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A DECISÃO ILÍQUIDA

A decisão que certifica o direito do credor a uma prestação (fazer, não-fazer, entrega de
coisa ou pagamento de quantia) deve conter pronunciamento sobre: a) o an debeatur
(existência da dívida); b) o cui debeatur (a quem é devido); c) o quis debeat (quem
deve); d) o quid debeatur (o que é devido); e) nos casos em que o objeto da prestação é
suscetível de quantificação, quantum debeatur (a quantidade devida).

Ilíquida é a decisão que (i) deixa de estabelecer o montante da prestação (quantum


debeatur), nos casos em que o objeto dessa prestação seja suscetível de quantificação;
ou (ii) que deixa de individualizar completamente o objeto da prestação, qualquer que
seja a sua natureza (quid debeatur).

CONCEITO DE LIQUIDAÇÃO

Quanto é ilíquida, uma decisão precisa ser liquidada para poder ser título que
fundamente a execução.

O objetivo da liquidação é integrar a decisão ilíquida.

Liquidação de sentença é a atividade judicial cognitiva pela qual se busca complementar


a norma jurídica individualizada estabelecida num título judicial.

É importante fazer três considerações:

1. Há casos em que a decisão define todos os elementos da norma jurídica


individualizada, mas é necessário fazer cálculos aritméticos, de acordo com os
parâmetros indicados na própria decisão ou na lei, para que se possa aferir, em
pecúnia, o quantum debeatur, nesse caso não é necessário a liquidação de
sentença, conforme disposto no art. 786 § único, do CPC.
2. Qualquer decisão condenatória pode ser ilíquida, não apenas aquelas que impõe
o pagamento de quantia.
3. Quando as obrigações de fazer, não fazer ou de entrega de coisa não podem ser
cumpridas na forma especifica, abra-se, no curso da fase executiva do processo
ou do próprio processo autônomo de execução, um incidente cognitivo para
apurar o valor em dinheiro dessa prestação, a fim de que se possa convertê-la
numa obrigação de pagar quantia; essa atividade de apuração de quantum
debeatur também é liquidação.
LIQUIDAÇÃO DE TÍTULO JUDICIAL

Em regra, não é possível falar em liquidação de título executivo extrajudicial, já a


liquidez, ao lado da certeza e da exigibilidade, são atributos indispensáveis para que
as obrigações representadas em tais títulos possam permitir um processo de
execução.

Nas execuções para entrega de coisa e para satisfação de fazer ou não fazer,
fundadas em título executivo extrajudicial, é possível que a prestação especifica seja
convertida em prestação pecuniária, sendo que a conversão pode ocorrer tanto no
início como no curso do processo de execução, em qualquer um dos casos as perdas
e danos devem ser apuradas mediante liquidação.

Optando pela conversão desde o início, o credor precisa deflagrar, primeiramente,


um processo de liquidação; só depois de certificado o valor das perdas e danos é que
tem início a execução. Se a conversão ocorrer no curso do processo de execução,
deve-se instaurar incidente cognitivo para análise dos pressupostos da conversão e
para a liquidação do valor.

MODELOS PROCESSUAIS DE LIQUIDAÇÃO: FASE DE LIQUIDAÇÃO,


PROCESSO AUTÔNOMO DE LIQUIDAÇÃO E LIQUIDAÇÃO INCIDENTAL

Existe três técnicas processuais para viabilizar a liquidação:

a) Fase de liquidação: a liquidação ocorre dentro de um processo já existente, como


questão principal de uma fase do procedimento exclusivamente destinada a esse
objetivo.
b) Processo liquidação: a liquidação é objeto de um processo de conhecimento
autônomo, instaurado com essa exclusiva finalidade.
c) Liquidação incidental: a liquidação ocorre com um incidente processual da fase
executiva do procedimento ou do processo autônomo de execução.

A FASE DE LIQUIDAÇÃO

A liquidação por arbitramento e a liquidação pelo procedimento comum, devem ser


buscadas, como regra, numa fase especifica do processo que se abre com essa exclusiva
finalidade: a fase de liquidação.
Essa fase do procedimento, a liquidação depende de requerimento do interessado, que
tanto pode ser o credor como o devedor, sendo que inicia-se por uma demanda.

Formulada a demanda, o juiz determinará, no caso da liquidação por arbitramento, a


intimação das partes para apresentação de pareceres e documentos, ou, no caso da
liquidação pelo procedimento comum, a intimação do requerido para apresentar
contestação no prazo de 15 dias.

O requerido será intimado do requerimento de liquidação de sentença, na pessoa do seu


advogado. Exige-se o contraditório, mas não se fala em citação exatamente porque não
há instauração de um novo processo; o processo de conhecimento continua pendente,
agora em nova fase.

A decisão que encerra a fase de liquidação em primeiro grau de jurisdição é a sentença,


porque finaliza uma fase cognitiva do procedimento em primeira instância,
complementando a norma jurídica individualizada estabelecida na decisão liquidanda.

O PROCESSO DE LIQUIDAÇÃO

A regra é a liquidação como fase do processo; mas é possível que ela seja buscada por
meio de processo autônomo.

Nesses casos, ou não há processo anterior no qual seja possível instaurar-se uma fase de
liquidação ou, mesmo havendo um processo anterior, nele não é possível instaurar-se
essa fase de liquidação.

Aplica-se por analogia, o regramento previsto para fase de liquidação, mas tem a
necessidade de instauração de um processo autônomo e haverá a citação do demandado.

A LIQUIDAÇÃO INCIDENTAL

Ocorre como incidente processual da execução.

Esse tipo de liquidação, ocorre por exemplo, na execução para entrega de coisa ou de
obrigação de fazer ou de não fazer, se não for possível ou inútil, fazendo necessário a
conversão em prestação pecuniária.

A decisão que resolve a liquidação incidental é interlocutória, por resolver


incidentalmente uma questão, sem encerrar o processo executivo. Se essa decisão
interlocutória versar sobre o mérito da pretensão de liquidação, tem aptidão para,
tornando-se irrecorrível, fazer coisa julgada.

LEGITIMIDADE PARA REQUERER A LIQUIDAÇÃO

Tanto o credor como o devedor têm legitimidade para requerer a liquidação. O juiz não
a pode deflagar de ofício.

COMPETENCIA PARA CONHECER E JULGAR A LIQUIDAÇÃO

Quando se tratar de liquidação-incidente, não há dúvida: considerando que se trata de


incidente cognitivo que surge no curso da fase executiva do processo ou no curso de
processo de execução autônomo, a competência para conhecê-lo é do mesmo juízo
competente para conhecer da execução.

Quando se tratar de liquidação-fase, a competência para proceder à liquidação da


sentença será do juízo que proferiu a decisão liquidanda, aplicando-se aqui os incisos I e
II do art. 516 do CPC. Trata-se de competência funcional-portanto, absoluta.

Quanto se tratar de processo autônomo de liquidação, aplica-se o inciso III do art. 516
“o juízo cível competente, quando se tratar de sentença penal condenatória, de
sentença arbitral, de sentença estrangeira ou de acórdão proferido pelo Tribunal
Marítimo”.

LIQUIDAÇÃO DA SENTENÇA ARBITRAL

A sentença arbitral, que se caracteriza como título executivo judicial, é proferida pelo
árbitro/tribunal arbitral, mas executada por um juízo estatal. O cumprimento de sentença
há de ser proposto perante um juízo estatal.

Havendo sentença arbitral ilíquida, é o próprio árbitro quem deve promover a


liquidação, complementando a sentença, a não ser que haja disposição em contrário na
convenção de arbitragem, mediante a qual se afasta do árbitro essa competência,
hipótese em que caberá ao juízo estatal promover a liquidação da sentença arbitral.

MOMENTO PARA REQUER A LIQUIDAÇÃO

Liquidação de decisão ainda pendente de recurso: não é necessário aguardar o trânsito


em julgado da decisão para promover a sua liquidação. “liquidação provisória” em
autos apartados no juízo de origem.
Vale destacar:

a) Não importa que o recurso tenha ou não efeito suspensivo: é possível liquidar a
decisão judicial, enquanto pendente qualquer recurso contra a decisão
liquidanda.
b) O legislador fala em “recurso”, sem especificar.
c) O requerimento de liquidação de sentença, na pendência de recurso, é incidente
processual que possui autos próprios, devem constar cópias da petição inicial, da
decisão liquidanda e das procurações outorgadas aos advogados de ambas as
partes.
d) Eventual acolhimento do recurso pendente, com a consequente anulação ou
reforma total da decisão liquidanda, esvaziará o conteúdo da liquidação, que
perderá o seu objeto.

Liquidação de decisão que contém parte líquida e outra ilíquida: é possível ao credor
promover, simultaneamente, a liquidação do capítulo ilíquido e a execução do
capítulo líquido, devendo ser feita liquidação em autos apartados.

Liquidação da decisão que resolve antecipada e parcialmente o mérito: sendo


ilíquida, essa decisão, a parte pode requerer a sua liquidação imediata,
independentemente de caução, ainda que haja recurso contra essa interposto, essa
liquidação será processada em autos suplementares.

PRESCRIÇÃO E LIQUIDAÇÃO

STJ vem entendendo que não se pode falar em prescrição quando há demora de
deflagrar a liquidação, porque o prazo de prescrição executiva somente tem início
com a trânsito em julgado da decisão que liquida a obrigação.

Mas há outra prescrição a ser considerada: a prescrição da pretensão à liquidação do


crédito já certificado. É perfeitamente possível dizer que há prescrição da pretensão
à liquidação quando, entre o trânsito em ligada da decisão liquidanda e a deflagração
da atividade liquidatória, há intervalo de tempo igual ou maior que o prazo de
prescrição para o exercício da pretensão cognitiva.

Essa prescrição é intercorrente, quando a liquidação pode ser buscada no mesmo


processo, ou prescrição comum, quando a liquidação depende de processo
autônomo.
Nesses casos, há prescrição da pretensão liquidatória, que enseja a extinção do
processo com resolução de mérito.

A COGNIÇÃO NA LIQUIDAÇÃO

A REGRA DA FIDELIDADE AO TÍTULO

A matéria de mérito da ação autônoma de liquidação ou da fase de liquidação esta


relacionada somente ao elemento que falta para completar a norma jurídica
individualizada estabelecida na sentença liquidanda.

Não se pode, em liquidação, discutir novamente as questões resolvidas na decisão


liquidanda, tampouco se pode modificar o seu conteúdo.

Na liquidação não apenas é vedada a rediscussão ou alteração dessa premissa, veda-


se também que o resultado da liquidação seja contraditório com o título.

A MATÉRIA DE DEFESA NA LIQUIDAÇÃO

A participação em contraditório dos sujeitos processuais é indispensável também no


procedimento de liquidação. Assim, o sujeito passivo da liquidação deve ser
cientificado da pretensão do liquidante, a fim de que sobre ela se manifeste.

Só é possível ao demandado na liquidação suscitar questões que não ofendam a


coisa julgada, nem tenham sido alcançadas pela preclusão.

ESPÉCIES DE LIQUIDAÇÃO

a) A liquidação por arbitramento


b) A liquidação pelo procedimento comum

Súmula 344 do STJ “a liquidação por forma diversa da estabelecida na sentença não
ofende a coisa julgada”.

A LIQUIDAÇÃO POR ARBITRAMENTO

Depende da produção de prova técnica (normalmente prova pericial, em qualquer das


modalidades, ex: vistoria, avaliação, etc).

De acordo com o art. 509, I, do CPC, deve-se optar por esse tipo de liquidação sempre
que:

1. Assim o determinar a decisão liquidanda.


2. Houver convenção das partes nesse sentido, antes ou depois da prolação da
decisão liquidanda.
3. Assim exigir a natureza do objeto da liquidação.

Normalmente, porém é a própria natureza do objeto que exige a liquidação por


arbitramento, pois é necessário valer-se do conhecimento especializado para liquidar.

É possível que a liquidação por arbitramento se desenvolva como fase do processo,


como processo autônomo ou como incidente da fase executiva ou do processo de
execução.

O juiz pode determinar a dispensa de produção de prova, quando achar que os


documentos já são suficientes para liquidação.

Não tem revelia e seus efeitos na liquidação por arbitramento.

Ao final, o juiz proferirá:

1. Decisão interlocutória, quando se tratar de liquidação por arbitramento como


incidente processual.
2. Sentença, quando se tratar de liquidação por arbitramento como fase ou como
processo autônomo.

A LIQUIDAÇÃO PELO PROCEDIMENTO COMUM

Se a apuração do montante da dívida ou a individuação do objeto da prestação depender


de prova de fato novo, ainda que essa prova seja pericial, deve-se proceder com à
liquidação pelo procedimento comum.

Fato novo é aquele relacionado com o valor, com o objeto ou, eventualmente, com
algum outro elemento da obrigação, que não foi objeto de anterior cognição na fase ou
no processo de formação do título, sendo fato que ainda não foi discutido no processo,
ainda que anterior à decisão liquidanda.

Submetem-se também à liquidação pelo procedimento, para que possam ser executados,
a sentença penal condenatória, o acórdão que julga procedente revisão criminal e a
decisão que certifica direitos individuais homogêneo, vez que ai, necessariamente, serão
imprescindíveis a alegação e a prova de fatos novos.
A liquidação, nesse caso, pode desenvolver-se como uma fase do processo ou como
processo autônomo.

LIQUIDAÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA

Tem suas próprias regras, devendo aplica-se o procedimento previsto nos arts. 534 e
535 do CPC.

DECISÃO E RECURSO NA LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA

O parágrafo único do art. 1.015 do CPC dispõe que cabe agravo de instrumento das
decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação de sentença. O mesmo vale,
para o processo autônomo de liquidação e para as decisões interlocutórias na liquidação
incidental.

LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA E VERBAS DE SUCUMBÊNCIA

A decisão que encerra a liquidação não precisa condenar o requerido ao pagamento de


honorários de sucumbência se a decisão liquidanda assim o fez.

Mas há exceções: art. 85 CPC

a) Se na decisão liquidanda não houve condenação.


b) Se a Fazenda Pública é parte no processo e a decisão for ilíquida, a fixação do
valor dos honorários de sucumbência será feita quando liquidada a decisão.
c) Quando se trata de processo autônomo de liquidação, é possível a condenação
em honorários.

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