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que os moradores do Estado fossem forçados a se moverem rumo a capital, neste meio tempo,
no estado vizinho, o Rio Grande do Norte, sofria com uma forte epidemia de varíola, um vírus
que era capaz de ficar até 2 semanas no corpo do hospedeiro sem apresentar qualquer sintoma
e isso era um dos principais fatores pela doença ser tão traiçoeira e difícil de ser evitada,
apenas depois de passado este tempo o contaminado pela doença começaria a sentir os
primeiros sintomas como febre, vômito e dores no corpo. A doença continuava a evoluir, até
chegar no ponto que fazia a doença ser tão cruel, manchas vermelhas começavam a ser
espalhar por todo corpo que em breve se transformariam em tumores e bolhas cheias de
líquido. Estimava-se que cerca de 30% das pessoas afetadas pela varíola viriam a óbito, sendo
as crianças as mais afetadas pelo vírus.
Devido ao grande volume de retirantes que saíam do interior do Estado rumo a capital, a
doença acabou se espalhando e tornou-se inevitável. Dentre aqueles de maior poder aquisitivo
a varíola não era tão arrasadora, pois a maioria vivia em boas condições, moravam em bairros
nobres e bem habitados. Porém, aqueles que acabavam de chegar ali eram os que mais
sofriam, eram obrigados a se aglomerarem em bairros com condições sanitárias precárias e,
como agravante, a fome e a sede era muito forte nesses grupos que se aglomeravam na capital
cearense.
Para termos ideia de como estava Fortaleza durante este tempo, no livro Varíola e
Vacinação no Ceará, escrito por Rodolfo Teófilo, foi documentado que; “A população de
Fortaleza podia-se calcular em 130 mil pessoas, das quais 110 mil eram retirantes, que
acossados pela secca, para escapar a fome haviam se refugiado na capital da província”.
Teófilo também documentou em seu livro que a epidemia se alastrava rapidamente na cidade;
“Em 30 de setembro, poucos dias depois da invasão da peste, já o lazareto tinha em
tratamento os 300 enfermos de sua lotação e a epidemia marchava a passos gigantescos”. O
sistema de saúde já não comportava mais os doentes, os hospitais haviam entrado em colapso.
Em outro trecho do mesmo livro, Rodolfo Teófilo demonstrava que já não havia mais
esperanças na capital, e que as mortes já eram muitas um pouco mais de 1 mês após o início
da epidemia; “No fim de outubro já não havia mais esperanças de restabelecer um serviço
hospitalar mais ou menos regular tal a cifra dos variolosos. Mais de cinco mil enfermos
contavam-se disseminados pela área sub-urbana da cidade afóra, os 592 mortos durante o
mez”. Os relatos demonstram como a doença se espalhava rapidamente e em dezembro deste
ano a doença chegou ao seu ápice, fazendo com que não só o sistema de saúde entrasse em
colapso, mas também o sistema funerário. Teófilo documenta também que os coveiros
precisavam trabalhar em estado de embriaguez, pois as cenas eram fortes e o álcool ajudava.
No mesmo livro, Rodolfo Teófilo descreve que Fortaleza tinha “aspecto de sombria
desolação”, onde os comércios estavam todos fechados, nas casas só se encontrava luto e
tristeza e nas ruas tinha-se a impressão de que era uma terra abandonada
As vítimas fatais eram tantas, que em 1994 operários que trabalhavam em obras de
saneamento da cidade encontraram dezenas de ossadas que foram de vítimas da varíola que,
por ter os cemitérios todos lotados, foram jogados em uma vala qualquer no meio da cidade.
Em 2020, Fortaleza, assim como o resto do mundo, se encontra novamente tendo que
lidar com outra epidemia, desta vez a Covid-19. Apesar de estarmos falando de 142 anos de
diferença, muitas semelhanças podem ser encontradas nos dois cenários, em como a doença
cresceu e como ela assola de forma mais cruel as pessoas que se encontram em áreas de
vulnerabilidade social. Entretanto, desta vez, os mais pobres não foram os responsáveis pela
disseminação da doença na cidade pois, diferente da varíola onde pessoas que vieram a capital
se refugiar da miséria ajudaram a espalhar o contágio, a Covid-19 foi disseminada pelas
classes mais altas do País, tendo em vista que é uma doença de origem chinesa. Contudo,
apesar das classes mais altas terem sido as primeiras a serem afetadas pela doença, foram as
classes mais baixas que mais sofreram.
Para levarmos estatísticas como base, o Meireles, bairro nobre de Fortaleza, até agosto
de 2020 foi o bairro mais afetado pelo Covid-19 com 1.673 casos, junto com a Aldeota, outro
bairro de classe média-alta com 1.439 casos, porém ao observarmos a quantidade de óbitos os
bairros citados nem sequer aparecem entre os mais afetados, sendo a Barra do Ceará, bairro
periférico de Fortaleza o que mais sofreu com 123 mortos, logo acompanhado de Vila velha
com 107 mortos e Vicente Pinzón com 88 mortos.
Estes números podem ser explicados por via de diversos indicativos, pois, assim como
na crise da varíola, a população mais pobre não tinha condições de manter-se fora de
aglomerações, a sua imensa maioria anda de ônibus, precisam trabalhar e não se dispõem do
luxo de poder ficar em casa, por mais que o governo tente incentivar estas medidas fica
praticamente impossível pra quem precisa trabalhar no dia a dia. Porem, mesmo assim
tivemos longos períodos de quarentena e até lockdown, onde tudo deve ser fechado, as ruas
ficaram desertas e só serviços essenciais continuaram funcionando, como transporte público,
farmácias, supermercados (onde era possível ver pessoas comprando alimentos em grande
quantidade afim de estocar, por medo do que poderia vir em seguida), hospitais e etc.