Algumas Diretrizes para Elaboração de Um Pré-Projeto

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Algumas diretrizes para elaboração de um Pré-Projeto

(José Luiz Braga)

Em princípio preferiria não apresentar especificações muito detalhadas para a


formulação de um projeto de pesquisa. Uma das razões é que se trata ainda de um pré-projeto,
a ser longamente elaborado, durante o segundo semestre, já em trabalho dos estudantes junto
a seus orientadores.

Outra razão é que especificações geralmente estimulam uma atitude de


"preenchimento de formulário", que devemos evitar a todo custo. Trata-se daquela situação
em que cada item solicitado vai sendo "preenchido" como se fosse um formulário burocrático,
tentando-se "acertar" e não deixar nada em branco.

Por outro lado, não oferecer a vocês nenhuma indicação seria também problemático,
pois algumas questões importantes acabariam não sendo abordadas na ausência de informação
sobre sua relevância. Encaminho portanto algumas especificações, com as ressalvas acima, e
também lembrando que o mais relevante é a coerência entre os diversos componentes do
projeto.

Os componentes mais freqüentemente encontrados em um projeto de pesquisa seriam:

- explicitação do problema (o que envolve o objeto de pesquisa e sua problematização, ou


ângulo de observação relevante, ou curiosidade argumentada sobre o objeto, ou um
“recorte” do objeto, ou “a pergunta” que a pesquisa tentaria responder, ou o eixo
ordenador das observações e das leituras, ou ...). Dentre estas alternativas para caracterizar
o problema, não deve se incluir o “quadro teórico”, que se refere ao terceiro item.

- contextualização do problema no ambiente social em que a situação enfocada ocorre.

- contextualizações teóricas em que o objeto específico é visto como pertencente a um tipo


de objeto sobre o qual tais e tais teorias nos oferecem perspectivas; este item é às vezes
referido como “marco teórico” ou “quadro teórico” (mas as expressões são limitativas).

- objetivos e justificativas da pesquisa, correspondendo ao interesse (humano, social,


intelectual,...) na busca de conhecimento sobre aquele objeto, segundo as perspectivas do
problema posto; motivos que dão base ao que se pretende pesquisar; encaminhamento

1
para tipos de resposta que a pesquisa pretende viabilizar ("tipos" e não "respostas" - nada
a ver com hipóteses).

- questões de observação (importante item a ser refletido) – ver texto específico sobre isto.

- aparato metodológico - na fase atual, ainda em nível de pré-figuração. Pelo menos


referência argumentada e relacionada ao problema específico, a autores que parecem
possibilitar bons encaminhamentos metodológicos (ver texto específico sobre relações
entre teoria e projetos); e, do lado do objeto e das observações pretendidas, reflexões
sobre as solicitações que estas fazem para um posterior desenvolvimento do aparato
metodológico;1

- como bibliografia incluir apenas os livros e artigos que sejam efetivamente referidos no
texto do pré-projeto. Não há vantagem, no momento, em listar tudo o que vocês têm lido
no semestre e nos anos anteriores (ou - menos ainda - livros que pretendam ler-para-
aprender). A bibliografia não deve ser de tipo "escolar" (leituras de aprendizagem); mas
sim leituras feitas e a fazer voltadas para a construção da pesquisa. Assim, se já
perceberam alguma leitura relevante a ser feita, é possível incluí-la no texto do pré-projeto
- especificando as razões para considerar que seja pertinente à pesquisa; ou seja,
relacionando informações indiciárias sobre o livro relacionadas a questões do seu
problema. Aí, é claro, esta referência vai para a bibliografia. Para os efeitos de uma
proposta preliminar, pode entrar pouca coisa em quantidade - mas que seja refletido
concretamente em suas relações com o projeto.

Não é preciso ter uma seção específica para "referências teóricas" - isto porque estas
não devem ser abstratas (apenas para mostrar conhecimento, escolares). Qualquer referência
teórica deve estar relacionada a alguma coisa relevante da pesquisa a ser feita - e portanto fará
parte de um daqueles itens (elementos, componentes) referidos. Assim, as referências
estariam localizadas em diversos pontos do projeto, em relação direta com as questões aí
tratadas. É claro que alguns componentes trazem maior probabilidade de solicitar referências -
aparato metodológico e contextualizações, por exemplo.

1
Esta será uma importante parte a ser desenvolvida posteriormente – e deve ajudar na configuração final do
problema, das contextualizações e nas observações a serem feitas.

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Dado o estágio preliminar de projetação, alguns pontos podem estar mais refletidos
que outros - é natural. Entretanto, deve-se dedicar sempre algum espaço na formulação (e
sobretudo algum tempo de reflexão) a cada um deles.

A seqüência de discussão destes pontos não precisa ser aquela em que acima indico os
componentes do projeto. A melhor seqüência é aquela que permite fazer perceber, ao leitor do
projeto, o que será a futura pesquisa e como ela está sendo provisoriamente pensada. Deixem-
se levar, portanto pela pré-figuração que fazem da pesquisa. Lembrem-se sobretudo que um
texto é necessariamente seqüencial mas isto não significa que tenha que ser linear. Assim, na
expressão - "a" leva a "b" que viabiliza "c", donde se desenvolve "d", em que "a" se sustenta
oferecendo a "c" sua melhor percepção, justificando portanto "d" - o que importa são as
articulações construídas pela reflexão, pela sensibilidade, pela criatividade redacional, entre a-
b-c-d. Estas articulações fazem um composto complexo e não necessariamente linear - ainda
que seqüenciado desta ou de outra forma.

Se referirmos o projeto de modo gráfico poderíamos apresentá-lo assim:

Referências teóricas (logo, bibliografia)

Contextualização
Aparato Observação
Justificativas Problema Objetivo Metodológico a ser feita
social e teórica

Situações do espaço
social,
objetos empíricos
(principal insumo)

O gráfico apenas assinala a presença dos elementos principais do pré-projeto. A


seqüência de "leitura" e de redação pode começar em qualquer ponto, e não necessariamente
da esquerda para a direita. O que significa que poderíamos acrescentar flechas partindo de
cada caixa em direção a cada uma das outras.

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Outra maneira de expressar isto seria perceber que podemos organizar o texto do
projeto com base em variados encaminhamentos, como por exemplo:

a) ... quero observar o objeto “x” que me parece curioso, daí construo um problema que,
contextualizado de tal modo, justifica, segundo tais e tais razões, uma pesquisa com tais
características, que podem ser asseguradas por um aparato metodológico, elaborado de
modo pertinente, permitindo assim atingir os objetivos ...

b) um aparato metodológico genérico, sugerido por autores, me interessando por suas


potencialidades em tal área de reflexão, estimula fazer o exame de um determinado tipo
de objetos, dentre os quais seleciono o objeto "x" para pesquisar; percebo que este objeto
apresenta problemas específicos, solicitando ajustes e transformações naquele aparato
metodológico genérico, o que me permitirá fazer observações com o objetivo de
encontrar respostas para...

c) em um contexto social determinado, observo uma situação que, parecendo-me relevante


por tais e tais motivos, sugere uma ampliação de seu conhecimento. Pretendo portanto
construir meu problema de pesquisa nesse espaço, onde encontro ângulos passíveis de
observação. Para o desenvolvimento destes ângulos, e eventual seleção e construção de
questões mais específicas pretendo cotejar determinados autores com alguns tipos de
dado da realidade e assim...

d) estando interessado, por determinados motivos, em uma ordem de questões, creio ser
possível aí recortar um bom objeto de pesquisa, o qual, submetido a determinadas
perspectivas teóricas deve resultar em um problema a ser trabalhado segundo um
aparato metodológico, que parece ser promissor para descobertas referentes a tais e tais
ângulos pertinentes àquela ordem de questões que me interessam...

...etc., etc., etc.

O importante é que os vários componentes se ajustem entre si – cada um servindo de


critério para os demais.

Tudo isso está muito abstrato. Concretizem através de reflexões sobre seus temas e
objetos de pesquisa. Lembrar que uma boa parte de tudo isso depende de tomadas de decisão
baseadas em reflexões e leituras. No momento, é possível que muitas reflexões estejam ainda

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em nível preliminar, e as leituras sejam relativamente poucas. Entretanto, o nível de risco das
decisões tomadas é ainda pequeno - pois podem ser depois redirecionadas - na medida mesmo
de maiores reflexões e leituras (viabilizadas por estas primeiras decisões e motivadas pelas
críticas que recebam de professores e colegas – ou, se for o caso, já no andamento de um
Mestrado).

Adicionalmente: para evitar a atitude de "preenchimento de formulários" uma boa


tática é a de evitar entre-títulos nomeados segundo os elementos (itens, componentes)
sugeridos acima ("problema", "contextualização", "objetivos",...). Adotem antes entre-títulos
escolhidos na substância específica do projeto. Assim, a estrutura do texto de pré-projeto não
deve ser apriorística (o tal formulário) – mas sim desenvolvida a partir das necessidades do
que estão projetando.

Lembrem-se também que um projeto (como o nome o diz) é uma reflexão voltada para
um fazer futuro – a pesquisa. Todas as leituras referidas, o conhecimento já desenvolvido, a
percepção atual de vocês sobre o tema, as idéias já elaboradas, as reflexões em andamento,
devem ser organizadas e apresentadas em função desse projeto de pesquisa. É certamente
necessário falar sobre o já sabido e estabelecido, sobre o passado e o presente – mas é
importante lembrar que o objetivo do projeto não é demonstrar estes conhecimentos, mas
organizá-los e apresentá-los a serviço da pesquisa a ser feita.

Lembrar ainda que a questão não é meramente redacional - trata-se de refletir sobre o
máximo de questões, dúvidas, preferências, informações já obtidas a respeito do objetos,
teorias e conceitos, perspectivas metodológicas, ... etc. - e tentar expressar, para o leitor do
projeto o que pretendem fazer e como - incluindo aí dúvidas e como se pretende superá-las.

De um modo geral, evitem pensar o pré-projeto simplesmente como um texto “para ser
avaliado”. Procurem construir como destinatário leitores genéricos, interessados, mas não
necessariamente bem informados sobre o tema e sobre o que vocês pretendem pesquisar.
Pensem na redação com o objetivo de tornar claro o que pretendem investigar.

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