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Álcool e jovens

O consumo de bebidas alcoólicas por adolescentes é um problema que desperta


preocupação no mundo todo. A discussão é de grande importância para a saúde
pública, sendo necessária a atenção das autoridades, profissionais da saúde, pais
e educadores

Por Arthur Guerra de Andrade / Natália Gomes Ragghianti / Lúcio Garcia de Oliveira

O consumo de bebidas alcoólicas por adolescentes (12 a 17 anos) e adultos jovens (18 a 24
anos) é um sério problema que desperta grande preocupação no mundo todo. Ao contrário do
que muitos acreditavam no passado, na fase de transição entre a infância e a vida adulta, o
sistema nervoso central dos jovens ainda se encontra em desenvolvimento. Desta maneira,
suas vias neuronais podem se tornar mais suscetíveis aos danos causados pelo álcool,
levando ao comprometimento de várias funções.
Em um período repleto de mudanças físicas, psicológicas e sociais, sob os efeitos do álcool, os
jovens ficam mais propensos a comportamentos de risco. Nota-se, ainda, que uma série de
fatores individuais, sociais e econômicos, principalmente a família e colegas, influencia o uso
de álcool pelo jovem. No Brasil, segundo dados do II Levantamento Domiciliar Sobre o Uso de
Drogas Psicotrópicas no Brasil, 2005, cerca de 54% e 79% dos jovens de 12-17 anos e de 18-
24 anos, respectivamente, já haviam experimentado alguma bebida alcoólica em sua vida (uso
de álcool na vida). Nestas mesmas faixas etárias, a dependência de álcool foi de 7,0% e de
19,2%, respectivamente. Essas altas prevalências ilustram a relevância do tema em nosso
país.
O consumo de bebidas alcoólicas por adolescentes é um problema que desperta
preocupação no mundo todo. A discussão é de grande importância para a saúde
pública, sendo necessária a atenção das autoridades, profissionais da saúde, pais
e educadores

Por Arthur Guerra de Andrade / Natália Gomes Ragghianti / Lúcio Garcia de Oliveira

Má influência familiar

A Secretaria da Saúde informou que adolescentes que bebem demais são


influenciados pelos pais. A pesquisa foi realizada pelo Centro de Referência em
Álcool, Tabaco e Outras Drogas (CRATOD), e envolveu mais de 500 pacientes entre
12 e 17 anos, dos quais 86% são do sexo masculino. Desses, 256 afirmaram ter
parentes que também fazem uso abusivo de álcool. O estudo mostra ainda que
4,36% dos entrevistados referem o álcool como droga que mais consomem. Ainda
segundo a pesquisa, dos entrevistados que apontaram o álcool como droga principal,
22% começaram a beber aos 13 anos de idade e 15% aos 11

Pesquisa revela

Mais recentemente, o Instituto Brasileiro de


Geografia e Estatística (IBGE) realizou uma
pesquisa nacional entre estudantes da 9ª série do
Ensino Fundamental (Pesquisa Nacional de Saúde
do Escolar 2009, PeNSE), com média de idade
entre 13 e 15 anos, e os resultados foram
alarmantes. A taxa de uso de álcool na vida foi de
71,4%, sendo que 22% dos escolares responderam
que já beberam até se embriagar.
Nos últimos 20 anos, observou-se que a
exteriorização de emoções (comportamentos
agressivos, impulsivos, ou descontrolados) e, em
menor grau, a interiorização das mesmas
(comportamentos ansiosos ou depressivos), duas
características detectáveis na infância, são
potenciais marcadores de uma predisposição para o Em crianças submetidas a estresse elevado, o
uso precoce de álcool, que está associado ao início da ingestão de álcool é mais precoce e o
histórico de consumo abusivo e de dependência de risco de consumo frequente pode ser maior. Tal
álcool. Por exemplo, foi estimado que indivíduos dinâmica pode ser observada entre as crianças
que iniciam o consumo de álcool antes dos 16 anos em situações de rua no Brasil
de idade possuem risco 1,3 a 1,6 vezes maior de desenvolver dependência alcoólica, e que
cada ano de atraso no início da ingestão de álcool seria capaz de gerar uma redução de 14%
no risco para a dependência alcoólica. Assim, a idade de início do uso de álcool é um dos
principais pontos de referência para avaliar os possíveis riscos de problemas associados. Em
paralelo, vários pesquisadores sugerem que tal efeito seria decorrente do fato de que a idade
de início modera a influência de outros fatores (hereditários e ambientais) sobre o uso dessa
substância.
Em crianças submetidas a situações de estresse elevado, o início da ingestão de álcool é mais
precoce e o risco de consumo frequente pode ser maior. Tal dinâmica pode ser observada
entre as crianças em situações de rua no Brasil: constatou-se que 33% dos jovens de 9 a 11
anos de idade e 77% dos jovens de 15 a 18 anos de idade consumiam álcool.
"Estima-se que indivíduos que iniciam o consumo de álcool antes
dos 16 anos de idade possuem risco 1,3 a 1,6 vezes maior de
desenvolver dependência alcoólica"

O consumo de bebidas alcoólicas por adolescentes é um problema que desperta


preocupação no mundo todo. A discussão é de grande importância para a saúde
pública, sendo necessária a atenção das autoridades, profissionais da saúde, pais
e educadores

Por Arthur Guerra de Andrade / Natália Gomes Ragghianti / Lúcio Garcia de Oliveira

Polêmica da lei

Um importante método de prevenção utilizado é a


imposição do limite de idade mínima legal para o
consumo e/ou venda de bebidas alcoólicas; porém,
esse assunto é bastante polêmico e, mesmo com
as punições, não é raro observar a quebra de tais
medidas legais. No Brasil, é proibida a venda de
bebidas alcoólicas aos menores de 18 anos, mas
não há uma lei que regulamente a idade mínima
para o consumo. Não há um padrão mundialmente
estabelecido, sendo que os limites podem variar de Fonte: National Institute on Alcohol Abuse and
16 a 25 anos de idade, de acordo com os costumes Alcoholism
e a cultura dos países.
Diversos tipos de abordagem buscam lidar e aliviar os problemas relacionados ao consumo de
álcool entre jovens. Possivelmente a abordagem mais frequentemente utilizada é a do método
educacional em ambiente escolar, que busca fornecer ao jovem informação sobre o uso de
álcool e suas consequências à saúde, busca trabalhar sua autoestima e fortalecer a resistência
à pressão em torno do consumo de bebidas alcoólicas. Materiais educativos também podem
ser direcionados a pais de crianças e adolescentes, com o intuito de esclarecê-los sobre os
prejuízos que o uso de álcool pode trazer à saúde de crianças e adolescentes.

Métodos efetivos

Outra abordagem utilizada é a da intervenção breve (intervenção de curta duração). Esse


método apresenta resultados bem satisfatórios na redução do consumo de álcool e de
problemas associados entre jovens adultos. Sua efetividade se faz valer também entre jovens
estudantes universitários, conforme atesta a literatura científica sobre o assunto. Contudo,
ainda faltam estudos comprovando a efetividade desse método entre jovens e adolescentes.
Vale destaque também para as mudanças em termos de políticas públicas, as quais resultam
em efeitos significativos tanto no comportamento dos jovens quanto na diminuição do consumo
de álcool. Assim, medidas relacionadas ao beber e dirigir e de combate à venda e consumo de
bebidas para jovens são de grande valia.

Por que os jovens bebem?

Arriscar-se, ser independente e experimentar - cada um com sua própria intensidade - são características marcantes que os
jovens passam a vivenciar e desejar durante a adolescência. Por isso, esse é um período de grande vulnerabilidade - e para
muitos jovens o álcool exerce um poder atrativo, seja por motivos sociais, psicológicos, genéticos ou culturais. Essa atração
ocorre exatamente quando os indivíduos geralmente não estão completamente preparados para enfrentar ou reconhecer os
efeitos e consequências do uso do álcool.
Pesquisas com animais mostram que adolescentes em geral são mais sensíveis que os adultos aos efeitos estimulantes do
álcool, e menos sensíveis a alguns dos efeitos aversivos da intoxicação aguda por álcool, como sedação, ressaca e perda de
coordenação muscular.

Associado a essa diferença de sensibilidade, muitos jovens ainda têm expectativas positivas do álcool, ou sejam, acreditam
que o seu consumo resultará em algo positivo, experiências prazerosas, e tornam- se menos convencidos das
consequências prejudiciais do álcool. Tais expectativas desempenham um papel fundamental no comportamento de beber
entre os jovens. Nesse contexto, os jovens relataram beber principalmente por prazer, hábito, para aumentar a confiança em
si mesmo, para aliviar a ansiedade ou estresse ou por lazer.

Álcool e jovens
O consumo de bebidas alcoólicas por adolescentes é um problema que desperta
preocupação no mundo todo. A discussão é de grande importância para a saúde
pública, sendo necessária a atenção das autoridades, profissionais da saúde, pais
e educadores

Por Arthur Guerra de Andrade / Natália Gomes Ragghianti / Lúcio Garcia de Oliveira

REFERÊNCIAS

CARLINI EA, GALDUROZ JC, NOTO AR, FONSECA AM, OLIVEIRA LG, NAPPO SA, et al. II Levantamento domiciliar sobre
o uso de drogas psicotrópicas no Brasil: estudo envolvendo as 108 maiores cidades do país - 2005. Brasília, DF, Brazil:
SENAD - Secretaria Nacional Antidrogas; 2007. GALDUROZ JC, CAETANO R. Epidemiology of alcohol use in Brazil.
Revista Bras Psiquiatr 2004;26 Suppl 1:S3-6. GALDUROZ JC, NOTO AR, NAPPO SA, CARLINI EA. Trends in drug use
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HINGSON RW, ZHA W, WEITZMAN ER. Magnitude of and trends in alcohol-related mortality and morbidity among U.S.
college students ages 18-24, 1998-2005. J Stud Alcohol Drugs Suppl 2009:12-20. HINGSON RW, ZHA W. Age of drinking
onset, alcohol use disorders, frequent heavy drinking, and unintentionally injuring oneself and others after drinking.
Pediatrics 2009;123:1477-1484. KUNTSCHE E, VAN DER VORST H, ENGELS R. The earlier the more? Differences in the
links between age at first drink and adolescent alcohol use and related problems according to quality of parent-child
relationships. J Stud Alcohol Drugs 2009;70:346-354. NATIONAL INSTITUTE ON ALCOHOL ABUSE AND ALCOHOLISM.
Underage Drinking: Understanding and Reducing Risk in the Context of Human Development. Pediatrics 2008;121: Issue
Supplement. WAGNER GA, ANDRADE AG. Uso de álcool, tabaco e outras drogas entre estudantes universitários
brasileiros. Revista Psiq Clin 2008;35 suppl 1:48-54.

Arthur Guerra de Andrade é médico Psiquiatra, Professor Associado do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), Professor Titular de Psiquiatria e Psicologia Médica, Faculdade de Medicina
do ABC, Presidente Executivo do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA)

Natália Gomes Ragghianti é bacharel em Psicologia e Pesquisadora Assistente do Centro de Informações sobre Saúde e
Álcool (CISA)

Lúcio Garcia de Oliveira é biomédico, Mestre e Doutor em Psicobiologia pelo Departamento de Psicobiologia da Universidade
Federal de São Paulo (UNIFESP). Atualmente é pós-doutorando pelo Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina
da USP

Texto retirado: http://psiquecienciaevida.uol.com.br/ESPS/Edicoes/52/entre-


jovens-o-consumo-de-bebidas-alcoolicas-por-adolescentes-170951-1.asp

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