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p r o g r a m a p r a x i s x x i

d i s q u a l
D I S Q U A L
optimização da qualidade e redução de custos na cadeia
de distribuição de produtos hortofrutícolas frescos

Manual de
Embalagem para
Hortofrutícolas
Frescos
Instituições do consórcio
Esta publicação foi elaborada no âmbito do Projecto de Investigação
em Consórcio – DISQUAL – Optimização da Qualidade e Redução de
Custos na Cadeia de Distribuição de Produtos Hortofrutícolas Frescos
(Projecto P020 – P31B – 02/97), apoiado pelo programa PRAXIS XXI.

Nesta colecção encontram-se disponíveis, para além deste manual,


manuais para os seguintes hortofrutícolas: Kiwi, Pêssego, Morango,
Tomate, Cenoura e Alface.

O Consórcio DISQUAL adverte que a informação contida neste


Manual foi seleccionada, compilada e editada com elevado grau de
cuidado mas que não tem qualquer caracter regulador. O Consórcio
não se responsabiliza pela sua aplicação.

Ficha Técnica

Título:
Manual de Embalagem para Hortofrutícolas Frescos
Autoria:
Maria de Fátima Filipe Poças (ESB)
Fernanda A. R. Oliveira (UCC, Irlanda)
Coordenação:
Maria de Fátima Filipe Poças (ESB)
Edição:
ESB/UCP - Porto, 2001 / 1ª Edição
Composição Gráfica:
Serviços de Edição da ESB/UCP
Impressão:
Greca - Artes Gráficas - 300 exemplares
ISBN: 972-98476-6-5
Depósito Legal:
D I S Q U A L - M A N U A L D E E M B A L A G E M P A R A H O R T O F R U T Í C O L A S F R E S C O S

ÍNDICE

Introdução ......................................................................................................... 2 Embalagem com atmosfera modificada ......................................................... 14

Requisitos de protecção para hortofrutícolas frescos ................................. 3 Respiração de produtos hortofrutícolas frescos .......................................... 15

Performance da embalagem ........................................................................... 4 Factores que afectam a taxa respiratória ................................. 16

Características das embalagens ...................................................................... 6 Modelagem matemática do efeito da composição da


atmosfera e da temperatura ........................................................... 16
Embalagem de venda ...................................................................... 7
Atmosferas recomendadas .............................................................................. 16
Embalagem de transporte .............................................................. 8
Materiais de embalagem com atmosfera modificada .................................. 18
Embalagem de madeira .................................................. 8
Projecto de embalagens com atmosfera modificada ...................................... 19
Embalagem plástica ....................................................... 8
Exemplo prático ................................................................................................ 23
Embalagem de cartão canelado .................................... 9
Nomenclatura .................................................................................................... 25
Sacos ................................................................................ 11
Bibliografia ........................................................................................................ 26
Sistemas de embalagem no mercado Português .......................................... 11

Morango ........................................................................... 11

Kiwi .................................................................................. 12

Pêssego ............................................................................ 13

Tomate ............................................................................. 13

Alface ............................................................................... 14

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INTRODUÇÃO

A embalagem desempenha um papel de importância crescente na venda de


hortofrutícolas frescos: cada vez mais a venda a granel deste tipo de produ-
tos tem sido abandonada em favor da venda de pré-embalados. Neste último
caso, o sistema de embalagem é constituído por uma embalagem primária, de
venda, e por uma embalagem de transporte. Na venda a granel, a embalagem
de armazenamento e de transporte é também a embalagem de exposição no
ponto de venda.

Em qualquer dos casos, o sistema de embalagem deve oferecer ao produto pro-


tecção contra as solicitações de natureza diversa que ocorrem durante o
armazenamento, transporte, manuseamento e distribuição. Assim, para
selecção e projecto da embalagem, é fundamental conhecer a cadeia de dis-
tribuição e as várias operações envolvidas. No caso da embalagem primária,
ela desempenha também uma função de conservação, prolongando a vida-útil
dos produtos. Este aspecto reveste-se da maior importância a nível da dis-
tribuição.

A embalagem não pode ser considerada de forma independente de factores


como o próprio produto e respectiva variedade, com as suas características
próprias de conservação e de utilização, da qualidade pretendida, do tipo de
distribuição e do preço.

Neste manual, são abordados aspectos ligados à embalagem de transporte e


aspectos ligados à embalagem com atmosfera modificada. É ainda apresenta-
da uma caracterização dos sistemas de embalagem usados actualmente no
mercado nacional, para o kiwi, morango, pêssego, tomate e alface.

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REQUISITOS DE PROTECÇÃO PARA HORTOFRUTÍCOLAS FRESCOS o padrão de empilhamento de forma a não haver obstrução com embalagens
adjacentes, no caso das embalagens de transporte. A área de ventilação deve
O sucesso da embalagem depende da forma como cumpre os requisitos de ser de pelo menos 5% da superfície da embalagem.
protecção do produto ao longo de toda a cadeia desde a produção até à sua
utilização final. A embalagem deve também ter barreira ao vapor de água adequada, pre-
venindo a perda de humidade dos produtos, que conduz a perda de peso e
Os frutos e legumes são produtos vivos, com elevado teor em água e diversi- desidratação com enrugamento da pele, e evitando a condensação de vapor
ficados em termos de morfologia, de composição e de fisiologia. As principais de água, fruto de oscilações de temperatura, que promove o crescimento
causas de deterioração dos frutos e legumes são alterações metabólicas, danos microbiológico.
mecânicos e ataques por pragas e doenças. A taxa de perda da qualidade do
produto depende de factores ambientais como a temperatura, a humidade Alguns produtos requerem tratamentos especiais para conservação, que devem
relativa, a composição atmosférica e a exposição à luz. A gestão da tempe- ser tidos em conta no projecto da embalagem, como por exemplo, o trata-
ratura ao longo da cadeia de distribuição é um dos parâmetros mais críticos. mento com dióxido de enxofre para uvas de mesa e em alguns casos o uso de
absorvedores de etileno na embalagem.
A embalagem deve permitir o arrefecimento rápido do produto imediata-
mente após a colheita, por exemplo por arrefecimento com ar forçado, e deve O sistema de embalagem deve também proteger o produto contra danos
permitir manter a temperatura adequada durante o transporte e armazena- mecânicos de natureza diversa.
mento, facilitando a remoção do calor metabólico. A embalagem deve assim
promover uma ventilação adequada que mantenha uma temperatura uni- Os danos causados por impacto, são resultantes de quedas durante as car-
forme. Esta ventilação é também muito importante para remoção do etileno gas e descargas, fruto de manuseamento pouco cuidadoso e de acelerações e
no caso de produtos sensíveis a este gás. paragens bruscas dos veículos durante o transporte.

Figura 1:
Orificios de ventilação
em embalagens Figura 2:
de maçã. Danos por impacto

Cortesia de
ICI Propafilm

A linha de limpeza, calibração e acondicionamento deve também ser adequa-


A ventilação é feita através de perfurações ou aberturas na embalagem. A da no que diz respeito às operações, superfícies, desníveis e velocidade de
área de ventilação e o posicionamento das perfurações ou aberturas devem, operação, para não ser ela própria fonte de danos por impacto, que podem ser
por um lado, ser adequadas ao produto e, por outro lado, estar de acordo com perceptíveis apenas mais tarde.

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Os danos por compressão, resultam de: PERFORMANCE DA EMBALAGEM


- empilhamento incorrecto
- enchimento além da capacidade e De forma a optimizar as condições ambientais a que o produto é exposto, a
- resistência deficiente da embalagem. embalagem pode ser submetida a condições de humidade relativa elevada (85-
95%). Flutuações de temperatura e humidade relativa ocorrem durante a trans-
Nestes casos é o produto que suporta parte do peso da carga. ferência de produto, por exemplo quando ele é removido da câmara de refri-
geração, podendo ocorrer condensação de vapor de água sob o produto e na
embalagem. A embalagem deve assim, manter as suas características de
resistência mecânica nas piores condições que pode encontrar ao longo de
toda a cadeia.

Figura 3: A resistência dos materiais de embalagem à humidade é diferente – a madeira


Danos por compressão
e o plástico sofrem pouca influência, enquanto que o cartão canelado tem
uma resistência mecânica bastante dependente da humidade. A Figura 5 ilus-
tra como as caixas de cartão canelado podem perder a sua resistência à com-
pressão inicial em função de diversos factores.

Figura 5:
Perda de resistência ao empilhamento de caixas de cartão canelado
Danos por abrasão e vibração são o resultado do movimento do produto
solto na embalagem. São normalmente danos superficiais mas que afectam a
qualidade do produto. Podem ser evitados com o uso de uma embalagem com
capacidade e densidade de enchimento correctas. Os produtos com pele mais
sensível requerem acessórios internos adicionais para protecção, como tabu-
leiros e envoltórios.
Caixa com sobrepalete (deslocada para fora): Empilhamento cruzado: Empilhamento em coluna com
Perda da resistência à compressão até 32% Perda da resistência à desalinhamento:
compressão até 50% Perda da resistência à
compressão até 30%

Figura 4:
Danos por abrasão
e vibração

Armazenamento prolongado: Humidade relativa elevada:


Perda da resistência à compressão até 50% Perda da resistência à compressão até 60%

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A resistência das embalagens depende não só das condições durante a sua uti-
lização, mas também das condições a que é exposta antes, durante o seu trans-
porte, armazenamento e manuseamento durante as operações de montagem
e acondicionamento. Condições de humidade muito elevada ou muito baixa Figura 6:
Layout de orifícios
são prejudiciais à maioria dos materiais de embalagem. de ventilação para
arrefecimento
por ar forçado
O transporte e o armazenamento das embalagens vazias deve ser res-
guardado, em condições de humidade moderada (óptimo entre 45 e 65%),
para evitar a perda de resistência mecânica, a oxidação de elementos metáli-
cos e a decomposição de colas, e ao abrigo da luz solar, que promove a
degradação dos materiais plásticos e a descoloração das impressões. Em qualquer dos casos, os furos de ventilação devem ser preferencialmente
verticais, pois assim a perda de resistência ao empilhamento da caixa é mini-
O manuseamento durante a montagem das caixas, enchimento e fecho é mizada.
também importante. O equipamento de montagem deve estar em boas
condições para não danificar o material de embalagem, e os elementos de
ligação e de fecho, quando utilizados, devem ser adequados.

Figura 7:
O arrefecimento pode, dependendo do produto e do tipo de cadeia, ser efec- Formato dos orifícios
tuado antes ou após acondicionamento. No caso de arrefecimento na emba- de ventilação
lagem, esta deve necessariamente ser adaptada ao processo de arrefeci-
mento usado.

No caso de arrefecimento por circulação de ar, são normalmente necessários


furos de ventilação em todos os lados das caixas e frequentemente também No caso de processos de arrefecimento especiais como arrefecimento com
no topo e no fundo. Os furos laterais aceleram o arrefecimento mas só se for água ou com gelo, a embalagem deve ser resistente à água.
deixado espaço entre caixas, quando empilhadas, para circulação do ar frio.
O projecto da embalagem deve igualmente ter em consideração as condições
No caso de arrefecimento por ar forçado, a embalagem deve ser construída observadas durante o transporte. No caso de transporte rodoviário, é acon-
com furos de ventilação numa única direcção e de forma a que o ar de arrefe- selhável a utilização de veículos com refrigeração. Quando tal não é possí-
cimento passe de uma caixa para a caixa adjacente. As caixas devem ter uma vel, o transporte deve ser efectuado durante a noite e não devem ser uti-
construção que permita, em função do tipo de empilhamento, um alinhamento lizados veículos com isolamento térmico, devido ao calor gerado pelo processo
dos furos de ventilação (Figura 6). Para reduzir o número de passagens entre respiratório dos produtos.
caixas, os furos são normalmente localizados no lados menores das caixas. Os
furos devem normalmente ser de 4 a 6 % da área superficial do lado menor Habitualmente a humidade relativa não é controlada durante o transporte.
da caixa. No entanto, a elevada actividade de água dos produtos transportados promove

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o aumento de humidade no interior do veículo conduzindo à absorção de Em alguns passos da cadeia de distribuição, o manuseamento manual de
humidade pelos materiais de embalagem comprometendo a sua eficiência. embalagens é necessário. A altura de queda das embalagens pode ser previ-
Durante um período de meio a um dia, os materiais de embalagem celulósi- sivelmente da ordem dos 50 – 60 cm na maioria dos casos, mas pode atingir
cos podem absorver humidade em valores tais que conduzem a uma perda de os 80 a 100 cm. É necessário que a construção da embalagem preveja esta
resistência ao empilhamento de 50% comparativamente à resistência regista- situação, com resistência à queda adequada, com a inclusão de pegas ou orifí-
da em condições normais de humidade relativa de 50 a 65% (Figura 5). cios para pega e com a unitização de embalagens mais pequenas (com peso
inferior a 5 kg). A formação do pessoal é também muito importante para sen-
A resistência ao empilhamento é adicionalmente reduzida pela acção de sibilização em relação aos danos passíveis de ocorrer nos produtos em con-
impactos e vibrações causadas pelo movimento do veículo e pelo estado do sequência de manuseamento manual pouco cuidadoso.
pavimento das estradas. Apesar da altura de empilhamento durante o trans-
porte não ser muito elevada (cerca de 2 m), o efeito negativo da humidade e
das vibrações, conduz frequentemente a que o transporte seja a etapa mais
exigente, no que diz respeito à embalagem de cartão, na distribuição de CARACTERÍSTICAS DAS EMBALAGENS
hortofrutícolas.
Os sistemas de embalagem usados para produtos hortofrutícolas podem ser
Além da influência na resistência ao empilhamento, a vibração durante o classificados de acordo com a etapa da cadeia de distribuição em que são uti-
transporte pode também causar danos aos produtos por abrasão. De forma a lizados:
evitar isto, o espaço livre da embalagem deve ser minimizado e os produ- - embalagem de venda ou para o consumidor
tos devem ser devidamente acolchoados em função da sensibilidade da sua - embalagem de transporte e
pele. Adicionalmente as embalagens mais pequenas devem ser agrupadas e a - carga unitária (paletes)
carga unitizada com rede ou com cintas, de forma a evitar o movimento das
embalagens (Figura 8). A embalagem na qual o consumidor recebe o produto pode ser introduzida em
qualquer ponto da cadeia, desde o campo até ao ponto de venda, dependendo
do tipo de produto, do tempo de transporte e do tipo de cadeia de distribuição.
Desempenha um papel muito importante na apresentação do produto.

A embalagem de transporte é usada para facilitar o manuseamento e conter


Figura 8: quantidades determinadas de produto. Constitui também, em regra, o ele-
Rede para unitização da carga
mento principal na protecção do produto. A embalagem de transporte é intro-
duzida no início da cadeia, no campo ou no armazém, e muitas vezes é tam-
bém usada como expositor no ponto de venda.

A unitização de cargas é feita para permitir o manuseamento mecânico efi-


Cortesia de
ciente durante a distribuição. É um aspecto muito importante na protecção
Andreas Hitzinger Ges. m.b.H. do produto, principalmente durante o transporte.

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Embalagem de venda
Figura 9:
A pré-embalagem dos produtos para venda ao consumidor apresenta como Envoltórios de
vantagens: filme plástico

- redução da taxa de deterioração dos produtos


- redução de perdas por manuseamento pelo consumidor no acto de
selecção e aquisição
- redução do tempo para pesagem e pagamento

A taxa de deterioração é reduzida porque a embalagem promove uma atmos-


fera com baixo teor em oxigénio, elevado teor em dióxido de carbono e ele-
Figura 10:
vada humidade relativa. No entanto, valores demasiado elevados de humidade Caixas plásticas
relativa podem conduzir à formação de grelos nos tubérculos e teores muito com tampa

reduzidos em oxigénio conduzem a respiração anaeróbica. De uma forma geral,


os produtos com elevada área superficial como as alfaces requerem uma Cortesia de
M.A. Stokes & Co. Ltd.
humidade relativa bastante elevada, enquanto que produtos como a cenoura
requerem atmosferas mais secas, sendo por isso usados materiais perfurados
ou mesmo rede.

Os sistemas de embalagem mais correntes para venda de hortofrutícolas pré-


embalados, incluem: Figura 11:
- envoltórios de filme plástico como LDPE ou PVC, na forma de filme Embalagens de
cartolina
estirável, normalmente aplicados sobre bandejas de polpa moldada, de
cartão ou de plástico (EPS, PP, PE ou PET); as bandejas combinam 4 ou
Cortesia de
6 peças de produto e oferecem alguma protecção mecânica no fundo e Andreas Hitzinger Ges. m.b.H.
nos lados.
- caixas plásticas (PET ou PP) com tampa e perfurações para ventilação,
ou embalagens em cartolina.
- sacos em rede (plástica ou de algodão).
- sacos plásticos com ou sem perfurações (de LDPE, OPP ou LLDPE) em
função da barreira ao vapor de água e aos gases requerida. Figura 12:
Sacos de rede

Cortesia de
Andreas Hitzinger Ges. m.b.H.

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A selecção do tipo de embalagem primária, depende do ponto da cadeia onde As caixas pregadas são rígidas e bastante resistentes sendo reutilizáveis. Os
é feito o acondicionamento, dos requisitos de protecção e características do componentes têm uma espessura superior a 6mm e o espaçamento entre eles
produto, da embalagem de transporte e de factores económicos. permite uma boa ventilação. As caixas pregadas são frequentemente usadas
como caixa de colheita e simultaneamente de transporte.

Embalagem de transporte As caixas agrafadas ou coladas são caixas normalmente mais leves e menos
resistentes, com componentes de espessura de 3 a 4 mm, não sendo reuti-
Os materiais de embalagem usados para o transporte de hortofrutícolas, são lizáveis.
a madeira, o plástico, o cartão canelado e sacos de grandes dimensões em
juta, tela e rede plástica. Quanto mais elevada é a densidade da madeira, melhor é a sua resistência
mecânica e melhor é a fixação dos elementos de ligação, como pregos ou
Embalagem de madeira agrafos.
A caixa de madeira tem como principais vantagens, face a outros sistemas
alternativos, a rigidez, a resistência ao empilhamento e a resistência à humi- A capacidade de absorção e o teor de humidade da madeira são parâmetros
dade. No entanto, o elevado peso, o espaço requerido para armazenagem (já relacionados com as operações de transformação da madeira e de construção
que a maioria dos formatos são pré-montados), a possibilidade de contami- da caixa, e com a possibilidade de ocorrência de variações dimensionais e
nação microbiológica da madeira e o facto de requerer operações manuais, são empenos da caixa após fabricada. A madeira deve estar adequadamente seca
factores frequentemente apontados como desvantagens e como causas de um também para evitar fendas e crescimento de bolores durante a sua utilização.
progressivo abandono da caixa de madeira em benefício das caixas em plás-
tico ou em cartão canelado. Adicionalmente, requer na maioria das vezes for- O ponto mais fraco da caixa é normalmente o elemento de ligação, por isso
ros de outro material macio para evitar danos do produto por abrasão. particular atenção deve ser dada a este aspecto.

As embalagens de madeira podem ser classificadas segundo critérios variados. Embalagem plástica
A madeira pode ser trabalhada de formas diversas, podendo ser serrada, cor- As caixas ou grades plásticas têm normalmente um preço superior ao das
tada ou desenrolada. Os elementos de ligação também podem constituir uma caixas de madeira ou de cartão canelado, mas pelo facto de terem uma
forma de classificação e nesse caso teremos caixas pregadas, agrafadas, coladas, duração maior, o seu custo inicial pode compensar.
entrançadas ou armadas. Finalmente as embalagens de madeira podem ser
classificadas quanto à forma e quanto ao tamanho. A Figura 13 apresenta algu-
mas das embalagens de madeira tipicamente usadas para hortofrutícolas.

Figura 14:
Tabuleiro de plástico
Figura 13:
Caixa pregada,
tabuleiro e cesto
agrafados
Cortesia de
M.A. Stokes & Co. Ltd.

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Os materiais usados são o HDPE ou o PP. O HDPE tem melhor resistência ao Embalagem de cartão canelado
impacto e à luz, enquanto que o PP resiste melhor à abrasão. As principais As embalagens de cartão canelado apresentam como principais vantagens o
vantagens das caixas plásticas são a possibilidade de reutilização, a diversi- seu baixo peso, a superfície lisa, a possibilidade de impressão, de formatos
dade de tamanhos e formatos, a facilidade de limpeza, a elevada resistência diversificados e de operações automáticas, e a possibilidade de serem forneci-
mecânica e à humidade. A principal desvantagem apontada para as caixas de das desmontadas, o que implica um espaço de armazenamento reduzido. A
utilização corrente, é o espaço ocupado em vazio. Para contornar esta questão principal desvantagem reside na elevada tendência a absorver humidade com
podem ser utilizadas caixas encastráveis ou colapsáveis. Na Figura 15 são consequente perda de resistência, em particular a resistência ao empi-
apresentadas caixas empilháveis e encastráveis com arcos, de fabrico por- lhamento.
tuguês. Os arcos podem ser colocados em duas posições distintas para permitir
o encaixe dos contentores uns dentro dos outros ou para permitir o empi- O cartão canelado, é constituído por uma estrutura em papel, que inclui dois
lhamento assegurando uma altura para o conteúdo. A Figura 16 mostra uma componentes colados entre si: o "liner" ou cobertura e o ondulado. Esta
caixa reutilizável, colapsável e com patilha para permitir o empilhamento sem unidade básica (ou cartão simples) é combinada com outra cobertura ou com
danificar o produto. Esta caixa tem, adicionalmente, a característica de ser outras unidades, dando origem ao cartão duplo, ou ao cartão de tripla cane-
fabricada em material plástico que inclui um aditivo para protecção lura (Figura 17).
antibacteirana – o Microban®.

Figura 15: Figura 17:


Caixas plásticas Estrutura do cartão
empilháveis e canelado
encastráveis

Cortesia de
Plásticos de Santo António Lda.

No fabrico do cartão canelado são usados papéis de diferentes gramagens e


teores de fibra reciclada. Para as coberturas são usados o "kraftliner" e o "test-
liner". O primeiro é fabricado a partir de pasta "kraft" com fibra virgem de pi-
nheiro, podendo ter até cerca de 20% de fibra reciclada ou fibra de eucalipto.
Figura 16:
O segundo tem normalmente duas camadas, apresentando percentagens mais
Caixa plástica com elevadas de fibra reciclada, até cerca de 80%. Os "liner" podem ser formados
aditivo Microban®
por duas camadas em que a exterior é branqueada (papéis White Top). Os
papéis para ondular são constituídos por pasta semi-química (uma só cama-
Cortesia de da, utilizando pasta de eucalipto e uma certa percentagem de pasta de pi-
Hays Crate Services nheiro) ou por 100% de fibras recicladas (papel Wellenstoff).

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e, para aplicações mais exigentes pode ser usado o cartão triplo com caneluras
B-A-A ou com outras combinações.
Figura 18:
Tabuleiro de cartão
O código FEFCO/ASSCO apresenta a classificação das características princi-
canelado pais do cartão canelado para caixas e dos seus formatos. Os cartões são clas-
sificados em três classes de acordo com os valores de resistência ao rebenta-
mento, à perfuração e à compressão. Os formatos de caixas de cartão canelado
são muito diversificados, desde os formatos simples de caixas obtidas por
corte e vincagem, até às caixas de recortes.

TIPO DE ONDA A B C D A construção mais popular é a correspondente ao código 0201 da FEFCO, cor-
rentemente designada por caixa americana ou caixa de abas (Figura 19a).
Nº de ondas / m 110 154 128 315 Esta caixa é a de construção mais simples e a mais económica em termos de
Tabela 1: Altura de onda, mm 4.7 2.5 3.6 1.1 uso do cartão canelado (área de cartão por unidade de volume da caixa). No
Características das
caneluras do cartão Empilhamento MB M B F entanto, para produtos hortofrutícolas, o estilo mais correntemente usado é
MB - muito bom;
Impressão F B M MB o 077 que corresponde a tabuleiros prontos a serem montados (Figura 19b).
B - bom; Corte F B M MB
M - médio;
F - fraco.
Perfuração B M MB F
a) b)
Vinco/dobragem F B M MB
Acolchoamento MB M B F
Esmagamento F B M M Figura 19:
Códigos e formatos
FEFCO

a)
As caneluras ou ondulados têm perfis diferentes (largo - A, fino - B, médio - C Caixas de abas
b)
ou microcanelura - D), de acordo com as características de resistência que a Tabuleiros
caixa deve ter (Tabela 1). A onda tipo A é usada para máximo acolchoamen-
to e boa resistência ao empilhamento, a onda tipo B é usada para situações
onde uma superfície de impressão lisa e uma boa resistência ao esmagamen-
to plano são desejáveis, e a onda tipo C satisfaz o compromisso entre as pro-
priedades das ondas tipo A e tipo B, sendo a mais correntemente usada. A As características a especificar para os cartões são:
onda tipo E permite o fabrico de caixas comparáveis às de cartão compacto - o tipo de canelura (dupla ou simples, C, B, etc.)
ou cartolina, sendo usada em aplicações onde não é necessária uma grande - o tipo de papel (a gramagem, o teor de reciclado, branqueado ou não)
resistência mecânica e onde a qualidade de impressão é importante. A maior - a absorção de água do cartão canelado (ensaio de Cobb)
parte das caixas são em cartão simples de canelura tipo C mas, para caixas - o valor de compressão em coluna (ou ECT) do cartão canelado
de maior capacidade, é usado o cartão duplo com caneluras A-B, A-C ou B-C - o valor de resistência ao rebentamento (ou Mullen) do cartão canelado.

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As características da caixa devem ainda incluir o tipo de revestimento, como SISTEMAS DE EMBALAGEM NO MERCADO PORTUGUÊS
cera ou polietileno, o tipo de junta (agrafada ou colada) e o tipo de construção:
além do estilo propriamente dito, o número, o tamanho, a forma e a posição Nesta secção são feitas algumas considerações sobre os sistemas de emba-
das aberturas de ventilação devem ser especificados. As aberturas de venti- lagem de alguns hortofrutícolas, em particular para o morango, kiwi, pêssego,
lação devem ser sempre que possível verticais e não horizontais, uma vez que tomate e alface.
para a mesma área de abertura, a sua posição vertical implica um prejuízo
menor para a resistência da caixa. Pela mesma razão, as aberturas não devem,
em princípio, ser colocadas junto às arestas e a sua localização deve ser ade- Morango
quada ao tipo de empilhamento na palete. A Figura 20 mostra a utilização de
uma caixa de cartão canelado de estilo telescópico (com tampa ou fundo sepa- De forma a evitar o manuseamento do produto que prejudica fortemente a sua
rado) para tomate. É ilustrada a localização das aberturas de ventilação e o conservação, o morango é colhido directamente para a embalagem que pode
tipo de empilhamento. ser destinada a venda a granel ou em unidades. No caso da venda a granel são
utilizados tabuleiros plásticos (Figura 21a) e no caso da venda em unidades
são usados godés plásticos acondicionados por sua vez em tabuleiros de cartão
canelado ou de plástico (Figura 21b). A embalagem deve proteger o produto
contra danos mecânicos durante o transporte e a distribuição e permitir o
Figura 20: pré-arrefecimento rápido do produto já que este é feito após acondiciona-
Caixa estilo telescópico
para tomate mento por ar forçado com atomização de água.

a) b)

Figura 21:
Embalagem para
morango

Sacos a)
a granel
Os materiais usados para sacos podem ser à base de fibras naturais como juta, b)
sisal e algodão, ou em tela ou rede sintética de polipropileno. As vantagens em godés

da utilização dos sacos residem no baixo preço e no facto de apresentarem


um rácio peso/volume também baixo o que reduz os custos de transporte. No
entanto, este sistema de embalagem oferece pouca protecção contra danos por
perfurações, compressão, vibração e impacto e oferecem alguma dificuldade Particular atenção deve ser dada às perfurações dos godés para ventilação. A
para empilhamento estável. Geralmente os sacos são usados para produtos Figura 22 ilustra dois tipos de godés com perfurações em diferentes localiza-
com elevada dureza e por isso mais resistentes aos danos mecânicos como ções. A localização das perfurações na tampa e fundo dos godés (Figura 22a)
batatas, cenouras e cebolas. e o empilhamento dos tabuleiros contendo os godés diminuem a eficiência do
arrefecimento por ar forçado na direcção horizontal que é normalmente uti-

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lizada. O sistema de perfurações nas arestas dos godés (Figura 22b) é assim A comparação entre a caixa plástica e a caixa de cartão canelado revela que
reconhecido como mais eficiente. a última apresenta melhor resistência à compressão. Adicionalmente tem a
possibilidade de impressão, mas não possui aberturas para ventilação. A mon-
a) b) tagem da caixa é feita por colagem apresentando na superfície interna uma
das abas que pela espessura do cartão poderá, em condições determinadas,
Figura 22:
Perfurações em godés
danificar o produto.
para morango

Para kiwi de menor calibre e para quantidades pequenas é corrente encon-


trar bandejas plásticas com rede sintética, em que é usado um tabuleiro de
cartão para agrupamento.
No caso dos godés que, em vez de tampa de encaixar, são envolvidos com
filme extensível, este problema não se coloca já que o filme é aplicado após
o pré-arrefecimento. No entanto, estes godés apresentam frequentemente a
ocorrência de condensação de humidade sob o filme fruto das oscilações de
Figura 24:
temperatura durante o transporte. Embalagens individuais
de kiwi

Kiwi

O kiwi é armazenado nos contentores plásticos de grande capacidade em que


é transportado do campo para o armazém, sendo calibrado e acondicionado
nas embalagens de distribuição e venda em função das encomendas. A embala-
gem desempenha assim funções de protecção físico-mecânica durante a dis- Encontram-se no mercado sistemas alternativos para venda a granel, como
tribuição servindo também como embalagem de exposição no ponto de venda. a caixa de cartão com liner (saco) de polietileno, para kiwi importado
Para venda a granel, são usadas caixas plásticas de 10kg de capacidade. O tabu- (Figura 25).
leiro de cartão canelado é preterido por razões de ordem económica e pela
sua menor resistência mecânica, sendo usado apenas esporadicamente.

Figura 25:
Sistema de embalagem
Figura 23: de kiwi a granel
Caixa plástica
para kiwi

12
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Pêssego Tomate

O pêssego é armazenado nas caixas plásticas de maior capacidade usadas O tomate é calibrado e acondicionado nas embalagens de distribuição e de
na colheita nas quais é transportado do campo para o armazém, sendo cali- exposição logo após a sua recepção. A embalagem desempenha assim
brado e acondicionado nas embalagens de distribuição e venda em função funções de protecção físico-mecânica durante a distribuição servindo tam-
das encomendas. A embalagem desempenha funções de protecção físico- bém como embalagem de exposição no ponto de venda. São usados tabu-
mecânica durante a distribuição servindo também como embalagem de leiros plásticos com alvéolos também de plástico para acolchoamento.
exposição no ponto de venda. São usados tabuleiros de cartão canelado com
alvéolos de plástico para acolchoamento.

Figura 28:
Tabuleiros de cartão
Figura 26: para tomate
Linha de calibração
e acondicionamento
do pêssego

Cortesia de
C.A.F. Cova da Beira

Os principais problemas com a embalagem do tomate colocam-se a nível da


protecção mecânica, principalmente na caixa de colheita. O tabuleiro de
distribuição e venda a granel, apresenta boa resistência à compressão, super-
fície interna lisa e sem arestas que poderiam danificar o produto (o que já
Figura 27: não acontece com a caixa de colheita), aberturas laterais como pegas e aber-
Tabuleiros de cartão
para pêssego
turas para arejamento laterais e nos topos. As aberturas existentes no fundo
dos tabuleiros são irrelevantes dado ficarem cobertas com os alvéolos de
acolchoamento. Estes podem ser em polipropileno ou em poliestireno, azuis
ou brancos. Os brancos, menos frequentes, melhoram consideravelmente a
apresentação do tomate.

O principal problema coloca-se a nível dos danos mecânicos sofridos pelo São também usados outros sistemas, como o tabuleiro de cartão canelado
produto durante a distribuição e o transporte. Os alvéolos plásticos consti- (em substituição do tabuleiro plástico), que permite o recurso à impressão,
tuindo a opção mais económica, não oferecem a melhor protecção e adi- e as embalagens de pequena capacidade, normalmente constituídas por uma
cionalmente conduzem à ocorrência de condensação de humidade fruto da bandeja de poliestireno expandido, ou de polpa moldada, com filme exten-
transpiração do produto associada a oscilações de temperatura. sível.

13
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Alface EMBALAGEM COM ATMOSFERA MODIFICADA

A alface é seleccionada e colhida directamente para a caixa de transporte e dis- A embalagem com atmosfera modificada baseia-se na criação e/ou
tribuição. A embalagem funciona assim como embalagem de campo e de exposição manutenção de uma atmosfera mais pobre em oxigénio e mais rica em dióxi-
para venda. Em alguns casos, depois de acondicionada a alface é mergulhada em do de carbono, o que reduz a taxa respiratória do produto, com o benefício
água, pelo que a embalagem deve ser adequada a este processo de lavagem. de retardar a sua senescência e assim aumentar o seu tempo de vida útil.
Em alguns casos, o efeito da atmosfera na redução da velocidade de reacções
São usadas caixas plásticas e em alguns casos caixas de madeira. As caixas oxidativas é também importante.
plásticas apresentam elevada resistência à compressão e a superfície é lisa,
sem arestas que poderiam danificar o produto. A embalagem com atmosfera modificada pode ser “passiva” ou “activa”. No
A caixa possui duas aberturas laterais como pegas e possui aberturas laterais primeiro caso, a modificação da atmosfera resulta da combinação de dois
e no fundo. Estas últimas permitem o escoamento das águas de lavagem. No processos naturais: a respiração do produto e a transferência de gases
entanto, no caso de empilhamento o escorrido passa ao produto da caixa do através da embalagem (Figura 31). Os níveis de dióxido de carbono e de
nível inferior. De uma forma geral, a embalagem não permite uma apresen- oxigénio vão, respectivamente, aumentando e diminuindo após o acondi-
tação do produto cuidada no ponto de venda (destina-se a venda a granel). cionamento do produto, como resultado do balanço entre a taxa de respi-
ração do produto e a taxa de transferência destes gases através da embala-
gem. Deste modo existe um período transiente, durante o qual a atmosfera
na embalagem não é a mais adequada para o produto. No caso da embala-
Figura 29:
Caixa plástica
gem activa, no momento do acondicionamento a atmosfera normal é subs-
para alface tituída por uma mistura de gases correspondente à atmosfera recomenda-
da, tendo a embalagem apenas o papel de conservar esta atmosfera. A
atmosfera modificada activa contribui assim para um maior tempo de vida
útil do produto, mas tem a desvantagem de ser um processo bastante mais
A tendência para uma apresentação mais cuidada do produto e a mini- oneroso.
mização do manuseamento pelo consumidor para redução de perdas, tem
levado ao aparecimento de embalagens individuais (para cada pé de alface)
em filmes plásticos. Os sacos, apesar de abertos, evitam também em certa
medida a perda de água do produto . O2
Figura 31:
Trocas gasosas em
embalagens com
Figura 30: atmosfera modificada
Saco plástico para
pés de alface
CO2

Cortesia de Cortesia de
Andreas Hitzinger Ges. m.b.H. Danisco Flexible P-Plus

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Em geral a atmosfera modificada aplica-se a produtos de maior valor acres- RESPIRAÇÃO DE PRODUTOS HORTOFRUTÍCOLAS FRESCOS
centado ou cujo tempo de vida útil necessite de ser aumentado, como acon-
tece por exemplo no caso da exportação de produtos altamente perecíveis, A respiração de produtos hortofrutícolas é um processo metabólico que
como o morango. Outro caso de interesse corresponde aos produtos fornece energia aos processos bioquímicos de manutenção da organização
hortofrutícolas frescos cortados. A Figura 32 mostra a aplicação de atmos- celular e da integridade das membranas. Vários compostos reactivos são for-
fera modificada para o transporte de morangos. O sistema de embalagem é mados durante a respiração. A respiração aeróbica (para efeitos de simpli-
constituído por godés plásticos agrupados em tabuleiros de cartão canela- ficação o termo respiração será usado para descrever a respiração aeróbi-
do. As paletes são, por sua vez, envolvidas por plástico onde a mistura de ca) consiste na quebra oxidativa de reservas orgânicas em moléculas mais
gases é injectada. simples, incluindo dióxido de carbono e água, com libertação de energia. Os
substratos usados no processo podem ser carbohidratos, lípidos e ácidos
Figura 32: orgânicos. No caso de o substrato ser um carbohidrato, a respiração é nor-
Acondicionamento
de morangos com
malmente descrita pela equação 1:
atmosfera modificada

a)
Godés em tabuleiros (1) C 6H 12O 6+6O 2 =>6H 2O+6CO 2+686Kcal
de cartão canelado

Esta equação pressupõe que uma molécula de dióxido de carbono é gerada


por cada molécula de oxigénio que é consumida. A razão entre a quantidade
de dióxido de carbono produzido e a quantidade de oxigénio consumido é
designada por quociente respiratório (QR). No caso da reacção descrita pela
b) equação 1, este quociente tem um valor unitário. Este valor ocorre quando
Envolvimento das
paletes com plástico o substrato usado no processo metabólico é um carbohidrato e existe
oxigénio em excesso. No entanto, cada produto sofre diferentes tipos de
reacções e, por isso, muitas vezes este parâmetro poder ser inferior ou supe-
rior a um. Os valores publicados em literatura variam entre 0.7 e 1.3, para
condições aeróbicas. Um valor inferior a 1 indicia que o substrato usado é
um lípido, enquanto que valores superiores a 1 ocorrem quando o substra-
to é um ácido orgânico. Em condições anaeróbicas o QR é superior a 1,
mesmo quando o substrato é um carbohidrato. Valores muito superiores a 1
c)
Injecção da mistura alertam para a ocorrência de respiração anaeróbica. No projecto de emba-
de gases lagem com atmosfera modificada, em regra é assumido um valor unitário de
QR, o que é razoável para uma grande parte de produtos quando armazena-
dos em condições de refrigeração.

15
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Factores que afectam a taxa respiratória Modelagem matemática do efeito da composição


da atmosfera e da temperatura
As taxas de respiração dependem de factores endógenos e exógenos. Os
primeiros incluem o tipo de produto, a variedade, as condições de produção A variabilidade experimental, a complexidade do processo e o tempo
e a maturidade. Em geral a taxa respiratória decresce com a maturidade, necessário à sua determinação, têm sido factores limitativos no desen-
embora aumente quando o produto se começa a degradar. Os produtos cli- volvimento de modelos que descrevam a dependência da taxa respiratória
matéricos apresentam um pico de respiração, associado ao amadurecimen- de factores relevantes, tais como a temperatura ou a composição atmos-
to e produção de etileno. Os factores exógenos incluem a temperatura, a férica. Por isso, em termos de projecto de embalagem com atmosfera modi-
composição atmosférica, intensidade de luz, danos mecânicos, perda de água ficada é comum o uso de um valor constante de taxa de respiração, habi-
e degradação. tualmente determinado nas condições de temperatura e atmosfera
recomendadas para o produto. Tal é no entanto de certo modo um contra-
Em regra a taxa respiratória aumenta duas a três vezes por cada 10 0C de senso, uma vez que a embalagem com atmosfera modificada baseia-se exac-
aumento de temperatura, sendo esta variação normalmente descrita por tamente no facto de se poder controlar a taxa respiratória através da varia-
equações como a lei de Arrhenius. A energia de activação varia entre 40 e ção da composição da atmosfera. Alguns estudos reportam o efeito da
105 kJ/mol e depende da composição atmosférica, sendo normalmente mais temperatura ou da atmosfera, mas raramente incluem o efeito simultâneo
baixa para as atmosferas recomendadas para embalagem com atmosfera destes dois factores. Adicionalmente, normalmente é determinada apenas
modificada. Em condições extremas de temperatura, no entanto, este padrão a taxa de produção de dióxido de carbono ou a taxa de consumo de oxigénio,
pode ser alterado: a temperaturas elevadas pode ocorrer desnaturação enzi- o que impossibilita a determinação do quociente respiratório, essencial
mática e uma consequente diminuição da taxa respiratória; a temperaturas para o projecto das embalagens.
muito baixas os danos fisiológicos podem contribuir para um aumento da
taxa respiratória.

A taxa respiratória diminui com a diminuição de oxigénio na atmosfera,


enquanto que o efeito do dióxido de carbono em geral tem o efeito contrário, ATMOSFERAS RECOMENDADAS
embora o seu efeito dependa do tipo e maturidade de produto, da gama de
concentrações e do tempo de exposição. Por exemplo, elevados níveis de A composição da atmosfera deve ser seleccionada especificamente para
dióxido de carbono podem causar danos nos tecidos e deste modo induzir cada produto (depende do tipo de produto, variedade, origem, estação e
um aumento da taxa respiratória. No caso dos produtos cortados, os danos estado de maturidade) e condições ambientais (temperatura e concentração
mecânicos a que estão sujeitos conduzem a um aumento da taxa respiratória de gases).
relativamente à do produto intacto.
O dióxido de carbono, para além de intervir na respiração, é importante
devido à sua actividade bacteriostática e bactericida e à sua actividade con-
tra diversos organismos deteriorativos que crescem e se reproduzem a baixas
temperaturas. Este aspecto não é muito relevante no caso de produtos intac-
tos, mas é da maior importância para os produtos cortados. O oxigénio neces-

16
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sita sempre de estar presente, uma vez que inibe o crescimento de orga- 21

yCO2 (%)
20
nismos patogénicos anaeróbicos. Um sistema de embalagem com atmosfera
modificada convenientemente projectado deve reduzir a taxa respiratória do
< amora, mirtilo, framboesa,
morango, figo.
produto mas não eliminá-la por completo. Existe uma fronteira muito ténue
entre aumentar o tempo de vida útil do produto e criar uma atmosfera na 15

qual o produto pelo contrário se deteriora mais rapidamente. Este aspecto


é particularmente importante no caso de produtos cortados, devido à pos- Figura 33: manga
< cereja
Atmosferas
sibilidade de desenvolvimento de microorganismos patogénicos devido a

<
recomendadas para 10
condições de anaerobiose. Os organismos que se desenvolvem em condições alguns frutos ananás <
(às temperaturas
aeróbicas produzem sinais de decomposição sendo perceptíveis pelos con- recomendadas) < toranja
banana
sumidores, enquanto numa situação anaeróbica a degradação pode decorrer

<
5
e o produto estar impróprio para consumo sem que tal seja visível. kiwi,

Efectivamente já foram registados diversos casos de intoxicação alimentar


pêssego <
nectarina < laranja
provocada pelo consumo destes produtos. uva <

<
0 5 10 15 20 21
Vários investigadores determinaram os níveis de oxigénio e de dióxido de azeitona
yO2 (%)
carbono mais adequados para uma diversidade de produtos. As Figuras 33
e 34 mostram, respectivamente, as condições recomendadas para alguns
frutos e hortícolas intactos, enquanto que a Figura 35 mostra as atmosferas 21

yCO2 (%)
recomendadas para produtos cortados. Para cada produto existe uma 20

“janela” de concentrações de oxigénio e de dióxido de carbono que con-


tribuem para a manutenção da sua qualidade e o aumento do tempo de cogumelos

<
vida útil, sendo o teor de azoto o necessário para perfazer o balanço. 15
Analisando estas figuras pode-se concluir que em geral os produtos corta-
dos requerem níveis de dióxido de carbono mais elevados. Por exemplo, a Figura 34: brócolos milho
alface intacta basicamente não tolera a presença de dióxido de carbono, Atmosferas

<

<
recomendadas para 10
enquanto a alface cortada requer níveis entre 10 e 15%. Note-se no entan- alguns hortícolas
to que os frutos silvestres, mesmo quando intactos, requerem igualmente (às temperaturas
recomendadas)
concentrações de dióxido de carbono relativamente elevadas. É também de couve de
Bruxelas
<
registar que alguns produtos não beneficiam do uso de baixos níveis de 5

<

<
<
aipo
< couve
oxigénio, como acontece no caso dos espargos, e outros ainda não carecem coração espinafres espargos

de todo do uso de atmosfera modificada, como é o caso da cenoura, da ba- < tomate
couve
tata ou da melancia. flor < pepino
0
<

<

0 5 10 15 20 21
cebola alface yO2 (%)

17
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y CO 2 , % 21 da de produtos que requerem níveis de dióxido de carbono relativamente ele-


20
vados, como é o caso dos frutos silvestres e dos produtos cortados. No entan-
Couve < Cenoura cortada to novos materiais têm vindo a ser desenvolvidos para responder a esta
galega
cortada
Cebola cortada necessidade. Um exemplo são os filmes microperfurados e os filmes micro-

<
15 porosos, que apresentam rácios de permeabilidade próximos de 1. A Figura
< Couve cortada
Figura 35:
Alface
cortada
36 apresenta uma embalagem de salada pré-cortada acondicionada em saco
Laranja cortada
Atmosferas feito de polipropileno microperfurado. Está ainda em desenvolvimento um

<
recomendadas para
alguns produtos
Cenoura
descascada
10 sistema de embalagem que consiste no uso de macro-perfurações em embala-
hortofrutícolas Batata
descascada
gens impermeáveis a gases, que é particularmente adequado para a embala-
cortados
(às temperaturas
ou cortada
< Folhas gem de grandes quantidades de produto.
recomendadas) de espinafres
<

5
<

Brócolos Kiwi
cortados cortado

0
0 5 10 15 20 21
Figura 36:
Saco em polipropileno
yO2 ,%
microperfurado a laser

Cortesia de
Danisco Flexible P-Plus
MATERIAIS DE EMBALAGEM COM ATMOSFERA MODIFICADA

A embalagem com atmosfera modificada usa sobretudo materiais poliméri- A permeabilidade dos filmes aumenta com a temperatura e, empiricamente,
cos flexíveis. Estes materiais são diversificados na sua estrutura química e este efeito é normalmente descrito por uma equação tipo lei de Arrhenius.
apresentam diferentes propriedades, dependendo da sua composição, A energia de activação depende do polímero em questão e do gás, podendo
processo de fabrico e uso de aditivos. variar entre 30 a 70 kJ/mol. Normalmente os dados de permeabilidade
fornecidos pelos produtores de materiais de embalagem referem-se a tem-
Os materiais mais comuns em embalagem modificada são o polietileno (PE), peraturas na gama 20-25 0C, o que é necessário ter em atenção, uma vez que
o polipropileno (PP), e ainda combinações de diferentes polímeros por na generalidade os produtos são acondicionados a temperaturas mais baixas.
copolimerização, como é o caso do copolímero de etileno-acetato de vinilo É necessário ter ainda em consideração que danos mecânicos, tais como
(EVA), laminação ou co-extrusão. perfurações ou alongamento do filme, principalmente no caso de filmes
estiráveis, podem alterar drasticamente a sua permeabilidade.
As permeabilidades ao oxigénio e dióxido de carbono dos filmes poliméri-
cos disponíveis no mercado variam bastante. No entanto o rácio destas per- Presentemente estão em desenvolvimento filmes denominados de filmes de
meabilidades, designado por β, apresenta uma variabilidade muito menor. compensação, cujas permeabilidades aumentam com a temperatura, de
Para a maior parte dos polímeros β varia entre 3 e 6 (Tabela 2), o que repre- forma semelhante à variação da taxa respiratória com a temperatura.
senta sérias limitações no projecto de embalagens com atmosfera modifica-

18
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Deste modo, alterações nas taxas respiratórias causadas por flutuações de PROJECTO DE EMBALAGENS COM ATMOSFERA MODIFICADA
temperatura na cadeia de distribuição são compensadas pela alteração da
permeabilidade do filme, evitando-se situações de anaerobiose. Para além da selecção do filme ou material a usar, o projecto da embalagem
implica ainda a selecção da espessura do filme, da área da embalagem, do
Tabela 2: Permeabilidades e rácios de permeabilidades (a 10 0C) de alguns materiais usados para embalagem com
peso do produto a ser embalado e do volume livre na embalagem.
atmosfera modificada (Exama et al, 1993)
O modelo matemático
Permeabilidade No caso da embalagem de frutos ou legumes é necessário considerar que o
[cm3.µm/
β processo de respiração consome oxigénio e liberta dióxido de carbono. Nesta
(cm2.dia.atm)]
situação, a variação do número de moles de cada gás no interior da emba-
Material O2 CO2 lagem é condicionada não só pelas características da embalagem, mas tam-
Macro-perfurações 1.498x108 1.15x108 0.8
bém pela massa de produto, W, e pela velocidade de consumo ou de for-
mação do gás em questão, Ri. Para cada um dos gases, oxigénio e dióxido
Filme microporoso 2.32x106 2.32x106 1.0 de carbono, pode-se então escrever:
Polipropileno não orientado (CPP) 3.2 9.2 2.8

Polipropileno biorientado (OPP) 2.1 6.4 3.1 (2)


(p − pO2 ) − R O2 W
dn O 2 PO 2 A
= ext
O2
Polietileno de baixa densidade (LDPE) 6.7 22.3 3.3 dt Vm e
Polietileno teraftalato (PET) 0.1 0.4 3.4
dn CO 2 PCO 2 A
(p − p CO 2 ) + R CO 2 W
(3)
Nylon multi-camada laminado 0.1 0.4 3.5 = ext
CO 2
dt Vm e
Polietileno linear de baixa densidade (LLDPE) 15.7 61.1 3.9

Polietileno de baixa densidade (LDPE) com 12.1 53.8 4.4


Estas equações resultam de um balanço material a cada um dos gases. No
cerâmica
caso do oxigénio: a variação é igual ao transferido através da embalagem
Polietileno de alta densidade (HDPE) 0.1 0.6 4.7 menos o consumido no processo de respiração; no caso do dióxido de car-
bono, a variação é igual ao transferido através da embalagem mais o pro-
Poliestireno (PS) com cerâmica 7.1 38.4 5.4
duzido no processo de respiração. É admitido que a transferência através da
Copolímero etileno-acetato de vinilo (EVA) 10.1 60.0 5.9 embalagem segue a 2ª lei de Fick.
Policloreto de vinilo (PVC) 14 85.3 6.1

Borracha de silicone 680.9 4346.4 6.4 A selecção do material de embalagem


O tipo de filme a seleccionar é condicionado pela atmosfera que se quer
Polibutadieno (PB) 68.2 603.0 8.8
estabelecer no interior da embalagem. A composição da atmosfera no inte-

19
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rior da embalagem em estado estacionário, pieq , pode ser calculada a par- meabilidades. De facto, não se pode escolher um filme com base na sua per-
tir das equações 2 e 3, uma vez que nessa situação o termo do lado esquer- meabilidade apenas ao oxigénio ou ao dióxido de carbono, uma vez que é
do vale zero: necessário controlar simultaneamente a composição destes dois gases. A
equação 6 mostra que a relação entre as concentrações de CO2 e de O2 no
equilíbrio é linear, sendo o declive desta razão correspondente à razão entre
(4) R O2
O2 = pO2 −
p eq Vm φ
ext
o quociente de respiração e o rácio de permeabilidades do filme. Esta relação
PO 2 está ilustrada na Figura 37 para um QR unitário e para diversos materiais
poliméricos. Graficamente, é imediato verificar que o polietileno de baixa
R CO 2 densidade seria adequado, por exemplo, para embalar couve-coração ou cou-
CO 2 = p CO 2 +
p eq Vm φ
(5) ext

PCO 2 ves de Bruxelas, mas seria desadequado para tomate ou couve-flor. Filmes
micro-perfurados seriam um material adequado para cogumelos.
sendo φ = We A
21

yCO2 (%)
Da análise destas equações pode-se concluir que a atmosfera que se vai esta- 20
Filme micro-perfurado
belecer no interior da embalagem depende:
· da composição da atmosfera exterior (normalmente ar); cogumelos

<
· da taxa respiratória do produto em termos de consumo de oxigénio e 15
libertação de dióxido de carbono; Figura 37:
· da permeabilidade do filme ao oxigénio e ao dióxido de carbono; Exemplificação da
brócolos milho
selecção de materiais
· do factor φ, que engloba os efeitos da espessura do filme, da área super-

<

<
de embalagem para
produtos hortícolas (as 10
ficial da embalagem e da massa de produto. linhas representam a
equação 6 para poli-
etileno de baixa densi-
O efeito destas variáveis no projecto da embalagem pode no entanto ser me- dade e filmes micro-
couve de
Bruxelas
<
lhor ilustrado combinando-se as equações 4 e 5: perfurados) 5

<

<
<
aipo
< couve espargos
coração espinafres

< tomate
couve
(6)
(pO2 − peqO2 )
QR ext LDPE
flor < pepino
CO 2 = p CO 2 +
p eq ext
0
β
<

<
0 5 10 15 20 21
cebola alface yO2 (%)

sendo QR o quociente respiratório (QR = RCO2 /RO2 ) e


β o rácio de permeabilidades (β = PCO2 /PO2 ). A selecção do filme não pode no entanto basear-se apenas nos seus requi-
sitos em termos de rácio de permeabilidades, uma vez que há ainda a con-
Esta equação permite reduzir as varáveis de projecto para selecção do tipo siderar aspectos comerciais e um conjunto de outras propriedades do filme
de filme a usar na embalagem de um dado produto ao seu rácio de per- que pode condicionar o sucesso ou insucesso da embalagem. Os principais

20
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factores a considerar são os seguintes: Na generalidade dos casos, a taxa de respiração varia ao longo do tempo, devi-
· propriedades ópticas; do a eventuais flutuações de temperatura, a alterações do produto e à própria
· resistência mecânica; variação da composição atmosférica. A permeabilidade dos materiais poliméri-
· qualidade de impressão; cos em geral também varia com a temperatura. Nestas situações as equações
· integridade do sistema de fecho; 2 e 3 não têm muitas vezes solução analítica e têm de ser resolvidas numeri-
· custos. camente. Se no entanto consideramos que as taxas de respiração e a permea-
bilidade do filme se mantém constantes, estas equações podem ser facilmente
integradas. Assumindo que a lei dos gases perfeitos é aplicável:
A selecção da espessura do filme, da área superficial da
embalagem e da massa de produto
(7)
RT PO 2 A ext 
(p O 2 − p O 2 ) − R O 2 W
O facto de se seleccionar o filme adequado, de acordo com a metodologia dp O 2
descrita na secção anterior, não garante só por si que a atmosfera no inte- = 
dt V  Vm e 
rior da embalagem seja a recomendada. É necessário ainda escolher para
uma dada massa de produto a embalar, a área superficial da embalagem e
RT PCO 2 A ext 
(8)
(p CO 2 − p CO 2 ) + R CO 2 W
a espessura do filme, de modo a que composição da atmosfera em estado dp CO 2
= 
estacionário se encaixe na “janela “ de atmosferas recomendadas. De facto, dt V  Vm e 
estas três variáveis estão enquadradas no parâmetro φ, e por análise das
equações 4 e 5 pode-se verificar que aumentar φ (aumentar a massa do pro-
duto ou a espessura do filme ou diminuir a área superficial da embalagem) Integrando estas equações desde o tempo inicial, em que a pressão parcial
faz deslocar a composição da atmosfera ao longo da linha correspondente do gás no interior da embalagem é pio, obtém-se:
ao filme seleccionado no sentido do eixo de dióxido de carbono. Se tomar-
mos como exemplo a couve-coração e as couves de Bruxelas, os dois produ-
tos podem ser acondicionados em polietileno de baixa densidade, mas as cou- 
(9) PO 2 RTA
R O 2 Vm φ   PO 2 RTA 
+ p ext  1 − e− VVm e 
t t
ves de Bruxelas necessitam de níveis de dióxido de carbono mais elevados. p O 2 = p O0 2 e− VVm e
O2 − 
Assim, para uma mesma quantidade de produto e para a mesma área super-  PO 2   
ficial de embalagem, as couves de Bruxelas necessitam de um filme de maior
espessura que a couve-coração. 
(10)
PC O RTA
2 R CO 2 Vm φ   PC O RTA 
2

+ p ext  1 − e− VVm e 


t t
p CO 2 = p CO
0
e− VVm e
CO 2 +   
2
 PCO 2   
O efeito do volume livre
Outro aspecto importante a considerar no projecto da embalagem, é o tempo
necessário para a atmosfera no seu interior se aproximar razoavelmente do
seu valor de equilíbrio, que depende do volume livre, uma vez que se este Estas equações permitem estimar a variação da composição no interior da
tempo for muito longo o produto sofrerá deterioração antes da atmosfera embalagem e prever o tempo necessário para se atingir o estado esta-
atingir a composição recomendada. cionário, por exemplo estabelecendo a pressão final com uma margem de

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10% relativamente à composição de equilíbrio, uma vez que em rigor o esta- O efeito da variação de temperatura
do estacionário só é atingido ao fim de um tempo infinito: Quando uma embalagem é projectada para uma cadeia de distribuição em
que a temperatura sofre flutuações, o procedimento de projecto acima
descrito não é adequado. Neste caso as equações 7 e 8 devem ser integradas
numericamente, sendo necessária informação sobre a variação de tempe-
(11)  ext R O 2 Vm φ 
 p O 2 − p eq
O2 −  ratura e sobre a dependência da taxa respiratória e da permeabilidade do
VVm e  PO 2  filme com a temperatura.
t eq =− × ln 
O2
PO 2 RTA R O 2 Vm φ 
 p ext − p 0
− 
 2 O O
PO 2  Se a sensibilidade da permeabilidade do filme e da taxa de respiração à tem-

2

peratura for semelhante, o efeito global será desprezável e a embalagem


será adequada mesmo que o produto sofra flutuações de temperatura. No
(12)  ext R CO 2 Vm φ  entanto, na maior parte dos casos tal não acontece, a taxa respiratória tende
 p CO 2 − p eq
CO 2 + 
VVm e  PCO 2  a ser mais sensível à temperatura do que a permeabilidade dos filmes. No
t eq =− × ln 
CO 2
PCO 2 RTA R CO 2 Vm φ  entanto, à medida que a taxa respiratória aumenta, menos oxigénio está
 p ext 
 CO 2 − p CO 2 + P
0
 disponível, o que por sua vez diminui a taxa respiratória. Deste modo, existe
 CO 2  um efeito amortecedor devido à diminuição da concentração de oxigénio.

Como regra geral, quando uma embalagem é suposta estar sujeita a varia-
O tempo necessário para se atingir o estado estacionário depende assim: ções de temperatura, deve ser projectada para a temperatura mais elevada
· das características da embalagem (área superficial da embalagem, per- a que estiver sujeita, uma vez que a taxa de respiração será mais elevada a
meabilidade e espessura do filme); esta temperatura e a alteração da composição atmosférica será mais rápi-
· da taxa respiratória do produto; da. É nestas situações que as concentrações de gases podem atingir limites
· da massa de produto e do volume livre; inaceitáveis.
· da concentração de gases no exterior e no interior da embalagem no
equilíbrio.
Estratificação de gases
Na prática pode-se limitar o tempo necessário para se atingir o estado esta- Na generalidade as embalagens em atmosfera modificada são pequenas.
cionário através do volume livre na embalagem: quanto menor for este Nestes casos é razoável assumir que a temperatura não varia com a posição
volume mais rapidamente se atingirá o estado estacionário. No entanto e que não ocorre estratificação de gases. No entanto, no caso de embalagens
volumes muito pequenos conduzem a estratificação de gases e à ocorrên- de maior dimensão, a questão da uniformidade de temperatura e de con-
cia de zonas estagnadas, com eventual risco de anaerobiose. Se o tempo centração de gases não deve ser negligenciada. É possível a ocorrência de
necessário para a composição da atmosfera se aproximar da recomendada anaerobiose em algumas zonas, embora o resto da embalagem apresente
(por exemplo com uma margem de 10%) for demasiado, deve-se usar atmos- concentrações nos limites requeridos. Em geral este problema torna-se maior
fera modificada activa. quando o volume livre no interior da embalagem é pequeno.

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EXEMPLO PRÁTICO: Selecção do material de embalagem


PROJECTO DE EMBALAGEM PARA BRÓCOLOS CORTADOS O cálculo da taxa respiratória em termos de consumo de oxigénio e pro-
dução de dióxido de carbono, usando-se a equação 13 e os parâmetros
O objectivo desta secção é exemplificar o projecto de uma embalagem em sumariados na Tabela 3, permite concluir que o quociente respiratório é
atmosfera modificada para 0.5 Kg de brócolos cortados, usando-se sacos de aproximadamente constante e igual a 1.16. A Figura 38 ilustra a gama de
30 por 20 cm. atmosfera recomendada para brócolos cortados, bem como as linhas relati-
vas a diferentes materiais poliméricos, considerando QR=1.16. Por análise
deste gráfico, ou através da equação 6, é fácil verificar que o material mais
Dados adequado para este produto é o polietileno de baixa densidade (LDPE), que
A gama de temperatura óptima para brócolos cortados corresponde a 0 - apresenta um rácio de permeabilidades de 3.3. A 10 0C, a permeabilidade
50C e a composição atmosférica recomendada corresponde a uma pressão deste filme ao oxigénio e ao dióxido de carbono é de 6.7 e 22.3
parcial de 0.01 a 0.03 atm de oxigénio a 0.06 a 0.07 atm de dióxido de car- cm3.µm/(cm2.dia.atm). A energia de activação destas permeabilidades, é
bono. respectivamente de 40.1 e 38.4 kJ/mol, o que permite estimar que a 2 0C as
permeabilidades sejam de 4.08 e 13.6 cm3.µm/(cm2.dia.atm).
A 2 0C a taxa respiratória varia com a pressão parcial de oxigénio e dióxido
de carbono de acordo com a Equação 13 (tipo Michaelis–Menten com
inibição un-competitiva).
%O2

19

(13) αp O 2 17
R O 2 ,CO 2 =
 p 
λ + p O 2 1 + CO 2  15

 γu 
13
Figura 38:
Representação gráfica da
11
selecção do material
polimérico para embalar
Os parâmetros deste modelo, sendo a pressão parcial dos gases expressa em brócolos cortados 9
atmosferas e a taxa respiratória em mol/(Kg.dia), são os apresentados na ( representa as
OPP
composições 7
Tabela 3. correspondentes aos
valores limites de φ) LDPE
5 LLDPE
Parâmetros
3
Tabela 3: Gás α λ γu EVA
Parâmetros da equação de
Michaelis-Menten com inibição 1
un-competitiva para a taxa O2 274.5 2.5 26.8
respiratória de brócolos a 2 0C
1 3 5 7 9 11 13 15 17 19
CO2 205.5 1.6 21.2
%O2

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Selecção da espessura do filme o pico na concentração de dióxido de carbono teria passado despercebido
Através das equações 4 e 5, pode-se verificar que um valor de φ entre 0.0093 (Figura 39 d).
e 0.014 Kgµm/cm2 permitirá que a composição atmosférica no equilíbrio se
enquadre na “janela” do produto em questão. Sendo a área superficial de 0,22
0,2 a)
0,22
0,2 50 cm3 b)
100 cm3
1200 cm2 e a massa do produto a embalar 0.5 Kg, a espessura do filme deve- 0,18
0,16
50 cm3 0,18
0,16 150 cm3

rá estar compreendida entre 22 e 33 µm. Uma vez que a espessura do poli- 0,14 0,14

pCO2 (atm)
pO2 (atm)
0,12 100 cm3 0,12
0,1 150 cm3 0,1
etileno de baixa densidade disponível comercialmente varia entre 25 e 200 0,08 0,08

µm, tal valor é possível. No sentido de se aumentar a resistência da embala- 0,06


0,04
0,06
0,04
0,02 0,02
gem convém optar por uma espessura próxima do máximo obtido, pelo que 0 0

se poderá seleccionar uma espessura de 30 µm. Tal conduzirá a uma 0 2 4 6 8 10 12 14


Tempo (h)
16 18 20 22 24 0 2 4 6 8 10 12 14
Tempo (h)
16 18 20 22 24

pressão parcial de 0.023 atm para o oxigénio e de 0.069 atm para o dióxi-
0,22 0,22
do de carbono. 0,2 50 cm3
100 cm3 c) 0,2 d)
0,18 150 cm3 0,18 150 cm3
0,16 0,16 3
0,14 100 cm
0,14

pO2 (atm)

pCO2 (atm)
0,12 0,12 50 cm3
0,1 0,1
Análise do efeito do volume livre 0,08 0,08
0,06 0,06
Uma vez que a taxa respiratória varia com a composição atmosférica, con- 0,04
0,02
0,04
0,02
vém proceder à integração numérica das equações 2 e 3. A Figura 39 mostra 0 0
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24
os resultados obtidos para diferentes volumes livres, entre 50 e 150 cm3. Da Tempo (h) Tempo (h)

sua análise (Figura 39 a) pode-se verificar que mesmo com um volume livre Figura 39:
de 150 cm3, ao fim de 8 horas a concentração de oxigénio já baixou para Evolução do teor de oxigénio (a) e de dióxido de carbono (b) no interior de uma embalagem de polietileno de baixa densi-
dade, de 30 µm de espessura e 1 200 cm2 de área superficial, contendo 0.5 Kg de brócolos cortados (as linhas tracejadas
limites aceitáveis, o que é bastante razoável. No entanto, o dióxido de car- representam os limites de composição recomendados); Evolução dos mesmos gases (c) e (d) não considerando o efeito da
bono carece de mais tempo para estabilizar e é particularmente relevante composição atmosférica na taxa respiratória.

verificar a existência de um pico de concentração (Figura 39 b): após o


acondicionamento o dióxido de carbono é gerado a uma taxa maior do que
aquela a que é transferido registando-se uma acumulação no interior da
embalagem, mas progressivamente a taxa de respiração diminui e o gradi-
ente de transferência de massa aumenta, o que inverte o processo. O pro-
duto fica durante um período alargado exposto a teores de dióxido de car-
bono elevados que podem conduzir à sua deterioração. Deste modo, seria
aconselhável a utilização de atmosfera modificada activa.

É importante notar que se o projecto da embalagem tivesse sido feito com


base numa taxa respiratória constante e igual à que ocorre nas condições
de equilíbrio, o que é a prática habitual, ter-se-ia concluído que a estabi-
lização do oxigénio seria muito mais lenta (Figura 39 c) e particularmente

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NOMENCLATURA SIGLAS USADAS PARA OS MATERIAIS


DE EMBALAGEM PLÁSTICOS:
A área superficial da embalagem cm2

ci concentração molar do gás i no interior da embalagem mol/cm3


LDPE - polietileno de baixa densidade
ciext concentração molar do gás i no exterior da embalagem mol/cm3

Di coeficiente de difusão do gás i µm.cm/dia LLDPE - polietieleno de baixa densidade linear

e espessura do filme µm HDPE - polietileno de alta densidade


ni nº de moles do gás i mol
PP - polipropileno
Pi permeabilidade do filme ao gás i cm3.µm/
OPP - polipropileno orientado
(cm2.dia.atm)

pi pressão parcial do gás i no interior da embalagem atm


EVA - copolímero de etileno - acetato de vinilo

pi0 pressão parcial do gás i no interior da embalagem no atm PET - polietileno tereftalato
instante inicial PVC - policloreto de vinilo
pieq pressão parcial do gás i no interior da embalagem no atm
EPS - poliestireno expandido
equilíbrio

piext pressão parcial do gás i no exterior da embalagem atm


QR quociente respiratório adimensional
R constante dos gases perfeitos atm.cm3/(mol.K)
Ri taxa respiratória em termos do gás i mol/(Kg.dia)

Si solubilidade do gás i no filme cm3/( cm3.atm)

t tempo dia

tieq tempo necessário para se atingir o equilíbrio em dia

termos do gás i

T temperatura K

V volume livre na embalagem cm3

Vm volume molar cm3/mol

W massa de produto Kg

yi fracção volumétrica do gás i adimensional

α,λ, γυ constantes da equação 13

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