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Tabela

de Conteúdos
INDICE
PREFACIO
INTRODUÇAO
Capı́tulo I MITOS COSMOLOGICOS E CONTOS DE ORIGENS
GERAÇAO ESPONTANEA: VIDA E MORTE
OS GOVERNADORES DO MUNDO: A LUTA ENTRE O SOL DA DEUSA E A
TEMPESTADE DE DEUS
MAIS CONFLITOS E COMPROMISSOS
EPISODIOS E MITOS DE ORIGEM
CRENÇAS A RESPEITO DA ALMA
O PARAISO BUDISTA E OS CUSTODIOS DO MUNDO
Capı́tulo II LEGENDAS LOCAIS E OSS DE CULTOS COMUNAIS
TOPOGRAFIA E DIVISAO EM CLAS
Capı́tulo III FADAS, SERES CELESTIMOS, OS HOMENS DA MONTANHA
A ORIGEM DOS CONTOS DE FADAS
AS FADAS DOMESTICAS
AS FADAS BUDISTAS, O TENNIN E OS RYUJIN
4. OS TAOISTAS IMORTAIS
Capı́tulo IV DEMONIOS, VAMPIROS E OUTROS SERES FANTASMA
O DIABO
O FANTASMA COM FOME E O ESPIRITO IRRITADO
OUTROS SERES FANTASMA
Capı́tulo V HISTORIAS ROMANTICAS
Capı́tulo VI CONTOS HEROICOS
Capı́tulo VII HISTORIAS DE ANIMAIS
I. ANIMAIS GRATOS
ANIMAIS VENGATIVOS E MALICIOSOS
A SERPENTE
O AMOR E O CASAMENTO DOS ANIMAIS
INSETOS, ESPECIALMENTE BORBOLETAS
Capı́tulo VIII HISTORIAS DE PLANTAS E FLORES
ARVORES MITICAS
OS GENIOS DAS PLANTAS
AS FADAS DA FLOR
4. O CALENDARIO FLORAL
Capı́tulo IX HISTORIAS DE ENSINO, HUMOR E SATRIES
A ADAPTAÇAO DE HISTORIAS PARA FINS DE ENSINO
A HISTORIA DE BONTENKOKU
HUMOR E SATYRE
UM TEMPO DE DESCONTENTE E SATYRE
APENDICE
BIBLIOGRAFIA

Sobre o autor

-MITOLOGIA JAPONESA-
*
MASAHARU ANESAKI

© 1947 Masaharu Anesaki

Design da capa: Aroa Graphics

Ilustraçã o da capa: Mishitsume Kawi


ÍNDICE

Prefácio

Introdução

Capítulo I. Mitos e histórias cosmológicas das origens
I. Geraçã o Espontâ nea: Vida e Morte
II. Os governantes do mundo: a luta entre a deusa-sol e o deus-
tempestade
III. Mais con litos e compromissos
4. Episó dios e mitos das origens
V. Crenças Relacionadas à Alma
SERRAR. O paraı́so budista e os guardiã es do mundo

Capítulo II. Lendas locais e cultos comunitários

Capítulo III. Fadas, seres celestiais, homens das montanhas
I. A Origem dos Contos de Fadas
II. As fadas-donzelas
III. As fadas budistas, o Tennin e o Ryujin
4. Os Imortais Taoı́stas

Capítulo IV. Demônios, vampiros e outros seres
fantasmagóricos
I. O diabo
II. O Fantasma Faminto e o Espı́rito Enfurecido
III. Outros seres fantasmagó ricos

Capítulo V. Histórias Românticas

Capítulo VI. Contos heróicos



Capítulo VII. Histórias de Animais
I. Grato Incentiva
II. Animais Vingativos e Maliciosos
III. A serpente
4. O amor e casamento de animais
V. Insetos, especialmente borboletas

Capítulo VIII. Histórias de plantas e lores
I. Arvores Mı́ticas
II. Os gê nios das plantas
III. As fadas das lores
4. O Calendá rio Floral

Capítulo IX. Histórias de ensino, humor e sátiras
I. A adaptaçã o de histó rias para ins didá ticos
II. A histó ria de Bontenkoku
III. Humor e sá tira
4. Uma é poca de descontentamento e sá tira

Apêndice
Folclore japonê s em cançõ es tradicionais

Bibliogra ia

Sobre o autor
PREFACIO

O objetivo deste livro nã o é contar histó rias engraçadas para o


divertimento dos curiosos, mas dar ao leitor sé rio uma visã o geral do
personagem e da variedade de mitos e contos japoneses
tradicionais. Consequentemente, as histó rias sã o narradas da forma
mais concisa possı́vel, tendo-se tomado grande cuidado em apontar as
conexõ es, conceituais ou histó ricas, que existem entre as diferentes
narrativas.
Muito se tem falado sobre as crenças religiosas que fundamentam
essas histó rias, uma vez que o autor considera que a atividade
mitoló gica da mente humana é indissociá vel de seus credos
religiosos. No entanto, nã o tira quaisquer conclusõ es sobre a natureza
exata da conexã o entre os dois ou a prioridade de um sobre o outro.
Por outro lado, o autor sabe muito bem que muitas ideias ou
histó rias devem sua existê ncia à s circunstâ ncias da vida social dos
povos que variam em cada perı́odo de sua histó ria. Esta visã o das
questõ es foi seguida em alguns casos, embora nã o tã o completamente
como o autor teria feito se nã o estivesse limitado pelo espaço
disponı́vel. Algo mais será dito a esse respeito na obra do autor
de Arte Japonesa em sua Relação com a Vida Social.
Muitos livros foram escritos sobre mitologia e literatura japonesas,
mas eles geralmente se limitam a uma parte especı́ ica do tó pico ou
apenas querem entreter. O presente trabalho pode talvez ser
considerado como um tratado mais ou menos sistemá tico sobre todo o
assunto. O autor espera que esse fato remunere o leitor, em certa
medida, por achar o livro pouco divertido.
O autor tentou incluir um capı́tulo sobre o
é pico Heike Monogatar[1] i, porque sua histó ria, tanto o enredo
principal quanto os episó dios secundá rios, foram amplamente
recitados pelas rapsó dias e se tornou a origem de muitas narrativas
dramá ticas. Mas as limitaçõ es de espaço o forçaram a pular esse
capı́tulo e deixar o tó pico para uma publicaçã o separada.
M. A
Karuizawa, Japão, janeiro de 1927

Ã
INTRODUÇÃO
AS PESSOAS, A TERRA E O CLIMA EM RELAÇAO A MITOLOGIA E AO
FOLCLORE

O arquipé lago alongado que serpenteia pelos mares orientais da Asia,


conhecido hoje como Japã o, nos tempos primitivos era habitado por
aborı́genes cabeludos chamados Ainus. A palavra Ainu signi ica
"homem" em sua lı́ngua. Dois ou trê s mil anos atrá s, grupos invasores
começaram a migrar do continente, com toda a probabilidade
pousando em vá rios pontos, em momentos diferentes. Esses invasores
foram gradualmente empurrando os nativos do paı́s, primeiro para o
Leste e depois para o Norte. Nã o se sabe ao certo de onde vieram esses
conquistadores, embora a hipó tese mais prová vel seja que eles
cruzaram o Mar do Japã o a partir do continente asiá tico,
pela penı́nsula coreana. Devemos esquecer que o nú cleo bá sico dos
japoneses, como o dos coreanos, difere em muitos aspectos do dos
chineses. A origem dos japoneses deve ser buscada mais ao norte do
que a dos chineses ou da raça Han. Por outro lado, a a inidade dos
coreanos com os japoneses está bem estabelecida.[2] e é possı́vel que
um dia seja possı́vel veri icar satisfatoriamente essa a inidade com
outras raças que habitam o Norte da Asia.
Mas os japoneses sã o um povo mesclado, e a raça até parece ter
mudado por meio de vá rias imigraçõ es, mais frequentemente da costa
oriental da China ou das ilhas do sul e, ocasionalmente, do lado
ocidental do Mar do Japã o. Os diferentes nú cleos sã o diferenciados pela
maioria dos especialistas da seguinte maneira: os japoneses autê nticos
geralmente tê m uma face oblonga com um nariz aquilino; o elemento
chinê s, por outro lado, tem o rosto mais achatado e as maçã s do rosto
mais proeminentes; e o tipo sulista ou malaio é marcado por um rosto
redondo em formato de bola e olhos muito estreitos. As caracterı́sticas
predominantes dos chineses nas ilhas ocidentais sã o naturalmente
explicadas pela fá cil conexã o por mar entre aquela parte do Japã o e
a foz do rio Yangtze.
Por outro lado, a existê ncia de um elemento meridional pode ser
inferida do fato de que os setores meridionais das ilhas ocidentais, de
acordo com a histó ria lendá ria, foram perturbados de tempos em
tempos por invasores turbulentos do extremo sul, chamados Hawkmen
(Haya-para) e a raça de urso (Kuma-so). Alé m disso, nesta parte do
paı́s, principalmente na provı́ncia de Satsuna, onde os nomes pessoais
compostos de "urso" sã o dados com mais frequê ncia. Alé m disso, a
costa sul da Ilha Shikoku é rica em nomes como "Cavalo de fulano", e
essas praias eram naturalmente as mais favorecidas pelos imigrantes
do sul. Deve-se ter em mente que esses aumentos pré -histó ricos da
populaçã o do arquipé lago, registros semi-histó ricos e histó ricos
frequentemente mencionam a imigraçã o da China e da Coré ia; e essas
imigraçõ es posteriores foram muito ativas na disseminaçã o de sua
civilizaçã o mais avançada pelas ilhas.
Tendo visto as hipó teses dos especialistas atuais, vamos ver o que
as lendas antigas nos dizem[3] sobre a origem e chegada dessas
pessoas à sua residê ncia atual.
Diz-se que os criadores das ilhas foram dois "deuses
celestiais". Falaremos mais sobre eles ao considerar os mitos
cosmoló gicos. Uma de suas ilhas era a deusa do Sol, que governa o
universo do Cé u e era a progenitora da famı́lia que governa no
Japã o. Certa vez, em agosto, a deusa do Sol olhou para a "Terra-mé dia
onde os juncos crescem abundantemente", isto é , o arquipé lago
japonê s; entã o ele viu que o paı́s foi abalado por vá rios "espı́ritos
malignos", e que eles estavam se agitando e esvoaçando como "moscas
azuis". A deusa enviou mensagens a esses espı́ritos malignos e, mais
tarde, enviou vá rias expediçõ es punitivas contra eles e os deuses
terrenos, que inalmente entregaram suas terras aos "deuses
celestiais". Entre aqueles que foram assim dominados estavam os
descendentes do deus da tempestade, irmã o da deusa do sol, que
governava as costas do mar do Japã o, em oposiçã o à s costas orientais
da Coreia.
Assim que a estrada foi pavimentada, a deusa do Sol enviou seu
a ilhado à s ilhas para "governar o paı́s até a eternidade". O grupo do
a ilhado chegou à ilha de Tsukushi (atual Kyus hu), no topo de um pico
muito alto, e se estabeleceu no Himukai (a terra "que olha para o sol"),
na costa do Pacı́ ico da ilha ocidental. Na verdade, essa regiã o é rica em
montes antigos, que agora estã o sendo escavados, graças aos quais
muitas relı́quias interessantes da antiguidade pré -histó rica vê m à tona.
Da regiã o "voltada para o sol", ondas de migraçã o e conquista
marcharam para o leste ao longo da costa do Mar Interior. O alvo era a
regiã o central, conhecida como Yamato,[4] que eventualmente
alcançou Jimmu Tenno, o lendá rio fundador da dinastia imperial. Mais
uma vez, os conquistadores encontraram a resistê ncia das "Aranhas da
Terra", das "Pequenas Corujas-Oitenta", das "Pernas Longas", das
"Fú rias Gigantes", etc. mas havia outros do seu lado que pertenciam à
mesma tribo dos conquistadores e que haviam se estabelecido
anteriormente na regiã o central. Nessas batalhas, os descendentes da
deusa do Sol foram derrotados uma vez lutando na frente do sol, de
modo que a partir de entã o eles lutaram com o sol em suas costas. No
inal, os descendentes solares saı́ram vitoriosos e se estabeleceram na
regiã o de Yamato, que se tornou a sede da residê ncia imperial até o
inal do sé culo VII. A principal massa de japoneses, representada pelos
descendentes desses conquistadores, passou a ser chamada de raça
Yamato.
Qualquer que seja o signi icado mı́tico ou valor histó rico dessas
lendas, a raça Yamato sempre acreditou em sua descida do cé u e em
adorar a deusa do Sol como a precursora da famı́lia
governante, senã o de todo o povo. Eles també m tentaram incutir essa
crença nas pessoas subjugadas, e em parte conseguiram impressioná -
los com esse eu. Depois de associadas ideias, listas, lendas e crenças,
junto com as prá ticas religiosas, eles formaram a religiã o original da
raça Yamato, conhecida hoje como Xintoı́smo, do qual falaremos mais
tarde. Dados Xintoı́stas da Antiguidade[5] foram compilados no sé culo
18, com o objetivo de con irmar a origem celestial da raça Yamato e
perpetuar a histó ria daquela cidade. Esses dados contê m mitos
cosmoló gicos e també m histó rias lendá rias, todas extraı́das
principalmente da tradiçã o oral, mas modi icadas por ideias
chinesas; Alé m disso, muito do folclore é bordado com as lendas da
raça, já que os japoneses sempre reverenciaram qualquer tipo de
tradiçã o ancestral. Estes dados o iciais do xintoı́smo conté m a massa
principal da mitologia antiga, e mantiveram-se relativamente livre de
in luê ncias estrangeiras nos ú ltimos anos tiveram um grande efeito
sobre literatura e arte japonesa.
Naturalmente, a propensã o das pessoas a contar histó rias e usar
suas pró prias ideias sobre fenô menos naturais e sociais
mitologicamente acrescentou mais material mı́tico ao dos arquivos de
dados o iciais. Parte dela, sem dú vida, foi introduzida por imigrantes
de outras terras e, portanto, estranhas à s tradiçõ es primitivas da
raça. Nã o faremos qualquer reclamaçã o sobre o "cará ter racial" ou a
"inclinaçã o inata" do povo, manifestada em suas ideias ou imagens
nativas. Mas nã o se pode negar que diferentes povos obviamente
oferecem diferentes traços mentais e espirituais na visualizaçã o de sua
existê ncia e em suas reaçõ es a diferentes ambientes. As caracterı́sticas
naturais e o clima da terra habitada por um povo tê m uma grande
in luê ncia em sua atividade de formaçã o de mitos. Mas como eles
reagem a essas condiçõ es externas é determinado por seu
temperamento, sua massa de ideias tradicionais e as in luê ncias
externas à s quais foram submetidos. Os japoneses sempre foram
suscetı́veis à s impressõ es da natureza, sensı́veis aos vá rios aspectos da
vida humana e prontos para aceitar sugestõ es estrangeiras. Vamos
considerar como essas condiçõ es in luenciaram o desenvolvimento do
folclore e da mitologia japonesas.
A natureza parece ter favorecido o povo japonê s apresentando os
aspectos mais suaves e charmosos. As ilhas fornecem quase todas as
fases da formaçã o geoló gica, e o clima varia do calor semitropical do
sudoeste aos invernos frios do norte. A magnitude continental é , claro,
zero, mas a paisagem é diversi icada de forma belı́ssima por
montanhas e rios, enseadas e promontó rios, planı́cies e lorestas. E
fá cil imaginar fadas vagando pelas lorestas e pelas principais
cachoeiras; na né voa da primavera e entre as nuvens do
verã o, os seres semicelestes podem ser facilmente visualizados; a
superfı́cie escura dos lagos enrolados por penhascos e picos
imponentes també m é adaptada para a morada de espı́ritos sinistros,
ou para ser palco de con litos entre gê nios fantá sticos. As lores de
cerejeira sã o produzidas, diz a lenda, a inspiraçã o de uma Dama-que-
faz-as-á rvores lorescer, e as folhas vermelhas dos bordos sã o obra de
uma Dama-que-tece-brocado. O espı́rito do urso borboleta surge na
noite de primavera, vestido com roupas rosa e velado com tule
esverdeado. No canto lamentoso do "percevejo do pinheiro", o povo
escuta a voz do ente querido que renasceu entre os arbustos do
campo. Nos altos picos dos picos nevados podem habitar grandes
divindades, e entre as nuvens iridescentes é possı́vel ouvir mú sica
celestial. Alé m do horizonte distante do mar ica a terra perpetuamente
verde do palá cio do Rei do Mar.
A suscetibilidade das mentes das pessoas ao ambiente é
demonstrada no inı́cio do advento de uma poesia em que a beleza da
natureza e o pathos da vida humana, o amor e a guerra sã o
cantados. Esta poesia inicial é simples na forma e muito ingê nua no
sentimento, mas é emocional e delicada. O povo se sentia em sintonia
com os aspectos mutá veis da natureza, exibidos nos fenô menos das
estaçõ es, nas variedades da lora, nos concertos de pá ssaros cantores e
insetos. Seus sentimentos em relaçã o à natureza sempre foram
expressos em termos de emoçõ es humanas; as coisas da natureza
foram personi icadas e os homens foram representados como seres
vivos no coraçã o dessa natureza. O homem e a natureza estavam tã o
pró ximos um do outro que os fenô menos personi icados nunca foram
dissociados de suas origens naturais. Os observadores ocidentais
frequentemente interpretam mal esta circunstâ ncia, declarando que os
japoneses nã o tê m o poder personi icador da imaginaçã o. Mas a
verdade é que o grau de personi icaçã o nã o é tã o completo como na
mitologia grega, e que a imaginaçã o nunca chegou a obscurecer sua
origem no mundo fı́sico real.
També m é verdade que os mitos e histó rias do Japã o nã o sã o tã o
bem conectados e sistematizados entre os povos arianos. Na mitologia
japonesa, há um certo ciclo de ideias cosmoló gicas, mas os vı́nculos
muitas vezes se perdem e muitas histó rias estã o totalmente
dissociadas. A leveza da execuçã o é caracterı́stica da imaginaçã o
japonesa, e a facilidade de improvisaçã o nã o é menos evidente. A
insistê ncia cuidadosa no relato o icial dos ancestrais do povo poderia
estar em con lito com a falta de um sistema que aparece em toda parte,
e a in luê ncia budista certamente modi icou as caracterı́sticas
peculiares que determinaram a mitologia da raça. No entanto, o
budismo foi adaptado pelos japoneses de acordo com sua disposiçã o
mental, e o grande sistema da mitologia budista foi desmembrado em
contos soltos ou rebaixado ao nı́vel mais humilde da experiê ncia
humana. Delicado, imaginativo, agradá vel, mas nunca isolado, sensı́vel,
mas nã o muito penetrante, é assim que poderı́amos caracterizar o
temperamento das pessoas, manifestado na sua mitologia e poesia, na
sua arte e na sua mú sica. Como consequê ncia desses traços, falta em
sua mitologia uma força trá gica. Os japoneses nã o tê m ideia de uma
tremenda catá strofe no mundo; os con litos quase nunca terminam em
tragé dias sublimes, mas em concessõ es. Mesmo as tragé dias de
histó rias e dramas posteriores sã o caracterizadas por uma dolorosa
submissã o do heró i, e apenas excepcionalmente pelo con lito de uma
vontade demonı́aca com o destino. Isso pode ser devido, pelo menos
em parte, à in luê ncia moderada da terra e do clima, embora na
realidade seja o resultado do cará ter do povo, visto considerando suas
ideias religiosas nativas.
A religiã o primitiva dessa cidade era chamada
de Shinto[6] que signi ica "Caminho dos Deuses" ou "Espı́ritos". Essa
crença remonta a uma visã o animista do mundo, associada ao culto
tribal das divindades do clã . A palavra animismo é usada aqui para
indicar a doutrina de que as coisas na natureza sã o animadas, como
nó s, por uma alma ou por um tipo especial de vitalidade. Vendo o
mundo sob esta luz, os japoneses adoram tudo, tanto um objeto
natural quanto um ser humano, desde que o adorado pareça
manifestar poder ou beleza incomuns. Cada um desses objetos ou
seres é chamado de kami, uma divindade ou espı́rito. A natureza é
habitada por uma coorte in inita dessas divindades ou espı́ritos, e a
vida humana está intimamente associada a seus pensamentos e
açõ es. O gê nio de uma montanha que inspira medo é chamado de
divindade da montanha, e pode ser considerado ao mesmo tempo com
o progenitor da tribo que vive ao pé da montanha ou, se nã o como o
ancestral, pode pelo menos ser invocado como o deus guardiã o da
tribo.
Portanto, a religiã o Shinto é uma combinaçã o de adoraçã o da
natureza e adoraçã o ancestral, e na maioria dos casos o mito-natureza
é insepará vel da histó ria sobre a divindade ancestral e sua adoraçã o,
porque a curiosidade de saber as origens das coisas atua com enorme
força tanto para o mundo fı́sico quanto para a vida individual e social
de cada um. Por esta razã o, as tradiçõ es xintoı́stas combinam a poesia
simples da natureza com especulaçõ es ilosó icas sobre a origem das
coisas. Esses dois aspectos do xintoı́smo estã o tremendamente
misturados nos cultos comunitá rios existentes e deram origem a
muitos mitos e lendas locais. Em tais histó rias, a fantasia desempenha
um papel proeminente, mas nunca há exclusã o da crença religiosa. Isso
se deve à tenacidade das lendas xintoı́stas entre as pessoas.
A in luê ncia estrangeira mais importante de todos os que vieram
para o Japã o, certamente em termos de religiã o, arte e literatura, foi a
do budismo. No campo da mitologia, o budismo introduziu uma grande
quantidade da imaginaçã o indiana no Japã o, caracterizada pela
grandeza de escala, a riqueza das imagens, os amplos voos da
fantasia. A literatura budista, importada para o Japã o e muito bem
recebida pelo povo, pertencia ao ramo do budismo conhecido
como Maliayana, ou a " Comunhã o Mais Ampla ". Nestes livros, diz-se
que existe um nú mero in inito de terras ou paraı́sos de Buda, e cada
uma delas é descrita em uma linguagem colorida e fantasiosa. Em um
desses paraı́sos existem avenidas com á rvores enfeitadas com joias,
lagos cheios de lores de ló tus, pá ssaros que cantam perpetuamente
um concerto com a mú sica tocada pelos seres celestiais. O ar está cheio
de perfumes milagrosos e a terra é pavimentada com pedras
preciosas. Inú meras variedades de ser é celestial, Budas, santos, anjos
e divindades habitam esses paraı́sos. Quando se fala em grandes
nú meros, eles sempre signi icam "mirı́ades de bilhõ es" (koti-niuta-
asankhya). Uma longa é poca é descrita assim: Suponha que você
pulverize os "grandes milhares" de mundos e os transforme em uma
poeira muito ina e que você carregue cada partı́cula para um dos
inú meros mundos espalhados por todo o vasto cosmos; o tempo
necessá rio para essa tarefa in inita pode ser comparado ao nú mero de
perı́odos terrestres que o Buda gastou em seu trabalho.
Nã o apenas o desenvolvimento da mitologia japonesa expandiu e
estimulou os voos da imaginaçã o budista, mas a mirı́ade de histó rias
budistas in luenciou muito o nascimento do folclore japonê s. O Buda
foi retratado como tendo vivido incontá veis existê ncias passadas,
vidas que oferecem aventuras inesgotá veis e atos compassivos,
encontrados nos Jatakas ("Histó rias de Nascimento"), Nielarias e
Avadarías (histó rias das causas da iluminaçã o do Buda). As doutrinas
budistas també m sã o elucidadas por muitas comparaçõ es e pará bolas
coloridas. Como os estudantes de literatura indiana e budista bem
sabem, quase todas essas histó rias falam da experiê ncia do Buda e de
outros seres relacionados à sua existê ncia em todas as formas de
humanos, animais ou plantas. [7]. Essas histó rias eram
frequentemente usadas para ins didá ticos em sermõ es budistas,
embora també m ajudassem a estimular o folclore, familiarizando
as pessoas com a ideia de animais e plantas personi icados e
fornecendo aos fabulistas temas e moralidade.
Destes canais do folclore japonê s, ele derivou muito do material
cuja origem era a mesma de que Esopo tirou suas fá bulas, e muitas
histó rias indianas tornaram-se tã o completamente naturalizadas no
Japã o que as pessoas ignoram sua proveniê ncia estrangeira. Neste
livro, consideraremos apenas algumas dessas histó rias indo-japonesas
e nã o mais enfatizaremos o tema da in luê ncia indiana nesse folclore
nativo. Devemos chamar a atençã o, entretanto, para o fato de que o
folclore japonê s é afetado, nã o apenas por essas contribuiçõ es
estrangeiras, mas també m pelo tipo geral de ideia e imaginaçã o
adotada pela religiã o budista.
O budismo é antes de tudo uma religiã o preeminentemente
panteı́sta, ensinando que todo ser, consciente ou nã o, está em
comunhã o espiritual conosco e está destinado, junto conosco, a atingir
o manto de Buda. Todos os seres estã o aparentemente separados,
mas unidos em uma continuidade, unidos por um vı́nculo indissolú vel
de causalidade moral e baseados em uma mesma realidade. A
continuidade da vida que permeia todas as existê ncias é o que inspirou
os japoneses com grande compaixã o por seus compatriotas e
todos os seres vivos, bem como pela natureza de seu ambiente. O ideal
religioso do budismo consiste em compreender em pensamento esta
verdade da unidade da existê ncia e em viver uma vida cheia da maior
compaixã o. Vendo o universo sob esta luz, é apenas uma fase da
comunhã o espiritual, e nada nele está fora da comunhã o mais pró xima.
Este ensinamento, este ú ltimo ideal fundamental, foi levado ainda
mais perto de nossa vida de compaixã o graças ao ensinamento do
karma, que signi ica o vı́nculo da causaçã o moral. De acordo com essa
doutrina, a vida presente deve ser considerada como um elo na cadeia
in inita de causalidade moral; a vida presente do ser é determinada
pelas qualidades dos acontecimentos passados de cada um e
está destinada a determinar a vida futura. Esta é a "continuidade
serial" da nossa existê ncia, mas també m existe uma continuidade
colateral.
Essa expressã o signi ica que a vida individual nã o é o produto
isolado do pró prio carma, mas sempre desempenha um papel no
destino comum mais amplo, desfrutado ou sofrido junto com os
outros. "Até mesmo o simples roçar das mangas de duas pessoas, por
mero acaso, é fruto do carma que as une." Esse sentimento é
experimentado em todas as relaçõ es humanas. Pais e ilhos, marido e
mulher e outras relaçõ es menos ı́ntimas sã o manifestaçõ es da
continuidade que persiste ao longo da vida e pode persistir no futuro.
Nã o apenas os relacionamentos humanos, mas os ambientes fı́sicos
da vida també m estã o conectados pelo mesmo vı́nculo do carma. «Se
um budista vê uma borboleta voando entre as lores, ou uma gota de
orvalho brilhando na folha de uma planta de ló tus, ele acredita que a
conexã o e a a inidade que existe entre esses objetos sã o
fundamentalmente como os laços que unem os seres humanos em seus
relacionamentos vitais. O fato de desfrutarmos o canto alegre das
cigarras entre as lores de ameixa é devido à necessidade do carma que
nos conecta com essas criaturas. "
Em uma religiã o panteı́sta, há sempre um grande incentivo na
realizaçã o de uma fantasia poé tica, bem como uma necessidade
constante de simpatia ı́ntima com outros seres e com o ambiente
fı́sico. O pró prio Buda, de acordo com os relatos indianos,
experimentou em suas inú meras reencarnaçõ es uma in inita variedade
de vidas animais. E por isso que seus seguidores podem ter passado
por tais experiê ncias, e muitas histó rias contam como o narrador já foi
um pá ssaro que cantava entre as lores e cujo espı́rito mais tarde se
tornou sua esposa.
Se o budismo estimula a imaginaçã o que se refere aos laços que
relacionam nossa vida com outras existê ncias, o taoı́smo representou e
representa o gê nio poé tico e a tendê ncia româ ntica do vale
de Yutzu chinê s em contraste com os traços prá ticos e só brios
dos chineses do norte, representados pelo confucionismo. Este enfatiza
de maneira especial a necessidade de retornar à natureza, entendendo
por esta uma vida livre de todos os defeitos humanos, de todas as
convençõ es sociais e de todas as relaçõ es morais. Seu ideal é alcançar,
por meio do treinamento persistente, uma vida em comunhã o com o
coraçã o da natureza, "alimentando-se das gotas ambrosı́acas de
orvalho, inalando né voas e é ter có smico". O taoı́sta que atinge
essa condiçã o ideal é chamado de Sennin ou "Homem da Montanha" e
deve vagar livremente no ar, levando uma vida imortal. O ideal de
existê ncia imortal era (e é ) frequentemente combinado com o ideal
budista de emancipaçã o perfeita das paixõ es humanas, e essa religiã o
de misticismo naturalista foi a origem natural de muitos relatos
imaginá rios de homens e super-homens que viveram no mundo.
"Coraçã o de natureza "e realizaram suas façanhas milagrosas em
virtude de seu mé rito religioso.
Alé m dos milagres atribuı́dos a esses "homens da montanha",
algumas das personi icaçõ es populares de objetos naturais devem sua
origem a uma combinaçã o de crenças taoı́stas com o naturalismo
budista, representado pela escola Zen. Vemos um exemplo na histó ria
do " Donzela da Montanha. "
O ambiente fı́sico dos japoneses e as in luê ncias religiosas
mencionadas contribuı́ram para o crescimento opulento do conto e da
lenda em que os fenô menos da natureza eram personi icados e
livremente representados pela imaginaçã o. No entanto, houve uma
força contrá ria: o confucionismo.
Os ensinamentos de Confú cio eram racionalistas e sua é tica tendia
a restringir a imaginaçã o humana e limitar a atividade humana à
esfera da vida cı́vica. Embora a in luê ncia das ideias confucionistas
fosse limitada no Japã o antigo à s instituiçõ es sociais e cı́vicas, essas
ideias nã o desencorajaram o desenvolvimento de criaçõ es folcló ricas e
imaginativas. Havia mitos e lendas na China antiga, mas Confú cio os
desprezava e ridicularizava. Os letrados confucionistas do Japã o, por
sua vez, consideravam esses contos româ nticos com
desdé m. Especialmente durante os trezentos anos entre os sé culos
XVII e XIX, o domı́nio completo da é tica confucionista como a
moralidade normal das classes dominantes, signi icou um enorme
obstá culo para o desenvolvimento natural do poder imaginativo da
raça.[8]. No entanto, as antigas tradiçõ es foram preservadas na aldeia,
e no Japã o há , portanto, um grande nú mero de mitos e lendas quase
inigualá veis em outras naçõ es.
Ao considerar a mitologia e o folclore dos japoneses, é conveniente
dividir essas histó rias em quatro classes, que sã o: 1) mitos e histó rias
de origem cosmoló gica, ou mitos explicativos; 2) produtos da
imaginaçã o, ou seja, contos má gicos e voos de fantasia
semelhantes; 3) o jogo do interesse româ ntico pela vida humana, isto
é , histó rias de amor româ ntico e contos heró icos, e 4) histó rias
contadas para sua liçã o moral, ou aquelas que podem ser
interpretadas como moral implı́cita: fá bulas ou histó rias didá ticas,
juntamente com humor e sá tira.[9]

Capítulo I

MITOS E HISTÓRIAS COSMOLÓGICAS
DAS ORIGENS

1. GERAÇAO ESPONTANEA: VIDA E MORTE

A mitologia japonesa, como as mitologias de muitos paı́ses, nada sabe


sobre a criaçã o por mandato, mas postula a origem das coisas por
geraçã o espontâ nea e seu desenvolvimento por geraçã o de sucessã o. A
explicaçã o da origem do universo pela criaçã o é grande; os mitos da
geraçã o espontâ nea e sua transformaçã o sã o reconfortantes. O
primeiro é monoteı́sta, pois tudo depende, em sua criaçã o, da vontade
e da força de um criador todo-poderoso; o segundo é hilozoı́sta ou
panteı́sta, pois todas as existê ncias se devem à vitalidade inerente. Foi
esse conceito japonê s inicial de coisas que se manifestou no
animismo xintoı́sta e, mais tarde, se harmonizou com o panteı́smo
budista.
Naturalmente, havia uma diferença entre o animismo xintoı́sta e o
papsiquismo budista. A primeira postulava metamorfose por acaso, ou
pela vontade arbitrá ria de uma divindade, enquanto a segunda
explicava todas as mudanças pela lei da causalidade, tanto fı́sica
quanto moral, negando as mudanças pelo acaso. No entanto, essa
diferença teó rica nã o ofereceu obstá culos sé rios para uma harmonia
entre os dois conceitos, e mitologias foram formadas a partir de
ambos; a metamorfose arbitrá ria do conceito xintoı́sta foi modi icada
pelo conceito budista de transformaçã o causal, e isso foi simplesmente
espalhado na mente popular por uma ideia mais livre
de causalidade. No inal, a combinaçã o desses dois conceitos
tornou universal a crença de que tudo é dotado de uma vitalidade
inata, e tudo muda dentro de si e por circunstâ ncias externas. A
aplicaçã o dessa ideia a todas as existê ncias de ine o padrã o para todos
os mitos e contos japoneses.
No inı́cio, como as antigas histó rias do xintoı́smo nos contam,
havia o caos, como um mar de petró leo. Daquele primeiro caos surgiu
algo como o tronco de um junco. Descobriu-se que era uma divindade
chamada The Eternal Lord Ordainer[10], e com ele foram geradas duas
divindades chamadas respectivamente de Deus-Produtor do Alto e da
Deusa Produtora do Divino.[11] Nã o é declarado explicitamente que
eles eram esposa e marido, mas é altamente prová vel que tenham sido
concebidos como tal. Independentemente disso, todos os trê s sã o
considerados a trı́ade original da geraçã o de deuses, homens e
coisas. Mas quase nada mais se sabe sobre eles, exceto que alguns clã s
a irmam descer de um deles para outro, e que o Deus Alto Produtor à s
vezes aparece atrá s da deusa do Sol, como se ela fosse seu nú meno ou
associado.
A trı́ade primitiva era seguida por uma sé rie de deuses e deusas,
provavelmente em pares, certamente personi icaçõ es de forças
germinativas, como lama, vapor e sementes. Diz-se que tudo isso
estava “escondido em si mesmo”, ou seja, morto, mas nã o de acordo
com o conceito de mortalidade humana. Apó s uma sucessã o de
geraçõ es e desaparecimentos espontâ neos, parecia um casal
destinado a gerar muitas coisas e deuses de grande importâ ncia. Eles
eram o "Homem-que-convida" (Izanagi) e a "Mulher-que-convida"
(Izana-mi),[12] e precisamos saber mais sobre ambos.
Essas duas divindades foram enviadas ao mundo por "ordem das
divindades celestiais" para trazer coisas à terra. Eles desceram de sua
morada pela "Fonte Flutuante do Cé u".[13] A divindade masculina
sondou o espaço com sua espada e as gotas de á gua salgada da ponta
de sua espada coagularam em uma ilhota chamada Onokoro,[14] quer
dizer: « Autocoagulante ». Em seguida, eles pousaram lá e se casaram,
e mais tarde circularam a ilhota em direçõ es opostas e se encontraram
na extremidade oposta. O primeiro ilho a nascer foi um ser
abortado, como uma á gua-viva, por falta da deusa durante a cerimô nia
de casamento. Essa criança foi jogada na á gua. Mais tarde, eles tiveram
muitas coisas, ou divindades, como o mar, cachoeiras, vento, á rvores,
montanhas, campos e assim por diante. Foi pela força do deus do vento
que a primeira né voa se dispersou e os objetos foram vistos
claramente. Apó s o nascimento dessas e de outras divindades,
incluindo as ilhas do arquipé lago japonê s (e, de acordo com uma
versã o, també m os governantes do universo: o sol, a lua e a
tempestade), o nascimento dos deuses do fogo foi fatal para a
deusa, lzanami. Sua morte foi como a de qualquer ser humano, por
causa de uma febre, pode ele ser chamado o primeiro caso de
mortalidade humana. Apó s sua morte, ele ascendeu ao Hades.[15]
A morte da deusa-mã e é o inı́cio da antı́tese entre a vida e a morte e
dos outros ciclos de contrastes semelhantes, como luz e escuridã o,
ordem e desordem, e assim por diante.
A deusa Izanami morreu e caiu nas mã os do Hades japonê s, Yomot-
su-Kuni ("Terra das Trevas"). Seu marido Izanagi, como Orfeu, a seguiu
até a morada subterrâ nea. A deusa pediu que ele nã o a seguisse. Mas,
ansioso por vê -la, seu marido acendeu uma tocha e, na escuridã o do
poço, divisou a igura terrı́vel e pú trida da deusa. Ela icou furiosa com
a desobediê ncia de seu marido e, desejando puni-lo també m
trancando-o na Terra das Trevas, o perseguiu quando ele fugiu. A deusa
convocou todas as Fú rias (Shikomé , "as mulheres de grande feiú ra") e
os fantasmas do lugar, e eles quase o pegaram, mas ele jogou para trá s
cachos de uvas selvagens e brotos de bambu que cresciam em seu
cabelo, e as Fú rias parou de comer essas frutas. Depois de vá rias
escapadas e experiê ncias extraordiná rias, o deus conseguiu chegar à
fronteira entre o Hades e o submundo. As Fú rias e fantasmas pararam
de persegui-lo, mas a deusa alcançou o im do mundo. Lá , seu marido
ergueu uma pedra enorme e bloqueou a abertura que levava ao mundo
superior.
A deusa exclamou, terrivelmente furiosa:
"De agora em diante, farei com que mil vassalos de seu reino
morram todos os dias."
"E eu darei à luz", respondeu o deus, "a mil e quinhentos todos
os dias."
As duas divindades chegaram a um acordo inal e, desde entã o,
nascimentos e mortes no mundo permaneceram nesta
proporçã o. Graças a essa ruptura do casal primitivo que gerou todas as
coisas deste mundo, surgiu a divisã o entre a vida e a morte. Vamos
agora ver como a antı́tese se desenvolveu em outro ciclo mı́stico.
Quando o deus masculino conseguiu escapar da captura pelos
espı́ritos das trevas e da morte, ele se puri icou, de acordo com os
antigos costumes, em um rio. A contaminaçã o devido ao seu contato
com a morte na Terra das Trevas foi gradualmente eliminada.
Dessas manchas surgiram vá rios espı́ritos do mal e també m
espı́ritos protetores contra esse mal, as divindades das corredeiras, dos
redemoinhos, e assim por diante. A ú ltima a nascer foi a Deusa Sol, a
"Divindade que ilumina o Cé u" (Amaterasu), do olho esquerdo do
Deus-Pai; o deus da Lua, o "Guardiã o da Noite Iluminada" (Tsu-ki-yo-
mi), do olho direito; e o deus da tempestade, a "Divindade
da rapidez impetuosa " (Susa-no-wo), de seu nariz. Dos trê s, o deus-lua
foi reduzido à insigni icâ ncia e os outros dois começaram a lutar.
2. OS GOVERNADORES DO MUNDO: A LUTA ENTRE O SOL DA
DEUSA E A TEMPESTADE DE DEUS
A irmã mais velha, a deusa do Sol, repousava em sua boa aparê ncia,
digna em seus trajes, de um cará ter magnâ nimo e benigno, e brilhava
gloriosamente no cé u. Ele estava encarregado do governo dos cé us. Por
outro lado, o irmã o mais novo, o deus da tempestade, tinha uma
aparê ncia escura, barbudo, de um cará ter furioso e impetuoso, embora
seu corpo mostrasse grande força. O mar foi o reino que lhe foi
con iado. Enquanto a deusa do Sol cumpria seus deveres e estava
ocupada promovendo vida e luz, o deus da Tempestade negligenciou
seu reino e causou todos os tipos de distú rbios e distú rbios. Chorando
e furioso, ele declarou que ansiava pela morada de sua mã e, e em seus
transportes de fú ria destruiu tudo o que sua irmã ordenou
sensatamente, como as obras de irrigaçã o dos campos de arroz, e até
mesmo os lugares sagrados preparados para as festividades da nova
colheita. A divisã o dos reinos feita pelo Deus-Pai levou a con litos sem
im entre o agente da vida, luz, ordem e civilizaçã o, e o autor da
desordem, destruiçã o, escuridã o e morte. Assim, vemos a antı́tese
entre as divindades primitivas masculinas e femininas, cujo resultado
tem sido a luta entre a vida e a morte, transferida para um con lito
mais desesperado entre a deusa do Sol e o deus da Tempestade.
Um episó dio interessante da histó ria é a visita do deus da
tempestade à morada celestial de sua irmã , que terminou com um
noivado entre os dois. Cuando la diosa-Sol vio que su hermano subı́a
hacia su reino, «la Pradera del Cielo» (Taka-ma-no-hata), estuvo segura
de que deseaba usu rparle este dominio y se dispuso a recibirle bien
armada y con instrumentos mortales na mã o. Quando inalmente o
deus da tempestade o confrontou atravé s do rio celestial Yasu[16],
explicou que ele nã o abrigava desı́gnios malignos, mas apenas queria
dizer adeus a sua irmã antes de retornar para a residê ncia de sua
mã e. Para testemunhar a con iança mú tua assim estabelecida,
concordaram em trocar seus bens e ter ilhos.
A deusa do sol deu suas joias ao irmã o, e o deus da tempestade
da hortelã deu a ela sua espada. Os dois beberam da fonte celestial na
bacia do rio e levaram as roupas trocadas à boca. Da espada na boca da
deusa do Sol emergiu a deusa das corredeiras e redemoinhos e, por
im, um esplê ndido jovem dido, a quem ela chamava
de ilho amado. Das joias na boca do deus da tempestade foram
produzidos os deuses da luz e da vitalidade.
Assim terminou o encontro à s margens do rio Yasu com sinais de
con iança mú tua que, no entanto, foram apenas temporá rios.
Apesar de sua compreensã o, o deus da tempestade nã o mudou seu
comportamento ultrajante, ele até destruiu os campos de arroz
construı́dos pela deusa do sol e contaminou suas observâ ncias mais
sagradas. Depois de tais ofensas intolerá veis, nã o apenas contra ela,
mas contra as sagradas cerimô nias instituı́das, a deusa do Sol se
escondeu das atrocidades cometidas por seu irmã o em uma caverna
celestial. A fonte de luz desapareceu, o mundo inteiro icou escuro e os
espı́ritos malignos devastaram o mundo.
Agora, oito milhõ es de deuses, confusos e amuados, se reuniam em
frente à caverna, consultando-se para ver como a luz poderia ser
restaurada. Como resultado dessa consulta, surgiu uma in inidade de
coisas de e icá cia divina, como espelhos, espadas e ofertas de
tecidos. As á rvores foram erguidas e adornadas com joias; galos foram
produzidos que podem cacarejar eternamente; fogueiras foram acesas,
e uma deusa chamada Uzume[17] ele executou uma dança com
acompanhamento musical alegre. A estranha dança de Uzume trazia
risos de ambos os deuses ali reunidos que faziam a terra tremer.
A deusa do Sol ouviu aquele barulho de sua caverna e icou curiosa
para saber o que estava acontecendo. Assim que ela abriu uma
abertura na caverna e se inclinou para fora, um deus poderoso alargou
o buraco e puxou-a à força para fora, enquanto os outros deuses a
impediram de retornar à caverna. Assim, a deusa do Sol reapareceu. O
universo foi novamente brilhantemente iluminado, o mal desapareceu
como uma né voa e a ordem e a paz prevaleceram na face da
terra. Quando a deusa do Sol reapareceu, os oito milhõ es de divindades
formaram um tumulto jubiloso e suas risadas penetraram em todo o
universo. Esta é a culminaçã o alegre de todo o ciclo do mito
cosmoló gico, e é um fato interessante que, nos tempos modernos,
partes da Criação de Haydn foram adaptadas para as cançõ es corais
que representam essa cena.
Talvez este episó dio representasse originalmente o reaparecimento
da luz e do calor apó s uma grande tempestade ou um eclipse total do
sol. Mas os compiladores dos acontecimentos mitoló gicos pensavam
també m na exaltaçã o do comando supremo do ancestral imperial, há
algum tempo ameaçado pelo perigo de usurpador, da vitó ria da ordem
e da paz sobre a barbá rie, do governo imperial sobre os
rebeldes. Embora haja muitas razõ es para acreditar que havia uma
base puramente natural para o mito da deusa do sol e do deus da
tempestade, os xintoı́stas o interpretaram como um marco histó rico,
celebrando o triunfo do governo imperial. Esta interpretaçã o ainda
está perto da verdade se considerarmos que estamos a lidar com um
mito de fenô menos naturais combinados com uma visã o da vida social,
isto é , uma mistura do que os sá bios alemã es chamam Natur-
meu assim e Kuliur-Mythus.
3. MAIS CONFLITOS E COMPROMISSOS
O governo da deusa do Sol foi restabelecido e os deuses reunidos
decidiram punir o cruel deus da tempestade. Sua barba foi arrancada,
seus bens con iscados e ele foi condenado ao exı́lio. Entã o o deus
começou suas andanças e aventuras.
Desceu para a regiã o de Izumo, na costa do Mar do Japã o. Lá ele
matou uma cobra monstruosa, que tinha oito cabeças. Quando ele
esmagou o corpo do monstro, uma espada emergiu de sua cauda, e
S usa-no-wo, o deus da tempestade, enviou-a para sua deusa irmã
como um tributo a ela e seus descendentes. Diz-se que essa espada
passa de um membro da famı́lia para outro como uma de suas
insı́gnias, sendo as outras duas uma joia e um espelho.[18]
Devemos deixar de lado outras aventuras de Susa-no-wo, mas é
interessante saber que ele é considerado o pioneiro da colonizaçã o da
Coreia e que foi ele quem plantou as lorestas da regiã o de Kii na costa
do Pacı́ ico. O lugar que ele visitou na Coré ia é chamado Soshi-mori,
que signi ica "Cabeça do Boi", em cuja capacidade ele é reverenciado
como um guardiã o contra pragas e identi icado com Indra, o deus
hindu da tempestade. A histó ria de seu trabalho em Kii, um nome que
poderia signi icar " lorestas", é que ele desceu de Izumo até a costa do
Pacı́ ico e plantou nas montanhas com o cabelo da cabeça e a barba,
que se transformaram em á rvores. Há um lugar na costa leste
de Kii onde se diz que o tú mulo de Susa-no-wo foi encontrado, e os
habitantes locais celebram um festival cobrindo o tú mulo com
lores. Assim, o deus da tempestade foi transformado no gê nio das
lorestas.
Mas o principal territó rio de atividade de Susa-no-wo era
Izumo. Acredita-se que seus descendentes ali reinaram desde entã o,
tendo instituı́do um regime teocrá tico relacionado ao sacerdó cio do
santuá rio Kitsuki, dedicado a ele e seus ilhos.[19] Aqui termina o mito
puramente cosmoló gico e começa o conto quase histó rico, no qual o
neto da deusa do Sol e o genro de Susa-no-wo desempenham os papé is
principais.
O sucessor de Susa-no-wo foi Oh-kuni-nushi, "Grande Mestre da
Terra". A histó ria de seu casamento com a ilha de Susa-no-wo é a
mesma de qualquer jovem raptada sem o consentimento do pai ou
dela mesma. Enquanto Susa-no-wo dormia, Oh-kuni-nushi amarrou
seu cabelo nas vigas da casa e fugiu com sua ilha, junto com os trê s
bens preciosos de seu pai: uma espada, um arco e lechas e uma
harpa. Foi isso que acordou Susa-no-wo, brincando sozinho
enquanto Oh-kuni-nushi fugia, mas ele conseguiu escapar enquanto
Susa-no-wo estava perdendo o cabelo, apesar disso ele perseguiu o
sequestrador. Assim que o pegou, exclamou, aparentemente admirado
por sua astú cia: “Sim, eu lhe darei minha ilha junto com os
tesouros. Você governará o paı́s e se chamará Utsuslii-kuni-dama, isto
é , "a Alma da Bela Terra".[20]
Para o governo do paı́s e o desenvolvimento de seus recursos, o
Grande Mestre da Terra encontrou um poderoso ajudante em um deus
anã o chamado Suku-na-biko, "O Famoso Homenzinho". Este
personagem se aproximou do Mestre da Terra quando ele estava na
praia, vindo do mar em uma jangada, vestido com asas de alevilla e um
manto de penas. O Mestre da Terra pegou o anã o na palma da mã o e
soube que ele era ilho da Deusa Produtora do Divino e conhecedor da
arte da Medicina. Os dois tornaram-se irmã os e colaboraram no
desenvolvimento da terra, cultivando vá rias plantas ú teis e curando as
doenças do povo.
Existem vá rias histó rias engraçadas relacionadas a esse deus anã o,
e alguns dos contos de anõ es e elfos sã o derivados delas. Suas pernas
eram tã o curtas que ele nã o conseguia andar, mas ele sabia tudo no
mundo e ia a todos os lugares. Seu inal foi muito especial. Enquanto o
painço de seus campos[21] à medida que amadurecia, ele subia em
uma de suas pontas e quando a haste balançava, o anã o foi jogado tã o
longe que nunca mais voltou, pois saltou para Tokoyo, "a Terra da
Eternidade". Poré m, acredita-se que esse anã o ainda apareça e
conduza as pessoas a lugares onde existem nascentes de cura. E por
isso que ele é frequentemente chamado de "deus das fontes termais",
uma funçã o bastante natural para uma divindade mé dica.
A atividade conjunta de ambas as divindades estabeleceu a
administraçã o Susa-no-wo em Izumo, onde um estado foi
fundado. Enquanto isso, a deusa do Sol desejava enviar seu amado
neto Ninigi ("Prosperidade do Homem") para as oito ilhas (o
arquipé lago japonê s) geradas pelo primeiro casal. Apó s algumas falhas,
seus embaixadores inalmente conseguiram obter o melhor dos
governantes de Izumo e dos estados contı́guos. O mais interessante de
todos os episó dios é o da subjugaçã o de Izumo, pois trata dos
con litos e do compromisso inal entre os dois clã s: os descendentes da
deusa do Sol e os do deus da Tempestade, respectivamente.
Esta é a histó ria: ciente das di iculdades da empreitada, a deusa do
Sol enviou dois de seus melhores generais, Futsu-nushi (O Senhor da
Ponta A iada, o gê nio das armas) e Take-mi kazuchi («o Bravo Trovã o
de agosto ') para o reino de Oh-kuni-nushi. Depois de uma longa
resistê ncia, Oh-kuni-nushi e seus ilhos, os mestres de Izumo, cederam
aos pedidos dos embaixadores armados, segundo os quais Izumo
deveria ser governado pelo augusto neto da deusa-sol. Mas uma
condiçã o foi imposta: que todo o poder do mundo visı́vel fosse dado ao
neto, enquanto as coisas "ocultas" icariam sujeitas ao poder do Grande
Mestre da Terra e seus descendentes. Por "coisas ocultas" eles queriam
dizer todos os misté rios alé m do mundo fı́sico visı́vel, as artes ocultas
de adivinhaçã o, bruxaria, exorcismo e artes mé dicas.
O longo con lito entre ambas as partes terminou com este pacto,
que estava de acordo com a portaria original emitida pelo primeiro
progenitor. O ciclo de antı́teses, entre a vida e a morte, entre a luz e as
trevas, entre a sabedoria e a barbá rie, nã o deu origem a um dualismo
trá gico contra o qual era necessá rio lutar, como em outras mitologias,
mas culminou num compromisso que caracterizou a iloso ia. da vida
japonesa, até que o budismo obscureceu essas crenças primitivas. A
parte lendá ria desta histó ria japonesa frequentemente menciona,
em conexã o com vá rias desventuras, a demanda do Grande Mestre da
Terra por conciliaçã o e a ajuda do conselho da deusa do Sol dado em
nome de seu colega, a Deusa Produtora do Divino.
Depois da histó ria do entendimento entre a deusa do Sol e o deus
da Tempestade, vem a histó ria da descida de Ninigi, o neto augusto da
deusa do Sol, ao arquipé lago japonê s. Esta histó ria já é mencionada na
Introduçã o, e com ela termina a mitologia cosmoló gica e a histó ria
lendá ria do paı́s, iniciando a do governo da dinastia reinante.
4. EPISODIOS E MITOS DE ORIGEM
O objetivo do ciclo dos mitos cosmoló gicos é elucidar a origem e a
formaçã o do mundo, dos objetos naturais e, o que é muito mais
importante na opiniã o dos compiladores das antigas tradiçõ es, a
origem da dinastia reinante. Ao delinear a mitologia antiga, omitimos
muitos episó dios que servem para explicar a origem dos objetos
naturais, costumes sociais e instituiçõ es humanas. Nestes mitos das
origens, a imaginaçã o poé tica colaborou com as ideias supersticiosas, e
os conceitos gerais de mundo e vida foram combinados com a crença
na e icá cia das cerimô nias. No entanto, alguns devem estar bem
estabelecidos.
O deus da lua, como dissemos, desempenha um papel muito
pequeno na mitologia, mas há uma histó ria sobre ele que serve a dois
propó sitos. E esta:
A deusa do sol certa vez disse a seu irmã o, o deus da lua, para
descer à Terra e ver o que uma deusa chamada Uke-mochi, "o gê nio da
comida", estava fazendo. O deus da lua desceu até o local onde
estava Ukemochi, perto de uma grande á rvore-katsura[22]. O gê nio da
comida, vendo o deus celestial descer, imediatamente seguido por
uma certa quantidade de arroz cozido de sua boca; quando ele virou o
rosto para o mar, peixes de todos os tamanhos saı́ram de sua boca; e
quando ele olhou para as montanhas ele vomitou todos os tipos de
caça. Em vez de apreciar essa diversã o, o deus da lua icou furioso por
oferecer à deusa coisas de sua boca, indo tã o longe a ponto de matar
sua infeliz an itriã . No momento, do corpo da Deusa do Alimento
saı́ram vá rios alimentos: o cavalo e a vaca nasceram de sua
cabeça; suas sobrancelhas produziram os vermes; sua testa deu
painço; arroz emergiu de seu abdô men e assim por diante.[23] Essa foi
a origem dessas coisas ú teis.
Quando o deus da Lua voltou ao cé u e contou à irmã sobre a
experiê ncia, a deusa do Sol icou zangada com sua irritabilidade e
crueldade e o repreendeu:
"Oh, irmã o cruel, eu nunca mais quero ver você de novo!"
E por isso que a Lua só aparece apó s o pô r do sol, e os dois nunca se
encontram cara a cara.
Outra histó ria relata a origem de uma cerimô nia que serve para
solicitar os favores do Deus das Colheitas.
Quando o Grande Senhor da Terra cultivou seus campos de
arroz, ele deu aos seus trabalhadores carne como alimento. Entã o veio
um ilho de Mitoshi-na-kami, deus das Colheitas, que viu os campos
manchados pelas impurezas causadas pela ingestã o da carne.
Ele se referiu a seu pai e o deus das Colheitas enviou uma nuvem de
gafanhotos aos campos que devoraram instantaneamente todas as
plantas de arroz. Graças aos seus poderes de adivinhaçã o, o Grande
Mestre da Terra sabia que esta catá strofe tinha sido produzida pelo
deus das Colheitas e para recuperar o favor desse deus ofereceu-lhe
um javali branco, um cavalo branco e um galo branco. O deus das
Colheitas se acalmou e ensinou o outro a restaurar seus campos de
arroz, espalhar câ nhamo, erguer um falo e oferecer-lhe vá rias frutas e
bagas. Os gafanhotos desapareceram e o deus da colheita foi
apaziguado. Desde entã o, os trê s animais mencionados sempre foram
oferecidos ao deus das Colheitas.[24] Esta é uma histó ria simples de
propiciaçã o, mas o mais curioso é que comer vitela deveria ser
considerado uma ofensa ao deus das Colheitas.
Já vimos como a relaçã o entre nascimentos e mortes teve sua
origem em uma disputa entre as divindades primitivas. Bem, há uma
curiosa histó ria que explica a curta vida dos prı́ncipes imperiais.
Ko-no-hana-akuya-hime, "a Senhora que faz as á rvores lorescer",
era a bela ilha de Oh-yama-tsumi, o deus das Montanhas, e sua irmã
mais velha era a feia Ivva-naga-tsumi, “a Senhora da perpetuidade dos
Rochedos». Quando Ninigi, o Augusto Nieto, desceu à Terra, sentiu-se
atraı́do pela beleza da Dama da Fló rida e pediu ao pai autorizaçã o para
se casar com ela. O pai ofereceu-lhe as duas ilhas, mas a escolha de
Ninigi recaiu sobre a mais nova. Nã o demorou muito para Lady Florida
ter um ilho. A Rock Lady exclamou:
-Se o Augusto Nieto me tivesse casado, seus descendentes teriam
uma vida longa, eterna como uma rocha; mas desde que ele se casou
com minha irmã mais nova, sua posteridade será frá gil e efê mera como
as lores das á rvores.
As á rvores à s quais ele se referia eram cerejeiras, e a histó ria
provavelmente se originou no sopé do Monte Fuji. O Fuji é um vulcã o
alto e em seu topo as rochas nuas se erguem como se desa iassem o
cé u, meu você entra que sua parte inferior está coberta de á rvores e
arbustos. Muito comum é a espé cie de cereja selvagem com ramos
pendentes e lores delicadas. A Dama da Fló rida é adorada em um
lugar amigá vel onde a á gua fria lui da rocha virgem e sua capela é
cercada por um bosque deste tipo de cerejeiras. O santuá rio existe
desde tempos imemoriais e a personi icaçã o do Pai das Montanhas e de
suas duas ilhas deve ser muito antiga.
Na histó ria, os objetos personi icados sã o relacionados à famı́lia
imperial e o mito se transforma em uma explicaçã o da curta vida de
seus membros. Nesse processo, a histó ria perdeu muito de seu cará ter
primitivo, mas a transformaçã o de uma lenda local, elaborada
com fanfarra poé tica, em um mito explicativo é interessante. Em outras
histó rias e representaçõ es pictó ricas, Lady Florida é uma fada pairando
sobre as á rvores, espalhando nuvens rosadas de lores de cerejeira
pelo cé u. També m é chamado de "o gê nio das cerejas" porque essas
frutas à s vezes sã o chamadas de " lores".
A contraparte da Dama da Fló rida é Tatsuta-hime, "A Dama que tece
o brocado" (de folhas de outono). Ela certamente era originalmente
uma deusa do vento e, portanto, do clima climá tico, mas como o lugar
onde ica sua capela, Tatsuta, era famosa por seus bordos
magni icamente coloridos no outono, ela era mais conhecida como o
gê nio do outono. Outra deusa, o gê nio da primavera, chamada Saho-
yama-hime, també m é mencionada em vá rios poemas. Seu
nome provavelmente deriva do Monte Sahoyama, que se eleva a leste
de Nara (a residê ncia imperial durante grande parte do sé culo VIII), já
que o leste é considerado o local de onde vem a primavera. Alé m disso,
lembre-se de que o rio Tats uta ica a oeste de Kara e a oeste é a regiã o
onde o outono aparece.
Dos muitos poemas que falam dessas duas deusas, escolhemos
dois da versã o em inglê s de Clara A. Walsh[25].

A deusa da primavera se espalhou


no salgueiro em lor
sua delicada tecelagem de ios de seda;
Oh vento de primavera, sopre suavemente
e doçura para que os ios do salgueiro se enredem!

Y:

Boa deusa dos céus pálidos de outono,
Eu gostaria de saber quantos teares você tem,
para quando ele habilmente tece seu estofamento
deixa seu ino brocado de folhas de bordo...
E em cada montanha, em cada rajada de vento,
em tons diferentes brilha o seu vasto bordado.
A antiga mitologia do Japã o é curiosamente desprovida de histó rias
sobre as estrelas. Uma ligeira referê ncia foi feita em relaçã o ao funeral
do Mestre-no-Waka-hiko, "o Jovem Celestial", apó s cuja morte um
amigo seu foi confundido com ele. Na cançã o cantada por sua esposa
em que ele explica que nã o é Waka-hiko, mas seu amigo, a
palavra tana-bata é usada para descrever os traços brilhantes daquele
que brilha no cé u, porque o funeral de Waka-hiko aconteceu em
Paraı́so.
Tana-robe, embora de etimologia obscura, é uma festa realizada na
noite do sé timo mê s lunar em homenagem à s duas constelaçõ es
chamadas de Partas e Weaver. A histó ria de ambos é que podem ser
encontrados dos dois lados do Ama-no-kaca, " o Rio Celeste" naquela
noite, uma só vez, esta aqui, um ano. Obviamente, essa histó ria vem da
China. Seu cará ter româ ntico atraiu os japoneses desde o inı́cio e o
festival já existe há muitos sé culos.
A referê ncia a tana-bata, portanto, nã o é parte integrante da
mitologia japonesa, mas uma alusã o igurativa que todos os japoneses
deveriam compreender e apreciar. Mas a histó ria da celebraçã o foi tã o
completamente naturalizada que uma palavra japonesa foi usada para
designá -la.
O interesse dos poetas japoneses por esta histó ria é ilustrado por
um poema do sé culo VIII para reproduzir o Mestre Cantor do Japão,
Walsh.

O córrego brilhante do Rio Celeste brilha,
uma ita prateada lui em azul,
e na costa onde seu esplendor espelha,
o pastor solitário sente sua tristeza novamente.

Desde os dias em que o mundo era jovem,
sua alma ansiava pela Weaver,
e vendo que agora um coração está oprimido
com um pensamento de amor ardente, de paixão eterna.

Ansioso por cruzar o rio em um barco pintado de vermelho,
fornecido com potentes pás de espuma brilhante,
navegar nas águas com a quilha ao entardecer,
ou cruzá-lo ao amanhecer com a maré calma.

Então, o amante espera naquelas águas amplas,
olhando em silêncio para o céu abobadado,
assim é o amante na maré brilhante,
exalando os suspiros de um coração desesperado.

E veja a ita que adorna a cabeça da Weaver esvoaçar,
com o qual o vento selvagem joga,
e com os braços estendidos, sua alma está in lamada de amor,
enquanto o outono dura
e não há asas rápidas para abrir caminho para seu desejo.

A celebraçã o desta festa é hoje universal, observada principalmente


por jovens e mulheres. Eles plantam varas de bambu e penduram
papé is coloridos nos galhos das á rvores, e nesses papé is eles escrevem
poesias em louvor à s duas estrelas, ou oraçõ es pedindo-lhes seus
favores em casos de amor. Eles amarram ios coloridos nos bambus,
como oferendas à Weaver, simbolizando a fome nunca saciada de
amor. Alé m dessas oferendas, as mulheres colocam á gua em uma bacia
e colocam as folhas da á rvore Jeaji nela, olhando para os re lexos das
estrelas cintilantes na á gua. Eles acreditam que assim encontrarã o
feitiços na á gua e nas folhas.
5. CRENÇAS A RESPEITO DA ALMA

Apesar da crença animista prevalecente, nã o há muitas mençõ es da


alma nos antigos escritos xintoı́stas. A alma foi concebida como uma
bola, como indica seu nome tama-shu ou "bola de vento". Consistia em
dois ingredientes ou funçõ es: um suave, re inado e alegre, e o outro
rude, cruel e vigoroso. O primeiro está sempre perto do corpo, mas o
segundo pode cair fora e funcionar alé m da compreensã o da pessoa a
quem pertence. Foi dito que o Grande Mestre da Terra uma vez viu,
para seu grande espanto, sua "alma á spera" vindo do mar, e que é
a alma o principal agente de suas realizaçõ es. No entanto, nã o se sabe
se todos os indivı́duos possuem uma alma dupla ou apenas os homens
que tê m poderes e habilidades especiais. Seja como for, a alma é uma
existê ncia que está mais ou menos fora dos con ins do corpo, embora
també m nã o se saiba se a alma, apó s a morte do corpo, vai
necessariamente para uma das futuras moradas.
A respeito dessas futuras moradas, já se falou da Terra das Trevas,
cuja antı́tese é a Pradaria do Alto Cé u, onde reinam os deuses
celestiais. Em todo caso, mais difundida do que a crença nesses lugares
é que a alma, apó s a morte, permanece por tempo inde inido perto da
morada dos seres humanos.
As antigas crenças sobre a alma, entretanto, eram vagas e sem
importâ ncia, sendo principalmente sob a in luê ncia chinesa e budista,
especialmente esta ú ltima, que os japoneses de iniram e elaboraram
suas ideias sobre a alma e seu futuro destino. Vamos ver o que essas
ideias signi icaram para eles.
O conceito chinê s de alma era baseado na teoria dos dois
princı́pios: Yin e Yang. De acordo com eles, a alma é composta de dois
fatores, um intimamente relacionado à maté ria densa e o outro sutil e
aé reo. O destino desses dois fatores é determinado em parte pelo local
de sepultamento. Mas essas ideias nã o in luenciaram os japoneses
tanto quanto os elaborados ensinamentos do budismo sobre a questã o
da transmigraçã o.
Estritamente falando, o budismo negou à alma um lugar de
descanso permanente e ensinou um processo de mudança no cará ter
moral do homem. Essa continuidade, a continuidade serial e colateral
do carma, como já dissemos, era um traço da alma na crença comum, e
seu destino era uma transmigraçã o de reino em reino, do mundo
celestial para o pior dos infernos.[26]. A mitologia budista está cheia
de detalhes minuciosos sobre a peregrinaçã o da alma de e para esses
reinos, e acreditava-se que os fantasmas daqueles que vagavam na
incerteza entre esses reinos apareciam aos seres humanos. Um dos
contos mais populares sobre as andanças da alma diz que existe um
rio em cuja margem a alma pode decidir para onde ir. O rio é
chamado Sanzu-no-Kawa, "Rio das Trê s Rotas", porque os caminhos
levam em trê s direçõ es: uma para o inferno, a segunda para a vida
animal e a terceira para o reino dos "fantasmas famintos" (em
Sâ nscrito, pretas). Nestes trê s caminhos existem vá rios pontos
nos quais a alma é examinada pelos juı́zes, o Platã o do Budismo; e,
inalmente, há o temı́vel juiz-rei, Emma (em sâ nscrito, Yama-raja), no
inferno, que ditou a sentença de puniçã o de acordo com os pecados
das almas que vieram antes dele. Frequentemente, as cenas pintadas
como representaçõ es grá icas do Juı́zo Final e puniçõ es do inferno,
todas pintadas por artistas da Europa medieval.
Mas o fantasma que teve um grande papel no folclore era aquele
que nã o era bom o su iciente para ir para o mundo celestial ou ruim o
su iciente para ser condenado ao castigo eterno. Tal alma, aquela que
estava em " chuu ", ou seja, nos estados intermediá rios, fazia apariçõ es
fantasmagó ricas, à s vezes como igura humana, mas sem pernas e com
palidez de cada lado. Um fantasma aparece aos seres vivos, com os
quais em vida manteve alguma relaçã o, seja de amor ou de ó dio,
porque é atraı́do por tais seres por afeto ou desejo de vingança. Essas
apariçõ es sã o frequentes no folclore, mas sã o tã o semelhantes entre si
que nã o há razã o para descrevê -las como casos separados.
Há uma bela, mas melancó lica histó ria sobre a existê ncia
de chuu que trata das almas de crianças mortas. Sua morada é a
desolada bacia do rio formada por grã os e areia, chamada de ofertas
da bacia do rio Sai-no-Kawara. " Extraı́do do hino dedicado a Jizo,
protetor da infâ ncia[27].

Na Terra cinza pálida de Meido ("o Reino das Trevas"),


no sopé do Monte Shidé ("Por onde você vagueia depois da morte"),
do leito ressecado do Rio das Almas sobe o murmúrio de vozes, a
tagarelice das vozes das crianças,
os acentos lamentosos da infância.

Ali as almas das crianças mortas, privadas do carinho amoroso dos
pais, vagueiam sem esperança, com saudades dos parentes, embora
nã o se esqueçam de brincar. Eles esculpem pedras e cascalho na forma
de um pagode budista e enquanto brincam cantam com as vozes de
seus ilhos:

Vamos construir a primeira torre, e orar


para os deuses enviarem bênçãos ao Pai;
vamos formar a segunda Torre implorando
aos deuses que enviam bênçãos à Mãe;
vamos levantar a terceira torre, orando
para o irmão e a irmã, e para os amados mortos.

Entã o, demô nios crué is vê m para destruir as torres e expulsar as


almas de crianças inocentes. Mas o compassivo deus Jizo vem em seu
socorro, colocando brincos nos cajados de seus peregrinos. Ele entra
no leito arenoso do rio e onde ele pisa lores de ló tus crescem. Expulsar
demô nios e confortar crianças aterrorizadas:

Não temam, meus queridos pequeninos,
você é muito doce para estar aqui...
com uma viagem tão longa do Meido!
Eu serei pai e mãe,
Pai e mãe e companheiro de brincadeira
de todos os ilhos do Meido!

Acaricia-os com ternura,
envolvendo-os com suas vestes brilhantes,
levantando o menor e mais frágil
até seu peito, e segurando
Seu cajado, para que os que tropeçam se apoiem nele.

Os bebês agarram-se às suas mangas compridas,
sorrindo em resposta ao sorriso de Deus,
sorriso que denota sua compaixão beatí ica.

6. O PARAISO BUDISTA E OS CUSTODIOS DO MUNDO

Há muito mais a ser dito sobre a teoria budista ou mitologia da


transmigraçã o, especialmente com referê ncia aos nascimentos
inferiores, em relaçã o ao folclore japonê s. Assim, nos referimos ao
paraı́so budista, distinguindo-o dos mundos celestiais, porque estes
sã o o resultado da transmigraçã o e estã o sujeitos à decomposiçã o,
enquanto o paraı́so nunca muda ou decai.
A mitologia budista ensinou que existem vá rios "reinos de Buda",
[28] ou paraı́sos, fornecidos por vá rios Budas para receber seus
respectivos crentes. Esses territó rios budistas sã o as realizaçõ es dos
votos de compaixã o dos ditos Budas de salvar os seres humanos da
transmigraçã o e das manifestaçõ es
dos mé ritos incomensurá veis acumulados por eles para esse
propó sito. O paraı́so budista, portanto, é uma personi icaçã o da
sabedoria e compaixã o do Buda, bem como da fé e iluminaçã o dos
crentes, e é chamado de "Terra da Pureza" (Jodo), ou "Reino
da Bençã o" (Gokuraku), presidiu por um ou outro Buda.
Para nã o demorar muito nos pontos de vista relativos a esses
paraı́sos, a crença nesses reinos abençoados exerceu grande in luê ncia
no imaginá rio popular, e a descriçã o dessas felizes condiçõ es é
frequente em mitos e histó rias. Essas descriçõ es sã o, no entanto, muito
semelhantes e di icilmente dizem mais do que esses paraı́sos sã o os
reinos de esplendor perpé tuo e in inito bem-estar. No entanto, é
possı́vel distinguir trê s paraı́sos principais, classi icados de maneiras
diferentes e localizados em locais diferentes. Assim, existe o Tosotsu-
ten (Tusita), ou "Cé u do Bem-estar", do futuro Buda Maitreya (em
japonê s Miroku), situado muito alto no ciclo; Cokuraku Jodo
(Sukhavati), realizado por Ainita Buddha, o Buda da Luz e Vida
In initas, situado a oeste; e inalmente, Ryojusen (Grdhra-kuta),
idealizado do Pico do Abutre, onde se acredita que o
Buda Sakyamuni pregou o "Ló tus da Verdade".
O primeiro, o "Cé u dos Bens ", é um paraı́so ainda em formaçã o
porque Lord Maitreya será um Buda completo no futuro, e seu paraı́so
está pronto para aqueles que serã o levados à perfeiçã o inal diante
dele; portanto, é uma espé cie de prelú dio para um verdadeiro
paraı́so. A crença nesse paraı́so é comum entre as pessoas, e muitas
histó rias sã o contadas sobre visitas ocasionais feitas a ele por seres
humanos.
O Pico do Abutre idealizado está situado no terceiro mundo e é
alcançado pelo verdadeiro budista nesta vida graças ao seu
conhecimento das verdades ensinadas no Lótus. Pode ser considerado
como o mundo atual transformado, e essa idealizaçã o do mundo
presente leva os budistas autê nticos a ter uma visã o poé tica e
simbó lica de seu ambiente, incluindo lores e animais, e
impressionando-os com a possibilidade de uma comunhã o espiritual
pró xima com o mundo. mundo exterior. Quando falamos das histó rias
de animais ou plantas, referimo-nos à ideia de que a alma de um
animal ou de uma planta pode ser salva pelo meu poder lacrimoso da
escrita do Lótus; Essa ideia é fruto da crença de que o paraı́so do Pico
do Abutre está ao alcance de todos os que conhecem as verdades
reveladas em tal escrita.
Mas a concepçã o paradisı́aca que exerceu maior in luê ncia sobre as
crenças populares foi a do Cokuraku Jodo, e ao falar de um paraı́so sem
quali icaçã o explı́cita, as pessoas se referem ao paraı́so de Amita-
Buda. Há uma jangada cheia de ambrosia onde emergem as lores
de ló tus, onde existem socalcos com á rvores de joias, e os pá ssaros
deste paraı́so cantam cançõ es celestiais, enquanto os sinos que
pendem das á rvores ressoam com uma mú sica suave agitada. Pela
brisa, e os anjos (Tennin) voam pelo cé u e espalham lores sobre o
Buda e seus santos. Esses detalhes descritivos eram familiares a todos
os japoneses e aparecem repetidamente na poesia e nas histó rias,
mesmo sendo usados com frequê ncia em conversas normais.
De acordo com a cosmologia budista, inú meros paraı́sos sã o
habitados por seres de perfeiçã o ideal, e o universo, que conté m
inú meros mundos, é povoado por espı́ritos, alguns benevolentes,
outros maliciosos.
Adiando a consideraçã o dos espı́ritos maliciosos para um capı́tulo
posterior, diremos aqui algumas palavras sobre os grandes custó dios
do mundo, os reis das hordas de espı́ritos benevolentes. Há quatro
deles e sã o representados como guerreiros bem armados, com espadas
ou lanças nas mã os, e demô nios pisoteando. O guardiã o do Oriente
é Jikoku-ten (Dhrta-rastra), "o Vigilante das Terras"; o Sul é guardado
por Zocho-ten (Virudhaka), "o Patrono do Crescimento"; a oeste
está Kornoku-ten (Virupaksa), "o Grande Voyeur"; e
ao norte está Bishamon-ten (Vaisravana), "o Grande Crente" ou
"Renomado". Eles sempre zelam pelos demô nios que atacam o mundo
desde os quatro cantos do Cé u, e cuidam especialmente dos budistas,
zelando por eles com zelo e ternura. Em quase todos os templos
budistas havia pinturas desses zeladores e eles també m eram as
iguras favoritas na religiã o do povo. Dos quatro, Bishamon era o mais
popular e, nos ú ltimos tempos, foi até vulgarizado como patrono da
riqueza.
E interessante saber algo sobre os custó dios chineses como
contrapartes dos budistas. A cosmologia chinesa ensina dois
princı́pios có smicos: Yin e Yang, e cinco elementos na formaçã o do
mundo; os guardiõ es do mundo representavam princı́pios e elementos
predominantes em cada um dos quatro cantos. O guardiã o do Sul, onde
o princı́pio positivo do Yang governa, onde o elemento apaixonado e
veemente predomina, é simbolizado pelo "Pá ssaro Vermelho". O Norte
governa o "Guerreiro Negro", uma tartaruga, o sı́mbolo Yin, o princı́pio
negativo e o elemento á gua. O "Dragã o Azul", a leste, simboliza o
crescimento quente da primavera e o elemento madeira. O "Tigre
Branco", a oeste, representa o outono e o elemento metá lico.
[29] Esses custó dios mundiais chineses existiram ao lado dos reis-
guardiõ es budistas, sem serem confundidos com eles na mente
popular.[30]




Capítulo II

LEGENDAS LOCAIS
E CULTAS COMUNAIS

TOPOGRAFIA E DIVISAO EM CLAS


As maiores ilhas do Japã o sã o atravessadas por cadeias de colinas e
rios que correm entre elas e que cruzam as ilhas perpendiculares ao
seu comprimento. Cada vale tem seus pró prios traços caracterı́sticos,
cercados por picos fantá sticos ou ocupados por lagos que preenchem o
fundo. As costas marı́timas sã o normalmente marcadas por altas
falé sias, enseadas recortadas e grandes promontó rios, com ilhotas e
baı́as espalhadas pelas vá rias baı́as. Esta terra muito diversi icada foi,
nos tempos antigos, dividida entre tribos de cará ter e composiçã o
muito variados; Ainda hoje as comunas preservam muitas tradiçõ es e
costumes antigos, que associam à s memó rias ancestrais e mantê m por
orgulho local. As caracterı́sticas topográ icas e as heranças comunais
explicam su icientemente a invençã o e preservaçã o de dezenas de
lendas locais peculiares à s diferentes provı́ncias e comunidades.
A compilaçã o de tradiçõ es orais, no sé culo VIII, tendeu
principalmente a sancionar uma unidade polı́tica baseada na adoraçã o
de uma divindade principal, a deusa-sol. No entanto, muitas lendas
comunitá rias e contos populares foram incorporados na narrativa
central que trata da origem da naçã o. Algumas histó rias eram comuns
a vá rias tribos, outras eram conhecidas apenas por uma
comunidade; mas todos eles encontraram um lugar na mitologia
nacional. Alé m disso, por um despacho especial de 713, portanto
pró ximo à é poca da grande compilaçã o, as lendas locais de cada
provı́ncia foram coletadas e, com o passar do tempo, vá rias dessas
memorabilia foram compiladas, chamadas Fudo-ki ou «Memó rias do
Air and the Earth », dos quais alguns foram preservados completos,
enquanto de outros apenas restaram fragmentos. Tarefas semelhantes
foram empreendidas nos ú ltimos sé culos, especialmente na é poca
feudal, e alé m dos registros o iciais dos estados feudais, há bastante
literatura sobre a geogra ia e as tradiçõ es locais das vá rias
provı́ncias. Esses livros sã o geralmente chamados de Meish o-Zuye, um
nome que pode ser traduzido como "Guia Ilustrado de Lugares
Famosos", e fornecem um rico material para o estudo das lendas locais,
uma espé cie de Hei-mats-kunde como os alemã es os chamam, das
diferentes provı́ncias e cidades.
Nessas histó rias, as origens dos objetos e fenô menos naturais sã o
atribuı́das a divindades primitivas; a personi icaçã o de tais objetos se
entrelaça com as tradiçõ es histó ricas das tribos e de seus ancestrais, e
à atividade criativa dos seres mı́ticos é atribuı́da a formaçã o da Terra,
origem das fontes e rios, plantas e animais. Esses contos, em parte
resultado de memó rias ancestrais, em parte resultado da imaginaçã o
ingê nua do folclore primitivo, foram gravados no Meisho-Zu ye, sendo
cantados pelos bardos e passados de geraçã o em geraçã o em tais
cançõ es, e mesmo muitas vezes formados parte do ritual religioso e a
observâ ncia dos feriados.
Se considerarmos o assunto com cautela, o folclore é algo vivo. As
lendas mudam, crescem e migram conforme as comunidades se
expandem e mudam de status, conforme os interesses se ampliam e a
faculdade criativa é re inada. Quando uma nova regiã o se tornou
habitá vel ou um vale escondido de qualquer comunicaçã o foi aberto,
montanhas, rochas, lorestas e rios desconhecidos deram origem a
novas lendas. Durante os sé culos do regime feudal, quando os clã s
semi-independentes eram mantidos encerrados em seus respectivos
bairros, o espı́rito do clã se manifestava em lendas que glori icavam o
passado da tribo e elogiavam os gê nios da regiã o habitada. A luta entre
dois clã s vizinhos muitas vezes se transformava nessas lendas em uma
luta entre os gê nios dos respectivos territó rios, ou em certas
caracterı́sticas geográ icas naturais ou estranhas dessas regiõ es, como
uma montanha ou um lago. Neles encontramos fragmentos populares
do folclore misturados com as invençõ es mitopoé ticas dos literatos, e
as ideias xintoı́stas sã o confundidas com as imagens sugeridas pelo
budismo ou pelo taoı́smo. E provavelmente verdade que a lendá ria
invençã o era mais ativa quando o paı́s estava politicamente dividido e o
espı́rito de clã reinava do que nos dias de unidade nacional. Hoje,
a unidade absoluta da naçã o, junto com o aumento das facilidades de
comunicaçã o, tende a destruir os traços peculiares da vida
provinciana; alé m disso, a disseminaçã o da educaçã o cientı́ ica faz com
que cada vez mais pessoas considerem essas lendas e histó rias
tolas. Talvez chegue o dia em que as lendas antigas só serã o
preservadas em coleçõ es escritas; mas esta é uma questã o nã o apenas
do Japã o, mas do resto do mundo: talvez a faculdade mitopoé tica da
humanidade esteja destinada a desaparecer completamente diante do
realismo da educaçã o moderna.
No entanto, no antigo Japã o, o folclore local era uma parte
insepará vel do culto comunitá rio das tribos. A crença na origem
comum do folclore do clã era atestada pelo culto à s suas divindades
ancestrais ou tutelares, cimentado por observâ ncias religiosas e
perpetuado pela constante corrente de lendas. Formas de relevo
naturais de aparê ncia estranha, como uma colina, loresta,
promontó rio ou lago, foram e ainda sã o dedicadas à divindade do clã ,
que se acredita ser o ancestral da tribo ou o gê nio tutelar da
regiã o. Uma capela simples de madeira ica à sombra das velhas
á rvores, geralmente em um local de onde se obté m a melhor vista do
local sagrado, e se torna o centro da vida da comunidade. Lá as pessoas
se reú nem em dias de festa, para agradecimento pelas colheitas, para
oraçõ es por chuva ou para se livrar de uma praga, ou em outras
ocasiõ es de interesse comum. A memó ria da divindade é preservada
em um objeto natural que se acredita ter se originado do interesse
benevolente da divindade pelas pessoas de sua escolha. Tal objeto pode
ser uma á rvore gigante, supostamente plantada pela divindade, ou na
qual acredita-se que seu espı́rito habite. Pode ser uma rocha sobre a
qual o deus ou a deusa sentou-se uma vez, ou que foi sua arma de
arremesso, esquecida e petri icada. Pode ser uma fonte que a
divindade fez luir...
Em adiçã o à capela-mor normalmente haver outras capelas
subsidiá rias nas imediaçõ es. Cada um é dedicado a uma divindade ou
espı́rito especial e tem sua pró pria histó ria associada à manifestaçã o
divina ou milagrosa da deusa ou deus adorado. Estas capelas menores
estã o espalhadas em vá rios locais, numa gruta ou junto ao mar, nas
margens de um rio, junto a uma cascata ou sob uma saliê ncia de
montanha. No entanto, nã o é necessá rio erguer uma capela para
indicar a sacralidade de um lugar. Para isso, pode-se suspender uma
corda da qual penduram pedaços de papel, sinal de santidade. Muitas
vezes distinguido desta forma a á rvore perto da qual um espı́rito
apareceu e lá era um milagre, e també m uma mola, uma enorme rocha
ou uma tumba antiga pode ser marcado na mesma maneira ainda que
nã o tem uma associaçã o divina de initiva.
Em resumo: qualquer lugar é considerado sagrado se tiver alguma
tradiçã o de deuses, espı́ritos, fadas e ancestrais relacionados à quele
submundo, e esses lugares sã o marcados e consagrados de acordo com
os umbres da antiga religiã o xintoı́sta. O paı́s inteiro está cheio desses
tipos de santuá rios; cada localidade tem pelo menos uma, e todas tê m
suas lendas ou histó rias. Essas histó rias costumam ser muito
semelhantes, embora cada uma seja zelosamente preservada,
nã o apenas em uma tradiçã o oral, mas por meio de cerimô nias
religiosas e festivais entre a comunidade à qual pertence. Na verdade,
pode-se dizer que o povo japonê s ainda vive em uma era mitoló gica; Na
verdade, a religiã o xintoı́sta ensina que este paı́s é a terra dos deuses,
que ainda hoje vivem entre os humanos e voam pelos cé us, ou entre as
lorestas, ou nos altos picos e altas montanhas.
A mais antiga das lendas locais refere-se a um curioso acidente
topográ ico na provı́ncia de Izumo, ao qual, como o leitor deve se
lembrar, o deus da tempestade foi banido pelos poderes celestiais.
Acredita-se que essa regiã o tenha sido palco de quase tudo o que
aconteceu na é poca dos grandes deuses e, desde tempos imemoriais, a
grande Capela de Kitsuki ica na costa do Mar do Japã o. Izumo é a
provı́ncia que por acaso foi o primeiro lar japonê s do gê nio poé tico
de Lafcadio Hearn, e lá ele obteve o primeiro apreço do povo japonê s
por sua arte e poesia. Em Izumo ainda parece haver uma certa
insinuaçã o da era das fá bulas, resultado indiscutı́vel da venerá vel
antiguidade e sedutora beleza da regiã o.
A provı́ncia ocupa uma estreita faixa de terra entre o mar do Japã o e
a cordilheira que forma a espinha dorsal do continente. Em seu lado
norte, há uma longa penı́nsula ligada ao continente a oeste por uma
costa arenosa e separada a leste por estreitos de costas arenosas
iguais. E assim que a tradiçã o explica esta penı́nsula:
Oini-t su-nu ("Mestre das Praias") era neto de Susa-no-wo, o deus
da tempestade, a quem ele sucedeu como governante de Izumo. Ele viu
que seu paı́s era apenas uma estreita faixa de terra e quis aumentá -
la. Para fazer isso, ele olhou para o norte em direçã o à Coreia e viu
que havia muitas terras vazias na costa leste. Entã o, ele amarrou uma
corda comprida naquele pedaço de terra e amarrou a outra ponta no
Monte Sahime. Por im, ele fez as pessoas puxarem a corda e puxarem
a terra em direçã o a Izumo. Quando o territó rio foi inalmente unido
a Izumo, eles deixaram a corda na praia, e é por isso que ela é chamada
de So-no-hagihama, "a longa praia de câ nhamo". Da mesma forma,
atraiu parcelas de terra das ilhas do Mar do Japã o e as ligou à costa de
Izumo. Ele amarrou a ú ltima das cordas ao Monte Taisen, e seus restos
formaram a costa de Yomi (veja o mapa). Desta forma, o Mestre das
Praias conseguiu alargar as suas terras acrescentando a penı́nsula que
hoje forma a parte norte da provı́ncia.[31]
Quanto a Izumo, conta-se que os nomes da provı́ncia e de alguns
lugares tiveram a sua origem em ligaçã o com as aventuras de Susa-no-
wo, depois de terem sido expulsos da Pradaria dos Altos Cé us
e descidos a esta provı́ncia. Ao caminhar ao longo do Rio Hi, o Deus
das Tempestades encontrou um casal chorando de dor. Sua ú nica ilha,
a Maravilhosa Princesa Inada, seria sacri icada a um dragã o que todos
os anos exigia uma donzela. Susa-no-wo acompanhou a jovem até o
local do sacrifı́cio na parte alta do rio. O dragã o apareceu e bebeu todo
o saquê preparado para ele e entã o atacou a jovem, mas o bravo Deus
das Tempestades o despedaçou. A princesa entã o se casou com Susa-
no-wo.
Com a aproximaçã o do dia do casamento, Susa-no-wo percorreu
a provı́ncia em busca de um local adequado para a cerimô nia. Ao
chegar a um determinado local, ele experimentou um prazer intenso e
exclamou:
—Meu coraçã o se refrescou (suga-suga-shi).
Desde entã o, o local designado se chama Suga e ainda hoje existe
uma capela dedicada ao deus e sua esposa. Alé m disso, no casamento, o
deus cantou um poema de celebraçã o que se lê assim:

Yakumo tatsu Muitas nuvens se erguem,


Izu-mo Yahe-gaki Um grande muro circunda tudo,
Tsuma-gome-ni Para receber os cônjuges dentro,
Yake-gake-tsukuru Eles formam uma grande cerca
Eles são o yahe-gaki wo! Ah, aquele grande arame farpado!

Daı́ o nome Izumo, que signi ica "nuvens ascendentes", e també m o
nome japonê s de Lafcadio Hearn, "Yakumo", que signi ica "nuvens
de oito lados".
Assim, Susa-no-wo se tornou o senhor de Izumo, e a grande
Capela Kitsuki foi erguida em sua homenagem. Com esta capela,
preeminente em sua santidade, sã o relatadas muitas histó rias e
observâ ncias que se referem a Susa-no-wo e seus descendentes. De
acordo com uma dessas histó rias, este santuá rio é o lugar onde todas
as divindades do Japã o se encontram no dé cimo mê s lunar para
organizar todos os casamentos que ocorrerã o no Japã o no pró ximo
ano. Com todas as evidê ncias, essa lenda nasceu graças ao casamento
de Susa-no-wo com a princesa Inada naquele lugar, e re lete o costume
japonê s de organizar casamentos por meio de um intermediá rio.
Diz-se que a assemblé ia dos deuses acontece à s quatro da manhã
do primeiro dia do dé cimo mê s lunar, e nessa hora o povo se tranca em
suas casas para nã o perturbar os deuses. Quando todos estã o reunidos,
o Rei Dragã o traz sua oferta para a assemblé ia. O Rei Dragã o,
acompanhado por uma inumerá vel procissã o de seres marı́timos,
surge no mar, que se ilumina, com a maré alta e o cé u a brilhar. Esta
cena é representada em um misté rio teatral do sé culo XV. O padre que
cuida da Grande Capela desce à praia para receber a oferenda do
Dragã o, sendo esta uma cerimó nia anual. Um fato particular
relacionado a este mito da assembleia de deuses em Kitzuki é que em
outras regiõ es do Japã o o dé cimo mê s é chamado de "mê s sem
deuses" (Kami-nashi-uki), mas em Izumo eles o chamam de "mê s com
deuses » (Kami-ari-zuki).
Susa-no-wo, o deus das Tempestades, é o tema da lenda da
hospitalidade, e suas andanças o levaram aos vá rios lugares onde
existem capelas em homenagem a esse deus. Embora a origem da
lenda nã o seja certa, os nomes das pessoas que nela intervê m sã o de
origem coreana. Esta é a lenda:
Assim que foi expulso da Pradaria dos Cé us Altos, Susa-no-
wo viajou como um pá ria miserá vel. Uma noite, quando chovia
torrencialmente, ele bateu na porta de um homem chamado Kotan-
Shorai[32]. Ao ver um homem vestindo uma capa esfarrapada e um
boné encharcado de chuva feito de algum tipo de junco, Kotan achou
melhor afugentar um visitante tã o duvidoso. Susa-no-wo, parecendo
com muita pressa, ele chamou a porta Somin-Shorai,
irmã o Kotan. Somin recebeu o viajante com grande gentileza. Na
manhã seguinte, o deus das Tempestades se despediu de seu an itriã o
com imensa gratidã o e disse: “Eu sou Susa-no-wo, o deus que controla
os espı́ritos da fú ria e da peste. E para pagar a dı́vida que contraı́ com
você , protegerei você e seus descendentes do ataque de espı́ritos
malignos, se você colocar uma placa na sua porta que possa ser
reconhecida.
Daı́ o costume de pendurar na porta um amuleto contra a peste ou a
varı́ola, no qual está escrito: "Descendentes de Somin-Shorai ".
Essa mesma histó ria é contada de outra maneira, aplicando-se
geogra icamente:
Há muito, muito tempo, quando Mi-oya-NO-kami, o deus
dos Antepassados, viajou o paı́s, uma noite ele perguntou para
hospedagem no Monte Fukuji em Suruga. O deus de Fukuji era um
avarento e, incapaz de ajudar qualquer viajante, dispensou-o de má
educaçã o. O Deus dos Ancestrais, furioso com tal grosseria, exclamou:
"Você é um avarento e vai sofrer por sua grosseria, e de agora em
diante estará eternamente coberto de neve e geada. A comida será
escassa para você e para as poucas pessoas que o visitam.
Em seguida, o deus itinerante foi para o Monte Taukuba em Hitachi,
onde foi calorosamente recebido pelo deus de Tsukuba. O Deus dos
Ancestrais agradeceu e acrescentou:
"Você é um homem de bom coraçã o." Portanto, você sempre terá
bastante comida e muitas pessoas irã o visitá -lo.
E por isso que hoje muito poucas pessoas escalam o Monte Fukuji,
que está sempre coberto de neve e geada, enquanto o Monte Tsukuba é
muito popular e atrai muitos peregrinos.[33]

Existem també m lendas simples, muito semelhantes entre si, sobre


as nascentes e as fontes. Um certo homem, dotado de poder milagroso,
cavou a terra e imediatamente uma fonte jorrou. O homem a quem esse
poder é atribuı́do foi Kobe Daysi, o fundador do Budismo Singlon no
sé culo IX. No nordeste do Japã o Mila normalmente grolo atribuı́do ao
yoshi-iye, o famoso general que liderou expediçõ es contra o Ainus
nessas provı́ncias, no sé culo XI, e da lenda teve suas origens ao
aparentemente na crença de que o general estava protegido pelo
deus Hachiman, ou "Oito Banners", cuja capela está localizada em Iwa-
shimizu, ou "a fonte da rocha virgem".
As histó rias de Kobo estã o sempre associadas a suas viagens
missioná rias. Certa ocasiã o, quando ele estava viajando, conta a
histó ria, ele foi saudado por uma mulher que morava em um lugar sem
á gua. Kobo, para recompensá -la por sua hospitalidade, criou a fonte
golpeando a terra com seu cajado de peregrino.
Ele disse é que as façanhas de yoshi-iye aconteceu durante suas
expediçõ es militares. Num dia de verã o, seus soldados sofreram de
calor e sede. O general orou a seu deus tutelar Hachiman, e quando ele
perfurou uma rocha com uma lecha, uma fonte apareceu que nunca
parava de luir.
Acredita-se que as fontes termais tenham sua origem em
uma apariçã o divina de Suku-na-biko,[34] o feiticeiro entre os deuses
antigos.
Entre as lendas sobre Kobo Daishi existem muitas que possuem
peculiaridades. Nã o há raposas na Ilha Shikou. Isso
porque Kobo afugentou o animal como puniçã o por tentar enganar o
grande mestre budista durante suas viagens por Shikoku. Em lugares
onde nã o há mosquitos, isso é explicado por um favor especial
de Kobo feito aos habitantes locais por lhe darem boa hospitalidade.
Há uma aldeia em Kozuke onde os tubé rculos nã o crescem
bem. Quando Kobo chegou à aldeia e pediu batatas, o dono da fazenda
respondeu que as batatas eram duras como pedra, pois ele nã o queria
dá -las ao monge mendigo.
-De verdade? Kobo perguntou. Entã o eles sempre serã o assim.
Desde entã o, os tubé rculos daquela cidade sempre cresceram duros
como pedras.
Em certo lugar, há um rio entre montanhas de onde sobe um denso
vapor. Uma vez, quando Kobo cruzou aquele rio, ele se
aproximou muito dele e pediu-lhe que escrevesse algumas cartas em
seu nome. Sem papel. Kobo os escreveu no ar. Entã o o menino pediu
que ele escrevesse outros na á gua do rio. Kobo escreveu o caractere
chinê s para o dragã o e intencionalmente omitiu um ponto. O jovem
acrescentou milagrosamente esse ponto. Mais milagrosamente ainda, o
ideograma se transformou em um dragã o vivo que voou para fora
d'á gua. Portanto, há um traço do dragã o voando sobre a á gua.
As á rvores preciosas de madeira sã o frequentemente objeto de
lendas locais, e as á rvores gê meas, especialmente, estã o relacionadas à
memó ria dos amantes. Entre essas á rvores, o pinheiro ica com a
melhor parte, seguido pela sugi, câ nfora e gingko.
Esta é a lenda dos pinheiros gê meos na antiga Hitachi Fudoki: Era
uma vez em Hitachi um jovem sensı́vel chamado Nasé e uma linda
garota chamada Azé .[35] Ambos eram famosos por sua beleza, o que
fazia com que os demais habitantes do lugar os admirassem e
invejassem ao mesmo tempo. Os dois jovens se apaixonaram e uma
noite, por ocasiã o da assemblé ia anual dos habitantes da cidade para a
troca de poemas, Nasé e Azé trocaram versos expressando seu amor.
[36] Entã o, eles deixaram os outros e foram para uma loresta perto da
costa. Lá eles falaram sobre seu amor a noite toda. Nã o havia ningué m
por perto, mas os pinheiros tocavam doces melodias com suas agulhas
murmurantes, e o casal passou a noite em um doce sonho.
Quando o dia começou a romper sobre o oceano e o crepú sculo da
manhã penetrou na loresta de pinheiros, os amantes perceberam pela
primeira vez que estavam muito longe de suas respectivas casas. Eles
estavam com medo de voltar para a aldeia por causa das insinuaçõ es
dos outros jovens e da censura dos mais velhos que teriam que
enfrentar. Assim, eles desejavam estar para sempre isolados do
mundo. Eles se abraçaram e choraram, e foram metamorfoseados em
dois pinheiros, entrelaçados e rodeados pelas outras á rvores.
Nesta lenda os pinheiros gê meos representam o sı́mbolo do amor
apaixonado, mas em outra lenda os dois pinheiros sã o atribuı́dos a um
casal maduro e representam a idelidade conjugal, como as famosas
á rvores Takasago, das quais falaremos mais tarde.
Na costa, onde o vento sopra constantemente de um ponto da
bú ssola, muitas vezes há á rvores cujos galhos se estendem em apenas
uma direçã o. A maioria dessas á rvores tem uma histó ria pró pria que
explica por que os galhos parecem inclinar-se na direçã o de algum
objeto. A seguinte lenda é muito tı́pica:
No Tango, numa costa de muito extenso areal, existe um pinheiro
cujos ramos se estendem até Miyako, a capital. A ilha de um nobre de
Miyako foi sequestrada por um ladino, como costumava acontecer na
Idade Mé dia. Foi levado para a Tango e vendido para um chefe local. A
jovem frequentemente icava embaixo da á rvore olhando para sua casa
e orava pensando em seus pais. A á rvore teve pena da pobre menina e
virou todos os seus galhos na direçã o da dita casa.
As rochas fornecem motivos semelhantes para os criadores de
mitos. A mais famosa é a rocha que ica em Matsura, na costa
oeste de Kyushu, de onde os navios partem para a China. Certa vez,
quando um nobre da corte foi enviado para a China, sua
esposa Sayohime o acompanhou até Matsura e viu o navio em que seu
marido havia acabado de embarcar desaparecer no horizonte, mas
ela continuou lá , acenando seu xale em gesto de despedida, até que sua
igura foi transformada em uma rocha que permanece até hoje, o que é
conhecido como a rocha de Sayo-hime. Diz-se que uma curiosa
projeçã o da pedra é a mã o com que ela ondulou o lenço.
As condiçõ es climá ticas també m servem para criar lendas
locais. Esta é uma das histó rias sobre as tempestades perió dicas que
atingiram o Japã o no outono. E a histó ria do "Furacã o Hira ",
sendo Hira o nome da cordilheira que se ergue na margem ocidental do
Lago Biwa, a maior do Japã o.
Há muito tempo, vivia um jovem encarregado do farol instalado em
um promontó rio no lado leste do Lago Biwa. Uma linda donzela
morava em uma cidade do outro lado do lago. Em certa ocasiã o, a
jovem visitou o promontó rio e viu o guardiã o do farol. Os dois se
apaixonaram e concordaram em se encontrar à noite para que
ningué m soubesse. A partir desse dia, a donzela visitou o jovem todas
as noites, atravessando o lago em um pequeno barco. Seja nas noites
calmas as ondas re letiam a luz da lua, ou se no escuro o lago estava
agitado e bravo, o barco nunca parava de chegar ao promontó rio
porque a luz do farol o guiava até o ente querido.
Assim, o verã o passou e o outono chegou. O jovem icou feliz com a
idelidade da moça; Mas, no inal, sua audá cia e indiferença ao perigo
de ser descoberta ou se afogar na á gua, tã o incomum em uma jovem,
levantaram uma forte suspeita no coraçã o do guardiã o. Assim, ele
começou a se perguntar se a jovem era um ser humano, uma dragoa ou
um ogro em forma feminina. Por im, ele decidiu ver se a
garota conseguia encontrar o caminho à luz do farol. Como de costume,
naquela noite a jovem cruzou as á guas do lago em seu barco, mas
quando a luz do farol se apagou ela icou desorientada. Ele começou a
remar desordenadamente, sem saber onde estava. Por im, ele se
desesperou e pensou que sua amante era in iel. Em sua dor e terror, ela
o amaldiçoou, amaldiçoou a si mesma e ao mundo també m. No inal,
ele pulou na á gua rezando para que uma tempestade destruı́sse o
farol. Assim que o corpo da infeliz jovem desapareceu na á gua,
explodiu um lash furioso que logo se tornou um furacã o violento. A
tempestade atingiu toda a noite. Ao amanhecer, a torre do farol com
seu zelador havia desaparecido engolida pelas á guas.
Desde entã o, todos os anos, no mesmo dia, um certo dia do oitavo
mê s lunar, uma tempestade assola o lago. Sai da cadeia de
montanhas Hira, onde vivia a infeliz jovem e é por isso que a chamam
de Montanha Furacã o Hira.




Capítulo III

FADAS, SERES CELESTIMOS,
OS HOMENS DA MONTANHA

1. A REGRA DOS CONTOS DE FADAS


Os japoneses sempre acreditaram na existê ncia e atividade dos
espı́ritos, tanto os de objetos naturais quanto os dos mortos; mas,
estranhamente, sua mitologia, como ica claro na tradiçã o xintoı́sta, é
povoada por muito poucos seres fantá sticos e é muito vaga sobre a
personalidade dos deuses. Muitas divindades sã o pouco mais do que
nomes, outras sã o adoradas como ancestrais de vá rios clã s, e suas
lendas sã o consideradas pelo povo mais como fatos autê nticos do que
como fragmentos de uma imaginaçã o poé tica. Isso ocorre
principalmente porque os primeiros relatos xintoı́stas foram
compilados, como dissemos, na forma de uma narrativa histó rica, seus
autores desejando produzir algo que rivalizasse com a histó ria chinesa
na antiguidade e com a suposta autenticidade. O que hoje
reconhecemos como mitos foram originalmente vistos como eventos
histó ricos, assim como a histó ria o icial da China se preocupou muito
em transformar as lendas raciais de seu povo em supostas crô nicas de
eventos reais. O pseudo-racionalismo das narrativas xintoı́stas é
principalmente um produto chinê s, ou seja, da in luê ncia de Confú cio.
No entanto, nã o se deve presumir que os japoneses foram incapazes
de imaginar a existê ncia de fadas e outros seres
semelhantes. Encontraremos vestı́gios abundantes de fadas e outros
seres fantá sticos nas antigas tradiçõ es japonesas, e há uma quantidade
considerá vel de lendas de fadas na literatura e nas tradiçõ es
verbais deste povo. A maior parte desse tipo de icçã o parece ter
derivado de fontes chinesas e indianas, e o gê nio japonê s é mais
frequentemente exibido na há bil adaptaçã o de tais contos à s condiçõ es
locais do que nas invençõ es originais. O luxo de ideias e histó rias
indianas naturalmente passou pelo canal da literatura budista, que por
sua vez derivou da literatura vé dica e sâ nscrita altamente
re inada. Veio principalmente para o Japã o por meio de traduçõ es
chinesas.
As histó rias chinesas foram derivadas, em primeiro lugar, nã o de
fontes nã o confucionistas, mas da literatura taoı́sta. Em um estudo
estritamente histó rico dos contos de fadas japoneses, seria necessá rio
distinguir criticamente esses dois elementos de origem continental da
quantidade muito menor de tradiçã o nativa. Mas neste trabalho nos
limitaremos a considerar algumas das lendas e histó rias que
comumente circulam entre as pessoas, sem levar em conta suas fontes
ou as mudanças sofridas durante o processo de adoçã o.
2. THE DON CELLAS-FAIRIES
Uma fada totalmente indı́gena do Japã o é Ko-no-hana-Sakuya-hime, "a
senhora que enche as á rvores". Já nos referimos a ele quando falamos
dos mitos das origens. Ela é a fada da lor da cerejeira e é retratada
voando e fazendo as cerejeiras lorescerem, provavelmente respirando
e soprando sobre elas. Seu casamento com o neto da deusa do Sol pode
ser considerado um exemplo de casamento de uma donzela celestial
com um ser humano.
Mas um exemplo mais tı́pico desse tipo de uniã o é dado na histó ria
da donzela-cisne. Esta donzela nã o tem nome pessoal e é concebida
como uma donzela celestial munida de penas ou vestindo um traje
feito de penas. A versã o mais idealizada da histó ria é O Vestido
de Pena em uma das obras Nã o. Seu resumo é o seguinte:
Certa vez, em um dia muito bonito, algumas fadas desceram à Terra
e se banharam em uma nascente, apó s pendurarem suas roupas de
penas nas á rvores ao lado da jangada formada pela á gua. Um homem
passou por aquele lugar e, vendo roupas tã o lindas, tirou uma tirando-
a da á rvore. As donzelas, alarmadas com a intrusã o do homem, voaram
para o cé u, mas a donzela cujo vestido estava faltando nã o podia voar
com as outras, mas teve que icar na Terra e se casar com o ladrã o.
[37]. Entã o ela deu à luz um menino e, apó s recuperar o vestido graças
a um estratagema, voou de volta para o cé u.
Esta histó ria é uma versã o do conto da donzela-cisne bem
conhecido no folclore de vá rias naçõ es, embora nã o haja evidê ncias de
que a narrativa japonesa venha de outros povos. Mas na versã o
idealizada de No Drama, a donzela é retratada como uma das fadas que
aguardam o prı́ncipe celestial que reside no palá cio de Luna, uma ideia
claramente tirada de uma lenda budista sobre a Lua. Alé m disso, nesta
versã o a donzela manté m sua virgindade intacta, e o motivo principal
da histó ria é o contraste entre a pureza nobre da donzela celestial e a
ganâ ncia da humanidade. A histó ria é a seguinte:[38]
Foi um lindo dia de primavera. Uma donzela celestial desceu para a
loresta de pinheiros Hiho, uma praia arenosa na costa do Pacı́ ico onde
há uma bela vista do Monte Fuji apontando para o cé u do outro lado
das á guas. A donzela icou encantada com a beleza daquele lugar e
esqueceu seu lar celestial. Um pescador passou e percebeu um
perfume milagroso que perfumava o ar, ao mesmo tempo em que
avistou uma linda vestimenta de penas pendurada em um
pinheiro. Enquanto o pescador examinava a vestimenta e se
perguntava o que era, a fada apareceu para ele e disse que era seu
vestido de penas, semelhante ao de todas as donzelas celestes. Isso
despertou a ganâ ncia do pescador, que cruelmente se recusou a
devolver o vestido. A donzela chorou por sua perda e inalmente
convenceu o pescador a devolver a vestimenta dançando diante dele
uma das danças celestiais. Esta cena é descrita assim:

(Lamento da Fada)
F
Em vã o meus olhares vagam pelo prado celestial,
onde os vapores que envolvem o ar sobem,
e ocultar as trilhas familiares de nuvem para nuvem.

R ̃
Nuvens! Nuvens viajando! Ela suspira e suspira em vã o
voando como você para pisar no cé u novamente;
em vã o ele suspira ao ouvir como costumava ouvir
os acentos mistos do pá ssaro do paraı́so;
Essa voz abençoada ica fraca Em vã o cé u
ressoa com a cançã o do guindaste voltando;
em vã o escute, onde o oceano lava a areia,
a suave gaivota ou as ondas do mar;
em vã o ele observa onde o zé iro varre a campina;
tudo, tudo pode voar... mas ela nunca mais voará .

(A fada dança)
F
E neste irmamento surge um palá cio na Lua, construı́do por mã os
má gicas.

R ̃
E daquele palá cio trinta monarcas governam,
dos quais quinze, até a lua cheia,
eles entram à noite, vestidos de branco;
mas que, desde a dé cima sexta noite de lua cheia,
cada noite, um tem que desaparecer no espaço,
e cinquenta monarcas vestidos de preto tomam seu lugar,
entretanto, sempre girando em torno de cada rei feliz,
as fadas que os servem cantam mú sica celestial.

F
E um desses sou eu.

R ̃
Já que aqueles brilhantes sã o feras
ainda por um momento, esta doce donzela aparece.
Aqui no Japã o desce (deixando o cé u para trá s)
para ensinar a arte da dança à humanidade.
E quando o grupo de penas
de fadas passam com suas asas de prata,
Eles vã o levar a rocha de granito.
Oh, sons má gicos que enchem nossos ouvidos excitados!
A fada canta e das esferas nubladas
os alaú des ressoam em unı́ssono,
os cı́mbalos e cı́mbalos dos anjos
e suas lautas lindamente prateadas.

Eles ecoam pelo cé u que brilhava em tons de roxo,


como quando a encosta oeste do Someiro mostra
os matizes do crepú sculo, enquanto a onda azul
de ilha em ilha, banham as costas revestidas de pinheiros;
da encosta Ukishima uma bela tempestade
arrancar as lores; e apesar dessa forma má gica,
Aquelas asas nevadas batendo na luz
eles seduzem nossas almas com graça e deleite.

F
Salve os reis que estã o se afastando da Lua!
O cé u é a sua casa, e os Budas també m.
R ̃
Vestimentas má gicas cobrem os membros das donzelas.
F
Eles sã o, como os pró prios cé us, da mais tenra cor azul.

R ̃
Ou, como as né voas da primavera, todo branco prateado,
perfumada e linda... linda demais para o olhar mortal!
Dance, doce donzela, nas suas horas felizes...
Dance, doce donzela, enquanto a magia loresce
coroando suas tranças, elas tremulam ao vento
movido por suas asas em movimento.
Dance, porque a dança mortal nunca pode
competir com aquela doce dança que você traz do cé u;
e quando, atravé s das nuvens, você deve retornar em breve
para sua casa na lua cheia,
ouça nossas oraçõ es, e com sua linda mã o
despeje grandes tesouros em nossa terra feliz.
Abençoe nossas praias, refresque todos os prados,
para que a terra possa produzir mais safras.
Mas ah, a hora, a hora de sair soa!
Pego pela brisa, as asas má gicas da fada
Eles a levam para o cé u da costa dos pinheiros.

Alé m do vasto pâ ntano de Ukishima,


alé m das alturas de Ashitaka e de onde se estendem
as neves eternas da cabeça de Fujiyama,
Cada vez mais alto para o cé u azul
até que as brumas itinerantes o escondam de nossos olhos!
A «dança de Azuma», como é chamada, teve a sua origem na dança
daquela fada na praia de Miho, e desta forma o « Goset » ou «Dança dos
Cinco Tactos» é atribuı́do à s fadas da Cereja lores. Quando o
imperador Temmu, que reinou no sé culo 8, tocava Koto no
Palá cio Yoshino, a mancha da lor de cerejeira, cinco fadas apareceram
no cé u, tocando seus instrumentos em harmonia com o mú sico real, e
dançaram diante dele. Dança dos cinco toques. Mais tarde, a mú sica e a
dança formaram uma das festividades regularmente observadas apó s
cada coroaçã o imperial. No teatro No, o coro descreve a cena com as
seguintes palavras:

Oh, que maravilha!


A música é ouvida no céu
Milagres enquanto os aromas preenchem o ar,
pétalas caem do céu como gotas de chuva...
Não são estes os sinais de um reino de paz?
Ouça, além de toda imaginação, eles são doces
os sons que ressoam em uníssono,
harpas e violões, lautas e chifres,
sinos e tambores de todos os tipos;
uma grande orquestra torna o ar sereno harmonioso,
a brisa suave da primavera.
Com o acompanhamento de música celestial
as donzelas celestiais dançam, lutuando no ar,
agitando suas mangas de penas,
voando e balançando entre as lores de cerejeira.

Outra histó ria em que uma fada virgem desce à Terra é o "La
Dama Resplandecente" (Kaguya-hime). Uma de suas versõ es é a
seguinte:
Era uma vez um velho que morava na provı́ncia de Suruga, onde ica
o Monte Fuji. Ele cresceu bambus. Na primavera, dois vaga-lumes
izeram seu ninho no bosque de bambu, e lá ele encontrou uma
adorá vel velhinha que chamou Kaguya-hime. O velho pegou a garota e
a criou com todo o seu amor. Quando a menina cresceu, ela se tornou a
jovem mais bonita do paı́s. Assim, ela foi chamada para a corte imperial
e se tornou a princesa consorte do imperador. Sete anos se passaram e
um dia a princesa disse ao marido:
"Eu nã o sou como você , um ser humano, embora um certo vı́nculo
me ligue a você ." Agora meu tempo na Terra acabou e devo retornar à
sua morada celestial. Sinto deixar você , mas é meu dever. Guarde em
minha memó ria este espelho no qual verá minha imagem.
Com essas palavras, ele desapareceu da vista do imperador. Ele
sentia tanto a falta de sua esposa que decidiu segui-la para o cé u. Em
seguida, ele escalou o cume do Fuji, a montanha mais alta do paı́s,
carregando o espelho na mã o. Mas quando chegou ao topo, nã o viu
nenhum vestı́gio da donzela perdida, nem conseguiu subir ainda mais
aos cé us. Sua paixã o era tã o poderosa que uma chama brotou de seu
peito[39] e o espelho pegou fogo. A fumaça subiu para o cé u e, desde
aquele dia, continua subindo do topo do Fuji.
Outra versã o da mesma lenda é conhecida pelo nome de "O
plantador de bambu". Segundo essa versã o, o velho encontrou
a menina dentro de um caule de bambu e, quando ela cresceu, muitos a
quiseram em casamento. Ela pediu a seus pretendentes que
realizassem uma façanha muito difı́cil e prometeu se casar com aquele
que melhor executasse a tarefa designada. Cinco pretendentes
concordaram em ser testados e cada um foi convidado a trazer um
objeto precioso para a jovem. Os pretendentes izeram o que puderam,
mas todos falharam. Para isso, cada um inventou uma mentira
inteligente para justi icar o fracasso. Mas a donzela adivinhou a
verdade e rejeitou todos eles. Essa histó ria, portanto, é didá tica e
satı́rica.
Bem, o imperador reinante, ao saber da beleza da jovem, chamou-a
ao palá cio, mas ela se recusou a ir embora ele lhe mandasse cartas e
poemas. O imperador se consolou com essa correspondê ncia, mas de
repente soube que a donzela era de origem celestial e que retornaria
ao palá cio de seu pai na Lua quando fosse meado do outono. O
imperador, desejando manter a donzela na Terra, enviou um exé rcito
ordenando aos soldados que guardassem a casa da menina. A noite
chegou, uma nuvem de nuvens apareceu no cé u e os soldados nã o
puderam atirar ou lutar porque seus braços e pernas estavam
paralisados. Assim, a donzela foi trazida para sua morada por seu pai, o
Rei da Lua. No entanto, ele deixou um baú com remé dios e uma carta
para o imperador. Apó s o desaparecimento da donzela, o Imperador
mandou seus homens com o baú ao topo do Monte Fuji. Lá eles
queimaram os remé dios e desde entã o aquele vulcã o fumega.

Nã o só as donzelas celestiais descem à Terra e se casam com seres


humanos no folclore japonê s, mas uma donzela das profundezas do
mar à s vezes se torna a esposa de um mortal, embora quando um
desses casamentos ocorre, segundo os relatos, o homem geralmente
desce para a mansã o de sua esposa. Universalmente, no entanto, a fada
e seu amante mortal estã o destinados a uma separaçã o precoce. Essas
histó rias das donzelas do mar nã o sã o simples contos de amor, mas
narram extensivamente o mundo dentro ou alé m do oceano. A
separaçã o dos casais é fruto da saudade do ser, que abandonou o seu
elemento natural, pela sua antiga casa. Quando a donzela desce do Cé u,
seu retorno se deve ao té rmino de seu tempo na Terra, ao passo que
quando um marido humano desce ao mar, a separaçã o é consequê ncia
de uma quebra da promessa que ele fez. Alé m disso, a permanê ncia do
marido no reino ideal parece muito curta para ele, mas quando ele
retorna, ele descobre que na verdade foi muito longa. Sua morada
terrena desapareceu e todos os seus parentes já morreram. Este tema,
que lembra o leitor da experiê ncia de Rip van Winkle[40], aponta para
o contraste entre a existê ncia evanescente da humanidade e a duraçã o
in inita da vida ideal.
A ideia de um mundo alé m do nosso foi estimulada pelos
ensinamentos budistas e taoı́stas, sendo essas in luê ncias claramente
vistas no desenvolvimento posterior de tais histó rias.
A narrativa mais famosa desse tipo é a do jovem
pescador Urashima, ou mais apropriadamente Urashima Taro, "o Filho
da Ilha da Areia". Geralmente, sua terra natal ica no Tango, no Mar
do Japã o, mas à s vezes em Sumi-no-ye, no Mar Interior. As versõ es
mais antigas sã o encontradas nas crô nicas xintoı́stas e em uma
antologia do sé culo VIII. Nas crô nicas, sua permanê ncia no mundo
alé m durou setecentos anos e seu retorno é mencionado como um fato
histó rico. Essa histó ria foi contada mais tarde com a tradiçã o budista
do Palá cio do Dragã o (Ryu-gu) e a histó ria da Donzela é chamada de
oto-hime, a ilha sob o Rei Dragã o.
A histó ria, em sua forma mais simples, é a seguinte: o jovem
pescador Urashima estava no mar com seu barco quando viu uma
jovem vindo em sua direçã o. Ela queria levá -lo para casa, e ele a seguiu
até seu reino de á guas profundas distante, onde icava um belo
palá cio. A jovem era ilha do rei, e Urashima se casou com ela. Apó s
trê s anos de casamento feliz, Urashima sentiu um desejo urgente de
ver seus pais. Sua esposa foi muito tenra para resistir a ele e, ao sair,
deu-lhe um pequeno baú com o qual ele poderia retornar ao Palá cio do
Dragã o, com a condiçã o de que nunca o abrisse. Urashima voltou ao
seu paı́s natal e o encontrou totalmente mudado. Para sua surpresa, ele
viu que setecentos anos se passaram desde sua partida e que seu
misterioso desaparecimento já era uma tradiçã o entre seus
conterrâ neos. Passando por uma grande confusã o mental e esperando
encontrar algum conforto no baú dado por sua esposa para poder
retornar ao Reino do Dragã o, ele ergueu a tampa e, para sua grande
surpresa, viu nuvens de fumaça saindo de seu interior e voou Para o
mar. Assim que o baú icou vazio, todo o corpo do jovem sentiu um frio
intenso, seus cabelos icaram brancos e ao mesmo tempo ele se
transformou em um velho contando centenas de
anos. Urashima morreu ali mesmo, e agora ele tem uma capela na
costa do tango.[41]
A histó ria de Urashima estimulou a invençã o de vá rios contadores
de histó rias que acrescentaram alguns detalhes de sua pró pria
criaçã o. Uma versã o, provavelmente do sé culo XV, diz que Urashima,
depois de abrir o cofre, metamorfoseou-se em garça, ave que
supostamente viveria centenas de anos, e que ele, como garça, e sua
mulher, como tartaruga, viva para sempre. Essa histó ria ilustra uma
peculiaridade da é poca: a recusa das pessoas em ouvir histó rias que
tinham um cará ter um pouco trá gico apesar, ou talvez pelo fato de ter
sido um tempo de guerra e desintegraçã o social. Por outro lado, um
escritor moderno que dramatizou a histó ria pinta Urashima como
o tı́pico representante do jovem de hoje, buscando ideais onı́ricos sem
grande esforço ou passando por treinamento metó dico.
Uma histó ria semelhante sobre a ilha do Rei do Mar é atribuı́da à
avó do lendá rio fundador do Impé rio.
Hiko-Hohodemi, "o sinalizador", certa vez perdeu um anzol que
havia perguntado a seu irmã o mais velho Ho-no-susari, "a chama
moribunda". Quando o irmã o mais velho implorou ao irmã o mais novo
para devolver o anzol, ele nã o sabia o que fazer ou dizer, mas uma
velha divindade o aconselhou a viajar para alé m do mar. Flare cruzou o
mar em um barco e chegou a um palá cio construı́do com um material
semelhante a escamas de peixes. Foi a residê ncia do Rei do Mar,
onde Hiko-Hohodemi conheceu uma jovem muito bonita. Seu nome era
Toyo-hama-hime, "A Dama com abundâ ncia de Jewels", ilha do rei, e
ele foi seduzido pela idé ia de sua ilha se casar com uma divindade
celestial, desde Hiko-Hohodemi era um descendente da deusa do Sol O
casal se casou, viveu muito feliz por trê s anos, quando o marido
revelou à sua esposa que tinha vindo ao seu reino em busca do anzol
perdido. Foi um problema para seu sogro, o rei do mar profundo,
encontrar o anzol, entã o Hiko-hohodemi voltou para seu lugar seguido
por sua esposa.
Bem, uma vez em sua residê ncia terrena, a esposa deu à luz um
ilho. Mas antes do parto a mã e, seguindo o costume, foi transferida
para um pavilhã o construı́do para essa ocasiã o. Ela pediu ao marido
que nã o olhasse para dentro do pavilhã o na hora do parto, porque
naquele transe ela teve que assumir sua forma original de mulher-
dragã o. Apesar de sua promessa, o marido espiou pela janela e entã o
sua esposa abandonou o marido e o ilho pequeno e voltou para seu
palá cio alé m do mar.
As in luê ncias budistas e taoı́stas foram de grande importâ ncia no
desenvolvimento da tradiçã o das fadas no Japã o, e os conceitos
primitivos de existê ncias ideais ou fantá sticas foram, graças a essas
in luê ncias, muito mais de inidos e elaborados. Em geral, as
importaçõ es budistas eram de duas categorias, uma sendo
os Devatas (em japonê s Tennyo ou Tennin, as donzelas celestiais), que
voam pelos cé us, e a outra é a dos Nagas (em japonê s Ryujin ou
espı́ritos do dragã o), que residir no mar profundo. A literatura chinesa
ou taoı́sta introduziu os Hsien (em japonê s Sennin), literalmente "os
Homens das Montanhas", que sã o seres celestiais, quase todos de
origem humana e que realizam feitos má gicos, vivendo existê ncias
imortais. Eles sã o de ambos os sexos, velhos e jovens, alguns de
aparê ncia esquisita e outros de feiçõ es nobres e belas, mas todos se
alimentam de petiscos ambrosı́acos e levam uma vida de total
emancipaçã o, nem perturbados nem preocupados com os assuntos
humanos. Os seres que nessas categorias foram ocasionalmente
amalgamados em um novo reino da invençã o sã o geralmente muito
diferentes. Estudaremos as trê s categorias, uma apó s a outra, e
examinaremos algumas histó rias que ilustram seu papel na mitologia
do Japã o.
3. AS FADAS BUDISTAS, O TENNIN E OS RYUJIN
Na India, as Devatas sã o deusas em geral, embora a palavra també m
seja aplicada à s gê nias femininas de á rvores, fontes e fontes. O folclore
budista está repleto de tais seres, alguns dos quais sã o totalmente
personi icados, enquanto outros sã o meras
abstraçõ es. O Tennyo japonê s, copiado dos Devatas, ronda o cé u,
vestido com vé us lutuantes e sem asas. Eles tocam mú sica e espalham
lores pelo ar, e sua presença é percebida por sua mú sica e perfume
celestial. Eles geralmente nascem em nuvens iridescentes e descem
para colinas ou promontó rios, ou iluminam lorestas ao crepú sculo. Os
piedosos budistas guardam e cumprem os deveres dos anjos da
guarda; eles vivem em lorestas loridas como fadas das lores; eles
aparecem em qualquer lugar onde a mú sica clá ssica é tocada e se
juntam a shows com instrumentistas humanos. As vezes, elas
aparecem como mulheres e contam histó rias de seus casos de amor
com homens. Eles sã o representados em esculturas e sã o encontrados
nos painé is decorados de templos budistas; sã o vistos em pinturas, sã o
cantados em poemas, celebrados em contos de fadas e alguns sã o
cultuados em capelas localizadas em belos lugares. Ocasionalmente,
eles sã o identi icados com deusas xintoı́stas e, desde o sé culo 13, essas
confusõ es sã o comuns no folclore, nas artes e na religiã o.
O ı́ndio Naga é uma criatura que vive no mar, cujo corpo é como o
de uma cobra. Nos livros budistas, é dito que algumas
tribos Naga vivem entre montanhas, mas sã o sempre nomeadas
como guardiã s das á guas. Quer a lenda japonesa do Deus do Mar seja
ou nã o produto da in luê ncia indiana, a concepçã o de Ryujin, o deus-
dragã o, logo foi amalgamada com a do Deus do Mar, e este ú ltimo, o pai
dos « Senhora com abundâ ncia de joias ', ele era frequentemente
identi icado com Sagara, um dos reis Naga hindus. Os Ryujins habitam
o mar, em um magnı́ ico palá cio de coral e vidro, de onde governa Ryu-
wo, o Rei Dragã o. Ele tem um corpo humano, usa uma cobra em sua
coroa e seus servos sã o cobras, peixes e outros monstros marinhos. O
Rei Dragã o é um ser nobre e sá bio, guardiã o da religiã o de Buda e dos
budistas. Mas sua benevolê ncia é frequentemente aniquilada pela
conduta tola ou maliciosa de seus vassalos ignorantes, e é por isso que
o mundo dos dragõ es à s vezes está travado em uma guerra contra os
reis celestiais. Da mesma forma, acreditava-se que as tribos de dragõ es
estavam encarregadas da chuva e da tempestade. Histó rias eram
contadas repetidamente sobre sacerdotes budistas muito sá bios que
podiam controlar esses monstros marinhos e fazer chover em tempos
de seca, e també m havia histó rias de peregrinos budistas e
missioná rios navegando entre o Japã o e a China, ordenando aos
dragõ es que aquietassem o mar revolto, e um budista
faná tico que, aguardando o aparecimento do futuro Buda, se
metamorfoseou em dragã o e viveu inde inidamente sob as á guas.
A igura mais notá vel dessa classe no folclore é a ilha do Rei
Dragã o. Seu nome japonê s é Benten, a indiana Sarasvati. Ela é a guardiã
da mú sica e dos discursos pú blicos, e també m a doadora de
riquezas. Ela é retratada como uma deusa indiana, vestida com
vestidos de mangas compridas e uma grande joia em sua coroa. As
vezes, ele aparece pessoalmente a um mú sico famoso, à s vezes o faz em
resposta à oraçã o de um budista piedoso pedindo riquezas, ou entã o
na forma de uma bela mulher que atrai o amor dos seres humanos.
Compartilhe a natureza de uma donzela celestial com a de uma
Princesa Dragã o e é frequentemente identi icada com uma certa deusa
do mar na mitologia antiga. E reverenciado em muitos lugares ao longo
da costa. Sua saı́da das ondas foi retratada em muitas pinturas como
um dos mitos clá ssicos de Vê nus, e sua associaçã o constante com um
instrumento musical, o biwa (em sâ nscrito vina, uma espé cie de banjo)
a equipara à s Musas. Seu culto era muito popular a partir do sé culo 12,
e mais tarde passou a ser considerado uma das sete divindades da boa
sorte, das quais falaremos mais.
Muitas lendas locais referem-se a ele e suas capelas. O mais famoso
dos que lhe sã o dedicados é o de Itsku-shima ou Miya-jima, a "Ilha do
Templo", bem conhecida dos turistas da ilha onde nã o eram permitidos
nascimentos ou mortes, uma espé cie de " Elysee " japonê s. Esta ilha
está localizada no Mar Interior, e em sua praia havia uma capela
dedicada à deusa do Mar desde tempos imemoriais. Posteriormente,
foi ampliada e adaptada ao culto de Benten, que acabou
se identi icando com a primitiva deusa del Mar.O templo atual é
tremendamente estranho e belo. E constituı́do por um conjunto de
edifı́cios e galerias que se erguem sobre uma praia arenosa que inunda
a maré até parecer que o templo lutua na á gua:
uma autê ntica imagem do Palá cio do Rei Dragã o. Fileiras de lanternas
de ferro estã o penduradas nas galerias, suas luzes re letindo no mar,
enquanto o cervo sagrado corre ao longo da praia perto do templo
enquanto as á guas baixam. As alturas ı́ngremes e rochosas da ilha se
erguem atrá s. mais do que o templo, criando um cená rio esplê ndido
para o pitoresco e suntuoso Palá cio do Dragã o. O homem que concebeu
a ideia de combinar a grandeza da natureza com a beleza da
arquitetura, e que equipou a histó ria do Palá cio do Dragã o com a
veneraçã o da Princesa Dragã o, foi Kiyomori, o ditador militar do sé culo
12 e heró i do é pico poema Heike Monogatari.
Enquanto Kiyomori era governador da provı́ncia à qual pertence a
ilha, um dia ele saiu para velejar e avistou um pequeno barco que se
aproximava de seu barco. Era feito de conchas e brilhava com brilho
perolado, ostentando uma vela escarlate de cetim ino. No barco
estavam trê s jovens fadas. Kiyomori os recebeu com a maior cortesia
e eles disseram a ele que eram Benten (ou o antigo japonê s Ichiki-
shima-hime) e suas duas irmã s. O guerreiro recebeu a promessa de
uma carreira extraordinariamente bem-sucedida se expandisse o
templo e renovasse a adoraçã o à s divindades. Kiyomori correu para
obedecer a esse comando e desde entã o a famı́lia dos militares usava a
insı́gnia escarlate que uma vez lutuou sobre todo o Japã o.
Outro lugar famoso para a adoraçã o de Benten é Chikubu-shi-ma no
Lago Biwa. A ilha se ergue abruptamente em relaçã o ao mar e
seus penhascos sã o povoados de imortelas. Os poetas nunca se cansam
de cantar sua beleza, e a fantasia popular atribui todo tipo de
maravilhas má gicas ao lugar. Há um santuá rio dedicado a Benten, cuja
mú sica é ouvida entre as ondas que batem nas falé sias rochosas, e sua
imagem é vista lutuando no cé u enquanto a lua transforma a ilha e
seus arredores em um reino de luz prateada. Diz-se que em um certo
dia de primavera, com a lua cheia no cé u, todas as divindades e fadas
do paı́s se reuniram em Chikubu-shima e formaram uma grande
orquestra. Uma histó ria relacionada à quele concerto dos deuses e
deusas trata de um menino que foi transformado em um ser fey e
adicionado a essa alta companhia. O menino desapareceu, deixando
para o pai adotivo o instrumento que ele costumava
tocar. Naturalmente, os mú sicos tê m uma grande honra em praticar sua
arte em Chikubu-shima, e dizem que ainda se pô de ver a deusa, que lhe
ensinou mais segredos de sua arte.
Há outra famosa capela Benten em E-no-shima, "A Ilha da Pintura",
perto de Kamakura, na costa do Pacı́ ico. A lenda relacionada a esta
capela diz que a Rainha das Fadas ali adorada era casada com um Rei
Dragã o que vivia numa jangada na ilha principal, perto da praia de
areia que liga a ilha ao continente. De acordo com esta histó ria, o
dragã o era um ser semelhante a uma cobra muito feia, e a irma-se
que Benten só cedeu ao amor apaixonado de tal ser apó s uma longa
resistê ncia.
A crença nas tribos de serpentes marinhas é geral, e há muitos
relatos a respeito delas e dos misté rios das á guas profundas onde
vivem. Eles sã o frequentemente associados a tempestades que o Rei
Dragã o pode promover ou sufocar e a luzes misteriosas vistas no
mar. Essas luzes sã o chamadas de Ryu-to ou "lanternas de dragã o" e
aparecem em noites de festa em certos santuá rios ao longo da costa. O
mais famoso é o Ryu-to que anuncia a chegada dos dragõ es que
fornecem presentes à s divindades reunidas na Grande Capela de
Izumo, no Mar do Japã o. Ningué m, exceto os sacerdotes, desce à praia
para receber as oferendas daqueles deuses do Mar. A vazante e a
vazante das maré s sã o atribuı́das ao poder dessas fadas do mar, que
possuem um misterioso urso de joias de cristal que pode levantar ou
abaixar o mar. As tribos de cobras anseiam por outros cristais
semelhantes para desfrutar do mesmo poder má gico.
Há um conto interessante que ilustra essa histó ria. Refere-se à mã e
de Fujiwara-no-Fusazaki, famoso Ministro de Estado. Diz assim:
Certa vez, o imperador da China enviou pelo mar um certo tesouro
sagrado de seu paı́s que queria depositar em um templo budista,
fundado e mantido pela famı́lia Fujiwara. O navio que carregava
os tesouros para o Japã o sofreu uma terrı́vel tempestade ao se
aproximar da costa de Sanuki no Mar Interior. A tempestade veio com
uma rapidez misteriosa e de repente també m diminuiu. Apó s a
tempestade, o capitã o do navio observou que um dos tesouros
estava faltando. Era um cristal onde a imagem do Buda era re letida
perpetuamente. Os outros tesouros foram transferidos para o templo e
mais tarde Fubito, o chefe da famı́lia Fujiwara, começou a pensar na
melhor maneira de recuperar o cristã o perdido. Ele suspeitou que
tinha sido roubado pelo Rei Dragã o, já culpado de outros crimes.
Entã o Fubito desceu até a costa Sanuki e contratou todos os
mergulhadores da provı́ncia para procurar o tesouro. Nenhum teve
sucesso e Fubito já havia desistido de todas as esperanças de recuperar
o cristal, quando uma pobre pescadora lhe pediu que tentasse. Como
recompensa, ele só pediu que seu ú nico ilho [42] ele seria criado pela
nobre famı́lia dos Fujiwara se encontrasse o cristal
divino. Ningué m pensou que ele poderia ter sucesso, mas ele teve
permissã o para tentar.
A mulher saltou na á gua e afundou mais e mais até que viu o palá cio
do Rei Dragã o, vendo como o cristal brilhava no topo de uma torre. Ela
estava cercada por vá rios grupos de monstros marinhos e, a princı́pio,
nã o viu como se aproximar do vidro. Mas felizmente os guardas
adormeceram e a pescadora corajosamente escalou até o topo da
torre. Ela agarrou o vidro e tentou nadar para longe, mas os
guardas acordaram e a perseguiram tã o perto que sua fuga foi quase
impossı́vel. De repente, ocorreu a ele que o sangue era horrı́vel para
aqueles monstros e para todos os servos do Rei Dragã o. Entã o uma faca
se cravou e os monstros marinhos nã o se atreveram a persegui-la por
aquelas á guas turvas de sangue. Quando um homem a ajudou a sair do
mar por meio de uma longa corda amarrada à cintura, ela estava
morrendo, mas encontraram o tesouro escondido em seu peito. Entã o
o tesouro foi recuperado pela mulher que sacri icou sua vida por seu
ilho.
O menino, continua a histó ria, foi adotado por Fubito e se tornou o
famoso estadista Fusazaki, que construiu um templo budista no
mesmo local onde sua mã e morreu, em sua memó ria. O templo ainda
existe hoje[43].

Podemos ainda adicionar outra lenda que ilustra a natureza do Rei


Dragã o como o guardiã o do Budismo e das rotas do mar. Na Idade
Mé dia, muitos padres tentaram ir para a China e depois para a India,
mas apenas alguns conseguiram chegar à China e nenhum à India. Um
dos monges, ansioso para visitar a terra natal do budismo, passou
vá rias noites no santuá rio Kasuga rezando para que a viagem
fosse tranquila. Uma noite, um Rei-Dragã o apareceu guardando o
santuá rio de Kasuga e convenceu o monge a abandonar seu projeto,
porque a cena do sermã o do Buda no Pico do Abutre poderia ser
mostrada a ele em uma visã o. O monge seguiu o conselho e captou a
visã o.
Inferior à tribo do Dragã o, mas, como seus componentes,
habitantes do mar, é Ningyo, a mulher-pescadora[44]. Tem a cabeça de
uma mulher com cabelos longos, mas seu corpo é como o de um
peixe. Esse tipo de sereia frequentemente aparece aos humanos para
dar um conselho ou um aviso. Suas lá grimas sã o pé rolas e, segundo
uma lenda, um pescador que a pegou em sua rede, mas depois a soltou,
recebeu lá grimas como recompensa, enchendo um baú inteiro de
pé rolas. Outra crença sobre ela é que a mulher que come sua carne
atinge a perpé tua juventude e beleza, e muitas histó rias sã o contadas
de mulheres que tiveram a sorte de poder comer uma comida tã o
milagrosa.

Outro ser semelhante a um ser fada de origem marinha é


o Shojo; Embora nã o pertença ao mar, acredita-se que tenha chegado
ao Japã o pelas á guas. Provavelmente é uma personi icaçã o idealizada
do orangotango, que nã o é nativo da China nem do Japã o, embora
alguns pareçam, sem saber como, conhecer as duas naçõ es. O Shojo é
uma feliz encarnaçã o do epicurismo que, obtendo seu maior prazer da
bebida perpé tua, é considerado o gê nio do saquê . Seu rosto é
avermelhado ou escarlate e sua aparê ncia é muito jovem. Seus longos
cabelos caem quase até os pé s; Ela adora saquê acima de tudo, usa
roupas vistosas de vermelho e dourado e dança uma espé cie de baile
de bacanal.
Nã o existem lendas bem de inidas sobre esses seres, mas grupos de
dois ou trê s Shojos costumam ser vistos pintados em quadros ou em
estatuetas, e sua dança caracterı́stica é dançada com acompanhamento
coral, com cançõ es que louvam esses seres e a bebida que amam.
4. OS TAOISTAS IMORTAIS
Consideremos agora o Sennin, o "Homem da Montanha", o homem
ideal do misticismo taoı́sta, modi icado pela imaginaçã o popular do
Japã o. Acredita-se que os Sennin realizam feitos sobrenaturais: eles
podem voar, projetar sua pró pria imagem atravé s de suas bocas,
caminhar sobre as á guas do mar, transformar uma abó bora má gica em
um cavalo, convocar animais misteriosos do nada à vontade e outras
maravilhas. semelhantes. Mas o que é mais essencial sobre eles é que
estã o alé m do efeito das mudanças do mundo, bem como de seus
choques, e desfrutam de uma vida imortal em uma abençoada
serenidade e na emancipaçã o absoluta de todos os cuidados. Eles sã o
internos ideais que estã o alé m das limitaçõ es humanas e vivem em
constante comunicaçã o com a natureza; os homens nos quais o
macrocosmo está encarnado e que, conseqü entemente, sã o os
verdadeiros " ilhos da natureza".
Diz-se que tê m sua casa no meio de montanhas distantes, ou em
ilhas felizes, e até mesmo no pró prio cé u, e suas reuniõ es sã o como
uma assemblé ia de poetas ou " oradores livres ". Mas os Sennin
sã o eminentemente individualistas e, mesmo quando celebram algo
juntos, cada um é autossu iciente e encontra prazer em si mesmo. Este
mito tem sua origem no longo perı́odo de inquietaçã o que a China
sofreu durante os sé culos que se seguiram ao IV. Naquela é poca
de desintegraçã o social, muitos homens talentosos se retiraram do
mundo. Esses misteriosos internos foram idealizados pelo povo,
tornando-se confundidos com seres sobrenaturais. A ideia de uma vida
isolada e meditativa encontrou simpatia no Japã o durante os tempos
turbulentos dos sé culos 14 e 15, e as histó rias sobre os Sennin se
tornaram os contos populares desse perı́odo.
O mais conhecido dos Sennin é Tobo-saku "o principal homem do
Oriente", juntamente com Weiwobo "a Rainha Mã e do Ocidente". O
primeiro é um velho que nunca envelhece e mora em algum lugar do
Oriente. Sua imortalidade é simbolizada por um pê ssego que ele segura
em sua mã o e evidentemente representa a vitalidade sempre renascida
da primavera. A rainha Madre mora em um planalto pró ximo ao cé u,
em direçã o ao oeste da China. Ela é uma bela senhora da juventude
eterna, cercada por uma corte de jovens fadas e reverenciada por todos
os Sennin e seres fadas como sua soberana. Muitos Sennin estã o
associados a animais ou plantas que simbolizam suas respectivas
qualidades. Por exemplo, Rafu-sen, que provavelmente signi ica
"sutileza iludida", é o gê nio feminino das lores de ameixa, a lor amada
dos poetas chineses e japoneses como uma pioneira da primavera e
uma representante tı́pica do perfume puro e da beleza casta. Rafu-sen
vagueia entre as ameixeiras à noite, especialmente ao
luar. Kinko Sennin, "o homem alto com uma harpa", monta uma garça
branca e golpeia seu instrumento enquanto voa pelo ar. Kiku-jido, "a
jovem Graça do Crisâ ntemo" é o gê nio dessa lor. Ele é um menino
eternamente que mora nas montanhas, pró ximo a uma fonte pró xima à
qual lorescem crisâ ntemos e da qual, em virtude dessas lores,
lui uma corrente dourada de maravilhosos poderes de cura. Gama
Sennin, ou "Mestre Sapo", tem o poder de produzir qualquer nú mero
de sapos e montá -los pelo cé u.
Esses e muitos outros Sennin foram importados para o Japã o, onde
sã o mais representados em pinturas do que celebrados no folclore. Mas
o Japã o també m tinha seu pró prio Sennin. O mais conhecido é En-no-
Ozuna, apelidado de Gyoja ou "Mestre Ascé tico". Gyoja é a igura mı́tica
de um famoso asceta que se disciplinou nas montanhas, no
sé culo VIII. Ele construiu uma ponte de pedra de uma montanha para
outra, graças à ajuda de deuses e espı́ritos, demô nios e
gnomos. Durante os trabalhos, o gê nio de uma das montanhas unidas
pela ponte se recusou a obedecer à s ordens de Gyoja porque por causa
de sua extrema felicidade ele nã o queria aparecer entre os outros
espı́ritos. Gyoja o puniu prendendo-o em uma caverna, na qual ele está
preso até hoje. Essa histó ria pode se referir à fase da histó ria religiosa
do Japã o, quando o ideal taoı́sta-budista era obter o melhor das antigas
crenças nativas. Alé m disso, por outro lado, é dito que Gyoja foi
condenado pelas autoridades governamentais como um má gico, e
durante seu exı́lio ele praticou uma sé rie de atos
sobrenaturais. Este tı́pico bico Sennin japonê s ainda exerce um certo
encanto no imaginá rio popular e sua imagem é vista em muitas
cavernas, sentado em uma cadeira com um cajado na mã o.
De acordo com a crença popular, no entanto, os Sennin correm o
risco de perder seus poderes sobrenaturais se forem tentados a ceder
à s paixõ es humanas, como fez Ikkaku Sennin, o 'Unicó rnio[45] '. Ele
passou por um longo treinamento disciplinar e ganhou o poder de
fazer milagres. Uma vez ele lutou com a tribo do Dragã o e os trancou
em uma caverna. Como resultado, nã o choveu mais, porque a chuva foi
controlada pelos Dragõ es, e toda a terra sofreu uma terrı́vel seca.
O rei da terra, Benares, soube da causa de tal calamidade e
planejou um estratagema para tentar o poderoso Sennin e assim
libertar os Dragõ es. Para tanto, o rei enviou a mais bela dama de sua
corte à montanha onde vivia o Unicó rnio. O Sennin
icou tã o fascinado com a beleza da senhora que consentiu em beber o
vinho que ela lhe ofereceu. Quando o Sennin foi intoxicado, ele perdeu
todos os seus poderes e os Dragõ es foram capazes de sair de seu
con inamento. Entã o o Sennin superou sua embriaguez e tentou lutar
contra seus inimigos. Mas já era tarde. Os dragõ es fugiram para o cé u e
a chuva caiu sobre a terra em torrentes. Assim, o plano do rei triunfou e
a terra foi renovada.

Outro exemplo bem conhecido do fracasso de um Sennin é o


de Kumé -no-Sennin. Ele viveu como um asceta entre as montanhas
perto de Kumé -dera, um templo budista, e alcançou o notá vel poder de
se alimentar de ar e voar. Um dia, quando ele estava curtindo o ar, ele
viu abaixo dele uma mulher lavando suas roupas na margem do
rio. Sua atençã o foi atraı́da para os pé s brancos da lavadeira brilhando
na á gua. Entã o, ele cedeu à tentaçã o e perdeu seus poderes
sobrenaturais. Ele caiu no chã o, felizmente ileso, mas nunca recuperou
seus dons milagrosos. Diz-se que ele se casou com a mulher e deixou a
posteridade. Seu destino sempre foi citado como um exemplo tı́pico da
queda do alto, embora essa histó ria també m pareça pertencer ao grupo
que trata dos casamentos entre um ser celestial e outro humano.
Nã o apenas as lendas dos Sennin sã o muito populares no Japã o,
mas a crença nesses seres sobrenaturais ainda é , até certo ponto, uma
força viva entre as pessoas. Os candidatos a Sennin comem vegetais
crus evitando os cozidos, caminham pelas montanhas, tomam banho
frequentemente em á gua fria e quase nunca dormem dentro de
casa. Eles esperam obter a imortalidade da vida corporal e acreditam
que possuem poderes sobrenaturais. Algué m tinha certeza de ver
nuvens roxas descendo do cé u prontas para saudá -lo se ele pulasse de
um penhasco ı́ngreme. Ele se atreveu a pular, mas sua segurança
acabou sendo uma ilusã o e ele se matou. Em todo caso, esses milagres
costumam ser reverenciados pelo povo e suas histó rias circulam com
grande frequê ncia na esfera japonesa.
Os Homens da Montanha, apesar de sua autossu iciê ncia, tinham
sua pró pria sociedade. Suas assemblé ias eram frequentemente
representadas pictoricamente. Essas assemblé ias ocorreram em uma
reuniã o ideal chamada Senkyo, o reino dos Sennin, uma regiã o
aninhada entre montanhas, onde os pinheiros simbó licos da
longevidade cresceram até o cé u e onde os terraços ofereciam amplos
panoramas correspondentes à s mentes livres e livres. quartos do
Sennin. Lá eles trocaram opiniõ es, compuseram poemas, tocaram
mú sica ou se envolveram em meditaçã o. Este rei nã o ideal era o
paraı́so dos taoı́stas, mas ao contrá rio do paraı́so dos budistas, nã o era
um mundo brilhante ou resplandecente. Era apenas um lugar
lindamente ideal habitado por aqueles imortais, que formavam uma
comunidade pró pria, sem estar muito bem-organizados ou unidos
como aqueles que viviam em paraı́sos budistas.
O Senkyo era frequentemente pintado em quadros que, por sua vez,
estimulavam a imaginaçã o poé tica dos japoneses para sonhos de
serenidade e reserva ideais, de total emancipaçã o e afastamento das
ansiedades mundanas, de felicidade imortal e proteçã o contra doenças
já existentes. Muitos budistas japoneses, imbuı́dos de doutrinas
taoı́stas, tentaram imitar a vida ideal dos imortais. Assim, eles
copiavam suas assemblé ias em reuniõ es de um tipo peculiarmente
calmo e contemplativo, ou em assemblé ias para conversas totalmente
livres e jogos lorais, e projetavam suas casas e jardins como imitaçõ es
daqueles do Senkyo ideal. Resumindo: o conceito Senkyo foi
uma verdadeira fonte de inspiraçã o para o folclore e a esté tica
japoneses.
Foi nos sé culos XIV e XV quando as ideias chinesas do Sennin e
do Senkyo tiveram uma maior difusã o no Japã o e foram assimiladas à s
crenças populares dos japoneses. Esse perı́odo foi uma é poca de
ecletismo, e assim como os budistas absorveram os ideais taoı́stas de
vida, os xintoı́stas foram rá pidos em distinguir suas pró prias ideias e
tradiçõ es das concepçõ es budistas. Essa tendê ncia resultou
no estabelecimento de um grupo de divindades, ou imortais,
considerados os gê nios patronos da fortuna e da longevidade, retirados
de todas as fontes disponı́veis. O grupo passou por vá rias mudanças,
mas no inal do sé culo 16 estava de initivamente bem-disposto e icou
conhecido como "as Sete Divindades da Boa Sorte" (Sichi Fukujin).

Essas divindades sã o:


1. Ebisu, originalmente o ilho abortado de divindades
primitivas, que era como uma medusa, e foi modi icado
como o padrã o abençoado de boa sorte. Tem um rosto
redondo, com um sorriso perpé tuo. Traz na mã o direita uma
linha com a qual pesca a dourada, peixe considerado sı́mbolo
da boa fortuna.
2. Daikoku, a 'Grande Divindade Negra', que era uma
modi icaçã o do Maha-kala indiano[46] combinado com o
japonê s O-kuni-nushi, o "Grande Mestre da Terra", cujo
nome, escrito em ideogramas chineses, foi pronunciado
como Daikoku. Essa divindade foi representada como um
homem robusto, de pele escura e rosto sorridente. Ele
carregava um saco no ombro e um mallo ou martelo na mã o
direita. Ele ica em dois sacos de arroz que, juntamente com
um à sua volta, simboliza uma fonte inesgotá vel de riqueza,
enquanto a malha serve para produzir o que cada um de
seus adoradores anseia. O rato é o animal associado
ao Daikoku.
3. Bishamon, o Vaisravana budista, é o guardiã o do norte que
subjuga o mau e protege o bom. De acordo com a crença
popular, ele é o doador de riquezas, e o santuá rio budista
que ele segura em sua mã o direita deve conter dinheiro. Está
associada na pintura e no folclore à centopé ia.
4. Benten, que vimos como uma fada, é a ú nica mulher neste
grupo e é considerada a padroeira da beleza
e riqueza femininas. Seu mensageiro é a cobra branca.
5. Fuku-roku-ju, ou o "gê nio da fortuna-riqueza-longevidade", é
uma igura chinesa que já foi um sá bio taoı́sta. Ele també m é
conhecido como uma encarnaçã o das estrelas do Pó lo
Sul. Tem uma cabeça extremamente alongada, emblema de
tudo o que concede à humanidade. Está sempre
acompanhado da garça branca, sı́mbolo de longevidade.
6. Ju-rojin, "o Anciã o da Longevidade"; Ele també m é um
taoı́sta imortal e patrono de uma vida longa. Um
veado marrom escuro é o seu animal e vagueia entre á rvores
e arbustos, simbolizando saú de e vida longa.
7. Hotei, aquele que ama as crianças, é um monge gordo que se
acredita ter vivido na China na antiguidade. Ele é a
personi icaçã o da alegria e do divertimento, e sempre brinca
com as crianças, que à s vezes põ e no saco que carrega nos
ombros. Esta bolsa també m conté m muitos tesouros que
distribui para quem nunca se preocupa com os problemas
que a vida oferece.

Nesse grupo de divindades ou imortais, temos uma combinaçã o de


iguras mı́ticas de origem indiana, chinesa e japonesa, vulgarizadas em
grande parte pelo desejo popular de ser rico e ter boa sorte. Essas
divindades tê m seus adoradores, embora nem sempre sejam tratados
com respeito. Frequentemente, sã o temas de performances cô micas,
pictó ricas ou teatrais e també m sã o temas favoritos de cançõ es
folcló ricas. O gê nio japonê s, tã o apto para a alegria e o riso, tornou
possı́veis esses aspectos tã o contraditó rios com os que aparecem na
arte e na literatura dessas sete divindades.


Capítulo IV

DEMÔNIOS, VAMPIROS
E OUTROS SERES FANTASMAS
Os japoneses adotaram anjos budistas e imortais taoı́stas com
pouquı́ssimas modi icaçõ es, mas demô nios e outros seres
fantasmagó ricos emprestados de fontes indianas ou chinesas nã o, e à s
vezes é extremamente difı́cil rastrear a identidade de tais
concepçõ es. E um fato, entretanto, que os espı́ritos malignos da
mitologia nativa antiga sã o objetos sombrios e vagos, pouco mais do
que nomes.[47]. Quase todos os demô nios ou seres fantasmagó ricos
no folclore japonê s sã o de origem estrangeira, embora a imaginaçã o
japonesa tenha dado a eles formas muito diferentes do que em outros
paı́ses.
Os seres dessa espé cie podem ser divididos em trê s classes, embora
os limites que os separam sejam obscuros. Eles sã o:
1. Fantasmas, puros e simples, ou formas

deterioradas de almas humanas errantes.


2. Demô nios, seres de origem infernal, criados para
punir os ı́mpios, mas muitas vezes envolvidos em
travessuras reais, caso em que sã o cô micos por
natureza.
3. Vampiros aé reos, chamados Tengu, e semelhantes
aos espı́ritos raivosos que se enfurecem no ar.

Aqui pode ser conveniente dizer algo sobre a doutrina budista


sobre a transmigraçã o da alma. Alé m dos quatro está gios superiores do
budismo, existem vá rios tipos de espı́ritos inferiores, nã o perfeitos. Os
mais altos vivem nos cé us (elevas). Já falamos sobre aqueles se você é
celestial ou angelical. Esses cé us nã o devem ser confundidos com
paraı́sos, porque seus habitantes celestiais estã o sujeitos a mudanças e
corrupçã o. Em seguida, vem a humanidade, cujas almas inferiores se
transformam em fantasmas famintos (em japonê s, gakis, em
sâ nscrito, pretas). Alguns desses fantasmas sã o assombrados apenas
por fome e sede perpé tuas, mas outros sã o espı́ritos vingativos que
vagam pelo mundo e causam danos a inimigos e até a
seres inocentes. A pró xima aula é a dos asuras, ou espı́ritos raivosos,
crué is e arrogantes e muito mais poderosos do que os fantasmas
comuns. Geralmente sã o personalidades renascidas daqueles que
morreram em combate; Sempre com fome de vingança, eles voam por
espaços celestiais, lutando entre si ou atacando seres humanos que
eram seus inimigos. A ordem de existê ncia mais baixa é encontrada nas
regiõ es infernais (Naraka). Os espı́ritos nascidos em um lugar tã o
sombrio e sombrio raramente aparecem no mundo, mas o
demô nio, oni, que vive no inferno tem um papel preponderante no
folclore popular.
1. O DIABO
O oni varia desde o gigante que pode devorar
o mundo inteiro, passando por ogros e vampiros, até o minú sculo
goblin que é o autor de travessuras. Mas os japoneses costumam
pensar que um oni é um demô nio feio e temı́vel que surge das regiõ es
infernais para arrastar pecadores para o inferno, para punir os ı́mpios
que ainda estã o vivos ou para aterrorizar homens de má
disposiçã o. Seu corpo varia da mesma forma que sua cor; pode ser
azul, rosa ou cinza; tem o rosto achatado e a boca muito larga que se
estende de orelha a orelha. Na cabeça mostra alguns
chifres; frequentemente ostenta um terceiro olho na testa; os pé s tê m
trê s dedos com unhas pontiagudas e há trê s dedos. Ele está quase nu e
sua tanga é feita de pele de tigre. Ele pode andar no chã o ou voar pelo
ar. Em sua mã o direita, ele frequentemente carrega uma barra de ferro
com pontas muito a iadas.
Esses demô nios apareceram em uma carroça envolta em chamas
para agarrar a alma de um ser maligno prestes a morrer. Os terrı́veis
tormentos que planejam para as almas perdidas do inferno sã o o tema
de muitas lendas fantá sticas. No entanto, eles pertencem à mitologia
puramente budista e tê m alguma semelhança com os diabinhos e
demô nios da superstiçã o cristã medieval.
Mas, apesar de sua aparê ncia aterrorizante, o oni do folclore
japonê s é um personagem tremendamente cô mico. Eles gostam de
se intrometer nos assuntos humanos, mas sã o facilmente enganados
com encantamentos e feitiços simples, e sua irritaçã o conseqü ente é
frequentemente o assunto de uma histó ria em quadrinhos. Eles sã o
facilmente enganados, e sua força demonı́aca, bem como
sua aparê ncia aterrorizante, os tornam ainda mais ridı́culos quando
sã o enganados ou deixados indefesos diante daqueles que desejam
assustar.
Um conto curioso, pertencente a uma coleçã o de contos do sé culo
XII, ilustra de forma divertida essa peculiaridade do oni. E conhecido
como "Remoçã o de protuberâ ncias" (Kobu-tori).
Era uma vez um velho que tinha um grande caroço na bochecha
direita. Um dia ele icou tã o tarde na loresta cortando lenha que foi
forçado a buscar abrigo durante a noite, o que fez no oco de uma
á rvore. Por volta da meia-noite ele ouviu ruı́dos confusos muito
pró ximos e por im percebeu que eram feitos por um grupo de onis,
composto por uma grande variedade de demô nios. Ele colocou a
cabeça para fora e os viu sentados a uma mesa bem abastecida
de vinhas, dançando um apó s o outro, alguns muito bem, outros muito
ruins. O velho se divertiu muito vendo aquela folia e com vontade de
participar da diversã o, saiu do oco da á rvore e começou a dançar. Os
demô nios foram surpreendidos sua aparê ncia, mas eles amaram que
um ser humano os acompanhasse, especialmente quando se observava
a capacidade que o velho tinha para dançar.
Passaram entã o umas horas muito agradá veis e, na hora de partir,
o onis pediu ao velho que voltasse outra noite para lhes dar um
gostinho da sua arte coreográ ica. O velho consentiu, mas os demô nios
queriam uma promessa de sua palavra. Para isso, eles poderiam ter
cortado seu nariz ou orelhas, mas decidiram remover o caroço de sua
bochecha direita,[48] já que o velho os fez acreditar que era o que ele
mais apreciava nele.
Quando o velho voltou para sua aldeia, as pessoas icaram
surpresas ao ver que ele nã o tinha mais o caroço na bochecha, e a
histó ria logo circulou por toda a comunidade. Outro velho morava na
mesma aldeia com um caroço na bochecha esquerda. Ao ouvir a
histó ria maravilhosa, ele desejou que os demô nios removessem o
caroço també m. Na noite seguinte, ele escalou a montanha, exatamente
como seu amigo lhe disse para fazer, e esperou a chegada dos
demô nios. Eles nã o demoraram muito para se apresentar e começaram
a comer, beber e dançar. O velho saiu timidamente do oco da á rvore e
tentou dançar, mas nã o era um bom dançarino e os demô nios logo
perceberam, por sua falta de jeito, que aquele velho nã o era o mesmo
da noite anterior. Eles icaram muito bravos e conversaram para
decidir como poderiam fazê -lo pagar caro por sua ousadia. Finalmente,
eles decidiram acertá -lo com o caroço que havia sido removido da
bochecha direita do primeiro velho, para que o velho que tinha o
caroço na bochecha esquerda repentinamente tivesse outro na
bochecha direita, entã o ele voltou para a aldeia com o rabo entre as
pernas, como se costuma dizer.
A moral ligada a esta histó ria é que você nunca deve invejar a sorte
dos outros, embora esta moral seja certamente um acré scimo do autor,
já que o motivo original era exclusivamente contar um desenho
animado.
A mesma coleçã o conté m outras histó rias referentes a demô nios,
nas quais eles já aparecem como seres terrı́veis, e como seres
extremamente cô micos. Por exemplo, um monge viajante encontrou
certa vez um demô nio horrı́vel nas montanhas. Apesar de sua
aparê ncia monstruosa e temı́vel, o diabo chorava amargamente. O
monge imediatamente perguntou-lhe o motivo de tal choro. O diabo
explicou a ele que ele já foi um ser humano, mas devido ao espı́rito
vingativo que ele abrigou contra seu inimigo, ele se tornou um
diabo. Assim, ele foi capaz de se vingar nã o apenas de seu inimigo, mas
de seus descendentes por vá rias geraçõ es, já que um demô nio vive
muito mais que um ser humano. E ele havia matado o ú ltimo membro
da linha de seu inimigo, e nã o havia mais inimigos para ferir. Apesar
disso, continuei a me ver torturado pelo desejo incessante de vingança.
A misé ria daquele demô nio consumido por paixõ es que ele nã o
conseguia satisfazer é uma liçã o muito agradá vel para os budistas,
mesmo que um monstro que clama por tal causa tenha um certo
humor nisso. E possı́vel que dessa lenda venha o prové rbio conhecido:
"Até nos olhos do diabo há lá grimas." Outro prové rbio diz: "Até os
demô nios sabem orar ao Buda", e este é o assunto favorito dos
pintores. Um demô nio com um rosto de horrı́vel feiú ra é pintado em
vestes moná sticas, agitando um sino que pende de seu peito,
supostamente repetindo o nome de Buda em unı́ssono com o sino. Os
demô nios assim caricaturados abundam nas pinturas japonesas,
especialmente nas obras da ú ltima geraçã o de pintores.
Em contrapartida aos demô nios, o folclore japonê s tem uma
espé cie de Arcanjo Miguel na pessoa do Shoki. Aparentemente, ele
viveu na China durante o sé culo VIII. Diz a lenda que ele cometeu
suicı́dio ao fracassar em sua carreira o icial. Mas depois de sua morte, o
imperador o honrou excessivamente, e por isso Shoki teve o cuidado de
proteger o palá cio imperial contra os demô nios. Ele é retratado como
um gigante usando uma coroa e vestindo o traje o icial chinê s da
é poca, apunhalando uma espada na mã o. Seus olhos brilham com raiva
e suas bochechas estã o cobertas por uma barba espessa. Ele persegue
demô nios sem remorso, e nas pinturas em que é visto lutando com
algum demô nio, o contraste entre sua estatura alta e a do diabinho é
muito divertido. A igura de Shoki aparece nas bandeiras hasteadas no
Primeiro de maio do Japã o, festa em que os espı́ritos malignos da
peste, outras doenças e pragas sã o exorcizados.
Ele é dito que alguns anos Onis ter um Mallo milagrosa, como
o Daikoku[49], que pode conceder tudo o que se deseja. Há uma
histó ria que con irma a respeito de Issun-boshi, "a Thumbelina".
Era uma vez um casal de idosos que, como nã o tinham ilhos, orava
continuamente ao deus de Sumiyoshi para que lhes concedesse um,
mesmo que tivesse apenas uma polegada de altura. Sua oraçã o foi
atendida e uma espé cie de pigmeu nasceu para eles. Eles o chamavam
de Issun-boshi ou "a Thumbelina"; no entanto, ele acabou por ser
um menino muito inteligente. Apesar de ser muito pequeno, ele
desejava conhecer o mundo e começar uma carreira em Miyako, a
capital imperial. Os pais deram-lhe provisõ es e o anã o partiu, levando
um prato de madeira e um palito que usava como barco e leme
para desenhar os rios. Quando ele chegou a Miyako, ele entrou ao
serviço de um nobre e logo se tornou seu servo mais iel.
Um dia ele acompanhou a princesa da mansã o ao templo
de Kiyomizu, e no retorno eles foram parados por um oni, que
ameaçava devorá -los. O habilidoso e corajoso Issun-boshi saltou na
boca do oni e espetou seus lá bios e nariz com sua espada, que era um
al inete, o oni, achando a dor insuportá vel, libertou-se o melhor que
pô de de seu agressor e fugiu. Quando o oni desapareceu, a princesa
encontrou um mallo que aparentemente caiu para o oni em sua fuga. A
jovem sabia que à s vezes oni usa uma malha maravilhosa que pode
atender a tudo o que for pedido a ela, entã o ela a pegou e a brandiu,
pedindo que Issun-boshi se tornasse um
homem. Thumbelina imediatamente se transformou em um homem de
boa estatura. A princesa agradeceu-lhe por salvá -la dos oni e Issun-
boshi agradeceu à princesa por transformá -lo em um homem. Mais
tarde, eles se casaram e viveram eternamente felizes.
2. O FANTASMA COM FOME E O ESPIRITO IRRITADO
Menos temı́veis, mas talvez mais miserá veis do que os onis, sã o
os gakis, ou fantasmas famintos, que sofrem perpetuamente de fome e
sede, e diante dos quais qualquer comida ou bebida é consumida pelas
chamas. Nas obras budistas, há vá rias descriçõ es desses fantasmas,
mas no folclore japonê s eles se tornaram seres infelizes, terrivelmente
emaciados, exceto pela barriga, que está anormalmente
inchada. Aquela barriga inchada e a boca muito larga simbolizam sua
fome nunca saciada, por isso se agrupam onde há restos de comida ou
bebida. Poucas lendas se referem a eles, mas todo ser humano cheio de
gula ou á vido por riquezas se assemelha a um gaki. Assim, alé m das
pinturas muito comuns de gakis, há referê ncias frequentes a essas
criaturas infelizes, tanto em histó rias quanto em prové rbios.
A terceira ordem de espı́ritos introduzida na mitologia japonesa
pelo budismo é a dos shuras, "Espı́ritos Enfurecidos". A
morada dos shuras é o cé u, onde eles se reú nem para lutar uns contra
os outros em grupos hostis. Sua aparê ncia é a de guerreiros; seus gritos
de raiva sã o como um trovã o, enquanto seus grupos amontoados à s
vezes obscurecem o sol ou a lua. As shuras sã o reencarnaçõ es de
guerreiros mortos em combate. Nã o há Valquı́rias no folclore japonê s,
pois esses seres enfurecidos sã o todos do sexo masculino,
incorporando o espı́rito de ó dio e vingança. Os shuras sã o mais ou
menos confundidos com outros tipos de seres, provavelmente de
origem chinesa, espé cie de ogros aé reos muito comum no folclore
japonê s, com o nome de tengu.
O tengu é de duas classes: o principal e o subordinado. O
chefe tengu usa uma tú nica vermelha como a de um bispo e uma
pequena coroa como a de um sacerdote da montanha, com um leque
de penas na mã o direita. Sua expressã o é zangada e ameaçadora, e ele
tem um nariz muito proeminente que supostamente simboliza
orgulho e arrogâ ncia. Os chefes Tengus possuem personalidades e
tı́tulos distintos, e acredita-se que cada um resida em um ponto alto de
sua propriedade. Por outro lado, os tengus inferiores estã o sujeitos a
um chefe e devem sempre o servir. Sua boca lembra o bico de um
pá ssaro e seu corpo possui pequenas asas. Nesse aspecto, eles sã o
muito semelhantes aos Garuda hindus, embora sejam menores em
estatura. Eles se reú nem em bandos em um mercado de
criptogra ia[50] gigante, perto da residê ncia do chefe, e daquela á rvore
eles voam para cumprir as ordens dadas por seu mestre. E por isso que
eles sã o chamados de Koppa Tengu ou " elenco tengus ".
Os tengus sã o, como dissemos, reencarnaçõ es daqueles cujo
espı́rito arrogante e vingativo nunca foi morto, dos orgulhosos e
altivos, especialmente os sacerdotes, ou daqueles que morreram em
combate. Esses seres fazem conferê ncias em cima de um grande cripto
mercado e, dependendo da decisã o tomada, atacam os odiadores ou
aqueles que desejam imbuir seu pró prio espı́rito de orgulho. Na é poca
das guerras, ou seja, nos trê s sé culos que se seguiram ao sé culo XIV, os
japoneses eram assombrados por terrı́veis superstiçõ es sobre
os tengus, abundavam lendas sobre eles.
Intimamente ligada com o Tengu e oni sã o os gê nios do vento e
trovõ es, chamado raison jin e fu-jin respectivamente. Seu
nascimento é incerto, mas eles se parecem muito com onis. O espı́rito
do trovã o é um oni vermelho e o espı́rito do vento é azul. A
raison jin leva uma moldura redonda na parte de trá s, que sã o unidas
por pequenos tambores. O fu-jin carrega um grande saco dos ra
emergentes chas vento a partir de uma brisa para um furacã o como o
fu-jin abrir mais ou menos o saco. Nã o há lendas especial sobre eles,
embora sejam frequentemente representado em está tuas e pinturas, à s
vezes comicamente, como quando um ra i-jin é mostrado cambaleando
como um bê bado ou um fu-jin levadas pelo vento que ele mesmo
desencadeou.
3. OUTROS SERES FANTASMA
Existem seres fantasmagó ricos importados do continente asiá tico e
modi icados pelos japoneses. Vamos descrever algumas dessas
concepçõ es originais japoneses, todos os quais sã o de origem mais
tarde, provavelmente nã o antes do sé culo XIV.
Yuki-onne, "a neve-mulher", é uma jovem de pele branca, magra,
gentil e muito atraente. Ele aparece para aqueles que estã o exaustos de
lutar contra uma tempestade de neve. Isso os acalma e atrai o sono
sobre eles, até que percam a consciê ncia e morram. As vezes, ela
assume uma mulher muito bonita e se casa com um homem que acaba
matando.
Myojo-tenshi, o "Anjo da Estrela da Manhã ", é um jovem bonito,
vestido como um prı́ncipe. Ele aparece aos homens sá bios e virtuosos e
os guia em suas viagens. Ele frequentemente guia monges itinerantes,
entã o essa crença pertence mais ao folclore budista do que ao
folclore em geral.
O folclore japonê s nã o tem seres como drı́ades ou ninfas, mas tem
contos sobre espı́ritos de lorestas, fontes e lagos. Os espı́ritos da
loresta e da montanha sã o geralmente criaturas fantasmagó ricas,
masculinas ou femininas, enquanto os das á guas sã o peixes, tartarugas
ou cobras. Um dos gê nios da montanha é Yama-uba, a "Mulher-
Montanha", que ronda as montanhas e aparece em formas muito
variadas. Seu nome parece ter sido uma palavra geral para todos os
espı́ritos femininos das montanhas, mas mais tarde foi aplicado a um
espı́rito particular, do qual todos os tipos de histó rias começaram a ser
contados.
Um dos contos que se referem aos espı́ritos femininos das
montanhas é o de Morniji-gari, ou "o Alamo viajante"; há uma versã o
famosa dessa histó ria em um drama lı́rico. Num dia de outono, um
guerreiro escalou uma montanha para apreciar a bela cor carmesim
das folhas já mortas de um bordo. Depois de entrar na loresta, ele se
viu na companhia de mulheres dando uma festa atrá s de cortinas de
cetim cintilantes fechadas ao redor delas. A guerreira juntou-se a esta
companhia feminina e divertiu-se agradavelmente, especialmente
pela lı́der do grupo, uma jovem nobre. Enquanto isso, o guerreiro
apreciava a mú sica e a cerveja de arroz que a jovem lhe oferecia. Em
meio à confusã o, a senhora se transformou em um demô nio
assustador que ameaçava a vida do guerreiro. Ele conseguiu acordar
do feitiço em que estava submerso e recuperou a compostura e sua
coragem conseguiu escapar daquele espı́rito traiçoeiro. Nesta lenda, o
gê nio feminino nã o tem nome[51], mas ele lembra muito Yama-uba.
Yama-uba, "Mulher da Montanha" à s vezes assume uma aparê ncia
aterrorizante, embora geralmente seja retratada como uma jovem
muito bonita, casada com um guerreiro. Seu ilho se
chama Kintaro ou Kintoki. Ele é um verdadeiro ilho da natureza,
robusto e corajoso; Ele nã o tem medo de ningué m e brinca com
animais selvagens. Pode ser considerado o Siegfried dos
japoneses. Diz-se que ele se tornou um servo do famoso
guerreiro Raiko, sobre o qual falaremos no Capı́tulo VI. No drama lı́rico,
a mã e do menino é romantizada em uma hada, as nuvens e brumas,
vagando entre as montanhas e visitando moradias humanas. A seguir,
damos um trecho do drama em questã o:
R ̃
Nó s a chamamos de Donzela da Montanha.
Mas ningué m conhece seu local de nascimento ou sua residê ncia;
mora nas nuvens e ao lado de todos os rios.
Nã o há lugar nenhum, nem mesmo nas montanhas mais remotas,
onde nã o há vestı́gios de sua passagem.

EMPREGADA
Embora eu nã o seja um ser humano.

R ̃
Ele se manifesta na igura maravilhosa de tamanho monstruoso,
g ,
emergiu das nuvens e das né voas,
transformando de acordo com o que o cerca...
Faz com que as folhas do salgueiro cresçam verdes com os brotos,
e que as lá grimas crescem, de uma bela cor rosa,
por si pró prios, e os deixa sozinhos.
Desta forma, a Donzela da Montanha sempre vagueia pelo mundo,
à s vezes consola o lenhador,
dando a ele um lugar para descansar sob uma á rvore lorida,
ao longo das trilhas das encostas das montanhas...
Ou suba em uma janela
ao lado do qual uma jovem trabalha em seu rack,
e ajuda suas mã os juvenis;
como o rouxinol cantando no salgueiro,
tece os ios verdes dos galhos pendurados.

R ̃
Na primavera, quando se aproxima a é poca das lores.

EMPREGADA
Eu vagueio em busca de lores.

R ̃
No outono, quando a noite é calma e o ar translú cido.

E
Eu migro de montanha em montanha,
apreciando a luz prateada da lua.

R ̃
No inverno, quando as nuvens trazem tempestades e neve.
E
Eu voo sobre a neve, sobre picos e trilhas.

R ̃
Ela vagueia incansavelmente entre as nuvens da ilusã o,
e vamos ver sua igura como as montanhas,
embora em constante mudança.
Voe em volta dos picos
sua voz ecoa nos vales.
A igura tã o perto um momento atrá s
voa para longe, voando para cima e para baixo,
à direita e à esquerda, circulando os picos,
vagando entre as cadeias de montanhas, voando e planando,
e inalmente sem deixar vestı́gios.



Capítulo V

HISTÓRIAS ROMÂNTICAS

O amor é sempre e em toda parte um poderoso estı́mulo


aos sentimentos e à imaginaçã o. Nenhuma emoçã o é tã o idealizada
pela mente humana, e a literatura, oral ou escrita, de todos os povos é
rica em icçõ es româ nticas que tratam dos inú meros aspectos e
manifestaçõ es das mais ternas paixõ es. Cada histó ria de amor re lete
naturalmente os sentimentos predominantes e o ambiente social da
é poca em que ocorreu. Por isso, nenhuma histó ria pode ser
considerada absolutamente universal em seu encanto. Alguns sã o tã o
ingê nuos, tã o simples, tã o emocionantes, que vã o de uma era a outra
sempre levando uma mensagem ao coraçã o humano. Eles sã o iltrados,
para dizer de alguma forma, pelas vá rias simpatias das geraçõ es, e cada
indivı́duo encontra nelas um eco de sua pró pria experiê ncia. Esse tipo
de histó ria româ ntica é o que Richard Wagner chamou
de reinmenschlich, ou pureza humana, e deve ser distinguida de
histó rias e romances de estrutura mais intrincada e paixõ es mais
intensas e, ao mesmo tempo, menos direta e menos atraente para as
emoçõ es da mulher raça. Essas histó rias pertencem à tradiçã o
emocional comum da humanidade. Sabemos que heró is e heroı́nas sã o
criaçõ es da imaginaçã o, mas nã o podemos negar a impressã o de que
possuem uma realidade mais autê ntica do que a de homens e mulheres
reais. A sua é uma realidade ideal; sã o sempre os mesmos e imortais
protó tipos de amantes de todos os tempos, de todos os climas.
Na histó ria, houve duas grandes idades favorá veis à produçã o
de contos româ nticos desse tipo especial. Na antiguidade, no inal do
sé culo VIII, o imaginá rio da raça ainda estava na fase primitiva e
mitoló gica de desenvolvimento. Naquela é poca, os mitos naturais à s
vezes eram traduzidos em contos simples e encantadores, animados
pelo amor humano. Novamente, entre os sé culos 10 e 12, houve uma
é poca de sentimentos româ nticos cuja origem era o ambiente peculiar
da vida na corte e foram estimulados pela concepçã o budista da
realidade. Mas no inal do sé culo XV houve um renascimento do
interesse desse amor româ ntico, mas o movimento nã o foi tã o criativo
quanto os dois anteriores, mas serviu para re inar e so isticar herdou
mais vezes esses materiais.
Nas histó rias das duas idades mencionadas, os protagonistas à s
vezes sã o personi icaçõ es de objetos naturais, mas na maioria das
vezes sã o seres humanos que representam os sentimentos e ideais da
é poca. Primeiro, reproduziremos um conto dos mitos mais antigos que
trata dos fenô menos corpori icados da natureza.
Eram dois irmã os, Haru yama nã o Kasumi-Onoko, e Aki-
yama nã o Shitabu-Onoko, a saber: "Man Mountain Mist Primavera" e
"Queda Man Frost Mountain." Naquela é poca, havia uma jovem
chamada lzushio-tome, ou seja, "a donzela das Graças", nascida dos
oito tesouros divinos-lança, joias, etc. Que foi levada para o Japã o por
um prı́ncipe coreano. O irmã o mais velho, Winter Frost Man, ansiava
por se casar com a jovem, mas ela rejeitou seu amor. O irmã o mais
velho contou ao mais novo, o Homem da Né voa da Primavera, e
prometeu dar-lhe um belo presente se ele pudesse icar com a
garota. O Homem-Nevoeiro garantiu que tinha certeza do sucesso e
perguntou a sua mã e[52] como ele poderia alcançar o coraçã o da
jovem. Sua mã e teceu para ele roupas feitas com inos tentá culos de
glicı́nias e deu-lhe um arco e lechas que ele deveria carregar ao visitar
a donzela. Quando o Homem da Né voa chegou à casa da jovem, seus
vestidos eram roxos e seu arco e lechas estavam adornados com
lores de glicı́nias. A jovem acolheu o belo jovem tã o adornado com
lores, casou-se com ele e deu-lhe um ilho.
Mais tarde, o irmã o mais novo foi ver o irmã o mais velho e contou-
lhe sobre seu sucesso, pedindo o presente prometido. Mas o Frost Man
tinha muito ciú me de seu irmã o e nã o cumpriu sua promessa. Entã o o
Homem da Né voa foi ver sua mã e e reclamou que seu irmã o o havia
traı́do. A mã e, por sua vez, icou com raiva do Homem-Gelo e lançou
uma maldiçã o sobre ele:[53] que ele secou como um bambu
desenraizado e adoeceu. Logo depois, o irmã o mais velho
icou gravemente doente, mas quando ele se arrependeu de sua culpa e
implorou que sua mã e o perdoasse, ela o perdoou, o Homem Frost foi
curado e todos viveram para sempre em boa harmonia.
Outra histó ria que també m trata de uma jovem e seus dois amantes
data do sé culo VIII. Embora pareça ter uma origem naturista, foi
contada como se fosse um episó dio real de amor humano, e os trê s
tú mulos foram mostrados anos depois aos transeuntes que ouviram a
histó ria. Entã o a histó ria continua:
Nã o viveu na provı́ncia de Settsu uma jovem mulher famosa por sua
beleza, conhecido como solteira de Unai. Muitos homens a queriam,
mas ela nã o atendeu a nenhum. Quando todos os outros perderam as
esperanças, dois jovens, igualmente bonitos, continuaram a exigir seu
amor. Os dois jovens disputavam o amor da donzela, tentando
conquistar seu coraçã o visitando-a e oferecendo-lhe deliciosos
presentes. Os pais, determinados a casar a ilha com um dos dois
rapazes, mas incapazes de ser determinados por nenhum dos dois,
adotaram uma soluçã o: um concurso de arco resolveria a questã o. Os
amantes apareceram no dia marcado, armados com arcos e lechas. A
jovem e seus pais se prepararam para assistir a competiçã o, na qual os
dois jovens atirariam em um pá ssaro pousado na superfı́cie de um rio
que corria em frente ao casarã o da mansã o. Os dois atiraram e as duas
lechas acertaram o pá ssaro, uma na cabeça e outra na cauda. Portanto,
o assunto permaneceu sem soluçã o.
A jovem, torturada pela di iculdade de decidir por um dos dois
amantes, enlouqueceu e se atirou ao rio. Os dois rapazes perderam
instantaneamente todo o interesse pela vida e seguiram o exemplo de
sua amada. Assim, os trê s foram unidos na morte e foram sepultados
juntos na margem do rio, a donzela no meio e os amantes um de cada
lado.
Antes de dar exemplos das histó rias e lendas produzidas durante a
Segunda Era Româ ntica, devemos dizer algo sobre os ideais
peculiares daqueles dias interessantes. Era a é poca dos "galantes das
nuvens" e das "donzelas das lores", dos nobres e damas elegantes que
se moviam em meio à atmosfera româ ntica e arti icial da corte
imperial. Foi uma é poca de esteticismo e sentimentalismo ou em que
emoçõ es re inadas e cultivadas foram desencadeadas pela atmosfera
enervante de Miyako, a capital imperial. Todos os membros desta
pitoresca sociedade, homens ou mulheres, eram poetas, sensı́veis aos
encantos da natureza e ansiosos por expressar todas as fases do
sentimento em versos. Seu amor ı́ntimo pela natureza e pela variedade
de emoçõ es do coraçã o humano foi expressa pela palavra awaré, que
signi ica "pena" e "simpatia". Esse sentimento teve sua origem no terno
romantismo da é poca, muito devido aos ensinamentos budistas sobre a
singularidade das existê ncias, à unidade bá sica que reú ne diferentes
seres e que persiste atravé s das diferentes encarnaçõ es do mesmo
indivı́duo. Essa convicçã o na continuidade da vida, nesta existê ncia e
em outras sucessivas, aguçou a nota sentimental e ampliou o alcance
simpá tico do awaré. Nã o é de se estranhar, portanto, que o reinado
do awaré tenha produzido tantos romances de amor, tanto na vida real
quanto nas histó rias da é poca.
Nã o apenas por meio de sua doutrina metafı́sica da unidade
existencial e da continuidade do carma, mas també m pelo ideal do
"Caminho", o Budismo imprimiu nas nuvens galantes e nas donzelas da
é poca a sensaçã o da singularidade da vida. De acordo com esse
ensinamento, seres, humanos, animais e até plantas, estã o destinados a
atingir a perfeiçã o inal. A base é comum, a meta é a mesma, e o
caminho que conduz ao conhecimento perfeito é um para todos os
seres, quaisquer que sejam suas diferentes disposiçõ es e
capacidades. Este era o ensinamento do "Caminho", e a escrita budista
onde era mais e melhor exposta era o Lótus da Verdade, o "Evangelho
segundo Sã o Joã o" do Budismo. A obra está repleta de sı́miles e
pará bolas, visõ es apocalı́pticas e profecias emocionantes, e deu um
tremendo impulso ao sentimento româ ntico da é poca: o romantismo
mais importante daquele perı́odo foi o Genji Monogatari, os contos dos
casos de amor do prı́ncipe. Genji, e o autor do livro, combinou as
verdades ensinadas no Lótus com a felicidade e charme ú nicos que
permeiam sua narrativa.
Os contos dos casos de amor do prı́ncipe Genji nã o sã o notá veis
pelo enredo ou incidente, mas sã o deliciosos por sua associaçã o
afetuosa com as belezas da natureza. Em outras palavras, as vá rias
personagens femininas apresentadas nesses casos de amor sã o
ilustradas nã o apenas pelas circunstâ ncias desse amor, mas pela
semelhança sugerida com certos locais fı́sicos e estaçõ es. Por exemplo,
a Dama Violeta é uma mulher inteligente e vivaz, que o prı́ncipe
conhece quando ela ainda é uma criança, e seu caso de amor com ele é
contado em uma sucessã o de episó dios de ternura e dias felizes como
uma primavera perpé tua. Por outro lado, a Royal Mauve Lady, esposa
legı́tima do prı́ncipe, é uma mulher ciumenta de temperamento
apaixonado: sua vida é tempestuosa, torturada pela in idelidade do
marido, e ela é até atacada pelo espı́rito vingativo de outra mulher
ciumenta.[54]. Essas histó rias, excelentes representantes do
sentimento do awaré, foram tã o populares entre os japoneses da Idade
Mé dia que se tornaram os modelos clá ssicos de histó rias de amor
româ ntico. Eles foram cantados repetidamente em versos,
mencionados em outros livros, inseridos em dramas lı́ricos e descritos
em pinturas; e as pessoas e incidentes nessas histó rias tornaram-se
tã o reais na mente popular que muitos autores trataram esses
romances como se fossem aventuras reais e nã o ictı́cias. A
popularidade dessas histó rias é vista no fato de que uma sé rie de
sı́mbolos[55] eles foram inventados para cada capı́tulo do livro e para
os personagens, circunstâ ncias e exemplos particulares.
Alé m do Genji Monogatari, existem outros livros que retratam o
mesmo personagem e sentimento, e alguns deles até rivalizavam com
o Genji em popularidade. Os locais onde tais narrativas se
desenrolavam eram frequentemente visitados, e dizia-se mesmo que
algumas pessoas apareceram a amantes româ nticos, que conversaram
com eles e converteram as suas almas, ainda imersas na paixã o do
amor, à religiã o budista. A partir do sé culo XIV, esses contos
româ nticos budistas foram transformados em obras-primas lı́ricas e,
graças a eles, romances antigos foram mais amplamente
divulgados. Esses dramas, chamados de " Utai ", nã o sã o dramá ticos no
sentido moderno do termo, mas sim narrativas lı́ricas das pessoas que
passam por tais experiê ncias, recitadas em uma espé cie de salmodia
com o acompanhamento de orquestra e coro. Nessas representaçõ es,
chamadas de "Nã o", há dois ou trê s personagens que aparecem em
cena; eles conversam em recitativos e executam algumas danças. Eles
nã o se assemelham à s tragé dias gregas na té cnica, mas as questõ es sã o
sentimentais e româ nticas, ao invé s de trá gicas. Essas obras foram
representadas perante assembleias de nobres e guerreiros, ainda hoje
sã o patrocinadas pelas classes instruı́das, e as histó rias que
interpretam costumam ser bem conhecidas do povo. Embora essas
histó rias nã o pertençam ao folclore no sentido real da palavra, elas
podem ser ilustradas aqui, pois sã o caracterı́sticas do vié s sentimental
do povo.

Primeiro temos o conto de Ono-no-Komachi, o tipo idealizado de


mulher bonita da literatura e folclore japoneses. Ela era uma senhora
da corte que viveu no sé culo IX. Nã o apenas sua beleza atraiu muitas
"nuvens galantes" ao seu redor, mas ela era uma poetisa altiva. Tendo
tido azar com seu amor por um certo nobre, ela rejeitou todos os seus
pretendentes, deixou a corte e viveu uma longa vida como
reclusa. Muitas histó rias foram contadas sobre ela, mas a mais
conhecida é a de sua apariçã o ao poeta Nari-hira, també m protagonista
de muitas histó rias româ nticas, e sua conversa em verso com ele.
A histó ria descreve a crueldade da jovem para com seus amantes, e
como ela se orgulhava de sua pró pria beleza, e termina por decidir que
a solidã o de seus ú ltimos anos foi o castigo por dito orgulho. O
infeliz Komachi é frequentemente retratado como uma infeliz velha
sentada em um sotoba, que é um pedaço de madeira erguido ao lado de
um tú mulo, em memó ria do falecido. E desse Komachi, sozinho e
esquecido, que fala o poema:
As lores e meu amor
eles murcharam na chuva,
enquanto eu mal os ouvia.
Onde está meu amor de ontem?

Assim ele morreu; ningué m a enterrou e seu corpo permaneceu
exposto à s intempé ries. Alguns anos depois, Narihira, a poetisa
do amor, passou uma noite naquele lugar, sem saber que foi ali
que Komachi havia morrido. De repente, ele ouviu uma voz fraca nos
arbustos, repetindo um poema em que se queixava de sua solidã o. Por
im, Komachi apareceu para ele, confessando a Narihira que ela sentia
muito por seu orgulho e sofria muito por sua solidã o. Na manhã
seguinte, Narihira descobriu um crâ nio corroı́do entre as gramas. "E
bom meditar", conclui a histó ria, "sobre a natureza transitó ria da
beleza fı́sica e a vaidade do orgulho."
A poetisa Narihira é uma das "nuvens-galantes" do sé culo IX, cuja
vida foi uma sucessã o de amores româ nticos. Há uma coleçã o de
narrativas que sã o atribuı́das à sua pena. Uma é sobre o amor de sua
infâ ncia e é chamada de histó ria do Isutsu-izutsu, ou "A fonte ".
Narihira tinha uma amiguinha a quem amava desde a
infâ ncia. Frequentemente, em seus tenros anos, eles icavam perto de
um poço e, ao se inclinarem sobre o meio- io do poço, ainda sorriam e
se olhavam nos olhos, seus rostos re letidos na
á gua. Quando Narihira cresceu, ele se apaixonou por outra mulher. Seu
antigo amor continuava junto ao poço, sozinho; Pensava em dias
distantes e, lembrando-se dos poemas que compô s na ponte do poço,
també m escreveu versos nos quais retratava o contraste entre o
passado feliz e o infeliz presente.
Assim é a velha histó ria. A peça Nã o "O meio- io do poço" é de inida
no antigo poço. Um monge viajante visita o local e vê o fantasma da
mulher abandonada por seu amante. Ela conta a ele sua histó ria,
executa uma dança que expressa seu desespero e desaparece. O coro
canta:
A alma do falecido, o fantasma da pobre menina,
incolor como uma lor murcha,
as folhas não deixam rastros no templo subterrâneo de Arihara.
O amanhecer está chegando e o sino toca suavemente;
no crepúsculo da manhã só há
as folhas frágeis da bananeira[56] agitado pela brisa da manhã.
nenhum som é ouvido além da melodia que a brisa toca nas agulhas
dos pinheiros.
O sonho é interrompido e o dia chega.
Voltemos à s famosas histó rias do Prı́ncipe Genji. Ele era um
prı́ncipe de nascimento real, tã o bonito e tã o arrojado que foi chamado
de "o Brilhante". Uma de suas amantes, a Dama da Sexta Avenida, foi
insultada e agredida pela esposa ciumenta do poeta, Lady Malva Real, e
quando a primeira morreu, seu espı́rito vingativo atacou nã o só Lady
Malva Real, mas outros amantes do Prı́ncipe. Ele sempre se lembrava
da falecida com carinho e até uma vez visitou a regiã o onde morava a
ilha do falecido.
Uma peça de teatro nã o tem como cená rio o local dessa visita. Como
costuma acontecer em tais dramas, um monge viajante visita o local
em uma noite de outono. O luar pá lido prateando o ar e os insetos
voando pela grama cantam suas melodias lamentosas. Lá , o fantasma
da infeliz Senhora da Sexta Avenida aparece ao monge, que salva sua
alma atormentada. O tema desta obra nã o consiste no contraste entre a
agonia do fantasma e a serenidade da noite; mas é popular entre as
pessoas porque celebra a uniã o apaixonada da senhora com o prı́ncipe,
mesmo depois da morte deste.
Muito semelhante em tom e efeito é a obra lı́rica "Dondiego à
noite". Esta é a histó ria:
O prı́ncipe Genji teve um amante chamado Yufugawo, ou "Dondiego
à noite"[57] para um palá cio abandonado na Sexta Avenida. Durante a
noite, um fantasma apareceu aos amantes. O pobre Yufugawo icou tã o
apavorado com essa apariçã o que Genji logo a encontrou morta. A
solidã o do lugar, o horror da apariçã o e o terno cuidado dispensado
pelo prı́ncipe à jovem aterrorizada sã o tã o vividamente descritos
no Genji Monogatari que o nome de Yufugawo, e o do palá cio, "a aldeia
na margem do rio ", desde entã o signi icam o im trá gico em uma
histó ria de amor, ou a separaçã o infeliz de dois amantes por causa da
morte.
Um drama lı́rico baseado nesta histó ria é ambientado em um
festival de lores realizado no inı́cio do outono e organizado por um
monge para o conhecimento espiritual das lores. Em frente ao altar
budista, um ornamento loral é arranjado e o monge oferece suas
oraçõ es ao espı́rito das lores. Entã o, entre eles, o pá lido Dondiego de
Noche começa a sorrir e a igura da mulher morta aparece. Seu espı́rito
infeliz é acalmado e paci icado pelo mé rito religioso da festa, e ela
expressa seu agradecimento por sua salvaçã o, desaparecendo entre as
lores.
Das muitas histó rias de amor no mesmo livro, tomaremos uma
relativa ao General Kaoru, o Perfumado, ilho do Prı́ncipe Genji,
enquanto o livro continua narrando os casos da segunda geraçã o desta
famı́lia amorosa. Kaoru era um homem de coraçã o terno, mas mais
calmo e reservado que seu pai, e as histó rias em que ele aparece sã o,
em geral, menos alegres do que aquelas nas quais seu pai é o
protagonista.
Kaoru amava uma princesa chamada Ukifune, que signi ica "O
Barco Flutuante". A jovem morava no campo com seu pai eremita, sem
participar da vida social de Miyako. Kaoru costumava visitar a princesa
em sua solitá ria casa, cuja aposentadoria ela achava muito bem-vinda,
mas as circunstâ ncias a impediam de visitá -la com a mesma frequê ncia
de antes, e a pobre princesa nem se atreveu a escrever para
Miyako. Pouco tempo depois, naturalmente, a princesa começou a
suspeitar que Kaoru era in iel a ela, e outro prı́ncipe, chamado Niou, "o
Perfumado", rival de Kaoru, aproveitou a oportunidade para encorajar
tais suspeitas. Com o coraçã o pesado, a jovem saiu para passear na
margem do rio, perto de sua casa. Seu nome, "Barco Flutuante" sugeria
a ela a efemeridade da vida e a vã de todas as esperanças, e a
correnteza do rio, enchido pelas chuvas, parecia chamá -la. Um dia, ela
pulou na á gua, mas foi salva por um monge que por acaso estava
passando. Poucos dias depois, ela se tornou freira e passou o resto de
sua vida em um convento. Essa é a histó ria melancó lica, e seu pathos
gentil encanta fortemente as mentes japonesas.

Capítulo VI
CONTOS HEROICOS
Em todos os povos, as façanhas de seus heró is primitivos
assumem inevitavelmente um cará ter mı́tico ou semimı́tico, e se o
heró i viveu em um passado muito remoto, sua fama é afetada por esse
processo mitopoé tico a tal ponto que é difı́cil separar o histó rico. fatos
dos adornos. lendá rios. Há ainda outra classe de heró is cuja existê ncia
real nã o pode ser estabelecida, mas cujos feitos lendá rios fazem agora
parte da tradiçã o popular que sã o considerados pessoas reais, como
aqueles cujas açõ es sã o inquestionavelmente autê nticas. Em uma breve
olhada nas narrativas heró icas dos japoneses, veremos ilustraçõ es de
ambos os tipos.
Um heró i muito famoso da mitologia antiga foi Susa-no-wo[58], o
Deus da Tempestade, que, como já sabemos, derrotou o dragã o de oito
cabeças e salvou uma jovem de ser sacri icada à quele
monstro. Histó rias semelhantes sã o contadas de seus ilhos, que
aparentemente subjugaram vá rios "deuses" que encontraram em seu
domı́nio, a atual provı́ncia de Izumo. Mas nã o precisamos
nos empolgar com essas histó rias que sã o puramente mı́ticas, porque
as narrativas estritamente heró icas começam com o bravo Yamato-
Takeru.
Este prı́ncipe, ilho de um imperador, viveu no segundo sé culo
desta é poca. Ele foi enviado em uma expediçã o
à s tribos desobedientes do Ocidente para vingar as atrocidades
cometidas contra seus irmã os. Em uma ocasiã o, disfarçado de mulher,
ele conseguiu ser admitido na mansã o de um chefe, e seu disfarce era
tã o engenhoso que o inimigo nã o suspeitou da verdade. O chefe se
embriagou em um banquete que deu em homenagem à suposta
senhora, e o prı́ncipe o esfaqueou, dominando toda a tribo. Em
seguida, o chefe moribundo deu a Yamato o tı́tulo de "Guerreiro
Heró ico do Japã o", admirado pela bravura e sutileza do prı́ncipe.[59].
Apó s seu retorno triunfante, o prı́ncipe foi enviado para as
provı́ncias do leste, onde os aborı́genes Ainu també m foram
dominados. No caminho, ele orou diante da capela sagrada de Atsuta,
onde a espada que Susa-no-wo arrancou do dragã o de oito cabeças que
ele matou foi depositada. Yamato, portanto, pegou a espada milagrosa
e foi esta arma que o salvou de todo perigo entre os Ainu. Esses
bá rbaros procuraram provocar a rendiçã o do prı́ncipe, convidando-o a
uma caça pela vasta pradaria, mas enquanto o prı́ncipe estava no
deserto, eles incendiaram a vegetaçã o rasteira. O heró i cortou as ervas
daninhas ao seu redor com sua espada e, depois de escapar ileso do
fogo, derrotou os bá rbaros. Desde entã o, a espada milagrosa icou
conhecida pelo nome de Kusa-nagi, "a tesoura de poda".
Outra vez, durante a mesma expediçã o, o barco do prı́ncipe foi
terrivelmente atingido por uma forte tempestade. Sabendo que era
devido à ira dos deuses contra o possuidor da espada que havia sido
tirada deles, e que a tempestade nã o seria acalmada sem um sacrifı́cio
humano, a consorte do prı́ncipe se jogou na á gua. No momento, o barco
conseguiu cruzar o oceano já calmo.
Apó s vá rias aventuras, o prı́ncipe voltou para Atsuta. Lá ele soube
que um espı́rito maligno havia se rebelado em uma montanha nã o
muito longe do lugar, e o prı́ncipe de lá foi dominar o espı́rito
també m. Poré m, essa foi a ú ltima de suas aventuras, já que ele adoeceu
com as febres que o mal espı́rito carregado com ele. O prı́ncipe ainda
voltou para Atsuta, mas ele nã o se recuperou mais da doença. Quando
ele morreu e foi devidamente enterrado, um pá ssaro branco emergiu
do tú mulo. Em seguida, eles ergueram outro no local, de onde
o pá ssaro havia desaparecido. Mas novamente o pá ssaro saiu do
segundo monte, entã o um terceiro foi erguido, de modo que há trê s
locais, em cada um dos quais se diz que o prı́ncipe repousa.[60] A
metamorfose deste pá ssaro em um pá ssaro pode ser interpretada de
vá rias maneiras, mas nã o há espaço para estudá -los aqui.
Depois de Yamato-Takeru, vem a Imperatriz Jingo, que governou o
principado da Coreia no sé culo III. Ele empreendeu a açã o obedecendo
ao orá culo de uma divindade, e a viagem foi feita com a ajuda de duas
joias oferecidas a ele pelos Deuses do Mar. Uma dessas joias tinha a
virtude milagrosa de elevar o nı́vel das á guas do mar, e a outra para
baixá -los. Graças a esses tesouros, a imperatriz conseguiu controlar
as maré s e trazer suas tropas em segurança para o continente.
Seja qual for a origem histó rica desta lenda, a protagonista, junto
com seu ilho[61], nascido no retorno daquela expediçã o, e seu antigo
conselheiro, formam um famoso trio de heró is. Suas imagens sã o
frequentemente carregadas em procissã o durante o festival anual de
bonecas infantis, e sua ajuda é invocada para que os jovens se tornem
heró is e realizem feitos vitoriosos.

No sé culo XI teve inı́cio a é poca heró ica do Japã o, caracterizada pela
ascensã o da classe guerreira. O clã que desempenhou o papel principal
na histó ria daqueles tempos foi o Minamoto, e entre os primeiros
heró is do clã , yoshi-iye é o mais popular. Yoshi-iy e celebrou a
cerimô nia que marca sua maioridade diante do santuá rio dedicado a
Hachiman, o ilho de Jingo, e em tempos posteriores esses dois heró is
foram reverenciados como patronos e protetores do clã Minamoto e,
conseqü entemente, como guerreiros eminentes..
O animal intimamente associado ao deus-heró i, Hachiman, deus
dos Oito Estandartes, era a rola, e os Minamoto sempre consideraram o
aparecimento das rolas acima dos campos de batalha como um bom
pressá gio. Os feitos de yoshi-iye estã o associados com suas expediçõ es
militares para o nordeste do Japã o, e já referida lendas locais que lhe
dizem respeito.
O mais popular e famoso dos primeiros generais do
clã Minamoto é Raiko, mais apropriadamente Yorimitsu.[62]. Ele
estava sempre rodeado por quatro bravos tenentes,[63] e vá rias
lendas sã o contadas sobre cada um deles. A mais conhecida é a
expediçã o de aventura contra um grupo d diabó licos e seres, cujo lı́der
era Shuten Doji, ou "Young Sot" cuja força estava no monte Oye-yama.
O Beodo era uma espé cie de ogro que se alimentava de sangue
humano. Ele tinha um rosto jovem, mas do tamanho de um gigante, e
usava roupas escarlates. Seus vassalos també m eram seres diabó licos,
de aspecto extremamente repulsivo. Suas incursõ es em busca de
pilhagem e excessos de todos os tipos nã o demoraram muito para se
espalhar pelas vizinhanças de sua residê ncia, chegando à capital, e
muitas damas nobres foram suas vı́timas, entã o o governo ordenou
a Raiko que derrotasse esses demô nios. Tsuna, um dos quatro tenentes
de Raiko, já havia dominado um ogro enorme, cortando seu braço,
entã o esperava-se que o Beodo també m nã o fosse
invencı́vel, embora nã o tenha sido fá cil para Raiko e seus tenentes
invadir a residê ncia forti icada. do ogro.
Raiko decidiu disfarçar seus homens como um grupo de sacerdotes
da montanha, como os que perambulavam pela regiã o. Desta forma, o
grupo foi admitido na fortaleza de Beodo, para a qual foram guiados
por um homem misterioso, que també m deu a Raiko uma certa
quantidade de uma bebida má gica, para envenenar o ogro.
Recebia seus convidados sem descon iar de nada e, ao anoitecer, os
supostos frades ofereceram a bebida venenosa ao Beodo e seus
servos, divertindo-os com cantos e danças alegres. Quando os ogros
icaram bastante atordoados, os guerreiros tiraram seus disfarces,
aparecendo com armaduras e capacetes, e depois de uma luta á rdua
conseguiram matar o ogro e seus seguidores.
O espı́rito do Beodo estremeceu de fú ria com a morte de seu corpo,
e sua cabeça, cortada por Raiko, ergueu-se no ar e tentou atacá -lo. Mas
os heró is, graças à sua coragem e ajuda divina, logo assumiram o
controle da situaçã o. A cidade de Miyako estremeceu de alegria quando
o vitorioso Raiko, com seus quatro tenentes, voltou mostrando a
cabeça do monstro e liderando uma procissã o de mulheres que haviam
sido libertadas do cativeiro na fortaleza do ogro.
A ascensã o e queda alternada dos dois clã s militares, Minamoto e
Taira, que ocorreu em rá pida sucessã o durante a segunda metade do
sé culo XII, foi uma rica fonte de contos heró icos. Os dois clã s foram
chamados coletivamente de Gen-Pei,[64] e sua rivalidade, suas
vitó rias e suas derrotas constituem a substâ ncia da poesia, romances
e dramas. Um dos heró is é picos mais populares é Tame-moto, o
famoso arqueiro, embora ainda mais conhecidos sejam Yoshitsune,
seu amigo e servo Benkei, e sua amante, Shizuka.
Compreenderemos melhor suas histó rias se soubermos algo sobre
seus antecedentes histó ricos. Os dois clã s militares tornaram-se
in luentes no campo polı́tico com a guerra civil de 1157, embora o
caminho já estivesse preparado para eles. No entanto, o equilı́brio de
poder entre os dois clã s nã o foi facilmente preservado, e quando outra
guerra civil estourou em 1159, os Mi Namoto foram completamente
derrotados pelos Taira. Na guerra de 1157, cada lado foi dividido
igualmente em dois campos rivais. Tamemoto estava do lado perdedor
e um dos irmã os lutava do outro e, na paixã o do momento, ousou até
mesmo executar o pai. Tamemoto, de quem falaremos mais tarde, foi
para o exı́lio numa ilha do Pacı́ ico. Na segunda guerra, os Tairas
derrotaram os Minamoto, e seu chefe, irmã o de Tamemoto, morreu em
uma das batalhas. Ele deixou trê s ilhos, que os vencedores estavam
prestes a matar, embora no inal tenham poupado suas vidas. Este ato
de compaixã o produziu frutos infelizes para os Taira, pois os trê s
jovens perdoados os derrotaram trinta anos depois. Naquela é poca, o
mais velho dos trê s ó rfã os era o chefe do clã Minamoto, mas o
guerreiro mais famoso era Yoshitsune, o mais jovem dos trê s irmã os e
o mais popular de todos os heró is japoneses.
Por sua vez, Tamemoto, o infeliz tio de Yoshitsune, era famoso como
arqueiro, ainda na infâ ncia. Insatisfeito com as condiçõ es em Miyako,
onde a oligarquia Fujiwara oprimia os militares, Tamemoto fugiu da
capital e foi para o oeste quando tinha apenas quatorze anos. Lá , suas
aventuras entre os guerreiros locais izeram dele um heró i temido e
lı́der de outros lı́deres menos famosos. Quando a guerra estourou em
Miyako em 1157, Tamemoto voltou a lutar ao lado de sua famı́lia. Mas
seu clã foi derrotado, seu pai foi morto e ele voltou para o exı́lio.
No entanto, seu espı́rito aventureiro nã o diminuiu. Ele dominou os
habitantes da ilha para a qual havia sido exilado e os governou como
rei. O governo japonê s soube disso e enviou uma expediçã o à
ilha. Quando Tamemoto viu a frota se aproximando, ele pegou sua
besta mais poderosa e com uma lecha tocou um dos navios,
perfurando um dos lados, fazendo com que o navio virasse. O
maravilhoso arqueiro poderia ter afundado os outros navios da mesma
forma, mas hesitou em fazê -lo e até em se defender com a ajuda dos
ilhé us, pois isso signi icaria a morte de mais homens por sua
causa. Portanto, ele se retirou para o interior da ilha e lá se suicidou.
Essa é a velha lenda, mas a imaginaçã o popular nunca se contentou
com esse inal, desejando que o heró i vivesse para realizar mais
façanhas. A tradiçã o, desta forma, faz com que Tamemoto nã o morra,
mas fuja da ilha para outras aventuras maravilhosas. Tomando isso
como base, um escritor do sé culo 19 queria contar a vida posterior do
heró i e como ele veio para as ilhas Loochoo e fundou ali uma dinastia
real. Esta fantasia, juntamente com as façanhas de icçã o que o escritor
atribuiu ao seu heró i, tornou-se tã o popular que hoje muitos acreditam
na realidade de tais histó rias, e chamar Tamemoto o primeiro rei das
ilhas. Loochoo.
O segundo heró i famoso é Yoshitsune, que teve um ilho
chamado Ushiwaka. Na segunda guerra civil, ele salvou sua vida quase
por milagre, junto com sua esposa, fugindo dali, e a lenda diz que ele e
seus irmã os foram poupados pela lı́der dos vencedores, Taira, por
amor à mã e. O mais jovem dos trê s irmã os foi enviado para um
mosteiro em Kurama, uma montanha ao norte de Miyako, onde viveu
como pajem de um mau, com o nome de Ushiwaka Maru.
O pequeno Ushiwaka, mesmo na infâ ncia, sempre planejou vingar a
derrota de sua famı́lia nas mã os do Taira. Considerando que a primeira
virtude de um bom guerreiro era ser um bom espadachim, o menino ia
todas as noites, quando todos dormiam, para a loresta contı́gua ao
mosteiro, onde praticava incansavelmente com uma espada de madeira
contra as á rvores. A tirâ nica ditadura do clã Taira já provocava uma
revolta popular e, segundo a lenda, os
sobrenaturais dez gus simpatizavam com o espı́rito de rebeliã o. O
gê nio do Monte Kurama foi um deles, um chefe Tengu chamado Sojo-
bo. Uma noite, Sojo-bo parecia Ushiwaka para oferecer sua ajuda,
simpatizando com o seu entusiasmo por vingança.
Vamos imaginar a cena. Na escuridã o da noite, entre as montanhas,
nada se ouvia. De repente, o gigantesco monstro tengu estava na frente
do garoto armado com sua espada de madeira. Os olhos raivosos do
tengu brilharam na escuridã o da loresta, suas roupas eram escarlates
e na mã o direita ele carregava o leque de tengu.
[65] O tengu gigante perguntou ao menino por que ele continuamente
exercitava sua espada. Ushiwaka confessou seu desejo ardente de
vingança, e o tengu, aprovando essa ambiçã o, prometeu ensinar-lhe
alguns segredos da arte da esgrima e instruı́-lo em tá ticas e
estraté gias militares. Sojobô entã o convocou seus servos,
os tengus voadores, e ordenou-lhes que dessem a Ushiwaka o
benefı́cio de sua experiê ncia e a habilidade de aprimorar sua esgrima.
Em seguida, Ushiwaka se reunia com o tengus todas as noites, e
logo ele era tã o adepto da esgrima que nã o podiam mais rivalizar com
ele. Finalmente, Sojo-bo, orgulhoso do progresso do menino, ensinou-
lhe todos os segredos da arte militar e entregou-lhe um pergaminho
em que foram escritos esses segredos. Assim, Ushiwaka se formou em
ciê ncias militares na academia arborizada de tengus, e acredita-se que
todos os seus triunfos militares nos anos posteriores foram o resultado
da instruçã o zelosa de Sojo-bo.
Ushiwaka nã o era tã o ingê nuo a ponto de pensar que suas façanhas,
sem ajuda, trariam seus projetos à fruiçã o, entã o ele
orava regularmente a Kwannon, a deusa da misericó rdia, por sua
orientaçã o e proteçã o constantes. Para isso, todas as noites ele visitava
um templo da deusa chamada Kiyomizu Kwannon, na parte sudeste de
Miyako. No caminho ele teve que cruzar a Ponte Cojo, a Ponte da
Quinta Avenida, que cruzou o rio Kamo, o Mestre da Florença japonesa,
e a aparê ncia noturna do jovem misterioso, seu rosto escondido por
um ino vé u de seda, foi logo assunto de fofoca entre o povo Miyako.
Naquela é poca, havia um monge soldado chamado Benkei, que
havia pertencido ao mosteiro no Monte Hiei, mas que agora residia em
Miyako em busca de uma aventura emocionante. Benkei ouviu falar do
jovem misterioso e decidiu descobrir se era um ser humano ou uma
apariçã o sobrenatural. Para fazer isso, Benkei se armou de vá rias
armas: espadas, uma barra de ferro, uma serra, etc., e vestiu suas
vestes moná sticas e o capuz inevitá vel.
Enquanto procurava o garoto misterioso, ele ouviu o som das botas
laqueadas do jovem nas pranchas do convé s. Eles foram se
aproximando cada vez mais até que, quando chegaram ao meio da
ponte, o monge gigantesco foi visto, gritando:
"Pare, garoto!" Quem é ?
Ushiwaka ignorou essas palavras. O bravo Benkei tentou detê -lo,
mas o menino continuou sem nem mesmo olhar para o monge. Isso
irritou Benkei tanto que ele investiu contra Ushiwaka, que o defendeu
com um golpe que arrancou a arma da mã o do
monge. Compreendendo quem teve que lutar ferozmente contra
aquele ducho adversá rio, Benkei pegou na barra de ferro, mas o
menino saltou e se esquivou de tremendo golpe poderoso. Para piorar
as coisas, ele riu zombeteiramente sob o nariz do monge, que estava
lançando golpe apó s golpe em seu oponente evasivo... tudo em vã o. O
jovem disparou ao redor, acima e atrá s de Benkei como um
pá ssaro. O longo treinamento de Ushikawa com os Tengus estava
provando seu valor e, no inal, Benkei foi forçado a se ajoelhar diante
desse garoto misterioso e pedir seu perdã o.[66]. A partir de
entã o, Benkei foi um servo iel de Ushiwaka e lutou ao seu lado em
todas as suas batalhas, até morrer para salvar a vida de seu mestre.
Existem muitos relatos sobre as façanhas guerreiras de Yoshitsune,
como eles acabaram chamando Ushiwaka e de seu iel
amigo Benkei. Juntos, eles alcançaram grandes vitó rias contra os Taira,
e juntos foram banidos quando Yoshitsune sofreu com o ciú me e as
suspeitas de seu irmã o mais velho. Essas lendas, especialmente a da
ú ltima luta desesperada de Benkei e dos ú ltimos momentos de Benkei,
quando ele morreu diante de lechas lançadas por seus adversá rios
triunfantes, sã o contadas até hoje com admiraçã o e entusiasmo.
[67] Mas eles sã o muito longos e numerosos para contar aqui, entã o
vamos nos referir apenas a um episó dio da vida heró ica de Yoshitsune.
Apó s sua brilhante vitó ria que quebrou o poder do clã
Tiara, Yoshitsune permaneceu em Miyako, a capital imperial, mas logo
se desentendeu com seu irmã o mais velho, o ditador militar. O chefe do
clã Minamoto invejava a fama de seu irmã o mais novo, e havia muitos
cortesã os ansiosos para in lamar ainda mais suas suspeitas e
ciú me. Por im, o ditador baniu Yoshitsune, que foi expulso de Miyako
por um ataque surpresa. Em seguida, ele se refugiou em Yoshino, um
lugar famoso pela beleza de suas cerejeiras. Lá , ele foi forçado a pegar
em armas contra os monges traiçoeiros que os emissá rios de seu irmã o
levantaram contra ele.
Durante todo esse tempo, ele foi acompanhado por Benkei e outros
servos ié is, bem como por sua amante Shizuka. Quando ele foi banido
de Miyako, um de seus tenentes morreu por ele. O perigo era tã o
grande que ele teve que se disfarçar de frade da montanha e partir com
apenas dois ou trê s de seus seguidores. A situaçã o lamentá vel do heró i,
sua tristeza pela morte de seu servo e sua triste separaçã o de sua
amada, sã o os temas favoritos de suas lendas.
A trá gica histó ria do exı́lio de Yoshitsune põ e um im paté tico à sua
brilhante carreira. A partir de entã o, sua vida foi uma sucessã o de
infortú nios e di iculdades, até que inalmente encontrou a morte na
derrota,[68] embora sempre tenha preservado sua nobreza e coragem,
já que a qualidade heró ica do homem nã o é menos nobre na
adversidade do que no triunfo. Nenhum outro heró i do Japã o, histó rico
ou imaginá rio, é tã o popular quanto Yoshitsune, e nenhum outro teve
uma carreira tã o cheia de feitos lindos e româ nticos, ou infortú nios
perturbadores ou vicissitudes emocionantes.
Os quatro sé culos que se seguiram ao segundo testemunharam o
surgimento do regime feudal. A guerra entre os clã s foi constante e
todo o perı́odo está repleto de romances heró icos. Quase todas as
histó rias sã o baseadas com demasiada irmeza em fatos histó ricos para
serem tratadas em um livro dedicado à mitologia. Mas aquela é poca
produziu muitas histó rias de feitos heró icos totalmente imaginá rios e
até fantá sticos, mas, ainda assim, re letindo perfeitamente o espı́rito da
é poca.
O tema principal dessas histó rias é aventura e vingança. First Class,
a histó ria da expediçã o Raiko contra o ogro Sot, já narrado, é o mais
tı́pico. Uma das primeiras e mais famosas histó rias cujo tema é a
vingança é fornecida por "Corda". E sobre a histó ria de dois ó rfã os que
conseguiram, diante de inú meras di iculdades, matar o assassino de
seu pai. Este episó dio é histó rico. Aconteceu na segunda metade do
sé culo 12 e mexeu tanto com a imaginaçã o do povo que a histó ria faz
parte do folclore japonê s[69].
E uma histó ria muito autê ntica para caber aqui, mas pelo nosso
conhecimento e crença, existem muito poucos relatos româ nticos
desse perı́odo que sã o puramente imaginativos.
A mais popular é a histó ria de Momotaro, ou a "á rvore do pê ssego".
[70] E tã o popular hoje que os folcloristas japoneses planejam erigir
uma está tua de bronze em memó ria do jovem heró i ictı́cio, todas as
crianças japonesas conhecem bem essa histó ria. Diz assim:
Era uma vez um casal de idosos que morava perto das
montanhas. Um dia, quando a esposa estava lavando algumas roupas
em um riacho, ela viu um grande pê ssego lutuando na á gua. A velha
pegou a fruta e a trouxe para o marido, e quando ele a abriu apareceu
um jovem robusto. O casal adotou o menino, que se tornou um menino
inteligente e inquieto. Pouco depois ele decidiu sair em busca de uma
aventura emocionante, indo visitar a Ilha dos Demô nios. Sua mã e fez
alguns donuts doces para ele e Momotaro saiu apenas com essas
provisõ es. No caminho ele conheceu um cachorro, que lhe pediu um de
seus donuts. Momotaro deu a ele e o cachorro começou a segui-
lo. Entã o, da mesma forma, a companhia de Momotaro aumentou com
um macaco e um faisã o, e todos juntos partiram para a Ilha dos
Demô nios. Apó s sua chegada, eles atacaram a fortaleza do demô nio,
nã o tendo di iculdade em controlar aqueles monstros. Assim, eles
voltaram com os tesouros tirados dos demô nios. O velho casal recebeu
o jovem com jú bilo, e animais ami gos de Momotaro dançaram diante
deles.
Um conto heroico associado à s fadas do mar é o de Tawara Toda, "o
guerreiro Toda com o saco de arroz", que viveu no sé culo XI. Uma noite,
quando Toda estava cruzando a famosa Ponte Seta sobre o ralo do
Lago Biwa, ele avistou uma cobra monstruosa deitada na ponte. O
heró i passou por ela com calma e compostura, como se isso nã o fosse
nada de extraordiná rio. Mais tarde naquela noite, uma jovem foi à casa
de Toda. Ela explicou que era ilha do Rei Dr. Agon, e que o admirava
pela coragem fria demonstrada na Ponte Seta, já que aparentemente a
enorme cobra tinha sido a mesma jovem em outra forma. Depois, ele
perguntou ao heró i se ele queria tentar derrotar uma terrı́vel
centopeia que estava matando muitos de seus semelhantes.
Todos, dispostos a cumprir o desejo da jovem, dirigiram-se para a
ponte. Enquanto esperava pelo monstro, ele viu o farol circundando o
Monte Mikanii do outro lado do lago e també m avistou duas luzes
cintilantes como espelhos em chamas. Eles eram os olhos da terrı́vel
centopeia. Toda atirou duas lechas naqueles olhos em chamas, mas as
lechas ricochetearam como se tivessem atingido placas de
metal. Entã o Toda, percebendo que a saliva era um veneno fatal para
uma centopeia, disparou uma terceira lecha embebida em sua saliva. O
monstro caiu sem vida, e os dragõ es estavam a salvo do temido
extermı́nio de toda sua raça.
Na noite seguinte, a senhora dragã o visitou Toda novamente para
agradecê -la por sua valente ajuda neste momento. Em seguida, ela
implorou que ele a honrasse e a todo o seu povo visitando seu palá cio,
Toda a seguiu até o palá cio subaquá tico, nas profundezas do lago, onde
lhe ofereceram todas as iguarias mais deliciosas que a á gua pode
oferecer. Antes de deixar o palá cio, o Rei Dragã o presenteou-o com trê s
presentes: um saco de arroz que acabou sendo, como a taça da
Fortuna, inesgotá vel; um rolo de seda que lhe forneceu tecidos de
duraçã o eterna; e um sino da India, que há muito estava escondido no
fundo do lago.
Toda dedicou o sino a um templo erguido nas margens do lago e
guardou os outros dois tesouros, que o ajudaram proveitosamente em
suas aventuras posteriores. Precisamente por possuir o inesgotá vel
saco de arroz, o povo sempre chamou Tawara Toda, "Senhor Toda do

saco de arroz".


Capítulo VII
HISTÓRIAS DE ANIMAIS

O animismo xintoı́sta ainda é uma força vital entre o


povo japonê s. Como vimos, a mitologia japonesa baseava seu conceito
de coisas na crença de que tudo que é animado e inanimado tem alma,
com atividades mais ou menos aná logas à s da alma humana. Essa
crença nã o é muito forte hoje, mas durante o perı́odo em que os mitos
e lendas se originaram, o imaginá rio popular se encheu de imagens
animistas. Nã o apenas animais e plantas deveriam ser capazes de
pensar e agir no estilo de homens e mulheres, mas suas
metamorfoses em outras formas de vida ou em seres humanos eram o
tema principal de suas tradiçõ es.
O budismo encorajou essa concepçã o animista da natureza com os
ensinamentos da transmigraçã o. A humanidade é , de acordo com esta
doutrina, apenas uma das mú ltiplas fases da existê ncia que inclui seres
celestiais, animais, plantas e até mesmo elfos e demô nios. Os animais, é
claro, sã o menos autoconscientes do que a humanidade, e as plantas
ainda sã o menos mó veis e inteligentes, mas suas vidas podem ser
passadas para os humanos e outras formas de
existê ncia. Filoso icamente falando, a doutrina budista nã o é apenas
animista, mas, dentro da mente popular, atinge uma grande elaboraçã o
e extensã o do animismo xintoı́sta original. Por este motivo, histó rias
ingê nuas sobre animais e plantas, que vê m desde os tempos mais
remotos, muitas vezes foram enriquecidas com sinais de piedade e
simpatia, ou com tristes re lexõ es sobre as misé rias da existê ncia em
geral, que mostram claramente a in luê ncia dos ensinamentos
budistas. Como um amigo muito querido, apó s sua morte, ele pode
renascer metamorfoseado em animal ou planta, e como ele mesmo
també m pode ter passado por uma dessas fases de transmigraçã o, nã o
é possı́vel considerar outras existê ncias como estranhas ou remotas.,
mas relacionados de uma forma ou de outra a nó s mesmos, seja por
um relacionamento no passado ou no futuro. Essas re lexõ es e
sentimentos logo determinaram a atitude das pessoas em relaçã o
a outros seres, estimularam a propensã o mitopoé tica de sua
imaginaçã o e aprofundaram seu interesse pelos seres de quem tais
histó rias eram contadas.
Frequentemente, é a odisseia astuta de algum animal ou uma
peculiaridade divertida de seu comportamento que forma a base da
histó ria dos animais. Existem també m muitas histó rias sobre animais
que mostram gratidã o ou afeiçã o especial aos seres humanos, e
geralmente re letem a interdependê ncia mú tua de todas as existê ncias
e a ê nfase especial dada pelo budismo e confucionismo à virtude da
gratidã o. Naturalmente, essas fá bulas, visto que se trata, de fato,
frequentemente tê m um propó sito didá tico ou moral, e de alguns
falaremos quando nos referirmos aos contos didá ticos tã o amados do
folclore japonê s.

Talvez a mais antiga das histó rias de animais é o de " de


Inaba White Hare, " disse em conexã o com as aventuras de Oh-kuni-
nushi, o heró i da tribo Izumo.
Uma lebre branca viveu na ilha de Oki. Esta lebre queria um
dia cruzar as á guas e chegar ao continente. Para fazer isso, ele
perguntou a um crocodilo se ele tinha tantos parentes quanto ela, e
entã o ingiu acreditar que o crocodilo excedia as dimensõ es de sua
famı́lia. Ele entã o pediu ao crocodilo que chamasse cada um dos
membros de sua tribo e os obrigasse a se deitar na superfı́cie do mar,
formando uma longa ila.
“Assim passarei por cima de você e contarei quantos crocodilos
existem no mundo”, explicou a lebre.
Os crocodilos concordaram com essa proposiçã o e formaram uma
longa linha de Oki ao continente; a lebre saltou de um para o outro até
que inalmente estava perto da costa. Orgulhosa do sucesso de sua
manobra, a astuta lebre riu da facilidade com que enganara os
estú pidos crocodilos. Mas ela zombou muito cedo, quando o ú ltimo
crocodilo a agarrou, esfolou-a e a mergulhou na á gua. E entã o a infeliz
lebre teve que chegar à costa nua e congelando até a morte.
Em Izumo havia uma famı́lia composta por muitos irmã os. E todos
ansiavam pelo amor de uma princesa que morava em Inaba. Entã o eles
foram a Inaba para sitiar o coraçã o da garota, mas os irmã os mais
velhos foram crué is com o mais novo, Oh-kuni-nushi, forçando-o a
carregar toda a bagagem. Portanto, o pobre irmã o estava seguindo os
outros com uma longa demora. Enquanto caminhavam ao longo da
costa, os irmã os mais velhos viram a lebre e, em vez de simpatizar com
a dor do pobre animal, eles a enganaram fazendo-a acreditar que
poderiam aliviar sua dor submergindo-a na á gua e, em seguida,
expondo seu corpo encharcado ao vento e Sol.
Quando a lebre seguiu o conselho maligno, sua pele rachou e
sangrou, sofrendo uma dor terrı́vel. Foi entã o que Oh-kuni-nushi
chegou, o cu al teve pena da lebre e o aconselhou a se lavar com á gua
fria e cobrir o corpo com o pó len macio da planta taboa. A lebre icou
muito grata ao menino e disse: “Nenhum de seus irmã os crué is se
casará com a princesa de Inaba. Só você conquistará seu coraçã o ».
As palavras da lebre foram ielmente cumpridas. Oh-kuni-nushi se
casou com a princesa e tornou-se o rei de Izumo, e quando depois de
sua morte, uma capela foi erguida em sua memó ria e de sua esposa,
a lebre branca de Inaba compartilhou com eles tã o grande honra.
I. ANIMAIS GRATOS

O mais popular dos animais agradecidos no folclore japonê s é o pardal.


Era uma vez uma senhora de bom coraçã o que viu um pardal com
as asas tã o gravemente feridas que nã o conseguia voar. Ela pegou o
pá ssaro, colocou-o em uma gaiola e cuidou dele até que recuperasse as
forças. Quando o pardal icou bom, a mulher o deixou sair da gaiola e o
pá ssaro saiu voando com grande alegria. Poucos dias depois, enquanto
a velha estava sentada na varanda de sua casa, o mesmo pardal
apareceu voando e deixou cair uma semente como se para expressar
sua gratidã o. Era uma semente de abó bora, e quando a velha a plantou,
ela desenvolveu uma grande cabaça com muitos frutos lindos. A
mulher os cozinhou e extraiu deles uma grande quantidade de
deliciosa polpa. Alé m disso, ele preservou as cabaças secas, que
milagrosamente produziram um suprimento inesgotá vel de
arroz. Assim, a velha conseguiu alimentar os vizinhos menos
afortunados graças à gratidã o e à generosidade do pequeno pardal.
Outra mulher morava na casa ao lado, mas ela era invejosa e
maliciosa. E como estava ciente do destino de seu vizinho, ela a invejou
de todo o coraçã o. Pensando, entretanto, que poderia obter a mesma
riqueza inesgotá vel de qualquer pardal, ele abateu um e cuidou dele
como seu vizinho fazia antes. Em seguida, ele també m soltou o pá ssaro,
uma vez recuperado de seus ferimentos. Poucos dias depois, o pardal
voltou e deixou para ele uma semente de abó bora. A mulher plantou e
a planta produziu apenas algumas cabaças, mas a polpa era tã o amarga
que nem mesmo a mulher gananciosa conseguia comê -la. Mas ele
manteve as abó boras secas na esperança de obter grandes quantidades
de arroz. E como as abó boras pesavam tanto quanto pedras, a mulher
achou que conseguiria mais arroz do que a vizinha. Mas quando ele os
abriu nã o havia arroz neles, mas vespas, centopeias, escorpiõ es, cobras
e outros vermes, que picaram a mulher até a morte por
envenenamento.
Outra versã o da mesma histó ria é conhecida como "O Pardal da
Lı́ngua Cortada". Este é mais popular do que o anterior, embora este
seja provavelmente o original. Era uma vez uma mulher gananciosa e
cruel que punia um pardal por ter comido um pouco de sua
fé cula, cortando sua lı́ngua. Sua vizinha, uma mulher de bom coraçã o,
cuidou do pobre pá ssaro e ele pô de voar assim que seu ferimento
sarou. De vez em quando, a gentil mulher e seu marido visitavam a
casinha que o pardal construiu com bambus. O pardal e seus
companheiros receberam com alegria o casal de idosos, acolhendo-os
com hospitalidade. Ofereceram-lhes comida e bebida deliciosas e
realizaram a famosa dança do pardal para eles.[71] Certa vez, quando o
casamento estava se despedindo, os pardais deram-lhes dois
pequenos baú s, um grande e outro menor. O bom velho exclamou: "Já
estamos velhos e nã o podemos carregar um baú tã o grande como este,
por isso nos contentaremos com o pequenino." Quando chegaram em
casa, abriram a caixa e dela saiu uma sucessã o interminá vel de objetos
muito valiosos.
Mas a mulher que cortou a lı́ngua do pardal tinha inveja dos
vizinhos afortunados, entã o perguntou onde morava o pardal e foi
visitá -lo, junto com o marido, por mais invejoso e cruel que ela. Os
pardais os receberam com a mesma gentileza do outro casal e, ao se
despedirem, aceitaram o maior dos baú s que lhes foram oferecidos,
pois pensaram que conteria mais presentes que o outro. Ao chegarem
em casa abriram o baú e, infelizmente, em vez de joias e objetos de
valor, surgiram goblins e monstros que devoraram o casal ganancioso.
O propó sito didá tico desta histó ria é claro.
Outra ave famosa por seu espı́rito agradecido é o Pato
Mandarim. Era uma vez, conta a histó ria popular, um pedaço que
amava os pá ssaros de uma forma extraordiná ria. Um dia ele pegou um
lindo pato mandarim e o trouxe para casa. Ele construiu uma bela
gaiola e con iou o pá ssaro aos cuidados de um jovem servo. Este ú ltimo
icou muito interessado no pato, porque o pá ssaro estava deprimido e
melancó lico e nã o comia nada. O criado tentou de tudo que pô de para
aguçar o apetite do pá ssaro, mas sem sucesso. Uma empregada na
mesma casa disse que conseguiu adivinhar a causa da tristeza do
pato. Este, segundo ela, sempre foi muito iel ao companheiro, e nã o
havia dú vida de que o cativo sentia saudades da companheira de quem
estava separado. O servo entã o o aconselhou a soltar o pato se ele nã o
quisesse que morresse de tristeza, e o servo alegou que temia que seu
mestre icasse zangado se ele soltasse o pá ssaro. O servo respondeu
que, em vez disso, seria fazer bem ao pá ssaro, mesmo correndo o risco
de incorrer na raiva do mestre. Entã o o pá ssaro foi solto e voou
feliz. Quando o mestre encontrou a gaiola vazia, ele icou furioso. O
servo admitiu sua falta e pediu desculpas por sua negligê ncia, mas o
rico nã o se acalmou e a partir daquele momento tratou seu servo com
extrema aspereza.
Quando a empregada viu a desgraça que seu conselho causara ao
iel servo, teve pena dele e acabou se apaixonando pelo jovem. Ele
retribuiu sua compaixã o e amor, e os dois mostraram seu afeto um pelo
outro tã o abertamente que os outros servos da mansã o começaram a
murmurar contra eles. No inal, o patrã o ouviu a fofoca sobre o
romance dos dois criados, bem como a parte que os dois tiveram na
fuga do pato mandarim. Sua raiva aumentou a um grau e entã o ele
ordenou aos outros servos que amarrassem o rapaz e a garota e
os jogassem no rio. No momento em que iam ser jogados na á gua, dois
mensageiros do governador da provı́ncia apareceram e perceberam
que um decreto recentemente assinado proibia a morte como puniçã o
dentro da provı́ncia. Imediatamente os dois criados foram libertados,
conduzidos por mensageiros à residê ncia o icial do governador. A noite
caiu no caminho e na escuridã o os dois mensageiros desapareceram
como né voa. Os dois servos os procuraram em vã o. Depois,
foram dormir em uma cabana abandonada e lá os dois mensageiros
apareceram para eles em uma visã o, dizendo que eles eram o pato
mandarim libertado e seu companheiro. Eles expressaram sua imensa
gratidã o aos dois servos, recuperaram sua forma de pá ssaro e voaram
para longe. Os dois servos se casaram e viveram felizes para sempre,
com o mesmo amor que unia o pato mandarim e sua companheira.
Em outra histó ria, é um cachorro que desempenha o papel
principal. Era uma vez um o icial muito ganancioso e invejoso. Ele
ganhava dinheiro criando bichos-da-seda que sua esposa tinha o dever
de alimentar. Uma vez ela nã o os criou direito e seu marido a
repreendeu e a expulsou de casa. Abandonada pelo marido e
possuindo apenas como bom um bicho-da-seda, ela cuidou dele com
amor. Um dia, o precioso verme, de quem dependia a expectativa de
vida da mulher, foi comido por um cachorro. A jovem, a princı́pio,
pensou em matar o animal feroz, tanto era sua fú ria, mas re letiu que
assim o verme nã o recuperaria a vida e que o cachorro, a inal, já era
seu ú nico companheiro. E como ele estava no im de todos os seus
recursos, ele acalmou sua mente confusa pensando nos ensinamentos
do Buda sobre o amor e o carma.
Outro dia, o cachorro machucou o focinho. A jovem encontrou um
io branco saindo da ferida e tentou puxá -lo. O io saiu sem parar até
que produziu centenas de bolas de seda muito ina. Mais tarde, o
cachorro morreu. A jovem o enterrou sob uma moral, orando ao Buda,
por meio de quem ela havia encontrado o cachorro. O moral cresceu
rapidamente e muitos bichos-da-seda apareceram em suas folhas. E a
seda que eles produziam era da melhor qualidade do paı́s, entã o eles
venderam tudo para a corte imperial. Sabendo disso, seu marido se
arrependeu de sua ganâ ncia e sua rudeza, ele voltou para o lado de sua
esposa e a partir de entã o os dois viveram em paz e prosperidade.

A lista de animais agradecidos é muito longa. Inclui a vaca, o


macaco, os peixes, os cã es, os cavalos e até os lobos e as raposas, mas
talvez seja a vespa que leva o bolo nesse papel. A seguir, uma das
histó rias mais populares.
Há muito tempo, um guerreiro chamado Yogo viveu em Yamato. Em
uma batalha ele foi totalmente derrotado, entã o ele se refugiou em
uma caverna. Lá ele viu uma vespa presa em uma teia de aranha e,
simpatizando com o destino infeliz do inseto, quebrou a teia e a
soltou. Entã o, enquanto ele estava dormindo na caverna, ele viu em um
sonho um homem vestido com roupas marrons em pé diante dele e
dizendo:
"Eu sou a vespa que você salvou e devo pagar a dı́vida que contraı́
com você ao ajudá -la em sua pró xima luta." Nã o se desespere e lute
novamente, mesmo que seus seguidores sejam poucos. Mas primeiro
construa um galpã o e coloque muitos jarros e garrafas dentro dele,
tantos quantos você puder encontrar.
Encorajado por esta visã o, Yogo reuniu seus companheiros ié is e se
preparou para lutar novamente. Entã o, inú meras vespas apareceram
de todas as direçõ es e se esconderam nas garrafas. O inimigo soube
que Yogo estava pronto para o combate novamente e enviou um
exé rcito para atacá -lo. Quando a batalha estava no auge, as vespas
saı́ram de seu esconderijo e começaram a picar as tropas inimigas até
que todos fugiram confusos, deixando Yogo vitorioso.

Como ú ltimo exemplo deste tipo de histó ria, contaremos a histó ria
de uma grega que se casou com seu benfeitor.
Era uma vez um nobre que perdeu toda a sua fortuna e foi viver
para o campo. Um dia ele viu um caçador que, depois de pegar
um guindaste, estava prestes a pendurá -lo. Piedade do nobre, ele
implorou ao caçador que nã o pendurasse o belo pá ssaro, mas o
indivı́duo cruel nã o quis soltar o guindaste sem um bom resgate, e
como o nobre nã o tinha nada alé m de sua espada preciosa, ele a
ofereceu ao caçador, feliz em sacri icar aquele tesouro e, assim, salvar a
vida do pá ssaro.
Na noite seguinte, uma jovem acompanhada por um ú nico criado
ligou para a cabana do nobre, pedindo asilo para pernoitar. O nobre
icou pasmo com a delicadeza de uma donzela em um lugar tã o
impró prio para ela, mas a recebeu com generosa hospitalidade. A
jovem disse a ela que sua madrasta malvada a tinha expulsado de
casa[72] e que, nã o tendo para onde ir, implorou para poder icar na
casinha do idalgo. Este ú ltimo concedeu-lhe permissã o para fazê -lo e,
com o tempo, os dois se apaixonaram e se casaram. A jovem deu ao
marido uma certa quantidade de ouro que havia trazido com ela, e o
casal conseguiu viver sem estresse. Mas sua existê ncia idı́lica nã o
durou muito. Um dia, o senhor feudal da regiã o organizou uma grande
caçada, e a jovem teve que confessar ao marido que era na verdade a
garça que ele salvara e que chegara a hora de voltar para o reino dos
pá ssaros. Assim, ela levou seu marido para o maravilhoso palá cio de
seus pais, mas no inal ambos tiveram que se separar por causa de
seus destinos diferentes.[73].
2. ANIMAIS VENGATIVOS E MALICIOSOS

O animal vingativo é tã o comum no folclore japonê s quanto o grato. As


vezes, os animais se vingam uns dos outros, à s vezes da
humanidade. Nessas histó rias, geralmente encontramos a crença na
bruxaria, o poder de animais maliciosos, e seus sucessos geralmente
sã o o triunfo da astú cia e da malı́cia. A astú cia animal, especialmente
nas histó rias infantis, contrasta com a loucura humana, embora nada
seja mais comum do que um medo supersticioso do poder do mal
que alguns animais supostamente possuem. Teoricamente, esses tipos
de histó rias podem ser divididos entre aquelas que sã o contadas para a
diversã o das crianças e aquelas que sã o produto da superstiçã o
popular. No entanto, muitas histó rias estã o na mesma divisã o e
compartilham os dois personagens, e sã o justamente essas histó rias
que infelizmente tendem a tornar as crianças tı́midas, medrosas e
supersticiosas. Iremos nos referir primeiro à s histó rias de bruxaria e
malı́cia perversa, e continuaremos com aquelas que sã o apenas
histó rias infantis.

Animais que regularmente possuem poderes estranhos sã o a


raposa, o texugo, o gato e a cobra, já que outros animais sã o
considerados dotados de tais poderes apenas ocasionalmente. Já
tratamos da serpente em relaçã o aos mitos da tribo dos dragõ es. Das
outras trê s, a raposa é a igura mais antiga da superstiçã o, com suas
histó rias que datam do sé culo 10 ou antes. O gato e o texugo chegaram
ao folclore mais tarde, provavelmente por volta do sé culo XIV. Em todo
caso, a in luê ncia chinesa parece ter dado o primeiro impulso à
imaginaçã o japonesa, uma vez que a tradiçã o primitiva do Japã o nã o
apresenta tais superstiçõ es.
A raposa-bruxa mais famosa é Tamano-no-Maye, uma senhora da
corte que viveu no inı́cio do sé culo XII. Na verdade, ela era uma raposa
muito velha, com cauda de oito bifurcaçõ es, e sua maldade consistia
em se transformar em uma bela mulher e arruinar um homem rico,
fazendo-o pecar. Ele teve grandes sucessos com essa arte maligna na
India e na China, e inalmente chegou ao Japã o graças ao seu poder de
voar com grande velocidade. Mas enquanto ela se entregava a suas
maquinaçõ es maliciosas, seu segredo foi descoberto por um nobre, que
inalmente conseguiu quebrar o encanto com o poder milagroso de um
espelho divino. Diante do espelho a raposa perdeu seus poderes
de transformaçã o, apareceu em toda sua aparê ncia horrı́vel e fugiu
para o Oriente. Eles enviaram um exé rcito em perseguiçã o, auxiliado
por uma horda de guerreiros que saiu do espelho, e juntos mataram a
raposa.
Seu espı́rito maligno refugiou-se em uma rocha nas pastagens
de Nasu, apó s o que qualquer um que tocasse a rocha, humano ou
animal, era imediatamente morto. A rocha passou a ser chamada de
"Rocha Mortal de Nasu ". No entanto, aquele espı́rito maligno foi
inalmente exorcizado por um monge virtuoso e a rocha deixou de ser
mortal.

Esta é a histó ria de uma raposa vingativa: Era uma vez um


camponê s chamado Jinroku, que um dia encontrou uma raposa
adormecida nos arbustos perto de sua fazenda. Por pura diversã o, ele
assustou o animal e o perseguiu até que estivesse quase exausto, mas
nã o o matou. Poucos dias depois, Jinroku viu em sonho uma igura
divina que o informou que havia uma grande quantidade de ouro em
um vaso enterrado em sua fazenda. Jinroku nã o era cré dulo o
su iciente para pensar que o sonho era verdade, mas quando a mesma
visã o apareceu para ele repetidamente, assim como para outros
membros da famı́lia, ele foi tentado a desenterrar o tesouro. Mantendo
o assunto em segredo, ele começou a cavar com seus ilhos. No entanto,
todo o trabalho foi inú til e por isso nã o demorou muito para
abandonar a busca por dinheiro.
Mais tarde, a mesma igura apareceu a ele em um sonho e,
acusando Jinroku de sua falta de fé e paciê ncia, explicou: “Eu sou o
deus patrono do ouro e da fortuna, e conheço muito bem a existê ncia
de todos os tesouros do mundo-terra. Nã o conseguiste descobrir este
tesouro, porque nã o con iaste no meu orá culo e també m porque
desejaste manter esta revelaçã o em segredo. Pois bem, dê uma grande
festa, convide todos os seus vizinhos, divulgue o segredo e o sucesso
será garantido. Nã o tenha dú vidas ».
Jinroku estava completamente convencido da veracidade da
apariçã o e se apressou em fazer tudo o que havia ordenado. Desta vez,
ele encontrou alguns centavos e, encorajado pelo resultado, cavou mais
e mais fundo. Assim, alguns centavos apareceram, mas nunca um
verdadeiro tesouro, entã o Jinroku acabou sendo a zombaria de seus
vizinhos. Desta forma, a raposa vingou-se de seu algoz.

Nã o há espaço aqui para contar mais histó rias desse tipo, mas
vamos adicionar um exemplo de uma travessura de que uma raposa foi
culpada.
Há muito, muito tempo, um homem foi com seu servo em busca de
um cavalo perdido. Depois de muitas buscas infrutı́feras, eles
chegaram a um prado. Lá eles viram
um criptô mero gigantesco, embora nunca tivessem visto aquela
á rvore naquele prado. Eles até duvidaram de seus pró prios olhos, mas
a verdade é que ambos viram a á rvore com clareza. Entã o, eles
pensaram que haviam confundido um prado com outro, embora
soubessem que isso era impossı́vel, e como ú ltimo recurso, eles
chegaram à conclusã o de que a á rvore misteriosa deve ser obra de um
espı́rito maligno. Por assim eles atiraram lechas á rvore gigante, que
desapareceram imediatamente. Eles voltaram para casa em segurança
e, na manhã seguinte, voltaram à campina, encontraram uma velha
raposa morta com alguns ramos de criptomo na boca.[74].
As histó rias sobre o texugo sã o semelhantes à s da raposa, embora o
texugo nunca seja tã o ruim quanto o francê s "Renard". Os dois animais
sã o retratados enganando os homens ao se transformarem em seres
humanos-um monge ou um menino-uma diferença talvez sugerida
pelas cores diferentes dos dois animais. També m o gato,
principalmente se for velho, é considerado uma criatura maliciosa, e
embora as transformaçõ es da raposa e do texugo sejam temporá rias, o
gato costuma adotar a igura humana permanentemente, e é um agente
ativo de uma longa histó ria como a de o tamanho da raposa. Durante o
regime feudal, principalmente no sé culo VIII, circularam muitas
histó rias em que uma gata se transformava em uma bela mulher para
ser amante de um senhor feudal e arruiná -lo. Mas essas histó rias nã o
pertencem, propriamente falando, ao folclore, embora ilustrem a
crença popular no cará ter malicioso do gato e em seus poderes
má gicos.
As cores do pelo do gato in luenciaram muito a popularizaçã o
dessas ideias sobre aquele animal. O gato mais temido era um
gato marrom avermelhado ou rosado, chamado de "gato da lor
dourada". Existe també m o gato com trê s cores mistas: branco, preto e
marrom. Acreditava-se que os poderes má gicos dos gatos pretos ou
brancos podiam prever o tempo, entã o os marinheiros sempre tinham
um no barco.

O que se segue é uma histó ria caracterı́stica sobre um gato de " lor
dourada".
Era uma vez um samurai que encontrou um gato " lor dourada" e o
trouxe para a casa de sua mã e, que icou entusiasmada com o
gatinho. Algum tempo depois, o gato desapareceu e imediatamente a
velha começou a evitar a luz, reclamando que seus olhos
a incomodavam terrivelmente. No entanto, ela evitou todo tratamento
mé dico, e seu ilho, apesar de sua ansiedade, nã o conseguiu convencê -
la a deixar os cantos escuros em que ela estava escondida. De repente,
duas donzelas desapareceram das criadas da casa, e ningué m
conseguiu encontrar seu rastro até que um dia, uma criada, cavando no
jardim, descobriu as roupas das duas moças com manchas de sangue, e
cavando mais encontrou seus ossos. O servo horrorizado correu para
dentro de casa para contar ao seu patrã o o que havia encontrado, mas
encontrou a mã e do patrã o, que, cheia de fú ria, ameaçava o criado com
a morte se ele falasse a algué m sobre sua descoberta. O bom criado
icou tã o assustado com a raiva da mã e que saiu de casa em silê ncio.
Poucos dias depois, um vizinho do samurai viu sua mã e lavar a boca
ensanguentada em um riacho que corria perto de sua casa. Enquanto
eu observava, um cachorro apareceu e a velha, assim que o viu, pulou
uma saliê ncia rochosa e fugiu. Isso convenceu a vizinha de que a gata
" lor de ouro" havia comido a mã e do samurai, transformando-se nela
mesma. Pouco depois, o vizinho foi visitar o samurai e contou-lhe o que
tinha visto. Ele levou vá rios cã es para o quarto de sua mã e e abriu a
porta. O gato feiticeiro era impotente sobre os cã es e eles logo o
mataram.
Outra histó ria de um gato malvado refere-se à sua morte por
lechas. Havia um menino samurai que costumava caçar com um arco e
dez lechas. Um dia, ao sair de casa, sua mã e o aconselhou a pegar mais
uma lecha do que de costume. O jovem obedeceu, sem perguntar à
mã e o motivo de tal conselho. Em seguida, ele passou o dia todo sem
ver nenhum jogo, e à noite sentou-se em uma pedra para
descansar. Enquanto ele estava sentado lá , apreciando o pô r do sol
calmo e vendo a lua nascer, de uma forma estranha outra lua apareceu
atrá s dele no oeste. O menino icou surpreso com tal aparê ncia e
imediatamente pensou que deveria ser obra de um espı́rito
maligno. Rapidamente, ele atirou uma lecha na segunda lua, que
causou um impacto; mas a lecha ricocheteou sem causar nenhum
dano. O menino atirou outra lecha, depois uma terceira, uma quarta e
assim por diante até a dé cima, sempre em vã o. No inal, ele colocou a
dé cima primeira no arco e disparou. Instantaneamente houve um grito
e o som de algo caindo no chã o. Ele foi até aquele lugar e encontrou um
gato gigante morto com um espelho em suas garras.
O jovem samurai correu para casa e contou a sua mã e o que tinha
acontecido, e ela disse a ele que naquela manhã ela tinha visto um gato
contando as lechas de seu ilho, entã o o aconselhou a carregar uma
lecha extra, pois o comportamento do gato o atingiu como altamente
suspeito. O gato, aparentemente, tinha um espelho com o qual ele
poderia se proteger contra as dez lechas, mas como ele pensava que
eram apenas dez, ele deixou cair o espelho, sendo atingido pela dé cima
primeira lecha.

Das muitas histó rias infantis sobre animais vingativos,


selecionamos aquela sobre o gambá que se vingou de um texugo que
traiu sua mã e, a raposa.[75].
Uma certa loresta foi tã o devastada pela devastaçã o que só restou
um texugo, uma raposa e uma pequena raposa, seu ilhote. Os trê s
viveram juntos, em grande sofrimento e di iculdades, e quando os
suprimentos acabaram, a raposa e o texugo traçaram um plano para
obter comida. O texugo ingiu estar morto e a raposa, transformada em
ser humano, levou o texugo aparentemente morto para o mercado.
A raposa conseguiu dinheiro para o texugo e comprou
comida; entã o o texugo conseguiu escapar e se dirigiu para a
loresta. Quando os suprimentos assim obtidos també m se esgotaram,
os dois animais repetiram o truque, mas desta vez foi a raposa que
ingiu estar morta e o texugo que vendeu seu corpo. Poré m, o texugo
malvado, desejando icar com toda a comida para si, aconselhou o
comprador a ter muito cuidado, certi icando-se de que a raposa estava
bem morta. O comprador começou a matar a raposa, e o texugo
devorou toda a comida sem dar ao ilhote da raposa uma ú nica
mordida.
Mas a raposinha entendeu a traiçã o do texugo e planejou
uma vingança ú til. Um dia ele disse ao texugo com grande inocê ncia:
"Meu tio, as pessoas sabem que tanto a raposa quanto o texugo sã o
especialistas em bruxaria, mas ningué m sabe qual dos dois é mais
há bil na arte." Vamos fazer uma competiçã o e ver qual é o
mais habilidoso.
O texugo riu da proposta da raposa, mas acedeu ao plano, pensando
em se livrar do ilhote també m. Assim, os dois animais marcharam
juntos para a cidade para exercer seus poderes má gicos sobre os seres
humanos. Ao se aproximar da cidade, a raposinha se atrasou e
desapareceu. Entã o o texugo sentou-se para descansar na entrada da
cidade; logo apó s uma longa procissã o passou por uma ponte, com o
palanquim de um Daimio[76] no centro. O texugo teve certeza de que
aquele show era uma ilusã o criada pela raposinha e imediatamente
saltou no meio da procissã o gritando:
"Seu cachorrinho estú pido, eu descobri o truque!" Render!
Mas a procissã o era muito real, e os servos do Daimio espancavam
o texugo insolente até a morte com seus cajados, enquanto a raposinha
vigiava tudo de longe. Desta forma, o ilhote vingou a morte de sua
mã e.

Outra histó ria infantil mais engraçada é "O macaco e o


caranguejo". Era uma vez um caranguejo que morava perto de um
caqui. Quando os frutos amadureceram, o caranguejo quis alcançar
alguns, mas como nã o conseguia subir na á rvore, pediu a um macaco
que jogasse alguns nele. O macaco pegou as maduras para si e jogou as
verdes no caranguejo, que foi pego por um caqui e, quando morreu,
muitos pequenos caranguejos saı́ram de sua barriga.
Eles queriam vingar o assassinato de sua mã e, mas perceberam
que eram muito jovens para lutar contra o macaco. Em seguida, eles
pediram ajuda a outras criaturas e seres inanimados, e aqueles que
vieram em seu auxı́lio foram um castanheiro, um funori[77], uma
vespa, um canhã o e um morteiro que atirou arroz. O castanheiro
entrou na casa dos macacos e se escondeu no forno. Quando o macaco
chegou em casa e se preparou para fazer o chá , o castanheiro saiu,
explodiu e atingiu o macaco nos olhos. Ele abriu uma caixa contendo
queijo de feijã o para aplicar na queimadura, e a vespa picou seu
rosto[78]. O macaco assustado escorregou no funori e caiu em
cheio. Entã o, o canhã o e a morteiro caı́ram do teto sobre o macaco e o
deixaram sem sentidos. Os caranguejos entã o atacaram o macaco
indefeso e o rasgaram em pedaços.
3. A SERPENTE

De todos os animais do folclore japonê s, a serpente desempenha o


papel principal, e as ideias supersticiosas sobre a "corda de caminhar"
ainda prevalecem entre as pessoas. A serpente, especialmente se for
branca, é considerada a patrona da riqueza e quase desejada como um
sı́mbolo da deusa Benten. Já vimos um exemplo disso na histó ria de
"Todo o saco de arroz". Mas a cobra é frequentemente descrita como
uma criatura maligna e vingativa. Uma mulher ciumenta se assemelha,
ou se torna, uma serpente. Em uma narrativa, uma mulher
perseguindo seu amante esquivo se transforma em uma enorme cobra
ao cruzar um rio, entã o se enrola e derrete um sino de bronze no qual o
amante in iel se escondeu.[79] Em outra histó ria, um guerreiro
renuncia à sua vida ativa e se torna um monge porque quando ele vê as
sombras lançadas em uma tela de papel por sua esposa e concubina,
seu cabelo se transforma diante dele em cobras que lutam entre si.
[80].
A cobra també m é considerada um sı́mbolo de luxú ria. Essa ideia
deu origem a muitas histó rias sobre a adesã o de uma cobra a uma
mulher e o consequente nascimento de uma criança, humana
ou semimonstro. Acredita-se até que algumas famı́lias descendem
dessa uniã o e sã o protegidas pela cobra-mã e.
Podemos acrescentar que existe a crença de que muitos lagos e
reservató rios tê m uma cobra como seu gê nio, embora nem sempre seja
claro se é um dragã o ou o verdadeiro ré ptil. As histó rias sobre esses
gê nios sã o muito semelhantes em todo o Japã o, e a mesma histó ria é
contada em locais diferentes. Essas cobras semimı́ticas aparentemente
possuem poderes milagrosos, especialmente aquelas que controlam o
clima, e em é pocas de seca elas se apresentam à s margens de seus
lagos. Os gê nios masculinos frequentemente tentam as mulheres,
atraindo-as para a á gua, enquanto as cobras femininas aparecem na
forma de belas mulheres e se casam com homens. As vezes, eles sã o
apresentados como cobras reais, embora muitos devam ter o poder de
se transformar em dragõ es monstruosos.
Agora vamos nos referir a uma dessas histó rias, a da cobra
macho Nanzo-bo[81]. Havia um monge budista
chamado Nanzobo. Este monge queria, como alguns budistas da Idade
Mé dia, testemunhar a vida apó s a morte e ouvir os sermõ es do futuro
Buda Maitreya que, de acordo com as profecias, poderia aparecer no
mundo apó s vá rios bilhõ es de anos. Guiado por um orá culo divino, ele
decidiu se tornar um dragã o e graças a isso sobreviver na á gua até o
aparecimento de Maitreya, já que um dragã o vive tanto que é quase
imortal. Para este im, ele recuou para a beira de um lago, ao pé do
mon you Kotowake onde continuamente recitando o Lótus da
Verdade e sob esta açã o disciplinar foi gradualmente transformado em
uma cobra.
Um dia ele viu uma senhora se aproximando, que disse a ele que ela
havia se sentido atraı́da por sua voz quando ele recitou aquele texto
sagrado, entã o ela queria coabitar com ele[82]. Nanzo-bo icou
surpreso com o pedido, mas quando soube que ela era a cobra genial
do lago, ele acedeu ao desejo dela e os dois viveram juntos na
á gua. Poucos dias depois, a esposa cobra disse a ele:
"Há uma cobra macho em outro lago pró ximo que há muito deseja
se casar comigo." Se ele vier me visitar, com certeza icará muito
zangado com a sua presença. Tente estar preparado.
Nã o demorou muito para a outra cobra aparecer, começando
imediatamente uma luta. A serpente atacou Nanzo-bo com sua cabeça
de oito lados, e Nanzo-bo se defendeu com sua cabeça de nove faces,
enquanto os oito pergaminhos das escrituras sagradas na cabeça de
Nanzo-bo se tornavam uma cabeça cada., E com os seus pró prios eles
acrescentaram nove. Nanzo-bo venceu a batalha e o dragã o rival fugiu
derrotado para seu lago, onde vivia como uma cobra de baixo grau.
4. O AMOR E O CASAMENTO DOS ANIMAIS
O amor e o casamento entre diferentes animais ou entre um animal e
um humano sã o temas frequentes no folclore japonê s. A histó ria mais
famosa é a da raposa Kuzu-no-ha, que se apaixonou por um guerreiro
e se casou com ele. O episó dio da separaçã o da raposa do ilho, nascido
desse casamento, foi dramatizado, e é a esse drama que a histó ria deve
sua popularidade, já que a pró pria histó ria carece de originalidade e
interesse.[83] Em uma histó ria semelhante, o espı́rito de um salgueiro
envelhecido, chamado O-Ryu, se casa com um guerreiro e é separado
de seu marido quando a á rvore é cortada. Na forma dramatizada dessa
histó ria, o motivo principal é a agonia que a esposa da á rvore
manifesta cada vez que o machado penetra mais fundo no tronco.

Uma histó ria infantil popular sobre um casamento animal é "The


Mouse's Marriage". A histó ria conta como dois ratos se casam, assim
como os seres humanos. Mas outra versã o tem um tom didá tico e
inculca a moral de que o casamento deve ser realizado entre iguais e
nã o entre pessoas que estã o em é pocas diferentes da vida. Ele relata
que um venerá vel casal de ratos tinha muito orgulho de sua ú nica ilha
e queria casá -la com uma pessoa de alta posiçã o. Mas quando a jovem
foi sucessivamente rejeitada pela Lua, pela Nuvem e pelo Vento, os pais
inalmente decidiram dá -la em casamento a um de seus ratos
empregados.

"A coruja e a á guia" é outra histó ria popular desse tipo. Era uma vez,
diz ele, vivia uma coruja chamada Eukuro. Ele amava
uma camachuela chamada Use-dori, que morava em outra loresta,
atraı́da pela beleza de suas cançõ es. Fukuro ele consultou seus
seguidores, a torre Kurozaemon a garça Shimbei saber como poderia
obter favores Use-dori. Eles responderam que a jovem rejeitou as
a irmaçõ es da á guia, o Sr. Uye-minu ("Nunca olhando para cima" ou
"Sem medo"), e aconselhou-a a perder a esperança. Mas a coruja nã o
seguir este conselho e enviou uma carta de amor de usar-dori por meio
de Shiju-gara (o grande Manchu herrerillo).
A carta era espirituosa e apaixonada,[84] e Use-dori icou tã o
emocionado que respondeu da seguinte forma:
«Nã o sou digno do teu amor e admiraçã o e nã o desejo despertar o
ciú me dos outros aceitando o teu amor, especialmente os de Uye-
minu. Mas em um futuro distante, quando as lores se abrirem no cé u e
os frutos amadurecerem na terra, nos encontraremos no paraı́so
ocidental de Ainita-Buda. "
Fukuro acreditava que essa resposta fazia alusã o a um encontro
apó s a morte e, portanto, uma rejeiçã o educada de seu amor. Abatido
por esse fracasso e lutando entre sua paixã o e sua determinaçã o de se
resignar, ele de repente encontrou conforto no conselho de uma
divindade que ele adorava. Essa divindade revelou a ele o signi icado
oculto da letra: as lores do cé u eram as estrelas, os frutos da terra
eram o amanhecer e o paraı́so uma capela do Buda Amita localizada na
encosta oeste da montanha. Fukuro, entã o, sentiu-se transportado de
felicidade por esta feliz apresentaçã o e imediatamente foi à capela para
encontrar sua amada.
Os outros pá ssaros souberam desse encontro e escreveram poesias
reclamando da sorte de Fukuro. A partir de tais poemas, a á guia Uye-
minu sabia o que estava acontecendo e voou em uma fú ria
furiosa. Seus servos atacaram os amantes quando os encontraram no
santuá rio de Amita e Fukuro conseguiu fugir, mas Uso-dori foi vı́tima
de violê ncia dos assaltantes.[85]. A coruja Fukuro icou tã o triste com
a morte de sua amada que vestiu uma tú nica moná stica e começou a
viajar pelo paı́s como um monge viajante. Por esta razã o, a coruja é
sempre encontrada nas lorestas pró ximas aos templos budistas.
5. INSETOS, ESPECIALMENTE BORBOLETAS

Por im, os insetos sã o bastante conhecidos no folclore japonê s,


embora sejam mais comuns como tema de poemas e
pinturas. Independentemente disso, eles se apresentam como fadas,
brincando com lores, pagando dı́vidas ou buscando conhecimento
budista. Já contamos a histó ria da vespa grata, e há contos
semelhantes com referê ncia a vaga-lumes ou borboletas
gratas. Libé lulas ou libelinhas sã o frequentemente cantadas na mú sica
tradicional, e acredita-se que as vermelhas estejam associadas ao
retorno dos mortos a seus lares no mundo. A borboleta no folclore é
uma pequena fada com asas multicoloridas; o grilo tece em seu ninho
e avisa os homens com sua cançã o da chegada do inverno; o matsu-
mushi (Calyptotryphus mamiomtus), o «percevejo», suspira e espera
pelo seu amigo [86].
De todos estes, a borboleta é o inseto mais popular, e uma
mú sica instrumental e uma dança caracterı́stica representando um
inseto tã o frá gil sã o frequentemente executadas em festivais. A
borboleta també m aparece no teatro Nã o. Esta é a histó ria:

Um monge viajante visita Miyako e passa a noite em um palá cio


abandonado. E uma noite calma de primavera, o ar é suave e calmo e a
lua ilumina a cena. Uma mulher aparece e fala ao monge das gló rias do
passado, quando as lores se abriam nos jardins e a mú sica e as
festividades traziam alegria ao local. Depois, ela confessa que é
realmente o espı́rito da borboleta, que gosta da companhia de todas as
lores, exceto da ameixa (em japonê s, ume), que desabrocha muito cedo
na primavera, e pede ao monge que o impregne de conhecimentos
budistas para que ele possa viver em comunhã o com todos os
seres. Ele entã o se transforma em uma borboleta rosa com uma
guirlanda verde na cabeça e um par de asas de cores variadas. O monge
recita a escritura Hokke-kyo, ("O ló tus da verdade"), e enquanto ele
recita a borboleta canta e dança. A ú ltima parte do drama consiste na
cançã o da fada e no refrã o, da seguinte forma:

As lores desabrocham de acordo com as estações,


seu coração vagueia entre os troncos das árvores.
Aqui, perto dos jardins imperiais, no palácio abandonado,
As lores silvestres se banham na suave brisa da primavera
os pássaros amarelos [rouxinóis japoneses] cantam entre os galhos.
Veja a borboleta dançando entre as nuvens de lores,
entre as pétalas que voam como locos de neve,
acenando as mangas e afastando as pétalas.
Oh, que visão adorável!
Quando a primavera passa e o verão acaba,
e o outono está presente, e todas as lores murcham,
apenas a geada branca dos crisântemos permanecerá.
Da NDO gira em torno dos galhos que ainda contêm lores,
a borboleta dança como um pião,
girando e girando em direção à Iluminação.
Veja a fada dançando a dança do Bodhisattva,
a dança e a música celestiais.
Sua igura aos poucos se afasta de nós,
para o céu que amanhece na noite de primavera.
Veja suas asas se movendo através dos círculos rodopiantes de névoa,
Observe sua igura desaparecer gradualmente na névoa da manhã!
Como uma transiçã o das histó rias das plantas e lores,
adicionaremos outro conto de borboletas, no qual uma aparece como a
personi icaçã o da alma humana pairando entre as lores que ela amou
em sua vida anterior.
Era uma vez um jovem chamado Sakuni. Ele passou sua existê ncia
plantando e cuidando de lores. Entã o ele se casou com uma jovem que
tinha o mesmo hobby. O casal cuidava apenas das lores que cresciam
em seus amplos jardins. Nasceu um ilho que també m herdou esse
amor pelas lores. Depois de muitos anos de vida idı́lica, marido e
mulher morreram. O ilho continuou a cultivar suas plantas e ervas
com mais amor do que nunca, como se fossem os espı́ritos de seus
falecidos pais. Com a chegada da primavera, o menino observou que
duas borboletas apareciam dia apó s dia e esvoaçavam juntas entre as
lores. Como o jovem també m amava borboletas, ele se certi icou de
que nenhum mal acontecesse a elas. Uma noite ele sonhou que seus
falecidos pais voltavam ao jardim e viam as lores comovidas e
admiradas, e por im elas se transformavam em borboletas. A manhã
seguinte, o menino correu para o jardim e encontrou as mesmas
borboletas esvoaçando entre as lores, assim como ele os tinha visto
em seu sonho. Assim ele soube que as amadas borboletas eram
realmente as almas de seus pais, entã o ele começou a alimentá -las com
mel e cuidou delas com toda ternura e cuidado.





Capítulo VIII

HISTÓRIAS DE PLANTAS
E FLORES

Já tivemos a oportunidade de falar sobre á rvores e lores, e de contar


algumas histó rias sobre elas. Essas histó rias sã o muito numerosas e
todas sã o baseadas na crença popular de que as plantas sã o dotadas de
almas semelhantes à s humanas. Nã o há o menor indı́cio de maldade na
natureza, pois as á rvores e lores sã o consideradas belas fadas ou seres
semelhantes, sempre gentis e modestos. Eles conversam entre si ou
com humanos, se amam ou se casam com humanos, assim como o
salgueiro que, como vimos, se transformou em mulher. Eles vã o aos
monges budistas em busca dos ensinamentos de sua doutrina e até
mesmo alcançam um certo grau de iluminaçã o religiosa. Quando lutam,
como ocasionalmente fazem, nunca o fazem com ferocidade. Em alguns
casos, a planta expressa gratidã o, como os rabanetes que aparecem em
uma histó ria como homens armados para defender o homem que
gostava muito dessas verduras.
As plantas e as lores, como os insetos, sã o iguras mais
proeminentes na arte e na poesia do que no folclore e, portanto, muitas
vezes sã o personi icadas na poesia, e alguns desses poemas dã o
origem a histó rias extremamente interessantes; alé m disso, as lores
sã o frequentemente pintadas em quadros, passando a assumir
personalidades bem de inidas no imaginá rio popular. Finalmente, o
lugar que as plantas e lores ocupam nos festivais sazonais está
intimamente associado ao povo mı́tico celebrado nesses festivais. Já
vimos que certas plantas estã o sempre associadas ao Sennin e
saberemos mais sobre elas quando chegarmos ao "Calendá rio das
Flores".
1. ARVORES MITICAS

Muitas á rvores antigas sã o consideradas semidivinas, sendo


numerosas e famosas em todo o Japã o. Existem també m á rvores
mı́ticas, como puras criaçõ es da imaginaçã o. Alé m da á rvore celestial
do budismo, o folclore japonê s tem uma á rvore celestial que é
a katsura (Cercidiphyllum japonicum), uma espé cie de louro que se
acredita viver na lua e é visı́vel nos lugares escuros de sua
superfı́cie. Embora essa ideia pareça ser de origem chinesa, ela se
tornou tã o naturalizada no Japã o que a " katsura da lua" é
uma expressã o comum. Um poema do sé culo IX diz:

Por que a lua está tão brilhante
na noite clara de outono?
É possível que seja porque
a katsura celestial brilha com um vermelho resplandecente,
como as folhas de bordo em nosso mundo?

Uma das á rvores gigantes atribuı́das à era mı́tica é o
enorme kunugi (Quercus serrata), uma espé cie de carvalho que se diz
ter icado na ilha de Tsukuchi, tã o imensa que a sombra que projetava
pela manhã e à noite o crepú sculo atingiu centenas de quilô metros ao
seu redor. Quando caiu, seu tronco revelou ser do tamanho de uma
cordilheira, e centenas e milhares de pessoas conseguiram andar sobre
ele. Aparentemente, essa histó ria foi inventada para explicar a origem
do carvã o, tã o abundante nesta ilha.
Outra á rvore mı́tica é o gigantesco castanheiro que icava no
distrito de Kurita ("castanha") da provı́ncia de Omi. Seus galhos se
espalharam tanto que as castanhas caı́ram vá rios quilô metros de
distâ ncia, e uma das pilhas feitas com essas frutas cobriu trê s distritos,
e o povo de Wakasa, no noroeste, reclamou que as safras de arroz
estavam diminuindo por causa daquela sombra. Entã o o governador
de Omi ordenou que a á rvore fosse cortada, e muitos lenhadores
começaram a trabalhar nela. Mas todos os cortes que foram in ligidos
ao tronco da á rvore foram novamente fechados à noite e na manhã
seguinte o castanheiro continuou a crescer tã o exuberante como antes.
Esse estranho fenô meno se devia ao fato de que os espı́ritos das
outras á rvores e até mesmo a grama do solo respeitavam a gigantesca
á rvore como se fosse seu rei, e todas as noites vinham curar suas
feridas. No entanto, uma noite um certo tipo de hera, chamado de hito-
kusa-Kazura, ou "uma hera humilde," foi com os outros para curar os
pobres á rvore. Mas o castanheiro era demasiado orgulhoso para se
deixar curar por uma erva tã o insigni icante como a hera, e recusou os
seus serviços. A hera foi insultada e planejou vingança contra a
castanha arrogante. Assim, a visã o apareceu aos lenhadores realizando
sua fú til tarefa e ele lhes contou como era feita a restauraçã o da
á rvore. Alé m disso, a hera vingativa explicou a eles como poderiam
impedir a cura noturna queimando a á rvore. Feito isso, as feridas
nã o sarariam e a á rvore cairia. O local onde caiu é a "Costa das
Arvores", no Lago Biwa em Omi.
2. OS GENIOS DAS PLANTAS

Entre as á rvores, o pinheiro é o que mais se destaca na paisagem e,


portanto, na pintura, na poesia e no folclore.[87] Os pinheiros mais
famosos sã o os dois de Takasago, cujos gê nios costumam aparecer ao
luar, como um homem de cabelos brancos, e sua esposa, limpando o
chã o cheio de agulhas com vassouras. Uma versã o da histó ria quer que
o marido seja o gê nio de um pinheiro do outro lado do mar e conta
como ele vai todas as noites à Takasago. A histó ria é muito tê nue, e as
circunstâ ncias que tornaram essas á rvores famosas aparecem em um
drama lı́rico popular, no qual o velho casal abençoa o pacı́ ico reino do
Imperador. A mú sica é , em parte, a seguinte:

As ondas ainda estão nos quatro mares.


O vento do tempo sopra suavemente, mas as árvores
suas folhas não balançam nem rangem.
Naqueles dias, abençoados eram os abetos
que se conheceram e envelheceram juntos.
Nem olha para o céu nem reverente
palavras de gratidão e elogio
pode expressar nossa gratidão, que todos os nossos dias
passar nesta era com bênçãos concedidas
pela generosidade de nosso Senhor Soberano

E uma cançã o de casamento, e os gê nios que simbolizam a
longevidade e a idelidade conjugal també m estã o presentes nessas
ocasiõ es, por meio de tabuinhas nas quais foram gravadas em
miniaturas.
O criptô mero (em japonê s, sugi) é mencionado quase tã o
frequentemente quanto o pinheiro no folclore japonê s. Claro que nã o
assume as formas fantá sticas do pinheiro, mas, pelo contrá rio, é
famosa pela sua retidã o e simetria, bem como pela densidade da sua
folhagem. Um sugi gigante ou grupo dessas á rvores é frequentemente
associado a uma capela xintoı́sta, e essa á rvore se tornou quase o
sı́mbolo do misté rio sombrio de um santuá rio xintoı́sta: uma estrutura
gó tica construı́da pelas mã os da natureza. Sugi també m é considerada
a morada favorita dos Tengus, que realizam suas assembleias nos
bosques dessas á rvores.
Uma histó ria muito antiga da qual o sugi participa é a do
santuá rio Miwa, dedicado ao Grande Senhor das Terras.

Uma mulher que morava em Yamato era visitada todas as noites


por um jovem muito bonito que nã o queria revelar sua identidade. A
mulher, querendo saber quem ele era, ele amarrou uma longa ita em
suas roupas e o seguiu quando ele saiu pela manhã . Assim, ele
descobriu que o jovem desapareceu na montanha de Miwa, no local
onde estavam trê s gigantescos sugi. A partir de entã o, aquele trio de
á rvores foi considerado a morada do divino Grande Senhor das Terras,
e por isso o santuá rio Miwa nã o possui edifı́cios sagrados, mas é
protegido por á rvores. Outras histó rias semelhantes a esta sã o
contadas sobre vá rios locais de santuá rios xintoı́stas.

O gê nio do icho, ou á rvore gingko, é uma velha. O tronco e os galhos


do gingko, conforme a á rvore envelhece, produzem raros
protuberâ ncias pendentes que lembram seios femininos. E por isso
que se acredita que o gingko exerce um cuidado especial com as mã es
que amamentam, razã o pela qual essas mulheres costumam adorar
uma dessas á rvores.
Nos ú ltimos anos, uma histó ria ú nica começou a circular sobre
um gingko que cresceu no Parque Hibiya de Tó quio, no centro desta
cidade. Nos tempos primitivos, o parque fora um verdadeiro deserto no
qual crescia apenas aquele velho ginkgo. Quando eles projetaram o
parque, o gingko começou a secar, para grande pesar dos
jardineiros. Mé todos diferentes foram tentados para mantê -lo vivo,
mas sem sucesso. Um dia, ao anoitecer, quando o jardineiro
sê nior estava sozinho em frente à á rvore, pensando se seria possı́vel
tentar algum outro remé dio para evitar sua morte, ele de repente viu
uma velha ao seu lado. A velha perguntou o que o estava torturando e o
jardineiro disse a ela. A velha apenas sorriu e exclamou:
"Como você sabe, o gingko é a á rvore do leite." Despeje bastante
leite de vaca em torno de suas raı́zes e a á rvore crescerá novamente.
Entã o, ele desapareceu tã o misteriosamente quanto apareceu. O
jardineiro seguiu esse conselho e quase
instantaneamente o ginkgo começou a recuperar sua força e vigor. E
hoje ele ainda está alto no centro do parque.
3. AS FADAS DA FLOR

As fadas das lores do folclore japonê s sã o essenciais em tudo como


o Tennin budista e, na mente popular, estã o sempre associadas à
mú sica e à dança. Já falamos sobre as cinco fadas da cerejeira; mas há
outros dois també m relacionados a dramas lı́ricos. A é fairy glycine
purpurea que loresce no inı́cio do verã o, e o outro é l basho ou banana,
que deixa as lá grimas ao vento de outono.
A trama do drama das glicı́nias se passa na praia de Tako, na costa
do Mar do Japã o. A seguir, transcrevemos uma parte do canto coral que
acompanha esta dança das fadas:

Sem a ajuda de um barco ou carroça


A primavera vem deslizando,
deixando para trás as câmaras cetônicas e pétalas esvoaçantes.
Sob as nuvens brancas das lores de cerejeira murchas,
as glicínias deixam cair suas gotas violetas de orvalho.
Veja a lua no céu nublado da noite de primavera,
um re lexo nebuloso que mancha as glicínias com seu brilho
arroxeado.
Raro é uma visão como esta na Praia Tako
onde os pinheiros crescem na outra faixa de terra.
O zé iro suave da noite de primavera
cante sua melodia com as agulhas dos pinheiros,
e o ar sussurra: "Viva milhares de anos."
E as lores de glicínias estão penduradas nos galhos,
cujos cachos violetas, como névoas iridescentes,
eles cortam um sulco na vegetação rasteira densa da loresta perene.
Veja a dança das fadas no meio do halo roxo,
agitando os braços de nuvens de penas de aglomerados de glicínias.
Cante, ó folhas trêmulas dos salgueiros suspensos!
Dancem juntos, ó pétalas giratórias das lores!
Dance com eles, ó fada dos campos povoados de glicínias!
As cores e aromas das árvores e lores se misturam
no ar sereno da praia de Tako,
onde as ondas sussurram baixinho
sob o lindo luar,
re letindo os véus ondulantes da fada dançante.
Repetidamente, para frente e para trás, para frente e para trás,
A fada da glicínia roxa dança,
Até o crepúsculo da manhã espreitar por entre as nuvens iridescentes,
até que inalmente sua igura se perde nos rastros da névoa...

Há um outro drama lı́rico em torno da dança, muito diferente da
fada Basho. Este drama se passa em um eremité rio nas montanhas,
onde um monge eremita recita a escrita Hokke-kyo todas as
noites. També m todas as noites uma mulher visita o local, sentada ao
lado do eremita. Uma noite, o monge pergunta quem ela é , e ela
confessa ser o gê nio do basho que cresce no jardim.[88] E assim:

Eu apareço neste jardim desolado!


Banhado no orvalho da graça,
graça concedida às folhas do basho pela chuva da verdade,
—De verdade que não é fácil de descobrir-.
Salve, oh Basho, assim transformado e vestido em vestes humanas,
mas sem lores.

(Agora, a fada Basho e o refrã o se alternam)
Fragilidade e evanescência
não são apenas qualidades de feminilidade,
mas a fada Basho, em roupas de cor escura,
sem as tinturas ou a beleza das lores,
ela é tímida, as mangas em farrapos.

(A fada Basho dança ao som do refrã o)
Com ou sem signi icado
sendo uma grama ou uma árvore,
a vida é apenas uma manifestação
da última realidade, que carece de signos distintivos,
uma formação alimentada por chuva e orvalho,
composto de geada e neve,
aparecendo no campo da alma universal,
do Cosmos, onipresente na poeira...[89]
A vida é apenas um sonho, fugaz como as folhas da fada Basho...
Na preguiça pálida do luar, vestido com roupas de gelo, vestindo uma
saia de gelo,
tecido com a teia da geada e a trama do orvalho, (dança).
Como a vestimenta de penas da fada da lua,
como ela, eu agito minhas mangas de folha de bananeira,
as mangas que ondulam como leques de folhas de bananeira,
e eu faço o vento varrer tudo,
os miscanthus e as patrinias, as ervas e as lores,
que crescem no jardim desolado do eremitério.
Delicado como o orvalho, sutil como fantasmas,
todos estão espalhados pelo vento
que sopra sobre os pinheiros gigantescos.
soprando em milhares de folhas e lores.
Vede aqueles milhares de folhas e Flores
que foram arrancados e espalhados,
nenhuma igura feminina pode ser rastreada,
mas as folhas arrancadas do basho jazem no chão.

Uma histó ria em que o elemento budista é muito claro é a do "Sr.


Borboleta e suas lores".[90]
Era uma vez um homem que morava no subú rbio de Miyako, que
nunca se casou, dedicando-se exclusivamente ao cultivo de lores em
seu jardim. Alé m dessas lores, ele nã o tinha outro amor senã o o de sua
mã e, a quem ele adorava profundamente. Ningué m sabia seu nome,
por isso era conhecido como "Sr. Butter ly". Quando sua mã e faleceu,
ele icou sozinho entre as lores, o que aumentou sua melancolia, pois
estavam destinadas a murchar e murchar, e ele icou triste ao vê -las
morrer nas geadas de outono. Quando ele olhou ao redor de seu jardim
e ouviu o som lamentoso dos sinos do templo budista dobrando nos
crepú sculos da noite, ele ponderou dolorosamente sobre a
evanescê ncia das coisas deste mundo, a tal ponto que ele inalmente
decidiu abandoná -lo.
Por isso ele se tornou um eremita e foi viver entre as montanhas,
longe de Miyako. Uma noite, houve uma batida em sua porta. Ao sair,
ele viu uma mulher vestida com roupas esfarrapadas, que lhe pediu
que orasse por ela de acordo com a religiã o de Buda. A princı́pio, o
eremita duvidou se devia ou nã o a deixar entrar, mas inalmente
decidiu que poderia muito bem admitir uma mulher tã o velha no
eremité rio. Enquanto a mulher estava sentada dentro do eremita,
ouvindo o discurso do eremita, uma jovem vestida de verde salgueiro e
com uma capa roxa entrou e sentou-se em silê ncio ao lado da
velha. Entã o, de uma forma estranha, como se emergissem do
nevoeiro, mais moças apareceram, uma apó s a outra, algumas com
roupas esverdeadas, algumas brancas e rosa, algumas mais brancas e
roxas, e assim por diante. Finalmente, cerca de trinta mulheres, velhas
e jovens, adornadas com uma in inidade de cores, reuniram-se, todas
as quais ouviram atentamente o sermã o do eremita. Este ú ltimo,
poré m, nã o sabia o que fazer com aquela assembleia nã o premeditada,
embora continuasse obstinadamente com seu sermã o, sublinhando a
vaidade da vida mundana e descrevendo o destino inal de tudo o que
existe, nã o só da humanidade, mas també m de vegetais e plantas.
animais. Quando ele terminou, as mulheres expressaram sua estima
por ele e confessaram que eram na verdade os espı́ritos das lores que
ele tanto amava, que queriam compartilhar com ele a graça do
budismo. Cada um deixou-lhe um poema, como expressã o de
agradecimento e como con issã o de fé .[91]
Assim que o ú ltimo deles desapareceu, o dia amanheceu; as plantas
e arbustos que cresciam ao redor do eremité rio tremiam suavemente
com o ar da manhã e brilhavam com gotas de orvalho. O eremita icou
novamente impressionado com a verdade do ensinamento de que
todas as criaturas estã o destinadas a se tornarem Budas e, portanto,
ele viveu o resto de sua vida com grande piedade.

Existem també m muitas histó rias bonitas e româ nticas sobre a


origem de vá rias plantas e
lores. O Ominameshi (Patriniascabio saefolia), por exemplo, é uma erva
que tem um caule delgado e cachos de pequenas lores amarelas que
lorescem no inı́cio do outono. Juntamente com as delicadas pontas
do susuki (Miscanthus sinensis), dobram-se e ondulam na brisa outonal
e dã o uma ideia de ternura e submissã o. E por isso que o ominameshi é
conhecido como a " lor feminina". [92]
A histó ria de sua origem é a seguinte:
Certa mulher, como resultado de um mal-entendido, acreditou ter
sido abandonada por seu amante, chamado Ono-no-
Yorikaze. Desesperada, ela cometeu suicı́dio se jogando em um rio que
corria perto de sua casa. Depois de ser enterrada, uma planta especial
cresceu em seu tú mulo. Foi a pá tria. O amante, Yorik Aze, chorou
amargamente por sua infeliz amado, e no inal ele també m se
afogou. Ele foi enterrado ao lado da jovem, e de seu tú mulo surgiram
os miscantos. Desde entã o, as duas plantas cresceram juntas e
raramente o fazem separadamente.
Outra histó ria muito parecida é sobre uma espé cie de hera que
cresce entre as pedras. Chama-se Teiba-kazura, sendo Teika o nome de
um poeta que viveu no sé culo XIII. Este poeta amava uma princesa,
també m poetisa, que faleceu e foi enterrada no complexo de Nison em
um mosteiro budista em Saga, perto de Miyako. Teika chorou tã o
apaixonadamente por ela que seu amor foi personi icado na hera que
se agarrou ao tú mulo da jovem. Ainda hoje a laje coberta de hera é
ensinada a quem visita o mosteiro.

No entanto, nem todas as plantas sã o amorosas e inofensivas; o


seguinte é uma histó ria em que eles sã o ciumentos e combativos.
Em Yoshino, famosa por suas cerejeiras em lor, havia uma que
tinha lores de oito pé talas, portanto chamada de Lady Yaye-z akura ou
"cereja de oito pé talas". Perto dali vivia um jovem e
corajoso prı́ncipe, Susuki (miscanthus), que se apaixonou por
Lady Yaye-zakura, que estava em plena loraçã o. Ela resistiu por algum
tempo ao amor da jovem Susuki, mas quando suas pé talas começaram
a cair ela se submeteu ao amante e permitiu que ele segurasse as
pé talas entre suas folhas verdes.
An Umé (em japonê s, ameixa) també m estava apaixonado por Yaye-
zakura, entã o ele sentiu ciú me de seu rival mais sortudo e decidiu
se vingar, pelo que convenceu as outras á rvores de que eram todas
infelizes por terem se apaixonado ao má ximo bela de todas as á rvores
de uma planta simples. Em seguida, todas as á rvores se reuniram sob a
copa da ameixeira e se prepararam para lutar contra as plantas e ervas
da loresta.
As plantas correram para defender Susuki e sua senhora, e logo em
seguida uma luta foi travada tã o feroz quanto a dos homens. A vitó ria
parecia inclinar-se mais para o lado das plantas, mas quando o famoso
general Kusu-no-ki (câ nfora) veio em favor das á rvores e ateou fogo
entre as plantas, a batalha mudou a favor das á rvores. O
prı́ncipe Susuki morreu no campo de batalha, assim como muitos de
seus seguidores. Lady Yaye-zakura, em seu pesar, raspou o cabelo e
vestiu tú nicas de freira. Desde entã o, é conhecida pelo nome de Zumi-
zome-zakura ("a cerejeira em vestes pretas").[93]
4. O CALENDARIO FLORAL

As plantas e as lores estã o naturalmente associadas à é poca em que


lorescem e estã o presentes nas festas que acompanham cada
é poca. Existe um conhecido "calendá rio loral", onde sã o listados os
locais famosos de cada lor e podem ser lidas poesias e
lendas relacionadas com elas. O simbolismo das lores deriva
principalmente de suas respectivas caracterı́sticas e de sua associaçã o
com as estaçõ es do ano, e as lendas, em certa medida, tê m sua origem
em iguras poé ticas ou narrativas mı́ticas, nativas e estrangeiras. Entre
estes ú ltimos, o maior é a poesia chinesa.[94]
No calendá rio loral, as estaçõ es costumavam ser organizadas de
acordo com os meses do antigo calendá rio lunar, e a alteraçã o causada
pela adoçã o do calendá rio gregoriano em 1873 foi reajustada por
mé todos muito engenhosos. Transcreveremos algumas histó rias do
Calendá rio Floral, como ainda sã o contadas em Tó quio hoje.

As plantas para os dias de Ano Novo (de 1 a 7 ou 15 de janeiro)


sã o pinho, bambu e ameixa. O pinheiro, por suas agulhas perenes,
representa prosperidade; bambu, a virtude da honestidade.
A lor da ameixa é escolhida por ser a primeira a desabrochar. Já
falamos sobre a genialidade do pinheiro; Dissemos que a ameixeira é
uma concepçã o chinesa, Rafu-sen, "a Fada com o vé u lutuante", que
aparece à noite entre suas lores e espalha seu perfume no ar. O animal
associado ao pinheiro é a garça, um sı́mbolo de longevidade; aquele
com o bambu é o pardal, que dança entre seus ramos: e o companheiro
da lor da ameixa é o rouxinol[95]. Outras lores do inı́cio da primavera
sã o o narciso, sı́mbolo de pureza; o adonis (em japonê s, fukujuso), que
representa a fertilidade da vida mesmo sob a neve, e acredita-se que
traz boa sorte e saú de; e o yuzuri-ha (Daphniphyllum ma-cropodum),
cujo nome sugere continuidade in inita.
A primavera é anunciada pelo salgueiro, cujos galhos pendentes
sugerem graça elegante e suas folhas verdes claras uma vida sempre
fresca. Folhas de salgueiro, junto com lores de cerejeira e outras
á rvores, compõ em o brocado primaveril tecido pelas mã os da Senhora
de Monte Sano, o gê nio da primavera. As lores de cerejeira lorescem
como resultado da Dama-Que-Faz-as-Flores de Cerejeira, de quem já
falamos. Depois da cerejeira, o pessegueiro, tanto nas lores quanto nos
frutos, é dotado de poderes contra a praga. As lores do pessegueiro
estã o associadas principalmente ao dia das bonecas (das meninas),
que é comemorado no dia 3 de março, e representam a fertilidade. A
sé rie de lores primaveris termina com a azalé ia, com a qual as pessoas
decoram um pequeno altar erguido ao menino Buda em seu
aniversá rio, que é comemorado em 8 de abril, embora na verdade
tenha ocorrido um mê s depois.
Floresce quase ao mesmo tempo que a azalé ia, mas já considerada
o prenú ncio do verã o, está a glicı́nia, a globularia (Kerria) e a
peô nia. Wisteria é o sı́mbolo do esplendor e també m do transitó rio,
uma das histó rias já contadas. O lı́rio é mais conhecido
como kakitsubata, uma de suas muitas variedades. E associado na
pintura decorativa ao yatsu-hashi ("a ponte das oito placas"),
mencionado em uma das lendas de amor de Narihira. Outra variedade,
o shobu[96], é a lor da festa das bonecas (infantil), que se celebra no
dia 5 de maio, e protege contra os maus espı́ritos. Para isso, suas
folhas sã o penduradas nos beirais da casa ou imersas em banho-
maria. Essa prá tica teve origem na China. O globularia (em
japonê s yamabuki) é muito admirado por sua cor amarela brilhante. Os
ramos do arbusto yamabuki, inclinados para baixo, sã o associados na
poesia e pintura com riachos, em cujas margens geralmente
crescem. A peô nia é o sı́mbolo da beleza encantadora. O mesmo
signi icado é atribuı́do ao fuyo (Hibiscus Mutabilis) e à hortê nsia; o
primeiro simboliza uma jovem bonita, mas infeliz, e o segundo, uma
jovem fascinante e inconstante.
A lor de verã o mais mencionada na poesia clá ssica é a de uma
espé cie de laranjeira, a tachibana (Citrus nobilis), cujas lores
pequeninas sã o altamente perfumadas. A lenda diz que a pedido do
soberano, foi trazido ao Japã o por um nobre de Tokoyo-no-Kuni, ou
Terra Eterna, uma ilha no sul onde as á rvores sã o sempre verdes. A
fragrâ ncia desta lor está associada ao canto do cuco. Mais populares
sã o a ipomeia e a lor pá lida da lima abaza vinatera, ou ipomeia
noturna. A ipomeia está associada à Coreia, talvez porque seu outro
nome seja " Chosen " ou "Morning Calm", que em japonê s é outro nome
para Coreia. O leitor se lembrará do conto no Capı́tulo V da donzela
da madrugada, retirado das aventuras do Prı́ncipe Genji, e o drama
lı́rico baseado nele. A amiga da lua no verã o é a prı́mula noturna, cujo
nome japonê s é tsukimiso, ou "a grama que olha para a lua". A taboa e
outras plantas semelhantes sã o comparadas à s lanças das rã s, aos
narizes dos tengus etc., e pinturas divertidas dessas ervas e desses
animais sã o comuns na arte japonesa, embora nã o haja histó rias
especiais sobre eles.
Mas a lor mais real do verã o é a lor de ló tus,
originalmente introduzida da India pelo budismo e sempre associada
ao ideal budista de pureza e perfeiçã o. E o sı́mbolo da pureza porque a
planta surge das á guas viscosas e, no entanto, nem o caule, nem as
folhas, nem as lores apresentam qualquer mancha. A lor de ló tus
incorpora o ideal de perfeiçã o, porque seu fruto amadurece quando a
lor se abre, simbolizando assim a singularidade das instruçõ es e do
conhecimento do budista. O paraı́so do budismo aparentemente tem
uma jangada cheia de ambrosia, onde o ló tus de vá rias cores e
fragrâ ncias celestiais cresce e loresce. Portanto, em todos os templos
budistas existe uma jangada com ló tus. As lendas també m a irmam que
lores de ló tus crescem nos tú mulos de budistas devotos. Portanto, a
lor de ló tus é o emblema do budismo e é amplamente utilizada na
decoraçã o de templos e pinturas budistas. Budas e santos budistas sã o
sempre vistos sentados em uma lor de ló tus com pé talas. A alma do
falecido budista é carregada para o alto e, nos cemité rios, a laje do
enterro frequentemente repousa sobre um ló tus esculpido na pedra.
A chegada do outono é indicada pelo aparecimento das "sete ervas",
que sã o: kikyo (Platycodon grandi lorum), uma espé cie de
campâ nula; o ominameshi, "a lor feminina", já mencionada; o fuji-
bakama (Eupatorium sinensis); glicina; o waremoko, uma lor
semelhante a um pequeno junco; o karukaya ou miscanthus, també m
mencionado; e o hagi (Lespecleza bicolor), um arbusto. Todos eles estã o
sempre associados a insetos cantores, e as pessoas vã o ao campo
admirar aquelas lores silvestres e ao mesmo tempo ouvir o lamento
dos insetos musicais. O miscanthus é a festa da lua das lores lle na do
nono mê s lunar, quando os doces sã o oferecidos a O-Tsuki sama ou
"Senhor da Lua".
Em outubro e novembro, o crisâ ntemo e o bordo dominam. Branco
e amarelo das bê nçã os crisâ ntemo envio selvagens da fonte da
juventude, onde resi de Kiku-Jido, ou "Crisâ ntemo jovens". Suas pé talas
e folhas sã o mergulhadas na cerveja de saquê que confere as bê nçã os
da saú de e longevidade à humanidade.
As lores domesticadas e multicoloridas do crisâ ntemo tê m vá rios
nomes relacionados a vá rias iguras poé ticas e personagens
lendá rios. O conto da "Primavera do Jovem Crisâ ntemo" e do rio que
dela lui fornece o tema de uma festa chamada "Festa do Rio
Sinuoso". Cada rio sinuoso tem sua origem em
um amplo jardim plantado com crisâ ntemos. Os homens e mulheres
que sabem versar sentam-se à s margens do rio. Minú sculos vasos de
madeira, lacados a vermelho e planos, sã o colocados onde corre a á gua
da nascente, que desce a corrente do rio. Em cada um deles há um
pedaço de papel com um tema poé tico escrito nele. Cada uma das
pessoas sentadas nas margens pega um dos copos, dá um gole no
saquê e compõ e um poema sobre o assunto que extraı́ram do copo. A
festa é um curso loral e ao mesmo tempo simboliza uma comunhã o na
ambrosia da primavera do crisâ ntemo ou da eterna juventude.
As folhas do bordo, embora nã o sejam lores, sã o consideradas
aparentadas com eles. Na poesia e na pintura, a cor carmesim do bordo
está associada ao choramingo melancó lico do cervo, pois esse animal
pode ser ouvido quando as folhas começam a icar vermelhas. As vezes,
o bordo també m é associado na poesia ao luar brilhante em uma noite
de outono; há , por exemplo, um poema no Kokin-shu, uma antologia
do sé culo IX, que diz:

O luar gelado, frio e branco,


É tão claro que permite que você veja
cada folha de bordo caindo da árvore,
para tecer um tapete perfeito,
no silêncio da noite outonal.[97]

O poema da á rvore katsura da lua, já mencionado, també m liga a


lua ao bordo na imaginaçã o do artista, mas essa associaçã o é muito
menos popular do que a do bordo ao veado.
Isso fecha o "Calendá rio Floral" do ano. Vá rios frutos que
amadurecem na ponte de inverno preenchem o abismo entre o outono
e a primavera seguinte.

Visto que estamos lidando com contos e lendas sobre plantas e


animais, devemos dizer algumas palavras sobre a herá ldica
japonesa. Todas as famı́lias no Japã o, por mais pobres que sejam, tê m o
brasã o de sua famı́lia. Esse uso generalizado de escudos tinha
s ou origem nos desenhos pintados nas bandeiras e outros itens
militares e data da é poca de guerras feudais que durou do sé culo XIV
ao XVI. O crisâ ntemo, emblema da famı́lia imperial, já estava em uso no
inı́cio do sé culo IX; e a borboleta do Taira e do sasarindo, as folhas e
lores do bambu, do Minamoto, provavelmente foram adotadas no
sé culo XII.
E um fato signi icativo que a herá ldica japonesa use muito
pequenos animais e, sim, em vez disso, lores. Estes sã o desenhados
com linhas simples, enquanto desenhos complicados como os vistos
em armaduras europeias sã o muito raros. Existem poucos contos e
relatos que tratam da escolha de brasõ es em particular; Uma famı́lia,
no entanto, que mostra o corte de um pepino, a irma que seus
membros eram originalmente adoradores de um certo deus, o gê nio do
pepino, que os tomou sob sua proteçã o quando consentiram em nã o
comer o fruto de sua planta.




Capítulo IX

HISTÓRIAS DE ENSINO,
HUMOR E SATIRAS

1. A ADAPTAÇAO DE HISTORIAS PARA FINS DE


ENSINO

Quase qualquer histó ria pode ter um propó sito didá tico se o fabulista
for habilidoso, mas, para isso, as histó rias de animais sã o mais e
melhores do que outras. No Japã o, lendas e contos de animais
agradecidos sã o usados especi icamente, uma vez que os japoneses
sempre enfatizam a virtude da gratidã o em primeiro lugar. Sem dú vida,
muitas histó rias desse tipo foram originalmente inventadas para
instilar liçõ es morais, contrastando a inteligê ncia ou astú cia dos
animais com a loucura ou estupidez da humanidade, e o ser humano
ica perplexo porque permite que sua razã o e sua moralidade sejam
superadas pela paixã o ou apetite, e mais frequentemente pelo pecado
da ganâ ncia, como, por exemplo, ica claro pela mulher perversa na
histó ria "O pardal com a lı́ngua cortada", e pelo homem que Escava um
tesouro no caso da raposa vingadora.
Muitos contos tradicionais foram aceitos para ins morais ou
religiosos pelos monges budistas. Gostavam especialmente de histó rias
româ nticas, como as de Komachi ou do Prı́ncipe Genji, para ensinar a
natureza fugaz da beleza fı́sica e o triste carma do amor
româ ntico. Eles també m encontraram muitos meios de pintar os
tormentos causados pelo ó dio, raiva, arrogâ ncia e outras paixõ es
semelhantes em histó rias como as dos tengus, que eram reencarnaçõ es
de guerreiros derrotados, ou do demô nio miserá vel que nã o estava
satisfeito com a vingança. Apesar de desabafar sua animosidade contra
geraçã o apó s geraçã o entre os descendentes de seu inimigo.

Uma das histó rias que certamente foram inventadas para dar uma
liçã o moral é a de "O caçador e os macaquinhos".
Era uma vez um caçador que matou um macaco. Ele o levou para
casa e o pendurou no teto bem em frente à lareira. A noite, ele foi
acordado pelo som de pé s chutando. Ele se sentou na cama e olhou em
volta. De repente, à luz do fogo que se apagava, avistou vá rios
macaquinhos se aquecendo em frente à lareira, e logo em seguida, um
apó s o outro, tentou aquecer o corpo já congelado do macaco
pendurado, abraçando-o. Eles eram, ele achava que entendia, os ilhos
do macaco morto, e seu coraçã o icou tã o profundamente tocado que
ele nunca mais saiu para caçar e buscou outros meios de ganhar a vida.
Um aviso contra a preguiça é encontrado na histó ria de Chin-
chin Ko-bakama ou "The Toothpick Pixies". [98] Era uma vez uma
senhora que nã o fazia nada por si mesma, mandava tudo aos seus
criados. Por outro lado, ele tinha o estranho há bito de esconder todos
os palitos que usava entre os tapetes. Uma noite, enquanto ela dormia
sozinha, ela ouviu um barulho muito perto de seu travesseiro e viu
homenzinhos vestidos com um kamishimo (uma espé cie de
vestimenta com ombreiras quadradas e uma saia
larga, hakama) dançando e cantando ao lado da cama. Seu sono foi
perturbado de forma semelhante em vá rias noites sucessivas. Quando
o marido dela, que estava viajando, voltou para casa alguns dias
depois, ela contou como havia sido perturbada. O marido estava de
guarda naquela noite e quando os goblins apareceram, ele
desembainhou a espada. No momento, todos eles caı́ram sem vida e, ai
de mim! eram apenas palitos de dente usados que a senhora
costumava esconder.
Um conto de ensino mais profundamente signi icativo é a
conhecida histó ria de "O cego que encontrou um elefante", que tenta
demonstrar a loucura das disputas de seita e o perigo de tomar meias-
verdades como verdades absolutas. A histó ria é de origem indiana e
frequentemente contada por professores budistas. Em uma ocasiã o,
vá rios cegos estavam discutindo como era a aparê ncia de um
elefante. Discordando, eles decidiram testar a precisã o de suas
respectivas descriçõ es com um exame em primeira mã o de um elefante
real. Conseqü entemente, eles foram onde nã o havia ningué m e cada
um apalpou o grande animal com as mã os. O primeiro cego apalpou
uma das enormes pernas do proboscidiano e disse que o elefante era
como o tronco de uma á rvore gigante; outro apalpou a tromba e
garantiu que um elefante parecia uma cobra; o terceiro subiu nas
costas do elefante e anunciou que este animal era como uma colina; o
quarto agarrou a cauda e insistiu que um elefante era como um hossu,
um espanador feito de cabelo. A experiê ncia desses cegos nos ensina
que as grandes verdades da existê ncia có smica nunca podem ser
compreendidas por aqueles que as abordam de um ú nico ponto de
vista.
2. A HISTORIA DE BONTENKOKU
Em alguns casos, o propó sito didá tico foi combinado com um vô o
lorido da fantasia. Essa é a histó ria de " Bontenkoku, ou o Reino de
Brahma", que provavelmente data do sé culo XVI. E um dos contos de
fadas mais elaborados do Japã o.
Era uma vez um jovem prı́ncipe de alto escalã o da corte
imperial. Apó s a morte de seus pais, o prı́ncipe dedicou sua mú sica ao
bem-estar espiritual dos mortos,[99] tocando uma lauta famosa
herdada de sua famı́lia. Assim ele passou sete dias, e no oitavo dia,
enquanto ele estava sentado tocando lauta, um banco de nuvens de
uma iridescê ncia roxa apareceu no cé u. As nuvens se aproximavam, e
entre elas o prı́ncipe viu um ser celestial cujo porte era de grande
dignidade, sentado em uma carruagem dourada e auxiliado por belas
iguras angelicais. Este resplandecente sendo dito ao prı́ncipe:
"Eu sou Brahma, o Senhor dos Altos Cé us." A melodia de sua lauta
comoveu todo o meu reino e aprovamos sua piedade ilial e sua
devoçã o religiosa. Eu quero que você se case com minha ú nica ilha; se
você consentir, deve esperar por ela esta noite, quando a lua nascer um
pouco antes da meia-noite.
O prı́ncipe mal podia acreditar na realidade da visã o, mas ao
anoitecer ele arrumou tudo para receber sua noiva celestial, entã o
sentou-se para tocar lauta. De repente, o cé u foi iluminado pela luz
da lua, permitindo ver o banco de nuvens roxas descendo de cima. O ar
estava repleto de perfumes deliciosos, e entre as nuvens estava uma
princesa maravilhosa e encantada. A cerimô nia de casamento foi
realizada com o acompanhamento de uma misteriosa mú sica
celestial. Muito em breve aquele casamento milagroso foi conhecido, e
també m a beleza será ica da noiva que muitos homens a desejavam. O
pró prio imperador invejou o destino do prı́ncipe e decidiu se livrar
dele e tomar a princesa para si. Para fazer isso, ele ordenou ao prı́ncipe
que realizasse vá rios feitos impossı́veis de realizar. Um dia ele disse:
—Como você é genro do Senhor celestial, certamente você pode me
mostrar a dança do pavã o no cé u ao acompanhamento musical de um
rouxinol celestial (kalivinka). Caso contrá rio, você terá que deixar este
paı́s, pois incorrerá em minha raiva.
O prı́ncipe icou incomodado com essa ordem e consultou sua
esposa a respeito. Para a ilha de Brahma foi uma coisa fá cil convocar
aqueles pá ssaros celestiais, que desceram à terra sob sua
invocaçã o. Todos foram enviados para Miyako, onde deliciaram a corte
imperial com a beleza de sua dança e mú sica.
Mais tarde, o imperador ordenou ao prı́ncipe que lhe trouxesse a
ilha do chefe ogro, um dos servos de Brahma. A mulher també m nã o
teve di iculdade em levar a jovem ao Palá cio Imperial, para divertir a
corte com suas roupas multicoloridas e suas estranhas danças. Mais
tarde, o imperador exigiu que os Thunderers fossem apresentados a
ele. Estes chegam no momento, convocados pela princesa. O grito deles
foi tã o terrı́vel que o imperador implorou que se calassem, mas eles
apenas obedeceram ao prı́ncipe, o marido da senhora celestial.
Destemido, o imperador ainda disse ao prı́ncipe:
"Suponho que você possa obter a assinatura de seu sogro junto com
seu selo celestial." Pegue-os para mim ou nã o vou permitir que você
continue morando no meu paı́s.
O prı́ncipe nã o teve escolha a nã o ser subir ao Alto Cé u e pedir ao
sogro sua assinatura e seu selo. Para isso, a princesa fada deu ao
marido um cavalo que o elevou ao cé u. Quando o jovem chegou ao
palá cio de Brahma, Brahma o recebeu com cortê s hospitalidade e o
tratou suntuosamente. Enquanto o prı́ncipe consumia o arroz celestial
que acabara de ser servido, sua atençã o foi atraı́da para uma criatura
de aparê ncia horrı́vel, abatida e faminta, trancada na sala ao
lado. Aquele monstro pediu ao prı́ncipe uma mordida de arroz, o que o
jovem compassivo fez. Assim que aquele ser comeu o arroz, ele rompeu
suas amarras, fugiu da cela e voou para o cé u.
O prı́ncipe, assustado, interessou-se pelo prisioneiro fugitivo e
soube assim que ele era o rei dos demô nios do Mar do Sul, que haviam
tentado prender a ilha de Brahma, por isso o mantiveram amarrado
sem lhe causar nenhum mal. comer. Mas agora, enquanto o arroz
celestial dava poderes milagrosos a quem o comia, o demô nio havia
recuperado sua força anterior e nã o se sabia se os guerreiros de
Brahma poderiam dominá -lo novamente. O caso todo foi
extremamente infeliz, embora parecesse nã o ter mais alteraçõ es, entã o
Brahma deu ao prı́ncipe sua assinatura e seu selo. O jovem correu para
a terra, onde descobriu que o rei demô nio havia levado sua amada
princesa. A partir de entã o, o marido problemá tico orou
continuamente, com lá grimas nos olhos, a Kwannon, a deusa da
piedade, para que sua esposa fosse devolvida a ele. Uma noite,
enquanto ele estava orando no templo de Kwannon, a deusa apareceu
para ele em uma visã o e disse-lhe como ele poderia encontrar o lugar
onde sua esposa estava presa. Seguindo as instruçõ es da deusa, o
prı́ncipe zarpou para o sul.
Depois de navegar milhares e milhares de lé guas, seu barco pousou
em uma praia rochosa. O prı́ncipe desembarcou e começou a tocar sua
lauta. Vá rios demô nios de pele escura foram atraı́dos pelo doce som,
achando a mú sica tã o encantadora que lhe disseram onde a princesa
estava sendo mantida em cativeiro. O prı́ncipe foi lá e ao chegar ao
palá cio fez saber à sua esposa a sua presença atravé s da lauta, ao que
ela respondeu tocando em harmonia com ele, na sua pró pria lauta. O
rei dos demô nios fora chamado para longe dali, saindo em sua
carruagem que podia viajar até trê s mil lé guas em um dia. Os guardas
que guardavam a princesa icaram tã o atraı́dos pela mú sica que nã o
ofereceram oposiçã o quando o prı́ncipe conduziu a princesa para outra
carruagem que o rei demô nio ainda tinha em sua garagem. A
carruagem partiu, mas só podia viajar duas mil lé guas por dia.
Quando os guardas acordaram de seu encantamento e viram que a
princesa havia desaparecido, eles tocaram seus tambores, que
ressoaram por todo o reino dos demô nios, cujo rei, ouvindo aquele
barulho, correu de volta, soube o que havia acabado de acontecer e
correu instantaneamente em busca do casal. Sua carruagem nã o
perdeu tempo em pegar o outro e certamente ele teria agarrado os
prı́ncipes, liberando sua fú ria sobre eles, se os pá ssaros celestiais
nã o tivessem aparecido de repente, levando todos os demô nios para o
fundo de seu submundo. Desta forma, o casal principesco conseguiu se
salvar e voltar para casa.
Diz-se que o prı́ncipe e a princesa sã o o deus e a deusa adorados
na Capela Ama-no-Hashidate e que protegem a humanidade contra as
artimanhas dos demô nios.

3. HUMOR E SATIRA
Na maioria das histó rias de ensino, as coisas mais importantes sã o
enfatizadas pelo exagero dos resultados do mal ou da tolice
humana. Esses exageros costumam ser humorı́sticos ou satı́ricos, e
mesmo à s vezes essas histó rias acabam sendo nada mais do que meros
contos de humor ou humor satı́rico. A histó ria do
Sennin caı́do de Kumé é mais humorı́stica do que seriamente
didá tica, especialmente quando descobrimos que o Sennin se casou
com a mulher que o fez perder seus poderes Sennin. Na histó ria da
Kaguya-hime, estratagemas e invençõ es dos pretendentes a senhora, a
im de fazer as coisas ou deturpar a H ada Lua pede-lhes como
uma condiçã o para o consentimento para o casamento, eles sã o muito
divertidos.
Os motivos humorı́sticos e satı́ricos que encontramos em muitas
lendas e contos foram usados livremente pelos escritores das farsas
conhecidas como K yogen, representadas nas obras Nã o. Daremos
aqui alguns exemplos, e assim, a farsa chamada Zazen ou "Meditaçã o",
[100] tem este argumento:
Um homem queria ver sua amante, mas para isso ele tinha que trair
sua esposa ciumenta. Entã o ela disse a ele que iria se sentar um dia e
uma noite em " Zazen ", um estado de meditaçã o tranquila, e que
durante esse tempo ningué m, nem mesmo ela, deveria entrar em seu
quarto. Mas temendo que sua esposa ainda entrasse, ele ordenou
que seu servo se sentasse em seu lugar e se cobrisse completamente
com um pano muito grande. Em seguida, foi visitar sua amante,
con iando que tudo sairia de acordo com seus desejos. Mas a esposa
estava descon iada demais para icar tanto tempo fora da sala. Ele
abriu a porta e viu um homem sentado, com a cabeça coberta. Quando
ele falou com ela, o homem nã o respondeu, e a mulher, puxando o
pano, descobriu que o homem sentado era o servo e nã o seu
marido. Imediatamente, ele o empurrou e tomou seu lugar, cobrindo-se
exatamente como o servo. Quando na manhã seguinte o marido voltou
da casa da amante, sem suspeitar do que havia acontecido em sua
ausê ncia, contou ao suposto criado tudo o que havia feito com sua
amante. Assim que o agustus foi despachado, a esposa se viu
confrontada com o imenso choque do marido in iel.
Outro Kyogen é chamado de "Os Trê s Deformados". Um homem
rico, extremamente caridoso, anunciou que qualquer homem que fosse
deformado, ou que tivesse perdido a visã o ou a audiçã o, poderia vir à
sua mansã o, onde comeria e seria bem cuidado por toda a vida. Um
vagabundo que tinha apostado toda a sua pequena fortuna, foi
reclamar a caridade do rico, sendo recebido com hospitalidade
ingindo ser cego. O pró ximo a aparecer foi amigo do primeiro
impostor e ingiu ser surdo, e o terceiro passou por aleijado. O caridoso
senhor os acolheu a todos com solicitude, cuidando deles com todo o
carinho. Um dia ele teve que sair de casa e designou os trê s homens
deformados para cuidar da adega onde o vinho, sedas e outros artigos
valiosos eram armazenados. Quando ele se foi, os trê s patifes tiraram
os disfarces e derramaram no vinho, dando-se um verdadeiro
banquete, cantando e dançando. Eles estavam tã o entusiasmados que
até esqueceram que seu benfeitor poderia voltar repentinamente. E de
fato, ele apareceu no meio da festa, encontrando o surdo cantando, o
aleijado dançando e o cego assistindo a dança e mantendo o ritmo com
as mã os. Quando os trê s impostores viram seu protetor diante deles,
tentaram apressadamente adotar seus respectivos disfarces, mas já era
tarde e foram expulsos de casa.
Uma terceira farsa foi intitulada "Vinho da Tia". Um jovem
dissipado sabia que sua tia tinha uma certa quantidade de saquê e
pediu a ela um copo. A tia recusou porque sabia que para o sobrinho
uma bebida signi icava uma sucessã o interminá vel de bebidas. Quando
o jovem percebeu que pela persuasã o nã o conseguiria nada, decidiu
obter a bebida assustando a mulher. Para isso, ele pegou uma má scara
do diabo e, assim, apareceu para ele disfarçado. A tia apavorada
implorou ao chamado demô nio para levar todos os seus suprimentos,
mas deixá -la viva. O jovem imediatamente começou a beber sem tirar a
má scara e à medida que icava mais bê bado a cada bebida, começava a
fazer tantas caretas e contorçõ es que a má scara escorregava. Ao
perceber, colocou-o sobre uma orelha, virando aquele lado do rosto
para a tia, mas ela descon iou do truque, olhou para o diabo e
descobriu o engano. Naturalmente, ele nã o perdeu tempo em expulsar
o sobrinho bê bado de casa.
4. UM TEMPO DE DESCONTENTAMENTO E SATIRA
Houve um tempo especı́ ico em que a sá tira prevaleceu na literatura
japonesa. Abrange a segunda parte do sé culo XVIII e os primeiros anos
do sé culo XIX. Naquela é poca, o governo implementou a censura
literá ria e emitiu vá rias regras suntuá rias, muito irritantes. As
histó rias, contos e romances da é poca sã o obviamente morais e quase
nã o tê m valor literá rio. Mas logo houve uma reaçã o popular, e entã o
houve outro perı́odo de excessiva liberdade de expressã o. Muitos
escritores se refugiaram nele, escondendo um propó sito satı́rico sob
uma seriedade ingida, ou escreveram sarcasmos contra o regime de
forma velada. Apenas nesta classe de obras existe um certo vigor e
originalidade. As produçõ es normais sã o sem vida e tediosas, cheias de
convençã o e literatura arti icial. Entre as obras imaginativas desse
perı́odo, as mais populares foram dois livros de viagens imaginá rias,
cujo autor foi Bakin, o maior escritor do Japã o. Trata-se de Wa SO-Byo-
ye, ou o "Andanças" do japonê s Chuang-Tse, sendo Chuang o taoı́sta
chinê s que sonhava em ter se tornado uma borboleta, e duvidava que
ele tinha transformado em uma borboleta ou uma borboleta tinha
transformado em Chuang; e Muso-Byoye ou "O Homem do
Sonho Visioná rio". O japonê s Chuang-Tse residia em Nagasaki. Certa
vez, ele estava pescando de um barco quando começou a soprar um
forte vendaval e o barco saiu para o mar, sem que ele soubesse para
onde estava indo ou para onde estava. Assim, ele veio para a Terra
da Imortalidade, onde nã o há doenças ou mortes. Todos os seus
habitantes estã o mais do que fartos da vida e rezam constantemente a
Deus para que a morte os prive da vida, ou pelo menos da saú de, mas
tudo é em vã o. O mesmo Wa-Entã o, depois de viver ali ci erto tempo,
ele també m quis morrer, porque a morte é tudo o que se pode
desejar. Assim, ele tentou cometer suicı́dio se atirando de um alto
penhasco, mas seu corpo caiu no chã o tã o suavemente que ele saiu
ileso do transe. Depois, ele tentou se afogar, mas teimosamente lutuou
até a superfı́cie da á gua. Sua ú nica saı́da era fugir para outro reino, o
que ele inalmente conseguiu fazer na garupa de um guindaste.
Isso o levou à Terra da Opulê ncia. Lá o povo ansiava por ser pobre, a
ponto de adorar o deus da Pobreza, enquanto a Riqueza era a
divindade temida. Entã o a garça levou Wa-So para a Terra da Vaidade,
depois para a Terra das Antiguidades, o paı́s cujos habitantes nunca
consentem com a menor mudança, depois para a Terra da Lascı́via e
inalmente para a Terra dos Gigantes. Um deles pegou Wa-So para
examiná -lo e, quando o soltou, voltou para sua casa em Nagasaki. No
esforço de descrever os costumes singulares dos habitantes
desses paı́ses imaginá rios, Bakin soube pintar com grande humor
satı́rico as peculiaridades da vida social de sua é poca.
Na continuaçã o deste livro, Wa-So se cansa de sua vida domé stica e
volta à s suas andanças. Ele vai para o mar e uma tartaruga aparece e
ele a leva em novas aventuras. O primeiro lugar que você leva é a Terra
da Pureza, onde os japoneses acabam se entediando com tanta
limpeza e ordem. Ele escapa de lá e em cima da tartaruga chega à Terra
das Pernas Longas e dos Muito Armados. Lá , os estranhos colonos
nunca pensaram em reduzir suas deformidades por meio
de casamentos mistos, mas Wa-So os induz a fazê -lo. Antes de ter a
oportunidade de ver o resultado deste mé todo, Wa-So tem que
percorrer alguns des iladeiros montanhosos e diversas selvas em
direçã o à Terra da Misé ria; e entã o atravé s de vastos prados sombrios
para a Terra da Audá cia. Outras regiõ es visitadas por ele sã o a Terra do
Ouro e Jó ias e a Terra dos Bá rbaros com Cabelo Comprido e
Orelhas Grandes. Por im, até a Ilha das Mulheres.[101] Ali Wa-So é
calorosamente recebido pelas mulheres que povoam a ilha, pois quase
enlouquecem com a ideia de poder ver e abraçar um ser
masculino. Wa-So é , portanto, o convidado de honra da corte da
Rainha, mas descobre que está em condiçã o de prisioneiro e apressa-
se em tentar fugir. Ao acordar, percebe que suas aventuras nã o
passaram de um sonho.
Muso Byoye, "O Homem dos Sonhos Visioná rios", é guiado em suas
viagens por Urashima, o antigo heró i que era namorado da Princesa
Dragã o. Urashima deu a Muso sua vara e linha de bambu, e Muso fez
uma pipa com elas, com a qual voou pelo ar. O primeiro lugar que visita
é a Terra das Crianças, onde Pai, Mã e e Enfermeira sã o divindades
representadas por imagens, e onde as pessoas nã o fazem nada alé m de
brincar, brigar e chorar. A pipa entã o o leva para a Terra da
Luxú ria. Enquanto Muso é dominado pela luxú ria desavergonhada do
povo, ele perde a pipa e o jovem nã o sabe como pode continuar sua
jornada. Entã o, ele conhece Urashima, que vive como um eremita entre
o povo obsceno, que dá a Muso um barco para ir para a Terra da Bebida
Perpé tua. Mas nã o demora muito para se juntar aos grupos de
bebedores, mas no meio da farra uma enorme á guia o agarra, que o
leva para a Terra da Ganâ ncia. Lá ele reencontra a pipa e nela viaja para
a Terra dos Mentirosos, para a Terra das Paixõ es Nunca Satisfeitas e,
por im, para a Terra das Delı́cias. O rei deste reino é mais uma
vez Urashima e quando Muso já saciou sua sede de prazeres em uma
regiã o tã o feliz, graças a Urashima ele retorna para sua casa no Japã o.


APÊNDICE
O FOLCLORE JAPONES EM CANÇOES TRADICIONAIS

O Japã o tem uma rica fonte de cançõ es tradicionais, desde as mais


antigas do sé culo 8 até aquelas que só foram coletadas depois que as
barreiras feudais foram quebradas no sé culo passado. Como sã o de
fato produto do sentimento e da imaginaçã o do povo, contê m
freqü entes alusõ es à s tradiçõ es populares, mas sua linguagem costuma
ser tã o obscura que só é possı́vel adivinhar a qual lenda
se referem. Alé m disso, jogos de palavras e charadas també m sã o muito
frequentes, e o resultado é que muito poucas mú sicas podem ser
traduzidas corretamente para o espanhol.
Algumas cançõ es populares sã o improvisaçõ es lı́ricas, embora a
maioria seja uma expressã o tradicional do sentimento popular em
vá rias ocasiõ es de festivais sociais ou comunitá rios. Essas festas sã o o
plantio do arroz e sua colheita, quando as pessoas trabalham juntas
nos campos ou se reú nem na capela local para dar graças; també m a
reuniã o dos aldeõ es para erguer um poste para uma nova casa (a
cerimô nia correspondente ao lançamento da primeira pedra entre os
povos do Ocidente); as procissõ es de peregrinos para Ise ou outros
santuá rios, e a celebraçã o de seu retorno; danças ao ar livre nas noites
de verã o, chamadas de danças Bon, nas quais se reú nem todos os
habitantes de uma cidade; a celebraçã o da Tana-baca, quando as moças
marcham em procissã o, ou as procissõ es dos meninos no dia
de Ano Novo. Alé m das cançõ es cantadas nessas ocasiõ es pú blicas, há
muitas outras, como cançõ es de ninar, cançõ es juvenis de meninos em
busca e captura de insetos, cançõ es infantis quando descobrem a
primeira estrela brilhando à noite, cançõ es de cocheiros, palanquins e
em breve.
Muitas dessas cançõ es sã o conhecidas em todo o Japã o, com
pequenas variaçõ es nas letras e melodias. Embora tais variaçõ es
di icilmente sejam importantes, podemos, comparando-as entre si,
obter mais conhecimento da importâ ncia das cançõ es, aprender com
elas algo sobre as diferentes condiçõ es e sentimentos que prevalecem
em diferentes á reas do paı́s.
Outra coisa a se notar é que muitas cançõ es populares tocadas hoje
nã o mudaram virtualmente em centenas de anos. Assim, há cançõ es
que datam do sé culo XVII ou XVIII, mas podem ser facilmente
detectadas em razã o do acabamento literá rio superior concedido pelos
literatos da pacı́ ica era Tokugawa. Um exemplo desse tipo é
apresentado posteriormente em "The Rats 'Complaint".
O primeiro exemplo que transcrevemos é uma cançã o de
felicitaçõ es por ocasiã o da construçã o de uma casa, na qual estã o
inseridas quase todas as iguras alegres do folclore japonê s:

A vida do guindaste por mil anos,


miríades de anos, a tartaruga.
Nove mil homens primitivos do Oriente (Tobo-saku)
oito mil o menino pescador de Urashima.
Uma centena e seis anos ela viveu o geral Osuke Miura.
Viva, viva, porque todos esses anos somados dão
vinte e oito mil cento e seis anos de prosperidade.
Navegando mil cento e seis anos de prosperidade.
Navegando aqui vem o Navio do Tesouro,
com suas velas de brocado e cetim, com cortinas roxas.
Nele estão as Sete Divindades da boa sorte,
festejando feliz, trocando copos de saquê,
Traga muita sorte para a casa!

Outra versã o da mesma mú sica é o seguinte:


Um guindaste e uma tartaruga vivem na casa,
e brincar ao lado do pinheiro,[102] e o pinho e o bambu prosperam
para sempre!
Noite passada eu tive um sonho feliz
feliz, feliz, oh sim, muito feliz:
Eu vi a lua, a lua, no travesseiro em que descansei minha cabeça,
abraçando o sol nascente,
e beber a ambrosia do saquê de uma taça de ouro.

Estamos na primavera, no terceiro mês,
Daikoku aparece antes, seguido por Ebisu,
e então vêm miríades de navios carregados de tesouros.

Em seguida, vem uma das cançõ es da é poca de semeadura


exaltando Ta-no-kami, o Campo de Ouro. Nesta cançã o, Ta-no-kami é
concebido como uma criança prestes a nascer, e as alusõ es a ele
mostram que ele é semelhante a um pequeno prı́ncipe nobre:

Na Índia, vou yaré ![103]
Na Pradaria dos Altos Céus, eu vou yaré !
Lá vive um deus, o pai de Ta-no-kami-sama.[104]
Na Índia, vou yaré !

Na jangada onde cresce o junco, sim!
Lá vive uma deusa, a mãe de Ta-no-kami-sama..
Ta-não-kami-s amores, I Yaré !
Em que mês você foi concebido? Yaré !
Entre o primeiro e o terceiro!
Ta-no-kami sama., I Yaré !
Em que mês vai nascer?
Em menos de dez meses!

Ta-no-kami sama, I Yaré !
Quem é sua enfermeira? Yaré !
A jovem princesa do Palácio do Dragão!

Ta-no-kami-sama, yaré !
Como icará o vestido do bebê? Yaré !
Medido sete vezes e cortado na hora, yaré .

Ta-no-kami-sama, yaré !
Onde está a fonte de onde tirarão água para banhá-lo?
Na Pedra Virgem de Yamashiro!

Ta-no-kami-sama., Yaré !
Quem vai trazer água para banhá-lo?
O Jovem Senhor de Kamakura![105]

Ta-no-kami-sama, yaré !
Qual será a cor do vestido do bebê? Yaré !
Roxo estampado alegre! Yaré !

Ta-no-kami-Sam um, Yare!
Que insígnia terá o vestido do bebê, yaré ?
Duas penas de falcão dentro de um pentágono, yaré !
Ta-no-kam i-sama, yaré !
Onde ele vai nascer bem, yaré ?
No prado de Mishima, yaré ![106]

Outra cançã o de semeadura di icilmente alude a mitos e tem um


cará ter mais lı́rico:
Plante arroz nos campos,
em nossos amados campos;
Plante, plante até a lua e as estrelas brilharem!
Eu icaria feliz em plantar arroz nos campos,
até a estrela da manhã brilhar e além...
se os campos fossem amados por mim.

Outra mú sica diz:


Cai, a chuva cai, mas no inal clareia...
Quando meu coração também icará claro?

Isso se refere ao fato de que a semeadura deve ocorrer no perı́odo
das chuvas, em junho, e o canto é mais um canto de amor do que um
canto de semeadura.
Uma mú sica se refere à coleta de folhas de chá :

Pegue, pegue as folhas de chá em sua colheita!


Quantos você pegou na colheita do chá?
Mil folhas que você coletou na colheita do chá!
Mil, tomados e acumulados um a um; até o pico de Fuji é feito de
grãos e terra.
Não se canse, nunca se canse de apanhar folhas, apanhe-as, apanhe-
as aos punhados.
Esta pequena letra é frequentemente cantada quando o
trigo debulha:
Brisa suave, brisa suave, você traz uma mensagem da minha casa?
Brisa suave, se você falar, qual é a mensagem da minha casa?

A mú sica a seguir deve ser cantada apenas no berço. No entanto, é


um dos mais atraentes:

Durma, garotinho, durma em mim!


Nas montanhas íngremes
os ilhinhos da lebre se perdem.
Por que suas orelhas castanhas macias são tão longas e inas
se projetando sobre as pedras quando eles jogam?

Porque sua mãe, antes de seus ilhos nascerem,
Comeu folhas do próprio com o rio da manhã,
e a planta de bambu, longa e delgada...
É por isso que as orelhas das lebres pequenas são longas...
Durma garotinho, durma com a canção de ninar da minha música...

Já falamos sobre a festa Tana-bata e citamos um poema que


costuma ser recitado ali; numerosas cançõ es també m sã o cantadas
nesta festa. Um deles diz:

No sétimo dia deste mês de verão,


Tana-bata, o pastor, anseia por ver sua esposa
através do rio do céu.

Mas, se estiver chovendo, oh, pobre amante,
Como você vai atravessar o rio?

Outra cançã o refere-se à crença de que é possı́vel conseguir uma


boa caligra ia se o festival de Tana-bata for celebrado com consciê ncia:

Oh querida Tana-bata sama!


Oh querida Tana-bata sama!
Deixe-me levantar as mãos![107]
Quatro papéis coloridos,
ios em cinco cores,
pendurar alto em hastes de bambu,
que são minhas humildes ofertas.
Uma cançã o de amor alude à Tana-bata:
Eu gostaria de ser uma estrela,
a estrela do Tana-bata!
As folhas vermelhas do bordo[108]
poderia formar a ponte do rio
e servir de passagem para o meu amor.
As itas coloridas poderiam amarrar meu desejo tão esperado
para o seu lindo coração.

A mú sica seguinte é baseada na superstiçã o de ver uma estrela


atirada em sua direçã o, o que é um pressá gio de boa sorte.

A brilhante estrela da tarde


brilha no céu entre meteoritos.
Pela manhã eles são claros
os rastros das nuvens brancas;
Deixe as pequenas estrelas douradas descerem até mim
entre os mais esplêndidos do céu.

Terminaremos com uma curta cançã o usada na dança Bon. Chama-


se "A queixa dos ratos".

Ouve as queixas lamentosas dos ratos!


Ah, como invejamos a boa sorte do gato!
É possível que em uma vida futura nasçamos como gatos?
Que sorte feliz os gatos têm!
Porque são amados pelos homens e vivem com eles,
e alimentá-los com pedaços deliciosos.
Os gatos têm o privilégio de sentar-se sobre os joelhos dos nobres...
Que azar [karma] nos fez nascer ratos?
Por que devemos sofrer uma vida tão miserável?
Para onde estamos indo neste vasto mundo
gatos e doninhas nos ameaçam e nos prendem.
Às vezes, os gatos não podem caçar
mas doninhas e cobras nunca falham...
Claro que existe um paraíso para nós,
uma noite de verão quando há muito arroz e grãos...
Mas quando chega o inverno, quando a comida é escassa,
Só podemos roer lascas e pedaços para roer...
Trazemos algumas oferendas a Buda (em excrementos),
No entanto, costumamos roubar coisas de você e oferecê-las a você.
Estamos destinados a um futuro triste
desde então, infelizmente! não pode ser de outra forma.
Seríamos muito mais afortunados se, pelo menos,
teríamos nascido ratos brancos!

BIBLIOGRAFIA

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Sobre o autor

Masaharu Anesaki (1873-1949), també m conhecido sob o pseudô nimo
de " Chofu Anesaki " foi um estudioso intelectual e japonê s,
fundamental no perı́odo do Meiji.
Anesaki é considerado o pai dos estudos religiosos no Japã o, mas
també m escreveu sobre uma ampla variedade de assuntos, incluindo
cultura, literatura e polı́tica. Ele també m foi membro da Comissã o
Internacional de Cooperaçã o Intelectual da Liga das Naçõ es.
Depois de estudar Filoso ia na Universidade Imperial de Tó quio, passou
trê s anos na Europa (1900-1903) com o apoio parcial de Albert Kahn, o
ilantropo francê s. Durante esse tempo, ele estudou com Deu ssen,
Hermann Oldenberg, Gerbe e Albrecht Weber na Alemanha, bem como
Thomas William Rhys Davids na Inglaterra.
Ele passou dois anos (1913-1915) como professor visitante na
Universidade de Harvard, lecionando sobre literatura japonesa e a
vida. As notas de aula desse perı́odo foram expandidas e revisadas e
mais tarde formaram a base para o livro Histó ria da Religiã o Japonesa.
Ele era um budista devoto e seu livro mais conhecido, o Nichiren, trata
desse assunto. Ele també m publicou tı́tulos como "Como o cristianismo
atrai um budista japonê s" (Hibbert Journal, 1905). Ele
traduziu Die Welt als Wille und Vorstellung de Schopenhauer para o
japonê s e foi essencial para a compreensã o mú tua do budismo e da
iloso ia ocidental.

[1] Conhecido em espanhol como Cantar de Heike, é um poema é pico clá ssico da literatura
japonesa, fonte de inú meras lendas, personagens e histó rias que nele se originam. Ele narra o
surgimento da classe guerreira do samurai e sua violenta irrupçã o na polı́tica do paı́s, evocando
també m com saudade a vida cortê s e elegante da capital. Do ponto de vista histó rico, é o relato
literá rio do im de uma era, o perı́odo Heian (792-1185), e do inı́cio de outra, a dos clã s
militares, que durará até a entrada do Japã o no mundo moderno era, em 1868. (N. del T.)

[2] E baseado na semelhança de isionomia e linguagem. Na mitologia e folclore, os


coreanos tê m sido grandemente in luenciados pela China, e ainda seu parentesco com os
japoneses depois ganhou mais uma prova atravé s de uma cuidadosa pesquisa nesta á rea.

[3] Kojiki, p. 93 f. Nihogni, i 64 e segs.


[4] A etimologia da palavra Yamato é discutida. De acordo com a teoria mais comumente
aceita, signi ica "Saı́das da Montanha", porque a regiã o é cercada por montanhas por todos os
lados e se abre por muito poucas passagens para as regiõ es alé m da
cordilheira. Aparentemente, esta é uma interpretaçã o plausı́vel porque é a mais natural na
lı́ngua japonesa. Mas é estranho que o nome escrito em ideogramas chineses signi ique "grande
paz". No entanto, o ideograma signi ica "paz" parece ter sido usado simplesmente pelo nome
chinê s para o japonê s " wa ", que, designada por outra carta, parece ter signi icado "anã o". A
teoria de Chamberlain é que Yamato era Amu na origem e signi icava "Castanha e Jangada". Mas
isso é imprová vel se levarmos em conta o fato de que as lagoas, numerosas na regiã o, foram
obras posteriores de irrigaçã o.
[5] As duas compilaçõ es principais
foram: Kojiki, ou Records of Anciens Matters (compilado em 712), acessı́vel na traduçã o para o
inglê s por BH Chamberlain; e Nihondi, ou Chronichles of Japan (720), traduzido para o inglê s
por WC Aston.
[6] Ou Sinto. També m é correto chamá -lo de Xintoı́smo ou Sint Oism. Nossos crité rios serã o
usar Shinto e Shinto de forma intercambiá vel. (N. de T.)
[7] Ver TW Rhys Davids Buddhist Birth Stories ou Jataka Tales, Londres, 1880.
[8] E curioso que o mais importante contista moderno, Iwaya, seja conhecido pelas crianças
como "Tio Sazanami ". tornou-se escritor apó s uma longa luta contra a resistê ncia de seu pai,
que era um erudito confucionista.
[9] A intençã o do autor foi falar sobre as fontes originais para o tratamento deste tema e os
diferentes perı́odos de formaçã o da mitologia e do folclore japonê s, mas alguns pontos
relacionados a diferentes perı́odos e tocam em algumas questõ es particulare s.
[10] Kuni-toko-tachi, isto é : "Aquele que está perpetuamente sobre o mundo" ou Ameno-
minaka-nashi, ou "O Senhor do Centro do Cé u". E questionado se os dois eram uma e a mesma
ou duas divindades diferentes.
[11] Taka-mi-musubi e Kami-mi-masubi. Kami, a partir do sobrenome, é traduzido por
"divino" e signi ica "milagroso".
[12] Izana-gi e Izana-mi. Ser kimono masculino e minha mulher.
[13] Muitas vezes é interpretado como um arco-ı́ris.
[14] Aston e outros vê em um traço de falismo aqui. Cf. o mito hindu de Pra-manthyus.
[15] Pode ser interessante citar o paralelismo Ainu do casal primitivo. De acordo com
isso, o casal concordou em colaborar na construçã o da ilha de Yeso. O marido começou no lado
oriental e a esposa no lado ocidental. Enquanto a divindade masculina trabalhava duro na
parte oriental, a divindade feminina se divertia conversando com outras deusas e,
conseqü entemente, seu trabalho icava atrá s do de seu marido. Assim, quando ele terminou
sua tarefa, a deusa terminou a dela à s pressas, e é por isso que as costas ocidentais sã o
rochosas e ı́ngremes para eles, enquanto as orientais sã o mais baixas e menos recortadas.
[16] 14 O nome Yasu é frequentemente interpretado como "paz". Mas, de acordo com
outra interpretaçã o, signi ica “muitos bancos de areia” ou “ampla bacia hidrográ ica”. A base
natural do conceito pode ser a Via Lá ctea ou o Arco-ı́ris.
[17] O nome Uzume signi ica "bê nçã o", "maravilha". Normalmente era representada como
uma mulher com uma expressã o feliz, com um rosto redondo e achatado.
[18] Mais desta histó ria é discutido no Capı́tulo II.
[19] Falaremos de sua capela Kitsuki mais de uma vez. Cf. també m NL Schwartz, "O
Grande Santuá rio de Idzumo", TASJ, XLI, 1918.
[20] Existem vá rios nomes para este deus. Sã o, aparentemente, vá rias personalidades
combinadas em uma.
[21] Localizado na ilha de Awa, provavelmente se referindo à penı́nsula do canto
sudoeste do Japã o. "Terra da Eternidade" icava alé m da extensã o do Oceano Pacı́ ico.
[22] Mais tarde, veremos a relaçã o entre esta á rvore e a lua.
[23] O Dr. S. Kanazawa observou que a correspondê ncia desses produtos com as partes do
corpo é um jogo de palavras, nã o em japonê s, mas em coreano. Os paralelos em coreano sã o os
seguintes: morri de cabeça e no mar a cavalo; nunca para os olhos e nunca para o bicho-da-
seda; torta para barriga e torta para arroz; pochi para os ó rgã os genitais e pori para o
trigo; kui para ouvidos e kuiri para pâ nico; kho para nariz e khong para grã os
(Teikoku Bungaku, 1907, pp. 99 e seguintes). Isso parece apoiar a hipó tese de que a histó ria
veio da Coreia para o Japã o, ou que se originou antes da separaçã o dos dois povos.
[24] Uma Tatsuta-hime, a deusa do vento e do clima, eles ofereceram um cavalo branco, bem
como ao gê nio do outono, quando a chuva implorou. Um cavalo preto foi oferecido para orar
para que a chuva parasse. Falaremos mais sobre essa deusa.
[25] CA Walsh, The Master Singers of Japan (na sé rie Wisdom of the East), pp. 74, 84.

[26] Vamos falar sobre esses reinos em relaçã o a fantasmas e espı́ritos.


[27] Essas citaçõ es pertencem à versã o versi icada do Jizo Wasan, feita por Clara A. Walsh, em
seu Master Singers of Japan, p. 66-68, adaptado para a versã o em prosa de Lafcadio Hearn. Com
relaçã o à divindade Jizo (sâ nscrito kṣiti-garbha), ver é buddisht arte do autor, capı́tulo III. A
melodia lamentosa do hino é impressionante e o autor nunca conseguiu esquecer a profunda
impressã o que causou em sua infâ ncia, quando os vizinhos que acabavam de perder um ilho
cantaram esse hino.
[28] Em sâ nscrito Buddha-Kshetra. O budismo ensina a existê ncia de inú meros Budas que
apareceram no mundo no passado e que aparecerã o no futuro. Os paraı́sos sã o as
moradas »dos Budas anteriores.
[29] Alé m dos quatro elementos distribuı́dos pelos quatro cantos, a terra, o quinto
elemento, está supostamente no centro para governar o Reino Central. Esta ú ltima crença nã o
era conhecida no Japã o.
[30] As duas sé ries de guardiõ es, em suas representaçõ es grá icas ou glı́pticas, correspondem
aos sı́mbolos cristã os dos quatro evangelistas e à s iguras dos arcanjos. Os respectivos nomes
japoneses dos quatro gê nios sã o: Shujaku, Gem-b u, Sei-ryo e Byak-ko.
[31] Esta histó ria é contada no Izumo Fudo-ki, um dos mais antigos Fudo-kis preservados.
[32] O nome Shorai geralmente signi ica "futuro", embora eu suponha que seja uma corrupçã o
de um tı́tulo coreano. Os nomes Soinin e Kotan nã o sã o japoneses. E um fato conhecido que as
histó rias de Susa-no-wo sã o em alguns pontos relacionadas à Coré ia.

[33] Esta histó ria é contada no Fudo-ki de Hitachi, onde essas duas montanhas sã o
claramente visı́veis.
[34] Ver acima, Cap., I, III.
[35] O nome Nasé pode signi icar "Caro" ou "Nã o tenha ciú mes." Outro nome dado à s vezes
ao homem é Naka-samuta ("o Campo Frio Central"). Azé pode signi icar "Rosto" ou "Meu
caro", e outro nome é Unakami-aze ("A Trilha no Mar"?)
[36] No Japã o antigo, o costume de organizar esta reuniã o entre jovens de ambos os
sexos era o mesmo em todos os lugares. Os poemas trocados entre Nasé e Azé sã o obscuros,
embora signi iquem: "Eu, oh, Azé , te enfeitaria como um pinheiro jovem com pedaços de
câ nhamo pendurados em seus galhos." A resposta: “A maré alta pode te esconder, ó Nasé , mas
eu quero te seguir mesmo que passe por oitenta ilhotas e rochas rochosas.” Por “pedaços de
câ nhamo pendurados” ele se refere a um feitiço usado pelos jovens para unir.
[37] Em uma das versõ es atribuı́das a Hinu-yama no Tango, o homem é um velho que
adota a fada. Muitos homens contestam seus favores, mas todos falham. Esta histó ria,
portanto, se assemelha à da Senhora Brilhante, que é contada mais tarde. Quando
seus pretendentes a insistem em se casar, ela foge para o cé u.
[38] Para uma traduçã o em inglê s, ver BH
Chamberlain, The Classical Poetry of the Japanese, Londres, 1880. A ú ltima parte dessa
traduçã o é reproduzida aqui.
[39] A expressã o japonesa para paixã o forte é "peito
inchado".
[40] Conto famoso do escritor americano Washington Irving. (N. de T.)
[41] Nas costas do Japã o existem vá rios montes que, de acordo com a crença popular, sã o
tantos tú mulos de Urashima. Um deles, perto de Kanagawa, foi usado por Bakin, que escreveu
um "Gulliver" japonê s sobre um pescador que vivia perto do monte. Veja o cap. IX.
[42] Uma versã o é que o menino era ilho natural de Fubito.
[43] Esta histó ria foi dramatizada em uma das peças No, retratando uma visita feita
por Fusazaki, ilho da falecida mulher. A histó ria é contada com mais detalhes por Y. Ozaky em
"O Buda de Cristal".
[44] O homem é Same-bito, "o homem-tubarã o". Cf. Lafcadio Hearn, Shadowings, London,
1900.
[45] Em sâ nscrito: Eka-srga. Cf. Takakusu, The Study of Ekasrga (Hansei Zasshi), 1898, p. 10 e
segs.
[46] Kala, originalmente signi icava "morte", mas neste caso é interpretado como "preto".
[47] A mitologia xintoı́sta antiga fala dos Magatsumi, os espı́ritos malignos, cujo chefe é Oh-
maga-tsumi, o Grande Maligno, cujas hordas sã o servos do Deus Tempestade e seus
descendentes, especialmente o Grande Senhor dos à terra. Mas sua aparê ncia e má s açõ es
nunca foram descritas. Aqueles seres foram completamente ofuscados por demô nios budistas, e
foi Hiraa, o Xintoı́smo pseudo-racionalista revivalista, que ressuscitou o medo desses
malfeitores no 19o sé culo. Mas sua in luê ncia nã o atingiu a mente popular.

[48] Derivado da ideia de que onis devora carne humana.


[49] Os malhos ou martelos má gicos sã o abundantes na mitologia japonesa, associados aos
sobrenaturais. Outros materiais má gicos també m sã o citados como o caso do "saco de arroz de
Toda". A ideia de um menino de uma polegada pode ser rastreada até a do "Famoso
Homenzinho".
[50] Uma espé cie de conı́fera nativa do Japã o. Assemelha-se
ligeiramente ao cipreste europeu.
[51] Mas o local é especi icado como Monte Togakushi, em Shinano.
[52] A histó ria nã o diz quem era a mã e, embora ela provavelmente representasse a natureza.
[53] A maldiçã o é esta: a mã e fez uma cesta de bambu, colocou algumas pedras tiradas de uma
bacia de rio dentro e misturou-as com folhas de bambu e sal. As palavras da maldiçã o mostram
que as folhas simbolizam o crescimento e o ressecamento, enquanto o sal simboliza a vazante e
a vazante das maré s do mar.
[54] Outras mulheres sã o tipi icadas por seus nomes, tirados especialmente delores. Assim,
existem as senhoras Wisteria, Artemis, Young Fern e Pink Plum, enquanto outras tê m nomes
como Tarde Mist, Cicada ou Pato Selvagem das Nuvens. Mais tarde falaremos sobre Lady
Dondiego.
[5 5] Os sı́mbolos sã o compostos de vá rias combinaçõ es, até cinquenta e dois ou cinquenta e
quatro, em cinco linhas verticais com uma ou duas linhas horizontais. Esses padrõ es simbó licos
foram originalmente usados em um jogo que discriminava as vá rias variedades
de incenso. Cf. Arte Japonesa, do autor.
[56] A bananeira sempre foi associada à fragilidade e evanescê ncia na literatura
japonesa. Veja o cap. VIII.

[57] O nome castelhano do dond iego carece das caracterı́sticas femininas atribuı́das à
personagem (N. del T.). Suas lores claras, que desabrocham ao anoitecer, sugerem solidã o e
melancolia, o poço simbolizando o temperamento e o trá gico destino da infeliz jovem fada.
[58] Atualmente escrito em caracteres latinos como "Susanoo". Nesse
caso, poré m, manteremos a redaçã o do texto original.
[59] Observe que a histó ria tem semelhanças com a de Susa-no-wo.

[60] A tentativa de um erudito japonê s moderno de transformar o prı́ncipe em um


redentor profé tico foi um verdadeiro fracasso. Referimo-nos a ele para demonstrar a
importâ ncia que os japoneses atribuem a essas primeiras lendas.
[61] Ele é dei icado e é conhecido como Hachiman, o deus das Oito Bandeiras. Mais
tarde, ele se tornou o patrono do clã Minamoto.
[62] Figura histó rica real, que estava alcançando qualidades mitoló gicas. Devido à s datas e
semelhanças na biogra ia, é possı́vel comparar o Cid castelhano. (N. de T.)
[63] O nú mero "quatro" neste e em outros casos semelhantes é derivado dos quatro reis
guardiõ es da mitologia budista.
[64] Gen é a pronú ncia sino-japonesa do ideograma chinê s usado para designar o
nome Minamoto, enquanto Hei ou Pei junto com Gen era o nome Taira. Os dois contos é picos
sã o o Hei-ke-Monogatari e o Gem-Pei-Seisui-ki, uma versã o expandida do primeiro. Veja sobre
esses dois con litos, Saito Musashibo Benkei, de Benneville.
[65] Para o aspecto tengus, consulte o cap. 4.
[66] Observe o motivo Christopho rus, tã o comum no folclore.
[67] Versõ es dramatizadas de algumas dessas histó rias estã o acessı́veis, com traduçõ es
para o inglê s de GB Samson, nas obras No: " Benkei en la Barrera" e " Benkei en la barca",
em TASJ, xl, 1912.
[68] Como seu tio, Tametonus, de acordo com algumas tradiçõ es, ele foi para Yeso
e para o continente asiá tico, onde se tornou Genghis Khan.
[69] O primeiro esboço da histó ria é o Soga-Monogatari, provavelmente da primeira
metade do sé culo XIII. Existem vá rias versõ es dramatizadas do sé culo XIV e subsequentes. Uma
circunstâ ncia que aumentou a popularidade da histó ria foi que a vingança termina durante uma
caçada organizada por Yorimoto no sopé do Monte Fuji.
[70] Um traço da histó ria sobre a expediçã o de Rama ao Ceilã o pode ser visto nesta
histó ria. Essa histó ria era conhecida por meio de livros budistas, embora nã o tivesse ampla
circulaçã o.
[71] Daı́ o prové rbio: "Os pardais nunca param de dançar, mesmo que já tenham cem
anos."
[72] Isso acontece com frequê ncia nas histó rias japonesas da Idade Mé dia.
[73] Este é um exemplo de uma visita ao maravilhoso palá cio localizado alé m do nosso
mundo.
[74] A histó ria está no Kon Jaku Monogatari, "(Contos antigos e modernos)" do sé culo XI. Este
livro é um dos mais antigos do gê nero e foi imitado por muitos outros.
[75] "O triunfo do ilhote", Contos de fadas japoneses, nº 12. Outra histó ria sobre um texugo é
a de "Kachi-kachi Yama ". Um texugo capturado por um lenhador devora sua esposa. Uma lebre
vem em auxı́lio do lenhador perturbado e no inal eles encontram o texugo em casa. Ibid, No. 5.
[76] O Daimyo foi o tı́tulo dado aos senhores feudais mais poderosos do Japã o medieval. (N. de
T.)
[77] Um tipo de amido feito de alga marinha, que é muito escorregadio se diluı́do.
[78] Daı́ o prové rbio: "Uma vespa pica uma cara que chora." Signi ica dupla desgraça para a
pessoa.
[79] Esta é a histó ria de Hidaka-gawa, conhecida por sua popular dramatizaçã o,
acompanhada pela dança da cobra.
[80] Esta é outra histó ria famosa de Kato-Saemon, o guerreiro, també m dramatizada.
[81] També m chamado de Nanso-b o. A etimologia deste nome é obscura,
embora bo signi ique monge ou sacerdote. Essa histó ria foi contada em diferentes localidades.
[82] A ideia budista é que o carma, que faz com que algué m se torne uma cobra,
estabelece uma camaradagem com outras cobras, o que torna possı́vel um relacionamento de
amor com uma delas. Apesar de suas intençõ es piedosas. Nanzo-bo era na verdade um animal.
[83] As luzes vistas na noite escura sobre os pâ ntanos à s vezes sã o explicadas como
tochas acesas para o casamento de duas raposas.
[84] A carta foi escrita imitando a linguagem dos pá ssaros, e poeticamente alude à s
caracterı́sticas de vá rios pá ssaros.
[85] O nome Uso-Dori pode signi icar "pá ssaro reclinado", um nome que pode ser a origem da
histó ria.
[86] A palavra matsu signi ica "pinho" e "espera". A histó ria é sobre dois amigos que gostavam
de ouvir o sussurro dos insetos no campo de Abe-no. Um deles morre ali e desde entã o canta
melancolicamente em harmonia com os insetos enquanto espera que seu amigo se junte a ele.
[87] O tributo pago ao pinheiro é de origem chinesa, mas sua perenidade sugere
prosperidade, e as dimensõ es que frequentemente atinge simbolizam a longevidade.
[88] O basho é a banana, mas o nome tem associaçõ es em versõ es chinesas e japonesas
muito diferentes do nome em outras lı́nguas. No Japã o, a bananeira nã o dá frutos, suas folhas
estã o sempre associadas à ideia de fragilidade e seu aspecto murcho no outono sugere
evanescê ncia.
[89] Mais é dito no poema sobre a relaçã o entre realidade e aparê ncia,
do ponto de vista budista do "Caminho do Meio". Para isso
ver N ichiren, por anesaki.
[90] Kocho Monogatari do sé culo 17.
[91] As lores sã o listadas na histó ria da seguinte forma: vaso de cabaça (ou "Dondiego à
noite"), yamabuki (Kirria japonica), carne de omiruim, ou a " lor da
senhora" (Patrinia scabiosaefolia), lı́rio, trepadeira, crisâ ntemo, glicı́nia, ló tus, etc. Essa histó ria
foi evidentemente sugerida pela semelhança das plantas no capı́tulo V do Lótus da Verdade.
[92] O nome pode signi icar "De acordo com o vento", "Campo pequeno". Nã o é possı́vel
saber se o nome foi feito para a histó ria ou se era um nome verdadeiro.
[93] Suas lores oferecem uma tonalidade azulada.
[94] C f. Calendário loral japonês, de EV Cleinent, Chicago, 1905; "Festivities of Flora and
Flowers", em seu Japan and his Art, Londres, 1889; Ano do Japão, por Carrtithers.
[95] O uguisi japonê s, comumente chamado de "rouxinol", tem associaçõ es muito diferentes
de sua contraparte ocidental. Sua alegre cançã o é considerada o prenú ncio da primavera. Diz-se
que suas notas repetem Hokke-Kyo, o nome japonê s da escritura budista O Lótus da Verdade.
[96] Muitas vezes, um colchã o pode ser feito de lençó is. Segundo o professor Weiner, da
Universidade de Harvard, os colchõ es dessa classe foram exportados da China para a Asia
Central e ainda mais a oeste, daı́ o nome " cama " ou " Bett " corrupçã o da palavra
chinesa, Mas, correspondendo à ú ltima sı́laba de shobu.
[97] Clara A. Walsh, The Master Singers of Japan, p. 103. Com referê ncia a este poema, a Srta.
CE Fuerness, do Vassar College, nos diz algo interessante: ela escreve: «Gostaria de mencionar
um poema porque se refere a um ponto que muitas vezes observei, mas nunca vi referido
qualquer site. As vezes, vi a luz da lua cair sobre uma á rvore cujas folhas murcharam com as
geadas de outono. Há vá rios perto de nosso observató rio e, como minhas tarefas me obrigam a
sair à noite, olho a lua por entre as folhas ou a vejo brilhando em uma á rvore. O efeito é mais
bonito quando as folhas icam amarelas do que quando icam vermelhas. Entã o, a
paisagem lembra a terra das fadas, ou mesmo algo mais eté reo, que nã o consigo mais associar
as fadas ao silê ncio da noite. Frequentemente, o silê ncio é tã o imenso que ouço uma folha cair,
roçando outras folhas ao passar em direçã o ao solo. Os poemas japoneses parecem ser mais
ı́ntimos, mais melancó licos do que os nossos. "
[98] Japanese Fairy Tale s Series, No. 25.
[99] Para a idé ia e prá tica da "dedicaçã o",
japonê s es, eko, veja Buddhist Art, cap. 1; acredita-se que qualquer trabalho realizado com
uma intençã o piedosa traz bem-estar espiritual para o falecido.
[100] The Classical Poetry of the Japanese, de BH Chamberlain, pp. 199 e segs.
[101] Para a Ilha das Mulheres, cf. A mitologia de todas as raças, vols. III, 117 e IX, 140, e
suas referê ncias; també m The Religion of the Ancient Celts, Edimburgo, 1911, p. 385 por JA
MacCulloch.
[102] Um pinheiro é considerado indispensá vel em um jardim respeitá vel, e um
guindaste e uma tartaruga de bronze ou de barro sã o frequentemente colocados sob ele.
[103] Yaré é uma exclamaçã o japonesa. No original, é repetido com mais frequê ncia.
[104] Sama signi ica " venerá vel".
[105] O herdeiro do ditador Minamoto.
[106] O deus de Mishima era adorado pelos Minamoto e samurais em geral,
apó s Hachiman.
[107] Ou seja, "ele adquire destreza na caligra ia"

[108] O desejo ou pensamento de saudade é chamado de "coraçã o vermelho" e é considerado


uma resposta favorá vel a uma carta de amor "delicadamente colorida" ou "bem colorida".

Texto original
Tras haber visto las hipó tesis de los actuales expertos, veamos qué nos dicen las
antiguas leyendas
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