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O SEGMENTO DIAFRAGMÁTICO
O SEGMENTO DIAFRAGMÁTICO
Este trabalho foi aprovado como requisito para a conclusão do Curso de Formação de
Analistas Reichianos do Instituto de Formação e Pesquisa Wilhelm Reich.
O Segmento Diafragmático 2
IFP Reich – Instituto de Formação e Pesquisa Wilhelm Reich Jorge Ivan Hmeljevski
RESUMO
O Segmento Diafragmático 3
IFP Reich – Instituto de Formação e Pesquisa Wilhelm Reich Jorge Ivan Hmeljevski
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Sete Segmentos da Couraça .......................................................................................... 7
Figura 2 - Segmentos da Couraça como Cinturões de Compressão ............................................. 7
Figura 3 - Vista Superior do Diafragma ....................................................................................... 12
Figura 4 – Vista Frontal do Diafragma ......................................................................................... 12
Figura 5 - Tendão do Diafragma .................................................................................................. 14
Figura 6 – Iliopsoas ...................................................................................................................... 15
Figura 7 - Diafragma na Inspiração e na Expiração ..................................................................... 17
Figura 8 - Ação dos Músculos Expiratórios Acessórios ............................................................... 19
Figura 9 - Corpo humano formado por tubos e diafragmas ....................................................... 23
Figura 10 - Biomecânica da Hiperlordose Diafragmática ............................................................ 33
Figura 11 - Efeitos do Encouraçamento Diafragmático na Coluna Lombar e Cervical................ 35
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Grupos Musculares Inspiratórios Acessórios ............................................................. 18
O Segmento Diafragmático 4
IFP Reich – Instituto de Formação e Pesquisa Wilhelm Reich Jorge Ivan Hmeljevski
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 6
1.1. Contexto de Desenvolvimento do Trabalho ................................................................. 6
1.2. Considerações Metodológicas .................................................................................... 10
2. ANATOMIA SIMPLIFICADA DO MÚSCULO DIAFRAGMA ................................................. 11
3. PRINCIPAIS RELAÇÕES ANATÔMICAS DO MÚSCULO DIAFRAGMA ................................. 13
3.1. Relações entre o Diafragma e o Tórax: o Sistema Suspensor do Diafragma .............. 13
3.2. Relações entre o Diafragma, o Abdômen e a Pelve: o Iliopsoas ................................. 14
4. BIOMECÂNICA RESPIRATÓRIA ......................................................................................... 16
4.1. Músculos Inspiratórios Acessórios .............................................................................. 18
4.2. Músculos Expiratórios Acessórios ............................................................................... 18
5. OUTRAS FUNÇÕES DO MÚSCULO DIAFRAGMA .............................................................. 19
6. O SEGMENTO DIAFRAGMÁTICO DA COURAÇA MUSCULAR ........................................... 20
6.1. A Anatomia Emocional de Keleman ............................................................................ 23
6.2. A Função Bioenergética do Diafragma ........................................................................ 25
6.3. Disfunções do Segmento Diafragmático ..................................................................... 27
6.4. A Hiperlordose Diafragmática e a Espondilite Anquilosante ...................................... 32
6.5. Intervenções Terapêuticas no Segmento Diafragmático ............................................ 36
7. CONCLUSÃO .................................................................................................................... 42
8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................................... 43
O Segmento Diafragmático 5
IFP Reich – Instituto de Formação e Pesquisa Wilhelm Reich Jorge Ivan Hmeljevski
1. INTRODUÇÃO
A motilidade biopsíquica, por sua vez, pode ser compreendida como a possibilidade do corpo
biológico e do psiquismo se moverem espontaneamente e involuntariamente, possibilidade
esta que, para o organismo enrijecido, é limitada no grau do seu enrijecimento. No entanto,
assim como a rigidez somática e a psíquica são dois aspectos de uma única couraça, a
motilidade biológica e a motilidade psíquica são dois aspectos de uma única motilidade: a da
bioenergia2. Assim, o encouraçamento implica fundamentalmente no bloqueio do livre fluxo
de bioenergia pelo organismo e este bloqueio se manifesta como rigidez biológica e psíquica.
Eis porque podemos considerar que a couraça, antes de tudo, é uma couraça bioenergética.
Lowen afirma que “Para Reich, o objetivo do tratamento era o desenvolvimento no paciente
de sua capacidade de se entregar totalmente aos movimentos espontâneos e involuntários do
corpo, os quais fazem parte do processo respiratório” (LOWEN, 1984, p. 20). Portanto, Lowen
ratifica que o objetivo da vegetoterapia é devolver a motilidade do organismo, no entanto,
acrescenta que esta motilidade é parte do processo respiratório. De nossa parte, lembramos
que os movimentos espontâneos e involuntários do corpo envolvem, além dos aspectos
biomecânicos destes movimentos, fluxos bioenergéticos. Assim, ao considerar que estes
movimentos involuntários fazem parte do processo respiratório, também iremos considerar
que a respiração, na qual o diafragma tem papel fundamental, guarda relação íntima com o
funcionamento bioenergético do organismo.
A couraça é apresentada por Reich (2009b, p. 341) como sendo disposta em sete segmentos:
ocular, oral, cervical, torácico, diafragmático, abdominal e pélvico. A Figura 1 ilustra a
localização destes segmentos no corpo.
1
Por motilidade entendemos movimentos espontâneos e involuntários. Movimentos voluntários são referidos
como mobilidade.
2
O termo bioenergia deve ser entendido de modo amplo, como sendo a "energia da vida" e englobando tanto seus
aspectos somáticos quanto psíquicos. Também consideramos que o termo bioenergia diz respeito às correntes de
energia orgone organísmica pelo corpo. Nesse sentido, a bioeletricidade é apenas uma das manifestações da
bioenergia, pois esta não se restringe a um fluxo de eletricidade bioquímica.
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Figura 1 - Sete Segmentos da Couraça - Fonte: Adaptado de Baker (1980, pp. 66 e 67)
Figura 2 - Segmentos da Couraça como Cinturões de Compressão - Fonte: Keleman (1985, p. 69)
Para Reich, "um segmento de couraça compreende aqueles órgãos e grupos de músculos que
têm um contato funcional entre si e que podem induzir-se mutuamente a participar no
movimento expressivo emocional" (REICH, 2009b, p. 342). É dizer que participa de um
segmento de couraça o conjunto de músculos e órgãos que funciona de modo relativamente
independente dos músculos e órgãos de outros segmentos para expressar (ou bloquear a
expressão) de emoções naquela parte do organismo.
O Segmento Diafragmático 7
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Também destacamos que, apesar do nome Couraça Muscular – o qual remete ao sistema
muscular, também é o próprio Reich quem inclui no conceito de couraça os órgãos localizados
nos respectivos segmentos corporais. Ainda que a ênfase do processo de encouraçamento
esteja nos músculos, diversas estruturas corporais (provavelmente todas) contidas em cada
segmento atuam no processo de motilidade ou bloqueio da motilidade bioenergética.
Reich destaca que os anéis de contenção dos segmentos da couraça não seguem "o percurso
de um músculo ou de um nervo; são completamente independentes dos processos
anatômicos" (REICH, 2009b, p. 341). Nesse sentido, ele considera que "a função vegetativa do
corpo ignora os limites anatômicos, que são indicações superficiais" (REICH, 2004, p. 256).
Por outro lado, ainda que a expressão emocional não esteja restrita pelos limites anatômicos,
é a estrutura anatomofisiológica que serve de substrato para o fluxo bioenergético (ou seu
bloqueio). Além disso, uma vez que na terapia reichiana podem ser realizadas intervenções
diretas sobre o corpo do paciente, consideramos relevante um estudo básico da
anatomofisiologia dos segmentos nos quais o terapeuta reichiano intervém.
A contenção realizada pelos anéis de couraça decorre do fato de que os músculos e órgãos que
participam da expressão emocional sofrem um espasmo3 que elimina sua motilidade e causa a
estase4 da bioenergia. É importante notar que esse espasmo representa o aspecto somático da
repressão psíquica (REICH, 2004, p. 256). Para Reich, esse espasmo "não é um 'resultado', uma
'expressão' ou um 'acompanhante' do mecanismo de repressão", mas é "a parte mais essencial
do processo de repressão” (REICH, 2004, p. 254).
3
Uma contração involuntária e, em geral, não percebida (inconsciente).
4
Uma retenção do fluxo bioenergético que se acumula no local contraído. A bioenergia fica "ligada" na contração
crônica dos músculos onde permanece acumulada.
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Importa notar que a livre expressão emocional e o bloqueio dessa expressão não se restringem
necessariamente a apenas um dos segmentos da couraça. Eles podem se fazer presentes, por
exemplo, num olhar sutil de desconfiança, quase imperceptível e localizado basicamente no
segmento ocular, mas também num choro convulsivo profundo que envolve os olhos, boca,
garganta, peito, diafragma, abdômen e pelve, ou seja, praticamente todo o organismo e todos
os segmentos da couraça. Quanto mais intensas forem as emoções vivenciadas, maior será a
carga bioenergética envolvida e quanto mais livre e desimpedido for o fluxo da bioenergia pelo
organismo, mais o corpo como um todo participará da expressão emocional. Os segmentos,
portanto, podem atuar em conjunto, de modo integrado, seja para promover a expressão
emocional ou para bloqueá-la através da interrupção do fluxo de bioenergias no corpo.
No sentido dessa atuação conjunta dos segmentos da couraça, Reich (2009b, p. 347) apresenta
o exemplo do trabalho com o reflexo de vômito para a liberação de um bloqueio bioenergético
no pescoço produzindo também um afrouxamento no quarto e no quinto segmentos (tórax e
diafragma). Reich esclarece que:
Qualquer dos segmentos pode não ser responsivo enquanto não forem
liberadas outras partes [...] a cada liberação de um segmento, a couraça dos
segmentos anteriores tornará a aparecer e exigir nova atenção, pois o
organismo não está acostumado ao movimento e tenta recuperar sua
imobilidade anterior (BAKER, 1980, p. 68).
Acrescentamos que não se trata apenas do organismo estar acostumado com o movimento,
pois para cada novo segmento desbloqueado, poderão se manifestar bloqueios mais
profundos nos segmentos anteriormente liberados.
O Segmento Diafragmático 9
IFP Reich – Instituto de Formação e Pesquisa Wilhelm Reich Jorge Ivan Hmeljevski
Neste texto optamos por abordar as particularidades de apenas um dos sete segmentos da
couraça: o segmento diafragmático. No entanto, como os segmentos interagem entre si, não
perderemos a visão da expressão emocional integral do organismo. Por isso, além do
segmento diafragmático, serão consideradas suas relações com outros segmentos da couraça
e suas atuações conjuntas, ainda que não nos aprofundemos em detalhes destes outros
segmentos.
As ideias contidas neste texto não são baseadas somente na obra de Wilhelm Reich. No
desenvolvimento do texto também foram consideradas ideias de autores neo-reichianos e
pós-reichianos, ainda que não tenha sido feita uma abordagem sistemática das ideias destes
autores. Ao abordarmos conceitos de Keleman, Souchard, Lowen, Navarro e outros autores
junto dos conceitos propostos por Reich, de modo algum consideramos que suas concepções
do funcionamento humano sejam de todo equivalentes ou de todo compatíveis. No entanto,
ainda que as ideias desses autores possam ter pontos de divergência fundamentais, elas
também contêm pontos de convergência ou, pelo menos, pontos passíveis de conciliação a
partir de uma compreensão mais ampla, em nossa opinião, a concepção reichiana. Assim,
entendemos que didaticamente e dentro de contextos específicos, é possível fazer
comparações e lançar mão do modelo proposto por um autor para elucidar conceitos e
mesmo para ampliar as propostas de outro autor.
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IFP Reich – Instituto de Formação e Pesquisa Wilhelm Reich Jorge Ivan Hmeljevski
De acordo com Souchard (1989a, p. 12) o diafragma é um músculo assimétrico, formando uma
abóboda de concavidade inferior que separa o tórax do abdômen. Esse músculo compreende
duas porções: uma porção muscular e periférica, graças à qual o diafragma insere-se no
contorno do tórax (costelas) e da coluna, e outra porção tendínea e central chamada de centro
tendíneo ou centro frênico.
A porção muscular do diafragma pode ser dividida em três partes: a vertebral, a costal e a
esternal. A porção muscular vertebral corresponde à sua parte de trás, na qual se dá a
inserção do músculo na coluna vertebral. Essa inserção ocorre entre a primeira e quarta
vértebras lombares (de L1 até L4) através de feixes de músculos conhecidos como pilares do
diafragma. A porção muscular costal do diafragma corresponde à sua parte lateral. Ela origina-
se na face interna das últimas costelas e termina ao encontrar o centro tendíneo. Por fim, a
porção muscular esternal é formada por feixes de músculos originados da parte posterior do
processo xifóide (esterno) (SOUCHARD, 1989a, p. 12-13).
A respeito da fixação do diafragma na coluna vertebral, enquanto Souchard diz que a inserção
dos pilares do diafragma na coluna ocorre entre as vértebras L1 e L4 (primeiras vértebras
lombares), Reich afirma que as inserções posteriores do diafragma ocorrem entre as vértebras
T10 e T12 (REICH, 2009b, p. 350), portanto, nas últimas vértebras torácicas. Com o objetivo de
esclarecer essa contradição, foram consultados Standring (2010, p.1007) e Vigué (2007, p.113),
a partir dos quais foi possível determinar que a informação correta é aquela obtida de
Souchard (1989a, pp. 12 e 13).
O centro tendíneo é uma lâmina fibrosa que se encontra no centro do diafragma. É neste
centro que se localizam os três grandes orifícios que permitem a passagem da aorta, do
esôfago e da veia cava. Nessa passagem, a aorta, o esôfago e a veia cava normalmente estão
aderidos ao diafragma. A Figura 3 e a Figura 4 permitem visualizar a anatomia do diafragma.
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A inervação do diafragma é realizada pelo nervo frênico. Este é um nervo simpático que se
origina na coluna cervical (no plexo5 cervical) e distribui-se no diafragma, sendo responsável,
dentre outras coisas, pelo seu funcionamento motor. Ao distribuir-se, o nervo frênico direito
liga-se à hemicúpula direita do diafragma e o nervo frênico esquerdo à sua hemicúpula
esquerda. Se um destes nervos sofre uma lesão, o respectivo lado do diafragma pode se
paralisar.
5
Um plexo é um é um complexo entrelaçamento de nervos, ou seja, uma rede de neurônios.
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Como ainda será descrito mais adiante, o segmento diafragmático da couraça muscular não
fica restrito ao músculo diafragma, sendo constituído também pelas vísceras logo abaixo dele.
Ao abordarmos as principais relações anatômicas do músculo diafragma, ressaltaremos a
relação deste músculo com as vísceras, no entanto, sem aprofundar os detalhes anatômicos
destas, pois consideramos que tal aprofundamento encontra-se fora do escopo deste trabalho.
Na face superior do diafragma estão os pulmões e o coração. O coração não só apoia-se sobre
o diafragma, mas também adere a ele através do ligamento6 freno-pericárdico. Em termos dos
segmentos da couraça, os pulmões e o coração fazem parte do segmento torácico.
No tórax existe uma rede aponeurótica8, fascial9 e ligamentar que segura o coração em seu
lugar. Através dessa rede de tecido conjuntivo, o coração adere firmemente ao esterno, à
coluna dorsal e à coluna cervical. Como o coração também adere ao diafragma, essa estrutura
limita as possibilidades de deslocamento do diafragma e faz com que ele fique relativamente
suspenso na base do crânio, na coluna cérvico-dorsal e na porção superior do tórax (esterno).
6
Ligamento é um feixe de tecido conjuntivo fibroso, denso, resistente e inelástico que une entre si duas cabeças
ósseas de uma articulação (ligamento articular) ou mantém no seu local fisiológico habitual um órgão interno
(ligamento suspensor). O ligamento freno-pericárdico prende o centro tendíneo do diafragma à base do pericárdio.
O pericárdio, por sua vez, é uma formação similar a uma “bolsa” (uma fáscia) que envolve o coração.
7
Também chamado plexo celíaco.
8
As aponeuroses (ou aponevroses) são membranas achatadas formadas por tecido conjuntivo denso, similares a
tendões, encontradas prendendo os músculos do tórax aos ossos da caixa torácica.
9
A fáscia é uma lâmina de tecido conjuntivo que envolve cada músculo, protegendo e evitando o atrito e
coordenando seus movimentos; forma assim uma bainha de contenção.
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Souchard (1989b, p. 18) afirma que essa rede é muito solida, portanto, destinada a esforços
repetitivos. Ele a chama de tendão do diafragma10.
Para Souchard (1989, p. 18), o entendimento mais difundido entre os estudiosos do tema é
que a limitação dos movimentos de contração e expansão do diafragma se dá somente pelo
papel das vísceras abdominais, no entanto, ele demonstra que além das vísceras, os
movimentos do diafragma também são influenciados pelo tendão do diafragma (SOUCHARD,
1989b, p. 24). Assim, Souchard defende que o deslocamento do músculo diafragma é freado,
por baixo, pela massa visceral e, por cima, pelo tendão do diafragma. A Figura 5 (A) ilustra
como está disposta essa rede conjuntiva no tórax e a Figura 5 (B) esquematiza seu papel de
freio limitador da amplitude do movimento do diafragma.
10
Não confundir o tendão do diafragma, que é uma estrutura conjuntiva torácica, com o centro tendíneo, que é a
parte central do músculo diafragma.
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Vimos que o diafragma tem sua inserção na coluna lombar através dos pilares do diafragma. O
músculo psoas major (um dos componentes do iliopsoas), por sua vez, está inserido logo
abaixo dos pilares do diafragma, dando-lhes suporte. Na realidade, os dois músculos estão
ligados pela fáscia toracolombar11. Entendemos ser relevante que praticamente à mesma
altura em que o diafragma e o psoas se encontram, também está disposto o plexo solar, cuja
importância bioenergética foi ressaltada por Reich (2004, pp. 259 a 262).
11
Além do diafragma e do psoas maior, também o quadrado lombar e o transverso abdominal inserem-se na fáscia
toracolombar na região do diafragma, portanto, sofrendo influencia direta deste músculo.
12
Para Lowen (1982), grounding significa entrar em contato com o chão, não apenas literalmente, mas também no
sentido oposto a ter uma “obsessão” e a estar no ar. Significa estar enraizado e em contato com a sua realidade,
sentindo-se mais seguro, com mais base e com maior capacidade de suportar as intensidades emocionais.
O Segmento Diafragmático 15
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4. BIOMECÂNICA RESPIRATÓRIA
13
A pleura é uma membrana dupla, similar a um saco, que envolve os pulmões. Ela é composta por duas camadas,
uma externa (parietal, ligada à cavidade torácica) e uma interna (visceral, ligada aos pulmões). Quando o tórax se
expande, é a pleura que é puxada pela expansão e, com isso, puxa os pulmões, expandindo-os também.
O Segmento Diafragmático 16
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Em relação à troca gasosa que ocorre nos pulmões, podemos dizer que ela obedece à Lei de
Boyle14. O aumento de volume dos pulmões durante a inspiração faz com que sua pressão
interna diminua e torne-se menor que a pressão do ambiente. Como o ar flui do local de maior
pressão para o de menor, ele entra nos pulmões até que a pressão interna dos pulmões iguale
novamente a pressão externa. Num processo inverso ao da inspiração, na expiração ocorre a
subida do diafragma e isso implica na diminuição do volume pulmonar, portanto, implica no
aumento da pressão gasosa nos pulmões e esta se torna maior que a do ambiente. Agora o
fluxo de gases ocorrerá no sentido do pulmão para o ambiente até que as pressões internas e
externas do corpo se igualem novamente. A troca gasosa nos pulmões baseada nessa
14
Simplificadamente a Lei de Boyle-Mariotte (geralmente citada apenas como Lei de Boyle) enuncia que a pressão e
o volume de certa quantidade de gás confinado são inversamente proporcionais, ou seja, se o volume do gás
aumenta, sua pressão diminui e vice-versa.
O Segmento Diafragmático 17
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diferença de pressão ocorre sempre da mesma maneira, qualquer que seja a amplitude
respiratória.
Vimos que os músculos inspiratórios acessórios são acionados basicamente nas inspirações de
grande amplitude. Eles podem ser organizados em quatro grandes grupos: os inspiratórios
torácicos, os escapulares, os nucais e os espinhais. A musculatura que faz parte de cada grupo
muscular inspiratório acessório é mostrada na Tabela 1.
O Segmento Diafragmático 18
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Podemos apontar como músculos expiratórios acessórios: oblíquo interno; oblíquo externo;
transverso do abdome; reto do abdome; piramidal do abdome; quadrado lombar; serrátil
posterior inferior; e transverso do tórax (SOUCHARD, 1989b, p. 56).
A atuação dos músculos expiratórios é no sentido de contrair o abdômen, com isso comprimir
as vísceras e empurrar a cúpula do abdômen para cima. Isso faz com que os pulmões se
retraiam e a pessoa expire. A Figura 8 ilustra esse processo.
Figura 8 - Ação dos Músculos Expiratórios Acessórios - Fonte: Souchard (1989b, p. 68)
Alguns autores, por exemplo, Keleman (1985, p. 44) afirmam que os músculos abdominais
normalmente são acionados na expiração por serem antagônicos ao diafragma. Souchard
(1989b, p. 56) discorda e afirma que, em geral, os abdominais só são demandados
acessoriamente por ocasião de respirações de grande amplitude (grandes esforços). Em nossa
opinião, ambos estão parcialmente corretos. Entendemos que a musculatura abdominal
normalmente não deveria ser acionada na expiração de pequena amplitude, no entanto, boa
parte das pessoas contrai essa musculatura permanentemente de modo involuntário. Trata-se
de mais um sintoma neurótico que muitas vezes é valorizado, por exemplo, na postura de
“barriga para dentro e peito para fora”.
A principal função do diafragma é a respiração, no entanto, essa não é a sua única função.
Além da função respiratória, também podemos considerar, dentre outras funções do
diafragma, a de fonação, a digestiva, a circulatória e a estática15. Do ponto de vista dos
segmentos da couraça muscular, temos especial interesse na função e disfunção bioenergética
do diafragma, por isso o aspecto bioenergético terá uma abordagem diferenciada no texto.
Em termos do aparelho fonatório humano, Souchard (1989a, p. 32 e ss.) nos ensina que o
diafragma e os pulmões atuam como a fonte de ar que permite às cordas vocais produzir sons
na laringe e modificá-lo na faringe (boca e nariz). O fornecimento deste ar é um processo
expiratório, ou seja, ocorre no relaxamento e subida do diafragma. Como nossa voz é
15
Por "estática" entendemos a função de levantamento de peso (SOUCHARD, 1989a. p.24).
O Segmento Diafragmático 19
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Por outro lado, o contato estreito com a massa visceral abaixo do diafragma faz com que ele
também exerça funções no aparelho digestivo. O esôfago, por exemplo, atravessa o diafragma
e encontra o estômago, o qual está aderido à hemicúpula inferior esquerda do diafragma.
Souchard (1989a, p. 48) afirma que o encaminhamento do bolo alimentar pelo esôfago é
realizado pela ação das fibras musculares do próprio esôfago, mas também com a ajuda do
diafragma. Este se abaixa na inspiração e causa um efeito de bomba que dilata o esôfago e
facilita a passagem do bolo alimentar. Além disso, Souchard (1989a, p. 48) afirma que “durante
contrações-relaxamentos vigorosos (tosse, espirro), as fibras do diafragma fecham o esôfago e
evitam o refluxo do bolo alimentar” e complementa que neste caso “O diafragma desempenha
papel de esfíncter entre esôfago e estômago”. Obviamente a ação do diafragma no aparelho
digestivo não ocorre somente sobre o esôfago. O estômago, por exemplo, é
permanentemente massageado pela ação do diafragma na respiração.
A função estática do diafragma diz respeito à sua participação nos esforços físicos. Em todo
esforço físico intenso, bloqueamos o diafragma. Supondo que uma pessoa faça um esforço
para levantar um grande peso, para firmar sua coluna a pessoa contrairá seus músculos
abdominais, fechará sua glote, contrairá seu períneo e bloqueará seu diafragma. Esse bloqueio
por todos os lados gera uma grande pressão interna no tórax e no abdômen, fornecendo a
firmeza necessária para a coluna sustentar o esforço. Souchard (1989a, p. 34) acrescenta que
“Quando o gesto é premeditado, abaixamos frequentemente o diafragma através de uma
inspiração profunda”. Portanto, tendemos a respirar fundo e prender a respiração para realizar
o tipo de esforço descrito.
O Segmento Diafragmático 20
IFP Reich – Instituto de Formação e Pesquisa Wilhelm Reich Jorge Ivan Hmeljevski
destas partes. Por outro lado, no livro Análise do Caráter (REICH, 2009b, p. 341), Reich
apresenta didaticamente os sete segmentos da couraça muscular, inclusive o diafragmático.
Na cronologia das obras reichianas, o livro A Função do Orgasmo foi publicado originalmente
no ano de 1942 e não sofreu ampliações posteriores de seu conteúdo. Por outro lado, embora
a primeira edição do livro Análise do Caráter tenha sido publicada em 1932, esta obra sofreu
ampliações posteriores significativas. Assim, o capítulo "A Linguagem Expressiva da Vida", na
qual consta a descrição dos sete segmentos de couraça muscular, só foi inserido por Reich na
no livro Análise do Caráter em 1948, em sua terceira edição. Portanto, as informações a
respeito da couraça muscular foram publicadas originalmente no livro A Função do Orgasmo e,
seis anos após, na terceira edição do livro Análise do Caráter.
16
A gravidez, com o aumento do útero, implica numa pressão permanente no diafragma que passa a atuar de modo
diferente do usual. Não abordamos essa situação neste trabalho, mas consideramos que ela é relevante e
merecedora de estudo.
O Segmento Diafragmático 21
IFP Reich – Instituto de Formação e Pesquisa Wilhelm Reich Jorge Ivan Hmeljevski
No livro A Função do Orgasmo (REICH, 2004, pp. 259 e ss.), Reich descreveu a dinâmica que
ocorre com o travamento do diafragma criando uma tensão abdominal17 como resultado da
compressão por cima, pelo diafragma; pela frente e pelos lados, pela musculatura abdominal;
por trás, pela coluna; e, por baixo, pela pelve. Reich (2004, p. 259) também afirmou que “a
tensão abdominal tornou-se um fator indispensável do nosso trabalho. As perturbações
respiratórias nas neuroses são os sintomas que resultam das tensões abdominais”.
Destacamos a importância fundamental que Reich dá ao processo de inibição respiratória, pois
ele considera que “como mecanismo fisiológico para a supressão e repressão dos afetos, a
inibição respiratória era o mecanismo básico da neurose em geral” (REICH, 2004, p.261).
Portanto, vemos que Reich considera que este segmento de couraça é formado não só pelo
músculo diafragmático e as costelas inferiores nas quais se insere, mas também pelos órgãos
viscerais contidos logo abaixo dele. Além disso, ele refere-se a “dois feixes de músculos
salientes que se estendem ao longo das vértebras torácicas inferiores”. Por esta descrição,
entendemos que Reich se refere principalmente ao músculo eretor da espinha (ou sacro-
espinhal), sendo este composto por três músculos: o iliocostal, o longuíssimo e o espinhal.
No livro Análise do Caráter (REICH, 2009b), Reich afirma que o segmento diafragmático, em
termos de função expressiva, é independente do tórax. Acrescenta ainda que "Isso é
confirmado pelo fato de que o bloqueio do diafragma permanece inalterado, mesmo após a
dissolução da couraça torácica e irrupção da raiva e das lágrimas" (REICH, 2009b, p. 349). Este
ponto de vista é simplesmente reproduzido por Baker (1980, p. 82), quando este afirma que o
diafragma e os órgãos abaixo dele não dependem da motilidade do peito para seu
funcionamento.
17
Ao tratar das “tensões abdominais”, Reich se refere às tensões criadas na cavidade abdominal pelo conjunto
diafragma, músculos abdominais, coluna e pelve. Esse conceito não deve ser confundido com a ideia de “tensões
nos músculos abdominais”, o que seria muito diferente.
18
Conforme visto anteriormente neste trabalho, Souchard (1989a, pp. 12 e 13) apresenta a informação correta de
que a inserção do diafragma se dá na coluna lombar, entre as vértebras L1 e L4.
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Consideramos que algumas ideias apresentadas por Keleman podem ser úteis na compreensão
da complementaridade entre a função expressiva específica do segmento diafragmático e a
expressão emocional integrada deste segmento com os seus segmentos adjacentes. Portanto,
vejamos aquilo que nos interessa na anatomia emocional proposta por este autor.
A palavra diafragma tem sua origem no grego antigo e pode ser entendida como “barreira de
separação”. Em termos anatômicos, quando falamos em diafragma, geralmente isso nos
remete ao músculo responsável pela respiração, ou seja, o diafragma torácico. No entanto,
este não é o único diafragma que existe no corpo humano. Na anatomia, esta palavra é usada
para designar várias membranas, músculos ou ligamentos que são usados para separar uma
cavidade de outra. Assim, além do diafragma torácico, o corpo também possui outros
diafragmas, por exemplo, o pélvico, o cervical, o tímpano e a íris.
Keleman (1985) nos apresenta o corpo humano como sendo composto da combinação de
espaços, camadas e tubos pulsáteis. Para ele, os esfíncteres e diafragmas regulam a interação
entre estes tubos e a realidade exterior ao corpo. Deste ponto de vista, podemos considerar
que o corpo humano é constituído de três tubos pulsáteis principais separados por diafragmas:
o tubo inferior equivale à cavidade abdominal e está localizado entre o diafragma pélvico
(períneo) e o diafragma torácico; o tubo intermediário equivale à cavidade torácica e está
localizado entre o diafragma torácico e o diafragma cervical (composto pelo conjunto faringe-
laringe); o tubo superior equivalente à cabeça e este localizado entre o diafragma cervical e o
diafragma no topo da cabeça. A Figura 9 (A) e a Figura 9 (B) mostram esquematicamente a
visão do corpo composto por três tubos principais separados por diafragmas.
Figura 9 - Corpo humano formado por tubos e diafragmas – Fonte: Keleman (1985, pp. 16 e 45)
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Embora não sejam abordagens equivalentes, podemos traçar um paralelo entre os conceitos
propostos por Keleman e as ideias de Souchard. Este defende que a função respiratória do
diafragma é indissociável da relação que ele estabelece com as estruturas logo abaixo dele
(massa visceral, musculatura abdominal e períneo) e também da relação com as estruturas
logo acima dele, situadas entre o diafragma torácico e o diafragma cervical (SOUCHARD,
1989a, p. 32). É dizer que o diafragma torácico, por estar entre a cavidade abdominal e a
cavidade torácica, interfere diretamente no funcionamento dos segmentos presentes nestas
duas cavidades (ou tubos, de acordo com Keleman).
Em termos biomecânicos, estas ideias não se afastam daquelas apresentadas por Reich no
livro A Função do Orgasmo (REICH, 2004). Naquela ocasião, como já mostramos, Reich
apresentou como a dinâmica respiratória influencia os ombros e também a cavidade
abdominal. Alinhado com esse entendimento de Reich, Souchard (1989a, p. 65) afirma, por
exemplo, que “Toda concentração do diafragma provoca uma hiperpressão intra-abdominal
que pesa sobre o períneo e o tensiona enquanto toda expiração cria uma depressão e o
relaxa”. Além dessas implicações do bloqueio diafragmático em relação à parte inferior do
corpo, Souchard (1989a, 1989b) também nos mostra como o tendão do diafragma, a partir do
interior do tórax, também influencia diretamente no funcionamento do diafragma.
Navarro (1995, p. 91), por sua vez, afirma que o bloqueio do diafragma faz com que ele se
transforme "numa barreira entre as duas partes do corpo, em vez de ser o traço de união
entre sua parte de cima e sua parte de baixo". Ele afirma que “A mensagem do superego19,
aliás, valoriza todas as emoções localizadas acima do diafragma, enquanto que tudo que
provém de baixo é considerado vil” (NAVARRO, 1995, p. 91).
19
Neste caso, o termo usado por Navarro é o de sentido psicanalítico.
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Dentre as referências pesquisadas, o modelo de Keleman (1985), que trata o corpo humano
como uma estrutura formada por tubos, camadas e diafragmas, parece-nos útil para
representar a função bioenergética deste segmento.
Reich apontou que "O processo vital consiste em uma contínua alternância entre expansão e
contração" (REICH, 2004, p. 246), ou seja, consiste numa pulsação. Ele demonstrou que essa
pulsação está presente em todos os seres vivos, seja num simples organismo unicelular ou
num organismo complexo como o corpo humano.
A abordagem de Keleman (1985) está alinhada com essas descobertas de Reich. Keleman
(1985, p. 13) afirma que todo nosso organismo pulsa em ondas que se manifestam desde o
nível celular até no corpo como um todo. Para ele, os diafragmas em nosso corpo são
estruturas que servem de bombas propulsoras dessas pulsações bioenergéticas ao longo do
organismo.
Além disso, Keleman (1985, p. 28) considera que o bombeamento realizado pelos diafragmas
gera a pressão interna que organiza os espaços dentro do corpo e ajuda a manter integra sua
estrutura. As ondas e a pressão interna, por sua vez, criam padrões pulsáteis que determinam
os tipos de emoções que sentimos, sejam eles prazerosos ou angustiantes (KELEMAN, 1985, p.
28).
O coração, embora também seja uma bomba por excelência, parece-nos especialmente ligado
com o fluxo radial da bioenergia no organismo através da circulação sanguínea, ou seja, no
sentido centro-periferia. Além disso, o coração e o diafragma estão intimamente conectados:
não só pelo ligamento freno-pericárdico e pela função respiratória, mas também pela
complementaridade de suas funções bioenergéticas de pulsação.
Lowen afirma que “A respiração leva ao movimento que é o veículo para a expressão do
sentimento” (LOWEN, 1984, p. 42). Isso implica que a ênfase do tratamento recai em deixar a
respiração se processar o mais plena e profundamente possível. Quando essa condição é
obtida, ou seja, quando se dá um suficiente desbloqueio dos sete segmentos da couraça, as
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Isso não quer dizer que o reflexo do orgasmo será plenamente obtido somente a partir do
desbloqueio do segmento diafragmático. O próprio Reich (2009b, p. 356) esclarece que este
não é o caso, pois em geral, após o desbloqueio do diafragma, a pelve ainda encontra-se
bloqueada. No entanto, esse reflexo já começa a se manifestar:
Lowen considera que “prazer é a percepção do fluxo rítmico da excitação no corpo” (LOWEN,
1984, p. 202). Ressaltamos que de um ponto de vista estritamente reichiano, podemos
considerar que esta afirmação de Lowen é verdadeira, no entanto, é bastante simplificadora,
uma vez que o conceito de prazer pode ser bem mais abrangente do que essa mera percepção.
De qualquer maneira, não é porque esta ideia é limitada que ela se torna equivocada.
Entendemos que a percepção citada por Lowen faz parte daquilo que podemos considerar
como prazer a partir de um ponto de vista reichiano. Quando Lowen qualifica o fluxo
percebido como sendo “rítmico”, consideramos que esse fluxo é harmonioso, ou seja, que ele
não sofre bloqueios ou distorções.
Uma vez que o segmento diafragmático esteja desbloqueado e que o comprometimento dos
segmentos abdominal e pélvico não o impeça, o livre fluxo bioenergético pelo corpo promove
uma sensação difusa e generalizada de bem estar corporal. Trata-se de uma sensação de
prazer que se manifesta em todo o organismo e que se reflete em emoções como alegria e
felicidade. Assim, o funcionamento relativamente desbloqueado do diafragma é uma condição
necessária para o fluxo rítmico das excitações corporais, portanto, para a percepção difusa de
prazer em todo o corpo.
20
O reflexo do orgasmo não deve ser confundido com o orgasmo sexual. Entendemos o reflexo do orgasmo como
um padrão de movimentos rítmicos espontâneos do organismo que se manifesta com a respiração quando a pessoa
obtém certo grau de desbloqueio corporal e capacidade de entrega e abandono às próprias sensações. Esses
movimentos são reflexos das correntes bioenergéticas (ou vegetativas) que fluem livremente pelo organismo.
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Além disso, a pessoa nesse estado de bem estar pode se sentir conectada com um "algo
maior". Trata-se do desenvolvimento de uma sensação de integração do ser humano à
natureza. Lowen afirma que “Grosso modo, encontramos prazer sensorial em estímulos que se
harmonizam com os ritmos e tonos de nosso corpo” (LOWEN, 1984, p. 201). Além disso, ele
complementa que a “harmonia entre os ritmos internos da pessoa e os ritmos externos da
natureza é a base para que se sinta identificação com o cosmo, a mais profunda raiz de prazer
e alegria” (LOWEN, 1984, p. 193).
Com isso não estamos afirmando que uma respiração livre conduz automaticamente para uma
experiência de identificação com o cosmos. No entanto, percebemos que o desbloqueio da
respiração atua no sentido de integrar o ritmo da pulsação do corpo com a pulsação da energia
orgone21 no ambiente. Em outras palavras, consideramos que pode ocorrer um alinhamento e
uma ressonância entre a pulsação da bioenergia no corpo do indivíduo que passou pelo
desbloqueio respiratório e a energia orgone presente na natureza, em especial em ambientes
como matas, rios, montanhas e praias, refletindo essa ressonância em sensações de
pertencimento e plenitude que podem levar ao estado de identificação cósmica mencionado
por Lowen.
Além dessas sensações agradáveis, o diafragma também está relacionado com a percepção de
emoções como o medo, a raiva e a tristeza. A pessoa cujo diafragma está desbloqueado
sentirá livremente essas emoções nas ocasiões em que se manifestarem. No entanto, essas
emoções podem se apresentar com muita intensidade em função da grande mobilização
bioenergética que o diafragma é capaz de promover. A incapacidade de suportar essas
emoções devido a sua alta intensidade (alta carga bioenergética) pode ser uma das causas do
bloqueio do diafragma, pois é uma forma de amortecer as sensações provenientes desse
segmento.
Baker, por exemplo, afirma que o segmento diafragmático retém uma "raiva assassina
violenta" (BAKER, 1980, p. 83). Embora a expressão “assassina” usada por este autor remeta a
uma conotação negativa a respeito das emoções retidas neste segmento, entendemos que
essa afirmação diz respeito à intensidade da raiva retida em função da grande quantidade de
bioenergia que o segmento diafragmático é capaz de mobilizar.
21
Energia Orgone é um tipo de energia identificada por Reich, com atributos particulares e que está presente em
todo o cosmos. A energia orgone no organismo equivale à bioenergia.
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Ao tratar das disfunções do diafragma, é importante ter claro que praticamente todo bloqueio
diafragmático é inspiratório. A contenção da respiração ocorre na fase de inspiração, ou seja,
quando o diafragma se contrai, portanto, o bloqueio do diafragma se dá com os pulmões
“cheios de ar” (ar residual). Nesse sentido, Souchard afirma que “Excetuando-se certos casos
de problemas neurológicos ou edema pulmonar, não existe insuficiência inspiratória, apenas
insuficiência expiratória” (SOUCHARD, 1989, p. 87). Portanto, a dificuldade respiratória da
maioria das pessoas consiste na relativa incapacidade de soltar o ar, ou seja, de expirar
adequadamente.
Em função de sua proximidade e atuação conjunta, problemas nas vísceras podem repercutir
diretamente sobre o diafragma. A aerogastria e a aerocolia, por exemplo, podem fazer subir a
hemicúpula diafragmática esquerda. Já a hemicúpula direita do diafragma pode sofrer efeitos
de uma inflamação, abscesso ou quisto do fígado. O sofrimento esôfago-gástrico e a hérnia de
hiato são outras disfunções diretamente relacionadas ao diafragma.
22
A gestação também implica numa subida do diafragma. Embora não seja uma situação patológica, este
deslocamento também está relacionado às importantes alterações emocionais pelas quais passa uma gestante.
Além disso, o diafragma tem papel fundamental no trabalho de parto. A relação do diafragma com a gravidez é
complexa e demanda um estudo amplo que foge do objetivo deste trabalho.
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Para Reich (2004, p. 247), a energia biofísica (bioenergia) é gerada principalmente na região
abdominal do organismo (incluindo o segmento diafragmático), nos grandes centros do
sistema nervoso autônomo, essencialmente no plexo23 solar, no plexo hipogástrico e no plexo
lombossacral. Ela é transmitida pelo sistema nervoso, mas também através dos fluidos em
movimento pelo organismo, em especial o fluxo sanguíneo.
Essas alterações fisiológicas ocorrem para garantir que o organismo produza menos
bioenergia, tenha menos mobilidade e, em consequência, para que haja uma diminuição das
sensações corporais. A pessoa dificulta a própria respiração como uma maneira de sentir
23
Um plexo é um aglomerado de células nervosas. O plexo solar, por exemplo, fica acima do estômago, logo abaixo
do diafragma.
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Para Lowen (1982, pp. 110 e 190), a tensão do diafragma está fortemente ligada com a
ansiedade de cair. Ele argumenta que a contração diafragmática reduz o fluxo de excitação
que se encaminha para a metade inferior do corpo, prejudicando assim o contato da pessoa
com sua base. Nesse sentido ele afirma que “A perda da energia nas pernas e pés produz uma
perda de contato com o chão” (LOWEN, 1982, p. 190) e complementa que “A ansiedade de
cair e os distúrbios respiratórios são dois aspectos de um único processo” (LOWEN, 1982, p.
190), ou seja, do encouraçamento do segmento diafragmático. No entanto, Lowen (1982, p.
192) reconhece que nem todos os neuróticos sofrem de ansiedade de cair.
Em nossa opinião, a percepção de Lowen a respeito daquilo que ele denomina como
ansiedade de cair pode estar relacionada com a propagação da contração do diafragma para o
músculo iliopsoas, conforme já descrita neste trabalho. No entanto, fazemos a ressalva de que
esse entendimento de Lowen não corresponde ao conceito reichiano de ansiedade de queda
(angústia de cair).
Ao considerarmos o caso descrito por Reich de um bebê de três semanas que apresentou uma
forte ansiedade de cair (REICH, 2009a, p. 393 e ss.) obviamente não caberia falar em “perda de
contato com o chão”, conforme proposto por Lowen. Assim, a manifestação da ansiedade de
queda num bebê indicaria a possibilidade dessa sensação ser consequência da retração busca
da bioenergia, conforme defendido por Reich. Portanto, enquanto Lowen atribui a ansiedade
de queda ao encouraçamento do diafragma e a perda de contato do corpo com a sua base,
Reich atribui essa angústia de cair a um retraimento rápido da bioenergia das extremidades do
corpo, sendo que esta sensação também se apresenta por ocasião do avanço do
desencouraçamento, na proximidade da saúde, quando surge mais intensamente a angústia
do orgasmo.
Ao falar de sua proposta terapêutica – a Bioenergética, Lowen afirma que ela “está interessada
pela forma como o indivíduo conduz o amor” (LOWEN, 1982, p. 74). Nesse sentido, ele diz que
“Dos nossos corações flui o calor que nos une ao mundo em que vivemos. Essa quentura é o
sentimento de amor. O objetivo de toda a terapia é ajudar a pessoa a aumentar sua
capacidade de dar e receber amor [...]” (LOWEN, 1982, p. 77). Portanto, para Lowen o coração
é o órgão por excelência relacionado com o amor e importa como ocorre a sua expressão
bioenergética. Lowen (1985, p. 75) também defende que a boca e a garganta são os canais de
comunicação primários do amor. A expressão do amor por estes canais ocorre no aleitamento
materno, nos beijos e nas palavras que o expressam. Além disso, pode haver uma importante
expressão dessa emoção pelos braços e mãos (carícias e abraços) e pelo sexo quando consiste
num ato de amor.
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Para que essas expressões múltiplas de amor sejam possíveis, o indivíduo precisa estar
relativamente saudável. Os bloqueios em diversos níveis corporais, por exemplo, na garganta,
diafragma e pelve, podem impedir a manifestação do amor. No entanto, um dos distúrbios
mais comuns a impedir a manifestação do amor é a dissociação das metades superior e
inferior do corpo, sendo esta uma consequência do bloqueio diafragmático. É por isso que
Lowen diz que “Onde quer que exista um grau de dissociação, os movimentos respiratórios
naturais não fluem livremente através do corpo” (LOWEN, 1985, p. 76) e acrescenta que “as
tensões musculares crônicas que bloqueiam o livre fluxo de excitação e sentimentos são
frequentemente encontradas no diafragma [...]” (LOWEN, 1985, p. 76).
Nós concordamos com Navarro que todos os neuróticos sofrem de algum grau de ansiedade e
que o tipo de reação explosiva descrita por ele ocorre em pessoas com fortes bloqueios
diafragmáticos. Também concordamos que todos os neuróticos têm bloqueios diafragmáticos
(respiratórios), bem como traços masoquistas. No entanto, não concordamos com o ponto de
vista de Navarro de que o bloqueio diafragmático é o principal determinante do tipo de caráter
masoquista. Certamente não é porque em algum grau os bloqueios diafragmáticos e os traços
masoquistas de caráter coexistem em todos os neuróticos que se estabelece uma relação
causal entre eles.
O Segmento Diafragmático 31
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Além disso, entendemos que a defesa que Navarro realiza da causalidade entre bloqueio
diafragmático e tipo de caráter masoquista não encontra respaldo na descrição que Reich faz
desse tipo de caráter. Para Reich, a gênese do masoquismo encontra-se numa regressão à fase
anal a partir de um exibicionismo fálico gravemente frustrado na infância, portanto, o traço
anal seria o principal traço do caráter masoquista (REICH, 2009b, pp. 238 e 239). Navarro
reconhece a importância do traço anal, mas lhe atribui uma importância acessória ao
distúrbio, afirmando que ele nem sempre está presente neste tipo de caráter (NAVARRO,
1995b, p. 72).
Uma vez que o bloqueio diafragmático está presente em todos os tipos de caracteres,
obviamente ele também está presente no masoquista. Pode-se argumentar que o bloqueio
diafragmático é mais intenso nesse tipo de caráter do que nos demais e parece que este
realmente é o caso. No entanto, ainda que este bloqueio seja relevante no masoquista, ele não
nos parece ser a causa (origem) desse tipo de caráter, mas sim uma consequência, ainda que
esta consequência seja importante para a manutenção desse tipo de caráter.
24
A crispação é a contração de um músculo ou nervo.
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De acordo com Souchard (1989b, p.80 e 84), anatomicamente, é possível dividir a musculatura
em termos de músculos dinâmicos e músculos estáticos. Os músculos dinâmicos, dentre outras
características, produzem pequenas trações e grandes deslocamentos sendo seu principal
papel realizar o movimento corporal. Inversamente, os músculos estáticos produzem uma
forte tração e pequenos deslocamentos, sendo sua principal função resistir ao movimento.
Na manutenção da postura, são os músculos estáticos que têm a função de sustentar o corpo
em pé uma vez que são eles que resistem à força gravitacional. Assim, a musculatura estática é
demandada quase permanentemente, possuindo naturalmente um tônus elevado. A
musculatura inspiratória acessória (nucal, escapular, torácica e espinhal), pertence a esta
categoria de músculos, portanto, desempenha a função de sustentação e naturalmente possui
elevado tônus muscular.
Souchard (1989b, p.88) também afirma que toda a agressão, seja ela psíquica ou somática,
aumenta o tônus muscular. Portanto, os músculos estáticos, os quais já têm naturalmente um
alto tônus em decorrência de sua função de sustentação, diante de agressões, inclusive
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emocionais, tendem a se contrair, encurtar e enrijecer ainda mais, sendo exatamente isto que
ocorre com os músculos inspiratórios acessórios.
Como se não bastasse, os músculos estáticos podem estar envolvidos numa espiral mórbida de
contração do organismo. O problema ocorre porque eles sofrem de histerese25. Isso quer dizer
que após uma contração, eles não retornam ao seu comprimento original na mesma
velocidade com que foram contraídos. Assim, ainda que o estímulo de contração já tenha
cessado, esses músculos tendem a relaxar muito lentamente, demorando mais tempo para
relaxar do que o tempo que levaram para se contrair. Supondo que depois de encerrada uma
contração, o estado de relaxamento inicial do músculo ainda não tenha sido alcançado
novamente e ele receba um novo estímulo de contração, então o músculo tenderá a se
contrair ainda mais intensamente do que da primeira vez, pois sua nova contração já iniciará
de um estado de contração prévio.
25
Histerese é a tendência de um material ou sistema de conservar suas propriedades na ausência do estímulo que
as gerou.
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A contração crônica do diafragma, transverso e psoas, conforme ilustrada na Figura 10, implica
ainda numa relevante consequência para o segmento pélvico. Souchard afirma que:
De acordo com Samara (1985, apud MARQUES, 2012, p.5), no quadro clínico da Espondilite
Anquilosante:
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A medicina não conhece as causas dessa doença, no entanto, no quadro clínico descrito
constatamos a presença de alguns elementos característicos da Hiperlordose Diafragmática: a
acentuação da lordose torácica, a acentuação da lordose cervical e a contratura do iliopsoas,
ou seja, toda a contração da cadeia de músculos, ligamentos e fáscias que une o pescoço à
pelve e que resulta de uma atitude inspiratória crônica, fruto de dificuldades emocionais.
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Além disso, as disfunções relacionadas com o diafragma (e também com outros segmentos)
podem variar desde uma simples estase bioenergética decorrente, por exemplo, da
abstinência sexual prolongada, até graves distúrbios físicos nos músculos e órgãos do
segmento diafragmático e dos segmentos adjacentes. Portanto, o terapeuta deve ser criterioso
em relação às técnicas a serem aplicadas, bem como àquelas a serem evitadas.
Por fim, no contexto deste trabalho não cabe uma descrição detalhadas das diversas técnicas
terapêuticas. Limitaremos-nos a citá-las e a referenciá-las de modo que o leitor interessado
possa aprofundar seu conhecimento consultando as obras originais com o objetivo de
encontrar um maior detalhamento das técnicas.
Por outro lado, é comum, embora não seja uma regra, que logo no início das intervenções
corporais na terapia reichiana já se trabalhe sobre a respiração e o diafragma. O próprio Reich
também o fazia. Esta abordagem não esta em desacordo com a advertência feita por ele
mesmo, pois neste caso se busca um aumento da carga bioenergética do organismo pela
ampliação da respiração e não um processo de desbloqueio profundo e completo do segmento
diafragmático. Este aumento de carga no início da terapia, dentre outras coisas, serve para
evidenciar os principais bloqueios bioenergéticos no organismo do paciente.
Em relação aos “beliscões nos ombros”, Reich não se aprofunda nesta questão, mas
entendemos se tratar de um modo de liberar a estase de bioenergia acumulada de modo
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superficial nessa musculatura. Além disso, quando o “beliscão” é executado de acordo com a
respiração, pode levar a um aprofundamento da respiração, a reações de susto, de prazer ou
outras manifestações corporais. As cócegas também tem um efeito similar de liberação da
estase superficial, em especial quando aplicadas na musculatura intercostal (musculatura
inspiratória acessória torácica). Neste caso, após a liberação de uma primeira camada
superficial da estase bioenergética, risadas intensas podem colaborar no desbloqueio do
diafragma.
Em relação à respiração forçada citada por Reich, relembramos que ela deve ter ênfase
expiratória. Conforme já vimos, em regra o bloqueio neurótico do diafragma é inspiratório.
Nesse sentido, Reich afirma:
Dentre as três abordagens terapêuticas citadas por Reich – os beliscões nos ombros, a
respiração torácica forçada e o reflexo do vômito, esta última é a mais enfatizada pelo autor.
Reich afirma que “O reflexo do vômito afrouxa o segmento diafragmático rápida e
radicalmente” (REICH, 2009b, p. 357) e esclarece:
Navarro, por sua vez, apresenta intervenções terapêuticas na forma de actings, os quais ele
define como “movimento proposto pelo terapeuta reichiano ao paciente durante a sessão de
vegetoterapia, visando à mobilização de determinados músculos e consequente afrouxamento
do bloqueio energético” (NAVARRO, 1995, p. 13). Em relação aos actings que atuam no
segmento diafragmático, Navarro afirma:
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É interessante notar que os actings propostos por Navarro atuam também sobre grupos
musculares inspiratórios acessórios, em especial a musculatura nucal e escapular. Nesse
sentido, Navarro afirma:
Existe, portanto, uma preocupação de Navarro com a relação entre os diferentes segmentos e
com um trabalho de desencouraçamento integrado. Isso se reflete nos actings que
contemplam os músculos inspiratórios nucais e escapulares, mas também pelo fato de que na
sua metodologia de trabalho, que também segue o sentido céfalo-caudal, as intervenções
corporais são recursivas, ou seja, para cada novo segmento que se trabalha, sistematicamente
revisitam-se os segmentos anteriores. Assim, nas sessões destinadas a trabalhar com o
diafragma, também voltarão a ser realizados, por exemplo, actings sobre o segmento cervical.
Entendemos que o retorno concomitante a segmentos anteriores, bem como as intervenções
pélvicas são importantes em função das relações que o diafragma estabelece com todo o
corpo.
Souchard também nos apresenta várias possibilidades terapêuticas. Suas técnicas são
apresentadas dentro do contexto do método da Reeducação Postural Global (RPG), do
Stretching Global Ativo (SGA) ou das Autoposturas, no entanto, em nosso entendimento são
passíveis de uso adaptado e criterioso dentro da terapia reichiana. Assim, dependendo do tipo
de disfunção e das características do paciente, Souchard (1989a, 1989b) propõe abordagens
diferentes e complementares:
O Segmento Diafragmático 39
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As autoposturas apresentadas em Souchard (1996?, 1997a, 1997b) são uma série de práticas
que podem ser utilizadas pelo próprio paciente, sozinho, com o objetivo de obter um
desbloqueio diafragmático, ainda que parcial.
− 5 - Respiração Abdominal;
− 5A - Variação: Balanço da Pelve;
− 5B - Variação: Expiração;
− 6 - Respiração e Vibração;
− 63 - Respiração Básica.
Para a realização destes exercícios, Lowen propõe dois "mandamentos": primeiro não prender
a respiração. Se a pessoa perceber que está prendendo sua respiração, deve dar um suspiro.
Segundo, emitir um som. O suspiro deve ser audível. Assim, o trabalho de Lowen também
passa a incluir a fonação, de modo similar à proposta de Navarro.
Exercícios de respiração ajudam um pouco, mas não fazem nada para reduzir
a tensão e restaurar o padrão respiratório natural. É preciso entender esses
padrões de respiração natural e saber por que eles se desorganizam (LOWEN,
1985, p. 35).
A explicação de Lowen para essas afirmações é que “trabalhar com as tensões musculares
exclusivamente, sem a análise das defesas psíquicas e sem a evocação dos sentimentos
reprimidos, não compõe um processo terapêutico” (LOWEN, 1982, p. 107). Não obstante, ele
afirma que mesmo assim “é tão importante que cada pessoa se mantenha em contato com
seu corpo e reduza seu nível de tensão que encorajamos todos os nossos pacientes a
praticarem os exercícios bioenergéticos” (LOWEN, 1982, p. 107).
O Segmento Diafragmático 40
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Nós concordamos com essas afirmações de Lowen e consideramos que são válidas não só para
os exercícios bioenergéticos ou para as práticas de reeducação corporal de Souchard, mas
também para os actings de Navarro, para a Massagem Reichiana e para as intervenções
corporais propostas pelo próprio Reich. Nenhuma destas técnicas é plenamente eficaz quando
feita de modo mecânico ou ainda desvinculada de um processo terapêutico adequado que
contemple a análise das resistências do caráter. É por isso que Reich afirmou:
Por outro lado, ainda que alguns destes exercícios e práticas sejam feitos fora de um processo
terapêutico adequado, eles não são isentos de valor se forem realizados conscientemente,
com atenção ao próprio organismo e sensações. Neste caso, eles colaboram no sentido de
aliviar parcialmente a estase bioenergética e ampliar a autoconsciência corporal do indivíduo
em relação aos seus bloqueios emocionais.
Por fim, citamos a Massagem Reichiana desenvolvida por Blanca Rosa Añorve e introduzida no
Brasil por Denise Dessaune (DESSAUNE, 1988). Essa massagem consiste na manipulação direta
da musculatura do paciente a partir de técnicas que permitem desbloquear a energia da
couraça muscular e liberar as emoções retidas na couraça. Essa manipulação pode ser feita
tanto sobre a musculatura inspiratória acessória, quanto sobre o próprio diafragma, neste caso
em especial a parte do diafragma acessível ao toque, ou seja, a sua porção muscular costal
(inserção nas costelas inferiores).
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Vide, por exemplo, as práticas respiratórias milenares do Taoismo na China e da Yoga na Índia.
27
Trata-se de contato vegetativo, ou seja, da capacidade da pessoa perceber suas próprias correntes vegetativas,
suas emoções e seus pensamentos (em síntese, sua “realidade interna”), bem como estabelecer uma relação
profunda com outra pessoa a partir desta capacidade (ou seja, com a sua “realidade externa”).
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Assim, nessa mesma linha de raciocínio consideramos que práticas das mais diversas origens
podem ser utilizadas como meros "exercícios respiratórios" ou podem ser adaptadas para
funcionar como actings terapêuticos se forem bem compreendidas e utilizadas.
7. CONCLUSÃO
Iniciamos este trabalho a partir de uma visão geral dos segmentos da couraça muscular
propostos por Reich. Sem entrarmos em detalhes de todos os segmentos, nos propusemos a
fazer um aprofundamento específico do segmento diafragmático.
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