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IFSP - campus Suzano.

3º ano Ensino Médio Integrado.

Sociologia Brasileira: A questão racial – Gilberto Freyre


e Florestan Fernandes.

Prof.ª Marcela - 2019


1 – Modernização e burguesia no Brasil

✓Desenvolvimento das atividades comerciais e de exportação e a expansão


capitalista do início do século XX → formação da burguesia nacional.

✓Necessidade de um saber mais pragmático, menos vinculado a uma


estrutura social herdada da colonização, capaz de transformar a antiga
colônia em uma nação capitalista.

✓Tentativa de ruptura com a herança cultural do passado: procura-se


combater o analfabetismo, homogeneizar os valores e o discurso, criar um
sentimento de patriotismo que levasse a mudanças reais na estrutura social.
A modernização do país passava a ser importante. Nesse sentido
desenvolviam-se inúmeras campanhas, como a abolicionista, do final do
século XIX.
Crescimento do poder econômico e político da burguesia nacional → nacionalismo →
modernizar o país e reunir as diferentes regiões sob um ideário comum.

Nacionalismo:
✓ Aspectos econômicos → defesa da produção nacional (taxas alfandegárias)
✓ Desejo de se conhecer realmente a nação.
✓ Repúdio a todo traço de colonialismo, de atraso, de importação cultural.

Reorientação do pensamento social

Movimento modernista nas artes e na literatura; fundação do Partido Comunista; movimento
tenentista e, dentro deste, a Coluna Prestes, que lutavam pela moralização e pela
modernização do sistema político brasileiro, propondo o fim da política do café-com-Ieite e de
seus vícios eleitoreiros.

Sociologia como atividade autônoma voltada para o conhecimento sistemático e metódico da


sociedade → década de 1930, com a fundação da Universidade de São Paulo e o consequente
incremento da produção científica.
Movimento Modernista:
✓ Ideia de que as regras vigentes sobre a
arte e a literatura “engessavam” a
produção brasileira (oposição às regras e
modelos estrangeiros).
✓ Antropofagia (Oswald de Andrade) →
Manifesto Antropofágico (1928) →
deglutição (daí o caráter metafórico da
palavra "antropofágico") da cultura
do outro externo, como a europeia, e
do outro interno, a cultura dos
ameríndios e negros, ou seja, não se
deve negar a cultura estrangeira, mas
ela não deve ser imitada → criação de
arte original.
✓ A Semana de Arte Moderna de 1922,
em SP, foi uma espécie de marco da
independência da arte brasileira.
2 – A geração de 1930

✓Reflexão sobre a realidade social ganha um caráter mais investigativo e explicativo.

✓Preocupações gerais entre a intelectualidade:


▪ Interesse pela descoberta do Brasil verdadeiro, em oposição ao Brasil
colonizado e estudado sob a visão etnocêntrica da Europa.
▪ Desenvolvimento do nacionalismo, como sentimento capaz de unir as diversas
camadas sociais em torno de questões internas à nação e como inspiração para
as políticas econômica e administrativa de proteção ao comércio e à indústria
nacional.
▪ Valorização do cientificismo como principal forma de conhecer e explicar a
nação.
▪ Anseio por modernizar a estrutura social brasileira.

✓Principais intelectuais da chamada geração de 1930: Caio Prado Júnior, Gilberto


Freyre, Sérgio Buarque de Holanda e Fernando de Azevedo.
Gilberto Freyre (1900 – 1987)

Casa Grande & Senzala (1933) → aborda as características da colonização portuguesa, a


formação da sociedade agrária, o uso do trabalho escravo e, ainda, como a mistura das raças
ajudou a compor a sociedade brasileira.

Caráter antirracista → combatia a ideia de superioridade racial e da mistura de raças como


causa do atraso da nação (“democracia racial”).

Casa Grande & Senzala → valoriza as características do negro, do índio e do mestiço


acrescentando a ideia de que a mistura dessas raças seria a “força”, o ponto positivo, da
nossa cultura.

Constituição da nacionalidade brasileira → harmoniosa união entre o branco (de origem


europeia), o negro (de origem africana), o índio (de origem americana) e o mestiço,
ressaltando que essa “mistura” contribuiu, em termos de ricos valores, para a formação da
nossa cultura.
A ideia de democracia racial:

“Segundo Freyre, a formação da cultura brasileira é o resultado do sincretismo


cultural processado entre o português, o índio e o africano escravo, que acabou
originando uma cultura ímpar, diferente na sua formação, fortemente mestiçada
e sincretizada, uma cultura marcada pela diversidade de contribuições culturais
do negro, do índio e do português, que acabou por constituir um conjunto de ex-
pressões culturais diversas.
A constituição da cultura brasileira seria resultado desse processo de sincretismo
e miscibilidade; o brasileiro seria resultado de um intercurso racial e cultural
democratizado e do encontro das culturas, um encontro democrático, ausente de
conflitos. Entretanto, alguns pensadores se contrapõem à ideia de “democracia
racial” devido ao fato de esta deixar de lado o fenômeno do preconceito racial e
cultural existente no Brasil; um preconceito não declarado, mas inculcado no
inconsciente coletivo”.
COSTA, Cristina. Sociologia: Introdução à ciência da Sociedade. São Paulo: Moderna, 2005.
Sobre as “falsidades” do mito: os anos 1950 e os estudos de exclusão (Racismo “à
brasileira” – Lilia M. Schwarcz, pp. 99-101).
Início dos anos 50 → dirigentes da Unesco encomendaram uma série de pesquisas (Programa
de Pesquisas sobre Relações Raciais no Brasil) para o exame das relações raciais no Brasil,
consideradas, na época, exemplares, para possíveis sugestões para outros contextos
conflituosos, sobretudo os Estados Unidos e a África do Sul. Os estudos foram realizados com
inclusão de pesquisas no terreno nas cidades de Recife, Salvador, Rio de Janeiro, São Paulo e
Itapetininga. (Charles Wagley, Thales de Azevedo, Costa Pinto, Roger Bastide, Oracy Nogueira,
Florestan Fernandes).

Análises de Costa Pinto (RJ) e de Bastide e Fernandes: questionam “harmonia racial” (mito da
democracia racial).: sinais de discriminação e preconceito.

Florestan Fernandes: temática racial a partir da perspectiva das desigualdades; problematiza


noção de “tolerância racial”.

Referencial teórico: no lugar do culturalismo, abordagens sociológicas centradas centradas


no tema da modernização do país e da situação das classes sociais.
Florestan Fernandes (1920 – 1995) e a questão racial.

✓ Obras sobre a temática:

1953 → Brancos e negros em São Paulo. (com Roger Bastide)


1965 → A integração do negro na sociedade de classes.
1972 → O negro no mundo dos brancos.

✓ Fundamentou suas pesquisas com base em dados do censo, que


demonstraram a exclusão do negro na sociedade de classes.

✓ Relações raciais → entendidas como estruturas sociais e modelos de


exclusão; impasses para integração e construção da ordem democrática no
país.
Perguntas norteadoras da obra do autor:

Como se coaduna a modernidade com a integração


do negro?

Como combinar ordem capitalista e racional com


ordem estamental e escravocrata?
(SCHWARCZ, L. Raça sempre deu o que falar. (Apresentação do livro “O negro do mundo dos brancos”, de Florestan
Fernandes)
✓ Discurso antirracista → passagem da ênfase biológica e/ou culturalista para a ênfase política
da noção de raça.

✓ Questão racial no Brasil é uma questão de classe.

✓ Preconceito racial → manifesta-se de modo decisivo justamente na dificuldade da


população negra, nas grandes metrópoles, de se inserir como cidadão pleno numa
sociedade institucionalmente liberal e de economia industrial.

✓ Análises históricas → assinalavam que haveria um descompasso entre as grandes


transformações nas estruturas econômicas e as relativas mudanças no caráter das relações
raciais desde 1888.

✓ Pós abolição → relações raciais teriam continuado na ordem do que Fernandes chamava de
padrão tradicional escravista, que impedia que a população negra participasse de forma
efetiva na nova sociedade de classes.
Problematiza a noção de tolerância racial.

Preconceito no Brasil é considerado ultrajante para quem o


sofre e degradante para quem o pratica

Consequência da permanência de um ethos católico

Preconceito de cor condenado no Brasil como se
representasse um mal em si mesmo, por outro lado, a
discriminação e exclusão se fazem presentes, de forma
dissimulada, nas práticas sociais.
Paradoxo da situação racial brasileira:

“[...] uma alentada mobilidade social teria eliminado


algumas barreiras existentes no período escravocrata,
mas criado outras; de ordem econômica e moral. Um
racismo dissimulado e pouco sistemático era, então,
diagnosticado por Fernandes [...].”
(SCHWARCZ, L. Raça sempre deu o que falar. Pág. 18. Apresentação do livro “O negro do mundo dos brancos”, de
Florestan Fernandes)
Não se entende a situação do negro e do mulato fazendo-se
tábula rasa do período escravista e do que ocorreu ao longo
da instauração da ordem social competitiva. [...] Do ponto de
vista sociológico, o que interessa, nesse pano de fundo, é o
fato de que os estoques negro e mulato da população
brasileira ainda não atingiram um patamar que favoreça sua
rápida integração às estruturas ocupacionais, sociais e
culturais do capitalismo.
(FERNANDES, F. O negro no mundo dos brancos. São Paulo: Global, 2007)
“A rápida transformação ocorrida em São Paulo
teria impossibilitado a inserção do
negro/mulato no estilo de vida urbano e o
inferiorizado na competição com a mão de obra
imigrante. O resultado é a pauperização e
desorganização social dessa população;
condicionada pelos mores da ordem
estamental”.
(SCHWARCZ, L. Raça sempre deu o que falar. Pág. 20. Apresentação do livro “O negro do mundo dos brancos”, de
Florestan Fernandes)
A democracia racial como mito:

“A ausência de tensões abertas e de conflitos


permanentes é, em si mesma, índice de ‘boa’
organização das relações raciais?”

(Florestan Fernandes. O negro no mundo dos brancos.)


Democracia racial → legado da ordem escravista e
estamental.

“[...] a discussão do mito da democracia racial liga-se


ao atraso da ordem racial (à ideologia da ordem
estamental), de ajustamento mais lento às mudanças
em relação à ordem social mais sincronizada com as
alterações econômicas”. (F. Fernandes)
Para Fernandes, o mito da democracia racial decorria de dois equívocos
básicos ligados à proposição de que o preconceito racial seria neutro:

1 - Fruto da compreensão de que a miscigenação foi tomada “como índice


de integração social e como sintoma, ao mesmo tempo, de fusão e de
igualdade raciais”. Ao contrário do que havia demonstrado Freyre,
Fernandes observava que a miscigenação, durante o período colonial,
serviu antes para “aumentar a massa da população escrava e para
diferenciar os estratos dependentes intermediários, que para fomentar a
igualdade racial”.

2 - Confusão entre a existência de padrões de tolerância racial que


imperariam “na esfera do decoro social com igualdade racial propriamente
dita”.
Igualdade racial ainda estaria por ser construída.

“Importa, em primeiro lugar, que se inclua o “negro” e o “mulato” (como


outras “minorias étnicas, raciais ou nacionais”) na programação do
desenvolvimento socioeconômico e nos projetos que visem aumentar a
eficácia da integração nacional. Dada a concentração racial da renda, do
prestígio social e do poder, a “população de cor” não possui nenhuma
vitalidade para enfrentar e resolver seus problemas morais. Cabe ao
governo suscitar alternativas, que viriam, aliás, tardiamente. Nessas
alternativas, escolarização, nível de emprego e deslocamento de
populações precisariam ganhar enorme relevo. Em suma, aí se necessita
de um programa de combate a miséria e a seus efeitos no âmbito dessa
população”.
(FERNANDES, F. O negro no mundo dos brancos. São Paulo: Global, 2007)
“A extinção da escravidão, a universalização
das leis e do trabalho não teriam afetado o
padrão tradicional de acomodação racial; ao
contrário, agiram no sentido de esconder o
racismo”.
(SCHWARCZ, 2009, pp.99-100)
SCHWARCZ, 2009, p. 100
Os anos 1970:

Movimentos de contestação: na política oficial, na literatura,


na música, questionavam-se os valores vigentes.

Movimento Negro Unificado (MNU)


SCHWARCZ, 2009, p.
100
Lei Afonso Arinos – ao punir o preconceito, acabava por formalizar sua
existência. Medida ineficaz contra discriminação (falta de punições mais
severas).

Lei 7.716, de 5 de janeiro de 1989: racismo como crime inafiançável. Seu texto
apresenta reafirmação do “atitudes que preconceito à brasileira” – só são
consideradas discriminatórias atitudes que publicamente levem ao
preconceito: atos privados e ofensas de caráter pessoal não são imputáveis.

SCHWARCZ, 2009, p. 101

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