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O saber humano e sua diversidade1

Apresentação

O homem é capaz de ordenar o seu mundo por meio de explicações


sobre as suas experiências, sensações e pensamentos. Essas explicações
permitem ao homem criar sistemas lógico-explicativos orientados por projeções
e idéias de tempo, de espaço e de expectativas do futuro. Essa construção é
simbólica e dotada de significados e sentidos em torno do mundo que o rodeia,
criando assim o que se chama cultura humana. Desde os primeiros vestígios
do homem sobre a Terra, se percebe que o enfrentamento dos problemas e
obstáculos por ele vividos - sobrevivência, proteção e continuidade da espécie -
criam uma resposta sobre si e sobre o mundo que o cerca. Diante disso, se
percebe que os saberes criados pelo homem assumem formas diferenciadas,
contextualizadas nessa experiência temporal e espacial na vida em
coletividade. É essa capacidade de pensar e explicar o mundo com o qual ele
interage que o homem criou o conhecimento.
Diante disso, se cria uma possibilidade para se trabalhar essa disciplina
na medida em que ela se coloca como um caminho para o pensamento –
dimensão epistemológica, um modo de pensar – dimensão metodológica
da pesquisa, e por fim uma forma e formato de sistematizar o pensamento e
saber produzido com a pesquisa – dimensão metodológica do estudo e da
redação científica. Ao longo do texto se discuti as possibilidades de
construção dos saberes, buscando criar espaços de debate e reflexão em todo
do Conhecimento, como uma produção humana, abordando-se os tipos de
conhecimentos, suas características, distinções e o ordenamento lógico de
cada forma de conhecer e explicar as experiências do homem em sua
interação com o meio e com outros homens e com as suas representações de
mundo. Algumas noções básicas serão apresentadas para desencadear o
conhecimento, o debate e a reflexão em torno do saber humano e de sua
diversidade.

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Fragmentos do Livro Metodologia Científica, publicado pelas professoras Célia Regina Diniz e Iolanda
Barbosa da Silva pela UEPB/UFRN – EDUEP, 2008 para o Curso de Geografia a Distância . ISBN: 978-
85-87108-98-2.
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O desafio do conhecimento!

Nessa aula, discutir-se-á o saber humano e sua diversidade. Serão


trabalhados fragmentos de textos teóricos e outros gêneros literários sobre a
temática, com apresentação de resumo do conteúdo e indicação de referências
para leitura complementar; além do glossário.

Objetivos

Pretende-se, ao final dessa aula que você tenha compreendido e


interpretado:
1. que o homem é produtor do seu conhecimento;
2. que existem saberes diferentes e plurais, interagindo na
produção de símbolos e significados que explicam a vida
humana.

Desafiando o homem, o saber se torna uma construção cultural ...

Pense nisto!!!

? O homem apresenta diversas formas de ver e explicar o mundo e nele


construir hipóteses experimentando-as ou não, mas sempre buscando superar
os limites do conhecimento que produz. Ao procurar conhecer para dominar o
mundo que o pertence ele classifica e ordena critérios para construção de
verdades sobre si e sobre o mundo que o contém.

Reflita!!!
Os relatos falam de um conhecimento cotidiano adquirido no dia-a-dia e orientado pela
observação da aparência dos fenômenos, da forma e do formato como eles se colocam
diante dos sentidos imediatos: visão, tato, olfato e audição. Esses sentidos possuem uma
razão sensitiva e sem a exigência de uma sistematicidade. O saber elaborado acontece
O que é o Conhecimento comum, saber popular ou senso
pela repetição de respostas quando se busca resolver um problema. Essa repetição pode
se tornar uma verdade entre outras para quem conhece.
comum?

Convidando Rubem Alves para discussão desse saber pode-se defini-lo,


como:
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Esta expressão foi inventada não foi inventada pelas pessoas de


senso comum. Creio que elas nunca se preocuparam em se definir.
[...] a expressão „senso comum‟ foi criada por pessoas que, segundo
seu critério, são intelectualmente inferiores. Quando um cientista se
refere ao senso comum, ele está,obviamente, pensando nas pessoas
que não passaram por um treinamento científico [...]. (ALVES, 1994,
p.13)

Pode-se ampliar esse pensamento do autor afirmando que o


conhecimento popular se refere ao conhecimento do povo, adquirido ao acaso,
dominado por valores e crenças baseadas nas experiências pessoais vividas
em circunstâncias diversas seguindo tradições e ritualidades particulares a
cada meio social e cultural.
Outros gêneros literários permitem compreender a lógica do saber do
conhecimento popular. Isso pode ser identificado nos fragmentos do poema
“Brasi de cima e Brasi de baxo” de Patativa do Assaré, no qual o poeta conta
sua vida ao amigo Zé Fulo.

[...]
Tudo que procuro acho.
Eu pude Vê neste crima.
Que tem Brasi de Baxo.
E tem Brasi de Cima.
Brasi de Baxo, coitado!
È um pobre abandonado;
Um do ôtro é bem deferente:
Brasi de Cima é pra frente.
Brasi de Baxo é pra trás.

Ciência, coisa boa?

Pense nisto!!!
Fernando Pessoa (apud ALVES, 1998,p.11) dizia „pensar é estar doente
dos olhos‟ e Alves(op.cit, p.11) complementa “pensar é estar doente do corpo”,
pois quando o corpo está sadio ele não o conhece, mas quando ele sente dor
tudo muda. Acontece uma perturbação no pensamento que o leva a construir
os porquês? As perguntas são de diversas ordens e começam a se encadear
numa lógica de racionalidade, cujo objetivo é descobrir o que causa a dor e
quais os efeitos dela sobre o corpo. Inicia-se a construção de um problema por
meio de hipótese, possíveis repostas para dor, exercício de linguagem e
argumentação científica.
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O que é o conhecimento científico, afinal?

O conhecimento científico procura conhecer além do fenômeno observado


pelos sentidos humanos utilizando-se de método. Ele se preocupa com as
causas e leis que determinam ou influenciam os acontecimentos, procurando
por meio da observação, experimentação, teste de hipóteses e verificação
produzir respostas aproximadamente verdadeiras para os fenômenos
analisados.
O conhecimento científico se propõe o ser uma explicação
certa/verdadeira sobre as coisas para isto utiliza-se de exposição
argumentativa dos motivos. Esse saber cria a possibilidade de ser refutado em
sua certeza ao utilizar critérios experimentais que venham a medir a veracidade
ou falseamento da realidade tornada verdade em teorias, conceitos e
categorias explicativas.
Refletindo sobre a ciência e o saber científico Boaventura Sousa Santos
(1999) sinaliza com a imagem dos progressos científicos desde o século XVI
provindos da revolução científica provocada por Copérnico, Galileu e Newton
através de cálculos matemáticos que construíram teorias e explicações lógico-
racionais contribuindo com o nascimento da ciência moderna, pautando o
debate das ciências físicas, naturais e lógicas ao longo dos séculos XVII e XVIII
e das ciências sociais no século XIX. As explicações sobre os fenômenos e os
argumentos de autoridade são vivenciados na experiência de um ordenamento
científico emergente.
A situação do Homo sapiens é distinta, pois ele é o único animal que dar
sentido e significado por meio de elaborações simbólicas a sua vida. Diante
disso, o conhecimento científico enquanto uma construção desse homem
racional teria como finalidade, conforme Brecht (apud ALVES, 1994) “aliviar a
miséria da condição humana”; no entanto, esse conhecimento instaura
desigualdades e limita os acessos de seu resultado a fragmentos de grupos e
classes em detrimento do bem comum.
A magia do conhecimento
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Pense nisto!!!

? “ Em 1932, Freud escreveu uma carta a Einstein que fazia uma estranha
pergunta/afirmação: „Não será verdade que toda Ciência contém, em seus
fundamentos, uma mitologia?„” ( ALVES, 1994, p.23).

Os mitos funcionaram como elementos explicativos para a vida humana


durantes séculos. Ao desenvolver a linguagem e aprimorar os códigos de
comunicação os humanos procuraram explicar o meio físico no qual viviam
coletivamente por meio de mitos.
O conhecimento mítico nasce num contexto explicativo, não lógico,
fantástico, mágico e refletido no contato homem com as forças da natureza.
Pode ser compreendido como uma narrativa alegórica, poética, fantasiosa e
figurada que é passada de geração em geração.
O mito refletia as visões que os seres humanos tinham ou criavam sobre o
cosmo e sobre a existência. Ele teatraliza a origem da vida, da terra e das
línguas. Na análise dos mitos encontra-se a interação entre natureza e cultura.

Reflita!!!

Mitos e magias não são coisas dos antepassados. Os mais sábios sabem disso, porque não se
esquecem de sonhar, de ritualizarem a vida.

O conhecimento filosófico

Pense nisto!!!
A reflexão sobre o universo, o cosmo, o mundo, a vida, as origens e os
elementos constitutivos do homem por meio da mediação da razão crítica
vieram ocupar o lugar dos mitos e elaborar um novo modelo explicativo, lógico
e racional – o conhecimento filosófico.

O conhecimento filosófico é sistemático e tem por campo de análise as


idéias, as relações conceptuais e exigências lógicas que não são redutíveis a
realidades materiais.
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A Filosofia emprega o método racional e encontra-se sempre a procura de


interrogar fatos e problemas que cercam o homem em sua existência concreta.
A percepção da realidade, para o saber filosófico, é mediata e valorativa,
imperceptível aos sentidos, extrapolando as experiências.

Ele busca deduzir certas regras de conduta que orientam a vida humana.a
filosofia é uma busca constante de sentido, de justificação, de possibilidades,
de interpretação a respeito de tudo que envolve a existência humana.

Reflita!!!

Tente adotar uma atitude filosófica diante de alguma situação que você vivencia no cotidiano da
escola. Veja a diferença entre “eu acho” e “eu penso”

A fé humana

Pense nisto!!!
O conhecimento religioso fundamenta-se no exercício da fé. A fé não se
objetiva, ela é inspiracional e acontece no contato direto ou pela revelação de
seres sobrenaturais aos seres humanos. Sua prática é histórica e se baseia em
rituais que a reafirmam a fé.

O conhecimento religioso ou teológico

O conhecimento religioso ou teológico considera as verdades infalíveis por


que são alcançadas pela revelação da divindade. A adesão ao conhecimento
acontece pelo ato de fé. O fiel não se detém a explicações lógico-causais e
evidências materiais, mas a revelação divina.
Durante a Idade Média período de grande poder da Igreja Católica, a
razão passou a ser considerada um instrumento auxiliar da fé. A fé ou a crença
como correu nas sociedades agrícolas míticas passou a explicar o
comportamento humano em grupo. O saber filosófico foi enclausurado nos
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mosteiros e apenas algumas obras foram disponibilizadas para leitura das


ordens religiosas, a filosofia permitida é a filosofia da IGREJA ficando a
população a margem do acesso a esse saber.

Reflita!!!

O saber teológico supõe e exige a autoridade divina, nela se fundamenta, só a ela atende. A teologia
para ser fiel a seus princípios, conserva sempre as mesmas doutrinas dos textos sagrados e das
tradições.

Orientação de Leitura

Orienta-se como leituras complementares às discussões apresentadas nesta


aula:

BERVIAN, P.A.; CERVO, A.L. Metodologia Científica. 4.ed. São Paulo:


MAKRON Books, 1996.

Os autores apresentam no capítulo 1 - Natureza do Conhecimento Científico


uma discussão teórica sobre os níveis de conhecimento e a relação que se
estabelece entre eles. Nesse capítulo, há um aprofundamento em torno do
saber científico, suas características e o trinômio da ciência: verdade, evidência
e certeza.
LAKATOS, E. M; MARCONI, M. de A. Metodologia Científica. 3.ed. rev.ampl.
São Paulo: Atlas, 2000.

As autoras apresentam uma discussão teórica e densa no capítulo 1- Ciência e


Conhecimento Científico, abordando os tipos de conhecimento confrontando-os
com a Ciência. Contextualizam, historicamente, cada tipo e elabora um quadro
comparativo contendo as principais características de cada tipo.

Revisando as discussões

Nessa aula, foram trabalhados os saberes humanos e a diversidade de


possibilidades de expressão desses conhecimentos. Iniciou-se com a
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apresentação do homem como construtor do conhecimento. Na seqüência


foram apresentados os tipos de conhecimento: senso comum, científico,
mitológico, filosófico e teológico. Na exposição desses tipos foram identificadas
as características de cada um; como também, as aproximações por meio de
exercícios reflexivos e discussões teóricas.

Referências

ALVES, Rubem. Conversas com quem gosta de ensinar. 27.ed. São Paulo:
Cortez, 1993.

BERVIAN, P.A.; CERVO, A.L. Metodologia Científica. 4.ed. São Paulo:


MAKRON Books, 1996.

______. Filosofia da ciência: introdução ao jogo e suas regras. 20.ed. São


Paulo: Brasiliense,1994.

______. Estórias de quem gosta de ensinar. 17.ed.São Paulo: Cortez, 1994.

______. Ciência, coisa boa... In: MARCELINO, Nelson C. (org.) Introdução as


Ciências Sociais. 7.ed. Campina, SP: Papirus,1988.

CHAUÍ, Marilena.Convite à Filosofia. 7.ed.São Paulo: Ática, 1996.

CORDEIRO, Darcy. Ciência, Pesquisa e Trabalho Científico: uma


abordagem metodológica.2.ed. Goiânia,GO: UCG,1999.

DINIZ, Célia Regina; SILVA, Iolanda Barbosa. Metodologia Científica.


Campina Grande; Natal: UEPB/UFRN – EDUEP, 2008.

LAKATOS, E. M; MARCONI, M. de A. Metodologia Científica. 3.ed. rev.ampl.


São Paulo: Atlas, 2000.

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