organismo humano não é uma tarefa fácil
de realizar, mas estima-se que nos eritrócitos seja de 35 dias, de 40 dias quando presente no sistema
nervoso, fígado e rins, que são tecidos moles, e cerca de 25 anos quando presente no tecido ósseo
(RAHDE, 1991).
8.4.2.4 Metabolismo
O chumbo elementar e os compostos inorgânicos de chumbo não são biotransformados pelo organismo
humano (RAHDE, 1991). Entretanto, diferentemente do chumbo metálico e compostos inorgânicos de
chumbo, o chumbo tetraetila, uma forma de chumbo orgânico, sofre biotransformação hepática e dá origem
a compostos alquílicos de chumbo, excretados na urina. Essa é uma situação patognomônica de intoxicação
por chumbo orgânico, quando a concentração do chumbo no sangue é moderamente elevada, enquanto os
níveis do metal na urina são extremamente elevados (GIDLOW, 2004).
8.4.2.5 Excreção
8.4.3 Toxicodinâmica
O chumbo interfere em processos bioquímicos e pode prejudicar sistemas enzimáticos por inibição
dos grupamentos sulfidrílicos proteicos.
8.4.4 Toxicidade
A exposição fatal ao chumbo é rara, e acidentes fatais demonstram que ocorrem pela exposição
acima de 30 g para acetato de chumbo ou carbonato de chumbo. Na exposição aguda, os sintomas mais
frequentes associados à exposição pelo trato digestório incluem vômitos, anorexia e cólica abdominal.
Com menor frequência, pode ocorrer o aparecimento de parestesia, cãibras e dores nos membros
447
Unidade III
inferiores, e a evolução do quadro clínico pode levar a disfunção renal, anemia hemolítica e choque
(RAHDE, 1991).
Em crianças, a morte ocorre quando o nível de chumbo no sangue (plumbemia) é igual ou superior
a 1250 μg/L.
No ambiente de trabalho, a via de exposição mais importante é o trato respiratório, quando pode
haver a inalação de fumaça, óxidos de chumbo e partículas do chumbo finamente divididas. Entretanto,
a exposição aguda por essa via é bastante incomum.
Vários são os sintomas decorrentes da exposição crônica pelo trato digestório do chumbo elementar
e seus sais, mas caracterizam-se sobretudo pelo gosto metálico, náusea, vômito, cólicas abdominais,
anorexia, linha de Burton, que consiste em uma linha azulada nas margens da gengiva (veja a figura a
seguir), letargia, encefalopatia, irritabilidade e convulsões (RAHDE, 1991).
Dois grandes grupos de pessoas são normalmente afetados pela exposição crônica ao chumbo:
adultos, pela exposição ocupacional, e crianças (RAHDE, 1991).
Os efeitos tóxicos decorrentes da exposição crônica ao chumbo pelo trato respiratório são
bastante parecidos com os da exposição pelo trato digestório, em que se observam cefaleia, distúrbio
do sono, fadiga, náuseas, vômitos, cólica abdominal, constipação, anorexia e ossos e músculos
doloridos. As crianças podem desenvolver encefalopatia, anemia e distúrbios do nervo periférico
(SCHVARTSMAN, 1996).
448
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Observação
A exposição ao metal ainda pode prejudicar a fisiologia das mitocôndrias no SN, produzir lesões
na alça de Henle e nos túbulos proximais renais, reduzir o tempo de vida dos eritrócitos e prejudicar a
síntese do heme (RAHDE, 1991), em que pode haver a inibição de enzimas que participam da biossíntese
do grupo heme, que forma a hemoglobina, como a do ácido Δ-aminolevulínico (Δ-ALA) desidratase,
coproporfibilogênio (CPG) oxidase e ferro quelatase ou heme-sintase, com consequente acúmulo no
organismo de Δ-ALA na urina, coproporfibilogênio na urina (CPU) e protoporfirina IX livre (EP) ou da
protoporfirina zincada (ZPP) (veja a figura a seguir) (SILVA, 2001).
Pb
Hemoglobina
449
Unidade III
Observação
Nos casos mais graves, podem ser observadas alterações encefalopáticas associadas às cólicas
abdominais, estas últimas resistentes a tratamento antiespasmódico convencional. Hipertensão arterial
sistólica pode também ser detectada nos casos agudos, além de palidez cutânea (devido à vasoconstrição
periférica) e icterícia (devido à hemólise) (CAPITANI, 2009).
Em casos de grave intoxicação, pode acontecer um fato clássico e importante: as cólicas satúrnicas.
São intensas cólicas abdominais que podem ser confundidas com outras doenças, como a apendicite,
e são refratárias ao tratamento com agentes antiespasmóticos tradicionais (CAPITANI; MADUREIRA;
MOREIRA FILHO, 2004).
450
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
8.4.6 Diagnóstico
A plumbemia indica principalmente a exposição recente ao metal, e não a carga corpórea total
(WANI; ARA; USMANI, 2015).
Observação
Ainda que a quantificação da protoporfirina eritrocitária na amostra de sangue possa ser utilizada
no diagnóstico da intoxicação pelo metal, a identificação da protoporfirina eritrocitária aumentada
isolada não é um análise sensível e apresenta um limiar alto de detecção, ou seja, pode não ser suficiente
para identificar os níveis de chumbo abaixo de 35 µg/dL no sangue (WANI; ARA; USMANI, 2015).
Duas formas bastante utilizadas para o diagnóstico de exposição ao metal por crianças são a
identificação da presença de uma banda radiopaca na região distal das metáfises de ossos longos em
processo de desenvolvimento e a radiografia do abdome da criança, caso tenha havido uma exposição
pelo trato digestório (CAPITANI, 2009). A fluorescência de raio-X é uma técnica não invasiva capaz de
medir o chumbo nos ossos e expressa a exposição da carga corporal total e cumulativa (WANI; ARA;
USMANI, 2015).
451
Unidade III
8.4.7 Tratamento
Ainda que a intoxicação pelo chumbo possa causar efeitos graves no organismo, é evitável. Uma das
formas de reduzir a exposição é desencorajar as crianças a colocarem a mão na boca (tarefa inglória!) e
orientá-las a lavar frequentemente as mãos, além de aumentar a ingestão de ferro e cálcio (WANI; ARA;
USMANI, 2015). O chumbo pode ser liberado para a água potável, quando presente nos encanamentos
de metal, que transportam água, ou pode estar presente nas soldas. Com o tempo, o chumbo presente
na solda é levado pela água e pode haver a exposição ao metal pelo trato digestório. Sugere-se, assim,
a substituição dos canos metálicos por canos de plástico (WANI; ARA; USMANI, 2015).
Observação
A água quente pode liberar mais chumbo para água que a água fria.
Os limites máximos de chumbo tolerados em alimentos são definidos pela Portaria n. 685 da Anvisa,
de 27 de agosto de 1998 (BRASIL, 2013). A IDA do chumbo em adultos é de 50 μg/kg peso corpóreo ou
3 mg para adultos e de 25 μg/kg peso corpóreo para crianças (RAHDE, 1991).
O TLV-TWA para poeira ou fumos de chumbo inorgânico é de 150 μg/m3 (RAHDE, 1991). O VR do
chumbo no sangue (PbS) é de 40 mg/dL e o IBMP é de 60 mg/dL (BRASIL, 1994).
Saiba mais
452
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
8.4.9 Carcinogenicidade
O quadro a seguir apresenta a classificação do metal, segundo sua especiação, pela Iarc.
8.5 Mercúrio
Você se recorda de Alice no país das maravilhas e do personagem Chapeleiro Maluco? Não estamos
apresentando um quadro de intoxicação com alucinação a ponto de expor em vão uma obra-prima da
literatura mundial escrita por Lewis Carroll em um capítulo de um livro de toxicologia! Não, isso também
não é um delírio! Mas qual é o sentido desse personagem estar presente em um módulo tão específico
como a toxicologia dos metais? Calma! Você já vai compreender. Você se recorda de que o Chapeleiro
Maluco era muito estressado? Você se lembra também se havia alguma alteração na coloração dos olhos
desse personagem? Ao longo da leitura deste tópico, você terá subsídios para unir os pontos entre o
Chapeleiro Maluco, personagem do livro, com a toxicologia do mercúrio.
O mercúrio é um metal excêntrico, uma vez que é o único metal líquido nas CNTP.
Além de ser um metal excêntrico, o mercúrio é também uma ameaça para o meio ambiente,
animais e humanos. Fontes antropogênicas representam 30% de toda a emissão anual de mercúrio
para a atmosfera, enquanto 10% da emissão do metal advêm de fontes naturais e 60% correspondem
à reemissão, ou seja, de uma redistribuição do mercúrio que foi previamente liberado durante séculos
nos mares e solo. Para que você tenha dimensão, em 2010, foram liberadas cerca de 1.960 toneladas
de mercúrio diretamente para a atmosfera. Nesse mesmo ano, a queima do carvão para a obtenção de
energia para uso industrial e geração de energia liberou 475 toneladas de mercúrio (UNEP, 2013).
Exemplo de aplicação
Você é capaz de dar exemplos de onde o mercúrio metálico pode estar presente no nosso cotidiano?
453
Unidade III
Possivelmente, na sua infância, você viu um termômetro clínico sendo quebrado acidentalmente.
E é fascinante: liberam-se esferas prateadas brilhantes de diversos tamanhos que se “fundem” umas nas
outras com constante mudança de diâmetro dessas esferas. Não foi isso que aconteceu?
Essas esferas são o mercúrio metálico líquido. Recorda-se de que alguns minutos após ter presenciado
essas esferas você as perdeu, ou seja, constatou que elas desapareciam paulatinamente? É exatamente
isso o que acontece: elas se volatilizam. Recorda-se, também, de que foi exposto que o mercúrio é o
único metal nas CNTP? Assim, caso a temperatura esteja superior a 20 ºC, o metal tende a se volatilizar
e vai para o ar, e isso é um grande problema toxicológico.
Observação
Exemplo de aplicação
Pela forma como o mercúrio está presente no cinábrio, você consegue fazer uma projeção de
sua toxicodinâmica?
8.5.3 Toxicocinética
Ao estudar metais, deve-se prestar atenção na especiação do metal, ou seja, nas suas características
físicas e químicas.
8.5.3.1 Absorção
Compostos mercuriais inorgânicos solúveis, como o cloreto mercuroso, podem ser rapidamente
absorvidos em até 10% pelo trato digestório. O restante do composto inorgânico mercurial pode
454
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
O cinábrio é particularmente pouco absorvido por essa via de exposição, uma vez que é insolúvel. Mas
atente-se: a exposição crônica, caracterizada pela exposição a pequenas quantidades, mas por longo
período, também pode levar à intoxicação pelo metal (KOLEV; BATES, 1996). Você consegue visualizar
como é tudo muito dinâmico?
Há uma importante situação envolvendo a exposição ao mercúrio orgânico pelo trato digestório
e gostaríamos que você se apropriasse entusiasticamente da informação quando estudarmos o que
aconteceu em Minamata.
Leia atentamente a informação a seguir, uma vez que muito nos impressiona o número que iremos
transmitir a você. Preste atenção: em função de sua rápida difusão através da membrana alveolar, até
80% do vapor do mercúrio metálico podem ser absorvidos pelos alvéolos pulmonares.
E você sabe por que o vapor do mercúrio metálico é absorvido com tanta intensidade? Porque é
lipossolúvel, e como vimos extensamente, substâncias lipossolúveis são absorvidas com facilidade pela
membrana plasmática.
O mercúrio elementar na forma líquida é moderadamente absorvido pela pele, dependendo das
condições de exposição (AZEVEDO, 2003). Estudos em animais apontam que o cloreto de mercúrio
aplicado sobre a pele de animais é até 8% absorvido dentro de cinco horas.
Exposição vaginal
Compostos mercuriais presentes em géis vaginais são prontamente absorvidos pela mucosa vaginal
e armazenados no organismo (KOLEV; BATES, 1996).
8.5.3.2 Distribuição
455
Unidade III
Quantidades menores do metal são distribuídas para os intestinos delgado e grosso, pele, fígado,
baço, mucosa do trato respiratório, glândulas salivares, encéfalo, músculo esquelético, coração e pulmões.
Há um armazenamento do metal por curto período no fígado, ossos e medula óssea. Uma semana após
a exposição, entre 85% a 95% do mercúrio ao qual o organismo se expôs são armazenados nos rins,
mas também no encéfalo; o metal apresenta especial afinidade às regiões basal e frontal desse órgão.
Acreditamos que com o olhar analítico e toxicológico desenvolvido ao longo da disciplina, você já
consiga estimar quais são os órgãos-alvo do metal, não é mesmo? Encéfalo e rins.
A especiação dos metais nos traz muitas particularidades. O mercúrio orgânico, por exemplo, tem a
capacidade de se concentrar mais nos eritrócitos, diferentemente dos compostos mercuriais inorgânicos.
Assim, a taxa da concentração do mercúrio presente nos eritrócitos e no plasma é um indicativo se o
organismo se expôs ao mercúrio orgânico ou inorgânico. Não é muito interessante quando lemos a
informação e conseguimos realizar conjecturas?
Essa é mais uma informação relevante. Vamos ver a seguir se você compreendeu bem: qual especiação
do mercúrio atravessa membranas com mais facilidade, o metálico na forma de vapor ou os compostos
mercuriais inorgânicos?
Você se recorda, quando falamos sobre os que tiveram a oportunidade de interagir com o mercúrio
elementar na forma líquida, de que o metal tende a ficar na forma esférica e que alguns minutos depois
desaparecia porque se volatilizava? Você também se recorda de que até 80% do vapor mercúrio metálico
são facilmente absorvidos pelo trato respiratório? Ótimo! Sabe qual é a consequência disso? O mercúrio
metálico na forma de vapor é amplamente absorvido e há uma tendência de acúmulo do metal no
encéfalo. Assim, o mercúrio metálico exposto a temperaturas superiores a 20 ºC se volatiliza, é bastante
lipossolúvel, é intensamente absorvido e pode causar danos ao organismo, inclusive encefálicos.
456
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Observação
8.5.3.3 Biotransformação
Você acredita que a meia-vida biológica do mercúrio seja igual para todos os órgãos?
Muito bem! Você se recordou que o vapor do mercúrio elementar é rapidamente absorvido pelo
trato respiratório, atravessa barreiras biológicas prontamente e atinge o encéfalo. Após sua oxidação,
é oxidado a mercúrio inorgânico e, consequentemente, é eliminado mais lentamente (KOLEV; BATES,
1996). Esse é o raciocínio toxicológico. É possível concluirmos, portanto, que dependendo do órgão no
qual o metal está presente e de sua especiação, o mercúrio pode ter variação do tempo de permanência
nesse órgão e, consequentemente, no organismo. Uma das mais marcantes alterações que ocorre com
o metal, no organismo humano, é sua oxidação pela catalase, quando encontrado no encéfalo, o que
retarda sobremaneira sua excreção desse órgão.
8.5.3.4 Excreção
A urina é a principal via pela qual o metal é expulso do organismo, mas também são encontradas
quantidades consideráveis de mercúrio nas fezes. Suor e lágrimas também excretam o metal, mas em
concentrações baixas, quando se compara com as excreções renal e fecal. Logo após a exposição, o
metal já começa a ser excretado. A maior parte do mercúrio é excretado em uma semana, caso tenha
havido exposição única, mas, ainda que em baixas quantidades, o metal pode ser encontrado por meses
na urina e fezes, sempre lembrando que o encéfalo tende a reter o metal por um longo período (KOLEV;
BATES, 1996).
Além do encéfalo, os rins também apresentam uma significativa tendência de acumular o mercúrio.
Após exposição única, entre 60% a 70% do mercúrio estão presentes nesse órgão.
Entre 60% e 70% do mercúrio ao qual o organismo se expôs são excretados na forma da
mercúrio-sulfidrila.
457
Unidade III
8.5.4 Minamata
Na década de 1950, no Japão, a empresa Chisso Co. Ltd. utilizava o mercúrio como catalisador
de processos industriais, mas não tratava seus efluentes, que eram lançados diretamente no mar da
cidade portuária de Minamata. Após algum tempo, observou-se que os gatos da cidade começaram a
apresentar um comportamento estranho: se jogavam no mar. As aves não voavam de forma sincrônica
e muitas se impactavam contra o solo.
Exemplo de aplicação
Faça agora um retrospecto dos principais pontos abordados envolvendo o mercúrio. Preste atenção
na leitura a seguir e veja se você consegue identificar ou relacionar as informações.
Uma das maneiras para que você compreenda como o mercúrio age no organismo humano é
saber que o metal é capaz de precipitar proteínas: ele interage com grupamentos sulfidrílicos e, por
consequência, as proteínas precipitadas perdem suas respectivas funções (KOLEV; BATES, 1996).
A despeito da inespecificidade sobre o mecanismo de ação por inibição dos grupamentos sulfidrílicos,
os compostos mercuriais são potentes toxicantes que comprometem a sobrevivência das células,
prejudicam a função de proteínas de membrana, enzimas e ácidos nucleicos e prejudicam os mecanismos
de transporte através da membrana, além de serem imunotóxicos. O metal também pode causar necrose
por precipitação de proteínas quando em contato direto com o tecido.
8.5.6 Toxicidade
458
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
A exposição a soluções concentradas de sais de mercúrio pode induzir a uma intensa precipitação
proteica na membrana das mucosas do trato digestório, com vômito e dor epigástrica, diarreia
sanguinolenta, colapso circulatório e morte. Em 24 horas pode haver a necrose do epitélio do túbulo
proximal renal e pela ativação do sistema angiotensina e pode ocorrer vasoespasmo.
Como o vapor do mercúrio elementar é lipossolúvel e atravessa membranas com facilidade, também
é capaz de atravessar a barreira hematoencefálica. Ele pode ser neurotóxico e levar a efeitos como
tremores e aumento da excitabilidade.
Exemplo de aplicação
Gostaríamos que você parasse um pouco e identificasse o que há de comum entre o último parágrafo
e os sinais e sintomas apresentados pelos trabalhadores da fábrica de chapéus ou do Chapeleiro Maluco.
A exposição aguda aos vapores do mercúrio elementar também pode levar à dificuldade respiratória,
tosse, tosse sanguinolenta, dor no peito e pneumonite intersticial (KOLEV; BATES, 1996).
Os compostos mercúricos são mais corrosivos para os olhos em comparação com os mercuriais.
Vamos refletir um pouco sobre a exposição ao calomel? Essa substância é o cloreto de mercúrio. Você
teria condição de estimar o órgão-alvo afetado por esse composto?
Você se lembrou que o rim é um dos órgãos-alvo dos compostos mercuriais inorgânicos. É assim que
se faz o raciocínio toxicológico. Além dos possíveis danos renais, o mercúrio também pode apresentar
aumento da salivação e linhas pretas nos dentes por conta da precipitação do mercúrio ligado ao
enxofre (KOLEV; BATES, 1996).
Observação
Os danos renais estão associados à lesão glomerular que, por consequência, manifestam a
glomerulonefrite e proteinúria e pelo dano tubular, consequência da necrose e dos danos causados nos
túbulos proximais.
460
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Mas os efeitos tóxicos não param por aí. Pode haver o eretismo, ou seja, elevação do estado de
excitabilidade do sistema nervoso, labilidade emocional (você se lembra como o Chapeleiro Maluco
ficava irritado com facilidade?), depressão severa, perda de memória, alteração do comportamento e
personalidade, alucinação e delírio (KOLEV; BATES, 1996).
A exposição crônica ao metal pela pele pode levar ao eritema, dermatite de contato, hipersensibilidade
retardada mediada por células e acrodinia, ou doença rosa, também conhecida por pink baby disease.
Essa doença apresenta uma reação idiossincrática causada pela exposição crônica ao mercúrio elementar
ou inorgânico, que ocorre na maioria das vezes em lactentes e crianças, mas também pode ocorrer em
adultos, e é caracterizada por erupção generalizada na pele, hipertensão, sudorese, taquicardia, anorexia,
insônia e erupção cutânea eritematosa e descamativa nas palmas das mãos (veja a figura a seguir) e
plantas dos pés (IBRAHIM et al., 2006), ulceração no couro cabeludo e alopecia (KOLEV; BATES, 1996).
Voltemos ao filme Alice no país das maravilhas. Você reparou que os olhos do Chapeleiro Maluco
tinham uma cor estranha? Agora, observe a informação a seguir para você compreender ainda melhor
por que os olhos do personagem tinham uma cor atípica.
461
Unidade III
Observação
8.5.7 Carcinogenicidade
8.5.8 Diagnóstico
O mercúrio inorgânico e o metálico podem ser determinados no sangue total ou na urina, lembrando
que os níveis de mercúrio no sangue tendem a ser mais elevados em comparação com os da urina em
uma exposição aguda (OLSON, 2014).
Ainda que o metal possa ser determinado na urina, observe como é importante conhecermos a
toxicocinética: apenas 10% do mercúrio orgânico são excretados pela urina e o restante, pelas fezes.
Inferimos, assim, que a determinação do metal na urina não parece ser um bom bioindicador de
exposição ao metal.
Acompanhe conosco outra constatação interessante: a exposição crônica faz com que haja a
deposição do metal no cabelo, de forma que a determinação do mercúrio no cabelo estima a exposição
crônica ao metal. N-acetilglicosaminidase e microalbuminúria podem ser úteis como marcadores
urinários e capazes de estimar efeitos precoces.
Observe como a perspicácia toxicológica deve estar sempre em primeiro plano quando se trata de
sinais e sintomas de intoxicação: existe um tumor que estimula a secreção pelas células cromafins de
catecolaminas, que é o feocromocitoma. Quando o organismo se intoxica pelo mercúrio, pode apresentar
um quadro de tremor, suor e hipertensão, que também são clássicos na feocromocitoma, podendo induzir
a erro de diagnóstico, em que o paciente está intoxicado pelo metal e o clínico associa os sintomas
e sinais com a secreção das catecolaminas liberadas pelo tumor. A quantificação das catecolaminas
na urina e no sangue é uma forma de realizar o diagnóstico diferencial e, consequentemente, dar
prosseguimento ao atendimento de emergência, pela exposição ao mercúrio (FARIA, 2003).
462
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
8.5.9.1 Descontaminação
Inalação
A vítima deve ser removida do local da exposição o mais brevemente possível após a inalação do vapor
do mercúrio. Pela iminente pneumonia aguda e edema pulmonar, é necessário monitorar atentamente
por várias horas e administrar oxigênio suplementar.
A limpeza do derramamento do mercúrio metálico deve ser feita preferencialmente por vácuo.
Ingestão
Pequenas quantidades de mercúrio líquido geralmente atravessam o trato digestório sem serem
absorvidas. Assim, pode ser necessária a remoção cirúrgica do metal dependendo da evidência do raio-X,
caso acuse acúmulo de grandes quantidades no trato digestório.
Na ingestão de sais inorgânicos mercuriais, é necessário proceder com a lavagem gástrica, mas
não deve-se induzir o vômito, pelo grave risco de dano tecidual por corrosão, e solicitar exame de
endoscopia. A insuficiência renal, a gastrenterite grave e o choque são iminentes caso o organismo se
exponha a grande quantidade de compostos inorgânicos mercuriais pelo trato digestório.
Há relatos de reações alérgicas pela utilização de amálgama na restauração dentária. Nesse caso,
a administração de anti-histamínicos normalmente é suficiente. Se o caso clínico se intensificar,
sugere-se a remoção do amálgama da restauração.
8.5.9.2 Tratamento
A substituição de fluídos deve ser utilizada agressivamente na iminência de choque, que pode ser
ocasionado pela exposição oral por sais de compostos mercuriais. Deve-se considerar hemodiálise por
até duas semanas em caso de insuficiência renal aguda, relativamente comum nesses casos, mas que
também tende a ser reversível (OLSON, 2014).
Um dos cuidados que se deve ter quando se administram antídotos para o tratamento da intoxicação
pelo mercúrio é que a quelação deve ser iniciada apenas após o esvaziamento do conteúdo intestinal
contendo mercúrio, pela possibilidade do aumento da absorção do metal (FARIA, 2003).
próprio mercúrio, por exemplo, pode ser tratada pela administração de um derivado da penicilina,
a penicilamina.
Observação
A penicilamina também pode ser utilizada como adjuvante no tratamento da intoxicação pelo
mercúrio quando o tratamento ocorre com o versenato dissódico de cálcio (EDTACaNa2), também
conhecido por ácido etilenodiaminotetracético cálcico dissódico, ou edetato dissódico de cálcio, ou
dimercaprol. O dimercaprol tem uma boa eficácia quando a exposição ocorre pelo trato digestório e deve
ser administrado em até quatro horas após a exposição a sais inorgânicos de mercúrio, para minimizar
os danos renais.
Deve-se atentar que o encéfalo pode ser considerado um órgão-alvo importante para compostos
organomercuriais ou mercúrio elementar, uma vez que esse antídoto pode redistribuir o metal para
esse órgão e causar ou aumentar a neurotoxicidade.
Observação
A excreção do mercúrio, assim como também a do chumbo, pela urina pode ser aumentada pela
administração de um análogo hidrossolúvel do dimercaprol, o succímero. Como visto, sais inorgânicos
mercuriais tendem à nefrotoxicidade, e o succímero aumenta a excreção do metal pela urina e,
consequentemente, protege contra os danos renais.
464
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Observação
8.6 Níquel
8.6.1 Introdução
O níquel é um metal ubíquo cujo percentual na crosta terrestre gira em torno de 0,008%.
Seu depósito de minério está na forma de sulfeto de níquel (HERTEL, 1991).
Na tabela periódica, o níquel se encontra após o ferro e o cobalto, no grupo VIII. Em condições
ambientais normais, seu estado de oxidação mais importante é o Ni2+, ainda que o metal também possa
se encontrar nos estados de oxidação 1, 0, 3+ e 4+ (ABADIN; FAY; WILBUR, 2005).
Alguns metais como o níquel e o chumbo devem sempre ser considerados na exposição humana e
de animais pela ingestão de água, uma vez que podem ser utilizados em tubulações de água potável
e resultar em contrações na água de até 500 µg de níquel por litro de água potável (HERTEL, 1991).
Outra situação que envolve a exposição ao metal é a quantidade de níquel presente nos alimentos.
Normalmente, os teores do metal não excedem 0,5 mg/kg de alimento fresco, mas alguns alimentos são
capazes de concentrar o metal, como farinha de aveia, nozes, soja, cacau e algumas leguminosas secas.
A intensidade de exposição ao metal presente no alimento também é ampla e depende da alimentação e
da cultura gastronômica, variando de 100 a 800 µg do metal por dia. Dependendo dos utensílios utilizados
para a preparação do alimento, sobretudo nas panelas, pode haver incremento da exposição ao metal.
A exposição pulmonar decorrente da inalação do metal presente no ar não pode ser desconsiderada.
Opostamente, dependendo da quantidade de níquel presente no ar, a absorção pode ser equivalente à
quantidade de níquel absorvido por um tabagista que fuma 40 cigarros por dia. O nível de exposição ao
metal pelo trato respiratório varia bastante, de 5 a 35 ng/m³, o que corresponde a uma taxa média de
absorção de 0,7 µg/dia.
465
Unidade III
Outra informação que nos remete ao nosso cotidiano é que algumas pessoas apresentam uma reação
de sensibilização ao metal pelo uso de piercings. Um dos motivos dessa reação é que, dependendo do
material utilizado na composição do piercing, o níquel pode estar presente em quantidade suficiente
para gerar uma reação de hipersensibilidade cutânea ou de mucosa, com possível infecção do local.
A qualidade do piercing deve ser avaliada antes de sua aplicação (HERTEL, 1991).
8.6.4 Toxicocinética
8.6.4.1 Absorção
Veja como alguns números nos chamam muito a atenção. Ao menos 50% de vapores de níquel
carbonila podem ser absorvidos pelos alvéolos pulmonares quando produzidos em alguns processos
industriais, sobretudo quando o monóxido de carbono interage com o níquel na forma metálica, sem
contar que a parte do metal que não é absorvida pode ser depositada na parede dos alvéolos e causar
dano ao organismo (ABADIN; FAY; WILBUR, 2005). Não impressiona a intensidade de absorção do metal
pelo trato respiratório?
Em ratos, apenas 0,1% da quantidade de cloreto de níquel ao qual o animal se expõe pelo trato
respiratório é encontrado nos pulmões, após 21 dias da exposição, uma vez que esse composto é solúvel
e sua depuração é, consequentemente, rápida. Após o jejum noturno, humanos absorvem entre 15% e
50% do níquel presente na água potável e cerca de 15% do metal presente nos alimentos.
Em média, um adulto de 70 kg possui uma carga corporal do metal de 0,5 mg. A maioria dos órgãos
apresenta uma concetração de 8 μg/kg a 10 μg/kg de peso úmido, como no encéfalo, fígado e rins. Mas
não é assim para todos os órgãos: a concentração do metal encontrado na adrenal, tireoide e pulmão é
de cerca de 20 μg/kg a 25 μg/kg, em peso úmido.
A cinética do metal pode ser influenciada por doenças, como no caso de queimaduras térmicas,
acidente vascular cerebral, infarto do miocárdio e cirrose hepática, mas não parece haver alteração
na concentração do metal em amostras biológicas em função da idade ou gênero (ABADIN; FAY;
WILBUR, 2005).
466
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
8.6.4.3 Metabolismo
No organismo, o níquel pode gerar a forma trivalente por metabolismo redox e formar espécies
reativas de oxigênio, as EROs. Neste material, tivemos a oportunidade de conversar sobre as interações
das substâncias químicas e seus impactos na saúde humana; agora, vamos ter a oportunidade de
contextualizar mais uma vez esses conceitos.
8.6.4.4 Excreção
O níquel não abosorvido pelo trato digestório é eliminado pelas fezes, e essa excreção reflete a
quantidade do metal ao qual o organismo está se expondo pela dieta. O organismo humano chega
a excretar 258 μg de níquel pelas fezes, por dia (ABADIN; FAY; WILBUR, 2005).
O níquel excretado pelas fezes é o que foi absorvido. Essa frase está correta?
A frase está incorreta: o metal em questão excretado pelas fezes é a fração que não foi absorvida.
Caso tenha sido absorvido, o metal será excretado principalmente pela urina, ainda que também possa
ser encontrado na saliva e no cabelo. O tempo que o organismo leva para excretar o metal pela urina
depende da especiação do metal. Compostos de níquel hidrossolúveis possuem meia-vida biológica que
varia de 11 a 39 horas em humanos. Para compostos particulados, a meia-vida biológica pode variar de
30 a 54 horas.
Observe como é interessante e importante a seguinte informação: elevados níveis de níquel oxídico
e níquel sulfídico presentes no ar geram pequenas quantidades do metal no plasma ou na urina, ou seja,
não existe uma relação confiável entre a concentração do metal no ar e na urina ou sangue, dependendo
da especiação do metal. Por outro lado, elevadas quantidades do metal presentes na mucosa nasal
provavelmente também refletem proporcionalmente a exposição nos pulmões, um possível órgão-alvo.
467
Unidade III
Diferentes técnicas analíticas podem ser utilizadas para correlacionar o metal e seus compostos,
dependendo da matriz biológica analisada (veja a tabela a seguir).
8.6.6 Toxicodinâmica
Nesse momento, estamos seguros de que você já conseguiu fazer uma leitura toxicológica da
informação e já é capaz de propor a possível toxicodinâmica desse meta.
Vamos raciocinar juntos: como o níquel está armazenado na crosta terrestre? Está ligado a alguma
substância química?
Isso mesmo, ligado ao sulfeto. Assim, no organismo humano, temos que imaginar que o metal
possivelmente estará ligado aos grupamentos sulfidrílicos e, consequentemente, irá inibir processos
enzimáticos, por exemplo.
468
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
8.6.7 Toxicidade
Pulmão
A exposição pelo trato respiratório é importante também considerando as reações alérgicas. A asma
pode ser desencadeada com prevalência a trabalhadores da indústria de galvanoplastia. A exposição ao
níquel orgânico pode induzir à asma, e a exposição aguda ao níquel carbonila pelo trato respiratório
pode gerar grave dano pulmonar (ABADIN; FAY; WILBUR, 2005).
Rim
Pode haver danos renais, normalmente reversíveis, em trabalhadores que se expõem ao metal
(ABADIN; FAY; WILBUR, 2005).
Pele
Além da exposição dérmica, os efeitos associados à dermatite e aos danos renais estão relacionados,
possivelmente, à exposiçao ao metal pelo trato respiratório e digestório. As mucosas também podem ser
afetadas, independentemente da via de exposição (ABADIN; FAY; WILBUR, 2005).
Observação
Você compreendeu o significado dessa observação? Parece não haver significativa diferença nos
teores do níquel presentes em amostras biológicas entre o homem e a mulher quando se expõem
nas mesmas condições. Entretanto, a dermatite alérgica é prevalente em mulheres.
Para que compreendamos melhor, quando expostos a testes adesivos com sulfato de níquel, a reação
de sensibilização é positiva para 11% das mulheres e apenas 2% dos homens.
469
Unidade III
Também deve-se considerar que as mulheres jovens são as que mais usam piercing na orelha, além
de outros tipos de piercings corporais (ABADIN; FAY; WILBUR, 2005).
Lembrete
Há evidências de que algumas pessoas sensíveis ao níquel expressam mais intensamente o antígeno
leucocitário humano (HLA) DRw6. Estima-se que o risco de sensibilidade ao níquel aos que expressam o
alelo HLA-DRw6 seja de 3,3.
Observação
Lembrete
470
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Veja mais uma consideração a respeito da relação entre as condições de exposição e a toxicidade
do níquel.
Normalmente, para que haja sensibilização pelo níquel, o organismo tem que se expor ao metal
por um tempo prolongado ou em dose elevada. O piercing, assim como algumas bijuterias, prolonga a
exposição do metal no organismo humano. Assim, a resultante dessa exposição pode ser uma dermatite
de contato, ou seja, uma reação inflamatória mediada por hipersensibilidade do tipo IV, que ocorre,
normalmente, abaixo do objeto contendo o metal. Destaca-se que quanto maior o tempo de exposição,
maior é a chance de a sensibilização se espalhar para outros locais, principalmente para as mãos. Após a
sensibilização, baixas doses do metal são suficientes para desencadear a dermatite. Para que você tenha
dimensão, a quantidade de níquel que serve de “gatilho” para a dermatite chega a ser mil vezes menor
em comparação com quem ainda não desenvolveu a sensibilidade.
Será que o tabagismo influencia no risco de câncer, aos que se expõem ao níquel? Vamos
ver isso agora.
Ressalta-se que a exposição ao níquel solúvel seja baixa em relação ao níquel particulado.
Entretanto, exposições concomitantes entre o níquel solúvel e as formas oxidativa ou sulfícida
aumentam o risco de câncer nesses órgãos, e parece haver efeito sinérgico entre a exposição ao
metal e ao tabagismo.
471
Unidade III
Entre 20% e 35% do metal menos solúvel ao qual o organismo se expõe pelo trato respiratório
tendem a ser absorvidos, e a fração não absorvida tende a ser excretada por movimento mucociliar
retrógrado, sendo engolida ou expectorada. No caso de exposição aguda ao níquel por essa via,
recomenda-se remover o intoxicado com a maior brevidade do local de exposição para um lugar onde
haja ar fresco e monitorar as funções respiratórias.
Os olhos e a pele devem ser cuidadosamente lavados, e a aplicação de cremes de barreira e de agentes
quelantes pode ser realizada para atenuar a absorção do níquel pela pele. O dietilditiocarbamato (DDC)
é um dos principais agentes quelantes no tratamento da intoxicação pelo níquel, e o dissulfiram é uma
alternativa na ausência do DDC. A penicilamina também pode ser utilizada no tratamento do níquel.
Entretanto, em função de sua toxicidade, não é o antídoto de primeira escolha.
Resumo
474
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
Exercícios
A mandioca apresenta substâncias que tem cianeto na molécula e que podem liberá-lo após reações.
Quando a célula de qualquer parte da planta se rompe (corte, esmagamento, trituração), uma enzima
presente na mandioca entra em contato com essas substâncias, formando compostos intermediários
que possuem o cianeto ligado. Esses compostos se decompõem espontaneamente ou por meio da ação
de outra enzima, liberando o cianeto, um composto tóxico para os seres humanos e animais.
A mandioca não tem cianeto, mas pode gerar cianeto. Essa confusão ocorre porque o teor das
substâncias que contêm cianeto na molécula é expresso em mg de ácido cianídrico (gerado após a ação
da enzima e decomposição dos compostos intermediários) por kg de raiz, folha ou produto de mandioca.
O ácido cianídrico, que evapora a 26 °C (passa de líquido para gás), é o cianeto na forma ácida.
No Brasil, a concentração de 100 mg de ácido cianídrico por kg de raiz fresca é considerada o limite
superior para o aipim ou a mandioca-mansa, conforme o estudo realizado pelo Instituto Agronômico de
Campinas (IAC) em 1985. O processamento pode diminuir a concentração das substâncias que contêm
cianeto, e alguns métodos de processamento são melhores do que outros para essa redução.
Fonte: DE OLIVEIRA, L. A. et al. Processamento de aipim e mandioca-brava. Embrapa Mandioca e Fruticultura, 2019.
Disponível em: https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/208034/1/CARTILHA-AIPIM-
Luciana-AINFO.pdf. Acesso em: 27 set. 2020.
I – Ao ser ingerido, o vegetal sem tratamento prévio entra em contato com o suco gástrico e, nesse meio
de baixo pH, catalisa a hidrólise dos glicosídeos cianogênicos, libera o cianeto (HCN) e gera intoxicação.
II – Ao ser ingerido, o vegetal sem tratamento prévio entra em contato com o suco gástrico e, nesse meio
de elevado pH, catalisa a hidrólise dos glicosídeos cianogênicos, libera o cianeto (HCN) e gera intoxicação.
475
Unidade III
I – Afirmativa correta.
Justificativa: o cianeto (HCN) pode causar intoxicação via alimentos in natura e que não passaram
por processamento prévio para anular seus efeitos. Contudo, nos vegetais, esse composto apresenta-se
na forma de glicosídeos cianogênicos que precisam ser hidrolisados para liberarem o cianeto molecular.
Tal processo ocorre em três diferentes situações, sendo uma delas no estômago pelo contato dos
glicosídeos cianogênicos com o suco gástrico (que representa um meio ácido – baixo pH), o que causa
liberação de aglicona e posterior formação do HCN.
II – Afirmativa incorreta.
Justificativa: pelo exposto na explicação da afirmativa I, o meio ideal para a hidrólise é de baixo pH.
Como existem muitas espécies de cogumelos – fala-se em 1,5 milhão – e nenhuma característica
física denuncia a presença de veneno ou substâncias alucinógenas, é muito difícil (e perigoso)
diferenciá-los no “olhômetro”. Para piorar as coisas, estima-se que nem 5% das espécies estejam
classificadas na literatura biológica. Isso significa que nem um micologista (especialista em fungos)
muito experiente pode enfiar na boca um cogumelo achado no meio da floresta. Mesmo que ele se
pareça muito com uma espécie comestível, é bom desconfiar, afinal, um mesmo gênero pode ter
espécies que matam, deixam doidão ou, simplesmente, enchem a barriga. Em laboratório, há duas
formas de se identificar um cogumelo: análise morfológica e bioquímica. A primeira nada mais é do que
comparar as características da espécie encontrada com as das já identificadas e catalogadas nos livros
científicos. Para isso, leva-se em conta o formato, as medidas e a coloração do cogumelo. Mesmo que
476
TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS
ele se pareça com alguma espécie conhecida, por precaução é analisado por um bioquímico treinado
para identificar a presença de toxinas (como a alfa-amanitina, encontrada no Amanita phalloides) e
de substâncias alucinógenas (como a psicilobina, do Psilocibe cubensis).
Os fungos são ubíquos e, quando na presença de substratos (por exemplo, amido), umidade e elevadas
temperaturas, podem proliferar e, dependendo da espécie do organismo, são capazes de produzir toxinas.
Sobre esse contexto, analise as afirmativas a seguir.
I – A ingestão de grãos, como milho, aveia e amendoim, pode causar intoxicação por aflatoxinas,
pois essas toxinas se originam da oxidação do amido presente nos alimentos citados.
III – As aflatoxinas representam sérias ameaças à saúde humana e animal. Podem ser ingeridas
quando nos alimentamos do próprio fungo produtor ou de alimentos contaminados por essas toxinas.
Riscos adicionais decorrem do fato de que as aflatoxinas são capazes de atravessar a placenta, chegando
ao embrião ou ao feto. Além disso, já foram encontradas no leite materno.
I – Afirmativa incorreta.
477
Unidade III
II – Afirmativa correta.
Justificativa: as aflatoxinas são compostos presentes na forma de cristais que variam de incolor
a amarelo claro e que resultam do metabolismo secundário de fungos como Aspergillus flavus,
A. parasiticus, A. ochraceoroseus, A. nomius, A. australis, A. pseudotamarii e A. bombycis.
Justificativa: as aflatoxinas são toxinas relacionadas com muitos casos de intoxicação em animais
e nos seres humanos. Além de serem ingeridas diretamente a partir do fungo produtor, elas podem
estar em muitos alimentos contaminados por esse fungo, como nozes, aveia, cevada, trigo, soja, arroz,
malte, sementes de algodão, sorgo, girassol, pimenta, pimenta preta, açafrão, coentro, amêndoas, nozes,
pistache, coco, leite e produtos lácteos. Esses dois últimos alimentos revelam outra característica dessa
micotoxina: a transferência para o leite materno. Aliás, já foi documentada até a transmissão da toxina
pela placenta.
478
FIGURAS E ILUSTRAÇÕES
Figura 1
GRANDJEAN, P. Paracelsus revisited: the dose concept in a complex world. Basic & Clinical
Pharmacology & Toxicology, v. 119, n. 2, p. 126-132, 2016. p. 127.
Figura 2
OGA, S.; CAMARGO, M. M. A.; BATISTUZZO, J. A. O. Fundamentos de toxicologia. 4. ed. São Paulo:
Atheneu, 2014. Adaptada.
Figura 3
Figura 4
KLAASSEN, C. D.; WATKINS, J. B. Fundamentos em toxicologia de Casarett e Doull. 2. ed. Porto Alegre:
AMGH, 2012. p. 19.
Figura 5
KLAASSEN, C. D. et al. Casarett and Doull’s toxicology: the basic science of poisons. 6. ed. Nova York:
McGraw-Hill, 2001. p. 154.
Figura 6
KLAASSEN, C. D. et al. Casarett and Doull’s toxicology: the basic science of poisons. 6. ed. Nova York:
McGraw-Hill, 2001. p. 163.
Figura 7
KLAASSEN, C. D.; WATKINS, J. B. Fundamentos em toxicologia de Casarett e Doull. 2. ed. Porto Alegre:
AMGH, 2012. p. 77.
Figura 8
OGA, S.; CAMARGO, M. M. A.; BATISTUZZO, J. A. O. Fundamentos de toxicologia. 4. ed. São Paulo:
Atheneu, 2014. Adaptada.
479
Figura 9
Figura 10
ZANASI JR., S. et al. Queimadura por soda cáustica. Arquivos Brasileiros de Ciências da Saúde, v. 33,
n. 1, 2008. p. 48.
Figura 11
NETO, P. D. L. S. et al. Envenenamento fatal por baiacu (Tetrodontidae): relato de um caso em criança.
Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, v. 43, n. 1, 2010. p. 93.
Figura 12
Figura 23
Figura 45
Figura 46
Figura 47
480
Figura 48
Figura 49
Figura 50
Figura 51
A) PLANT-BARLEY-WHEAT-GRAIN-DISH-MEAL-FOOD-PRODUCE-CROP-CORN-BREAKFAST-BEER-
CEREAL-VEGETARIAN-FOOD-GRAINS-FLOWERING-PLANT-COMMODITY-EMMER-SUNFLOWER-SEED-
BEER-PRODUCTION-GRASS-FAMILY-LAND-PLANT-FOOD-GRAIN-EINKORN-WHEAT-WHOLE-GRAIN-
THE-MALT-WHEAT-MALT-BARLEY-MALT-957469.JPG. Disponível em: https://get.pxhere.com/photo/
plant-barley-wheat-grain-dish-meal-food-produce-crop-corn-breakfast-beer-cereal-vegetarian-
food-grains-flowering-plant-commodity-emmer-sunflower-seed-beer-production-grass-family-land-
plant-food-grain-einkorn-wheat-whole-grain-the-malt-wheat-malt-barley-malt-957469.jpg. Acesso
em: 15 dez. 2020.
C) PLANT-FRUIT-FOOD-PRODUCE-YELLOW-BANANA-MATURE-FLOWERING-PLANT-BANANA-DA-
TERRA-LAND-PLANT-BANANA-FAMILY-COOKING-PLANTAIN-BUNCH-OF-BANANAS-1294883.
JPG. Disponível em: https://get.pxhere.com/photo/plant-fruit-food-produce-yellow-banana-
mature-flowering-plant-banana-da-terra-land-plant-banana-family-cooking-plantain-bunch-of-
bananas-1294883.jpg. Acesso em: 15 dez. 2020.
D) POTATOES-VEGETABLES-RAW-FOOD-POTATO-WALLPAPER-PREVIEW.JPG. https://c1.peakpx.com/
wallpaper/15/94/523/potatoes-vegetables-raw-food-potato-wallpaper-preview.jpg. Disponível em: .
Acesso em: 15 dez. 2020.
Figura 52
JUNGES, A. L. et al. Efeito estufa e aquecimento global: uma abordagem conceitual a partir da física
para educação básica. Experiências em Ensino de Ciências, Cuiabá, v. 13, n. 5, p. 126-151, 2018. p. 133.
481
Figura 53
Figura 54
Figura 55
Figura 56
SANSEVERINO, I. et al. Algal bloom and its economic impact. Joint Research Centre, 2016. p. 7.
Figura 57
Figura 58
Figura 59
KURODA, E. K. et al. Avaliação da toxicidade aguda de uma cepa de Microcystis spp. por meio de testes
com camundongos. Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 12, n. 1, p. 24-31, 2007. p. 27.
Figura 60
KURODA, E. K. et al. Avaliação da toxicidade aguda de uma cepa de Microcystis spp. por meio de testes
com camundongos. Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 12, n. 1, p. 24-31, 2007. p. 27.
482
Figura 61
Figura 62
Figura 63
PATOCKA, J.; GUPTA, R. C.; KUCA, K. Anatoxin-A (S): natural organophosphorus anticholinesterase
agent. Military Medical Sciences Letters, v. 80, p. 129-139, 2011. p. 130.
Figura 64
PATOCKA, J.; GUPTA, R. C.; KUCA, K. Anatoxin-A (S): natural organophosphorus anticholinesterase
agent. Military Medical Sciences Letters, v. 80, p. 129-139, 2011. p. 131.
Figura 65
UNITED STATES ENVIRONMENTAL PROTECTION AGENCY (USEPA). Drinking water health advisory
documents for cyanobacterial toxins. Usepa, 2015. p. 6.
Figura 66
Figura 67
TWINER, M. J. et al. Azaspiracid shellfish poisoning: a review on the chemistry, ecology, and toxicology
with an emphasis on human health impacts. Marine drugs, v. 6, n. 2, p. 39-72, 2008. p. 41.
Figura 68
TWINER, M. J. et al. Azaspiracid shellfish poisoning: a review on the chemistry, ecology, and toxicology
with an emphasis on human health impacts. Marine drugs, v. 6, n. 2, p. 39-72, 2008. p. 51.
483
Figura 69
REGUERA, B. et al. Dinophysis toxins: causative organisms, distribution and fate in shellfish. Marine
Drugs, v. 12, n. 1, p. 394-461, 2014. p. 396.
Figura 70
REGUERA, B. et al. Dinophysis toxins: causative organisms, distribution and fate in shellfish. Marine
Drugs, v. 12, n. 1, p. 394-461, 2014. p. 396.
Figura 71
SANSEVERINO, I. et al. Cyanotoxins: methods and approaches for their analysis and detection. Joint
Research Centre, 2017. p. 17.
Figura 73
PLANT-LEAF-FLOWER-PETAL-RED-BOTANY-GARDEN-FLORA-PLANTS-LEAVES-ANTHURIUM-SHRUB-
ORNAMENTAL-ARACEAE-SCARLET-FLOWERING-PLANT-LAND-PLANT-CANNA-FAMILY-1259930.JPG.
Disponível em: https://get.pxhere.com/photo/plant-leaf-flower-petal-red-botany-garden-flora-plants-
leaves-anthurium-shrub-ornamental-araceae-scarlet-flowering-plant-land-plant-canna-family-
1259930.jpg. Acesso em: 15 dez. 2020.
Figura 74
Figura 75
Figura 76
484
Figura 77
Figura 79
Figura 80
Figura 81
GROWTH-PLANT-LEAF-BLOOM-FLORAL-ENVIRONMENT-SPRING-HERB-NATURAL-FRESH-BOTANY-
HEALTHY-FLORA-BOTANICAL-ECO-ECOLOGY-ALTERNATIVE-GARDENING-HERBS-ORGANIC-
BIO-HERBAL-MEDICINAL-ECOLOGICAL-HOMEOPATHY-MEDICINAL-HERBS-THERAPEUTIC-REMEDY-
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