Explorar E-books
Categorias
Explorar Audiolivros
Categorias
Explorar Revistas
Categorias
Explorar Documentos
Categorias
novo modelo
democrático?
Distritão:
novo modelo
democrático?
Paper para discussão – Junho de 2021
Centro de Estudos e Pesquisas da QCP –
Quanta Consultoria, Projetos e Editora Ltda.
Coordenação-Geral
Sinoel Batista
Coordenação Executiva
Tamara Ilinsky Crantschaninov
Capa e Diagramação
João Inacio dos Santos Neto
www.qcp.com.br
qcp@qcp.com.br
Sumário executivo
Este documento apresenta uma discussão teórica, histórica e analítica
sobre o tema do distritão, que tem estado em pauta com as
discussões mais recentes sobre reforma política.
3
O modelo do distritão propõe que o voto que exceda ao quociente
eleitoral não possa ser utilizado para auxiliar a eleger candidaturas do
mesmo partido, como acontece no modelo atual. As pessoas mais
votadas seriam as eleitas, sem o cálculo e a utilização do quociente
eleitoral e sem consideração à filiação partidária. As “sobras
eleitorais” não mais seriam contabilizadas para a eleição de outras
candidaturas e passariam a ser desprezadas no cômputo geral.
Se, por um lado, esse modelo parece mais simples e vantajoso, ele
acaba por focar em programas eleitorais individuais, e não mais num
programa partidário e numa linha ideológica em comum com os/as
colegas de sigla. Isso faz com que sejam eleitas as pessoas mais
conhecidas pelo público em geral, as que têm mais recursos para
investir na campanha e não, necessariamente, as mais preparadas para
desempenhar essa importante tarefa de representação.
4
No Brasil, a proposta do distritão aparece de tempos em tempos,
desde o Império. Mais recentemente, surgiu com força nas
manifestações de insatisfação política de 2013, que se desdobram
em debates no Congresso sobre a reforma política. Atualmente, um
dos principais articuladores da matéria é o deputado Giovani Cherini
(PL-RS), que alega que a dificuldade de compreensão do voto pelo(a)
eleitor(a) é o que causa o absenteísmo político. Michel Temer,
ex-Presidente da República, também é um defensor: alega que os(as)
puxadores(as) de votos são um transtorno à democracia e que o alto
custo de campanhas poderia ser barateado com a menor dispersão
de recursos entre as diversas candidaturas de um partido.
5
Já os(as) polêmicos(as) “puxadores(as) de votos” não desapareceriam
em um sistema como o distritão, já que partidos provavelmente
apostariam mais em figuras carismáticas ou personalísticas, mesmo
sem vocação ao Legislativo.
6
CIDADANIA (+2), PT (+2), MDB (+1) e PTB (+1). Por outro lado, o
partido que mais perderia com a mudança do sistema eleitoral para o
distritão seria o PSL (–10), que aglomerou diversas figuras pelo país
para fixar o então candidato Bolsonaro à sua imagem. Mesmo não
sendo mais deputado federal, Bolsonaro conseguiu ser um “puxador
de votos” indireto para os/as que se filiaram ao PSL conjuntamente.
Um aspecto relevante desse possível cenário é a presença marcante
do conhecido “Centrão”, caso o distritão fosse aprovado.
7
Somando-se as duas constatações anteriores, adotado o distritão, a
Câmara dos Deputados, na contramão dos movimentos sociais, se
tornaria bem “mais branca” e mais “masculina” do que é na
atualidade.
8
Sumário
Primeiro, não custa perguntar: Você sabe o que é isso? ................................................ 11
Anexo 1 .................................................................................................................................................................... 70
Anexo 2 .................................................................................................................................................................... 74
9
“O que é o voto distritão em discussão na reforma política?”, “Entenda o
que é o distritão”, “Entenda o que é o modelo distritão” são algumas
das frases que nos acostumamos a ler em reportagens de diferentes momentos
do período recente. Em 2017 e em 2021, por exemplo, encontramos explica-
ções sintetizadas do que é esse modelo de cálculo para o ingresso nas cadeiras
do Legislativo, acompanhadas de informações atualizadas da tentativa mais
recente de fazer tal modelo emplacar. Como se trata de proposta de alteração
constitucional, na medida em que não é aprovada, o debate se esvai para dar
as caras em outro momento, fazendo a agenda política efervescer novamente,
provocando manifestações junto à opinião pública a respeito das justificativas,
dos ganhos e perdas da proposta.
Este documento visa a contribuir para essa discussão, mas evitando ser mais
uma das reportagens que surgem para lembrar que, por exemplo, a palavra
“distritão” é um tanto enganosa quanto à proposta que o modelo evoca. Sem
oposições a esses conteúdos mais breves; eles são essenciais! Aqui, contudo,
buscaremos algo de maior fôlego: dar um breve histórico de como a ideia
ganhou corpo e foi materializada em projeto de Emenda Constitucional, quais
são as experiências internacionais parecidas, o que podemos aprender com
elas, além de ver o que a teoria e a prática dizem sobre os possíveis efeitos do
distritão. Para complementar, traremos alguns cálculos que realizamos, que
talvez ajudem a ilustrar o cenário que estamos abordando. Enfim, vamos lá!
10
Primeiro, não custa perguntar:
você sabe o que é isso?
O distritão é um modelo que busca alterar a maneira como são realizadas as
eleições para a Câmara dos Deputados e para as assembleias legislativas, nos
âmbitos nacional e estadual, respectivamente, além das câmaras municipais,
em que se elegem os vereadores. Já iremos entender que alteração é essa, mas,
antes, vamos descrever o panorama atual.
11
Já o segundo modelo de eleição é aquele que leva em conta o que chamamos
de critério de proporcionalidade. Não à toa, esse modelo é conhecido como
eleição proporcional. Ele é válido para a escolha de deputadas e deputados,
tanto federais quanto estaduais, e vereadoras e vereadores. A ideia aqui é,
basicamente, tratar uma candidatura individual como sendo parte de um grupo
de candidaturas, com ideias e propostas parecidas. É fazer com que o voto de
uma pessoa ajude a eleger o nome que foi escolhido por ela para ocupar a
vaga, mas também auxiliar o grupo ao qual esse mesmo nome faz parte. Isso
assegura maior importância aos programas dos partidos e coligações e garante
que, se a pessoa escolhida por você não tiver o número de votos necessário
para entrar, ainda assim seu voto seja útil para outra ou outro aspirante do
mesmo programa político.
12
independentemente se as cinco candidaturas tiveram, individualmente, mais
ou menos de 10.000 votos, pois os votos daquelas e daqueles que não
entraram, ou até os votos excedentes dos ingressantes, são computados para
auxiliar o partido a ter mais representantes.
13
O distritão surge para tentar tornar mais fácil esse cálculo, além de também
permitir candidaturas mais independentes e, com isso, acabar por diminuir a
relevância dos partidos. Há, entretanto, uma pergunta incômoda que os/as
defensores(as) da tese de candidaturas independentes necessitam responder:
independentes de quem?
Mais adiante, neste texto, veremos que nem sempre o que é mais fácil de
entender é mais desejável de se ter. De toda forma, a proposta é que esse
modelo atual – de eleição proporcional – torne-se majoritário, ou seja,
somente os/as mais votados(as) seriam eleitos(as), independentemente do
quociente eleitoral obtido pelas legendas. Os municípios, nas eleições para
vereança, e os estados, nas eleições para as assembleias legislativas e Câmara
Federal, se tornariam, para efeitos dos cálculos, imensos distritos – daí o termo
“distritão” – e a contabilização é feita na base de uma lista classificatória, ou
seja, os/as mais votados(as) ocupariam as vagas em disputa.
14
É um modelo que foge da proporcionalidade. As campanhas passam, então, a
ser individuais, e não mais baseadas num programa partidário e numa linha
ideológica em comum com colegas de sigla. Isso faz com que sejam eleitas as
pessoas mais conhecidas pelo público em geral, e não necessariamente as mais
preparadas para desempenhar essa importante tarefa de representação.
Uma mudança como essa, que altera a maneira como fazemos nossos cálculos
e nossa lógica na hora de votar, assim como a própria condução de
campanhas eleitorais, merece bastante cuidado na análise. Afinal, o voto é algo
essencial para uma democracia e, em especial, para nossa vida democrática.
15
Afinal, de onde vem a ideia de um
distritão?
Podemos dizer que o distritão surgiu no âmbito de uma intenção maior de
mudança do sistema político brasileiro. Desde 1988, quando o Brasil
promulgou a sua nova Constituição Federal, algumas propostas vieram para
alterar as regras eleitorais, ou seja, mudar as condições e o funcionamento de
como escolher quem nos representa e definir quem pode entrar e sob quais
parâmetros se alcança essa condição. Em 1993, por exemplo, ocorreu um
plebiscito para decidir se o Brasil seguiria sendo república presidencialista ou
se adotaria a monarquia e, se mantida a república, se esta seria presidencialista
ou parlamentarista. Mais adiante, em 1998, foi aprovada proposta de emenda
constitucional permitindo uma reeleição para os cargos executivos
(prefeitos(as), governadores(as) e presidente, algo até então não permitido.
16
representação do cenário brasileiro, como se para tentar equacionar os
problemas levantados nas pautas difusas. Um dos temas amplamente
debatidos foi a mudança na forma de financiamento das campanhas eleitorais.
1 G1. Câmara rejeita sistema “distritão” para escolha de deputados e vereadores. Disponível
em: http://g1.globo.com/politica/noticia/2015/05/camara-rejeita-sistema-distritao-para-
escolha-de-deputados-e-vereadores.html Acesso em 16 de maio de 2021.
17
combinasse metade dos cargos legislativos em eleições proporcionais e a
outra metade em eleições majoritárias, mas essa proposta também não
prosperou.
18
Onde esse modelo é aplicado?
Após compreendermos no que consiste a proposta da emenda constitucional
do distritão, vamos analisar alguns casos em que este modelo foi adotado.
Reunimos alguns exemplos de países e momentos históricos para entender os
resultados obtidos na construção de representatividade e democracia.
19
A seguir, para além dos elencados acima, serão apresentados dois exemplos
de países que já adotaram esse sistema eleitoral ou que permanecem em
diferentes formatos para exercê-lo. São os casos de Japão e Afeganistão. A
partir deles, poderemos compreender os motivos pelos quais adotou-se esse
desenho institucional e os efeitos associados à sua aplicação.
20
O distritão japonês
A Constituição Imperial Meiji foi introduzida em 1889. Nela, o poder
emanava do imperador e a estrutura de governo era formada majoritariamente
pela aristocracia e por antigos senhores feudais (hambatsu). Eram grupos
privilegiados que mantinham a máquina estatal sob seu poder de influência,
que perdurou por anos no Japão.
A primeira eleição nacional foi marcada pela disputa de muitos partidos e pela
força do personalismo das candidaturas, as quais, em sua maioria, tinham
pouca ou nenhuma experiência política institucional. A seleção de membros
da Câmara Baixa era, até então, majoritária mista, sendo 214 parlamentares
eleitos(as) em distritos uninominais e 86 parlamentares eleitos(as) em distritos
binominais, com o total de 43 distritos com voto múltiplo. Isto é: cada
eleitor(a) votava a quantidade de vezes equivalente ao número de cadeiras em
disputa, no caso, ou em uma pessoa ou em duas pessoas, a depender do
distrito. Além disso, o direito de votar era restrito àqueles(as) que pagassem
pelo menos 15 yenes em impostos federais por ano.
21
manter o poder em partidos que não pudessem alterar a lógica dos interesses
dos antigos senhores feudais, de tal modo que, com partidos fracos, a
burocracia imperial teria mais poder que a classe política.
22
concessão de presentes aos grupos empresariais, como gestão de obras
públicas. Outro grande problema que ocorria nesse sistema eleitoral era o
desperdício de votos, na medida em que muitos nomes com votação
significativa não chegavam ao limite de cadeiras do distrito e não tinham
nenhum de seus votos aproveitados.
Esse sistema também gerava cada vez mais sub-representação nos grandes
centros urbanos como Kobe, Osaka e Yokohama, que, apesar de sua
densidade populacional, tinham proporcionalmente números pequenos de
representantes, enquanto zonas rurais contavam com sobrerrepresentação
parlamentar, sobretudo onde o LDP tinha maior influência. Por isso, o Liberal
Democratic Party com o uso da máquina pública, manteve-se no poder e
conseguiu se estabelecer com políticas direcionadas a setores específicos do
eleitorado e por meio de ações clientelistas, evitando a ascensão de novos
atores políticos (COX, 2005, apud FEITOSA, 2018).
23
Os/As dirigentes políticos(as) da época associaram os problemas acima ao
sistema eleitoral, endereçando suas críticas a uma proposta de reforma. Dentre
as diversas propostas em discussão, estava a adoção de um sistema eleitoral
misto. Assim, passava-se a considerar a proporcionalidade dos distritos para se
ter em conta as representações das minorias e da representatividade conforme
o tamanho populacional. Essa representação atualmente está demonstrada
pela maior proporcionalidade dos partidos políticos japoneses, conforme o
mapa a seguir, das eleições gerais de 2017. Apesar das mudanças, seguem
com a força partidária LDP em sua maioria, alcançando 284 cadeiras no
parlamento, no total de 465.
24
Apesar dos avanços, a reforma em 1996 para a proporcionalidade em um
sistema distrital misto ainda não modificou por completo as conformidades
estabelecidas na representatividade eleitoral japonesa. A sua aceitação ocorreu
somente porque o modelo atendia aos interesses dos grandes partidos, que
viam, no sistema majoritário de distritos uninominais, uma oportunidade de
manter reduzida a competição interna de seus quadros e a consequente
redução do custo das campanhas. Também ia de encontro aos interesses das
lideranças dos pequenos partidos envolvidos na coalizão, que viam, na parte
proporcional do sistema, um meio de manter a sua representação no
parlamento (HIZEN, 2004, apud FEITOSA, 2018). Ao fim e ao cabo, a
reforma aplacou uma redução do custo de campanha, mas não acabou com a
formação iminente de um sistema bipartidário no Japão, com grande influência
personalista de lideranças partidárias, impossibilitando a alternância de poder
almejada.
25
O distritão afegão
Após o fim do Emirado Islâmico regido pelo Talibã, decorrente da invasão
americana ao Afeganistão em 2001, as forças políticas opositoras apoiadas
pelos Estados Unidos deram início à refundação por completo do país. O
Acordo de Bonn estabeleceu um governo de transição com uma Força
Internacional de Assistência em Segurança, que seria responsável pela
estabilização dos conflitos internos. Um grupo de lideranças políticas afegãs
próximas a esses organismos internacionais passou a trabalhar no novo
desenho de instituições para estabelecer um Estado constitucional
democrático, segundo critérios desse acordo (THIER e CHOPRA, 2002).
26
Dessa maneira, o Afeganistão foi dividido em 34 distritos eleitorais
multinominais de grandes variações entre si: entre 2 e 33 cadeiras em disputa.
Eleitoras e eleitores depositavam um voto em uma das candidaturas
concorrentes, sendo que os/as que alcançavam o maior número de votos até
o limite das cadeiras em disputa levavam o cargo. Aqui, uma novidade: o
sistema também previa a possibilidade de candidaturas independentes de
partidos e uma cota de 68 cadeiras para mulheres (REYNOLDS, 2006).
27
desenvolvimento da participação feminina na política institucional, tendo sido
eleitas diversas mulheres já no primeiro pleito de 2005, sem o auxílio das
cotas previstas pelo sistema.
Fonte: https://www.nybooks.com/daily/2010/10/07/should-afghanistan-exist/
3 A título de exemplo, nas eleições parlamentares de 2005, 68% dos votos válidos foram
para candidaturas que não foram eleitas. Além disso, o percentual médio de votos do nome
mais votado em cada distrito foi de 11,5% (REYNOLDS, 2006).
28
denúncias de fraudes eleitorais e manipulação de campanha. Este fato é
esperado em sistemas eleitorais dessa magnitude, como o First Past The Post,
originário do Reino Unido e usado como base em diversos outros países.
Nesse sistema, há dificuldade de criar coalizões e até um sistema partidário,
devido à quantidade grande de parlamentares independentes eleitos(as), sem
uma clara definição de agenda e posição em relação ao governo, tornando
altamente volátil a relação entre Executivo e Legislativo, de tal forma que a
Presidência tem de estar em constante barganha política. O processo eleitoral
afegão tornou-se uma disputa de poder eminentemente personalista e
fragmentada, com a quantidade exorbitante de oitenta e seis partidos políticos
registrados com baixo nível de organização (NDI, 2001, apud FEITOSA,
2018).
29
de um sistema misto em que permaneceria o sistema de Votos Únicos Não
Transferíveis para 159 cadeiras do parlamento, além de 80 em um sistema
proporcional, mantendo-se as 68 de reservas para mulheres e a quota de 10
cadeiras eleitas separadamente para o povo nômade Kuchi. Após mais de um
ano de discussão, mesmo com amplas modificações no referido projeto,
nenhuma alteração no sistema eleitoral foi aprovada, pois prevaleceu a
posição do presidente Hamid Karzai e das elites aliadas de manutenção das
regras do jogo como forma de garantir a sua perpetuação no poder (BIJLERT,
2013, apud FEITOSA, 2018).
30
E como o distritão seria adaptado
ao contexto brasileiro? Ou “Será
que já não vimos esse filme
antes”?
É importante lembrar: o distritão já esteve em vigor no Brasil! Foi entre a época
imperial (1824-1889) e o fim da República Velha (1889-1930). Esses
períodos foram momentos históricos na política brasileira, em que fraudes
eleitorais eram frequentes, como o uso do mecanismo de voto por procuração,
no qual a pessoa transferia seu direito de votar para outra, ou mesmo de
títulos eleitorais falsos. Além do mais, o voto era censitário, ou seja, apenas
uma parcela da população tinha direito ao sufrágio. Como adiantamos no
início, durante o Império, podiam votar somente homens, maiores de 25 anos,
alfabetizados e que tivessem uma renda mínima de 100 mil réis anuais.
Mesmo com a Proclamação da República, esse quadro não teve grandes
modificações, mantendo mulheres, pessoas analfabetas, em situação de rua,
soldados rasos, indígenas, integrantes do clero e quem fosse menor de 21
anos impedidos de votar. Ou seja: as eleições, nesse período, tinham
baixíssima representatividade.
31
Nessa situação, a população brasileira continuava com as mesmas
características desiguais de três séculos de colonização, em que 85% da
população era analfabeta e mais de 90% vivia em áreas rurais, sob a influência
de pessoas com grandes propriedades de terra. Em 1894, por exemplo, na
capital do país, Rio de Janeiro, que contava com 500 mil habitantes, apenas
1,3% da população votou (CARVALHO, 2001).
32
Esses grandes latifundiários detinham os principais partidos políticos, que
acabavam por eleger a presidência da Nação. Esse período também ficou
conhecido como “política do café com leite”, justamente pela prioridade
econômica que se alternava em conluio de poder entre o Partido Republicano
Paulista (PRP), comandado pelos nomes ligados à produção de café, e o
Partido Republicano Mineiro (PRM), que comandava os latifúndios pecuários
e de leite. Os estados se revezavam na indicação da presidência: uma vez
ligada a São Paulo, outra vez a Minas Gerais, enquanto outros estados, bem
como outros partidos, acabavam sendo sub-representados, já que o próprio
sistema do distritão e as fraudes eleitorais reforçaram o poder do PRM e do
PRP no rumo da condução política nacional.
33
O que nos dizem as teorias
jurídicas e políticas sobre o
debate?
Como já demonstrado, a proposta do distritão e da reforma política tem
aparecido no debate público coincidentemente aos anos que antecedem as
eleições estaduais e nacionais. Isso nos traz uma vantagem: já em 2017,
diversos pesquisadores e pesquisadoras se posicionaram sobre o tema,
argumentando e mostrando, com base na teoria política e do direito, os riscos
e as consequências da alteração no sistema eleitoral. Aproveitando esse
acúmulo, retomaremos os pontos mais relevantes encontrados nessa literatura
recente para posicionar a discussão no cenário político atual.
34
periga cair em propostas “apequenadas pelo roldão imediatista, limitadas pelos
interesses individuais e localizados de representações políticas e suas
agremiações”, nas palavras da jurista Edilene Lôbo (2017, p. 112). Mudanças
políticas devem ser amplamente debatidas, lançando mão de consultas diretas
à população, e não se reservar apenas ao debate dentro do sistema partidário,
uma vez que os partidos são os principais interessados quando essa agenda
emerge, a cada quatro anos.
4 Poder 360. Câmara escolhe PEC da reforma política e tenta pular tramitação na CCJ.
Disponível em: https://www.poder360.com.br/congresso/camara-escolhe-pec-da-reforma-
politica-e-tenta-pular-tramitacao-na-ccj/ Acesso em 19 de maio de 2021.
5 Proposta de emenda à constituição n° -, de 2020. Disponível em: https://static.poder360.
com.br/2021/03/PEC-distritao-giovani-cherini.pdf. Acesso em 19 de maio de 2021.
35
que o sistema majoritário irá diminuir o número de nomes disputando o
pleito, ampliando o controle sobre os gastos eleitorais.
Temer levanta uma questão que é um transtorno para os que votam: os/as
famosos(as) puxadores(as) de votos, pessoas com resultados excepcionais que
acabam colaborando para que nomes desconhecidos ocupem as cadeiras do
parlamento. Como explica o autor: “Já houve caso concreto de um deputado
federal eleito com cerca de 1,5 milhão de votos que conduziu pela legenda
mais quatro deputados – um deles com 382 votos (e que residia, de fato, em
outro estado). Enquanto um candidato de outra legenda, com 128 mil votos,
não foi eleito, em face do chamado quociente eleitoral”. Por fim, levanta um
36
outro transtorno referente aos custos das campanhas, justificando que o voto
majoritário iria restringir o número de candidaturas listadas pelos partidos,
afastando a dispersão e, consequentemente, barateando a busca por votos.
37
Os pontos levantados pelos favoráveis ao distritão seguem uma argumentação
lógica, dialogando com anseios da população e dando exemplos concretos.
Contudo, é importante analisar cada um desses argumentos mais
detalhadamente.
38
havendo o recurso de transferências de votos e enfraquecendo chapas com
viés mais partidário do que personalista. Dessa forma, os/as aspirantes não
poderiam optar por abordagens localizadas, sendo imprescindível o
estabelecimento de campanhas por todo o território do Estado para angariar
uma votação ampla, no caso de deputadas e deputados federais e estaduais, o
que, naturalmente, elevará os custos das campanhas.
9 Esse fenômeno foi corrigido na reforma política de 2017, que passou a exigir que o/a
candidato(a) faça, no mínimo, 10% do quociente partidário para ser puxado.
39
modelo proporcional sem coligação, trariam resultados piores do que o
modelo vigente, quando medido o índice de desproporcionalidade eleitoral10.
No mesmo sentido, o sociólogo e comentarista político Sérgio Abranches
(2017) argumenta que, ao contrário do que se coloca, o distritão privilegia as
figuras que puxam voto, uma vez que a disputa majoritária criaria novas
estratégias dos partidos em direção a nomes com esse apelo, preservando
os/as atuais detentores(as) das vagas e dificultando o acesso de novos nomes
ao Legislativo. Ou seja, o modelo de votos majoritário pode disseminar a
estratégia de lançar candidaturas com alto apelo personalista e populista,
independentemente de sua vocação para o Legislativo, aprofundando o que
hoje é uma exceção.
40
do que os cargos executivos. O fato tenderia a enfraquecer ainda mais a
participação social nos pleitos, o que poderia gerar mais frustração e
desestímulo (LÔBO, 2017).
41
multiplicidade de aspirantes que não possuem recursos para campanhas
amplas, excluindo grupos historicamente desfavorecidos como mulheres,
pessoas negras e que pertencem à classe baixa. Por mais que se argumente que
o modelo favorece a renovação com grande influência na sociedade, para
além do sistema partidário, não serão esses casos exceções, assim como são
de pessoas desses grupos que conseguem romper as barreiras estruturais da
sociedade?
Ainda que consideremos possível uma relação mais próxima entre quem vota
e quem é votado(a), conforme argumentam os defensores do distritão, é
importante pensarmos quais seriam as implicações para o sistema político com
a corrosão da mediação dos partidos políticos no Legislativo, levando a um
perfil muito mais personalista de exercício da representação. Na prática, como
afirma Jairo Nicolau11, o distritão aumenta o poder de barganha individual da
pessoa e enfraquece os partidos, mesmo aqueles que poderão ter mais
acúmulo de cadeiras por ter maior representatividade nos estados, como MDB,
PT, PSD e PSDB, Isso porque se enfraquece o poder do partido nas tomadas de
decisões e alinhamento dos seus deputados e deputadas nos enquadramentos
ideológicos, prevalecendo uma lógica direta entre representante e votante,
afetando a governabilidade do sistema e, considerando os votos
desperdiçados, a exclusão de grupos da participação política.
42
Por fim, inserindo a proposta dentro do contexto político atual, parece ser
ainda mais difícil que ela seja uma solução aos anseios de maior engajamento
da população e superação da crise de legitimidade institucional do mundo
político. Desde as “jornadas de 2013”, fica evidente o crescente
descontentamento da população com o sistema atual e o direcionamento
dessa frustração aos partidos políticos.
43
Quais os possíveis impactos da
adoção do modelo no Brasil?
Na esteira de toda problematização já desenvolvida, podemos nos dedicar a
discutir, por fim, os possíveis impactos da adoção do distritão no sistema
eleitoral brasileiro. Embora as formulações teóricas e os casos internacionais
explorados até o momento forneçam argumentos para tanto, esse é sempre
um exercício de especulação, na medida em que, como já mencionado, diante
de novas regras do jogo, as partes envolvidas – tanto quem vota quanto quem
tenta se eleger – modificam seus cálculos estratégicos, ocasionando resultados
não previstos. Com rigor e cuidado, porém, é possível antecipar tendências e
possíveis efeitos dessa mudança e quais as consequências para a renovação
política e a saúde democrática do Brasil.
44
Vamos aos resultados. Em 2018, caso o distritão tivesse sido adotado, do
total de 513 cadeiras em disputa, 64 – ou seja, 12% – sofreriam mudanças.
Esse número representa um aumento de 3% em relação à simulação com
dados de 2014, que previa alteração de 45 assentos12. Para além do
quantitativo total, é possível olhar essa simulação filtrando os números por
unidade da federação, como o gráfico a seguir mostra.
12 Uma ressalva há de ser feita antes de qualquer análise sobre essa diferença entre os
resultados dos dois ciclos eleitorais: diferentemente de 2014, em 2018 já não eram
permitidas coligações proporcionais. O impacto dessa nova regra, embora seja difícil de
mensurar, também deve ser levado em conta.
45
Como cada estado possui uma quantidade diferente de vagas em disputa, é
necessário se atentar para os valores relativos: Acre, Santa Catarina e Sergipe
são os estados que sofreriam, proporcionalmente ao número de vagas, mais
alterações: 25% de suas cadeiras. São seguidos por Rio de Janeiro, com 21%,
e Espírito Santo, com 20%. Duas coisas chamam a atenção nesse recorte: a
diversidade regional e a diferença de magnitude dos distritos, pois há estados
com menos de 10 cadeiras e outros, como São Paulo, com 70. Ou seja, pelo
menos preliminarmente, não é possível concluir que as mudanças mais
expressivas se dão por algum critério regional ou pelo tamanho dos distritos.
46
Figura 4 – partidos políticos câmara federal
eleição 2018 votos proporcionais
47
Como seria com o distritão?
Caso o distritão fosse aprovado, os seguintes partidos teriam mais deputadas
e deputados federais, em ordem de saldos positivos: PSDB (+10), DEM (+6),
REPUBLICANOS (+4), PROGRESSISTAS (+3), PSD (+3), SOLIDARIEDADE
(+3), PR – atualmente Partido Liberal – (+3), CIDADANIA (+2), PT (+2), MDB
(+1) e PTB (+1). Como apresentado no próximo gráfico, aumentaria ainda
mais o número de nomes no espectro de centro-direita e direita, sobretudo de
diversas figuras filiadas ao PSDB. Neste partido, dos(as) possíveis postulantes,
somente duas figuras estão abaixo dos 53 anos, tendo a maioria consolidadas
carreiras políticas, tendo apresentado candidatura desde a década de 1980 e
1990, ou seja, já estão presentes na máquina pública em um grande período
da redemocratização.
Por outro lado, o partido que mais perderia com a mudança do sistema
eleitoral para o distritão seria o PSL (–10), que aglomerou diversas figuras pelo
país para fixar o então candidato Bolsonaro à sua imagem. Mesmo não sendo
mais candidato a deputado federal, Bolsonaro conseguiu ser um “puxador de
votos” indireto para os que se filiaram ao PSL conjuntamente. Além desse
partido, outros que também perderiam cadeiras com a adoção do distritão, em
ordem de saldos negativos, seriam os seguintes: PDT (–5), AVANTE (–5), PHS
(–5), NOVO (–3), PSB (–2) e PMN (–2). E os que diminuiriam uma cadeira são:
PROS, PRP, PSC, REDE, PCdoB e PSOL.
48
Figura 5 – Partidos póliticos câmara Federal
Eleição 2018 votos com dirtritão
49
Por fim, outro ponto são os partidos que já têm pouca expressão em seus
posicionamentos e, devido às suas possíveis perdas nas cláusulas de barreira,
já iniciam suas fusões ou extinções, como os casos do PHS, que se incorporou
ao PODEMOS, e do PRP, que se fundiu ao PATRIOTAS. Outros partidos
permanecem como legendas de aluguel.
50
Como o distritão remonta a diferenças de cunho personalista, também é
relevante demonstrar as distinções em aspectos gerais de representação de
gênero, racial e classificação etária. Conforme mostra o gráfico a seguir, há
uma mudança, considerada pequena, de somente 1%, tanto no aspecto de
gênero quanto de raça. Entretanto, vale lembrar que as lutas de mulheres,
pretos e pretas para representação na Câmara dos Deputados enfrenta diversos
obstáculos e a possível mudança para o voto do distritão, nesses exemplos
tomados, dificultaria ainda mais uma reversão dessa sub-representação na
política brasileira. Em outras palavras, se não retrocede tanto o cenário atual,
certamente indica um entrave para o seu avanço.
Figura 6 – divisão de gênero em voto distritão Figura 7 – divisão de gênero em voto proporcional
na camara federal - eleição 2018 na camara federal - eleição 2018
51
Quando tomado o ponto da representatividade racial, entrariam mais
brancos(as), sobretudo homens (53, no total) e teríamos menos pardos(as),
com uma diferença de seis parlamentares, e autodeclarados(as) pretos(as), com
uma diminuição de 3 deputados homens. Entretanto, em um caso isolado,
com a adoção do distritão, teríamos a entrada de mais uma mulher preta no
parlamento brasileiro pela Bahia: Tia Eron, do REPUBLICANOS. Esses
apontamentos raciais estão apresentados no gráfico a seguir.
52
Assim, o que se apresenta, no caso de adoção do distritão, é o aumento da
força dos maiores partidos, principalmente do Centrão, com a dificuldade dos
menores e novas agremiações em angariar cadeiras, além da diminuição da
diversidade ideológica e social. Aumentam-se também os aspectos
personalistas, diminuindo a importância e responsabilidade do programa
partidário, conservando algumas figuras no poder. Entre os estados, alguns
casos podem deixar mais evidente essa diferença, principalmente aqueles que
possuem maior número de cadeiras a deputadas e deputados federais.
Em São Paulo, por exemplo, sairiam seis homens brancos e 1 preto, além de 1
mulher (com partidos que variam da esquerda para a direita, quais sejam,
PCdoB, NOVO, MDB, PSL, PT e PODEMOS), para a entrada de 7 homens
brancos (DEM, PP, PSD, 3 do PSDB e PSB).
53
Minas Gerais é também outro estado que seguiria os mesmos aspectos.
Perderia 4 homens brancos e 1 preto e 2 mulheres brancas dos seguintes
partidos: PSL (3), AVANTE (2), PMN (1) e PHS (1). Suas vagas seriam
substituídas por 6 homens e 1 mulher, todos(as) brancos(as), dos partidos:
PSDB (2), PROGRESSISTAS (2), PODE (1) e DEM (1).
54
Armadas. Dentro dos 64 nomes que foram eleitos em 2018, mas não o seriam
pelo distritão, 7 apresentavam esse perfil, provavelmente na esteira do discurso
do então candidato à Presidência Jair Bolsonaro. Na simulação, no entanto,
não seria eleito nenhum nome vinculado a essa categoria. Isso pode significar
um padrão de votos mais concentrado, por ser de uma classe corporativa, cuja
potência se esvai caso o critério seja o voto majoritário.
Outro ponto a ser notado é o ligado ao âmbito religioso: tanto nas eleições
realizadas quanto na simulação feita, as figuras ligadas, de alguma maneira, a
religiões – em aspecto amplo – são expressivamente representadas. Talvez o
que seja válido notar em pesquisas futuras é, dentro dessa categoria, quais os
perfis da atuação desses(as) candidatos(as).
55
A inclusão das variáveis “Seguidores(as) no Instagram” e “Seguidores(as) no
Twitter”, medidas pelas respectivas quantidades de seguidores(as), foi uma
tentativa de captar o poder e influência das redes sociais nas eleições13. Um
dos argumentos utilizados contra o sistema proporcional é que, ao transferir o
excedente de votos de um nome para outros do partido, seriam eleitas pessoas
desconhecidas pelo(a) eleitor(a) e que, assim, a vontade popular não seria
respeitada. Uma vez que o distritão, em oposição, só elege os/as mais
votados(as), faria sentido que uma atuação expressiva nas plataformas de
internet se traduzisse em cadeiras ganhas. Os resultados estão expressos nos
anexos 1 e 2. Já é possível notar que, em termos quantitativos, o Instagram
possui uma aderência maior do que o Twitter.
Os dados indicam que quem se elegeria pelo distritão não possui, no geral, um
número de seguidores(as) maior do que quem perderia em ambas as
plataformas, como poderíamos supor. Pelo contrário, a candidata com maior
número de seguidores(as), Lauriete, com 1.600.000 no Instagram, não seria
eleita pelo distritão. Foi, no entanto, pelo voto proporcional.
56
efetivamente eleitos(as) pelo proporcional são muito mais populares do que
os/as que ganhariam pelo majoritário. Não podemos, no entanto, nos
apressar: a grande amplitude dos valores pode explicar uma média maior para
quem foi eleita e eleito pelo voto proporcional (ou um possível “Efeito
Lauriete”, ou seja, uma candidata com número de seguidores(as) muito grande
que eleva a média).
57
Por fim, os dados da categoria “Experiência Política”14 corroboram o
argumento de que a adoção do distritão favorece figuras de carreiras
consolidadas, de faixa etária avançada e dentro do perfil que sempre dominou
a cena política. Basta reparar que, enquanto, entre os/as 64 eleitos(as) pelo
voto proporcional, 14 tiveram sua primeira filiação antes de 2000, entre o
mesmo número de vencedores(as) na simulação do distritão esse número
subiu para 2515. Mais um indicativo para engrossar o coro de que esse sistema,
a despeito de sua simplicidade, vai na contramão da diversidade e da
renovação política.
14 Essa categoria é mensurada pelo ano da primeira filiação da pessoa a um partido político.
15 Nesse sentido, o caso do PSDB, partido que mais assentos ganharia segundo os resultados
da simulação, é emblemático. Das 12 vagas que iriam ser conquistadas, 8, ou 66%, estariam
com políticos(as) cuja primeira filiação partidária ocorreu há mais de 20 anos, sendo que a
data mais antiga é 1981.
58
Mas como os partidos poderiam se
posicionar? Como ainda podemos
melhorar a representação do
nosso sistema eleitoral?
Nenhum sistema eleitoral está isento de falhas e distorções na representação
e isso deve estar claro para todas e todos que chegaram até aqui. Da mesma
forma, apenas o sistema eleitoral não pode ser responsável por corrigir os
diferentes conflitos do regime democrático, quando diversos outros fatores
estão interligados na dinâmica do poder na sociedade: igualdade econômica,
acesso a recursos, dinâmicas dos partidos e história política. Esse fato fica
ainda mais evidente quando o momento é de desconfiança e crise
institucional de quem dá as cartas politicamente, dado que mudanças sempre
trarão consequências imprevistas.
59
imprescindível que o processo eleitoral busque a renovação do espírito
democrático e acordos comuns para a convivência do pluralismo, tendo uma
base sólida de segurança jurídica em 2022.
60
do sistema representativo e, mais importante, detectar quais outras implicações
não previstas surgirão de uma adesão automática ao modelo.
Uma primeira reflexão fala sobre em que medida o remédio prescrito é o mais
adequado ao diagnóstico realizado. Conforme expôs Carlos Melo16, na
ocasião das discussões de 2015, da maneira que foi proposta, a reforma
política se reduziu à forma eleitoral; os problemas apresentados pelo nosso
sistema político não passam unicamente pela eleição, mas também pelo modo
como é construída a governabilidade e as maiorias no Congresso. Outras
normatizações, como regras de financiamento de campanha ou mesmo a
composição da magnitude dos distritos, ficaram à margem ou, pelo menos,
não foram tratadas de forma conjunta no debate. Em resumo: creditar ao
sistema proporcional todas as disfunções da representação brasileira é um
raciocínio, no mínimo, ingênuo e, no extremo,
mal-intencionado.
61
que, caso o distritão representasse, de fato, todas as virtudes que advoga, seria
amplamente adotado em outras democracias. Pontos como a grande
quantidade de votos desperdiçada e o predomínio de interesses de partidos
dominantes ficaram patentes nas experiências trazidas, como Afeganistão e
Japão.
62
superados. No entanto, é difícil crer que serão tratados apenas com mudanças
nas regras eleitorais.
63
ser necessário para que novas vozes adentrem na política institucional, o que,
na verdade, reforça a manutenção de sistemas eleitorais que valorizem a
capacidade de renovação dos quadros políticos, ao invés de consolidar
aqueles que já centralizam o poder. De todo modo, uma reforma política,
principalmente se pensada apenas em seu eixo eleitoral, dificilmente irá minar
os conflitos existentes na diversidade política. O descontentamento da
população com determinadas figuras de diferentes espectros ideológicos
reflete, na verdade, a diversidade das opiniões políticas no Brasil. Em outras
palavras, você pode não gostar de determinado(a) candidato(a), sua postura e
formas de pensar, mas não é alterando a regra eleitoral que você evitará que
essa pessoa esteja na Tribuna. Ou, se alterar, outra figura que lhe desagrada
estará lá, representando outra fração da sociedade. A solução para o
desencantamento com a política, por incrível que pareça, é mais política. Uma
política do dia a dia, que efetive mecanismos de acompanhamento contínuo
das atividades legislativas e que mantenha próximo(a) quem elege e quem é
eleita ou eleito, para além do que ocorre, geralmente em outubro, a cada dois
anos.
64
se estaria indo de encontro ao distritão, uma vez que o sistema distrital
apresenta grandes diferenças, já que as eleições majoritárias se dão num
espaço circunscrito muito menor e mais homogêneo do que cidades ou
estados inteiros, por exemplo. Nesse modelo de votação distrital misto, uma
parte dos eleitos emergiria dos distritos e outra, pela votação geral do estado
pelo qual o/a candidato(a) disputar a eleição em dois turnos. No primeiro
turno, todos(as) os/as candidatos(as), de todos os partidos, devem se
apresentar. No segundo, a disputa será entre os/as dois/duas mais votados(as)
em cada distrito. Contudo, mesmo esse modelo carece de advir com um
intenso debate sobre seus prós e contras, evitando estar calcado, como já
discutimos aqui, apenas nas eleições que se avizinham.
65
de especialistas, levam-nos a crer que o distritão não trará resultados positivos
nesse sentido. Na verdade, ele pode ir além de uma mera insuficiência
enquanto modelo, tendo o potencial de representar uma sinalização a
retrocessos no aparato democrático que acreditávamos, enquanto nação, já
termos superado.
66
Referências bibliográficas
ABRANCHES, Sérgio. Conversas de Política. ‘Distritão’ serve para conservar
classe política. CBN, 10 ago. 2017. Podcast. Disponível em: <https://sergioa-
branches.com.br/podcasts/169-distritao-serve-
-para-conservar-a-classe-politica>. Acesso em 24 de maio de 2021.
67
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, Enxada e Voto. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1997.
68
THIER, Alexander; CHOPRA, Jarat. The road ahead: political and institutional
reconstruction in Afghanistan. Third World Quarterly, v. 23. n. 5, 2002, p.
893-907. Disponível em: <https://library.fes.de/libalt/journals/swetsfulltex-
t/15164503.pdf>. Acesso em 13 de maio de 2021.
69
ANEXO 1 – Tabela de “vencedoras e vencedores”:
candidaturas a deputada(o) federal que seriam eleitas pelo distritão em 2018
NOME Estado Partido Gênero Classificação Raça Profissão Seguidores(as) Seguidores(as) Experiência
Etária Twitter Instagram Política
70
RONALDO AL PDT Homem 52 Branco Engenheiro Civil 329 29.400 1982 -
LESSA PMDB
PROFESSOR DF PODE Homem 47 Pardo Prof. Ens. 3.017 13.500 2014 - PSB
PACCO Superior,
palestrante
71
PAULO BA PSD Homem 68 Branco Administrador 108 2.077 1991 -
MAGALHÃES PFL
DR. ELEUSES SP PSD Homem 67 Branco Médico, professor 2.655 7.935 2008 -
PAIVA universitário DEM
FABIO SOUSA GO PSDB Homem 38 Branco Bispo, historiador, 10.800 49.900 2004 -
teólogo e PSDB
jornalista
OTAVIO LEITE RJ PSDB Homem 59 Branco Advogado 8.664 4.634 1992 - PDT
TIÃO AC PSL Homem 67 Branco Prof. Ens. Médio 800 7.736 1998 -
BOCALOM Matemática PSDB
VICTORIO GALLI MT PSL Homem 60 Branco Prof. Ens. Médio 146 4.361 2006 - PMDB
72
MERLONG PI PT Homem 62 Branco Prof. Ens. Superior 3.247 10.200 2010 - PT
SOLANO Economista
TIA ERON BA REPUBLICANOS Mulher 48 Preta Deputada 4.506 1.6200 2001 - PFL
JORGE BRAZ RJ REPUBLICANOS Homem 67 Branco Bispo IURD 1.656 16.900 2000 - PPB
73
ANEXO 2 - tabela de “perdedoras e perdedores”: candidaturas a
deputado(a) federal eleitas em 2018 que não venceriam pelo distritão
NOME Estado Partido Gênero Classificação Raça Profissão Seguidores(as) Seguidores(as) Experiência
Etária Twitter Instagram Política
JESUS SERGIO AC PDT Homem 47 Pardo Professor 480 2.967 2012 - PDT
TEREZA NELMA AL PSDB Mulher 63 Branca Psicóloga 378 15.100 2000 - PSB
JUNIOR MANO CE Patriota Homem 36 Pardo Empresário 639 27.400 2007 - PRB
JOSE NELTO GO PODEMOS Homem 60 Branco Advogado 3.626 30.900 1978 - MDB
MAJOR VITOR GO PSL Homem 43 Pardo Militar 258 149.000 2018 - PSL
HUGO
74
PATOR MA PMN Homem 49 Pardo Sarcedote 258 1.183 1998 - PFL
GILDENEMYR
LEO MOTTA MG PSL Homem 47 Preto Cantor 15.400 6.466 1991 - PTC
LUIS TIBE MG AVANTE Homem 49 Branco Empresário 11.600 13.200 2000 - PGT
ALE SILVA MG PSL Mulher 46 Branca Advogada 146.400 61.300 2018 - PSL
75
PROFESSOR RJ PSL Homem 55 Preto Militar 3.217 22.300 2003 -
JOZIEL PSDC
PAULO RAMOS RJ PDT Homem 76 Branco Militar reformado 1.798 21.600 1980 -
e advogado PMDB
LIZIANE BAYER RS PSB Mulher 40 Branca Pastora 3.176 16.100 2013 - PSB
NEREU CRISPIN RS PSL Homem 57 Branco Empresário 3.936 4.789 2018 - PSL
RICARDO GUIDI SC PSD Homem 43 Branco Produtor rural e 12.200 438 2014 - PPS
Empresário
CORONEL SC PSL Homem 63 Branco Militar reformado 3.431 13.100 2018 - PSL
ARMANDO
76
ORLANDO SP PCdoB Homem 49 Preto Liderança 73.900 29.000 1989 -
SILVA política PCdoB
77