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REVISTA DE LIVRES PENSADORES MITOLÓGICOS

SUMÁRIO
03 APRESENTAÇÃO EDITORIAL;

06 ILUSTRES ILUSTRADORES;

08 PRÓLOGO DOS ARTIGOS;

09 ARTIGO DE CAPA: MÍMIR - A


MEMÓRIA DOS DEUSES
12 ARTIGO 01: DOS HERÓIS DO
CINEMA AO HERÓI QUE HÁ
DENTRO DE VOCẼ
15 ARTIGO 02: A TRÍADE TUPI E AS
ORIGENS DA ALMA BRASILEIRA
23 ARTIGO 03: MATERNAGEM E
MATERNIDADE
44 ARTIGO 04: DESTA VEZ A CASA
NÃO SAIRÁ DE ULISSES
55 ARTIGO 05: UM DEUS ANTIGO
ESCONDIDO EM FIGURAS
FOLCLÓRICAS IBÉRICAS

59 BIBLIOTECA DE THOTH;

65 VITROLA DE ORFEU;

76 HISTÓRIAS DA VÓ TIANA;

77 ARQUIVOS DE LOKI;

81 A NONA ÁRVORE;

86 ACADEMIA DE QUÍRON;

89 PANTEÃO DE COLABORADORES;

95 AGRADECIMENTOS.
APRESENTAÇÃO
EDITORIAL

Para não perdermos os bons Na Bilbioteca de Thoth, temos


costumes, vamos falar da edição do dicas literárias nacionais, onde uma
mês passado, que teve milhares de das resenhas foi feita por uma nova e
alcances nas primeiras 24h de querida colaboradora; A Vitrola de
publicação! Orfeu trará duas bandas nacionais
potentes; Nos Arquivos de Loki
Além disso, temos a honra imensa trouxemos os mitos japoneses em
de trazer nesta edição um jovem uma resenha sensacional; A Nona
ilustrador equatoriano muito Árvore traz um galho grego desta vez
talentoso, que trouxe essa belíssima e na Academia de Quíron, outros
representação de poder e coragem da cursos interessantes surgem, além de
mitologia nórdica! ouvir mais das Histórias da Vó Tiana!

Também temos novamente a honra Toda esta edição espera por você!
de ter o querido ilustrador do Reino
Unido, agora ilustrando um artigo! Aproveitem!

Como na edição anterior, teremos Larissa Dias


um artigo de capa, mostrando um
pouco mais sobre a a cultura da
divindade da imagem de capa da
revista deste mês.

Sou Larissa Dias, uma apaixonada pela Mitologia!


A Revista Eletrônica Mitologia Aberta surgiu com três principais
objetivos: Divulgação, Colaboração e Paixão!
GUIA DE SEÇÕES

ILUSTRES
ILUSTRADORES
Para saber um pouco mais sobre os artistas que dão vida às nossas
divindades por meio de incríveis ilustrações.

ARTIGOS
Um grande banquete onde todos os deuses se encontram para partilhar
conhecimento.

BIBLIOTECA
DE THOTH
Thoth é o deus da sabedoria da mitologia egípcia e nesta seção
vasculharemos em sua biblioteca dicas preciosas de livros de mitologia!

VITROLA
DE ORFEU
Orfeu é o deus da música da mitologia grega e aqui teremos acesso à sua
amada vitrola, repleta de mitologia musical!

HISTÓRIAS DA
VÓ TIANA
Quem nunca teve um familiar que lhe contasse histórias? Minha avó
Sebastiana era mineira e sempre me contava histórias, e aqui, estarão essas
histórias que fazem parte da mitologia familiar brasileira
GUIA DE SEÇÕES

ARQUIVOS
DE LOKI

Loki é o deus das trapaças na mitologia nórdica e com ele, tudo era
fictício. Assim, muitos mitos se desenvolveram sobre as ficções criadas
por ele. Por isso, nesses arquivos estarão algumas obras de ficção que
foram baseadas na mitologia.

A NONA
ÁRVORE

A Nona Árvore é uma seção especial para publicações de HQs mitológicas.

ACADEMIA DE
QUÍRON

Quíron era um centauro da mitologia grega, que treinava os heróis!


Então, nesta seção poderemos encontrar cursos, palestras e eventos de
mitologia para quem queira se aprofundar neste tema encantador!

PANTEÃO DE
COLABORADORES

Para saber um pouco mais sobre todos os incríveis colaboradores que criam
cada uma de nossas sessões!
ILUSTRES
ILUSTRADORES

Carlos Airas é um artista do


Equador, um incrível ilustrador, que a
revista Mitologia Aberta conheceu
através das suas belas artes feitas
para a banda Tuatha de Dannan. Ele
criou esta incrível arte exclusiva-
mente para a revista, que traz o deus Carlos Arias
Odin lutando contra Ymir, um antigo @carlosredlayer
gigante, o pŕimeiro ser vivo do início www.facebook.com/carlos.arias.79219
dos tempos!

Sou nascido em Cuenca, no


Equador, e atualmente tenho 24 anos.
Estou terminando meus estudos
universitários em artes visuais, pois
desde criança vivo fascinado pela
arte da fantasia, o que me levou a me
interessar pela disciplina de arte
conceitual. Atualmente, busco como
um dos nichos de minha carreira,
trabalhar como artista visual no
mundo dos videogames, desenhando
personagens. Outra das minhas
paixões é a arte clássica, que foi meu
início no mundo da arte, fazendo
pinturas a óleo. Atualmente trabalho
quase que exclusivamente com "Ymir e Odin",
Arte que ilustra a capa desta
técnicas digitais, que na verdade são
edição
semelhantes às técnicas tradicionais.
Eu realmente espero que meu
trabalho seja do agrado de todos
vocês leitores!" - Carlos Arias
ILUSTRES
ILUSTRADORES

Patrick Burke é um artista do Reino


Unido, cujo trabalho tem uma força e
expressividade únicas!

Atuando como artista multimídia,


seus trabalhos transitam entre
músicas elaboradas, histórias em @patrickburkeartworks
quadrinhos e claro, suas pinturas diary-of-an-artist.webnode.com
maravilhosamente impressionantes. facebook.com/PatrickBurkeArtworks

Ele diz "Sempre gostei de ser


criativo, é uma forma maravilhosa de
viver, nunca paro de trabalhar".

Já conhecemos Patrick com a


belíssima ilustração da edição do mês
passado, e agora, temos essa incrível
obra de acrílico sobre tela "Eyes from
the Past" (Olhos para o passado)
trazendo o corvo, animal símbolo da
morte em muitas mitologias.

Este artista incrível navega nos


muitos mares profundos das artes,
como HQs, fotografia, artes plásticas,
música e outras!

Não deixem de conhecer seu incrível "Eyes From the Past",


trabalho! arte que ilustra o segundo artigo
desta edição.
PRÓLOGO DOS
ARTIGOS

A revista Mitologia Aberta está na profunda, onde o Sol, a Lua e o Amor


sua quarta edição, e como ela é uma mostram seus papéis na formação da
revista de livres pensadores da da alma dos seres humanos.
mitologia, sempre batalhamos para
que ela possa ser acessível para Já o terceiro artigo traz o
pessoas de diversas áreas, que se matriarcado pelos olhos da mitologia
interessem pela temática. de um modo impressionante e envol-
vente, trazendo vínculos entre
Teremos novamente um artigo de mitologia e história pelo olhar da
capa, desta vez, trazendo informa- psicologia analítica, em uma grande
ções sobre o grande deus Mímir, que homenagem ao mês das mães.
assim como o gigante Ymir, faz parte
da mitologia nórdica. O artigo O quarto artigo é de uma beleza
também traz sua relação com o poética incrível, onde o autor traz o
grande deus Odin, que aparece na mito de Ulisses nesses tempos
capa da nossa edição, lutando contra pandêmicos, com o tema "Ulisses
Ymir. não sairá de Casa". Está imperdível e
avassalador!
O primeiro artigo traz de forma
bela o mito do herói e as etapas da Para finalizar, o quinto artigo vai
jornada para que todo possam trazer um antigo deus escandinavo
conhecer mais. A jornada do herói é que se esconde por trás de figuras
vivida nas mitologias do mundo todo, folclóricas ibéricas, trazendo um
então esta não será a primeira nem a novo conhecimento para os leitores!
última vez que a abordaremos. Além
disso, o artigo faz algumas analogias Como está tudo muito interessante,
interessantes com os heróis do que tal embarcarmos em busca da
cinema. nossa alma mitológica?

O segundo artigo traz a tríade Boa leitura!


Tupi-Guarani e as origens da Alma Larissa Dias
Brasileira, de uma forma intensa e
ARTIGO DE CAPA ALLAN MARANTE

MÍMIR – A MEMÓRIA
DOS DEUSES
POR ALLAN MARANTE

Estamos acostumados a ler as Na Edda “Sabedoria da Bisavó” temos


histórias antigas como se fossem um literal universo de conhecimento
novelas ou contos, com personagens a ser explorado e entendido. A
fictícios, que, nas situações em que verdade por detrás da alegoria.
se encontram, são Deuses ou heróis.
Um dos exemplos desta situação é
Contudo, ao tratarmos as antigas Mímir, o sábio tio de Óðinn, descrito
religiões como histórias perdidas no como uma cabeça decapitada falante,
tempo, não apenas ignoramos o fato detentor de grande conhecimento e
de que diversas crenças antigas guardião do Mímisbrunnr “Poço das
resistiram ou perduraram até os lembranças”.
tempos modernos, por meio de
reconstruções, histórias locais, Mas de onde vem estes conceitos?
costumes, valores culturais e até Por que as pessoas assim descrevem
mesmo as próprias crenças Mímir? E o que exatamente isso
sobreviveram, como nos distanciamos representa dentro do Forn Siðr
do real entendimento do que os “Antigo Costume”?
manuscritos antigos realmente
querem dizer. Comecemos com o significado do
nome de Mímir. Comumente
Não se enganem! As fontes traduzido como “Aquele que se
históricas nórdicas são vastas e lembra”, ou “Aquele que é Sábio”, o
repletas de conhecimento espiritual. nome de Mímir vem do substantivo
ARTIGO DE CAPA ALLAN MARANTE

neutro *Minþiją (lembrança; mælti við hann ok sagði honum marga


recordação; brinde; memória), da leynda hluti.
língua protogermânica, que da origem
ao substantivo neutro Minni Assim os Vanir começaram a suspeitar
(memória; lembrança), na língua que os Æsir os teriam enganado na
nórdica antiga. troca de reféns. Eles capturaram Mímir,
o decapitaram e enviaram a cabeça
O verbo *Minþijaną (recordar; dele aos Æsir. Óðinn pegou a cabeça e
relembrar), da língua protogermânica, a defumou com ervas, de forma que ela
que origina o verbo Minna (recordar; não iria apodrecer, e entoou
relembrar; memorizar), da língua magníficas galdrar (canções mágicas).
nórdica antiga, também está Assim, ele concedeu a Mímir o poder da
diretamente ligado ao nome de fala, e o revelou muitos segredos.
Mímir. (Tradução de Allan Marante, presente
na obra Ynglinga Saga “A Saga dos
É por isso que o nome de Mímir é Deuses e Reis Nórdicos”)
então traduzido como “Aquele que se
lembra”. Uma existência divina que Este é um dos fragmentos que
se recorda dos mais antigos feitos atestam que Mímir realmente é uma
dos Regin “Poderes Governantes” e cabeça decapitada, e que Óðinn o
dos homens. reanimou com o galdr, a arte nórdica
de encantamentos.
O que dizem as fontes primárias
sobre Mímir? Na Ynglinga Saga “A Por que um Áss “Deus; Poder
Saga dos Reis Nórdicos”, um texto do Incitador” poderoso como Óðinn,
século XII, escrito em nórdico antigo, governante de todas as coisas,
temos o seguinte fragmento: grandiosas e simplórias, precisaria
reanimar a cabeça do próprio tio após
Þá grunaði Vani, at Æsir mundi hafa ele ser morto? A resposta vai além da
falsat þá í mannaskiptinu; þá tóku þeir alegoria.
Mími ok hálshjoggu ok sendu höfuðit
Ásum. Óðinn tók höfuðit ok smurði Não podemos pensar em
urtum, þeim er eigi mátti fúna, ok kvað personagens de “carne de osso”,
þar yfir galdra, ok magnaði svá, at þat como se fossem meros bonecos ma-
ARTIGO DE CAPA ALLAN MARANTE

nipulados em uma narrativa. servam com afinco as memórias e


Enquanto as memórias estão lembranças.
preservadas, as coisas não morrem.
Apenas quando se compreende o
Em diversos textos importantes da passado, se entende o presente e
Edda, como o Hávamál “O Elevado torna-se possível construir os
Discurso”, é mencionado que tudo caminhos ao futuro.
está destinado a morrer, mas os
feitos e o destino daqueles que são Alt veit ek, Óðinn!
lembrados jamais morre. hvar þú auga falt:
í inum mœra
O Mímisbrunnr, o Poço das Mímis brunni;
Lembranças, o Povo de Mímir, é a
memória Divina, que recorda e De tudo eu sei, Óðinn!
resguarda tudo aquilo que aconteceu Onde tu escondeste o teu olho,
e que acontece. É a fonte da nas profundezas
sabedoria do Universo, onde mesmo do Mímisbrunnr (Poço de Mímir).
Óðinn, o mais soberano e exímio dos
Æsir “Poderes Incitadores” buscou
suas inesgotáveis memórias, em
sjlálfr sjalfum mér “eu mesmo a mim
mesmo; meu espírito dedicado a
mim”. REFERÊNCIAS

MARANTE, ALLAN (Tradução).


É impossível, contudo, em um curto
Völuspá. A profecia da Mulher
espaço de tempo, explorar todas as
riquezas e conhecimentos espirituais Sábia.
que a língua nórdica antiga e seus
manuscritos preservam. Mas se cada
dia pudermos mergulhar um pouco
mais fundo nas memórias dos
antepassados, então poderemos
entender o porque mesmo os Regin
“Poderes Governantes; Deuses” pre-
ARTIGO 1 NÚBIA FUJII

DOS HERÓIS DO
CINEMA AO HERÓI QUE
HÁ DENTRO DE VOCÊ
POR NÚBIA FUJII

Capitão América, Thor, Mulher fossem nós mesmos. E isso é


Maravilha, Homem Aranha, Pantera verdade, já que em cada um de nós
Negra - nos últimos anos, a indústria habita um herói. Por outro lado, é
cinematográfica tem apostado possível dizer que há algo mais
bastante em filmes de heróis e profundo nessa afirmação.
heroínas, e os altos índices de
bilheteria comprovam que se trata de A figura do herói é típica de
um sucesso. Desde os primórdios que qualquer civilização, independente-
as histórias de deuses, heróis, mente do tempo e do espaço. Usando
mocinhos e mocinhas, que se lançam termos junguianos, trata-se de um
em um caminho permeado de arquétipo. O arquétipo está ligado ao
obstáculos e dificuldades, mas que ao conceito de inconsciente coletivo,
final chegam a uma grande conquista, que pode ser descrito como uma
fascinam o imaginário das pessoas, espécie de reservatório de conteúdos
sejam em obras literárias, no cinema, relacionados à nossa ancestralidade,
no teatro ou na TV. E você, já se ao nosso passado comum. Os
perguntou por que isso acontece? arquétipos representam esses
conteúdos e apresentam modelos de
A resposta parece ser simples, uma existência, formas de lidar com a vida
vez que nutrimos uma identificação (HALL; NORDBY, 2014).
com tais enredos, e, muitas vezes,
nos imaginamos no lugar desses Um dos modos de tornar esses
personagens heroicos, como se eles conteúdos inconscientes em algo
ARTIGO 1 NÚBIA FUJII

consciente é expressá-los por meio faz uma descrição detalhada, mas


dos mitos, por exemplo. Mitos são podemos dizer que a jornada é
narrativas de uma realidade que dividida basicamente em três fases:
passa a existir. Eles se tornam um partida, iniciação e retorno.
modelo e dão origem a padrões de
comportamento. A cada repetição A partida implica num afastamento
desses comportamentos existe do ambiente em que o herói vive,
sempre a possibilidade de algo novo. como se ele precisasse deixar o
Para Joseph Campbell (2014), os mundo exterior para adentrar o
mitos ajudam a colocar a mente em mundo interior. Ela vem com um
contato com a experiência de estar chamado, prenunciado por um certo
vivo, podendo dar a ela um sentido desconforto, uma insatisfação, como
maior. se algo estivesse fora do lugar. Com o
chamado aceito, o herói adentra um
Sendo assim, todos nós, ao longo labirinto, por um portal, para, quem
de nossa caminhada, passamos por sabe, sair dele renascido. No meio do
muitas jornadas heroicas, que nos percurso contará sempre com aquilo
mobilizam psicologicamente, nos que Campbell chama de auxílio
levam a um crescimento espiritual e sobrenatural, uma figura que
nos permitem um maior representa o poder protetor do
conhecimento de nós mesmos, ou destino. Sabe aqueles momentos
seja, vivenciamos o mito do herói difíceis em que, de repente, nos
constantemente. deparamos com situações que
parecem ter sido providenciais?
Toda jornada heroica encontra um Gratas surpresas, que nos ajudam a ir
caminho de medo e insegurança, mas em frente...
se for bem percorrida pode trazer
grande satisfação, restauração da A segunda fase é a de iniciação.
vida e bem-aventurança. Campbell Nela, obstáculos precisam ser
delineou a jornada do herói e todas ultrapassados, através de provas
as suas etapas em seu livro “O herói desafiadoras. Limitações pessoais
de mil faces”. Essas etapas são devem ser vencidas e a busca aqui se
geralmente observadas em todas as revela como o encontro de uma
narrativas heroicas. No livro, o autor unidade, uma elevação do espírito,
ARTIGO 1 NÚBIA FUJII

que se tornou mais inteiro após


REFERÊNCIAS
tantos desafios. Trata-se do encontro
com a bem-aventurança.
CAMPBELL, Joseph. O herói de mil
A última etapa é a do retorno. faces. 11º edição. São Paulo:
Nessa etapa o herói volta ao mundo Editora Pensamento, 2007.
transformado, e a ideia é que ele se CAMBELL, Joseph. O poder do
torne testemunha viva da dádiva que mito. 30ª edição. São Paulo: Palas
lhe ocorreu, devolvendo para o Athena, 2014.
mundo essa preciosidade, ensinando HALL, Calvin S.; NORDBY, Vernon
o que foi aprendido e tornando o J. Introdução à psicologia
mundo um lugar melhor. junguiana. São Paulo: Cultrix,
2014.
Assim, é maravilhoso pensar que
todos nós temos potencialidades que
podem ser desenvolvidas, que temos
forças que não conhecemos, mas que
se mostram poderosas em momentos
decisivos. E, o mais importante: que
essa força é capaz de transformar a
nós e o mundo que nos cerca, assim
como ocorre nas famosas histórias
que tanto nos encantam. Por isso,
quando você ouvir um chamado para
algo maior em sua vida, não hesite.
No final você encontrará sua bem-
aventurança. Desperte o herói que há
dentro de você!
ARTIGO 2 SOLANGE D’AMATO

A TRÍADE TUPI-
GUARANI E AS
ORIGENS DA ALMA
BRASILEIRA
POR SOLANGE D’AMATO

Compartilhar um mito tupi- Somos um povo miscigenado e,


guarani por meio da tríade divina de apesar da riqueza étnica cultural, a
algumas etnias indígenas, história de dominação da cultura
apresentando um deus brasileiro europeia sobre nosso povo acabou
equivalente a Eros da mitologia por fazer com que em certos debates
grega, é um convite a olhar para a fossem excluídas nossas influências
nossa ancestralidade, a nossa origem indígenas e africanas.
como povo.
Nossa história como povo começou
Desde os primórdios das muito antes do descobrimento do
civilizações, os indígenas têm uma Brasil, mas é comum começar a
conexão com as forças da natureza, contá-la aos nossos estudantes a
que estão presentes nas suas crenças partir dele. Assim, parece que
em divindades por eles cultivadas. perdemos o nosso mito de origem e
Esse legado permanece vivo até hoje, negamos nossa ancestralidade. Como
em mais de 305 etnias, com 274 diz Roberto Gambin (2020), “Cada
línguas distintas, que vivem no Brasil. um de nós carrega um índio dentro de
Vale a pena conhecer um pouco dessa si.”
cultura que com eles resiste!
ARTIGO 2 SOLANGE D´AMATO

Não devemos negligenciar a riqueza


da cultura europeia, mas precisamos
valorizar a totalidade da cultura
brasileira para fundamentar nossa
identidade em suas raízes. A partir
dos mitos indígenas podemos
resgatar aspectos da alma brasileira.

Historicamente, os mitos, ritos e


costumes dessa cultura foram
ensinados como algo exótico, e
raramente como nossa base cultural.
Não enxergar a importância da nossa
raiz cultural é excluir parcela da
nossa essência.

Precisamos resgatar aspectos da


nossa alma brasileira para conquistar
uma identidade cultural
fundamentada em nossa totalidade.
"Eyes from the Past" - Patrick Burke
Ainda nos diz Roberto Gambini
(2020)” que se não tivéssemos
fundida, para que possamos
negado nossas raízes estaríamos
reconhecer nosso patrimônio humano
realizando, através da nossa história,
e nos tornarmos realmente o que
uma grande síntese de duas maneiras
somos, pessoal e coletivamente,
de ser humano: a europeia e a
como país.
ameríndia.” Como não foi feita a
síntese das duas polaridades, o que
Pretendo agora concluir essa
ocorreu historicamente foi a negação
reflexão, abordando um mito
de um polo em predominância
brasileiro Tupi – Guarani: uma
avassaladora a outro.
história de amor do Deus Rudá - uma
adaptação da versão do mito Rudá
A mitologia indígena precisa ser di-
por Christiane Angelotti.
ARTIGO 2 SOLANGE D´AMATO

No começo, ainda no silêncio… bola de fogo, esquentava tudo aquilo.


muito silêncio… havia a escuridão, E criava.
muita escuridão. Nada se via. Nem
olhos havia para ver. Escuro, muito Criava peixes, de espécies e cores
escuro. diferentes, que viviam nas águas,
cada qual com o seu tamanho… Criava
Então nasceu o Sol, Guaraci. Desde animais de espécies e cores
o primeiro dia, Guaraci nasceu como diferentes, que viviam nas terras,
sempre nascia: devagarinho, primeiro cada qual com o seu tamanho… Criava
um clarão no nascente, depois uma vegetais, de espécies e cores
bola de luz vermelha… ia clareando e diferentes, que viviam nas águas e
subindo… subindo… subindo… e ia nas terras, também com tamanhos
clareando tudo, iluminando tudo, diferentes… Criava pássaros e insetos
aquecendo tudo, derramando vida em para povoar o ar… sempre de espécies
tudo… e cores e tamanhos diferentes… E
todos eles faziam sons diferentes…
Mas o tudo, no começo, era quase cada um do seu jeito.
nada.
E de tanto criar tantas coisas, tanta
Então Guaraci viu aquele nada e natureza, tudo tão bonito… ah…
começou a criar… Criou as águas, Guaraci ficou cansado. Ficou muito,
muitas águas: águas de sal, águas muito cansado… e foi ficando com
doces, águas de jorrar do céu… Depois muito sono… precisou dormir. Foi
criou as terras, muitas terras… fechando os olhos, bem devagarinho,
e quando fechou os olhos de vez,
Entremeando as terras, águas que tudo ficou escuro, muito escuro.
corriam, águas que paravam… As Guaraci não podia ver mais nada do
águas se movimentavam e as terras que havia criado. Enquanto dormia,
também… e Guaraci gostava daquele só a escuridão. Ah… cadê tudo aquilo
movimento. E de ver aquele tão bonito? Guaraci queria ver tudo
movimento, Guaraci criou o vento, de novo, mas estava tão cansado…
que também se movimenta. Às vezes Ainda queria descansar mais, mas
forte, tufão, furacão… às vezes leve, estava tão sozinho…
brisa calma e refrescante. E Guaraci,
ARTIGO 2 SOLANGE D´AMATO

Nesse sono ou nesse sonho, no meio E ele queria mostrar a ela o quanto
dessa escuridão toda, Guaraci criou a era bonita toda aquela natureza, com
Lua, Jaci. Mas foi no meio do seu suas flores e cores… Mas ela não
sono, quando estava tudo escuro. Foi estava mais lá. E ele procurava,
assim: lá longe, Guaraci viu chegando procurava… e ela não estava mais lá.
um clarão, no coração da escuridão. De tanto procurar por Jaci,
Aquele clarão foi crescendo, foi se novamente Guaraci ficou cansado,
abrindo no escuro da noite, e foi se muito cansado… e mais uma vez
apresentando. Subindo no céu, ela foi fechou os olhos para dormir um
surgindo, Jaci, primeiro como uma pouco. E, enquanto dormia, lá vinha
bola amarela, cor de laranja, as ela, fazendo o seu desfile no fundo
laranjas que Guaraci tinha criado da escuridão, com seu lume, com seu
antes. Depois Jaci, a Lua, subia e jeito de se apresentar e de mudar de
subia, e quanto mais alto subia, mais ouro em prata… Era mesmo muito
o seu brilho virava prata, e fazia um bela, Jaci.
lindo clarão, iluminando toda a
natureza. Era lindo o brilho nas E Guaraci queria dizer de seu amor
águas, o clarão nas montanhas… e por ela, e o quanto de lindo havia
outros sons se faziam, os sons da quando ela não estava… E queria
noite. dizer que quando abria os olhos para
chegar a ela, tudo clareava e ela
Era uma Lua tão bonita que Guaraci, sumia. E queria dizer também que
nessa mesma noite de sono ou de quando tudo se iluminava, ela
sonho, apaixonou-se por ela. Um desaparecia.
sentimento tão bom… ela era tão
bonita… e mostrava, do seu modo Então, Guaraci criou Rudá, o
especial, do modo mesmo de Jaci, mensageiro de seu amor… para dizer a
mostrava tudo aquilo que ele tinha ela o que se sentia quando ela crescia
criado. Guaraci ficou tão encantado e no escuro do seu sono… e que, na
apaixonado que abriu os olhos para clareza do seu sonho, ele a admirava.
poder vê-la e admirá-la melhor… mas, Ele queria também mostrar a ela
ah… quando abria os olhos tudo se quantas coisas lindas havia quando
iluminava de um jeito mais forte, ele estava de olhos abertos… E como
colorido, e ela desaparecia… ele se sentia só quando ela desapa-
ARTIGO 2 SOLANGE D´AMATO

recia… que ela também se sentia só e sentia


muita saudade quando Guaraci abria
Foi assim que nasceu Rudá, o amor. seus olhos iluminando tudo, mas que
Porque o AMOR não conhece luz ou ela o amava e queria que ele
escuridão, e assim podia levar a Jaci a soubesse disso. E Rudá levou a
mensagem de Guaraci. Dia ou noite, mensagem.
Rudá, o AMOR, podia dizer à Lua Jaci
o quanto o Sol Guaraci era Então Guaraci criou algumas estrelas,
apaixonado por ela. mais estrelas, muitas estrelas, cada
uma com um tamanho e brilho
E levou a mensagem a Jaci. Ela, por diferente para cintilar no céu e
sua vez, mandou também uma alegrar Jaci, fazendo companhia a ela
mensagem de volta, dizendo o enquanto ele dormia.
quanto achava lindo tudo o quanto
ele fazia… que ela passava a noite E até hoje, Rudá, o filho do Sol,
admirando todas as águas, todos os nascido para ser o mensageiro do
peixes, todas as terras e todos os amor de Guaraci por Jaci, vive dia e
seres que vivem na terra, todos os noite, cumprindo sua missão.
pássaros da noite, que se deliciava
com a brisa suave, que ouvia os sons Ele é encarregado de reproduzir os
da noite, contraponto dos sons do seres criados, pois Guaraci e Jaci
dia… querem sempre mostrar um ao outro
uma coisa diferente. E todos os dias e
E Rudá, o AMOR, levava a mensagem todas as noites Rudá, que vive nas
de Jaci a Guaraci, e sempre ficava tão nuvens, fortalece esse amor com suas
feliz que novamente abria os olhos e mensagens.
iluminava tudo durante o dia… E
novamente mandava por Rudá, nova Ele também tem a missão de criar o
mensagem de amor. amor no coração dos homens,
despertando o amor como aquele de
E por Rudá, Jaci mandava também Guaraci por Jaci e de Jaci por Guaraci.
outra mensagem de amor, dizendo O amor feito de admiração e de
que a luz que ela brilhava também respeito pelo brilho do outro, pois
vinha dele, do amor que ele tinha. E cada um tem seu jeito próprio de bri-
ARTIGO 2 SOLANGE D´AMATO

lhar. O amor feito de saudade, de Amãna reçaiçu


beleza, de encantamento. O amor Iuaká pinaié
também pela Terra, pelos mares, Aiuté Cunhã
pelos rios, pelas árvores, pelos Puxiuéra oikó
animais, pelos homens, pelas Ne mumamára ce recé
mulheres e entre todos, porque afinal Quahá caarúca pupé.
todos são admirados de dia e de
noite por Guaraci e Jaci. Traduzindo:

Interpretação "Óh Rudá, tu que estás nos céus e


que amas as chuvas...Tu que estás
Temos nesse mito uma tríade divina nos céus...faz com que ele, por mais
da cultura de algumas etnias mulheres que tenha, ache-as todas
indígenas, que são representadas feias; faz com que ele se lembre de
pelo Sol (Guaraci), a Lua (Jaci) e Rudá mim nesta tarde, quando o Sol se
(amor). ausentar no ocidente…"

Na mitologia tupi, Rudá é o deus do Invocações à lua


amor que vive nas nuvens. Sua
função é despertar o amor dentro do Os tupis consideravam as luas cheia
coração dos homens. Guaraci, assim e nova elementos auxiliares de Rudá,
como em outras mitologias que o deus do amor, e tinham invocações
apresentam divindades relativas ao semelhantes às que cantavam àquele
Sol, é também um importante deus deus, e para o mesmo fim, de trazer
para os tupis-guaranis, tanto quanto os amantes ao lar, pelo poder da
Apolo na mitologia grega, Brahma na saudade. Eram estas as invocações à
mitologia hindu e Osíris na egípcia. lua cheia (cairé) e à lua nova (catiti):
Rudá é o Cupido dos indígenas. É a
ele que as virgens e os guerreiros se Cairé, cairé nú
dirigiam, pedindo-lhe proteção nas Manuára danú çanú
suas pretensões amorosas. Eré ci erú
Piape amu
Rudá, Rudá, Omanuara ce recé
Iuaká pinaié Quanhá pitúna pupé
ARTIGO 2 SOLANGE D´AMATO

Catiti, catiti casamento sagrado. Esse casamento


Imara notiá está na base de todas as tradições
Notiá imára ancestrais, e presente na psicologia
Espejú (fulano) profunda.
Emú manuára
Ce recé (fulana) Conhecemos a mística que existe
Cuçukui xa ikó nos elementos sol e lua para a cultura
Ixé anhú i piá póra. indígena, que vê também o mistério e
a beleza do universo nesses dois
Sua tradução, apesar da ignorância elementos da natureza.
do sentido de alguns versos, é assim
apresentada: Podemos entender por essa narrativa
poética que todo mito é carregado de
"Eia, ó minha mãe (a lua) fazei chegar significado e representações, de
esta noite ao coração (do amante) a acordo com sua cultura, ética e visão
lembrança de mim". de mundo de seu povo.

"Lua nova, ó lua nova! Assoprai em Procurei apresentar aqui um pouco


fulano lembranças de mim, eis-me da riqueza cultural do nosso povo,
aqui, estou em vossa presença; fazei pouco valorizada em nosso país, e a
com que eu tão somente ocupe seu necessidade de mantê-la viva, para
coração". garantir, por meio dos mitos
indígenas, um contato maior com a
Nessa narrativa mítica, vamos nossa realidade e similaridade com
encontrar aspectos presentes em mitos de outras culturas, mais
nossa constituição como humanos: a conhecidos e divulgados.
polaridade emoção / pensamento,
masculino / feminino, razão / afeto.
Segundo a mitologia junguiana, o sol
REFERÊNCIAS
é o princípio ativo masculino, o logos, OLIVEIRA, HUMBERTO. (org),
enquanto a lua é associada ao Morte e Renascimento da
feminino. Rudá faz a ponte entre a Ancestralidade Indígena na Alma
lógica e a sensibilidade. Ele foi capaz Brasileira. Petrópolis RJ: Vozes
de harmonizar essa tensão e gerar o 2020.
ARTIGO 2 SOLANGE D´AMATO

WERÁ, KAKÁ. O trovão e o Vento.


São Paulo SP: Polar 2016.
MUNDURUKU, DANIEL. O
Banquete dos Deuses. São Paulo
SP: Global 2006
JUNG, CARL. GUSTAV. O Homem e
seus Símbolos. Rio de Janeiro RJ:
Nova Fronteira 2008

Sites Consultados:
<http://sandrafichera.blogspot.com/2
011/12/lenda-do-sol-e-da-lua.html.>
Acesso em: 9 de fev.2021
<http://vida-de-indio.blogspot.com>
Acesso em: 9 de fev.2021
ARTIGO 3 ROSANGELA CORRÊA

MATERNAGEM E
MATERNIDADE:
ALÉM DO ESPECTRO DE FEMININO
POR ROSANGELA CORRÊA

Olá, caros leitores, sejam sempre longe de ser uma exclusividade da


muito bem-vindos. Para o estudo MULHER, mas ainda assim no
deste 4° exemplar da nossa Revista manancial arquetípico do que
Mitologia Aberta, e que acontece num entendemos e aceitamos como
mês de maio, procurei, de alguma pertencente ao feminino. Pream-
maneira, associar o tema ao evento bulando e sintetizando: Maternagem
de Dia das Mães, comemorado no pode e deve ser exercida e
Brasil e em vários outros países do experimentada por qualquer ser vivo,
globo - esta localização se faz por simplesmente ser uma escolha e
ação de cuidar e ser cuidado. – Ah!, e
necessária, pois nossa querida revista
entusiasmadamente exorto-vos a
já ultrapassou as fronteiras nacionais.
apropriarem-se desta constatação, e
Mas, obviamente, MÃE é universal, e
que possamos exercitar ativamente a
sempre torna-se um tema pulsante,
empatia, em todas as frentes de
por vezes controverso. Desde o início
atuação e inter-relação.
sabia que queria falar sobre a questão
de MATERNIDADE, mas não só para as
Dito isto, comecemos do princípio:
mães ou para as pessoas que querem
como quase tudo que nos remete às
ser mãe de alguma forma, e
narrativas e/ou especulações do
definitivamente não apenas para as
“antigamente”, sejam mitologias,
mulheres. O objetivo é abordar as
histórias pregressas ou até da pré-
questões da maternidade e tudo o
história, como vamos abordar neste
que envolve a dinâmica do feminino,
artigo, inexoravelmente somos pos-
que entendemos como MATERNAGEM,
ARTIGO 3 ROSANGELA CORRÊA

tos e expostos às muitas versões minado indivíduo, e que correlacione


propagadas, defendidas, pesquisadas, seus dramas atuais a algum evento
ou popularmente aceitas como experimentado, tido como factual ou
tradições. Alguns pesquisadores não, devemos considerar, trabalhar e
defendem a “romantização” da tratar os conteúdos presentes em sua
origem da era matriarcal ou respectiva experiência de verdade
matriarcado, conjecturando que psíquica, muitas vezes
tenha sido apenas aventada para ressignificando, transmutando e
balizar as mitologias ao longo do integrando, na medida e no tempo
hábil ao próprio indivíduo, no
desenvolvimento humano. E não
desenvolvimento de sua mitologia
estou aqui para negar ou assentir com
pessoal. Conforme Eliade (1963, p.
esse julgamento ou proposição, mas
11), “[...] o mito conta uma história
também não vou me esquivar de
sagrada; ele relata um acontecimento
acolhê-lo, como os artistas gostam
ocorrido no tempo primordial [...] É
de sugerir em seus ramos de atuação,
sempre, portanto, a narrativa de uma
como “licença poética” de vazões
‘criação”.
criativas. Portanto, partindo deste
pressuposto e considerando que os Então, sem mais delongas, para este
conteúdos presentes no que a estudo vamos considerar, sim, o
psicologia junguiana define como desenvolvimento conceitual do
inconsciente coletivo, uma vez lá Matriarcado e sua transição ao
posto – conteúdos arquetípicos –, Patriarcado, bem como desdobra-
sejam eles factuais ou não, do ponto mento de ambos, contemporanea-
de vista dos seres viventes, mente. Para tal, escolhi como fio
relativizado e pertencendo ao condutor parte da entrevista do
manancial arquetípico, está e para professor Bernardo de Gregório, na
sempre estará disponível e acessível série Entre o Céu e a Terra,
a todos! De maneira bastantes devidamente referenciado, e que
simplificada e para ilustrar o recomendo vivamente, por muitas
raciocínio, consideremos como razões, seja pela abrangência
exemplo uma percepção clínica: sintetizada de um assunto tão rico,
sobre a realidade psíquica de cada lindo e vasto, seja pela simplicidade
um, ou seja, quando tratamos os em abordá-la, e, principalmente, pela
traumas manifestados por um deter-
ARTIGO 3 ROSANGELA CORRÊA

“licença” muito bem-humorada e mesmo período, comumente no final


impessoal de sua exposição, além de da primavera. Gestavam por nove
agregar conteúdo de outras fontes meses, e após três meses de
pesquisas ao longo do desenvolvi- amamentação, já estavam aptas a
mento deste artigo. uma nova ovulação, afinadas a um
ciclo sazonal, renovado a cada doze
Como preâmbulo, compartilho a meses, e consequentemente, não
citação dos pensadores Monteiro, havia o fenômeno de menstruação.
Pires e Colonna: Ocorria o que entendemos como cio,
e que o prof. Bernardo cita
[…] o feminino torna-se ‘demoníaco' ilustrando: como uma espécie de
quando banido do consciente, mas não ditadura hormonal, onde sincroniza-
se afasta de nós, acabando por nos damente, por causa dos picos
possuir de forma inconsciente. hormonais, todas as fêmeas que,
(Monteiro 1998, p. 34) ovulando, eram instintivamente
Reforçado pela descrição de Valéria conduzidas às cópulas, e, portanto,
Fabrizi Pires, embasada na afirmação fecundadas.
de Colonna (1980) “O demoníaco é
uma força arquetípica da experiência Sacralidade – A princípio e por
humana. Essa força pode ser milênios, entendia-se a mulher como
construtiva, destrutiva ou ambas, a própria deusa geradora de vida, e
dependendo da quantidade de era natural que os filhos,
impulsos para expressá-la. Lilith, que conceitualmente, pertencessem às
necessita expressar-se em toda a sua mulheres: mães. Até então, era nada
natureza instintiva, acaba tornando-se óbvio a participação do homem na
um demônio. (Pires 2008, p. 45). geração de uma nova vida. A mulher,
além de gestar e parir
Matriarcado como Princípio
“magicamente”, era equipada e
abastecida com alimento para aquele
Originalmente, quando ainda não
novo ser. Naturalmente, não havia um
éramos humanos propriamente dito,
conceito de pai ou qualquer inter-
as fêmeas mamíferas silvestres
relação nesse sentido. Como explica
tinham ciclos de fecundidade anual, e
o prof. Bernardo, na Série Entre o
naturalmente todas ovulavam no
Céu e a Terra:
ARTIGO 3 ROSANGELA CORRÊA

“[…] Então era como uma situação tempo, seja pelo ataque de animais,
mágica, uma situação divina, ou por condições climática inóspitas.
sobrenatural em que a própria mulher Com o passar do tempo e do
era a deusa, porque ela criava uma desenvolvimento humano, começa-
nova vida do nada, ela amamentava, e ram perceber que novas plantas
a imagem da amamentação também é surgiam no local onde as sementes
divina, pois aparece magicamente, por eram descartadas e seus frutos eram
assim dizer, o alimento daquele bebê. similares aos que haviam consumido
Ela criou uma nova vida, e ela sustenta antes, e passaram a plantar
essa nova vida com os recursos dela conscientemente, iniciando assim a
sozinha. Então nessa época que é o revolução agrícola, fundamental para
finalzinho do paleolítico, a mulher é o desenvolvimento da espécie
vista como uma deusa, ela humana. Por analogia associaram a
propriamente, como uma deusa terra à Grande Mãe Terra, visto que
encarnada, a ideia da deusa é a mulher produzia vida, assim, naturalmente
de carne e osso […].” (Gregório, também era percebida como
entrevista - Série Entre o Céu e a feminino, e sagrada como mulher.
Terra) Ainda sobre o fogo, o prof. Bernardo,
acrescenta um dado geométrico
De modo geral os homens interessante:
desenvolviam as tarefas de caçar,
pescar e proteger o núcleo “A este tempo já estamos falando da
matrilinear, pois moravam em fase neolítica, onde já se dispensa a
cavernas e ainda não dominavam a necessidade de morar em cavernas, e
criação do fogo. Porém já eram já se organizam em aldeias. É
capazes de manter acessa as chamas, interessante perceber que o formato
fruto de um evento natural, como geométrico circular das aldeias está
raios ou incêndios, o que era intimamente associado a cultura do
responsabilidade e domínio das fogo, inicialmente nas cavernas, pela
mulheres, que, além cuidar da prole, justa natureza comportamental de nos
da moradia e do fogo, também posicionarmos ao redor do fogo, de
desenvolveram a arte da coleta de modo que a fogueira esteja posicio-
frutas e raízes, normalmente próximo nada ao centro para beneficiar, com
às cavernas que habitavam, em luz e calor, um maior número de parti-
função dos muitos perigos daquele
ARTIGO 3 ROSANGELA CORRÊA

cipantes naquele tempo/espaço. E conta que México DC é uma das


quando migram para as aldeias em maiores cidades do mundo. De
formação, reproduzem o modelo qualquer forma, é ainda mais
geométrico, ainda presentes nas impressionante perceber a extrema
aldeias indígenas atualmente […].” mobilidade oferecida por um conceito
(Gregório, entrevista - Série Entre o tão arcaico em torno do modelo
Céu e a Terra). geométrico circular, cunhado pelo
instinto de sobrevivência humano e
Podemos perceber essa influência e altamente recorrente nos muitos
referência geométrica de muitas símbolos de diversas mitologias.
maneiras, como em alguns níveis
experimentados e/ou tentados em As manifestações arquetípicas atuam
sistemas viários de certos centros do instinto primitivo do indivíduo às
urbanos contemporâneos, como o elaborações de conceitos e ideias na
complexo viário da Cidade do México, vida contemporânea. Em suma, todas
organizado em dois anéis (interior e as formulações, símbolos e imagens,
periférico) e linhas ortogonais – citei aspectos e conceitos, interpenetram-
se, excluem-se e/ou completam-se,
o exemplo mexicano pois, por ocasião
aparentemente independentes uns
de uma visita, fiquei imensamente
dos outros. Entretanto, estão ligados
impressionada com o modelo viário
a um arquétipo como o da Grande
para deslocamento entre as cidades
Mãe, por exemplo. O termo “Grande
no entorno dessa grande megalópole,
Mãe”, englobado no conceito “Grande
onde partindo do centro é possível
Feminino”, pressupõe uma
chegar a vários outros núcleos de
consciência desenvolvida, embasada
evasão viária. Lembro que na ocasião,
na reunião de símbolos com carga
em 2012, no mapa era mesmo emocional. Dentro deste contexto,
possível perceber as disposições num temos:
formato de anel periférico. Numa
breve e rápida pesquisa para este “Mãe” - corresponde ao aspecto
artigo, infelizmente, encontrei de maternidade e/ou
indícios de que a operacionalidade “maternagem”, assim como a
deste modelo implantado perdeu condição psíquica do ego.
parte de sua eficiência, em função da
evolução demográfica, levando em
ARTIGO 3 ROSANGELA CORRÊA

“Grande” – corresponde ao caráter que tange incubação, germinação,


simbólico de superioridade em nascimento, crescimento, floração e
relação ao que está presente em fruto, para em seguida o ciclo ser
todas as criaturas. reiniciado. Tudo indica que nesse
tempo tudo era focal, sem
Jung e Neumann, fazem coro neste perspectivas ou reflexões sobre
sentido: passado e futuro. Na era matriarcal,
segundo prof. Bernardo, nada era
“Os arquétipos do inconsciente coletivo imposto, tudo era simplesmente
se manifestam como Jung descobriu há
acolhido, tradicionalmente embasado
muitos anos, nos “motivos
numa ancestralidade arquetípica e
mitológicos”, os quais podem se
funcionalmente operante, pelo
apresentar de forma análoga ou
inconsciente coletivo. Era quase
idêntica em todas as épocas e em
como se não houve uma percepção de
todos os povos, e podem até mesmo
continuidade, mas sim de reinício
surgir de forma espontânea – sem
cíclico. E, como estamos falando de
nenhum conhecimento consciente – do
rito, especialmente os ritos arcaicos
inconsciente do homem moderno.”
(NEUMANN 1996, p.26). comumente estão vinculados às
demandas de sacrifícios, nas quais o
Sacrifício Orgânico – Com o advento objeto a ser sacrificado,
agrícola e tudo que se seguiu em irrefutavelmente, deve sempre ser o
função de, e/ou paralelo a este melhor, o perfeito, como homenagem
processo evolutivo, o ciclo e oferenda à deusa e/ou deidades
reprodutivo já não se dava mais conclamadas, objetivando e
apenas e imperativamente decorrente resultando em renovação de ciclo de
de pico hormonais, outrora colheitas e retornos abundantes, seja
denominado cio, mas sim, e em ofertas agrícolas, ou de caça e
concomitantemente, num processo pesca, bem como para a geração de
ritualístico, íntimo e intrinsecamente novos membros à comunidade
associado a agricultura e, matrilinear. Isso significava que o
consequentemente, aos desenvolvi- melhor grão era selecionado para o
mentos de plantios e toda a sacrifício de ser enterrado e/ou
economia e ecologia acessível, no ofertado para renovação, ou seja,
desistia-se de consumir o melhor
ARTIGO 3 ROSANGELA CORRÊA

alimento para garantir o “sucesso” do interessante e robusto, abordando as


ciclo seguinte. Naturalmente, isto várias facetas em torno do tema, bem
também compreendia sacrifícios como o natural envolvimento no
humanos, de filhos homens e espectro do feminino e matriarcado,
perfeitos, geralmente o filho da líder além de um rico registro de imagens,
grupal. Lembrando que filhas com fotografias e ilustrações,
mulheres eram poupadas, porque permitindo um verdadeiro tour pelas
mulheres eram sagradas, próprias muitas mitologias ao redor do mundo.
deusas de criação. Todavia, serem Neste ensejo, trago um dos esquemas
eleitos aos sacrifícios era motivos de
proposto por Neumann, sintetizando
honra diante do todo envolvido.
o conteúdo explicativo da disposição
subdividida entre o Caráter Elementar
Esferas Funcionais do Feminino –
do feminino, onde prevalece o Ma-
No livro “A Grande Mãe” Neumann
ternal, e o Caráter de Transformação,
nos oferece um estudo bastante
considerando a prevalência da Anima.
ARTIGO 3 ROSANGELA CORRÊA

A Grande Mãe não é apenas prove- Mistérios da Morte (Doença /


dora da vida, mas também aquela que Extinção / Morte / Desmem-
promove a morte. Ela pode dar amor, bramento).
assim como suprimi-lo, para Arquétipos do Domínio da Bruxa
demonstrar seu poder e/ou garantir a Velha: Kali, Hécate, Górgona.
manutenção sistêmica.
Caráter de Transformação:
Caráter Elementar: subliminar- subliminarmente simboliza a
mente simboliza a função do função do aquecer e/ou nutrir,
conter, associada à tendência a enfatizando o elemento dinâmico
conservar em si o que gerou, num da psique, colocando em
eterno pertencer e mantê-lo movimento algo já existente e
próximo, típico do matriarcado. levando a uma transformação.
Ilustrado na figura arquetípica de Este caráter também está
Mãe Bondosa (M+), vibrando na presente no maternal, e vai se
polaridade positiva, que abrange diferenciando. Os dois tipos de
as funções de: caráter não se excluem, ao
Gerar e Libertar; contrário, estão interligados e
Desenvolvimento; integrados desde o início.
Mistérios da Vegetação (Fruta / Entretanto, nesta perspectiva,
Nascimento / Renascimento) que manifesta-se arquetipi-camente
dirige à Imortalidade na através da Anima (A+), vibrando
Transformação Espiritual. na polaridade positiva que
Arquétipos do Domínio da Mãe: abrange as funções de:
Isis, Deméter, Maria. Dar;
Transformação,
Bem como seu oposto Sublimação;
complementar, na figura arquetípica Mistérios da Inspiração (Êxtase /
de Mãe Terrível (M-), vibrando na Inspiração / Visão) dirigindo à
polaridade negativa, que por sua vez, Sabedoria na Transformação
abrange as funções de: Espiritual.
Reter, Fixar, Aprisionar; Arquétipos do Domínio da Virgem:
Diminuir, Devorar; Musas, Sofia, Maria.
ARTIGO 3 ROSANGELA CORRÊA

Assim como seu oposto sora de uma e/ou mais membros


complementar, na figura arquetípica comunitários. No entanto, esta
de Anima Negativa (A-), vibrando na movimentação organizacional,
polaridade negativa e abrangendo as promoveu um novo fator até então
funções de: não experimentado, e resultante do
descarte fisiológico do ovulo não
Rejeitar, Privar; fecundado, denominado
Transformar, Dissolver; menstruação. Dada esta evidência de
Mistérios da Embriagues (Êxtase / uma suposta punição divina, expressa
Loucura / Impotência - Estupro). no sangue mestrual, as mulheres
Arquétipos do Domínio da Bruxa dissidentes são exiladas das aldeias e
Jovem: Lilith, Circe, Astarte. passam a viver nas florestas. Longe
das comunidades, muitas não
Feminino Transgressor – Como resistem, mas tantas outras se
citamos anteriormente, os ciclos adaptam, desenvolvendo novas
hormonais que produziam ovulações formas de sobrevivências, inclusive
e gestações eram anuais, a princípio através da botânica e/ou
praticado de maneira puramente domesticação dos gatos, começando
instintiva, e que, após longo período a inexorável correlação com a
evolutivo, passou a compor um chamada bruxa, pelo simples fato de
modelo de manutenção mítica para aprenderem a usar recursos que a
renovação e continuidade existencial. maioria desconhecia, capazes de
promover curas e/ou mortes. O prof.
Pois bem, a certa altura dos
Bernardo coloca de uma maneira
acontecimentos, uma das mulheres
bastante interessante, que essa
decide renunciar ao ingresso
mulher ancestral de certa maneira,
ritualístico de copulação coletiva,
num dado momento, rompe com essa
rompendo com o clã e toda a
grande deusa que rege os ciclos
sacralidade em torno do evento,
anuais, e estabelece vínculo de
culminando em dissidência, seja por
devoção e de cumplicidade com uma
começar a nascer uma espécie de
deusa lunar, aparentemente dando
desidentificação com aquele modelo início aos ciclos menstruais, que
vigente, seja pelo temor do clã em ainda experimentamos nos dias de
sofrer retaliações e punições em hoje.
função da deliberada ação transgres-
ARTIGO 3 ROSANGELA CORRÊA

É impressionante perceber a siliência, numa nítida ação


influência arcaica tão viva e presente transgressora, e para dizer o
em tantas culturas, registradas em mínimo, numa atitude da preser-
tantas narrativas mitológicas, vação de um povo,
algumas ainda vivas e operantes em fundamentalista alicerçado em
povos, religiões e costumes em pleno bases do patriarcado, mas acima
século XXI. Concordam?! Durante a de tudo atentos e ciosos a
última década, tive a grata felicidade manutenção e continuidade de seu
de apreciar em três ocasiões distintas povo, modificaram uma de suas
a peça teatral “A Alma Imoral”, bases angulares, assumindo a
baseada no livro homônimo de Nilton matrili-nearidade, ou seja, a partir
Bonder, que, diga-se de passagem, de então, fica instituído que, é
por sua vez, também é fundamentado judeu, aquele que nasce de uma
nos textos bíblicos. E, organicamente, mãe judia, quebrando um dos
como tinha que ser, a cada principais parâmetros do
experimentação, algum ou alguns patriarcado ancestral deste povo.
temas, dos muitos abordados na
peça, ganham evidente relevância nas "É no período da invasão romana da
percepções das plateias. Para este Palestina que os judeus fazem uma
estudo, pincei duas passagens para importante modificação em sua lei. Até
ilustrar este ponto do artigo: então seguindo uma tradição
patrilinear, em que os direitos, títulos e
Num episódio histórico, quando os identidade eram passados de pai para
romanos invadiram a Palestina, filho, o judaísmo se tornou matrilinear,
entre suas práticas de dominação, ou seja, as relações entre uma geração
as mulheres dos povos e a seguintes se estabeleciam de mãe
conquistados eram sistematica- para filho. Para um judaísmo calcado
mente estupradas, com a finali- em seu texto bíblico patriarcal, esse
dade de aniquilar e/ou deturpar a novo “correto” para a lei exigia a
linhagem dos povos, mitigando existência de algum novo “bom” muito
resistência à dominação romana. significativo que justificasse uma
Entretanto, o povo judeu, através mudança tão radical e com tantas
destas mesmas mulheres violen- implicações." (Bonder 1998, p. 98)
tadas, oferecendo resistência, re-
ARTIGO 3 ROSANGELA CORRÊA

Não menos transgressor, vamos traição da própria lei, mas que o texto
abordar outro ponto da peça/livro bíblico não condena ou julga. Estava
teatral. Pois bem, em outro iniciada uma das linhagens da descen-
episódio bíblico, em que Sodoma dência de David e, por consequência,
e Gomorra foram destruídas e do Messias." (Bonder 1998, p. 101)
apenas a família de Lot é poupa-
da. Porém, a esposa de Lot, du- Notem que já não estamos mais
rante a fuga, negligencia a falando de ainda não humanos, na
orientação de não olhar para trás, verdade esse tempo bíblico/histórico
e é transformada em sal. As filhas já é bem próximo cronologicamente,
do casal, crendo que a hecatombe do que denominamos era cristã
havia tomado todos os lugares, e (AC/DC). E me atrevo a instigar-vos
acreditando não haver outra solu- com uma pergunta paradoxal: Será
ção para dar continuidade à que já estamos livres de não
linhagem do pai, já velho, armam sucumbir à suposta condenação
um ardil, embriagando-o e deitan- incestuosa, mediante um aniquila-
do-se com ele. Geram filhos / ne- mento existencial?
tos, a princípio seguindo o
preceito bíblico de continuidade E quando o assunto é transgressão,
patrilinear, mas concomitante- como deixar Lilith de fora, não é
mente, infringindo em incesto verdade?! Há muitas narrativas de
transgressor. mito de criação, e de modo geral o
ocidente, especialmente os povos
"Em termos bíblicos, estavam dando desenvolvidos nas bases de crenças
continuidade à semente do pai, cuja judaicas-cristãs, tem ao menos
preservação estava ameaçada. […] As notícias de Lilith, supostamente a
filhas de Lot haviam salvo a continui- primeira esposa de Adão, expulsa do
dade tanto do pai como do povo. A paraíso. Engelhard, dentre outras
solução encontrada, no entanto, é um demandas, nos apresenta umas das
incesto transgressivo das leis da pró- contendas que culminou na expulsão
pria Bíblia. O “bom” que é a preserva- dessa nossa transgressora primordial:
ção da espécie fica aqui salvaguardado
por um novo “correto” com que é a
ARTIGO 3 ROSANGELA CORRÊA

"Lilith é essa mulher da primeira vez, sexual, que se extravasa no beijo


que, cheia de saliva e sangue, assusta profundo, essa troca espiritual vital
Adão. Esse sangue se relaciona ao entre os seres." (Engelhard 1997, p. 32)
aspecto fisiológico, vital, instintivo do
ser feminino, o seu aspecto carnal, o Breve Abordagem da Transição –
sangue menstrual. É a sexualidade livre Muito bem, retomando a dinâmica
de tabus e proibições, que pode ser sobre o matriarcado e considerando
vivida mesmo durante o período milênios dessa rotina arcaica, o
menstrual. Quanto à saliva, é uma processo evolutivo suposta e
secreção erótica de caráter claramente consequentemente, capacitou fisica-
mente o homem, dotando-o de maior
força e robustez, até viabilizar e
produzir a alteração de poder. Como
já mencionado, o matriarcado não era
impositivo, mas sim orgânico, natural;
já o patriarcado lança mão de
imposição pela força, estabelecendo
regras de contenção e conquista, seja
internamente, em relação as
mulheres, seja para com as tribos e
agrupamentos vizinhos, no melhor
estilo do invadir, submeter/subjugar e
conquistar, concomitantemente ao
desenvolvimento de acumulação de
bens e de uma ideia, que podemos
perceber conceitualmente, como
direito a heranças. E, neste sentido,
faz-se necessário uma reorganização
núcleo-familiar, na qual, finalmente,
se constela a ideia de pai e de
linhagem patrilinear, ou seja, insurge
um forte movimento de suplantação
ARTIGO 3 ROSANGELA CORRÊA

do Matriarcado, como a determinação recendo algum distanciamento, cito o


de mulheres só copularem com o Podcast “40 semanas”, produzido
mesmo homem, garantindo que os pela Folha de São Paulo,
filhos desta mulher fossem mencionando alguns pontos dos
exclusivamente deste parceiro, relatos de brasileiras casadas com
obviamente impetrando medidas para homens de outra nacionalidade e
domesticar o ímpeto transgressor das morando em outros países, em
mulheres, que neste momento ocasiões de gestação e parto.
começam a experimentar submissão,
orquestrada e imposta pelo “O 5º episódio do podcast 40 Semanas
Patriarcado. Lembrando que a tal fala sobre diferentes experiências de
regra era destinada às mulheres; gestação e parto mundo afora.
quanto aos homens, dependia de sua Brasileiras que tornaram-se mães ou
capacidade de conquista, no bom trabalham na área médica contam
estereótipo cartunista, do homem das histórias de países como Japão,
cavernas puxando a mulher pelos Marrocos, Portugal, Nova Zelândia e
cabelos! Arábia Saudita.” (Descrição do Podcast
40 semana, Folha de São Paulo, 5°
Maternidade como Possível Função Episódio)
Existencial
Fiquei especialmente sensibilizada
Ao longo do desenvolvimento com algumas situações, que aos olhos
humano essa demanda sociopolítico- de uma latina, beira negligência e
cultural passou por ajustes, freios e descaso humanitário, como as
contenções, mas inexoravelmente ocorridas em Marrocos e Arábia
servindo de estrutura basal e Saudita, citados no podcast, que em
fomentando as diversas mitologias e função dos preceitos religiosos
religiões regionais, o que em maior fundamentalistas e estruturadas nas
ou menor graus, perspectiva, local égides de um patriarcado ancestral, e
e/ou situação, ainda vibram e com todo o respeito, absolutamente
ressoam atualmente, suplantando o ultrapassado, ainda hoje é
PATRIARCADO sobre o terminantemente proibido a presença
MATRIARCADO. Nem precisaríamos de homens, seja marido ou
sair do Brasil, mas para ilustrar, ofe- profissionais da saúde, em alas femi-
ARTIGO 3 ROSANGELA CORRÊA

ninas, cujo depoimento de uma das Retomando a perspectiva


entrevistadas, gestante em trabalho mitológica, embora não seja a única
de parto e sem falar o idioma local, manifestação relevante neste gigan-
fica submetida a uma verdadeira tesco manancial, é quase impossível,
violência médica assistida, no âmbito ao menos do ponto de vista
físico, psicológico e porque não dizer, ocidental, falar de maternidade em
também espiritual. mitologia sem abordar o mito de
Deméter (mãe) e Perséfone (filha),
Todos os casos citados neste que, entre outras relevâncias, repre-
episódio do podcast, em algum nível, senta o sofrimento materno provo-
carregam peso ancestral, seja pelo cado pelo “ninho vazio”, podendo
fundamentalismo religioso ou indicar às mulheres como se
preceitos que de alguma forma comportar mediante as perdas exis-
desqualificam pessoas e/ou atitudes tenciais, principalmente por ocasião
em detrimento de algum parâmetro do afastamento das filhas. Essas
estipulado, como no Japão, que um deusas personificam mulheres que
parto submetido a cesariana, mesmo experimentam significativas rupturas
em caso de risco para mãe ou para o psicológicas com elos estruturais
bebê, recebe uma certa conotação de básicos, que favorecem mudança e
fraqueza, ultrapassando o limiar podem servir de mecanismos para as
físico. necessárias transformações femini-
nas. Deméter e Perséfone são
"Repetia-se uma descoberta feita já arquétipos que constelam alguns
nos tempos de Adão e Eva: a opostos complementares, em suas
preservação da espécie depende da respectivas expressões, manifesta-
obediência e desobediência ao status ções e necessidades, entre outros,
quo, ou às desobediências à moral de:
animal de um momento. A moral de
Adão e Eva, que os proibia de provar Casamento (versus) Separação na
da árvore, precisou ser rompida para a hora certa;
verdadeira continuidade da espécie Alimentação (versus) Depen-
dência;
humana pudesse ocorrer. " (Bonder
Superação dos conflitos pessoais
1998, p. 99)
(versus) Vitimização;
ARTIGO 3 ROSANGELA CORRÊA

Percepção do que acontece com por isso raptada por Hades (deus
as pessoas (versus) Recolhimento dos infernos, submundo).
meditativo na fase de amadure-
cimento. A segunda perda é a de um filho
para a morte, para o casamento ou
Deméter congrega sentimentos para o mundo, simbolizada pelo
instáveis, intuições proféticas, “fruto maduro”, cuja dor materna,
receptividade irracional, sensibilidade supostamente, é maior quando se
à natureza, memória coletiva. Essa trata de uma filha. Essa fase é
deusa simboliza a transformação vivenciada pela mulher como
feminina nas três fases existenciais depressão do “ninho vazio”. Coré
sumamente importantes: puberdade, foi raptada pela morte (Hades),
maternidade, e menopausa, etapas uma alusão mítica ao casamento.
que Neumann identifica como Portanto, a aproximação do
“mistérios de transformação ligados masculino significa uma violação
ao sangue”. do laço simbiótico mãe-filha. O
primeiro encontro sexual com um
O maior valor desse mito está nas homem é o mais profundo
transformações e no significado mistério de transformação para a
simbólico das perdas femininas, tanto mulher, trata-se de um
quanto, na superação das mortes desvelamento ritual bastante
psíquicas que, efetivamente, a mulher significativo, que vai selar seu
enfrenta, vez por outra. destino com relação à alteridade.

A primeira é a perda da inocência A terceira etapa é a perda da


infantil, simbolizada pela “flor” − fertilidade, simbolizada pela
também conhecida como a “morte “semente”, rito de passagem para
da donzela” interior − que uma etapa áurea da vida, muitas
acontece na primeira vezes denominada de Sofia —
menstruação. Essa etapa sabedoria da mulher madura — um
existencial expressa-se, período vivido com muita
simbolicamente, no momento em angústia. O mito ensina que se
que Coré (Perséfone adolescente) deve destruir a sombra do paraíso
se lança para colher flores, sendo infantil perdido, sacrificar (sacrum
ARTIGO 3 ROSANGELA CORRÊA

facere, “tornar sacra”) a inocência samento simbólico consigo mesmo.


e reconhecer que se traz dentro As mulheres modernas protagonizam
de si o poder aventureiro de mitos em suas jornadas existenciais,
conquistar a vida individual. Isto fazem escolhas, subsistem a todo
está designado pela força tipo de provação, de privação, de
arquetípica do herói e da heroína, crueldade, de abuso sexual, de
da maternidade e da paternidade. carência afetiva, de compadecimento,
A mulher e o homem maduros criando possibilidade de salvação,
devem aceitar a nova fase da vida reagindo no presente e programando
com criatividade. Deméter, em sua o futuro, conscientes de que são
narrativa mitológica, aproveitou falíveis em meio às turbulências da
esse tempo para transmitir vida, mas que são capazes de mudar
sabedoria aos homens, o curso de suas histórias.
principalmente ao jovem.
Maternagem
O retorno do reino de Perséfone só
é possível com a reintegração dos Caro leitor, não sei se já está claro
conteúdos reprimidos e/ou negados à para todos o conceito maternagem.
consciência do ego pelos ditames Qual será a diferença entre
patriarcais, o que representa para a maternidade e maternagem? Você já
mulher lutar contra o apego à mãe, os parou para refletir? De maneira
impulsos agressivos, as iniciativas bastante sucinta, me atrevo uma
sem reflexão, a possessão do animus última vez, na tentativa de oferecer
negativo, a negação da natureza esclarecimentos.
erótica, bem como contra a
Maternidade = qualidade ou
complacência maternal excessiva
condição de ser mãe, laço de
pelo outro. A libertação de tudo isso
parentesco que une mãe e filho.
oportunizará a renovação, reconhe-
Fisiológico.
cendo que a grande conquista na
Maternagem = cuidados próprios
individuação feminina é confrontar-
de mãe, materno, afetuoso,
se com os medos, entendê-los e
dedicado, carinhoso e maternal.
transformá-los, sendo muitas vezes
Integral, podendo contemplar o
impossível evitar o sofrimento, fisiológico.
embora favoreça ao indivíduo o ca-
ARTIGO 3 ROSANGELA CORRÊA

Assim se classificam os dois termos, amor. Embora o conceito derive da


maternidade e maternagem, que, mesma raiz não significa, em
embora bastante semelhantes em absoluto, que toda mãe é maternal.
suas descrições, são diferentes em As pessoas maternais são aquelas que
essência. Ambos possuem caracte- abraçam as grandes causas,
rísticas arquetípicas e instintivas. preocupam-se com todos os seres.
Entretanto, as pesquisas da filósofa
A maternidade é uma característica Elisabeth Badinter revelam que:
única feminina, de consequências
instintivas e arquetípicas, podendo o Na França, mas não é exclusividade
aspecto arquetípico ser sombrio e apenas deste país, havia um costume
transformar a mulher numa mãe das mães entregarem seus bebês às
devoradora, destruidora, não mater- amas mercenárias, porque, inicial-
nal; mas a maternagem se caracteriza mente, alguns consideravam a
muito mais por uma característica amamentação um gesto de primi-
arquetípica com apelo instintivo tivismo animal. As mais ricas
contratavam amas para morarem nas
primordial, assim aquela(s), ou
suas casas, e numa certa cronologia
aquele(s), que exerce a maternagem
histórica, também as mulheres mais
possui sempre a característica de
pobres, inclusive as que exerciam a
servir, de devoção, mas não nos
função de amas, enviam seus bebês
enganemos, pois também aí en-
recém-nascidos às amas mercenárias
contraremos os aspectos sombrios
mais pobres.
daqueles que usam deste recurso
para, abusando do poder, exercer o
“Mas é no século XVIII que o envio das
mal e a destruição. Ser mãe é uma crianças para a casa de amas se
condição sempre física e nem sempre estende por todas as camadas da
optativa, mas a maternagem é sociedade urbana. Dos mais pobres aos
sempre uma escolha, um desejo de mais ricos, nas pequenas ou grandes
servir que existe nas mulheres e nos cidades, a entrega dos filhos aos
homens que possuem uma relação de exclusivos cuidados de uma ama é um
influência por sua anima – resumindo fenômeno generalizado.” (BADINTER
muitíssimo o conceito anima: é o 1985, p.67)
feminino interior no masculino –.
Maternagem é cuidar, dedicar-se por
ARTIGO 3 ROSANGELA CORRÊA

Há registros desta prática desde o para longe.” (BADINTER 1985, p.68)


século XIII, e ainda é possível “Ademais, a mortalidade das crianças
encontrar registros até meados do pobres confiadas a amas, e a
século XX, seja por famílias quantidade das crianças abandona-
aristocratas ou por famílias que das, continua considerável no século
precisavam se ocupar de trabalhos, XIX. Na década de 1850, a mortalidade
como das classes operárias, artesãos, global das crianças de menos de um
entre outras. Lamentavelmente, ano é ainda superior a 16%. Francisque
muitos bebês morriam já no precário Sarcey afirma que, dentre 25 mil
transporte, feito em carroças com crianças entregues a amas, morrem 20
outros bebês. Essas amas trabalha- mil.” (BADINTER 1985, p.227)
vam no campo o dia inteiro e
deixavam os bebês fortemente enfai- Conforme a região, até 80% dos
xados, e muitos pendurados, para não bebês morriam até os quatro anos de
serem incomodados pelos animais. idade, quando finalmente voltavam
Consequentemente, acabou gerando para a casa de suas mães. As mães de
preocupante problemas de saúde famílias abastadas logo contratavam
pública e demográfica. uma governanta, depois um preceptor
para encaminhá-las ao internato, de
Em Paris: “Em 1780, na capital, em onde saiam para o casamento. O
cada grupo de 21 mil crianças que governo francês percebeu a falta de
nascem anualmente (numa população crianças e fez uma campanha imensa
de oitocentos a novecentos mil para mudar a maternagem, desen-
habitantes), menos de mil são volvendo o tipo de mãe dedicada -
amamentadas pelas mães, mil são devotada, algumas sacrificando a
amamentadas por uma ama em própria existência, e que ainda
domicílio. Todas as outras, ou seja, 19 podemos identificar atualmente.
mil, são enviadas para a casa de amas.
Com a emancipação da mulher, a
Dessas 19 mil confiadas a amas fora
maternagem ficou prejudicada. Não
do teto materno, duas ou três mil, cujos
somente pela ausência física e
pais dispunham de rendimentos
afetiva, mas pela falta de
cômodos, deviam ser colocadas nas
conhecimentos educativos. Geral-
proximidades de Paris. As outras,
mente, a mãe sente-se culpada por
menos afortunadas, eram relegadas
ARTIGO 3 ROSANGELA CORRÊA

ficar tanto tempo longe do filho e exerçam, de alguma maneira, a


tenta compensar agradando-o em maternagem devem estar atentos ao
demasia, atrapalhando assim a trato filial. Ampliando nossos
educação, pois o filho aprende a ser horizontes, vemos que é exatamente
um “amado tirano”, que, de certa do que precisamos para equilibrar
forma, comanda a vida dos adultos à esta sociedade tão racionalizada, tão
sua volta. Faz mais falta o carente de cuidados, de afeto e
desconhecimento de como educar serviços amorosos, tão dependente e
bem, do que o tempo de convivência muitas vezes personificando os
com o filho. O problema não está na “amados tiranos”, que de certa forma
mãe trabalhar fora, mas em não saber comandam a vida dos adultos e/ou
administrar esta ausência, na dos cuidadores maternais à sua volta.
particular e transitória situação de ser
mãe de filhos, especialmente, na E para concluir este artigo amplo,
primeira infância. denso e por vezes polêmico, registro
aqui dois recortes de um programa de
Quanto mais novo e mais incapaz entrevistas, cujo nome é nada menos
for o filho, mais cuidados ele requer que “PROVOCA”, devidamente refe-
da mãe. Entretanto, é a mãe que tem renciado, mas cuja contextualização
que saber que educar não é criar o se faz necessária. O apresentador e
filho para si – como percebemos no repórter Marcelo Tas, largamente
estudo do mito Deméter –, mas conhecido na mídia brasileira,
prepará-lo para ter autonomia entrevista o fotojornalista e
comportamental, indepen-dência correspondente de guerra, André
financeira e cidadania ética, que Liohn. A entrevista toda é
obviamente refletirá na saúde, tanto interessantíssima, mas fiz recortes
física quanto psíquica, dos seres e na milimétricos, na firme intenção de
sobrevivência de toda forma de vida. arrebatamento pela, inicial suposta,
dicotomia da fala sensível,
Maternagem consciente é tornar o acolhedora e genuinamente humana
filho (e/ou indivíduo ou grupo que na voz de um fotojornalista de
recebe cuidado) independente dela guerra. E isto se destaca por não ser
(e/ou dele, e/ou instituição, e/ou mera pesquisa do tema, mas da voz e
estado), ou seja, tudo e todos que olhar de alguém que se propõem a,
ARTIGO 3 ROSANGELA CORRÊA

de fato, ver, acompanhar e registrar Todos os trechos, mas em especial a


as histórias de pessoas que estão, última frase, é intrinsecamente arre-
literalmente, experimentando guerras batadora. Se estivéssemos genuina-
em lugares inóspitos de nossos dias, mente afinados e afinizados com o
inadvertidamente atuais. cerne que ela representa, seria vã e
absolutamente desnecessário tudo o
Tas: “Aparentemente, esta situação que estudamos e tratamos neste
não tem saída?” artigo.
Liohn: “Não acho que seja um beco sem
saída, agora é hora do povo se unir, Olhando com o devido distan-
mas se unir de forma boa. Praticando o ciamento para as diretrizes da
bem, sendo generoso… parece absurdo Maternagem e Maternidade, bem
dizer isto agora […], é quase como a como para as demandas do
‘violência’ de Gandhi […]” Matriarcado e Patriarcado, espero ter
Tas: “O que a guerra te ensinou sobre contribuído para uma perspectiva
este ‘bicho’ ser humano?” menos personalista, seja qual for a
Liohn: “O ser humano, eu acho que é sua perspectiva. Ambos contribuíram
um bicho lindo, cara! […] Eu acho que e continuam essenciais ao
na verdade, é o único bicho que a gente desenvolvimento humano, as pelejas
tem que tratar bem. Porque se a gente estão nos extremos, mas, à medida
tratar bem o ser humano, todo o resto que fazemos concessões,
funciona bem também, mas tratar bem, empaticamente, passamos a ser
de verdade, não tratar bem, no sentido dotados de equanimidade, o que de
de privilegiar […] maneira alguma despersonifica suas
Tas: “Mesmo, se este ser humano não respectivas naturezas arquetípicas.
parecer muito humano?”
Liohn: “Não acho que seja assim, eu Mais uma vez despeço-me,
acho que a gente nasce, e depois a agradecendo a viagem e a oportuni-
gente vai ficando ruim.” dade desse aprendizado. Preciso
[…] finalizar, mas o tema vai muito além
Liohn: “A nossa melhor arma é a do exposto aqui. Por favor,
empatia, o que nós melhor podemos continuem, pesquisem, estudem,
fazer é estar atentos à nossa própria conversem com outras pessoas a
empatia. respeito… E troquem conosco tam-
ARTIGO 3 ROSANGELA CORRÊA

bém suas impressões… Na seção _____ In:ENGELHARD, Suely. “O


Panteão de Colaboradores, ali, no renascer de Lilith.” Revistada
final da revista, constam os contatos Sociedade de Psicologia Analítica,
de todos os colaboradores. Sejam n. 15, São Paulo, 1997, p. 28-41.
muito bem-vindos! _____ In:MONTEIRO, Dulcinéia da
Mata Ribeiro. Mulher: feminino
Até breve! plural. Rio de Janeiro: Rosa dos
Tempo, 1998.

REFERÊNCIAS Sites acessados entre 05 e 08 de


Abril 2021:
BADINTER, Elisabeth. Um Amor
Conquistado: o Mito do Amor <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitexto
s/07.073/343>
Materno. Rio de Janeiro: Nova <https://pt.wikipedia.org/wiki/Neol%C3%ADtico>
Fronteira, 1985. <https://www.historiadomundo.com.br/pre-histo
BONDER, Nilton. A Alma Imoral: ria>
<https://diplomatique.org.br/o-homem-pre-histo
Traição e tradições através dos rico-tambem-era-uma-mulher/>
tempos. Rio de Janeiro: Rocco, # Podcast: 40 Semanas – Apresentadores:
1998. Melina Cardoso e Renan Sukevicius – Veículo:
Folha do S. Paulo – Fala sobre as ocorrências
ELIADE, Mircea. Mito e Realidade.
durante a gravidez – <https://open.spotify.
São Paulo: Perspectiva, 1963. com/show/57wTgodmcV7r7RYJm2UwpZ>
NEUMANN, Erich. A Grande Mãe – Especificamente citado no artigo: 5° episódio:
<https://open.spotify.com/episode/55AYgLK7UqL
Um estudo fenomenológico da
yctbEB9K8IV>
constituição feminina do # Programa de Reportagem: Provoca –
inconsciente. São Paulo, SP: Apresentador: Marcelo Tas – Emissora: TV
Cultura – Convidado entrevistado: André Liohn
Cultrix, 2006.
(Fotojornalista e Correspondente de Guerra) –
PIRES, Valéria Fabrizi. Lilith e Eva <https://www.youtube.com/watchv=gZw9aOddGv
– Imagens arquetípicas da mulher Y
na atualidade. São Paulo, SP: # Série Entre o Céu e a Terra – Entrevista do
Professor Bernardo de Gregório – <https://www.
Summus, 2008. youtube.com/watchv=2uDYSwitcCY&list=PLe_B1A
_____ In:COLONNA, Florença M. mZvQBxL_Uw9VopeqVPV2zdQrVWF&index=5>
T. "Lilith, ou Lua Negra". Journal of
Analytical Psychology, v.25, n. 4,
out, 1980, p. 325-49.
ARTIGO 4 MARCOS FERREIRA-SANTOS

“DESTA VEZ, A CASA


NÃO SAIRÁ DE ULISSES:
A CASA VIROU O MUNDO OU
O MUNDO VIROU A CASA – DE PERNAS PARA O AR!”

POR MARCOS FERREIRA-SANTOS

do vale à montanha meida é investigador da filosofia


da montanha ao monte trágica, do imaginário, do cinema e
cavalo de sombra autoformação, poeta, escritor e
cavaleiro monge músico. Com um belíssimo trabalho
por quanto é sem fim sobre o imaginário de Fernando
sem ninguém que o conte Pessoa em seu doutoramento,
caminhais em mim. publicado como “O criador de mitos:
(Fernando Pessoa) imaginário e educação em Fernando
Pessoa” (Educ, 2011), e sobre a
Ulisses não sairá de casa... Nos diz o filosofia trágica em sua tese de livre-
curta-metragem, "Desta vez Ulisses docência: “O mundo, os homens e
não sairá de casa" de Rogério Almeida suas obras: filosofia trágica e
(FE-USP), Hemeroteca Produções, pedagogia da escolha” (Feusp, 2015).
2020, 13:30, rodado em Portugal, Hoje coordena o Lab_Arte e segue,
integrante da 16ª edição da Mostra errático, mas não sem horizontes,
Internacional do Cinema Negro. uma linhagem de alta estirpe de
pensadores independentes, autôno-
Amigo e professor da Faculdade de mos e criativos.
Educação da USP, a quem tive o
privilégio de acompanhar a trajetória Seu curta-metragem entrelaça de
e compartilhar textos, livros, canções maneira primorosa a mitologia, a
e algumas taças de vinho em música e o cinema: três linguagens
conversas epicuristas, Rogério de Al- míticas por excelência que nos reco-
ARTIGO 4 MARCOS FERREIRA-SANTOS

locam na trama existencial em que Lisboa: o porto de Ulisses.. Ulisses


notas novas arpejam e ressoam em bo… Lisboa, na corruptela do belo
um velho instrumento: a ancestra- latim vulgar que vai dar no
lidade. apaixonante português lusitano
entregue ao mar, e ao mar aberto
Ele nos diz deste Ulisses, hoje com a saudade de quem nunca partiu.
deprimido e depravado, em dia com o Ou a saudade do marinho audaz e
imposto de renda e devendo ao imigrante fugido de Salazar. Ou,
amigo que faz tempo não vê… Ulisses ainda, rebento da Revolução dos
domesticado. Astuto, engana e mata; Cravos, que, ainda que movido por
amante, se perde do caminho; errante militares, teve a participação intensa
que viaja sem destino; faminto, da população, desde os não tão
devora monstros; não tem medo da velhos refrãos de “Grândola, Vila
morte. A saga termina quando volta Morena” de Zeca Afonso (1971), três
para casa. Ulisses é todo mundo e anos antes da própria revolução
ninguém. (1974), e que serviu de senha para o
movimento:

Em cada esquina um amigo


Em cada rosto igualdade
Grândola, Vila Morena
Terra da fraternidade
Terra da fraternidade
Grândola, Vila Morena
Em cada rosto igualdade
O povo é quem mais ordena
As cenas de viagem não são
ilustrativas. São o texto. O texto é Ardente nostalgia nos arpejos de um
pré-texto… condição básica para um destino cruel sobre os ombros. Ou
encontro. Tal qual o reflexo da melhor, ouvindo um fado por sobre
câmera no vidro da janela do trem… os ombros do garçon de alguém que
canta e sofre ao modo de Amália
Ou ainda a nostalgia lusitana do Rodrigues, das cordas da guitarra
viajante sobre os telhados róseos de portuguesa em trinados agudos a pe-
ARTIGO 4 MARCOS FERREIRA-SANTOS

netrar no coração de quem pode Lisboa, tens cá namorados


ainda escutar as heranças mouriscas que dizem, coitados, com as almas na
de um cantar que flexiona a própria voz
alma pela garganta, tal qual um Lisboa, não sejas francesa
moezin no alto do minarete do Tu és portuguesa, tu és só pra nós
sentimento. De um jeito lusitano de (Raul Ferrão & José Galhardo, 1955)
incorporar o espírito sufi, anarquista,
pobre e remendão. Mas, se bem- Lembro de Adorno ao falar da
educado, com um destino mais regressão do ouvido, agora deslei-
benevolente, com sotaque francês, xado e diminuto, que, pela indústria
será professor ou empresário, com fonográfica, entregue à esquizofonia,
trejeitos franceses, paladar francês; acredita no que ouve sem sentir a
ainda que a mesma Amália nos vibração da interpretação, do
tivesse advertido: intérprete com seu instrumento ou
sua voz. Aliás, onde ele estaria agora?
“Lisboa, não sejas francesa Provavelmente não saiu de casa, e
Com toda a certeza não vais ser feliz
gravou pela internet a obra que agora
Lisboa, que ideia daninha
se escuta na playlist do smartphone.
Vaidosa, alfacinha, casar com Paris
Sem saber quem era, sem saber do
ARTIGO 4 MARCOS FERREIRA-SANTOS

que se trata, sem ler sua dedicatória, man (romances de formação) sejam
sem saber de sua jornada, o tão necessários, na falta da
consumidor ou usuário (nunca deixou experiência, da viagem, da saga…
de ser algum tipo de droga) ignora o Uma experiência emprestada.
que seja a obra. Não saiu de casa. Por
causa da pandemia ou da preguiça. A janela ajuda…
Ou da falta de financiamento. Não
que seja preciso a biografia Mas, e a constante travessia?
tagarelante do compositor ou Homericamente, há um detalhe
intérprete, ou a crítica ciumenta de importante no castigo à soberba de
algum crítico inconformado, mas Ulisses, que riu dos deuses,
conhecer minimamente do que se vangloriando-se de sua astúcia ao
trata a obra ajuda nos filtros derrotar Tróia. Ah… trinta anos de
necessários para poupar os ouvidos e perdição pelos mares, sem voltar à
a alma dos poluentes não- casa. Mas, no meio da travessia,
biodegradáveis despejados no mundo necessária, mas castigo divino, ele
da (des)informação fácil. encontra Circe, e em seus braços
adormece, na ilusão de uma vida
O fato é que a saga foi suspensa. E sonhada por anos a fio. Só a
ele, o intérprete ou o viajante, teve lembrança de Penélope, em casa, lhe
que ficar em casa. Entregue à fantasia esperando, a fiar e desfiar o tecido
do “se fosse, o que seria?”. E vive, e do tapete da promessa a um novo
sente, e se emociona como tal… As pretendente, subterfúgio e malogro
imagens ajudam neste imaginário da ensinados pela astuta, sábia e
ausência de ação. Já não falamos em apaixonante Palas Athena das
ausência de ser, existência, ausência tecelãs, é que lhe desperta. Num
do ser amado, mas na ausência da dado momento, para a continuidade
da volta à Ítaca.
ação. Inércia que se articula com a
anestesia: a incapacidade de estesia.
Como sair do sono virtual dos
Eles ficaram em casa e a casa é
braços de Circe? Tudo à mão,
pequena. Apartamento talvez. À parte
confortável, prazeroso, sem trabalho
do mundo. Hoje, talvez mais
exaustivo, como que desfrutando da
importante do que à própria época do
romantismo alemão, os bildungsro-
ARTIGO 4 MARCOS FERREIRA-SANTOS

ambrosia dos deuses em noites de e o mito como estrutura musical, e


paixão e êxtase. Para que sair do que o destino, benevolente, lhe
sonho? E então vemos o Ulisses possibilitou também construir seu
moderno, gordo, sentado na frente pré-texto com o texto musical que
do computador, espremido no metrô, até aqui vem se estruturando em
cristão ressentido, nutrindo ódios no cânones medievais e contrapontos
silêncio da aquiescência. Guiando em antífonas, perfilando a
Telêmaco no parque, divorciado de constelação greco-medieval da
Penélope, de quem maldiz o tempo constituição da saga de Ulisses entre
todo. Esse Ulisses, além de cristão, as vagas sonoras de um mar que se
criacionista fervoroso, fundamen- abre à quilha e por vezes se
talista surdo, virou terraplanista, tranquiliza na distância de uma
xenófobo, homofóbico, toma harmonia ainda canônica, na visão
cloroquina com medo da pandemia que se tem do mar. Predominância
que diz não existir, árduo defensor da grave e profunda que está, apenas e
pátria (aliás, qual será sua pátria?), da tão somente, à superfície da saga. E
família (qual família mesmo?) e da agrada às primeiras impressões da
propriedade. Me lembro de Mahatma antiguidade, mesmo que diga ao
Gandhi dizendo que todo aquele que tempo todo, da atualização moderna
possui o que não precisa é um ladrão. e engravatada da saga. Impasse
No mesmo jôrro de imagens- musical e textual. Existencial e
lembranças, uma deliciosa e trágica antropológico. Um cidadão comum e
charge de Henfil, com um índio pacato, diria um velho amigo, que
perguntando ao velho “TFP”: “Oh TFP, talvez seja mobilizado pelas imagens.
tu vais defender também a minha
tradição, a minha família e a minha A janela ajuda…
propriedade?”. Odisseia que nos
revela, hoje, um Odisseu que odeia e O mundo é grande, diria Drummond.
que é mais odiado do que Odisseu.

A trilha sonora de Rogério de


Almeida, também músico e
compositor, com o qual divido os
liames infindáveis entre o imaginário
ARTIGO 4 MARCOS FERREIRA-SANTOS

Ah… o Castelo de São Jorge… Marca pagãos, personificados no dragão.


medieval no meio da citadina Lembre-se que dragão em grego é
polvorosa dos andares apressados, “delphina”, o mesmo nome para
nunca sabendo para onde e por que útero. O que sempre me levou a ver a
vão. Mas, vão. A nostalgia no sangue, velha iconografia da luta com a lança,
mas não há mais tempo para prestar de São Jorge na Lua (evidentemente,
atenção. Porém, o castelo está lá. ao clima anímico), que se trata de
Altaneiro e perene (graças à uma cópula. Uma dança nupcial entre
preservação do patrimônio histórico), o agricultor e o útero da terra,
a perseverar um tempo que não mais mediados pelo seu falo feito lança
existe. Nem de Ulisses, na Odisséia, cravando na terra sua dominância.
nem de geórgos (o trabalhador da Seria interessante hoje pensar esta
terra, origem grega dos nomes mesma imagem em sua realidade às
Georges, Jorge, etc), agricultor avessas: o dragão cavalgando por
exsudado de sua roça na Capadócia sobre geórgos com sua lança ereta,
para defender a cristandade contra os num prazer mais anímico e menos
ARTIGO 4 MARCOS FERREIRA-SANTOS

machista. mantenha, ao modo de um Zbigniew


Preisner, nos filmes de Krzysztof
Mas, o castelo está lá… Kieślowski (1941-1996), ambos
lusitanamente atestando a velha poloneses, uma melodia modal que
saudade lusófona. persiste como ostinato a querer
atingir a alma em suas profundezas,
Ulisses, homericamente, retorna e rodeando as beiras, nota por nota, em
mata os pretendentes, travestido de aproximações sucessivas e quase
mendigo. Somente o cão o vertiginosas. A música não ilustra a
reconhece. Depois da matança, obra. A obra é a música. Assim, como
haveria clímax para uma noite de nosso autor aqui nos diz do Ulisses
reencontro com Penélope? Nosso atualizado no cinema. Ele não assiste
autor, muito astuto nos questiona: a filmes, não está em alguma
sofriam de flatulência? Perdurou a poltrona na sala escura das
ereção? Copularam no tapete cheio projeções. Ulisses é o filme.
de sangue? Haveria tanto amor ainda
nos corações depois de tanto tempo
de ausência?

Uma frase indiana me vem de


súbito: “a saudade de ti não se
preenche com tua presença”.

A construção musical textual de


Rogério de Almeida aqui se abre ao
minimalismo da alma listrada do Assim como o cinema jamais foi
piano. Tal qual uma Nina Simone moderno, é trágico e aspira ao mito,
branca e caucasiana. Pena que não ao inaudito. Não existe ainda. Ulisses
explore seu canto à margem das segue sua saga na tela. A tela
teclas tigradas. Fica a eterna projetada na imensidão da sala escura
sugestão. que, por favor, também é diferente
da televisão ou da tela do
Notas espaçadas de uma construção computador ou do smartphone – me
mais rítmica que melódica, embora perdoem os atualizados e integrados,
ARTIGO 4 MARCOS FERREIRA-SANTOS

mas “é uma história em tecnicolor A construção musical de Rogério de


para ter algum luxo, por Deus, que eu Almeida avança para o lounge,
também preciso”, lembraria Clarice moderna batida quase eletrônica que
Lispector em “A hora da estrela” nada diz, a não ser: “espere”… Por
(1973), pouco antes de falecer. isso, tão em voga nas salas de espera,
Se Ulisses não sai mais de casa, que salas vip, aeroportos, clubes,
sua saga seja em tecnicolor, ou HD, elevadores. Atualização da velha
em televisão de plasma que ocupe a música muzak. Um mobiliário, um
parede inteira pelo menos… Ainda adorno (sem brincadeiras com nosso
prefiro o cinema antigo. Antigo!
frankfurtiniano), ambiente. Por isso
Repito para não confundir com
se mistura facilmente às espumas em
cinemas de shoppings. Ah… os velhos
close de um mar que já não se
cineclubes da Rua Augusta ou no
conhece, nem se reconhece. E as
bairro do Bexiga… sempre vazios… e o
pessoas ouvem distraidamente, para
luxo da solidão quando se ia sozinho
amenizar o tédio da espera, estas
assistir àquele mesmo filme pela
espumas sonoras que se agitam à
enésima vez. Consumidores de
superfície, sem perigo algum à
imagens fáceis à mão, em
smartphones de “burro-usuários” ou consciência. Não há o que se
televisões a cabo (arrastadas pelos desfrute, não há o que se interprete,
cabos de baixa tensão cognitiva) ou não há o que se sinta, não há algo
“netfriques”. Me perdoem… ainda sou que toque n’alma. Música maquinal
jurássico e não tenho vergonha disso. para seres-máquinas. E aqui, já não
Li Sócrates e Homero ainda criança e falamos em humanos, mas em
isso fez um estrago incomensurável, “máquinas” maquinalmente construí-
do qual não me arrependo. das, educadas e formadas
(formatadas) para produzirem como
máquinas e consumirem como máqui-
nas nos templos-shoppings das
máquinas-prazer que, prazerosa-
mente, alimentam o sistema máquina
dos algoritmos que nos controlam
para alimentar o sistema: “sorria:
você está sendo rastreado!” Nem
mesmo o velho lucro já não se sus-
ARTIGO 4 MARCOS FERREIRA-SANTOS

tenta. O capitalista do bio-poder- se entregando ao mar, e se sente


tecnológico já não consegue imaginar testemunha de um mundo que já não
os tantos zeros que alimentam sua existe. Ulisses hoje. As antífonas
fortuna. Frustado, quer apenas conversam com a Igreja da Sé, aquela
manter o poder da máquina matrix. mesma velha igreja no alto da ladeira,
Apenas a máquina. em meio à citadina polvorosa das
correrias – com charme francês.
Maquinalmente. Mefistofelesmente. Prefiro o velho boteco da ladeira,
Frankesteinmente. Faustianamente. com cheiro de “prato-feito”. Uma
conversa distraída ao balcão, com o
Para que a saga, pensam os mortais, vinho verde, o pão e o azeite sobre a
ao olharem a tal saga espelhada nas mesa, e um bacalhau – como quem
pedras do caminho a ser trilhado, se come comida de pobre. Não tem o
eu posso vender minh’alma ao cartão “requinte” colonizador que há no
de crédito e parcelar em suaves Brasil provinciano. E é tão bom estar
prestações a glória e os 15 minutos de ali, quase escondido da correria,
celebridade? citadina e turista, olhando os andares
apressados em direção à Sé. Só um
Aqui já não cabe o velho Ulisses mendigo para na porta do boteco e
errático. Mas, ainda há aqueles que perscruta o interior escuro, na
são erráticos. Constroem o sem- hipótese de conseguir alguma esmola
sentido da existência sobre as ou um restinho de comida. Olha pra
escolhas do viático, sabendo que não mim, e minha cor de pele, comendo o
há o que se salvar, nem o que bacalhau comum de pobre, o
recuperar, nem o que resgatar. Mas desestimula. Desiste e vai para os
segue errático, pelo simples prazer de turistas na Sé.
manter-se vivo, enquanto vivo, a
caminhar errante pelo mundo. E Ulisses mendigo que ainda
insistem em sair de casa. sobrevive na saudade. Saudade no
amarelo dos bondes que ainda
A janela ajuda... circulam frenéticos. Saudade no
penedo da saudade em Coimbra, feito
E voltam as antífonas… Abatido e apenas para sentar-se sob a árvore,
com saudade, Ulisses olha para o Tejo olhar a cidade do alto, e sentir sau-
ARTIGO 4 MARCOS FERREIRA-SANTOS

dade. Saudade colorida nas casinhas qual voltar. Será a saudade da


amontoadas à margem do Douro, viagem, da saga, a saudade de partir
enquanto o vinho do porto, para depois retornar… e como toda
sonolento, ainda dorme nas barcas ao “saga”, é a mesma “fada”, portadora
ritmo das vagas. Saudade do milho do “fatum”: o destino. Ao som de um
verde que ondeia em meio à “fado”, a anima desvirgina o herói ao
gramática de pedras de Trás-os- mundo e lhe cavalga as mil
Montes e flerta apaixonado com as possibilidades, das quais elegerá
moiras gallegas do Atlântico norte apenas uma. E sonhará com as outras
celtíbero. 999 possibilidades que foram
preteridas. E se fosse, o que seria?
Eu também retorno ao clichê de
sempre, no universo lusófono: A saudade permanece, embora, não
saudade. se saia mais de casa.
A janela ajuda…
A mais completa consciência de si:
soidade. De estar só. De estar sem o A janela é a anima a desvirginar o
ser amado. Dominado por um Póthos herói, incauto e desavisado, como
avassalador de estar e ser errático, ao sempre.
mar aberto das incertezas. Nascido na
nostalgia de ser dois, diria Gaston Para quem fica, Ulisses flatulento
Bachelard. de hoje, e não se deixa “tentar” pela
anima da janela, talvez o desejo seja
Sabendo que não haverá casa para defenestrar os outros.
voltar. A casa está dentro, e quase
inacessível quando se é surdo e cego
à própria alma.

É desta “soidade” que nasce nossa


glória vernácula intraduzível: sauda-
de.

E se Ulisses, hoje, não sairá de casa,


a saudade não será aquela da casa a
ARTIGO 4 MARCOS FERREIRA-SANTOS

oh sentina de escombros, pozo abierto


y amargo.

pálido buzo ciego, desventurado


hondero,
descubridor perdido, todo en ti fue
naufragio!

es la hora de partir, la dura y fría hora


que la noche sujeta a todo horario.

el cinturón ruidoso del mar ciñe la


costa.
surgen frías estrellas, emigran negros
pájaros.

abandonado como los muelles en el


alba.
sólo la sombra trémula se retuerce en
mis manos.

ah más allá de todo. ah más allá de


todo.

es la hora de partir. oh abandonado!”

(Pablo Neruda,
La canción desesperada,
Veinte poemas de amor y una canción
desesperada, 1924)
ARTIGO 5 KARLA BARBOSA

UM DEUS ANTIGO
ESCONDIDO EM
FIGURAS FOLCLÓRICAS
IBÉRICAS
POR KARLA BARBOSA

A Ibéria passou por diversas zes destruída com a invasão Romana


ocupações em seu território, e nos e seu golpe final com o Cristianismo.
voltamos, nesse texto, para a Porém o sincretismo religioso e o
ocupação indígena celta, que se folclore acabaram por nós deixar os
iniciou na Idade do Ferro, sem que vestígios do culto aos antigos deuses
possamos ter uma data definida. O celtas.
termo celta é usado para nomear não
uma única tribo na península, mas E o Deus, que esse texto pretende
várias, entre elas: vetões, galaicos, resgatar, está no folclore da Galícia e
celtiberos, astur, e os de cultura celta do Principado das Astúrias, no
como os lusitanos, entre outros; o Noroeste da Espanha, território da
que unem essas tribos nesse guarda- antiga tribo celta galaica.
chuva chamado Celta são
aproximações linguísticas, religiosas Chamado de nubeiros, nubleros,
e culturais. nubeirus ou renuveros, em Astúrias
também Xuan Cabrito, esse ser
Esse povo distante, que ocupou
folclore tem o poder de cavalgar as
grande parte da Península Ibérica,
nuvens, ocasionando os trovões,
teve sua cultura anexada e muitas ve-
raios, tempestades, também a névoa.
ARTIGO 5 KARLA BARBOSA

Ele pode destruir plantações com suntos sagrados, os registros romanos


seus movimentos climáticos, se tiver e o sincretismo deles dos deuses
alguém como inimigo, ao contrário celtas, por meio de características
pode dar a fertilidade e a bonança, próximas, nos fazem saber de que
aqueles que tem como amigo. Ele é Deus se trata essa figura folclórica da
descrito como um homem Galícia e Astúrias.
pequenininho ou gigante cheio de
pelo, com um chapéu, barba e Reues, era o deus celeste galaico,
cabelos brancos e longos, que senhor da tempestade, raios e dos
algumas vezes saí a visitar os mortais trovões, foi chamado de Jupiter celta
para pedir abrigo, e nesse momento é pelos romanos, suas águas traziam
que a amizade ou a inimizade podem bonança, ao mesmo tempo que seus
ser feitas. Na lenda do Xuan Cabrito raios poderiam trazer devastação, era
conta-se que ele vive com sua mulher um deus que tinha um falo imenso,
no alto de uma montanha, coberta de mostrando que era um deus da
nuvens, com muitas cabras, e é de lá fertilidade, e carregava na mão um
que vem cavalgando nas nuvens, martelo, responsável pelos seus raios
trazendo a tempestade, e desce delas e trovões.
para visitar os humanos.
Em algumas árias romanas, ele
aparece em relação com alguns rios,
não que isso o possa colocar como
um deus de rios, porém as águas,
mandadas por ele, eram que
alimentavam esses.
Outra relação que Reues tem é com
os altos montes, como a Serra do
Larouco, em Trás-os-Montes, norte
Nuberu de Ardisana- Astúrias de Portugal, também antigo território
Fonte: https://mapio.net/pic/p- galaico, em que na Paróquia São
56500619/
Miguel Vilar Perdizes foi encontrada a
Por mais que os celtas não tenham única imagem que temos de Reues
deixado nada escrito, por ser um Larouco, um dos epítetos pelo qual
povo que não usava a escrita para as- ele é chamado.
ARTIGO 5 KARLA BARBOSA

montanhas, e conceder bençãos se


recebido com hospitalidade, essa era
um dos princípios caros das tribos
celtas, tanto como a honra e a
coragem. Ele trazia a fertilidade com
suas águas que enchiam os rios e
regavam a terra. Podia ser
inclemente, destruindo plantações,
se não fosse agradado.
SERRA DO LAROUCO
Fonte: https://www.flickr.com/photos/fer-ribeiro/2315122637
Podemos apontar que Reues era um
deus celeste, ligado às forças
incontroláveis da natureza, dentro do
panteão um deus, provavelmente,
mais antigo do que os outros, uma
espécie de deus primordial.

Com tudo isso, podemos dizer que


o Deus Reues sobreviveu à
romanização e cristianismo, e
caminha em cada nova tempestade
da Galícia e Astúrias, quando esses
PARÓQUIA SÃO MIGUEL VILAR PERDIZES povos o veem como o nubeiru, o
Fonte: http://sitiodasideias.blogspot.com/2019/06/visita-
temem e o respeitam.
terras-de-barroso.html

Em uma mistura com registros


históricos romanos, achados arqueo- REFERÊNCIAS
lógicos e com o folclore, podemos
tecer as características do deus celta ABAD, Rosa Brañas. Entre Mitos,
Reues, um deus que ao mesmo tempo Ritos e Santuarios. Los Dioses
era temido por sua ferocidade, era Galaico-Lusitanos. In: Los Pueblos
um deus próximo aos humanos, de la Galicia Céltica. Org. GARCÍA,
disposto a vir visitá-los vindo da suas F.J González. Akal Universitaria.
terras distantes, no topo das altas Madrid: 2007.
ARTIGO 5 KARLA BARBOSA

CABRERO, J. C. Alvarez. Mitología


Asturiana. Editora Pata Negra.
Oviedo: 2016.
PEDREÑO, Juan Carlos Olivares.
Los Dioses de la Hispania Celtica.
Real Academia de la Historia.
Universidad de Alicante: 2016.

Sites consultados entre 01 e 03 de


Abril/2021:

<http://www.elcaminencantau.com/>
<https://verasturies.com/ast/seres-
magicos-de-la-mitologia-asturiana/>
<http://narradoresdelmisterio.net/ser
es-mitologicos-gallegos-el-nubeiro/>
BIBLIOTECA DE
THOTH
LIVRO: MITOLOGIAS - Deuses, heróis e xamãs nas tradições e
lendas de todo mundo
ORGANIZADOR: Roy Willis

POR LARISSA DIAS

Este livro faz parte da Coleção


Referência, da Publifolha, que além
de mitologia, tem como temas
também a filosofia e as religiões.

É muito interessante como esse


livro traz inicialmente a mitologia
pelos grandes temas da: Criação,
Arquitetura Cósmica, Mitos da
Humanidade, Seres Sobrenaturais,
Desastres Cósmicos, Heróis
Astuciosos, Animais e Plantas, Corpo
e Alma e Casamento e Afinidade. Isso
funciona como uma espécie de
familiarização da riqueza cultural
diversa que vem pela frente!

Nos capítulos seguintes autores


especializados trazem as temáticas um pouco sobre os faraós e, como
mitológicas do mundo todo, não poderia faltar, a mística vida
começando pelo Egito, com suas após a morte.
divindades, as diversas versões da
criação do universo, os principais Outro capítulo fala sobre o Oriente
deuses e deusas, e claro, as principais Médio, a Suméria e a Babilônia, o
histórias, como sobre o Olho de Rá e clássico mito do primeiro herói mito-
a luta do deus Hórus contra seu tio lógico Gilgamesh, os mitos da criação
Set pela posse do poder do Egito. e do dilúvio, mitos ugaríticos e dos
Além disso, essa parte traz também hititas, além da mitologia persa.
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THOTH

No capítulo sobre a Índia No capítulo celta, os autores


encontramos as origens do mundo e revelam os deuses, os heróis de
os deuses Indra, Brahma, Vishnu e Ulster e, como não poderia faltar, as
suas encarnações, Shiva, Devi (a lendas do Rei Arthur, Merlin e
deusa), a sagrada família hindu e Viviane, além das histórias do Mabi-
ainda mitos jainistas e budistas. nogion, de Gales. No capítulo nórdico
os autores, além dos deuses, trazem
Os mitos chineses contam a as lendas de Beowulf e Sigurd, assim
teoria do mundo que nasce do caos, a como no capítulo eslavo mostram os
criação por Nu Gua e Fu Xi, os mitos espíritos malignos, ancestrais, criatu-
dos corpos celestes, a mitologia bu- ras da floresta, Baba Yaga, lobiso-
dista, taoísta e também nos apre- mens e vampiros.
senta os deuses do lar. Já no capítulo
sobre o Tibete e a Mongólia temos O livro aborda também os mitos
mitos sobre os reis e deuses, além de das regiões árticas, dos povos inuítes
abordarem o xamanismo mongol. Já e da Sibéria; da América do Norte,
os mitos japoneses trazem a história com os xãmas e os mitos navajos e de
de Izanagi e Izanami, a luta da deusa animais, como o coiote; da Meso-
Amaterasu e do deus Susanoo, e América, trazendo divindades como
muito mais! Tezcatlipoca e Quetzalcoatl, os
deuses do calendário solar sagrado e
Indo para o capítulo da Grécia, o os deuses maias; na parte da América
livro traz os principais deuses do
do Sul, os mitos dos andes, o panteão
Olimpo e as histórias de heróis, como
inca e o mundo espiritual da floresta
Hércules, Perseu e Teseu, além de
ancestral; já na parte da África, traz
criaturas mitológicas, como os
Exu, mitos de origem, mitos de
centauros e as amazonas. O capítulo
animais trapaceiros, inventores e
de Roma faz a analogia com o
transformadores; enquanto na parte
panteão grego de forma bem
da Austrália, traz a origem do
interessante.
casamento, mitos da inundação e de
morte e luto; a Oceania vem com
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THOTH

mitos dos Maoris e com a história de LIVRO: Col. o Silêncio dos Deuses
Maui, o trapaceiro da Oceania. O
- Livro 1. O Livro do Silêncio
autor fecha o livro com os mitos do
Sudeste Asiático, com informações
AUTOR: P.J. Pereira
interessantes, como a origem do POR LAINE BALBINO
arroz. @ORGASMOLITERAL

Aqui foram apresentadas algumas


partes do livro, que é ricamente
ilustrado e muito diversificado, em
311 páginas (enormes) de muito
conhecimento!

Naturalmente, os livros de mitologia


mundial não conseguem trazer todas
as informações disponíveis, como nos
livros específicos de cada mitologia,
mas este é um ótimo exemplo de
autores que conseguem apresentar
um panorama geral da mitologia
mundial de forma clara e bem
organizada. Além disso, no início do
livro existem mapas que nos ajudam
com a localização, principalmente
quando lemos sobre mitologia
Por conceber o tempo como algo
comparada, as invasões e as grandes
circular (o que vivemos hoje já foi
migrações.
vivido por nossos antepassados e
será novamente experimentado por
No fim, este é um livro fantástico,
gerações futuras), a mitologia
que vale muito a pena ter à mão!
africana encontra em seus adivinhos
os conselhos necessários para que os
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seres humanos cumpram os seus No núcleo tupiniquim, acompa-


destinos. Mas e se eles fossem nhamos mensagens eletrônicas envia-
silenciados? das pelo jornalista Newton Fernandes
a um destinatário que não conhece-
“O livro do silêncio” é o primeiro da mos, mas que é chamado de Laroiê (o
trilogia “Deuses de dois mundos”, do nome já nos traz algumas informa-
escritor PJ Pereira. Nele somos apre- ções, né?).
sentados ao início de uma história
envolvente sobre deuses orixás, ba- New é um homem com persona-
balaôs, odus, guerreiros africanos e o lidade gananciosa e egoísta e que
futuro dos seres humanos. possui pensamentos extremamente
céticos quanto a qualquer tipo de
Confesso que iniciei a leitura com espiritualidade. Já de início percebe-
pouco entusiasmo, afinal meu conhe- mos que ele não mede esforços, nem
cimento sobre os mitos africanos se atém a conceitos éticos, quando o
ainda é mínimo, mas o desânimo que está em jogo é algo que almeja.
sumiu nas 5 primeiras páginas (que
grata surpresa!). Porém, o personagem recebe um
chamado do mundo dos orixás para
A história é narrada em dois realizar uma importante tarefa e
núcleos: um se passa na cidade de acaba abrindo sua percepção para
São Paulo e o outro traz aconte- uma realidade que jamais acreditou
cimentos ocorridos entre o Aiê, aqui existir.
trazido como um mundo mágico dos
mortais vivos, e Orum, mundo espi- Intercalando as histórias dos dois
ritual dos imortais. As narrativas núcleos, o autor nos apresenta a
ocorrem de forma paralela, mos- jornada de Orunmilá, grande babalaô
trando como ações tomadas hoje afe- (adivinho) que vê seus instrumentos
tam a vida de muitas gerações, de trabalho silenciados: os odus,
mudando absolutamente o futuro de donos das histórias dos homens e
todos. responsáveis por transmitir as mensa-
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gens dos deuses através de diferentes rer das páginas começamos a pensar
artes divinatórias, se calam completa- de uma outra forma.
mente sem deixar motivo.
Além disso, o livro também nos
Mandando seu mensageiro Exu ao permite refletir sobre conceitos
Orum para investigar o que estava binários do tipo bem e mal: os
acontecendo, Orunmilá descobre que personagens mostram atitudes que
o silêncio dos odus é decorrente de podem ser socialmente consideradas
um plano das velhas feiticeiras Iá Mi ruins por alguns, mas que para seus
Oxorongá para controlar o Aiê e se praticantes são boas, trazendo
tornarem as responsáveis pela também a ideia de que não há
história da humanidade. represálias, mas sim consequências
das nossas ações.
O babalaô recebe dos orixás a
missão de reunir 7 grandes guerreiros Muitas questões me chamaram a
capazes de enfrenta-las e recuperar o atenção na história (amo literatura
destino dos homens. A partir de fantástica!), mas algo que realmente
então, seguimos Orumnilá na busca me cativou foi como o autor consegue
desses corajosos e somos apresen- apresentar de forma fluída uma
tados a diferentes arquétipos dessa mitologia que é tão próxima de nós,
rica mitologia. brasileiros, mas que, infelizmente,
ainda é pouco reconhecida e por
Acompanhar as duas narrativas que muitos rechaçada.
ocorrem paralelamente nos dá aquela
sensação de “pulga atrás da orelha”, Embora traga termos e nomes que,
sabe? A leitura segue nos instigando a muitas vezes, são desconhecidos do
pensarmos como New afeta a história nosso cotidiano, há um glossário e um
dos orixás e vice-versa: em seu texto com informações que nos
primeiro e-mail, o personagem fala ajudam a acompanhar a leitura de
de traição e dá a entender que foi forma prazerosa, sem afetar o seu
traído de forma brutal, porém com o pleno entendimento.
decor-
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Vi algumas críticas apontando uma deixa super ansiosos pela


possível falta de descrição das continuidade (eu quase surtei quando
características físicas dos persona- percebi que o livro tinha acabado...).
gens como um fator negativo na obra. O autor criou um book trailer
Mas fico pensando: estamos falando (disponível na plataforma YouTube)
de mitologia africana, é realmente que deixa muitos curta metragens no
prejudicial à nossa imaginação o autor chinelo! Podem assistir a essa
não mencionar que os orixás são maravilha sem medo, porque não traz
negros, por exemplo? Quando spoiler algum, mas tenha a certeza
falamos dos deuses nórdicos, não é que após esse vídeo será
preciso enfatizar a cor da pele de praticamente impossível você não
Thor para o imaginarmos, não é querer ler o livro.
mesmo? Vejo um pouco de má
vontade em considerações que vão
por esse viés... *** RECOMENDAÇÃO DA EDITORA:
Acompanhem a página no Instagram
Lealdade, paixão, magia, fé, lutas do @OrgasmoLiteral, pois lá tem
sangrentas... as páginas nos puxam e muitas dicas de leituras preciosas
pintam em nossas mentes imagens com resenhas magníficas como essa!
coloridas e lindas, trazendo os sons
dos batuques e quase nos fazendo
sentir o cheiro de comida e perfume
das grandes festas (tem uma cena em
que Oxum dança que eu posso jurar
que fui hipnotizada por sua beleza).

É uma leitura rápida não por ser


pequena ou algo assim, mas porque
quando começamos a ler é pratica-
mente impossível pararmos! Por ser o
primeiro de uma trilogia, seu final nos
VITROLA
DE ORFEU
ARTISTA: Megaira
MÍDIA: Power, Lies and Death
POR MEGAIRA

A banda Megaira, fundada em


2009, no ABC Paulista, se diferencia
pela mistura dos estilos Thrash/Death
com Metal Tradicional e letras
voltadas a Mitologia Grega. Formada
atualmente por Paulo Schmidt
(Vocal), Annia Bertoni (Vocal), Paulo
Melo (Guitarra), Tom Petram
(Guitarra),Tiago Souza (Baixo) e Paulo
Lima (Bateria) a Megaira traz
influências de Black Metal com
bandas Thrash/Metal/Melodic dos
anos 80 e 90 e suas composições são
baseadas na Mitologia Grega
contando histórias a partir de estudos O resultado final foi um álbum que
com bases históricas. apresenta características de Heavy
Metal Extremo e Metal Tradicional,
No ano de 2010, a banda realizou vocais guturais/death contrastando
diversos shows na capital paulista, com vocal heavy metal feminino e
grande ABC, litoral e interior de São uma nova forma de contar histórias
Paulo. O ano seguinte foi marcado da Mitologia Grega com um toque de
pela finalização do processo de nostalgia de grandes bandas do estilo
composição do álbum de estréia. No de décadas passadas.
primeiro semestre de 2012, foi
iniciado o processo de gravações de O álbum “Power, Lies and Death”
"Power, Lies and Death", com pré- lançado em 2017 pela Shinigami
produção e gravações do produtor Records está disponível para venda
Luiz Portinari e finalização de na loja oficial da banda, principais
produção do produtor Thiago Oliveira plataformas digitais e lojas da Galeria
(Warrel Dane/Confessori). do Rock em São Paulo e apresenta
VITROLA
DE ORFEU

uma nova fase do estilo reinventado bandas Ilusion, que tocou covers e suas próprias
composicões, e Wasted Land, com apenas músicas
com força e energia para representar originais. Em 2000 formou a banda Cenotaph com o
histórias da mitologia de uma forma guitarrista Cristian Araújo, que mais tarde se tornaria
Esdrelon, uma banda de Thrash Metal, com a entrada do
moderna. atual guitarrista da Megaira, Paulo Melo. Esta formação
trabalhou por alguns anos tocando com bandas como
Tuatha de Dannan, Torture Squad, Necromancia, entre
outros, no Estado de São Paulo. Alguns anos depois, ele
foi convidado pelos fundadores da Megaira Paulo Melo e
Cristian Araújo para assumir os vocais da banda, que ele
dedica exclusivamente aos dias de hoje.

ANNIA BERTONI
(Vocal Heavy Melódico)

Começou sua carreira artística em 2002 como atriz e


estudou canto popular, rock e lírico por 10 anos. Formou
sua primeira banda em 2004 cantando covers de rock e PAULO MELO
desde então fez parte de outras bandas com o mesmo (GUITARRA)
perfil, como a banda Radiometria. Participou de peças
musicais como A Ópera do Malandro e bandas de tributo Seu primeiro contato com a música aconteceu no ano de
como Dio / Black Sabbath e Iron Maiden, mas elas nunca 1998, tendo aulas particulares de violão popular e
guitarra elétrica com o músico Gerson Junior. Depois de
decolaram. Em 2012, ela participou como backing vocal no
um curto período tocando em bandas cover, de 2000 a
álbum "Unfold" da banda Almah, um convite do cantor
2003, começou a estudar violão clássico e teoria musical
Edu Falaschi. Nos anos seguintes, indicados pelo
no Conservatório de São Bernardo do Campo e também
guitarrista e produtor Thiago Oliveira, ela participou como
aulas particulares com o músico Joel Galmacci. Em 2001,
cantora em eventos de caridade e arrecadação de fundos,
ele se juntou à banda Esdrelon como guitarrista, onde
onde conheceu o produtor Luiz Portinari que, no futuro, a
conheceu Cristian Araújo (também guitarrista) e o
indicou para um teste na Megaira, a qual assumiu os
vocalista Paulo Schmidt, músicos que, alguns anos
vocais heavy melódicos.
depois, formariam a banda Megaira. De 2004 a 2006
estudou violão clássico e teoria musical na Fundação das
Artes em São Caetano do Sul e de 2007 a 2009 estudou
guitarra elétrica com o músico Marcelo Naudi. Em 2009
formou a banda Megaira, que ele dedica exclusivamente
aos dias atuais, junto com o ex-membro da Esdrelon,
Paulo Schmidt.
PAULO SCHMIDT
(Vocal Gutural)

Começou sua carreira em 1990 como vocalista em


bandas cover de Heavy Metal e começou a estudar canto
com a professora Marisa Serrano. Mais tarde formou as
VITROLA
DE ORFEU

PAULO LIMA Kraaken e Blood Graal). De 2007 até meados de 2010,


(BATERIA) Petram parou de tocar e só assumiu novamente a guitarra
no final de 2010, tocando com seus amigos nas bandas
Paulo Lima estuda bateria desde 2005, sempre com o Avalon (power metal) e Imaginarium (Rock) até 2012. No
objetivo de ser baterista de Heavy Metal. ano seguinte, entrou na banda Rainha Plebe que encerrou
Desde 2007 possui experiência com bandas de diversos suas atividades no mesmo ano. De 2014 a 2015, Tom
gêneros dentro de Rock e Metal, participando de voltou a estudar guitarra com o guitarrista do
composições de bandas autorais e gravações. Necromancia: Marcelo D´Castro. Entre 2016 e 2017, voltou
Em 2010 começou a dar aulas de bateria em diversas a tocar com as bandas Avalon e Imaginarium. Em 2018,
escolas de música na cidade de São Paulo. foi convidado por Tiago Souza a fazer um teste na banda
Em 2013 foi aluno do Amilcar Christófaro (Torture Megaira, assumindo, então, uma das guitarras.
Squad). Atualmente, estuda no Instituto de Guitarra e Tecnologia
Desde 2014 toca faz parte de uma das bandas cover mais (IG&T) de São Paulo com o professor Tiago Nascimento.
expressivas de São Paulo, o Frantic - Metallica Cover,
que possui agenda de shows em diversos estados, como
SP, PR, SC, MT, MS, MG etc.
Desde 2016 faz parte da banda Eve Desire, que está em
processo de gravação de seu primeiro disco, produzido
pelo Thiago Bianchi (Ex-Shaman / Noturnall).
Em 2018 foi indicado pelo produtor e guitarrista Thiago
Oliveira (Warrel Dane / Seventh Seal) a fazer os testes
para entrar na Megaira.
TIAGO SOUZA
(BAIXO)

Começou sua carreira musical como baixista em 2000 e


começou a praticar com um grupo de amigos por alguns
anos. Em meados de 2006, ingressou na banda Drayhen,
uma banda de Metal Tradicional / Power Metal, que
ensaiava em um estúdio em São Bernardo do Campo (São
Paulo-Brasil), que por coincidência Megaria também
TOM PETRAM ensaiava, e logo houve a oportunidade de audição para a
(GUITARRA) banda. Em 2010 ele se juntou ao Rainha Plebe, uma
banda com influências tradicionais de metal, com letras
Tom Petram começou a estudar guitarra aos 13 anos de em português.
idade no Centro de Desenvolvimento Musical (CDM) de sua A carreira foi se desenvolvendo com as três bandas por um
cidade e no ano seguinte, estudou com professores
tempo, mas a Drayhen acabou terminando suas
particulares. Influenciado por bandas como Iron Maiden,
atividades. Em 2013, ele retomou seus estudos de baixo
Blind Guardian e Iced Earth, Tom participou de diversas
elétrico com Fabio Senna, e sobre o mesmo período a
bandas de heavy metal formadas por amigos entre 2002 e
banda Rainha Plebe se separou, transformando-o a partir
2007 (Soldados Urbanos, Dark Dream, Wild Wind,
desse ponto, um membro exclusivo da Megaira.
VITROLA
DE ORFEU

O conceito do álbum debut do Além destas e outras histórias o


Megaira “Power, Lies and Death” é álbum conta também com a música
baseado em várias histórias populares Erinyes, que narra a história das 3
da mitologia grega como a do divindades que punem os mortais
Minotauro, o labirinto e a morte de pelos seus pecados, sendo uma delas
Ícaro, mas também apresenta perso- a Megaira, que dá nome a banda.
nagens não tão conhecidos e suas
trajetórias, como a da constelação O resultado final como construção
Corona Borealis e a ida de Minos para musical de “Power, Lies and Death” é
ser o juiz no Tártaro. de um álbum que apresenta caracte-
rísticas de Heavy Metal Extremo e
“Power, Lies and Death” inicia Metal Tradicional, vocais guturais /
narrando sobre Minos, o rei de Creta, death contrastando com vocal heavy
seus anseios por poder e Ariadne, sua metal feminino e traz influências de
filha, que ajudou Teseu, o herói de Black Metal com bandas Thrash /
Atenas, a entrar no labirinto e matar Metal / Melodic dos anos 80 e 90,
o Minotauro. apresentando uma nova fase do estilo
reformulado, com força e energia
Neste momento é apresentado para representar histórias da mitolo-
Dédalo, inventor e arquiteto, que foi gia grega de uma forma moderna.
punido pelo rei junto com seu filho
Ícaro a ficarem presos dentro de sua O CD Power, Lies and Death conta
própria criação, o labirinto, e narra com as seguintes músicas:
sua fuga espetacular que resultou na
morte de Ícaro. Furioso, Minos vai *RISING OF THE KING (INTRO)
para a Sicília na busca por Dédalo, Abertura instrumental orquestrada
mas acaba morrendo, indo assim para
o Tártaro e transformando-se, junto *POWER AND CRUELTY
com seus outros 2 irmãos, em um dos Narra a história de Minos, filho de
juízes de Hades. Zeus e Europa, que matou seus
irmãos para tomar o poder em Creta
VITROLA
DE ORFEU

mandando Dedalus, seu arquiteto, ter sido levada por um estrangeiro. O


construir o labirinto para abrigar o rei sentencia ele e seu filho Ícaro
Minotauro e defender seu palácio, para morrerem em sua própria
fazendo juras de poder e conquista. criação, mas eles conseguem fugir do
labirinto construindo asas com cera
*ARIADNE’S THREAD de abelhas e penas de pássaros.
Conta a história de Teseu, herói de
Atenas, que queria matar o Minotauro *CORONA BOREALIS
e acabar com o tributo a Atenas A princesa Ariadne é abandonada por
imposto por Creta. Após saber do Teseu em uma ilha enquanto ela
Oráculo de Delfos, que só conseguiria dormia. Ela entra em desespero ao
vencer com a força do amor, ele faz acordar, mas encontra a deusa
uma proposta de casamento para a Afrodite que lhe promete o amor
princesa Ariadne que o ajuda a entrar imortal de Baco com o qual viveu até
e sair do labirinto com um simples seus últimos momentos. Após sua
truque. morte, por amor e devoção a Ariadne,
Baco a transforma na constelação
*THE FALL OF MINOTAUR Corona Borealis.
Narra a entrada de Teseu no labirinto,
um ambiente assustador com cheiro
de morte. Sabendo que pode se *END OF A REIGN
deparar com o monstro a qualquer Minos chega na Sicília onde Dédalus
momento ele se prepara para dar um havia se abrigado e manda o rei
golpe fatal e quando teve a melhor Cócalo entregá-lo para ser punido,
chance mata o Minotauro assim que o caso contrário invadiria o palácio.
encontra. Sabendo das intenções de Minos, o
rei Cócalo consegue persuadi-lo com
*DEDALUS AND ICARUS’ ESCAPE a ajuda de suas filhas para entrar e
Minos fica enfurecido com Dédalus repousar, mas é morto por elas
pelo seu labirinto ter falhado, o escaldado em um banho. Após sua
Minotauro ter sido morto e sua filha
morte, Minos vai para ao Tártaro, on-
VITROLA
DE ORFEU

de é convocado por Hades a se juntar Links para os Clipes do Megaira:


aos seus 2 irmãos e se tornar seu juiz.
POWER AND CRUELTY
*ERINYES Assista aqui:
Conta a história das 3 Erínias, filhas https://www.youtube.com/watch?v=rLU
de Nêmesis, a deusa da vingança que I_t4lkDA
punia os deuses. Alecto (Inominável),
espalha pestes e maldições para punir ARIADNE’S THREAD
os mortais pelos delitos morais, Assista aqui:
Trisífone (Castigo) açoita e https://www.youtube.com/watch?v=lVv
enlouquece para punir os assassinos e NC_0JD2o
Megaira (Rancor) grita eternamente
as faltas dos pecadores infiéis ao DEDALUS AND ICARUS’ ESCAPE
matrimônio sem dar descanso a Assista aqui:
mente levando-os ao desespero e https://www.youtube.com/watch?v=naS
insanidade. x01vM8Ns

CORONA BOREALIS
PARA MAIS INFORMAÇÕES SOBRE O Assista ao clipe aqui:
MEGAIRA ACESSE: https://www.youtube.com/watch?v=xqu
ti_jWAEY
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FFICIAL
VITROLA
DE ORFEU
ARTISTA: Sepultura
MÍDIA: Roots (A identidade do Heavy Metal brasileiro a partir de
suas raízes)
POR LUIS F. RIBEIRO - HELLYEAH!

Desde que o Heavy Metal brasileiro


começou a ter algum reconhecimento
mundo afora, é inegável afirmar que a
maior banda formada em terras
tupiniquins foi o Sepultura, principal
responsável por esse interesse cres-
cente na nossa música. Independente
dos rumos que sua música tomou, de
suas consideráveis mudanças de
formação ou da apreciação do
trabalho da banda, a importância do
Sepultura é incontestável na abertura
das portas do Brasil para o Metal e busta que outrora, entrando inclusive
para a formação da identidade em temas de cunho mitológico, o que
musical dessa vertente segundo a podemos observar até mesmo
nossa própria cultura. estampado na capa de um de seus
discos, o grandioso “Kairos”, que faz
Se no início de sua trajetória, em referência ao deus do tempo
meados de 1984, o Sepultura oportuno na mitologia grega.
apostava em músicas e temáticas
menos profundas, abordando Emissários reconhecidos de uma
questões como política, religião e mensagem das raízes da sua terra, em
reflexões sobre a vida e a morte, em "Roots", o Sepultura rasgou as
seus trabalhos mais recentes, cada
entranhas mais profundas da
vez mais a banda vem apresentando
riquíssima cultura de seu povo,
composições melhor elaboradas e
aprofundando-se nas tradições, nas
com uma riqueza lírica muito mais ro-
histórias e na mitologia indígina
brasileira através de seus ritmos tri-
VITROLA
DE ORFEU

tribais e suas letras de uma combinação dos elementos


autenticidade excepcional. Vem daí percussivos da banda, representou
aquela que é provavelmente a um processo que vai muito além da
primeira referência da banda à dinâmica musical, criando uma fusão
mitologia em sua música, não sendo dos elementos já conhecidos nas
essa presença costumeiramente vertentes mais extremas do Heavy
emitida de maneira explícita, sendo Metal com o som orgânico da terra e
essencialmente intrínseca, especial- incursões no desconhecido e volátil
mente evidente na musicalidade da terreno do experimentalismo, que
banda. vestiu como uma luva ao som da
banda, que de uma maneira
Em "Roots", sexto álbum de estúdio absolutamente natural mergulha no
da banda, lançado em 1996, o coração selvagem do Brasil, onde
Sepultura juntou-se a tribo indígena reivindica a supremacia de suas
Xavantes, na região de Camarana, no origens.
Mato Grosso, onde imergiram em sua
cultura durante três dias breves mas ***
intensos, compartilhando dos costu-
mes e ritos daquela tribo, tendo seus No decorrer do século XVIII, com a
corpos pintados, participando de suas descoberta do ouro na capitania de
cerimônias e danças, comendo a sua Goiás, houveram inúmeros atritos
comida, bebendo a sua bebida e violentos entre as tribos xavantes
tomando banho de rio. Esta imersão desta região com os garimpeiros,
resultou em uma obra quase colonos, bandeirantes e missionários
conceitual sobre aquele povo e seus que chegaram a essas terras. Alguns
ritmos, cânticos e a fúria do Heavy xavantes nesse período optaram por
Metal do quarteto se confunde com a migrar para o oeste, onde
história e as crenças das muitas
atravessaram o rio Araguaia,
tribos escondidas nos cantos mais
enquanto os que ficaram para trás
remotos dessa nação de proporções
passaram a ser conhecidos por
colossais. Inseridos nesse contexto, a
Xerentes. Mitos Xavantes descrevem
esse episódio com a figura de um bo-
VITROLA
DE ORFEU

to colossal que teria surgido no meio “Nós estamos crescendo a cada dia,
das águas do rio Araguaia, mais fortes em todos os sentidos. Eu te
amedrontando e separando para levarei para um lugar onde
sempre Xavantes e Xerentes. Outro encontraremos nossas raízes
mito relata que os Xavantes teriam sangrentas”. - Roots Bloody Roots,
sido transportados por botos, Sepultura.
somente assim conseguindo atraves-
sar as turbulentas águas do Araguaia. Esse resgate da mitologia dos povos
A designação "Xavante" teria sido do Cerrado promovido pelo Sepultura
então criada pelos não índios para é uma forma de conhecer a
diferenciar os Xavantes dos Xerentes diversidade cultural sobre a qual está
que ficaram no que hoje é o estado formada a nação brasileira. Para os
do Tocantins. índios, recontar as histórias é evocar
as forças naturais e honrar o legado
de seus ancestrais.
***
Em sua cruzada pela busca da
identidade do Heavy Metal brasileiro, "Itsári", que assim como o título do
o Sepultura passou a fazer cada vez disco, significa "Raízes", manifesta a
mais experimentações em suas performance dos Xavantes em um
canções, tornando mais e mais cerimonial capturado e utilizado pela
evidente a importância que a raíz, a banda na gravação desta canção. Os
história e a mitologia de um povo trechos apresentados em "Itsari",
possuem sobre sua arte. Isso tudo fazem parte de "Datsi Wawere", um
fica evidente logo de cara, na canção fragmento de um conjunto de cantos
de abertura do disco, “Roots Bloody e danças de um cerimonial de cura,
Roots”, que aborda abertamente a que segundo a mitologia dos
preservação da cultura brasileira e a Xavantes foi um cântico muito antigo
importância do nosso contato com trazido nos sonhos por um ancião que
nossas raízes. tem o poder de restaurar a vida em
pessoas que estão a beira da morte,
se elas acreditam de verdade que po-
VITROLA
DE ORFEU

dem ser curadas. dentro dessa esfera que se observa a


real importância do mito. No que
“Quando o fogo estava bem forte, a concerne ao discurso mítico Xavante,
mãe jogou a filha em cima da grande percebe-se em sua própria narrativa a
fogueira. Os pais haviam decidido conservação de seu contrato e a
jogar sua filha no fogo, porque não apresentação de seus sujeitos em
havia nenhuma forma de tirar o fedor dizeres como: “Contam os antepas-
do lobo impregnado em seu corpo. sados”, “Dizem os índios de antiga-
Nesse momento, o calor do fogo fez mente”, “Os meus avós me contaram
estourar o seio da moça, entumescido assim”. Estas marcas revelam a
de leite. O leite que saiu jorrou longe e manifestação de uma voz institu-
molhou o tronco da árvore réwede. O cional, representada pela ancestrali-
leite penetrou pelo tronco da árvore e dade e conhecimento oficial daquele
formou sua seiva. Até hoje nós usamos grupo. Da mesma forma, elas
a resina de réwede para curar as reiteram a autoridade de seus
doenças e preparar adornos e objetos comunicantes: se a veracidade está
de poder para as cerimônias.” - Trecho na autoridade dos ancestrais, a voz
de “O Lobo Guará e outras histórias do da enunciação apropria-se desta
povo Xavante”, sobre o mito de autoridade temporal, pois são os
invocação dos ancestrais nos rituais “mais velhos” que narram as histórias
de cura Xavantes. aos “mais jovens”.

*** A narrativa dos mitos indígenas,


apesar de diversos elementos que
Os Xavante, tal qual qualquer outra transcendem à realidade cotidiana, é
comunidade humana, apresentam um recebida como verdadeira pelos que a
conjunto de narrativas, consideradas ouvem. O efeito de verdade é
como mitos, que definem tanto o propiciado pela autoridade da pessoa
mundo quanto os indivíduos, assim que conta. Contar uma história é
como a condição do vínculo que os tomar o poder da palavra, é ter o
caracteriza ou os diferencia de outros direito de ser ouvido. Nos mitos indí-
grupos humanos e da natureza. É
VITROLA
DE ORFEU

genas o contrato de verdade só é teza, eles também cantaram um dia”


estabelecido através de suas - Monólogo ao Pé do Ouvido, Chico
representações sociais e “institucio- Science e Nação Zumbi
nalização” de uma diversidade de
histórias, ritos e meios de fazer que Viva Roots! Viva o Sepultura do
são tidos como originais e Brasil!
verdadeiros.

***

Em “Roots” o Sepultura elevou-se a


um novo patamar em termos de
composição e tornou-se um produto
do orgulho nacional através da
visibilidade que trouxeram para nosso
país, para a nossa cultura e
especialmente para a cultura
indígena, em uma busca pela
identidade nacional através de sua
música por meio do encontro das
influências culturais europeias,
africanas e indígenas, que formam
aquilo que se conhece como o mito
das três raças, subjugando inclusive
as barreiras do preconceito e da
marginalização do gênero musical
que eles representam.

“Viva Zapata! Viva Sandino! Viva


Zumbi! Antônio Conselheiro! Todos
os Panteras Negras. Lampião, sua
imagem e semelhança Eu tenho cer-
HISTÓRIAS DA
VÓ TIANA

HISTÓRIA: O Labatut que a Caipora e mais terrível que o


CONTADOR: Luiz Júnior Cão-Coxo. Ele mora, como dizem os
velhos, no fim do mundo, e todas as
Típico do sertão do Nordeste noites percorre as cidades, para
brasileiro, o Labatut, ou Monstro saciar a fome, porque ele vive
Labatut, teve sua origem – veja só! – eternamente esfaimado. Anda a pé;
de uma pessoa que realmente existiu. os pés são redondos, as mãos
Trata-se do general francês Pedro compridas, os cabelos longos e
Labatut, que combateu os revoltosos assanhados, corpo cabeludo, como o
de Joaquim Pinto Madeira durante a porco espinho, só tem um olho na
Independência do Brasil, sendo testa como os ciclopes da fábula e os
conhecido pela sua extrema agressi- dentes são como as presas do
vidade e certo grau de sadismo, elefante! Ele gosta muito mais de
principalmente com negros e meninos, porque são menos duros
membros de seu próprio exército. que os adultos! Ao sair da lua, ele,
Suas histórias foram cantadas em que anda ligeiro, entrará pelas ruas
prosa e verso por todos aqueles que o num trote estugada, pairando às
conheceram, e ele se eternizou, portas para ouvir quem fala, quem
finalmente, na imagem de um mons- canta, quem assobia e quem ressonar
tro de pés redondos, mãos muito alto e, zás!, devorar. Os cães dão
compridas, cabelos longos e assa- sinal, latindo atrás!”. (www.portalsao
nhados e corpo cabeludo. É uma francisco.com.br).
espécie de Ciclope – com um olho só Esta é uma lenda que vem,
no meio da testa – e longos caninos, portanto, da crueldade do ser
como os de um elefante. humano. Labatut, quando em vida, foi
Considerado muito mais feroz que tão feroz que se tornou temido até
o lobisomem, o Labatut vai à caça em por seu próprio exército – e hoje vem
noites de Lua Cheia ou de muito assombrando o interior do Brasil com
vento, preferindo devorar crianci- suas histórias terríveis. ___
nhas, por estas terem a carne mais Gostou? Este e outros contos
tenra e macia. estão na coletânea Corpo Seco e
“Labatut é um bicho pior que o Outras Histórias, disponível em e-
Lobisomem, pior que a Burrinha, pior book na www.amazon.com.br.
ARQUIVOS
DE LOKI
FILME: Mononoke Hime ( もののけ姫)
DIREÇÃO: Hayao Miyazaki / PRODUÇÃO: Studio Ghibli

por: Fábia Lucas com colaboração de Carlie Lucas

A presença de entidades que foi ferido mortalmente e sofreu


sobrenaturais do folclore japonês - dores inimagináveis com uma bola de
conhecidos culturalmente como yōkai ferro corroendo seu corpo por dentro.
(youkai ou 妖怪 ) é forte nos mangás e
animes, bem como em outras formas Durante a luta o Tatari Gami toca o
de arte e literatura nipônica. É um príncipe, contaminando-o com sua
jeito de preservar a cultura e as maldição. Ele então é orientado pelo
crenças que existem desde tempos Oráculo da vila a partir em busca do
remotos. seu destino e descobrir o que teria
transformado o Deus Javali em
A presente resenha é sobre o longa- demônio, procurando, sem o olhar do
metragem de animação “Mononoke ódio, curar a maldição.
Hime”, lançado em 1997, dirigido por
Hayao Miyazaki e produzido pelo Seguindo o rastro do deus javali ele
conceituado Studio Ghibli. chega a uma grande floresta. Lá se
depara com deuses lobos e uma
Apesar de ser ambientado na Era jovem que vive com eles – a princesa
Muromachi (1336 – 1573), apresenta Mononoke – que foi criada por esses
um tema cada vez mais atual - a espíritos e odeia os humanos por
relação do ser humano e a natureza, causa de todas as destruições pelas
abordando a ganância que gera a quais são responsáveis; também se
destruição das florestas e as suas depara com dois homens feridos e
consequências. resolve levá-los de volta para a
aldeia deles. Para sair da floresta é
A história começa quando um Tatari ajudado pelos Kodamas ( ⽊霊 ), seres
Gami ( 祟り神) invade uma pequena que habitam a árvore que dá vida à
vila. O príncipe Ashitaka consegue floresta.
matá-lo e descobre que antes de virar
um demônio ele era um deus javali, A aldeia vive da mineração de ferro
ARQUIVOS
DE LOKI

e é comandada pela Lady Eboshi, uma morte no folclore japonês) é um deus


mulher que apresenta uma dualidade cervo (palavra formada pelos kata-
– de um lado é a mulher que feriu kanas ‘shishi’ – cervo – e ‘gami’ ou
mortalmente o deus javali e pretende ‘kami’ - deus), uma entidade que tem
destruir o grande deus da floresta, o poder sobre a vida e a morte, bem
Shishigami ( シシ神 ), para poder como sobre os poderes da natureza. É
dominar a região e explorar todos os apresentado como o ‘espírito da
recursos possíveis; por outro lado, ela floresta’, que durante o dia assume a
formou seu povoado com mulheres forma de um magnífico cervo com
que seriam vendidas para prostituição enormes chifres, pés de ave e face de
e leprosos que seriam deixados para babuíno - uma criatura ancestral, com
morrer à míngua, se não fosse a sua o poder da criação; e à noite mostra-
generosidade em acolher e oferecer se em toda a sua plenitude e poder,
respeito e dignidade a eles, mesmo na forma do Andarilho, um
que em troca de trabalhos pesados. Daidarabotchi - entidade de forma
gigantesca, acima do bem e do mal.
Na sua busca gananciosa ela Ao ser ferido mortalmente e ter sua
encontra mercenários que fingem cabeça arrancada e roubada pelos
ajudá-la e também conhece a mercenários, ele desencadeia uma
misericórdia de Ashitaka, que não se série de fenômenos que arrasam tudo
deixa tomar pelo ódio ao ver os erros o que há pela frente, incluindo a
que a ganância dela levaram-na a aldeia da Lady Eboshi, ensinando
cometer. sobre as consequências de nossas
atitudes gananciosas e assassinas,
A narrativa apresenta elementos do mas também mostrando grandeza e
folclore japonês, como os seres poder de renascimento.
mágicos das florestas, apresentados a
seguir: A imagem do deus javali trans-
formado em Tatari Gami ilustra de
O Shishigami (não confundir com os forma quase que palpável a dor que
Shinigamis 死神 , q u e s ã o d e u s e s d a pode se transformar em amargura e
ARQUIVOS
DE LOKI

ódio tão grandes ao ponto de fazer vores. São considerados criaturas


com que a vítima queira destruir tudo pacíficas, guias e protetores das
à sua frente, o que ao invés de florestas, sendo considerados símbo-
acalmar a dor, só faz aumentá-la, até los de boa sorte. Estão na classifi-
que consuma totalmente seu espírito cação dos Yokai – criaturas sobrena-
e ela deixe de ser, definitivamente e turais, que podem assumir tanto
irremediavelmente, o que foi um dia. forma humana como animal ou ainda
aqueles que têm a habilidade de se
O Tatari Gami é um deus da transformar. Há lendas que relatam
maldição, visto como deus ou que é possível ouvir o lamento dos
demônio, que quando maltratado Kodamas quando árvores são
pode lançar maldições em forma de derrubadas.
epidemias e mortes. O folclore
japonês descreve vários exemplos de A princesa Mononoque, que é a
Tatari Gami, entre eles o Yamata no personagem que dá nome à obra, não
Orochi (uma serpente que possui oito está na classificação de humano e
cabeças, oito caudas e olhos nem de espírito. Ela é uma humana
vermelhos e que exigia que criada pela deusa loba e que nutre
anualmente fosse feito para si o um forte e crescente sentimento de
sacrifício de uma virgem – e sim, não vingança, colocando-se no papel de
é por acaso que o Orochimaru das justiceira. Não é à toa que o filme
histórias do Naruto tem esse nome, carrega o seu nome, pois é um ser
mas isso é tema para um outro artigo, entre os dois mundos, representa o
no qual poderemos falar também do elo entre o ser humano e a natureza,
Susanoo e do Amaterasu). O Tatari fruto de dois mundos que se
Gami é uma deidade que nasce de tornaram antagônicos.
mortes trágicas, regadas com o
extremo do horror e do ódio. Não é exatamente um filme leve,
mas tem uma beleza poética e
Já os Kodamas são espíritos que dolorida ao mesmo tempo, abordando
habitam as maiores e mais antigas ár- temas urgentes neste momento, co-
ARQUIVOS
DE LOKI

mo a destruição da natureza, ato tão


SAIBA MAIS SOBRE FÁBIA LUCAS NA
cruel e covarde, e suas consequên- SEÇÃO "PANTEÃO DE COLABORADORES"
cias, como desastres naturais e
doenças que tiveram início com o SOBRE A COLABORADORA CARLIE
comércio ilegal de animais silvestres LUCAS:
ou com a aproximação deles dos HTTPS://WWW.LINKEDIN.COM/IN/CARLI
centros urbanos, por causa da E-LUCAS-93200B190/
destruição do seu habitat.

Fonte da imagem: https://www.posterlounge.pt/p/620045.html


A NONA ÁRVORE
A NONA ÁRVORE
A NONA ÁRVORE
A NONA ÁRVORE
A NONA ÁRVORE

CADU SIMÕES
Fundou em 2007 o Quarto Mundo,
um coletivo que possuía a função de
distribuir, divulgar e fomentar a
produção de HQs independentes no
Brasil. E em 2011 fundou o coletivo
de quadrinistas Petisco, que teve
HQ "A Jornada do Herói Quadrinista", dentre suas atividades a publicação
Parte da Revista "Cosmogonias" periódica de quadrinhos na Internet
para leitura online e gratuita. Agora
possui seu próprio selo de qua-
Cadu Simões é historiador por
drinhos, a Aedo Edições.
formação e roteirista por insistência.
É natural de Osasco, uma cidade
Além de suas obras autorais,
localizada no “faroeste” de São
costuma trabalhar como roteirista,
Paulo.
redator e revisor freelance para
diversas empresas e instituições.
Começou a fazer quadrinhos em
Também trabalha fazendo letreira-
2000, publicando de forma
mento para quadrinhos. Eventual-
independente tanto pela Internet
mente ministra palestras, oficinas e
quanto em publicações impressas. Em
cursos relacionados a roteiro, criação
2008 foi premiado com o Troféu HQ
de narrativas, produção de HQs
Mix na categoria de Roteirista
independentes e publicação de
Revelação.
webcomics (quadrinhos digitais).

As suas atuais séries de histórias


*** NOTA DA EDITORA: Cadu Simões
em quadrinhos são: Homem-Grilo,
gentilmente nos cedeu a HQ em
uma paródia com o universo de
questão, que traz um pouco da
super-heróis; Nova Hélade, uma
jornada do herói (tema do artigo 1)
revisitação a mitologia grega em um
em conjunto com o universo do
cenário fantástico-futurista;
quadrinista, que sempre são
Cosmogonias, uma antologia de HQs
homenageados nesta seção!
curtas com temáticas filosóficas com
base em mitologias; Acelera SP; uma SAIBA MAIS SOBRE O AUTOR NA
ficção científica cyberpunk SESSÃO PANTEÃO DE COLABORADORES
embientado na Grande São Paulo.
ACADEMIA DE
QUÍRON

cursos,
palestras,
eventos...
MAI 2021
ACADEMIA DE
QUÍRON

MAI 2021

O MITO EM NÓS É UM CURSO CONSTITUÍDO DE 07


ENCONTROS VIVENCIADOS (UM AO MÊS, VISANDO O
RECONHECIMENTO DO MASCULINO E FEMININO
COMPLEMENTANDO-SE EM CADA UM DE NÓS,
ATRAVÉS DAS MITOLOGIAS GREGA, INDIANA, EGÍPCIA,
INDÍGENA, E CELTA.

SOLANGE S. D’AMATO - PSICOPEDAGOGA /


ARTETERAPEUTA
VILMA C. FIDALGO DEL RY - ESCRITORA / PROF. DE
LITERATURA
NOVA TURMA: MAIO/2021
INFORMAÇÕES: 99132-9228 - SOLANGE
ACADEMIA DE
QUÍRON

MAI 2021

Bom
Proveito!
PANTEÃO DE
COLABORADORES

LARISSA DIAS
EDITORA E IDEALIZADORA

Larissa Dias é uma paulistana apaixonada por mitologia. Psicoterapeuta e Orientadora


Profissional, atua com a mitologia em todos os seus processos.
É Socióloga, com formação nas áreas de Mitologia Criativa, Contos de Fadas e Psicologia
Analítica, Psicoterapia Junguiana e Recursos Humanos.
Atuando por mais de 15 anos no mundo corporativo, descobriu nos atendimentos de
psicoterapia e orientação profissional essa nova e incrível vocação. Criadora do método
“Jornada Vocacional”, um jogo que atua com a jornada do herói, mitos, e contos para a
descoberta da vocação. Também é associada à ABOP (Associação Brasileira de Orientação
Profissional) e certificada pela Escola Eneagrama de Khristian Paterhan. Já atuou como
professora de Mitologia na Pós-Graduação de Mitologia Criativa e Mitodrama, da UNIP - SP.

www.larissadiaspsico.com.br
larissa@larissadiaspsico.com.br

FÁBIA LUCAS
REVISORA DE TEXTO E COLABORADORA DE OBRA CINEMATOGRÁFICA
Revisora de textos - Professora de Português e Inglês – Licenciada em Letras português-
inglês; Especialista em Metodologias do Ensino de Português para Estrangeiros; Concluindo o
último semestre de Pedagogia em julho de 2021. Lecionou para turmas do ensino médio de
escola estadual em São Paulo; atualmente é professora voluntária de português para
estrangeiros na Missão Paz e membro da equipe que elaborou o conteúdo da apostila virtual
no ano de 2020, além dos trabalhos com revisão de livros, artigos e textos acadêmicos.
Ainda na infância teve contato com a antiga Coleção Mitologia, publicada pela Editora Abril na
década de 1970, cujas histórias despertaram o amor pela leitura. Já adolescente, conheceu os
mistérios do Tarot. Além disso, como dançarina encontrou nas danças árabes e ciganas grande
amor e motivação para conhecer outras línguas, culturas e religiões, rompendo barreiras de
preconceitos e ajudando outros a despertar para as línguas, e, por meio delas, recuperar a
liberdade, a dignidade e a autonomia.

Instagram: @fabia.luca
E-mail: facaroli@yahoo.com.br
Linkedin: https://www.linkedin.com/in/fábia-carolina-lucas-3183011a2
PANTEÃO DE
COLABORADORES

ALLAN MARANTE
COLABORADOR DE ARTIGOS
Jornalista, pós graduado em comunicação institucional e desenvolvedor de soluções em TI.
Tradutor de nórdico antigo e pesquisador de runologia, publicou obras que tornam os
manuscritos escandinavos originais acessíveis para o público, abordando ritos, divindades
nórdicas, inscrições rúnicas, poemas, hinos e demais elementos da cultura e espiritualidade
nórdica.
Suas obras são "Paganismo Nórdico no Século XXI", "Hávamál: As palavras de Sabedoria de
Óðinn", "Ynglinga Saga: A História dos Deuses e Reis Nórdicos" e "Sabedoria das Runas:
História, Arqueologia e Literatura".
Fundador da iniciativa "Caminho Nórdico", que promove aulas, palestras e produz conteúdos
históricos e religiosos sobre a prática do Forn Siðr, a religião nórdica antiga.

Facebook: https://www.facebook.com/caminhonordico
E-mail: allan.caminho@gmail.com

NÚBIA FUJII
COLABORADORA DE ARTIGOS
Professora da rede pública há mais de dez anos, formada em Pedagogia pela USP. Desde a
época da graduação já nutria interesse pela área da mitologia e sempre foi apaixonada por
psicologia. Encontrou a união dessas duas temáticas no curso de Mitologia Criativa, na Unip,
onde também se especializou em Arteterapia. Atualmente, faz graduação em Psicologia
pela Faculdade Fecaf. Eterna aprendiz!

Contato: nubiafujii@hotmail.com

SOLANGE D´AMATO
COLABORADORA DE ARTIGOS
Solange Silva D’Amato adora a natureza e a simplicidade da vida. Quando adolescente,
desejou participar do Projeto Rondon que lhe colocaria em contato com indígenas da
Amazônia, mas não lhe foi possível nesse tempo. Sonho esse que só veio se concretizar bem
mais tarde, quando em uma Pós-graduação em Mitologia Criativa, Contos de Fada e
Psicologia Analítica, escolheu como tema de sua monografia a mitologia indígena. Para
mergulhar no assunto escolhido de seu TCC, em 2018, teve a alegria de conviver com 7 etnias
indígenas, numa aldeia multiétnica. Como resultado do trabalho, desenvolveu um jogo para
autoconhecimento cujo nome é “Travessia: Acessando o Melhor de Mim.” Atende em
consultório como arteterapeuta e psicopedagoga. Além realizar cursos através de workshops
em parceria com Vilma Fidalgo Del Ry.
novolhar_ workshop@yahoo.com.br / @solange.damato / www.facebook.com/solange.damato
PANTEÃO DE
COLABORADORES

ROSANGELA APARECIDA CORRÊA


COLABORADORA DE ARTIGOS
Rosangela Aparecida Corrêa – Psicoterapeuta - Analista Junguiana e Psicossomática-
FACIS/IJEP, Especialista em Clínica Junguiana do Psicodiagnóstico à Intervenção Clínica-
SEDES, Especialista em Mitologia e Contos de Fadas, Massoterapeuta, Reikiana,
Astróloga, Analista de Sistemas e Escritora. Tendo atuado por 13 anos no mundo
corporativo de multinacionais, na Área de Exatas(TI) e desde então, 17 anos atuando na
Área de Humanas, cuidando do ser, holisticamente. Fundadora do Viva Vidas Vivas, que
busca oferecer informações, serviços e compartilhamento de experiencias para incentivar
cada pessoa que tiver contato com estes recursos, a experimentar, empreender e viver
suas respectivas vidas de maneira viva, intensa, vibrante e presente.

Site 1: https://psicoterapiajunguiana.com/ Site 2: https://vivavidasvivas.com/


Facebook: fb.me/vivavidasvivas / Instagram: @vivavidasvivas
Cartão Virtual: https://heylink.me/vivavidasvivas / E-mail: i’nfo@vivavidasvivas.com

PROF. DR. MARCOS FERREIRA-SANTOS


COLABORADOR DE ARTIGOS
Jardineiro, artesão, cultivador de bonsai tropical e penjing, folklorista, arte-educador.
semeador de sumak kawsay, pan-africanismo e filosofias ancestrais…
Professor de mitologia em várias universidades na espanha e américa latina, com
investigações e intervenções poéticas em mito, música & iniciação nas comunidades
tradicionais e povos originários há mais de quatro décadas se orienta pelas pensadoras e
pensadores do “círculo de eranos” (ascona, 1927-1988), primeiro grupo interdisciplinar de
mitologia, antropologia simbólica e mitohermenêutica; assim como é influenciado pela
“antropologia da pessoa” (nikolay berdyaev, emmanoel mounier, paul ricoeur, jean cocteau,
annie besant, etc)

Youtube: youtube.com/c/MarcosFerreiraSantosoficial-mito_musica/videos
www.marcosfe.net / E-Mail: marcosfe@usp.br

KARLA BARBOSA
COLABORADORA DE ARTIGOS
Pedagoga e Professora dos Anos Iniciais. Membro há 7 anos do Grupo Druídico Ramo de
Carvalho, que busca vivenciar a espiritualidade celta, por meio da honra aos antigos deuses
celtas, à ancestralidade e animismo. Dedicou-se a estudar o Ibero Celticismo, e pública as
suas descobertas sobre ele e o Druidismo no blog pessoal "O Canto da Suindara".

e-mail: karlaalves10@yahoo.com.br
PANTEÃO DE
COLABORADORES

LAINE BALBINO - ORGASMO LITERAL


COLABORADORA LITERÁRIA
Graduada em Letras pela Universidade de São Paulo, Laine é uma paulistana que passa seus
dias perto do mar. Após anos de trabalho como secretária e professora de literatura brasileira,
atualmente estuda Tarot e é freelance na produção de artigos diversos.

Por acreditar no poder transformador das artes, mantém um perfil no Instagram chamado
Orgasmo.Literal, espaço em que compartilha leituras de diferentes gêneros, artistas
independentes e filmes (longa e curta metragens), com resenhas elaboradas com muito
empenho, para estimular os leitores na busca do conhecimento, sua grande paixão!

E-mail: balbino.elaine.s@gmail.com
Instagram: @Orgasmo.Literal

ĹUIZ JÚNIOR
COLABORADOR LITERÁRIO

Luiz Junior é formado em Design de Produtos pela Universidade Mackenzie e em Geografia


pela Universidade de São Paulo/USP, com extensão em Arqueologia pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP, além de Pós Graduado em Mitologia Criativa,
Contos de Fadas e Psicologia Analítica pela UNIP/SP e em Gestão Estratégica de Marketing
pela FAMART/MG. Atualmente faz MBA em Gestão de Projetos e Metodologia Ágeis pela
Exame Academy e estuda Liderança na Fundação Dom Cabral.É estudante de astrologia
desde 2010 e astrólogo desde 2012, tendo atendido mais de três centenas de pessoas.
Ministra cursos de astrologia online. É especialista em previsões e interpretações, e fez sua
formação na Escola Gaia de Astrologia, em São Paulo. Faz pesquisas periódicas nos campos
de Astrologia e Vibrações e das Qualidades Primordiais da Astrologia. Elabora o horóscopo
diário para o Jornal Cotia Agora e para empresas em São Paulo e no Brasil.É escritor, com
livros lançados na Europa e no Brasil – são dele os livros "O Templo da Magia", "O Livro de
Luaror" e "O Pergaminho de Lemanto", entre outros. Pesquisa e escreve sobre Mitos e Lendas
brasileiras, tendo lançado o livro "Corpo Seco e Outras Histórias", disponível na Amazon.

www.oraculosemisterios.com.br // www.escritorluizjunior.com.br // (11) 98721-9413


PANTEÃO DE
COLABORADORES

LUIS F. RIBEIRO (HELL YEAH)


COLABORADOR MUSICAL
A Hell Yeah Music Company surgiu em 2020 a partir do sonho de dois amigos, Luis Fernando
Ribeiro e Leandro Abrantes, que se conheceram há 15 anos por meio do Heavy Metal e
tomaram-no como trilha sonora de suas vidas e matéria prima de sua arte. Respeito,
valorização, criatividade e amor pelo que fazemos são nossos pilares.

A #HYMC nasceu para quebrar padrões, ignorar estereótipos e dar suporte às bandas
brasileiras que compartilham do mesmo sonho que nós. Baseada em Florianópolis, SC, a Hell
Yeah atende bandas de todo o Brasil e de Portugal. Hell Yeah Music Company, música como
experiência.

Instagram: @hellyeahmusiccompany // Linkedin: https://linktr.ee/hellyeahmusiccompany


//(48) 99815-6284

MEGAIRA
COLABORADORES MUSICAIS

A banda Megaira, fundada em 2009, no ABC Paulista, se diferencia pela mistura dos estilos
Thrash/Death com Metal Tradicional e letras voltadas a Mitologia Grega. Formada atualmente
por Paulo Schmidt (Vocal), Annia Bertoni (Vocal), Paulo Melo (Guitarra), Tom Petram
(Guitarra),Tiago Souza (Baixo) e Paulo Lima (Bateria) a Megaira traz influências de Black Metal
com bandas Thrash/Metal/Melodic dos anos 80 e 90 e suas composições são baseadas na
Mitologia Grega contando histórias a partir de estudos com bases históricas.

Site oficial: http://megairaofficial.com/


Facebook: https://www.facebook.com/MegairaOfficial/
Youtube Megaira Official: http://youtube.com/c/MegairaOfficial
PANTEÃO DE
COLABORADORES

JÉSSICA DIAS - ALPHA CENTAURI


MÍDIAS SOCIAIS

Sócia da empresa Alpha Centauri BI, Tecnologia e Desenvolvimento. Tem como lema a
melhoria contínua em todo trabalho que participa levando sua criatividade e inovação.
É paulista, formada em Gestão Ambiental com ênfase em licenciamento ambiental e
sensoriamento remoto. Apaixonada por Ciências Mortuárias, Natureza, Artes e Música
contribui com a edição de artes das mídias sociais a partir da 2ª quinzena de Março.

E-mail: jessica@alphacentauritecnologia.com.br
Site: https://www.alphacentauritecnologia.com.br/

ÉRICA DIAS
TRADUTORA REVISORA DE MÍDIAS SOCIAIS

Formada em Secretariado Executivo Bilíngue, Érica atua com finanças e recursos humanos há
mais de 10 anos, possui certificação de RH Business Partner pela FGV e Pós Graduação de
Finanças pela Unisa.
Tradutora e revisora dos textos bilíngues e das mídias sociais à partir da terceira quinzena de
Março/21.

E-mail: dias.erica14@gmail.com

CADU SIMÕES
COLABORADOR ARTIÍSTICO

Cadu Simões é historiador por formação e roteirista por insistência. É natural de Osasco, São
Paulo. Começou a fazer quadrinhos em 2000 e é ganhador do Troféu HQ Mix na categoria de
Roteirista Revelação. As suas atuais séries de histórias em quadrinhos são: Homem-Grilo;
Nova Hélade; Cosmogonias; Acelera SP; Fundador dos coletivos Quarto Mundo e Petisco e
proprietário do selo de quadrinhos, a Aedo Edições.
Além de suas obras autorais, costuma trabalhar como roteirista, redator e revisor freelance
para diversas empresas e instituições, além defazer letreiramento para quadrinhos e ministrar
palestras, oficinas e cursos relacionados a roteiro, criação de narrativas, produção de HQs
independentes e publicação de webcomics (quadrinhos digitais).

Instagram: @cadu42 / Site: https://cadusimoes.com/


AGRADECIMENTOS

Prezado Leitor Mitológico,

Agradeço ao Allan por novamente trazer um rico conteúdo mitólógico nos


contando mais sobre Mímir, à Núbia por trazer de forma tão didática os passos
da jornada do herói e à Solange por nos apresentar de forma tão poética à
tríade tupi-guarani. Agradeço novamente à Rosangela que nos brindou com
este incrível artigo sobre a maternagem no mês das mães e ao professor
Marcos que trouxe uma belíssima visão de Ulisses nestes tempos de
isolamento social, assim como a Karla que nos apresentou um deus pouco
abordado, para a luz do nosso conhecimento!

Agradeço à Laine, que nos brindou com uma resenha entorpecente falando
sobre a mitologia africana, mesmo sem ter tempo de respirar! Agradeço ao
Luiz Júnior por trazer mais um persoagem muito interessante e ao Luis da Hell
Yeah que sempre nos brinda com seu conhecimento mitólógico todos os
meses!

Agradeço aos integrantes da banda Megaira, que nos presentearam contando


sua história e trazendo uma incrível resenha do seu CD, mais do que
mitológico! Agradeço também ao Cadu, que nos cedeu gentilmente sua
belíssima arte contida originalmente na revista "Cosmogonias" para encher
nossos olhos de mitologia nas HQs! Agradeço ao Carlos, que criou esta capa
maravilhosa especialmente para a revista e ao Patrick que nos cedeu mais uma
de suas ilustrações para nossos artigos.

Agradeço sempre à querida Fábia Lucas, nossa revisora, que neste mês
produziu uma resenha fantástica sobre mitologia japonesa para os Arquivos de
Loki, assim como a Érica Dias pela revisão e tradução das comunicações das
mídias sociais. Também agradeço à Jéssica Dias pelas belas e criativas artes
que todos podem acompanhar durante o mês no Facebook e no Instagram!

Até a próxima!
Equipe Mitologia Aberta.
Mitologia Aberta
REVISTA DE LIVRES PENSADORES MITOLÓGICOS

Coordenação Editorial
Larissa Dias

Equipe Editorial

Editora-chefe: Larissa Dias


Revisão: Fábia Lucas
Projeto Gráfico: Larissa Dias e Jéssica Dias
Ilustração da Capa: "Ymir e Odin", Carlos Arias
Colaborador Literário: Luiz Júnior
Colaborador Musical: Luis F. Ribeiro - Hell Year Music Company

Edição Original: 2021, Maio, World Wild Web

Colaboram Nesta Edição:


Allan Marante, Núbia Fujii, Solange d´Amato, Rosangela Corrêa, Marcos Ferreira-Santos, Karla Barbosa, Laine Balbino,
Banda Megaira, Érica Dias, Patrick Burke e Cadu Simões.

Revista Eletrônica de Livre Circulação


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Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida, arquivada ou transmitida de nenhuma forma ou por nenhum meio, sem a
permissão expressa e por escrito da Revista Eletrônica de Mitologia Aberta.

Distribuído on-line por Revista Eletrônica de Mitologia Aberta

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