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UMA AVALIAÇÃO SOBRE O MERCADO DE CARBONO NO BRASIL

Ariel Ramos, 10281970


Pedro Henrique, 5983420

RESUMO

Diante das crescentes demandas por recursos mais sustentáveis, novas


oportunidades comerciais se abrem aos países. O mercado de crédito de carbono pode
ser destacado como uma das alternativas possíveis na obtenção da maior
sustentabilidade almejada. Em meio aos diferentes artigos que analisam o potencial
brasileiro nesse mercado, encontrou-se espaço para explorar uma abordagem
quantitativa baseada na teoria de Heckscher-Ohlin para explicar o possível potencial
brasileiro na obtenção e exportação de créditos de carbono. Como os principais materiais
utilizados, destacam-se alguns artigos e teses que abordam o mercado de crédito de
carbono, os capítulos 5 e 12 do livro Economia Internacional (KRUGMAN, OBSTFELD,
MELITZ, 2015) e a bases de dados disponibilizadas pelo World Input-Output Tables.

INTRODUÇÃO

O debate envolvendo a comercialização de créditos de carbono ganhou projeção


internacional recentemente devido, em boa parte, aos compromissos firmados por 195
países no dia 12 de dezembro de 2015 na Conferência das Nações Unidas sobre as
Mudanças Climáticas (COP21), realizada em Paris. Nesta data, os países se
comprometeram a deter o aumento da temperatura do planeta abaixo dos 2ºC, quando
comparado à temperatura média pré-industrial até 2050.
O acordo foi ratificado em 4 de novembro de 2016 e passou a vigorar em 2020,
substituindo o Protocolo de Kyoto. O acordo assinado em Paris está inserido também na
questão acerca do aquecimento global, tópico esse que anualmente ganha destaque por
representar um grande impacto que é, além de economicamente expressivo, se insere
diretamente no bem estar da população mundial.
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Em razão do acordo, iniciativas voltadas em promover maior sustentabilidade se
fortaleceram. Empresas como Danone, Mercedes-Benz AG, Microsoft Corporation,
Natura, NIKE, Starbucks e Unilever aderiram a diferentes iniciativas, podendo citar a
Transform to Net Zero como uma delas. Dessa forma, torna-se claro que o efeito do
acordo assinado pelos países transcende o âmbito político e passa a se refletir também
em ações de empresas comprometidas a zerar as emissões líquidas de gases que
contribuem com o efeito estufa.
O mercado de crédito de carbono ganha destaque, portanto, justamente por ser
um dos mecanismos possíveis de serem utilizados por empresas e governos que
almejam diminuir e até mesmo zerar as emissões líquidas de gases que contribuem para
o aquecimento global. No Brasil se constatam iniciativas que fomentam o mercado de
crédito de carbono, citando como exemplo o Projeto de Lei 528/21, que institui o Mercado
Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE), que tem como objetivo regulamentar a
compra e venda de créditos de carbono no País.
Dessa forma, entende-se que há oportunidades de se avaliar o potencial do
mercado de créditos de carbono no Brasil em comparação com outros países, fazendo
uso, entre outros materiais, do conteúdo visto na disciplina Economia Internacional I. O
investimento e a comercialização de créditos de carbono abrem espaço para que sejam
feitas discussões sobre o impacto que esse mecanismo representará no comércio
internacional. Dentre as abordagens possíveis, neste artigo será dada maior ênfase ao
Teorema de Heckscher-Ohlin com o objetivo de explicitar o potencial brasileiro na
comercialização de créditos de carbono com outros países.

METODOLOGIA

Serão apresentados dados do World Input-Output Tables, onde são apresentados


dados de 40 países cobrindo 35 setores diferentes entre os períodos de 1995 e 2011
seguindo as normas da Classificação Internacional Normalizada Industrial (International
Standard Industrial Classification). Dentre os mais de 40 países disponíveis na base de
dados, os relatórios do Brasil e do Reino Unido serão mais utilizados como uma forma
de obter uma melhor comparação entre os países de perfil socioeconômico distintos.
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Dentre as dezenas de variáveis disponíveis na base de dados, serão enfatizadas
três variáveis sendo elas: (i) uso de terra (em milhares de hectares) para atividades de
agricultura, caça, silvicultura e pesca; (ii) energia total consumida pelas atividades de
agricultura, caça, silvicultura e pesca; e (iii) emissão de CO² provindas da agricultura,
caça, silvicultura e pesca.
Serão feitos cálculos de correlação e covariância das três variáveis citadas para
os países Brasil e Reino Unido entre os anos de 1995 e 2009. Na sequência, a teoria do
modelo Heckscher-Ohlin será abordada como uma forma de sintetizar o possível impacto
dos números apresentados pelos países comparados no mercado internacional de
crédito de carbono.

O MERCADO DE CARBONO

O desenvolvimento sustentável se revela cada vez mais importante no


desenvolvimento de políticas públicas. Assim como afirmou Junior em seu trabalho
“Análise da potencialidade do mercado de projetos de créditos de carbono no Brasil”:

[...] A preocupação do mercado (considerando todos os stakeholders) com o


desenvolvimento sustentável se revela, dentre outras formas, na elaboração de
indicadores socioambientais, plataformas de elaboração de relatórios de
sustentabilidade e outros modos de divulgação de ações “sustentáveis”. Diante
desta demanda, as empresas têm reagido com projetos em eficiência energética,
restauração de habitats degradados, projetos de redução de emissão de gases
de efeito estufa (GEE), dentre outras ações. Estes projetos visam, dentre outros,
gerar excedentes de carbono (créditos que podem ser negociados) e melhoras
no meio ambiente [...]. (JUNIOR, 2012)

A partir do Protocolo de Kyoto as percepções de que o mercado poderia auxiliar


no processo de redução das emissões dos GEE passaram a ganhar consistência com a
ideia de se criar um valor transacionável para reduções de emissões dos GEE
(BARTHOLOMEU, FILHO, 2001). O referido Protocolo, apesar de ter sido substituído em
2020, oferece três possibilidades para que os países desenvolvidos cumpram suas metas

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de reduções das emissões de GEE (JUNIOR, 2012), sendo que a principal a ser tratada
neste artigo é a chamada Clean Development Mechanism (Mecanismo de
Desenvolvimento Limpo [MDL]). O MDL possibilita que países desenvolvidos realizem
investimentos em projetos de reduções de GEE nos países em desenvolvimento, ou
mesmo, comprem certificados de reduções realizadas em outros países (JUNIOR,
2012).
Para se emitir um título de crédito de carbono, é preciso que se encaminhe um
projeto à AND - Autoridade Nacional Designada (no caso do Brasil a AND está
subordinada ao Ministério da Ciência e Tecnologia – MCT) e que se tenha um registro do
projeto junto ao EB UNFCCC (Executive Board) da Convenção Quadro das Nações
Unidas para mudanças climáticas (FILHO, 2010). Após aprovação do projeto e de suas
reduções de emissões de carbono, são feitas emissões dos títulos com valor de mercado
transacionáveis no mercado financeiro, lastreando fundos de investimentos e outros
produtos financeiros. O preço de cada título corresponde ao valor de mercado de uma
tonelada de CO² equivalente sequestrado ou reduzido da atmosfera.

IMPLICAÇÕES NO MERCADO BRASILEIRO

Segundo a Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias (EMBRAPA), o Brasil


possui diferenciais competitivos na sua matriz energética em relação a países
desenvolvidos. Um relatório publicado em 2007 pela EMBRAPA apontou que, no Brasil,
45% de todo o consumo de energia provém de fontes renováveis, enquanto os EUA e
países membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE) apresentaram média pouco superior a 6% de fontes renováveis nas respectivas
matrizes energéticas. Tal cenário indica que o Brasil se apresenta como menos
vulnerável a crises de escassez de combustíveis fósseis e mais próximo ou alinhado com
uma política energética “verde” (FILHO, 2010).
Somado a isso, um estudo mais recente promovido pelo Laboratório de
Processamento de Imagens e Geoprocessamento da Universidade Federal de Goiás
(Lapig/UFG) apontou para uma expressiva redução no número de propriedades com
áreas de pastagens com degradação severa e moderada entre 2010 e 2018 no Brasil. O
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estudo teve como objetivo fazer o acompanhamento do Plano ABC (Agricultura de
Emissão de Baixo Carbono) principalmente em regiões de pastagens brasileiras.

Figura 1: Comparação de matrizes energéticas (2007)

Fonte: EMBRAPA

O estudo apontou que, no período de 2010 a 2018, foram recuperados 26,8


milhões de hectares de pastagens degradadas. A nível de comparação, a área
recuperada é maior que o território do Reino Unido, que tem aproximadamente 24,2
milhões de hectares. Considerando que áreas de pastagens e de reflorestamento
apresentam grandes potenciais para se resgatar carbono, pode-se inferir que o Brasil
apresenta oportunidades de explorar o mercado de crédito de carbono.
Para contribuir na elucidação da oportunidade brasileira, foram feitas as análises
de covariância e correlação das variáveis (i) uso de terra (em milhares de hectares) para
atividades de agricultura, caça, silvicultura e pesca; (ii) energia total consumida pelas
atividades de agricultura, caça, silvicultura e pesca; e (iii) emissão de CO² provindas da
agricultura, caça, silvicultura e pesca, entre o Brasil e o Reino Unido a partir dos dados
disponibilizados pelo World Input-Output Tables.

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ANÁLISE DOS DADOS

Quando se analisou a base de dados do Brasil e do Reino Unido, se observou


que, entre períodos de 1995 e 2009, ambos os países demonstraram correlações entre
o uso de terra (em milhares de hectares) para atividades de agricultura, caça, silvicultura
e pesca com os níveis de emissão de CO² provindas das mesmas atividades, sendo as
correlações iguais a [0.90] e [0.70] respectivamente. Se tratando da comparação entre a
energia total consumida pelas atividades de agricultura, caça, silvicultura e pesca com a
emissão de CO² provindas das mesmas atividades, também se observa correlações entre
os anos de 1995 e 2009, tanto no Brasil quanto no Reino Unido, na ordem de [0.71] e
[0.41] respectivamente. Maiores detalhes estão disponíveis no anexo 1.
As correlações mencionadas evidenciam que as atividades de agricultura, caça,
silvicultura e pesca contribuem, mesmo que com magnitudes diferentes, com a maior
emissão de CO² e com o maior uso de terra. De maneira análoga, os principais escopos
setoriais de projetos de MDL no Brasil são: indústria energética, energia renovável,
eficiência energética e substituição de combustíveis e reflorestamento. Dessa forma, as
atividades mencionadas acima representam oportunidades de resgate de créditos de
carbono tanto ao Brasil quanto ao Reino Unido. No entanto, assim como evidenciado
pelos dados trabalhados, o Brasil apresentou em 2009, áreas de atividades de
agricultura, caça, silvicultura e pesca 2552% maiores em comparação com o Reino
Unido. Em termos absolutos, no mesmo ano o Brasil utilizava uma área de
aproximadamente 508.579 (em milhares de hectares) nas atividades mencionadas,
enquanto que o Reino Unido utilizava áreas de aproximadamente 19.931 (em milhares
de hectares). Dessa forma, mais do que se analisar a correlação entre as variáveis
estudadas, observa-se que, considerando que a obtenção de créditos de carbono seja
intensiva em terra, o Brasil apresenta grandes oportunidades de se resgatar créditos de
carbono, e ainda, exportá-los.

APLICAÇÕES DO MODELO HECKSCHER-OHLIN

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A teoria da proporção dos fatores, muitas vezes referida como a teoria de
Heckscher-Ohlin, defende que o comércio internacional é em grande parte impulsionado
pelas diferenças de recursos dos países. Assim como no capítulo 5 do livro Economia
Internacional, será considerado a versão mais simples do modelo de Heckscher-Ohlin:
serão considerados apenas dois países: Brasil e Reino Unido; serão considerados dois
bens: o bem crédito de carbono e o bem tecido; e serão considerados dois fatores de
produção: o fator terra e o fator trabalho. Pelos resultados apontados pelos dados trazidos
nos tópicos anteriores, pode-se inferir que, na comparação entre o Brasil e o Reino Unido,
o Brasil apresenta o fator terra como um fator abundante, enquanto o Reino Unido
apresenta o fator terra como um fator escasso. Analogamente, será suposto, a nível de
exemplificação, que o Brasil apresenta escassez no fator trabalho, e, por sua vez, o Reino
Unido apresenta abundância deste fator.

Teorema de Heckscher-Ohlin: o país que é abundante em um fator exporta o bem


cuja produção é intensiva nesse fator. (KRUGMAN, OBSTFELD, MELITZ, 2015)

Associando as suposições mencionadas acima com o teorema, pode-se inferir que


o Brasil tende a produzir mais créditos de carbono por apresentar abundância no fator
terra, que por sua vez é o fator utilizado intensivamente na produção do crédito de
carbono. Como os países tendem a exportar bens nos quais são intensivos nos fatores
com os quais são fornecidos abundantemente, pode-se inferir ainda que o Brasil
exportará crédito de carbono.
No entanto, vale ressaltar que mesmo com a teoria de Heckscher-Ohlin prevendo
a obtenção da equalização dos preços dos fatores no longo prazo, a realidade observada
na verdade mostra uma equalização incompleta dos preços de fatores, em função de
grandes diferenças de recursos, barreiras ao comércio e diferenças internacionais de
tecnologias. Essas razões explicam, mesmo que em partes, porque o Brasil não se coloca
como um grande exportador de crédito de carbono atualmente.
Há outras razões que explicam o porquê do Brasil não despontar como um país
exportador de crédito de carbono. A suposição de que o crédito de carbono é intensivo
no fator terra é uma suposição forte, pois há todo um procedimento técnico envolvido a

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cada projeto proposto de emissão de crédito de carbono, bem como investimentos de
capital consideráveis. Como um outro exemplo dos desafios envolvendo o mercado de
carbono internacional, está a discussão sobre as tarifas de importação. A imposição de
tarifas de importação de crédito de carbono poderia evitar que indústrias de países
europeus, por exemplo, se deslocassem para países onde fosse mais barato se tornar
“mais verdes e sustentáveis”. Dentro do mesmo debate, é possível que também haja
retaliações entre países no comércio internacional pautadas em crédito de carbono. No
mercado de crédito de carbono, assim como mencionado no capítulo 12 do livro
Economia Internacional, ainda residem muitas controvérsias e incertezas sobre quais
países efetivamente vão se beneficiar da comercialização de créditos de carbono.

CONCLUSÕES

Considerando que a diferença de dotação de fatores entre os países influencia em


grande parte o comércio internacional e considerando ainda que os créditos de carbono
são bens intensivos no fator terra, o teorema Heckscher-Ohlin pode ser usado sim para
defender a competitividade brasileira neste mercado. De acordo com o teorema, o Brasil
teria condições de se tornar um país exportador de créditos de carbono diante de sua
abundância em terra.
No entanto, quando se considera que algumas suposições feitas são fortes e não
observadas, o que se espera é que o Brasil tenha maiores desafios em exportar créditos
de carbono. Como exemplo, pode-se citar o fato de o crédito de carbono ser obtido a
partir de uma quantidade razoável de capital e tecnologia. Outros fatores como taxações
a importação de crédito de carbono de países em desenvolvimento, e com preços
ecologicamente mais competitivos, também se impõe como um grande desafio ao
comércio internacional dos créditos de carbono. Finalmente, o comércio de créditos de
carbono pode ser destacado como um grande aliado na obtenção de uma maior
sustentabilidade entre países e indústrias, mesmo que ele apresente, atualmente,
grandes controvérsias.

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REFERÊNCIAS

BARTHOLOMEU, D. B.; FILHO, J. V. C; Riscos e oportunidades de investimento no


mercado de créditos de carbono, 2001.
CÂMARA DOS DEPUTADOS, Comissão aprova proposta que regulamenta mercado
de negociação de créditos de carbono, Disponível em:
https://www.camara.leg.br/noticias/775240-comissao-aprova-proposta-que-regulamenta
mercado-de-negociacao-de-creditos-de-carbono/. Acesso em: 25 de jul. 2021

ESTUDO mostra redução de 26,8 milhões de hectares de pastagens degradadas


em áreas que adotaram o Plano ABC. Disponível em:
<https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/noticias/estudo-mostra-reducao-de-26-8-
milhoes-de-hectares-de-pastagens-degradadas-em-areas-que-adotaram-o-plano-abc>.
Acesso em: 08 de jun. de 2021.

FILHO, D. F. S.; Riscos e oportunidades de investimento no mercado de créditos de


carbono, 2010.

KRUGMAN, Paul R.; OBSTFELD, Maurice; MELITZ, Marc J.; Economia Internacional:
Controvérsias na política comercial. 10. ed. São Paulo: Pearson, 2015. p. 226-243

KRUGMAN, Paul R.; OBSTFELD, Maurice; MELITZ, Marc J.; Economia Internacional:
Recursos e comércio: o modelo de Heckscher-Ohlin. 10. ed. São Paulo: Pearson, 2015.
p. 67-92

MAPA lança bases para promoção da agricultura de baixo carbono até 2030.
Disponível em:
<https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/noticias/Mapa-lanca-bases-para-
agricultura-de-baixo-carbono-ate-2030>. Acesso em: 08 de jun. de 2021.

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REIS JUNIOR, J. A.; Análise da potencialidade do mercado de projetos de crédito
de carbono no Brasil. 2012, 95f. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Economia,
Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão
Preto, 2012

REZENDE, B. B.; O mercado de créditos de carbono como um incentivo a um


modelo energético e climático sustentável, 2008.

SANTOS, D. S.; Os benefícios do mercado internacional de comércio de créditos de


carbono para o Brasil, 2011.

TRANSFORM TO NET ZERO, Net Zero by 2050, Disponível em:


https://transformtonetzero.org/. Acesso em: 25 de jul. 2021

ANEXO 1 – CÁLCULOS COM BASE DE DADOS

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