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Eaditores, Sio Paulo, 2009. jchaumann, 270 — Pinheiros (0 — Siio Paulo — SP — Fax yendas: (Oxx11) 3611-3268 itorasaraiva.com.br BN 978-85-7056-902 Suplementado por Inclui bibliografia. Psicologia educacional, 2, Psi agem. I. Cruz, wria Nazaré da I (CDD-370.15 “ologia e Trabalho Pedagégico Capitulo 2 A abordagem inatista-maturacionista Todos nés j4 ouvimos ou dissemos coisas como: “Ele ainda nao tem maturidade para aprender a ler”; “Meu filho tem uma aptidao ineri- vel para a matematica”; “A Marina é tao inteligente! Puxou ao pai!”. Maturidade, aptidio, inteligéncia sao temas tradicionalmente abor- dados pela psicologia numa perspectiva que atribui um papel central a fatores biolégicos no desenvolvimento da crianga. Essa perspectiva, que estamos denominando inatista-maturacionista, parte do principio de que fatores hereditarios ou de maturagao so mais importantes para o desenvolvimento da crianga e para a determinagao de suas capacidades do que os fatores relacionados & aprendizagem e a experiéncia. Mas o que ‘esses fatores hereditdrios ou de maturagao? A hereditariedade pode ser entendida como um conjunto de quali- dades ou caracteristicas que esto fixadas na crianga, ja a0 nascimento. Ou seja, quando falamos em hereditariedade estamos nos referindo heranga genética individual que a crianga recebe de seus pais. Todos sabemos que tragos como, por exemplo, a cor dos olhos ¢ do cabelo, 0 tipo sanguineo, o formato da orelha e da boca ja esto determinados Seneticamente quando nascemos. A idéia de maturacio refere-se a um a fodos/os memiros de determinada espécie, que se verifica durante a vida de cada individuo. O crescimento do feto dentro do ttero da mie, Por exemplo, segue um padrio de mudangas biologicamente determi nado, As transformagées do corpo, 0 crescimento dos OTgHs, te. NEGA: fecem de acordo com uma seqlléncia predeterminada, que, Principio, nao i .§ externos. i ee ee ae 1 que essa hist6ria de cor dos aligg ou do desenvolvimento do feto tem a ver com Wil abordagem psicolds ica i fas aptiddes e da inteligéncia. (2 EO EES da perspectiva inatisee matiiaaipe nista supoem que, do mesmo modo que @ Cor dos olhos, aptiddes indivi- pado de mudangas comum a Guais e inteligéncia sio caracteristicas herdadas dos pais e, portanto, jé esto determinadas biologicamente quando a crianga nasce. Ou entao que, & maneira do crescimento das partes do corpo, 0 desenvolvimento do comportamento e das habilidades da crianga € governado por um processo de maturacio biolégica, independentemente da aprendizagem e da experiéncia. Sao essas concepedes que estudaremos no decorrer deste capitulo. ‘A questo das diferencas individuais e a hereditariedade da inteligéncia: “filho de peixe, peixinho €?” Por que as pessoas so diferentes umas das outras? Por que algu- mas criancas parecem mais inclinadas para atividades artisticas, en- quanto outras se saem melhor com os nti- meros? Foram perguntas desse tipo que orientaram, no comego do século, as pri- meiras investigagdes psicoldgicas sobre 0 problema da natureza hereditéria das apti- dies e da inteligéncia. Interessados em saber por que uma pes- soa é diferente da outra— quanto a tragos de personalidade, de habilidades, de desempe- mho intelectual, ete. —, pesquisadores pro- curaram obter dados que permitissem esta- belecer comparagGes entre pessoas. Eles constataram, entdo, que pessoas com uma aptidao especial (um artista, por exemplo) normalmente tinham familiares que apresentavam o mesmo tipo de aptidao. Ou, ainda, que gémeos idénticos apresenta- vam aptiddes e nivel intelectual com u™ grau de semelhanca maior do que 0 encon- trado entre irmaos no gémeos. Por outt? lado, identificaram diferengas de aptiddes © de tragos mentais entre homens e mulheres ou entre ragas diferentes. a Essas constatagdes foram interpretadas como indicadoras de que oS Genens: onl” fatores inatos so mais poderosos na determinago das aptides indi ete wie — Guais e do grau em que estas podem se desenvolver do que a experié herditaredade Cia, © Meio social e a educacao. O papel do meio social, segundo ess ssmmmames: — perspectiva inatista, se restringe a impedir ou a permitir que essas apt” does se manifestem. Assim, uma crianga — filha, neta ou sobrinha de miisicos — ap"? senta inclinacdo e facilidade para aprender misica porque herdou de seus familiares a aptidio, 0 “dom” para a miisica, e nado porque fo educada num ambiente em que, provavelmente, a mtisica yalorizada & a ensinada. Do mesmo modo, criangas brancas e negras apresentam dife- rengas no desempenho de determinadas tarefas em razo da heranea ge- nética de suas racas, e ndo de diferencas culturais ou de oportunidades. Foi nessa linha da preocupacio com as diferencas individuais que se desenvolveram os primeiros estudos psicolégicos com 0 objetivo de avaliar a inteligéncia. Um dos pioneiros desses estudos, 0 pesquisador francés Alfred Binet, interessou-se especialmente pela mensuragdo da inteligéncia através de testes. Quem foi Binet? Alfred Binet nasceu em 1857 e viveu até 1911. Formou-se em Medicina, mas desde cedo interessou-se pela psicologia da crian- ¢ae do deficiente, drea em que se tornou conhecido. Em 1904, quando era diretor do Labora- torio de Psicologia Fisioldgica da Universi dade de Sorbonne, participou de uma comis- so de médicos, educadores e cientistas, no- ‘meados pelo ministro da Instrugdo Piiblica da i +E Franca, que tinha como objetivo estabelecer 4 métodos e formular recomendagoes para 0 xg, ensino de criancas deficientes mentais, Binet ae {foi incumbido da tarefa de desenvolver um Ae instrumento que permitisse identificar as crian- ¢as mentalmente deficientes. Como resultado de seu trabalho nessa comissdo e de suas pesquisas anteriores, ele publicou em 1905, com a colaboracao de Théodore Simon, a primeira escala para a ‘medida da inteligéncia geral. Essa escala, que se tornou conhecida como escala Binet- Simon, passou por duas revisbes: a primeira, em 1908, ¢ a segunda, em 1911, pouco antes da morte de Binet. Pode-se dizer que o desenvolvimento dessa escala marcou 0 inicio da medida da inteligéncia, tal como a conhecemos hoje, Os testes de Binet e Simon foram traduzidos e wilizados também em muitos outros paises e deram origem a Ce revisdes, realizadas por outros pesquisadores, bem como inspiraram a elaboragao de outros testes de inteligéncia. 2 No Brasil, seus estudos e testes foram introduzidos em 1916 por educadores ligados ao Laboratorio de Psicologia Pedagdgi- ca do Rio de Janeiro. omo uma aptidao geral que nao de- \s adquiridas no decorrer da Binet concebia a inteligéncia com« Pende das informagdes ou das experiénciai Vida do individuo, Segundo ele, ax principals caracteristicas da inteli- géncia serian as capacidades de atengdo, de julgamento e de adaptagio do comportamento a objetives: Parece-nos que na inteligéncia Iki uma faculdade fundamen- tals, Esta faculdade € 0 julgamento, também chamado bom senso pratico, iniciativa, a faculdade de adaptarsse ds cirounstancias, Jul- Ray, compreender ¢ raciocinar bem; estas so as atividades essen- clais da inteligéncia, inet © Simon, O dasenresimenne onic maser Nt Mea, 1) B importante compreender que, nessa perspectiva, a idéia de inteli- géneia nfo se confinde com os conhecimentos adquiridos pelo indivi- duo durante sua vida, Habitualmente, consideramos como muito inteli- gente uma pessoa que demonstra ter um Vasto conhecimento; ou sea, dizemos que os mais inteligentes (entre nossos colegas, por exemplo) silo os que sabem mais, Noentanto, o que define a inteligéneia de um individuo nao é a quan- tidade de conhecimentos que ele possui, mas sua capacidade de julgar, compreendere raciocinar, Essas capacidades, segundo Binet, nao podem seraprendidas, mas, ao contririo, sito biologicamente determinadas, As- sim, a inteligéncia é vista como um atributo do individuo fixado pela he reditariedade e, como tal, varidivel de uma pessoa para outra, Mas, se as pessoas silo diferentes umas das outras nas suas apt does, tragos de personalidade ou de inteligéncia, existem também mui- tas semelhangas entre elas, A maioria dos bebés, por exemplo, torna-se capaz, de se sentar antes que possa se arrastar, engatinhar e depois andar. ‘Do mesmo modo, quando comega a falar, a crianga primeiro diz apenas palayras isoladas, ¢ s6 depois junta duas ou mais palavras, formando frases. Ou, entiio, antes de desenhar casas, animais ou carros, @ crianga rabisea tragos e efreulos, Exsas seqiléneias parecem se repetir sempre em relagiio & maioria -das criangas, © que sugere a existéncia de certo padrio de desenvolvi- Mento humano, Esse fato tem chamado a atengdio de muitos pesquisa Quem foi Gesell? Pesquisador norte-americano que viveu entre 1880 e 1961, Gesell foi o principal expoente das teorias do desenvolvimento que dao maior énfase ao papel da maturagao. Desde muito cedo, logo que formado na Escola Normal (Ma- gistério), dedicou-se a carreira de professor. Foi dire- tor de colégio e escreveu sua primeira tese sobre um assunto ligado a pedagogia. Depois de doutorar-se em psicologia, Gesell retomou o seu trabalho como professor em uma escola primdria. Alguns anos de- pois, decidiu-se por fazer o curso de Medicina e assim que 6 concluiu foi nomeado professor de Higiene da Crianga na Escola de Medicina de Yale, cargo que ocupou até a sua aposentadoria. Em 1915, Gesell passou a empregar a psicologia com vistas a proporcionar ajuda pedagégica as criangas desadaptadas. Ele é, por isso, considerado 0 primeiro psicdlogo escolar norte-americano. Preocupado com a criagéo de uma ciéncia do desenvolvimento humano que integrase todos os recursos da psicologia experimen- tal, da biologia evolutiva e da neurofisiologia, de 1920.a 1961 Gesell dedicou-se & pesquisa cientifica e d publicagdo de livros e artigos. Pode-se dizer que Gesell foi o primeiro te6rico da maturagao, uma vez que defendia a prioridade dos fatores de maturagiio sobre os fatores de aprendizagem, ou de experiéncia, na evolucdo do comportamento da crianga. Para ele, o que explica a existéncia de um padrio de desenvolvi- mento comum a maioria das criangas € 0 processo de maturaedo biolégica inerente As transformagGes por que passa 0 comportamento da crianga. Assim, a evolugao psicolégica da crianga seria determinada biolo- gicamente, do mesmo modo que o crescimento do feto no ttero mater- No. Seus comportamentos e formas de pensar tornam-se mais comple- Xos medida que ela cresce, que seu sistema nervoso, sua estrutura muscular, etc, se desenvolvem. O ambiente social ¢ as influéncias exter- nas, de modo geral, limitam-se a facilitar ou dificultar 0 processo de maturagao. Por exemplo, uma crianga que raramente € tirada do bergo e deixada A yontade no chao, certamente vai demorar mais para enga- tinhar ou andar. Em condigdes adequadas, seu desenvolvimento se pro- | Cessaria no ritmo e na seqiiéncia determinados pela maturagao. ‘ Tanto Binet quanto Gesell, acreditando queainteligénciaeodesenvolvi- ‘Mento psiquico da crianca so biologicamente determinados, preocuparam- Seem descrever comportamentos e habilidades tipicos de cada faixa etéiia, ___Binetestava interessado, como ja dissemos, em medir e comparar a inteligéncia das pessoas. Mas, se podemos medir a altura ou o tamanho 0 dedo de uma crianca simplesmente usando uma fita métrica, medir a inteligéncia é bem mais complicado. Enquanto aptidao geral do indivi- luo, a inteligéncia nao pode ser medida diretamente, mas apenas atra- vés de algumas de suas realizagdes. Por isso, para construir um teste de inteligéncia, Binet precisava conhecer 0 que criancas sfo capazes de fazer em cada idade. Essa também foi uma necessidade experimentada por Gesell. Preo- cupado em compreender a evolugdo da crianea, ele procurou estabele- cer escalas de desenvolvimento que permitissem comparar os compor- tamentos de uma crianea com aqueles que eram esperados, ou conside- rados “normais”, para sua faixa etéria. Mas como foram criados os testes de inteligéncia e estabelecidas as escalas de desenvolvimento? Essa é uma pergunta importante, porque sua resposta nos mostra um pouco como o conhecimento € produzido na rea da psicologia. Partindo do principio de que a hereditariedade e a maturagao sao os fatores mais decisivos na determinagao da inteligéncia e na evolucao do comporta- mento da crianea, tanto Binet quanto Gesell dedicaram-se a pesquisas. Pesquisando a crianca: a constru¢ao dos testes de inteligéncia Binet partiu da experimentago e da observacio do que as criangas eram capazes de fazer em idades variadas. Ele procurou selecionar proble- mas ou questdes cuja solucao envolvesse os efeitos combinados da aten- 40, do juizo e do raciocinio e nao dependesse de aprendizagens anteriores. Essas questdes eram organizadas em grupos por idade, de acordo com 0 seguinte critério: se um teste era resolvido satisfatoriamente por 60% a 90% das criangas de determinada idade estudadas, ele era consi- derado adequado para aquela idade. Um exemplo: se todas ou quase todas as criangas de 6 anos fossem capazes de comparar dois pesos, essa tarefa era considerada muito facil para essa idade; se 60% a 90% das criancas de 5 anos estudadas resol- vessem o problema de maneira correta, ele era aceito como adequado para essa faixa etdria. Do mesmo modo, se quase nenhuma das criancas de 4 anos estudadas conseguisse copiar um quadrado, essa tarefa era considerada dificil demais para essa idade. Seguindo esse procedimento, Binet selecionava um ntimero detet- minado de tarefas, em ordem crescente de dificuldade, para cada idade. Assim, 0 seu teste de inteligéncia geral, destinado a avaliar pessoas dos 3 anos até a idade adulta, era composto por varios conjuntos de proble- mas; um para as criangas de 3 anos, outro para as de 4 anos, outro para as de 5 anos, e assim sucessivamente, Por meio desses testes, a inteligéncia ¢ avaliada pelo desempenho nas tarefas. O ntimero de testes que a crianga consegue resolver determi- naa sua idade mental ou o seu quociente de inteligéncia (QI), Se ela con- seguir resolver todos os testes propostos para a sua idade, sua inteligén- cia serd considerada normal. Se ela também resolver corretamente al- ‘guns dos testes propostos para criangas mais velhas, seu QI estara acima da média, E se, ao contrario, ela acertar apenas questdes propostas para criangas mais novas, sua inteligéncia ser considerada abaixo da média. TT" Vocé sabe 0 que éo OI? Embora confundido por muita gente com a propria inteligén- cia, 0 O1 (quociente intelectual) ¢ basicamente uma comparagdo entre a idade mental ¢ a idade real da crianga (idade cronolégica). Aidade mental é determinada pelo nimero de tarefas de umn tes- fe que acrianga consegue resolver corretamente, Por exemplo, se ela acerta todas as tarefas atribu(das ao grupo de 10.anos, diz-se que ela tem idade mental de 10 anos, seja qual for sua {dade cronoldgica. 0.01 é obtido quando se divide a idade mental de uma crianga pela sua idade cronoldgica, Suponhamos que uma crianga de 8 anos consiga resolver todos os problemas propostos para a idade de 10. anos, mas nada além desse nivel. Diremos que suaidade men- tal é de 10 anos e, para calcular o seu QI, dividiremos 10 por 8, 0 que dé um resultado de 1,25. Por convengéto, esse resultado é mul- tiplicado por 100, para que o OI possa ser expresso em mimeros inteiros, Isso significa que, em nosso exemplo, a crianga tem um OL de 125, que é considerado acima da média. x * ‘idade cronolégica Qi Assim, quando a idade mental e a idade cronolégica forem as mesmas, 0 Ol serd sempre 100. Se a idade mental for inferior 4 idade cronolégica, os resultados serdo sempre inferiores a 100, ‘o.que indicard um Ql abaixo da média, Se, ao contrdrio, a idade mental for superior a idade cronotdgica, 0 Ol serd sempre supe- rior a 100, ou acima da média. Pesquisando a crianga: a elaboracao das escalas de desenvolvimento Gesell também se utilizou da observagao e as para elaborar suas escalas de desen- introduziu uma importante inovagdo técni- portamento da crianga: as cme- A semelhanga de Binet, da experimentagao com volvimento, No entanto, cle ca na observagao e no registro do com| ras cinematograficas. _ ind ea Na Clinica do Desenvolvimento da Crianga, criada por ele em ‘a Universida ale, Gesell montou um observat6rio fotogra- Teeth de 4 metros de didmetro € 2,5 metros de altura, equipado no alto ¢ nas paredes laterais com céimeras cinemato- gréficas, Enquanto Gesell submetia as criangas a varios testes — sem- pre voltados a descobrir 0 que sao capazes de fazer em cada idade — as Cimeras rodavam, registrando todas as reagdes que elas apresentavam, Os filmes obtidos eram posteriormente analisados. Gesell procura. va, ento, destacar diversos aspectos da evolucio do comportamento da crianga. A postura, a locomocao, a acio de agarrar, os jogos, as con. dutas sociais, etc. eram minuciosamente analisados e descritos com o objetivo de captar as formas que esses com. portamentos tomam no decorrer do desenvol- vimento da crianga. A partir dessas anilises, tornava-se po vel estabelecer que comportamentos eram tipi- cos de cada faixa etdria, como, por exemplo, comegar a engatinhar, colocar-se de pé e andar com apoio, subir em cadeiras ou sofis e cami- nha sozinha. a Engatinhar e andar sozinho: estdgios diferentes do desenvolvimento infantil | ee Essas pesquisas, baseadas na andlise dos filmes, foram denomint: das por Gesell pesquisas normativas, j4 que visavam 4 apreensi0 do. ritmo e da seqiiéncia “normais” do desenvolvimento, Assim, a0 enu™™ Tar os Comportamentos considerados tipicos de cada faixa etaria, € °° ritmo ¢ essa seqiléncia que as escalas de desenvolvimento express*™ A questo dos comportamentos tipicos Tanto Binet quanto Gesell ocuparam-se em definir os compo"! tos tipicos de cada faixa etéria, embora a partir de perspectivas “ile Como ja apontamos, Gesell nfo apenas destacava quais comportamentos infantis comuns a determinada idade, mas tamer procurava retratar a maneira como esses comportamentos evolu transformam-se. E 0 caso, por exemplo, da capacidade da cria"* manter-se sentada sem apoio. se E possivel observar, nas figuras a seguir, que a evoluc®? “jy comportamento deve-se a0 progresso do alinhamento das cos! © a met” es 0s aumento do controle da cabega: gradativamente as costas do bebé (que, no recém-nascido, sao arredondadas) ficam mais alinhadas, e a crianga torna-se capaz de manter a cabega levantada, podendo, entéo, permane- cer sentada sem apoio. cocmccremas Primeiras 4 ee semanas de vidas Entre 4e6 ‘odorso do bebé semanas o bebé é uniformemente temo dorso ‘arredondado, arredondado e a hhavendo falta de cabega & erguida controle da por alguns cabera. ‘momentos. imeem a Binet, por sua vez, preocupava-se com aqueles comportamentos que, numa ee determinada idade, pudessem ser tomados ae como indicadores do nivel de inteligéncia semanas 0 dorso da crianga. A evolugao ou o desenvolvi- ainda é mento dos comportamentos considerados nae tipicos nfo o interessaram de modo espe- ine cial, mas sim a capacidade da crianga de porém o bebe Tealizé-los na idade tida como adequada. sinda tende a Mas, apesar das diferengas, podemos reese dizer que Binet e Gesell estabeleceram pa- Earn drdes de comportamento com a finalidade de ayaliar a inteligéncia ou o desenvolvi- mento da crianga. O pressuposto de que os fatores biolégicos (hereditariedade e Maturagao) sfio os mais decisivos na deter- minago da inteligéncia e do desenvolvi- — Mento leva a supor que tais padroes de Entre 16.620 comportamento sao independentes de fa- was Loa lores externos ou do contexto social em aihetite que as criangas vivem. Desse modo, nao cabeca é mantida importa o lugar e a época em que a crianga rea sem Viva ou as condigdes materiais ¢ a8 possi- wapllacin bilidades educacionais a que tenha acesso: —— @ crianga “normal” deve apresentar tais comportamentos, No entanto, é importante lembrar que eles chegaram definigaio dos padrdes de comportamento de cada faixa etéria a partir de pesqui- Sas realizadas nas primeiras décadas do século, com determinados gru- Pos de criangas (francesas e norte-americanas). Logo, os comporta- slop mentos considerados tipicos foram aqueles apresentados pela maioria das criangas que eles estudaram, e foi a partir daf que se definiu o que € normal ou nao. Esse procedimento € bastante coerente com os principios teéricos pelos quais Binet e Gesell se orientaram. Se o ritmo e a seqiiéncia do desenvolvimento sao biologicamente determinados, espera-se que cer- tos comportamentos aparecam sempre na mesma seqiiéncia e na mesma idade, quer se trate de criancas européias de classe média, quer de crian- gas do interior do Nordeste brasileiro. As relacoes entre desenvolvimento e aprendizagem e as influéncias do inatismo-maturacionismo na escola Se 0 ritmo e a seqiiéncia do desenvolvimento sao biologicamente determinados, qual a sua relacdo com os processos de aprendizagem? Antes de responder a essa pergunta, é importante Iembrar que os pes- quisadores da abordagem inatista-maturacionista nao tinham como ob- jetivo o estudo da aprendizagem. No entanto, ao destacar o papel de fatores internos na determinagao da inteligéncia e do desenvolvimento, essa abordagem considera que aquilo que a crianga aprende no decorrer da vida nao interfere no processo de desenvolvimento. De acordo com a perspectiva inatista-maturacionista, a aprendiz: gem é que depende do desenvolvimento. Ou seja, 0 que a crianca € capaz ou nao de aprender é determinado pelo nivel de maturagao de suas habilidades e do seu pensamento ou, ainda, pelo seu nivel de inteligéncia. Essa concepgao tem tido bastante influéncia na escola, desde sua elaboragao. Pode-se dizer que o inatismo-maturacionismo marca 0 cO- mego da relagao entre a psicologia cientifica e a educagdo. Como vi- mos, a construgao dos primeiros testes de inteligéncia de Binet ¢ Simon foi resultado de uma necessidade emergente nos meios educa- cionais franceses da época: a de identificar as criangas mentalmente deficientes e estabelecer métodos que tornassem o ensino acessivel 2 elas. O trabalho de Gesell também foi orientado por fins ligados 2 educacio, especialmente a de criangas consideradas desadaptadas. No Brasil, as principais pesquisas psicol6gicas sobre criangas da- tam do inicio do século, Educadores, geralmente vinculados as Escolas Normais (antigo nome dos cursos de Magistério), implantaram na déca- da de 20, em suas escolas, laboratérios de Psicologia Experimental ¢ de Psicologia Pedagégica. Nesses laboratérios, as criangas eram submeti- das a exames destinados a medir suas reagOes psicofisicas (diserimina- ges visuais, auditivas, etc.), e foi através deles que se introduziram no pais os primeiros testes psicoldgicos. O primeiro teste para avaliar 4 prontidao de criangas para a alfabetizagdo foi desenvolvido por um edu- cador, Lourengo Filho. A idéia de que a crianga é portado dos atributos universais (biol6- gicos) do género humano produz ou justifica a crenga de que caberia educagio: fazer aflorar esses atributos naturais, desenvolvendo as potencialidades do educando de modo harmonioso. Tal concepgdio teve © mérito de chamar a atengio para as especificidades da crianga, para as caracteristicas, habilidades e capacidades dos educandos, colocando em destaque nogdes como prontidio, maturidade, aptidio. Mas, ao mesmo tempo que atribuem a escola o papel de “cultivar” 0 individuo, de possibilitar © seu desenvolvimento harmonioso, as pro- postas pedagégicas orientadas por essa perspectiva consideram que para aprender os contetidos escolares a crianga precisaria ja ter desen- volvido determinadas capacidades. Isso acaba gerando a idéia de que existe uma idade bem precisa para aprender certos contetidos. Ou, ain- da, que 0 proveito que a crianga tira das situagdes de aprendizagem depende de seu nivel de prontidao ou maturidade. Essas nogdes, além de circularem entre os agentes do proceso educacional, influenciando, muitas vezes, 0 cotidiano da escola, tam- bém dao sustentacao a pritica de utilizagao de testes psicoldgicos para avaliar as possibilidades educacionais da crianga, E fato bem conhecido que testes de prontidao (para a leitura, por exemplo) e testes de inteligéncia tém sido amplamente utilizados para a avaliago de criangas em idade escolar, penalizando muitas delas. Os resultados de tais testes tém, historicamente, impedido que intimeras criangas tenham acesso ao conhecimento e & propria escolarizagio, ao fornecerem indicadores de sua “imaturidade” ou de seus “déficits” de inteligéncia, Hé criangas, por exemplo, que sao retidas na pré-escola ou permanecem nos exercicios preparat6rios, &s vezes um ano inteiro, por- que “néio estao prontas” para aprender a ler e escrever; outras sto envi- adas as classes especiais porque “ndo tém condigées” intelectuais de seguir 0 curso normal da escolaridade,

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