A ação reivindicatória, iniciadora do caso e proposta em 1995, refere-se ao
reconhecimento de titularidade e obtenção da posse de nove lotes de terreno ocupados por diversas famílias, favelizando a área, situados em Santo Amaro - SP (“Favela do Pullman”). Foi julgada procedente em 1º grau, no sentido de afastar a hipótese de usucapião urbano dos ocupantes, e condenar os réus na desocupação da área, sem direito a retenção por benfeitorias e devendo pagar indenização aos requerentes, à luz do poder de reivindicar atribuído pelo artigo 524 do Código Civil de 1916, vigente à época.
Reformada totalmente, entretanto, em apelação dos réus provida pelo
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que deu provimento à pretensão e julgou improcedente a ação reivindicatória, invertendo os ônus sucumbenciais. Em razão de estarem os lotes inseridos em favela consolidada, com ocupação estável iniciada há cerca de 20 anos, dotada de equipamentos públicos urbanos – luz e água, a exemplo –, entendeu o Desembargador José Osório pela caracterização dos lotes de terreno reivindicados e o próprio loteamento como abstrações jurídicas. É sabido que o objeto da ação reivindicatória deve ser coisa corpórea, existente e bem definida, ou seja, coisa concreta que pode ser reivindicada. Sendo assim, a realidade configurada na favela demonstrou que o loteamento só existia no papel, vez que não chegou a ser efetivamente implantado, restando a área abandonada – vide artigo 589, III, do Código Civil anterior –, coberta de vegetação e, posteriormente, ocupada e urbanizada por centenas ou milhares de pessoas por muitos anos.
Por força dos artigos 77 e 78 do antigo Código Civil, foi possível ao
Desembargador inferir que o objeto do direito perdeu suas qualidades essenciais e, então, perdeu-se o direito de propriedade; o objeto do direito transformou-se em outra coisa, esta que não é passível de ser reavida fisicamente por questões econômicas e, principalmente, sociais. Como bem asseverou o douto Desembargador: “O desalojamento forçado de trinta famílias, cerca de cem pessoas, todas inseridas na comunidade urbana muito maior da extensa favela, já consolidada, implica uma operação cirúrgica de natureza ético-social, sem anestesia, inteiramente incompatível com a vida e a natureza do Direito”. Ademais, diante do princípio da função social da propriedade, assegurado, hoje, pela Constituição Federal, o direito de propriedade precisa ser restringido quando houver interesse social, cabendo ao Poder Judiciário tal tarefa. Inovando em sua decisão, o Desembargador reconheceu essa função social da propriedade, aliando isto, desde a época, ao abandono dos lotes.
Tendo em vista todo o explicitado, o Recurso Especial (REsp nº 75.659 – SP
(1995/0049519-8) do Superior Tribunal de Justiça) interposto a fim de reformar o referido acórdão não foi conhecido, a tese foi afastada em face do perecimento do direito de propriedade, conforme Relatório do Exmo. Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior.
5 Organização Administrativa_ Administração Direta e Indireta_ Centralizada e Descentralizada_ Autarquias, Fundações, Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista