Você está na página 1de 72

Sumário

0. Sobre Bernardo Stamato


1. Passo a passo para se tornar um autor ou autora (Novo)
2. Como Melhorar sua Escrita Criativa
3. Ler para Escrever
4. Escrita Básica
5. Escrita de Contos
6. Como Estruturar a Narrativa
7. Como Criar Empatia pelos Personagens
8. Diálogos
9. Foco
10. Bloqueio Criativo (Revisado)
11. Envio de Originais
12. Parcerias Literárias

Próximos:
Como começar o enredo
Como desenvolver o enredo
Como abordar o abstrato na narrativa
Como desenvolver seu estilo narrativo
Como angariar leitores
Como descrever cenários imersivos
Escrita sucinta ou rebuscada
Como manter o leitor interessado ao longo do livro
Como lidar com personagens super-poderosos
Como saber se escrevo bem o suficiente
Como criar a geografia do cenário
Como criar as culturas do cenário
Como escrever em parceria e coautoria
Como escrever o livro por atos
Como escrever os capítulos do livro
Como escrever as cenas dos capítulos
Como escrever passagem de anos
Como escrever flashbacks
Como escrever vários cenários diferentes e entrelaçados
Jornada do herói
Jornada da heroína
Arquétipos dos personagens
0. Sobre Bernardo Stamato

No princípio, a nerdice

E quem apontar algum erro atribuível à minha ignorância não fará grande descoberta, pois não
posso dar a outrem garantias acerca do que escrevo, não estando sequer satisfeito comigo
mesmo. — Michel de Montaigne.

Como nasce um escritor? Certamente seria presunçoso da minha parte tentar responder a uma
pergunta tão elevada. Mas talvez eu possa lhe contar como eu me tornei um escritor. E já aviso
de antemão que também não há uma resposta precisa para tal assunto, por isso tentarei seguir
a ordem cronológica. Então, vou começar pelas minhas origens como um nerd: o videogame —
mais precisamente, o Nintendinho que herdei dos meus irmãos mais velhos.
Veja bem, eu sou nerd. E não sou pouco nerd, sou nerd até o osso. Tão nerd que escrevo
livros de Fantasia Sombria e, quando me questionei sobre minhas origens de escritor nerd, me
dei conta que meu jogo favorito do meu primeiro videogame foi Castlevania — o maior clássico
de Fantasia Sombria dos videogames. Hoje temos Dark Souls, Dragon Age, The Witcher, mas
na década de 80, Castlevania foi o auge do misto entre horror e aventura.
Eu lembro quando minha mãe me deu um cartucho com quatro jogos, Contra, California
Games, Castlevania e um último que eu não me lembro. De tudo que joguei naquele console —
e acredito que joguei bastante coisa —, Castlevania sempre foi meu favorito — apesar de eu
nunca ter chegado muito longe. Lembro do protagonista, Simon Belmont, chegando nos
portões do castelo, os gráficos e sons toscos, mas épicos, deixando claro o perigo que estava
pela frente. Em seguida, os jardins do castelo, com uma música menos suspense e mais
aventura, num cenário simples, que me permitia testar os controles sem me arriscar. Então a
primeira fase, com zumbis, morcegos e sahuagins me perseguindo e me cercando. Para
finalmente o primeiro chefe, um morcego gigante — que eu chamava simplesmente de
“morcegão”. Eu me senti a criança mais corajosa do planeta ao vencer todos esses desafios. A
cada nova fase, sentia o misto de medo e curiosidade, que me impulsionavam a seguir em
frente para derrotar o Drácula. Lógico que eu nunca consegui zerar esse jogo, ele é
infernalmente difícil. Mas fui longe, chegava até ao Monstro de Frankenstein.
Enfim, eu adorei esse jogo e ainda adoro a série como um todo. E é esse o tom de narrativa
que eu mais gosto numa ficção: não tão colorido quanto O Senhor dos Anéis ou Final Fantasy,
não tão visceral quanto It: A Coisa ou Sexta-Feira 13. O foco de Castlevania ainda é a ação,
mas uma ação menos frenética e mais cautelosa. Quer correr e estourar inimigos? Tem Mario,
Sonic e Mega Man. Quer sentir um frio no umbigo enquanto caça os monstros dentro de um
castelo mal-assombrado? Castlevania é um prato cheio. Lógico que Castlevania não foi o único
jogo que eu adorei no Nintendinho, tampouco o único jogo que me influenciou.
Lembro que Contra foi o primeiro jogo que eu zerei — lógico que foi com a ajuda do meu irmão.
Era um jogo de plataformas bem desafiador, como Castlevania, mas em vez de controlar um
guerreiro num castelo mal-assombrado, você controlava soldados ao estilo Rambo enfrentando
uma invasão alienígena. A jogabilidade era bem mais ágil e intensa e era bem mais divertido
jogar no multiplayer — algo que Castlevania não permitia. Acredito que Contra me influenciou
nessa pegada mais ação colaborativa. Eu ainda prefiro histórias em que vários personagens
fazem a diferença, do que apenas um único herói dando conta de todo o recado. Tanto que me
inspirei em Contra — e The Last of Us e Capitão América: O Primeiro Vingador — para
escrever o conto Cavaleiro Branco, que abre meu segundo livro, A Era do Abismo: Crônicas do
Éden. De onde saiu a ideia de um grupo de aventureiros explorando uma ilha misteriosa e
enfrentando invasores cósmicos? Contra + The Last of Us + Capitão América = O Cavaleiro
Branco.
Por último, mas não menos importante, Street Fighter 2 é uma das minhas principais
inspirações para escrever — acredite se quiser. E sim, o Nintendinho teve uma versão do
Street Fighter 2. Era muito tosco! Só dava para jogar com Ryu, Guile, Chun Li e Zangief e eu
nunca cheguei a zerar porque era muito difícil — mas passava horas no versus com meu irmão.
Minha mãe deve ter se arrependido de dar esse jogo para a gente, porque nosso tio tinha um
Mega Drive com o jogo de verdade e nós passamos a implorar um Mega Drive aos nossos pais
— que o meu avô acabou dando de aniversário para o meu irmão. Enquanto Castlevania foi
meu jogo favorito do Nintendinho, Super Street Fighter 2 foi o meu favorito do Mega Drive.
Enquanto Castlevania e Contra tinham poucas opções de personagens, Street Fighter já trazia
de cara quatro lutadores (e a versão de Mega Drive chegou ao total de dezesseis), o que é um
bom exemplo de pluralidade no elenco. E boa parte do elenco do meu primeiro livro veio de
Street Fighter. Sendo bem específico: Ryu, Ken, Chun Li, Guile e Rosa inspiraram Draco,
Gladius, Zhi Wu, Alberich e Rosa, respectivamente.
Dois dos meus jogos favoritos de todos os tempos também tiveram origens no Nintendinho,
mas eu só fui descobri-los na adolescência: Final Fantasy e The Legend of Zelda. Eu zerei o
primeiro Final Fantasy na versão de PSP e o primeiro Zelda num emulador de Nintendinho —
usando e abusando do “quick save”. Mas eu joguei essas versões mais por nostalgia e para
descobrir as origens de duas franquias que amo. Com certeza seus jogos não tão antigos,
como Final Fantasy 6 e Ocarina of Time, me influenciaram muito mais do que suas origens
arcaicas.
O Cavaleiro do Caos é outro conto que escrevi cheio de inspirações em videogames. O
começo é inspirado na primeira missão de Final Fantasy 1, quando heróis brotam sem nenhum
contexto num reino fantástico e partem para resgatar uma princesa. A Máscara da Verdade é
mistura da Majora’s Mask e Mask of Truth dos jogos The Legend of Zelda do Nintendo 64. O
Cavaleiro do Caos “despencando” — e um bocado da ideia da jornada dele — veio da franquia
Kingdom Hearts. A cena do flashback se inspirou na introdução do Final Fantasy X e o “ser
dourado” se inspirou no conceito de Weapons da franquia Final Fantasy num geral. E a
escadaria foi inspirada na introdução de Kingdom Hearts 2 — e o duelo da princesa no
videoclipe da música Die Another Day da Madonna. Como eu disse, sou nerd até o osso.
Bom, eu certamente não comecei a escrever por causa de nenhum desses jogos, mas foi com
eles que eu comecei a me tornar um nerd. E sinceramente acho mais do que natural que os
videogames influenciem tanto o meu livro. Os autores do passado não se inspiravam apenas
na literatura, com certeza o teatro e a música sempre dialogaram com a escrita fictícia.
Posteriormente, a televisão e o cinema passaram a influenciar também. E a geração atual de
escritores cresceu jogando videogame — como por exemplo Taran Matharu, bestseller britânico
que declara abertamente como Pokémon e Skyrim inspiraram sua série O Conjurador. O
brasileiro Raphael Draccon, diga-se de passagem, emula cenas de jogos em vários de seus
livros. Hoje em dia, cinema, videogame, histórias em quadrinhos, música, teatro e literatura
estão em diálogo constante, nenhum escritor se baseia unicamente na literatura para escrever.
E com certeza as gerações vindouras terão a internet, o smartphone, o Netflix, o YouTube e o
que mais surgir como referências.
Então digo seguramente que meu Nintendinho foi minha primeira nerdice e seus jogos foram a
minha primeira inspiração para contar histórias. Seja com a fantasia sombria de Castlevania, a
ação cooperativa de Contra ou a pluralidade de elenco do Street Fighter, a nerdice faz parte
essencial da minha vida, o que é no mínimo bastante divertido.

Da nerdice para a leitura

“Não devemos nos questionar porque algumas coisas nos acontecem e sim o que podemos
fazer com o tempo que nos é dado.” — J. R. R. Tolkien.

Videogame não forma escritores, apenas os livros têm esse poder. Diferente de muitos colegas
escritores, eu não fui uma criança leitora. Não devorei a biblioteca da escola, não desbravei
páginas e mais páginas, céus, eu detestava ler. Desculpa, mas minha vida de leitor não
começa como a maioria das outras.

Começando a ler

Minha vida de leitor começa — adivinhe só — nos videogames. Ao longo da infância e


adolescência, joguei muita coisa e criei gosto pelos RPGs eletrônicos, especialmente a série
Final Fantasy. Acontece que os videogames se inspiram muito em mitologia e literatura.
Dragões, fadas, demônios, a maioria das criaturas que matamos nos jogos tem origens na
mitologia. Sem falar nos jogos inspirados diretamente em literatura, como The Witcher, Metro
2033 e até O Guia do Mochileiro das Galáxias. Céus, existe até um MMORPG inspirado em
Jane Austen.
E como eu já conhecia bastante de videogames, comecei a reparar que várias criaturas dos
jogos apareciam em filmes, séries e animes que eu assistia. Lembro especificamente de
assistir Beowulf no cinema — era 2007, eu tinha 19 anos — e quando citam o monstro Grendel,
pensei na hora “conheço esse nome, vai dar ruim”. Adorei o filme e saí curioso para relembrar
onde tinha ouvido esse nome antes — a resposta foi Final Fantasy. Então pesquisei nomes de
outras criaturas, como Abadom, Quetzalcóatl, Shiva e descobri que muitas das criaturas que eu
conhecia através dos jogos vinham das mais diversas mitologias. Eu já tentava ler desde o
Ensino Médio, mas num ritmo bem insatisfatório — hoje sei que tenho déficit de atenção. Mas
foi nessa ocasião que minha fome por livros se intensificou.
Isso mesmo, só aos 19 anos. Daí em diante foi tudo muito rápido. Li tanto sobre Mitologia
Grega, que comecei a achar os livros repetitivos — não sou doutor no assunto, mas sei
bastante. Li também sobre Mitologia Nórdica, Celta, Iorubá e um pouco de cada continente do
nosso mundo. Depois comecei a ler Tolkien, o autor que influenciou praticamente toda a
literatura fantástica contemporânea. Mas o primeiro livro de literatura que adorei de verdade foi
O Inimigo do Mundo, do Leonel Caldela. Ainda aos 19 anos, escrevi meu primeiro conto, vou
contar em detalhes mais para frente.

Do Videogame para a Mitologia

O Livro de Ouro da Mitologia é uma leitura excelente sobre mitologia… grega. São várias
lendas, algumas famosas, outras nem tanto, mas é quase tudo — tipo ¾ — só sobre cultura
greco-romana. No finalzinho tem alguma coisa sobre mitologia nórdica e só. O título deveria ser
O Livro de Ouro da Mitologia Grega, mas se você quer uma leitura básica, divertida e simples
sobre esse assunto em específico, pode ir sem medo.
Curiosamente um dos melhores livros sobre mitologia que já li foi Divindades e Semideuses, do
D&D 3ª Edição, infelizmente fora de linha. O livro dá um excelente resumo sobre mitologia
grega, nórdica e egípcia, uma ótima leitura até para quem não é rpgista — é só ignorar as
estatísticas de jogo. Afinal, o Filhos do Éden: Universo Expandido do Eduardo Spohr também
inclui estatísticas de RPG e aposto que a maioria dos fãs do autor não joga, não é?
Outra ótima referência mitológica é a Enciclopédia de Mitologia de Marcelo Del Debbio. Esse
calhamaço parece um dicionário de heróis, entidades e deuses de inúmeras mitologias —
grega, nórdica, egípcia, iorubá, indígena, cristã, tudo. Por citar literalmente milhares de
personalidades, as informações são bem resumidas, mas com certeza norteiam o leitor e
podem ser o pontapé inicial para pesquisas mais complexas.
Acredito que toda essa leitura sobre mitologia me influenciou quando fiz questão de usar várias
fontes para criar o mundo do meu livro. Pesquisei mitologia grega, nórdica, japonesa, até
filipina para criar os personagens e as criaturas. Afinal, se um escritor é capaz de criar um
mundo fértil, é porque ele também buscou inspirações diversificadas.

Da Mitologia para a Literatura

Dando um passo para longe de mitologia e nos aproximando da literatura, lógico que eu não
quis ficar só em pesquisas e quis conhecer também as narrativas. Um dos primeiros livros que
eu li e adorei foi A Canção de Tróia, que narra a guerra entre Grécia e Tróia, mas de uma
perspectiva mais humana e menos fantástica. Os deuses são abstratos e as bestas lendárias
são apenas animais do nosso mundo real — como os pégasos, uma unidade de corcéis
exemplares. Cada capítulo é narrado por um herói diferente, a saga é contada desde as
intrigas diplomáticas que motivaram a guerra até a divisão dos espólios, e vários temas
polêmicos, como a religiosidade da época, a brutalidade da guerra e a homossexualidade dos
gregos, são tratados da forma como devem ser tratados: natural, espontânea, parte da nossa
história e da nossa natureza humana.
Gosto de livros que pegam lendas e mitos e trazem para um contexto histórico. Outro bom
exemplo disso é a trilogia Crônicas de Artur de Bernard Cornwell. Quando li o primeiro livro, O
Rei do Inverno, achei chato e cansativo e larguei antes da metade. Como eu tinha consciência
de que estava ainda desenvolvendo o hábito de ler, devolvi o livro para a estante e decidi
retomá-lo depois. E quando o fiz, adorei cada página.
Cornwell pegou os fatos comprovados sobre a história da Inglaterra e traduziu num romance
épico e visceral. Sacerdotes de religiões diferentes disputam sua fé, mas o leitor pode
interpretar como preferir: poderes místicos colidiram de fato ou foi apenas a crendice em ação?
Artur, Merlin, Morgana, Lancelot, cada um dos personagens arturianos é apresentado de forma
renovada e intrigantemente plausível. No fim do romance, Cornwell explica cada fato real que
narrou e cada licença poética que precisou tomar — principalmente para personagens
famosos, mas questionáveis, como Merlin e Lancelot.
Outro passo maior que a perna que dei nessa época foi tentar ler Contos Inacabados, de
ninguém menos que J. R. R. Tolkien. Diferente de O Rei do Inverno, eu li Contos Inacabados
até o final, não gostei e depois continuei não sendo fã da escrita de Tolkien. Gosto do mundo
que o Tolkien criou, mas não da narrativa dele. Contos Inacabados reunem rascunhos e
fragmentos que o Tolkien não concluiu, sendo uma leitura excelente para os fãs de O Senhor
dos Anéis e para quem quiser conhecer melhor como que um dos escritores mais famosos de
todos os tempos trabalhava, mas é uma leitura bem cansativa e me entediou bastante.
Através da leitura desses clássicos internacionais, comecei a descobrir o que gosto e o que
não gosto numa narrativa. Gostei dos múltiplos personagens e da naturalidade como certos
temas foram abordados n’A Canção de Tróia, gostei do mundo áspero e estoico que Bernard
Cornwell elaborou e não gostei da prolixidade de Tolkien.

Da Literatura Internacional para a Literatura Nacional

Foi nessa época que descobri meu gosto por literatura nacional. Eu não lembro qual livro li
primeiro, A Canção de Tróia ou O Inimigo do Mundo, mas com certeza esses foram os
primeiros livros que adorei. O Inimigo do Mundo, por sua vez, fica num lugar especial no meu
coração e Leonel Caldela é meu escritor favorito.
Eu já falei minha opinião sobre a Trilogia Tormenta em textos e vídeos pela internet, mas vale
falar um pouco sobre o elenco criado por Cadela e todo o mundo de Arton. Caldela é um belo
exemplo de como fazer personagens que parecem pessoas reais, de carne e osso, com suas
motivações, suas peculiaridades e seus defeitos e ele também soube explorar o cenário de
Tormenta, várias cidades, masmorras e desafios, cada um único a sua própria forma. Tormenta
é minha saga favorita e O Inimigo do Mundo é um livro de estreia épico em todos os sentidos.
Outro livro que adorei instantaneamente foi O Espadachim de Carvão do Affonso Solano.
Diferente da maioria, que segue arquétipos e mitos, Solano busca inspiração em obras
inusitadas e cria um mundo tão único, que os fãs se deleitam em debater se é uma fantasia ou
uma ficção científica. O Espadachim de Carvão é a aventura de um herói clássico num mundo
estranho e hostil, uma narrativa enérgica num universo singular, uma lufada de ar fresco para
os leitores acostumados a leituras tão repetitivas que temos por aí.
Depois de Caldela e Solano, decidi ler um certo livro que todo mundo estava falando, A Batalha
do Apocalipse. Eduardo Spohr fez um excelente trabalho em criar um universo baseado em
várias mitologias reais, mas sem medo de usar a própria interpretação e basicamente revirar
tudo de cabeça para baixo. A Batalha do Apocalipse é cheio de aventuras e batalhas cósmicas
e a sequência, a Trilogia Filhos do Éden, mostra como um autor pode evoluir em sua própria
jornada.
Caldela, Spohr e Solano são três dos melhores autores da atualidade. Você já deve ter ouvido
falar que muito se perde na tradução, e a vantagem de ler nacionais é que eles já falam no
nosso idioma. Impossível um livro traduzido ser tão espontâneo ou sarcástico quanto um
nacional, simplesmente porque o brasileiro já usa os maneirismos e os trejeitos do nosso dia a
dia. Sem falar que poder ir num evento e papear com um autor nacional é uma experiência
única, convenhamos.

Da Literatura para o RPG

RPG é um tema bem específico, muito possivelmente você que está lendo nem joga, mas o
hobby faz parte da minha vida de leitor, então falarei brevemente dos meus favoritos.
Já falei um bocado de Tormenta RPG, então não deve ser surpresa eu falar que é o meu
cenário favorito. Fantasia Medieval e Horror Cósmico, como não amar? Mas Tormenta é mais
do que isso, os livros falam de magia, de guerras, de piratas, ilhas pré-históricas, enfim,
Tormenta é o maior mundo fictício nacional, são décadas de publicações, dezenas de livros de
RPG, quatro romances, duas coletâneas de contos, vários mangás, um jogo digital… É muito
improvável que você não se apaixone por nenhuma dessas obras.
Ravenloft é a minha aventura de D&D favorita. A aventura Castelo Ravenloft é inspirada no
Conde Drácula, mas o reino de Baróvia e o antagonista Conde Strahd Von Zarovich são
apavorantes e apaixonantes ao mesmo tempo e o jogo apresenta variáveis que permitem que o
mesmo grupo jogue a aventura diversas vezes, sempre tendo experiências novas. A aventura
fez tanto sucesso, que Ravenloft se tornou um mundo inteiro, um cenário gótico onde o mal
sempre vence e você simplesmente nada contra a correnteza até seu inevitável fim trágico. Ler
sobre os Domínios do Medo com certeza me dá várias ideias divertidas para torturar e
assombrar meus personagens.
Dragon Age é o meu jogo favorito da atualidade e Dragon Age RPG é um dos melhores RPGs
de mesa dos últimos tempos. As regras são simples, dinâmicas e divertidas e os reinos, a
cosmologia e os personagens são fascinantes. Enquanto Tormenta puxa mais para o Horror
Cósmico e Ravenloft mergulha de cabeça no gótico, Dragon Age é um mundo medieval com
muitos dragões e demônios e poucas esperanças, sendo a Fantasia Sombria em seu primor.
Numenera foi o RPG que me pegou de surpresa. Ganhei o livro num concurso, comecei a ler e
viciei nesse calhamaço. O mundo é o equilíbrio perfeito entre Fantasia Medieval e Sci-fi: a
civilização é feudal, mas os reinos foram erguidos em cima de milhões de anos de tecnologias
perdidas, esperando para serem desenterradas e redescobertas. Não existe magia, existe itens
tecnológicos misteriosos e os aventureiros que fazem uso, sem nunca de fato compreendê-los.
Numenera, assim como Kurgala, é um mundo onde o divertido é explorar os mistérios sem
desvendá-los por completo. É impossível compreender as civilizações do passado e sua
tecnologia surreal. O que nos resta é usá-la a nosso favor e sobreviver aos monstros,
autômatos e alienígenas que agora dividem o nosso mundo.

Surpresas e frustrações como leitor


Também tiveram livros que me surpreenderam — no bom e no mau sentido. Eu imaginei que
iria adorar os livros inspirados nos videogames, mas nenhum está entre meus favoritos. World
of Warcraft, Diablo, God of War, Assassin’s Creed, todos são muito mais merchandise do que
uma boa leitura. Se você gostar de jogar e de ler, pode gostar de um desses livros, mas não
são boas leituras nem para conhecer esses jogos e nem para o jogador conhecer a literatura.
Por outro lado, torci o nariz para alguns livros, que adorei no final. Especialmente dois livros
nada a ver com o meu gosto individual. Philomena é um livro baseado em fatos reais, que
inspirou o filme homônimo, indicado a vários prêmios, como Oscar e Globo de Ouro. É a
história de uma mulher que foi obrigada a entregar o filho à adoção pela igreja irlandesa.
Depois de décadas, ela decide contratar um jornalista para investigar o paradeiro do filho
perdido. Enquanto o filme retrata a busca da mãe idosa, o livro foca na história do menino. É
trágico, é emocionante e é real, impossível não adorar.
O Livro de Julieta, por sua vez, é os relatos de uma mãe com sua filha com Síndrome de Down,
sua vivência, os desafios e a dificuldade de aceitar a própria criança. Numa página, você ri da
espontaneidade de Julieta, e na outra, você engole em seco com a inevitável amargura da
mãe, que batalha contra os próprios sentimentos de rejeição.
Eu li esses dois livros por obrigação e adorei ambos. Vida de leitor é assim, a gente se frustra
com livros que pareciam incríveis e se surpreende com leituras nada a ver com nosso perfil.

Vida de leitor

Falei muito e falei pouco ao mesmo tempo. Se eu falasse de cada autor que me influenciou,
como Stephen King, Kafka, Saramago, Renata Ventura, Raphael Draccon, André Vianco e
muitos outros, daria para escrever um livro por si só.
Vida de leitor é um caminho sem volta. Já li de tudo um muito, desde mitologia e fantasia, até
biografia e estudos acadêmicos. Acredito que leitura é a melhor forma de experimentar
histórias, pois abre espaço para a criatividade complementar a narrativa de forma que cinema e
videogame não permitem. Talvez esse tenha sido um dos motivos de eu ter me tornado
escritor.

Da leitura para a escrita

“Se você vai tentar, vá até o fim. Se não, nem ao menos comece.” – Charles Bukowski.

Decidir ser escritor é um divisor de águas na vida de uma pessoa. É um ato de bravura,
audácia e esperança. Por isso estou compartilhando com você o começo da minha carreira.
Acredito que cada pessoa tem sua própria jornada e é a singularidade de cada um que torna
sua história especial. Sendo assim, primeiro eu me tornei um nerd, depois eu me tornei um
leitor — um tanto tarde, confesso — e enfim eu decidi ser escritor. O ponto de virada foi um
telefonema que mudou a minha vida, mas vou começar pelo começo.
Eu tinha uns 21 anos e cursava História na UERJ quando a Devir Livraria lançou o concurso
cultural Eu, Criatura, onde cada participante poderia enviar até três contos ambientados no
Mundo das Trevas, sistema de RPG de terror. A principal regra era que o personagem-narrador
deveria ser uma criatura das trevas, um vampiro, lobisomem, mago etc. Eu nunca tinha escrito
ficção na minha vida, mas não tinha nada a perder e tentei a sorte.
Ao todo foram mais de cem contos inscritos de todos os estados do país e minhas chances
eram mínimas. Confesso que nem sequer havia jogado aquela edição do RPG, havia jogado
apenas o Vampiro: A Máscara anos antes. Céus, eu nem tinha nenhum livro dessa edição. Eu
peguei um livro emprestado de um amigo, li metade, escrevi um conto e enviei. Com certeza
haveria outros participantes com mais experiência tanto em escrita quanto no Mundo das
Trevas.
Escrever aquele conto foi uma experiência pitoresca. Lembro quando a ideia veio: eu estava
entrando no meu prédio tarde da noite, a luz do corredor começou a piscar e eu pensei “nossa,
esse é o cenário perfeito para uma cena de assassinato”. Subi no elevador e entrei no meu
apartamento com a cena na minha cabeça e o conto começou a surgir. Acho que foi minha
ideia mais genuína, porque ela não surgiu lendo um livro, jogando videogame ou vendo tevê.
Surgiu do nada, em um momento real, soturno e corriqueiro ao mesmo tempo. Depois disso, só
precisei fazer algumas adaptações — como decidir qual seria a criatura das trevas narradora —
e pronto, eu tinha a minha história.
Lembro também que havia planejado três contos, escrevi dois, mas um ficou grande demais
para os limites do concurso, não tive tempo de revisar por conta da faculdade, tive menos
tempo ainda para escrever um terceiro e acabei enviando só um. Lembro até de mandar o
e-mail, não receber confirmação, ficar paranoico achando que a internet estava com problema,
correr para a faculdade, tentar por lá e enviar o e-mail por mais de um servidor diferente até um
deles receber a confirmação. Depois me achei bobo pela preocupação, hoje agradeço por ter
sido tão precavido.
O tempo passou... e absolutamente nada aconteceu. O dia de anunciarem os vencedores veio
e foi, o site da Devir cricrilava e eu simplesmente assumi que não havia ganhado nada, como
era de se esperar. Até o dia que eu estava dormindo no ônibus a caminho da faculdade —
provavelmente de boca aberta e roncando — e meu telefone tocou. Estranhei o DDD de São
Paulo e atendi ainda sonolento.

— Alô...
— Alô, Bernardo? Aqui é a Zanini, da Devir, tudo bom?
Fiquei sóbrio na hora.
— Alô, oi! Tudo!
— Você participou do concurso cultural Eu, Criatura, né?
— Sim, participei.
— Você olhou o seu e-mail recentemente?
— Acho que sim, por quê?
— Então, Bernardo, você venceu o concurso.
— O quê?
— O concurso Eu, Criatura. Você é o Bernardo, né? Escreveu o conto Aberração na Coleira.
— Sim, sim, sou eu. Mas eu fiquei em segundo lugar? Terceiro?
Risos do outro lado da linha.
— Não, Bernardo. Você ficou em primeiro lugar.
Eu pirei.
Fiquei tão incrédulo que achei que era trote — o que arrancou mais risadas da Zanini. Cheguei
na faculdade, ignorei minha aula e corri para um computador para abrir meu e-mail e estava lá.
Primeiro lugar com o primeiro conto que escrevi na vida.
Contei para a minha namorada da época e decidimos matar aula para comemorar. Antes de ir
para casa, encontrei dois amigos, sendo um deles aquele que havia me emprestado o livro e
mostrei o e-mail para eles também. Nisso, minha mãe já estava me ligando, me dando bronca
porque estava tarde e eu tinha aula cedo dia seguinte. Cheguei em casa, ela queria conversar
comigo e eu peguei meu notebook enquanto ela me dava bronca. Quando ela terminou, eu já
estava com o e-mail do concurso aberto e mostrei para ela. Pronto, acabou a bronca, ela me
deu os parabéns e eu terminei o dia com minha mente em ebulição — acho que está em
ebulição até hoje.
Eu sempre tive uma vontade reprimida de escrever livros, mas repetia para mim mesmo que
era uma carreira muito arriscada e que não valia a pena. Tudo havia mudado naquele
momento: agora, era inegável que eu tinha algum potencial, então decidi arriscar. Decidi mudar
de carreira e ser escritor.
Vários blogues de RPG comentaram o concurso e eu conheci muita gente na época. Sou muito
agradecido à Zanini, em especial, por todo o nosso diálogo e por tudo que aprendi enquanto
revisávamos meu conto — reconheço que eu devia ter teimado menos com ela. Outras
pessoas foram — felizmente — passageiras, mas me mostraram o ecossistema do mercado
editorial brasileiro. Devo ter um certo pé atrás com e-zines até hoje por causa disso — e agora
planejo lançar uma e-zine, irônico, não?
De lá para cá, muita coisa aconteceu. Hoje, sou formado em Letras, pós-graduado em
Produção Textual, trabalhei com roteiros para YouTube e sou pai. O mercado editorial também
mudou, mas aprendi muito, aprimorei minha escrita, conheci pessoas, escrevi muitos contos, já
publiquei dois livros da saga A Era do Abismo e estou a caminho do meu primeiro livro de
Horror Psicológico, intitulado Pesadelos Através do Espelho.
E agradeço a você por ter lido até aqui. Seja você um leitor que teve a curiosidade de saber
como foi o começo de carreira de um autor brasileiro ou um escritor em busca de inspiração,
somos nós que mantemos a chama da cultura — e também do entretenimento — acesas.
1. Passo a passo para se tornar autor ou autora

Existe uma diferença enorme entre estudar e praticar. Quem nunca estudou arduamente e
sentiu que não estava chegando a lugar nenhum? Eu mesmo me senti assim quando decidi me
tornar escritor.
Eu decidi escrever contos e melhorar minha Escrita Criativa antes de escrever meu primeiro
romance, o que foi a melhor decisão que poderia ter tomado. Ainda assim, depois de escrever
um bom bocado de contos, senti que estava dando voltas em círculos e decidi que precisava
buscar algo mais substancial. Enfim eu comecei a escrever meu primeiro livro.
E mais uma vez eu me senti perdido. Mais uma vez eu precisei seguir com base em tentativa e
erro. Mais uma vez eu dei voltas em círculos até aprender e encontrar meu caminho.
Agora, estou aqui compartilhando algumas das lições mais valiosas que eu aprendi nessa
jornada para que você encontre o seu caminho sem precisar ter tantas incertezas e nem de
tantos tropeços quanto eu tive. A seguir, vou explicar um passo a passo eficiente para você se
tornar um escritor ou escritora.

O que não fazer

Explicar o que não deve ser feito é tão importante quanto explicar o que deve ser feito. No caso
da carreira de autores e autoras, esse é um ponto contraintuitivo. Não comece escrevendo seu
livro. Talvez você ache esse conselho até chocante, mas permita-me explicar melhor.
Se você quiser aprender a tocar um instrumento musical, vai subir no palco direto ou vai
estudar e ensaiar antes? Se você quiser aprender uma arte marcial, vai subir no ringue direto
ou vai praticar e treinar antes? Se você quiser escrever um livro, vai sair escrevendo sem
estudar e praticar ou vai se preparar melhor antes?
Ninguém quer fazer vexame no palco, ninguém quer levar nocaute no ringue, ninguém quer
publicar um livro mal escrito. Se fosse fácil, todo mundo seria bestseller, mas não é fácil. Não é
nada fácil.
Na verdade, o fato de você estar lendo esse artigo já lhe bota na frente da maioria! Enquanto
muitos saem escrevendo sem estudar e praticar primeiro, você tem a oportunidade de se
preparar melhor. E agora que já sabemos qual caminho não seguir, vamos dar os primeiros
passos na direção certa.

Gênero

Alguns autores já sabem o que querem escrever desde crianças, outros mudam de gênero com
a mesma frequência que trocam de roupa. Nesse caso, não existe uma escolha certa ou
errada, mas é importante compreender a escolha a ser tomada.
Se você já escolheu qual gênero vai escrever, ótimo! Se não, sem desespero, você pode
experimentar mais de um gênero antes de escolher um foco. Leia alguns livros, rabisque
alguns rascunhos, pense em algumas ideias e avalie qual opção faz o seu coração cantar. A
propósito, eu falei em detalhes sobre a escolha de gênero literário no artigo sobre Escrita
Fantástica, talvez você já tenha dado uma lida.
E se quiser mudar de escolha no meio do caminho, ótimo também! Agora é a hora de buscar
autoconhecimento, não de assinar qualquer pacto vitalício. Eu mesmo escrevia contos de
fantasia medieval e horror psicológico antes de escrever meu primeiro livro — de fantasia
medieval. Hoje, tenho dois livros de fantasia medieval publicados e um de horror psicológico
escrito. Escrever não é um casamento que dura até que a morte nos separe, está tudo bem em
pular a cerca entre gêneros.
Mas vai ter uma hora em que você vai ter que ter um foco. Escrita exige muito esforço e
dedicação, recomendo que você se dedique a um gênero específico para estudar e praticar e
que mantenha a escolha até publicar o livro. E depois você decide se vai escrever outro no
mesmo gênero e manter o foco ou se vai experimentar algo diferente. O importante é ter foco
enquanto estiver produzindo o próximo livro.

Leitura

Alguns autores mergulham na leitura do gênero enquanto escrevem, outros fogem do gênero.
Como já falei e não canso de repetir, não existe certo ou errado, existe compreender a sua
própria escolha.
As chances são altas de que você ainda tenha muito para ler sobre o gênero que escolheu.
Entre nacionais e estrangeiros, clássicos e contemporâneos, o que não falta é leitura para
inspirar e enriquecer a nossa Escrita Criativa. Eu falei bastante sobre o que ler e como ler no
artigo Ler para Escrever, então não vou me alongar nesse tópico.
E se você quiser ler apenas outros gêneros, sem problema também. Acho imprescindível estar
lendo, mas você decide o que ler.

Contos

Escolher o gênero e as leituras são etapas mais teóricas na formação dos escritores. Um bom
primeiro passo mais prático é a escrita de contos — outro assunto que já falei em detalhes aqui
no Compêndio de Escrita Criativa.
De forma sucinta: imagina que você escreve 50.000 palavras, fica um lixo e você precisa
começar do zero. Frustrante, não? E se você escrever 10 contos de 5.000 palavras cada?
Alguns vão ficar bons, outros nem tanto e você vai poder usar os melhores para seus trabalhos
a longo prazo. Bem mais produtivo do que arriscar descartar tudo, não é?
E você também pode avaliar com mais precisão os pontos fortes e fracos da sua escrita através
de narrativas curtas. Usando o exemplo anterior, encontrar erros entre 50.000 palavras é
procurar agulha no palheiro. Encontrar erros num conto de 5.000 palavras e depois passar para
o próximo é bem mais eficiente.
Sem falar que você está praticando e desenvolvendo sua voz e seu estilo de narrativa nesse
processo. Lembra da metáfora entre músicos antes de subir no palco e lutadores antes de subir
no ringue? A lógica é essa.

Feedback
Outra enorme vantagem de escrever contos é poder pedir feedbacks para seus amigos e nas
redes sociais. Ainda no exemplo, é improvável que alguém leia 50.000 palavras de um autor ou
autora estreante, mas um conto de 5.000 palavras é algo bem mais provável — e que pode
levar a pessoa a pedir mais depois.
Você pode publicar seus contos no Wattpad, num blogue pessoal ou enviar por email, o que
preferir. Quando pedir feedback, pergunte pelos pontos fortes que devem ser repetidos e pelos
pontos fracos que devem ser melhorados. Uma crítica apenas elogiosa faz bem para a
autoestima, mas não ajuda a melhorar nossa escrita. E uma crítica apenas destrutiva também
não acrescenta em nada, então só ignore. Sempre busque opiniões externas e filtre as críticas
que realmente vão agregar à sua carreira.
Durante esse processo, é possível que você forme uma relação de leitor ou leitora beta,
alguém que vai sempre ler seus textos e dar feedbacks enriquecedores. Nunca falei desse
assunto em texto, mas falei em vídeos no canal, caso queira saber mais.
O importante é buscar opiniões, de preferência de quem estiver disposto a apontar seus erros.

Mais contos e mais feedbacks

Escrever contos e receber feedbacks não é um estágio inicial da carreira dos autores e autoras.
É a nossa rotina. Como todos os artistas, estamos sempre praticando e melhorando. Como
disse Aristóteles, “a excelência, então, não é um ato, mas um hábito.”
Depois de escrever contos e receber o feedback, escreva mais contos e receba mais
feedbacks. E depois mais e mais.
Não é fácil.
Mas vale a pena.

Estudos

Só existe um problema com o feedback dos amigos e dos leitores beta: essas pessoas
geralmente são leigas. Suas opiniões vão ser pautadas mais em gostos pessoais do que
conhecimento ou experiência profissional. Com certeza a perspectiva de um leigo é válida, mas
é importante compreender que não é o bastante.
A melhor forma para aprender Escrita Criativa é cursos e oficinas de autores e autoras que já
têm experiência profissional. De preferência, cursos e oficinas que ofereçam aulas, exercícios e
feedback dos professores. Lembra o que falei sobre lutadores e músicos? Eles tiveram seus
treinadores e instrutores, não é? Mais uma vez a metáfora se aplica: se todas as artes são
ensinadas por profissionais, por que seria diferente com a Escrita Criativa?
Recomendo que você sempre se informe sobre a experiência de um professor antes de
ingressar num curso ou oficina. Leia seus contos e romances. Se não gostar da leitura,
provavelmente também não vai gostar da aula. E se o professor prometer ensinar sobre o
mercado editorial, confira sua experiência profissional também. Acredito que alguém que nunca
publicou um livro até possa escrever bem e ensinar a outras pessoas, mas não poderia ensinar
sobre mercado editorial sem ter experiência prática.
Autores investem entre R$ 1.000,00 à R$ 10.000,00 para publicar seus livros. Um curso de
Escrita Criativa geralmente custa entre R$ 200,00 à R$ 500,00. Faça as contas e me responda:
vale mais a pena investir na publicação do seu livro tendo uma boa bagagem de conhecimento
primeiro ou investir apenas na publicação e arriscar ter um livro mal escrito que vai frustrar
leitores e receber avaliações negativas na Amazon, no Skoob e nas redes sociais?
Citando mais um grande pensador: como disse Derek Bok, “se você acha que educação é
cara, experimente a ignorância”.

Mais contos e mais feedbacks de novo

Acredito que não preciso explicar mais uma vez a importância de estar sempre praticando e
sempre recebendo feedback. Caso não tenha ficado claro ainda, volte duas casas e releia o
tópico sobre mais contos e mais feedbacks.

Livro

Quantos contos você precisa escrever e quantos cursos e oficinas precisa estudar? Como tudo
sobre a Escrita Criativa, a única resposta certa é a sua. Escreva e estude até sentir que
encontrou sua voz narrativa, que calejou a mão e que chegou a hora de encarar uma jornada
mais longa e mais desafiadora. Escreva o seu livro.
No fim das contas, se tornar escritor ou escritora não é menos desafiador do que conquistar a
faixa preta numa arte marcial ou gravar um álbum musical inteiro. Todo artista precisa se
empenhar muito para alcançar os seus sonhos, a diferença é que já temos profissionais
ensinando todas as outras artes — como música, ilustração e escultura —, enquanto o ensino
de Escrita Criativa ainda é relativamente escasso.
Acredito que o ideal é intercalar entre a escrita de um capítulo do livro e de um conto para
manter os estudos e práticas em dia — ainda mais se você estiver publicando os contos na
internet, é melhor não sumir durante o longo período de escrita do livro. Ter pressa é a pior
coisa durante a Escrita Criativa, então leve o tempo que for necessário e dedique o máximo
dos seus esforços.
Como disse e repito: não é fácil, mas vale a pena.

Depois do livro

Publicar um livro pode ser muito empolgante ou muito frustrante.


Acredito que publicar um livro sem estar ciente de tudo que isso realmente significa é um risco
enorme. Algumas pessoas se frustram por ter seus livros rejeitados pelas editoras que tanto
sonham, se assustam quando veem o preço que as editoras cobram pela publicação e se
decepcionam quando publicam e percebem que vender o livro exige esforço e dedicação
hercúleos. Muitos desistem nesse caminho. E eu acredito que a melhor forma para não sofrer
isso tudo é se informando e conscientizando.
Antes de mais nada, conheça o mercado editorial e busque amadurecer como escritor ou
escritora através de cada etapa desse passo a passo. Isso vai melhorar a sua escrita e dar
mais confiança em si. Depois, prepare-se para uma jornada eterna que é a vida de autor ou
autora. Lembre-se que as dores passam. Mas o seu livro pode ficar para a eternidade.
E assim como nós terminamos de ler um livro e partimos para o próximo, também terminamos
de escrever um livro e partimos para o próximo.
Muita coisa se repete nessa jornada. Muita coisa se aprende. Muita coisa se reinventa.
Só os desafios no percurso são garantidos.
Então precisamos estar preparados para eles.
2. Como Melhorar sua Escrita Criativa

Ninguém nasce sabendo absolutamente nada — até para respirar, muitos precisam de um
tapinha. A gente estuda para aprender a ler e escrever, tanto quanto para aprender qualquer
arte, como música, pintura e escrita literária. Por mais que todo mundo aprenda redação na
escola, quase ninguém aprende a escrever diálogos, descrições, criação de personagens e
tudo mais que engloba o ofício de narrar histórias.
Vou falar uma verdade dura, mas necessária: gostar de ler não é o suficiente para escrever
bem. Eu adoro música e mesmo assim canto mal e não toco instrumento nenhum. Também
adoro animações e quadrinhos e ilustro mal. Se cantores e ilustradores precisam estudar e
praticar, por que seria diferente com escritores?
A boa notícia é que existem várias formas de melhorar a escrita criativa. No capítulo a seguir,
falarei sobre as principais opções para quem quer de fato narrar histórias interessantes para
seus leitores. Recomendo que você experimente cada uma delas ao menos uma vez e avalie
quais servem melhor para você.
Boa leitura e depois boas escritas.

Leitura

Leitura é praticamente o ar que os escritores e escritoras respiram. Tanto quanto qualquer


atleta e qualquer músico precisam dosar a respiração e o fôlego para exercer seus respectivos
ofícios, quem escreve não pode parar de ler.
Talvez você já tenha lido muito, talvez tenha lido pouco, o fato é que nunca vai parar de ler. A
leitura nos dá vocabulário, incrementa a nossa voz narrativa e inspira nossa mente a criar mais
histórias. Acredito que, mais importante do que tudo o que você já leu, é a compreensão de ler
como escritor ou escritora e o ritmo de leitura que você vai estabelecer daqui para frente.
Mas, porém, contudo, entretanto, todavia, não obstante precisamos de mais nutrientes além da
leitura, tanto quanto atletas e músicos precisa de mais do que fôlego. Eles precisam de um
bom condicionamento físico, de treino e de uma boa dieta. Nós precisamos praticar do nosso
jeito também.
Por isso acredito que seja de extrema importância que você esteja ciente das outras formas de
melhorar a sua escrita criativa. Como por exemplo...

Livros sobre escrita

Nada mais justo do que ler um livro sobre como escrever melhor. Se parar para pensar, é a
forma mais lógica de aprender escrita criativa. Inclusive, a quantidade de livros sobre o tema é
surpreendente.
Eu já li A Jornada do Escritor, de Christopher Vloger, Para Ler como Escritor, de Francine
Prose, Sobre a Escrita, de Stephen King, Como Narrar uma História e Como Escrever
Diálogos, de Silvia Adela Kohan. Os próximos da fila são Story, de Robert McKee e Os
Segredos da Criatividade, de Silvia Adela Kohan. E com certeza existem muitos outros que eu
desconheço agora, mas irei ler ainda.
Cada livro ensina algo diferente, de forma diferente, de um ponto de vista diferente. Acredito
que o mais valioso é justamente conhecer como cada autor ou autora enxerga a sua escrita
para avaliar o que podemos trazer de útil para nós mesmos e o que devemos descartar. Sem
falar que ler é sempre prazeroso, portanto ler sobre escrita criativa é um deleite.

Internet

Quando eu comecei a estudar escrita criativa, a internet era só mato. Hoje temos toneladas de
conteúdos de qualidade por toda parte e devemos usar isso ao nosso favor. Num mundo onde
podemos aprender de tudo através de tutoriais e videoaulas, uma excelente ideia é buscar
também por dicas de escrita criativa e mercado editorial.
Google, YouTube e blogues estão recheados de artigos e vídeos sobre como melhorar a leitura,
como escrever em gêneros específicos, como publicar um livro de forma independente e todo
um universo de conteúdos, além dos mais diversos serviços sendo prestados, desde leitura
crítica, registro na Biblioteca Nacional e publicação em si. A internet oferece de tudo, use isso
ao seu favor.
Também é válido pesquisar a carreira dos autores e autoras que você gosta. Pesquise
entrevistas, podcasts e sites pessoais para conhecer melhor a experiência e a trajetória dos
profissionais que vieram antes de você. Nada melhor do que aprender com quem admiramos.
Minha maior ressalva com a internet é que também tem todo tipo de gente falando de tudo,
inclusive gente desqualificada. Antes de seguir dicas que podem se basear em achismo,
confira o que os autores e autoras de fato já produziram e vivenciaram. Quer dica de escrita?
Leia os contos e romances dessa pessoa também. Quer dica de mercado editorial? Confira a
experiência profissional do autor ou autora. Se a teoria não for condizente com a prática, é
melhor só ignorar esse tipo desinformação.

Cursos e oficinas

Lembra o que eu falei sobre pesquisar a carreira dos autores e autoras? Quando a internet era
só mato, eu encontrei um podcast com o Leonel Caldela, onde ele falou sobre como aprendeu
com cursos e oficinas de escrita. E é lógico que eu imediatamente busquei por cursos e
oficinas na minha cidade.
E posso dizer que valeu muito a pena. Estudei com dezenas de escritores e escritoras mais
experientes do que eu, conheci inúmeros colegas de ofício e me forcei a praticar e a conhecer
novos pontos de vista. Isso tudo ajudou a calejar minhas mãos e a minha voz narrativa, me
preparando melhor para escrever meus livros.
E como a internet não é mais só mato, hoje temos cursos e oficinas online. As vantagens de
estudar escrita criativa à distância incluem continuar no conforto de casa, não precisar se
preocupar com horário e deslocamento, poder assistir a cada aula quantas vezes quiser e não
precisar estar na mesma cidade que o professor. Sem falar que o preço costuma ser menor do
que o de um curso presencial.
Como eu falei, se músicos e ilustradores precisam estudar pesado para aprenderem suas
respectivas artes, com a escrita criativa com certeza não é diferente.
Escrita

De vez em quando precisamos ouvir — e ler — obviedades. Então aqui está uma obviedade
fundamental: escreva! Músicos não vivem só de ouvir música. Ilustradores não vivem só de
apreciar ilustrações. Escritores e escritoras não vivem só de ler. Precisamos botar a mão na
massa.
A gente precisa escrever. Precisa superar a tela em branco. Precisa praticar e errar. Precisa
excluir, revisar e partir para o próximo texto. A teoria ajuda a prática, mas só a prática dá vida à
arte. Então escreva.
E a melhor hora de começar é agora.

Sua trajetória

Particularmente, eu pratico todas as 5 formas de como melhorar a escrita criativa citadas nesse
capítulo. Como todo ser humano, não tenho tempo e fôlego para fazer tudo isso todos os dias,
mas não me permito ficar tempo demais sem cada método que apresentei aqui.
O que importa é você compreender o seu estilo, encontrar o seu caminho e criar a sua própria
trajetória. Talvez todas as dicas que você leu possam servir para a sua carreira, talvez apenas
duas ou três vão lhe acompanhar a longo prazo. Meu dever aqui é explicar as ferramentas que
estão a sua disposição. Como e quando usar é por sua própria conta.
Agora que você teve uma boa leitura — e como eu sempre digo e nunca canso de repetir —,
boas escritas.
3. Ler para Escrever

Todo escritor foi um leitor antes de contar suas próprias histórias. Na verdade, todo escritor
ainda é e sempre será um leitor. Mas, da mesma forma como podemos aprimorar nossa escrita
criativa, também podemos aprimorar nossa leitura. O artigo a seguir apresenta dicas valiosas
para escritores tirarem o maior proveito possível de cada livro em suas estantes.

Sobre o que você já leu

Por onde começar? Com certeza fazemos essa mesma pergunta várias vezes ao longo da
vida. No caso da leitura, você provavelmente já começou, então compreender como as suas
leituras lhe influenciaram é um ótimo passo a dar em seguida. Particularmente, antes de
escrever meu primeiro livro, eu já havia lido Tolkien, King, Caldela, Spohr, entre outros. E você?
Quais livros, autores e autoras já leu e como eles influenciaram sua escrita até agora?
Liste seus livros, autores e autoras favoritos. Pode ser as leituras que marcaram sua infância,
adolescência, início da fase adulta, os tempos atuais, tudo. Se você já escreve contos ou está
focando em um livro, reflita sobre como essas leituras se manifestam na sua escrita. Para você
alcançar seus objetivos e ambições, primeiro você precisa compreender a si mesmo e aonde
você está nesse momento.
Depois de compreender como suas leituras já influenciam a sua escrita, pense em como você
deseja que elas de fato influenciem. Por exemplo, eu adoro o universo criado pelo Tolkien, mas
não sou fã das suas longas descrições sobre o mundo e o passado. E apesar de adorar a
escatologia e o sadismo do Caldela, não desejo narrar histórias tão sanguinolentas. Com
certeza seus autores e autoras favoritos têm pontos fortes e fracos e têm aspectos que você
gosta e desgosta. Filtre como cada um deles vai influenciar a sua carreira.
E filtre também quais livros dos seus autores e autoras favoritos você deseja que influenciem
sua escrita. Meu livro favorito do Spohr é Herdeiros de Atlântida e, por mais que eu adore todos
os outros, acho que a narrativa desse tem mais afinidade com o meu próprio estilo. Por outro
lado, as temáticas que King aborda não combinam com meus livros de fantasia medieval, mas
ainda posso criar personagens inspirados em Carrie e Pennywise, por exemplo. E você, quais
seus livros favoritos dos seus autores e autoras favoritos? Quais você deseja que influenciem
mais o seu estilo?
Depois de avaliar nossos livros favoritos, é inevitável lembrar de vários livros que ainda
desejamos ler. Então esse é a nossa próxima etapa: pensar nas nossas próximas leituras.

Sobre o que você precisa ler

Todos os autores com quem eu já tive contato me contaram que descobriram muitos outros
autores depois de publicarem seus livros. Curioso, não? Como fãs, pensamos que conhecemos
de tudo. Como autores, percebemos que ainda temos muito a conhecer. E novamente a
pergunta: por onde começar? Eu sempre digo que devemos ler tudo o que queremos e
exclusivamente o que queremos. Mas eu recomendo fortemente que você pense nas seguintes
opções.
Pesquise os livros consagrados mais influentes do gênero que você escreve. Quem são os
autores e autoras mais famosos do passado e da atualidade? Como eles influenciaram o
gênero e talvez toda a literatura? O que você pode aprender com eles? Afinal, eles não
conquistaram legiões de fãs e se tornaram consagrados à toa e ignorá-los seria abrir mão de
aprendizagens valiosas. É lógico que você não precisa gostar de nenhum livro só porque ele é
considerado consagrado, mas ao menos seria útil conhecer aquilo que você não quer replicar
na sua própria escrita.
Pesquise os livros contemporâneos mais influentes do gênero que você escreve. Quais autores
e autoras se destacaram nos últimos anos? O que o seu público anda lendo? Quais são as
tendências atuais? Qual foi a trajetória desses autores e autoras? Afinal, você também é um
autor ou autora contemporâneo, então nada mais justo do que você conhecer e contemplar
seus colegas. Ao ler livros contemporâneos, você se conecta com as tendências do gênero,
com o público atual e pode aprender com a experiência de quem está fazendo sucesso hoje.
Pesquise os livros internacionais mais influentes do gênero que você escreve. A maioria dos
gêneros faz sucesso no exterior primeiro e depois faz sucesso no Brasil. O que também quer
dizer que os leitores geralmente são introduzidos ao gênero através dos livros importados e só
depois descobrem os nacionais. Inclusive, é comum eu ouvir “nossa, que legal, um brasileiro
escrevendo fantasia épica, nem sabia que isso existia”. A influência dos livros internacionais é
inevitável e os benefícios de lê-los são praticamente os mesmos de ler os consagrados e os
contemporâneos — talvez a maioria dos livros consagrados e contemporâneos da sua lista já
são internacionais, não é mesmo?
Pesquise os livros nacionais mais influentes do gênero que você escreve. Talvez você mesmo
desconheça muitos livros nacionais do seu gênero tanto quanto a maioria dos leitores
desconhece. Depois de publicar o seu livro, você com certeza vai conhecer diversos autores e
autoras em redes sociais e eventos literários. Acredito que a maior vantagem de ler nacionais é
ter um contato direto com quem já conta suas histórias no nosso próprio idioma. Ler um autor
ou autora que usa nossos trejeitos e peculiaridades é uma experiência inigualável. E é essa
experiência que desejamos passar aos nossos leitores. Portanto a melhor forma de
aprendermos é com quem já escreve a mais tempo e conquistou o seu espaço no coração dos
leitores — como nós também queremos conquistar.
Recomendo que você liste ao menos um livro consagrado, um contemporâneo, um nacional e
um internacional e bote em prioridade na sua fila de leituras. Provavelmente você já tem vários
livros de algum desses grupos na sua estante, mas talvez não tenha nenhum de um ou mais
desses grupos. Dê uma pesquisada na internet, nas lojas virtuais e até nas redes sociais.
Tenho certeza que você ainda vai descobrir muita coisa interessante. Mas, se não descobrir,
não se esqueça que a regra de ouro ainda é “devemos ler tudo o que queremos e
exclusivamente o que queremos”.
E o que diferencia a leitura de um escritor da leitura de um fã? O que um leitor pode absorver
de útil e transmutar em aprendizado em cada livro? Como a resposta não é simples, vamos
partir para o próximo tópico.

Sobre como ler


Uma boa leitura oferece todo um conjunto de conteúdos férteis ao leitor. A gente absorve todo
esse conteúdo de forma consciente ou inconsciente — mas com certeza aprendemos muito
mais quando absorvemos de modo consciente. A seguir, vou citar os tipos de conteúdos que
absorvemos durante a leitura e que precisamos compreender de forma consciente para
assimilarmos à nossa própria escrita criativa.
Bons livros oferecem um bom vocabulário. Mas isso não quer dizer apenas usar palavras que
ninguém conhece. Bom vocabulário é usar tanto palavras simples quanto palavras sofisticadas
cada uma no momento certo. Quando você encontrar uma palavra interessante e desejar
acrescentá-la ao seu próprio vocabulário, anote-a e use-a na primeira oportunidade.
Além do vocabulário, cada autor também tem uma voz narrativa própria. Alguns conjugam o
verbo no pretérito, outros no presente, alguns usam muitos adjetivos, outros usam muitos
adjuntos adverbiais, alguns usam frases longas, outros usam frases curtas. Perceba o estilo de
cada autor e autora que você gosta e selecione como a voz narrativa de cada um vai inspirar a
sua própria voz narrativa.
As descrições fazem parte da voz narrativa, mas de uma forma específica. Alguns descrevem
personagens e cenários demais, outros quase não descrevem nada e todos desenvolvem um
estilo próprio. Como tudo a respeito da escrita criativa, não existe certo ou errado, existe o seu
jeito, o que funciona melhor para a sua proposta. Um bom exercício é folhear os primeiros
capítulos dos seus livros favoritos e reparar como diferentes protagonistas e diferentes mundo
são apresentados.
Eu não conheço nenhum leitor que não goste de diálogos. Em certos livros, os diálogos
parecem ser meramente dissertações e descrições com um travessão na frente. Mas nos bons
livros, os diálogos dão vida para à narrativa e fazem os personagens parecerem ser de carne e
osso, em vez de tinta e papel. De tudo que você pode observar num livro, eu fortemente
recomendo que você dê atenção especial para os livros com diálogos que lhe agradem.
Vocabulário, voz narrativa, descrições e diálogos são aspectos mais específicos, quase
técnicos da escrita criativa. Falando nos aspectos mais “orgânicos”, os personagens são o
elemento principal de toda história. Como eu sempre digo, o leitor primeiro se encanta com
Harry, Hermione e Rony e depois quer ir estudar em Hogwarts, da mesma forma que primeiro
admira Frodo, Aragorn e Gandalf e depois quer desbravar a Terra-Média. Compreenda por que
você adora seus personagens favoritos e pense bem no que os seus próprios personagens
oferecem de interessante para os seus leitores.
Não que Hogwarts, Terra-Média e demais mundos fantásticos não sejam um elemento
fundamental. Todos os leitores de Harry Potter têm uma casa favorita, como todos os leitores
de O Senhor dos Anéis têm uma raça e um reino favoritos. Compreenda o worldbuilding dos
seus cenários favoritos para você também criar cenários imersivos que vão fascinar seus
leitores.
Dando um olhar mais abrangente agora: como seus autores e autoras favoritos começam e
encerram os capítulos das suas sagas? O ritmo narrativo faz toda diferença no momento da
leitura e todos escritores e escritoras já tiveram dúvidas de como começar o capítulo, como
encerrar, quantas páginas deveria ter cada um, entre outras questões. Uma das respostas mais
simples e mais eficientes para isso tudo é: como os seus autores e autoras favoritos fazem?
Inspire-se neles e desenvolva o seu próprio ritmo narrativo.
Geralmente os livros são divididos em atos ou partes. É lógico que isso varia muito entre cada
autor ou autora. Livros mais sucintos geralmente não têm divisões além dos capítulos, mas
muitos livros se dividem entre dois, três, quatro ou mais atos. Para decidir como dividir o seu
livro, a pergunta é a mesma: como seus livros favoritos fizeram? Como você prefere, uma única
parte ou várias? Com certeza você deveria escrever da forma como você preferiria ler. Não
canso de repetir: não existe jeito certo ou errado, existe apenas o seu jeito.
Enfim, olhe para sua estante e observe os vários livros de um mesmo autor ou autora. Alguns
criam sagas quilométricas. Outros desbravam diferentes gêneros. Cada um tem a sua própria
jornada. Como foi a sua jornada como leitor através dos seus livros favoritos? E como eles vão
inspirar as jornadas que você vai oferecer para seus leitores. Imagine alguém como você
olhando a própria estante de livros, mas vendo os seus livros nela. Um dia, essa cena vai se
tornar realidade. Um livro de cada vez. Um ato de cada vez. Um capítulo de cada. Uma palavra
de cada vez.
No fim das contas, tudo isso vai servir de inspiração para a sua escrita, tanto num nível mais
específico quanto mais abrangente. Só não se esqueça que você é o dono ou dona da sua
inspiração, não o contrário. E o primeiro passo para conquistar a própria inspiração é
compreendendo melhor a própria leitura.
Por isso leia, leia muito e leia com atenção para que a inspiração se torne um fluxo constante
em sua mente.

Sobre como eu leio

Antes de mais nada: sempre leia do seu jeito. Na cadeira ou na cama, mantendo o livro perfeito
ou dobrando-o ao meio, sublinhando com caneta ou até rasgando as folhas, não interessa! Leia
do seu jeito! O valor real do livro está na experiência da leitura e não no objeto material em
suas mãos. O livro é seu, faça o que quiser com ele. Quer mantê-lo igualzinho como estava
quando comprou? Ótimo! Quer judiar do bichinho? Ótimo também! O que importa é a
experiência da leitura e o conteúdo que você absorve, nada mais.
Particularmente, eu gosto de ler sossegado. Às vezes com música, às vezes no silêncio, mas
sempre sossegado. Meu melhor horário é de madrugada ou de manhã, de preferência quando
boto algum vídeo para renderizar antes de enviá-lo para o YouTube. Leio muito em ônibus e
metrô também — por mais que não seja nada sossegado, é uma forma de aproveitar o tempo
da viagem. Eu não amasso ou dobro o livro, mas é comum ter uma mancha de café ou comida
que caiu entre uma página e outra.
Comecei a fazer releituras recentemente. Seleciono um livro que tenha me influenciado como
autor, pego uma caneta e vou relendo e sublinhando algumas palavras, frases e até
parágrafos. Observo em especial adjetivos para enriquecer meu vocabulário e descrições para
enriquecer minha narratologia. Sinto que aprendo o triplo numa releitura em comparação à
leitura inicial.
Meu foco é degustar o livro como um fã na primeira leitura e analisá-lo como um estudioso na
releitura. Com certeza ambas as experiências são prazerosas, mas gosto de separar meu foco
em cada momento. Acredito que seria prejudicial perder a experiência de apenas ler e apreciar
a jornada como um fã tanto quanto não buscar um análise mais minuciosa e aprofundada de
um profissional.
O que importa é você criar o seu próprio método e ler do seu jeito. Experimente ler gêneros
novos ou em momentos diferentes do dia, mas sempre buscando o que for melhor para você.
Conheça a si mesmo primeiro para então conhecer com ainda mais profundidade os livros das
suas próximas leituras.
4. Escrita Básica

Escrever um livro é uma tarefa árdua e complexa. Ouso dizer que a distância entre um
romance e uma redação básica é similar à distância entre estudar cálculo na faculdade e
aprender a somar e subtrair na escola. E tanto quanto um aluno precisa aprender contas
básicas antes de aprender cálculo, um escritor precisa praticar escrita básica antes de narrar
suas histórias.
Com certeza esse não é o assunto mais empolgante do mundo, mas é aqui que separamos as
crianças dos adultos e adultas. Gente grande sabe a importância de se dedicar ao máximo e
sempre buscar melhorar da mesma forma que um lutador faixa preta sabe a importância de
praticar os mesmos fundamentos que os faixas brancas — apesar da diferença de experiência
e compreensão do assunto —, enquanto faixas azuis e amarelas desprezam tais fundamentos.
Seja você um escritor ou escritora que ainda está começando a botar suas primeiras histórias
no papel ou se já tiver publicado um ou mais livros, esse artigo vai ser enriquecedor para você.

Como elaborar uma frase

Recentemente, eu li um livro com parágrafos muito longos e que se perdiam ao transitar entre
assuntos, resultando numa apresentação de ideias disforme e confusa. Uma solução para
aquele escritor em específico poderia simplesmente ser acrescentar pontos finais ao longo dos
parágrafos para que ele pudesse organizar melhor cada ideia. Ou seja, uma simples
elaboração de frases.
Para escrever um livro coerente e prazeroso, é necessário saber escrever parágrafos
coerentes e prazerosos. E para tal, é necessário escrever frases coerentes e prazerosas. Por
isso é importante praticar o simples e o básico primeiro.
Você já deve saber, mas não custa repetir. Uma frase é formada por sujeito, verbo e
complemento. Exemplo simples: o seu personagem favorito morre no final do livro. “O seu
personagem favorito” é o sujeito e “personagem” é o núcleo do sujeito. “Morre” é o verbo. “No
final do livro” é o complemento.
Perceba que não tem vírgula nessa frase. Não vou me alongar nesse tópico, então a dica é: só
inclua vírgula quando souber que ela é necessária. Na dúvida, não inclua vírgula. Geralmente a
vírgula é usada quando mudamos a ordem da frase. Exemplo: no final do livro, seu
personagem favorito morre — ou seu personagem favorito, no final do livro, morre. Recomendo
que pratique frases mais simples, seguindo a ordem de sujeito, verbo e complemento até sentir
que consegue expressar suas ideias com clareza seguindo essa lógica básica. Como tudo na
vida, a gente primeiro pratica o simples e depois avança para o mais complexo. Não dá para
fazer bife à parmegiana sem antes aprender um bom feijão com arroz, não é mesmo?
Falando em praticar, você provavelmente está achando tudo isso fácil demais, então sugiro que
pratique enquanto lê. Escolha um tema — que tal a sua opinião sobre seu livro favorito? — e
escreva uma frase simples. Em seguida, vamos transformar essa frase simples em um
parágrafo e por fim vamos transformar o parágrafo em redação. Assim, esse artigo deixa de ser
apenas um beabá e se torna também uma aula prática.
Como elaborar um parágrafo

Uma frase esclarecida pode transmitir uma ideia sucinta, uma informação pequena que pode
transmitir tudo o que for necessário de uma vez só ou que pode fazer parte de um contexto
maior. Se a informação está completa em uma frase, não há a necessidade de encher linguíça.
Mas se a frase faz parte de um parágrafo maior, precisamos nos preocupar com a construção
das ideias apresentadas.
Acredito que a chave para um bom parágrafo é o tópico frasal. Não quero ser técnico demais,
então vou simplificar. Tópico frasal é basicamente o assunto do qual se trata a frase. Se eu
começo falando “seu personagem favorito”, espera-se que a frase seja sobre o seu
personagem favorito. Como o exemplo é simples, isso fica bem óbvio, mas a situação pode
ficar complicada numa frase de três linhas ou mais.
Além do tópico frasal, coerência e coesão também são importantes. Coerência é quando as
ideias fazem sentido e coesão é quando a gramática faz sentido. Exemplo: acordei, levantei,
bebi café, escovei os dentes. Essa frase teve coerência porque você entendeu a lógica das
ações, mas não teve coesão porque são apenas ações soltas. Outro exemplo: acordei e
levantei do meu saleiro, peguei miopia e cheguei ao processo civil. Essa frase teve coesão
porque a gramática está correta, mas não teve coerência porque as ideias não fazem sentido.
Lembre-se desses dois elementos principalmente quando for revisar o que escreveu.
Dito tudo isso, minha recomendação para escrita de um parágrafo básico é: uma frase de
introdução, três frases de argumentação e uma frase de conclusão. A introdução apresenta a
ideia que vai elaborar, a argumentação explana a ideia e a conclusão a encerra. É lógico que
você pode ter mais ou menos frases, que pode só explicitar o tópico frasal na conclusão e fazer
todo tipo de mistura que quiser, mas como eu disse e não canso de repetir: pratique e aprimore
o básico primeiro, depois invente suas doideiras.
Usando o nosso exemplo inicial:
“O seu personagem favorito morre no final desse livro. O autor decidiu encerrar sua história
com a morte de um personagem marcante para causar impacto emocional aos leitores. A morte
também serve de gancho narrativo para conectar com o próximo livro. Esse tipo de desfecho
assume o risco de frustrar uma parcela dos leitores em prol de cativar intensamente um número
ainda maior de fãs dedicados. Os leitores apresentaram opiniões favoráveis sobre a conclusão
do livro.”
Perceba que usei o modelo de sujeito, verbo e complemento e que não usei nenhuma vírgula
no parágrafo. Apenas cinco frases sequenciadas que elaboram o tema. Se eu fosse escrever o
mesmo parágrafo sem me preocupar em manter cada frase simples, ficaria assim:
O seu personagem favorito morre no final desse livro. O autor decidiu encerrar sua história com
a morte de um personagem marcante para causar um impacto emocional aos leitores,
aumentando as expectativas por uma sequência. Falando em sequência, a morte também
serve de gancho narrativo para conectar com o próximo livro. Esse tipo de desfecho assume o
risco de frustrar uma parcela dos leitores em prol de cativar intensamente um número ainda
maior de fãs dedicados. Até agora, os leitores apresentaram opiniões favoráveis sobre a
conclusão do livro.
Sua vez de botar a mão na massa. Pegue a frase que você formulou anteriormente e use-a
como introdução de um parágrafo maior, adaptando-a, se necessário. Perceba que minha frase
dizia “final do livro” no começo e agora disse “desse livro”, pois precisei modificá-la para se
encaixar melhor no parágrafo. Experimente também escrever uma versão mais simples,
seguindo a fórmula básica, e depois uma versão mais livre, usando conectores, adjuntos
adverbiais e o que mais desejar.

Como elaborar um texto

Agora que já falamos sobre escrever frases e parágrafos, estamos prontos compreender a
escrita do texto.
O primeiro passo para escrever um bom texto é rascunhar o seu esqueleto. Liste “rascunho,
argumento 1, argumento 2, argumento 3 e conclusão” e então escreva o assunto — tópico
frasal — de cada um desses parágrafos. É claro que você pode ter mais ou menos argumentos
dependendo do texto, eu só acho que três é o mínimo. Exemplo:

Introdução: Morte de personagens como ferramenta narrativa


Argumento 1: Impacto emocional.
Argumento 2: Gancho narrativo.
Argumento 3: Frustrar ou cativar leitores.
Conclusão: Mais prós do que contras.

Particularmente, nunca gostei de escrever rascunhos. Desde o colégio, sempre fiz o esqueleto
do texto e partia direto para a escrita. E sempre tirei boas notas com esse método. Hoje, eu
sigo esse modelo tanto para textos dissertativos quanto para narrativos, como já demonstrei
em aulas práticas — https://www.youtube.com/watch?v=lhrGkma8VsI. Como sempre escrevo
direto no computador, acho fácil reajustar tanto as ideias quanto a ortografia e vocabulário
durante as revisões.
O “passo a passo” basicamente é: primeiro, montar o esqueleto do texto; segundo, escrever
parágrafo por parágrafo, frase por frase, palavra por palavra, sempre relembrando os
fundamentos básicos da escrita; terceiro, revisar tudo.
Recomendo que primeiro bote as ideias no papel — ou na tela —, sem perfeccionismo em
relação a ortografia, vocabulário e afins. A princípio, você foca em expressar as ideias. Na
primeira revisão, seu foco ainda é o conteúdo. Coloque-se no lugar do leitor e observe se as
ideias estão esclarecidas e de fato levam às conclusões que você deseja. Só depois você
revisa de novo focando na forma desse conteúdo.
Sobre ortografia, recomendo que você instale um revisor ortográfico no seu computador ou use
algum online. O que eu costumo usar é o FLiP direto no meu navegador mesmo — não
confundir com a Festa Literária Internacional de Paraty. Recomendo que use o site do FLiP no
momento da sua última revisão, como uma forma de passar um pente fino na escrita.
Outra dica é ler as frases em ordem inversa. Não ler de trás para frente, por favor! É ler a última
frase, depois a penúltima, depois a antepenúltima e assim vai. Lendo fora de ordem, você sai
do contexto e foca naquele trecho isolado, aumentando sua atenção à escrita em si.
Também é fundamental sempre ter — e tirar — dúvidas. Se eu escrevo e tenho uma pequena
dúvida, já abro o Google e jogo a palavra em questão nele para conferir. Enxergo é com X ou
CH? E encharcado? Exceção é com Ç ou SS? E excesso? Quem diabos decorou todas as
regras de acento na vida? Todos os livros passam por revisão ortográfica profissional
justamente porque não existe escritor impecável. Nosso texto nunca vai ser perfeito, mas
devemos nos esforçar para escrever o melhor possível, por isso precisamos reconhecer que
sempre vamos ter dúvidas.
Outro fator importante na revisão é o vício de linguagem. Todos temos. O meu maior vício de
linguagem é o “mas”. Eu adoro elaborar minhas ideias através de contrastes e até de
contradições. É muito comum eu apertar um “ctrl + F” e pesquisar cada mas, porém, contudo,
entretanto, todavia e não obstante dos meus textos. Lembrando que faço isso na hora da
revisão. Enquanto escrevo, uso o “mas” quinhentas vezes mesmo. Conforme vou revisando, eu
vou polindo, enxugando e reduzindo meus vícios de linguagem. Procure as palavras, termos e
até expressões que você mais repete e se force a variar não só aquele trecho em específico,
mas toda a forma como você constrói uma frase.
Recomendo pelo menos três revisões. A primeira focando só no conteúdo. A segunda focando
no conteúdo e na ortografia. E a terceira focando só na ortografia. E então comece a escrever
seu próximo texto. Você aprimora mais escrevendo textos diferentes do que tentando alcançar
a perfeição — que não existe — em um só. Tão importante quanto seu texto ficar melhor em
cada revisão é o próximo texto ser melhor que anterior.
E, como exercício prático, uma boa ideia é pegar a frase que já virou um parágrafo e usar como
base para escrever um texto. Pode começar agora.

Pratique escrita básica

Como eu disse anteriormente, atletas campeões e astros musicais sabem a importância de


estudar o fundamental. Precisamos estudar Escrita Básica tanto quanto precisamos ler para ter
inspiração e beber água e respirar para viver.
Ouso dizer que a leitura é o que dá inspiração para nossas ideias e a Escrita Básica é o que
exercita a nossa habilidade de dar forma ao nosso conteúdo. Ninguém alcança a medalha de
ouro só assistindo a esportes na televisão, ninguém compõe o próximo hit número 1 só ouvindo
música, tanto quanto ninguém escreve o próximo bestseller só lendo e relendo seus livros
favoritos. A aprimoração é alcançada através da prática e do esforço.
A propósito, já escreveu hoje?
5. Escrita de Contos

Por muito tempo, o Mercado Editorial priorizou a publicação de romances sob o argumento de
que outros gêneros, como contos e poesias, não tinham tanto retorno financeiro. Hoje em dia, o
cenário é outro. Não sei se o público contemporâneo desenvolveu o gosto por leituras mais
sucintas, se a leitura de contos de autores consagrados nas escolas e faculdades influenciou
algo ou se as editoras simplesmente estavam equivocadas. Mas tenho certeza de que quase
todos os grandes escritores nacionais e internacionais escreveram contos ao menos em um
período das suas carreiras, que o público está sim lendo narrativas curtas e que os autores e
autoras de hoje deveriam estar escrevendo contos.

Por que todos escritores deveriam escrever contos?

Além do fato dos leitores de hoje estarem interessados em narrativas curtas — seja em
coletâneas, ou em plataformas digitais como Kindle e Wattpad, ou onde for —, contos são a
melhor forma de exercitar a Escrita Criativa.
Suponhamos que você escreva dez mil palavras do seu próximo romance e fique ruim — um
risco especialmente grave para escritores de primeira viagem. As chances são que você queira
jogar essas dez mil palavras no lixo e começar tudo de novo. Mas e, se em vez de começar
direto no romance, você escrever um ou dois contos totalizando também dez mil palavras? O
esforço foi praticamente o mesmo, mas você vai poder avaliar com mais precisão os pontos em
que acertou, os pontos em que pode melhorar e vai ter praticado sua escrita. Seja você autor
ou autora iniciante ou experiente, todos precisamos buscar o aprimoramento e a melhor forma
de praticar é escrevendo contos.
E os escritores e escritoras ainda podem publicar seus contos na internet para alcançar seus
primeiros leitores e receber as primeiras críticas. Graças às plataformas digitais, podemos
escrever e publicar para literalmente o mundo inteiro ler quase que instantaneamente e
acredito que devemos usar todos os recursos disponíveis ao nosso dispor. Por mais que a
gente não queira disponibilizar gratuitamente nosso primeiro livro, uma opção interessante é
escrever contos e publicar na internet para angariar leitores e opiniões, o que dá experiência e
segurança para nossa escrita.
O que não descarta a validade do conto a longo prazo. Sir Arthur Conan Doyle, Robert E.
Howard e H. P. Lovecraft são exemplos de autores que basearam suas carreiras literárias na
escrita de contos e até hoje suas coletâneas são vendidas e suas histórias são adaptadas para
outras mídias. Aqui no Brasil, temos por exemplo Anacrônicas: Contos Mágicos e Trágicos, da
Ana Cristina Rodrigues, onde a autora juntou diversos textos publicados em revistas e
antologias e também inéditos e publicou como um livro próprio. O conto pode ser escrito e lido
em curto prazo, mas sua validade se estende à eternidade.
Além desses exemplos, você provavelmente já leu algum autor ou autora que se beneficiou
com a escrita de contos ao longo da carreira — talvez a carreira inteira. Tanto internacionais,
como Edgar Allan Poe, Franz Kafka, Julio Cortázar e Charles Bukowski, quanto nacionais,
como Rubem Fonseca, Graciliano Ramos, Clarice Lispector, Guimarães Rosa, Dalton Trevisan
e Machado de Assis, inúmeros grandes escritores escreveram contos. Eu não sei você, mas eu
quero que meu nome esteja ao lado dos grandes futuramente.
Seja para praticar Escrita Criativa ou para pavimentar sua carreira literária, não há motivo para
não escrever contos.

O que define um conto?

Conto é uma narrativa curta e autossuficiente. Se você pesquisar, vai encontrar incontáveis
especificidades e tecnicidades e também um monte de gente dizendo que o conto é “aquilo que
o autor chamou de conto”. Acredito que você deva estabelecer seus próprios critérios à
vontade, sempre lembrando dessas duas palavras: curta e autossuficiente.
O que é uma narrativa curta? Eu já li que um conto tem até 7.5 mil palavras, sendo que eu
tenho um conto com mais de 20 mil palavras. Devemos lembrar que existem romances com
menos de 50 mil palavras e outros com mais de 400 mil. Se o tamanho do romance pode variar
tanto, por que o do conto não poderia o mesmo? Não se apegue aos números e sim ao
conceito.
O que é uma narrativa autossuficiente? Acredito que esse sim é o X da questão. Muitos
escritores têm a ideia de escrever um conto e, quando terminam, percebem que escreveram o
primeiro capítulo de um novo romance. Um conto não pode terminar no começo de uma
história ou depender de qualquer outro texto além dele mesmo. O conto precisa narrar uma
história por si só, independente de qualquer contexto ou narrativa além dele mesmo. Um leitor
precisa ler, entender e gostar do seu conto mesmo que nunca tenha lido nenhum outro texto
seu e que nunca mais venha a ler nenhum outro depois. Acredite, o leitor vai querer ler mais,
se gostar do seu conto — mas ele precisa funcionar como uma história completa e não como
uma parte de algo maior.
Se quiser, você pode pesquisar por explicações mais específicas e até técnicas sobre a
definição de conto, mas como escritor ou escritora, a prática da escrita é o que vai importar no
fim das contas. Escreva, teste, experimente, revise e reescreva até que você encontre o seu
estilo e a sua voz narrativa. Seu foco precisa ser contar as suas histórias do seu próprio jeito.

Como escrever um conto

Sabe aqueles momentos breves, que passam rápido, mas ficam marcados na memória? Esse
é o objetivo de um conto: marcar a memória do seu leitor através de um momento breve.
Existem várias formas de se alcançar esse objetivo, então recomendo que você leia esse artigo
até o final e experimente cada elemento apresentado a seguir.
O ditado de “menos é mais” prevalece no conto. É desfavorável que a narrativa curta tenha
muitos personagens, se passe por diversas localidades e que transcorra por um longo período
de tempo. O conto precisa focar numa quantidade mínima de elementos para conseguir
elaborar cada um da melhor forma possível.
Uma das maiores vantagens de escrever um conto é que a inspiração pode vir de qualquer
lugar. Pode vir de outro conto que você leu, ou do capítulo de um livro, ou de uma cena de um
filme, ou de uma música etc. Escrever um romance é como minerar e lapidar até formar uma
joia polida, enquanto que escrever um conto é como peneirar a inspiração em busca de um
minério raro. Com certeza você pode encontrar um conto excelente no meio dos últimos textos,
filmes, séries, músicas e jogos que experimentou.
Existe escritores que planejam o romance todo antes de escrever, outros que planejam mais ou
menos e outros que não planejam nada. A respeito de contos, acredito que o final precisa estar
claro antes do começo da escrita. Um conto com um final insatisfatório é como uma comida
bonita, mas com gosto desagradável. Ou uma música que desafina no final. É comum o
desfecho de uma narrativa ficar na nossa memória, seja o fim de uma história ou de um
capítulo. Acontece que, quanto menor a narrativa, mais peso tem o final. Lógico que a
introdução e o desenvolvimento também precisam ser bons, a questão é que acredito que a
melhor forma de escrever introdução e desenvolvimento de bons contos é tendo em mente a
conclusão desde o princípio.
O único excesso saudável é a própria leitura. Ao decidir escrever um conto, nada mais justo —
e coerente — do que buscar ler muitos contos. Antes de escrever, experimente ler contos do
seu gênero favorito tanto para se inspirar em seu conteúdo quanto para começar a perceber a
forma como foram escritos. Isso vai ajudar a elaborar o conteúdo e a forma dos seus próprios
contos.

Os personagens do conto

Naturalmente, o escopo do conto é menor do que o de um romance. Isso significa menos


páginas, menos arcos narrativos e menos personagens, o que é uma boa notícia. Com um
elenco menor, podemos dar mais atenção a cada personagem. Todos devem ser marcantes,
portanto menos — quantidade — é mais — profundidade.
Mas, porém, contudo, entretanto, todavia, não obstante um elemento nunca muda: cada
personagem precisa ter objetivo. Inclusive, recomendo que o conto priorize um ou uma
personagem e um objetivo. Dedique toda o seu esforço em criar um personagem cativante com
um objetivo esclarecido. Exemplo: no primeiro conto de Witcher, o foco é Geralt de Rívia e sua
missão, sem se aprofundar na história do mundo e nem no passado do personagem. Esses
elementos vieram a ser criados posteriormente, mas com certeza o autor só teve oportunidade
de ir mais longe porque escreveu um primeiro conto sucinto e satisfatório.
E para cativar os leitores com seus personagens e objetivos, é fundamental que a leitura seja
emocionante. Pense em uma emoção principal que o leitor deve sentir. Pode ser medo, paixão,
adrenalina, o que você quiser. O que importa é que essa emoção exploda os miolos do leitor.
Digo por mim mesmo, meu primeiro conto venceu o Concurso Cultural Eu, Criatura porque
ambientava bem o Mundo das Trevas através da melancolia e desesperança. O ditado popular
diz que “romance vence por ponto e conto vence por nocaute” e histórias nocauteiam através
de emoções intensas.
Basicamente, contistas devem apresentar um personagem empático com um objetivo
esclarecido e narrar sua história de forma emocionante. A narrativa é o que desenvolve o
personagem e conduz o leitor às emoções. Recomendo que você pense em uma única cena
que informe tudo o que você precisa de uma vez só. Introdução, desenvolvimento e clímax,
ponto final — leu o capítulo sobre Escrita Básica, né? Fique bom em fazer o simples primeiro e
vai adicionando mais complexidade conforme for aprimorando. Escreva, pratique e depois
elabore contos com mais cenas, mas que ainda sejam narrativas sucintas.
Lembre-se que o foco de todas as histórias é os personagens. Um elenco cativante é o que
separa uma história emocionante de uma história tediosa. Como o conto é uma narrativa curta,
o ideal é ter menos quantidade de elementos e mais foco em um ou uma personagem.

O cenário do conto

O foco do conto é o personagem, o que não quer dizer que os outros elementos narrativos não
sejam relevantes, como o cenário. Pense num filme ou numa peça de teatro. Quem conduz a
narrativa são os atores, mas o cenário ainda está presente. Essa lógica pode ser aplicada de
várias formas no conto.
A narrativa pode se passar em um local, como uma casa — ou apenas um cômodo de uma
casa —, a cena de um crime, uma espaçonave, um castelo etc. A vantagem de usar um único
lugar é ter uma única ambientação, ajudando a manter o clima da narrativa. A casa pode ser
confortável ou melancólica, a cena do crime pode ser sombria ou sangrenta, a espaçonave
pode ser um centro de pesquisa ou um veículo de guerra, o castelo pode ser luxuoso ou
decadente e assim por diante. O que importa é conectar a emoção que você quer passar no
conto com a ambientação do cenário para acentuar o clima da narrativa.
O que não impede que o conto se passe em diversas localidades. Eu recomendo que uma
maior quantidade de cenários diminua o detalhamento da descrição de cada um deles para
aumentar ainda mais o foco nos personagens. Escrever entre um a três parágrafos para
descrever um único cenário em um conto está de bom tamanho, porém escrever três
parágrafos para três cenários diferentes totaliza nove parágrafos só de descrição, o que pode
tornar a leitura confusa e/ou cansativa. Imagine uma sala de cirurgia em um hospital. Se esse
for o único cenário, faz sentido descrever cada detalhe, afinal a descrição está ambientando a
narrativa. Mas se esse for mais um cenário entre outros vários, qual é a necessidade de
descrever cada instrumento na bandeja do cirurgião?
E temos também a opção de não usar cenário nenhum. Ou descrever apenas um ou outro
elemento, como citar uma janela ou uma cadeira, mas sem detalhar se o elenco está em uma
casa, apartamento, escritório ou qualquer coisa, ou até mesmo não citar nenhum elemento de
cenário em momento algum. A vantagem de abstrair por completo o cenário é focar ainda mais
nos personagens, descrevendo os mínimos detalhes da aparência de cada um e dando maior
ênfase nos diálogos e nas ações.
Outra opção é o cenário ser o foco do conto. Talvez seja a casa de uma família ou toda uma
cidade. Nesse caso, podemos pensar no cenário como um membro do elenco. Se os
personagens são um casal de irmãos, por exemplo, a casa onde eles cresceram seria um
terceiro personagem e o foco é a relação e a memória desses três elementos. Ainda assim, o
cenário é um elemento passivo e os personagens são elementos ativos. Como disse
anteriormente, o personagem conduz a narrativa e o cenário serve para ambientá-la.
Lembre-se disso quando narrar um conto a respeito de uma localidade em específico.

Enquanto os personagens conduzem a narrativa, o cenário dá vida ao mundo ao redor deles.


Como concluir o conto

Você já sabe que o conto vence por nocaute, mas agora vamos nos aprofundar nesse tema. A
conclusão do conto precisa explodir os miolos do leitor, ou causar um embrulho no estômago,
ou fazê-lo derreter de amores, ou o que quer que seja. Só não pode ser um final morno, que
não fede e nem cheira.
O golpe mais clássico para levar ao nocaute é o clímax do conto. O momento em que os
piratas abrem o baú do tesouro perdido, em que o agente secreto corta o fio da bomba relógio,
quando a luz do dia desintegra o vampiro etc. O leitor acompanhou a trajetória do seu ou sua
protagonista do começo ao fim na expectativa de que haja uma recompensa no final. Portanto
dê valor ao clímax, dedique todo os seus esforços e esmero para criar um final satisfatório.
Mas o final não precisa ser sempre tão óbvio. E se o baú do tesouro estiver vazio? E se o
agente secreto corta o fio errado? E se o vampiro não desintegrar na luz do dia? O anti-clímax
também pode ser satisfatório. Bom, ao menos satisfatório para o leitor. Não basta encher o
leitor de esperanças e frustrá-las no final. Se o mocinho morre, é bom que a história tenha um
clima mais pessimista, até mesmo impiedoso. Se o casal não fica junto, talvez haja alguma
mensagem interessante a ser aprendida. Se o assassino continua à solta, ele precisa ser um
personagem cativante por si só. Esse é o segredo do bom anti-clímax: frustrante para
personagens, satisfatório para leitores.
Outro tipo de final que funciona bem é as reticências. Um final que não conclui, que apenas
sugere o que pode ter acontecido e deixa a imaginação do leitor completar o resto. Alguns
leitores vão imaginar um final feliz, outros vão imaginar um final trágico, e também vão ter
aqueles que vão preferir ficar só com o “gostinho” das reticências, sem tirar conclusões. E
todos eles vão poder discutir sobre qual deveria ser o final verdadeiro. Ler é um ato de
imaginar. E nada dá tanto combustível para a imaginação quanto um final em reticências.
Por fim, muitos bons contos terminam com uma grande reviravolta — o “plot twist”. Talvez o
imediato tenha armado um motim contra o capitão pirata que buscava o baú. Talvez o agente
secreto é na verdade um agente duplo. Talvez o vampiro não estivesse caçando o mocinho, e
sim ensinando um novo vampiro a usar os seus poderes, enquanto o próprio protagonista não
consegue aceitar no que se tornou. A reviravolta precisa subverter as expectativas do leitor.
Não basta algo totalmente inesperado acontecer sem mais nem menos. O leitor precisa
esperar um clímax ou anti-clímax e então ser surpreendido com algo interessante, mas
coerente dentro da narrativa. A reviravolta é aquela carta tirada da manga, não um balde de
água fria que cai do nada.
Tanto quanto o final do conto é o momento de tudo ou nada para a narrativa, ele também é o
momento de tudo ou nada para o leitor virar seu fã ou virar a página e esquecer que você
existe.

Contos como parte de uma narrativa maior

É válido esclarecer que, por mais que o conto precise ser uma leitura autossuficiente, isso não
impede que ele faça parte de uma narrativa maior. Então como escrever contos que
complementam narrativas maiores sem perder sua essência autossuficiente? Acredito que
existem três principais opções que funcionam muito bem.
A primeira é o conto que expande personagens. Você pode pegar um ou uma personagem do
seu romance / saga e contar uma história de origem, ou uma história que aconteceu durante o
livro enquanto esse personagem estava ausente, ou até narrar o que aconteceu com ele ou ela
depois do fim do livro. Apesar dessa opção parecer fácil, na verdade pode se revelar
desafiadora, porque você vai precisar narrar de forma que não seja redundante para os leitores
veteranos e nem alienante para os novatos. A boa notícia é que leitores são insaciáveis e
sempre querem novas histórias de seus personagens favoritos.
A segunda é o conto que expande o cenário. Você pode escrever um conto que se passa antes
e do seu romance / saga, pode contar uma história que se passar no mesmo cenário, mas em
regiões distantes e inéditas, ou apresentar toda a origem cósmica do mundo em forma de
narrativa. Essa é a opção que dá mais liberdade para a escrita, só não pode ser um conto tão
desconectado que fique irrelevante para o seu cenário. O mais importante é a narrativa reforçar
a ambientação do mundo já apresentado.
A terceira é o conto que expande a própria narrativa. Você pode contar uma história que
aconteceu durante seu romance / saga — como algum ação “por trás das cortinas” de um
antagonista ou coadjuvante —, pode escrever uma história extra que se passa entre um livro e
outro, ou pode narrar uma cena do livro, mas através um novo ponto de vista. Expandir a
narrativa é a opção mais delicada porque é muito difícil focar numa história já contada de forma
autossuficiente. Seu conto não pode ser obrigatório para o entendimento da sua narrativa maior
e precisa ser compreensível para quem nunca leu nenhum texto seu antes. Nada de errado em
escrever um “capítulo extra”, só é fundamental compreender que isso não seria um conto.
Um conto como parte de uma narrativa maior é a união perfeita entre o útil e o agradável. Um
leitor novato pode gostar do seu conto e querer ler suas histórias maiores e um leitor veterano
vai adorar retornar aos seus personagens e/ou cenários através de uma narrativa menor.
Contos são uma das melhores formas de ganhar leitores novatos e de evoluir os novatos para
veteranos.

Quem conta um conto aumenta um ponto

A magia da literatura é a sua subjetividade que nos permite reinterpretar infinitas histórias e até
infinitas frases. Afinal, quem conta um conto, aumenta um ponto. Ou seja, a cada conto que
escreve, você vai fortalecer sua escrita criativa, expandir sua carreira literária e ainda estreitar
seus laços com seus leitores, tudo isso de uma vez só. As possibilidades — e as vantagens —
são infinitas.
6. Como Estruturar a Narrativa

Todo e qualquer texto tem início, meio e fim. No caso de uma dissertação, é introdução,
argumentação e conclusão. Da mesma forma, um parágrafo tem início meio e fim. E a frase
também, não preciso repetir. Uma narrativa segue a mesma linha de raciocínio, contudo o
texto, parágrafos e linhas se manifestam através de livro, partes — que eu chamo atos —,
capítulos e cenas.

Como eu falei anteriormente, estudar Escrita Básica não é o assunto mais empolgante do
mundo, mas pode fazer toda a diferença na hora de narrar nossas histórias. Se você sabe
escrever uma boa dissertação, já está meio caminho andado para escrever uma boa narrativa.
Se você está com dificuldades para escrever uma narrativa, talvez precise aprimorar sua
Escrita Básica. Afinal, mesmo o gênero textual sendo diferente, a linha de raciocínio ainda é
similar.

Todos os autores e autoras já tiveram dúvida sobre o próximo capítulo do livro, de como
encerrar uma história ou de como conectar o início ao fim. Nesse artigo, você vai aprender a
observar a narrativa com diferentes níveis de aproximação para compreender em que ponto
está tendo dificuldade e não ter mais dúvidas do que escrever a seguir.

Início, meio e fim do livro

O início do livro deve ser dedicado a introduzir personagens, cenário e enredo — os três
baluartes da Escrita Criativa — de forma cativante para os leitores. É como se você estivesse
preparando o tabuleiro e suas peças para uma partida de xadrez ou o jogo que preferir. Os
personagens são o elemento mais importante, pois são eles que vão conduzir os leitores
através do cenário e do enredo. Nesse momento inicial, é importante apresentar as principais
informações a respeito dos três baluartes de forma que o leitor conheça o suficiente para se
interessar, mas não tudo de uma vez para não sobrecarregá-lo.

O meio do livro — geralmente o terceiro ato, entretanto podem haver quatro, cinco ou vários
atos no percurso — deve ser dedicado a desenvolver e se aprofundar nos personagens,
cenário e enredo, trazendo novos eventos e possivelmente revelando mistérios do passado. É
como se as peças do tabuleiro fizessem suas principais jogadas e suas estratégias
começassem a se revelar. Novos personagens e cenários ainda podem ser apresentados, mas
vão ter menos relevância do que aqueles que estão na história desde o começo, afinal seus
leitores já estarão interessados neles. Agora que os leitores já conhecem os fundamentos dos
três baluartes, você pode dar mais atenção aos acontecimentos sem precisar de tantas
explicações como no começo.

O final do livro deve ser dedicado a encerrar tudo que foi introduzido no começo e desenvolvido
no meio. É o momento do xeque-mate. Os leitores já conhecem quase tudo sobre
personagens, cenário e enredo, só resta trazer a resolução de todos os seus objetivos e talvez
algumas reviravoltas — os “plot twists”. É altamente contraindicado introduzir novos
personagens no final, eles só vão tirar o foco do enredo e os leitores não vão se importar com
eles — como dito, eles já estarão interessados nos personagens que estão na história desde o
princípio. Os leitores que chegam ao final do livro só querem um desfecho satisfatório para os
personagens, cenário e enredo que acompanharam até aqui, então essa deve ser sua maior
prioridade.

Início, meio e fim do ato

Acredito que a melhor forma de começar um ato — seja no começo, no meio ou no fim do livro
— é dando ênfase aos personagens. Quem são, onde estão, quais são os seus objetivos? Isso
ajuda os leitores a se nortearem na história e dá a eles uma trilha esclarecida para seguir. Se
for o primeiro ato, esses são os elementos a serem introduzidos. Se for no meio ou no final do
livro, esses elementos podem ter mudado e precisam ser atualizados ou podem ser os
mesmos, portanto é um bom momento para relembrá-los.

O meio do ato é um bom momento para a ação, seja através intrigas, de acidentes de percurso,
de desilusões amorosas, cenas de ação no sentido literal etc. É o momento em que o enredo
precisa acontecer de fato. É cansativo quando o leitor tem a sensação de que nada está
acontecendo, então desenvolva e aprofunde seus personagens, cenário e enredo ao longo da
história. Pense nos principais elementos que você quer oferecer aos seus leitores e dê
amostras de cada um no meio de cada ato.

O final de um ato é o momento de marcar o enredo com o fim de um ciclo e possivelmente o


começo de um novo. Se for o primeiro ato, é quando as bases são consolidadas e agora o
enredo vai começar a se desenrolar. Se for o penúltimo ato, é quando tudo está pronto para se
encaminhar para o grande desfecho final. E se for o último ato, não tem mistério, é a hora da
conclusão. É importante que os leitores sejam recompensados e/ou instigados no final de um
ato. Pode ser um momento de vitória, de traição, aquele beijo tão aguardado, uma morte
trágica, algo que arranque o fôlego dos leitores.

Início, meio e fim do capítulo

Ao longo da escrita, surgem muitas dúvidas e como começar um capítulo é uma das mais
frequentes. A boa notícia é que a resposta quase sempre é os três baluartes da Escrita
Criativa: personagens, cenário e enredo. No caso do começo do capítulo, você pode começar
se aprofundando em um personagem em si ou na relação entre dois ou mais personagens,
descrevendo o local onde o elenco se encontra ou partindo direto ao que interessa numa cena
que mova o seu enredo — essa terceira opção só é recomendável caso os seus leitores já
conheçam bem as outras duas. O começo do capítulo é o que vai fazer os leitores
mergulharem dentro da sua história, então priorize cenas significativas e instigantes.
O meio do capítulo é quando as coisas acontecem. Seus leitores já sabem quem são os
personagens envolvidos, onde estão e o que estão fazendo. Metaforicamente, as luzes e as
câmeras estão prontas, então é hora de gritar "ação". Escolha um ou mais dos três baluartes e
desenvolva, seja entrando em mais detalhes, revelando segredos do passado ou avançando
com a história. Sempre que tiver dúvida sobre o que escrever, pergunte-se: o que poderia ser
desenvolvido agora, personagens, cenário e/ou enredo?

As duas melhores maneiras de finalizar um capítulo são através da conclusão ou do gancho.


Conclusão é simplesmente encerrando o que estava acontecendo, os personagens
conquistaram algo ou chegaram a um lugar importante, um antagonista foi derrotado, o beijo
finalmente aconteceu. O gancho, por outro lado, é quando os leitores são surpreendidos de
forma que precisam continuar lendo, um personagem está à beira da morte, um aliado se
revelou um traidor, o noivo ou a noiva abandonou o altar no meio da cerimônia. Ao fim do
capítulo, os leitores devem estar satisfeitos ou instigados, procure dosar essas duas sensações
para mantê-los interessados no seu livro.

Início, meio e fim da cena

O começo da cena vai estabelecer o clima do que está por vir. Você quer que o leitor se sinta
dentro do livro, que os leitores sintam as emoções dos seus personagens. O começo da cena é
fundamental para gerar essa conexão. Então pergunte-se: o que está por vir? Adrenalina? A
cena poderia começar com foco na ansiedade ou no ímpeto do elenco. Mistério? A cena
poderia começar com foco num clima soturno ou na curiosidade de um personagem. Medo? A
cena poderia começar com foco no que provoca o medo, seja um recinto coberto de sangue,
um vulto espreitando os arredores, uma descoberta perturbadora. Romance? A cena poderia
começar com foco no frio no umbigo do personagem, no cheiro do jantar e nas luzes de velas,
nos receios e inseguranças inevitáveis. Lembre-se da importância de se conectar com os
leitores, de trazê-los para dentro do livro.

Depois que você estabeleceu o clima e se conectou com seus leitores, sua cena deve
desenvolver o conteúdo apresentado. Narrar uma história exige uma harmonia tênue entre
informar e entreter os leitores. Entregar as informações que seus leitores precisam de forma
saborosa — seja lá qual for o sabor da sua história. Narre sem pressa, dê atenção aos detalhes
que vão informar e entreter seus leitores, permita que eles se deleitem com sua escrita. A
jornada é mais importante do que o destino, por isso é tão importante escrever cada cena com
esmero e dedicação.

Encerrar uma cena não é muito diferente de encerrar um capítulo, ou você conclui o que está
acontecendo ou cria um gancho para a próxima cena. O elenco estava se preparando para a
ação e agora o momento finalmente começou. O personagem abriu a gaveta e agora vai ler as
respostas para aquilo que investigava. O vulto se revelou um assassino com uma faca e agora
está perseguindo o elenco. O beijo finalmente aconteceu e agora o casal está arrancando a
roupa um do outro. Escrever uma cena pode ser parecido com servir um banquete, seus
convidados vão sentir o cheiro no começo, abocanhar a comida no meio e sentir o gosto no fim,
da mesma maneira que seus leitores vão sentir o cheiro da cena, vão abocanhá-la e então vão
degustar aquele sabor que fica na língua — e na memória — depois da leitura.

Início, meio e fim da Escrita Criativa

Miyamoto Musashi escreveu O Livro dos Cinco Anéis com ensinamentos baseados nos
elementos terra, água, fogo, vento e vazio, sendo o último o mais intrigante. De acordo com
Musashi, você precisa esquecer depois de aprender. Você não pensa para respirar, você só
respira. Você não pensa ao lutar, você luta. Acredito que, da mesma forma, você não pensa em
todos os detalhes ao escrever suas histórias, você apenas escreve.

Ainda assim, estudar e praticar é fundamental. Músicos desafinam, ilustradores amassam


papéis e arremessam na lixeira, escritores apagam trechos — até capítulos — inteiros. Faz
parte de buscar o aprimoramento. Você não vai ter todos os ensinamentos na sua mente o
tempo todo. Você vai internalizá-los e executá-los de forma espontânea. Você tem toda a
capacidade de escrever um capítulo inteiro sem pensar em nenhum ensinamento teórico. Mas
eles vão estar na sua escrita. E quando você tiver dúvidas, quando não souber o que fazer com
a página em branco, quando estiver com bloqueio criativo, esse é o momento para retornar aos
ensinamentos teóricos.

Estude. Pratique. Execute. Esqueça. E depois repita esse processo. Sempre melhor do que
antes a cada ciclo.
7. Como Criar Empatia pelos Personagens

Eu vivo falando que os personagens são o baluarte mais importante de uma narrativa. Mas
criar personagens que agradam aos leitores é uma tarefa capciosa. Hoje eu vou falar de um
dos elementos mais importantes dos personagens: a empatia.

O que é um personagem empático

O personagem empático é aquele com o qual os leitores se identificam ou admiram. Em ambos


os casos, os leitores vão torcer pelo sucesso dos personagens tanto quanto torcem para o
próprio sucesso e pelo sucesso dos amigos e familiares na vida real. Afinal, às vezes a gente
se apega para valer a certos personagens fictícios, não é mesmo?
E não tem meio termo: ou os leitores vão torcer pelo sucesso dos seus personagens principais
ou vão fechar o livro e devolvê-lo para a estante. Talvez até doem para um amigo ou sebo. O X
da questão é dar motivos para os leitores gostarem dos personagens certos.
Nada pior que um personagem antipático. Já li um conto de fantasia medieval em que o herói
era um grosseirão. Também já li um romance em que o rapaz era um hipócrita. Na verdade,
comecei a ler. Porque abandonei ambas as leituras. Devo terminá-las um dia, só não tenho
pressa nenhuma para isso. Eu não tenho porque torcer pelo sucesso de grosseirões e
hipócritas. Então também não tenho porque ler suas histórias.
Quando criar seus personagens, lembre-se de criar também motivos para os seus leitores
gostarem deles.

Como criar empatia

Como eu disse, os leitores gostam de personagens com quem eles se identificam ou admiram.
O personagem com quem nos identificamos é gente como a gente. Harry Potter é uma criança
gentil, como todos nós fomos — ou acreditamos que fomos. Adolescentes gostam do
Homem-Aranha porque ele é um adolescente por trás da máscara. Luke Skywalker foi
construído de forma tão simples justamente para que o máximo possível de espectadores se
identificassem com ele. Nós somos ou já fomos assim um dia, então sabemos como eles se
sentem em relação às suas vidas — exceto pela parte da magia e dos poderes. Pare um
momento e pense nos personagens que você gosta porque se identifica com eles.
O personagem que admiramos é alguém que adoraríamos ser. Jay Gatsby tem tudo o que
qualquer pessoa poderia sonhar ter e está sempre conquistando mais. O Batman é inteligente,
forte, bom de briga — e ainda namora a Mulher-Gato. Qualquer personagem interpretado pelo
Tom Cruise sempre é bom em tudo e salva o mundo no final. Quem não gostaria de ser tão
habilidoso — e bonitão — quanto esses caras? Pare um momento e pense nos personagens
que você gosta porque gostaria de ser como eles.
Falar o que não fazer é tão importante quanto falar o que fazer. Eu já li um livro em que o
protagonista adorava falar grosseria para todo e qualquer antagonista, num nível que ficou
óbvio, repetitivo, incoerente e chato. Óbvio porque eu nem precisava mais adivinhar em quem
eu deveria confiar ou desconfiar, quando o protagonista fazia grosseria, eu já sabia que não era
para confiar nele. Repetitivo porque, como eu disse, acontecia com todo e qualquer
antagonista. Incoerente porque muitas vezes os antagonistas acabavam engolindo os
desaforos de uma forma que eles não eram obrigados a engolir — afinal, eles eram
antagonistas, tinham recursos para fazer o protagonista pagar pela língua. E chato porque,
céus, como cansa ficar lendo personagens grosseiros. Já basta aturar gente assim entre os
parentes e no trabalho na vida real.
Todo e qualquer comportamento antipático tem que ser usado com cautela e sabedoria. É legal
ler o protagonista jogando verdades na cara do antagonista. É legal ler um casal brigando e
depois se apaixonando. É legal ler um personagem que sempre tem uma resposta na ponta da
língua. Mas se a gente sobrecarregar o enredo com esse tipo de situação, enche o saco.

Como manter a empatia

Mas se identificar ou admirar um personagem é apenas o pontapé inicial. O que realmente


sustenta a empatia durante a história inteira é as virtudes e os vícios dos personagens.
Nós torcemos até o final pelos protagonistas por causa das suas virtudes. Torcemos porque
eles demonstram companheirismo pelos seus colegas, amor pela família, caridade e
compaixão pelos mais necessitados. Seja quando ajudam um animalzinho ferido ou quando
sacrificam seus objetivos pessoais para ajudar um amigo, dá gosto ver esse tipo de gente
vencendo no final.
Isso parece clichê, mas pense nos personagens que nós gostamos e nos que não gostamos.
Em O Diabo Veste Prada, a gente torce pela Andrea e até consegue gostar da Miranda, mas
todo mundo detesta os amigos e o namorado da Andrea, que só atrasam a vida dela. Em
Titanic, a Rose é basicamente a única pessoa rica que conseguimos gostar. Em Django Livre,
sentimos uma satisfação enorme em ver Jamie Foxx metendo bala em escravagistas na
mesma proporção que em ver o Leonardo DiCaprio sendo baleado.
E assim como nos conectamos pelas virtudes dos heróis, nos conectamos com os vícios dos
vilões — e dos anti-heróis. Admiramos a inteligência de Hannibal Lecter. Compreendemos o
amor implacável de Cersei Lannister. Ficamos encantados pela obsessão do Conde Drácula.
Simplesmente adoramos quando um vilão faz um discurso e pensamos “é, até que ele tem
razão”. Procure em seus sentimentos, você sabe que falo a verdade. Bons vilões nos fazem
adorar odiá-los ou odiar adorá-los. Porque, no fundo, nos identificamos com seus vícios.
Mas lembre-se que um personagem simpático, mas sem virtude nenhuma pode simplesmente
não cativar o público. Imagina que tudo que o personagem faz é tratar as pessoas ao seu redor
com educação. Isso pode parecer o suficiente, mas ainda assim falta algo. Humildade,
generosidade, paciência, caridade, inteligência, coragem, ambição, alguma virtude, algum valor
que nós temos e gostamos quando são reconhecidos ou que gostamos de encontrar nas
pessoas ao nosso redor. Sem virtudes, a gente até consegue ler o livro todo, mas não se apega
ao protagonista e simplesmente esquece depois. Um personagem sem virtudes é alguém que
não nos faz torcer pelo seu sucesso, o que torna suas vitórias indiferentes.

Empatia fora da caixa


E tem também aqueles personagens que simplesmente são muito legais, mas acho que eles
funcionam melhor como secundários do que como protagonistas ou antagonistas. Lancelot das
Lendas Arturianas, o Chapeleiro Louco de Alice no País das Maravilhas, Barney de How I Met
Your Mother, o Gênio da Lâmpada em Aladdin. Quem não gostaria de ter esses personagens
como melhores amigos? Lógico que é possível admirar ou se identificar com eles, lógico que
eles têm virtudes e vícios, mas na maior parte do tempo eles dão suporte para os protagonistas
e para o enredo — e fornecem frases de impacto inesquecíveis.
Essas são as principais formas de criar empatia pelos personagens: identificação, admiração,
virtudes, vícios e um comportamento muito legal.
Só não espere que os leitores gostem de um personagem só porque ele é muito legal. Lembro
que li um livro em que o protagonista era Lúcifer, e ele era todo poderoso, e tinha uma
presença avassaladora, e conseguia tudo o que queria, e me dava vontade de dormir. Logo no
começo do livro, Lúcifer chegava num prédio, falava com a recepcionista e subia até a
cobertura para falar com um grande empresário. Ele não usou nenhum poder mágico para
enfeitiçar a recepcionista, só falou com ela e conseguiu passagem pela lábia. Mas o diálogo era
muito fraco! Não fez sentido nenhum ele subir e encontrar o empresário! Ele é Lúcifer e
consegue convencer a recepcionista a deixá-lo passar só pela lábia, mas a lábia apresentada
foi totalmente medíocre! E esse tipo de diálogo se repetia o livro inteiro! Aff! O autor queria que
o Lúcifer fosse muito inteligente, charmoso e descolado, mas o leitor não vai achar isso tudo,
se não tiver motivos para achar isso tudo. Então, quando quiser apresentar um personagem
muito legal, lembre-se de construir essa impressão nos leitores, sem nunca esperar que os
leitores simplesmente vão gostar do personagem porque você disse que ele era muito legal.

Conclusão

Os leitores não vão se apegar aos seus personagens de imediato e muito menos de graça. A
empatia é construída conforme os personagens são apresentados e desenvolvidos na história.
Crie cada personagem com esmero e escolha quais elementos você vai usar para gerar
conexão com os leitores. Seus personagens vão conduzir seus leitores até o final da sua
história — ou vão fazê-los desistir e detestar o seu livro.
8. Diálogos

Nunca conheci um leitor que não gostasse de um bom diálogo. Pelo contrário, os leitores
sempre ressaltam os bons diálogos dos seus livros favoritos. É através dos bate-papos e dos
discursos que os personagens realmente se destacam, não só pelas suas ideias e
divergências, mas também pela forma como se expressam. Os diálogos podem tornar uma
história única — ou pode arruiná-la. A seguir, confira três dicas para melhorar sua escrita.

Por que escrevi esse artigo?

Antes de mais nada, quero contar uma breve história. Eu decidi escrever esse texto porque,
quando comecei minha carreira de escritor, os diálogos eram o meu ponto fraco. Meu
Calcanhar de Aquiles.
Sei disso porque já havia ganhado um concurso cultural, mas com um conto quase sem falas.
Então, na faculdade, por coincidência — e um pouco de mérito —, eu passei a ser visto como o
aluno que escrevia bem. E uma professora pediu para ler um conto meu. Eu escrevi, mostrei a
ela e fui elogiado. Com um porém: os diálogos não estavam muito bons.
Eu meio que já sabia que tinha essa dificuldade. Num paradoxo irônico, sempre adorei ler
diálogos, mas quando fui escrever, eles foram minha maior dificuldade. Se eu continuasse a
escrever sabendo que as falas dos meus personagens não estavam boas o suficiente, não me
sentiria um autor bom o suficiente. Eu precisava resolver essa questão.
E o que fiz? Estudei. Li um livro sobre o assunto, pesquisei na internet e pratiquei. Pratiquei
muito. E continuo praticando. Posteriormente, outros professores pediram para ler meus
contos. E passaram a elogiar os diálogos. Hoje, com dois livros publicados, os leitores e críticos
literários costumam ressaltar a qualidade dos diálogos também.
Por isso tenho certeza que sempre podemos melhorar. Podemos pesquisar, estudar e exercitar.
Podemos transmutar fraqueza em força. Se eu saí de um futuro escritor com diálogos fracos
para um escritor publicado com bons diálogos, acredito que todos podem melhorar, seja um
iniciante ou um expert. Se você também busca melhorar sempre, boa leitura.

Não seja formal demais

Nossa fala é essencialmente informal. O escritor precisa encontrar o equilíbrio ideal entre a
licença poética para que seus personagens não falem como se estivessem recitando um
manual de instruções e a fidelidade à forma culta padrão para o texto não ficar sobrecarregado
de oralismo. O escritor precisa manter a forma culta padrão durante descrições e narrações,
tanto quanto precisa flexibilizar seu vocabulário durante os diálogos.
O equilíbrio ideal depende de cada escritor, do seu público-alvo de leitores e da história em si.
Uma narrativa contemporânea pode ter mais gírias, enquanto que uma narrativa nos séculos
ou milênios passados pode precisar apenas de uma pequena dose de informalidade para uma
conversa não ficar artificial. Não existe uma tabela de informalidades permitidas ou proibidas ou
qualquer fórmula de bolo aqui, cabe ao escritor praticar e desenvolver a própria voz.
Particularmente, prefiro ler “me passa o sal” do que “passa-me o sal” simplesmente porque
ninguém fala da segunda forma, por mais que seja gramaticalmente incorreto começar frase
com pronome oblíquo. Por outro lado, não gosto de misturar “você” com “tu” — e
respectivamente “seu” e “teu” ou “lhe” e “te” —, então busco usar o “você” sem pronome
oblíquo. Exemplo: não escreveria “você pode me dizer o seu telefone, vou te ligar depois”, pois
o “te” se refere a “tu” e não a “você”, mas também não escreveria “você pode me dizer o seu
telefone, vou lhe ligar depois” porque ninguém falaria assim. Optaria apenas por “você pode me
dizer seu telefone, a gente se fala mais tarde”. Dessa forma, não misturo nada e mantenho a
oralidade.
Outra questão que também rondou minha mente foi usar “para” ou “pra”, “está” ou “tá”, “estou”
ou “tô” e outras abreviações. Nesse caso, decidi sempre usar o “pra” nos diálogos porque me
soa artificial imaginar a voz de um personagem e então ler um “para”, fica evidente que o autor
só escreveu assim para manter a forma culta. Porém descartei qualquer “tá” ou “tô” e afins, pois
me pareceu exagerado ou até desleixado. Ler “estou com saudades” ou “o almoço está pronto”
não me incomoda como ler um “comprei um presente para você”. Talvez concorde ou discorde
de mim, o que importa é você tomar as suas decisões sobre sua voz narrativa com consciência
e propriedade.
Conversas precisam ser fluídas, jamais rígidas. A regra de ouro é ler o diálogo e não ter aquela
sensação de “ninguém falaria assim na vida real”.

Torne o personagem singular

Pessoas têm trejeitos e maneirismos. Um personagem com um modo de falar próprio tem boas
chances de cativar o leitor, desde que o escritor não cometa um preconceito linguístico. Pode
ser um vício de linguagem, uma gíria, uma mania ou a obsessão de contar a mesma história o
tempo todo, os leitores adoram esses tipos de personagens — ou adoram odiar, dependendo
do caso.
Renata Ventura, por exemplo, emula os sotaques de diferentes estados brasileiros através dos
seus personagens, tornando-os únicos e inesquecíveis. Particularmente, busco diferenciar os
diferentes povos do mundo através de detalhes na fala — anões nunca usam ponto de
interrogação e elfos usam muitas metáforas em suas falas, por exemplo. E como não lembrar
do Coringa do Heath Ledger contando versões diferentes das origens das cicatrizes dele —
entre uma lambida no lábio e outra — ao longo do filme do Batman: O Cavaleiro das Trevas?
Outra opção interessante é dois ou mais personagens terem uma forma específica de falar
entre si, talvez até um código. Pode ser porque são amigos de longa data ou profissionais que
precisam falar coisas importantes com discrição, essas pessoas têm uma ou mais frases-chave
que vão ser recorrentes na narrativa, compreendidas apenas por elas e pelo leitor. Lembro dos
livros Os Karas, do Pedro Bandeira, onde as crianças tinham um clube secreto cheio de
códigos entre elas, ao ponto de uma delas cruzar os braços como um sinal para a outra ficar
em silêncio durante uma discussão na diretoria do colégio até que um dos adultos reclamou
que aquilo não era postura de um aluno.
Mas também é importante salientar que preconceito linguístico — retratar de forma pejorativa
um grupo social — é inadmissível. Por mais que grupos de pessoas usem variações
linguísticas que geram algum estranhamento a outras pessoas, é ofensivo retratar um
personagem através de estereótipos pejorativos, sob o risco de cometer crime de racismo,
homofobia e afins. Quando for representar um grupo social através de uma fala específica, faça
isso com espontaneidade e lisonjeio, jamais através de um insulto.
Para praticar, escolha um personagem e experimente dar a ele um vício de linguagem ou jeito
de falar bem específico.

Info Dump jamais

Com certeza o pior pecado dos diálogos — e da narrativa em si — é o “info dump” — o


excesso de exposição, tornando o texto sobrecarregado e artificial.
É comum o escritor encontrar o dilema de precisar explicar algo da história e não ter certeza de
como fazê-lo. Compreender esse dilema é o primeiro passo. “Essa conversa é importante, mas
ficou artificial”. Talvez o diálogo possa ficar mais espontâneo ou talvez seja melhor explicar o
contexto de outra forma. Um diálogo ruim não é uma opção. Nunca.
Outro info dump comum é quando os personagens se apresentam demais ou introduzirem um
assunto já conhecido pelos personagens, mas novo para o leitor de forma clichê, o que é
péssimo. “Eu sou aquele tipo de pessoa que…”, “você me conhece, eu sou…”, “como você
sabe, nossa missão é se infiltrar na base inimiga”, você com certeza já leu essas variações
algumas — muitas — vezes. Nesse caso, uma solução é a boa e velha regra de ouro “mostre,
não conte”. Narre uma cena que demonstre o caráter do personagem, apresente um dilema
moral durante uma conversa ou simplesmente uma divergência de opiniões entre o elenco.
Mais uma solução para o info dump é precisamente o contexto ao redor do diálogo. Onde e
quando os personagens estão conversando? Se for um patrão abusivo, é melhor apresentá-lo
em casa com a família ou gritando com os funcionários no escritório? Seguindo essa lógica, se
temos um jovem inconsequente, ele pode estar matando aula ou saindo da sala da diretoria.
Um mago poderoso pode dividir a atenção entre o protagonista e um tomo arcano ou pode
apressar a conversa porque tem uma reunião agendada com um semideus extradimensional
em meia hora. Em qualquer uma dessas cenas, uma única linha de diálogo pode funcionar mil
vezes melhor do que um parágrafo inteiro dissertando sobre cada personagem.
Info dump é um assunto que poderia levar a outro artigo por inteiro, mas por enquanto vou
encerrar com o lembrete: aconteça o que acontecer, nunca use o info dump.

A prática leva ao aprimoramento

Escrever bons diálogos pode ser um desafio, mas como tudo na vida, quanto mais prática,
mais facilidade.
Minha última recomendação é: escreva uma cena apenas de conversa, nada mais. Depois
revise. E depois mostre para alguém e peça uma opinião externa. E depois revise de novo. E
depois escreva outra conversa.
Eu também tive dificuldades no início e hoje sou elogiado pelos diálogos. Não se esqueça que,
como qualquer arte, a escrita exige prática e aprimoramento constante. Todos podem — e
devem — buscar melhorar — e também experimentar coisas novas e diferentes.
Então, continue escrevendo.
9. Foco

Ouvi dizer que é necessário muito foco e disciplina para ser escritor. Acho engraçado, pois
tenho déficit de atenção, sou péssimo em foco e disciplina e mesmo assim escrevo num ritmo
consideravelmente bom. Meu segredo é escrever mesmo quando estou desfocado — o que
não quer dizer que consigo escrever quando minha filha senta do meu lado e começa a me
contar as histórias dos jogos favoritos dela, é claro.
Muitos gostariam de começar o dia com algumas horas livres — e a compreensão e respeito
dos parentes — para escrever o próximo livro, como Stephen King. Acontece que ter foco não
é ter um cenário ideal para escrever. Pelo contrário, foco é criar o melhor cenário possível para
escrever e também é escrever no pior cenário possível. Eu escrevi parte do meu primeiro livro
num tablet quando meu computador pifou, por exemplo. Era extremamente desconfortável,
mas eu mantive meu foco.
E também não acredito no “melhor possível”. Eu acredito em “dentro do possível, o melhor”.
Parece que as duas frases dão na mesma, não é? Mais para frente, explicarei a diferença.
Mas primeiro eu vou lhe falar como criar o melhor cenário possível para você ter foco na escrita
e como escrever mesmo no pior cenário possível.

Como manter o foco

Preparar, apontar e fogo! Seria bom ter o foco preciso e com resultados explosivos como um
míssil em plena rota de colisão. Infelizmente, nosso cérebro não é assim. Os pensamentos
fluem e dispersam, às vezes parecem sumir, às vezes parecem tijolos sólidos dentro da mente.
Precisamos filtrar e organizar as ideias e a melhor forma é… bom, acredito que a melhor forma
é ter o foco de um míssil. Preparar, apontar e fogo!
Preparar o foco é eliminar suas distrações. Não é só ficar longe de redes sociais, Wikipédia e
Netflix, é compreender qual é o melhor horário para sua mente produzir sua escrita e
comunicar a todos ao seu redor que você está indisponível naquele momento. Experimente
acordar mais cedo para escrever — antes das distrações acordarem —, ou escrever logo
depois do expediente — aproveitando que sua mente já está no fluxo produtivo —, ou escrever
de madrugada — o melhor horário para mim, particularmente. Experimente até encontrar a
combinação entre o horário com menos distrações e que sua mente esteja mais fértil. Talvez
não dê para ter o melhor dos dois mundos, então compreenda o que está dentro do possível e
escolha a melhor opção.
Apontar o foco é ter um ritual para a escrita. Eu gosto de jogar uma partida de videogame para
espairecer, pegar um café, ligar uma música que combine com a escrita do momento e botar a
mão na massa. Não adianta ter o ambiente ideal no meu quarto, se não tiver o ambiente ideal
dentro da mente. Estudos comprovam que manter uma sequência de ações ajudam nosso
cérebro a se preparar para certas atividades, seja um trabalho, esporte ou arte. Nossa mente
precisa estar tão organizada, limpa e confortável quanto o ambiente físico em que escrevemos.
Fogo é o ponto de ignição da escrita focada. É quando sentamos no computador e botamos os
dedos no teclado que todas as distrações berram ao mesmo tempo, seja o vizinho fazendo
barulho, um parente chamando, um telefone tocando ou até aquele vídeo no YouTube que você
começa a assistir sem motivo nenhum. Podemos lidar com a maioria das distrações, mas tem
uma coisa mais importante do que isso: escrever mesmo com as distrações. O cenário ideal
não existe. Lembra que falei que gosto de escrever de madrugada depois de jogar videogame?
Pois é, estou escrevendo esse artigo às 13h de uma segunda-feira e sem ter jogado nada.
Tenho mil coisas na cabeça — e mil abas no navegador abertas —, como as provas da minha
filha que começam amanhã, o Whatsapp Web que não para de apitar e um livro em PDF aqui
me chamando para lê-lo. E estou escrevendo.
Esse é um dos motivos de falar “dentro do possível, o melhor” em vez de “o melhor possível”.
Na minha cabeça, o melhor possível seria escrever de madrugada com café depois de jogar
videogame. Mas o que de fato tenho dentro do possível é um começo de segunda-feira com
café, então vou fazer o meu melhor agora! Não vou esperar a próxima madrugada para tentar
ter a escrita perfeita, até porque eu posso estar tão cansado que vou me render ao Whatsapp
e/ou o tal PDF aqui — a propósito, é o livro de RPG Tormenta 20, muito bom.
Permita-me contar uma fábula antes de continuar. A raposa estava andando na floresta, viu
uma tartaruga e pensou “me dei bem, encontrei janta”. A tartaruga viu a raposa e pensou “me
ferrei, virei janta”. E então a tartaruga se encolheu e não fez mais nada. Só ficou ali, protegida
dentro do casco, enquanto a raposa a rodeava e farejava. Até que a raposa cansou, foi embora
e a tartaruga não virou janta. Essa fábula se refere à arte da meditação e ensina que devemos
continuar focados mesmo quando temos pensamentos intrusos dentro da nossa cabeça como
raposas famintas. Acredito que essa metáfora também sirva para o foco na escrita.
Estamos muito longe de termos o sossego e o foco do Stephen King. Mas o próprio King
também estava longe de ter tudo isso enquanto escrevia seu primeiro livro, Carrie, A Estranha,
não é mesmo? King também já teve outros empregos, já tinha família, morava num trailer e
tinha um vício voraz por drogas — o pior de tudo. Ele não conseguiu o sossego e o foco para
se tornar um bestseller multinacional. Ele teve foco em meio às distrações da vida, se tornou
bestseller multinacional e só depois conseguiu o sossego. Então nos resta escrever com o
desassossego que a vida oferece para alcançar nossos sonhos. Um dia de cada vez. Palavra
por palavra do nosso próximo livro.

Como Compreender as Distrações

Eu acredito que a gente não consegue resolver um problema sem antes compreendê-lo. Por
isso vou falar aqui das 3 distrações mais óbvias e das 3 distrações mais sutis que sabotam o
nosso foco. Depois, vou falar sobre como lidar com as distrações, mas não adianta saber a
solução sem compreender o problema, seria como aprender a afinar um violão sem aprender a
identificar a corda desafinada. Teste as cordas do violão prestando bastante atenção em cada
uma até ouvir qual ou quais estão desafinadas e então ajuste-as.
As distrações mais óbvias de todas são as redes sociais — como Facebook e Instagram — e
os canais de entretenimento — como YouTube e Netflix. Acontece que nossa mente leva entre
10 a 20 minutos para se concentrar em uma atividade. Se você parar o tempo todo só para
verificar a notificação do seu celular, isso já atrapalha demais o seu foco. Na terceira ou quarta
vez que estiver sentindo dificuldade de focar e “só olhar mais uma notificação”, você já vai
desbloquear a tela e se render ao vício. Da mesma forma, os 20 minutos iniciais de foco podem
parecer frustrantes, mas faz parte! Não é porque a raposa está rondando há 20 minutos que
você não vai conseguir alcançar o foco. É importante não se render às distrações nesse
estágio inicial, nem às pequenas e nem às maiores.
Uma distração óbvia, porém delicada é a vida social. É lógico que ninguém vai abrir mão da
vida social — tanto quanto não vai abrir mão do Facebook, YouTube e afins. Mas, porém,
contudo, entretanto, todavia, não obstante nós precisamos dosar nossa vida social tanto quanto
todas as outras distrações. Depois de uma longa semana cansativa de trabalho, tudo o que a
gente quer é relaxar com família, amigos e/ou pessoa amada. E eu realmente acredito que vida
social é uma das melhores e mais importantes coisas da vida. Acontece que eu tenho um foco:
escrever meus livros. E se sinto que não escrevi o suficiente, vou pedir licença à minha família
e amigos para me dedicar à escrita. Ontem mesmo, meus amigos jogaram RPG via Discord e
eu não pude comparecer. Foi chato, faz tempos que não interajo com o pessoal, ia ser um bom
momento para espairecer, mas olhei para todas as minhas tarefas acumuladas e avisei que
não poderia estar com eles. É lógico que vou me esforçar para poder socializar na próxima
oportunidade, não sou louco de sacrificar minha vida social em hipótese nenhuma. Vida social
é indispensável, mas não em excesso. Se você socializa todos os fins de semana, acredito que
seja saudável você se fechar no seu quarto ao menos um fim de semana por mês — no
mínimo — para escrever e ficar livre para socializar em todos os outros.
A última distração óbvia é trabalho e estudos em excesso. E tanto quanto não devemos
sacrificar vida social, também não devemos sacrificar trabalho e estudos, é lógico. Mas você
precisa fazer hora extra sempre? Precisa fazer aquele bico no fim de semana para angariar uns
trocados a mais? Precisa pegar ainda mais matérias na faculdade? Se você realmente precisa
disso tudo, sem problemas, acerte a sua vida pessoal primeiro e escreva depois. Mas avalie
bem se você realmente precisa disso tudo. Eu fiz uma pós-graduação alguns anos atrás e me
arrependi. Foi importante? Sendo brutalmente honesto, não. Aquela pós não moveu a minha
vida para nenhuma direção que eu desejo seguir. Aprendi coisas valiosas, mas que não uso
para nada. Frisando: não sacrifique trabalho e estudos, apenas compreenda se você realmente
não está fazendo a mais do que precisa às custas de ter tempo para se dedicar para realizar
seus sonhos. Se suas horas de trabalho e matérias de estudo extras movem sua vida na
direção que ela precisa seguir, foque nisso. Se o que você quer é ser um autor ou autora de
sucesso, foque na sua escrita.
A maior de todas as distrações sutis é a leitura. Se você leu tudo até aqui, já entendeu que a
meta não é eliminar por completo as distrações e sim dosá-las de forma que elas não
atrapalhem a sua escrita. E a verdade é que muitas pessoas leem muito e escrevem pouco —
algumas não escrevem nunca. Acho lindo quem lê um livro por semana ou até mais, de
coração. Mas quantos livros você leu e quantos capítulos do seu livro escreveu? Se você leu
um livro inteiro e não escreveu nenhum capítulo do seu livro, não acha que essa relação está
desnivelada? Na minha humilde opinião de um mero mortal, duas horas de leitura e uma hora
de escrita é um ritmo saudável. Então, se você consegue ler por seis horas num domingo,
poderia ler quatro horas e escrever duas. Se você lê uma hora por dia, poderia ter dois dias de
leitura e um de escrita. É impossível escrever bem sem ter uma rotina de leitura saudável, mas
se você quer ser escritor ou escritora, precisa botar a mão na massa.
Eu já falei de família no parágrafo sobre vida social, mas a gente sabe que família não é só o
almoço de domingo. Você provavelmente tem convívio constante com ao menos um parente,
talvez vários e isso não ocupa só o tempo, ocupa também a mente. Nossos pais estão bem de
saúde? As crianças estão tirando boas notas na escola? Todos os irmãos e/ou primos estão
empregados? O fato é que é muito mais fácil desmarcar um encontro com os amigos do que
não atender a um telefonema de um parente. Mas vamos ser francos aqui, sua família não
precisa de você 100% do tempo. Só bebês precisam de atenção 100% do tempo. E mesmo
assim, eu acho muito justo deixar um bebê com os avós para que a gente possa escrever por
uma horinha. Família provavelmente é o elemento mais difícil de dosar porque não depende só
de nós mesmos. Particularmente, sou a favor de me relacionar só com quem me compreende e
me afastar de quem não me apoia, o que inclui minha família. Pode custar um enorme esforço
ter uma conversa franca e pedir para ter mais tempo, privacidade e paz para escrever, mas
todos ao seu redor precisam compreender que você precisa disso. E, se não compreendem,
não deveriam estar ao seu redor.
Ainda assim, a distração sutil que mais destrói escritores e escritoras é o perfeccionismo. Todos
queremos escrever a melhor história possível. Mas autocrítica em excesso logo vira
autojulgamento, que vira a autossabotagem mais venenosa de todas. Seu livro não vai ser
perfeito, e está tudo bem. Nenhum alpinista chegou no topo do Everest sem antes subir os
pequenos morros da própria cidade. Seu foco não é escrever o melhor livro de todos os
tempos. Nem ser tão bom quanto os melhores escritores de todos os tempos. Seu foco é
escrever o melhor capítulo que você pode escrever hoje. E então o próximo capítulo vai ser
melhor. E o próximo, melhor ainda. E assim você vai escrever o melhor livro que pode escrever
hoje. E o próximo livro vai ser melhor ainda. Dedique todo o seu esforço e esmero a cada
etapa. E quando não se sentir bom ou boa o suficiente, olhe para quantos livros — e filmes,
músicas e jogos — a gente gosta e não são perfeitos. O que importa é fazer a nossa arte do
nosso jeito e dar o nosso melhor. Tendo isso em mente, com certeza nosso livro vai ser o
favorito de ao menos um leitor. E depois de outro. E depois de mais outro. E assim vai.

Inclusive, tive que parar de escrever esse parágrafo anterior para botar minha filha no banho.
Como disse, as distrações são inevitáveis. A questão é como a gente as administra — e como
se esforça para não perder o foco depois de uma interrupção.

Como lidar com distrações

Não é nenhuma novidade que apenas saber os problemas não é o mesmo que resolvê-los.
Então vamos ao que interessa. A seguir, quatro formas de lidar com as distrações.
O que mais queremos é eliminar as distrações. Se possível, essa é a melhor opção — o
problema é esse “se”. Algumas opções que estão ao nosso alcance são: deletar aplicativos no
celular que só nos distraem, cancelar redes sociais inúteis, se desapegar de alguns hábitos
viciosos, talvez até cortar relações com pessoas que nos atrapalham. Particularmente, eu
escrevi partes do meu primeiro livro dentro da empresa em que eu trabalhava, fora do meu
horário de serviço, pois conseguia ter menos distrações lá do que em casa. Se você puder
escrever em outro ambiente — talvez levando um notebook para fora de casa —, essa opção
em específico é poderosa. A má notícia é que não é possível eliminar por completo todas as
distrações.
Nesse caso, precisamos conciliar as distrações. Eu costumo até mesmo fazer barganhas
comigo mesmo. Tipo “vamos lá, revisa mais 5 páginas e depois vê aquele vídeo no YouTube”.
Transformar a distração numa recompensa após o foco pode motivar, por mais estranho que
isso seja. Algumas pessoas preferem estabelecer horários, como entrar em redes sociais só à
noite ou desligar todas as distrações durante uma ou duas horas de foco. Para mim, não
funciona, mas você pode testar. Eu falei sobre manter o foco mesmo com a raposa ao redor,
lembra? Às vezes eu estabeleço um ritmo de escrever uma página, olhar o whatsapp, escrever
mais uma página, olhar o whatsapp de novo e assim vai. Está longe de ser o ideal, mas
funciona comigo — e é melhor do que me julgar e frustrar por não ter o foco ideal e acabar
desistindo de vez. Se você consegue estabelecer um alto nível de disciplina, parabéns. Se não,
não é o fim do mundo. Aceite a raposa e segue o seu próprio fluxo, sem se julgar ou frustrar.
E se não pode vencer a raposa, una-se a ela. Ninguém é de aço, ninguém vive sem
procrastinar nunca. O X da questão é manter a procrastinação como exceção à regra, não
como a própria regra. Identifique e compreenda suas distrações imbatíveis e abrace-as. Tire
uma ou duas horas na semana para chafurdar nessa distração, como um “guilty pleasure”. Isso
pode lhe ajudar a relaxar e até a se cobrar mais depois. Ontem mesmo, eu estava me
preparando para revisar um texto, assisti a três vídeos no YouTube, abri o texto, morri de
vontade de voltar para o YouTube e falei para mim mesmo “não, já vi vídeos demais, agora eu
vou trabalhar e, daqui a cinco páginas, vejo mais um”. Como eu disse, longe de ser o ideal,
mas funcionou: terminei a revisão do texto.

No fim das contas, muito depende da sua tentativa e erro. Minha mãe é uma pessoa
extremamente disciplinada e prega o foco total, o que nunca funcionou para mim, pois somos
pessoas diferentes. Por isso me esforço para apresentar opções diferentes, pois sei que o que
funciona para uns, não funciona para outros. Portanto cabe unicamente a você testar, errar e
testar mais, até acertar e estabelecer seu próprio ritmo.
Inclusive, recomendo que você anote as ideias que pareceram mais eficientes, experimente-as
e crie a partir daí o seu próprio método. Isso vai ajudar a botar o seu cérebro para funcionar.

Dentro do possível, o melhor

Não adianta idealizar o cenário ideal e se frustrar por não alcançá-lo. O caminho para
alcançá-lo é compreendendo o cenário atual, usá-lo da melhor forma possível e, aos poucos,
adaptá-lo para melhorá-lo cada vez mais. E um dia alcançar o tão desejado cenário atual.
Gosto de manter os pés no chão e a cabeça nas nuvens, só não podemos esquecer que são
os pés que nos levam de fato para onde queremos chegar — e que nos fazem ficar parados no
mesmo lugar ou nos levam a nos perder. Ou seja, use a cabeça nas nuvens para enxergar os
caminhos ao longe, foque no terreno firme e caminhe em direção aos seus objetivos, sempre
conciliando a cabeça nas nuvens e os pés no chão.
10. Bloqueio Criativo

Bloqueio criativo é o pior pesadelo de 92.87% dos escritores — esse dado é totalmente
preciso, eu mesmo fiz a pesquisa diretamente da minha cabeça e digitando as teclas
aleatoriamente depois do 9. Dispersei? Desculpa, é que eu tenho déficit de atenção. Como ia
dizendo, o bloqueio criativo assombra a maioria dos escritores. Parece que as ideias se
esgotaram, ou que elas estão aqui dentro, só se recusam a sair. Já sentiu isso? Sim ou
sempre? Por isso decidi trazer 13 dicas para superar o bloqueio criativo — prometo que meu
déficit de atenção não vai retornar ao longo do artigo, pode ler sem receios.

Mergulhe no gênero

O escritor lê diversos livros de um gênero que adora — ópera espacial, por exemplo. E vê
filmes desse gênero. E joga videogames desse gênero. Talvez assista a animes também. Ou
até jogue RPG. Então tem várias ideias. Começa a escrever. Fica empolgado com a própria
história. E escreve mais. E mais. E mais. E trava. E questiona se tem talento o suficiente. Em
vez de se questionar, é válido conferir quanto tempo tem que não leu, assistiu ou jogou algo
dentro desse gênero.
Às vezes, por conta de trabalho, estudos, vida social e tudo mais, a gente fica afastado do que
gosta e isso é natural. Então, para conquistar o sonho de contar nossas histórias, nos forçamos
a escrever com rigor, o que também toma muito tempo. Mas uma hora a inspiração seca e
precisamos ir buscar mais. Digo por experiência própria, algumas horas lendo, assistindo ou
jogando o que gostamos pode ser tudo o que precisamos para voltar a escrever com ímpeto!
Seja revistando uma história que influenciou sua obra ou desbravando histórias diferentes que
você não havia experimentado ainda — talvez clássicos, talvez a última novidade lançada —,
não podemos esquecer que, para transpirar, precisamos inspirar primeiro.

Fuja do gênero

Falando em inspiração e criatividade, o excesso também pode ser um problema. Pode ser que
ler, assistir e jogar demais o mesmo gênero acabe bloqueando nossas ideias. Quando nos
damos conta, estamos copiando e não criando, ou simplesmente sem ideia nenhuma na
cabeça. E quanto mais buscamos inspiração, sentimos o bloqueio ainda mais intenso. Pode ser
contraintuitivo, mas talvez o melhor seja justamente mudar os ares nesses momentos.
Experimente consumir histórias de qualquer outro gênero. Star Wars — ficção científica — se
inspirou em muitos gêneros, desde velho oeste a samurais, além de fábulas e mitologias, por
exemplo. R. A. Salvatore criou a cultura dos elfos negros da saga A Lenda de Drizzt — fantasia
medieval — inspirado em O Poderoso Chefão. Um dos contos do meu livro A Era do Abismo:
Crônicas do Éden se chama O Silêncio dos Condenados, tente adivinhar qual foi minha
inspiração.
Pense fora da caixa. Tire da estante aquele livro do seu pai, mãe, irmão, irmã, namorado ou
namorada e dê uma lida como quem não quer nada. Vá ao cinema mais próximo e experimente
algo diferente do que escolheria em qualquer outro dia. Ouça outros gêneros musicais ou mude
o canal da televisão por um dia, que seja! O que importa é trazer novidade para dentro do seu
cérebro para arejar suas ideias.

Não desista de primeira

Deixa eu contar rapidinho como comecei a escrever esse texto que você está lendo agora. Eu
havia começada outro texto e então achei que estava ficando ruim. Decidi fazer uma pausa.
Dias depois, voltei nele e já não achava tão ruim. Fiz os ajustes que achei necessário, mas
ainda não estava satisfeito. Percebi que precisava escrever outra coisa antes dele. Movi aquele
texto para outra pasta e criei o arquivo do artigo atual. Aconteceu algo parecido com outros
textos meus. Achei que não estavam bons, parei e, quando voltei, eles estavam bons sim. Eu
só precisei não desistir deles.
Não é porque uma ideia está parecendo ruim, que ela com certeza seja ruim — pode ser que
até seja, mas é sempre importante avaliar mais de uma vez. Sabia que Stephen King jogou no
lixo o rascunho de Carrie: A Estranha — o livro que o tornou mundialmente famoso — e a
esposa dele achou o papel, leu e mandou ele continuar escrevendo? Se até Stephen King
achou que Carrie estava ruim em algum momento, o seu texto também merece mais uma
chance.
Não desista de um texto ruim de imediato. Eu já deletei um conto que estava ruim, mas eu reli
algumas vezes até ter certeza. Também já modifiquei um capítulo do meu primeiro livro quase
que por inteiro. Também já deletei um conto e recomecei do zero. Mas antes de tomar essas
decisões mais bruscas, eu li, reli, descansei e li de novo e aí sim dei o diagnóstico — um foi
para o esquecimento, outro foi brutalmente modificado e o último só precisei recomeçar do
zero, mas a ideia ainda era a mesma.

Volte duas casas

Essa dica funciona melhor para textos longos, mas também serve para curtos. Particularmente,
os capítulos dos meus livros têm entre cinco mil a vinte mil palavras. Quando sinto que travei
em uma parte, volto para o começo do capítulo e reviso tudo antes de seguir em frente.
Isso refresca as ideias que estão em andamento e ajuda o cérebro a voltar aos trilhos. Pode
ser que você encontre trechos problemáticos e corrija-os durante a revisão ou que retome o fio
da meada e consiga desengatar. Talvez sejam os astros se alinhando a seu favor. Eu não
entendo a ciência por trás de tudo, sei que funciona e estou aqui para te apresentar soluções,
não teorias.
Tanto quanto você enfia o dedão para reiniciar o computador travado, tente resetar sua
criatividade ao voltar ao começo do texto.

Escreva mais de uma coisa

Variedade faz bem para o cérebro. Há quem diga que faz bem usar sua mão inapta para
tarefas cotidianas, como escovar os dentes ou pôr a comida no prato, ou até comer comidas
diferentes para “desviciar” o cérebro e ficar mais inteligente. Seguindo essa lógica, faz bem
escrever coisas diferentes.
Se não está conseguindo seguir em frente com seu romance, talvez escrever um conto ajude a
criar algo novo e fresco para depois voltar revigorado ao seu projeto inicial. Escrever críticas
sobre os livros que leu — ou filmes, jogos ou tudo — também é uma boa forma de exercitar a
mente e fugir da mesmice ao mesmo tempo. Se você for doido o suficiente — como eu — pode
até escrever mais de um livro ao mesmo tempo, mas só recomendo algo tão extremo para
quem ama o caos — como eu.
Pode ser que você esteja plenamente capaz de escrever, só não é a vez desse texto que está
em aberto agora. Escrita não é um casamento, você pode pular a cerca e depois voltar sem
problema nenhum. Na verdade, talvez até faça bem. Quem sabe um conto interligado ao seu
livro atual não lhe ajude a compreender um certo personagem ou mundo ao redor dele e ainda
sirva como um complemento interessante para sua história?

Total abstinência

Por outro lado, excesso de informação pode sobrecarregar nossa mente. É como comer
demais e sentir o estômago estufado, sabe? Então a gente só deita na cama e deixa o corpo
fazer digestão até se sentir aliviado e voltar a viver. Algo similar pode acontecer com o cérebro:
excesso de informações entopem nossa criatividade e precisamos deixar a caixola digerir os
pensamentos para então voltar a confeccionar as próprias ideias.
A dica aqui é total abstinência mesmo. Tire um dia de folga para passear no parque, fazer uma
caminhada na praia, visitar os avós, praticar algum esporte. Yoga ou meditação também vale.
Ou aprender a tocar instrumento musical novo ou pintar uma tela a óleo. O que importa é fazer
algo extremamente diferente daquilo que está criando, com absolutamente conexão nenhuma.
Pode ser que você sinta até vontade de escrever enquanto está longe do seu texto — talvez
essa seja a deixa para voltar a pôr a mão na massa.

Não se cobre

Quanto mais a gente pensa num problema, mas grave ele parece. No caso do bloqueio criativo,
pode ser que pensar demais nele e insistir e solucioná-lo gere um efeito de “cutucar a ferida”.
Você sabe, quando a gente cutuca até aumentar ainda mais um machucado que já estava
quase sarado. No fim das contas, excesso de cobrança só leva a mais estresse e estresse só
agrava o bloqueio criativo.
Experimente fazer algo relaxante antes de escrever. Pode ser comer um doce, assistir a um
filme de comédia romântica, jogar videogame, o que preferir. O foco não é inspirar e nem
transpirar, é apenas espairecer. Afinal, o problema pode não ser o excesso ou a escassez de
inspirações e sim um estresse que impede que o cérebro processe a criatividade.
E quando sentar no computador — ou com seu caderno, papiro, seja lá o que for —, mantenha
a cabeça fria enquanto escreve. Você não precisa escrever o melhor livro do mundo, ou
escrever tão rápido quanto o Stephen King, nem nada disso. Você precisa contar a história que
quer contar, simples assim. Exigir demais de si mesmo é uma das autossabotagens mais
comuns.

Prazo

Mas, porém, contudo, entretanto, todavia, não obstante a gente precisa sempre ter uma noção
de prazo. Digo por experiência própria: quando eu não me dava prazos, meus projetos nunca
viravam realidade e hoje, que eu sempre estabeleço prazos, tenho resultados muito mais
substanciais.
Um professor de uma oficina escrita criativa que participei chamou isso de “soltar os
cachorros”. Sem prazo, os alunos nunca entregavam os trabalhos. Com prazos, entregavam
trabalhos ainda melhores! Afinal, a gente só sabe o quão rápido corre quando tem um cachorro
brabo perseguindo nossos calcanhares.
Comece estabelecendo um prazo para terminar a escrita do seu próximo capítulo ou conto. Se
não conseguir cumprir o prazo, dê foco total à escrita até concluí-lo. Ninguém torna um sonho
em realidade sem sacrificar algumas horas de sono ou algumas festas nos fins de semana.

Pense em alternativas

Algumas ideias são ótimas na teoria e não dão certo na prática. Talvez você tenha pensado
numa cena excelente, mas não tenha conseguido encaixá-la na sua história. Talvez seus
personagens precisem ir do ponto A ao ponto B, mas isso não faz sentido dentro da motivação
deles. Talvez o fato de você não ter planejado tenha te levado a um beco sem saída.
Pare e repense na sua narrativa. O erro está em algo que você escreveu e não ficou bom ou
está na dificuldade de seguir em frente de onde travou? Volte para a prancheta, revise os
planos, pense em alternativas para a sua história, faça todos os ajustes necessários e só
depois volte a escrever.
Replanejar ajuda tanto a resolver um problema que bloqueou a sua criatividade, quanto para
revisar e alimentar as ideias em sua mente e até para renovar seu fôlego para voltar a
escrever.

Prazer

Não faz sentido escrever, se isso não gera prazer. Consegue imaginar um cantor que não gosta
de cantar ou ilustrador que não gosta de ilustrar? A gente lê porque é prazeroso, logo a escrita
também precisa ser prazerosa.
É difícil sempre ter prazer quando estamos trabalhando num texto de dezenas de milhares de
palavras — talvez centenas de milhares. Se o texto atual não faz seus olhos brilharem como
antes, talvez você precise escrever aquele capítulo excelente, mas que ainda não era o
momento de escrever. Ou talvez você possa escrever qualquer outra coisa só pelo prazer de
escrever, o que te der na telha. Você precisa reencontrar o prazer na escrita de alguma forma,
talvez através de um método que só você seja capaz de descobrir.
Pare e pensa: por que não estou tendo prazer em escrever? Encontre o problema, resolva e
depois volte a escrever. Se você não está gostando de escrever, provavelmente nem ninguém
vai gostar de ler.

Beba café

Tudo bem, isso é algo bem particular, mas funciona comigo. Sério! Eu estou sentado sem
conseguir escrever, levanto, busco um café, tomo um gole e os dedos fuzilam o teclado. Isso
quer dizer que você também deveria ser viciar em café? Estou fazendo apologia? Sim, com
certeza. Beba café. Sério. Pare de ler, pegue um café e só depois continue.

Faça um ritual

Ritual é tudo o que fazemos de forma padronizada. Se a primeira coisa que você faz quando
acorda é escovar os dentes, isso é um ritual. Um tia minha sempre fuma depois de beber café,
o que também é um ritual. Todos nós temos rituais pessoais e isso influencia a forma como
nossa mente funciona. É como se certos gatilhos fossem acionados dentro da nossa cabeça.
Podemos usar isso a nosso favor. Crie o seu próprio ritual para escrever. Para mim, é ler um
capítulo de um livro ou jogar uma partida de videogame e depois tomar um café — além de
começar a sentir algum prazer com leitura ou a jogatina e das propriedades mágicas da
cafeína, o hábito ritualístico também me ajuda meu cérebro a “entrar no clima”. Experimente
condicionar a sua mente a uma ordem de fatores específica. Pode ser uma comida, uma
música, um banho quente, o que você quiser, apenas crie o hábito de escrever em seguida.
Se você achar essa ideia bizarra, pesquise “hábitos estranhos de escritores famosos”. Você vai
até se achar normal — ou vai gostar ainda mais de ser estranho. Preciso nem falar qual é o
meu caso, né?

Escreva mesmo sem vontade

Se nada funcionar, apenas escreva. É sério. Sei que é péssimo — sei MUITO bem que é
péssimo. Mas fazer o quê? Sendo brutalmente honesto, não podemos confundir bloqueio
criativo com procrastinação. Se você já tentou de tudo e continua com dificuldade, a solução é
nadar contra a correnteza e lembrar que feito é melhor do que perfeito.
Se você leu até aqui, deve estar com disposição para tentar de tudo. Seu livro precisa ser
escrito. Você precisa sair da inércia. Não é fácil, mas vale à pena. Pode ser que o texto passe a
fluir melhor depois do primeiro parágrafo. Talvez só depois da primeira página. Talvez nem flua,
mas pelo menos você escreveu! Ao menos você vai ter a sensação de progresso, o que
também é empolgante. Se você quer mesmo escrever, vai escrever de um jeito ou de outro.
Algumas pessoas comparam livros com filhos, não é mesmo? Pois é, a grande maioria dos
partos exige muito esforço e dor. Não sei como é dar a luz, mas tenho tatuagens, então posso
falar disso com mais propriedade. Dói. Sempre dói. Mas vale a pena e eu gosto. Para mim,
escrever é assim às vezes também. Dói, mas vale à pena.
A sua criatividade pertence a você

Criatividade exige esforço. Quando você começa a aprender algo novo, tem dificuldade até
pegar o jeito e então passa a fazer naturalmente, seja uma equação matemática ou um
instrumento musical. Criatividade não é diferente.
Sempre haverá obstáculos no caminho, a questão é saber como superá-los. Uma vez que
superamos, o próximo é mais fácil. E o seguinte é mais fácil ainda. E depois encontramos um
obstáculo mais desafiador do que nunca. Mas a vida é assim. A gente encara. Sofre. Supera. E
continua fazendo o que ama, mesmo sabendo que haverá dificuldades no caminho. Sempre há
obstáculos. Que venham!
Apenas lembre-se: somos os donos da nossa criatividade.
11. Envio de Originais

Escrever um livro exige um esforço hercúleo, mas é preciso mais do que escrever para ter um
livro publicado. Na verdade, escrever é a primeira etapa, depois precisamos revisar o nosso
próprio trabalho quantas vezes for necessário, enviar o original para as editoras, fazer o
copidesque e a revisão ortográfica, diagramação, capa, enfim muita coisa.
Infelizmente, temos mais livros sendo recusados pelas editoras do que aprovados. Pior, temos
bons livros sendo recusados. Pode parecer injusto um bom livro ser recusado, mas precisamos
entender por que isso acontece.
A editora não tem tempo de ler cada palavra de cada original que recebe antes de decidir qual
publicar e os profissionais envolvidos no processo de publicação também não serão leitores de
cada livro em que trabalham. Em outras palavras, o escritor precisa deixar claro de forma
sucinta sobre o que seu livro trata, seus pontos fortes, seus diferenciais e cada bom motivo que
o editor tem para apostar naquela obra.
Este capítulo vai esclarecer as principais etapas que uma editora leva para escolher qual livro
publicar para que você aumente suas chances de ter seu livro publicado.

Antes do original

O profissional que lê o original para ser aprovado pela editora é o parecerista, mas antes da
editora enviar um original para o parecerista, ela confere algumas questões: a proposta do livro
— também chamada de book proposal —, as redes sociais do autor e se o original está na
formatação exigida pela editora.
A propósito, o parecerista é o profissional responsável por de fato ler os originais e dar um
feedback para a editora. Ele já conhece as linhas de publicação da editora, conhece o mercado
editorial como um todo e entende das várias etapas de uma publicação. Em editoras menores,
um editor pode cumprir o dever de parecerista — como toda empresa que acumula várias
funções em um funcionário só —, mas o normal é ter um parecerista e algumas editoras
maiores chegam a ter vários pareceristas fornecendo múltiplas avaliações para cada original.
A proposta do livro é um texto que varia entre uma a dez páginas que explica todos os
aspectos que a editora precisa saber sobre a obra, desde sinopse, informações sobre o autor,
até o resumo de cada capítulo do livro. Falaremos com mais detalhes a respeito mais para
frente.
A editora também avalia as redes sociais do autor para conferir que tipo de postura ele adota
publicamente. Por exemplo: já houve caso de escritores comentarem de forma enervada nas
redes sociais sobre uma determinada editora estar demorando para responder se seu original
seria aceito ou não. Por motivos óbvios, nenhuma editora aprovaria um original de um autor
depois de ser ofendida em redes sociais, além de que outras editoras também pensariam duas
vezes antes de lidar com alguém com uma postura tão antiprofissional. Posturas intolerantes,
agressivas e/ou polêmicas podem ser mal vistas por qualquer tipo de empresa, incluindo
editoras.
A formatação do original é outro passo importante na avaliação. Se a editora especifica a fonte,
espaçamento, tamanho de letra, margem das páginas e afins, o original precisa estar nesse
formato específico para ser aprovado. Enviar um original fora da formatação exigida pode
indicar que o autor nem sequer se deu ao trabalho de ler os requisitos antes de enviar o livro,
ou que ele tenha preguiça de trabalhar no próprio texto, ou que não saiba cumprir exigências
externas. Seja qual for o motivo para um autor não formatar seu livro de acordo com as
especificações da editora, isso é um sinal que ele é um profissional menos qualificado para se
lidar.
Além da proposta do livro, das redes sociais e da formatação do original, muitas editoras têm
formulários de envio de originais. Como cada formulário é único, o que posso dizer aqui é que o
autor precisa dedicar atenção e tempo para preencher o formulário da melhor forma possível.
Tanto quanto o autor quer que seu original seja tratado com esmero, a editora também
demanda esmero por parte dos autores para aprová-los. Leia cada item e responda tudo sem
pressa. Pode ser cansativo, mas é a aprovação do original que está em jogo, então o
formulário precisa ser levado a sério.
Algumas editoras não oferecem formulário, mas pedem a proposta do livro. Outras oferecem o
formulário e não falam nada sobre a proposta do livro. De uma forma ou de outra, o autor
precisa estar preparado para enviar a proposta do livro e para responder ao formulário. Não
podemos prever o que cada empresa vai nos exigir, mas podemos e devemos estar preparados
para todos os cenários. A editora com certeza vai dar prioridade em analisar a proposta do
livro, ou o formulário, ou ambos, portanto essas são as etapas mais importantes antes do
original em si.

A Proposta do Livro

A proposta do livro é uma apresentação resumida do livro e deve conter todas as informações
que a editora precisa saber a respeito dele.
Um editor nunca lê um livro inteiro para decidir se vai publicar um livro ou não. Alguns leem o
primeiro capítulo e decidem se enviam o original para o parecerista ou não. Outros, leem a
primeira página. Há aqueles que leem apenas o primeiro parágrafo. Por outro lado, as chances
do editor enviar um original para o parecerista aumentam caso ele também receba uma
proposta do livro.
Com uma proposta do livro, o editor vai conhecer sua obra de forma muito mais eficiente. E se
ele leu toda a proposta do livro, as chances dele de fato dar a atenção que o seu original
merece aumentam. Por isso o autor deve prepará-la com tanto esmero quanto escreve os
principais capítulos do seu livro.
O recomendado é que a apresentação geral caiba em uma página e um resumo do livro caiba
entre uma a quatro páginas.

A apresentação geral deve conter:

Título do livro: autoexplicativo.


Biografia resumida: principais informações a respeito do autor, em uma ou duas linhas.
Resumo do livro em uma frase: uma sinopse extremamente resumida, apresentando os
conceitos essenciais da obra.
Sinopse: uma prévia do livro em um parágrafo.
Informações sobre o autor: uma biografia mais detalhada em um parágrafo.
Obras de referência: ao menos três livros nacionais e três livros internacionais que se
assemelham ao seu.
Plano de marketing: principais formas de divulgação que podem potencializar as vendas do
livro, desde parcerias com influenciadores de um nicho específico, até eventos culturais em que
o livro pode ser apresentado e todas as ações que o autor tiver em mente.
Dados técnicos: informar quantidade de palavras, quantidade de capítulos, valor de capa
pretendido, formato da obra (romance, novela, coletânea de contos etc), gênero e subgênero,
público-alvo e faixa etária do público-alvo.
Resumo do livro: Apesar de ser a parte mais cansativa de escrever da proposta do livro, é
também uma das mais importantes. Aqui, tudo deve ser dito, cada capítulo, cada personagem,
cada reviravolta na trama, tudo, incluindo o final. Lembre-se que o editor e o parecerista não
são leitores e fãs em potencial, eles são profissionais que precisam tomar uma decisão que vai
acarretar em investimento financeiro e pessoal pelos próximos meses, talvez anos da vida
deles. Eles precisam saber de tudo e não ser esclarecido na proposta do livro é um grave sinal
de amadorismo.
É recomendável que, antes de apresentar cada capítulo, cada personagem principal da trama
seja também apresentado de forma resumida, no máximo uma linha para cada um.

O resumo de cada capítulo deve conter:

Sinopse do capítulo.

Como os personagens são explorados e desenvolvidos.

Como o mundo ou cenário é explorado e desenvolvido (caso o mundo ou cenário for relevante
para trama, como em romances de fantasia, policial ou que focam a história em um bairro ou
cidade).

Como a narrativa é desenvolvida e avança.

Cada aspecto citado deve ser resumido, cabendo em uma ou duas linhas.

Considerações Finais

Uma boa apresentação faz toda a diferença, tanto nos deveres da escola e da faculdade,
quanto em uma entrevista de emprego e até no envio de um original. Quando nos preparamos
com mais cuidado, aumentamos as chances de nos destacarmos. Um autor pode apenas
enviar um original para as editoras e cruzar os dedos para ser escolhido ou pode fazer mais do
que a maioria e enviar mais do que um livro com potencial.
Para a editora enxergar o potencial da sua obra com mais clareza, é importante você provar
suas singularidades e facilitar o trabalho tanto do editor, quanto do parecerista.
Conheça a editora e, se possível, os profissionais dessa editora, prepare uma apresentação
eficiente e invista tempo e atenção no momento de enviar seu original. Suas chances com
certeza são muito maiores quando você cuida de cada detalhe com esmero.

Exemplo de Proposta de Livro

A seguir, a proposta do livro A Era do Abismo: O Torneio dos Campeões, que foi aprovado por
quatro editoras e publicado pela Pendragon.
Título da série: A Era do Abismo

Sobre o autor: Bernardo Stamato, vencedor do concurso cultural Eu, Criatura pela Devir,
redator-chefe do portal Mundo Epic e instagrammer conhecido como Nerd & Louco.

Resumo do romance em uma frase: Em um mundo antigo, audazes aventureiros unem armas e
magias para desafiar um torneio que reunirá gladiadores e mercenários.

Sinopse: A Liga Prateada tem fama de ser a região mais próspera e segura do continente, mas
isso não impede que um grupo de aventureiros desbrave suas estradas e proteja o povo de
orcs, mortos-vivos e magos insanos. Enquanto Draco e Gladius investigam o assassinato do
seu mestre, o guerreiro Marcus cobiça a glória do combate e suas fortunas, a cartomante Rosa
busca por sua família perdida, o paladino anão Alberich propaga o ideal da Justiça, a
sacerdotisa elfa Ravenlla promove as graças da Liberdade e a kunoichi Zhi Wu protege os
mistérios do seu passado. Unidos pelo acaso, eles irão desafiar não só monstros selvagens,
mas também nobres corruptos e cultistas profanos. Conseguirão eles triunfar em meio aos
incontáveis desafios da sua jornada? O fim de uma vida dará início a uma saga épica onde
Virtudes e Vícios colidem e aventureiros lutam contra todas as expectativas em um mundo
condenado.

Informações sobre o autor: Bernardo Stamato participou do concurso cultural “Eu, Criatura”,
ficando em primeiro lugar. Desde então, escreve contos, se tornou crítico literário e
instagrammer Nerd & Louco (mais de 13 mil seguidores). Além deste romance, os leitores
podem desbravar mais fábulas d’A Era do Abismo através de contos gratuitos no Wattpad.

Obras de Referência:
Nacionais: Trilogia Tormenta - Leonel Caldela -, O Espadachim de Carvão - Affonso Solano - e
Tetralogia Angélica - Eduardo Spohr.
Internacionais: Conan - Robert E. Howard -, O Senhor dos Anéis - J. R. R. Tolkien - e a série
Dragon Age - David Gaider.

Plano de Marketing: Foco em parceria com influenciadores, especialmente os mais ativos no


Instagram, rede social com maior foco no público-alvo. Divulgação via web através de contos
dentro deste mesmo cenário, textos informativos sobre o cenário e a saga e ilustrações. Além
disso, distribuição do livro para sites e canais de YouTube para resenhas.

Detalhes técnicos: 111.686 palavras. 18 capítulos, prólogo, epílogo e codex. Valor de capa
pretendido: R$ 40,00. Público alvo: jovem/adulto. Público de literatura fantástica e jogadores de
videogame - como o caso do brasileiro Raphael Draccon e do britânico Taran Matharu. Outra
referência são sagas derivadas de jogos, com as séries de Diablo, World of Warcraft e God of
War.
Resumo d’A Era do Abismo (alerta spoiler, caso você deseje ler o livro futuramente):
O romance foi escrito em estrutura procedimental, com inspiração nos folhetins e pulp fictions
como Dom Quixote de la Mancha, Sherlock Holmes e Conan. Cada capítulo é uma célula
narrativa própria com início, meio e fim e narrado por um personagem entre os sete
protagonistas, seguindo uma ordem cronológica, mas dedicado a apresentar o cenário e os
personagens, além da narrativa maior.

Prólogo: Dois guerreiros se enfrentam. Um dia, eles foram mestre e discípulo, agora seguem
ideologias antagônicas. Quando o ex-pupilo mata o mestre, revela que sabe dos outros dois
jovens guerreiros que foram treinados pelo ancião.

Capítulo 1: O grupo se reúne ao atender o chamado de um nobre para uma missão na Floresta
Feérica, território élfico.
Desenvolvimento dos personagens: cinco dos protagonistas são apresentados, os guerreiros
Draco, Gladius e Marcus, o paladino anão Alberich e a kunoichi Zhi Wu.
Desenvolvimento do cenário: primeiro contato do leitor com o mundo e suas regras básicas,
elfos, anões, goblins e magia existem, mas os elfos estão isolados das demais civilizações.
Desenvolvimento da narrativa: o grupo começa a sua jornada, ainda sem destino definido,
Draco e Gladius citam que têm uma missão em comum, mas não entram em detalhes e um dos
Sete Males Primordiais é apresentado, Uraxtor, o Lorde da Tirania.

Capítulo 2: O grupo passa por uma aldeia onde uma série de assassinatos está ameaçando o
povo local.
Personagens: Gladius revela que não quer assumir seus deveres familiares.
Cenário: aswang - monstro do folclore filipino - é apresentado, a Aniquilação é citada, evento
onde os Patriarcas Celestiais e todos os celestiais foram derrotados e dizimados pelos Males
Primordiais e os abissais.
Narrativa: contrariando a resolução através de combate do primeiro capítulo, os protagonistas
precisam investigar e descobrir quem ou o que está por trás dos assassinatos.

Capítulo 3: O grupo investiga uma mansão mal-assombrada para livrar um condado de zumbis.
Personagens: Marcus demonstra egoísmo excedente.
Cenário: em vez de adversários corpóreos, os protagonistas precisam lidar com um
necromante e uma assombração, ambos usuários de magia.
Narrativa: a Mácula - fonte de poder adormecido que cada mortal carrega dentro de si e
desperta conforme seus Vícios se tornam mais fortes que suas Virtudes - e as Armas do
Legado - itens com poderes sobrenaturais - são citadas.

Capítulo 4: O grupo enfrenta um bando de orcs para livrar uma cidadela, mas descobre que os
orcs haviam sido expulsos das cavernas por uma outra criatura ainda mais ameaçadora.
Personagens: Marcus morre em combate e o grupo fica abalado.
Cenário: orcs e minotauros são apresentados.
Narrativa: capítulo dedicado a expor as nuances entre moralidade e humanidade ao apresentar
antagonistas que atacaram por necessidade e expor os riscos que os protagonistas assumem
através da morte de um dos personagens.

Capítulo 5: O grupo para em uma cidade para descansar e comprar novos equipamentos, mas
fica em dúvida entre agir ou só observar ao presenciar um conflito que não lhes diz respeito.
Personagens: a cartomante Rosa e a elfa sacerdotisa da liberdade Ravenlla são apresentadas.
Cenário: a raça bestial - humanoide com aspecto animalesco - e Aura - uma cidade com um
templo tão grande no centro que pode ser visto por todas as extremidades da região - são
apresentadas.
Narrativa: o grupo descobre que haverá um torneio e parte em direção ao evento.

Capítulo 6: O grupo descobre uma aldeia devastada por mortos-vivos e vai até o templo
abandonado para caçar seu líder.
Personagens: Draco sofre o efeito da Mácula e entra em frenesi em combate.
Cenário: duques abissais - criaturas muito mais poderosas do que os abissais comuns, mas
ainda abaixo dos Males Primordiais - são citados.
Narrativa: por que Gladius não ficou surpreso com a Mácula de Draco?

Capítulo 7: Após o confronto desastroso, o grupo recupera as energias e discute sobre suas
motivações e segredos.
Personagens: cada um fala um pouco mais sobre si, ainda que uma certa desconfiança
permaneça, o grupo descobre que Gladius vem de linhagem nobre e Draco e Gladius revelam
que, desde o início, estão em busca do assassino do mestre deles.
Cenário: a Mácula é explicada em detalhes.
Narrativa: ninguém confia com plenitude em ninguém.

Capítulo 8: O grupo é rendido e capturado por um batalhão de robgoblins até que um feiticeiro
mercenário ataca os raptores porque foi contratado por um duque local.
Personagens: Ravenlla não venera a Virtude que declara venerar.
Cenário: decaído - humanoide com linhagem abissal - é apresentado.
Narrativa: o elenco desvia sua rota, fazendo com que mais cidades sejam apresentadas ao
longo do romance.

Capítulo 9: O grupo descansa em uma estalagem, mas descobre que o local é o covil de uma
bruxa e seus capangas ogros ao ser emboscado.
Personagens: Zhi Wu precisa decidir entre fugir pela própria vida ou se arriscar para salvar
seus aliados.
Cenário: bruxas e ogros são apresentados.
Narrativa: Zhi Wu está espionando o grupo desde o início.

Capítulo 10: O grupo se depara com uma elfa sombria condenada a uma morte lenta em uma
praça pública e decide intervir.
Personagens: Ravenlla e Alberich não confiam na nova personagem por causa do histórico do
seu povo, uma linha renegada dos elfos.
Cenário: elfos sombrios, gênios, alquimia - um uso variante de magia - e Gálata - cidade notória
por suas torres - são apresentados.
Narrativa: o altruísmo do elenco é posto em cheque depois da traição da elfa sombria, que já
estava sendo considerada a nova integrante da equipe.

Capítulo 11: Grupo passa por uma aldeia que está sendo atacada por abissais e precisa evitar
que uma invocação perigosa aconteça.
Personagens: um romance entre Draco e Rosa começa a surgir.
Cenário: abissais aparecem pela primeira vez - um desafio brutal em comparação a todos os
anteriores.
Narrativa: o escudo de Gladius é uma arma do legado desde o início e ninguém sabia e o título
“Guerreiros da Luz” é citado pela primeira vez.

Capítulo 12: No que parecia ser uma estadia tranquila em uma grande cidade, o grupo recebe
um pedido de socorro através de mensagens telepáticas.
Personagens: a frustração de Alberich em relação à Ordem dos Paladinos é revelada.
Cenário: psiquismo - um poder diferente de magia -, o clero de Rhazmodon, a Lady do
Sadismo, e Polímnia - cidade notória pela geometria, meditação e agricultura - são
apresentados.
Narrativa: o grupo precisa superar suas desconfianças e inseguranças.

Capítulo 13: O grupo finalmente chega à última cidade do romance e participa da etapa seletiva
do torneio.
Personagens: o elenco não resiste à tentação de investigar um assassinato, mostrando que
ainda há altruísmo neles.
Cenário: Tália, a Cidade Festiva, é apresentada.
Narrativa: dois adversários relevantes do torneio são apresentados.

Capítulo 14: O grupo tira um dia para descansar e coletar informações sobre os demais
competidores do torneio.
Personagens: o romance entre Draco e Rosa fica ainda mais evidente.
Cenário: a reta final do romance é dedicada à narrativa, sem novidades em relação ao mundo.
Narrativa: a cartomante lê a sorte do grupo e descobre derrota e morte no futuro.

Capítulo 15: Primeira fase do torneio.


Personagens: Gladius fala abertamente sobre a relação de Draco e Rosa, gerando
constrangimento ao amigo.
Cenário: a reta final do romance é dedicada à narrativa, sem novidades em relação ao mundo.
Narrativa: Rosa e Zhi Wu não passam para a segunda etapa do torneio, enquanto Draco,
Gladius, Alberich e Ravenlla se preparam para o dia seguinte.
Capítulo 16: Segunda fase do torneio.
Personagens: Draco questiona seus sentimentos por Rosa.
Cenário: a reta final do romance é dedicada à narrativa, sem novidades em relação ao mundo.
Narrativa: Ravenlla é brutalmente derrotada por um dos adversários, gerando o sentimento de
vingança entre os demais.

Capítulo 17: Semifinais do torneio.


Personagens: Gladius enfrenta seu adversário decidido a vingar Ravenlla, mas é derrotado e
quebra uma das pernas.
Cenário: a reta final do romance é dedicada à narrativa, sem novidades em relação ao mundo.
Narrativa: Draco é qualificado para a última etapa do torneio com o sentimento de vingança
redobrado, estabelecendo o clima da batalha final.

Capítulo 18: Batalha final do livro.


Personagens: Draco está prestes a perder, sente a Mácula se manifestando, mas a contém
com sucesso e consegue revirar o combate e derrotar seu adversário. Quando tudo parecia
concluído, o real vilão surge na arena: o assassino do mestre dos protagonistas.
Cenário: a reta final do romance é dedicada à narrativa, sem novidades em relação ao mundo.
Narrativa: Todos em condições de lutar se unem à batalha, mas o vilão é nitidamente superior
e, no momento final, quando Draco vai finalmente ser morto, Rosa se joga no caminho da
espada e se sacrifica em seu lugar, quebrando as expectativas de que o casal consolidaria seu
romance. A cena final é Draco desmaiando na frente do corpo de sua amada.

Epílogo: Personagem misterioso recebe relatório das aventuras do grupo e anuncia que
chegou a hora de recrutá-los para a Legião Protetora.
12. Parcerias Literárias

Blogues literários são uma das engrenagens mais importantes do mercado editorial nos dias de
hoje. A lógica é simples: para os leitores saberem que o livro existe e sentirem vontade de lê-lo,
alguém precisa falar sobre o livro — e a pessoa ideal para indicar o seu livro é um blogueiro ou
blogueira que já tem seguidores interessados no seu nicho. O artigo a seguir explica tudo o que
os escritores e escritoras precisam saber sobre parcerias literárias.

O que você ganha com parcerias

Vamos pensar como leitores por um instante. O que leva alguém a se interessar em ler um
livro? Poderíamos listar vários elementos, como a capa, o título, a sinopse, o gênero etc. Mas
considerando que todo livro já apresenta todos esses elementos, alguns também oferecem
gatilhos de venda extras que despertam o interesse no leitor. Imagine que, em um dia, o leitor
toma conhecimento de dois livros, busca sobre eles na internet e encontra três críticas literárias
sobre um e nenhuma sobre o outro. Adivinhe qual dos dois o leitor vai querer adquirir.
Mas por quê? A seguir, alguns gatilhos de venda que são ativados na mente do leitor quando
ele lê uma resenha literária:
Prova social: Comprar é um risco e ninguém quer sentir que desperdiçou dinheiro e tempo com
um livro — ou no cinema, restaurante, cabeleireiro e qualquer transação comercial. Por isso é
comum buscarmos recomendações antes de pagarmos por algo. A partir do momento em que
lemos uma opinião favorável em um ou mais blogues, sentimos que é mais provável que a
nossa experiência ao ler tal livro será agradável.
Autoridade: Os seguidores dos blogueiros e blogueiras reconhecem essas pessoas como
formadoras de opiniões. Em outras palavras: autoridades naquele assunto. Ao criticar
positivamente um livro, o blogue está dando seu selo de aprovação e seus seguidores ficam
mais propensos a adquirirem seja lá o que foi indicado. Da mesma forma, um livro que foi
elogiado por diversos blogues ganha autoridade e passa a ser mais desejado tanto pelos
leitores como também por outros blogues.
Familiaridade: Já aconteceu de você ver um produto numa prateleira algumas vezes até chegar
o momento em que botou no carrinho e comprou? É comum não comprarmos algo de primeira
até que simplesmente decidimos que queremos experimentá-lo. O mesmo acontece com livros.
O leitor vê um blogue elogiando um livro um dia, depois vê outro blogue elogiando o mesmo
livro e mais outro, até que decide que quer conferir se a história é realmente boa por si mesmo.
Todo escritor e escritora quer que seu livro seja lido, mas primeiro o leitor precisa desejar o livro
— e os blogues são a melhor forma de um livro ser descoberto e desejado pelos leitores.

Antes de buscar parcerias literárias

Tanto quanto um maratonista precisa calçar o tênis e se aquecer antes de correr ou um


guitarrista precisa afinar seu instrumento e ensaiar antes do show, escritores e escritoras
precisam cumprir algumas etapas antes de buscar parcerias literárias.
Antes de mais nada, o livro precisa estar no mínimo escrito. Sabe quando você assiste ao
trailer de um filme, mas passam anos, ele não é lançado e seu interesse diminuiu ou até some?
O mesmo pode acontecer com o seu livro, se você simplesmente falar dele e demorar para
lançá-lo. Particularmente, eu só combino parceria se tiver um exemplar pronto para ser enviado
no dia seguinte justamente para evitar qualquer atraso. Da mesma forma, recomendo que você
só busque parceiros, se estiver com o livro pronto para ser enviado — seja versão física ou
digital.
É importante definir o que você vai oferecer e o que vai esperar em troca da parceria. O mínimo
que o autor ou autora deve oferecer é uma cópia digital para a leitura. Mas com certeza o
blogue vai ficar mais grato, se receber um exemplar físico em sua casa. Se o exemplar vier
com brindes, melhor ainda. Particularmente, envio o livro, um pôster e sete marcadores
personalizados para minhas parcerias, o que já rende um vídeo de unboxing interessante.
Também não exijo prazo ou detalhes sobre a divulgação, apenas envio e espero, deixando a
parceria mais à vontade sobre o que e como fazer.
Por fim, informação é poder, então é favorável que você saiba como fechar uma parceria e
tanto quanto como aproveitar cada parceria da melhor forma possível. Também recomendo que
leia todo esse artigo antes de começar a seguir cada passo apresentado. Não tem problema
em voltar em cada tópico e revisá-lo depois de concluir a leitura. Como eu disse: informação é
poder. Esse artigo está aqui para você estudá-lo e consultá-lo quando e quanto quiser.

Defina que tipo de parceiros você quer

É fundamental que um livro seja criticado por blogues literários, mas outros nichos também
podem ser válidos dependendo do gênero.
Particularmente, como escritor de literatura fantástica, eu testei fazer parceria com diversos
nichos, como por exemplo: perfils geeks e nerds, gamers, cosplayers e modelos góticas. Todos
esses nichos trouxeram algum resultado, mas uns trouxeram mais do que os outros, por isso
vou falar sobre a relação de qualidade e quantidade mais para frente.
Um livro infanto-juvenil poderia fazer parceria com perfis com público-alvo infantil, como um
livro de fantasia medieval poderia fazer parceria com perfis de RPGistas e um livro hot poderia
fazer parceria com perfis de modelos que combinem com seu subgênero, como plus-size ou
bdsm por exemplo. Pense que tipo de conteúdo os seus leitores consomem além de livros e
busque perfis com sinergia com sua obra.

A cada quatro livros que envio para parcerias, separo três para perfis literários e um para um
perfil diversificado. Ou a cada dez livros, envio sete ou oito para perfis literários e três ou dois
para perfis diversificados, dependendo do momento.
Recomendo que você priorize blogues literários, principalmente se está lançando seu primeiro
livro. Mas não se esqueça que os leitores estão por toda parte, então pense fora da caixa
também.

Liste os possíveis parceiros


Abra o Google, YouTube, Instagram e demais meios de comunicação por onde você se informa
sobre livros — talvez Twitter ou Skoob, por exemplo.
Se preocupe menos em buscar termos genéricos, como blogue literário ou booktuber, e foque
em pesquisar termos associados ao seu nicho. Tente pensar o que o seu futuro leitor buscaria.
Se seu livro é de terror, por exemplo, experimente buscar por “melhores livros de terror”,
“stephen king resenha”, ou “horror gótico / cósmico / psicológico”.
Dependendo, o uso de hashtags é mais útil, mas a lógica é a mesma. Buscar pelo nicho, como
#fantasiamedieval, #steampunkbrasil ou #livrofofo é mais recomendável do que apenas #livro,
#livros #leitores.
A lógica é encontrar perfis que já falem de livros similares ao seu. Busque pelo seu subnicho e
também por críticas a livros do mesmo gênero. Assim, quando você abordar o blogue, tem mais
chance dele gostar, entender e ter seguidores interessados no seu livro.
Faça uma lista com no mínimo dez e não mais de cem blogues, canais no YouTube, perfis no
Instagram e afins.

Registre os dados relevantes dos candidatos

Cria uma planilha no Excel, no Google Docs, ou onde preferir e anote os dados relevantes de
cada uma das possíveis parcerias.
Minha planilha inclui: nome do perfil, nicho, quantidades de seguidores, se eu mandei
mensagem nas redes sociais, se mandei e-mail, se a pessoa me respondeu, se confirmou a
parceria, endereço de envio, se eu já enviei o livro, se ela já recebeu, se fez a crítica e se vou
enviar a sequência ou não. Talvez você queira incluir mais informações na sua planilha, como
endereço do site e/ou e-mail.
Com isso, eu mantenho controle dos influenciadores e influenciadores que me despertaram o
interesse, o nicho e a quantidade do público, se eu já me comuniquei, se já cumpri a minha
parte na parceria (enviar o livro e brindes), se a pessoa cumpriu a parte dela (divulgar meu
livro) e se eu vou manter a parceria para o próximo livro ou não.
Essa planilha serve tanto para você avaliar e selecionar suas parcerias quanto para manter o
controle de quantos livros enviou, para quem enviou e se obteve o resultado desejado.

Filtre os parceiros

Eu já disse que informação é poder, né? Durante o processo de pesquisar e listar as possíveis
parcerias, você também acabará aprendendo muito sobre cada uma delas.
Talvez você encontre erros ortográficos em postagens de alguns perfis. Talvez algum perfil
tenha parecido interessante, mas então você descobre que ele só falou do seu subnicho uma
vez e nunca mais. Talvez você perceba que certos perfis têm menos de mil seguidores, o que é
muito pouco. Outros até têm muitos seguidores, mas ninguém comenta nas postagens. Isso
tudo são bons motivos para riscar esse perfil da sua lista.
Seja criterioso. Não adianta ter uma crítica mal escrita, nem uma crítica que não seja vista por
quase ninguém ou que seja vista pelos leitores errados. Você está investindo seu tempo e seu
dinheiro na parceria, portanto merece um retorno à altura.
Primeiro qualidade, depois quantidade

Por onde começar?


Pelos melhores.
Mas o que define qualidade?
Num primeiro momento, desconsidere quantidade de seguidores e perfis que não sejam
nichados. Por mais que pareça intuitivo buscar visibilidade, é melhor se preocupar com a
quantidade só depois de garantir a qualidade. Suas primeiras parcerias precisam entregar uma
boa crítica, independente da quantidade de visualizações, curtidas e comentários.
Não adianta muitas pessoas saberem que seu livro existe, mas encontrarem poucas
informações sobre você e sua obra depois do primeiro momento. Quando o futuro leitor souber
que você existe, precisa encontrar outras boas avaliações e também seu perfil pessoal com
conteúdo interessante. O momento de ter visibilidade vai chegar, por isso você precisa otimizar
a primeira impressão que cada futuro leitor vai ter.
Outro fator importante é o tipo de postagem feito pelas parcerias. Um story no Instagram só fica
visível por um dia. Uma foto no feed do Instagram perde a relevância em menos de uma
semana. Um vídeo no YouTube ou uma postagem em um blogue tem menos visibilidade assim
que é postado, mas pelo menos é mais fácil de ser encontrado em uma busca. Portanto
postagens que continuam relevantes a longo prazo são favoráveis, ainda mais para autores
estreantes.
Separe os perfis que apresentam críticas bem escritas, fotos atraentes e que também já
trabalhem com o seu subnicho. A longo prazo, essas postagens vão agregar valor a sua
carreira literária — ainda mais quando você publicar seus próximos livros.

Entrando em contato com os influenciadores

A primeira impressão é importante, tanto para leitores quanto para blogues. Cuidado para não
parecer invasivo ou interesseiro no primeiro contato. É fundamental demonstrar respeito e
reconhecimento do valor da pessoa com quem estamos entrando em contato.
Não envie mensagem direta ou e-mail já apresentando suas exigências e nem sequer seu livro
de imediato. Primeiro, certifique-se que a pessoa tem disponibilidade e interesse em parceria e
aí sim você faz sua apresentação. Se o blogueiro ou blogueira tiver a impressão de que você
só se interessou pelos números de seguidores dele ou dela e/ou que está enviando mensagem
para o máximo de pessoas possível até que alguém aceite, poderá se sentir ofendido ou
ofendida — e com razão.
Mande uma mensagem inicial e aguarde o retorno. Particularmente, enviei mensagem por
“inbox“ do Instagram e por email. A seguir, meu modelo de mensagem.

Inbox:

Olá, tudo bom? Você faz parcerias com autores independentes?


Sinceramente acho que haveria uma sinergia legal entre nossos seguidores.

E-mail:

Saudações!

Eu sou Bernardo Stamato, autor de A Era do Abismo, e gostaria de saber se há interesse e


disponibilidade em uma parceria entre a gente. Acredito que haveria uma sinergia legal entre
nossos seguidores (meu instagram é o @mochileiros_do_multiverso)

Segue em anexo algumas artes do livro e aqui está o link da pré-venda (com sinopse e demais
informações): https://www.lojapendragon.com.br/fantasia/livro-a-era-do-abismo

Há interesse? Quais as condições?

Obrigado desde já.

Um abraço!

Muitas parcerias responderam com interesse depois desse contato inicial. Algumas informaram
que não tinham disponibilidade por diversos motivos. Outras responderam apresentando
valores a serem pagos antes da parceria — que eu não tinha disponibilidade para pagar. E
outras nem responderam. Isso tudo faz partes. Recomendo que apenas responda com
educação quando não for fechar parceria e foque suas energias em quem teve interesse.
Depois do primeiro contato, eu informo o que ofereço, solicito endereço para envio e mantenho
algum contato. Acredito que uma parceria é, também, uma relação humana, então costumo
perguntar se a pessoa está bem, como vai a família e interagir em redes sociais comentando
em postagens. Como disse antes, demonstrar respeito e reconhecimento é valoroso.

Envie o livro e espere

Antes de mais nada, não recomendo que você vá aos correios com vários livros para postar de
uma vez só. Isso poupa esforços, mas os blogues também vão receber os pacotes em datas
aproximadas, você vai ter uma divulgação forte, porém curta nas redes sociais. Acho melhor ir
aos correios uma vez por semana no máximo, então os blogues vão divulgando cada um no
seu devido tempo e você garante uma constância nas redes sociais.
Tem escritores que enviam pacotes lindos demais, outros que enviam pacotes simples demais.
É interessante caprichar na dedicatória e no autógrafo e preparar um pacote dentro do que está
ao seu alcance, mas que não seja um prejuízo para você. Eu envio o livro, marcadores e pôster
num envelope pardo simples. Os vídeos dos blogues fazendo unboxing e reagindo aos brindes
costumam ficar excelentes. Um colega escritor me enviou seu livro com uma caricatura minha
na dedicatória, eu adorei. O importante é ter esmero e criatividade na hora de agradar suas
parcerias.
E informe ao blogue o código de rastreamento do correio. Isso mantém o contato entre vocês
aquecido e garante que o pacote não desapareça nos correios — um risco lamentável, mas
real. Eu já recebi pacote de volta algumas vezes, inclusive, faz parte.
Eu nunca cobro minhas parcerias. Por mais que a ansiedade seja grande, prefiro não
incomodar. Se passar uma ou duas semanas e o blogue não se manifestar, eu costumo só
enviar uma mensagem dizendo “Oi, tudo bom? O livro chegou direitinho?”. Já aconteceu de
blogues levarem tantos meses para fazerem um post, que eu só desencanei da parceria e não
enviei meu segundo livro depois. E tiveram também alguns que nunca nem postaram nada nas
redes sociais. Foi frustrante, é claro. Mas, como eu sempre digo, prefiro focar no que dá
resultado, então, quando sinto que a parceria foi boa, mantenho. Quando não foi por qualquer
motivo que seja — o post não ficou bem-feito ou demorou demais —, eu simplesmente sigo em
frente. Por mais que dê vontade de falar algumas palavras atravessadas para algumas
pessoas, realmente acho que o desgaste não compensa nem um pouco.

Atualize seu registro

Lembra da planilha de parcerias? Ela vai ser sua melhor ferramenta para manter controle das
suas ações e para não se perder — ou enlouquecer. Tão importante quanto criar e preencher a
planilha é mantê-la atualizada.
Eu tenho colunas destinadas a controlar quando envio o livro, quando o livro é recebido,
quando o post foi feito e se eu vou manter a parceria para o próximo livro ou não. Assim que
chego em casa dos correios, já atualizo a planilha e informo o código de rastreamento para o
blogue. Daí em diante, vou acompanhando e atualizando.
Se necessário, releia os emails e as conversas nas redes sociais para relembrar algum detalhe
que deixou alguma dúvida ou simplesmente mande uma mensagem perguntando. Afinal, não
adianta de nada planejar o controle sem mantê-lo atualizado.
Atualizar a planilha é até fácil, só não pode se esquecer e se enrolar.

Compartilhe o conteúdo

Fazer parceria é uma trabalheira enorme. Então que tal expandir e multiplicar seus benefícios?
Tudo o que for postado sobre seu livro, republique. Use todas as suas redes sociais e não
poupe nenhuma publicação. Unboxing, início de leitura, fim de leitura, crítica, foto aleatória,
republique tudo.
Além da republicação servir para expandir ainda mais as visualizações da postagem original,
ela vai fortalecer as suas próprias redes sociais e sua relação com o seu público. Seus
seguidores vão ver que você está em atividade, que seu trabalho está sendo apreciado por
outras pessoas, que você está crescendo e se fortalecendo. No começo do artigo falei de
alguns gatilhos mentais — prova social, autoridade e familiaridade —, lembra? Então, esses
são os gatilhos que você dispara na republicação.
E sua republicação também estreita sua relação com o blogue. Você estará divulgando e
valorizando o trabalho da parceria, o que vai ser saudável para ambas as partes. Alguns
blogues voltam a falar dos livros que gostaram depois de publicar a crítica e com certeza os
escritores mais proativos são os primeiros a serem lembrados nessa hora.
Na minha humilde opinião de um mero mortal, não republicar o conteúdo das suas parceria é
simplesmente fazer o trabalho pela metade — sem falar que essa é uma das partes que nos
exigem menos esforços.

Extra: impulsione o conteúdo

Se você pode duplicar, talvez triplicar o alcance de uma postagem ao republicá-la, pode
multiplicar esse alcance em dez ou até mais ao impulsionar nas redes sociais. Impulsionar não
gera vendas instantâneas, mas atrai novos leitores que vão engajar nas redes sociais e vão se
interessar pelo seu livro em um longo prazo — desde que você mantenha o trabalho bem-feito
e constante. Sempre que você tiver pelo menos R$ 50,00 ou R$ 100,00 sobrando no mês, vale
a pena investir em publicidade — você vai gastar muito mais que isso só para publicar seu
livro, então esse valor é bem razoável.
Eu faço da seguinte forma:
Abro a foto no Instagram e clico na barrinha azul dizendo “promover” — precisa ter conta
comercial para isso. Seleciono a opção para direcionar a publicação como “seu perfil”. Crio um
público especificando a localização como Brasil — caso queira focar em algum estado ou
cidade, pode —, defino interesses relacionados ao meu livro — recomendo que você selecione
livros e autores do seu gênero — e limito a idade para 21 a 40 anos — que é a faixa etária do
meu público, é válido conferir a faixa do seu na aba de informações do seu perfil. Por fim, eu
informo o valor diário que quero investir e o tempo da divulgação e confirmo o pagamento.
Caso você prefira usar as ferramentas do Facebook ou do Google, elas são bem similares ao
do Instagram, só precisa se adaptar a cada plataforma.
É importante entender a diferença entre marketing e remarketing. Com o marketing, você
alcança pessoas novas. Com o remarketing, você alcança de novo as pessoas que já
demonstraram interesse por você antes.
O Instagram não oferece ferramentas de remarketing, então eu faço através do Facebook. Eu
vou para o gerenciador de anúncios e clico na aba de “públicos”. Nessa janela, eu clico na
barrinha azul dizendo “criar público” e na opção “público personalizado”. Então, clico em “Perfil
comercial do Instagram” e seleciono as opções “‘qualquer um dos’ seguintes critérios”, “todas
as pessoas que se envolveram com seu negócio” e “nos últimos 30 dias”. Perceba que esse
método alcança até quem curtiu sua publicação patrocinada, mas não seguiu sua conta, então
é uma nova chance de conquistar esse futuro leitor.
Para fazer o remarketing pelo Facebook, eu vou na janela de Campanhas e clico no botão
verde “Criar”. As melhores opções são alcance — para fotos e vídeos — e reconhecimento de
marca — para publicação com várias fotos juntas, os carrosséis. Primeiro, dou o nome da
campanha e deixo as configurações padrões mesmo — tipo de compra como leilão e objetivo
da campanha como alcance. Em Conjunto de anúncios, uso minha página de Instagram,
informo meu orçamento, defino o público como o público que criei anteriormente e seleciono
onde desejo que minha publicação apareça em Posicionamentos — geralmente escolho só
Instagram, mas Facebook pode ser útil para você. Então, dou o nome do anúncio, em
“configurações do anúncio”, seleciono “usar publicação existente”, escolho a publicação,
informo o link do meu perfil e escolho “cadastre-se” em Chamada para ação”. Por fim, clico no
botão verde “publicar”.
A propósito, andei mexendo no Facebook e talvez dê para impulsionar fotos em carrossel como
opção de alcance em vez de reconhecimento de marca. Não sei, não testei ainda, mas talvez
seja possível. A diferença é: o alcance vai mostrar uma ou duas vezes para muita gente,
enquanto reconhecimento de marca vai mostrar várias vezes para algumas pessoas.
Particularmente, prefiro impulsionar uma publicação diferente por semana e manter focando em
alcance para quem já interagiu comigo antes.
Lembre-se de investir apenas o que não for fazer falta para sua vida pessoal e carreira literária.
Esse investimento traz retorno a longo prazo e não substitui todos os outros esforços que
sempre temos que ter — como manter redes sociais atualizadas e escrever, é claro. Não sou
especialista em marketing, mas ouvi dizer que nunca se deve arriscar demais em uma
divulgação. Toda ação de marketing visa a possibilidade de falha, lembre-se disso.
Falando em falha, eu já configurei errado minhas divulgações e um monte de gente aleatória
começou a me seguir. Se nosso objetivo é divulgar — e vender — nossos livros, de que adianta
ganhar seguidores que não são leitores? De nada, confie em mim. Se começar a aparecer
seguidores fora do seu perfil de leitores, cancele e replaneje o público — e encare o dinheiro
investido como aprendizagem.

Recapitulando

Influenciadores e influenciadoras são fundamentais para o mercado literário. Liste os perfis que
trabalham com o seu gênero, entre em contato, envie seu livro — e, se possível, alguns brindes
—, republique tudo o que for postado sobre o seu livro e mantenha o controle das suas ações
na sua planilha. Faça isso pelo menos uma vez por mês e não mais que uma vez por semana.
Se possível, impulsione suas publicações. Matenha um trabalho constante, que o resultado
vem no longo prazo.

Você também pode gostar