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Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 1

Escola Tomista
Professor Carlos Nougué
Aula 34
Bem-vindos à 34ª aula de nossa Escola Tomista. Estamos no Tratado das
Categorias ou Predicamentos II.

Pois bem, vamos continuar estes preâmbulos das Categorias, os


antepredicamentos, naquele nosso ritmo monótono de modo a que fique mais
bem fixado o conteúdo da aula para vocês.

Pois bem, tratamos, na aula passada, os equívocos que incluem –


lembrem-se – os equívocos simpliciter, absolutamente falando, e os equívocos
análogos, que não são simpliciter, são secundum quid, secundum quid, por
certo aspecto, segundo algum aspecto. Pois bem, hoje vamos tratar dos
unívocos e de outras coisas.

Pois bem, unívocos, unívocos, a palavra latina univocus, traduz o grego


sinonimon (eu não sei pronunciar grego de jeito algum; perdoem-me, eu sei
que esse “o” aí é uma vogal longa e acentuada; é a única coisa que eu sei).
Pois bem, unívocos traduz a palavra grega sinonimon.

E o que era o sinônimo para Aristóteles? Sinônimo, para Aristóteles,


poderia dizer-se de várias coisas que têm um mesmo nome comum. Então
atenção: podia dizer-se de várias coisas que têm um mesmo nome comum ou
de diversos nomes que tem um só significável. Então repita-se: para Aristóteles
sinônimo (sinonimon) podia dizer-se quer das várias coisas que têm um nome
comum ou de vários nomes – dois ou mais – que têm um significado comum.

Pois bem, isto em grego (sinonimon – sinônimo). Em latim, unívoco e,


portanto, em todas as línguas modernas que traduzem o latim, unívoco só se
usa da primeira maneira, ou seja, é um nome só que se diz de várias coisas da
mesma maneira. Isto é o que quer dizer unívoco. Ao passo que sinônimo, nas
nossas línguas atuais, incluindo o português, é que quer dizer, é que se refere
a duas ou mais palavras que têm o mesmo significado. No Brasil “cão” e
“cachorro”, por exemplo. Lembrem-se que cachorro, em Portugal, é o filhote do
cão, como em espanhol: el cachorro, El cachorrito. Mas, no Brasil, há três
nomes para este mesmo animal: cão, cachorro e perro que é tomado do
espanhol em algumas áreas fronteiriças com países espanoblates.

Pois bem, qual é a definição de unívoco que dá Aristóteles? São aquelas


coisas que têm um nome comum. Aquelas coisas que têm um nome comum e,
segundo este mesmo nome, este mesmo nome significa a mesma noção de
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substância ou essência. Como veremos, ao tratar a substância no Tratado aqui


mesmo das Categorias, substância se diz de dois modos: substância primeira e
substância segunda. A primeira é a substância segundo aquilo que nós
vínhamos entendendo desde o início do curso: substância, suporte de
acidentes, aquilo que subsiste por si, suporte de acidentes. Mas a substância
segunda, como se verá nas Categorias e que tanta confusão fazem em torno
disso, é simplesmente a essência. Certo?

Pois bem, para Aristóteles sinonimon só tem o sentido de unívoco, não


tem o sentido de sinônimo sobretudo. Desculpem-me, não é só o sentido, mas
o que lhe importa no Tratado das Categorias é o sentido de unívoco, ou seja,
as mesmas coisas – várias coisas – que têm um nome comum que significa
uma mesma razão de essência, uma mesma noção de essência.

Ao contrário do que se dava com os equívocos análogos, a noção de


substância ou essência não é diversa, mas igual, igual, igual. Quando eu digo
que eu, você, Joaquim, José, Maria, Josefina somos homens, homem – a
palavra homem aí é um só nome para vários e significam a mesma substância
segunda ou essência. Isto é o que quer dizer unívoco. Aqui não basta que seja
a mesma substância só secundum quid como é no caso dos análogos e como
vimos na aula passada. Deve ser simpliciter, pura e simplesmente,
absolutamente, em termos absolutos, a mesma noção. Noção se diz em latim
ratio (r-a-t-i-o) – a mesma coisa que o logos grego.

Pois bem, não basta, insista-se no assunto, que a ratio dos unívocos
tenha alguma identidade, senão que tem de ser uma identidade total, perfeita e
cabal. Isso é assim porque o unívoco se distingue do equívoco – ainda não o
equívoco absoluto, simpliciter, mas o equívoco secundum quid ou análogo –
então repita-se: o unívoco distingue-se do equívoco assim como perfeito se
distingue do imperfeito. O unívoco, a univocidade é uma perfeição e a
equivocidade, incluindo a analogia, é certa imperfeição. E, enquanto o mal
pode ser de várias maneiras, de diversas maneiras – já vimos no caso aqui em
questão, o equívoco pode ser simpliciter, absoluto, ou secundum quid ou
análogo – o bom não: o bom só pode ser de uma maneira.

Atenção, isto é importantíssimo para o que estudarmos daqui até o final


do curso. O bom, a bondade, aquilo que é bom, é bom absolutamente. Nada
pode ser mais ou menos bom assim como de... nada pode ter vários modos de
ser bom. O bom é bom, assim como o verdadeiro é verdade. A verdade é
verdade. Mas o mal, sim: ele pode ter diversos modos. Vimos, então, duplo
modo quanto ao equívoco que está para o unívoco assim como o mal está para
o bom. E o duplo modo é ser equívoco simpliciter (cão animal e constelação)
ou ser análogo: ente, por exemplo. Deus é ente e as suas criaturas são entes,
mas não são univocamente entes senão que Deus é ente por essência e suas
criaturas são entes, têm o ser, por participação dele mesmo, de Deus mesmo.
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Como veremos, como veremos, a relação entre as criaturas e Deus é uma


relação análoga de atribuição intrínseca. Veremos no momento adequado.

Pois bem, exatamente porque substância aqui denota essência, é que


este segundo modo estende a definição de maneira que não só... não,
desculpe. Esse segundo significado estende a definição de tal maneira que não
se digam unívoco só os nomes e conceitos que se prediquem in quid, ou seja,
essencialmente. O que é que se predica in quid? Já o vimos no Tratado dos
Predicáveis e agora começamos a entender a importância deste tratado. Quais
são os nomes e os conceitos que se predicam in quid? Os gêneros, as
diferenças e as espécies. Já os vimos. Os gêneros, as espécies e as
diferenças. Mas, nesse sentido extenso, pode abarcar-se todos os nomes e
conceitos que se predicam em comum, seja essencialmente, seja
acidentalmente. Per se ou per accidens. Per se é essencialmente, per accidens
é por acidente, acidentalmente. Accidens com dois “cês”. Intrínseca ou
extrinsecamente.

Pois bem, no pensamento de Aristóteles pode dar-se as duas coisas: ou


só se trata aqui daquela predicação, daqueles nomes e conceitos que se
predicam in quid, mas também daqueles nomes e conceitos que se predicam
igualmente não in quid, mas acidentalmente. Mas a intenção de Aristóteles aqui
no Tratado dos Predicamentos ou Categorias é falar sobretudo daqueles
conceitos ou de nomes unívocos que se predicam in quid, essencialmente. Isso
veremos quando ele tratar o predicamento principal que é o da substância. Ele,
com efeito, no capítulo V, parágrafo 3º das Categorias, diz Aristóteles que o
predicamento substância diz que os acidentes não se predicam segundo a
razão de substância. O que implica que não se predicam univocamente à
maneira como a definição se predica daquilo que é definido. Diz, além disso,
que é propriedade das substâncias segundas ou essências – já o veremos – ou
seja, é próprio delas e não dos acidentes. Lembremos que das dez categorias
ou predicamentos uma é substância e os outros são acidentes. Então ele diz
que a propriedade das substâncias segundas, ou seja, a propriedade delas e
só delas e não dos acidentes, é predicar-se univocamente da substância
primeira. Olha que interessante: as substâncias segundas se predicam
univocamente da substância primeira, não de outra coisa. A substância
segunda se predica da substância primeira. Para que se entendam: eu sou
uma substância primeira. A substância segunda ou essência homem se predica
desta substância primeira que sou eu. Assim também com cada um de vocês.
A substância segunda homem se predica de cada substância primeira que são
vocês. Isso tudo nós voltaremos a vê-lo. Aqui, essa última partezinha que eu
falei são setas, são setas, mas setas que se resolverão se não na aula
seguinte, na outra aula, já que o primeiro ponto a tratar nas Categorias é
exatamente as substâncias, seja a substância primeira, seja a substância
segunda.
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Pois bem, dá-se, então, para Aristóteles, a seguinte divisão: alguns


nomes, a alguns nomes se aplica a definição simpliciter e a outros secundum
quid. Portanto unívocos simpliciter são aqueles que se predicam in quid,
essencialmente, como a definição ao definido. E unívocos secundum quid são
aqueles que se predicam acidentalmente.

Então resumo do que acabo de dizer: uma categoria ou predicamento se


predicará essencialmente, enquanto as outras se predicarão acidentalmente,
mas de modo absoluto, perfeito, de modo cabal, essencial, per se a predicação
unívoca é a predicação essencial, é a predicação in quid, é aquilo que se
predica essencialmente.

Pois bem, já estudamos na aula passada os equívocos. Acabamos de ver


os unívocos. Veja que estamos, relembre-se e relembre-se, estamos nos
antepredicamentos. Já-já, assim como vamos vendo pouco-a-pouco a
importância que têm os predicáveis para os predicamentos, assim também
pouco-a-pouco veremos a importância que têm os antepredicamentos para os
próprios predicamentos ou categorias.

Pois bem, se já vimos os equívocos na aula passada e acabamos de ver


os unívocos restam-nos os denominativos com respeito ao qual se fazem as
maiores confusões entre os que pretendem entender esta obra-prima de
Aristóteles que são suas Categorias.

Pois bem. A palavra “denominativus”, denominativus em latim, de onde


vem nosso denominativo, traduz o grego parônimo que quer dizer que tem
nome semelhante ou que deriva de outro. A palavrinha parônima não é
desconhecida dos que já estudaram gramática. Pois bem, em latim o sentido
aqui – não na gramática, mas aqui – o sentido de denominativo é mais preciso
que o sentido da palavra grega parônimo, porque se diz propriamente de um
nome derivado de outro.

Então vamos ver a definição que dá de denominativo ou parônimo


Aristóteles. Com efeito, ao falar da denominação levam-se em conta três
coisas: 1º) a forma denominante. Por exemplo “brancura”, “gramática”.
Cingemo-nos, limitemo-nos a estes dois exemplos. Então repita-se: ao falar de
denominação tem de levar-se em conta três coisas: 1º) a forma denominante –
gramática e brancura, brancura e gramática – a coisa mesma denominada, ou
seja, a coisa branca, o homem gramático e o denominativo que é o que nos
interessa aqui: branco e gramático. Vejam, a coisa branca ou o homem
gramático têm um acidente. Que acidente é esse? Ou, no caso da coisa
branca, tem o acidente brancura e no caso do homem gramático tem o
acidente gramática.

Pois bem, o que é denominativo? São estas mesmas palavras “brancura”


e “gramática” alteradas pela desinência, pela terminação da palavra: branco e
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gramático. De brancura, branco; de gramática, gramático. Claro que isto não é


tão simples, só o disse a modo de... ao modo de introdução.

Para que se entenda, vamos calmamente porque não é tão simples,


conquanto seja simples. Aí a dificuldade não reside do lado de você, reside
antes de meu lado que não é simples de explicar conquanto a coisa seja mais
simples que o equívoco e o unívoco.

Pois bem, os denominativos se definem por três condições. Já vimos que


o denominativo é aquele nome que deriva de outro. Mas atenção: esta
derivação nominal (branco de brancura, gramático de gramática) não é
segundo a origem etimológica. O que é etimológico? É a origem da própria
palavra. Certo? Então esta derivação nominal que se chama denominativo não
é segundo a origem etimológica do nome, porque, com efeito, na origem
etimológica do nome justiça é que deriva de justo e não justo de justiça. É
porque, em geral, etimologicamente, primeiro se formaram nas línguas as
palavras concretas (branco) e depois os abstratos (brancura). Branco é esta
coisa branca aqui; gramático é este gramático aqui. É uma coisa concreta. Só
depois é que, nas línguas, se formaram gramática e brancura.

Muito bem, em geral isto não é, na língua, uma coisa que eu aprendi logo,
que nada é cem por cento quando se afirma uma coisa dessa, né? Mil
variações, mil exceções, etc. e tal, mas, de uma maneira geral, assim é:
etimologicamente nasce primeiro o concreto para depois dar-se o abstrato.

Mas, quando se fala aqui em denominativo, se fala não segundo a origem


etimológica das palavras, mas segundo a própria natureza das coisas. Porque
primeiro é o que é por essência, para depois vir derivativamente aquilo que é
por participação. Assim como as criaturas feitas por Deus derivam por
participação de Deus, assim também o que é por essência – e Deus é ser por
essência – derivam delas o que é por participação. Então, o que é por essência
aqui? O denominante gramático, brancura que é a forma considerada por
essência e dela é que deriva o denominativo branco e gramática por certa
participação.

Alguém poderia objetar: mas estudioso, que é algo virtuoso, estudioso


deriva de virtude, mas não é disso que estamos tratando aqui. Estamos
tratando daquilo que deriva também nominalmente. Tá certo? Ou seja,
segundo a coisa mesma, segundo a realidade, ser estudioso deriva de virtude,
mas não denominativamente. De virtude derivaria virtuoso; de estudo derivaria
estudioso.

Bom, pois bem, a segunda condição para que se dê o denominativo é que


este mesmo denominativo tome o nome denominante declinado ou
transfigurado. Declinado nas línguas declináveis tome-se o caso do latim, né?
Latim. Pegue-se a palavra rosa: rosa, rosa, rosæ, rosa, rosam, rosæ, rosa. Pois
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bem, cada uma dessas terminações, por exemplo rosam, em vez de rosa,
rosam, este “am” final indica que se trata de acusativo ou objeto direto. Claro,
muitas vezes o acusativo não corresponde ao objeto direto português, mas isso
é outro assunto. Isso é para uma aula de latim. Mas, para que se entenda, esse
“am” – rosam – deriva de rosa e, enquanto rosa é o nominativo, rosam é o
acusativo. Rosæ – rosae – rosæ é o genitivo, por exemplo. Da rosa. Pois bem,
isto é o denominante rosa declinado – isto nas línguas declináveis – mas vale
também quando digo, quando falo de transfiguração para as nossas
terminações. Tá certo? Por exemplo: as terminações de feminino e masculino,
por exemplo.

Por exemplo: em português, se se trata de uma mulher – que é gramática


– este “gramática” é um denominativo, embora seja defeituoso. Por que é
defeituoso? Não porque a mulher é gramática, mas é defeituoso porque aí o
denominativo é igual ao denominante: gramática. Então isso é por defeito de
denominação. É um denominativo defeituoso, mas não deixa de ser. Se eu me
refiro a uma mulher que é gramática, este “gramática” é essencialmente um
denominativo do abstrato “gramática”.

Mas atenção: o concreto branco, branco... branco eu sou, eu sou um


concreto branco, mas se se entende o branco como uma participação da
brancura neste sujeito que sou eu, então sim será denominativo. Então se eu
digo “o branco vem aí”, “o branco lhes está falando”, este branco não é
denominativo, mas se eu digo o branco como uma participação da brancura no
sujeito que sou eu – sujeito ou substância são a mesma coisa de ângulos
diversos, voltaremos a vê-lo – aí sim você tem algo denominativo.

A terceira condição para o denominativo é que só haja essa diferença de


caso ou de transfiguração. Esta é a única diferença. Tá certo?

Então, atenção: salvador, a palavra “salvador” é denominativo de


salvação? Salvação é o abstrato. Salvador, a palavra “salvador” é um
denominativo de salvação? Não, não o é. Vejam que interessante: não é
porque salvador não indica qualidade de salvado. Salvado, ou salvo, é que é o
denominativo, salvo é que é o denominativo de salvação. Salvador não indica a
qualidade de salvo, indica a potência de salvar, o poder de salvar, a
capacidade de salvar, mas o que nos interessa é o salvo, que é a qualidade de
salvo que é uma participação do denominante salvação. Na verdade, salvador
não é denominativo: é equívoco. Análogo. Equívoco secundum quid com
analogia de atribuição. E salvo sim é que é denominativo. Claro que estou
novamente lançando-lhes uma seta: o que é ser análogo “salvador” com
analogia de atribuição. Já o veremos, já o veremos. É importantíssimo isso,
mas, por hora, basta saber que, com respeito à salvação, “salvador” não é
denominativo, senão que é equívoco. O denominativo de “salvação” é “salvo”.
Pode dizer-se “salvado”, mas... também... é mais salvo. Salvado nós só
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usamos em português como particípio de conjugações perifrásticas. Então


“tinha salvado” e “havia salvado”, mas “esta aula está salva”. A explicação
dessa diferença que uso dos particípios irregulares e regulares, dou-a
detidamente, longamente na minha Suma Gramatical.

Pois bem, se se consideram essas três condições que acabo de anunciar


e que vocês lerão na transcrição ou reouvirão se voltam atrás na aula, o
denominativo é um meio-termo. Meio-termo entre quê? Entre o unívoco e o
equívoco. Por quê? Porque o unívoco, já o vimos, a ratio, a noção de unívoco é
simpliciter a mesma, igual, absolutamente a mesma para tudo aquilo a que se
atribui. A dos equívocos, como vimos na aula passada, é uma ratio diversa, ao
menos secundum quid. É diversa absolutamente se se trata de equivocidade
absoluta: cão constelação e animal. E é diversa ao menos secundum quid se
se tratar de análogos. Deus é ente: ente referente a Deus e a suas criaturas.
Nos denominativos, por seu lado, em contrapartida, é absolutamente a mesma
quanto à definição ou significado, mas differens casu – vejam, a expressão é
latina – differens é d-i-f-f-e-r-e-n-s, differens casu: c-a-s-u. De novo: differens
casu. D-i-f-f-e-r-e-n-s. Outra palavra: casu – a mesma palavra “caso” em
português só que, em vez de “o”, termina em “u”: casu. Ou seja, enquanto ao
modo de possuir. São setas.

Então, acabamos, com isso, o primeiro antepredicamento que se divide


naquilo que vimos: em equívocos, unívocos – incluindo os equívocos são
equívocos absolutos ou secundum quid que são os análogos – os unívocos e
os denominativos.

É assim que se explica esta parte das categorias de Aristóteles com


respeito à qual já se gastou tanta tinta, às vezes inutilmente. É assim que se
explica e ponto final. Tudo isto é repleto de exemplos, etc. e tal. Vocês terão,
aos que quiserem comprar, quando sair meu Tratado dos Universais. Já
expliquei na aula passada por que ainda não saiu. Mas, quando sair, esta parte
já está absolutamente pronta, né?, vocês verão: há muitos exemplos, muita
ilustração, mas espero que tenha sido suficiente o que eu disse quanto a este
primeiro antepredicamento. Podemos, se não for, escrevam-me.

Podemos agora passar, então, para o segundo antepredicamento que se


divide em complexos e incomplexos.

Então, depois de ter dado as três definições que se explicaram,


Aristóteles estabelece duas distinções: uma que pertence às coisas enquanto
concebidas e outra que corresponde a essas mesmas coisas em si. Veja a
dupla distinção de Aristóteles, do gênio que foi Aristóteles: uma destas
distinções diz respeito às coisas enquanto concebidas, ao passo que a
segunda diz respeito às coisas tal como são em si. Mais precisamente ele diz o
seguinte: das coisas expressas, umas se dizem segundo conexão, outras sem
conexão. Então vamos entender isto que diz Aristóteles.
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Em latim, novamente vamos entender a palavrinha: complexio significa


entrelaçamento, conexão. Em latim, complexio vem de cum (c-u-m) nexus (sem
acento exatamente como se diz, com “x”. Cum nexus, né? Conexão vem de
cum nexus. Complexo significa, então, entrelaçamento ou é sinônimo de
conexão (com nexo, que tem nexo). Ligadura, abraço, abarcamento.

Pois bem, complexo, em português e nas línguas modernas, significa,


como adjetivo, algo composto de elementos diversos e, como substantivo, o
complexo significa conjunto ou união de duas ou mais coisas, ou seja, não se
refere tanto aos vínculos que unem, mas, sobretudo, às mesmas partes que
são unidas.

Pois bem, Aristóteles se refere às coisas enquanto concebidas e essas


coisas, enquanto concebidas, se se dizem segundo complexão, complexão –
que vem de complexo, né? – pode entender-se de duas maneiras, duas
maneiras: segundo composição verbal, o que é o sentido principal, porque o
próprio verbo já implica por si mesmo composição, mas também segundo
composição nominal – sem verbo – este é o sentido estendido.

Vamos fazer uma digressãozinha aqui, um parênteses, porque eu falei, eu


já disse desde o início do curso, que a primeira operação do intelecto é a
inteligência dos incomplexos. Então, vamos ver como Santo Tomás chama
complexo, o que é que Santo Tomás diz por vox complexa (voz complexa, vox
com “x”). O que que ele entende por vox complexa? O que ele entende por vox
complexa é a composição do juízo: isto é aquilo. Já vimos o que é o juízo e a
segunda operação do intelecto. Isso é o que ele chama de vox complexa. Mas
também, às vezes, conquanto ele diga que a primeira operação do intelecto é a
inteligência dos incomplexos – a simples apreensão – ele, às vezes, ele se
refere às coisas significadas pela primeira operação ou simples apreensão
como complexas. Porque lembremos: eu posso dizer que o objeto da primeira
operação do intelecto é homem ou animal racional. Ora, o homem é um nome
incomplexo; animal racional é já uma expressão complexa. Há duas: animal e
racional. Pois bem, então vejam que devemos ter o máximo cuidado com a
polissemia, com a múltipla significação que os termos filosóficos têm sob a
pena dos grandes doutores, sob a pena de um Santo Tomás, sob a pena de
um Aristóteles! Então vejam que, conquanto a primeira operação do intelecto
seja a inteligência dos incomplexos, por certo ângulo e isto mesmo que é um
objeto da primeira operação do intelecto, pode ser complexo por certo ângulo.
Vejam, homem e animal racional são exatamente a mesma coisa e, por um
ângulo, ambos, já que são a mesma coisa, são incomplexos, mas, por outro
ângulo, porque é composta de duas palavras e já vimos que a oração
imperfeita é a simples junção de duas ou mais palavras sem verbo, também
por vezes se refere Santo Tomás a ela como complexas.
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Pois bem, no contesto das categorias de Aristóteles, é preciso entender


complexo em sentido extenso. Vejam só, peguemos a oração – agora é uma
oração perfeita porque tem verbo – “homem corre”, “o homem corre”. “O
homem...”, “homem branco”. Agora é uma oração imperfeita – duas palavras
sem verbo. Mas “homem corre”, “o homem corre” ou “homem branco” têm parte
num predicamento (homem substância) e tem parte em outro predicamento
(corre que, como veremos, é um predicamento ação e branco que, como
veremos, é um predicamento qualidade). Mas se se trata só de “homem corre”
e “branco” estão substancialmente em um só predicamento. E é isso que
interessa aqui, é isto que interessa aqui. Quando Aristóteles divide os
predicamentos em dez categorias, ele está pensando sobretudo nestas coisas
individuais. Ele não está pensando sobretudo em “o homem corre”, “homem
branco”; ele está pensando em “homem”, “corre” e “branco” para dar três dos
dez predicamentos ou categorias: homem - substância; corre - ação; branco -
qualidade.

Pois bem, poderia encontrar-se, poderíamos encontrar ou poderemos


falar de composição ou complexidade das coisas nos conceitos ou nas
palavras. Então a complexidade pode referir-se às coisas, aos conceitos, ou
seja, das coisas enquanto concebidas, e às palavras. Se querem vê-lo, um
pouquinho já o antecipo bastante a certa altura da minha Suma Gramatical,
podendo, e podemos achar complexidão, complexão, complexidade – vamos
para simplificar – em cada um destes âmbitos, ou seja, nas próprias coisas,
nas coisas enquanto concebidas, nas próprias palavras que significam essas
concepções. Por exemplo, tome-se uma natureza única, incomplexa ou
incomposta em si mesma: homem. Tomemos esta natureza: homem. Pode
conceber-se, como dito, de uma maneira complexa (animal racional). Vejam,
então, vejam que interessante: a natureza é incomposta ou incomplexa em si
mesma, mas pode – homem – mas pode conceber-se de certo modo de
maneira complexa ou composta – animal racional. Inversamente uma natureza
composta pode ser concebida, pode conceber-se de maneira simples
(automóvel). O automóvel é uma coisa de si complexa. Tá certo? Ele não tem a
unidade substancial – já vimos, se lembrem de quando falamos dos artefatos,
quando falamos dos artefatos que eles não têm essência por si, não falamos
disso? Pois bem, o automóvel é uma coisa de si complexa, ele não é uma
substância, ele não é uma essência única, mas pode conceber-se de maneira
simples e realmente concebemos de maneira simples o automóvel ou carro.
Pois bem, algo semelhante se dá entre os conceitos e as palavras. Podemos
expressar uma palavra simples, por uma palavra simples, mediante uma
palavra simples, conceitos complexos. Por exemplo: branco, o branco. Tá
certo? E com palavras compostas um conceito simples, mas inominado. Por
exemplo: leão-do-mar. Vejam, é uma palavra composta: leão-do-mar, leão-
marinho, cavalo-do-mar. São palavras compostas que expressam um conceito
único.
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Pois bem, qual é a complexão ou complexidade que nos importa aqui


especialmente, ou seja, aqui no âmbito das categorias de Aristóteles? Pois
bem, o que, quando tratarmos das categorias nos interessará primeira e
especialmente, é a complexão e/ou a incomplexão, ou seja, é a complexidade
ou a incomplexidade segundo o conceito, não segundo a coisa nem segundo
as palavras. Não segundo as palavras porque os conceitos expressam as
coisas antes que as palavras. Não segundo as coisas em si mesmas, porque a
primeira coisa que conhecemos das coisas é o que alcançamos pelos
conceitos, não segundo os conceitos em si mesmos, enquanto conceitos,
porque esse modo de composição já foi considerado nos predicáveis. Vejam
agora, vejam! Não se trata dos conceitos em si mesmos enquanto conceitos,
porque isso já foi tratado nos predicáveis. O que nos interessará nas categorias
são os conceitos enquanto são conceitos das coisas. Então não se trata das
palavras, não se trata das coisas em si, não se trata dos conceitos enquanto
são conceitos, dos conceitos em si, senão que se trata dos conceitos enquanto
são conceitos das coisas. Ou, para expressá-lo de uma maneira mais simples,
o que nos importará é considerar a complexão ou incomplexão, a
complexidade ou a imcomplexidade das coisas enquanto concebidas. Então
repita-se: o que nos interessará não são as palavras, não são as coisas em si
mesmas – isso é o que nos interessará nas categorias de Aristóteles e isso
resolve toda a discussão às vezes vertiginosas que se travou ao longo dos
séculos em torno das Categorias de Aristóteles – o que nos interessará ao
estudar os predicamentos ou categorias de Aristóteles não são as palavras em
si, não são as coisas, não são as palavras, desculpem-me, (2) não são as
coisas em si – disso tratará a Física e a Metafísica – tampouco se tratará de
ocupar-nos dos conceitos enquanto são conceitos, porque isso já estudamos
no Tratado dos Predicáveis, mas o que nos interessará são os conceitos
enquanto são conceitos das coisas, ou seja, vamos considerar, ao estudar as
categorias de Aristóteles, a complexão ou incomplexão das coisas enquanto
concebidas.

Pois bem, podemos passar ao terceiro antepredicamento. Este também


se subdivide duplamente: o primeiro é estar em um sujeito; o segundo é dizer
de um sujeito.

Quanto a este terceiro antepredicamento, as discussões então beiram à


alucinação, sobretudo modernamente perdeu-se a capacidade de entender
completamente este importantíssimo terceiro antepredicamento cuja divisão é
estar em um sujeito e dizer-se de um sujeito. Relembremo-nos que sujeito é
aquilo que suporta uma predicação ou aquilo em que se dá algo ou a que ou
em que inere algo. Isto é o sujeito, ou seja, é pouco mais ou menos o mesmo
que substância visto por outro ângulo. Mas isto é uma seta. Por hora fiquemos
com que o terceiro e importantíssimo antepredicamento – antepredicamento,
aliás, transcritores, não é “anti” predicamentos; se fosse “antipredicamentos”
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seria algo contrário ao predicamento, senão que é antepredicamento, ou seja,


anterior ao predicamento, assim como se diz antediluviano, ou seja, antes do
dilúvio universal. Pois bem, então divide-se o terceiro antepredicamento em
estar em um sujeito ou dizer-se de um sujeito.

Repita-se que essas distinções são fonte comuníssima de confusões


porque se utiliza um termo sujeito em sentido equívoco. Aqui a palavrinha ou
termo “sujeito” está usado não de maneira unívoca, mas de maneira equívoca.
Há uma dupla distinção: a primeira delas – peço-lhes que acompanhem com
atenção, qualquer dúvida escrevam-me – é a distinção real entre substancial e
acidental. Isto é que quer dizer ser ou estar em um sujeito. Aqui referimo-nos
com estar ou ser em um sujeito, estar ou ser ou dar-se no sujeito, referimo-nos
à distinção real entre substancial e acidental. Não é uma distinção que façamos
racionalmente. Claro que a concebemos racionalmente, óbvio, somos nós que
entendemos a coisa, mas é uma distinção que se dá na coisa mesma, é uma
distinção real. Bom, e a outra é a distinção de razão entre universal e particular.
Isto é que é dizer-se de um sujeito. Então, vamos de novo: trata-se de uma
distinção, trata-se de um uso de sujeito equívoco e não unívoco. No primeiro
caso, estar ou ser ou dar-se em um sujeito remete à distinção real entre
substancial e acidental, ao passo que dizer-se de um sujeito remete à distinção
de razão entre universal e particular.

Pois bem, muitos de vocês ou alguns de vocês já hão de ter ouvido ou


lido que o que caracteriza, uma das teses fundamentais, um dos pilares
fundamentais do Tomismo é a distinção real entre essência e ser e não uma
distinção de razão. Veja, esta distinção entre real – in re, na coisa – real, na
realidade, uma distinção real e a distinção de razão vai fundar um dos pilares
do Tomismo, a distinção real entre essência e ser. Claro isto é uma baita seta,
isto é uma enorme seta, porque só voltaremos a tratá-lo e só se entenderá
perfeitamente a distinção real entre essência e ser ao estudarmos, ao nos
ocuparmos da Metafísica. Mas aqui se trata da distinção real entre substancial
e acidental e a isto remete o ser ou estar ou dar-se no sujeito e a distinção de
razão entre o universal e o particular e a isso remete o dizer-se de um sujeito.
Então vamos aos pouquinhos, não é esse... já é mais... um pouquinho mais
difícil que o anterior, mas nada impossível.

A distinção real entre substancial e acidental, ou seja, o estar, ou dar-se,


ou ser em um sujeito antes de tudo. Então tentemos explicá-lo.

Tudo aquilo que entra nos predicamentos, tudo aquilo que cai nos
predicamentos ou é algo em si, ou está em um sujeito. Ou é algo em si e não
em um sujeito, ou é, ou está, ou se dá em um sujeito. Então repita-se: tudo
quanto cai, tudo quanto se encontra sob os predicamentos ou categorias que,
lembremos, dizemos as categorias de Aristóteles, mas não como se ele as
tivesse inventado, dizemos as categorias de Aristóteles porque ele as
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 12

descobriu, não inventou, a não ser que se entenda inventado no sentido de


descobrir, o que também é possível, mas tudo que entra, tudo que cai, tudo
que se encontra sob os predicamentos, nos predicamentos, no âmbito dos
predicamentos ou categorias, ou é em si e não em um sujeito ou é em um
sujeito. Esta é uma distinção primeira e evidentíssima. A nossa inteligência
capta como evidente no próprio modo de ser das coisas que se oferecem
imediatamente à nossa experiência sensível. Com efeito, se eu olho para
alguém, para José, um de vocês, para José, eu verei que José é em si, José é
em si. Isso que chamo José, esta substância que eu chamo José, é em si.
Subsiste por si. Por isso é substância. E ela pode ser negra ou branca ou
amarela ou vermelha. E ser branco, amarela ou vermelha é em um sujeito. Isto
é de evidência. Não é preciso pensar muito. Isto é de evidência. Pode ser que,
com respeito às coisas que se dão evidentemente pela experiência sensível à
nossa inteligência, pode ser que não a saibamos explicar, mas é evidente que
uma coisa é José, outra sua cor. Que José é em si e que sua cor é em José.
Isto é que é ser num sujeito. Pois bem, por isso é que é claro que o ser branco
ou negro ou amarelo, o ser filho, o ser marido ou esposa são coisas que são
em um sujeito. Em contrapartida, o que é ser homem, corpo, mesa, são coisas
que são em si e não em um sujeito. O homem pode ser branco, negro,
amarelo, vermelho; o corpo pode ser magro ou gordo, grande ou pequeno; a
mesa pode ser marmórea ou de madeira, de mármore ou de madeira. Mas
cada uma dessas coisas, por este ângulo que tratamos, são em si e não em
um sujeito. Enquanto branco, de mármore, esposa, filho, pai, marido são coisas
que se dão em um sujeito.

Pois bem, Aristóteles dá três condições para que as coisas possam dizer-
se em um sujeito, e na Física, no seu livro A Física – que relembro, cuja
tradução que fiz trabalhosíssima, será lançada em janeiro ou fevereiro junto
com meu livro Da necessidade da Física Geral aristotélico-tomista, será
lançada a tradução que eu fiz mais meu livro, vão ser lançados num só volume
pela É Realizações –, pois bem, na Física Aristóteles distingue oito modos de
ser em algo. Ele quer entender a primeira condição do que é ser em um sujeito.

Pois bem, ele distingue no livro da Física, ele distingue oito modos de ser
em algo. Vou arrolá-los. Primeiro modo: como a parte no todo, como a parte no
todo. Por exemplo, meu braço no todo. Meu braço está em algo que é o todo
que sou eu. O todo nas partes, porque, com efeito, o todo também está nas
partes. Eu estou nas minhas partes. Esse é o segundo. O terceiro é como a
espécie no gênero. Assim, cisne, homem, etc. estão no gênero animal, mas o
quarto modo é como o gênero na espécie, porque, com efeito, o gênero animal
está em suas espécies homem, cisne, cavalo, dromedário. O quinto como a
forma na matéria. O sexto como o efeito está em sua causa. O sétimo como
uma coisa está em seu fim e, finalmente, como o localizado está no lugar.
Naturalmente voltaremos a estudar estes oito modos ao estudarmos a Física
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 13

de Aristóteles, exatamente a Física Geral. É o ponto do nosso programa Física


Geral.

Mas, na primeira condição dele, está que não se trate de parte, que não
sejam como partes. Pois bem, se assim é, estão excluídos os quatro primeiros
modos, ou seja, uma parte no todo, o todo na parte, como a espécie no gênero,
o gênero na espécie. Mas ele diz que, além de não ser como partes, ou seja,
estar em um sujeito, ele não pode ser separado daquilo em que é, ou seja,
estar em um sujeito implica que ele não pode ser separado daquilo em que ele
está. Se assim é excluem-se os três últimos dos oito modos, ou seja, o efeito
na causa, uma coisa em seu fim, e o localizado no lugar.

Resta, então, como a forma está na matéria. Mas aqui, vejam, como a
forma está na matéria é algo que só se entende na Física. Então estamos
longe dela ainda. Temos de traduzir como a forma está na matéria assim como
a forma acidental está no sujeito. Eu sou um sujeito. A forma acidental “branco”
está em mim. Então este é o único modo dos oito modos dados por Aristóteles
na Física que se leva em consideração ao tratar do ser em um sujeito. Certo?

Bom, então isto é... acabamos de falar da distinção real entre substancial
e acidental. Substancial sou eu; acidental são as formas acidentais que só
podem existir em mim, só podem dar-se em mim, só podem ser em mim.

Pois bem, vamos ver agora a distinção de razão – não real agora, é
importante, mas não é real, é de razão, nós é que entendemos essa distinção
na coisa que, no entanto, não é real – é a distinção de razão entre universal e
particular e é a isso que remete o dizer-se de um sujeito. Antes vimos o estar
ou ser ou dar-se em um sujeito, e isto corresponde à distinção real entre
substancial e acidental. Agora não. Temos o dizer-se de um sujeito que remete
a uma distinção de razão entre universal e particular.

Pois bem, tudo o que se encontra ou cai ou está nos predicamentos, sob
os predicamentos ou pode afirmar-se de um sujeito – e é então universal:
homem branco – ou não pode afirmar-se de um sujeito e é singular: preto ou
branco. Então, esta distinção entre universal e particular é a mesma distinção
aqui entre universal e singular, a coisa singular. Então, repita-se essa primeira
coisa que disse: tudo quanto cai sob os predicamentos ou pode predicar-se,
afirmar-se de um sujeito e é, então, universal – homem branco – ou não pode
afirmar-se ou predicar-se de um sujeito, ou dizer-se de um sujeito, e aí é
singular – Pedro, este branco. Carlos é singular. Este branco sou eu mesmo.
Este aqui: Carlos. Este é singular ou particular.

Mas atenção: dizer-se de um sujeito não significa predicar-se de um


sujeito numa proposição. A proposição, lembremos, é a obra da segunda
operação do intelecto. Nesta posso dizer perfeitamente “este é Pedro”, “este é
Carlos”, “esta é Maria”, ou posso dizer “esta mesa é branca”, “esta parede é
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bege”. Aqui, quando se fala de dizer-se ou predicar-se ou afirmar-se de um


sujeito, significa ter debaixo de si um inferior do qual possa predicar-se. Então
não se trata da segunda operação do intelecto, trata-se dessa predicação de
um inferior que é a razão mesma do universal, já vimos. Pode predicar-se de
um inferior como o todo universal da parte subjetiva. Já o vimos. Como o
gênero se predica da espécie ou como a espécie se predica do indivíduo. O
cisne é animal. Carlos é homem.

Muito bem. A distinção é de razão e por que é que se diz que a distinção
é de razão? Porque as coisas em si mesmas são singulares. Eu sou singular,
cada um de vocês é singular, a parede é singular, a mesa é singular. Elas são
só universais enquanto são consideradas pela razão. E o que faz a razão?
Abstrai do singular o particular. Isso já o vimos. A razão abstrai. Por isso é uma
distinção de razão, mas eu sou o singular.

Pois bem, universal e singular ou particular se dão simpliciter,


absolutamente no predicamento substância, substância. Isso nós veremos.
Então registre-se, consigne-se isso, assinale-se isso com muita firmeza:
universal e particular ou singular se dão simpliciter, perfeitamente,
absolutamente, pura e simplesmente no predicamento substância, porque só a
substância, como já dito e redito, é simpliciter unívoca e só a substância é
singular por si mesma. O branco, que sou eu, não é singular por si mesmo. Ele
só é singular porque está em um sujeito que sou eu, que é a substância Carlos.

Pois bem, o acidente é universal unívoco secundum quid, segundo certo


aspecto, e é singular em razão do sujeito, como acabo de dizer, ou seja,
enquanto é ou está ou se dá neste sujeito que sou eu que é cada um de vocês,
que é aquela parede, que é esta mesa.

Pois bem, Aristóteles então dá a combinação destas duas distinções no


terceiro antepredicamento. Isso é importante. Ele se dá – desculpem-me, eu
tenho de pegar o papel pra ler – trata-se agora da combinação das duas
distinções que já vimos – a distinção relativa a ser em um sujeito e de dizer-se
de um sujeito – a combinação das duas distinções no terceiro
antepredicamento dá-a Aristóteles. A distinção entre substancial (distinção real)
entre substancial e acidental divide o predicamento substância dos demais
predicamentos. Isto é importantíssimo. A distinção real entre substancial e
acidental divide o primeiro predicamento ou categoria dos nove outros, dos
demais predicamentos. Já a distinção entre universal e singular divide
interiormente todos e cada um dos predicamentos. Então repita-se isto que é
fundamental, esta parte fundamental da parte chamada antepredicamento das
categorias de Aristóteles: a distinção real entre substancial e acidental se dá
entre o primeiro predicamento por um lado e todos os nove outros
predicamentos ou categorias de outro lado. Já a distinção entre universal e
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singular divide interiormente cada uma e todas, todos os predicamentos,


incluída a substância, os dez predicamentos.

Pois bem, a combinação disso tudo dá lugar a quatro classes de coisas, a


quatro espécies de coisas, a quatro sortes de coisas. Aí temos o único
documento desta aula, que está em PDF, que é exatamente a combinação das
duas distinções no terceiro antepredicamento. Ali vocês verão no documento
um asterisco no título. Temos (A) a distinção real entre substância,
entresubstancial e acidental: estar ou ser em um sujeito, eu prefiro ser, vou
mudar isso: ser em um sujeito. Da distinção de razão entre o universal e
particular, ou seja, dizer-se de um sujeito. Aí vocês verão todas as
combinações possíveis e eu vou ler aí o quadro. Se vocês não entenderem
perfeitamente o quadro, por favor escrevam-me.

As coisas que são, as coisas que existem – vamos, ponhamos para


facilitar a coisa – dizem-se do sujeito: as universais; não se dizem de nenhum
sujeito: as singulares. Não estão em sujeito, ou em um sujeito: as substanciais
homem, algum homem, é, não, não estão, é e um sujeito, e entre os singulares
algum homem, e estão em um sujeito as acidentais branco – entre as
universais – e, entre as singulares, algum branco. Então vejam, repita-se o
quadro: as coisas que são dizem-se do sujeito: as universais. Não se dizem de
nenhum sujeito: as singulares. Não estão em um sujeito dentre as substanciais:
homem; dentre as singulares o exemplo: algum homem. Estão em um sujeito:
as acidentais. Entre as universais: branco; entre as singulares: algum branco.

Estamos no grau de abstração elevadíssimo, concebo, mas, antes


mesmo, depois, na próxima aula nós a começaremos tratando o quarto
antepredicamento que são as regras de inclusão. Mas darei aqui um tira-gosto
porque, após os antepredicamentos que são mais árduos, entraremos nos
predicamentos mesmos ou categorias e vou antecipar algo que direi outra vez
na próxima aula só pra lhes dar o gostinho do que está por vir aí depois dos
antepredicamentos, ou seja, nos próprios predicamentos ou categorias.

Escreve Aristóteles nas Categorias, no livro: cada uma das coisas que se
dizem fora de toda combinação ou significam uma substância, ou um quanto,
ou um qual, ou um relação a algo, ou uma ubiquação ou onde, ou um quando,
ou um achar-se em algum lugar, ou um estar de certo modo, ou um fazer, ou
um padecer. É substância, para dizê-lo como exemplo, homem/cavalo, é
quanto de – o termo é antigo – de dois codos, de três codos (é certa medida) é
qual, ou seja, qualidade (branco/letrado), é correlação a algo
(dobro/metade/maior) é onde ou ubiquação (no liceu/na praça do mercado). É
quando (ontem/o ano passado). É situação (o achar-se situado/jazer/estar
sentado/estar deitado). É ter (vai calçado/vai armado). É fazer (cortar, ou seja,
ação, cortar/queimar). É padecer (ser cortado/ser queimado).

Agora já entramos em algo bem mais concreto.


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Nenhuma destas expressões, continua Aristóteles, por si mesma dá lugar,


dá ensejo a afirmação alguma, mas de sua mútua combinação surge a
afirmação. Com efeito, toda afirmação é, ao que parece – agora já estamos na
segunda operação do intelecto e ele dá uma antecipação – com efeito toda
afirmação é, ao que parece, verdadeira ou falsa, enquanto nenhuma das coisas
ditas à margem de toda combinação é nem verdadeira, nem falsa como, por
exemplo, homem-branco-corre-vence.

Pois bem, voltamos àquela distinção entre a primeira operação do


intelecto – segunda operação do intelecto. Só na segunda há verdade ou
falsidade, enquanto na primeira não há verdade ou falsidade.

Pois bem, creio que posso dar por encerrada esta aula. Muito obrigado
pela atenção. Deixei o quarto antepredicamento que não é tão simples, as
regras de inclusão, para a próxima aula, mas saibam já que já na próxima aula
começaremos a estudar o primeiro dos predicamentos, o primeiro das
categorias que é a substância que, como antecipado, se divide em substância
primeira, ou seja, aquilo que entendemos até hoje como substância, aquilo que
é suporte de acidentes concretamente porque subsiste por si – eu, esta
substância singular aqui – ou a substância segunda que também, de que
também se pode predicar coisas, mas que, agora, é sinônimo de essência.

Muitos tradutores traduzem substância por entidade. Isto é um absurdo


total. Isso é um total absurdo. A melhor tradução para que prossigamos na
mesma tradição filosófica ocidental é substância primeira e substância segunda
como sinônimo de essência ou quididade. Poder-se-ia traduzir... trata-se do
grego ousía. Ousía se escreve o-u-s-i com acento – eu digo na transliteração –
“aousia”. Em grego não há esse som “z”. Então e “ou” é “u”. Então se diz ussia.
O-u-s-í, com acento, a. Ousía pode traduzir-se quer por substância, quer por
essência. A tradição ocidental latina optou por traduzir por substância primeira
e substância segunda. Poder-se-ia, em tese, traduzir por essência primeira ou
essência segunda, mas isso lançaria confusão e completo desarranjo em
nossa mesma tradição. É uma tradição milenar! Então o melhor é mesmo a
tradução... isso, eu voltarei a explicar isso ao tratarmos já na aula que vem o
predicamento substância. O melhor é deixar como substância primeira e
substância segunda, assim como define o coordenador daquela edição, não sei
se vocês veem aqui, a edição portuguesa maravilhosa – que infelizmente não
se completou pela crise econômica de Portugal – das obras completas de
Aristóteles feita por António Mesquita. Falarei dele bastante na aula que vem.
Ele sustenta e exatamente eu sustento com ele que a melhor tradução é esta
mesma: substância primeira e substância segunda para ousía primeira e ousía
segunda, conquanto, repita-se, pudesse, em tese, ser essência primeira e
essência segunda, em tese, mas, de modo algum, poderia ser entidade
primeira e entidade segunda o que constitui um verdadeiro absurdo filosófico.
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Muito obrigado pela atenção. Nos vemos na próxima aula e não se


esqueçam: qualquer dúvida, qualquer, não se avexem de perguntar-me. O
aluno é, por definição, ignorante. Ou seja, o aluno, por definição, não sabe
algo. Por isso, exatamente, que ele tem um professor. Ele tem um professor
exatamente para superar aquela ignorância que ele tem. Pois bem, não tenham
vergonha alguma de me perguntar o que quer que seja. Estou aqui para isto
mesmo.

Muito obrigado pela atenção. Até a nossa próxima aula.

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