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Sociedade e
Cultura
NÚCLEO COMUM 1
UNIVERSIDADE
Núcleo de Educação a Distância
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TOJI, Simone.
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CDD 657
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PLANO DE ENSINO
EMENTA
Os conceitos de sociedade e cultura segundo a sociologia e antropologia.
Diversidade cultural e direitos humanos. Diversidade religiosa, gênero, raça e etnia
na sociedade contemporânea. Questões culturais, identidade cultural e conflitos na
sociedade contemporânea.
OBJETIVO GERAL
Apresentar e discutir as principais correntes e autores antropológicos
contemporâneos.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
UNIDADE I
Apresentar alguns conceitos fundamentais que auxiliam a compreensão da
sociabilidade humana. Discutir e relacionar temas sobre a especificidade humana
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CONTEÚDO PROGRAMÁTICO
UNIDADE I
Natureza, cultura e poder
Parentesco, mito e ritual
Etnocentrismo e relativismo cultural
Antropologia como ciência
Antropologia urbana
Antropologia econômica e política
Antropologia de gênero
Antropologia biológica e da família
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UNIDADE II
Durkheim e Mauss: a ordem e o fato social
Estrutural-funcionalismo inglês e a antropologia social
Bronislav MalInowski
Radcliffe-Brown e Pritchard: as organizações políticas africanas
O estruturalismo francês
Lévi-Strauss e a antropologia do pensamento humano
Os norte-americanos e a antropologia cultural
Antropologia cultural: Franz Boas e Ruth Benedict
UNIDADE III
Diversidade cultural: discussões sobre uma nação miscigenada
Os ensaístas
A institucionalização do pensamento antropológico no Brasil
Alienação e cultura
Florestan Fernandes: da antropologia dos povos indígenas ao estudo das classes
Roberto da Matta: carnavais, malandros e heróis
A tradição dos estudos de antropologia rural no Brasil
Estudos contemporâneos sobre etnologia
UNIDADE IV
Formação étnica e histórica do Brasil
O sentido da colonização
As teorias raciais do século XIX e a questão racial
Origens do racismo brasileiro
O sentido dos movimentos populares e o exemplo dos movimentos negros no Brasil
A trajetória dos movimentos negros no Brasil (1º e 2º períodos)
A trajetória dos movimentos negros no Brasil (3º período)
Uma reflexão sobre os direitos humanos
BIBLIOGRAFIA BÁSICA
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BOAS, Franz. Antropologia Cultural. Rio Janeiro: Jorge Zahar Editores, 2010.
DA MATTA, Roberto. Relativizando: Uma introdução a antropologia social. Rio de
Janeiro: Rocco, 2010
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR:
DIWAN, Pietra. Raça Pura: uma história da eugenia no Brasil e no mundo. São
Paulo: Contexto, 2007
GOMES, Mércio Pereira. Os Índios e o Brasil: passado, presente e futuro. São
Paulo: Contexto, 2012
CASTRO, Celso. Evolucionismo Cultural: textos de Morgan, Tylor e Frazer Rio
de Janeiro: Jorge Zahar editores, 2005.
WHYTE, William Foote. Sociedade de Esquina: a estrutura social de uma área
urbana pobre e degradada. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editores, 2005.
METODOLOGIA:
A disciplina está dividida em unidades temáticas que serão desenvolvidas por meio
de recursos didáticos, como: material em formato de texto, vídeo aulas, fóruns e
atividades individuais. O trabalho educativo se dará por sugestão de leitura de
textos, indicação de pensadores, de sites, de atividades diversificadas, reflexivas,
envolvendo o universo da relação dos estudantes, do professor e do processo
ensino/aprendizagem.
AVALIAÇÃO:
A avaliação dos alunos é contínua, considerando-se o conteúdo desenvolvido e
apoiado nos trabalhos e exercícios práticos propostos ao longo do curso, como
forma de reflexão e aquisição de conhecimento dos conceitos trabalhados tanto na
parte teórica como na prática e habilidades. Prevê ainda a realização de atividades
em momentos específicos como fóruns, chats, tarefas, avaliações a distância e
Prova Presencial, de acordo com a Portaria de Avaliação vigente. A Avaliação
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Presencial, está prevista para ser realizada nos polos de apoio presencial, no
entanto, poderá ser realizada em home seguindo as orientações das autoridades da
área da saúde e da educação e considerando a Pandemia COVID 19.
Sumário
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a forma como o ser humano pensa. Por quê? Porque a mesma regra social que
evoca a forma como organizamos culturalmente a vida social também evoca a
capacidade humana de pensar, de criar grupos, classificar e refletir o mundo.
Segundo Lévi-Strauss, não somente a ciência moderna faz essa separação
entre o que é causa natural e o que é causa sociocultural, ou seja, sobre o que
corresponde ao mundo natural e o que corresponde ao mundo que os seres
humanos criam. Outros povos fazem esse tipo de separação e refletem essa
capacidade humana essencial de se distanciar daquilo que é natural. A ação do
homem sobre a natureza expressa uma separação entre sua parte natural (enquanto
parte dela) e sua parte cultural. O homem é o único animal capaz de criar cultura
sistematicamente e viver a partir dessa realidade que ele próprio cria, não somente
das condições naturais. A natureza não explica, por exemplo, porque roupas e joias
significam status social ou, simplesmente, porque os seres humanos vivem sob a
perspectiva de alguma religião.
Nós, assim como outros povos, notamos essa capacidade estritamente
humana de criar Cultura e refletimos sobre ela. Para Lévi-Strauss, não é à toa, por
exemplo, que muitos mitos ameríndios dedicam-se ao tema da relação do homem
com o fogo ou mesmo dedicam-se ao tema do tabu do incesto, por exemplo. O fogo,
o cozimento, as construções, a vida sociedade, as regras sociais são temas que
expressam a capacidade humana de não somente agir sobre a natureza através do
trabalho, mas também de criar cultura e refletir sobre ela.
O humano tem toda sua vida mediada por essa segunda realidade que é a
cultura. Um bom exemplo é o próprio parentesco: o parentesco não somente regula
nosso comportamento com os outros, mas influencia a forma como pensamos o
próprio “outro”. É como se todo nosso olhar sobre o mundo fosse moldado por aquilo
que a cultura, portanto, aquilo que a vida em sociedade, permite que vejamos.
Isso implica, inclusive, no fato de que a forma como pensamos a própria
distância entre o ser humano e a natureza depende de nossa cultura e nossa vida
em sociedade.
3. Cultura e Poder
Podemos entender cultura como uma dimensão do processo social e utilizá-la
como um instrumento para compreender as sociedades contemporâneas. A cultura
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medida em que distorce a maneira de ver outras culturas, sobretudo quando usado
ideologicamente como base para opressão social.
Para fazer observações sobre uma cultura alheia é necessário conhecer os
significados dessa linguagem, senão, tenderemos a analisar as outras visões de
forma preconceituosa, pois estaremos observando signos dos quais ou temos
conceitos diferentes ou nem mesmo conhecemos. Assim começamos a classificar
culturas superiores e culturas inferiores. A primeira é a “nossa” cultura, a que segue
o nosso padrão, a que fala a nossa linguagem, age e pensa como nós. Já a segunda
é a que deve ser destruída por ser “atrasada”, ignorante por não conhecer a nossa
visão. Como na nossa sociedade quem regula a ordem social é a classe dominante,
essa é que irá impor a sua “cultura superior” - a cultura da “elite”.
2. Relativismo cultural
“Enquanto a etnografia inglesa era construída como uma
descrição intensiva da sociedade como uma unidade de tempo
e espaço em laboratórios-ilhas na fronteira, a etnografia
boasiana-kroeberiana podia aplicar-se a tarefas de salvamento
cultural, e no limite, podia se converter na colaboração com um
único informante ou na exposição de sobreviventes. Mas foi
também uma antropologia formadora de uma cultura pluralista,
antirracista e tolerante, em oposição às tendências racistas,
xenófobas e eugenistas da época.” (ALMEIDA, 2004, p. 67)
Franz Boas, um dos pais antropologia cultural que estudaremos na Unidade
II, é considerado fundador da postura que hoje chamamos de relativista e este autor
desenvolveu seus estudos procurando mostrar que cada cultura tem sua forma de
conceber e significar a realidade. Tal disposição permite pensar numa política de
relacionamento com o outro que é totalmente oposta ao etnocentrismo.
Segundo Boas, para que compreendamos o que as diferentes culturas
querem dizer e para que entendamos realmente a singularidade de cada cultura, é
preciso adotar uma postura relativista. Boas parte de uma crítica às teorias racistas
e ao evolucionismo cultural e influência positivista. Esteve em contato com um
contexto de pesquisa das culturas dos povos nativos norte-americanos que era
bastante distinto daquele vivido pelos antropólogos ingleses em suas pesquisas de
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diferentes aspectos da estrutura social e cultural desse povo que foi descrita em
diferentes livros, dentre eles, Argonautas do Pacífico Ocidental, que ficou famoso
por descrever o cerimonial de trocas entre as ilhas, chamado de Kula.
Outro antropólogo que buscou conviver com os grupos que pretendia estudar
e descrever o “ponto de vista nativo” foi Evans-Pritchard, que viveu entre os Nuer e
os Azande, povos da África Central. Assim como Malinowski, Evans-Pritchard
descreveu o modo de vida, a cultura e os diferentes aspectos que constituem as
estruturas sociais desses povos em suas monografias, dentre elas Os Nuer e
Bruxaria, Oráculos e Magia entre os Azande.
Os trabalhos escritos por esses autores têm em comum mais do que o fato
deles terem vivido com os povos que estudaram: eles procuram descrever a
estrutura social desses grupos não somente abstraindo as formas como se
relacionam socialmente e constroem suas instituições culturais e sociais, mas
buscando compreender o valor e o significado que esses povos dão para tais
instituições. Não é aleatório o fato do livro Argonautas do Pacífico Ocidental partir da
descrição e interpretação das cerimônias de troca entre as ilhas ou do livro Bruxaria,
Oráculos e Magia entre os Azande descrever a bruxaria como característica especial
da sociedade Azande. Descrever a cultura e a sociedade de um povo a partir da
pesquisa de campo na Antropologia é levar em consideração aquilo que os grupos
estudados falam sobre si próprios, aquilo para que dão importância, é levar em
consideração como eles próprios falam de si. Isso significa que o trabalho de campo
participante depende de um olhar de dentro para fora e do domínio dos códigos para
a compreensão dos significados que os sujeitos dão para suas próprias ações.
Vivendo com os habitantes das ilhas Trobriand, Malinowski notou que as
atividades econômicas de troca eram como pontos de confluência das atividades
políticas, religiosas, de parentesco, por isso sua monografia sobre a estrutura
sociocultural dos Trobriandeses leva em consideração a importância dessas
atividades para o povo local. Da mesma forma, Evans-Pritchard nota que a bruxaria
rege todas as relações sociais, políticas, econômicas, culturais dos Azande, sendo
preocupação recorrente do cotidiano desse povo e, por isso, escolhida como tema
para descrever sua estrutura sociocultural.
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italiana de Cornerville. Whyte começa seu contato com os grupos de poder pelos
garotos das esquinas, as pequenas gangues de garotos que faziam serviços para os
gangsters ou que simplesmente se dedicavam a atividades ilegais (como as apostas
e jogos de esquinas). Sabendo que sua entrada na comunidade deveria partir de um
convívio cotidiano, o autor mudou-se para o bairro, sendo acolhido por uma família
local.
Depois de anos morando em Cornerville, Foote Whyte notou uma estrutura
muito complexa de relações entre gerações e entre subgrupos. Os garotos das
esquinas eram de uma primeira geração de imigrantes italianos nascida na América.
Os garotos que frequentavam círculos sociais dos clubes e faculdades também. Os
mais velhos ainda viviam mais isolados do universo cultural americano. O conflito de
gerações levava os garotos para as ruas e para as instituições legais ou ilegais que
os permitia ter uma vida americanizada. Por sua vez, a estrutura de atividades
ilegais se sustentava pelo carisma e pelo poder daqueles que se envolviam na
administração geral das atividades ilegais, carisma e poder que era reconhecido
pela comunidade. Toda a estrutura inferior sustentava os gangsters e muitos deles
limpavam sua imagem com o poder que exerciam entre a polícia e, inclusive, na
política.
Reconhecido como um bairro italiano violento de periferia, Cornerville se
mostrava muito mais complexo pelas descrições de Whyte. Primeiramente, as
instituições assistenciais não alcançavam os garotos das gangues, somente aqueles
que buscavam ascensão social pela educação. Acontece que todo o sistema de
operações ilegais era sustentado justamente pela juventude não assistida. Além
disso, dentro da comunidade esses jovens não necessariamente representavam um
papel negativo, pelo contrário, muitos deles agiam mais como italianos que os
jovens formados. Por outro lado, eram justamente as instituições políticas e policiais
que permitiam que os grandes chefões das atividades ilegais continuassem agindo
na ilegalidade ou na legalidade. Todo o sistema dependia dos garotos das esquinas
e se retroalimentava na política.
Com suas análises, Whyte mostrou a economistas que a sociedade e a
cultura se organizam em relação à pobreza. Mostrou aos políticos e assistentes
sociais que as políticas públicas não alcançavam a estrutura de relações que
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dentre grupos intimamente presos a terra. Portanto, não é a autoridade política que
explica, tão pouco, a sedentarização.
A Antropologia Política de Pierre Clastres, portanto, nos diz que não
necessariamente as relações políticas são expressas por essa visão de que o ser
humano é mau ou individualista por natureza e por isso precisa de uma autoridade
que oriente sua vida em sociedade. Tão pouco é uma característica universal ao
poder essa capacidade de instaurar-se perpetuamente criando desigualdade,
hierarquia e dominação. Essa é a visão de certa sociedade sobre o poder, o que
implica que não necessariamente as relações políticas implicam em dominação.
Nesse ponto, retornamos ao que nos disse Karine Kurschinir: “A abordagem
da política pela antropologia pode ser definida de uma forma simples: explicar como
os atores sociais compreendem e experimentam a política” (idem). A Antropologia
nos ensinou que cada grupo experiência a política de forma distinta e que qualquer
tomada de decisão quanto à vida política de uma população deve partir dessa
experiência. Muitas políticas públicas experimentaram o fracasso justamente porque
se sobrepuseram a alguns grupos os ideais políticos de sua própria sociedade:
cooperativas, reservas, políticas de assistência não foram eficientes porque não
alcançaram os significados locais para as relações políticas. Isso vale não somente
para populações tradicionais, populações indígenas, povos rurais, mas também
grupos urbanos, marginalizados e periféricos.
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marcada pela dominação de homens sobre mulheres e, além disso, essa dominação
foi necessária ao desenvolvimento da civilização como a conhecemos.
Mais tarde, inspirado em Morgan, Friedrich Engels (1820-1895) escreve A
origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado, livro em que estuda a
relação entre trabalho e civilização dentro da história evolutiva da humanidade.
Engels discorda de Morgan no que se refere à participação das mulheres na
construção da civilização, dizendo que a fixação à terra depende eminentemente
das mulheres e que é muito mais provável que as primeiras organizações familiares
e sociais tenham sido matriarcados. Com essa argumentação, Engels ganhou a
atenção dos estudos feministas na segunda metade do século XX. São os estudos
feministas os primeiros a considerarem especificamente uma Antropologia de
Gênero.
O livro que inaugura essa preocupação das feministas em questionar as
relações assimétricas entre homens e mulheres, ou o lugar da mulher na sociedade,
é O segundo Sexo, da filósofa e escritora francesa Simone de Beauvoir (1908-1986).
A autora foi uma das primeiras a destacar, em um estudo minucioso e
interdisciplinar, que a noção de feminilidade naturalizada como característica
genética da mulher é, na verdade, uma condição cultural e social inventada, ou,
como diriam os antropólogos, cultural e histórica. A autora nos mostrou que dentro
da sociedade moderna, a assimetria suposta entre homens e mulheres instaura-se
como natural e esse pressuposto cultural se expressa inclusive nos estudos
filosóficos, biológicos e antropológicos, como é o caso de Morgan. Além disso,
segundo Beauvoir, “não se nasce mulher, torna-se mulher”, ou seja, é a sociedade
que molda ao longo da vida aquelas características que serão consideradas e
requisitadas como características essenciais a uma mulher.
Estudos feministas foram, portanto, os primeiros a questionarem as
pressuposições existentes nas características de gênero e, com isso, começaram
uma série de estudos que nos permitem hoje não somente relativizar as relações
entre mulheres e homens, mas também relativizar a relação da sociedade com
pessoas que fogem às classificações gerais, como os homossexuais ou transexuais.
Por algum tempo, devido a essa influência, os estudos de gênero foram
praticamente marginalizados como estudos de mulheres sobre mulheres, já que as
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uma teoria geral da Magia, Ensaio sobre a dádiva e As técnicas do corpo, reunidos
no livro Sociologia e Antropologia, com prefácio escrito por Lévi-Strauss.
Não se propondo a delimitar conceitos e ferramentas especificamente
sociológicas, Mauss permitiu-se dialogar com diferentes campos do conhecimento,
aproximando e distanciando a Antropologia e a Sociologia da Psicologia, da
Economia e mesmo da Geografia. Mesmo influenciado pela sociologia da escola
francesa, Mauss inovou ao propor, por exemplo, a noção de fato social total,
considerando não somente que há fatos que são sociais e culturais, mas também
considerando que há fatos sociais tão complexos que expressam a totalidade das
relações sociais e culturais construídos por diferentes povos. Se Durkheim mostrou-
se preocupado em construir conceitos que nos explicassem a relação entre indivíduo
e coletividade, Mauss mostrou-se preocupado também com as particularidades
culturais e o universo social dos povos considerados pelos evolucionistas como
primitivos.
A sua leitura de fato social total mostra-se muito interessante para pensarmos
como diversas instituições sociais podem estar representadas em um simples ato,
como o da troca ritual. É esse o objeto de sua pesquisa e de seu Ensaio sobre a
dádiva: forma e razão da troca nas sociedades arcaicas, em que analisa dados de
diferentes sociedades, da Escandinávia até a Polinésia, para encontrar os elementos
e razões comuns daquilo que o autor chama de economia das sociedades arcaicas.
Estudando dados sobre os costumes de diferentes povos pelo mundo, Mauss
reconheceu nas relações de troca um exemplo de fato social total, porque
considerou que diferentes instituições sociais estariam representadas nos ritos e
atos de troca entre os grupos ou os sujeitos dentro desses povos. As trocas seriam
reguladas por costumes religiosos, por relações de parentesco, por crenças e por
relações políticas ao mesmo tempo em que representavam as relações produtivas
das sociedades estudadas. Nesse sentido, podemos dizer que, diferentemente de
autores evolucionistas e deterministas, Mauss considera que as relações produtivas
não estão diretamente ligadas às necessidades de sobrevivência, sendo mediadas
pelas construções sociais e culturais dos povos. Além de contrapor-se aos
deterministas e concordar com os nascentes sociólogos ao dizer que há causas que
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Tendo uma leitura das relações sociais influenciada por Durkheim, o estrutural
funcionalismo de Radcliffe-Brown discorda do evolucionismo assim como a
sociologia durkheiminiana, apesar de ambos fazerem referências a termos já
discutidos por esses autores, como a noção de estrutura e de função.
Uma das principais posturas do estrutural funcionalismo é analisar as
sociedades a partir da relação funcional entre as instituições que a compõem, sendo
que cada sociedade, enquanto organismo independente, pode ser vista como uma
estrutura funcional única. A observação etnográfica, ou seja, a observação da forma
como os sujeitos em dada sociedade se relacionam e se organizam socialmente,
deve partir do presente e não buscar classificar e comparar sociedades e povos no
tempo, como fazem os evolucionistas culturais e sociais. Essa é uma das premissas
principais do trabalho de campo antropológico, defendido por Malinowski, em que o
observador deve viver com os povos que está estudando e descrever a realidade
presente observada. É, portanto, com o presente etnográfico observável que essa
corrente do pensamento antropológico está preocupada e não com uma suposta
história evolutiva humana.
Além disso, assim como Durkheim, Radcliffe-Brown e os demais autores do
pensamento antropológico inglês consideram as diferentes sociedades a partir de
suas regras funcionais internas e essa consideração carrega consigo uma forma de
ver os diferentes povos que critica a maneira como a antropologia evolucionista os
pensou. Os estrutural-funcionalistas ingleses estão preocupados em entender como
as sociedades sobrevivem no tempo, como os diferentes povos criam formas de
relacionamento e organização social que os permitem reconhecerem-se enquanto
unidade política, econômica, social e cultural. Em outras palavras, os estrutural-
funcionalistas estão preocupados em abstrair a estrutura social que sustenta as
formas de vida que são típicas dos diferentes povos e permitem reconhecerem-se
enquanto grupo diferenciado.
Notem que, para esses autores, a diversidade cultural e social é um fato
observável: os povos com os quais estão postos em contato possuem seus próprios
costumes e se organizam segundo regras sociais próprias que os fazem existir
enquanto grupo. Tais regras e formas de organização sociais compõem aquilo que
esses autores chamarão de estrutura social e tal estrutura pode ser abstraída pois
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com estudos sobre a relação entre cultura material e economia. Nesse livro,
Malinowski descreve desde a construção ritualizada da canoa, que servirá de
transporte em um processo de troca cerimonial entre as ilhas, chamado Kula, até as
cerimônias e festas em que as trocas são realizadas, nos mostrando como a
reciprocidade esperada no processo de troca é ritualizada e, portanto, mediada por
diferentes aspectos da vida cultural.
O Kula é um cerimonial entre as ilhas do pacífico sul, em que conchas
vermelhas são trocadas em um dos sentidos circulares das visitas e conchas
brancas são trocadas no outro sentido (anti-horário e horário, respectivamente). Os
trobriandeses trocavam joias feitas de conchas que tinham valor significativo
enquanto objeto de status e a troca era o marco das relações estabelecidas entre as
ilhas e uma forma de representar e manter as relações de reciprocidade que
sustentavam a vida sociocultural e econômica desse povo.
Malinowski nota que a vida econômica é regrada pelo universo cultural e que
a produção e a troca são mediadas por relações políticas e de parentesco. Em
várias partes do livro, o autor mostra-se preocupado em descrever os elementos
básicos da alimentação e da vida material dos trobriandeses, mas acaba
encontrando, nessa procura, a mediação do universo cultural.
Assim como outros autores estrutural-funcionalistas, Malinowski estava
preocupado em encontrar as razões pelas quais os habitantes das ilhas Trobriand se
reconheciam como um grupo e também quais relações os mantinham unidos ao
longo do tempo. O autor encontrou na reciprocidade das relações de troca uma
resposta para seus questionamentos nesse sentido. Todos seus livros abordarão o
sistema de reciprocidade expresso pelas trocas rituais, de uma forma ou de outra,
mostrando que a estrutural social dos trobriandeses se sustenta por esse sistema de
relações recíprocas, que envolvem sempre a obrigatoriedade (como regra) de
retribuir os presentes dados, como no cerimonial das conchas. Compreendemos,
portanto, que o Kula é como uma expressão por excelência das regras de convívio
entre os trobriandeses, uma ritualização da estrutura de relações que mantém a
sociedade ativa e viva.
Em seu livro Crime e Costume na Sociedade Selvagem, o tema da
reciprocidade reaparece quando o autor se propõe a fazer uma espécie de
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reciprocidade é atentar contra aquilo que mantém a sociedade unida, por isso,
passível de punição.
A preocupação de Malinowski com a manutenção da sociedade nos leva a
compreender diferentes aspectos da vida dos povos das ilhas Trobriand. Pensando
nisso, lembramo-nos de que a complexidade das relações e costumes de cada povo
orientam diferentes aspectos de seu cotidiano e também os orientam a agir seguindo
a sociedade e a cultura em situações individuais. Essa conclusão é uma das
principais contribuições de Malinowski e dos demais autores estrutural funcionalistas
para a Antropologia.
Na próxima aula, apresentaremos outros autores dessa corrente do
pensamento antropológico com mais detalhes e também conheceremos aspectos
culturais de outros povos por eles estudados.
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moderna. Além disso, cada povo se constitui segundo diferentes propósitos e eles
podem nos ensinar alguma coisa sobre nossos próprios propósitos econômicos,
políticos e sociais.
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Nesta aula vamos falar sobre outra definição de Estrutura, defendida como
característica eminentemente humana pela chamada Antropologia estrutural
francesa, cujo autor fundador é Claude Lévi-Strauss (1908 – 2009).
Assim como estrutural funcionalismo inglês, a antropologia estrutural francesa
dialoga com os autores evolucionistas e se funda a partir da sua crítica. O
estruturalismo francês dialoga com o conceito de cultura e com o de estrutura social
ao buscar compreender o humano em sua universalidade, mas suas críticas se
direcionam para outras premissas dos autores evolucionistas que já estudamos nas
aulas anteriores: o estruturalismo francês nasce como uma crítica à visão de que há
povos mais ou menos racionais.
Para o estruturalismo francês, em todas as manifestações culturais e sociais
humanas, encontramos a expressão da Razão: é com as formas como opera o
pensamento humano que essa corrente do pensamento antropológico está
preocupada e, para seus autores, o pensamento humano é que será o responsável
pela explicação do que é universal às culturas e do que é diversidade cultural.
Lembremos que autores como James Frazer e Lévy-Bruhl dedicaram-se a
provar que as manifestações mitológicas e rituais dos povos por eles considerados
“primitivos” expressam uma etapa do desenvolvimento da racionalidade humana que
é anterior à própria Razão, já que estão lendo a Razão a partir da filosofia e da
ciência ocidentais e modernas. A proposta de Claude Lévi-Strauss é justamente
contrária a essa leitura. Em todos seus livros, o autor nos mostra que essas
manifestações culturais das sociedades anteriormente consideradas primitivas
expressam as mesmas capacidades mentais e reflexivas do pensamento científico.
Ao nos dizer que as diferentes culturas e formas de relacionamento sociais só
existem porque o ser humano é eminentemente um ser racional, Lévi-Strauss não
está negando nem o culturalismo norte-americano nem o estrutural funcionalismo
inglês, mas sim englobando as críticas dessas correntes ao evolucionismo, apesar
de estar dialogando com outros autores também. Para Lévi-Strauss, tanto as
manifestações culturais dos povos quanto a forma como se organizam social,
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humano opera sua forma de conhecer e refletir o mundo. Mesmo que índios
considerem araras como essencialmente diferentes de galinhas (uma é capaz de
voar e outra não), vocês devem perceber que, para Lévi-Strauss, a racionalidade
humana se expressa não pela qualidade dos grupos formados, mas sim pela
capacidade de formar grupos.
O que é revolucionário nessa forma de pensar o homem é, portanto, a
maneira como o autor pensa a diversidade. O fato de concebermos um deus único
ou vários deuses não nos faz mais ou menos racionais. O que nos faz racionais é a
capacidade de concebermos uma entidade divina, é a capacidade que cada
sociedade tem de dar explicações para sua própria existência. Fazendo isso, Lévi-
Strauss destrói todas as barreiras valorativas entre a forma de conhecer
empreendida por um “selvagem” e a forma de conhecer da própria “ciência”, numa
crítica contundente ao positivismo ou ao cientificismo que, ao mesmo tempo, não
desqualifica nem a ciência e nem o pensamento conhecido como “selvagem”. A
pesquisa científica dá legitimidade à forma de conhecer da sociedade moderna,
enquanto o xamanismo ou o uso de remédios naturais dá legitimidade à forma de
conhecer das sociedades indígenas e Lévi-Strauss não as considera mais ou menos
verdadeiras: somente as considera partes de culturas diferentes e expressões da
mesma humanidade que há em nós ou que há em povos indígenas.
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relação aos imigrantes japoneses foram muito mais intensos do que em relação a
italianos e alemães. Essa seria uma expressão da influência das teorias racistas
para as políticas governamentais no início do século XX.
A própria miscigenação é tema recorrente até hoje quando falamos no
imaginário sobre a identidade nacional e a formação da sociedade brasileira.
Voltaremos a esse período no começo da Unidade IV. Foi a partir desse tema que
os primeiros ensaístas começaram a dialogar com as teorias racistas a partir de um
viés sociológico e antropológico, negando e criticando a visão de que a
miscigenação contribuiu para a degeneração da nação. Dentre eles, estão Gilberto
Freyre (1900 – 1987) e Euclides da Cunha (1886 – 1909), autores considerados por
sociólogos e antropólogos os primeiros a levantarem o problema da formação
brasileira com o olhar das ciências sociais e da história e não a partir de
pressupostos médicos ou jurídicos.
somente na década de 1950, depois de ter ido aos EUA e ter tido contato com a
linguística estrutural, mas sua influência no pensamento antropológico brasileiro é
clara.
Além de Lévi-Strauss, outros antropólogos e filósofos vieram na chamada
missão francesa direcionada à USP, dentre eles, Roger Bastide, que ficou conhecido
por ter sido pioneiro nos estudos sobre as religiões afro-brasileiras (1898 – 1974).
Nesse momento, o volume de temas a serem estudados e a nascente
institucionalização do conhecimento das ciências sociais no país, fazem com que os
autores caminhem por diferentes campos. Bastide era sociólogo, mas nesse
momento a sociologia e a antropologia no Brasil não se apartam totalmente. O
importante a notar é que estes temas inauguram as discussões propriamente
antropológicas no país. A etnologia indígena ou o estudo das religiões afro
inauguram, portanto, temas antropológicos brasileiros por excelência e também
inauguram a formação dos primeiros autores da área em instituições de ensino
superior no país.
A década de 1940 marca a chegada de outros autores importantes à
formação do pensamento antropológico brasileiro, como, por exemplo, os alemães
Emílio Willems (1905-1997) e Herbert Baldus (1899-1970), o norte-americano
Donald Pierson (1900-1995).
Willems lecionou na USP e na Escola de Sociologia e Política de São Paulo,
tendo sido o primeiro a ocupar a cadeira de antropologia na USP e, por isso, formou
muitos outros autores dentro da área, como Gioconda Mussolini (1913-1969).
Willems dedicou-se, dentre outros estudos, principalmente ao trabalho com
populações rurais brasileiras, seguindo uma proposta de estudo do ambiente rural
influenciada por autores americanos e também ingleses. Por isso o autor é bastante
referido dentro da tradição de estudos de antropologia rural no Brasil e considerado
um de seus fundadores.
Podemos citar também uma grande influência da antropologia alemã para os
estudos de etnologia no Brasil e, nesse sentido, podemos citar os trabalhos de
Herbert Baldus, que assumiu na Escola de Sociologia e Política de São Paulo a
cadeira de etnologia em 1939. O autor também se destaca nos estudos
arqueológicos brasileiros. Baldus, ao lado dos demais autores vindos com a missão
os autores das teorias raciais. A proposta desses autores era encarar os fatos
sociais, políticos e culturais que explicavam situações de conflito ou de mudança e
que ainda não haviam sido estudados antropologicamente, como é o caso da
etnologia indígena.
No começo, havia um grande interesse por parte dos antropólogos pela
descrição de diferentes aspectos da vida social e cultural dos povos indígenas
brasileiros, que haviam sido pouco estudados. Etnias e diferentes temas sobre elas
próprias foram explorados pelos antropólogos estrangeiros e seus discípulos. No
entanto, a história da etnologia no Brasil segue a própria história da relação entre as
instituições governamentais e os índios, não somente segue o interesse de pesquisa
sobre os aspectos da cultura indígena. Devemos citar essa importância porque
muito do que hoje é o imaginário da população brasileira depende do papel dado
aos índios na formação de nossa sociedade.
Primeiro, o índio foi tratado como participante do processo de miscigenação, o
que contribuiu para a visão do índio como aquele que foi colonizado no passado e
dizimado pela cultura ou pela própria ocupação do território pelos portugueses.
Depois, foi redescoberto pelos autores que vieram lecionar Antropologia no país e
passou a ser tema de pesquisa novamente. Os costumes, a cultura, as relações
sociais dentro dos grupos indígenas passaram a ser objeto de pesquisa, assim como
as populações rurais, seguindo-se uma preocupação clara com o perigo de
desaparecimento das populações indígenas no processo de desenvolvimento
capitalista e da expansão da fronteira agrícola.
Junto com a retomada da preocupação com o estudo antropológico dos povos
indígenas brasileiros, surge a preocupação indigenista e sertanista também
retomada em meados do século XX. Os indigenistas e sertanistas, como os irmãos
Orlando, Carlos e Leonardo Villas-Boas, tentavam chegar aos povos indígenas
antes do progresso, que trazia doenças e mais mortes. Um dos autores que
podemos destacar, quando lembramos desses intuitos de contato e de proteção dos
índios é Darcy Ribeiro (1922 – 1997), que, junto com indigenistas foi um dos
primeiros a envolver-se politicamente na questão indígena brasileira.
O contexto das pesquisas com populações indígenas brasileiras começa a
mudar após o governo militar. O desenvolvimentismo e a intenção de ocupar a
a) As matrizes étnicas
O primeiro passo para sairmos do tratamento mais superficial sobre as
matrizes étnicas é percebermos que há especificidades em cada uma das matrizes.
Não estamos falando, portanto, do branco ou do europeu, mas de um dado povo da
Europa. Da mesma maneira ocorre com negros e índios.
A Europa, assim como o continente americano antes da descoberta e o
continente africano, abarca muitos povos, com histórias e especificidades culturais
muito próprias. Povos distintos, com culturas distintas. Por exemplo, os portugueses
falam um idioma latino, habitam a ponta oeste da Península Ibérica, possuem traços
culturais próprios e uma formação nacional das mais antigas da Europa. O
protagonismo no comércio mundial tornou Portugal, ao lado da Espanha, uma
grande potência dos séculos XIV, XV e XVI. A sua posição geográfica e as disputas
pelas rotas comerciais possibilitaram o desenvolvimento da tecnologia necessária
para navegação oceânica e abriram as portas para os descobrimentos. Os
portugueses são, portanto, um povo, com cultura e história próprias, com diversos
aspectos distintos daqueles dos demais povos europeus.
O mesmo ocorre com o que convencionamos chamar de índios ou povos
indígenas. Na verdade, essa é uma forma de generalização para se referir ao povo
nativo como se fosse uma coisa só. Na verdade, temos pelo menos dois grandes
troncos culturais e idiomáticos e, dentro de cada um desses troncos, diversos povos
distintos, com similaridades idiomáticas e culturais, mas povos diferentes que
formam uma grande diversidade cultural que, aliás, não estava fechada: havia o
contato entre esses povos por todo o continente, como demonstram os achados
arqueológicos de peças de cobre dos Andes próximas do que hoje é São Paulo e as
trilhas que ligavam regiões e aldeias, algumas muito extensas, como a trilha do
Peabiru, que vai do Paraguai a São Paulo.
Da mesma maneira era a composição do que convencionamos chamar de
negros ou africanos. O continente africano é vasto e possui, assim como a Europa e
a América, regiões e povos distintos. Em primeiro lugar, devemos localizar
geograficamente a “África negra”: falamos prioritariamente da região que está abaixo
(em direção ao sul) do deserto do Saara, ou a “África subsaariana”, como se
convencionou chamar. De lá foram trazidos para cá africanos escravizados. Mas
esta região também possui povos e culturas distintas. Para o Brasil vieram tanto
grupos da Alta Guiné e sudaneses, quanto os angolanos. Os chamados “sudaneses”
estavam divididos em alguns agrupamentos culturais, como os iorubás e provinham
da região mais central da África. Os de origem banto (angolanos, moçambiques,
congoleses) vinham da região mais ao sul. Idiomas distintos, traços culturais
diversos, religiões distintas. Por exemplo, havia grupos islâmicos (como é mais
comum na região norte do continente africano) e grupos que deram origem ao culto
dos orixás no Brasil (Candomblé).
Enfim, pensar nas matrizes étnicas da nossa cultura exige pensar na sua
diversidade cultural e não cairmos em simplificações generalizantes que impedem a
justa compreensão da complexidade da nossa formação. Vamos ao segundo
aspecto.
b) A questão histórica
Geralmente, quando falamos da formação cultural brasileira e das matrizes
étnicas, corremos o risco de tratarmos o tema de maneira idílica, ou seja, um tanto
quanto pueril e fantasiada. Por vezes, ao estudarmos sobre a miscigenação e o
encontro desses povos e culturas distintos, deixamos de lado um aspecto
fundamental: a razão do encontro.
Pensar a razão desse encontro significa jamais deixar de lado a reflexão
sobre as questões históricas que permitiram que esses povos estivessem aqui no
começo do século XVI. Essa reflexão permite pensar objetivamente a formação do
Brasil e abre o caminho para irmos mais além: compreendermos alguns traços
culturais fundamentais da nossa formação.
De maneira rápida, para na aula seguinte aprofundarmos mais o
conhecimento do tema, devemos esquematicamente expor os pontos fundamentais
dessa reflexão. São eles:
a) a chegada dos portugueses se deve aos interesses comerciais e à sua
dinâmica do período. A ocupação do território obedece a questões que veremos na
aula seguinte, mas não podemos tratar dessa ocupação senão como uma invasão,
ou seja, os portugueses tomam para si um território que era habitado por diversos
povos nativos.
A Europa ainda passou, no século XIV, por uma grave crise econômica .
Dentre seus motivos destacam-se a “Guerra dos Cem Anos” (travada entre
Inglaterra e França) e a chamada “Peste Negra”, que reduziram brutalmente a
população europeia, diminuindo também drasticamente a mão-de-obra disponível.
Somente a partir do século XV a população e a empresa comercial voltaram a
crescer apesar da permanência de crises econômicas, e em grande parte através
delas mesmo, principalmente por meio do comércio das especiarias, que era a
principal atividade mercantil europeia na época.
Desde logo é necessário destacar que “o caráter mercantil da produção , isto
é, o predomínio da produção para a troca não se confunde com o caráter capitalista
das relações de produção, que se baseiam no intercâmbio do trabalho vivo com o
salário” (Moraes, 2000, p. 162). Mesmo com o advento do mercantilismo, as
relações feudais, ainda que passando pelas transformações descritas acima,
prevaleciam em toda a Europa e persistiram, mesmo depois da revolução industrial,
por alguns séculos em algumas de suas regiões. (Sodré, 1973).
2. A expansão marítima e a supremacia portuguesa
No século XV, os grandes centros comerciais eram as cidades do Norte da
Itália e dos Países Baixos. O Mediterrâneo, a grande via de escoamento comercial
da época, tornou-se monopólio dos italianos e árabes. Além da necessidade de
buscar novas rotas para o comércio, o escoamento de moedas para o Oriente como
forma de pagamento das especiarias gerou uma escassez de metais preciosos,
prejudicando assim o comércio europeu. O caminho, tanto para baixar o preço das
especiarias, quanto para obtenção de metais preciosos para emissão de moedas, foi
a busca de novos mercados abastecedores, que consequentemente só poderiam
ser encontrados fora da Europa.
Diversos fatores fizeram com que Portugal se tornasse uma potência naval.
Dentre eles podemos destacar:
a) sua privilegiada posição geográfica, pois esta, ao lhe garantir saída para o
Atlântico, aumentava sua possibilidade de desenvolver o comércio ao longo da costa
africana e o estabelecimento de novas rotas para as “Índias”.
b) Portugal tornou-se reino independente ainda no século XII, delimitando
suas fronteiras (século XIII), estabelecendo uma monarquia centralizada, agrária,
polêmicas, além das questões legislativas, que são amplamente divulgadas através,
por exemplo, de páginas na internet das organizações, jornais e revistas. As
resoluções da Conferência de Durban (Conferência Mundial Contra o Racismo,
Xenofobia e Intolerância Correlata, ocorrida em 2001), são interessantes para uma
visão global da questão. Fora esses documentos mais atuais, conhecer mais e
melhor a história do nosso país e os livros de Clóvis Moura são, sem dúvida
alguma, obrigatórios para os que pretendem compreender melhor o assunto.
humana, o sujeito de direitos. E é por isso que se fala da universalidade dos Direitos
Humanos.
As normas de Direitos Humanos são internacionais e oferecem proteção a
todos, sem distinções entre nacionais e estrangeiros. Enfim, o conceito
contemporâneo de Direitos Humanos visa respeitar a dignidade humana e combater
o sofrimento, proclamando direitos como a vida, a liberdade, a igualdade e a
segurança, por meio de Convenções Internacionais, de forma universal e indivisível.
Nesse sentido, podemos definir os Direitos Humanos como aqueles direitos
inerentes às pessoas, dirigidos a proteção destas, aceito por todas as culturas, isto
é, por todos os Estados Soberanos que os ratificam.
Ainda que a ideia de sujeito de direito seja permeada pela concepção liberal
de indivíduo e, portanto, seja altamente questionável e auxilie na ocultação das
relações objetivas de exploração entre classes como ocorre no capitalismo,
devemos considerar a noção de Direitos Humanos e a luta para que seus princípios
sejam seguidos por todos os países como um avanço civilizacional importante ou, no
mínimo, tomar seus princípios como uma importante arma de combate às injustiças
e desigualdades presentes em nosso tipo de sociabilidade, principalmente em
países da periferia do sistema, como o Brasil, com agravante de nosso recente
passado escravista, como estudamos nas aulas anteriores.
Portanto, ainda que permeado por contradições próprias do nosso tempo, a
noção de Direitos Humanos permite um avanço positivo, baseada em três pontos
fundamentais: a) a liberdade pública, compreendida como a proteção da liberdade e
dos direitos da pessoa; b) direitos econômicos e sociais; c) Direito de Solidariedade
Podemos separar dois grandes grupos que defendem a noção de Direitos
Humanos. O primeiro grupo procura fazer uma defesa teórica da tese dos Direitos
Humanos que resvala necessariamente para a defesa de uma suposta “natureza
humana”, ou seja, esses Direitos Humanos que são afirmados agora existem desde
que a espécie humana surge na natureza, ainda que não sejam reconhecidos e
defendidos. A partir dessa perspectiva, a compreensão é a de que temos direitos
humanos que são direitos naturais, ou seja, eles são parte da nossa espécie, nos
ajudam a mantermos a espécie e, ao mesmo tempo, definem as condições (pelo
menos as mínimas) para que sejamos compreendidos como espécie humana.
Existe, portanto, uma fusão dessa perspectiva com formas do que se convencionou
chamar de jusnaturalismo, ou seja, “direitos naturais”, pertencentes ontologicamente
à espécie. Essa perspectiva está ligada à compreensão liberal do indivíduo, como
dissemos no parágrafo anterior. O segundo grupo não parte da noção de uma
natureza humana que não se altera historicamente (ontológica, ou seja, própria do
ser), portanto, não pode partir da ideia de que os Direitos Humano sejam direitos
naturais que existem desde sempre, embora sejam reconhecidos somente agora.
Para este grupo, como já mencionado mais acima, a noção dos Direitos Humanos
aparece como um avanço do nosso tempo e um instrumento a mais de defesa de
liberdades mínimas e de conquista de proteção contra as formas variadas de
repressão política e violência social nas quais vivemos e se repetem ao longo da
história recente. Neste caso, a luta pelos Direitos Humanos está revestida de um
caráter progressista e positivo, que pretende, ao mesmo tempo, assegurar as
garantias mínimas de existência a toda a espécie e avançar para as possibilidades
abertas de novas formas de organização da vida social, baseadas na solidariedade
e na divisão da abundante capacidade de produção da riqueza material que
possuímos, garantindo condições dignas de vida à nossa espécie e uma nova
maneira de nos relacionarmos com o restante da vida no planeta.
Seja como for, como tese da natureza humana ou como instrumento de lutas
por avanços civilizacionais, o mais importante é refletirmos sobre os Direitos
Humanos como meio para atingirmos melhores e mais harmoniosas formas de vida
coletiva.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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3ed. São Paulo: Ática, 1978.
FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil.11ed.rev. São Paulo: Cia.
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