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Lucas Almeida de Araujo

SOLUÇÕES BASEADAS NA NATUREZA


PARA A BACIA DO RIO COMPRIDO
Estratégias Biofílicas para uma Requalificação Fluvial Urbana

Monografia apresentada ao Programa de Pós-Graduação em


Paisagismo Ecológico da PUC-Rio como requisito parcial para
obtenção do título de Especialista em Paisagismo Ecológico:
Planejamento e Projeto da Paisagem

Orientadora: Prof.ª Cecília Polacow Herzog


Co-orientador: Prof. Osvaldo Moura Rezende

Rio de Janeiro
Julho 2019
Lucas Almeida de Araujo

SOLUÇÕES BASEADAS NA NATUREZA


PARA A BACIA DO RIO COMPRIDO
Estratégias Biofílicas para uma Requalificação Fluvial Urbana

Monografia apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Paisagismo


Ecológico da PUC-Rio como requisito parcial para obtenção do título de
Especialista em Paisagismo Ecológico: Planejamento e Projeto da
Paisagem. Aprovada pela comissão examinadora abaixo assinada.

Prof.ª Cecília Polacow Herzog


Orientadora
Departamento de Arquitetura e Urbanismo – PUC-Rio

Prof.º Pierre Andre Alexandre Henri Paul Martin


Departamento de Arquitetura e Urbanismo – PUC-Rio

Rio de Janeiro, 02 de julho de 2019


Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho por
qualquer meio convencional ou eletrônico para fins de estudo e pesquisa,
e outros fins não comerciais desde que citada a fonte e dado crédito ao
autor.

Ficha Catalográfica

Araujo, Lucas Almeida de

Soluções baseadas na natureza para a Bacia do Rio Comprido :


estratégias biofílicas para uma requalificação fluvial urbana / Lucas
Almeida de Araujo ; orientadora: Cecília Polacow Herzog ; co-
orientador: Osvaldo Moura Rezende. - 2019.
96 f. : il. color. ; 30 cm

Trabalho de conclusão de curso (especialização)–Pontifícia


Universidade Católica do Rio de Janeiro, Departamento de Arquitetura
e Urbanismo, Programa de Pós-Graduação Paisagismo ecológico,
2019.
Inclui bibliografia.

1. Arquitetura e Urbanismo – TCC. 2. Cidades biofílicas. 3.


CDD: 720
Soluções baseadas na natureza. 4. Requalificação fluvial urbana. 5.
Rios Urbanos. 6. Rio Comprido. I. Herzog, Cecília Polacow. II.
Rezende, Osvaldo Moura. III. Pontifícia Universidade Católica do Rio
de Janeiro. Departamento de Arquitetura e Urbanismo. IV. Título.
Greta Thunberg, 16 anos
Discurso no Fórum Econômico Mundial
Davos, janeiro de 2019
Desde o início da graduação em Arquitetura e Urbanismo em 2010, e durante os
dois anos de duração deste curso de pós-graduação, inúmeras pessoas
caminharam junto comigo e me guiaram para a minha formação atual. À todos
estes que fizeram parte desta minha construção eu gostaria de deixar o meu
agradecimento.

Agradeço à minha família por estar presente em todos os momentos e por serem
minha estrutura durante toda a vida, sempre com muita paciência.

Agradeço aos meus amigos de curso, à Amanda, à Ana Carolina, ao Artur, à


Eduarda, ao Gabriel, à Hanna, à Juliana, à Olivia, ao Pedro, ao Raphael, à Silvia
e à Úrsula, que durante nossos encontros e reuniões dentro e fora do âmbito
acadêmico já não podem ser chamados de colegas, mas sim de amigos com os
quais divido a paixão pelo verde e a ânsia por um futuro melhor.

Agradeço ao amigo Guto Santos por me envolver no projeto Baixo Rio e alimentar
minhas esperanças de um dia ver o rio Comprido e o Rio Comprido requalificados
e cheios de vida.

Agradeço a todos os professores que transbordaram conhecimento despertando


ainda mais minha curiosidade e que aguçaram meu olhar para um sempre novo
entendimento sobre as paisagens que habitamos. Em especial ao Prof. Osvaldo
Rezende, meu co-orientador que despertou e intensificou minha paixão pelos rios
urbanos. Obrigado por serem os grandes norteadores dessa caminhada.

Aos amigos, conselheiros, professores e coordenadores do curso, Cecília Herzog


e Pierre Martin, que me acompanham desde a graduação, por mais uma vez me
inspirarem profundamente a seguir minhas paixões e por me sempre oferecerem
oportunidades de buscar ativamente um mundo com cidades mais verdes e
verdadeiramente para todos.

Agradeço especialmente aos citados coordenadores e à Coordenação Central de


Extensão da PUC-Rio pelo convite para monitoria de turma que me possibilitou o
ingresso no curso. Obrigado.
Resumo da Monografia apresentada à CCE/PUC-Rio como parte dos requisitos
necessários para obtenção do título de Especialista.

Lucas Almeida de Araujo

Julho/2019

Orientadora: Cecília Polacow Herzog


Co-orientador: Osvaldo Moura Rezende
Curso: Paisagismo Ecológico: Planejamento e Projeto da Paisagem

Com o intenso desenvolvimento da atividade humana no planeta vive-se em uma


nova era geológica, o Antropoceno. As alterações nos padrões das paisagens
feitas para construção das cidades baseadas no consumo erradicaram
ecossistemas, impermeabilizaram o solo e impactam negativamente o meio
ambiente, em especial os cursos d’água que cortam as cidades e que sofrem com
alterações morfológicas, poluição das águas e abandono. Estes rios tiveram seus
fluxos naturais alterados e escondidos, e apenas ressurgem em eventos
climáticos extremos, agravados pelas mudanças climáticas, causando diversos
prejuízos para as cidades alagadas. Faz-se necessária uma nova abordagem
sobre os rios urbanos e três conceitos surgem como resposta: o primeiro de
cidades biofílicas e Soluções Baseadas na Natureza oferece uma gama de
intervenções que mimetizam e se sustentam na natureza – como elementos de
Infraestrutura Verde – para alcançar resultados desejados reconectando o
ambiente urbano com os sistemas naturais; o segundo, de Requalificação Fluvial
Urbana advoga por novas abordagens sobre os rios urbanos e suas bacias
hidrográficas para resgatar a qualidade ambiental destes elementos; o terceiro
sugere um planejamento de espaços urbanos que incentivem a mobilidade ativa
e ofereçam condições para uma vida urbana exuberante. Como contribuição final
para o trabalho são apresentadas estratégias para a bacia do rio Comprido no Rio
de Janeiro, para aumentar a qualidade ambiental do rio e da cidade ao seu redor,
com harmonia entre o ambiente natural e construído.

Cidades Biofílicas; Soluções Baseadas na Natureza;


Requalificação Fluvial Urbana; Rios Urbanos; Rio Comprido.
Abstract of the Postgraduate Specialization Project presented to CCE/PUC-Rio
as a partial fulfilment of the requirements for the title of Specialist.

Lucas Almeida de Araujo

July/2019

Advisor: Cecília Polacow Herzog


Co-advisor: Osvaldo Moura Rezende
Course: Ecological Landscaping: Landscape Planning and Design

With the intense development of the human activity on the planet there is now a
new geological era, the Anthropocene. The modifications made in the landscape
patterns for the construction of consumption-based cities, eradicated ecosystems,
sealed the soil and negatively impact the environment, especially considering the
streams permeating such cities which suffers with morphological modifications,
high water pollution and abandonment. These rivers have had their natural
systems altered and hidden, and only resurface in extreme weather events,
aggravated by climate change, causing several damages to the flooded cities.
Thus a new approach regarding urban rivers becomes necessary and three
concepts emerge as possible responses: the first, Biophilic Cities and Nature
Based Solutions, offers a range of interventions that mimics nature and are
sustained by it – such as Green Infrastructure – to achieve specific goals while
reconnecting the urban environment with the natural systems; the second, Urban
River Restoration, advocates for new approaches on dealing with urban rivers and
their respective watersheds in order to restore the environmental quality of these
elements and improve the urban waters management; the third concept suggests
a public spaces planning and design that encourage active mobility while offering
better conditions for an exuberant urban life. As a final contribution to this project,
a series of strategies are presented for the Comprido river urban basin, aiming to
increase the environmental quality, all in harmony among the natural and built
environments.

Biophilic Cities; Nature Based Solutions; Urban River Restoration;


Urban Rivers; Rio Comprido.
Figura 1 - Gráfico do Histórico de Consumo de Energia por Tipo no Mundo ..................... 5
Figura 2 - Londres em 1879. ............................................................................................... 7
Figura 3 - Morro da Providência e o Bairro de Santo Cristo no início do séc. XX ............... 9
Figura 4 - Mapa da TSC na RMRJ na década de 1980 ....................................................... 13
Figura 5 - Mapa da TSC na RMRJ na década de 2000 ....................................................... 14
Figura 6 - Mapa da TSC na RMRJ na década de 1990 ....................................................... 14
Figura 7 - Representação Simplificada do Ciclo Hidrológico ............................................ 17
Figura 8 - Gráfico de Volume de Escoamento ao longo do tempo ................................... 19
Figura 9 - Carros debaixo d'água na Rua Jardim Botânico, Rio de Janeiro ....................... 19
Figura 10 - Exemplos de Serviços Ecossistêmicos oferecidos pela Arborização Urbana .. 27
Figura 11 – Diferenças entre termos e definição de requalificação fluvial ...................... 29
Figura 12 - Espaços urbanos inadequados em Botafogo e no Rio Comprido ................... 36
Figura 13 - Foto aérea do Rio Comprido e região. ............................................................ 40
Figura 14 - Mapa de Localização da Bacia Hidrográfica .................................................... 41
Figura 15 - Bacia do Rio Comprido e Tributários .............................................................. 42
Figura 16 - Mapa de Cobertura Vegetal, 2016 ................................................................. 43
Figura 17 - Mapa de Localização das Favelas na bacia. .................................................... 44
Figura 18 - Limites do Bairro do Rio Comprido ................................................................. 45
Figura 19 - Quinta do Bispo, no Rio Comprido no século XIX ........................................... 46
Figura 20 - Av. Paulo de Frontin, 1928 por Augusto Malta. ............................................. 47
Figura 21 - Av. Paulo de Frontin finalizada em 1919 com o Corcovado ao fundo ............ 48
Figura 22 - Construção do Elevado em fevereiro de 1971 ............................................... 48
Figura 23 - A Av. Paulo de Frontin, sob o elevado, atualmente ....................................... 49
Figura 24 - Trânsito sobre o Elevado Engenheiro Freyssinet, 2015.................................. 50
Figura 25 - Paisagem sob o elevado.................................................................................. 51
Figura 26 - Cheia no Rio Comprido em evento de chuva intensa..................................... 52
Figura 27 - Corte Típico do Trecho 2 - Existente ............................................................... 64
Figura 28 - Corte Típico do Trecho 2 - Proposto ............................................................... 65
Figura 29 - Sistema de Espaços Livres na Bacia do Rio Comprido .................................... 67
Figura 30 - Exemplo de espaço público adaptado na Rua Haddock Lobo ........................ 68
Figura 31 - Proposta de Seção Transversal do Rio Comprido ........................................... 68
Figura 32 - Proposta para "Barreira Verde" e Iluminação Natural para o Elevado .......... 69
Figura 33 - Corte Típico Trecho 3 - Existente .................................................................... 71
Figura 34 - Corte Típico Trecho 3 - Proposto .................................................................... 72
Figura 35 - Mapa de Localização dos Reservatórios Propostos ........................................ 75
Figura 36 - Mapa de Localização das ETEC's Propostas .................................................... 76

Quadro 1 - Classificação de medidas para o controle de inundações. ............................. 31


Quadro 2 - Localização e Características dos Trechos de Estudo ..................................... 58
Quadro 3 - Potencialidades e Fragilidades do Trecho 1 ................................................... 59
Quadro 4 - Potencialidades e Fragilidades do Trecho 2 ................................................... 61
Quadro 5 - Potencialidades e Fragilidades do Trecho 3 ................................................... 66
O objetivo desse trabalho é discutir de forma exploratória sobre como a
abordagem de uma requalificação fluvial do Rio Comprido e sua bacia hidrográfica
inserida em área urbana, usando de práticas e soluções baseadas na natureza
(infraestrutura verde), pode exercer papel fundamental para o aumento da
qualidade ambiental do rio, da resiliência da cidade e da qualidade dos espaços
públicos ao longo de suas margens altamente antropizadas. A proposta da
requalificação fluvial é contribuir na busca de um ponto de equilíbrio para a
coexistência das cidades com seus rios, em um melhor estado de qualidade
ecológica (MIGUEZ, REZENDE e VERÓL, 2015) estimulando a reconexão e
funcionamento em conjunto com o espaço geobiofísico em que está inserida, uma
busca pela harmonia entre o ambiente natural e o construído.
Neste trabalho pretende-se defender a seguinte hipótese:
• O uso de tipologias de soluções baseadas na natureza
(infraestrutura verde) associadas a infraestrutura tradicional,
criando uma infraestrutura híbrida, pode contribuir para a
melhoria da qualidade ambiental do rio Comprido, do espaço
urbano ao longo de suas margens e para a melhoria do manejo
de águas urbanas.

A metodologia deste trabalho começa a partir de uma revisão bibliográfica


que objetiva fundamentar as estratégias e diretrizes propostas nos capítulos
seguintes para o caso estudado, a bacia do Rio Comprido localizada no Rio de
Janeiro, RJ.
O capítulo 2 - Contextualização, busca situar a conjuntura das cidades
frente aos desafios da atualidade passando por uma breve descrição histórica da
formação dos centro urbanos – a cidade do Rio de Janeiro em particular – seguida
por uma revisão bibliográfica sobre a relação dessas mesmas cidades, e suas
complicações, com os rios que as permeiam, desde o início da ocupação até ao
que os rios representam para os espaços urbanos na contemporaneidade.
No capítulo 3 - Fundamentação Teórica-Conceitual, são apresentados, por
meio de uma revisão bibliográfica, os três conceitos que estruturam as propostas
deste trabalho; Biofilia e Soluções Baseadas na Natureza; Requalificação Fluvial
Urbana; e Caminhabilidade e Vitalidade Urbana. Estes conceitos possuem relação
com os fatores abióticos, bióticos e antrópicos, pertencentes a uma visão holística
de se observar a paisagem.
No capítulo 4 - O caso do Rio Comprido, procura-se apresentar a bacia
estudada, suas características geográficas, biológicas e socioculturais seguidas
de uma descrição da base e importância histórica da formação urbana local e sua
relação com o rio. A adoção e estudo da bacia hidrográfica permite observar,
propor e aprender através de um contexto existente, oportunidades para aplicação
de soluções baseadas na natureza tendo como eixo estruturador um rio urbano.
Assim, na próxima etapa, no capítulo 5 - Estratégias, são identificadas
oportunidades de aplicação de soluções baseadas na natureza no contexto
urbano da bacia estudada ao longo do Rio Comprido. A finalidade é produzir
diretrizes para a área de estudo que sigam as fundamentações apresentadas na
revisão bibliográfica de maneira a melhorar a situação urbana atual e trazer mais
qualidade ambiental e de vida urbana para a região. A metodologia para
elaboração das diretrizes consiste na divisão da bacia em trechos ao longo do seu
rio principal, e posterior descrição das potencialidades e estratégias de cada um.
Por fim, na Conclusão é feita uma discussão final sobre a validade das
soluções apresentadas no capítulo anterior e sua aplicabilidade na bacia
estudada, assim como essa abordagem pode ser aplicada a outras bacias que
apresentem contextos similares além de apontar caminhos para aprofundar este
conhecimento objetivando uma aplicação prática no futuro.
O químico holandês Paul Crutzen e o pesquisador americano Eugene F.
Stoermer (2000) cunharam oficialmente, o termo “antropoceno” para designar a
nova era geológica em que vivemos. Segundo os autores, nesta nova era
geológica, o ser humano (do grego antigo anthropos) é quem desempenha o
principal papel transformador da paisagem no planeta. Desde o domínio da
agricultura a espécie humana vem alterando paisagens naturais e explorando
recursos para desenvolvimento próprio.
Com a revolução industrial no século XIX, o desenvolvimento humano e o
aumento da produção e consumo passaram a crescer aceleradamente, com uma
rapidez e intensidade nunca vista na História. O gráfico abaixo mostra a evolução
do consumo de energia no mundo a partir de 1850 (Fig. 1), época da Revolução
Industrial, um aumento diretamente relacionado com a aceleração do
desenvolvimento humano através da evolução das tecnologias de produção,
especialmente do motor a vapor.

Figura 1 – Gráfico do Histórico de Consumo de Energia por Tipo no Mundo

Fonte: Adaptado de United Nations, Department of Economic and Social Affairs, “The Great Green
Technological Transformation”. Disponível em <https://www.un.org/development/desa/dpad/wp-
content/uploads/sites/45/2011wess.pdf>. Acesso em 15/05/2019
A população humana que, desde o surgimento da espécie Homo sapiens
levou 200 mil anos para atingir a marca de 1 bilhão de habitantes em 1810, viu
seus números se multiplicarem para mais de 7 bilhões de pessoas no planeta em
2010 – um crescimento de mais de 700% em um curtíssimo espaço de tempo de
apenas 200 anos. (SMITH, 2013) “A civilização se tornou uma força de alcance
planetário e de duração e abrangência geológicas” (OLIVEIRA, 2015, p. 14).
A atividade humana provoca alterações nos padrões de diversos biomas e
ecossistemas iniciando diversos processos que geram consequências diversas,
tanto positivas quanto negativas para o ambiente natural e para a própria espécie
humana. Uma das mais significativas consequências é o cenário atual de
mudanças climáticas que o planeta vem enfrentando sem precedentes devido ao
acumulo de Gases de Efeito Estufa (GEE) na atmosfera causado pela queima de
combustíveis fósseis (HERZOG, 2013).
Em meio a todos os tipos de alterações que o desenvolvimento humano
produz no planeta, a urbanização certamente ganha papel de destaque. As
cidades são os locais em que se acumulam alimentos, serviços, valores, cultura,
moradia e infraestrutura, além de serem os destinos principais de todos os
recursos extraídos da natureza e processados pela atividade humana. São os
grandes centros de consumo da humanidade no planeta e principal fonte de
riqueza para as economias dos países (SILVA, 2017, p.1).
Dados do Banco Mundial1 mostram que em 2017 quase 55% da população
mundial era urbana. Ao considerar apenas o Brasil, segundo o IBGE (2010), 85%
da população brasileira vive em cidades. Observa-se então, o acelerando
desenvolvimento dos centros urbanos concentrando populações em grandes
metrópoles onde a paisagem natural encontra-se completamente alterada e
adaptada a esse modelo intenso de ocupação humana. A forma das cidades hoje,
é um resultado de uma série de interferências humanas feitas sobre o meio
ambiente provocando mudanças nos fatores naturais biológicos, geomorfológicos,
hidrológicos, climáticos e energéticos.
O processo de urbanização foi intensificado no século XIX, com o início da
Revolução Industrial por meio da migração de mão de obra dos campos para os
centros urbanos, suprindo a demanda da crescente indústria movida à carvão.
Nesse primeiro momento, as cidades cresceram sem planejamento, gerando
ambientes altamente insalubres onde pessoas aglomeradas em moradias
precariamente iluminadas e ventiladas dividiam as vielas da cidade com veículos

1
(THE WORLD BANK, UNITED NATIONS POPULATION DIVISION, 2018)
movidos à cavalo e esgotos a céu aberto. Cenário agravado pela alta poluição do
ar e das águas provocadas pela intensa atividade industrial (HERZOG, 2013).
Esses ambientes sem áreas verdes ao ar livre e nenhuma qualidade de vida,
gerava as condições perfeitas para doenças como cólera e tuberculose. Londres
(Fig. 2), foi a mais simbólica dessas cidades industriais, e ficou conhecida como a
cidade do “smog”: junção de termos entre o nevoeiro típico da região (fog) com a
intensa fumaça produzida pelas fábricas (smoke) gerando uma espessa camada
de poluição que bloqueava a luz solar e prejudicava a população.

Figura 2 – Londres em 1879.

Fonte: Gustave Dore, 1879 em London a Pilgramage. Brittish Library. Disponível em:
<https://www.bl.uk/collection-items/london-illustrations-by-gustave-dor> Acesso em: 15/03/2019

Mais tarde, no fim do século XIX e início do século XX, o urbanismo foi
dominado por políticas higienistas que visavam, além de embelezar as cidades
aos moldes da elite da época, melhorar as condições de salubridade. Nessa
época, grandes alterações aconteceram social e ambientalmente. Acreditava-se
que os “miasmas”, vindos do saneamento precário, má ventilação e até de alguns
ecossistemas naturais como os pântanos, eram as causas das doenças e
epidemias generalizadas. Assim, uma política de destruição e alargamento do
tecido urbano foi posta em prática - novas avenidas foram abertas, largas e
arborizadas, e parques foram criados ao mesmo tempo em que os rios e áreas
úmidas foram aterrados, retificados e canalizados (MIGUEZ, REZENDE e VERÓL,
2015; HERZOG, 2013).
Essas intervenções, amenizaram questões de saúde pública e
ordenamento da cidade, mas provocaram alterações drásticas nos ciclos dos
ecossistemas, em especial os ciclos biológico e hidrológico. O funcionamento
natural das bacias hidrográficas foi ignorado, e as obras de drenagem e
aterramento de áreas alagadas foram feitas sem medir consequências com o que
poderia acontecer em locais que antes acomodavam águas naturalmente e agora
eram parte da cidade, impermeabilizadas e ocupadas por empreendimentos que
valorizavam os mercados imobiliários.
A cidade modelo desse novo urbanismo higienista foi a Paris da segunda
metade do século XIX, quando o Barão George-Eugène Haussmann (1809-
1891)2, prefeito e urbanista, começou uma renovação da cidade com objetivos
militares, de salubridade e estéticos. Foi nessa época que os grandes bulevares
parisienses foram implantados, criando um padrão estético replicado ao redor do
mundo.
No Brasil já virando o século XX e influenciado pelo modelo
haussmanniano de Paris, onde estudou nos anos 1850, o engenheiro Francisco
Pereira Passos (1836-1913) (PINHEIRO, 2015) iniciou seu famoso “bota abaixo”
na cidade do Rio de Janeiro, então Capital Federal. A renovação da cidade
começou quando tomou posse como prefeito, em 1902. Foram necessárias
diversas desapropriações de imóveis e remoção de moradores do Centro, além
do arrasamento de morros para abrir novas vias como a Avenida Central, e
construir edifícios luxuosos, como o Theatro Municipal, todos inspirados na
arquitetura e urbanismo franceses. No entanto, a transformação do Rio de Janeiro
na “Paris tropical” teve consequências sociais e ambientais, uma vez que o rígido
traçado do urbanismo francês interrompeu os fluxos naturais da paisagem e as
remoções contribuíram para as primeiras ocupações pela população em encostas,
criando as primeiras favelas da cidade, como por exemplo o Morro da Providência
(Fig. 3).

2
(BRITANNICA, THE EDITORS OF ENCYCLOPAEDIA, 2019)
Figura 3 – Morro da Providência e o Bairro de Santo Cristo no início do séc. XX

Fonte: Kfuri, Jorge, 1893-1965. Brasiliana Fotográfica/Biblioteca Nacional. Disponível em:


<http://brasilianafotografica.bn.br/brasiliana/handle/20.500.12156.1/4566> Acesso em: 12/03/2019

A partir da década de 1930, com o advento do automóvel popularizado,


começa-se a planejar as cidades com base na eficiência, desde a escala dos
interiores domésticos às grandes vias expressas ligando partes das cidades
setorizadas a outras - nascia o modernismo. Essa concepção de cidade-máquina,
além de suprimir ecossistemas nativos provocou a perda de identidade das
cidades. Brasília, planejada por Lúcio Costa e inaugurada em 1960 é o grande
exemplo das cidades modernas. A cidade, setorizada e voltada para a circulação
individual em veículos em alta velocidade, não possui a escala dos pedestres, que
não ocupam as ruas e com isso perde sua diversidade social e cultural (HERZOG,
2013).
O urbanista dinamarquês Jan Ghel ao abordar Brasília em sua obra (2013)
diz que a cidade é uma bela composição se vista do alto, em um avião ou
helicóptero. Já ao nível dos olhos, diz ser uma catástrofe devido à escala
monumental, com as ruas muito largas, espaços urbanos amorfos e lugares
distantes entre si. Ainda comenta que a “síndrome de Brasília”, onde o que chama
de “dimensão humana” é negligenciada no planejamento urbano, está presente
em novos empreendimentos imobiliários ao redor do mundo, com torres
autossuficientes e construções espetaculares que são impressionantes do alto ou
à distância, mas que ignoram ou pouco contribuem para a qualidade do espaço
urbano na escala local ao seu redor.
Com a verticalização possibilitada pelas novas tecnologias de construção,
e o enfoque na arquitetura monumental, as cidades passaram a sofrer uma forma
de padronização de suas paisagens. Na busca de reforçar uma imagem
dominante perante o mercado econômico mundial, as grandes empresas
começaram a investir em grandes edifícios, geralmente cobertos de vidro
espelhado e sempre climatizados artificialmente. Com a globalização, esse padrão
de arquitetura associado ao sucesso econômico foi generalizado, e pode ser
encontrado em todas as grandes cidades do planeta, com pouca diferenciação,
contribuindo para a perda da identidade local e a homogeneização da paisagem
urbana com uma estética globalizada (HERZOG, 2013, p. 59-60).
Outro fator que influenciou fortemente a forma das cidades e a qualidade
de vida nas mesmas foi a pressão das indústrias automobilísticas. O incentivo do
predomínio dos veículos particulares na paisagem causou, em especial no Brasil
a partir de 1960, uma decadência nos sistemas de transportes públicos, setor no
qual os ônibus passaram a sobrepor os outros meios de transportes sobre trilhos
mais eficientes. Além disso, esses meios de transporte motorizados sobre rodas
demandam grandes investimentos em infraestrutura rodoviária. Vias expressas,
túneis e viadutos cortaram as malhas urbanas existentes e provocaram ocupações
desordenadas em locais inadequados, já que funcionam como vetores de
ocupação por oferecerem um acesso rápido ao transporte (HERZOG, 2013).
Sobre o acelerado processo de urbanização no Brasil, ocorrido após a
industrialização do país, Silva (2017) diz que:

[...] proporcionou uma súbita concentração de indústrias,


serviços e trabalhadores nas cidades que, somados à
mecanização do campo, transformaram o déficit habitacional e a
escassez de empregos para a mão de obra sem qualificação
profissional, um dos maiores problemas sociais das cidades
urbanizadas. A expansão urbana brasileira se deu, em sua
maioria, sob um modelo de adensamento excessivo com a
concentração de população em cidades e regiões
metropolitanas sem infraestrutura, particularmente no que se
refere à infraestrutura de transporte público de grande
capacidade e ao saneamento. (SILVA, 2017, p. 2)

Silva e Romero (2010), citados por Silva (2017), complementam esse


modelo de urbanização pós-industrial ao afirmar que nele predomina a ausência
da integração com a natureza e a perda do sentido sócio espacial entre os
habitantes e a cidade. Essa política de crescimento a qualquer custo, baseada na
exploração intensiva de recursos naturais gera externalidades negativas,
marcando as cidades do fim do século XX. As externalidades provocadas pela
erradicação de ecossistemas nativos e interrupção dos fluxos naturais, prejudicam
a cidade como um todo, da questão de infraestrutura urbana (drenagem,
saneamento, energia e transporte) até questões de saúde pública e economia.
O paradigma de controle e domínio sobre a natureza prevalece nas
cidades do antropoceno. As grandes obras de infraestrutura urbana buscam
solucionar problemas que, antes da presença humana, a natureza já havia
solucionado. Os impactos ambientais3 causados por um modo de vida globalizado,
artificial e com economia baseada no consumo individual desenfreado prejudica
de diversas maneiras a qualidade de vida urbana. O funcionamento dos veículos
movidos à combustíveis fósseis, por exemplo, é altamente poluente e impacta
diretamente a saúde da população através da qualidade do ar. Apenas no
município do Rio de Janeiro, o setor de transporte é responsável por 39% do total
das emissões de GEE (COPPE/UFRJ, 2011). Sobre a saúde da população, os
dados são alarmantes, segundo a Organização Mundial da Saúde (WORLD
HEALTH ORGANIZATION, 2018), são estimadas em 4,2 milhões o número de
mortes anuais relacionadas à poluição do ar, e em 2013 essas mortes tiveram um
custo de 225 bilhões de dólares na economia mundial (THE WORLD BANK
GROUP, 2016). Ao falar desse modelo de cidade insustentável e completamente
desconectado de seu ambiente geobiofísico que lhe dá suporte, Herzog (2013),
diz:

A cidade moderna, estruturada em zoneamentos


funcionais, é altamente conveniente para a economia baseada
no indivíduo e no consumo intensivo. É composta de torres
residenciais, sem identidade arquitetônica, em condomínios
fechados; shoppings centers climatizados e iluminados
artificialmente, nos quais não se tem referência de tempo; vias
expressas para veículos, de preferência individuais, com
expansão urbana sem limites. As ruas comerciais e residenciais
são substituídas por grandes complexos fechados e cercados
por segurança em tempo integral. O livre mercado estimula a
especulação imobiliária que transforma indiscriminadamente as
áreas naturais e sua biodiversidade – que deveriam ser
conservadas para a sustentabilidade ambiental local. Por ser
dependente de trânsito motorizado e ter ambientes altamente
mineralizados, esse modelo urbano é altamente poluente (ar,
água e solo) havendo enorme consumo de energia e emissão
de gases de efeito estufa – GEE. (p.54).

3
De acordo com o Artigo 1º da Resolução nº 001, de 23 de janeiro de 1986, do Conselho
Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), Impacto Ambiental é: "qualquer alteração das
propriedades físicas, químicas, biológicas do meio ambiente, causada por qualquer
forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que afetam: A saúde, a
segurança, e o bem-estar da população; as atividades sociais e econômicas; A biota; As
condições estéticas e sanitária ambientais; A qualidade dos recursos ambientais".
O estilo de vida é impactado por esse paradigma urbano. As pessoas,
estimuladas a consumir sempre mais e acostumadas ao conforto oferecido pelos
inúmeros serviços que chegam a elas facilmente nas cidades, já não se veem
parte da natureza. Muitas desconhecem, por exemplo, a produção e a origem do
alimento, consumindo altas quantidades de produtos ultra processados,
prejudicando sua saúde e sem reconhecer a importância dos ecossistemas nisso,
além dos impactos que suas escolhas diárias causam no mesmo.
A vida nos espaços públicos influenciada pelo paradigma urbano baseado
no consumo tem sido reduzida ao simples ir e vir (ao trabalho ou a serviços) dentro
de veículos individuais climatizados artificialmente ou em horas intermináveis em
transportes públicos precários. Mesmo aos que resistem e decidem fazer trajeto a
pé, a cidade não se mostra amigável ao oferecer ambientes inóspitos, quentes,
poluídos e sem atratividade para seus habitantes caminharem, colocando suas
vidas em risco entre os veículos que passam em alta velocidade. Jane Jacobs
aborda este aspecto em sua obra ao afirmar que “a cidade reurbanizada despreza
a função da rua e, com ela, necessariamente a liberdade da cidade” (JACOBS,
1960, p. 52).
A qualidade dos espaços públicos urbanos também é impactada
indiretamente pelas alterações climáticas em escala global e diretamente por
alterações no ambiente em escala local. A ocupação do território por construções,
a atividade industrial e a poluição gerada por veículos e consumo de energia
tornam as cidades grandes emissores de GEE e causadores da mudança
climática nas duas escalas.
No caso do Rio de Janeiro, localizado em região tropical, a concentração
de calor causado pela urbanização intensa, é um dos efeitos mais significativos
sobre a população. A temperatura da região já é naturalmente quente, ao ocupar
o espaço físico intensamente de forma a melhor aproveitá-lo, as habitações
urbanas se aglomeram verticalizadas, em estruturas de concreto e aço impedindo
a circulação adequada de ar e concentrando energia térmica. Somado a isso, há
os veículos com motores à combustão circulando pela cidade, liberando calor e
gases poluentes, além da extensa cobertura do solo urbano por asfalto e concreto
(materiais que absorvem calor) e a baixa porcentagem de áreas verdes. De acordo
com a Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro (2016), 48,6 % do solo do município
é ocupado por áreas urbanizadas.
A intensa atividade geradora de GEE e o alto índice de áreas
mineralizadas, provocam um desequilíbrio ambiental e físico. O balanço de
energia é alterado, provocando uma mudança climática em escala local e fazendo
as temperaturas aumentarem, como é explicado por Lucena et al. (2012) em sua
obra, em que também apresentam mapas sobre a evolução da temperatura da
superfície continental (TSC) na Região Metropolitana do Rio de Janeiro da década
de 1980 à década de 2000 (Fig. 4, 5 e 6).

Figura 4 – Mapa da TSC na RMRJ na década de 1980

Fonte: LUCENA et al. (2012)


Figura 65 -–Mapa
Mapada
daTSC
TSCna
naRMRJ
RMRJna
nadécada
décadade
de1990
1990

Fonte: LUCENA et al. (2012)

6–
Figura 5 Mapa da
- Mapa da TSC
TSC na
na RMRJ
RMRJ na
na década
década de
de 2000
2000

Fonte: LUCENA et al. (2012)

O fenômeno de ilha de calor urbana impacta diretamente a qualidade de


vida urbana, tornando quase impossível uma vida sem climatização artificial,
aumentando ainda mais o consumo de energia e contribuindo para o próprio
fenômeno que se busca mitigar, iniciando-se um ciclo de feedback positivo
(LUCENA et al., 2012). Além disso a saúde mental e física dos habitantes é
prejudicada pela concentração de calor tornando as atividades diárias mais
exaustivas e desgastantes.
As cidades no antropoceno são paisagens transformadas, com uma
remodelação do espaço geográfico natural e sujeitas a diversos problemas
ambientas, de fenômenos climáticos extremos, a enchentes, alagamentos,
deslizamentos, poluição das águas e do ar, entre outros.
De modo a viabilizar a ocupação urbana, o entendimento geral dos
gestores foi de que obras de engenharia tradicional poderiam resolver os
problemas através da supressão dos ecossistemas naturais (HERZOG, 2009). No
entanto, as ações tomadas em nome do melhoramento dessas condições
costumam ser pontuais e não consideram cenários futuros além de não
trabalharem com uma visão sistêmica e ecológica. Por isso, os problemas
enfrentados hoje são agravados quando se leva em conta o cenário global de
mudanças climáticas. As cidades atuais não são resilientes, ou seja, não possuem
a capacidade de se adaptarem e crescerem para sobreviver, não importando que
tipo de estresses e choques venham a experimentar (RIO DE JANEIRO, 2015). O
documento de Estratégia de Adaptação a Mudanças Climáticas da Prefeitura do
Rio de Janeiro aponta que no futuro são esperados dias e noites mais quentes e
verões com intenso aquecimento, além do aumento do período de secas (RIO DE
JANEIRO, 2016).
De maneira geral, o antropoceno é a era das cidades, polos de atração
para a população com grande oferta de trabalho, educação, cultura, lazer,
serviços, tecnologia, habitação e convívio social. Porém, o conflito entre a
urbanização e os ecossistemas naturais traz outros problemas como: baixa
qualidade de vida, problemas de saúde para a população, falta de espaços livres
multifuncionais, eliminação da biodiversidade, perda de identidade, alta poluição,
além de perdas financeiras (HERZOG, 2009).
Os rios e outros cursos d’água, ao longo da História, constituíram
localidades atraentes para as ocupações humanas. Ofereciam acesso à água
potável e eram tidos como pontos de referência na paisagem a ser dominada,
além de facilitarem o transporte, o cultivo de alimentos e a geração de energia.
Com a evolução da urbanização e o crescimento das cidades, no entanto, esse
cenário de valorização dos rios foi invertido. A presença dos corpos d’água nas
cidades foi praticamente reduzida aos problemas associados aos mesmos:
enchentes, esgoto, doenças, mau-cheiro e alagamentos (GORSKI, 2010).
Os rios fazem parte de um complexo sistema de fluxos de energia e
matéria na paisagem, e compõem até mesmo um ecossistema próprio, o
ecossistema fluvial. Um corpo d’agua, nunca pode ser considerado como um
elemento independente, pois faz parte de um sistema em que estão envolvidas
características climáticas, florísticas, morfológicas e geológicas de uma
determinada área (GORSKI, 2010; MIGUEZ, REZENDE e VERÓL, 2015).
Esse território, a bacia hidrográfica, é dotado de declividade, possibilitando
o escoamento das águas e é composto por uma rede de drenagem formada por
um conjunto de cursos d’agua presentes na região, tudo interligado através do
sistema que compõe o ciclo hidrológico (GORSKI, 2010) (Fig. 7).
Com o desenvolvimento das cidades e o avanço da ocupação urbana sem
controle, em especial a partir da Revolução Industrial, o denso tecido urbano
criado alterou os padrões de uso e ocupação do solo interferindo na qualidade do
ambiente. Essas mudanças drásticas de ocupação do solo, aconteceram na
medida em que a urbanização foi se alastrando e substituindo cobertura vegetal,
alagados naturais e outros ecossistemas por áreas construídas e
impermeabilizadas.
As cidades industriais do século XIX padeciam com diversos problemas de
saneamento, mobilidade, habitação e saúde, agravados pelo espaço urbano
compacto e mal planejado. Como resposta a esse cenário, surge o conceito
higienista de drenagem urbana, em que a estratégia é a captação, condução e
descarga rápida de esgoto e águas pluviais com o objetivo de melhorar a
salubridade na cidade (MIGUEZ, REZENDE e VERÓL, 2015). Esse conceito
higienista, perdurou através do tempo, e foi aplicado na maioria das cidades ao
redor do mundo. No Brasil, foi aplicado em especial a partir do início do século
XX, impulsionado pela época de grandes renovações urbanas.
Figura 7 - Representação Simplificada do Ciclo Hidrológico

Fonte: Adaptado e traduzido de UNIVERSITY OF ARKANSAS, 2010, p. 24.

As abordagens higienistas de drenagem, consistiam em medidas para


agilizar o descarte de águas da cidade, por isso, foi comum o uso de intervenções
baseadas na impermeabilização do solo, na canalização e retificação de rios
impermeabilizando seus leitos. Essas drásticas alterações morfológicas nos rios
e em suas bacias, procuravam combater inundações e enchentes para evitar as
temidas epidemias e os miasmas4. As vegetações ciliares, de matas de várzeas e
mangues, importantes ecossistemas para o funcionamento do ciclo hidrológico na

4
Impurezas no ar que se originavam pela proximidade com pessoas e animais doentes, dejetos, e
material orgânico em decomposição. Associadas na época à pântanos e áreas alagadas naturais,
vistas como poluídas e impuras.
paisagem, foram ocupados pela cidade e substituídos por edifícios, calçadas de
concreto e ruas asfaltadas, interrompendo os fluxos naturais da paisagem.
Aliado ao cenário de alteração morfológica, os problemas de saneamento
nas cidades foram responsáveis pela deterioração da qualidade da água dos rios
urbanos. De acordo com Rolnik apud Gorski (2010, p. 62), tendo dificuldade de
acesso às áreas centrais, a população de baixa renda passou a ocupar e expandir
a periferia, invadindo áreas de proteção de mananciais. Assim, a situação de risco
dos rios foi agravada nas questões de erosão, assoreamento e contribuição de
esgoto in natura em suas águas.
O processo de impermeabilização através da redução de vegetação e
expansão de áreas pavimentadas das bacias provocado pela ocupação urbana
(ordenada ou não) aumenta o volume e a velocidade das águas, provocando o
rápido escoamento superficial que dificulta ainda mais a infiltração das águas no
solo, e facilita o carregamento de sedimentos e poluição difusa que contribuem
para o assoreamento e degradação de qualidade das águas dos corpos hídricos.
O processo de poluição difusa se dá quando as chuvas, após captarem a poluição
do ar, varrem a superfície urbana contaminada por lixo, resíduos orgânicos, metais
pesados e sólidos, transportando-os diretamente para os rios (TUCCI, 2003).
A alta impermeabilização interrompe o fluxo hidrológico natural de
escoamento superficial e impede a infiltração e armazenamento de água no solo
e subsolo. Esse processo, aliado à supressão de vegetação e diminuição de
retenções superficiais contribui para o aumento e o adiantamento do volume e
vazão das águas acumuladas nas superfícies urbanas (pico de cheia),
concentrando um grande volume de águas nas tubulações e canais de drenagem
tradicional, que não comportam tamanho volume e extravasam causando
enchentes e inundações.
Em um ambiente não urbanizado, o volume de escoamento não se
acumula, pois, os componentes do ambiente como vegetação, relevo e solo
trabalham em conjunto para interceptar, deter e infiltrar a água de maneira lenta e
distribuída por toda a bacia, fazendo com que o volume de escoamento tenha uma
menor acumulação e seja melhor distribuído ao longo do tempo (Fig. 8) (MIGUEZ,
REZENDE e VERÓL, 2015).
Figura 8 – Gráfico de Volume de Escoamento ao longo do tempo

Fonte: Adaptado de UNIVERSITY OF ARKANSAS, 2010, p. 26.

As canalizações e retificações de rios – alterações morfológicas comuns


no século XX – aumentam o volume de água à jusante rapidamente, causando
grande impacto se revelando uma medida limitada para controlar enchentes e
inundações, ademais, podem gerar custos insustentáveis para se tornarem
efetivos. (BOCHI 2013; TUCCI, 2003)
O fenômeno de ilhas de calor, agravado pelas mudanças climáticas, pode
contribuir ainda mais para o aumento dos picos de cheia. O ar superaquecido da
ilha de calor formada sobre a cidade aumenta a evaporação local, facilitando a
formação de intensas chuvas convectivas, que aliadas à impermeabilização da
bacia e supressão da vegetação causam fortes e impactantes cheias urbanas,
gerando diversos prejuízos para a cidade, a exemplo das chuvas ocorridas do
início de abril de 2019, na cidade do Rio de Janeiro (Fig. 9). No entanto, Bonilha
(2012 apud GORSKI, 2010) destaca que enchentes são processos naturais do
ciclo hidrológico, mas que inundações são resultantes do processo da
urbanização e ocupação do solo.

Figura 9 – Carros debaixo d'água na Rua Jardim Botânico, Rio de Janeiro

Fonte: Portal G1 - Reprodução/Redes sociais


Em resumo, os impactos da ação antrópica de contaminação das bacias
hidrográficas se dão tanto por vias diretas – despejo de efluentes domésticos e
industriais –, quando por vias indiretas – remoção de vegetação ripária,
construções irregulares e poluição difusa, entre outros – sendo fontes de
degradação dos rios. A precariedade do saneamento básico, alterações
morfológicas nos cursos d´água e na bacia, e outras intervenções estruturais
resultam em rios degradados e desqualificam a paisagem fluvial urbana (GORSKI,
2010).
Os rios urbanos deteriorados e sua ruptura de relação com as cidades,
causaram um desligamento afetivo dos mesmos com o espaço urbano. O aspecto
de depreciação associado aos corpos d’água urbanos relegou sua dimensão
cultural nas cidades contemporâneas (GORSKI, 2010).
No entanto, é notável que a partir do fim do século XX há uma crescente
busca pela recuperação dos corpos d’água degradados e uma mudança no
modelo de abordagem para com a drenagem urbana (GORSKI, 2010; REZENDE,
2018). É considerado que uma nova fase de abordagem sobre as águas urbanas
se inicia após 1990, a de Desenvolvimento Sustentável. Esta fase é caracterizada
pelo tratamento do escoamento pluvial, preservação do sistema natural e
integração institucional, permitindo uma melhoria na conservação ambiental e na
qualidade de vida além do controle de inundações (TUCCI, 2005 apud REZENDE,
2018).
O cenário baseado na rápida e simples retirada de água das áreas
impermeabilizadas, por meio de canalizações, se apresenta insustentável e uma
nova visão passou a ser buscada, focando principalmente em medidas
relacionadas ao controle de inundações. Surge então a chamada abordagem
ecossistêmica, onde predomina um pensamento de gerir o ambiente natural e o
construído, entendendo-os como componentes dependentes e interligados, partes
do mesmo sistema. (MIGUEZ, REZENDE e VERÓL, 2015).
A água passou a ser tema de discussão em vários eventos mundiais
(GORSKI, 2010), e novas medidas de baixo impacto passaram a ser adotadas ao
redor do mundo, principalmente em países desenvolvidos, com o intuito de
recuperar os rios degradados. Medidas como o LID (Low Impact Development) ou
o BMP (Best Management Practices) passaram a fazer parte do cenário de
planejamento hidrológico urbano e a resgatar a conexão entre as cidades e os
rios. Essas medidas passam a tentar reproduzir as condições do ciclo hidrológico
natural (pré-ocupação), adaptando-as ao ambiente construído, usando de
estruturas de controle pluvial em pequenas unidades ao longo da bacia
hidrográfica de um rio. Além disso, buscam contribuir sempre que possível para a
melhora da qualidade ambiental e da qualidade de vida urbana (MIGUEZ,
REZENDE e VERÓL, 2015).
Há, portanto, um processo de reconciliação das cidades com seus rios,
resgatando-os do estado de degradação e do esquecimento cultural. Os rios estão
cada vez mais sendo protagonistas do processo de planejamento urbano e sendo
estruturadores para a revitalização das cidades. Até mesmo para o mais
degradado dos rios urbanos há potencial para renascimento e para reconectar
populações urbanas com esta hidrologia natural. (BEATLEY, 2011)
As cidades no Antropoceno se desenvolveram de maneira afastada dos
sistemas naturais que dão suporte à vida no planeta. Vêm se construindo e se
produzindo em escalas cada vez maiores e sem considerar os limites planetários.
As consequências sendo sentidas, e as previsões para as próximas décadas são
sempre muito alarmantes. Além disso, a vida nas cidades sujeita seus habitantes
a impactos negativos na saúde mental e física, e tende a coloca-los em uma
espécie de bolha artificial sem reconhecer o funcionamento natural do planeta.
Cidades são ecossistemas abertos onde a atividade humana ocorre e
fluxos naturais bióticos e abióticos acontecem (HERZOG, 2013). Humanos e
natureza não podem ser tratados de maneira separada, uma vez que o
desenvolvimento de uma sociedade, sua sobrevivência e os objetivos de
conservação, dependem uns dos outros.
Há um reconhecimento crescente da necessidade de um contato direto e
diário com a natureza, e que é possível uma sociedade se desenvolver
economicamente enquanto tem sucesso na conservação da natureza. Como uma
resposta a esse cenário, vem sendo cada vez mais explorado na literatura
específica, uma vertente de pesquisas e estudos que oferecem uma nova
abordagem de urbanismo, em que se propõe que a relação entre natureza e a
cultura humana pode ser estreitada através do planejamento urbano (HERZOG,
2016). O conceito de Cidades Biofílicas (BEATLEY, 2011) com Soluções
Baseadas na Natureza se mostra uma alternativa de um novo paradigma urbano
condizente com as necessidades das cidades contemporâneas.
O termo “biofilia” foi popularizado pelo mirmecologista e sociobiólogo de
Harvard, Edward O. Wilson (1993) e é definido pelo mesmo como: “a ligação inata
emocional dos seres humanos com outros organismos vivos. Inato pois é
hereditária e, desse modo, parte da mais profunda natureza humana”5. Wilson
apud Beatley e Newman (2013) também diz que ao co-evoluir com a natureza, a
parte ancestral do cérebro humano sente a necessidade de se conectar e se afiliar
a natureza para ser saudável e feliz.
A partir desse conceito é possível aplica-lo a uma abordagem urbana,
lançando um novo olhar sobre os espaços verdes urbanos. Para os organizadores
do Projeto Biophilic Cities, liderado por Timothy Beatley, professor do

5
Tradução do autor
Departamento de Planejamento Urbano e Ambiental da Universidade de Virgínia,
uma “cidade biofílica” é definida da seguinte forma:

“Cidades Biofílicas reconhecem a importância do


contato diário com a natureza como um elemento de uma vida
urbana significativa, além da responsabilidade ética que as
cidades têm de preservar a natureza global sendo um habitat
compartilhado para vidas não-humanas e pessoas.” (THE
BIOPHILIC CITIES PROJECT, 2019)

Complementando a definição do que é uma cidade biofílica, Beatley


escreve em sua obra:

“[...] é uma cidade que coloca a natureza em primeiro


lugar no seu projeto, planejamento e gerenciamento; que
reconhece a necessidade essencial de contato humano diário
com a natureza assim como os muitos valores ambientais e
econômicos providenciados pela natureza e os sistemas
naturais.” (BEATLEY, 2011, p. 45)6

No entanto, Beatley (2011) destaca que não há uma definição única ou


definitiva do que de fato é uma cidade biofílica ou como ela se parece. Mas que,
na verdade, uma cidade biofílica pode ser identificada muito mais pelo nível de
engajamento dos seus cidadãos em atividades diárias para cuidar e desfrutar da
natureza que por sua aparência física, ou pela quantidade de área verde que
possui.
Sendo assim, entende-se que uma cidade biofílica é aquela que no seu
planejamento e em seu funcionamento entende, valoriza e trabalha em conjunto
com a biodiversidade e os processos ecológicos naturais da paisagem procurando
os inserir nas suas ruas, edifícios e na sua vida urbana, e na qual seus habitantes
são diariamente e ativamente envolvidos com a natureza presente.
Inserir os processos naturais da paisagem em seu planejamento e
mimetizar a natureza inserindo elementos multifuncionais em seus espaços deve
ser prioridade para o desenvolvimento sustentável biofílico de uma cidade. Nessa
estratégia surge o conceito de Soluções Baseadas na Natureza (SbN), como uma
série de abordagens que propõem introduzir a natureza e seus serviços em
contextos urbanos.
Apesar de cada vez mais comum, o conceito de Soluções Baseadas na
Natureza (SbN) não possui uma definição clara na literatura. Diversos autores
usam o termo sob diversas interpretações e voltado a diversas áreas como
agricultura, urbanismo e até mesmo design industrial. Assim, o termo SbN pode

6
Tradução do autor
ser considerado como um conceito guarda-chuva para todas as aplicações
relacionadas ao capital natural e de “aprendizagem com a natureza” (BARTON,
2016; POSTCHIN et al., 2016).
A União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) define as
SbN como ações para proteger, gerenciar de forma sustentável e restaurar
ecossistemas naturais ou modificados que abordam os desafios sociais de forma
eficaz e adaptável, simultaneamente provendo bem-estar humano e benefícios
para a biodiversidade (COHEN-SHACHAM et al., 2016). A IUCN destaca que as
SbN não apenas almejam resolver problemas ou impactos ambientais, mas que
também abordam explicitamente desafios sociais. A IUCN ainda define os
seguintes princípios para intervenções de SbN:

1. A intervenção entrega uma solução efetiva para um desafio


global usando natureza.
2. A intervenção fornece benefícios de biodiversidade em
termos de ecossistemas diversos e bem manejados.
3. A intervenção possui melhor custo-benefício em relação a
outras soluções.
4. A intervenção deve ser facilmente e convicentemente
compreendida.
5. A intervenção pode ser medida, verificada e replicada.
6. A intervenção respeita e reforça os direitos das
comunidades sobre os recursos naturais.
7. A intervenção busca fontes públicas e privadas de
financiamento. (IUCN, 2012, p. 24-25)

Já de acordo com a Comissão Europeia (CE), SbN são ações inspiradas,


sustentadas ou copiadas da natureza, que usam o complexo sistema de
processos desta – como a habilidade de sequestrar carbono ou regular a
temperatura e o fluxo de água – para alcançar resultados desejados, tais como
redução de riscos de desastres, melhoria do bem-estar humano e
desenvolvimento socialmente inclusivo sustentável. As SbN abordam demandas
ou desafios específicos, enquanto buscam maximizar outros benefícios
ambientais, sociais e econômicos (CE, 2015). Esta definição se mostra mais
adequada para este trabalho, já que é mais relacionada com as interpretações na
área de desenvolvimento e planejamento urbano.
O conceito de SBN está enraizado em diversos outros conceitos que
reconhecem a importância da natureza e exigem uma abordagem sistêmica sobre
o funcionamento dos ecossistemas e a atividade humana, mas é principalmente
fundamentado no conceito de Serviços Ecossistêmicos e de Infraestrutura Verde.
(BARTON, 2016).
O conceito de SbN se mostra como uma forma de aumentar a percepção
da sociedade sobre os serviços que a natureza presta, os chamados Serviços
Ecossistêmicos. De maneira simples, Serviços Ecossistêmicos são os serviços
que o os ecossistemas oferecem para manter a vida na Terra (HERZOG, 2013).
De acordo com a inciativa internacional The Economics of Ecosystems and
Biodiversity (TEED), que define o termo como os benefícios que as pessoas obtêm
dos ecossistemas, os serviços ecossistêmicos podem ser divididos em quatro
categorias: provisão, regulação, de suporte, e cultural. Provisão se relaciona a
tudo que é essencial para a vida, em termos de matéria ou energia, tais como
alimentos, água e matéria prima. Regulação são os serviços que regulam a
qualidade do ar, água e solo, como por exemplo o sequestro de carbono e a
polinização. De suporte ou do habitat são os serviços que provêm habitats para a
vida, e relacionados à diversidade genética. Por fim, os serviços culturais são
aqueles que incluem todos os benefícios não materiais obtidos do contato com
ecossistemas, tais como recreação, turismo, apreciação estética e experiências
espirituais (TEEB, 2011).
O termo Infraestrutura Verde foi introduzido por Benedict e McMahon, em
sua publicação com esse mesmo nome em 2006, e se refere à vegetação e a
dinâmica da água em espaços urbanos. A Infraestrutura Verde compreende a
cidade como um sistema sócio-ecológico aberto e propõe uma rede interligada de
espaços vegetados ou permeáveis, conectados por corredores verdes
(vegetação) e/ou azuis (água), sob a ideia básica de mimetizar o que ocorre em
paisagens naturais, trabalhando sempre com uma visão sistêmica e
multifuncional. A infraestrutura verde pode ser um fator chave para as cidades
desenvolverem resiliência frente aos desafios e incertezas dos impactos da
mudança climática (HERZOG, 2013, 2016). Podem atuar na prevenção de
enchentes, regulação de temperatura, produção de alimentos, melhora da saúde
da população, aumento da biodiversidade entre outros.
Através das definições expostas é possível constatar que estes conceitos
ainda estão em desenvolvimento e suas definições podem ter diferenças de
acordo com a literatura consultada, e podem inclusive se mesclar. Entretanto,
como fundamento em comum, todos eles se baseiam na natureza, de maneira
geral, em suas abordagens e que objetivam a melhoria dos ambientes urbanos de
qualidade de vida de seus habitantes.
As tipologias de SbN podem ser diversas: espaços verdes e permeáveis,
telhados verdes, corredores verdes, alagados construídos, jardins de chuva,
biovaletas, pavimentos porosos, e ruas verdes. Essas tipologias trabalham em
contraste com as abordagens tradicionais de engenharia cinza, como estradas ou
grandes reservatórios para reter água da chuva.
Uma tipologia chave e simbólica das SbN e Infraestrutura verde, e que
oferece diversos serviços ecossistêmicos são as árvores. Em uma cidade, a
arborização urbana provê serviços como a regulação de temperatura, a filtragem
do ar, o embelezamento, a interceptação de água da chuva, a retenção de
poluentes e até influenciam na economia ao valorizar seu entorno (Fig. 10).
Arborizar a cidade é uma prática biofílica e oferece soluções baseadas na
natureza.

Figura 10 - Exemplos de Serviços Ecossistêmicos oferecidos pela Arborização Urbana

Fonte: Adaptado de Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação. Benefits of
urban trees. Disponível em: <http://www.fao.org/3/a-c0024e.pdf> Acesso em: 22/06/2019

O conceito de cidades biofílicas e de SbN se mostra de grande importância


diante do cenário atual de mudança climática que põe em risco os assentamentos
urbanos. As SbN podem ser uma eficiente abordagem para aumentar a resiliência
urbana, já que trabalha com multifuncionalidade e redundância, além de ser um
processo adaptativo, permitindo absorção de diversos impactos e melhorando a
partir deles. É necessário que os ecossistemas sejam incorporados ao
planejamento urbano, o que pode inclusive influenciar em mudanças positivas
economizando o orçamento municipal, impulsionando o comércio local e
melhorando a qualidade de vida (TEEB, 2011).
Não faltam ferramentas ou estratégias para reintroduzir a natureza no
espaço urbano e transformar cidades problemáticas em cidades biofílicas. Há
oportunidades de pequenas a grandes escalas: podem ser uma grande área
alagável em um parque, ou um simples telhado verde de um edifício em bairro
residencial (BEATLEY, 2011).
A reconexão das cidades com o ecossistema do qual fazem parte é cada
vez mais reconhecida como necessária para qualidade de vida e saúde dos seus
habitantes. É também um caminho para se atingir os Objetivos do
Desenvolvimento Sustentável (ODS) traçados pela ONU em 2015 para a Agenda
2030, onde 8 dos 17 objetivos estão relacionados com benefícios que as SbN
podem oferecer (ONU, 2015; SAFATLE, 2017).
Considerando os desafios do futuro para as cidades, o investimento em
biodiversidade a partir de uma abordagem biofílica baseada na natureza se mostra
como uma interessante alternativa resiliente para supera-los e se alcançar a
sustentabilidade urbana através de um ambiente cheio de natureza que seja
enriquecedor para todos.

A ocupação das terras para urbanização, agricultura e infraestruturas


provocou um impacto notável sobre o funcionamento das águas urbanas,
especialmente considerando-se a propagada aplicação de canalizações e
retificações de rios no passado (BATTEMARCO et al., 2015) feita pela abordagem
tradicional de drenagem, além do extenso selamento do solo urbano pela própria
urbanização, impedindo o armazenamento e a infiltração das águas naturalmente.
Historicamente, os engenheiros tentaram solucionar o problema da perda do
armazenamento de água no sistema natural, através do aumento da velocidade
de escoamento utilizando, por exemplo, as obras de canalização mencionadas
(CANHOLI, 2014).
Diante desse quadro de degradação, vem se tornando cada vez mais
importante a preservação dos sistemas naturais remanescentes e a restauração
dos ambientes degradados (CARDOSO e BAPTISTA, 2013). Neste contexto, as
razões para avançar nesta discussão podem partir de questões ambientais
(biodiversidade e valorização da natureza), socioculturais (qualidade de vida) e
socioeconômicas (MIGUEZ, REZENDE e VERÓL, 2015), sendo necessária uma
abordagem diferente da engenharia tradicional de drenagem urbana.
São diversos os termos usados, por vários autores, para tratar da melhoria
dos rios: requalificação, renaturalização, criação, reabilitação, remediação,
revitalização, melhoria, preservação, entre outros (BATTEMARCO et al., 2015).
No entanto, o termo requalificação é adotado neste trabalho a partir do
entendimento da obra de Miguez, Rezende e Veról (2015, p. 176) de que
requalificação transmite a ideia de passar de uma situação degradada para uma
melhor, e por não propor necessariamente uma volta ao estado original do rio,
considerando as condições naturais e antropizadas do local. Requalificação
fluvial, portanto, funciona como um conceito que engloba diversas outras
abordagens de recuperação de rios, conforme demonstrado pelo esquema (Fig.
11).

Figura 11 – Diferenças entre termos e definição de requalificação fluvial

Fonte: Adaptado pelo autor a partir de RUTHERFURD et al., 2000 apud. MIGUEZ, REZENDE e
VERÓL, 2015. p. 176

Uma proposta de requalificação fluvial, trata diretamente sobre o estado


de qualidade de um rio e para defini-la são considerados diversos elementos
interconectados “em que se destacam a hidrologia e a avaliação do
comportamento hidráulico do canal, a morfologia, a qualidade da água e a
presença de ecossistemas fluviais saudáveis, sendo estes últimos, uma
consequência dos outros itens” (VERÓL, 2013).
Em um contexto não urbano, uma requalificação fluvial pode simplesmente
significar uma restauração do corredor fluvial ao tratar, principalmente, do
replantio da vegetação ripária removida pela ação humana. Já em ambientes
urbanos consolidados, com a artificialização da bacia muito intensa, o corredor
fluvial não seria sustentado, mesmo que fosse possível restaurar a vegetação
ripária (VERÓL, 2013).
É necessário encontrar um ponto de equilíbrio entre a cidade e o rio, ambos
em um melhor estado de qualidade ambiental. Dufour e Piégay (2009) apud
Miguez, Rezende e Veról (2015), defendem que uma Requalificação Fluvial
Urbana deve resultar de uma combinação entre um estado desejado (o que se
quer) e o potencial funcionamento (o que se deseja), ou seja, deve-se adequar a
requalificação fluvial com o que se é possível fazer de acordo com cada situação.
Os rios podem ser considerados como a síntese dos territórios a ele
conectados (CIRF, 2006, p. 23). Sendo assim, em uma RFU o rio não pode ser
dissociado de sua respectiva bacia hidrográfica, já que as ações aplicadas nesta
impactam aquele. Ambos fazem parte da paisagem urbana ou rural e, por isso,
são parte do mesmo sistema de processos ecológicos que condicionam o ciclo
das águas. Portanto, para uma efetiva RFU, é indispensável reconhecer a bacia
hidrográfica como uma unidade espacial paisagística, e assumi-la também, como
unidade de gestão (GORSKI, 2010).
Desse modo, uma requalificação fluvial, se vista de maneira simplista como
uma técnica, pode exigir que sejam feitas alterações no território e uma extensa
reorganização em termos de ocupação do solo. Em um cenário altamente
urbanizado e fortemente consolidado, isso poderia significar uma inviabilização da
ideia. No entanto, a requalificação, neste caso, deve ser entendida com uma
abordagem multidisciplinar, não apenas como uma técnica a ser aplicada em um
corpo d’água, mas como uma estratégia a ser aplicada em toda a bacia, com o
objetivo de melhorar a condição do rio. Neste contexto, prioriza-se trabalhar com
uma lógica de ação distribuída pela bacia hidrográfica do rio, controlando os
escoamentos pluviais na fonte de modo a sustentar o conceito de requalificação
fluvial.
Ao tratar das técnicas possíveis de serem utilizadas é reconhecido que um
projeto de drenagem urbana, incluindo a requalificação fluvial tanto para o controle
de cheias e eventos extremos, quanto para o controle da qualidade ambiental do
rio, deve prever medidas estruturais e medidas não estruturais (CANHOLI, 2014).
As medidas estruturais são técnicas e intervenções consideradas de controle
feitas diretamente sobre as calhas dos rios ou na paisagem urbana, como
canalizações e criação de reservatórios. Dividem-se em extensivas quando
possuem ação sobre a bacia, e intensivas quando possuem ação direta sobre os
rios e canais. Já as medidas não estruturais são ações indiretas, como legislação
urbana, zoneamentos e educação ambiental, possuindo um caráter mais
preventivo (CANHOLI, 2014; MIGUEZ, REZENDE e VERÓL, 2015). O Quadro 1
apresentada a seguir oferece um melhor entendimento sobre a classificação de
medidas estruturais e não estruturais.

Quadro 1 – Classificação de medidas para o controle de inundações.

Fonte: Adaptado pelo autor a partir de SIMONS, 1977 apud. MIGUEZ, REZENDE e
VERÓL, 2015. p. 107
Para a aplicação dessas medidas em ambientes urbanizados, diante da
ineficiência do sistema de drenagem tradicional baseado na simples e rápida
remoção de água das áreas impermeabilizadas (velocidade de escoamento), é
importante pensar em um novo sistema de manejo das águas pluviais na bacia
para o sucesso de uma RFU. Especialmente na busca de uma cidade mais
biofílica, é necessário pensar em abordagens ecossistêmicas, baseadas na
natureza, e que considerem igualmente objetivos ecológicos, econômicos e
sociais. Trata-se de uma adaptação da cidade de modo a melhorar as funções
ecológicas ou até restaura-las. Quando considerados, de maneira geral, os
ecossistemas no planejamento urbano ou de drenagem, “é menos provável que
as ações possam prejudicar o próprio ecossistema ou a saúde humana”
(ONTARIO, 1993)7.

7
Tradução do autor
Muitos conceitos foram criados para designar os conjuntos de técnicas de
drenagem urbana que consideram os aspectos ecológicos ou que propõem
soluções baseadas na natureza. Entre esses, destaca-se para este trabalho o
conceito de LID – Low Impact Development (Desenvolvimento de Baixo Impacto),
pois, segundo a publicação da University of Arkansas (2010), oferece técnicas de
engenharia leve, e baseadas em vegetação, para recuperar ou sustentar o regime
hidrológico original, antes do desenvolvimento urbano de uma região. A proposta
do LID é, em oposição ao sistema convencional de escoamento, remediar “o
escoamento superficial poluído através de uma rede de paisagens de tratamento
distribuídas” (UNIVERSITY OF ARKANSAS, 2010, p. 22)8.
Um dos mais significativos problemas enfrentados pelos rios urbanos, é a
poluição difusa, como já mencionado, podendo ser atribuída em parte a falhas nos
sistemas de coletas de esgoto, e em parte à poluição carreada pelo escoamento
em superfícies impermeabilizadas na paisagem urbana. Segundo University of
Arkansas (2010), os sedimentos depositados sobre as superfícies das bacias
urbanas e carregados pela chuva para os rios, são extremamente poluentes
contendo resíduos de hidrocarbonetos, óleos, gasolina, fluidos mecânicos,
partículas asfálticas, metais pesados, entre outros. A mesma publicação afirma
que o escoamento da primeira hora de uma chuva “possui um índice de poluição
maior que o de esgoto in natura” (p. 26)9.
Com este cenário, a proposta desta abordagem para a drenagem urbana
é significativa, uma vez que a abordagem tradicional não consegue solucionar
esses problemas. Além da proposta de reduzir o índice de poluição do
escoamento urbano, o LID ainda propõe trabalhar com os princípios de
redundância, resiliência e distribuição, com tipologias aplicáveis em diversas
escalas – edifícios, lote, ruas e espaços abertos – com técnicas de infiltração,
retenção, detenção, filtração e tratamento. Abaixo são listadas algumas tipologias
de equipamentos propostos pela abordagem LID (UNIVERSITY OF ARKANSAS,
2010):
• Reservatórios em Lote
• Paredes/Tetos vegetados
• Jardins de Chuva
• Pavimentação Permeável

8
Tradução do autor
9
Tradução do autor
• Biovaletas
• Canteiros Pluviais
• Lagoas de Retenção e Detenção
• Caixa de Árvore Filtrante
• Tubulação Superdimensionada
Destaca-se ainda, além das tipologias da abordagem LID, a preservação
e a recuperação de áreas vegetadas no tecido urbano. Dado o potencial da
vegetação de reter, filtrar e absorver água pluvial, além da capacidade de liberar
grande parte através da evapotranspiração, áreas verdes e a arborização urbana
são ferramentas de elevada importância para uma RFU, caracterizadas como
medidas estruturais extensivas (MIGUEZ, REZENDE e VERÓL, 2015, p. 107).
Dentro das questões socioculturais do tema, para a RFU ter sucesso em
sua aplicação, também é fundamental a reconexão dos cidadãos com o rio. O que
hoje é um elemento indesejado ou ignorado na paisagem deve passar a resgatar
uma memória afetiva, e ser adotado pela comunidade envolvida. Os rios sempre
fizeram parte da história das cidades, ajudando a definir as características
socioeconômicas e espaciais das mesmas (GORSKI, 2010).
Posto este contexto sobre o tema deste capitulo, este trabalho se estrutura
sobre o quadro conceitual que uma efetiva Requalificação Fluvial Urbana deve
sempre tomar a bacia hidrográfica urbana como unidade básica de planejamento
e referência, deve valorizar e integrar a comunidade no processo e deve ter uma
abordagem ecossistêmica para restaurar os fluxos naturais da região no
gerenciamento de águas pluviais. Além disso é importante que as soluções
propostas combinem abordagens ecossistêmicas com as abordagens tradicionais
para um funcionamento efetivo das intervenções na drenagem urbana em busca
de melhores resultados para o ambiente natural e construído.

O deslocamento a pé é a forma mais importante usada pelos brasileiros


para circular nas cidades (VASCONCELLOS, 2017). A prática de se andar a pé é
fundamental para a vitalidade dos espaços públicos e para uma cidade ativa e
sustentável. Segundo o arquiteto Richard Rogers:
A cidade compacta – com empreendimentos agrupados
em torno de transporte público, áreas para caminhar e andar de
bicicleta – é a única forma de cidade ambientalmente
sustentável. Entretanto, para um aumento da densidade
populacional e para uma expansão das áreas para caminhar e
pedalar, a cidade deve aumentar a quantidade e qualidade dos
espaços públicos agradáveis, bem planejados e, na escala do
homem, sustentáveis, saudáveis, seguros e cheios de vida.
(ROGERS, 2013 apud GEHL, 2013, prefácio, tradução nossa)

Com o desenvolvimento e o adensamento das cidades, aliado à massiva


presença e foco dado aos veículos automotores, as cidades foram aos poucos
deixando grande parte de seu espaço público com baixa qualidade, não
atendendo a real divisão da demanda por modal, negligenciando assim os
pedestres e privilegiando a circulação em veículos particulares movidos à
combustíveis fósseis (MALATESTA, 2017). A influência de ideologias dominantes,
em especial o pensamento moderno no planejamento urbano, com a proposta de
setorizar a cidade e aumentar a eficiência através do uso do automóvel criou
espaços urbanos pouco favoráveis aos próprios habitantes das cidades, enquanto
que as forças do mercado e tendências arquitetônicas fizeram dos edifícios
elemento isolados, autossuficientes e indiferentes à vida da cidade (GEHL, 2013).
Em seu trabalho, Jan Ghel e Brigitte Svarre (2018, p. 2) definem espaço
público como “ruas, becos, edifícios, praças, frades (obstáculos verticais
delimitantes) ou balizas, tudo o que possa ser considerado parte do ambiente
construído”. E complementam explicando que a vida nesse espaço é tudo o que
acontece entre as edificações, no caminho para escola, nas calçadas, com
pessoas caminhado, pedalando ou apenas sentadas.
Em 1961 a jornalista americana Jane Jacobs, publicou pela primeira vez
seu livro, Morte e Vida das Grandes Cidades (JACOBS, 2014), onde falava sobre
seu bairro em Nova York, e evidenciava o prazer de se apreciar a vida nas
cidades, que chamava de “o balé da rua”, e como o aumento drástico de
automóveis espremia essa vida para fora do espaço urbano. Sua obra foi
fundamental para que a década de 1960 fosse marcada pelo início da mudança
de pensamento sobre o planejamento das cidades, acumulando conhecimento
sobre o tema de vida nas cidades e aprofundando a discussão. Aconteceu um
distanciamento dos ideais do planejamento moderno. Além disso, especialmente
seguindo o aumento de automóveis na década de 1960, nas décadas após a obra
de Jacobs, houve um correspondente desenvolvimento no planejamento de
tráfego urbano, com introdução de moderação de tráfego e segurança no trânsito
(GEHL, 2013).
A caminhabilidade e a qualidade e vitalidade dos espaços públicos não
dependem necessariamente um do outro, porém estão intimamente conectados.
Por isso, neste trabalho a abordagem dos dois temas é conjunta. Criar espaços
públicos de qualidade é um grande avanço para se ter uma cidade caminhável, e
vice-versa.
O trabalho do urbanista Jan Gehl é referência neste tema. Assim, é difícil
falar de vida no espaço urbano sem recorrer a ele diversas vezes. Em seu livro de
2013, Gehl inicia criticando a falta da dimensão humana no planejamento urbano,
e que as ideologias dominantes – influenciadas pelo modernismo – não
priorizaram o espaço público. Ele diz:

O rumo dos acontecimentos não só reduziu as


oportunidades para o pedestrianismo como forma de
locomoção, mas também deixou sitiadas as funções cultural e
social do espaço da cidade. A tradicional função do espaço da
cidade como local de encontro e fórum social para os moradores
foi reduzida, ameaçada ou progressivamente descartada.
(GEHL, 2013, p. 3)

A construção de grandes obras viárias – como pontes, viadutos e


alargamento de vias – inibem a conectividade espacial, e comumente provocam a
perda de urbanidade e vitalidade de certas áreas nas cidades. (MONTEIRO,
GUEDES e MACHRY, 2017). A priorização de mais vias para veículos, em uma
tentativa de aliviar a pressão do tráfego urbano, apenas causa mais tráfego de
veículos, de maneira que a única solução para diminuir o tráfego é diminuir a
quantidade de vias ou aumentar o custo para usá-las (SPECK, 2017).
Mas, apesar de geralmente causada por obras viárias, a perda de
vitalidade urbana pode ser influenciada pela permeabilidade e aspecto das
fachadas, por longas distâncias, escalas irregulares, obstáculos, falta de conforto,
falta de equipamentos públicos, falta de arborização, clima e falta de segurança
(GEHL, 2013).
As cidades passaram a maltratar seus habitantes no espaço público. Os
pedestres têm que lidar com espaço limitado, ruídos, poluição, obstáculos,
insegurança, calor e espaços monótonos em seu dia a dia. Em cidades de países
emergentes, como o Brasil, as informalidades que tomam conta do espaço urbano
ainda contribuem para a piora de sua qualidade. Mesmo que por vezes contem
com calçadas generosas, é comum ver obstáculos – geralmente veículos – se
apropriando dos espaços dos pedestres, ou o próprio trânsito intenso oferecer
condições inseguras de travessia ou caminhada junto às vias (Fig. 12).
Figura 12 - Espaços urbanos inadequados em Botafogo e no Rio Comprido

Fonte: Acervo pessoal do autor

Gehl (2013) ainda destaca que é necessária um maior enfoque na


dimensão humana nos planejamentos urbanos, que o reforço das áreas de
pedestres como política pública é necessário para alcançar os quatro objetivos
definidos pelo mesmo; de se obter cidades vivas, seguras, sustentáveis e
saudáveis.
A locomoção na cidade pode influenciar na saúde de seus habitantes,
sendo o meio de transporte considerado um dos determinantes sociais da saúde
pela OMS (WHO, 2011). Priorizar os automóveis nas cidades estimula uma vida
sedentária entre sua população, que opta pelo transporte individual no lugar de
caminhadas ou do ciclismo. Isso pode aumentar o risco de doenças como
hipertensão arterial, diabetes, obesidade e transtornos mentais (LEDERBOGEN
et al., 2011 apud VERAS, DOMENICO e MARQUES, 2017; WHO, 2011). A
alternativa a esse impacto negativo é o incentivo ao transporte ativo, incluindo a
caminhada e o transporte não motorizado na rotina dos habitantes, se tornando
uma forma de exercício físico que reduz as doenças mencionadas anteriormente.
(VERAS, DOMENICO e MARQUES, 2017).
Uma cidade torna-se viva, quando há abundância de atividades sociais e
culturais, que convidam os habitantes a caminhar, pedalar e permanecer nos
espaços públicos. A cidade segura é a que estimula a atividade e a permanência,
aumentando o sentimento de segurança nos espaços públicos. São os “olhos da
rua” descritos por Jane Jacobs (2014). Em uma cidade sustentável a mobilidade
sustentável – a pé, de bicicleta ou transporte público – é priorizada e se torna
atrativa, beneficiando a economia e o meio ambiente. Por fim, uma cidade
saudável intensifica o caminhar ou pedalar como um fenômeno natural integrado
à rotina diária de seus habitantes, sendo uma política de saúde combatendo o
sedentarismo (GEHL, 2013, p. 6-7).
Para Speck e sua “Teoria Geral da Caminhabilidade”, a caminhada
adequada deve atender a quatro condições principais: ser proveitosa, segura,
confortável e interessante. Condições explicadas a seguir, de acordo com sua
obra (SPECK, 2017, p. 20-21):
• Proveitosa: significa que a caminhada deve atender às
necessidades do morador tendo os serviços e aspectos da vida
cotidiana distribuídos a seu favor.
• Segura: a rua deve ser aproveitada de modo a oferecer proteção
aos pedestres contra os automóveis, fazendo aqueles se sentirem
seguros.
• Confortável: Speck descreve que as ruas, formadas por edifícios e
sua paisagem, devem ser como “salas de estar ao ar livre”,
ambientes que atraiam os pedestres.
• Interessante: os edifícios ao longo da calçada devem ser
singulares, agradáveis e ter sinais de humanidade. Gehl (GEHL,
2013) destaca o importante papel das fachadas que se relaciona
com o discurso de Speck.
Um contraponto interessante às condições de Speck, em especial em
relação à segurança, é o que a ferramenta elaborada pelo ITDP Brasil (2018), o
Índice de Caminhabilidade ou iCam, levanta. O iCam é composto por 15
indicadores divididos em 6 categorias: Segurança Viária, Atração, Calçada,
Ambiente, Mobilidade e Segurança Pública.
Em sua obra, Speck (2017) apenas relaciona segurança em relação à
proteção ao pedestre contra os veículos, já a ferramenta iCam (ITDP BRASIL,
2018) separa segurança em dois aspectos: Viária e Pública. A primeira fala em
relação aos veículos e travessias, assim como Speck. Já a segunda aborda
questões de sensação de segurança e número de ocorrências, considerando a
iluminação dos espaços e fluxo de pedestres. Por isso, a ferramenta do iCam se
mostra mais adequada quando considerada a realidade das cidades brasileiras,
onde há uma profunda desigualdade social.
Por fim, para o melhoramento dos espaços da cidade em que a vitalidade
urbana é comprometida, o ponto de partida deve ser a consideração da dimensão
humana no planejamento. O desenho das cidades deve começar a partir das
pessoas. Ao oferecer um melhor espaço urbano, faz-se um convite às pessoas, e
seu uso aumenta, sendo aplicável desde grandes espaços públicos, calçadas até
para um único banco de praça (GEHL, 2013).
Criar espaços públicos de qualidade, que convidem os habitantes a optar
pelo transporte ativo integrado a um bom sistema de transporte público, ocupar a
rua e ter uma vida urbana intensa na escala do pedestre, é uma eficiente maneira
de planejar as cidades para responder aos desafios do século XXI.
Figura 13 - Foto aérea do Rio Comprido e região.

Fonte: Google Earth, 2019


A sub-bacia hidrográfica do rio Comprido (Fig. 13 e 14) possui cerca de 5,5
km² de área e se localiza na Zona Norte da Cidade do Rio de Janeiro, na Área de
Planejamento 1 (AP1). A sub-bacia pertence à Bacia do Canal do Mangue, que
possui aproximadamente 43,2 km² e abrange bairros como Rio Comprido, São
Cristóvão, Tijuca, Maracanã, Estácio, Vila Isabel, Andaraí, Grajaú, Praça da
Bandeira, entre outros.

Figura 14 - Mapa de Localização da Bacia Hidrográfica

Fonte: Google Earth; Instituto Pereira Passos; LHC-Coppe/UFRJ.

Seu rio principal, o Comprido, nasce em uma área de mata nativa na Serra
do Sumaré, na elevação 590m e percorre 4,5 km até o Canal do Mangue, onde já
deságua sob a influência do sistema de marés da Baía de Guanabara.
Ao longo de seu trajeto, o rio Comprido recebe as águas de três rios
tributários (Fig. 15): o córrego Bananal, que corre sob a Rua do Bispo vindo
também do Sumaré; o córrego chamado popularmente de Canal da Chácara, que
nasce em Santa Teresa, descendo paralelo à Rua Barão de Petrópolis e por fim
seguindo sob a Rua Campos da Paz; e um tributário sem nome que tem sua
nascente no alto da Rua Aureliano Portugal e chega ao rio Comprido sob a Rua
Sampaio Viana.
Figura 15 - Bacia do Rio Comprido e Tributários

Fonte: Google Earth; Instituto Pereira Passos; LHC - Coppe/UFRJ.

Na região da bacia são registrados diversos eventos extremos


relacionados às chuvas anualmente, principalmente inundações à jusante do rio,
uma vez que após a parte alta do rio, próximo à nascente, o rio percorre um
caminho praticamente plano, criando áreas com potencial de serem alagadas. A
área mais crítica a essas inundações é considera a a região da Rua do Matoso
(PCRJ, 2015).
Em relação à cobertura vegetal a bacia conta com cerca de 46% de sua
área com algum tipo de vegetação, porcentagem alta principalmente pela
proximidade com a Floresta e o Maciço da Tijuca. De acordo com o programa de
monitoramento da cobertura vegetal e do uso das terras da cidade do Rio de
Janeiro, feita pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SMAC/PCRJ, 2016),
as ocorrências de vegetação que predominam na bacia do rio Comprido são:
floresta ombrófila densa, reflorestamento, e vegetação arbórea não florestal. A
nascente do rio, se encontra em região de floresta ombrófila densa montana, em
estágio avançado. A vegetação se distribui na bacia de acordo com o mapa a
seguir (Fig. 16).
Figura 16 - Mapa de Cobertura Vegetal, 2016

Fonte: Instituto Pereira Passos; SMAC/Prefeitura da Cidade do Rio De Janeiro; LHC – Coppe/UFRJ

Estas áreas vegetadas à montante do rio, apesar de serem


predominantemente de encostas, se mostram particularmente vulneráveis devido
à intensa ação antrópica de comunidades que se estabeleceram ali (Fig. 17). Com
isso a vegetação existente sofre pressão pelo avanço da ocupação irregular e
desmatamento. Há, inclusive, uma ocupação nas margens do rio, próximo à cota
de 150m (REZENDE, 2018), prejudicando a qualidade ambiental do rio já em sua
cabeceira e tornando a região muito suscetível a deslizamentos colocando em
risco a vida da população que ali se estabeleceu.
A exemplo disso, no marcante evento de chuvas extremas de abril de 2010,
com 66 vítimas pela cidade, uma encosta deslizou sobre as edificações da Rua
Gomes Lopes, em Santa Teresa, próximo ao Morro dos Prazeres, destruindo 10
casas e matando 30 pessoas.
Figura 17 - Mapa de Localização das Favelas na bacia.

Fonte: Google; IPP; LHC – COPPE/UFRJ

No Rio Comprido, o cenário higienista tradicional de drenagem baseado


na rápida retirada da água em áreas pavimentadas começou a ser implantado
com a canalização do corpo d’água, na década de 1910. O cenário permanece,
com a intensa mineralização das margens do rio principal ao longo da Av. Paulo
de Frontin, além da extrema poluição despejada no rio, tanto de esgoto in natura,
quanto de poluição difusa levada pelas chuvas. O rio sofre canalizado, assoreado,
poluído, escondido pelo viaduto, e rejeitado pela população. As alterações feitas
contribuem ainda, para o aumento do risco de inundações por transbordamentos
à jusante, impactando bairros como Tijuca, Estácio e Praça da Bandeira devido à
topografia da região e à velocidade com que as águas se acumulam ao percorrer
seu leito impermeabilizado. Esse modelo de drenagem urbana se mostra
insustentável e uma outra abordagem deve ser priorizada.
O bairro do Rio Comprido (Fig. 18) fica localizado na Zona Norte da Cidade
do Rio de Janeiro, pertence à Área de Planejamento I, e à III Região
Administrativa, que leva seu nome. A população atual é de 43.764 habitantes
(PCRJ, 2010) e ocupa uma área de aproximadamente 3,35 km² (PCRJ, 2018),
sendo mais de 60% área urbana.

Figura 18 - Limites do Bairro do Rio Comprido

Fonte: Instituto Pereira Passos - DATARIO

O bairro tem pouco de sua história registrada, mas sabe-se que é um dos
mais antigos bairros da cidade e que tem sua origem na época colonial, nas
antigas freguesias do Engenho Velho e do Espírito Santo (SANTOS, 1965 apud
de MARTINS, 2015). O local era considerado como interior, já que a a cidade era
apenas um núcleo urbano localizado no atual bairro do Centro.
Essa era uma região de grandes fazendas e engenhos pertencentes à
pessoas abastadas, incluindo condes e viscondes da época que iam atrás de um
clima ameno proporcionado pela proximdade com o Maciço da Tijuca (Fig. 19).
No entanto, a presença dos rios na região, como o Comprido, talvez tenha sido o
principal fator para atrair os engenhos para a área, já que a produção era garantida
pelo abastecimento hídrico (SIQUEIRA, 2013).

Figura 19 - Quinta do Bispo, no Rio Comprido no século XIX

Fonte: Litografia por P. Bertichen, 1856. Brasiliana iconográfica. Disponível em:


<https://www.brasilianaiconografica.art.br/obras/18061/collegio-episcopal-de-s-pedro-de-alcantara>
Acesso em 12/06/2019.

No século XVIII, após a expulsão dos Jesuítas, as freguesias foram


subdivididas e em 1865 foi criada a Freguesia do Espírito Santo que compreendia
a maior parte do atual Rio Comprido. Em 1875, foi oficializada a criação do bairro
a partir de uma designação popular que se origina do nome do rio que corta a
região. Chamado yguasu, toponímia indígena com o significado de “água grande”,
que através do tempo tornou-se popular dando origem ao nome do bairro atual,
Rio Comprido (SIQUEIRA, 2013).
Ainda no século XIX, a consolidação dos transportes públicos (bondes) na
cidade contribuiu para a expansão do centro e consolidação dos bairros mais
afastados como o Rio Comprido. O crescimento populacional também foi
fortemente influenciado pelo fim da escravidão em 1888 e a atração de imigrantes
pelo incio da indutrialização do país, quando um grande contingente populacional
passou a se instalar pela cidade de maneira precária e insalubre em cortiços, sem
saneamento ou ordenação (MARTINS, 2015).
Frente a esse desordenamento da cidade insalubre, o prefeito Francisco
Pereira-Passos (1903-1906) iniciou uma série de reformas urbanísticas higienistas
pela cidade,atingindo também o bairro do Rio Comprido. Entre as reformas no
bairrro, a canalização do rio Comprido (Fig. 20) como uma tentativa de conter os
constantes transbordamentos, foi a mais significativa. Junto à canalização, muitos
dos cortiços existentes ali foram demolidos, o que fez com que alguns moradores
se instalassem nas encostas dando origem às favelas da região (SIQUEIRA,
2013).

Figura 20 - Av. Paulo de Frontin, 1928 por Augusto Malta.

Fonte: Instituto Moreira Salles (IMS). Disponível em:


<http://fotografia.ims.com.br/#/detailpage/6999>. Acesso em 10/06/2019.

Na gestão do prefeito engenheiro Paulo de Frontin, em 1919, foi aberta a


Avenida Paulo de Frontin (Fig. 21), o principal logradouro que valorizou o bairro
transformando-o em área nobre. No entanto, na década de 1960, propôs-se a
abertura do Túnel Rebouças, inaugrado em 1967, conectanto o Rio Comprido à
Zona Sul em uma tentativa de desafogar o trânsito da cidade.
Figura 21 - Av. Paulo de Frontin finalizada em 1919 com o Corcovado ao fundo

Fonte: Acervo O Globo / AGCRJ

Após a abertura do túnel, o fluxo de veículos na Av. Paulo de Frontin


aumentou consideravelmente, gerando ainda mais congestionamentos. Como
solução para o problema, um outro projeto viário de grande porte passou a ser
elaborado para o local: a construção do viaduto Eng. Freyssinet, conhecido como
Elevado Paulo de Frontin, que depois foi ligado diretamente à via expressa Linha
Vermelha, como parte do Plano Doxiadis para o sistema viário da cidade.
O elevado, construído com os prinicipais avanços tecnológicos da época
– em peças pré moldadas e protentidas (Fig. 22), foi inaugurado em 1974. Durante
a obra, em 1971, um trecho de 122 metros do elevado desmoronou, causando a
morte de 28 pessoas no cruzamento com a Rua Haddock Lobo.

Figura 22 - Construção do Elevado em fevereiro de 1971

Fonte: Rodolpho Machado / Agência O Globo


A partir da construção do elevado, um processo de degradação ambiental
e desvalorização da região se deu início. Os imóveis ao longo da avenida viram
sua iluminação natural ser prejudicada (Fig. 23) e a poluição sonora e do ar
aumentarem consideravelmente, uma enorme queda na qualide de vida da área.
(MARTINS, 2015) Essa tendência de desvalorização é associada também à
expansão das favelas do bairro como a do Turano, Fogueteiro e Querosene
(SIQUEIRA, 2013). O bairro deixa de ser um local residencial aprazível para se
tornar um lugar de passagem (LACERDA, et al., 2017).

Figura 23 - A Av. Paulo de Frontin, sob o elevado, atualmente

Fonte: Acervo pessoal do autor

Apesar do impacto gerado pelo viaduto, o Rio Comprido possui uma


mémoria viva através de seus moradores e uma vida urbana muito ativa. Sua
população atual é de cerca de 80 mil habitantes (GeoRio, 2010), e conta com uma
infraestrutura de comércio e educação diversificada. Há duas universidades no
bairro, a Universidade Estácio e a Unicarioca, além de diversas grandes empresas
como o Inmetro, a Fundação Roberto Marinho, a Fundação Cesgranrio, o Hospital
Casa e a grife Osklen.
Com isso, o bairro vem sendo alvo de propostas de revitalização do seu
espaço urbano. Instituições como a ONG Aliança Resgate (ARONG), a Fundação
Cesgranrio e o CAp-UERJ realizam ações rotineiras em prol de resgatar as
memórias locais e manter viva a cultura local. O Coletivo Baixo Rio, composto por
especialistas de diversas áreas coordenados pelo arquiteto Luiz Augusto da Costa
Santos Filho, conhecido como Guto Santos, vêm se destacando como um
movimento pela revitalização do bairro, atuando como um mediador na articulação
de moradores, líderes locais, universidades (como a PUC-Rio e a UFRJ), ONGs,
empresas e poder público.

As intervenções higienistas ocorridas durante o século XX alteraram


drasticamente a paisagem e o contexto sociocultural do bairro do Rio Comprido.
O fator que pode ser considerado como principal contribuinte para a degradação
do bairro é a presença do conjunto de infraestrutura rodoviária formado pelo
Elevado Engenheiro Freyssinet (Fig. 24) e a Avenida Paulo de Frontin que cortam
a região ao meio e causam um impacto direto negativo sobre o entorno imediato
e ainda mais sobre o rio que se encontra envolto por essas estruturas.

Figura 24 - Trânsito sobre o Elevado Engenheiro Freyssinet, 2015

Fonte: Nina Lima - Agência O Globo

Após a inauguração do Túnel Rebouças e da construção do Elevado, o


bairro sofreu um esvaziamento e ficou conhecido apenas como um bairro de
passagem. O elevado é uma infraestrutura cinza, construído com o propósito de
otimizar a eficiência viária, o que elimina a redundância e multifuncionalidade
(HERZOG, 2013), caracterizando o elevado como uma estrutura monofuncional.
Os impactos gerados pela presença da significativa infraestrutura viária são
variados passando por poluição do ar, poluição sonora, aumento da poluição
difusa por material particulado e resíduos dos veículos, redução da iluminação
natural, degradação do aspecto visual da cidade e aumento da insegurança viária
e urbana.
Uma outra consideração interessante sobre o impacto de tais
infraestruturas monofuncionais de mobilidade que cortam a cidade é o conceito
abordado por Gabriel Duarte em seu artigo (2005). O autor diz que tais elementos
de mobilidade conectam pontos distantes com eficiência, mas, por outro lado,
criam bordas indesejáveis no tecido da cidade, chamadas por ele, em inglês, de
“infrascapes”, ou seja, paisagens geradas pela infraestrutura. Tal tipo de
infraestrutura não “se enquadra nos padrões de qualidade esperados de uma
região habitável comum”10, gerando um desenvolvimento inverso e atraindo usos
e atividades que são indesejadas em outras áreas da cidade, ocupando esse
espaço residual gerado pela infraestrutura de mobilidade e estimulando um
caráter ilegal de manipulação pela população, do espaço público degradado (Fig.
25).

Figura 25 - Paisagem sob o elevado

Fonte: Acervo do autor

Em contrapartida, Martins (2015), em seu trabalho em que aborda o


aspecto do Elevado Eng. Freyssinet no Rio Comprido, declara que é fato que a
implantação de um viaduto diminui significativamente a qualidade do espaço
urbano e gera outros prejuízos indiretos como o aumento da violência.
Especialmente nos primeiros anos após a implantação do elevado, a percepção

10
Tradução do autor
era de o mesmo ser o principal motivador da depreciação do bairro. Porém, ao
concluir seu trabalho, Martins constata que atualmente para os moradores o
viaduto deixou de ser o fator determinante para a degradação do espaço urbano,
passando a ser apenas mais um agravante somado a outros fatores, como a o
aumento da violência e o desinteresse do poder público. Assim não é possível
relacionar a condição atual de estagnação do bairro do Rio Comprido
exclusivamente à presença do elevado, mas sim à ausência do poder público e à
falta de intervenções que possam melhorar este espaço.
Em relação ao aspecto ambiental de funcionamento hidrológico, as
questões são outras. Com a presença do elevado, e a Av. Paulo de Frontin
configura-se o contexto de “avenida beira-rio” abordado por Gorski (2010) ou
“avenida canal” como é conhecido popularmente, onde a adoção das margens do
rio como área de expansão do sistema viário automobilístico suprime as funções
ecológicas do rio e compromete sua qualidade ambiental. Nesse cenário, o
contexto problemático da drenagem urbana é agravado, devido à alta
impermeabilização das margens pelas vias construídas nas laterais e sobre o rio.
As superfícies ficam cobertas de poluentes advindos dos automóveis e, quando
chove, são lavadas e toda essa poluição difusa é levada para o rio (Fig. 26)
impactando diretamente na qualidade da água, já muito prejudicada pelo
lançamento de esgoto in natura e de resíduos sólidos.

Figura 26 - Cheia no Rio Comprido em evento de chuva intensa.

Fonte: Facebook
A alteração morfológica sofrida pelo rio Comprido ao ser canalizado,
agrava problemas de inundações em sua bacia (Fig. 24). Na região são
registrados diversos problemas anuais do tipo, sendo a área da Rua do Matoso o
ponto mais crítico (PCRJ, 2015). Esses eventos geram prejuízos para a população
local, e podem ser consideradas como um dos fatores para degradação urbana.
(GUIMARÃES, et al., 2018)
As condições urbanas da bacia do rio Comprido também não são
favoráveis à otimização da drenagem urbana, e contam com grandes alterações
na paisagem natural. A presença de vegetação concentra-se, principalmente nas
áreas de encostas e o espaço urbano apresenta grandes áreas impermeabilizadas
onde há o predomínio da presença dos veículos e condições não ideais para os
pedestres e para a vitalidade urbana.
As alterações das funções ecológicas e ecossistêmicas do ambiente
causadas pela expansão urbana e erradicação de espaços naturais gerou
diversos impactos negativos sobre a sub-bacia do Rio Comprido e ao longo do
seu principal rio, tendo consequências ambientais e socioculturais, como exposto
nos capítulos anteriores. Além disso, os desafios das incertezas do cenário de
mudanças climáticas podem agravar a situação.
Neste capítulo são apresentadas estratégias para o aumento da resiliência
da bacia estudada, preparando-a para absorver impactos e manter suas funções,
se adaptando. As estratégias são elaboradas como diretrizes, funcionando como
orientações iniciais de medidas e projetos a serem implementados na área de
estudo visando mitigar as externalidades negativas da urbanização. Tais diretrizes
propõem não apenas uma melhoria ambiental do rio, mas também um aumento
da vitalidade urbana e qualidade de vida na cidade ao redor, tendo como base os
conceitos de Requalificação Fluvial Urbana, Cidades Biofílicas com Soluções
Baseadas na Natureza e Caminhabilidade e Vitalidade Urbana apresentados
anteriormente.
É importante destacar que o contexto urbano ao redor do Rio Comprido
configura uma situação problemática do ponto de vista de uma possível
requalificação fluvial. Seu entorno é altamente antropizado, com duas pistas de
uma via arterial ao longo de suas margens, leito impermeabilizado, águas poluídas
e tudo coberto por uma via expressa elevada. São muitos elementos interferindo
sobre o rio que tornam qualquer intervenção uma tarefa complexa e cheia de
considerações.
A intenção deste trabalho não é ditar qual a solução para uma recuperação
fluvial do rio Comprido. O papel a desempenhar é de considerar possiblidades e
oferecer possíveis estratégias para melhorar a situação atual. Dessa maneira, a
requalificação fluvial no rio Comprido deve ser pensada em um sentido mais
amplo, como um instrumento para auxiliar no controle de cheias, aumentar a
resiliência da cidade com menos dependência de manutenção e melhorando as
condições ecológicas do fluxo de água, e promovendo a gestão sustentável de
águas urbanas.
A presença do Elevado Engenheiro Freyssinet, é um fator complicador
para qualquer intervenção proposta, especialmente intervenções paisagísticas
baseadas na natureza e que dependem de iluminação natural para funcionar. Os
impactos de poluição gerados pelo elevado também são fatores muito limitantes
quanto à atração e permanência de pedestres. Há um consenso entre população
e ativistas do bairro que para melhorar o local, é necessária a demolição do
elevado, a exemplo do caso do Elevado da Perimetral demolido em 2014.
Não há dúvidas que um ambiente sem o elevado apresentaria uma
qualidade de espaço melhor (MARTINS, 2015). Entretanto, não é objetivo deste
trabalho definir se seria ou não necessária a demolição do viaduto, até mesmo
pela alta complexidade do caso, envolvendo uma revisão do sistema de
transportes a nível metropolitano.
Desse modo, trabalha-se considerando que há várias soluções que podem
ser adotadas para mitigar os impactos do equipamento sem envolver sua
demolição. O mais importante é que qualquer que seja a solução, ela contemple
a participação dos usuários afetados (participação popular) e a condição
econômica de cada lugar, como determina o Estatuto das Cidades (Lei Federal
nº10.257/2001) para uma cidade mais justa e democrática (MARTINS, 2015).
Dentro das abordagens de requalificação fluvial, o conceito de remediação,
definido por Miguez, Rezende e Veról (2015) em sua obra se mostra mais
adequado à situação do rio Comprido. Os autores definem remediação como uma
tentativa de desenvolvimento de uma nova condição de equilíbrio, não
necessariamente igual ao estado original do rio; já que as alterações são tão
drásticas e profundas, que a condição original do rio Comprido não é mais
relevante.
Por isso é necessária uma abordagem mais ampla – especialmente na
questão do manejo de águas pluviais – afim de encontrar medidas de controle de
escoamento na fonte, distribuídas pela bacia hidrográfica urbanizada do rio
Comprido (MIGUEZ, REZENDE e VERÓL, 2015). Esta abordagem baseia-se nos
princípios de ecologia da paisagem, tomando a bacia hidrográfica como a unidade
básica de planejamento ambiental, já que é um sistema complexo que abrange os
diversos fluxos da natureza relacionados ao sistema do rio incluindo fatores
bióticos, hidrográficos e antrópicos. Esta adoção da bacia hidrográfica como
unidade de planejamento, encontra apoio a nível nacional através da Lei nº
9433/1997 que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos.
Sendo o rio principal da bacia, e exercendo papel fundamental na
drenagem da região além de ser também um eixo de referência na paisagem
urbana, o Comprido é tomado como um estruturador deste estudo agindo como
um catalisador para melhoria urbana. A partir dessa decisão, e levando em
consideração o contexto do ambiente ao longo do percurso do rio, para fins de
direcionar e entender melhor a região, foi definida uma divisão da bacia em três
trechos ao longo do rio: Alto rio Comprido (Trecho 1); Médio rio Comprido (Trecho
2); e Baixo rio Comprido (Trecho 3). A divisão em trechos permite explorar melhor
as características e potencialidades de cada um, sendo caracterizados de acordo
com o Quadro 02, na página seguinte.
Em relação as outras áreas da bacia, em especial aos rios tributários, a
abordagem de estudo é feita considerando dois padrões de áreas percorridos
pelos cursos d’água: trechos de encosta sendo próximos às nascentes e acima
do limite de cota 50m; e trechos de áreas urbanizadas, mais próximas ao rio
principal, abaixo da cota 50m.
Qualquer estratégia para requalificar o rio Comprido deve considerar os
conceitos ambientais de uma cidade biofílica – valorização da natureza e
biodiversidade – objetivando a busca de uma melhor qualidade de vida,
melhorando seus aspectos estéticos e naturais, e por consequência, revitalizando
o espaço urbano ao seu longo. Requalificar se torna um objetivo ambiental, no
sentido de que um melhor estado geral do rio Comprido pode agregar valor à
sociedade oferecendo atividades de recreação e lazer, e permitem a preservação
da natureza e da biodiversidade (MIGUEZ, REZENDE e VERÓL, 2015).
Quadro 2 - Localização e Características dos Trechos de Estudo

Fonte: Dados adaptados de: Google Earth; IPP; LHC – Coppe/UFRJ


O Trecho 1 do Rio Comprido é de grande sensibilidade para todo o rio por
alguns fatores:
1. É o trecho onde se localiza a nascente do rio Comprido, recurso
fundamental para qualidade da água de todo o sistema fluvial à
jusante.

2. Possui declividade elevada, com um terreno naturalmente


suscetível à deslizamentos, aspecto potencializado pela presença
de ocupação irregular.

3. Possui ocupação por comunidade, já a partir da cota 150m,


comprometendo as áreas de proteção do rio e sua nascente, além
do despejo de rejeitos no corpo d’água e de remoção da vegetação.

4. Trecho alto da bacia, as ações realizadas aqui, negativas ou


positivas, impactam toda a bacia à jusante.

Para um maior entendimento do trecho, são levantas as potencialidades e


as fragilidades da área, para direcionar as proposições de diretrizes de projeto.
Conforme o Quadro 3 a seguir.

Quadro 3 - Potencialidades e Fragilidades do Trecho 1

Nesse sentido as diretrizes sugeridas para este trecho são:

• Preservação da cobertura vegetal existente através do


fortalecimento da fiscalização da APP, impedindo o avanço do
desmatamento pelas ocupações irregulares além de poder atuar no
combate ao despejo de esgoto e lixo no rio;
• Recuperação da cobertura vegetal degradada, através de
reflorestamento, entendendo a presença de vegetação como uma
solução fundamental para: contenção de encostas; retenção de
águas pluviais; retenção de sedimentos do solo evitando o
assoreamento à jusante; aumento da biodiversidade; além de
outros serviços ecossistêmicos;

• Implantação de telhados verdes, sistemas de reaproveitamento de


água da chuva para o a retenção de água pluvial nos locais onde o
reflorestamento não seja possível, evitando remoções

• Estímulo à implantação de hortas na comunidade Paula Ramos,


como uma política de saúde e educação alimentar para a
população, que pode funcionar também como fonte de renda. Essa
estratégia aumenta a resiliência dessa população, fazendo proveito
do serviço ecossistêmico de provisão

• Trabalho de educação ambiental na comunidade presente no


trecho, com o objetivo de diminuir os impactos sobre a APP e sobre
o rio. Uma medida não-estrutural voltada para o controle dos
impactos e para oportunidade de uma reconexão biofílica e da
população e com o sistema fluvial do rio Comprido, com o qual
convivem em proximidade;

Por ser o trecho em que o rio se encontra mais próximo ao seu estado
original, não se fazem necessárias intervenções de grandes medidas estruturais
intensivas. Porém, considerando a mitigação dos efeitos que podem ocorrer mais
à jusante, destaca-se a potencialidade de implantação de um reservatório de
detenção neste trecho. Para isso, a área final do trecho, próximo à entrada do
Túnel Rebouças, possui potencial por oferecer área física e assim poder mesclar
a infraestrutura viária a esta medida estrutural de drenagem em seu subsolo.

O trecho do Médio Comprido é principalmente impactado pela presença do


Elevado e pela canalização do rio que tem seu leito e margens completamente
revestidos e impermeabilizados. A qualidade da água aqui já se mostra baixa
pelos impactos sofridos no Trecho 1, mas por não receber ainda nenhum tributário
e ainda não receber elevada carga de poluição difusa, em dias de sol é possível
constatar um aspecto visual de água limpa no rio.
Para uma leitura facilitada do trecho, são levantadas as fragilidades e
potencialidades do mesmo, conforme Quadro 4 a seguir.

Quadro 4 - Potencialidades e Fragilidades do Trecho 2

Em relação as estratégias e medidas propostas para este trecho, elas são


focadas, assim como no Trecho 1, em diminuir os impactos à jusante, além de
focarem em melhorar a condição ambiental do rio, no sentido de qualidade da
água, biodiversidade e capacidade hidráulica.
Este trecho não apresenta grandes demandas de circulação de pedestres
principalmente por ser acesso ao Túnel Rebouças, não sendo um polo gerador de
viagens. A circulação mais intensa de pedestres começa muito próximo da Praça
Condessa Paulo de Frontin, portanto este aspecto é abordado mais
profundamente no Trecho 3. O favorecimento à mobilidade cicloviária e ao
pedestre, porém, se mostra interessante para atender as residências e a alguns
serviços existentes ao longo do trecho.
A Praça Santa Alexandrina, no entanto, é uma exceção ao caso. O local
atrai significativa atividade social ao ser ponto de encontro de estudantes da
Fundação Osório, possuir alguma atividade comercial no entorno e por ser ponto
de parada de diversas linhas de ônibus, formando assim um cenário interessante
para intervenções paisagísticas que estimulem o contato com a natureza e a vida
urbana ativa local. Por estar uma cota acima do rio e das pistas da Av. Paulo de
Frontin, a praça não oferece condições apropriadas para medidas estruturais de
manejo de águas.
Em relação à abordagem do esgotamento sanitário e da poluição difusa,
se faz necessária um trabalho intenso para obter uma melhoria da qualidade da
água do rio e evitar que tais poluentes alcancem o rio. A poluição difusa pode ser
minimizada com o uso de determinadas tipologias de infraestrutura verde, tais
como biovaletas e canteiros pluviais, para as quais é direcionado o escoamento
superficial das ruas que é filtrado e metabolizado pelas espécies vegetais
adaptadas. O despejo de esgoto é um problema mais grave e por isso, como
medida prática para proteger o rio, é proposta a implementação de um sistema de
transição em tempo seco de duas linhas de interceptores ao longo do rio, que
podem captar as aguas muito poluídas em períodos de estiagem e direciona-las
à companhia responsável pelo tratamento dos esgotos da cidade, formando uma
espécie de cinturão ao longo do rio.
Nesse sentido as diretrizes sugeridas para o Trecho 2 são:

• Medidas estruturais intensivas de desimpermeabilização da calha


do rio, e mudanças em sua seção transversal de modo a melhorar
sua capacidade hidráulico reduzindo o risco de enchentes;

• Desimpermeabilização da calha e criação da nova seção


transversal com calha feita de gabião11, material com rugosidade
para dissipar a energia das águas neste trecho inclinado diminuindo
a velocidade com que chegam no Trecho 3 à jusante, permitir
infiltração no solo, além de criar potenciais habitats;

• Implementação de medidas ou equipamentos para o aumento de


iluminação natural na região (inclusive para sobrevivência da
vegetação introduzida no rio, assim como melhoria da iluminação
noturna);

• Implementação de soluções para mitigação da poluição sonora e


do ar ao longo do viaduto;

• Implementação de ciclovia ou ciclofaixa através do


redimensionando o sistema viário e estimulando a mobilidade ativa
como meio de transporte local integrado ao sistema de transporte
público de alta capacidade (metrô);

• Melhoria das condições das calçadas e criação de passeio ao longo


das margens do rio, estimulando a conexão biofílica com os
sistemas naturais;

11
Estrutura armada consistida em gaiolas metálicas de fios de aço galvanizado com formatos de
caixa e preenchidas por seixos ou pedras britadas de diversos tamanhos.
• Intensificar a arborização ao longo da Av. Paulo de Frontin, usando
maior diversidade de espécies nativas, estimulando a formação de
um corredor ecológico, atraindo biodiversidade, melhorando o
microclima e a estética local, mitigando impactos dos veículos e
estimulando a biofilia;

• Implementação de elementos de infraestrutura verde e LID ao


longo das calçadas da Av. Paulo de Frontin, como uma maneira de
infiltrar, deter, reter e filtrar as águas da chuva, tais como biovaletas
e canteiros pluviais, contribuindo para o aumento de solo
permeável na cidade;

• Intervenção urbanística na Praça Santa Alexandrina, criação de


espaços de convivência social com assentos e equipamentos
atrativos, introduzindo paisagismo com espécies nativas e
equipamentos de infraestrutura verde.

Os cortes típicos do Trecho 2 apresentados nas páginas seguintes


destacam alguns dos aspectos existentes no trecho atualmente (Fig. 27), e em um
cenário que considera a implementação das estratégias sugeridas para o Médio
Rio Comprido (Fig. 28), demonstrando com poderiam ser aplicadas algumas
diretrizes listadas.
Figura 27 - Corte Típico do Trecho 2 - Existente

Fonte: Criação do autor


Figura 28 - Corte Típico do Trecho 2 - Proposto

Fonte: Adaptado de ARAUJO, 2016 e GUIMARÃES et al., 2018


O trecho do Baixo Rio Comprido é o trecho com mais atividade urbana, no
sentido de fluxo de pedestres e de serviços oferecidos, especialmente
considerando a área entorno da Praça Condessa Paulo de Frontin, centro do
bairro do Rio Comprido onde há uma abundante oferta de comércio, serviços, e
transporte público, além de ter escolas e universidades em seu entorno. É também
o mais plano e, por isso, mais suscetível à alagamentos. De acordo com a
prefeitura da cidade do Rio de Janeiro, o ponto mais crítico de alagamentos é a
região da Rua do Matoso (PCRJ, 2015). Além disso, a qualidade da água é mais
prejudicada devido à presença do deságue dos tributários que carregam poluição
difusa de outras regiões da bacia.
Para uma leitura facilitada do trecho, são levantadas a fragilidades e
potencialidades do mesmo, conforme o Quadro 5 a seguir.

Quadro 5 - Potencialidades e Fragilidades do Trecho 3

Devido à baixa declividade e os equipamentos presentes no entorno, o


trecho oferece um grande potencial para a implementação de ciclovia,
funcionando como um meio de transporte ativo que conecta os diversos pontos
de interesse e os serviços do bairro, diminuindo a demanda por transporte
motorizado. Este aspecto é potencializado quando considerada a presença das
estações de metrô Estácio e Afonso Pena, muito próximas ao trecho, fortalecendo
a integração de um meio de transporte local (bicicleta) com o transporte público
de massas (metrô), atendendo aos aspectos de mobilidade sustentável.
Outra potencialidade de destaque do trecho é a presença de terrenos e
áreas públicas ao seu longo. São terrenos residuais ou subutilizados que tem
potencial de caráter público. Podem funcionar como estruturadores da
requalificação baseada na natureza, oferecendo áreas públicas de lazer, convívio
de socialização, áreas verdes para estímulo à biofilia e como elementos de manejo
sustentável de águas urbanas, combinando tipologias de infraestrutura verde e
LID, como reservatórios de detenção e alagados construídos multifuncionais.
O trabalho de Guimarães et al. (2018) é um exemplo e referência desta
abordagem ao propor para o Rio Comprido a utilização do sistema de espaços
livres ao longo do rio para criar um sistema multifuncional que seja capaz de
trabalhar tanto para o manejo de águas pluviais, oferecendo volume de
armazenamento, quanto como espaços de lazer e recreação para a população.
No artigo, os autores levantam os espaços do Trecho 3 que podem ter esse
aspecto multifuncional (Fig. 29 e 30)

Figura 29 - Sistema de Espaços Livres na Bacia do Rio Comprido

Fonte: Adaptado de GUIMARÃES et al., 2018, p. 82; IPP; Google, LHC – COPPE/UFRJ
Figura 30 - Exemplo de espaço público
adaptado na Rua Haddock Lobo

Fonte: GUIMARÃES et al., 2018, p. 86

Outro aspecto interessante abordado no trabalho de Guimarães et al.


(2018) é em relação a intervenções na calha do rio Comprido. Como já
mencionado no item 5.3 deste capítulo, é proposta para o Trecho 2 uma
intervenção de desimpermeabilização da calha do rio, e mudanças em sua seção
transversal de modo a melhorar seu funcionamento hidráulico reduzindo o risco
de enchentes. Este tipo de intervenção é proposto no trabalho de Guimarães et
al. (Fig. 29) onde são mantidas as margens de concreto e proposta uma calha
secundária nos espaços entre os pilares do elevado como espaços de
armazenamento temporário de águas e onde preveem o plantio de espécies
vegetais adaptadas a áreas alagadas, como a Typha latifólia (PINHEIRO, 2017
apud GUIMARÃES et al., 2018).

Figura 31 - Proposta de Seção Transversal do Rio Comprido

Fonte: GUIMARÃES et al., 2018, p. 93


Neste trabalho, em relação à seção transversal do rio Comprido, e
adaptando as propostas de Guimarães et al., é sugerida a mesma alteração da
seção, com a implementação de calhas de gabião no Trecho 2 como já sugerido
no item 5.2. A profundidade do leito mais raso é projetada para receber chuvas
com tempo de recorrência (TR) de 1 ano, já considerando o cenário de alterações
propostas em todo a bacia que minimizam a vazão de tais eventos.
Um dos impactos mais significativos do elevado é a poluição sonora e a
emissão de partículas pelos veículos que passam por ali todos os dias. A
proximidade do elevado com os edifícios ao longo do Trecho 3 chega a ser em
torno de apenas 3 metros em alguns pontos, uma ameaça para a saúde mental e
física dos moradores causada pela má qualidade do ar e constante ruído, podendo
contribuir par ao aumento dos casos de hipertensão, depressão, estresse,
ansiedade e problemas respiratórios incluindo câncer pulmonar (WHO, 2016).
Como forma de mitigar esses efeitos existem diversas SbN que podem contribuir.
Um exemplo é a estrutura proposta para o mesmo elevado no trabalho de Araujo
(2016), um pergolado vegetado que o autor chama de “barreira verde” instalado
ao longo do viaduto funciona como um filtro para poluentes e barulho e combina
soluções para o aumento da iluminação natural sob o elevado (Fig. 30).

Figura 32 – Proposta para "Barreira Verde" e Iluminação Natural para o Elevado

Fonte: Criação do autor, 2016


Feitas estas considerações, as diretrizes sugeridas para o Trecho 3 – por
similaridade de situações – são as mesmas para o Trecho 2, exceto a relacionada
à praça Santa Alexandrina, e à alteração da calha do rio com gabião sendo
adicionadas das seguintes:
• Desimpermeabilização do leito do rio e criação da nova seção
transversal com calhas adaptadas para aguentar chuvas de TR=1,
e com possível introdução de vegetação adaptada que pode
contribuir para filtragem das águas, melhoria do microclima,
potencial criação de habitats e melhoria estética do ambiente;
• Levantamento dos espaços livres subutilizados com caráter público
para transforma-los em um sistema de espaços verdes
multifuncionais que ofereçam recreação e lazer para a população e
contribuam no manejo de águas pluviais como espaços de
reservatórios temporários;
• Estímulo a criação de novos equipamentos e comércio ao longo da
Av. Paulo de Frontin para reativar o espaço público e trazer
vitalidade com a presença de pedestres na área;
• Identificação dos pontos de lançamento de esgoto e remodelagem
do sistema de esgoto urbano, segregando efetivamente a rede de
esgoto e águas pluviais para evitar que seja despejado esgoto in
natura diretamente no rio, assim como nos tributários;
Os cortes típicos do Trecho 3 apresentados nas páginas seguintes
destacam alguns dos aspectos existentes no trecho atualmente (Fig. 33), e em um
cenário que considera a implementação das estratégias sugeridas para o Baixo
Rio Comprido (Fig. 34), demonstrando com poderiam ser aplicadas algumas
diretrizes listadas.
Figura 33 - Corte Típico Trecho 3 - Existente

Fonte: Criação do Autor


Figura 34 - Corte Típico Trecho 3 - Proposto

Fonte: Adaptado de ARAUJO, 2016 e GUIMARÃES et al., 2018


Um dos princípios de uma requalificação fluvial urbana efetiva, é que as
ações para a melhora ambiental do rio não se concentrem apenas em ações
diretas sobre o rio ou seu entorno imediato, mas de se priorizar uma lógica de
ação distribuída pela bacia hidrográfica, de modo a controlar os escoamentos
pluviais na fonte e aumentando a efetividade da abordagem de requalificação
fluvial.
A abordagem deste trabalho em dividir as estratégias em trechos do rio
Comprido é de grande auxílio para identificar e solucionar alguns problemas locais
e imediatamente relacionadas ao contexto do rio associado ao elevado. No
entanto, para o melhoramento efetivo do manejo sustentável de águas pluviais e
mitigar os problemas a jusante do rio devem ser elaboradas estratégias para a
bacia hidrográfica como um todo, que abordem inclusive os tributários do rio
principal e tendo uma abordagem ecossistêmica.
As estratégias propostas para a bacia do rio Comprido objetivam o controle
de escoamento pluvial na fonte, o aumento de áreas verdes, proteção de
mananciais dos tributários, e recuperação de cobertura vegetal nas encostas.
De maneira simplificada as estratégias propostas para a bacia em geral e
para os tributários consistem em:
• Implementação de reservatórios de detenção nos pés de encosta,
incorporados ao sistema de drenagem, implantados especialmente
no curso dos rios tributários ao rio Comprido.
• Implementação de Estações de Tratamento de Esgotos Compactas
(ETEC’s) em pontos à montante da bacia, especialmente próximas
à comunidades e favelas como no Trecho 1 – Alto Rio Comprido;
• Implementação de equipamentos de infraestrutura verde e LID nas
áreas urbanizadas, com objetivo de reproduzir o máximo possível
as condições de drenagem antes da urbanização (REZENDE,
2018). As tipologias podem incluir:
o Jardins Filtrantes;
o Canteiros Pluviais;
o Telhados e Paredes Verdes;
o Reservatórios em lote;
o Pavimentação permeável;
o Arborização;
• Intensificação da arborização urbana em geral, usando maior
diversidade de espécies nativas, estimulando a formação de
corredor ecológicos, atraindo biodiversidade, melhorando o
microclima e a estética local, mitigando impactos dos veículos e
estimulando a biofilia;

• Implementação de infraestrutura cicloviária através do


redimensionando o sistema viário com vias compartilhadas,
ciclofaixas e ciclovias onde for possível, estimulando a mobilidade
ativa como meio de transporte local integrado ao sistema de
transporte público de alta capacidade (metrô);

• Identificação e transformação de espaços livres residuais que


possuam potencial em áreas verdes que ofereçam áreas de
convívio social, recreação e lazer, estimulem a presença de
biodiversidade, e possam funcionar como infraestruturas
multifuncionais de manejo sustentável de águas pluviais;

• Estímulo à participação social através da identificação e


mobilização de instituições e indivíduos que possam ser
fortalecidos para estimular o engajamento da população com
futuros projetos de implementação das estratégias e/ou para
adoção e conservação de áreas públicas.

A estratégia de implementação de reservatórios de detenção nos pés de


encosta é baseada na abordagem feita pela fundação COPETTEC (2000 apud
REZENDE, 2018) em que é proposta a construção de 21 reservatórios para
complementar as ações para redução de riscos de inundação na Bacia do Canal
do Mangue. Dos 21, são propostos 2 reservatórios para o rio Comprido chamados
Projeto Alto Rio Comprido que age diretamente sobre o rio principal (no Trecho 1),
e Projeto Bananas, implementado sobre o tributário rio Bananas. Rezende (2018)
ainda propõe em seu trabalho a criação de mais 3 reservatórios de detenção em
praças na área da bacia do rio Comprido: na Praça Del Vecchio (rio Bananas,
tributário), na Praça Condessa Paulo de Frontin e no Largo do Estácio (rio
Comprido).
Além dos propostos pela abordagem da COPETTEC e por Rezende, é
sugerida a criação de mais 3 reservatórios à montante dos tributários, devido à
presença de ocupação nas encostas que provocam o aumento da vazão escoada
na bacia. Destaca-se, dentro dessa situação, a micro bacia do Tributário 2
conhecido como Canal da Chácara que percorre a base de encostas ocupadas
por três grandes favelas da região. O mapa a seguir representa a localização das
propostas de criação de reservatórios combinadas (Fig. 31).
Figura 35 - Mapa de Localização dos Reservatórios Propostos

Fonte: Google Earth; IPP; LHC – COPPE/UFRJ; REZENDE, 2018; COPETTEC, 2000

Em relação à implementação de ETEC’s distribuídas em pontos a


montante da bacia, o objetivo é descentralizar o sistema de tratamento, fazendo
uso de espaços vazios urbanos. O efluente do sistema de tratamento poderia ser
depois lançamento na rede pluvial, evitando a sobrecarga do sistema de esgoto à
jusante. Esta proposta parte do princípio de tratar o problema na fonte, evitando
que ele se agrave nas partes baixas e facilitando as soluções em pequena escala.
O mapa a seguir sugere pontos em que podem ser implantadas as ETEC’s
sugeridas (Fig. 36).
Figura 36 - Mapa de Localização das ETEC's Propostas

Fonte: Google; IPP, LHC – COPPE/UFRJ.

Estas propostas podem ser incorporadas às estratégias para uma


requalificação fluvial urbana do rio Comprido, seguindo o conceito de
multifuncionalidade e redundância para o aumento da resiliência do sistema como
um todo, mesclando as SbN com infraestruturas “cinzas”.
Esta monografia apresentou o conceito de requalificação fluvial com
soluções baseadas na natureza como um elemento estratégico e estruturador
para restaurar e assegurar a qualidade ambiental do espaço urbano. Esta
abordagem multifuncional permite conjugar ao sistema azul (hidrológico) os
serviços ecossistêmicos que dão suporte à vida, em consonância com o espaço
urbano consolidado.
A contextualização deste trabalho mostrou que o modelo de cidade
reproduzida na era do Antropoceno e os modelos do sistema de drenagem urbana
implantados têm gerado diversos impactos negativos sobre as próprias cidades,
que atingem as esferas ambiental, social e econômica. Forma-se um cenário de
incertezas para o futuro que provoca a revisão dos modelos convencionais de
planejamento na busca por novos paradigmas que possam adaptar as cidades
para um desenvolvimento sustentável.
Todavia, conforme apresentado na fundamentação desta obra, existem
outras soluções. As estratégias que se baseiam e mimetizam o funcionamento da
natureza se apresentam como uma alternativa para aumentar a resiliência urbana
através de um ponto de equilíbrio para coexistência das cidades com os sistemas
naturais.
Neste contexto, os rios urbanos – que foram negligenciados no passado –
se mostram, através da requalificação, como um caminho consistente para
agregar valor à sociedade, revitalizando os espaços urbanos e permitindo
preservar a natureza e a biodiversidade.
Perante o exposto ao considerar a bibliografia consultada e o caso
estudado, conclui-se que a hipótese defendida foi confirmada. Sendo possível
defender que: o uso de Soluções Baseadas na Natureza, associadas à uma
infraestrutura tradicional, criando uma infraestrutura híbrida, pode
contribuir para a melhoria da qualidade ambiental de rios urbanos, do
espaço urbano ao longo de suas margens e para o melhoramento do manejo
sustentável das águas urbanas.
Vale destacar que o trabalho não esgota a discussão sobre a
implementação de soluções baseadas na natureza em cidades, a discussão sobre
a requalificação de rios urbanos ou sequer sobre o planejamento de soluções para
a bacia do Rio Comprido. Porém, busca estimular a realização de estudos
posteriores e principalmente aplicações práticas destas abordagens para
confirmação de sua efetividade e deve ser melhor adaptada para os futuros
impactos das mudanças climáticas que são ainda imprevistos na atualidade.
Por fim, este trabalho recomenda o uso destas abordagens multifuncionais
como elementos de resgate dos rios urbanos, transformando esses sistemas
naturais em ativos estruturadores da paisagem urbana renovada. Permitindo a
busca por cidades sustentáveis e verdadeiramente biofílicas que valorizem,
desfrutem e funcionem em harmonia com a natureza.
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