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Administração
E-ISSN: 1982-2596
jmoraes@id.uff.br
Universidade Federal Fluminense
Brasil
Borges, Fábio Roberto; Teixeira Veiga, Ricardo; Gonçalves Filho, Cid; Bueno Fernandes,
Izabella; Torres Júnior, Noel
QUALIDADE EM SERVIÇOS E GESTÃO DA EXPERIÊNCIA DO CLIENTE NO
COMÉRCIO ELETRÔNICO
Revista Pensamento Contemporâneo em Administração, vol. 8, núm. 2, abril-junio, 2014,
pp. 126-143
Universidade Federal Fluminense
Rio de Janeiro, Brasil
Resumo
A gestão da experiência do cliente é uma abordagem que vem gerando crescente interesse em
profissionais e acadêmicos da área de marketing (KLAUS, 2013; RAWSON; DUNCAN; JONES,
2013). De outro lado, a qualidade em serviços continua sendo estudada e vem ganhando novas escalas
e modelos para o contexto online (BOSHOFF, 2007; LI; SUOMI, 2009). O limiar entre os temas
continua, porém, pouco explorado na literatura acadêmica, dificultando a operacionalização dos
conceitos de maneira integrada (KLAUS, 2013). Este artigo busca elucidar a inter-relação entre os
temas a partir da representação da jornada do cliente, onde a qualidade em serviços é um fator
primordial para a entrega de valor, dentro de um contexto mais amplo, que envolve todos os pontos de
contato do cliente com a empresa, que devem ser geridos a partir da centralidade de pensamento no
cliente e no comprometimento em oferecer-lhe experiências positivamente diferenciadas, capazes de
promover engajamento.
Abstract
The customer experience management is an approach that is growing in interest from marketing
professional to marketing academics (KLAUS, 2013; RAWSON; DUNCAN; JONES, 2013). On the
other hand, service quality still being studied and gaining new scales and models applied to the online
context (BOSHOFF, 2007; LI; SUOMI, 2009). However, the boundaries between the subjects
customer experience management and service quality, remains little explored in the literature, making
it difficult to operationalize the concepts in an integrated way (KLAUS, 2013). This article seeks to
elucidate the interrelationship between the subjects using the representation of the customer journey,
where service quality is a key factor to delivering value, within a broader context, which involves all
touch points customer with the company, which must be managed from the customer centrality
thought and commitment to offer you positively differentiated experiences capable of promoting
engagement.
Introdução
Olhando para além das fronteiras da literatura acadêmica, profissionais de marketing lidaram
nos últimos anos com uma convocação para aderirem à ideia de gerir a experiência de seus
clientes através de todos os pontos de contato dos mesmos com a empresa (KLAUS, 2013).
Nesta perspectiva, muitas foram as conjecturas sobre como a gestão da experiência do cliente é
uma estratégia ampla, onde a qualidade em serviços é um dos seus pontos primordiais, mas não
a abordagem completa. Neste sentido, Hyken (2013), autor e palestrante sobre o tema afirma
que “o serviço ao consumidor forma a base para a experiência do cliente”, focando sua definição
de serviço na interface de atendimento pessoal. De maneira similar, Gleneicki (2013), consultora
na área, afirma que “o serviço ao consumidor é apenas uma parte de toda a experiência do
consumidor”. Em outro patamar de relevância, e dentro do escopo de análise deste trabalho, Jeff
Bezos, CEO da Amazon, também afirma que “internamente, serviço ao consumidor é apenas um
componente da experiência do cliente” (STONE, 2013). Além dele, Jerry Gregoire, ex-CIO da
Dell, empresa conhecida pela sua excepcional qualidade em serviços e operações, já afirmava no
final da década 1990: “a experiência do cliente é o novo campo competitivo” (KIRSNER, 1999).
compreensão pelos acadêmicos e também pelos praticantes do campo (KLAUS; MAKLAN, 2012).
Além disso, pode também ser interpretado, principalmente em trechos de profissionais como os
citados, que a qualidade em serviços deve ser relegada a um posto menor, perante um novo
conceito holístico como o da experiência. Contudo, isto não passa perto de ser verificado. Como
coloca Lecinski (2011), a entrega do serviço é um momento da verdade, sendo o mesmo
decisivo, crucial e irrevogável, onde o cliente irá tirar suas conclusões sobre a capacidade da
empresa em satisfazer suas necessidades e resolver os seus problemas. Assim sendo, uma
abordagem centrada na experiência do cliente somente será assim entendida se tiver como base
a entrega de serviços de qualidade. Neste sentido, este artigo explora a relação entre a qualidade
em serviços online e a experiência do cliente, com foco no comércio eletrônico, respondendo
quais são os elementos do conceito da gestão da experiência do cliente no comércio eletrônico
que ampliam a entrega de valor para além dos fatores que compõem a qualidade de serviços.
Qualidade em Serviços
como SERVPERF (MIGUEL; SALOMI, 2004). De acordo com Miguel e Salomi (2004), no
instrumento SERVPERF, os 22 itens que representam as cinco dimensões da qualidade,
desenvolvidos por Parasuraman, Zeithaml e Berry (1988), foram utilizados para a avaliação de
desempenho. O modelo de desempenho ideal, elaborado por Teas (1993), também utiliza as
cinco dimensões desenvolvidas por Parasuraman, Zeithaml e Berry (1988), e tem maior
correlação com as preferências de compra, intenções de recompra e satisfação com os serviços
(MIGUEL; SALOMI, 2004).
Autor(es) Dimensões
Dabholkar Design do website; confiabilidade; entrega; facilidade de uso; divertimento; e, controle
(1996)
Zeithamal et al Segurança; comunicação; confiabilidade; capacidade de resposta; e, entrega
(2002)
Madu e Madu Desempenho; elementos; estrutura; estética; confiabilidade; manutenção; segurança e
(2002) integridade do sistema; confiança; capacidade de resposta; diferenciação e
customização; política da loja online; reputação; garantia; e, empatia
Analisando a frequência com que foi utilizada cada uma das dimensões no Quadro 1, observa-se
que as mais empregadas foram: confiabilidade (8); capacidade de resposta (5); segurança (5); e,
design do website (4). Li e Suomi (2009) a partir de extensa revisão da literatura também
propuseram sua escala, utilizando como dimensões: design do website; confiabilidade;
Contudo, o autor observou que grande parte das escalas desenvolvidas para o comércio
eletrônico não dedicavam itens suficientes à análise de aspectos relacionados ao processo de
comprar e obter determinado produto/serviço, com um foco demasiado em itens sobre os
momentos pré-compra. Após revisão da literatura, Francis (2007) propôs cinco dimensões para
análise da qualidade do serviço: website; transação; entrega; serviço de atendimento ao
consumidor; e, segurança. Contudo, Francis (2007) acredita ser preciso distinguir os itens a
serem analisados na prestação de serviços de websites de comércio eletrônico, que podem
vender serviços ou bens, físicos ou virtuais.
O Quadro 2 apresenta três dos instrumentos mais utilizados para avaliação da qualidade de
serviços na internet, juntamente com suas críticas mais importantes, apresentadas por Boshoff
(2007); suas dimensões, conforme compiladas por Li e Suomi (2009); e, número de itens da
escala destinados à pré-compra e compra e aquisição, de acordo com Francis (2007).
Nº de Itens
Pré- Compra e
Instrumento Dimensões Crítica
Compra Aquisição
WebQual Informação; Interatividade; 1) Criada para ajudar
(LOIACONO et al, Confiança; Tempo de desenvolvedores de website;
2002) Resposta; Design do Website; 2) Entrevistou apenas
Navegação Intuitiva; estudantes; 3) Não inclui
Capacidade de despertar preenchimento como uma 35 1
estado de fluxo; dimensão (ZEITHAML et al,
Inovatividade; Comunicação 2002; Parasuraman et al,
Integrada; Processos de 2005)
Negócio; e, Sustentabilidade
e-TailQ Design do Website; Confiança; 1) Não captura o processo de
(WOLFINBARGER; Segurança; e, Serviço ao compra como um todo; 2)
GILLY, 2003) Cliente Questionável
10 4
dimensionalmente
(ZEITHAML et al, 2002;
Parasuraman et al, 2005)
SITEQUAL (YOO; Facilidade de Uso; Design do 1) Utilizou amostras de
DONTHU, 2001) Website e Estética; conveniência; 2) Não captura
Velocidade de o processo de compra como
9 0
Processamento; e, Segurança um todo (ZEITHAML et al,
2002; Parasuraman et al,
2005)
Dentro desse contexto, foi a escala E-S-QUAL, desenvolvida por Parasuraman, Zeithamal e Malhotra
(2005) que ganhou, desde sua publicação, maior relevância e confiabilidade para medição da qualidade
em serviços online (BOSHOFF, 2007). A E-S-QUAL é uma escala multidimensional para medição da
qualidade de serviços entregues por websites nos quais os consumidores compram online
(PARASURAMAN; ZEITHAMAL, MALHOTRA, 2005). Os autores identificaram que era necessário
desenvolver uma escala focada em serviços online, do que meramente adaptar a escala SERVQUAL para
este contexto. Assim, num primeiro momento, conforme consta em Zeithamal, Parasuraman e Malhotra
(2000) apud Parasuraman, Zeithamal, Malhotra (2005), onze dimensões foram pensadas: confiabilidade
do website, responsividade, acesso, flexibilidade, facilidade de navegação, eficiência, confiança no
vendedor, segurança/privacidade, conhecimento do preço, estética do website, e,
customização/personalização. Inicialmente com 121 itens, reduzidos para 113 após grupos focais, a
escala foi testada em uma amostra de 549 respondentes. Utilizando análise fatorial exploratória em
componentes principais, a escala foi reduzida para 22 itens, organizados em quatro dimensões, a saber:
Discordo Concordo
Totalmente Totalmente
Eficiência
No site X é fácil encontrar o que necessito. 1 2 3 4 5 6 7
O site X facilita a navegação por onde eu quero. 1 2 3 4 5 6 7
O site X facilita completar a transação rapidamente. 1 2 3 4 5 6 7
A informação no site X é bem organizada. 1 2 3 4 5 6 7
As páginas no site X carregam rapidamente. 1 2 3 4 5 6 7
O site X é fácil de usar. 1 2 3 4 5 6 7
O site X auxilia o usuário a navegar dentro dele de modo rápido. 1 2 3 4 5 6 7
O site X é bem organizado. 1 2 3 4 5 6 7
Disponibilidade do Sistema
O site X está sempre disponível para fazer negócios 1 2 3 4 5 6 7
O site X funciona perfeitamente. 1 2 3 4 5 6 7
O site X não sai do ar. 1 2 3 4 5 6 7
O site X não trava depois de eu ter feito meu pedido. 1 2 3 4 5 6 7
Preenchimento
O site X entrega a mercado quando prometido. 1 2 3 4 5 6 7
O site X entrega a mercadoria dentro de um tempo justo. 1 2 3 4 5 6 7
O site X entrega a mercadoria de modo muito rápido. 1 2 3 4 5 6 7
O site X entrega a mercadoria quando solicitada. 1 2 3 4 5 6 7
O site X parece ter em estoque os itens que são apresentados no site. 1 2 3 4 5 6 7
O site X é confiavél em relação às suas ofertas. 1 2 3 4 5 6 7
O site X faz promessas sobre a entrega de produtos. 1 2 3 4 5 6 7
Privacidade
O site X protege a informação sobre meu comportamento de compra. 1 2 3 4 5 6 7
O site X não divulga minha informação pessoal para outros sites. 1 2 3 4 5 6 7
O site X protege a informação sobre meu cartão de crédito. 1 2 3 4 5 6 7
Quadro 3 – Escala E-S-QUAL
Fonte: Desenvolvido por Parasuraman, Zeithmal e Malhotra (2005), traduzido por Vieira e Torres
(2008).
Percebe-se, portanto, que, conforme colocado por Francis (2007), as escalas para medição da
qualidade em serviços online ficam muito focadas em itens pré-compra, e também, como é
possível vislumbrar na E-S-QUAL, para garantir a dimensionalidade, há uma necessidade de
reduzir os itens e dimensões para os processos básicos, orientados para permitir que a
transação e entrega aconteça, fato que é analisado mais profundamente adiante neste mesmo
artigo.
O artigo seminal dos estudos sobre a perspectiva experiencial no consumo foi elaborado por
Holbrook e Hirschman (1982), como apontam Carù e Cova (2003), Gentile, Spiller e Noci (2007)
e Addis e Holbrook (2001). Os autores Holbrook e Hirschman (1982) atribuem a concepção da
perspectiva experiencial à incapacidade que o modelo até então prevalecente, conhecido como
Information Processing Model, ou Modelo de Processamento de Informações, tinha de explicar
comportamentos de consumo com base na percepção de que os indivíduos não tomam decisões
puramente racionais, utilizando-se da lógica. Pine II e Gilmore (1998) observaram que a
perspectiva experiencial nasce de um processo competitivo, no qual os bens e os serviços
ofertados se tornam cada vez mais similares, ou comoditizados, e as empresas passam a
competir projetando experiências de consumo diferenciadas (JOHNSTON; KONG, 2011).
A literatura científica que estuda o tema, como é comum ocorrer em temas emergentes, mostra
limitações e inadequações, principalmente em termos de terminologia precisa e de estrutura
sólida do construto (GENTILE; SPILLER; NOCI, 2007; ADDIS; HOLBROOK, 2001; PALMER, 2010),
em grande parte, limitando-se a relacionar ferramentas operacionais utilizadas por empresas
para promover essas experiências diferenciadas de consumo (JOHNSTON; KONG, 2011). Para
uma compreensão mais ampla dos principais conceitos utilizados para definir a gestão da
experiência do cliente, estão compiladas as diferentes abordagens de autores importantes da
área no Quadro 4.
Autor(es) Definição Iniciativa e
Perspectivas de
Interação
Holbrook e Aborda o consumo a partir de seus aspectos subjetivos, tendo em Empresa-Cliente
Hirschman vista a variedade de significados simbólicos, as respostas
(1982) hedônicas e os critérios estéticos que o envolvem.
Pine II e Proporcionar valor para os clientes ao superar suas expectativas, Empresa-Cliente
Gilmore (1998) em experiência memoráveis, que irão remanescer retidas em
suas memórias, devido ao envolvimento emocional promovido.
Schmitt (2004) O processo de gerenciar, estrategicamente, toda a experiência de Empresa-Cliente-
um cliente com determinado produto ou empresa. Empresa
Verhoef et al. A soma das experiências entre o consumidor e a empresa, que Cliente-Empresa
(2009) inclui desde a procura por bens e/ou serviços, compra, consumo
e pós-venda, podendo envolver os múltiplos canais em que se dá
esse contato.
Grewal, Levy e Todos os pontos de contato em que o cliente interage com o Empresa-Cliente-
Kumar (2009) negócio, produto ou serviço de determinada empresa, incluindo o Empresa Cliente-
contato passivo ou não programado. Cliente
Quadro 4 – Abordagens do Conceito de Gestão da Experiência do Cliente
Assim como foi realizado em Verhoef et al. (2009), Johnston e Kong (2011) e Palmer (2010),
para que haja maior clareza no desenvolvimento deste trabalho, proporcionando melhor
entendimento em sua leitura, faz-se necessário explicitar a definição a que o autor estará se
referindo durante o texto ao abordar o conceito de gestão da experiência do cliente. Dessa
forma, entende-se neste artigo por gestão da experiência do cliente: a estratégia empresarial
estruturada (GREWAL; LEVY; KUMAR, 2009; SCHMITT, 2004) e o esforço desprendido para
proporcionar experiências únicas e memoráveis para os consumidores (GILMORE e PINE II,
2002), considerando todos os pontos de contato com o negócio, produto, serviço ou marca
(GREWAL; LEVY; KUMAR, 2009), promovendo boas impressões e engajamento emocional
positivo desses consumidores (JOHNSTON; KONG, 2011) e permitindo o desenvolvimento de
vantagens competitivas sustentáveis no mercado de atuação da empresa (SHAW; IVENS, 2002).
Schmitt (2004) propõe as cinco etapas para que o conceito seja traduzido em uma ferramenta
prática de gestão: (1) analisando o mundo experiencial do cliente: proporciona insights do
mundo do cliente, devendo-se analisar o contexto sociocultural em que ele se encontra, as
necessidades e os estilos de vida, com foco em compreender diversos aspectos de sua vida e de
suas aspirações; (2) construindo a plataforma experiencial: é o principal ponto de ligação entre
a estratégia e a implementação, devendo-se construir uma representação multissensorial e
multidimensional do posicionamento experiencial a ser adotado, especificando o valor
experiencial prometido; ou seja, tudo aquilo que a empresa deseja entregar em termos de
experiência, de acordo com a análise realizada anteriormente do mundo experiencial do cliente;
(3) projetando a experiência da marca: a partir do descrito na plataforma experiencial, a
empresa deve traduzir os elementos em aspectos como estética do produto, logos, sinalização,
embalagem, propriedade, espaços de varejo, mensagens e demais recursos promocionais; (4)
estruturando a interface do cliente: trata da interface dinâmica entre a empresa e o cliente; ou
seja, pontos de contato, que variam cada vez que o cliente estabelece uma relação com eles,
devendo ser estruturados o conteúdo e o estilo dessa interação, que compreende itens como
abordagem feita a um cliente na loja, resposta a uma solicitação de troca de produtos e o
atendimento a um pedido de informações; (5) comprometendo-se com a inovação contínua:
garante que a empresa não se acomode com a experiência que vem sendo proporcionada e
construída com os clientes, atendo-se à importância de buscar oferecer novos formatos de
experiência que complementem a plataforma experiencial e superem continuamente a
expectativa dos clientes.
Nesse sentido, Chen et al (2008) desenvolveram um modelo teórico que relaciona a lealdade do
cliente com a gestão da experiência virtual do cliente, formada pelos seguintes elementos: (1)
Os fatores moderadores utilizados por Chen et al. (2008) são: orientação econômica, que é
orientação por buscar na Internet produtos por melhor preço; orientação por conveniência, que
se relaciona ao uso da Internet como forma de facilitar a aquisição de determinado produto em
comparação a sua compra em outro meio; e experiência e habilidade que o usuário tem para
utilizar a Internet e o site especificamente para a compra de mercadorias. Os autores afirmam
que os elementos alinhados e desenvolvidos adequadamente, quando não impactados
negativamente pelos fatores moderadores, aumentam a intenção de navegar pelo site e de
realizar compras pelo site, o que, por sua vez, aumentará a lealdade do cliente e a repetição
desse comportamento em ocasiões futuras.
A gestão da experiência do cliente traz a ideia de que todos os pontos de contato do cliente com
a empresa devem estar alinhados e serem capazes de proporcionar experiências únicas e
memoráveis. Para além dos pontos de contato, a gestão da experiência do cliente é uma
abordagem que deve pensar na jornada do consumidor até o engajamento com a empresa e nas
maneiras pelas quais a inovação contínua deve manter esse cliente engajado ao longo do tempo
(RAWSON; DUNCAN; JONES, 2013). Durante essa jornada, existem diversos “momentos da
verdade”, conforme Lecinski (2011), onde oferecer qualidade em serviços é primordial para, de
fato, entregar o valor construído ao cliente, e aumentar a possibilidade de envolvimento do
mesmo, durante sua jornada para com a empresa.
A Figura 3, que representa a compreensão dos autores formada pela literatura exposta neste
artigo, principalmente considerando Schmitt (2004), Lecinski (2011), Halligan e Shah (2010),
Parasuraman, Zeithamal e Malhotra (2005) e Klaus (2013), mostra que a jornada do
consumidor engloba todos os pontos de contato com a marca desde as etapas iniciais do
processo de compra, onde o consumidor ainda não reconheceu sequer a necessidade de
comprar o produto. A Figura 3 mostra também que a experiência total do consumidor tão pouco
acaba no momento da compra, pois as empresas devem focar em extrair o máximo de valor do
relacionamento com o cliente durante todo o tempo em que este estiver apto a comprar, indicar
ou contribuir para a empresa de alguma forma. Os serviços, pensando especificamente no
comercio eletrônico, representam os pontos em que a empresa pode cumprir, de fato, aquilo que
promete em suas ofertas. Assim, a Figura 3 apresenta uma representação genérica da jornada do
consumidor, que inclui os serviços como pontos cruciais para entrega de valor, dentro de um
contato muito mais amplo que forma a experiência completa com a marca/empresa.
É importante ressaltar que, antes de iniciar o processo de atração de prospects como mostrado
pela Figura 3, dentro do conceito de gestão da experiência do cliente, a empresa precisa
estruturar a experiência e como a mesma será entregue ao consumidor. Nesse sentido,
destacam-se as etapas elaboradas por Schmitt (2004), que são: (1) analisando o mundo
experiencial do cliente; (2) construindo a plataforma experiencial; (3) projetando a experiência
da marca; (4) estruturando a interface do cliente. A partir deste ponto, como mostra a Figura 3,
representando a jornada da experiência do cliente no comércio eletrônico, a empresa deve
atrair aqueles consumidores que são clientes em potencial (prospects) para sua presença digital
(mídia própria), principalmente por meio de conteúdo relevante, de acordo com necessidades
de informação e objeções deste público sobre os serviços/bens oferecidos. Uma vez que este
prospect visita o website da empresa, é preciso trabalhar para que este, de alguma maneira, se
conecte à empresa, seja deixando uma informação para contato, seguindo uma página de rede
social, etc., fazendo com que este se transforme em um cliente em potencial que já está aberto a
manter algum relacionamento com a empresa, uma oportunidade de negócio (lead). É
interessante destacar que a venda e o restante da jornada pode ocorrer sem que
necessariamente esta etapa de transformação de consumidores em leads ocorra e que esta
transformação por ocorrer depois do reconhecimento do problema, estimulado pela própria
empresa.
Quando este consumidor reconhecer um problema, é interessante, embora também não tenha
que ocorrer nesta ordem, que o mesmo já saiba que, para este problema a empresa possui
bens/serviços que podem atender a essa demanda. Neste ponto o consumidor segue o processo
natural de compras, entre busca de informações, avaliação e seleção de alternativas até a
escolha da loja. Se o website da empresa proporcionar uma experiência positiva de pré-compra,
com os bens/serviços que o consumidor procura, passando confiança em sua interface,
atendimento, preço certo, prazo de entrega adequada, formas de pagamento almejadas,
estímulo aos sentidos, relacionamento em comunidade, interação facilitada, usabilidade, entre
outros, é de se esperar que parte dos consumidores opte pela empresa. Este é um momento da
verdade, em que todo o processo deve funcionar de maneira adequada e o serviço deve ser
prestado com qualidade. Neste ponto, podemos observar que não adianta que toda a
experiência até então seja positiva e memorável se o primeiro serviço em si a ser prestado,
envolvendo pagamento, não corresponder ao esperado.
Assim, o cliente pode caminhar para o ciclo de engajamento, onde re-compras para problemas
similares, ou para problemas para os quais a empresa oferece serviços/bens para satisfazer a
demanda, formarão o comportamento de lealdade do cliente. Se a empresa conseguir continuar
encantando esse cliente, oferecendo uma experiência positiva para o mesmo, mantendo o
relacionamento com este cliente alimentado, é possível que o mesmo se sinta motivado a falar
com outros consumidores sobre a empresa, comente sobre a mesma com seus amigos e
familiares, escreva reviews sobre seus bens e serviços, ajudando a construir sua base de cliente e
atraindo mais prospects para a sua plataforma experiencial. Assim, a Figura 3 explicita a visão
deste artigo sobre a inter-relação entre os temas, a partir de extensa revisão da literatura,
entendendo que o consumidor atravessa uma jornada em seu relacionamento com a empresa e
a experiência deve ser gerida para oferecer valor em todos os pontos de contato com a marca,
sendo que a qualidade em serviços é responsável pelos momentos cruciais onde o cliente
avaliará o valor entregue a possibilidade de se engajar com a empresa/marca.
Considerações Finais
Orientar a empresa para a jornada do cliente até o engajamento com a marca requer o
pensamento orientado para gerir a experiência do cliente (GREWAL; LEVY; KUMAR, 2009;
SCHMITT, 2004). A qualidade em todas as possibilidades de serviço oferecidas pela empresa é
um requisito para que o valor entregue ao cliente seja, de fato, capaz mantê-lo conectado à
empresa.
Nesse sentido, a empresa de comércio eletrônico que se ocupar apenas em atrair clientes,
oferecer seus produtos ao preço certo e entregá-los dentro do prazo combinado e manter um
ambiente seguro, estará tendo retornos na média ou acima dela somente enquanto seus
concorrentes diretos estiverem também com o foco neste processo descrito (RAWSON;
DUNCAN; JONES, 2013). Contudo, a empresa que não abandonar esses requisitos básicos da
competição, mas adicionar uma visão centrada no consumidor e trabalhar todos os elementos
de sua jornada, alinhando todos os pontos de contato com a marca a fim de oferecer
experiências únicas e memoráveis, certamente conseguirá mais advocates para a sua base de
clientes e a partir dos mesmos atrairá mais clientes e os tornará mais engajados, atingindo
retornos acima da média do setor (SCHMITT, 2004; HALLIGAN; SHAH, 2010).
Conforme coloca Chen et al. (2008), o relacionamento em comunidade talvez seja um dos
aspectos que mais distancia o comércio eletrônico do comércio tradicional, pois a possibilidade
de criação de muitos para muitos possibilita a concepção coletiva da experiência de compra.
É preciso que, a partir da coleta de dados na internet chamada de Web Analytics, a empresa
conheça profundamente os interesses dos seus clientes e apresente ofertas que realmente sejam
condizentes com seu perfil e estilo de vida. Esse processo de aprendizado deve ser contínuo,
unindo processos de coleta e análise para formação de perfis ricos. Ainda nesse aspecto, o
relacionamento em comunidade pode aprofundar esta relação de intimidade com o cliente, a
medida que não somente dados de fluxos de cliques serão coletados, mas também a opinião
desse cliente, compondo um quadro maior de seus interesses.
Para conseguir que o ciclo de engajamento do cliente seja valioso, a empresa precisa se conectar
emocionalmente com o mesmo (PINE II; GILMORE, 1998; VERHOEF et al., 2009). Tal conexão
pode ser melhor estabelecida se, onde tiver oportunidade de fazê-lo, a empresa alcance outros
sentidos, que não somente auditivos e visuais, que marcam a interação pela internet. Uma
empresa virtual, quando entrega um bem físico para seu cliente, pode aproveitar esta ocasião
para ampliar a sua percepção de marca para sentidos como tato e olfato, seja por meio da
embalagem ou do próprio produto. Esta representação multissensorial da marca contribui para
este vínculo emocional, que juntamente ao relacionamento em comunidade podem catalisar o
ciclo de engajamento.
Este artigo mostrou que longe de ser uma filosofia amorfa de negócios, a gestão da experiência
do cliente é uma ferramenta prática de gestão, conforme coloca Schmitt (2004), desde que a
empresa esteja disposta a compreender toda a jornada do seu cliente e ampliá-la a partir de
novos serviços e novos espaços de relacionamento. Os serviços são, dentro desta jornada,
pontos cruciais para a entrega de valor, que irão ser preponderantes para que o consumidor
compare as expectativas que foram criadas com a percepção obtida dos benefícios
proporcionados. Assim, em cenários mais competitivos, como marcadamente é o comércio
eletrônico, não é suficiente oferecer serviços de qualidade, pois o campo competitivo se amplia
para oferta de experiências memoráveis em todos os pontos de contato (PINE II; GILMORE,
1998), requerendo alinhamento de todos estes pontos em uma proposta de valor concisa. A
medida que a competitividade aumenta, as ofertas precisam manter ou aumentar a qualidade,
enquanto a proposta de valor deve incluir outros elementos que, para além do trivial, se
conectem emocionalmente ao consumidor e façam com que o mesmo traga receitas em todo o
seu ciclo de relacionamento com a empresa, seja comprando mais e melhor, seja cocriando o
conteúdo juntamente com a empresa, seja relacionando-se em comunidade e evoluindo a
compreensão da empresa sobre os seus clientes a partir desse relacionamento, seja, entre
outros, atraindo novos clientes para esta jornada.
Os autores deste artigo concordam com Klaus (2013) quando o mesmo afirma que a experiência
do cliente é específica para cada contexto e que o desenvolvimento do construto deve se dar
sempre a partir da análise de empresas, comparação entre empresas ou análise de escopos de
atividade selecionados. Sendo assim, é interessante que a articulação do conceito da gestão da
experiência do cliente analise jornadas do cliente com uma empresa específica, podendo
vislumbrar em quais pontos de contato e em quais serviços entregues a empresa, de fato,
conseguiu o almejado engajamento do cliente e até que ponto este pode ser duradouro e trazer
resultados financeiros.
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