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Antes porém de analisarmos a letra da música é importante conhecermos o autor dela, que
é o músico Renato Russo. Esse foi
4 Tão contrario a si é o mesmo amor Estou acordado e todos dormem todos dormem todos
dormem Agora vejo em parte, mas então veremos face a face É só o amor, é só o amor Que
conhece o que é verdade Ainda que eu falasse a língua dos homens E falasse a língua dos
anjos, sem amor eu nada seria (Legião Urbana. Álbum: Quatro Estações, 1987). Análise
estilística: Nessa música, encontramos algumas figuras de linguagem, conforme veremos a
seguir: - Prosopopéia ou personificação: Atribuição de qualidades animadas a seres
inanimados. é só o amor que conhece - Paradoxo: figura que engloba simultaneamente duas
idéias opostas. O amor é o fogo que arde sem se ver É ferida que dói e não se sente É um
contentamento descontente É dor que desatina sem doer É um não querer mais que bem
querer É solitário andar por entre a gente É um não contentar-se de contente É cuidar que
se ganha em se perder É um estar-se preso por vontade É servir a quem vence, o vencedor
É um ter com quem nos mata a lealdade - Metáfora: figura que consiste em usar uma
palavra com o significado de outra em vista de uma relação de semelhança entre o qual elas
representam.
5 O amor é fogo - Epíteto: qualificação do nome através de uma característica que já lhe é
inerente. fogo que arde ferida que dói - Antífrase: em sentido estrito, antífrase é a
expressão que adquire no contexto significado oposto ao significado habitual.
contentamento descontente - Anáfora: repetição de palavra ou expressão no início de
frases. É ferida que dói e não se sente É um contentamento descontente É dor que
desatina sem doer É um não querer mais que bem querer É solitário andar por entre a gente
É um não contentar-se de contente É cuidar que se ganha em se perder É um estar-se
preso por vontade É servir a quem vence, o vencedor É um ter com quem nos mata a
lealdade - Antítese: figura que consiste em confrontar idéias opostas entre si. É
importante também trazer à baila o texto que a música traz de intertexto, a fim de
contextualizar melhor seus significados ao leitor. Segue abaixo a primeira carta aos
Coríntios: Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver amor, serei
como o bronze que soa, ou como o símbolo que retine. Ainda que eu tenha o dom de
profetizar e conheça todos os mistérios e toda a ciência; ainda que eu tenha tamanha fé ao
ponto de transportar montanhas, se não tiver amor nada serei. Primeira epístola de Paulo
aos coríntios, cap. 13, In: A Bíblia Sagrada, ed.revista e atualizada. Brasília: Sociedade
Bíblica do Brasil, 1969, p.208.
Portanto, o trecho da bíblia faz referência a outro elemento: CARIDADE. Sugere que se a
pessoa não tiver o sentimento – a vontade da doação – logo, não importa a alarde de seus
atos.
Estão inseridos, no segundo quarteto, termos que procuram definir o amor como: “ fogo que
arde”, “ferida que dói”, etc. Cada qual, seguido de uma qualificação que contradiz o
significado do termo anterior. Portanto, “sem se ver” contradiz “fogo que arde”; “não se
sente” contradiz “ferida que dói”.
Os termos abstratos que definem o significado das figuras utilizadas pelo autor fornecem
a essência das palavras e dos versos, note a tabela:
Quando diz: “Tão contrário a si é o mesmo amor”, o poeta abandona a tentativa de definir o
amor.
No soneto de Camões, a palavra “amor” abre e fecha a produção literária dando a ideia de
que ao final das tentativas de definir o amor, chega-se à redundância “amor é amor”. Este
mesmo soneto permite concluir que o sentimento amoroso só pode ser vivenciado e não
explicado por categorias lógicas. Isto quer dizer que é impossível buscar uma definição de
amor externamente.Quando diz: “Tão contrário a si é o mesmo amor”, o poeta abandona a
tentativa de definir o amor.
O amor existe como vida, é a realização de um sentimento e não a descrição desta virtude.
O sujeito encontra-se em conjunção com o ato realizado e em disjunção da virtualização do
amor que faz a ação ser verdadeira.
O que é revelado pelas palavras que se opõem é que o amor é doação total, é um não esperar
troca – a não ser o bem do outro. Além disso, o amor é uma contradição a ele próprio:
paradoxal para quem vive porque é feito de sensações contrárias.
O texto sugere o ato da transformação dada pela presença do sentimento. O caminho que é
utilizado para que aconteça a transformação é a vivência do amor e não sua definição.
O elemento eufórico – o que é valorizado e buscado pelo texto – não é nada mais do que o
amor verdadeiro. O elemento disfórico – a parte negativa – é o sentimento que não existe
através de uma definição.
A atribuição do amor verdadeiro com alegria de ser constante, perseverante e capaz de ver
o outro na totalidade é o único sentimento capaz de transformar o mundo, desde que não
seja insinuado, mas vivido. E quem vive o amor não precisa discursar sobre ele, uma vez que
este é exteriorizado pelo testemunho de vida. Só quem ama sabe o que é amor.
Bibliografia:
FIORIN, José Luiz e SAVIOLI, Francisco Platão. Para entender o texto. 12. ed. São Paulo:
Ática.
É só o amor, é só o amor
Que conhece o que é verdade
O amor é bom, não quer o mal
Não sente inveja ou se envaidece
É só o amor, é só o amor
Que conhece o que é verdade
05 – “Ainda que eu falasse a língua dos homens. E falasse a língua do anjos, sem amor eu
nada seria.” Interprete esses versos.
O tempo utilizado (pretérito imperfeito do subjuntivo) é responsável para causar o
efeito de sentido de impossibilidade e suposição. Está claro que o narrador não tem nada
daquilo que se apresenta por orações concessivas e dificilmente terá (ele não fala a língua
dos anjos, não tem o dom da profecia, não conhece todos os mistérios, não tem toda a fé,
etc.).
06 – Nos versos: “É só o amor! É só o amor / Que conhece o que é verdade.” O que o autor
relata?
Relata que só através do amor é possível se conhecer a verdade e que ele é um
sentimento puro do qual não dar lugar para a inveja e não se acaba, mas se eterniza.
08 – Quando o poeta diz: “Tão contrário a si é o mesmo amor”; que quer dizer?
Aqui o poeta abandona a tentativa de definir o amor.
O artigo trata da conversa que o compositor Renato Russo trava em sua música “Monte
Castelo”, com o famoso poema de Luís de Camões “Amor é um fogo que arde sem se ver” e
com o texto bíblico “O amor é um dom supremo” escrito pelo apóstolo Paulo à Igreja de
Corinto. Há ainda a alusão do título da música a uma batalha da Segunda Guerra Mundial
vencida por soldados da Força Expedicionária Brasileira; batalha na qual, apesar da vitória,
ocorreu uma baixa de 1000 pracinhas. A motivação em se trabalhar a intertextualidade
presente nessa música veio da observação do ajustamento perfeito do tema “Amor” que o
compositor conseguiu mesmo promovendo o diálogo entre obras tão distintas como o poema
de Camões, que fala de um amor Eros (homem-mulher, possessivo) e a carta de Paulo, esta
tratando do amor Ágape (o amor altruísta, generoso). Dessa forma, o objetivo foi
encontrar na música o elemento chave que une os dois textos e seu título. Assim, foi feito o
estudo dos três textos e o contexto em que foram escritos, chegando-se à afirmação de o
amor ser tratado como um sentimento que se concretiza na ação; e esta sempre acarretará
em alguma forma de dor nobre.
No estudo relativo à Lingüística Textual, aponta-se como uma das condições de
textualidade a referência (explícita ou implícita) a outros textos orais, escritos, visuais,
entre outros. Esse “diálogo” entre textos chamamos de intertextualidade. E sua
importância é tamanha a ponto de se afirmar que
“Quem escreve não escreve no vazio, pois um texto não surge do nada. Pode-se dizer que
escrever é a habilidade de aproveitar criticamente, criativamente outros materiais
interdiscursivos, outros textos. É por isso que quem lê está em situação privilegiada para
escrever, uma vez que se apropria, mediante a leitura, de idéias e de recursos de
expressão”. (Guia de Produção Textual)
Na música Monte Castelo a intertextualidade foi aplicada de forma muito rica. Renato
Russo apropria-se de dois famosos textos sobre o “amor” e constrói, a partir deles, a sua
mensagem para uma geração que, talvez, induzida pela cultura rebelde dos anos 80, não
estivesse muito a par de dois escritores tão “distantes” desse novo mundo do século XX e
sua mensagem de sexo, drogas e rock roll.
CONTEXTUALIZANDO OS TEXTOS
O poema de Camões data do século XVI e compõe a vasta gama de produção do período do
Classicismo. O poeta viveu experiências que formaram o “seu dramático mundo
inconfundível” segundo Geraldo Mello Mourão. Dessa forma, sua expressão foi afinada por
uma realidade trágica. O soneto foi produzido em uma época que ainda sofria resquício
cultural da Idade Média, principalmente no tocante ao fato de que
“A literatura ainda era vista como um importante instrumento de formação moral dos
homens nobres: tinha, portanto, caráter moralizante e aristocrático”. (Ulisses Infante)
Ele tenta, em vão, conceituar o Amor; mas só consegue demonstrar que qualquer tentativa
semelhante, ao final, levará ao ponto de partida. Em Camões, o amor sempre é
propositadamente contraditório, pois o poeta quer mostrar que é desse paradoxo que se
origina a sua grandeza para dominar, de forma delicada e imbatível, a vida do ser humano,
ser tão complexo em seus sentimentos. O tratamento dado ao tema no soneto é
visivelmente ligado ao sentimento humano entre um homem e uma mulher, o amor romântico,
seja ele correspondido ou não. O amor Eros está sempre ligado à falta, ao sofrimento, uma
vez que um amante nunca está saciado do outro. Assim, a mensagem enfatiza que, embora
haja sofrimento no amor, ele sempre é, contraditoriamente, acompanhado pela amizade e
toda sensação causada por ele, aprazível ou não, é nobre e enobrece o ser que ama.
Já na carta do apóstolo Paulo à Igreja de Corinto, registrada na Bíblia, o contexto é bem
diferente. A carta foi escrita em Éfeso, no século I d.C. e teve seu direcionamento
orientado por três situações: primeiro, depois de um incidente com filósofos atenienses,
Paulo resolvera se centrar na mensagem simples da cruz; logo depois foi forçado pela
oposição judaica a focalizar o seu ministério para os gentios e em terceiro lugar, a
congregação de Corinto, composta por judeus e gentios havia florescido de forma
preocupante no tocante há vários pontos do evangelho. Corinto era uma das maiores cidades
do mundo romano e uma das mais corruptas, assim a Igreja estava repleta de problemas
sérios, entre eles a divisão interna que estava despedaçando as relações entre os crentes.
Portanto,
“Paulo havia sido confrontado com uma tarefa enorme, e esta longa carta aos Coríntios foi
uma tentativa de tratar o problema”. (Bíblia de Genebra)
“O amor busca o bem do próximo, e a sua verdadeira medida é o quanto ele dá para que se
alcance tal fim. Mais do que simples emoção, o amor é um princípio de ação. É uma questão
de fazer algo pelos outros por compaixão a eles, sem levar em conta se sentimos ou não
afeição por eles”. (Bíblia de Genebra)
Paulo fala aos Coríntios de um amor que eles não conheciam, o amor ágape, aquele que se
sacrifica pelo bem do outro. É um amor prático, abnegado, que não espera nada em troca.
Compreendendo a situação de produção dos dois textos que baseiam Monte Castelo, é
interessante questionar o motivo de tais textos serem musicados por um grupo de rock nos
tumultuados anos 80.
UM CENÁRIO, UM ENCONTRO
Diante do que já foi dito, pode-se perceber, precedendo mesmo a análise dos textos, algo
em comum nos contextos acima descritos: a necessidade real de se ensinar sobre a
grandeza do amor para um público que, aparentemente, a teme, desconhece ou não lhe
concede a importância devida. No soneto, o poeta fala sobre a dor que o amor humano
causa, mas, ao mesmo tempo, em como essa dor é prazerosa a ponto de o amante querer
estar preso por vontade [ v.9], portanto, não há o que temer diante dele. Podemos
interpretar essa lição como dada a outros poetas desse tempo, os quais se prendiam à
imagem platônica do Amor por seres ideais, superiores e desprezavam o sentimento humano
carnal. A carta é enviada pelo apóstolo no intuito de ensinar alguns preceitos cristãos para
os coríntios, tão necessitados de orientação em meio a tantos erros, tristezas e
depravação, e não há nenhum ensinamento maior do que o do amor. Dessa forma, a música
promove o encontro dessas duas lições sobre o amor de caráter ativo e nobre, mesmo na
dor, diante de uma juventude carente de ideais, valores humanos maiores e mais
individualista, se comparada a gerações passadas. Portanto, observa-se que entre os três
textos já existe intertextualidade em relação ao contexto em que eles foram escritos e,
dependendo da leitura que se faça, pode-se afirmar que a mensagem final também será a
mesma, levando em consideração, claro, todas as diferenças existentes entre elas já
citadas aqui: o conceito do amor como um sentimento que causa dor ao mesmo tempo em
que enobrece o ser amante, pois leva a ações que buscam o bem do outro.
Uma outra intertextualidade presente em Monte Castelo, mas não tão visível ou conhecida
como a música em si, é o seu próprio título, o qual faz alusão a uma batalha da Segunda
Guerra Mundial.
“A conquista do Monte Castelo na cordilheira apenina, no norte da Itália, foi uma atuação
heróica dos soldados brasileiros. Mesmo mal treinados, com equipamento inadequado e
enfrentando um frio de até 15 ºC negativos, eles conseguiram derrotar as forças alemãs
que estavam entrincheiradas no alto do monte Castelo. O resultado das operações
conjuntas com outras forças na batalha foi a expulsão dos alemães dos montes Apeninos,
permitindo uma ofensiva dos aliados no norte da Itália que marcaria o fim dos confrontos
no país”. (Roberto Navarro)
O planejamento da ação mostrava o grande perigo que os soldados enfrentariam, eles
mesmos sabiam disso, apesar de não se falar abertamente sobre o caso. No entanto, eles
não desistiram, sabiam que estavam ali por um bem maior, para derrotar a gigante
Alemanha Nazista que já havia lançado seus princípios podres em solo brasileiro. No final
da ofensiva, 1000 homens brasileiros não voltaram para suas casas.
Renato Russo não nomeia essa canção de forma aleatória. Para falar de um amor supremo,
que conhece a verdade, age de forma a propiciar o bem do outro e não se desencoraja
diante da dor nada melhor do que nomeá-la com um episódio que demonstrou esse amor
maior de forma concreta.
Observando mais diretamente os textos (ver anexos), é evidente a intertextualidade na
letra de Monte Castelo com os outros textos já citados, pois ela é toda construída a partir
de um “diálogo” entre eles. Somente em um verso, o compositor usa palavras suas, é o que
podemos constatar no verso 21 da música que diz