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PORTER, Michael E. Competigao: Estratégias Competitivas Essenciais. Tradugdio por: Afonso Celso da Cunha Serra. Rio de Janeiro. Campus. 1999. Paginas 167-208 CAPITULO 6 A Vantagem Texto 14 Competitiva das Nacées Michael E. Porter A PROSPERIDADE NACIONAL NAO E ALGO herdado, mas sim o produto do esforco criativo humano. Nao é algo que emana dos dotes naturais de um pats, de sua forga de trabalho, das taxas de juros ou do valor da moeda, como insistem os economistas cléssicos. ‘A competitividade de um pais depende da capacidade da sua industria de inovar e melhorar. As empresas conquistam uma posicéo de vantagem em re- lagdo aos melhores competidores do mundo em tazao das presses ¢ dos desa- fios. Elas se beneficiam da existéncia de rivais internos poderosos, de uma base de fornecedores nacionais agressivos e de clientes locais exigentes Num mundo de competigao global crescente, os paises se tornaram mais, ¢ nado menos, importantes. A medida que os fundamentos da competicao se deslocam cada ver mais para a ctiagao e assimilagéo do conhecimento, au- menta a importancia dos pafses. A vantagem competitiva é gerada e sustenta- da através de um processo altamente localizado. As diferengas nos valores nacionais, a cultura, as estruturas econdmicas, as instituigdes ¢ a histéria so fatores que contribuem para o éxito competitivo, Em todos os patses consta- tam-se disparidades marcantes nos padtées de competitividade. Nenhum pais é capaz de competir em todos e nem mesmo na maioria dos setores, Em Ultima instancia, os paises obrém éxito em determinados setores porque 0 ambiente doméstico € 0 mais progressista, dindmico ¢ desafiador. Margo-abril de 1990. Nota do autor: Michael J. Enright, que atuou como coordenador do projeto, neste esiudo, conuribuiu com valiosas sugestécs. 168 MICHAEL E, PORTER Estas conclusdes, produto de quatro anos de estudo sobre os padrées do éxito competitive em dez. dos principais patses comerciais, contraria a sabe- doria convencional que orienta o pensamento de muitas empresas ¢ gover nos nacionais — ¢ que hoje se encontra em grande voga nos Estados Unidos. (Para mais informagées sobre o estudo, ver, a seguir, “Padrées do Exito Competitivo dos Paises".) De acordo com o pensamento predomi- nante, os custos da mao-de-obra, as taxas de juros, as taxas de cimbio e as economias de escala sio os determinantes mais poderosos da competitivi- dade, Nas empresas, as palavras do dia séo fusio, alianca, parceiros estraté- gicos, colaboragio e globalizacio supranacional. Os gerentes estéo pressionando por mais apoio governamental para setores especificos. Entre os governos, verifica-se uma tendéncia crescente para experimentar varias politicas destinadas a promover a competitividade nacional — desde os es- forcos para gerenciar as taxas de cambio, as novas medidas para controlar o comércio, além das politicas para atenuar as medidas de defesa da concor- réncia— que em geral se revelam contraproducentes (ver, mais adiante, “O que E, Competitividade Nacional?”). Padrées do Exito Competitivo dos Paises Com 0 objetivo de investigar os motivos pelos quais os paises ganham vanta- gem competitiva em determinados setores ¢ suas implicag&es para a estratégia, das empresas ¢ para as economias nacionais, realize! um estudo de quatro anos sobre dez paises importantes, em termos comerciais: Dinamarca, Alemanha, Itdlia, Japao, Coréia, Singapura, Suécia, Sufga, Reino Unido ¢ Estados Uni- dos. Contei com a assisténcia de uma equipe de mais de 30 pesquisadores, a maioria consticuida de cidadaos natos ¢ residentes dos pafses estudados. To- dos utilizaram a mesma metodologia. Trés paises — Estados Unidos, Japio ¢ Alemanha — sao as principais po- téncias industriais do mundo. Os outros representam uma diversidade de di- mensées populacionais, politicas governamentais em relacio 3 industrializagao, filosofias sociais, éreas territoriais ¢ localizacao. Juncos, os dez paises responde- ram por mais de 50% das exportagdcs mundiais em 1985, 0 ano-base para a andllise estatistica. A maioria das andlises anteriores sobre a competitividade nacional se con- centraram num tinico pais ou cm comparagées bilaterais. Ao analisar paises com amplas variedades de caracteristicas ¢ circunstancias, 0 estudo procurou segregar as forcas fundamentais subjacentes 3 vantagem competitiva nacional dos aspectos apenas idiossincraticos. COMPETIGAO 169 Em cada pais, 0 estudo consistiu de duas partes. A primeira identificou todos os setores em que suas empresas desfrutavam de sucesso internacional, com base nos dados estatisticos dispontycis, em fontes publicadas suplemen- tares ¢ em entrevistas de campo. Consideramos bem-sucedido, em termos in- ternacionais, 0 setor de um pals que apresentasse vantagem competitiva em relagio aos melhores competidores do mundo. Muitos indicadores da vantagem competitiva, como a rentabilidade divulgada, as vezes so enganosos, Escolhie~ mos como melhores indicadores a existéncia de exportacées substanciais ¢ sus- tentadas para uma vasta gama de outros paises ¢/ou investimentos externos significativos, com base em habilidades ¢ em ativos gerados internamente. O pais foi considerado a base doméstica de uma empresa quando se tratava de ‘uma organizagao nativa de propriedade local ou quando esta dispunha de ges- tao auténoma, ainda que de propricdade de empresas ou investidores estran- geiros, Desenvolvemos, entio, o perfil de todos os setores em que cada nacio obtivera éxito internacional em trés pontos no tempo: 1971, 1978 ¢ 1985. O padrao dos setores competitivos em cada economia nao se revelou de forma alguma aleatdrio; a tarefa agora consistia em explicar este padréo e como ele se alterou ao longo do tempo. As conexdes ou relacionamentos entre os setores competitivos do pats despertaram grande interesse. Na segunda parte do estudo, examine’ a histéria da competi¢ao em deter- minados setores, de modo a compreender como se gerou a vantagem compe- titiva. Na base dos perfis nacionais, selecionamos mais de 100 setores ou grupos de setores para uma andlise detalhada; examinamos uma quantidade muito maior, com menor profundidade. Recuamos no tempo tanto quanto necessério para compreender como ¢ por que setor se iniciou no pais, como cresceu, quando ¢ por que as empresas desenvolveram a vantagem competiti- va internacional ¢ processo pelo qual se sustentou ou se perdeu a vantagem competitiva. As histérias de casos daf resultantes ficam aquém do trabalho de um bom historiador, em termos de deralhes, mas proporcionam insights so- bre o desenvolvimento tanto do setor como da economia nacional. Para cada pais, escolhemos uma amostra de setores que representasse os grupos de seto- tes competitivos mais importantes da economia, Os setores estudados respon- diam por uma grande proporcio do total das exportagoes em cada pais: mais de 20% do total das exportagées do Japao, da Alemanha e da Suiga, por exem- plo; ¢ mais de 40% na Coréia do Sul. Estudamos algumas das mais famosas ¢ importantes histérias de sucesso internacional —o alto desempenho dos seto- tes automobilistico € de produtos quimicos da Alemanha, os semicondutores ¢ videocassetes japoneses, os setores bancdtio ¢ farmacéutico da Suiga, os de calgados e téxtil da Ieélia ¢ os aerondutico de cinema dos Estados Unidos — além de alguns setores um tanto obscuros mas muito competitivos — os pia nos da Coréia do Sul, as botas para esqui italianas ¢ os biscoitos ingleses. Tam- bém acrescentamos alguns outros setores, em raz4o dos aparentes paradoxos: a demanda doméstica do Japao por méquinas de escrever com caracteres oci- dentais, por exemplo, é quase inexistence, mas o Japio mantém uma posi de fortes exportagies ¢ de investimentos estrangeiros no setor. Evitamos seto- 170 MICHAEL E, PORTER res altamente dependentes de recursos natutais: esses setores nfo constituem a espinha dorsal das economias avangadas ¢ a capacidade de competit nesses se- tores é mais explicdvel através da teoria classica, No entanto, inclufmos varios outros relacionados com recursos naturais com maior intensidade tecnolégi- ca, como os de papel de jornal e de produtos qutmicos para a agricultuca, A amostra dos paises ¢ dos setores proporciona uma rica fundamentagao emptrica para o desenvolvimento ¢ teste da nova teoria sobre como os estados conquistam a vantagem competitiva. O presente artigo se concentra nos de- . terminantes da vantagem competitiva em setores individuais ¢ também esbo- gaalgumas das implicagées gerais do estudo pata as politicas governamentais ¢ Para.a estratégia das empresas. No meu livro A Vantagem Competitiva das Na- ¢es, adovo uma abordagem mais abrangente, que desenvolve a teoria ¢ suas implicagées em maior profundidade ¢ oferece muitos outros exemplos. Ele também contém deserigées detalhadas dos patses que estudamos ¢ as perspec- tivas futuras para as respectivas economias. eee Essas abordagens, muito defendidas pelas empresas ¢ pelos governos, sio falas. Basicamente, nao percebem de forma correta as verdadeiras fon. tes da vantagem competitiva. Se as adotassem, com todo o apelo de curto prazo, os Estados Unidos — ou qualquer outro pals avangado — jamais al- cangariam a vantagem competitiva efetiva ¢ sustentivel, Necessitamos de novas perspectivas ¢ ferramentas — uma abordagem de competitividade que emane diretamente de uma andlise dos setores de éxito internacional, sem preocupagio com a ideologia tradicional ou com a mais recente moda intelectual. Precisamos saber, apenas, o que funciona e por qué. Em seguida, devemos aplicat as ligé eee O QueE Competitividade Nacional? A competitividade nacional se transformou numa das preocupacées centrais do governo e da industria em todos os paises. No entanto, nao obstante todas as andlises, debates ¢ esctitos sobre tema, ainda inexiste uma teoria convin- cente para explicé-la, Pior ainda, nao hé sequer uma definigao consagtada do termo “competitividade”, no que se refere a um pais. Embora a nogao de em. Presa competitiva seja nitida, a idéia de pats competitive ainda ¢ obscura, Alguns véem a competitividade nacional como um fendmeno macrocco- némico, induzido por variveis como taxa de cambio, taxas de juros ¢ déficits governamentais, Mas 0 Japao, a Itdlia ea Coréia do Sul apresentam padres de COMPETIGAO 171 vida em répida ascensao, apesar dos déficits orcamentirios, idem para a Ale- manha ea Suica, apesar da valorizagao das respectivas moedas, com o agravan- te das altas taxas de juros, nos casos da Itdlia ¢ da Coréia Outros argumentam que a competitividade € fungao da mao-de-obra ba- rata e abundante, Mas a Alemanha, a Suica e a Suécia prosperaram, mesmo com clevados salirios ¢ escassez. de mao-de-obra. Ademais, serd que 0 pafs nao deve procurar aumentar o saldrio dos trabalhadotes, justamente como um dos objetivas da competitividade? Outra visio relaciona a competitividade com a abundancia dos recursos naturais. Mas, nesse caso, como se explicaria 0 éxito da Alemanha, do Japio, da Suiga, da Itilia e da Coréia do Sul — pafses com recursos limitados? Mais recentemente, tem sido objeto de crescente aceitacio 0 argumento de que a competitividade é induzida pelas politicas governamentais: a con- centragao de recursos, 0 protecionismo, a promogio das importagées ¢ os subs{dios clevaram os setores automobilistico, sidertirgico, de construgdo na- val e de semicondutores do Japio e da Coréia do Sul & situacao de preeminén- cia mundial. Mas uma andlise mais minuciosa revela uma situag’o mais inconsistente. Na Irdlia, a intervengao governamental tem sido ineficaz — mas cla exibiu taxas de crescimento na sua participagéo em exportagées mun- diais superadas apenas pelo Japao. Na Alemanha, a intervengio governamen- tal direta nos setores exportadores € rata. E mesmo no Japao ¢ na Coréia do Sul, o papel do governo em setores importantes como méquinas de fax, copia~ doras, robética ¢ materiais avangados, tem sido modesta; alguns dos cxemplos citados com maior freqiiéncia, como méquinas de costurar, siderurgia ¢ cons- truco naval, esto bastante obsoletos. Una tiltima explicagio popular para a competitividade nacional é a dife- renga nas praticas gerenciais, inclusive nas relacbes trabalhistas. No entanto, 0 problema aqui é que diferentes setores exigem diferentes abordagens geren- ciais. As préticas gerenciais bem-sucedidas que prevalecem nas pequenas em- presas familiares italianas, geralmente de capital fechado e com uma organizacao mais frouxa, seriam desastrosas se aplicadas nas empresas dos se- tores automobilistico e quimico da Alemanha, nos laboratérios farmacéuticos da Sufga ou na indiistria acrondutica americana. Tampouca é posstvel genera- lizar sobre as relagées trabalhistas. Nao obstante a visio comum de que 0s po- derosos sindicatos debilitarg a vantagem competitiva, estas instituigdes séo fortes na Alemanha ¢ na Suécia— e ambos os paises ostentam empresas de ¢x- celéncia internacional. E claro que nenhuma das explicagées é de todo satisfatéria, nenhuma é suficiente para analisar a posi¢o competitiva dos setores no ambito das fron- teiras nacionais. Cada uma contém alguna verdade, mas parece que se encon- tra em atuacao um conjunto de forgas de maior amplitude ¢ complexidade. A falta de uma explicagao clara sinaliza para uma questao ainda mais fun- damental, O que é, em primeiro lugar, um pais “competitive”? O pats “com- petitive” é aquele em que todas as empresas ou setores sto competitivos? 172 MICHAEL BE, PORTER Nenhum pais passa por este teste. Até mesmo o Japao possui grandes setores econémicos que ficam atrés dos melhores competidores mundiais. O pats “competitivo” é aquele cuja taxa de cambio favorece a competitivi- dade dos produtos nos mercados internacionais? Tanto a Alemanha como 0 Japao tém desfrutado de ganhos extraordinarios em termos de padrao de vida — e atravessado perfodos prolongados de moeda forte ¢ pregos crescentes. O pals competitivo € aqucle que exibe clevados saldos comerciais positivos? A Sufga mal apresenta uma balanga comercial equilibrada, a Itdlia sustenta défi- cits comerciais crénicos — ambos usufruem de rendas nacionais em acentua~ do ctescimento. O pais “competitive” é aquele com mao-de-obra barata? Os saldrios e os custos da méo-de-obra séo baixos no México ¢ na India, mas ne- nhum deles desponta como modelos industriais atraentes. O tinico conceito significative de competitividade no nivel nacional é a produtividade. O principal objetivo de um pats consiste em proporcionar um padrao de vida elevado e crescente para os cidadaos. A capacidade para tanto depende da produtividade com que o trabalho e o capital atuam. Produtivida- de é0 valor da produgao de uma unidade de trabalho ou de capital. Depende tanto da qualidade ¢ das caracteristicas dos produtos (que determinam o seu prego) como da eficiéncia com que séo produzidos. A produtividade é o prin- cipal determinante do padrio de vida de longo prazo do pals; é a causa pri- mordial da renda per capita nacional. A produtividade dos recursos humanos determina o saltio dos empregados, a do capital estabelece 0 retorno gerado para seus detentores. O padrao de vida de um pats depende da capacidade de suas empresas de atingir altos niveis de produtividade — ¢ de continuar aumentando-a ao lon- go do tempo. O ctescimento sustentado da produtividade exige que a econo- mia sempre se aprimore a si mesma. As empresas devem melhorar de forma implacével a produtividade dos setores existentes, adicionando caracteristicas desejaveis, desenvolvendo a tecnologia dos produtos ou impulsionando a efi- ciéncia da produgao. Precisam reforgar as capacidades necessdrias para com- petir em segmentos cada vez mais sofisticados, em que a produtividade é, em geral, elevada. Devem, por fim, desenvolver os recursos para competit em se- tores inteiramente novos, com elevado grau de complexidade. O comércio internacional ¢ os investimentos externos sio capazes nao apenas de melhorar, mas também de ameacar a produtividade nacional. Eles a fortalecem ao permitir que os pafses se especializem naqueles setores ¢ seg- mentos nos quais suas empresas sio mais produtivas ¢ 20 importar nos casos em que é menor a produtividade. Nenhum pais tem condigoes de ser compe- titivo em todos os setores. O ideal consiste em alocar o conjunto limitado de recursos humanos € outros recursos para produtivos. Mesmo os paises com os padrées de vida mais elevados possuem muitos setores em que as empresas locais ndo si competitivas. No entanto, 0 comércio internacional ¢ os investimentos externos as ve também ameagam o crescimento da produtividade. Eles submetem os setores econémicos de um pats ao teste dos padrdes intcrnacionais de produ- usos ma COMPETICAO 173 tividade. O setor sairé perdendo se sua produtividade nao for suficiente- mente mais elevada do que a dos rivais externos, para compensar quaisquer vantagens nos salirios locais. Se o pais perder a capacidade de competir num conjunto de setores de alta produtividade ¢ altos saldrios, seu padrao de vida estard ameacado. Definit a competitividade nacional como a obtencao de superdyits ou de equilfbrio na balanga comercial ¢ inadequado. A expansio das exportacdes em azo dos baixos saldrios e da moeda fraca, ao mesmo tempo em que se impor- tam produtos sofisticados que as suas empresas sio incapazes de produzir de forma competitiva, talvez contribua para sicuacao de equilfbrio ou superdvit mas compromete o padrao de vida. A competitividade também nao significa empregos. O elemento decisivo para a prosperidade econdmica ¢0 tipo de em- pregos, ¢ nao a capacidade de empregar os cidadaos com baixos salirios. ‘Assim, a tentativa de explicar a “competitividade” no nfvel dos paises é responder & pergunta errada, Ao contrario, precisamos compreender os de- terminantes da produtividade ¢ de sua taxa de crescimento. Para descobrir as respostas, devemos focalizar nao a economia como um todo, mas os setores espectficos ¢ os segmentos setoriais. Precisamos compreender como € por que se criam as habilidades e tecnologias comercialmente vidveis, 0 que s6 é de todo explicavel no nivel dos setores especificos. Trata-se do resultado dos milhares de lutas pela vantagem competitiva contra os rivais estrangeiros em segmentos c setores especificos, nos quais sdo gerados ¢ aprimorados os pro- dutos e processos que constituem os pilares do crescimento da produtivida- de nacional. Quando se analisa com atengio qualquer economia nacional, consta- tam-se diferengas marcantes entre os setores de um pafs em termos de éxito competitivo. A vantagem internacional em geral se concentra em segmentos setoriais espectficos. As exportagées alemas de automdveis se caracterizam so- bretudo por veiculos de elevado desempenho, ao paso que as corcanas so quase que exclusivamente de compactos ¢ subcompactos, Em muitos setores ¢ segmentos setoriais, os concorrentes com verdadeira vantagem competitiva internacional se encontram em apenas poucos pases. Em conseqiiéncia, nossa busca se concentra na caracter(stica decisiva de um pals que permite as suas empresas a criagio ¢ sustentagZo da vantagem com- petitiva em campos especificos —ou scja, a procura é pela vantagem competi- tiva dos pafses. Estamos especialmente inveressados nos determinantes do éxito internacional nos segmentos ¢ setores com muitas tecnologias ¢ habi- lidades, que sustentam a clevada e crescente produtividade. A teoria cldssica explica 0 éxito dos pafses em setores espectficos com base nos chamados fatores de produgio, como terra, mao-de-obra ¢ recursos natu- rais. Com base neles, os pafses conquistam vantagens comparativas nos setores que utilizam os fatores que possuem em abundancia de forma intensa. No en: tanto, esta tcoria tem sido ofuscada, nos setores ¢ paises avangados, pela globa- lizagio da competigao ¢ pelo poder da tecnologia. 174 MICHAEL E. PORTER Uma nova teoria deve reconhecer que, na moderna competigao interna- cional, as empresas concorrem com estratégias globais, envolvendo nao ape: nas 0 comércio internacional, mas também os investimentos externos. Essa nova teoria precisa explicar por que determinado pas proporciona uma base doméstica favorével para as empresas na competicao internacional. A base do- méstica é 0 pafs em que se criam ¢ se sustentam as vantagens competitivas es- senciais da empresa. E onde se estabelece sua estratégia, onde sio geradas mantidas as tecnologias essenciais dos produtos e dos processos e onde se loca lizam os empregos mais produtivos ¢ as habilidades mais avangadas. A presen- sa da base doméstica num pafs exerce maior influéncia positiva sobre outros setores internos vinculados ¢ conduz.a outros beneficios na economia nacio- nal, Embora a propriedade da empresa em geral se concentre na base domésti- ¢a, a nacionalidade dos acionistas é secundéria. A nova teoria deve ir além da vantagem comparativa, para se concentrar na vantagem competitiva dos paises. Ela precisa refletir 0 conceito fecundo de competigao, que inclui metcados segmentados, produtos diferenciados, di- versidades tecnolégicas ¢ economias de escala, E importante que nao se limite a0s aspectos de custo € explique por que as empresas de alguns paises sio me- Ihotes do que outras na geracio de vantagens baseadas na qualidade, nas ca- racterfsticas ¢ na inovagao dos produtos. Esse novo corpo de conhecimentos partiria da premissa de que a competigao ¢ dindmica ¢ evolutiva, sendo fun- damental que responda is seguintes indagagSes: Por que algumas empresas baseadas em certos paises inovam mais do que outras? Por que alguns paises proporcionam um ambiente que capacitam as empresas a melhorar e a inovar com mais rapidez do que os rivais externos? Como as Empresas Obtém Exito nos Mercados Internacionais Em todo o mundo, as empresas que conquistaram a lideranga internacional adovam estratégias que diferem entre si sob todos os aspectos. No entanto, embora toda empresa bem-sucedida siga a propria estratégia espectfica, os modos de operagdo subjacentes —- sua natureza ¢ trajetéria — sfo funda- mentalmente idénticos. As empresas atingem a vantagem competitiva através das iniciativas de inovagao. Elas abordam a inovagio no seu sentido mais amplo, abrangendo novas tecnologias ¢ novas maneiras de fazer as coisas. Elas percebem uma nova base para a competicao ou encontram melhores meios para competir moda antiga. A inovagao se manifesta no novo desenho do produto, no novo proceso de produgio, na nova abordagem de marketing ou nos no- COMPETIGAO 175 vos métodos de treinamento. Boa parte das inovagées s4o triviais e incre- mentais, dependendo mais da acumulacio de pequenos insights ¢ melhorias do que de um tnico ¢ grande avango tecnolégico revoluciondrio, Freqiientemente, envolvem idéias que nem mesmo séo “novas” — idéias que jé circulavam por af, mas que nunca foram adotadas com vigor. Sempre demandam investimentos em habilidades ¢ conhecimento, assim como em ativos fisicos ¢ na reputagao das marcas. Algumas inovacées geram vantagem competitiva a partir da percepgio de uma oportunidade de mercado inteiramente nova ou através do aten- dimento a um segmento do mercado negligenciado por outras empresas. Quando os concorrentes so vagarosos em suas reacées, a inovacao gera a vantagem competitiva. Por exemplo, em setores como o de automéveis ¢ de aparelhos domésticos eletrénicos, as empresas japonesas conquistaram a vantagem inicial através da énfase em modelos menores, mais compactos € de menor capacidade, desdenhados pelos concorrentes estrangeitos como menos rentdveis, menos importantes ¢ menos atraentes. Nos mercados internacionais, as inovagées que proporcionam a vanta- gem competitiva antecipam as necessidades domésticas ¢ externas. Por exemplo, com o aumento da preocupagao internacional com a seguranga dos produtos, as empresas suecas, como a Volvo, a Adas Copco ea AGA, foram bem-sucedidas na antecipacao das oportunidades de mercado. Por outro lado, as inovacées que atendem a preocupag6es ou a circunstancias tf- picas do mercado interno sao capazes de retardar de forma efetiva 0 éxito competitivo internacional. O chamariz do gigantesco mercado de defesa dos Estados Unidos dispersou a atengao das empresas de materiais ¢ de ma- quinas-ferramentas em relagao aos atraentes mercados comerciais globais. A informagao desempenha um papel primordial no processo de inovagao ¢ melhoria — sobretudo a que nao estd disponivel para os concorrentes ou que nio € objeto de suas pesquisas. As veres, ela decorre de simples investimentos em pesquisa ¢ desenvolvimento ou de levantamentos de mercado; com mais freqiiéncia, resulta do esforgo, da abertura e da investigacao nos lugares certos, sem o jugo das premissas ofuscantes ¢ da sabedoria convencional. Essa é a razao pela qual os inovadores em geral sao observadores exter- nos de outros setores ou de outros paises. A inovagao As vezes emerge numa nova empresa cujo fundador apresenta antecedentes nao tradicionais ou simplesmente nao foi valorizado numa empresa mais antiga. Ou a capaci- dade de inovasao viceja numa empresa existente, através de gerentes senio- res que sia novos naquele setor especifico c, em conseqiiéncia, mais capazes de perceber oportunidades ¢ mais propensos a perseguir as novas chances. 176 MICHAEL E. PORTER Quas inovagdes se originam em outros paises, com diferentes citcunstan- cias ou diferentes formas de competi¢ao. Com poucas excecées, a inovacao ¢ 0 resultado do esforco incomum, A empresa que implementa com éxito uma nova ¢ melhor maneira de compe- tir, na maioria das vezes, persegue sua abordagem com uma determinagio obstinada, mesmo em face de duras criticas ¢ de diffceis obstdculos. Na rea- lidade, para ser bem-sucedida, a inovagao geralmente exige pressio, necessi- dade ¢, até mesmo, adversidade: 0 medo da perda quase sempre se revela mais poderoso do que a esperanga do ganho. Uma vez conquistada a vantagem competitiva através da inovagéo, a empresa terd condigdes de sustenté-la apenas através de um proceso impla- cével de methorias continuas. Quase todas as vantagens esto sujeitas a imi- tages. As empresas coreanas j4 igualaram a capacidade de producao em massa de televisGes em cores ¢ de videocassetes dos rivais japoneses presas brasileiras j4 reuniram tecnologias ¢ desenhos compardveis aos dos produtores italianos de calgados de couro esportivos. E inevitavel que os concorrentes acabem suplantando qualquer empresa que intertompa seu proceso de melhoria c inovagéo. As veres, as vantagens do pioneirismo, como o relacionamento com os clientes, as economias de escala nas tecnologias existentes ou a lealdade dos canais de distribuigao, so suficien- tes para permitir que uma empresa estagnada retenha sta posicio protegida durante anos ou mesmo décadas, No entanto, mais cedo ou mais tarde, rivais mais dindmicos descobririo um modo de inovar em totno dessas vantagens ou de criar uma forma de competi¢ao melhor e mais barata. Os produtores de cle- trodomésticos italianos, que competiam com éxito na base do custo, nos mer- cados de aparelhos médios e compactos, através de grandes cadeias vatejistas, repousaram durante muito tempo sobre essa vantagem inicial. Com o desen- volvimento de produtos mais diferenciados ¢ a criagéo de fortes fianquias de tmatca, os concortentes alemies comegaram a ganhar terreno. Em tiltima instancia, a tinica maneira de sustentar a vantagem competi- tiva consiste na sua ampliago — evoluindo para formas mais sofisticadas. Essa foi cxatamente a iniciativa dos fabricantes de automsveis japoneses. De inicio, penctraram nos mercados externos com cartos compactos pequenos e baratos, de qualidade adequada, competindo na base do baixo custo de mio-de-obra. No entanto, mesmo enquanto perdurava a vanta- gem decorrente do custo da méo-de-obra, as empresas japonesas amplia- vam. sua posigéo. Investiam de forma agressiva em grandes fébricas modernas, de modo a colher os beneficios das economias de escala. Em se- guida, se tornaram inovadores na tecnologia dos processos, introduzindo a yas cm-

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