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A.

Introdução
As teorias éticas
A Ética é uma virtude que está sempre presente no comportamento humano,
portanto é um fator essencial na vida social. Ela leva o Homem a questionar suas
ações e as atitudes alheias, tentando definir se elas são boas ou más, corretas ou
incorretas. Esta ciência se preocupa com a análise das ideias que envolvem o Bem e
do Mal, ou seja, ela se dedica aos seus aspectos teóricos. Por outro lado, a moral
está intrínseca na decisão de como agir frente a uma determinada situação, no foro
íntimo de cada um, na forma como as pessoas, individualmente, reagem diante de
um impasse.
Enquanto as inquietações com a esfera conceitual dos valores que regem o
comportamento humano estão localizadas no âmbito da Ética, as questões práticas
deste campo pertencem à esfera da Moral, que governa a alma de cada indivíduo.
Ao longo da História, diversos pensadores tentaram compreender o que é o Bem,
para melhor aplicar esta ideia no cotidiano, nos momentos em que se tem de
escolher entre a sua prática e a do Mal. Mas nunca se chegou a um consenso sobre
esta indagação.
Outra forma de se distinguir Ética e Moral é perceber que a primeira constitui um
preceito, é definitiva, comum a todos, é uma norma de conduta e pertence ao campo
teórico; a outra é composta de ângulos analisáveis dos comportamentos individuais,
é temporária, específica de cada cultura, a lei em ação, e é inerente ao campo da
práxis.
Além do mais, a Ética já encontra a vivência moral vigente na sociedade, portanto
não é ela quem estabelece os valores morais; ela apenas busca compreender seu
núcleo conceitual, como ela surge, em que estado às atitudes morais são
perpetradas, do ponto de vista pessoal e das circunstâncias objetivas, os princípios
de onde partem os julgamentos de natureza moral, entre outros fatores teóricos.
Ao estudar a história da filosofia, notamos que não existe “a ética” e sim as “éticas”,
os pensadores que se sucedem aproveitam-se das teorias anteriores, modificando em
funções de novas indagações de seu tempo. .
Os primeiros passos das análises éticas foram provavelmente empreendidos pelos
filósofos da Grécia Antiga. Atualmente seus estudos transcendem o campo
filosófico e se estendem ao domínio de sociólogos, psicólogos, biólogos, e muitos
outros estudiosos. Esta disciplina também procura definir como é atribuída ao
Homem a obrigação de se comportar moralmente. Ou seja, os pesquisadores se
esforçam para entender de que forma o indivíduo optou entre as várias
possibilidades à sua disposição; esta compreensão do livre-arbítrio humano pertence
ao campo da Ética.
É importante não restringir esta ciência a uma definição meramente prescritiva, pois
ela é antes de tudo uma ferramenta conceitual elaborada justamente para tornar
inteligível o que se passa nos bastidores das escolhas humanas. Ela não é, portanto,
uma receita preparada para saber qual a resposta mais apropriada a cada contexto,
embora torne mais claro esse processo decisório e, neste sentido, talvez possa ajudar
o Homem a realizar melhor suas escolhas.

B. Ética grega: Características gerais do período clássico.


No período Clássico da filosofia grega ( século V a.C) , os filósofos ampliaram as
áreas de reflexão, abrangendo as questões morais. O sujeito moral não era
compreendido como hoje, na sua completa individualidade. Os gregos eram
membros de uma comunidade em que a ética estava ligada à política,ou seja, à
administração da polis, exercendo a liberdade em um campo reservado apenas aos
que eram considerados “iguais”.
Na vida privada prevalecia a desigualdade e a ausência de liberdade, já que as
mulheres e os escravos não eram considerados cidadãos e o destino que lhes cabia
era manter a subsistência da vida em atividades relacionadas com o corpo: o escravo
pelo trabalho manual e a mulher para a procriação.
Assim dizia a filósofa Hannah Arendt:
“O ser político, o viver numa polis, significava que tudo era decidido mediante
palavras e persuasão, e não através de força e violência. Para os gregos, forçar
alguém mediante violência, ordenar ao invés de persuadir, eram modos pré-politicos
de lidar com as pessoas, típicos da vida fora da polis, característicos do lar e da vida
em família, na qual o chefe da casa imperava com poderes incontestes e
despóticos.”
Essa visão hierarquizada vinha desde os tempos homéricos, em que aos “melhores”
(aristói, em grego) cabia decidir os destinos da cidade. Só que na era clássica, os
valores da aristocracia guerreira foram substituídos pelos da cidadania, A excelência
não era mais coragem, mas a filia( philía, em grego). A tradução de filia é
“amizade”, “amor”, tem o sentido amplo de “reciprocidade entre os iguais”. Ou
seja, para gregos a filia era a base da vida pública, das relações na comunidade.
Outro aspecto marcante da filosofia antiga é o viés metafísico, segundo o qual a
compreensão do mundo baseia-se na noção de ser, ou seja, na busca de um sentido
que nos conduza à essência do ser. Por exemplo:
O que é verdade? O que é bem?
Daí a importância que, desde Sócrates, foi dada à definição do conceito.

C. Ética em Platão
 Platão: Ética e sabedoria
Platão (428-347 a.C.) descreve as discussões de Sócrates a respeito das
virtudes e da natureza do bem. Neles, é ressaltada a convicção de que a
virtude se identifica com a sabedoria e o vício com a ignorância: portanto, a
virtude pode ser aprendida. Platão explorou com grande enfase temas
metafísicos, desenvolvendo suas teoria das ideias, segundo a qual a forma
mais fundamental de realidade está nas formas ideais das coisas, que são
abstratas, e não nas suas formas transitórias, que são materiais e conhecemos
através dos sentidos.
Na célebre passagem de “A república” em que Platão descreve a “Alegoria
da caverna” reaparece essa ideia: o sábio é o único capaz de se soltar das
amarras que o obrigavam a ver apenas sombras e, ao dirigir-se para fora,
pode contemplar o sol, que representa a ideia do Bem. Portanto, “alcançar o
bem” relacione-se com a capacidade de “compreender bem”.
Nessa mesma obra, Platão descreve uma cidade utópica, “Calípolis” (que
quer dizer “cidade bela” em grego), na qual distingue uma sociedade
dividida em três classes sociais, e em que cada uma prevalece um aspecto da
alma e as virtudes que lhes são próprias:
 Os governantes têm a alma racional e, por exercerem a virtude da sabedoria,
têm a capacidade de governar.
 Os soldados (guardiães) têm a alma irascível (é impulsiva, sede de coragem,
localizada no peito) e sua virtude é a coragem, com qual defendem a polis.
 Os produtores (camponeses, artesões, comerciantes) têm a alma
concupiscível (é a sede do desejo intenso de bens ou gozos materiais) e as
virtudes da temperança ou moderação.
A cidade perfeita é a aquela em que predominam em cada classe as virtudes
citadas e a justiça consiste na harmonia entre elas (sabedoria, coragem e
temperança).
Para Platão, essa desigualdade de classes não é necessariamente um
problema, desde que cada cidadão seja encaminhado para a função que está
em conformidade com a sua natureza. Isso porque, para ele, cada um nasce
mais preparado para exercer um determinado tipo de atividade. A cidade
justa é aquela que se organiza pela justa medida, isto é, aquela em que cada
um ocupa o lugar designado pela sua natureza. Nas palavras de Platão, a
cidade é “justa pelo fato de que cada uma das três ordens (classes) que a
constituem cumpre sua função”, ou seja: “É justo que aquele que, por
natureza, é sapateiro fabrique sapatos e nada mais faça, que o construtor
construa e, quanto aos outros, também seja assim.” Se isso for assegurado,
reinará a harmonia e a prosperidade.
Para melhor explicar e justificar essa posição, Platão se vale de uma fábula,
ou melhor, de uma “mentira, única e genuína”, daquelas que se fazem
“necessárias” uma vez que servem à conservação da cidade. Trata-se do
mito dos nascidos da terra, segundo o qual os gregos, tanto eles quanto
suas armas, teriam sido modelados e criados no interior da terra e esta, como
sua mãe, os teria dado à luz. Por isso, eles devem cuidar do lugar onde
vivem como um filho cuida de sua mãe, defendê-la dos inimigos e tratarem-
se mutuamente como irmãos. E a narrativa prossegue:

“Todos vós que estais na cidade sois irmãos, [...] mas ao plasmar-vos, o
deus, no momento da geração, em todos os que eram capazes de comandar
misturou ouro, e por isso são valiosos, e em todos os que eram auxiliares
daqueles misturou prata, mas ferro e bronze nos agricultores e outros
artesãos. Já que todos vós sois da mesma estirpe, no mais das vezes geraríeis
filhos muito semelhantes a vós mesmos, mas, às vezes, do ouro seria gerado
um filho de prata e, da prata, um de ouro, e assim com todas as combinações
de um metal com outro. Aos chefes, como exigência primeira e maior,
ordenou o deus que de nada mais fossem tão bons guardiões quanto de sua
prole, nem nada guardassem com tanto rigor, procurando saber que mistura
havia na alma deles e que, se um filho tivesse dentro de si um pouco de
bronze ou de ferro, de forma alguma se compadecesse dele, mas que o
relegasse, atribuindo-lhe o valor adequado à natureza, ao grupo dos artífices
e agricultores. Mas, em compensação, se um deles tivesse em si um pouco
de ouro ou prata, reconhecendo-lhe o valor, fizesse que uns ascendessem à
função de guardião e outros à de auxiliares, porque havia um oráculo que
previa que a cidade pereceria quando um guardião de ferro ou bronze
estivesse em função.”

Embora se trate de uma “mentira”, como reconhece Platão, esta fábula seria
útil para que os magistrados “cuidassem mais da cidade e do relacionamento
entre uns e outros,” mostrando-lhes que possuem alma de ouro e que,
portanto, não precisam almejar possuir ouro em metal (riqueza material),
pois a maior riqueza está dentro deles e esta não perece e não lhes pode ser
tomada. Assim a cidade seria governada por pessoas que não teriam motivo
para praticar a corrupção, favorecendo a justiça. 

D. Ética em Aristóteles
Aristóteles (384-322 a.C) apronfudou a discussão a respeito das questões éticas na
obra “Ética a Nicômaca”. A ética é a parte da filosofia que nos ajuda refletir sobre o
fim ultimo de todas as atividades humanas, uma vez que tudo o que fazemos visa
alcançar um bem- ou o que nos parece ser um bem.
Examinando todos os bens desejáveis, tais como os prazeres, a riqueza, a honra, a
fama, observa que eles não são fruídos por si mesmo, mas visam sempre outra
coisa. Pergunta-se então qual seria o sumo bem, aquele que é um fim em si mesmo,
e não um meio para o que quer que seja, e o encontra no conceito de “boa vida”, de
“vida feliz” (em grego, Eudaimonía). Por isso a filosofia moral de Aristóteles é
uma eudemonia.
A felicidade
Aristóteles reserva ao filósofo o exercício mais complexo da racionalidade, mas
reconhece que também as pessoas comuns aspiram ao saber e se deleitam com ele,
satisfeitas quando esclarecem dúvidas ou compreendem melhor algo que antes lhes
parecia confuso.
A virtude
A vida humana, porém, não se resume ao intelecto e encontra sua expressão na
ação, em uma atividade bem realizada. O objetivo, portanto, combinar um certo
modo de vida com um princípio racional. Ou seja, o bem é a atividade exercida de
acordo com a sua excelência ou virtude. Em moral, a virtude é a força com qual nos
aplicamos ao dever e o realizamos.

 O justo meio

A moral não é uma ciência exata, pois enfrenta a dificuldade de lidar com os elementos
irracionais da alma, como os afetos fortes das paixões humanas, a fim de submetê-los à
ordem da razão. A propósito, Aristóteles desenvolveu a teoria da mediania, pela qual
toda virtude é boa quando é controlada no seu excesso e na sua falta. Em outras
palavras, agir virtuosamente é encontrar o justo meio entre dois extremos, que são
chamados vícios. Veja alguns exemplos:

 A virtude da coragem torna-se excessiva quando é temeridade (audácia excessiva) e


deficiente quando é covardia;
 “Gastar dinheiro” pode significar a virtude de generosidade, da prodigalidade,
enquanto seus extremos são a dissipação ou a avareza;
 A virtude da temperança é o meio- termo entre voluptuosidade e insensibilidade.
 No trato com os outros, a virtude é a afabilidade, enquanto seus extremos são a
subserviência e a grosseria.

Aristóteles adverte, porém, que não é fácil determinar o justo meio, nem quais são os
extremos. Pode ser que uma pessoa que costuma agir de modo temerário classifique a
prudência de um corajoso como covardia. Também a irascibilidade (ira, irritação) pode
não se configurar um excesso em determinadas ocasiões nas quais não convém a apatia.

Justiça e amizade

Segundo Aristóteles, o indivíduo bom é generoso, isto é, não pensa apenas em si, mas
orienta-se para atender às dificuldades e às necessidades dos outros. Nesse sentido, a
justiça pode ser:
 Individual, quando se refere às relações entre as pessoas, aplicada à própria pessoa e
aos outros;
 Social, quando se refere às relações entre os indivíduos e o governo, estabelecidas
em leis.

Por isso, a justiça pode ser uma virtude moral ou política. Ao se referir á justiça,
Aristóteles recorre aos termos de proporção e igualdade. Tratar as pessoas com justiça

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