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p-ISSN: 1519-5902
e-ISSN: 2238-0094
http://doi.org/10.4025/rbhe.v16i4.779
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* Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo, Professora de História da
Educação, Universidade de São Paulo – USP, São Paulo – SP. E-mail:
anajcosta@gmail.com.
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entre as últimas décadas do século XIX e os primeiros anos do século XX
Introdução
A reflexão sobre educação popular, mais especificamente sobre
educação das classes trabalhadoras, no passado ou nos dias de hoje, não
deve se limitar à forma escolar (Vincent, Lahire & Thin, 2001). Para além
da escola, havia e há muitas formas de aprender, inclusive de aprender a
cultura letrada. Nesse sentido, as associações de trabalhadores foram
espaços privilegiados de aprendizagem entre meados do século XIX e
início do século XX. Acompanhando-as, podemos contar, um pouco, a
história da educação das classes populares naquele período, bem como a
história da formação da classe trabalhadora no Brasil. Associando essas
histórias, encontramos, por um lado, a participação da educação no
processo de formação dessa classe e, por outro, o papel ativo das classes
trabalhadoras na conquista do direito à educação.
Trabalhos historiográficos recentes têm demonstrado a expansão do
fenômeno associativo no Brasil, durante o século XIX (Batalha, 1999;
Barata, 1999; Chalhoub, 2007; Gondra & Schueler, 2008; Morel, 2005).
Esse movimento, de grande importância política e social, manifestou-se
em diversos formatos: confrarias, irmandades religiosas e leigas,
academias, lojas maçônicas, grêmios, sociedades corporativas ou
profissionais, beneficentes, filantrópicas, de auxílio mútuo, científicas,
literárias, pedagógicas, institutos de pesquisa, imprensa periódica,
tipografias, editoras e livrarias, etc. Marco Morel (2005) assinala a
necessidade e, ao mesmo tempo, a dificuldade de se estabelecer uma
tipologia dessas associações heterogêneas, muitas vezes instáveis e
efêmeras, em certos casos com múltiplos fins (beneficentes, pedagógicos,
filantrópicos, religiosos, culturais, científicos, etc.).
Gondra e Schuler (2008) procuraram realizar uma sistematização
das associações envolvidas com a prática pedagógica no império
brasileiro. Classificando-as entre as forças educativas ao lado do Estado e
da Igreja, esses autores destacam as mais proeminentes: Sociedade
Auxiliadora da Indústria Nacional; Sociedade Amante da Instrução;
Sociedade Propagadora das Bellas Artes (promotora do Lyceo de Artes e
Officios); Sociedade Propagadora da Instrução para as Classes Operárias
da Lagoa. Destacam, ainda, sociedades que ligavam abolicionismo e
instrução, como é o caso do Club dos Libertos Contra a Escravidão que,
além de promover alforrias de escravos, mantinha um curso noturno de
instrução primária para livres, libertos e escravos.
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francesa no século XVI feita por Davis (1990), uma similitude com a
realidade tratada aqui. Segundo ela, a pobreza que esperamos encontrar
entre os homens que não tinham qualificação alguma, que faziam serviços
avulsos quando os encontravam, também era o fardo do oficial qualificado
e mesmo do mestre. Circunstâncias da vida, como ter muitas bocas para
alimentar, ser dispensado, ficar doente, engravidar, poderiam ser
catastróficas para a vida daqueles sujeitos.
Somada aos imprevistos apontados por Davis, outra situação
aparentemente recorrente, pela frequência com que os estatutos das
associações beneficentes do Rio de Janeiro oitocentista lhe designavam
socorros, era a detenção do sócio. Segundo os estatutos da ‘Auxiliadora
das Artes e Ofícios e Beneficente dos Sócios e Suas Famílias’, “[...] o
sócio que for preso criminalmente, a sociedade deverá tratar da maneira de
seu livramento [...]” (Estatutos da Sociedade Auxiliadora das Artes e
Ofícios e Beneficente dos Sócios e Suas Famílias, 1835, p. 8). Até que
fosse provada sua culpa, o sócio teria auxílio. Tal recorrência tem a ver
com a tênue fronteira entre o mundo do trabalho e o ‘mundo da desordem’.
Esses condicionantes da experiência dos trabalhadores os
distinguiriam como classe em face da ‘insegurança estrutural’, conceituada
por Savage (2004), contra a qual se organizavam as associações de
auxílios mútuos e beneficência. O conflito de classes expressava-se
sutilmente nessas organizações entre a autoproteção do homem pobre
trabalhador e a busca de tal proteção nos círculos da elite; entre a crítica da
estrutura social desigual e a necessidade de deferência aos poderes que
mantinham tal ordem. Essa ambiguidade se expressava ainda nas
composições, muitas vezes interclassistas, das associações fundadas por
trabalhadores. Era o caso da ‘Sociedade Montepio dos Conservadores’,
fundada por “Joaquim Ferreira dos Santos, João da Silva Augusto e José
da Costa Corrêa entre si e outros operários empregados na conservação da
via permanente e material rodante da Estrada de Ferro de D. Pedro II e
domiciliados na Barra do Piraí, onde a Sociedade [tinha] sua sede e foi
instituída em 1881” (Projeto de Estatutos da Sociedade de Socorros
Mútuos Montepio dos Conservadores, 1881). Como era comum entre
outras sociedades beneficentes de trabalhadores, procuravam-se evitar
discussões “[...] que não tenham por fim estes princípios [humanitários e
beneficentes] e a fraternal convivência entre os sócios” (Projeto de
Estatutos da Sociedade de Socorros Mútuos Montepio dos Conservadores,
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entre as últimas décadas do século XIX e os primeiros anos do século XX
Nessa época, os fins da associação eram intervir nos conflitos entre patrões e
associados, criando para isto uma caixa de resistência; defender os interesses
dos profissionais, procurando obter por meios legais o aumento de salário e a
diminuição de trabalho, prestar auxílio médico, farmacêutico e pecuniário em
casos de acidente de trabalho, defender os associados, caso fossem presos por
delito profissional e comemorar o 1º de maio (Batalha, 2009, p. 184).
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Nas leis escritas, nas atas, nos relatórios vemos a estreita ligação dos
trabalhadores com o mundo da escrita e da leitura. Mesmo os que
possivelmente não soubessem ler e escrever presenciavam e escutavam a
leitura de relatórios e balanços de gestão em assembleia. No relatório
referente a 1863/64 da ‘Imperial Sociedade Auxiliadora das Artes
Mecânicas Liberais e Beneficente’6, identificamos o costume de o
secretário apresentar o livro de atas das sessões do Conselho nas
solenidades de posse dos novos conselheiros. Nos estatutos da ‘Sociedade
Bem Estar dos Caixeiros’, estabelecia-se, como um dos deveres dos
sócios, “[...] o tributo dos seus conhecimentos que deveriam ser dirigidos
ao conselho, ‘por escrito’, sob forma de quaisquer indicações das quais se
possam tirar utilidade” (Estatutos da Sociedade Bem-Estar dos Caixeiros
no Rio de Janeiro, 1836, p. 16, grifo nosso). A crença implícita aqui é
aquela narrada por Thompson quanto à história da formação da classe
operária inglesa: “[...] ‘um homem é um homem, apesar de tudo’. […] os
procedimentos baseavam-se na crença deliberada de que todo homem era
capaz de raciocinar e de aumentar suas capacidades [...]” (Thompson,
2004, p. 202, grifo do autor).
No desempenho de funções sociais, a leitura, a escrita e o cálculo
eram de grande importância. As formalidades da escrita estavam presentes
na vida de um associado desde seu ingresso, uma vez que, como consta
nos estatutos da ‘Auxiliadora das Artes e Ofícios e Beneficente dos Sócios
e Suas Famílias’ e outras entidades pesquisadas, ele deveria, por escrito,
“[...] apresentar ao conselho um requerimento em que declare seu nome,
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naturalidade, idade, estado civil, arte ou ofício que exerce, rua e número da
casa, (Estatutos da Sociedade Auxiliadora das Artes e Ofícios e
Beneficente dos Sócios e Suas Famílias, 1835, p. 5). No entanto, ser aceito
em uma dessas organizações era só o início da vida associativa. No
momento seguinte, já se fazia necessário entrar em pleno contato com suas
leis ‘escritas’.
Os estatutos eram respeitados como a lei máxima das entidades, o
que pode ser notado em diversos relatórios, como o da ‘Protetora dos
Artistas Sapateiros e Classes Correlativas’, no qual encontramos a seguinte
frase: ‘sabemos observar tudo quanto nossa lei predisse e impôs’. Temos
aí uma escrita organizadora da classe. Para além desses artefatos mais
cristalizados, permanentes apesar das reformas pelas quais vez ou outra
passavam, a escrita e o cálculo eram ferramentas organizativas de extrema
importância no dia a dia das associações. Segundo o mesmo relatório, era
“[...] o cobrador quem [nivelava] os destinos de uma associação! [Era] o
escriturário quem [garantia] o bem estar dos sócios pela fidelidade e
clareza dos seus livros” (Relatório da Sociedade Protetora dos Artistas
Sapateiros e Classes Correlativas, 1886).
Outras habilidades necessárias para a administração de uma
associação expressam-se em alguns verbos presentes nos estatutos da
‘Auxiliadora das Artes e Ofícios e Beneficente dos Sócios e Suas
Famílias’ para designar as funções do tesoureiro: “[...] ‘organizar’ a conta
geral da receita e despesa da sociedade. […] ‘Apresentar’ mensalmente ao
Conselho uma demonstração da receita e da despesa. […] Assistir às
seções do Conselho e ‘opinar’ em qualquer matéria financeira, ‘dando a
este respeito, de viva voz ou por escrito, as informações’ que o Conselho
exigir [...]” (Estatutos da Sociedade Auxiliadora das Artes e Ofícios e
Beneficente dos Sócios e Suas Famílias, 1835, p. 6, grifo nosso). O mesmo
tipo de habilidade era esperado do conjunto dos sócios da ‘Associação
Tipográfica Fluminense’ reunidos nas assembleias gerais: ‘examinar’ se a
associação tem sido bem administrada; ‘tomar todas as medidas que
julgar’ úteis à associação; ‘resolver’ sobre acusações de infração dos
estatutos; ‘aprovar ou rejeitar’ as reformas dos estatutos propostas pelo
conselho. Discutir, deliberar, aprovar, rejeitar, etc. Esses verbos, que
podem ser cotejados por meio de uma comparação entre todas as
sociedades aqui estudadas, se listados, nos dão notícia de uma intensa ação
reflexiva no interior dessas organizações.
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Tabela 2. Práticas educativas das associações fundadas a partir de 1890 até 1917
Periódico/ Conferências/
Nome Biblioteca Instrução Formal
Impresso Exposições
Intuito de aulas
gratuitas no ensino
Associação
primário e
Beneficente do
Intuito de secundário, cursos
Corpo De
- biblioteca para militares, -
Oficiais
os sócios profissionais, de
Inferiores da
educação física para
Armada
associados, seus
filhos e tutelados
Intuito de Intuito de criar
Associação de Intuito de
manter aulas primárias e
Marinheiros e manter uma -
biblioteca e profissionais para
Remadores revista oficial
sala de leitura associados
Associação de
Intuito de fundar
Resistência dos Intuito de
escolas para
Cocheiros, jornal de - -
associados e seus
Carroceiros e propaganda
filhos
ClassesAnexas
Encaminhava
educação
Associação dos
profissional literária
Funcionários - - -
para os filhos do
Públicos Civis
associado
necessitado10
Centro dos Ensino teórico e
Operários - - prático em escola -
Marmoristas noturna
Intuito de fundar
Liga Federal
escolas onde os
dos Intuito de
sócios possam
Empregados - manter -
aprender o
em Padaria no biblioteca
português e o
Rio de Janeiro
esperanto
Partido
Echo Popular - - -
Operário
Partido
Operário do O Socialista - - -
Brasil
gratuita dos filhos dos sócios pobres e por metade das pensões ordinárias para os sócios que
tenham fortuna” (Conselho do Estado. Seção do Império, 1863).
10 Procurava promover a admissão dos filhos dos sócios em estabelecimentos educacionais
enquanto a associação não possuísse um congênere.
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Periódico/ Conferências/
Nome Biblioteca- Instrução Formal-
Impresso Exposições-
Partido
Gazeta
Socialista - - -
Operária
Brasileiro
Sociedade
Cosmopolita
Protetora Dos O Panificador - - -
Operários em
Padaria
Intuito de
conferências e
Sociedade de
publicações que
Resistência dos Intuito de
Intuito de Intuito de aulas de interessem à
Trabalhadores jornal de
biblioteca instrução primária classe e sejam
em Trapiche e propaganda
fonte de
Café
instrução e
educação cívica
Sociedade dos
Carpinteiros e
Acordem! - - -
Artes
Correlativas
Sociedade
Operária do Cursos para
- - -
Jardim operários
Botânico
Instruir e Instruir e
Sociedade
orientar por orientar por
União dos - -
meio de meio de
Foguistas
biblioteca conferências
União dos
Operários das O Congresso - - -
Pedreiras
União dos Intuito de Intuito de Intuito de
Intuito de aulas de
Operários jornal de criação de realização de
instrução primária
Estivadores propaganda biblioteca conferências
União Operária Escola primária
do Engenho de - - para crianças dos -
Dentro dois sexos
União
Protetora do Intuito de criar Intuito de criar
- -
Comércio biblioteca escolas de instrução
Volante
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mas uma forma de imprimir dinâmica ao olhar histórico. Seria uma forma
de ver como as mudanças ocorrem quando os seres refletem e agem sobre
sua própria vida e o mundo à volta. No caso, seria uma forma de ver como
as classes populares na Corte e Província do Rio de Janeiro participaram
da instauração de determinados projetos educacionais, fossem vencedores
ou vencidos, mas sempre fruto de lutas.
Considerações finais
Quando se pensa em educação popular e, nesse bojo, em educação
das classes trabalhadoras, muitas vezes, a concepção da necessidade se
sobrepõe à concepção do direito. A educação para esses sujeitos viria, via
de regra, suprir uma falta, constituindo-se em uma intervenção de fora para
dentro de seu universo cultural.
Em nosso caso, procuramos olhar a educação popular de outra
lógica. Tomamos como pressuposto o papel ativo das classes trabalhadoras
em sua educação. Tipógrafos, artistas mecânicos, caixeiros, sapateiros,
padeiros e tantos outros produziam e transmitiam conhecimentos. Foi
especificamente em suas associações de classe que buscamos os indícios
da educação intrínseca às suas práticas organizativas, além da apropriação
que fizeram da forma escolar.
Identificamos que o caráter educativo das associações dos
trabalhadores, por um lado, e sua organização para promover a educação
formal, por outro, corresponderam a um processo que denominamos
‘educar-se das classes trabalhadoras’, a uma parte da própria formação da
classe.
Optamos por um recorte horizontal no universo das associações de
trabalhadores da passagem do século XIX para o século XX. Dessa forma,
não aprofundamos a análise sobre qualquer uma delas, especificamente.
Foram, majoritariamente, associações de auxílio mútuo e beneficência,
posto que estas predominaram durante o século XIX. No entanto, na
passagem para o século XX, já foi possível observar o trânsito dessa
hegemonia para organizações com caráter classista e ideologicamente mais
definidas.
Procuramos compreender seus padrões de experiência,
principalmente no que diz respeito às ações educativas formais, ou não,
encontradas em seus relatórios e estatutos. Não focalizamos as
especificidades de projetos educacionais ideologicamente marcados,
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Referências
Barata, A. (1999). Luzes e sombras: a ação da maçonaria brasileira (1870-
1910). Campinas, SP: Unicamp.
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Educação e formação da classe trabalhadora no Rio de Janeiro
entre as últimas décadas do século XIX e os primeiros anos do século XX
Maciel, L. A. (2006). De ‘O povo não sabe ler’ para uma história dos
trabalhadores da palavra. In L. A. Maciel, P. R. Almeida, & Y. A.
Khoury (Orgs.). Outras histórias: memórias e linguagens (p. 228-229).
São Paulo, SP: Olho D'água.
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Vincent. G., Lahire, B., & Thin, D. (2001). Sobre a história e a teoria da
forma escolar. Educação em Revista, (33) 7-47.
Fontes
Assistência Pública e Privada no Rio de Janeiro (Brasil). (1922). História e
estatísticas. Município do Rio de Janeiro. Comemoração do Centenário
da Independência Nacional. Rio de Janeiro, RJ: Typographia do
Anuário do Brasil.
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