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CURSO DE FILOSOFIA
Petrópolis
2019
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PETRÓPOLIS
CURSO DE FILOSOFIA
Professor orientador
Petrópolis
2019
Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer
meio convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que
citada a fonte.
CIP – Catalogação na
Publicação
CDD: 170
(Santo Agostinho)
RESUMO
INTRODUÇÃO...............................................................................................................5
5 CONCLUSÃO.............................................................................................................38
6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................41
1 INTRODUÇÃO
Cartago e mais uma vez dedica-se ao ensino da retórica. Em 383 seguiu para Roma e no
ano seguinte é nomeado mestre de eloquência em Milão.
A inquietude era um tema permanente em sua vida. O despertar de seu espírito
crítico o levou a adotar o maniqueísmo, o maniqueísmo é uma filosofia religiosa
sincrética e dualística fundada e propagada por Manes ou Maniqueu, filósofo cristão do
século III, que divide o mundo simplesmente entre Bom, ou Deus, e Mau, ou o Diabo.
A matéria é intrinsecamente má, e o espírito, intrinsecamente bom. Com a popularização
do termo, maniqueísta passou a ser um adjetivo para toda doutrina fundada nos dois
princípios opostos do Bem e do Mal, pretendendo seguir a força única da razão. Durante
doze anos foi seguidor de Mani, profeta persa fundador do maniqueísmo no qual se
misturavam Evangelho, ocultismo e astrologia. Segundo Mani, o bem e o mal constituíam
princípios opostos e eternos, presentes em todas as coisas. O homem não era culpado por
seus pecados, pois já trazia o mal dentro de si.
Insatisfeito com as respostas que o maniqueísmo oferecia, Agostinho resolveu
abandonar a doutrina e seu lugar é temporariamente preenchido por um profundo
ceticismo. Em 386 procura Ambrósio, o poderoso bispo do Império em busca de uma
colocação oficial como professor. Em vez disso, encontra respostas para algumas das suas
dúvidas. Passa a assistir os sermões de Ambrósio, inspirados, sobretudo, no Antigo
Testamento. Ao conhecer de fato Cristo Agostinho finalmente encontra as respostas que
procurava:
Romano. Em 396 é sagrado bispo auxiliar de Hipona, onde se tornou um dos pilares da
teologia católica.
Entre 397 e 398, Agostinho se dedica a escrever Confissões, em que narra a
juventude e sua conversão, onde revela os caminhos da fé em meio às angústias do
mundo. O livro é uma autobiografia que também imprime o seu pensamento filosófico.
Cria a noção de espaço interior como campo da verdade essencial do homem verdade e
Deus devem ser buscados no interior da alma, e não no mundo.
Em 413 começa a obra A Cidade de Deus, escrita para consolar os cristãos após
Roma ser saqueada pelos bárbaros visigodos, em 410. Na obra, Santo Agostinho
apresenta a defesa do cristianismo e convida seus contemporâneos a compreender o
sentido profundo da história. Já não se trata de um reino de Deus que sucede à vida
terrena. A cidade de Deus e a dos homens coexistem: a primeira, antes simbolizada por
Jerusalém, é agora a comunidade dos cristãos. A cidade dos homens tem poderes
políticos, moral, e existências próprias. Segundo ele as duas cidades permanecerão lado
a lado até o fim dos tempos, mas depois a divina triunfará, para a eternidade.
Deixou uma obra fundamental para a doutrina da igreja católica, que foi registrada
em tratados filosóficos, teológicos, comentários, sermões e cartas. Exerceu grande
influência em várias áreas do conhecimento. Teve papel importante na fixação da
hierarquia na Igreja Católica e fez a síntese entre a filosofia grega e o pensamento cristão.
Fixou a ideia da vida interior do homem como o palco essencial da construção da
identidade.
Santo Agostinho faleceu em Hipona, África, no dia 28 de agosto de 430. Santo
Agostinho foi canonizado por aclamação popular, e reconhecido como Doutor da Igreja,
em 1292, pelo papa Bonifácio VIII.
Tudo isto nos permite conhecer a evolução do pensamento de Agostinho, pois
dentre suas influencias está, sua mãe como figura de fé, a leitura de Cícero, que o desperta
para a filosofia, sua adesão ao maniqueísmo e pôr fim a influência de Ambrósio, que
finalmente o leva a beatitude, o autor produziu imensa obra literária, entre ela além das
obras filosóficas, também obras dogmáticas, apologéticas, exegéticas e polêmicas.
Ora, do ponto de vista ético [...] para Agostinho, o ser humano tem um telos
(fim) para atingir, o qual é uma coisa, uma realidade distinta de um mero signo,
pois o signo apenas indica, aponta, significa algo que vai além dele mesmo.
Porém, para se atingir o fim almejado, é necessário ter claro que há duas
maneiras de se relacionar ou aderir aos seres em geral: o frui e o uti. Isso
compreendido, vê-se que há seres que são objeto do uti (uso), servem como
meio, enquanto outros são objetos do frui (fruição, gozo), funcionando como
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o fim. Ora, entender isso e viver de acordo com essa hierarquia é se colocar na
ordinata dilectio (ordem do amor), percebendo que a caritas (caridade) é o
princípio primeiro e fundamental (GRACIOSO, 2012, p. 19).
A felicidade então está no próprio Deus que é apontado como esta verdade. Todo
aquele que possui o que quer é feliz, mas só é de fato feliz se o que possuir for permanente
e eterno. Logo, só quem possui a Deus é feliz. O fato, é que o simples conhecimento não
é suficiente para alcançar a Deus, por isso deve-se estar inserido no amor, que une o que
ama e o que é amado, assim só o amor é capaz de levar a Deus e a felicidade “portanto,
ele será feliz quando, sem obstáculos nem perturbações, puder gozar daquela única
verdade, fonte de tudo que é verdadeiro” (AGOSTINHO, 1997, p. 177). Ou seja, no
encontro dessa verdade que é Deus e que só pode ser alcançado pelo amor é que se
encontra está verdadeira felicidade.
Para alguns pensadores foi com Santo Agostinho que “o pensamento cristão
ganhou uma nova visão, pois, passou a melhor articular elementos do pensamento
clássico com princípios cristãos para melhor adequar e fundamentar os ideais cristãos”
(PAULA; MELO, 2011, p. 12). Santo Agostinho, gera uma mudança de foco no sentido
de amor, acrescentando ao mero desejo a caridade. De eros, que indicava desejo, passou
a ágape, que quer dizer caridade: “É um abuso de linguagem dizer que os concupiscentes
amam, assim como é abusivo dizer que aqueles que amam são concupiscentes. Ora, o
verdadeiro amor é aderir à verdade, para viver na justiça” (AGOSTINHO, 2018, p. 168).
Nesse sentido é dito por um de seus comentadores: “Desse modo, para Santo Agostinho,
o cristianismo trouxe um novo conceito de amor, que recebeu um olhar diferente do que
havia sido entendido por pensadores gregos como Platão. O foco que se dava ao amor
tomou um novo sentido” (PAULA; MELO, 2011, p. 4). Ou seja, há então uma virada
onde o amor que era mero desejo ganha o sentido do amor ágape que vai além desse mero
desejar. É importante refletir sobre tal mudança, pois rapidamente parece se estar
afirmando que o eros é deixado de lado em vista do ágape, mas na Encíclica Deus Caritas
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Est Bento XVI (Joseph Ratzinger) diz que “isto não é rejeição do eros, não é o seu «
envenenamento », mas a cura em ordem à sua verdadeira grandeza” (RATZINGER,
2005)1. Continua Bento XVI:
Ou seja, para o Papa Bento XVI o verdadeiro desafio do eros não está em vence-
lo, mas em conseguir manter uma verdadeira harmonia entre eros e ágape, só assim o
homem pode viver plenamente sua condição e estar inteiramente voltado ao amor para
assim compreender e viver a sua grandeza.
Como já visto em trechos anteriormente citados de Santo Agostinho ele apresenta
o amor também como meio pra viver na justiça, ou seja, ao aderir ao amor encontra-se
também uma vida justa, e realiza-se assim a justiça proposta pela ética. Dessa forma, para
Santo Agostinho:
[...] A ordem da vida moral é, pois, regida pela ordem do amor que se desdobra
na esfera do uso como amor de si mesmo e dos outros segundo o reto modo e
os graus correspondentes, e se eleva finalmente à esfera da fruição como amor
de Deus, amado em si mesmo e por si mesmo (LIMA VAZ, 1999, p. 193).
Nessa mesma ordem de ideias, o cristão ama o seu inimigo: não enquanto
inimigo, mas enquanto homem, possuidor da natureza humana. Ao ponto de
desejar para ele o mesmo que deseja para si mesmo, isto é, de poder chegar à
felicidade do Reino dos Céus, após ter sido renovado e transformado.
(AGOSTINHO, 2017, p. 75).
Ninguém ama a si, sem amar a Deus e ao próximo; ao próximo, sem amar a Deus
e a si; nem a Deus, sem amar a si e ao próximo. “Para Santo Agostinho, a caridade aparece
como a virtude primeira e será entendida como o fundamento de toda a vida ética”
(VIEIRA, 2014, p. 62). Nesse sentido a regra de ouro, também chamada regra da
caridade, tem papel fundamental em sua ética.
As considerações de Santo Agostinho sobre a Regra de Ouro exerceram grande
influência ao longo dos tempos, sendo comentadas por vários autores, alguns que
oportunamente serão aqui citados, diante da grande importância dessas considerações é
que esse trabalho irá se deter como também sobre o pensamento do autor acerca do tema,
propondo um estudo mais aprofundado sobre a regra e suas formulações, no primeiro
capítulo, no segundo capítulo o conhecimento da regra, e sobre a regra de ouro e a
“imago dei”, no terceiro capítulo.
11
Os textos nos quais Santo Agostinho usa a regra de ouro são numerosos, ela
aparece em diversos livros do autor, as vezes mais de uma vez. Diante disso poderá ser
visto no apêndice do presente trabalho um conjunto dessas formulações em ordem
cronológica. A regra na filosofia do santo é vista como uma máxima do amor: “Pois a
perfeição da misericórdia com a qual é atendida toda alma extenuada de pena e cansaço
não vai além desse amor aos inimigos” (AGOSTINHO, 2017, p. 91). É o amor que atende
a perfeição da misericórdia, amor esse que deve ser praticado mesmo aos inimigos, o
amor é o caminho para a perfeição é a regra é o caminho para viver de modo ético esse
amor. Agostinho afirma na Doutrina Cristã que:
Vive justa e santamente quem é perfeito avaliador das coisas. E quem as estima
exatamente mantém amor ordenado. Dessa maneira, não ama o que não é digno
de amor, nem deixa de amar o que merece ser amado. Nem dá primazia no
amor àquilo que deve ser menos amado, nem ama com igual intensidade o que
se deve amar menos ou mais, nem ama menos ou mais o que convém amar de
forma idêntica (AGOSTINHO, 2002, p. 46).
Sendo assim é justo aquele que mantém o amor de maneira ordenada, amando
mais o que deve ser mais amado e menos o que deve ser menos amado, essa ordenação
diz a respeito à perfeição acima citada tendo em vista que a coisas mais perfeitas que
devem ser mais amadas e coisas menos perfeitas que devem ser menos amadas. A regra
de ouro é, nesse sentido, a atitude ética mantenedora dessa relação de amor, é através dela
que se é capaz de viver perfeitamente no amor, ou seja, de forma ordenada.
A formulação mais conhecida da regra em Agostinho e provavelmente a mais
conhecida na cultura em geral é a presente no sermão da montanha, tendo sido proferida
12
pelo próprio Jesus Cristo: “Tudo, portanto, quanto desejais que os outros vos façam, fazei-
o, vós também, a eles. Isto é a Lei e os Profetas. (Mt. 7,2)” Foi o contato com essa
formulação ao escrever o Comentário ao Sermão da Montanha que fez com que
Agostinho escrevesse um dos maiores trechos encontrados em seus escritos sobre a regra,
trecho esse que, junto de outros, será utilizado nesse trabalho na ajuda da construção de
uma ideia acerca da regra no pensamento do Santo.
Segundo o comentador de Agostinho Giovanni Catapano, antes de adentrar
mais profundamente ao estudo da regra na ótica do autor, são necessárias ser feitas ao
menos 3 observações de caráter mais geral. “A primeira é que Agostinho não cessou de
recorrer a regra de ouro desde o início ao fim de sua atividade literária e pastoral”
(CATAPANO, 2005, p. 104)2. Ora, agostinho tem em torno de 33 citações da regra ao
longo de seus escritos e essas citações comportam tanto formulações positivas quanto
negativas da regra isso endossa o comentário acima citado de que Agostinho realmente
não abandonou seus estudos sobre a regra desde que a conheceu. Desde o período
cassicíaco, època de estudos e produção acadêmica (filosófica), até o seu episcopado
Agostinho se dedicou de várias formas ao estudo da regra, nas palavras do próprio
comentador “Agostinho usa a regra de ouro nas circunstâncias e para os mais diversos
fins” (CATAPANO, 2005, p. 104)3, isso demonstra a forte presença da regra na filosofia
do Santo Doutor que não só a utilizou em diversas circuntâncias para diversos fins como
dedicou parte da sua vida ao estudo dessa máxima.
“A segunda observação que a tabela de lugares permite expressar, além disso, é
a heterogeneidade dos textos agostinianos que relatam as ocorrências da regra de ouro”4
(CATAPANO, 2005, p. 104), isso indica que nas suas mais diversas obras, de filosofia,
tratados apologéticos, escritos dogmáticos, exegéticas, obras polemicas antimaniqueias e
antipelagianas, discursos ao povo, cartas, e sua obra única que é Confissões. “Se pode
dizer que quase não há gênero literário, entre os praticados por Agostinho, em que ele não
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“La prime è che Agostino non ha cessato di ricorrere alla Regula d’oro dall’inizio alla fine della sua attività
letteraria e pastorale”. CATAPANO, Giovanni. La regola d’oro in Agostinho. Apud: VIGNA, Carmelo;
ZANARDO, Susy (ORG.) La Regola d'oro come etica universale. Vita e Pensiero: Milano, 2005.
3 “adopera la regola d'oro nelle circostanze e per i fini più diversi”. CATAPANO, Giovanni. La regola
d’oro in Agostinho. Apud: VIGNA, Carmelo; ZANARDO, Susy (ORG.) La Regola d'oro come etica
universale. Vita e Pensiero: Milano, 2005.
4 “la seconda osservazione che la tabella dei luoghi permette di esprimere concerne appunta l'eterogeneità
dei testi agostiniani che riportano occorenze della regola aurea”. CATAPANO, Giovanni. La regola d’oro
in Agostinho. Apud: VIGNA, Carmelo; ZANARDO, Susy (ORG.) La Regola d'oro come etica
universale. Vita e Pensiero: Milano, 2005.
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usou a regra de ouro” (CATAPANO, 2005, p. 104)5, o Santo sempre citou a regra
independente do gênero literário utilizado por ele naquela obra e em praticamente todos
os gêneros utilizados pelo autor se encontra alguma citação da regra de ouro.
É curioso se deter nessa parte, pois de fato foram poucas as ocasiões onde
Agostinho de fato se deteve em elaborar um texto ou uma dissertação significativamente
longa sobre a regra, porém isso não implica necessariamente que ele vê como secundária
a importância da regra, mas “significa simplesmente que já não é dada como tal nos
textos, mas deve ser reconstruída a partir deles” 7 (CATAPANO, 2005, p. 105), ou seja,
ele não formula especificamente uma doutrina sobre a regra, pois ela deve ser lida,
meditada e compreendida a partir dos textos e citações que a comportam. Agostinho está
muito mais preocupado com a prática da regra do que com um tratado filosófico sobre
ela, segundo Jones Bernades Machado:
É por esse motivo, que nas páginas que se seguem, esse trabalho se concentrará
em reunir citações literárias do autor e de seus comentadores para buscar construir um
pensamento e uma doutrina coesa da visão da regra pelo autor.
Para Agostinho, aquilo que pode tornar os homens perfeitos é a capacidade de
amar: “Assim, o que faz os homens invencíveis e perfeitos é somente o fato de eles
5 “se può dire che non v'é quasi genere letterario, fra quelli praticati da agostino, in cui egli non abbia
utilizzato la regola d'oro”. CATAPANO, Giovanni. La regola d’oro in Agostinho. Apud: VIGNA,
Carmelo; ZANARDO, Susy (ORG.) La Regola d'oro come etica universale. Vita e Pensiero: Milano,
2005.
6 “la terza e ultima osservazione riguarda l'estensione dei passi citati nell'elenco. come si può facilmente
notare, esse non sono lunghi più de due o tre paragrafi. Agostino non ha mai trattato con ampiezza della
regola d'oro; a volte la usa senza nemmeno farla oggeto di considerazioni dirette”. CATAPANO, Giovanni.
La regola d’oro in Agostinho. Apud: VIGNA, Carmelo; ZANARDO, Susy (ORG.) La Regola d'oro
come etica universale. Vita e Pensiero: Milano, 2005.
7 “significa semplicemente chè essa non e gia data come tale nei testi, ma va riconstruita a partire da essi”.
CATAPANO, Giovanni. La regola d’oro in Agostinho. Apud: VIGNA, Carmelo; ZANARDO, Susy
(ORG.) La Regola d'oro come etica universale. Vita e Pensiero: Milano, 2005.
14
poderem amar” (AGOSTINHO, 2017, p. 76), o amor também torna o homem invencível,
ou seja, o torna capaz de superar as dificuldades. Segundo Giovanni Reale para
Agostinho:
Isso reforça o poder do amor e da moral na natureza humana e parece afirmar que
a regra de ouro como forma de ordenação desse amor está também implícita nessa
natureza como será investigado futuramente no 3.2 desse trabalho. Porém, no momento
é hora de se reclinar sobre as formulações e aplicações da regra de ouro dentro da filosofia
de Santo Agostinho.
168). O santo justifica então o acréscimo do termo “bem” ao fato de ele ser uma forma
de impedir que a regra justifique a realização de um mal ao outro tendo o argumento de
que o desejava para si também: “Por exemplo, se alguém quisesse beber em excesso, até
a embriaguez. Mas seria ridículo de se justificar por aí quem procurasse beber ou excitasse
outrem a beber em excesso, até ficar bêbado. Para evitar essa interpretação e para maior
clareza, foi acrescentada a expressão ‘façam de bem’” (AGOSTINHO, 2017, p. 168). Ou
seja, para evitar que um mal ou um excesso seja cometido contra um outro ou contra si
mesmo, foi acrescentada essa expressão “de bem”.
Apesar disso, o santo não acha oportuno que se faça alteração nos já citados
exemplares gregos: “Se faltar nos exemplares gregos será bom completar. Mas quem se
permitiria corrigir o texto grego? É preciso, pois, admitir que a recomendação está plena
e completa, mesmo sem essa adição” (AGOSTINHO, 2017, p. 168). O autor, afirma então
que a recomendação é completa mesmo sem a adição do termo “bem”, pois ele serviria
apenas para evitar o mal-uso da regra e direcionar melhor essa recomendação evitando
que seja distorcida por má-fé ou ignorância.
Em Agostinho, o amor é caminho para o agir ético por excelência:
façam a nós)” (CATAPANO, 2005, p. 110)8 Nesse sentido a regra no seu caráter positivo
faz relação ao amor do próximo, o que não exclui por si o amor de Deus, esse está
implícito no próprio sentido de amor:
Que ninguém diga: “Não sei o que amar”. Que ele ame o seu irmão e estará
amando o próprio Amor. Pois assim conhecerá melhor o amor com que ama
do que o irmão a quem ama. Pode desse modo ter de Deus um conhecimento
maior do que o do irmão. Sim, Deus torna-se mais conhecido, porque lhe está
mais presente. Deus lhe será mais conhecido porque lhe é mais íntimo. Mais
conhecido porque mais seguro. Ao abraçar a Deus que é Amor, abraças a Deus
por amor. É esse mesmo amor que une todos os anjos bons e todos os servos
de Deus pelo vínculo da santidade. É o mesmo amor que nos une entre nós e a
eles reciprocamente, e ainda nos submete a Deus (AGOSTINHO, 2018, p.
170).
Nesse sentido o amor é vinculo de unidade entre sujeito, objeto e o próprio Amor,
que é Deus, quem ama algo, ama necessariamente a Deus que é amor. Sobre esse sentido
do amor a Deus trataremos melhor no próximo ponto que diz sobre a regra na formulação
negativa, que segundo a linha de interpretação seguida diz respeito propriamente ao amor
de Deus.
Como já dito anteriormente, a regra de ouro conta com mais uma formulação,
inteirando assim duas formulas possíveis, a positiva acima citada e a negativa que será
tratada nesse ponto. Deve-se se buscar entender o valor das duas formulações, se as duas
podem ser consideradas máximas éticas e se tem aplicações diferente pelas suas diferentes
formulas.
É notório o fato de que Santo Agostinho conhece também a formula negativa da
regra de ouro, ela está presente na obra do Santo em vários textos e coincide com a
formula apresentada no Livro de Tobias: “Assim, o que não gostas, não o faças a ninguém
(Tb. 4, 31)”. A formula negativa como o próprio nome já diz ao invés de apresentar uma
atitude a ser feita apresenta algo a não ser feito.
A fórmula negativa é a mais utilizada pelo santo doutor em suas obras formuladas
de diversas maneiras. Em suma, são todas maneiras diversas de expressar o mesmo
conteúdo; pois, se forem interpretadas corretamente elas prescrevem a mesma ação: uma
8
“la formula positiva si limita ai dovere nei confronti del prossimo (prescrive infatti di fare agli uomini
ciò che vogliamo essi facciano a noi)”. CATAPANO, Giovanni. La regola d’oro in Agostinho. Apud:
VIGNA, Carmelo; ZANARDO, Susy (ORG.) La Regola d'oro come etica universale. Vita e Pensiero:
Milano, 2005.
18
Não poderá ser vencido por homem algum aquele que vence suas próprias
paixões. Com efeito, não será vencido senão aquele a quem o adversário lhe
arrebata as coisas que ele ama. Então, aquele que ama somente aquilo que não
9 “mentre quella 'negativa' comprende anche i doveri verso Dio”. CATAPANO, Giovanni. La regola d’oro
in Agostinho. Apud: VIGNA, Carmelo; ZANARDO, Susy (ORG.) La Regola d'oro come etica
universale. Vita e Pensiero: Milano, 2005.
19
A regra de ouro que leva ao amor de Deus, se direciona justamente a esse amor
que não pode ser arrebatado e que não causa inveja, pois se outro atinge esse amor e
motivo de felicidade e nunca de inveja, tal amor que não pode ser arrebatado atende as
exigências de uma verdadeira ética, pois sempre se agirá em conformidade com esse
amor, tanto o amor que está destinado ao próximo quanto o que está destinado a Deus, é
assim que a regra em seus dois sentidos atende as expectativas de uma verdadeira ética
de amor.
Em Agostinho o amor se configura sendo “a perfeita justiça — a que nos leva a
amar mais o que vale mais, e amar menos o que vale menos” (AGOSTINHO, Santo. 2017,
p. 79). Ao alcançar essa perfeição o homem se torna capaz de valorizar melhor o que vale
mais, nesse caso, valorizar melhor o irmão, quando diz respeito a regra positiva e valorizar
melhor a Deus, quando diz respeito a regra negativa. A regra de ouro torna-se então
caminho ético por excelência que possibilita o homem conceber melhor suas relações e
os objetos dessas relações levando assim a uma perfeita conduta ética que respeita as
relações humanas e seus objetos.
Diante das duas formulações da regra é importante perceber que as duas devem
ser levadas em conta, ou seja, ao mesmo tempo que se deve tratar bem o seu próximo,
fazendo a ele o que gostaria que fosse feito a si mesmo, também deve-se evitar tratá-lo
mal, não fazendo a ele o mal que não quer para si mesmo, sendo assim as duas
formulações se completam, demonstrando como se deve dar a verdadeira conduta de vida.
20
3 O CONHECIMENTO DA REGRA
10 “esiste quindi una legge rivelata nella scritture, e una legge naturale, scritta non in un libro, ma nel
cuore, che qualsiasi uomo giunto all'uso di ragione può scoprire dentro di sé”. CATAPANO, Giovanni. La
regola d’oro in Agostinho. Apud: VIGNA, Carmelo; ZANARDO, Susy (ORG.) La Regola d'oro come
etica universale. Vita e Pensiero: Milano, 2005.
21
autônomo e acesso à verdade eterna, mas depende, para isso, de iluminação divina” (
FERRARI, 2008)11. Ou seja, a verdade pode ser alcançada por qualquer homem mesmo
que dependendo de uma iluminação divina que nesse sentido seria a revelação que
completa o conhecimento humano preenchendo-o com o que Deus tem a ensinar, as
formulações presentes na revelação, sagrada escritura, seriam nesse sentido meios de
Deus demonstrar ao homem aquilo que ele deseja que eles conheçam, nesse caso a
ordenação da caridade através da regra de ouro: amar a si, amando a Deus e ao próximo;
ao próximo, amando a Deus e a si; e a Deus, amando a si e ao próximo.
Num trecho das Confissões, Agostinho professa a eternidade e imutabilidade do
Verbo Divino que não deixa de ser o que era para passar a ser o que não era, tal afirmação
dá caráter necessário a toda revelação presente no que professou o Cristo, próprio Verbo
encarnado:
Sabemos, Senhor, sabemos que de algum modo uma coisa nasce e morre,
quando deixa de ser o que era e passa a ser o que não era. Na tua palavra, nada
aparece e desaparece, porque é realmente imortal e eterna. Com esta palavra,
que é eterna como tu, enuncias a um só tempo e eternamente tudo o que dizes.
E tudo o que dizes que se faça, realiza-se. Não de outro modo, mas somente
com a palavra, tu crias (AGOSTINHO, 1997, p. 203).
Isso inclui a regra de ouro, por isso para o Santo a regra é imutável e necessária,
pois está presente na revelação do próprio Verbo, o princípio de amor e o de tratamento
da regra são de grande importância para Agostinho graças a isso e como se verá
futuramente tal necessidade da regra se fundamenta melhor ainda ao investigar o coração
do homem.
Num trecho do livro A Trindade ao se perguntar sobre onde estão escritas essas
regras que possibilitam o conhecimento da justiça, inclui-se aqui a regra de ouro, pois
para o Santo ela é uma regra de justiça, Agostinho chega à conclusão de que essas estão
escritas no “livro da luz da verdade” que é também a fonte da revelação divina e que ela
passa a estar escrita no coração do homem junto dessa pratica da justiça, isso se dá porque
para o filósofo Deus, cria, ordena e possibilita o conhecimento das coisas que deve ser
buscado na interioridade do homem:
Onde, pois, estarão escritas essas regras? Elas que possibilitam ao injusto
reconhecer o que é justo, descobrir que deve possuir aquilo que ele mesmo não
possui? Onde hão de estar escritas senão no livro daquela luz que se chama
Verdade? Nesse livro é que se baseia toda lei justa que é transcrita e se transfere
para o coração do homem que prática a justiça. Não como se ela emigrasse de
um lado para o outro, mas a modo de impressão na alma. Tal como a imagem
de um anel fica impressa na cera, sem se apagar do anel (AGOSTINHO, 2018,
p. 280).
Isso é possível para o Santo porque ele admite que Deus ilumina o conhecimento
estando este já anteriormente em nosso espírito. Essa doutrina da Iluminação divina
caracteriza-se por uma luz que não é material e que atinge no encontro com o
conhecimento da verdade para que o homem possa ter uma vida feliz e beata. Essa luz da
verdade, pela qual a alma é iluminada, é Deus ele mesmo ao passo que a alma é uma
criatura que ainda que feita racional e intelectual à sua imagem, quando ela se esforça por
ver a luz ela mesma age com dificuldade é no entanto de lá que lhe vem tudo o que ela
apreende pelo intelecto como ela o pode fazer. A teoria da iluminação, preocupa-se menos
em demonstrar se podemos ou não conhecer a verdade, e mais em nos fornecer as
condições de possibilidade para que o façamos, nesse sentido a regra de ouro é o que nos
leva a condição de possibilidade de amar a Deus e ao próximo.
Através de um pequeno itinerário filosófico de Agostinho, pode ser perceber o
papel central que tem a revelação em seu pensamento:
2017, p. 169). Ou seja, a regra contempla toda a revelação, pois contempla seu mais
importante mistério, o mistério do amor, ao comtemplar o amor enquanto amor ela
apresenta tudo o que é necessário para uma vida em Cristo, o sentido pleno de toda a
revelação.
A lei natural também conhecida como lei eterna ou ainda direito natural na
filosofia de Santo Agostinho seria encontrada no próprio indivíduo que a deveria buscar
em seu interior, é a lei que está inscrita no coração humano. Nos dias atuais, essa ideia é
chamada de moral que é encontrada no foro íntimo da pessoa. Em um primeiro momento,
o homem não possui acesso à essa lei, por ser cometedor do pecado original. Entretanto,
o homem pode ter acesso através da fé. A lei eterna, para Agostinho, visa a paz eterna.
“Contudo, os autores medievais concordaram em valorizar a regra de ouro como
uma expressão importante da lex naturae (lei natural)” (TATRANSKY, 2006, p. 647)12.
Nesse sentido pode se perceber que a regra de ouro é uma importante peça dentro daquilo
que é chamado de lei natural, ou seja, ela está presente nos mais profundos anseios do
coração do homem, pela própria impressão desta nesse coração.
Diante desse texto percebe-se que a regra de ouro não necessita da revelação para
se fundamentar, apesar de essa lhe dar autoridade da promulgação divina, a regra mostra-
se autossustentável através da própria natureza humana, ou seja, na própria criação do
homem foi deixada por Deus em seu coração essa regra que como pertencente a essa
instituição divina se sustenta pela própria natureza humana, pelos próprios anseios de seu
coração.
12 “Tuttavia, gli autori medievali erano concordi nel valorizzare la regola d’oro come un’espressione
importante della lex naturae.”. TATRANSKY, Tomás. SUL VOLUME LA REGOLA D’ORO COME
ETICA UNIVERSALE. Nuova Umanità. XXVIII (2006/5) 167, p. 643-659.
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Vamos supor que, não sei de onde, vem um amigo teu, e sem testemunhas
confia-te certa quantidade de ouro. Somente ele e tu, dentre os homens, tendes
conhecimento disso. Existe, porém, ali outra testemunha que é invisível, mas
vê. O amigo te entregou o ouro secretamente, em teu quarto, talvez sem a
presença de qualquer árbitro. A testemunha presente, não está dentro das
paredes do quarto, mas no recinto de vossas consciências. O amigo entregou e
partiu. Não o contou a nenhum dos seus, esperando voltar, e receber de volta
o que entregara. Como são as coisas humanas, ele morre. Tem um herdeiro, o
filho que deixou. O filho ignora o que o pai possuía e a quem o confiou. Vamos.
Volta, volta, prevaricador, ao teu coração, onde está escrita a norma: “Não
25
faças a ninguém o que não queres que te façam”. Imagina que foste tu quem
confiou o ouro, que não disseste a nenhum dos teus, que morreste e deixaste
um filho. Que querias que teu amigo fizesse? Responde, julga a questão, o
tribunal do juiz está em tua mente. Ali Deus está sentado, tua consciência é o
acusador, e o medo o carrasco. Vives em meio às vicissitudes humanas, na
sociedade dos homens. Pensa no que querias que teu amigo prestasse a teu
filho. Sei o que te respondem teus pensamentos. Julga, então, conforme ouves.
Julga. Haverá uma voz. A voz da verdade não se cala. Não clama com os
lábios, mas vocifera no coração. Presta ouvidos. Fica ali com o filho de teu
amigo (AGOSTINHO, 1997, p. 81).
Quando os pagãos, embora não tenham a Lei, cumprem o que a Lei prescreve,
guiados pelo bom senso natural, esses que não têm a Lei tornam-se Lei para si
mesmos. Por sua maneira de proceder, mostram que a Lei está inscrita em seus
corações: disso dão testemunho igualmente sua consciência e os juízos éticos
de acusação ou de defesa que fazem uns aos outros... (Rm. 2,14-15).
Ou seja, essa lei está inscrita no coração do homem, pois mesmo os que não
conhecem a revelação a praticam como é prevista, tal lei se faz presente no homem por
necessidade, é preciso que ela esteja presente no coração humano para que assim ele possa
agir bem e para que ele seja correto e justo, esse ideal de justiça dado pela regra demonstra
sua natureza ética, pois é ela responsável por fazer o homem agir bem com os outros e
com Deus.
“Como Anne-Marie La Bonnardière esclareceu, quando Agostinho usa o ditado,
‘o que você não gostaria que acontecesse para você, não faça para os outros’, não é para
ele um ato de um texto biblico, mas uma frase que expressa o preceito fundamental da lei
natural” (CATAPANO, 2005, p.115)13, nesse sentido o filósofo observa que a regra de
ouro é um preceito fundamental da lei natural e não um ato específico de um texto biblíco,
sendo assim ele relaciona a regra muito mais profundamente com a natureza humana que
13 “come há chiarito la Bonnardière, quando Agostinho utilizza il detto, ‘quod tibi fieri non uis, alli ne
feceris’, se trata per lui non de un testo scritturistico, ma de una sentenza che esprime il precetto
fundamentale della legge naturale”. CATAPANO, Giovanni. La regola d’oro in Agostinho. Apud: VIGNA,
Carmelo; ZANARDO, Susy (ORG.) La Regola d'oro come etica universale. Vita e Pensiero: Milano,
2005.
26
a própria revelação que traz a conhecê-lá, ela não seria aceita mesmo com a revelação se
não fosse preceito já presente no coração homem.
Portanto, nota-se que a regra pode ser conhecida de duas maneiras distintas, ela
pode ser revelada através da ação divina, bem como pode ser encontrada no próprio
coração do homem, acontece que a regra precisava ser revelada para que os religiosos
nela acreditassem, mas também precisava estar presente no homem para que os pagãos
igualmente o fizessem, o importante é que seja qual for a forma de conhecimento ao que
se deu a regra ela é necessária para uma boa conduta de vida e para um bom agir para
com os outros.
27
Na obra da criação, Deus cria o homem, Adão, no sexto dia. Dando-lhe a Sua
imagem e semelhança:
Para Agostinho, Deus diz à nossa imagem para marcar que não somos imagem só
do Pai, ou só do Filho ou só do Espírito Santo. Somos imagem da Trindade, mas essa
mesma Trindade é apenas um só Deus. “Então o Senhor Deus formou o ser humano com
o pó do solo, soprou-lhe nas narinas o sopro da vida, e ele tornou-se um ser vivente.
Depois, o Senhor Deus plantou um jardim em Éden, a oriente, e pôs ali o homem que
havia formado” (Gênesis 2, 7-8). Terminada a criação do homem Deus lhe dá como
morada um belo jardim chamado Éden.
14
“Imagem de Deus”.
28
Agostinho indica uma oposição entre imago Dei x vestigium Dei15. Pois Deus
deixou seu vestígio em toda a criação e todas as coisas criadas são boas. Mas a ordem
sensível, incluindo nela o homem exterior, só pode manifestar os vestígios de Deus, já
que para Agostinho ela está numa posição inferior. Somente na mente humana, parte mais
nobre da alma que corresponde ao homem interior, é que de fato se manifesta a imagem
de Deus:
Como é dito, Deus não criou o homem e a mulher, mas somente o homem e a
partir dele criou a mulher, sendo assim, toda a humanidade descende de um único homem
criado a imagem e semelhança de Deus, toda a concepção do universo agostiniano
repousa sobre a ideia de semelhança já que todo mundo criado manifesta um elo
fundamental de semelhança com seu criador, todos os seres revelam de alguma forma o
Ser de Deus em maiores ou menores graus de participação no Ser divino, sendo o homem
não só semelhança, mas imagem por excelência de Deus.
Tal dignidade do homem deixava-o acima de qualquer outra criatura material,
deixando-o abaixo apenas dos anjos:
Ao homem, [...] deu uma natureza intermédia entre o anjo e o animal: [...], mas
se, abusando da sua livre vontade pelo orgulho e a desobediência, ofendesse o
Senhor seu Deus, deveria, condenado à morte, viver à maneira dos animais,
15
“Vestígio de Deus”.
29
escravo das paixões e votado, após a morte, a eterno suplício. Foi por isso que
o criou único e só, não certamente para o deixar isolado de toda a sociedade
humana, mas para pôr mais em relevo a seus olhos o vínculo de unidade e
concórdia que esta sociedade deve manter, estando os homens ligados entre si
pela identidade de natureza e pelos vínculos afetivos de parentesco
(AGOSTINHO, 2011, p. 1139-1140).
Ficou claro nesta passagem que o homem, apesar de criado numa natureza
intermediaria entre anjos e animais e mesmo estando muito acima dos animais precisava
obedecer aos preceitos de Deus para não sofrer com a escravidão das paixões como os
animais. Deus criou o homem nessa condição intermediaria para que através de uma
natureza única ela pudesse além de governar o mundo dado viver na unidade e seguir aos
seus preceitos.
Esse estado original no qual Deus criou o homem, pode ser chamado também de
estado de graça que é o estado perfeito de retidão com Deus, estado no qual foram criados
os primeiros pais e no qual se manteriam até a beatitude não fosse pelo pecado original.
Agostinho comenta, caso o homem não tivesse pecado “juntar-se-ia à sociedade dos anjos
e conseguiria para sempre a beatitude eterna sem passar pela morte” (AGOSTINHO,
2011, p. 1139).
Esse estado de graça no qual o homem se encontrava é o estado de perfeita
comunhão com Deus e perfeita vivência do Seu amor, nesse estado pode-se dizer que os
homens viveriam perfeitamente a exigência da regra de ouro, pois, desejariam o bem para
si, para o próximo e para Deus sempre, já que em tal estado não haveria desordem na
natureza humana, pois, todos os homens estariam sob o efeito do amor de Deus, nesse
sentido leva-se em consideração o 3.2 desse trabalho que afirma a regra ter um
fundamento na natureza humana, ou seja, Deus cria o homem com a regra já em seu
coração. Em relação a isso Agostinho faz um questionamento:
Quem é que, de fato, ousaria negar que os primeiros homens no Paraíso tenham
sido felizes antes do pecado [...]? Não é sem motivo que nós hoje chamamos
felizes àqueles que vemos viverem na justiça e na piedade com a esperança da
imortalidade, sem qualquer crime a roer-lhes a consciência, obtendo facilmente
a misericórdia divina para os seus pecados de fragilidade presente. [...] a
respeito do gozo de um bem presente, o primeiro homem era mais feliz no
Paraíso do que qualquer justo na debilidade desta vida mortal. (AGOSTINHO,
2011, p. 1017)
Em vista da resposta que Agostinho dá, pode-se dizer que não é possível ao
homem de hoje, mesmo que muito próximo a Deus, alcançar a felicidade que tiveram
aqueles primeiros homens no paraíso, isso por que por mais santo que seja o homem atual
sofre ao menos o temor do pecado enquanto os primeiros homens sequer o conheciam.
30
O homem ao ser criado nesse estado de graça é um homem de boa vontade, pois
está em perfeita comunhão com Deus “Assim Deus criou o homem, semelhante a Ti. Para
viver na sua bondade e em sua fidelidade, mantendo-se em perfeita ordem carnal e
espiritual. Vivendo sob a graça e sob o efeito do amor dele que é seu Senhor e Criador”
(DALBOM, 2017, p. 22). Ou seja, este é um estado de perfeito amor à imagem de Deus
que há no homem, por isso o homem ama igualmente seus semelhantes já que todos
partilham dessa imagem de Deus em si mesmos.
Para Santo Agostinho, antes do pecado vem a soberba, antes de comer o fruto
proibido é desobedecer a Deus o homem se encheu de soberba e orgulho, ou seja, do
desejo de grandeza que o levou a abandonar a Deus e só pensar em si próprio:
Foi no seu íntimo que começaram a ser maus para logo caírem em ostensiva
desobediência. De fato, não se chega ao ato mau sem que a vontade má o tenha
precedido. Ora qual pode ser o começo da vontade má senão a soberba?
Efetivamente, "o orgulho é o começo de todo o pecado (Ecles. 10,15)". Mas
que é a soberba senão o desejo de uma falsa grandeza? A grandeza perversa
está, na verdade, em abandonar o princípio ao qual a alma se deve unir para se
tornar de certo modo seu próprio princípio. Isso se realiza quando ela se
compraz demasiadamente em si própria. E, de fato, compraz-se em si própria
quando se afasta daquele imutável bem que devia agradar-lhe mais do que ela
própria a si mesma. [...] o mal, a transgressão em comer do alimento proibido,
não se realizou senão por comerem-no quando já eram maus (AGOSTINHO,
2011, p. 1277 e 1278).
A serpente era o mais astuto de todos os animais selvagens que o Senhor Deus
tinha feito. Ela disse à mulher: “É verdade que Deus vos disse: ‘Não comais
de nenhuma das árvores do jardim?’” A mulher respondeu à serpente: “Nós
podemos comer do fruto das árvores do jardim. Mas do fruto da árvore que
está no meio do jardim, Deus nos disse: ‘Não comais dele nem sequer o
toqueis, do contrário morrereis’”. Mas a serpente respondeu à mulher: “De
modo algum morrereis. Pelo contrário, Deus sabe que, no dia em que comerdes
31
Assim, o homem passa a querer apenas o próprio bem e por isso faz-se necessária
a instituição daquilo que é chamado de moral, pois o homem passa a poder fazer coisas
que não deveria e no intuito de evitar que isso aconteça a moral é instituída e Agostinho
a funda no princípio de amor contido na regra de ouro. A perca da capacidade natural do
homem de se relacionar com Deus significa a perca da capacidade natural de se relacionar
com o outro, é nesse sentido que se faz necessário o uso da regra de ouro, pois como
visto anteriormente ela é capaz de ordenar é vinculo de unidade entre sujeito, objeto e o
próprio Amor, que é Deus.
O pecado original se dá por uma má vontade que gera o mau desejo de querer ser
como Deus “no caso do pecado original, a má vontade é o que moveu o primeiro homem
32
ao ato do pecado. [...] Nisto está presente a soberba, na má vontade de querer ser como
Deus, na má vontade e no mau desejo de querer ocupar uma posição que é de seu Senhor”
(DALBOM, 2017, p. 27). Para Santo Agostinho a má vontade não tem uma causa
eficiente, mas se dá por um declínio do estado de perfeição do homem a um estado menos
perfeito:
Para o bispo de Hipona, não se deve procurar uma causa eficiente para a má
vontade, pois ela, a má vontade, começa a se configurar justamente no
momento em que o homem declina do mais perfeito ao menos perfeito, ou seja,
na medida em que a vontade, que é um bem, é corrompida e ocorre uma
defecção, uma perda. Logo, a má vontade é uma privação, ausência de algo
próprio a uma natureza e, por isso, não se devem procurar causas eficientes
para tais privações, já que seria o mesmo que querer ver as trevas por si
mesmas, esquecendo que nada mais são do que ausência de luz (GRACIOSO,
2012, p. 22-23).
Diante disso percebe-se que o estado humano após o pecado é diferente de seu
estado anterior, há depois do pecado uma condição de miséria e instabilidade que antes
não havia, fruto do pecado e de suas consequências na humanidade. Diante dessa ideia de
corrupção o pecado deixa de ser um mal ontológico e passa a ser um mal moral que está
ligado ao livre arbítrio:
Graças as consequências do pecado original o ser humano nasce com sua natureza
desordenada, ou seja, fora do estado de graça:
Isso demonstra como dito anteriormente que o homem perde sua capacidade de
agir e de conhecer: “quando sabia, não quis agir bem e, dessa maneira, foi privado de
notar o que é bom. E, quando podia agir bem, não o quis e, assim, perdeu o poder de
praticar o bem quando quiser” (GRACIOSO, 2012, p. 23), desse modo o homem passa a
34
possuir a má vontade originada pelo pecado e assim necessita de algo além de si mesmo
para superar esse mal e atingir um bem.
Depois da queda o pecado passa a ser parte da natureza humana atingindo todos
os homens que descenderam de Adão:
Ou seja, Adão como o primeiro ser humano, ao cometer o pecado e assim imputar
o mal na sua natureza acabou por transmiti-lo a todos os homens posteriores. Isso porque
Deus não produz nenhuma nova criação, mas apenas administra a criação que já foi feita
e uma das maneiras que utiliza para administrar é através das Razões Seminais, que
existem em forma de forças germinativas que brotarão no tempo. Continuando com
Agostinho:
Tão grande foi o pecado por eles cometido que a natureza humana ficou
deteriorada e com ela se transmitiu aos descendentes a sujeição do pecado e a
necessidade da morte. Todavia, o reino da morte dominou de tal forma os
homens que um merecido castigo a todos precipitaria na segunda morte, que
não tem fim, se uma graça de Deus, não merecida, disso não libertasse um certo
número (AGOSTINHO, Santo. 2011, p. 1233)
Nesse trecho a tese é melhor desenvolvida, pois, o autor afirma claramente que a
gravidade do pecado original foi tanta que deteriorou a natureza humana de modo até
mesmo a transmiti-la aos descendentes, tendo o pecado dominando a natureza humana de
tal modo que todos os homens passariam a merecer a morte.
16
“Razões Seminais”
35
Santo Agostinho fala claramente dá morte como consequência direta desse pecado
no seguinte trecho:
Essa morte, que todos nós, os nascidos de Adão, passamos a dever à natureza,
com a qual Deus ameaçou ao dar o preceito de não comer do fruto daquela
árvore, essa morte está figurada nas túnicas feitas de peles. Eles fizeram para
si túnicas com folhas de figueira, e Deus lhes fez túnicas de peles, ou seja, eles
apeteceram o prazer de mentir repudiando a beleza da verdade, e Deus
transformou seus corpos nesta mortalidade da carne, onde se ocultam os
corações mentirosos (AGOSTINHO, Santo. 2005, p. 577).
Quem de nós, porém dirá que o livre-arbítrio do gênero humano pereceu com
o pecado do primeiro homem? O que pereceu foi a liberdade por causa do
pecado; mas foi a liberdade que havia no paraíso, que possuía plena justiça
junto com a imortalidade; por isso, a natureza humana precisa da graça divina,
como diz o Senhor: Se o Filho vos libertar, sereis verdadeiramente livres (Jo.
8, 36), certamente livres para viver bem e com justiça. O livre arbítrio, de tal
maneira, não pereceu por causa do pecado, pelo qual pecam todos os que
pecam com deleite e, amando o pecado, escolhem o que lhes agrada
(AGOSTINHO, Santo. 1952, p. 465).
Diante de tal situação, o homem nada pode fazer, pois com dito, perdeu a
capacidade de escolher fazer o bem e agir na justiça, mas para Agostinho o homem ainda
pode contar com a graça do Criador que regenera essa liberdade e o possibilita a
novamente buscar e permanecer no bem:
O homem, nesse caso, não tem a capacidade de, por si só, escolher voltar ao
estado original. Antes, precisa da ajuda do Criador e só ele é capaz de regenerar
a liberdade, fazendo com que ela possa novamente buscar o bem e permanecer
nele. A graça de Cristo não só restaura a natureza como também aquela
liberdade que havia perecido por causa do pecado (SILVA, 2009, p. 85).
Ao perder o dom de Deus o homem se pode contar com aquele que o concedeu
para o restituir:
[...]O dom de Deus; o homem perdeu-o por sua própria falta; só quem lho
concedeu é que lho pode restituir. Por isso diz a Verdade: Se o Filho vos
libertar, então é que sereis livres na verdade — que o mesmo é dizer: "Só
estareis verdadeiramente salvos, se o Filho vos salvar". Realmente, Ele é que
é o nosso libertador porque Ele é que é o nosso Salvador (AGOSTINHO, 2011,
p. 1272).
do Seu Filho que veio salvar a humanidade que havia sido perdida e restaurar a imagem
de Deus presente no homem.
Para Agostinho o homem tem a concupiscência que não o permite servir a Deus e
a justiça. Para vencer a concupiscência Agostinho diz que devemos estar debaixo da graça
que concedo o amor ao que a lei prescreve e não da lei que somente prescreve o bem, mas
não o concede:
Somente a graça de Cristo no batismo pode tirar a culpa e levar para a vida
eterna. A concupiscência permanece na natureza depois do batismo, mas com
a renovação da pessoa na vida da graça, pouco a pouco será transformada até
a regeneração final da ressurreição (HILL, 2014, p. 29).
Vê-se também que é a partir do Sacramento do Batismo que o homem pode ser
regenerado por esta graça:
É pelo batismo que o homem passa a viver sob a graça divina, sob o efeito do
amor de Deus. Não por merecimento, pois o justo castigo é o merecimento da
desobediência de seu único ascendente, ao qual todo homem é descendente.
Mas pela infinita bondade de nosso Deus e Senhor, o homem batizado recebe
o resgate de sua alma, a graça de Deus, sendo conduzido por Deus à libertação
do castigo da morte eterna (DALBOM, 2017, p. 69).
37
O Batismo é o que pode conceder a graça ao homem, para que ele volte a viver
sob o amor de Deus e assim o ser humano pode ser conduzido por Deus à libertação do
castigo da morte eterna. É interessante ressaltar que para Agostinho, essa graça não é dada
por merecimento, mas gratuitamente: “Esta graça, sem a qual nem as crianças nem os
adultos podem ser salvos, não é dada em consideração aos merecimentos, mas
gratuitamente, o que caracteriza a concessão como graça. Justificados gratuitamente pelo
seu sangue” (AGOSTINHO, 1998, p. 115).
Por fim, Agostinho afirma que:
Os que tiverem feito o bem avançarão para uma ressurreição de vida"; estes
são os que viverão; "os que tiverem feito o mal avançarão para uma
ressurreição de juízo", estes são os que não viverão porque morrerão da
segunda morte. [...] há duas regenerações, [...] uma, segundo a fé, que agora se
realiza pelo batismo, e a outra, segundo a carne, que se realizará na
incorruptibilidade e na imortalidade pelo grande e último juízo
(AGOSTINHO, Santo. 2011, p. 1997).
5 CONCLUSÃO
Como vimos através de Ratzinger o verdadeiro desafio do eros não está em vence-
lo, mas em conseguir manter uma verdadeira harmonia entre eros e ágape, só assim o
homem pode viver plenamente sua condição e estar inteiramente voltado ao amor para
assim compreender e viver a sua grandeza.
Ora ninguém ama a si, sem amar a Deus e ao próximo; nem ao próximo, sem amar
a Deus e a si; nem a Deus, sem amar a si e ao próximo. “Para Santo Agostinho, a caridade
aparece como a virtude primeira e será entendida como o fundamento de toda a vida ética”
(VIEIRA, 2014, p. 62).
Hannah Arendt (1997, p. 151), em sua leitura de Agostinho, destaca que “o amor
do próximo está ligado, conforme o mandamento da tradição, tanto ao amor a Deus como
ao amar o outro como a si mesmo (tamquam se ipsum)”. Esse amor possui uma ordenação
própria que está presente nos textos de Agostinho como a regra de ouro, nesse sentido, a
ética do amor proposta por ele está fundamentada nessa regra e investiga-la é crucial para
entender o pensamento ético do autor.
39
Diante desse pecado que gera a corrupção da natureza humana somente a graça
pode agir para restaurar a capacidade humana de amor e de viver a regra de ouro:
Desse modo, o pecado não terá domínio sobre nós; pois, não estamos debaixo
da Lei que, de fato, prescreve o bem, porém não o concede; mas estamos
debaixo da graça que, fazendo-nos amar o que a Lei prescreve, pode imperar
livremente sobre nós (AGOSTINHO, 2013, p. 194 e 195).
O mal moral vem da livre vontade desordenada que se afasta do bem e, por isso,
torna-se má:
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42
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43
VIEIRA, Carlos Alberto Pinheiro. O amor como fundamento da ordem social em Santo. PARALELLUS
Revista de Estudos de Religião – UNICAP. Recife, n. 1, jan./jun. 2010.
44
1 De ordine II, 8, 25
17
As formulações da regra estão em latim.
45
12
403: mar – Enarrationes in Psalmis
15/set 32, 6 Non facias alli quod pati non vis.
13
403: Enarrationes in Psalmis
1ºq.dez 84, 12 Non facias alii quod tu pati non vis.
14
403: Enarrationes in Psalmis Quod tibi non vis fieri, ne facias alteri; quod
2ºq.dez 57, 1 ergo tibi nos vis fieri noli alteri facere.
15
403: Enarrationes in Psalmis
2ºq.dez 57, 2 Quod tibi nos vis fieri, alii ne feceris.
16
403 – 404 Sermo 9, 14 (16 – 18) Quod tibi fieri nos vis, alii ne feceris.
17
403 – 404 Sermo 9, 15 Quod tibi fieri nos vis, alii ne feceris.
18
403 – 404 Sermo 9, 16 Quod tibi fieri nos vis, alii ne feceris.
19
Enarrationes in Psalmis
404-405 140, 18 Non facit alteri quod pati non vult.
20
A partir de Quaecumque non vultis fieri vobis, nolite
412 Sermo 260 facere aliis.
21 Quae vultis ut faciant vobis, homines bona,
412: Enarrationes is Psalmis haec et vos facite illis; quod in se non vult fieri,
inverno 51, 10 non debet facere alteri.
22
In Iohannis evangelium Quod tibi non vis fieri, alii ne feceris; quod nos
414 tractatus 49, 12 vis pati, facere noli.
23
Ne mali aliquid faciat quisque alteri, quod pati
44 Epistula 157, 3, 15 ipse non vult.
24
415 Sermo Dolbeau 19, 7 Quod tibi non vis, alio... ne feceris.
25
415-420 Sermo 306, 10, 9 Quod pati non vis, noli facere.
26
Omnia quacumque vultis faciant vobis
416-418 De Trinitate homines bona, haec et vos facite illis.
27
Quaecumque vultis ut faciant vobis homines,
418 De civitate Dei XIV, 8, 2 eadem et vos facile illis.
28
420 – 421, Contra duas epistulas
inv. Palagianorum III, 4, 13 Aliis facientes, quod fieri noluissent.
29
420 – 421,
inv Contra Iulianum IV, 3, 25 ...ut aliis non facerent quod perpeti nollent.
46
30
420 – 421,
inv. Contra Iulianum IV, 7, 30 Noli ergo facere quod pati non vis.
31
Speculum “Quis ignorat” Quod ab alio odis fieri tivi, vide ne alteri tu
427? 24, 279 aliquando facias.
32
Speculum “Quis ignorat” Omnia ergo quaecumque vultis ut faciant vobis
427? 25, 284 homines et vos facite eis.
33
Speculum “Quis ignorat” Prout vultis, ut faciant vobis homines, facite
427? 27, 307 illis similiter.