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MANUAL TERAPÊUTICO PARA COVID-19

FÁRMACOS DE REPOSICIONAMENTO

UM GUIA PRÁTICO E RÁPIDO DE FARMACOLOGIA PARA


TRATAMENTO PRECOCE EM PACIENTES COVID-19

Dermeval Reis Junior


Assinado digitalmente por DERMEVAL REIS JUNIOR

DERMEVAL DN: C=BR, OU=PESQUISA EM SAÚDE, O="INSTITUTO


BIOMÉDICO DE FISIOLOGIA E SAÚDE ", CN=DERMEVAL
REIS JUNIOR, E=drdermeval@gmail.com
Razão: Eu sou o autor deste documento

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Data: 2021-01-20 10:18:25
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MANUAL TERAPÊUTICO PARA COVID-19

FÁRMACOS DE REPOSICIONAMENTO
Um guia prático e rápido de farmacologia para tratamento
precoce em pacientes COVID-19.

Dermeval Reis Junior

2021

2
Nota sobre o autor

DERMEVAL REIS JUNIOR

✓ Doutorando em Ciências Fisiológicas e Terapia Celular pelo Programa de Pós-


Graduação em Ciências Fisiológicas pela Universidade Federal do Triângulo
Mineiro - Uberaba-MG;

✓ Mestre em Medicina pelo Programa de Pós-Graduação em Medicina, do


Departamento de Medicina e Disciplina de Cardiologia da Universidade Federal
de São Paulo - Escola Paulista de Medicina - São Paulo-SP (2016);

✓ Especialista em Patologia Clínica (análises clínicas) pelo Departamento de


Medicina da Universidade Federal de São Paulo-Escola Paulista de Medicina -
São Paulo-SP (2011);

✓ Especialista em Fisiologia Humana pela Faculdade de Medicina do ABC-Santo


André-SP (2004) com reconhecimento de Docência e Pesquisa pelo Conselho
Regional de Biomedicina da 1ª Região;

✓ Docente em ciências médicas e da saúde (2008-2009) na Universidade Nove de


Julho-UNINOVE, nos cursos de Biomedicina, Enfermagem, Farmácia,
Fisioterapia, Medicina, Nutrição e Radiologia, nas disciplinas de Biologia
Celular e Molecular, Bioquímica Básica, Bioquímica Clínica, Farmacologia
Básica e Clínica, Fisiologia, Hematologia, Imunologia, Metodologia da
Pesquisa, Microbiologia e Patologia.

✓ Docente em ciências médicas e da saúde (2006-2007) pelo Centro Universitário


São Camilo nos cursos de Nutrição e Terapia Ocupacional, nas disciplinas de
Bioquímica Básica, Farmacologia, Fisiologia e Patologia.

✓ Docente e coordenador de Hematologia do curso de Hematologia do Instituto


de Pesquisa e Educação em Saúde de São Paulo (IPESSP - 2006).

✓ Habilitado na especialidade Patologia Clínica e Graduado em Biomedicina pela


Universidade de Franca-Franca-SP (2001).

3
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO

2. FISIOPATOLOGIA DA COVID-19

3. IMUNOPATOLOGIA DA COVID-19

4. COMPLICAÇÕES DA COVID-19

5. SINTOMAS

6. DIAGNÓSTICO

7. TERAPÊUTICA
7.1. Hidroxicloroquina
7.2. Zinco
7.3. Azitromicina
7.4. Bromexina
7.5. Nitazoxanida
7.6. Ivermectina
7.7. Vitamina D
7.8. Colchicina

8. ANTICOAGULANTES
8.1. Heparina
8.2. Antagonistas da Vitamina K
8.3. Rivaroxabana
8.4. Apixabana

9. GLICOCORTICÓIDES
9.1. Dexametasona / Prednisona

4
1. INTRODUÇÃO

O autor não tem a pretensão de que este guia seja considerado


um protocolo de tratamento. Trata-se de enfoque farmacológico de
fármacos conhecidos, porém, com aplicabilidade à terapêutica à COVID-19,
com o objetivo, apenas, de orientar o clínico quando este julgar necessário.

Ainda não existe um tratamento específico para COVID-19. As


descobertas sobre a base molecular da doença fornecem oportunidades sem
precedentes para traduzir os resultados da pesquisa em novos medicamentos.
No entanto, desenvolver um novo medicamento exige uma enorme quantidade
de tempo, dinheiro e esforço, principalmente devido aos gargalos no processo
de desenvolvimento terapêutico. Atrasos e barreiras significam que a tradução
de uma molécula promissora em um medicamento aprovado geralmente leva
mais de 14 anos. É crucial desenvolver estratégias para reduzir esse período de
tempo, diminuir custos e melhorar as taxas de sucesso.

O reaproveitamento de medicamentos é uma dessas estratégias.


Muitos agentes aprovados para outros usos já foram testados em humanos,
portanto, informações detalhadas estão disponíveis sobre sua farmacologia,
formulação e toxicidade potencial. Como o reaproveitamento se baseia em
esforços de pesquisa e desenvolvimento anteriores, novas terapias candidatas
podem estar prontas para testes clínicos rapidamente e sua integração aos
cuidados de saúde, até que surja o fármaco ideal.

O Ministério da Saúde já adotou posicionamento sobre o tratamento


precoce com drogas de reposicionamento, quando referendou o uso da
hidroxicloroquina como medida farmacológica terapêutica para COVID-19.

“Os medicamentos cloroquina e hidroxicloroquina foram


recomendados pelo Ministério da Saúde como possibilidade
terapêutica em pacientes com diagnóstico confirmado da COVID-
19, hospitalizados e com a forma grave da doença, em caráter off
label, ou seja, sem indicação prévia em bula. Ressalta-se que a
sugestão do uso pode ser modificada a qualquer tempo, a

5
depender dos resultados das pesquisas científicas em curso. A
bula da cloroquina informa sua contraindicação para pacientes com
deficiência de G6PD (glicose-6-fosfato desidrogenase) e a bula da
hidroxicloroquina adverte que seu uso nesses pacientes deve ser
feito com cautela.”1

1
https://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2020/May/11/Seguranca-
CloroquinaeHidroxicloquina-COVID19.pdf (consultado em 17.01.2021)
6
2. FISIOPATOLOGIA DA COVID-192

O coronavírus pode causar doenças respiratórias, gastrintestinais e


neurológicas. Os vírus mais comuns já identificados na prática clínica são: 229E,
OC43, NL63 e HKU1, os quais são os causadores mais comuns de sintomas
relacionados ao resfriado comum em indivíduos imunocomprometidos.

No início da infecção, o SARS-CoV-2 tem como alvo células epiteliais


nasais, brônquicas e os pneumócitos. Por meio da proteína viral estrutural Spike
(S) o SARS-CoV-2 se liga ao receptor da enzima conversora de angiotensina 2
(ACE2). Uma serina protease transmembranar tipo 2 (TMPRSS2) presente na
célula hospedeira promove a captação viral por clivagem da ACE2. Isto
desencadeia a ativação da proteína S do SARS-CoV-2, que medeia a entrada
do coronavírus nas células hospedeiras por um processo de endocitose.

ACE2 e TMPRSS2 são expressos em células-alvo do hospedeiro,


particularmente nas células epiteliais alveolares tipo II ou pneumócitos tipo II.
Como em outras doenças virais respiratórias, pode ocorrer linfopenia profunda
em indivíduos com COVID-19 quando o SARS-CoV-2 infecta e mata linfócitos T.
Além disso, a resposta inflamatória viral, que consiste tanto na resposta imune
inata quanto na adaptativa, prejudica a linfopoiese e aumenta a apoptose dos
linfócitos.

Em estágios posteriores aos da infecção, quando a replicação viral se


acelera, a integridade da barreira epitelial-endotelial fica comprometida. Além
das células epiteliais, o SARS-CoV-2 infecta as células endoteliais dos capilares
pulmonares, acentuando a resposta inflamatória e desencadeando um influxo de
monócitos e neutrófilos. Infiltrados inflamatórios mononucleares intersticiais e
edema se desenvolvem e aparecem como opacidades em vidro fosco na
tomografia computadorizada. Segue-se o edema pulmonar preenchendo os
espaços alveolares com formação de membrana hialina, compatível com
síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA) de fase inicial. Angioedema

2
JAMA. 2020;324(8):782-793. doi:10.1001/jama.2020.12839
7
pulmonar dependente de bradicinina pode contribuir para o agravamento da
doença. Coletivamente, a ruptura da barreira endotelial, a transmissão
disfuncional alveolar-capilar de oxigênio e a capacidade de difusão de oxigênio
prejudicada são características peculiares da COVID-19.

Numa fase mais tardia e grave, ocorre ativação fulminante da


coagulação e consumo dos fatores de coagulação. Tecidos e endotélio
pulmonares inflamados podem resultar formação de microtrombos e contribuir
para a alta incidência de complicações trombóticas, como trombose venosa
profunda (TVP), embolia pulmonar e complicações arteriais trombóticas (por
exemplo, isquemia de membro, acidente vascular encefálico isquêmico, infarto
do miocárdio) em condições críticas pacientes doentes. O desenvolvimento de
sepse viral, definida como disfunção orgânica com risco de vida causada por
uma resposta desregulada do hospedeiro à infecção, pode contribuir ainda mais
para a falência de múltiplos órgãos.

8
Conhecimento atual da síndrome respiratória aguda grave induzida por coronavírus 2 (SARS-CoV-2) -
resposta imune do hospedeiro. O SARS-CoV-2 tem como alvo as células através da proteína viral estrutural
spike (S) que se liga ao receptor da enzima conversora de angiotensina 2 (ACE2). A serina protease tipo 2
transmembranar serina protease (TMPRSS2) na célula hospedeira promove ainda a captação viral por
clivagem de ACE2 e ativação da proteína S SARS-CoV-2. No estágio inicial, o número de cópias virais pode
ser alto no trato respiratório inferior. Moléculas de sinalização inflamatória são liberadas por células
infectadas e macrófagos alveolares, além de linfócitos T recrutados, monócitos e neutrófilos. Na fase tardia,
o edema pulmonar pode preencher os espaços alveolares com formação de membrana hialina, compatível
com a síndrome do desconforto respiratório agudo de fase inicial (fonte: Wiersinga e cols., JAMA.
2020;324(8):782-793. doi:10.1001/jama.2020.12839).

9
3. IMUNOPATOLOGIA DA COVID-193

Já está demonstrado que o SARS-CoV-2 interrompe as respostas


imunológicas normais, levando o sistema imune ao prejuízo com respostas
inflamatórias não controladas em pacientes graves e críticos com COVID-19.

CD69, CD38 e CD44 são altamente expressos em LTCD4+ e


LTCD8+. As células T de pacientes e as células T específicas de casos graves
exibem um fenótipo de memória central com altos níveis de IFN-γ, TNF-α e IL-2.

Os níveis de neutrófilos são significativamente mais altos em


pacientes graves, enquanto a porcentagem de eosinófilos, basófilos e monócitos
é reduzida.

O aumento da produção de citocinas, especialmente de IL-1β, IL-6 e


IL-10, é outra característica chave da COVID-19 grave. Os níveis de IgG também
estão aumentados e há um título mais alto de anticorpos totais.

Os casos mais graves de COVID-19 exibem um aumento extremo nas


citocinas inflamatórias, incluindo IL-1β, IL-2, IL-6, IL-7, IL-8, IL-10, fator
estimulador de colônia de granulócitos (G-CSF), fator estimulador de colônia de
macrófagos de granulócitos (GM-CSF), proteína induzível por interferon-10
(IP10), proteína quimiotática 1 de monócitos (MCP1), proteína de inflamação de
macrófagos-1α, IFN-γ e TNF-α, representando uma “tempestade de citocinas”.

Em pacientes não graves, os níveis de citocinas, incluindo IL-1β, IL-


1RA, IL-2R, IL-6, IL-7, IL-8, IL-9, IL-10, IFN-γ, TNF-α, G-CSF, GM-CSF, IP10,
MCP1, também são regulados positivamente no sangue, mas são
significativamente mais baixos do que aqueles em pacientes graves.

3
COVID-19: immunopathogenesis and Immunotherapeutics. Sig Transduct Target Ther 5, 128 (2020).
https://doi.org/10.1038/s41392-020-00243-2
10
A imunopatologia de COVID-19. Os padrões imunológicos de COVID-19 incluem linfopenia, ativação e
disfunção de linfócitos, anormalidades de granulócitos e monócitos, aumento da produção de citocinas e
aumento de anticorpos. A linfopenia é uma característica fundamental dos pacientes com COVID-19,
especialmente em casos graves. CD69, CD38 e CD44 são altamente expressos em CD4 + e CD8 +As
células T de pacientes e as células T específicas de vírus de casos graves exibem um fenótipo de memória
central com altos níveis de IFN-γ, TNF-α e IL-2. No entanto, os linfócitos mostram um fenótipo de exaustão
com proteína-1 de morte celular programada (PD1), domínio de imunoglobulina de células T e domínio de
mucina-3 (TIM3), e subfamília de receptor tipo lectina de célula assassina subfamília C membro 1 (NKG2A).
Os níveis de neutrófilos são significativamente mais altos em pacientes graves, enquanto a porcentagem
de eosinófilos, basófilos e monócitos é reduzida. O aumento da produção de citocinas, especialmente de
IL-1β, IL-6 e IL-10, é outra característica chave da COVID-19 grave. Os níveis de IgG também estão
aumentados e há um título mais alto de anticorpos totais (Fonte: Yang e col. COVID-19:
immunopathogenesis and Immunotherapeutics. Sig Transduct Target Ther 5, 128 (2020).
https://doi.org/10.1038/s41392-020-00243-2).

11
4. COMPLICAÇÕES DA COVID-19

Funções prejudicadas do coração, cérebro, pulmão, fígado, rim e


sistema de coagulação. A COVID-19 pode causar miocardite, cardiomiopatia,
arritmias ventriculares e instabilidade hemodinâmica. Doença cerebrovascular
aguda e encefalite são observadas com doença grave, em até 8% dos pacientes.

Eventos tromboembólicos venosos e arteriais ocorrem em 10% a 25%


em pacientes hospitalizados. Na UTI, eventos tromboembólicos venosos e
arteriais podem ocorrer em até 31% a 59% dos pacientes.

Além de insuficiência respiratória, os pacientes hospitalizados podem


desenvolver lesão renal aguda (9%), disfunção hepática (19%), sangramento e
disfunção de coagulação (10% -25%) e choque séptico (6%).

12
5. SINTOMAS4

O período de incubação médio, desde a exposição até o início dos


sintomas é de aproximadamente 5 dias. Aproximadamente 97,5% dos indivíduos
que desenvolvem sintomas o farão dentro de 11,5 dias após a infecção. O
intervalo médio do início dos sintomas até a admissão hospitalar é de 7 dias.

A COVID-19 tem várias manifestações clínicas. Em geral, com base


em um estudo de 44.672 pacientes com COVID-19 na China, 81% dos pacientes
tiveram manifestações leves, 14% tiveram manifestações graves e 5% tiveram
manifestações críticas, estas últimas definidas por insuficiência respiratória,
choque séptico e / ou falência múltipla de órgãos.

Sintomas leves: anosmia, ageusia, coriza, diarreia, dor abdominal,


febre, mialgia, tosse, fadiga, cefaleia.

Sintomas moderados: Tosse persistente e com febre persistente


diária ou tosse persistente com piora progressiva de outro sintoma relacionado
à COVID-19 (adinamia, prostração, hiporexia, diarreia) ou pelo menos um dos
sintomas acima com presença de fator de risco.

Sintomas graves: síndrome respiratória aguda grave – síndrome gripal


que apresente: dispneia/desconforto respiratório, com batimentos de asa de
nariz ou pressão persistente no tórax, com esforço de movimentos respiratórios,
ou saturação de O2 menor que 95% em ar ambiente, ou coloração azulada de
lábios ou rosto.

4
BRASIL - MINISTÉRIO DA SAÚDE. Orientações do Ministério da Saúde para manuseio medicamentoso
precoce de pacientes com diagnóstico da COVID-19.
13
6. DIAGNÓSTICO4

O diagnóstico clínico dá celeridade ao início do tratamento precoce.


Identificada a síndrome gripal, prescrita a terapêutica, pode-se, então, dar início
aos exames complementares,

Inicialmente, RT-PCR para SARS-CoV-2, até o 7º dia de sintomas.


Em caso de falta de ar, tosse, a tomografia de tórax torna-se mais urgente para
a constatação de acomentimento pulmonar pela presença de imagem definida
como “vidro fosco”.

Ademais, outros exames complementares podem ser solicitados:

Hemograma completo, gasometria arterial, coagulograma (TP, TTPA,


fibrinogênio, D-dímero), proteína C-reativa sérica (de preferência ultra sensível);
perfil metabólico completo (AST (TGO), ALT (TGP), Gama-GT, creatinina, ureia,
albumina), glicemia, ferritina, desidrogenase lática, biomarcadores cardíacos
(troponina, CK-MB, Pró-BNP), 25 OH-Vitamina D, íons (Na/K/Ca/Mg),
hemoculturas e culturas de escarro, sorologia (CLIA ou ELISA) para IgM/IGG
específico para SARS-Cov-2 (após 12º dia de sintomatologia).

Anormalidades radiográficas e laboratoriais, como linfopenia e


elevação da lactato desidrogenase, são comuns, mas inespecíficas. O
diagnóstico é feito pela detecção de SARS-CoV-2 por meio do teste de reação
em cadeia da polimerase de transcrição reversa, embora resultados de teste
falso-negativos possam ocorrer em até 20% a 67% dos pacientes; no entanto,
isso depende da qualidade e do tempo de teste.

14
7. TERAPÊUTICA5

A medicina baseada em evidências é de suma importância para


nortear a terapêutica médica. No entanto, vale repetir o que já dissemos no início
deste manual: estamos em meio a uma pandemia e o tempo hábil para que
sejam produzidas as evidências dignas de nota está em desacordo com a
gravidade e evolução da doença. Claro que iniciativas de diretrizes baseadas em
evidências devem e são estabelecidas por muitos países e sociedades
profissionais, incluindo diretrizes que são atualizadas regularmente pelos
National Institutes of Health (NIH), no entanto, desde que a ciência célere e a
experiência empírica na clínica mostrem resultados, neste momento delicado, e
impossível de obtenção de estudos mais substanciais, vale muito o emprego de
fármacos de reposicionamento.

Aqui serão abordados fármacos utilizados em protocolos para o


chamado tratamento precoce, que são aqueles iniciados nos 5 primeiros dias de
sintomas do paciente, sabido que a fase 1 ocorre entre os dias 1 e 7 de sintomas,
porém, sendo mais importante o início de um tratamento no sentido lógico de
que isto possa produzir um melhor prognóstico para o desfecho do paciente o
quanto antes, dentro dos 5 primeiros dias, conhecidos os mecanismos de
replicação viral descritos no capítulo Fisiopatologia da COVID-19.

Também será feita uma breve abordagem sobre a fase 2 da COVID-


19, acrescendo informações necessárias aos fármacos para esta fase. A
avaliação do grau de severidade de cada paciente, realizado pelo médico
assistente, poderá orientá-lo na escolha do melhor esquema terapêutico, assim
como suas características e comorbidades.

A sugestão de vários protocolos de tratamento é que estas


drogas sejam administradas iniciando-as nos 5 primeiros dias de sintomas
e todas em conjunto, excetuando os glicocorticoides, conforme cada
tópico informa.

5
https://ncats.nih.gov/preclinical/repurpose
15
7.1. Hidroxicloroquina6,7

É um antimalárico usado há 70 anos na clínica, e que teve seu uso


reposicionado para Lúpus e Artrite Reumatóide. Dentre suas ações biológicas,
destaca-se, para COVID-19, sua ação como bases fracas. Se acumulam dentro
dos endossomos, lisossomos ou vesículas de Golgi dentro das células,
resultando em elevação do pH dentro desses compartimentos. O aumento do
pH, especialmente nos lisossomos, interfere com as etapas dependentes do pH
da replicação do SARS-CoV-2, como fusão e não revestimento. Como o
coronavírus requer acidificação dos endossomos para o bom funcionamento
deduz-se que um aumento no pH nos compartimentos intracelulares tenha
importante efeito inibidor, no tratamento de pacientes infectados com SARS-
CoV-2. Assim, fora do pH ideal, a atividade enzimoprotéica viral é paralisada,
não havendo replicação viral nem sua biomagnificação.

Há relatos de que o uso de hidroxicloroquina induz ao aumento do


intervalo QT no eletrocardiograma, provocando o fenômeno Torsade de Pointes.
Um recente estudo demonstrou que a hidroxicloroquina não causou mortalidade
cardíaca por Torsade de Pointes. Ao contrário, a hidroxicloroquina diminui os
eventos cardíacos. Este estudo conclui que seu uso não deve ser restrito a
pacientes com COVID-19 por medo de mortalidade cardíaca8.

Posologia para COVID-19

A hidroxicloroquina 400 mg deve ser iniciada desde o primeiro dia de


sintomatologia, mas, na impossibilidade disto, o recomendável é que seja entre
o 2º e 4º dia de sintomas de síndrome gripal, independente do resultado do
exame diagnóstico. No 1º dia de tratamento tomar 1 comprimido de 12/12 horas
até o 2º comprimido. A partir do 3º comprimido, tomar 1 ao dia por 5 dias. A dose

6
https://doi.org/10.1016/j.mehy.2020.109815
7
BMC Infect Dis 21, 72 (2021). https://doi.org/10.1186/s12879-021-05773-w
8
https://doi.org/10.1016/j.nmni.2020.100747
16
pode ser ajustada a critério do clínico, podendo ser utilizada a apresentação de
hidroxicloroquina 200 mg com a mesma posologia, mas nunca ultrapassar a
dose diária máxima prevista na bula.

Interação medicamentosa e contra indicações9

Hidroxicloroquina deve ser evitada em associação com:


clorpromazina, clindamicina, estreptomicina, gentamicina, heparina,
indometacina, tiroxina, isoniazida e digitálicos.

São contraindicações absolutas ao uso da hidroxicloroquina:


pacientes com deficiência de G6PD, retinopatia/maculopatia secundária ao uso
do fármaco já diagnosticada, hipersensibilidade ao fármaco e miastenia grave.
O risco de retinopatia é menor com o uso da hidroxicloroquina. A retinotoxicidade
relaciona-se com a dose acumulada. No caso da cloroquina, o risco aumenta de
modo significativo quando a dose cumulativa excede 300 gramas. No caso da
hidroxicloroquina, há maior risco com doses cumulativas que ultrapassam 1.000
gramas.

Em crianças, dar sempre prioridade ao uso de hidroxicloroquina pelo


risco de toxicidade da cloroquina. Cloroquina deve ser usada com precaução em
portadores de doenças cardíacas, hepáticas ou renais, hematoporfiria e doenças
mentais.

Cloroquina deve ser evitada em associação com: amiodarona,


cimetidina, clorpromazina, clindamicina, estreptomicina, gentamicina, heparina,
indometacina, tiroxina, isoniazida e digitálicos. Avalie as interações com outros
medicamentos, especialmente em pacientes críticos ou oncológicos.
Medicamentos que podem prolongar o intervalo QT incluem: azitromicina,
voriconazol, ondasetrona, metadona, ciprofloxacina, clorpromazina, cisaprida,
risperidona e domperidona. Se QTc for superior a 450 milissegundos, não se
deve iniciar a hidroxicloroquina. Se prolongamento do QTc for acima de 25% da
linha de base, o tratamento deve ser suspenso. Evitar em portadores de doenças
cardíacas, que propiciem evento arrítmico (bloqueios bifasciculares, FEVE

9
Proposta De Protocolo de Tratamento Precoce Ambulatorial Contra Covid-19 para o Estado do Paraná e
Municípios – 07/08/2020. -
17
menor que 30%, doença de Wolf-Parkinson-White, etc) e Miastenia Gravis. Usar
com precaução: Doenças hepáticas ou renais, hematoporfiria e doenças
mentais. Investigar e tratar anemia.

7.2. Zinco10

O zinco é um micronutriente essencial, com concentrações sistêmicas


e intracelulares estritamente reguladas, e é fisiologicamente necessário para
uma resposta antiviral eficaz. Este efeito é potencializado na presença de zinco,
que provoca atividade contra vários vírus, inibindo a atividade da RNA
polimerase dependente de RNA (RdRp) do vírus da hepatite E e coronavírus. As
evidências apontam para os ionóforos de zinco no bloqueio da replicação do
coronavírus. Deve ser usado associado à hidroxicloroquina.

Posologia para COVID-19

Podem ser prescritas qualquer das duas apresentações


farmacêuticas:

Zinco Quelado 60 mg – tomar 1 comprimido de 12/12h durante 5 dias


(ou enquanto uso de hidroxicloroquina) ou;

Sulfato de Zinco 50mg – tomar 1 comprimido de 12/12h durante 5 dias


(ou enquanto uso de hidroxicloroquina).

10
https://doi.org/10.1016/j.mehy.2020.109815
18
7.3. Azitromicina

A Azitromicina pertence à classe quimioterápica dos antibióticos


macrolídeos. Efeitos anti-inflamatórios e antivirais foram constatados pelo uso
de azitromicina; entretanto, o mecanismo é desconhecido. A azitromicina já é
reconhecida por sua atividade antiviral em vírus de RNA11.

A Azitromicina já foi relatada como interferente no processo de


internalização de partícula viral na célula hospedeira durante a fase inicial da
invasão de vírus12.

Possui efeito celular de inibição de proteínas inflamatórias ou


suprimindo fatores de transcrição gênica para citocinas inflamatórias13.

Exerce efeito em células pulmonares infectadas semelhante ao efeito


em bactérias. Nestas, a azitromicina atua na subunidade 50S do ribossomo
bacteriano impedindo a síntese proteica. Em células humanas doentes, a
azitromicina atua, por homologia, em ribossomos mitocondriais14.

Portanto, a azitromicina promove, via mitocondrial, um desajuste


energético tal à célula pulmonar doente ao ponto de impedir a endocitose e
exocitose de partículas virais de SARS-CoV-2.

Posologia para COVID-19

Azitromicina 500 mg – deve ser prescrita diferentemente das


prescrições rotineiras para infecções bacterianas. Apenas 1 comprimido ao dia
por 5 dias. No entanto, o paciente que apresentar lesão pulmonar em vidro fosco,
usando azitromicina deve ter a evolução da remissão da doença acompanhada,
podendo, se for o caso, prorrogar a suspensão do uso o quão necessário se

11
European Respiratory Journal 2010 36: 646-654; DOI: 10.1183/09031936.00095809
12
J Antibiot 72, 759–768 (2019). https://doi.org/10.1038/s41429-019-0204-x
13
Respir Res 7, 134 (2006). https://doi.org/10.1186/1465-9921-7-134
14
Aging (Albany NY). 2019 Apr 30; 11(8): 2202–2216. doi: 10.18632/aging.101905
19
fizer. Neste caso, após o 5º dia, pode ser associado outro antibiótico –
axietilcefuroxima 500 mg12/12 horas, até a remissão da pneumonia. Este
antibiótico não faz parte do protocolo inicial, sendo utilizado como coadjuvante
em fase mais tardia, apenas.

Interação medicamentosa e contra indicações

Importante ressaltar que a azitromicina é o macrolídeo de menor


impacto como influenciador no intervalo QT do eletrocardiograma. O
prolongamento do intervalo QT pelos macrolídios é bem conhecido na
farmacologia básica. De uma maneira global, é possível ordenar os macrólideos
de forma decrescente quanto ao potencial de prolongar o intervalo QT:
eritromicina> claritromicina> roxitromicina> azitromicina. Azitromicina , portanto,
é o menor potencializador de prolongamento do intervalo QT, mas isto não exclui
uma monitorização cardíaca quando associado à cloroquina e hidroxicloroquina
em pacientes que fazem uso de digitálicos e/ou antiarrítmicos ou pacientes com
taquicardia ventricular severa15 (vide informações sobre intervalo QT no tópico
hidroxicloroquina).

Não é recomendado o uso de antiácidos à base de alumínio ou


magnésio. Estes podem retardar a absorção e reduzirem as concentrações
séricas máximas. Temos que lembrar que o uso na COVID-19 é de 1 comprimido
ao dia, diferente da posologia para infecções bacterianas, que são 3 ao dia.

Semelhantemente à eritromicina, a azitromicina pode inibir as


enzimas do citocromo P450. Isto implica em aumentar as concentrações séricas
de vários medicamentos – teofilina, anticoagulantes orais, ciclosporina,
metilprednisolona e digoxina16.

15
Revista de la OFIL, 25 años al servicio de la farmacia ibero-latinoamericana vol. 25 – nº1 – 2015
16
Farmacologia Básica e Clinica – Fármacos quimioterápicos – Tetraciclinas, macrolídios, cloranfenicol e
estreptograminas, pgs 671 – 679, 2008.
20
7.4. Bromexina17,18,19

Este fármaco pode ser usado como profilático para infecção por
SARS-CoV-2, dado seu mecanismo de ação interferir diretamente no
mecanismo de infecção viral.

É um medicamento usado há várias décadas como agente mucolítico.


Trata-se de um inibidor da serino-proteasse transmembranar 2 (TMPRSS2) com
maior capacidade de distribuição no tecido pulmonar.

O SARS-CoV-2 se liga ao receptor da enzima conversora de


angiotensina 2 (ECA2) da célula hospedeira por meio de sua proteína Spike (S).
Os vírus mais recentes tendem a usar a via de não endocitose, que é ativada
pela TMPRSS2, muito presente nas células do sistema respiratório,
especialmente nos pulmões. A bromexina tem por ação biológica o bloqueio da
via TMPRSS2 e da não endocitose, impedindo, assim, que o vírus tenha acesso
ao interior de nossas células pulmonares.

As únicas contra indicações são amamentação e gravidez, não tendo,


também, nenhum tipo de risco de interação medicamentosa importante, relatado.

Posologia para COVID-19

Bromexina 8mg/5ml – Tomar 5 ml via oral por 3 vezes ao dia,


continuamente para fazer profilaxia. Para crianças existe a apresentação
pediátrica com a dosagem 4mg/5ml, sendo a mesma posologia.

17
Pharmacol Res. 2020 Jul; 157: 104837. doi: 10.1016/j.phrs.2020.104837
18
BioImpacts, 2020, 10(4), 209-215 doi: 10.34172/bi.2020.27
19
Internal and Emergency Medicine https://doi.org/10.1007/s11739-020-02383-3
21
7.5. Nitazoxanida20,21

Após absorvida, a nitazoxanida é convertida em tizoxanida. Seu


mecanismo de ação descrito na terapêutica parasitária intestinal não é aplicado
ao uso como antiviral no combate ao SARS-CoV-2.

Considerado um antiviral de amplo espectro devido ao fato de que o


mecanismo de ação é baseado na interferência com as vias reguladas pelo
hospedeiro envolvidas na replicação viral, em vez das vias específicas do vírus.
É capaz de inibir o SARS-CoV-2 em uma pequena concentração. Suprime a
produção de citocinas, enfatizando seu potencial para controlar a tempestade de
citocinas induzida por COVID-19. Super-regula os mecanismos antivirais inatos
amplificando largamente a detecção de RNA citoplasmático e as vias de
interferon (IFN) tipo I. Interfere na infecção viral ao regular positivamente os
mecanismos precisos do hospedeiro que os vírus usam para contornar as
defesas celulares do hospedeiro.

A nitazoxanida potencializa a produção de interferon (IFN). IFN é uma


molécula produzida por células do sistema imune (IFN alfa) e por fibroblastos
(IFN beta). Estas moléculas são estimuladas na presença de RNA. Coronavírus,
e em especial, SARS-CoV-2 é um vírus de RNA. Contra vírus de RNA, os IFNs
inibem a replicação viral dentro de uma célula. Promovem aumento do potencial
de lise celular das células NK (matadoras naturais). São um tipo de linfócito, que
ao se autodestruírem, destroem os agentes infecciosos e liberam enzimas e
outras substâncias que atuam como mediadores imunológicos, aumentando, por
exemplo, a atividade dos linfócitos T citotóxicos.

Posologia para COVID-19

20
Journal of Genetic Engineering and Biotechnology volume 18, Article number: 35 (2020)
21
European Respiratory Journal doi: 10.1183/13993003.03725-2020
22
A dose preconizada para nitazoxanida, e que foi utilizada no estudo
brasileiro21 é a de 1 comprimido de 500mg/dia por 5 dias, podendo ser extendido
o tratamento na medida da necessidade.

7.6. Ivermectina22

Semelhantemente à bromexina, este fármaco pode ser utilizado como


profilático, dado seu mecanismo de ação para SARS-CoV-2. Trata-se de uma
lactona macrocíclica de ivermectina B1a e B1b, derivado do actinomiceto
terrestre Streptomices avermitilis.

Seu uso na terapêutica para COVID-19, resume-se no papel de inibir


as proteínas de transporte nuclear - importina alfa / beta-1 - do hospedeiro, que
são parte de um processo de transporte intracelular chave, em que os vírus
sequestram para aumentar a infecção, suprimindo a resposta antiviral do
hospedeiro. Também interferem na fixação da proteína do pico (Spike 1) do
SARS-CoV-2 à membrana da célula humana, evitando assim, a entrada na
célula, portanto, evitando a infecção.

A Ivermectina possui propriedades anti-inflamatórias potenciais,


postuladas como benéficas no tratamento de COVID-19 e, recentemente o
Painel de Diretrizes do NIH23 concede aval para uso em estudos da droga com
a seguinte afirmação: "Atualmente está sendo avaliado como um tratamento
potencial para COVID-19."

Estudo ICON24

Este estudo mostrou que, de 280 pacientes com


infecção pelo SARS-CoV-2 confirmada 173 haviam recebido

22
European Journal of Medical and Health Sciences, 2: (6), 2020.
23
COVID-19 Treatment Guidelines Panel. Coronavirus Disease 2019 (COVID-19) Treatment Guidelines.
National Institutes of Health. Available at https://www.covid19treatmentguidelines.nih.gov/. Accessed
[17.01.2021].
24
doi: https://doi.org/10.1101/2020.06.06.20124461
23
tratamento com Ivermectina, e 107 haviam sido tratados de acordo
com o protocolo padrão. A análise univariada mostrou REDUÇÃO
DE MORTALIDADE NO GRUPO IVERMECTINA (15.0 % versus
25.2%, OR 0.52, IC 95% 0.29-0.96, p=.03). A mortalidade também
FOI MENOR em 75 pacientes com doença pulmonar grave,
tratados com Ivermectina (38.8% vs 80.7%, OR 0.15, IC 0.05-0.47,
p=.001).

Posologia para COVID-19

O uso de ivermectina é curto – 3 dias. Porém, a dose é calculada por


comprimido por peso por dia. A prescrição é: 1 comprimido a cada 30Kg de peso
(arredondar para cima ex. 75Kg = 3 comprimidos) durante 3 dias para
tratamento. Para prevenção, repete a cada 15 dias.

Interação medicamentosa e contra indicações

A ivermectina não deve ser utilizada na gravidez.

Não é indicado usar ivermectina juntamente com outros fármacos que


atuam no aumento da atividade GABA – barbitúricos, benzodiazepínicos, ácido
valpróico.

7.7. Vitamina D25

Pode e deve ser usada como profilático para COVID-19. Este


composto vitamínico tem por ação, estimular linfócitos especializados em regular
a resposta imune, as chamadas células T-Reg. O metabólito ativo da vitamina D
leva à ativação e expressão de várias proteínas do sistema imune inato e
adaptativo (células T-reg, citocinas, defensinas, receptores de reconhecimento
de padrões, etc). Exerce efeitos opostos no sistema imunológico adaptativo

25
NFS Journal, Volume 21, November 2020, Pages 38
24
(inibição) e inato (promoção). Isso se correlaciona com uma resposta anti-
inflamatória e equilibra a resposta imune.

Por outro lado, a vitamina D tem importante ação nas vias metabólicas
da angiotensina II. Estas vias estão diretamente associadas ao processo
molecular de interação entre a partícula viral do SARS-CoV2 e a célula pulmonar,
via um receptor proteína S do vírus e receptor ACE2 nas células pulmonares. O
SARS-CoV-2 não apenas reduz a expressão de ACE2, mas também leva a uma
limitação adicional do eixo “ACE2/Ang 1-7/Mas" por meio da ativação de
ADAM17, que por sua vez promove a absorção do vírus. Isso resulta em um
aumento da Angiotensina II, que regula positivamente a ADAM 17. Dessa forma,
um ciclo vicioso é estabelecido transformando-se em um processo progressivo
e autogerado constantemente. É um processo que pode contribuir não só para
a lesão pulmonar (síndrome do desconforto respiratório agudo - SDRA), mas
também para a lesão cardíaca e vascular, observada em pacientes com COVID-
19. A vitamina D é um regulador negativo da expressão da renina (portanto, da
cascata da angiotensina II) e reduz a expressão da renina ao suprimir a atividade
transcricional no promotor do gene da renina, agindo assim como um fator
negativo - Regulador RAS - para prevenir reações exageradas, inibindo o ciclo
vicioso do eixo "ACE2/Ang 1-7/Mas", inibindo, portanto, os mecanismos de
absorção do SARS-CoV-2.

Em um nível inato, a síntese intrácrina de 1,25D por macrófagos e


células dendríticas (DC) estimula a expressão de proteínas antimicrobianas,
como a catelicidina, bem como diminui as concentrações de ferro intracelular por
meio da supressão da hepcidina.

Por potencializar a autofagia, a vitamina D também pode


desempenhar um papel importante no combate a patógenos intracelulares, como
M. tuberculosis e infecções virais. A síntese local de 1,25D por macrófagos
também parece desempenhar um papel central na mediação das respostas das
células T à vitamina D, levando à supressão de células T auxiliares inflamatórias
(Th)1 e Th17 e indução concomitante da resposta às células T-reg
imunotolerogênicas.

25
Posologia para COVID-19

Existem diversas prescrições para a vitamina D. Idosos devem


receber uma dosagem maior, dada sua defasagem com a idade e a pouca
exposição ao sol. Depois dos relatos de que idosos com baixa dosagem sérica
de vitamina D evoluíram para formas mais graves de COVID-19, enquanto que
os que tinham dosagens adequadas tiveram remissão da doença, ainda em sua
forma mais branda ou moderada.

Portanto, a prescrição pode seguir esta recomendação:

Até 50Kg: 200 UI/Kg/dia

50-69Kg: 10.000 UI/dia

70-89Kg: 15.000 UI/dia

+90Kg: 20.000 UI/dia

7.8. Colchicina26 27

Uma das ações da colchicina é reduzir a migração de leucócitos,


principalmente neutrófilos, para tecidos inflamados. Seja qual for o mecanismo
de ação - inibindo o inflamassoma, reduzindo a migração e ativação de
neutrófilos ou prevenindo dano endotelial, a colchicina parece ser benéfica para
o tratamento de pacientes hospitalizados COVID-19. A redução acentuada dos
níveis séricos de proteína C- reativa entre o segundo e o quarto dias coincidem
com a recuperação clínica da maioria dos pacientes. Estes resultados foram
obtidos com uma maioria de participantes em na segunda semana de sintomas,
fase em que a inflamação sistêmica se torna marcante.

26
www.medrxiv.org/content/10.1101/2020.08.06.20169573v2.full.pdf.
27
https://agencia.fapesp.br/anti-inflamatorio-colchicina-acelera-recuperacao-de-pacientes-com-covid-
19-hospitalizados/33890/
26
O mecanismo de ação da colchicina é agir em dois tipos de células
do sistema imune, os neutrófilos e os macrófagos, reduzindo a produção das
chamadas citocinas inflamatórias, entre elas a interleucina-1 beta (IL-1β) e a
interleucina-18 (IL-18) e, como consequência, também a interleucina-6 (IL-6) e o
fator de necrose tumoral (TNF).

Posologia para COVID-19

1 comprimido a cada 12 horas, a partir do 4º ou 5º dia se sintomas.

27
8. ANTICOAGULANTES28

São vários os tipos de anticoagulantes utilizados no tratamento


precoce, tanto para a fase 1 (viral) quanto para a fase 2 (inflamatória). Em tese,
qualquer anticoagulante prescrito em dosagens mais baixas para a fase 1 é
muito bem vindo, dada a importância protetora contra uma futura trombogênese
provocada pelo agravamento do quadro, quando tratado tardiamente ou não
tratado.

Dentre os fármacos atuantes na coagulação do sangue estão os


inibidores da vitamina K, fibrinolíticos e anti-agregantes plaquetários. Na fase 1,
alguns protocolos recomendam o uso de enoxaparina (heparina), enquanto
outros recomendam o uso de anticoagulante oral.

Diferentemente, na fase 2, onde, por questão de tempo/efeito, e


agravamento rápido com formação de microtrombos em curso, a anticoagulação
parenteral se faz inexorável. Coagulograma e plaquetograma devem ser
realizados diariamente a partir do 4º dia de tratamento, no caso de heparina não
fracionada. Em caso de plaquetopenia, para não interromper a anticoagulação,
uma saída viável é a redução das doses e a intercalação de posologia. Estas
medidas, monitoradas, podem ajudar a estabilizar os índices de plaquetas,
porém, é importante considerar que, a partir da fase 2, ou até mesmo do 5º dia
da fase 1, quando [tardiamente] o tratamento precoce for iniciado, em caso de
lesão pulmonar, ainda que com baixa percentagem de área pulmonar acometida
e/ou D-Dímero acima de 1000 ng/L, a suspensão de anticoagulante pode dar
margem ao potencial trombogênico devido a tempestade de citocinas ser
iminentemente factível (vide tópico sobre glicocorticóides).

Deve ser considerado que anticoagulantes têm menor eficácia em


pacientes com doenças agudas, pois muitos dos reagentes inflamatórios de fase
aguda são proteínas de ligação à heparina, diminuindo sua biodisponibilidade,
especialmente em pacientes obesos. Uma saída é alterar anticoagulante e a via
de administração.

28
https://pebmed.com.br/principais-orientacoes-na-prescricao-de-anticoagulantes/
28
No caso de pacientes que sofrem de hemorragia por superdosagem
de heparina de baixo peso molecular (HBPM), a conduta ideal é lançar mão de
protamina. Deve-se fazer sulfato de protamina (1 mg/100 unidades de atividade
anti-Xa), o que pode reduzir parcialmente o sangramento clínico. Doses menores
podem ser suficientes caso a última dose de HBPM tenha sido administrada há
8 horas ou mais.

8.1. Heparina

Inibe indiretamente a trombina por atuar como co-fator da


antitrombina (AT), aumentando sua atividade e, consequentemente, seu efeito
anticoagulante sob a trombina, o fator Xa, e, em menor grau, os fatores XII, XI e
IXa.

Além dos pontos já observados quanto à possível trombogênese, a


heparina tem ação anti-inflamatória, e para o tratamento da COVID-19, tem
maior favorecimento, por ser um fármaco baseado no modelo de relação
imunotrombótica, onde o bloqueio da trombina pela heparina pode reduzir a
resposta inflamatória. Assim, uma das propriedades da heparina é sua função
anti-inflamatória por meio da ligação às citocinas, inibição da quimiotaxia dos
neutrófilos e migração leucocitária, neutralização do fator complemento C5a e
sequestro de proteínas na fase aguda29.

Posologia para COVID-19

1-1,5mg/Kg/dia SC, por 10 dias; ou

Heparina 5.000 UI SC cada 12 horas

29
COVID-19 and its implications for thrombosis and anticoagulation. Blood 2020;2(3):1–21.
29
Para a fase 1 manter os 10 dias. Para a fase 2, enquanto houver lesão
pulmonar em vidro fosco, ainda que seja em doses baixas e alternadamente,
para casos de plaquetopenia.

8.2. Antagonistas da Vitamina K:

A Varfarina é o anticoagulante oral mais usado na prática clínica


ambulatorial.

Mecanismo de Ação: inibição dos fatores de coagulação vitamina K-


dependentes (II, VII, IX e X). Este efeito da varfarina resulta na síntese de formas
imunologicamente detectáveis, porém biologicamente inativas destas proteínas
de coagulação. Também inibe as proteínas C e S, que possuem propriedades
anticoagulantes. Devido a estes efeitos concorrentes, antagonistas da vitamina
K criam um paradoxo bioquímico através da produção de um efeito
anticoagulante devido à inibição de pró-coagulantes (fatores II, VII, IX e X) e um
efeito potencialmente trombogênico, ao alterar a síntese de inibidores naturais
da coagulação (proteínas C e S).

Durante os primeiros dias de tratamento com varfarina, o


prolongamento do tempo de protrombina reflete principalmente a sua ação sobre
a via extrínseca da coagulação, através da depressão do fator VII. Os outros
fatores (II, IX e X) mantêm-se relativamente inalterados durante os primeiros
dias. Deste modo, o paciente não está completamente anticoagulado com
varfarina até que estes outros componentes também sejam reduzidos. Níveis de
equilíbrio dos fatores são atingidos cerca de uma semana após o início da
terapia. Por esta razão, os anticoagulantes parenterais devem ser utilizados por
4-5 dias enquanto é iniciado o tratamento com varfarina em pacientes com
doença trombótica aguda, sendo descontinuados após este período, quando
garantido um nível terapêutico de INR (2-3).

30
Posologia para COVID-19

Em idosos, desnutridos, hepatopatas, doentes crônicos, iniciar


tratamento com doses menores (2,5 mg/dia). Monitorização: inicialmente 2 vezes
por semana até estabilização do INR dentro da faixa alvo e, a seguir,
semanalmente ou quinzenalmente. Após INR mantido e dose estabilizada,
monitorizar mensalmente o valor do INR.

INR alvo: Para a maioria das situações estabelece-se INR alvo como
entre 2,0 e 3,0. Em pacientes com síndrome do anticorpo antifosfolipídeo (SAF)
e múltiplos episódios de tromboembolismo prévio, deve-se considerar manter o
INR entre 2,5 e 3,5.

Ajuste de dose: A dose da varfarina deve ser ajustada (aumentada ou


diminuída) em 5-20% da dose semanal na dependência do valor do INR.

Interação medicamentosa e contra indicações

Interações genéticas: Vários polimorfismos genéticos, principalmente


relacionados ao citocromo P450 alteram a biodisponibilidade da varfarina;

Aumentam o efeito da varfarina: AINEs, álcool, amiodarona,


ciprofloxacina, eritromicina, fenitoína, fluconazol, isoniazida, lovastatina,
metronidazol, norfloxacino, omeprazol, paracetamol, propafenona, propranolol,
tiroxina, sulfametoxazol+trimetoprim.

Diminuem o efeito da varfarina: barbituratos, carbamazepina,


colestiramina, rifampicina, sucralfate.

Interações alimentícias: aumentam o efeito da varfarina: vitamina E,


ginkgo biloba, alho. Diminuem o efeito da varfarina: abacate; alface; brócolis; chá
verde; espinafre; ginseng.

31
Interações com tabagismo: Fumantes exigem doses 12% maior do
que não fumantes, revelando o aumento da depuração da varfarina em pacientes
fumantes.

Contraindicações – a varfarina é contra indicada em pacientes com


alergia à varfarina, aneurisma cerebral, cirurgia ocular ou neurocirurgia recente,
diátese hemorrágica ou sangramento ativo, incapacidade de monitorização do
INR, gestação, punção venosa em local não compressível.

8.3. Rivaroxabana

É um inibidor direto do fator Xa, de uso oral.

Posologia para COVID-19

Se início do tratamento precoce no 2º ou 3º dia de sintomas, onde,


espera-se, não tenha lesão pulmonar, 10 mg 1 vez ao dia, com alimentos, por 6
a 10 dias.

Se houver lesão pulmonar, 20 mg 1 vez ao dia, com alimentos, por 10


a 15 dias, enquanto houver lesão pulmonar acima de 20%.

Interação medicamentosa e contra indicações

Interações medicamentosas: algumas drogas como cetoconazol,


itraconazol, voriconazol, rifamicinas e carbamazepina alteram a
biodisponibilidade da droga, e, devido a sua interação pouco previsível, deve-se
evitar o uso concomitante com essas drogas.

Contra indicações: Clearence renal < 30 mL/min (insuficiência renal


grave); insuficiência hepática (Child B e C), < 18 anos (falta de estudos),
gestação e amamentação.

32
8.4. Apixabana

É um inibidor direto do fator Xa, de uso oral.

Posologia para COVID-19

Para fase 1 da COVID-19, 1 comprimido de 2,5 mg ao dia por 7 a 10


dias.

Se, no 5º dia de sintomas - ou a partir dele, e fase 2 - houver lesão


pulmonar, ajustar a dose para 1 comprimido de 2,5 mg a cada 12 horas.

Em caso de se comprometimento pulmonar entre 40% e 50%, a dose


é de 5 mg a cada 12 horas.

Interações medicamentosas e contra indicações

Idem Rivaroxabana.

Ademais, quanto aos anticoagulantes, podem ser utilizados, além


destes propostos, a Aspirina Prevent de 300 mg, com posologia ajustada para
300 mg 1 vez ao dia para a fase 1 com sintomas leves, ou , se lesão pulmonar a
partir do 5º dia ou em fase 2, a prescrição dos anticoagulantes anteriores são
mais indicadas, especialmente a heparina.

33
9. GLICOCORTICÓIDES

9.1. Dexametasona/Prednisona30, 31

Não há evidências claras dos efeitos da prednisona para conter


SARS-CoV-2 na fase 1, onde há iminente linfopenia. No entanto, a prednisona
foi associada a resultados clínicos desfavoráveis agudamente em outras
infecções virais; por exemplo, constatou-se que a prednisona resulta em uma
incidência significativamente maior de infecções respiratórias agudas graves em
pacientes com H1N1.

NUNCA PRESCREVA CORTICÓIDES NA FASE 1 DA COVID-19.


Conferir com informações de imunossupressão sobre Imunopatologia da COVID-19
(no início) e Informações Adicionais (logo abaixo).

O uso de glicocorticoides na COVID-19 é indicado para, a partir da


fase 2 (7º dia), onde inicia-se o espectro inflamatório caracterizado pelas
tempestades de citocinas em contraste à franca regressão da fase de replicação
viral.

Posologia para COVID-19

Dexametasona- 10mg EV Bolus

Prednisona: 3 comprimidos de 20mg (60 mg) pela manhã, por 7 a 10


dias, enquanto houver lesão pulmonar.

30
J Leukoc Biol 1996; 60 (5): 563-72. doi: 10.1002 / jlb.60.5.563.
31
Clin Dermatol . 2020; 38 (6): 775–780. doi: 10.1016 / j.clindermatol.2020.05.003
34
Interações medicamentosas e contra indicações

Usar este medicamento com qualquer um dos seguintes


medicamentos exige certa atenção para possíveis efeitos colaterais, que podem
estar sujeitos a alteração de dose e/ou suspensão do(s) fármacos.

Desmopressina, vacina contra rotavírus, aceclofenac, acemetacina,


aldesleucina, alfentanil, amiodarona, amtolmetin Guacil, asparaginase,
balofloxacino,bemiparin,benzidrocodona, besifloxacin, bromfenac,bufexamac,
buprenorfina, bupropiona, celecoxib, ceritinib, salicilato de colina, ciprofloxacino,
clonixina, codeína, daclatasvir, darunavir, desogestrel, dexibuprofeno,
dexketoprofen, diclofenac, dienogest, diflunisal, diidrocodeína, dipirona,
dronedarone, drospirenona, droxicam, elvitegravir, enoxacina, estradiol,
etinilestradiol, etinodiol, etodolac, etofenamato, etonogestrel, etoricoxib, felbinac,
fenoprofeno, fentanil, fepradinol, feprazone, fleroxacin, floctafenina, ácido
flufenâmico, flumequine, flurbiprofeno, gatifloxacino, gemifloxacina, gestodene,
hemin, hydrocodone, ibuprofeno, indometacina, cetoprofeno, cetorolaco,
levofloxacino, levonorgestrel, lomefloxacina, lopinavir, lornoxicam, loxoprofeno,
lumateperona, lumiracoxib, lutécio Lu 177 dotatate, macimorelina,
meclofenamato, medroxiprogesterona, ácido mefenâmico, meloxicam,
meperidina, mestranol, metadona, morniflumate, moxifloxacino, nabumetona,
nadifloxacino, nadroparina, naproxen, nepafenac, nifedipino, ácido niflúmico,
nimesulida, nimesulida beta ciclodextrina, nomegestrol, norelgestromin,
noretindrona, norfloxacino, norgestimato, norgestrel, ofloxacina, oxaprozina,
oxicodona, oxifenbutazona, parecoxib, pazufloxacina, pefloxacina, pentazocina,
fenilbutazona, piketoprofen, piperaquina, piroxicam, pranoprofeno,
proglumetacina, propifenazona, proquazona, prulifloxacino, ritonavir, rofecoxib,
rufloxacina, ácido salicílico, salsalate, sargramostim, segesterone, salicilato de
sódio, esparfloxacino, sufentanil, sulindac, tacrolimus, telaprevir, tenoxicam,
ácido tiaprofênico, ácido tolfenâmico, tolmetin, tosufloxacina, tramadol,
ubrogepant, ulipristal, valdecoxib, velpatasvir, voxilaprevir.

Informações Adicionais

Os glicocorticóides resultam na diminuição da produção de citocinas


pró-inflamatórias, como interleucina-1, interleucina-6, fator de necrose tumoral,

35
prostaglandinas e leucotrienos, mas aumenta discretamente as citocinas anti-
inflamatórias e diminui as citocinas inflamatórias. Inibem profundamente vários
aspectos da imunidade das células T, principalmente por meio da inibição da
expressão de citocinas nos níveis transcricional e pós-transcricional. Também foi
relatado que os glicocorticoides agem indiretamente induzindo a expressão do
fator de crescimento transformador-beta (TGF-β), que por sua vez bloqueia a
imunidade das células T. (vide Imunopatologia da COVID-19).3

Ao exercer seus efeitos antiproliferativos, os glicocorticoides se


difundem nas células alvo onde se ligam ao seu receptor citoplasmático, que por
sua vez se transloca para o núcleo onde inibe a transcrição de genes de citocinas
por meio da ligação direta aos elementos de resposta aos glicocorticóides (GRE),
que estão localizados no promotor de genes de citocinas ou, alternativamente,
através do antagonismo da ação dos fatores de transcrição necessários para a
ativação transcricional ideal.

IMPORTANTE RESSALTAR: A CLÍNICA É SOBERANA.

O CLÍNICO É QUEM DECIDE A CONDUTA A SER ADMINISTRADA AO


PACIENTE, DE ACORDO COM O ESTADO CLÍNICO APRESENTADO.

Igarapava-SP, 20 de Janeiro de 2021.

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