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A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE NO CONTEXTO

EDUCACIONAL

Aylla Monise Ferreira da Silva1 - Estácio Macapá

Eixo – Psicopedagogia, Educação Especial e Inclusão


Agência Financiadora: não contou com financiamento

Resumo

Esta pesquisa buscou verificar como a relação afetiva se desenvolve na dinâmica escolar e quais
os seus reflexos no processo ensino-aprendizagem. Para isso foi realizada pesquisa
bibliográfica consistente que trata da importância da afetividade, visto que a mesma se constitui
em um tema bastante discutido no âmbito educacional, sendo objeto de análises e reflexões
presentes nas principais teorias de desenvolvimento, dentre elas a de Piaget, Vygotsky e
Wallon. Por meio da reflexão a respeito de conceitos elaborados pelas perspectivas piagetianas,
vigotskyana e walloniana procuram-se superar a dicotomia entre cognição e afetividade
presente nas escolas, identificando a importância dos sentimentos, emoções e afetos nas
interações sociais, principalmente a que se refere à relação professor-aluno. Trata-se de destacar
contribuições de uma perspectiva integradora, para a formação do educando concebendo
inteligência e afetividade com naturezas distintas, mas indissociáveis, interdependentes, além
de determinantes na construção do conhecimento e na constituição da personalidade. A
afetividade quando valorizada dentro do processo ensino-aprendizagem traz inúmeros
benefícios aos seus agentes, para o professor oferece confiança, a sensibilidade e o manejo
necessário para entender o que seus alunos estão sentindo em determinados momentos e a
habilidade e competência para encontrar possíveis soluções para certos conflitos. A relação
entre sujeito e objeto, desenvolvimento e aprendizagem estão permeados de afeto, pois a
interação entre o organismo e o meio social se dá de forma interativa, por meio de influências
mútuas que envolvem todos os aspectos do ser humano e não apenas o cognitivo. A afetividade
ocupa lugar de destaque dentro do processo educacional e a maneira como ela acontece pode
ser decisiva na concepção de mundo e de homem construída pelo aluno, assim como na sua
reelaboração do conhecimento culturalmente organizado.

Palavras-chave: Afetividade. Educação. Desenvolvimento. Aprendizagem. Relação


Professor-Aluno.

1
Graduação em Pedagogia (UNIFAP), Psicopedagoga Clínica e Institucional (UNINTER) e Especialista em
Educação Especial e Inclusiva. Professora da Faculdade Estácio de Macapá (Estácio Macapá). E-mail:
aylla.silva@estacio.br

ISSN 2176-1396
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Introdução

A afetividade é a temática deste trabalho que objetiva verificar como a relação afetiva
se desenvolve na dinâmica escolar e quais os seus reflexos no processo ensino-aprendizagem.
Ideologicamente a razão de existir da escola era a de repassar informações segundo
planos metódicos, garantindo às novas gerações o poder da herança cultural acumulada e o
papel do professor limitava-se especificamente à exploração desses conteúdos. (ANTUNES,
2006, p.1).
Durante muito tempo confundiu-se ensinar com transmitir e, nesse contexto, o aluno era
um agente passivo da aprendizagem e o professor um transmissor não necessariamente presente
nas necessidades do aluno. Acreditava-se então que alunos e professores habitavam mundos
diferentes e que os propósitos da educação eram distintos, nos quais alguns se propunham a
dizer e outros a ouvir.
Entretanto, a escola deve se ocupar com seriedade da questão do conhecimento e da
qualidade de suas relações, visto que as interações afetivas existentes no cotidiano escolar são
de suma importância para o desenvolvimento e a construção do conhecimento.
Sobre isso, Bock et al (1999, p.124) escreve que:

A escola surgirá, então, como um lugar privilegiado para este desenvolvimento, pois
é o espaço em que o contato com a cultura é feito de forma sistemática, intencional e
planejada. O desenvolvimento – que só ocorre quando situações de aprendizagem o
provocam – tem ritmo acelerado no ambiente escolar. O professor e os colegas
formam um conjunto de mediadores da cultura que possibilita um grande avanço no
desenvolvimento da criança.

A afetividade no ambiente escolar favorece o ensino-aprendizagem, uma vez que o


professor compromissado com a educação não apenas transmite conhecimento, mas também
escuta seus educandos, promovendo, assim, uma relação de troca. Quando essa relação é
fundamentada no afeto, respeito, diálogo, limites e confiança, tornam-se fontes de crescimento
e realização tanto para o aluno quanto para o professor.

A interação professor-aluno
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Segundo Salvador et al (2000 p. 153) nas relações interpessoais há “duas fontes


principais, embora não sejam exclusivas, de relações interpessoais no contexto escolar: as
relações professor-aluno e as relações entre alunos”.
Atualmente na escola a afetividade tem sido vivenciada ou simplesmente ignorada,
quando ignorada torna a relação professor-aluno um ato descompromissado , contribuindo
efetivamente para o fracasso escolar.
No tocante a este assunto Barbosa (2001, p.100) afirma que:

[...] é urgente lembrarmos que, para aprender, é necessário um vínculo afetivo positivo
com o conteúdo a ser aprendido, um ambiente que leve em consideração os aspectos
de Ser Humano, do educador e do aprendiz, e a função social do ensino/aprendizagem.

Muitas vezes o afeto em algumas instituições recebe pouca importância provocando um


ranço nas relações interpessoais. Nestes ambientes em que a educação é considerada um
depósito de informações, onde um ensina e o outro aprende o professor que deveria ser o
mediador do conhecimento, é visto como o agente ativo da exclusão escolar e social. Sabemos
que esta relação possui um caráter unilateral, autoritário e punitivo, que não considera o aspecto
sócio-emocional resultando num distanciamento entre educador e educando.
A afetividade quando valorizada dentro do processo ensino-aprendizagem traz inúmeros
benefícios aos seus agentes, para o professor oferece confiança, a sensibilidade e o manejo
necessário para entender o que seus alunos estão sentindo em determinados momentos e a
habilidade e competência para encontrar possíveis soluções para certos conflitos. Para os
alunos, o simples fato de sentir-se valorizado e respeitado como ser humano já aumenta sua
disposição para aprender e cooperar com seu professor e seus colegas.
Estas interações tornam o processo de construção do conhecimento e o valor pedagógico
das relações humanas ainda mais evidentes. O docente, na interação com o discente, estimula e
ativa o interesse do aluno e orienta o seu esforço individual para aprender.
É relevante ressaltar que a afetividade não acontece apenas no contato físico; questionar
a capacidade do aluno, valorizar seu trabalho, reconhecer seu esforço e incentivá-lo sempre,
estabelecem forma cognitivas de aprendizagem. Para Cavalcante (2005, p. 56).

O cuidado com o aluno vai muito além de dar beijinho, elogiar e acarinhar. Muitas
vezes o afeto é demonstrado de forma contraria: quando o professor é severo. Se ele
é justo e chama a atenção de forma respeitosa, o aluno passa a admirá-lo e busca não
decepcioná-lo. [...] Alunos que se relacionam e se desenvolvem bem são aqueles que
se sentem acolhidos, valorizados por seus talentos e que lidam bem com seus
sentimentos.
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O professor deve ajudar o aluno para que este desenvolva suas capacidades, ou seja,
deve criar um ambiente propício para a aprendizagem, onde o educando aprenda a administrar
suas emoções, e sinta-se motivado a aprender e perceber que seu mundo intelectual cresce em
conjunto com seu mundo emocional. Freitas (2000, p. 211) vem acrescentar afirmando que:

[...] professores na verdade são mestres, pois utilizam em suas aulas não só a
argumentação oriunda da razão, mas também aliada a emoção estabelecendo assim o
ambiente e o contexto necessário para o desenvolvimento da inteligência e da
afetividade de seus alunos. Tocando e convidando significativamente seus alunos à
aventura de se permitirem ser como são.

Portanto, o educador que demonstra satisfação por estar em companhia dos alunos, que
respeita as opiniões dos educandos, que são divergentes das suas, que busca transmitir algo
mais que conteúdos da matéria, conquista a confiança de seus discentes e os ajuda a identificar
nele alguém com quem podem conversar. Para a maioria esse diálogo já é o suficiente.

O desenvolvimento, a afetividade e a aprendizagem

Jean Piaget foi um importante teórico que dissertou sobre essa questão e mesmo que
não tenha sido sua intenção acabou trilhando caminhos para os trabalhos pedagógicos atuais.
Em sua teoria verifica-se o estreito paralelismo entre os aspectos cognitivos e afetivos,
admitidos como aspectos complementares da conduta humana. Piaget influenciou também
posturas em sala de aula, proporcionando ao professor elementos para que ele reflita sobre si
mesmo e sobre sua relação com os alunos.
Ao se referendar ao pesquisador suíço, Costa (2002, p. 45) contribui afirmando que
professor e aluno:

[...] Ambos, embora em posições diferentes, investem na construção do


conhecimento. Enquanto o aluno faz construções – desconstruções sobre conteúdos,
materiais ou situações, o professor investe no acompanhamento do aluno e faz suas
construções – desconstruções através de hipóteses sobre o que supõe estar ocorrendo
no processo de construção dos alunos. O que os move é o investimento nesse saber -
suposto ou ignorado... Ambos levantam hipóteses para serem testadas, do que resulta
uma construção possível sobre o objeto do conhecimento de cada um. O profissional
que atua na intervenção psicopedagógica levanta hipóteses sobre o movimento dos
mecanismos da inteligência. As novas ações do aluno delineiam por sua vez, para o
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professor, modalidades de intervenção psicopedagógica sustentadas pela teoria de


Piaget. Esta assume o papel de um andaime que suporta e acompanha uma construção
e não tem o sentido de prescrever normas que resultem num produto final
homogeneizado.

Como demonstrou Piaget, da mesma maneira que a criança funciona mentalmente de


acordo com os estágios de desenvolvimento, os quais dão origem a sua aquisição de noções,
ela também vive um processo de crescimento afetivo e social marcado por várias etapas que
constituem sua personalidade. O comportamento no ambiente escolar, a atitude em relação ao
professor e a motivação para as atividades escolares dependem da forma como a criança vive
seu próprio desenvolvimento.
Piaget assinalou que os esquemas de assimilação apresentam duas facetas: uma
intelectual e outra afetiva, e que as mesmas são indissociáveis. Advertiu-nos sobre o fato de
que, apesar de apresentarem naturezas distintas, a afetividade e a cognição são inseparáveis e
indissociáveis em todas as ações simbólicas e sensório-motoras.
Para Battro (1976, p.336)

Nos processos afetivos, tal como Piaget os entende, intervêm tantos os sentimentos e
emoções como as tendências e valores [...]. Em geral reserva para a afetividade a
propriedade de constituir a energética da ação, enquanto que sua estrutura corresponde
à inteligência; ambos os aspectos são solidários.

A afetividade, para Piaget, possui papel funcional na inteligência, é a fonte de energia


de que a cognição se utiliza para poder funcionar, ou seja, existe uma relação intrínseca entre
afetividade e cognição. Por isso, na relação entre sujeito e objeto, ou das pessoas consigo
mesmo, existe uma energia que direciona seu interesse para uma situação ou outra; e
corresponde a essa energética, há uma ação cognitiva organizando o funcionamento mental.
No transcorrer de seu trabalho, Piaget agrega a relação entre afetividade e cognição,
outro tema: os valores. Para ele, os valores pertencem à dimensão geral da afetividade no ser
humano e surgem a partir de uma troca afetiva entre sujeito e mundo exterior, com objetos ou
pessoas. No entanto, a teoria da Psicogênese de Piaget enfatizou a questão da inteligência como
o “motor” do desenvolvimento humano. A linguagem, a afetividade, o desenvolvimento do
juízo moral e a aplicação de sua teoria à educação fizeram parte de sua discussão, mas não
constituíram tema central de seu estudo.
Barbosa (2001, p.336) vem colaborar dizendo que:
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Piaget ressalta, muito embora não fosse seu objeto de pesquisa, que a vinculação
afetiva com o objeto a ser aprendido é um elemento importantíssimo para que o
desenvolvimento aconteça. Coloca a afetividade como o aspecto energético que
possibilita a mobilidade necessária para que a construção das estruturas possa se
efetivar.

Outro teórico que discorre sobre o tema é Vygotsky, sua teoria apoia-se na concepção
de um sujeito interativo, que em um processo mediado pelo outro consegue elaborar seus
conhecimentos sobre os objetos. Partindo da concepção de um organismo ativo, Vygotsky
defende o princípio da contínua interação entre as mutáveis condições sociais e a base biológica
do comportamento humano.
Vygotsky afirma que as características tipicamente humanas resultam da interação
dialética do homem com o seu meio sócio-cultural, numa ação de transformações recíprocas.
Dessa forma, não estão presentes desde o nascimento do individuo nem são simples resultados
das pressões do meio externo (REGO, 1995, p. 412). Desde o nascimento, as crianças estão em
constante interação com os adultos; estes, por sua vez, procuram incorporá-las a suas relações
e a sua cultura, sendo esses processos, de início, compartilhados entre pessoas (interpsíquicas)
e na medida em que a criança cresce se tornam intrapsíquicos (a criança acaba por executar de
dentro esses processos) (BOCK et al., 1999, p.109).
A Teoria de Vygotsky é hoje referência na questão da aprendizagem, pois para ele, esta
só ocorre nas relações entre as pessoas. Neste sentido Bock et al.(1999, p. 124) enfatiza que:

[...] a relação do individuo com o mundo está sempre mediada pelo outro, não há como
aprender e apreender o mundo se não tivermos o outro, aquele que nos fornece os
significados que permitem pensar o mundo a nossa volta. [...]

Para La Taille et al. (1992, p. 75) Vygotsky, em termos contemporâneos, poderia ser
considerado um cognitivista por ter se preocupado com a investigação dos processos internos
referentes à aquisição, organização e uso do conhecimento em sua dimensão simbólica. Porém,
“Vygotsky concebe o homem como um ser que pensa, raciocina, deduz e abstrai, mas também
como alguém que sente, se emociona, deseja, imagina e se sensibiliza [...]” (REGO, 1995,
p.120-121).
Vygotsky afirma que na interação humana, a afetividade e a emoção atuam como
elementos básicos, pois são através das interações com os indivíduos mais experientes do seu
meio social que a criança constrói suas funções mentais superiores, e neste caso, a presença do
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adulto dá a criança condições de segurança física e emocional que a levem a explorar melhor o
seu ambiente e, conseqüentemente, a aprender.
Na perspectiva vygotskyana, cognição e afeto se encontram indissociados no ser
humano, se inter-relacionando e se influenciando mutuamente ao longo de toda a história do
desenvolvimento do indivíduo. Afeto e cognição formam uma unidade de dentro do processo
dinâmico do desenvolvimento psíquico, sendo impossível compreendê-los separadamente
(REGO, 1995, p.122).
Dentre os teóricos que escreveram sobre o tema, destaca-se também Henri Wallon, foi
o comandante de uma verdadeira revolução no ensino, efetivada ainda no início do século
passado por defender a idéia de que a escola deve proporcionar formação intelectual, afetiva e
social às crianças.
La Taille et al (1992, p.90) comentando a perspectiva walloniana, afirma que:

A afetividade, nesta perspectiva, não é apenas uma das dimensões da pessoa: ela é
também uma fase do desenvolvimento, a mais arcaica. O ser humano foi, logo que
saiu da vida puramente orgânica, um ser afetivo. Da afetividade diferenciou-se
lentamente, a vida racional. Portanto, no início da vida, afetividade e inteligência estão
sincreticamente misturados, com o predomínio da primeira.

Para Wallon, o desenvolvimento é um processo descontínuo, permeado por conflitos e


rupturas, que consegue integrar aspectos centrais como a afetividade, a inteligência e a
motricidade. A afetividade é imprescindível para o processo de desenvolvimento da
personalidade, sendo este constituído por alternâncias dos domínios funcionais. Os três campos
funcionais (afetividade, inteligência e ato motor) integram-se ao longo da evolução,
apresentando momentos de preponderância de uns sobre os outros (BASTOS, 2003, p.19).
Segundo Mahoney e Almeida (2006, p.58):

A escolha de Henri Wallon para iluminar a questão da afetividade no processo ensino-


aprendizagem decorre de varias razões: sua teoria psicogenética auxilia a
compreensão do desenvolvimento e oferece contribuições para o processo ensino-
aprendizagem. Dá subsídios para compreender o aluno e o professor e a interação
entre eles; ao focalizar o meio social como um dos conceitos fundamentais da teoria,
coloca a questão do desenvolvimento no contexto ao qual está inserido, e a escola
como um dos meios fundamentais para o desenvolvimento do aluno e do professor;
estabelece uma relação fecunda entre psicologia e educação, ou seja, psicologia e
pedagogia constituem momentos complementares de uma mesma atitude
experimental.
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Wallon afirma que professores e alunos compartilham de vários ambientes além da


escola, mas o ambiente escolar é o meio essencial para o desenvolvimento desta relação
pedagógica, pois ajuda a proporcionar diferentes oportunidades de participação em outros
grupos.
Nesse contexto, educandos e educadores são atingidos uns aos outros e ambos pelo meio
em que estão inseridos, e quando suas necessidades afetivas, cognitivas e motoras não alcançam
o êxito esperado, isto afeta diretamente o processo ensino-aprendizagem, visto que no aluno
gera dificuldades de aprendizagem e no professor provoca insatisfação, descompromisso e
apatia.
A teoria walloniana auxilia na compreensão acerca da necessidade das relações entre as
pessoas quando trata da construção do eu com caráter inteiramente dependente do outro, isto é,
seja para servir de referência ou ainda para ser negociado. Assim, para “Wallon, ‘o outro é um
parceiro perpétuo do eu na psíquica’, mesmo na vida adulta os indivíduos se vêem às voltas
com a definição das fronteiras entre eu e o outro”. (GALVÃO, 1995, p.56).
Diversos estudos, de abordagem piagetiana, vygotskyana e walloniana, têm dado ênfase
ao desenvolvimento cognitivo e afetivo como decorrente da necessidade dos sujeitos de
coordenar as suas ações ou confrontar seus pontos de vista diante de uma situação – problema
a ser solucionado. A resolução conjunta de problemas onde cada sujeito traz uma abordagem
cognitiva – afetiva particular a respeito de si, do outro e da natureza da atividade a ser
desenvolvida é fundamental para a maximização das ações coordenadas e dos confrontos de
visões entre os sujeitos.

Conclusão

A história revela que em todas as sociedades a afetividade sempre constituiu um


elemento importante da vida do ser humano, seja nas sociedades onde a educação era concebida
em sua forma holística, ou no discurso daqueles pensadores que defendiam a formação integral
do homem, a presença dos afetos, sentimentos e emoções sempre foi uma constante.
A afetividade sempre esteve movendo a ação humana e o fato de pensadores proporem
a dicotomia entre razão e emoção, já é um indicativo de fundamental importância dado a esse
aspecto do ser humano. A verdade é que tal enfoque tem conduzido a uma visão parcial e
distorcida da realidade, com reflexos nas investigações científicas e no modelo educacional
vigente. Hoje existe uma busca por parte dos psicólogos, psicopedagogos e educadores, no
sentido de humanizar o conhecimento, com a intenção de se desenvolver, paralelamente, os
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aspectos cognitivos e afetivos. Essa tendência integradora centra-se particularmente na


observação de três teorias do desenvolvimento: na de Piaget, na de Vygotsky e na de Wallon.
Na teoria piagetiana, o cognitivo e o afetivo são dois componentes do desenvolvimento
intelectual. Verifica-se nela o estreito paralelismo entre esses dois aspectos. Piaget distingue os
estágios do afeto que correspondem aos estágios do desenvolvimento das estruturas. Para ele,
afetividade e cognição, apesar de apresentarem naturezas distintas, são inseparáveis e
indissociáveis. Porém, em sua teoria, a evolução da inteligência na área moral é que permitiria
a organização do mundo afetivo, não ocorrendo o contrário. Apesar de ter agregado a temática
dos valores a relação entre afetividade e cognição, Piaget deu ênfase à questão da inteligência
como “motor” do desenvolvimento humano.
Vygotsky concebe o homem como um ser que pensa, raciocina, deduz e abstrai, mas
que também sente, se emociona, deseja, imagina e se sensibiliza. Afirma que na interação
humana, a afetividade e a emoção atuam como elementos básicos, pois é através da interação
com os indivíduos mais experientes do seu meio social que a criança constrói suas funções
mentais superiores e, para isso, necessita de segurança física e emocional para explorar o
ambiente e aprender.
Neste cenário Vygotsky traz uma grande contribuição, uma vez que para ele a relação
do indivíduo com o mundo está sempre mediada pelo outro, e a escola surge como um espaço
privilegiado para esta interação, pois é neste lugar em que ocorre o contato com a cultura, onde
educandos e educadores são parceiros principais nesta tarefa social e o aluno nunca deverá ser
visto como um ser que não aprende: todos estão envolvidos e são responsáveis pelo processo
ensino-aprendizagem
Para Piaget a afetividade é a mola propulsora, a “energia” que impulsiona as ações, é
fundamental para que a estrutura cognitiva realize suas operações. Em Vygotsky ela é uma
dimensão de funcionamento psicológico do homem profundamente conectado à dimensão
cognitiva. Apesar das diferentes conceituações é perceptível a intrínseca conexão entre
afetividade e cognição, assim como sua interdependência.
Mas é na teoria Psicogenética de Wallon que a afetividade ganha maior destaque como
um componente integrado ao cognitivo e ao motor (psicomotor). A afetividade é um domínio
ou conjunto funcional, responsável pelas emoções, pelos sentimentos e pela paixão. Ela se
refere à capacidade e a disposição do ser humano de ser afetado pelo mundo externo e interno,
por sensações ligadas a tonalidades agradáveis ou desagradáveis.
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Seja como “energia”, dimensão humana ou domínio funcional, a afetividade, ou melhor,


as suas manifestações, sempre foram objeto de reflexão por parte do homem em diversos
contextos históricos. Teóricos como Piaget, Vygotsky e Wallon, além de outros demonstraram
cientificamente como este aspecto do ser humano é determinante no seu desenvolvimento e na
sua aprendizagem.
A afetividade ocupa lugar de destaque dentro do processo educacional e a maneira como
ela acontece pode ser decisiva na concepção de mundo e de homem construída pelo aluno,
assim como na sua reelaboração do conhecimento culturalmente organizado. Por isso,
recomenda-se a continuidade de estudos e pesquisas, pois as mudanças no contexto escolar
dependem do aprofundamento teórico e metodológico dos seus agentes, além do sentido
político e afetivo dado às práticas educativas.
Que essas reflexões possam ser úteis àqueles que pretendem conciliar os desafios de
uma nova época com a busca que perdura a tempos, de conduzir os envolvidos no processo
educacional a atitudes mais afetivas e que este aspecto da vida não fique restrito apenas ao
âmbito do discurso e sim que se torne uma realidade tangível e constante nas nossas escolas.

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