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PPGCOM PROGRAMA DE
PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO
Organizadores
Goiânia
PPGCOM/FIC/UFG
2021
© 2021 Programa de Pós-Graduação em Comunicação – Universidade Federal de Goiás
Qualquer parte desta publicação pode ser reproduzida, desde que mencionada a fonte.
Disponível em: https://ppgcom.fic.ufg.br/
CDU: 316.77
Apresentação
RESUMO
Intentamos, nesse breve artigo, articular os conceitos de Comunicação, Cultura e Educação a partir
de uma perspectiva focada em imagens de Exu, entidade que ocupa lugar proeminente no panteão
dos orixás, a partir do Candomblé, religião de matriz africada consolidada no Brasil. Em outras
palavras, buscamos aqui uma perspectiva epistemologicamente centrada no conceito de Exu
enquanto esfera dinamizadora da vida. Para isso, nos amparamos nas próprias vivências de pessoas
africanas em diáspora, especialmente as pessoas negras brasileiras. Exu, orixá senhor da
Comunicação entre o Aiyê e o Orun – grosso modo, terra e céu na cosmogonia nagô – aparece nas
leituras que fazemos de Muniz Sodré, Luiz Antônio Simas & Luiz Rufino, estando também nas
margens do conceito de mediação de Jesus Martín-Barbero, bases que fundamentam o presente
texto. O levantamento bibliográfico aqui proposto enquanto metodologia pode subsidiar estudos
futuros com foco nas performances culturais e na comunicação pelas imagens capazes de reorientar
imaginários. Associar positivamente signos das culturas diaspóricas ao campo comunicacional,
conforme acreditamos, ensaia a possibilidade de ressignificar comunicação, cultura, educação, além
da própria dialogicidade conforme proposta pelo educador Paulo Freire. A construção do trabalho
alia uma elaboração teórico com imagens fotográficas que ancoram nossos argumentos visualmente
com os imaginários de Exu, desde suas insígnias, até o transe mediúnico. Defendemos, com a
presente escrita, uma virada epistêmica que recoloca imagens e imaginários do Candomblé na
centralidade de noções e conceitos importantes em nossas pesquisas. Tudo isso, enquanto exercício
que tem o propósito de combater o epistemicídio histórico que domina as relações de produção do
conhecimento. Os estudos aqui apresentados compõem parte das pesquisas realizadas no âmbito do
Programa de Pós-Graduação em Comunicação que buscam fortalecer a educomunicação enquanto
metodologia, mas também e especialmente como epistemologia comunicacional. Compreendemos
ser a educomunicação, um campo teórico-prático profundamente propositivo, uma vez que provoca
intervenção considerando a educação para a mídia; o uso das mídias na educação; a produção de
conteúdo educativo; a gestão democrática das mídias; além da prática epistemológica e
experimental do que podemos chamar de cultura.
1
Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Comunicação (PPGCOM) da Faculdade de Informação e
Comunicação (FIC) da Universidade Federal de Goiás (UFG). Jornalista no Instituto Federal de Goiás (IFG) –
Campus Jataí. Integra o Pindoba – Grupo de Pesquisa em Narrativas da Diferença. evaldo.silva@ifg.edu.br
2
Doutora em Antropologia. Professora da Universidade Federal de Goiás, com atuação nos Programas de Pós-
Graduação em Comunicação, da Faculdade de Informação e Comunicação, e em Performances Culturais, da
Faculdade de Ciências Sociais. Coordenadora do Pindoba – Grupo de Pesquisa em Narrativas da Diferença.
luciene_dias@ufg.br
O Exu, que chamamos aqui de senhor da Comunicação, foi o mais vilipendiado pelo
sincretismo religioso. Dono de uma sexualidade não normativa, carregando azeite de dendê
na peneira e matando ontem um pássaro com a pedra que jogou hoje, Exu é transformado
no diabo cristão. Com seu Ogó, porrete em formato fálico que é usado para proteger Oxalá,
o senhor do pano branco, e cobrar as oferendas a ele destinadas, e o seu tridente, Exu se
posta nas encruzilhadas. O próprio Exu zomba dessa relação e, ao mesmo tempo, se protege
nela uma vez que cristãos temem o diabo.
Tentam aprisionar Exu, mas o senhor dos muitos caminhos segue pelas praças,
vendendo e comprando a liberdade e a subversão. Ou como anuncia o ponto cantado do
povo de rua:
“Exu é assim
assim ele é
ele pode não ser anjo,
mas diabo ele não é.
Eu sei que você sabe
Mas eu falo pra você
Dendezeiro não dá mel
Abelha não faz dendê
Aquele que hoje fere
Ferido amanhã vai ser
Exu subverte os caminhos, defende seu povo das amarras do projeto colonial ou, em
outras palavras, nos ensina que “a astúcia de praticar a dobra na linguagem é a forma que
temos de não nos subordinarmos diante da imposição de normas que nos violentam e nos
negam enquanto possibilidade” (SIMAS & RUFINO, 2018, p. 73).
Figura 5: Pomba Gira Rosa Vermelha. Exu de Babá Walisson de Baru, do Ile Ase Baba Ona Layo.
O pesquisador Muniz Sodré (2017) caracteriza a educação libertária como uma busca
capaz de conduzir a formas diversas de soberania individual ou coletiva. Essa educação
3 CONCLUSÃO
Sujeitos sociais, para a perspectiva aqui defendia, não devem existir como meros
receptores. Toda pessoa participante do diálogo deve falar junto e atuar de forma a permitir
que os “objetos” comuniquem suas intenções. Pensando nisso, a caracterização da
comunicação é simplesmente o diálogo. “É então indispensável ao ato comunicativo, para
que este seja eficiente, o acordo entre os sujeitos comunicantes. Isto é, a expressão verbal
de um dos sujeitos tem que ser percebida dentro de um quadro significativo comum ao
outro sujeito” (FREIRE, 1983, p. 53).
O diálogo de que falamos não é apenas o diálogo entre um sujeito e outro, entre
quem escreve e quem lê. É o diálogo firmado no chão empoeirado da encruzilhada Atlântica,
por onde portugueses, africanos e indígenas se encontraram. É a forma como cada uma das
matrizes culturais que passaram a habitar esse território, nas praças do novo mundo,
ressignificaram suas existências, resistências e reexistências. É o santo católico que dizimou
tupinambás e que foi canibalizado por eles. Destacamos que tanto nas culturas tupinambás,
quanto nas culturas bantos, há a canibalização simbólica dos adversários. De acordo com
Simas & Rufino (2018), ao serem derrotados pelos portugueses sob a bandeira de São
Sebastião, os tupinambás uniram suas forças às do santo católico que, em um outro cruzo,
se torna o Inquice caçador dos bantos e patrono dos Candomblés de Caboclos, onde os
Abstract: In this work, we intend to articulate the concepts of Communication, Culture and Education
from a perspective that focuses on the images of Exu, an entity that occupies a prominent place in
the pantheon of the orishas, from the Candomblés of Nagô origin and which is syncretized with the
Vodun Elegbará, deity of the Fon peoples, and the inquice Aluvaia, of the Bantu peoples, in addition
to the cushions of the umbandas and quimbandas. In other words, an epistemologically perspective
centered on the concept of Exu / Elebgará / Aluvaia as a dynamic sphere of life based on the
experiences of African people in the diaspora. Exu, orixá lord of Communication between Aye and
Orun - which can be roughly translated as earth and sky in the Nagô cosmogony - appears in the
readings we do by Muniz Sodré, Luiz Antônio Simas & Luiz Rufino, being also on the margins of the
concept mediation of Jesus Martín-Barbero, foundations that underlie the construction of the
thought that led to this text. The bibliographic survey that we propose as a methodology can support
future studies focusing on cultural performances and communication through images that are
capable of reorienting imagery, especially in educational spaces. To positively associate signs from
diasporic cultures to the communicational field, as we believe, rehearses the possibility of re-
signifying communication, culture, education, in addition to Freire's dialogicity itself. The
REFERÊNCIAS
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GRAMSCI, Antônio. Os intelectuais e a organização da cultura. Rio de Janeiro: Civilização
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SILVA, Renata de Lima. Corpo limiar e encruzilhadas: processo de criação na dança. Goiânia:
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SIMAS, Luiz Antonio; RUFINO, Luiz. Fogo no Mato: A Ciência Encantada das Macumbas.
Mórula editorial. Rio de Janeiro, 2018.
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SODRÉ, Muniz. Claros e escuros: Identidade, povo, mídia e cotas no Brasil. Petrópolis, RJ:
Vozes, 2015.
SODRÉ, Muniz. Reinventando a educação: Diversidade, Descolonização e Redes. Petrópolis,
RJ: Vozes, 2012.