Núcleo de Estudos Estratégicos
em Defesa e Segurança
Por Anselmo de Oliveira Rodrigues *
Em dezembro de 2019, os chineses
identificaram uma moléstia desconhecida
que se alastrava a uma velocidade
impressionante e contaminava milhares
de chineses na cidade de Wuham - China.
Semanas depois, o que era uma
enfermidade local, transformou-se num
desafio de ordem nacional e mobilizou
todos os setores da sociedade chinesa
diante de um oponente invisível: Covid-
19.
Enquanto o mundo ocidental assistia o
esforço de guerra realizado pela China do
outro lado do mundo, de maneira sútil o
coronavírus começava a se instalar em
alguns países da Europa. Com o mundo
globalizado e altamente interconectado,
não tardou para que o mesmo vírus se
instalasse em território brasileiro,
provocando reações da mídia, do poder
público e da sociedade.
Diante desse cenário, pode-se dizer que o
país trava uma guerra contra um oponente
invisível, ardiloso e sagaz: Covid-19.
Dessa forma, para que o país logre êxito
nessa guerra e obtenha o menor número
de baixas, torna-se imperioso a aplicação
do conceito de Guerra Total proposto por
Clausewitz. Em síntese, esse conceito
propõe que um país precisa mobilizar
todos os meios que estão à sua disposição
para superar o inimigo: militares,
econômicos, políticos e psicossociais
(CLAUSEWITZ, 1983). No Brasil, pode-
se inferir que todos os meios que se
encontram à disposição estão
concentrados em cinco campos do poder:
1) político, 2) econômico, 3) ciência e
tecnologia, 4) militar e 5) psicossocial.
A liderança do país repousa no campo
político. É crucial que as autoridades
políticas liderem o país nessa guerra e
implementem ações voltadas para conter
o avanço do inimigo em território
brasileiro. O poder político precisa
manter os principais serviços essenciais
disponíveis à população: alimentação,
transporte, saúde, segurança, defesa,
água, energia e comunicações. Em
tempos de guerra, não há espaço para
preciosismos ou rivalidades, ou seja, o
momento agora é de união de todos os
entes da República (federal, estadual e
municipal) diante de um oponente
invisível.
A economia é o motor de um país. Como
em toda guerra que um país e sua
sociedade se predispõem a lutar, ao final
dela fatalmente sua economia estará
combalida, o que acarretará em grandes
perdas e prejuízos para toda a sociedade.
Em vista disso, o foco da economia deve
ser a contenção do avanço do coronavírus
em território brasileiro. Para isso, o poder
econômico pode contribuir
manutenção de um bom estado de saúde
da população, realizando esforços no
sentido de disponibilizar de forma
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Coronavírus: o Desafio da Guerra Total
contínua alimentos, medicamentos e
combustível para a sociedade. Especial
atenção deve ser dada à inflação, que em
momentos de crise surge com força
considerável no Brasil. De forma
semelhante ao poder político, entende-se
que o momento atual é de união de todos
os setores da economia brasileira nessa
guerra.
Em tempos de globalização e de mundo
digital, a ciência e tecnologia
desempenham papel fulcral nessa guerra.
Através dos meios de comunicações
disponíveis (televisão, internet, rádio,
mídias sociais, etc...), esse campo do
poder tem a singular capacidade de
convergir os esforços realizados em todos
os campos do poder do Brasil. É
determinante que a população brasileira
receba informações atualizadas e seja
orientada da melhor forma possível no
combate ao Coronavírus. Não há espaço
para rivalidades e nem para fake news, ou
seja, é imperiosa a união da população
brasileira, dos principais setores de
comunicações do país e do governo
brasileiro nessa guerra.
Diante desse cenário, pode-se
dizer que o país trava uma
guerra contra um oponente
invisível, ardiloso e sagaz:
Covid-19. Dessa forma, para
que o país logre êxito nessa
guerra e obtenha o menor
número de baixas, torna-se
imperioso a aplicação do
conceito de Guerra Total
proposto por Clausewitz.
Historicamente, o poder militar tem sido
o principal ator nas guerras, mas o cenário
atual não sugere esse protagonismo.
Sendo composto pelas Forças Armadas e
pelas Forças de Segurança (federais,
estaduais e municipais), o poder militar
possui duas grandes missões: 1) manter a
lei e a ordem no Brasil, ou seja, evitar que
a violência se instale e o caos se espalhe
nas cidades brasileiras; e 2) disponibilizar
os excelentes meios de saúde existentes
(hospitais e profissionais) para a
sociedade brasileira. Em suma, o poder
militar exerce papel estratégico nessa
guerra, na medida em que sua principal
missão é manter a percepção de
segurança em níveis satisfatórios nas
cidades brasileiras.
Não à toa, o último campo do poder a ser
discorrido é o poder psicossocial. Sendo
eminentemente representado pela
na população brasileira, entende-se que o
poder psicossocial é o principal ator nessa
guerra. Em seu ataque, o Coronavírus não
faz distinção de ricos ou pobres, de
Artigo de Opinião – Núcleo de Estudos Estratégicos em Defesa e Segurança da UFSCar
Autor: Anselmo de Oliveira Rodrigues
brancos ou negros, de médicos ou
militares, de artistas ou anônimos, ou
seja, ele atua de forma invisível e o
cuidado deve ser tomado por toda a
população brasileira, pois todos nós
sofremos o mesmo risco de ser
contaminados. Dessa forma, o
comportamento e os procedimentos
adotados por cada brasileiro é
determinante para a contenção do avanço
do inimigo e o consequente sucesso do
país no enfrentamento dessa guerra. De
nada adianta o esforço nacional realizado
no campo político, no campo econômico,
no campo militar e na ciência e
tecnologia, se a população brasileira não
executar as medidas preventivas
sugeridas e o isolamento social
determinado pelos agentes do poder
público.
A melhor definição do cenário atual é a
de que o Brasil, assim como outros países,
está enfrentando uma guerra típica do
século XXI (Estado x ameaça não
estatal). Por ironia do destino, uma das
possíveis linhas de ação que o Brasil pode
adotar nessa guerra, foi citada há mais de
duzentos anos atrás. Trata-se do conceito
de Guerra Total proposto por Clausewitz
em seu livro da Guerra.
Por fim, espera-se que o Brasil saia
vitorioso ao final da guerra e, de
preferência, com o mínimo de baixas
letais. Mas, de forma distinta, o principal
ator desse combate é a população
brasileira (pobres, ricos, negros, brancos,
pardos, etc...). Não se minimiza aqui o
papel desempenhado pelos demais
campos do poder nessa guerra, mas
contra um inimigo invisível,
desconhecido, ardiloso e sagaz, não
restam dúvidas de que os brasileiros serão
os principais responsáveis pelo sucesso
alcançado do país nesse combate, afinal
estamos numa Guerra Total.
* Tenente Coronel de Infantaria/Exército
Brasileiro.
Doutor em Ciências Militares.
Instrutor do Instituto Meira Mattos.
Pesquisador do Laboratório de Estudos de
Defesa (LED/ECEME).
anselmo.rodrigues@eb.mil.br
Vinculação ao NEEDS: Mar/2019
Data: 23 de Março de 2020.