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Faculdade de Direito
Discentes:
Elina Samanguana nº
Idálio Djedje nº
1
Universidade Eduardo Mondlane
Faculdade de Direito
Pesquisa do 2º Grupo
2
índice
1. Introdução................................................................................................................................................4
1.1. Objectivo Geral:...............................................................................................................................5
1.1.2. Objectivos Específicos:..................................................................................................................5
1.2. Metodologia:....................................................................................................................................5
2. COSMOLOGIA......................................................................................................................................5
2.1. Tradição................................................................................................................................................6
2.1.2. COSMOLOGIA TRADICIONAL.....................................................................................................6
2.1.3. A vida da Familia..........................................................................................................................7
2.2. Observações ao quadro dos termos de parentesco das tribos............................................................8
2.2.1. Aspectos do sistema de parentesco noutras tribos do sul de África...............................................8
2.2.2. A Poligamia.......................................................................................................................................8
2.2.3.Origem e extensão da poligamia entre os tsongas...........................................................................8
2.3. Qual é a origem deste costume?........................................................................................................9
2.3.1. Consequências da Poligamia..........................................................................................................9
3. Ordem Social: noção...............................................................................................................................9
3.1. Instrumentos de ordenamento social...................................................................................................10
3.1.2. Costumes.....................................................................................................................................10
2.1.3. Religião.......................................................................................................................................10
3.2. Moral..............................................................................................................................................10
4. Organização e divisão dos cargos judiciários........................................................................................11
4.1. Crimes e Penas...................................................................................................................................12
4.2. Conceptualização................................................................................................................................12
4.2.1. Estrutura familiar e social dos Vatssangas...................................................................................13
4.2.2. Sistema de ordem social dos Vatssangas.........................................................................................13
4.2.3. Organização económica dos Vatssangas......................................................................................14
5. Sucessão do Mambo..........................................................................................................................14
5.1. Religião e magia.............................................................................................................................14
5.2. Linhagem........................................................................................................................................15
5.2.1. Chefatura.....................................................................................................................................16
5.2.2. Estado..............................................................................................................................................16
6. FEITIÇARIA.........................................................................................................................................18
3
6.1. IDEOLOGIA......................................................................................................................................18
6.1.2. CONFLITOS DE FEITIÇARIA......................................................................................................19
6.2. CRIME DE FEITIÇARIA..................................................................................................................22
6.2.1. Conflitos da feitiçaria pós-independência....................................................................................22
6.2.2. NOS DIAS DE HOJE..................................................................................................................23
6.2.3. Conflitos de Feitiçaria..................................................................................................................23
4
1. Introdução
Nste trabalho abordarseà de temas referentes à Cosmologia Tradicional, Ordem Social e
conflitos de Feitiçaria. Sendo que a cosmologia tradicional baseiase no Estudo dos princípios
religiososmíticos e leis da natureza das tradições de Moçambique. Na ordem social iremos
debruçar os diferentes instrumentos sociais, que garantiram a coesão social e a resolução de
conflitos de feitiçaria.
1.2. Metodologia:
Para a realização desta pesquisa, usouse o método hermenêutico, consultas em manuais e
livros, e pesquisas na internet.
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2. COSMOLOGIA: Noção
É uma palavra que deriva do grego. Segundo Chauí (2000),“a palavra Cosmologia é composta de
duas outras: Cosmos, que significa mundo ordenado e organizado, e logia, que vem da palavra
logos, que significa pensamento racional, discurso racional, conhecimento”. Os filósofos pré-
socráticos desenvolveram uma cosmologia porque tentaram desvendar a verdadeira origem do
universo, as causas da sua transformação e a sua organização. A Cosmologia estuda o universo, a
sua organização e a sua origem.
2.1. Tradição
Quando se fala de tradição fala-se da transmissão de costumes, crenças, memórias e lendas para
pessoas de uma comunidade a que passarão a pertencer a esses costumes.
A tradição, segundo Carlos Feijó (2007), possui duas características aceites: a sacralidade e a
intemporalidade. A sacralidade provém do apelo ao passado, aos fundadores da comunidade.
Para as sociedades tradicionais africanas, a autoridade tradicional é investida de poderes
sobrenaturais que lhe conferem uma natureza divina ou espiritual e simbólica, o que faz com que
a esta estejam associados um conjunto de imagens, insígnias e rituais tanto de entronização como
de falecimento.
Como exemplo desta, podemos recorrer ao exemplo do aspecto ideológico do Estado dos
Mwenemutapas, no qual quem dirigia era o mambo, o chefe máximo e representante supremo de
todas comunidades. Ele devia se desligar das suas origens terrenas para conferir à realeza um
carácter sagrado. “ a fim de quebrar todas as lições com a sua linhagem, para se tornar
representante de toda a sociedade, indiferente às rivalidades familiares, (o mambo) comete, no
momemnto da sua entronização, o incesto com uma parente próxima, infringindo desse modo o
mais absoluto interdito. Numerosos testemunhos afirmam que a principal mulher do
monomotapa era a sua própria irmã” (W. Randles, 1975; apud; Serra, 1988). Esta prática tinha
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um grande significado para o seu reino, assim, ele era visto como um ser próximo ao
sobrenatural.
É notavelmente claro, que nas sociedades antigas predominava a monarquia, eram absolutistas.
No tipo de legitimação da autoridade tradicional, naquele estabelecido pela comunidade, Morais
(2020) “a legitimidade deve ser entendida, segundo Anders Nilson, como um processo de
reconhecimento instituído entre o (s) líder (es) e uma dada comunidade/grupo étnico,
relacionamento este assente num reconhecimento e aceitação mútua de regras e interesses, por
forma a garantir a harmonia social e o desenvolvimento do grupo”.
Em termos ideológicos, desde as primeiras comunidades até aos demais estados que foram
surgindo, praticava-se as cerimónias mágico-religiosas que assumiam um papel muito
importante, e constituía uma arma fundamental do poder, da coesão social e de aparente
imobilidade social. Os responsáveis destas cerimónias imploravam aos antepassados, chuvas, a
saúde, a protecção para caça e para as viagens, etc. Para os Bantu estas práticas eram feitas pelos
chefes das linhagens e os chefes territoriais. Já no caso dos Mwenemutapa, quem tinha esse
direito era o mambo, ele era o intermediário entre as necessidades dos aldeões e os espíritos
“vivos” dos antepassados régios: “Quando padecem algumas necessidades ou esterilidades, ao
rei se socorrem, cuidando firmemente que ele é poderoso para lhe dar todas as coisas que
desejarem, e houverem mister, e que tudo pode alcançar dos defuntos seus antepassados, com os
quais lhes parece que fala. Pela qual razão, ao rei pedem chuva, quando lhe falta, e todas as
bonanças de tempos para as suas novidades, e quando lhe vão pedir qualquer coisas d’estas
levam-lhe grande presente (...) (Frei João dos Santos, op.cit., pag 69; apud; Serra, 1998:70).
Elaborado por:
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2.1.3. A vida da Familia
O sistema de parentesco dos tsongas e todos os bantú, é muito diferente do nosso e embraça os
leigos (individuos com pouco conhecimento ou nenhum conhecimento em determinada
matéria)que tenta compreende-lo
Os Ndzawus, Também chamados Ngais, Habitavam mais ao norte entre o Save e a Beira.
Gramaticamente a maior parte dos termos de parentesco Tsonga pertence a classe Um-va, que é a
classe pessoal.Formam o plural em "Va" (vatatana, Vana, Vamakwavo, Vatukulo).Alguns
pertencem a classrnh-ti que compreende principalmente animais, mais também nomes de
profissões ou de relações de familia: Ndrisana, Nhondriwa, Namu, Nhombe, Nhlampsa que
formam o plural enti.Os termos Tatana, mamana, rharhana, malume e kokwana, são tidos como
nomes próprios empregados como tais.
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2.2.2. A Poligamia
2° Leis de sucessão que regulam a famíliaagnática actual entre os tsongas conduzem também
necessariamente a poligamia!
√ O primeiro destes males é o terrível desenvolvimento das paixões sexuais entre os polígamos,
os brancos que viveram em povoação de chefe onde os homens têm numerosas mulheres.Podem
testemunhar excessos medonhos a que eles se deixem levar (a ver annotation.14 observações
feitas pelo Dr.Liengme na residência do Ngungunyana).
√ Os conflitos domésticos que haviam nas povoações dos polígamos eram outro mal.
√ Uma irmãherda a viúvado irmão mais velho, quer seja casado ou não.
Se, A poligamia começou desta segunda maneira, o seu desenvolvimento não há-deespantar,
corresponde admiravelmente o ideal de vida bantú.
Elaborado por:
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3. Ordem Social: noção
Segundo (PATRÍCIO, 2016: 58), define a ordem social na concepção africana como
sendo as relações de parentesco e os costumes de uma determinada tribo. Sendo que
(PATRÍCIO, 2016: 60) afirma que “ o fundo consuetudinário africano é uma “norma de conduta
nascida na prática social e considerada obrigatória para todos”. (VIEIRA, 2011: 4), sustenta que
a ordem social não postula a existência dum corpo escrito de regras.
3.1.2. Costumes
Segundo (PATRÍCIO, 2016: 61), os costumes são “lei” porque “lei” é um conjunto
amplo e relativamente indefinido de esforços e de interconexões entre instituições para manter a
ordem e o controlo social, os quais variam conforme a natureza da organização de cada grupo.
No caso em estudo, há que referenciar algumas normas costumeiras usadas nos estados
tradicionais, salientado:
Proibição de viajar com sal; corria o risco de não atingir o destino.( JUNOD, 1996: 309);
Durante uma viagem não se devia afiar a azagaia, pois podia dispertar os inimigos da
floresta. (JUNOD, 1996: 309);
Não se devia colher folhas de Milala "Usadas para trançar cestos" quando se pretendia
executar uma viagem a outra povoção, pois constituia insulto. (JUNOD, 1996: 309);
Na recepção de um viajante era exigida ao povo hospitalidade, que caso não seja feita o
chefe obrigava a população a pagar multa. (JUNOD, 1996: 322).
2.1.3. Religião
Segundo (LOURENÇO, 2005: 13), os factores mágico-religiosos assumiam especial
relevância para a manutenção do poder e da coesão social, sendo que geralmente os espíritos
eram os antepassados-deuses. Na mesma corrente, as normas religiosas promulgavam:
O termo “feiticeiro”, constituia insulto gravíssimo quando dirigido a qualquer elemento
da comunidade política, excepto se fosse usado para um curandeiro, pois enriquecia o seu
prestígio. (LOURENÇO, 2005: 13);
Fazer oferendas aos espíritos, pedindo a fertilidade do solo, chuvas. (AUATE, 2017: 23).
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3.2. Moral
Segundo RIBEIRO (brasilescola) define a moral como sendo o conjunto de valores, normas
e noções sobre o que é certo ou errado, proibido e permitido dentro de uma determinada
sociedade. E no caso em estudo podemos representar as seguintes normas morais:
Chefe Tradicional: segundo (LOURENÇO, 2005: 12), o chefe tradicional era responsável pela
lei e pela ordem, detinha grandes funções jurídicas. E sublinha que apesar desta grande
concentração de poderes político-jurídicos, os chefes tradicionais não eram, por regra, autocratas
governando arbitrária e despoticamente, pois deviam cingir-se às normas do direito
consuetudinário e empregar os seus privilégios e riquezas com ponderação e discernimento,
tendo sempre em mente o bem-estar geral da comunidade.
Conselho dos anciãos: responável pela reposição da ordem social ajudar o chefe tradicional na
administração da justiça. (LOURENÇO, 2005: 12);
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tradicional Capela, da margem sul da baía de Lourenço Marques, que, durante uma grande fome,
tentou extorquir mantimentos aos súbditos.
Chinbingué: é uma leve multa a que são condenados todos os que cometem falta leve
contra os seus legítimos superiores, não só autoridades públicas, mas ainda os chefes e
grandes nas famílias, a quem é devida certa sujeição. (PATRÍCIO, 2016: 86);
Mutaca: imposto denominado de sangue, que o criminoso é obrigado a pagar à
autoridade da terra aonde tiver feito derramar sangue. (PATRÍCIO, 2016: 86);
Ussambi: tentativa de crime de adulterio com mulher casada. Este crime é considerado
simplesmente como injuria feita ao marido da ofendida, e por isso a sua pena não é
superior ao pagamento, por parte do deliquente e para o marido, de duas peças de
fazenda. (PATRÍCIO, 2016: 86).
Elaborado por:
MATEUS, Haylton de Tima
4.2. Conceptualização
Ordem Social é o conjunto de normas, instituições e costumes que regulam a vida dos indivíduos
em suas relações. A ordem social tem como objectivo a harmonia, o bem-estar e justiça
sociais.De acordo com Mahumana (2015:8), os discursos e as práticas sendo parte dos valores
tradicionais, produzem e reproduzem uma ordem social que valoriza a cultura oral, o passado e
símbolos enquanto factores perpetuadores da experiência entre gerações.Esta ordem é prática e
moral e resulta das actividades regulares realizadas pelos membros da sociedade, segundo as
suas próprias competências.
Paraefeitos de análise da ordem social no período pré-colonial, recorri a obra de José Amorim
(1957), com o título os “Vatssangas” (mais conhecidos por Vandaué), que pertencem a grande
família Bantu, o qual povoava a vasta área de Mossurize. Os hábitos e costumes desta população
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têm muita influência dos Ngunis particularmente de Ngungunhana,por ter lhes mudando os
Mutupo (Totem estou bem) de “Como“ e “Senguaio“ para “Sitole“ e começou a designá-los
Vandaué, que significa - e tu como tens passado?
Deste modo, um indivíduo ou um grupo que ficasse insatisfeito com a decisão tomada no
tribunal do seu chefe de grupo de povoações podia recorrer ao tribunal de outro chefe, ou ao do
régulo-chefe. Por sua vez, o tribunal tinha de enviar para a administração os milandos que o seu
tribunal não conseguia resolver ou aqueles que não faziam parte das suas competências
jurisdicionais, como os milandos de sangue, os crimes contra o Estado (fuga ao trabalho
obrigatório e ao imposto de palhota, fuga ao recrutamento para o serviço militar), roubos de
maior importância, etc. (Florêncio, 2008: 376).
b) Herdeiros ou sucessores:Em primeiro lugar quem tinha direito de herdar ou suceder era o
filho mais velho e por último o sobrinho mais velho.
5. Sucessão do Mambo
Em caso da morte do Mambo, os seus ascendentes mais velhos (avós, tios, ou mesmo primos),
convocam para determinado dia, uma reunião de toda a população , homens, mulheres e crianças,
na povoação do falecido, onde é feita comida em abundância, devendo a massa ser feita de
várias farinhas, matam bois ou cabritos ou ambas as espécies. No meio da povoação fica sentado
na esteira o novo Mambo, a quem os presentes vão fazendo ofertas constituídas por toda a
espécie de objectos ou animais. A esta cerimónia chama-se “Gaja“, o que significa nomeação do
chefe (Amorim, 1957: 32; Florêncio, 2008:376).
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5.1. Religião e magia
O povo Vatssangas, é monoteísta, pois acredita na existência de um só Deus que designam de
“Muari“ e que consideram um espírito – Muzimo – superior que em si concentra toda a força,
superintentendo sobre todas aas coisas que há e se passam no mundo em que vivem, assim como
na vida para além da morte, na qual acredita.Para esta população a Morte é o fim da vida,
absolutamente natural e inevitável e porém, creem noutra vida para além desta aqui na terra.
(Amorim, 1957: 33).O sistema religioso tradicional enquadra, dinamiza e força todas as relações
sociais de um grupo, especificando as relações familiares ou de parentesco. Ele representa a
ordem social na sua íntima relação com o sistema de parentesco e os antepassados.Relativamente
a prática mágica, existia advinho chamado “Nhanga“ e o curandeiro “Chiremba“. A função do
advinho consiste em através de ossos de leão, leopardo, cabrito de mato, macaco, papa-formigas,
cabrito doméstico, cágado, conchas e caroços de fruto de uma árvore chamada “Mungomo“,
escamas de crocodilo, etc, advinhar determinados factos de que as pessoas não conhecem a
execução. Enquanto o curandeiro, através de raízes e plantas, faz medicamento para as várias
doenças que graçam a população local (Amorim, 1957: 38).
Elaborado por:
NHANOMBE, Camisário Álvaro Mesa
Desde há cerca de 1700 anos, foram chegando ao nosso país grupos sucessivos agricultores,
pastores e conhecedores da metalurgia e da olaria que ficaram designados por Bantu.
Lentamente três grandes tipos de organização social foram se ordenando: a linhagem, a chefatura
e o estado.
5.2. Linhagem
Agrupava parentes cuja descendência se fazia por via paterna ou materna. Com reduzido
excedente económico, ausência de classes sociais, chefia política descentralizada e relações de
aliança com outras linhagens (Carlos Serra, 1982).
À frente de cada linhagem estava um chefe com poderes políticos, jurídicos e religiosos, e um
conselho de anciãos. As funções políticas eram exercidas pelo homem, em algumas regiões o
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poder passava do irmão mais velho para o irmão a seguir, noutras regiões o poder passava do pai
para o filho e, noutras a norte do Zambeze o poder passava do tio materno para o sobrinho.
Cada aldeia tinha um chefe chamado m’fumoou muene e no caso de um conflito armado
nomeava um chefe de guerra (Carlos Serra, 1982).
5.2.1. Chefatura
Uma linhagem sénior mais antiga subordinava outras, uma incipente rede tributária tomando um
possível excedente económico maior do que o da linhagem, divisão em classes sociais
embrionárias e abarcamento das esferas comerciais pelos chefes (Carlos Serra, 1982).
O chefe tradicional era responsável pela lei e ordem e detinha funções importantes judiciais.
Na corte Tsonga por exemplo, como noutras cortes, não havia separação de poderes. Com a
ajuda dos conselheiros, o chefe tinha o poder legislativo, o poder executivo e o poder judicial em
suas mãos, tornando-se assim a autoridade suprema e das suas decisões, não havendo assim
apelo nas suas decisões, isso porque o chefe é que tomava a decisão final.
Nas comunidades matrilineares os chefes tradicionais (umo), tinham poder limitado, pois havia a
existência da chefe Mãe, assim os chefes tradicionais resolviam pequenos problemas, caso não
conseguissem pediam ajuda de outro chefe tradicional vizinho.
Na linhagem matrilinear ninguém devia julgar seu próprio filho, o julgamento era feito pelo
irmão mais velho da mãe.
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A terra pertencia à comunidade política e não ao chefe tradicional. O chefe tradicional era
responsável pelo controle da terra, regulando direitos, resolvendo conflitos de utilização,
distribuindo áreas de terra a linhagens e subdivisões distritais.
5.2.2. Estado
O aparelho servia como aristocracia comandando parentes e súbditos a quem tributava numa
vasta extensão territorial. Daí a existência nos Estados de conquista de um subproduto social
considerável, tornando possível uma administração centralizada, uma equipa de funcionários
especializados e um exército permanente ou semipermanente. Daí o monopólio do comércio dos
reis (Carlos Serra, 1982).
A expansão territorial do Estado pôde ter dado origem à formação de um Império, com um
estado dominando os outros estados, chefatura e linhagens.
A sociedade muitas vezes estava organizada em Tribos e cada tribo tinha seus hábitos e
costumes.
A tribo Tonga que está estabelecida na vizinhaça de Inhambane por exemplo, tem uma língua
diferente do Tsonga propriamente dito, isto por pertencer a outro grupo linguístico (Junnod,
1996).
Dentro da corte existiam personagens que eram conhecidos como: conselheiros, arauto e
insultador oficial.
Conselheiros principais ou letikulu que eram encarregados de discutir e tomar decisões graves
que interessavam o país (Junnod, 1996)
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E por fim indivíduos estabelecidos pelo chefe em pequenos distritos do país para a categoria de
conselheiros para vigiar os súbditos e averiguar as desavenças. São eles que deviam levar à
capital os negócios importantes (Junnod, 1996)
O Arauto era o encarregado de levar e fazer ouvir as ordens do chefe (Junnod, 1996).
O insultador oficial era uma espécie de louco da corte que tinha o direito de vomitar os insultos
mais graves, os mais ultrajantes para todos os dependentes do país. Nunca insultava estrangeiros,
mas gozava de perfeita imunidade (Junnod, 1996).
Elaborado por:
6. FEITIÇARIA
Feitiçaria – Nos estudos em antropologia e em ciências sociais em geral não há consenso sobre o
que é a feitiçaria. Invariavelmente, os diferentes autores que estudam o fenómeno, sobretudo no
contexto de África, recorrem aos termos empregues pelos nativos, para descrever experiências
particulares. No âmbito desta tese de doutoramento, entende-se por feitiçaria a crença de que
determinadas pessoas têm capacidades para actuar sobre aos outros, prejudicando-as e reduzindo
a sua força vital, podendo mesmo chegar ao ponto de lhes tirar a vida em definitivo. Alguns
autores fazem uma distinção entre a feitiçaria e a bruxaria. No entanto, para este estudo a
distinção é irrelevante, pois quer a feitiçaria quer a bruxaria resultam da crença do grupo social
que pratica. O termo feitiçaria tal como o pretendemos usar neste estudo, refere-se a todos os
atos de magia e de bruxaria cometidos pelas pessoas para fazer mal às outras. Portanto, esta
dissertação usa o conceito de feitiçaria num sentido amplo, para fazer menção à crença no poder
oculto que permite fazer mal às pessoas ou à propriedade destas. (Mahumane, Marido espiritual,
p.5).
6.1. IDEOLOGIA
A Caracterização geral das sociedades em Moçambique no que diz respeito as crenças mágico-
religiosas e outros aspectos ideológicos desempenharam, nessas sociedades, um papel muito
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importante, constituído uma arma fundamental do poder, da coesão social e de aparente
imobilidade.
Mas eram as crenças na feitiçaria, a acção dos feiticeiros e dos curandeiros contra feiticeiros, que
exprimiam os conflitos socias, as coerções morais e politicas e as dependências familiares. A
forma como os homens se julgavam relacionados entre si e com a natureza, e as incertezas às
quais estavam sujeitos criava tenções que encontravam expressão figurada na feitiçaria.
[...] é proibido pelo rei da terra que ninguém seja feiticeiro sem uma licença, porque somente ele
e seus amigos quer que usem desta ciência. (Santos, Etiópia oriental, p.220).
Mas ninguém os viu até hoje actuar, nem isso é mesmo possível... O feiticeiro ou feiticeira leva a
doença, a morte qualquer infortúnio, a alguém por mera acção espiritual.
19
ou mesmo de provocar menstruação irregular. A feitiçaria provoca o medo, a intranquilidade, a
desconfiança e é vista como sendo muito perigosa.
Contudo, a descrição pormenorizada dos acontecimentos acabou por revelar que, dessa ultima
vez, a mulher enfrentou o marido, tendo-o atingido na cabeça com uma frigideira para conseguir
fugir. Ao saber-se isto, o ambiente mudou de imediato. O juiz demostrou estranheza com o facto
e tanto ele quanto as pessoas da parte do marido começaram a questionar, de forma cada vez
mais aberta, se uma tão inusitada reacção por parte da mulher não apenas explicável por ela se
ter tornado feiticeira. Apesar das suas indignadas recusas de uma tal sugestão, a mulher passou
rapidamente de queixosa a acusada. E o juiz, considerando-se incompetente em tais matérias, fez
organizar de imediato um tribunal de feitiçaria.
Este novo julgamento, embora ad hoc, começou de acordo com os procedimentos habituais que
anteriormente referiu. No entanto, dado que a agora acusada insistia em não se reconhecer como
culpada, um dos julgadores acabou por lhe passar para a mão um espelho, perguntando-lhe o que
via nele. Conforme seria de esperar, a mulher disse que via a sua imagem reflectida.
Não sei o que veio a acontecer a essa mulher, que continuava a refutar as acusações, embora um
tão original meio de prova tivesse convencido a maioria dos presentes. (Paulo,
Determinationchaos, P, 9).
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acusações de feitiçaria. Essas intenções, muitas vezes, ultrapassam o campo do sagrado,
revelando motivações económicas ou relacionadas com desavenças e vingança.
Diz que a feitiçaria entre os ajauas era um ato condenável e passível de punições, os acusados de
serem feiticeiros eram linchados, e podiam também ser condenados à morte na fogueira.
Em um dos processos analisados, temos um caso de homicídio de uma suposta feiticeira. Este
caso nos revela uma série de dados interessantes sobre o convívio doméstico, como a violência
contra a mulher. E também estratégias de vingança, nos quais o discurso de feitiçaria sérvio
como justificativa para o crime. A mulher acusada sofreu o tipo de punição mais recorrente em
casos de feitiçaria, a fogueira. Neste processo, um homem chamado Mendele, chefe de
povoação, ordena a seus cipoaisBeve e Momade que assassinem uma mulher chamada
Awayarese. Mendele acredita que ela, sua ex-esposa, teria lhe “enfeitiçado”, pois estava doente
de uma perna. Em alguns testemunhos, porém, há indícios que a motivação do crime poderia ser
uma traição conjugal. Beve e Momade jogaram a mulher em uma fogueira. Depois disso foram
aconselhados por Mendele a fugir para terras estrangeiras emNyassiland, actual Malawi.
A doença na perna de Mendele foi logo atribuída à feitiçaria. Vimos que qualquer infortúnio que
recaísse sobre uma pessoa podia ser considerado acção de algum feiticeiro. Desastres, má
colheita, doenças e a morte de algum indivíduo certamente eram relacionados à feitiçaria. Temos
nos processos analisados inúmeros casos de doenças e mortes que foram atribuídas à acção de
feiticeiros. (Yohanna, B. Os yao, p.29).
Vejamos alguns desses casos. Em um dos processos criminais analisados deparamo-nos com o
assassinato de um indivíduo chamado Cangoma. Saindo de viagem, junto com sua esposa e
sobrinha, Cangoma foi abordado por Manuel e Anilade. Estes dois homens agarraram e
agrediram Cangoma, arrastaram-no para o mato onde o assassinaram. Um detalhe importante
nesse crime é que Cangoma, Manuel e Anilade eram irmãos. Em depoimento, Manuel alega ter
matado Cangoma porque este era feiticeiro e, através de feitiço, teria feito Abula, seu outro
irmão, falecer:
Certamente, os irmãos possuíam algum tipo de rivalidade. A doença e morte de Abula logo
foram associadas à acção de um feiticeiro. Tendo coincidido a morte de Abula com a repentina
viagem de Cangoma, as suspeitas de feitiçaria recaíram sobre ele. Qualquer comportamento
21
atípico, contra o senso de colectividade, ou o descumprimento de algum tabu ou norma social,
poderia causar a suspeita. (AHM- Arquivo Histórico de Moçambique. Conselho de Cabo
Delgado no Ibo. P. 5593 à 5608).
6.1.3. COMO JULGAR CONFLITOS DE FEITIÇARIA
Amaral descreve que, para descobrirem a identidade do feiticeiro, os adivinhos ajauas utilizavam
uma espécie de cofio enfeitado com plumas de aves, um bambu fléxil e oco, preenchido com
algumas ervas e raízes especiais, fechado hermeticamente com cera de abelha.
Traça-nos um cenário relativo ao planalto de Moeda em que a feitiçaria se desenrola num Mundo
invisível que está em interacção com o nosso, no qual os feiticeiros nefastos se projectam para
praticarem as suas malfeitorias. Estes só poderão ser neutralizados ou revertidos por uma
projecção semelhantes por parte de feiticeiros benéficos que, nesse Mundo actuam sobre aquilo
que os malocados provocam. (Harr, O ponders e o invicívelemMueda).
Bastaria para esse efeito, que a pessoa acusada reconhecesse a sua falta, mas alegasse estar
possuído por um espirito abusivo que a obrigava a praticar actos sem ter consciência deles e
contra a sua vontade e que essa alegação recolhesse consenso social e confirmação por parte de
especialista.
22
enforcamento, na decapitação a golpe de maobado, no golpeamento com azagaia e na morte pelo
fogo, sendo este ultimo o meio mais frequentemente adoptado para tais criminosos.
A proibição das actividades dos ny’anga e dos nhamussoro também afectou imenso o quotidiano
das populações, porque a maioria da população, mesmo a que professa as diversas confissões
cristãs, consulta regularmente estas personagens mágico-religiosas tradicionais.
Elaborado por:
TXAIA, Tomé Fransisco
23
6.2.3. Conflitos de Feitiçaria
Como forma introdutoria referir antes de tudo que a a feitiçaria era acto normal e comum nas
sociedades tradicionais pre-existentes, porem, mesmo sendo um acto comum na comunidade
existente era considerado um acto perigoro/terrivel.
Dentro da cosmovisao, o feitiçeiro mata os seres humanos para lhes comer a carne. E um
crime cometido a noite por acçao espirutual, a acusaçao ou identificaçao da feitiçaria e
feita na base da advinhaçao dos ossos, feita por um nhanga (tinhanga em plural referese
aos especialistas (curandeiros) locias possuindo não por espíritos e que tem um papel central na
prestação de cuidados de saúde e resolução de problemas sociais de diversa indole) e em casa
da recusa, e submetido ao ritual mondro e a puniçao era a morte .
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que tao profundas dissensoes e pertubaçoes causaram ate epocas recentes. Pelo contrario,
o chefe tradicional podia recorrer ao auxilio dessa suposta potencia sobre humana quando
julgasse a colectividade ameaçada.(VICTOR A. LOURENÇO-2005)
Estes por vezes, eram detentores de insignias que conferiam poderes sobrenaturais como a
bracelete dos tinguluve/o celebre mphulo, que tornava a chefatura invencivel, ou os
relicarios sacralizados compostos por minusculos restos extraidos dos corpos moribundos
de antepassados. Identica força lhes davam esses potentes e secretos medicamentos
magicos que transformavam toda a sua pessoa em um perigoso tabu. O seu nome possuia
um caracter mistico-sagrado.
Eram os chefes tradicionais que realizavam os complexos rituais que garantiam o sucesso
das grandes migraçoes que vigiavam o cumprimento dos numeros tabus e observancias
que regulavam e dinamizavam a vida social e politica da comunidade que
superientendiam(VICTOR A. LOURENÇO-pp-13).
Elaborado por:
SAMANGUANA, Elina
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