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TRANTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO

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Sumário

NOSSA HISTÓRIA .......................................................................................... 2

Transtornos Globais do Desenvolvimento ....................................................... 3

TGD a partir da Política Nacional da Educação Especial na perspectiva da


educação inclusiva - PNEE/PEI (2008) .................................................................. 5
Autismo .................................................................................................... 5

Síndrome de rett ....................................................................................... 8

Síndrome de Asperger ........................................................................... 10

Transtorno desintegrativo da infância (psicose infantil) .......................... 11

Transtorno invasivo do desenvolvimento - sem outra especificação ...... 13

Novos delineamentos ................................................................................. 14


Aspectos importantes para a educação escolar......................................... 16
Função executiva ................................................................................... 16

Teoria da mente ..................................................................................... 20

A formação e a aprendizagem da criança com TGD ................................. 22


A criança ao ingressar na escola............................................................ 22

A família.................................................................................................. 26

REFERÊNCIAS ............................................................................................. 29

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NOSSA HISTÓRIA

A instituição história, inicia com a realização do sonho de um grupo de


empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação
e Pós-Graduação. Com isso foi criado a iinstituição, como entidade oferecendo
serviços educacionais em nível superior.

A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de


conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação
no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua.
Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que
constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de
publicação ou outras normas de comunicação.

A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma


confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica,
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido.

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Transtornos Globais do Desenvolvimento

Os Transtornos Globais do Desenvolvimento (TGD) são distúrbios nas


interações sociais recíprocas que costumam manifestar-se nos primeiros cinco anos
de vida. Caracterizam-se pelos padrões de comunicação estereotipados e repetitivos,
assim como pelo estreitamento nos interesses e nas atividades.

Os TGD englobam os diferentes transtornos do espectro autista, as psicoses


infantis, a Síndrome de Asperger, a Síndrome de Kanner e a Síndrome de Rett.

Com relação à interação social, crianças com TGD apresentam dificuldades


em iniciar e manter uma conversa. Algumas evitam o contato visual e demonstram
aversão ao toque do outro, mantendo-se
isoladas. Podem estabelecer contato por
meio de comportamentos não verbais e, ao
brincar, preferem ater-se a objetos no lugar
de movimentar-se junto das demais
crianças. Ações repetitivas são bastante
comuns.

Os Transtornos Globais do
Desenvolvimento também causam variações na atenção, na concentração e,
eventualmente, na coordenação motora. Mudanças de humor sem causa aparente e
acessos de agressividade são comuns em alguns casos. As crianças apresentam
seus interesses de maneira diferenciada e podem fixar sua atenção em uma só
atividade, como observar determinados objetos, por exemplo.

Com relação à comunicação verbal, essas crianças podem repetir as falas dos
outros - fenômeno conhecido como ecolalia - ou, ainda, comunicar-se por meio de
gestos ou com uma entonação mecânica, fazendo uso de jargões.

Os Transtornos Globais do Desenvolvimento (TGD) representam uma


categoria na qual estão agrupados transtornos que têm em comum as funções do
desenvolvimento afetadas (BRASIL, 2010). Posto isso, é importante compreender
que nem todos os estudantes diagnosticados com algum tipo de transtorno mental

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são estudantes da Educação Especial – área dos Transtornos Globais do
Desenvolvimento. Nessa categoria, estão incluídos os alunos com diagnóstico de
autismo, Síndrome do Espectro Autista (Asperger), Transtorno Desintegrativo da
Infância (psicose) e Transtorno Invasivo de Desenvolvimento - sem outra
especificação.

Na área TGD é habitual depararmo-nos com os termos síndrome e/ou


transtorno. Assim, é importante esclarecer que a nomenclatura síndrome se refere a
um conjunto de sintomas, não restrito a uma só doença, que ocorre no indivíduo; e
transtorno é aplicado para indicar a existência de um conjunto de sintomas ou
comportamentos que ocorrem no transcorrer da infância, com um comprometimento
ou atraso no desenvolvimento e maturação do sistema nervoso central. O transtorno
não se desenrola de traumatismo ou doença cerebral adquirida; ele denuncia uma
desordem neurológica e origina-se de anormalidades no processo cognitivo derivados
de disfunção biológica (FRANZIN, 2014).

O autismo e a Síndrome de Asperger compõem um grupo de problemas que


abrange os desvios nos campos do relacionamento social e da comunicação,
denominados de Transtornos Globais do Desenvolvimento (TGD). Outros dois termos
têm sido empregados em nosso idioma como tradução para pervasive developmental
disorder, que são: transtornos invasivos do desenvolvimento e transtornos
abrangentes do desenvolvimento. Esta pluralidade de nomenclaturas acontece pela
falta de consenso na tradução do inglês de pervasive (cuja origem é do latim
pervasis). Assim sendo, os termos aplicados:

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Autores como Klin (2006), Mercadante e Rosário (2009) ressaltam que embora
existam critérios para o diagnóstico do autismo e da Síndrome de Asperger é visível
a variabilidade de apresentações clínicas. De acordo com essas afirmações, pode-se
presumir que não exista um único padrão de autismo ou de Síndrome de Asperger,
mas há “variações no desenho do cérebro social que implicam modos de funcionar
distintos, ainda que tenham sempre em comum uma desadaptação precoce dos
processos de sociabilidade” (MERCADANTE; ROSÁRIO, 2009, p. 19).

O cérebro social é definido pela neurociência como um conjunto de regiões


cerebrais que são ativadas durante a execução de atividades sociais. Concebendo
que essas estruturas estejam ligadas umas às outras, formando o que se chama de
cadeias associativas ou de redes neurais, é possível afirmar que o modo de agir
socialmente depende do desenho dessas redes.

Os Transtornos Globais do Desenvolvimento (TGD), por se tratarem de um


conjunto de sintomas e comportamentos que transcorrem na infância, com
comprometimento ou atraso no desenvolvimento, apresentam, entre a síndrome e os
transtornos que os compõem, uma sucessão de características que serão detalhadas
no decorrer da apostila.

TGD a partir da Política Nacional da Educação Especial na


perspectiva da educação inclusiva - PNEE/PEI (2008)

Autismo

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O autismo refere-se a um grupo de transtornos caracterizados por uma tríade
de prejuízos qualitativos, quanto à interação social, à comunicação e a
comportamentos, que poderão variar em menor ou maior agravo para a criança que
apresente comportamentos restritivos, repetitivos e estereotipados. É um transtorno
com perturbações significativas no
desenvolvimento do sujeito e começa a
manifestar-se antes dos três anos de
idade.

Kanner (1943) definiu o autismo


como um distúrbio infantil caracterizado
por uma inabilidade inata de relacionar-
se afetivamente com outras pessoas, apresentando uma minuciosa descrição desse
transtorno. O desejo obsessivo de isolamento e de manutenção da uniformidade
explicava uma série de comportamentos do autista. Em um estudo Kanner percebeu
através dos relatos dos pais das crianças observadas nessa pesquisa, que os filhos
ficavam mais satisfeitos quando deixados sozinhos do que quando em companhia de
outras pessoas, não interagiam e permaneciam completamente absortos em si
mesmos, não tinham desenvolvido uma consciência social e agiam como se
estivessem hipnotizados. Eles ignoravam contato físico direto, movimento ou barulho
que ameaçasse interromper seu isolamento, ou demonstravam aflição ao sofrerem
interferência externa (KANNER, 1943).

É importante saber que o campo científico demonstrou um interesse crescente


pelo autismo nos anos de 1970 e 1980, já que esse interesse viabilizou o
desenvolvimento de pesquisas tanto nos campos neurobiológico e cognitivo quanto
psicanalítico. O empenho de encontrar um quadro nosográfico (descritivo) adequado
ao autismo e aos espectros correlatos mostrava-se tanto na França quanto em outros
países, ensejando grandes debates acerca da natureza e da definição indiscutível de
cada um deles.

As pesquisas realizadas sobre o autismo até a década de 1970 não


conseguiram explicar os sintomas do transtorno, principalmente as dificuldades de
relacionamento social. Quanto maior for o aprofundamento de uma pesquisa, mais
próximos estamos de constatar uma forma de tratamento específico.

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O diagnóstico realizado por especialistas é alicerçado em critérios
comportamentais, ou seja, distúrbios na interação social, comunicação e padrões
restritos de comportamento e interesse. Ainda, para um completo diagnóstico, é
necessário que haja desenvolvimento anormal nos três primeiros anos de vida, em
pelo menos um dos seguintes aspectos: social, linguagem, comunicação ou
brincadeiras simbólicas.

Gustavo Teixeira (2016) define o autismo como uma síndrome de início


precoce caracterizada por alterações marcantes no desenvolvimento da linguagem e
da interação social. Esse autor aponta para o fato de haver a presença de
comportamentos estereotipados e repetitivos, rituais, alterações sensoriais e
interesses restritos. Ainda que todos os diagnosticados apresentem esses sintomas,
o quadro clínico apresenta níveis de severidade muito distintos.

Teixeira (2006) salienta que, com relação aos bebês com autismo, esses
apresentam grande déficit no comportamento social, tendem a evitar contato visual,
mostram-se pouco interessados na voz humana e não assumem a postura
antecipatória – como colocar seus braços à frente para serem levantados pelos pais.
Quando crianças, não brincam com outras, tampouco demonstram interesse por
jogos e atividades em grupo; podem ter tendências como cheirar e lamber objetos ou
ainda bater palmas e mover a cabeça e tronco para frente e para trás.

Os autistas adolescentes podem adquirir sintomas obsessivos (como ideias de


contaminação) e apresentar, também, comportamentos ritualísticos como repetição
de perguntas, entre outros. O professor precisa saber que, em relação ao aspecto

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comportamental, em geral, estudantes com esse diagnóstico apresentam intolerância
frente às mudanças de rotina, expressando-se com reações de oposição. A
dificuldade em lidar com sentimentos e expressá-los é observada nas mudanças de
humor sem causa aparente e acessos de agressividade.

Diferentemente da maioria das crianças, que diante de novidades demonstram


interesse e necessidade de novos conhecimentos e em explorar o meio, com essas
crianças são comuns os comportamentos estereotipados, com interesse limitado
diante do novo, repetitivos em ações, gestos e falas (MERCADANTE, 2006).

Síndrome de rett

A Síndrome de Rett foi identificada em 1966 por Andréas Rett, tendo ficado
mais conhecida após o trabalho de Hagberg. É uma desordem do desenvolvimento
neurológico, acometendo em sua maioria crianças do sexo feminino,
aproximadamente 1 em cada 10.000 a 20.000, mas também atinge criança do sexo
masculino meninas nascidas vivas (os
meninos normalmente não resistem e
morrem precocemente). Aparece em todos
os grupos étnicos.

A Síndrome de Rett compromete


progressivamente as funções motora e
intelectual, e provoca distúrbios de
comportamento e dependência. No caso típico, a menina se desenvolve de forma
aparentemente normal entre 8 a 18 meses de idade, depois começa a mudar seu
padrão de desenvolvimento. Ocorre uma regressão dos ganhos psicomotores, a
criança torna-se isolada e deixa de responder e brincar. O crescimento craniano, até
então normal, demonstra clara tendência para o desenvolvimento mais lento,
ocorrendo microcefalia adquirida. Aos poucos, deixa de manipular objetos, surgem
movimentos estereotipados das mãos (contorções, aperto, bater de palmas, levar as

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mãos à boca, lavar as mãos e esfregá-las), culminando na perda das habilidades
manuais e estagnação do desenvolvimento neuropsicomotor.

Do ponto de vista clínico, a Síndrome de Rett pode ser organizada em quatro


etapas, de acordo com Mercadante (2007), conforme segue:

 Estagnação precoce: Dos 6 aos 18 meses, caracterizando-se pela


estagnação do desenvolvimento, desaceleração do crescimento do perímetro cefálico

e tendência ao isolamento social.


 Rapidamente destrutiva: Entre o primeiro e o terceiro ano de vida, com
regressão psicomotora, choro imotivado, irritabilidade, perda da fala adquirida,
comportamento autista e movimentos estereotipados das mãos. Podem ocorrer
irregularidades respiratórias e epilepsia.
 Pseudoestacionária: Entre os dois e dez anos de idade, podendo haver
certa melhora de alguns dos sintomas como, por exemplo, o contato social. Presença
de ataxia, apraxia, espasticidade, escoliose e bruxismo. Episódios de perda de fôlego,
aerofagia, expulsão forçada de ar e saliva.
 Deterioração motora tardia: Inicia-se em torno dos dez anos de idade,
com desvio cognitivo grave e lenta progressão de prejuízos motores, podendo
necessitar de cadeira de rodas.

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Mesmo com a identificação do gene, os mecanismos envolvidos na Síndrome
de Rett ainda são desconhecidos. Reduções significativas no lobo frontal, no núcleo
caudato e no mesencéfalo têm sido descritas, havendo também algumas evidências
de desenvolvimento sináptico.

Síndrome de Asperger

A Síndrome de Asperger é classificada como um transtorno invasivo de


desenvolvimento. Crianças com esta síndrome podem ter inteligência normal e
tipicamente apresentarem inteligência verbal maior que a não verbal. Embora as
habilidades verbais dessas crianças não
apresentem os prejuízos encontrados nas
crianças autistas, elas frequentemente
apresentam profundas dificuldades sociais
e de semântica.

Teixeira (2006) afirma que o


desenvolvimento inicial da criança parece
normal, contudo, no decorrer dos anos, seu discurso se torna diferente, monótono,
peculiar e há, com frequência, a presença de preocupações obsessivas. É um
transtorno de múltiplas funções do psiquismo, com afetação principal nas áreas do
relacionamento interpessoal e da comunicação, embora a fala seja relativamente
normal.

A interação da criança com Síndrome de Asperger com outras crianças se


torna difícil, pois demonstra pouca empatia e apresenta comportamento excêntrico;

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sua vestimenta pode se apresentar estranhamente alinhada e a dificuldade de
socialização pode torná-la solitária. É inflexível, ou seja, tem dificuldades de lidar com
mudanças. É emocionalmente vulnerável e instável, ingênua e eminentemente
carente de senso comum. Há prejuízo na coordenação motora e na percepção
visoespacial. Frequentemente apresenta interesses peculiares, em determinadas
áreas do conhecimento, podendo passar horas assistindo ao canal da previsão do
tempo na televisão ou estudando exaustivamente sobre temas ou assuntos
preferidos, como dinossauros, Egito, carros, aviões, mapas de ruas, planetas,
missões espaciais, entre outros.

Conforme Ferrari (2012), a expressão transtornos invasivos do


desenvolvimento agrega um conjunto de problemas do desenvolvimento das funções
psicológicas, geralmente aquelas envolvidas na apropriação de aptidões para as
relações sociais e para a utilização da linguagem.

De acordo com Klin (2006, p. 1), o autismo e a Síndrome de Asperger são


entidades diagnósticas em uma família de transtornos de neurodesenvolvimento, nas
quais ocorre uma ruptura nos processos fundamentais de socialização, comunicação
e aprendizado.

Transtorno desintegrativo da infância (psicose infantil)

O Transtorno Desintegrativo da Infância (TDI) foi


inicialmente retratado por Theodore Heller, educador
austríaco, em 1908. Heller explicitou o caso de seis
crianças que, após um desenvolvimento aparentemente
normal nos quatro primeiros anos de vida, apresentaram
uma grave perda das habilidades de interação social e
comunicação. Segundo o Manual de Diagnóstico e
Estatístico de Distúrbios Mentais (DSM-IV), da
Associação Americana de Psiquiatria (1994), o

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Transtorno Desintegrativo da Infância é também conhecido como Síndrome de Heller,
demência infantil ou psicose desintegrativa.

A Política Nacional da Educação Especial na Perspectiva da Educação


Inclusiva PNEEPEI (2008) usa a nomenclatura Transtorno Desintegrativo da Infância
(psicoses) ao se referir ao público-alvo do Atendimento Educacional Especializado
(AEE).

A definição sobre psicose, apresentada pelo DSM-IV, é entendida como uma


perda dos limites do ego ou um amplo prejuízo no teste da realidade. O termo psicose
refere-se a delírios, quaisquer alucinações proeminentes, discurso desorganizado ou
catatônico. Assim, a psicose pode ser definida como uma desordem mental na qual
ocorre um comprometimento do pensamento, da capacidade de perceber a realidade
sem distorções e do relacionamento interpessoal (SADOCK, 2000).

Existem muitos conceitos diferentes para o termo psicose, tais como perda do
contato com a realidade de forma temporária ou definitiva; perturbação psíquica grave
(podendo gerar uma desintegração das estruturas da personalidade); e personalidade
que se fragmenta (ASSUMPÇÃO, 1993; TENGAN; MAIA, 2004).

Os sintomas e as características classificatórias da patologia necessitam de


observação e análise da interação social e do conteúdo dos pensamentos, o que
deixa o diagnóstico incomum na infância, sendo extremamente inusitados os relatos

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de incidência em idade inferior a cinco anos (MCKENNA; GORDON; RAPAPORT,
1994; HOLLIS, 2000).

Os sujeitos com psicose apresentam como sintoma a dificuldade para se


afastar da mãe e de compreensão de gestos e linguagens, alterações significativas
na forma do conteúdo do discurso, repetição de palavras e/ou frases ouvidas, ou
utilização estereotipada de formas verbais, sendo usual a inversão pronominal,
referindo-se a si mesma na terceira pessoa do singular ou usando seu próprio nome,
e ainda conduta social embaraçosa (AJURIAGUERRA; MARCELLI, 1991).

Transtorno invasivo do desenvolvimento - sem outra especificação

Os Transtornos Invasivos do Desenvolvimento são um grupo de transtornos


caracterizados por importante atraso no desenvolvimento, em diferentes áreas de
funcionamento, incluindo a socialização, comunicação e relacionamento interpessoal.

O Transtorno Invasivo do Desenvolvimento - sem outra especificação é


composto por um grupo heterogêneo de crianças com tendências a apresentar
comportamento inflexível, intolerância à mudança e explosão de raiva e birra quando
submetidas às exigências do ambiente ou até mesmo às mudanças de rotina.

Essa categoria diagnóstica é utilizada (DSM-IV) quando há prejuízo severo e


invasivo no desenvolvimento da interação social e são excluídas as hipóteses de
autismo, Síndrome de Asperger e Psicose Infantil.

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Novos delineamentos

É de extrema importância fazer algumas considerações sobre a publicação do


Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais - DSM-V (2014). Houveram
algumas modificações relevantes quanto à denominação de quadros clínicos
anteriormente associados à área dos Transtornos Globais do Desenvolvimento.
Transtornos antes chamados de autismo infantil precoce, autismo infantil, autismo de
Kanner, autismo de alto funcionamento, autismo atípico, transtorno global do
desenvolvimento sem outra especificação, transtorno desintegrativo da infância e
Síndrome de Asperger são englobados pelo termo transtorno do espectro autista. Por
conseguinte, estudantes com diagnóstico de Síndrome de Asperger, atualmente,
receberiam o diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista sem comprometimento
linguístico ou intelectual.

É significativo ressaltar que na edição do DSM-V foi suprimida a classificação


por subtipos e proposta a categoria diagnóstica do Transtorno do Espectro do
Autismo, pois a comunidade científica considerou que o transtorno autista, o
transtorno de Asperger e o transtorno invasivo do desenvolvimento sem outra
especificação não são desordens distintas, mas parte de um transtorno único e
contínuo, de médio a severo prejuízo, nos domínios da comunicação e dos
comportamentos\interesses restritos e repetitivos (KAJIHARA, 2014, p. 25).

O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V) salienta:

Contudo, é necessário reforçar que esses novos delineamentos dados pelo


DSM-V não foram integralmente adotados na Política de Educação Especial na

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Perspectiva da Educação Inclusiva. É possível reconhecer menções acerca do
assunto por meio do Decreto n.º 8.368, de 02 de dezembro de 2014, e da Nota
Técnica n.º 20, de 18 de março de 2015, onde o Ministério da Educação (MEC) orienta
para as necessidades educacionais especiais de estudantes com Transtorno do
Espectro Autista (TEA). É possível observar que ao utilizar a nomenclatura TEA, o
MEC assume “oficialmente” o conhecimento da substituição do termo “autismo”.

O transtorno do espectro autista no DSM-V engloba transtornos antes


chamados de autismo infantil precoce, autismo infantil, autismo de Kanner, autismo
de alto funcionamento, autismo atípico, transtorno global do desenvolvimento sem
outra especificação, transtorno desintegrativo da infância e transtorno de Asperger.

Segundo o DMS-V o Transtorno do Espectro Autista (TEA) engloba diferentes


quadros marcados por perturbações do desenvolvimento neurológico com três
características fundamentais, que podem manifestar-se em conjunto ou
isoladamente. São elas: dificuldade de comunicação por deficiência no domínio da
linguagem e no uso da imaginação para lidar com jogos simbólicos, dificuldade de
socialização e padrão de comportamento restritivo e repetitivo.

Recebe o nome de espectro (spectrum), porque envolve situações e


apresentações muito diferentes umas das outras, numa gradação que vai da mais
leves à mais grave. Todas, porém, em menor ou maior grau estão relacionadas, com
as dificuldades qualitativas de comunicação e relacionamento social. No espectro, o
grau de gravidade varia de pessoas que apresentam um quadro leve, e com total
independência e discretas dificuldades de adaptação, até aquelas pessoas que serão
dependentes para as atividades de vida diárias (AVDs), ao longo de toda a vida.

Os TEAs apresentam uma ampla gama de severidade e prejuízos, sendo


frequentemente a causa de deficiência grave, representando um grande problema de
saúde pública. Há uma grande heterogeneidade na apresentação fenotípica do TEA,
tanto com relação à configuração e severidade dos sintomas comportamentais.

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Aspectos importantes para a educação escolar

Função executiva

Por Função Executiva, podemos compreender o conjunto de condutas de


pensamento que permite a utilização de estratégias adequadas para se alcançar um
objetivo. É um conjunto de funções responsáveis por iniciar e desenvolver uma
atividade com objetivo final determinado. Essa função se relaciona com a capacidade
de antecipar, planificar, controlar impulsos, inibir respostas inadequadas, flexibilizar
pensamento e ação.

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Todas essas capacidades são fundamentais e estão em uso sempre que se
faz necessário agir diante de situações-problema, situações novas, na condução das
relações sociais, no alcance de objetivos ou na satisfação de necessidades e alcance
de propósitos, em diferentes contextos, sempre que esteja presente uma intenção,
um objetivo ou uma necessidade a ser atendida.

A Função Executiva é o que permite, por exemplo, flexibilizar os modelos de


conduta adquiridos pela experiência, para nos adaptarmos às variações existentes
nas situações do presente. Permite que possamos sincronizar nossas condutas em
função de nossas intenções, considerando aspectos novos de cada momento e
situação. Utilizamos nossas capacidades relacionadas a essa função nas situações
mais simples, como, por exemplo, para que possamos obter um copo de água em
diferentes contextos. Essa função nos permite que não nos comportemos num
ambiente formal, em um consultório médico, em um banco ou em uma reunião de
trabalho, utilizando as mesmas estratégias que utilizamos em casa para matar a sede.

Nossa conduta para esse fim será diferente em cada situação, e o impulso de
simplesmente tomar para si o copo de água deverá ser inibido ou adiado, a depender
da exigência do ambiente. Também estão implicadas as mesmas capacidades
quando adequamos nossos assuntos e maneiras em diferentes situações sociais.

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Adequamos nossa escolha de assuntos, de palavras, de atitudes, bem como adiamos
ou deixamos de atender a impulsos para obter um fim social, como, por exemplo, ser
bem aceito ou conquistar a amizade de alguém.

Para brincar com ambos os exemplos dados, podemos afirmar que está
presente a Função Executiva se inibimos o impulso de nos servirmos de água, sem
que nos seja oferecida, para parecermos bastante educados diante de uma pessoa
da qual temos a intenção de nos aproximar. Também poderíamos dizer que tal função
está presente se aproveitamos o momento em que a pessoa da qual queremos nos
aproximar serve-se de água, para iniciar uma conversação, pedindo para que nos
sirva da mesma água, mesmo que não estejamos com sede.

No processo de aprendizagem, utilizamos sistematicamente a Função


Executiva, já que se faz necessário utilizar as informações e procedimentos já
aprendidos, adaptando-os às novas situações a serem resolvidas. Hoje já está
elucidado que a Função Executiva é característica do funcionamento dos lobos
frontais.

Algumas características dos Transtornos Globais do Desenvolvimento,


presentes de forma mais típica no Autismo, são semelhantes aos déficits da função
executiva presentes nas pessoas que possuem lesões dos lobos frontais. Os
aspectos semelhantes são: ansiedade diante de pequenas alterações no entorno,
insistência em detalhes da rotina, condutas estereotipadas e repetitivas, interesse
centrado em detalhes ou parte de informações de forma perseverante, dificuldade de
perceber o todo e de integrar aspectos isolados.

O mais importante talvez, para nós educadores, é a perspectiva de


compreender as manifestações das crianças com autismo por meio da Função
Executiva. Isso porque, no desenvolvimento de todas as crianças que recebemos na
escola, tal função encontra-se implicada, já que o aprendizado a ser desenvolvido ali
se sustenta, em grande parte, no uso dela. Por outro lado, já que nossa atuação,
mediante todas as crianças, como professores, está implicada no aprimoramento e
ampliação de possibilidades de uso dessa função, essa compreensão é a interface
que permite identificar possibilidades de atuação com nossos alunos com TGD.

A compreensão de que o autismo implica um transtorno da Função Executiva


é, atualmente, uma das ideias centrais das investigações. Não significa uma simples

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troca de termos, mas trata-se de conceitos muito mais precisos do que aqueles
utilizados por Kanner e Eisenberg. A Função Executiva consiste em uma disposição
adequada com o fim de alcançar um objetivo. Essa disposição pode implicar um ou
vários aspectos:

 A intenção de evitar ou adiar uma resposta (inibição do impulso de agir


imediatamente sobre uma situação);
 Um plano estratégico de ações sequenciadas;
 Uma representação mental da tarefa.

Na Função Executiva, portanto, está implicada a flexibilidade estratégica. Esta


é a marca fundamental do funcionamento frontal tão desenvolvido no ser humano,
pela necessidade de estratégias de caráter propositivo e dirigidas ao futuro. A
flexibilidade estratégica permite adiar, inibir, avançar ou retroceder para alcançar um
propósito.

Em testes com tarefas de Função Executiva, os autistas demonstraram muita


inflexibilidade. Quando esses testes comparavam pessoas com autismo e com
Transtorno de Asperger, evidenciou-se a presença de inflexibilidade em ambos,
enquanto testes que envolviam tarefas de Teoria da Mente resultaram em diferenças
(o conceito de Teoria da Mente será desenvolvido adiante). Esses testes levaram os
autores a supor que o transtorno da Função Executiva pode ser considerado como
sendo o transtorno primário.

O problema fundamental do autismo seria a inflexibilidade, sendo o restante


explicável a partir desse problema. Assim,
podemos entender, por exemplo, que as
dificuldades no campo da relação social são
decorrentes do fato de que, nesse campo, a
flexibilidade se faz mais necessária do que em
qualquer outro domínio mental. A antecipação
é uma importante função dos lobos frontais e
se encontra prejudicada nas pessoas com
TGD. Essa função pode estar alterada em
diferentes níveis entre as pessoas com Espectro Autista e com TGD, mas todas
apresentam algum prejuízo na antecipação. Esse prejuízo pode se manifestar pela

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aderência inflexível a estímulos que se repetem, como na reprodução do mesmo filme
inúmeras vezes, no mesmo itinerário para a escola, na permanência dos objetos no
ambiente, etc.

As estereotipias são um exemplo da manifestação do prejuízo na flexibilidade.


Trata-se de estereotipias sensório-motoras: balançar o corpo, bater palmas, fazer e
desfazer, ordenar e desordenar. São rituais simples. Também podemos encontrar
rituais mais elaborados, como apego a objetos que são carregados a todos os
lugares, controle rigoroso de situações do ambiente ou da rotina e rígido
perfeccionismo.

Outra característica do prejuízo na Função Executiva apresentada pelas


pessoas com Espectro Autista é a dificuldade de dar sentido aos acontecimentos e
às atividades. Para dar sentido é preciso antecipar, dar propósito, e isso tem a ver
com a finalidade de algo. Na manifestação desse prejuízo, encontramos pessoas que
apresentam predominantemente atividades sem sentido, sem propósito, sem
funcionalidade. Também encontramos aquelas que conseguem fazer atividades
funcionais simples e breves, e outras que desenvolvem atividades funcionais e com
autonomia, mas motivadas externamente.

A característica de prejuízo na reciprocidade social, descrita inicialmente como


"extrema solidão", pode ser explicada pela inflexibilidade mental das pessoas com
autismo, em decorrência do prejuízo da Função Executiva. A indiferença nas relações
sociais tem a ver com o nível de exigência de flexibilidade nesse campo humano,
tornando-o o campo de maior impossibilidade para algumas dessas pessoas. As
relações sociais exigem antecipar, dar sentido, significados e ter propósitos. Mais do
que isso implica no uso de símbolos, de sentidos múltiplos e no lidar com situações
não antecipáveis. Nessa característica, também está implicada a Teoria da Mente,
que será explicada a seguir.

Teoria da mente

O termo Teoria da Mente surgiu no final da década de 70, em decorrência de


pesquisas na área da cognição animal. A partir dessa época, a psicologia cognitiva
ocupou-se do desenvolvimento de modelos explicativos para esse termo e suas

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aplicações. A Teoria da Mente significa a capacidade de atribuir estados mentais a
outras pessoas e predizer o seu comportamento em função destas atribuições. O
termo "Teoria" resulta do fato de que tais estados não são diretamente observáveis,
solicitando uma verdadeira "teorização" de quem infere um estado mental em outro
indivíduo.

A Teoria da Mente é essencial para o ser humano, uma vez que permite a
teorização do estado mental das outras pessoas, o
que sentem, o que pensam, quais as suas intenções
e como poderão agir. Isto nos permite modular nossas
reações e nosso comportamento social, além de
desenvolver nossa empatia frente a sentimentos
inferidos nas outras pessoas.

Baron - Cohen (1995) propuseram um modelo


para explicar o sistema de leitura da mente. Tal sistema postula quatro mecanismos
que interagem para produzir tal leitura: o detector de intencionalidade, o detector de
direcionamento do olhar, o mecanismo de atenção compartilhada e o mecanismo de
Teoria da Mente.

O mecanismo detector de intencionalidade constitui um aparato perceptivo que


interpreta estímulos móveis em termos de desejos e metas. Em paralelo, o detector
da direção do olhar é responsável pela detecção da presença e direção do olhar, bem
como é o encarregado da interpretação do olhar de alguém que está deliberada e
conscientemente vendo (este mecanismo permite a seguinte questão: ela vê aquilo?).
Estes dois mecanismos mandam informações para o terceiro mecanismo
(mecanismo de atenção compartilhada), o qual se encarrega de criar relações entre
o eu, outros agentes e objetos (este mecanismo formula a seguinte questão: eu e
você vemos a mesma coisa?).

Finalmente, o quarto mecanismo (mecanismo da Teoria da Mente) é o


responsável pela união das noções (até então separadas) de atenção, desejo,
intenção, crença dentro de um aparato teórico coerente para o entendimento do
comportamento em termos mentalistas, isto é, dentro de um contexto de
representações.

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Nas crianças com autismo, os mecanismos de atenção compartilhada e de
Teoria da Mente estariam prejudicados, o que acarretaria prejuízos nas relações
sociais e na comunicação. Tais prejuízos ocorrem pelo fato de que o déficit na Teoria
da Mente dificulta a compreensão do que as pessoas pensam, sentem e do modo
como se comportam. Não conseguindo atribuir estes significados, a criança com
autismo não interage com o meio social da mesma forma que as demais crianças.

A formação e a aprendizagem da criança com TGD

Para iniciar este assunto, descreveremos situações comumente vividas pelas


crianças, pelas famílias e pelas escolas ao receberem alunos com TGD. O objetivo é
de proporcionar a identidade entre o presente texto e a realidade vivida pelos
professores, buscando subsidiar
teoricamente a compreensão dessa
realidade e propor alternativas de atuação e
de valorização desse desafio.

A criança ao ingressar na escola

Conforme já foi mencionado, a oportunidade de trabalhar com alunos com TGD


na turma tem sido nova para a grande maioria das escolas. De acordo com a nossa
observação, é grande o impacto nos profissionais da educação que atuam na escola
quando se deparam com as reações dessas crianças que, tanto quanto os
professores, estão diante de uma experiência nova.

É comum que essas crianças apresentem manifestações de sua inflexibilidade


de maneira exacerbada. Se utilizarmos os subsídios teóricos trabalhados
anteriormente nesse texto, é fácil compreender que, no ambiente escolar, com todos
os seus estímulos e vendo-se em meio a muitas outras crianças, a tantas falas e
atitudes das outras pessoas que, aliás, não lhe são familiares, a criança reaja assim.

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Essas reações, de forma recorrente, podem ser de choro intenso, de
movimentos corporais repetitivos, de indiferença em relação aos apelos e tentativas
de ajuda, de apego a determinados locais fixos na escola e de recusa em deslocar-
se conforme orientado. Também já observamos, em casos mais complexos,
autoagressões ou reações abruptas envolvendo objetos ou mesmo alguma outra
pessoa.

A ocorrência de tais manifestações não deve ser interpretada como o estado


permanente da criança ou no que consiste o seu porvir. Na verdade, trata-se de
reações esperadas mediante uma alteração importante na sua rotina. A escola,
naquele momento, é uma experiência desconhecida e de difícil apropriação de
sentido e propósito pela criança.

Por parte dos professores, a vivência desses primeiros momentos pode ser
paralisante, carregada de sentimento de impotência, angústia e geradora de falsas
convicções a respeito da impossibilidade de que a escola e o saber/fazer dos
professores possam contribuir para o desenvolvimento daquela criança. Mediante as
dificuldades iniciais, as escolas recorrem a todo tipo de tentativa de acolhimento ao
aluno. Essa é uma atitude absolutamente compreensível, embora sejam importantes
alguns cuidados. Se conseguirmos deslocar nossa atenção das estereotipias e
reações da criança e nos projetarmos a um cotidiano futuro, é possível "cuidar" de
algumas questões.

Considerando os subsídios teóricos já disponibilizados nesse texto,


entendemos que tais dificuldades iniciais ocorrem em decorrência da inflexibilidade
mental dessa criança. É pela falta de flexibilidade que a experiência de estar na escola
não é significada facilmente, representando inicialmente apenas a perda da rotina
cotidiana, que permitia a essa criança não se desorganizar. Devemos lembrar de que
o apego a rotinas e rituais é uma
característica comum às crianças com TGD.

Os professores que trabalham com


as idades iniciais da escolarização
acumulam farta experiência como
testemunhas de diferentes graus de reação
das crianças aos primeiros dias na escola e

23
à primeira separação da família para um meio social mais amplo. Algumas
conseguem rapidamente se adaptar às novas vivências, enquanto outras levam
muitos dias nessa empreitada, absorvendo toda a atenção dos professores em
atitudes de choro contínuo, apego à mãe na entrada da escola, sem deixarmos de
poder mencionar o apego de mães aos seus filhos e a grande insegurança de
algumas ao deixá-los na escola.

É importante entender que as primeiras manifestações correspondem àquelas


acima descritas, comuns às demais crianças, potencializadas pela inflexibilidade
decorrente do TGD. Assim, no decorrer dos primeiros dias, é fundamental ter em
mente que a experiência da escola necessita entrar, o quanto antes, num terreno mais
previsível para aquela criança. Isso deve ser feito, obviamente, sem retirar a
naturalidade do ambiente escolar, mas tendo em mente que a mesma inflexibilidade
que torna tão difíceis as primeiras experiências nesse ambiente poderá também
promover o apego a situações que posteriormente poderão se tornar indesejáveis.

Em outras palavras, é importante, na tentativa de acolhimento àquela criança,


não proporcionar a ela vivências que não farão parte da sua rotina no futuro. A
inflexibilidade e o apego a rotinas poderão levar a criança a estabelecer rotinas
inadequadas no interior da escola, que causarão dificuldades posteriores para os
profissionais e para a própria criança quando forem reformuladas.

Exemplos disso são o acolhimento individual com acesso a brinquedos que


não é dado às demais crianças, horários reduzidos para adaptação progressiva,
permanência separada da turma em espaços como sala da coordenação ou direção
da escola, alimentação em horário diferente do restante da turma, etc. O cotidiano
escolar possui rituais que se repetem diariamente.

A organização da entrada dos alunos, do deslocamento nos diversos espaços,


das rotinas em sala de aula, do recreio, da organização da turma para a oferta da
merenda, das aulas em espaços diferenciados na escola, da saída ao final das aulas
e outros são exemplos de rituais que se repetem e que favorecem a apropriação da
experiência escolar para a criança com TGD.

Esses rituais escolares proporcionam a todas as crianças o desenvolvimento


de aspectos cognitivos úteis à vivência social, envolvendo antecipação, adiamento da
atuação imediata, entre outros. A diferença é que a necessidade de exercício explícito

24
de ensino e aprendizagem empreendidos junto à criança com TGD, em tais situações,
torna visível tal processo. O grande valor desses rituais já inerentes à escola para a
criança com TGD é o fato de que acontecem para todos os alunos e não são artificiais
ou preparados exclusivamente para a criança com TGD, já que constituem regras de
organização de um meio social real e, portanto, diverso.

O aprendizado advindo das situações reais é de utilidade real para a criança,


ou seja, passível de ser utilizado em outros contextos, diferentemente daquele
advindo de situações artificiais. Quanto mais cedo a criança com TGD puder antecipar
o que acontece diariamente na escola, mais familiar e possível de ser reconhecida se
tornará para ela a vivência escolar, tornando as primeiras manifestações da criança
progressivamente menos frequentes.

Tendo em vista que a capacidade de antecipar é uma função que se apresenta


prejudicada para aqueles que apresentam TGD, consiste em facilitador da
familiarização com o ambiente escolar essa antecipação, com a ajuda de outra
pessoa. Por antecipação realizada por outra pessoa, estamos nos referindo à
necessidade de que a criança seja comunicada antes, de forma simples e objetiva, a
respeito do que vai ocorrer no momento seguinte. Isso pode parecer não funcionar
por um tempo, pois a criança poderá aparentar não ter prestado atenção ou não
entender, quando não altera suas atitudes diante dessa antecipação.

O importante é tornar a antecipação uma rotina e não desistir da expectativa


de adesão da criança. Como efeito da antecipação, a cada dia mais o contato diário
da criança com o ambiente escolar e com seus rituais, que se repetem, vão tornando
o cotidiano mais previsível e seu comportamento poderá ir se transformando. Com o
passar do tempo, a escola poderá ir
dispensando tal antecipação nas situações que
se repetem diariamente, podendo verificar que
um precioso progresso foi conquistado no
cotidiano daquela criança.

As intervenções dos colegas consistem


em importante estratégia transformadora de
padrões de comportamento da criança com TGD. O envolvimento da criança com

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TGD pelos colegas proporciona, não raras vezes, intervenções que partem deles
espontaneamente, na tentativa de que aquela criança participe como eles da rotina.

A intervenção dos colegas acontece quando eles reconhecem a expectativa da


escola de que a criança com TGD conseguirá comportar-se melhor. O efeito dessa
intervenção dos pares na adesão da criança com TGD a esses rituais é mais
frequentemente eficaz do que aquela que provém dos adultos. Se, por um lado, esses
rituais são inerentes à rotina escolar, também o são as situações inusitadas, as
novidades e surpresas.

A família

A descoberta de que o filho ou a filha é uma criança com Transtorno Global do


Desenvolvimento consiste numa das etapas do desconforto que, na verdade, se inicia
bem antes, quando se percebe que algo não vai bem. Desde a primeira desconfiança
até a identificação do quadro, e daí em diante, um leque extremamente extenso de
sensações, angústias, incertezas, inseguranças, tentativas, erros, medos e
esperanças envolve a família.

Temos observado que os prejuízos na área da comunicação comprometem,


com frequência, a possibilidade imediata de confiança por parte da família na
permanência da criança na escola durante todo o turno ou, até mesmo, na
permanência dessa criança sem a presença da mãe. Tal insegurança se pauta, por
exemplo, na crença de que a criança passará por fome e sede, por não saberem
comunicar suas necessidades ou pedir ajuda a outras pessoas além da família. Nesse
momento, torna-se fundamental o reconhecimento, por
parte dos educadores, de que a escola é o espaço de
aprendizagens que propicia a aquisição da autonomia
para todos os alunos.

Para alguns, a autonomia em relação às próprias


necessidades básicas é adquirida no meio familiar,
tornando a escola uma oportunidade de exercício dessa
autonomia em ambiente social diferenciado e mais amplo
do que a família. Neste caso, a aprendizagem refere-se à

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experiência que oportuniza a generalização das competências já adquiridas,
mediante novas situações-problema.

Para crianças com TGD, poderá ocorrer que a permanência no ambiente


escolar por si só represente uma exposição a situações-problema que poderão fazer
emergir competências ainda não adquiridas. Nos casos em que há ausência da
comunicação, as necessidades e desejos da criança são, geralmente, subentendidos
por outro familiar, sendo poucas as oportunidades de exposição a situações em que
a busca de ajuda ou de satisfação das necessidades tenha que ser exercida com a
contribuição da própria criança.

Certamente, o enfrentamento de tais situações deve ser mediado pela escola


de modo a torná-las eficazes para o desenvolvimento de tais competências Se, no
trabalho com a maioria das crianças, não fica tão evidente o desenvolvimento da
autonomia em decorrência da escolarização, no caso das crianças com TGD, esta
decorrência se evidencia, demandando intenção pedagógica para desenvolvê-la.

O reconhecimento da escola como espaço de desenvolvimento de


aprendizagens, em prol da autonomia, e a convicção na possibilidade de se exercer
este papel junto à criança com TGD são fundamentais na relação inicial com a família,
no sentido de sustentar a permanência da criança na escola desde o início e o
estabelecimento de vínculo de confiança com os familiares.

Desde o início, é importante que tanto a escola quanto a família tenham a


compreensão de que nem todos os dias tudo vai dar certo. Além disso, os
profissionais da escola necessitam observar os progressos que a criança vai
conquistando do ponto de vista da própria criança. Isto significa que não faz sentido
utilizar parâmetros inflexíveis e impessoais de
avaliação pedagógica sob o risco de nos privarmos
dos subsídios para a ação pedagógica apropriada à
criança.

É preciso analisar o processo desde seu


ingresso na escola, como a criança se portava e o
que passou a ser capaz de realizar. Tanto a família
quanto a escola precisam compreender que,
mesmo quando a criança supera as dificuldades

27
iniciais e abandona determinadas atitudes ou estereotipias, eventualmente elas
podem se manifestar novamente, não significando por isso que o trabalho da escola
está sendo mal sucedido.

A escola precisa estar em permanente interlocução com a família. Além de


todos os benefícios inerentes a essa interlocução, isso poderá contribuir para que,
juntos, a família e os profissionais da escola possam compreender mais rapidamente
os motivos para eventuais retomadas pela criança de reações que já haviam sido
superadas.

Como exemplo disso, podemos relatar um dos casos que observamos em que
a troca da empregada doméstica, que havia trabalhado por vários anos com a família,
e a mudança na rotina de horários da mãe, em função do trabalho, eram os motivos
das manifestações apresentadas pela criança em determinado momento da
escolarização. Isso acontece porque são crianças sensíveis às alterações de rotinas,
conforme já dissemos.

Além disso, há momentos em que são feitas alterações de medicamentos pelo


profissional da área médica. Nesses momentos, há um período de adaptação ao novo
medicamento ou nova dosagem, o que muitas vezes explica estados de sonolência
ou agitação incomuns.

Para que haja sucesso na interlocução e parceria entre a escola e a família, os


profissionais da escola devem sistematicamente dar retorno à família sobre todo e
qualquer progresso apresentado pela criança no ambiente escolar, evitando-se a
tendência que observamos de se relatarem apenas as dificuldades vividas com a
criança.

Os professores devem ter em mente que a família encontra-se muitas vezes


fragilizada por toda a vivência desde a descoberta do transtorno e que será parceira
quanto mais conseguir entender o processo pedagógico do filho e perceber os
pequenos avanços. O que chamamos de pequenos avanços são extremamente
significativos para a família.

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