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WINNICOTT

Winnicott destaca vários aspectos no processo de análise, como o holding, a regressão


à dependência e o uso de objetos, revela a importância do papel do analista para além da
interpretação. Winnicott realiza uma distinção fundamental entre um recurso técnico, a
interpretação, e a realização de um trabalho de análise, explicando que o processo de análise
não se restringe à interpretação.
Transtorno Psicossomático não é o estado clínico expresso em termos de patologia
somática ou funcionamento patológico (colite, asma, eczema crônico), mas sim a persistência
de uma cisão na organização do ego do paciente, ou de dissociações múltiplas. As
dissociações do próprio médico precisam ser consideradas juntamente com as dissociações
nas personalidades dos pacientes.
Muitos pacientes não dividem o seu cuidado médico em duas partes; a cisão se dá em
fragmentos múltiplos, e nós, os médicos, nós descobrimos agindo no papel de um desses
fragmentos. Somente a continuação do tratamento tem utilidade no caso real e, no caso real e,
no decorrer do tempo, o paciente cuja existência estou postulando pode vir a aliviar-me do
dilema em que sua doença me coloca.
A enfermidade psicossomática é o negativo de um positivo, com este último sendo a
tendência no sentido da integração de vários de seus significados, inclusive aquele a tendência
no sentido da integração em vários de seus significados. O positivo é a tendência herdada que
cada indivíduo tem de chegar a uma unidade da psique e da soma, uma identidade
experiencial do espírito, ou psique, e da totalidade do funcionamento físico. Uma tendência
conduz o bebê e a criança no sentido de um corpo que funciona, no qual e a partir do qual se
desenvolveu uma personalidade que funciona, completa com defesas contra a ansiedades de
todos os graus e espécies. A cisão entre psique e soma é um fenômeno regressivo que
emprega resíduos arcaicos no estabelecimento de uma organização de defesa.
Naturalmente, quando a personalidade se acha dissociada, as dissociações no meio
ambiente são exploradas pelo indivíduo. Exemplo disso seria o uso que se possa fazer de uma
tendência na mãe no sentido da desintegração ou despersonalização, da discórdia dos pais, do
rompimento da unidade familial ou do antagonismo (especialmente o antagonismo
inconsciente) entre família e escola. Da mesma maneira, faz-se uso das cisões (a que me
referi) na questão da provisão médica.
As doenças crônicas da pele acham-se relacionadas, de maneira obscura, ao transtorno
psicótico da mente. Exemplo desta ansiedade impensável é o estado no qual não existe
moldura no quadro, nada para conter o entrelaçamento de forças na realidade interna psíquica
e, em termos práticos, ninguém para sustentar o bebê. Uma paciente, mulher de meia-idade,
chegou a um reconhecimento muito completo deste estado de coisas em si mesma e conseguiu
adicionar ao quadro clinico certos detalhes que possuem valor para mim, como observador.
Juntamente com várias formas de prurite crônica, algumas a aparecerem de modo espontâneo
e outras produzidas ou exageradas pelo coçar, a paciente identificou outras maneiras que tinha
de manter-se em seu corpo. Na cama, nunca fica parada. Sempre dá um jeito para que todos
os seus músculos se encontrem tensionados. Sentira que havia sido incapaz de participar do
rito religioso que tinha a ver com um novo bebê, porque todo ele se achava vinculado ao
momento de separação entre um bebê e a mãe.
Nessa sessão relacionou-se com a necessidade que esta paciente tem de lidar com o
tema da separação em termos simplesmente da cicatriz existente tanto nela quanto na mãe. A
parte que unia as duas está faltando em ambas. Esta forma de separação teve de ser
plenamente explorada nesta paciente, após o que haverá (como já podemos ver) um retorno à
exploração da separação em termos de raiva, mordidas e outras formas de agressão.
É necessário que a análise propicie as condições que faltaram nos momentos das
falhas ambientais e que impediram o desenvolvimento saudável. Ainda se leva em
consideração que cada período do amadurecimento requer condições diferentes, o que leva a
modificações no trabalho de análise de acordo com as necessidades de cada paciente em
relação a determinado ponto do amadurecimento. A análise é vista como a satisfação das
necessidades com base na noção de holding, o que mostra outra forma de trabalho na qual, até
então, o principal instrumento de trabalho era a interpretação.
Winnicott postula que, em determinadas situações clínicas, as interpretações relativas
ao conteúdo da sessão produziriam um efeito nocivo quando se considera, por exemplo, a
intrusão que uma interpretação transferencial clássica representaria ao mostrar o analista
como outro não-eu para um paciente que o necessita, ainda, como fazendo parte de si mesmo.
Nesse caso, o analista teria sido um mau analista fazendo uma boa interpretação.
A experiência da transferência em Winnicott configura, assim, um arriscado desafio,
sem dúvida, no qual é preciso poder odiar e se deixar odiar/destruir, sobrevivendo a esse
movimento emancipatório do analisando, sem abandono nem retaliação. O desafio consiste
em poder desapegar-se dos sentidos de si já constituídos para habitar junto com o analisando a
“terceira área da experimentação” que faz, do encontro afetivo, criação.

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