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SUMÁRIO

1 CONTEXTUALIZAÇÃO: O HOSPITAL COMO UMA ORGANIZAÇÃO


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2 A GESTÃO DE PESSOAS E O SETOR DA SAÚDE ......................... 7

3 PRÁTICAS DA GESTÃO DE PESSOAS ESTRATÉGICA NA ÁREA


DA SAÚDE ....................................................................................................... 13

4 FATORES QUE PODEM HUMANIZAR UMA INSTITUIÇÃO DE


SAÚDE 19

5 A EVOLUÇÃO DA HUMANIZAÇÃO NA GESTÃO HOSPITALAR ... 24

6 HUMANIZAÇÃO DO AMBIENTE HOSPITALAR ............................. 30

7 LEITURA COMPLEMENTAR........................................................... 32

7.1 A gestão de recursos humanos em hospitais do sistema único de


saúde (SUS) e sua relação ao modelo de assistência: um estudo em hospitais
de Belo Horizonte, Minas Gerais. ................................................................. 32

8 BIBLIOGRAFIA ................................................................................ 49

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1 CONTEXTUALIZAÇÃO: O HOSPITAL COMO UMA ORGANIZAÇÃO

Fonte:www.ulbra.br

As estruturas hospitalares conceituadas como um instrumento terapêutico


se dão a partir do final do século XVIII onde, de um morredouro passou a ser, ao
longo dos anos, um ambiente de terapia, de prevenção de patologias, enfim, um
ambiente de cuidados para a sociedade. (FOUCAULT, 1979).
Os cuidados médicos estavam mais ligados a uma assistência espiritual
do que a cuidados materiais, a medicina era profundamente individualista, a cura
estava em jogo entre a natureza, a doença e o médico. Dentre vários outros
fatores citados por Foucault, os processos de transformação das pesquisas
científicas, na descoberta de necessidade de “purificação” do ambiente
hospitalar, e na disciplinarização das atividades hospitalares levaram ao
desenvolvimento de um espaço hospitalar até aos modelos que temos hoje,
como locais privativos, limpos, fiscalizados, e que promovem a saúde e não a
doença.
É a introdução dos mecanismos disciplinares no espaço confuso do
hospital que vai possibilitar sua medicalização. Tudo o que foi dito até agora pode
explicar porque o hospital se disciplina. As razões econômicas, o preço atribuído
ao indivíduo, o desejo de evitar que as epidemias se propaguem explicam o
esquadrinhamento disciplinar a que estão submetidos os hospitais. Mas se está
disciplina torna-se médica, se este poder disciplinar é confiado ao médico, isto

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se deve a uma transformação no saber médico. A formação de uma medicina
hospitalar deve-se, por um lado, à disciplinarização do espaço hospitalar e, por
outro, à transformação, nesta época, do saber e das práticas médicas.
(FOUCAULT, 1992:62).

Fonte:www.urmc.rochester.edu

Desta forma o médico passa a ser o responsável pela gestão do hospital,


ele é o eixo de tratamento, de organização de medicamentos e dos fatores
econômicos e pela sustentabilidade deste. Mais à frente teórica e historicamente,
o sistema hospitalar vai passando por fases juntamente com a evolução do
sistema econômico, social e político (GRAÇA, 2005), onde destaco o sistema
profissional liberal – de meados do Séc. XIX até a II Guerra Mundial – é neste
sistema onde através da manufatura, do operário de ofício e do trabalho em
equipe que se traz à tona a noção de qualificação profissional. A partir da II
Guerra Mundial há o sistema técnico, onde a produção contínua e a
automatização integra funções, gera um trabalho em rede e um sistema de
produção. Sendo assim, este sistema técnico, conduziu o espaço hospitalar a
uma reorganização às condições atuais do exercício da medicina, marcadas por
sucessivos métodos de racionalização nos âmbitos financeiros, econômicos e
organizacional.

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Fonte: www.fraunhofer.dr

No Brasil, os hospitais também sofreram muitas mudanças ao longo dos


tempos, desde a seu papel social até seu modelo de gestão. Estas
transformações são consideráveis a partir de 1930, quando a intervenção do
Estado se tornou mais efetiva e depois, a partir de 1960 o sistema público
começou a se mostrar deficiente no atendimento à população devido à crise do
mesmo e, diante desta crise, houve um alavancamento de investimento privado
o que iniciou o que se tem como “complexo médico hospitalar”. (MONTEIRO,
2009).
Ainda frente a este autor, deu-se início a uma grande mudança na gestão
hospitalar, tendo as seguintes características: a) o período do processo de
assalariamento dos médicos e demais profissionais; b) o crescimento dos
estabelecimentos privados de caráter lucrativo; c) a diminuição da importância
dos estabelecimentos filantrópicos e constituição de uma ideologia empresarial
no setor de saúde.
Diante de todas estas transformações, os hospitais se tornam empresas,
desta forma começam a pensar em meios de gestão deste espaço, através da
engenharia e de controles de qualidade. O hospital, e não só a medicina, passam
a ser um ambiente essencial para a formação de recursos humanos e seguindo
as tendências globais se dispõe a ter constante refinamento profissional.

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Fonte: www.licht.de

Mesmo tendo sido atingido por todas as transformações econômicas e


culturais ao longo dos anos, ainda sim, é possível se perguntar: o setor de saúde
pode ser tratado como todos os outros?
Bem, pelo antagonismo de tratar a saúde como um negócio, é complicado
exigir dos administradores de saúde que tenham ânsia por uma gestão de metas,
indicadores, desenvolvimento de pessoas, mas por toda a pressão social de
resultados e de promover boas práticas, a área da saúde tem se rendido cada
vez mais a uma gestão mais estratégica onde os médicos participam desta,
porém não necessariamente são os únicos gestores desta.

A ideia de que as empresas “competem por meio das pessoas” dá


ênfase ao fato de que o sucesso depende cada vez mais da
capacidade empresarial de gerenciar o capital humano. A expressão
“capital humano” refere-se ao valor do conhecimento, das habilidades
e das capacidades da empresa. Embora o valor desses ativos possa
não aparecer diretamente no balanço patrimonial de uma empresa, seu
impacto no desempenho dela é enorme (MAGALHÃES, 2006:18).

Para Druker (1999), o hospital é uma das organizações mais complexas


para administração, pois nele há vários serviços envolvidos, como por exemplo
o de hotelaria, o de lavanderia, o de serviços médicos e de relacionamento com
o consumidor. Os regimentos legais também são extensos e oriundos de
diversas instituições e órgãos. O hospital se tornou uma organização complexa,

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que depende não somente de atualização tecnológica, mas totalmente de seus
recursos humanos e do desenvolvimento destes.

2 A GESTÃO DE PESSOAS E O SETOR DA SAÚDE

Fonte:www.jornalnh.com.br

Segundo Marras (2000), para se alcançar a necessidade de contabilizar


pessoas, organizar suas horas trabalhadas, atrasos, pagamentos e descontos
foi que surgiu o setor de Recursos Humanos próximo ao que conhecemos hoje.
Mas, foi acompanhando as necessidades globais que este passou por fases de
transformação passando por cinco etapas: contábil, legal, tecnicista,
administrativa e estratégica.
Para Chiavenato (2010), a Gestão de Pessoas é uma das áreas que mais
vem sofrendo mudanças nos últimos anos. A visão que se tem hoje da área é
totalmente diferente da tradicional configuração quando recebia a nomenclatura
de Administração de Recursos Humanos (ARH). Ainda segundo este autor, a
Administração de Recursos Humanos (ARH) é o conjunto de políticas e práticas
necessárias para conduzir o que envolve as pessoas ou recursos humanos,
através de recrutamento, seleção, treinamento, recompensas e avaliação do
desempenho.

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A Gestão de Pessoas é o conjunto de atividades de especialistas e de
gestores, esta área deve construir talentos por meio de um conjunto integrado
de processos e cuida do capital humano das organizações, o elemento
fundamental destas. A Gestão de Pessoas ou RH pode ser entendida em três
contextos: o setor como função ou departamento; o RH como uma prática de
gestão de pessoas e o RH como profissão, estes três elementos são
indissociáveis entre si, visto que são função de qualquer gestor de pessoas e
não apenas atividades de um departamento especializado.
A fase atual do RH - Conhecimento, tem a sua essência na inovação,
muito ligada ao talento e ao aprendizado. Os desafios da Gestão de Pessoas
neste momento para setores tão tecnicistas têm chamado muito a atenção de
estudiosos, pois agir na era do conhecimento implica mudanças de modelos
mentais.

Fonte: www.upec.edu.ec

Na área da saúde estabelecer com o cliente uma relação próxima com a


equipe que presta o serviço é essencial, esta relação afeta diretamente o
conceito e a confiabilidade da organização. Os conceitos de administração
hospitalar estão cada vez mais preocupados em gerar nos setores de saúde
resultados financeiros que não estejam isolados, mas ligados principalmente a
um serviço de qualidade. Estes conceitos administrativos deram abertura para
as práticas de Recursos Humanos.

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O hospital tem seu desempenho vinculado ao comportamento de seus
profissionais e em toda sua complexidade torna perceptível a
articulação de aspectos econômicos, humanos e sociais pertinentes à
sua administração. Caracteriza-se como uma organização prestadora
de serviço, multiprofissional, voltada para o atendimento de
necessidades multidimensionais, apresentando-se como local de
trabalho de grupos sócio profissionais específicos, diretamente
comprometidos no processo de prestação de cuidados de assistência
hospitalar em funções de apoio ou de gestão. Seu sistema técnico e
organizacional de trabalho com suas especificidades, é ímpar, uma vez
que o seu objeto de trabalho constitui-se do ser humano,
representando a vida. Trabalhar com saúde requer considerações
além da capacidade técnica e ética do profissional, incluindo-se
também a cultura organizacional, o paciente e a relação interpessoal.
(MAGALHÃES, 2006:21).

A gestão de pessoas passou a ter valores estratégicos, pois estes são


meios de alcance de resultados eficazes. No ambiente empresarial o termo
estratégico vem sendo muito utilizado, a palavra vem do grego antigo stratègós
(destrato, “exército” e ago, “liderança”), designava o comandante militar
ateniense. A estratégia significa inicialmente a ação de conduzir exércitos em
tempo de guerra, mais tarde o termo foi se estendendo a outros campos:
relacionamento humano, político, econômico e ao contexto empresarial, sendo
sua raiz o estabelecimento de caminhos não previsíveis ao inimigo.
(WHITTIINGTON, 2002).

Fonte:saudeexperts.com.br

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As ações de recursos humanos promovem a análise do clima e das
necessidades internas da empresa, identificando as ameaças, oportunidades,
pontos fortes e fracos, estes serão alinhados à estratégia junto ao mercado. A
complexidade das organizações hospitalares envolve a satisfação de
expectativas não somente dos clientes diretamente ligados aos serviços como
também para a sociedade e alcançar estas expectativas só se dará pelos
indivíduos que compõe a instituição.

Os valores que regem o comportamento da organização e de seus


componentes precisam ser conservados e ao mesmo tempo inovados,
principalmente, acompanhando as mudanças sociais e as inovações
tecnológicas. É preciso preservar a qualidade dos comportamentos
que presidem as relações entre as pessoas que convivem e se cruzam
no hospital. A crescente complexidade de um hospital que envolve
atividades diversas, com alta necessidade de coordenação e o alto
custo de insumos e novas tecnologias médicas, igualmente
correspondem a fatores que são impulsionadores de uma gestão mais
atuante. Em uma organização hospitalar, na busca da qualidade dos
serviços prestados, emerge a questão de definir qualidade. Qualidade
que tornou-se palavra de domínio público, é trabalhada dentro de
amplos limites, daquilo que se considera senso comum. Em conclusão,
mesmo se poucos sabem o que o termo significa textualmente, todos
sabem reconhecê-la quando se está diante de algo considerado de
qualidade, da mesma forma que todos sabem quando ela está ausente
de determinado produto ou serviço. (MAGALHÃES, 2006:21-22)

Essas mudanças organizacionais são muito discutidas e há uma extensão


bibliográfica a respeito, estas discussões demostram o quanto os profissionais
reconstroem em suas atividades cotidianas estas modificações, portanto a
Gestão de Pessoas precisa estar conectada a estas transformações.
Segundo Gil (2001), a Gestão de Pessoas prevista se posicionar de forma
mais consultiva afim de prevenir perdas no que compete aos profissionais e à
rentabilidade das organizações. Direcionar os negócios, realizar planejamentos
a longo prazo, pensar em estruturas enxutas é a responsabilidade do gestor de
pessoas.
O papel da gestão de pessoas nesse ambiente transformacional nos
ajudará a entender como a área da saúde tem se posicionado para o
desenvolvimento de seu setor e poderá contribuir para entender o porquê da
resistência em implementar práticas de Recursos Humanos ainda continua e
qual é a percepção deste setor destas práticas indispensáveis.
O processo do que se chama Administração ou Gestão Hospitalar na
Teoria Geral da Administração é baseado na compreensão de que o hospital é

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um subsistema dentro de um sistema social mais amplo, mas, ao mesmo tempo,
imerso na lógica de Mercado. (JORGE, 2002).

Fonte:extra.globo.com

O ambiente da saúde vem se transformado e cada vez mais sendo


compreendido como um espaço de negócio complexo, o hospital além de
qualidade em assistência, precisa incorporar socialmente a diversidade de seus
atores, como os médicos, que apesar de prestadores de serviços, são
autônomos, mesmo em meio a uma estrutura administrativa estruturada. Estes
conflitos de poder geraram está complexidade da Administração Hospitalar, que
por ter sido responsabilidade (e em alguns momentos ainda ser) de líderes
religiosos, médicos ou enfermeiros, demorou a ser entendido como
responsabilidade de um gestor.

Interessante, todavia, é que a partir do momento em que esses


profissionais, que trabalham diretamente com o paciente, ocupam
coordenações, na medida que ascendem na organização, passam a
desempenhar mais tarefas administrativas. A enfermeira que coordena
uma unidade de internamento, realiza mais funções administrativas e
quase nenhuma técnica. Ela usa seus conhecimentos de enfermagem
para atuar na chefia. Esses profissionais, ao ocupar determinados
cargos, não gostam e não entendem das atividades administrativas.
Com isso, o hospital perde um bom técnico e não ganha um bom chefe.
(MELO & SEIXAS, 2004:16).

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A partir do momento em que se vê maior necessidade de ter gestão
de pessoal, gestão de recursos econômicos, de materiais, ou seja, em que se
percebeu que os modelos aplicados eram escassos e inadequados e que o
médico, mesmo diretor é condicionado a pensar mais em políticas para
tratamento de patologias do que de sanar as dificuldades de uma instituição é
que se pensar em gestores hospitalares ganha força.
Ainda com base em Melo & Seixas (2004), a figura do gestor no ambiente
hospitalar começou a se dar em alguns países a partir de regras legais e
mínimas. Porém a relação de gestão não é simplista, o administrador hospitalar
precisa partilhar suas ações com os médicos e enfermeiros, privilegiando as
rotinas destes, sempre levando em consideração o papel assistencial do hospital
e do paciente, a função do gestor é encontrar o equilíbrio entre investimentos,
custos e preços.
A gestão de pessoas assumirá um papel importante neste processo de
equilíbrio; por ser ainda em grande parte gerido por técnicos da saúde, as
práticas de recursos humanos ainda não são tão difundidas neste campo, porém
vem cada vez mais sendo buscadas como meio competitivo. O Gestor de
Pessoas precisa ter competências conceituais e tradicionais, mas também
novas, que possam atingir aos indivíduos internos e pacientes. Este também
deve ter uma linguagem conectada ao seu setor e estar envolvido
tecnologicamente com ele e compartilhar os valores éticos e sociais que
conduzem a instituição.
Para Lefevre (2001), no setor da saúde especialmente, nos recursos
humanos a relação entre a equipe de trabalho e o cliente são essenciais para se
alcançar os objetivos da organização, visto que esta equipe está diretamente
ligada a vida do cliente.

Tempos atrás, temia-se que um dia as máquinas eliminassem a


necessidade do trabalho humano. Na realidade, está ocorrendo
exatamente o oposto. Nunca as pessoas foram tão importantes nas
empresas quanto hoje. O ser humano e seu desempenho profissional
nas organizações de saúde é hoje objeto de numerosos estudos por
inúmeros profissionais e organizações especializadas. Existem autores
que vão na direção contrária e ao mesmo tempo que afirmam que as
pessoas são importantes, constatam que os postos de trabalho têm
diminuído em correlação direta com novas formas de gestão e/ou
automação. O que se observa, é que são linhas de pensamento de um
modo geral direcionadas para empresas distintas das prestadoras de

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serviços de saúde. Os hospitais, na sua maioria, estão sinalizando um
cenário novo de conscientização e valorização da dimensão humana e
subjetiva presente em todo ato de assistência à saúde. Estão
procurando aprimorar as relações entre profissionais de saúde e
usuários, dos profissionais entre si e do hospital com a comunidade e
buscando a sensibilização dos dirigentes hospitalares para a
necessidade de desenvolvimento de um modelo de gestão que reflita
a lógica do ideário do processo assistencial, refletindo uma cultura
organizacional pautada pelo respeito, pela solidariedade, pelo
desenvolvimento da autonomia e da cidadania dos agentes envolvidos
e dos usuários.(MAGALHAES, 2006:44-45).

Os profissionais da área da saúde lidam diretamente com a vida do


cliente/paciente, desta forma o ambiente de pressão e de processos de muitos
detalhes, exige cada vez mais uma gestão de recursos humanos. Entretanto é
importante a consideração abaixo:

Contudo, se analisada a realidade encontrada nas organizações de


saúde não é possível aceitarmos a afirmativa do autor como verdade
absoluta. É fato que como empresa, os hospitais exercem também um
caráter explorador frente a força de trabalho, casos como a má
distribuição de leitos por profissionais; o caráter público x privado que
visivelmente apresenta distorções gerenciais; a falta de programas de
humanização que contemplem os profissionais, neste momento
definidos como “cuidadores” ou aqueles que objetivam “cuidar de quem
cuida” panorama que vem contrapor o discurso do autor cima citado.
(MAGALHÃES, 2006:48).

Percebe-se, portanto, a contradição explicita na aplicação da


Gestão de Pessoas estratégica no ambiente da saúde. Há a cobrança do
mercado, porém as características ainda muito tradicionais do setor dificultam
uma implantação plena destas práticas. Porém, mesmo diante destas
contradições, cada vez mais ações vêm sendo aplicadas, sempre conciliando os
desejos internos com as necessidades externas.

3 PRÁTICAS DA GESTÃO DE PESSOAS ESTRATÉGICA NA ÁREA DA


SAÚDE

Considerando a visão contemporânea de que a gestão de pessoas não é


exclusividade de um setor, mas prática dos gestores, de acordo com pesquisa
realizada por BRAND, TOLFO, PEREIRA & ALMEIDA (2008) no setor privado
esta prática em alguns hospitais já pode ser observada, em que um setor de
gestão de pessoas não é formalizado na estrutura da empresa, mas sim o

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profissional que está vinculado à Direção da mesma. A área é descentralizada,
cabendo a um especialista da área dar suporte ao demais.

Fonte:circuitomt.com.br

Ainda nesta pesquisa é possível constatar que na área da saúde


ainda permanecem em sua maioria a direção assumida por profissionais da área
médica e, é comum o despreparo e desconhecimento dos princípios básicos da
gestão administrativa e principalmente no que diz respeito a gestão de pessoas,
sendo frequente o pouco investimento e a dificuldade de aprovação de
programas de capacitação e realização de cursos voltados para o
desenvolvimento dos colaboradores.
Esta descentralização de um setor de recursos Humanos no setor privado
foi percebida por diversos fatores, dentre eles o tamanho da organização, a
quantidade de sócios que normalmente atuam profissionalmente na instituição e
não percebem a empresa em sua complexidade, levando a um modelo de gestão
mais tradicional. Os instrumentos de gestão permitem medir a performance da
instituição possibilitando concorrência com o mercado, gerando um ciclo de
melhores práticas sendo este o grande desafio do momento, principalmente no
setor de saúde como é possível observar:

As organizações hospitalares precisam hoje em dia ter sua gestão de


RH voltada para fazer a conexão entre o investimento em pessoas e o
sucesso da organização, atrelando seus resultados aos resultados da
organização. Precisam utilizar medições, indicadores,

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sistematicamente, de modo a compor um conjunto de dados que
privilegie todos os aspectos importantes da gestão. O planejamento
estratégico deve definir o que medir, como e quando. A partir daí, como
efeito cascata, facilita-se localização de metas e de objetivos dos
diversos departamentos e níveis hierárquicos. (MAGALHÃES,
2006:54).

Os ambientes hospitalares estão começando a perceber a


necessidade de ter indicadores que possibilitem decisões assertivas e que
proporcionem crescimento a organização. Algumas práticas já vem sendo
usadas nos ambientes privados para se alcançar o crescimento, tais como é
possível observar na pesquisa de BRAND, TOLFO, PEREIRA & ALMEIDA
(2008), desde a admissão dos funcionário até o desligamento da organização,
então, existem avaliações de desempenho, programas de treinamento e
desenvolvimento, programas de benefícios e remuneração, além das ações
voltadas à qualidade de vida e projetos de melhoria de satisfação dos
colaboradores, do clima organizacional e produtividade no trabalho.
A área de gestão de pessoas tem cada vez mais, no setor privado, atuado
como uma consultora interna para os hospitais, porém ainda não é uma realidade
homogênea no Brasil, mas os trabalhos de permitir que o colaboradores sejam
parceiros e não apenas recursos tem sido intensivos na área da saúde e os
resultados tem aparecido.

Fonte:drtvnoticias.com

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Ao setor de saúde, principalmente para melhor qualidade nos serviços
prestados que dependem essencialmente das pessoas que estão em contato
direto com os pacientes/clientes, se faz necessário seguir as sistemáticas dos
Recursos Humanos. E para se ter indicadores que possam subsidiar e avaliar os
desempenhos da empresa, é primordial a aplicação de processos e
subprocessos do RH, estes deverão estar alinhados ao planejamento estratégico
da empresa. Nos ciclos de RH, citados por Assis (2005 apud Magalhães 2006);
é perceptível que o cliente é beneficiado com as práticas de RH, o entendimento
desta cadeia e aplicação dela permite ao setor de saúde melhores indicadores
para mensuração da eficiência do negócio.
Nesta cadeia, indicadores qualitativos de RH e quantitativos podem ser
aplicados. Seguindo Magalhães (2006), indicadores quantitativos são aqueles
utilizados quando há interesse por dados números os quais se deseja manter
controle, entre eles turnover, absenteísmo, custo médio por empregado, tempo
médio de preenchimento de vagas, tempo médio de treinamentos e afins. Entre
os qualitativos, é possível citar clima organizacional (satisfação de
colaboradores), satisfação de clientes internos e externos e através deste dado
será possível mensurar a opinião das pessoas, seus valores e os próprios
valores do hospital.

Fonte:www.rtvcanal38.com.br

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Autores como Gomes (1999 apud Magalhães 2006), sugere a divisão dos
indicadores nos seguintes grupos:
a) Indicadores Operacionais: aqueles que permitem medir a eficiência de
um dado processo-chave, indicadores de eficiência medem,
predominantemente, o consumo de recursos humanos, materiais, físicos,
financeiros e tecnológicos.
b) Indicadores de Qualidade: aqueles que permitem medir o envolvimento
e comprometimento dos empregados, nível de educação, qualificação,
treinamentos, motivação e satisfação das pessoas.
c) Indicadores estratégicos de RH: aqueles que avaliam atividades,
produtos e serviços de RH como se o segmento de RH fosse uma empresa
prestadora de serviços. Para o autor, tais indicadores podem medir o nível de
satisfação dos clientes para cada atividade ou processo ligado à gestão de RH.

Outro agrupamento citado por Assis (2005 apud Magalhães 2006), que é
sugerido pelo Instituto Sextante Brasil, pretende focar em dez grandes áreas:
 Eficácia organizacional: o grupo de indicadores que auxiliam na avaliação
do valor agregado pelo capital humano às organizações, tomando-se por
base de custos, receitas despesas e retorno;
 Estrutura de RH: voltados à avaliação de despesas diretas, estruturas,
serviços números, níveis e categorias de seus profissionais e afins;
 Remuneração: voltados à avaliação das estratégias e dos sistemas de
recompensa e de reconhecimento utilizados pelas organizações;
 Benefícios: são os indicadores que auxiliam, em conjunto com o anterior,
na compreensão da remuneração total;
 Absenteísmo e rotatividade: grupo de indicadores capazes de auxiliar na
compreensão do nível de abstenção ao trabalho e flutuação dos
empregados; recrutamento e seleção, aqueles que auxiliam na
compreensão do nível de aproveitamento interno, admissão de novos
empregados, custo com admissões, tempo de preenchimento de vagas e
afins;
 Educação e aprendizagem: indicadores que dão informações sobre os
esforços na capacitação do capital humano;

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 Saúde ocupacional: utilizados para a identificação dos esforços realizados
em segurança do trabalho e saúde ocupacional;
 Relações trabalhistas: estão relacionados com a compreensão das
demandas trabalhistas, custos das reclamações, paralisações por greves
e afins;
 Perfil da força de trabalho: auxiliam na compreensão do perfil da força de
trabalho, incluindo aspectos ligados à formação, faixa etária e afins.

Este último agrupamento apresenta características mais completas e mais


estratégicas para o setor de saúde e, estes indicadores, devem ser monitorados
permanentemente para melhoria do desempenho e alcance dos alvos definidos
pela empresa. Estas práticas de RH têm sido cada vez mais buscadas pelos
gestores de saúde, contudo, como exposto neste trabalho, ainda há muito
trabalho por parte dos gestores de pessoas para abertura de atuação neste
setor, o RH está em constante evolução atuando em ambientes que se
transformam frequentemente e em especial naqueles que são competitivos. Ao
longo do tempo não são apenas mudanças terminológicas no que tange a
administração de pessoas, mas tem trazido meios e resultados de alta
complexidade e competitivos na globalidade.
Com base na pesquisa realizada por Magalhães (2006), o RH é um setor
dinâmico da organização hospitalar, os indicadores seguem um desenho
metodológico e nesta atmosfera não tendem a seguir isoladamente. Estes
indicadores exercem poder de decisão para a formulação estratégica da gestão
de pessoas.
Os usos destas ferramentas de RH são relevantes para o cenário atual e
cada vez mais vem sendo percebidas como tal, e para maior força a Gestão de
Pessoas hospitalar precisa cada vez mais atuar para que os funcionários e
prestadores de serviços sejam vistos como agentes da organização, que fazem
a diferença entre o relacionamento externo e interno dos hospitais.
Para muito além do que é entendido por profissionais técnicos que estão
em cargos de direção, em que o profissional de RH deve apenas seguir o
tradicional de controle de ponto, recrutamento de colaboradores, aplicar
punições e realizar integrações superficiais entre empresa e colaborador, este
profissional o tempo todo deve ter espaço para aplicar práticas estratégicas de

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RH que levarão de forma saudável para a organização valores de
desenvolvimento tanto da qualidade de prestação de serviços, bem como maior
lucratividade para as empresas de saúde.
No ambiente hospitalar entre diversos desafios enfrentados pelo gestor
de pessoas, estão a diversidade do perfil dos profissionais que prestam serviço
neste espaço, há uma valorização e predomínio do conhecimento técnico, as
estruturas de poder são excessivamente tradicionais e a carga horária costuma
ser extensiva, há a preocupação com as patologias, porém o processo de
humanização ainda é muito recente, o estresse de lidar com a vida ou com o
risco de morte diário é eminente, as pessoas devem se desenvolver
tecnicamente porém pouco se valoriza o desenvolvimento comportamental.
Quando se fala da gestão de pessoas na área da saúde precisamos
considerar que mesmo aqueles colaboradores de formação não técnica na área
estão totalmente ligados às ações técnicas da medicina, como recepcionistas
que precisam a todo tempo estar em contato com convênios/seguros de saúde
e são pontes com clientes/pacientes, desta forma a assessoria do RH deve ser
em todos os níveis da empresa, conforme Ciclo de Processo de RH
anteriormente apresentado neste trabalho.
Nos hospitais a matéria-prima é humana, o produto é humano, seu
trabalho é feito essencialmente por mãos humanas e o objetivo padrão é o bem-
estar de seres humanos. (MONTEIRO, 2009). Desta forma, a gestão de pessoas
estratégica deve ser utilizada por organizações hospitalares, em que as ações
devem resgatar o tempo todo o conhecimento como um valor para estas
organizações e as técnicas de gestão que se fundamentam pelas metodologias
comportamentalistas, conseguindo assim definir as competências chave para
empresa e montar seu planejamento estratégico de forma sólida.
Conforme proposta de Ulrich (1998), para o setor de saúde o RH deve ser
atuante como um parceiro empresarial, um verdadeiro agente de mudança.

4 FATORES QUE PODEM HUMANIZAR UMA INSTITUIÇÃO DE SAÚDE

A palavra humanização sintetiza todas as ações, medidas e


comportamentos que se devem produzir para garantir e salvaguardar a

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dignidade de cada ser humano como paciente de um estabelecimento de saúde.
Isto significa que o paciente deve estar no centro de cada decisão, não só um
produto de requerimentos funcionais, mas sim como uma expressão de valores
que se devem ser considerados. Para tanto, o paciente deve ser recebido como
único, dotado de sua história pessoal, pertencente a uma cultura, com seus
valores, sua religião, hábitos e costumes.

Fonte:www.a12.com

Para tornar agradável a estada do paciente nada melhor que um olhar,


sorriso e uma palavra para confortá-lo. A amabilidade da equipe de cuidados tem
o poder de tornar agradável a estada do paciente, apesar do sofrimento que o
acompanha.
A recepção deve acolher o paciente de forma a familiarizá-lo com a
instituição, pois o calor humano torna a recepção menos traumatizante.
O profissional de saúde, ao receber o paciente deve fazê-lo
humanamente, identificando-se com sua dor, isto é, compaixão, oferecer- -lhe
segurança, olhar e permitir ser olhado, ouvir e permitir ser ouvido, sem
julgamentos nem agressão.
Uma vez transferido para a unidade de internação, o profissional deve
possuir bom senso no que diz a respeito à relação humana. Ele deve receber

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preparação adequada, além de ser vocacionado e possuir capacidade de
estabelecer contato humano.
A privacidade é uma consideração primordial nos ambientes da prática da
medicina. Esta sensação crucial para os pacientes que recebem certos tipos de
tratamento, como nos casos dos pacientes de câncer, nos quais sempre se
manifesta o sentimento de depressão, ansiedade e temor de ser discriminado,
requer que os ambientes devam ter espaço que promovam adequadamente os
níveis de privacidade.
O paciente quer e precisa ter um relacionamento pessoal com aqueles
que o tratam. Para que o ambiente hospitalar se torne um diferencial nas
relações do cuidado humanizado, é preciso que a equipe técnica atue com
humildade, solidariedade, sensibilidade, além de postura correta e dignidade de
caráter. Para tanto, a humanização se constitui na presença solidária da equipe
técnica refletida na compreensão e no olhar sensível de cuidado, que desperta
no ser humano, sentimento acolhedor e de confiança. Ser solidário é demonstrar
sensibilidade e flexibilidade para com o outro.
É justo e mútuo o tratamento da instituição de saúde e do paciente,
exigindo assim que os respectivos direitos e deveres estejam claros e bem
definidos. É preciso preservar a sensibilidade pessoal e a dignidade humana dos
pacientes e seus familiares, pois estão atravessando momentos difíceis.
Quantas vezes durante uma visita numa instituição de saúde nos sentimos
golpeados pela frieza dos ambientes físicos, dificuldades de orientação, falta de
iluminação, de vista agradável, com a impressão de uma estrutura enorme,
opressora e potencialmente autoritária, em que a dimensão humana se sente
anulada.
A ideia é propor modelos de ambiente que decepem o medo e aumentem
a confiança e autoestima dos pacientes.
A pessoa doente está em desarmonia, não apenas em seu corpo que está
passando algum distúrbio, mas também entre seu corpo e sua alma. Por estar
fora de seu estado habitual, este indivíduo necessita sentir que está sendo
cuidado, não só fisicamente, mas também emocionalmente. É, portanto, muito
importante um ambiente apropriado que irá contribuir para o bem- -estar
fisiológico e psicológico do paciente.

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É possível melhorar o bem- -estar dos pacientes e aprimorar o
atendimento com a correta utilização das cores nos ambientes hospitalares.

Fonte:versatilrp.com.br

A cor é um elemento fundamental na vida humana, ou seja, é um elemento


significativo na sensação que o ser humano tem em um determinado espaço.
Existem diferenças subjetivas no modo como cada um percebe a cor, porém
biologicamente todos nós temos reações similares. É um item essencial na
composição arquitetônica, extremamente pelos efeitos positivos ou negativos
que possam interferir na paisagem.
As cores são ondas eletromagnéticas que estimulam nosso sistema
nervoso e endócrino, criando respostas biológicas distintas, como aumento dos
batimentos cardíacos e da pressão sanguínea em ambientes com tons saturados
de vermelho até a sonolência, dores de cabeça, ansiedade e depressão, no caso
de grandes superfícies brancas, amarelas ou azuis. Estas reações ocorrem
independentemente no nosso conhecimento.
Ainda seguindo o pensamento da autora, a escolha das cores em um
ambiente hospitalar deve ter função psicológica e estética, visando promover a
cura, melhorar o bem-estar físico e emocional do paciente, contribuir para a
acuidade de um diagnóstico visual, de procedimentos cirúrgicos, terapêuticos e

22
de reabilitação. Deve também otimizar a iluminação, a ergonomia visual,
orientar, informar, definir áreas e melhorar as condições de trabalho.
Por outro lado, o autor Watanabe entende que as atribuições de se
oferecer bem-estar, aconchego, conforto, estão relacionadas à hospitalidade,
pois é esta a responsável por tal efeito, porque resgata as origens e a essência
da assistência hospitalar, como uma organização acolhedora de pessoas que
não estão desfrutando de saúde. Destaca que a própria questão da humanização
de atendimento em saúde pode estar relacionada ou ainda pode ser beneficiada
da inserção do conceito de hospitalidade. Não estamos falando da perfumaria
ou luxo, mas de ambientes onde haja:
 a preocupação em oferecer aos internados e familiares espaço para uma
convivência não-hostil com profissionais do hospital;
 oferecimento de vínculos com o “mundo” que continua a “acontecer” fora
das fronteiras do hospital: notícias, contato com amigos. Como exemplo:
cybercafé, oferecimento de jornais, revistas, televisão, entre outros;
 opção de cardápio;
 cuidados com enxoval hoteleiro e cirúrgico: não é preciso que seja o mais
caro, mas sim bem cuidado (cheiro, cores agradáveis, confortável,
maciez, aparência, respeito à privacidade);
 acolhimento: não se limita a um curso de sorrisos, mas o desenvolvimento
de atividades comportamentais que estimulem e levem os profissionais a
repensarem e refletirem sobre posturas e comportamentos respeitosos,
amistosos, não- -invasivos nem indiferentes;
 ambientação: cuidado com o paisagismo, uso de cores, quadros e outros
elementos decorativos;
Dias salienta que a Hotelaria Hospitalar busca criar e organizar um
“espaço humano”, isto é, a partição do espaço para a escala humana, por
intermédio de elementos materiais – sistema material (paredes, portas, janelas,
painéis, pisos, e tetos), para atender a um conjunto de necessidades humanas
específicas. Agregar a este espaço equipamentos adequados e o trabalho cria o
ambiente do paciente/cliente.

23
5 A EVOLUÇÃO DA HUMANIZAÇÃO NA GESTÃO HOSPITALAR

A humanidade vivenciou revoluções importantes que marcaram a história:


o surgimento da agricultura, o advento da indústria e posteriormente a era das
informações ou a revolução das informações.
Essa revolução despertou na sociedade novos valores e princípios
almejados ao longo do tempo, inclusive aqueles que buscam o bem-estar físico,
social, mental e espiritual de seus membros.
Como cita Dias os dois últimos séculos, descobertas e avanços na
medicina trouxeram mudanças na imagem dos edifícios hospitalares e na
maneira de usá-los. A função do hospital de custódia dos doentes passa a ser
de local onde a vida pode ser salva e sua qualidade melhoras.

Fonte:valepublicar.com.br

Os avanços da ciência vão assim surgindo como a promessa de resolver


as angústias humanas e dominar a vida e a morte. A utopia da saúde perfeita
surge de forma clara na própria definição da saúde proposto pela OMS em 1948,
como sendo o estado de completo bem- -estar físico, mental e social, não
meramente a ausência de doença ou enfermidade.
O hospital da atualidade é uma organização complexa, onde atividades
industriais se misturam à ciência e à tecnologia de ponta, com o objetivo de

24
atender à clientela nas suas necessidades de saúde, sendo indisponível que
essa atenção seja oferecida em um ambiente seguro.
Existem limites para a consecução da produtividade nos hospitais através
da tecnologia, equipamentos e conhecimento técnico- -científico; porém, quando
esses limites são atingidos, só há uma coisa a fazer para melhorar-se no
mercado tão competitivo: investir na humanização, a última descoberta da
tecnologia moderna. A hotelaria traz em seu seio a humanização das pessoas e
do ambiente hospitalar.
Os processos humanos devem ser criativos, flexíveis e dependem de
percepções, sentimento e sensibilidade. Ninguém frequenta um hospital por sua
livre e espontânea vontade, mas por estar, circunstancialmente, obrigado a fazê-
lo. O cliente de saúde é um ser humano que está passando por momentos de
grande instabilidade emocional. Ele é um ser humano que quer atenção, respeito
e qualidade. As pessoas não são máquinas, têm grandes diferenças (e não só
biológicas). Elas amam, sentem, sofrem, têm conflitos, projetam, desejam. E são
essas pessoas que vão ao médico, ao hospital, buscar ajuda.
Taraboulsi nos lembra que nas instituições de saúde, todo cliente vem
procurar auxílio para seu problema, mas sempre em paralelo vem um estado
emocional alterado, com angústias, ansiedade, medo, agressividade, fragilidade,
depressão, entre outros.
Os profissionais que estão em contato com esses clientes devem ter em
mente que aqueles comportamentos não são dirigidos para quem está
atendendo; eles apenas refletem o estado psíquico daquele momento.
Estamos passando por um momento de intensa crise de humanismo.
Podemos perceber essa afirmação no relato de Pessini a seguir:
Ambientes desumanizados, tecnicamente perfeitos, mas sem alma e
ternura humanas. A pessoa doente deixou de ser o centro das atenções e, com
facilidade, é transformada em objeto de cuidados, perdendo seu nome e sua
identidade pessoal. Torna-se um número ou, simplesmente, um caso
interessante para a pesquisa.
Conforme relata Boeger, no hospital o cliente precisa ser bem acolhido,
pois está vivenciando um momento de grande vulnerabilidade. A
responsabilidade pela acolhida do cliente deve ser de todos os profissionais que
prestam serviço no hospital.

25
A humanização está diretamente ligada à hotelaria hospitalar e à as áreas
de atendimento. O cliente muitas vezes está debilitado, sonolento, ansioso e,
muitas vezes, até mesmo apavorado com o ambiente hospitalar. Como
oportunidade da ampliação de serviços prestados, a hotelaria passa a ser um
diferencial importante. Encantar o cliente com esses serviços tornou-se algo
bastante possível e consegue, em muitos casos, sua fidelidade.
O termo humanização hospitalar foi criado há anos para se discutir a
forma de contato e comunicação que ocorria dentro dos estabelecimentos de
saúde. O hospital é o local por excelência em que a fragilidade da saúde aparece
e confronta a realidade.
A humanização da saúde é um movimento controvertido. Surge de um
paradoxo entre a essência do ser, da capacidade do humano e a necessidade
da construção de um espaço concreto, nas instituições, que legitime o humano
das pessoas que, por vocação, escolheram trabalhar com a tênue e delicada
relação entre a vida e a morte.
Só é possível humanizar o atendimento quando o cliente é ouvido e
informado sobre todas as suas dúvidas, quando participa das decisões sobre os
procedimentos. Paralelo, o hospital da atualidade precisa proporcionar um
ambiente físico agradável e acolhedor (que faça o cliente se sentir mais em um
hotel do que em um hospital – ambiente que se relacione com dor, medo e
sofrimento).
É necessário criar um espaço humano por meio de elementos materiais
que atendam a um conjunto de necessidades humanas que ofereçam melhores
condições para recuperação da saúde do cliente ou para uma morte tranquila e
digna.
Muitas vezes a desumanização dos hospitais e dos serviços de saúde é
resultante da despersonalização dos pacientes que se tornam um número, uma
patologia, um órgão, entre outros, dissociados do todo, do seu ser humano com
histórias e vidas repletas de experiências.
Os clientes-pacientes querem ser atendidos como pessoas ativas, que
pensam, que podem interagir com o saber médico e dos demais profissionais.
Querem ser respeitados, bem tratados, sentir-se bem.
Para muitos, abrir um espaço cultural de atividades complementares às
atuações dos profissionais de saúde já é o novo para a instância hospitalar;

26
outros acreditam que uma mudança de layout, associada à hotelaria hospitalar,
seja humanização; ainda há aqueles que apregoam que com treinamento efetivo
dos profissionais envolvidos com o cliente pode-se criar vínculos no ato do
cuidar.
Outros autores lembram dos princípios éticos da bioética, como a
autonomia do paciente, a beneficência, a não maleficência e a justiça, que
devem imperar nas relações humanas dentro das instituições hospitalares.
Linguisticamente, humanizar é dar o humano ao próprio humano.
Humanizar a saúde é dar qualidade para a relação, é suportar as
angústias do ser humano diante da fragilidade do corpo. O humanizar não pode
ser imposto, normatizado, como também não pode ser relegado a uma
maquiagem hospitalar de hotelaria, de bons modos e costumes, de treinamento
da comunicação entre os membros do hospital e seus usuários. Nos hospitais
como em qualquer instituição, é preciso esclarecer critérios para que se organize
as atividades e se busque qualidade nos serviços.
Humanização é o processo de transformação da cultura institucional que
reconhece e valoriza os aspectos subjetivos, históricos e socioculturais dos
pacientes e profissionais, melhorando as condições de trabalho e a qualidade do
atendimento, por meio da promoção de ações que à competência técnica e
tecnológica, agregam o valor da dimensão subjetiva dos participantes.
Para que os trabalhadores de saúde possam exercer sua profissão com
honra e dignidade, respeitar o outro e sua condição humana, necessitam manter
sua condição humana também respeitada, trabalhar em condições adequadas,
receber uma remuneração justa e o reconhecimento de suas atividades e
iniciativas.
Um meio de humanizar o atendimento é a preocupação com as notícias
dadas às famílias. A notícia sobre o estado dos enfermos ou as notícias de morte
para a família pode ser dada pela equipe, que informa e presta esclarecimentos
à família.
Entenda-se equipe como a unidade multidisciplinar que permeia todo o
atendimento. Formada pelos médicos, enfermeiros, assistentes sociais,
psicólogos e outros profissionais envolvidos no atendimento. Trata-se de um
momento em que a atuação tem de ser efetuada num clima de total
entendimento, diálogo e profissionalismo.

27
Outras ações que podem ser tomadas pela hotelaria hospitalar, que
poderão auxiliar na humanização são:
 canal para sugestões e reclamações e ouvidoria. Não se deve
tratar o usuário que reclama como adversário ou inimigo. Das
reclamações podem surgir soluções e ideias importantes. Através
da ouvidoria ou da caixa de sugestões, nenhuma questão pode
ficar sem resposta;
 comemoração do dia do aniversário do paciente internado:
utilizam-se bexigas, enfeites e até bolo para comemorar o
aniversário do paciente, com fotografias que garantem uma
agradável lembrança;
 atividades lúdicas: trabalhos desenvolvidos avaliam que a atividade
lúdica diminui drasticamente os índices de desistência do
tratamento e melhora a colaboração da criança com os
procedimentos médicos.
 brinquedoteca: medidas de segurança quanto ao controle de
infecção hospitalar devem ser rigorosas. Pode existir uma
brinquedoteca móvel para crianças com dificuldade de locomoção.
Os brinquedos são laváveis e devem ser autorizados pelo médico
do controle de infecção hospitalar. A limpeza e esterilização dos
brinquedos são de responsabilidade dos próprios profissionais da
brinquedoteca hospitalar. Os livros são plastificados para facilitar a
higiene;
 doutores da Alegria: o objetivo principal está ligado à diversão com
intuito de melhorar a qualidade de vida. Resultados de pesquisas
mostram que, apesar do trabalho dos Doutores da Alegria ser
dirigido para as crianças, tem efeitos extensivos a pais,
profissionais de saúde e funcionários dos hospitais. Com relação
ao staff, esses resultados se traduzem pela diminuição do estresse
no trabalho, melhora da auto percepção profissional e da imagem
do hospital, bem como melhora da comunicação entre os membros
da equipe e destes com familiares e pacientes;

28
 acompanhamento escolar da criança por pedagogos; Projeto
Carmim: transformar o quarto do paciente em ateliê; A arte como
promoção humana; Músicos que tocam e cantam nos andares do
hospital são exemplos de ações humanizadas.
A seguir, Masetti descreve os benefícios da presença dos Doutores da
Alegria no contexto hospitalar:
A surpresa da presença de um palhaço como conceito aparentemente tão
oposto à realidade hospitalar, tem a capacidade de brecar, ou suspender
momentaneamente a lógica dos pensamentos e a dinâmica dos sentimentos
vividos por pacientes, familiares e profissionais. Isso abre espaço para que essas
pessoas percebam novos processos que acontecerão a partir da visão de mundo
do palhaço.
Segundo Boeger ações como essas podem influenciar o tratamento e na
recuperação positivamente. O riso é a expressão mais pura da saúde. A criança
resgata o direito à infância, à criatividade, à sociabilidade, à experiência, à
descoberta, à espontaneidade. A doença, o tratamento e a quebra da rotina
diária podem provocar e agravar desequilíbrios nos pacientes e suas famílias.
Atitudes de humanização servem para restauração de dignidade humana.
Nem sempre o humanizar é possível, nem o cuidar é realizado. Zaher20
descreve alguns aspectos que podem atrapalhar a humanização hospitalar:
sobrecarga de trabalho, sobrecarga de responsabilidade diante do sofrimento
humano, vá- rios pacientes a ser assistidos, poucas condições de trabalho,
escassos recursos humanos e de material, aliados a questões sociopolítico-
econômicas de um país como o Brasil, onde a saúde tem pouco e efetivo apoio
governamental. O trabalho torna-se robotizado, desafetizado e automatizado,
sendo muitas vezes alienado.
Humanizar a assistência hospitalar implica dar lugar tanto à palavra do
usuário quanto à palavra dos profissionais da saúde, de forma que possam fazer
parte de uma rede de diálogo, que pense e promova as ações, campanhas,
programas e políticas assistenciais a partir da dignidade ética da palavra, do
respeito, do reconhecimento mútuo e da solidariedade.
As organizações têm como objetivo produzir bens e serviços, visando à
satisfação das necessidades das pessoas. Os clientes de saúde precisam ser

29
enxergados como pessoas, tratados como pessoas e respeitados, e nada melhor
que a empatia para entendermos esse estado de aflição e insegurança.
A grandeza do papel desempenhado pelos hospitais confere a seus
empregados, enfermeiros, médicos e voluntários, pois trabalhar no ambiente
hospitalar significa servir com amor e desprendimento e, sendo assim, torna-se
também uma missão a cumprir.
Muito foi feito, mas muito ainda há por fazer. As sociedades crescem,
evoluem, desenvolvem- -se, entretanto, a vida tem mostrado que o crescimento
tecnológico é muito mais rápido que a razão humana e do que o tempo das
relações entre as pessoas.
Surgem as crises, as violências, os medos. Perdem-se os valores. Para
Pessini “o grande desafio é cuidar da dor e do sofrimento humanos nas suas
dimensões física, psíquica, social e espiritual, com competência tecnocientífica
e humana.
O que se deve levar em consideração é o quanto na recuperação do
paciente e na hospedagem do acompanhante podemos contribuir. O quanto é
válido a hotelaria hospitalar, aplicando-se no acolhimento e bem-estar do cliente.
A humanização dos serviços médico-hospitalares é a vantagem que
poderá fazer a diferença na conquista do cliente de saúde, e a hotelaria com
seus serviços adaptados à atividade hospitalar é o caminho a ser seguido para
acoplar qualidade em todas as fases do processo de atendimento.
Para que os profissionais de saúde possam exercer sua profissão com
honra e dignidade, respeitar o outro e sua condição humana, necessitam manter
sua condição humana também respeitada: trabalhar em condições adequadas,
receber uma remuneração justa e o reconhecimento de suas atividades.

6 HUMANIZAÇÃO DO AMBIENTE HOSPITALAR

Em alguns casos, humanização equivale a melhorias na estrutura física


dos prédios. Sem dúvida, são medidas relevantes numa instituição. No entanto,
podem ser fatores meramente pontuais se não estiverem inseridos em um
processo amplo de humanização das relações institucionais.

30
Essa nova tendência, que traz em sua essência a humanização do
ambiente hospitalar, pode parecer luxo para alguns, mas a receptividade dos
clientes de saúde ao tratamento e a satisfação observada facilitaram muito o
serviço médico e diminuíram, consideravelmente, os quadros depressivos.
Mudanças na arquitetura, programação social, serviços de hotelaria,
quadro em exposição, música ambiente, restaurante, piano-bar e apresentações
de músico fazem com que alguns hospitais deixem de ter cara de hospital.
Boeger descreve algumas ações encontradas nos hospitais como forma
de humanizar o ambiente: criar espaços especiais relaxantes para
acompanhantes; design arredondado, mobiliário moderno; rodapés
arredondados para não acumular sujeiras; quadros e telas para esconder a
“régua de oxigênio “.

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7 LEITURA COMPLEMENTAR

Nome do autor: Marina Campos Morici e Allan Claudius Queiroz Barbos

7.1 A gestão de recursos humanos em hospitais do sistema único de


saúde (SUS) e sua relação ao modelo de assistência: um estudo em
hospitais de Belo Horizonte, Minas Gerais.

RESUMO
O artigo discute a gestão de recursos humanos em hospitais de Belo
Horizonte, Minas Gerais, considerando a relevância do debate no contexto
gerencial contemporâneo e suas implicações ao modelo assistencial
preconizado pelos hospitais analisados. A partir de levantamento de dados
(entrevistas semiestruturadas com gestores e profissionais de recursos humanos
e análise de documentos pertinentes às práticas e normatizações existentes), o
estudo aponta uma defasagem nas políticas e práticas de recursos humanos,
com a contratação via concurso público não conseguindo suprir de forma ágil a
atividade assistencial. Os resultados apontam ainda ser esse um fator
determinante na fixação e motivação dos profissionais, o que diferencia em
termos de autonomia aqueles hospitais onde a gestão de recursos humanos
ocorre via regras do direito privado.

Palavras-chave: políticas e práticas de recursos humanos; hospitais;


recursos humanos em saúde.

INTRODUÇÃO
Este trabalho procura descrever e discutir as políticas e práticas de
recursos humanos desenvolvidas em hospitais que atendem pelo Sistema Único
de Saúde (SUS). Considerando sua interface com a assistência, visa também
analisar a forma de administração (natureza pública ou privada) das instituições
em termos de sua adoção ao modelo assistencial preconizado. A área da saúde
se caracteriza por uma grande demanda de mão de obra qualificada, o que exige
adoção de políticas e práticas de gestão de recursos humanos capazes de
responder a esse contexto. Com a crescente necessidade em buscar novas

32
configurações capazes de proporcionar uma gestão mais flexível, notadamente
através de parcerias entre o ente público e uma organização de direito privado,
a dimensão gerencial de recursos humanos assume uma relevância ímpar.
Este quadro, a forma de contratação influencia a gestão de recursos
humanos, na medida em que define, em última instância, a capacidade de
decisão. Isso é corroborado por La Forgia e Couttolenc, que afirmam ser a
capacidade de decisão a respeito dos funcionários um fator crucial para a gestão
da organização hospitalar: "O atendimento hospitalar depende muito dos
funcionários, a autoridade de decisão com respeito aos mesmos pode ser um
fator crucial" (La Forgia e Couttolenc, 2009:215).
Isso permite uma construção teórica que inicialmente situa o debate sobre
recursos humanos considerando ser esse um campo de grande complexidade
conceitual e operacional/prática. Posteriormente, uma discussão sobre o SUS e
a inserção dos hospitais permite o entendimento da lógica de recursos humanos.
A metodologia do estudo bem como seus resultados e considerações finais
encerram o debate proposto.

REFERENCIAL TEÓRICO
O debate sobre recursos humanos em saúde necessariamente exige
entender como é tratado esse tema tanto na acepção usual quanto na lógica do
SUS. Com efeito, é sempre necessário resgatar a inserção histórica para
entender seu papel "operacional" nas ações organizacionais e o que isso
representa em termos de impacto. Voltada à administração de pessoal e a
mecanismos assistenciais de suporte ao empregado, esta perspectiva, conforme
observa Albuquerque (1987), permite observar a evolução do departamento de
pessoal com as dificuldades inerentes à "importação" de um modelo gerencial
norte-americano, notadamente na forma como foram estabelecidas as relações
de trabalho no Brasil. A administração de recursos humanos nas organizações
brasileiras, segundo Albuquerque (1987:11), "tem sua evolução marcada pelas
limitações da legislação trabalhista, pela importação de técnicas de
administração de pessoal de países desenvolvidos, pela ausência e
manipulação no movimento sindical durante muitos anos e pela influência de
variáveis ambientais, externas à organização".

33
É comum observar na literatura sobre recursos humanos a tipologização
em fases ou momentos marcados por características inerentes a um dado
momento, conforme apregoa Sarsur (1999), ao definir fases nesta evolução: pré-
jurídico-trabalhista (pré-1930), marcada pela inexistência da legislação
trabalhista e de departamento pessoal; burocrática (1930 a 1950), com o
surgimento do departamento pessoal para atender as exigências da legislação
trabalhista elaborada nesse período; tecnicista (décadas de 1950 e 1960),
preocupada com eficiência e produtividade em função da implantação da
indústria automobilística; sistêmica (décadas de 1960 a 1970), com o surgimento
da área de recursos humanos na estrutura organizacional; a década de 80,
marcada pelo contexto de novas relações de trabalho, e a década de 90,
caracterizada pelo acentuado avanço tecnológico e o aumento da
competitividade, trazendo um grande desafio à função de recursos humanos no
que se refere a repensar sua posição e adotar novas práticas.
Considerando os processos de recursos humanos e seu reforço ao
componente histórico, uma visão considerada tradicional baseia-se na
subdivisão de atividades afins correlacionadas a um mesmo objetivo. Ou seja,
classicamente são consideradas cinco subáreas de caráter técnico:
suprimento/provisão (recrutamento e seleção), aplicação (análise e descrições
de cargos, plano de carreiras e avaliação de desempenho), manutenção
(remuneração e benefícios, medicina e segurança do trabalho), desenvolvimento
(treinamento e desenvolvimento) e controle (auditoria, banco de dados e sistema
de informações) (Albuquerque, 1987).
Essa tipologia não sugere imobilismo ou independência, o que permite
entender um dos grandes desafios à necessária integração dos processos, de
forma que contribuam efetivamente para o alcance das estratégias
organizacionais e consequente realização dos objetivos pessoais. Nesta
perspectiva, Boxall e Purcell (2007) observam ser a gestão de recursos humanos
um processo inevitável nas organizações, dedicado ao gerenciamento de
pessoas e do trabalho executado, em diferentes níveis de gestão, e que tende à
incorporação de diferentes estilos de gestão e matizes ideológicos.
O que, em última instância, se observa é que estes processos se
desenvolvem pouco articulados às estratégias organizacionais, reforçando a
observação de Fischer (1998:119) de que "o papel da gestão de RH é manter a

34
competência instalada, evitando a depreciação deste ativo intelectual da
organização". Mais recentemente, as transformações do éthos produtivo, com
um discurso pautado pela lógica dos resultados e cumprimento de metas,
tornaram evidente a dificuldade de ajuste da atividade de recursos humanos. À
luz desse debate, a lógica da gestão de recursos humanos no contexto
organizacional apresenta contradições quando confrontada com a realidade
brasileira. Caldas e colaboradores (2003), por exemplo, demonstraram o
expressivo crescimento na produção científica, mas indicaram uma preocupação
fortemente centrada em estudos que não ampliam o horizonte analítico,
restringindo-se, em sua imensa maioria, a uma análise de empresas ou
situações com suas dadas especificidades.
Essa situação evidencia a ênfase comportamental dos artigos publicados,
com provável ligação a um ambiente organizativo que remonta ao período de
maior estabilidade, típico da chamada era de ouro do fordismo (pós-Segunda
Guerra Mundial até a década de 1970) e uma abordagem metodológica que não
permite generalizações confiáveis.
Este quadro evidencia um debate ainda secundário e com pouco
destaque e voz diante das decisões de natureza estratégica das organizações.
No caráter contemporâneo do debate, Kamoche (2001) observa que a discussão
sobre recursos humanos teve algumas marcas significativas durante as décadas
de 1980 e 1990, notadamente no que concerne aos temas em voga naquele
período. Boxall, Purcell e Wright (2007), por sua vez, identificam três principais
campos na gestão de recursos humanos: a micro gestão, que abrange as
subfunções de recursos humanos (recrutamento, seleção, formação etc.) e o
debate sobre as relações de trabalho em sentido mais amplo. A
gestão estratégica de recursos humanos abrange as estratégias globais
adotadas por unidade de negócio e empresas e procura mensurar o impacto
sobre o desempenho. E, por fim, a gestão internacional de recursos humanos,
que examina como as empresas operam além de suas fronteiras nacionais.
Lengnick-Hall e colaboradores (2009) identificaram sete grandes temas na
perspectiva temporal que alimentaram a trajetória do debate sobre estratégia de
recursos humanos: contingência e ajuste; foco na gestão de pessoas para
criação de contribuições estratégicas; elaboração de componentes do sistema
de recursos humanos e da estrutura; ampliação do escopo do debate; a

35
realização de implementação e execução; medição de resultados; e, por fim,
avaliação das questões metodológicas. Cada um desses temas desempenhou
um papel significativo na evolução do campo e proporcionou
diferentes approaches ao debate. Deadrick e Gibson (2007) sugerem que há
inúmeras lacunas que dissociam as duas dimensões, variando, em função da
área, quanto à magnitude e profundidade.
Existem argumentações de que o campo de recursos humanos, em
grande medida, não apresenta uma teoria para orientar a pesquisa sobre as
principais questões (Campbell, 1990), sendo parte da pesquisa realizada nesta
área de baixa qualidade e normalmente descrevendo fenômenos
organizacionais, em detrimento da eficácia das práticas de recursos humanos
(Dunnette, 1990).
À luz destas diferentes e múltiplas argumentações, existe um relativo
entendimento de que a área de recursos humanos tem se caracterizado por uma
postura mais passiva e adaptativa diante das transformações, fato observado
por autores em estudos conduzidos na década de 1990 e reforçado com a
entrada no século XXI. Isso demonstra a relevância do debate e sua relevância
no espaço da saúde, que exige inicialmente a compreensão de sua lógica
histórica em termos de constituição do SUS no Brasil.

O SUS E OS HOSPITAIS
Em 1985, com o fim do regime militar, lideranças do movimento sanitário
assumem efetivamente posições em postos-chave nas instituições responsáveis
pela política de saúde no país. Na 8ª Conferência Nacional de Saúde, em 1986,
em Brasília, são lançados os princípios da Reforma Sanitária, aprovando-se a
criação de um Sistema Único de Saúde, que se constituísse em um novo
arcabouço institucional, com a separação total da saúde em relação à
Previdência (Brasil, 2007).
Os principais desdobramentos da 8ª Conferência Nacional de Saúde
foram a constituição da Comissão Nacional de Reforma Sanitária (CNRS) e a
conformação da Plenária Nacional de Saúde. A primeira foi responsável por
elaborar a proposta do capítulo referente à saúde para a Constituição (Escorel e
Teixeira, 2009).

36
A criação do SUS aconteceu com a promulgação da Constituição de 1988,
redefinindo o conceito de saúde e incorporando novas dimensões em seu
entendimento, tais como alimentação, moradia, emprego, lazer, educação etc.
O art. 197 da Constituição Federal (Brasil, 1988) define a relevância
pública das ações e dos serviços de saúde, cabendo ao poder público dispor
sobre sua regulamentação, fiscalização e controle. A celebração do SUS implica,
portanto, a reafirmação destes três princípios somados à universalidade em
todas as ações e serviços de saúde. Sua regulamentação por meio da Lei
Federal nº8.080/1990 veio acompanhada de resultados marcantes ao longo dos
anos.
Com efeito, em 2006, a organização do SUS como uma rede diversificada
envolvia cerca de 6 mil hospitais, 26 mil equipes de saúde da família, 215 mil
agentes comunitários de saúde e 13 mil equipes de saúde bucal em mais de 5
mil municípios brasileiros (Brasil, 2006).
Nesse contexto, os hospitais integrantes do sistema enfrentam desafios
como o subfinanciamento, a baixa capacidade gerencial e a ineficiência de
escala. O subfinanciamento é um tema largamente discutido, e pode ser
constatado mediante o pagamento insuficiente de alguns procedimentos, para
os quais são pagos valores muito abaixo de seus custos. Além dos desafios
financeiros, o sistema funciona com baixa capacidade gerencial. Na área de
Recursos Humanos, a baixa capacidade gerencial está diretamente relacionada
à dificuldade de monitoramento e avaliação dos resultados individuais e dos
gastos com pessoal (Brasil, 2006).
O desafio da eficiência é destacado por La Forgia e Couttolenc (2009). Os
autores afirmam que os hospitais podem avançar muito no que diz respeito à
utilização dos recursos disponíveis no SUS e a eficiência pode ser aumentada a
partir de investimentos em instituições de maior porte, uma vez que foi
encontrado pelos autores sensível aumento na eficiência dos hospitais à medida
que o número de leitos cresce.
Mesmo sendo sensíveis os avanços obtidos pelo SUS no campo da
Atenção Primária (Brasil, 2009), ainda está presente nos hospitais a sobrecarga
de atendimentos imposta pelos casos não atendidos na atenção básica. Lobato
(2000) destaca que, muitas vezes, devido à falta de funcionamento pleno da
atenção básica ou mesmo pela falta de uma estrutura mínima de operação, recai

37
sobre os hospitais o peso das questões de saúde não resolvidas no nível
primário. Os usuários tendem a procurar unidades de emergência em hospitais,
o que sobrecarrega o atendimento nas mesmas. Com isso, problemas de saúde
mais simples passam a competir com emergências reais de atenção. Essa
questão onera duplamente a rede: por um lado, diminui a capacidade de
atendimento hospitalar das reais demandas de média e alta complexidade e, por
outro, onera financeiramente a máquina estatal, uma vez que procedimentos
realizados em serviços especializados custarão mais aos cofres públicos.
Para Elias (1999), a discussão sobre modalidades de gestão transformou-
se numa das questões centrais na agenda pública brasileira, destacando-se
mais do que as discussões a respeito da assistência em si. Longo (2004)
corrobora este aspecto ao situar que a maior motivação para a busca dessas
formas alternativas de gestão está na possibilidade de flexibilização da Gestão
de Recursos Humanos.
Os hospitais brasileiros estão submetidos a diferentes regimes
administrativos e modelos de gestão. Braga Neto, Barbosa e Santos (2009)
distinguem três grandes conjuntos de hospitais segundo propriedade de
patrimônio e normas administrativas de funcionamento. O primeiro seria o de
caráter público e estatal, integrando a administração pública. O segundo é
constituído no âmbito privado, mas compõe de forma diferenciada interesses de
caráter público, e o terceiro é composto do âmbito privado, operado com base
nas regras de mercado, podendo ou não prestar serviço para o SUS.

A GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS E A SAÚDE


O Relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) (2007) ressalta a
importância dos recursos humanos nos sistemas de saúde. No caso brasileiro,
isso ocorre e vem se difundindo a partir da percepção de gestores, trabalhadores
e representantes do governo de que a formação, o desempenho e a gestão de
recursos humanos afetam profundamente a qualidade dos serviços prestados e
o grau de satisfação dos usuários (Seixas, 2002).
Para Fonseca e Seixas (2002), as políticas de recursos humanos são
destacadas como prioritárias para a consecução de um SUS democrático,
equitativo e eficiente. As dimensões do ideário do SUS influenciam fortemente a
formulação de políticas de recursos humanos para a saúde no Brasil, levando-

38
se em conta as questões conceituais (definição de saúde na Constituição
Federal), as diretrizes (universalidade, integralidade e equidade) e a organização
do sistema (pluralista, regionalizado, hierarquizado e descentralizado, com
direção única em cada esfera de governo).
Os desafios de recursos humanos encontrados no sistema de saúde
refletem-se nas instituições que compõem a rede. Cada instituição, no entanto,
responde a esses desafios de maneira própria, de acordo com sua organização
interna e a capacidade de estruturação.
A superação dos desafios relativos às questões de recursos humanos na
área da saúde internacional é abordada por diversos autores. Podem ser
resumidas, segundo Pierantoni, Varella e França (2004), em quatro grandes
objetivos: aumentar a cobertura e a fixação das equipes de profissionais,
objetivando assegurar a prestação de serviços de saúde de forma adequada e
equitativa; garantir competências e habilidades-chave para a força de trabalho
em saúde; aumentar o desempenho da equipe de profissionais diante de
objetivos definidos; e fortalecer a capacidade de planejamento e gerenciamento
de RH no setor saúde.
Os mesmos objetivos podem ser encontrados no relatório da Organização
Mundial de Saúde. São apontadas estratégias de recursos humanos para lidar
com os problemas mundiais de saúde. Institucionalmente, as estratégias
relativas à força de trabalho devem focar três desafios principais: melhorar o
recrutamento, ajudar a força de trabalho a melhorar seu desempenho e diminuir
a rotatividade dos trabalhadores. A otimização do desempenho dos atuais
trabalhadores adquire ênfase porque: a) provavelmente apresenta resultados
mais rápidos do que o aumento do número de trabalhadores; b) as possibilidades
de aumento do número de trabalhadores são limitadas na maioria dos casos; c)
a força de trabalho com bom desempenho auxilia o recrutamento de novos
trabalhadores, bem como a conservação dos existentes; e d) os governos devem
assegurar a justiça e a eficiência da utilização dos recursos financeiros
disponíveis (OMS, 2007).
Seria função de recursos humanos nas organizações hospitalares a
gestão do emprego, de sistemas de apoio necessários para a realização do
trabalho e a criação de um ambiente de trabalho positivo, considerando as três
etapas apontadas pela OMS (2007): a entrada de funcionários, a implementação

39
das alavancas para melhoria do desempenho dos trabalhadores e a gestão da
saída de profissionais.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A metodologia qualitativa foi escolhida no presente estudo, entendendo-
se tratar da melhor forma de buscar a compreensão das relações estabelecidas
entre as políticas e práticas de Recursos Humanos presentes em hospitais no
SUS, a capacidade de resposta dessas políticas e práticas de Recursos
Humanos às demandas de assistência hospitalar e as possíveis diferenças entre
políticas e práticas de Recursos Humanos desenvolvidas em hospitais com
diferentes naturezas jurídicas.
Estudo se caracteriza como descritivo. Segundo Seltiz e colaboradores
(1965), estes estudos podem ser usados com a intenção de descobrir ou testar
se determinadas variáveis estão associadas. Em um primeiro momento, foram
executadas as atividades de descrição dos fenômenos e a relação entre as
variáveis estudadas em cada uma das organizações hospitalares. No segundo
momento da pesquisa buscou-se estabelecer relações entre as realidades
presentes em cada uma das organizações e, posteriormente, entre as
características peculiares a cada um dos grupos de hospitais estruturados.
Isso permitiu a construção dos roteiros utilizados nas entrevistas (tanto
dos gestores de RH quanto dos gestores assistenciais). As categorias refletem
o referencial teórico adotado, tanto nas dimensões jurídico-normativas quanto
naquelas associadas a Recursos Humanos especificamente e à área hospitalar.

OS HOSPITAIS ESTUDADOS: PERCURSO DE ESCOLHA


Considerando a demarcação metodológica adotada e o espaço hospitalar
como local de coleta de dados e aprofundamento das dimensões construídas no
referencial teórico, a escolha dos casos a serem estudados, isto é, dos hospitais
que atendem ao SUS se deu de forma intencional, procurando identificar aqueles
com práticas e políticas de Recursos Humanos bem estruturadas e reconhecidas
e claramente associadas ao modelo de assistência.
A delimitação territorial foi a cidade de Belo Horizonte, que conta com uma
rede de saúde articulada, onde existem esforços integrados para que as ações
de saúde potencializem o cuidado aos pacientes. Desde a década de 1990 a

40
Secretaria Municipal já havia assumido toda a gestão dos serviços de saúde no
seu território (Magalhães Júnior, 2010).
Segundo Magalhães Júnior (2010), a experiência de estruturação da rede
de saúde de Belo Horizonte é reconhecida por diversos estudos científicos como
a maior e mais densa experiência moderna brasileira de atenção primária com
base em todo o sistema municipal de saúde. A organização do sistema municipal
de saúde passou ao longo dos últimos anos pela reorganização da atenção
primária, das redes de suporte e por ações articuladas de saúde coletiva.
O município de Belo Horizonte conta, desde o advento da gestão plena
em 1994, com uma série de instrumentos para gestão do sistema municipal de
saúde, regulando todos os serviços públicos e privados contratados pelo SUS.
Com isso, foi possível a reorganização do sistema, com desenvolvimento de
controles e avaliações objetivando a coibição de fraudes, o redimensionamento
de recursos do teto financeiro municipal de um setor para o outro, o investimento
vigoroso na rede própria de serviços, o investimento em tecnologias e a
implantação de novas modalidades assistenciais e a participação da população
na gestão do sistema (Magalhães Júnior, 2010).
O alto grau de desenvolvimento da rede de saúde municipal torna-se um
atrativo para a realização do estudo no município de Belo Horizonte. No que diz
respeito às instituições hospitalares, o município conta com o total de 89
hospitais (públicos e privados), sendo 37 hospitais gerais, 39 hospitais
especializados, um pronto-socorro geral e dois especializados, segundo dados
do CNES (2011).
Os hospitais inicialmente escolhidos para participar do estudo foram
definidos após consulta prévia à Subsecretária de Saúde do Município sobre a
viabilidade de acesso às informações pertinentes ao estudo, sendo identificado
um grupo inicial de cinco hospitais. Os mesmos foram convidados a participar do
estudo e quatro responderam afirmativamente. Entre os que aceitaram
participar, foi possível identificar aqueles hospitais administrados segundo as
regras do direito público (uma autarquia federal e uma autarquia municipal) e
aqueles hospitais administrados segundo as regras do direito privado (uma
fundação privada e um contrato de gestão entre o estado de Minas Gerais e uma
fundação privada), sendo dois hospitais em cada uma dessas tipologias.

41
O hospital HBH1 é uma autarquia da prefeitura municipal de Belo
Horizonte. Possuía 413 leitos no momento do estudo. Compreende, além de um
hospital geral, um pronto-socorro de urgência e emergência. O hospital HBH2
faz parte de uma instituição federal de ensino superior e possui 433 leitos. É um
hospital de ensino voltado para o desenvolvimento de tratamentos inovadores e
complexos. No momento da coleta de dados, atendia o SUS e alguns convênios
de saúde. O hospital HBH3 é uma instituição filantrópica particular. Trata-se de
hospital geral com 233 leitos. No momento da coleta de dados, 90% de seus
atendimentos eram pelo SUS. O hospital HBH4 é fruto de uma parceria "público-
público" entre a Secretaria de Saúde do Estado de Minas Gerais e uma
universidade pública de âmbito federal. O hospital possuía no momento da
pesquisa 319 leitos voltados para o atendimento de urgência e emergência,
traumatológica e não traumatológica.

COLETA DE DADOS: FONTES E INSTRUMENTOS


A metodologia de coleta de dados visou atuar de maneira a possibilitar o
entendimento da estrutura de funcionamento da área de Recursos Humanos
inserida na lógica da gestão de cada hospital estudado, bem como sua relação
com as atividades assistenciais.
Os estudos de caso foram realizados mantendo-se os mesmos critérios
em todas as instituições selecionadas, sendo colhidos dados através de:
entrevistas, observação direta e análise de documentos institucionais e
normativos (legislação) disponibilizados. A utilização de diferentes fontes de
dados pretende aumentar a confiabilidade das informações colhidas, uma vez
que permite a confrontação de dados contrastantes. Com a intenção de colher
informações e percepções tanto de profissionais ligados ao setor de Recursos
Humanos quanto da área da assistência, as entrevistas foram realizadas em
todos os casos com representantes dos dois grupos: profissionais de Recursos
Humanos e gestores assistenciais.
Na área de Recursos Humanos, foi priorizada a coleta de dados junto ao
responsável geral, e a entrevista a analistas e/ou outros profissionais da área
teve como objetivo complementar as informações recebidas. Foram colhidos
dados a respeito das políticas e práticas de Recursos Humanos, buscando
informações sobre a estruturação formal de políticas bem como das ações de
42
gerenciamento de pessoal correntes na organização. Também foi investigada a
percepção da relação das políticas e práticas de Recursos Humanos com as
atividades assistenciais.
A entrevista com os gestores das áreas assistenciais teve como base um
roteiro similar, enfocando as mesmas questões de Gestão de Recursos
Humanos. Foram também colhidos dados a respeito da percepção destes
gestores acerca da adequação das práticas e políticas de Recursos Humanos
desenvolvidas para as necessidades diárias da assistência, explorando-se as
contribuições ou os entraves causados pelas políticas e práticas tal como
estruturadas. Para tanto, foram entrevistados responsáveis pela gestão de
trabalhadores na área assistencial, dando-se especial ênfase a gestores das
áreas de médicos e enfermagem, por se tratar do maior contingente de
trabalhadores na área hospitalar.
Além das entrevistas, a observação direta tornou-se um importante
método de coleta de dados, na medida em que, segundo Seltiz e colaboradores
(1965), possibilita o registro do comportamento na ocasião em que ele ocorre.
Esse registro direto dos acontecimentos pode ser utilizado em certas situações
como forma de verificação das informações colhidas nas entrevistas.
A análise de documentos pertencentes às organizações estudadas
completou a coleta de dados. Documentos impressos e informações
disponibilizadas através de veículos institucionais são fontes ricas de dados a
respeito de características organizacionais, desde que considerados os
possíveis vieses presentes nos registros produzidos por cada um dos hospitais
(Yin, 2005).

ANÁLISE DE DADOS
O tratamento dos dados foi realizado tomando-se por base as categorias
de análise descritas. Para tanto, utilizou-se o software NVivo9, em que foram
compiladas as transcrições de cada uma das entrevistas, os documentos
disponibilizados pelas instituições e as observações de campo. O software foi
utilizado em todas as etapas da análise, possibilitando a estruturação de cada
um dos estudos de caso, bem como a comparação entre as instituições.
Na primeira etapa, o estudo de caso de cada um dos hospitais
pesquisados foi realizado, buscando compreender a relação das políticas e

43
práticas de Recursos Humanos com a atividade de assistencial em cada uma
das realidades institucionais.
Em um segundo momento, os estudos de caso resultantes da primeira
fase foram divididos em dois grupos, segundo a forma de administração das
instituições, contendo, portanto, cada grupo dois hospitais. Dentro desses
grupos, os hospitais foram comparados entre si, com o objetivo de delimitar
características de interação entre políticas e práticas de Recursos Humanos e o
trabalho assistencial similares e relacionados à forma de gestão das
organizações.
Posteriormente, foram comparadas a estruturação das políticas e práticas
de Recursos Humanos e sua relação com a assistência nos dois grupos de
hospitais (administrados segundo regras da administração pública e segundo
regras da administração privada).

RESULTADOS ENCONTRADOS
A apresentação dos resultados encontrados está organizada segundo as
categorias de análise previamente definidas no presente trabalho. Um dos
objetivos deste estudo é a comparação entre a estruturação das políticas e
práticas de Recursos Humanos em hospitais administrados segundo as regras
públicas e segundo as regras privadas. Essa comparação tem por objetivo o
entendimento de como essas políticas e práticas são influenciadas pela forma
de contratação dos hospitais. Para tanto, serão seguidas as dimensões de
análise previamente definidas.
Estes resultados, embora amplos, permitem destacar, por exemplo, a
forma de vinculação e, em última instância, o modelo de recrutamento e seleção
adotado. Os hospitais administrados segundo as regras públicas vinculam seus
funcionários por meio do RJU e aqueles administrados pelas regras privadas
vinculam os trabalhadores segundo as regras da CLT. O ingresso nos hospitais
orientados pelas regras públicas ainda é prejudicado pela falta de concursos
regulares e pela morosidade desse processo seletivo. Com isso, torna-se
indispensável ao funcionamento do hospital a contratação de profissionais
subordinados a outros vínculos de trabalho, mais imediatos e flexíveis. Nos
hospitais administrados pelas regras privadas, a contratação acontece via CLT.
Vale ressaltar, no entanto, que a contratação dos profissionais médicos não

44
passa por esse fluxo, sendo selecionados por mecanismos informais nas duas
instituições.
A remuneração é diferente nos dois grupos estudados. Nos hospitais
administrados segundo as regras públicas os salários estão definidos em tabela
negociada com o sindicato ou por lei específica, e nos hospitais administrados
segundo as regras privadas eles são definidos de acordo com o mercado.
As carreiras nos hospitais administrados segundo as regras públicas
oferecem a seus trabalhadores planos bem definidos e progressões baseadas
em tempo de serviço e avaliações de desempenho. Nos hospitais administrados
segundo as regras privados não existe definição formal de carreira e os
aumentos salariais são concedidos de forma isolada ou como resultado de
negociação sindical.
A avaliação de desempenho, por ser um critério para a progressão na
carreira, é aplicada nos hospitais administrados segundo as regras públicas de
forma generalizada. Nos hospitais administrados segundo as regras privadas,
mesmo que não totalmente implantadas, as avaliações de desempenho são
vistas como importantes para o desenvolvimento do quadro de funcionários.
De forma geral, nos hospitais administrados segundo as regras públicas,
a política de recursos humanos tem um caráter de proteção aos trabalhadores,
enquanto nos hospitais administrados segundo as regras privadas, a intenção é
um posicionamento estratégico em relação à gestão do hospital.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerando o primeiro objetivo do trabalho, de investigar a capacidade


das políticas e práticas de Recursos Humanos desenvolvidas em hospitais no
SUS de darem respaldo às atividades assistenciais, foi possível constatar que
existe uma grande defasagem do desenvolvimento destas políticas e práticas
nas instituições, de maneira generalizada. Vários processos de Gestão de
Recursos Humanos carecem de definições e implantação, como os sistemas de
premiação. Na única instituição em que os mesmos existem, estão
desconectados do desempenho individual.
A falta de estabelecimento das políticas e práticas de Recursos Humanos
também é percebida pelos gestores assistenciais dos hospitais estudados. Os

45
gestores relacionam vários problemas enfrentados pelas instituições no que
dizem respeito à gestão de pessoal com a falta de definições internas e
programas desenvolvidos. No entanto, como ponto positivo, há de se destacar a
abertura desses profissionais para que essas políticas e práticas sejam
desenvolvidas e o reconhecimento global de que esse trabalho tem grande
potencial de contribuir para a assistência ao paciente.
Visando traçar uma possível diferenciação entre a forma de estruturação
das práticas e políticas de Recursos Humanos em instituições hospitalares de
diferentes naturezas jurídicas, o primeiro ponto essencial seria a confirmação de
que a estruturação das políticas e práticas de Recursos Humanos nas
instituições está de fato intimamente ligada à forma de contratação de pessoal
adotada nos hospitais. As regras de contratação definem a base da estrutura de
Recursos Humanos, sob os quais as demais políticas e práticas são alicerçadas.
Nos hospitais estudados, as principais formas de contratação são o RJU (nas
instituições geridas segundo as regras públicas) e por meio da CLT (instituições
geridas segundo as regras privadas).
Uma vez analisadas as diferenças entre a estruturação das políticas e
práticas de Recursos Humanos nas instituições de diferentes naturezas
jurídicas, três outras questões podem ser depreendidas do estudo realizado.
A primeira questão está relacionada com a estruturação do processo
seletivo nas instituições e com a capacidade do mesmo de dar respaldo às
atividades assistenciais. Seguindo o RJU, o ingresso nas instituições
administradas segundo as regras públicas se dá prioritariamente através de
concursos públicos. Esse processo seletivo claramente não é capaz de suprir a
assistência com profissionais capacitados com a agilidade necessária, uma vez
que os concursos não são realizados regularmente e, quando realizados, são
processos morosos, compostos de várias etapas. Além da demora na provisão
de pessoal, os critérios de seleção utilizados são questionados, por basearem-
se nos títulos que os candidatos possuem e no conhecimento teórico, não
existindo garantias de que esse conhecimento será refletido na prática do
cuidado com o paciente.
Nas instituições administradas segundo as regras públicas, a falta de
provisão de profissionais aprovados em concurso faz com que seja necessária
a contratação de trabalhadores por meio de outros vínculos mais flexíveis,

46
garantindo assim o número adequado de profissionais para o atendimento
assistencial. Essa contratação contraria as leis vigentes, mas é vista como única
alternativa para o pleno funcionamento das instituições de saúde pesquisadas.
Conclui-se, então, que a tentativa de garantir o ingresso justo de
profissionais mediante a realização de concursos públicos, por sua própria
ineficiência, gera uma situação paralela de contratação irregular.
No que diz respeito à agilidade de contratação e à possibilidade de
seleção dos profissionais segundo o perfil necessário ao trabalho assistencial, a
contratação pela CLT apresenta vantagens. Para os contratos pela CLT são
desenvolvidos processos seletivos internos segundo as necessidades
específicas das instituições, que podem ser realizados em prazos menores
quando comparados aos concursos públicos.
No entanto, por serem próprios das instituições, não existem regras
globais para esses processos seletivos. Normalmente, as vagas disponíveis só
são divulgadas quando não existem interessados em número suficiente pela
oportunidade, demonstrando a falta de publicidade dos processos de
contratação. Mesmo sendo verificada preocupação dos profissionais das áreas
de Recursos Humanos dos hospitais com a transparência na condução das
seleções de pessoal, não existem garantias reais de isenção.
A segunda questão diferencial entre a estruturação das políticas e práticas
de Recursos Humanos nas instituições com relação aos vínculos de trabalho
emerge após a contratação dos mesmos. Convivem nas instituições
trabalhadores com diferentes vínculos de trabalho e, consequentemente, com
diferentes salários, benefícios, direitos etc. Essas diferenças influenciam na
fixação e na motivação dos profissionais.
A fixação de profissionais mostrou ser um grande desafio em todas as
instituições, principalmente pelo grande impacto causado na assistência pela
perda de trabalhadores experientes, treinados e habituados às rotinas das
instituições. A fixação se relaciona diretamente com a forma de contratação do
profissional, e quanto mais estável seu vínculo de trabalho, mais ele tende a se
fixar na instituição.
No entanto, os profissionais que possuem vínculos muito estáveis tendem
a ser menos motivados com relação ao trabalho. Aparentemente, a
complexidade dos processos de exoneração no serviço público gera nos

47
empregados e funcionários públicos uma sensação de impunidade quanto aos
desempenhos insatisfatórios e uma consequente acomodação. Por outro lado,
os trabalhadores contratados segundo as regras da CLT sentem que devem
desempenhar bem suas funções, uma vez que, caso contrário, podem ser
demitidos. No entanto, contratos muitos precários, como os estabelecidos com
profissionais autônomos, também são incapazes de motivar os trabalhadores,
que encaram a prestação de serviço como eventual e temporária.
Pode-se concluir que cada forma de vinculação tem vantagens e
desvantagens em relação às demais. No entanto, ao levarmos em conta a
premissa de que o desempenho do sistema de saúde depende do desempenho
dos trabalhadores (OMS, 2007), é de se constatar que a questão da motivação
e dedicação dos trabalhadores às atividades assistenciais é essencial para o
bom atendimento ao usuário do SUS e, portanto, a contratação através da CLT
seria vantajosa neste sentido.
A administração dos hospitais segundo as regras privadas (contratação
via CLT), assim como definido por Braga Neto, Barbosa e Santos (2009),
realmente garante ainda às instituições maior autonomia de gestão de seu
pessoal, sendo essa a terceira questão a ser ressaltada.
Nos hospitais administrados segundo as regras do direito público, a
capacidade de gestão do quadro de pessoal é limitada. A começar pela falta de
autonomia na definição dos selecionados para o trabalho na instituição, o setor
de Recursos Humanos não tem liberdade de negociação de salários e planos de
carreira, de mudança de cargos ou de contar com o desligamento de
trabalhadores inaptos de forma ágil. Com isso, cabe ao setor atividades
cotidianas menos estratégicas para a instituição, tais como a assistência aos
funcionários e o apaziguamento de conflitos.
Já nos hospitais administrados segundo as regras do direito privado, pode
ser constatada uma tentativa de posicionamento estratégico das atividades de
Recursos Humanos. Nessas instituições, a função principal do setor seria o
fortalecimento da capacidade de gestão dos coordenadores em busca dos
objetivos institucionais. No entanto, é de se destacar que o potencial de uma
administração mais autônoma e flexível, baseada nas regras da CLT, não é
explorado ao máximo nas instituições que se utilizam dessa forma de

48
contratação prioritariamente. Assim como destacado inicialmente, muito ainda
pode ser desenvolvido nesses hospitais em termos de gestão de pessoal.

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